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Sexta-feira, 15 de maio de 2020 I Série — Número 53

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE14DEMAIODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 36

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os

375, 377 e 378/XIV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 451 a 459/XIV/1.ª.

Procedeu-se a um debate sobre o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas juntamente com a apreciação dos Projetos de Resolução n.os 440/XIV/1.ª (PSD) — Complemento do Programa de Estabilidade 2020 com a apresentação de um programa de emergência social e

ação diplomática para o seu financiamento europeu, 441/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional de Reformas, adote um conjunto de medidas concretas que permitam respostas para todos os portugueses afetados pela pandemia, 442/XIV/1.ª (PCP) — Pelo direito soberano de Portugal decidir do seu futuro: combater o vírus e o seu aproveitamento, assegurar o desenvolvimento do País e 443/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional de Reformas, inclua no plano de recuperação da crise

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económica, social e sanitária provocada pela COVID-19 a opção estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento no combate e na adaptação às alterações climáticas, na não aplicação de medidas de austeridade e em medidas de combate a interesses instalados, que foram rejeitados. Usaram da palavra, a diverso título, além dos Ministros do Planeamento (Nelson de Souza) e de Estado e das Finanças (Mário Centeno), os Deputados Nuno Miguel Carvalho (PSD), Miguel Matos (PS), André Silva (PAN), Duarte Alves (PCP), Isabel Pires (BE), Nuno Fazenda (PS), Fernando Negrão (PSD), Vera Braz (PS), Cecília Meireles (CDS-PP), Carlos Brás (PS), Fernando Anastácio (PS), João Cotrim de Figueiredo (IL), José Luís Ferreira (PEV), Mariana Mortágua (BE), Hortense Martins (PS), André Ventura (CH), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Joacine Katar Moreira (N insc.), João Gonçalves Pereira (CDS-PP), Álvaro Almeida (PSD) — que também exerceu o direito de defesa da honra relativamente a afirmações do Ministro de Estado e das Finanças —, Filipe Neto Brandão (PS), Duarte Pacheco (PSD), Luís Moreira Testa (PS), António Filipe (PCP) e João Paulo Correia (PS).

Foram debatidos conjuntamente, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece medidas excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, que foi aprovada, e os Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-lei n.º 10-I/2020, de 13 de Março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19 no âmbito cultural e artístico, 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 12-A/2020, de 6 de Abril, que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19, 370/XIV/1.ª (BE) — Proteção dos direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica e 373/XIV/1.ª (N insc.) — Estabelece medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural português, no âmbito da crise epidemiológica. Intervieram, além da Ministra da Cultura (Graça Fonseca), os Deputados Cristina Rodrigues (PAN), Beatriz Gomes Dias (BE), Joacine Katar Moreira (N insc.), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Rosário Gambôa (PS), Paulo Rios de Oliveira (PSD), Ana Mesquita (PCP), João Cotrim de Figueiredo (IL) e André Ventura (CH). Posteriormente, foram aprovados requerimentos, apresentados pelos partidos autores dos projetos de lei, solicitando a baixa à Comissão de Cultura e Comunicação, sem votação, por 30 dias, daqueles diplomas.

O Deputado André Ventura (CH) interpelou a Mesa sobre o não agendamento, para votação, de um projeto de voto de pesar apresentado pelo seu partido. Depois de a Presidente em exercício ter justificado a respetiva não inclusão no guião de votações, aquele Deputado interpôs recurso dessa decisão, que foi rejeitado, tendo ainda usado da palavra o Deputado Pedro Delgado Alves (PS).

Após terem sido lidos os Projetos de Voto n.os 219/XIV/1.ª (apresentado pelo CH) — De pesar pela morte do mestre Raúl Cerveira, fundador de várias associações de artes marciais e

impulsionador do karaté em Portugal e 225/XIV/1.ª (apresentado pelo PAR e subscrito por Deputados do PS, do PSD, do PAN e do CH) — De pesar pelo falecimento de D. Manuel Vieira Pinto, foram aprovadas as respetivas partes deliberativas (a), tendo sido guardado 1 minuto de silêncio.

Foram rejeitados os Projetos de Resolução n.os 268/XIV/1.ª (PEV) — Classificação de tripulante de cabine como profissão de desgaste rápido e 251/XIV/1.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de tripulante de cabine com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade e à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho, bem como foi rejeitado, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 234/XIV/1.ª (CDS-PP) — Criação do grupo de trabalho para a regulamentação legal das profissões de desgaste rápido e criação da respetiva tabela.

Foi aprovado, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, relativo aos Projetos de Resolução n.os 120/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda ao Governo que tome as medidas de defesa do rio Tejo, 167/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo que promova medidas de garantia de caudais verdadeiramente ecológicos no rio Tejo com informação regular às populações, 187/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a renegociação dos caudais e das situações de exceção constantes na Convenção de Albufeira, 266/XIV/1.ª (PEV) — Revisão da Convenção de Albufeira para salvaguarda de recursos hídricos fundamentais ao País e 271/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova a revisão da Convenção de Albufeira, apresente os resultados da análise da adequabilidade da rede de monitorização hidrometeorológica atualmente existente e que torne públicos os resultados do acompanhamento da execução dos planos no quadro de planeamento hidrológico 2016-2021, assim como os pressupostos estratégicos que definirão o aprofundamento significativo da cooperação bilateral para o ciclo de planeamento 2021-2027.

Foi aprovado um requerimento, apresentado pelo PS e pelo PSD, de avocação pelo Plenário da votação, na especialidade, de propostas de alteração relativas ao texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a Proposta de Lei n.º 30/XIV/1.ª (GOV) — Altera as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19. De seguida, o texto final foi aprovado na especialidade e em votação final global, com propostas entretanto aprovadas, tendo o Deputado Pedro Delgado Alves (PS) apresentado um requerimento solicitando a dispensa de redação final e do prazo para apresentação de reclamações contra inexatidões, que foi igualmente aprovado.

A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 19 horas e 11 minutos.

(a) Estas votações tiveram lugar ao abrigo do n.º 10 do

artigo 75.º do Regimento.

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O Sr. Presidente: — Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Sr.as Funcionárias e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs.

Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 36 minutos.

Antes de iniciarmos a ordem do dia, dou a palavra à Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha para proceder à

leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, muito boa tarde a todos e a todas.

Passo a anunciar que deram entrada na Mesa, e foram admitidas, várias iniciativas legislativas.

Refiro, em primeiro lugar, os Projetos de Lei n.os 375/XIV/1.ª (PSD) — Procede à quarta alteração à Lei n.º

1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica

provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, isentando de taxa de registo no sistema de

registo de estabelecimentos regulados as entidades responsáveis pela criação e manutenção de «hospitais de

campanha» e estruturas afins, que baixa à 9.ª Comissão, com conexão à 13.ª Comissão, 377/XIV/1.ª (PSD) —

Suspende os artigos 16.º e 40.º da Lei das Finanças das Regiões Autónomas, por forma a dotar as Regiões

Autónomas de todos os meios financeiros possíveis para fazer face aos efeitos da pandemia da doença COVID-

19, que baixa à 5.ª Comissão, e 378/XIV/1.ª (PSD) — Remissão à Região Autónoma da Madeira do pagamento

dos encargos decorrentes do empréstimo PAEF, por forma a dotar a Região de todos os meios financeiros

possíveis para fazer face aos efeitos da pandemia da doença COVID-19, que baixa à 5.ª Comissão.

Deram também entrada na Mesa os Projetos de Resolução n.os 451/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao

Governo medidas para defesa da sustentabilidade do rio Tejo e dê cumprimento à Resolução da Assembleia da

República n.º 63/2019, que baixa à 11.ª Comissão, 452/XIV/1.ª (PEV) — Garantia de aumento da oferta de

transportes públicos em época de desconfinamento e aceleração da concretização da estratégia nacional para

a utilização da bicicleta, que baixa à 6.ª Comissão, 453/XIV/1.ª (PEV) — Reforço de investimento no Serviço

Nacional de Saúde, que baixa à 9.ª Comissão, 454/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a adoção de

medidas de combate ao racismo, à xenofobia e à discriminação étnico-racial, que baixa à 1.ª Comissão,

455/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda a disponibilização de máscaras adaptadas permitindo incluir as pessoas

surdas ou com dificuldades auditivas, que baixa à 10.ª Comissão, em conexão com a 9.ª Comissão, 456/XIV/1.ª

(PSD) — Recomenda ao Governo a aprovação de medidas de reconhecimento aos trabalhadores do Serviço

Nacional de Saúde envolvidos no combate à doença COVID-19, que baixa à 9.ª Comissão, 457/XIV/1.ª (PAN)

— Recomenda ao Governo a flexibilização das condições da linha de financiamento Crédito Social Investe, que

baixa à 10.ª Comissão, 458/XIV/1.ª (N insc.) — Campanha nacional para renovar o pacto antirracista na

sociedade portuguesa, que baixa à 1.ª Comissão, e 459/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo medidas para

formulação de preços justos ao produtor e ao consumidor, que baixa à 7.ª Comissão.

Terminei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, no primeiro ponto da ordem do dia, temos um debate sobre o Programa

de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas juntamente com a apreciação dos Projetos de Resolução

n.os 440/XIV/1.ª (PSD) — Complemento do Programa de Estabilidade 2020 com a apresentação de um programa

de emergência social e ação diplomática para o seu financiamento europeu, 441/XIV/1.ª (CDS-PP) —

Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional de Reformas, adote um conjunto de medidas

concretas que permitam respostas para todos os portugueses afetados pela pandemia, 442/XIV/1.ª (PCP) —

Pelo direito soberano de Portugal decidir do seu futuro: combater o vírus e o seu aproveitamento, assegurar o

desenvolvimento do País, e 443/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional

de Reformas, inclua no plano de recuperação da crise económica, social e sanitária provocada pela COVID-19

a opção estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento no combate e adaptação às

alterações climáticas, na não aplicação de medidas de austeridade e em medidas de combate a interesses

instalados.

Para abrir o debate, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento, Nelson de Souza.

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O Sr. Ministro do Planeamento (Nelson de Souza): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Previsto no

processo de monitorização do Semestre Europeu, o Programa Nacional de Reformas (PNR) ficou este ano

condicionado pela coincidência temporal com o decurso da pandemia da COVID-19, tendo-se, por isso, optado

por uma versão simplificada. Trata-se — temos de o reconhecer — de um documento incompleto, mas é o

possível neste momento.

Neste Programa Nacional de Reformas, o que propomos é a manutenção do essencial da rota estratégica

definida pelo Governo nas Grandes Opções do Plano, aprovadas com o Orçamento de 2020. Posteriormente, e

logo que estejam mais dissipadas as condicionantes de que já falei, apresentaremos uma estratégia de

desenvolvimento revista à luz dos impactos da pandemia e que necessariamente incorporará, num primeiro

tempo, um plano de recuperação.

Para situar a Estratégia 2030, incorporada nas Grandes Opções do Plano, que apresentamos, recordemos

os seus quatro domínios estratégicos. O primeiro grupo é o dos designados «desafios gémeos», adotados pela

própria União Europeia e que naturalmente incluímos no nosso plano estratégico: o Green Deal, o crescimento

verde e a ação climática, traduzindo uma vinculação aos objetivos de descarbonização e de sustentabilidade e

uma aposta num desenvolvimento gerador de oportunidades de crescimento, sem esquecer nunca de incorporar

a dimensão da transição justa, sobretudo em regiões e setores mais afetados.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, a transição digital e a inovação, que, aliás, mostraram toda a sua relevância na mitigação

dos efeitos sociais do confinamento físico na ligação entre as pessoas e como um instrumento decisivo nas

práticas de teletrabalho e de telemedicina. Ao invés, ficou também visível, tantas vezes de uma forma bem crua,

o potencial negativo de marginalização social e económica daqueles que ficam para trás neste processo de

transição.

A estes desafios juntam-se outros dois, que ainda persistem e afetam a nossa capacidade de

desenvolvimento. São eles, em primeiro lugar, os problemas que têm a ver com as pessoas: os desafios

demográficos, mas também a inclusão social e o combate que temos de prosseguir às desigualdades de todos

os tipos, dimensões que, aliás, têm de ser amplamente reforçadas num quadro de maior exigência de coesão

social. E, finalmente, os desequilíbrios territoriais — alguns territórios mais próximos da faixa atlântica,

naturalmente confrontados com problemas de competitividade externa, mas também outros territórios mais do

interior que requerem processos de coesão social e de coesão interna.

A estas quatro agendas estratégicas se juntarão agora, naturalmente, dimensões de urgência, de reparação

e de relançamento para a saída da crise. Desde logo, para a reanimação e recuperação das cadeias produtivas

e dos setores que saíram mais fragilizados da pandemia: o turismo e todas as suas atividades conexas, os

serviços e o comércio de proximidade e todos os setores tradicionais exportadores da nossa economia. Mas

também para estimular o reforço da autonomia estratégica, ou seja, da capacidade do País em se abastecer e

garantir a independência a nível de produtos e bens que asseguram a sua própria sobrevivência, e ainda da sua

contribuição para que o mesmo suceda a nível da própria União.

Deixo uma última nota para os apoios comunitários. Temos utilizado e iremos continuar a utilizar a margem

de flexibilidade assegurada nos fundos comunitários através de iniciativas da própria Comissão Europeia. Temos

reconhecido o seu trabalho, nomeadamente o da Comissária responsável pela pasta da coesão, mas

reconhecemos — e temo-lo dito —que a quantidade e a natureza dos apoios recebidos é ainda manifestamente

insuficiente. Para o futuro imediato é indispensável concretizar o que ficou decidido no último Conselho Europeu

sobre o próximo quadro financeiro plurianual e sobre o plano de recuperação. É premente a clarificação quanto

à natureza dos instrumentos, à dimensão financeira global do pacote e aos calendários da sua disponibilização.

Para finalizar, queria sublinhar a importância de duas palavras-chave para a nossa estratégia de resposta a

nível da recuperação: confiança e investimento. É preciso aumentar a confiança das pessoas e nas pessoas,

nas instituições, nas empresas, nos seus trabalhadores, nos empresários e também nas políticas públicas e no

Estado; criar confiança no desconfinamento e na retoma da atividade; gerar confiança na economia, com a

promoção do investimento público, satisfazendo, em simultâneo, necessidades coletivas que são inadiáveis, e

a criação de estímulos e condições de resposta de investimento privado para o relançamento e o reganhar

dinâmicas de orientação para a sua competitividade.

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Aplausos do PS.

Serão questões-chave, que, aliadas aos recursos que têm de vir da solidariedade europeia e à qualidade das

estratégias que soubermos concretizar num futuro próximo, determinarão o sucesso da resposta para

rapidamente retomarmos a dinâmica de convergência interrompida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de prosseguirmos, queria apenas dizer que está aberto o sistema

eletrónico para efeitos de registo do quórum de votações. Peço, portanto, aos serviços para tratarem dessa

questão rapidamente.

A Mesa regista seis inscrições para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro do Planeamento.

Sr. Ministro, como pretende responder?

O Sr. Ministro do Planeamento: — Em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Carvalho.

O Sr. Nuno Miguel Carvalho (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs.

Deputados, ouvi com muita atenção o Sr. Ministro do Planeamento no que diz respeito à base fundamental para

os próximos desafios que temos pela frente. E a base para vencer estes desafios é, efetivamente, o crescimento,

que, como sabe, nestes últimos anos tem sido muito impulsionado pelas empresas e pelos trabalhadores do

setor privado, em particular.

Sr. Ministro, acho que é fundamental esse reconhecimento e esse agradecimento, porque eles, sim, são os

craques da economia, eles, sim, ajudaram a que as contas do País pudessem ser equilibradas. Não há outro

craque que não eles, muito menos qualquer outro ministro pode ser considerado um craque neste papel

fundamental que eles têm tido e que terão de ter no futuro.

Aplausos do PSD.

Sr. Ministro, quando falamos no futuro, «crescimento» é a palavra fundamental que nos dá diversas opções,

mas, se perguntar a qualquer trabalhador qual é o principal risco para o seu posto de trabalho ou se perguntar

a qualquer empresário qual é o principal risco para a sua empresa, a resposta será esta terrível pandemia que

todos vivemos.

Sr. Ministro, para a apreciação que fez e para as perspetivas futuras, faz todo o sentido perguntar: como e

para quando o aumento no investimento na saúde que aqui é falado? Porque o Sr. Ministro não fala no «como»

nem no «quando» e isso ajudaria a mitigar o risco para o crescimento económico, para as empresas e para os

trabalhadores.

Sr. Ministro, quero também falar-lhe daquilo que, na ótica do crescimento, é o contexto de custos

empresariais. Vejo que, neste documento, menciona aquilo que são os processos de licenciamento. Mas se eles

não forem efetivamente executados, estes custos de contexto serão um grave problema para as empresas. E

adiciona-se um que não vejo aqui refletido, que é a excessiva informação empresarial que os empresários têm

de prestar, onde um contabilista é praticamente um funcionário das finanças. E todos estes custos combinados

fazem com que se pague menos salários e que as empresas tenham menos meios disponíveis.

Ora, Sr. Ministro, isto são reformas fáceis de fazer, são reformas baratas, digamos assim, e que têm alto

retorno. Portanto, acho que elas têm de ser prioritárias.

Sr. Ministro, deixe-me falar também daquilo que são as empresas neste momento a operar, até mesmo

aquelas que não recorreram ao layoff, que estão a vender. Nesse contexto, elas são fundamentais e entre elas

há muitas empresas exportadoras. Deixe-me dizer-lhe que, no que que diz respeito à exportação, nesta década,

tivemos os craques da economia a fazer com que as exportações crescessem de 30% para 43% do PIB (produto

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interno bruto), Sr. Ministro. Portanto, temos de impulsioná-las. E nos seguros de crédito com garantia do Estado,

temos de olhar para o mercado da União Europeia.

Neste documento, o Sr. Ministro fala apenas dos mercados fora da União Europeia. Ora, nós temos 70%

daquilo que é a produção de bens do nosso País a ser vendido para a Europa dos 28, para a União Europeia.

Pergunto-lhe se vamos poder ou não incluir o mercado da União Europeia nos seguros de crédito com garantia

do Estado, porque isso é fundamental para apoiar as empresas que têm esta atividade virada para este território.

Sr. Ministro, em relação à liquidez, ao apoio à economia, e na forma de fundo perdido, se nós recuperarmos

as palavras do Ministro da Economia, quando diz que fundo perdido de hoje são impostos de amanhã, diria que

não podia haver maior contradição com aquilo que oiço dizer que o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa, faz

quando vai a Bruxelas e pede apoio a fundo perdido para Portugal. Parece que o Governo quer que as empresas

e as famílias se endividem, mas o Governo não se pode endividar. Portanto, vamos falar a uma única voz: nós

precisamos que o Fundo de Recuperação vindo da Europa, que o dinheiro que poderemos ter para apoiar a

nossa economia possa vir a fundo perdido, Sr. Ministro, e que seja célere. A falta de liquidez, hoje, será um

problema maior, amanhã. A falta de liquidez, hoje, poderá fazer com que os trabalhadores e as empresas,

quando a economia abrir, não tenham capacidade para abrir portas. Portanto, Sr. Ministro, se estamos à espera

que esse dinheiro, esse apoio venha por via do Conselho Europeu e daquilo que vai ser distribuído pelo

Conselho Europeu, quando é que acha que vai cá chegar? Vai chegar a tempo? Acha que vamos ter esses

instrumentos?

Sr. Ministro, o tempo é precioso. Os craques da economia, os verdadeiros craques, não podem esperar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, ultrapassou largamente o seu tempo, mas, como desconta no tempo do

seu grupo parlamentar, não há problema.

Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Miguel Costa Matos, do PS.

O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, depois de três anos de

convergência, deparamo-nos agora com um tempo excecional. Em breve, esta Assembleia apreciará um

Orçamento suplementar e as particularidades deste Programa de Estabilidade e deste Programa Nacional de

Reformas são fundamentais para, sem gerar ruído, afirmar as grandes linhas políticas de prioridade no combate

à crise.

Este Programa de Estabilidade e este Programa Nacional de Reformas fazem as previsões possíveis, num

contexto de incerteza, mas, no essencial, falam-nos das medidas que, em boa hora, protegeram o emprego e o

rendimento. É que, com tantos portugueses a verem a sua vida em suspenso, este revela-se um verdadeiro

programa de verdadeira estabilidade e de reformas justas nas várias camadas de segurança que dá às famílias

e às empresas.

Se é justo reconhecer a enorme resiliência e versatilidade inovadora das nossas empresas, é também

necessário e justo um compromisso com as micro, pequenas e médias empresas nas quais se organiza tanta

da nossa vida em comunidade.

Saudamos este Programa porque tem bem presente o custo social que teria se falhássemos alguns destes

compromissos. Mas também o saudamos porque dá a prioridade certa ao investimento público, à

descarbonização e ao combate às desigualdades e ao reforço do Estado social, que foi determinante para o

sucesso dos países na luta contra esta pandemia.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, pergunto, então, quais seriam as consequências

se alguns aqui recusassem que as políticas contracíclicas pudessem ter o seu caminho. Pergunto se, em vez

de termos um pograma de estabilidade social, de fomento económico e de ação climática, tivéssemos um

regresso aos programas de instabilidade, de austeridade, da privatização e da emigração.

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Sr. Presidente, Sr. Ministro, segundo o reputado think-tank Bruegel, em 10 países europeus analisados,

Portugal é o segundo que tem maior estímulo fiscal e o terceiro que mais adia impostos. Pergunto, pois: quando

a oposição nos fala de medidas já tomadas, e nos distrai com o Novo Banco, é tudo «dor de cotovelo»?

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr. Ministro do

Planeamento, no Programa de Estabilidade, o Governo refere a atribuição de 226 milhões e 500 mil euros para

um programa de digitalização, referente a equipamentos e apoio ao teletrabalho e tele-educação.

O PAN considera positivo a previsão desta verba, tendo em conta que, segundo o Instituto Nacional de

Estatística, só no ensino básico pelo menos 50 000 alunos não têm acesso a computador ou à internet, e esta

verba permite-nos começar a colmatar esta falha.

Contudo, é preciso aqui lembrar que, para se fazer uma transição digital séria na educação, é necessário

também, entre outras coisas, assegurar uma uniformização do software de gestão das escolas — já que cada

uma usa aplicações diferentes —, garantir o acesso remoto a essas aplicações, garantir sistemas de segurança

eficazes contra ataques cibernéticos — já que a crise sanitária aumentou grandemente estes ataques —,

assegurar uma renovação do parque de máquinas existente — que é completamente obsoleto — e ainda

assegurar uma formação, tendo em vista a necessidade de adaptação de métodos de ensino a esta transição

digital.

