O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Sábado, 5 de dezembro de 2020 I Série — Número 27

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

REUNIÃOPLENÁRIADE4DEDEZEMBRODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Lina Maria Cardoso Lopes Nelson Ricardo Esteves Peralta

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 2

minutos. Ao abrigo do artigo 72.º do Regimento, procedeu-se a um

debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PSD, subordinado ao tema «A pandemia e as suas implicações nas políticas de habitação». Usaram da palavra,

a diverso título, além da Secretária de Estado da Habitação (Marina Gonçalves), os Deputados Filipa Roseta (PSD), Hugo Costa (PS), Bruno Dias (PCP), Maria Manuel Rola (BE), Carlos Silva (PSD), Mariana Silva (PEV), Hugo Carvalho (PS), João Gonçalves Pereira (CDS-PP), Inês de Sousa Real (PAN), Carlos Pereira (PS) e Márcia Passos (PSD).

Página 2

I SÉRIE — NÚMERO 27

2

Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 63/XIV/2.ª (GOV) — Procede à suspensão excecional de prazos associados à sobrevigência e caducidade de convenção coletiva de trabalho — que foi aprovada — e dos Projetos de Lei n.os 10/XIV/1.ª (PCP) — Repõe o princípio do tratamento mais favorável, elimina a caducidade da contratação coletiva e regula a sucessão de convenções coletivas de trabalho (décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro), 74/XIV/1.ª (BE) — Promove a contratação coletiva, procedendo à décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e 130/XIV/1.ª (PEV) — Consagra a reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador e a eliminação da caducidade da contratação coletiva (décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro) — que foram rejeitados. Proferiram intervenções o Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional (Miguel Cabrita) e os Deputados Diana Ferreira (PCP), Isabel Pires (BE), José Luís Ferreira (PEV), Inês de Sousa Real (PAN), João Cotrim de Figueiredo (IL) Emília Cerqueira (PSD), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Tiago Barbosa Ribeiro (PS).

Foram discutidos, conjuntamente, o Projeto de Resolução n.º 729/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo um conjunto de medidas para utilização mais eficaz e eficiente dos fundos da União Europeia, nomeadamente no âmbito da Política de Coesão, do Plano Estratégico da Política Agrícola Comum e do Plano de Recuperação da União Europeia, o Projeto de Lei n.º 589/XIV/2.ª (IL) — Criação e manutenção do Portal da Transparência por uma entidade independente — foi discutido na generalidade — e os Projetos de Resolução n.os 714/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que apresente à Assembleia da República relatórios trimestrais sobre a negociação e a execução dos fundos europeus atribuídos a Portugal ao abrigo do Programa Next Generation e do Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 e a respetiva implementação do plano de recuperação económica Portugal 2020-2030 e 748/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo que proceda à criação de uma plataforma pública demonstrando, de forma transparente, acessível e territorializada, a alocação dos fundos europeus atribuídos a Portugal através do Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 e do fundo de recuperação Próxima Geração UE. Proferiram intervenções os Deputados Nuno Fazenda (PS), João Cotrim de Figueiredo (IL), Duarte Marques (PSD), Fabíola Cardoso (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Bruno Dias (PCP), João Gonçalves Pereira (CDS-PP) e Emídio Guerreiro (PSD). Posteriormente, o projeto de lei foi rejeitado e os projetos de resolução foram aprovados na generalidade.

Foi apreciado o Relatório sobre a Aplicação da Declaração do Estado de Emergência no período de 9 a 23 de novembro de 2020. Usaram da palavra, além dos Ministros da Administração Interna (Eduardo Cabrita) e da Saúde (Marta Temido), os Deputados André Ventura (CH), Mariana Silva (PEV), Inês de Sousa Real (PAN), João Pinho de Almeida (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Moisés Ferreira (BE), André Neves (PSD) e Pedro Delgado Alves (PS).

Procedeu-se a um debate, com a presença do Primeiro-Ministro (António Costa) e de outros membros do Governo, sobre o pedido de autorização, solicitado pelo Presidente da República, de renovação do estado de emergência, tendo proferido intervenções os Deputados Constança Urbano de Sousa (PS), Mónica Quintela (PSD), Pedro Filipe Soares (BE), João Oliveira (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP), André Silva (PAN), José Luís Ferreira (PEV), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), Joacine Katar Moreira (N insc.) e Cristina Rodrigues (N insc.) e o Ministro da Administração Interna. No final, a Câmara concedeu autorização para a renovação solicitada.

Seguiu-se o debate preparatório do próximo Conselho Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do Processo de

Construção da União Europeia. Proferiram intervenções, além do Primeiro-Ministro, que abriu e encerrou o debate, os Deputados Luís Capoulas Santos (PS), Paulo Moniz e Luís Leite Ramos (PSD), Fabíola Cardoso (BE), Bruno Dias (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP), André Silva (PAN), José Luís Ferreira (PEV), André Ventura (CH) e João Cotrim de Figueiredo (IL).

Após a Deputada Edite Estrela (PS) ter lido o Projeto de Voto n.º 410/XIV/2.ª (apresentado pelo PAR e subscrito por Deputados do PSD, do BE, do PAN e do IL, pela Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e por Deputados do PS) — De pesar pelo falecimento de Eduardo Lourenço, foi aprovada a respetiva parte deliberativa (a), tendo sido guardado 1 minuto de silêncio.

Foi aprovada a parte deliberativa (a) do Projeto de Voto n.º 374/XIV/2.ª (apresentado pelo PSD) — De congratulação pelo título de vice-campeão mundial de maratona BTT alcançado pelo ciclista Tiago Ferreira.

Após ter sido lido o Projeto de Voto n.º 409/XIV/2.ª (apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e subscrito por Deputados do PS) — De saudação pelo Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres, foi aprovada a respetiva parte deliberativa (a).

Foram rejeitados os Projetos de Resolução n.os 653/XIV/2.ª (BE) — Pela valorização da carreira docente, 660/XIV/2.ª (PCP) — Valorização dos professores e educadores e melhoria das suas condições de trabalho e 716/XIV/2.ª (PEV) — Atribuição de direitos devidos aos professores.

Foi aprovado o Relatório e Conta de Gerência da Assembleia da República relativo ao ano de 2019.

Foram aprovadas, em votação global, as seguintes propostas de resolução:

N.º 5/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Acordo sobre a Participação da Croácia no Espaço Económico Europeu, assinado em Bruxelas, em 11 de abril de 2014;

N.º 8/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Protocolo sobre os Privilégios e Imunidades do Tribunal Unificado de Patentes, feito em Bruxelas, a 29 de junho de 2016;

N.º 9/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Acordo sobre Transporte Aéreo entre a República Portuguesa e a República do Peru, assinado em Lisboa, a 26 de fevereiro de 2019;

N.º 12/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Acordo-Quadro entre a República Portuguesa e as Nações Unidas sobre Reuniões das Nações Unidas a ter lugar na República Portuguesa, assinado em Nova Iorque, em 11 de maio de 2020;

N.º 14/XIV/2.ª (GOV) — Aprova a Convenção Sobre a Repressão de Atos Ilícitos Relacionados com a Aviação Civil Internacional, adotada em Pequim, em 10 de setembro de 2010;

N.º 15/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República do Paraguai sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, assinado em Lisboa, em 11 de maio de 2017.

Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 644/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo o envolvimento das Forças Armadas nas ações de planeamento e operacionalização das medidas e ações que vierem a ser adotadas nesta nova fase de combate à pandemia, nomeadamente no apoio aos cidadãos em situação de maior vulnerabilidade e risco, como é o caso do apoio aos lares e instituições sociais de todo o País que prestam serviços a esta franja da população mais vulnerável.

Foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 739/XIV/2.ª (CH) — Pela criação de uma entidade independente que fiscalize a execução dos fundos europeus consignados ao plano de recuperação e resiliência da União Europeia.

Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 689/XIV/2.ª (BE) — Pela criação de um fundo de apoio ao desporto.

Foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos Projetos de Lei n.os 196/XIV/1.ª (BE) — Altera a composição do Conselho Nacional de Bombeiros,

Página 3

5 DE DEZEMBRO DE 2020

3

possibilitando a representação da Associação Portuguesa dos Bombeiros Voluntários (1.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril), e 203/XIV/1.ª (PAN) — Altera a composição do Conselho Nacional de Bombeiros, regulada pelo Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril (1.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril).

Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados autorizando um Deputado do PSD a intervir em tribunal.

Foi anunciada a entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os 590 e 591/XIV/2.ª.

Deu-se conta dos Deputados que estiveram presentes, por videoconferência, na reunião plenária.

O Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 11 minutos.

(a) Estas votações tiveram lugar ao abrigo do n.º 10 do

artigo 75.º do Regimento.

Página 4

I SÉRIE — NÚMERO 27

4

O Sr. Presidente: — Bom dia, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Srs. Agentes da autoridade.

Vamos dar início aos nossos trabalhos.

Eram 10 horas e 2 minutos.

Como sabem, a sessão de hoje terá dois momentos, um de manhã e outro de tarde. Os Srs. Deputados ficam

desde já avisados de que, na parte da tarde, como vamos ter de proceder a uma votação praticamente no início

dos trabalhos, ou passado muito pouco tempo, a contagem do quórum para efeitos de deliberação será aberta

logo às 15 horas.

Vamos, então, entrar na ordem do dia, de cujo primeiro ponto consta o debate de urgência, requerido pelo

Grupo Parlamentar do PSD, subordinado ao tema «A pandemia e as suas implicações nas políticas de

habitação».

Para abrir o debate, pelo Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada Filipa Roseta.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas: Uma em cada quatro pessoas em Portugal convive com humidade, infiltrações e apodrecimento de materiais dentro de casa e uma

em cada cinco pessoas não tem dinheiro para aquecer a casa no inverno. Antes da pandemia, a falta de

dignidade da habitação já era um dos piores indicadores de pobreza de Portugal nos objetivos de

desenvolvimento sustentável.

O problema da habitação em Portugal é um problema da classe média, muito além dos mais vulneráveis:

afeta cerca de um quarto da nossa população, muito além das 25 000 famílias identificadas pelo IHRU (Instituto

da Habitação e da Reabilitação Urbana) em 2018, como o próprio já veio reconhecer. A pandemia expôs os

mais precários, nos lares, e expôs a falta que faz uma política de habitação integrada e digna do envelhecimento.

A paragem da economia empurrou mais famílias para a dificuldade de chegar ao fim do mês sem saber de

onde irá vir o dinheiro para pagar a renda ou a prestação do crédito à habitação. O PSD esteve na defesa das

moratórias ao crédito e nos apoios ao arrendamento habitacional. Os pedidos de apoio ao arrendamento foram

2900, muito menos do que as 317 000 moratórias hipotecárias pendentes — repito, 317 000 moratórias

hipotecárias pendentes.

Antes da pandemia, a política de habitação socialista era inexistente. Não houve qualquer capacidade para

aproveitar as propriedades vazias do Estado. Os Orçamentos sucessivos indicaram 250 milhões para o Fundo

Nacional de Reabilitação do Edificado, mas nem o Primeiro-Ministro, nem o Ministro, nem a Presidente do IHRU

souberam dizer, neste Parlamento, quanto dinheiro é que, efetivamente, passou para o Fundo Nacional de

Reabilitação do Edificado e o que é que o Fundo andou a fazer, desde 2016. Não conseguiram responder! É

por este fracasso rodeado de propaganda vazia que não acreditamos quando o Ministro nos diz que é para o

próximo ano que vai aparecer um plano nacional nesta Assembleia. Só vamos acreditar no dia em que o virmos

dar entrada aqui.

Hoje, a União Europeia quer segurar as famílias e os empregos e vai enviar milhares de milhões a fundo

perdido. Não temos a troica da austeridade, com que o Primeiro-Ministro José Sócrates assinou o Memorando

antes de ir viver para Paris. No Plano de Recuperação e Resiliência, o Governo destinou 1600 milhões para a

habitação — repito, 1600 milhões para a habitação —, 250 milhões para comunidades desfavorecidas, 620

milhões para a eficiência energética dos edifícios e ainda verbas para o envelhecimento. O total andará próximo

dos 3000 milhões.

Antes da pandemia, tínhamos um Ministro sem plano e sem dinheiro. Agora, temos um Ministro sem plano e

com milhares de milhões. A urgência deste debate é que a solução pode ser pior que o problema. Não se gastam

3000 milhões sem um programa nacional. Em tempos de fome, sem um programa nacional nem sequer se

deveriam gastar os 250 milhões que já estão comprometidos para o parque habitacional no Orçamento do

Estado para 2021.

Somos um País com mais de 100 anos de políticas de habitação. Temos, no terreno, inúmeros exemplos e

inúmeras provas de que é possível fazer bem, mas também sabemos que hoje há bairros sociais feitos de ontem,

que são o maior problema social que temos. Será que o Ministro quer construir habitação social de baixo custo

Página 5

5 DE DEZEMBRO DE 2020

5

sem propriedade privada e atribuir casas por sorteio, deixando de fora muitos e celebrando a sorte de poucos?

Mas qual é a justiça social de ganhar uma casa por sorteio?

Não há falta de habitação social em Portugal. Não há sequer falta de habitação. Em Portugal, há 1,5 casas

para cada núcleo familiar. São 6 milhões para 4 milhões: 1,5 casas para cada núcleo familiar. Em vez de dezenas

de programas que se atropelam ou de uma manta de retalhos de estratégias municipais, precisamos de um

desígnio nacional para construir as cidades que queremos.

