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Sexta-feira, 10 de julho de 2020 I Série — Número 74

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE9DEJULHODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 8

minutos. Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência

e Estatuto dos Deputados relativo à retoma do mandato de um Deputado do PSD e à cessação do mandato do Deputado substituto.

Deu-se conta da retirada, pelo IL, do seu Projeto de Resolução n.º 522/XIV/1.ª e da caducidade do processo relativo à apreciação do Decreto-Lei n.º 23/2020, de 22 de maio — Estabelece as regras para a celebração de contratos

de parceria de gestão na área da saúde [Apreciações Parlamentares n.os 16/XIV/ 1.ª (PCP) e 19/XIV/1.ª (PSD)].

Procedeu-se ao debate sobre as prioridades da presidência do Conselho da União Europeia, conforme previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia (Lei n.º 43/2006, de 25 de agosto, alterada pela Lei n.º 21/2012, de 17 de maio, e pela Lei n.º 18/2018, de 2 de maio) e sobre o relatório anual, enviado pelo Governo, relativo

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à participação de Portugal no processo de construção da União Europeia, nos termos do disposto da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 4 do artigo 5.º da mesma Lei, juntamente com os Projetos de Resolução n.os 556/XIV/1.ª (Comissão de Assuntos Europeus) — Apreciação do Relatório sobre Portugal na União Europeia, 2019, e 566/XIV/1.ª (Comissão de Assuntos Europeus) — Adoção, pela Assembleia da República, das iniciativas europeias consideradas prioritárias para efeito de escrutínio, no âmbito do Programa de Trabalho da Comissão Europeia para 2020.

Usaram da palavra, além do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva), os Deputados Luís Capoulas Santos e Isabel Oneto (PS), Isabel Meireles (PSD), Fabíola Cardoso (BE), Bruno Dias (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP), André Silva (PAN), José Luís Ferreira (PEV), André Ventura (CH) e João Cotrim de Figueiredo (IL).

Foi discutido, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 456/XIV/1.ª (PS) — Alarga o prazo para a realização, por meios de comunicação à distância, das reuniões dos órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais, procedendo à quinta alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março. Intervieram os Deputados Pedro Delgado Alves (PS), Jorge Paulo Oliveira (PSD), José Maria Cardoso (BE), Cecília Meireles (CDS-PP), Bebiana Cunha (PAN), Paula Santos (PCP) e André Ventura (CH).

Foram discutidos, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 43/XIV/1.ª (GOV) — Reforça as garantias dos contribuintes e a simplificação processual e o Projeto de Lei n.º 465/XIV/1.ª (CDS-PP) — Aditamento ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, introduzindo o processo de conciliação fiscal, juntamente com o Projeto de Resolução n.º 548/XIV/1.ª (IL) — Pela transparência e equilíbrio na relação do Estado com o contribuinte. Intervieram, além do Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais (António Mendonça Mendes), os Deputados Cecília Meireles (CDS-PP), João Cotrim de Figueiredo (IL), Duarte Alves (PCP), Cristina Rodrigues (N insc.), António Ventura (PSD), Fernando Anastácio (PS) e Mariana Mortágua (BE).

Foi discutida, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 44/XIV/1.ª (GOV) — Transpõe a Diretiva (UE) 2018/1808, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de novembro de 2018, respeitante à oferta de serviços de comunicação social audiovisual, tendo proferido intervenções o Secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media (Nuno Artur Silva) e os Deputados Ana Rita Bessa (CDS-PP), Isabel Lopes (PSD), Diana Ferreira (PCP), Jorge Costa (BE), André Ventura (CH) e Rosário Gambôa (PS).

Foi discutida, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 45/XIV/1.ª (GOV) — Autoriza o Governo a legislar em matéria de trabalho a bordo das embarcações de pesca e da atividade de marítimos a bordo de navios, transpondo as Diretivas (UE) 2017/159 e 2018/131. Proferiram intervenções o Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional (Miguel Cabrita) e os Deputados João Dias (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Sandra Pereira (PSD), João Azevedo Castro (PS), Cristina Rodrigues (N insc.) e José Moura Soeiro (BE).

Foi discutida, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 46/XIV/1.ª (GOV) — Define os objetivos, prioridades e orientações de política criminal para o biénio de 2020-2022. Intervieram a Ministra da Justiça (Francisca Van Dunem), os Deputados Inês de Sousa Real (PAN), José Manuel Pureza (BE), Elza Pais (PS), André Coelho Lima (PSD), António Filipe (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Cristina Rodrigues (N insc.) e André Ventura (CH) e ainda o Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna (Antero Luís).

Foi discutida, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 49/XIV/1.ª (GOV) — Promove a simplificação de diversos procedimentos administrativos, incluindo das autarquias locais, e introduz alterações ao Código do Procedimento Administrativo. Proferiram intervenções, além da Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública (Alexandra Leitão), os Deputados Bebiana Cunha (PAN), José Cancela Moura (PSD), Cecília Meireles (CDS-PP), Paula Santos (PCP), Fernando Paulo Ferreira (PS) e André Ventura (CH).

Foi discutida, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 48/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece o regime fiscal das entidades organizadoras da competição UEFA Champions League 2019/2020 Finals e prorroga a isenção de imposto sobre o valor acrescentado nas transmissões e aquisições intracomunitárias de bens necessários para o combate à COVID-19. Intervieram o Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais e os Deputados Lina Lopes (PSD), João Cotrim de Figueiredo (IL), André Ventura (CH), Carlos Brás (PS), Duarte Alves (PCP), Luís Monteiro (BE), Cecília Meireles (CDS-PP) e André Silva (PAN).

Deu-se conta da apresentação do Projeto de Resolução n.º 568/XIV/1.ª.

A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 19 horas e 29 minutos.

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O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 8 minutos.

Antes de darmos início à ordem de trabalhos de hoje, vou dar a palavra à Sr.ª Secretária da Mesa, Maria da

Luz Rosinha, que tem várias informações importantes a dar-vos.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, passo a anunciar que

deu entrada na Mesa o Parecer n.º 10, de 8 de julho, da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados,

sobre a retoma do mandato do Sr. Deputado Bruno Coimbra (PSD), eleito pelo círculo eleitoral de Aveiro,

cessando funções o Sr. Deputado Rui Cruz.

O parecer é no sentido de a retoma do mandato do Deputado em causa ser de admitir, uma vez que se

encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CH e da Deputada não

inscrita Joacine Katar Moreira.

Pode prosseguir, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, anuncio a retirada, por

parte do Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, da Iniciativa Liberal, do Projeto de Resolução n.º 522/XIV/1.ª

(IL) — Pela suspensão da designação do novo Governador do Banco de Portugal até à conclusão do processo

legislativo em curso na Assembleia da República, que, entretanto, tinha baixado à 5.ª Comissão.

Anuncio também a caducidade do processo relativo à apreciação do Decreto-Lei n.º 23/2020, de 22 de maio

— Estabelece as regras para a celebração de contratos de parceria de gestão na área da saúde [Apreciações

parlamentares n.os 16/XIV/1.ª (PCP) e 19/XIV/1.ª (PSD)]. As propostas de alteração estão, portanto, caducadas.

Terminei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos dar início ao primeiro ponto da nossa agenda de hoje,

que é composto pelo debate sobre as prioridades da presidência do Conselho da União Europeia, conforme

previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pela

Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia (Lei n.º 43/2006, de 25 de

agosto, alterada pela Lei n.º 21/2012, de 17 de maio, e pela Lei n.º 18/2018, de 2 de maio) e sobre o relatório

anual, enviado pelo Governo, sobre a participação de Portugal no processo de construção da União Europeia,

nos termos do disposto da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 4 do artigo 5.º da Lei relativa ao

acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de construção

da União Europeia (Lei n.º 43/2006, de 25 de agosto, alterada pela Lei n.º 21/2012, de 17 de maio, e pela Lei

n.º 18/2018, de 2 de maio), em conjunto com os Projetos de Resolução n.os 556/XIV/1.ª (Comissão de Assuntos

Europeus) — Apreciação do Relatório sobre Portugal na União Europeia, 2019, e 566/XIV/1.ª (Comissão de

Assuntos Europeus) — Adoção pela Assembleia da República das iniciativas europeias consideradas prioritárias

para efeito de escrutínio, no âmbito do Programa de Trabalho da Comissão Europeia para 2020.

Para abrir este debate, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros Augusto Santos

Silva, que aproveito para cumprimentar.

Faça favor, Sr. Ministro.

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e

Srs. Deputados: Iniciou-se no passado dia 1 de julho, com a Presidência alemã, o trio de presidências do

Conselho da União Europeia, em que se enquadra Portugal.

O Programa do Trio é conhecido e foi muito fácil elaborá-lo, tal a convergência de pontos de vista entre a

Alemanha, Portugal e a Eslovénia, que se sucederão neste trio de presidências.

Esse Programa do Trio pode ser resumido em poucas palavras. Em primeiro lugar, prosseguir os objetivos,

as prioridades que ficaram definidas pelos líderes europeus na Agenda Estratégica 2019-2024.

Quais são essas prioridades? Em primeiro lugar, assegurar a transição para a economia digital, os processos

de transformação digital das economias europeias; em segundo lugar, favorecer a transição energética,

essencial para a descarbonização dessas economias; em terceiro lugar, garantir a prioridade e a liderança

europeias na ação climática, quer ao nível interno, quer ao nível global; e, em quarto lugar, valorizar e afirmar a

posição da União Europeia como um ator global, um ator indispensável para as grandes agendas multilaterais

do mundo de hoje.

Ora, estas prioridades continuam atuais e são cada vez mais atuais, mas a crise provocada pela pandemia

acrescenta outras prioridades a estas, sem as pôr em causa. E essas prioridades resultam das lições aprendidas

com a crise da pandemia, lições do ponto de vista da necessidade de reforçar os sistemas sociais e, em

particular, os serviços de saúde — e daí a proposta da Comissão Europeia de lançamento, pela primeira vez na

história da União, de um programa comum em matéria de saúde —; lições no que diz respeito à necessidade

de aproximar mais da Europa as cadeias globais de produção e abastecimento de bens públicos que nós todos,

na Europa, consideramos essenciais; e da necessidade de re-industrializar a Europa, afirmar mais, como nós

dizemos crescentemente, a soberania económica da Europa. E último traço característico do Programa do Trio

das presidências é fazer isto, prosseguir as prioridades estratégicas, retirar as lições da crise com o sentido da

urgência na ação.

A União Europeia foi muito atingida pela pandemia, as suas consequências económicas são devastadoras

para as economias de todos os Estados-Membros e, portanto, o sentido de urgência na ação, a consciência de

que temos de iniciar rapidamente um processo de recuperação económica e social à escala europeia,

preservando e salvaguardando o mercado interno e criando os meios financeiros indispensáveis para que os

Estados-Membros possam realizar os investimentos e as reformas incontornáveis, esse sentido de urgência

marca o Programa do Trio.

Por isso mesmo é que a Alemanha tem dito que a sua presidência terá prioridades em pequeno número,

claras, nos pontos essenciais.

Primeira prioridade: concluir o acordo, tão rapidamente quanto possível, sobre o próximo quadro financeiro

plurianual (QFP) e o plano de recuperação; concluir o acordo sobre o orçamento plurianual da União Europeia

para os próximos sete anos e, ao mesmo tempo, tendo a ele acoplado o programa Próxima Geração, isto é, um

programa de execução imediata para favorecer a recuperação económica e social da União. Portanto, procurar

esse acordo já desejavelmente em julho. O próximo Conselho Europeu será um marco essencial nessa procura

de acordo.

Segunda prioridade essencial da presidência europeia: favorecer a conclusão das negociações entre o Reino

Unido e a União Europeia com um acordo que regule a relação futura entre ambos.

Terceira prioridade: o Estado de direito. Em outubro próximo, a Comissão Europeia publicará o primeiro

relatório sobre o Estado de direito e a Presidência alemã insiste na necessidade de nós iniciarmos diálogos

políticos interpares que nos envolvam a todos sobre o Estado de direito, que é, aliás, uma condição de pertença

à União.

Quarta prioridade: o novo pacto de migrações e asilo, que a Comissão Europeia diz que irá propor mal esteja

concluída a negociação do QFP e do programa Próxima Geração.

Estas são as prioridades essenciais da Presidência alemã e elas casam-se bem com a sua outra grande

responsabilidade, que é a de lançar formalmente a conferência sobre o futuro da Europa. Neste momento já

temos as posições do Parlamento Europeu, da Comissão Europeia e do Conselho Europeu sobre o que deve

ser a conferência sobre o futuro da Europa — quais os seus objetivos, a sua natureza e a sua estrutura — e,

portanto, esperamos que rapidamente as três instituições cheguem a acordo para que a conferência se possa

lançar.

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O programa da Presidência portuguesa, que sucederá à Presidência alemã, encaixa perfeitamente quer no

Programa do Trio, quer na sequência do programa da Presidência alemã. Esperamos que, quando iniciarmos a

nossa presidência, o QFP esteja aprovado e, portanto, se implemente o novo quadro financeiro plurianual, uma

responsabilidade muito grande para nós. Esperamos, também, que as negociações com o Reino Unido tenham

sido levadas a bom porto e, portanto, se trate, para nós, de implementar essa nova relação, tão próxima quanto

possível, entre a União Europeia e o Reino Unido.

Esperamos que o debate sobre as migrações seja um dos debates mais importantes da nossa Presidência

e julgamos ter argumentos para dar uma contribuição positiva para esse debate e para o seu desenlace a favor

da Europa, a favor das migrações, a favor das responsabilidades também em matéria de direito internacional e

de direito internacional humanitário que a Europa tem. E desenvolveremos os trabalhos da conferência sobre o

futuro da Europa e acrescentaremos a nossa própria marca, que é a afirmação da dimensão social da União

Europeia.

O modelo social europeu é o grande recurso de que a Europa dispõe para fazer com sucesso a transição

digital, a transição energética, a ação climática, mas também para reforçar o seu papel no mundo, um papel de

liderança em muitas áreas a favor do multilateralismo e da resposta comum a problemas comuns e da defesa

comum de bens que também são comuns.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado

Capoulas Santos.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,

Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Vou pronunciar-me sobre o

programa da Presidência alemã do Conselho da União Europeia. A minha colega, Isabel Oneto, intervirá mais

adiante sobre o relatório anual que se refere à participação da Presidência portuguesa no processo de

construção europeia, que constitui o outro tema da nossa ordem de trabalhos.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vivemos na União Europeia um momento histórico de enorme

transcendência, dificilmente comparável com qualquer outro ao longo dos 70 anos que nos separam da

declaração visionária de Robert Schumann, proferida no Quai d'Orsay, em 1950.

Quis a ironia do destino que a liderança do Conselho coubesse à Alemanha no curto, mas decisivo, espaço

de tempo do segundo semestre de 2020, que antecede imediatamente a Presidência portuguesa do Conselho.

Não é por isso de estranhar, como o Sr. Ministro acabou de referir, a grande convergência de objetivos entre

o Programa do Trio, apresentado em 9 de junho, a declaração dos presidentes dos parlamentos alemão,

português e esloveno, assinada solenemente no dia 29 de junho e o programa da Presidência alemã, que hoje

aqui debatemos, quer nos objetivos imediatos e de curto prazo, quer na visão a mais longo termo nele expresso.

Ensina-nos a História que os momentos de crise constituem, igualmente, oportunidades únicas de

renascimento e de reconciliação para o início de novos períodos de paz e de prosperidade. É com este espírito

que estamos a enfrentar as atuais dificuldades e a procurar as respostas adequadas nos planos nacional e

europeu.

No curto prazo, controlar e vencer a epidemia e relançar a economia são as prioridades para as quais não

existe plano B, assim como não existem outras opções para o futuro modelo de desenvolvimento que não

assentem no primado e aperfeiçoamento do Estado de direito, na sustentabilidade, em todas as suas vertentes,

na inovação, na segurança e no fortalecimento da Europa no teatro global.

O problema não está, pois, nos objetivos e nas linhas de orientação estratégica que, generalizadamente,

partilhamos, mas na forma de os concretizar, tendo em conta o estado de anemia a que chegou o projeto

europeu e as contradições que ainda prevalecem no seu seio.

Ainda nos últimos dias assistimos, com tristeza, à lamentável incapacidade da União Europeia para decidir

em conjunto coisas tão simples como a harmonização de regras para a reabertura das fronteiras internas. Daí

a importância acrescida que a Presidência alemã e o Conselho, já da próxima semana, representam para o

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relançamento do projeto europeu e para a tomada de decisões que se impõem para responder com urgência à

emergência com que estamos confrontados.

Estamos todos conscientes das dificuldades que será ainda necessário ultrapassar para alcançar um acordo

justo e equilibrado onde os 27 possam rever-se. Qualquer adiamento terá consequências extremamente

negativas, ainda mais gravosas se a ele se associar um fracasso no acordo de saída do Reino Unido, que terá

de estar, forçosamente, concluído até ao final de outubro.

Gostaria, assim, Sr. Ministro, que, face ao contexto que acabei de descrever, nos possa transmitir, com o

detalhe que lhe for possível, a sua perspetiva quanto à concretização do essencial do programa da Presidência

alemã e, por ser questão incontornável, quais as suas reais expectativas para o Conselho da próxima semana,

tendo em conta os contactos bilaterais que o Governo português tem vindo a desenvolver e de que as recentes

passagens por Lisboa dos Primeiros-Ministros espanhol e italiano foram a face mais visível.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Ainda no tempo de que dispõe o Partido Socialista, tem a palavra, para uma intervenção,

a Sr.ª Deputada Isabel Oneto.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr.

Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Cabe-me, enquanto relatora do

relatório que o Governo enviou à Assembleia da República sobre a sua participação no projeto europeu em

2019, aqui tecer algumas considerações sobre esse mesmo relatório. E, ao fazer a enumeração das múltiplas

ações do Governo português, percebi que não teria tempo para falar sobre tudo, só chegaria a meio daquela

que foi a participação de Portugal na União Europeia em 2019.

Creio que, ao ler o relatório, aquilo que posso concluir, e que o Partido Socialista conclui, é que o Governo

português conseguiu conquistar credibilidade junto dos seus parceiros, junto dos demais Estados-Membros.

Hoje, Portugal tem um lugar próprio na União Europeia, Portugal influenciou de forma determinante a agenda

estratégica que o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros aqui referiu, influenciou a agenda da União

Europeia, e conseguiu mobilizar 17 Estados-Membros para dizerem «não» àquilo que um conjunto de países da

União Europeia pretendia relativamente ao próximo quadro financeiro plurianual…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E continua tudo igual!

A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — … e fazer um caminho que nos permitiu chegar ao patamar de negociações em

que hoje estamos.

Por isso, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, aquilo que podemos concluir é que, com os

valores que Portugal tem defendido junto da União Europeia, que são os valores que estão na nossa

Constituição de Abril e os valores fundacionais da União Europeia, não há perda de soberania, há um reforço

da nossa soberania, através da nossa credibilidade e da defesa dos nossos pontos de vista na União Europeia.

A Presidência alemã será, com certeza, muito importante para o futuro da Europa, mas Portugal vai iniciar a

sua Presidência em 2021 num clima de nova era, se assim for possível, com o quadro financeiro plurianual, com

a responsabilidade de implementação do plano de recuperação, com o desafio da agenda europeia, da transição

digital, da transição climática e, acima de tudo, como muito bem referiu, tendo presente a dimensão social e o

modelo social europeu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Meireles, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Isabel Meireles (PSD): — Sr. Presidente, Ex.mo Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,

Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Caras e Caros Colegas Deputados: Começo pelas

prioridades da presidência rotativa do Conselho da União Europeia, que, como sabemos, este semestre será

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ocupada pela Alemanha, as quais tivemos a sorte de ouvir descritas, na Comissão de Assuntos Europeus, pelo

Embaixador alemão em Portugal. E constatámos que a principal ambição desta Presidência alemã é, sem dúvida

alguma, completar as negociações do quadro financeiro plurianual e do fundo de recuperação, sendo que

também sabemos que a grande dificuldade são os quatro Estados «frugais».

Sabemos que o mais incisivo nestas matérias é o Primeiro-Ministro holandês — agora, dos Países Baixos —

, Mark Rutte, com quem o nosso Primeiro-Ministro tem uma relação cordial e com quem se vai reunir antes do

próximo Conselho Europeu, e, por acaso, retive uma declaração de Mark Rutte, em que dizia que existe um

pacote de 540 mil milhões de euros em créditos aprovados pelo Eurogrupo e até agora não houve um único

euro que fosse despendido.

Portanto, as minhas perguntas vão no sentido de saber como é que o Governo de Portugal vai reagir face à

exigência, nomeadamente dos Países Baixos, de, primeiro, se recorrermos às ajudas financeiras, termos de

fazer reformas económicas; segundo, os países do Sul terem de prestar uma justificação clara do que farão com

o dinheiro emprestado; terceiro, qualquer ajuda do Norte significar, necessariamente, reformas do Sul.

Recordo que, neste Conselho Europeu, aliás, como disse o Embaixador alemão, todos temos uma pistola

apontada à cabeça, porque existe a regra da unanimidade e mesmo os países «frugais», para poderem fazer

cedências, têm de prestar contas ao seu eleitorado e, também, aos Parlamentos nacionais.

Mas, mesmo que haja fumo branco, a Deputada europeia socialista Margarida Marques disse que, muito

provavelmente, o dinheiro só chegará em 2022. Digamos que ficámos preocupados, porque, se assim for,

famílias, empresas e o próprio País irão à falência antes que o dinheiro chegue. Porém, ainda que este cenário

se não verifique, e esperemos que não, o Governo terá até abril para apresentar planos de aplicação do dinheiro

e, obviamente, a rapidez das transferências dependerá da velocidade com que forem apresentados os planos e

as reformas. Pior: se encurtarmos o plano de recuperação dos quatro para os três anos, então, a pressão será

enorme e teremos um problema de absorção dos fundos, que, recordo, são estimados em 19 milhões de euros

por dia.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Mil milhões!

A Sr.ª Isabel Meireles (PSD): — O mesmo raciocínio se aplica às verbas da coesão, do atual quadro

financeiro plurianual, bem como às futuras verbas do próximo quadro financeiro plurianual. Portanto, Portugal

terá de duplicar a sua capacidade de execução de fundos para conseguir aplicar a totalidade do envelope

financeiro que lhe é destinado e terá de combater a crise e os bloqueios estruturais que nos têm impedido de

crescer de forma sustentada.

Daí que as minhas questões, nesta área, sejam as seguintes: o Governo já sabe o que vai fazer com o

dinheiro dos fundos? Já tem uma visão estratégica para a sua aplicação? Tem capacidade para transformar

esta estratégia em programas, projetos e investimentos concretizáveis num curto espaço de tempo? Perante

todo este trabalho titânico, temos funcionários públicos e pessoal habilitado para estas funções? E, finalmente,

temos ambiente regulatório e capacidade de controlo para aplicação destas verbas e, obviamente, para evitar

que surjam fraudes?

Quanto ao relatório anual enviado pelo Governo sobre a participação de Portugal no processo de construção

da União Europeia, é muito descritivo, sem grandes ousadias na captação da realidade, mas deixo aqui duas

breves notas em relação ao mesmo, que é, genericamente, positivo.

A primeira nota tem a ver com um conjunto de recomendações da Comissão Europeia para Portugal,

relativamente à eficácia dos tribunais administrativos e fiscais, e com razão, porque não há reforma da justiça

fiscal há mais de 30 anos. A morosidade da justiça é intolerável e, mais, estamos cansados de um «Estado

gangster», de um Estado que dispara primeiro sobre o bolso dos contribuintes e, depois, pergunta se deve.

Não disponho de tempo para dizer mais nada em relação a esta matéria, pelo que desejo apenas ao Governo,

ao Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e ao Sr. Primeiro-Ministro o maior dos sucessos para o

próximo Conselho Europeu. Estes são os desejos do Grupo Parlamentar do PSD porque a nossa Europa é

também o nosso oxigénio e só notamos a sua ausência quando dele precisamos.

Finalmente, para terminar, a solidariedade deve ser a palavra-passe para não sermos um País a orbitar na

sua própria solidão.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, pelo que tem a palavra a Sr.ª

Deputada Fabíola Cardoso.

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr.

Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: São muitos os desafios que se

colocam a quem tem a responsabilidade de presidir ao Conselho Europeu nos próximos semestres. A nova

realidade que enfrentamos assim o exige.

A Alemanha terá de abordar as consequências da crise pandémica, conseguindo a aprovação dos

instrumentos que permitam superar esta emergência e conduzam à recuperação europeia, a Norte, a Sul e a

Leste. Mas a Alemanha terá, ainda, de o fazer promovendo um modelo de desenvolvimento centrado na

sustentabilidade, desde logo, na sustentabilidade económica, garantindo a aprovação rápida de um QFP e de

um plano de recuperação com montantes suficientes para enfrentar a calamidade, fazendo-o em tempo útil e

disponibilizando esses fundos de modo regionalizado e desburocratizado, para que possam ser

verdadeiramente acessíveis a pequenas empresas, a pequenos produtores, como, por exemplo, da agricultura

familiar do nosso País.

Esse modelo de desenvolvimento deve também ser centrado na sustentabilidade ambiental, não adiando

mas reforçando os objetivos estratégicos de descarbonização e transição ecológica sistémica, e na

sustentabilidade social, assegurando a coesão e a diminuição das desigualdades e discriminações.

Por isso mesmo, o Bloco de Esquerda vem, novamente, expressar a sua preocupação com as medidas que

agora se começam a delinear com maior clareza e, sobretudo, com as consequências destas medidas para o

futuro do País e da União.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — As prioridades que o Governo alemão apresenta não são claras

relativamente ao financiamento dos novos fundos. Por agora, a Comissão irá ao mercado por nós, mas, e

depois?! Precisamos de uma nova abordagem às fontes de financiamento, de forma a impedir que sejam, mais

uma vez, os países do Sul a pagar, com medidas austeritárias.

Precisamos de fundos próprios. Não podemos empurrar os problemas para a frente. A taxação das

transações financeiras e dos gigantes digitais são exemplos de medidas que permitem rumar a uma justiça

social e equilibram a discussão entre o Norte e o Sul.

Está o Governo português, Sr. Ministro, disposto a defender a justiça tributária e a criação de fundos próprios

que garantam que não haverá uma nova vaga de austeridade?

Terá este Governo a coragem de impedir soluções que aumentem a dívida pública portuguesa?

Defenderá a revogação dos tratados que asfixiam os países?

Pugnará pelo reforço dos sistemas públicos, nomeadamente de saúde — sim! —, mas também de educação

e apoio social?

O programa apresentado pela Alemanha também não clarifica outro aspeto que consideramos ser

fundamental: a ligação entre o financiamento e a manutenção do Estado de direito. Países que a cada dia

restringem a liberdade do seu povo, limitam o poder das suas instituições democráticas, atacam a liberdade de

expressão, não podem sair impunes deste processo. É necessário travar o populismo de autoritarismos

antidemocráticos.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Está o Governo português disposto a defender a associação do

cumprimento do Estado de direito à atribuição de verbas aos Estados-Membros?

Para terminar, a questão da TAP, neste momento, é indissociável de decisões europeias. O quadro de apoio

que foi autorizado à TAP prova os erros da privatização e vem acompanhado de um plano de reestruturação da

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empresa inaceitável, que ameaça remeter a TAP para um papel puramente regional. Vai o Governo português

contrariar esta escolha da Comissão Europeia, defendendo verdadeiramente o interesse nacional?

Precisamos de coragem, de coragem para preparar a Europa para uma próxima geração de jovens, mas

sem hipotecarmos o seu futuro. É esta coragem que o Bloco de Esquerda gostaria de esperar da Presidência

alemã e que exige, certamente, do Governo português.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Segue-se o Grupo Parlamentar do PCP, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado Bruno

Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Neste debate sobre

as prioridades da presidência do Conselho e sobre a participação de Portugal no processo de construção da

União Europeia, os eixos fundamentais das linhas políticas em ambos os domínios surgem associados aos

critérios do «Semestre Europeu», a «um ambicioso plano de reformas», a um ainda maior aprofundamento do

mercado único, à privatização e concentração de serviços públicos, à rearrumação das cadeias de produção e

ao financiamento de grandes projetos ligados à chamada «digitalização» e à instrumentalização das questões

ambientais, alinhados com os interesses do grande capital, com novas fileiras de acumulação capitalista e com

as prioridades das grandes potências.

