O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Sábado, 3 de outubro de 2020 I Série — Número 9

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

REUNIÃOPLENÁRIADE2DEOUTUBRODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 2

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa do Projeto de

Resolução n.º 679/XIV/2.ª e dos Projetos de Lei n.os 547 a 552/XIV/2.ª.

Foi reapreciado o Decreto da Assembleia da República n.º 57/XIV — Nona alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade. Proferiram intervenções os Deputados Constança Urbano de Sousa (PS), Nelson Basílio Silva (PAN), José Luís Ferreira (PEV), António Filipe

Página 2

I SÉRIE — NÚMERO 9

2

(PCP), João Cotrim de Figueiredo (IL), Catarina Rocha Ferreira (PSD), Beatriz Gomes Dias (BE), Telmo Correia (CDS-PP), André Ventura (CH) e Joacine Katar Moreira (N insc.), tendo sido, posteriormente, aprovado um novo decreto com as alterações entretanto aprovadas.

Foi reapreciado o Decreto da Assembleia da República n.º 59/XIV — Primeira alteração à Lei n.º 17/2014, de 10 de abril, que estabelece as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional. Proferiram intervenções os Deputados Emília Cerqueira (PSD), João Cotrim de Figueiredo (IL), João Azevedo Castro (PS), João Dias (PCP), Inês de Sousa Real (PAN), André Ventura (CH), Ricardo Vicente (BE) e Telmo Correia (CDS-PP), tendo sido, posteriormente, aprovado um novo decreto com as alterações entretanto aprovadas.

Foram discutidos, conjuntamente, e aprovados na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 641/XIV/2.ª (CDS-PP) — Adoção de medidas para o regular funcionamento dos cuidados de saúde primários, 248/XIV/1.ª (PAN) — Garantir um Serviço Nacional de Saúde de qualidade, 630/XIV/2.ª (PCP) — Medidas para a recuperação da atividade nos cuidados de saúde primários e 656/XIV/2.ª (BE) — Recuperação e reforço da atividade dos cuidados de saúde primários. Intervieram os Deputados Ana Rita Bessa (CDS-PP), Bebiana Cunha (PAN), Paula Santos (PCP), Moisés Ferreira (BE), Susana Correia (PS), Mariana Silva (PEV), Alberto Machado (PSD) e André Ventura (CH).

Foram debatidos, conjuntamente, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 53/XIV/1.ª (PAN) — Visa assegurar a não discriminação no acesso à habitação por quem possui animais de companhia e 496/XIV/1.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Altera o Código Civil, garantindo a não discriminação no acesso ao arrendamento por quem detém animais de companhia. Proferiram intervenções os Deputados Inês de Sousa Real (PAN), Cristina Rodrigues (N insc.), João Cotrim de Figueiredo (IL), Bruno Dias (PCP), Maria Manuel Rola (BE), Mariana Silva (PEV), Pedro Delgado Alves (PS), João Gonçalves Pereira (CDS-PP) e Márcia Passos (PSD). Posteriormente, a requerimento dos seus autores, baixaram à Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, sem votação, por 60 dias.

Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 640/XIV/2.ª (PAR) — Deslocação do Presidente da República a Bruges.

Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 547/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo a requalificação do Pavilhão 5 do Hospital Dr. Sousa Martins, 555/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a requalificação do Pavilhão 5 do Hospital de Sousa Martins, na Unidade Local de Saúde da Guarda, para instalação do departamento de saúde da criança e da mulher, 595/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo prioridade absoluta na conclusão do projeto de requalificação do Pavilhão 5 do Hospital Sousa Martins, da Guarda, para maternidade e departamento de saúde, da criança e da mulher, 609/XIV/1.ª (BE) — Requalificação do Pavilhão 5 do hospital da Guarda e do Pavilhão Dona Amélia e 613/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda a reconstrução imediata do Pavilhão 5 do Hospital Sousa Martins para instalação da área clínica materno-infantil (Guarda).

Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 473/XIV/1.ª (PS) — Aprova a Carta de Direitos Fundamentais na Era Digital e 498/XIV/1.ª (PAN) — Aprova a Carta dos Direitos Digitais e um conjunto de medidas complementares que asseguram o reforço das garantias dos cidadãos no domínio digital.

Foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 532/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo um conjunto de medidas com vista a identificar e solucionar o problema dos lares que se encontrem em situação irregular ou ilegal.

Foram rejeitados, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 484/XIV/1.ª (BE) — Cria um teto máximo para o valor das propinas dos 2.º e 3.º ciclos de estudos e pós-graduações no ensino superior público e 492/XIV/1.ª (PCP) — Eliminação das propinas no ensino superior público, tendo sido aprovado

o Projeto de Lei n.º 497/XIV/1.ª (PAN) — Limita a alteração do valor das propinas dos cursos técnico superior profissional, 2.º e 3.º ciclos de estudos no ensino superior público.

Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 18/XIV/1.ª (PCP) — Melhora as regras de atribuição e altera a duração e montantes do subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego e 495/XIV/1.ª (BE) — Alarga e melhora as condições de acesso e os períodos de concessão do subsídio de desemprego e do subsídio social de desemprego (Décima sétima alteração do Regime Jurídico de Proteção no Desemprego) e foi rejeitado, também na generalidade, o Projeto de Lei n.º 491/XIV/1.ª (PAN) — Aumenta as garantias dos beneficiários de prestações de desemprego no âmbito das regras referentes à formação profissional, alterando o Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro.

Foi aprovada a Proposta de Resolução n.º 7/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Acordo de Parceria Abrangente e Reforçada entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica e os seus Estados-Membros, por um lado, e a República da Arménia, por outro, assinado em 24 de novembro de 2017, em Bruxelas.

Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 622/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que garanta o direito ao acompanhante das grávidas, 626/XIV/1.ª (IL) — Pela alteração da orientação da DGS de forma a garantir o direito da grávida a acompanhante em todos os serviços de obstetrícia, 635/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Pelo acompanhamento de mulheres grávidas durante todas as fases do trabalho de parto no contexto da COVID-19 e 636/XIV/2.ª (BE) — Garante o acompanhamento da mulher grávida na assistência à gravidez e em todas as fases do parto mesmo durante a pandemia de COVID-19.

Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 605/XIV/1.ª (BE) — Recomenda a integração de assistentes operacionais precários na escola pública e 654/XIV/1.ª (BE) — Recomenda a contratação de mais professores, técnicos especializados e trabalhadores não docentes para a escola pública e foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 627/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a contratação de todos os trabalhadores necessários ao funcionamento da escola pública.

Em votação final global, foram aprovados os seguintes textos finais:

Apresentado pela Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, relativo ao Projeto de Resolução n.º 168/XIV/1.ª (BE) — Moratória à venda ou cessão de património do Estado em cidades em carência habitacional;

Apresentado pela Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, relativo ao Projeto de Resolução n.º 230/XIV/1.ª (PCP) — Mobilização do património público habitacional;

Apresentado pela Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, relativo ao Projeto de Resolução n.º 540/XIV/1.ª (BE) — Reforço da oferta de transporte ferroviário e complementaridade com o transporte rodoviário para garantir condições de segurança;

Apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao Projeto de Resolução n.º 546/XIV/1.ª (IL) — Pela eficaz proteção dos denunciantes;

Apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao Projeto de Resolução n.º 550/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que apresente e submeta à aprovação da Assembleia da República a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção 2020-2024.

Relativamente ao texto final, apresentado pela Comissão de Orçamento e Finanças, sobre o Projeto de Lei n.º 365/XIV/1.ª (PAN) — Altera as regras de nomeação do Governador e os demais membros do conselho de administração do Banco de Portugal (Oitava alteração à Lei n.º 5/98, de 31 de janeiro), foram aprovados três

Página 3

3 DE OUTUBRO DE 2020

3

requerimentos, apresentados pelo PSD, pelo PAN e pelo PCP, respetivamente de avocação, pelo Plenário, da votação, na especialidade, de uma proposta de alteração ao texto final (que foi rejeitada), de artigos do projeto de lei (que foram rejeitados) e do artigo 4.º do texto final (que foi aprovado). Após terem usado da palavra os Deputados Inês de Sousa Real (PAN), Duarte Pacheco (PSD), Duarte Alves (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP), Mariana Mortágua (BE), Fernando Anastácio (PS), João Cotrim de Figueiredo (IL) e André Ventura (CH), o texto final foi aprovado em votação final global.

Em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e Segurança Social, relativo ao Projeto de Lei n.º 474/XIV/1.ª (PSD) — Programa especial de apoio social aos ex-trabalhadores da COFACO.

Foram rejeitados, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 52/XIV/1.ª (PAN) — Privilegia o modelo de residência alternada sempre que tal corresponda ao superior interesse da criança, excecionando-se o decretamento deste regime aos casos de abuso infantil, negligência e violência doméstica, e 114/XIV/1.ª (BE) — Altera o Código Civil, prevendo o regime de residência alternada da criança na regulação do exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento.

Foi aprovado, na generalidade, na especialidade (assunção, pelo Plenário, das votações indiciárias realizadas

na Comissão) e em votação final global, o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos Projetos de Lei n.os 87/XIV/1.ª (PS) — Altera o Código Civil, estabelecendo o princípio da residência alternada do filho em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento dos progenitores, 107/XIV/1.ª (PSD) — 76.ª alteração ao Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966, alterando o regime do exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento, de forma a clarificar que o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores sempre que tal corresponda ao superior interesse do menor, e 110/XIV/1.ª (CDS-PP) — Sobre o estabelecimento da residência alternada dos menores, em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens e declaração de nulidade ou anulação do casamento. No final, a Deputada Inês de Sousa Real (PAN) proferiu uma declaração de voto.

Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados autorizando um Deputado do PSD a intervir em tribunal.

O Presidente (José Manuel Pureza) encerrou a sessão eram 13 horas e 32 minutos.

Página 4

I SÉRIE — NÚMERO 9

4

O Sr. Presidente: — Bom dia, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Srs. Agentes da autoridade. Vamos dar início à nossa sessão plenária.

Eram 10 horas e 2 minutos.

Tem a palavra a Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha para proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, o Projeto de Resolução n.º 679/XIV/2.ª (Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,

Liberdades e Garantias) — Propõe a realização de um referendo sobre a (des)penalização da morte a pedido e

os Projetos de Lei n.os 547/XIV/2.ª (PS), 548/XIV/2.ª (PS), 549/XIV/2.ª (PS), 550/XIV/2.ª (Deputada não inscrita

Cristina Rodrigues), 551/XIV/2.ª (BE) e 552/XIV/2.ª (PCP).

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Vamos, então, começar os nossos trabalhos com a reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 57/XIV — Nona alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da

Nacionalidade.

Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Constança Urbano de Sousa.

A Sr.ª Constança Urbano de Sousa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, estamos a discutir o veto do Sr. Presidente da República ao Decreto da Assembleia da República n.º 57/XIV— Nona alteração à

Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade.

O veto do Sr. Presidente da República prendeu-se, basicamente, com as normas inovatórias introduzidas no

regime de aquisição de nacionalidade derivada por via do casamento ou da união de facto com um cidadão

português e que, no fundo, traduz, no nosso ordenamento jurídico, o princípio do favorecimento da unidade de

nacionalidade na família.

O objetivo destas normas, que foram agora vetadas foi nitidamente inspirado numa norma que foi introduzida

na nossa Lei da Nacionalidade em 2018 e que foi promulgada pelo Sr. Presidente da República. O seu objetivo

era, no fundo, proteger o interesse do cidadão português que tem um progenitor estrangeiro na unidade de

nacionalidade da sua família. E, na perspetiva do cidadão português, a norma não pode ser considerada

discriminatória em relação às outras situações, porque, quando não há concidadão português também não há

um interesse que possa ser tutelado.

Na perspetiva do cônjuge estrangeiro, ou parceiro estrangeiro, do cidadão português, que já beneficia, hoje,

de um amplíssimo e muito generoso regime de acesso à nacionalidade portuguesa, as observações do Sr.

Presidente da República são, de facto, pertinentes. Por isso, o Partido Socialista propõe a eliminação dessas

normas como forma de ultrapassar este obstáculo, atendendo a que hoje já temos um regime que é, de facto,

talvez, dos mais generosos do mundo no que diz respeito ao acesso à nacionalidade por parte de um cidadão

estrangeiro, casado ou unido de facto com um português.

Além do mais, o grande objetivo desta lei nem sequer era este. E é esse objetivo que tem de ser — e fica —

salvaguardado, que é o objetivo de aprofundar o direito de solo, para que os filhos dos imigrantes, os filhos de

todos os imigrantes possam ter a nacionalidade portuguesa quando nascem em território nacional.

Quanto às propostas do Bloco de Esquerda, não vamos poder acompanhá-las por várias razões. Em primeiro

lugar, porque são dificilmente conformes ao princípio da nacionalidade efetiva e até fazem recordar um pouco a

automaticidade do casamento em sede da nacionalidade, que hoje é proibida pela Convenção Europeia sobre

a Nacionalidade.

Depois, abrem, nitidamente, a porta a uma fraude à lei e também a uma fraude ao princípio de proteção da

unidade da nacionalidade da família, que visa, precisamente, proteger as verdadeiras famílias e não famílias

que constituem vínculos de mera conveniência.

Em terceiro lugar, também não acompanhamos estas propostas do BE porque são muito tributárias de uma

perspetiva, quanto a nós errada, da Lei da Nacionalidade. A Lei da Nacionalidade não serve para regular fluxos

migratórios, mas tão-só para estabelecer quem é o povo português, quem são aquelas pessoas que têm com a

Página 5

3 DE OUTUBRO DE 2020

5

comunidade nacional, organizada em Estado, uma ligação efetiva e, por isso, devem ser membros dessa

comunidade, devem ser cidadãos portugueses.

Naturalmente, os estrangeiros casados com um português ou unidos de facto a um português já hoje

beneficiam de um amplo direito à entrada e à residência no território nacional.

Não se trata, aqui, de nenhum poder discricionário do Estado. A Lei Orgânica n.º 2/2006 consagra, para

esses cidadãos, um pleno direito de entrarem e de residirem em território nacional, pelo que a via da

nacionalidade, para além de não ser nada adequada para este fim — aliás, não serve mesmo para este fim —,

em nada beneficia o estatuto migratório de um cidadão casado com um português, que já tem, hoje, um pleno

direito, se quisermos, a residir no nosso território.

Por isso, não podemos acompanhar as propostas do Bloco de Esquerda.

Em suma, o PS apresenta estas alterações, que vão plenamente ao encontro — e acolhem na sua

integralidade — das objeções pertinentes do Sr. Presidente da República, sobretudo também com o objetivo de

permitir uma rápida entrada em vigor deste diploma, cujo objetivo central, friso, é o aprofundamento do direito

de solo em sede de nacionalidade, permitindo que os filhos dos imigrantes nascidos em território nacional

possam ser portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Nelson Silva, do PAN.

O Sr. Nelson Basílio Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, devido a um veto do Sr. Presidente da República, o Parlamento vê-se, novamente, na circunstância de ter de discutir a nona alteração

à Lei da Nacionalidade, que aprovámos no final da anterior sessão legislativa com um amplo consenso.

Nunca é demais lembrar que foi por proposta do PAN, e com base num esforço conjunto feito em sede de

discussão na especialidade, que conseguimos corrigir na Lei da Nacionalidade uma injustiça histórica, que

existia há demasiado tempo, relativamente a um conjunto de cidadãos que, residindo no nosso País em 1974,

não puderam conservar a nacionalidade portuguesa devido ao Decreto-Lei n.º 308-A/75, de 24 de junho, embora

tivessem aqui a sua residência e os seus laços.

Esta injustiça perpetuou-se e estendeu-se aos seus filhos e descendentes, que não obtiveram a

nacionalidade da única pátria que conheceram, a sua pátria.

Esta injustiça histórica não é de pouca monta, uma vez que, ao longo de décadas, tem potenciado situações

de não documentação que contribuíram para uma grave ostracização destes cidadãos. Ostracização visível em

questões tão pequenas como o acesso à carta de condução, ostracização que trouxe desigualdades no acesso

à educação, à saúde ou a um emprego digno e com direitos. No fundo, esta foi uma ostracização que deixou o

tão famoso elevador social parado para milhares de cidadãos, o que é lamentável.

O mínimo que podíamos fazer, como órgão de soberania e como País, era aprovar esta proposta, mais do

que justa, do PAN e confirmar, hoje, o largo consenso que tivemos aqui há uns meses.

Mas, concretamente quanto ao veto do Sr. Presidente da República, o PAN não pode deixar de notar que o

mesmo é, no mínimo, estranho. Isto porque o Sr. Presidente veta um diploma com base na crítica a normas cujo

sentido essencial não foi alterado e que, curiosamente, correspondem ao que constava das alterações à Lei da

Nacionalidade, introduzidas pela Lei Orgânica n.º 2/2018, de 05 de julho, promulgada, imagine-se, pelo mesmo

Presidente que agora veta.

Tal situação parece legitimar a ideia de que este veto parece querer esconder, debaixo de formalismos, uma

divergência maior que, por conveniência, não deve ser assumida. Desconhecemos o motivo, mas não podemos

deixar de assinalar esta situação.

Em todo o caso, e porque estamos a discutir a vida dos cidadãos, vamos votar a favor das propostas

apresentadas por PS e Bloco de Esquerda, ainda que consideremos que o ideal fosse a aprovação das soluções

propostas pelo Bloco de Esquerda, que asseguram de uma forma clara avanços nos direitos dos cidadãos.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.

Página 6

I SÉRIE — NÚMERO 9

6

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Decidiu o Sr. Presidente da República devolver, sem promulgação, o Decreto desta Assembleia relativo à nona alteração à Lei n.º 37/81, de

3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade.

Trata-se, a nosso ver, de uma decisão, ou melhor, de um de veto, que incide sobre uma matéria muito

específica e muito concreta e que não belisca, de forma alguma, o essencial que, na perspetiva dos Verdes, se

pretendia com este diploma.

E o essencial, para Os Verdes, é consagrar na Lei da Nacionalidade o princípio do jus soli, para efeitos de

aquisição de nacionalidade originária, o que permitiria aos filhos de imigrantes nascidos em Portugal obter a

nacionalidade portuguesa.

Com efeito, os reparos do Sr. Presidente da República, e que, de resto, fundamentam a sua decisão,

prendem-se somente com as normas que preveem a dispensa de aplicação do regime específico, genérico,

relativamente a casais ligados por matrimónio ou união de facto com filhos em comum, filhos esses dispondo de

nacionalidade portuguesa.

Sucede que estas normas, ou seja, os n.os 4 e 5 do artigo 3.º e o n.º 2 do artigo 9.º, na redação do Decreto

cuja apreciação agora fazemos, levantam alguns problemas, que se prendem com o facto de a situação

apontada no diploma deixar os casais sem filhos, bem como os casais com filhos com nacionalidade portuguesa

mas que não são filhos em comum, numa situação desfavorável face aos casais com filhos em comum. E,

portanto, na leitura do Sr. Presidente da República, esta solução potencia ou é suscetível de potenciar uma

discriminação que importa evitar ou remover.

Ainda assim, estamos em crer que esta Assembleia tem todas as condições para adaptar este diploma de

forma a remover quaisquer indícios de discriminação que, certamente, ninguém deseja, ultrapassando assim os

reparos expressos pelo Sr. Presidente da República e, ao mesmo tempo, garantindo o essencial que se

pretendia garantir com este processo legislativo, ou seja, consagrar na Lei da Nacionalidade o princípio do jus

soli para efeitos de aquisição da nacionalidade originária, o que permitiria aos filhos de imigrantes nascidos em

Portugal obter a nacionalidade portuguesa.

Da parte de Os Verdes existe toda a disponibilidade para, nesta sede de reapreciação do diploma,

acompanhar todas as propostas de alteração que procurem ou que tenham como objetivo ultrapassar os reparos

que fundamentaram a decisão do Sr. Presidente da República.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Filipe, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Esperamos que se conclua hoje, do ponto de vista da Assembleia da República, um processo legislativo que já vai longo e que tem sido protelado com

questões que não estavam, inicialmente, nos propósitos dos autores das iniciativas legislativas em discussão,

mas que, de certa forma, foram interferindo neste processo e fazem com que, hoje, longos meses depois de se

ter iniciado, ainda estejamos aqui a procurar fechar, finalmente, este processo legislativo.

Importa lembrar que o que foi aprovado na generalidade e que foi, depois, submetido a apreciação em sede

de especialidade foram dois projetos de lei que visavam questões diferentes, mas relevantes. O projeto de lei

do PAN visava a questão que o Sr. Deputado Nelson Silva acabou de referir e o projeto de lei do PCP visava

aprofundar o princípio do jus soli, permitindo que mais crianças nascidas em Portugal, filhos de não nacionais,

possam adquirir a nacionalidade portuguesa.

Para nós, foi sempre este o grande propósito desse projeto de lei: prosseguir uma linha de aprofundamento

do jus soli, que já deu alguns passos em anos recentes, mas que, do nosso ponto de vista, importa ainda

aprofundar, e não criar uma situação legal em que crianças que nascem em Portugal, que vão viver em Portugal

porque os seus pais cá residem não possam ter nacionalidade portuguesa de origem. Tal afigura-se-nos injusto

e é esse, de facto, o nosso grande propósito.

Claro que todos nos lembramos que, ao longo da discussão na especialidade, o processo foi conturbado. Foi

conturbado por outras questões, que não tinham que ver com as iniciativas originárias, que levaram, até, a

meses de discussão acalorada. Foi o caso, por exemplo, do problema da atribuição de nacionalidade portuguesa

Página 7

3 DE OUTUBRO DE 2020

7

a descendentes dos judeus sefarditas, uma questão que foi colocada em sede de especialidade, que foi polémica

e que acabou por se retirar nos termos em que tinha sido proposta.

E chegámos à votação final global, no final da Sessão Legislativa anterior, já com o processo resolvido quanto

a esse ponto.

Depois, o Sr. Presidente da República veio chamar a atenção para um outro ponto, que também não constava

de iniciativas originárias, foi introduzido na especialidade e que, aliás, não suscitou grande controvérsia. Mas,

enfim, o Sr. Presidente da República chama a atenção, de facto, para a disposição que permite adquirir a

nacionalidade portuguesa pelo casamento, não fazendo depender essa aquisição da duração do casamento

havendo filhos comuns. O Sr. Presidente da República vem dizer que tal é discriminatório para casais que, tendo

filhos, os filhos não sejam comuns e para casais que não tenham filhos, porque não querem ou porque não

podem. Deste ponto de vista, não nos incomodam estas objeções e, portanto, estamos perfeitamente

disponíveis para que essa possibilidade possa ser removida, como aliás propõe o Partido Socialista.

Do nosso ponto de vista, a resolução desse problema acomoda o que, para nós, é essencial. Achamos que

não faz muito sentido, numa fase em que estamos a apreciar um diploma na sequência de um veto presidencial,

estar a reabrir todo o processo legislativo como se estivéssemos no início. Portanto, o que foi proposto, no início,

já foi discutido atempadamente nesta Câmara e trata-se, agora, de acomodar a vontade desta Assembleia

relativamente ao que estava consolidado no processo legislativo, com as objeções que o Sr. Presidente da

República colocou e que não nos parecem, de facto, descabidas, tendo alguma pertinência. Nesse sentido,

acompanharemos a proposta que o Partido Socialista faz e, também, propostas cujo conteúdo, ainda que não

se circunscreva a isso, mereça a nossa concordância. Parece-nos que, finalmente, estamos em condições de

pacificar definitivamente esta questão e de concluir o que, para nós, é essencial.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Vou concluir de imediato, Sr. Presidente. É essencial um aprofundamento do princípio do jus soli, que será muito importante para muitas crianças que

hão de nascer em Portugal e que merecem ter a nacionalidade portuguesa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Voltamos hoje a discutir aqui a Lei da Nacionalidade. O Sr. Presidente da República resolveu vetar o diploma, invocando objeções,

algumas não claras, e considerando discriminatórias algumas disposições que até já constavam da redação

original da lei e que, até aqui, ninguém contestava.

Tal como afirmámos no debate inicial sobre este diploma, a posição de princípio da Iniciativa Liberal é a de

que sempre que alguém, nos termos da lei, optar por requerer a nacionalidade portuguesa está, implicitamente,

a reconhecer as vantagens de ser português, eventualmente vantagens de natureza material, afetiva ou outras.

Sempre que este reconhecimento for acompanhado de um equivalente reconhecimento das obrigações — que

também as há — de ser português estão, em nossa opinião, reunidos os requisitos para o ser.

Por isso, apresentámos hoje uma proposta de alteração que visa ir ao encontro das objeções do Sr.

Presidente da República: por um lado, reduzindo a diferença entre o período necessário de vida comum, em

matrimónio ou em união de facto, de casais com e sem filhos em comum; por outro lado, reconhecendo esse

mesmo período de vida como suficiente para presumir a existência de ligação efetiva à comunidade nacional.

Por fim, propomos também a eliminação do artigo 14.º, já que não vemos qualquer justificação para que o

direito de requerer a nacionalidade portuguesa seja limitado pelo momento e pela idade em que se estabelece

a filiação.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

Página 8

I SÉRIE — NÚMERO 9

8

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr. Presidente. Ser português é bem mais do que uma questão de sangue e não é só uma questão de solo. Ser português

é, também hoje, bem mais do que a pátria que é a língua portuguesa, de que falava Fernando Pessoa, esse

genial português que passou tantos anos fora de Portugal.

O Sr. Presidente: — Informo a Câmara de que já há Deputados inscritos mais do que suficientes para as votações. Portanto, as bancadas podem proceder em conformidade.

Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Catarina Rocha Ferreira, do Grupo Parlamentar do

PSD.

A Sr.ª Catarina Rocha Ferreira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos aqui, novamente, a discutir as alterações à Lei da Nacionalidade, uma das leis fundamentais do nosso ordenamento jurídico.

Estamos a falar da lei que estabelece e que determina quem pode ser português, quem tem direitos políticos

exclusivos aos nacionais e, enfim, quem vamos ter como cidadão português no futuro. Por isso, a nossa

nacionalidade é algo que muito nos deve orgulhar, é algo que devemos estimar e não é algo que deva oferecer-

se ao desbarato, como se de uma campanha promocional se tratasse.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Rocha Ferreira (PSD): — Portanto, o PSD não pode ser favorável a uma legislação que não valoriza devidamente a forma de atribuição da nossa nacionalidade. Apesar de algumas alterações específicas

— por exemplo, as que o PSD impulsionou em relação aos cônjuges estrangeiros de portugueses, ou as

impulsionadas por outros partidos em relação aos netos dos portugueses, as quais votámos a favor e que são

positivas —, o PSD não pode, em consciência, ser favorável a uma legislação que, no seu todo, trata bem melhor

um filho de estrangeiro que nasça no nosso território do que os portugueses, os cônjuges de portugueses e os

netos de portugueses que temos espalhados pelo mundo.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Essa é que é essa!

A Sr.ª Catarina Rocha Ferreira (PSD): — A estes, desde a Assembleia da República de Portugal, e em nome do PSD, envio uma especial saudação.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Rocha Ferreira (PSD): — Incidindo o veto do Sr. Presidente da República sobre um aspeto muito particular das alterações à Lei da Nacionalidade, é, de resto, diferente das maiores divergências que aqui

tivemos e deriva do entendimento de que é politicamente injusto, ou de natureza discriminatória, a atribuição de

um desfavorecimento de tratamento ao cônjuge estrangeiro de um nacional português sem filhos ou que tenha

filhos que não são em comum, ao favorecer-se o cônjuge estrangeiro de um português que tenha filhos em

comum portugueses.

Ora, a questão que se coloca é a da presunção de uma relação familiar em relação a um casal que tem filhos

de nacionalidade portuguesa, em particular devido ao princípio do direito da nacionalidade, que é o princípio da

unidade da família, o qual, neste veto, é confrontado com o princípio da não discriminação. Mas o motivo do

veto fica sanado com as propostas de alteração apresentadas em relação a este aspeto em concreto,

nomeadamente como propõe o Partido Socialista.

Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, voltamos a ter, acima de tudo, mais uma oportunidade para esta Casa

refletir novamente sobre o que pretende com a Lei da Nacionalidade. Temos mais uma oportunidade para não

aprovar uma legislação que vem atalhar caminho para que, um dia, quem nasça em território nacional seja

automaticamente português, como eram as propostas da esquerda, que depois foram suavizadas, amenizadas,

pela proposta do Partido Socialista, ainda assim com um aprofundamento do jus soli que, no nosso entender, é

demasiado amplo, em particular quando comparado com a forma como tratamos o jus sanguinis. O PSD já tinha

Página 9

3 DE OUTUBRO DE 2020

9

alertado que toda e qualquer alteração que se faça a uma lei com a importância da Lei da Nacionalidade deverá

ser feita com muito bom senso e ponderação.

Mas, aproveitando este veto, aproveitando esta nova discussão, é dada mais uma oportunidade para que

todos os partidos, em especial os partidos da esquerda, ponderem melhor a quem deve ser atribuída a

nacionalidade portuguesa. Uma lei que atribui a nacionalidade a qualquer indivíduo que nasça em solo

português, sendo suficiente que um dos seus progenitores aqui tenha residência há um ano, que pode ser legal

ou não, significa um facilitismo imenso a um passaporte europeu.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Rocha Ferreira (PSD): — Recordo que, até 2018, eram exigidos cinco anos de residência legal. Em 2018, passaram a ser exigidos dois anos e residência legal. Agora, a esquerda uniu-se, como vem

sendo hábito, e vem alterar este requisito para um ano, servindo qualquer residência, seja legal ou ilegal.

Em consciência, não podemos concordar com este caminho. Em tudo o que da bancada do PSD depender,

iremos continuar a pugnar para que Portugal nunca seja uma maternidade de ocasião. Resta-me deixar um

apelo de mais bom senso às restantes bancadas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Beatriz Gomes Dias, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Foram introduzidas alterações significativas à Lei da Nacionalidade, uma das quais, a mais importante, foi o aprofundamento do princípio do

direito de solo na atribuição da nacionalidade.

Embora a lei continue a não garantir a atribuição automática da nacionalidade portuguesa a todas as pessoas

nascidas em Portugal, independentemente da nacionalidade e do estatuto legal da progenitora ou do progenitor,

como temos defendido — e bem — em todas as propostas de alteração que apresentámos, fizemos progressos

importantes. O Decreto agora em reapreciação, aprovado com o voto favorável do Bloco de Esquerda,

representa um avanço e representa, também, o reconhecimento, na lei, da diversidade que existe na

comunidade nacional. Não resolve todas as injustiças de que são alvo as pessoas que não conhecem outra

terra que não esta, não remove todos os obstáculos que são colocados aos estrangeiros que aspiram poder

obter a nacionalidade portuguesa, mas tem o mérito de melhorar, ainda que de uma forma parcial, as condições

de acesso a direitos fundamentais.

Esta conquista é o fruto da luta determinada das organizações antirracistas e representativas das pessoas

migrantes que, denunciando o muro burocrático e legal que nega, aos filhos e às filhas de estrangeiros, os

direitos e a sua pertença à comunidade nacional, colocaram na agenda política e mediática a defesa

intransigente dos direitos de cidadania de todas as pessoas que nascem em Portugal. O Bloco de Esquerda,

desde sempre, esteve nesta luta, assumindo ao longo do tempo o firme compromisso de corrigir esta injustiça

histórica.