Relativamente a esta questão, gostava de lhe deixar duas perguntas. A primeira é a seguinte: poderá dar-

nos mais pormenores sobre o que está realmente em causa neste programa de digitalização na educação e em

que medida e com que ordem de prioridades todas estas medidas que referi estarão inseridas?

A segunda é esta: em que medida envolverá o Governo as áreas metropolitanas, as comunidades

intermunicipais e as autarquias locais neste processo?

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o

Sr. Deputado Duarte Alves.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Ministro do

Planeamento, o que se tem passado nos últimos dois meses tem revelado que nem numa situação de pandemia

com graves impactos económicos como a que estamos a viver a União Europeia consegue disfarçar a sua

natureza, que é tudo menos um projeto de solidariedade.

A única resposta concreta da União Europeia e da zona euro continua a ser a de empurrar os Estados para

mais endividamento, que depois será sujeito às mesmas regras e aos mesmos constrangimentos que levaram,

no passado, aos PEC (Programas de Estabilidade e Crescimento) e aos programas da troica, de má memória

para os portugueses.

Perante isto, perante este autêntico falhanço das instituições do euro e da União Europeia, o Governo insiste

em sujeitar as opções do País ao chamado «visto prévio de Bruxelas», apresentando estes dois atos de

submissão, que são o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas.

Pergunto, Sr. Ministro, se não acha que a exigência destes Programas, quando estamos no meio de uma

situação sem precedentes que exige que cada país tome opções quanto ao seu futuro, é uma prova da

inamovível burocracia e ortodoxia burocrática da União Europeia e das suas instituições e do seu total

desfasamento daquilo que são as necessidades dos Estados e dos povos da Europa.

E por que razão não se conhece o documento com as orientações da Comissão Europeia para a elaboração

dos programas de estabilidade? É confidencial? Chega a este ponto o afastamento da burocracia europeia em

relação aos cidadãos?

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Sr. Ministro, o facto é que o Governo decidiu entregar estes Programas, embora sem se comprometer com

cenários macroeconómicos, transformando estes documentos num prestar contas das medidas já tomadas no

âmbito da COVID-19.

Fala-se da competitividade nestes Programas. Mas como é que podemos querer ser competitivos, se os

apoios à economia, em Portugal, são baixíssimos, ao pé dos apoios que existem noutros Estados? Somos o

quinto país com menores apoios! A Alemanha, em percentagem do Orçamento, tem três vezes mais verbas

para apoiar a sua economia! Por cá, continuamos a não ter medidas que cheguem ao nosso tecido empresarial,

que é constituído essencialmente por micro, pequenas e médias empresas.

Pergunto-lhe se não considera que o que está em marcha é não a convergência de que falou na sua

intervenção mas, sim, um acentuar das divergências e das desigualdades entre Estados-Membros.

Pergunto-lhe, ainda, se acha que devemos ficar à espera que as soluções da União Europeia nos caiam dos

céus, ou se, pelo contrário, precisamos de, independentemente da União Europeia, ou apesar dela, responder

aos problemas nacionais e às exigências que se colocam na resposta à COVID-19, seja no reforço do SNS

(Serviço Nacional de Saúde), seja na recuperação do investimento público, da produção nacional, do emprego

e dos rendimentos, essenciais para alavancar a economia nacional.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do

Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, Sr. Ministro, a pandemia

provocada pela doença COVID-19 afetou em grande medida a saúde pública, numa crise sanitária de dimensões

nunca antes vista no nosso tempo de vida, e também afeta já a vida social e económica um pouco por todo o

mundo. Portugal não é exceção e as previsões apontam para uma queda abrupta e severa da atividade

económica para os próximos meses, com um impacto absolutamente transversal a todos os setores de atividade.

Por isso, também os documentos hoje aqui discutidos, no momento atual, não podem, obviamente, descurar

um contexto extremamente difícil em que eles são apresentados. Por isso mesmo, as respostas a esta crise

também têm de ser muito diferentes.

Dissemo-lo já em várias ocasiões: as receitas do passado não podem, de modo algum, valer para esta crise.

Não podem porque são baseadas em austeridade e tiveram já resultados comprovadamente desastrosos. E por

mais que muitos dos que hoje clamam contra a austeridade a terem implementado há alguns anos, são precisas

garantias e propostas concretas de que as soluções não irão nesse sentido.

Desse ponto de vista, a dimensão europeia da resposta à crise tem um papel fundamental, tanto para o bem

como para o mal. Tudo dependerá das escolhas políticas que sejam feitas a partir de agora.

Gostava, por isso, de lhe colocar uma questão sobre os fundos comunitários. Como é que o Governo prevê

operar a revisão dos fundos, num contexto de pandemia? Sabemos que o investimento público vai ser uma peça

essencial para a recuperação económica, pelo que as prioridades devem ser muito bem definidas e devem

responder a necessidades muito concretas das populações, como sejam a saúde e a mobilidade, mas também

a manutenção do combate às alterações climáticas.

Não é demais lembrar os debates que se tiveram, não há tanto tempo quanto isso, porque a Comissão

Europeia escolheu cortar nos fundos da coesão ou da agricultura, por exemplo. E essa opção não é mais viável

e seria incompreensível por toda a gente.

O próximo quadro financeiro plurianual tem de ser, desde já, repensado e tem de ter em conta as

necessidades urgentes decorrentes desta crise pandémica.

Por isso, pergunto ainda o seguinte: o que vai o Governo defender nesta matéria? Vai defender o aumento

dos fundos da coesão e da agricultura? Vai defender apoios diretos para auxiliar a economia, especificamente

as pequenas e médias empresas?

Outra questão que lhe tinha para colocar tem a ver com o mecanismo SURE. O Sr. Ministro já referiu várias

vezes que este mecanismo seria importante para financiar medidas de proteção do emprego, como, entre outras,

a medida do layoff. Tem sido um mecanismo muito falado por vários governantes, mas já percebemos que, à

semelhança de outras supostas soluções que têm chegado da Comissão Europeia, poderá nem sequer chegar

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a tempo para se responder agora aos problemas. Aliás, o próprio Sr. Ministro admitiu-o no dia 12 de maio, há

dois dias, ao dizer que as verbas deste programa só deveriam estar disponíveis em setembro, e mesmo isso

poderá não ser certo.

Além disso, este mecanismo tem, em nossa opinião, um problema adicional, que é este: os apoios serão

concedidos através de empréstimos aos Estados-Membros, diz-se que «em condições favoráveis», mas o que

isso significa é mais dívida a acumular. E isso nada tem a ver, parece-nos, com a pretensa solidariedade

europeia que tanto tem sido falada. O Sr. Ministro referiu aqui exatamente a solidariedade europeia, mas as

propostas que estão a ser apresentadas têm como base «dar com uma mão para tirar com a outra».

Assim sendo, pergunto: não considera o Governo pugnar por programas e mecanismos de apoio que sejam

baseados em apoios diretos, já que há capacidade para o fazer? É que o que não tem havido é opção política.

Daí perguntar-lhe qual vai ser a opção deste Governo relativamente a isso.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Nuno Fazenda, do Grupo

Parlamentar do PS.

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Portugal registou,

nos últimos quatro anos, um crescimento acima da média da União Europeia, tendo alcançado resultados

históricos no investimento e nas exportações. Esses resultados devem-se às empresas, às instituições, mas

também a políticas públicas adequadas e ao apoio dos fundos comunitários.

Entretanto, por força da COVID-19, a trajetória de crescimento da economia portuguesa foi interrompida e,

para fazer face à COVID-19 e retomar o crescimento, Sr. Ministro do Planeamento, os fundos comunitários são

essenciais.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Entre as várias medidas que foram tomadas no âmbito da COVID-19, o

Governo procedeu à adaptação do Portugal 2020, tendo dado resposta em três áreas-chave.

Em primeiro lugar, deu resposta a milhares de promotores com projetos aprovados, através da aceleração

de pagamentos. Entre março e abril, o Portugal 2020 pagou mais de 500 milhões de euros. Só o pagamento às

empresas representou quase o dobro do que foi pago em período homólogo.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Tudo isto, com pessoas em teletrabalho, com um empenho muito grande das

equipas. E, por isso, não queria também deixar de saudar todos os trabalhadores, todos os quadros que

trabalham nas entidades gestoras dos fundos comunitários, pelo trabalho excecional que têm desenvolvido para

fazer chegar dinheiro às empresas.

Em segundo lugar, para além da aceleração dos pagamentos, o Governo suspendeu, de forma unilateral e

universal, por um ano, o pagamento das prestações dos reembolsos, por parte das empresas, aos programas

comunitários. Só em março e abril, as empresas deixaram de pagar 71 milhões de euros, o que lhes permitiu,

assim, uma maior liquidez.

Tudo isto, sem burocracia e necessidade de justificações, por parte dos promotores, perante as autoridades

de gestão ou organismos intermédios.

Em terceiro lugar, o Governo deu resposta à necessidade de apoiar, a fundo perdido, projetos essenciais no

combate à COVID-19, nomeadamente de testes, ventiladores, equipamentos de proteção individual e também

para investigação científica, e assegurou ainda o financiamento a projetos de cariz social.

Tendo sido importante esta ação no imediato, há, no entanto, ainda desafios a que urge dar resposta e que

subsistem, uns de natureza conjuntural, outros de natureza estrutural.

Por isso, Sr. Ministro do Planeamento, deixo-lhe duas questões. Primeira: pode informar-nos para quando

está prevista a abertura dos novos concursos para apoio, a fundo perdido, às microempresas, por forma a que

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estas adaptem as suas atividades e os seus estabelecimentos às exigências da COVID-19? Esta é uma questão

muito importante para as microempresas.

Segunda, e última questão: sendo a transição digital uma prioridade do Governo, será ainda com este quadro

comunitário que as escolas portuguesas serão mais digitais? Teremos mais computadores e mais manuais

digitais ao dispor dos alunos das nossas escolas?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Ministro do Planeamento para responder,

queria só informar que já estão registados 141 Sr.as e Srs. Deputados, para efeitos de quórum de votação. Tirem

as conclusões deste número!

Agora, sim, para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento, Nelson de Souza.

O Sr. Ministro do Planeamento: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as questões colocadas. Vou

tentar ser conciso nas respostas e responder à maior parte das questões.

Sr. Deputado Nuno Carvalho, seja bem-vindo à promoção do investimento público.

Aplausos do PS.

Já que reforçou as necessidades de o Estado reduzir custos de contexto e investir na saúde, estamos

plenamente de acordo. Os custos de contexto, de facto, são e continuarão a ser, sempre, um esforço

permanente para criar condições para que as empresas encontrem circunstâncias favoráveis para o

investimento, e estamos de braço dado nesta matéria.

O investimento na área da saúde, que foi realizado nos últimos anos, deu os resultados que obtivemos nesta

crise pandémica. Aquilo que fizemos e vamos continuar a fazer, certamente, é continuar esse esforço e,

porventura, até reforçá-lo, mas tivemos uma boa prova da resiliência do nosso sistema de saúde, testado com

esta enorme prova a que foi sujeito e a que tão bem resistiu.

Vamos continuar a promover o investimento público não só para satisfazer necessidades coletivas, mas,

como todos sabemos, como um instrumento fundamental para animar a economia e obter, entre outros efeitos,

dinamização da procura, que, em último caso, também aproveita ao setor privado. Aliás, é completamente

errado, nestes tempos de crise e de relançamento da economia, ter estas vistas curtas, perdoe-me a expressão,

de separar interesses privados e interesses públicos…

O Sr. André Ventura (CH): — É verdade!

O Sr. Ministro do Planeamento: — … e não perceber que uma gestão global da economia pode ter

resultados globais de crescimento dinâmico no total da procura agregada.

Relativamente às questões de seguros de crédito, sabemos que estão em curso alterações, em resposta às

necessidades que nos foram mais recentemente sinalizadas pelos setores, as quais estão a ser tratadas pelo

Ministério da Economia, em conjunto com o Ministério das Finanças.

No que se refere às questões do fundo perdido, naturalmente, estamos a lutar para que, no plano de

recuperação, a maior parte do apoio venha com essa natureza, e não através de empréstimos ou de

instrumentos financeiros de outra natureza, de modo a que se possam atribuir apoios a fundo perdido às

empresas, nomeadamente em matéria de investimento. É precisamente por essa razão que nos batemos por

esse objetivo em Bruxelas e nos debates que, sobre essa matéria, se travam.

Sr. Deputado André Silva, estamos, neste momento, a preparar e a discutir a iniciativa relativa à questão do

ensino à distância, da digitalização das escolas. Temos tido reuniões semanais quer quanto à procura de

financiamento, quer, sobretudo, quanto aos detalhes de que falou e relativamente aos quais tem toda a razão,

pois temos de procurar soluções que respondam aos problemas que foram detetados nesta experiência de

ensino à distância e que, naturalmente, têm de ser corrigidos. Mas também tenho de lhe dizer que nos preocupa,

muito em particular, resolver os problemas de marginalização, de falta de acesso a esse sistema, por questões

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de recursos económicos de pessoas e famílias ou até por questões de localização em territórios de baixa

densidade não cobertos por redes de dados e de sistemas.

Passando, rapidamente, a outras questões, Sr. Deputado Duarte Alves, sabemos que, em matéria de opções

de integração europeia, não estamos de acordo em alguns aspetos, mas também podemos partilhar de algumas

dúvidas sobre a oportunidade de conduzir ou prosseguir este processo do Semestre Europeu rigorosamente

nos mesmos termos em que seria conduzido noutras circunstâncias.

Relativamente a questões colocadas por outros Srs. Deputados, e já que me falta tempo para poder reservar

o espaço de tempo próprio de intervenção do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, queria referir que partilho

inteiramente do posicionamento quanto às preocupações de preservar os fundos de coesão e da política agrícola

comum, no âmbito do quadro financeiro plurianual. Vamos estar atentos para que, nesta discussão mais

globalizada do quadro financeiro e do plano de recuperação, a política de coesão e a política agrícola comum,

particularmente o segundo pilar desta última, não saiam, uma vez mais, desfavorecidas; pelo contrário, vamos

estar atentos para que, no seu conjunto e de uma forma integrada, sejam acrescidas, até em função do valor

estratégico que demonstraram, como instrumento de resposta, no quadro da resposta à crise que a própria

Comissão Europeia apresentou e implementou. Portanto, estamos inteiramente de acordo, assim faremos, e já

o temos feito, nas discussões que estão em curso.

Quanto à questão dos timings de decisão, naturalmente, precisamos de bons instrumentos, de bom desenho

dos instrumentos, mas, de facto, também temos pressa, temos urgência na resposta, até porque os problemas

já ocorreram e estão a ocorrer e as necessidades de financiamento já existiram e ainda existem. Porém, a

urgência na resposta não se compadece, de facto, com a complexidade da montagem que também temos de

reconhecer que existe por parte da Comissão Europeia. E temos de perceber ainda que a solução final tem de

ser objeto de consenso e, mais do que de consenso, de acordo unânime por parte de um coletivo composto por

27 Estados-Membros. Portanto, é esta questão que nos leva, muitas vezes, a não tomar posições que possam,

mais tarde, inviabilizar, de todo, as nossas pretensões. É assim, sempre foi, no espaço europeu e nas

discussões, sobretudo em relação a estes temas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão, do Grupo

Parlamentar do PSD.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Inesperadamente e em plena pandemia, o País vive um problema, aparentemente recente, que nos deve obrigar

a exigir sentido de responsabilidade e maturidade. Isto porque a situação grave que o País atravessa não se

compadece com estranhas «crises políticas». A última coisa de que precisamos é que quem hoje tem a

responsabilidade política não esteja à altura do dramático momento que os portugueses vivem.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD não ignora, nem podia

ignorar, as condições absolutamente anormais em que este Programa de Estabilidade foi elaborado e é

apresentado. Sem projeções nem quadros macroeconómicos, resume-se ao impacto das medidas.

Encontramo-nos hoje, aqui, a tentar discutir a normalidade, em circunstâncias absolutamente anormais.

Hoje, falamos aqui de estabilidade, da criação de bases para o desenvolvimento e crescimento económicos,

mas estamos a fazê-lo sob um Estado inevitavelmente fragilizado, uma economia enfraquecida, um conjunto de

cidadãos debilitados, muitos deles em condições verdadeiramente preocupantes, e que está a deixar marcas, e

marcas profundas, muitas delas vividas na sombra.

Veja-se o caso do aumento da violência doméstica, que se estima que tenha aumentado, em média, 60%. O

Estado, neste período, demitiu-se de qualquer papel dissuasor dessas práticas criminosas, suspendendo todos

os mecanismos de vigilância e proteção e não considerando este controlo como uma primeira necessidade, que

deveria ter sido englobada nos serviços mínimos.

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Veja-se a situação dos nossos idosos, negligenciados na voragem da epidemia e fechados por tempo

indeterminado no silêncio dos lares, quando se deu por eles.

Veja-se o caso da proteção das crianças, quando ainda ontem fomos alertados pelo Comité Português para

a UNICEF (United Nations Children's Fund), dizendo que, e cito, «milhares de crianças portuguesas sinalizadas

como estando em risco ou em perigo não foram presencialmente acompanhadas no decurso do confinamento».

Veja-se, ainda, o facto de a DECO, entre 18 de março e 11 de maio, ter recebido 3600 pedidos de ajuda por

parte de famílias em dificuldades financeiras, sendo que no topo das preocupações não está a prestação do

crédito à habitação, Sr.as e Srs. Deputados, mas, sim, a falta de dinheiro para comprar «coisas básicas», como

a alimentação, ou para pagar as contas da água, da luz ou do gás.

Ultrapassado — assim esperamos — o período de maior alarme a nível de saúde, é tempo de nos focarmos

na economia, mas, acima de tudo, de nos focarmos nas pessoas. É tempo de construir sem manobras de

propaganda, nem agendas partidárias.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Estes são os tempos em que o Estado e a governação não podem falhar,

sob pena de vermos instalar-se entre nós um manto de miséria que atingirá cada vez mais pessoas.

Atente-se na deterioração contínua e a um ritmo sem precedentes do mercado de trabalho, com 1900 novos

desempregados inscritos por dia, com mais de 600 empresas em layoff por dia, envolvendo mais de 4500

trabalhadores. Todos os apoios sociais têm de ser acionados para evitar o pior, que seria juntar, a uma crise

pandémica, a rutura da economia e o falhanço do sistema de apoio social. Temos de evitar que isto aconteça!

Além do Estado, há o apoio indispensável de organizações como as IPSS (instituições particulares de

solidariedade social), as misericórdias, a Caritas, o Banco Alimentar e outras que, em articulação solidária com

a sociedade civil, têm multiplicado iniciativas como nunca antes se viu, avançando muitas vezes antes, ou em

substituição, das entidades oficiais. Estas, muito e bem, têm alertado o Governo e as entidades oficiais para os

atrasos, para a burocracia desnecessária, para a ineficácia e, principalmente, para a preocupação marginal com

que os problemas das pessoas têm vindo a ser encarados.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Que melhor exemplo há do que o layoff, quando tomamos

conhecimento de que 30% das empresas não receberam qualquer apoio até à semana passada? Na segurança

social, é preciso dizer «basta»! Basta de desculpas para a ineficiência, basta de falhas técnicas que hipotecam

a vida de milhares de portugueses, basta de incerteza.

É tempo de reconstruir com noção das deficiências do passado. É tempo de refazer o que estava mal. Bem

sabemos que o Serviço Nacional de Saúde foi uma das principais vítimas da política de desinvestimento público

que caracterizou os últimos quatro anos. Não basta anunciar medidas, é preciso saber concretizá-las em tempo

útil e com resultados, sem falhas técnicas, sem burocracias desnecessárias, sem desculpas!

Todos os dias vamos conhecendo cenários dantescos de famílias, muitas delas de classe média e que

conseguiam viver de forma sustentada, que a crise empurrou para a miséria. Para isso, deve o Governo avançar

com um programa de emergência social baseado na equidade, na justiça social, no reequilíbrio das contas

públicas, mas, sobretudo, na salvaguarda dos rendimentos das famílias e na recuperação do tecido empresarial

português.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — O Governo tem o dever de não falhar aos portugueses e, por isso, este

programa de emergência social deve, em tempo útil, apresentar a identificação, a quantificação e o calendário

de execução de um conjunto de medidas concretas que possam minimizar o impacto da crise social que Portugal

está a viver.

Não queria terminar sem uma palavra para as autarquias, para os municípios e para as freguesias e para o

papel de ajuda de proximidade crucial que desempenharam nesta fase. Muitas vezes, foi o poder local que se

substituiu ao poder central na proteção de pessoas e bens. Foram as autarquias, as freguesias e os municípios

que permitiram que o Estado falhasse um pouco menos aos cidadãos nesta fase mais crítica.

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O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É verdade!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — E não podemos, de modo algum, ignorar o trabalho atento, dedicado e

notável que foi feito e assumido pelos Governos Regionais da Madeira e dos Açores, que souberam controlar

os efeitos da pandemia, que, como se sabe, poderia ter tido, naquelas regiões, efeitos ainda mais devastadores.

Todos temos de fazer parte da mudança e da reconstrução.

Termino, usando palavras sábias do Presidente da Coreia do Sul: «isto não acaba até acabar».

Risos do PS e do PCP.

Mantenhamo-nos, por isso, atentos ao outro e, principalmente, disponíveis para a ajuda, conscientes de que

o ajudado poderia ser qualquer um de nós.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se a Sr.ª Deputada Vera Braz, do PS.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Vera Braz (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr. Deputado Fernando

Negrão, é com algum espanto que oiço a sua intervenção e que o oiço referir que as medidas que têm vindo a

ser implementadas parece que não estão a ir ao encontro das suas expectativas. Porquê?

Ainda ontem, na audição que tivemos com o Sr. Ministro das Finanças sobre o Programa de Estabilidade, o

Deputado do PSD, relativamente às medidas concretas que têm vindo a ser adotadas, referiu que, e passo a

citar, «na essência daquilo que foi conhecido até agora, podemos divergir em alguns aspetos, mas na base, no

princípio, estamos de acordo». Parece que temos aqui alguma divisão quanto à visão das medidas que têm sido

implementadas pelo Governo no combate a esta pandemia.

Aplausos do PS.