As cidades que queremos têm uma política de habitação integrada, com a população diversificada,

multigeracional e interclassista, incluindo pequenos núcleos de apoio ao envelhecimento para envelhecermos

com dignidade, junto dos nossos e da nossa comunidade.

As cidades que queremos acreditam na iniciativa privada, além-Estado, e no setor social, num mercado de

habitação livre de burocracias a coexistir com um mercado condicionado, construído sobre as propriedades do

Estado.

As cidades que queremos não segregam, não deixam ninguém para trás e garantem oportunidades de vida

a todos aqueles que as queiram agarrar.

Aplausos do PSD.

Acima de tudo, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, Sr. Presidente, as cidades que queremos dão corpo à ideia

de um homem que morreu faz hoje 40 anos, ao serviço deste País, enquanto Primeiro-Ministro. Francisco Sá

Carneiro, quando morreu, tinha 46 anos, menos um do que eu tenho hoje. Era um homem jovem, portanto. Mas

é nas palavras dele que encontro as cidades que queremos: cidades de liberdade, justiça social e solidariedade.

Estas são as cidades de que Portugal precisa hoje.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada Filipa Roseta, a Mesa regista a inscrição do Sr. Deputado Hugo Costa, do Grupo Parlamentar do PS, para pedir esclarecimentos.

Tem a palavra para o efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr. Presidente, Secretária de Estado da Habitação, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Filipa Roseta, cumprimentamos o PSD pela

escolha do tema da habitação, um tema crucial nas políticas públicas, que, desde a governação iniciada em

2015, se tornou central.

Este debate permite desmascarar o populismo. A habitação é um direito constitucional que está na base de

outros, como a saúde, a educação e o emprego. Bem sabemos que as políticas públicas de habitação têm mais

de 100 anos, mas a Sr.ª Deputada reconhece que só com a Nova Geração de Políticas de Habitação elas

ganharam eixo estratégico?

A Sr.ª Deputada diz que não temos um problema de habitação em Portugal. Não temos mesmo um problema

de habitação em Portugal, Sr.ª Deputada? A Sr.ª Deputada reconhece ainda que, para além de responder a

questões urgentes, a questões de indignidade, como faz o 1.º Direito, é necessário responder a pessoas de

rendimentos médios, a quem o mercado tão defendido pelo partido de V. Ex.ª não responde?

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — O Governo tem cinco anos!

O Sr. Hugo Costa (PS): — Mas, Sr.ª Deputada, existe uma questão que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não compreende, a menos que seja por mero populismo. A Sr.ª Deputada tem vindo a defender a

impossibilidade de executar verbas enquanto não for aprovado o plano nacional de habitação, previsto no artigo

17.º da Lei de Bases da Habitação.

Ou seja, o Partido Social Democrata e a Sr.ª Deputada defendem que todo o investimento público que foi

realizado na habitação não o deveria ter sido?

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

Página 6

I SÉRIE — NÚMERO 27

6

A Sr.ª Deputada defende que as pessoas que tiveram acesso a casa entreguem a chave? Defende que os

cidadãos que tiveram acesso a habitação entreguem a chave, porque o PSD defende que essas pessoas não

tenham habitação? Foi isso que a Sr.ª Deputada aqui trouxe.

Aplausos do PS.

Assumimos a importância desse documento, que o Governo já disse ir apresentar em 2021. É certamente o

facto de o último Governo PSD/CDS apenas ter apresentado uma estratégia para a habitação em 2015 que

justifica que, durante quatro anos, não tenha existido investimento público. Só isso o justifica, porque, como não

havia plano e só o apresentaram em meados de 2015, não fizeram nada relativamente à habitação.

Tenho uma última pergunta, Sr.ª Deputada: não acha estranho que o partido que votou contra a Lei de Bases

da Habitação a venha evocar para não poder existir investimento público na habitação?

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Hugo Costa (PS): — Será que veio fazer um pedido de desculpas por o Partido Social Democrata ter votado contra a primeira Lei de Bases da Habitação? É esta a pergunta que lhe deixo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Filipa Roseta.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Ó Sr. Deputado, vou tentar ser clara: acho que não se gastam 3000 milhões sem um plano nacional, independentemente da lei.

Vozes do PSD: — Exatamente!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Que os senhores façam uma lei que não querem cumprir, é convosco. Agora, para nós, em tudo, inclusivamente na TAP (Transportes Aéreos Portugueses), não se gastam 3000 milhões a

fundo perdido, que nos vão ser entregues pela União Europeia, sem um programa nacional.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Não se faz! Não se faz! Não se faz! Não se faz! Não se faz! Não há justiça nenhuma nisto!

Não continuem a dizer que têm uma política de habitação, quando produziram, em cinco anos, 144 fogos.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Exato!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Isto é ridículo! Por favor!

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — É ridículo!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — A política de habitação é para todo o País. É para todo o País! Como eu disse, e muito bem, é um problema da classe média, que vai além dos vulneráveis. Tem de haver políticas, não é

entregar chaves por sorteio! Entende isto?! Não quero tirar nada a ninguém, mas temos de olhar por todos.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Ora bem!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Acho que isto não pode ser mais claro!

Página 7

5 DE DEZEMBRO DE 2020

7

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Governo, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação, Marina Gonçalves.

A Sr.ª Secretáriade Estado da Habitação (Marina Gonçalves): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, agradeço a possibilidade de fazermos este debate importante sobre habitação e de debatermos a

realidade, aqueles que são os problemas e as soluções para um direito social tão estruturante como o da

habitação.

Agradeço ainda este aparente consenso quanto à importância de promovermos políticas públicas de

habitação, mas quero lembrar também o passado — e falo não apenas da anterior Legislatura, mas de 2015,

quando, efetivamente, a estratégia foi feita pelo telhado e apresentada, como já foi dito, em fim de mandato.

Lembrando um passado mais recente, o que este Governo fez, desde 2016, foi definir uma Nova Geração

de Políticas de Habitação, onde traçou os problemas, definiu os instrumentos, definiu as metas, definiu aqueles

que seriam os grandes diplomas estruturantes da política, tendo dado um segundo passo, que foi o de

apresentar esses diplomas, que foram publicados, escrutinados e debatidos neste Parlamento.

Todos os anos a própria Sr.ª Deputada vota, neste Parlamento, o plano de habitação do Governo para a

legislatura. Aliás, ainda há pouco tempo, votou, neste Parlamento, a estratégia do Governo em matéria de

habitação. Nós somos os primeiros a salientar a importância de um programa nacional de habitação que seja

apresentado e escrutinado neste Parlamento e assumimos o compromisso de, em 2021, apresentar esse

documento. Mas não tenhamos dúvidas, Sr.ª Deputada, de que esse documento vai incorporar a política de

habitação que tem sido defendida e prosseguida desde 2016.