Tais passos, a serem concretizados, significariam ataques adicionais à soberania económica e uma grave

abdicação de receitas fiscais, um aumento do endividamento do País, uma ainda maior dependência externa,

constrangimentos e imposições adicionais e um aprofundamento das assimetrias e divergências que

caracterizam o processo de integração capitalista.

Este quadro e as medidas em discussão — onde se inclui a operação política e ideológica da conferência

sobre o futuro da Europa — colocam uma ainda maior premência na necessidade de rejeitar as imposições e

condicionalismos da União Europeia e de libertar o País da submissão ao euro, de forma articulada, com a

renegociação da dívida pública.

A situação na Europa exige uma profunda reflexão sobre as reais causas do desemprego, da pobreza, das

crescentes desigualdades sociais, do aumento das assimetrias entre países, do crescimento da extrema-direita,

dos nacionalismos, do racismo, da xenofobia, da guerra, do terrorismo, dos movimentos migratórios em massa.

Não fazer esse questionamento e insistir nos caminhos que trouxeram a Europa até este ponto ⎯ o caminho da

integração capitalista europeia ⎯ é permitir a continuação de um rumo que poderá ter consequências dramáticas

para todos os povos da Europa.

Mas essa não é uma inevitabilidade. A internacionalização da economia, a crescente divisão internacional

do trabalho, a interdependência e cooperação entre Estados e os processos de integração não são caminhos

de sentido único. Em função das opções que prevalecem, tais processos podem servir os monopólios ou podem

servir os povos.

A cada salto na integração capitalista, a cada aprofundamento, a cada alargamento, aprofundam-se as

contradições inseparáveis da natureza de classe deste processo e do seu objetivo de domínio económico e

político. Contradições insanáveis, como insanáveis são as contradições do sistema capitalista. O processo de

integração capitalista consubstanciado na União Europeia já demonstrou, e continua a demonstrar, que não é

reformável.

A Europa precisa de confrontar e romper com a centralização e concentração do capital nos grandes

monopólios e do poder em instituições supranacionais dominadas pelo diretório de potências, comandado pela

Alemanha. A Europa precisa de rejeitar a chantagem deste falso dilema: ou a União Europeia do grande capital

e das grandes potências ou a extrema-direita. A Europa precisa de confrontar e romper com o processo de

integração capitalista. É esse o caminho alternativo.

Salvar a Europa dos perigos com que está confrontada exige a intensificação da luta por um outro projeto de

cooperação, por uma Europa dos trabalhadores e dos povos. Exige a firme defesa da soberania, da democracia,

dos direitos, para abrir caminhos alternativos, de futuro, justiça, progresso e paz.

Aplausos do PCP e do PEV.

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O Sr. Presidente: ⎯ Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida,

do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. JoãoPinhodeAlmeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e

Srs. Deputados: Neste debate, a primeira referência tem de ser, naturalmente, para o contexto em que o mesmo

se faz.

Estamos a fazer este debate na véspera de serem aqui debatidas, na Assembleia da República, iniciativas

no sentido de se reduzir o escrutínio parlamentar do processo europeu. Julgo que temos de assinalar que o que

o Parlamento poderá fazer amanhã é exatamente o contrário do que está a fazer a maioria dos parlamentos dos

outros países da União. É que o que fazemos aqui, no Parlamento português, é um debate anterior ao Conselho

Europeu em que estão presentes os chefes de Estado e os chefes de Governo ⎯ eu diria que é o mínimo.

Há vários parlamentos que, neste momento, já fazem debates antes de cada Conselho, em qualquer das

suas formações. Ou seja, quando os Conselhos reúnem setorialmente para discutir as matérias cada um desses

setores, as comissões especializadas dos parlamentos nacionais ouvem o ministro da pasta, discutem com o

ministro da pasta aquela que deve ser a posição do País. E o que é que faz Portugal? Deixa de discutir aquilo

que é essencial. Isso tem muito a ver com a nossa participação na União.

Não nos podemos queixar de ter uma opinião pública e uma população que se preocupa pouco com as

questões europeias quando os seus representantes, que somos nós, em vez de aprofundar o escrutínio do

debate e do processo europeu, diminuem esse escrutínio.

Penso que esta reflexão é muito importante e que vai ainda a tempo de ser feita, para que não cometamos

um erro crucial naquilo que é o escrutínio do Parlamento nacional do processo europeu.

Há questões estruturais e questões conjunturais que temos que debater aqui. Nas questões conjunturais,

vamos ter um Conselho muito importante e há muitas matérias ainda em aberto. Não é só saber se o que vamos

receber são subvenções ou são empréstimos e ficarmos satisfeitos se forem mais subvenções do que

empréstimos. Como dizia o Sr. Embaixador da Alemanha, ainda ontem, num caso ou noutro, vão ter de ser

pagos. O dinheiro não vai nascer do chão quer seja subvenção, quer seja empréstimo.

Portanto, precisamos de saber várias coisas. Em primeiro lugar, o fundo de recuperação foi criado com

recursos especiais porque há necessidade especiais. A primeira questão que é preciso esclarecer é a seguinte:

o Governo de Portugal já fez as contas para saber se aquilo de que precisamos a mais por causa da pandemia

é compensado por aquilo que vamos receber a mais do fundo de recuperação? Nunca vi essas contas.

Relativamente ao quadro financeiro plurianual, o Governo de Portugal já pensou que, se nós éramos contra

o mesmo, antes de haver fundo de recuperação, não podemos, neste momento, dizer que somos a favor, quando

o que é estrutural não mudou?

Depois, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, há questões essenciais do posicionamento da União

Europeia. Por exemplo, e como tenho que terminar, o que é que Portugal pensa da relação com a China? O que

é que Portugal pensa da relação entre um bloco como é a União Europeia e uma potência, do ponto de vista

comercial, como é a China, quer do ponto de vista da relação da União, quer do ponto de vista da relação

bilateral de cada país?

O Sr. Presidente: ⎯ Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. JoãoPinhodeAlmeida (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

É essencial sabermos qual é o posicionamento de Portugal relativamente a essas questões e a algumas

tendências protecionistas dentro da União Europeia. Qual é o posicionamento do Estado português

relativamente a esta matéria?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

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O Sr. AndréSilva (PAN): ⎯ Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Uma das grandes ideias que

Portugal deve defender na próxima reunião do Conselho Europeu é precisamente a necessidade de se acelerar

o acordo sobre o fundo de recuperação, de modo a que estas verbas cheguem aos países o quanto antes.

De facto, não podemos deixar de ver com preocupação que, face à metodologia proposta pela Comissão

Europeia, o dinheiro do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, onde está um total de 310 mil milhões de

euros, a fundo perdido, poderá só chegar ao nosso País em 2022. Esta metodologia, manifestamente, não dá

resposta àquelas que são as necessidades dos países neste momento e esperemos que, de facto, na cimeira

da próxima semana se consiga acelerar o processo.

Mas ao PAN também preocupa a necessidade de se começar a fazer, desde já, a preparação dos projetos

a apresentar à Comissão. Neste momento, o Governo já deveria estar a trabalhar, por exemplo, para que o País

tivesse um atlas de risco das alterações climáticas que constituísse a base para a ação do Estado ao nível do

ordenamento do território e na definição do investimento público prioritário. Só assim, do nosso ponto de vista,

será possível assegurar que o investimento que se fará com os dinheiros europeus vai servir para adaptar o

território aos efeitos das alterações climáticas, de modo a minimizarmos, o mais possível, o seu impacto nas

populações e nos territórios.

Portanto, o que lhe pergunto é: qual o plano B para o caso de o calendário do processo não ser antecipado?

Em que ponto vai a preparação dos projetos nacionais? Quais são os principais projetos em matéria de combate

às alterações climáticas? E o Governo está, ou não, a preparar o atlas de risco das alterações climáticas?

Mas uma vez que aqui está para falar de política europeia e que, recentemente, o Sr. Primeiro-Ministro esteve

duas vezes com o Primeiro-Ministro espanhol, não posso deixar de lhe falar da bomba-relógio que é a Central

Nuclear de Almaraz, que há muito deveria ter encerrado.

O Estado espanhol decidiu prolongar a atividade desta Central até 2028. Na sequência dessa decisão, o Sr.

Ministro do Ambiente afirmou que iria defender a realização de uma avaliação ambiental. Entretanto, nos dias

22 e 27 de junho, ocorreram dois incidentes em ambos os reatores, em áreas onde já tinham sido identificadas

necessidades de intervenção.

Portanto, o que gostaria de lhe perguntar, Sr. Ministro, é, face aos incidentes de junho, o que está o Governo

a fazer para garantir a realização de uma avaliação de impacto ambiental transfronteiriça relativa ao

prolongamento da exploração da Central Nuclear de Almaraz até 2028? Que diligências está o Governo a

desenvolver para que a Central seja encerrada? O Sr. Ministro e o Sr. Primeiro-Ministro abordaram este assunto

com o Primeiro-Ministro espanhol nos dois encontros recentes que tiveram com ele?

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, do Partido

Ecologista «Os Verdes».

O Sr. JoséLuísFerreira (PEV): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste

debate, vamos dedicar um minuto ao que consta do relatório e outro minuto ao que não consta do relatório.

Sobre o que consta do relatório, gostaria de dizer que Os Verdes registam que o tema da neutralidade

carbónica até 2050 tenha sido assumido como um objetivo a alcançar, mas estamos com receio de que as

medidas para esse objetivo continuem a ser adiadas e remetidas para 2049, porque, nessa altura, já será

irremediavelmente tarde.

Registamos, ainda, a apresentação do Pacto Ecológico Europeu, que procura transformar os desafios

climáticos e ambientais em oportunidades, proporcionando uma transição justa e inclusiva para todos, mas o

que vamos esperar é que essa transição seja mesmo justa e inclusiva para todos e que, quando se fala em

oportunidades, se evite o erro que foi cometido quando o combate às alterações climáticas foi transformado

numa oportunidade de negócios, com o mercado de carbono.

Sobre o que não consta do relatório, mais concretamente do capítulo das Relações Externas, continuamos

sem ver qualquer referência sobre uma recomendação ao Governo feita por esta Assembleia em 2015, aliás,

com os votos favoráveis de todas as bancadas. Referimo-nos ao reconhecimento do Estado da Palestina.

Face ao que estamos a assistir nos últimos dias, é importante recordar o teor desse documento,

nomeadamente o seu primeiro ponto: «A Assembleia da República recomenda ao Governo que reconheça, em

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coordenação com a União Europeia, o Estado da Palestina como um Estado independente e soberano, de

acordo com os princípios estabelecidos pelo Direito Internacional».

Ora, no relatório pouco mais se diz do que constatar que as relações da União Europeia com Israel e com a

Palestina continuaram a ser um foco de dificuldade da agenda europeia na vizinhança sul. Ou seja, numa altura

em que Israel ameaça anexar territórios palestinianos, violando décadas de resoluções das Nações Unidas e as

regras mais elementares do direito internacional, a União Europeia finge que nada se está a passar.

Esta passividade da União Europeia é para nós absolutamente inadmissível e deveria, aliás, envergonhar

todos os cidadãos da Europa.

Aplausos do Deputado do PCP Bruno Dias.

O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. AndréVentura (CH): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou começar por referir-me à intervenção da

Sr.ª Deputada Isabel Oneto, que disse que «Portugal conseguiu nos últimos anos e, sobretudo, nos últimos

meses, granjear e sustentar a credibilidade junto da União Europeia».

É verdade, Sr.ª Deputada. Por isso mesmo é que, ontem, Bélgica, Finlândia e Escócia fecharam o corredor

aéreo com Portugal, juntando-se ao Reino Unido e a mais de 35 países que fecharam fronteiras com Portugal.

Deve ser essa a credibilidade que Portugal conseguiu na luta contra a pandemia!

Hoje, está aqui o Ministro dos Negócios Estrangeiros e não é tanto a nós que tem de responder mas àqueles

milhões de portugueses lá fora que se perguntam por que é que todos nos fecham as portas e nós continuamos

de portas abertas para todos. É uma ótima pergunta para o Ministro dos Negócios Estrangeiros responder.

O mesmo Ministro dos Negócios Estrangeiros disse, ontem, que campeia a descoordenação na União

Europeia. Então, Sr. Ministro, o que é que nós vamos fazer para lutar contra essa descoordenação? É que todos

fecham as portas a Portugal, desde a Roménia ou a Bulgária, e nós continuamos de portas abertas para todos,

a dizer «venham de qualquer maneira, nós não nos importamos», e não fazemos nada para evitá-lo. Sr. Ministro,

é a si, não a mim nem a ninguém neste Parlamento, que cumpre dar uma palavra de força ao Estado português,

que, neste momento, não a tem.

Pergunto-lhe, ainda, em relação ao quadro financeiro plurianual, se vai haver, ou não, cortes na política

agrícola comum. É que já chega de ouvir António Costa a dizer que não sabe, que não sabe como é que vai ser

ou como é que vai correr. Vamos, ou não, ter cortes nas políticas de coesão e na política agrícola comum?

Finalmente, para terminar Sr. Presidente, gostaria apenas de perguntar ao Sr. Ministro o seguinte: ontem, o

Primeiro-Ministro António Costa disse que estávamos perto de um acordo; hoje, o Presidente do Conselho

Europeu diz que falta muito para chegar a um acordo. Meus senhores, vamos lá ver se nos entendemos. Ou

estamos perto de um acordo ou não estamos perto de um acordo!

O Sr. Presidente: ⎯ Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. AndréVentura (CH): ⎯ Vou terminar, Sr. Presidente.

É importante que o Ministro dos Negócios Estrangeiros nos diga quem tem razão, se é o Primeiro-Ministro

de Portugal ou o Presidente do Conselho Europeu, porque já chega de mentiras nesta luta contra a pandemia.

O Sr. BrunoDias (PCP): ⎯ Ele ontem estava muito ocupado, não podia ir à Comissão.

O Sr. Presidente: ⎯ Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, da

Iniciativa Liberal.

O Sr. JoãoCotrimdeFigueiredo (IL): ⎯ Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Srs.

Deputados: Na agenda estratégica elaborada pelo trio de presidências ⎯ Alemanha, Portugal e Eslovénia ⎯,

pode ler-se com satisfação o seguinte: «A política europeia deve ser moldada de forma a encarnar os nossos

valores societais, promover a inclusividade e permanecer compatível com o nosso modo de vida». Repito, «com

o nosso modo de vida».

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As prioridades hoje aqui anunciadas são importantes para a afirmação da Europa enquanto espaço de

progresso e desenvolvimento mas de nada servirão se não cuidarmos de produzir o nosso modo de vida

europeu, o nosso amor pela liberdade individual, pelos direitos humanos e pela tolerância. É exatamente por

isso que quero insistir hoje, aqui, na importância geoestratégica da política externa europeia.

É que a defesa do nosso modo de vida exige firmeza na forma como Portugal e a União Europeia se

relacionam com os regimes que não respeitam os direitos humanos nem os valores da democracia liberal. E o

melhor exemplo desta necessidade de firmeza é a relação com o regime comunista da China. Não é o único

regime cujas ações e ambições podem fazer perigar o nosso modo de vida europeu, mas é, certamente, o mais

perigoso, e só os mais distraídos, ou então, os coniventes, poderão não reconhecer a recente agressividade e

o descaramento do regime comunista chinês.

Os mortos no vale de Galdwan, na fronteira com a Índia, as escaramuças diárias no Mar da China Meridional,

os primeiros detidos ao abrigo da nova lei de segurança em Hong Kong e o ataque informático massivo aos

serviços públicos da Austrália estão aí para testemunhar a ambição infinita da China. O regime comunista chinês

decidiu, definitivamente, que prefere ser temido a ser respeitado.

O Iniciativa Liberal tem estado sozinho no alerta para este perigo. Assim continuaremos se tiver de ser mas

era bom que outras forças políticas abrissem os olhos para o risco real que enfrentamos.

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

A União Europeia parece, felizmente, estar mais atenta do que a generalidade desta Câmara e é bom que

na Cimeira UE-China, há 15 dias, a Europa tenha sido firme na condenação do atropelo democrático que é a lei

de segurança em Hong Kong, que tenha exigido transparência quanto às ajudas de Estado na China e quanto

à transferência da tecnologia e que tenha avisado que não toleraria as constantes campanhas de desinformação

e os frequentes ciberataques com origem na China.

Por isso, voltamos a perguntar aqui, hoje, aquilo que ficou sem resposta por parte do Sr. Primeiro-Ministro e

do Governo da última vez: partilha o Governo português estas preocupações europeias e as posições já

assumidas e será, por isso, firme na defesa do modo de vida europeu? E que medidas concretas vai tomar para

que Macau não tenha o mesmo destino que Hong Kong?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo isto: perante uma China

comunista autoritária e uns Estados Unidos da América erráticos, cabe à Europa ser o farol da liberdade no

mundo e cabe a Portugal, durante a sua Presidência, fazer tudo para que a luz da liberdade ilumine a esperança

dos que aspiram a um mundo melhor.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro de Estado

e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo

por agradecer as palavras de estímulo que foram dirigidas ao Governo e também as sugestões, propostas e

chamadas de atenção que foram formuladas ao longo deste debate muito importante e que muito enriquece as

nossas condições não só de monitorização da participação portuguesa no processo de construção europeia

como de acompanhamento do trabalho da Presidência alemã, e também, mais imediatamente, de preparação

de um Conselho Europeu que será muito importante, porque terá em cima da mesa a questão de saber se

conseguimos ou não chegar a um acordo sobre o que regulará a nossa capacidade orçamental nos próximos

sete anos e a nossa capacidade financeira para coordenar a recuperação da economia europeia.

Queria começar por dizer que o que está aqui em causa não é uma questão de solidariedade nem é uma

questão de o Norte ajudar o Sul ou de o Sul precisar da ajuda do Norte. O que está aqui em causa é a

preservação do mercado interno; o que está aqui em causa é o funcionamento da economia europeia; o que

está aqui em causa é a soberania da Europa em matérias tão essenciais como a provisão de serviços essenciais

aos seus cidadãos, como a provisão de bens públicos, que todos consideramos críticos, como também um

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processo de autonomia face a cadeias globais de valor, que passa, fundamentalmente, pelo processo de

reindustrialização da economia europeia.

Portanto, não é uma questão de saber se nos queremos ajudar uns aos outros e em que condições, é uma

questão de saber que, todos nós, estamos envolvidos no mesmo processo de recuperação de uma economia,

que é global e que queremos que seja global.

O que está em causa, fundamentalmente, na aprovação do quadro financeiro plurianual e do fundo de

recuperação do programa Próxima Geração, são sete pontos essenciais.

O primeiro ponto é relativo ao volume de recursos financeiros que conseguimos mobilizar; o segundo ponto

é relativo ao equilíbrio, nesses recursos, entre os recursos que são transferidos a título de subvenções e os

recursos que são providenciados a título de empréstimos; o terceiro ponto é a chave de afetação desses

recursos pelos diferentes Estados-Membros e as suas regiões; o quarto ponto crítico é o período de

implementação dos programas nacionais de recuperação que beneficiam dos fundos do programa Próxima

Geração; o quinto ponto é relativo às condições de acesso aos fundos disponíveis; o sexto ponto é relativo à

governação do programa; e o sétimo ponto é relativo às condições de pagamento do empréstimo que a União

Europeia, como tal, em nosso nome e com a nossa garantia, vai fazer nos mercados.

Consideramos que a proposta apresentada pela Comissão Europeia, na sequência da declaração franco-

alemã e muito inspirada também por propostas portuguesas, designadamente o instrumento orçamental para a

competitividade e a convergência — como bem assinalou a Sr.ª Deputada Isabel Oneto, tem-se visto a marca

da influência portuguesa na agenda europeia nos últimos anos —, é muito equilibrada, em todos estes pontos.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Finalmente!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — E esta proposta permite responder a várias das

dúvidas colocadas pelas Sr.as e pelos Srs. Deputados.

Primeira dúvida: como é que vamos pagar este empréstimo? Evidentemente, a Comissão Europeia vai

levantar dinheiro dos mercados, sob a forma de empréstimo. Fazendo-o em conjunto, os 27, conseguiremos

condições de maturidade, de juros e de moratória do pagamento como nunca nenhum de nós conseguiria

isoladamente.

Aplausos do PS.

Como é que pagamos, depois dessa moratória? De duas maneiras ou, melhor, com uma combinação destas

duas maneiras: através do aumento das contribuições nacionais ou através de novos recursos próprios. Portugal

é favorável a novos recursos próprios da União Europeia, como tal.

O Sr. André Ventura (CH): — Impostos europeus!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Há formas de fiscalidade que significam orientar

a economia europeia para a transição verde e que significam desonerar os contribuintes nacionais.

O Sr. André Ventura (CH): — Desonerar?!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Aqueles que dizem que não aceitam novos

recursos europeus, o que estão a dizer é que prefeririam que fossem os contribuintes nacionais a pagar.

Aplausos do PS.

Não vale a pena esconder esse facto.

O Sr. André Ventura (CH): — Não estamos escondidos, estamos aqui!

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Ou se querem novos recursos próprios da

União Europeia, como tal, que permitam, designadamente, taxar empresas que, hoje, não pagam impostos em

nenhum país europeu,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Já ouvi essa conversa uma vez!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Como dizia, ou se quer isto ou, então, o que

se quer é o aumento das contribuições nacionais, que, por sua vez, são sustentadas pelos contribuintes de cada

Estado-Membro.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — As duas?!

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Quanto à questão do acesso aos fundos, a

sequência das decisões da Comissão Europeia, do Eurogrupo e do que se espera que venham a ser as decisões

do Conselho Europeu, é uma sequência que permite resolver todas as dúvidas que possa haver, do ponto de

vista do timing de acesso aos fundos.

É que, neste momento, estarão disponíveis os fundos do programa SURE (Support to mitigate Unemployment

Risks in an Emergency), assim que os Países Baixos fizerem a sua parte, no seu Parlamento. E já dissemos,

da parte de Portugal, qual é o volume de que necessitaremos, ao abrigo do programa SURE.

Quando a Assembleia da República aprovou o Orçamento Suplementar, aprovou a parte relativa ao

Orçamento nacional e teve a informação disponível…

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

… para saber quanto é que entendemos usar, dos fundos europeus, para pagar as despesas relacionadas

com a formação, com o layoff e outras despesas de preservação do mercado de emprego e de reforço dos

serviços de saúde.

Temos pronto um programa, chamado REACT-EU (Recovery Assistance for Cohesion and the Territories of

Europe), a ser aplicado ainda neste semestre, que consistirá na primeira bolsa de fundos imediatamente

disponível. E, depois, teremos o quadro financeiro plurianual, cuja implementação começará no primeiro dia de

janeiro de 2021, assim seja aprovado pelos líderes europeus, entretanto.

Portanto, não há hiato a não ser que falhemos no acordo que é necessário obter ao nível europeu.

Finalmente, quanto às questões relativas ao escrutínio, este é absolutamente essencial mas temos um

quadro de escrutínio que construímos, a que chamamos o Semestre Europeu, e que deve ser o nosso quadro

de referência para monitorizar a aplicação dos fundos e para monitorizar a execução de programas.

O Sr. André Ventura (CH): — Não respondeu a nada!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Portanto, não se trata — e estou terminando,

Sr. Presidente — de cada país aplicar uma receita única, muito menos uma receita austeritária, trata-se de cada

país apresentar o seu próprio plano de investimentos e de reformas, na primeira versão, já em outubro — como

fará Portugal —, negociar com a Comissão Europeia,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ser a sua própria troica.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … e trata-se, depois, de esse programa ser

aprovado e ser monitorizado da mesma forma que fazemos em relação aos demais planos nacionais de

reformas.

Não é preciso inventar outro mecanismo quando temos um processo que nós próprios criámos e com que

nós próprios gerimos, entre nós, a aplicação dos fundos.

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Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Não respondeu a nada!

O Sr. Presidente: — Vamos passar ao segundo ponto da ordem do dia, com a discussão, na generalidade,

do Projeto de Lei n.º 456/XIV/1.ª (PS) — Alarga o prazo para a realização, por meios de comunicação à distância,

das reuniões dos órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais, procedendo à quinta alteração

à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março.

Para abrir o debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente iniciativa legislativa

é dotada de alguma simplicidade, no sentido em que visa repor em vigor uma norma excecional, desenhada no

contexto da pandemia de COVID-19, que habilitou as autarquias locais e as entidades intermunicipais a

realizarem, com recurso a videoconferência, as reuniões dos seus órgãos deliberativos e dos seus órgãos

executivos.

Fundamentalmente, e logo na Lei n.º 1-A/2020, onde esta matéria foi primeiramente colocada, tratava-se de

assegurar o cumprimento das medidas de distanciamento social e a segurança na realização das reuniões dos

órgãos das autarquias locais, obviamente tentando acautelar também a necessária publicidade das reuniões

destes órgãos.

Num primeiro momento, a versão que foi aprovada vigorou até 30 de junho deste ano. No entanto, face à

evolução da pandemia, face à situação que em muitos municípios do País ainda pode continuar a desaconselhar

a realização presencial destas reuniões, seja porque o número de membros é significativo — por exemplo, a

Assembleia Municipal de Lisboa, para reunir, quer com os Deputados municipais, quer com os restantes

serviços, pode, por vezes, necessitar de colocar mais de 100 pessoas numa mesma sala —, seja porque alguns

municípios do País têm um número elevado de freguesias — como, por exemplo, Barcelos — e têm, assim,

assembleias municipais com uma dimensão significativa, justifica-se, parece-nos, continuar a recorrer a esta

modalidade para assegurar tranquilidade, segurança e também o funcionamento normal dos órgãos das

autarquias locais.

É importante que, na leitura da proposta que apresentamos, se sublinhem algumas diferenças face ao regime

que vigorou até 30 de junho.

Por um lado, clarifica-se que, quando é necessário proceder a votações secretas, naturalmente, a votação

tem de ser presencial, organizando-se os serviços das assembleias ou dos executivos de forma a assegurar a

segurança das pessoas que se deslocam para proceder à participação nessas votações.

Por outro lado, procura-se resolver a questão de como arranjar formas de suprir os problemas causados pela

necessidade da participação do público nestas reuniões, clarificando que ela pode ter lugar credenciando as

pessoas que se inscrevam a participar remotamente, através da videoconferência; permitindo que as pessoas

remetam, previamente à realização da reunião, a intervenção que fariam presencialmente, gravando um vídeo

que remeteriam aos serviços de apoio; ou, alternativamente, permitindo que os municípios ou as freguesias

possam disponibilizar as suas instalações para as pessoas que, não tendo meios para proceder previamente à

gravação, se desloquem em segurança, também respeitando as regras de distanciamento, ao local onde possa

ter lugar essa gravação.

Adicionalmente, e no decurso dos pareceres recebidos da ANMP (Associação Nacional de Municípios

Portugueses) e da ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias), reconhecemos que há algumas matérias que

podem carecer de algum aperfeiçoamento, em sede de especialidade, nomeadamente a clarificação de que não

se trata de suspender a realização das reuniões que, obrigatoriamente, têm de ter caráter público mas, sim, de

tomar medidas que assegurem que elas funcionem, que assegurem a lotação das salas, quando esta tenha de

ser condicionada, e que assegurem também a publicidade das reuniões.

Estamos bem cientes de que a urgência relativa da matéria existe, uma vez que o prazo de vigência da lei

anterior terminou no dia 30 de junho.

Estando agendada para amanhã a tentativa de fazer as três votações num único momento, era positivo que

todos os grupos parlamentares que quisessem acolher estas sugestões da ANMP e da ANAFRE pudessem,

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com o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tentar construir um texto final a tempo de uma entrada em vigor

deste diploma o mais rapidamente possível, uma vez que muitos municípios aguardam por uma clarificação da

parte da Assembleia da República para poderem marcar as reuniões dos seus órgãos deliberativos ou

executivos nos termos deste novo regime e para que, corrigindo-se, melhorando-se ou aperfeiçoando-se as

questões que já constam da lei mas que podem não ser inteiramente claras, consigamos continuar a dar

resposta aos autarcas e àqueles que, no exercício das suas funções, têm, necessariamente, de reunir, seja por

via presencial, seja por via de videoconferência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, do Grupo

Parlamentar do PSD.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido

Social Democrata acompanhou, no devido tempo, a proposta de lei que veio consagrar a possibilidade da

realização das reuniões dos órgãos das autarquias locais e das comunidades intermunicipais por meios de

comunicação à distância.