Estamos de acordo quanto ao facto de ter de haver um plano de recuperação futuro, um plano económico

em que, tal como se refere no projeto que o PSD apresenta hoje relativamente ao Programa de Estabilidade —

que, no fundo, concorda com o que o Partido Socialista entende —, deve haver uma ação coordenada e conjunta

no seio da União Europeia, ou seja, temos um mercado único, livre de circulação e é importante que não se

esqueçam que as nossas empresas e grande parte da sua produção dependem das exportações.

Portanto, Sr. Deputado, a questão que lhe deixo é a de saber se concorda, efetivamente, com as medidas

que estão a ser adotadas, que servem e têm servido não só para combater esta pandemia, como para ir ao

encontro dos impactos nefastos que esta tem causado nos cidadãos, nas nossas empresas e que servirá para

iniciar uma trajetória de crescimento que se impõe não só em Portugal, no nosso País, mas também na União

Europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, referiu que as medidas que têm vindo a

ser implementadas não terão correspondido às minhas expectativas. Deixe-me que lhe diga que as minhas

expectativas não interessam para nada, o que interessa são as expectativas dos portugueses.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

Protestos do Deputado do PS João Paulo Correia.

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O Sr. Fernando Negrão (PSD): — E as expectativas dos portugueses são, de facto, as seguintes: os

princípios são bons, o erro está na execução. Sr.ª Deputada, deixe-me que lhe diga que não é nenhuma

novidade para nós o facto de o Partido Socialista e o Governo, normalmente, executarem mal as coisas.

Aplausos do PSD.

Isso está a acontecer! Basta olharmos para as filas de pessoas à procura de alimentos. E o Governo o que

tem feito? Não tem feito nada, Sr.ª Deputada!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — É mentira!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Não temos visto que tenham feito alguma coisa.

Protestos do PS.

A sua crítica, Sr.ª Deputada, relativamente à minha intervenção, revela duas coisas. Primeiro, desabituaram-

se de ouvir críticas, e isso é mau.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Oh!…

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Segundo, confundem os princípios com a execução, com o ato de «meter

as mãos na massa», de fazer as coisas e de responder com aquilo que é preciso aos portugueses que precisam

de mais apoio e de mais ajuda.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Na

realidade, embora devêssemos discutir hoje o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas,

o que hoje estamos a discutir é o não-programa de estabilidade e o não-programa nacional de reformas, aliás

não apresentados aqui pelo Sr. Ministro das Finanças ou pelo ainda Sr. Ministro das Finanças.

Convém que tenhamos noção da gravidade do momento em que fazemos esta discussão. Estamos a viver

a pior crise provocada por uma pandemia, mas também a pior crise de há muitas décadas. A economia está

agora a lutar para abrir gradualmente. Muitos trabalhadores esforçam-se para manter os seus postos de trabalho

e muitas empresas lutam pela sua sobrevivência. A nossa concentração máxima, a concentração máxima do

País, do Governo, do Parlamento, de todos devia estar na recuperação, na retoma e na reabertura.

Na realidade, o que temos aqui com estes documentos é o Conselho das Finanças Públicas a dizer que o

Programa de Estabilidade, pura e simplesmente, não cumpre a legislação nacional e não cumpre a legislação

comunitária. O que estamos aqui a discutir não é um Programa de Estabilidade, é uma conta-relatório de

atividades e mesmo essa bastante imperfeita.

A UTAO, Unidade Técnica de Apoio Orçamental, diz expressamente que Portugal é o único país da Europa

que não divulga nem faz projeções macroeconómicas ou projeções de finanças públicas. Este organismo

independente, traduzindo, diz que o Governo não faz ideia do que vai passar-se na economia — e,

aparentemente, não quer fazer — e também não faz ideia de que forma vamos poder aplicar os recursos do

País, os recursos de todos nós, que são limitados, muito limitados. Aparentemente, está mais ocupado a discutir

outros assuntos prioritários.

O CDS não aceita nem se conforma com esta apatia e apresenta aqui um projeto feito a pensar naqueles

que estão em layoff, que já estão a receber apenas dois terços do salário, a quem a austeridade já chegou,

naqueles pequenos empresários que não sabem se vão ou não poder abrir o seu negócio, naqueles que

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perderam o seu emprego e não sabem como vão poder ir ao supermercado na semana seguinte. São eles que

têm de ser a nossa prioridade e é este o debate que devia, hoje, estar aqui a acontecer.

Por isso, o CDS não se fica pelas palavras e apresentou um projeto de resolução com três prioridades:

primeiro, retoma económica e recuperação económica; segundo, um programa de emergência social, porque

aqueles que são mais afetados pela crise não podem ficar para trás; terceiro, levantamento das medidas de

confinamento em segurança, recuperando o que está em atraso na saúde e eliminando a desigualdade digital

na educação.

A pandemia é ainda uma ameaça e a resposta europeia, vamos ser francos, é muito incerta, mas nós

podemos e devemos concentrar-nos naquilo que depende de nós e só de nós. Neste momento, temos um

Governo que oscila entre discutir a Europa ou discutir-se a si próprio, deixando para Portugal e para os

portugueses que estão a viver um momento muito difícil uma mera nota de rodapé. Perante dificuldades, o que

vemos é mais preocupações em passar culpas do que em resolver os problemas. E, quando era preciso

estarmos a discutir um Programa de Estabilidade a sério e, de facto, um programa de reformas, o que vemos é,

com toda a franqueza, um Ministro das Finanças em serviços mínimos e um Primeiro-Ministro amuado com os

contratos que ele próprio assina em nome do País.

Sr.as e Srs. Deputados, a concentração, hoje, tem de ser na recuperação, na retoma e na abertura. É nesse

sentido que o CDS apresenta não apenas palavras mas propostas concretas, que, aliás, continuaremos a

apresentar ao longo deste debate.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do Grupo

Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perante um Governo que mantém a sujeição

das opções orçamentais do País ao visto prévio de Bruxelas, mesmo numa situação como a que estamos a

viver, o PCP apresenta, em forma de projeto de resolução, as opções de uma política alternativa que dê resposta

à situação causada pela COVID-19 e que rompa com a submissão aos ditames de Bruxelas, encetando um

rumo de soberania nacional, desenvolvimento e progresso social.

Para combater os impactos do surto epidémico, o aproveitamento que dele está a ser feito e para garantir o

futuro do País, Portugal precisa de uma política que assegure o emprego, que defenda os salários e os direitos

dos trabalhadores e do povo, que reforce os serviços públicos, que promova a produção nacional e que assegure

o investimento.

Fingindo ignorar a real dimensão dos problemas económicos e sociais com que o País está confrontado, o

Governo lança a ideia da chamada «reabertura da economia», sem, contudo, responder a questões de fundo

que se colocam, designadamente os riscos de falências em massa de empresas e do colapso de setores e

fileiras económicas; a redução significativa do poder de compra da população e os seus impactos no plano social

e económico; os problemas e limitações nos serviços públicos, que impedem a resposta que seria agora

necessária; os processos de ainda maior concentração e centralização de capital, antagónicos aos interesses

nacionais.

Para o PCP, o único caminho que abre uma perspetiva de desenvolvimento sustentado, capaz de resistir a

ameaças e incertezas do futuro, é o caminho da reposição de direitos e rendimentos, é o reforço do investimento

público, dotando o País das infraestruturas de que necessita, é a dinamização do aparelho produtivo nacional,

substituindo importações por produção nacional, é o reforço dos serviços públicos, é a libertação do País do

domínio dos grupos monopolistas e a recuperação do controlo público dos setores estratégicos da economia,

opções essas que não são compatíveis com a submissão às regras da União Europeia e do euro.

Por isso, o PCP propõe medidas de curto prazo, que ao mesmo tempo assegurem perspetivas de futuro para

o País. Medidas como a proibição dos despedimentos, o pagamento dos salários por inteiro, recorrendo a um

fundo público financiado pelo Orçamento, o alargamento de apoios sociais a quem ficou sem nada de um dia

para o outro, a proteção e defesa da saúde dos milhares de trabalhadores que asseguram funções essenciais,

medidas de apoio aos agricultores e pescadores, garantindo rendimentos a quem continua a abastecer o País.

Medidas para que haja apoios que, de facto, cheguem às micro, pequenas e médias empresas, desde logo, a

criação de um fundo público de apoio à tesouraria das microempresas que não passe pela ineficaz intermediação

bancária, a recuperação do controlo público de empresas e setores estratégicos particularmente ameaçadas na

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atual situação, como é o caso da TAP, a dinamização de um forte investimento nos serviços públicos, rompendo

com o subfinanciamento, falta de pessoal, degradação e privatização.

São 64 recomendações, em diversas áreas, que colocamos ao País. Não valem pelo número, mas pelo seu

conteúdo, porque são as opções de que o País precisa para responder aos problemas atuais.

A realidade tem demonstrado que o País precisa de uma política alternativa, patriótica e de esquerda, que

rompa com as amarras e condicionamentos que impedem o nosso desenvolvimento.

É essa a opção que o PCP coloca em cima da mesa.

Em vez de continuar a obedecer a uma União Europeia que não revela qualquer interesse em responder de

forma adequada a esta nova realidade, precisamos de optar por um outro caminho para combater o vírus e

assegurar o desenvolvimento do País!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Carlos Brás, do

Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. CarlosBrás (PS): ⎯ Sr. Presidente, Sr. Deputado Duarte Alves, o PCP, por intermédio de V. Ex.ª,

traz-nos uma proposta que recomenda que se mande às favas os compromissos com a União Europeia. Ora,

este é um tempo em que é reclamada coesão no território nacional e entre os portugueses e também entre os

Estados-Membros da União Europeia.

Pertencer à União Europeia implica, obviamente, como todos sabemos, alienar algumas parcelas de

soberania, mantendo sempre a nossa identidade e defendendo sempre a solidariedade.

A defesa do interesse nacional é compatível com a moeda única e com a União Europeia e o futuro de

Portugal é defendido dentro da União Europeia e não fora dela. As opções do PEC (Pacto de Estabilidade e

Crescimento) são compatíveis, também, com esse mesmo interesse nacional e o PCP não pode reclamar nas

instâncias europeias, nomeadamente no Parlamento Europeu, subvenções e, depois, vir a este Parlamento

propor a rutura com a União Europeia.

Tem de haver alguma coerência entre as posições assumidas, fora e dentro do País. Por isso, Sr. Deputado,

só posso compreender esta proposta como sendo para consumo interno do seu partido. Mas o PCP já mostrou

que sabe fazer mais e melhor, e fazer melhor neste caso, Sr. Deputado, é dar voz ao partido, é reforçar a posição

do partido nas instâncias europeias e não tentar minar o projeto europeu.

Os nossos esforços devem ser desenvolvidos no seio da União Europeia e Portugal deve ser parte da

solução, da boa solução.

Sr. Deputado, queria que nos explicasse se o PCP defende que Portugal deve sair da União Europeia e deve

romper com os tratados europeus. É essa a questão que gostaria de ver esclarecida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Duarte Alves, do PCP.

O Sr. DuarteAlves (PCP): ⎯ Sr. Presidente, Sr. Deputado, agradeço a sua pergunta. Referiu a palavra

solidariedade, uma palavra que se ouve muito na propaganda da União Europeia, mas trata-se de uma

solidariedade propalada, que não a estamos a ver. Qualquer pessoa que olhe para a realidade europeia e para

a realidade das políticas que estão a ser aplicadas pelas instituições da União Europeia e também do euro vê

que essa solidariedade é uma miragem, não existe.

O PCP coloca como necessidade para o País romper com os mecanismos de submissão que são

determinados por estes pactos, por estes tratados que nos empurram para mais dívida para que depois essa

dívida seja sujeita aos mesmos ajustamentos do tipo troica e do tipo PEC, que o País conhece pelas piores

razões.

Como é que se explica que, no momento em que estamos atualmente, o BCE (Banco Central Europeu) possa

emprestar diretamente aos Estados e empreste aos bancos e que, depois, os Estados se financiem a juros

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superiores? Como é que se mantêm os pactos que nos vão empurrar para esses ajustamentos do tipo troica?

Como é que não há um reforço das verbas da coesão?

Perante esta realidade, o que se impõe é colocarmos em cima da mesa a rutura com esses mecanismos e

com essas imposições e, até, a necessidade de recuperamos a soberania monetária, que tanta falta faria para

dar resposta a uma situação como aquela que estamos a viver.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Silva, do Grupo

Parlamentar do PAN.

O Sr. AndréSilva (PAN): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: Todos compreendemos que a crise sanitária, social e económica causada pelo novo coronavírus

(SARS-CoV-2) trouxe alguma imprevisibilidade. Não podemos é aceitar que o Governo nos apresente uma

espécie de rascunho focado em fazer marketing político, preocupado com a política do dia a dia e sem uma

visão estratégica para a recuperação do País no pós-COVID-19.

Não podemos aceitar que FMI (Fundo Monetário Internacional), Comissão Europeia, Banco de Portugal ou

universidades consigam fazer previsões de cenários sobre a evolução da economia portuguesa, da dívida e do

défice e o Governo diga ao Parlamento e aos cidadãos que não consegue apresentar um cenário

macroeconómico.

Tal postura é única entre os países da zona euro, traduz-se numa falta de transparência orçamental sem

precedentes e desvirtua aqueles que deveriam ser os objetivos do Programa de Estabilidade e do Plano Nacional

de Reformas. Em tempos de crise, exige-se de um Governo clareza e transparência.

Em ambos os documentos salta à vista a ausência de uma visão estratégica para o País e para a recuperação

da crise económica, social e sanitária causada pelo novo coronavírus.

O que esperávamos era que o Governo, seguindo as orientações da ONU (Organização das Nações Unidas)

e das instituições da União Europeia, iria apostar numa mudança estrutural de paradigma e na construção de

uma economia ambientalmente sustentável e climaticamente neutra, que colocasse as pessoas e as suas

necessidades à frente dos interesses instalados.

Ora, o Plano Nacional de Reformas não coloca o combate às alterações climáticas como eixo central do

plano de recuperação para o pós-COVID-19 e, nas poucas linhas em que refere esse combate, esquece a

necessidade de o País se adaptar aos efeitos das alterações climáticas, que são o maior desafio da humanidade.

Este é um documento que não concretiza nem calendariza medidas, já para não falar da sua justificação à

luz de estudos que avaliem o seu valor económico e social.

Uma vez que o Governo apresentou um Plano Nacional de Reformas de faz de conta e sem as reformas de

que o País carece, o PAN traz para este debate uma proposta com uma visão clara para o País: a opção

estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento, no combate e adaptação às alterações

climáticas, na não aplicação de medidas de austeridade e em medidas de combate a interesses intocáveis.

O PAN propõe, assim, uma aposta nas energias renováveis, na eficiência energética e na redução da

pobreza energética, designadamente através de incentivos à microprodução, à produção de energia solar e ao

armazenamento das energias renováveis.

Defendemos a aposta no teletrabalho e na mobilidade sustentável, com melhoria da rede de transportes

públicos, incentivos à mobilidade ativa e apoio ao desenvolvimento de tecnologias mais limpas.

Na área da agricultura, a aposta deve ser a produção local, de proximidade, em modo biológico, com baixa

intensidade na utilização de agrotóxicos e de água.

Mas hoje não queremos deixar de enfatizar que esperamos que, neste Programa de Estabilidade, o Governo

não esteja a esconder um programa de austeridade com aumentos de impostos e com cortes dos salários e de

pensões.

Por isso, o PAN propõe que, para fazer face ao enorme aumento de despesa associado às medidas de

combate à crise económica, social e sanitária, o Governo adote opções orçamentais corajosas, que coloquem

as pessoas e o ambiente à frente de certos interesses instalados.

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Se a isenção de impostos sobre os produtos do petróleo custa ao País mais de 500 milhões de euros por

ano, o Governo que tenha a coragem de pôr fim a estes subsídios perversos.

Se a corrupção custa ao País por ano 18 mil milhões de euros, o Governo que tenha coragem de aprovar um

plano de combate à corrupção que preveja medidas eficazes e aprofunde a transparência.

Se pagamos três vezes mais do que devíamos pelas PPP (parcerias público-privadas) rodoviárias, o Governo

que tenha a coragem de renegociar estes contratos ruinosos para o País.

Se todos os anos perdemos 236 milhões de euros em impostos para a Holanda, o Governo que tenha a

coragem de, em articulação com a União Europeia, adotar mecanismos de combate ao branqueamento de

capitais e aos fenómenos de evasão e elisão fiscais assentes em paraísos fiscais.

Se, desde 2017, os buracos do Novo Banco já custaram ao País 3 mil milhões de euros, o Governo que

tenha a coragem de renegociar os empréstimos previstos para o Novo Banco, de modo a que durante a crise

sanitária não haja novas injeções.

Fontes de receita não faltam ao Governo, é apenas necessária coragem para agir.

Quando votarem a iniciativa do PAN, todos os partidos terão oportunidade de dizer de que lado estão. Se do

lado de um modelo económico extrativista e produtivista que nos trouxe à emergência climática e ao

esgotamento dos ecossistemas ou do lado do combate às alterações climáticas e pela construção de uma

economia verde. Se do lado da austeridade e dos sacrifícios para os mesmos de sempre, ou do lado do combate

aos benefícios injustificados aos setores intocáveis.

O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do Grupo

Parlamentar do PS.

O Sr. FernandoAnastácio (PS): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: O Programa de Estabilidade é apresentado num dos momentos mais graves e críticos da nossa

vida coletiva, no quadro de uma crise sanitária nunca vivida por nenhum de nós, uma crise de saúde pública

que traz a reboque uma grave crise económica e social.

Em primeiro lugar, quero deixar expresso o reconhecimento que é devido aos portugueses e às portuguesas

pela forma e pelo espírito cívico e de responsabilidade coletiva com que têm encarado e vivido este momento

particularmente difícil,…

Aplausos do PS.

… assim como uma palavra de apreço a todos aqueles que, na linha da frente, tiveram um papel determinante

no conter da propagação da pandemia. Para eles o nosso obrigado.

Sr.as e Srs. Deputados, no momento em que começamos a viver o processo de desconfinamento e de retoma

da atividade económica, ainda que num quadro de grande incerteza e de muita imprevisibilidade, o Governo

português, cumprindo as suas obrigações internas e externas, apresentou na Assembleia da República o

Programa de Estabilidade.

Este é um tempo sem paralelo, logo os modelos e as práticas não podem ser os mesmos dos tempos

normais. Por isso mesmo, seria muito útil ao debate que aqueles que têm como função fazer estudos técnicos

tivessem a humildade de reconhecer essa evidência.

Fazer previsões no presente momento, mais do que produzir informação plausível e credível, como o atual

Governo nos tem habituado — e perdoem-me aqueles que a tal se têm aventurado —, não seria mais do que

um mero exercício de adivinhação suscetível de frustrar ou condicionar a confiança dos agentes económicos.

Optou o Governo, e no nosso entender bem, por trazer à Assembleia da República um Programa de

Estabilidade focado no detalhe das medidas que têm vindo a ser tomadas no combate à pandemia em diferentes

vertentes — saúde pública, reforço do Serviço Nacional de Saúde, apoios sociais, proteção ao emprego, às

famílias e à habitação, capitalização das empresas, assim como evidencia a sua dimensão financeira e o seu

impacto orçamental.

Todos temos consciência de que o esforço financeiro é gigantesco e de que será necessário um amplo e

forte programa de relançamento da economia, o qual terá, necessariamente, de contar com a contribuição de

soluções, também elas inovadoras, geradas no quadro europeu.

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Sr.as e Srs. Deputados, os resultados da governação do Partido Socialista permitem-nos, hoje, tanto no plano

interno como externo, estar em melhores condições do que no passado recente para responder a este imenso

desafio. Os resultados no emprego, no crescimento económico, na redução da dívida pública, no equilíbrio das

contas públicas — recordo o superavit de 0,2%, tão criticado — são indicadores que sustentam de forma

inequívoca o que acabo de afirmar.

Mas detenhamo-nos no Programa de Estabilidade, que, de uma forma clara, nos dá a dimensão desse

esforço, particularmente nas medidas com impacto orçamental: em saúde pública, 500 milhões de euros; em

apoio às famílias, um impacto mensal de 141 milhões de euros; em apoio à atividade económica, 700 milhões

de euros mensais e 500 milhões de euros de uma prestação única; aproximadamente 1% do PIB, próximo dos

2000 milhões de euros.

Quanto a medidas com impacto financeiro, sem impacto orçamental, destaco as prorrogações das obrigações

fiscais, que equivalem a 3,71% do PIB, 7,8 milhões de euros; moratórias de créditos, 11,351 milhões de euros,

cerca de 5,35% do PIB; linhas de crédito com garantia do Estado; e outras medidas de apoio à liquidez, mais

de 4000 milhões de euros. Refiro ainda o Portugal 2020, os fundos europeus para reforço do investimento, que

ascendem a cerca de 1,29 milhões de euros.

Em síntese, são mais de 25 mil milhões de euros, o equivalente a 11% do PIB.

Esta realidade, bem como o seu financiamento, necessariamente imporá um orçamento suplementar. O

Governo já o afirmou, e comprometeu-se a apresentar esse orçamento durante o mês de junho.

Esse será o exercício orçamental que terá a chancela de quem já apresentou quatro Orçamentos do Estado

sem a necessidade de retificativos, e que cumpriu sempre as suas previsões orçamentais.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, este é o Programa de Estabilidade adequado e possível no momento, destinado a

elencar e a descrever o esforço que se está a fazer, a base para o orçamento suplementar, que será o

instrumento de política orçamental para responder à crise pandémica e à crise social e económica, relançando

a economia por forma a possibilitar que, no mais curto lapso de tempo possível, voltemos ao crescimento

económico e ao bem-estar social.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Cotrim de

Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e

Srs. Deputados: Este devia ser um debate sobre o Programa de Estabilidade. Mas qual Programa de

Estabilidade? Não é possível discutir um documento que, na verdade, não o é.

O Conselho das Finanças Públicas e a UTAO fazem a mesma crítica que nós: este documento não contém

informações mínimas, não tem cenários macroeconómicos ou orçamentais, não cumpre as orientações

europeias nem é transparente.

Gostava de saber como é que o Conselho de Ministros aprovou um Programa que não é mais do que uma

lista de medidas relacionadas com a COVID-19, com quase nenhuns números. Os Ministros leram, ao menos,

o documento?

Portugal vai ser o último País a entregar o programa a Bruxelas e o documento nem sequer está em

condições. Desta vez não corremos, certamente, o risco de nos acharem o bom aluno da Europa.

Quanto ao Plano Nacional de Reformas, o Governo diz que vai preparar um plano de recuperação

económica. E a pergunta é: quando?