Efetivamente, temos em curso uma política de habitação para todos os portugueses — todos! —, temos o

programa 1.º Direito, que está em execução, temos um programa para acabar com as carências habitacionais,

que, fruto da pandemia, vai ser reforçado, nomeadamente com um investimento através do Plano de

Recuperação e Resiliência, e que visa dar resposta às famílias com menores rendimentos.

Sr.ª Deputada, neste momento, há nove acordos de colaboração assinados com os municípios. São 11 000

famílias a quem a Sr.ª Deputada está a pedir que esperem em sua casa enquanto se apresenta aqui um

programa. É isso que a Sr.ª Deputada está a pedir!

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

Temos também uma segunda via de intervenção, que começou com o Fundo Nacional de Reabilitação do

Edificado para obras mais complexas, que está a avançar e que, entre dois dos projetos mais estruturantes, vai

permitir que existam 400 casas.

Sr.ª Deputada, podem dizer que há zero casas, neste momento, no mercado, mas quero acreditar que todos

sabem como é que se reabilita e como é que se começa um processo do zero, depois de anos de

desinvestimento, anos em que, fruto da responsabilidade do Partido Socialista, mas também do CDS e do PSD,

o património do Estado esteve devoluto e parado.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — A política do Governo é mesmo zero!

A Sr.ª Secretáriade Estado da Habitação: — O que estamos a fazer agora é a pegar nessa responsabilidade, a fazer os projetos, a fazer todos os passos iniciais, que, como a Sr.ª Deputada certamente

saberá, são necessários para salvaguardar resposta no arrendamento acessível, em complemento a um

segundo diploma que a Sr.ª Deputada terá oportunidade de discutir aqui, um decreto-lei aprovado em outubro,

que permite que também o IHRU, a par do Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado, reabilite os imóveis

devolutos do Estado para dar habitação a preços acessíveis, em todo o País, a todos os portugueses.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Quando?!

Página 8

I SÉRIE — NÚMERO 27

8

A Sr.ª Secretáriade Estado da Habitação: — Por isso, Sr.ª Deputada, diria que tentei dar uma nota daquilo que está a ser feito e que vai ser incorporado no programa. E não conte com o Governo para suspender políticas

de habitação,…

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Quais políticas?!

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — … à espera de um programa que mais não é do que a repercussão das políticas em curso desde 2016.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Quais políticas?!

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se quatro Srs. Deputados para pedir esclarecimentos à Sr.ª Secretária de Estado, que vai responder a todos em conjunto.

Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Bruno Dias, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado, queria colocar à Sr.ª Secretária de Estado da Habitação uma questão que tem a ver com dois aspetos que têm de ser tratados

de uma forma simultânea, diria, nesta fase da vida do País.

Por um lado, é preciso dar uma resposta estruturada, planeada, com uma intervenção de fundo que

corresponda a uma política de habitação progressista, justa, de desenvolvimento e de resposta aos problemas

estruturais que o País tem desde há muitos anos nesta matéria, seja no desenvolvimento do parque habitacional

público, seja na reabilitação e na requalificação do próprio edificado que o IHRU tem à sua responsabilidade.

Nesse sentido, há um conjunto de decisões concretas que têm de ser preparadas e que têm vindo a ser

anunciadas, mas importa saber o ponto de situação para a sua efetiva aplicação no terreno.

Por outro lado, é preciso dar uma resposta imediata, tendo em conta a situação que o País atravessa e que

a população enfrenta, que passa por medidas que podem e têm de ser adotadas agora, não a médio prazo, não

daqui a uns anos, mas agora, já, sob pena de as pessoas que estão a enfrentar situações de grande dificuldade

ficarem desprotegidas e pelo caminho, contrariando a tal conversa de que «não fica ninguém para trás». Ou

seja, em relação ao Porta 65 Jovem, aos apoios de emergência para fazer face aos problemas dramáticos que

as populações enfrentam, à própria gestão e utilização do património habitacional ou do património edificado

público com aptidão para uso habitacional, há medidas que têm de ser tomadas agora.

A Assembleia aprovou, por proposta do PCP, um regime excecional de pagamento das rendas, mas, na

prática, de acordo com as votações cruzadas do PS e do PSD, cortou aquilo que tinha a ver com a eficácia

imediata da proposta do PCP.

A pergunta é esta: já que o Governo vai regulamentar, vai fazê-lo em que sentido?

A penúltima pergunta prende-se com os meios que o IHRU tem para enfrentar esta matéria, ainda por cima

com o regresso do teletrabalho e com o acréscimo de uma segunda, terceira e quarta vagas de necessidades

das populações. Que resposta está a ser dada para que o IHRU tenha, de facto, a capacidade e os meios para

dar resposta às necessidades que surgem?

Finalmente, a última pergunta tem a ver com o esforço financeiro exigido aos municípios. De acordo com os

tais acordos de colaboração e aquilo que está a ser definido, não lhe parece, Sr.ª Secretária de Estado, tendo

em conta a incumbência do Estado e do poder central, nos termos constitucionais e nos termos legais, que está

a ser exigida aos municípios uma fatia substancialmente maior do que aquela que, nos termos da Constituição

e da lei, lhes devia ser dada para a resolução destes problemas?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

Página 9

5 DE DEZEMBRO DE 2020

9

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Secretária de Estado, esta pandemia tornou evidente a importância da habitação como pilar democrático e constitucional. Quem não tem

uma habitação com condições dignas está mais vulnerável à doença, não tem condições para fazer

confinamento, para fazer teletrabalho e muito menos para ter sucesso educativo ou para acompanhar os filhos.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Percebemos que, no terrível oceano da pandemia, não estamos todos no mesmo barco.

Com a crise pandémica, ficaram também mais expostos os efeitos brutais da especulação imobiliária. O

Partido Socialista não pretendeu, e parece não pretender, contrariá-la, depois do desastre que foi a iniciativa da

direita neste âmbito.

A monocultura do turismo e a siamesa do imobiliário, o dumping fiscal e as benesses aos fundos imobiliários

e milionários que compram solo nacional para acederem a direitos de cidadania revelam, mais do que nunca,

uma aposta errada e, mais do que isso, uma aposta perversa.

Mesmo com a crise que vivemos agora, o valor do imobiliário, para compra ou para arrendamento, mantém-

se quase inalterado.

Sabemos, ao mesmo tempo, que em Portugal os rendimentos são os que mais descem na Europa. Os turistas

já não vêm e as cidades estão vazias, mas nem por isso o mercado se reconverteu para servir os que cá habitam.

Os trabalhadores mais pobres e precários, que são também os que não podem ser proprietários, estão, por isso,

mais dependentes do mercado de arrendamento e são também os mais penalizados. Entre estes, acima de

todos, os mais penalizados são as mulheres.

