27 DE FEVEREIRO DE 2020
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Casos como este de João Moura e dos seus animais não são, infelizmente, uma exceção; são, sim, uma
realidade presente em todo o nosso País. Todos os dias se conhecem exemplos de extrema crueldade para
com animais de companhia. Veja-se, por exemplo, o caso da cadela Roxi, que foi morta e esquartejada pelo ex-
companheiro da sua detentora, numa clara demonstração de como o fenómeno da violência contra animais está
intimamente ligado à violência contra pessoas. Ou o caso do cão Simba, em 2016, morto a tiro por um vizinho
e cuja morte valeu ao seu agressor uma irrisória multa de menos de 2000 €. Ou, mais recentemente, o caso da
cadela que foi esventrada pelo seu próprio detentor, que teve apenas a aplicação de uma pena suspensa!
A maioria dos processos tem merecido não mais do que o arquivamento ou a absolvição dos arguidos. A
verdade é que, não obstante o número de acusações deduzidas por crimes contra animais de companhia não
parar de aumentar, tal aumento não se traduz em concretas e efetivas condenações. Isto é apenas o sinal da
sensibilidade crescente para a problemática dos maus-tratos a animais, mas também da gravidade e presença
do fenómeno da violência contra os animais, mas tal aumento não tem correspondência no número de decisões
condenatórias proferidas. As absolvições, por exemplo, passaram de 18%, em 2017, para 44%, em 2018.
Temos, de facto, de ir mais longe e alargar a tutela penal à proteção dos restantes animais, não podemos
continuar a ignorar os maus-tratos a que são sujeitos, permanecendo de olhos fechados para esta realidade.
Aqui tomo de empréstimo as palavras de Milan Kundera que, em A Insustentável Leveza do Ser, referiu: «O
verdadeiro teste moral da humanidade — o mais radical, num nível tão profundo que escapa ao nosso olhar —
são as relações com aqueles que estão à nossa mercê: os animais. É aí que se produz o maior desaire e desvio
do ser humano, derrota fundamental da qual decorrem todas as outras».
Esperamos, por isso, defraudar as palavras de Milan Kundera e que também esta Assembleia não cometa
este desvio, um desvio moral que muito tem sacrificado e penalizado os animais, tão frequentemente esquecidos
pelo nosso País.
Sr.as e Srs. Deputados, deram já entrada duas iniciativas do PAN tendentes a assegurar uma maior defesa
e proteção dos animais. Uma delas, o Projeto de Lei n.º 183/XIV/1.ª, visa reforçar o regime sancionatório
aplicável aos animais de companhia e alargar a proteção aos animais sencientes vertebrados; a outra, o Projeto
de Lei n.º 219/XIV/1.ª, determina a proibição das corridas de cães, mais conhecidas por «corridas de galgos».
Trata-se, assim, de duas iniciativas que se revestem da maior pertinência e atualidade, pelo que resta saber
se os Srs. Deputados vão estar disponíveis ou não para acompanhar estas preocupações do PAN e da
sociedade civil, a fim de garantirmos a proteção devida aos animais, o que acreditamos ser, de facto, da mais
elementar justiça.
Aplausos do PAN.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, a Mesa regista cinco inscrições para pedidos de esclarecimento.
Como pretende responder?
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Responderei em duas rondas, Sr. Presidente, uma de três pedidos de
esclarecimento e outra de dois.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, então, a palavra, a Sr.ª Deputada Mariana Silva para formular o
primeiro pedido de esclarecimento.
A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, as
preocupações em torno do bem-estar animal têm estado na agenda da intervenção de Os Verdes ao longo dos
anos através das diversas iniciativas legislativas apresentadas nesta Assembleia.
Desde a construção da Lei de Bases da Proteção Animal, na distante VII Legislatura, que, ao longo do tempo,
Os Verdes deram prioridade a projetos para combate a violência, a criminalidade e a exploração dos animais.
Portanto, o Parlamento tem vindo, ao longo dos anos e das diversas legislaturas, a criar legislação importante
no que se refere ao bem-estar animal. E se é verdade que o Parlamento não acordou recentemente para as
questões em torno do bem-estar animal, também é verdade que se trata de um caminho que, na perspetiva de