É que planear a retoma é urgente e, por isso, já ontem o Iniciativa Liberal apresentou o seu programa de

retoma, com dezenas de medidas que bem vos podiam servir de inspiração.

A própria Comissão Europeia destaca a ausência de melhorias estruturais em várias áreas, entre elas — de

muitas! — a sustentabilidade financeira e a transparência das empresas públicas, a redução da carga

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administrativa e regulamentar que pesa sobre as empresas, a redução das restrições nas profissões altamente

regulamentadas.

Continuamos enredados em burocracia. É urgente descomplicar Portugal, mas nenhum destes documentos

nos ajudará a fazê-lo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste

debate sobre o Programa de Estabilidade e sobre o Programa Nacional de Reformas que o Governo português

decidiu apresentar à Comissão Europeia, Os Verdes começam por lembrar dois elementos que, não fazendo,

propriamente, parte do conteúdo dos documentos, não podem, ainda assim, ficar de fora desta discussão.

O primeiro elemento é para lembrar que tanto o Programa de Estabilidade como o Programa Nacional de

Reformas fazem parte de um conjunto de instrumentos que expressam, no plano formal, as submissões a que

o nosso País se continua a sujeitar perante as instituições europeias.

O segundo elemento é para lembrar que, em concreto, a decisão de aceitar essa espécie de «visto prévio»

da União Europeia face às opções e às prioridades do nosso País teve apenas o acolhimento do PS, do PSD e

do CDS-PP.

Na verdade, sempre que esta Assembleia discutiu transferências de soberania para a União Europeia, foram

essas forças políticas que disseram «sim senhor, transfira-se». E assim foi, também, em matéria de soberania

orçamental, que é, de resto, a questão-chave de qualquer povo, em termos de soberania.

Ora, na perspetiva de Os Verdes, já há muito que é tempo de se proceder a uma avaliação sobre este

conjunto de submissões, onde a União Europeia é que sabe quais as prioridades do nosso País e não os

portugueses e os seus representantes.

E, por mais voltas que se pretendam dar para fugir ao que é evidente, há, neste contexto, um dado do qual

não é possível fugir. Enquanto permanecermos sujeitos às imposições que decorrem da aplicação das regras

do euro, por mais remendos que se façam, aqui e acolá, serão sempre programas condicionados pelo exterior

e que, como vimos no passado, estão muito longe de responder aos problemas do País e dos portugueses.

Aliás, como a crise provocada pela COVID-19 está a deixar bem claro, as políticas que tiveram como pano

de fundo este «visto prévio» fizeram sempre mais parte do problema do que da solução. E fizeram mais parte

do problema não só porque representaram, como continuam a representar, sérios obstáculos ao

desenvolvimento do nosso País e dos povos da Europa em geral, mas também porque vieram acentuar as

divergências entre os próprios países da União Europeia.

A este propósito, não deixa, aliás, de ser curioso que os Estados-Membros, em plena pandemia, continuem

vinculados ao cumprimento dos calendários e dos critérios do Semestre Europeu e, simultaneamente, o

endividamento lhes seja apresentado pelas instituições europeias como o único meio para financiar o aumento

da despesa pública decorrente da pandemia e, desde logo, as despesas com a saúde.

Ainda assim, não deixamos de fazer alguns comentários sobre o conteúdo dos documentos em discussão,

em particular no que diz respeito ao Programa Nacional de Reformas.

Vejamos. No capítulo da sustentabilidade dos recursos e transição energética, o documento assume

pretender continuar os esforços de transformação da paisagem e a remuneração dos serviços dos ecossistemas

que promovam a conservação da natureza e da biodiversidade. E nós dizemos: muito bem. Só que ficamos sem

perceber onde em tão nobre propósito encaixa a construção do aeroporto do Montijo e os seus impactos nos

ecossistemas e na biodiversidade.

Logo a seguir, assinala-se a melhoria da qualidade dos solos, que promova a sua revitalização e

recuperação, nomeadamente no caso dos passivos ambientais. E nós dizemos: muito bem. Só que o Governo

continua com a lei ProSolos na gaveta e não há meio de a de lá tirar.

Por fim, o documento destaca o desenvolvimento de uma agricultura sustentável, mas o Estatuto da

Agricultura Familiar continua à espera de melhores dias para sair do papel.

Quanto ao resto, o que Os Verdes consideram essencial é proceder ao relançamento da economia de forma

justa e sustentável, que dê resposta aos desafios sociais e ambientais que temos pela frente, mas que essas

respostas tenham como farol orientador o interesse do desenvolvimento do País e o bem-estar dos portugueses

e que não sejam norteadas por imposições externas.

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Do que precisamos é de apostar na nossa produção, que é, aliás, a única forma de nos defendermos dos

fatores externos que não dominamos, mas que condicionam a economia. Sobretudo, é preciso recuperar a

nossa soberania alimentar, cuja emergência saiu reforçada perante a crise que estamos a viver.

E se é verdade que o nosso País tem todas as condições para promover um crescimento económico onde a

componente económica se agregue à componente social e ambiental, com uma atividade produtiva de qualidade

e respeitadora dos nossos recursos e património naturais, também é verdade que, enquanto estivermos sujeitos

a este nível de condicionalismos e constrangimentos da União Europeia, não haverá Programa de Estabilidade

nem haverá Programa Nacional de Reformas que promovam um crescimento verdadeiramente sustentável.

Aplausos do Deputado do PCP Duarte Alves.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de

Esquerda.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: É para

nós muito claro que o problema não é o que está no documento do Programa de Estabilidade, o problema é o

que lá falta. E devo dizer que os cenários macroeconómicos valem sempre o que valem.

A nós não nos preocupam as informações que vão ou não vão para serem validadas por Bruxelas, o que nos

preocupa é se o Governo tem uma resposta de médio e longo prazo para responder à crise que se avizinha —

e que, aliás, já está instalada —, por consequência da pandemia de COVID-19.

A ideia que o Governo tem reiterado de esperar pela confirmação da crise é uma ideia perigosa. A crise já

está confirmada e já sabemos que ela é grave, a única dúvida é saber quão grave será esta crise.

Sabemos já que não bastam as linhas de crédito, numa economia que já está endividada, não basta enviar

milhares de trabalhadores para layoff, perpetuando e normalizando os baixos salários.

É preciso estender os apoios sociais — e já! — para garantir que ninguém entra na pobreza, e por isso a

proposta do Bloco de Esquerda para um subsídio extraordinário de desemprego e de cessação de atividade.

É preciso — já! — encontrar formas de apoio para as microempresas que não acedem ao crédito, e por isso

a proposta do Bloco de Esquerda é a de um apoio direto, a fundo perdido, para manter os salários nas

microempresas.

Sabemos que, no médio prazo, nada disto chegará e bastará para recuperar a economia.

Queremos saber qual é o programa de investimentos, qual é a estratégia de longo prazo do Governo para a

recuperação económica. Não chega, para isso, dizer que se vão manter os planos de investimento que já

estavam previstos anteriormente, sabendo nós que alguns deles são desastrosos, como é o caso da construção

do novo aeroporto ou da decisão errada de construir uma linha circular de metro em Lisboa.

Vai ser preciso fazer mais, porque nada voltará a ser como era. Será preciso reconverter setores produtivos

em crise. Será preciso repensar os serviços públicos.

Qual é o novo papel da educação? Qual é o novo papel da saúde, dos cuidados dos idosos e dos doentes?

Qual é o novo papel dos serviços públicos e que investimento teremos de fazer? Qual é o papel dos setores

essenciais e como vamos controlar os setores essenciais? Como vamos alterar as regras fiscais para um mínimo

de moralidade na forma como as empresas contribuem para a recuperação do País?

Perante esta necessidade, o Governo também faz mal em dizer que quer esperar por aquilo que virá da

Europa. As regras europeias têm sido uma condicionante, uma restrição ao desenvolvimento do País, e

continuam a sê-lo. Até agora, aquilo que saiu do Eurogrupo é inútil. É de tal forma inútil para o fim da recuperação

económica que nenhum País aceita utilizar o mecanismo.

Aproveito para felicitar o Ministro das Finanças português por decidir recusar o mecanismo que foi

apresentado pelo Presidente do Eurogrupo. Fez bem em recusá-lo! Esse mecanismo seria perigoso para a

estabilidade de Portugal.

A questão que deixamos neste debate é a seguinte: para além de esperar por aquilo que há de vir, para além

de esperar pela crise que há de vir, para além de esperar pela Europa — que nunca virá e que sabemos que

não virá como se espera —, qual é a estratégia, qual é o compromisso, de médio e longo prazo, do Governo

para com o País?

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A discussão não é sobre este Programa de Estabilidade, a discussão é sobre o orçamento suplementar que

aí virá e é sobre o que virá depois desse orçamento suplementar, seja quem for o Ministro das Finanças.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, todos sabemos que

estamos perante uma crise absolutamente excecional e, portanto, seria de todo impossível que estes

documentos fossem iguais aos do passado.

Este Governo apresentou uma estratégia, tem dado uma resposta fundamental à crise para apoiar os

portugueses, e podemos congratular-nos com essa resposta, que foi essencial ao nível do Serviço Nacional de

Saúde, reconhecido internamente e internacionalmente.

Aplausos do PS.

Penso que estamos de acordo sobre isso, Sr.ª Deputada, porque o Serviço Nacional de Saúde é

absolutamente essencial para todos os portugueses. E foi este Governo, com o apoio dado em termos de

consenso neste Parlamento, que permitiu que essa resposta fosse capaz e essencial em relação a esta

pandemia.

Mas esta crise pandémica ainda não está vencida e o investimento que se fez só foi feito porque foram

poupados recursos, nomeadamente 2 mil milhões de euros em juros, resultado da boa gestão, a nível

orçamental, feita por este Governo, liderado pelo Primeiro-Ministro António Costa e pelo Ministro das Finanças

Mário Centeno. Temos de dizê-lo. As contas públicas certas permitiram este investimento, que temos de

continuar necessariamente a fazer. É isso que o Partido Socialista quer que seja feito.

Aplausos do PS.

Investiu-se nos equipamentos, nos materiais de apoio a esta pandemia e, também, nas infraestruturas a nível

hospitalar, com as quais o Governo já se comprometeu. E investiu-se também num plano apresentado para

reforçar o Serviço Nacional de Saúde, que queremos cada vez melhor.

Esse Serviço Nacional de Saúde tem dado resposta aos portugueses e tem sido elogiado, por exemplo, pela

OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) no que diz respeito à questão do Plano

Nacional de Vacinação, à questão da obstetrícia, ao facto de termos uma das mais baixas taxas de mortalidade

infantil da OCDE, às respostas inovadoras como a telessaúde, a telemedicina, respostas que não são só para

a COVID-19, mas também para as necessidades existentes que se mantiveram e que foram, de certa maneira,

descuradas, embora as necessárias tenham sido priorizadas.

Temos de prosseguir nesse movimento assistencial e estou certa de que teremos esse consenso para,

juntos, lutarmos por um melhor e mais eficaz Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Hortense Martins, as contas públicas certas

levaram a que, em 2018, quase 50% do investimento público ficasse por executar. Se, hoje, o País tem

dificuldade, por exemplo, em que possam ser cumpridas as regras sanitárias nos comboios da linha de Sintra,

agradece às contas públicas certas, que não permitiram comprar novos comboios para a linha de Sintra.

Sabemos que a resposta inicial do Governo foi importante e sabemos quão importante foi o investimento que

se fez em recursos humanos no Serviço Nacional de Saúde ao longo destes anos. Isso não está em causa. O

que está em causa é que a crise económica e social agrava-se e o Governo não pode viver das medidas iniciais

que pôs em prática.

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A questão é esta: o que é que vai ser feito agora para combater essa crise que se agrava?

É esta a pergunta que fazemos, à qual este documento não dá resposta.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Hoje, devíamos

estar a discutir que medidas vamos tomar para compensar aquele quase um terço de empresas que ainda não

receberam os apoios do layoff ou aquelas ordens profissionais que ficaram de fora dos apoios profissionais.

Este Programa não responde a isso. Ficámos surpreendidos. Como diria o Deputado João Paulo Correia,

«fomos apanhados pelas costas».

Tendo em conta aquilo que hoje é mais importante, olhamos para este Programa e vemos uma coisa: que

dele não constam os dados fundamentais. Não refere qual é a evolução da dívida pública, nem sequer a perda

de receita fiscal, o que nos leva a questionar, Sr. Ministro — e talvez possa esclarecer isso hoje a esta Câmara

e aos portugueses —, se vai, ou não, haver aumento de impostos muito em breve.

Porque não nos quis dizer qual é a perda de receita fiscal? Acredito que seja o «Ronaldo das finanças», mas

não faz milagres! Portanto, mais vale dizer a este País e a esta Câmara que impostos é que vai aumentar, se

vai aumentar alguns.

Queria terminar dizendo o seguinte: detesto ser aquele tio chato que faz perguntas desagradáveis no jantar

de Natal, mas, Sr. Ministro, no meio de uma crise destas, estarmos todos, em casa, a ver na televisão o Sr.

Ministro com o Primeiro-Ministro, o Primeiro-Ministro consigo, o Presidente da República a ligar para lá, ninguém

a atender ou a atender… Explique lá isto ao País: demitiu-se ou não se demitiu? Vai demitir-se ou não vai

demitir-se? Vai continuar ou vai para o Banco de Portugal?

Acho que a grande maioria dos portugueses quer saber se o nosso «Ronaldo das finanças» vai continuar à

frente do leme, a gerir a crise ou se se vai embora. É uma pergunta mais do que justa que, hoje, os portugueses

lhe fazem.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Almeida, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: O CDS entende que, neste momento, na ausência do Programa Nacional de Reformas e do

Programa de Estabilidade, que era o que devíamos estar a discutir, o Governo, pelo menos naquilo que nos

apresentou em substituição do Programa Nacional de Reformas e do Programa de Estabilidade, devia ter tido a

preocupação de apresentar medidas claras para o momento que vivemos e, desde logo, aquilo que o CDS

reclama desde o início desta crise, que é um verdadeiro programa de emergência social.

Já aqui o dissemos e essa é uma parte significativa do nosso projeto de resolução: como é que achamos

que a economia deve recuperar o seu ritmo e como é que o emprego deve, também, retomar o ciclo que vinha

tendo de crescimento.

Em termos de economia social, em termos de emergência social, é preciso, muito claramente, ajudar as

famílias, que, mais do que nunca, precisam de saber como conciliar a sua vida familiar, o apoio à família, o apoio

às crianças e aos idosos, com o desempenho da atividade profissional.

É preciso reativar a rede de cantinas sociais, porque, infelizmente, há gente, neste momento, a passar fome

em Portugal. É fundamental que reativemos essa rede, para que esta situação deixe de existir o mais depressa

possível.

Para os desempregados, é preciso haver um programa de formação profissional que perceba que a economia

não vai voltar a ser aquilo que era e que a reconversão profissional tem de ser uma prioridade deste programa

de emergência, para que as pessoas possam encontrar, efetivamente, emprego no futuro.

É preciso ajudar as pessoas com deficiência, pois, em situações de crise, agrava-se a sua exclusão, e as

instituições particulares de solidariedade social, que, neste contexto, quando tiveram de fazer esforços maiores

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do que aqueles que faziam, naturalmente, noutra situação, tiveram um aumento, segundo o acordo feito com o

Estado, inferior ao custo do aumento do salário mínimo.

É fundamental que este Governo assuma as suas responsabilidades. E assumir as suas responsabilidades

é não deixar ficar ninguém para trás, é aprovar e praticar um verdadeiro programa de emergência social.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada não inscrita Joacine Katar

Moreira.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes dois documentos em

análise, tanto o Programa de Estabilidade como o Programa Nacional de Reformas, mostram-nos que o

Executivo tem unicamente como objetivo cumprir o calendário do Semestre Europeu, porque ambos os

documentos apenas fazem o resumo daquelas que têm sido as medidas tomadas e votadas neste Plenário, sem

uma visão estratégica e, sobretudo, sem olhar para o futuro.

Num ambiente igual a este, de emergência sanitária, de desemprego, de despejo, de pobreza e de aumento

da vulnerabilidade de milhares de famílias, importa-nos que haja um olhar efetivo sobre o amanhã. Esse amanhã

só está resumido naquilo que o Executivo afirma ser o seu plano de recuperação económica. Então, se existe

isto, urge questionarmos: está assegurada a não aplicação de medidas de austeridade? Estão considerados

investimentos que nos ajudem a mitigar os efeitos da ação climática? Estão, igualmente, previstos investimentos

nos serviços públicos?

É que esta, sim, é uma visão estratégica, nomeadamente no que toca ao investimento no Serviço Nacional

de Saúde, que é absolutamente essencial no atual contexto de emergência.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira, do

Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Estado e das Finanças, Srs.

Secretários de Estado, Srs. Deputados: O Programa Nacional de Reformas tem, como objetivo, identificar e

ultrapassar os bloqueios do Estado. E existem bloqueios estruturais na nossa economia. Existe um excesso de

carga fiscal, um excesso de burocracia, um excesso de endividamento, e temos um País que precisa de menos

impostos, de menos papelada e de mais liquidez.

Hoje, vivemos tempos de austeridade no País. A austeridade chegou àqueles trabalhadores que estão em

regime de layoff e que perderam rendimento. A austeridade também chegou àqueles empresários que tiveram

de encerrar as suas empresas. A austeridade também chegou àqueles que estão, infelizmente, numa situação

de desemprego. Ou seja, há milhares de portugueses que vivem numa situação de austeridade.

Neste contexto, é importante perguntar-lhe, Sr. Ministro das Finanças: que ministro temos hoje no

Parlamento? Temos um ministro demissionário? Temos um ministro que apenas vai ficar no Governo até dia 15

de junho, como foi anunciado? O País e o Parlamento exigem uma resposta da parte do Sr. Ministro e do

Governo.

Sr. Ministro, esclareça, pois: está, ou não está, demissionário?

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Mário

Centeno.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Mário Centeno): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A

apresentação do Programa de Estabilidade marca, em cada ano, o Semestre Europeu, um ciclo anual que

permite aos países da União Europeia coordenar as suas políticas económicas. Mas 2020 é um ano diferente,

não porque a coordenação seja, hoje, menos importante — até pelo contrário, ela é hoje mais importante —,

mas porque Portugal, a Europa e grande parte do mundo foram assolados por uma pandemia, causadora de

enorme incerteza e instabilidade em todas as dimensões da nossa sociedade.

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Apresentámos Programas de Estabilidade entre 2016 e 2019. Em todos eles, apesar das reservas de outras

entidades, as nossas estimativas foram sempre as que mais se aproximaram da realidade. Na verdade, fomos

até ultrapassados em todos esses anos pela própria realidade. Éramos sempre, à partida, os mais otimistas e

os factos demonstraram em todos estes quatro anos as razões para este otimismo.

Aplausos do PS.

Chegámos ao final de 2019 com um dos maiores crescimentos económicos trimestrais da zona euro: 0,7%.

Fomos o País cujo crescimento mais acelerou. Pela primeira vez em democracia, atingimos um excedente

orçamental, de 0,2% do PIB.

Aplausos do PS.

A economia portuguesa evoluiu nos primeiros meses de 2020 seguindo o mesmo padrão. Os dados

conhecidos de janeiro e de fevereiro mostram uma aceleração da receita fiscal, da receita contributiva e da

generalidade dos indicadores económicos. No final de fevereiro, a taxa de desemprego tinha caído para 6,4%.

Mas, em abril, a situação foi substancialmente distinta. A profunda alteração da ação do Estado e da

sociedade tal como a conhecemos, em resultado do combate à COVID-19, está a ter um impacto massivo na

economia, no mercado de trabalho e nas contas públicas.

Sabemos que este impacto é massivo e que não tem origem na economia, nem no sistema financeiro, hoje

mais robustos e preparados, mas desconhecemos a sua intensidade e a sua extensão no tempo.

Este é, na verdade, um dos momentos mais críticos para a sociedade portuguesa das últimas décadas.

O Programa de Estabilidade que apresentamos não pretende responder a desequilíbrios macroeconómicos

ou a défices excessivos. O Programa de Estabilidade de 2020, remetido pelo Governo a esta Assembleia, é

distinto do que apresentámos anteriormente, porque o momento que vivemos é também ele distinto.

A avaliação do impacto do confinamento a que o País e o mundo foram sujeitos apenas se poderá concretizar

mais tarde.

O retorno à trajetória de crescimento económico e consolidação orçamental só será possível e sustentável

quando a crise sanitária e os seus efeitos económicos e sociais se encontrarem debelados.

O Programa de Estabilidade apresenta uma estimativa do impacto no crescimento económico das medidas

de confinamento social com base em informação setorial sobre a adesão ao regime de layoff simplificado.

Estimamos, assim, que, em média, cada 30 dias úteis de confinamento gerem um impacto negativo anual no

PIB de 6,5 pontos percentuais.

Para mitigar o impacto económico e social das medidas de controlo sanitário, o Governo tem vindo a adotar

diversas iniciativas de proteção dos trabalhadores e dos seus postos de trabalho, bem como de apoio às

empresas. Estas medidas estão orçamentadas em cerca de 2000 milhões de euros por mês — 1% do PIB de

2019, incluindo medidas com incidência única. Acrescem medidas discricionárias, com impacto financeiro, mas

sem impacto orçamental direto, de mais de 25,1 mil milhões de euros — 12,5% do PIB, incluindo o apoio à

liquidez das empresas, concessão de incentivos, moratória de créditos e de rendas e prorrogações fiscais e

contributivas.

Os dados disponíveis para março e abril demonstram bem a severidade da quebra da atividade económica

registada. Entramos, agora, no período de levantamento gradual das restrições de confinamento, que não

sabemos por quanto tempo se alargará.

Há, certamente, uma redução da atividade sem paralelo na nossa economia nas últimas décadas. Disso não

temos dúvidas.

Portugal, nos últimos quatro anos, construiu bases sólidas e ganhou uma credibilidade que nos permitem,

hoje, enfrentar melhor esta crise do que no passado.

Aplausos do PS.

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Foram quatro Orçamentos com objetivos cumpridos, a maior redução da dívida pública da área do euro em

quatro anos, uma também substancial redução da dívida do setor privado e o maior crescimento económico e

do emprego em muitas décadas.

Nos últimos quatro anos, Portugal demonstrou uma solidez das suas instituições sem paralelo no contexto

europeu. A estabilidade, previsibilidade e transparência das decisões de política económica são essenciais para

a confiança e o investimento.

