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Sexta-feira, 15 de maio de 2020 I Série — Número 53
XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)
REUNIÃOPLENÁRIADE14DEMAIODE 2020
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 36
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os
375, 377 e 378/XIV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 451 a 459/XIV/1.ª.
Procedeu-se a um debate sobre o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas juntamente com a apreciação dos Projetos de Resolução n.os 440/XIV/1.ª (PSD) — Complemento do Programa de Estabilidade 2020 com a apresentação de um programa de emergência social e
ação diplomática para o seu financiamento europeu, 441/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional de Reformas, adote um conjunto de medidas concretas que permitam respostas para todos os portugueses afetados pela pandemia, 442/XIV/1.ª (PCP) — Pelo direito soberano de Portugal decidir do seu futuro: combater o vírus e o seu aproveitamento, assegurar o desenvolvimento do País e 443/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional de Reformas, inclua no plano de recuperação da crise
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económica, social e sanitária provocada pela COVID-19 a opção estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento no combate e na adaptação às alterações climáticas, na não aplicação de medidas de austeridade e em medidas de combate a interesses instalados, que foram rejeitados. Usaram da palavra, a diverso título, além dos Ministros do Planeamento (Nelson de Souza) e de Estado e das Finanças (Mário Centeno), os Deputados Nuno Miguel Carvalho (PSD), Miguel Matos (PS), André Silva (PAN), Duarte Alves (PCP), Isabel Pires (BE), Nuno Fazenda (PS), Fernando Negrão (PSD), Vera Braz (PS), Cecília Meireles (CDS-PP), Carlos Brás (PS), Fernando Anastácio (PS), João Cotrim de Figueiredo (IL), José Luís Ferreira (PEV), Mariana Mortágua (BE), Hortense Martins (PS), André Ventura (CH), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Joacine Katar Moreira (N insc.), João Gonçalves Pereira (CDS-PP), Álvaro Almeida (PSD) — que também exerceu o direito de defesa da honra relativamente a afirmações do Ministro de Estado e das Finanças —, Filipe Neto Brandão (PS), Duarte Pacheco (PSD), Luís Moreira Testa (PS), António Filipe (PCP) e João Paulo Correia (PS).
Foram debatidos conjuntamente, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece medidas excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, que foi aprovada, e os Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-lei n.º 10-I/2020, de 13 de Março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19 no âmbito cultural e artístico, 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 12-A/2020, de 6 de Abril, que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19, 370/XIV/1.ª (BE) — Proteção dos direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica e 373/XIV/1.ª (N insc.) — Estabelece medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural português, no âmbito da crise epidemiológica. Intervieram, além da Ministra da Cultura (Graça Fonseca), os Deputados Cristina Rodrigues (PAN), Beatriz Gomes Dias (BE), Joacine Katar Moreira (N insc.), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Rosário Gambôa (PS), Paulo Rios de Oliveira (PSD), Ana Mesquita (PCP), João Cotrim de Figueiredo (IL) e André Ventura (CH). Posteriormente, foram aprovados requerimentos, apresentados pelos partidos autores dos projetos de lei, solicitando a baixa à Comissão de Cultura e Comunicação, sem votação, por 30 dias, daqueles diplomas.
O Deputado André Ventura (CH) interpelou a Mesa sobre o não agendamento, para votação, de um projeto de voto de pesar apresentado pelo seu partido. Depois de a Presidente em exercício ter justificado a respetiva não inclusão no guião de votações, aquele Deputado interpôs recurso dessa decisão, que foi rejeitado, tendo ainda usado da palavra o Deputado Pedro Delgado Alves (PS).
Após terem sido lidos os Projetos de Voto n.os 219/XIV/1.ª (apresentado pelo CH) — De pesar pela morte do mestre Raúl Cerveira, fundador de várias associações de artes marciais e
impulsionador do karaté em Portugal e 225/XIV/1.ª (apresentado pelo PAR e subscrito por Deputados do PS, do PSD, do PAN e do CH) — De pesar pelo falecimento de D. Manuel Vieira Pinto, foram aprovadas as respetivas partes deliberativas (a), tendo sido guardado 1 minuto de silêncio.
Foram rejeitados os Projetos de Resolução n.os 268/XIV/1.ª (PEV) — Classificação de tripulante de cabine como profissão de desgaste rápido e 251/XIV/1.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de tripulante de cabine com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade e à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho, bem como foi rejeitado, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 234/XIV/1.ª (CDS-PP) — Criação do grupo de trabalho para a regulamentação legal das profissões de desgaste rápido e criação da respetiva tabela.
Foi aprovado, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, relativo aos Projetos de Resolução n.os 120/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda ao Governo que tome as medidas de defesa do rio Tejo, 167/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo que promova medidas de garantia de caudais verdadeiramente ecológicos no rio Tejo com informação regular às populações, 187/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a renegociação dos caudais e das situações de exceção constantes na Convenção de Albufeira, 266/XIV/1.ª (PEV) — Revisão da Convenção de Albufeira para salvaguarda de recursos hídricos fundamentais ao País e 271/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova a revisão da Convenção de Albufeira, apresente os resultados da análise da adequabilidade da rede de monitorização hidrometeorológica atualmente existente e que torne públicos os resultados do acompanhamento da execução dos planos no quadro de planeamento hidrológico 2016-2021, assim como os pressupostos estratégicos que definirão o aprofundamento significativo da cooperação bilateral para o ciclo de planeamento 2021-2027.
Foi aprovado um requerimento, apresentado pelo PS e pelo PSD, de avocação pelo Plenário da votação, na especialidade, de propostas de alteração relativas ao texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a Proposta de Lei n.º 30/XIV/1.ª (GOV) — Altera as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19. De seguida, o texto final foi aprovado na especialidade e em votação final global, com propostas entretanto aprovadas, tendo o Deputado Pedro Delgado Alves (PS) apresentado um requerimento solicitando a dispensa de redação final e do prazo para apresentação de reclamações contra inexatidões, que foi igualmente aprovado.
A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 19 horas e 11 minutos.
(a) Estas votações tiveram lugar ao abrigo do n.º 10 do
artigo 75.º do Regimento.
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O Sr. Presidente: — Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Sr.as Funcionárias e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs.
Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 36 minutos.
Antes de iniciarmos a ordem do dia, dou a palavra à Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha para proceder à
leitura do expediente.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, muito boa tarde a todos e a todas.
Passo a anunciar que deram entrada na Mesa, e foram admitidas, várias iniciativas legislativas.
Refiro, em primeiro lugar, os Projetos de Lei n.os 375/XIV/1.ª (PSD) — Procede à quarta alteração à Lei n.º
1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica
provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, isentando de taxa de registo no sistema de
registo de estabelecimentos regulados as entidades responsáveis pela criação e manutenção de «hospitais de
campanha» e estruturas afins, que baixa à 9.ª Comissão, com conexão à 13.ª Comissão, 377/XIV/1.ª (PSD) —
Suspende os artigos 16.º e 40.º da Lei das Finanças das Regiões Autónomas, por forma a dotar as Regiões
Autónomas de todos os meios financeiros possíveis para fazer face aos efeitos da pandemia da doença COVID-
19, que baixa à 5.ª Comissão, e 378/XIV/1.ª (PSD) — Remissão à Região Autónoma da Madeira do pagamento
dos encargos decorrentes do empréstimo PAEF, por forma a dotar a Região de todos os meios financeiros
possíveis para fazer face aos efeitos da pandemia da doença COVID-19, que baixa à 5.ª Comissão.
Deram também entrada na Mesa os Projetos de Resolução n.os 451/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao
Governo medidas para defesa da sustentabilidade do rio Tejo e dê cumprimento à Resolução da Assembleia da
República n.º 63/2019, que baixa à 11.ª Comissão, 452/XIV/1.ª (PEV) — Garantia de aumento da oferta de
transportes públicos em época de desconfinamento e aceleração da concretização da estratégia nacional para
a utilização da bicicleta, que baixa à 6.ª Comissão, 453/XIV/1.ª (PEV) — Reforço de investimento no Serviço
Nacional de Saúde, que baixa à 9.ª Comissão, 454/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a adoção de
medidas de combate ao racismo, à xenofobia e à discriminação étnico-racial, que baixa à 1.ª Comissão,
455/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda a disponibilização de máscaras adaptadas permitindo incluir as pessoas
surdas ou com dificuldades auditivas, que baixa à 10.ª Comissão, em conexão com a 9.ª Comissão, 456/XIV/1.ª
(PSD) — Recomenda ao Governo a aprovação de medidas de reconhecimento aos trabalhadores do Serviço
Nacional de Saúde envolvidos no combate à doença COVID-19, que baixa à 9.ª Comissão, 457/XIV/1.ª (PAN)
— Recomenda ao Governo a flexibilização das condições da linha de financiamento Crédito Social Investe, que
baixa à 10.ª Comissão, 458/XIV/1.ª (N insc.) — Campanha nacional para renovar o pacto antirracista na
sociedade portuguesa, que baixa à 1.ª Comissão, e 459/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo medidas para
formulação de preços justos ao produtor e ao consumidor, que baixa à 7.ª Comissão.
Terminei, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, no primeiro ponto da ordem do dia, temos um debate sobre o Programa
de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas juntamente com a apreciação dos Projetos de Resolução
n.os 440/XIV/1.ª (PSD) — Complemento do Programa de Estabilidade 2020 com a apresentação de um programa
de emergência social e ação diplomática para o seu financiamento europeu, 441/XIV/1.ª (CDS-PP) —
Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional de Reformas, adote um conjunto de medidas
concretas que permitam respostas para todos os portugueses afetados pela pandemia, 442/XIV/1.ª (PCP) —
Pelo direito soberano de Portugal decidir do seu futuro: combater o vírus e o seu aproveitamento, assegurar o
desenvolvimento do País, e 443/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do Programa Nacional
de Reformas, inclua no plano de recuperação da crise económica, social e sanitária provocada pela COVID-19
a opção estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento no combate e adaptação às
alterações climáticas, na não aplicação de medidas de austeridade e em medidas de combate a interesses
instalados.
Para abrir o debate, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento, Nelson de Souza.
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O Sr. Ministro do Planeamento (Nelson de Souza): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Previsto no
processo de monitorização do Semestre Europeu, o Programa Nacional de Reformas (PNR) ficou este ano
condicionado pela coincidência temporal com o decurso da pandemia da COVID-19, tendo-se, por isso, optado
por uma versão simplificada. Trata-se — temos de o reconhecer — de um documento incompleto, mas é o
possível neste momento.
Neste Programa Nacional de Reformas, o que propomos é a manutenção do essencial da rota estratégica
definida pelo Governo nas Grandes Opções do Plano, aprovadas com o Orçamento de 2020. Posteriormente, e
logo que estejam mais dissipadas as condicionantes de que já falei, apresentaremos uma estratégia de
desenvolvimento revista à luz dos impactos da pandemia e que necessariamente incorporará, num primeiro
tempo, um plano de recuperação.
Para situar a Estratégia 2030, incorporada nas Grandes Opções do Plano, que apresentamos, recordemos
os seus quatro domínios estratégicos. O primeiro grupo é o dos designados «desafios gémeos», adotados pela
própria União Europeia e que naturalmente incluímos no nosso plano estratégico: o Green Deal, o crescimento
verde e a ação climática, traduzindo uma vinculação aos objetivos de descarbonização e de sustentabilidade e
uma aposta num desenvolvimento gerador de oportunidades de crescimento, sem esquecer nunca de incorporar
a dimensão da transição justa, sobretudo em regiões e setores mais afetados.
Aplausos do PS.
Em segundo lugar, a transição digital e a inovação, que, aliás, mostraram toda a sua relevância na mitigação
dos efeitos sociais do confinamento físico na ligação entre as pessoas e como um instrumento decisivo nas
práticas de teletrabalho e de telemedicina. Ao invés, ficou também visível, tantas vezes de uma forma bem crua,
o potencial negativo de marginalização social e económica daqueles que ficam para trás neste processo de
transição.
A estes desafios juntam-se outros dois, que ainda persistem e afetam a nossa capacidade de
desenvolvimento. São eles, em primeiro lugar, os problemas que têm a ver com as pessoas: os desafios
demográficos, mas também a inclusão social e o combate que temos de prosseguir às desigualdades de todos
os tipos, dimensões que, aliás, têm de ser amplamente reforçadas num quadro de maior exigência de coesão
social. E, finalmente, os desequilíbrios territoriais — alguns territórios mais próximos da faixa atlântica,
naturalmente confrontados com problemas de competitividade externa, mas também outros territórios mais do
interior que requerem processos de coesão social e de coesão interna.
A estas quatro agendas estratégicas se juntarão agora, naturalmente, dimensões de urgência, de reparação
e de relançamento para a saída da crise. Desde logo, para a reanimação e recuperação das cadeias produtivas
e dos setores que saíram mais fragilizados da pandemia: o turismo e todas as suas atividades conexas, os
serviços e o comércio de proximidade e todos os setores tradicionais exportadores da nossa economia. Mas
também para estimular o reforço da autonomia estratégica, ou seja, da capacidade do País em se abastecer e
garantir a independência a nível de produtos e bens que asseguram a sua própria sobrevivência, e ainda da sua
contribuição para que o mesmo suceda a nível da própria União.
Deixo uma última nota para os apoios comunitários. Temos utilizado e iremos continuar a utilizar a margem
de flexibilidade assegurada nos fundos comunitários através de iniciativas da própria Comissão Europeia. Temos
reconhecido o seu trabalho, nomeadamente o da Comissária responsável pela pasta da coesão, mas
reconhecemos — e temo-lo dito —que a quantidade e a natureza dos apoios recebidos é ainda manifestamente
insuficiente. Para o futuro imediato é indispensável concretizar o que ficou decidido no último Conselho Europeu
sobre o próximo quadro financeiro plurianual e sobre o plano de recuperação. É premente a clarificação quanto
à natureza dos instrumentos, à dimensão financeira global do pacote e aos calendários da sua disponibilização.
Para finalizar, queria sublinhar a importância de duas palavras-chave para a nossa estratégia de resposta a
nível da recuperação: confiança e investimento. É preciso aumentar a confiança das pessoas e nas pessoas,
nas instituições, nas empresas, nos seus trabalhadores, nos empresários e também nas políticas públicas e no
Estado; criar confiança no desconfinamento e na retoma da atividade; gerar confiança na economia, com a
promoção do investimento público, satisfazendo, em simultâneo, necessidades coletivas que são inadiáveis, e
a criação de estímulos e condições de resposta de investimento privado para o relançamento e o reganhar
dinâmicas de orientação para a sua competitividade.
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Aplausos do PS.
Serão questões-chave, que, aliadas aos recursos que têm de vir da solidariedade europeia e à qualidade das
estratégias que soubermos concretizar num futuro próximo, determinarão o sucesso da resposta para
rapidamente retomarmos a dinâmica de convergência interrompida.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de prosseguirmos, queria apenas dizer que está aberto o sistema
eletrónico para efeitos de registo do quórum de votações. Peço, portanto, aos serviços para tratarem dessa
questão rapidamente.
A Mesa regista seis inscrições para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro do Planeamento.
Sr. Ministro, como pretende responder?
O Sr. Ministro do Planeamento: — Em conjunto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Carvalho.
O Sr. Nuno Miguel Carvalho (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs.
Deputados, ouvi com muita atenção o Sr. Ministro do Planeamento no que diz respeito à base fundamental para
os próximos desafios que temos pela frente. E a base para vencer estes desafios é, efetivamente, o crescimento,
que, como sabe, nestes últimos anos tem sido muito impulsionado pelas empresas e pelos trabalhadores do
setor privado, em particular.
Sr. Ministro, acho que é fundamental esse reconhecimento e esse agradecimento, porque eles, sim, são os
craques da economia, eles, sim, ajudaram a que as contas do País pudessem ser equilibradas. Não há outro
craque que não eles, muito menos qualquer outro ministro pode ser considerado um craque neste papel
fundamental que eles têm tido e que terão de ter no futuro.
Aplausos do PSD.
Sr. Ministro, quando falamos no futuro, «crescimento» é a palavra fundamental que nos dá diversas opções,
mas, se perguntar a qualquer trabalhador qual é o principal risco para o seu posto de trabalho ou se perguntar
a qualquer empresário qual é o principal risco para a sua empresa, a resposta será esta terrível pandemia que
todos vivemos.
Sr. Ministro, para a apreciação que fez e para as perspetivas futuras, faz todo o sentido perguntar: como e
para quando o aumento no investimento na saúde que aqui é falado? Porque o Sr. Ministro não fala no «como»
nem no «quando» e isso ajudaria a mitigar o risco para o crescimento económico, para as empresas e para os
trabalhadores.
Sr. Ministro, quero também falar-lhe daquilo que, na ótica do crescimento, é o contexto de custos
empresariais. Vejo que, neste documento, menciona aquilo que são os processos de licenciamento. Mas se eles
não forem efetivamente executados, estes custos de contexto serão um grave problema para as empresas. E
adiciona-se um que não vejo aqui refletido, que é a excessiva informação empresarial que os empresários têm
de prestar, onde um contabilista é praticamente um funcionário das finanças. E todos estes custos combinados
fazem com que se pague menos salários e que as empresas tenham menos meios disponíveis.
Ora, Sr. Ministro, isto são reformas fáceis de fazer, são reformas baratas, digamos assim, e que têm alto
retorno. Portanto, acho que elas têm de ser prioritárias.
Sr. Ministro, deixe-me falar também daquilo que são as empresas neste momento a operar, até mesmo
aquelas que não recorreram ao layoff, que estão a vender. Nesse contexto, elas são fundamentais e entre elas
há muitas empresas exportadoras. Deixe-me dizer-lhe que, no que que diz respeito à exportação, nesta década,
tivemos os craques da economia a fazer com que as exportações crescessem de 30% para 43% do PIB (produto
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interno bruto), Sr. Ministro. Portanto, temos de impulsioná-las. E nos seguros de crédito com garantia do Estado,
temos de olhar para o mercado da União Europeia.
Neste documento, o Sr. Ministro fala apenas dos mercados fora da União Europeia. Ora, nós temos 70%
daquilo que é a produção de bens do nosso País a ser vendido para a Europa dos 28, para a União Europeia.
Pergunto-lhe se vamos poder ou não incluir o mercado da União Europeia nos seguros de crédito com garantia
do Estado, porque isso é fundamental para apoiar as empresas que têm esta atividade virada para este território.
Sr. Ministro, em relação à liquidez, ao apoio à economia, e na forma de fundo perdido, se nós recuperarmos
as palavras do Ministro da Economia, quando diz que fundo perdido de hoje são impostos de amanhã, diria que
não podia haver maior contradição com aquilo que oiço dizer que o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa, faz
quando vai a Bruxelas e pede apoio a fundo perdido para Portugal. Parece que o Governo quer que as empresas
e as famílias se endividem, mas o Governo não se pode endividar. Portanto, vamos falar a uma única voz: nós
precisamos que o Fundo de Recuperação vindo da Europa, que o dinheiro que poderemos ter para apoiar a
nossa economia possa vir a fundo perdido, Sr. Ministro, e que seja célere. A falta de liquidez, hoje, será um
problema maior, amanhã. A falta de liquidez, hoje, poderá fazer com que os trabalhadores e as empresas,
quando a economia abrir, não tenham capacidade para abrir portas. Portanto, Sr. Ministro, se estamos à espera
que esse dinheiro, esse apoio venha por via do Conselho Europeu e daquilo que vai ser distribuído pelo
Conselho Europeu, quando é que acha que vai cá chegar? Vai chegar a tempo? Acha que vamos ter esses
instrumentos?
Sr. Ministro, o tempo é precioso. Os craques da economia, os verdadeiros craques, não podem esperar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, ultrapassou largamente o seu tempo, mas, como desconta no tempo do
seu grupo parlamentar, não há problema.
Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Miguel Costa Matos, do PS.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, depois de três anos de
convergência, deparamo-nos agora com um tempo excecional. Em breve, esta Assembleia apreciará um
Orçamento suplementar e as particularidades deste Programa de Estabilidade e deste Programa Nacional de
Reformas são fundamentais para, sem gerar ruído, afirmar as grandes linhas políticas de prioridade no combate
à crise.
Este Programa de Estabilidade e este Programa Nacional de Reformas fazem as previsões possíveis, num
contexto de incerteza, mas, no essencial, falam-nos das medidas que, em boa hora, protegeram o emprego e o
rendimento. É que, com tantos portugueses a verem a sua vida em suspenso, este revela-se um verdadeiro
programa de verdadeira estabilidade e de reformas justas nas várias camadas de segurança que dá às famílias
e às empresas.
Se é justo reconhecer a enorme resiliência e versatilidade inovadora das nossas empresas, é também
necessário e justo um compromisso com as micro, pequenas e médias empresas nas quais se organiza tanta
da nossa vida em comunidade.
Saudamos este Programa porque tem bem presente o custo social que teria se falhássemos alguns destes
compromissos. Mas também o saudamos porque dá a prioridade certa ao investimento público, à
descarbonização e ao combate às desigualdades e ao reforço do Estado social, que foi determinante para o
sucesso dos países na luta contra esta pandemia.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, pergunto, então, quais seriam as consequências
se alguns aqui recusassem que as políticas contracíclicas pudessem ter o seu caminho. Pergunto se, em vez
de termos um pograma de estabilidade social, de fomento económico e de ação climática, tivéssemos um
regresso aos programas de instabilidade, de austeridade, da privatização e da emigração.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro, segundo o reputado think-tank Bruegel, em 10 países europeus analisados,
Portugal é o segundo que tem maior estímulo fiscal e o terceiro que mais adia impostos. Pergunto, pois: quando
a oposição nos fala de medidas já tomadas, e nos distrai com o Novo Banco, é tudo «dor de cotovelo»?
Aplausos do PS.
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr. Ministro do
Planeamento, no Programa de Estabilidade, o Governo refere a atribuição de 226 milhões e 500 mil euros para
um programa de digitalização, referente a equipamentos e apoio ao teletrabalho e tele-educação.
O PAN considera positivo a previsão desta verba, tendo em conta que, segundo o Instituto Nacional de
Estatística, só no ensino básico pelo menos 50 000 alunos não têm acesso a computador ou à internet, e esta
verba permite-nos começar a colmatar esta falha.
Contudo, é preciso aqui lembrar que, para se fazer uma transição digital séria na educação, é necessário
também, entre outras coisas, assegurar uma uniformização do software de gestão das escolas — já que cada
uma usa aplicações diferentes —, garantir o acesso remoto a essas aplicações, garantir sistemas de segurança
eficazes contra ataques cibernéticos — já que a crise sanitária aumentou grandemente estes ataques —,
assegurar uma renovação do parque de máquinas existente — que é completamente obsoleto — e ainda
assegurar uma formação, tendo em vista a necessidade de adaptação de métodos de ensino a esta transição
digital.
