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Quinta-feira, 14 de maio de 2020 I Série — Número 52

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE13DEMAIODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Lina Maria Cardoso Lopes Nelson Ricardo Esteves Peralta

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 6

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º

31/XIV/1.ª, dos Projetos de Lei n.os 365 a 367, 369 a 374 e 376/XIV/1.ª, das Apreciações Parlamentares n.os 11 a 13/XIV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 426 a 450/XIV/1.ª.

Procedeu-se a um debate de atualidade, requerido pelo PSD, pelo BE e pelo CDS-PP, ao abrigo do n.º 10 do artigo 72.º do Regimento, sobre o tema «Novo Banco — questões financeiras». Depois de os Deputados Duarte Pacheco (PSD), Mariana Mortágua (BE) e Cecília Meireles (CDS-PP) terem aberto o debate, usaram da palavra, a diverso título,

além daqueles oradores, o Secretário de Estado Adjunto e das Finanças (Ricardo Mourinho Félix) e os Deputados André Silva (PAN), José Luís Ferreira (PEV), João Paulo Correia (PS), Duarte Alves (PCP), João Cotrim de Figueiredo (IL), André Ventura (CH), Álvaro Almeida (PSD), Fernando Anastácio (PS) e Afonso Oliveira (PSD).

Em declaração política, o Deputado José Luís Ferreira (PEV) lembrou que a pandemia originou uma crise com efeitos em todos os setores de atividade, pelo que alertou para a importância, após abertura progressiva do período de confinamento, de se repensarem prioridades e de se encontrarem respostas para políticas públicas com vista à

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qualidade de vida e ao bem-estar das pessoas. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Hugo Pires (PS), Clara Marques Mendes (PSD), Paula Santos (PCP), Nelson Peralta (BE) e Cristina Rodrigues (PAN).

Em declaração política, o Deputado Pedro do Carmo (PS) salientou o papel da agricultura, da pecuária, da pesca e de outros setores produtivos neste período de pandemia pela resposta que deram ao assegurarem a cadeia de fornecimento alimentar da população e defendeu o consumo de produtos nacionais. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Ricardo Vicente (BE), Emília Cerqueira (PSD), André Ventura (CH), João Dias (PCP), José Luís Ferreira (PEV), Cecília Meireles (CDS-PP) e Cristina Rodrigues (PAN).

Em declaração política, a Deputada Diana Ferreira (PCP) considerou insuficientes as respostas do Governo para as famílias com crianças a frequentarem diversos equipamentos de apoio à infância, reforçou as propostas do seu partido no sentido da gratuitidade de uma rede pública de creches até à idade de entrada no pré-escolar e manifestou preocupação pelas condições de segurança na reabertura daqueles estabelecimentos. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Ana Rita Bessa (CDS-PP), João Paulo Pedrosa (PS), Helga Correia (PSD), Mariana Silva (PEV) e Joana Mortágua (BE).

Em declaração política, a Deputada Inês de Sousa Real (PAN) defendeu a valorização, pelo Governo e pela Assembleia da República, do papel fundamental desempenhado pelos profissionais de saúde, pelas forças e serviços de segurança e socorro, pelas Forças Armadas e pelos serviços públicos durante a pandemia, tendo ainda chamado a atenção para a necessidade de, com o alívio das medidas sanitárias, se acautelar a proteção de todos os que retomarem os seus trabalhos presencialmente. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Alberto Machado (PSD), Ana Rita Bessa (CDS-PP), André Ventura (CH), Diana Ferreira (PCP), Sónia Fertuzinhos (PS) e Moisés Ferreira (BE).

Em declaração política, o Deputado João Cotrim de Figueiredo (IL) fez um balanço das medidas implementadas no País desde o primeiro caso de COVID-19 e deu conta da apresentação, pelo seu partido, de um programa de retoma económica e cívica, tendo respondido a pedidos de

esclarecimento dos Deputados André Silva (PAN), Hugo Costa (PS) e Cecília Meireles (CDS-PP).

Em declaração política, o Deputado André Ventura (CH), a propósito de um crime que levou à morte de uma criança, propôs a alteração da lei portuguesa com vista à restauração da prisão perpétua e insurgiu-se contra aqueles que o têm ameaçado, bem como ao seu partido, com processos judiciais pelas ideias que defende. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento das Deputadas Isabel Rodrigues (PS) e Inês de Sousa Real (PAN).

Foi apreciada a Petição n.º 365/XIII/2.ª (Associação Nacional de Apostadores Online) — Revisão da lei do jogo online, nomeadamente da taxação das apostas desportivas à cota. Intervieram os Deputados Emídio Guerreiro (PSD), Cristina Jesus (PS), Duarte Alves (PCP), João Gonçalves Pereira (CDS-PP) e Isabel Pires (BE).

Foi apreciada a Petição n.º 623/XIII/4.ª (Arménio Francisco Gonçalves Maximino e outros) — Solicitam a adoção de medidas contra a deslocalização dos serviços de registo sitos na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.os 7 a 11, Lisboa. Usaram da palavra os Deputados Rita Borges Madeira (PS), Catarina Rocha Ferreira (PSD), José Manuel Pureza (BE), António Filipe (PCP), João Gonçalves Pereira (CDS-PP), André Ventura (CH) e Inês de Sousa Real (PAN).

Foi apreciada a Petição n.º 597/XIII/4.ª (Amélia Luciana Brugnini de Sousa Uva Passo e outros) — Solicitam que a profissão de tripulante de cabine seja qualificada como de desgaste rápido juntamente com os Projetos de Resolução n.os 268/XIV/1.ª (PEV) — Classificação de tripulante de cabine como profissão de desgaste rápido e 251/XIV/1.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de tripulante de cabine com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade e à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho e com, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 234/XIV/1.ª (CDS-PP) — Criação do grupo de trabalho para a regulamentação legal das profissões de desgaste rápido e criação da respetiva tabela. Pronunciaram-se os Deputados Mariana Silva (PEV), Isabel Pires (BE), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Carla Barros (PSD), Diana Ferreira (PCP), Inês de Sousa Real (PAN) e Hugo Oliveira (PS).

A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 19 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 6 minutos.

Antes de entrarmos no primeiro ponto da ordem do dia, o Sr. Secretário Nelson Peralta vai ter o gosto de ler

um conjunto de iniciativas que VV. Ex.as fizeram entrar na Mesa.

Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Nelson Peralta): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, passo a anunciar as várias

iniciativas legislativas que deram entrada na Mesa e foram admitidas.

Refiro, em primeiro lugar, a Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece medidas excecionais e

temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da pandemia da doença COVID-19.

Deram ainda entrada na Mesa os seguintes Projetos de Lei: n.º 365/XIV/1.ª (PAN) — Altera as regras de

nomeação do Governador e demais membros do Conselho de Administração do Banco de Portugal (Oitava

alteração à Lei n.º 5/98, de 31 de janeiro); n.º 366/XIV/1.ª (PCP) — Cria o regime de apoio à retoma e

dinamização da atividade dos feirantes no abastecimento às populações, no contexto da resposta à epidemia

de COVID-19; n.º 367/XIV/1.ª (BE) — Cria o subsídio extraordinário de desemprego e de cessação de atividade,

aplicável a trabalhadores por conta de outrem, trabalhadores independentes e trabalhadores informais excluídos

de outros apoios; n.º 369/XIV/1.ª (PCP) — Controlo público da TAP e da SPdH; n.º 370/XIV/1.ª (BE) — Proteção

dos direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica; n.º 371/XIV/1.ª (PCP) — Propõe

medidas para o alargamento da gratuitidade das creches e soluções equiparadas; n.º 372/XIV/1.ª (PCP) — Cria

um regime de reforço de trabalhadores em equipamentos sociais e revoga a Portaria n.º 82-C/2020, de 31 de

março; n.º 373/XIV/1.ª (N insc.) — Estabelece medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural

português, no âmbito da crise epidemiológica (texto inicial substituído a pedido do autor); n.º 374/XIV/1.ª (PCP)

— Medidas de apoio imediato às pequenas e médias explorações agrícolas que compensem os agricultores

pelos graves prejuízos resultantes do surto epidémico da COVID-19; e n.º 376/XIV/1.ª (CDS-PP) — Atualização

do compromisso de cooperação celebrado com as entidades do setor social e solidário num valor que cubra os

custos do aumento da remuneração mínima mensal garantida e de outros fatores, tais como a inflação.

Deram também entrada na Mesa as seguintes Apreciações Parlamentares: n.º 11/XIV/1.ª (PCP) — Relativa

ao Decreto-Lei n.º 19/2020, de 30 de abril, que estabelece um regime temporário e excecional de apoio às

associações humanitárias de bombeiros, no âmbito da pandemia da doença COVID-19; n.º 12/XIV/1.ª (BE) —

Relativa ao Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio, que altera as medidas excecionais e temporárias relativas à

pandemia da doença COVID-19, retificado pela Declaração de Retificação n.º 18-C/2020; e n.º 13/XIV/1.ª (PCP)

— Relativa ao Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio, que altera as medidas excecionais e temporárias relativas

à pandemia da doença COVID-19, retificado pela Declaração de Retificação n.º 18-C/2020, de 5 de maio, da

Presidência do Conselho de Ministros.

Por fim, refiro a entrada na Mesa dos seguintes Projetos de Resolução: n.º 426/XIV/1.ª (CDS-PP) —

Recomenda ao Governo medidas concretas para eliminar o fosso digital na educação; n.º 427/XIV/1.ª (BE) —

Alarga a abrangência do apoio do Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana no pagamento das rendas

habitacionais no âmbito da COVID-19; n.º 428/XIV/1.ª (CDS-PP) — Programa extraordinário de recuperação de

listas de espera para consulta, MCDT e cirurgia; n.º 429/XIV/1.ª (PEV) — Informação aos cidadãos sobre as

melhores práticas de utilização corrente de material de proteção individual, como máscaras, viseiras ou luvas, e

incentivo à opção por material reutilizável; n.º 430/XIV/1.ª (PEV) — Recomenda ao Governo que não resgate

grandes indústrias poluentes no período de influência da COVID-19 e no relançamento da economia; n.º

431/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que assegure a qualidade de serviço dos aterros em Portugal; n.º

432/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a aplicação da taxa reduzida do IVA a substâncias nutrientes ou

nutrimentos (vitaminas e minerais) que reforcem o sistema imunológico humano; n.º 433/XIV/1.ª (PEV) —

Medidas de prevenção e erradicação do racismo; n.º 434/XIV/1.ª (BE) — Transição ecológica: a resposta à crise

pandémica, social e económica; n.º 435/XIV/1.ª (CDS-PP) — Medidas de auxílio às empresas itinerantes do

setor das diversões; n.º 436/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que tome as medidas de defesa do rio

Tejo; n.º 437/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que condicione a emissão de licença de exploração das

novas centrais de biomassa ao cumprimento de rigorosos padrões ambientais e de sustentabilidade; n.º

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438/XIV/1.ª (IL) — Pela suspensão imediata do pagamento de IMI para senhorios com perdas superiores a 20%

dos rendimentos; n.º 439/XIV/1.ª (BE) — Incentivo aos modos ativos de transporte durante e após o período de

pandemia para a proteção do ambiente e do espaço público; n.º 440/XIV/1.ª (PSD) — Complemento do

Programa de Estabilidade 2020 com a apresentação de um programa de emergência social e ação diplomática

para seu financiamento europeu; n.º 441/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do

Programa Nacional de Reformas, adote um conjunto de medidas concretas que permitam respostas para todos

os portugueses afetados pela pandemia; n.º 442/XIV/1.ª (PCP) — Pelo direito soberano de Portugal decidir do

seu futuro: combater o vírus e o seu aproveitamento, assegurar o desenvolvimento do País; n.º 443/XIV/1.ª

(PAN) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do programa nacional de reformas, inclua no plano de

recuperação da crise económica, social e sanitária provocada pela COVID-19 a opção estratégica por um

modelo de recuperação assente no investimento no combate e adaptação às alterações climáticas, na não

aplicação de medidas de austeridade e em medidas de combate a interesses instalados; n.º 444/XIV/1.ª (PAN)

— Recomenda ao Governo que efetue uma transição económica e social sustentável no decurso da crise da

COVID-19; n.º 445/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que defina um plano estratégico para garantir a

transição digital nas escolas; n.º 446/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que alargue a duração da

concessão dos apoios à habitação; n.º 447/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que não apoie indústrias

poluentes no âmbito da crise da COVID-19; n.º 448/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que promova os

meios ativos de transporte, durante e após a crise da COVID-19; n.º 449/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao

Governo que priorize o investimento nas necessidades estruturais e de funcionamento do Serviço Nacional de

Saúde e a valorização de todos os seus profissionais; e n.º 450/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda o uso de máscaras

adaptadas para utilização dos profissionais e funcionários das creches.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário Nelson Peralta, pela leitura de tantas iniciativas.

Vamos entrar no primeiro ponto da ordem do dia, que consta de uma marcação do PSD, do BE e do CDS-

PP, com um debate de atualidade, ao abrigo do n.º 10 do artigo 72.º do Regimento da Assembleia da República,

sobre o tema «Novo Banco — Questões financeiras».

Como deverão saber, nas declarações políticas havia três intervenções sobre este mesmo tema e, tal como

está regimentalmente previsto, os grupos parlamentares chegaram a acordo para transformá-las num debate de

atualidade.

Assim, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O País

vive numa situação de saúde pública que era inimaginável há seis meses, com fortes consequências económicas

e sociais: recessão a registar um valor recorde, desemprego a subir, desespero a entrar em muitos lares

portugueses.

Foi neste contexto que os portugueses, e aparentemente o próprio Primeiro-Ministro, foram surpreendidos

com uma decisão do Ministério das Finanças. Do alto da sua tradicional arrogância, o Dr. Mário Centeno decidiu

transferir 850 milhões de euros para o Fundo de Resolução destinado ao Novo Banco sem dar qualquer

explicação ao País, num comportamento inaceitável em democracia. Confrontado com a gravidade do seu

comportamento, o Dr. Mário Centeno procura encontrar qualquer explicação que lhe permita tirar «a água do

seu capote».

Afinal, a responsabilidade pela transferência dos 850 milhões pode ser — sabe Deus! — de D. Afonso

Henriques, que constituiu o reino português; dos Governos e dos Deputados que permitiram instituições

financeiras privadas; do Dr. Ricardo Salgado, pela gestão que fez do BES (Banco Espírito Santos); do Governo

que procedeu à resolução do banco para salvaguardar a sustentabilidade do sistema financeiro; da Assembleia

da República, que, através de uma comissão de inquérito, analisou a resolução e aprovou um relatório sem

identificar este problema, com os votos do próprio PS e do hoje Ministro Pedro Nuno Santos.

Afinal, a responsabilidade é de todos menos de uma pessoa, menos do próprio Dr. Centeno. Porém, foi ele

quem definiu as formas de venda do Novo Banco ao Lone Star, quem acordou os termos deste pagamento ao

longo do tempo e quem, afinal, aparentemente à revelia do Primeiro-Ministro, deu a ordem para se passar este

cheque.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É verdade que estão definidas as condições, os pressupostos e as

circunstâncias em que estas transferências devem ser feitas, mas também é verdade que, quando os valores

apresentados atingem este montante, o Governo deveria proceder a uma auditoria, a uma análise ou a um

estudo em vez de pagar «de cruz».

O Primeiro-Ministro concorda com este princípio e, por isso mesmo, deu como garantia a este Parlamento a

auditoria que está em curso, dizendo que até haver resultados dessa auditoria não haveria qualquer reforço do

empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução para esse fim. A seguir, o Primeiro-Ministro foi desautorizado

pelo Ministro das Finanças e ficou em silêncio. Pergunta-se: até quando?

O Presidente da República concorda com este princípio, porque diz que há uma auditoria que deveria estar

concluída em maio deste ano, e para os portugueses não é indiferente cumprir os compromissos com

conhecimento do que se passou ou cumprir os compromissos e só mais tarde virem a saber o que se passou.

Mas para o Dr. Centeno nada disso faz sentido. Ele pensa de forma diferente do Primeiro-Ministro e do

Presidente da República. E logo decidiu entregar 850 milhões de euros ao Novo Banco sem esperar pelo

resultado dessa auditoria e, mais, sem sequer avisar o Primeiro-Ministro de que o iria fazer, levando o Primeiro-

Ministro a enganar a Assembleia da República, os portugueses e a apresentar um pedido de desculpas.

Sendo assim, tem de fazer-se esta pergunta: o Primeiro-Ministro exerce a sua autoridade no Governo deste

modo? Estranho, estranho País em que vivemos!…

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este é o Ministro das Finanças que não manifesta qualquer

constrangimento com a sua decisão e que afirma não ter de pedir desculpas ao Primeiro-Ministro por o ter

enganado. E, a seguir, o Primeiro-Ministro ouve e cala-se. Estranho País este em que vivemos!…

Este é o mesmo Ministro das Finanças que não sente nenhuma iniquidade em deixar acumular milhões de

euros de dívidas em atraso às empresas fornecedoras do Estado, mesmo numa situação de aflição para essas

empresas, que atrasa a devolução do IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) que é devido

às famílias, mesmo numa situação social crítica, mas que, a seguir, não sente nenhuma iniquidade em pagar a

tempo e horas ao Novo Banco. Inaceitável! É inaceitável decerto para os portugueses. Não é inaceitável para o

Dr. Centeno.

Razão tinha o PSD quando fez aprovar no Orçamento do Estado para este ano uma norma limitadora e

escrutinadora destas transferências financeiras. Mas, por aquilo que vimos, temos de ir mais longe, temos de

ser mais certeiros, para prevenir a arrogância do Ministro das Finanças, já que o Primeiro-Ministro não consegue

controlá-lo.

Por isso, vamos apresentar uma iniciativa legislativa, definindo que novas transferências só poderão ocorrer

após a Assembleia da República ser informada dos termos e das razões invocados para o efeito.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Isto, Sr.as e Srs. Deputados, porque, nos tempos que já vivemos, e naqueles que iremos viver, a coesão da

sociedade é um valor essencial, filha da confiança, que só a verdade e a seriedade da governação podem

instilar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O País tomou nota do compromisso

do Primeiro-Ministro perante o Parlamento, e cito: «Até haver resultados da auditoria não haverá qualquer

reforço do empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução».

Hoje, o Ministro das Finanças explicou que esse compromisso do Primeiro-Ministro era «impensável» e

«irresponsável». Acrescentou, mais, e cito, que era destinado a disputar «10 segundos de telejornal» e «um

slogan de ocasião», que «há quem teime em não aprender» e que «não havia qualquer margem para dúvida»

de que os 850 milhões de euros tinham que ser pagos.

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Não havia mesmo margem para dúvida. O compromisso do Primeiro-Ministro era público, era explícito e foi

violado.

Portanto, de duas, uma: ou estamos a assistir a uma remodelação em direto e o Ministro das Finanças sairá

do Governo, porque considera o seu Primeiro-Ministro «irresponsável»; ou já assistimos a uma remodelação e

o Ministro das Finanças passou a dirigir o Governo. O que o Governo não nos pode dizer é que se compromete

a não pagar sem auditoria e paga sem auditoria, ou que a auditoria é indispensável mas não é necessária.

O rigor é imprescindível nesta matéria porque Portugal sabe bem que, sempre que o antigo BES entra por

uma porta, saem pela janela centenas de milhões de euros, e com eles voam também os compromissos políticos

anteriormente assumidos.

Em 2015, Maria Luís Albuquerque garantiu que a resolução não traria custos para os contribuintes. António

Costa, na altura, acusou-a, e bem, de «iludir os contribuintes». Três anos mais tarde, foi António Costa a jurar

que a venda do Novo Banco não traria mais encargos para os contribuintes. Centeno acrescentava, nessa altura,

que a venda não iria incluir uma «garantia de Estado para suportar negócios privados». Ou seja, até hoje,

nenhum Governo teve a coragem de dizer aos portugueses a verdade sobre o Novo Banco.

Todo o processo do BES já custou aos contribuintes 6030 milhões de euros: 3900 milhões de euros, por

conta da tal resolução que não teria custos, e mais 2130 milhões de euros, perdidos com a tal venda que não

teria encargos. E o Novo Banco não deixará de reclamar os 1000 milhões de euros que sobram da tal garantia

pública que não iria existir.

No fim da história, o fundo Lone Star ficará com um banco pronto para vender, as empresas que compram

as carteiras de créditos tóxicos farão o seu lucro e os administradores terão os seus bónus. E tudo pago com

dinheiro dos contribuintes.

Sr.as e Srs. Deputados: A crónica desta anunciada auditoria já vai longa. Em fevereiro de 2019, a auditoria

foi determinada por lei. Em março, o Ministério das Finanças escrevia que «o valor expressivo das chamadas

de capital em 2018 e 2019 tornava indispensável a realização de uma auditoria para o escrutínio do processo

de concessão dos créditos incluídos no mecanismo de capital contingente».

Na mesma altura, o Primeiro-Ministro defendeu a auditoria, enquanto o Ministro Centeno apontava que os

riscos que estavam no balanço do Novo Banco, desde 2014, tinham de ter nomes e responsabilidades apuradas.

Mais tarde, a auditoria voltou a ser recomendada pela Assembleia da República.

Tudo isto precedeu o compromisso do Primeiro-Ministro, no passado dia 22 abril, em resposta ao Bloco de

Esquerda, ao dizer: «A auditoria sobre o Novo Banco que determinámos está em curso, só estará concluída em

julho, e é fundamental para fazer as decisões que temos que fazer no âmbito do contrato de financiamento».

E chegamos ao dia de hoje, depois de o Ministro das Finanças ter passado o cheque de 850 milhões de

euros ao Novo Banco ignorando o compromisso assumido pelo Primeiro-Ministro.

Srs. Deputados, isto não é uma «falha de comunicação», é um problema político de enorme gravidade. É

que deixamos de saber se o que vale é a palavra do Primeiro-Ministro ou se as suas promessas podem depois

ser quebradas por um dos seus ministros.

O valor das chamadas de capital, se já era expressivo na altura em que o Ministro das Finanças determinou

a auditoria, aumentou em 50%, só nesta injeção, para 3000 milhões de euros.

Entretanto, o banco, que continuou a apresentar prejuízos ao longo deste tempo, decidiu atribuir um bónus

de 2 milhões de euros aos mesmos administradores que se têm esforçado por esgotar rapidamente a garantia

pública.

Ou seja, o acionista Estado tem 10% do capital, pagou a conta dos prejuízos, não tem nada a dizer sobre a

atribuição de prémios milionários, não apurou responsabilidades sobre os créditos e não verificou a gestão dos

ativos e da carteira tóxica de crédito que está ao abrigo da garantia. A única pressa do Estado parece ser a de

colocar na mão do Lone Star mais um cheque de centenas de milhões de euros.

A República, Sr.as e Srs. Deputados, não tolera este jogo político. Um compromisso é um compromisso e um

euro do dinheiro dos contribuintes é um euro do dinheiro dos contribuintes.

O compromisso do Bloco de Esquerda é que, para além da proibição da atribuição de bónus — passados,

presentes ou futuros, enquanto o Novo Banco estiver a ser salvo com dinheiro público —, qualquer nova injeção

de capital público seja submetida à decisão da Assembleia da República. Isto, para que não voltemos a ficar

dependentes de compromissos frágeis e que se perdem pelo caminho.

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Esta proposta, que curiosamente o PSD vem agora apresentar como sendo a solução para os problemas —

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Não é a mesma?!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … foi dito aqui pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco que iriam querer sujeitar

novas injeções ao escrutínio da Assembleia da República —, foi exatamente a proposta apresentada pelo Bloco

de Esquerda, em janeiro, aquando da discussão do Orçamento do Estado, e foi exatamente a proposta que o

PSD chumbou, em janeiro, quando votou o Orçamento do Estado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Se a proposta do Bloco de Esquerda tivesse sido aprovada em janeiro, a

Assembleia da República teria discutido a injeção de dinheiro no Novo Banco e teria podido esperar pela

auditoria, para que este processo fosse claro, transparente e tivesse o rigor que a República exige e merece.

O que podemos esperar é que, desta vez, quando apresentarmos este projeto, a indignação do PSD

contribua para a aprovação destas medidas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Creio que se algum

extraterrestre chegasse hoje ao Parlamento e assistisse às discussões que temos, iria ficar convencido de que

Portugal era o único País do mundo que não tinha sido afetado pela pandemia.

Infelizmente, não é assim. Portugal foi, sim, afetado pela pandemia. E num momento como este, é preciso

saber escolher prioridades. E as prioridades, aqui, têm de ser as pessoas, a economia, os trabalhadores e as

empresas que foram forçados a parar por força da pandemia.

E não deixa de ser extraordinário que estejamos a discutir num momento em que, para o Governo, parece

ser bastante mais prioritário fazer transferências para o Novo Banco do que fazer transferências para estas

pessoas, para a economia e para as empresas.

Vou explicar. Nós ouvimos o Sr. Ministro das Finanças dizer aqui que para o Novo Banco era preciso cumprir

os contratos, que o princípio é o de que os contratos são para cumprir.

Ora, só posso lamentar que, para as empresas, para os trabalhadores e para as pessoas, que esperam e

desesperam por que o Governo cumpra o prometido, já não fosse prioridade que o Governo contratasse aquilo

que tinha prometido.

E é bom lembrar aqui que estas empresas e estes trabalhadores precisam de apoio não porque tenham

gerido mal, não porque tenham trabalhado mal, não porque tenha havido alguma fraude, mas porque a economia

parou e as autoridades decidiram que, por razões de saúde pública, era preciso parar a economia. É por isso

que é precisa a intervenção do Estado.

Neste aspeto, gostava de ir um pouco ao detalhe, porque algumas perguntas ficaram sem resposta. Sr.as e

Srs. Deputados, ouvimos o Sr. Ministro das Finanças dizer que era preciso cumprir os contratos. Então, tenho

de perguntar se o Sr. Primeiro-Ministro de Portugal não sabe aquilo que, em nome do Estado, contratou e como

é que pôde assumir no Parlamento um compromisso que viola aquilo que ele próprio decidiu contratar.

E já que discutimos o passado e os contornos da resolução, também vale a pena falar em alternativas. E aí

pergunto se a alternativa que estamos hoje a discutir seria a de ter deixado o Banco Espírito Santo com a gestão

que lá tinha e com o Estado a dar garantias públicas, ao invés de fazer uma resolução, porque, aparentemente,

parece que é isso que alguns senhores do PS preferem agora, como preferiram no passado.

Por último, gostava de dizer o seguinte: em política, há prioridades. Passámos os últimos dias a discutir as

transferências para o Novo Banco porque, para este Governo, a prioridade foi fazer esta transferência. Para o

Novo Banco foi preciso cumprir contratos; para as empresas portuguesas, que esperam e desesperam pelas

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linhas de crédito que o Governo anunciou já lá vai mais de um mês, já não é preciso cumprir aquilo que se

prometeu.

Soubemos ontem, através das sociedades de garantia mútua que o CDS chamou ao Parlamento, quase ao

mesmo tempo que o Sr. Primeiro-Ministro anunciava linhas de crédito que já atingem o limite de 5000 milhões

de euros, soubemos ontem, dizia, pouco tempo depois, na comissão, que, na realidade, só 8,7% desse montante

estava efetivamente contratado. Ou seja, a esmagadora maioria das empresas não tinha recebido nem um

cêntimo.

Mais, soubemos também que, até ao dia 16, 17 de abril, a esmagadora maioria das candidaturas não tinha

sequer entrado. E só quando houve uma reformulação das linhas é que a esmagadora maioria das empresas

se pôde candidatar. E aguarda-se, até agora, que o Governo venha explicar por que é que para estes

empresários, pura e simplesmente, não havia contratos para cumprir, ao contrário do que aconteceu com o Novo

Banco.

Em segundo lugar, quero também lembrar as empresas exportadoras, que esperam e desesperam por um

seguro de crédito para poderem exportar dentro da União Europeia, que é onde temos os nossos principais

clientes. Estes seguros estão parados desde o princípio da pandemia. Também para estes empresários e para

os trabalhadores destas empresas, que tanto são louvados nos discursos, não há contratos que lhes valham

como ao Novo Banco, têm de esperar e não sabem quando é que terão seguros de crédito.

Também para os trabalhadores que estão em layoff sabemos que o Governo se havia comprometido e

contratado com as empresas que lhes pagaria até ao dia 28 de abril. Pois bem, ao contrário do Novo Banco,

com estas empresas, foi possível não cumprir o prazo e até hoje não sabemos exatamente a quantas terá sido

pago nem quantos trabalhadores estão abrangidos.

Por último, e já que falamos em prazos, gostava de lembrar os contribuintes portugueses, aqueles que

receberam ou aqueles que ainda estão à espera de receber reembolso de IRS, aqueles que adiantaram mais

dinheiro ao Estado do que o que seria devido, em impostos. Também a esses não lhes valeram os prazos,

porque, inexplicavelmente, neste período de pandemia, em que muitos trabalhadores viram reduzido o seu

rendimento e muitas pessoas ficaram sem emprego ou estão a receber um salário reduzido, mesmo a esses, o

Estado demorou mais tempo, mais uma semana, a processar reembolsos do que tinha demorado no ano

passado. Com esses, não havia contratos que o Estado tivesse de cumprir.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PAN, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado André

Silva.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A

transferência dos 850 milhões de euros para o Novo Banco, via Fundo de Resolução, é uma operação em que

o Governo e o Sr. Ministro das Finanças mostraram uma conduta irresponsável e imoral. Irresponsável porque

todos sabemos que, pelos milhões envolvidos, haverá um enorme impacto nos resultados orçamentais do nosso

País este ano, os quais, devido ao novo coronavírus, já estão bastante comprometidos. Imoral porque esta

decisão do Governo demonstra, na nossa opinião, que mesmo num contexto grave como o que vivemos, em

que cada euro conta, para o Governo, a banca e os interesses instalados estão à frente dos cidadãos e são

sempre a prioridade número um.

De resto, não deixa de ser irónico que o Governo que afirma que não existe dinheiro, por exemplo, para

financiar apoios para que os sócios-gerentes das micro, pequenas e médias empresas ou para que os artistas

e os profissionais do setor da cultura possam fazer face às graves dificuldades financeiras, é o mesmo Governo

que, na semana passada, com pouco mais de um mês de vigência do Orçamento do Estado, injetou com grande

urgência muitos milhões de euros para tapar buracos da má gestão da banca.

Contrariamente a outros partidos, o PAN votou contra essa injeção de capital no Novo Banco em sede de

Orçamento do Estado. Goste-se ou não, essa transferência passou pelo Parlamento e foi aprovada, pelo que,

aos partidos que a viabilizaram e estão esquecidos, deve dizer-se: a responsabilidade política também é vossa.

Aliás, de resto, o Partido Socialista não tem maioria neste Parlamento e esta injeção de capital só ocorreu porque

outros partidos o permitiram.

Mas é importante aqui lembrar que, daqui para a frente, qualquer nova transferência de dinheiros públicos

para o Novo Banco não só terá de ser aprovada pelo Parlamento, como, por proposta do PAN, aprovada em

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Orçamento do Estado por todos os partidos à exceção do Partido Socialista, o Governo terá de identificar o tipo

de medida em causa, o montante, as condições, os juros e o prazo máximo de reembolso, e essa proposta será

sujeita a uma análise técnica prévia da UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental) e do Conselho das

Finanças Públicas, duas entidades independentes, credíveis e livres de quaisquer constrangimentos políticos.

Tudo isto permitirá, pela primeira vez, e pela mão do PAN, que todos os cidadãos e cidadãs possam, em

momento prévio à injeção, saber o verdadeiro impacto orçamental na sustentabilidade das finanças públicas

destas transferências e se estas cumprem ou não as regras orçamentais, o que é um passo a mais no sentido

da transparência e que reforça grandemente os poderes do Parlamento. Estranho é que o Partido Social

Democrata já não se recorde desta norma que foi aprovada e tenha vindo aqui, precisamente há um quarto de

hora, dizer que vai apresentar uma iniciativa legislativa sobre matéria que já está aprovada.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Só vale para este ano!

O Sr. André Silva (PAN): — E se dúvidas existem sobre isto, veja-se o artigo 154.º, n.º 6, do Orçamento do

Estado. Aquilo que está aprovado é aquilo que o Partido Social Democrata veio a esta tribuna dizer que vai fazer

debater e aprovar.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Só vale para este ano!