Assistimos, infelizmente, a um interregno temporário do processo de crescimento económico. Não devemos

nem podemos permitir que este interregno afete o funcionamento das instituições, a estabilidade económica,

financeira e bancária de longo prazo e muito menos a estabilidade social e institucional.

Aplausos do PS.

Voltaremos, em conjunto, a conquistar o futuro, para o qual, de forma tão árdua, trabalhámos nos últimos

quatro anos, com verdade e com a responsabilidade de apresentar todas as consequências das propostas que

fazemos.

Foi assim que sempre construímos os nossos programas de estabilidade, é assim que este deve ser lido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — A Mesa regista a inscrição de seis Srs. Deputados para pedidos de esclarecimento.

Entretanto, o Sr. Ministro informou a Mesa que irá responder em conjunto.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Almeida, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Começo por cumprimentar os Srs. Ministros,

os Srs. Secretários de Estado, as Sr.as e os Srs. Deputados.

Sr. Ministro de Estado e das Finanças, nesta hora difícil, em que atravessamos uma crise sanitária e

económica provocada pela COVID-19, é fundamental que os portugueses sejam confortados com a esperança

de que o Governo de Portugal sabe o que fazer para minimizar os efeitos da crise. Os portugueses precisam de

confiar na estratégia do Governo para os ajudar a atravessar este período, e, por isso, precisam de acreditar

que o Governo tem uma boa estratégia.

A apresentação do Programa de Estabilidade deveria ser o momento de os portugueses conhecerem e

confiarem na estratégia do Governo. É, por isso, incompreensível que o Governo não tenha apresentado um

Programa de Estabilidade. O Governo apresentou um documento que faz de conta que é um Programa de

Estabilidade, mas não é, porque como diz, e muito bem, o Conselho de Finanças Públicas não contém os

elementos informativos mínimos para que possa ser considerado um verdadeiro Programa de Estabilidade.

O Governo está, assim, a faltar ao respeito aos portugueses e a esta Assembleia ao trazer para esta

discussão um documento que não respeita a Lei de Enquadramento Orçamental, nomeadamente o n.º 1 do seu

artigo 33.º, que determina que o Programa de Estabilidade é elaborado com regulamentação da União Europeia

aplicável. E sabemos hoje que as orientações da Comissão Europeia para este Programa de Estabilidade não

são aquelas que cumpre o documento que o Sr. Ministro entregou.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Como é que sabe?

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — O Sr. Ministro, ontem, não hesitou — e muito bem! — em invocar a

importância do cumprimento da lei e dos contratos para acusar o Sr. Primeiro-Ministro de ter um comportamento

irresponsável. E repare, Sr. Ministro, eu não estou a discordar de si, eu concordo com o Sr. Ministro em que a

lei e os contratos são para ser cumpridos, mas é toda a lei. Portanto, porque é que o Sr. Ministro, hoje, não

cumpriu a lei ou, melhor, não cumpriu, na sexta-feira, a Lei de Enquadramento Orçamental?

Por isso, a minha primeira pergunta é esta: porque é que o Sr. Ministro entregou um Programa de Estabilidade

de faz de conta, que contraria a Lei de Enquadramento Orçamental e contraria a regulamentação comunitária

aplicável, as orientações da Comissão Europeia?

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Depois da novela a que assistimos ontem, a resposta parece-me óbvia: o Sr. Ministro das Finanças entregou

um documento de faz de conta, porque, neste momento, o senhor só faz de conta que é Ministro.

Risos do Deputado do PSD Adão Silva.

Quero cumprimentá-lo e dar-lhe os parabéns pela retumbante vitória que teve ontem à noite sobre o Sr.

Primeiro-Ministro, e, já agora, perguntar-lhe qual foi o preço dessa vitória.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Faça perguntas sobre o Programa de Estabilidade!

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Vai ser obrigado a continuar no Governo muito mais tempo? Teve de abdicar

do Banco de Portugal em troca de outro cargo internacional? Ou, Sr. Ministro, será que, a partir de setembro,

vamos ter a oportunidade de o ter aqui, deste lado, como Deputado, e, nessa altura, teremos oportunidade de

fazermos o tal debate — já não entre candidatos a Deputados, mas sendo ambos Deputados —, que ficou

pendente da campanha eleitoral?

Sr. Ministro das Finanças, o facto de o Governo não apresentar ao País uma estratégia de finanças públicas

não faz desaparecer a restrição orçamental que limita as políticas de apoio aos portugueses e à economia

portuguesa.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Na atual conjuntura, a restrição orçamental não será o valor do défice em

2020, sobretudo se esse défice resultar da conjuntura e de medidas excecionais e transitórias. Esperemos que

não sejam medidas permanentes.

No entanto, a restrição orçamental continua. E a restrição orçamental vinculativa, em 2020, será a capacidade

de financiamento do País e do Governo. E essa capacidade de financiamento não é ilimitada e pode acontecer

que ela seja inferior às necessidades das políticas de retoma da economia e de apoio social de que o País

precisa.

É por isso que esta restrição de financiamento tem de ser aliviada com o contributo de políticas a nível da

União Europeia: primeiro, porque a pandemia da COVID-19 é o momento da História que mais justifica a

invocação dos valores da coesão e da solidariedade, que são um dos pilares fundamentais do projeto europeu;

segundo, porque a igualdade de condições de concorrência no mercado europeu está a degradar-se, já que os

auxílios de Estado são diferentes de país para país, porque também a restrição orçamental é diferente de país

para país.

Portanto, se não houver medidas a nível da União Europeia, é também o próprio mercado único — um outro

pilar fundamental da construção europeia — que está em causa.

Por isso, Sr. Ministro, pergunto-lhe que medidas o Governo vai tomar, que diligências vai efetuar junto das

instituições europeias, nomeadamente junto do Eurogrupo, para que um programa europeu de financiamento

de recuperação económica e social seja apresentado e implementado em tempo útil sem que isso ponha em

causa as contas públicas nacionais.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão,

do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.

Ministro das Finanças, como deliberadamente o Governo assume no documento que submete a esta Casa,

discutimos o Plano de Estabilidade no momento em que a única certeza é a incerteza — a incerteza de uma

realidade sem qualquer precedente comparável.

E a verdade insofismável é que vivemos hoje, ainda, na primeira das fases de desconfinamento previstas,

começando a segunda na próxima segunda-feira, sendo ainda prematuro prever como as mesmas irão evoluir.

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É difícil fazer previsões, especialmente sobre o futuro, mas, no caso, é mesmo importante que saibamos

responder com a honestidade e a verdade que a realidade impõe. Enquanto forem tão incertas, quanto são hoje,

quer a natureza, quer a dimensão e a duração das medidas sanitárias restritivas, a construção de cenários

macroeconómicos irá sempre redundar num pouco útil exercício de cartomância. E se isso é verdade para os

demais países, é-o ainda mais para países como Portugal, onde o turismo pesa significativamente no PIB, e,

por isso, estão ainda mais dependentes da velocidade da recuperação da confiança decorrente do sucesso do

combate à pandemia.

Não obstante todas essas incertezas, de resto assumidas pelo Governo no Programa de Estabilidade, quero

deixar duas questões.

O Sr. Ministro, bem como a equipa que lidera, tem a seu crédito, como referiu, a credibilidade conquistada

por quatro Orçamentos cumpridos, pela maior redução da dívida pública da área do euro nos últimos quatro

anos e pelo maior crescimento económico e de emprego, em Portugal, em muitas décadas. Foi um trabalho

notável ao serviço do País, como muito bem, ontem, em nome de toda a bancada, referiu publicamente o nosso

Vice-Presidente João Paulo Correia, palavras que subscrevo integralmente.

Daqui a um mês, o Governo irá apresentar, neste Parlamento — ontem, o Sr. Ministro confirmou-o —, um

orçamento suplementar, tornado necessário pelo inevitável aumento da despesa pública, decorrente das

medidas de apoio à economia e ao emprego. Pergunto-lhe se as projeções que hoje entende prematuras

apresentar serão apresentadas daqui a um mês, previsivelmente, com a proposta de lei de orçamento

suplementar.

Um recente estudo do Fundo Monetário Internacional interpela-nos a todos, recordando que a experiência

de todas as epidemias globais se traduziu invariavelmente, até hoje, num agravamento das desigualdades.

Citando o estudo, se as pandemias do passado servirem de guião, o custo nos segmentos mais pobres e mais

vulneráveis da sociedade irá ser pior. Pergunto se o Governo está ciente desta ameaça à nossa coesão social,

aos nossos mais pobres e vulneráveis e, sobretudo, se estão as políticas públicas deste país mobilizadas para

a combater.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É, agora, a vez de a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, colocar

pedidos de esclarecimento.

Faça favor.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, as perguntas que fiz há pouco mantêm-se.

Qual a resposta para as empresas endividadas? Qual a resposta para quem, tendo ou não apoio, entrou na

pobreza? Qual o plano de investimento e de recuperação económica? Que recursos vão ser mobilizados, para

além daquela proposta inaceitável do Eurogrupo? O que está neste documento não é suficiente, a discussão

tem de ir muito para além destas respostas do Governo.

Mas há um tema ao qual quero voltar, porque ele não é uma distração e merece ser tratado com seriedade.

Há anos que o Novo Banco apresenta prejuízos astronómicos, prejuízos que dizem respeito a uma carteira de

créditos tóxicos, que desconhecemos em pormenor e que não sabemos como está a ser gerida.

Depois de terem sido conhecidos os prejuízos astronómicos de 2018, foi pedida, pelo Governo, uma auditoria

especial para analisar esses créditos e para analisar as perdas que foram imputadas à garantia de Estado

chamada «mecanismo de capital contingente».

O Primeiro-Ministro comprometeu-se publicamente a não fazer uma nova injeção sem que essa auditoria

fosse conhecida. O compromisso foi violado pelo Ministro das Finanças e o Primeiro-Ministro pode ter voltado

atrás mas o Bloco de Esquerda não volta atrás.

Então, o que perguntamos é se a exigência de ter uma auditoria antes da injeção de mais de 850 milhões de

euros no Novo Banco é ou não razoável. A República deve ou não exigir uma auditoria antes de comprometer

dinheiro público? É ou não razoável que o País conheça como estão a ser geridas estas perdas e estes créditos?

Ou o Sr. Ministro acha que podemos confiar numa administração que se quis pagar a si própria 2 milhões de

euros em bónus?! Ou será que devemos confiar numa administração que sempre que pode carrega na conta

do Estado por conta do Fundo de Resolução?! Ou será que podemos dormir descansados com uma Comissão

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de Acompanhamento que disse nesta Assembleia da República que havia créditos a serem geridos

politicamente no Novo Banco, que não tinha capacidade para fazer acompanhamento dos créditos e que havia

gente, empresas, a ganhar dinheiro com a venda de créditos tóxicos?!

Sr. Ministro, a República tem o dever e tem o poder de saber ao pormenor como gasta cada cêntimo do

erário público e o Governo tem o dever de obedecer a essa exigência, quer ela seja legal ou moral. E, se mais

for fosse, tem o dever de responder a essa exigência porque este é o mesmo Governo que nega um subsídio

de risco a enfermeiros no momento de crise, este é o mesmo Governo que regateia apoios a recibos verdes,

este é o mesmo Governo que atrasa o investimento público e este é o mesmo Governo que impôs alterações

contratuais aos trabalhadores que estão em layoff e foram obrigados a aceitar menos do que o salário que

estava contratualizado.

Por isso, sim, este Governo tinha a obrigação de fazer uma auditoria antes de injetar 850 milhões de euros

no Novo Banco.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Há auditorias, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Esta não é uma polémica vazia, esta não é uma discussão sem sentido;

esta é uma discussão sobre a República, sobre o dever de transparência das contas, esta é uma discussão

sobre rigor, sobre como gastamos o dinheiro público, é também uma discussão sobre o significado dos

compromissos políticos;…

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não faça demagogia!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — …e esta é também uma discussão sobre o futuro da política, sobre o

futuro da economia e sobre a forma como gerimos, certamente, os recursos que são de todos nós.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Ministros: Sr. Dr. Mário Centeno,

Ministro das Finanças, a sua intervenção, pelo tom e pelo conteúdo, foi um verdadeiro testamento político.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É o quarto!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Veio aqui dizer-nos, de forma cansada, estafada,…

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Estafado está o Sr. Deputado!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … veio repetir, pela enésima segunda vez, aquilo que fez, mas já sem um

rasgo de esperança sobre o que vai fazer.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Vai dar-me essa esperança?

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Isso significa que estamos precisamente num momento especial. Estamos

num momento especial, num momento em que temos uma primavera escondida, em que temos uma pandemia

por todo o lado, em que temos uma economia em recessão, em que temos uma crise social gravíssima, em que

temos um Programa de Estabilidade que todos já percebemos que o não é, e em que temos um Ministro das

Finanças que também só o é formalmente porque está a prazo nessas funções.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Estamos todos! O Sr. Deputado também!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E porquê? Vou dizer: porque falta o essencial. Falta o essencial, falta dizer

onde estamos e aí é que os portugueses sabem onde é que estamos. O PSD sabe onde estamos,…

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sabe?

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … porque estamos num momento grave, com as empresas a viverem os

momentos mais difíceis que, porventura, já ultrapassaram nas últimas décadas e com as famílias cada vez mais

carentes e a mergulhar numa crise social como, felizmente, não há memória na nossa história.

Mas faltou o essencial, Sr. Ministro, porque faltou a estabilidade governativa. Faltou a estabilidade

governativa num momento essencial da política e da economia deste País e faltou a estabilidade política por

responsabilidade do Governo, do próprio Governo, e dos conflitos que foram criados entre o Ministro das

Finanças e o Primeiro-Ministro.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Se assim não fosse, Sr. Ministro das Finanças, não tínhamos passado os

últimos dias como passámos, com o Sr. Ministro das Finanças a criticar abertamente o Sr. Primeiro-Ministro,

com o Sr. Primeiro-Ministro a mostrar desconforto, com o Presidente da República, pelos vistos, a tomar partido

por um dos lados, e, depois, a telefonar a pedir-lhe desculpa, a si, mostrando, claramente, a confusão que está

instalada.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Você sabe? Está a falar de coisas que não sabe!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas há uma coisa que sabemos, Sr. Ministro: quando sai um comunicado,

àquelas horas, em que o Primeiro-Ministro se vê obrigado a dizer que mantém a confiança no seu ministro, isso

significa que já não a tem,…

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Você lê?!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … porque quando um Primeiro-Ministro confia na sua equipa não precisa

de vir a praça pública dizê-lo, porque isso é um ato natural da chefia do Governo. Então, o facto de o ter feito

significa que as dúvidas existiam: existiam na sociedade, existiam em si próprio e existiam no Primeiro-Ministro.

Mas, depois, sabe, há uma coisa muito interessante: deu para perceber, daquele comunicado especial, que,

nesta crise, utilizando um ditado português, o Sr. Primeiro-Ministro tem prazer em ser o último a saber. Ora, isso

significa que há aqui algo que tem de mudar na governação em Portugal, pela decência deste País e pela forma

como esta crise merece ser resolvida.

Aplausos do PSD.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Estávamos à espera dessa intervenção!

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Moreira Testa.

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: Sr. Ministro de Estado e das Finanças, permita-me que me dirija a V. Ex.ª confrontando os Srs.

Deputados Duarte Pacheco e Álvaro Almeida com o seu próprio papel.

Na verdade, os Srs. Deputados Duarte Pacheco e Álvaro Almeida estão pouco interessados em discutir as

duas razões que nos trazem a esta Câmara.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — É verdade!

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O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Por um lado, o Plano de Estabilidade, que é um documento essencial para

assegurar a motivação e as necessidades de um País que tem de responder a uma crise pandémica que assola

as populações, as empresas, o tecido económico, mas também a necessidade de nos mantermos coesos e

unidos nessa mesma resposta.

Os Srs. Deputados Duarte Pacheco e Álvaro Almeida revelaram-se, no final de contas, úteis ao seu partido,

como os outros úteis que vêm descritos nos livros, sustentando uma narrativa que encontra mais razões nos

Passos Perdidos do que, propriamente, no debate parlamentar.

Sr. Ministro das Finanças, nós, enquanto exemplo do exercício da função política, representantes de um povo

que lá está fora e que acredita nos mecanismos construídos pelo Estado como resposta efetiva e necessária

aos desafios do futuro, mas também às determinações da história — e hoje vivemos com uma —, aquilo que

temos como obrigação é saber se contribuímos ou não para o nosso futuro coletivo.

Nós, certamente, estamos aqui, nesta Câmara, reunidos para colocar questões, no exercício da nossa função

fiscalizadora do Governo, mas também como proponentes da resposta necessária para o futuro coletivo da

nossa nação.

Arrisco-me a dizer que em todas as intervenções encontramos várias possibilidades, mais ou menos

desgarradas, mas há uma coisa, Sr. Ministro, que nós, certamente, não conseguimos encontrar: a existência de

uma ideia que seja nas intervenções do PSD.

Os Srs. Deputados do PSD não se contentam em sair do estado de emergência; aquilo que o PSD deseja,

verdadeiramente, é que o estado de emergência, seja ele qual for, até pode ser o de emergência política, se

mantenha e atemorize os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, queria dizer-lhe que estamos muito

preocupados com a situação dramática pela qual o País está a passar, pela qual muitos portugueses estão a

passar neste momento, mas não estamos nada preocupados com psicodramas da relação política do Ministro

das Finanças com o Primeiro-Ministro.

Aliás, isso é o que menos preocupa seguramente os portugueses; o que preocupa os portugueses é saber

como é que vão conseguir viver até ao fim do mês, como é que vão conseguir viver nos meses seguintes e como

é que o nosso País, a nossa economia, o nosso Serviço Nacional de Saúde vão conseguir responder aos

problemas graves por que, efetivamente, o País está a passar em consequência desta pandemia.

Por isso, o que mais nos interessa discutir aqui são as prioridades nacionais de resposta às consequências

económicas, sociais e financeiras desta pandemia e o que menos nos importa discutir são documentos para

Bruxelas, e não digo para Bruxelas ler, digo para Bruxelas fingir que lê, porque, efetivamente, é com isso que

estamos confrontados.

Estamos aqui a discutir documentos exigidos por Bruxelas, pela ortodoxia financeira da União Europeia,

como se nada se passasse e isso é muito significativo da forma como a União Europeia está a fingir que

responde a este problema. Qual é a resposta da União Europeia? Estamos perante uma crise, os estados

endividem-se e, depois, nós cá estaremos para criar novas troicas, caso os estados não respeitem os limites de

endividamento. É este o problema com que estamos confrontados.

O Sr. Ministro dirá que todos sabemos das nossas divergências relativamente à União Europeia, mas, Sr.

Ministro, não é isso que nos importa discutir; o que estamos a discutir…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.

O que estamos a discutir é qual é a resposta para os problemas nacionais, pois é isso que nos interessa, é

responder aos problemas nacionais, não é responder às imposições da União Europeia.

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Pelos vistos, o Governo está mais preocupado em responder à União Europeia e nós estamos mais

preocupados em encontrar soluções para os problemas nacionais. Daí o projeto de resolução que

apresentámos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: O ponto de partida destes debates sobre o Programa de Estabilidade e sobre o Plano Nacional de

Reformas deve ser o estado como estava a nossa economia em fevereiro, nas vésperas desta pandemia da

COVID-19, porque sabemos — e é certo que alguns querem esquecer e fingir que não sabem — que tínhamos

um crescimento económico, do PIB, acima de 2%, a economia portuguesa a crescer em anos consecutivos

acima da média europeia, um superavit orçamental, o primeiro da nossa democracia pós-25 de abril, as

exportações representavam 44% do PIB e a taxa de desemprego decrescia de forma sustentada até aos 6%.

Era este o retrato da nossa economia e das nossas contas públicas.

É muito importante dizer isto por duas razões: primeiro, porque foi esta a base que permitiu ao Governo

adotar um conjunto de medidas excecionais e temporárias, que, se calhar, de outra forma não teriam sido

adotadas, para socorrer e responder às necessidades das famílias e das empresas e também da dívida

soberana; segundo, porque, se assim não fosse, hoje, a direita estaria aqui a atirar ao Governo a

responsabilidade de não ter ido mais longe nas medidas, porque o ponto de partida não era tão bom como o foi

e era em fevereiro deste ano.

Lembramo-nos do que disse o PSD no ano passado, na discussão do Programa de Estabilidade, aqui, no

Parlamento: disse que a economia em 2019 ia desacelerar, que era mentira o défice que estava previsto no

Programa de Estabilidade para 2019 e que os outros indicadores também não iriam ser cumpridos.

Ora, pela quinta vez consecutiva, o Governo cumpriu as suas metas, superou as suas metas e esse é o

grande problema, o grande flagelo para o PSD e o CDS,…

Aplausos do PS.

… que não encontram naquilo que é o principal, a prestação de contas de um Governo e de um Ministério

das Finanças, um ponto para atacar ou para fragilizar o trabalho que tem sido realizado.

Olhemos para as medidas excecionais e temporárias que foram adotadas. Há que reconhecer que o Estado

tem feito um esforço colossal não só no tempo em que tem tomado as medidas mas também no esforço

financeiro e orçamental que essas medidas representam.

O Estado central mas também as autarquias — as câmaras municipais e as freguesias — merecem essa

palavra de reconhecimento, porque têm sido parceiras essenciais do Estado central, mas também as empresas,

os empresários, os gestores e os trabalhadores, que têm feito um esforço gigante para acompanhar tudo o que

é resposta coletiva a esta pandemia, bem como as famílias, pois muitas medidas são dirigidas às famílias.

Olhemos, também, para as medidas. O layoff abrange cerca de 120 000 empresas, mais de um milhão de

trabalhadores. As linhas de crédito que estão neste momento autorizadas, para cerca de 7000 milhões de euros

com garantia do Estado, sabemos que podem crescer até 13 000 milhões de euros, esperando agora pelo plano

de recuperação.

Muitos dizem: «Bem, o Governo, o Estado, aqui, não faz qualquer esforço.» Não é verdade, porque estas

linhas de crédito têm uma carência de 12 meses e daqui a 12 meses, se alguém não pagar os empréstimos que

agora está a contrair à banca em relação a estas linhas de crédito, será o Estado a assumir 80% desse

incumprimento, executando a garantia do Estado.

Olhemos para as moratórias, quer para as famílias, no crédito à habitação, quer para as empresas. Muitas

foram as empresas que aderiram a estas medidas, dezenas de milhares de empresas.