Admitindo que, aqui e ali, possa ter havido um ou outro abuso, objetivamente, não há qualquer razão para

que não acompanhemos, igualmente, a presente iniciativa, que visa prorrogar até ao final do ano essa

possibilidade. Em primeiro lugar, porque, infelizmente, ainda estamos em período COVID-19 e não em período

pós-COVID-19, o que significa que a situação de pandemia se mantém, pelo que temos de assegurar que os

órgãos das autarquias locais e das comunidades intermunicipais continuem a dispor de mecanismos que lhes

permitam manter, como têm mantido até agora, o funcionamento pleno da democracia local. Em segundo lugar,

registamos que esta iniciativa legislativa suprime insuficiências deixadas pela redação primitiva do regime

jurídico excecional, como sejam as matérias já referidas da participação do público e do voto secreto.

Dito isto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaríamos de enaltecer e de agradecer, uma vez mais, o

papel notável que os autarcas portugueses estão a desempenhar no combate à pandemia e na mitigação dos

seus impactos sociais e económicos. Os autarcas são os melhores aliados do poder central neste combate.

Podemos confiar neles e temos o dever de os ajudar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Podemos ajudar os autarcas também em aspetos simples e básicos.

Permitam-me, em jeito de conclusão desta intervenção, deixar dois exemplos dessa ajuda simples e básica.

Primeiro exemplo, reduzir a brutalidade dos reportes que as autarquias locais são obrigadas a fazer para o

Instituto Nacional de Estatística e para a Direção-Geral das Autarquias Locais em mais do que uma plataforma

eletrónica, repetindo desnecessariamente, repito, desnecessariamente, informação, o que representa, Sr.

Presidente, Srs. Deputados, uma verdadeira carga de trabalhos para qualquer autarca português.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Segundo exemplo, pôr a funcionar órgãos de acompanhamento e de

coordenação que contam com a participação dos autarcas, de que são exemplo o Conselho de Coordenação

Financeira ou a Comissão de Acompanhamento da Descentralização, que se encontram num estado de apatia,

de letargia e de inação de todo, repito, de todo indesculpável.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Maria Cardoso, do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda.

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O Sr. José Maria Cardoso (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sobre este projeto de lei, gostaria

de dizer que o artigo 3.º da Lei n.º 1-A/2020 consagrou a possibilidade da realização, por meios de comunicação

à distância, das reuniões dos órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais até 30 de junho. O

presente projeto de lei, que até chama a atenção por se aproximar do referido prazo — que, por acaso, já foi

ultrapassado —, é que vem dar cobertura legal à prorrogação dessa mesma situação até ao dia 31 de dezembro.

Como só hoje estamos a debater esta proposta, que amanhã vamos votar, que pode ou não ser aprovada e

que, na melhor das hipóteses, só na próxima semana é publicada, pergunta-se: então, as reuniões que

decorreram e que estão a decorrer neste período foram todas presenciais? É que, se foram por meios de

comunicação à distância, não têm cobertura legal, o que, com certeza, põe em dúvida, inclusive, as decisões

tomadas.

Tecendo considerações específicas ao projeto em apreço, digo o seguinte: no artigo 2.º, quanto às alterações

propostas tanto no ponto 1 como no ponto 2, invoca-se uma condição que nos parece desnecessária ao

momento, que é «desde que haja condições técnicas para o efeito» ou «sempre que tecnicamente viável». É

evidente que, ao facultar esta possibilidade, os meios técnicos indispensáveis à sua efetiva realização têm de

estar assegurados. Sinceramente, não me parece ser dificultoso possuir meios técnicos para as reuniões de

âmbito municipal e se, no caso das freguesias, assim acontecer, deverão as câmaras providenciar meios para

que tal ocorra. Esta condição tem de ser assumida como obrigatória, em nome da transparência e do escrutínio

público. Aliás, o Bloco de Esquerda defende que deveria ser acrescentada ou considerada uma formulação que

garantisse a manutenção destas gravações, em repositório on-line, para consulta e visionamento posterior.

No ponto 3, sobre a intervenção do público, estamos perfeitamente de acordo com as condições de

participação que estão asseguradas, mas, sobre este ponto, tendo em atenção um reparo constante do parecer

da Associação Nacional de Municípios Portugueses, precisamente no seu ponto 5, pergunto, até em forma de

esclarecimento, o seguinte: essa observação refere-se à necessidade de plasmar no diploma a anulação da

suspensão da obrigatoriedade da realização pública de reuniões ou a referência é sobre a suspensão da

obrigatoriedade da presença de público nas reuniões?

O ponto 4 do presente projeto de lei, ao colocar a questão da sessão presencial quando é necessário

proceder a deliberação por voto secreto, desde que asseguradas todas as orientações emanadas pela Direção-

Geral da Saúde, abre um precedente que nos parece poder ser generalizado. Ou seja, desde que criadas as

condições e seguidas as regras estabelecidas pela Direção-Geral da Saúde, as reuniões dos órgãos das

autarquias locais devem decorrer preferencialmente de modo presencial. Ainda há pouco, focou o caso da

Assembleia Municipal de Barcelos, que é a maior do País e da qual faço parte, que funcionou presencialmente,

com todas as condições asseguradas, e funcionou muito bem — obviamente, com o condicionante de criar

condições de cumprimento das regras estabelecidas e em conformidade com a realidade de cada situação e

em cada período de tempo.

A coberto das alterações legais, introduzidas como meio de agilizar processos e facilitar mecanismos,

nomeadamente com a suspensão de reuniões de assembleias municipais, de assembleias de freguesia e,

mesmo, de reuniões de edilidade, permitiu-se um exercício de decisões confinadas, muitas vezes, ao gabinete

presidencial. Na verdade, os órgãos deliberativos, na maioria dos concelhos, foram arredados de funções e não

contaram para nada, mesmo que, através dos seus grupos municipais, tivessem enviado contributos ou

sugestões, que não foram atendidas.

A democracia não pode ser suspensa em nenhum estado de situação!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do

Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este projeto de lei do Partido

Socialista que discutimos alarga até ao dia 31 de dezembro de 2020 o regime que estava consagrado até dia

30 de junho, um regime que permite a realização à distância, por videoconferência, das reuniões dos órgãos

das autarquias locais e das entidades intermunicipais.

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Naturalmente, quer nestes órgãos, quer em todos aqueles em que tal seja possível, o CDS é favorável à

realização das reuniões em condições de segurança e, como é óbvio, num período de pandemia, as condições

de segurança são acauteladas de maneira mais eficaz pela realização, sempre que tal seja possível, de reuniões

à distância, através de videoconferência.

Respondendo ao repto do Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, acho que tem particular pertinência a sugestão

da Associação Nacional de Municípios Portugueses e a dúvida que coloca, ao dizer que em lado nenhum é

estabelecido que pode ser suspensa a obrigatoriedade da realização das reuniões com a presença do público.

Ou seja, de duas, uma: ou este projeto de lei pretende suspender a obrigatoriedade da realização das

reuniões com a presença do público, dizendo apenas que tal deverá acontecer sempre que tal seja possível, ou

não! Acho que deve ficar taxativo que esta opção só é possível se forem asseguradas outras formas de

participação do público, designadamente através da gravação dessas participações e da disponibilização da

reunião em site. Creio que esta questão não está clara no projeto de lei e penso que devia ficar claro qual é o

seu objetivo.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do

Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde logo, houve um consenso

alargado da parte deste Parlamento para que a crise sanitária não fosse pretexto para suspender ou limitar a

democracia nas autarquias locais. Era essa a recomendação de diversas organizações internacionais e era

precisamente esse o espírito que este Parlamento tinha em mente quando previu a possibilidade de, até dia 30

de junho, se realizarem as reuniões dos órgãos autárquicos à distância, através dos meios tecnológicos

existentes.

Como era previsível, quatro meses volvidos, a crise sanitária permanece e o vírus não vai tirar férias, mesmo

que o Governo tire férias das sessões no INFARMED (Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de

Saúde). Mas enfim!

Face ao contexto atual, o PS propõe-nos, com este seu projeto de lei, estender as disposições excecionais

até ao final do ano. Naturalmente, o PAN acompanhará essa proposta.

Esta discussão permite debruçarmo-nos sobre a aplicação prática destas disposições nos últimos meses e

deixamos três pequenas notas como contributo para este debate.

Em primeiro lugar, a falta de referência ao período de intervenção do público neste regime excecional serviu

de pretexto para que, em algumas assembleias municipais e de freguesia, se suspendesse este ato de

democracia participativa e de proximidade dos eleitos com os seus eleitores. Por isso, da nossa parte, parece-

nos que esta questão fica clara com este projeto do Partido Socialista, que não deixa margem para que estes

equívocos se repitam. Mas se, efetivamente, outros partidos considerarem necessária uma clarificação nesse

sentido, o PAN, obviamente, acompanhará a necessidade dessa clarificação maior.

Em segundo lugar, a não referência à possibilidade de reuniões à distância seja de comissões

especializadas, seja de representantes ou de líderes, se assim os quisermos entender. Isto fez com que,

nalgumas assembleias, estas reuniões não acontecessem, ou, quando aconteciam em formato informal, não

havia a devida senha de presença para estes representantes. Parece-nos que este aspeto deve ser clarificado

e deixamos esse repto ao Partido Socialista.

Em terceiro e último lugar, gostaríamos de sublinhar que, apesar de esta solução resolver o problema, para

o PAN era importante que este Parlamento se unisse no sentido de ponderar e de realizar uma alteração

cirúrgica ao regime jurídico das autarquias locais, de modo a consagrar uma norma que permita aos órgãos

reunir à distância através de meios eletrónicos em casos muito excecionais, já previstos na lei. Foi essa a

modernização das reuniões dos órgãos locais que se fez em Espanha para enfrentar esta crise sanitária e

parece-nos que, até dezembro, será perfeitamente possível que também o façamos.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PCP, a Sr.ª

Deputada Paula Santos.

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos esta proposta do Partido

Socialista, de prorrogar o prazo para possibilitar a realização de reuniões dos órgãos das autarquias locais e

das entidades intermunicipais utilizando os meios tecnológicos ao dispor.

Gostaríamos de dizer o seguinte: compreendemos a necessidade de, no início do surto, de forma a garantir

o funcionamento dos órgãos autárquicos, quer as assembleias municipais, quer as assembleias de freguesia

poderem, nesse período particular e excecional que estávamos a viver, continuar a funcionar e a tomar as suas

decisões, segundo o regime democrático em que vivemos. Nesse momento excecional, de facto, pareceu-nos

que fazia sentido existir essa possibilidade.

Estamos, agora, num momento diferente. Enfrentamos a pandemia, mas estamos num momento em que já

se retoma um conjunto de atividades económicas, por isso, parece-nos que a regra devia ser no sentido de

avançar para a realização das reuniões em regime presencial, cumprindo, naturalmente, as recomendações

sanitárias.

Não nos opomos a que, excecionalmente, onde não haja condições, possa continuar a haver a possibilidade

do recurso aos meios tecnológicos, mas deveríamos criar as condições para a realização destas reuniões em

regime presencial, cumprindo, naturalmente, todas as recomendações sanitárias. Reitero-o, porque creio que é

importante.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem, ainda, a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega, para uma intervenção.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos, hoje, em discussão um projeto de lei

do Partido Socialista que deveria, aliás, ter sido dos primeiros a ser apresentado, para a manutenção da

democraticidade dos órgãos autárquicos, mesmo em tempos de pandemia.

Há duas questões que nos parece merecerem algum esclarecimento e, sobretudo, eventualmente, alguma

clarificação.

Começando pela questão da participação do público, fica claro que se mantém o regime da credencial e da

inscrição prévia. Isso parece-me evidente. Mas o Partido Socialista acrescenta, e bem, um novo item, que é o

das gravações previamente feitas e enviadas. Conforme foi dito por outros organismos, é preciso clarificar a

quem são enviadas essas gravações, em que e se se mantém, ou não, o requisito da inscrição prévia que, como

ex-autarca e todos os que aqui estão presentes e são autarcas sabem, é um requisito fundamental para a

participação neste tipo de reuniões.

Portanto, é um regime que carece de clarificação em relação à participação pública que aqui é definida.

Finalmente, as votações secretas mantêm-se e, como é sabido, muitas deliberações de órgãos autárquicos

têm de ter votação presencial secreta. Falta clarificar de que forma é que esse regime é definido. Apesar de, no

projeto de lei, estar uma enunciação desse regime, convém determinar a sua obrigatoriedade para que não haja

adiamentos sucessivos em matérias disciplinares, por exemplo, que obrigam ao voto secreto nas autarquias

locais.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Estes dois aspetos parecem-nos de importantíssima clarificação para que este regime entre em vigor

imediatamente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não há mais inscrições.

Pergunto se o Partido Socialista se quer inscrever.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, se não houver mais inscrições, inscrevo-me, então, para

encerrar o debate.

O Sr. Presidente: — Dispõe de 2 minutos. Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Agradeço as várias observações

e as várias notas que deixaram e devo dizer que, global e genericamente, estamos praticamente de acordo com

todas, sem exceção.

Quanto à expressão «tecnicamente viável», de facto, é um inciso que pode ser suprimido, uma vez que hoje

é inquestionável que entre o município e as freguesias é fácil encontrar uma solução, caso no plano

especialmente das freguesias seja difícil encontrá-la e, portanto, penso que é superável removendo esse

elemento para que não subsistam dúvidas de que é um regime que passa a ser utilizado.

A ideia de ter a gravação disponível no site por mais tempo também nos parece adequada. Muitas vezes, há

o problema da capacidade de armazenamento, porque os vídeos são potencialmente «pesados» para a

totalidade da reunião, mas, pelo menos, deverá haver a possibilidade de ele ser requerido e ser solicitado

posteriormente; em qualquer caso, a ata da reunião fica sempre disponível e os leitores também não estão

sempre presentes em todas as reuniões, pelo que a combinação da gravação com a ata, pensamos, é suficiente

para assegurar a questão da publicidade.

Quanto à suspensão da presença física e à dúvida que também a ANMP (Associação Nacional de Municípios

Portugueses) coloca, há três questões distintas: há reuniões que são obrigatoriamente públicas, as das

assembleias municipais e algumas reuniões dos executivos. Ora, o facto de a reunião ser pública significa que

ela tem de ser acessível ao público. Adicionalmente, temos uma outra faculdade, que é a possibilidade de

intervenção do público, coisa distinta. Ou seja, temos de responder a uma, que é assegurar que ou há

transmissão on-line ou as pessoas podem aceder depois à gravação, cumprindo-se o requisito da publicidade

do que aconteceu, coisa distinta que também tem de ter um tratamento próprio é a possibilidade de o público

usar da palavra nessa reunião que é pública, mas em que o público se torna também interveniente e para a qual

é necessário desenhar meios para que possa ter a credencial e possa intervir em vídeo ou ter outra possibilidade.

Mas, sendo coisas distintas, o que se procura é ter uma resposta adequada a cada uma delas e, se em

alguns casos é possível resolver o problema, nomeadamente através da gravação vídeo, noutros poderá não

ser, ou seja, poderá acontecer que continuem a existir reuniões em que a lotação da sala é extraordinariamente

limitada e só pode estar determinado número de pessoas na sala, podendo as pessoas acompanhar por outra

via. Eventualmente, colocar a possibilidade de transmissão on-line pode ajudar a resolver alguns destes

problemas.

As questões colocadas pela Sr.ª Deputada do PAN, nomeadamente a de deixar claro que a possibilidade de

reuniões à distância se aplica a todos os órgãos das autarquias ou a todos os subórgãos que as integram, as

comissões e as conferências dos representantes, também nos parecem pertinentes.

Parece-nos, também, que é fácil solucionar as dúvidas que o Sr. Deputado André Ventura colocou.

Sobre a quem se manda, direi que se manda a quem a assembleia municipal respetiva entender, ou seja, o

procedimento utilizado para uma inscrição do público deve ser usado também com fixação do prazo, do horário,

do local onde podem ser feitas as gravações… Eu não espartilharia excessivamente…

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado. Já excedeu o tempo de que dispunha.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Como dizia, eu não espartilharia excessivamente, deixaria na margem de decisão de cada um.

Quanto à questão do voto secreto, o objetivo é o de habilitar e obrigar a que as deliberações se realizem e,

portanto, não arranjar um expediente para não as fazer, obviamente deixando também na margem de decisão

de cada um a forma como elas se operacionalizariam.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegados ao fim do segundo ponto da ordem do dia, vamos passar ao

terceiro ponto, que consiste na apreciação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 43/XIV/1.ª (GOV) — Reforça

as garantias dos contribuintes e a simplificação processual e do Projeto de Lei n.º 465/XIV/1.ª (CDS-PP) —

Aditamento ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, introduzindo o processo de conciliação fiscal,

juntamente com o Projeto de Resolução n.º 548/XIV/1.ª (IL) — Pela transparência e equilíbrio na relação do

Estado com o contribuinte.

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Para abrir o debate e apresentar a proposta de lei, tem a palavra, pelo Governo, o Sr. Secretário de Estado

Adjunto e dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais (António Mendonça Mendes): — Sr.

Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A iniciativa legislativa que trazemos hoje à apreciação da Assembleia da

República decorre de um trabalho que fizemos com um grupo que designámos para o efeito. Na sequência do

relatório que recebemos, fizemos uma apresentação pública, numa conferência sobre «Cidadania fiscal», e

estivemos, então, a trabalhar nas propostas que esse grupo de trabalho nos entregou.

Como sempre dissemos, temos como objetivo melhorar a relação entre o contribuinte e a administração

fiscal, de forma a promover aquilo que é mais relevante do ponto de vista do funcionamento do sistema fiscal,

que é promover o cumprimento voluntário das obrigações por parte dos contribuintes, sendo certo que sabemos

que esse é mesmo o padrão do contribuinte português.

A proposta que aqui apresentamos visa melhorar a relação com o contribuinte, evitando os litígios que

existem, por via de algumas propostas concretas, das quais, se me permitem, destacaria cinco.

Em primeiro lugar, a criação de um mecanismo de conciliação entre a Autoridade Tributária (AT) e os

contribuintes, mecanismo de conciliação esse a funcionar antes do fim do procedimento inspetivo.

Em segundo lugar, a reformulação do regime de dispensa e redução de coimas, o que vai permitir, por

exemplo, que alguém que se esqueça de pagar um imposto numa determinada data possa fazê-lo nos três dias

seguintes sem pagamento de coima, como não aconteceu até hoje.

Em terceiro lugar, fixamos um critério objetivo sobre quantas decisões de tribunais superiores no mesmo

sentido devem existir que obriguem automaticamente a administração fiscal a conformar a sua atuação com

essas mesmas orientações dos tribunais superiores. Até agora, não acontecia o cumprimento tão expedito dessa

norma porque não havia esse critério objetivo, ao colocarmos esse critério objetivo temos a garantia de que a

Autoridade Tributária não litigará contra os contribuintes quando haja jurisprudência firme sobre a matéria.

Em quarto lugar, consagramos o direito de audição prévia dos contribuintes sempre que façam pedidos de

informação vinculativa.

Em quinto lugar, gostaria de sublinhar uma iniciativa e uma medida da maior importância, que é diferir o início

do processo de execução fiscal para o final do momento em que se esgotem as garantias de impugnação

graciosa por parte dos contribuintes, ou seja, não haverá mais execuções fiscais enquanto não estiverem

concluídos todos os meios de defesa por parte dos contribuintes, aplicando-se esta medida aos contribuintes

pessoas singulares com dívidas até 5000 € e às pessoas coletivas, às empresas, com dívidas até 10 000 €.

No pouco tempo de que ainda disponho, permitam-me que destaque a melhoria das garantias de devolução

da penhora de saldos bancários quando é feita de forma indevida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de lei do Grupo Parlamentar do CDS-PP, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O

Governo apresenta-nos a Proposta de Lei n.º 43/XIV/1.ª, sobre o reforço da simplificação e das garantias dos

contribuintes.

Em relação aos objetivos, não podíamos estar mais de acordo, contudo, entendo que esta proposta merece

uma leitura atenta, porque, em muitos casos, ela é tudo menos simples e fica bastante aquém do que seria de

esperar no que toca às garantias dos contribuintes. Entendo até que, nesta matéria, apesar dos esforços

políticos para que as garantias dos contribuintes sejam aumentadas, a administração tributária tem sempre uma

certa garantia e, às vezes, sente quase a necessidade de mudar alguma coisa na legislação para que, na prática,

os seus poderes continuem na mesma. Entendo que este Parlamento e a vontade política devem esforçar-se

por contrariar essa tentação.

Em relação a esta proposta, tenho algumas dúvidas quanto à nova redação do artigo 68.º-A da LGT (Lei

Geral Tributária), que basicamente trata do chamado «direito circulatório» e estabelece alguns critérios para que

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a administração tributária seja obrigada a rever circulares quando elas manifestamente são uma interpretação

abusiva da legislação e são contrariadas pelos tribunais.

Gostava de ter a certeza de que os requisitos que são apontados no artigo 68.º-A não são cumulativos,

porque se forem significa que em alguns casos vai dificultar e vai ser utilizado não para conseguir que a

administração tributária reveja as suas circulares mas, sobretudo, até para o impedir. Este assunto motivou já

uma pergunta do CDS-PP a que a administração tributária respondeu mostrando os poucos casos em que tinha

revisto o seu chamado «direito circulatório». Aliás, os casos sucedem-se a um ritmo alucinante. Lembro-me, por

exemplo, do caso daqueles pensionistas que, por um atraso do Estado, receberam as pensões um ou dois anos

mais tarde e que viram ser-lhes cobrado mais IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares). O

Parlamento legislou, foi aqui aprovada legislação, creio que por unanimidade, e mesmo assim a administração

tributária veio dizer que não podia aplicar, e já foi preciso o assunto ser novamente discutido.

Srs. Deputados, isto é para se perceber bem o grau de liberdade, digamos assim, para utilizar um eufemismo,

com que a administração tributária se sente no poder de basicamente impor a sua opinião, mesmo quando

percebe que ela é manifestamente contra a vontade do legislador.

O CDS apresenta um projeto que tem a ver não com garantias dos contribuintes mas com agilidade

processual de introdução do processo de conciliação fiscal voluntário e no caso em que os contribuintes

manifestamente, pelo volume da dívida em questão, tenham acesso a defesa adequada. É um projeto que visa,

sobretudo, aliviar os tribunais, protegendo os contribuintes que utilizam os tribunais tributários para se

defenderem, e promover a celeridade processual.

Gostava, ainda, de me referir ao projeto da Iniciativa Liberal porque ele vem consagrar, ainda que infelizmente

sob a forma de resolução, uma ideia histórica do CDS-PP, a ideia da conta-corrente que, aliás, foi chumbada há

15 dias no Orçamento Suplementar. Obviamente, sendo uma ideia histórica do CDS, estou de acordo com ela.

Gostava de explicar a razão pela qual o CDS propô-la no Orçamento Suplementar sob a forma de lei? Porque

a resolução não resolve o problema. E eu explico porquê. A conta-corrente, do ponto de vista das intenções, já

existe, aliás, fazia parte do Simplex (Programa de Simplificação Administrativa e Legislativa). O problema é que,

lá está, a administração tributária nunca reconhece a existência do crédito e como não reconhece a existência

do crédito impede, na prática, o funcionamento da conta-corrente.

Por isso, o CDS encontrou uma solução legislativa, que este Parlamento, infelizmente, chumbou, fazendo

uma inversão do ónus da prova, isto é, o contribuinte tem o direito de reclamar o crédito, de alegar a sua

existência e, ao contrário, cabe à administração tributária provar que ele não existe.

Desta forma, permitir-se-ia um mecanismo que, mais do que intenções, na prática, e simplificando a

explicação, tornaria possível a existência da conta-corrente.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de resolução da Iniciativa Liberal, tem a palavra o Sr.

Deputado João Cotrim de Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: O

Estado falha demasiado a todos os cidadãos, em especial na sua qualidade de contribuintes e beneficiários. Os

cidadãos não sentem que os seus elevados impostos e elevadas contribuições resultem nem em boa qualidade

de serviços públicos, nem numa adequada proteção, em caso de necessidade. Para piorar, sentem-se, muitas

vezes, traídos por um Estado que é sempre o primeiro a cobrar, mas o último a pagar.

As duas propostas que a Iniciativa Liberal hoje aqui traz têm um simples objetivo: equilibrar essa relação

entre o Estado e o cidadão e torná-la mais transparente.

A primeira medida consiste na criação de uma conta-corrente, já aqui falada hoje, entre as pessoas e as

empresas, de um lado, e a Autoridade Tributária e a segurança social, do outro. O Estado não deve poder cobrar,

muitas vezes de forma coerciva, ameaçadora e abusiva, quando o próprio Estado é devedor. Queremos com

isto reequilibrar a relação de poder entre as pessoas e o Estado e evitar as frequentes situações em que o

Estado põe e dispõe sem que os cidadãos se possam defender. Isto é de tão elementar justiça que só aqueles

que, nesta Câmara, têm do Estado uma visão hegemónica ou ingénua se podem opor.

A segunda medida é a criação de um documento a ser enviado uma vez por ano aos beneficiários da

segurança social descrevendo, de forma clara e acessível, a situação contributiva do beneficiário e os direitos

que lhe assistem, no presente e no futuro. Esta informação é a única forma de habilitar as pessoas a tomarem

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as suas decisões de poupança conscientemente, num esforço de aumentar a literacia financeira, já tantas vezes

identificada como uma lacuna que afeta o bom funcionamento do sistema, sendo também o fundamento de uma

maior exigência dos beneficiários em relação ao Estado, sem a qual, já se sabe, o Estado acabará sempre por

abusar do seu poder.

Estas propostas inserem-se numa visão que a Iniciativa Liberal tem para Portugal e para a relação dos

concidadãos com o Estado que queremos e são um símbolo da soberania do indivíduo perante o Estado, do

constante escrutínio a que o Estado deve estar sujeito e, igualmente, de um aumento da transparência de

informação a que os portugueses têm direito.

Não é inevitável ter uma das mais altas taxas de esforço fiscal da OCDE (Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento Económico), sem ver as contrapartidas dos serviços públicos. Não é inevitável promover esta

atitude de dependência e de até de servilismo em relação ao Estado, que quer sempre aumentar o seu poder à

custa da liberdade das pessoas. Nada disto é inevitável, até porque há uma alternativa e essa alternativa é o

liberalismo.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado

Duarte Alves.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: A proposta de lei

em apreço pretende, segundo a exposição de motivos, simplificar procedimentos fiscais.

A talhe de foice, gostaríamos de dizer que, para simplificar, o Governo podia começar por cumprir a lei que

hoje existe e que foi aprovada na Assembleia da República por iniciativa do PCP, de garantir 120 dias para a

disponibilização dos formulários, o que não aconteceu, nomeadamente, com o Modelo 3 da declaração de IRS.

Relativamente à proposta de lei em apreço, estamos de acordo com o conjunto de medidas para simplificar

procedimentos entre a administração fiscal e os contribuintes. Estamos de acordo com a possibilidade de os

contribuintes requererem audição prévia, quando peçam informação vinculativa; com a suspensão de execução

de dívidas até determinados valores, até ao termo do prazo de apresentação de defesa graciosa ou judicial; com

as dispensas de coimas em casos de infrações simples, caso a coima seja regularizada no prazo de três dias.

Enfim, estamos de acordo com todas as medidas apresentadas na exposição de motivos, que vão ao encontro

da necessidade de simplificar procedimentos fiscais.

Mas, lendo em pormenor a proposta de lei, encontramos aspetos que não estão referidos na exposição de

motivos — ainda por cima, trata-se de uma iniciativa que entrou, na semana passada, na Assembleia da

República, em pleno processo orçamental, e que será votada já amanhã — e que nos preocupam.

Falamos, por exemplo, do disposto no artigo 5.º, mais concretamente na alteração que é proposta ao n.º 3

do artigo 40.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT). Diz o artigo proposto que a Autoridade

Tributária e Aduaneira e a segurança social passam a ser consideradas autoridades de polícia criminal para

efeitos do Código de Processo Penal. Ora, isto coloca-nos as maiores dúvidas e é preciso perceber qual o

alcance desta alteração e o que se pretende exatamente, que competências específicas passam a ter a AT e a

segurança social e quem é que deixa de exercer esses poderes. É a Polícia Judiciária? Ou têm sido assumidas

diretamente pelo Ministério Público? Isto precisa, na nossa opinião, de ser esclarecido e, para nós, não está

claro pela leitura da proposta de lei.

Quanto às outras iniciativas arrastadas para esta discussão, deixo dois breves comentários.