A justa expetativa de milhares de pessoas privadas da nacionalidade portuguesa, que aguardam a

promulgação da lei, revela a urgência da sua aprovação. O veto do Presidente da República e a consequente

reapreciação que nos cabe concedem-nos a oportunidade de remover alguns dos obstáculos que a lei ainda

conserva e que impedem a plena inclusão das comunidades migrantes em Portugal.

A proposta de revisão que agora apresentamos contempla alterações que incidem nos artigos destacados

no veto do Presidente da República. Em primeiro lugar, propomos uma alteração do artigo 3.º, no sentido de

fazer depender a aquisição da nacionalidade portuguesa por estrangeiro casado ou unido com cidadão nacional

exclusivamente da declaração feita na constância do matrimónio, na hipótese de casamento, e da emissão, pela

respetiva junta de freguesia, de declaração de reconhecimento no caso da união de facto. Não aceitamos que

as normas que estão em vigor para os cidadãos nacionais não possam ser aplicadas aos cidadãos estrangeiros.

Nada o justifica!

Página 10

I SÉRIE — NÚMERO 9

10

Esta alteração promove o alargamento da aquisição da nacionalidade portuguesa, melhorando

inequivocamente a lei, e responde às preocupações enunciadas pelo Presidente da República. Ao dissociar a

aquisição da nacionalidade, por via do casamento ou por união de facto, da duração do vínculo ou da existência

de filhos em comum com a nacionalidade portuguesa, garantimos que a lei facilita a aquisição da nacionalidade

aos estrangeiros, casados ou unidos com cidadãos nacionais, quando têm filhos em comum com nacionalidade

portuguesa, quando não têm filhos ou têm filhos com nacionalidade portuguesa que não são filhos em comum.

Em segundo lugar, propomos uma alteração do artigo 9.º. Na nossa proposta, mantemos, no n.º 2, a redação

do decreto-lei em vigor e aditamos um n.º 3, que elimina a possibilidade de oposição à aquisição de

nacionalidade por efeito de vontade, no caso de estrangeiro casado ou unido com português, com o fundamento

de inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional, assumindo que a existência do vínculo familiar

estabelece a ligação à comunidade nacional.

Estas alterações constituem mais um passo relevante para a consecução de uma lei mais justa e mais

inclusiva.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de dizer, em primeiro lugar, e dentro da parte das concordâncias, que subscrevemos o que aqui foi dito em relação à importância e à

relevância da matéria. Diria mesmo que, em qualquer país e em qualquer parlamento, não há nenhuma matéria

mais importante do que a da nacionalidade, que é aquilo que, no fundo, nos une e determina quem é ou não é

português.

Em segundo lugar, gostaria de dizer que, dentro desta discussão entre jus soli e jus sanguinis e sobre o peso

e a relevância de qualquer um dos critérios, historicamente já estivemos mais próximos de ter um jus soli como

critério determinante e já tivemos uma maior relevância do jus sanguinis. Temos procurado ter algum equilíbrio

que vem sendo, de há uns tempos a esta parte, progressivamente desequilibrado para o lado do jus soli. Não

se trata do facto de ambos os critérios não serem relevantes, e pegando, enfim, com o meu talento, que não

será muito, em algumas reflexões mais poéticas que aqui ouvi, quero lembrar que, de facto, a nossa ligação a

uma nacionalidade é sempre, em alguma medida, a ligação a um quinhão de terra que, em muitos casos, nos

viu nascer e que, em muitos casos também, nos receberá um dia. Esta é, de facto, a relevância do jus soli, mas

a ligação a essa terra está, obviamente, no nosso sangue, no sangue dos nossos ascendentes, dos nossos

descendentes, no sangue de muitos e muitos portugueses espalhados pelo mundo, numa nação que é,

obviamente, muito maior e com uma dimensão muito superior à do seu território ⎯ essa é a realidade.

É por isso que aquilo que os partidos mais à esquerda têm defendido, têm feito e têm proposto, ano após

ano, legislatura após legislatura, sem sequer deixar amadurecer as soluções anteriores, como aqui foi dito, e

bem, é um erro.

Nós tínhamos, de facto, um prazo de cinco anos, reduzimo-lo para dois anos e agora vamos num ano, sem

sequer querer saber se a entrada em Portugal foi legítima ou ilegítima, se foi legal ou ilegal. Trata-se de um erro

absoluto, do nosso ponto de vista, e um erro que esta alteração não só não trava, como incentiva e que tem

efeitos muito errados.

Somos a favor de rigor na entrada, somos a favor de todo o tipo de humanismo, somos contra todo o tipo de

discriminação na integração, mas aprovar uma lei deste tipo, feita, na minha opinião, com os pés ⎯ com os pés,

literalmente, pois quem põe os pés em território português passa a ser considerado português ⎯ é um erro

absoluto e uma desnecessidade absoluta.

A terminar, Sr. Presidente, em relação ao veto em concreto, gostaria de dizer que o fundamento do veto do

Sr. Presidente da República é outro: a existência de possíveis discriminações. Confrontados com isso, o que

poderíamos fazer? Dizer «então, se há discriminação, não se aplica a ninguém» não me parece que fosse muito

curial no âmbito do veto e da matéria que estamos a discutir.

Portanto, manteremos a nossa posição de princípio. Votaremos contra as alterações que levariam a um

alargamento ainda maior, mantendo a nossa ideia de que a Lei da Nacionalidade estava bem como estava.

Página 11

3 DE OUTUBRO DE 2020

11

Somos contra a alteração. Temos uma visão restritiva desta matéria, porque consideramos que as propostas de

alterações resultam num desvalor da nacionalidade portuguesa, que é o que mais queremos valorizar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): ⎯ Sr. Presidente, pode dizer-se que esta Lei da Nacionalidade tem coisas boas e coisas originais, mas as que são boas não são originais e as que são originais são piores que boas.

Protestos do PS e do BE.

Na verdade, estamos perante uma norma e perante um veto do Presidente da República feito por uma única

razão: por taticismo, visto que queria dar um sinal para fora, mas não um sinal para o Partido Socialista.

Outra verdade tem de ser dita, também: o Partido Socialista cedeu à extrema-esquerda na Lei da

Nacionalidade. Basta que os portugueses saibam, hoje, que já não se distingue entre residência legal e

residência ilegal para perceberem que tanto faz entrar em Portugal bem, com documentos ou sem documentos,

de forma legal ou ilegal, de forma lícita ou de forma ilícita, para, depois, se vir a obter a nacionalidade.

Hoje, podemos dar as voltas que quisermos a esta lei, chamar-lhe jus soli ou chamar-lhe o que quisermos,

mas a verdade é que ela transmite para fora esta ideia: «Entrem de qualquer maneira, escondam-se, se

puderem, porque daqui a um tempo, alguém da vossa família há de receber a nacionalidade portuguesa.»

Esta não distinção abre a porta àquilo que já não é uma nacionalidade pelo solo ou uma nacionalidade pelo

sangue, mas a uma nacionalidade atribuída independentemente de as razões serem legais ou ilegais. É uma

nacionalidade próxima de ser criminosa ou, pelo menos, próxima de ser, assim, atribuída. Isso é uma realidade

indesmentível!

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): ⎯ Vou terminar, Sr. Presidente. Amanhã, quando olharmos para esta Lei da Nacionalidade, vamos poder dizer muitas coisas, mas não é de

humanismo que vamos falar: é de uma nacionalidade que esqueceu o que é ser nacional de um país. É isso

que foi esta Lei da Nacionalidade.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos ao fim deste primeiro ponto da nossa ordem do dia…

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada Joacine Katar Moreira não dispõe de tempo neste debate.

Pausa.

Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada Joacine Katar Moreira invoca a possibilidade que o Regimento lhe dá de

proferir uma intervenção de 10 minutos por cada sessão legislativa, mas julgo que tal não acontece neste

contexto, em que há uma grelha de tempos previamente definida e em que a intervenção da Sr.ª Deputada não

está prevista.

Pausa.

Srs. Deputados, peço-lhes só um momento enquanto a Mesa esclarece esta questão.

Pausa.

Página 12

I SÉRIE — NÚMERO 9

12

Srs. Deputados, a Sr. Deputada Joacine Katar Moreira invoca outro artigo do Regimento, mais

especificamente o n.º 4 do artigo 145.º. E tem razão, porque, ao abrigo deste artigo, tem o direito de utilizar o

mesmo tempo que os Deputados únicos representantes de um partido ⎯ neste caso, 1 minuto ⎯, em cinco

debates ao longo de cada sessão legislativa.

Portanto, depois desta intervenção, que será de 1 minuto, fica ainda com 4 minutos. Efetivamente, tem direito

a falar 1 minuto neste debate.

Sr.ª Deputada, obrigado por nos ter clarificado o Regimento.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por referir que não foram efetivamente feitos avanços enormes na melhoria da atual Lei da Nacionalidade, mas, mesmo assim, estes

avanços, estas melhorias, têm um impacto enorme no que diz respeito a uma legislação mais enquadrada e que

tem uma ótica mais humanizante dos indivíduos que requerem a nacionalidade.

Esta não é uma legislação qualquer. Trata-se de uma legislação que tem um impacto gigantesco na

existência de milhares de indivíduos, nas suas expectativas e, sobretudo, trata-se de uma legislação relacionada

com uma série de questões altamente complexas, nomeadamente as da identidade e da pertença a uma

comunidade.

Acompanharei todas as iniciativas legislativas e sugestões de alteração que estejam relacionadas com o

aumento da cidadania e com uma maior igualdade. Mas, hoje, importa ressalvar aqui algo: quais os benefícios

para o Estado, para a sociedade da exclusão da cidadania a uma parte importante dos indivíduos que fazem

parte integrante, de uma forma quotidiana, e que contribuem, constantemente, para o tecido nacional…

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): ⎯ Quais os benefícios para o Estado da exclusão de jovens negros nascidos em Portugal entre 1981 e 2006, que, até hoje, continuam sem ter acesso à nacionalidade? Sabemos

o impacto que tem a falta de reconhecimento de cidadania nas suas vidas, nas suas expectativas e nas

dificuldades enormes que têm de inserção social.

Gostaria ainda de referir que não vejo qualquer diferença em se atribuir a nacionalidade a uma criança que

tem um pai ou uma mãe que se encontram em Portugal há 1 ano ou dar-lhe a nacionalidade na altura em que

este indivíduo nasce em solo português.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem mesmo de terminar.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (Não insc.): ⎯ A nacionalidade não é um elemento que possa ser decretado em termos de legislação.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (Não insc.): ⎯ Há muitos jovens que não têm a nacionalidade, mas que, mesmo assim, se sentem elementos integrantes do tecido nacional.

A nós cabe-nos não os afastar.

O Sr. Presidente: — Quando há estes pedidos de intervenção, temos de cumprir a regras: a Mesa, por um lado, e a Sr.ª Deputada, por outro.

Vamos, então, passar ao segundo ponto da nossa ordem do dia, que consta da reapreciação do Decreto n.º

59/XIV — Primeira alteração à Lei n.º 17/2014, de 10 de abril, que estabelece as Bases da Política de

Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional.

Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): ⎯ Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Podemos encarar o veto do Sr. Presidente da República ao decreto que visava alterar a Lei de Bases do Ordenamento e Gestão do Espaço

Página 13

3 DE OUTUBRO DE 2020

13

Marítimo Nacional como um retrocesso no aproveitamento das potencialidades do mar ou podemos encará-lo

como uma segunda oportunidade para repensar o diploma e, de forma ponderada, aliada a uma visão

estratégica, introduzir-lhe as melhorias que se mostrem necessárias por forma a potenciar o aproveitamento

deste ativo estratégico e contribuir para o colocar na centralidade que se impõe.

Para o PSD, o veto do Sr. Presidente da República constitui, claramente, uma oportunidade para que a

Assembleia da República aprove alterações à Lei de Bases do Ordenamento e Gestão do Espaço Marítimo

Nacional que sirvam, realmente, os melhores interesses do continente e das Regiões Autónomas dos Açores e

da Madeira, numa palavra, que sirvam melhor o mar português e Portugal.

Esta lei é crucial ao desenvolvimento do mar português e, consequentemente, crucial ao desenvolvimento

de Portugal.

Trata-se de uma lei que se pretende ampla e integrada, uma lei inovadora que defina o quadro da política do

ordenamento do espaço marítimo nacional, a sua articulação e compatibilização com os instrumentos de

planeamento, nomeadamente com planos de situação e de afetação.

Mesmo assim, compreendemos e acompanhamos a motivação inicial da proposta vinda da Assembleia

Legislativa Regional dos Açores, visando o reforço das competências em matéria de ordenamento e gestão do

espaço marítimo adjacente às regiões autónomas, o que no nosso entender é possível e mesmo desejável,

desde que não seja colocada em causa a integridade e a soberania do Estado, como exige, aliás, a Constituição

da República Portuguesa, tendo-se já, por diversas vezes, pronunciado sobre esta matéria o Tribunal

Constitucional.

Porém, o que se passou no processo legislativo foi, no nosso entender, muito além deste reforço. Foi um

atropelo das competências do Estado e das regiões autónomas. Por essa razão, a bancada do PSD apresentou,

aquando da votação final global, uma declaração de voto, onde manifestámos as nossas dúvidas e incertezas

quanto ao texto aprovado. Alertámos, na altura, para o risco de violação da Constituição e manifestámos o nosso

receio relativamente à formulação aprovada para maior inclusão das regiões autónomas na definição do

ordenamento e gestão da área do espaço adjacente aos arquipélagos dos Açores e da Madeira.

O que nos parece é que a solução que o PS decidiu aprovar iria originar situações de conflito de interesses

que inviabilizariam a gestão e o ordenamento desse mesmo espaço marítimo, comprometendo assim a sua

utilização na perspetiva da sua valorização e salvaguarda, tendo como finalidade contribuir para o

desenvolvimento sustentável do País e do mar.

Por isso, foi com agrado, mas sem surpresa, que recebemos o veto presidencial, que se debruça

especialmente sobre as alterações ao nível do novo artigo 31.º-A, relativo, precisamente, às regiões autónomas.

É proposto à Assembleia da República uma reflexão complementar sobre essa matéria: no caso dos fundos

marinhos é sugerido que o procedimento deve garantir a conjugação efetiva entre o Estado e as regiões

autónomas através de parecer obrigatório e vinculativo; no mesmo sentido, no caso das atividades de extração

de inertes, pesca e produção de energias renováveis, a competência das regiões autónomas deve incluir a

integridade e a soberania do Estado.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD, defensor da lei de bases do ordenamento e gestão do espaço

marítimo nacional, está, desde a primeira hora, disponível para melhorar procedimentos da lei ou da sua

regulamentação, no sentido de aprofundar a participação das regiões autónomas, sem que tal ponha em causa

três vetores essenciais: primeiro, o princípio da integridade e soberania do Estado; segundo, a valorização do

mar português, ou seja, que não se torne o mar português ingerível, como ficará com esta proposta que hoje

reapreciamos, comprometendo o seu potencial e valorização; terceiro, a posição negocial de Portugal como

interlocutor único em processos negociais, seja a nível europeu, na fixação das quotas de pescas, seja nas

Nações Unidas, no processo essencial para o nosso País que é a extensão da plataforma continental.

A oportunidade que Portugal tem no mar é enorme, não a ponhamos em causa. O desenvolvimento através

do mar por todos é dito como fundamental e consensual. No entanto, infelizmente, veio mais uma vez o PS, na

última hora, no último minuto, apressadamente, apresentar outra proposta que tem como única preocupação

obstar ao possível veto do Sr. Presidente da República e não, como os Açores, a Madeira e Portugal mereciam,

aproveitar esta última oportunidade para desenvolver e remediar esta lei e torná-la, realmente, naquela lei de

que Portugal precisa, de que o mar precisa e que nos colocaria como ponto estratégico, como, aliás, o PSD

tanto pugnou. Pena foi não nos terem ouvido.

Página 14

I SÉRIE — NÚMERO 9

14

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal, para proferir a sua intervenção.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaríamos de agradecer ao Sr. Presidente da República — podemos dizer que verdadeiramente «acordou e vetou» — por mais esta

oportunidade de sublinhar a importância da autonomia da Região Autónoma dos Açores.

O decreto que agora voltamos a discutir é, sem dúvida, um passo importantíssimo na gestão do mar dos

Açores. Este mar que tanto significa emocionalmente para os açorianos, mas que tarda em realizar todo o seu

potencial económico e de desenvolvimento para a Região.

É evidente que a gestão do mar dos Açores não pode ser decidida à revelia dos açorianos, pelo contrário

são os açorianos quem têm de assumir um papel preponderante na definição da política de gestão do seu mar.

Isto é, aliás, tão evidente que está previsto no Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores:

os poderes do Estado português em relação às zonas marítimas sob jurisdição nacional adjacentes aos Açores

são exercidos no quadro de uma gestão partilhada com a Região.

Só a gestão partilhada permitirá valorizar o mar dos Açores, os seus recursos e o seu valor geoestratégico,

com base no conhecimento dos açorianos, fruto da experiência, mas também do conhecimento produzido

localmente, nomeadamente na Universidade dos Açores.

A Iniciativa Liberal tem como uma parte essencial do seu programa a descentralização de competências,

estreitamente acompanhada pela descentralização de recursos e pela descentralização de responsabilidades.

Mais liberdade, mais responsabilidade é o nosso mantra.

Por tudo isto, não temos dúvidas em afirmar que este diploma é fulcral para garantir aos açorianos — e não

confundir com o governo regional do PS, que tudo quer controlar na Região — o direito de decidir como gerir o

seu próprio mar.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PS. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Azevedo Castro.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Azevedo Castro (PS): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: As regiões autónomas de Portugal, os Açores e a Madeira, dotam o País de uma dimensão atlântica

incomparável, na Europa e no Mundo, com o que de mais valioso e precioso detêm — o mar.

É justo e equilibrado que o País, aqui representado, promova a sua participação nas áreas do ordenamento

e gestão deste recurso.

Com a aprovação desta iniciativa, a Assembleia da República dá um sinal claro da disponibilidade para

considerar as suas regiões e de as capacitar com uma voz ativa na interpretação dos seus anseios e aspirações.

A Constituição da República Portuguesa confere às regiões autónomas o poder de «…participar na definição

das políticas respeitantes às águas territoriais, à zona económica exclusiva e aos fundos marinhos contíguos».

O Estatuto Político Administrativo da Região Autónoma dos Açores refere a região como a entidade

competente para o licenciamento, no âmbito da utilização privativa de bens do domínio público marítimo do

Estado, das atividades de extração de inertes, da pesca e de produção de energias renováveis. Refere ainda

que os demais poderes reconhecidos ao Estado português sobre as zonas marítimas são exercidos no quadro

de uma gestão partilhada com a região, salvo quando esteja em causa a integridade e a soberania do Estado.

A Lei de Ordenamento e Gestão do Espaço Marítimo em vigor, que se altera com a presente iniciativa,

determina que os instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional são elaborados pelo Governo,

com consulta prévia dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, bem como os instrumentos de

ordenamento do espaço marítimo nacional que digam respeito à plataforma continental, para além das 200

milhas marítimas, são elaborados pelo Governo, ouvidas as regiões autónomas.

Torna-se, assim, evidente a necessidade de corrigir a articulação com a Lei de Ordenamento e Gestão do

Espaço Marítimo Nacional quando restringe a intervenção das regiões autónomas a uma consulta prévia ou a

Página 15

3 DE OUTUBRO DE 2020

15

uma mera audição, numa limitação clara do poder de participação conferido pela Constituição da República

Portuguesa, ou de gestão partilhada, conforme o Estatuto Político-Administrativo, também aprovado nesta Casa.

É neste contexto que o Programa do XXII Governo Constitucional propõe concretizar uma maior intervenção

das regiões autónomas em sede de gestão e exploração dos espaços marítimos respetivos, através da alteração

da Lei de Bases da Política de Ordenamento e Gestão do Espaço Marítimo Nacional.

Foi neste contexto que a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, mediante proposta do

Governo Regional, aprovada por unanimidade, suscita à Assembleia da República a proposta de lei n.º

179/XIII/4.ª (ALRAA), visando a necessidade de clarificação do conceito de «gestão partilhada», no respeito pela

Constituição da República Portuguesa e pelo Estatuto Político-Administrativo.

Foi neste contexto que, depois de uma ampla participação na especialidade, envolvendo quatro comissões

permanentes deste Parlamento, a Assembleia da República aprovou a proposta de lei de alteração da Lei do

Ordenamento e Gestão do Espaço Marítimo Nacional, enviada para promulgação com a publicação do Decreto

n.º 59/XIV.

O Sr. Presidente da República devolve à Assembleia da República, sem promulgação, referindo aspetos que

nos deverão merecer a maior atenção. Considera não haver razões suficientes para suscitar a fiscalização

preventiva da inconstitucionalidade de qualquer das suas normas, nomeadamente as constantes do n.º 3 do

ponto 8 do artigo 31.º-A. Mais refere que tais normas ressalvam a primazia da integridade e da soberania do

Estado, que tornam indelegáveis os poderes primários sobre o domínio público marítimo.

Considera, contudo, que deve merecer reflexão complementar e precisão acrescida o tocante às alíneas c)

e d) do n.º 3 do citado artigo 31 º-A. Complementa, ainda, ao referir, na alínea c), que se ganhará em exigir que

os procedimentos de codecisão constem, ao menos no seu traçado essencial, dos instrumentos de ordenamento

previstos no n.º 3 do artigo 8.º, assim garantindo a conjugação entre Estado e regiões autónomas na definição

desse traçado. Um aditamento cumprirá essa função.

Na alínea d), será importante ressalvar explicitamente as matérias relativas à integridade e à soberania do

Estado mediante aditamento final.

É neste contexto que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresenta a proposta de alteração, no

sentido de corresponder exatamente às considerações do Sr. Presidente da República, que nos parecem

pertinentes.

Votaremos, pois, favoravelmente a presente proposta, que atribui também às regiões autónomas uma

responsabilidade e uma participação efetiva na construção do mar de Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado João Dias.

O Sr. João Dias (PCP): — Antes de mais, cumprimento o Sr. Presidente e os Srs. Deputados. Neste momento, estamos a reapreciar o Decreto da Assembleia da República n.º 59/XIV, que procede à

primeira alteração à Lei n.º 17/2014, de 10 de abril, que estabelece as Bases da Política de Ordenamento e de

Gestão do Espaço Marítimo Nacional.

Srs. Deputados, para nós, o facto de estarmos a reapreciar este decreto só vem dar razão às preocupações

que o PCP manifestou desde logo, ainda em 2019, aquando da discussão do respetivo diploma na generalidade

e mesmo na especialidade, e que se prendiam, no essencial, com o pleno exercício da soberania nacional. O

que nos suscitou dúvidas foi, precisamente, as alterações que esta proposta produzia, no seu artigo 8.º, bem

como a introdução de um novo artigo, o artigo 31.º-A. No nosso entender, na altura, não estavam

salvaguardadas a competência e a integridade da soberania do Estado.

Srs. Deputados, neste momento, parece-nos bastante claro que o que importa fazer é salvaguardar dois

aspetos. Por um lado, como já aqui foi sobejamente falado, a integridade da soberania nacional e a garantia da

unidade do Estado, e, por outro lado, conciliar isso com as competências próprias das regiões autónomas, e,

em concreto, com uma matéria como esta, sensível, que é a Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço

Marítimo Nacional.

Página 16

I SÉRIE — NÚMERO 9

16

Poderemos perguntar se é fácil. Não é fácil, Srs. Deputados, não é fácil. Mas é preciso encontrar soluções

para estas dificuldades. Essas soluções têm de estar conforme a Constituição da República, e, ao mesmo tempo,

devem respeitar o Estatuto Político-Administrativo das Regiões Autónomas. É por isso que o PCP entende que

estamos perante uma matéria — Srs. Deputados, temos de ter essa consciência — que deve ser um fator de

unidade e não um fator de divisão. E é nesse sentido, ao apreciarmos as propostas que foram agora

apresentadas pelo Sr. Deputado João Castro e que o Grupo Parlamentar do PS aqui nos faz chegar, que o PCP

entende que essas propostas são razoáveis para responder às exigências que agora aqui colocámos, pelo que

acompanharemos essas propostas.

Srs. Deputados, estamos todos convocados para o respeito pela soberania nacional, mas como fator de

unidade e não de divisão.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN. Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No debate sobre a lei do mar, saltou à vista que havia duas posições bastante claras. Por um lado, havia a posição daqueles que, do alto da

sua sobranceria, queriam deixar tudo na mesma, em nome de uma suposta soberania nacional, dando rédea

curta aos Açores, querendo que a autonomia fosse uma mera pena no chapéu do continente. E, por outro lado,

havia a visão daqueles que, como o PAN, não querendo ficar preso a uma visão antiquada da autonomia dos

Açores, pretendia assegurar importantes mudanças que garantissem que a região pudesse ter uma verdadeira

autonomia e passasse a ter uma palavra a dizer no que diz respeito à gestão do espaço marítimo que lhe está

adjacente.

Que sentido faria um modelo em que eram os gabinetes do Terreiro do Paço que tomavam sozinhos decisões

sobre a gestão do espaço marítimo das regiões autónomas, neste caso a dos Açores? Que sentido faria que a

gestão do espaço marítimo dos Açores não desse preponderância ao conhecimento, experiência e saber da

região local?

O mar dos Açores não pode servir apenas para que nosso País venha dizer que tem uma das zonas

económicas exclusivas maiores do mundo. O País tem de saber valorizar a importância que este mar tem para

a zona económica exclusiva e tem, também, de reconhecer essa importância através da previsão de uma lógica

de gestão partilhada deste espaço e garantir o envolvimento ativo da Região Autónoma dos Açores nessa

gestão.

Quando sabemos que nos Açores têm vindo aumentar de forma preocupante os níveis de desemprego, esta

alteração representa, também, uma forma de criar emprego e de gerar dinamismo na economia da região, pois

não duvidamos que o reforço das competências dos Açores em matéria de gestão do espaço marítimo poderá

significar uma gestão mais sustentável e respeitadora dos ecossistemas, uma vez que ninguém mais do que a

própria região tem interesse na sua preservação, contribuindo para a transição para uma economia e um modelo

de desenvolvimento mais sustentável.

No entanto, neste debate, não podemos também deixar de fazer uma crítica ao Partido Socialista, uma vez

que todos sabemos que esta alteração simples se limita apenas a concretizar o que a Constituição e o próprio

estatuto político administrativo da região já preveem há vários anos e que já devia ter ocorrido anteriormente. E

não deixa de ser lamentável, depois de, em 2016, sobretudo em períodos eleitorais, em que gostámos de ver o

nosso Primeiro-Ministro a arrogar-se como defensor das regiões, tendo prometido levar a cabo esta alteração,

verificarmos agora que nada foi feito para a concretizar, o que é demonstrativo da importância que o PS dá aos

Açores.

Dito isto, o PAN, ainda que considerando que o diploma não carecia das clarificações excessivas exigidas

pelo Sr. Presidente da República, vai votar a favor das propostas de alteração apresentadas, para que este

diploma possa ser viabilizado com amplo consenso, indo assim ao encontro daquilo que é um ensejo da própria

região autónoma, para que possa salvaguardar uma melhor gestão do seu espaço marítimo, num respeito mais

profundo pelos ecossistemas e a biodiversidade que a própria região acolhe.

Página 17

3 DE OUTUBRO DE 2020

17

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, esta norma tem a particularidade de vários partidos e vários grupos parlamentares terem chamado a atenção para a grosseira inconstitucionalidade que representava, sendo

que esta lei torna ainda possível a verificação política e não jurídica.

Quando o Sr. Deputado João Azevedo Castro terminou, a quantidade de Deputados do Partido Socialista

que nem sequer o aplaudiram… Sabe porque é que não o aplaudiram, Sr. Deputado? Porque vão votar contra

esta norma. Membros do Partido Socialista vão votar contra, porque sabem que é grosseiramente

inconstitucional o que aqui traz hoje.

Vou dar-lhe um exemplo — e não é preciso pensar muito —, que é o facto de as matérias ditas de interesse

de soberania não estarem devidamente caracterizadas neste diploma.

Protestos de Deputados do PS.

Nenhum Tribunal Constitucional do mundo deixará passar uma norma com estas características.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Não é verdade!

O Sr. André Ventura (CH): — É verdade, Sr. Deputado! Não diga que não é verdade, porque é. As ditas matérias de soberania não estão aqui caracterizadas, o que torna a gestão do Estado central, para

lá das 200 milhas, meramente residual. É grosseiramente inconstitucional, porque torna o Estado central num

mero artífice na gestão para lá das 200 milhas.

Protestos do Deputado do PS Carlos Pereira.

Digo-lhe mais: vai enfraquecer a posição de Portugal nas Nações Unidas, na negociação do espaço marítimo

e, mais grave ainda, nas quotas de pesca em matéria de negociação com a União Europeia. Por isso, esta lei é

mais grave do que parece e é muito pior do que na verdade se apresenta. É uma lei que vai destruir a capacidade

negocial de Portugal e uma norma que em caso algum este Tribunal Constitucional, se fizer um juízo sereno e

ponderado, deixará passar.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente. Por isso mesmo, vamos ver quantos Deputados do Partido Socialista votarão a favor desta norma, que só

tem um nome: inconstitucional.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Vicente, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Ricardo Vicente (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: A população dos Açores demonstrou bem o seu descontentamento com a falta de autonomia da região e com as limitações da Lei de

Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo.

É bom relembrar que esta lei, que amputou a democracia da Região Autónoma dos Açores e subalternizou

a administração regional, foi criada pelo Governo de PSD e CDS, mas a sua aprovação contou também com o

voto favorável do Partido Socialista.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

Página 18

I SÉRIE — NÚMERO 9

18

O Sr. Ricardo Vicente (BE): — O Bloco de Esquerda considera que os órgãos de governo próprio devem ter um papel ativo na gestão do espaço marítimo adjacente aos arquipélagos dos Açores e da Madeira e que,

por isso, é urgente capacitar as populações locais para decidir e influenciar as decisões sobre o seu próprio

território. Esta necessidade foi bem visível com as duas iniciativas legislativas aprovadas na Assembleia

Legislativa da Região Autónoma dos Açores, uma das quais partiu da iniciativa do Bloco de Esquerda.

O Bloco considera, assim, que a proposta de alteração à lei hoje em debate representa um avanço face à

situação inicial, mesmo considerando as alterações identificadas pelo Presidente da República, que se recusou

a promulgar a primeira proposta de alteração ao diploma. Mas não podemos deixar de lamentar que esta

proposta de lei não vá mais além na atribuição de autonomia às regiões autónomas, tal como previa a proposta

do Bloco de Esquerda, pois a economia do mar é absolutamente essencial para o desenvolvimento

socioeconómico da região.

O alargamento da plataforma continental está a abrir um conjunto de possibilidades novas, algumas delas

de elevadíssimo risco ambiental. A este respeito, a possibilidade de mineração profunda do mar dos Açores é

um bom exemplo, pois o Governo parece preparar-se para escancarar reservas de elevado valor ecológico a

uma indústria extrativista, o que terá enormes custos ecológicos para a economia do mar do arquipélago dos

Açores. Quais alterações climáticas?!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!

O Sr. Ricardo Vicente (BE): — Apesar de o Ministro do Mar defender a aplicação de uma moratória de 20 anos à mineração em mar profundo, parece que está sozinho nesta proposta. O Ministro do Ambiente, o Governo

e o Partido Socialista assobiam para o lado, situação que só podemos considerar lamentável. É lamentável

também que este assunto não tenha sido preocupação do Presidente da República, na sua análise.