Relativamente a esta questão, gostava de lhe deixar duas perguntas. A primeira é a seguinte: poderá dar-
nos mais pormenores sobre o que está realmente em causa neste programa de digitalização na educação e em
que medida e com que ordem de prioridades todas estas medidas que referi estarão inseridas?
A segunda é esta: em que medida envolverá o Governo as áreas metropolitanas, as comunidades
intermunicipais e as autarquias locais neste processo?
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o
Sr. Deputado Duarte Alves.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Ministro do
Planeamento, o que se tem passado nos últimos dois meses tem revelado que nem numa situação de pandemia
com graves impactos económicos como a que estamos a viver a União Europeia consegue disfarçar a sua
natureza, que é tudo menos um projeto de solidariedade.
A única resposta concreta da União Europeia e da zona euro continua a ser a de empurrar os Estados para
mais endividamento, que depois será sujeito às mesmas regras e aos mesmos constrangimentos que levaram,
no passado, aos PEC (Programas de Estabilidade e Crescimento) e aos programas da troica, de má memória
para os portugueses.
Perante isto, perante este autêntico falhanço das instituições do euro e da União Europeia, o Governo insiste
em sujeitar as opções do País ao chamado «visto prévio de Bruxelas», apresentando estes dois atos de
submissão, que são o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas.
Pergunto, Sr. Ministro, se não acha que a exigência destes Programas, quando estamos no meio de uma
situação sem precedentes que exige que cada país tome opções quanto ao seu futuro, é uma prova da
inamovível burocracia e ortodoxia burocrática da União Europeia e das suas instituições e do seu total
desfasamento daquilo que são as necessidades dos Estados e dos povos da Europa.
E por que razão não se conhece o documento com as orientações da Comissão Europeia para a elaboração
dos programas de estabilidade? É confidencial? Chega a este ponto o afastamento da burocracia europeia em
relação aos cidadãos?
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Sr. Ministro, o facto é que o Governo decidiu entregar estes Programas, embora sem se comprometer com
cenários macroeconómicos, transformando estes documentos num prestar contas das medidas já tomadas no
âmbito da COVID-19.
Fala-se da competitividade nestes Programas. Mas como é que podemos querer ser competitivos, se os
apoios à economia, em Portugal, são baixíssimos, ao pé dos apoios que existem noutros Estados? Somos o
quinto país com menores apoios! A Alemanha, em percentagem do Orçamento, tem três vezes mais verbas
para apoiar a sua economia! Por cá, continuamos a não ter medidas que cheguem ao nosso tecido empresarial,
que é constituído essencialmente por micro, pequenas e médias empresas.
Pergunto-lhe se não considera que o que está em marcha é não a convergência de que falou na sua
intervenção mas, sim, um acentuar das divergências e das desigualdades entre Estados-Membros.
Pergunto-lhe, ainda, se acha que devemos ficar à espera que as soluções da União Europeia nos caiam dos
céus, ou se, pelo contrário, precisamos de, independentemente da União Europeia, ou apesar dela, responder
aos problemas nacionais e às exigências que se colocam na resposta à COVID-19, seja no reforço do SNS
(Serviço Nacional de Saúde), seja na recuperação do investimento público, da produção nacional, do emprego
e dos rendimentos, essenciais para alavancar a economia nacional.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do
Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, Sr. Ministro, a pandemia
provocada pela doença COVID-19 afetou em grande medida a saúde pública, numa crise sanitária de dimensões
nunca antes vista no nosso tempo de vida, e também afeta já a vida social e económica um pouco por todo o
mundo. Portugal não é exceção e as previsões apontam para uma queda abrupta e severa da atividade
económica para os próximos meses, com um impacto absolutamente transversal a todos os setores de atividade.
Por isso, também os documentos hoje aqui discutidos, no momento atual, não podem, obviamente, descurar
um contexto extremamente difícil em que eles são apresentados. Por isso mesmo, as respostas a esta crise
também têm de ser muito diferentes.
Dissemo-lo já em várias ocasiões: as receitas do passado não podem, de modo algum, valer para esta crise.
Não podem porque são baseadas em austeridade e tiveram já resultados comprovadamente desastrosos. E por
mais que muitos dos que hoje clamam contra a austeridade a terem implementado há alguns anos, são precisas
garantias e propostas concretas de que as soluções não irão nesse sentido.
Desse ponto de vista, a dimensão europeia da resposta à crise tem um papel fundamental, tanto para o bem
como para o mal. Tudo dependerá das escolhas políticas que sejam feitas a partir de agora.
Gostava, por isso, de lhe colocar uma questão sobre os fundos comunitários. Como é que o Governo prevê
operar a revisão dos fundos, num contexto de pandemia? Sabemos que o investimento público vai ser uma peça
essencial para a recuperação económica, pelo que as prioridades devem ser muito bem definidas e devem
responder a necessidades muito concretas das populações, como sejam a saúde e a mobilidade, mas também
a manutenção do combate às alterações climáticas.
Não é demais lembrar os debates que se tiveram, não há tanto tempo quanto isso, porque a Comissão
Europeia escolheu cortar nos fundos da coesão ou da agricultura, por exemplo. E essa opção não é mais viável
e seria incompreensível por toda a gente.
O próximo quadro financeiro plurianual tem de ser, desde já, repensado e tem de ter em conta as
necessidades urgentes decorrentes desta crise pandémica.
Por isso, pergunto ainda o seguinte: o que vai o Governo defender nesta matéria? Vai defender o aumento
dos fundos da coesão e da agricultura? Vai defender apoios diretos para auxiliar a economia, especificamente
as pequenas e médias empresas?
Outra questão que lhe tinha para colocar tem a ver com o mecanismo SURE. O Sr. Ministro já referiu várias
vezes que este mecanismo seria importante para financiar medidas de proteção do emprego, como, entre outras,
a medida do layoff. Tem sido um mecanismo muito falado por vários governantes, mas já percebemos que, à
semelhança de outras supostas soluções que têm chegado da Comissão Europeia, poderá nem sequer chegar
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a tempo para se responder agora aos problemas. Aliás, o próprio Sr. Ministro admitiu-o no dia 12 de maio, há
dois dias, ao dizer que as verbas deste programa só deveriam estar disponíveis em setembro, e mesmo isso
poderá não ser certo.
Além disso, este mecanismo tem, em nossa opinião, um problema adicional, que é este: os apoios serão
concedidos através de empréstimos aos Estados-Membros, diz-se que «em condições favoráveis», mas o que
isso significa é mais dívida a acumular. E isso nada tem a ver, parece-nos, com a pretensa solidariedade
europeia que tanto tem sido falada. O Sr. Ministro referiu aqui exatamente a solidariedade europeia, mas as
propostas que estão a ser apresentadas têm como base «dar com uma mão para tirar com a outra».
Assim sendo, pergunto: não considera o Governo pugnar por programas e mecanismos de apoio que sejam
baseados em apoios diretos, já que há capacidade para o fazer? É que o que não tem havido é opção política.
Daí perguntar-lhe qual vai ser a opção deste Governo relativamente a isso.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Nuno Fazenda, do Grupo
Parlamentar do PS.
O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Portugal registou,
nos últimos quatro anos, um crescimento acima da média da União Europeia, tendo alcançado resultados
históricos no investimento e nas exportações. Esses resultados devem-se às empresas, às instituições, mas
também a políticas públicas adequadas e ao apoio dos fundos comunitários.
Entretanto, por força da COVID-19, a trajetória de crescimento da economia portuguesa foi interrompida e,
para fazer face à COVID-19 e retomar o crescimento, Sr. Ministro do Planeamento, os fundos comunitários são
essenciais.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Entre as várias medidas que foram tomadas no âmbito da COVID-19, o
Governo procedeu à adaptação do Portugal 2020, tendo dado resposta em três áreas-chave.
Em primeiro lugar, deu resposta a milhares de promotores com projetos aprovados, através da aceleração
de pagamentos. Entre março e abril, o Portugal 2020 pagou mais de 500 milhões de euros. Só o pagamento às
empresas representou quase o dobro do que foi pago em período homólogo.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Bem lembrado!
O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Tudo isto, com pessoas em teletrabalho, com um empenho muito grande das
equipas. E, por isso, não queria também deixar de saudar todos os trabalhadores, todos os quadros que
trabalham nas entidades gestoras dos fundos comunitários, pelo trabalho excecional que têm desenvolvido para
fazer chegar dinheiro às empresas.
Em segundo lugar, para além da aceleração dos pagamentos, o Governo suspendeu, de forma unilateral e
universal, por um ano, o pagamento das prestações dos reembolsos, por parte das empresas, aos programas
comunitários. Só em março e abril, as empresas deixaram de pagar 71 milhões de euros, o que lhes permitiu,
assim, uma maior liquidez.
Tudo isto, sem burocracia e necessidade de justificações, por parte dos promotores, perante as autoridades
de gestão ou organismos intermédios.
Em terceiro lugar, o Governo deu resposta à necessidade de apoiar, a fundo perdido, projetos essenciais no
combate à COVID-19, nomeadamente de testes, ventiladores, equipamentos de proteção individual e também
para investigação científica, e assegurou ainda o financiamento a projetos de cariz social.
Tendo sido importante esta ação no imediato, há, no entanto, ainda desafios a que urge dar resposta e que
subsistem, uns de natureza conjuntural, outros de natureza estrutural.
Por isso, Sr. Ministro do Planeamento, deixo-lhe duas questões. Primeira: pode informar-nos para quando
está prevista a abertura dos novos concursos para apoio, a fundo perdido, às microempresas, por forma a que
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estas adaptem as suas atividades e os seus estabelecimentos às exigências da COVID-19? Esta é uma questão
muito importante para as microempresas.
Segunda, e última questão: sendo a transição digital uma prioridade do Governo, será ainda com este quadro
comunitário que as escolas portuguesas serão mais digitais? Teremos mais computadores e mais manuais
digitais ao dispor dos alunos das nossas escolas?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Ministro do Planeamento para responder,
queria só informar que já estão registados 141 Sr.as e Srs. Deputados, para efeitos de quórum de votação. Tirem
as conclusões deste número!
Agora, sim, para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento, Nelson de Souza.
O Sr. Ministro do Planeamento: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as questões colocadas. Vou
tentar ser conciso nas respostas e responder à maior parte das questões.
Sr. Deputado Nuno Carvalho, seja bem-vindo à promoção do investimento público.
Aplausos do PS.
Já que reforçou as necessidades de o Estado reduzir custos de contexto e investir na saúde, estamos
plenamente de acordo. Os custos de contexto, de facto, são e continuarão a ser, sempre, um esforço
permanente para criar condições para que as empresas encontrem circunstâncias favoráveis para o
investimento, e estamos de braço dado nesta matéria.
O investimento na área da saúde, que foi realizado nos últimos anos, deu os resultados que obtivemos nesta
crise pandémica. Aquilo que fizemos e vamos continuar a fazer, certamente, é continuar esse esforço e,
porventura, até reforçá-lo, mas tivemos uma boa prova da resiliência do nosso sistema de saúde, testado com
esta enorme prova a que foi sujeito e a que tão bem resistiu.
Vamos continuar a promover o investimento público não só para satisfazer necessidades coletivas, mas,
como todos sabemos, como um instrumento fundamental para animar a economia e obter, entre outros efeitos,
dinamização da procura, que, em último caso, também aproveita ao setor privado. Aliás, é completamente
errado, nestes tempos de crise e de relançamento da economia, ter estas vistas curtas, perdoe-me a expressão,
de separar interesses privados e interesses públicos…
O Sr. André Ventura (CH): — É verdade!
O Sr. Ministro do Planeamento: — … e não perceber que uma gestão global da economia pode ter
resultados globais de crescimento dinâmico no total da procura agregada.
Relativamente às questões de seguros de crédito, sabemos que estão em curso alterações, em resposta às
necessidades que nos foram mais recentemente sinalizadas pelos setores, as quais estão a ser tratadas pelo
Ministério da Economia, em conjunto com o Ministério das Finanças.
No que se refere às questões do fundo perdido, naturalmente, estamos a lutar para que, no plano de
recuperação, a maior parte do apoio venha com essa natureza, e não através de empréstimos ou de
instrumentos financeiros de outra natureza, de modo a que se possam atribuir apoios a fundo perdido às
empresas, nomeadamente em matéria de investimento. É precisamente por essa razão que nos batemos por
esse objetivo em Bruxelas e nos debates que, sobre essa matéria, se travam.
Sr. Deputado André Silva, estamos, neste momento, a preparar e a discutir a iniciativa relativa à questão do
ensino à distância, da digitalização das escolas. Temos tido reuniões semanais quer quanto à procura de
financiamento, quer, sobretudo, quanto aos detalhes de que falou e relativamente aos quais tem toda a razão,
pois temos de procurar soluções que respondam aos problemas que foram detetados nesta experiência de
ensino à distância e que, naturalmente, têm de ser corrigidos. Mas também tenho de lhe dizer que nos preocupa,
muito em particular, resolver os problemas de marginalização, de falta de acesso a esse sistema, por questões
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de recursos económicos de pessoas e famílias ou até por questões de localização em territórios de baixa
densidade não cobertos por redes de dados e de sistemas.
Passando, rapidamente, a outras questões, Sr. Deputado Duarte Alves, sabemos que, em matéria de opções
de integração europeia, não estamos de acordo em alguns aspetos, mas também podemos partilhar de algumas
dúvidas sobre a oportunidade de conduzir ou prosseguir este processo do Semestre Europeu rigorosamente
nos mesmos termos em que seria conduzido noutras circunstâncias.
Relativamente a questões colocadas por outros Srs. Deputados, e já que me falta tempo para poder reservar
o espaço de tempo próprio de intervenção do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, queria referir que partilho
inteiramente do posicionamento quanto às preocupações de preservar os fundos de coesão e da política agrícola
comum, no âmbito do quadro financeiro plurianual. Vamos estar atentos para que, nesta discussão mais
globalizada do quadro financeiro e do plano de recuperação, a política de coesão e a política agrícola comum,
particularmente o segundo pilar desta última, não saiam, uma vez mais, desfavorecidas; pelo contrário, vamos
estar atentos para que, no seu conjunto e de uma forma integrada, sejam acrescidas, até em função do valor
estratégico que demonstraram, como instrumento de resposta, no quadro da resposta à crise que a própria
Comissão Europeia apresentou e implementou. Portanto, estamos inteiramente de acordo, assim faremos, e já
o temos feito, nas discussões que estão em curso.
Quanto à questão dos timings de decisão, naturalmente, precisamos de bons instrumentos, de bom desenho
dos instrumentos, mas, de facto, também temos pressa, temos urgência na resposta, até porque os problemas
já ocorreram e estão a ocorrer e as necessidades de financiamento já existiram e ainda existem. Porém, a
urgência na resposta não se compadece, de facto, com a complexidade da montagem que também temos de
reconhecer que existe por parte da Comissão Europeia. E temos de perceber ainda que a solução final tem de
ser objeto de consenso e, mais do que de consenso, de acordo unânime por parte de um coletivo composto por
27 Estados-Membros. Portanto, é esta questão que nos leva, muitas vezes, a não tomar posições que possam,
mais tarde, inviabilizar, de todo, as nossas pretensões. É assim, sempre foi, no espaço europeu e nas
discussões, sobretudo em relação a estes temas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão, do Grupo
Parlamentar do PSD.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Inesperadamente e em plena pandemia, o País vive um problema, aparentemente recente, que nos deve obrigar
a exigir sentido de responsabilidade e maturidade. Isto porque a situação grave que o País atravessa não se
compadece com estranhas «crises políticas». A última coisa de que precisamos é que quem hoje tem a
responsabilidade política não esteja à altura do dramático momento que os portugueses vivem.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD não ignora, nem podia
ignorar, as condições absolutamente anormais em que este Programa de Estabilidade foi elaborado e é
apresentado. Sem projeções nem quadros macroeconómicos, resume-se ao impacto das medidas.
Encontramo-nos hoje, aqui, a tentar discutir a normalidade, em circunstâncias absolutamente anormais.
Hoje, falamos aqui de estabilidade, da criação de bases para o desenvolvimento e crescimento económicos,
mas estamos a fazê-lo sob um Estado inevitavelmente fragilizado, uma economia enfraquecida, um conjunto de
cidadãos debilitados, muitos deles em condições verdadeiramente preocupantes, e que está a deixar marcas, e
marcas profundas, muitas delas vividas na sombra.
Veja-se o caso do aumento da violência doméstica, que se estima que tenha aumentado, em média, 60%. O
Estado, neste período, demitiu-se de qualquer papel dissuasor dessas práticas criminosas, suspendendo todos
os mecanismos de vigilância e proteção e não considerando este controlo como uma primeira necessidade, que
deveria ter sido englobada nos serviços mínimos.
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Veja-se a situação dos nossos idosos, negligenciados na voragem da epidemia e fechados por tempo
indeterminado no silêncio dos lares, quando se deu por eles.
Veja-se o caso da proteção das crianças, quando ainda ontem fomos alertados pelo Comité Português para
a UNICEF (United Nations Children's Fund), dizendo que, e cito, «milhares de crianças portuguesas sinalizadas
como estando em risco ou em perigo não foram presencialmente acompanhadas no decurso do confinamento».
Veja-se, ainda, o facto de a DECO, entre 18 de março e 11 de maio, ter recebido 3600 pedidos de ajuda por
parte de famílias em dificuldades financeiras, sendo que no topo das preocupações não está a prestação do
crédito à habitação, Sr.as e Srs. Deputados, mas, sim, a falta de dinheiro para comprar «coisas básicas», como
a alimentação, ou para pagar as contas da água, da luz ou do gás.
Ultrapassado — assim esperamos — o período de maior alarme a nível de saúde, é tempo de nos focarmos
na economia, mas, acima de tudo, de nos focarmos nas pessoas. É tempo de construir sem manobras de
propaganda, nem agendas partidárias.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Estes são os tempos em que o Estado e a governação não podem falhar,
sob pena de vermos instalar-se entre nós um manto de miséria que atingirá cada vez mais pessoas.
Atente-se na deterioração contínua e a um ritmo sem precedentes do mercado de trabalho, com 1900 novos
desempregados inscritos por dia, com mais de 600 empresas em layoff por dia, envolvendo mais de 4500
trabalhadores. Todos os apoios sociais têm de ser acionados para evitar o pior, que seria juntar, a uma crise
pandémica, a rutura da economia e o falhanço do sistema de apoio social. Temos de evitar que isto aconteça!
Além do Estado, há o apoio indispensável de organizações como as IPSS (instituições particulares de
solidariedade social), as misericórdias, a Caritas, o Banco Alimentar e outras que, em articulação solidária com
a sociedade civil, têm multiplicado iniciativas como nunca antes se viu, avançando muitas vezes antes, ou em
substituição, das entidades oficiais. Estas, muito e bem, têm alertado o Governo e as entidades oficiais para os
atrasos, para a burocracia desnecessária, para a ineficácia e, principalmente, para a preocupação marginal com
que os problemas das pessoas têm vindo a ser encarados.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Que melhor exemplo há do que o layoff, quando tomamos
conhecimento de que 30% das empresas não receberam qualquer apoio até à semana passada? Na segurança
social, é preciso dizer «basta»! Basta de desculpas para a ineficiência, basta de falhas técnicas que hipotecam
a vida de milhares de portugueses, basta de incerteza.
É tempo de reconstruir com noção das deficiências do passado. É tempo de refazer o que estava mal. Bem
sabemos que o Serviço Nacional de Saúde foi uma das principais vítimas da política de desinvestimento público
que caracterizou os últimos quatro anos. Não basta anunciar medidas, é preciso saber concretizá-las em tempo
útil e com resultados, sem falhas técnicas, sem burocracias desnecessárias, sem desculpas!
Todos os dias vamos conhecendo cenários dantescos de famílias, muitas delas de classe média e que
conseguiam viver de forma sustentada, que a crise empurrou para a miséria. Para isso, deve o Governo avançar
com um programa de emergência social baseado na equidade, na justiça social, no reequilíbrio das contas
públicas, mas, sobretudo, na salvaguarda dos rendimentos das famílias e na recuperação do tecido empresarial
português.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — O Governo tem o dever de não falhar aos portugueses e, por isso, este
programa de emergência social deve, em tempo útil, apresentar a identificação, a quantificação e o calendário
de execução de um conjunto de medidas concretas que possam minimizar o impacto da crise social que Portugal
está a viver.
Não queria terminar sem uma palavra para as autarquias, para os municípios e para as freguesias e para o
papel de ajuda de proximidade crucial que desempenharam nesta fase. Muitas vezes, foi o poder local que se
substituiu ao poder central na proteção de pessoas e bens. Foram as autarquias, as freguesias e os municípios
que permitiram que o Estado falhasse um pouco menos aos cidadãos nesta fase mais crítica.
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O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É verdade!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — E não podemos, de modo algum, ignorar o trabalho atento, dedicado e
notável que foi feito e assumido pelos Governos Regionais da Madeira e dos Açores, que souberam controlar
os efeitos da pandemia, que, como se sabe, poderia ter tido, naquelas regiões, efeitos ainda mais devastadores.
Todos temos de fazer parte da mudança e da reconstrução.
Termino, usando palavras sábias do Presidente da Coreia do Sul: «isto não acaba até acabar».
Risos do PS e do PCP.
Mantenhamo-nos, por isso, atentos ao outro e, principalmente, disponíveis para a ajuda, conscientes de que
o ajudado poderia ser qualquer um de nós.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se a Sr.ª Deputada Vera Braz, do PS.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Vera Braz (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr. Deputado Fernando
Negrão, é com algum espanto que oiço a sua intervenção e que o oiço referir que as medidas que têm vindo a
ser implementadas parece que não estão a ir ao encontro das suas expectativas. Porquê?
Ainda ontem, na audição que tivemos com o Sr. Ministro das Finanças sobre o Programa de Estabilidade, o
Deputado do PSD, relativamente às medidas concretas que têm vindo a ser adotadas, referiu que, e passo a
citar, «na essência daquilo que foi conhecido até agora, podemos divergir em alguns aspetos, mas na base, no
princípio, estamos de acordo». Parece que temos aqui alguma divisão quanto à visão das medidas que têm sido
implementadas pelo Governo no combate a esta pandemia.
Aplausos do PS.
Estamos de acordo quanto ao facto de ter de haver um plano de recuperação futuro, um plano económico
em que, tal como se refere no projeto que o PSD apresenta hoje relativamente ao Programa de Estabilidade —
que, no fundo, concorda com o que o Partido Socialista entende —, deve haver uma ação coordenada e conjunta
no seio da União Europeia, ou seja, temos um mercado único, livre de circulação e é importante que não se
esqueçam que as nossas empresas e grande parte da sua produção dependem das exportações.