O Sr. André Silva (PAN): — Contudo, sem referir aqui que a resolução do BES foi decidida na praia, não

podia deixar de sublinhar que o PSD, agora tão preocupado com a falta de auditoria prévia à transferência dos

850 milhões de euros para o Novo Banco, é o mesmo partido que, há poucos meses, em janeiro, com a sua

abstenção, deu a mão ao Partido Socialista e chumbou a proposta do PAN, que pretendia — espantem-se! —

que quaisquer transferências de dinheiros públicos para o Novo Banco acima de 850 milhões de euros tivessem

de ser precedidas por uma auditoria.

O PSD do Dr. Rui Rio já nos vem habituando a que o lema do «bem prega frei Tomás, olha para o que ele

diz, não olhes para o que ele faz» se lhe aplique que nem uma luva, mas a desfaçatez em matéria de banca tem

ultrapassado todos os limites.

Por isso, seria bom que o PSD explicasse esta sua incoerência: por que razão é que, no Orçamento,

inviabilizou a existência de uma auditoria prévia para as transferências superiores a 850 milhões de euros e

agora vem dizer, pela voz do Dr. Rui Rio, que esta auditoria é necessária para que haja «um rigoroso escrutínio»

às razões que determinam estas transferências?!

Mas, mais: quem olha para esta transferência apresentada para o Novo Banco não pode deixar de considerar

que Mário Centeno quis facilitar a vida ao próximo Governador do Banco de Portugal, que, segundo rumores

constantes, é um cargo que deseja muito ocupar. Ora, o PAN já se posicionou quanto a esta dança das cadeiras,

dizendo que somos contra, porque a nomeação de Mário Centeno estaria carregada de conflitos de interesses.

Apresentámos já um projeto de lei que, em nome da transparência e da independência do Banco de Portugal,

propõe que seja fixado um período de nojo de cinco anos que impeça a ocupação de cargos no Conselho de

Administração do Banco de Portugal por pessoas que tenham ocupado cargos na banca comercial, no Governo

e nas consultoras que trabalhem com o Banco de Portugal.

O que pergunto ao PSD é se um ministro das finanças reúne as condições éticas para, sem período de nojo,

ir para o Banco de Portugal e se considera que não há qualquer conflito de interesses.

O que pergunto ao PSD é se continuam a achar que não é preciso assegurar, como propõe o PAN, regras

mais transparentes na nomeação dos cargos do Conselho de Administração do Banco de Portugal.

O que pergunto ao PSD é se, uma vez mais, vão dar a mão ao PS e ao Governo, na nomeação do próximo

Governador, ou se vão estar ao lado de quem quer um Banco de Portugal forte e independente de pressões

políticas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, por Os Verdes, o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Desde

o início da crise financeira, os portugueses já pagaram mais de 20 mil milhões de euros a tentar salvar a banca.

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E, quando falamos do problema do Novo Banco, falamos de um problema que se arrasta há já cerca de seis

anos.

Não vou trazer à colação as responsabilidades do Governo PSD/CDS, que são muitas, direi apenas que o

problema do Novo Banco não nasceu agora, nasceu com o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas, que

separou o BES mau do BES bom,…

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

… quando se percebeu que, afinal, não existia BES bom.

Não sei se o Sr. Ministro das Finanças tem ou não razão quando afirma que «esta foi a mais desastrosa

resolução bancária alguma vez feita na Europa», o que sabemos é que o Governo PSD/CDS criou um problema

mas não o resolveu e, a cada dia que passa, vamos percebendo que, afinal, a tal «saída limpa» está cada vez

mais poluída.

Sabemos que foi um processo que nasceu torto e «o que nasce torto tarde ou nunca se endireita», mesmo

que se apregoe a tal saída limpa.

E também todos nos lembramos das palavras da então Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque,

quando, em 2015, dizia ao mundo que não ia haver custos para o contribuinte. O que é verdade é que os

contribuintes já estão fartos de andar a pagar as aventuras e as irresponsabilidades dos banqueiros. E o pior é

que nem sequer sabemos quando é que a torneira se fecha, o que torna ainda mais urgente a necessidade de

acabar com a imoralidade que representa aquilo a que temos vindo a assistir e que é muito simples: quando os

bancos dão lucro, os seus acionistas dividem entre eles os lucros, aos milhões, em silêncio, ninguém os ouve,

repartem o bolo e calam-se, muito caladinhos; quando os bancos dão prejuízo, o Estado chama os contribuintes

a pagar a fatura.

Ora, isto não pode continuar a acontecer. É preciso pôr termo a esta imoralidade e a esta injustiça. O Estado

não pode andar a suportar negócios privados, desde logo porque coloca em risco o dinheiro dos contribuintes.

E, como já o referimos noutras ocasiões, na nossa perspetiva, esta mudança de paradigma devia começar já

com o Novo Banco. Devíamos começar pela solução que menos onere os contribuintes e que melhor sirva os

interesses do País. Deve ser essa a solução a adotar para o caso do Novo Banco.

Para isso, é necessário que o Estado tome conta do Novo Banco. O Novo Banco tem de ficar nas mãos do

Estado para, desta forma, o Estado poder colocá-lo ao serviço do desenvolvimento do País e da nossa

economia, ao serviço dos interesses dos portugueses, ao serviço dos interesses do nosso País.

Se o Estado paga, o Novo Banco deve estar nas mãos do Estado, nas mãos de quem o paga.

Quanto à transferência de mais 850 milhões de euros para o Novo Banco, é claro que, só por si, a falta de

articulação no Governo, numa matéria como esta, é grave, é muito grave. Mas pior do que essa falta de

articulação é o facto de essa transferência configurar a violação de um compromisso assumido com os

portugueses pelo próprio Governo.

De facto, o Governo, através do Sr. Primeiro-Ministro, assumiu publicamente que só haveria uma nova

transferência para o Novo Banco depois dos resultados da auditoria. Mas o que aconteceu foi que a transferência

ocorreu antes da conclusão dessa auditoria. E é exatamente isso que interessa perceber. Interessa perceber os

motivos que levaram o Governo a fazer a transferência antes da auditoria, ao contrário do que havia assumido.

Face a essa inversão, outra questão interessa perceber. Interessa perceber os motivos que levaram o

Governo a fazer depender a transferência dos resultados da auditoria.

Era sobre estas matérias que Os Verdes gostariam que o Governo, hoje, se pronunciasse.

Mas, para além disso e segundo consta, o Fundo de Resolução terá decidido subtrair 2 milhões de euros das

transferências para esconder o facto de a administração do Novo Banco ter reservado essa verba para prémios

a distribuir em 2020. Falamos de bónus em tempos como aquele que vivemos, com as micro, pequenas e médias

empresas a sufocar e a clamar por empréstimos junto dos bancos; falamos de bónus em tempos como aquele

que vivemos, quando muitos trabalhadores perderam uma parte substancial dos seus rendimentos ou porque

ficaram sem trabalho ou porque estiveram em regime de layoff; falamos de bónus em tempos como o que

vivemos, quando há muitas famílias, em Portugal, com dificuldades em adquirir hoje bens essenciais.

Para terminar, também não sabemos se é muito comum ser o Fundo de Resolução a reter a verba, os tais 2

milhões de euros, e não o próprio Tesouro. De qualquer forma, interessava saber se, de facto, foi o Fundo de

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Resolução a reter a verba e, se foi, porquê, isto é, por que razão é que foi o Fundo de Resolução e não o próprio

Tesouro a reter a verba.

Mas, ainda assim, importava saber se o Governo foi ouvido nessa bondosa remuneração do Novo Banco e,

já agora, em que sentido foi a resposta do Governo.

São estas as questões que Os Verdes trazem para discussão e que esperam que o Governo esclareça neste

debate de atualidade que hoje fazemos.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia, em nome do Grupo

Parlamentar do PS.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Uma

primeira palavra para dizer que o PS considera inaceitável a decisão do Novo Banco de atribuir prémios de

gestão aos seus administradores e espera que o Banco de Portugal, nas suas funções de supervisor e regulador,

de forma isolada ou até conjuntamente com o Banco Central Europeu (BCE), boicote ou bloqueie a atribuição

desses prémios de gestão aos administradores do Novo Banco.

Aplausos do PS.

Mas queria também dizer que, em vez de estarmos aqui a debater a espuma dos dias, era importante

debatermos, sim, as razões pelas quais se tornou necessário o Estado emprestar 850 milhões de euros ao

Fundo de Resolução, para que o Fundo de Resolução injete esse dinheiro no Novo Banco, empréstimo esse,

aliás, do Estado ao Fundo de Resolução, autorizado e aprovado pelo Orçamento do Estado para 2020.

Quem devia estar aqui a dar explicações sobre o porquê são aqueles que prometeram que o Novo Banco

seria um banco bom, o PSD e o CDS. Importa lembrar — e não podemos esquecer — os dias e os meses

antecedentes à resolução do BES, quando o ex-Presidente da República, a ex-Ministra das Finanças, o

Governador do Banco de Portugal, reconduzido pelo anterior Governo, vieram dar provas e votos de confiança

à gestão do BES e, passados poucos dias e poucas semanas, resolveram o banco.

Aplausos do PS.

O BES foi resolvido com um capital inicial de 4900 milhões de euros e hoje sabemos, depois de ouvirmos

antigos responsáveis do banco e também o Banco de Portugal, que foi uma resolução desastrosa e às

prestações, porque o capital inicial, na altura, não era de 4900, eram necessários mais de 10 000 milhões de

euros. No entanto, o PSD e o CDS tinham uma dificuldade tremenda em explicar isso aos portugueses, porque,

semanas antes, os seus dirigentes e até um comentador televisivo, que ainda faz comentário político no domingo

à noite, vieram dar votos de confiança à gestão do BES. Isso não pode cair no esquecimento!

A resolução do BES, como disse há pouco, foi desastrosa e foi feita às prestações. Aliás, houve um partido

que deu a sua concordância à resolução quando a sua líder deu o OK, através de uma resposta por e-mail, na

praia, gozando de um pouco de sol.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — O senhor é um ordinário!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Esta decisão de resolver o BES, transferindo para o Novo Banco um

conjunto de créditos e de ativos tóxicos que não deveriam ter sido transferidos e deveriam ter ficado no BES, é

o que a auditoria em curso, que estará concluída daqui a dois meses, nos irá dizer, sabendo quem são os

responsáveis e apurando as responsabilidades das decisões que foram causadoras destas injeções que, agora,

o Estado é obrigado a fazer, emprestando dinheiro ao Fundo de Resolução.

O anterior Governo do PSD/CDS prometeu vender o Novo Banco e não o vendeu em 2015, pois a venda

falhou e não disseram a verdade ao País na altura, porque estávamos a poucas semanas das eleições

legislativas de 2015. Se tivessem dito a verdade ao País, ter-se-ia sabido que o Novo Banco não era um banco

bom. E, no mês de dezembro de 2015, o Novo Banco estava a um passo da insolvência e foi por isso que o

Banco de Portugal teve de transferir 2000 milhões de euros do Novo Banco para o BES, em obrigações seniores,

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causando um grave prejuízo às contas públicas porque obrigou o Estado português a pagar mais juros de dívida

pública durante longos meses.

Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Para terminar, gostaria de dizer que o

Novo Banco tinha uma licença precária, isto é, ou era vendido em 2017 ou era liquidado em 2017. A venda foi

a alternativa que menos custou aos contribuintes e foi este Governo que teve de resolver mais uma pesada

herança da governação do PSD/CDS.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PCP. Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, pretendo fazer um pedido de esclarecimento ao Sr.

Deputado João Paulo Correia.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Deputado João Paulo Correia, fez aqui uma intervenção muito

interessante sobre a história, claramente crítica dos seus colegas que integraram a comissão parlamentar de

inquérito.

Mas a pergunta que tenho de colocar-lhe é muito simples. O Sr. Deputado omitiu por completo a transferência

de 850 milhões de euros e o nome do Dr. Mário Centeno.

Vozes do PSD: — Essa é que é essa!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Não falei disso?!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Será que, para o Partido Socialista, o Sr. Ministro das Finanças já não o é

de facto e os portugueses ainda não o sabem? Esta é a resposta que todos nós desejamos saber.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra para responder o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, pensei que o Sr. Deputado Duarte Pacheco aproveitasse

agora a oportunidade para responder à grande questão que coloquei.

O Sr. André Ventura (CH): — Ah! Ele é que vai responder?!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — O PSD devia estar aqui a explicar por que razão prometeu um banco

bom e, afinal, o Novo Banco revelou-se um banco com graves prejuízos para o Estado e para os contribuintes.

Os senhores é que têm de dar essa explicação ao País.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: — Agora, sim, é a vez do Sr. Deputado Duarte Alves, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: No dia 16 de abril,

o PCP perguntou, numa audição ao Sr. Ministro das Finanças, se, perante a situação atual, em que os recursos

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públicos fazem tanta falta no SNS (Serviço Nacional de Saúde), no investimento público, no apoio à economia

e aos trabalhadores, pretendia manter a transferência de 850 milhões de euros para o Novo Banco. Disse o

Ministro, na altura, que a transferência se fazia na mesma, porque os contratos são contratos e são para

respeitar.

Gostava que o Governo se dirigisse aos 1 300 000 trabalhadores que estão em layoff, com um corte de um

terço do salário, que também tinham contratos assinados, com salários contratualizados, e lhes dissesse que

contratos são contratos, ou aos trabalhadores a falsos recibos verdes, que tinham contratos de prestação de

serviços e foram despedidos, muitos deles ficando sem qualquer rendimento, sem dinheiro para comer, só

porque estavam isentos de contribuições para a segurança social, ou que se dirija aos milhares de pequenos

empresários a quem os apoios contratualizados entre o Estado e a banca não chegam.

Contratos são contratos, mas, para o Governo, há contratos e contratos, há compromissos e compromissos.

E os compromissos que, para o Governo, são para cumprir, aconteça o que acontecer, são os 850 milhões para

o Novo Banco.

É verdadeiramente inaceitável que esta transferência se faça sem que tenha havido um controlo político por

parte do Governo, ou uma articulação entre o Ministro das Finanças e o Primeiro-Ministro, e com uma agilidade

que contrasta totalmente com a burocracia e com a quantidade de documentos que são pedidos às micro e

pequenas empresas para terem acesso aos apoios públicos. Estas burocracias, assim como os critérios da

banca, têm afastado milhares de empresas que são viáveis mas que para a banca não são rentáveis e que ficam

de fora dos apoios. Nós não podemos deixar de assinalar esta discrepância de critérios: burocracias, dificuldades

colocadas aos microempresários para poderem sobreviver; facilidades e benesses para o Novo Banco, pagas

por todos os portugueses.

Disse o Sr. Ministro que Portugal não pode dar-se ao luxo de, no meio de uma crise, colocar um banco em

risco. Na nossa opinião, não pode é dar-se ao luxo de pagar a limpeza e não ficar com o banco. Não pode dar-

se ao luxo de ver desaparecer milhares de microempresas, porque não há recursos para as apoiar, mas há

recursos para continuar a enterrar no Novo Banco. Não pode dar-se ao luxo de ignorar a manobra para distribuir

prémios aos administradores do Novo Banco, no valor de 2 milhões de euros.

Já agora, refiro aqui a proposta, apresentada pelo PCP, que impedia o pagamento destes prémios, mas que

foi votada e rejeitada, na passada quinta-feira, pelo PS, pelo PSD, pelo CDS, pelo PAN, pelo Chega e pelo

Iniciativa Liberal.

São mais 850 milhões de euros, Srs. Deputados, que se juntam aos milhões que já foram entregues pelos

portugueses, desde a fraudulenta resolução decidida pelo Governo do PSD/CDS, até à ruinosa privatização a

custo zero do Novo Banco, com garantias dadas pelo Estado, realizada pelo Governo do PS.

Esta transferência e a forma como foi feita não apagam dois problemas de fundo. O primeiro é o facto de o

Governo ter faltado aos critérios que o próprio Governo tinha definido, ou seja, esperar pelas conclusões da

auditoria. O segundo é o facto de continuarmos a pagar a conta da limpeza do BES/Novo Banco e, no final, o

banco nem é nosso. Continuamos a enterrar milhões de euros dos portugueses para que o banco fique nas

mãos de privados e para que mais um banco, muito provavelmente, seja entregue, num futuro próximo, ao

controlo do capital espanhol.

Reafirmamos o que colocámos no Orçamento do Estado para 2020, isto é, que não seja entregue nem mais

um cêntimo ao Novo Banco sem que se inicie o processo de recuperação do controlo público do banco,

colocando-o ao serviço da economia e do País.

Demonstra-se agora, mais uma vez, a razão de ser que esta proposta do PCP — rejeitada pelo PS, pelo

PSD, pelo CDS, pelo Iniciativa Liberal, pelo Chega e pelo PAN, no âmbito da Comissão de Orçamento e

Finanças — tinha, ainda mais no momento em que vivemos e em que tanta falta faz ter instrumentos,

nomeadamente no setor da banca.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Mas o PCP vai continuar a insistir nesta proposta, porque o Novo Banco não

pode continuar a ser um buraco sem fundo, pago por todos os portugueses, sem se garantir o seu controlo

público, um buraco sem fundo que é consequência da ruinosa gestão privada da banca, é verdade, mas que

também é consequência das opções de sucessivos Governos tanto do PS, como também do PSD e do CDS.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, pelo Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Este

debate está a ser muito elucidativo. Estamos todos de acordo com o facto de haver um problema no Novo Banco;

ninguém está de acordo sobre de quem é a culpa. Esta culpa não vai só morrer solteira, vai morrer enjeitada.

Quem tinha a maioria há duas Legislaturas não vê problema nenhum no modelo de resolução, quem tinha a

maioria na Legislatura passada não vê problema nenhum no modelo de venda, nem no acordo de capital

contingente, nem na forma bizantina como está construída a Lei n.º 15/2019. A minoria do PS, apoiada sabe-se

lá por quem, nesta Legislatura, também não vê problema nenhum no Orçamento que é aprovado já com esta

verba lá dentro e não assume a autêntica tristeza que é esta ópera bufa de descoordenação entre o Primeiro-

Ministro e o Ministério das Finanças. É um triste exercício de irresponsabilidade coletiva.

Protestos do Deputado do BE Jorge Costa e do Deputado do PCP Duarte Alves.

Devo dizer-vos, Srs. Deputados, que tenho muitos motivos para desejar que a Iniciativa Liberal tenha mais

Deputados, mas hoje acrescentei mais um: teríamos tido força para agendar o projeto de resolução que

submetemos a 9 de dezembro e que teria impedido a injeção pública de dinheiro no Fundo de Resolução.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo Parlamentar do CDS-

PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Continuo a pensar que qualquer pessoa que viesse de fora ou qualquer extraterrestre que chegasse aqui

continuaria a achar que Portugal é um País que não foi afetado pela pandemia.

Protestos do Deputado do BE Jorge Costa e do Deputado do PCP Duarte Alves.

Perguntemo-nos a nós próprios o que imaginará um trabalhador desesperado para receber o seu salário,

porque a empresa onde trabalha ainda não recebeu o apoio ao layoff,ou o dono de uma empresa desesperado

para receber as linhas de crédito que ainda não estão contratadas. O que estarão a imaginar acerca deste

debate? É que ele não contribuiu em nada para resolver esses problemas.

Mas há algo que tem de ser dito, porque a indignação do PS não pode ser — e peço desculpa pela expressão

— a inimputabilidade. Estou a assistir, nesta tarde, a um branqueamento daquilo que se passou no Banco

Espírito Santo, da sua gestão, da conivência política de alguns governos com o Banco Espírito Santo, que não

é, pura e simplesmente, aceitável.

Sr.as e Srs. Deputados, ouvi aqui hoje dizer que os problemas no Novo Banco começaram em 2014. Mas,

Srs. Deputados, então o BES era um caso de sucesso antes de 2014? Estava tudo bem com o BES? Então o

banco não estava falido? O banco estava bem gerido? Mas que branqueamento é este do Banco Espírito

Santo?! Temos ou não processos judiciais, com arguidos, em que se investiga o que se passou no Banco

Espírito Santo — que demoram demasiado tempo, com isto estou de acordo — e em que se deve investigar,

também, o que se passou na Caixa Geral de Depósitos e em vários bancos portugueses, com a conivência do

poder político e com a conivência, sim, de alguns membros de um Governo em particular, que, sim, era do PS.

Não há nenhuma exaltação, Sr. Deputado João Paulo Correia, que vá substituir esta verdade. A verdade é

que, em 2011, quando os senhores deixaram o Governo, a banca estava num estado lamentável e, sim, o estado

do BES era particularmente mau. Esse foi um problema que outro Governo teve de resolver. Quer discutir a

resolução? Quer discutir a diferença entre a separação do balanço? Estou disponível para discutir e também

para lhe dizer aquilo que, então, o Banco de Portugal garantiu, as garantias que pedimos ao Banco de Portugal,

mas não estarei — e jamais estarei — disponível para o absoluto branqueamento da história a que estou a

assistir.

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Sr.as e Srs. Deputados, ou nós nos concentramos no presente e em resolver os problemas que temos no

presente, e os senhores passam a pôr o mesmo zelo que põem na resolução dos problemas do Novo Banco na

resolução dos problemas de toda economia, ou, então, vamos ter, à semelhança das inúmeras comissões de

inquérito, mais uma para discutir o passado e, então, Srs. Deputados, não haverá branqueamentos nem de

responsáveis políticos do PS nem do Banco Espírito Santo.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O caso que nos traz hoje aqui e ao qual

esperamos que o Sr. Secretário de Estado possa dar esclarecimentos um pouco maiores do que aqueles que

deram, até agora, quer o Sr. Primeiro-Ministro, quer o Sr. Ministro das Finanças prende-se com o seguinte: a

irresponsabilidade.

Na verdade, o Primeiro-Ministro tinha dito que não haveria transferência antes de haver auditoria. Sabemos

que houve, mas hoje o Sr. Ministro das Finanças disse que nada é feito sem passar pelo Conselho de Ministros

e ficamos sem perceber quem está a falar verdade e quem está a falar mentira.

Mas o pior — e não podemos deixar passar isto em claro — é que no dia em que o Presidente da República

diz que teria sido melhor ter feito a transferência só depois da auditoria, o Primeiro-Ministro responde dizendo

que ele deveria candidatar-se a um segundo mandato.

Talvez passe por alguns, mas não passará por aqui a tentativa de hoje, quando se discute o Novo Banco,

lançar a candidatura presidencial para as hostes da opinião pública e do sistema mediático para logo à noite.

Não funcionará!

Sr. Deputado João Paulo Correia, pode atirar as responsabilidades para quem quiser, mas foi o seu Primeiro-

Ministro que disse que só transferiria o dinheiro depois da auditoria. Podemos ir a 2014, a 2010, a 2009, até

podemos ir a 2001 — ao pântano —, mas a verdade das verdades é que houve um Primeiro-Ministro que falhou

nas suas responsabilidades.

Vou terminar, recordando o seguinte, Sr. Deputado: Jornal de Negócios, em 2016, «Imposto de Sócrates

para fazer ‘justiça’ acaba a pagar o Novo Banco».

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Sr. AndréVentura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Este imposto acabou por durar por causa da intervenção no BES, o banco amigo de José Sócrates.

Que eu saiba, José Sócrates não foi líder de nenhuma destas bancadas, senão da bancada do Partido

Socialista.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção em nome do Governo, o Sr. Secretário de

Estado Adjunto e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix.

O Sr. SecretáriodeEstadoAdjunto edasFinanças (Ricardo Mourinho Félix): — Sr. Presidente, Srs.

Deputados: A história do BES é, de facto, uma história antiga, bastante antiga. E não começou em 2014. Como

já foi dito nesta Câmara, se o banco já estava em tão má condição nos anos anteriores a 2014, porque é que o

Governo dessa altura demorou três anos para fazer uma Resolução? Esteve à espera dos banhos de 2014 para

fazer a intervenção?!

A Sr.ª CecíliaMeireles (CDS-PP): — Esteve à espera do dinheiro porque estava falido!

O Sr. SecretáriodeEstadoAdjunto e dasFinanças: — Uma intervenção de uma Resolução incompetente,

uma Resolução sem qualquer auditoria, uma Resolução que criou um banco mau e um banco péssimo!

Aplausos do PS.

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Depois, andámos até 2015 e nesse ano a milagrosa venda, anunciada pelo Governo, que ia permitir não só

recuperar o dinheiro injetado pelo Estado, como, eventualmente, ainda dar lucro, eis que falha! Falha

clamorosamente e o Banco de Portugal decide, então, fazer uma retransmissão de 2 milhões de euros de

obrigações seniores, que, podendo até ser legal, foi irresponsável. Destruiu a credibilidade da República! As

taxas de juro começaram a subir e o aumento da taxa de juro implicou custos para o erário público de 1500

milhões de euros, de acordo com a nossa estimativa.

Aplausos do PS.

Chegámos, então, ao início de outubro de 2017, com a venda do banco, com o dito «mecanismo de capital

contingente». É desde então que há uma recuperação da credibilidade de Portugal, é desde então que há

melhoria do rating e é desde então que começa a queda dos juros da República Portuguesa que permitiu poupar,

só em juros, 2000 milhões de euros.

Aplausos do PS.

Os 2000 milhões de euros que são usados precisamente para financiar a saúde, para financiar a educação,

para financiar o investimento! São esses 2000 milhões de euros que permitem que tenhamos feito essas

políticas.

O mecanismo de capital contingente permitiu dar segurança, permitiu limitar aquilo que é a entrada de fundos

públicos no Novo Banco a 3890 milhões de euros, pagos pelo Fundo de Resolução, sendo devolvidos ao Estado,

ao longo do tempo, os empréstimos que tiverem sido concedidos até ao limite de 850 milhões de euros por ano,

com as contribuições dos bancos.

O estudo que o Sr. Deputado Duarte Pacheco referiu é feito. São feitos vários estudos até, há várias

auditorias e verificações: a do auditor do Novo Banco; a do BCE, enquanto supervisor; a do agente de

verificação; a da Comissão de Acompanhamento; a do Fundo de Resolução. São cinco agentes que intervêm,

uma mão-cheia deles que permite, precisamente, escrutinar as operações. E é nesse escrutínio que o Fundo de

Resolução questionou o Novo Banco sobre o pagamento de prémios — e fê-lo muito bem —…

Aplausos do PS.

… e decidiu não tomar em conta para a capitalização que fez, precisamente, esse pagamento de prémios,

decisão que, obviamente, apoiamos.

Em 2020, o momento em que estamos, as perdas acumuladas nos ativos sobre o mecanismo de capital

contingente são de 3600 milhões de euros. A injeção do Fundo de Resolução foi de cerca de 3000 milhões de

euros — 2976 milhões de euros —, o que quer dizer que 600 milhões de euros foram suportados pelo capital

que foi gerado pelo próprio banco. O empréstimo do Estado foi de 2100 milhões de euros até ao momento, o

que quer dizer que 900 milhões de euros foram suportados pelos recursos próprios do Fundo de Resolução com

atribuições do sistema bancário e o Estado, até ao momento, recebeu dos empréstimos ao Fundo de Resolução

500 milhões de euros pagos pelas contribuições que os bancos fazem para o Fundo de Resolução. Isso é uma

partilha de custos justa.

O empréstimo está previsto no Orçamento do Estado aprovado por esta Câmara, sem contingências — não

consta lá nenhuma contingência, nem face a qualquer auditoria, nem face à auditoria prevista na Lei n.º 15/2019.

O empréstimo foi feito no último dia contratualmente estabelecido, o dia 6 de maio, e foi de 850 milhões de

euros, sujeito ao escrutínio pelas cinco entidades que referi e que posso repetir.

O PSD e o CDS, este num tom um pouco mais populista, defendem o quê, então? Defendem que se deveria

ter incumprido o contrato? Defendem mesmo isso? Acham que juntar à crise sanitária uma crise bancária é

aquilo de que o País precisa neste momento? Os senhores só defendem isso porque sabem que isso não

aconteceria, porque sabem que aquilo que estão a defender é inconsequente. Querem mesmo dizer aos

portugueses que o melhor era não ter feito o empréstimo? Que o melhor era o Fundo de Resolução não ter feito

a injeção de capital e estarmos agora a discutir a segunda resolução ou a liquidação do Novo Banco? É isso

que acham que faria chegar o dinheiro às empresas?! É isso que acham que a economia beneficiaria?! Não é,

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seguramente! Não é, seguramente, e não acredito que considerem que tal fosse a medida adequada, se ela

tivesse as consequências daquilo que defendem.

Defende-se, e defende o Bloco de Esquerda, que não se pague sem auditorias. Estamos de acordo em que

não se pague sem auditorias. Concordamos! Não defendemos resoluções feitas em época estival, na praia, de

forma leviana e incompetente. Por isso, há todo um mecanismo prévio de auditoria à injeção de capital.

A auditoria da Lei n.º 15/2019 não é uma auditoria prévia à injeção de capital. É uma auditoria retrospetiva

que avalia as causas das perdas que estiveram na génese da injeção de capital anterior e que apura eventuais

responsabilidades civis e criminais que, vindo a ser apuradas, depois seguirão os trâmites que esse tipo de

responsabilidades segue na justiça. Não serve para determinar as injeções e capital, serve para apurar a sua

razão, os atos de gestão e as responsabilidades que houver a apurar.

Concordamos em não envolver dinheiro público sem auditorias, e foi isso que fizemos. Por isso, houve as

auditorias que estão previstas no contrato. Infelizmente, não foi assim quando o banco foi resolvido em 2014.

Então, houve envolvimento de dinheiro público sem qualquer auditoria.

O Partido Comunista e o Partido Ecologista «Os Verdes» discordam de qualquer injeção de capital público

em instituições privadas, haja ou não haja auditorias. É uma posição de princípio que defende que a banca deve

estar nas mãos do Estado. Defendem a nacionalização da banca. É uma posição coerente. Não concordo, mas

respeito a coerência.

Alerto apenas para o seguinte: nesse caso, todos os prejuízos que viessem a existir seriam públicos. Estamos

a falar dos 3600 milhões de euros de perdas do mecanismo de capital contingente e estamos a falar dos 1000

milhões de euros pagos pelo Lone Star na compra do banco.

O Governo defende a estabilidade financeira, porque ela é essencial ao crescimento económico, e defende

a capitalização dos bancos, em especial no momento de crise em que vivemos. Como disse o Sr. Primeiro-

Ministro, o Orçamento é para ser cumprido. É um empréstimo que o Estado faz, não é uma despesa. E o

empréstimo não é entregar dinheiro, como alguém aqui disse. Um empréstimo é algo que é para ser devolvido

e que será pago, no tempo, com base nas contribuições que os bancos vão fazendo para o Fundo de Resolução.

As obrigações contratuais, como também já foi hoje dito, são para ser cumpridas, nos termos da lei.

O Sr. Presidente: — Peço que conclua, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. SecretáriodeEstadoAdjunto e dasFinanças: — Concluirei, Sr. Presidente.

A auditoria referida é a que precede o pagamento, não é a que é posterior ao pagamento. Nunca o Governo

disse ou defendeu incumprir contratos de financiamento, sobretudo no momento atual, pondo em causa, dessa

forma, a estabilidade do sistema financeiro.

Reitero, então, que não houve nenhum reforço do empréstimo e que, se o houvesse, tal como está

determinado no Orçamento, esta Câmara teria de se ter pronunciado.

Defendemos a transparência, defendemos que tudo seja auditado. Defendemos a estabilidade e a confiança

dos portugueses, mas defendemos, também, que se fale verdade, mesmo que essa verdade seja complexa e

que seja dura. Defendemos que os portugueses devem ser esclarecidos, porque é isso que é exigido de nós e

é isso que nos pedem, e é isso que é governar para os portugueses em momentos excecionais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado, o Sr. Deputado

Álvaro Almeida. Segundo fui informado, como o Governo já não dispõe de tempo, o Grupo Parlamentar do PSD

cede 30 segundos para a resposta.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Almeida.

O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, veio agora

o Sr. Secretário de Estado repetir aquilo que o Sr. Ministro das Finanças já nos tinha dito hoje, de manhã, na

Comissão. Ou seja, que havia muitas auditorias e, portanto, não era preciso mais nenhuma para fazer a

transferência dos 850 milhões de euros, porque era isso que estava no contrato.

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Recordo que esse contrato, que implica, potencialmente, perdas de 3900 milhões de euros, foi assinado pelo

Governo do Partido Socialista e, portanto, aquilo que o Sr. Ministro das Finanças veio dizer é que já tinha

prometido transferir 850 milhões de euros.