Em vez de entregar os recursos locais à voracidade do mercado e da finança, precisamos de políticas

públicas para uma economia assente no conhecimento, na investigação científica e no desenvolvimento

tecnológico, com alicerces participativos e democráticos, que respondam aos interesses das populações.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, queria dizer que o que está em causa com este veto e com as alterações subsequentes pode ser discutido de todas as formas, mas não estamos a

discutir exatamente que tipo de indústrias é que a Região Autónoma, os açorianos ou até o País vão ter ou não

vão ter, não é isso que está em causa. No fundo, estamos numa questão essencial anterior a essa, que é a da

arquitetura. Podemos desviar a conversa para outro lado qualquer, mas não é disso que estamos a falar.

Estamos a falar da arquitetura do sistema e das responsabilidades partilhadas.

Dito isto, obviamente que subscrevemos o que foi dito por diferentes grupos parlamentares sobre a relevância

dos Açores. De resto, somos defensores claros de uma visão atlântica e de atlantismo do País, por um lado,

sendo o mar e a relevância dos Açores a essência ou a expressão maior, se quisermos, desse Portugal atlântico.

Bastará recordar, como é dito tantas vezes, que, para quem vê do continente, as últimas ilhas dos Açores estão

já na placa americana e não na placa continental europeia. Portanto, é essa a importância, é isso que nos dá

dimensão, é isso que nos projeta e temos claramente essa noção da relevância dos Açores.

Por outro lado, somos também, de há muitas décadas a esta parte, um partido defensor e respeitador da

capacidade de autonomia regional e, nesse sentido, somos autonomistas. No entanto, como é evidente, é

preciso encontrar um equilíbrio entre a visão da importância do mar — mar que, antes de ser açoriano, é

português — e o interesse da autonomia nesta matéria.

Sob esse ponto de vista, queria dizer que esta questão não apareceu nem surgiu agora. Esta pretensão, que

é muito firme nos Açores, já esbarrou e já chumbou várias vezes quando confrontada com a questão

constitucional. Vamos ver se isso não acontece mais uma vez. Lembra a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, e bem,

Página 19

3 DE OUTUBRO DE 2020

19

que foram seis vezes, portanto, vamos ver se isso não acontecerá mais uma vez. Independentemente disso,

esse é o ponto e a questão central.

As alterações que temos agora em cima da mesa resolverão ou não a situação? O CDS teve uma posição

reservada e, de resto, é surpreendente ter ouvido aqui hoje uma expressão como, se não estou em erro, porque

estou a citar de cor, «uma suposta soberania nacional». A soberania nacional não é «suposta». O ponto primeiro,

básico e essencial da Constituição da República Portuguesa é a defesa e existência da soberania nacional.

Por isso, a nossa posição é cautelar, como foi na votação final da lei, aguardando que se consiga encontrar

esse equilíbrio entre uma pretensão açoriana e autonomista e uma responsabilidade soberanista e de

integridade do território nacional.

O Sr. Presidente: — Chegamos, assim, ao final da reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 59/XIV.

Passamos ao terceiro ponto da ordem do dia, com a discussão conjunta dos Projetos de Resolução n.os

641/XIV/2.ª (CDS-PP) — Adoção de medidas para o regular funcionamento dos cuidados de saúde primários,

248/XIV/1.ª (PAN) — Garantir um Serviço Nacional de Saúde de qualidade, 630/XIV/2.ª (PCP) — Medidas para

a recuperação da atividade nos cuidados de saúde primários e 656/XIV/2.ª (BE) — Recuperação e reforço da

atividade dos cuidados de saúde primários.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Já antes da pandemia eram conhecidas e verificáveis as limitações do SNS (Serviço Nacional de Saúde) na garantia de cuidados de saúde

a todos os cidadãos, em todas as zonas do País, a tempo e horas. Agora, com sete meses de uma crise de

saúde pública que tende a entrar em nova fase aguda, a consequência destas limitações é ainda mais

preocupante.

Segundo o Presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, até julho, ficaram por

realizar 7 milhões de contactos presenciais, entre enfermagem e consultas médicas, só nos cuidados de saúde

primários. A jusante, nos hospitais, ficaram por fazer 900 000 consultas e 90 000 cirurgias. Tudo isto pode ter

efeitos, e efeitos graves, na saúde dos portugueses.

Sr.as e Srs. Deputados, tão grave como a crise de saúde pública da COVID-19, ou até mais grave, é esta

outra crise da doença não-COVID, de pessoas que não estão a ser diagnosticadas e não estão a ser tratadas

no tempo certo — em alguns casos, a tempo. É importante que seja explicado o excesso de mortalidade, com

mais 6000 mortes do que em igual período de 2019, das quais menos de 2000 são por COVID. E é preocupante

a suspeita do aumento das morbilidades, que não temos como avaliar ou dimensionar.

Neste momento, os hospitais retomam lenta e assimetricamente a sua atividade, mas o Plano para o Outono-

Inverno da DGS (Direção-Geral da Saúde) não se consegue aplicar nos cuidados de saúde primários e a porta

de entrada para o SNS não está realmente aberta. Isto porque os médicos de família estão crescentemente

sobrecarregados com a vigilância COVID, no despiste de doentes suspeitos ou no seguimento diário dos casos

em isolamento, e porque têm de assegurar as novas áreas dedicadas aos sintomas respiratórios e as

deslocações para os lares, quando assim é requerido.

Portanto, os médicos não conseguem fazer as consultas nem acompanhar os 1900 doentes das suas listas,

muito menos os outros que nem nas listas estão. As pessoas dirigem-se aos centros e unidades de saúde e

deparam-se com filas para senhas de marcações e filas para senhas de consultas, tudo do lado de fora para

garantir a distância social, que, claro, à porta, se torna numa ficção aos olhos de todos.

A Sr.ª Ministra afirma que será difícil atingir o nível de 2019 na assistência a outras doenças, mas a verdade

é que não tem de ser assim. Dever-se-ia ter começado a trabalhar mais cedo, mas ainda é tempo, se forem

tomadas algumas medidas que o CDS recomenda neste projeto.

Dessas medidas destaco, em primeiro lugar, a colocação dos novos médicos de família que se candidataram

às 435 vagas do concurso de maio e que ainda não foram contratados. A sua falta contribui para que, hoje,

quase 1 milhão de portugueses não tenha médico de família, mais 300 000 utentes do que no ano passado.

Onde terá ficado a promessa de um médico e de uma equipa de saúde familiar para cada português?

Página 20

I SÉRIE — NÚMERO 9

20

Em segundo lugar, destaco o reforço criterioso e ágil dos recursos humanos — enfermeiros, assistentes

operacionais e assistentes técnicos — e dos meios, seja a capacidade das centrais telefónicas, seja o sistema

de marcação digital, para uma resposta célere e segura aos cidadãos.

Destaco, em terceiro lugar, a garantia da cobertura nacional da rede de cuidados de saúde primários, com

plena capacidade de resposta, se necessário, contratualizando com os setores privado e social.

Sr.as e Srs. Deputados, no momento presente, querer teimosamente provar que só o SNS basta é fechar a

porta a muitos portugueses, pondo em risco a sua saúde para além da COVID. Há unidades privadas e

profissionais de saúde disponíveis, mesmo que transitoriamente, para aliviar a pressão nos cuidados de saúde

primários e no SNS. A escolha é simples e cristalina: vai o Governo usá-los para cuidar das pessoas ou vai usar

as pessoas para cuidar do SNS?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde o início da crise sanitária que sabemos quer da possibilidade de surgir uma segunda onda COVID-19, quer de um número significativo de

vários surtos que irão agravar a situação de risco de doença respiratória das pessoas, particularmente das mais

vulneráveis, e, com isso, aumentar a necessidade de resposta dos serviços de saúde públicos. É preciso

potenciar o que se tem aprendido com esta crise e, acima de tudo, antecipar estes problemas.

Apesar de o Governo ter reforçado as equipas de saúde em contexto hospitalar, os défices estruturais e o

cenário que se adivinha exigem uma verdadeira coragem e priorização desta área, agora e no próximo

Orçamento do Estado. Não podemos ignorar a realidade dos profissionais de saúde que se encontram no

terreno, que não olham a horas ou a acréscimo de trabalho para cumprirem as suas responsabilidades. Mas

estes profissionais, Sr.as e Srs. Deputados, estão a ficar esgotados.

As políticas de reforço do SNS têm esquecido as equipas dos cuidados de saúde primários, não obstante o

imprescindível papel que estas têm no acompanhamento de utentes, para além de todas as suas outras funções

e responsabilidades. A Organização Mundial da Saúde realça que «os cuidados de saúde primários podem

cobrir a maioria das necessidades de saúde de uma pessoa durante toda a sua vida, incluindo a prevenção, o

tratamento, a reabilitação e os cuidados paliativos».

Mas, para isso, é preciso priorizar, investir, cuidar de quem cuida; e é preciso ouvir. Um dos problemas que

constantemente nos é relatado é o da falta de comunicação e diálogo do Governo com estes profissionais, cuja

presença no SNS importa garantir. Finalmente, hoje, ouvimos a Sr.ª Ministra da Saúde dizer que quer ouvir estes

profissionais. Haja esperança!

É necessário um plano eficiente de recuperação da atividade nos cuidados de saúde primários, pois os

profissionais destes cuidados de saúde assumem uma enorme responsabilidade na vigilância e monitorização

dos utentes. Neste sentido, o PAN recomenda ao Governo que prossiga com todas as medidas de reforço do

SNS, sem esquecer o reforço de profissionais e a melhoria das condições de trabalho ao nível dos agrupamentos

de centros de saúde (ACES), bem como a cobertura nacional da rede de cuidados de saúde primários.

Lembramos que quase 1 milhão de pessoas continua sem médico de família — eu sou uma delas, mas já há

quase 34 anos.

O Plano da Saúde para o Outono-Inverno 2020-2021 orienta no sentido da retoma da atividade normal dos

cuidados de saúde primários, mas todos sabemos o quanto é difícil e demorado contactar as unidades de saúde

públicas, seja porque se priorizam as situações urgentes, ou porque houve um acréscimo expressivo de

contactos, ou porque as redes de comunicação se encontram obsoletas, ou porque faltam meios humanos. A

realidade é que se tornam exasperantes as tentativas de contacto dos cidadãos e das cidadãs com os cuidados

de saúde públicos — seja até porque, antes deste surto, cada médico de família já tinha, em média, 1900 doentes

para acompanhar.

Por isso, a proposta que o PAN traz hoje é no sentido de serem reforçadas e melhoradas as condições que

viabilizem um serviço de comunicação telefónica e eletrónica mais eficiente, quer neste contexto específico quer

fora dele, uma vez que uma boa comunicação estabelece a confiança e reduz muitos dos contactos presenciais

Página 21

3 DE OUTUBRO DE 2020

21

não essenciais. Também consideramos fundamental a melhoria da prestação de cuidados de saúde

domiciliários.

Por fim, enquanto medida de saúde pública preventiva que deve acompanhar a experiência

comprovadamente eficaz de outros países, recomendamos ao Governo que sejam anualmente adotadas

medidas de prevenção coincidentes com o pico estimado da gripe e de outras infeções respiratórias, como o

uso de máscara reutilizável, o distanciamento social, a etiqueta respiratória e a higienização das mãos, tornando

estas medidas em boas práticas de proteção e saúde pública.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O acesso aos cuidados de saúde primários constitui uma prioridade. Contudo, e apesar de já ter sido decidida a recuperação dos cuidados de saúde que

ficaram por realizar na fase inicial da pandemia, a verdade é que, na generalidade dos centros de saúde, esta

atividade não foi retomada.

Os dados do Portal da Transparência do SNS são muito claros relativamente a isto: de janeiro a julho de

2020, comparando com o período homólogo de 2019, registou-se uma redução de 4,6 milhões de consultas

médicas presenciais e menos 2,35 milhões de contactos de enfermagem.

A esmagadora maioria das consultas que se estão a realizar é telefónica, mas tenhamos presente que o

contacto telefónico não substitui a consulta presencial, não substitui a observação do utente pelo médico. Por

isso, é importante que haja esta retoma da observação e do contacto presencial entre o utente e os profissionais

de saúde, garantindo, obviamente, as recomendações de saúde pública.

São inúmeras as dificuldades no acesso aos cuidados de saúde primários: há utentes que não conseguem

marcar uma consulta com o seu médico de família; há utentes que não conseguem, sequer, contactar

telefonicamente com o centro de saúde, porque não há trabalhadores suficientes para atender todas as

chamadas ou porque o sistema de comunicações existente está obsoleto; há utentes que são atendidos na rua,

à janela ou ao postigo; há utentes que aguardam horas e horas, à espera de um atendimento na rua, por vezes

com condições climatéricas adversas, expostos ao sol, à chuva e, agora que se aproxima o inverno, ao frio; há

extensões de saúde que se mantêm encerradas, que ainda não foram reabertas, e centros de saúde que só

atendem situações de urgência. Esta situação pode, de facto, conduzir a um agravamento do estado de saúde

dos utentes.

Os cuidados de saúde primários, todos sabemos, são fundamentais para o acompanhamento dos doentes

crónicos, para evitar que possam descompensar. No rastreio e no diagnóstico precoce, há já relatos de que a

deteção de doenças graves está a ser feita num estádio tardio e todos sabemos o que isto significa. Se não há

acompanhamento por parte dos cuidados de saúde primários, também não há referenciação dos utentes para

cuidados diferenciados, para consultas de especialização ou outros cuidados de saúde nas unidades

hospitalares.

As limitações e insuficiências nos cuidados de saúde primários não são de hoje, já vêm de trás, e têm

responsáveis, que são, naturalmente, quem esteve nos anteriores Governos, PSD, PS e CDS, os quais

impuseram uma política de desinvestimento e são responsáveis pela falta de médicos e de enfermeiros de

família, de assistentes técnicos e operacionais, pela obsolescência das comunicações, pela existência de

centros de saúde com instalações desadequadas.

Se, na fase inicial da pandemia, foi necessário organizar o SNS para dar resposta, não se compreende que

a atividade dos cuidados de saúde primários ainda não tenha sido retomada, cuidados estes muitas vezes

designados como a porta de entrada no Serviço Nacional de Saúde — e, se ela, de facto, não está aberta, pode

estar colocado em causa o acesso à saúde.

O PCP entende que é fundamental reforçar os cuidados de saúde primários e recomenda ao Governo que

adote um plano de recuperação da atividade dos cuidados de saúde primários com vista à realização

generalizada das consultas. Para isso, é fundamental: a reabertura de todas as extensões e dos centros de

saúde ainda encerrados; a contratação de profissionais de saúde — médicos e enfermeiros de família,

Página 22

I SÉRIE — NÚMERO 9

22

psicólogos, assistentes técnicos e operacionais —; a dotação de mais profissionais de saúde para reforçar as

diversas unidades dos centros de saúde, como as unidades de recursos assistenciais partilhados ou as unidades

de cuidados na comunidade; a contratação de médicos estrangeiros, a título excecional e por um período

transitório, enquanto não houver condições para assegurar a todos os utentes um médico de família; a promoção

e valorização das especialidades médicas de medicina geral e familiar e de saúde pública junto dos estudantes

de medicina; a modernização, naturalmente, dos equipamentos e sistemas de comunicação; o alargamento do

horário de funcionamento das unidades de cuidados de saúde primários.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente. Reafirmamos que, de facto, o reforço do Serviço Nacional de Saúde e o reforço dos cuidados de saúde são

fundamentais para assegurar a todos os utentes o acesso aos cuidados de saúde. E cuidar do SNS é cuidar das

pessoas, é cuidar dos utentes, é assegurar o direito à saúde.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de resolução do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda e intervir no debate, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Serviço Nacional de Saúde tem sido fundamental nos últimos meses da pandemia, e nunca é demais lembrar isto, porque há sempre alguma

tendência para fazer esquecer o papel do Serviço Nacional de Saúde nesta época.

Que ninguém se engane: só o Serviço Nacional de Saúde conseguiu e consegue proteger-nos, enquanto

população, nestes tempos que vivemos. Quando o setor privado fechou portas, foi o Serviço Nacional de Saúde

que deu resposta; quando várias entidades do setor privado ou do chamado «setor social» decidiram acabar

com as convenções que tinham com o Serviço Nacional de Saúde, foi o Serviço Nacional de Saúde que ficou e

que está no terreno, todos os dias, a dar resposta à pandemia.

Compreende-se, por isso, que, no início da pandemia, logo no início de março, tenha existido uma

reprogramação da atividade do Serviço Nacional de Saúde — a reprogramação de consultas e exames e a

suspensão de determinada atividade, também —, porque, efetivamente, o SNS precisava de concentrar esforços

e recursos para responder à epidemia. Os serviços de saúde pública precisavam de rastrear contactos e

estabelecer cadeias de transmissão, os cuidados de saúde primários precisavam de acompanhar os doentes

que, embora positivos, com sintomatologia ligeira, estavam em casa e os hospitais precisavam de estar em

pleno regime de prontidão. Compreendia-se que assim fosse, e os utentes compreenderam também que assim

fosse: compreenderam que o seu médico, o seu enfermeiro, o seu técnico de radiologia estivessem

concentrados em dar resposta à pandemia. Ninguém queria ver em Portugal as imagens que nos chegavam,

por exemplo, de Itália.

O que já não se compreende, Sr.as e Srs. Deputados, é que, sete meses depois — sete meses depois! —,

não se tenham tomado ainda medidas para reforçar o SNS, para que possa continuar a responder à pandemia,

para que possa recuperar a atividade que foi suspensa e para que possa retomar a atividade programada.

Não se compreende que, durante a pandemia, se tenham perdido médicos de família e que, durante a

pandemia, haja mais utentes sem médico de família. Não se compreende que se tenha publicado um programa

de recuperação de atividade para os hospitais, mas nada para os cuidados de saúde primários ou, por exemplo,

para a atividade das juntas médicas.

Não se compreende que, sete meses depois, continue a haver dificuldade em marcar consulta nos centros

de saúde, em renovar receitas, em telefonar para o centro de saúde, e muito menos se compreende que o Plano

da Saúde para o Outono-Inverno, que o Governo já apresentou, não diga absolutamente nada — nada! — sobre

meios e recursos para os cuidados de saúde primários. O Plano lá admite que é preciso maximizar os cuidados

de saúde primários, lá diz que eles têm de dar resposta à pandemia e recuperar atividade, mas, depois, sobre

recursos, como fazer, com que profissionais, com que tecnologia, nada! Não se diz nada nesse Plano.

Página 23

3 DE OUTUBRO DE 2020

23

Protestos da Deputada do PS Maria Antónia de Almeida Santos.

O problema, Sr.as e Srs. Deputados, toda a gente percebe, não está no Serviço Nacional de Saúde. O

problema está no facto de o Governo não alocar os recursos necessários ao Serviço Nacional de Saúde. O

problema, toda a gente percebe, não está nos profissionais do Serviço Nacional de Saúde, que trabalham mais

do que nunca, neste momento. O problema está no facto de o volume de trabalho ter aumentado brutalmente e

não ter sido acompanhado pelo aumento de recursos humanos — de profissionais, de trabalhadores — no

Serviço Nacional de Saúde.

O problema não são os centros de saúde, o problema é que, sete meses depois do início da pandemia, o

Governo não reforçou em assistentes operacionais, em assistentes técnicos, em enfermeiros para as unidades

de cuidados na comunidade, em médicos, em técnicos superiores de diagnóstico, não renovou as centrais

telefónicas nem fez um plano de recuperação de atividade para os cuidados de saúde primários. E esse reforço,

esse investimento, esse plano, é absolutamente essencial para dar capacidade ao SNS.

Por isso, já que o Governo não o faz, o Bloco de Esquerda traz um projeto de resolução para ser debatido e

votado, com o intuito de a Assembleia da República dizer que tem de ser feito, como é óbvio. E o que é que

propomos? Propomos: um programa de recuperação para a atividade não realizada nos cuidados de saúde

primários, com atividade acrescida e remuneração adicional; uma linha de financiamento para cada

administração regional de saúde, para contratação de assistentes operacionais, assistentes técnicos,

enfermeiros e outros profissionais para todas as unidades funcionais, consoante as necessidades das

administrações regionais de saúde; um concurso extraordinário para formação médica especializada,

nomeadamente em medicina geral e familiar; centrais móveis digitais em todos os centros de saúde e

distribuição de telemóveis por estas unidades; e instalação de meios complementares de diagnóstico e

terapêutica, como a criação de centros de diagnóstico de proximidade.

Assim, sim, se farão uns cuidados de saúde primários e um Serviço Nacional de Saúde que, efetivamente,

consigam dar resposta à pandemia e a todas as necessidades do dia a dia, a toda a atividade programada.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Susana Correia, do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Susana Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, são aqui apresentados quatro projetos de resolução que recomendam ao Governo medidas para a recuperação e o reforço dos cuidados de

saúde primários.

Permitam-me que divida a minha intervenção em três pontos, três pontos demasiado importantes para o

Serviço Nacional de Saúde, para os cuidados de saúde primários e para este Grupo Parlamentar: primeiro,

reconhecer e avaliar as dificuldades que enfrentamos; segundo, o que está a ser feito, ou seja, as medidas que

foram implementadas, as que estão a ser implementadas e as que o Governo se prepara para implementar; e,

terceiro, o compromisso, do Governo e de cada um de nós, para com os portugueses e as portuguesas.

Quanto ao primeiro ponto, de reconhecimento e avaliação, importa dizer que, passado todo este tempo, e

desde o primeiro positivo COVID, o nosso País e todo o mundo enfrentam exigências nunca experimentadas.

Foram necessários o empenho, a articulação, a cooperação de todos os agentes para combater aquilo a que

chamávamos «o vírus desconhecido».

Todos se mobilizaram, articularam, recriaram, reinventaram e adaptaram, e os cuidados de saúde primários,

Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, não ficaram de fora. Foi imperativo suspender a atividade assistencial, para

implementar novos procedimentos, novos circuitos, novas equipas, novo comportamento, em termos de

atendimento telefónico aos doentes, de acompanhamento presencial e no domicílio. Também nos centros de

saúde se criaram muitas áreas dedicadas à COVID.

Passado todo este tempo, e que parece não ter fim, somos capazes de avaliar o ponto de onde partimos e o

que temos de recuperar, ao mesmo tempo que continuamos a trajetória com que nos comprometemos, de

reforço do Serviço Nacional de Saúde.

Página 24

I SÉRIE — NÚMERO 9

24

Aplausos do PS.

Podemos avaliar também que o nosso sistema de saúde é garantia de prestação de cuidados de qualidade.

Podemos afirmar, e devemos, como fez o diretor da Organização Mundial da Saúde, que somos um dos

melhores.

Aplausos do PS.

Relativamente ao meu segundo ponto de intervenção, sobre o que está a ser feito, poderia elencar um grande

número de medidas, mas o tempo de que disponho não me permitirá fazê-lo. Elas são do conhecimento de

todos — Sr. Deputado Moisés Ferreira, as medidas são do conhecimento de todos.

Aplausos do PS.

Refiro a indicação da retoma da atividade assistencial em 2 de maio, o reforço dos recursos humanos —

ainda ontem, em comunicado do Conselho de Ministros, foi feito o anúncio da integração de 2995 profissionais

no Serviço Nacional de Saúde —,…

Aplausos do PS.

… a antecipação e o aumento da vacinação, as equipas de saúde mental na comunidade, a diversificação

de valências nos cuidados de saúde primários — saúde oral e visual, pediatria, nutrição, meios complementares

de diagnóstico e, ainda, ginecologia —, a contratação de médicos, que está a decorrer. Srs. Deputados, para

435 vagas abertas concorreram 444 candidatos.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — É a primeira vez!

A Sr.ª Susana Correia (PS): — É a primeira vez que assistimos a este número. Refiro ainda uma resposta laboratorial cada vez mais aumentada e a implementação do Plano da Saúde para

o Outono-Inverno 2020-2021, com uma tripla preocupação: os doentes COVID, os doentes não-COVID e a

literacia e comunicação.

Finalmente, quanto ao terceiro ponto da minha intervenção, o compromisso do Partido Socialista é claro e

inequívoco e está no Programa do Governo e nas Grandes Opções do Plano para 2021-2023: melhorar a

resposta do Serviço Nacional de Saúde face às necessidades dos cidadãos e torná-lo mais resiliente, reforçar

os cuidados de saúde primários e recuperar a atividade assistencial de forma segura. É nosso compromisso

continuar na linha da frente na implementação de medidas, no acompanhamento e na garantia de resultados.

Estamos conscientes das dificuldades, sim, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, estamos conscientes das

dificuldades, mas estamos convictos de que o Governo e as autoridades de saúde nacional e regionais têm o

compromisso de as resolver, garantindo os cuidados de saúde primários como um direito inegável de todos os

portugueses e de todas as portuguesas. E não podemos negar o trabalho crescente dos profissionais de saúde,

de todos os que estão no terreno, com um empenho inegável e inquestionável.

Para concluir, Sr.as e Srs. Deputados, nós não negamos os problemas, estamos conscientes dos problemas

e estamos a tentar resolvê-los.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, em nome de Os Verdes, a Sr.ª Deputada Mariana Silva.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os projetos que hoje aqui discutimos revelam a dificuldade com que todos nos confrontamos quando nos deparamos com as inúmeras queixas de

problemas em aceder aos cuidados primários de saúde.

Página 25

3 DE OUTUBRO DE 2020

25

Não se compreende como é que os hospitais se adaptaram, e bem, para receber os doentes com COVID,

estando a proceder às adaptações para receber todos os outros utentes, com as mais variadas doenças, e esta

adaptação ainda não tenha acontecido nos centros de saúde de todo o País. O combate à COVID-19 veio trazer

reforçados desafios ao SNS, que lhes respondeu positivamente, apesar das dificuldades reconhecidas e

conhecidas.

Este é o momento de dotar todos os centros de saúde de meios humanos, técnicos e financeiros para que

garantam respostas à população que servem. É necessário, desde logo, cumprir com as promessas e garantir

que todos os portugueses tenham médico e enfermeiro de família. É urgente reforçar o Serviço Nacional de

Saúde para, daqui a uns meses, não estarmos a discutir como é que foi possível deixar as pessoas morrerem

sem o acompanhamento de saúde devido.

As doenças crónicas que precisam de ser seguidas, os tratamentos que necessitam de adaptações, os

exames de rotina que é indispensável serem feitos, a proximidade que é premente garantir aos grupos de risco

e, principalmente, aos idosos, o acompanhamento na saúde mental são elementos que não podem ser deixados

para trás.

Os cuidados primários são particularmente necessários aos mais idosos, que veem no seu médico ou

enfermeiro de família a pessoa de confiança,…

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Caso tenham!

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — … que os acompanha, que conversa, que sabe as suas necessidades e os encaminha. Para além do acompanhamento na saúde, são também o amigo, o conselheiro, o apoio nas horas

más.

São urgentes medidas e orientações para que se reforcem os meios para o acompanhamento na doença, no

planeamento familiar, na prevenção. Nunca foi tão necessário investir no SNS, e este investimento nunca poderá

ser considerado despesa, deve, sim, ser visto como um investimento para o futuro.

É urgente reabrir os centros de saúde, com todas as valências, e terminar com as filas à porta, com os

atendimentos no postigo, com a descrição dos sintomas pelo telefone ou com os pedidos para que os idosos

marquem as suas consultas através de um endereço eletrónico que eles não dominam.

É fundamental que as extensões e centros de saúde possam recuperar a atividade assistencial para impedir

que se sobrecarreguem as urgências dos hospitais, com todas as consequências que advêm desse

comportamento.

Ouvimos dizer, repetidamente, que é tempo de pensarmos a forma como queremos viver, como queremos

consumir, ou até de mudarmos determinados comportamentos. O problema é que as necessidades das

populações, as suas doenças, os seus modos de vida não querem saber se há ou não COVID, querem é

respostas, e querem uma resposta pública para todos.

Por isso, é cada vez mais premente que sejamos capazes de exigir a normalidade no acesso aos serviços,

para que os exames não fiquem por fazer, para que a prevenção não falhe, para que o isolamento não mate

mais do que outras doenças, inclusive a COVID-19.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Alberto Machado, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Alberto Machado (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutimos hoje quatro iniciativas, todas elas reconhecendo a situação crítica em que se encontra o Serviço Nacional de Saúde, agravada pela má gestão

desta pandemia, por parte do Governo socialista,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não apoiassem!

O Sr. Alberto Machado (PSD): — … que está hoje bem patente aos olhos de todos os portugueses. O País cor de rosa, aqui pintado pelo PS, não bate certo com a realidade.

Página 26

I SÉRIE — NÚMERO 9

26

Apesar do apoio patriótico do PSD, nos primeiros meses desta crise sanitária, ao Governo socialista em

funções,…

Protestos de Deputados do PS.

… dando-lhe todas as condições políticas e de gestão orçamental para que pudesse implementar as medidas

necessárias à adequação dos serviços públicos, em particular dos serviços de saúde, para cuidar das pessoas,

e da economia, para ajudar as empresas, o Governo falhou.

Não podemos aceitar e não podemos ficar calados, quando, mais de seis meses depois, o Governo não

soube organizar, planear e cuidar daquilo que é fundamental para o País.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Alberto Machado (PSD): — O PSD não compreende como é que, com estes meses de preparação, e já sabendo que caminhávamos para o inverno e para um novo pico da pandemia, não foi possível encontrar

soluções para garantir aos portugueses o acesso aos cuidados de saúde primários.

São centros de saúde fechados, são telefones que tocam e voltam a tocar e não são atendidos, são filas à

porta, são pessoas que desesperam por ser atendidas, algumas desde março, são serviços em rutura por falta

de médicos, de enfermeiros, de administrativos e de auxiliares. É uma situação terceiro-mundista, resultado da

falta de ação e de preparação do Governo naquele que é o ponto nevrálgico desta crise sanitária.

Ao fim de cinco anos de governação do Partido Socialista, a situação crítica para que foi conduzido o SNS

por quem se arroga ser o seu protetor é de colapso do sistema.

Protestos da Deputada do PS Sónia Fertuzinhos.

Foram cinco anos em que o que sobrou de anúncios e propaganda escasseou em realizações e resultados.

Senão, vejamos: em 2011, depois de o Governo do Partido Socialista ter chamado a troica, porque acabou

com o dinheiro, e de ter assinado um memorando castrador da nossa liberdade financeira, foi possível, ainda

assim, ao Governo do PSD,…

Protestos de Deputados do PS.

A verdade é dura, a verdade é dura!

Como dizia, foi possível, ainda assim, ao Governo do PSD, entre 2011 e 2015, reduzir o número de

portugueses sem médico de família, de 1,8 milhões para 1 milhão, atribuindo médico de família a mais de 800

000 portugueses.

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Muito bem lembrado!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Querem apagar quatro anos?!

O Sr. Alberto Machado (PSD): — Em 2020, ao fim de cinco anos de governação socialista, o número de portugueses sem médico de família é praticamente o mesmo. Nada fizeram!

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — É porque há mais gente no País, Sr. Deputado!

O Sr. Alberto Machado (PSD): — Aliás, longe vão os tempos em que a fanfarronice do atual Primeiro-Ministro o levava a dizer que, em 2017, todos os portugueses teriam médico de família atribuído. Dizem tudo e

o seu contrário!

Página 27

3 DE OUTUBRO DE 2020

27

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Faça lá as contas!