Portanto, Sr. Deputado, a questão que lhe deixo é a de saber se concorda, efetivamente, com as medidas
que estão a ser adotadas, que servem e têm servido não só para combater esta pandemia, como para ir ao
encontro dos impactos nefastos que esta tem causado nos cidadãos, nas nossas empresas e que servirá para
iniciar uma trajetória de crescimento que se impõe não só em Portugal, no nosso País, mas também na União
Europeia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, referiu que as medidas que têm vindo a
ser implementadas não terão correspondido às minhas expectativas. Deixe-me que lhe diga que as minhas
expectativas não interessam para nada, o que interessa são as expectativas dos portugueses.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
Protestos do Deputado do PS João Paulo Correia.
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O Sr. Fernando Negrão (PSD): — E as expectativas dos portugueses são, de facto, as seguintes: os
princípios são bons, o erro está na execução. Sr.ª Deputada, deixe-me que lhe diga que não é nenhuma
novidade para nós o facto de o Partido Socialista e o Governo, normalmente, executarem mal as coisas.
Aplausos do PSD.
Isso está a acontecer! Basta olharmos para as filas de pessoas à procura de alimentos. E o Governo o que
tem feito? Não tem feito nada, Sr.ª Deputada!
O Sr. João Paulo Correia (PS): — É mentira!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Não temos visto que tenham feito alguma coisa.
Protestos do PS.
A sua crítica, Sr.ª Deputada, relativamente à minha intervenção, revela duas coisas. Primeiro, desabituaram-
se de ouvir críticas, e isso é mau.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Oh!…
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Segundo, confundem os princípios com a execução, com o ato de «meter
as mãos na massa», de fazer as coisas e de responder com aquilo que é preciso aos portugueses que precisam
de mais apoio e de mais ajuda.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo
Parlamentar do CDS-PP.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Na
realidade, embora devêssemos discutir hoje o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas,
o que hoje estamos a discutir é o não-programa de estabilidade e o não-programa nacional de reformas, aliás
não apresentados aqui pelo Sr. Ministro das Finanças ou pelo ainda Sr. Ministro das Finanças.
Convém que tenhamos noção da gravidade do momento em que fazemos esta discussão. Estamos a viver
a pior crise provocada por uma pandemia, mas também a pior crise de há muitas décadas. A economia está
agora a lutar para abrir gradualmente. Muitos trabalhadores esforçam-se para manter os seus postos de trabalho
e muitas empresas lutam pela sua sobrevivência. A nossa concentração máxima, a concentração máxima do
País, do Governo, do Parlamento, de todos devia estar na recuperação, na retoma e na reabertura.
Na realidade, o que temos aqui com estes documentos é o Conselho das Finanças Públicas a dizer que o
Programa de Estabilidade, pura e simplesmente, não cumpre a legislação nacional e não cumpre a legislação
comunitária. O que estamos aqui a discutir não é um Programa de Estabilidade, é uma conta-relatório de
atividades e mesmo essa bastante imperfeita.
A UTAO, Unidade Técnica de Apoio Orçamental, diz expressamente que Portugal é o único país da Europa
que não divulga nem faz projeções macroeconómicas ou projeções de finanças públicas. Este organismo
independente, traduzindo, diz que o Governo não faz ideia do que vai passar-se na economia — e,
aparentemente, não quer fazer — e também não faz ideia de que forma vamos poder aplicar os recursos do
País, os recursos de todos nós, que são limitados, muito limitados. Aparentemente, está mais ocupado a discutir
outros assuntos prioritários.
O CDS não aceita nem se conforma com esta apatia e apresenta aqui um projeto feito a pensar naqueles
que estão em layoff, que já estão a receber apenas dois terços do salário, a quem a austeridade já chegou,
naqueles pequenos empresários que não sabem se vão ou não poder abrir o seu negócio, naqueles que
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perderam o seu emprego e não sabem como vão poder ir ao supermercado na semana seguinte. São eles que
têm de ser a nossa prioridade e é este o debate que devia, hoje, estar aqui a acontecer.
Por isso, o CDS não se fica pelas palavras e apresentou um projeto de resolução com três prioridades:
primeiro, retoma económica e recuperação económica; segundo, um programa de emergência social, porque
aqueles que são mais afetados pela crise não podem ficar para trás; terceiro, levantamento das medidas de
confinamento em segurança, recuperando o que está em atraso na saúde e eliminando a desigualdade digital
na educação.
A pandemia é ainda uma ameaça e a resposta europeia, vamos ser francos, é muito incerta, mas nós
podemos e devemos concentrar-nos naquilo que depende de nós e só de nós. Neste momento, temos um
Governo que oscila entre discutir a Europa ou discutir-se a si próprio, deixando para Portugal e para os
portugueses que estão a viver um momento muito difícil uma mera nota de rodapé. Perante dificuldades, o que
vemos é mais preocupações em passar culpas do que em resolver os problemas. E, quando era preciso
estarmos a discutir um Programa de Estabilidade a sério e, de facto, um programa de reformas, o que vemos é,
com toda a franqueza, um Ministro das Finanças em serviços mínimos e um Primeiro-Ministro amuado com os
contratos que ele próprio assina em nome do País.
Sr.as e Srs. Deputados, a concentração, hoje, tem de ser na recuperação, na retoma e na abertura. É nesse
sentido que o CDS apresenta não apenas palavras mas propostas concretas, que, aliás, continuaremos a
apresentar ao longo deste debate.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do Grupo
Parlamentar do PCP.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perante um Governo que mantém a sujeição
das opções orçamentais do País ao visto prévio de Bruxelas, mesmo numa situação como a que estamos a
viver, o PCP apresenta, em forma de projeto de resolução, as opções de uma política alternativa que dê resposta
à situação causada pela COVID-19 e que rompa com a submissão aos ditames de Bruxelas, encetando um
rumo de soberania nacional, desenvolvimento e progresso social.
Para combater os impactos do surto epidémico, o aproveitamento que dele está a ser feito e para garantir o
futuro do País, Portugal precisa de uma política que assegure o emprego, que defenda os salários e os direitos
dos trabalhadores e do povo, que reforce os serviços públicos, que promova a produção nacional e que assegure
o investimento.
Fingindo ignorar a real dimensão dos problemas económicos e sociais com que o País está confrontado, o
Governo lança a ideia da chamada «reabertura da economia», sem, contudo, responder a questões de fundo
que se colocam, designadamente os riscos de falências em massa de empresas e do colapso de setores e
fileiras económicas; a redução significativa do poder de compra da população e os seus impactos no plano social
e económico; os problemas e limitações nos serviços públicos, que impedem a resposta que seria agora
necessária; os processos de ainda maior concentração e centralização de capital, antagónicos aos interesses
nacionais.
Para o PCP, o único caminho que abre uma perspetiva de desenvolvimento sustentado, capaz de resistir a
ameaças e incertezas do futuro, é o caminho da reposição de direitos e rendimentos, é o reforço do investimento
público, dotando o País das infraestruturas de que necessita, é a dinamização do aparelho produtivo nacional,
substituindo importações por produção nacional, é o reforço dos serviços públicos, é a libertação do País do
domínio dos grupos monopolistas e a recuperação do controlo público dos setores estratégicos da economia,
opções essas que não são compatíveis com a submissão às regras da União Europeia e do euro.
Por isso, o PCP propõe medidas de curto prazo, que ao mesmo tempo assegurem perspetivas de futuro para
o País. Medidas como a proibição dos despedimentos, o pagamento dos salários por inteiro, recorrendo a um
fundo público financiado pelo Orçamento, o alargamento de apoios sociais a quem ficou sem nada de um dia
para o outro, a proteção e defesa da saúde dos milhares de trabalhadores que asseguram funções essenciais,
medidas de apoio aos agricultores e pescadores, garantindo rendimentos a quem continua a abastecer o País.
Medidas para que haja apoios que, de facto, cheguem às micro, pequenas e médias empresas, desde logo, a
criação de um fundo público de apoio à tesouraria das microempresas que não passe pela ineficaz intermediação
bancária, a recuperação do controlo público de empresas e setores estratégicos particularmente ameaçadas na
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atual situação, como é o caso da TAP, a dinamização de um forte investimento nos serviços públicos, rompendo
com o subfinanciamento, falta de pessoal, degradação e privatização.
São 64 recomendações, em diversas áreas, que colocamos ao País. Não valem pelo número, mas pelo seu
conteúdo, porque são as opções de que o País precisa para responder aos problemas atuais.
A realidade tem demonstrado que o País precisa de uma política alternativa, patriótica e de esquerda, que
rompa com as amarras e condicionamentos que impedem o nosso desenvolvimento.
É essa a opção que o PCP coloca em cima da mesa.
Em vez de continuar a obedecer a uma União Europeia que não revela qualquer interesse em responder de
forma adequada a esta nova realidade, precisamos de optar por um outro caminho para combater o vírus e
assegurar o desenvolvimento do País!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Carlos Brás, do
Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. CarlosBrás (PS): ⎯ Sr. Presidente, Sr. Deputado Duarte Alves, o PCP, por intermédio de V. Ex.ª,
traz-nos uma proposta que recomenda que se mande às favas os compromissos com a União Europeia. Ora,
este é um tempo em que é reclamada coesão no território nacional e entre os portugueses e também entre os
Estados-Membros da União Europeia.
Pertencer à União Europeia implica, obviamente, como todos sabemos, alienar algumas parcelas de
soberania, mantendo sempre a nossa identidade e defendendo sempre a solidariedade.
A defesa do interesse nacional é compatível com a moeda única e com a União Europeia e o futuro de
Portugal é defendido dentro da União Europeia e não fora dela. As opções do PEC (Pacto de Estabilidade e
Crescimento) são compatíveis, também, com esse mesmo interesse nacional e o PCP não pode reclamar nas
instâncias europeias, nomeadamente no Parlamento Europeu, subvenções e, depois, vir a este Parlamento
propor a rutura com a União Europeia.
Tem de haver alguma coerência entre as posições assumidas, fora e dentro do País. Por isso, Sr. Deputado,
só posso compreender esta proposta como sendo para consumo interno do seu partido. Mas o PCP já mostrou
que sabe fazer mais e melhor, e fazer melhor neste caso, Sr. Deputado, é dar voz ao partido, é reforçar a posição
do partido nas instâncias europeias e não tentar minar o projeto europeu.
Os nossos esforços devem ser desenvolvidos no seio da União Europeia e Portugal deve ser parte da
solução, da boa solução.
Sr. Deputado, queria que nos explicasse se o PCP defende que Portugal deve sair da União Europeia e deve
romper com os tratados europeus. É essa a questão que gostaria de ver esclarecida.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Duarte Alves, do PCP.
O Sr. DuarteAlves (PCP): ⎯ Sr. Presidente, Sr. Deputado, agradeço a sua pergunta. Referiu a palavra
solidariedade, uma palavra que se ouve muito na propaganda da União Europeia, mas trata-se de uma
solidariedade propalada, que não a estamos a ver. Qualquer pessoa que olhe para a realidade europeia e para
a realidade das políticas que estão a ser aplicadas pelas instituições da União Europeia e também do euro vê
que essa solidariedade é uma miragem, não existe.
O PCP coloca como necessidade para o País romper com os mecanismos de submissão que são
determinados por estes pactos, por estes tratados que nos empurram para mais dívida para que depois essa
dívida seja sujeita aos mesmos ajustamentos do tipo troica e do tipo PEC, que o País conhece pelas piores
razões.
Como é que se explica que, no momento em que estamos atualmente, o BCE (Banco Central Europeu) possa
emprestar diretamente aos Estados e empreste aos bancos e que, depois, os Estados se financiem a juros
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superiores? Como é que se mantêm os pactos que nos vão empurrar para esses ajustamentos do tipo troica?
Como é que não há um reforço das verbas da coesão?
Perante esta realidade, o que se impõe é colocarmos em cima da mesa a rutura com esses mecanismos e
com essas imposições e, até, a necessidade de recuperamos a soberania monetária, que tanta falta faria para
dar resposta a uma situação como aquela que estamos a viver.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Silva, do Grupo
Parlamentar do PAN.
O Sr. AndréSilva (PAN): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: Todos compreendemos que a crise sanitária, social e económica causada pelo novo coronavírus
(SARS-CoV-2) trouxe alguma imprevisibilidade. Não podemos é aceitar que o Governo nos apresente uma
espécie de rascunho focado em fazer marketing político, preocupado com a política do dia a dia e sem uma
visão estratégica para a recuperação do País no pós-COVID-19.
Não podemos aceitar que FMI (Fundo Monetário Internacional), Comissão Europeia, Banco de Portugal ou
universidades consigam fazer previsões de cenários sobre a evolução da economia portuguesa, da dívida e do
défice e o Governo diga ao Parlamento e aos cidadãos que não consegue apresentar um cenário
macroeconómico.
Tal postura é única entre os países da zona euro, traduz-se numa falta de transparência orçamental sem
precedentes e desvirtua aqueles que deveriam ser os objetivos do Programa de Estabilidade e do Plano Nacional
de Reformas. Em tempos de crise, exige-se de um Governo clareza e transparência.
Em ambos os documentos salta à vista a ausência de uma visão estratégica para o País e para a recuperação
da crise económica, social e sanitária causada pelo novo coronavírus.
O que esperávamos era que o Governo, seguindo as orientações da ONU (Organização das Nações Unidas)
e das instituições da União Europeia, iria apostar numa mudança estrutural de paradigma e na construção de
uma economia ambientalmente sustentável e climaticamente neutra, que colocasse as pessoas e as suas
necessidades à frente dos interesses instalados.
Ora, o Plano Nacional de Reformas não coloca o combate às alterações climáticas como eixo central do
plano de recuperação para o pós-COVID-19 e, nas poucas linhas em que refere esse combate, esquece a
necessidade de o País se adaptar aos efeitos das alterações climáticas, que são o maior desafio da humanidade.
Este é um documento que não concretiza nem calendariza medidas, já para não falar da sua justificação à
luz de estudos que avaliem o seu valor económico e social.
Uma vez que o Governo apresentou um Plano Nacional de Reformas de faz de conta e sem as reformas de
que o País carece, o PAN traz para este debate uma proposta com uma visão clara para o País: a opção
estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento, no combate e adaptação às alterações
climáticas, na não aplicação de medidas de austeridade e em medidas de combate a interesses intocáveis.
O PAN propõe, assim, uma aposta nas energias renováveis, na eficiência energética e na redução da
pobreza energética, designadamente através de incentivos à microprodução, à produção de energia solar e ao
armazenamento das energias renováveis.
Defendemos a aposta no teletrabalho e na mobilidade sustentável, com melhoria da rede de transportes
públicos, incentivos à mobilidade ativa e apoio ao desenvolvimento de tecnologias mais limpas.
Na área da agricultura, a aposta deve ser a produção local, de proximidade, em modo biológico, com baixa
intensidade na utilização de agrotóxicos e de água.
Mas hoje não queremos deixar de enfatizar que esperamos que, neste Programa de Estabilidade, o Governo
não esteja a esconder um programa de austeridade com aumentos de impostos e com cortes dos salários e de
pensões.
Por isso, o PAN propõe que, para fazer face ao enorme aumento de despesa associado às medidas de
combate à crise económica, social e sanitária, o Governo adote opções orçamentais corajosas, que coloquem
as pessoas e o ambiente à frente de certos interesses instalados.
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Se a isenção de impostos sobre os produtos do petróleo custa ao País mais de 500 milhões de euros por
ano, o Governo que tenha a coragem de pôr fim a estes subsídios perversos.
Se a corrupção custa ao País por ano 18 mil milhões de euros, o Governo que tenha coragem de aprovar um
plano de combate à corrupção que preveja medidas eficazes e aprofunde a transparência.
Se pagamos três vezes mais do que devíamos pelas PPP (parcerias público-privadas) rodoviárias, o Governo
que tenha a coragem de renegociar estes contratos ruinosos para o País.
Se todos os anos perdemos 236 milhões de euros em impostos para a Holanda, o Governo que tenha a
coragem de, em articulação com a União Europeia, adotar mecanismos de combate ao branqueamento de
capitais e aos fenómenos de evasão e elisão fiscais assentes em paraísos fiscais.
Se, desde 2017, os buracos do Novo Banco já custaram ao País 3 mil milhões de euros, o Governo que
tenha a coragem de renegociar os empréstimos previstos para o Novo Banco, de modo a que durante a crise
sanitária não haja novas injeções.
Fontes de receita não faltam ao Governo, é apenas necessária coragem para agir.
Quando votarem a iniciativa do PAN, todos os partidos terão oportunidade de dizer de que lado estão. Se do
lado de um modelo económico extrativista e produtivista que nos trouxe à emergência climática e ao
esgotamento dos ecossistemas ou do lado do combate às alterações climáticas e pela construção de uma
economia verde. Se do lado da austeridade e dos sacrifícios para os mesmos de sempre, ou do lado do combate
aos benefícios injustificados aos setores intocáveis.
O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do Grupo
Parlamentar do PS.
O Sr. FernandoAnastácio (PS): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: O Programa de Estabilidade é apresentado num dos momentos mais graves e críticos da nossa
vida coletiva, no quadro de uma crise sanitária nunca vivida por nenhum de nós, uma crise de saúde pública
que traz a reboque uma grave crise económica e social.
Em primeiro lugar, quero deixar expresso o reconhecimento que é devido aos portugueses e às portuguesas
pela forma e pelo espírito cívico e de responsabilidade coletiva com que têm encarado e vivido este momento
particularmente difícil,…
Aplausos do PS.
… assim como uma palavra de apreço a todos aqueles que, na linha da frente, tiveram um papel determinante
no conter da propagação da pandemia. Para eles o nosso obrigado.
Sr.as e Srs. Deputados, no momento em que começamos a viver o processo de desconfinamento e de retoma
da atividade económica, ainda que num quadro de grande incerteza e de muita imprevisibilidade, o Governo
português, cumprindo as suas obrigações internas e externas, apresentou na Assembleia da República o
Programa de Estabilidade.
Este é um tempo sem paralelo, logo os modelos e as práticas não podem ser os mesmos dos tempos
normais. Por isso mesmo, seria muito útil ao debate que aqueles que têm como função fazer estudos técnicos
tivessem a humildade de reconhecer essa evidência.
Fazer previsões no presente momento, mais do que produzir informação plausível e credível, como o atual
Governo nos tem habituado — e perdoem-me aqueles que a tal se têm aventurado —, não seria mais do que
um mero exercício de adivinhação suscetível de frustrar ou condicionar a confiança dos agentes económicos.
Optou o Governo, e no nosso entender bem, por trazer à Assembleia da República um Programa de
Estabilidade focado no detalhe das medidas que têm vindo a ser tomadas no combate à pandemia em diferentes
vertentes — saúde pública, reforço do Serviço Nacional de Saúde, apoios sociais, proteção ao emprego, às
famílias e à habitação, capitalização das empresas, assim como evidencia a sua dimensão financeira e o seu
impacto orçamental.
Todos temos consciência de que o esforço financeiro é gigantesco e de que será necessário um amplo e
forte programa de relançamento da economia, o qual terá, necessariamente, de contar com a contribuição de
soluções, também elas inovadoras, geradas no quadro europeu.
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Sr.as e Srs. Deputados, os resultados da governação do Partido Socialista permitem-nos, hoje, tanto no plano
interno como externo, estar em melhores condições do que no passado recente para responder a este imenso
desafio. Os resultados no emprego, no crescimento económico, na redução da dívida pública, no equilíbrio das
contas públicas — recordo o superavit de 0,2%, tão criticado — são indicadores que sustentam de forma
inequívoca o que acabo de afirmar.
Mas detenhamo-nos no Programa de Estabilidade, que, de uma forma clara, nos dá a dimensão desse
esforço, particularmente nas medidas com impacto orçamental: em saúde pública, 500 milhões de euros; em
apoio às famílias, um impacto mensal de 141 milhões de euros; em apoio à atividade económica, 700 milhões
de euros mensais e 500 milhões de euros de uma prestação única; aproximadamente 1% do PIB, próximo dos
2000 milhões de euros.
Quanto a medidas com impacto financeiro, sem impacto orçamental, destaco as prorrogações das obrigações
fiscais, que equivalem a 3,71% do PIB, 7,8 milhões de euros; moratórias de créditos, 11,351 milhões de euros,
cerca de 5,35% do PIB; linhas de crédito com garantia do Estado; e outras medidas de apoio à liquidez, mais
de 4000 milhões de euros. Refiro ainda o Portugal 2020, os fundos europeus para reforço do investimento, que
ascendem a cerca de 1,29 milhões de euros.
Em síntese, são mais de 25 mil milhões de euros, o equivalente a 11% do PIB.
Esta realidade, bem como o seu financiamento, necessariamente imporá um orçamento suplementar. O
Governo já o afirmou, e comprometeu-se a apresentar esse orçamento durante o mês de junho.
Esse será o exercício orçamental que terá a chancela de quem já apresentou quatro Orçamentos do Estado
sem a necessidade de retificativos, e que cumpriu sempre as suas previsões orçamentais.
Aplausos do PS.
Sr.as e Srs. Deputados, este é o Programa de Estabilidade adequado e possível no momento, destinado a
elencar e a descrever o esforço que se está a fazer, a base para o orçamento suplementar, que será o
instrumento de política orçamental para responder à crise pandémica e à crise social e económica, relançando
a economia por forma a possibilitar que, no mais curto lapso de tempo possível, voltemos ao crescimento
económico e ao bem-estar social.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Cotrim de
Figueiredo, do Iniciativa Liberal.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e
Srs. Deputados: Este devia ser um debate sobre o Programa de Estabilidade. Mas qual Programa de
Estabilidade? Não é possível discutir um documento que, na verdade, não o é.
O Conselho das Finanças Públicas e a UTAO fazem a mesma crítica que nós: este documento não contém
informações mínimas, não tem cenários macroeconómicos ou orçamentais, não cumpre as orientações
europeias nem é transparente.
Gostava de saber como é que o Conselho de Ministros aprovou um Programa que não é mais do que uma
lista de medidas relacionadas com a COVID-19, com quase nenhuns números. Os Ministros leram, ao menos,
o documento?
Portugal vai ser o último País a entregar o programa a Bruxelas e o documento nem sequer está em
condições. Desta vez não corremos, certamente, o risco de nos acharem o bom aluno da Europa.
Quanto ao Plano Nacional de Reformas, o Governo diz que vai preparar um plano de recuperação
económica. E a pergunta é: quando?