Só tenho uma pergunta para lhe fazer, Sr. Secretário de Estado: se já havia tantas auditorias feitas, se a

transferência da verba não precisava de mais nenhuma, porque é que o Sr. Primeiro-Ministro, nesta Casa, disse

que a transferência só poderia ocorrer depois de a auditoria estar concluída?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Finanças.

O Sr. SecretáriodeEstadoAdjunto e das Finanças: — Sr. Presidente, penso que já terei respondido.

Como referi, a auditoria que é necessária é aquela que está definida no conjunto de mecanismos de

verificação: há uma auditoria externa, feita pelo auditor externo; há relatório feito pelo agente de verificação; há

um parecer feito pela Comissão de Acompanhamento; e há uma decisão circunstanciada do Fundo de

Resolução.

Agora, não se confunda: ninguém deu 3900, 3600 ou 3000 milhões de euros ao Novo Banco. O Estado

empresta ao Fundo de Resolução, o Fundo de Resolução injeta no Novo Banco e receberá, ao longo do tempo,

contribuições do setor bancário para se ressarcir dessa injeção e pagar os empréstimos ao Estado, que tem

uma taxa de juro definida, 2%, e que já levou ao recebimento, por parte do Estado, de juros no montante de 500

milhões de euros.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª CecíliaMeireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que o Sr. Secretário de Estado

não ouviu bem o que foi aqui dito. Aquilo que eu disse foi que a prioridade não era essa.

Sr. Secretário de Estado, o senhor, da tribuna, disse: «É evidente que os contratos são para cumprir. Todos

sabemos que os contratos são para cumprir e os senhores sabem muito bem que nós tínhamos de cumprir o

contrato.» Gostava de entender, e por isso lhe pergunto, se o senhor, quando sair daqui, em vez de voltar para

o seu gabinete no Terreiro do Paço, vai diretamente a São Bento dizer isso ao Sr. Primeiro-Ministro, porque

quem disse aqui que não iria cumprir o contrato até haver auditoria foi o Sr. Primeiro-Ministro.

Portanto, se o senhor nos vem aqui dizer que o Sr. Primeiro-Ministro estava cansado de saber que o que

estava a dizer era impossível, Sr. Secretário de Estado, só tem duas alternativas: ou nos explica como é que o

Primeiro-Ministro anda aqui a dizer coisas que ele próprio está cansado de saber que não são possíveis ou,

então, vai ali a São Bento e põe o seu lugar à disposição. Já não volta para o Terreiro do Paço!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª MarianaMortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começando pelos prémios que o Novo

Banco decidiu atribuir, devo dizer que eles são, obviamente, escandalosos e inaceitáveis, mas, Sr. Deputado

João Paulo Correia, eles existem porque foram permitidos pelo Estado quando negociou a venda do Novo Banco

ao Lone Star. E existem porque o Governo, quando negociou essa venda, ficou com 25% do Novo Banco, mas

sem qualquer poder de decisão executiva nesse banco.

Por isso, o Estado paga 90% dos prejuízos de um banco, tem 25% do seu capital e não tem qualquer poder

de decisão. Se isso não é uma venda ruinosa, não sei… Pergunte a algum privado se aceitava este negócio de

vender um banco, ficar com 25%, assumir 90% dos prejuízos e não ter poder de decisão sobre esse banco.

Nem o Governo, nem o Partido Socialista têm de atirar para cima do Banco de Portugal, como, aliás, fizeram

o PSD e o CDS no passado, as exigências sobre a política remuneratória do Novo Banco. O Governo tem de

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exigir ao Lone Star e ao Novo Banco que não paguem bónus, tem de, legalmente, impedir o pagamento desses

bónus e, mais, tem de publicitar e de exigir o conhecimento da política remuneratória do Lone Star. Isto porque

o que pode estar a acontecer é o acionista privado do Novo Banco estar a criar incentivos para os gestores do

Novo Banco administrarem uma garantia contra os interesses do Estado — um acionista contra o outro acionista

e os administradores a serem remunerados por isso. O Estado não conhece a política remuneratória e permite

o pagamento de bónus.

Por isso, o que tem de ser feito é, legalmente, impedir o pagamento de bónus. E não é só o pagamento, é a

acumulação do direito ao pagamento no futuro, porque o cúmulo da ironia é que o Novo Banco não pode pagar

bónus e, portanto, o que faz é criar um direito que guarde nas contas para pagar em 2022, quando já puder.

Entretanto, os administradores acumularam bónus de desempenho, apesar de o banco apresentar prejuízos e

apresentar a sua conta ao Estado.

Isso é, obviamente, inaceitável e é por isso que o Bloco vai apresentar uma proposta para impedir o

pagamento de bónus futuro, mas também para eliminar os direitos que foram criados e que não deveriam ter

sido porque o Novo Banco sobrevive com dinheiro público.

Relativamente à transferência para o Novo Banco, o que está em causa, hoje e agora, não é a Resolução,

inicial, de 2014, que foi ruinosa, porque essa Resolução foi, sim, ruinosa. O Banco de Portugal não prestou

contas a ninguém, nem publicou ainda a auditoria que fez à sua própria intervenção.

O que está em causa, hoje, não é a venda, que também não foi melhor, por aquilo que já explicámos: o

Estado fica com 25%, mas paga 90% dos prejuízos; o Lone Star fica com 75% e assume 10% dos prejuízos.

O que está em causa, hoje, não é, sequer, a garantia que o Governo aceitou dar ao comprador privado no

valor equivalente à injeção que já tinha sido feita de 3900 milhões de euros.

O que está em causa é simples. O Sr. Primeiro-Ministro, que é chefe deste Governo,…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Devia!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … comprometeu-se, nesta Assembleia da República, duas vezes, a ter

nas mãos uma auditoria antes de se realizar a transferência. E não era uma auditoria qualquer, não era uma

das auditorias nem a certificação legal de contas. A auditoria a que o Sr. Primeiro-Ministro se referia era a uma

auditoria específica, que foi determinada por lei, uma auditoria relativamente à qual o Ministério das Finanças

fez um comunicado, a dizer que, tendo em conta as injeções avultadas no Novo Banco, o Ministério das Finanças

decidiu determinar uma auditoria. Ela tanto era necessária que isso mesmo foi admitido pelo Ministério das

Finanças. E foi esta auditoria que o Sr. Primeiro-Ministro disse que queria conhecer antes de autorizar uma

injeção no Novo Banco.

Ora, a injeção foi feita e esta auditoria não estava pronta, ou seja, o compromisso não foi assumido. Essa é

a bota que nem o Sr. Ministro das Finanças nem o Sr. Secretário de Estado conseguiram descalçar, até agora.

Porque é que o Ministro das Finanças não cumpriu o compromisso que foi assumido publicamente no dia 22 de

abril e, de novo, no dia 4 de maio, pelo Primeiro-Ministro, que se referia a uma auditoria específica, que todos

sabemos qual é, porque ela foi debatida publicamente durante largos meses e pela qual o Bloco de Esquerda

fez várias perguntas em — arrisco-me a dizer — todas as audições com o Sr. Ministro das Finanças e em quase

todos os debates quinzenais? Por isso, Sr. Secretário de Estado, continuamos sem uma resposta para esta

pergunta.

Acrescento uma outra questão. Só haveria uma forma de impedir estas transferências: se tivesse sido

aprovada uma proposta que dissesse que qualquer nova transferência teria de vir à Assembleia da República.

Peço desculpa ao Sr. Deputado André Silva, até admito que possa ter boas intenções, mas, lamento, não é isso

que é dito no Orçamento do Estado. O que é dito no Orçamento do Estado é que qualquer transferência acima

dos 850 milhões tem de vir à Assembleia da República. Essa foi a proposta do PAN e era a proposta do PSD.

Essa proposta é equivalente a não propor nada, porque o que conta são as transferências abaixo dos 850

milhões de euros.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É aquilo que o PSD agora vai propor, apesar de o ter chumbado no

Orçamento do Estado; é aquilo que o Bloco de Esquerda vai propor, repetindo o que já apresentou no Orçamento

do Estado; e é aquilo que pode fazer uma diferença nos 1000 milhões que ainda restam da garantia pública.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do PS.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cecília Meireles e Sr.

Deputado André Ventura: Recordam-se quem é que pediu para que, no consórcio dos submarinos, estivesse o

BES? Recorda-se, Sr.ª Deputada Cecília Meireles?! Paulo Portas. E o Sr. Deputado André Ventura onde estava,

na altura? No PSD, com o Governo de Passos Coelho!

É bom sabermos a posição de cada um!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Duarte Pacheco, vi e ouvi-o perguntar, da tribuna, que País é este. Sr. Deputado, este não é o

País de 2011 a 2015, não é o País onde se faziam resoluções de bancos por telefone e na praia.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Não! É um País diferente, é um País onde as pessoas e os governantes

assumem as suas responsabilidades perante o povo português.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Estamos à espera!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — E como os senhores não foram capazes de assumir as vossas

responsabilidades, este Governo está a assumi-las, com frontalidade. É porque esconder 6000 milhões de euros

em ativos tóxicos num banco que, teoricamente, iria dar lucro — era o que se dizia aos portugueses — é enganar

os portugueses.

Aplausos do PS.

Hoje, o que estamos a fazer é a pagar os 6000 milhões de euros que os senhores meteram debaixo do

tapete! E explico porquê! Porque não queriam sacrificar isto no altar de uma saída limpa, pois tinham eleições

uns tempos depois. E para vocês, na altura — e espero que hoje não seja igual! —, tudo valia, quando se tratava

de votos.

O PS é diferente, este Governo é diferente e é por isso que estamos aqui de uma maneira diferente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PSD, o Sr. Deputado

Afonso Oliveira.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Tivemos

aqui um momento de humor protagonizado pelo Sr. Deputado do Partido Socialista porque, se houve um

momento tóxico, foi antes de 2011. Houve um Governo tóxico que levou o País onde levou! Mas nem vale a

pena falarmos sobre isso, não é esse o tema de hoje, contudo, esse foi o momento tóxico.

Aplausos do PSD.

No final deste debate, há algumas conclusões que podemos já retirar.

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Em primeiro lugar, há uma conclusão que já se tirou hoje de manhã, na Comissão de Orçamento e Finanças,

quando ouvimos o Sr. Ministro, e que agora à tarde, neste debate, se mantém. A conclusão é a mesma, não há

grande alteração: a de que o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Primeiro-Ministro estiveram muito mal. Não

estiveram bem!

O Sr. Ministro das Finanças, como já lhe disse hoje de manhã, claramente, na audição na Comissão de

Orçamento e Finanças, falhou! E falhou quando não valorizou o facto de o Estado português estar a transferir

para o Fundo de Resolução o montante de 850 milhões de euros. A verdade é que transferir 850 milhões de

euros, emprestar 850 milhões de euros ao Fundo de Resolução não é um ato administrativo. Não basta afirmar,

como ouvimos de manhã, na Comissão de Orçamento e Finanças, que está prevista no Orçamento uma rubrica

que permite transferir esse montante. Mas não é isso que está aqui em causa. O que está em causa é que isto

merece um debate, merece uma análise, merece escrutínio. É isso que deve ser feito e não foi isso que foi feito.

Não chega, pois, dizer que estava no Orçamento do Estado. Emprestar ao Fundo de Resolução 850 milhões

de euros não é emprestar 850 euros! É um montante que os portugueses percebem que é de uma dimensão tal

que obriga ao escrutínio de uma discussão. Este assunto é muito sério e o Sr. Ministro das Finanças falhou

quando se exigia escrutínio e rigor!

Em segundo lugar, num momento em que o País exige critério, transparência, decisões políticas ajustadas e

escrutinadas, não é aceitável que o Sr. Ministro das Finanças não lhe tenha atribuído a importância que era

absolutamente exigível.

Deixe-me dizer também, Sr. Secretário de Estado — e hoje de manhã o Sr. Ministro ouviu o que lhe dissemos

sobre esta matéria —, que não compreendo como é que, com tanta informação, como o senhor aqui disse que

tinha, sobre as auditorias, com tanto debate — e de manhã o Sr. Ministro disse também que era debatido em

sede de Conselho de Ministros —, não há conhecimento prévio desta matéria. Como é que o Sr. Primeiro-

Ministro não tem conhecimento disto? Os senhores, afinal, transmitiram ou não essa informação ao Sr. Primeiro-

Ministro? Fico sempre na dúvida. Mas a quantidade de dados que hoje aqui apresentaram deixa-nos um bocado

perplexos sobre como é que a informação não chegou ao conhecimento do Sr. Primeiro-Ministro.

A verdade é que hoje os portugueses vivem um período muito difícil, com dramas pessoais, com quebras de

rendimento muito acentuadas, com um crescimento exponencial do desemprego, com pessoas em casa, em

layoff, com grandes dificuldades e quebras de rendimento. Não é aceitável que não se trate o tema com a

exigência e a transparência com que estes temas têm de ser tratados!

Em terceiro lugar, como é possível que o empréstimo ao Fundo de Resolução ocorra — e, mais uma vez,

repito — sem que haja conhecimento por parte do Sr. Primeiro-Ministro? Fica a dúvida, uma dúvida quase

existencial. Não compreendo. Não compreendemos mesmo como é que isto é possível.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Nem os portugueses!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Não compreendemos como é possível que o Sr. Primeiro-Ministro tenha de

vir a público pedir desculpas por uma situação — como já foi aqui referenciado no debate e como os senhores

também referiram — que tantas vezes foi debatida no Governo. Não compreendo como é que não há

conhecimento. Deixa-nos esta perplexidade.

Em quarto lugar, queremos reafirmar, claramente, que o PSD conhece o compromisso que o Governo tem,

que resulta do acordo de venda do Novo Banco e que tem, evidentemente, de assumir o compromisso. Somos

responsáveis e consideramos que os compromissos do Governo e do País são para se cumprir. Defendemos

sempre que os compromissos do Estado têm de ser cumpridos! Assumir compromissos, cumprir as

responsabilidades do Estado, a resposta é sim! Fazer as coisas como o Governo e o Sr. Ministro das Finanças

querem é um «não», é um redondo «não»!

O Sr. Presidente: — Peço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, se me permite, deixo uma última nota, para esclarecer uma

questão muito importante. Referimos aqui que iríamos apresentar uma iniciativa legislativa no sentido de alterar

o modelo, digamos assim, com que este tema é tratado no Parlamento. É importante que se perceba que

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compete ao Governo tomar esta decisão. Na nossa ótica, tem de haver, no Parlamento, uma discussão prévia,

um debate prévio sobre este tema para que haja conhecimento sobre o mesmo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É este o nosso ponto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, não é tanto uma intervenção, mas mais um

esclarecimento ao Sr. Deputado Fernando Anastácio.

O Sr. Deputado disse que foi o CDS que tinha levado o BES para algo — já não me lembro o que era — que

tinha que ver com aquisições militares…

Protestos do Deputado do PS Fernando Anastácio.

Sr. Deputado, gostava de esclarecer…

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço que deixem a Sr.ª Deputada intervir.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — O Sr. Deputado disse que o CDS tinha levado o BES para os

submarinos.

Como já tive ocasião de esclarecer noutra sede, em comissão parlamentar, essa afirmação é factualmente

falsa. É mentira, Sr. Deputado. O BES — creio que estava a referir-se à Escom — entrou no processo de

aquisição dos submarinos, salvo erro — vou citar de cor —, em 1998, quando o Governo era do Partido

Socialista.

Tive ocasião de esclarecer essa e outras questões numa sessão de comissão de inquérito parlamentar com

a, então, Sr.ª Deputada Ana Gomes, que, aliás, pediu desculpa por essa e por outras imprecisões.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Portanto, Sr. Presidente, relativamente a coisas que são

manifestamente falsas, gostava que a Câmara fornecesse ao Sr. Deputado as atas dessa sessão, para o Sr.

Deputado poder verificar a mentira que acabou de dizer neste Plenário.

O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao fim do primeiro ponto da ordem do dia.

Entramos agora no segundo ponto, com declarações políticas.

A primeira declaração política é de Os Verdes, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal encontra-se novamente

mergulhado numa crise com efeitos em todos os setores de atividade e em todas as dimensões das nossas

vidas. Depois de se ter pedido aos cidadãos que se confinassem em casa e tendo a generalidade dos cidadãos

respeitado essa orientação — muito, aliás, com um enorme sacrifício pessoal, porque implicou uma perda

substancial dos seus rendimentos —, é tempo de começar a gerar alguma normalidade e de encontrar respostas

de políticas públicas que estejam à altura de um país desenvolvido e comprometido em gerar qualidade de vida

e bem-estar às pessoas.

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Diz-nos o bom senso que é preciso aprender com os erros do passado e por isso, hoje, mais do que nunca,

se exige um Estado interventivo, proativo e determinado nos investimentos necessários, desde logo que não

coloque a cegueira do défice à frente das respostas necessárias de que os cidadãos precisam e que são

fundamentais ao desenvolvimento do País.

Por outro lado, desta crise podemos, apesar de tudo, tirar algumas conclusões e olhar para ela como uma

oportunidade de repensar as prioridades que têm norteado as nossas vidas, a forma como vivemos, produzimos

e consumimos e a forma como nos relacionamos com a natureza.

Em primeiro lugar, percebemos que, quanto mais fortalecido estiver o Serviço Nacional de Saúde, mais

adequada será a resposta a crises como aquela que estamos a viver. Portanto, desta crise sai reforçada a

necessidade de se investir a sério no SNS e na valorização dos seus profissionais.

Ficou também claro que temos de nos virar para a produção nacional e recuperar a nossa soberania

alimentar, não apenas porque é determinante para reduzir a pegada ecológica, mas também porque, em tempos

como aqueles que vivemos, é preciso que os países estejam em condições de assegurar resposta aos seus

cidadãos.

Por isso, é necessário potenciar a agricultura familiar, de pequena escala e biológica, dar vida ao estatuto da

agricultura familiar e fazer renascer os mercados de proximidade e os pequenos circuitos de distribuição, que

são fundamentais até para que os agricultores possam escoar os seus produtos.

É preciso reequacionar o papel do Estado na economia e colocar a banca ao serviço do relançamento da

economia, em vez de se continuarem a transferir recursos públicos para apoio à banca privada, recursos esses

que são indispensáveis para o desejável relançamento da economia.

É tempo também de avaliar as parcerias público-privadas (PPP) e de colocar um fim na brutal imoralidade

que os paraísos fiscais representam. São milhões e milhões de euros que podem e devem ser canalizados para

combater a pobreza, para garantir os apoios às famílias que perderam os seus rendimentos com esta crise e

para apoiar as pequenas empresas, para que estas também possam dar o seu contributo no relançamento da

economia.

Mas é tempo, também, de reequacionar este modelo económico, que assenta na exploração desenfreada

dos recursos naturais, que potencia elevados riscos para a saúde e que promove fortes impactos ambientais,

para além de aprofundar de forma dramática as desigualdades sociais. É preciso inverter as premissas, porque,

afinal de contas, é a economia que existe para servir as pessoas, não são as pessoas que existem para servir

a economia.

Portanto, quando falamos dos objetivos da economia, a discussão tem de assentar no bem-estar das

pessoas, na repartição justa da riqueza por todos produzida, na conciliação da vida profissional com a vida

familiar, no combate às assimetrias regionais e no estabelecimento de uma relação de harmonia e de equilíbrio

com a natureza.

A crise climática, a assustadora perda de biodiversidade e o uso insustentável de recursos naturais não

podem deixar de estar presentes nas preocupações de hoje, porque, certamente, vão exigir maiores desafios

amanhã. Também por isso esta pandemia não pode servir de desculpa para reduzir o investimento em áreas

determinantes para garantir o equilíbrio ecológico, como seja a conservação da natureza ou o setor dos

transportes.

Vejamos: durante estes dias, os índices de poluição baixaram consideravelmente, sobretudo porque as

deslocações pendulares deixaram de se realizar massivamente. Ora, estes dados vêm reforçar a necessidade

e a oportunidade das propostas de Os Verdes relativamente à aposta séria nos transportes públicos a preços

socialmente justos, para que possam representar uma verdadeira alternativa à utilização diária do automóvel

particular.

Por isso, Os Verdes insistem na necessidade de reforçar os horários e o material circulante, aumentando a

oferta de transportes públicos, dotando o País de uma maior cobertura, com maior incidência na ferrovia, alargar

a abrangência do passe social, mas também favorecer a utilização de modos de transportes suaves ou ativos,

nomeadamente com a implementação de uma rede nacional de ciclovias, com ligação entre municípios e

regiões.

Olhemos, pois, para esta crise como o ponto de viragem nas nossas prioridades e questionemos aquilo que

fomos aceitando como normal, nomeadamente, o modelo económico que faz depender a sua sobrevivência da

exploração desenfreada dos recursos naturais; a possibilidade dada às grandes empresas que, produzindo os

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seus lucros no nosso País, colocam a sua sede fiscal na Holanda para não pagarem impostos cá; um sistema

fiscal que permite que uns possam viver em paraísos fiscais, para a generalidade viver num verdadeiro inferno

fiscal; um modelo em que os banqueiros dividem os lucros quando os bancos dão lucro, mas que chama os

contribuintes a pagar a irresponsabilidade dos banqueiros quando os bancos dão prejuízo.

Não pode ser! Há muita coisa errada nisto tudo!

Por isso mesmo, dizemos: que esta crise sirva, pelo menos, para nos interrogarmos sobre estas e outras

injustiças e imoralidades e sobre a relação que estabelecemos com o planeta.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado José Luís Ferreira, inscreveram-se três Srs. Deputados para pedir

esclarecimentos. Gostaria de saber se responde a todos, no fim.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Pires,

do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Luís Ferreira, esta pandemia

virou as nossas vidas ao contrário, não há como esconder. Teremos tempos de muita turbulência pela frente,

tempos que nos porão à prova enquanto indivíduos, enquanto sociedade, tempos que exigirão o melhor de nós,

em prol de todos.

Temos de olhar para esta calamidade, resultante de uma crise sanitária, e perceber que temos uma

oportunidade para acelerar muitos processos de mudança, no sentido de caminharmos para uma sociedade

mais justa e mais sustentável.

Os portugueses não desistem de um futuro coletivo mais próspero e menos desigual. A última crise obrigou

milhares de mulheres e de homens a sair de Portugal, à procura de uma vida melhor. Muitos estavam a regressar

e traziam consigo um futuro carregado de sonhos. É pelos que regressaram e pelos que sempre aqui estiveram

que temos a responsabilidade de fazer tudo o que está ao nosso alcance para que esses projetos de vida não

esmoreçam.

O pós-COVID é a oportunidade para mudarmos alguns hábitos, revermos rotinas e assentarmos o nosso

modelo de desenvolvimento numa economia verde que contribua para a criação de riqueza e bem-estar. Temos

excelentes recursos para concretizar essa mudança: ciência, tecnologia, indústrias criativas e recursos naturais.

Esta é a altura de reforçar a modernização no nosso setor produtivo, de implementar uma política fiscal que

beneficie empresas e atividades que cumpram critérios de sustentabilidade.

Mas esta crise veio também acelerar as mudanças que devem existir no setor da agricultura, por exemplo,

sobretudo na necessidade de encurtar as cadeias de produção, de distribuição e de consumo, contribuindo,

assim, para a redução da pegada ecológica.

Por último, e não menos importante, queria dizer, com orgulho, que foi o Governo português o primeiro

Governo a assumir o compromisso de alcançar a neutralidade carbónica em 2050, assumindo, desde já, uma

redução de 50% das emissões de carbono em 2030. Esta redução só se faz mobilizando muitos dos setores da

sociedade, apostando cada vez mais numa política de digitalização da economia, de eletrificação da mobilidade,

de reforço do transporte público e de outras formas de mobilidade.

Para terminar, gostaria de dizer que muitos de nós, por estes dias, respiramos ar menos poluído e ouvimos

menos barulho. Esta pandemia mostrou-nos que o excesso de barulho e a poluição…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Hugo Pires (PS): — Vou mesmo terminar, Sr.ª Presidente.

Como eu estava a dizer, esta pandemia mostrou-nos que o excesso de barulho e a poluição não são uma

inevitabilidade de quem vive nas cidades.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Clara

Marques Mendes, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Luís Ferreira,

começo por saudar o Partido Ecologista «Os Verdes» por ter trazido, neste ponto das declarações políticas, um

tema importante, que é o pós-COVID-19. De facto, esta pandemia veio causar graves dificuldades económicas,

sociais e humanas, que, infelizmente, se vão fazer sentir ao longo do tempo. Por isso, o PSD entende que deve

haver um plano de ação que vá para além deste momento da COVID-19.

Entendemos que a Assembleia da República e o Governo têm vindo a criar um conjunto de medidas para

fazer face a esta situação de pandemia que estamos a viver, mas elas são manifestamente insuficientes.

Verificamos, hoje, que há um conjunto de famílias com graves dificuldades; verificamos, hoje, que há um

aumento da situação de desemprego; verificamos, hoje, muitas dificuldades por parte das empresas em

manterem postos de trabalho e por parte das instituições em darem respostas sociais, pelo que o Governo deve

encetar uma ação que deve ser global, transversal entre os vários ministérios, para dar resposta a estas muitas

necessidades que se fazem sentir.

Entendemos, e concordamos, que deve haver um plano de recuperação económica, mas, paralelamente, em

conjunto com este plano de recuperação económica, é fundamental acudirmos àqueles que estão, neste

momento, numa situação de maior fragilidade e de maior vulnerabilidade.

Por isso, entendemos que deve haver um plano de respostas sociais, um plano de emergência social que vá

para além das medidas que estão atualmente em vigor e a serem aplicadas, plano esse que sirva, precisamente,

para acudir à situação que se vai fazer sentir ao longo do tempo e onde, como referiu, e bem, estejam também

refletidas as preocupações ambientais.

Termino, perguntando ao Sr. Deputado se acompanha o PSD nesta preocupação e na necessidade de existir

um plano estruturado, transversal, plano esse que responda às questões económicas e de emergência social.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula

Santos, do Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado José Luís Ferreira,

cumprimento-o pelo tema que trouxe a debate na Assembleia da República.

De facto, o surto evidencia, como referiu, a importância do SNS, os graves problemas estruturais e a

dependência do País e revela como está a ser utilizado como pretexto pelo capital para agravar a exploração,

atacar direitos, reduzir salários, destruir postos de trabalho, aprofundando a pobreza e as desigualdades.

Isto demonstra que a solução para os problemas existentes não é a política de exploração e de

empobrecimento que caracterizou o período das troicas, mas uma política alternativa, patriótica e de esquerda

que garanta o desenvolvimento soberano do País, uma política que permita a recuperação dos instrumentos de

soberania económica e monetária, com a libertação do País da submissão ao euro, e medidas que travem a

escalada do peso da dívida.

É preciso uma política de valorização do trabalho e dos trabalhadores, dos salários, da estabilidade no

emprego, do combate à precariedade, uma política que garanta o pagamento integral dos salários, a proibição

dos despedimentos, o alargamento dos apoios sociais e a proteção da saúde dos trabalhadores.

Defendemos a promoção da produção nacional, combatendo dependências e défices, e o apoio ao

rendimento dos micro e pequenos empresários, dos pequenos e médios agricultores e pescadores, assegurando

o abastecimento nacional e o escoamento da produção.

Como sinalizou na sua intervenção, consideramos também que, ao mesmo tempo, é preciso pôr fim ao atual

modo de produção capitalista, que conduz à exploração abusiva dos recursos naturais, à destruição da floresta,

que leva à poluição, à sobreprodução, ao desperdício e ao consumo exagerado.

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Defendemos, também, o controlo público da banca, a recuperação para o setor público dos setores básicos

e estratégicos da economia, o investimento nos serviços públicos, na saúde, na educação, no apoio social, na

ciência, na cultura, na mobilidade e, como bem sinalizou, no reforço dos transportes públicos, com mais carreiras

e mais horários, para que deem resposta às necessidades das populações. Deu-se um passo muito grande com

a criação do passe social e é preciso continuar a caminhar no sentido da redução dos custos para as populações.

É preciso uma política de combate aos privilégios fiscais do grande capital, aos paraísos fiscais, à fraude e à

evasão fiscais e é preciso pôr fim às transferências dos recursos financeiros para as PPP e a banca.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Defendemos a proteção da natureza e a garantia de um ambiente equilibrado e sadio.

Por isso, a questão que deixo, Sr. Deputado, é a de saber se, de facto, o Partido Ecologista «Os Verdes»

acompanha o PCP na necessidade de se avançar neste caminho, para responder aos problemas nacionais,

correspondendo aos interesses dos trabalhadores, do povo e do País.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson

Peralta, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Nelson Peralta (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado José Luís Ferreira, de

facto, a COVID-19 trouxe um momento doloroso para a sociedade, desde logo pela questão da saúde pública,

mas também pelo facto de aumentar as desigualdades sociais.

Olhemos, primeiro, para quem tem estado a responder à crise. Desde logo, os trabalhadores, homens e

mulheres, que, na linha da frente, com o seu trabalho, garantem o funcionamento da sociedade e o bem-estar

de todos nós, tal como os serviços públicos, na saúde, na educação, na segurança social e em tantas mais

áreas.

Olhamos para o modelo económico vigente e vemos que falhou. Falhou aos trabalhadores, no salário, e

falhou ao serviço público, no financiamento.

É por isso que o relançamento da economia tem de resolver este problema, tem de garantir serviços públicos

universais e bem financiados e um modelo económico que garanta que a riqueza seja também repartida pelos

trabalhadores, pelo seu trabalho. É também por isso que este modelo económico, que nos trouxe não só

desigualdades sociais mas também, pelos mesmos processos, a crise climática, deve ser alterado.

O relançamento da economia deve ter, como prioridade, a alteração das relações na sociedade, de forma a

termos mais igualdade e um sistema económico que não dependa da extração contínua e absoluta de recursos

para a produção de riqueza, mas que seja orientado para as necessidades das pessoas e do planeta. É essa,

aliás, a proposta que o Bloco de Esquerda já apresentou nesta Assembleia da República e que será discutida

em breve.

A minha pergunta para o Sr. Deputado é, precisamente, a de saber se acompanha esta proposta do Bloco

de Esquerda, de fazer um relançamento da economia que abandone o petróleo, que abandone a exploração

infinita de recursos, que seja sustentável e que tenha repartição de riqueza através da criação de emprego onde

ele é preciso de forma a, no combate à crise climática, mudar o nosso modelo energético, mudar o nosso modelo

de agricultura, garantir transportes públicos e investimento na ferrovia para todo o País. Concorda connosco

quando dizemos que é preciso um relançamento da economia com mais igualdade, com mais serviços públicos,

com justiça social e climática e que responda às necessidades de cada um e de cada uma, da sociedade e do

planeta?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, o último, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Cristina Rodrigues, do Grupo Parlamentar do PAN.

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A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado José Luís Ferreira,

o tema que nos traz é, obviamente, oportuno e estamos em absoluto acordo com a preocupação em relação à

retoma económica, ao respeito pelos valores ambientais e, também, à necessidade de descarbonização.

Consideramos que esta é a oportunidade que devemos aproveitar para encontrar uma nova normalidade que

seja ambientalmente sustentável, ao contrário daquilo que aconteceu até agora.

Consideramos que o Estado deve basear todas as ações e investimentos no conceito da criação de uma

economia sustentável, apostando nas energias renováveis e na eficiência energética, na ferrovia, na quantidade

e qualidade dos transportes coletivos, no fomento de um turismo sustentável, no aumento da durabilidade dos

produtos, no incremento das embalagens reutilizáveis, na educação para a sustentabilidade, entre muitas outras

coisas.

A pergunta que lhe faço, Sr. Deputado, é a de saber se concorda, ou não, que o Estado deve, para além do

que acabei de dizer, incentivar a banca a utilizar esses mesmos critérios no que diz respeito ao financiamento

da economia.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, do

Partido Ecologista «Os Verdes».

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr.ª Presidente, agradecia que, numa próxima vez, quando me fosse

perguntado de que forma eu queria responder, me fosse dado o número exato de perguntas, porque, sendo

cinco, teria respondido por duas vezes. Mas percebo. Se calhar, as inscrições foram feitas depois.

De qualquer forma, vou tentar respeitar o tempo na resposta aos cinco Srs. Deputados.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem razão, Sr. Deputado. Houve inscrições tardias.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr.ª Presidente, queria, antes de mais, agradecer as perguntas que me

foram dirigidas pelos cinco Srs. Deputados.

Começo por responder ao Sr. Deputado Hugo Pires, do Partido Socialista. De facto, a crise virou-nos a vida

do avesso. Ainda bem que há essa sinalização da parte do PS de que teremos o PS para procurar uma

sociedade mais justa e sustentável.