Olhemos para os deferimentos das contribuições, dos impostos e segurança social; olhemos, também, para

o Quadro Financeiro Plurianual, com a antecipação dos pagamentos e dos reembolsos, o esforço que a máquina

do Estado está a fazer — e quero deixar aqui também uma palavra de reconhecimento e elogio a todos os

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trabalhadores do Estado, que se têm mobilizado de forma inequívoca para que estas medidas sejam postas em

prática o mais rápido possível — e olhemos para o seguro de crédito, que elevou a garantia do Estado para que

as nossas empresas possam exportar, para que os plafonds atribuídos pelas seguradoras de crédito às

exportações aumentem e deem confiança.

Olhemos agora para o plano de recuperação económica, que terá, obviamente, de ser acompanhado com

um reforço ainda maior do Estado social. As respostas sociais já estão no terreno mas têm de ser reforçadas

porque o plano de recuperação económica não quer deixar ninguém para trás. É esta certamente a grande

ambição do Governo, que é também, certamente, do Partido Socialista e pode sê-lo, certamente, de todos os

grupos parlamentares: um plano de recuperação económica que não deixe ninguém para trás, que mantenha a

aposta no investimento público, que tem crescido ano após ano, com principal destaque para o Serviço Nacional

de Saúde, mas também mantendo a aposta nos transportes públicos e na educação.

É um plano de recuperação económica que atribui estímulos às empresas, principalmente àqueles setores

que são particularmente atingidos e têm sido sacrificados por esta pandemia e para os quais estas respostas

têm de aparecer também num curto espaço de tempo, com a substituição das importações e a soberania

alimentar.

Por fim, a resposta da Europa. O Banco Central Europeu lançou uma chamada «bomba atómica» na sua

política de quantitative easing, com 750 000 milhões de euros, que sossegou os mercados, nomeadamente o

mercado de dívida soberana. Mas a Europa — o BEI (Banco Europeu de Investimento), o Mecanismo Europeu

de Estabilidade, a própria Comissão Europeia — precisa de ir mais longe, porque todas estas instituições e

entidades europeias são essenciais no financiamento do plano de recuperação económica de que precisamos

para o País.

Para terminar, Sr. Ministro, a pergunta que queria colocar-lhe é a seguinte: o que é que podemos esperar

relativamente a estas respostas, quanto à dimensão e ao seu horizonte temporal? As empresas e os

empresários que acompanham este debate gostariam, certamente, de obter respostas mais concretas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Mário Centeno.

Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o PSD veio para este debate

e para as questões que colocou ao Governo sem alternativas, sem ideias, na verdade, de mãos a abanar.

O Sr. Deputado Álvaro Almeida, provavelmente, chegou aqui nesse estado dado o preço que pagou para

estar sentado nessa bancada, mas para o desempenho de faz-de-conta que fez espero que tenha pago um

preço baixo, porque senão foi enganado ou está a enganar-nos. Sr. Deputado, tem de dizer-nos primeiro qual

foi o preço que pagou para estar aí sentado, antes de lhe darmos qualquer resposta.

Protestos do PSD.

Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, este Programa de Estabilidade é um programa adaptado às condições

atuais da economia e ao que foi pedido pela Comissão Europeia, em termos informativos, aos países.

Há, e houve, diferentes estratégias por parte dos diferentes países. Portugal adotou uma estratégia coerente

com o que fizemos ao longo dos últimos anos.

As previsões económicas devem ser credíveis, devem ser sinais de certeza, não de ruído, devem apresentar

caminhos compatíveis com as políticas e é exatamente isso que faremos — para responder à sua primeira

pergunta — quando apresentarmos aqui a proposta de lei de alteração do Orçamento do Estado, o Orçamento

do Estado suplementar, onde apresentaremos um quadro macroeconómico completo com a informação que

está em falta. E que informação está em falta? Está em falta, desde logo, a informação relativa à resposta

europeia, na qual temos de participar e em que queremos, obviamente, estar presentes.

O plano de recuperação económica é uma peça essencial para podermos preparar a nossa recuperação

económica. Esperamos, nessa altura, já ter essa informação e poder apresentar aos portugueses um plano

coerente, completo, credível e que permita evitar, por exemplo, o facto de a OCDE já ter revisto duas vezes as

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suas previsões ou de o Governo francês já ter feito três previsões económicas em outros tantos orçamentos.

Nós achámos que não é esse o papel do Governo. O papel do Governo é preparar medidas, medidas que tem

preparado e tem tomado, tem implementado, que tem levado às empresas, aos trabalhadores e às famílias.

Esses apoios têm, obviamente, um foco muito significativo nos mais desprotegidos, nos informais, nos

trabalhadores independentes, naqueles que recebem o rendimento social de inserção. Em todas estas áreas

foram implementadas medidas simplificadas, de acesso muito rápido a apoios adicionais ou novos — que não

existiam, portanto — a todas estas dimensões dos portugueses, sempre garantindo mínimos, mínimos que

permitam que estes trabalhadores e estas empresas possam responder às dificuldades das crises.

Aplausos do PS.

É, na verdade, o impacto destes mecanismos, destes instrumentos, que permitirá à economia portuguesa

recuperar e essa recuperação nalguns indicadores até já está a acontecer. Por exemplo, quando olhamos para

os indicadores de vendas no comércio a retalho, indicadores que temos com um acesso muito imediato, vemos

que, no momento mais grave da crise económica, que foi a terceira semana de março, as vendas com a

utilização de meios automáticos de pagamento tinham uma quebra de 48%; na primeira semana depois da

abertura gradual da economia essa quebra reduziu-se para 33%. Este é um caminho longo, um caminho que

tem de ser feito com confiança, um caminho que tem de ser gradual mas apoiado por todas estas medidas.

Finalmente, e respondendo a uma questão que me colocou a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, sobre o Novo

Banco, quero fazer aqui uma declaração muito rápida.

O Novo Banco é uma instituição que tem as portas abertas. O Novo Banco emprega milhares de

trabalhadores. O Novo Banco é a guarda das poupanças de milhões de portugueses e é no Novo Banco que

milhares, centenas de milhares de empresas portuguesas têm os seus créditos. Não podemos falar do Novo

Banco quando queremos falar do BES.

Uma coisa é a resolução, outra coisa é a instituição Novo Banco. Não permitirei, enquanto Ministro das

Finanças, que uma instituição bancária que tem as portas abertas possa ser prejudicada por um debate

parlamentar sem qualquer sentido. As auditorias — as várias auditorias, inspeções, verificações e comissões de

acompanhamento — antecedem qualquer injeção de capital e qualquer empréstimo do Estado ao Fundo de

Resolução. Não há nenhuma injeção de capital no Novo Banco sem auditorias. Podemos e devemos tomar

decisões com o máximo de informação disponível e é isso mesmo que fazemos, mas não há ausência de

controlo nestes processos.

Aplausos do PS.

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — É para um pedido de defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de explicar em que é que foi ofendida a sua honra.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Muito bem, Sr. Presidente.

O Sr. Ministro das Finanças, em vez de responder às perguntas que lhe coloquei, em vez de explicar ao País

por que é que não cumpriu a Lei de Enquadramento Orçamental,…

O Sr. Presidente: — É melhor que vá diretamente à questão da defesa da honra. Qual é a justificação?

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Sr. Presidente, a minha questão é que o Sr. Ministro fez insinuações sobre

a minha posição aqui, como Deputado,…

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O Sr. Presidente: — Então, faça favor de exercer o direito de defesa da honra.

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Portanto, o Sr. Ministro, em vez de responder à minha questão, em vez de

esclarecer o País sobre a sua posição no Governo, em vez de explicar por que é que não cumpriu a Lei de

Enquadramento Orçamental, pôs-se a fazer insinuações sobre a forma como cheguei a Deputado. Sabe como

cheguei a Deputado, Sr. Ministro? Cheguei a Deputado porque o povo português me elegeu, contrariamente ao

senhor, que só é ministro porque foi nomeado e, portanto, depende do Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, só queria dizer ao Sr. Deputado Álvaro Almeida

que fui eleito Deputado como o senhor.

Aplausos do PS.

Felizmente, os portugueses deram mais votos à lista onde eu estava do que à lista do Sr. Deputado e é por

isso que estou aqui e o Sr. Deputado está na oposição.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, chegámos, assim, ao final da apreciação deste ponto da ordem

do dia.

Do ponto seguinte consta o debate conjunto, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) —

Estabelece medidas excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da

pandemia da doença COVID-19, e dos Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-lei n.º 10-

I/2020, de 13 de Março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença

COVID-19 no âmbito cultural e artístico, 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 12-A/2020, de 6 de Abril,

que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19, 370/XIV/1.ª (BE)

— Proteção dos direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica e 373/XIV/1.ª (N insc.)

— Estabelece medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural português, no âmbito da crise

epidemiológica.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.

A Sr.ª Presidente: — Muito boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.

Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas.

Vamos dar, então, início ao debate da Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece medidas

excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da pandemia da doença

COVID-19.

Para abrir o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura, Graça Fonseca.

Faça favor, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra da Cultura (Graça Fonseca): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta que

o Governo submete ao Parlamento e que aqui hoje discutimos altera um regime anteriormente aprovado, o

regime criado pelo Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 13 de março, que estabeleceu, no âmbito do estado de

emergência que vivíamos, regras especiais, particulares, para o reagendamento e cancelamento de eventos de

natureza cultural e artística realizados entre o dia 28 de fevereiro e 90 dias após o levantamento do estado de

emergência.

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Definia este diploma regras específicas para a prioridade aos reagendamentos — sempre que possível,

reagendar eventos culturais em vez de os cancelar — e estabelecia a regra de que, em caso de reagendamento,

não havia lugar ao reembolso mas o bilhete manter-se-ia.

Portanto, ao longo deste tempo procurámos trabalhar com todas as entidades privadas e públicas para,

nomeadamente, manter os compromissos e os pagamentos que já estavam contratualizados com entidades e

artistas.

Levantado o estado de emergência foi necessário alterar o que havia sido consagrado no Decreto-Lei n.º 10-

I/2020, pelo que o que esta proposta de lei traz de novo é, por um lado, a regra da proibição de festivais até ao

dia 30 de setembro, numa perspetiva em que, como julgo que todos sabemos, festivais e eventos análogos

consistem mais numa experiência do que num concerto ou festival de música. Por outro lado, também vem

estabelecer, no n.º 2, a possibilidade de realização de alguns eventos culturais em todo o País, desde que sejam

cumpridas regras gerais como a da necessidade de lugares marcados, mesmo que seja ao ar livre, e a da

limitação de entradas, ou seja, cumprindo as regras de distanciamento social que têm sido emitidas pela Direção-

Geral da Saúde (DGS).

A proibição é a regra, mas o que se propõe é a permissão para que, cumpridas as regras da Direção-Geral

de Segurança, que estamos a ultimar, seja possível realizar eventos culturais no País.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — As regras da Direção-Geral da Saúde!

A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sim, da Direção-Geral da Saúde, peço desculpa. São já alguns dias em

confinamento…

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Não faz mal, nós percebemos!

A Sr.ª Ministra da Cultura: — Finalmente, é também de referir a regra de emissão de vales que aqui se

estabelece. Ou seja, uma das questões que se colocou quando foi publicado o Decreto-Lei n.º 10-I/2020 foi

sobre o que sucederia ao bilhete, ou seja, quanto à proteção do direito do consumidor.

A nossa proposta de emissão de um vale pelo valor correspondente ao do bilhete proíbe que sejam cobradas

comissões e permite que quem já tenha um bilhete venha a usufruir de um vale para um festival ou evento

cultural de natureza análoga ao longo do próximo ano. Estas são as regras que trazemos e que representam

uma alteração ao regime inicial, publicado durante o estado de emergência.

Sr.as e Srs. Deputados, quero terminar com uma nota muito breve, apenas para dizer que, na perspetiva do

Governo, é muito importante conseguir criar condições para que neste verão exista e se possa realizar alguma

programação cultural no território. Este vai ser um verão atípico, como todos sabemos, e é muito importante

para a coesão territorial e para a confiança das pessoas, para a confiança de cada um de nós, sentir que existe

programação cultural. Naturalmente que terá de ser em menor escala, com menor dimensão, mas é importante

que ela exista e que possamos dar às pessoas a possibilidade de sentirem que, aos poucos, a normalidade

regressa e podemos voltar a ter confiança.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Embora a Sr.ª Ministra já não tenha tempo para responder, a Mesa

regista a inscrição do Sr. Deputado André Ventura, do Chega, para pedir esclarecimentos.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, dou 30 segundos do meu tempo à Sr.ª Ministra para que me

possa responder.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, faça favor de formular o seu pedido de esclarecimentos.

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O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, como o meu tempo é muito curto, e sei que

também tem pouco tempo, tenho de lhe perguntar sobre as exceções que vamos ter, como sabemos. E já vimos

que as exceções correram mal.

Soubemos pelo Sr. Primeiro-Ministro que, provavelmente, vamos ter uma exceção para a Festa do Avante!,

um festival do Partido Comunista Português — mas são criativos e não é um festival ou alguma coisa parecida

—, exceção que não vamos ter para os outros.

O que lhe pergunto é o seguinte: vai o Governo sujeitar-se ao mesmo espetáculo do 1.º de Maio, com todos

os portugueses em casa a criticar e com o Presidente da República a vir depois dizer que não era isto que

esperava do 1.º de Maio? É que eu não imagino ver o Sr. Presidente Marcelo Rebelo de Sousa a vir dizer —

apesar de ele já lá ter ido — que a Festa do Avante! não correu assim tão bem.

Sr.ª Ministra, convinha, portanto, esclarecer se vai ou não haver exceção para a Festa do Avante! nesta

matéria.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.

A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, pelo que sei, deu entrada nesta Câmara uma

proposta do Chega nesse sentido. Aguardarei pela votação que aqui for feita da proposta que o Governo

apresenta.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar os Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) — Altera o

Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 13 de março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à

pandemia da doença COVID-19 no âmbito cultural e artístico e 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 12-

A/2020, de 6 de abril, que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença

COVID-19, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Verifica-se que, para além de ter sido dos primeiros a parar e de, provavelmente, ser um dos últimos a voltar à

normalidade depois desta crise sanitária, o setor da cultura também é dos últimos a receber qualquer tipo de

apoio. De resto, infelizmente, não há surpresa nessa circunstância, já que os sucessivos governos têm tratado

sempre a cultura como o parente pobre, limitando-se a manter estável a precariedade associada ao setor.

Dada a sua já conhecida fragilidade, a COVID-19 teve, consequentemente, um impacto brutal na cultura, nas

suas diversas manifestações. No caso dos espetáculos, a impossibilidade de agendamento num futuro próximo

deixa todos os profissionais deste setor numa situação de enorme insegurança. Veja-se o exemplo da música,

em que a esmagadora maioria dos rendimentos decorre de espetáculos ao vivo e cuja época de concertos e

festivais se iniciaria agora. Este período representa um balão de oxigénio para o setor, depois do outono e do

inverno, épocas em que, tipicamente, o trabalho escasseia.

Face às atuais condicionantes, o que se antevê é que a seguir aos meses de escassez se somem meses de

uma escassez maior ainda. Consequentemente, pretende-se que exista uma previsão específica, um apoio

extraordinário para fazer face à redução da atividade económica, direcionada concretamente para os artistas e

profissionais do espetáculo.

Creio que todos nós antevemos que a situação de precariedade se prolongará para além dos meses para os

quais a atual Lei prevê apoio para os profissionais liberais em geral. Assim, propomos que esse apoio deva

prolongar-se até março de 2021.

Por outro lado, importa acautelar a situação dos agentes culturais que se encontrem na posição de sócios-

gerentes, uma vez que, dada a especificidade da sua função, dificilmente terão acesso ao layoff.

No que respeita aos espetáculos que já estavam agendados, importa alterar o Decreto-Lei n.º 10-I/2020, no

sentido de as entidades públicas promotoras poderem escolher entre cancelar ou reagendar — salvo nos casos

em não seja possível fazê-lo —, sendo que no caso do cancelamento tenham de cumprir sempre com o

pagamento dos serviços contratados, até porque se tratavam de valores já orçamentados.

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Para além disso, a agenda de um artista e toda a organização associada aos espetáculos carece de uma

determinada antecedência, pelo que se propõe que, após o termo do estado de emergência e durante os 90

dias seguintes, as entidades públicas promotoras indiquem a data para a qual pretendem o reagendamento.

De resto, a proposta de lei em debate continua sem responder a estas questões e, para além disso, gera

dúvidas quanto a outros pontos. Esta proposta determina, por exemplo, a proibição da ocorrência de festivais

ou atividades similares até 30 de setembro, mas não contém qualquer definição de festival, deixando dúvidas

relativamente a quais os espetáculos abrangidos, ou não, pelo princípio da proibição, nomeadamente a dúvida

sobre se haverá, ou não, lugar à Festa do Avante!. E, não, não estou a falar de restringir a atividade política,

estou a falar de tudo o que acontece na Festa do Avante! para além disso.

A proposta do Governo possibilita ajuntamentos de 200 pessoas e, ao mesmo tempo, autoriza a que um

promotor que tenha agendado uma festa para um recinto com lotação máxima para 100 ou 150 pessoas possa,

livremente, cancelar ou adiar esse evento. Mas se houver condições para a realização do espetáculo porquê

dar a possibilidade do cancelamento?

De resto, temos de dizer que todas as medidas para o setor da cultura se demonstram manifestamente

insuficientes face às necessidades. Veja-se o caso da Linha de Apoio de Emergência ao Setor das Artes, à qual

foi atribuída uma verba de apenas 1 milhão de euros, reforçada agora com 700 000 €. Segundo o Ministério da

Cultura, foram recebidos 1025 pedidos, dos quais 389 não foram considerados elegíveis, 311 projetos foram

apoiados e, embora elegíveis, 325 não tiveram qualquer apoio por falta de verba.

Importa dizer que a cultura não são só os espetáculos e que não são só os músicos e os atores que estão

com dificuldades. Importa olhar para a cultura nas suas várias manifestações, olhar para as suas pessoas e

construir uma resposta séria às necessidades do setor.

Para terminar, quando foi solicitado a Winston Churchill que cortasse o financiamento das artes para colmatar

os custos da guerra, ele simplesmente respondeu: «Então, para que é que estamos a lutar?»

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 370/XIV/1.ª (BE) — Proteção dos

direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica, tem a palavra a Sr.ª Deputada Beatriz

Dias.

A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da

Cultura, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do

Património Cultural: Em média, por cada espetáculo cancelado ficaram sem rendimento 18 artistas envolvidos,

mais de um profissional de produção e mais de dois técnicos. Os números são de um inquérito lançado pela

GDA (Gestão dos Direitos dos Artistas), durante o mês de março.

Um outro inquérito, realizado pelo CENA-STE (Sindicato dos Trabalhadores dos Espetáculos, do Audiovisual

e dos Músicos), revela que 98% dos trabalhadores tiveram trabalho cancelado por causa das medidas restritivas

para conter a pandemia. Em termos financeiros, para as 1300 pessoas que responderam ao questionário, as

perdas por trabalhos cancelados representam ainda 2 milhões de euros, apenas para o período de março a

maio deste ano, o que indica a perda de um valor médio de receita, por trabalhador, de cerca de 1500 €.

Um estudo realizado pela Universidade do Minho dá conta, e cito, de que «para além das perdas imediatas

a que as medidas transversais e setoriais não estão a ser capazes de dar uma resposta cabal, no final de 2020

poderemos assistir, para além de um agudizar da precarização, a um incremento no desemprego de

profissionais do setor cultural que tinham contratos de trabalho, uma vez que as organizações do setor cultural

estimam uma redução de 45,2% nos postos de trabalho e de 78,6% no volume de negócios».

Num setor onde a precariedade laboral é a regra e as estruturas de produção são tipicamente de micro e

pequena dimensão, a desproteção dos trabalhadores é total. A inexistência de um regime de trabalho e de

proteção social específicos para o setor revela-se particularmente penalizadora neste momento de crise. Tal

como alertam os profissionais do setor, se não forem tomadas medidas urgentes, consistentes e estruturantes,

o setor cultural português poderá sofrer danos irreparáveis fruto da pandemia.

No Projeto de Lei n.º 328/XIV/1.ª, o Bloco de Esquerda apresentou um programa de emergência que

reforçava o orçamento do Ministério da Cultura em 10%, criava candidaturas simplificadas para projetos culturais

em tempos de isolamento social, aprofundava o apoio a estruturas e equipamentos culturais públicos e privados

e, sobretudo, criava mecanismos de garantia do cumprimento integral dos compromissos das entidades

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públicas, nacionais ou municipais, bem como das entidades com financiamento público que cancelaram ou

adiaram espetáculos, serviços educativos e outras atividades culturais.

Foram aprovadas melhorias às medidas de emergência para o setor, nomeadamente alterações que

responsabilizam toda a cadeia de contratação. Contudo, apesar de estas alterações terem introduzido uma

pequena melhoria na proposta inicial do Governo, continuam a não responder a aspetos essenciais do setor

cultural e deixam escancarada a janela dos reagendamentos longos. Ficou de fora o reforço do financiamento e

a limitação dos reagendamentos a um prazo de 90 dias, impedindo que as entidades prorroguem prazos para

não assumirem o cancelamento e o pagamento a 100% com os custos do trabalho.

O Bloco volta a apresentar propostas sobre este diploma e a insistir nas seguintes regras, que nos parecem

essenciais: os cancelamentos devem ser pagos a 100% do que seriam as despesas com trabalho, incluindo o

pagamento aos trabalhadores externos, independentes, assistentes de sala e trabalhadores dos serviços

educativos; os reagendamentos não podem ser pretexto para adiar metade dos pagamentos e, dessa forma, a

própria capacidade das pessoas fazerem face às suas necessidades básicas; os apoios sociais desenhados

pelo Ministério do Trabalho devem ter em conta a condição intermitente de muito do trabalho artístico e não

podem excluir, pelas suas regras fechadas, milhares de profissionais deste setor.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 373/XIV/1.ª (N insc.) — Estabelece

medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural português, no âmbito da crise epidemiológica

(texto inicial substituído a pedido da autora), tem a palavra a Sr.ª Deputada Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Enquanto nós andávamos a usufruir da arte e da cultura, no âmbito do nosso confinamento e no âmbito das

medidas sanitárias, estavam a ser despedidas e despedidos muitos profissionais da cultura, não sendo

respeitados os seus direitos.