É que planear a retoma é urgente e, por isso, já ontem o Iniciativa Liberal apresentou o seu programa de
retoma, com dezenas de medidas que bem vos podiam servir de inspiração.
A própria Comissão Europeia destaca a ausência de melhorias estruturais em várias áreas, entre elas — de
muitas! — a sustentabilidade financeira e a transparência das empresas públicas, a redução da carga
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administrativa e regulamentar que pesa sobre as empresas, a redução das restrições nas profissões altamente
regulamentadas.
Continuamos enredados em burocracia. É urgente descomplicar Portugal, mas nenhum destes documentos
nos ajudará a fazê-lo.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste
debate sobre o Programa de Estabilidade e sobre o Programa Nacional de Reformas que o Governo português
decidiu apresentar à Comissão Europeia, Os Verdes começam por lembrar dois elementos que, não fazendo,
propriamente, parte do conteúdo dos documentos, não podem, ainda assim, ficar de fora desta discussão.
O primeiro elemento é para lembrar que tanto o Programa de Estabilidade como o Programa Nacional de
Reformas fazem parte de um conjunto de instrumentos que expressam, no plano formal, as submissões a que
o nosso País se continua a sujeitar perante as instituições europeias.
O segundo elemento é para lembrar que, em concreto, a decisão de aceitar essa espécie de «visto prévio»
da União Europeia face às opções e às prioridades do nosso País teve apenas o acolhimento do PS, do PSD e
do CDS-PP.
Na verdade, sempre que esta Assembleia discutiu transferências de soberania para a União Europeia, foram
essas forças políticas que disseram «sim senhor, transfira-se». E assim foi, também, em matéria de soberania
orçamental, que é, de resto, a questão-chave de qualquer povo, em termos de soberania.
Ora, na perspetiva de Os Verdes, já há muito que é tempo de se proceder a uma avaliação sobre este
conjunto de submissões, onde a União Europeia é que sabe quais as prioridades do nosso País e não os
portugueses e os seus representantes.
E, por mais voltas que se pretendam dar para fugir ao que é evidente, há, neste contexto, um dado do qual
não é possível fugir. Enquanto permanecermos sujeitos às imposições que decorrem da aplicação das regras
do euro, por mais remendos que se façam, aqui e acolá, serão sempre programas condicionados pelo exterior
e que, como vimos no passado, estão muito longe de responder aos problemas do País e dos portugueses.
Aliás, como a crise provocada pela COVID-19 está a deixar bem claro, as políticas que tiveram como pano
de fundo este «visto prévio» fizeram sempre mais parte do problema do que da solução. E fizeram mais parte
do problema não só porque representaram, como continuam a representar, sérios obstáculos ao
desenvolvimento do nosso País e dos povos da Europa em geral, mas também porque vieram acentuar as
divergências entre os próprios países da União Europeia.
A este propósito, não deixa, aliás, de ser curioso que os Estados-Membros, em plena pandemia, continuem
vinculados ao cumprimento dos calendários e dos critérios do Semestre Europeu e, simultaneamente, o
endividamento lhes seja apresentado pelas instituições europeias como o único meio para financiar o aumento
da despesa pública decorrente da pandemia e, desde logo, as despesas com a saúde.
Ainda assim, não deixamos de fazer alguns comentários sobre o conteúdo dos documentos em discussão,
em particular no que diz respeito ao Programa Nacional de Reformas.
Vejamos. No capítulo da sustentabilidade dos recursos e transição energética, o documento assume
pretender continuar os esforços de transformação da paisagem e a remuneração dos serviços dos ecossistemas
que promovam a conservação da natureza e da biodiversidade. E nós dizemos: muito bem. Só que ficamos sem
perceber onde em tão nobre propósito encaixa a construção do aeroporto do Montijo e os seus impactos nos
ecossistemas e na biodiversidade.
Logo a seguir, assinala-se a melhoria da qualidade dos solos, que promova a sua revitalização e
recuperação, nomeadamente no caso dos passivos ambientais. E nós dizemos: muito bem. Só que o Governo
continua com a lei ProSolos na gaveta e não há meio de a de lá tirar.
Por fim, o documento destaca o desenvolvimento de uma agricultura sustentável, mas o Estatuto da
Agricultura Familiar continua à espera de melhores dias para sair do papel.
Quanto ao resto, o que Os Verdes consideram essencial é proceder ao relançamento da economia de forma
justa e sustentável, que dê resposta aos desafios sociais e ambientais que temos pela frente, mas que essas
respostas tenham como farol orientador o interesse do desenvolvimento do País e o bem-estar dos portugueses
e que não sejam norteadas por imposições externas.
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Do que precisamos é de apostar na nossa produção, que é, aliás, a única forma de nos defendermos dos
fatores externos que não dominamos, mas que condicionam a economia. Sobretudo, é preciso recuperar a
nossa soberania alimentar, cuja emergência saiu reforçada perante a crise que estamos a viver.
E se é verdade que o nosso País tem todas as condições para promover um crescimento económico onde a
componente económica se agregue à componente social e ambiental, com uma atividade produtiva de qualidade
e respeitadora dos nossos recursos e património naturais, também é verdade que, enquanto estivermos sujeitos
a este nível de condicionalismos e constrangimentos da União Europeia, não haverá Programa de Estabilidade
nem haverá Programa Nacional de Reformas que promovam um crescimento verdadeiramente sustentável.
Aplausos do Deputado do PCP Duarte Alves.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de
Esquerda.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: É para
nós muito claro que o problema não é o que está no documento do Programa de Estabilidade, o problema é o
que lá falta. E devo dizer que os cenários macroeconómicos valem sempre o que valem.
A nós não nos preocupam as informações que vão ou não vão para serem validadas por Bruxelas, o que nos
preocupa é se o Governo tem uma resposta de médio e longo prazo para responder à crise que se avizinha —
e que, aliás, já está instalada —, por consequência da pandemia de COVID-19.
A ideia que o Governo tem reiterado de esperar pela confirmação da crise é uma ideia perigosa. A crise já
está confirmada e já sabemos que ela é grave, a única dúvida é saber quão grave será esta crise.
Sabemos já que não bastam as linhas de crédito, numa economia que já está endividada, não basta enviar
milhares de trabalhadores para layoff, perpetuando e normalizando os baixos salários.
É preciso estender os apoios sociais — e já! — para garantir que ninguém entra na pobreza, e por isso a
proposta do Bloco de Esquerda para um subsídio extraordinário de desemprego e de cessação de atividade.
É preciso — já! — encontrar formas de apoio para as microempresas que não acedem ao crédito, e por isso
a proposta do Bloco de Esquerda é a de um apoio direto, a fundo perdido, para manter os salários nas
microempresas.
Sabemos que, no médio prazo, nada disto chegará e bastará para recuperar a economia.
Queremos saber qual é o programa de investimentos, qual é a estratégia de longo prazo do Governo para a
recuperação económica. Não chega, para isso, dizer que se vão manter os planos de investimento que já
estavam previstos anteriormente, sabendo nós que alguns deles são desastrosos, como é o caso da construção
do novo aeroporto ou da decisão errada de construir uma linha circular de metro em Lisboa.
Vai ser preciso fazer mais, porque nada voltará a ser como era. Será preciso reconverter setores produtivos
em crise. Será preciso repensar os serviços públicos.
Qual é o novo papel da educação? Qual é o novo papel da saúde, dos cuidados dos idosos e dos doentes?
Qual é o novo papel dos serviços públicos e que investimento teremos de fazer? Qual é o papel dos setores
essenciais e como vamos controlar os setores essenciais? Como vamos alterar as regras fiscais para um mínimo
de moralidade na forma como as empresas contribuem para a recuperação do País?
Perante esta necessidade, o Governo também faz mal em dizer que quer esperar por aquilo que virá da
Europa. As regras europeias têm sido uma condicionante, uma restrição ao desenvolvimento do País, e
continuam a sê-lo. Até agora, aquilo que saiu do Eurogrupo é inútil. É de tal forma inútil para o fim da recuperação
económica que nenhum País aceita utilizar o mecanismo.
Aproveito para felicitar o Ministro das Finanças português por decidir recusar o mecanismo que foi
apresentado pelo Presidente do Eurogrupo. Fez bem em recusá-lo! Esse mecanismo seria perigoso para a
estabilidade de Portugal.
A questão que deixamos neste debate é a seguinte: para além de esperar por aquilo que há de vir, para além
de esperar pela crise que há de vir, para além de esperar pela Europa — que nunca virá e que sabemos que
não virá como se espera —, qual é a estratégia, qual é o compromisso, de médio e longo prazo, do Governo
para com o País?
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A discussão não é sobre este Programa de Estabilidade, a discussão é sobre o orçamento suplementar que
aí virá e é sobre o que virá depois desse orçamento suplementar, seja quem for o Ministro das Finanças.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Hortense Martins.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, todos sabemos que
estamos perante uma crise absolutamente excecional e, portanto, seria de todo impossível que estes
documentos fossem iguais aos do passado.
Este Governo apresentou uma estratégia, tem dado uma resposta fundamental à crise para apoiar os
portugueses, e podemos congratular-nos com essa resposta, que foi essencial ao nível do Serviço Nacional de
Saúde, reconhecido internamente e internacionalmente.
Aplausos do PS.
Penso que estamos de acordo sobre isso, Sr.ª Deputada, porque o Serviço Nacional de Saúde é
absolutamente essencial para todos os portugueses. E foi este Governo, com o apoio dado em termos de
consenso neste Parlamento, que permitiu que essa resposta fosse capaz e essencial em relação a esta
pandemia.
Mas esta crise pandémica ainda não está vencida e o investimento que se fez só foi feito porque foram
poupados recursos, nomeadamente 2 mil milhões de euros em juros, resultado da boa gestão, a nível
orçamental, feita por este Governo, liderado pelo Primeiro-Ministro António Costa e pelo Ministro das Finanças
Mário Centeno. Temos de dizê-lo. As contas públicas certas permitiram este investimento, que temos de
continuar necessariamente a fazer. É isso que o Partido Socialista quer que seja feito.
Aplausos do PS.
Investiu-se nos equipamentos, nos materiais de apoio a esta pandemia e, também, nas infraestruturas a nível
hospitalar, com as quais o Governo já se comprometeu. E investiu-se também num plano apresentado para
reforçar o Serviço Nacional de Saúde, que queremos cada vez melhor.
Esse Serviço Nacional de Saúde tem dado resposta aos portugueses e tem sido elogiado, por exemplo, pela
OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) no que diz respeito à questão do Plano
Nacional de Vacinação, à questão da obstetrícia, ao facto de termos uma das mais baixas taxas de mortalidade
infantil da OCDE, às respostas inovadoras como a telessaúde, a telemedicina, respostas que não são só para
a COVID-19, mas também para as necessidades existentes que se mantiveram e que foram, de certa maneira,
descuradas, embora as necessárias tenham sido priorizadas.
Temos de prosseguir nesse movimento assistencial e estou certa de que teremos esse consenso para,
juntos, lutarmos por um melhor e mais eficaz Serviço Nacional de Saúde.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Hortense Martins, as contas públicas certas
levaram a que, em 2018, quase 50% do investimento público ficasse por executar. Se, hoje, o País tem
dificuldade, por exemplo, em que possam ser cumpridas as regras sanitárias nos comboios da linha de Sintra,
agradece às contas públicas certas, que não permitiram comprar novos comboios para a linha de Sintra.
Sabemos que a resposta inicial do Governo foi importante e sabemos quão importante foi o investimento que
se fez em recursos humanos no Serviço Nacional de Saúde ao longo destes anos. Isso não está em causa. O
que está em causa é que a crise económica e social agrava-se e o Governo não pode viver das medidas iniciais
que pôs em prática.
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A questão é esta: o que é que vai ser feito agora para combater essa crise que se agrava?
É esta a pergunta que fazemos, à qual este documento não dá resposta.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Hoje, devíamos
estar a discutir que medidas vamos tomar para compensar aquele quase um terço de empresas que ainda não
receberam os apoios do layoff ou aquelas ordens profissionais que ficaram de fora dos apoios profissionais.
Este Programa não responde a isso. Ficámos surpreendidos. Como diria o Deputado João Paulo Correia,
«fomos apanhados pelas costas».
Tendo em conta aquilo que hoje é mais importante, olhamos para este Programa e vemos uma coisa: que
dele não constam os dados fundamentais. Não refere qual é a evolução da dívida pública, nem sequer a perda
de receita fiscal, o que nos leva a questionar, Sr. Ministro — e talvez possa esclarecer isso hoje a esta Câmara
e aos portugueses —, se vai, ou não, haver aumento de impostos muito em breve.
Porque não nos quis dizer qual é a perda de receita fiscal? Acredito que seja o «Ronaldo das finanças», mas
não faz milagres! Portanto, mais vale dizer a este País e a esta Câmara que impostos é que vai aumentar, se
vai aumentar alguns.
Queria terminar dizendo o seguinte: detesto ser aquele tio chato que faz perguntas desagradáveis no jantar
de Natal, mas, Sr. Ministro, no meio de uma crise destas, estarmos todos, em casa, a ver na televisão o Sr.
Ministro com o Primeiro-Ministro, o Primeiro-Ministro consigo, o Presidente da República a ligar para lá, ninguém
a atender ou a atender… Explique lá isto ao País: demitiu-se ou não se demitiu? Vai demitir-se ou não vai
demitir-se? Vai continuar ou vai para o Banco de Portugal?
Acho que a grande maioria dos portugueses quer saber se o nosso «Ronaldo das finanças» vai continuar à
frente do leme, a gerir a crise ou se se vai embora. É uma pergunta mais do que justa que, hoje, os portugueses
lhe fazem.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Almeida, do Grupo
Parlamentar do CDS-PP.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: O CDS entende que, neste momento, na ausência do Programa Nacional de Reformas e do
Programa de Estabilidade, que era o que devíamos estar a discutir, o Governo, pelo menos naquilo que nos
apresentou em substituição do Programa Nacional de Reformas e do Programa de Estabilidade, devia ter tido a
preocupação de apresentar medidas claras para o momento que vivemos e, desde logo, aquilo que o CDS
reclama desde o início desta crise, que é um verdadeiro programa de emergência social.
Já aqui o dissemos e essa é uma parte significativa do nosso projeto de resolução: como é que achamos
que a economia deve recuperar o seu ritmo e como é que o emprego deve, também, retomar o ciclo que vinha
tendo de crescimento.
Em termos de economia social, em termos de emergência social, é preciso, muito claramente, ajudar as
famílias, que, mais do que nunca, precisam de saber como conciliar a sua vida familiar, o apoio à família, o apoio
às crianças e aos idosos, com o desempenho da atividade profissional.
É preciso reativar a rede de cantinas sociais, porque, infelizmente, há gente, neste momento, a passar fome
em Portugal. É fundamental que reativemos essa rede, para que esta situação deixe de existir o mais depressa
possível.
Para os desempregados, é preciso haver um programa de formação profissional que perceba que a economia
não vai voltar a ser aquilo que era e que a reconversão profissional tem de ser uma prioridade deste programa
de emergência, para que as pessoas possam encontrar, efetivamente, emprego no futuro.
É preciso ajudar as pessoas com deficiência, pois, em situações de crise, agrava-se a sua exclusão, e as
instituições particulares de solidariedade social, que, neste contexto, quando tiveram de fazer esforços maiores
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do que aqueles que faziam, naturalmente, noutra situação, tiveram um aumento, segundo o acordo feito com o
Estado, inferior ao custo do aumento do salário mínimo.
É fundamental que este Governo assuma as suas responsabilidades. E assumir as suas responsabilidades
é não deixar ficar ninguém para trás, é aprovar e praticar um verdadeiro programa de emergência social.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada não inscrita Joacine Katar
Moreira.
A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes dois documentos em
análise, tanto o Programa de Estabilidade como o Programa Nacional de Reformas, mostram-nos que o
Executivo tem unicamente como objetivo cumprir o calendário do Semestre Europeu, porque ambos os
documentos apenas fazem o resumo daquelas que têm sido as medidas tomadas e votadas neste Plenário, sem
uma visão estratégica e, sobretudo, sem olhar para o futuro.
Num ambiente igual a este, de emergência sanitária, de desemprego, de despejo, de pobreza e de aumento
da vulnerabilidade de milhares de famílias, importa-nos que haja um olhar efetivo sobre o amanhã. Esse amanhã
só está resumido naquilo que o Executivo afirma ser o seu plano de recuperação económica. Então, se existe
isto, urge questionarmos: está assegurada a não aplicação de medidas de austeridade? Estão considerados
investimentos que nos ajudem a mitigar os efeitos da ação climática? Estão, igualmente, previstos investimentos
nos serviços públicos?
É que esta, sim, é uma visão estratégica, nomeadamente no que toca ao investimento no Serviço Nacional
de Saúde, que é absolutamente essencial no atual contexto de emergência.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira, do
Grupo Parlamentar do CDS-PP.
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Estado e das Finanças, Srs.
Secretários de Estado, Srs. Deputados: O Programa Nacional de Reformas tem, como objetivo, identificar e
ultrapassar os bloqueios do Estado. E existem bloqueios estruturais na nossa economia. Existe um excesso de
carga fiscal, um excesso de burocracia, um excesso de endividamento, e temos um País que precisa de menos
impostos, de menos papelada e de mais liquidez.
Hoje, vivemos tempos de austeridade no País. A austeridade chegou àqueles trabalhadores que estão em
regime de layoff e que perderam rendimento. A austeridade também chegou àqueles empresários que tiveram
de encerrar as suas empresas. A austeridade também chegou àqueles que estão, infelizmente, numa situação
de desemprego. Ou seja, há milhares de portugueses que vivem numa situação de austeridade.
Neste contexto, é importante perguntar-lhe, Sr. Ministro das Finanças: que ministro temos hoje no
Parlamento? Temos um ministro demissionário? Temos um ministro que apenas vai ficar no Governo até dia 15
de junho, como foi anunciado? O País e o Parlamento exigem uma resposta da parte do Sr. Ministro e do
Governo.
Sr. Ministro, esclareça, pois: está, ou não está, demissionário?
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Mário
Centeno.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Mário Centeno): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A
apresentação do Programa de Estabilidade marca, em cada ano, o Semestre Europeu, um ciclo anual que
permite aos países da União Europeia coordenar as suas políticas económicas. Mas 2020 é um ano diferente,
não porque a coordenação seja, hoje, menos importante — até pelo contrário, ela é hoje mais importante —,
mas porque Portugal, a Europa e grande parte do mundo foram assolados por uma pandemia, causadora de
enorme incerteza e instabilidade em todas as dimensões da nossa sociedade.
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Apresentámos Programas de Estabilidade entre 2016 e 2019. Em todos eles, apesar das reservas de outras
entidades, as nossas estimativas foram sempre as que mais se aproximaram da realidade. Na verdade, fomos
até ultrapassados em todos esses anos pela própria realidade. Éramos sempre, à partida, os mais otimistas e
os factos demonstraram em todos estes quatro anos as razões para este otimismo.
Aplausos do PS.
Chegámos ao final de 2019 com um dos maiores crescimentos económicos trimestrais da zona euro: 0,7%.
Fomos o País cujo crescimento mais acelerou. Pela primeira vez em democracia, atingimos um excedente
orçamental, de 0,2% do PIB.
Aplausos do PS.
A economia portuguesa evoluiu nos primeiros meses de 2020 seguindo o mesmo padrão. Os dados
conhecidos de janeiro e de fevereiro mostram uma aceleração da receita fiscal, da receita contributiva e da
generalidade dos indicadores económicos. No final de fevereiro, a taxa de desemprego tinha caído para 6,4%.
Mas, em abril, a situação foi substancialmente distinta. A profunda alteração da ação do Estado e da
sociedade tal como a conhecemos, em resultado do combate à COVID-19, está a ter um impacto massivo na
economia, no mercado de trabalho e nas contas públicas.
Sabemos que este impacto é massivo e que não tem origem na economia, nem no sistema financeiro, hoje
mais robustos e preparados, mas desconhecemos a sua intensidade e a sua extensão no tempo.
Este é, na verdade, um dos momentos mais críticos para a sociedade portuguesa das últimas décadas.
O Programa de Estabilidade que apresentamos não pretende responder a desequilíbrios macroeconómicos
ou a défices excessivos. O Programa de Estabilidade de 2020, remetido pelo Governo a esta Assembleia, é
distinto do que apresentámos anteriormente, porque o momento que vivemos é também ele distinto.
A avaliação do impacto do confinamento a que o País e o mundo foram sujeitos apenas se poderá concretizar
mais tarde.
O retorno à trajetória de crescimento económico e consolidação orçamental só será possível e sustentável
quando a crise sanitária e os seus efeitos económicos e sociais se encontrarem debelados.
O Programa de Estabilidade apresenta uma estimativa do impacto no crescimento económico das medidas
de confinamento social com base em informação setorial sobre a adesão ao regime de layoff simplificado.
Estimamos, assim, que, em média, cada 30 dias úteis de confinamento gerem um impacto negativo anual no
PIB de 6,5 pontos percentuais.
Para mitigar o impacto económico e social das medidas de controlo sanitário, o Governo tem vindo a adotar
diversas iniciativas de proteção dos trabalhadores e dos seus postos de trabalho, bem como de apoio às
empresas. Estas medidas estão orçamentadas em cerca de 2000 milhões de euros por mês — 1% do PIB de
2019, incluindo medidas com incidência única. Acrescem medidas discricionárias, com impacto financeiro, mas
sem impacto orçamental direto, de mais de 25,1 mil milhões de euros — 12,5% do PIB, incluindo o apoio à
liquidez das empresas, concessão de incentivos, moratória de créditos e de rendas e prorrogações fiscais e
contributivas.
Os dados disponíveis para março e abril demonstram bem a severidade da quebra da atividade económica
registada. Entramos, agora, no período de levantamento gradual das restrições de confinamento, que não
sabemos por quanto tempo se alargará.
Há, certamente, uma redução da atividade sem paralelo na nossa economia nas últimas décadas. Disso não
temos dúvidas.
Portugal, nos últimos quatro anos, construiu bases sólidas e ganhou uma credibilidade que nos permitem,
hoje, enfrentar melhor esta crise do que no passado.
Aplausos do PS.
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Foram quatro Orçamentos com objetivos cumpridos, a maior redução da dívida pública da área do euro em
quatro anos, uma também substancial redução da dívida do setor privado e o maior crescimento económico e
do emprego em muitas décadas.
Nos últimos quatro anos, Portugal demonstrou uma solidez das suas instituições sem paralelo no contexto
europeu. A estabilidade, previsibilidade e transparência das decisões de política económica são essenciais para
a confiança e o investimento.
Assistimos, infelizmente, a um interregno temporário do processo de crescimento económico. Não devemos
nem podemos permitir que este interregno afete o funcionamento das instituições, a estabilidade económica,
financeira e bancária de longo prazo e muito menos a estabilidade social e institucional.