O Sr. Alberto Machado (PSD): — Assistimos a uma brutal degradação da atividade assistencial nos últimos sete meses, mas os doentes não estão curados, como que por magia, e as outras doenças não desapareceram

com a COVID.

Protestos do Deputado do PS Santinho Pacheco.

Aliás, é engraçado ver aqui o Bloco de Esquerda a criticar, quando aprovou os sucessivos Orçamentos do

Partido Socialista.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Alberto Machado (PSD): — Assegurar o acesso aos cuidados de saúde primários e aos cuidados de saúde hospitalares é urgente, já devia ter sido preparado e cada dia que passa é mais um dia negro para o SNS.

É o acesso à saúde que está em causa!

Sr. Presidente, perante esta realidade, algumas das iniciativas hoje em discussão padecem do tão conhecido

quanto prejudicial preconceito ideológico-estatista.

Para o PSD, não é esse o caminho. Para nós, o caminho é o de um Serviço Nacional de Saúde que cumpra

a Constituição, garantindo a toda a população o acesso a cuidados de saúde, de forma universal e

tendencialmente gratuita; um SNS com equipas de gestão e profissionais de saúde motivados, onde as

instituições disponham de real autonomia de gestão e tenham objetivos contratualizados; um SNS no qual haja

um efetivo sistema de incentivos financeiros aos profissionais de saúde, em função dos resultados obtidos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Um SNS cotado na bolsa!…

O Sr. Alberto Machado (PSD): — Mas acreditamos também num sistema de saúde assente em três pilares: o público, o social e o privado; um sistema de saúde onde o sentido de serviço ao cidadão e a lógica da

colaboração entre setores substituam a lógica do confronto permanente, que a extrema-esquerda tanto insiste

em promover. Neste tempo em que a pandemia tanto tem dificultado o acesso dos portugueses aos cuidados

de saúde, impõe-se mobilizar todos os recursos e capacidades existentes no sistema de saúde.

Por isso, defendemos a contratualização de médicos de família do setor social e do setor privado,…

Protestos de Deputados do PS.

… desse modo atribuindo médicos de família a todos os portugueses. E acreditamos ser possível fazer

melhor, ajudar o SNS, envolver o setor social e o setor privado, com o objetivo último de cuidar da saúde das

pessoas, de forma integral — e já! —, lançando mão de todas as disponibilidades, a bem da saúde dos

portugueses e sem atavismos ideológicos.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Arranje-nos médicos, que nós contratamos!

O Sr. Alberto Machado (PSD): — Só assim, com propostas inclusivas e mobilizadoras, garantiremos o acesso de todos os portugueses aos cuidados de saúde, de forma justa e equitativa. Esta é a profunda convicção

do Partido Social Democrata!

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, muito bom dia. Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura.

Página 28

I SÉRIE — NÚMERO 9

28

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, estamos numa situação caricata, do ponto de vista da saúde, em Portugal.

Tivemos 4 milhões de consultas canceladas, mais de meio milhão de cirurgias adiadas e a solução do

Governo é a de que vai compensar estes cancelamentos e adiamentos.

Dizem os Deputados do Partido Socialista: «Arranjem-nos os médicos, que nós cá estaremos para os

contratar!» Claro que, nos últimos 20 anos, estiveram no poder em 15 e não o fizeram, mas agora dizem que o

vão fazer ao longo do próximo ano.

Mas melhor ainda é ver a extrema-esquerda obcecada, como sempre, com o setor social e o setor privado,

como se não bastasse a situação que já temos no setor público.

Sr.ª Deputada Paula Santos, ouvi-la dizer da tribuna que só há três culpados nesta situação — o PS, o PSD

e o CDS — é o mesmo que dizer que o PCP não teve nada que ver com os últimos Orçamentos do Partido

Socialista, ao longo da última Legislatura.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — E não!

O Sr. André Ventura (CH): — Quando era preciso reforçar o SNS, quando era preciso aumentar os centros de saúde que agora estão fechados, alguns deles por falta de limpeza — repito, por falta de limpeza —, e quando

era preciso reforçar os cuidados primários, o PCP lá estava a dar a mão ao Partido Socialista, em três

Orçamentos seguidos.

Protestos da Deputada do PS Alexandra Tavares de Moura.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Repito, três Orçamentos seguidos, sem nunca ter exigido nada mais!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não diga mentiras!

O Sr. André Ventura (CH): — Agora, sobe à tribuna, como se não existisse ontem, como se o PS, sem o PCP, tivesse…

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente. Agora, a Sr.ª Deputada aparece aqui, como se o PCP tivesse nascido ontem, a dizer que o PS, o PSD e o

CDS são uns mauzões que tratam mal a saúde dos portugueses.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira concluir.

O Sr. André Ventura (CH): — Lembrem-se disso, quando se fizerem próximas coligações em Portugal!

Protestos do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — As nossas propostas falam por nós!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Vamos passar ao encerramento deste ponto da ordem do dia. Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, do CDS-PP.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, chegados ao encerramento deste debate, parece-me que aquilo que temos em comum é a partilha de uma enorme preocupação com o estado da saúde em Portugal.

Página 29

3 DE OUTUBRO DE 2020

29

Mas o que nos distingue — e distingue-nos francamente — é onde pomos a tónica dessa preocupação, quer no

discurso, quer nas escolhas.

Ouvi o Bloco de Esquerda e o PCP, para quem a tónica deve estar colocada no SNS. O SNS é o alfa e o

ómega desta discussão e deve-se reforçar o SNS, quanto for possível, de Orçamento em Orçamento, à custa

da espera das pessoas, que estão secundarizadas em relação ao sistema.

Ouvi o PS falar pelo Governo, cheio de boas intenções, com muita dificuldade em concretizá-las, situando-

se sempre dentro do perímetro do SNS, assim como o Plano da Saúde para o Outono-Inverno, ignorando que

essas opções levaram a que hoje tenhamos mais 300 000 utentes sem médico de família, tão longe já da

promessa da anterior Legislatura, de um médico de família para cada cidadão.

Protestos da Deputada do PS Maria Antónia de Almeida Santos.

Sr.as e Srs. Deputados, não sei mais como vos dizer que a crise de saúde que temos é grave e que a tónica

tem de estar na capacidade de servir as pessoas, nos seus cuidados de saúde, onde houver capacidade. Como

vos digo, a insistência cega de que só o SNS pode dar resposta levará a resultados graves na saúde das

pessoas, pelos quais, depois, ninguém será responsável, porque só se verão daqui a muitos anos — mas eles

existirão e as pessoas senti-los-ão.

Portanto, o custo de uma má decisão, o custo de uma decisão errada da vontade de provar, a todo o custo,

que o SNS, manifestamente incapaz, vai ser a única resposta terá consequências na saúde das pessoas. Apelo

sinceramente à bancada do PS e ao Governo que ponderem bem se não é altura de, pelo menos

transitoriamente, contratualizar com os setores privado e social para dar resposta às pessoas que hoje estão à

porta do centro de saúde.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Encerrado o terceiro ponto, passamos ao ponto quatro da nossa ordem de trabalhos, que consta da discussão conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 53/XIV/1.ª

(PAN) — Visa assegurar a não discriminação no acesso à habitação por quem possui animais de companhia e

496/XIV/1.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Altera o Código Civil, garantindo a não discriminação

no acesso ao arrendamento por quem detém animais de companhia.

Para apresentar a iniciativa legislativa do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quase todos nós já ouvimos falar, no nosso dia a dia, ou conhecemos mesmo pessoas que, aquando do processo de escolha de uma casa,

se confrontam com perguntas no sentido de saber se têm animais de companhia. Do mesmo modo, diariamente,

seja nas redes sociais, seja nas várias plataformas, como a OLX (OnLine Exchange), ou noutros meios digitais,

não é incomum vermos anúncios que mencionam a intenção de ceder um animal de companhia em virtude de

as pessoas mudarem de casa.

Esta é uma realidade que ocorre num contexto em que, em Portugal, os estudos indiciam que mais de 50%

das famílias detêm animais de companhia. Não podemos ignorar que os animais de companhia são, muitas das

vezes, a única companhia — passo a redundância —, seja para as crianças, com valor constitutivo para a

formação da sua personalidade, seja para as pessoas idosas, que vivem numa situação de maior isolamento,

ou até mesmo em contextos muito mais complexos, como o da violência doméstica, em que os animais são o

único porto seguro ou companhia e, obviamente, neste caso, uma relação muito mais sublinhada pelo contexto

difícil em que as pessoas sobrevivem.

Importa, por isto, que o legislador assegure, quer numa ótica de garantia de não discriminação, quer numa

ótica de proteção das pessoas e dos animais, nomeadamente na necessidade de combater o flagelo do

abandono, que existam respostas legislativas que eliminem este obstáculo no acesso à habitação.

Esta é, sem dúvida, uma situação de grande dificuldade para as famílias, que, não tendo a possibilidade de

comprar, elas próprias, uma casa — o que, não só no contexto económico que vivemos, mas no que já

anteriormente era sentido, bem sabemos, é um processo difícil —, veem, assim, a sua liberdade restringida e,

no limite, são forçadas até, muitas vezes, a fazer algo contrário à letra da lei e que está penalizado no nosso

Código Penal, que é abandonar o próprio animal de companhia. Temos nota também de casos, ainda que mais

Página 30

I SÉRIE — NÚMERO 9

30

pontuais, em que as pessoas acabam por viver em habitações precárias ou ficam em situação de sem-abrigo,

por se recusarem a separar-se dos seus animais de companhia.

Parece-nos, assim, que esta é, de facto, uma questão não só de manifesta discriminação como de

desigualdade, que não podemos continuar a ignorar, enquanto legisladores. Inclusivamente, estes casos têm

chegado aos tribunais portugueses, que já se pronunciaram sobre esta matéria, existindo jurisprudência que

tem vindo a derrogar cláusulas contratuais que obrigam a que não existam animais de companhia no locado,

precisamente por considerarem que colidem com a relevância que os animais hoje têm para a formação humana,

para os valores da família, para o desenvolvimento dos menores que integram este seio familiar e também para

os valores que queremos transmitir a estas mesmas crianças, nomeadamente a proteção, a preservação, a

generosidade, entre outros valores fundamentais no nosso Estado de direito.

Não podemos também ignorar o restante ordenamento jurídico. Portugal ratificou a Convenção Europeia para

a Proteção dos Animais de Companhia, convenção esta que reconhece e sublinha os laços afetivos que nos

unem a estes animais. Veja-se que, secularmente, o Homem tem trazido o animal de companhia para a sua

casa e, portanto, não faz qualquer sentido que, depois, seja o ser humano a defraudar o vínculo e o compromisso

que assumiu para com estes seres vivos dotados de sensibilidade, tal como reconhece o nosso Código Civil, e

que, como tal, carecem dos nossos cuidados e atenção.

No contexto mais complexo da COVID-19, com desafios acrescidos nesta nova realidade, em que uma

situação que já de si era complicada, como o acesso à habitação, agora se agudiza, antecipa-se que, a esta

crise, sucederá outra, uma crise social, pelo que é mais importante do que nunca eliminar as barreiras no acesso

à habitação.

Com esta proposta, não pretendemos descurar de forma alguma os direitos dos senhorios, mas a lei civil já

tutela este conflito de interesses, ao possibilitar precisamente que haja o ressarcimento dos danos que possam

ser provocados.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, queria pedir-lhe que concluísse.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Termino já, Sr. Presidente. Aquilo que não podemos continuar a permitir é uma clara discriminação que vem penhorar as famílias e os

valores que nos pautam no século XXI.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita Cristina Rodrigues, para apresentar a sua iniciativa legislativa.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (N insc.): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje a não discriminação no acesso ao arrendamento por quem detém animais de companhia, uma pequena alteração que

pode ter um grande impacto na vida das pessoas e que, inclusivamente, me motivou, há uns anos, a criar uma

petição pública precisamente com este objetivo.

Não podemos esquecer que o direito à habitação é um direito fundamental, constitucionalmente consagrado,

mas que, infelizmente, se verificam situações em que as famílias não conseguem encontrar uma casa para viver

porque os senhorios não aceitam animais de companhia. Assim, pergunto: o que deve fazer uma família nesta

situação? Abandonar os animais? O abandono, para além de cruel, é crime.

Ora, se a lei prevê a permanência de animais em habitações, por que razão se deve permitir que um senhorio

restrinja aquilo que a lei já admite? Acresce que os direitos do senhorio se encontram já assegurados na nossa

lei, para além de o senhorio poder exigir o pagamento de uma caução, o que é prática habitual.

Não é aceitável que o ordenamento jurídico português, que reconhece a senciência dos animais, que prevê

normas específicas para a sua proteção, obrigando o detentor a assegurar o bem-estar do animal, que

criminaliza os maus-tratos e o abandono de animais, permita, ao mesmo tempo, que os senhorios impeçam, de

forma abusiva, aqueles que detém animais de aceder ao arrendamento.

Página 31

3 DE OUTUBRO DE 2020

31

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Passamos à fase de debate, cabendo a primeira intervenção ao Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

Tem a palavra.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Saúdo o PAN, porque, de facto, é coerente. Para o PAN, os animais são exatamente iguais às pessoas, faz questão de lembrá-lo em cada

ocasião e cada ocasião parece boa.

Não interessa se estamos a combater uma pandemia, ou a enfrentar uma das maiores crises económicas e

sociais de sempre, ou a ponto de falhar o alvo com a «bazuca» de Bruxelas, ou a reconhecer que a TAP

(Transportes Aéreos Portugueses) não vai custar só 1200 milhões de euros e, se ficar pelo dobro, é uma sorte.

No meio disto tudo, o PAN arranja sempre forma de pôr os direitos dos animais na discussão. A única coisa

boa desta insistência do PAN é que dá ao Iniciativa Liberal a oportunidade de afirmar o óbvio: os animais não

são pessoas e, por isso, não têm os mesmos direitos.

Mas, mesmo nesta persistência, o PAN revela a fraqueza da sua argumentação: diz que os animais são

como membros da família, mas que as pessoas facilmente os abandonam quando lhes é recusado o acesso à

habitação. Em que ficamos? São membros da família ou são para serem abandonados? Aliás, esta situação já

constitui um crime, e muito bem.

A argumentação com base na igualdade entre pessoas e animais entra, depois, em campos bem mais

sombrios, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real. O PAN compara — imagine-se! — a eventual recusa de um

senhorio em aceitar animais com discriminação racial ou discriminação com base na orientação sexual.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira concluir.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr. Presidente. Convinha parar para pensar nisto: o PAN acha que uma situação em que um senhorio não arrenda a sua

casa a alguém com um animal é a mesma coisa que não o fazer a um casal homossexual. Este absurdo dispensa

comentários.

Não devia precisar de repetir isto, mas aqui vai na mesma: os animais não são iguais às pessoas e a maior

prova de amor e respeito pela sua natureza é, exatamente, não os tratar como pessoas.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira concluir.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — E, já agora, Sr. Presidente, como em todos os outros casos, vamos deixar o Estado fora disto.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Passamos, agora, à intervenção do Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.

Faça favor.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para milhões de portugueses, a presença dos seus animais de companhia e a convivência com eles constituem um elemento indispensável do seu

quotidiano. Para além do dever ético e da responsabilidade para com o bem-estar animal, que a própria

legislação, ao longo dos últimos anos, foi consolidando em relação aos detentores de animais, há essa realidade

tão simples e tão concreta que coloca estes animais como uma presença de enorme importância em inúmeras

famílias por todo o País.

Acompanhando o crescimento e o desenvolvimento das crianças, ajudando a vencer ou a atenuar o

sentimento de solidão ou de isolamento, assumindo o seu espaço próprio no quotidiano das famílias, os animais

de companhia não são, nem na lei, nem na sensibilidade e na consciência dos cidadãos, objetos descartáveis

que possam ser abandonados numa qualquer situação.

Ora, ao longo dos anos, em particular com a designada «lei dos despejos», da então Ministra Assunção

Cristas, no Governo PSD/CDS, milhares e milhares de pessoas foram confrontadas com a autêntica expulsão

das suas casas, particularmente nos principais centros urbanos, num quadro de precarização das suas vidas,

Página 32

I SÉRIE — NÚMERO 9

32

de incerteza e de fragilidade no seu direito à habitação, de aumento brutal das rendas das casas, nesse contexto

de especulação imobiliária, tornando estas casas, estes bairros e estas cidades praticamente inacessíveis para

quem nelas morou uma vida inteira.

A tornar ainda mais dramáticas essas situações de mudança forçada, de retirada das suas casas e de procura

de uma outra habitação, à medida das possibilidades dessas pessoas que foram e são afetadas por este

problema tão sério, junta-se, muitas vezes, um outro problema concreto, que é o da abusiva proibição de alguns

senhorios quanto à presença de animais de companhia nas respetivas casas.

Os projetos de lei em apreço apontam, como objetivo nesta matéria, a definição no quadro legal de uma

resposta a estes problemas: num caso, propondo a proibição de diversas práticas discriminatórias, em sede de

contrato de arrendamento ou, desde logo, de publicitação do arrendamento, relativamente a animais de

companhia; noutro caso, propondo a consagração do princípio da não discriminação, previsto no Código Civil,

para o acesso ao arrendamento, englobando a questão dos animais de companhia.

O PCP não levanta objeções de fundo a iniciativas que procurem contribuir para uma resposta a esta

realidade. A observação que não podemos deixar de fazer é quanto à eficácia e ao alcance das medidas

propostas. Ou seja, se, à partida, ninguém iria discordar — pensávamos nós! — das normas que pudessem

impedir proibições abusivas em sede contratual no arrendamento, também é verdade que, na maioria das vezes,

a discriminação não vem com pré-aviso e não desaparece da vida quando sai do papel.

Não devemos enveredar, nesta matéria, por um debate abstrato sobre igualdade. É um debate legítimo o da

eliminação das discriminações e abusos que assumidamente, formalmente, impedem o cumprimento das

responsabilidades destes cidadãos para com os seus animais de companhia. O problema é quando esses

abusos deixam de ser escritos e assinados e continuam a verificar-se na prática. E a verdade é que, quanto a

isso, nada consta destes diplomas como resposta possível, nem sabemos se poderia constar.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não podemos deixar de assinalar que, no tempo que vivemos, a

situação insustentável de carência habitacional para milhares e milhares de pessoas, de famílias, de idosos, de

crianças, com ou sem animais de companhia, exige uma resposta concreta, decisões concretas, recursos

dedicados, vontade política!

É isso que tem de ser assinalado e respondido pelo poder político de uma vez por todas, porque o direito à

habitação e a responsabilidade que incumbe ao Estado para o garantir, Srs. Deputados, são exigências do

nosso tempo, que a Constituição consagra e que são para cumprir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola, do Boco de Esquerda.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A discriminação tem efeitos importantes e negativos na estabilidade da estrutura e qualidade de vida de uma pessoa ou família.

Quando uma pessoa não consegue um emprego ou não consegue alugar uma casa logo à partida e por

discriminação, existe um impacto sério. Quando não se consegue trabalho justamente remunerado ou uma casa

com uma renda justa por discriminação de classe, género, etnia, crença religiosa ou outra, existe um impacto

financeiro que só quem passa por isso consegue, de facto, imaginar. E, no caso concreto da habitação, a

discriminação e limitação de acesso também influencia a saúde, tão em voga e tão discutida nestes dias, na

medida em que o acesso a habitação digna é um determinante de saúde, ou seja, intensifica a exposição à

doença. Já o referimos e não nos fartamos de o repetir.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — A discriminação baseia-se, já sabemos, em ideias pré-condicionantes, clichés, generalizações que categorizam as pessoas e os seus comportamentos e que limitam grandemente a

liberdade das pessoas visadas. Qualquer discriminação que impeça o acesso a direitos básicos, como é o direito

à habitação, deve, de facto, ser condenada.

Página 33

3 DE OUTUBRO DE 2020

33

Nestes projetos que analisamos aqui hoje, pretende-se inscrever um tipo de discriminação concreta — e não

queremos fazer juízos de valor — a que se assiste na tentativa de arrendamento de habitação: pessoas e

famílias que coabitam com animais domésticos.

Parece-nos justa a inclusão da prevenção relativamente a esta forma de discriminação no Código Civil no

acesso ao arrendamento, mas talvez seja também avisado garantir formas mais efetivas de se dirimirem os

conflitos que possam daí advir. Sim, também para isto existem os regulamentos dos condomínios, as cauções

e a própria limitação, por exemplo, do número de animais, mas é de facto necessário garantir também meios de

maior e melhor convivência para que não se acentuem os medos.

Temos, por isso, que trabalhar para que não exista esta condicionalidade no acesso à habitação, que

penaliza quem cuida de um animal e que justamente não o abandonará, nem nós queremos que o faça.

Dos projetos em si, acompanharemos os dois, nomeadamente aquele que prevê a alteração ao Código Civil,

que nos parece, de facto, fazer mais sentido. No entanto, parece-nos importante prever também que os anúncios

não podem conter, a priori, disposições discriminatórias e devemos incluir propostas que reforcem um bom

convívio com todos os moradores do prédio.

Podem contar com o Bloco de Esquerda para trabalhar com as suas propostas nos projetos, em sede de

especialidade, e isto pelo direito à habitação que a toda a gente assiste, para além do facto de ter ou não animais

de estimação nas suas habitações.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, do Partido Ecologista «Os Verdes».

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:O Partido Ecologista «Os Verdes» já aqui referiu, e quero repeti-lo, que, naquilo que se refere à legislação sobre animais, sobre o bem-estar animal

e, designadamente, aos cuidados de animais domésticos, este Parlamento tem promovido, ao longo das últimas

legislaturas, um trabalho ao nível legislativo, com participação da sociedade civil, que nos parece justo assinalar,

nomeadamente no que se refere à criminalização dos maus tratos a animais e também à necessidade de mudar

o paradigma do abate para o da esterilização, com vista ao controlo da população animal. Refiro este entre

outros exemplos que aqui poderiam ser dados.

Hoje debatemos a não discriminação no acesso à habitação por quem detém animais de companhia.

Recordamos aqui que os animais de companhia estão, de forma crescente, na casa das famílias portuguesas,

que os acolhem com carinho, integrando-os entre os seus e lhes dedicam cada vez mais tempo, mas também

que os animais de companhia constituem, cada vez mais, um apoio para crianças e jovens e, particularmente,

para idosos, a quem asseguram companhia e amparo em muitos momentos de solidão. Muitas vezes são

mesmo a única companhia dessas pessoas.

Nesse sentido, aquilo que importa é garantir condições de higiene, de salubridade, de saúde ambiental e

social para o bem-estar dos animais, exigindo-se das pessoas que fazem a opção de ter e cuidar de animais

domésticos essa responsabilidade.

Sr.as e Srs. Deputados, não podemos ignorar que são também recorrentes os conflitos, seja com senhorios,

em função de estragos que os animais provocam nos imóveis, seja com vizinhos, proprietários ou arrendatários

de imóveis, particularmente em prédios, pelo barulho que alguns animais fazem e pelos cheiros que provocam

em função do descuido dos donos.

Ora, as soluções que os proponentes dos projetos de lei aqui nos trazem representam um passo e poderão

ser melhoradas em sede de especialidade, porque, infelizmente, não se resolvem conflitos que opõem os direitos

das pessoas a deter os seus animais de companhia ao direito de outras pessoas ao sossego e à tranquilidade

apenas pelo recurso à lei.

Não se decreta nem se impõe, sob pena de tal não ter correspondência com o ambiente social e de não

resolver nenhum conflito, que os proprietários de imóveis têm de aceitar animais de companhia, porque, como

se sabe, os senhorios têm sempre a última palavra no arrendamento e, com o quadro normativo do

arrendamento em Portugal, custa muito pouco despejar um inquilino.

Página 34

I SÉRIE — NÚMERO 9

34

Não se decreta que os donos garantem a disciplina dos animais, garantem a limpeza e o asseio do seu

espaço e dos espaços comuns.

Não se decreta que todos os detentores de animais têm meios para cuidar deles e, portanto, não existe a

possibilidade de criarem mau ambiente em prédios em que convivem com outras pessoas.

Este é um caminho difícil, é o caminho das pedras e é preciso fazê-lo com os cuidados necessários para que

não se abram as portas aos que pretendem andar para trás.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Vá ver a letra da lei, Sr.ª Deputada!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, do Partido Socialista.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começamos por saudar a iniciativa legislativa e a questão que é colocada pelo PAN e pela Sr.ª Deputada não inscrita. De facto, ela toca

um aspeto que é importante e que diz respeito à vida e ao acesso à habitação de muitos milhares de pessoas;

no entanto, tem de ser enquadrada naquilo que é também o acesso dos vizinhos das pessoas que têm esta

necessidade, por um lado, e na posição do próprio senhorio, do titular da fração, por outro. Portanto, é na

conciliação de vários elementos, que não são simples de harmonizar no mesmo espaço, que este debate deve

ter lugar.

Ao longo dos anos, e foi bem referido nas intervenções anteriores, tem-se evoluído significativamente naquilo

que é o reconhecimento na lei civil, na lei penal, sobre o bem-estar animal como um valor a ter em conta,

também, na construção da nossa ordem jurídica. Aliás, se olharmos para outros países e para a resposta que

dão a esta mesma questão, ou seja, em que circunstâncias é que pode haver a presença de animais de

companhia no locado ou até, às vezes, em propriedade de um terceiro, encontramos soluções muito menos

avançadas do que aquelas que são as da legislação portuguesa.

Muitas vezes encontramos, de facto, uma total possibilidade de o senhorio impedir qualquer acesso de

animais de companhia por parte dos inquilinos e até temos circunstâncias em que é o próprio condomínio que

pode determinar restrições não apenas aos espaços comuns mas àquilo que se passa dentro das frações,

assumindo — precisamente porque como há trânsito e há o atravessamento das partes comuns — que isso, de

alguma maneira, pode influenciar a vida da comunidade naquele edifício.

Portanto, a legislação desses vários Estados que têm essas leituras mais intensas demonstra que o problema

não é de fácil solução e que a solução que temos de encontrar deve ter em conta não só a nossa realidade, não

só a proteção do bem-estar animal, mas também o equilíbrio da posição daqueles que, por um lado, são

proprietários e das outras pessoas que ali residem.

Os projetos de lei apresentados procuram ser cautelosos num determinado sentido, ou seja, procuram

identificar, tanto quanto possível, elementos objetivos para tentar justificar as circunstâncias em que pode haver

estes limites. Identificam o número máximo de animais por fração, identificam a detenção de animais perigosos

como sendo, também, um fator que, eventualmente, pode levar a esta proibição e referem a saúde pública, mas

verdadeiramente há um problema de base que é a construção das normas que apresenta estar feita ao contrário.

Ou seja, proclama primeiro um princípio de não discriminação (e aí sim, concordamos, em parte, com aquilo que

foi dito pelo Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo) e coloca-o no mesmo patamar daquilo que são as

cláusulas suspeitas de não discriminação constantes da Constituição da República em função da etnia, da

orientação sexual, da ascendência, etc. — elementos esses que, de facto, devem ponderar-se na criação de

uma cláusula de não discriminação porque respeitam, volto a dizê-lo, às categorias suspeitas do n.º 2 do artigo

13.º da Constituição —, a detenção de animais de companhia, que tem, de facto, um impacto que pode reverter-

se na vida de outras pessoas.

Portanto, não discordando da ideia de que é necessário legislar sobre o tema, temos de encontrar uma

solução equilibrada que encontre respaldo na Constituição, mas também na proteção dos senhorios, dos

inquilinos, das outras pessoas que ali residem e que atente à realidade do que é que estamos a discutir. É que

podemos encontrar num arrendamento rural de uma propriedade rural — e aí não chocará ninguém — uma

restrição desmesurada, essa sim chocante, que impeça a presença de um animal de companhia, obviamente.

No entanto, se estamos a falar de uma fração, de um T0 ou de um T1, num determinado contexto muito restritivo,

Página 35

3 DE OUTUBRO DE 2020

35

em que o impacto da detenção do animal de companhia pode ser significativo para a restante comunidade, a

resposta já não pode ser a mesma.

Portanto, a grande reserva que temos em relação a esta formulação prende-se mesmo com a estrutura

utilizada. Ou seja, proclama-se primeiro uma ideia de que não deve haver qualquer discriminação sem qualquer

fundamento — usando a expressão «discriminação» que não nos parece adequada —, ao invés de fazer o

caminho ao contrário, volto a dizê-lo. Primeiro, vamos identificar, então, em que circunstâncias é que é atendível

e em que deve ser acautelada e protegida a vontade do inquilino em ter um animal de companhia, na quantidade

adequada, na espécie adequada e num contexto que seja compatível com a vida em comunidade.

Nesse sentido, e no passado já o dissemos, temos abertura para a discussão e para tentar construir uma

solução equilibrada; no entanto, na formulação em que ela se encontra, não nos parece que seja ainda esse o

caso, mas temos abertura para, caso as iniciativas baixem à comissão sem votação, poder tentar construir uma

solução equilibrada, que acautele melhor a proteção de todas as pessoas e previna precisamente o que foi dito,

isto é, o abandono, que, muitas vezes, é a solução que acaba por acontecer na ausência de resposta

habitacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, pelo CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que comece por cumprimentar o Sr. Presidente da Assembleia Regional da Madeira, que está aqui presente, ex-

Deputado José Manuel Rodrigues.

As Sr.as Deputadas Inês de Sousa Real e Cristina Rodrigues apresentaram aqui estes projetos de lei de não

discriminação no acesso ao arrendamento por quem tem animais de companhia. Ora, é importante salientar

neste debate o largo consenso que existe e que foi expresso, por exemplo, em 2014, naquilo que diz respeito

aos maus-tratos de animais de companhia, tendo o Parlamento dado aqui um bom exemplo.

É verdade — e podemos dizê-lo invocando os números — que mais de 50% dos lares em Portugal têm

animais de companhia e, assim, podíamos dizer: «Bem, o problema está resolvido. Então, para quê uma

alteração legislativa?».

Mas é justo reconhecer que, efetivamente, há cidadãos que, quando procuram uma nova morada de família,

muitas das vezes são confrontados com a proibição de poderem levar os seus animais de companhia, seja um

cão, seja um gato. Porém, também é igualmente verdade que não podemos ignorar aquele que é o direito dos

proprietários.

O PAN traz novamente uma iniciativa que é exatamente a mesma que apresentou em 2017. Não é nada de

novo, não nos surpreende, é coerente naquilo que é a intervenção política do PAN, mas é também importante

salientar neste debate que hoje existe uma maior sensibilidade de todos relativamente àquilo que são os animais

de companhia.

Hoje, a sensibilidade que existe em Portugal não é igual àquela que existia há 10 anos e muito menos há 20

anos, há uma sensibilidade muito maior. Mas, depois, há aqui questões que se prendem com a própria

propriedade e com os danos que podem ser causados no imóvel, com as próprias cauções, com o direito de

receber um imóvel nas condições em que foi oferecido.

Portanto, neste debate, o PAN e a Sr.ª Deputada não inscrita vêm defender a igualdade dos cidadãos e o

PAN o que diz é que há aqui uma igualdade de cidadãos que tem a ver também com aqueles que possuem

animais de companhia. Porém, não podemos esquecer um outro direito igualmente importante, um direito

fundamental previsto na Constituição, que é o direito à propriedade privada, havendo um princípio constitucional

que tem a ver com o seguinte: as liberdades e os direitos de cada cidadão terminam, como é evidente, quando

começam os direitos e as liberdades dos outros.

Entendemos, assim, que o Estado não pode obrigar um senhorio ou um proprietário…

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.