A proposta do CDS-PP visa alargar meios alternativos de resolução de conflitos, no âmbito tributário, para

impugnações superiores a 500 000 €. Portanto, não estamos a falar propriamente do contribuinte comum. Seja

como for, o PCP é, por princípio, desfavorável à desjudicialização e à privatização da justiça. Consideramos que

a solução passa não pela promoção da arbitragem mas, sim, pela garantia de que os tribunais tenham meios

para cumprir a sua função de forma eficaz e célere, tentando, inclusivamente, a conciliação, mas sempre no

âmbito dos tribunais.

Sobre o projeto de resolução da Iniciativa Liberal, é mais uma daquelas iniciativas em que se pede ao

Governo que faça aquilo que só a Assembleia da República pode fazer. É bom lembrar que foi aprovado, no

Orçamento do Estado para 2020, e por iniciativa de Os Verdes, uma proposta há muito defendida pelo PCP: a

criação do acerto de contas entre o Estado e os contribuintes classificados como micro e pequenas empresas,

que ficou consagrada no artigo 35.º-A da Lei Geral Tributária, relativamente a créditos fiscais e, obviamente,

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sem misturar créditos de outra natureza. É na lei que se altera este tipo de matérias e não com recomendações

facilitistas e sem sentido ao Governo, como propõe a Iniciativa Liberal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — É a vez de intervir a Sr.ª Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (N insc.): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sendo a confiança um fator

fundamental na relação entre os cidadãos e o Estado, a verdade é que os portugueses pouco confiam na

Autoridade Tributária.

De facto, esta instituição nem sempre comunica de forma clara e nem sempre atua de forma transparente. A

elevada burocracia existente leva a que, muitas vezes, incidam sobre os cidadãos determinadas obrigações das

quais estes não têm conhecimento e que podem, inclusive, dar origem ao pagamento de coimas. São, assim,

comuns os casos em que os contribuintes são notificados para pagamento de dívidas cuja existência

desconheciam, às vezes vários anos depois do facto que lhes deu origem, acrescendo elevados juros e

dificultando o seu exercício de defesa.

A legislação tributária é complexa e dispersa, o que leva a que os contribuintes nem sempre conheçam os

seus direitos e os meios de defesa. É, por isso, fundamental que a Autoridade Tributária procure novas formas

de comunicar com os cidadãos.

Por fim, acompanhamos genericamente as iniciativas em discussão, sendo sempre de apoiar iniciativas que

visem a criação de mecanismos que tornem a relação entre os contribuintes e a administração tributária mais

próxima, mais transparente e menos burocrática.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Deputado António Ventura, do Grupo

Parlamentar do PSD.

O Sr. António Ventura (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei em apreço assenta

na simplificação do relacionamento entre a administração fiscal e os contribuintes e no reforço das garantias

desses mesmos contribuintes.

Ora, o PSD considera positivo tudo o que contribua para o caminho da simplificação e da clarificação, da

melhor transparência e da proteção dos contribuintes, muito mais no tempo excecional em que vivemos, ou seja,

o tempo de pandemia da COVID-19. É um dever e uma obrigação que se governe a favor da melhoria de vida

dos portugueses e a burocracia, a complexidade processual e a falta de proteção dos portugueses atentam

contra esta melhoria.

Naturalmente, está nos objetivos do PSD, genericamente, um melhor relacionamento do Estado com os

cidadãos e, no caso, uma simplificação dos procedimentos do contencioso tributário em aspetos como o reforço

da componente de arbitragem tributária, a simplificação das regras sobre a caducidade e a prescrição de

impostos, com alteração dos mecanismos de suspensão e de interrupção, e o prazo de manutenção de uma

garantia idónea para a suspensão do processo executivo.

O PSD está cá para ser crítico, proponente e aliado nas iniciativas conducentes aos objetivos da simplificação

e da clarificação para se evitar, por vezes, o calvário, isto é, a morosidade do sistema de justiça tributária a que

se assiste. A credibilidade de Portugal deve estar sempre no nosso horizonte e, certamente, melhorando o

sistema de justiça tributária, estamos a contribuir para melhorar a confiança dos portugueses e a imagem de

Portugal.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em sede de especialidade, faremos as nossas observações e

daremos eventuais contributos, desde já saltando à vista situações de dúvida e até possíveis situações de

concentração de poder.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, informo que não há mais inscrições. Não sei se os grupos

parlamentares que ainda não intervieram o querem fazer…

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A

presente proposta de lei tem como pressupostos dois dos objetivos enunciados pelo atual e pelo anterior

Governo em matéria fiscal, a saber, o reforço das garantias dos contribuintes e a estabilidade fiscal. Mas também

a simplificação e a clarificação da relação entre a administração fiscal e o contribuinte, assim como o reforço

das garantias dos contribuintes.

Estas são preocupações e premissas da presente iniciativa legislativa e, como já aqui foi referido, resulta do

trabalho produzido pelo Grupo de Trabalho para a Prevenção e Composição Amigável de Litígios e que tem em

consideração a necessidade de garantir a previsibilidade e a segurança aos contribuintes. Nesta matéria,

destaco o facto de a presente proposta de lei só entrar em vigor em 2021, ou seja, por abranger um conjunto de

alterações pretende-se, desta forma, uma consonância quanto ao momento da sua produção de efeitos, com

evidente vantagem para os contribuintes e para as empresas.

Das questões e das soluções em concreto, destaco, a nível da Lei Geral Tributária, a densificação dos

critérios de revisão das orientações genéricas da administração tributária, passando a AT a estar obrigada a

alterar os entendimentos a favor dos contribuintes, quando haja jurisprudência firme nesse sentido,

nomeadamente, a existência de acórdãos de uniformização de jurisprudência pelo Supremo Tribunal

Administrativo ou jurisprudência reiterada nos tribunais superiores sobre estas matérias. Ou seja, há uma

preocupação notória em procurar uniformizar interpretações de acordo com o sentido das decisões judiciais e

da jurisprudência, reforçando, assim, a previsibilidade e a segurança quanto às orientações da Autoridade

Tributária, ao que se alia a introdução da possibilidade de os contribuintes requererem a sua audição prévia,

aquando do pedido de informação vinculativo.

Em sede do Código de Procedimento e de Processo Tributário, estabelece-se o diferimento do início do

processo de execução fiscal para o fim do prazo de defesa, isto relativamente a dívidas até 5000 € ou 10 000 €,

conforme estejamos a falar de contribuintes pessoas singulares ou de pessoas coletivas. Ainda permite que

haja, com isto, proporcionalidade, procurando adequar também mecanismos com vista à cessação da penhora

com facilidade, inclusivamente suspendendo-a.

Em sede de inspeção tributária, é criado também um mecanismo fiscal de conciliação para a fase final e um

novo procedimento de regularização voluntária por parte dos contribuintes, ou seja, fica definitivamente fixada

na lei e regulada a regularização voluntária e o momento para o fazer, também associado à redução de coimas,

o que traz segurança, previsibilidade e defesa dos direitos dos contribuintes.

Quanto aos projetos que foram aqui apresentados, queria deixar duas notas muito breves. O Iniciativa Liberal

prossegue o seu discurso de permanente desconfiança com o Estado, aquele mesmo Estado ao qual se agarra

com ambas mãos quando há uma crise. É da vida, Sr. Deputado!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Está enganado!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — De facto, a contradição entre a prática e, depois, o discurso não

convence os eleitores.

Quanto ao CDS, esta é uma medida, de facto, para o seu eleitorado, ou seja, trata só dos problemas dos

contribuintes com rendimentos acima dos 500 000 €, porque, relativamente às questões dos outros, não as trata.

Protestos do CDS-PP.

Aliás, cria nitidamente até uma situação de tratamento discriminatório e de desproporcionalidade, o que,

necessariamente, terá de ser ponderado.

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É inacreditável! Devia ter vergonha!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Termino dizendo precisamente que o Partido Socialista estará disposto,

na especialidade, a trabalhar para a melhoria, para o tratamento e para a resolução dos princípios, mas tocando

sempre nos seguintes focos: segurança, previsibilidade, defesa dos consumidores e tratamento igual de todos

os contribuintes.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Que vergonha de intervenção!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, suponho que se inscreveu para intervir.

Pausa.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Parece-

nos que o duplo objetivo desta proposta e destas alterações deve ser não apenas a garantia dos contribuintes

e a estabilidade da legislação fiscal mas a garantia dos contribuintes e a capacidade de a Autoridade Tributária

poder investigar e prevenir a fraude e a evasão fiscais.

Se estes dois objetivos forem bem cumpridos, será possível reequilibrar uma disparidade de tratamento —

percebida, julgo eu, com alguma justiça, pelos contribuintes na sua generalidade — entre o pequeno contribuinte,

que não tem qualquer hipótese com a Autoridade Tributária, se atrasar o prazo um ou dois dias, se falhar o

pagamento, se tiver uma falta ou uma distração, e o grande contribuinte, que tem outra capacidade de lidar com

a Autoridade Tributária. É esta disparidade que é necessário reequilibrar e esta proposta de lei traz, de facto,

algumas alterações e faz algumas propostas que permitem reequilibrar a situação do pequeno contribuinte face

à Autoridade Tributária.

A audição prévia, no momento de informação vinculativa, é positiva; a suspensão de execução de dívidas,

quando são valores muito baixos que estão em causa, é positiva; a dispensa de coimas, quando se trata de

infrações simples; a devolução de penhoras, quando estas não se justifiquem, tudo isso facilitará a vida aos

pequenos contribuintes. Penso que devemos ser favoráveis a este movimento da AT, em nome da simplificação

e das garantias dos contribuintes.

Temos uma preocupação que diz respeito — gostaria de esclarecer este ponto com o Sr. Secretário de

Estado — quer a algumas alterações desta proposta de lei, quer à iniciativa do CDS.

O projeto de lei do CDS leva esta preocupação ao extremo, ao instituir uma justiça privada para quem pode,

porque é isso que se faz quando se criam mecanismos conciliatórios privados para grandes contribuintes,

retirando do âmbito público e do âmbito da AT a litigância face a grandes processos. Somos contra este tipo de

mecanismos e de tribunais privados quando se trata de questões fiscais, como somos contra quando se trata

de quaisquer outras questões, inclusive questões de comércio e de outra litigância já aqui discutidas várias

vezes. Mas isto também nos levanta dúvidas quanto aos mecanismos de conciliação antes dos procedimentos

inspetivos, e o Sr. Secretário de Estado dirá se esta preocupação faz ou não faz sentido.

A regularização voluntária deve ser um objetivo da Autoridade Tributária e a conciliação também o deve ser,

pois evita anos e anos em tribunais, sendo que a Autoridade Tributária pode até perder esses casos. Mas a

regulação voluntária e a conciliação não podem impedir o julgamento de crimes tributários nem prevalecer sobre

eles. O que quero dizer com isto? A «Operação Furação» foi um caso generalizado de fraude fiscal, de crime

fiscal, e deveria ser julgado como tal, mas quando vamos ver os resultados desta operação, a verdade é que

não houve condenados porque os processos foram todos resolvidos em conciliações com recuperação parcial

dos montantes da fuga aos impostos. Por isso, para a recuperação de valores que não foram pagos, sim,

conciliação sempre que possível, mas também é preciso haver condenações quando os crimes o justificam —

é esta a nossa preocupação, a do equilíbrio entre a eficácia da Autoridade Tributária e a justiça quando, por

outro ponto de vista, se trata de grandes contribuintes e de grandes crimes fiscais.

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Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos

Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados,

agradeço as várias questões que me colocaram. Em primeiro lugar, penso que é positivo que estejamos todos

de acordo relativamente a esta iniciativa legislativa, aos seus propósitos e à aceitação de princípio relativamente

às respostas que aqui damos e, na especialidade, teremos seguramente tempo para detalhar vários temas.

Gostaria de começar pela última questão que a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua colocou e que me parece

muitíssimo pertinente. Não podemos confundir mecanismos de conciliação e de facilitação do cumprimento

voluntário das obrigações com a desresponsabilização de práticas criminais. Isto está perfeitamente separado.

Operações como a que a Sr.ª Deputada frisou são operações do âmbito criminal e cuja direção pertence ao

Ministério Público.

O que estamos a propor no mecanismo conciliatório é que, durante um qualquer processo inspetivo, depois

da notificação do relatório para audiência prévia, o contribuinte possa solicitar uma reunião com a Autoridade

Tributária para que possam fazer uma ata com as infrações que aceitam. Em função das infrações que aceitam,

há uma redução de coima, havendo um comprometimento de não litigância para o futuro. Penso que isso é

positivo.

Já que estamos a falar da Autoridade Tributária enquanto autoridade de polícia criminal, o Sr. Deputado

Duarte Alves colocou uma questão importante, mas a nossa alteração ao artigo 40.º do RGIT não faz, nem

poderia fazer, nenhuma modificação às competências da Lei de Organização da Investigação Criminal. Sempre

que há um inquérito aberto, a direção cabe ao Ministério Público.

Aquilo que aqui especificamos é quem é o órgão de polícia criminal na Autoridade Tributária,

responsabilizando, desde logo, a hierarquia. Isto decorre de algo que aconteceu há cerca de um ano e pouco.

Na altura, os Srs. Deputados falaram muito, e depois nunca mais se falou, sobre a eventual existência de equipas

de investigação criminal clandestinas na AT. Isso não existe, mas chegámos à conclusão de que era necessário

criar mecanismos de equilíbrio de poderes e que isso significaria que era importante que as entidades de polícia

criminal também pudessem ser centralizadas, sem prejuízo de fazerem depois a delegação, para haver um

maior controlo das atividades neste âmbito.

Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me, ainda, que diga o seguinte: a Sr.ª Deputada Cecília Meireles colocou

bem a questão. Sendo uma excelente jurista, teve a dúvida sobre se as três condições em que a Autoridade

Tributária é obrigada pela lei são cumulativas, ou não. Não são cumulativas e penso que isso se clarificará se,

em sede de especialidade, quisermos colocar o «ou». A intenção do Governo é a de que seja muito claro que,

havendo decisões de uniformização de jurisprudência ou decisões reiteradas por tribunais superiores, nessas

circunstâncias a Autoridade Tributária possa adaptar a sua atuação.

Sr. Presidente, se me permite, termino com duas notas. A primeira é para dizer à Sr.ª Deputada Cristina

Rodrigues que não podemos ser injustos na forma como julgamos os milhares de trabalhadores da AT, que

todos os dias dão o seu melhor ao serviço do País. Muitas dessas notificações de dívidas que a Sr.ª Deputada

diz que se desconhecem são respeitantes a dívidas não fiscais que entram no processo de execução fiscal. Por

isso, desde o último Orçamento, que a Sr.ª Deputada também aprovou, temos uma norma, em que estamos a

trabalhar, de retirada das contraordenações rodoviárias do processo de execução fiscal. Muitas vezes, essas

dívidas não foram notificadas pelas entidades competentes ao contribuinte e, depois, a primeira vez que ele

toma conhecimento delas é por via de uma notificação da Autoridade Tributária, porque entraram no processo

de execução fiscal.

Neste momento, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.

A Sr.ª Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Secretário de Estado.

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O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Termino, Sr.ª Presidente, com uma

menção à intervenção do Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo. Respeito a iniciativa do Iniciativa Liberal e não

tenho dúvidas de que quererão, seguramente, ir ao encontro dos anseios dos contribuintes, mas, Sr. Deputado,

um Estado forte é um Estado tolerante, mas que atua.

Acho que a soberania do indivíduo não se sobrepõe ao Estado, porque a soberania reside no povo, Sr.

Deputado. É o que diz a Constituição da República Portuguesa e isso é muito importante.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Aproveito para cumprimentar o Sr. Secretário de Estado e os restantes

Membros do Governo presentes.

Concluímos, assim, o ponto 3 da ordem do dia, pelo que passamos ao ponto 4, que consta do debate, na

generalidade, da Proposta de Lei n.º 44/XIV/1.ª (GOV) — Transpõe a Diretiva (UE) 2018/1808, do Parlamento

Europeu e do Conselho, de 14 de novembro de 2018, respeitante à oferta de serviços de comunicação social

audiovisual.

Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media,

Nuno Artur Silva, a quem também cumprimento.

O Sr. Secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media (Nuno Artur Silva): — Sr.ª Presidente, Sr.

Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Para a transposição da Diretiva (UE)

2018/1808, que alterou a Diretiva «Serviços de Comunicação Social Audiovisual», propomos que se altere a Lei

da Televisão e dos Serviços Audiovisuais a Pedido, bem como a Lei do Cinema, adotando-se as seguintes

prioridades, a saber, a promoção da produção e difusão de obras portuguesas; o aprofundamento da equidade

concorrencial entre os vários tipos de serviços, isto é, por um lado, entre os serviços de programas televisivos

e, por outro, entre os serviços audiovisuais a pedido, também conhecidos como video on demand, bem como

entre os operadores nacionais e os estrangeiros cujos serviços são oferecidos ao público situado em território

português; a melhoria das condições de financiamento dos serviços televisivos nacionais; o aumento dos níveis

de proteção dos menores e dos consumidores; o reforço da acessibilidade das pessoas com deficiência e demais

pessoas com necessidades especiais aos serviços de comunicação social audiovisual; o incremento das

competências de literacia mediática; e, por fim, a prevenção do discurso do ódio, do incitamento à violência e

do terrorismo.

Para a promoção da produção e difusão de obras portuguesas, propomos que se passem a aplicar aos

serviços a pedido obrigações de investimento similares às que impendem sobre os serviços de programas

televisivos, vulgo canais de televisão.

Propomos também que os serviços televisivos e a pedido situados sob a jurisdição de outros Estados passem

a ter, relativamente às receitas que obtêm em Portugal, obrigações iguais às dos serviços situados em território

nacional.

Propomos, ainda, que, pela publicidade dirigida às audiências situadas em Portugal e que seja difundida nos

serviços audiovisuais a pedido, independentemente do Estado que sobre eles tem jurisdição, seja devida a taxa

de exibição, prevista no artigo 10.º da Lei do Cinema.

Na senda do previsto na diretiva, tais obrigações não se aplicam a serviços com baixas receitas ou baixa

audiência. Por outro lado, as obrigações de investimento são progressivas em função do volume de receitas.

Acresce que se permite aos operadores que escolham se querem que as suas contribuições tenham por base

a receita propriamente dita, o número de assinantes ou uma taxa fixa em função do escalão de receitas em que

se inserem.

A isenção, a abordagem progressiva e a flexibilidade que se proporciona aos operadores para escolherem a

base de cálculo das respetivas contribuições são importantes para não criar barreiras à inovação e à entrada de

novos operadores.

Com este conjunto de medidas, consegue-se um aumento relevante do financiamento para a produção de

obras nacionais, ao mesmo tempo que se criam condições para um mercado dinâmico e apelativo para os

consumidores. Estas inovações são também importantes para se aprofundar a equidade concorrencial entre os

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vários tipos de serviço, isto é, por um lado, os serviços televisivos e, por outro, os serviços a pedido, bem como

entre os operadores nacionais e os operadores estrangeiros.

Com este objetivo em vista, também se propõe a flexibilização das regras que regem os limites quantitativos

à emissão de publicidade televisiva, bem como das normas respeitantes à colocação de produto. Esta

flexibilização coloca os operadores televisivos nacionais num plano de maior equidade concorrencial com os

operadores de serviços a pedido e com os operadores estrangeiros já em Portugal, aumentando a sua

capacidade para se financiarem.

Uma das novidades mais significativas da diretiva que propomos que seja transposta para a ordem jurídica

nacional consiste na sujeição das plataformas de partilha de vídeo a um conjunto de regras que visam a proteção

de valores fundamentais como a não discriminação, a prevenção do discurso do ódio, bem como a proteção dos

menores e dos consumidores. Pode parecer um passo modesto, mas é um salto relevante, pois significa que

uma atividade com fortíssimo impacto social e que estava, em grande medida, isenta de regulamentação passa

a ter de cumprir as regras mais essenciais do nosso sistema jurídico e, sempre que estiverem sob jurisdição do

Estado português, passam a estar sob fiscalização da ERC, além, é claro, das autoridades policiais e judiciais.

Para concluir, quero sublinhar que na proposta de transposição que ora apresentamos aproveitamos o novo

quadro normativo europeu para maximizar as oportunidades de financiamento do setor audiovisual e do cinema

nacional nas suas várias componentes, ao mesmo tempo que reforçamos a defesa dos valores fundamentais,

dos menores e dos consumidores, naquilo que no tempo presente é mais relevante.

Esta é uma peça de uma estratégia bastante mais abrangente que permitirá construir um setor audiovisual

economicamente mais vigoroso, criando empregos qualificados e sendo também culturalmente mais relevante.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa,

do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado:

Discutimos a proposta de Lei n.º 44/XIV/1.ª, que resulta da transposição para o ordenamento jurídico nacional

da diretiva de 2018, sobre serviços de comunicação social e audiovisual.

A primeira nota que tenho de fazer é formal e tem a ver com prazos e processos. Trata-se de uma diretiva

de finais de 2018 e é difícil perceber por que razão o Governo deixa para a 25.ª hora a apresentação desta

proposta de lei porque a consequência é a de que o Parlamento não tem tempo para fazer o seu trabalho

devidamente, ou seja, para apreciar uma matéria que é complexa e que tem de ser sujeita a consulta pública, a

qual acaba por ter de ser encurtada para o prazo mínimo, além de que vai ser difícil realizar audições presenciais

nos termos que teriam interesse para bons contributos.

Bem sei que só há dois países, se não me falha a memória, que fizeram já a transposição, a Áustria e o

Luxemburgo, mas isso em nada ajuda ao processo em Portugal, a não ser que se pretenda falhar os prazos, o

que não deveria ser, em si mesmo, um objetivo.

A segunda nota tem a ver com o conteúdo propriamente dito e, nesse sentido, é mais relevante. O texto

desta proposta de lei é muito próximo do texto da diretiva, do texto inicial, e merece a nossa aprovação, na

generalidade, como, de resto, no Parlamento Europeu, também foi votada favoravelmente pelo Eurodeputado

Nuno Melo.

Como disse, trata com equilíbrio de matérias difíceis de legislar, mas relevantes, como a proibição de

conteúdos violentos, racistas e xenófobos; dá especial atenção à proteção de menores no acesso a conteúdos

impróprios para as suas idades, assim como no acesso a determinados conteúdos publicitários como, por

exemplo, a produtos prejudiciais à saúde ou ao ambiente; e dá especial importância e atenção ao direito de

acesso à informação pelas pessoas com deficiência.

Por outro lado, também tem mecanismos que, concordamos, promovem a produção audiovisual

independente e a produção cinematográfica, e também nacional, e cria um, na expressão inglesa, level playing

field, isto é, as condições de mercado concorrenciais niveladas entre operadores e plataformas.

A terceira e última nota tem a ver com a especialidade e com o nosso entendimento do que deve ser o

processo de especialidade. A densidade e o volume de alterações legislativas aqui introduzidas, que têm

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particular impacto na nossa legislação no que diz respeito às leis-quadro do cinema e da televisão, têm também

impactos em vários setores e em vários operadores e há algumas coisas que, em nosso entender, têm de ser

clarificadas em sede de especialidade. O Sr. Secretário de Estado, agora, não tem tempo para clarificar esses

aspetos, mas provavelmente no processo da especialidade até terá oportunidade para intervir a esse respeito.

Deixo aqui três exemplos desses aspetos que carecem de clarificação.

Por um lado, prevê-se a imposição aos serviços audiovisuais a pedido de uma quota mínima de 30% de

obras europeias com a garantia de uma posição proeminente. Ora, tem de ser clarificado o que diz respeito ao

peso da produção nacional nessa quota, porque pode gerar um efeito contrário àquele que se pretende. Esta é

a primeira clarificação que tem de ser feita.

A segunda clarificação tem a ver com o conceito de proveitos relevantes, que prevê englobar tanto as receitas

de assinaturas ou transações pontuais dos serviços audiovisuais a pedido, como, também, as receitas que

resultem da exploração de comunicações comerciais audiovisuais, como, por exemplo, de publicidade, de

patrocínios ou de colocação de produtos. Ora, conviria saber exatamente que tipo de comunicações comerciais

audiovisuais estão aqui em causa.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Por exemplo, a exploração das plataformas de video on demand (VOD), como espaço publicitário, está aqui

em causa, ou não?

Finalmente, uma última nota, de que o Sr. Secretário de Estado falou, é esta: seria importante clarificar como

vão ser aplicadas as obrigações decorrentes deste novo regime aos serviços de plataformas de partilha de vídeo

cujas empresas não estão sedeadas em Portugal e como é que a ERC (Entidade Reguladora para a

Comunicação Social) vai ter força e capacidade para fazer essa aplicação em Portugal.

Em sede de especialidade, tentaremos garantir estas melhorias.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Lopes, do

Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Isabel Lopes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos

hoje uma proposta de lei do Governo que transpõe para a ordem jurídica interna uma diretiva da União Europeia.

Esta diretiva visa adequar as regras existentes à oferta de serviços de comunicação social audiovisual, em

Portugal e na Europa.

É, sem dúvida, uma transposição importante, necessária e há meses esperada.

As alterações introduzidas pela diretiva entraram em vigor em 18 de dezembro de 2018, como já foi aqui

referido, e têm de ser transpostas para a ordem jurídica dos países da União Europeia até 19 de setembro de

2020.

Esta iniciativa legislativa europeia ocupa uma posição central e de primordial relevância ao determinar uma

maior disciplina no setor audiovisual na União Europeia.

Sr.as e Srs. Deputados, o direito fundamental à liberdade de expressão e de informação, bem como a uma

cidadania informada, só pode ser garantido através da liberdade de imprensa e do pluralismo. Esta é uma

premissa essencial, pois afirma valores e princípios fundamentais da democracia.

Neste sentido, esta transposição pode e deve ser também uma oportunidade para melhorarmos e

aprofundarmos o funcionamento do setor da comunicação social em Portugal, como seja: assegurar a liberdade

e o pluralismo dos meios de comunicação através de uma governação independente dos mesmos; reforçar a

segurança e a proteção dos espectadores, sobretudo dos mais vulneráveis, nomeadamente as crianças;

combater o discurso do ódio com maior eficácia; e garantir equidade concorrencial entre o setor da radiodifusão

tradicional e os novos serviços, como sejam os serviços de vídeo ou os conteúdos audiovisuais nas redes

sociais.

O PSD está disponível para, em sede de discussão na especialidade, trabalhar e propor melhoramentos,

como sejam: a melhoria das condições de financiamento dos serviços televisivos nacionais, o reforço da

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acessibilidade das pessoas com deficiência aos serviços da comunicação social audiovisual, o aumento dos

níveis de proteção dos menores e dos consumidores, a promoção da difusão de obras portuguesas.

O PSD defenderá sempre a clarificação e a definição de regras no funcionamento da comunicação social

audiovisual.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira,

do Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Na discussão

deste diploma, importa começar por dizer que sabemos bem da propaganda do Governo em querer transpor

todas as diretivas ainda pendentes até ao final da sessão legislativa.

Sendo a data-limite para a transposição desta diretiva especificamente 19 de setembro do corrente ano, e

sendo a diretiva de final de 2018, o que o Governo deveria ter feito era, atempadamente, ter promovido uma

discussão ampla sobre esta matéria e não ter entregue uma proposta de lei a 29 de junho para ser discutida a

9 de julho, considerando as implicações deste documento nos setores da comunicação social, do audiovisual e

da cultura, com esta transposição.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Lá está!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Uma transposição obedece a regras definidas nas instituições portuguesas,

tem de ser adaptada à legislação nacional, enquadrada com as diferentes instituições e entidades que por ela

serão abrangidas e devidamente apreciada neste Parlamento, que, aliás, está hoje a fazer esta discussão tendo

só o parecer da ALRAM (Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira) sobre esta mesma matéria.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Muito bem! Até aqui, muito bem!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — O Governo não ouviu nem consultou entidades, estruturas e agentes, por

exemplo do setor da cultura, tendo elaborado esta proposta de lei nas suas costas. Isto, quando propõe

alterações consideráveis à Lei do Cinema, designadamente ao nível das taxas e das obrigações de investimento,

mas, como também pudemos aqui confirmar na intervenção do Sr. Secretário de Estado, quando acaba por

subordinar o cinema ao audiovisual.

É por isso mesmo que o PCP defende que se realizem todas as audições consideradas necessárias pelo

Parlamento com as várias entidades diretamente afetadas pela transposição desta diretiva.