Para estas questões, o Governo não tem tido respostas à dimensão dos problemas que enfrentamos e das

disfuncionalidades gritantes do mercado. Nas políticas públicas e na ação do Governo, para responder a este

problema, tem imperado a inércia, seja na regulamentação da Lei de Bases da Habitação e da lei de combate

ao assédio imobiliário, seja na mobilização do edificado público e vazio ou, até, nas alterações à lei do

arrendamento.

Também devo dizer, confesso, que pensei que o agendamento do PSD fosse um ato de contrição. Imaginei

que a Deputada Filipa Roseta viesse solenemente pedir desculpa aos milhares de pessoas que foram

despejadas graças a essas normas inconstitucionais implementadas pelo Governo do PSD ou, ainda, pelo guião

da reforma do Estado que o seu partido apresentou quando era Governo.

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

Pois nada disto tivemos oportunidade de ver. Mas o resultado está à vista: dezenas de milhares de pessoas

sem condições de acesso à habitação e, com a crise pandémica e a descida dos rendimentos, esta realidade

só tenderá a piorar. É neste sentido que a intervenção do Governo e das políticas públicas é decisiva.

A pergunta que se impõe, neste momento, é a seguinte: estão o Governo e o Partido Socialista dispostos a

prolongar as medidas em vigor para o ano de 2021?

Estamos no auge da crise pandémica e necessitamos de dar respostas às pessoas que, neste momento,

não sabem como responder aos problemas habitacionais que já no início de janeiro baterão à sua porta.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Carlos Silva, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, antes da pandemia, a habitação já era um dos principais problemas do quotidiano dos portugueses, com particular

impacto nas populações residentes nas áreas metropolitanas, associando a estes o problema da mobilidade,

das periferias e a falta de qualidade e de conservação dos imóveis.

Página 10

I SÉRIE — NÚMERO 27

10

Nos locais mais acessíveis das cidades, o custo da habitação ultrapassa em muito a capacidade financeira

das famílias para fazerem face às rendas e às prestações dos bancos. O mercado imobiliário funciona sem

qualquer regulação.

A pandemia veio acentuar de forma mais exigente as dificuldades das populações. Existem mais sem-abrigo,

existem mais pessoas a viver em bairros degradados, existem mais jovens a abandonar as casas que

partilhavam e que deixaram de pagar, existem famílias em sobrelotação, mais sujeitas à propagação do vírus.

O desemprego e a quebra de rendimentos têm colocado muitas famílias em grandes dificuldades e as medidas

de apoio à emergência têm-se revelado verdadeiramente insuficientes. O programa de apoio às rendas é uma

espécie de conjunto vazio. O programa afundou-se, enredado em burocracia, e transformou-se em dívida futura

para as famílias.

É neste sentido que surge a necessidade da intervenção do Estado, com a criação de uma verdadeira política

pública, elaborando programas que criem condições para retirar pressão urbanística em zonas que tendem a

empurrar populações para fora.

Lamentavelmente, este Governo optou por outro caminho, que foi o da propaganda, lançando programas,

alguns sem calendário e sem dotação orçamental. Ao mesmo tempo, há coisa de 15 dias, no âmbito do

Orçamento do Estado, anunciou o Sr. Ministro ao País que o Parlamento irá aprovar, para o ano, o programa

nacional de habitação.

Em que ficamos, Sr.ª Secretária de Estado? Governam há seis anos, criaram, em 2017, uma secretaria de

Estado de forma pomposa, anunciaram uma nova geração de políticas de habitação, onde meteram tudo e mais

um par de botas. O resultado são programas com execuções orçamentais próximas do ridículo: umas dezenas

de casas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Mas só agora, ao final de seis anos, se deram conta de que não tinham uma visão estratégica para o País em termos de habitação e de que é preciso mais um plano.

Sr.ª Secretária de Estado, estamos num tempo em que os portugueses exigem mais ação e menos

propaganda nas respostas aos seus problemas. Acima de tudo, espero que não se esqueça do sábio e justo

poema constitucional que nos dizia que só há liberdade a sério quando houver paz, pão, habitação, saúde e

educação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, de Os Verdes.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, o PSD traz-nos um assunto de importância e de atualidade.

A habitação é uma necessidade básica de sobrevivência do ser humano e um fator de desenvolvimento

individual e coletivo. A Constituição da República Portuguesa consagra o direito a uma habitação digna e,

segundo o artigo 65.º, «Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada,

em condições de higiene e conforto (…)», cabendo ao Estado adotar as medidas necessárias no sentido de

tornar este direito mais exequível e acessível a todos.

O País enfrenta, nos dias de hoje, uma pandemia que veio colocar a nu as diversas dificuldades vividas nas

diferentes áreas.

A questão da habitação é um problema antigo que se agravou com as alterações promovidas pela maioria,

de má memória, PSD/CDS, com a generalização de despejos, particularmente de idosos, favorecendo os

interesses ligados ao turismo e com reflexos na gentrificação. A questão da habitação foi, e é, um problema com

o desinvestimento na habitação social e com a consequente degradação da existente.

A sociedade portuguesa enfrenta atualmente uma realidade caracterizada por precariedade, por baixos

salários, por instabilidade e insegurança, em que uma grande maioria da população se depara com dificuldades

quer no arrendamento, quer na aquisição de habitação própria. Esta situação é mais grave e acentuada nas

Página 11

5 DE DEZEMBRO DE 2020

11

camadas jovens e desfavorecidas da população, sendo o emprego e a habitação determinantes para a sua

emancipação e independência.

Décadas de política contra a emancipação dos jovens levam a que estes saiam cada vez mais tarde da casa

dos pais e levam mesmo a que alguns tenham de voltar aí, ou que apenas se aguentem com a ajuda destes. As

medidas de apoio ao arrendamento jovem excluem milhares de candidatos.

Em pleno século XXI, a falta de condições de habitabilidade atinge milhares de portugueses, havendo

habitações degradadas, com dimensões reduzidas, sobrelotadas, sem água canalizada e sem saneamento

básico, sem condições para que, no caso de infeção pelo vírus, seja possível aplicar as medidas de segurança,

de higienização e de isolamento profilático, garantindo que a COVID não se propague de forma descontrolada

pelos membros da família.

A aposta na habitação social é, hoje, praticamente residual, o valor das rendas e das prestações é exorbitante

e o alto endividamento apresenta-se como a única solução perante a crescente desresponsabilização do Estado

em assegurar o direito à habitação.

Por tudo isto, a luta pelo direito à habitação não se pode dissociar da luta pela defesa das conquistas e dos

direitos democráticos.