Aplausos do PS.
Voltaremos, em conjunto, a conquistar o futuro, para o qual, de forma tão árdua, trabalhámos nos últimos
quatro anos, com verdade e com a responsabilidade de apresentar todas as consequências das propostas que
fazemos.
Foi assim que sempre construímos os nossos programas de estabilidade, é assim que este deve ser lido.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — A Mesa regista a inscrição de seis Srs. Deputados para pedidos de esclarecimento.
Entretanto, o Sr. Ministro informou a Mesa que irá responder em conjunto.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Almeida, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Começo por cumprimentar os Srs. Ministros,
os Srs. Secretários de Estado, as Sr.as e os Srs. Deputados.
Sr. Ministro de Estado e das Finanças, nesta hora difícil, em que atravessamos uma crise sanitária e
económica provocada pela COVID-19, é fundamental que os portugueses sejam confortados com a esperança
de que o Governo de Portugal sabe o que fazer para minimizar os efeitos da crise. Os portugueses precisam de
confiar na estratégia do Governo para os ajudar a atravessar este período, e, por isso, precisam de acreditar
que o Governo tem uma boa estratégia.
A apresentação do Programa de Estabilidade deveria ser o momento de os portugueses conhecerem e
confiarem na estratégia do Governo. É, por isso, incompreensível que o Governo não tenha apresentado um
Programa de Estabilidade. O Governo apresentou um documento que faz de conta que é um Programa de
Estabilidade, mas não é, porque como diz, e muito bem, o Conselho de Finanças Públicas não contém os
elementos informativos mínimos para que possa ser considerado um verdadeiro Programa de Estabilidade.
O Governo está, assim, a faltar ao respeito aos portugueses e a esta Assembleia ao trazer para esta
discussão um documento que não respeita a Lei de Enquadramento Orçamental, nomeadamente o n.º 1 do seu
artigo 33.º, que determina que o Programa de Estabilidade é elaborado com regulamentação da União Europeia
aplicável. E sabemos hoje que as orientações da Comissão Europeia para este Programa de Estabilidade não
são aquelas que cumpre o documento que o Sr. Ministro entregou.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Como é que sabe?
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — O Sr. Ministro, ontem, não hesitou — e muito bem! — em invocar a
importância do cumprimento da lei e dos contratos para acusar o Sr. Primeiro-Ministro de ter um comportamento
irresponsável. E repare, Sr. Ministro, eu não estou a discordar de si, eu concordo com o Sr. Ministro em que a
lei e os contratos são para ser cumpridos, mas é toda a lei. Portanto, porque é que o Sr. Ministro, hoje, não
cumpriu a lei ou, melhor, não cumpriu, na sexta-feira, a Lei de Enquadramento Orçamental?
Por isso, a minha primeira pergunta é esta: porque é que o Sr. Ministro entregou um Programa de Estabilidade
de faz de conta, que contraria a Lei de Enquadramento Orçamental e contraria a regulamentação comunitária
aplicável, as orientações da Comissão Europeia?
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Depois da novela a que assistimos ontem, a resposta parece-me óbvia: o Sr. Ministro das Finanças entregou
um documento de faz de conta, porque, neste momento, o senhor só faz de conta que é Ministro.
Risos do Deputado do PSD Adão Silva.
Quero cumprimentá-lo e dar-lhe os parabéns pela retumbante vitória que teve ontem à noite sobre o Sr.
Primeiro-Ministro, e, já agora, perguntar-lhe qual foi o preço dessa vitória.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Faça perguntas sobre o Programa de Estabilidade!
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Vai ser obrigado a continuar no Governo muito mais tempo? Teve de abdicar
do Banco de Portugal em troca de outro cargo internacional? Ou, Sr. Ministro, será que, a partir de setembro,
vamos ter a oportunidade de o ter aqui, deste lado, como Deputado, e, nessa altura, teremos oportunidade de
fazermos o tal debate — já não entre candidatos a Deputados, mas sendo ambos Deputados —, que ficou
pendente da campanha eleitoral?
Sr. Ministro das Finanças, o facto de o Governo não apresentar ao País uma estratégia de finanças públicas
não faz desaparecer a restrição orçamental que limita as políticas de apoio aos portugueses e à economia
portuguesa.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Na atual conjuntura, a restrição orçamental não será o valor do défice em
2020, sobretudo se esse défice resultar da conjuntura e de medidas excecionais e transitórias. Esperemos que
não sejam medidas permanentes.
No entanto, a restrição orçamental continua. E a restrição orçamental vinculativa, em 2020, será a capacidade
de financiamento do País e do Governo. E essa capacidade de financiamento não é ilimitada e pode acontecer
que ela seja inferior às necessidades das políticas de retoma da economia e de apoio social de que o País
precisa.
É por isso que esta restrição de financiamento tem de ser aliviada com o contributo de políticas a nível da
União Europeia: primeiro, porque a pandemia da COVID-19 é o momento da História que mais justifica a
invocação dos valores da coesão e da solidariedade, que são um dos pilares fundamentais do projeto europeu;
segundo, porque a igualdade de condições de concorrência no mercado europeu está a degradar-se, já que os
auxílios de Estado são diferentes de país para país, porque também a restrição orçamental é diferente de país
para país.
Portanto, se não houver medidas a nível da União Europeia, é também o próprio mercado único — um outro
pilar fundamental da construção europeia — que está em causa.
Por isso, Sr. Ministro, pergunto-lhe que medidas o Governo vai tomar, que diligências vai efetuar junto das
instituições europeias, nomeadamente junto do Eurogrupo, para que um programa europeu de financiamento
de recuperação económica e social seja apresentado e implementado em tempo útil sem que isso ponha em
causa as contas públicas nacionais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão,
do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
Ministro das Finanças, como deliberadamente o Governo assume no documento que submete a esta Casa,
discutimos o Plano de Estabilidade no momento em que a única certeza é a incerteza — a incerteza de uma
realidade sem qualquer precedente comparável.
E a verdade insofismável é que vivemos hoje, ainda, na primeira das fases de desconfinamento previstas,
começando a segunda na próxima segunda-feira, sendo ainda prematuro prever como as mesmas irão evoluir.
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É difícil fazer previsões, especialmente sobre o futuro, mas, no caso, é mesmo importante que saibamos
responder com a honestidade e a verdade que a realidade impõe. Enquanto forem tão incertas, quanto são hoje,
quer a natureza, quer a dimensão e a duração das medidas sanitárias restritivas, a construção de cenários
macroeconómicos irá sempre redundar num pouco útil exercício de cartomância. E se isso é verdade para os
demais países, é-o ainda mais para países como Portugal, onde o turismo pesa significativamente no PIB, e,
por isso, estão ainda mais dependentes da velocidade da recuperação da confiança decorrente do sucesso do
combate à pandemia.
Não obstante todas essas incertezas, de resto assumidas pelo Governo no Programa de Estabilidade, quero
deixar duas questões.
O Sr. Ministro, bem como a equipa que lidera, tem a seu crédito, como referiu, a credibilidade conquistada
por quatro Orçamentos cumpridos, pela maior redução da dívida pública da área do euro nos últimos quatro
anos e pelo maior crescimento económico e de emprego, em Portugal, em muitas décadas. Foi um trabalho
notável ao serviço do País, como muito bem, ontem, em nome de toda a bancada, referiu publicamente o nosso
Vice-Presidente João Paulo Correia, palavras que subscrevo integralmente.
Daqui a um mês, o Governo irá apresentar, neste Parlamento — ontem, o Sr. Ministro confirmou-o —, um
orçamento suplementar, tornado necessário pelo inevitável aumento da despesa pública, decorrente das
medidas de apoio à economia e ao emprego. Pergunto-lhe se as projeções que hoje entende prematuras
apresentar serão apresentadas daqui a um mês, previsivelmente, com a proposta de lei de orçamento
suplementar.
Um recente estudo do Fundo Monetário Internacional interpela-nos a todos, recordando que a experiência
de todas as epidemias globais se traduziu invariavelmente, até hoje, num agravamento das desigualdades.
Citando o estudo, se as pandemias do passado servirem de guião, o custo nos segmentos mais pobres e mais
vulneráveis da sociedade irá ser pior. Pergunto se o Governo está ciente desta ameaça à nossa coesão social,
aos nossos mais pobres e vulneráveis e, sobretudo, se estão as políticas públicas deste país mobilizadas para
a combater.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — É, agora, a vez de a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, colocar
pedidos de esclarecimento.
Faça favor.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, as perguntas que fiz há pouco mantêm-se.
Qual a resposta para as empresas endividadas? Qual a resposta para quem, tendo ou não apoio, entrou na
pobreza? Qual o plano de investimento e de recuperação económica? Que recursos vão ser mobilizados, para
além daquela proposta inaceitável do Eurogrupo? O que está neste documento não é suficiente, a discussão
tem de ir muito para além destas respostas do Governo.
Mas há um tema ao qual quero voltar, porque ele não é uma distração e merece ser tratado com seriedade.
Há anos que o Novo Banco apresenta prejuízos astronómicos, prejuízos que dizem respeito a uma carteira de
créditos tóxicos, que desconhecemos em pormenor e que não sabemos como está a ser gerida.
Depois de terem sido conhecidos os prejuízos astronómicos de 2018, foi pedida, pelo Governo, uma auditoria
especial para analisar esses créditos e para analisar as perdas que foram imputadas à garantia de Estado
chamada «mecanismo de capital contingente».
O Primeiro-Ministro comprometeu-se publicamente a não fazer uma nova injeção sem que essa auditoria
fosse conhecida. O compromisso foi violado pelo Ministro das Finanças e o Primeiro-Ministro pode ter voltado
atrás mas o Bloco de Esquerda não volta atrás.
Então, o que perguntamos é se a exigência de ter uma auditoria antes da injeção de mais de 850 milhões de
euros no Novo Banco é ou não razoável. A República deve ou não exigir uma auditoria antes de comprometer
dinheiro público? É ou não razoável que o País conheça como estão a ser geridas estas perdas e estes créditos?
Ou o Sr. Ministro acha que podemos confiar numa administração que se quis pagar a si própria 2 milhões de
euros em bónus?! Ou será que devemos confiar numa administração que sempre que pode carrega na conta
do Estado por conta do Fundo de Resolução?! Ou será que podemos dormir descansados com uma Comissão
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de Acompanhamento que disse nesta Assembleia da República que havia créditos a serem geridos
politicamente no Novo Banco, que não tinha capacidade para fazer acompanhamento dos créditos e que havia
gente, empresas, a ganhar dinheiro com a venda de créditos tóxicos?!
Sr. Ministro, a República tem o dever e tem o poder de saber ao pormenor como gasta cada cêntimo do
erário público e o Governo tem o dever de obedecer a essa exigência, quer ela seja legal ou moral. E, se mais
for fosse, tem o dever de responder a essa exigência porque este é o mesmo Governo que nega um subsídio
de risco a enfermeiros no momento de crise, este é o mesmo Governo que regateia apoios a recibos verdes,
este é o mesmo Governo que atrasa o investimento público e este é o mesmo Governo que impôs alterações
contratuais aos trabalhadores que estão em layoff e foram obrigados a aceitar menos do que o salário que
estava contratualizado.
Por isso, sim, este Governo tinha a obrigação de fazer uma auditoria antes de injetar 850 milhões de euros
no Novo Banco.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Há auditorias, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Esta não é uma polémica vazia, esta não é uma discussão sem sentido;
esta é uma discussão sobre a República, sobre o dever de transparência das contas, esta é uma discussão
sobre rigor, sobre como gastamos o dinheiro público, é também uma discussão sobre o significado dos
compromissos políticos;…
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não faça demagogia!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — …e esta é também uma discussão sobre o futuro da política, sobre o
futuro da economia e sobre a forma como gerimos, certamente, os recursos que são de todos nós.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Ministros: Sr. Dr. Mário Centeno,
Ministro das Finanças, a sua intervenção, pelo tom e pelo conteúdo, foi um verdadeiro testamento político.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É o quarto!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Veio aqui dizer-nos, de forma cansada, estafada,…
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Estafado está o Sr. Deputado!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … veio repetir, pela enésima segunda vez, aquilo que fez, mas já sem um
rasgo de esperança sobre o que vai fazer.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Vai dar-me essa esperança?
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Isso significa que estamos precisamente num momento especial. Estamos
num momento especial, num momento em que temos uma primavera escondida, em que temos uma pandemia
por todo o lado, em que temos uma economia em recessão, em que temos uma crise social gravíssima, em que
temos um Programa de Estabilidade que todos já percebemos que o não é, e em que temos um Ministro das
Finanças que também só o é formalmente porque está a prazo nessas funções.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Estamos todos! O Sr. Deputado também!
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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E porquê? Vou dizer: porque falta o essencial. Falta o essencial, falta dizer
onde estamos e aí é que os portugueses sabem onde é que estamos. O PSD sabe onde estamos,…
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sabe?
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … porque estamos num momento grave, com as empresas a viverem os
momentos mais difíceis que, porventura, já ultrapassaram nas últimas décadas e com as famílias cada vez mais
carentes e a mergulhar numa crise social como, felizmente, não há memória na nossa história.
Mas faltou o essencial, Sr. Ministro, porque faltou a estabilidade governativa. Faltou a estabilidade
governativa num momento essencial da política e da economia deste País e faltou a estabilidade política por
responsabilidade do Governo, do próprio Governo, e dos conflitos que foram criados entre o Ministro das
Finanças e o Primeiro-Ministro.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Se assim não fosse, Sr. Ministro das Finanças, não tínhamos passado os
últimos dias como passámos, com o Sr. Ministro das Finanças a criticar abertamente o Sr. Primeiro-Ministro,
com o Sr. Primeiro-Ministro a mostrar desconforto, com o Presidente da República, pelos vistos, a tomar partido
por um dos lados, e, depois, a telefonar a pedir-lhe desculpa, a si, mostrando, claramente, a confusão que está
instalada.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Você sabe? Está a falar de coisas que não sabe!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas há uma coisa que sabemos, Sr. Ministro: quando sai um comunicado,
àquelas horas, em que o Primeiro-Ministro se vê obrigado a dizer que mantém a confiança no seu ministro, isso
significa que já não a tem,…
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Você lê?!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … porque quando um Primeiro-Ministro confia na sua equipa não precisa
de vir a praça pública dizê-lo, porque isso é um ato natural da chefia do Governo. Então, o facto de o ter feito
significa que as dúvidas existiam: existiam na sociedade, existiam em si próprio e existiam no Primeiro-Ministro.
Mas, depois, sabe, há uma coisa muito interessante: deu para perceber, daquele comunicado especial, que,
nesta crise, utilizando um ditado português, o Sr. Primeiro-Ministro tem prazer em ser o último a saber. Ora, isso
significa que há aqui algo que tem de mudar na governação em Portugal, pela decência deste País e pela forma
como esta crise merece ser resolvida.
Aplausos do PSD.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Estávamos à espera dessa intervenção!
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Moreira Testa.
O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: Sr. Ministro de Estado e das Finanças, permita-me que me dirija a V. Ex.ª confrontando os Srs.
Deputados Duarte Pacheco e Álvaro Almeida com o seu próprio papel.
Na verdade, os Srs. Deputados Duarte Pacheco e Álvaro Almeida estão pouco interessados em discutir as
duas razões que nos trazem a esta Câmara.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — É verdade!
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O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Por um lado, o Plano de Estabilidade, que é um documento essencial para
assegurar a motivação e as necessidades de um País que tem de responder a uma crise pandémica que assola
as populações, as empresas, o tecido económico, mas também a necessidade de nos mantermos coesos e
unidos nessa mesma resposta.
Os Srs. Deputados Duarte Pacheco e Álvaro Almeida revelaram-se, no final de contas, úteis ao seu partido,
como os outros úteis que vêm descritos nos livros, sustentando uma narrativa que encontra mais razões nos
Passos Perdidos do que, propriamente, no debate parlamentar.
Sr. Ministro das Finanças, nós, enquanto exemplo do exercício da função política, representantes de um povo
que lá está fora e que acredita nos mecanismos construídos pelo Estado como resposta efetiva e necessária
aos desafios do futuro, mas também às determinações da história — e hoje vivemos com uma —, aquilo que
temos como obrigação é saber se contribuímos ou não para o nosso futuro coletivo.
Nós, certamente, estamos aqui, nesta Câmara, reunidos para colocar questões, no exercício da nossa função
fiscalizadora do Governo, mas também como proponentes da resposta necessária para o futuro coletivo da
nossa nação.
Arrisco-me a dizer que em todas as intervenções encontramos várias possibilidades, mais ou menos
desgarradas, mas há uma coisa, Sr. Ministro, que nós, certamente, não conseguimos encontrar: a existência de
uma ideia que seja nas intervenções do PSD.
Os Srs. Deputados do PSD não se contentam em sair do estado de emergência; aquilo que o PSD deseja,
verdadeiramente, é que o estado de emergência, seja ele qual for, até pode ser o de emergência política, se
mantenha e atemorize os portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, queria dizer-lhe que estamos muito
preocupados com a situação dramática pela qual o País está a passar, pela qual muitos portugueses estão a
passar neste momento, mas não estamos nada preocupados com psicodramas da relação política do Ministro
das Finanças com o Primeiro-Ministro.
Aliás, isso é o que menos preocupa seguramente os portugueses; o que preocupa os portugueses é saber
como é que vão conseguir viver até ao fim do mês, como é que vão conseguir viver nos meses seguintes e como
é que o nosso País, a nossa economia, o nosso Serviço Nacional de Saúde vão conseguir responder aos
problemas graves por que, efetivamente, o País está a passar em consequência desta pandemia.
Por isso, o que mais nos interessa discutir aqui são as prioridades nacionais de resposta às consequências
económicas, sociais e financeiras desta pandemia e o que menos nos importa discutir são documentos para
Bruxelas, e não digo para Bruxelas ler, digo para Bruxelas fingir que lê, porque, efetivamente, é com isso que
estamos confrontados.
Estamos aqui a discutir documentos exigidos por Bruxelas, pela ortodoxia financeira da União Europeia,
como se nada se passasse e isso é muito significativo da forma como a União Europeia está a fingir que
responde a este problema. Qual é a resposta da União Europeia? Estamos perante uma crise, os estados
endividem-se e, depois, nós cá estaremos para criar novas troicas, caso os estados não respeitem os limites de
endividamento. É este o problema com que estamos confrontados.
O Sr. Ministro dirá que todos sabemos das nossas divergências relativamente à União Europeia, mas, Sr.
Ministro, não é isso que nos importa discutir; o que estamos a discutir…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. António Filipe (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
O que estamos a discutir é qual é a resposta para os problemas nacionais, pois é isso que nos interessa, é
responder aos problemas nacionais, não é responder às imposições da União Europeia.
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Pelos vistos, o Governo está mais preocupado em responder à União Europeia e nós estamos mais
preocupados em encontrar soluções para os problemas nacionais. Daí o projeto de resolução que
apresentámos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: O ponto de partida destes debates sobre o Programa de Estabilidade e sobre o Plano Nacional de
Reformas deve ser o estado como estava a nossa economia em fevereiro, nas vésperas desta pandemia da
COVID-19, porque sabemos — e é certo que alguns querem esquecer e fingir que não sabem — que tínhamos
um crescimento económico, do PIB, acima de 2%, a economia portuguesa a crescer em anos consecutivos
acima da média europeia, um superavit orçamental, o primeiro da nossa democracia pós-25 de abril, as
exportações representavam 44% do PIB e a taxa de desemprego decrescia de forma sustentada até aos 6%.
Era este o retrato da nossa economia e das nossas contas públicas.
É muito importante dizer isto por duas razões: primeiro, porque foi esta a base que permitiu ao Governo
adotar um conjunto de medidas excecionais e temporárias, que, se calhar, de outra forma não teriam sido
adotadas, para socorrer e responder às necessidades das famílias e das empresas e também da dívida
soberana; segundo, porque, se assim não fosse, hoje, a direita estaria aqui a atirar ao Governo a
responsabilidade de não ter ido mais longe nas medidas, porque o ponto de partida não era tão bom como o foi
e era em fevereiro deste ano.
Lembramo-nos do que disse o PSD no ano passado, na discussão do Programa de Estabilidade, aqui, no
Parlamento: disse que a economia em 2019 ia desacelerar, que era mentira o défice que estava previsto no
Programa de Estabilidade para 2019 e que os outros indicadores também não iriam ser cumpridos.
Ora, pela quinta vez consecutiva, o Governo cumpriu as suas metas, superou as suas metas e esse é o
grande problema, o grande flagelo para o PSD e o CDS,…
Aplausos do PS.
… que não encontram naquilo que é o principal, a prestação de contas de um Governo e de um Ministério
das Finanças, um ponto para atacar ou para fragilizar o trabalho que tem sido realizado.
Olhemos para as medidas excecionais e temporárias que foram adotadas. Há que reconhecer que o Estado
tem feito um esforço colossal não só no tempo em que tem tomado as medidas mas também no esforço
financeiro e orçamental que essas medidas representam.
O Estado central mas também as autarquias — as câmaras municipais e as freguesias — merecem essa
palavra de reconhecimento, porque têm sido parceiras essenciais do Estado central, mas também as empresas,
os empresários, os gestores e os trabalhadores, que têm feito um esforço gigante para acompanhar tudo o que
é resposta coletiva a esta pandemia, bem como as famílias, pois muitas medidas são dirigidas às famílias.
Olhemos, também, para as medidas. O layoff abrange cerca de 120 000 empresas, mais de um milhão de
trabalhadores. As linhas de crédito que estão neste momento autorizadas, para cerca de 7000 milhões de euros
com garantia do Estado, sabemos que podem crescer até 13 000 milhões de euros, esperando agora pelo plano
de recuperação.
Muitos dizem: «Bem, o Governo, o Estado, aqui, não faz qualquer esforço.» Não é verdade, porque estas
linhas de crédito têm uma carência de 12 meses e daqui a 12 meses, se alguém não pagar os empréstimos que
agora está a contrair à banca em relação a estas linhas de crédito, será o Estado a assumir 80% desse
incumprimento, executando a garantia do Estado.
Olhemos para as moratórias, quer para as famílias, no crédito à habitação, quer para as empresas. Muitas
foram as empresas que aderiram a estas medidas, dezenas de milhares de empresas.
Olhemos para os deferimentos das contribuições, dos impostos e segurança social; olhemos, também, para
o Quadro Financeiro Plurianual, com a antecipação dos pagamentos e dos reembolsos, o esforço que a máquina
do Estado está a fazer — e quero deixar aqui também uma palavra de reconhecimento e elogio a todos os
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trabalhadores do Estado, que se têm mobilizado de forma inequívoca para que estas medidas sejam postas em
prática o mais rápido possível — e olhemos para o seguro de crédito, que elevou a garantia do Estado para que
as nossas empresas possam exportar, para que os plafonds atribuídos pelas seguradoras de crédito às
exportações aumentem e deem confiança.