Página 36

I SÉRIE — NÚMERO 9

36

O Sr. João Gonçalves Pereira CDS-PP): — Vou terminar Sr. Presidente. Entendemos que o Estado não pode obrigar um proprietário de um imóvel a arrendar uma casa a um qualquer

inquilino, tenha ele cão ou não, tenha ele um gato ou não tenha um gato. Como é evidente, isto viola a liberdade

contratual.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Márcia Passos.

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Analisamos hoje duas iniciativas legislativas sobre duas perspetivas que visam assegurar que ninguém pode ser limitado no seu direito de acesso

a uma habitação pelo facto de ter um animal de companhia.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Assim o entendemos também, mas o que nos parece é que a questão não terá sido bem colocada de princípio.

Vou tentar explicar: se, por um lado, o bem-estar animal, por si só, não encontra uma proteção constitucional

direta, mas apenas de forma reflexa nas preocupações de cariz ambiental cujo fim último é a saúde humana,

por outro lado, é inegável a evolução de mentalidades e a evolução legislativa a que temos assistido no sentido

da proteção dos direitos dos animais enquanto seres não-humanos e na sua relação com estes.

São evidentes as vantagens que têm, ou podem ter, as relações das famílias com os animais, quer do ponto

de vista da companhia que fazem, quer do ponto de vista da saúde humana. Não são raras as vezes, e todos o

sabemos e conhecemos situações desta natureza, que um animal de companhia é um estabilizador de emoções,

um elemento imprescindível ao desenvolvimento de uma criança ou um fator de equilíbrio emocional, físico e

mental, até, dos idosos.

Protestos do Deputado do PS Ascenso Simões.

Por isso, parece-nos lógico que um regulamento de condomínio não possa impedir a presença de animais

nas respetivas frações da propriedade horizontal, desde logo porque não é suposto que o regulamento de

condomínio regule, salvo raríssimas exceções, o que se passa dentro das frações autónomas. Por isso, parece-

nos dispensável regular ou legislar sobre esta matéria, que, cremos, estar perfeitamente acautelada no nosso

sistema legal no que respeita à propriedade horizontal.

Tal como nos parece lógico que uma família que beneficie de medidas de habitação social não fique limitada

ou impedida de alcançar tais benefícios pelo facto de ter um animal de companhia. Este fator, o facto de ter um

animal, nunca deverá ser um critério de eleição na habitação social, por exemplo, e devemos refletir sobre isto.

É que estas famílias beneficiárias da habitação social, ao contrário do arrendamento que abordam os

diplomas em causa, não têm opção e, não tendo, não poderá ser este um critério de limitação no acesso a estas

habitações.

Diferente é o caso do arrendamento tradicional, que não habitação social, e, nesses casos, Srs. Deputados,

obrigar o senhorio a aceitar os animais de companhia que o inquilino pretende levar consigo para a casa que

vai arrendar pode introduzir, na nossa perspetiva, um mecanismo dificultador do arrendamento para quem

procura casa.

Certamente assistiríamos, se assim fosse, à exigência de cauções de valor superior ao habitual ou à

necessidade do pagamento de prémios de seguros que o arrendatário se veria obrigado a fazer. E isto, Srs.

Deputados, cria entraves ao mercado do arrendamento, dificulta quem procura casa, cria ónus elevados a quem

tantas vezes já tem dificuldades para pagar a renda quanto mais outras prestações.

Nesta perspetiva, parece-nos mal criar um elemento perturbador no arrendamento e parece-nos exagerado

o cariz discriminatório que se pretende dar a estas cláusulas.

Srs. Deputados, sob pena de violação do princípio constitucional da proporcionalidade, entendemos que a

matéria pode merecer reflexão em sede de especialidade, para o que, naturalmente, estamos disponíveis.

Página 37

3 DE OUTUBRO DE 2020

37

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Passamos, agora, à fase de encerramento deste ponto, para o que dou a palavra à Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, quero agradecer não só ao PS como ao PSD a disponibilidade que demonstraram para, em sede de especialidade, debater esta

questão, e pensamos que também o Bloco acompanhará esta preocupação, porque nos parece fundamental

fazê-lo, se bem que há aqui críticas que não podemos acompanhar.

Desde logo, parece-nos absolutamente falacioso o que referiu o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, da

Iniciativa Liberal, relativamente não só à desvirtualidade daquela que é a intenção desta proposta, porque o que

o Sr. Deputado está a dizer a estas pessoas, a estas famílias, é: «Se têm animais de companhia, azar o vosso,

abandonem esses animais.»

De facto, do que estamos a falar, Sr. Deputado, não é de colocar animais no mesmo patamar das pessoas;

estamos a falar de assegurar que estas pessoas não são discriminadas e têm acesso à habitação. É disto que

estamos a falar e do valor constitutivo que estes animais têm para as famílias, a par de algo que temos de

combater, o flagelo do abandono.

Recordo-lhe, Sr. Deputado — e o mesmo se aplica àquilo que foi referido pelo PEV —, que frequentemente

ouvimos aqui referir que a política do não abate foi uma política errada, que os canis e os gatis municipais estão

absolutamente cheios, mas, depois, quando se trazem aqui propostas que visam eliminar obstáculos que

existem e que contribuem, de alguma forma também, para o abandono, aí os Srs. Deputados dizem: «alto lá

que o PAN já está a trazer a sua agenda animalista» — que muito nos orgulha, Sr. Deputado, não temos qualquer

problema e agradecemos que o tenha reconhecido porque, efetivamente, temos na nossa agenda política este

debate e isso em nada nos embaraça.

Em relação a uma questão, muito pertinente, que a Sr.ª Deputada Márcia Passos referiu, há aqui uma

questão no acesso à habitação pública e o nosso objetivo não é criar um critério discriminatório pela positiva;

pelo contrário, aquilo que não pode acontecer, à semelhança do que acontece no arrendamento privado, apesar

de não estar escrito nas orientações, é a negação do acesso à habitação pública seja de pessoas que estão em

situação de sem-abrigo, seja de vítimas de violência doméstica, que nem sequer podem aceder às casas-abrigo,

se tiverem animais de companhia.

Ora, parece-nos manifestamente discriminatório que estas situações ocorram.

Se as Sr.as e os Srs. Deputados nos acompanharem numa visita pelas ruas da cidade de Lisboa, por exemplo,

verão que, frequentemente, vemos pessoas em situação de sem-abrigo que têm animais, que se encontram

nessa condição e que não podem aceder à habitação pública precisamente porque têm animais.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Concluo já, Sr. Presidente. Portanto, parece-nos manifestamente que algo está errado.

Aceitamos de bom grado a vontade de, em sede de especialidade, debatermos esta questão, porque o direito

à habitação e o direito de as pessoas que têm animais de companhia poderem mantê-los no seu agregado

familiar são direitos fundamentais que devem ser respeitados.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminámos assim o ponto 4 da nossa agenda. Do ponto 5, para o qual não foram atribuídos tempos de debate, consta a Proposta de Resolução n.º 7/XIV/1.ª

(GOV) — Aprova o Acordo de Parceria Abrangente e Reforçada entre a União Europeia e a Comunidade

Europeia da Energia Atómica e os seus Estados-Membros, por um lado, e a República da Arménia, por outro,

assinado em 24 de novembro de 2017, em Bruxelas.

Página 38

I SÉRIE — NÚMERO 9

38

Vamos passar ao ponto 6, de que constam as votações regimentais, dando um pouco de tempo para que as

Sr.as Deputadas e os Srs. Deputados se preparem para esta fase da nossa sessão.

Pausa.

Srs. Deputados, creio que estamos em condições de iniciar o período de votações.

Vamos, então, votar o Projeto de Resolução n.º 640/XIV/2.ª (PAR) — Deslocação do Presidente da República

a Bruges.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, relativamente ao Decreto da Assembleia da República n.º 57/XIV — Nona alteração à Lei

n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade, vamos começar por votar a proposta de alteração,

apresentada pelo BE, de emenda ao n.º 1 do artigo 3.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do

Decreto.

Submetida à votação foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH, do IL e da Deputada

não inscrita Cristina Rodrigues e votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV e da Deputada não inscrita

Joacine Katar Moreira.

Era a seguinte:

1 — O cônjuge estrangeiro de nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa através de

declaração formal registada na constância do matrimónio.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Vamos votar a proposta de alteração, apresentada pelo IL, de emenda ao n.º 1 do artigo 3.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP, do PEV e do CH

e votos a favor do BE, do PAN, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.

Era a seguinte:

1 — O estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade

portuguesa mediante declaração feita na constância do matrimónio, sem prejuízo do disposto no número 4 do

presente artigo.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Vamos votar a proposta de alteração do BE, de emenda ao n.º 3 do artigo 3.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH, do IL e da Deputada

não inscrita Cristina Rodrigues e votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV e da Deputada não inscrita

Joacine Katar Moreira.

Era a seguinte:

3 — O estrangeiro que viva em união de facto com nacional português pode adquirir a nacionalidade

portuguesa mediante a apresentação de declaração de reconhecimento da união de facto emitida pela respetiva

junta de freguesia.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Vamos votar a proposta de alteração apresentada pelo IL, de emenda ao n.º 3 do artigo 3.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto.

Página 39

3 DE OUTUBRO DE 2020

39

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP, do PEV e do CH,

votos a favor do PAN e do IL e abstenções do BE e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine

Katar Moreira.

Era a seguinte:

3 — O estrangeiro que, à data da declaração, viva em união de facto há mais de três anos com nacional

português pode adquirir a nacionalidade portuguesa, após ação de reconhecimento dessa situação a interpor

no tribunal cível, sem prejuízo do disposto nos números 4 e 5 do presente artigo.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Vamos votar a proposta de alteração do BE, de eliminação do n.º 4 do artigo 3.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto.

Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do PAN, do PEV e

das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do CDS-PP, do CH e do

IL.

As próximas votações seriam de propostas da autoria do PS e do IL, respetivamente, também relativas à

eliminação do mesmo n.º 4 do artigo 3.º, constante do artigo 2.º do Decreto. Porém, estão prejudicadas.

Desta forma, passamos à votação da proposta, apresentada pelo BE, de eliminação do n.º 5 do artigo 3.º da

Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN,

do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e o voto contra do IL.

Fica, assim, prejudicada a votação da proposta, apresentada pelo PS, de eliminação do n.º 5 do artigo 3.º da

Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto, bem como a votação da proposta, apresentada pelo

IL, que emenda o n.º 5 do artigo 3.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto.

Votamos a proposta, apresentada pelo BE, que emenda o n.º 2 do artigo 9.º da Lei da Nacionalidade,

constante do artigo 2.º do Decreto.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do PAN, do PEV e

das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do CDS-PP, do CH e do

IL.

É a seguinte:

2 — (Atual redação da lei em vigor).

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica prejudicada a votação da proposta, apresentada pelo IL, de emenda do n.º 2 do artigo 9.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto.

Passamos, assim, à votação, na especialidade, da proposta, apresentada pelo BE, de aditamento de um n.º

3 ao artigo 9.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto, e consequente renumeração do atual

n.º 3 como n.º 4.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, doPSD, doCDS-PP, do CH e do IL e votos a

favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.

Era a seguinte:

Página 40

I SÉRIE — NÚMERO 9

40

3 — A oposição à aquisição de nacionalidade com fundamento na alínea a) do n.º 1 não se aplica às situações

de aquisição de nacionalidade em caso de casamento ou união de facto quando o casamento ou união de facto

decorra há pelo menos 2 anos.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Passamos à votação da proposta, apresentada pelo PS, de aditamento de um n.º 3 ao artigo 9.º da Lei da Nacionalidade, constante do artigo 2.º do Decreto, e consequente

renumeração do atual n.º 3 como n.º 4.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP, do PAN, do PEV e da

Deputada não inscrita Cristina Rodrigues, votos contra do CDS-PP, do CH e do IL e abstenções do BE e da

Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

É a seguinte:

3 — A oposição à aquisição de nacionalidade com fundamento na alínea a) do n.º 1 também não se aplica

às situações de aquisição de nacionalidade quando o casamento ou a união de facto decorra há pelo menos 6

anos.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Votamos, agora, a proposta, apresentada pelo IL, de aditamento de um artigo 2.º-A ao Decreto n.º 57/XIV.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, doCDS-PP e do CH, votos a favor doPSD, do

BE, do PAN, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do

PCP e do PEV.

Era a seguinte:

Artigo 2.º-A

Norma revogatória

É revogado o artigo 14.º da Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, na sua redação atual.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Passamos, assim, à votação do novo Decreto, com as alterações que acabámos de aprovar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PSD, do CDS-PP e do CH

e a abstenção do IL.

Passamos para o guião suplementar II, relativo à reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º

59/XIV — Primeira alteração à Lei n.º 17/2014, de 10 de abril, que estabelece as Bases da Política de

Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional.

Assim sendo, a primeira votação que temos de fazer no âmbito deste guião é relativa à proposta, apresentada

pelo PS, de substituição do n.º 4 do artigo 8.º da Lei n.º 17/2014, de 10 de abril, constante do artigo 1.º do

Decreto, e consequente emenda da norma revogatória constante do artigo 4.º.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do IL, dos

Deputados do PSD Paulo Moniz, Paulo Neves, Sara Madruga da Costa e Sérgio Marques e da Deputada não

inscrita Joacine Katar Moreira, votos contra do CH, dos Deputados do PS Ana Paula Vitorino, Ascenso Simões,

Isabel Alves Moreira, Jorge Lacão, José Magalhães, Marcos Perestrello, Rosário Gambôa e Sérgio Sousa Pinto,

do Deputado do PSD António Lima Costa e da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e abstenções do PSD,

do CDS-PP e dos Deputados do PS Bruno Aragão e Filipe Neto Brandão.

Página 41

3 DE OUTUBRO DE 2020

41

É a seguinte:

4 — Os instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional definem os procedimentos de codecisão,

no âmbito da gestão conjunta ou partilhada entre a administração central e a regional autónoma, quando esteja

em causa o regime económico e financeiro associado à utilização privativa dos fundos marinhos.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado António Ventura, não estando na Sala pelas razões que são conhecidas, também vota a favor.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Está esclarecido. Os serviços deverão tomar nota desta circunstância.

Vamos prosseguir as votações.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, é para anunciar que irei apresentar uma declaração de voto.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado. Segue-se a votação da proposta, apresentada pelo Partido Socialista, que emenda da alínea b) do n.º 3 do

artigo 31.º-A da Lei n.º 17/2014, de 10 de abril, constante do artigo 2.º do Decreto.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do IL, dos

Deputados do PSD António Ventura, Paulo Moniz, Paulo Neves, Sara Madruga da Costa e Sérgio Marques e

da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, votos contra do CH, dos Deputados do PS Ana Paula Vitorino,

Ascenso Simões, Isabel Alves Moreira, Jorge Lacão, José Magalhães, Marcos Perestrello, Rosário Gambôa e

Sérgio Sousa Pinto, do Deputado do PSD António Lima Costa e da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e

abstenções do PSD, do CDS-PP e dos Deputados do PS Bruno Aragão e Filipe Neto Brandão.

É a seguinte:

b) A participação dos serviços da administração central competente no procedimento prévio dirigido à

aprovação dos planos de ordenamento e gestão do espaço marítimo até às 200 milhas marítimas, mediante a

emissão de parecer, o qual é obrigatório e vinculativo nas matérias relativas à integridade e soberania do Estado;

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Passamos à votação da proposta, apresentada pelo Partido Socialista, de emenda da alínea d) do n.º 3 do artigo 31.º-A da Lei n.º 17/2014, de 10 de abril, constante do

artigo 2.º do Decreto.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do IL, dos

Deputados do PSD António Ventura, Paulo Moniz, Paulo Neves, Sara Madruga da Costa e Sérgio Marques e

da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, votos contra do CH, dos Deputados do PS Ana Paula Vitorino,

Ascenso Simões, Isabel Alves Moreira, Jorge Lacão, José Magalhães, Marcos Perestrello, Rosário Gambôa e

Sérgio Sousa Pinto, do Deputado do PSD António Lima Costa e da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e

abstenções do PSD, do CDS-PP e dos Deputados do PS Bruno Aragão e Filipe Neto Brandão.

Página 42

I SÉRIE — NÚMERO 9

42

É a seguinte:

d) A competência exclusiva das regiões autónomas para licenciar, no âmbito da utilização privativa de bens

do domínio público marítimo do Estado, designadamente, atividades de extração de inertes, pesca e produção

de energias renováveis, salvo quando esteja em causa a integridade e soberania do Estado.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Votamos, agora, o novo Decreto, com as alterações que, entretanto, foram adotadas.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PAN, do IL, dos Deputados do PSD António

Ventura, Paulo Moniz, Paulo Neves, Sara Madruga da Costa e Sérgio Marques e da Deputada não inscrita

Joacine Katar Moreira, votos contra do CH, dos Deputados do PS Ana Paula Vitorino, Ascenso Simões, Bruno

Aragão, Isabel Alves Moreira, Jorge Lacão, José Magalhães, Marcos Perestrello, Rosário Gambôa e Sérgio

Sousa Pinto, do Deputado do PSD António Lima Costa e da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e

abstenções do PSD,do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV e do Deputado do PS Filipe Neto Brandão.

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, é para informar a Mesa que acabei de entregar uma declaração de voto.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr. Deputado. Pede-me a palavra o Sr. Deputado Bruno Aragão. Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Bruno Aragão (PS): — Sr. Presidente é também para informar a Mesa que farei chegar uma declaração de voto sobre estes pontos.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr. Deputado. Pede, ainda, a palavra a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa. Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, é também para anunciar uma declaração de voto em nome dos Deputados do PSD eleitos pela Madeira.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr.ª Deputada. Pede-me também a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino. Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr. Presidente, é para informar a Mesa que eu, a Sr.ª Deputada Rosário Gambôa e os Srs. Deputados Ascenso Simões, Jorge Lacão, Marcos Perestrello, Pedro Bacelar de

Vasconcelos, Sérgio Sousa Pinto, José Magalhães, Alexandre Quintanilha, Isabel Moreira e António Gameiro

iremos apresentar uma declaração de voto.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr.ª Deputada.

O Sr. António Lima Costa (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Lima Costa (PSD): — Sr. Presidente, é para anunciar que entregarei uma declaração de voto sobre esta matéria.

Página 43

3 DE OUTUBRO DE 2020

43

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr. Deputado. Pede-me ainda a palavra o Sr. Deputado André Ventura. Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr. Deputado. Fica tudo devidamente registado e agradeço as vossas inscrições.

Voltamos, então, à página 2 do guião principal, com a votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º

547/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo a requalificação do Pavilhão 5 do Hospital Dr. Sousa Martins.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Baixa, portanto, à 9.ª Comissão.

Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 555/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao

Governo a requalificação do Pavilhão 5 do Hospital de Sousa Martins, na Unidade Local de Saúde da Guarda,

para instalação do departamento de saúde da criança e da mulher.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Baixa à 9.ª Comissão.

Votamos, agora, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 595/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo

prioridade absoluta na conclusão do projeto de requalificação do Pavilhão 5 do Hospital Sousa Martins, da

Guarda, para maternidade e departamento de saúde da criança e da mulher.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Baixa à 9.ª Comissão.

Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 609/XIV/1.ª (BE) — Requalificação do

Pavilhão 5 do hospital da Guarda e do Pavilhão Dona Amélia.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Baixa à 9.ª Comissão.

Votamos, ainda, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 613/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda a

reconstrução imediata do Pavilhão 5 do Hospital Sousa Martins para instalação da área clínica materno-infantil

(Guarda).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN,

do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a abstenção do IL.

Baixa, portanto, à 9.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 473/XIV/1.ª (PS) — Aprova a Carta de Direitos

Fundamentais na Era Digital.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PAN, votos contra do CH e do IL e

abstenções do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e

Joacine Katar Moreira.

Baixa à 1.ª Comissão.

Votamos agora, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 498/XIV/1.ª (PAN) — Aprova a Carta dos Direitos

Digitais e um conjunto de medidas complementares que asseguram o reforço das garantias dos cidadãos no

domínio digital.

Página 44

I SÉRIE — NÚMERO 9

44

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PAN e da Deputada não inscrita Joacine

Katar Moreira, votos contra do CH e do IL e abstenções do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV e da

Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

Baixa à 1.ª Comissão.

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, é para anunciar que apresentaremos uma declaração de voto sobre esta matéria e sobre este projeto de lei.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr. Deputado. Podemos então passar à votação seguinte.

Votamos, pois, o Projeto de Resolução n.º 532/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo um conjunto de

medidas com vista a identificar e solucionar o problema dos lares que se encontrem em situação irregular ou

ilegal.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do BE, do PCP e do PEV e votos a favor do

PSD, doCDS-PP, do PAN, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar

Moreira.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 484/XIV/1.ª (BE) — Cria um teto máximo para o

valor das propinas dos 2.º e 3.º ciclos de estudos e pós-graduações no ensino superior público.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, doPSD, doCDS-PP e do IL, votos a favor do

BE, do PCP, do PAN, do PEV, dos Deputados do PS Ivan Gonçalves e Sérgio Sousa Pinto e das Deputadas

não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a abstenção do CH.

Baixa à 8.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 492/XIV/1.ª (PCP) — Eliminação das propinas

no ensino superior público.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH, do IL e da Deputada

não inscrita Cristina Rodrigues e votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV e da Deputada não inscrita

Joacine Katar Moreira.

Vamos passar à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 497/XIV/1.ª (PAN) — Limita a alteração do

valor das propinas dos cursos técnico superior profissional, 2.º, 3.º ciclos de estudos no ensino superior público.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PAN, do IL e da Deputada não

inscrita Cristina Rodrigues, votos contra do PSD e abstenções do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e da

Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

O diploma baixa à 8.ª Comissão.

Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Barroco de Melo.

O Sr. Eduardo Barroco de Melo (PS): — Sr. Presidente, é para anunciar a apresentação de uma declaração de voto, em meu nome e em nome dos Srs. Deputados Maria Begonha, Joana Sá Pereira, Miguel Costa Matos,

Filipe Pacheco e Olavo Câmara, sobre as três últimas votações.

Página 45

3 DE OUTUBRO DE 2020

45

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr. Deputado. Vamos passar à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 18/XIV/1.ª (PCP) — Melhora as regras de

atribuição e altera a duração e montantes do subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas

não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do CH e do IL e abstenções do PS, do

PSD e do CDS-PP.

Baixa à 10.ª Comissão.

Passamos, agora, à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 491/XIV/1.ª (PAN) — Aumenta as

garantias dos beneficiários de prestações de desemprego no âmbito das regras referentes à formação

profissional, alterando o Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do PCP, do

PAN, do PEV, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do

PS e do CH.

Vamos passar à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 495/XIV/1.ª (BE) — Alarga e melhora as

condições de acesso e os períodos de concessão do subsídio de desemprego e do subsídio social de

desemprego (Décima sétima alteração do Regime Jurídico de Proteção no Desemprego).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV, das Deputadas não

inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do CH, do IL e abstenções do PS, do PSD e

do CDS-PP.

Baixa à 10.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 641/XIV/2.ª (CDS-PP) — Adoção de medidas para

o regular funcionamento dos cuidados de saúde primários.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PS, do BE, do PCP e do

PEV.

Baixa à 9.ª Comissão.

Vamos passar à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 248/XIV/1.ª (PAN) — Garantir um

Serviço Nacional de Saúde de qualidade.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL, do

Deputado do PS Ascenso Simões e da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e abstenções do PS, do BE,

do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

Baixa à 9.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 630/XIV/2.ª (PCP) — Medidas para a

recuperação da atividade nos cuidados de saúde primários.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH, do

IL, do Deputado do PS Ascenso Simões e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar

Moreira e abstenções do PS e do CDS-PP.

Baixa à 9.ª Comissão.

Página 46

I SÉRIE — NÚMERO 9

46

Vamos passar à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 656/XIV/2.ª (BE) — Recuperação e

reforço da atividade dos cuidados de saúde primários.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do PEV, do PAN, do CH, do

IL, do Deputado do PS Ascenso Simões e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar

Moreira e abstenções do PS e do CDS-PP.

Baixa à 9.ª Comissão.

Não havendo objeções, vamos agora votar em conjunto o requerimento, apresentado pelo PAN, solicitando

a baixa à Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, sem votação, por 60 dias, do Projeto

de Lei n.º 53/XIV/1.ª (PAN) — Visa assegurar a não discriminação no acesso à habitação por quem possui

animais de companhia, e o requerimento, apresentado pela Sr.ª Deputada não inscrita Cristina Rodrigues,

solicitando a baixa à Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, sem votação, por 60 dias,

do Projeto de Lei n.º 496/XIV/1.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Altera o Código Civil, garantindo

a não discriminação no acesso ao arrendamento por quem detém animais de companhia.

Submetidos à votação, foram aprovadospor unanimidade.

Vamos passar à votação global da Proposta de Resolução n.º 7/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Acordo de

Parceria Abrangente e Reforçada entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica e os

seus Estados-Membros, por um lado, e a República da Arménia, por outro, assinado em 24 de novembro de

2017, em Bruxelas.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH,

do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP, e do

PEV.

Vamos passar à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 622/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao

Governo que garanta o direito ao acompanhante das grávidas.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PEV, do PAN, do CH, do

IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD e do CDS-

PP.

Baixa à 9.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 626/XIV/1.ª (IL) — Pela alteração da

orientação da DGS de forma a garantir o direito da grávida a acompanhante em todos os serviços de obstetrícia.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PAN, do CH, do IL e das Deputadas

não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PCP e do PEV e abstenções do PSD

e do CDS-PP.

Baixa à 9.ª Comissão.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, é para anunciar que o Grupo Parlamentar do PSD apresentará uma declaração de voto relativamente às duas últimas votações.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr.ª Deputada. Vamos agora votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 635/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina

Rodrigues) — Pelo acompanhamento de mulheres grávidas durante todas as fases do trabalho de parto no

contexto da COVID-19.

Página 47

3 DE OUTUBRO DE 2020

47

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PAN, do CH, do IL e das Deputadas

não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP e do PEV.

Baixa à 9.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 636/XIV/2.ª (BE) — Garante o

acompanhamento da mulher grávida na assistência à gravidez e em todas as fases do parto mesmo durante a

pandemia de COVID-19.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH, do

IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PSD e a abstenção

do CDS-PP.

Baixa à 9.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 605/XIV/1.ª (BE) — Recomenda a

integração de assistentes operacionais precários na escola pública.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH, do

Deputado do PS Ascenso Simões e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, o

voto contra do IL e abstenções do PS e do CDS-PP.

Vamos passar à votação do Projeto de Resolução n.º 627/XIV/2.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a

contratação de todos os trabalhadores necessários ao funcionamento da escola pública.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH, do Deputado

do PS Ascenso Simões e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra

do PSD e abstenções do PS, do CDS-PP e do IL.

De seguida, vamos votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 654/XIV/2.ª (BE) — Recomenda a

contratação de mais professores, técnicos especializados e trabalhadores não docentes para a escola pública.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH, do Deputado

do PS Ascenso Simões e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra

do IL e abstenções do PS e do PSD.

Baixa à 8.ª Comissão.

Vamos agora passar à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Economia, Inovação,

Obras Públicas e Habitação, relativo ao Projeto de Resolução n.º 168/XIV/1.ª (BE) — Moratória à venda ou

cessão de património do Estado em cidades em carência habitacional.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Economia, Inovação, Obras

Públicas e Habitação, relativo ao Projeto de Resolução n.º 230/XIV/1.ª (PCP) — Mobilização do património

público habitacional.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

De seguida, passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Economia,

Inovação, Obras Públicas e Habitação, relativo ao Projeto de Resolução n.º 540/XIV/1.ª (BE) — Reforço da

oferta de transporte ferroviário e complementaridade com o transporte rodoviário para garantir condições de

segurança.

Página 48

I SÉRIE — NÚMERO 9

48

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do IL, das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PS, do CDS-PP e do CH.

Vamos passar à votação, na generalidade, do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao Projeto de Resolução n.º 546/XIV/1.ª (IL) — Pela

eficaz proteção dos denunciantes.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL e

da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues, votos contra do BE e abstenções do PCP, do PEV e da Deputada

não inscrita Joacine Katar Moreira.

Vamos agora à votação, na generalidade, do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao Projeto de Resolução n.º 550/XIV/1.ª (PAN) —

Recomenda ao Governo que apresente e submeta à aprovação da Assembleia da República a Estratégia

Nacional de Combate à Corrupção 2020-2024.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PAN, do CH, do IL e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP, do CDS-PP e do

PEV.

Não havendo objeção, vamos votar, em conjunto, três requerimentos, apresentados pelo PSD, pelo PAN e

pelo PCP, relativos à avocação pelo Plenário da votação, na especialidade, de propostas de alteração ao texto

final, apresentado pela Comissão de Orçamento e Finanças, relativo ao Projeto de Lei n.º 365/XIV/1.ª (PAN) ⎯

Altera as regras de nomeação do Governador e os demais membros do conselho de administração do Banco

de Portugal (oitava alteração à Lei n.º 5/98, de 31 de janeiro).

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Passamos ao guião suplementar III e, uma vez que se trata de avocações pelo Plenário da votação, na

especialidade, a Mesa gostaria de colocar à consideração das Sr.as e dos Srs. Deputados duas possibilidades:

cada partido avocante apresenta a respetiva avocação ou entramos de imediato no debate.

Pausa.

Não havendo objeções, entramos de imediato no debate.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, vamos aprovar um modelo de nomeação dos membros do conselho de administração do Banco de Portugal que, no fundo, vem modernizar e

apostar na transparência relativamente ao modelo existente.

Este constitui um enorme avanço que se faz, apesar dos expedientes dilatórios que vieram a atrasar não só

esta votação como esta discussão. Para o PAN, há dois aspetos, contudo, que não podem ficar fora desta

alteração legislativa.

O primeiro tem a ver com o período de nojo para os titulares de cargos políticos, que, claramente, ficam de

fora desta alteração. E aqui apelamos, obviamente, ao bom senso do PCP e do Bloco para que nos

acompanhem nesta alteração legislativa, porque a «porta giratória» também funciona do poder político para o

Banco de Portugal. Aliás, o «bloco central» tem sido exemplo disso a nível do que têm sido essas nomeações.

Neste caso, não podemos deixar de perguntar ao PCP e ao Bloco se acham mesmo que os figurões do

«bloco central» têm servido o interesse público e onde é que se tem visto esse exercício de interesse público

ser servido pelos últimos conselhos de administração do Banco de Portugal, onde 42% dos membros tinham

vindo, precisamente, do poder político. Acham mesmo que, por exemplo, Vítor Constâncio, reconhecido por um

Página 49

3 DE OUTUBRO DE 2020

49

percurso político, serviu o interesse público na postura que teve com o BPN (Banco Português de Negócios)?

Será que o PCP, por exemplo, acredita que Miguel Beleza, que acusaram — e cito — de ser «um dos

executantes das receitas da cartilha neoliberal e monetarista», serviu o interesse público?

O Banco de Portugal tem vários problemas e um deles é, de facto, a sua independência face ao poder político

e também ao «bloco central» que tem emergido. O que pedimos hoje é que o PCP e o Bloco não façam este

jeito ao «bloco central» e que nos acompanhem nesta iniciativa, que recuem na vossa posição inicial e que

aprovem a proposta do PAN de consagração de um período de nojo para os titulares de cargos políticos na

nomeação do Conselho de Administração do Banco de Portugal.