Também acho que a crise sanitária deveria ser, também, uma oportunidade para fazer assentar a economia

naquilo que o Sr. Deputado referiu, uma economia verde e sustentável.

Sobre a neutralidade carbónica, já tivemos oportunidade de registar que Portugal foi o primeiro a assumi-la.

O que vamos esperar é que não seja tudo remetido para o último ano. Portanto, que os passos sejam dados

gradualmente e não esperar até ao fim para que depois a neutralidade chegue de um dia para o outro, porque

assim não vamos lá.

Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes, de facto, esta pandemia trouxe graves consequências que vão ter

repercussões no futuro, como muito bem referiu. Foi tomado um conjunto de medidas que são insuficientes. Por

isso é que há, hoje, muita gente com dificuldades até para comprar bens alimentares, há famílias com

dificuldades a esse nível. Há uma perda de rendimentos generalizada, porque ou as pessoas ficaram sem

trabalho ou estão em regime de layoff e, portanto, perderam uma parte substancial dos seus rendimentos.

Quanto ao plano de recuperação económica, ele vai depender, naturalmente, do seu conteúdo e depois

estaremos, certamente, abertos à discussão para ver que propostas é que esse plano contempla e, sobretudo,

o seu conteúdo, porque falar-se em abstrato é mais complicado para se fazer qualquer juízo de valor. Mas que

ele é necessário, é, e será necessário para o futuro.

Sr.ª Deputada Paula Santos, de facto, a banca continua a ganhar com a crise. Aliás, um dos reparos que

temos a fazer ao Governo sobre as medidas que foram tomadas foi o de ter colocado a banca como intermediária

entre o Estado e as linhas de crédito, ainda por cima atribuindo à banca o poder discricionário de decidir quais

as pequenas empresas que tinham acesso às linhas de crédito e quais as que não tinham acesso às linhas de

crédito, mesmo reunindo os critérios que o Governo definiu para esse efeito.

De qualquer modo, também subscrevemos a ideia de que é preciso apostar a sério na produção nacional

para procurar também a nossa soberania alimentar porque, antes de entrarmos para a CEE (Comunidade

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Económica Europeia), importávamos 25% dos produtos que consumimos, do ponto de vista alimentar, e hoje

importamos 75%. É preciso inverter esta tendência.

Sr. Deputado Nelson Peralta, de facto, foram os trabalhadores que estiveram na linha da frente, bem como

os serviços públicos, sobretudo o Serviço Nacional de Saúde. Se fizéssemos uma reflexão sobre o problema

que seria para todos se não tivéssemos o Serviço Nacional de Saúde, apesar dos cortes e do subfinanciamento

a que foi sujeito, certamente as coisas seriam muito piores. Portanto, se há alguma coisa que se deve neste

combate não é só ao Governo, é também a quem esteve por detrás, o Serviço Nacional de Saúde, que foi capaz

de dar a resposta possível.

O relançamento da economia tem, de facto, de assentar não só na questão da sustentabilidade do planeta,

mas também na justa repartição da riqueza por todos produzida de forma justa, naturalmente, porque só assim

é que haverá desenvolvimento sustentável.

Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, do PAN, tal como eu disse na intervenção, a crise devia representar uma

nova oportunidade para procurarmos uma nova normalidade que seja mais sustentável, que se possam extrair

do planeta apenas aqueles recursos que são necessários para, dessa forma, não hipotecarmos o futuro, porque,

no futuro, eles vão ser necessários.

A eficiência energética, a aposta nos transportes públicos…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Quero, pois, dizer-lhe, Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, que Os Verdes acompanham essa ideia global de

obrigar a banca a ter esse critério de ponderação nos incentivos que faz à economia.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Como foi visto, houve muita tolerância de tempo por parte da Mesa,

quer em relação às inscrições tardias, quer em relação à resposta do Sr. Deputado José Luís Ferreira, que

também foi induzido em erro.

Portanto, a partir de agora, peço aos Srs. Deputados que tenham em atenção que os pedidos de

esclarecimento devem ser indicados no decurso da intervenção do orador, porque a Mesa não vai continuar a

ser tão tolerante como até agora.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro do Carmo, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal, a Europa e o mundo estão

confrontados com um enorme desafio de saúde pública, o maior e mais exigente de há décadas, que nos

reconduz ao essencial e ao razoável.

Mais do que sublinhar os riscos da globalização, como se fosse possível o regresso ao «orgulhosamente

sós» ou a modelos teóricos puros, sem implantação em nenhum ponto do planeta, que tantas vezes vi, aqui,

serem defendidos, estamos confrontados com uma insuperável dinâmica global, com riscos, que deverá implicar

novos equilíbrios regionais e nacionais, novas prioridades e novas afirmações estratégicas. Ninguém pensa em

parar o vento, mas aproveitamo-lo para gerar energia renovável.

Nesta pandemia, Portugal precisou do Serviço Nacional de Saúde, e este disse: «Presente!». Portugal

precisou do mundo rural, da sua capacidade produtiva, da nossa agricultura e dos seus produtores, e eles

disseram: «Presente!».

Uma vez mais, o interior, a agricultura, a pecuária, a pesca e outros setores produtivos responderam e

corresponderam às necessidades dos portugueses e posicionaram-se na consciência nacional como ativos

estratégicos centrais da afirmação de Portugal na normalidade e na emergência.

Aplausos do PS.

Tal como nas questões da floresta, fomos encaminhados para o essencial: ver a realidade, tomar um banho

de realismo. Precisamos, pois, de manter uma capacidade produtiva agroalimentar que, num quadro de

sustentabilidade, assegure as necessidades básicas da população, seja acolhida pela distribuição e chegue à

mesa dos portugueses, pelos meios tradicionais ou através de suportes digitais.

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Perante o apelo, em estado de necessidade, os agricultores, os produtores e os pescadores disseram, uma

vez mais: «Presente!», num quadro em que os decisores políticos mantiveram importantes interações com os

setores e decidiram bem, no tempo certo. É ver a campanha «vamos alimentar quem nos alimenta» ou os apoios

disponibilizados às fileiras da nossa agricultura.

Aplausos do PS.

Ainda em pleno desafio pandémico, resulta claro, no essencial, que o mundo rural respondeu ao desafio de

assegurar a cadeia de fornecimento alimentar dos portugueses, persistindo problemas e bloqueios resultantes

da redução da procura, devido à suspensão de atividades de hotelaria e restauração e às perturbações nos

mercados locais. A capacidade produtiva alimentar nacional assumiu, pois, uma centralidade, adaptou-se às

novas realidades de distribuição e precisa de continuar a ser acompanhada para superar os bloqueios e

consolidar o seu posicionamento num novo «normal» a que temos de nos habituar.

Os produtos locais e regionais ganharam maior presença digital — podem chegar aos cidadãos diretamente

sem que estes tenham de sair de casa. Este reforço do potencial rural na plataforma digital, à mão de semear

de qualquer um, em sua casa, tem e deve continuar a ser aprofundado. A ideia nunca poderá ser a de acabar

com as tradições, mas, sim, de criar espaços de afirmação para as fileiras da terra e do mar, de ter mais respeito

por quem cria, por quem nos dá qualidade.

Sr.as e Srs. Deputados, no meio de demasiadas más notícias da pandemia, esta é uma realidade

incontornável: a distribuição pode vender mais produto nacional, os portugueses podem comprar mais produtos

gerados no território continental, nos Açores e na Madeira. Os homens e as mulheres que, em terra e no mar,

aproveitam os recursos naturais para produzir e fornecer produtos de qualidade excecional estão prontos para

continuar a responder.

Fomos, assim, reconduzidos, pela emergência, a uma sociedade do bom senso e a uma economia do

razoável. Precisamos de prosseguir este esforço de valorização da capacidade produtiva e de crença na nossa

agricultura. É preciso apoiar, acreditar e agir em conformidade com os nossos hábitos de consumo. É preciso

consumir e exigir mais produtos nacionais, uma valorização e uma exigência que são boas para a economia

nacional, boas para o emprego e essenciais para a nossa capacidade de resiliência perante todos os cenários,

incluindo os do desafio das alterações climáticas,…

Aplausos do PS.

… uma valorização e uma exigência que são fundamentais para as comunidades rurais e para as economias

locais. O novo «normal» tem de ser com produto nacional.

Concluo, sublinhando o que deverá ser a sociedade do bom senso e a economia do razoável. A sociedade

do bom senso será aquela que, perante os condicionalismos e os ensinamentos da pandemia, procede aos

ajustamentos necessários para preservar as vidas humanas, salvaguardar as dinâmicas comunitárias e proteger

os mais vulneráveis. A economia do razoável, Srs. Deputados, será aquela que, perante os ensinamentos da

pandemia, reforça a sua resiliência perante os riscos, aprofunda o seu potencial de capacidade produtiva e

ajusta o funcionamento aos novos hábitos e dinâmicas dos cidadãos e das comunidades.

Com o contributo do mundo rural, Portugal pode ser uma sociedade do bom senso e uma economia do

razoável. Vamos todos ter de dar um novo valor à ruralidade!

Neste contexto de pesar pela perda de vidas humanas, de resiliência das comunidades e de exemplos

sublimes de missão de serviço em função dos outros, nomeadamente no Serviço Nacional de Saúde e na

sustentação de bens e serviços essenciais, importa fazer o que é preciso, sempre, mas sempre, centrados no

essencial, para estarmos mais preparados, mais resilientes e mais confiantes em relação ao futuro.

O mundo rural ou, melhor, o mundo real, que sempre esteve nesse registo, voltará a dizer: «Presente!». E é

desse presente que se fará o futuro, com um novo «normal», que será a produção nacional.

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — A Mesa regista sete inscrições de Srs. Deputados para pedidos de

esclarecimento. Como é que o Sr. Deputado Pedro do Carmo deseja responder?

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Sr.ª Presidente, primeiro, aos três primeiros Srs. Deputados e, depois, aos

restantes quatro Srs. Deputados.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito bem.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Vicente, do Grupo Parlamentar do Bloco

de Esquerda.

O Sr. Ricardo Vicente (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro do Carmo, em

Portugal, a produção agrícola é garantida essencialmente por explorações agrícolas de minifúndio e familiares.

No entanto, independentemente da sua dimensão, a dificuldade dos agricultores não está na produção, mas,

sim, na venda dos seus produtos — produz-se bem, vende-se mal.

Durante décadas, os Governos do PS e do PSD promoveram a abertura de grandes supermercados e

destruíram os mercados locais e, hoje, essas grandes cadeias de distribuição multinacionais praticam os preços

que querem, metem os agricultores e os pescadores a pagar promoções que fazem, aplicam os descontos que

entendem, cobram caro aos consumidores e, no final, algumas ainda pagam impostos no estrangeiro.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. Ricardo Vicente (BE): — Sr. Deputado, não raras vezes, encontramos agricultores a vender a sua

produção abaixo do custo de produção. O mesmo acontece com os pescadores em que, por vezes, os preços

pagos aos produtores são 10 vezes mais baixos do que paga o consumidor. Neste momento de pandemia, não

foi diferente.

Assim, a pergunta que lhe deixo é a de saber se o Partido Socialista está disponível para acompanhar a

proposta do Bloco de Esquerda no sentido de estabelecer taxas máximas de intermediação e preços mínimos

acima dos custos de produção, de forma a garantir preços justos ao produtor e ao consumidor e a acabar com

o abuso da grande distribuição.

Não é uma questão de bom senso e de razoabilidade, mas de justiça.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília

Cerqueira, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr.ª Presidente, antes de mais, saúdo o Grupo Parlamentar do PS por

trazer a debate o tema da agricultura, neste período de declarações políticas.

Sr. Deputado, de facto, algumas coisas que aqui disse, como frases feitas, são realmente aquilo que todos

defendemos, que é a defesa do mundo rural, a importância da agricultura, da pecuária, da distribuição, da

produção… O quanto ela se evidenciou agora!

Sr. Deputado, também tenho de deixar nota, como lamento, que normalmente vejo-o defender essas

posições, mas não o vejo acompanhado pelo seu grupo parlamentar. Daí, a primeira pergunta que tenho de lhe

fazer é se o seu grupo parlamentar subscreve tudo aquilo que aqui afirmou.

Vamos por partes: estamos de acordo com a campanha «Alimente quem o alimenta», naturalmente, e com

tudo aquilo que vem ajudar o mundo rural e o setor. O PSD está sempre de acordo e estará sempre ao lado da

solução.

No entanto, Sr. Deputado, também não posso deixar de lhe lembrar a sua entrevista — esta de hoje, que

também está no mesmo portal, no Agroportal. Que diz o Presidente da Fenepecuária (Federação Nacional das

Cooperativas de Produtores Pecuários) ainda hoje? Diz o seguinte: «agricultores exigem decisões políticas para

continuarem a alimentar o País.»

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Sim, esta função tão essencial, que é a alimentação, está a ser assegurada pelos produtores, mas não com

medidas efetivas, porque a única coisa que vimos até hoje são adiantamentos, adiantamentos, adiantamentos

da PAC (política agrícola comum). Dinheiro novo no setor, zero! Tudo o que vimos são adiantamentos que são

dados hoje e que vão faltar amanhã! Esta é que é a realidade.

Além do mais, a nossa capacidade produtiva é fundamental para defender o mundo rural, como o PSD vem

vindo a fazer ao longo desta Legislatura, e, diga-se de passagem, quase sempre sozinho.

Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se o PS vai apoiar uma série de projetos de resolução e de projetos de lei que

deram entrada neste Parlamento e que são atentados ao mundo rural, à produção, à pecuária, à alimentação.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Vai o PS estar ao lado desses diplomas ou vai estar com o mundo rural,

como afirmou o Sr. Deputado?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Tanta violência contra uma simples recomendação!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André

Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro do Carmo, se o PS pudesse fazer

declarações de voto a seguir à sua declaração política, seria bom perceber quantas seriam feitas.

O Sr. Deputado falou da sociedade do bom senso e da economia do razoável, só que isso não chega para

ajudar os setores nem para pôr comida na mesa das famílias. Para tal é preciso um bocado mais do que

razoabilidade e uma economia com bom senso.

Ainda ontem ouvimos a Confederação Nacional da Agricultura falar da dificuldade de escoamento — e o

senhor sabe isso tão bem quanto eu, sobretudo nas plataformas online, que referiu, e, bem —, nomeadamente

no que tem sido a sabotagem deste trabalho e a dificuldade dos pagamentos e de cobranças de taxas nestes

serviços. O que é que o PS está disposto a fazer quanto a isto?

Sobre a cereja, ouvimos os respetivos produtores queixarem-se. Afinal, o País não está tão bem assim como

o PS gosta de pintar. O Governo deixou isso para os seguros — os seguros que resolvam. Não pode ser! Esses

homens e mulheres, que durante anos pagaram impostos, têm agora direito a terem a nossa ajuda. O que é que

o PS está disposto a fazer em relação a isso?

Referiu também o setor das pescas…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Referiu o setor das pescas, mas a verdade é que o Governo deixou os pescadores entregues ao fundo de

garantia salarial e a empréstimos com juros bonificados. O que é que o PS disposto a fazer para colocar liquidez

efetiva nesta indústria?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder a estes três pedidos de esclarecimento, tem a palavra

o Sr. Deputado Pedro do Carmo.

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Sr.ª Presidente, o Sr. Deputado Ricardo Vicente colocou aqui questões

relativas ao facto de o PS ter colocado este tema na agenda e apelar ao consumo. Fui claro na minha intervenção

quando disse, claramente, que, neste momento difícil do País, a agricultura respondeu de forma exemplar. E

não respondeu de forma exemplar por acaso, foi pelo valor dos homens da terra e do mar que estavam

preparados e tinham os mecanismos.

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Os decisores decidiram no tempo certo, e decidiram bem, e colocou-se na ordem do dia uma campanha

alimentar a que todos temos obrigação de corresponder e a que todos devemos a obrigação de responder não

só neste Parlamento, mas também nas nossas atitudes e nos nossos hábitos de consumo. Foi este o tema que

quis trazer e que era necessário trazer aqui. Aliás, o PS tem trazido sempre a esta Assembleia, nestes

momentos, o que é essencial, com bom senso e com a responsabilidade que é inevitável.

Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, não sei de que projetos falou, mas tem sido sempre o Partido Socialista, na

linha da frente, a tomar posições em defesa do mundo rural, da ruralidade e da agricultura, de uma agricultura

com equilíbrio, de uma agricultura verdadeira, de uma agricultura sustentável que respeite o meio ambiente,

mas que tenha níveis de produção que nos permita exportar. É desses dois tipos de agricultura que eu falei

quando referi da tribuna que tem de haver um equilíbrio e um sentido de responsabilidade.

Aplausos do PS.

Protestos dos Deputados do PSD Emília Cerqueira e do PCP João Dias.

Quando eu falei — e repito — numa visão idílica, que não tem aplicação em nenhuma parte do planeta, é aí

que o PS lidera o processo, é aí que o PS mostra que faz, efetivamente, a diferença.

Naturalmente, agradeço os elogios que referiu, mas devo dizer que esqueceu-se de ler a entrevista toda, que

foca grande parte dos pontos positivos e da rapidez com que foram efetuadas as soluções na agricultura.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Vou concluir, dizendo ao Sr. Deputado André Ventura que parece que não

faz parte, naturalmente, da economia do razoável nem do bom senso.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Dias.

O Sr. João Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro do Carmo, no presente, e

sempre, o pior cego é aquele que não quer ver. Os problemas da agricultura são bem maiores do que os que o

Governo identifica e são mais bem sentidos e visíveis na pequena e na média agricultura.

É por isso que o PCP, ainda ontem, apresentou na Assembleia da República um projeto de lei com medidas

de apoio aos pequenos e médios agricultores, propondo a majoração do pagamento anual do regime da pequena

agricultura para os 1250 €. E, neste caso, Srs. Deputados, o Governo não se pode desculpar com o impedimento

da Comissão Europeia, porque, neste caso, as regras da política agrícola comum permitem que se possa ir mais

longe, permitem um pagamento que pode ir até aos 1250 €, sendo que o impedimento é do Governo, que não

quer ajudar à sobrevivência de milhares de agricultores, que se veem na iminência de perder todo o esforço e o

trabalho de uma vida.

Os agricultores, a quem é retirada a possibilidade de escoamento dos seus produtos, ficaram sem mercado,

ficaram sem os restaurantes, que lhes compravam os produtos, ficaram com os produtos, ficaram com os

prejuízos, perderam o rendimento — que o digam os pequenos produtores de raças autóctones, os produtores

de vinho, os produtores de leite, os produtores de fruta, entre muitos outros —, veem descer os preços dos seus

produtos todos os dias e veem-se agora numa situação muito difícil e sem apoios.

Por isso, defendemos medidas de aplicação imediata, de fácil acesso, descomplicadas, desburocratizadas,

medidas essas que devemos usar, bem como todos os mecanismos de ajuda existentes e ajustá-los a quem

mais precisa, ou seja, a pequena e média agricultura.

Por isso, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, segundo o PCP, as medidas de apoio ao setor agrícola que têm

vindo a ser implementadas para responder aos efeitos da situação atual são insuficientes e devem, por isso, ser

acompanhadas de medidas que garantam o escoamento dos produtos agrícolas dos pequenos agricultores e

da agricultura familiar e que permitam reduzir os custos dos fatores de produção agrícola e pecuária.

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O PCP defende a criação de um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares

provenientes da pequena e da média agricultura e que promova o escoamento…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Dias (PCP): — Concluo, Sr.ª Presidente, com duas perguntas: sem escoamento, sem preços

justos à produção, sem apoios específicos, como é que a pequena e média agricultura vai sobreviver?

E, Sr. Deputado Pedro do Carmo, quero perguntar-lhe se vai acompanhar as propostas e os projetos de lei

que o PCP apresentou e que responderiam às necessidades da pequena e da média agricultura.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís

Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro do Carmo, queria, antes de mais,

felicitá-lo pelo tema que traz para discussão: agricultura, combate à desertificação, o mundo rural e, sobretudo,

a recuperação da nossa soberania alimentar.

Acho que esta crise sanitária deixou bem claro que temos mesmo de nos virar para a produção nacional e

recuperar a nossa soberania alimentar não apenas porque ela é determinante para reduzir a pegada ecológica,

mas também porque, em tempos como o que vivemos, é preciso que os países estejam em condições de

assegurar as respostas aos cidadãos.

Por isso, é preciso recuperar a nossa soberania alimentar e inverter a tendência, que tende, aliás, a agravar-

se, porque, quando entrámos para aquilo que, na altura, era a CEE, importávamos apenas 254% dos produtos

alimentares que consumíamos e depois passámos a importar 75% dos produtos que consumimos. Portanto, é

preciso inverter esta tendência.

E eu encontraria aqui dois motivos pelos quais isto aconteceu: por um lado, certamente, como se lembrará,

em alguns governos, sobretudo no Governo de Cavaco Silva, dava-se dinheiro às pessoas para abandonarem

a agricultura, para arrancaram as suas plantações; e, por outro lado, a proliferação das grandes superfícies,

sobretudo a liberalização dos horários, veio criar muitas dificuldades aos pequenos agricultores para escoarem

os seus produtos para as grandes superfícies, que são hoje os grandes embaixadores da importação de

produtos alimentares. Aliás, nem se percebe muito bem como é que nas grandes superfícies não há batata

portuguesa quando os agricultores portugueses não conseguem escoar a sua batata e quando essas grandes

superfícies dizem que estão a apoiar a produção nacional!

Foi, aliás, depois da liberalização dos horários das grandes superfícies que os mercados perderam força,

começaram a fechar. Os mercados eram muito importantes para os nossos agricultores, porque eram uma forma

de eles escoarem os seus produtos.

Por isso, consideramos que é necessário potenciar a agricultura familiar de pequena escala e biológica, fazer

renascer os mercados de proximidade e os pequenos circuitos de distribuição, que são fundamentais para os

agricultores poderem escoar os seus produtos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Mas, Sr. Deputado, tenho uma pergunta para lhe fazer, que é a seguinte: encara ou não como muito

importante o estatuto da agricultura familiar, que, finalmente, este Governo aprovou, mas que é preciso que saia

do papel, porque não há meio de o Governo andar para a frente com o estatuto da agricultura familiar?

Queria, então, saber, Sr. Deputado Pedro do Carmo, se podemos contar consigo para pressionar o Governo

no sentido de tirar do papel o estatuto da agricultura familiar.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Meireles.

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, queria também saudar o Sr. Deputado Pedro do Carmo

por ter trazido aqui o tema da agricultura e do mundo rural.

Gostaria de começar por dizer que, de facto, a agricultura e o mundo rural têm estado à altura, e bem à altura:

quem não se lembra de, no princípio desta pandemia, ouvir falar em algum receio de que pudessem haver

ruturas no abastecimento alimentar? Ora, foi bem visível que tal não aconteceu.

Da mesma forma, também apreciei ouvi-lo valorizar o mundo rural e eu gostava apenas de lhe lembrar que,

ainda há bem pouco tempo, aqui, no Parlamento, discutimos um conselho consultivo do mundo rural e pena é

que o Partido Socialista, nessa altura, não tenha valorizado desta forma o mundo rural. De facto, uma das

principais ameaças que o mundo rural e a agricultura têm atravessado é uma certa visão um bocado urbano-

desconfiada em relação ao setor agrícola, como se, de algum modo, fizesse mal à terra ou às pessoas. Trata-

se de uma visão preconceituosa em relação ao mundo rural, que, acho, o poder político devia contrariar e tenho

visto, com toda a franqueza, não da parte do Sr. Deputado, mas do seu partido, um certo compactuar com esta

visão.

Portanto, gostava de lhe perguntar se esta é uma inflexão do Partido Socialista, que é bem-vinda.

Por último, gostava de lhe perguntar o seguinte: é verdade que não houve rutura no abastecimento, mas

também é verdade que há muitos agricultores, sobretudo de fruta — estou a lembrar-me dos produtores da

cereja e do pêssego — e também de produtores pecuários, que sentem que os seus habituais circuitos de

distribuição estão bloqueados, sobretudo produtores que vendiam para a hotelaria e para a restauração.

São boas as iniciativas de mercado digital, mas isso, obviamente, não responde à esmagadora maioria dos

agricultores e, por outro lado, também é natural que venha a acontecer uma descida do preço em muitos bens

agrícolas. E isso vai ser, a prazo, um problema, pelo que lhe pergunto o que está planeado desse ponto de vista.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina

Rodrigues.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, saúdo, obviamente, o PS por

ter trazido este tema a Plenário, que é tão importante, e deixo também o nosso reconhecimento de que,

efetivamente, os agricultores tiveram uma grande capacidade de reação a todas as condicionantes provocadas

pela crise sanitária. De facto, a agricultura ganhou aqui um peso vital, que já tinha, mas agora mais forte ainda,

como ativo nacional neste tempo de pandemia.

Felizmente, não foi necessário fechar as fronteiras ao transporte de mercadorias, caso contrário, para além

da crise sanitária, teríamos um problema de falta de alimentos, pois, na verdade, Portugal é apenas

autossuficiente na produção de leite, ovos, milho, vinho e pouco mais.

O que quero dizer com isto é que a nossa soberania alimentar está em causa, e isto acontece devido a

políticas agrícolas inadequadas que, consecutivamente, cedem aos interesses da indústria agroalimentar, onde

se privilegiam os grandes produtores em detrimento da agricultura familiar, onde se subsidiam fortemente modos

de produção agrícola altamente poluentes em detrimento de práticas mais sustentáveis, como a agricultura em

modo biológico, onde se fomenta a monocultura em vez de uma produção plural e rica em variedades e onde o

lucro prevalece sempre sobre o bem comum.

Não basta ser nacional, embora isso seja obviamente importante, mas tem também de ser sustentável. Veja-

se o caso do Alentejo: no âmbito do Programa de Desenvolvimento Rural 2014-2020, até fevereiro de 2019, o

investimento em olival nesta região representava quase 65% do investimento agrícola total realizado no Alentejo.

As searas deram lugar a um novo megalatifúndio assente em fundos internacionais, com seis grandes grupos a

deter ou a gerir mais de 65% dos olivais da região. São eles os grandes beneficiários do maior investimento

público alguma vez realizado na agricultura portuguesa.

A tudo isto acresce o facto de os trabalhadores agrícolas, muitos deles imigrantes, serem sujeitos a condições

indignas e a que ninguém deveria estar sujeito.

Pergunto ao Sr. Deputado Pedro do Carmo se há ou não vontade de implementar políticas que tenham como

objetivo assegurar a soberania alimentar, por um lado, e, por outro, se o PS está disposto a trabalhar para que

se verifique uma efetiva promoção da agricultura em modo biológico e se deixe de subsidiar modos de produção

com impactes ambientais significativos.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder a estes pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.

Deputado Pedro do Carmo.

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Sr.ª Presidente, saúdo e agradeço ao Sr. Deputado José Luís Ferreira

porque, da forma como falou, vê-se que, efetivamente, ouviu e acompanhou toda a minha explanação e se revê,

com certeza, nesta sociedade do bom senso, nesta economia do razoável. Fiquei, naturalmente, satisfeito por

isso.

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, naturalmente que também falei dos constrangimentos e dos bloqueios, eles

existem. Não estamos numa situação em que gostaríamos de estar ou que fosse desejável, estamos,

efetivamente, num momento muito difícil, a atravessar a crise desta pandemia, e este setor tem bloqueios.

O que é importante realçar é que estivemos à altura e conseguimos ultrapassar os problemas. Houve

decisões políticas e medidas para acompanhar os intervenientes, os homens da terra e as mulheres do mar, e

dar uma solução. Isso foi feito e o Partido Socialista tem liderado o processo nesse sentido. É este equilíbrio

com o mundo rural que é preciso aqui salientar.

A Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, do PAN, falou da questão do «orgulhosamente sós». Não estou aqui a

defender um País fechado, que produza só aquilo que interessa e querendo ser autossuficiente em tudo.

Estamos na União Europeia, temos de partilhar com a União Europeia, temos de ter uma economia partilhada,

mas também temos de ter uma agricultura que produza e dê resposta a todas essas situações.

O Sr. Deputado João Dias não ouviu nada do que eu disse. Ele quis falar aqui um pouco do que desconhece.

É contra a PAC, mas quer que a PAC resolva os problemas.

Protestos do Deputado do PCP João Dias.

O Sr. Deputado falou da agricultura familiar, mas, efetivamente, quem deu soluções para a agricultura familiar

foi o Partido Socialista, que conseguiu fazer o que é desejável e necessário para o nosso País: ter uma

agricultura familiar, ter o Estatuto da Agricultura Familiar e respeitar os pequenos agricultores e ter uma

agricultura competitiva, capaz de exportar e assegurar um contributo forte para a economia nacional. É este

equilíbrio que é difícil e que o Partido Socialista conseguiu, mas não foi com a sua ajuda.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana

Ferreira, do Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É com preocupação que o PCP tem

acompanhado a situação das famílias com crianças que frequentam os diversos equipamentos de apoio à

infância. A estas famílias foi cobrado, mesmo durante o encerramento dos equipamentos, o pagamento das

mensalidades das instituições, ao mesmo tempo que muitas mães e pais trabalhadores perderam o emprego,

perderam o salário, sentiram o aumento das despesas familiares, criando-se dificuldades acrescidas ao

pagamento destas mensalidades e sendo este pagamento mesmo incomportável em muitas situações.

As respostas do Governo a esta situação foram e são manifestamente insuficientes.

Foi para garantir respostas imediatas às famílias face às dificuldades que estão criadas com a quebra de

salários e rendimentos, bem como para criar medidas que tenham em consideração as dificuldades financeiras

com que muitas instituições de solidariedade social estão confrontadas que o PCP discutiu, na passada semana,

uma iniciativa legislativa que propunha a revisão das mensalidades de forma a refletir a alteração dos

rendimentos do agregado familiar e uma redução de, pelo menos, 20% das mesmas mensalidades no período

de suspensão de atividades letivas e não letivas; a alteração do período que serve de cálculo a essa revisão,

passando esta a ser efetuada em função dos rendimentos dos últimos dois meses; a proibição de anulação de

matrícula ou de cobrança de taxas ou multas por incumprimento do pagamento das mensalidades no período

de encerramento das valências; e o alargamento das vagas abrangidas pelos acordos de cooperação nas

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valências de apoio à infância, criando-se critérios de igualdade no cálculo das mensalidades entre as crianças

que frequentam as valências de infância e garantindo a todas a possibilidade de redução das mensalidades.

Esta é uma iniciativa que daria a resposta urgente que as famílias precisam e que permitiria às instituições

ter condições para a continuidade da resposta, mas que, infelizmente, foi rejeitada.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, as muitas dificuldades sentidas e todos os problemas decorrentes

do pagamento ou não das mensalidades confirmam a necessidade de se garantir uma rede pública, universal e

gratuita de creches, como o PCP tem defendido. Se existisse hoje uma rede pública de creches e se estivesse

concretizado o alargamento da rede pública de pré-escolar, de forma a garantir vaga a todas as crianças a partir

dos três anos, não se colocaria qualquer questão em relação às mensalidades, porque elas simplesmente não

existiriam.

Por isso mesmo, o PCP volta a insistir, tendo entregado nova iniciativa legislativa sobre a gratuitidade das

creches para todas as crianças até à entrada no pré-escolar.

É urgente concretizar o que foi aprovado em Orçamento do Estado por proposta do PCP. O projeto que

entregámos esta semana clarifica o procedimento célere a adotar, assegurando que, com a sua rápida

concretização, se efetiva uma redução das despesas dos agregados familiares num momento tão difícil para

muitas famílias, confrontadas com despedimentos, desemprego e perda de salários e outros rendimentos.

Não abdicando da criação de uma rede pública de creches com garantia de vaga a partir do final da licença

de maternidade e paternidade e de gratuitidade de acesso para todas as crianças até à entrada no pré-escolar,

o PCP propõe que tal objetivo possa ser implementado de forma faseada até estar assegurada a universalidade

deste direito para todas as crianças.

Para o PCP, a valência de creche deve proporcionar a componente de guarda e socialização das crianças

enquanto os pais trabalham, mas igualmente deverá ter os recursos humanos e técnicos adequados e

especializados para cumprir o seu papel no desenvolvimento das crianças.

A creche deve, no seu funcionamento, compatibilizar os tempos de cuidados com momentos de troca de

interesses e aprendizagem, com espaços em que a independência e a autonomia se possam exercer, de acordo

com as fases de desenvolvimento das crianças, de acordo com a idade e com o seu próprio ritmo.