Por parte dos sucessivos Governos, tem-se verificado incumprimento, desrespeito e ataques profundos ao

direito à habitação, criando condições de benefício, de favorecimento e de privilégio aos grandes grupos

económicos, sendo bastante clara e evidente a sua opção de se colocar ao lado da banca, em detrimento das

pessoas.

Sr.ª Secretária de Estado, que medidas tem definidas e quais estão em concretização para assegurar um

mercado habitacional que garanta aos mais pobres, aos mais jovens, a todos, o direito à habitação?

Relativamente aos jovens, pode garantir, hoje e aqui, que todos os que cumprem os critérios de elegibilidade

para aceder ao apoio previsto no Porta 65 Jovem terão acesso a ele?

O Sr. Presidente: — Para responder a este conjunto de quatro pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação, Marina Gonçalves.

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as perguntas que me fizeram.

Assumindo, obviamente, a responsabilidade de anos de desinvestimento em habitação e assumindo a

dificuldade de, a curto prazo, encontrar respostas estruturantes, mas imediatas, para o problema da habitação,

há, efetivamente, uma dupla vertente de trabalho que temos de garantir.

Por um lado, uma resposta estruturada e a longo prazo que passa, necessariamente, pelo reforço da resposta

pública, pelo reforço do parque habitacional público. Só com uma resposta em que o Estado tenha, efetivamente,

um papel central é que poderemos garantir o direito à habitação para todos. Por outro lado, há uma resposta no

imediato que não se pode pautar apenas pela reabilitação, porque a reabilitação tem, obviamente, passos que

são centrais e, infelizmente, não se coloca uma casa no mercado de um dia para o outro.

Portanto, há um conjunto de instrumentos que têm de ser criados para salvaguardar, a curto prazo, sobretudo

em função da pandemia, respostas estruturadas para a população.

O apoio no pagamento das rendas foi importante. É verdade que não teve uma adesão muito forte, mas, não

querendo falar sobre a opção dos portugueses, não houve muitos candidatos ao programa. O programa tinha

requisitos, foi criado numa semana, foram vistas as ineficiências do mesmo e, neste Parlamento, no Orçamento

Suplementar, foram aprovadas propostas para tornar o modelo mais simplificado.

Neste momento, não há problemas de atraso no processamento dos apoios. O IHRU tem uma equipa que

está apenas a trabalhar nos apoios e que vai continuar a trabalhar até 2021, pois os apoios foram prorrogados,

por proposta do PCP, no Parlamento, até 2021. Estamos a terminar o decreto-lei para, precisamente logo no

início do ano, dar execução a este apoio, sendo certo que uma das questões que estamos a ponderar, que,

aliás, decorre do que foi aprovado no PEES (Programa de Estabilização Económica e Social), é o facto de parte

destes apoios, tendo em conta os rendimentos das famílias e os efeitos da crise, poder ser convertido em

subsídios, ou seja, não serem empréstimos mas, sim, subsídios do IHRU.

Página 12

I SÉRIE — NÚMERO 27

12

Há um conjunto de respostas a curto prazo que têm de ser definidas — é mais do que óbvio —, mas a

verdade é que a resposta que é mais estruturada e mais eficiente será, sem dúvida, a resposta dada a longo

prazo, com o parque habitacional público.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Carvalho, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Hugo Carvalho (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD aparece, neste debate, com lágrimas de crocodilo. Foram Governo entre 2011 e 2015 e não fizeram

rigorosamente nada em matéria de habitação!

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: — Ah!…

O Sr. Hugo Carvalho (PS): — Foram oposição nos quatro anos seguintes, quando, nesta Câmara, se discutiu, aprovou e legislou a Lei de Bases da Habitação. O PSD faltou a esse debate e esteve contra!

Portanto, ao PSD não basta agora marcar um debate de urgência para dizer que está preocupado com um

tema com o qual nunca, mas nunca o PSD se importou.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, se o PSD quer ser responsável e consciente neste debate, deve dizer, de forma clara,

se é ou não a favor do investimento público no parque habitacional, porque, se o é, deveria ter aprovado as

propostas do Orçamento do Estado no âmbito da habitação, pois isso, sim, reforçaria também o investimento na

habitação. Se o PSD quer ser responsável e sério no debate da habitação, também deve ser capaz de dizer se

quer ou não celeridade na execução de políticas públicas, porque, se o quer, não pode vir para o debate político

com subterfúgios e burocracias insignificantes para procurar impedir a execução de políticas de habitação.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Que não existem!

O Sr. Hugo Carvalho (PS): — Da parte do Partido Socialista, sabemos o que estamos aqui a defender. Temos lançado programas de apoio ao programa 1.º Direito, em colaboração estreita com os municípios

portugueses, com um programa robusto do ponto de vista financeiro. É isso que estamos a fazer, mas também

estamos a trabalhar no arrendamento acessível, porque sabemos o quão importante é que possamos

salvaguardar o que os senhores não salvaguardam, que é o mercado especulativo do arrendamento. Temos de

garantir que as famílias e a classe média possam ter condições de rendimento para aceder a habitação. É isso

o que estamos a fazer e é isso que vamos continuar a fazer!

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado: Neste momento, vivemos uma crise habitacional e vivemos uma crise pandémica.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Exatamente!

Página 13

5 DE DEZEMBRO DE 2020

13

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Estamos a falar neste momento exato, mas, em 2021, a resposta à crise não estará pronta — nem à crise habitacional, nem à crise pandémica. É essa a questão que se coloca

precisamente neste momento, quando daqui a uns dias terminar, por exemplo, a moratória à suspensão dos

contratos.

Gostava que a Sr.ª Secretária de Estado nos respondesse se o Partido Socialista está disponível para não

acrescentar crise à crise que estamos a viver neste momento e que irá alargar-se, se não fizermos nada, a partir

de dia 31 de dezembro.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Agora, é a vez de o Grupo Parlamentar do CDS-PP intervir. Tem a palavra o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado da Habitação, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria congratular

o PSD por ter tido a iniciativa deste debate.

A nível habitacional, a pandemia trouxe-nos vários desafios. Muitas famílias não conseguem cumprir os seus

compromissos com o pagamento da prestação bancária e muitas também não conseguem pagar as rendas aos

seus senhorios. A pandemia trouxe, também, o isolamento e acelerou o teletrabalho. Para além do que possa

ser o diagnóstico da situação, importa aqui, como é evidente, fazer um balanço da ação governativa.

Sobre o arrendamento acessível, o Governo decidiu, no Plano de Recuperação e Resiliência, investir

qualquer coisa como 1200 milhões de euros, nos próximos seis anos, em habitação social. Só vai ser possível

concretizar esta política e este desafio se existir uma cooperação entre a administração central e a administração

local. Portanto, neste debate, é importante que o Governo esclareça quantas câmaras municipais já

apresentaram a sua estratégia local de habitação ao IHRU, para que possamos ter noção se esta política, este

dinheiro e estes recursos, efetivamente, vão poder responder a esta necessidade.