O segundo aspeto prende-se com a entrada em vigor da própria lei. O PS quer impedir que esta lei entre já

em vigor no imediato, de forma a dar tempo ao Governo que fique de mãos livres para fazer as nomeações do

Banco de Portugal que vão ocorrer nas próximas semanas. Adiar esta entrada em vigor para 1 de janeiro de

2021…

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Faça favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Concluo já, Sr. Presidente. Como estava a dizer, adiar a entrada em vigor da lei para 1 de janeiro de 2021 é, claramente, permitir que

até lá se façam as nomeações que se pretendem. E é aqui que, de facto, o PSD tem de mostrar de que lado

está: ou volta a ser da equipa B do PS, e faz mais este favor ao Governo como fez com os debates quinzenais,

ou está do lado dos que querem um Parlamento mais forte e um Banco de Portugal também ele mais forte.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco, do PSD, para uma intervenção.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com a evolução da democracia, há procedimentos que têm de ser alterados — é uma exigência da sociedade. E, por isso mesmo, o Parlamento

não pode ficar insensível àquilo que é o debate fora desta Casa, e nomeadamente ao nível dos impedimentos

dos responsáveis de cargos políticos.

Eu sei que, neste caso, há aqui um bloco de todas as esquerdas para permitir e continuar a permitir que

membros do Governo passem diretamente para a governação do Banco de Portugal.

Há poucos meses, tivemos este debate, que, na altura, foi um debate quente e aceso. Mas, depois, quando

chegou o momento da verdade, naturalmente, o Partido Socialista defendeu a sua dama, mais uma vez não

com uma bengala, mas com duas bengalas — o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português.

Aplausos do PSD.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, aquilo que temos de dizer, aqui, hoje, claramente, é que nós fomos

aprendendo com o passado. E se também houve governantes do PSD — é verdade que houve, estou aqui a

dizê-lo olhos nos olhos, não me escondo atrás disso —, aquilo que digo é que aprendemos, e, por isso mesmo,

a situação tem de ser corrigida. E corrigida para a frente, fazendo o seguinte: evitando discussões ad hominem,

que é aquilo que os senhores vão querer, ou seja, que, quando voltar a ser nomeado alguém, se discuta o

caráter e a personalidade em questão.

Não, que fique claro, a partir de hoje em diante, que governantes deixem de ser impedidos de passar

diretamente para o Banco de Portugal. Quero ver a vossa responsabilidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — A próxima intervenção cabe ao Sr. Deputado Duarte Alves, do PCP.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

Página 50

I SÉRIE — NÚMERO 9

50

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP revê-se, na generalidade, nas alterações do texto final relativo a este projeto, nomeadamente naquilo que visa impedir que dirigentes e pessoas

que exercem altos cargos nos bancos e nas grandes consultoras não possam transitar diretamente para o Banco

de Portugal, porque aí, sim, está o grande problema da captura do supervisor pelo próprio setor que é

supervisionado.

E, já agora, gostava de perguntar ao PSD se gostou da atuação de Carlos Costa, que passou diretamente

da banca para o Banco de Portugal.

Mas, neste texto final, há um aspeto com o qual não podemos concordar e, por isso, fizemos também um

requerimento de avocação, que tem a ver com a entrada em vigor. Esta é uma questão muito importante, porque

o PSD aprovou uma proposta, apresentada pelo PS, no sentido da entrada em vigor destas regras apenas em

1 de janeiro de 2021. Ou seja, por vontade do PSD, aprovando esta proposta do PS, permite que às nomeações

para o conselho de administração, que vão ser feitas nas próximas semanas, não sejam aplicadas as regras

que estamos aqui a discutir. Esta é uma questão importantíssima e que é necessário clarificar agora. Com esta

avocação, o PCP dá uma oportunidade ao PSD de demonstrar se, de facto, está do lado da transparência ou

se está a empurrar as decisões que tomámos na Comissão Parlamentar de Orçamento e Finanças.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Relativamente à incompatibilidade com cargos públicos, a nossa posição foi sempre clara. Sempre dissemos, desde o início, que consideramos não existir qualquer conflito de interesses

entre o exercício de cargos públicos e a ida para o Banco de Portugal. Consideramos, sim, que o maior conflito

de interesses é entre o setor que é regulado e o supervisor que o regula. Aí existe conflito de interesses das

«portas giratórias» da banca para o Banco de Portugal, das grandes consultoras para o Banco de Portugal, e

aí, sim, temos visto a grande falha do modelo de supervisão, supostamente independente, que tem dado tantos

escândalos, do BES, do BANIF, do BPN, em que, de facto, ficou demonstrado que este modelo de supervisão

não funciona.

É através de um maior controlo público por parte do Banco de Portugal que pode haver a resolução destes

problemas e não através dessa falsa independência de que aqui falam, em que, no fundo, o Banco de Portugal

está sujeito ao próprio setor da banca, que domina o próprio supervisor.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do CDS-PP.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A história desta legislação é uma triste história de adiamentos. Como se sabe, o CDS tem uma divergência de fundo em relação a esta

legislação. Nós entendemos que, no caso do Banco de Portugal, e também no caso de outros reguladores

fundamentais, devia haver uma consagração de três órgãos de soberania a intervir no processo de nomeação,

com o Governo a propor, a Assembleia da República a ouvir e o Presidente da República a nomear. Esse nosso

projeto foi chumbado logo à partida, e, portanto, o que estávamos aqui a discutir era um projeto que tinha,

sobretudo, a ver com incompatibilidades e consagração de incompatibilidades.

Através de alianças de geometria variável, nuns casos com o PCP e com o Bloco e noutro caso com o PSD,

o PS conseguiu, seja o que for aqui aprovado hoje, que não se aplique a Mário Centeno. Ou seja, através de

uma aliança com o PCP e com o Bloco, que são a favor de incompatibilidades, mas não a favor de

incompatibilidades de membros do Governo, conseguiram que, pura e simplesmente, essa ideia não avançasse.

Mas como havia o PSD, que é a favor da ideia, para que isso não impedisse Mário Centeno, então o PSD não

se opôs a que fosse feita a audição e a nomeação de Mário Centeno. E eis que corríamos o risco de ter uma lei

— aliás, ainda corremos esse risco — que é a seguinte: o que não se aplica a Mário Centeno também não se

aplica aos outros nomeados nos próximos meses. É a garantia total!

Página 51

3 DE OUTUBRO DE 2020

51

Protestos do Deputado do PS Pedro Delgado Alves.

Sr. Deputado, se quer que lhe diga se eu acho que Mário Centeno é absolutamente incompatível com o cargo

de Governador do Banco de Portugal, digo-lhe que acho! E acho que vamos ter uma comissão de inquérito ao

Novo Banco, que vai explicar-lhe, se dúvidas tivesse, porque é que isso aconteceu, porque o mesmo homem

que conduziu a venda do Novo Banco é o homem que agora supervisiona essa mesma venda e o que resultou

dela.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, faça favor de concluir.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Se isto não é incompatível, não sei o que seria. Já teria terminado a minha intervenção se o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves não estivesse a gritar. E

porque se tornou numa praxe parlamentar os Srs. Deputados tirarem as máscaras quando querem que os

apartes sejam ouvidos e porque acho haver nisso um certo risco para a saúde, talvez não fosse pior se tal

pudesse ser evitado.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Bloco não mudou um milímetro da sua posição desde o início deste debate. É preciso proteger o Banco de Portugal das incompatibilidades face ao

privado, independência face ao regulado. É esse o problema da banca, é quando obedece aos interesses do

privado, que é o regulado. Mas não aceitamos que exista uma incompatibilidade entre quem defende o interesse

público e quem defende o interesse público, mesmo que eu não concorde com a ideia de quem defende o

interesse público.

Sr.ª Deputada do PAN, diferenças ideológicas não se proíbem, discutem-se. E é por isso que o Bloco de

Esquerda defende que a análise de alguém que for para Governador do Banco de Portugal tem de ser debatida

na Assembleia da República, com parecer vinculativo, votado aqui, que comprometa todos os partidos. Não é

proibindo ideias só porque eu não concordo com alguém, que vou resolver, certamente, os problemas da banca

ou de qualquer outro setor da economia portuguesa.

Por isso, desde o início que propusemos um parecer vinculativo. O PAN também o propôs, mas foi um

parecer vinculativo aprovado por maioria absoluta. Sr.ª Deputada, sabe qual é o resultado? Só seria nomeado

quem o PS e o PSD quisessem. Para quem não quer fazer favores ao «bloco central», vou dizer-lhe, Sr.ª

Deputada, que fez um grande favor ao «bloco central». Só não passou porque o PSD e o PS recusaram essa

possibilidade, que foi a possibilidade de dar à Assembleia da República a última palavra sobre quem poderia

ser o Governador do Banco de Portugal. Lamentamos que assim tenha sido. Lamentamos também que, por

proposta do PSD, as incompatibilidades face ao privado tenham reduzido de cinco para três anos. E lamentamos

o expediente e manobras dilatórias para que este processo não se aplicasse com celeridade. Houve, sim,

atrasos no processo, eles contaram sempre com o voto do PSD e do PS, nunca contaram com o voto do Bloco

nem com aquele que atrasou para o dia 1 de janeiro de 2021 a entrada em vigor deste diploma.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — É a vez do Grupo Parlamentar do PS. Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Fernando Anastácio.

Sr. Deputado, estando na segunda fila, tenho de lhe pedir o favor de usar máscara.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, há pouco não houve esse procedimento, mas concordo consigo.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem toda a razão, Sr. Deputado. Peço desculpa. Faça favor de usar da palavra.

Página 52

I SÉRIE — NÚMERO 9

52

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS, com máscara ou sem máscara, é convicto nas suas posições. Aliás, a demonstração disso é que, precisamente depois de uma discussão algo

atribulada, permitimos, com as posições do Partido Socialista, que não se fizessem, neste Parlamento, leis ad

hominem, leis que envergonhariam o nosso regime parlamentar. Aliás, as alterações que o Partido Socialista

apresentou foram bastante consensuais, de facto, e permitiram que hoje tenhamos uma lei muito melhor.

Temos uma lei que permite resolver um problema que está na origem de muitos problemas com que nos

deparamos atualmente, particularmente as denominadas «portas giratórias» entre os regulados e o regulador.

Aliás, muitos dos protagonistas que vamos encontrar dentro de pouco tempo, estiveram nos auditores, estiveram

no Banco de Portugal, numa demonstração inequívoca de que, com a posição do Partido Socialista, tal não

voltará a acontecer.

Mas também temos uma posição muito clara: não temos dúvidas de que o interesse público deve ser

defendido no exercício de cargos políticos, deve ser defendido na Administração Pública, deve ser defendido no

Banco de Portugal. Aliás, os titulares de cargos políticos, da Administração e do Banco de Portugal têm um

dever, que é o de defender o interesse público. Por isso, não há aqui qualquer incompatibilidade. Há, sim, de

facto, uma incompatibilidade entre os regulados, quem vem dos reguladores, dos auditores e o Banco de

Portugal. E, por isso, criámos uma norma de três anos de período de nojo sobre tal matéria.

Mas, mais: garantimos a quota de género, ou seja, a garantia de que no Banco de Portugal também haverá

o princípio da igualdade de género. Também garantimos que vamos ter, de facto, uma legislação melhor, vamos

ter o escrutínio parlamentar, que será um relatório fundamentado, um parecer fundamentado e verificado no

Parlamento.

Por isso, Srs. Deputados, a convicção do Partido Socialista é a de que fizemos uma boa lei, que permitirá ter

mais escrutínio, mais transparência, mais eficácia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

Faça favor, Sr. Deputado.

Vozes do PS: — Está sem a máscara!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Têm toda a razão. Sr. Deputado, como está na segunda fila, faça favor de usar a máscara.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, se assim é, doravante vou ter de fazer todas as intervenções de máscara?

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, é uma regra que tem de se aplicar a todos em todas as circunstâncias. Peço desculpa.

Faça favor de proferir a sua intervenção, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este processo, de facto, mostra muitas coisas que estão verdadeiramente mal na política em Portugal, porque aquilo que estamos aqui a discutir,

hoje, já era para ter sido discutido há dois meses, antes da nomeação de Mário Centeno. E não me venham

com a teoria de que seria uma lei ad hominem, porque não é disso que se trata.

A esquerda diz que há problemas de promiscuidade entre supervisionados e supervisores. Estamos de

acordo. Mas já não há problemas nenhuns entre tutelados e tutela quando transitam diretamente de um para

outro. E, se dúvidas houvesse, basta ver o que se tem passado nas declarações públicas do ex-Ministro das

Finanças, e até nas audiências que pede ao Presidente da República, para explicar a preocupação que tem com

a situação do Novo Banco.

Página 53

3 DE OUTUBRO DE 2020

53

Eu gostava de saber como é que o Governador do Banco de Portugal avaliará aquilo que foi a atuação do

Ministro das Finanças nos últimos cinco anos nesta matéria do Novo Banco. Gostava muito de saber, se dúvidas

houvesse, sobre a promiscuidade entre o tutelado e a tutela.

Mas, lamento muito dizer, o PSD não fica isento de responsabilidades neste adiamento, porque não permitiu

que se discutisse este caso antes de ser feita a nomeação do Prof. Mário Centeno, e houve toda a oportunidade

para o fazer. E temo muito que esta história de a data de entrada em vigor não ser conforme o que decorre da

lei, que normalmente é de cinco dias depois da publicação, mas de ser só no primeiro de janeiro, tenha a ver

com interesses que os senhores tenham na nomeação de administradores para o Banco de Portugal. Temo

muito que isso aconteça e, se assim for, será mais um péssimo sinal do estado da política em Portugal.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para fazer a última intervenção neste debate sobre as avocações, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, o que estamos aqui a discutir era perfeitamente evitável se nos tivéssemos conseguido mobilizar atempadamente, com a força e a forma de que precisávamos, para evitar

aquilo a que o PS chama de «nomeação ad hominem», mas todos sabemos que estamos a falar da entrada de

um ministro diretamente para o Banco de Portugal, da entrada de um ministro que supervisionou uma operação

e que agora vai prestar esclarecimentos sobre essa mesma operação enquanto chefe da regulação. Não haveria

nenhum país da Europa em que isto acontecesse sem que a democracia se risse quando olhasse para esta

situação.

Mas, pior, tivemos tudo nas nossas mãos e, uns com o argumento de que não queriam uma incompatibilidade

ad hominem, outros com o argumento de que não queriam uma incompatibilidade para sempre, outros ainda

com o argumento de que não se deveria apressar o processo legislativo, o resultado está à vista e os

portugueses não deixarão de os julgar. Poderíamos ter usado os argumentos que quiséssemos, mas o que

passou para fora foi que o Parlamento decidiu não se opor à nomeação de Mário Centeno para o Banco de

Portugal. Ninguém vai querer saber que argumentos escolheram, se porque não era ad hominem ou porque não

se apressam processos legislativos.

Isto era o que estava em cima da mesa e o que a história julgará será o dia em que este Parlamento teve

nas mãos a possibilidade de impedir que um ministro passasse para o Banco de Portugal num dos momentos

mais cruciais da história das operações financeiras em Portugal e não teve coragem, capacidade nem força para

o fazer. Cedeu ao Governo, cedeu aos interesses do centralismo e, sobretudo, cedeu ao interesse do Governo

socialista, que, a cada passo, ameaça com uma crise política e com eleições à vista. Foi isto que aconteceu e

que nos deve envergonhar enquanto Parlamento.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, depois do debate sobre as avocações requeridas, vamos proceder às respetivas votações, na especialidade, constantes do guião suplementar III,

relativas ao texto final, apresentado pela Comissão de Orçamento e Finanças, sobre o Projeto de Lei n.º

365/XIV/1.ª (PAN) — Altera as regras de nomeação do Governador e os demais membros do conselho de

administração do Banco de Portugal (Oitava alteração à Lei n.º 5/98, de 31 de janeiro).

Começamos pela votação da alínea a) do n.º 3 do artigo 27.º da Lei Orgânica do Banco de Portugal, constante

do artigo 2.º do projeto de lei (avocação requerida pelo PAN).

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do BE, do PCP, do PEV e das Deputadas não

inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH e do

IL.

Passamos à votação da alínea b) do n.º 3 do artigo 27.º da Lei Orgânica do Banco de Portugal, constante do

artigo 2.º do projeto de lei (avocação requerida pelo PAN).

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD, do BE, do PCP, do PEV e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos a favor do CDS-PP, do PAN, do CH

e do IL.

Página 54

I SÉRIE — NÚMERO 9

54

Srs. Deputados, prosseguimos com a votação da proposta, apresentada pelo PSD, de aditamento de uma

alínea c) ao n.º 8 do artigo 27.º da Lei Orgânica do Banco de Portugal, constante do artigo 2.º do texto final

(avocação requerida pelo PSD).

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do BE, do PCP, do PEV e das Deputadas não

inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH e do

IL.

A Sr.ª Deputada Cecília Meireles pediu a palavra para que efeito?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, fiquei com uma dúvida, porque o Sr. Presidente disse que se tratava da alínea c) do n.º 8 do artigo 27.º, mas creio que votámos a alínea c) do n.º 3 do artigo 27.º.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, limitei-me a ler o que está no guião de votações.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, creio que o guião está errado, porque o que foi avocado foi isto que eu disse.

Pausa.

Srs. Deputados, havendo uma renumeração no texto final, fica o assunto resolvido com a votação que há

pouco fizemos.

Passamos, portanto, à votação do artigo 4.º do projeto de lei (avocação requerida pelo PAN).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do CDS-

PP, do PAN, do PEV, do CH e do IL e abstenções das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine

Katar Moreira.

Vamos votar, Srs. Deputados, o artigo 4.º do texto final (avocação requerida pelo PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD e votos contra do BE, do PCP, do

CDS-PP, do PAN, do PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar

Moreira.

O Sr. Deputado João Paulo Correia pediu a palavra para que efeito?

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, para fazer um ponto de ordem sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, é para que fique claro que, na reunião da Comissão de Orçamento e Finanças onde foi discutido e votado todo este processo relacionado com as novas regras de

nomeação para o Banco de Portugal, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega, não só não esteve presente no

debate como também não participou na votação, pelo que ficámos estupefactos com o discurso que fez aqui,

pois não foi condizente com a sua participação no processo.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, isso não é, verdadeiramente, um ponto de ordem. Srs. Deputados, vamos regressar ao guião de votações principal.

Começamos por votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Orçamento e

Finanças, relativo ao Projeto de Lei n.º 365/XIV/1.ª (PAN) — Altera as regras de nomeação do Governador e os

Página 55

3 DE OUTUBRO DE 2020

55

demais membros do conselho de administração do Banco de Portugal (Oitava alteração à Lei n.º 5/98, de 31 de

janeiro).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PAN, do CH e do IL, votos contra do CDS-

PP e abstenções do PSD, do BE, do PCP, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine

Katar Moreira.

Passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e Segurança Social,

relativo ao Projeto de Lei n.º 474/XIV/1.ª (PSD) — Programa especial de apoio social aos ex-trabalhadores da

COFACO.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN,

do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a abstenção do IL.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 52/XIV/1.ª (PAN) — Privilegia o modelo de residência

alternada sempre que tal corresponda ao superior interesse da criança, excecionando-se o decretamento deste

regime aos casos de abuso infantil, negligência e violência doméstica.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP, do PEV e da

Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, votos a favor do BE, do PAN e da Deputada não inscrita Cristina

Rodrigues e abstenções do CH e do IL.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 114/XIV/1.ª (BE) — Altera o Código Civil,

prevendo o regime de residência alternada da criança na regulação do exercício das responsabilidades parentais

em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e

da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, votos a favor do BE, do PAN, da Deputada não inscrita Cristina

Rodrigues e do Deputado do PS Sérgio Sousa Pinto e a abstenção do IL.

Prosseguimos, com a votação, na generalidade, do texto de substituição, apresentado pela Comissão de

Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos Projetos de Lei n.os 87/XIV/1.ª (PS) —

Altera o Código Civil, estabelecendo o princípio da residência alternada do filho em caso de divórcio, separação

judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento dos progenitores, 107/XIV/1.ª

(PSD) — 76.ª alteração ao Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966,

alterando o regime do exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação judicial de

pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento, de forma a clarificar que o tribunal pode

determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores sempre que tal corresponda ao superior

interesse do menor, e 110/XIV/1.ª (CDS-PP) — Sobre o estabelecimento da residência alternada dos menores,

em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens e declaração de nulidade ou anulação do casamento.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH, do IL e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do BE, do PCP, do PAN e do

PEV.

A Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real pediu a palavra para que efeito?

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, é para anunciar uma declaração de voto oral.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Muito bem, Sr.ª Deputada. Será feita no final das votações. O Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto também pediu a palavra. É para que efeito, Sr. Deputado?

Página 56

I SÉRIE — NÚMERO 9

56

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Sr. Presidente, é também para anunciar uma declaração de voto, mas por escrito.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Fica registado, Sr. Deputado. Passamos à votação da assunção, pelo Plenário, das votações indiciárias realizadas na especialidade, em

sede de Comissão, relativas ao texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais,

Direitos, Liberdades e Garantias, sobre os Projetos de Lei n.os 87/XIV/1.ª (PS), 107/XIV/1.ª (PSD) e 110/XIV/1.ª

(CDS-PP).

Submetidas à votação, foram aprovadas por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global deste texto de substituição.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH, do IL e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do BE, do PCP, do PAN e do

PEV.

Por fim, vamos votar um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados que a Sr.ª

Secretária Sofia Araújo vai fazer o favor de anunciar.

A Sr.ª Secretária (Sofia Araújo): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados relativo ao Ofício n.º 85/14.ª-CTED/2020 é no sentido de autorizar o Sr. Deputado do

PSD Alberto Amaro Guedes Machado a intervir num processo que corre no Tribunal Judicial da Comarca do

Porto.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, para produzir a declaração de voto oral anunciada, relativa ao texto de substituição,

apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre os Projetos

de Lei n.os 87/XIV/1.ª (PS), 107/XIV/1.ª (PSD) e 110/XIV/1.ª (CDS-PP), tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de

Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, relativamente ao texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que diz

respeito aos Projetos de Lei n.os 87/XIV/1.ª (PS), 107/XIV/1.ª (PSD) e 110/XIV/1.ª (CDS-PP), deixando de fora

as iniciativas do Bloco de Esquerda e do PAN, queria dizer que não podemos acompanhar na totalidade esta

iniciativa.

O PAN absteve-se porque, efetivamente, nos parece que este texto de substituição defrauda o escopo do

próprio grupo de trabalho e da iniciativa. O que se pretendia era um regime preferencial, não estando em causa

a clarificação da legislação e, no fundo, parece-nos que esta redação não vem mudar, em grande medida, a

letra da lei já existente, não obstante, para nós, ser sempre de salvaguardar o superior interesse da criança.

Isso não está, de todo, em causa no alcance desta redação, mas parece-nos que aquilo que era garantir um

direito do próprio menor à participação mais igualitária de ambos os progenitores, salvaguardando,

evidentemente, os casos de abuso infantil e de violência doméstica, continua a ter um caminho a fazer na letra

da lei.

Apesar disto, não podemos deixar de saudar o trabalho realizado no âmbito deste grupo de trabalho,

nomeadamente as várias audições realizadas e a forma como se aprofundou o trabalho da Sr.ª Coordenadora,

que foi bastante diligente e profundo neste âmbito.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminamos, assim, a nossa ordem de trabalhos.

Página 57

3 DE OUTUBRO DE 2020

57

A próxima sessão plenária será no dia 7, quarta-feira, pelas 15 horas, e terá dois pontos na ordem de

trabalhos. O primeiro consta de um debate com o Governo sobre política geral e o segundo de um debate

preparatório do próximo Conselho Europeu, com a participação do Sr. Primeiro-Ministro.

A todas as Sr.as Deputadas e a todos os Srs. Deputados agradeço a colaboração nesta sessão e desejo um

bom fim de semana.

Eram 13 horas e 32 minutos.

———

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação

Relativa ao Decreto n.º 59/XIV:

Temos por incontroverso que o Decreto n.º 59/XIV não deveria poder deixar de ser apreciado sem que, ao

mesmo tempo, se tenham presentes nessa apreciação todas as objeções que, sobre a matéria, o Tribunal

Constitucional vem há anos expendendo em sucessivos arestos (cfr. Acórdãos n. os 280/90, 330/99, 131/2003,

654/2009, 402/2008, 315/2014 e 136/2016).

Eram, pois — leia-se «são» —, várias e fundadas as dúvidas de conformidade à Constituição que a Proposta

de Lei n.º 179/XIII ALRAA (que veio a dar origem ao Decreto da Assembleia da República n.º 59/XIV)

apresentava e que subjazeram à declaração de voto que entendemos apresentar aquando da sua votação final.

Divergimos, assim, do entendimento de S. Ex.ª o Presidente da República, plasmado no primeiro parágrafo

do ponto 2 da carta em que devolveu, sem promulgação, à AR o Decreto ora em causa, quando ali considera

«não haver razões suficientes para, à luz da jurisprudência constitucional […] suscitar a fiscalização preventiva

da constitucionalidade de qualquer das suas normas…»

Com o devido respeito por juízo diverso, cremos, muito pelo contrário, que a jurisprudência constitucional

sobre a matéria recomendaria vivamente uma apreciação de constitucionalidade prévia à sua promulgação.

Neste particular, sempre acrescentaremos que as alterações hoje introduzidas ao Decreto n.º 59/XIV não

têm, atenta a sua natureza minimalista (e, quase diríamos, irrelevante), a virtualidade de contribuir para a

dissipação das dúvidas que a leitura da redação original do Decreto já suscitava.

Recuperando o que já na referida declaração de voto havíamos escrito, temos que o Tribunal Constitucional

vem reiteradamente considerando o mar circundante das regiões autónomas como um bem dominial integrado

necessariamente no domínio público marítimo estadual, atenta a sua incindível conexão com a identidade e a

soberania nacionais.

Mais vem aquele Tribunal recordando, nemine discrepante, que «aos titulares de bens dominiais devem ser

concedidos poderes próprios e exclusivos que, por emergirem da relação estabelecida com o domínio público,

não podem ser entregues a outras entidades, sob pena de se esvaziar o sentido da garantia institucional

consagrada no n.º 2 do artigo 84.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). Desta garantia institucional

resulta a impossibilidade de se remeter para uma entidade a definição do regime de bens dominiais na

titularidade de outra, assim como a impossibilidade de se negar ao titular do bem dominial o exercício de

competências normativas e administrativas dirigidas ao seu modo de gestão.»

Significa isso que, no que respeita ao domínio público marítimo, pertencendo ele necessariamente ao Estado,

não poderão ser transmitidos a outras entidades os poderes que efetivamente justificam a sua titularidade. Dito

de outra forma, «Atribuir em exclusivo ao Estado a titularidade dos bens em causa, por poderosas razões que

se prendem com a soberania, identidade e unidade do Estado, e depois admitir a possibilidade de tal atribuição,

através da transmissão a outras entidades, ou de partilha com outras entidades, dos poderes essenciais

associados ao domínio, seria uma opção constitucional destituída de sentido, pois esvaziaria de conteúdo essa

posição dominial. Aceites as premissas, esta conclusão é inelutável, constituindo, portanto, jurisprudência

uniforme e constante deste Tribunal» (Ac. TC 136/2016, in DR de 30/3/2016, pág. 10750).

Isto posto, não poderemos ignorar que, sobre a questão do planeamento e ordenamento do espaço marítimo,

e sua relação com a dominialidade, o Tribunal Constitucional, muito recentemente, reiterou, uma vez mais (idem,

pág.10755), o entendimento de que «Se o fim a que se dirige o ordenamento do espaço marítimo influir com a

funcionalidade específica que justificou a sua submissão a um regime de dominialidade — e que constitui um

Página 58

I SÉRIE — NÚMERO 9

58

limite aos poderes dominiais —, então o poder de ordenar assume-se como um poder essencial à subsistência

e manutenção do domínio […] O domínio do espaço marítimo nacional manifesta-se assim através de poderes

públicos que denotam supremacia e supra ordenação do Estado e cujo exercício depende exclusivamente dele.

Um dos poderes de referência dessa autoridade é o poder regulamentar, através do qual o titular do domínio

marítimo, no desempenho da função administrativa de conservação, proteção e utilização, cria regras jurídicas

de conduta que provocam a produção de efeitos jurídicos com repercussão imediata na esfera jurídica de

terceiros.» (os sublinhados são nossos).

Ora, no Decreto da Assembleia da República ora em causa, o poder de ordenar o espaço marinho resulta

muito substancialmente transferido do Estado para as regiões autónomas, registando-se que, à exceção das

matérias relativas à integridade e soberania do Estado (numa redação, aliás, que o Tribunal Constitucional

provavelmente desaconselhará, porque pouco clara e potenciadora de conflitos, como expressamente resulta

da leitura do Acórdão n.º 315/2014, in DR de 15 de maio, pág. 2857), a intervenção do Estado, na maior parte

dos casos, passará a não se revestir, sequer, de caráter vinculativo.

Vale o mesmo dizer que, em tais casos — que antevemos não serem poucos —, o Estado corre o risco de

ficar arredado de qualquer papel determinante no ordenamento e gestão do espaço marítimo em causa.

Tal como referíramos na nossa declaração de voto, aquando da votação, na generalidade, da Proposta de

Lei n.º 179/XIII/ALRAA, o reforço da participação das Regiões na gestão do mar adjacente afigurar-se-nos-ia

positivo e, por isso, então a acompanhámos.

Não ignoramos, porém, que atento o modo como o ora reapreciado Decreto da Assembleia da República n.º

59/XIV faz operar a distribuição/transferência de competências entre Estado e Regiões, dificilmente permitirá

reconhecê-lo como conforme à Constituição, razão, cremos, mais do que atendível para se justificar uma

apreciação de constitucionalidade prévia à sua promulgação.

Sobretudo, quando o Tribunal Constitucional, de modo particularmente assertivo (Ac. TC 136/2016, idem,

pág. 10755), escreve — e cito: «Afigura-se-nos, pois, que é bastante questionável a possibilidade de o Estado

abdicar do poder de ordenar o espaço marinho, transferindo o seu exercício para as regiões autónomas, ainda

que parcialmente. Nessa hipótese, ficaria despojado de um instrumento fundamental, porventura o mais

essencial, à regulação e proteção do domínio público marítimo.» (os sublinhados são nossos).

Renovando o que afirmáramos na nossa declaração de voto, aquando da votação da Proposta de Lei n.º

179/XIII/ALRAA na generalidade, muito gostaríamos de ter podido contribuir hoje para um reforço dos poderes

dos órgãos das regiões autónomas sobre o mar que lhes é adjacente. O respeito que devemos à Constituição

da República Portuguesa, e aos princípios nesta plasmados, densificados através da jurisprudência do Tribunal

Constitucional, cotejados com as soluções preconizadas no Decreto da Assembleia da República n.º 59/XIV

impedem-nos, contudo, de o poder fazer.

Amicus Plato, sed magis amica veritas.

Palácio de S. Bento, 2 de outubro de 2020.

O Deputado do PS, Filipe Neto Brandão.

——

Constatando que as alterações hoje introduzidas ao DAR 59 XIV não o fazem substantivamente distinto do

texto devolvido, sem promulgação, à Assembleia da República, mantenho, coerentemente, e pelas mesmas

razões, o mesmo voto que expressei aquando da votação da proposta de lei que lhe deu origem.

Palácio de S. Bento, 2 de outubro de 2020.