É também para avançar neste desígnio que o PCP propõe medidas para o reforço do número de

trabalhadores nos equipamentos sociais onde existam carências, através da criação de uma bolsa de

recrutamento de trabalhadores, sob responsabilidade da Segurança Social, para assegurar que o reforço se

faça em função das necessidades e das prioridades a definir, garantindo a contratação com vínculo efetivo

destes referidos trabalhadores.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, acompanhamos também com preocupação o momento atual da

reabertura dos equipamentos de apoio à infância, considerando que nos têm chegado inúmeras preocupações

das instituições sobre a reabertura, bem como preocupações e dúvidas de mães e pais que estão baralhados

com informações pouco claras.

Para que as creches possam reabrir em segurança para as crianças e suas famílias e para os trabalhadores

é necessário que se garantam medidas de proteção da saúde e de prevenção de contágio, bem como de

condições de funcionamento dos equipamentos. É preciso que o Governo dê confiança às famílias, criando as

condições para que as creches funcionem com segurança e clarificando indicações que foram dadas e que

estão a gerar intranquilidade e indignação — o PCP questionou já o Governo sobre esta situação —, mas

também sobre a reabertura do pré-escolar e dos ATL, matéria que continuaremos a acompanhar de forma

próxima e interventiva.

É necessário dar resposta aos problemas e dificuldades de caráter conjuntural para um quadro excecional

como o que vivemos, mas elas têm de se inserir numa resposta ampla aos problemas estruturais que afetam a

rede de equipamentos e serviços na área da ação social.

O PCP defende que a garantia dos direitos sociais, incluindo a existência de equipamentos e serviços de

apoio às crianças, aos jovens, aos idosos, às pessoas com deficiência, às pessoas em situação de exclusão

social, entre outras respostas sociais, é uma responsabilidade primeira do Estado. Sucessivos governos têm

transferido essa responsabilidade para as instituições particulares de solidariedade social, cujo papel

reconhecemos como importante, mas como complemento das respostas públicas a que o Estado está obrigado

constitucionalmente.

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A implementação de uma rede pública nesta área representa o cumprimento de uma função social do Estado

que este deve chamar a si.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — A Mesa regista cinco inscrições para pedidos de esclarecimento.

Como pretende responder, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Responderei, em conjunto, aos dois primeiros e, seguidamente, aos últimos

três, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para formular o primeiro pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Ana Rita Bessa, do CDS-PP.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, muito obrigada por ter

trazido à discussão este tema de enorme relevância, tanto mais que na segunda-feira se espera a abertura das

creches. E a Sr.ª Deputada disse, e muito bem, de resto como vem também explicado no documento de

orientações da DGS (Direção-Geral da Saúde), que o papel das creches é, essencialmente, um papel de guarda

e socialização das crianças até aos três anos de idade.

A Sr.ª Deputada disse também que havia muitas queixas em relação às orientações da DGS, porque eram

pouco claras. Ó Sr.ª Deputada, acho que, infelizmente, são até bastante claras! O problema não é de clareza, é

de exequibilidade!

Sr.ª Deputada, vou dar-lhe alguns exemplos de orientações da DGS do que me parece ser um desafio a ser

salvaguardado pelas creches: «Os brinquedos que as crianças possam eventualmente levar consigo…» — em

princípio não devem levar brinquedos para as creches, porque sabemos que as crianças até aos três anos de

idade não precisam dos seus próprios brinquedos, nem têm na sua companhia um brinquedo que seja de

segurança, mas vamos admitir que não levam e que isso não é uma violência para elas — «…devem ser lavados

regularmente, pelo menos duas a três vezes ao dia». Bem, suponho que haja alguém responsável por fazer esta

lavagem duas a três vezes ao dia, secar com certeza, e até engomar, se for caso disso!...

Uma outra orientação é a seguinte: «Se possível, devem manter-se as portas e janelas das salas abertas,

de modo a permitir a melhor circulação do ar». Também acho uma boa ideia, desde que as crianças não caiam

por algum lado ou não se atirem de uma janela abaixo, porque, entretanto, a educadora estará a lavar o

brinquedo e não terá ocasião de estar a controlar.

Finalmente, refiro — e, sinceramente, a minha preferida é esta: «Os colchões devem ser separados de forma

a assegurar o máximo distanciamento físico possível, mantendo as posições dos pés e das cabeças das crianças

alternadas». Sei que as crianças até aos três anos de idade são anjinhos, mas, em princípio, elas mexem-se

enquanto estão a descansar. Vejo que seja muito difícil garantir que se mantenham, durante todo o tempo da

sesta com a cabeça virada cada uma para o seu lado! Suponho até que isto venha do «episódio do elevador»,

em que a Sr.ª Dr.ª Graça Freitas se virava, com os outros elementos, cada um para o seu lado e, assim,

salvaguardava a segurança!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr.ª Deputada, por favor.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Concluo, Sr.ª Presidente, perguntando se o PCP não entende que estas

medidas são inexequíveis e que, nestes termos, respeitando estas orientações, as creches não poderão abrir.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr.

Deputado João Paulo Pedrosa, do Grupo Parlamentar do PS.

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O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, saúdo-a por ter trazido

este tema a debate e também por me ter permitido, em nome da bancada do Partido Socialista, expressar a

satisfação que sinto ao lembrar que na história destes 50 anos de democracia têm sido os Governos do Partido

Socialista a garantir a universalidade dos direitos e das prestações sociais dos idosos e da infância.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Nessa medida, e com esta crise da COVID, isso não só se manteve

como se intensificou. Fomos os primeiros na Europa, através do Ministério do Trabalho, Solidariedade e

Segurança Social, a fazer um rastreio de todos os funcionários dos equipamentos sociais existentes em Portugal,

com o sucesso e eficácia que se conhece. Conferimos apoio a milhares de famílias para manter o emprego,

através do layoff. Na infância e nas creches mantivemos todos os acordos de cooperação, com a garantia da

segurança social. Já tínhamos garantido, no Orçamento do Estado, para quem visse reduzido o seu rendimento,

uma diminuição de comparticipação. Temos vindo a aumentar, a caminho da universalização, o número de

creches através do Programa PARES. Este ano já houve 130 candidaturas para mais de 7000 lugares e já foi

garantido que onde houver cortes de cooperação garantidos pelo Estado as pessoas que não tiverem

rendimentos não ficam sem lugar na creche. E as duas medidas decisivas e das mais fundamentais de todas é

que as famílias, através do orçamento da segurança social, puderam ficar em casa sem perda de vínculo ao

emprego e sem perda da totalidade do seu rendimento. E esta medida já foi prorrogada até ao dia 1 de junho, o

que significa que quem não quiser colocar as crianças na creche, com todas as medidas de higiene e segurança

que foram asseguradas, pode mantê-las em casa até ao dia 1 de junho.

Por fim, quero perguntar à Sr.ª Deputada, que sabe que há muitos partidos e governos que não têm esta

sensibilidade social, se não acha que estas medidas que estão a ser tomadas são decisivas para lutar contra as

desigualdades sociais, medidas estas que, na maior parte das vezes, se não em todas, têm sido acompanhadas

pelo PCP.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder a estes dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra

a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, agradeço aos Srs. Deputados Ana Rita Bessa e João Paulo

Pedrosa as questões que colocaram.

De uma forma muito breve, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, as orientações publicadas hoje pela DGS têm um

conjunto de indicações e o facto de elas serem pouco claras refere-se, naturalmente, à informação que chega

muitas vezes às famílias e também às instituições, nomeadamente à informação que chegou nos dias que

antecederam a publicação deste documento.

Entendemos que é absolutamente fundamental para garantir a reabertura das creches que elas tenham

condições para cumprir todas as normas de segurança definidas pela DGS, no contexto em que atualmente

vivemos, e isso tanto é válido para as crianças como para os trabalhadores das próprias instituições. Importa

também perceber, por exemplo, se os espaços das instituições — e esta é uma das perguntas que o PCP já

dirigiu ao Governo — são suficientes para cumprir uma outra orientação da DGS que tem a ver com a redução

do número de crianças nesses espaços. Sabemos que, neste momento, há instituições a anular inscrições que

inicialmente aceitaram porque, dentro das salas que lhes estão destinadas, não têm espaço para acolher o

conjunto das crianças.

Estas são as nossas preocupações e entendemos que o Governo tem de encontrar as soluções, tanto para

estas preocupações como para outras. Entendemos que estes problemas exigem uma intervenção firme por

parte do Governo, que dê a confiança necessária às famílias para que estas possam colocar as suas crianças

nas creches e nos restantes equipamentos de apoio à infância, porque é também destes equipamentos que

estamos a falar, naturalmente.

Sr. Deputado João Paulo Pedrosa, depois da intervenção que fez, há algumas coisas de que não poderemos

deixar de falar. Garantir o emprego através do layoff é, objetivamente, algo que, na prática, não se verifica.

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Sr. Deputado, o layoff a que um conjunto de empresas está a recorrer significa a perda de rendimentos para

centenas de milhares de trabalhadores. Aliás, há mais de 1 300 000 trabalhadores em situação de layoff, e isso

tem uma repercussão imediata nos rendimentos das famílias, nomeadamente na questão do pagamento das

mensalidades.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Para terminar, Sr.ª Presidente, era importante, por exemplo, que, em relação

às mensalidades, o Governo tivesse garantido que não haveria nenhuma penalização nem anulação da

matrícula por incumprimento das famílias. Objetivamente, as famílias estão com menos rendimentos neste

momento. Esta é uma realidade a que tem de ser dada resposta, e o Governo não respondeu da forma devida.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helga

Correia, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Helga Correia (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, vivemos num momento

particularmente difícil e, nesta fase de desconfinamento, com uma tentativa de regresso controlado à

normalidade, estamos sujeitos a novos desafios. Os portugueses tiveram a capacidade de se adaptarem

rapidamente às novas formas de trabalho em casa, com novos desafios laborais e a trabalhar ao mesmo tempo

em que eram cuidadores e educadores dos seus filhos.

Quero saudar o PCP por trazer a debate este tema no dia em que a DGS divulgou oficialmente as orientações

para a reabertura das creches. É um tema que nos preocupa e que preocupa pais e educadores. Nos últimos

dias, várias têm sido as preocupações demonstradas pelas entidades e associações do setor, depois de terem

vindo a público algumas das medidas hoje anunciadas oficialmente pela DGS.

O Grupo Parlamentar do PSD vê com preocupação e acompanha algumas das inquietações de pais,

educadores e instituições. Entendemos que o Governo tem de ser capaz de criar as condições necessárias para

a reabertura das creches, salvaguardando as crianças e as famílias, mas não deixando de salvaguardar também

as instituições e a sua sustentabilidade. O Governo não pode deixar ninguém para trás.

Reafirmamos o que dissemos no debate da semana passada sobre esta matéria: o Estado não poderá deixar

as famílias, as instituições privadas e as IPSS (instituições particulares de solidariedade social) desprotegidas e

entregues à sua sorte. É com preocupação que tomamos conhecimento de que a Sr.ª Ministra do Trabalho,

Solidariedade e Segurança Social vai dar tratamento diferenciado às creches privadas, que vão ser obrigadas a

abrir portas. O Estado social tem de ser capaz de dar resposta a todos. Não existem crianças de primeira e

crianças de segunda.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o PSD vai querer ouvir entidades e profissionais do setor.

Sr.ª Deputada Diana Ferreira, pergunto-lhe se acompanha as preocupações do PSD. O PCP concorda com

a reabertura e com o modelo que está a ser adotado?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Silva, do Grupo Parlamentar do PEV.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, como

sabe, Os Verdes acompanham as preocupações sobre a possibilidade de algumas crianças poderem estar a

perder o lugar nas creches pelo não pagamento da mensalidade devida no período de confinamento.

Por nossa iniciativa nesta Assembleia, recomendamos ao Governo que mobilize as instituições no sentido

de promoverem acordos de reajustamento do valor das mensalidades com as famílias, para que estas não sejam

ainda mais prejudicadas pelo facto de terem perdido rendimentos ou o emprego.

Por outro lado, relembramos que é urgente a elaboração de um plano de criação de uma rede pública de

creches que cubra todo o País, com vista a garantir creche gratuita a todas as crianças até aos 3 anos, tal como

a Sr.ª Deputada referiu na sua intervenção.

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Entretanto, com a reabertura das creches a 18 de maio, damos voz às preocupações e dúvidas suscitadas

pelos pais e pelos profissionais, para que seja possível um retomar das rotinas em segurança, para as crianças

e para os profissionais. Existe muita insegurança, as respostas sobre o vírus ainda são escassas e talvez por

isso as indicações da DGS não sejam devidamente compreendidas. O que está em causa é a dinâmica na

relação entre as crianças e entre estas e os educadores e auxiliares, está em causa o trabalho pedagógico e de

estímulo do desenvolvimento da criança. O afeto, o toque, a partilha, a brincadeira, são dimensões assentes

numa interação de proximidade praticamente impossível de ser banida, sob pena de contribuir negativamente

para o desenvolvimento da criança no seu todo e de prejudicar os vínculos da criança com os adultos de

referência, com quem deve estabelecer confiança e segurança.

Por isso, Sr.ª Deputada, pergunto-lhe: para garantir o equilíbrio entre a necessidade de dar resposta a todos

os pais que têm de regressar ao trabalho, a vantagem que as atividades de sociabilização têm para as crianças

e a indispensável segurança para todos, não concorda que já deveriam estar previstas ações de fiscalização às

instalações das creches, por forma a determinar se as mesmas reúnem condições de segurança para garantir

a sua reabertura?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana

Mortágua, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, esta pandemia foi fulminante

na forma como deixou a descoberto os problemas de uma rede de creches entregue ao mercado. Isso é verdade

na questão das mensalidades, e por isso é que o Bloco apresentou também um projeto para impedir que as

crianças fiquem de fora pelo facto de as famílias não terem rendimentos, mas agora é também verdade na

questão da reabertura das creches, pois, como todos entendem, não é possível impor às crianças os

comportamentos dos adultos. As regras inicialmente conhecidas de isolamento das crianças são absurdas,

impraticáveis e, aliás, contraproducentes face a tudo o que se conhece daquilo que é necessário para o

acompanhamento pedagógico e o desenvolvimento das crianças.

Porém, ao mesmo tempo, é importante que as crianças regressem às creches. É importante para as famílias

e é importante para as próprias crianças, para o seu desenvolvimento. Por isso, tudo indica — e parece que a

DGS também já recuou nesse sentido — que a única medida que poderá ser eficaz é a do desdobramento dos

grupos de crianças em várias salas, o que, naturalmente, implica mais recursos humanos e mais vagas. E é aí

que entra o problema do mercado e da inexistência de um serviço público de creches.

O que lhe pergunto é se, neste momento, não é essencial manter o apoio financeiro para os pais que decidam

ficar em casa com as crianças enquanto não houver vagas suficientes de uma rede pública para garantir que

elas podem voltar às creches em condições de desdobramento de salas, em condições que gerem confiança

nas famílias, porque é importante que as crianças voltem para as creches.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, agradeço às Sr.as Deputadas Helga Correia, Mariana Silva

e Joana Mortágua as questões que colocaram.

Sr.ª Deputada Helga Correia, como inicialmente afirmámos, entendemos que para as creches reabrirem tem

de estar garantido um conjunto de medidas de segurança, tanto para as crianças como para os trabalhadores.

Teria de ter sido feito algo e questionamos o Governo sobre isso, como por exemplo se este plano para planificar

a reabertura das creches foi feito em conjunto com as instituições e também com as organizações

representativas daqueles trabalhadores. Também esta é uma matéria importante, que não pode ser esquecida,

porque estes trabalhadores também têm de ser devidamente protegidos e salvaguardados.

Caso haja instituições que não consigam reabrir, seja em 18 de maio ou 1 de junho, também questionamos

o Governo sobre quais são os eventuais mecanismos de apoio que pretende atribuir. Aliás, e respondendo

também à Sr.ª Deputada Joana Mortágua, o apoio aos pais que existe atualmente fica muito aquém daquele

que é necessário. Sendo um apoio que se poderá manter, fica muito aquém do necessário porque, para muitos

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pais, significa a perda de rendimentos no final do mês, sendo esta é uma realidade que o PCP apresentou logo

quando se procedeu à discussão do decreto-lei que deu origem a um conjunto destas medidas.

Também questionamos o Governo no que se refere, por exemplo, à realidade das amas da segurança social

e das creches familiares que existem no nosso País, sendo que não temos nenhuma informação clara sobre

como irá funcionar esta dimensão de resposta nos equipamentos sociais de apoio à infância.

Sr.ª Deputada Mariana Silva, no que se refere à questão das ações de fiscalização, entendemos que o

Governo tem de acompanhar todo este desenvolvimento de forma muito próxima, tem de acompanhar as

instituições, tem de estar presente, tem de estar no terreno e tem de garantir que as instituições têm as condições

para acolher as crianças com as normas de saúde e segurança devidamente cumpridas, de acordo com o que

está estipulado nos vários planos de saúde, considerando o contexto atual.

Nesta resposta, não podemos deixar de reafirmar que a realidade e o momento em que vivemos comprovam

que é absolutamente imperioso dar passos decisivos na construção de uma rede pública de creches que

responda ao conjunto das necessidades sentidas e que tenha o número adequado de profissionais, pois esta

realidade exigirá, naturalmente, o reforço do número de profissionais para acompanhar as crianças.

Naturalmente que isto seria feito de forma muito mais célere e justa se fosse o Estado a garantir esta mesma

resposta.

A resposta e os apoios sociais são uma responsabilidade do Estado, estando enquadrados nas funções

sociais do Estado de um ponto de vista constitucional. É isto que o PCP tem defendido e foi isto que trouxemos

à discussão, novamente, nesta declaração política.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim

de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, primeiro é o PAN.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço desculpa, Sr.ª Deputada, tem razão.

Tem a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do Grupo Parlamentar do

PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Passaram mais de dois meses

desde que a COVID-19 veio mudar um conjunto de certezas que tínhamos por adquiridas. De um dia para o

outro, fomos forçados a mudar comportamentos a fim de garantirmos o mais elementar que cada um de nós tem

— a sua vida e a sua saúde.

Enquanto grande parte de nós permaneceu em casa em confinamento, houve quem tivesse de continuar

fisicamente nos seus trabalhos e distante das suas famílias, os verdadeiros heróis que estiveram e continuam a

estar na linha da frente do combate à COVID-19: profissionais de saúde, das forças e serviços de segurança e

de socorro, das Forças Armadas, dos serviços públicos essenciais ou de gestão e manutenção das

infraestruturas essenciais. São profissionais a quem o legislador apelidou de essenciais, mas a quem não tem

sido devolvido todo o esforço e reconhecimento que há muito, e não apenas agora, lhes é devido.

A sociedade portuguesa tem feito a sua parte, seja apoiando, seja ficando em casa sempre que possível,

mas o Governo e a Assembleia da República têm de fazer mais, têm de reconhecer o papel fundamental que

todos estes profissionais merecem.

Os aplausos podem ser um conforto em tempos adversos como estes em que vivemos, mas não chegam

para justificar as privações e os medos que este cenário provoca. Os aplausos não chegam para retribuir a

dedicação e o comprometimento para com o próximo. Os aplausos não chegam, nem de perto, para compensar

o risco de verem a sua segurança e a dos seus familiares em causa. E não digam que não há dinheiro para que

todos estes profissionais possam ser valorizados quando, há anos, se passa um cheque em branco à banca,

cuja garantia tem sido feita à conta do dinheiro dos contribuintes. Há muito tempo que Portugal tem uma dívida

para com estes e para com outros profissionais. Há demasiado tempo, veja-se!

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Temos profissionais com remunerações baixas, física e psicologicamente desgastados, com condições de

trabalho adversas, e com poucos meios humanos e materiais para desempenharem funções de forma adequada

ao seu trabalho. Antes o Governo dizia-nos que não era o tempo, porque tínhamos um superavit. Agora também

não é tempo, porque estamos em crise. Quando será, afinal, esse tempo?

Pois bem, nós dizemos que o tempo é agora, Sr.as e Srs. Deputados! Por gratidão, por justiça e porque há

setores absolutamente indispensáveis à nossa sociedade onde é urgente fortalecer a resposta coletiva!

Principalmente numa altura em que se espera que cenários como o atual venham a acontecer num futuro muito

próximo e de forma cada vez mais frequente. E é também por isso que este é igualmente o tempo de integrar

os 2453 profissionais de saúde entretanto chegados ao Serviço Nacional de Saúde.

É o tempo da valorização de todos os profissionais na linha da frente e de passar dos aplausos para a prática.

E é aqui que se torna incompreensível que tantas propostas neste sentido, que já passaram por esta Assembleia,

tenham sido sucessivamente rejeitadas.

Falo, por exemplo, da proposta do complemento remuneratório de 20% para valorizar a dedicação dos

profissionais neste período particularmente difícil, a proposta de elevar os seus salários e aproximá-los da média

europeia, já que os médicos portugueses foram dos poucos que viram os seus salários reduzidos entre 2010 e

2017, e os enfermeiros são dos que, na OCDE, menos recebem pelo seu trabalho. Ou falo ainda da proposta

para a atribuição do estatuto de profissão de risco e consequente pagamento do subsídio de risco às forças de

segurança, elementos decisivos neste período para a implementação de medidas pouco populares e de difícil

fiscalização. Todas estas propostas, do PAN, que visavam uma real valorização destes profissionais, foram

incompreensivelmente chumbadas nesta Assembleia.

Sr.as e Srs. Deputados, com o alívio das medidas sanitárias, é agora fundamental acautelar a proteção de

outros profissionais, também eles essenciais, ainda que não reconhecidos na letra da lei. Falamos de todos os

que retomam agora presencialmente os seus trabalhos, nomeadamente em áreas tão delicadas como a

educação. Muitas são as reservas levantadas pela comunidade escolar — e já tivemos oportunidade de ouvir

aqui hoje falar sobre este tema — nos últimos dias quanto a esta tentativa de regresso à normalidade, já no

próximo dia 18, com famílias e educadores compreensivelmente apreensivos e com muitas dúvidas quanto ao

sucesso do desconfinamento. O regresso às atividades presenciais deve ser feito em segurança e num clima

de confiança, algo que não nos parece que esteja a acontecer, quer no regresso das aulas dos 11.º e 12.º anos,

quer nas creches. E quanto a esta questão, ou o Governo garante até essa data as condições necessárias e a

proteção dos professores, educadores, jovens e crianças para o regresso às aulas presenciais e para a

reabertura das creches, ou então terá de adiar este regresso.

Que não se repitam com estes profissionais os erros cometidos com os profissionais de saúde, dos lares ou

da distribuição e logística – erros que fizeram com que tenhamos uma elevada percentagem, por exemplo, de

profissionais infetados.

De facto, não é admissível que seja a sociedade civil, os profissionais, as organizações não governamentais,

as associações ou o tecido empresarial a assumir as responsabilidades que são do Governo. Por isso,

reiteramos: que a passagem do estado de emergência para o estado de calamidade não sirva para o Governo

«sacudir a água do capote», empurrando para outros aquelas que são as suas responsabilidades,

nomeadamente a de garantir que este regresso à normalidade se faz de forma segura para todas as pessoas.

Mas não nos esqueçamos também das responsabilidades que esta Assembleia tem, que não são apenas

exclusivas do Governo. Chamemos, por isso, a nós as nossas responsabilidades, porque palmas, Srs.

Deputados, é algo que não chega para estes profissionais.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, inscreveram-se seis Srs. Deputados para pedir

esclarecimentos. Como pretende responder?

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, responderei, em conjunto, primeiro, a um grupo de três

Srs. Deputados e, depois, a um outro grupo de três Srs. Deputados.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito bem, Sr.ª Deputada.

Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Alberto Machado, do Grupo Parlamentar do PSD.

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O Sr. Alberto Machado (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, a declaração política

que acabou de proferir, pela valorização dos profissionais de saúde, está genericamente em linha com o projeto

de resolução, submetido recentemente pelo PSD, no qual recomendamos ao Governo a aprovação de um

conjunto de medidas de reconhecimento, aos trabalhadores do SNS, envolvidos no combate à doença COVID-

19.

O PSD entende que é imperioso reconhecer o papel dos profissionais de saúde, principalmente dos que

trabalham no SNS, cuja abnegação, sacrifício pessoal, sentido de dever e profissionalismo em tanto contribuíram

para as relativamente baixas taxas de doentes infetados e de falecimentos por COVID-19, no nosso País.

Não podemos esquecer as condições específicas do exercício profissional que colocam estes profissionais

perante um risco de contágio por COVID-19 muito acrescido em relação à generalidade das pessoas.

Também não podemos esquecer os sacrifícios que muitos fizeram ao afastarem-se das suas famílias, por

fundado receio de transmissão da doença.

Tem também de ser reconhecido que estes profissionais têm sido colocados perante tempos de trabalho

muito superiores, além de as suas funções estarem a ser exercidas em condições de especial stress, penosidade

e com restrições de alguns direitos laborais, circunstâncias que ocorrem num já pré-existente contexto de

desgaste profissional e que em muito contribuem para aumentar o risco de burnout laboral.

O PSD entende que se impõe ao Estado reconhecer os altos e relevantes serviços prestados, a favor do bem

comum, pelos trabalhadores do setor da saúde mais diretamente envolvidos no combate à COVID-19.

Esse reconhecimento deverá ter expressão ao nível do gozo de férias em função dos dias de trabalho

prestados nesta pandemia, na atribuição de um prémio de desempenho correspondente a 50% da remuneração

base e na atribuição de uma distinção por comportamento exemplar por parte do Ministério da Saúde aos

profissionais do SNS que estiveram envolvidos no combate a esta pandemia.

Sr.ª Deputada, tendo em conta o aqui exposto e o conteúdo da sua declaração política, pergunto: está o

Grupo Parlamentar do PAN disponível para acompanhar o PSD, votando favoravelmente o nosso projeto de

resolução?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita

Bessa, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, claro que no CDS

valorizamos o trabalho de todos os profissionais que estiveram na linha da frente, como diz, e bem, desde os

profissionais de saúde aos agentes de segurança, aos lojistas, aos funcionários do retalho, aos produtores e a

tantos outros trabalhadores dos serviços essenciais, que, no seu conjunto, garantiram que todos os outros

pudessem ficar em casa em segurança, respeitando o isolamento.

A valorização dos profissionais de saúde é matéria tratada num projeto de resolução do CDS, já discutido.

Mas teria sido ainda melhor se tivesse sido precavido um conjunto de falhas, para as quais alertámos em tempo

útil, desde logo a da proteção desses trabalhadores e profissionais de saúde, aos quais faltaram máscaras,

luvas, equipamentos de proteção individual e testes. Em consequência disso, como sabe, foram infetados 477

médicos, 838 enfermeiros, 774 assistentes operacionais, 152 assistentes técnicos e 107 técnicos superiores de

diagnóstico e terapêutica.

Teria sido bom que tivesse sido prevenida esta situação também como forma de valorização do seu trabalho.

Falou, depois, a Sr.ª Deputada dos profissionais que agora voltam aos seus locais de trabalho e que,

naturalmente, precisam de segurança neste retorno, no que a acompanhamos.

Porém, na opinião do CDS, faltou falar de um outro grupo de trabalhadores, aqueles que, agora, findo o

estado de emergência, merecem o foco da nossa atenção e que, de certa maneira, são a próxima nova primeira

linha de profissionais. São aqueles que perderam o seu emprego e aqueles que estão em layoff, cujo número

se estima, no caso dos desempregados, num acréscimo de 100 000 e, no caso dos funcionários em layoff, que

ainda não foram ressarcidos pelo Governo na parte que lhe compete, em cerca de 500 000 a 600 000

trabalhadores.

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Pergunto-lhe se esses não são também trabalhadores da linha da frente, se esses não merecem também o

trabalho do Parlamento e, em concreto, o trabalho do PAN.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André

Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, estamos totalmente de

acordo. De facto, se há profissionais que têm sido maltratados em Portugal, por este Governo, esses têm sido

os profissionais da saúde e os profissionais das forças de segurança. E, de facto, bater palmas não chega.

Como disse a Sr.ª Deputada, e bem, num tempo, dizia-se que havia excedente e que, portanto, não havia

condições para pagar e, agora, que estamos em crise, já não há novamente condições para pagar.

Mas, lembre-se, Sr.ª Deputada, que quem permitiu também que esse Orçamento do excedente fosse

aprovado — sem estas condições e sem as mais de 150 alterações que propôs e que, mesmo assim, foram

rejeitadas pelo Partido Socialista — foi o PAN, com a sua abstenção, aquando da respetiva votação.

Por isso, o que vem aqui dizer hoje é, mais ou menos, isto: «Não deram quando tinham e agora também não

dão, mas eu dei-lhes a mão à mesma, porque precisavam». Ora, esta é uma linguagem dificilmente

compreensível para o eleitor comum.

Falou também do subsídio de risco. É hoje evidente que não só profissionais de saúde como profissionais

de segurança e outros que estão na linha da frente, como, por exemplo, nos transportes e em algumas

instituições de ensino, estão numa situação de vulnerável risco.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Concorda, ou não, o PAN que também estes possam ter acesso ao subsídio de risco, no âmbito de um

complemento social de crise?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, procurando dar resposta às várias questões, começava,

desde logo, por saudar o PSD por, finalmente, se juntar a todos nós nesta preocupação com a valorização dos

profissionais de saúde. É que, recordo, não houve, se calhar, fase de maior desinvestimento na área da saúde

durante o tempo em que foram Governo, no tempo da troica, nomeadamente de desvalorização do Serviço

Nacional de Saúde em prol daquilo que é a iniciativa privada.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Finalmente, portanto, junta-se a nós. Esperamos que, assim, aquele

que é o maior partido da oposição assuma a responsabilidade de, quando trazemos medidas a esta Assembleia,

não as apelidar de «folclore parlamentar» e se juntar a nós num debate sério e estrutural que temos de fazer

em prol destes profissionais.

Portanto, o PAN estará obviamente ao lado destes profissionais. Assim o esteja também o PSD.

Relativamente à questão do CDS, que cruza com uma questão colocada também pelo PSD, relativamente

às infeções provocadas por força da questão laboral, obviamente que o PAN acompanha essa preocupação.

Recordo que apresentámos várias medidas relativamente ao IVA das máscaras e dos demais equipamentos de

proteção. Estamos totalmente de acordo e, nesse sentido, apoiamos que se traduza em medidas concretas.

Pese embora já não estejamos em estado de emergência, não nos podemos esquecer que, mesmo em estado

de calamidade, é um problema que persiste. Portanto, foram várias as recomendações que trouxemos nesse

sentido.

Em relação ao layoff — e a questão que nos traz é bastante pertinente —, recordo que o PAN chamou a Sr.ª

Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social ao Parlamento precisamente para ser ouvida porque

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não podemos deixar para trás esses trabalhadores. Temos de perceber em que contexto é que houve atrasos,

temos de perceber também que medidas é que irão ser tomadas para garantir que não haverá despedimentos.

Mais, o PAN propôs também, porque é uma questão premente, que se revissem as necessidades de aumento

do próprio rendimento social de inserção. E até mesmo em relação à questão dos apoios aos trabalhadores

independentes, existe aqui uma preocupação quanto ao valor que foi consignado no estado de emergência

porque temos de o estender também ao estado de calamidade.

Portanto, acompanhamos plenamente as vossas preocupações e cá estaremos para fazer esse debate.

Em relação à pergunta do Sr. Deputado André Ventura, do Chega, compreendo que, se calhar, para quem o

vê lá em casa, argumentar que alguns se abstêm e estendem a mão é mais fácil do que trabalhar e apresentar

medidas concretas. Mas este último é o caminho mais difícil, o caminho das pedras é sempre o mais difícil, Sr.

Deputado. Agora, o PAN tem feito o seu trabalho. O PAN apresentou propostas de melhoria do Orçamento do

Estado, propostas que foram rejeitadas e que poderiam ter alterado a vida destes profissionais. Mas

conseguimos também fazer aprovar tantas outras medidas, que vieram, de alguma forma, ajudar os

portugueses. Nós não nos demitimos de fazer este debate e de seguir este caminho.

Se o Sr. Deputado se demite, isso é consigo — fica mais bonito nos jornais e nas publicações do Facebook.