Todo este processo está mal conduzido e mais parece que se quer despachar rapidamente o assunto, sem

que haja discussão que alerte para os perigos do que está traduzido neste diploma.

O Governo optou pela transposição taxativa da Diretiva (UE) 2018/1808 para esta proposta de lei. Tal

significa que as condições equitativas entre os serviços de comunicação de audiovisuais tradicionais e em linha

com as plataformas de partilha de vídeos não foi alcançada, o que não estará desligado da recente discussão

em torno do direito de autor e das salvaguardas, nomeadamente dos utilizadores e da justa remuneração dos

artistas.

A este propósito, importa lembrar o que o PCP afirmou, aquando da discussão dessa mesma diretiva sobre

os direitos de autor: «Assistimos a um arrufo de gigantes que nada tem que ver com a salvaguarda dos

interesses, nem dos criadores nem dos utilizadores; o que está em causa é a repartição dos lucros que resultam

da disseminação de conteúdos, sem que se garanta uma justa remuneração aos criadores. Institucionalizam-se

os filtros, condicionando-se a liberdade criativa, a liberdade de imprensa e o livre acesso à cultura, ao mesmo

tempo que se promove uma maior concentração e monopólio no setor digital», reflexão esta que mantém toda

a atualidade nesta discussão.

Com a transposição desta diretiva, subsiste a isenção da responsabilidade editorial destas plataformas,

promove-se a autorregulação da indústria, liberaliza-se a colocação de produtos e as regras quantitativas

relativas à comunicação comercial.

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E não se vai tão longe até nas condições de acesso das pessoas com deficiência a um conjunto de

instrumentos, as quais ficam muito aquém do que urge concretizar.

Esta proposta não deixa de estar inserida na estratégia do mercado único digital. Aprofunda o caminho de

harmonização da legislação e regulação do setor, limitando a soberania dos Estados-Membros na determinação

do enquadramento legal que melhor sirva a sua estratégia de desenvolvimento.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

O PCP defende que este processo legislativo não pode ser concluído sem auscultações amplas e contributos

vários que permitam que o diploma final tenha efetivamente em conta a realidade nacional.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa, do

Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de

Esquerda trouxe aqui, na discussão do Orçamento do Estado para 2020, a proposta da extensão das taxas

definidas na Lei do Cinema para os operadores de TV Cabo às plataformas de conteúdos audiovisuais,

nomeadamente a Netflix e a HBO, que recentemente têm tido uma grande expansão. O Governo, na altura,

através do Sr. Secretário de Estado, respondeu que era agora, no âmbito da discussão da diretiva, que esse

debate deveria ser tido. É por isso que estranhamos o modo como o Governo traz agora esta discussão à

Assembleia da República, sem qualquer debate público, na 25.ª hora da sessão legislativa, e tendo deixado

passar o tempo em que essa transposição deveria ter sido feita e aproximar-se o prazo em que ela deve estar

concluída.

Isso não dispensa, em nosso entender, que sejam feitas as necessárias audições e que sejam ouvidos os

intervenientes do setor e todas as partes interessadas, até porque, em nossa opinião, esta proposta não serve

e não cumpre os objetivos da diretiva.

Em primeiro lugar, porque ela inclui uma verdadeira borla fiscal às plataformas digitais, nomeadamente

isentando-as da contribuição que os operadores de TV Cabo pagam — 2 € por ano por cada seu subscritor —,

contribuição essa que não encontra correspondência do lado das plataformas de conteúdos audiovisuais.

Por outro lado, essa receita é essencial, porque ela deveria contribuir para fortalecer a capacidade de

investimento público, a capacidade do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) para a promoção da produção

nacional audiovisual.

A única taxa prevista é sobre a publicidade comercial, mas quando olhamos para as principais plataformas

que estão em causa, nomeadamente a HBO ou a Netflix, não estou a ver qual é a receita publicitária que vai ser

tributada e gostava de obter esclarecimento do Governo acerca disso, até porque sou consumidor desse tipo de

produtos e não tenho espaços publicitários expressamente referidos como tal nesses conteúdos. Portanto,

gostava de saber qual é a previsão do Governo para a receita a obter a esse nível.

E mesmo sobre as obrigações de investimento a proposta é errada porque, nas obrigações de investimento

destas operadoras, não inclui a de instalar capacidade de produção em Portugal. Basta-lhes contratar meia

dúzia de serviços que contribuam para produções lá fora e não são obrigadas a preencher a sua quota com

produção efetivamente realizada cá.

A não ser assim, temos interesse em perceber uma melhor explicação, pois foi essa a leitura que fizemos

daquilo que está escrito no diploma agora proposto.

Portanto, a nosso ver, esta é uma oportunidade perdida para dar ao ICA a capacidade de investimento que

o contributo destas empresas, que são as que mais crescem no setor, poderia dar.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Jorge Costa (BE): — E se olharmos para outros países — como, por exemplo, a Polónia, que consigna

ao ICA polaco 1,5% dos lucros destas plataformas, a Alemanha, onde 1,8% a 2,5% da faturação vai como

contribuição para o instituto do cinema alemão, ou a França que vai a 5% dessa faturação e ainda mais 16% a

25% de obrigação de investimento direto em produções em França —, vemos que ficamos muito aquém e fica

também muito aquém o cumprimento do objetivo da diretiva, que não era o de dar estas facilidades às

plataformas, mas, pelo contrário, convocá-las a comparticipar na compensação dos efeitos e dos impactos que

a sua atividade tem sobre o investimento público e sobre a capacidade de produção audiovisual no nosso País.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Concluindo, Sr.ª Presidente, julgamos que é necessário voltar a este diploma e

fazê-lo sobretudo depois de ouvir os intervenientes do setor e as partes interessadas, coisa que é

incompreensível que o Governo não tenha querido fazer.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado: Há aspetos neste diploma que são

evidentemente positivos, como a extensão da jurisdição portuguesa em algumas matérias e também o

pagamento de taxas por parte de operadores que estão fora da obrigação de pagamento dessas taxas.

É também de saudar a prevenção relativamente a conteúdos suscetíveis de influenciar menores e o livre

desenvolvimento da personalidade.

O aspeto que queria aqui questionar especificamente prende-se com o discurso do ódio. Este normativo

transpõe e procura introduzir na Europa limites claros à liberdade de imprensa, de tal forma que — e digo-o para

os mais distraídos — o artigo 86.º-B diz isto: «A ERC pode (…) impedir a oferta de programas incluídos em

catálogos de serviços audiovisuais (…)». A ERC pode impedir! Sem a autorização de nenhum tribunal, sem

nenhuma ordem jurisdicional! Não há maior forma de censura do que esta! Quem é a ERC para impedir o que

quer que seja de conteúdos e de liberdade de imprensa?!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH) — E nós temos de parar com esta loucura de que qualquer decisão politicamente

orientada pode conduzir a uma censura operante em Portugal.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. André Ventura (CH) — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Nós não aceitaremos a censura e não aceitaremos nenhuma forma de censura em Portugal sobre esta

matéria.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosário Gambôa,

do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: De

facto, a aceleração vertiginosa que marca o nosso mundo contemporâneo e o impacto que essa aceleração tem

manifestado no seio do campo da comunicação social e audiovisual colocam-nos desafios urgentes.

Esses desafios urgentes são os desafios primordiais que nos devem trazer aqui, os desafios no âmbito da

democracia, da salvaguarda da liberdade de expressão, da sustentabilidade dos órgãos de comunicação social

e audiovisual, mas também da responsabilidade destes mesmos órgãos na defesa destes valores.

Ora, o que a Diretiva (UE) 2018/1808 procura trabalhar, como ponto central no novo quadro paradigmático,

são, precisamente, esses objetivos. E cabe ao País proceder, num quadro legislativo adequado, à sua

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transposição. É por essa razão que temos hoje, aqui, esta proposta de lei em discussão. Não está em causa a

soberania nacional, Sr.ª Deputada Diana Ferreira. Cabe ao Parlamento definir a forma e o modo como entende

concretizar estas orientações gerais.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Importa, no entanto, percebermos algumas questões cruciais desta diretiva,

que já aqui foram muito focadas.

Algumas dessas questões, por exemplo, pegando na situação que a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa começou

por levantar, têm a ver com a forma, com a morosidade que pode implicar e que outros Srs. Deputados também

evocaram. Nós, Partido Socialista, temos consciência disso e estamos dispostos, nestas e noutras coisas, a

proceder aos aperfeiçoamentos necessários, em diálogo democrático.

E desde já avançamos com a eventual possibilidade, uma vez que o Regimento o permite, de existir uma

cisão dentro da própria apreciação. Isto é, fazermos uma separação entre, concretamente, o que faz a

transposição da diretiva, que essa, sim, tem um prazo, e deixarmos para outro capítulo, digamos, a apreciação

da alteração das leis do cinema e do audiovisual, para que possamos fazer aquilo que todos os Srs. Deputados

têm considerado como relevante e que, com certeza, nos irmana a todos: um trabalho sério, um trabalho

consistente, um trabalho que passa, obrigatoriamente, pela audição de vários stakeholders, pessoas

interessadas, agentes, para que esta diretiva e o que está a ela associado possa ser transposto nas devidas

condições e com a devida qualidade.

É isso que nos mobiliza e é isso que o Partido Socialista entende dever ser a nossa tarefa, a vossa e a de

todo este Parlamento.

Nos pouquíssimos segundos de que ainda disponho, gostava de evidenciar que a questão da defesa da

democracia e a responsabilidade de todos perante a democracia é um dos pontos fortes desta diretiva, e, com

certeza, em termos da sua análise na especialidade, poderemos todos tentar otimizar e perceber melhor todas

estas implicações.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — A encerrar este debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do

Cinema, Audiovisual e Media, Nuno Artur Silva, que dispõe de 2 minutos.

O Sr. Secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, em

relação ao cumprimento dos prazos, como já foi dito, temos, de facto, uma data-limite, mas aconteceu uma

situação excecional que, entre outras coisas, atrasou a própria orientação europeia, as guidelines, que era

suposto terem chegado mais cedo e que demoraram mais tempo a ser transmitidas aos Estados-Membros.

Aliás, como foi referido pela Deputada do CDS, não somos caso único, Portugal não é o único país a ter um

atraso. Aliás, não temos um atraso, estamos nesta situação. Esta é a explicação quanto ao atraso.

De qualquer maneira, em relação aos contributos, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, antes de termos começado

o nosso trabalho, tivemos ocasião de recolher depoimentos de todo o setor e de os pedir às várias associações.

Portanto, isso foi feito.

Ao Sr. Deputado Jorge Costa, do Bloco de Esquerda, queria dizer que o ICA esteve envolvido, obviamente,

desde a primeira hora, neste trabalho, connosco. E deixe-me dizer-lhe que rejeito completamente a ideia de que

não há obrigações da parte dos operadores. Pelo contrário, eu disse aqui que se passam a aplicar aos serviços

a pedido obrigações de investimento similares às que impendem sobre os serviços de programas televisivos.

Acabei de dizer isso aqui. Portanto, objetivamente, há obrigações que passam por colocar ao mesmo nível os

operadores estrangeiros e os operadores portugueses.

O Sr. Jorge Costa (BE): — E relativamente à produção nacional?

O Sr. Secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media: — Sobre isso tenho pena de não dispor

agora de tempo para o esclarecer, mas terei todo o gosto em fazê-lo na especialidade.

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Também gostaria de lembrar que, a partir de setembro, vamos ter a discussão do plano estratégico para o

cinema e audiovisual, e também quero rejeitar qualquer submissão do cinema à lógica audiovisual. Isso vai ser

discutido no final de setembro e é também nessa sede que há muitas questões que podem ser resolvidas.

No que diz respeito à diretiva, terei todo o gosto em desenvolver e esclarecer convosco, na especialidade,

com mais tempo, o que for necessário.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Concluímos, assim, o quarto ponto da nossa ordem do dia.

Segue-se o debate, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 45/XIV/1.ª (GOV) — Autoriza o Governo a legislar

em matéria de trabalho a bordo das embarcações de pesca e da atividade de marítimos a bordo de navios,

transpondo as Diretivas (UE) 2017/159 e 2018/131.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação

Profissional, Miguel Cabrita, que cumprimento.

Faz favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional (Miguel Cabrita): — Sr.ª

Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A melhoria das condições e relações de trabalho é um objetivo estratégico

das políticas públicas. Tanto o direito internacional como o diálogo social bipartido e tripartido têm sido, ao longo

de décadas, instrumentais para estes objetivos de progresso, de bem-estar e de melhoria das condições e

direitos dos trabalhadores.

Neste sentido, o Governo apresentou a esta Assembleia uma proposta de lei que o autoriza a legislar em

matéria de trabalho a bordo de embarcações de pesca e da atividade marítima a bordo de navios, cumprindo,

assim, aliás, uma obrigação prevista nos tratados europeus de transpor, integralmente, as diretivas do

ordenamento jurídico nacional.

As diretivas em questão visam o acordo da aplicação da convenção da OIT (Organização Internacional do

Trabalho) sobre o trabalho no setor das pescas, subscrito em 2012 pelos parceiros sociais do setor, e também

sobre o acordo celebrado igualmente pelos parceiros do setor para alterar uma diretiva de 2009, já em

conformidade com as emendas de 2014, de 2016 e de 2018, relativamente à convenção do trabalho marítimo

de 2006, aprovadas pela OIT em Conferência Internacional do Trabalho, em 2014 também.

De modo a permitir esta correta transposição, é necessário atualizar os regimes jurídicos do contrato

individual de trabalho a bordo das embarcações de pesca e as prescrições mínimas de segurança e saúde a

bordo de navios de pesca.

Do mesmo modo, para transpor para o nosso ordenamento jurídico as emendas que referi, será necessário

proceder a alterações dos diplomas que regulam a atividade de marítimos a bordo de navios que arvoram a

bandeira portuguesa, bem como as responsabilidades do Estado português enquanto Estado de bandeira ou do

porto e o regime jurídico relativo à inspeção de navios pelo Estado do porto.

Não existindo tempo, neste debate, para elencar, com detalhe, todas as alterações que estão em causa,

gostaria, no entanto, de reforçar que estas diretivas resultam do diálogo social à escala europeia e que são,

genericamente, alterações significativas no sentido do reforço dos direitos e condições dos trabalhadores do

setor das pescas e do trabalho marítimo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Dias, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. João Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Vem o Governo

solicitar autorização para legislar em matéria do trabalho a bordo de embarcações de pesca, bem como no que

respeita à atividade de marítimos a bordo de navios, transpondo, assim, duas diretivas da União Europeia.

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Quer o Governo transpor para o ordenamento jurídico nacional matérias relativas às prescrições mínimas de

segurança e de saúde no trabalho, estabelecer, também, o regime jurídico do contrato individual de trabalho,

bem como regular a atividade dos marítimos.

Tratando-se de matéria claramente relacionada com legislação laboral, como é sabido, Srs. Deputados, a

mesma encontra-se em fase de discussão pública até dia 24 de julho de 2020, garantindo-se, assim, aquilo que

é a importante participação dos cidadãos neste procedimento legislativo.

No seu conjunto, as disposições que o Governo apresenta, embora de uma forma e com uma aplicação

limitada, poderão ajudar a resolver problemas que há muito se arrastam no setor, nomeadamente no que se

relaciona com a melhoria da segurança e saúde ocupacional e o atendimento médico no mar e também que

pescadores doentes e feridos sejam atendidos em terra, que o descanso seja suficiente para que haja saúde e

segurança, que exista a proteção de um contrato de trabalho por escrito, que essa proteção seja providenciária,

tal como para os outros trabalhadores, enfim, visam garantir que as embarcações de pesca tenham, no fundo,

também, melhores condições de vida, decentes, a bordo dos navios.

Acompanhamos esta autorização do Governo, uma vez que há vantagens em incorporar a Convenção do

Trabalho Marítimo, neste caso pela transposição para a lei nacional de diretivas da União Europeia, conferindo

uma muito maior capacidade de fiscalização no nosso espaço marítimo, por exemplo a nível dos processos de

infração, o que fortalecerá ainda mais a observância da lei.

Sr. Secretário de Estado, contudo, devo dizer que nós, PCP, não podemos deixar de chamar a atenção do

Governo para o facto de não ter a mesma preocupação para com outros aspetos igualmente relevantes para a

atividade dos trabalhadores marítimos e para a sua saúde e segurança a bordo das embarcações de pesca.

Sr. Secretário de Estado, estou a falar de uma matéria que, provavelmente, não acompanhará, mas que tem

relação com esta: a definição do conteúdo funcional e dos requisitos de acesso às categorias e funções dos

marítimos. O projeto de portaria que esteve em consulta pública até há bem pouco tempo não responde àquilo

que é exigido no novo Regulamento de Inscrição Marítima, publicado em 2019, em que o Governo define que

pode aceder à categoria de marítimo praticante quem esteja habilitado com um curso de preparação de nível de

apoio para a marinhagem, um curso que ninguém conhece, que falta definir. Que curso é este?! Como é que

ninguém sabe do que se trata?! Ninguém conhece como é, onde se pode aceder a este curso. Portanto, esta

exigência de nada serve.

Mas o mais grave de tudo é que vêm substituir o certificado de segurança básica que é exigido aos marítimos

praticantes por um comprovativo de ter efetuado embarques como não marítimo, a bordo de embarcações de

pesca, por um período não inferior a seis meses.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Dias (PCP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Ou seja, ao fim de seis meses, sem cédula, sem nada, sem ter qualquer certificação, passam a ficar com a

cédula sem habilitações. E pronto, está garantida a segurança, está garantida a formação! É isto que o Governo

reserva e não se preocupa em resolver.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de

Almeida, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: As duas diretivas que hoje o Governo aqui traz numa proposta de lei têm um impacto significativo

no setor das pescas, desde logo pelo conjunto de diplomas que alteram: são alteradas as condições de

segurança a bordo, alteram o diploma relativo ao contrato de trabalho dos marítimos e também o que diz respeito

às responsabilidades do Estado português como Estado de bandeira, das embarcações e do porto.

Estas alterações, como já foi aqui dito, foram feitas na sequência de um diálogo social, construído ao nível

europeu. E é importante que haja esse diálogo social ao nível europeu, porque, como sabemos, o setor das

pescas é um setor relevante em muitos países, entre os quais Portugal, e é fundamental que, por exemplo no

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que diz respeito às condições de segurança, haja uma harmonização dessas exigências e dessas condições de

segurança para que, obviamente, não haja depois questões injustas, não só do ponto de vista social, mas

também do ponto de vista económico, de concorrência, que não é também feita sob os mesmos parâmetros.

Por isso, quanto à concretização destas alterações, concordamos, porque na esmagadora maioria dos casos

elas vão no sentido ou de aumentar a segurança dos embarcados, ou de melhorar as suas garantias, por

exemplo relativamente aos períodos de descanso.

O que é que queremos salientar nesta matéria? Tratando-se de uma proposta de lei com 80 páginas, 100

pontos anexos e um conjunto enormíssimo de diplomas, o Governo poderia ter tido outro respeito pela

Assembleia da República na sua apresentação. Esta proposta de lei entrou cá no dia 29 de junho, dez dias antes

do debate. Pior: ela entrou já depois de ambas as diretivas terem visto caducar o prazo para transposição.

Portanto, do ponto de vista formal, há aqui, da parte do Governo, uma atuação que não prestigia o processo de

transposição dessas garantias, com um problema final: tratando-se de matéria laboral, esta proposta de lei tem

de estar sujeita a apreciação pública, e bem, e, do nosso ponto de vista, essa apreciação pública ainda vai ser

essencial para que, na especialidade, possamos considerar contributos do setor, designadamente do setor

ligado aos pescadores, no sentido de saber se é possível melhorar ainda esta proposta de lei.

Acontece que o período de apreciação pública termina depois do último Plenário desta sessão legislativa, o

que quer dizer que este atraso do Governo não é um atraso apenas até junho, vai ser um atraso pelo menos até

setembro, e isso, naturalmente, prejudica não só do ponto de vista burocrático a imagem de Portugal no

cumprimento das suas obrigações ao nível europeu, mas prejudica, acima de tudo, aqueles que poderiam ser

beneficiados já pela concretização da entrada em vigor desta lei e que, assim, terão de esperar mais tempo.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra Pereira,

do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: A

presente proposta de lei consiste num pedido de autorização legislativa que o Governo faz à Assembleia da

República para alterar três diplomas, por forma a efetuar a transposição de duas diretivas comunitárias — já foi

aqui dito —, cujos prazos de transposição já foram esgotados. São três diplomas que se referem à prestação de

trabalho no setor das pescas, um setor naturalmente muito importante para Portugal, além de que a

transnacionalidade que o setor assume obriga a uma harmonização da legislação e a uma proteção equitativa

de todos os colaboradores e de todos os trabalhadores da União Europeia.

O reforço das normas de saúde, higiene e segurança no trabalho, a fixação de limites máximos de tempo de

trabalho e limites mínimos de descanso dos tripulantes das embarcações de pesca, assim como da instituição

de limites ao trabalho suplementar, assegurar o pagamento dos salários em dívida em caso de abandono, tudo

isto, Sr.as e Srs. Deputados, são objetivos enunciados pelo Governo que até já resultam, aliás, de obrigações

internacionais a que o Estado português estava já vinculado e, naturalmente, com os quais o PSD concorda e

que acompanha.

As matérias da formação e qualificação profissionais, as condições de trabalho, a contratação, a

remuneração, a duração do trabalho, as férias, o repatriamento e o alojamento são questões muito particulares

e muito importantes para os trabalhadores deste setor, os pescadores e os trabalhadores das embarcações de

comércio, que merecem a nossa especial atenção.

Sr.as e Srs. Deputados, o PSD está sempre na linha da frente no reforço dos direitos e garantias de maior

dignidade no trabalho exercido nas embarcações de pesca, nos navios de comércio e, mais, nas melhores

condições de trabalho para os nossos pescadores.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Castro, do

Grupo Parlamentar do PS.

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O Sr. João Azevedo Castro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:

Vamos centrar-nos no essencial.

A presente proposta autoriza o Governo a legislar em matéria de trabalho a bordo das embarcações de pesca

e da atividade de marítimos a bordo de navios, transpondo as Diretivas (UE) 2017/159 e 2018/131.

A Convenção do Trabalho Marítimo, da Organização Internacional do Trabalho, estabelece as condições

mínimas e de vida para os marítimos a bordo de navios da Marinha de Comércio e prevê obrigações para os

armadores, os Estados de bandeira, os Estados de porto e, ainda, para os Estados fornecedores de mão de

obra.

A Diretiva (UE) 2018/131 aplicou as alterações efetuadas no sentido de assegurar a existência de sistemas

de garantia financeira e consagrar mecanismos de assistência a marítimos abandonados pelo armador, em

acordo com os parceiros sociais.

A convenção sobre o trabalho no setor das pescas, aplicada pela Diretiva (UE) 2017/159, estabeleceu novas

diretrizes e princípios com vista a assegurar que os trabalhadores tenham condições de trabalho dignas a bordo

dos navios de pesca.

Efetivamente, a pesca é uma atividade perigosa, comparável ao combate a incêndios ou mesmo à mineração.

A taxa de mortalidade dos pescadores é muito superior à da generalidade das profissões. Na pesca não existe

separação clara entre o tempo de trabalho e o tempo de lazer ou de atividades particulares. A remuneração dos

trabalhadores baseia-se, com frequência, na divisão das capturas de um barco, em vez de um salário fixo. Muitos

pescadores não são, no sentido convencional, trabalhadores, sendo proprietários armadores ou só considerados

trabalhadores por conta própria.

Neste contexto, facilmente se percebe que os procedimentos e salvaguardas estabelecidos para as pessoas

que trabalham em terra não se adequam ou não são eficazes para o setor pesqueiro, contribuindo para o défice

de trabalho decente para os pescadores. Neste sentido, cumpre atualizar o regime jurídico que estabelece o

contrato individual de trabalho e regular as prescrições mínimas de segurança e saúde no trabalho a bordo dos

navios de pesca, assegurar que a pesca tenha condições de trabalho dignas, concretizando requisitos mínimos

em matéria laboral, condições de serviço, alojamento, alimentação, segurança, proteção na saúde, assistência

médica e segurança social.

Num registo dos avanços já concretizados, por exemplo na Região Autónoma dos Açores, no sentido de que

todos os pescadores tenham a possibilidade de contar com um contrato de trabalho, o Grupo Parlamentar do

PS não poderia deixar de acompanhar esta iniciativa, assinalando-a como francamente positiva, numa

preocupação clara e necessária com o setor da pesca e os pescadores.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita

Cristina Rodrigues.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (N insc.): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:

Aplaudo o facto de estas diretivas serem finalmente transpostas.

O Parlamento Europeu propôs que os subsídios do FEAMP (Fundo Europeu para os Assuntos Marítimos e

as Pescas) possam ser utilizados «com o objetivo de melhorar a segurança ou as condições de trabalho e de

vida da tripulação, o que inclui correções à qualidade do mesmo, desde que» — e sublinho «desde que» —

qualquer aumento da capacidade «esteja dentro do limite atribuído ao Estado-Membro em causa, sem pôr em

risco o equilíbrio entre a capacidade de pesca e as oportunidades de pesca disponíveis e sem aumentar a

capacidade do navio na captura de peixe».

Existe, de facto, uma linha ténue entre o aumento da capacidade de pesca e a melhoria da segurança e das

condições de trabalho e de vida a bordo. A questão é a seguinte: devem os fundos públicos do FEAMP servir

para melhorar a segurança e as condições de trabalho se também levarem ao aumento da capacidade de pesca,

colocando ainda mais em risco a proteção da biodiversidade? Consideramos que não.

Se tal acontecer, esta medida mina a credibilidade da União Europeia nas negociações com a Organização

Mundial do Comércio, que visam proibir subsídios prejudiciais que contribuam para a sobrecapacidade, a pesca

excessiva e a pesca ilegal até 2020, pelo que esta situação deve, necessariamente, ficar acautelada.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro, do

Bloco de Esquerda.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como já aqui foi referido, estamos

a falar de duas diretivas que abrangem matérias muito amplas, desde os tempos de trabalho e de descanso; os

acidentes de trabalho e doenças profissionais; as garantias financeiras para assistência a marítimos

abandonados pelo armador; o direito de regresso; o funcionamento dos contratos de trabalho em caso de

pirataria ou de assalto à mão armada; a inspeção de navios, mexendo, também, nas contraordenações; a

regulação do alojamento de navio ou embarcação de pesca; enfim, como foi dito, um conjunto muito vasto de

matérias que são da maior importância.

O Bloco de Esquerda acompanha todas as medidas, os esforços e as iniciativas que visam reforçar a

segurança e as condições de trabalho e, portanto, grande parte destas normas tem, precisamente, esse objetivo.

Não podemos deixar de referir, como aqui também já foi dito, que o Governo apresentou tardiamente esta

transposição, e há disposições constitucionais inultrapassáveis que se prendem com o período de apreciação

pública de matérias relacionadas com legislação laboral. E aqui falamos, naturalmente, de um caso que tem

uma relação direta com a legislação laboral.

Também já em comissão tive oportunidade de chamar a atenção para esse aspeto. É que mesmo

considerando um prazo de 20 dias, que é o prazo mínimo de apreciação pública, isso significa que este conjunto

de alterações não poderá ser transposto para a lei portuguesa antes do final da presente sessão legislativa.

Portanto, haverá ainda a considerar o tempo para o contributo das organizações representativas do setor, sem

prejuízo da negociação que já houve à escala europeia, mas também em Portugal as associações

representativas, nomeadamente os trabalhadores, terão ainda tempo para se pronunciarem, e esse período

deve ser respeitado e, depois desses contributos, então, poder-se fechar o processo legislativo que o Governo

pretende agora iniciar.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, para encerrar este debate, tem a palavra o Sr.

Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita.

Sr. Secretário de Estado, dispõe de 2 minutos.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional: — Sr.ª Presidente, Sr.as e

Srs. Deputados: Antes de mais, quero registar o acompanhamento genérico das preocupações do Governo no

sentido de fazer esta transposição, como é, aliás, obrigação do Estado português, mas, na verdade,

reconhecendo, como o Governo também reconhece, que são questões da maior importância e diversidade,

algumas delas versando sobre direitos relevantes dos trabalhadores e promoção da sua segurança.

É um setor, como também aqui foi reconhecido, que tem riscos, complexidades e especificidades que

merecem um tratamento aprofundado e, aliás, ao longo de décadas, as questões relacionadas com as condições

de trabalho e a sua melhoria têm vindo a ser sucessivamente objeto de avanços.