O Deputado do PS, Bruno Aragão.

——

Página 59

3 DE OUTUBRO DE 2020

59

É nosso entendimento que a Lei de Bases do Ordenamento e Gestão do Espaço Marítimo (LBOGEM) deverá

ser objeto de alteração no sentido de reforçar a intervenção das regiões autónomas em matéria de ordenamento

e gestão do espaço marítimo adjacente.

Por se considerar positiva a ideia de um reforço dos poderes dos órgãos das regiões autónomas sobre o mar

que lhes é adjacente, apesar das fragilidades políticas e das inconstitucionalidades presentes no diploma, alguns

de nós, na generalidade, não votaram desfavoravelmente a Proposta de Lei n.º 179/XIII/4.ª (ALRAA), na

expectativa que viessem a ser corrigidas na especialidade.

No entanto, tal não aconteceu. O Decreto n.º 59/XIV que daí resultou enferma dos seguintes vícios de

natureza política e jurídica:

−Cria uma fratura na soberania nacional ao criar um conceito específico de território autónomo designado

«mar dos Açores», que transforma o «mar Português», em matéria de ordenamento e gestão, num somatório

de três espaços marítimos, o dos Açores, o da Madeira e o do Continente;

−Submete o exercício de poderes de soberania do Governo da República para lá das 200 milhas a parecer

obrigatório e vinculativo das regiões autónomas;

−Torna a intervenção do Governo da República até às 200 milhas residual, limitado à emissão de parecer

que só será obrigatório e vinculativo nas matérias ditas de soberania e de integridade territorial, que o diploma

não caracteriza.

Para além disso, o diploma suscita outras preocupações de natureza geral:

−A gestão do mar, alargada a toda a plataforma continental, não é matéria de interesse específico das

regiões. Pelo contrário, integra o núcleo central das funções de soberania, incorrendo a solução aprovada no

risco de colisão com o exercício dos poderes do Estado nas áreas da defesa nacional, da segurança interna e

dos negócios estrangeiros;

−Esta lei fragiliza e não reforça a posição negocial de Portugal no processo que decorre nas Nações Unidas

de extensão da plataforma continental em que pelo regulamento da Comissão de Limites apenas pode existir

um interlocutor nacional;

−Esta lei comprometerá o processo normal de negociação europeia de fixação das quotas nacionais de pesca

que, naturalmente, são definidas para todo o mar português com a participação do Governo da República no

Conselho de Ministros das Pescas da UE;

−Igualmente, torna muito mais difícil a existência de um plano estratégico e de ação nacional quer quanto à

utilização económica, quer quanto à proteção do mar, uma vez que qualquer projeto de dimensão nacional fica

sujeito a avaliações e licenciamentos parcelares.

Pelo exposto, votámos contra a Proposta de Lei n.º 179/XIII/4.ª (ALRAA), em votação final global. O veto

presidencial, devolvendo o Decreto n.º 59/XIV à Assembleia da República para reapreciação criou uma nova

oportunidade para serem sanadas as fragilidades apontadas anteriormente.

No entanto, tal não aconteceu. As alterações introduzidas não corrigem essas fragilidades e simultaneamente

não dão resposta cabal às preocupações manifestadas por Sua Excelência o Presidente da República.

Foi ignorada a mensagem do Presidente da República que referia a necessidade de considerar um regime

adequado de delegação de competências, mantendo-se a opção por um modelo de atribuição de competências

aos órgãos das regiões autónomas que afasta a intervenção do Estado.

Os aditamentos efetuados ao texto do Decreto agravam o sentido das críticas que fundamentaram a posição

por nós assumida na votação de julho, afastando o Estado de qualquer intervenção no licenciamento da

utilização privativa de bens do domínio público marítimo e limitam-se a diferir para legislação futura «o regime

económico e financeiro associado à utilização privativa dos fundos marinhos».

Mantêm-se, assim, inteiramente pertinentes as considerações feitas na anterior declaração de voto,

designadamente por se estabelecer uma situação de inferioridade do Estado relativamente às regiões

autónomas ao atribuir natureza vinculativa plena aos pareceres regionais e limitando a intervenção do Estado

aos casos residuais em que esteja em causa a integridade e soberania nacional.

Continuamos a considerar legítimo e necessário o reforço da autonomia das regiões autónomas em matérias

do mar, respeitando, no entanto, um enquadramento constitucional e político adequado.

Como tal não existem razões para alterar o sentido de voto que continuará a ser contra.

Assembleia da República, 2 de outubro de 2020.

Página 60

I SÉRIE — NÚMERO 9

60

Os Deputados do PS, Ana Paula Vitorino — Ascenso Simões — Jorge Lacão — Marcos Perestrello — Pedro

Bacelar de Vasconcelos — Sérgio Sousa Pinto — José Magalhães — Alexandre Quintanilha — Isabel Alves

Moreira — António Gameiro — Rosário Gambôa.

——

Em coerência com as minhas declarações de voto anteriores relativas à iniciativa em apreço, a razão do meu

voto contra (sentido de voto não coincidente com o do Grupo Parlamentar do PSD), prende-se com o

entendimento de que este diploma não defende o interesse nacional, uma vez que atribui a uma entidade

subnacional (regiões autónomas) «poder de veto» sobre opções legitimamente tomadas pelo nível nacional

(Estado central), o que considero inaceitável.

A tentativa de eliminação desse «poder de veto» através da menção «salvo nas matérias relativas à

integridade e soberania do Estado» não é, a meu ver, totalmente eficaz, dada a evidente dificuldade de

clarificação, sem margem para dúvidas, de quais são essas matérias.

Este mau precedente evoca o que recentemente aconteceu com o «poder de veto» de alguns municípios à

construção de um aeroporto de abrangência nacional. Essa lei foi irresponsável e contrária ao interesse nacional.

Tal como, por exemplo e pela sua atualidade, seria inaceitável que um município pudesse vetar a concessão

pelo Estado central da exploração de lítio no seu território colocando, assim, em causa o interesse nacional.

O Deputado do PSD, António Lima Costa.

——

Tendo presente que votei contra na votação final global do texto final apresentado pela Comissão de

Agricultura e Mar relativo à Proposta de Lei n.º 179/XIII/4.ª (ALRAA), na Reunião Plenária n.º 76, a 23 de julho

de 2020, alicerçado em diversos motivos, mas, sobretudo, na dúvida quanto à constitucionalidade sobre o

modelo de gestão e de ordenamento proposto, face à conceção constitucional unitária do Estado português;

Considerando que o texto final apresentado pela Comissão de Agricultura e Mar relativo à Proposta de Lei

n.º 179/XIII/4.ª (ALRAA) foi aprovado com os votos favoráveis dos Grupos Parlamentares do PS, do PAN e do

IL e com as abstenções de todos os outros grupos parlamentares, sem que qualquer Grupo votasse contra;

Considerando que na mensagem de Sua Excelência o Presidente da República é claramente enunciado que

resulta de uma análise cuidada «não considerar haver razões suficientes para, à luz da jurisprudência

constitucional, aliás acompanhada, de forma claramente maioritária, pela doutrina, suscitar a fiscalização

preventiva da inconstitucionalidade de qualquer das suas normas, nomeadamente as constantes do n.º 3 do

artigo 8.º e do artigo 31.º-A»;

Considerando que a competência legislativa primária da Lei de Bases da Política de Ordenamento e de

Gestão do Espaço Marítimo Nacional continua na esfera constitucional da Assembleia da República;

Considerando que esta matéria não tem reserva de iniciativa legislativa, nem obrigatoriedade de ser objeto

de uma maioria de aprovação reforçada;

Considerando o voto de confiança dos grupos parlamentares na votação de 23 de julho à capacidade de

iniciativa política das regiões autónomas, na ausência de votos contra;

Na presente votação para reapreciação do Decreto n.º 59/XIV — Primeira alteração à Lei n.º 17/2014, de 10

de abril, que estabelece as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional – o

meu sentido de voto será favorável, acompanhando o sentido de voto da bancada do Grupo Parlamentar do

Partido Socialista.

O Deputado do PS, Pedro Cegonho.

———

Relativa ao Projeto de Lei n.º 498/XIV/1.ª:

Página 61

3 DE OUTUBRO DE 2020

61

Os Deputados socialistas viabilizaram o Projeto de Lei n. º 498/XIV/1.ª, do PAN, que visa objetivos similares

aos em apreciação por iniciativa do PS. Um dos fins visados por esse projeto foi suscitar debate a apresentação

de ideias e propostas para resolver problemas decorrentes da transformação digital, ponderar as oportunidades

e ameaças associadas ao crescimento da Internet e combater a infoexclusão e a desigualdade de

oportunidades.

A reflexão sobre estes fenómenos e sobre o seu enquadramento social e político está hoje a correr a uma

velocidade surpreendente, sendo que a atual Presidência da Comissão Europeia tem vindo a apresentar

reflexões e iniciativas legislativas de enorme significado e novas iniciativas se anunciam, como o Digital Services

Act, devendo, inclusivamente, algumas ser aprovadas durante a Presidência portuguesa do Conselho da UE em

2021.

O projeto do PAN revela apreciável sintonia com preocupações do Governo e do PS, encontrando-se parte

delas vertidas no seu Programa para a presente Legislatura. O programa do atual Governo tem uma forte

sustentação em princípios como a sustentabilidade ambiental e transformação digital, enquanto pilares

estratégicos para a definição de um modelo de desenvolvimento económico e social; a defesa firme dos direitos

de privacidade, de segurança e de acesso dos cidadãos e adoção de um modelo de desenvolvimento que

garanta que as oportunidades geradas pelo digital são impulsionadas e disponibilizadas aos cidadãos, às

empresas e ao desenvolvimento do País.

É também patente a sintonia com os objetivos constantes da Resolução do Conselho de Ministros n. º

30/2020, de 21 de abril, que aprova o Plano de Ação para a Transição Digital, a qual menciona que a

transformação digital «é o motor de transformação do país, tendo como propósito acelerar Portugal, sem deixar

ninguém para trás, e projetar o país no mundo».

O voto favorável do PS na generalidade é sujeito a condição de benfeitorias na especialidade.

Desde logo, a proposta apresentada está alinhada com o objetivo de estender a toda a população e a todo

o território nacional o acesso a serviços de Internet. Contudo, o cumprimento deste propósito implica um esforço

de investimento ainda muito significativo por parte do Estado, o qual deverá prolongar-se por vários anos, pelo

que a formulação da carta deverá pressupor o objetivo tendencial de cobertura universal. A definição rigorosa

quanto aos timings de implementação de alguns dos deveres do Estado depende inevitavelmente de programas

de ação e investimentos no quadro do Plano de Recuperação e Resiliência.

O artigo 3.º do projeto faz menção à Portaria n.º 208/2017, de 13 de julho, para efeitos de definição dos

territórios de baixa densidade populacional e dos territórios do interior. No entanto, a remissão deveria ser feita

em abstrato – e não em específico – de forma a não ser necessário alterar a lei na eventualidade de a portaria

ser substituída. Em fase de eventual apreciação na especialidade, o PS proporá a seguinte redação: «em

portaria a aprovar pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da coesão territorial»;

A menção ao combate aos comportamentos aditivos merece concordância. No entanto, a exemplificação

deve mencionar também as crianças, os jovens e os idosos.

O artigo 4.º do projeto prevê:

1 - É proibida a interrupção intencional, total ou parcial, de acesso à Internet, ou a limitação da informação

que, através dela, possa ser disseminada, salvo nos casos expressamente previstos na lei ou nos casos

determinados por decisão judicial.

2 - As velocidades mínimas de acesso à Internet que os operadores ou prestadores de serviços deverão

assegurar em todo o território nacional são fixados pela Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) para

um período anual, ouvidos os operadores, prestadores de serviços e as organizações representativas dos

consumidores.

3 - A fiscalização do cumprimento do disposto no n.º 1 e das velocidades mínimas estabelecidas ao abrigo

do disposto no número anterior é da competência da ANACOM, que em caso de incumprimento por um operador

ou prestador de serviços deve notificá-lo desse facto e dar-lhe a possibilidade de se pronunciar num prazo não

inferior a I0 dias.

4 - Após ter procedido à audiência nos termos do número anterior, a ANACOM pode:

a) Ordenar ao operador ou prestador de serviços a adoção de medidas destinados a corrigir o

incumprimento;

b) Aplicar sanções pecuniárias compulsórias, nos termos previstos na Lei n.2 5/2004, de I0 de fevereiro.

Atenta a génese do artigo e os prazos que nele são definidos, deverá ser acautelada a respetiva

correspondência com as regras que vierem a ser definidas na lei de transposição da Diretiva (U.E.) 2018/1972

Página 62

I SÉRIE — NÚMERO 9

62

do Parlamento Europeu e do Conselho de II de dezembro de 2018, que estabelece o Código Europeu das

Comunicações Eletrónicas.

Não se justifica tratar desenvolvidamente na Carta os temas de supervisão e fiscalização por parte da

ANACOM (n.os 3 e 4) por se tratar de matéria que deverá ser regulada na transposição adequada do CECE.

O PS entende que importa ter em conta os trabalhos preparatórios que o Governo, em conjunto com a

ANACOM e com a associação representativa dos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas, tem

vindo a desenvolver no âmbito da criação desta tarifa, que deve ser objeto de diploma autónomo, que fixará o

universo de beneficiários.

O n.º 3 do artigo proposto deverá ser eliminado, na medida em que a criação da tarifa social de acesso aos

serviços de Internet corresponde a uma forma de concretização do serviço universal de acesso à Internet

previsto no CECE. Logo, o calendário de regulamentação deverá ser o que resulta da transposição do próprio

CECE, ou seja, até 21 de dezembro de 2020.

A criação agora de um novo prazo específico para este fim criaria um conflito de prazos para implementação

da referida tarifa social.

Artigo 6.º

Liberdade de expressão e direito à informação e opinião

1 - Todos têm o direito de exprimir e divulgar o seu pensamento e criar, procurar, obter e partilhar ou difundir

informações e opiniões através da internet, de forma livre, sem qualquer tipo ou forma de censura,

designadamente através de meios de comunicação digital.

2 - Os utilizadores de plataformas de comunicação digital, de redes sociais ou similares têm o direito de

beneficiar de medidas públicas de proteção contra o cibercrime, nomeadamente, contra todas as formas de

discriminação, contra o discurso de ódio e apologia do terrorismo, racismo, homofobia e xenofobia, violência

contra as mulheres, violência de género e violência doméstica.

N.º 2 deve ser realçada a proteção contra os crimes de pornografia e assédio sexual infantil, exploração

sexual.

Acresce que, tendo em conta em que o conceito de cibercrime apenas abrange os crimes tipificados na Lei

n.º 109/2009, de 15 de setembro (Lei do Cibercrime) as medidas públicas deverão ser de proteção não só contra

o cibercrime, mas também contra outras formas de discriminação e crime. A fusão com a redação proposta pelo

PS é o caminho natural para esse resultado.

A redação do número 3 qualifica como manifestações de cibercrime todas as situações enumeradas, o que

não se afigura concetualmente correto. Além disso, deixa de fora as manifestações mais correntes de cibercrime,

como o phishing, usurpação de identidade, exfiltração de informação ou acesso indevido a dados pessoais.

Admitindo que a intenção é dar particular relevo às situações indicadas, seria preferível a seguinte redação:

«3 - Os utilizadores de plataformas de comunicação digital, de redes sociais ou similares têm o direito de

beneficiar de medidas públicas de proteção contra o cibercrime e, em especial, contra todas as formas de discriminação, contra o discurso de ódio e apologia do terrorismo, racismo, homofobia e xenofobia, violência

contra as mulheres, violência de género e violência doméstica.»

Artigo 7.º - Direito à proteção contra a desinformação

A diferença relevante nesta norma consiste em acrescentar um elenco do que se considera informação

comprovadamente falsa ou enganadora. A inserção deste elenco exemplificativo, sem mais, pode ser arriscado,

na medida em que não se concretizam estes conceitos. Por exemplo, o que se considera por informação

fabricada? Ou redes de falsos seguidores? Na especialidade haverá que precisar conceitos.

Artigo 8.º

Direitos de reunião, manifestação, associação e participação

1 - A todos é assegurado o direito de reunião, manifestação e associação na Internet e através dela,

designadamente para fins políticos, sociais e culturais, e o direito de usar meios de comunicação digitais para a

organização e divulgação de ações cívicas ou a sua realização no ciberespaço, nos termos do disposto na

Página 63

3 DE OUTUBRO DE 2020

63

Deliberação n.2 38/11, aprovada pelo Comité dos Direitos Humanos da ONU em 6 de julho de 2018, e sem

prejuízo do disposto na Constituição e na Lei.

2 - Os órgãos de soberania e do poder local asseguram a possibilidade de exercício dos direitos de

participação legalmente previstos através de plataformas digitais.

3 - A Assembleia da República, as Assembleias Municipais e as Câmaras Municipais asseguram a gravação

em suporte de vídeo das respetivas reuniões de natureza pública, disponibilizando-as em acesso livre no

respetivo portal na Internet.

4 - As Assembleias Municipais e as Câmaras Municipais, quando disponham de meios para o efeito, podem

transmitir em direto através do respetivo portal na Internet ou de outra plataforma digital as reuniões de natureza

pública sem prejuízo das contradições que o presente artigo apresenta em relação aos trabalhos preparatórios

que o Governo, em conjunto com a ANACOM e com a associação representativa dos prestadores de serviços

de comunicações eletrónicas, tem vindo a desenvolver no âmbito da criação desta tarifa, considera-se ser

desejável a sua análise e discussão no contexto da preparação do diploma autónomo que deverá criar esta

tarifa. Acresce que, nesta sede, se afigura desenquadrada a referência detalhada ao universo de beneficiários

da tarifa social, obrigando posteriormente a uma alteração a própria Carta, caso se pretenda alterar alguma

categoria de beneficiários.

N.º 3: Para além disso, o PS considera que o número 3 deste artigo, deverá ser eliminado, na medida em

que a criação da tarifa social de acesso aos serviços de internet corresponde a uma forma de concretização do

serviço universal de acesso à internet previsto no CECE. O calendário de regulamentação deverá ser o que

resulta da transposição do próprio CECE, ou seja, até 21 de dezembro de 2020.

A criação agora de um novo prazo específico para este fim criaria um conflito de prazos para implementação

da referida tarifa social.

N.º 2 do artigo 6.º: O PS entende que deve ser realçada a necessidade de inclusão de medidas de proteção

contra os crimes de pornografia e assédio sexual infantil, exploração sexual.

Acresce que, tendo em conta em que o conceito de cibercrime apenas abrange os crimes tipificados na Lei

n.º 109/2009, de 15 de setembro (Lei do Cibercrime) as medidas públicas deverão ser de proteção não só contra

o cibercrime, mas também contra todas as formas de discriminação e crime.

Neste sentido, redação aperfeiçoada conjugando os projetos do PS e do PAN e fazendo o aditamento referido

poderá ser a seguinte:

“Todos têm o direito de beneficiar de medidas públicas de proteção contra o cibercrime e todas as formas de

discriminação e crime, nomeadamente, contra o discurso de ódio e apologia do terrorismo, racismo, homofobia

e xenofobia, violência contra as mulheres, violência de género e violência doméstica, pornografia e assédio

sexual infantil, exploração sexual.”

Artigo 8.º

Direitos de reunião, manifestação, associação e participação

I - A todos é assegurado o direito de reunião, manifestação e associação na Internet e através dela,

designadamente para fins políticos, sociais e culturais, e o direito de usar meios de comunicação digitais para a

organização e divulgação de ações cívicas ou a sua realização no ciberespaço, nos termos do disposto na

Deliberação n.2 38/11, aprovada pelo Comité dos Direitos Humanos da ONU em 6 de julho de 2018, e sem

prejuízo do disposto na Constituição e na Lei.

5 - Os órgãos de soberania e do poder local asseguram a possibilidade de exercício dos direitos de

participação legalmente previstos através de plataformas digitais.

6 - A Assembleia da República, as assembleias municipais e as câmaras municipais asseguram a gravação

em suporte de vídeo das respetivas reuniões de natureza pública, disponibilizando-as em acesso livre no

respetivo portal na Internet.

7 As assembleias municipais e as câmaras municipais, quando disponham de meios para o efeito, podem

transmitir em direto através do respetivo portal na Internet ou de outra plataforma digital as reuniões de natureza

pública.

Página 64

I SÉRIE — NÚMERO 9

64

N. º 1: No seu projeto o PS propõe igualmente a consagração do direito de reunião, manifestação, associação

e participação devendo, contudo, ser estipulado a necessidade de estas deverem ocorrer de forma pacífica

conforme previsto na Constituição da República Portuguesa e na Carta dos Direitos Fundamentais da U.E.

N. º 2, 3 e 4: Estas disposições devem ser suprimidas uma vez que dizem respeito aos direitos de reunião,

manifestação, associação e participação dos órgãos de soberania e poder local. Afigura-se mais adequada a

redação proposta pelo Grupo Parlamentar do PS.

O PS votará contra a redação proposta – Note-se que, no limite, a redação proposta pelo PAN faria com

que o Estado tivesse de assegurar o exercício do direito de voto através de plataformas digitais já nas

próximas eleições de 2021 (presidenciais e autárquicas).

No que concerne à transmissão das reuniões, deve ser encontrada uma formulação mais genérica e

programática, e não uma obrigação direta, colocando-se questões identificadas pela CNPD. Não pode

ter-se a certeza de que todas as autarquias fossem capazes de acautelar as preocupações propostas

neste artigo.

No tocante ao Direito à neutralidade da Internet há contributos recebidos na Comissão de Assuntos

Constitucionais (vg da Internet Society) a ponderar na especialidade.

A inclusão de um artigo sobre o tema nesta Carta faz todo o sentido face ao objeto da mesma, desde que

harmonizado com o Regulamento (U.E.) 2015/2120 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro

de 2015, não devendo ser utilizados conceitos vagos e indeterminados (o que seria “uma oferta zero-rating

contrária ao referido Regulamento que não garanta o funcionamento contínuo do ecossistema da Internet como

motor de inovação".

A única matéria com referência a neutralidade da Internet que ainda não se encontra regulada em Portugal

é a referente à competência da ANACOM e as sanções aplicáveis neste âmbito. Contudo, tal será objeto de

regulação no Código Europeu das Comunicações Eletrónicas, pelo que não deverá ser regulada nesta sede.

No que respeita à matéria das ofertas de zero-rating, tal já se encontra regulado pelo referido regulamento,

jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e pelas guidelines do ORECE (BEREC Guidelines on

the Implementation of the Open Internet Regulation).

N.º 5: Consagra o direito ao exercício de ação popular digital contra quem infrinja o direito à neutralidade da

rede, facto que conjugado com o disposto no artigo 19. 0 da Carta não parece fazer sentido, porquanto este

último reporta-se a um direito geral aplicado à violação de todos os direitos consagrados na Carta e a

especificação deste número 5 é redundante e poderia criar problemas de interpretação.

Tendo em conta a redação proposta pelo PS e contributos recebidos talvez a redação mais adequada possa

vir a ser a seguinte:

1. Todos têm direito a que os dados transmitidos e recebidos na Internet não sejam sujeitos a discriminação,

restrição ou interferência em relação ao remetente, destinatário, tipo ou conteúdo dos dados, dispositivo

utilizado, aplicações ou, em geral escolhas legitimas das pessoas.

2. O direito à neutralidade da Internet, na sua totalidade, é uma condição necessária para o exercício efetivo

dos direitos fundamentais da pessoa."

O PS proporá a eliminação da parte final da redação do PAN para o artigo 11.º ("sem prejuízo do disposto

na lei").

Conjugando o que propõe o PS com os n.os 2 e 3 aventados pelo PAN atinge-se a seguinte redação:

lncumbe ao Estado o combate à usurpação de identidade e a promoção de medidas tendentes à criação de

plataformas que permitam o uso pelo cidadão de meios de autenticação eletrónica seguros e à promoção de

mecanismos que visem o aumento da segurança e da confiança nas transações eletrónicas, em especial na

ótica da defesa do consumidor. (...)"

Página 65

3 DE OUTUBRO DE 2020

65

A responsabilização dos serviços de plataformas em linha não deverá ser objeto de normas da Carta, uma

vez que tal se encontra regulado, designadamente pela Lei do Comércio Eletrónico, que será revista no âmbito

do Digital Services Act da UE.

N.º 4: A proibição prevista neste artigo deve cingir-se exclusivamente aos casos que a lei define como tal,

devendo, contudo – coisa que o PS proporá - estender-se a proibição de difusão de informação através do

código bidimensional a "aspetos relacionados com origem racial ou étnica, opiniões políticas, convicções

religiosas ou filosóficas, filiação sindical, dados genéticos, dados biométricos e dados relativos à vida sexual ou

orientação sexual de uma pessoa."

N.º 5: PS Considera que esta matéria deverá ser objeto de um artigo autónomo na Carta.

O artigo sobre o Direito ao esquecimento deverá estar em conformidade com o Regulamento Geral de

Proteção de Dados e com a jurisprudência do Tribunal de Justiça da U.E.

Nesta medida, este direito não deverá ser consubstanciado como um direito absoluto devendo ter-se em

conta, designadamente a liberdade de expressão e de informação e o interesse público.

A redação que aperfeiçoa o também proposto pelo PS poderá ser a seguinte:

Qualquer pessoa tem o direito de obter o apagamento dos seus dados pessoais, sem demora injustificada,

quando:

a) os dados pessoais deixarem de ser necessários para a finalidade que motivou a sua recolha;

b) retirar o consentimento em que se baseia o tratamento dos dados e não exista outro fundamento jurídico

para o referido tratamento;

c) se opuser ao tratamento nos termos legais, e não existam interesses legítimos prevalecentes que

justifiquem o tratamento;

d) os dados pessoais tiverem sido tratados ilicitamente;

e) os dados pessoais tenham de ser apagados para o cumprimento de uma obrigação jurídica decorrente do

direito aplicável; e f) os dados pessoais de crianças forem recolhidos no contexto da oferta de serviços da

sociedade da informação.

2. Os Estados asseguram que se os dados pessoais objeto de uma obrigação de apagamento tiverem sido

tornados públicos são tomadas as medidas que forem razoáveis, incluindo de carácter técnico, tendo em

consideração a tecnologia disponível e os custos da sua aplicação, para informar que foi solicitado o apagamento

das ligações para esses dados pessoais, bem como das cópias ou reproduções dos mesmos.

3. Os n.os 1 e 2 não se aplicam na medida em que o tratamento se revele necessário:

a) Ao exercício da liberdade de expressão e de informação;

b) Ao cumprimento de uma obrigação legal que exija o tratamento previsto pelo direito do Estado a que o

responsável esteja sujeito, ao exercício de funções de interesse público ou ao exercício da autoridade pública

de que esteja investido o responsável pelo tratamento;

c) Por motivos de interesse público no domínio da saúde pública, nos termos legalmente aplicáveis;

d) Para fins de arquivo de interesse público, para fins de investigação científica ou histórica ou para fins

estatísticos nos termos da lei, na medida em que o direito referido no n. 0 1 seja suscetível de tornar impossível

ou prejudicar gravemente a obtenção dos objetivos desse tratamento; ou

Página 66

I SÉRIE — NÚMERO 9

66

e) Para efeitos de declaração, exercício ou defesa de um direito num processo judicial. (...)"

N.º 3: No que se refere à utilização de um formulário digital simples, haverá que ponderar na especialidade

a melhor solução. Importa ter em conta que o RGPD, bem como as guidelines do Comité Europeu para Proteção

de Dados já estabelecem que este direito, à semelhança dos restantes direitos previstos no RGPD, deve ser

exercido de forma simples e fácil para o titular dos dados, devendo poder ser exercido da mesma forma que o

titular dos dados disponibilizou os seus dados.

Haverá que ponderar o argumento segundo o qual “os grandes protagonistas tecnológicos já utilizam para o

exercício deste direito formulários digitais simples, pelo que esta norma irá afetar as PMEs e startups, para as

quais, tal criação teria um grande impacto económico”.

Artigo 14.º

Direitos em plataformas digitais

I- Os utilizadores de plataformas digitais, de serviços over the top e similares têm direito a receber informação

clara e simples sobre as regras do respetivo funcionamento, a receber informações sobre quaisquer alterações

contratuais e a ter acesso em condições de igualdade, devendo poder, em caso de mudança de condições

contratuais, interromper a utilização, obter cópia dos dados que lhe dizem respeito de forma interoperável e o

apagamento desses dados na plataforma.

2- São garantidos os direitos de resposta e de retificação em relação a conteúdos publicados em plataformas

digitais, aplicando-se aos serviços previstos na Diretiva 2018/1808, de 14 de novembro, com as devidas

adaptações, o regime previsto na Lei n.2 27/2007, de 30 de julho.

3- É obrigatório apor na peça original um aviso e uma hiperligação para o conteúdo da resposta ou retificação,

o mesmo se aplicando a pedidos de atualização de informação ultrapassada quando suscetível de gerar danos

reputacionais.

4- Da eventual recusa de divulgação, cabe recurso para a ERC.

N.º 1: O PS entende que o n.º 1 deverá ser uniformizado com o Código Europeu das Comunicações

Eletrónicas, a Lei das Comunicações Eletrónicas, a Lei das Cláusulas Contratuais Gerais e com o Regulamento

Geral de Proteção de Dados.

Neste sentido, os utilizadores não deverão poder rescindir o contrato, se existir razão atendível que as partes

tenham convencionado ou se essas alterações forem exclusivamente em benefício do utilizador, ou sejam de

caráter puramente administrativo e não tenham nenhum efeito negativo no utilizador ou sejam impostas por lei.

Por outro lado, o direito de acesso aos dados e o apagamento dos mesmos apenas deverá ser permitido nas

condições estipuladas no Regulamento Geral de Proteção de Dados.

O PS, na especialidade, proporá a fusão com o texto do seu projeto na seguinte redação aperfeiçoada para

o n.º 1 e acrescentando outro n.º 2 e 3:

1. Todos têm direito a receber informação clara e simples sobre as regras de funcionamento das plataformas

digitais, de serviços over the top e similares, incluindo informações sobre quaisquer alterações contratuais,

devendo, neste último caso, poder rescindir o contrato nos termos previstos na lei.

2. Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do presente artigo, não pode o contrato ser objeto de rescisão em caso

de alterações das condições contratuais, se existir razão atendível que as partes tenham convencionado ou se

essas alterações forem exclusivamente em benefício do utilizador, ou sejam de caráter puramente administrativo

e não tenham nenhum efeito negativo no utilizador ou sejam impostas por lei.

3. Em qualquer das situações previstas no n.º 1, todos podem obter cópia dos dados que lhe dizem respeito

e o apagamento desses dados no prestador intermediário de serviços nos termos previstos na lei.

N.º 4: O direito a recorrer à ERC não é o único direito que assiste aos utilizadores que podem recorrer aos

tribunais judiciais, bem como à própria ERC nos termos gerais da lei. Haverá que ponderar a melhor redação.

Artigo 15.º

Direito à cibersegurança

Página 67

3 DE OUTUBRO DE 2020

67

3 - As vítimas de ações que violem a cibersegurança têm direito de ação popular digital de acordo com o

previsto na presente Lei.