Olhemos agora para o plano de recuperação económica, que terá, obviamente, de ser acompanhado com
um reforço ainda maior do Estado social. As respostas sociais já estão no terreno mas têm de ser reforçadas
porque o plano de recuperação económica não quer deixar ninguém para trás. É esta certamente a grande
ambição do Governo, que é também, certamente, do Partido Socialista e pode sê-lo, certamente, de todos os
grupos parlamentares: um plano de recuperação económica que não deixe ninguém para trás, que mantenha a
aposta no investimento público, que tem crescido ano após ano, com principal destaque para o Serviço Nacional
de Saúde, mas também mantendo a aposta nos transportes públicos e na educação.
É um plano de recuperação económica que atribui estímulos às empresas, principalmente àqueles setores
que são particularmente atingidos e têm sido sacrificados por esta pandemia e para os quais estas respostas
têm de aparecer também num curto espaço de tempo, com a substituição das importações e a soberania
alimentar.
Por fim, a resposta da Europa. O Banco Central Europeu lançou uma chamada «bomba atómica» na sua
política de quantitative easing, com 750 000 milhões de euros, que sossegou os mercados, nomeadamente o
mercado de dívida soberana. Mas a Europa — o BEI (Banco Europeu de Investimento), o Mecanismo Europeu
de Estabilidade, a própria Comissão Europeia — precisa de ir mais longe, porque todas estas instituições e
entidades europeias são essenciais no financiamento do plano de recuperação económica de que precisamos
para o País.
Para terminar, Sr. Ministro, a pergunta que queria colocar-lhe é a seguinte: o que é que podemos esperar
relativamente a estas respostas, quanto à dimensão e ao seu horizonte temporal? As empresas e os
empresários que acompanham este debate gostariam, certamente, de obter respostas mais concretas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Mário Centeno.
Faça favor, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o PSD veio para este debate
e para as questões que colocou ao Governo sem alternativas, sem ideias, na verdade, de mãos a abanar.
O Sr. Deputado Álvaro Almeida, provavelmente, chegou aqui nesse estado dado o preço que pagou para
estar sentado nessa bancada, mas para o desempenho de faz-de-conta que fez espero que tenha pago um
preço baixo, porque senão foi enganado ou está a enganar-nos. Sr. Deputado, tem de dizer-nos primeiro qual
foi o preço que pagou para estar aí sentado, antes de lhe darmos qualquer resposta.
Protestos do PSD.
Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, este Programa de Estabilidade é um programa adaptado às condições
atuais da economia e ao que foi pedido pela Comissão Europeia, em termos informativos, aos países.
Há, e houve, diferentes estratégias por parte dos diferentes países. Portugal adotou uma estratégia coerente
com o que fizemos ao longo dos últimos anos.
As previsões económicas devem ser credíveis, devem ser sinais de certeza, não de ruído, devem apresentar
caminhos compatíveis com as políticas e é exatamente isso que faremos — para responder à sua primeira
pergunta — quando apresentarmos aqui a proposta de lei de alteração do Orçamento do Estado, o Orçamento
do Estado suplementar, onde apresentaremos um quadro macroeconómico completo com a informação que
está em falta. E que informação está em falta? Está em falta, desde logo, a informação relativa à resposta
europeia, na qual temos de participar e em que queremos, obviamente, estar presentes.
O plano de recuperação económica é uma peça essencial para podermos preparar a nossa recuperação
económica. Esperamos, nessa altura, já ter essa informação e poder apresentar aos portugueses um plano
coerente, completo, credível e que permita evitar, por exemplo, o facto de a OCDE já ter revisto duas vezes as
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suas previsões ou de o Governo francês já ter feito três previsões económicas em outros tantos orçamentos.
Nós achámos que não é esse o papel do Governo. O papel do Governo é preparar medidas, medidas que tem
preparado e tem tomado, tem implementado, que tem levado às empresas, aos trabalhadores e às famílias.
Esses apoios têm, obviamente, um foco muito significativo nos mais desprotegidos, nos informais, nos
trabalhadores independentes, naqueles que recebem o rendimento social de inserção. Em todas estas áreas
foram implementadas medidas simplificadas, de acesso muito rápido a apoios adicionais ou novos — que não
existiam, portanto — a todas estas dimensões dos portugueses, sempre garantindo mínimos, mínimos que
permitam que estes trabalhadores e estas empresas possam responder às dificuldades das crises.
Aplausos do PS.
É, na verdade, o impacto destes mecanismos, destes instrumentos, que permitirá à economia portuguesa
recuperar e essa recuperação nalguns indicadores até já está a acontecer. Por exemplo, quando olhamos para
os indicadores de vendas no comércio a retalho, indicadores que temos com um acesso muito imediato, vemos
que, no momento mais grave da crise económica, que foi a terceira semana de março, as vendas com a
utilização de meios automáticos de pagamento tinham uma quebra de 48%; na primeira semana depois da
abertura gradual da economia essa quebra reduziu-se para 33%. Este é um caminho longo, um caminho que
tem de ser feito com confiança, um caminho que tem de ser gradual mas apoiado por todas estas medidas.
Finalmente, e respondendo a uma questão que me colocou a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, sobre o Novo
Banco, quero fazer aqui uma declaração muito rápida.
O Novo Banco é uma instituição que tem as portas abertas. O Novo Banco emprega milhares de
trabalhadores. O Novo Banco é a guarda das poupanças de milhões de portugueses e é no Novo Banco que
milhares, centenas de milhares de empresas portuguesas têm os seus créditos. Não podemos falar do Novo
Banco quando queremos falar do BES.
Uma coisa é a resolução, outra coisa é a instituição Novo Banco. Não permitirei, enquanto Ministro das
Finanças, que uma instituição bancária que tem as portas abertas possa ser prejudicada por um debate
parlamentar sem qualquer sentido. As auditorias — as várias auditorias, inspeções, verificações e comissões de
acompanhamento — antecedem qualquer injeção de capital e qualquer empréstimo do Estado ao Fundo de
Resolução. Não há nenhuma injeção de capital no Novo Banco sem auditorias. Podemos e devemos tomar
decisões com o máximo de informação disponível e é isso mesmo que fazemos, mas não há ausência de
controlo nestes processos.
Aplausos do PS.
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — É para um pedido de defesa da honra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de explicar em que é que foi ofendida a sua honra.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Muito bem, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro das Finanças, em vez de responder às perguntas que lhe coloquei, em vez de explicar ao País
por que é que não cumpriu a Lei de Enquadramento Orçamental,…
O Sr. Presidente: — É melhor que vá diretamente à questão da defesa da honra. Qual é a justificação?
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Sr. Presidente, a minha questão é que o Sr. Ministro fez insinuações sobre
a minha posição aqui, como Deputado,…
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O Sr. Presidente: — Então, faça favor de exercer o direito de defesa da honra.
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Portanto, o Sr. Ministro, em vez de responder à minha questão, em vez de
esclarecer o País sobre a sua posição no Governo, em vez de explicar por que é que não cumpriu a Lei de
Enquadramento Orçamental, pôs-se a fazer insinuações sobre a forma como cheguei a Deputado. Sabe como
cheguei a Deputado, Sr. Ministro? Cheguei a Deputado porque o povo português me elegeu, contrariamente ao
senhor, que só é ministro porque foi nomeado e, portanto, depende do Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, só queria dizer ao Sr. Deputado Álvaro Almeida
que fui eleito Deputado como o senhor.
Aplausos do PS.
Felizmente, os portugueses deram mais votos à lista onde eu estava do que à lista do Sr. Deputado e é por
isso que estou aqui e o Sr. Deputado está na oposição.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, chegámos, assim, ao final da apreciação deste ponto da ordem
do dia.
Do ponto seguinte consta o debate conjunto, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) —
Estabelece medidas excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da
pandemia da doença COVID-19, e dos Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-lei n.º 10-
I/2020, de 13 de Março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença
COVID-19 no âmbito cultural e artístico, 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 12-A/2020, de 6 de Abril,
que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19, 370/XIV/1.ª (BE)
— Proteção dos direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica e 373/XIV/1.ª (N insc.)
— Estabelece medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural português, no âmbito da crise
epidemiológica.
Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.
A Sr.ª Presidente: — Muito boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.
Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas.
Vamos dar, então, início ao debate da Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece medidas
excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da pandemia da doença
COVID-19.
Para abrir o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura, Graça Fonseca.
Faça favor, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Cultura (Graça Fonseca): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta que
o Governo submete ao Parlamento e que aqui hoje discutimos altera um regime anteriormente aprovado, o
regime criado pelo Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 13 de março, que estabeleceu, no âmbito do estado de
emergência que vivíamos, regras especiais, particulares, para o reagendamento e cancelamento de eventos de
natureza cultural e artística realizados entre o dia 28 de fevereiro e 90 dias após o levantamento do estado de
emergência.
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Definia este diploma regras específicas para a prioridade aos reagendamentos — sempre que possível,
reagendar eventos culturais em vez de os cancelar — e estabelecia a regra de que, em caso de reagendamento,
não havia lugar ao reembolso mas o bilhete manter-se-ia.
Portanto, ao longo deste tempo procurámos trabalhar com todas as entidades privadas e públicas para,
nomeadamente, manter os compromissos e os pagamentos que já estavam contratualizados com entidades e
artistas.
Levantado o estado de emergência foi necessário alterar o que havia sido consagrado no Decreto-Lei n.º 10-
I/2020, pelo que o que esta proposta de lei traz de novo é, por um lado, a regra da proibição de festivais até ao
dia 30 de setembro, numa perspetiva em que, como julgo que todos sabemos, festivais e eventos análogos
consistem mais numa experiência do que num concerto ou festival de música. Por outro lado, também vem
estabelecer, no n.º 2, a possibilidade de realização de alguns eventos culturais em todo o País, desde que sejam
cumpridas regras gerais como a da necessidade de lugares marcados, mesmo que seja ao ar livre, e a da
limitação de entradas, ou seja, cumprindo as regras de distanciamento social que têm sido emitidas pela Direção-
Geral da Saúde (DGS).
A proibição é a regra, mas o que se propõe é a permissão para que, cumpridas as regras da Direção-Geral
de Segurança, que estamos a ultimar, seja possível realizar eventos culturais no País.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — As regras da Direção-Geral da Saúde!
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sim, da Direção-Geral da Saúde, peço desculpa. São já alguns dias em
confinamento…
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Não faz mal, nós percebemos!
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Finalmente, é também de referir a regra de emissão de vales que aqui se
estabelece. Ou seja, uma das questões que se colocou quando foi publicado o Decreto-Lei n.º 10-I/2020 foi
sobre o que sucederia ao bilhete, ou seja, quanto à proteção do direito do consumidor.
A nossa proposta de emissão de um vale pelo valor correspondente ao do bilhete proíbe que sejam cobradas
comissões e permite que quem já tenha um bilhete venha a usufruir de um vale para um festival ou evento
cultural de natureza análoga ao longo do próximo ano. Estas são as regras que trazemos e que representam
uma alteração ao regime inicial, publicado durante o estado de emergência.
Sr.as e Srs. Deputados, quero terminar com uma nota muito breve, apenas para dizer que, na perspetiva do
Governo, é muito importante conseguir criar condições para que neste verão exista e se possa realizar alguma
programação cultural no território. Este vai ser um verão atípico, como todos sabemos, e é muito importante
para a coesão territorial e para a confiança das pessoas, para a confiança de cada um de nós, sentir que existe
programação cultural. Naturalmente que terá de ser em menor escala, com menor dimensão, mas é importante
que ela exista e que possamos dar às pessoas a possibilidade de sentirem que, aos poucos, a normalidade
regressa e podemos voltar a ter confiança.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Embora a Sr.ª Ministra já não tenha tempo para responder, a Mesa
regista a inscrição do Sr. Deputado André Ventura, do Chega, para pedir esclarecimentos.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, dou 30 segundos do meu tempo à Sr.ª Ministra para que me
possa responder.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, faça favor de formular o seu pedido de esclarecimentos.
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O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, como o meu tempo é muito curto, e sei que
também tem pouco tempo, tenho de lhe perguntar sobre as exceções que vamos ter, como sabemos. E já vimos
que as exceções correram mal.
Soubemos pelo Sr. Primeiro-Ministro que, provavelmente, vamos ter uma exceção para a Festa do Avante!,
um festival do Partido Comunista Português — mas são criativos e não é um festival ou alguma coisa parecida
—, exceção que não vamos ter para os outros.
O que lhe pergunto é o seguinte: vai o Governo sujeitar-se ao mesmo espetáculo do 1.º de Maio, com todos
os portugueses em casa a criticar e com o Presidente da República a vir depois dizer que não era isto que
esperava do 1.º de Maio? É que eu não imagino ver o Sr. Presidente Marcelo Rebelo de Sousa a vir dizer —
apesar de ele já lá ter ido — que a Festa do Avante! não correu assim tão bem.
Sr.ª Ministra, convinha, portanto, esclarecer se vai ou não haver exceção para a Festa do Avante! nesta
matéria.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, pelo que sei, deu entrada nesta Câmara uma
proposta do Chega nesse sentido. Aguardarei pela votação que aqui for feita da proposta que o Governo
apresenta.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar os Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) — Altera o
Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 13 de março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à
pandemia da doença COVID-19 no âmbito cultural e artístico e 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 12-
A/2020, de 6 de abril, que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença
COVID-19, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues.
A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Verifica-se que, para além de ter sido dos primeiros a parar e de, provavelmente, ser um dos últimos a voltar à
normalidade depois desta crise sanitária, o setor da cultura também é dos últimos a receber qualquer tipo de
apoio. De resto, infelizmente, não há surpresa nessa circunstância, já que os sucessivos governos têm tratado
sempre a cultura como o parente pobre, limitando-se a manter estável a precariedade associada ao setor.
Dada a sua já conhecida fragilidade, a COVID-19 teve, consequentemente, um impacto brutal na cultura, nas
suas diversas manifestações. No caso dos espetáculos, a impossibilidade de agendamento num futuro próximo
deixa todos os profissionais deste setor numa situação de enorme insegurança. Veja-se o exemplo da música,
em que a esmagadora maioria dos rendimentos decorre de espetáculos ao vivo e cuja época de concertos e
festivais se iniciaria agora. Este período representa um balão de oxigénio para o setor, depois do outono e do
inverno, épocas em que, tipicamente, o trabalho escasseia.
Face às atuais condicionantes, o que se antevê é que a seguir aos meses de escassez se somem meses de
uma escassez maior ainda. Consequentemente, pretende-se que exista uma previsão específica, um apoio
extraordinário para fazer face à redução da atividade económica, direcionada concretamente para os artistas e
profissionais do espetáculo.
Creio que todos nós antevemos que a situação de precariedade se prolongará para além dos meses para os
quais a atual Lei prevê apoio para os profissionais liberais em geral. Assim, propomos que esse apoio deva
prolongar-se até março de 2021.
Por outro lado, importa acautelar a situação dos agentes culturais que se encontrem na posição de sócios-
gerentes, uma vez que, dada a especificidade da sua função, dificilmente terão acesso ao layoff.
No que respeita aos espetáculos que já estavam agendados, importa alterar o Decreto-Lei n.º 10-I/2020, no
sentido de as entidades públicas promotoras poderem escolher entre cancelar ou reagendar — salvo nos casos
em não seja possível fazê-lo —, sendo que no caso do cancelamento tenham de cumprir sempre com o
pagamento dos serviços contratados, até porque se tratavam de valores já orçamentados.
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Para além disso, a agenda de um artista e toda a organização associada aos espetáculos carece de uma
determinada antecedência, pelo que se propõe que, após o termo do estado de emergência e durante os 90
dias seguintes, as entidades públicas promotoras indiquem a data para a qual pretendem o reagendamento.
De resto, a proposta de lei em debate continua sem responder a estas questões e, para além disso, gera
dúvidas quanto a outros pontos. Esta proposta determina, por exemplo, a proibição da ocorrência de festivais
ou atividades similares até 30 de setembro, mas não contém qualquer definição de festival, deixando dúvidas
relativamente a quais os espetáculos abrangidos, ou não, pelo princípio da proibição, nomeadamente a dúvida
sobre se haverá, ou não, lugar à Festa do Avante!. E, não, não estou a falar de restringir a atividade política,
estou a falar de tudo o que acontece na Festa do Avante! para além disso.
A proposta do Governo possibilita ajuntamentos de 200 pessoas e, ao mesmo tempo, autoriza a que um
promotor que tenha agendado uma festa para um recinto com lotação máxima para 100 ou 150 pessoas possa,
livremente, cancelar ou adiar esse evento. Mas se houver condições para a realização do espetáculo porquê
dar a possibilidade do cancelamento?
De resto, temos de dizer que todas as medidas para o setor da cultura se demonstram manifestamente
insuficientes face às necessidades. Veja-se o caso da Linha de Apoio de Emergência ao Setor das Artes, à qual
foi atribuída uma verba de apenas 1 milhão de euros, reforçada agora com 700 000 €. Segundo o Ministério da
Cultura, foram recebidos 1025 pedidos, dos quais 389 não foram considerados elegíveis, 311 projetos foram
apoiados e, embora elegíveis, 325 não tiveram qualquer apoio por falta de verba.
Importa dizer que a cultura não são só os espetáculos e que não são só os músicos e os atores que estão
com dificuldades. Importa olhar para a cultura nas suas várias manifestações, olhar para as suas pessoas e
construir uma resposta séria às necessidades do setor.
Para terminar, quando foi solicitado a Winston Churchill que cortasse o financiamento das artes para colmatar
os custos da guerra, ele simplesmente respondeu: «Então, para que é que estamos a lutar?»
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 370/XIV/1.ª (BE) — Proteção dos
direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica, tem a palavra a Sr.ª Deputada Beatriz
Dias.
A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da
Cultura, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do
Património Cultural: Em média, por cada espetáculo cancelado ficaram sem rendimento 18 artistas envolvidos,
mais de um profissional de produção e mais de dois técnicos. Os números são de um inquérito lançado pela
GDA (Gestão dos Direitos dos Artistas), durante o mês de março.
Um outro inquérito, realizado pelo CENA-STE (Sindicato dos Trabalhadores dos Espetáculos, do Audiovisual
e dos Músicos), revela que 98% dos trabalhadores tiveram trabalho cancelado por causa das medidas restritivas
para conter a pandemia. Em termos financeiros, para as 1300 pessoas que responderam ao questionário, as
perdas por trabalhos cancelados representam ainda 2 milhões de euros, apenas para o período de março a
maio deste ano, o que indica a perda de um valor médio de receita, por trabalhador, de cerca de 1500 €.
Um estudo realizado pela Universidade do Minho dá conta, e cito, de que «para além das perdas imediatas
a que as medidas transversais e setoriais não estão a ser capazes de dar uma resposta cabal, no final de 2020
poderemos assistir, para além de um agudizar da precarização, a um incremento no desemprego de
profissionais do setor cultural que tinham contratos de trabalho, uma vez que as organizações do setor cultural
estimam uma redução de 45,2% nos postos de trabalho e de 78,6% no volume de negócios».
Num setor onde a precariedade laboral é a regra e as estruturas de produção são tipicamente de micro e
pequena dimensão, a desproteção dos trabalhadores é total. A inexistência de um regime de trabalho e de
proteção social específicos para o setor revela-se particularmente penalizadora neste momento de crise. Tal
como alertam os profissionais do setor, se não forem tomadas medidas urgentes, consistentes e estruturantes,
o setor cultural português poderá sofrer danos irreparáveis fruto da pandemia.
No Projeto de Lei n.º 328/XIV/1.ª, o Bloco de Esquerda apresentou um programa de emergência que
reforçava o orçamento do Ministério da Cultura em 10%, criava candidaturas simplificadas para projetos culturais
em tempos de isolamento social, aprofundava o apoio a estruturas e equipamentos culturais públicos e privados
e, sobretudo, criava mecanismos de garantia do cumprimento integral dos compromissos das entidades
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públicas, nacionais ou municipais, bem como das entidades com financiamento público que cancelaram ou
adiaram espetáculos, serviços educativos e outras atividades culturais.
Foram aprovadas melhorias às medidas de emergência para o setor, nomeadamente alterações que
responsabilizam toda a cadeia de contratação. Contudo, apesar de estas alterações terem introduzido uma
pequena melhoria na proposta inicial do Governo, continuam a não responder a aspetos essenciais do setor
cultural e deixam escancarada a janela dos reagendamentos longos. Ficou de fora o reforço do financiamento e
a limitação dos reagendamentos a um prazo de 90 dias, impedindo que as entidades prorroguem prazos para
não assumirem o cancelamento e o pagamento a 100% com os custos do trabalho.
O Bloco volta a apresentar propostas sobre este diploma e a insistir nas seguintes regras, que nos parecem
essenciais: os cancelamentos devem ser pagos a 100% do que seriam as despesas com trabalho, incluindo o
pagamento aos trabalhadores externos, independentes, assistentes de sala e trabalhadores dos serviços
educativos; os reagendamentos não podem ser pretexto para adiar metade dos pagamentos e, dessa forma, a
própria capacidade das pessoas fazerem face às suas necessidades básicas; os apoios sociais desenhados
pelo Ministério do Trabalho devem ter em conta a condição intermitente de muito do trabalho artístico e não
podem excluir, pelas suas regras fechadas, milhares de profissionais deste setor.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 373/XIV/1.ª (N insc.) — Estabelece
medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural português, no âmbito da crise epidemiológica
(texto inicial substituído a pedido da autora), tem a palavra a Sr.ª Deputada Joacine Katar Moreira.
A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Enquanto nós andávamos a usufruir da arte e da cultura, no âmbito do nosso confinamento e no âmbito das
medidas sanitárias, estavam a ser despedidas e despedidos muitos profissionais da cultura, não sendo
respeitados os seus direitos.
Isto, como referi, enquanto nós estávamos em casa ou no emprego a usufruir de muito do que é o seu
esforço. E falo de esforço porque, exatamente neste ambiente de extrema ansiedade, é importante olharmos
para os artistas e os agentes culturais, enquanto referência, para nos ensinarem a relacionar-nos com o
ambiente hostil, com os mínimos apoios, com uma instabilidade enorme, com dificuldades laborais enormes, e,
ainda assim, conseguirem criar, fazer arte, contribuir para toda a sociedade, contribuir para a nossa história
nacional, contribuir para a nossa felicidade, em ambiente de dificuldades absurdas, resultantes do
desinvestimento de anos e anos de sucessivos Executivos.