—, mas não é esse o caminho que fazemos. O caminho que fazemos é o de trazer a debate soluções e

alternativas para os portugueses.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana

Ferreira, do Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, gostaria de a

cumprimentar pela declaração política que aqui nos trouxe. Se há coisa que este surto confirmou foi algo que o

PCP vem afirmando há vários anos: o Serviço Nacional de Saúde é a resposta efetiva para resolver todas as

questões de saúde da população e dos trabalhadores portugueses, seja no âmbito da prevenção, seja no âmbito

do tratamento. É justo, naturalmente, que se faça este reconhecimento ao Serviço Nacional de Saúde, mas não

só hoje, já agora, também para o futuro, aliás, como deveria ter sido feito no passado, e o PCP fê-lo em todos

os momentos.

Sr.ª Deputada, os trabalhadores da Administração Pública, e muitos têm estado, efetivamente, na linha da

frente a este combate, nomeadamente os da saúde, os das forças e serviços de segurança, os dos resíduos e

um conjunto de outros que continuam a assegurar o funcionamento de vários serviços públicos, mas também

os trabalhadores do setor privado, os trabalhadores do setor social, que garantem a resposta nos equipamentos

sociais, e ainda os trabalhadores da distribuição, que têm tido um papel absolutamente fundamental na linha da

frente, em respostas às populações do nosso País neste momento, merecem ser valorizados não só com

palmadinhas nas costas ou palavras elogiosas, merecem uma valorização significativa, que é, naturalmente, a

valorização salarial. Há trabalhadores da Administração Pública que têm a sua vida suspensa, com carreiras

congeladas por mais de 10 anos, e que têm o direito — é da mais inteira justiça — a que lhes seja garantida a

necessária valorização salarial.

Gostava de perceber o que é que o PAN entende do possível recuo do Governo, face ao compromisso que

assumiu com os trabalhadores da Administração Pública, de haver aumentos salariais mais significativos no

próximo ano, porque, neste momento, já dá o dito pelo não dito, e também da necessidade de se integrarem no

Serviço Nacional de Saúde, com vínculo efetivo, como o PCP propôs, os trabalhadores da área da saúde que

foram contratados no contexto em que vivemos.

Gostávamos ainda de perceber como é que o PAN se posiciona em relação à valorização salarial dos

trabalhadores do setor privado, dos grandes grupos económicos e do grande patronato,…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … que continuam a pagar baixíssimos salários a trabalhadores que se

encontram, neste momento, a dar resposta às populações, garantindo, aliás, várias respostas também na linha

da frente do combate a este surto.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia

Fertuzinhos, do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, queria saudá-la pela

sua intervenção e pelo tema que trouxe a esta Assembleia.

A primeira afirmação que gostaria de fazer é a de que, para o Partido Socialista, a valorização dos

profissionais que estão na linha da frente do combate a esta crise não é apenas devida hoje, é devida sempre,

sempre, Sr.ª Deputada. E é isso que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem feito, no apoio ao Governo,

nesta Legislatura e na anterior, em que foi possível, a nível dos trabalhadores da função pública, reverter

reduções remuneratórias, repor o regime das 35 horas semanais de trabalho, descongelar carreiras, regularizar

a situação dos trabalhadores com vínculo precário e, a nível dos profissionais de saúde, de uma forma muito

particular, valorizá-los, desde logo, na proposta de lei de bases da saúde, com a reposição das majorações

devidas pela realização de trabalho suplementar extraordinário e, claramente, com o reforço de profissionais no

Serviço Nacional de Saúde.

Com o último Governo, foi possível contratar mais profissionais, a todos os níveis, para o Serviço Nacional

de Saúde e houve uma recuperação do Serviço Nacional de Saúde que foi fundamental para a capacidade que

hoje tem de poder responder da forma como responde à crise e às necessidades das pessoas infetadas pelo

vírus da COVID-19.

Mas se na última Legislatura foi possível reforçar o Serviço Nacional de Saúde ou, diria mesmo, recuperá-lo,

ele continua a estar no centro das nossas preocupações nesta Legislatura e a apresentação do Orçamento do

Estado para 2020 colocou-o no centro das prioridades deste ano e desta Legislatura.

A Sr.ª Deputada falou nas remunerações baixas. A questão das remunerações baixas destes profissionais

não pode ser descontextualizada das remunerações baixas em geral dos trabalhadores do nosso País. E esta

é também uma questão central do Governo do Partido Socialista.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Para terminar, Sr.ª Presidente, gostaria só de perguntar à Sr.ª Deputada

Inês de Sousa Real se não acha que a resposta à crise tem de ser equilibrada, não apenas pela valorização dos

profissionais que estão a responder à pandemia mas também pela solução que é necessário dar à crise

económica e social que esta pandemia vai provocar e que tem necessariamente de ser equilibrada.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés

Ferreira, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, os profissionais de saúde

são imprescindíveis e espero que já não haja dúvidas sobre isso, mesmo entre aqueles que, no passado,

disseram que eram gorduras do Estado, que, enquanto mão de obra, eram exportáveis e que eram despesa que

deveria ser cortada no Serviço Nacional de Saúde. Hoje, não pode haver qualquer dúvida sobre o facto de serem

imprescindíveis para a sociedade e para o País.

É óbvio que aplausos são merecidos, é óbvio que palavras de reconhecimento são da maior justiça, mas

também é óbvio que não se pode ficar por aí, nem se pode ficar por palavras de apresentação de alguns projetos

de resolução, como os que foram anunciados hoje, por exemplo, pelo PSD, quando, no momento em que foram

chamados a votar projetos de lei que instituíam, por exemplo, o subsídio de risco, chumbaram esses projetos

de lei.

Portanto, não podemos ficar por aqui, não podemos dizer que são imprescindíveis e muito importantes e,

depois, pelas costas, enganá-los ou atraiçoá-los. Isto é que não pode acontecer!

O que tem de acontecer é, efetivamente, o reconhecimento do risco inerente à profissão destes profissionais

de saúde e, por isso, um subsídio de risco, sim, e também o caminhar para a criação de um estatuto de risco e

penosidade associado a estas profissões. O que tem de acontecer é garantir que todos os profissionais de

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saúde, e são já mais de 3000 os do SNS que foram infetados com COVID-19, têm o direito a ser tratados por

doença profissional, com remuneração a 100%. O que tem de acontecer é a contratação definitiva de todos os

profissionais que foram contratados temporariamente e a contratação dos 8400 que foram prometidos, aquando

do debate do Orçamento do Estado para 2020, e que devem ser contratados já neste ano de 2020. O que tem

de acontecer são carreiras justas, porque não podemos homenagear os heróis que tantas vezes dizemos que

estão no Serviço Nacional de Saúde, mas, depois, ter assistentes operacionais a ganhar pouco mais de 600 €.

Isto é o que o Bloco de Esquerda tem vindo a propor e vai continuar a propor e a votar.

Portanto, a questão que se coloca é a de saber se o PAN e a Sr.ª Deputada acompanharão também estas

propostas.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, começo precisamente pela última questão que foi

referida pelo Sr. Deputado Moisés Ferreira.

De facto, não basta estarmos solidários com estes profissionais. Mais: referiu, e bem, a questão da rejeição

das propostas que aqui foram trazidas, não apenas pelo PAN, mas também por outras forças políticas, para

reconhecermos, por exemplo, a atribuição do subsídio de risco a estes profissionais, e, neste caso em concreto,

os 108 Deputados do Partido Socialista votaram contra, rejeitaram a proposta.

Portanto, respondendo também à Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, é necessário haver um equilíbrio,

efetivamente, mas, a par de um equilíbrio financeiro, também tem de haver coerência e prioridades — coerência

na hora de votar e prioridades na hora de investir e alocar dinheiro.

E deixo exemplos muito claros, Sr.ª Deputada. Aeroporto do Montijo e Novo Banco, neste último, no ano

passado, foram injetados mais de 1000 milhões de euros — quantos profissionais de saúde não poderíamos

valorizar?! A linha circular do metropolitano vai custar mais 200 milhões de euros ao Estado do que aquela que

poderia ser a opção — quantos profissionais das forças de segurança poderíamos valorizar, Sr.ª Deputada?!

Pelo combate sério à corrupção, batemo-nos nesta Assembleia para que, no âmbito do Orçamento do Estado,

fossem garantidas as ferramentas necessárias, porque a corrupção custa ao Estado, anualmente, mais de 18

000 milhões de euros — quantas medidas de apoio ao layoff, por exemplo, poderíamos garantir com uma verba

destas?!

Portanto, Srs. Deputados, há, de facto, que estabelecer aqui prioridades. E as prioridades, para o PAN, têm

de ser as pessoas. Com estas prioridades, sim, vamos conseguir garantir um orçamento mais equilibrado. É

este o caminho que esperamos que, finalmente, o Partido Socialista retome, até porque referiu há pouco, e bem,

que houve uma retoma de prioridades a nível do Serviço Nacional de Saúde, mas isso não chega. O dinheiro

que foi investido não cobre o défice, a grande dívida, que já existia no Serviço Nacional de Saúde, ao longo de

décadas sucessivas de desinvestimento que provocaram a sua rutura.

Estamos num momento crucial e decisivo para aquele que vai ser o futuro do País e, de facto, percebemos,

e bem, respondendo à Sr.ª Deputada Diana Ferreira, que há áreas que são fundamentais, pelo que cá estaremos

para apoiar essas preocupações. E, Sr.ª Deputada, tem toda a razão: não vale a pena virar o público contra o

privado, não vale a pena dizer que os funcionários públicos é que vão ser remunerados ou compensados por

uma dívida que têm e que os restantes não serão. Não é esse o caminho, o caminho tem de ser, de facto,

equilibrado e responsável, mas, acima de tudo, tem de haver prioridades, Srs. Deputados.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim

de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Passam hoje 72 dias

desde que foi declarado o primeiro caso da doença COVID em Portugal.

Nestes 72 dias muita coisa mudou na vida dos portugueses.

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Por uma epidemia que, convém recordar, o Governo inicialmente desvalorizou, passámos 45 dias em estado

de emergência, ao qual nos opusemos e que, como se confirma agora pela abrangência das medidas em estado

de calamidade, era desnecessário.

Nestes 72 dias: deixámos de ver os amigos, a família, até aquela que está em lares e que, ao princípio, nos

aconselharam a visitar; passámos a usar máscaras, as tais que eram desaconselhadas e agora são obrigatórias;

baixou o nível de escrutínio e exigência com quem nos governa e instalou-se um unanimismo pouco saudável

em democracia; muita gente, mais de 2 milhões de pessoas, deixou de trabalhar, ficou no desemprego, ou em

layoff, nos encerramentos obrigatórios de lojas, serviços e restaurantes e a economia parou, sendo hoje claro

que vamos ter a recessão mais profunda de que há registo; os apoios tardam em chegar ao terreno, embrulhados

nas malhas da burocracia e no arrastar das decisões políticas, deixando segmentos inteiros da população sem

solução durante semanas, como aconteceu com os sócios-gerentes ou com os dentistas e como acontece com

milhares de empresas em todo o País; o turismo, que foi o motor da última recuperação económica, vai tardar a

voltar a recuperar os estrangeiros, que representavam 70% das dormidas, especialmente se o Primeiro-Ministro

continuar a afirmar, como fez em entrevista recente, que Portugal foi «descoberto», e tal não resultou do esforço

e do talento dos milhares de pessoas que trabalham no turismo. Diz que foi sorte. Pois é um daqueles casos em

que se pode dizer que a sorte dá muito trabalho e o Sr. Primeiro-Ministro faria bem em não ficar à espera da

sorte para a retoma deste ou de qualquer outro setor.

Mas também houve, nestes 72 dias, o que corresse bem: contivemos a doença, achatámos a curva. O

Governo esforça-se agora por ficar à frente na fotografia, numa luta pela popularidade com o Presidente da

República, luta esta que o Governo não quer perder outra vez, como sucedeu nos incêndios de 2017. Desta

vez, quer ficar com os louros de um resultado que, na verdade, se ficou a dever mais às pessoas do que ao

Governo, às do setor público e do setor privado e social, às que estiveram na linha da frente e às muitas outras

que asseguraram tantos serviços essenciais e que se autoconfinaram mesmo antes de serem obrigadas.

Nestes 72 dias, também se assistiu aos oportunismos mais rasteiros dos populistas, à esquerda e à direita.

À esquerda, os populistas veem nesta crise um pretexto para defender nacionalizações, requisições e

expropriações, proibir dividendos, despedimentos e sabe-se lá mais o quê. Proibições e obrigações é com eles!

Atacar sem cessar a iniciativa privada e os criadores de riqueza e de emprego é o seu sonho húmido. E, se a

TAP, a Efacec ou os CTT acabarem nacionalizados, podem ter a certeza de que esses populistas de esquerda

não ficarão por aí. O seu ódio aos privados só será saciado quando nacionalizarem as próprias pessoas.

Na direita populista as manobras são igualmente lamentáveis. E não digo mais, exatamente para não fazer

o jogo dos que apenas querem polémica ou palco mediático.

Nestes 72 dias, ainda houve quem, habilidosamente, quisesse lançar uns mitos.

O mito de confundir o elogio, de uma forma geral merecido, ao desempenho dos serviços públicos com a

tentativa de nos convencer de que os serviços públicos têm de ser exclusivamente prestados pelo Estado. Não

têm!

O mito, este até alvo de cartilha que todos os socialistas têm decorada, de que esta crise veio sublinhar a

importância do Estado social, como se isto justificasse diretamente a existência de um Estado pesado e de

impostos incomportáveis. Talvez quem não tenha imaginação ou só esteja preocupado com o soundbite acredite

nisso, mas nós não e há numerosos exemplos de países liberais que nos dão razão. A cartilha está errada.

E, finalmente, o mito de que só o Estado pode salvar a economia, através de investimento público maciço.

Pois digo-vos já aqui que, sem o devido escrutínio técnico e a ponderação financeira, um novo surto de

investimento público sem interesse para a economia redundará no mesmo que redundou quando foi aplicado

pelo Governo do Eng.º Sócrates — mais elefantes brancos e mais dívida para as gerações futuras pagarem.

Por falar em gerações futuras, para bem dos mais jovens, houve coisas que poderiam ter começado a mudar

nestes 72 dias, mas não mudaram, e precisam de mudar, a começar já nos próximos 72 dias e, depois, em

todos os dias seguintes. Temos de poder dizer aos jovens deste País que vale a pena viver e trabalhar em

Portugal. Precisamos que os jovens deste País acreditem que estudando, trabalhando e esforçando-se terão

acesso a oportunidades para subir na vida e que, se alguns quiserem ter uma experiência internacional que os

faça crescer, poderão voltar para um País onde haverá oportunidades, um País que reconhecerá o seu mérito.

É urgente explicar-lhes que o elevador social, avariado há tanto tempo, se pode reparar, que não são só os que

conhecem a pessoa certa ou os que têm um cartão do partido certo que terão as oportunidades de atingir o que

desejam.

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Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A pensar nesses jovens e em todos os que querem fazer algo por si e pelo

seu País, apresentámos hoje mesmo o nosso programa de reforma económica e cívica, um PREC liberal e

democrático, desta vez. Trata-se de um documento em que apresentamos 100 medidas, umas para os próximos

72 dias e outras para todos os dias seguintes, para fazer Portugal sair deste ciclo de estagnação que já dura há

demasiado tempo.

De entre as dezenas de medidas que propomos, deixo-vos só alguns exemplos para contrastar com a aridez

de ideias dos planos do Governo socialista que aqui discutiremos amanhã.

Onde os socialistas veem um utente de saúde, ligando mais ao facto de o prestador de saúde ser público do

que à qualidade e à velocidade com que o cidadão é atendido, nós vemos pessoas que merecem os melhores

cuidados no mais curto espaço de tempo e, por isso, propomos o alargamento do SIGIC (Sistema Integrado de

Gestão de Inscritos para Cirurgia) e do SIGA SNS (Sistema Integrado de Gestão do Acesso no Serviço Nacional

de Saúde) aos prestadores do setor privado e social, para acabar com as listas de espera nas cirurgias e nas

consultas de especialidade.

Onde os socialistas veem crianças que têm de ficar presas à escola mais próxima, muitas vezes com poucos

meios, nós vemos crianças que merecem ter acesso ao elevador social e, por isso, propomos a criação do

cheque-ensino, para que cada família tenha direito a esse valor para usar numa escola, seja ela pública ou não.

Onde os socialistas veem cidadãos em quem não se pode confiar, nós vemos pessoas que merecem a nossa

confiança, pelo que propomos a simplificação de vários processos administrativos a anteriori, para que possam

ser fiscalizados, efetivamente fiscalizados, a posteriori.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Passaram 72 dias desde o anúncio do primeiro caso de COVID-19 em

Portugal. O número de dias que passarão até que possamos dizer que vencemos a crise dependerá de cada

um de nós, da coragem que tivermos de tomar as decisões certas na altura própria, da capacidade de

mostrarmos trabalho e de arriscarmos em conjunto, da liberdade que usarmos para enfrentar as novas

circunstâncias sociais e económicas e procurarmos um novo caminho e, se calhar, errar, mas certamente

voltando a tentar.

Este é um momento que pode definir o futuro de toda uma geração.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Podemos lamentar a sorte e olhar para o futuro com medo da próxima crise ou podemos, então, lutar contra

o fatalismo desta estagnação, livres para tomar as nossas próprias opções, sendo responsáveis por elas

também.

Esse futuro começa agora e só depende de nós, se tivermos a liberdade para o construir.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem três pedidos de esclarecimento.

Para o primeiro pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, um dos efeitos do

novo coronavírus na nossa vida política foi o de fazer com que os liberais, do dia para a noite, deixassem de

idolatrar Margaret Thatcher para passarem a venerar Che Guevara.

Num dia eram contra o Estado social, contra o Serviço Nacional de Saúde e criticavam o excesso de Estado

e no outro passaram a pedir uma intervenção intensa do Estado, porque deixaram de acreditar que a iniciativa

privada pudesse salvar-se sozinha ou que o coronavírus pudesse ser combatido sem o Serviço Nacional de

Saúde. Não deixa de ser caricato, mas não podemos deixar de saudar esta conversão do Iniciativa Liberal ao

Estado social.

Mas hoje é-nos proposto — ainda não percebi bem se pelo Deputado João Cotrim de Figueiredo ou pelo

empresário João Cotrim de Figueiredo — que discutamos a recuperação do País face à crise económica. Para

o PAN, é claro que esta recuperação não se pode fazer com o regresso ao modelo produtivista e extrativista

que nos colocou na crise climática que vivemos, deve fazer-se por via de um novo modelo que construa uma

economia verde e climaticamente neutra, que acelere a transição energética, que priorize o investimento no

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setor dos bens e dos serviços ambientais, que introduza mudanças profundas no setor energético, na mobilidade

e no setor agroalimentar.

Tudo isto não se cumpre enquanto o Governo continuar a conceder empréstimos a empresas poluentes ou

enquanto continuar a atribuir benefícios fiscais e outros subsídios perversos a grandes poluidores, como sejam

as companhias de aviação e a EDP.

Mas o Iniciativa Liberal também não tem estado melhor nas propostas que tem apresentado para combater

a crise, pois tem mostrado zero preocupações com o combate à crise climática que vivemos e que o novo

coronavírus não derrotou, algo patente, por exemplo, na proposta de concessão de isenções a certos impostos

a todas as empresas, sem exigir qualquer respeito por standards mínimos de sustentabilidade ambiental e social.

Mais: nesta crise, o Iniciativa Liberal tem mostrado que não tem interesse em combater certos interesses

instalados. Tal é patente quando chumbou as propostas do PAN que impediam que a banca lucrasse à conta

da COVID-19 e que o dinheiro público servisse para o pagamento de bónus aos administradores e gestores do

Novo Banco, mas também a proposta que pretendia — pasme-se — que o Estado desse apoios financeiros a

todos os gestores e administradores de empresas.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Silva (PAN): — Isto significa que, num momento em que cada cêntimo faz falta ao erário público,

por vontade do Iniciativa Liberal, teríamos CEO (chief executive officer) de grandes empresas a receberem

subsídios do Estado.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria deixar uma pergunta ao Iniciativa Liberal.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito rapidamente, Sr. Deputado.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Deputado, pergunto-lhe quando é que o Iniciativa Liberal vai adotar

preocupações ambientais e sociais no âmbito da recuperação da crise económica.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo

Costa, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr.ª Presidente, gostaria de cumprimentar o Sr. Deputado João Cotrim de

Figueiredo e a sua conversão à importância do Estado.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Mas qual conversão?

,

O Sr. Hugo Costa (PS): — Os liberais são-no enquanto não há crise; quando há crise, é necessária a

intervenção do Estado. O que o Sr. Deputado veio aqui dizer é que são necessários mais e mais apoios, ou seja,

é o típico liberal que só é liberal quando lhe convém.

Sr.ª Presidente, outra questão que também gostava de sublinhar é o facto de o Iniciativa Liberal ter vindo

aqui reconhecer que o combate à pandemia da COVID-19 correu bem, a nível de saúde. É importante vir aqui

relembrá-lo. Por isso, queria questionar o Sr. Deputado se não foi o Serviço Nacional de Saúde, aquilo que tanto

critica, a base dessa resposta.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!

O Sr. Hugo Costa (PS): — E que países liberais ou que têm serviços nacionais de saúde ou serviços de

saúde privados responderam desta forma à pandemia da COVID-19? Basta ver o exemplo dos Estados Unidos

para percebermos o erro total no combate à COVID-19.

Depois, o Sr. Deputado vem aqui pedir mais apoios. É importante relembrar que só, por exemplo, os apoios

ao layoff, aos sócios-gerentes, ou outros conjuntos de apoios custam mais de 2000 milhões de euros por mês.

Isso não é intervenção do Estado? Não é essa a intervenção do Estado que critica? Também não são

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intervenção do Estado os cerca de 5000 milhões de euros que já estão garantidos em empréstimos a empresas?

Não é esta também a intervenção do Estado que critica?

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Incoerente!

O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr. Deputado, tipicamente, esta é a incoerência do liberalismo, mas reconheça-

se também que, finalmente, o Parlamento tem alguém que defende o liberalismo, porque estamos habituados

àqueles liberais envergonhados. O Sr. Deputado assume-se como liberal, e muito bem, só que é o típico liberal

que só é liberal até que o Estado precise de intervir. Quando a crise chega, não há capitalismo que salve os

liberais.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para um pedido de esclarecimento, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada

Cecília Meireles, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, queria começar por cumprimentar o Sr. Deputado João

Cotrim de Figueiredo.

De facto, os pedidos de esclarecimento que teve são bem exemplificativos daquilo que acontece quando

trazemos preconceitos ideológicos enviesados intelectualmente para a pandemia. Se não fosse trágico, acharia

até divertido ver alguns Srs. Deputados dizerem: «Então agora querem o Estado?». Ou seja, temos uma crise

de saúde pública e o Estado decreta a um pequeno empresário que tem o seu café que não o pode abrir, que

tem de o manter fechado, que não pode abrir portas, que não pode ter clientes, que tem de estar fechado em

casa e, depois, quando chega a hora de compensar essas medidas que foram decretadas, diz: «Então agora o

senhor acha que precisa do Estado? Então agora não é capaz de fazer por si?».

Protestos do Deputado do PS Luís Moreira Testa.

Srs. Deputados, o que aconteceu aqui foi uma pandemia e acho que utilizar isso como argumento ideológico

para discutir maneiras de desenvolvimento e de desenvolvimento económico nem é enviesamento intelectual, é

mesmo tornarmos a política numa caricatura. Acho que merecemos todos um bocadinho mais.

Sr. Deputado, disse que amanhã íamos discutir o plano do Governo, mas nós vamos discutir um não plano,

pois o Governo não apresenta nem programa de estabilidade, nem reforma, nem plano de retoma. Apresenta

uma coisa para cumprir calendário e que não tem lá rigorosamente nada!

Muitos estão à espera da resposta da Europa e a única certeza que alguns de nós podemos ter em relação

à resposta europeia é que vai demorar, vai tardar. Por isso, pergunto ao Sr. Deputado se não devíamos começar

já a trabalhar na retoma económica, em algo que podemos fazer todos e que Portugal pode fazer já sem precisar

da Europa para nada: simplificar, desburocratizar.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Bem-vinda ao Simplex!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não seria melhor estarmos concentrados nisto ao invés de termos

discussões que não chegam sequer à categoria de ideológicas?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de

Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, agradeço aos Srs. Deputados as questões, até

porque me divertiram bastante e provaram que não ouviram nada do que eu disse.

Quando eu digo que é um mito a ideia de que um liberal não pode defender a intervenção do Estado numa

situação de emergência, é o mesmo do que dizer que um socialista não pode impedir o direito à greve numa

situação de emergência, como os senhores fizeram e como votaram três vezes nesta Câmara. Em situação de

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emergência, penso que a ideologia deve ser não a segunda, não a terceira, mas a última das preocupações. A

primeira preocupação deve ser acudir às pessoas que precisam. Srs. Deputados, talvez não estejam de acordo,

mas esta é a nossa visão das coisas.

Depois, o Sr. Deputado André Silva diz que continuamos a defender os interesses instalados. Sr. Deputado,

não deve haver partido, nesta Câmara, que mais vezes tenha defendido as pessoas individuais contra todos os

poderes, contra todas as tiranias, sejam elas do Estado, das grandes empresas ou dos monopólios, do que a

Iniciativa Liberal. Não é por acharmos que as atividades bancárias ou outras devam ter liberdade económica

que isso deixa de ser verdade. A Iniciativa Liberal estará sempre, sempre ao lado dos interesses individuais das

pessoas.

O Sr. Deputado Hugo Costa diz que nós criticamos muito o SNS. Não tem ouvido bem! Nós criticamos esta

estrutura de SNS, porque exclui a participação dos privados e do setor social no que poderia ser um melhor

serviço prestado às pessoas, se fosse dada liberdade de escolha. A seu tempo, outra das vítimas desta epidemia

foi o nosso plano para a saúde, que, como estava previsto, não pôde ser apresentado em março.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Foi uma grande perda!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Deputada Cecília Meireles, é verdade que já devíamos estar

a pensar no plano de retoma económica, na parte que está nas nossas mãos, sem estarmos à espera de

Bruxelas para tudo e para nada. Sim, a simplificação e a desburocratização é algo que Portugal pode fazer

sozinho.

Mais: quem acha que o que aí vem, do ponto de vista dos desafios económicos, se faz sem uma enorme

agilidade, sem uma enorme capacidade de iniciativa, sem termos muitíssimos portugueses a tentarem dar o

melhor, por si e pelos seus, está muito enganado e acha que voltámos ao antigamente, ao tempo pré-crise. Não

vai ser igual, precisamos de muitíssimo mais capacidade de iniciativa e isso só se faz simplificando muitíssimo

a vida social e económica em Portugal.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado André

Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Hoje, estamos num momento particularmente

único da nossa história criminal.

Mais uma vez, deixámos desprotegida uma vítima inocente. A pequena Valentina morreu, com 9 anos,

desprotegida de todos, desprotegida por esta sociedade, e morreu às mãos de quem tinha o primeiro dever de

a proteger.

Revolta e indignação — a mesma luta de sempre de um povo que clama por justiça e que não a vê, conforme

basta vermos e procurarmos em cada passo de opinião pública deste País.

Mas este caso não é novo. Em 2004, Leonor Cipriano matou a filha e deu-a aos porcos para ser comida —

já está cá fora! Em 2005, um menino surdo-mudo foi violado e assassinado pelo padrasto — já está cá fora! Em

2012, uma mãe incendiou uma casa com os dois filhos lá dentro. Esta, que podia ser uma narrativa jornalística,

é a história da criminalidade que temos, que podia continuar incessantemente e sempre com o mesmo final —

«já está cá fora!».

Temos de prevenir e de ressocializar, é esse o grande objetivo da lei penal, mas também temos de proteger

a comunidade e de garantir que monstros, que não têm outro nome, não possam ou possam apenas daqui a

muitos anos voltar a ver a luz da liberdade, pela nossa proteção, a dos nossos filhos e a daqueles que amamos.

Ouvir o povo português não é dizer «populismo», «extrema-direita» ou «base de comentários de jornais», é

ouvi-lo, senti-lo, sentir aquilo que um povo inteiro quer por justiça.

O Chega proporá a restauração da prisão perpétua em Portugal e fá-lo-á naquilo que a melhor tradição

europeia neste momento faz, ou seja, com uma revisão de 20 em 20 anos, para que aqueles que se

ressocializaram e mudaram possam, então, conhecer, novamente, a liberdade.

O que não podemos ter é esta charada de justiça que já só Portugal é que tem, acompanhado da Noruega.

Todos os outros países, um por um, nomeadamente aqueles que eram apontados como os melhores exemplos,

caem. Caiu Espanha, que, depois da morte brutal de uma professora, restaurou a prisão perpétua no seu

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território — «fascistas!», «extremistas!», «extrema-direita!», «populistas!». Todos assim pela Europa! Caiu

Inglaterra, com o caso de um pedófilo em série que foi condenado a prisão perpétua — «fascistas!»,

«extremistas!». Caiu a Alemanha, e poderia continuar por aí em diante.

Já não falo do Partido Comunista Português, que, em casos de corrupção, admite a pena de morte e aplaude-

a lá para fora, mas esquece-se do que acontece cá dentro.

Temos de mudar a lei portuguesa. Por isso, o Chega chamará a esta iniciativa «projeto Valentina», em

homenagem àquela que perdeu a vida num ato bárbaro, pois procuraremos restaurar, em Portugal, a justiça

para aqueles que não a têm.

Não queria terminar sem lamentar profundamente o facto de este debate continuar completamente

enviesado, quando a maioria dos portugueses já nos disse o que quer. Afinal, como perguntava um famoso

autor britânico, de que vale a justiça se não representa o povo, se não age em nome desse povo e se se fecha

num círculo fechado de politicamente correto?

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, passámos a última semana com insinuações da pior espécie, de que o

nacional-socialismo tinha regressado a Portugal. Ontem mesmo, pessoas com responsabilidades, algumas

delas neste Parlamento, diziam que uma espécie de Adolf Hitler tinha encarnado neste Parlamento e agora

falava livremente.

Sucedem-se tentativas de ilegalizar o Chega junto do Tribunal Constitucional e de lançar, sobre mim e sobre

os dirigentes do partido, calúnias de difamação, processos-crime, o melhor que os Estados autoritários alguma

vez conseguiram.

Risos do Deputado do BE José Manuel Pureza.

O Sr. AntónioFilipe (PCP): — E as assinaturas falsas?

O Sr. AndréVentura (CH): — Confio muito nos magistrados do nosso País. Muito! Confio que jamais, em

democracia, voltaríamos a assistir à ilegalização de um partido político. E confio que aqueles que todos os dias

perdem nas sondagens, que na urna de voto sabem que perderiam, agora queiram ganhar em processos

judiciais ou em tentativas de tornar o Chega inconstitucional por ser racista, xenófobo ou o que queirais!

Só há uma razão para subirmos nas sondagens: a voz do povo português, que, finalmente, clama por essa

justiça. É a voz de um povo que quer um sistema diferente e que já não acredita neste.

Por isso, repudiamos não só as insinuações de ligação ao nacional-socialismo e as ameaças de processos

judiciais sobre o mim ou sobre o Chega, como repudiamos uma das maiores e mais terríveis perseguições que

em democracia se pode fazer.

Os portugueses estão muito atentos e sabem bem aquilo que se passa e aquilo que, certamente, se passará

no futuro, porque sabem a força terrível do sistema, o sistema que querem, também eles, derrotar.

Poderíamos dizer que a restauração da prisão perpétua é a restauração do populismo e que usar o nome de

uma criança que morreu é ainda mais populista. Mas todos os países têm imposto estas medidas no rescaldo

de casos chocantes — Espanha, Inglaterra, Alemanha, todos eles da nossa tradição, alguns deles elogiados

pelo Primeiro-Ministro português em termos de justiça e de recuperação económica.

É hora de olharmos para eles e, já que olhamos noutras circunstâncias, é hora de acabarmos com a farsa

de que este sistema ressocializa e pune, quando não o faz, que traz justiça, quando não traz, que ressocializa

e protege a comunidade, quando não o faz. Se ouvíssemos os portugueses, por essas televisões fora, ao longo

dos últimos dias, iríamos perceber que, provavelmente, não havia um que dissesse que a nossa justiça está no

bom caminho.

Pois então cabe-nos a nós, Deputados da Nação portuguesa, representantes desse mesmo povo, e a quem

muitos aqui chamam de tasca ou de taberna, representar esse povo português.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. AndréVentura (CH): — Senão, um dia, a tasca e a taberna serão muito maiores que nós.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, inscreveram-se duas Sr.as Deputadas para formular

pedidos de esclarecimento.

Como deseja responder?