Isto, como referi, enquanto nós estávamos em casa ou no emprego a usufruir de muito do que é o seu

esforço. E falo de esforço porque, exatamente neste ambiente de extrema ansiedade, é importante olharmos

para os artistas e os agentes culturais, enquanto referência, para nos ensinarem a relacionar-nos com o

ambiente hostil, com os mínimos apoios, com uma instabilidade enorme, com dificuldades laborais enormes, e,

ainda assim, conseguirem criar, fazer arte, contribuir para toda a sociedade, contribuir para a nossa história

nacional, contribuir para a nossa felicidade, em ambiente de dificuldades absurdas, resultantes do

desinvestimento de anos e anos de sucessivos Executivos.

Estas iniciativas legislativas — nomeadamente a minha — referem-se a medidas excecionais e temporárias

de apoio ao sistema cultural, em que o objetivo é auxiliarmos minimamente as entidades culturais que andam a

passar por enormes dificuldades, com o cancelamento e a anulação dos espetáculos, a ausência de

investimento e outros problemas.

Mas nós precisamos de entender que muitas dessas medidas excecionais — e só são excecionais porque,

infelizmente, não houve opção absolutamente nenhuma — devem ser medidas regulares, para se investir.

Finalmente, este Executivo tem a oportunidade de ouvir os artistas, de ouvir e de estar ao lado dos artistas. É

que não nos adiantaria rigorosamente nada avançarmos para a melhoria da situação sanitária e, amanhã, não

haver relatos,…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — … não haver reconhecimento desta época complicada que

estamos a viver.

Precisamos ainda de entender que cultura não é sinónimo de entretenimento, cultura é conhecimento.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa,

do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

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A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O

Governo traz hoje ao Parlamento a Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª, que impõe um princípio de proibição de

realização de festivais e outros eventos de natureza análoga até 30 de setembro de 2020.

A razão para limitar os espetáculos de música, ou outros, ao ar livre é semelhante à que aconselha não haver

ajuntamentos de pessoas em qualquer outra situação. É uma medida restritiva e gravosa, mas pensamos que

proporcional em relação ao fim público a que se destina.

Permite também aos agentes do setor mais diretamente visados a previsibilidade para as suas decisões, e

até aqui merece a nossa concordância.

Por outro lado, não ficam proibidos os espetáculos em que se possa assegurar distância, ou seja, aqueles

que têm lugares marcados, mediante a avaliação da DGS.

Para o CDS, a questão tem a ver com a utilização de conceitos indefinidos ou mal definidos, que poderão vir

a gerar discriminações e eventualmente até exceções não pretendidas.

Assim, exatamente, o que é que cabe na expressão «festivais»? Se são festivais de música, por que não

dizê-lo explicitamente? O que é que cabe na designação «espetáculos de natureza análoga»?

Não é claro e conviria ao Governo — o qual, ainda por cima, propõe um regime de proibições e de exceções

— propor definições claras e exatas, para que saibamos exatamente a quem se dirige a sua intervenção, e

conviria que não o fizesse no preâmbulo mas, sim, no articulado, onde realmente é relevante. E como esta

proposta de lei será apreciada em sede de especialidade, aí será feito o caminho necessário para a sua

clarificação.

Por último, não posso deixar de fazer uma nota em relação a um projeto de lei que também se encontra aqui

hoje em discussão, o Projeto de Lei n.º 340/XIV/1.ª, do PAN, que baixará à respetiva comissão.

O PAN atende neste projeto de lei não aos apoios às atividades artísticas mas aos apoios aos artistas. O seu

projeto trata não do espetáculo mas das pessoas que ficam sem rendimento. É por isso que é espantoso e, a

meu ver, particularmente gravoso, que exclua taxativamente o espetáculo tauromáquico. É que não se trata de

financiamentos públicos ao espetáculo. Mas, para o PAN, aparentemente, os apoios às pessoas, aos artistas

em situação precária, são de dois níveis: há os que merecem e há os que podem ficar na precariedade e sem

esses apoios.

Afinal, para o PAN, em termos de pandemia, não estamos todos unidos. O PAN bem pode até mudar o seu

nome, se assim o entender, para partido de todos os animais mas só de algumas pessoas.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosário Gambôa,

do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A

questão que nos traz aqui hoje é aquela que tem dominado os debates neste Parlamento, ou seja, a pandemia

e a necessidade de uma gestão social e económica da evolução da mesma, face ao flagelo que nos aflige e à

margem de incerteza que vamos tentando mitigar com o conhecimento que a ciência nos vai dando.

No quadro da emergência que se instalou, como já foi aqui referido, começou por existir, logo desde o início,

e foi depois consagrado nos sucessivos estados de emergência, um conjunto de orientações específicas

dirigidas aos eventos públicos e de massas sempre que estes implicavam a concentração das pessoas,

recomendando o seu cancelamento, o que acabou por ser imposto.

Ora, esta situação provocou, conforme também já foi aqui referido por vários grupos parlamentares, um

impacto absolutamente devastador no setor cultural. E quando se fala num impacto absolutamente devastador

no setor cultural, fala-se não só dos promotores dos espetáculos mas fundamentalmente de uma rede extensa

e capilar de artistas, técnicos e agentes de artistas e também de outra dimensão fundamental, como, por

exemplo, as atividades de espetro largo, como o turismo, que têm uma influência enorme nas comunidades e

no País e que ficaram de facto extremamente afetadas, assim como as cidades e os territórios ficaram impedidos

de fazer as celebrações que consagram a sua identidade e outras iniciativas que, entretanto, foram construindo,

como os festivais, que passaram a ser oportunidades.

É neste contexto que aparece esta proposta de lei e é neste contexto que se justifica o acompanhamento da

evolução da pandemia e o acompanhamento de novas fases de mitigação, tentando conciliar aquilo que é o

supremo interesse da saúde pública com, simultaneamente, interesses que têm a ver com a defesa dos artistas

e de outras pessoas associadas.

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Ora, a proposta de lei, como aqui foi referido, não só proíbe um conjunto de espetáculos como também

determina a sua exceção, exceção essa que tem a ver com a inibição dos espetáculos que não estejam

regulados pelas recomendações da Direção-Geral da Saúde.

Esta proposta de lei sublinha também uma questão importante relativamente à defesa do consumidor,

consagrando regras que têm de ficar definidas. Não obstante o contexto atual, estes direitos dos consumidores

não podem ser suprimidos.

Os eventos realizados pelas organizações políticas, Srs. Deputados, têm um estatuto especial, como todos

sabemos. Esta proposta de lei define e estabelece, contudo, os seus limites. Isto é, os referidos eventos, recordo,

só podem ter lugar em recinto coberto ou ao ar livre, com lugares marcados e no respeito pela lotação

especificamente definida pela Direção-Geral da Saúde, em função das regras de confinamento definidas.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Há assuntos que poderão, como já foi aqui referido, e deverão ser melhor densificados, em sede de

apreciação na especialidade, como, por exemplo, a aclaração de definições e a limitação de ambiguidades.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — E o Partido Socialista está disponível para analisar, rever e aceitar as

alterações.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rios de

Oliveira, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Sem prejuízo dos demais projetos de lei, neste debate vou limitar-me à apreciação da proposta de lei do

Governo, pois é a mais relevante e a mais surpreendente.

Na aparência da proibição da realização de «festivais» e de «espetáculos de natureza análoga», o Governo

opta por apresentar um diploma pouco claro, pouco objetivo e pouco competente. De tal maneira que somos

obrigados a perguntar: os três artigos/alterações propostos pretendem esclarecer ou confundir? Este diploma é

fonte de solução ou origem de novos problemas? Como deve ser interpretado?

Mais, quando se apresenta uma proibição de festivais até 30 de setembro, interrogamo-nos desde logo com

a data: 30 setembro. Se a situação está a ser monitorizada à semana e nós caminhamos para um gradual

desconfinamento, porquê este prazo tão perentório? Como definir o conceito de «festival» e, pior, como definir

o conceito de «espetáculo de natureza análoga»? Abrange quem? Exclui quem? Verdadeiramente, o Governo

quer proibir todos ou quer entreabrir a porta a alguns? Quais os limites do «cancelamento» e «reagendamento»?

Quem decide? Quais os pressupostos?

Sr.as e Srs. Deputados, vamos falar claro. O momento que vivemos é de grave compressão dos direitos

fundamentais dos portugueses, no qual estamos a impor restrições a liberdades constitucionalmente previstas

e que só uma emergência como esta justifica.

Os portugueses exigem do Governo que não haja dois pesos e duas medidas — outra vez! O povo português

assistiu — em casa e indignado — às manifestações do 1.º de Maio, realizadas à boleia de umas pretensas

orientações, que, na prática, violaram todas as regras que nos impuseram e nos empurraram para o

confinamento. E este diploma é tão indefinido e vago que parece propositado!

Srs. Deputados, existe, neste momento, um elefante no meio desta sala chamado «Festa do Avante!», que

o PCP divulga carinhosamente com o slogan Não há Festa como esta e que se apresta para acontecer em

setembro, logo em setembro.

Todos sabemos onde é, quantas pessoas junta e o modelo de participação que determina. Se houver o tal

rigor/coerência/equilíbrio que se exige aos nossos governantes e autoridades de saúde, é manifestamente

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impossível pensar que uma Festa como esta — que não sei se é festa travestida de comício ou comício

travestido de festa — possa ter lugar.

Não haverá S.to António, não haverá S. João, não houve as comemorações do 13 de Maio, em Fátima. Aliás,

em coerência, o PSD cancelou as Festas do Pontal e do Chão da Lagoa, na Madeira.

Não insultem a inteligência dos portugueses outra vez!

O PSD acompanha o Governo nas medidas de combate ao vírus mas não contem connosco para fretes,

mimos ou complacência do PS e do Governo com o PCP ou com a geringonça! Seremos sempre responsáveis,

mas nunca muletas ou testemunhas silenciosas de manobras de mera propaganda ou de aproveitamento

político, especialmente se vindo do Governo.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe para terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Os portugueses foram sérios, maduros e responsáveis quando o momento da emergência chegou e têm

agora o direito de exigir do Governo idêntico comportamento.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita, do

Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O assunto

que nos encontramos a discutir prende-se com matérias que dizem respeito à difícil situação que se vive na

cultura e ao agravamento de problemas que, muitas vezes, já vinham de trás.

Não nos iremos perder, por isso mesmo, com as costumeiras atoardas e invetivas, vindas de quem pouco

valoriza ou nem está verdadeiramente interessado em defender as artes, a cultura, os seus trabalhadores e o

direito de todos a toda a cultura.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Vamos falar do que está, efetivamente, em discussão e não vamos entrar

em jogos de espelhos.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Na proposta de lei do Governo é identificada a necessidade de aprovar um

conjunto de medidas, tendo em conta os constrangimentos causados pelo surto epidemiológico no setor dos

festivais de música, e refere-se a busca de, e cito, «um equilíbrio entre a sustentabilidade financeira dos

operadores económicos e os direitos dos consumidores que, não obstante o contexto atual, não podem ser

suprimidos ou eliminados.»

Por um lado, o Governo considera que as medidas contidas no Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 26 de março,

que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19 no âmbito

cultural e artístico, são insuficientes ou têm de ser alteradas. Isto num quadro em que o Governo anunciou e pôs

já em andamento a reabertura progressiva de toda a atividade cultural.

Por outro lado, há problemas concretos que ficam por resolver e que podem ter impacto direto ou indireto na

vida das pessoas que adquiriram ingressos para os eventos em causa, dos trabalhadores das artes do

espetáculo e das empresas e promotores.

Assim, quem adquiriu o bilhete deixa de ser ressarcido pelo cancelamento, a breve trecho, do valor da sua

compra na sequência do cancelamento do evento. Passa a haver um vale que pode ser utilizado na aquisição

de bilhetes de ingresso para o mesmo espetáculo que venha a ser realizado em nova data ou para outros

eventos realizados pelo mesmo promotor, mas que apenas prevê a restituição em 2022. No entanto, passa a

ser abrangido o adiamento, que antes não estava previsto.

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Surge também uma dúvida sobre o que ocorre exatamente com o dinheiro que advém de quem comprou

bilhetes. Não havendo perspetiva de devolução a curto prazo e passando agora a ficar do lado dos promotores

de espetáculos, é importante questionar por que razão não existem regras de utilização definida. Isto é, no limite,

e é uma pergunta que deixamos, esta verba pode ser utilizada na distribuição de lucros, na remuneração de

administradores? Pode ser utilizada em processos de falência? Não nos parece que assim deva ser.

O PCP considera que a verba em questão deve ser orientada prioritariamente para o cumprimento de

compromissos contratuais com os trabalhadores das artes do espetáculo e para os agentes culturais,

nomeadamente, artistas, intérpretes e executantes, autores, produtores, agentes e outros.

Como tal, ponderando os elementos em análise, o PCP irá abster-se na votação da Proposta de Lei n.º

31/XIV/1.ª, a par dos restantes projetos em análise.

O PCP defende, e termino, Sr.ª Presidente, que são necessárias e urgentes medidas ambiciosas e eficazes

para acorrer a todos os trabalhadores, companhias, estruturas, agentes e entidades de toda a cultura, das artes

performativas, passando pelo cinema, sem esquecer o património cultural.

Um quadro que já era de emergência não pode ser condenado a lidar com as imensas dificuldades que

atravessa com as mesmas receitas de sempre, nomeadamente o subfinanciamento e a desresponsabilização

do Estado, como opções políticas de primeira linha.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de

Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Bem-

vindos a mais um «minuto liberal». Podia dizer muito em relação a esta proposta de lei, mas é um minuto

curtinho, pelo que, se calhar, vou concentrar-me naquilo que o Deputado Paulo Rios de Oliveira, hoje, já chamou

de «o elefante».

Nestas semanas tem ficado claro que há, em Portugal, filhos e enteados, com regras para uns e regras para

outros.

O PCP diz que a Festa do Avante! tem de se realizar, porque não é um simples festival de música.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Ninguém disse isso!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — De acordo! A Festa doAvante! é um meio de financiamento do

PCP, sem pagar IVA e outros impostos, enquanto os festivais normais os pagam, algo com que o Iniciativa

Liberal quis acabar e foi chumbado aqui, nesta Câmara.

O Sr. António Filipe (PCP): — Está enganado!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Permitimos milhares de pessoas no festival de um partido, mas

não permitimos cinco pessoas no areal de uma praia. Permitimos milhares de pessoas no festival de um partido,

mas não permitimos que uma pessoa tome um banho de mar, a menos que leve uma prancha de surf ou, quem

sabe, uma t-shirt do PCP.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Duarte Cordeiro): — Não é verdade!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Que sentido é que isto tem? Nenhum, absolutamente nenhum! É

o mesmo que se viu no 1.º de Maio. É a desigualdade pura e dura! São regras para os portugueses normais de

um lado e outras regras privilegiadas para quem pode ou tem influência sobre o Governo. É esta a mensagem

que queremos passar lá para fora?!

O Sr. António Filipe (PCP): — Está enganado!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Orwell podia ter estado a referir-se a Portugal…

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir com uma citação de George Orwell, Sr.ª Presidente.

Penso que é um final condigno.

O Sr. António Filipe (PCP): — Trotskista!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Dizia Orwell, se calhar, referindo-se ao Portugal de hoje, que

«Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que outros». Infelizmente, em Portugal, hoje,

continuamos com um País e dois sistemas.

O Sr. António Filipe (PCP): — Está redondamente enganado!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues,

do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, antes de mais, gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Ana

Rita Bessa que a posição do PAN é evidente: quando falamos de cultura, não podemos estar a falar de

tauromaquia e, portanto, nesta discussão, não tem lugar a tauromaquia.

Aplausos do PAN.

Além disso, Sr.ª Deputada, deixe-me dizer-lhe…

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Diga, diga!

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Exatamente! Digo!

No meio de tantas faltas, no meio de tantas pessoas com tantas necessidades, desviar dinheiros públicos

para apoiar aqueles que ganham a sua vida a torturar animais não é, e não será, certamente, a prioridade do

PAN.

Aplausos do PAN.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, chegámos ao fim do segundo ponto da nossa ordem

de trabalhos, pelo que vamos passar às votações regimentais.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, permite-me o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado André Ventura, pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Filipe (PCP): — É sobre a Festado Avante!?!

O Sr. André Ventura (CH): — Não, não é sobre a Festa do Avante!, Sr. Deputado.

Sr.ª Presidente, gostava de pedir um esclarecimento à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sobre a condução dos trabalhos, Sr. Deputado?

O Sr. André Ventura (CH): — Sim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, com a antecedência que está prevista no Regimento, o Chega

apresentou um voto de pesar. Esse voto de pesar não consta do guião das votações que hoje vamos fazer aqui,

em Plenário. E, sendo um voto de pesar, não tinha sido abrangido nas últimas decisões consensuais relativas

aos votos.

Pergunto, por isso, qual é a razão de o voto do Chega não estar incluído nas votações que vamos hoje

realizar.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, a Mesa informa-o, e a toda a Câmara, que deram entrada

vários votos de pesar com o mesmo objeto e que, de acordo com o Regimento, baixaram à 1.ª Comissão para

haver lugar a uma uniformização.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, permite-me, de novo, o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. André Ventura (CH): — Para apresentar recurso para o Plenário dessa decisão, Sr.ª Presidente. E a

razão é evidente: não é isso que está no Regimento.

Admito que isso possa ser decidido à la carte, mas tem de haver aqui regras e, por isso, nos termos do artigo

82.º do Regimento, peço recurso para o Plenário.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, o que me é informado é que os votos que deram

entrada tinham considerandos e, sendo assim, quando têm considerandos que ultrapassam o objeto, devem

baixar à respetiva comissão.

Portanto, o Sr. Deputado André Ventura insiste, mas não vai resolver o problema neste momento, uma vez

que os votos já foram enviados para a 1.ª Comissão.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, no âmbito da discussão em curso, pretendo pedir um

esclarecimento sobre a condução dos trabalhos, para tentar… Penso que, face às regras, que são novas, há,

efetivamente, um enquadramento, que é o que a Sr.ª Presidente descreveu…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Obrigado, Sr.ª Presidente.

Como estava a dizer, há um enquadramento, que é precisamente o de, existindo mais do que um voto sobre

a mesma matéria, poder ser requerido que os votos baixem à comissão, para se procurar um consenso, o que

não impede, obviamente, que, não sendo possível encontrá-lo, eles não acabem por vir todos à reunião plenária.

Portanto, a possibilidade da votação em Plenário existe, mas não nesta sessão, uma vez que a Mesa optou pela

descida à Comissão.

Penso que o ponto regimental é este e o que ficou estipulado para os votos foi a possibilidade de eles

baixarem…

O Sr. André Ventura (CH): — Que ponto regimental?

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — O ponto regimental é o das normas que revimos ainda há pouco tempo

e que estamos…

O Sr. André Ventura (CH): — Onde estão?

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — É o artigo 76.º, Sr. Deputado, se não se importa…

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — É o artigo 75.º, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, dá-me licença…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, não vamos estar aqui a prolongar o assunto, porque o

Sr. Deputado não tem razão, uma vez que o Regimento foi recentemente alterado, toda a gente conhece o seu

conteúdo, e o artigo 75.º é muito claro. Há vários votos sobre a mesma matéria, não é apenas o seu. Houve

outros grupos parlamentares que apresentaram votos, salvo erro deram entrada cinco votos, e, portanto,

baixaram à comissão.

O Sr. Deputado quer um tratamento privilegiado que não pode ter.

O Sr. André Ventura (CH): — Se me permitir, Sr.ª Presidente…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Faça favor, então, de dizer para que efeito pretende usar da palavra,

Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, com o devido respeito, não só não é esse o enquadramento

— pode ser a sua opinião ou a de alguns —, como acho muito estranho que um voto de pesar baixe a uma

comissão, ainda que sejam quatro ou cinco, sem que isso seja consensualizado com os proponentes. Isto já

mostra muito da democracia que temos.

Mas deixe-me dizer-lhe outra coisa, Sr.ª Presidente. É que o artigo 82.º do Regimento, que me parece valer

tanto como o artigo 75.º — o PS já manda muito, mas, acho eu, ainda não manda no valor dos artigos —, diz

que «Qualquer Deputado…» — e eu acho que ainda o sou — «… pode reclamar das decisões do Presidente

da Assembleia ou da Mesa, bem como recorrer delas para o Plenário.»

Portanto, não me venham com normas do Regimento. O Regimento diz que posso recorrer e que tenho

direito a 2 minutos para dizer os motivos pelos quais estou a recorrer.

Protestos do Deputado do BE Jorge Costa.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito bem, Sr. Deputado.

Pretendendo, então, recorrer para o Plenário, tem a palavra para apresentar os seus motivos.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, os motivos são muito simples. Passámos os

últimos meses a alterar as circunstâncias dos votos e todos compreendemos porquê: havia muitos votos e não

se queria que tivessem considerações políticas.

Foi consensualizado, desde o início, que os votos de pesar ficavam fora deste enquadramento. Agora, vamos

começar a olhar para os votos de pesar, linha a linha, e a dizer: «Ah, está aqui um considerando, baixa à

comissão». Então, vão baixar todos às comissões! Qualquer dia não há um voto que não passe por uma

comissão! É um autêntico terror sobre aquilo que podemos fazer! Qualquer dia não há um voto que não baixe a

uma comissão e, depois, são ou não chumbados nas comissões.

Mas o voto de pesar é um voto de consideração sobre alguém que faleceu e que traz a esta Câmara um

momento de homenagem. Fazer passar isto pelas comissões é, no mínimo, ridículo, mas, sobretudo, não é o

que tinha sido acordado, não é o que tinha sido consensualizado e que a imprensa noticiou como regulamento

dos votos.

Portanto, podemos hoje proceder desse modo, podemos não aceitar que o voto suba a Plenário, mas

estamos, mais uma vez, a atropelar as liberdades dos Deputados, e acho que isso é inadmissível.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, se o seu voto de pesar, e os dos outros grupos

parlamentares, tivesse sido, de facto, circunscrito ao pesar em si e ao objeto desse pesar, teria sido agendado

para ser votado hoje. Não foi o caso.

O que diz o artigo 75.º, no n.º 4, é o seguinte: «Os projetos de votos de pesar motivados por falecimentos e

que se circunscrevam a esse objeto…» — sublinho, «que se circunscrevam a esse objeto»! — «… são discutidos

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e votados nos termos dos números anteriores». Ou seja, os votos em questão poderiam ser votados hoje, mas

não foi o caso.

O Sr. Deputado já recorreu para o Plenário e, portanto, vamos votar o recurso que apresentou, uma vez que

não há lugar a debate.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP e do PEV,

votos a favor do PAN, do CH e do IL e a abstenção da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

Agora, sim, Srs. Deputados, vamos proceder às votações regimentais.