O PS proporá a substituição da referência a infraestruturas e tecnologias, pela referência a redes e sistemas

de informação, uma vez que se trata de uma designação tecnicamente mais próxima da terminologia utilizada

nos instrumentos jurídicos em vigor, nomeadamente o regime jurídico da segurança do ciberespaço (Lei n.º

46/2018, de 13 de agosto), a Diretiva (UE) 2016/1148, sobre segurança das redes e da informação, e o

Regulamento (UE) 2019/881, sobre a Agência da União Europeia para a Cibersegurança e a certificação da

cibersegurança das tecnologias da informação e comunicação.

PS proporá que se adite referência ao facto de o Centro Nacional de Cibersegurança ser a Autoridade

Nacional de Cibersegurança.

O n.º 3 prevê o direito de ação popular digital para as vítimas de ações que violem a cibersegurança. Importa

notar que o direito de ação popular se destina a permitir a qualquer cidadão agir judicialmente no sentido de

promover, individual ou associadamente, a defesa de interesses difusos, ou seja, de interesses de toda a

comunidade, cuja violação implica prejuízo para a comunidade como um todo, e não para uma pessoa

individualmente considerada ou para um conjunto específico de pessoas. Ora, quando uma pessoa é “vítima[s]

de ações que violem a cibersegurança”, existe uma lesão concreta e determinada a um direito subjetivo que é

do próprio, e não da generalidade da comunidade, pelo que o recurso à figura da ação popular neste caso se

afigura desajustado. Nos casos em que o seja a ação pode ser intentada ao abrigo do artigo 19.º.

Artigo 16.º

Direito à proteção contra a geolocalização abusiva

I - Todos têm direito à proteção contra a recolha e tratamento de informação sobre a sua localização quando

efetuem uma chamada.

2. Os dados tratados numa rede pública móvel provenientes da infra-estrutura da rede ou do dispositivo

móvel, que indicam a posição geográfica do equipamento terminal móvel de um utilizador final e, numa rede

pública fixa, os dados sobre o endereço físico do ponto terminal da rede só podem ser utilizados pelas autoridade

legalmente competentes nos domínios da proteção civil, saúde pública e investigação criminal.

3. Os meta-dados respeitantes a pessoas obtidos através dos meios de georreferenciação não podem ser

tratados, designadamente com recurso à inteligência artificial, fora dos limites previstos na legislação em vigor

sobre proteção de dados pessoais.

4. É proibida a utilização de meios de reconhecimento facial com recurso à inteligência artificial através de

sistemas de videovigilância em locais públicos.

N.º 2: A forma como este artigo (e o proposto pelo PS) se encontram redigidos parece proibir a utilização dos

dados da posição geográfica do equipamento terminal móvel de um utilizador para efeitos designadamente de

publicidade (i.e. -o utilizador deve ter o direito a decidir quanto à receção de publicidade direcionada, por

exemplo, ofertas promocionais das lojas por onde está a passar), e de utilização do sistema ecall dos veículos.

Na especialidade, o PS proporá que se pondere se deve ser permitida a utilização dos dados da posição

geográfica do equipamento terminal de um utilizador com o consentimento do mesmo ou com outro fundamento

legal. A palavra "autoridade" deve ser corrigida para "autoridades".

Artigo 17.º

Direitos digitais face à Administração pública

I - Perante a Administração Pública são reconhecidos, designadamente, os seguintes direitos:

a) Direito à adoção de procedimento administrativo digital;

b) Direito à comunicação e informação digital relativamente a procedimentos e atos administrativos;

c) Direito à assistência pessoal no caso de procedimentos exclusivamente digitais;

d) Direito a não repetir o fornecimento de dados já prestados;

e) Direito a beneficiar de regimes de "Dados Abertos" que facultem o acesso a dados constantes das

aplicações informáticas de serviços públicos e permitam a sua reutilização;

Página 68

I SÉRIE — NÚMERO 9

68

f) Direito de livre utilização de uma plataforma digital europeia única para a prestação de acesso a

informações nos termos do Regulamento (UE) 2018/1724 do Parlamento Europeu e do Conselho,

de 2 de outubro de 2018.

2 - No prazo máximo de 180 dias após a publicação da presente lei, o Governo apresentará à Assembleia

da República uma proposta de lei que enquadre e defina as regras aplicáveis ao processo administrativo em

suporte eletrónico, nos termos do disposto no número 4 do artigo 64.2 do Código do Procedimento

administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.0 4/2015, de 7 de janeiro.

O projeto de lei do PAN está alinhado com o do PS e ambos com o Programa do Governo.

O elenco dos direitos constante nesta norma é igual à proposta do Grupo Parlamentar do PS.

No entanto, é proposto que o Governo regulamente – no prazo máximo de 180 dias após a publicação da lei

em análise e através de uma outra proposta de lei –, que enquadre e defina as regras aplicáveis ao processo

administrativo em suporte eletrónico, nos termos do disposto no número 4 do artigo 64.º do [CPA].

Em primeiro lugar, o PS entende que esta norma é desnecessária, porquanto o CPA, no artigo mencionado

(64.º, n.º 4), já prevê a regulamentação desta matéria («4 - O disposto nos números anteriores não é aplicável

ao processo administrativo em suporte eletrónico, que é definido por diploma próprio).»

Em segundo lugar, uma Carta dos Direitos Fundamentais na Era Digital deve ser um documento geral e

abstrato. Não devem ser inseridas na Carta normas que incidam sobre a regulamentação de um diploma

específico.

Artigo 19.º, n.º 3: Atento o quadro atual, caberá à Administração Pública decidir a melhor entidade para

prestar este tipo de apoio sem necessidade de se especificar em concreto, o que condicionaria futuramente

outras opções mais eficazes. Não é líquido que a entidade mais adequada sejam os Espaços do Cidadão. A

solução pode ser próxima da que funciona há anos contra conteúdos nocivos. O PS fará essa correção ao seu

próprio projeto que suscita o mesmo problema.

O direito ao testamento vital deverá ser objeto de um artigo autónomo que, conjugado com o texto do PS,

poderá ter a seguinte redação: «Todos os cidadãos, considerados maiores de idade e capazes, que não se

encontrem interditos ou inabilitados por anomalia psíquica, podem manifestar antecipadamente a sua vontade

no que concerne à disposição dos seus dados digitais, designadamente, os constantes nos seus perfis e contas

pessoais em plataformas digitais, bem como do conteúdo das mesmas, nos termos da lei aplicável.»

Dada a multiplicidade de plataformas digitais onde podem estar depositados conteúdos, a ideia de criar um

registo nacional das manifestações de vontade com vista à ulterior preservação dos referidos bens digitais

postumamente merece ser ponderada, num solução porventura semelhante ao Registo Nacional do Testamento

Vital desenhado na Lei n. º 25/2012, de 16 de julho na sua redação atual. Outra via será deixar ao cuidado dos

interessados e à diversidade de formas de depósito de manifestações de vontade a resolução do problema (a

rede social Facebook anunciou já a intenção de criar um serviço de registo desse tipo).

Por último, o PS proporá que a Carta inclua um artigo sobre os direitos das crianças, tendo em conta a

importância desta matéria, porventura do seguinte teor: «1. As crianças têm direito à proteção e aos cuidados

necessários ao seu bem-estar e segurança no ciberespaço.

2. As crianças podem exprimir livremente a sua opinião e a liberdade de receber e transmitir informações ou

ideias, em função da sua idade e maturidade.»

Artigo 21.º

Regulamentação

No prazo máximo de 180 dias após a publicação da presente lei, o Governo procederá à aprovação da

legislação complementar necessária à regulamentação e implementação da presente Lei, salvo no disposto no

número 3 do artigo 5.2 da presente Lei.

A fixação de um prazo genérico de 180 dias para a regulamentação de medidas que decorrem da futura lei

não parece adequado, porquanto a redação proposta pelo PAN não especifica os casos concretos dependentes

de eventual regulamentação. Na verdade, o prazo de 180 dias pode ser excessivo para algumas situações e

Página 69

3 DE OUTUBRO DE 2020

69

demasiado curto para outras, sobretudo tendo em conta o atual cenário de pandemia em que vivemos e que

obriga a uma produção legislativa regular e excessiva por parte do Governo.

Os Deputados do PS.

———

Relativa ao texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,

Liberdades e Garantias, sobre os Projetos de Lei n.os 87/XIV/1.ª (PS), 107/XIV/1.ª (PSD) e 110/XIV/1.ª (CDS-

PP):

Enquadramento:

A questão designada como residência alternada da criança em caso de divórcio, separação judicial de

pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento dos pais, colocou-se na Assembleia da

República pela primeira vez na XIII Legislatura na sequência da Petição n.º 530/XIII/3.ª («Solicitam alteração

legislativa com vista a estabelecer a presunção jurídica da residência alternada para crianças com pais

separados»), petição subscrita por 4169 cidadãos e cujo primeiro subscritor foi o Sr. Ricardo Filipe Madeira

Simões (Presidente da Direção da APIPDF – Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direitos dos

Filhos), tendo dado entrada na Assembleia da República em 17.07.2018 solicitando a alteração do Código Civil

no sentido de ver estabelecida «a presunção jurídica da residência alternada para crianças cujos pais e mães

se encontrem em processo de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou

anulação do casamento».

Na atual Legislatura deram entrada as seguintes iniciativas legislativas sobre a mesma matéria:

-Projeto de Lei n.º 52/XIV/1.ª (PAN) – Privilegia o modelo de residência alternada sempre que tal

corresponda ao superior interesse da criança, excecionando-se o decretamento deste regime aos casos

de abuso infantil, negligência e violência doméstica;

-Projeto de Lei n.º 87/XIV/1.ª (PS) - Altera o Código Civil, estabelecendo o princípio da residência

alternada do filho em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade

ou anulação do casamento dos progenitores;

-Projeto de Lei n.º 107/XIV/1.ª (PSD) - 76.ª alteração ao Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47

344, de 25 de novembro de 1966, alterando o regime do exercício das responsabilidades parentais em

caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do

casamento, de forma a clarificar que o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada

um dos progenitores sempre que tal corresponda ao superior interesse do menor.

-Projeto de Lei n.º 110/XIV/1.ª (CDS-PP) - Sobre o estabelecimento da residência alternada dos

menores, em caso de divórcio separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou

anulação do casamento;

-Projeto de Lei n.º 114/XIV/1.ª (BE) - Altera o Código Civil, prevendo o regime de residência alternada

da criança na regulação do exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação

judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento;

Estas iniciativas foram discutidas na generalidade no Plenário de 11.12.2019, tendo baixado, sem votação,

à 1.ª Comissão para nova apreciação na generalidade, que veio a ocorrer na reunião de 30.09.2020.

Do debate ocorrido na especialidade veio a ocorrer uma fusão entre as propostas apresentadas pelo PS e

pelo PSD decorrente do entendimento a que conseguiram chegar os representantes destas forças partidárias.

Importa aqui referir que a matéria da fixação de residência vem regulada no artigo 1906.º do Código Civil,

que estabelece o seguinte:

«Artigo 1906.º - Exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação judicial de

pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento.

1 - As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são

exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo

nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar

informações ao outro logo que possível.

Página 70

I SÉRIE — NÚMERO 9

70

2 - Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular

importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão

fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores.

3 - O exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente do filho cabe ao progenitor

com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém, este

último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes,

tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente.

4 - O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente

pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.

5 - O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo

em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade

manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.

6 - Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de

ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do

filho.

7 - O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de

grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que

favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles.»

Início de vigência: 30-11-2008.

Sendo que, as diferentes propostas apresentadas optaram pela introdução de um novo n.º 6 (passando os

atuais n.os 6 e 7 para n.os 7 e 8), com exceção para as propostas do BE, PAN e CDS que propõem alterações

igualmente nos demais números.

Em todo o caso, as propostas de PS e PSD, que são aquelas sobre que importa debruçar, apenas

introduziram um novo n.º 6.

Interessa conhecer essas propostas:

Proposta do PS:

«Artigo 1906.º

[…]

1. […]

2. […]

3. […]

4. […]

5. […]

6. O tribunal privilegia a residência alternada do filho com ambos os progenitores, independentemente de

mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação de alimentos, sempre que, ponderadas todas as

circunstâncias relevantes, tal corresponda ao superior interesse daquele.

7. (Atual n.º 6)

8. (Atual n.º 7)»

Proposta do PSD:

«Artigo 1906.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – O tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores,

independentemente de acordo e sempre que, ponderadas todas as circunstâncias relevantes atendíveis, tal

corresponda ao superior interesse daquele.

7 – [anterior n.º 6].

8 – [anterior n.º 7].»

Solução de entendimento:

Página 71

3 DE OUTUBRO DE 2020

71

6. Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes,

o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com ambos os progenitores, independentemente de

mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação de alimentos.

Naquilo que concerne ao nexo central do entendimento obtido, torna-se assim claro que o PS abdica da

componente obrigatória da sua proposta inicial («O tribunal privilegia a residência alternada do filho com ambos

os progenitores…») para adotar a formulação sugerida pelo PSD («O tribunal pode determinar a residência

alternada do filho com cada um dos progenitores…».

Para além deste que é o cerne da norma que se discute, a mesma subdivide-se em outros importantes

fatores, a saber:

1) Quando corresponder ao superior interesse da criança.

2) Ponderadas todas as circunstâncias relevantes.

3) Independentemente de mútuo acordo dos cônjuges nesse sentido.

4) Sem prejuízo da fixação de alimentos (o que significa que a fixação de prestação de alimentos é

facultativa e não obrigatória, precisamente por se presumir poder não ser necessária em situações de

residência alternada).

1. Opinião:

O subscritor, respeitando absolutamente a posição do partido por que foi eleito (que inclusive assenta em

iniciativa legislativa própria), o debate ocorrido no seio do seu grupo parlamentar e sobretudo a circunstância de

a solução estar assente num processo negocial entre os dois partidos com maior representação na Assembleia

da República na XIV Legislatura, não pode, ainda assim, deixar de manifestar que, em obediência à sua

consciência cidadã, não se revê na solução alcançada.

E por várias ordens de razão.

a) Do conceito de família

A paternidade é um vínculo perene de um(a) filho(a) ao seu pai e à sua mãe. Entre si, constituirão sempre

uma família, ainda que essa família deixe de residir no mesmo teto e ainda que essa família deixe de o ser pelos

seus vínculos formais. Mas o conjunto criado por pai, mãe e filho(s) constituir-se-á sempre como uma família, é

certo que com as especificidades de uma família não estruturada ou não formalmente constituída, mas uma

família ainda assim. Atendendo a que aqueles serão sempre o pai e a mãe daquele/a filho/a.

Este é, por isso, o pressuposto base para a discordância. É um pressuposto de natureza intelectual.

É arcaico considerar que, uma vez rompidos os laços formais ou de residência comum na primitiva família,

ela deixe de existir. Porque ela existirá sempre. Existe com especificidades, existe com dificuldades, mas existe

enquanto tal. Trata-se, por isso, de um pressuposto não meramente filosófico, mas efetivo e material de

abordagem.

Pelo que, se fosse considerado este núcleo pai/mãe/filho(a) como sendo um núcleo familiar perene, este

pressuposto deveria obrigar o legislador a considerá-la (a essa família) enquanto tal. E a legislar em

conformidade com este pressuposto. O que significaria privilegiar sempre a residência com ambos os

progenitores, só tal não sucedendo quando houvesse indicações objetivas para que tal não sucedesse, vale

dizer, só tal não sucedendo quando (1) o superior interesse da criança e (2) a ponderação das circunstâncias

relevantes indicassem diversamente.

Não foi essa a opção legislativa.

Aliás, considerar diversamente do que aqui se defende é admitir que a partir do momento em que pai e mãe

de um mesmo filho/a se desentendem e decidem divorciar-se ou viver separadamente um do outro, aquele

filho/a passa a pertencer apenas a um dos seus progenitores. Cabendo ao outro um regime de visitas mais ou

menos consensualizado.

Privilegia-se a residência à paternidade. Privilegia-se a casa de morada de família à própria família.

Uma família é um conjunto de pessoas, independentemente das suas distâncias e divergências. O conceito

legal atribui maior valia ao seu local de residência fixa do que à unidade que entre si compõem. É difícil imaginar

conceito mais arcaico do que este.

Privilegiar a família em detrimento do seu teto, é o conceito que se defende.

b) Uma nova abrangência das responsabilidades parentais

A paternidade é, além de uma enorme alegria e privilégio, uma responsabilidade. A assunção da perenidade

do vínculo paternal deve igualmente ser uma preocupação do Estado e, como tal, do legislador.

Página 72

I SÉRIE — NÚMERO 9

72

A modalidade atual de responsabilidades parentais está construída precisamente para permitir que, uma vez

quebrado o vínculo familiar originário (isto no entendimento da lei, que não é claramente o entendimento do

subscritor) ou melhor, uma vez cessada a partilha da casa de morada de família, um dos progenitores possa

tomar as suas opções de vida alheando-se absolutamente, se o desejar, do vínculo paternal para com o seu

filho/a.

É a adoção legal do regime-regra da desresponsabilização. Ou do princípio da irresponsabilidade.

O progenitor que, nos termos da lei em vigor (artigo 1906.º n.º 6 do Código Civil que após esta alteração se

manterá em vigor, passando apenas para 1906.º n.º 7), «não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades

parentais» pode alhear-se absolutamente da função parental, na medida em que ela é uma «responsabilidade»

daquele a quem «a guarda» pertence. Pode fazê-lo, conquanto não incumpra com o seu dever de pagamento

da pensão de alimentos que vier a ser determinada.

O dinheiro pelo vínculo. O pecúlio pela paternidade.

Valha a verdade que não se pode dizer que se trata de um alheamento absoluto porque, diz a lei, a esse

progenitor «assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação

e as condições de vida do filho». Comovente. Tem o direito a ser informado.

No fundo, há um «progenitor responsável» e um «progenitor irresponsável». A expressão é dura, mas é o

que resulta do edifício legislativo.

Aliás, não se pense que esta responsabilidade unilateral só implica pontos positivos para o progenitor

residente, para aquele a quem compete a responsabilidade educacional. Num primeiro momento, os

progenitores batalham pela «guarda» dos seus filhos, mas depois essa passa a ser uma responsabilidade do,

como lhe chamei «progenitor responsável» face ao «progenitor irresponsável». Ou seja, tem que educar, cuidar,

aceitar sozinho os condicionamentos que implicam na sua vida pessoal e profissional e ainda tem que prestar

contas ao «progenitor irresponsável».

Não é uma posição simples. Não se percebe que superior interesse se visa proteger para criar um tamanho

desfasamento de obrigações e responsabilidades.

A ideia de um progenitor que, por si, tem que tomar a criança a seu cargo e do outro que, mediante o

pagamento de uma pensão de alimentos, se desonera das suas efetivas responsabilidades parentais, é uma

ideia em si mesmo incomodativa. Mas é a que resulta da lei.

A lei força à quebra do vínculo parental. A lei força a criar a ideia de um «progenitor responsável» e um

«progenitor irresponsável». A lei separa entre o «progenitor de facto» e o «progenitor de direito». Pensado com

o devido distanciamento, dificilmente se consegue imaginar um edifício legislativo mais insensível, menos

humanista porque incentivador do apartamento ao invés da aproximação.

E, naturalmente, gerador das grandes divisões que tantas vezes surgem nos processos de responsabilidades

parentais, tamanho é o poder atribuído a um dos progenitores e tamanho é o afastamento do seu filho/a e

desresponsabilização exigido ao outro.

E para quê? Responder-se-á que é para corresponder ao superior da criança. Conceito tão abstrato quão

subjetivo. E sobretudo, creio que erradamente, assente no pressuposto de que o interesse do menor é melhor

salvaguardado se assegurada residência fixa.

c) Residência fixa ou Residência alternada? – qual o superior interesse da criança?

Como se diz em cima, o entendimento subjacente ao edifício legislativo tem sido – e continuará a ser – de

que o superior interesse da criança é melhor salvaguardado atribuindo-lhe uma residência fixa e estável. Por se

considerar, benignamente e sem dúvida com a melhor das intenções, que para a estabilidade da criança é

importante poder ter os benefícios advenientes da residência fixa num só local, os amigos, a escola, o

enraizamento numa comunidade onde de insira.

O problema é que considero estar esse entendimento profundamente errado.

Considero claramente que o superior interesse da criança é poder ser filho de ambos os progenitores, tanto

da sua mãe como do seu pai. Poder ser irmão dos irmãos que porventura tenha ou possa vir a ter tanto na

família do pai como na família da mãe. Poder fazer parte das duas famílias que são, na realidade, a sua.

Para a forma como fomos habituados a ver a sociedade, esta circunstância errática e instável, não protege

o superior interesse da criança. Precisamente por lhe proporcionar uma vida errática e pouco estável.

Mas que importa se isso significar maior felicidade?

Mas que importa se isso significar maior harmonia na sua família (a do vínculo perene, embora agora dividida

por diferentes residenciais)? Isto é, se significar maior harmonia entre o seu pai e a sua mãe?

Página 73

3 DE OUTUBRO DE 2020

73

É que os pais desta criança têm, assim, menos um fator de divergência (as mais das vezes o maior fator de

divergência), não há um progenitor vencedor e um progenitor vencido, ambos são progenitores de pleno direito,

devidamente adaptados às suas novas circunstâncias de vida.

Não sou conhecedor de estatísticas, mas tenho a certeza absoluta que se a uma criança for dada a opção

de escolher entre a harmonia entre o seu pai e a sua mãe (ainda que separados ou divorciados) ou a residência

estável num só local, ele prefere sujeitar-se a todas as dificuldades que implica estar constantemente a mudar

de casa e de família, se isso implicar que todos possam viver felizes, se isso implicar que ele não tenha que se

sentir a causa maior de todas as discussões e animosidades entre os seus pais.

Qualquer criança (e, valha a verdade, qualquer adulto também) troca facilmente o seu conforto pela sua

felicidade.

E a verdade é que estou firmemente convicto de que a residência alternada (ainda que não sendo ou não

podendo obviamente ser absolutamente equitativa) retira de um casal separado ou divorciado o maior foco de

desentendimento e divergência entre o extinto casal.

Assim se contribuindo para a harmonia entre todos, por não haver vencedores e vencidos.

Assim se contribuindo para a felicidade da criança.

Numa palavra, assim se contribuindo para aquele que é, em minha opinião, o superior interesse da criança,

que é ser feliz.

d) Uma família ou duas famílias?

A lei procura a todo o custo garantir à criança uma «vida normal». Uma família, um progenitor e uma

residência. Cuidando estar dessa forma a contribuir para o superior interesse da criança, que assim não se sente

«diferente dos demais».

Nada de mais errado em minha opinião.

Desde logo porque a educação para a diferença é, em primeira instância, pedagógica. É a sociedade que

tem de aprender a não isolar, diferenciar, sequer sentir as várias diferenças que a compõem.

A origem desta legislação assenta no estigma de que é mau ser-se filho de pais divorciados. É algo que se

tenta esconder. Provém duma sociedade onde tenta não fazer notar «as diferenças», cuidando dessa forma

estar a proteger quem as tenha.

Se, pelo contrário, assumirmos as diferenças, se as exibirmos, estamos a criar condições para que todas e

quaisquer pessoas, independentemente de quais sejam as suas circunstâncias, proveniências, particularidades

ou mesmo opções, se sintam plenamente enquadrados na sociedade.

E, de caminho, estamos a educar a própria sociedade.

Mas há ainda uma outra dimensão, porventura mais significativa:

É que, da forma como está pensado o edifício legislativo das responsabilidades parentais, ao se pretender

que a criança tenha uma só família, além da dimensão (já analisada) de isso implicar haver um progenitor

vencedor e um progenitor vencido, há a dimensão, sempre negligenciada, de aquela criança passar a ser filho

de apenas um dos seus progenitores, e visita do outro.

Ele deixa de ter pais, passa a ter só pai, ou só mãe, visitando de quando em vez o outro.

Ora, uma vez mais em minha opinião, creio firmemente que se satisfaz o superior interesse da criança

criando-se-lhe condições legais para que façam parte das duas famílias em que se repartiu a sua família

originária, possam ter as duas casas como sendo a sua, não sendo apenas visita da casa do progenitor vencido.

Não apenas visita da família que só lhe tocou visitar de quando em vez. Porque, desse modo, ele nunca fará

parte dessa nova família, será apenas um visitante fugaz e tantas vezes formal daquela que é também a sua

família, mas que a lei não permite que assim seja.

As crianças merecem viver nas duas casas e não ser visita da casa do pai ou da mãe. Porque essa é a sua

vida.

É fácil? Claramente que não o é, mas é a vida que tem. Pelo que deve o Estado criar as condições da

adaptação harmoniosa a essas circunstâncias de vida, ao invés de fazer um simulacro de que a sua vida é

«normal» (conceito em si mesmo abjeto mas que tem que ser usado porque é ele que está na base de todo o

edifício legislativo).

e) Da igualdade entre progenitores

Do que fica dito em cima, torna-se claro que esta posição não assenta, nem nunca assentaria, na defesa de

um qualquer direito de igualdade dos progenitores.

Página 74

I SÉRIE — NÚMERO 9

74

A própria utilização do argumento visa, tão somente, desacreditar quem apresente uma visão menos clássica

e mais humanista, menos agarrada aos cânones daquilo a que fomos habituados e mais agarrada à felicidade

do ser humano como objetivo último do Estado e da lei.

Obviamente que se aceita uma visão diametralmente oposta à que aqui se defende, que é tão válida e tão

legítima quanto ao resto. Não se diga é que quem seja a favor da residência alternativa visa objetivos de princípio

de igualdade entre progenitores.

Há um diferente conceito, uma diferente forma de ver o superior interesse da criança. Que se considera

melhor alcançado com a residência alternada de com uma residência fixa.

Só isso e nada mais.

f) Da solução legal

Em conclusão, impõe-se aqui analisar novamente o normativo aprovado:

6. Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes,

o Tribunal pode determinar a residência alternada do filho com ambos os progenitores, independentemente de

mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação de alimentos.

Ou seja, sem prejuízo do que tudo quanto ficou dito quanto à subjetividade em torno do que deve ser o

«superior interesse da criança» e, sobretudo, sem prejuízo de ser unânime para todos – defensores e opositores

à residência alternada – que é o «superior interesse da criança» que deve nortear a solução legislativa então

pergunta-se porque é que sempre que «corresponder ao superior interesse da criança» e sempre que «as

circunstâncias relevantes» assim o aconselhem o tribunal apenas pode determinar a residência alternada?

É que, se lido na inversa, a solução legal permite que mesmo que «corresponda ao superior interesse da

criança» e mesmo que «as circunstâncias relevantes» aconselhem a que seja determinada a residência

alternada o tribunal pode, se assim o desejar, não a determinar.

Então, em que é que fica o superior interesse da criança?

Se este normativo permite que um qualquer juiz possa não decidir pela determinação da residência alternada

ainda que isso seja o recomendável em nome do «superior interesse da criança»?

De facto, não se percebe.

Se é o «superior interesse da criança» que nos deve nortear porque é que o tribunal apenas «pode

determinar» e não «deve determinar»?

Esta formulação deixa a porta aberta para que, mesmo sendo, abstratamente, no «superior interesse da

criança», o tribunal possa não determinar a residência alternada se assim o entender, na medida em que se

privilegia a opção do tribunal («tribunal pode determinar») em detrimento das circunstâncias objetivas.

Esta formulação faz um avanço tímido no que já existe.

Ao criar este novo n.º 6 cria-se claramente um comando legal que diz que o legislador considera que a

residência alternada deve ser um regime mais utilizado, mas fá-lo do modo mais cautelar possível, mantendo

todos os poderes no juiz e no tribunal.

Dizendo-lhe que apenas o «pode» fazer, mesmo quando o «superior interesse da criança» e as

«circunstâncias relevantes» o aconselhem.

Donde, é legítimo retirar-se que a residência alternada pode nunca ser determinada.

Mesmo sendo melhor para a criança e atendendo às circunstâncias concretas do caso, o juiz tem o cutelo

decisório pois se considerar, no seu juízo, que é melhor para uma criança ter uma residência estável e ficar com

apenas um dos progenitores, fá-lo validamente e com toda a cobertura legal.

O que representa a atribuição de um poder quase discricionário no juiz, pois ele tem o poder até de contrariar

as circunstâncias concretas e o superior interesse da criança. Porque mesmo quando essas o aconselham, ele

apenas «pode determinar».

O que representa uma manifestação do princípio do inquisitório, uma confiança total nos decisores judiciais,

atribuindo-lhes o poder de contrariar até o «superior interesse da criança» que é algo que manifestamente se

não compreende se o verdadeiro objetivo do legislador é proteger, acima de todos os interesses e interessados

envolvidos nestas disputas, as crianças.

Lisboa, 2 de outubro de 2020.

O Deputado do PSD, André Coelho Lima.

Página 75

3 DE OUTUBRO DE 2020

75

———

Nota: As declarações de voto anunciadas pelos Deputados do PS Sérgio Sousa Pinto e Eduardo Barroco de

Melo, pelas Deputadas do PSD Clara Marques Mendes e Sara Madruga da Costa e pelo Deputado do CH, André

Ventura, referentes a esta reunião plenária, não foram entregues no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do

Regimento da Assembleia da República.

———

Relativa ao Projeto de Resolução n.º 582/XIV/1.ª (PSD) [votado na reunião plenária de 25 de setembro de

2020 — DAR I Série n.º 6 (2020-09-26)]:

Os impactos da epidemia no Algarve, o aproveitamento que dela têm feito os grupos económicos e

financeiros, associados à insuficiência de medidas por parte do Governo, estão a provocar um rápido

agravamento da situação económica e social que deixará marcas muito profundas no plano do desemprego e

dos direitos dos trabalhadores, na situação de milhares de micro e pequenas empresas, no aumento da pobreza.

Para o PCP, continuam a ser necessárias medidas urgentes para responder aos impactos da epidemia quer

no plano social, quer no plano económico. Perante a degradação da situação económica e social no Algarve

aquilo que se impõe é a valorização dos salários e dos direitos dos trabalhadores, por forma a aumentar o poder

de compra e dinamizar a economia regional e nacional.

As medidas propostas pelo PSD visam atribuir mais apoios ao grande capital, desde logo pelo prolongamento

do layoff. Não há uma palavra sobre os baixos salários, o emprego público, a falta de diversificação da atividade

económica.

E, nas medidas propostas, o PSD finge que não tem responsabilidades no ataque e fragilização dos serviços

públicos, nos baixos salários, na imposição de portagens etc.

O PCP absteve-se na globalidade das recomendações apresentadas pelo PSD, tendo votado contra todas

as que prejudicam os trabalhadores, as micro, pequenas e médias empresas bem como a população algarvia e

a região. Para o PCP, é tão crucial combater o surto epidémico da COVID-19, como o desemprego e a redução

de rendimentos e direitos dos trabalhadores.

Assembleia da República, 2 de outubro de 2020.

O Deputado do PCP, João Dias.

[Recebida na Divisão de Redação em 2 de outubro de 2020].

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

Páginas Relacionadas
Página 0048:
I SÉRIE — NÚMERO 9 48 Submetido à votação, foi aprovado, com votos a
Página 0049:
3 DE OUTUBRO DE 2020 49 percurso político, serviu o interesse público na postura qu
Página 0050:
I SÉRIE — NÚMERO 9 50 O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deput
Página 0051:
3 DE OUTUBRO DE 2020 51 Protestos do Deputado do PS Pedro Delgado Alves.
Página 0052:
I SÉRIE — NÚMERO 9 52 O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Srs.
Página 0053:
3 DE OUTUBRO DE 2020 53 Eu gostava de saber como é que o Governador do Banco de Por

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×