Foi colocada a questão dos prazos. Como sabem e é conhecido, o Estado português melhorou muitíssimo a

sua condição em termos de prazos de transposição de diretivas. É verdade que preferimos sempre cumprir

todos os prazos e até, preferencialmente, antecipá-los, mas, quando não é possível, pretende-se colmatar essa

situação no mais curto período de tempo. É também neste sentido que esta proposta de autorização legislativa

está agora na Assembleia da República.

Quero sublinhar, de novo, o facto de estas diretivas resultarem do diálogo social à escala europeia. Esta é

uma metodologia que os tratados europeus permitem e que nós, aliás, muito valorizamos, sem prejuízo,

naturalmente, dos contributos que, à escala nacional, os parceiros sociais, quer sindicais, quer empresariais,

possam dar sobre estes diplomas e estas matérias.

Gostaria igualmente de dizer que há aqui uma dupla preocupação que foi também referida por diferentes

forças políticas. Uma delas tem a ver com a promoção da harmonização de condições, que é também uma

maneira de promover a concorrência leal e transparente entre diferentes países. Este é um setor com uma

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condição transnacional e global cada vez mais acentuada e em que essa dimensão de concorrência leal é muito

importante. E uma das maneiras de o garantir é, justamente, a de oferecer condições de trabalho dignas, que

permitam que essa concorrência se faça sem atropelos e sem dumping na concorrência entre empresas e

países.

Nesse sentido, saliento algumas das melhorias, dos passos, que, a nosso ver, são mais importantes e que

têm vindo a ser dados. Aliás, alguns deles já foram aqui referidos, mas eu gostaria de os sublinhar.

Em primeiro lugar, refiro a consagração do direito do pescador em examinar e aconselhar-se sobre as

cláusulas do contrato antes da sua celebração, bem como o dever de este ser entregue ao trabalhador e estar

disponível a bordo.

Por outro lado, saliento a alteração dos limites de trabalho noturno, entre as 22 horas de um dia e as 7 horas

do dia seguinte, ou quando há disposições específicas em regulamentação coletiva de trabalho, assegurando

que haja pelo menos nove horas de descanso consecutivas, incluindo o período entre as 0 horas e as 5 horas

da madrugada.

Lembro também a existência de sistemas de garantia financeira, rápidos e eficazes, para dar assistência aos

marítimos, em particular quando há situações de abandono por parte dos armadores.

Refiro, igualmente, a prorrogação da validade do certificado do trabalho marítimo por um período máximo de

cinco meses, após uma inspeção de renovação com resultado favorável e a garantia de pagamento pelo armador

de uma indemnização em caso de morte ou incapacidade de longa duração de um marítimo, resultante de um

acidente de trabalho ou doença profissional, questão muito relevante neste setor.

Por fim, e também já aqui falada, refiro a garantia de que, em casos extremos, como atos de pirataria ou

assaltos à mão armada contra navios, o contrato de trabalho do trabalhador marítimo continua a produzir efeitos,

os salários continuam a ser devidos e pagos e são mantidas as demais prestações decorrentes da lei e dos

instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.

São, portanto, questões que não são de somenos e que, em muitos casos, dizem respeito ao quotidiano

destes trabalhadores, mas também a situações de riscos específicos do setor.

Portanto, creio que, com esta transposição, estaremos em condições de dar mais um passo na proteção

destes trabalhadores e na garantia de condições de trabalho adequadas e cada vez mais favoráveis.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, chegámos ao fim da apreciação, na generalidade, da

Proposta de Lei n.º 45/XIV/1.ª (GOV), pelo que vamos, agora, proceder ao debate, também na generalidade, da

Proposta de Lei n.º 46/XIV/1.ª (GOV) — Define os objetivos, prioridades e orientações de política criminal para

o biénio de 2020-2022.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, que cumprimento.

A Sr.ª Ministra da Justiça (Francisca Van Dunem): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em

cumprimento da Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, o Governo apresenta a esta Câmara a proposta de lei de política

criminal para o biénio 2020-2022, compreendendo a definição de objetivos, prioridades e orientações em matéria

de prevenção da criminalidade, de investigação criminal e de ação penal, bem como de execução de penas e

medidas de segurança.

A proposta que aqui apresentamos considera os dados dos Relatórios Anuais de Segurança Interna (RASI)

de 2018 e de 2019 e incorpora as análises prospetivas internacionais, feitas, designadamente, pela Europol,

assim como o impacto dos diferentes fenómenos criminais na vida das pessoas, no sentimento de segurança

comum e na realização do Estado de direito democrático.

A leitura crítica dos dados registados pelos órgãos de polícia criminal (OPC) em 2019, e revelados no último

RASI, permite-nos constatar a inexistência de alterações significativas dos fenómenos criminais com maior

prevalência a nível nacional.

Os números da violência doméstica, da burla informática e nas telecomunicações continuam a justificar

grande preocupação.

Numa lógica de continuidade relativamente ao quadro estabelecido na Lei n.º 96/2017, que antecedeu esta,

esta proposta integra, no plano da prevenção da criminalidade, programas e planos de segurança e de

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policiamento específicos, destinados a vítimas particularmente vulneráveis quer em razão da sua condição

particular, quer em função da natureza do crime e, bem assim, destinados a controlar fontes de perigo,

nomeadamente em meios complexos, como a internet.

Paralelamente, no plano da repressão, queremos aqui sinalizar a manutenção de diferenças procedimentais

entre o tratamento dos crimes graves e dos crimes de baixa e média gravidade, salvaguardando-se a coerência

entre a fase preliminar e as fases subsequentes no processo penal e conciliando-se, também, a execução das

prioridades com o atual modelo de gestão das comarcas.

Em linha com as grandes preocupações da agenda europeia, a proposta confere centralidade às vítimas de

crimes, atribuindo prioridade à sua proteção e à reparação dos danos sofridos, ao mesmo tempo que aposta na

prevenção da reincidência, promovendo a disponibilização de programas dirigidos a agentes de certas

categorias de crimes ou a alguns dos seus fatores criminógenos específicos, programas esses a executar tanto

em meio prisional institucional como em meio não prisional.

Num outro plano, a proposta de lei mantém um claro enfoque na recuperação de ativos, enquanto política

que visa restituir à comunidade valores e património obtidos mediante a prática de crimes, enfatizando a

premissa de que o crime não pode compensar.

A perceção da necessidade de um acompanhamento mais próximo das dificuldades da investigação criminal,

em particular no crime económico-financeiro e na corrupção, fundamenta a proposta que fazemos, de integração

no relatório a apresentar pelo Procurador-Geral da República, relativamente à execução da lei, de um capítulo

especial relativo à avaliação das medidas adotadas no quadro da prevenção e da repressão do crime

económico-financeiro.

As circunstâncias específicas do momento que vivemos e a incerteza quanto à sua duração justificam

opções, com a prioridade que acordámos, pela investigação de crimes contra a autoridade pública, cometidos

em contexto de emergência sanitária ou de proteção civil e, bem assim, a criminalidade praticada em ambiente

de saúde.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa

Real, do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Os

objetivos de política criminal para o biénio de 2020-2022, ao estabelecerem os fenómenos criminais de

prevenção prioritária, acautelam, efetivamente, algumas das preocupações que têm vindo a ser destacadas pelo

PAN ao longo dos últimos anos, como sejam, desde logo, a violência doméstica, o homicídio conjugal, os crimes

de discriminação racial, religiosa e sexual, a criminalidade em ambiente escolar e em ambiente de saúde e,

ainda, os crimes contra a floresta.

Não podemos, no entanto, deixar de manifestar algumas preocupações com aquela que será, na prática, a

aplicação destes objetivos, quando antecipamos que a mesma não será acompanhada dos meios necessários

para a sua materialização. Isto, sobretudo quando já estamos a meio do ano e temos ainda bem presentes

propostas apresentadas pelo PAN de reforço do investimento nestas áreas que foram rejeitadas por esta

Assembleia. Vejam-se alguns exemplos: a proposta que reivindicava meios humanos e materiais para a Polícia

Judiciária, a contratação de 65 psicólogos para o Ministério da Justiça ou o reforço do financiamento destinado

ao acompanhamento de crianças e jovens em cumprimento de medidas tutelares educativas especiais por

situações de abuso sexual.

De pouco serve, assim, que a proposta aqui apresentada estabeleça, e bem, um conjunto de objetivos,

prioridades e orientações em matéria de prevenção da criminalidade, de investigação criminal, de ação penal

ou execução de penas e medidas de segurança, se não houver, em contrapartida, o necessário investimento a

nível dos meios humanos e materiais nos órgãos de polícia criminal, nos tribunais e, também assim, nos demais

parceiros, como sejam as autarquias locais e demais instituições.

Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Justiça: Precisamos de uma verdadeira política criminal, leia-se uma

política estruturada e pensada, a nível da prevenção, que contrarie a tendência de um País a várias velocidades,

consoante a disponibilidade financeira ou a sensibilidade de quem a aplica.

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Não queremos terminar sem deixar de notar o facto de, mais uma vez, os crimes contra animais não

merecerem qualquer tipo de definição nestes objetivos, nomeadamente a nível de preocupação acrescida,

quando é consabido que estes crimes têm vindo a aumentar e a tornar-se, em alguns casos, particularmente

violentos.

Os animais também são vítimas dos fenómenos de violência, estando particularmente vulneráveis pela

circunstância de se encontrarem inteiramente à mercê do ser humano. No entanto, continuam a faltar respostas

cabais nesta matéria, tanto mais quando vemos a preocupação com eles a cingir-se ao tráfico de espécies

protegidas, leia-se uma perspetiva meramente económica, ignorando-se, assim, a necessidade de combater os

maus tratos a animais e a sua relação com a violência contra pessoas, como reconhece, por exemplo, o FBI,

nos Estados Unidos.

Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo: A estratégia em torno da política criminal não pode,

no nosso entender, ser um mero enunciar de princípios ou uma simples declaração de intenções; exige-se que

seja a concretização das respostas que a sociedade tanto clama, mas isto só se alcança com um investimento

condizente com o tamanho dos desafios e, igualmente importante, com uma estratégia concertada entre todos

os agentes, sejam eles o Estado central ou as autarquias locais.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel

Pureza, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Há quase

três anos, quando aqui debatemos a proposta do Governo sobre as prioridades da política criminal para o biénio

2017-2019, exprimi, em nome do Bloco de Esquerda, a nossa crítica a uma solução que previa nada menos do

que 20 crimes de prevenção prioritária e 15 crimes de investigação prioritária.

Três anos volvidos, aqui estamos a discutir uma proposta do Governo que identifica nada menos do que 19

crimes de prevenção prioritária e 18 crimes de investigação prioritária.

A constância numérica e substantiva das prioridades é, afinal, a falta de prioridades. Sejamos sérios: uma

lista de duas dezenas de prioridades é a expressão acabada da falta de definição do que é, realmente, prioritário.

Aliás, a Sr.ª Ministra, no debate de há três anos, em resposta a uma pergunta que então lhe formulámos

precisamente sobre isto, foi de uma franqueza que só pode ser elogiada — e digo-o sem nenhuma ironia.

Permita-me que a cite no debate de há três anos. Dizia a Sr.ª Ministra: «(…) estes crimes são todos igualmente

prioritários — é justamente uma das grandes dificuldades destas enunciações —, o que significa que não há

uma categorização da prioridade em função da posição da indicação do crime ou do fenómeno criminal nesta

lista.» E logo acrescentava: «(…) na altura em que se esteve a discutir isto até se sugeriu a possibilidade de

ficar por ordem alfabética.»

Cerca de três anos depois, eis-nos, novamente, face a esta sensação de que estamos aqui a cumprir uma

exigência legal, mas que ela é totalmente ou quase totalmente inconsequente.

Não é com um elenco de 20 prioridades que a Assembleia da República fixa uma moldura precisa dentro da

qual o Ministério Público, com a sua autonomia, vai determinar critérios finos de ordenação de objetivos.

Por outro lado, verificando a similitude quase absoluta entre esse elenco de crimes tidos como de prevenção

e de investigação prioritárias, constante da proposta do Governo de há três anos, e aquele que o Governo

apresenta agora, fica a dúvida sobre se foi feita alguma avaliação da aplicação da lei anterior quanto às

prioridades então adotadas, fica a dúvida sobre que instrumentos de conhecimento da realidade portuguesa

foram usados para chegar aqui, fica-nos a dúvida sobre se, enfim, afinal de contas, não foi a mera força da

inércia que prevaleceu na definição deste elenco.

Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as e Srs. Deputados: Com um conteúdo assim, tal como há três anos, esta lei não

tem efeito útil e não ajuda, como devia, a definir uma política bem pensada de combate à criminalidade. Está

mais do que na altura de rever a lei para dignificar o Parlamento. O Bloco de Esquerda cá estará para que assim

seja.

Aplausos do BE.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais, do

Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As prioridades

de política criminal para o biénio 2020-2022, que hoje o Governo aqui apresenta, decorrem de uma análise

profunda da realidade criminal do País, bem retratada no Relatório Anual de Segurança Interna, recentemente

divulgado, que nos dá conta de que a criminalidade em Portugal apresenta níveis inferiores aos da média da

União Europeia. Contudo, persistem fenómenos com especial relevância que exigem destaque, dado o impacto

social que produzem e os bens jurídicos que ofendem.

É desse modo que a presente proposta de lei confere centralidade à vítima, sobretudo às especialmente

vulneráveis, como é o caso das vítimas de violência doméstica, bem como de menores, idosos e cidadãos

portadores de deficiência em contexto familiar.

Relativamente à violência doméstica, registou-se, em 2019, o valor mais elevado dos últimos 10 anos, com

um aumento de 11,5% (mais de 3000 participações). Mesmo que estejamos perante um fenómeno de

«desocultação» territorializada da criminalidade, como parece, o reforço dessa prioridade é digno de registo,

bem como a implementação e consolidação de medidas, como a intervenção dos OPC nas 72 horas

subsequentes à denúncia e a criação da Base de Dados de Violência contra as Mulheres e Violência Doméstica

(BDVMVD).

Especial destaque merece também, a nível da prevenção e da investigação criminal, a tendência do crime

transnacional e da cibercriminalidade, nas suas distintas dimensões de materialidade e gravidade, onde se

destaca, como a Sr.ª Ministra já disse, o aumento significativo da criminalidade informática — mais 43% —, bem

como a criminalidade altamente organizada associada ao tráfico de pessoas e de estupefacientes.

É de referir, ainda, a prioridade dada aos crimes contra a autodeterminação sexual e à criminalidade motivada

por discriminação racial ou sexual, que, na atual conjuntura nacional e mundial, exigem uma particular atenção,

pela emergência de fenómenos disruptivos e de grande agitação social a que estão associados.

No quadro da prevenção prioritária, cumpre destacar: a prevenção da reincidência, que passa pela

concretização de programas de consciencialização da ilicitude das condutas para se evitar a prática de novos

crimes, como é o caso dos programas para agressores de violência doméstica; as ações de intervenção no

âmbito dos incêndios rurais; e a estratégia global de policiamento de proximidade, de que são exemplos o Escola

Segura e o Idosos em Segurança.

Para finalizar, queria dizer que esta proposta de lei assegura uma linha de continuidade relativamente à lei

anterior, como a Sr.ª Ministra já disse, mantém a estreita colaboração e articulação com os OPC e renova a

aposta na celeridade processual para garantir o direito a uma decisão em prazo razoável.

Contudo, dadas as atuais modificações sociais e as exigências de vivermos numa nova normalidade,

provocadas pela COVID-19, pergunto, Sr.ª Ministra, se não seria de considerar uma nova relevância para o

crime de propagação de doença.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Coelho

Lima, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. AndréCoelhoLima (PSD): ⎯ Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª

Ministra da Justiça: De facto, às vezes, as leis obrigam-nos a estas chatices de ter de fazer uns diplomas, de

ter, com determinada periodicidade, de refletir sobre determinadas matérias, o que, visivelmente, como aqui

estamos a verificar e vou já fundamentar, fazemos de forma esforçada.

Começo por dizer que a lei de política criminal que aqui estamos a apreciar, devendo reportar-se ao período

2019-2020, reporta-se ao período 2020-2022, porque ⎯ não sabemos porquê e queria pedir essa explicação à

Sr.ª Ministra ⎯, durante o ano anterior, tivemos um ano sem vigência de uma lei de política criminal.

Portanto, se aqui vimos dizer que é muito importante que este diploma exista, que o analisemos e que sobre

ele reflitamos, também é preciso perceber por que é que, durante um ano, não o tivemos. O mesmo se diga

sobre o relatório de execução, que compete ao Governo, sobre a anterior lei de política criminal, que já caducou

no ano passado e que chegou há uma semana e meia ao Parlamento.

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Ou seja, o próprio relatório de execução chegou, agora, em cima do próprio debate da lei de política criminal,

o que significa que não foi sequer tido em conta para a reflexão necessária à elaboração da mesma, como era

suposto que acontecesse, ou seja, que o relatório de execução nos levasse a refletir em como deveria ser feita

a nova lei.

Para além de muitas coisas que vêm da lei anterior para esta, de chapa quatro ou chapa cinco, como prefira

a Sr.ª Ministra, queríamos, ainda assim, elogiar a circunstância de se manter a catalogação, na lei de política

criminal, por fenómenos criminais e não por crimes, porque a tipologia criminal está no Código Penal e a lei de

política criminal aborda os fenómenos de criminalidade. Isso está muito bem, adotando, aliás, o que tinha sido

inovador na lei de política criminal de 2015-2017.

Mas, se é assim, se é de fenómenos que estamos a falar, queria chamar a atenção, muito brevemente, para

o artigo 15.º, que se refere ao crime de incêndio rural, crime que não existe. O que existe é o crime de incêndio

florestal, previsto no artigo 274.º do Código Penal.

Dito isto, Sr.ª Ministra, gostaria de dizer ⎯ subscrevendo o que disse o Sr. Deputado José Manuel Pureza

⎯ que não podemos ter 19 fenómenos criminais de prevenção prioritária, o que corresponde a 101 crimes, e 18

fenómenos criminais de investigação prioritária, o que corresponde a 114 crimes. O que isso significa, Sr.ª

Ministra, é que, na realidade, temos aqui quase uma cópia do Código Penal. Para isso, não precisamos da lei

de política criminal! Ao pegar no Código Penal e fazer disto um documento político, ao invés de fazer, como

devíamos, um documento de verdadeira orientação da política criminal, estamos a abdicar de usar este

instrumento para aquilo que ele serve.

Termino, Sr.ª Presidente, dizendo o seguinte: efetivamente, temos de poder ter a capacidade de abordar

estes instrumentos como instrumentos de orientação de política criminal e, sobretudo, instrumentos de natureza

pragmática.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. AndréCoelhoLima (PSD): ⎯ Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Com os meios atuais, com essas duas centenas de crimes de investigação e de prevenção prioritária, como

é que os órgãos de política criminal e os Srs. Magistrados do Ministério Público hão de determinar alguma coisa

como prioritária?

Vamos chegar à seguinte conclusão: quando tudo é prioritário, nada é prioritário.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Filipe, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. AntónioFilipe (PCP): ⎯ Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: O

PCP, em 2006, votou contra a aprovação da Lei n.º 17/2006, que está na origem desta proposta de lei, por

considerar que, num Estado que se pauta pelo princípio da legalidade no exercício da ação penal, este tipo de

diploma legislativo não faz qualquer sentido.

Foi essa a nossa posição e, de cada vez que discutimos na Assembleia da República a proposta que o

Governo apresenta para corresponder ao disposto nesta Lei n.º 17/2006, fica mais evidente que essa lei não faz

qualquer sentido.

De facto, a obrigação de o Governo apresentar uma proposta de lei para que a Assembleia da República

aprove uma lei para a definição de objetivos, prioridades e orientações em matéria de prevenção da

criminalidade, investigação criminal, ação penal, execução de penas e medidas de segurança não faz sentido.

Em matéria de prevenção, há mecanismos institucionais estabelecidos para a coordenação das várias forças

de segurança que têm a função de prevenção da criminalidade ⎯ existe o Secretário-Geral do Sistema de

Segurança Interna, existe o Conselho Superior de Segurança Interna, enfim, existem mecanismos institucionais

para esse feito.

Para a investigação criminal e ação penal, não nos passa pela cabeça que o Governo se intrometa em

matéria de investigação criminal. Trata-se de matéria das autoridades judiciárias, matéria para a Procuradoria-

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Geral da República e para o Ministério Público. Quanto à execução de penas e medidas de segurança, trata-se

de matéria judicial, matéria para os tribunais e execução de penas. Portanto, nada disto faz sentido.

O que aconteceu ⎯ é preciso dizê-lo ⎯ foi que se pretendeu, em 2006, aprovar uma lei contra o Ministério

Público. Foi essa a razão da lei de 2006: dar a entender que o Procurador-Geral da República responde perante

a Assembleia da República. Foi esse o sentido da lei de 2006 e a partir daí está tudo mal.

Portanto, o melhor serviço que se prestaria à Pátria seria propor a revogação da Lei n.º 17/2006. De facto, o

que temos aqui? Temos, como já foi dito por alguns Srs. Deputados, uma definição de prioridades que tem dois

efeitos perversos.

O primeiro é o de poder pensar-se que o que não é prioritário não se investiga. Num Estado que se rege pelo

princípio da legalidade só se investiga o que é prioritário? Obviamente que não, não se pode dizer isso.

O segundo é o poder pensar-se que, então, como não se pode dizer isso, tudo o que é crime grave tem de

ser prioritário. Bom, dá-se a ideia de colocá-los por ordem alfabética, dizendo-se, «se é tudo o prioritário, se não

há uns que sejam mais prioritários do que outros, até poderia apresentá-los por ordem alfabética». Não, não

podia, porque, depois, lá ia o terrorismo abaixo da habilitação para conduzir. Não pode ser!

Risos de Deputados do PSD e do BE.

Então, qual é a ordem? A ordem, Sr.ª Ministra, é mediática, e não deveria ser.

Mas eu diria que o problema não é desta proposta de lei.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. AntónioFilipe (PCP): ⎯ Concluo de imediato, Sr.ª Presidente.

O problema é o que está na origem, que é o facto de existir a Lei n.º 17/2006, que, do nosso ponto de vista,

não faz sentido nenhum e obriga-nos, a nós, a fazermos esta figura, que não é muito edificante nem para a

Assembleia da República nem para a política criminal em Portugal.

Aplausos do PCP e do Deputado do BE José Manuel Pureza.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia,

do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): ⎯ Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de

Estado: Sr.ª Ministra, efetivamente, como aqui foi dito mas não é novo ⎯ estava a trocar essa impressão com

os Srs. Deputados do Partido Social Democrata ⎯, lembro-me de, já em 2017, eu próprio lhe ter dito exatamente

que, no meio de tanta prioridade, é impossível escolher o que é efetivamente prioritário. Isso é uma verdade

absoluta a que nem as propostas anteriores desta lei nem a atual escapam, como foi aqui dito por vários grupos

parlamentares. Trata-se de uma verdade indiscutível.

Além disso, Sr.ª Ministra, gostaria de perguntar-lhe o seguinte: mesmo não tendo, provavelmente, refletido

toda a experiência anterior, como também foi aqui dito, será que, ainda assim, este documento tem, ou não, em

conta uma certa inversão de tendência que temos tido em matéria de criminalidade?

Essa inversão de tendência é particularmente evidente, inclusivamente, no último RASI. Não podemos

esquecer que temos um aumento da criminalidade violenta, que temos mais crimes, como o roubo, com 30% de

aumento, como o rapto ou sequestro, com perto de 25% de aumento, e que temos, sobretudo, como já tive

ocasião de lhe chamar à atenção, Sr.ª Ministra, mais crimes cometidos por gente cada vez mais jovem,

designadamente num contexto de delinquência juvenil ou de violência grupal.

Estas são preocupações reais, tanto mais que, tendo V. Ex.ª só ⎯ «só» é uma expressão ⎯ a tutela da

Polícia Judiciária e não tendo a tutela das forças de segurança propriamente ditas, temos esse aumento de

criminalidade sabendo que temos, ao mesmo tempo, menos polícias e que esse é um facto que, nalguns casos,

é, inclusivamente, percetível pelos próprios agentes criminosos. Ou seja, temos mais crimes e menos polícias e

mais crimes cometidos por gente mais nova.

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Parece-nos particularmente importante, neste contexto, e o CDS trouxe recentemente o tema a esta Câmara,

que os crimes cometidos contra os agentes das forças de segurança ⎯ a fórmula da lei é «contra» ou «por», o

que é correto, do nosso ponto de vista ⎯, sejam prioritários, quer em termos de prevenção, quer em termos de

investigação.

Isso é correto e não discutimos, mas perguntava-lhe se não entende que os crimes contra a autoridade

pública, no contexto de emergência sanitária ou de proteção civil, sendo de investigação prioritária, não deveriam

também ser considerados de prevenção prioritária. Os crimes cometidos contra agentes das forças de

segurança deveriam ser o objetivo essencial da política criminal, do nosso ponto de vista.

No meio deste quadro alargado, como dissemos, pergunto-lhe, ainda assim, Sr.ª Ministra, se o crime de

tráfico de estupefacientes sai dos crimes de prevenção prioritária e porquê. Não nos parece que faça muito

sentido.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): ⎯ Termino, Sr.ª Presidente, com uma concordância em matéria de apoio à

vítima e, designadamente, no apoio à vítima de violência doméstica. Também aqui propusemos os gabinetes de

apoio e, aí, estamos de acordo, havendo uma evolução que registamos e que é positiva.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada não inscrita

Cristina Rodrigues.

A Sr.ª CristinaRodrigues (N insc.): ⎯ Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Na proposta

hoje apresentada destacamos o reforço da proteção de vítimas especialmente vulneráveis, em particular no

caso dos crimes de violência doméstica ou dos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, com a

disponibilização de programas específicos de prevenção da reincidência e reforço do policiamento de

proximidade, em particular porque se trata de crimes que ainda se encontram bem presentes na nossa

sociedade.

Depois, gostaríamos também de mencionar a aposta no combate aos crimes contra o ambiente, a

consagração dos crimes de incêndio rural e de tráfico de espécies protegidas como crimes de investigação

prioritária.

Até agora, a prevenção e combate aos crimes contra o ambiente tem sido manifestamente insuficiente,

situação comprovada pela diminuição, de acordo com o RASI, de ações de fiscalização em 2019.

Esperamos que esta priorização seja uma realidade e que o Estado consiga, num País que todos os anos

tanto sofre com incêndios e com constantes danos ambientais, finalmente, responder de forma efetiva para a

defesa dos ecossistemas e da biodiversidade.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura,

do Chega.

O Sr. AndréVentura (CH): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra: Chegamos a um normativo que,

como já foi dito, nos apresenta dezenas ou, melhor, mais de uma centena de tipos de crimes. É o mesmo que

dizer que nada é prioritário em Portugal. Mas, mesmo assim, seria importante fazer um balanço daquilo que

tivemos.

Não costumo citar Deputados do Bloco de Esquerda, mas vou fazê-lo hoje. De facto, como disse o Sr.

Deputado José Manuel Pureza…

Risos do Deputado do BE José Manuel Pureza.

O Sr. JorgeCosta (BE): ⎯ Deixe estar, não é preciso!

O Sr. AndréVentura (CH): ⎯ Faz bem de vez em quando!

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Como perguntou o Sr. Deputado José Manuel Pureza, onde está o balanço do último normativo? É que, por

exemplo, um dos elementos que este normativo define é que os conselhos municipais de segurança e as forças

de segurança devem desenvolver programas específicos para este tipo de crimes de prevenção prioritária. Qual

é o balanço que fazemos disso? Qual é o balanço que fazemos do último normativo? Temos esses dados ou

não temos esses dados? Não percebemos bem.

O Sr. JoséMagalhães (PS): ⎯ Temos!

O Sr. AndréVentura (CH): ⎯ Por fim, gostaria de dizer-lhe também que, se houvesse alguma prioridade a

definir em Portugal, deveria ser o combate ao aumento da criminalidade violenta. Tivemos mais crimes sexuais

⎯ quase mais 2,8% no número de violações ⎯, tivemos mais carjacking, tivemos mais crimes contra as forças

de segurança. Isto deveria ser a nossa prioridade e não é, assim como a corrupção e os crimes de natureza

económica e fiscal. É que querer fazer tudo prioritário é não fazer nada prioritário.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. AndréVentura (CH): ⎯ Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Sr. Deputado António Filipe, então, não concebe que o poder democrático estabeleça orientações à política

criminal? Não temos recursos escassos?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. AndréVentura (CH): ⎯ Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Num mundo em que os recursos policiais são escassos, não pode o poder democrático dizer o que é mais

importante e o que não é? Será que está tudo igual, em pé de igualdade, no mundo em que vivemos?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para encerrar este debate, o Sr. Secretário de Estado

Adjunto e da Administração Interna, Antero Luís, que aproveito para cumprimentar.