O Sr. AndréVentura (CH): — Em conjunto, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem, então, a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada

Isabel Rodrigues, do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª IsabelRodrigues (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quero começar por manifestar a

consternação do Grupo Parlamentar do Partido Socialista — e tenho a certeza de que interpreto a consternação

de todas as Deputadas e Deputados desta Casa, bem como a de todas as portuguesas e portugueses — perante

os eventos trágicos que levaram, com uma precocidade insuportável e em circunstâncias, ao que tudo indica,

profundamente chocantes, a criança Valentina.

Mas, Sr. Deputado André Ventura, quero dizer-lhe que farsa é o senhor manifestar-se consternado com a

tragédia e usar o seu tempo de tribuna para não fazer mais nada senão propagar as suas ideias políticas.

Concluo que isto não constituiu, para si, mais do que uma oportunidade para colocar no megafone aquilo que

efetivamente pensa.

Julgo que é importante termos consciência de duas coisas.

A primeira é a de que, infelizmente, os maus tratos infantis são uma realidade tremenda em todo o mundo e

que, em comparação com certos contextos, Portugal até tem uma situação bastante positiva, apesar das

inúmeras situações trágicas, e serão sempre demais, ainda que fosse só uma. Serão sempre demais!

A segunda é a de que temos de ter presente — julgo que o Sr. Deputado não tem ou não lhe dá jeito ter

presente para poder fazer o seu discurso — que, por mais eficazes que sejam os sistemas, haverá sempre

situações que não vamos conseguir prever ou acudir e pelas quais vamos sofrer posteriormente.

A Sr.ª HortenseMartins (PS): — Sem dúvida!

A Sr.ª IsabelRodrigues (PS): — Isso é assim porque os sistemas são operados por seres humanos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª IsabelRodrigues (PS): — Vou concluir, Sr.ª Presidente, mas queria só referir mais duas questões.

Primeira: Sr. Deputado, Portugal tem, em matéria penal, um património que não será o senhor a destruir.

Aplausos do PS.

Segunda: Sr. Deputado, terrível, para não a qualificar de outra maneira, porque me encontro numa

Assembleia que representa todos os portugueses, foi a utilização abusiva que fez da fotografia desta menina,

usando-a para propagar as suas ideias. Isso, sim, é uma farsa!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de

Sousa Real, do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª InêsdeSousaReal (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado André Ventura,

antes de mais, gostaria, obviamente, de lamentar aquela que foi, de facto, uma trágica perda, não só para a

família, mas também para todas e todos nós, pois não há tragédia maior do que perdermos todos, enquanto

coletivo, uma criança às mãos da violência.

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Mas, Sr. Deputado, não vale tudo em política. Em política não vale não só sermos incoerentes, como virmos

para aqui, de forma populista, utilizar uma tragédia para apresentar uma agenda ideológica, quando, depois, na

prática, criticamos as medidas de outras forças políticas.

Avivo-lhe a memória, Sr. Deputado: ainda há bem pouco tempo, criticou uma proposta do PAN que visava

criar um observatório para a proteção dos direitos da criança — trata-se de um observatório precisamente para

evitar que, de alguma forma, não conseguissemos combater aquele que é um fenómeno bastante complexo, o

qual, de facto, não temos conseguido combater de forma eficaz —, votando-a contra. Pior, o Sr. Deputado

acusou-nos de estarmos a querer criar «tachos», como se criar mecanismos que garantam a defesa dos direitos

das crianças não devesse ser prioritário para o País.

Mais, Sr. Deputado: ainda há pouco, ouvimo-lo dizer que o PAN tinha estendido a mão ao PS ao abster-se

na votação do Orçamento do Estado. Recordo-lhe que o PAN conseguiu inscrever nesse Orçamento do Estado

uma medida fundamental para a proteção das vítimas de violência doméstica, nomeadamente uma licença

especial para que consigam sair de suas casas e não estarem desprotegidas do ponto de vista laboral.

Há uma grande diferença, Sr. Deputado, entre todos nós nos sentirmos profundamente consternados com

essa perda, entre estarmos comprometidos em arranjar soluções — ou, pelo menos, deveríamos estar — para

combater a violência, nomeadamente o abuso infantil, e propagandearmos medidas e sermos completamente

incoerentes, como o Sr. Deputado tem sido na hora de votar ou de mostrar de que lado quer estar. Isto é que

não podemos tolerar!

Não se faz aproveitamento político da morte de uma criança, Sr. Deputado! Nesta hora de pesar, devemos

respeito não apenas à Valentina mas a todas as vítimas de violência.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª InêsdeSousaReal (PAN): — Concluo já, Sr.ª Presidente.

Sr. Deputado, não posso, de facto, deixar de lhe dizer isto, não apenas como Deputada, mas a nível pessoal,

como cidadã deste nosso País: não podemos andar a fazer populismo à conta da violência! Não é esse o

caminho, nem deverá ser o desta Assembleia.

Aplausos do PAN e de Deputados do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. AndréVentura (CH): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Rodrigues, se o Chega vai, ou não,

destruir o património que temos em direito penal, não lhe compete a si decidir, mas ao povo português. Percebo

que, como está tão fechada na mesma ideia socialista de sempre, queira mandar nas eleições, no País e no

Estado, mas talvez um dia tenha uma surpresa, mais cedo do que espera.

Protestos de Deputados do PS.

Não é populismo, Sr.ª Deputada, é querer fazer justiça, quando os portugueses lá fora sabem que não há

justiça. Mas já estamos habituados a isso nesta Câmara, bem como da parte da Sr.ª Deputada: quando há um

crime grave e alguém vem propor medidas mais duras, dizem logo que é populista, extremista, terrível, ainda

que milhares de portugueses lá fora digam que temos de o fazer. À Sr.ª Deputada isso não lhe interessa, deverá

achar que os portugueses não são bons da cabeça e que mais vale seguir a linha do Partido Socialista.

O Sr. PorfírioSilva (PS): — Abutre!

O Sr. AndréVentura (CH): — Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, deixe-me dizer-lhe isto: não é com um

observatório dos direitos humanos que resolve situações como esta, não é com um observatório a gastar mais

dinheiro dos impostos dos portugueses que vai resolver a situação de centenas ou de milhares de crianças,

maiores ou menores, vítimas de terríveis atos bárbaros de violência. É com a lei penal!

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Protestos da Deputada do PS Isabel Rodrigues.

Sr.ª Deputada, quero deixar isto muito claro, para que não fiquem dúvidas: se um dia disserem que André

Ventura e o Chega meteram no caixote de lixo da História o património da lei penal, nesta matéria de luta contra

a corrupção e a pedofilia, ficarei muito feliz. Por isso, não me afeta minimamente quando diz que estamos a

atingir o património penal português. É-me indiferente!

Para mim, o que importa e o que vale é chegar aos portugueses e dizer: «Vamos olhar também para a

Europa, para o melhor que lá fazem». E a Sr.ª Deputada diz: «Não, lá fora é tudo de um extremismo terrível!».

A Sr.ª IsabelRodrigues (PS): — E a fotografia?!

O Sr. AndréVentura (CH): — A fotografia, Sr.ª Deputada? Eu digo-lhe! É para que a imagem da Valentina,…

O Sr. PorfírioSilva (PS): — Abutre!

O Sr. AndréVentura (CH): — … como a de muitas outras Valentinas deste País, nunca saia da nossa

memória, para que nunca saia destes grupos parlamentares e para que, lá fora, o povo, que clama por justiça,

a tenha, independentemente de os senhores gostarem ou não de ver fotografias.

O Sr. PorfírioSilva (PS): — Abutre! Abutre!

O Sr. AndréVentura (CH): — Não gosta? Apaga! Dói menos!

A Sr.ª IsabelRodrigues (PS): — É chocante!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Concluímos, assim, a discussão deste ponto da nossa ordem do dia.

Passamos ao terceiro ponto, que consta da apreciação da Petição n.º 365/XIII/2.ª (Associação Nacional de

Apostadores Online) — Revisão da lei do jogo online, nomeadamente da taxação das apostas desportivas à

cota.

Não havendo inscrições dos Srs. Deputados para intervenções, passaremos ao ponto seguinte.

Se não se inscrevem é porque não estão interessados em debater a iniciativa.

Pausa.

Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Emídio Guerreiro, do PSD.

O Sr. EmídioGuerreiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição é de 2017 e solicita que

a taxação das apostas desportivas deixe de ser feita pelo volume de negócios e passe a ser pelos lucros,

solicitando ainda a regulamentação das apostas cruzadas.

Os peticionários referem que o negócio é pouco atrativo para os apostadores e que, como tal, o jogo ilegal é

enorme. Sendo de 2017, a petição acaba por ser prejudicada pelo tempo.

Na reunião promovida pelo Sr. Deputado Relator, Hugo Pires, em dezembro de 2017, os peticionários deram

conta de que quase 70% dos apostadores o fazem ilegalmente. Nos últimos estudos, são já quase 50% os

apostadores que o fazem no mercado regulado, número esse ainda muito preocupante, mas que, ao contrário

das previsões feitas em 2017, melhorou. O mesmo sucedeu relativamente ao número de empresas licenciadas,

passando de duas, em 2017, para 10, atualmente.

Recordo que, antes de 2015, todo o mercado de apostas era ilegal. O modelo de taxar pelo volume de

negócios não é exclusivo de Portugal, existindo outros países que assim o fazem. E as alterações no Orçamento

do Estado de 2020 vêm de alguma forma responder à preocupação dos peticionários.

Quanto às apostas cruzadas previstas na legislação, em 2015, estas eram incipientes no panorama

internacional e ainda hoje não são permitidas em muitos países, mas é claramente uma matéria a acompanhar

e a regular no futuro.

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Ao tempo da preparação da legislação do jogo online, nomeadamente das apostas desportivas à cota, a

grande preocupação do legislador foi regular para pôr fim ao jogo ilegal, jogo esse que não só não promovia o

jogo responsável como não era tributado de todo. No que tocava ao desporto, a grande preocupação era que o

apuro da taxação revertesse para o desporto, sendo esta, hoje, uma receita muito importante para as federações

desportivas.

Apesar destes progressos é notório que muito há a fazer. Desde logo, é preciso um combate firme ao jogo

ilegal e, aqui, cabe ao Estado dotar o Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos (SRIJ) dos meios necessários

para tal, bem como incrementar a articulação com o sistema judicial para melhorar a eficácia da resposta e isto

quer no plano nacional, quer no plano internacional.

Permitam-me recordar que Portugal foi dos primeiros países a subscrever a Convenção do Conselho da

Europa sobre a Manipulação de Competições Desportivas, em 2014, e nesta matéria temos de ser todos firmes

e muito focados para vencer este combate.

É preciso trabalhar também na defesa e proteção dos cidadãos mais vulneráveis à dependência do jogo,

dependência essa a ser acompanhada pelo SICAD (Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas

Dependências), que necessita de ver reforçados os meios e os recursos para esse efeito.

Tudo se torna mais difícil se quer o combate ao jogo ilegal quer o combate à dependência ao jogo não forem

prioridades para a ação do Governo.

E este, Sr.ª Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, é, verdadeiramente, o caminho que precisa de ser

valorizado.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Cristina de Jesus,

do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Cristina Jesus (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Analisamos hoje a Petição n.º

365/XIII/2.ª, apresentada pela Associação Nacional de Apostadores Online à Assembleia da República, sobre a

revisão da lei do jogo online, nomeadamente a taxação das apostas desportivas à cota.

O jogo online é, hoje, uma realidade em crescimento exponencial. É baseado em plataformas informáticas,

com características bem diferentes do jogo tradicional, como o euromilhões, as raspadinhas ou a lotaria.

É essencial realçar que a atividade do jogo online tem características muito diferentes das outras atividades

económicas e que tem de ser acautelado o seu impacto social na proteção do consumidor, bem como na

prevenção da fraude e do branqueamento de capitais.

A regulação do jogo online em Portugal é baseada no equilíbrio entre a competitividade do mercado, de forma

a reduzir a exploração e prática ilícita do jogo online, e os interesses de ordem pública, como a proteção de

menores, grupos vulneráveis e de risco ou a prevenção de comportamentos aditivos dos jogadores.

O mercado do jogo online em Portugal tem, atualmente, 13 operadores licenciados, dos quais 10 oferecem

apostas desportivas à cota. Existem vários pedidos de licenciamento em curso, o que demonstra bem o interesse

pelo mercado português.

No último Orçamento do Estado foram feitas alterações na tributação das apostas desportivas à cota. A

progressividade do imposto especial do jogo online, que tinha uma taxa variável entre 8% e 16%, foi eliminada,

passando a ter uma taxa única de 8% sobre o montante das apostas efetuadas. A eliminação da progressividade

do imposto era uma das reivindicações das entidades que operam neste setor.

Os peticionários pretendem uma alteração legislativa a nível fiscal, sugerindo uma alteração na tributação de

apostas desportivas à cota, de forma a que a mesma passe a incidir sobre a receita bruta dos operadores e não

sobre o volume das apostas.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cristina Jesus (PS): — Isto significa que a taxa de 8% seria aplicada ao valor líquido das apostas,

após o pagamento dos prémios.

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Esta forma de tributação colocaria em causa os princípios fundamentais, tanto fiscais como extrafiscais, que

estiveram na base da regulação do jogo online: o controlo do volume de jogo, o combate à fraude e evasões

fiscais,…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cristina Jesus (PS): — Termino, Sr.ª Presidente.

Como dizia, com isto, o controlo do volume de jogo, o combate à fraude e evasões fiscais, a proteção dos

jogadores e o combate à viciação de apostas e resultados podiam ser colocados em causa.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, houve um erro na contagem do tempo.

Pensei que ainda estávamos nos esclarecimentos, pelo que, neste caso, ainda dispõe de mais algum tempo

para a sua intervenção.

Peço desculpa. Faça favor de continuar.

A Sr.ª Cristina Jesus (PS): — Não faz mal, Sr.ª Presidente. Termino, então.

A exploração de apostas cruzadas em Portugal também era defendida pelos peticionários. Esta está

dependente da aprovação de um regulamento que estabeleça os requisitos do sistema técnico de jogo. O

Governo português está a aguardar a decisão da Comissão Europeia, relativamente a duas queixas efetuadas

por associações europeias de jogo online.

Para terminar, queria dizer que o jogo online é uma atividade transversal a toda a sociedade. As suas

especificidades exigem, cada vez mais, regulamentação e controlo, pois só assim podemos assegurar a defesa

dos mais vulneráveis, dos menores e, em última análise, do consumidor.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Mais uma vez peço desculpa por tê-la interrompido antes de tempo, Sr.ª

Deputada.

Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Duarte Alves, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: Queria começar por cumprimentar os

peticionários. A petição em apreço visa rever a taxação das apostas desportivas à cota, para que incida sobre

a receita bruta dos operadores e não sobre o volume das apostas.

O atual regime fiscal dos jogos online é baseado no imposto especial de jogo online, definido pelo Decreto-

Lei n.º 66/2015, entretanto revisto, que recai sobre as entidades exploradoras. Convém dizer que os rendimentos

diretamente resultantes das atividades sujeitas a este imposto não estão sujeitos a IRC (imposto sobre o

rendimento das pessoas coletivas) nem a imposto de selo.

Os argumentos dos peticionários merecem-nos várias observações. Um dos argumentos é o de que esta

alteração iria trazer para o mercado regulado a grande maioria dos apostadores, sites e casas de aposta online,

o que não é conseguido porque o incentivo a jogar no mercado ilegal é maior por causa dos prémios. Não vamos

por aí.

Os incentivos ao mercado paralelo existirão sempre, as cotas serão sempre mais aliciantes quando não

forem taxadas e não será uma alteração à forma como é taxado o jogo que vai resolver o assunto. O que é

preciso é investir nos meios de fiscalização, de combate à fraude no desporto e também de combate aos

comportamentos aditivos, no que diz respeito às apostas online.

A mesma coisa se pode dizer quanto à quantidade de produtos que a lei permite. Por muito que se alargue

o número de jogos e tipo de jogos de apostas permitidos, surgirão sempre novos jogos, mais aditivos,

contornando a lei.

Importaria ainda perceber se a proposta dos peticionários levaria a um aumento ou a uma redução da receita

fiscal e isso seria uma base importante para perceber se as empresas aceitariam rever as cotas e serem mais

atrativas para os apostadores virem para o chamado mercado regulado.

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Da nossa perspetiva, mesmo que se possa discutir a equidade na estrutura do imposto, o caminho não deve

ser o de aligeirar os impostos sobre o jogo online, que nunca deveria ter sido legalizado, com as consequências

sociais que tem, particularmente junto da juventude.

No momento particular que vivemos, preocupa-nos a maior utilização do jogo online, por isso entregámos,

nesta Assembleia, um projeto de lei para limitar os horários da publicidade a jogos e apostas para só depois das

22 horas e 30 minutos. Apelamos a que esta proposta do PCP seja aprovada, para que a expansão do jogo

online não crie ainda mais consequências sociais negativas, como tem sido sinalizado ao longo de vários

relatórios por parte do SICAD.

Relativamente à proteção dos peticionários, o PCP não acompanha as propostas referidas na petição, sem

que, pelo menos, se apresentem mais em profundidade os seus pressupostos.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João

Gonçalves Pereira, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos aqui uma

petição, apresentada pela Associação Nacional de Apostadores Online, que, no fundo, traz três pretensões,

nomeadamente para que possam existir mais operadores no mercado, mais produtos, o que significa mais jogos,

e para que haja menos carga fiscal, menos impostos para, com isso, terem um preço mais competitivo e subirem

os valores dos respetivos prémios.

Estas são as pretensões desta petição. No entanto, importa recordar um pouco o que é a história do jogo

online em Portugal, do qual temos os primeiros registos precisamente em 2002.

Entre 2002 e 2015, ou seja, durante 13 anos, não havia regulação nenhuma e estávamos perante um jogo

que poderíamos entender, até, como sendo ilegal.

Hoje temos o quê? Temos 13 operadores no mercado e temos qualquer coisa como 450 000 apostadores

que estão registados, isto sem contar com aqueles jogadores da Santa Casa da Misericórdia.

O que é que a regulação permite? A regulação veio permitir a proteção das crianças e dos que são mais

vulneráveis, veio prevenir a fraude e o branqueamento de capitais e veio trazer também segurança ao setor.

Esta mesma lei de 2015 previa que, de dois em dois anos, a lei pudesse ser revista e o certo é que a lei não

foi revista nem em 2017, nem em 2019.

No entanto, há um problema hoje, em 2020 — como houve, também, em 2019, e daí para trás —, que tem

a ver com o mercado ilegal, com o jogo ilegal. Segundo um estudo que foi promovido pela Associação

Portuguesa de Apostas e Jogos Online (APAJO), em 2019, cerca de 56% do jogo online em Portugal era ilegal.

Portanto, até diria que é com estranheza que ouvimos o PCP defender que este jogo não devia ser regulado,

ou seja, que todo o jogo online que existe em Portugal devia ser ilegal.

Este jogo ilegal o que é que traz? Desvirtua a própria concorrência, desprotege os apostadores, desprotege

as crianças e as pessoas mais vulneráveis, não previne a fraude nem o branqueamento de capitais e traduz-se

em menos receita para o próprio Estado.

Isto significa que o Estado está a falhar. Isto significa que o regulador deste setor está, também ele, a falhar,

quando mais de 50% do jogo online é ilegal. É possível extrapolar e dizer que há cerca de 450 000 apostadores

que jogam o tal jogo ilegal.

Portanto, é urgente — dizemos nós — que o próprio Parlamento e o Governo possam rever a lei, no sentido

de dotar de mais poderes…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Como dizia, é urgente que o Parlamento e o Governo revejam a lei, para dotar de mais poderes o próprio

regulador, dotando-o também dos meios necessários para combater este mesmo jogo ilegal.

Aplausos do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do

Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: Em primeiro lugar, o Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda quer saudar os mais de 4000 peticionários. Falamos de uma petição — como

já foi dito — que entrou neste Parlamento em 2017 e que, apesar da data, se dirige à Assembleia da República

com um tema que tem relevância pela sua atualidade, já que o setor dos jogos online apenas recentemente foi

regulado em Portugal.

Já aqui foi referido que a primeira lei do jogo online surgiu em 2015, tratando-se de um momento em que,

apesar das dificuldades, se conseguiu implementar alguma legislação num setor que, pela sua natureza, é de

difícil supervisão e que estava completamente votado à ilegalidade, pelo que foi importante.

Também seria importante, a partir daí, fazer as revisões necessárias a essa mesma legislação. Desde essa

altura, algumas matérias foram tendo avanços, nomeadamente na diminuição da percentagem de jogo ilegal,

mas, apesar disso, em 2019 este ainda representava cerca de 56% do total do jogo, o que significa que ainda

há um grande número de operações a decorrer ao arrepio de quaisquer obrigações legais ou fiscais.

Os números são elevados, o que deve levar a uma reflexão por parte do legislador, de forma a continuar um

trabalho de supervisão e de fiscalização relativamente a este setor.

Há várias questões ligadas ao jogo online. Poderíamos falar do que foi aprovado já no último Orçamento do

Estado para 2020 e que trouxe algumas alterações importantes, mas cremos que a reflexão deve ser continuada

na Assembleia da República e pelo próprio legislador. Isto porque há várias questões em cima da mesa que têm

sido, também pela sua atualidade, acompanhadas mais recentemente.

É o caso, por exemplo, das questões relacionadas com comportamentos aditivos e de como,

responsavelmente, responder a essa matéria. Temos também a questão das apostas desportivas, que têm

especificidades dentro do próprio jogo online. Temos ainda a questão de como fiscalizar as plataformas ilegais,

porque, claramente, a falha de fiscalização é um dos maiores problemas associados a este setor, e é uma falha

bastante grande não conseguir, realmente, acabar com o jogo ilegal.

Quando olhamos para alguma legislação de outros países, percebemos que a percentagem de jogo ilegal

em países com legislações mais ou menos parecidas com a nossa é bastante inferior, portanto há que avançar

na questão da fiscalização e também na questão da publicidade.

Quanto à questão da publicidade, verificaram-se, inclusivamente durante o período de pandemia, algumas

alterações, mas esta matéria está, de facto, mais ligada aos comportamentos aditivos e também dá uma ideia

daquilo que se quer para o setor do jogo online.

Portanto, cremos que este Parlamento deve manter a sua atenção sobre este tema e é isso que gostaríamos

de dizer, também, aos peticionários.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma curta intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves,

do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Relativamente à intervenção do Sr. Deputado

João Gonçalves Pereira, queria só explicar que a nossa posição é bastante clara. Baixar os impostos

relativamente a estes jogos online não vai resolver o problema, porque um jogo ilegal, sem o pagamento de

qualquer imposto, será sempre mais competitivo do que um jogo que paga imposto. Portanto, desse ponto de

vista, aquilo que é preciso, de facto, é haver fiscalização contra o jogo ilegal.

O PCP não acompanha as pretensões dos peticionários. Se o CDS acompanha, devia ter apresentado uma

iniciativa legislativa e não o fez.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Não disse que defendíamos! Não ouviu!

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos ao quarto ponto da nossa ordem de trabalhos, que trata da

apreciação da Petição n.º 623/XIII/4.ª (Arménio Francisco Gonçalves Maximino e outros) — Solicitam a adoção

de medidas contra a deslocalização dos serviços de registo sitos na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.os 7 a

11, Lisboa.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Madeira, do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Rita Borges Madeira (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Queria começar por saudar e

agradecer, na pessoa do Sr. Arménio Maximino, a todos aqueles que, na defesa dos seus direitos, através do

direito de petição, assinaram a mesma.

O Ministério da Justiça decidiu deslocalizar parte do atendimento dos serviços do Instituto dos Registos e do

Notariado (IRN) localizados no edifício da Avenida Fontes Pereira de Melo, em Lisboa, para a Loja do Cidadão

do Mercado 31 de Janeiro, na zona do Saldanha.

A deslocalização destes serviços teve por base uma lógica de racionalização da prestação de serviço público,

permitindo, também, descomprimir o atendimento na Avenida Fontes Pereira de Melo, proporcionando, assim,

melhores condições a quem se dirige lá, bem como a quem lá trabalha.

Compreendendo as razões dos peticionários, sublinho que, entre os dois espaços, distam apenas 50 m,

estando, por isso, ambas as localizações numa zona central da cidade, bem servida por transportes públicos.

Acrescento, também, que a mesma foi efetuada, naturalmente, com a concordância de todos os funcionários.

É obrigação do Estado prestar um serviço adequado às necessidades e interesses dos cidadãos. É obrigação

do Estado promover o bem-estar coletivo e assegurar boas condições de vida a todos. Para isso, o Estado

precisa de encontrar o equilíbrio entre três fatores: as necessidades das pessoas, as respostas dos serviços e

os recursos da Administração Pública.

É por isso que, ciente da necessidade não só de continuar, sempre que necessário, a deslocalizar frentes de

atendimento, como também de reforçar o número de recursos humanos nos seus serviços, o Estado está a

ultimar a tramitação de um concurso de admissão de assistentes técnicos, que permitirá o reforço das frentes

de atendimento dos serviços do IRN, especialmente dos balcões de atendimento do cartão de cidadão, e irá,

também, abrir um concurso para o preenchimento de mais de 700 lugares vagos de conservador e de oficial de

registos.

É obrigação do Estado inovar: inovar na gestão pública e nas políticas públicas; inovar nos processos

participativos; inovar na simplificação; inovar na desmaterialização, na abertura, na acessibilidade e na inclusão.

É isso que este Governo tem feito, nos últimos anos, nomeadamente com a abertura de inúmeras lojas do

cidadão, que facilitam, e muito, a relação entre os cidadãos, as empresas e o Estado, e que trouxeram um novo

modelo de atendimento integrado, permitindo ganhar tempo e reduzir custos; com o funcionamento de 630

Espaços Cidadão, que disponibilizam cerca de 200 serviços públicos e que já efetuaram cerca de 600 milhões

de atendimentos; com a abertura de Espaços Empresa; com a criação de um portal de serviços público, o

ePortugal, que já teve oito milhões de acessos; com a criação de um Mapa de Cidadão, que fornece todas as

indicações úteis sobre os locais de atendimentos ao público e que permite obter senhas online para todos os

serviços disponíveis, em qualquer uma das lojas do cidadão.

Tudo isto representa um ganho para todos, mas a evolução da sociedade empurrou-nos para novas formas

de interagir com os serviços públicos. Hoje, e para um grande número de serviços, não é necessário uma

deslocação presencial. Podemos deslocar-nos virtualmente.

Vivemos num tempo novo pela possibilidade tecnológica e pelo horizonte de respostas que essas

possibilidades nos oferecem. O sentido é único: melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, potenciar a

possibilidade de, à distância de um clique, acedermos a todos os serviços.

A metodologia centra-se sempre nas pessoas. O Estado e a Administração Pública, per se, não detêm

nenhum valor público, se esse valor não for uma mais-valia para aqueles que servem.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Rocha

Ferreira, do Grupo Parlamentar do PSD.

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A Sr.ª Catarina Rocha Ferreira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que comece

por saudar as senhoras e os senhores peticionários, enaltecendo esta iniciativa. É sempre fundamental

valorizarmos a democracia participativa, nomeadamente porque, desta forma, se trazem à discussão, nesta

Assembleia, assuntos que têm a ver com questões pertinentes e concretas, que afetam e preocupam a

sociedade e os cidadãos. Nunca é demais sublinhar que, quanto mais participativos forem os cidadãos, mais

rica é a nossa democracia.

Esta petição, hoje discutida, vem apelar à adoção de medidas contra a deslocalização dos serviços de registo

na Avenida Fontes Pereira de Melo, em Lisboa. Enquanto, antes, um cidadão podia tratar de qualquer ato de

registo num único local, em ato contínuo, agora não pode. Agora, o cidadão tem de ir a um local tratar de um

ato — por exemplo, vai lá fazer um casamento ou um divórcio —, mas, se necessitar de um novo cartão de

cidadão — porque, em virtude do casamento ou do divórcio, mudou de apelido —, já terá de se dirigir a um outro

local. Ora, se isto é um ónus para um cidadão comum, é um ónus acrescido para os cidadãos de mobilidade

reduzida.

Na verdade, não se entende a deslocalização de serviços que funcionam bem de forma integrada. Aliás,

mais uma vez se constata que, apesar do que aqui é dito, o setor dos registos e de notariado tem sido muito

esquecido pelo Governo. Tem sido mesmo menosprezado pelo Governo.

Se existe área que necessita de um ímpeto reformista, é esta. Mas isso não é algo que se obtenha com uma

simples deslocalização de serviços e de funcionários, que se transferem de um lado para outro. O que é

necessário é a contratação de mais funcionários, o que é necessário é a abertura de novos serviços.

Nesse sentido, já no final da anterior Legislatura, foi aprovado, por esta Assembleia, um projeto de resolução

do PSD, a recomendar ao Governo, precisamente, a adoção de medidas urgentes em matéria de registo e

notariado. Estou a referir-me à Resolução da Assembleia da República n.º 39/2019. Por incrível que pareça,

praticamente nenhuma das medidas urgentes lá mencionadas foi implementada.

Estamos a falar de várias conservatórias que ainda nem têm um conservador, como é o caso de Melgaço.

Estamos a falar dos dados pessoais dos cidadãos, que continuam sem proteção, agora ainda pior nas

conhecidas «ilhas de atendimento». Estamos a falar da lei orgânica, que ainda não foi revista. Estamos a falar

de computadores obsoletos, de falhas frequentes no sistema. Estamos a falar da inexistência de medicina do

trabalho, entre outras medidas urgentes.

Ainda houve uma leve esperança: a de que, ao menos no Programa Nacional de Reformas, o Governo

tivesse nem que fosse uma palavrinha sobre estas áreas que, como se verifica, necessitam de intervenção

urgente. Mas nada, nem uma palavra.

De facto, não se compreende esta atitude do Governo, porque, como se verifica, estamos a falar de assuntos

que afetam, preocupam e interessam aos cidadãos.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel

Pureza, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, naturalmente,

cumprimentar os peticionários e dizer que fui relator desta petição, na 1.ª Comissão, sendo também nessa

qualidade que quero intervir.

O que temos diante de nós?! Temos, diante de nós, um serviço que funcionava bem — que funciona bem!

—, num local integrado de várias valências: resposta aos cartões de cidadão, aos passaportes, conservatória

de registo civil, conservatória de registo comercial, SIR (Soluções Integradas de Registo), balcão Casa Pronta…

Enfim, um conjunto de valências que estão num determinado espaço e, ainda para mais, num local de fácil

acesso.

De repente, o Governo decide partir este serviço em três dimensões: uma fica naquele local, outra passa

para o Mercado 31 de Janeiro e a terceira passa para o Parque das Nações, a pretexto de fazer uma coisa

moderna, com uma linguagem moderna, que é separar, «em bom português», o back office do front office, ou,

na linguagem que a Sr.ª Deputada Rita Madeira há pouco utilizou, fazer a «racionalização das frentes de

atendimento».

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Com tanta modernidade, na verdade, o Governo inovou, mas inovou da pior maneira, inovou mal, inovou

erradamente. A fragmentação é errada, porque é prejudicial para as pessoas e é prejudicial para o serviço. Na

verdade, os serviços continuam a debater-se com questões profundas, que são antigas.

Portanto, a modernidade desta linguagem não atende, designadamente, como já foi sublinhado, a falta de

pessoal, o equipamento obsoleto, a falta de condições físicas de privacidade no atendimento. Tudo isso é o dia

a dia destes serviços e, a isso, o Governo não diz nada. Faz uma deslocalização e, enfim, utiliza a linguagem

do back office e do front office e a coisa fica resolvida.

Na verdade, creio que esta pretensa modernidade de linguagem gerencial de medidas como esta disfarça

mal a incapacidade do Governo de responder às necessidades reais de serviços públicos como este: mais

pessoal, melhores condições de atendimento, mais respeito pelos utentes.

São questões antigas?! Pois são! Não têm linguagem moderna?! Pois não! Mas são os desafios essenciais

que é preciso cumprir.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço desculpa, mas antes de dar a palavra, vou chamar a atenção do

Sr. Deputado João Gonçalves Pereira, que está sem máscara. Esqueceu-se de voltar a pô-la.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Peço desculpa, Sr.ª Presidente. De facto, esqueci-me de voltar

a pô-la.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Queria, em nome do PCP, saudar os

subscritores desta petição, que foi da iniciativa do Sindicato dos Trabalhadores dos Registos e do Notariado.