Estas iniciativas legislativas — nomeadamente a minha — referem-se a medidas excecionais e temporárias
de apoio ao sistema cultural, em que o objetivo é auxiliarmos minimamente as entidades culturais que andam a
passar por enormes dificuldades, com o cancelamento e a anulação dos espetáculos, a ausência de
investimento e outros problemas.
Mas nós precisamos de entender que muitas dessas medidas excecionais — e só são excecionais porque,
infelizmente, não houve opção absolutamente nenhuma — devem ser medidas regulares, para se investir.
Finalmente, este Executivo tem a oportunidade de ouvir os artistas, de ouvir e de estar ao lado dos artistas. É
que não nos adiantaria rigorosamente nada avançarmos para a melhoria da situação sanitária e, amanhã, não
haver relatos,…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — … não haver reconhecimento desta época complicada que
estamos a viver.
Precisamos ainda de entender que cultura não é sinónimo de entretenimento, cultura é conhecimento.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa,
do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
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A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O
Governo traz hoje ao Parlamento a Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª, que impõe um princípio de proibição de
realização de festivais e outros eventos de natureza análoga até 30 de setembro de 2020.
A razão para limitar os espetáculos de música, ou outros, ao ar livre é semelhante à que aconselha não haver
ajuntamentos de pessoas em qualquer outra situação. É uma medida restritiva e gravosa, mas pensamos que
proporcional em relação ao fim público a que se destina.
Permite também aos agentes do setor mais diretamente visados a previsibilidade para as suas decisões, e
até aqui merece a nossa concordância.
Por outro lado, não ficam proibidos os espetáculos em que se possa assegurar distância, ou seja, aqueles
que têm lugares marcados, mediante a avaliação da DGS.
Para o CDS, a questão tem a ver com a utilização de conceitos indefinidos ou mal definidos, que poderão vir
a gerar discriminações e eventualmente até exceções não pretendidas.
Assim, exatamente, o que é que cabe na expressão «festivais»? Se são festivais de música, por que não
dizê-lo explicitamente? O que é que cabe na designação «espetáculos de natureza análoga»?
Não é claro e conviria ao Governo — o qual, ainda por cima, propõe um regime de proibições e de exceções
— propor definições claras e exatas, para que saibamos exatamente a quem se dirige a sua intervenção, e
conviria que não o fizesse no preâmbulo mas, sim, no articulado, onde realmente é relevante. E como esta
proposta de lei será apreciada em sede de especialidade, aí será feito o caminho necessário para a sua
clarificação.
Por último, não posso deixar de fazer uma nota em relação a um projeto de lei que também se encontra aqui
hoje em discussão, o Projeto de Lei n.º 340/XIV/1.ª, do PAN, que baixará à respetiva comissão.
O PAN atende neste projeto de lei não aos apoios às atividades artísticas mas aos apoios aos artistas. O seu
projeto trata não do espetáculo mas das pessoas que ficam sem rendimento. É por isso que é espantoso e, a
meu ver, particularmente gravoso, que exclua taxativamente o espetáculo tauromáquico. É que não se trata de
financiamentos públicos ao espetáculo. Mas, para o PAN, aparentemente, os apoios às pessoas, aos artistas
em situação precária, são de dois níveis: há os que merecem e há os que podem ficar na precariedade e sem
esses apoios.
Afinal, para o PAN, em termos de pandemia, não estamos todos unidos. O PAN bem pode até mudar o seu
nome, se assim o entender, para partido de todos os animais mas só de algumas pessoas.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosário Gambôa,
do Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A
questão que nos traz aqui hoje é aquela que tem dominado os debates neste Parlamento, ou seja, a pandemia
e a necessidade de uma gestão social e económica da evolução da mesma, face ao flagelo que nos aflige e à
margem de incerteza que vamos tentando mitigar com o conhecimento que a ciência nos vai dando.
No quadro da emergência que se instalou, como já foi aqui referido, começou por existir, logo desde o início,
e foi depois consagrado nos sucessivos estados de emergência, um conjunto de orientações específicas
dirigidas aos eventos públicos e de massas sempre que estes implicavam a concentração das pessoas,
recomendando o seu cancelamento, o que acabou por ser imposto.
Ora, esta situação provocou, conforme também já foi aqui referido por vários grupos parlamentares, um
impacto absolutamente devastador no setor cultural. E quando se fala num impacto absolutamente devastador
no setor cultural, fala-se não só dos promotores dos espetáculos mas fundamentalmente de uma rede extensa
e capilar de artistas, técnicos e agentes de artistas e também de outra dimensão fundamental, como, por
exemplo, as atividades de espetro largo, como o turismo, que têm uma influência enorme nas comunidades e
no País e que ficaram de facto extremamente afetadas, assim como as cidades e os territórios ficaram impedidos
de fazer as celebrações que consagram a sua identidade e outras iniciativas que, entretanto, foram construindo,
como os festivais, que passaram a ser oportunidades.
É neste contexto que aparece esta proposta de lei e é neste contexto que se justifica o acompanhamento da
evolução da pandemia e o acompanhamento de novas fases de mitigação, tentando conciliar aquilo que é o
supremo interesse da saúde pública com, simultaneamente, interesses que têm a ver com a defesa dos artistas
e de outras pessoas associadas.
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Ora, a proposta de lei, como aqui foi referido, não só proíbe um conjunto de espetáculos como também
determina a sua exceção, exceção essa que tem a ver com a inibição dos espetáculos que não estejam
regulados pelas recomendações da Direção-Geral da Saúde.
Esta proposta de lei sublinha também uma questão importante relativamente à defesa do consumidor,
consagrando regras que têm de ficar definidas. Não obstante o contexto atual, estes direitos dos consumidores
não podem ser suprimidos.
Os eventos realizados pelas organizações políticas, Srs. Deputados, têm um estatuto especial, como todos
sabemos. Esta proposta de lei define e estabelece, contudo, os seus limites. Isto é, os referidos eventos, recordo,
só podem ter lugar em recinto coberto ou ao ar livre, com lugares marcados e no respeito pela lotação
especificamente definida pela Direção-Geral da Saúde, em função das regras de confinamento definidas.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Há assuntos que poderão, como já foi aqui referido, e deverão ser melhor densificados, em sede de
apreciação na especialidade, como, por exemplo, a aclaração de definições e a limitação de ambiguidades.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — E o Partido Socialista está disponível para analisar, rever e aceitar as
alterações.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rios de
Oliveira, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Sem prejuízo dos demais projetos de lei, neste debate vou limitar-me à apreciação da proposta de lei do
Governo, pois é a mais relevante e a mais surpreendente.
Na aparência da proibição da realização de «festivais» e de «espetáculos de natureza análoga», o Governo
opta por apresentar um diploma pouco claro, pouco objetivo e pouco competente. De tal maneira que somos
obrigados a perguntar: os três artigos/alterações propostos pretendem esclarecer ou confundir? Este diploma é
fonte de solução ou origem de novos problemas? Como deve ser interpretado?
Mais, quando se apresenta uma proibição de festivais até 30 de setembro, interrogamo-nos desde logo com
a data: 30 setembro. Se a situação está a ser monitorizada à semana e nós caminhamos para um gradual
desconfinamento, porquê este prazo tão perentório? Como definir o conceito de «festival» e, pior, como definir
o conceito de «espetáculo de natureza análoga»? Abrange quem? Exclui quem? Verdadeiramente, o Governo
quer proibir todos ou quer entreabrir a porta a alguns? Quais os limites do «cancelamento» e «reagendamento»?
Quem decide? Quais os pressupostos?
Sr.as e Srs. Deputados, vamos falar claro. O momento que vivemos é de grave compressão dos direitos
fundamentais dos portugueses, no qual estamos a impor restrições a liberdades constitucionalmente previstas
e que só uma emergência como esta justifica.
Os portugueses exigem do Governo que não haja dois pesos e duas medidas — outra vez! O povo português
assistiu — em casa e indignado — às manifestações do 1.º de Maio, realizadas à boleia de umas pretensas
orientações, que, na prática, violaram todas as regras que nos impuseram e nos empurraram para o
confinamento. E este diploma é tão indefinido e vago que parece propositado!
Srs. Deputados, existe, neste momento, um elefante no meio desta sala chamado «Festa do Avante!», que
o PCP divulga carinhosamente com o slogan Não há Festa como esta e que se apresta para acontecer em
setembro, logo em setembro.
Todos sabemos onde é, quantas pessoas junta e o modelo de participação que determina. Se houver o tal
rigor/coerência/equilíbrio que se exige aos nossos governantes e autoridades de saúde, é manifestamente
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impossível pensar que uma Festa como esta — que não sei se é festa travestida de comício ou comício
travestido de festa — possa ter lugar.
Não haverá S.to António, não haverá S. João, não houve as comemorações do 13 de Maio, em Fátima. Aliás,
em coerência, o PSD cancelou as Festas do Pontal e do Chão da Lagoa, na Madeira.
Não insultem a inteligência dos portugueses outra vez!
O PSD acompanha o Governo nas medidas de combate ao vírus mas não contem connosco para fretes,
mimos ou complacência do PS e do Governo com o PCP ou com a geringonça! Seremos sempre responsáveis,
mas nunca muletas ou testemunhas silenciosas de manobras de mera propaganda ou de aproveitamento
político, especialmente se vindo do Governo.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe para terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Os portugueses foram sérios, maduros e responsáveis quando o momento da emergência chegou e têm
agora o direito de exigir do Governo idêntico comportamento.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita, do
Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O assunto
que nos encontramos a discutir prende-se com matérias que dizem respeito à difícil situação que se vive na
cultura e ao agravamento de problemas que, muitas vezes, já vinham de trás.
Não nos iremos perder, por isso mesmo, com as costumeiras atoardas e invetivas, vindas de quem pouco
valoriza ou nem está verdadeiramente interessado em defender as artes, a cultura, os seus trabalhadores e o
direito de todos a toda a cultura.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Vamos falar do que está, efetivamente, em discussão e não vamos entrar
em jogos de espelhos.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Na proposta de lei do Governo é identificada a necessidade de aprovar um
conjunto de medidas, tendo em conta os constrangimentos causados pelo surto epidemiológico no setor dos
festivais de música, e refere-se a busca de, e cito, «um equilíbrio entre a sustentabilidade financeira dos
operadores económicos e os direitos dos consumidores que, não obstante o contexto atual, não podem ser
suprimidos ou eliminados.»
Por um lado, o Governo considera que as medidas contidas no Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 26 de março,
que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19 no âmbito
cultural e artístico, são insuficientes ou têm de ser alteradas. Isto num quadro em que o Governo anunciou e pôs
já em andamento a reabertura progressiva de toda a atividade cultural.
Por outro lado, há problemas concretos que ficam por resolver e que podem ter impacto direto ou indireto na
vida das pessoas que adquiriram ingressos para os eventos em causa, dos trabalhadores das artes do
espetáculo e das empresas e promotores.
Assim, quem adquiriu o bilhete deixa de ser ressarcido pelo cancelamento, a breve trecho, do valor da sua
compra na sequência do cancelamento do evento. Passa a haver um vale que pode ser utilizado na aquisição
de bilhetes de ingresso para o mesmo espetáculo que venha a ser realizado em nova data ou para outros
eventos realizados pelo mesmo promotor, mas que apenas prevê a restituição em 2022. No entanto, passa a
ser abrangido o adiamento, que antes não estava previsto.
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Surge também uma dúvida sobre o que ocorre exatamente com o dinheiro que advém de quem comprou
bilhetes. Não havendo perspetiva de devolução a curto prazo e passando agora a ficar do lado dos promotores
de espetáculos, é importante questionar por que razão não existem regras de utilização definida. Isto é, no limite,
e é uma pergunta que deixamos, esta verba pode ser utilizada na distribuição de lucros, na remuneração de
administradores? Pode ser utilizada em processos de falência? Não nos parece que assim deva ser.
O PCP considera que a verba em questão deve ser orientada prioritariamente para o cumprimento de
compromissos contratuais com os trabalhadores das artes do espetáculo e para os agentes culturais,
nomeadamente, artistas, intérpretes e executantes, autores, produtores, agentes e outros.
Como tal, ponderando os elementos em análise, o PCP irá abster-se na votação da Proposta de Lei n.º
31/XIV/1.ª, a par dos restantes projetos em análise.
O PCP defende, e termino, Sr.ª Presidente, que são necessárias e urgentes medidas ambiciosas e eficazes
para acorrer a todos os trabalhadores, companhias, estruturas, agentes e entidades de toda a cultura, das artes
performativas, passando pelo cinema, sem esquecer o património cultural.
Um quadro que já era de emergência não pode ser condenado a lidar com as imensas dificuldades que
atravessa com as mesmas receitas de sempre, nomeadamente o subfinanciamento e a desresponsabilização
do Estado, como opções políticas de primeira linha.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de
Figueiredo, do Iniciativa Liberal.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Bem-
vindos a mais um «minuto liberal». Podia dizer muito em relação a esta proposta de lei, mas é um minuto
curtinho, pelo que, se calhar, vou concentrar-me naquilo que o Deputado Paulo Rios de Oliveira, hoje, já chamou
de «o elefante».
Nestas semanas tem ficado claro que há, em Portugal, filhos e enteados, com regras para uns e regras para
outros.
O PCP diz que a Festa do Avante! tem de se realizar, porque não é um simples festival de música.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Ninguém disse isso!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — De acordo! A Festa doAvante! é um meio de financiamento do
PCP, sem pagar IVA e outros impostos, enquanto os festivais normais os pagam, algo com que o Iniciativa
Liberal quis acabar e foi chumbado aqui, nesta Câmara.
O Sr. António Filipe (PCP): — Está enganado!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Permitimos milhares de pessoas no festival de um partido, mas
não permitimos cinco pessoas no areal de uma praia. Permitimos milhares de pessoas no festival de um partido,
mas não permitimos que uma pessoa tome um banho de mar, a menos que leve uma prancha de surf ou, quem
sabe, uma t-shirt do PCP.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Duarte Cordeiro): — Não é verdade!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Que sentido é que isto tem? Nenhum, absolutamente nenhum! É
o mesmo que se viu no 1.º de Maio. É a desigualdade pura e dura! São regras para os portugueses normais de
um lado e outras regras privilegiadas para quem pode ou tem influência sobre o Governo. É esta a mensagem
que queremos passar lá para fora?!
O Sr. António Filipe (PCP): — Está enganado!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Orwell podia ter estado a referir-se a Portugal…
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir com uma citação de George Orwell, Sr.ª Presidente.
Penso que é um final condigno.
O Sr. António Filipe (PCP): — Trotskista!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Dizia Orwell, se calhar, referindo-se ao Portugal de hoje, que
«Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que outros». Infelizmente, em Portugal, hoje,
continuamos com um País e dois sistemas.
O Sr. António Filipe (PCP): — Está redondamente enganado!
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues,
do Grupo Parlamentar do PAN.
A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, antes de mais, gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Ana
Rita Bessa que a posição do PAN é evidente: quando falamos de cultura, não podemos estar a falar de
tauromaquia e, portanto, nesta discussão, não tem lugar a tauromaquia.
Aplausos do PAN.
Além disso, Sr.ª Deputada, deixe-me dizer-lhe…
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Diga, diga!
A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Exatamente! Digo!
No meio de tantas faltas, no meio de tantas pessoas com tantas necessidades, desviar dinheiros públicos
para apoiar aqueles que ganham a sua vida a torturar animais não é, e não será, certamente, a prioridade do
PAN.
Aplausos do PAN.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, chegámos ao fim do segundo ponto da nossa ordem
de trabalhos, pelo que vamos passar às votações regimentais.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, permite-me o uso da palavra?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado André Ventura, pede a palavra para que efeito?
O Sr. António Filipe (PCP): — É sobre a Festado Avante!?!
O Sr. André Ventura (CH): — Não, não é sobre a Festa do Avante!, Sr. Deputado.
Sr.ª Presidente, gostava de pedir um esclarecimento à Mesa.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sobre a condução dos trabalhos, Sr. Deputado?
O Sr. André Ventura (CH): — Sim, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Faça favor, Sr. Deputado.
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O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, com a antecedência que está prevista no Regimento, o Chega
apresentou um voto de pesar. Esse voto de pesar não consta do guião das votações que hoje vamos fazer aqui,
em Plenário. E, sendo um voto de pesar, não tinha sido abrangido nas últimas decisões consensuais relativas
aos votos.
Pergunto, por isso, qual é a razão de o voto do Chega não estar incluído nas votações que vamos hoje
realizar.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, a Mesa informa-o, e a toda a Câmara, que deram entrada
vários votos de pesar com o mesmo objeto e que, de acordo com o Regimento, baixaram à 1.ª Comissão para
haver lugar a uma uniformização.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, permite-me, de novo, o uso da palavra?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. André Ventura (CH): — Para apresentar recurso para o Plenário dessa decisão, Sr.ª Presidente. E a
razão é evidente: não é isso que está no Regimento.
Admito que isso possa ser decidido à la carte, mas tem de haver aqui regras e, por isso, nos termos do artigo
82.º do Regimento, peço recurso para o Plenário.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, o que me é informado é que os votos que deram
entrada tinham considerandos e, sendo assim, quando têm considerandos que ultrapassam o objeto, devem
baixar à respetiva comissão.
Portanto, o Sr. Deputado André Ventura insiste, mas não vai resolver o problema neste momento, uma vez
que os votos já foram enviados para a 1.ª Comissão.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, no âmbito da discussão em curso, pretendo pedir um
esclarecimento sobre a condução dos trabalhos, para tentar… Penso que, face às regras, que são novas, há,
efetivamente, um enquadramento, que é o que a Sr.ª Presidente descreveu…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Obrigado, Sr.ª Presidente.
Como estava a dizer, há um enquadramento, que é precisamente o de, existindo mais do que um voto sobre
a mesma matéria, poder ser requerido que os votos baixem à comissão, para se procurar um consenso, o que
não impede, obviamente, que, não sendo possível encontrá-lo, eles não acabem por vir todos à reunião plenária.
Portanto, a possibilidade da votação em Plenário existe, mas não nesta sessão, uma vez que a Mesa optou pela
descida à Comissão.
Penso que o ponto regimental é este e o que ficou estipulado para os votos foi a possibilidade de eles
baixarem…
O Sr. André Ventura (CH): — Que ponto regimental?
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — O ponto regimental é o das normas que revimos ainda há pouco tempo
e que estamos…
O Sr. André Ventura (CH): — Onde estão?
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — É o artigo 76.º, Sr. Deputado, se não se importa…
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — É o artigo 75.º, Sr. Deputado.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, dá-me licença…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, não vamos estar aqui a prolongar o assunto, porque o
Sr. Deputado não tem razão, uma vez que o Regimento foi recentemente alterado, toda a gente conhece o seu
conteúdo, e o artigo 75.º é muito claro. Há vários votos sobre a mesma matéria, não é apenas o seu. Houve
outros grupos parlamentares que apresentaram votos, salvo erro deram entrada cinco votos, e, portanto,
baixaram à comissão.
O Sr. Deputado quer um tratamento privilegiado que não pode ter.
O Sr. André Ventura (CH): — Se me permitir, Sr.ª Presidente…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Faça favor, então, de dizer para que efeito pretende usar da palavra,
Sr. Deputado.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, com o devido respeito, não só não é esse o enquadramento
— pode ser a sua opinião ou a de alguns —, como acho muito estranho que um voto de pesar baixe a uma
comissão, ainda que sejam quatro ou cinco, sem que isso seja consensualizado com os proponentes. Isto já
mostra muito da democracia que temos.
Mas deixe-me dizer-lhe outra coisa, Sr.ª Presidente. É que o artigo 82.º do Regimento, que me parece valer
tanto como o artigo 75.º — o PS já manda muito, mas, acho eu, ainda não manda no valor dos artigos —, diz
que «Qualquer Deputado…» — e eu acho que ainda o sou — «… pode reclamar das decisões do Presidente
da Assembleia ou da Mesa, bem como recorrer delas para o Plenário.»
Portanto, não me venham com normas do Regimento. O Regimento diz que posso recorrer e que tenho
direito a 2 minutos para dizer os motivos pelos quais estou a recorrer.
Protestos do Deputado do BE Jorge Costa.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito bem, Sr. Deputado.
Pretendendo, então, recorrer para o Plenário, tem a palavra para apresentar os seus motivos.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, os motivos são muito simples. Passámos os
últimos meses a alterar as circunstâncias dos votos e todos compreendemos porquê: havia muitos votos e não
se queria que tivessem considerações políticas.
Foi consensualizado, desde o início, que os votos de pesar ficavam fora deste enquadramento. Agora, vamos
começar a olhar para os votos de pesar, linha a linha, e a dizer: «Ah, está aqui um considerando, baixa à
comissão». Então, vão baixar todos às comissões! Qualquer dia não há um voto que não passe por uma
comissão! É um autêntico terror sobre aquilo que podemos fazer! Qualquer dia não há um voto que não baixe a
uma comissão e, depois, são ou não chumbados nas comissões.
Mas o voto de pesar é um voto de consideração sobre alguém que faleceu e que traz a esta Câmara um
momento de homenagem. Fazer passar isto pelas comissões é, no mínimo, ridículo, mas, sobretudo, não é o
que tinha sido acordado, não é o que tinha sido consensualizado e que a imprensa noticiou como regulamento
dos votos.
Portanto, podemos hoje proceder desse modo, podemos não aceitar que o voto suba a Plenário, mas
estamos, mais uma vez, a atropelar as liberdades dos Deputados, e acho que isso é inadmissível.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, se o seu voto de pesar, e os dos outros grupos
parlamentares, tivesse sido, de facto, circunscrito ao pesar em si e ao objeto desse pesar, teria sido agendado
para ser votado hoje. Não foi o caso.
O que diz o artigo 75.º, no n.º 4, é o seguinte: «Os projetos de votos de pesar motivados por falecimentos e
que se circunscrevam a esse objeto…» — sublinho, «que se circunscrevam a esse objeto»! — «… são discutidos
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e votados nos termos dos números anteriores». Ou seja, os votos em questão poderiam ser votados hoje, mas
não foi o caso.
O Sr. Deputado já recorreu para o Plenário e, portanto, vamos votar o recurso que apresentou, uma vez que
não há lugar a debate.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP e do PEV,
votos a favor do PAN, do CH e do IL e a abstenção da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
Agora, sim, Srs. Deputados, vamos proceder às votações regimentais.
Começamos pelo Projeto de Voto n.º 219/XIV/1.ª (apresentado pelo CH) — De pesar pela morte do mestre
Raúl Cerveira, fundador de várias associações de artes marciais e impulsionador do karaté em Portugal, que vai
ser lido pelo Sr. Secretário Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o projeto de voto é do seguinte
teor:
«Raúl Augusto Queiroz da Mota Cerveira nasceu a 11 de abril de 1944, na cidade de Lisboa.