O Sr. SecretáriodeEstadoAdjuntoedaAdministraçãoInterna (Antero Luís): ⎯ Sr.ª Presidente, Srs.

Deputados: De facto, as prioridades podemos discuti-las, mas esta lei não é exatamente a antiga lei e vou

apenas salientar alguns aspetos que penso que merecem ser salientados.

Desde logo, as diretivas do Procurador-Geral da República podem ser territorialmente delimitadas, e

delimitadas no tempo; em segundo lugar, o papel dos conselhos municipais de segurança passa a existir na lei,

o que não acontecia no passado; em terceiro lugar, nos DIAP (Departamentos de Investigação e Ação Penal)

são criadas secções especializadas no âmbito da violência doméstica; em quarto lugar, há programas

específicos no sentido de evitar a reincidência, em casos de violência doméstica; em quinto lugar, os programas

especiais de prevenção da reincidência são alargados a todo o território nacional, coisa que não existia no

passado, havendo apenas em alguns estabelecimentos prisionais.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. SecretáriodeEstadoAdjuntoedaAdministraçãoInterna: — Mas há mais novidades.

Não podemos esquecer que, na antiga lei, não estavam previstas as equipas mistas de prevenção, no âmbito

do Secretário-Geral, que voltam, agora, a estar na lei, como já estiveram no passado.

Alarga-se, por outro lado, o âmbito da recuperação de ativos. Se repararem, está lá não apenas aquilo que

consta do Gabinete de Recuperação de Ativos, alargando-se antes a todas as situações do Código Penal e em

relação a todos os tipos de criminalidade. Portanto, diria que a lei não é exatamente a mesma.

Podemos discutir os crimes. De facto, são muitos crimes prioritários, é verdade. Mas perguntaria, olhando

para eles, quais seriam os que seriam excluídos. Quais é que seriam?

O Sr. José Magalhães (PS): — O que é que propõem?!

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O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna: — É que não podemos esquecer, Srs.

Deputados, que o que está em causa é atribuir prioridade na investigação, no julgamento e na decisão nos

tribunais superiores.

Outra novidade, que não existia na anterior lei, é que agora o processo é uno, do princípio ao fim. A prioridade

já não se limita ao inquérito, vai até ao Supremo Tribunal de Justiça. Portanto, não diria que a lei é a mesma.

Poderão ser muitos os crimes que estão nas prioridades, mas está lá também a questão dos estupefacientes,

no artigo 4.º, alínea b).

O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna: — De facto, podemos discutir isso, mas

a realidade que temos, dos Relatórios Anuais de Segurança Interna, incide exatamente, do ponto de vista da

sua problemática, sobre estes crimes e não sobre outros. Portanto, se é sobre estes crimes, diríamos que

definimos — temo-lo repetido —, de dois em dois anos, a prioridade dos crimes.

Mas mesmo aí há realidades novas. Alguns destes crimes, e são vários, não estavam na última lei. Tal

significa que não se faz um copy/paste nem se ordenam os crimes por ordem alfabética. Não é isso,

manifestamente. É, antes, feita uma análise das tendências da criminalidade, com base nos dois Relatórios

Anuais de Segurança Interna e na avaliação feita ao nível europeu, e, com base nesta informação, são

estabelecidas as prioridades.

Houve ainda a preocupação, do ponto de vista da execução da lei, de estabelecer mecanismos que a tornem,

de facto, mais eficaz; daí estas novidades que referi e que não existiam no passado.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. SecretáriodeEstadoAdjuntoedaAdministraçãoInterna: — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Estou convencido de que estas melhorias, obviamente, trarão uma melhor execução da lei.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos ao sétimo ponto da nossa ordem do dia, com a discussão,

na generalidade, da Proposta de Lei n.º 49/XIV/1.ª — Promove a simplificação de diversos procedimentos

administrativos, incluindo das autarquias locais, e introduz alterações ao Código do Procedimento

Administrativo.

Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública,

Alexandra Leitão, a quem cumprimento.

A Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública (Alexandra Leitão): — Sr.ª

Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Uma realidade que a crise que vivemos tornou evidente foi a da

importância de uma Administração Pública simultaneamente robusta e ágil, capaz de dar reposta rápida a novos

desafios.

Depois do confinamento imposto pela pandemia de COVID-19 e do consequente abrandamento da atividade

económica, torna-se agora imperativo garantir uma maior celeridade dos procedimentos administrativos, como

forma de permitir a realização de investimento público e privado.

No âmbito do Programa de Estabilização Económica e Social, o Governo vem propor um regime excecional,

ultra-simplificado, de procedimentos da Administração Pública que deverá vigorar até ao final deste ano.

Assim, a proposta que hoje se discute determina a realização de conferências procedimentais deliberativas,

com vista à emissão simultânea de todos os pareceres e atos administrativos necessários à prática dos atos

finais em procedimentos complexos que envolvam várias entidades administrativas.

Esta regra aplica-se também aos procedimentos que envolvam, conjuntamente, entidades da administração

direta e indireta do Estado e das autarquias locais ou entidades intermunicipais, através da realização de

conferências procedimentais periódicas, no âmbito das comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas,

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competindo a convocação das mesmas ao presidente da respetiva comissão de coordenação e desenvolvimento

regional (CCDR).

A presente proposta de lei introduz, ainda, alterações pontuais ao Código do Procedimento Administrativo,

no sentido de esclarecer alguns aspetos relativos a prazos, incluindo um encurtamento dos prazos de decisão

da Administração Pública, bem como adequar algumas normas à generalização da utilização dos meios

telemáticos, numa ótica de celeridade e simplificação administrativa.

Nesta matéria, o que se visa é adequar a atuação da Administração à realidade atual, aproveitando a

tecnologia para garantir respostas mais eficazes.

Pretende-se que a simplificação a aprovar na presente proposta de lei se traduza em ganhos de tempo de

análise de processos, bem como em ganhos de emprego e de recursos, permitindo uma diminuição indireta de

custos para todos os intervenientes, designadamente para os particulares e as empresas, que são os

destinatários da ação administrativa.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — A Mesa não regista, para já, inscrições de nenhum grupo parlamentar.

Peço aos diferentes grupos parlamentares que se inscrevam, para não haver perdas de tempos.

Pausa.

Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei

do Governo assume o propósito de adaptar o procedimento administrativo às contingências da crise sanitária.

Como o Governo afirma no Programa de Estabilização Económica e Social, estamos a falar de um «Simplex

SOS», que é bem urgente, nomeadamente no que diz respeito à adaptação do Código do Procedimento

Administrativo à nova realidade de reuniões à distância, trazida pelo contexto que vivenciamos.

Também a previsão generalizada da possibilidade de os órgãos da Administração Pública poderem reunir

por via de meios telemáticos traz, obviamente, mais segurança, evita que tenhamos de voltar a aprovar

legislação ad hoc no caso de a situação epidemiológica se vir a agravar, e, acima de tudo, permite que as

recomendações da DGS, no que diz respeito ao distanciamento social, se possam continuar a aplicar na

Administração Pública.

Por outro lado, parece-nos também positiva a previsão legal da possibilidade de, até ao final do ano, as

entidades públicas poderem recorrer à figura das conferências procedimentais.

Consideramos que estamos, assim, a assegurar, dentro do quadro legal aplicável, decisões administrativas,

coordenação entre entidades públicas e, acima de tudo, uma agilização do procedimento administrativo, que o

tornará, em simultâneo, mais económico.

Estamos a falar da instituição de um mecanismo inspirado no ordenamento jurídico italiano e que está

previsto na lei desde 2015, mas que, desde essa data, raramente tem saído do papel. Com esta proposta do

Governo, que acompanhamos, dá-se um impulso derradeiro a esta figura, que poderá ser útil para uma boa

administração e, ainda, para um melhor procedimento administrativo.

Gostaríamos, no entanto, de sublinhar que o prazo de vigência desta figura nos parece demasiado curto,

uma vez que dificilmente as entidades públicas conseguirão adaptar-se em tão curto período a este modelo,

pelo que apelamos ao Governo para que seja feito um redobrado investimento para garantir a aplicação do seu

funcionamento, senão corremos o risco de não o ver sair do papel.

Numa nota final, para sublinhar que consideramos, também, positiva a previsão de um mecanismo de

monitorização e avaliação da aplicação desta lei, pois tal, obviamente, permitirá perceber como a mesma corre

e corrigir o que houver a corrigir.

Deixamos à Sr.ª Ministra um desafio, no sentido de que garanta que o Parlamento tem acesso a estes dados

de monitorização e respetiva avaliação, para que possamos também fazer o nosso papel naquilo que houver a

propor com vista à melhoria funcionamento desta figura.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Cancela

Moura, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. José Cancela Moura (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Para o

PSD, são imperativas a modernização e a digitalização da Administração Pública, de modo a dar uma resposta

mais célere e eficaz aos cidadãos e às empresas. Mas o Governo simplificou tanto esta iniciativa que a proposta

de lei quase não era um diploma. Se fosse um requerimento, os serviços teriam dificuldade em aceitá-lo; se

fosse uma guia tributária, a repartição não a podia liquidar; e se fosse uma petição no tribunal, presumo que

mereceria despacho de indeferimento liminar.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, não está em causa a bondade da simplificação de procedimentos, mas,

depois de ter passado o confinamento, depois de reabrirem os serviços públicos, depois de retomada a

normalidade possível dos serviços, qual é a razão desta emergência do Governo para, neste momento, substituir

pareceres ou pronúncias obrigatórias por conferências, para substituir regimes de licenciamento por

comunicações prévias e para substituir decisões presenciais pela tramitação eletrónica de procedimentos? Estas

são explicações que cabe ao Governo dar, aqui e agora.

Por outro lado, esta iniciativa deu entrada na Assembleia da República no passado dia 1, foi distribuída à

comissão competente no dia 7 e dois dias depois é discutida em Plenário sem pareceres obrigatórios e sem

nenhum estudo ou decisão que a fundamente, em clara violação dos requisitos formais e regimentais. Não se

compreende nem se alcança esta pressa de legislar.

Portanto, tirando os regulamentos municipais e os estudos de impacto ambiental, todos os outros

procedimentos — por exemplo, os licenciamentos de obras particulares — poderão ser decididos através de

meios telemáticos e em conferência procedimental. Mas este «Simplex SOS», como o Governo lhe chama, em

vez de facilitar, poderá complicar a vida dos cidadãos.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, estranhamos que o direito de audiência prévia dos interessados seja

exercido oralmente e na mesma sessão em que estarão presentes todos os órgãos participantes.

Estranhamos também que a falta de poderes de quem representa uma entidade participante para decidir seja

equiparada a uma ausência, mas, simultaneamente, seja considerada para efeitos de verificação do quórum de

funcionamento.

Estranhamos ainda que, no âmbito de um procedimento que envolva entidades participantes de uma única

autarquia local, em concreto, e da administração, direta ou indireta, seja um ente terceiro a esta relação,

nomeadamente o presidente da CCDR, a convocar a conferência.

Estes equívocos serão lapsos de redação legislativa ou intenções expressas do Governo? Convém que o

Governo e a Sr.ª Ministra o esclareçam, aqui e agora.

Esta crise sanitária mostrou à evidência a necessidade de aumentar o contributo das novas tecnologias para

simplificar procedimentos. Mas a adoção de uma solução tão precipitada quanto esta, para nos salvar da

pandemia, terá de ser corrigida para não nos colocar num verdadeiro pandemónio.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. José Cancela Moura (PSD): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Está, pois, na mão do Governo garantir o êxito, a procedência ou a improcedência desta iniciativa.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles,

do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: O objetivo desta proposta de lei é a simplificação de procedimentos. Quanto ao objetivo, estamos

completamente de acordo. Tenho é algumas dúvidas de que este objetivo de simplificação e de agilização de

procedimentos se consiga com este projeto. Portanto, creio que, em sede de especialidade, terá de haver um

trabalho bastante rigoroso.

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Há algumas dúvidas, contudo, que gostaria de esclarecer já, em discussão na generalidade.

A simplificação de procedimentos é um objetivo que existe independentemente da pandemia. É

absolutamente necessário e foi já adiado muitas vezes. Portanto, a primeira dúvida que gostaria de esclarecer,

e que me parece mais pertinente, é porque é que o Capítulo II, «Simplificação de Procedimentos», é meramente

temporário. Por que é que está previsto que ele dure apenas durante uns meses?

O que era, aqui, essencial — e é mencionado o facto de esta medida estar dentro do Programa de

Estabilização Económica e Social — era, precisamente, que as medidas que podem ser tomadas, sobretudo

aquelas que podem ser tomadas sem custos orçamentais e que melhoram a vida dos portugueses e agilizam a

economia, fossem já tomadas.

Não consigo perceber por que é que uma parte da simplificação só há de funcionar durante uns meses. Além

disso, se estamos a falar de alguma emergência de saúde pública, não percebo, francamente, por que é que

ela se faz sentir agora, na fase de estabilização, e não existiu na fase de emergência.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Claro!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Isto não tem sentido e tem de ser muito bem explicado. Começa a ver-

se um padrão que acho particularmente preocupante. É que, quanto à contratação pública, também se diz que

é objetivo do Governo simplificá-la. Percebo que, com concurso público que demora um ano, seja difícil fazê-la

deste modo, mas o que também se percebeu nesse regime é que, depois, há três ou quatro exceções: se é para

habitação, já não há as mesmas regras; se é para aplicar fundos europeus, já não há as mesmas regras…

Se chegamos à conclusão de que as nossas regras são demasiado complexas, então, se calhar, faz sentido

fazer um trabalho que seja mais aprofundado mas que, de uma vez para sempre, as simplifique, ao invés de

andarmos constantemente a criar remendos e, depois, a criar regimes excecionais.

Termino salientando a importância de sermos muito cuidadosos com a criação de regimes excecionais.

Continuamos a atravessar uma fase de pandemia, mas já passámos a fase de emergência e Portugal é um País

com um problema de desconfiança em relação ao poder público e, designadamente, em relação à seriedade

com que as decisões são tomadas. A visão da esmagadora maioria dos portugueses é a de que há, sim,

corrupção na tomada de decisão pública e na contratação pública. A criação de regimes excecionais prolonga

um estado de desconfiança e gera sobre quem toma estas decisões uma suspeição que não é saudável para

rigorosamente ninguém, nem para a forma de exercício do poder público, nem para a sociedade em geral.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, do

Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste

período que vivemos já há alguns meses, consideramos, de facto, necessário que não haja uma obstaculização

aos procedimentos da Administração Pública para que um conjunto de processos se possa desenvolver e

continuar, de forma a que não fiquem parados e por isso haja atrasos. Por isso, compreendemos, neste contexto

e nestas circunstâncias, a proposta trazida pelo Governo, que propõe a simplificação de um conjunto de

procedimentos, criando esta figura da conferência, procurando uma agilização.

Há, no entanto, nesta proposta, um conjunto de aspetos que nos trazem preocupações, sobre os quais

queríamos falar. É que a proposta prevê, também, um conjunto de alterações a título definitivo no Código do

Procedimento Administrativo. Estas alterações são consequência destes tempos que vivemos, mas pareceu-

nos que algumas destas matérias exigiriam mais alguma cautela na sua elaboração e na sua proposição, porque

uma coisa é, em tempos excecionais, admitirmos medidas excecionais para que a Administração Pública

funcione e outra é tornar permanente aquilo que deve ser excecional.

Não quero, com isto, dizer que algo nos move contra a utilização de tecnologias para a melhoria da eficiência

da Administração Pública, mas, por exemplo, queria salientar um dos aspetos que esta proposta traz, sobre o

qual, em particular, temos dúvidas, relativamente ao funcionamento das instituições. A dada altura, propõe, na

alteração ao artigo 29.º do Código do Procedimento Administrativo, que os órgãos colegiais só podem deliberar

quando a maioria do número dos seus membros com direito a voto estiver fisicamente presente ou a participar

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através dos meios telemáticos. Ou seja, o poder de voto passa também a poder ser exercido à distância e não

presencialmente.

Em órgãos colegiais, isto gera-nos preocupações e dúvidas. Podemos, no limite, ter, num órgão colegial, dois

membros presentes e todos os restantes membros à distância. O facto de o poder de voto poder ser exercido

desta forma, de acordo com a proposta que o Governo traz, confesso que, para o PCP, não nos parece a solução

mais adequada, tendo até em conta que, neste caso concreto, já não se trata de uma medida excecional mas,

sim, de uma proposta que o Governo traz para ficar presente no Código do Procedimento Administrativo de uma

forma definitiva.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Paulo

Ferreira, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Fernando Paulo Ferreira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da

Administração Pública, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta

o Governo ao Parlamento uma proposta de lei que visa a simplificação administrativa de procedimentos em que

intervenham diversas entidades públicas, procurando agilizar e tornar obrigatórias reuniões de articulação e de

decisão, com possibilidade de recurso a videoconferência, sobretudo nos casos em que há diversos pareceres

e pronúncias a obter até ser tomada a decisão final. Esta proposta institui mesmo, no caso das autarquias locais

e das entidades intermunicipais, conferências procedimentais periódicas, competindo a sua convocação regular

ao presidente da respetiva CCDR.

Este regime simplificado, inserido no esforço de modernização sempre em curso da Administração Pública,

resulta também do Programa de Estabilização Económica e Social e arranca numa fase experimental até

dezembro deste ano, podendo ser continuada, depois de devidamente avaliado o seu impacto.

À partida, a expectativa é grande, sobretudo por parte dos particulares que viram os procedimentos em que

estavam interessados suspensos ou atrasados, por via da COVID-19, ou porque simplesmente aguardam

pareceres de entidades diferentes, cuja velocidade de decisão é, por vezes, muito díspar.

Quanto ao recurso à videoconferência para a realização das reuniões, a sua determinação é perene,

resultando já da experiência positiva que muitas entidades públicas já implementaram no terreno, nestes últimos

meses. Já hoje, no Plenário, tivemos oportunidade de discutir a continuidade da realização das reuniões dos

órgãos autárquicos, através de meios telemáticos.

Faz, por isso, bem o Governo em aproveitar as novas tecnologias para tornar mais eficazes os serviços

públicos e facilitar a vida aos cidadãos.

Os anos de experiência e de bons resultados do programa Simplex, entre outros, e a capacidade

demonstrada pelos poderes central e local em adaptar-se a novas formas de trabalhar e de decidir dão-nos a

expectativa de que este caminho veio para ficar.

Aos cidadãos e empresas que verão os procedimentos administrativos em que têm interesse mais agilizados,

é-lhes proporcionada maior dinâmica e confiança, sendo esta, ao fim e ao cabo, a melhor forma de rapidamente

injetarmos energia na sociedade, tão necessária para a fase de recuperação económico-social que todos

desejamos.

Contará, pois, o Governo, por isso, com o apoio do Grupo Parlamentar do Partido Socialista em mais esta

sua iniciativa.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do

Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e

da Administração Pública: O normativo que nos traz peca essencialmente por ser tardio, porque, de facto, um

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dos grandes problemas com que empresários e a sociedade civil se depararam ao longo dos últimos meses foi

com a excessiva burocracia, a excessiva demora por parte do Governo em acudir-lhes quando mais falta fazia.

Em todo o caso, há dúvidas que têm de ser esclarecidas, como, por exemplo, o facto de os pareceres

obrigatórios serem substituídos por conferências. Como é que o vamos fazer sem precludir a lei geral e a lei

fundamental?

Diz coisas redundantes, como esta: para haver uma votação, tem de estar presente a maioria do número

legal de membros, em princípio. Bom, claro que, em princípio, tem de estar presente a maioria do número legal

de membros. Mas mais preocupante é dizer que tem de haver, agora sim, um prazo máximo para pareceres. A

nova lei diz que são 20 dias. Mas quais são as consequências se isso não acontecer? Não sabemos.

Mais: diz que os procedimentos de iniciativa particular têm de estar terminados ao fim de 60 dias. Muito bem.

Quais são as consequências se isso não acontecer? Também não sabemos.

Por isso, é uma lei redundante que vai trazer, de facto, muito pouco em termos de simplificação, que levanta

questões jurídicas mais profundas do que aquelas que resolve e que peca por tardia no objetivo fundamental.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Ou seja, falha no essencial, confunde o acessório e transita ainda mais confusão sobre os aspetos que podia

resolver.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para encerrar o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Modernização

do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão.

A Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública: — Sr.ª Presidente, Srs.

Deputados: Acho que devemos, então, entender-nos. É uma lei demasiado simplista que peca por tardia, ou é,

pelo contrário, uma lei, como também foi dito, que atropela os direitos dos administrados? Ou, então, se calhar,

queremos é mesmo uma lei que seja ela própria tão complicada, tão complicada, que ninguém a perceba. Mas

vamos, então, resolver várias das questões que foram colocadas.

Os Srs. Deputados André Ventura e Cancela Moura não leram bem, quando disseram que os pareceres

obrigatórios ficavam prejudicados, porque não ficam! O n.º 2 do artigo 6.º da Lei diz que, quando o parecer for

obrigatório, é necessário que a entidade que emite o parecer obrigatório se pronuncie favoravelmente na

votação. Portanto, o que é obrigatório e vinculativo continua a ser obrigatório e vinculativo.

Da mesma maneira, também se diz que, quando não se possa estar presente, isso não prejudica o quórum,

porque não podemos ter uma situação em que, por falta de quórum, as coisas não avancem, mas também se

diz que é preciso que esteja presente quem tem de emitir estes pareceres.

Garanto-vos que nem na parte ultrassimplificada, nem na alteração ao CPA os administrados perdem

qualquer tipo de garantias. Se virem com atenção, os únicos prazos que são mexidos no CPA são os da

Administração, para encurtar os da Administração.

Há várias normas que até dão mais garantias aos administrados. Por exemplo, em matéria de instrução do

procedimento, onde, antes, se dizia que só o que era público e notório é que não carecia de prova pelo particular,

agora diz-se que também não carece de prova pelo particular tudo aquilo que a Administração possa obter

sozinha. Toda a gente enche a boca a dizer que a Administração não tem de pedir aos particulares o que já

detém, mas quando alguém quer fazer uma alteração ao CPA nessa matéria alguma coisa, ao que parece,

confunde os aqui presentes.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública: — Tenham em atenção o

seguinte: o mecanismo ultrassimplificado tem uma duração mais curta para ser monitorizado, exatamente para

ver como corre.

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As conferências procedimentais não são nada de novo, existem no CPA desde 2015. A audiência prévia oral

dos interessados, Sr. Deputado, simplesmente remete para o artigo 80.º do CPA, que é a lei geral. Portanto,

nessa matéria, nem inovámos.

Protestos do Deputado do PSD José Cancela Moura.

Dito isto, é um diploma importante para que as consequências económicas da pandemia possam ser

respondidas.

Quando a Administração quer ser célere, que não seja a Assembleia da República a não deixar.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Aproveito para me despedir da Sr.ª Ministra.

Passamos ao ponto 8 da nossa ordem do dia, que trata da discussão, na generalidade, da Proposta de Lei

n.º 48/XIV/1.ª (GOV) — Estabelece o regime fiscal das entidades organizadoras da competição UEFA

Champions League 2019/2020 Finals e prorroga a isenção de imposto sobre o valor acrescentado nas

transmissões e aquisições intracomunitárias de bens necessários para o combate à doença COVID-19.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais, António

Mendonça Mendes.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:

A proposta de lei que trazemos à apreciação da Assembleia da República trata de duas matérias.

Por um lado, prorrogar a isenção de IVA (imposto sobre o valor acrescentado) das aquisições

intracomunitárias de equipamentos destinados ao combate à COVID-19. Trata-se de uma medida que Portugal

adotou na sequência da decisão da Comissão Europeia e que visa criar esta mesma medida para as

importações. Por isso, com base no princípio da neutralidade, que é um princípio básico do IVA, na aceção da

não distorção da concorrência, achámos que, também nas aquisições intracomunitárias, deveríamos tomar essa

iniciativa, que foi aprovada pela Assembleia da República e que terminou no dia 30 de junho. Uma vez que foi

prorrogada pela Comissão Europeia para 31 de outubro, é essa a proposta que trazemos à Assembleia da

República.

Por outro lado, trazemos uma proposta relativa ao regime fiscal da realização, em Portugal, da final da

Champions, organizada pela UEFA (União das Associações Europeias de Futebol).

Sr.as e Srs. Deputados, trata-se de um evento desportivo da maior importância, um evento transmitido para

todo o mundo, um evento acompanhado por milhões de pessoas. À semelhança do que aconteceu noutras

circunstâncias idênticas, criámos um regime fiscal que assegura, em primeiro lugar, a uniformidade no

tratamento dos organizadores e participantes, sejam eles de que país for; em segundo lugar, a reciprocidade na

aplicação da medida fiscal que beneficia os clubes portugueses que também participam em competições da

UEFA; e, em terceiro lugar, a simplificação de procedimentos na aceção da aplicação de mecanismos de

eliminação das convenções para evitar a dupla tributação. Trata-se, por isso, de um regime fiscal que já foi

adotado em Portugal mais do que uma vez, é adotado noutros países quando se organiza este tipo de

competições e permitam-me mesmo que diga, Sr.as e Srs. Deputados, que a realização deste evento no contexto

atual torna-se ainda mais importante para promover e projetar a imagem do nosso País. Todos estamos

empenhados em que o País recupere rapidamente a atividade económica.

Fico à disposição dos Srs. Deputados para responder às questões que entenderem.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço aos Srs. Deputados dos diferentes grupos parlamentares que se

inscrevam para intervir, pois tenho apenas uma inscrição da Sr.ª Deputada Lina Lopes, do PSD.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A atribuição a

Portugal da responsabilidade da organização da final da competição da UEFA, a decorrer em agosto, em Lisboa,

com a possibilidade da realização de alguns jogos no Porto e em Guimarães, é algo que o PSD considera

positivo quer para a promoção da imagem do País, quer, em particular, para a visibilidade das cidades que os

recebem.

Esperemos que os benefícios obtidos neste evento justifiquem e ultrapassem largamente as perdas que

resultam das vastas isenções de impostos que o Governo se propõe conceder a não residentes de Portugal,

como moeda de troca para a realização da referida competição.

Num País tão dependente de investimento estrangeiro, estas isenções de impostos aceites de forma

instantânea pelo Governo quando instado pelo mundo do futebol contrastam vivamente com a perceção

reiterada pelos investidores nacionais e estrangeiros de que o sistema fiscal é extremamente injusto e um

obstáculo à competitividade do País. Parece que tudo se torna muito simples quando é o futebol, o todo-

poderoso, a exigir isenções de impostos!

Srs. Deputados, é bem conhecida a nossa extrema dependência do turismo, hoje cada dia mais preocupante,

para a qual o PSD tem vindo a alertar, com as consequências na precariedade e no nível salarial do emprego,

que torna a estrutura da nossa economia cada vez mais semelhante à de um país não europeu.

Com a atual crise pandémica, a recuperação da confiança dos turistas não vai acontecer de imediato e por

isso, a curto prazo, impõem-se incentivos ao desenvolvimento dos mercados locais do turismo, ou seja, aos

residentes em Portugal.

Assim, as isenções concedidas a residentes no estrangeiro, que o Governo é tão célere a aprovar para a

UEFA, opõem-se às não isenções e à carga brutal de impostos que os residentes são obrigados a suportar.

Por outras palavras, o Governo deve explicar o racional e a legitimidade de tamanhas isenções de impostos

perante uma população esmagada pela gigante carga fiscal defendida pelo mesmo Governo e pelos seus

apoiantes, hoje intermitentes, mas ainda assim solícitos, da esquerda parlamentar.

Srs. Deputados, os trabalhadores das empresas residentes em Portugal poderão sentir-se defraudados pela

facilidade com que o Governo se apressa a isentar de impostos tão vasto número de não residentes, os quais

não consta que passem por dificuldades comparáveis às dos residentes em Portugal.

Este Governo impôs a maior carga fiscal de sempre…

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Bem lembrado!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — … e é lamentável que não tenha tido com as famílias e com as empresas

portuguesas a mesma atenção e sensibilidade que manifesta agora, por ocasião deste evento desportivo, com

os não residentes.