Na verdade, aquilo de que estamos a falar não é de uma mera deslocalização, porque poderia parecer um

pouco despiciendo estarmos a discutir um problema de passar uma repartição 50 m para o lado. De facto, o

problema é muito mais do que isso. A existência, designadamente, de um novo espaço no Mercado 31 de

Janeiro, que fica muito próximo desta repartição de que estamos a falar, era uma oportunidade, havendo mais

espaço, para resolver melhor a acessibilidade dos cidadãos aos serviços públicos.

Mas, efetivamente, não foi isso que aconteceu. O que aconteceu foi o seguinte: não havendo mais

funcionários para o mesmo serviço, obviamente, parte dos funcionários também foram deslocalizados. Portanto,

não melhorou o atendimento aos cidadãos e este é um problema.

De facto, não tem havido uma evolução significativa no número de funcionários nos serviços de registos e

notariado e isso tem tido consequências muito graves no atendimento aos cidadãos, a vários níveis. Não é, de

facto, aceitável que, no início da terceira década do século XXI, seja preciso perder mais do que um dia de

trabalho para renovar o cartão de cidadão. Não faz sentido absolutamente nenhum, mas é isso que acontece.

É óbvio que estes serviços precisam de mais pessoal! Isso é incontornável. E o Governo, o que tem feito,

nos últimos anos, é procurar disfarçar esta situação com vários estratagemas. Um foi a abertura de Espaços

Cidadão pelas câmaras municipais. O que é que acontece?! O cidadão vai lá, quer tratar de um assunto. O que

lhe dizem?! Dizem: «Ah, não, aqui não. Aqui tratamos de outros assuntos, mas desse não. Tem de ir à Loja do

Cidadão». Vai à Loja do Cidadão, dirige-se a um balcão para tratar de um assunto e dizem-lhe: «Não, nós aqui

também não temos capacidade para isso. Tem mesmo de ir à repartição». Depois, a pessoa vai à repartição e

perde lá um dia inteiro.

Isto não é aceitável! Mas isto, de facto, só é resolúvel se houver mais recursos humanos nestes serviços,

que possam dar resposta a problemas elementares dos cidadãos. Estas medidas não têm, de facto, disfarçado

a gravidade desta situação.

Por outro lado, ainda hoje recebemos, precisamente da parte dos subscritores desta petição, uma chamada

de atenção para as deficientes condições de segurança com que esses serviços estão a ser reabertos, no âmbito

da pandemia que estamos a viver e, obviamente, tendo em conta a necessidade de ir reabrindo os serviços.

Fazemos, aqui, um apelo muito sério para que esses problemas se resolvam, em nome da segurança quer dos

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trabalhadores dos registos, quer dos utentes que vão ter de recorrer a esses mesmos serviços, porque, de facto,

esta é uma questão muito séria. Os serviços têm de ir reabrindo, mas, obviamente, têm de ir reabrindo em

condições de segurança e é preciso que isso seja devidamente acautelado.

Portanto, o apelo que deixamos, a propósito da questão da deslocalização das instalações da Avenida Fontes

Pereira de Melo, é para que os serviços de registos e notariado e os serviços públicos em geral, neste País,

sejam dotados com o pessoal necessário, para que se possa prestar aos cidadãos um serviço compatível com

a terceira década do século XXI, que estamos a iniciar.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Gonçalves

Pereira, do Grupo Parlamentar do CDS.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr.ª Presidente. Sr.as e Srs. Deputados: em primeiro lugar,

quero agradecer a chamada de atenção da Sr.ª Presidente, mas foi pura distração.

Começo por cumprimentar o peticionário por esta petição, a qual andava aqui, na Assembleia da República,

há cerca de um ano, e que tem a ver com uma decisão do Ministério da Justiça, em relação a alguns dos serviços

de conservatória, ao nível do cartão de cidadão, passaporte, registo de nascimento, registo de óbitos, da Av.

Fontes Pereira de Melo para o Saldanha.

Um ano depois, podemos fazer uma avaliação que é o que temos ouvido um pouco em todo este debate. Ou

seja, há uma divisão dos serviços e isto coloca problemas ao nível da orgânica e do funcionamento do próprio

serviço interno e tem uma consequência direta para o cidadão.

E aqui perdeu-se uma ótima oportunidade. É que a oportunidade dessa mesma transferência devia ter

servido, precisamente, para reforçar aquilo que era as linhas de atendimento com novos trabalhadores, com

mais trabalhadores.

Mas quando analisamos, por exemplo, o último balanço publicado do IRN, o balanço social de 2018, o que

é que ele nos vem dizer? Que há um défice de 199 conservadores, há um défice 1154 oficiais e há um défice,

também, de 139 assistentes técnicos. E, portanto, esta era a grande oportunidade, precisamente, de reforçar

este serviço público.

Ainda há poucos dias, tivemos conhecimento, através de uma notícia, que há mais de 700 000 cartões de

cidadão caducados. Isto significa que é preciso serviços, é preciso respostas. E estes funcionários que lá estão,

que, como é evidente, estão a tentar dar o seu melhor, não conseguem dar a resposta devida aos cidadãos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do

Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente: Antes de mais, quero saudar os peticionários e dizer que

estamos perante um dos grupos que mais tem sido prejudicado nas fases sucessivas de reformulação do

Estado, não só na que levou à redução do número de funcionários e que não permitiu novas contratações,

tornando este tipo de serviços numa das tarefas mais difíceis — como até a Sr.ª Ministra da Justiça reconheceu.

Por outro lado — porque não dizê-lo também? —, a deslocalização, feita a avaliação, tem gerado, de facto,

um impacto muito negativo, não só na vida dos cidadãos, que, tal como dizia o Sr. Deputado António Filipe, se

veem envolvidos numa burocracia enorme. Basta ver-se que na cidade de Lisboa não dá para tratar de uma

coisa ou de duas no mesmo espaço e temos de andar a percorrer sítios diferentes da cidade, a maior parte das

vezes, não todas. De facto, muitas vezes, estes trabalhadores são os que mais sofrem com isto.

Portanto, nós temos de garantir que, sem cair no esforço de centralização, conseguimos a descentralização

adequada para que estes serviços sejam, efetivamente, prestados numa lógica de proximidade. Na verdade, foi

isso que a Sr.ª Ministra da Justiça garantiu em 2017, ou seja, que iria fazer esta descentralização numa lógica

de proximidade.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

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Portanto, o que falta para garantirmos a estes trabalhadores o mínimo de dignidade, para além da questão

das carreiras, é permitir essa descentralização, mas com meios, com competências e com proximidade.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa

Real, do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os mais

de 5000 peticionários que nos trouxeram esta petição com a preocupação, relativamente a uma intenção

manifestada desde 2017, de deslocalizar os serviços que, neste momento, estão concentrados no edifício da

Avenida Fontes Pereira de Melo, entre eles o mais importante espaço de registos, que permite, de acordo com

o próprio conceito — e aqui a questão modelar que foi referida há pouco, e bem, pelo PCP, é, de facto, relevante

—, haver uma concentração num único local físico de atendimento de todas as valências, de forma transversal

e integrada, num único ponto de acesso físico, ponto este que tem, precisamente, uma acessibilidade particular

e que adiante também referirei.

Os serviços que são aqui prestados têm diferentes valências, como a Conservatória do Registo Civil, a

Conservatória do Registo Comercial, o próprio SIR, o Balcão Casa Pronta, o Balcão Heranças e Divórcio com

Partilha (BHDP), o cartão de cidadão e o passaporte eletrónico. Evita-se, assim, a deslocação dos cidadãos, de

forma individual, ou de empresas, a diversos locais, podendo, de facto, aceder num único local, a vários serviços.

Aquilo que os peticionários nos vêm pedir — e bem! — é que se evite e não se concretize este

desmembramento, alertando para alguns pontos, que passo a destacar: desde logo, para os serviços não serem

separados sendo possível aceder, num único ponto de atendimento, a todas estas valências registais.

Com razão, vêm alertar para a questão de o back office do atendimento ao público ser separado do front

office, o quepode colocar em causa um atendimento não só personalizado, como também mais eficiente, do

ponto de vista até técnico. Isto porque o back office contém, muitas vezes, os técnicos que têm conhecimentos

especializados e, portanto, esta solução põe em causa a necessária e desejável integração, para uma maior

rapidez e eficiência no atendimento, do back office e o front office.

Aquilo que, de facto, podemos verificar é que em muitos locais de atendimento ao público, como o Casa

Pronta, as finanças ou a segurança social, quem está a atender tem a capacidade de se levantar e pedir apoio

aos seus pares ou até mesmo aos responsáveis, para garantir um melhor atendimento ao cidadão.

Por outro lado, se este edifício é bastante central e está servido também de autocarros e de estações de

metropolitano, pelo menos três, nas proximidades, estar a deslocar para um local que não tem essas

acessibilidades garantidas, é, de facto, estar aqui a confinar alguns cidadãos que não têm a mesma capacidade

de mobilidade.

O PAN acompanha, assim, obviamente, esta preocupação dos peticionários quer quanto ao fundamento do

atendimento nos serviços, quer também à intenção de deslocalização. Isto porque nos parece, de facto, que é

estar a mexer… E costumamos usar esta gíria até noutras áreas da nossa vida: em equipa vencedora, não se

mexe.

E, portanto, não obstante as fragilidades que os serviços possam ter, seja ao nível da falta de pessoal, seja

ao nível da valorização dos profissionais, se existe uma solução modelar que tem, de facto, de forma integrada,

estas respostas, não se compreende que haja esta alteração.

Há pouco, a Sr.ª Deputada Rita Madeira, do Partido Socialista, falou na questão do atendimento ao público,

de privilegiar, hoje em dia, a transição digital. Sr.ª Deputada, existem milhares de cidadãos no nosso País que

não têm acesso a equipamentos informáticos, nem têm literacia digital…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Concluo já, Sr.ª Presidente.

Como estava a dizer, esses cidadãos nem têm literacia digital para poderem aceder a plataformas online e

não nos podemos esquecer destes cidadãos, que devem ser, obviamente, considerados como os restantes e

não cidadãos de segunda linha, podendo aceder a todos estes serviços.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos ao quinto ponto da ordem do dia, que consiste na apreciação

da Petição n.º 597/XIII/4.ª (Amélia Luciana Brugnini de Sousa Uva Passo e outros) — Solicitam que a profissão

de tripulante de cabine seja qualificada como de desgaste rápido, juntamente com os Projetos de Resolução n.os

268/XIV/1.ª (PEV) — Classificação de tripulante de cabine como profissão de desgaste rápido e 251/XIV/1.ª (BE)

— Pela regulamentação da atividade de tripulante de cabine com vista à redução do desgaste resultante do

exercício da atividade e à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho e com, na generalidade, o

Projeto de Lei n.º 234/XIV/1.ª (CDS-PP) — Criação do grupo de trabalho para a regulamentação legal das

profissões de desgaste rápido e criação da respetiva tabela.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Barros, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Sr.ª Presidente, se me permite, creio que os autores das iniciativas têm

prioridade na intervenção inicial.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Exatamente, Sr.ª Deputada. É isso.

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada Mariana Silva, tem a palavra para uma intervenção pelo

PEV.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Obrigada, Sr.ª Presidente. Peço desculpa por não me ter inscrito, pensei que

estaria definido que o PEV falaria.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de saudar, em nome de Os Verdes, os

mais de 13 000 cidadãos que assinaram a petição solicitando que a profissão de tripulante de cabine seja

qualificada como de desgaste rápido.

As profissões de desgaste rápido estão associadas a condições de trabalho desvantajosas e a uma

acumulação de cansaço e stress dos profissionais, decorrentes do exercício da atividade.

Os tripulantes de cabine, que operam a bordo das aeronaves, estão sujeitos a situações que aceleram e

acumulam fadiga e desgaste, já comprovadas por diversos relatórios técnicos.

As situações mais evidentes e atestadas por peritos médicos, prendem-se com o facto de, tal como os pilotos

de aeronaves, operarem diariamente a grande altitude, com variações de pressão, que afetam o ouvido, o nariz

e os intestinos. Nas fases de descolagem e aterragem, a variação de pressão faz-se sentir de forma intensa. O

ambiente artificial em que operam é de baixa temperatura e baixa humidade

Existem outros fatores de riscos derivados, por exemplo, da vibração, da turbulência, dos níveis de ruído dos

motores, entre outros, que provocam lesões musculares e ósseas, perturbações de sono, e problemas de tensão

arterial.

Os horários irregulares e o chamado jet-lag afetam os ritmos de sono e o descanso necessário, provocando

dessincronização dos ritmos cardíacos. Também a maior densidade de voos, a maior carga laboral, o menor

tempo de recuperação geram cargas psicológicas bastante extenuantes, assim como a acumulação de stress,

decorrente, até, de funções que os tripulantes de cabine têm de exercer no âmbito de uma constante garantia

de segurança, vigilância e gestão de situações de emergência.

Tendo em conta todas estas circunstâncias, de uma profissão que tem características muito próprias, de

nítido desgaste acelerado dos profissionais que a exercem, o PEV considera que deve ser reconhecido esse

estatuto de desgaste rápido aos tripulantes de cabine, tal como já está reconhecido para os pilotos e

controladores aéreos, de modo a salvaguardar um regime de reforma antecipada que compense estes

trabalhadores pelo exercício de uma profissão com as características referidas, mas que é imprescindível às

sociedades atuais.

Os Verdes consideram ser uma medida que garante a justiça para com estes profissionais, mas também

consideramos que esta é uma discussão que se quer mais abrangente, para que outras profissões possam

também usufruir deste estatuto.

No entanto, o mais importante é que se abra a discussão para a redução do horário de trabalho, que se

reduza a idade da reforma, que se assegurem condições de trabalho, que se valorize o trabalho e os

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trabalhadores com a melhoria dos salários, que se acabe de vez com a precariedade, porque o caminho é o dos

direitos e não o da degradação da situação de cada um.

Assim se atacam os constrangimentos, não só na saúde, mas na produtividade e no acompanhamento da

família.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do

Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. e Sr.as Deputadas: Em primeiro lugar, o Bloco de Esquerda

quer cumprimentar os peticionários e as peticionárias, designadamente os que estão aqui hoje, que nos

trouxeram um tema extremamente importante a debate e que tem a ver com profissões de desgaste rápido.

O Bloco de Esquerda tem vindo a alertar, há muito tempo, para o crescente número de profissões e de

trabalhadores que, por várias razões, têm encetado lutas e lançado alertas para as condições em que se trabalha

em Portugal.

E não é por acaso que cada vez mais profissões, de diferentes setores de atividade, têm pedido, através de

petições ou de outras formas, o reconhecimento da sua profissão como sendo de desgaste rápido.

Os ritmos de trabalho têm-se acelerado, os horários de trabalho são cada vez mais longos, as condições de

trabalho são pioradas e não se tem em conta as condições extremas de determinadas profissões.

No caso dos tripulantes de cabine, é necessário que se reconheçam as condições adversas e, em algumas

situações, extremas em que estas pessoas têm que trabalhar, sendo expostas a riscos e com exigência muito

alta na execução das suas tarefas.

Os tripulantes de cabine — comissários, assistentes de bordo, chefes de cabine e supervisores de cabine —

exercem a sua atividade a bordo de aeronaves onde se encontram expostos a riscos profissionais e a fatores

de desgaste penalizantes, idênticos aos que encontramos em várias profissões já hoje consagradas com o

estatuto de profissão de desgaste rápido.

É reconhecido que é uma atividade marcada por horários disruptivos, distúrbio do sono, exposição a radiação

e contaminação do ar de cabine, por meio de organofosfatos. Decorre numa atmosfera artificial, com

percentagens reduzidas de oxigénio, com microvibrações do voo aéreo, variações climatéricas bruscas,

mudanças rápidas e frequentes de fusos horários e alterações frequentes do ritmo circadiano.

Podemos verificar que não estamos a falar de condições normais de trabalho. Além disso, são requeridos

altos níveis de exigência psíquica e emocional nesta profissão. Há, portanto, uma carga que acarreta riscos para

a saúde dos e das trabalhadoras tripulantes de cabine que é, do nosso ponto de vista, bastante clara.

Deixamos, necessariamente, uma palavra a centenas de tripulantes e trabalhadores da aviação civil que,

neste momento de crise, perderam já o seu trabalho por estarem com contratos mais precários, o que denota,

também, a precariedade em todos os setores da atividade portuguesa, mesmo aqueles em que a exigência é

mais alta e em que os riscos de saúde e de segurança são, também, elevados.

Por isso mesmo, a proposta que o Bloco de Esquerda aqui apresenta é de justiça. É disso que estamos aqui

a falar. Sendo competência do Governo a regulamentação no que toca à lista de profissões de desgaste rápido,

achamos que não se pode perder esta oportunidade e que a recomendação deve ser aprovada o mais

rapidamente possível, em nome de todos os tripulantes de cabine.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de

Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar,

quero cumprimentar os mais de 13 000 peticionários desta petição relativamente ao pessoal de cabina e à

questão do desgaste rápido, que, do nosso ponto de vista, merece, como já tínhamos dito em discussões

anteriores, uma análise que compatibilize os regimes excecionais existentes com aquelas que são as ambições

legítimas de muitas outras profissões de virem a ter a sua situação consagrada também como uma profissão de

desgaste rápido.

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Todavia, devemos criar uma legislação que não uniformize o regime, porque, obviamente, mesmo sendo

profissões de desgaste rápido, há características que distinguem cada uma destas profissões e o regime não

pode ser igual para todas as que tenham este estatuto, mas tem de servir de enquadramento, designadamente

no acesso ao estatuto.

Portanto, entendemos que deverá haver um regime que, não sendo uma decisão pontual e arbitrária para

cada profissão, tenha o mesmo conjunto de regras para a análise e eventual aplicação do estatuto.

Por isso, a iniciativa do CDS o que propõe é a criação de um grupo de trabalho multidisciplinar em que

intervenham as áreas governamentais que têm diretamente tutela sobre estas áreas, por forma a que, num

prazo relativamente longo, se possa produzir esta legislação.

Não se trata de uma oposição a esta pretensão dos tripulantes de cabine, que, naturalmente reconhecemos,

como já foi aqui dito, quer pelo facto de os horários serem muito diferentes, havendo implicações no sono devido

aos fusos horários e deslocações, quer pela pressão dentro das aeronaves, pela questão das descolagens e

das aterragens, etc. Enfim, há uma série de fatores que contribuem para a excecionalidade desta profissão,

mas, como sabemos, há também outros, e alguns já passaram por esta Assembleia. Só para elencar alguns,

lembro os trabalhadores de call center, os trabalhadores dos órgãos de polícia criminal, os motoristas de

pesados, os trabalhadores de manutenção e montagem de aerogeradores e outros, que, naturalmente, têm de

ter também, da parte deste Parlamento, a mesma atenção.

Do nosso ponto de vista, isso só pode ser feito com um regime jurídico que se aplique a todas estas situações,

permitindo, depois, excecioná-las, pelo que devíamos criar este grupo de trabalho para que tal seja possível.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Barros.

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD começa por saudar todos os

cidadãos subscritores desta petição, que visa a consagração do estatuto de profissão de desgaste rápido para

os tripulantes de cabine. Esta petição visa também considerar para os tripulantes de cabine o acesso à idade

de reforma aos 59 anos e ainda que, no final, totalizados 35 anos de serviço nesta profissão, também possam

aceder à reforma sem penalização.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Parlamento consultou o membro do Governo desta área sobre

esta matéria e também ele — subentende-se no ofício que recebemos — apresentou algumas reservas quanto

à criação de mais regimes especiais no acesso à reforma.

Também o PSD apresenta as suas reservas, porque duvidamos muito da saúde da segurança social, tal

como tem vindo a público nos últimos dias. Aliás, há dias, já em período da COVID-19, questionámos a Sr.ª

Ministra sobre o efeito da quebra da bolsa no Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social neste

tempo da COVID, mas o PSD não obteve resposta sobre as contas neste Fundo de Estabilização Financeira da

Segurança Social.

Aquilo que sabemos é que, antes da era da COVID, havia cerca de 20 000 milhões de euros disponíveis para

garantir dois anos de pagamento de pensões aos portugueses, mas hoje não sabemos qual é o valor nem os

portugueses sabem com aquilo que contam em termos de segurança social.

Enfim, à parte destas questões financeiras, naturalmente que reconhecemos que há profissões que

provocam um desgaste mais rápido na saúde dos trabalhadores, tal como a de tripulantes de cabine.

Consideramos, sim, que esta profissão tem um efeito desgastante e rápido na saúde dos trabalhadores.

Quanto às duas iniciativas do Partido Ecologista «Os Verdes» e do Bloco de Esquerda, não vamos

acompanhar estas recomendações ao Governo,…

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Grande novidade!

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — … fruto de tudo aquilo que foi dito na minha exposição, vamos, sim,

acompanhar a iniciativa do CDS, mas fazendo algumas exigências, como é natural.

Há muito trabalho a fazer em sede de especialidade e deixem-me, por exemplo, apresentar uma das razões

pela qual o digo: sobre os elementos que elenca que devem participar no grupo de trabalho sobre este estudo

das profissões de desgaste rápido, o Sr. Deputado não fala nos parceiros sociais, não fala nos representantes

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dos patrões nem nos representantes dos trabalhadores. É que, de facto, estamos a falar de trabalhadores e de

trabalho e o PSD valoriza muito o diálogo saudável e a negociação que é feita entre as partes.

O CDS fala num elemento do Conselho Económico e Social, mas não vemos aqui um equilíbrio, não sabemos

se trabalhadores, se patrões, e queremos os dois, sim.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Pode ser!

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Há outras matérias que é preciso afinar e, naturalmente, se o CDS tiver esta

abertura, depois, na votação final global, caso a iniciativa seja aprovada, poderão vir a contar connosco.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Podem contar, mas não é agora!

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Os tripulantes de cabine também podem vir a contar connosco nesta matéria.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de, em nome do Grupo

Parlamentar do Partido Comunista Português, cumprimentar os mais de 13 000 peticionários, o Sindicato

Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil, que dinamizou esta petição, que aqui traz um alargado conjunto

de preocupações sobre os ritmos e as condições de trabalho dos tripulantes de cabine e os riscos profissionais

daí decorrentes, sinalizando também a dimensão dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.

A este propósito, importa lembrar o profundo agravamento das condições de trabalho dos trabalhadores

deste setor, o incremento dos níveis de exploração a que estes trabalhadores estão sujeitos, por exemplo, com

a intensificação das horas de voo e a não garantia do descanso necessário, existindo hoje menos tempo de

repouso para estes trabalhadores.

Esta realidade também não está desligada da desregulação do próprio setor, da concorrência desleal e

desenfreada, das opções de governos nacionais e da União Europeia de favorecimento do modelo de negócio

de algumas companhias, designadamente das chamadas low cost, que acabam sempre em processos de

chantagem contra os países, exigindo-lhes apoios para não encerrarem a operação e colocando-se, por via

desses apoios públicos, em posição de concorrer contra as companhias nacionais, companhias essas,

chamadas low cost, que têm a marca dos despedimentos, dos baixos salários, de pressão e de chantagem

sobre os trabalhadores e de grandes atropelos a direitos laborais.

Lembro, aqui, o comportamento de uma destas empresas, a Ryanair, em abril de 2018, aquando de uma luta

histórica dos tripulantes de cabine portugueses, que respondeu a estes trabalhadores com ameaças, com

chantagens, com repressão, com assédio sobre trabalhadores que estavam a defender os seus direitos e que

estavam a exigir que esta empresa cumprisse a legislação nacional e a Constituição da República.

A realidade atual deste setor, que, aliás, no contexto atual foi o que mais despediu ou colocou trabalhadores

em layoff, tem profundas implicações e consequências nas condições de trabalho destes trabalhadores,

incluindo em matéria de saúde, de higiene e de segurança no trabalho.

É inegável que, hoje em dia, as condições de trabalho dos tripulantes de cabine são mais duras, existindo

implicações para a saúde destes trabalhadores, uma realidade identificada na petição e também aquando da

audição dos peticionários.

O PCP entende que os anseios e as reivindicações colocadas por estes trabalhadores, pelos tripulantes de

cabine, têm de ser alvo de reflexão, até porque, no caso concreto, falamos da própria segurança e da qualidade

do serviço para os passageiros do transporte aéreo, uma vez que estamos a falar de tripulantes que têm a seu

cargo a segurança e o cuidado das vidas a bordo.

Há também um outro conjunto de reivindicações que têm chegado à Assembleia da Republica que vão no

mesmo sentido e que têm de merecer a atenção, a reflexão e uma discussão cuidada e aprofundada.

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A discussão destas matérias tem de ser feita de forma transversal e abrangente, incluindo também a

abordagem às condições e aos ritmos de trabalho, que se intensificaram, bem como às funções e ao exercício

das profissões, com a abertura necessária para um debate aprofundado.

O PCP cá estará para fazer esse debate e para contribuir para o mesmo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa

Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os mais

de 13 000 peticionários que assinaram esta petição e que trouxeram esta matéria à Assembleia da República,

precisamente para que a profissão de tripulante de cabine seja qualificada como de desgaste rápido.

Acolhemos as suas preocupações e reivindicações. Já aqui foi referido o elevado desgaste a que está sujeita

esta profissão e, de facto, pelas funções que exercem, os tripulantes de cabine estão sujeitos a elevados riscos

profissionais, a fatores de desgaste penalizantes, que têm de ser considerados semelhantes a outras profissões

que já têm este estatuto de profissão de desgaste rápido.

Ora, os tripulantes de cabine têm, bem sabemos, como principais funções, desde logo, zelar pela segurança

dos ocupantes do avião, cumprindo as normas de segurança, atuar corretamente mesmo em caso de

emergência, orientando ou colaborando em tarefas de sobrevivência, isto a par do seu desgaste normal do seu

dia-a-dia, bem como prestar assistência aos passageiros, sendo que têm ainda o dever de assegurar antes da

descolagem que todo o equipamento de emergência está em condições de ser utilizado e também garantir os

procedimentos de segurança, a par daquelas que são as suas normais funções.

Creio que todos reconhecemos que esta atividade é, de facto, bastante desgastante, quer pelas condições

que abruptamente se alteram, do ponto de vista do ambiente climático presente, quer do ponto de vista físico e

psicológico, pois estão sujeitos diariamente a elevados níveis de stresse e com enormes exigências.

Para além disso, estes profissionais encontram-se ainda sujeitos a horários de trabalho irregulares, incluindo

trabalho por turnos, que tem consequências a nível da privação do sono. Todas estas exigências profissionais

têm consequências, inevitavelmente, ao nível do seu bem-estar e da sua saúde, inclusive da sua saúde mental,

tendo-se verificado um elevado número de baixas médicas prolongadas por esgotamento, depressões e burnout.

Recordo também que, no decurso dos trabalhos desta Assembleia e das comissões, nomeadamente na

audição dos peticionários, foi-nos indicado pelos próprios que há diversos estudos que demonstram já que, pelas

enormes exigências profissionais, os tripulantes de cabine estão sujeitos a contraírem doenças, como, por

exemplo, doenças do foro oncológico, músculo-esqueléticas, auditivas e ainda do foro psicológico.

Assim, concordamos, obviamente, com a sua pretensão e vamos acompanhar os projetos de resolução que

foram apresentados sobre esta matéria, porque nos parecem da mais elementar justiça, sendo, pois,

fundamental não só a regulamentação da profissão, a redução da exposição destes profissionais aos fatores de

risco inerentes a sua profissão, bem como a criação de formas de minimizar as consequências nefastas que

este desgaste tem na sua vida pessoal, familiar, ao longo da vida profissional e mais tarde, obviamente, na

reforma, em virtude do desgaste sentido ao longo da sua vida profissional.

O PAN irá, obviamente, acompanhar estas iniciativas, porque nos parece que é elementar reduzir este

desgaste associado ao exercício da atividade da profissão de tripulante de cabine pelas consequências que a

profissão tem e, portanto, saudamos os peticionários por nos terem trazido aqui as suas preocupações, que

procuraremos acompanhar.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Oliveira.

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar a minha

intervenção por cumprimentar todas e todos os signatários da petição que estamos a debater.

O Partido Socialista compreende bem as pretensões e preocupações dos tripulantes de cabine que

ambicionam que a sua profissão seja qualificada como de desgaste rápido. Também compreendemos as

pretensões e as preocupações de muitos outros profissionais, como os carteiros, os operadores de call center,

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os técnicos de eólicas, entre muitos outros profissionais que ambicionam igualmente que a sua profissão seja

qualificada como profissão de desgaste rápido.

Deste modo, o Partido Socialista e o Governo consideram que é necessário estabelecer regras exatas para

a definição dos padrões de profissões de desgaste rápido, garantindo assim justiça e equidade na qualificação

das diversas profissões.

É com este sentido que Governo tem a decorrer, desde o início do ano, um processo legislativo interno, com

o intuito de produzir um diploma de forma a regular as profissões de desgaste rápido.

Este processo está a decorrer em articulação com vários ministérios, com a participação de diversas

entidades conexas e os parceiros sociais, com o propósito de estabelecer um conjunto de regras claras e

objetivas que permitam identificar quais as profissões que devem ser qualificadas de desgaste rápido.

Uma profissão de desgaste rápido deve, antes de mais, ser uma profissão com acesso a medidas efetivas e

eficazes de mitigação da penosidade, com incidência sobre as questões da saúde e segurança no trabalho,

permitindo reduzir as condições laborais penosas e os seus impactos negativos na saúde destes profissionais.

O Partido Socialista sempre colocou um grande enfoque na temática da saúde e segurança no trabalho, mas

mesmo tendo a noção — e temos bem a noção — de que em algumas profissões a mitigação deste risco seja

difícil, por vezes mesmo impossível, devemos sempre promover a redução das condições laborais penosas e

precaver as implicações irreversíveis na saúde destes profissionais.

Deste modo, consideramos que até à definição das novas regras, exatas, não deve existir a qualificação de

profissões de desgaste rápido de forma avulsa, como propõem os projetos do Bloco de Esquerda e de Os

Verdes.

Também não podemos acompanhar a iniciativa do CDS, que propõe a criação de um grupo de trabalho para

a regulamentação das profissões de desgaste rápido, não por discordarmos desta proposta, não por não a

acharmos meritória, mas por considerarmos que, neste momento, o Governo já tem em curso um processo

idêntico ao que o CDS propõe e seria uma redundância,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!…

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — … com a certeza de que, num futuro próximo, todos nós teremos oportunidade

de debater nesta mesma Assembleia o processo que o Governo tem em curso.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, concluímos a nossa ordem do dia de hoje.

Vamos ter nova reunião plenária amanhã, às 15 horas e 30 minutos. Da ordem do dia constarão três pontos.

No primeiro terá lugar o debate conjunto sobre o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas

e os Projetos de Resolução n.os 440/XIV/1.ª (PSD) — Complemento do Programa de Estabilidade 2020 com a

apresentação de um programa de emergência social e ação diplomática para seu financiamento europeu,

441/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional de Reformas, adote

um conjunto de medidas concretas que permitam respostas para todos os portugueses afetados pela pandemia,

442/XIV/1.ª (PCP) — Pelo direito soberano de Portugal decidir do seu futuro: combater o vírus e o seu

aproveitamento, assegurar o desenvolvimento do País, e 443/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que, no

âmbito do Programa Nacional de Reformas, inclua no plano de recuperação da crise económica, social e

sanitária provocada pela COVID-19 a opção estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento

no combate e adaptação às alterações climáticas, na não-aplicação de medidas de austeridade e em medidas

de combate a interesses instalados.

No segundo ponto da ordem do dia de amanhã terá lugar a discussão conjunta, na generalidade, da Proposta

de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece medidas excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de

natureza artística, no âmbito da pandemia da doença COVID-19 e dos Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) —

Altera o Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 13 de março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de

resposta à pandemia da doença COVID-19 no âmbito cultural e artístico, 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-

Lei n.º 12-A/2020, de 6 de abril, que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da

doença COVID-19, 370/XIV/1.ª (BE) — Proteção dos direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica

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e económica, e 373/XIV/1.ª (N insc.) — Estabelece medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural

português, no âmbito da crise epidemiológica; por fim, um terceiro ponto, votações regimentais.

No terceiro ponto da ordem do dia de amanhã terão lugar as votações regimentais.

Sr.as e Srs. Deputados, terminámos a nossa sessão. Desejo um bom resto de dia às Sr.as e Srs. Deputados,

às Sr.as e Srs. Jornalistas e às Sr.as e Srs. Funcionários e até amanhã, às 15 horas e 30 minutos.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 55 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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