Temos um problema no mercado do arrendamento em Portugal. Em termos habitacionais, o arrendamento

representa apenas 2% do mercado. Uma das classes mais afetadas pela ausência deste mercado de

arrendamento é precisamente a classe média, os idosos e os mais jovens.

Quanto aos pedidos de ajuda para o pagamento de renda, preocupa o CDS que o IHRU apenas tenha

aprovado 24% dos pedidos. Recebeu algo como 3000 pedidos de ajuda ao pagamento de renda, de famílias

que estão em total desespero, que tiveram quebra de rendimentos, e, destes 3000 pedidos, apenas cerca de

700 foram aprovados. Há algo aqui que não está a correr bem, há algo aqui que está mal, seguramente. Temos

um programa para ajudar ao pagamento das rendas, temos famílias que estão a perder rendimento, que pedem

apoios, mas, depois, são apenas aprovados 24% destes mesmos pedidos.

Nós sabemos qual é a razão, sabemos aqui e sabe-se lá fora — é a burocracia. O País liga o

«complicómetro» e o Partido Socialista devia criar um «Simplex», na medida em que tem de ajudar as famílias

e aqueles que pedem estes apoios. Falamos de famílias carenciadas, muitas vezes com dificuldades em

interpretar requisitos burocráticos que impedem que possam ter os devidos apoios. Vivemos tempos em que é

preciso ajudar e apoiar, não vivemos tempos para complicar! A incapacidade de resposta, no entanto, é evidente

e tal percebe-se. O IHRU precisa de mais recursos, então que venham esses mesmos recursos.

Depois, temos programas como o 1.º Direito, com um histórico de execução na ordem dos 8%, sobre o qual,

ainda no Orçamento do Estado, ouvimos dizer: «Desta é que é! Agora é que vamos fazer!». A pergunta que

fazemos é a seguinte: será desta que vamos ter o 1.º Direito a funcionar e a ter uma execução? Não sabemos!

Depois, temos as moratórias bancárias, um problema que existe e a que todos nós assistimos. Fazemos uma

leitura dos números e percebemos que as famílias não conseguiram pagar mais de 500 milhões de euros de

prestações. Isto é adiar um problema que temos em cima da mesa. A pergunta que fazemos é a seguinte: o que

é que o Governo está a preparar para quando terminarem estas moratórias? O problema destas famílias existe

e o que se exige, neste debate, é que o Governo apresente as devidas soluções.

Depois, temos os sonhos socialistas. Em revelações recentes, o Sr. Primeiro-Ministro, Dr. António Costa,

dizia que tem como objetivo uma proposta para celebrar os 50 anos do 25 Abril, que consiste em, no ano 2024,

Página 14

I SÉRIE — NÚMERO 27

14

termos erradicado da sociedade portuguesa situações de habitação indigna. Pergunto: este mesmo Primeiro-

Ministro não foi presidente de uma câmara e não sabe as condições em que vivem as pessoas nos bairros

sociais e nos bairros municipais? Há casas sobrelotadas, cheias de humidades e de infiltrações, prédios com

elevadores avariados, famílias completamente abandonadas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, por favor.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Vou terminar já, Sr. Presidente. Depois, vem dizer que quer erradicar situações de habitação indigna! É absolutamente notável!

O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Vou já terminar, Sr. Presidente. Importa recordar que António Costa, Primeiro-Ministro, que, hoje, diz querer erradicar, em três anos,

situações de habitação indigna, é o mesmo António Costa, Presidente da Câmara, que meteu na gaveta

qualquer política de habitação pública.

Deste Governo, o que temos? Propaganda, propaganda e propaganda!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra, pelo PAN, a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo aqui presentes: Hoje, debatemos uma matéria que tem implicações não só decorrentes desta crise sanitária,

nomeadamente na habitação, mas também de um problema estrutural cuja resolução, muito antes desta crise,

vinha sendo empurrada e adiada por sucessivos Governos. São problemas estruturais que esta crise apenas

veio agravar e evidenciar.

Um desses problemas estruturais que não podemos ignorar é o da falta de habitação a custo acessível para

os jovens. Em 2017, numa altura de expansionismo económico, mais de 63% dos nossos jovens entre os 18 e

os 34 anos viviam em casa dos pais, a habitação própria era já então um sonho difícil de alcançar. Hoje, este

cenário será previsivelmente mais grave, uma vez que sabemos que a crise sanitária trouxe um aumento

galopante do desemprego jovem.

As causas deste cenário são diversas. Desde logo, o facto de termos um mercado de trabalho que, seja pela

sua estrutura, seja pela legislação laboral, incentiva um modelo de baixos salários assente na generalização dos

estágios profissionais, muitas vezes não remunerados, e de vínculos sem estabilidade. Mas, naturalmente, não

podemos ignorar a insuficiência das políticas públicas de promoção da habitação jovem, cujo foco

governamental está na atribuição de competências ao domínio municipal e no programa Porta 65, que é

manifestamente insuficiente na sua duração e que ignora a absoluta desregulação do mercado. Ignora, também,

a devida articulação com outras políticas públicas, nomeadamente em matéria laboral e formativa, porque

combater a falta de acesso à habitação é combater a precariedade e a pobreza que assola as pessoas do nosso

País.

Voltando à questão da desregulação do mercado, esta tem razões que não podem também ser postas de

lado e que devem ser combatidas, como é o caso da promoção de um turismo absolutamente insustentável, que

marcou os últimos anos no nosso País, e promotor da gentrificação, correndo com as pessoas das suas cidades,

ou o caso dos programas dos vistos gold, criados também pelo PSD e pelo CDS, que nada trouxeram para a

economia produtiva do País e que artificializaram o preço do imobiliário em cidades como Lisboa e Porto e em

regiões como a do Algarve, entre outras.

Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, no debate que fazemos hoje, não podemos dizer, efetivamente, que temos

as gerações mais qualificadas de sempre e que reconhecemos o seu papel para, depois, dizermos que

reconhecemos esse mérito com mais anos de permanência na casa dos pais, à espera da hora da emancipação.

Não é isso que merecem os nossos jovens e menos ainda deve ser isso o que temos para lhes oferecer!

Sr.ª Secretária de Estado, é importante sabermos quando vai, efetivamente, o Governo perceber que não há

uma política pública de promoção da habitação jovem eficaz sem um modelo que garanta uma legislação laboral

que incentive vínculos estáveis e que garanta que o dinheiro público serve para financiar empresas que

Página 15

5 DE DEZEMBRO DE 2020

15

promovam boas práticas em matéria laboral. Quando vai, de facto, o Governo cumprir o Orçamento do Estado

e tirar, por exemplo, os vistos gold de cidades como Lisboa e Porto, para que as pessoas possam fixar-se nas

suas áreas metropolitanas?