Esperemos, pois, que tudo seja feito para que o retorno desta atividade desportiva corresponda ao desejado.

É fundamental que neste evento todos os intervenientes respeitem as regras sanitárias decorrentes da COVID-

19. Isto exige por parte da DGS e das autoridades uma atuação bem mais eficaz do que aquela que, infelizmente,

se tem observado nos últimos tempos.

Por isso, pergunto: o Governo tomou ou vai tomar medidas específicas para estas competições de forma a

assegurar a saúde pública e evitar o surto epidémico?

Uma última nota para dizer que acompanhamos e saudamos a segunda vertente desta proposta de lei, que

estende até dia 31 de outubro a isenção de IVA para as transmissões e aquisições intracomunitárias de bens

necessários para combater os efeitos do surto de COVID-19.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de

Figueiredo, da Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Acho

que nem preciso do «minuto liberal» inteiro para vos dizer que não contem com a Iniciativa Liberal para aprovar

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um regime fiscal favorável para certas entidades estrangeiras como a UEFA, enquanto os portugueses

continuam a ter de viver sob o peso de uma carga fiscal recorde, ainda por cima em tempo de crise.

Uma coisa é evitar eventuais duplas tributações de prémios ou rendimentos, isso pode fazer sentido quando

o retorno económico do evento o justifica, o que nem sequer é este o caso porque é pouco provável que, não

havendo público nos estádios, o retorno exista.

Outra coisa, bem diferente, é atribuir esta isenção de forma desigual. Uma empresa de segurança contratada

no estrangeiro por alguma das equipas fica isenta de impostos, se contratar a empresa de segurança portuguesa

cá paga imposto. Ou estão todas isentas ou nenhuma está!

É mais um caso, como vários, que a Iniciativa Liberal tem denunciado de um país, dois sistemas. Não é novo!

Enquanto os portugueses têm várias e altas taxas de IRS, os não residentes têm uma única taxa de 20%;

enquanto os portugueses têm de pagar impostos, os partidos políticos estão isentos dos mesmos. Agora pedem

que este triste espetáculo passe para o futebol, usado pelos políticos do sistema para distrair o povo perante o

pandemónio da pandemia!

Nós, liberais, defensores acérrimos da igualdade perante a lei, mostraremos o «cartão vermelho» a esta

proposta.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do

Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, o Governo anunciou que a Champions era um prémio para

os profissionais de saúde. Afinal, ficamos a saber que é, sobretudo, um prémio para os organizadores da final

da Champions, porque, para além da Supertaça Europeia, temos também todos os organizadores isentos de

impostos quer em sede de IRS, quer em sede de IRC (imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas). Os

mesmos que têm em Portugal das mais elevadas taxas da Europa são agora isentados por uma organização

específica.

Mas, Sr. Secretário de Estado, há uma questão que quero saber, mas que não tem a ver com a fiscalidade:

esta isenção foi, ou não, uma exigência da UEFA para trazer a Champions para Portugal? É isto que os

portugueses querem saber. A isenção foi, ou não, uma imposição feita a partir da sede da UEFA para que a

Champions se realizasse em Portugal? É que nem sequer se compreende bem como é que uma isenção deste

tipo se aplica apenas a não residentes em Portugal, ou seja, os mesmos organizadores — equipa médica,

pessoal de segurança, equipas profissionais desportivas — se forem residentes em Portugal têm de pagar

impostos, mas se forem residentes fora já não pagam impostos beneficiando da isenção.

Perguntamos, por isso, se o Governo está disposto a fazer esta alteração. Era, pelo menos, o mínimo de

justiça que se poderia fazer a um País que já paga a maior carga fiscal da Europa.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Sobretudo, queria perguntar ao Sr. Secretário de Estado, porque esta questão é particularmente importante,

o seguinte: a isenção foi, ou não, uma exigência da UEFA para trazer a Champions para Portugal?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brás, do

Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Carlos Brás (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta

de lei, apresentada pelo Governo, tem um duplo objetivo, sendo um a criação de um regime fiscal temporário

aplicável às entidades organizadoras e participantes na competição Champions League Finals 2019/2020 e o

outro a alteração do prazo previsto no artigo 5.º da Lei n.º 13/2020, de 7 de maio.

Quanto à criação do regime fiscal das entidades organizadoras da competição UEFA Champions League

2019/2020, devo referir que corresponde ao habitual em situações análogas…

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Não é nada habitual!

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O Sr. Carlos Brás (PS): — … e consiste na criação de um regime especial de isenção em sede de IRC e

IRS para os rendimentos obtidos em território português pelos intervenientes nesta competição, sejam

organizadores, associações, clubes de futebol, jogadores ou, até, os técnicos. É idêntico ao criado aquando da

realização em Portugal do Euro 2004 e das finais da UEFA Champions League e UEFA Women’s Champion

League 2013/2014.

É, portanto, uma isenção fiscal temporária, parcial e dedicada a um evento e é uma condição habitual da

UEFA solicitar esta isenção aos países que organizam as finais.

Para que fique claro que não se trata da criação de um benefício fiscal novo e direcionado para o futebol,

convém ter noção de que, estando em questão instituições e intervenientes maioritariamente estrangeiros e

europeus, eles próprios já teriam direito a esta isenção por via das convenções para evitar a dupla tributação. O

que este diploma vem fazer é uma simplificação de procedimentos e evitar a necessidade de se invocar essas

convenções e serem acionados os referidos benefícios. Além de mais, é habitual em todas as finais que a UEFA

promove em todos os países.

A escolha de Portugal para organizar este que é o maior evento desportivo europeu é um motivo de orgulho

para todos os portugueses, reforça o prestígio internacional de Portugal e posiciona-nos, mais uma vez, no

mercado de eventos de grande projeção mediática. Esta é, portanto, uma proposta adequada, justificada,

razoável e proporcional.

A outra componente da presente proposta, que tem a ver com a isenção de IVA para as transmissões e

aquisições intracomunitárias de bens, vem alterar o prazo que estava estipulado inicialmente, até 31 de julho,

para a aquisição de material e equipamento de proteção destinados ao combate ao surto de COVID-19. É bom

que se refira que este material se destina a ser distribuído gratuitamente e, por isso mesmo, vai beneficiar de

uma isenção nas aquisições e transmissões intracomunitárias, acompanhando o que a Comissão Europeia

decidiu através da Decisão n.º 2020/491.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo

apresenta uma proposta de lei que estabelece um regime fiscal específico para a fase final da UEFA Champions

League, isentando do pagamento de IRS e de IRC os rendimentos auferidos pelas entidades organizadoras dos

eventos, pelas associações dos países e pelos clubes desportivos e respetivos jogadores, bem como pelas

equipas técnicas participantes nos mesmos, que não sejam considerados residentes fiscais em Portugal.

Há, pelo menos, três antecedentes desta situação: o primeiro, estabelecido no Orçamento do Estado para o

ano de 2000, relativo às entidades organizadoras do Euro 2004; o segundo, referente a duas finais de

competições da UEFA, que tiveram lugar em Lisboa, em 2014; e o terceiro, relativo à final da Taça das Nações

em 2019, não foi assim há tanto tempo.

Em todas estas situações, o PCP absteve-se e suscitou um conjunto de questões, que a realidade tem

demonstrado que precisam de encontrar uma resposta de forma consistente.

Para além da justificação baseada nos compromissos assumidos com a UEFA — é a justificação que está

na exposição de motivos da proposta de lei —, o que justifica que se crie esta isenção, quando os códigos

tributários estabelecem explicitamente que estão sujeitos ao pagamento de imposto os rendimentos derivados

do exercício, em território português, da atividade de profissionais de espetáculos ou desportistas?

Por que motivo se opta por isentar apenas os eventos de determinada modalidade desportiva e, dentro dessa

modalidade, apenas um evento concreto e não todos os eventos similares de todas as modalidades desportivas?

Por que motivo se opta por isentar atividades desportivas e se excluem as atividades de profissionais de

espetáculos, apesar de os Códigos do IRS e do IRC tratarem estas atividades em pé de igualdade?

Por que motivo sucessivos Governos vão legislando à peça, em vez de proporem um regime geral de

isenções que abarque quer eventos desportivos, quer de profissionais de espetáculos considerados

especialmente relevantes para o País?

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São questões que colocámos em 2000, em 2014, em 2019 e que mantêm toda a pertinência.

Estamos disponíveis para fazer esse debate, mais abrangente, que permita encontrar soluções que garantam

mais justiça e equidade fiscais, sem que haja discriminações entre modalidades desportivas e entre eventos

desportivos e eventos de outra natureza, nomeadamente espetáculos de âmbito cultural.

Apesar de não pretendermos inviabilizar a realização de eventos desportivos de relevância internacional no

nosso País — sejam eles mais ou menos populares, consoante as circunstâncias —, consideramos que é

preciso fazer essa abordagem mais abrangente e não uma abordagem casuística, que pode conduzir a injustiças

fiscais face a outros eventos, outras modalidades e a espetáculos de outra natureza.

Por esses motivos, e manifestando ainda a nossa concordância com o prolongamento da isenção de IVA nos

bens necessários ao combate à COVID-19 que se destinem a organismos do Estado, mantemos a abstenção

face à proposta do Governo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro, do

Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo, à imagem do ano passado

— e já fizemos este debate aqui, em Plenário —, apresenta uma proposta para isentar de IRC e de IRS os

agentes económicos relacionados com a organização da final da Liga dos Campeões, desta vez em 2020, em

Portugal.

Olhando para a exposição de motivos da proposta de lei, aproveitaria algumas palavras do segundo

parágrafo para percebermos qual é a justificação que o Governo dá, ainda que à peça, uma vez que, à medida

que vão aparecendo estas situações, vamos conhecendo novos argumentos. De todo o modo, este é

particularmente importante para o debate que estamos a fazer pela situação pandémica que vivemos.

Diz a exposição de motivos que o Governo apresenta: «Atento o interesse turístico e económico subjacente

a esta competição,…» — à partida não havendo turistas, não haverá adeptos — «… nomeadamente a nível da

imagem que, através dela, o País projetará para o exterior neste momento tão particular para Portugal». A

proposta que o Governo traz aqui é baseada num certo voluntarismo sobre os retornos económicos da final da

Champions League. O Governo quer que acreditemos que haverá um retorno certo e que a final da Champions

League, sem adeptos e, muito provavelmente, sem praticamente ninguém que não os próprios lisboetas na

cidade de Lisboa, vai ter um retorno económico fantástico para o País. O Governo está a dizer que uma

competição à porta fechada vai garantir isso e acho que todos percebemos que esta proposta, mais do que

otimista, é mesmo voluntarista.

Creio que, há praticamente um ano, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais utilizou o mesmo

argumento da dupla tributação e, na altura, foi esse o debate que tivemos aqui. Garantiu o Sr. Secretário de

Estado que estes agentes económicos já eram tributados nos seus países de origem e que, por isso, não fazia

sentido estarem a ser tributados aqui. Bem, há aqui um argumento e uma pergunta. A pergunta é no sentido de

saber se o Sr. Secretário de Estado pode dizer ao Plenário e dar hoje a garantia de que os agentes económicos

que não foram tributados no ano passado pagaram impostos nos seus países. Era importante que pudesse

garantir isso aqui, porque se já há antecedentes, esse argumento é importante.

O argumento relativo à questão da dupla tributação tem que ver com o facto de nós próprios sabermos que

um dos mecanismos que a UEFA tem utilizado, nomeadamente na organização destes eventos, é justamente a

evasão fiscal, porque sabemos que os agentes económicos dizem que pagam impostos no seu país de origem,

mas, depois, o seu país de origem diz que têm de os pagar no país onde essa atividade económica foi exercida.

Portanto, na verdade, não os pagam em lado nenhum! O que o Governo está aqui a propor, novamente, é uma

espécie de offshore ambulante, em que estes agentes nunca são tributados em lado nenhum. Até podíamos

discutir a pertinência de uma isenção fiscal, independentemente da dupla tributação e do retorno económico.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Terminarei, Sr.ª Presidente.

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O que torna ainda mais grave este debate, neste ano, é o facto de sabermos que, na economia real, não

vamos ter retorno nenhum: o estádio vai estar vazio, as pessoas vão ver o jogo pela televisão, não vai haver

turistas, durante estes dias, para ver o espetáculo desportivo.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Terminarei, Sr.ª Presidente.

Portanto, torna-se mesmo num voluntarismo do Governo. Se, há um ano, tínhamos reticências, parece-me

que, neste ano, fica muito claro qual é a nossa ideia.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles,

do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:

Este diploma trata de dois assuntos que têm muito pouco que ver um com o outro, exceto no facto de serem

ambos sobre questões fiscais.

Se, por um lado, trata do alargamento do tempo de isenção de IVA nas transmissões e aquisições

intracomunitárias de bens que tenham que ver com o combate à COVID-19 — algo que creio não merecer

objeções ou dúvidas de praticamente ninguém —, por outro lado, trata de uma isenção fiscal para as finais da

Champions. Aliás, pedia confirmação para este facto, isto é, se esta isenção é pedida a qualquer país que se

ofereça para organizar estes eventos e se já foi concedida por Portugal na organização destes eventos.

Sobre este assunto das finais, há várias questões que convém deixar claras. Primeiro, a realização destas

finais foi anunciada pelo Sr. Presidente da República e pelo Sr. Primeiro-Ministro com pompa e circunstância,

isto é, pelas primeira e terceira figuras do Estado português. É uma escolha política, mas contestável. O Sr.

Primeiro-Ministro disse mesmo que eram um prémio merecido para os profissionais de saúde — até me vou

abster de comentar mais esta frase.

Em segundo lugar, esta imagem, este anúncio e estas afirmações do Sr. Primeiro-Ministro correspondem a

uma estratégia que o Governo português decidiu adotar no desconfinamento: por um lado, de propaganda

interna e, por outro, de imagem externa. Agora, tendo já passado algum tempo, acho que é bom que tenhamos

noção de que esta estratégia falhou, de que teve consequências más e graves. A estratégia era errada, correu

mal e as consequências são graves.

Portugal é dos países da Europa, para não dizer do mundo, em que o turismo tem um dos maiores pesos no

PIB (produto interno bruto). Neste momento, estamos na lista negra do Reino Unido, da Áustria, do Chipre, da

Lituânia, da Bulgária, da Grécia, da Bélgica e da Finlândia. É esta a nossa imagem externa!

A consequência disto será que a recessão vai ser mais profunda do que aquilo que era inevitável, face à

primeira fase da pandemia. Se tivesse havido menos cuidado e menos empenho nos anúncios, se esse cuidado

e esse empenho tivessem sido mantidos no desconfinamento, se, em vez de andarmos em manifestações

políticas, em vez de irmos à praia, em vez de darmos sinais absolutamente contraditórios aos portugueses,

dizendo que podiam fazer tudo e que já não tinha de haver cuidado com nada, podíamos agora não estar a

discutir o que estamos a discutir, ou seja, uma recessão bastante mais profunda do que aquela que teria de

acontecer, face à pandemia. Isto acontece por causa da imagem externa de Portugal, que tem que ver com os

resultados que temos para apresentar e com a atual situação.

Portanto, em vez de estarmos a discutir esta proposta, acho que seria melhor, por exemplo, trabalharmos na

comissão que o CDS aqui propôs — que foi aprovada — de acompanhamento à COVID e percebermos como

damos a volta a esta imagem externa e, acima de tudo, como damos a volta a esta situação para que não haja

pessoas a ficarem doentes, mas que não têm de ficar doentes por causa de uma estratégia errada.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Nesta matéria, e porque tem que ver com isto, gostava de deixar clara

esta posição do CDS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do

Grupo Parlamentar do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: Hoje, o

Governo, habilmente, traz-nos à discussão uma proposta de lei que integra duas medidas no domínio fiscal: o

alargamento do período de aplicação do regime de isenção de IVA para a aquisição de bens necessários ao

combate à crise sanitária — e bem — e a atribuição de uma borla fiscal à UEFA, devido à realização da Liga

dos Campeões no nosso País.

Se a primeira medida é de elementar bom senso, a segunda trata-se de uma afronta a todos os cidadãos. A

posição do PAN quanto à Liga dos Campeões é conhecida: entendemos que, no atual contexto de crise sanitária,

a realização da prova pode ser um risco por poder trazer para o nosso País milhares de pessoas, desde as

equipas envolvidas, ao respetivo staff, passando por um batalhão de jornalistas e acabando nos adeptos que,

mesmo não assistindo aos jogos, não deixarão de seguir as suas equipas, a menos que o Governo o proíba.

Ainda estamos para ver se o número de pessoas que vem assistir à Liga dos Campeões não vai ser superior ao

número de jovens que o Governo impediu que fizessem melhorias de nota com o argumento da crise sanitária.

Contrariamente ao que sucedeu no caso do Euro 2004 ou do Festival da Eurovisão de 2018, é para nós

duvidoso que, no atual contexto, a Liga dos Campeões traga vantagens relevantes à nossa economia ou de que

a publicidade ao nosso País tenha efeito útil — se calhar terá até efeito contrário. Portanto, as externalidades

positivas são, no mínimo, duvidosas.

Por isso mesmo, para o PAN, estas borlas fiscais à UEFA e aos clubes de futebol, propostas pelo Governo,

são imorais num momento em que, devido às consequências da pandemia, as filas de comida à porta de

instituições não param de aumentar, em que milhões de portugueses estão com cortes nos salários, em que as

falências e o desemprego crescem todos os dias e em que o Governo e o PS dizem não haver dinheiro para dar

condições de trabalho dignas aos profissionais de saúde ou para dar apoios dignos, por exemplo, aos

profissionais do setor da cultura ou aos jovens precários que ainda estão desprotegidos.

Além do mais, pelos termos em que está desenhado, poderá violar os critérios estabelecidos no n.º 1 do

artigo 107.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia e constituir um auxílio de Estado ilegal. Mas grave

é também o facto de o Governo utilizar o argumento de que devemos dar esta borla fiscal à Liga dos Campeões

porque a UEFA o exige. Não sendo novo, este argumento demonstra uma submissão do Governo à chantagem

da UEFA, o que é pouco aceitável.

O Governo e o PS não contam com o PAN para coartar a soberania fiscal do nosso País, em nome dos

interesses do futebol.

Num País que, neste momento, está a passar dificuldades e que, só em 2018, perdeu, para a lavandaria das

transferências de jogadores de futebol, quase 4 milhões de euros — sim, Sr. Secretário de Estado!—,

deveríamos estar a discutir formas de evitar estas fugas de capitais e perdas de receita fiscal, ao invés de

estarmos a discutir borlas fiscais.

Portanto, o PAN votará contra esta proposta.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para encerrar este debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado

Adjunto e dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados,

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, depois da intervenção que fez relativamente à situação do nosso País, permita-

me que lhe dê um conselho. Aconselho-a a ver uma intervenção do Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite, do

PSD, de há muito poucos dias, num canal de televisão inglês. Acho que a Sr.ª Deputada terá muito a aprender

com a intervenção do Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite e com a defesa que fez do seu País.

Em segundo lugar, Sr.as e Srs. Deputados, e em particular os Srs. Deputados que colocam em dúvida a

vantagem de realizarmos em Portugal esta competição, presumo que defendem que seria melhor que a

competição não se realizasse em Portugal — acho que essa é a consequência a tirar dessa avaliação.

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Mas vamos ao ponto que verdadeiramente me choca. Choca-me que os Srs. Deputados que têm uma

enorme responsabilidade perante o País possam, numa circunstância tão difícil, querer acenar com o que não

existe: não há aqui nenhuma borla fiscal.

O Sr. André Silva (PAN): — Era uma chatice!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — É muito importante que se perceba que o

regime fiscal adotado para esta competição é o mesmo que, em regime de reciprocidade, existe sempre que se

realiza uma competição desta natureza em determinados países. É este regime fiscal que permite que tanto os

jogadores, como as equipas técnicas, como os clubes sejam tributados.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Se fosse uma isenção…

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Eles são sempre tributados, quer pelas

receitas de publicidade, quer pelos prémios, quer por qualquer rendimento que tenham tanto as equipas, como

os jogadores. Eles são tributados no Estado de origem.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Se é sempre, é ainda pior!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Da mesma forma, quando um clube

português vai jogar uma final desta natureza a outro país, é a autoridade fiscal portuguesa que lhes cobra o

imposto que eles não pagam nesse país, mas que pagam, sim, no país de residência, de acordo com este

regime fiscal.

Já agora, Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo, lamento que o exemplo que tenha dado esteja errado, porque

uma empresa de segurança que tenha residência no estrangeiro paga, por via das convenções para evitar a

dupla tributação, as CDT, e não por via deste regime, o imposto no país de residência.

O Sr. André Ventura (CH): — Há outros mecanismos para isso!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Por isso, Sr. Deputado, falhou

redondamente no minuto liberal.

Protestos do CH e do IL.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Secretário de Estado, peço desculpa, mas tenho de o interromper.

Srs. Deputados, já várias vezes disse que os apartes são regimentais, mas devem ser feitos com a máscara

posta.

Sr. Deputado André Ventura, já tirou a sua máscara cinco, seis ou sete vezes. Sr. Deputado, se quer fazer

apartes tem de os fazer com máscara!

Peço desculpa, Sr. Secretário de Estado. Pode continuar.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Com certeza, Sr.ª Presidente.

Por isso, Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo, penso que o minuto liberal tem de ser revisto.

Termino, voltando ao ponto: consideramos importante para o País, ainda para mais nestas circunstâncias,

acolher uma iniciativa desta dimensão, porque somos um País que tem condições de saúde pública que

permitem fazê-lo. E tal permite, ainda que modestamente, que as equipas e as equipas técnicas possam utilizar,

por exemplo, o setor hoteleiro — não se trata apenas da questão da assistência nos estádios — e que projetem

também, tal como consta da exposição de motivos da proposta de lei, a imagem do nosso País. Estamos

convencidos de que isto, ainda que intangível, será um benefício para o nosso País.

Repito, o que estamos a fazer, com este regime, é a dar condições para evitar a dupla tributação, mas

garantindo que jogadores, equipas e empresas sejam tributados no Estado de residência, tal como decorre das

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10 DE JULHO DE 2020

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convenções, para evitar a dupla tributação. A expetativa que temos é a de que, efetivamente, estes contribuintes

paguem o imposto nas suas residências.

Sr.as e Srs. Deputados, termino, apelando à responsabilidade que todos temos conseguido ter e a que não

se brinque com coisas sérias. Estamos a procurar, com equilíbrio, trazer as melhores soluções para o País e

estamos convencidos de que a nossa capacidade de organizar este evento e de nos projetarmos como um país

seguro é absolutamente fundamental para enfrentarmos com otimismo, ou pelo menos com confiança, o futuro

que nos chega.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, chegámos ao fim da nossa ordem de trabalhos.

Despeço-me dos Srs. Membros do Governo.

Entretanto, a Sr.ª Secretária Sofia Araújo vai dar conta de um diploma que deu entrada na Mesa.

A Sr.ª Secretária (Sofia Araújo): — Sr.ª Presidente, informo que deu entrada na Mesa, e foi admitido, o

Projeto de Resolução n.º 568/XIV/1.ª (PAR) — Deslocação do Presidente da República a Madrid.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, a sessão plenária de amanhã começa às 10 horas,

constando vários pontos da agenda.

No primeiro ponto, irão decorrer eleições para os seguintes órgãos: Tribunal Constitucional, Conselho

Superior da Magistratura, Conselho de Fiscalização do Sistema Integrado de Informação Criminal, Conselho de

Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, Conselho Superior de Defesa Nacional,

Conselho Económico e Social, Comissão Nacional de Proteção de Dados, Comissão de Fiscalização dos

Centros Educativos, Conselho Superior de Informações, Conselho Pedagógico do Centro de Estudos

Judiciários, Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários e Conselho Superior de Segurança do

Ciberespaço.

No segundo ponto, por marcação do PSD, iremos proceder à discussão conjunta dos Projetos de Lei n.os

199/XIV/1.ª (PSD) — Sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 96/89, de 28 de março, que cria o Registo Internacional

de Navios da Madeira (MAR) e 221/XIV/1.ª (PS) — Procede à nona alteração do Decreto-Lei n.º 96/89, de 28

de março, que cria o Registo Internacional de Navios da Madeira.

Do terceiro ponto constam, sem tempos de discussão, os Projetos de Lei n.os 455/XIV/1.ª (PSD) — Clarifica

o regime em que se integram os trabalhadores da entidade cedente na entidade cessionária, no âmbito do n.º 4

do artigo 244.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada em anexo à Lei n.º 35/2014, de 20 de

junho, e 467/XIV/1.ª (PAN) — Reforça as garantias dos trabalhadores da entidade cedente na entidade

cessionária, procedendo à décima segunda alteração à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada

em anexo à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho.

No quarto ponto, será apreciado o Projeto de Lei n.º 226/XIV/1.ª (PSD) — Nona alteração à Lei Orgânica n.º

1/2001, de 14 de agosto, que regula a eleição para os órgãos das autarquias locais.

Do ponto 5 consta a discussão conjunta dos seguintes projetos de lei: n.º 227/XIV/1.ª (PSD) — Oitava

alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho (Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas

Eleitorais) e terceira alteração à Lei n.º 2/2005, de 10 de janeiro (Lei de Organização e Funcionamento da

Entidade das Contas e Financiamentos Políticos); n.º 235/XIV/1.ª (CDS-PP) — Altera a Lei n.º 19/2003, de 20

de junho (Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais), eliminando o benefício de

isenção de imposto municipal sobre imóveis (IMI) para os partidos políticos; n.º 240/XIV/1.ª (IL) — Elimina os

benefícios fiscais dos partidos políticos e reduz o valor das subvenções públicas (oitava alteração à Lei do

Financiamento dos Partidos Políticos, Lei n.º 19/2003, de 20 de junho); n.º 241/XIV/1.ª (BE) — Procede à oitava

alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, introduzindo medidas de justiça fiscal e igualdade de tratamento;

n.º 248/XIV/1.ª (PAN) — Revoga benefícios fiscais atribuídos aos partidos políticos, diminui os limites das

despesas de campanha eleitoral e restabelece limites das receitas de angariação de fundos (oitava alteração à

Lei n.º 19/2003, de 20 de junho); e n.º 259/XIV/1.ª (PCP) — Reduz o financiamento público aos partidos políticos

e às campanhas eleitorais.

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No sexto ponto vamos proceder à discussão conjunta das seguintes iniciativas: Projeto de Lei n.º 457/XIV/1.ª

(PSD) — Quarta alteração ao Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares, aprovado pela Lei n.º 5/93, de 1

de março, introduzindo a participação obrigatória de pessoas da sociedade civil nas comissões parlamentares

de inquérito; Projeto de Lei n.º 458/XIV/1.ª (PSD) — Extingue a Comissão Parlamentar de Transparência e

Estatuto dos Deputados e cria, em sua substituição, o Conselho de Transparência e Estatuto dos Deputados,

procedendo à décima quarta alteração ao Estatuto dos Deputados, aprovado pela Lei n.º 7/93, de 1 de março,

e à primeira alteração à Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, que aprova o regime do exercício de funções por titulares

de cargos políticos e altos cargos públicos; Projeto de Lei n.º 459/XIV/1.ª (PSD) — Quinta alteração à Lei n.º

43/90, de 10 de agosto (Exercício do direito de petição); Projeto de Lei n.º 460/XIV/1.ª (PSD) — Terceira

alteração à Lei n.º 43/2006, de 25 de agosto, relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pela

Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia; Projeto de Resolução n.º

543/XIV/1.ª (PSD) — Primeira alteração à Resolução da Assembleia da República n.º 210/2019, de 20 de

setembro, que aprova o Código de Conduta dos Deputados à Assembleia da República; e Projeto de Lei n.º

466/XIV/1.ª (PAN) — Reforça os direitos de participação no âmbito das iniciativas legislativas dos cidadãos,

procedendo à quarta alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho.

Do sétimo ponto consta, sem tempos atribuídos, o Projeto de Lei n.º 471/XIV/1.ª (PS) — Altera o anexo à Lei

n.º 52/2019, de 31 de julho, harmonizando o conteúdo da Declaração Única de Rendimentos, Património,

Interesses, Incompatibilidades e Impedimentos com o respetivo formulário.

No oitavo e último ponto terão lugar as votações regimentais.

Srs. Deputados, até amanhã e tenham um bom resto de dia.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 29 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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