Começamos pelo Projeto de Voto n.º 219/XIV/1.ª (apresentado pelo CH) — De pesar pela morte do mestre

Raúl Cerveira, fundador de várias associações de artes marciais e impulsionador do karaté em Portugal, que vai

ser lido pelo Sr. Secretário Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o projeto de voto é do seguinte

teor:

«Raúl Augusto Queiroz da Mota Cerveira nasceu a 11 de abril de 1944, na cidade de Lisboa.

Mestre de Shotokai Karaté-Do, tem a mais alta graduação neste estilo, sendo, sem qualquer dúvida, um dos

maiores impulsionadores do Karaté-Do em Portugal.

Iniciou a sua prática em 1963, da única forma que, nesta época, era possível treinar karaté em Portugal, a

interpretar ilustrações de livros, bem como a tentar aplicar as técnicas neles descritas.

Numa época em que não existiam em Portugal mestres, instrutores ou monitores, Raúl Cerveira foi um dos

dinamizadores e impulsionadores, iniciando formalmente a prática do karaté a 11 de abril de 1964. Obteve a

graduação de 1.º Dan, no primeiro Dojo de Portugal, a Academia de Budo, em outubro de 1966. O seu treino foi

interrompido pelo serviço militar, em África.

Foi um dos fundadores e presidente da Associação Portuguesa de Karaté-Do, em 1980, e em 1985 funda a

Federação Portuguesa de Karaté e Disciplinas Associadas, tendo, no ano seguinte, ganhado o título de Mestre,

atribuído pelo Ministério da Educação e Cultura.

Em 1992, foi também um dos fundadores da Federação Nacional de Karaté - Portugal, da qual foi presidente

até 1993, tendo posteriormente regressado à sua direção, entre 2001 e 2007.

No passado dia 6 de maio, Raúl Cerveira deixou-nos, mas o seu nome, as recordações de quem com ele

conviveu de um homem de valor elevado e elegante sentido de humor, tal como o seu percurso, ficarão gravados

na história das artes marciais em Portugal.

Reunida em Plenário, a Assembleia da República presta a sua homenagem à memória do Mestre Raúl

Cerveira, endereçando sentidas condolências à sua família, amigos e a todos os praticantes em geral.»

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr. Deputado Duarte Pacheco. Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos ao Projeto de Voto n.º 225/XIV/1.ª (apresentado pelo PAR e subscrito por Deputados do PS, do

PSD, do PAN e do CH) — De pesar pelo falecimento de D. Manuel Vieira Pinto.

Peço à Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha o favor de ler este projeto de voto.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o projeto de voto é do seguinte

teor:

«Faleceu, no passado dia 1 de maio, no Porto, D. Manuel Vieira Pinto, Arcebispo resignatário da Arquidiocese

de Nampula e figura maior na luta pela afirmação da dignidade da pessoa humana no Portugal contemporâneo.

Nascido em Amarante, a 9 de dezembro de 1923, D. Manuel Vieira Pinto frequentou o Seminário Diocesano

do Porto, cidade onde viria a desempenhar a sua primeira função sacerdotal, na qualidade de coadjutor da

Paróquia de Campanhã.

Seguiu depois para Roma, tendo aí travado conhecimento com o célebre Padre Lombardi, fundador do

movimento Por Um Mundo Melhor. Tendo aderido a este importante movimento renovador, o então Padre Vieira

Pinto viria a assumir a responsabilidade pela atuação do mesmo em Portugal.

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Em 1967, foi nomeado, pelo Papa Paulo VI, Bispo da Diocese de Nampula, cidade a que chegou em plena

guerra colonial. O novo Bispo destacou-se, de imediato, pela ousadia dos seus gestos e dos seus atos, que

motivaram a animosidade de parte significativa da população branca e a ampla adesão da população negra.

A sua voz livre e corajosa não mais deixou de se fazer ouvir, fosse em defesa do diálogo intercultural e inter-

religioso, fosse na promoção dos direitos humanos, fosse na exortação ao reconhecimento do direito do povo

moçambicano a ser o sujeito político construtor da sua própria história.

D. Manuel Vieira Pinto, dando mostra de excecionais dotes de lucidez e coragem, contestou abertamente a

guerra colonial e o colonialismo que a fundamentava e declarou a sua adesão ao princípio de que todos os

povos têm direito à autodeterminação. Perante tais manifestações de rebeldia, o regime autoritário, que viria a

ser deposto a 25 de abril de 1974, promoveu o afastamento do Bispo da sua diocese, a que viria só a regressar

em janeiro de 1975. No período pós-independência, prosseguiu a sua atividade em prol da salvaguarda dos

direitos humanos em circunstâncias não raras vezes bastante difíceis.

Já na fase final da sua permanência em Moçambique, desenvolveu vastos esforços para ajudar a que se

pusesse termo à guerra civil que assolava o país e se iniciasse um verdadeiro processo de reconciliação

nacional.

Partindo da sua mundividência cristã, D. Manuel Vieira Pinto foi um homem empenhado na interpretação das

contingências sócio-históricas do seu tempo, tendo em vista uma ação transformadora capaz de contribuir para

o reforço da dignidade do ser humano.

Reunida em sessão plenária, a Assembleia da República expressa o seu pesar pelo falecimento de D. Manuel

Vieira Pinto, recordando o homem de exceção e o cidadão de primeiro plano, e endereçando à família e amigos

as mais sentidas condolências.»

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha. Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, na sequência dos dois projetos de votos que acabámos

de aprovar, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Vamos continuar com as nossas votações.

Assim, passamos à votação do Projeto de Resolução n.º 268/XIV/1.ª (PEV) — Classificação de tripulante de

cabina como profissão de desgaste rápido.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do PAN,

do PEV, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do CDS-PP e do IL.

Votamos agora o Projeto de Resolução n.º 251/XIV/1.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de

tripulante de cabine com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade e à garantia das

condições de segurança e saúde no trabalho.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do PAN,

do PEV, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do CDS-PP e do IL.

De seguida, passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 234/XIV/1.ª (CDS-PP) — Criação

do grupo de trabalho para a regulamentação legal das profissões de desgaste rápido e criação da respetiva

tabela.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e do PEV, votos a favor do PSD, do

CDS-PP, do PAN e do IL e abstenções do BE, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

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Votamos agora o Projeto de Resolução n.º 440/XIV/1.ª (PSD) — Complemento do Programa de Estabilidade

2020 com a apresentação de um programa de emergência social e ação diplomática para o seu financiamento

europeu.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e do PEV, votos a favor do PSD, do BE,

do PAN, do CH, do IL e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e a abstenção do CDS-PP.

Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 441/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que, no âmbito

do Programa Nacional de Reformas, adote um conjunto de medidas concretas que permitam respostas para

todos os portugueses afetados pela pandemia.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não

inscrita Joacine Katar Moreira, votos a favor do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL e a abstenção do PAN.

Vamos proceder, de seguida, à votação do Projeto de Resolução n.º 442/XIV/1.ª (PCP) — Pelo direito

soberano de Portugal decidir do seu futuro: combater o vírus e o seu aproveitamento, assegurar o

desenvolvimento do País.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL, votos a

favor do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e a abstenção do PAN.

Votamos agora o Projeto de Resolução n.º 443/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do

Programa Nacional de Reformas, inclua, no plano de recuperação da crise económica, social e sanitária

provocada pela COVID-19, a opção estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento no

combate e adaptação às alterações climáticas, na não-aplicação de medidas de austeridade e em medidas de

combate a interesses instalados.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do

PAN, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP, do CH e do IL.

O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr.ª Presidente, queria apenas anunciar que entregarei uma declaração de voto

em relação ao Projeto de Resolução n.º 443/XIV/1.ª, apresentado pelo PAN, em meu nome e em nome dos Srs.

Deputados Maria Begonha, Tiago Estevão Martins, Filipe Pacheco, Eduardo Barroco de Melo, Joana Sá Pereira

e Olavo Câmara.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, fica registado.

Passamos à votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece medidas

excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da pandemia da doença

COVID-19.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PAN, o voto contra da Deputada não

inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e do IL.

Esta proposta de lei baixa, assim, à 12.ª Comissão.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada Joacine Katar Moreira, pede a palavra para que efeito?

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A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, queria anunciar a apresentação de uma

declaração de voto sobre a última votação.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito bem, Sr.ª Deputada. Fica registado.

Temos agora vários requerimentos para votar. Pergunto ao PAN, ao BE e à Deputada não inscrita Joacine

Katar Moreira se podemos votá-los em conjunto.

Pausa.

Não havendo oposição, vamos votar, em conjunto, os três requerimentos, apresentados pelo PAN, pelo BE

e pela Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, solicitando a baixa à Comissão de Cultura e Comunicação,

sem votação, por 30 dias, dos Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-lei n.º 10-I/2020, de 13

de março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19 no

âmbito cultural e artístico, 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 12-A/2020, de 6 de abril, que estabelece

medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19, 370/XIV/1.ª (BE) — Proteção

dos direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica e 373/XIV/1.ª (N insc) — Estabelece

medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural português, no âmbito da crise epidemiológica.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Passamos, de seguida, à votação final global do texto final apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia

e Ordenamento do Território relativo aos Projetos de Resolução n.os 120/XIV/1.ª (PCP) ⎯ Recomenda ao

Governo que tome as medidas de defesa do rio Tejo, 167/XIV/1.ª (BE) ⎯ Recomenda ao Governo que promova

medidas de garantia de caudais verdadeiramente ecológicos no rio Tejo com informação regular às populações,

187/XIV/1.ª (PAN) ⎯ Recomenda ao Governo a renegociação dos caudais e das situações de exceção

constantes na Convenção de Albufeira, 266/XIV/1.ª (PEV) ⎯ Revisão da Convenção de Albufeira para

salvaguarda de recursos hídricos fundamentais ao País e 271/XIV/1.ª (PSD) ⎯ Recomenda ao Governo que

promova a revisão da Convenção de Albufeira, apresente os resultados da análise da adequabilidade da rede

de monitorização hidrometeorológica atualmente existente e que torne públicos os resultados do

acompanhamento da execução dos planos no quadro do planeamento hidrológico 2016-2021, assim como os

pressupostos estratégicos que definirão o aprofundamento significativo da cooperação bilateral para o ciclo de

planeamento 2021-2027.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, dá-me licença?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — A Sr.ª Deputada Mariana Mortágua pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): ⎯ Sr.ª Presidente, é para anunciar que o Bloco de Esquerda apresentará

uma declaração de voto sobre esta votação.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Fica registado, Sr.ª Deputada.

Vamos agora proceder à votação do requerimento, apresentado pelo PS e PSD, solicitando a avocação pelo

Plenário da votação, na especialidade, de propostas de alteração relativas ao texto final da Comissão de

Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à Proposta de Lei n.º 30/XIV/1.ª (GOV) ⎯

Altera as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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Passamos ao guião suplementar. Vamos votar, na especialidade, as propostas de alteração respeitantes ao

texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo a esta última

proposta de lei.

Havendo acordo das bancadas, vamos votar em conjunto as propostas de alteração, apresentadas pelo PS

e pelo PSD, de emenda do n.º 6 e de emenda do n.º 8 do artigo 6.º-A da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março,

constante do artigo 2.º.

Submetidas à votação, foram aprovadas, com votos a favor do PS, do PSD e do PAN, votos contra da

Deputadanão inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e do IL.

São as seguintes:

Artigo 6.º-A

Regime processual e transitório

6 — Ficam suspensos no decurso do período de vigência do regime excecional e transitório:

a) O prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do Código da

Insolvência e da Recuperação de Empresas;

b) Os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência relacionados com a

concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família;

c) As ações de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa

imóvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, possa ser

colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão imperiosa;

d) Os prazos de prescrição e de caducidade relativos aos processos e procedimentos referidos nas

alíneas anteriores;

e) Os prazos de prescrição e de caducidade relativos aos processos cujas diligências não possam ser

feitas nos termos da alínea b) do n.º 2, da alínea b) do n.º 3 ou do n.º 7.

(…)

8 — O disposto nas alíneas d) e e) do n.º 6 prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos

máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo

correspondente à vigência da suspensão.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos agora votar a proposta de alteração, apresentada pelo PS e pelo

PSD, de aditamento de um n.º 3 ao artigo 5.º da mesma proposta de lei.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra da Deputadanão inscrita

Joacine Katar Moreira e abstenções do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do PEV, do CH e do IL.

É a seguinte:

Artigo 5.º

Prazos administrativos

3 — O disposto no presente artigo não se aplica aos prazos das fases administrativas em matéria

contraordenacional.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos, agora sim, à votação final global do texto final apresentado

pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à Proposta de Lei n.º

30/XIV/1.ª (GOV) ⎯ Altera as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID19.

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do PAN e do IL e abstenções do BE,

do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e da Deputadanão inscrita Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, dá-me licença?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): ⎯ Sr.ª Presidente, não muda o resultado, mas na votação da Proposta

de Lei n.º 31/XIV/1.ª gostaríamos de corrigir o sentido de voto do PAN de a favor para abstenção.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Fica registado, Sr.ª Deputada.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, dá-me licença também?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): ⎯ Sr.ª Presidente, é para apresentar um requerimento de dispensa de

redação final e do prazo de reclamações relativamente à proposta de lei que acabámos de aprovar.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Vamos então votar o requerimento oral, apresentado pelo PS,

solicitando a dispensa de redação final e do prazo para apresentação de reclamações contra inexatidões

relativamente ao texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e

Garantias relativo à Proposta de Lei n.º 30/XIV/1.ª (GOV) ⎯ Altera as medidas excecionais e temporárias de

resposta à pandemia da doença COVID-19.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Chegamos, assim, ao fim das votações regimentais e da nossa ordem de trabalhos de hoje.

A próxima reunião plenária, cuja ordem do dia consistirá no debate quinzenal com o Sr. Primeiro-Ministro,

terá lugar na próxima quarta-feira, dia 20, pelas 15 horas.

Muito boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados. Desejo-vos um bom resto de dia e até quarta-feira.

Eram 19 horas e 11 minutos.

———

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação

Relativa ao Projeto de Resolução n.º 443/XIV/1.ª:

Considerando que:

Vivemos numa emergência climática, como reconheceu e afirmou a Resolução da Assembleia da República

n.º 125/2019, aprovada por unanimidade no dia 5 julho 2019;

O Programa do XXII Governo Constitucional confere, com justiça, prioridade ao combate às alterações

climáticas como desafio estratégico da ação governativa;

As alterações climáticas apresentam riscos sérios, significativos e iminentes às pessoas, bens e às atividades

económicas, sociais e culturais, contribuindo ainda para acelerar os vetores de transmissão das pandemias;

A mitigação das alterações climáticas e a adaptação do território, das pessoas e das comunidades às suas

consequências apresentam, para além de uma ameaça credível, uma oportunidade concreta para o crescimento

e a melhoria do nível de vida dos portugueses;

As políticas de austeridade, praticadas em Portugal na XII Legislatura, e em muitos países europeus pela

mesma altura, fracassaram por completo, tendo os seus objetivos de consolidação das contas públicas

fracassado todos os anos;

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As políticas de austeridade em Portugal, e não só, tiveram, ainda, um enorme impacto social e económico,

tendo-se registado uma nova vaga de emigração, pobreza e falência de entidades económicas, bem como o

desinvestimento na investigação e inovação, com danos permanentes na vida, capacidade produtiva e

património das pessoas, empresas e de toda a República;

As políticas de austeridade foram utilizadas para fazer aprovar medidas de retrocesso sem precedentes nos

direitos sociais e económicos, em particular nos direitos laborais, cujos impactos ainda hoje se fazem sentir;

Também acompanhou esse período uma desastrosa política de privatização, tanto através da venda de

ativos do Estado como também através da degradação dos serviços públicos;

O compromisso de rejeitar a austeridade, já firmado pelo Partido Socialista e pelo XXII Governo

Constitucional, é fundamental para assegurar a confiança dos agentes económicos;

Entenderam, pelos motivos expostos, os Srs. Deputados do Partido Socialista que, votando contra o Projeto

de Resolução n.º 443/XIV/1.ª (PAN), o Governo deverá priorizar na conceção do plano de recuperação da crise

económica, social e sanitária a transição rápida e justa para uma economia neutra em carbono, evitando por

completo um regresso às políticas falhadas da austeridade, privatização e retrocesso dos direitos sociais e

económicos que marcou o período da XII Legislatura.

Os Deputados do PS, Miguel Matos — Maria Begonha — Tiago Estêvão Martins — Filipe Pacheco —

Eduardo Barroco Melo — Joana Sá Pereira — Olavo Câmara.

———

Relativa à Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª:

Enquanto usufruímos da arte e da cultura no âmbito do nosso confinamento e no âmbito das medidas

sanitárias estavam a ser despedidas e despedidos muitos profissionais da cultura e a não ser respeitados os

seus direitos.

A cultura em Portugal tem sofrido a cada ano o desgaste dos seus profissionais, marcados pela precarização

laboral, e o congelamento do investimento no setor por sucessivos governos. A crise COVID-19, conforme é

entendido o período em que vivemos, mostra-nos uma realidade angustiante que tem agravado o difícil

panorama das entidades culturais, dos artistas e demais profissionais: a súbita interrupção da vida cultural tal

como estava instituída, programada e financiada; dificuldades de subsistência de grande parte dos profissionais,

muitos colocados à margem dos apoios; a emergência de um público cujo confinamento tem aumentado a

necessidade de fruição de produtos culturais e a procura de formas de pensar e de viver a crise pandémica.

Sucede que da mesma forma que a cultura se difundiu nesta crise epidemiológica, expôs as suas fragilidades

estruturais de longa data, que em última análise repousam sobre quem, mesmo em instabilidade, consegue criar

sob a força da precariedade. Os artistas e demais agentes culturais não deixaram de produzir, criando para eles

e para todas e todos, ajudando a sociedade portuguesa a atravessar esta crise, e seria negligente não apoiar

um setor que é tão fundamental como vital, para o País. Afinal a cultura é o corpo de trabalho intelectual e

criativo no qual a experiência e o pensamento de uma sociedade são inscritos, sobretudo nos momentos mais

difíceis que a esta lhe cabe atravessar, contribuindo para o bem-estar e para a saúde mental da população.

Precisamos de entender que muitas destas medidas agora designadas como excecionais devem ser medidas

regulares por forma a fazer face à fragilidade sistémica da cultura em Portugal. É preciso garantir o apoio

sustentado e de longa duração a artistas e entidades culturais. Se os artistas e agentes culturais estão focados

apenas em sobreviver, a criação será sempre amputada e a sua qualidade posta em causa.

As medidas propostas pelo Executivo sobre matérias relativas à cultura são insuficientes. Não nos adiantaria,

então, rigorosamente nada avançarmos para a melhoria da situação sanitária e amanhã não haver relatos,

criações e reflexões, mas sobretudo não haver conhecimento proveniente da cultura em relação a esta época

complicada que estamos a viver. Apoiar as artes e a cultura garante que mais tarde, as futuras gerações, terão

acesso à memória e à experiência destes tempos. A cultura não é sinónimo de entretenimento; a cultura, tal

como a ciência, é conhecimento. E por isso mesmo deve ser estruturalmente apoiada.

Pelas razões acima expostas, votei contra, e sob forma de protesto, a mencionada proposta do Governo.

Lisboa, 19 de maio de 2020.

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A Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

———

Relativa ao texto final, apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, sobre

os Projetos de Resolução n.os 120/XIV/1.ª (PCP), 167/XIV/1.ª (BE),187/XIV/1.ª (PAN), 266/XIV/1.ª (PEV) e

271/XIV/1.ª (PSD):

Relativamente ao texto final, apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território,

sobre os Projetos de Resolução n.os 120/XIV/1.ª (PCP), 167/XIV/1.ª (BE), 187/XIV/1.ª (PAN), 266/XIV/1.ª (PEV)

e 271/XIV/1.ª (PSD), a posição de voto do Bloco de Esquerda foi a favor das recomendações contidas naquele

diploma.

Entendemos que, de uma forma geral, o diploma contribuirá para a necessária revisão da Convenção de

Albufeira e, por conseguinte, ajudará a garantir caudais verdadeiramente ecológicos cuja existência é uma das

condições necessárias para se recuperar e preservar o rio Tejo e os seus afluentes.

No entanto, não podemos deixar de assinalar a nossa discordância com a alínea c) do ponto 2 e com o ponto

10 do diploma.

Na alínea c) do ponto 2, a Assembleia da República recomenda ao Governo «retirar do âmbito da Convenção

de Albufeira a fixação dos caudais a descarregar na zona da secção de ponte de Muge, uma vez que a gestão

local dos recursos hídricos realizada em território português não é matéria de interesse ou condicionante do

território espanhol».

A nossa discordância com a alínea c) do ponto 2 prende-se com o facto de esta alínea abrir a possibilidade

de uma utilização mais intensiva dos caudais a montante de ponte de Muge, condicionando o volume de água

e as concentrações de nutrientes e de sedimentos que alcançam o estuário do rio Tejo, podendo agravar os

desequilíbrios daquele ecossistema estuarino e facilitar a progressão para montante da chamada «cunha

salina».

A alínea c) do ponto 2 pode ainda levar à redução da já diminuta monitorização dos caudais naquela secção

e, por conseguinte, à ausência de informação disponível sobre os recursos hídricos e estado ecológico daquele

troço do rio Tejo.

No ponto 10 do diploma, a Assembleia da República recomenda ao Governo que «proceda ao estudo do

aproveitamento hidráulico do rio Tejo para fins múltiplos».

Entendemos que o ponto 10 do diploma vai ao encontro das aspirações do Projeto Tejo — Aproveitamento

Hidráulico de Fins Múltiplos do Tejo e Oeste, cujo projeto de intervenção no rio Tejo visa, com recurso a

financiamento público, a construção de açudes e outras barreiras por forma a concretizar um projeto

megalómano de irrigação agrícola. Tal intervenção poria em causa o único troço livre do rio Tejo, trazendo

consequências nefastas para o ecossistema ribeirinho, para as atividades tradicionais que ali se desenvolvem

e para o pleno usufruto da natureza pelas populações.

Além do mais, em plena crise climática, na qual os efeitos da seca são já sentidos em vastas áreas do

território português, é necessário implementar medidas de eficiência hídrica que possibilitem o uso racional da

água na agricultura, ao invés de se aumentar desmesuradamente as áreas de irrigação que promovem o

desperdício de recursos hídricos.

Assembleia da República, 18 de maio de 2020.

Os Deputados do Bloco de Esquerda.

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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