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24 DE OUTUBRO DE 2020

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O direito à vida quando confrontado com um conflito com outros direitos pode sofrer compressões, aplicando-

se o mecanismo da concordância prática e desde que o núcleo fundamental do direito não seja afetado. Se

proporcional, adequado e necessário o direito à vida pode sofrer compressões. Mas uma compressão não é

sinónimo de eliminação, irradiação da ordem jurídica ou natural.

Por exemplo, perante o exercício do direito de legítima defesa pode dar-se o caso de alguém ter de ofender

a integridade física de outrem, mas apenas na medida proporcional, necessária e adequada.

Como o declarante afirmou anteriormente na sua declaração de voto sobre a eutanásia, existe um falso

conflito de direitos, já que o direito a escolher morrer não é um verdadeiro direito fundamental formal ou material.

Existe até uma demissão do Estado na defesa ao limite do direito à vida, quando não promove investimentos

em melhores cuidados de saúde para os cidadãos.

O referendo em causa visa a consulta popular sobre a questão de saber se existe um direito de escolher

morrer e tal não constitui uma consulta sobre um direito fundamental.

O declarante não acompanha, por conseguinte, a tese que propugna a inviabilidade do referendo dado estar

em causa, no caso patente deste projeto de resolução, uma escolha sobre direitos fundamentais (o pretenso

direito de escolher morrer).

f) A resposta é afirmativa (exemplo: referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez).

g) Existe um argumento interessante que tem sido apresentado que se prende com o facto de se poder

dar o caso de uma minoria popular poder coartar o direito de escolher morrer, quando essa minoria não

é representativa de uma maioria.

Na verdade, o argumento pode ser desconstruído com base no n.º 11 do artigo 115.º da CRP, onde se lê

que «O referendo só tem efeito vinculativo quando o número de votantes for superior a metade dos eleitores

inscritos no recenseamento».

Significa isto que, se se desse o caso de cidadãos «radicais» na defesa do direito à vida serem os únicos a

votar num qualquer referendo sobre a eutanásia, tal resultado nunca seria vinculativo se o número de votantes

não fosse superior a metade dos eleitores inscritos no recenseamento.

Não há, pelo contrapeso constitucional, qualquer hipótese de uma minoria, por exemplo, de 100 000, 500

000 pessoas determinar a imposição de um resultado a todas as outras, caso essas outras, por exemplo, não

votassem.

Nas últimas eleições legislativas estavam recenseados em Portugal 10,8 milhões de eleitores. Sem levar em

linha de conta com extremo rigor quem pode participar num referendo, sempre poderíamos dizer que um

referendo não seria vinculativo se o número de votantes não fosse, pelo menos, superior a 5,4 milhões de

eleitores. E este número é demasiado representativo e respeitável para não se dever valorar um qualquer

resultado que daí adviesse, fosse ele qual fosse.

Para qualquer um dos sentidos de voto ganhar precisaria de qualquer coisa como 2,7 milhões de eleitores.

Tendo em conta que nas últimas legislativas votaram 5,2 milhões de eleitores, isso significaria mais de 50% dos

votantes nessas eleições.

Conclui-se, deste modo, que o universo de votantes num determinado sentido só lograria alcançar a

imposição da sua vontade se, atentos os freios constitucionais, representasse um número esmagadoramente

significativo de votantes. E um número significativo não é classificável como uma minoria.

Pelo que o argumento da sobreposição da vontade de uma minoria não parece vencer.

h) A pergunta proposta pelos subscritores é: «Concorda que matar outra pessoa a seu pedido ou ajudá-la

a suicidar-se deve continuar a ser punível pela lei penal em quaisquer circunstâncias?»

O requisito constitucional do n.º 6 do artigo 115.º da CRP estabelece que as questões a formular nos

referendos devem «ser formuladas com objetividade, clareza e precisão e para respostas de sim ou não (…)».

Cumpre a pergunta proposta pelos subscritores o requisito constitucional?

A pergunta em causa não se dirige especificamente à questão da eutanásia ou da morte medicamente

assistida e a mesma pode mesmo conter outras situações ou hipóteses, pelo modo da sua formulação.

Mais, é uma pergunta que induz a uma resposta.

Assim, salvo melhor opinião e sem prejuízo de uma análise mais profunda, a pergunta parece não preencher

os requisitos constitucionais da objetividade, da clareza e da precisão.

Se é um referendo sobre a eutanásia e a morte medicamente assistida, então a redação da pergunta ou das

perguntas deveria ser irremediavelmente apresentada de modo tecnicamente mais apurado.

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