Mestre de Shotokai Karaté-Do, tem a mais alta graduação neste estilo, sendo, sem qualquer dúvida, um dos
maiores impulsionadores do Karaté-Do em Portugal.
Iniciou a sua prática em 1963, da única forma que, nesta época, era possível treinar karaté em Portugal, a
interpretar ilustrações de livros, bem como a tentar aplicar as técnicas neles descritas.
Numa época em que não existiam em Portugal mestres, instrutores ou monitores, Raúl Cerveira foi um dos
dinamizadores e impulsionadores, iniciando formalmente a prática do karaté a 11 de abril de 1964. Obteve a
graduação de 1.º Dan, no primeiro Dojo de Portugal, a Academia de Budo, em outubro de 1966. O seu treino foi
interrompido pelo serviço militar, em África.
Foi um dos fundadores e presidente da Associação Portuguesa de Karaté-Do, em 1980, e em 1985 funda a
Federação Portuguesa de Karaté e Disciplinas Associadas, tendo, no ano seguinte, ganhado o título de Mestre,
atribuído pelo Ministério da Educação e Cultura.
Em 1992, foi também um dos fundadores da Federação Nacional de Karaté - Portugal, da qual foi presidente
até 1993, tendo posteriormente regressado à sua direção, entre 2001 e 2007.
No passado dia 6 de maio, Raúl Cerveira deixou-nos, mas o seu nome, as recordações de quem com ele
conviveu de um homem de valor elevado e elegante sentido de humor, tal como o seu percurso, ficarão gravados
na história das artes marciais em Portugal.
Reunida em Plenário, a Assembleia da República presta a sua homenagem à memória do Mestre Raúl
Cerveira, endereçando sentidas condolências à sua família, amigos e a todos os praticantes em geral.»
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr. Deputado Duarte Pacheco. Vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Passamos ao Projeto de Voto n.º 225/XIV/1.ª (apresentado pelo PAR e subscrito por Deputados do PS, do
PSD, do PAN e do CH) — De pesar pelo falecimento de D. Manuel Vieira Pinto.
Peço à Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha o favor de ler este projeto de voto.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o projeto de voto é do seguinte
teor:
«Faleceu, no passado dia 1 de maio, no Porto, D. Manuel Vieira Pinto, Arcebispo resignatário da Arquidiocese
de Nampula e figura maior na luta pela afirmação da dignidade da pessoa humana no Portugal contemporâneo.
Nascido em Amarante, a 9 de dezembro de 1923, D. Manuel Vieira Pinto frequentou o Seminário Diocesano
do Porto, cidade onde viria a desempenhar a sua primeira função sacerdotal, na qualidade de coadjutor da
Paróquia de Campanhã.
Seguiu depois para Roma, tendo aí travado conhecimento com o célebre Padre Lombardi, fundador do
movimento Por Um Mundo Melhor. Tendo aderido a este importante movimento renovador, o então Padre Vieira
Pinto viria a assumir a responsabilidade pela atuação do mesmo em Portugal.
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Em 1967, foi nomeado, pelo Papa Paulo VI, Bispo da Diocese de Nampula, cidade a que chegou em plena
guerra colonial. O novo Bispo destacou-se, de imediato, pela ousadia dos seus gestos e dos seus atos, que
motivaram a animosidade de parte significativa da população branca e a ampla adesão da população negra.
A sua voz livre e corajosa não mais deixou de se fazer ouvir, fosse em defesa do diálogo intercultural e inter-
religioso, fosse na promoção dos direitos humanos, fosse na exortação ao reconhecimento do direito do povo
moçambicano a ser o sujeito político construtor da sua própria história.
D. Manuel Vieira Pinto, dando mostra de excecionais dotes de lucidez e coragem, contestou abertamente a
guerra colonial e o colonialismo que a fundamentava e declarou a sua adesão ao princípio de que todos os
povos têm direito à autodeterminação. Perante tais manifestações de rebeldia, o regime autoritário, que viria a
ser deposto a 25 de abril de 1974, promoveu o afastamento do Bispo da sua diocese, a que viria só a regressar
em janeiro de 1975. No período pós-independência, prosseguiu a sua atividade em prol da salvaguarda dos
direitos humanos em circunstâncias não raras vezes bastante difíceis.
Já na fase final da sua permanência em Moçambique, desenvolveu vastos esforços para ajudar a que se
pusesse termo à guerra civil que assolava o país e se iniciasse um verdadeiro processo de reconciliação
nacional.
Partindo da sua mundividência cristã, D. Manuel Vieira Pinto foi um homem empenhado na interpretação das
contingências sócio-históricas do seu tempo, tendo em vista uma ação transformadora capaz de contribuir para
o reforço da dignidade do ser humano.
Reunida em sessão plenária, a Assembleia da República expressa o seu pesar pelo falecimento de D. Manuel
Vieira Pinto, recordando o homem de exceção e o cidadão de primeiro plano, e endereçando à família e amigos
as mais sentidas condolências.»
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha. Vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, na sequência dos dois projetos de votos que acabámos
de aprovar, vamos guardar 1 minuto de silêncio.
A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.
Vamos continuar com as nossas votações.
Assim, passamos à votação do Projeto de Resolução n.º 268/XIV/1.ª (PEV) — Classificação de tripulante de
cabina como profissão de desgaste rápido.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do PAN,
do PEV, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do CDS-PP e do IL.
Votamos agora o Projeto de Resolução n.º 251/XIV/1.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de
tripulante de cabine com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade e à garantia das
condições de segurança e saúde no trabalho.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do PAN,
do PEV, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do CDS-PP e do IL.
De seguida, passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 234/XIV/1.ª (CDS-PP) — Criação
do grupo de trabalho para a regulamentação legal das profissões de desgaste rápido e criação da respetiva
tabela.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e do PEV, votos a favor do PSD, do
CDS-PP, do PAN e do IL e abstenções do BE, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
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Votamos agora o Projeto de Resolução n.º 440/XIV/1.ª (PSD) — Complemento do Programa de Estabilidade
2020 com a apresentação de um programa de emergência social e ação diplomática para o seu financiamento
europeu.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e do PEV, votos a favor do PSD, do BE,
do PAN, do CH, do IL e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e a abstenção do CDS-PP.
Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 441/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que, no âmbito
do Programa Nacional de Reformas, adote um conjunto de medidas concretas que permitam respostas para
todos os portugueses afetados pela pandemia.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não
inscrita Joacine Katar Moreira, votos a favor do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL e a abstenção do PAN.
Vamos proceder, de seguida, à votação do Projeto de Resolução n.º 442/XIV/1.ª (PCP) — Pelo direito
soberano de Portugal decidir do seu futuro: combater o vírus e o seu aproveitamento, assegurar o
desenvolvimento do País.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL, votos a
favor do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e a abstenção do PAN.
Votamos agora o Projeto de Resolução n.º 443/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que, no âmbito do
Programa Nacional de Reformas, inclua, no plano de recuperação da crise económica, social e sanitária
provocada pela COVID-19, a opção estratégica por um modelo de recuperação assente no investimento no
combate e adaptação às alterações climáticas, na não-aplicação de medidas de austeridade e em medidas de
combate a interesses instalados.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do
PAN, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP, do CH e do IL.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?
O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr.ª Presidente, queria apenas anunciar que entregarei uma declaração de voto
em relação ao Projeto de Resolução n.º 443/XIV/1.ª, apresentado pelo PAN, em meu nome e em nome dos Srs.
Deputados Maria Begonha, Tiago Estevão Martins, Filipe Pacheco, Eduardo Barroco de Melo, Joana Sá Pereira
e Olavo Câmara.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, fica registado.
Passamos à votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece medidas
excecionais e temporárias quanto aos espetáculos de natureza artística, no âmbito da pandemia da doença
COVID-19.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PAN, o voto contra da Deputada não
inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e do IL.
Esta proposta de lei baixa, assim, à 12.ª Comissão.
A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada Joacine Katar Moreira, pede a palavra para que efeito?
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A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, queria anunciar a apresentação de uma
declaração de voto sobre a última votação.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito bem, Sr.ª Deputada. Fica registado.
Temos agora vários requerimentos para votar. Pergunto ao PAN, ao BE e à Deputada não inscrita Joacine
Katar Moreira se podemos votá-los em conjunto.
Pausa.
Não havendo oposição, vamos votar, em conjunto, os três requerimentos, apresentados pelo PAN, pelo BE
e pela Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, solicitando a baixa à Comissão de Cultura e Comunicação,
sem votação, por 30 dias, dos Projetos de Lei n.os 337/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-lei n.º 10-I/2020, de 13
de março, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19 no
âmbito cultural e artístico, 340/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 12-A/2020, de 6 de abril, que estabelece
medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19, 370/XIV/1.ª (BE) — Proteção
dos direitos dos trabalhadores da cultura em crise pandémica e económica e 373/XIV/1.ª (N insc) — Estabelece
medidas excecionais e temporárias afetas ao sistema cultural português, no âmbito da crise epidemiológica.
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.
Passamos, de seguida, à votação final global do texto final apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia
e Ordenamento do Território relativo aos Projetos de Resolução n.os 120/XIV/1.ª (PCP) ⎯ Recomenda ao
Governo que tome as medidas de defesa do rio Tejo, 167/XIV/1.ª (BE) ⎯ Recomenda ao Governo que promova
medidas de garantia de caudais verdadeiramente ecológicos no rio Tejo com informação regular às populações,
187/XIV/1.ª (PAN) ⎯ Recomenda ao Governo a renegociação dos caudais e das situações de exceção
constantes na Convenção de Albufeira, 266/XIV/1.ª (PEV) ⎯ Revisão da Convenção de Albufeira para
salvaguarda de recursos hídricos fundamentais ao País e 271/XIV/1.ª (PSD) ⎯ Recomenda ao Governo que
promova a revisão da Convenção de Albufeira, apresente os resultados da análise da adequabilidade da rede
de monitorização hidrometeorológica atualmente existente e que torne públicos os resultados do
acompanhamento da execução dos planos no quadro do planeamento hidrológico 2016-2021, assim como os
pressupostos estratégicos que definirão o aprofundamento significativo da cooperação bilateral para o ciclo de
planeamento 2021-2027.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, dá-me licença?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — A Sr.ª Deputada Mariana Mortágua pede a palavra para que efeito?
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): ⎯ Sr.ª Presidente, é para anunciar que o Bloco de Esquerda apresentará
uma declaração de voto sobre esta votação.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Fica registado, Sr.ª Deputada.
Vamos agora proceder à votação do requerimento, apresentado pelo PS e PSD, solicitando a avocação pelo
Plenário da votação, na especialidade, de propostas de alteração relativas ao texto final da Comissão de
Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à Proposta de Lei n.º 30/XIV/1.ª (GOV) ⎯
Altera as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
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Passamos ao guião suplementar. Vamos votar, na especialidade, as propostas de alteração respeitantes ao
texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo a esta última
proposta de lei.
Havendo acordo das bancadas, vamos votar em conjunto as propostas de alteração, apresentadas pelo PS
e pelo PSD, de emenda do n.º 6 e de emenda do n.º 8 do artigo 6.º-A da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março,
constante do artigo 2.º.
Submetidas à votação, foram aprovadas, com votos a favor do PS, do PSD e do PAN, votos contra da
Deputadanão inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e do IL.
São as seguintes:
Artigo 6.º-A
Regime processual e transitório
6 — Ficam suspensos no decurso do período de vigência do regime excecional e transitório:
a) O prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do Código da
Insolvência e da Recuperação de Empresas;
b) Os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência relacionados com a
concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família;
c) As ações de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa
imóvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, possa ser
colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão imperiosa;
d) Os prazos de prescrição e de caducidade relativos aos processos e procedimentos referidos nas
alíneas anteriores;
e) Os prazos de prescrição e de caducidade relativos aos processos cujas diligências não possam ser
feitas nos termos da alínea b) do n.º 2, da alínea b) do n.º 3 ou do n.º 7.
(…)
8 — O disposto nas alíneas d) e e) do n.º 6 prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos
máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo
correspondente à vigência da suspensão.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos agora votar a proposta de alteração, apresentada pelo PS e pelo
PSD, de aditamento de um n.º 3 ao artigo 5.º da mesma proposta de lei.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra da Deputadanão inscrita
Joacine Katar Moreira e abstenções do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do PEV, do CH e do IL.
É a seguinte:
Artigo 5.º
Prazos administrativos
3 — O disposto no presente artigo não se aplica aos prazos das fases administrativas em matéria
contraordenacional.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos, agora sim, à votação final global do texto final apresentado
pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à Proposta de Lei n.º
30/XIV/1.ª (GOV) ⎯ Altera as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID19.
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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do PAN e do IL e abstenções do BE,
do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e da Deputadanão inscrita Joacine Katar Moreira.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, dá-me licença?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): ⎯ Sr.ª Presidente, não muda o resultado, mas na votação da Proposta
de Lei n.º 31/XIV/1.ª gostaríamos de corrigir o sentido de voto do PAN de a favor para abstenção.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Fica registado, Sr.ª Deputada.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, dá-me licença também?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): ⎯ Sr.ª Presidente, é para apresentar um requerimento de dispensa de
redação final e do prazo de reclamações relativamente à proposta de lei que acabámos de aprovar.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Vamos então votar o requerimento oral, apresentado pelo PS,
solicitando a dispensa de redação final e do prazo para apresentação de reclamações contra inexatidões
relativamente ao texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias relativo à Proposta de Lei n.º 30/XIV/1.ª (GOV) ⎯ Altera as medidas excecionais e temporárias de
resposta à pandemia da doença COVID-19.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Chegamos, assim, ao fim das votações regimentais e da nossa ordem de trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária, cuja ordem do dia consistirá no debate quinzenal com o Sr. Primeiro-Ministro,
terá lugar na próxima quarta-feira, dia 20, pelas 15 horas.
Muito boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados. Desejo-vos um bom resto de dia e até quarta-feira.
Eram 19 horas e 11 minutos.
———
Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação
Relativa ao Projeto de Resolução n.º 443/XIV/1.ª:
Considerando que:
Vivemos numa emergência climática, como reconheceu e afirmou a Resolução da Assembleia da República
n.º 125/2019, aprovada por unanimidade no dia 5 julho 2019;
O Programa do XXII Governo Constitucional confere, com justiça, prioridade ao combate às alterações
climáticas como desafio estratégico da ação governativa;
As alterações climáticas apresentam riscos sérios, significativos e iminentes às pessoas, bens e às atividades
económicas, sociais e culturais, contribuindo ainda para acelerar os vetores de transmissão das pandemias;
A mitigação das alterações climáticas e a adaptação do território, das pessoas e das comunidades às suas
consequências apresentam, para além de uma ameaça credível, uma oportunidade concreta para o crescimento
e a melhoria do nível de vida dos portugueses;
As políticas de austeridade, praticadas em Portugal na XII Legislatura, e em muitos países europeus pela
mesma altura, fracassaram por completo, tendo os seus objetivos de consolidação das contas públicas
fracassado todos os anos;
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As políticas de austeridade em Portugal, e não só, tiveram, ainda, um enorme impacto social e económico,
tendo-se registado uma nova vaga de emigração, pobreza e falência de entidades económicas, bem como o
desinvestimento na investigação e inovação, com danos permanentes na vida, capacidade produtiva e
património das pessoas, empresas e de toda a República;
As políticas de austeridade foram utilizadas para fazer aprovar medidas de retrocesso sem precedentes nos
direitos sociais e económicos, em particular nos direitos laborais, cujos impactos ainda hoje se fazem sentir;
Também acompanhou esse período uma desastrosa política de privatização, tanto através da venda de
ativos do Estado como também através da degradação dos serviços públicos;
O compromisso de rejeitar a austeridade, já firmado pelo Partido Socialista e pelo XXII Governo
Constitucional, é fundamental para assegurar a confiança dos agentes económicos;
Entenderam, pelos motivos expostos, os Srs. Deputados do Partido Socialista que, votando contra o Projeto
de Resolução n.º 443/XIV/1.ª (PAN), o Governo deverá priorizar na conceção do plano de recuperação da crise
económica, social e sanitária a transição rápida e justa para uma economia neutra em carbono, evitando por
completo um regresso às políticas falhadas da austeridade, privatização e retrocesso dos direitos sociais e
económicos que marcou o período da XII Legislatura.
Os Deputados do PS, Miguel Matos — Maria Begonha — Tiago Estêvão Martins — Filipe Pacheco —
Eduardo Barroco Melo — Joana Sá Pereira — Olavo Câmara.
———
Relativa à Proposta de Lei n.º 31/XIV/1.ª:
Enquanto usufruímos da arte e da cultura no âmbito do nosso confinamento e no âmbito das medidas
sanitárias estavam a ser despedidas e despedidos muitos profissionais da cultura e a não ser respeitados os
seus direitos.
A cultura em Portugal tem sofrido a cada ano o desgaste dos seus profissionais, marcados pela precarização
laboral, e o congelamento do investimento no setor por sucessivos governos. A crise COVID-19, conforme é
entendido o período em que vivemos, mostra-nos uma realidade angustiante que tem agravado o difícil
panorama das entidades culturais, dos artistas e demais profissionais: a súbita interrupção da vida cultural tal
como estava instituída, programada e financiada; dificuldades de subsistência de grande parte dos profissionais,
muitos colocados à margem dos apoios; a emergência de um público cujo confinamento tem aumentado a
necessidade de fruição de produtos culturais e a procura de formas de pensar e de viver a crise pandémica.
Sucede que da mesma forma que a cultura se difundiu nesta crise epidemiológica, expôs as suas fragilidades
estruturais de longa data, que em última análise repousam sobre quem, mesmo em instabilidade, consegue criar
sob a força da precariedade. Os artistas e demais agentes culturais não deixaram de produzir, criando para eles
e para todas e todos, ajudando a sociedade portuguesa a atravessar esta crise, e seria negligente não apoiar
um setor que é tão fundamental como vital, para o País. Afinal a cultura é o corpo de trabalho intelectual e
criativo no qual a experiência e o pensamento de uma sociedade são inscritos, sobretudo nos momentos mais
difíceis que a esta lhe cabe atravessar, contribuindo para o bem-estar e para a saúde mental da população.
Precisamos de entender que muitas destas medidas agora designadas como excecionais devem ser medidas
regulares por forma a fazer face à fragilidade sistémica da cultura em Portugal. É preciso garantir o apoio
sustentado e de longa duração a artistas e entidades culturais. Se os artistas e agentes culturais estão focados
apenas em sobreviver, a criação será sempre amputada e a sua qualidade posta em causa.
As medidas propostas pelo Executivo sobre matérias relativas à cultura são insuficientes. Não nos adiantaria,
então, rigorosamente nada avançarmos para a melhoria da situação sanitária e amanhã não haver relatos,
criações e reflexões, mas sobretudo não haver conhecimento proveniente da cultura em relação a esta época
complicada que estamos a viver. Apoiar as artes e a cultura garante que mais tarde, as futuras gerações, terão
acesso à memória e à experiência destes tempos. A cultura não é sinónimo de entretenimento; a cultura, tal
como a ciência, é conhecimento. E por isso mesmo deve ser estruturalmente apoiada.
Pelas razões acima expostas, votei contra, e sob forma de protesto, a mencionada proposta do Governo.
Lisboa, 19 de maio de 2020.
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A Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
———
Relativa ao texto final, apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, sobre
os Projetos de Resolução n.os 120/XIV/1.ª (PCP), 167/XIV/1.ª (BE),187/XIV/1.ª (PAN), 266/XIV/1.ª (PEV) e
271/XIV/1.ª (PSD):
Relativamente ao texto final, apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território,
sobre os Projetos de Resolução n.os 120/XIV/1.ª (PCP), 167/XIV/1.ª (BE), 187/XIV/1.ª (PAN), 266/XIV/1.ª (PEV)
e 271/XIV/1.ª (PSD), a posição de voto do Bloco de Esquerda foi a favor das recomendações contidas naquele
diploma.
Entendemos que, de uma forma geral, o diploma contribuirá para a necessária revisão da Convenção de
Albufeira e, por conseguinte, ajudará a garantir caudais verdadeiramente ecológicos cuja existência é uma das
condições necessárias para se recuperar e preservar o rio Tejo e os seus afluentes.
No entanto, não podemos deixar de assinalar a nossa discordância com a alínea c) do ponto 2 e com o ponto
10 do diploma.
Na alínea c) do ponto 2, a Assembleia da República recomenda ao Governo «retirar do âmbito da Convenção
de Albufeira a fixação dos caudais a descarregar na zona da secção de ponte de Muge, uma vez que a gestão
local dos recursos hídricos realizada em território português não é matéria de interesse ou condicionante do
território espanhol».
A nossa discordância com a alínea c) do ponto 2 prende-se com o facto de esta alínea abrir a possibilidade
de uma utilização mais intensiva dos caudais a montante de ponte de Muge, condicionando o volume de água
e as concentrações de nutrientes e de sedimentos que alcançam o estuário do rio Tejo, podendo agravar os
desequilíbrios daquele ecossistema estuarino e facilitar a progressão para montante da chamada «cunha
salina».
A alínea c) do ponto 2 pode ainda levar à redução da já diminuta monitorização dos caudais naquela secção
e, por conseguinte, à ausência de informação disponível sobre os recursos hídricos e estado ecológico daquele
troço do rio Tejo.
No ponto 10 do diploma, a Assembleia da República recomenda ao Governo que «proceda ao estudo do
aproveitamento hidráulico do rio Tejo para fins múltiplos».
Entendemos que o ponto 10 do diploma vai ao encontro das aspirações do Projeto Tejo — Aproveitamento
Hidráulico de Fins Múltiplos do Tejo e Oeste, cujo projeto de intervenção no rio Tejo visa, com recurso a
financiamento público, a construção de açudes e outras barreiras por forma a concretizar um projeto
megalómano de irrigação agrícola. Tal intervenção poria em causa o único troço livre do rio Tejo, trazendo
consequências nefastas para o ecossistema ribeirinho, para as atividades tradicionais que ali se desenvolvem
e para o pleno usufruto da natureza pelas populações.
Além do mais, em plena crise climática, na qual os efeitos da seca são já sentidos em vastas áreas do
território português, é necessário implementar medidas de eficiência hídrica que possibilitem o uso racional da
água na agricultura, ao invés de se aumentar desmesuradamente as áreas de irrigação que promovem o
desperdício de recursos hídricos.
Assembleia da República, 18 de maio de 2020.
Os Deputados do Bloco de Esquerda.
———
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.