Olhemos para os riscos que os problemas estruturais da habitação têm trazido no contexto desta crise

sanitária.

Não podemos deixar de descurar o facto de a perda de rendimentos se ter agravado de forma bastante

relevante, aumentando, em contrapartida, o desemprego, sendo impossível não termos, hoje, presente a

realidade das pessoas que se encontram numa situação muito vulnerável, de extrema pobreza ou de privação

material, como as pessoas em situação de sem-abrigo. Há uma ausência de respostas estruturadas, ano após

ano, para garantir o seu direito a uma casa, algo que, reiteradamente, vimos aqui dizer que é lei fundamental e

que decorre de um dos basilares da nossa Constituição, mas que teima em não sair do papel.

Por proposta do PAN, conseguimos que o Orçamento do Estado de 2020 e 2021 representasse avanços

nesta matéria, mas falta-nos ainda apostar na prevenção, evitando que mais pessoas venham a cair na pobreza

ou fiquem a viver em situação de sem-abrigo. Tal é incompreensível, atento o vasto património que o Estado

detém e que devia e podia recuperar para garantir uma maior oferta de habitação seja para os jovens, seja para

os mais vulneráveis, seja para os migrantes, com o programa das rendas acessíveis.

Temos todos um caminho a fazer e está na hora de, de facto, sair um compromisso forte do Governo, mas

também desta Assembleia da República, para que não sejam rejeitadas iniciativas que visam garantir o que é

da mais elementar justiça: o direito à habitação para todas e para todos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não sei se há palavras, mas tempo não há, de certeza, para dizer tudo o que era preciso sobre o PSD, que, além de ter votado,

sistematicamente, contra as propostas do PCP em matéria de habitação, é exatamente o partido da «lei dos

despejos», da destruição do IHRU,…

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — É falso!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … do abandono das populações em matéria de habitação e que, agora, fala como se fosse o campeão das políticas de habitação.

Vozes do PCP: — Bem lembrado!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Até parece pessoal de esquerda, que veio para aqui reclamar! O que também não podemos deixar de observar é que é grave que aquilo que está hoje a acontecer não

mereça da parte do poder central a resposta que deve ter, quando há milhares e milhares de pessoas que

precisam de casa porque não têm uma habitação condigna. E esse problema vem de trás. Antes de haver crise

pandémica, já havia problemas graves de habitação no País. Acrescenta-se a crise pandémica e, além dos

milhares de pessoas que não têm uma habitação condigna e que precisam de uma casa em condições,

humanas, para viver, há milhares de pessoas que têm casa e que podem ficar sem ela. Há milhares de

problemas de habitação que estão a aparecer agora.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Mas o Governo é vosso!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quando colocámos a questão de manter, em 2021, o regime de proteção aos inquilinos, que está em vigor até 31 de dezembro, e propusemos que esse regime continuasse para 2021, essa

proposta foi chumbada com votos contra do PS, do PSD e do CDS. Repito, com votos contra do PS, do PSD e

do CDS!

Protestos do PSD.

Página 16

I SÉRIE — NÚMERO 27

16

Propusemos a continuidade desse regime para não deixar as pessoas desprotegidas já a partir de 1 de

janeiro e os senhores quiseram que ele acabasse no fim deste ano.

Em relação aos meios e à capacidade de resposta do IHRU, o Governo não deve deixar esta questão sem

resposta. É importante tomar medidas imediatas para que, a nível do IHRU, haja capacidade para fazer face às

necessidades.

Também em relação ao reforço de verba do programa Porta 65 Jovem, PS e PSD, em conjugação,

chumbaram a proposta que o PCP apresentou.

Em relação ao esforço financeiro exigido aos municípios, Sr.ª Secretária de Estado, dos seis acordos de

colaboração concluídos, que surgem na informação dada pelo Governo, com um investimento total de 486

milhões de euros, 307 milhões de euros ficam para a fatura dos municípios.

O Sr. Presidente: — Peço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Termino, Sr. Presidente. Sr.ª Secretária de Estado, isto não é maneira de resolver os problemas, tendo em conta a responsabilidade

que incumbe ao poder central, nos termos da Constituição.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Carlos Pereira, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Entre a intervenção de lágrimas de crocodilo da Sr.ª Deputada Filipa Roseta e o «comício 325» que o Sr. Deputado Carlos Silva sacou do baú, de

vários que lá tem e que tem feito nesta Assembleia,…

O Sr. Carlos Silva (PSD): — É um elogio!

O Sr. Carlos Pereira (PS): — … gostava de fazer alguns comentários, que me parecem muito importantes. Primeiro, deixando de lado a enorme contradição, que me parece muito evidente, diria mesmo, o mergulho

na contradição por parte da Sr.ª Deputada Filipa Roseta, o essencial, neste debate, foi pedir que o Governo se

despache com o programa nacional de habitação, cuja exigência, curiosamente, só pode ser feita porque existe

uma lei de bases feita por este Governo e por este partido, lei que a Sr.ª Deputada e o seu Governo votaram

contra.

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

Acho que a Sr.ª Deputada tem de procurar mais inspiração. Devo dizer que até estou surpreendido, porque

tem facilidade de o fazer. É quase insólito, estranho, que não o tenha feito, que não tenha procurado mais

inspiração! Isso merece ser sublinhado.

Sr.ª Deputada, quanto às suas intervenções sobre o programa nacional de habitação e sobre aquilo que diz

que o PS nada fez, diria que há uma espécie de desejo grotesco de que aquilo que não é nada assim seja

mesmo assim. Explico — os ingleses dizem isto bem: é uma espécie de wishful thinking, a Sr.ª Deputada gostava

que fosse assim. Mas eu e o Grupo Parlamentar do PS não nos intrometemos em dores de alma. A única coisa

que vamos dizer — e que a Sr.ª Secretária de Estado já referiu e eu quero sublinhar — é que o Partido Socialista

não faz nenhuma travagem a todo o apoio e a todos os meios que tem dado, enfim, a todas as políticas que tem

implementado no quadro da habitação.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Desengane-se, Sr.ª Deputada. Nós não vamos parar com o apoio que temos dado.

Página 17

5 DE DEZEMBRO DE 2020

17

Termino, Sr. Presidente,…

O Sr. Presidente: — Rapidamente, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — … deixando uma nota ao Bloco de Esquerda: eu e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista achamos que há uma linha, ou várias linhas, ou mesmo um muro que separa o Bloco de

Esquerda do PSD.

A minha alma cristã continua à espera, com paciência,…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou largamente o seu tempo. Faça favor de terminar.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — … que o Bloco de Esquerda volte a apoiar as políticas públicas de apoio à habitação, para as quais contribuiu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação, Marina Gonçalves.

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria, muito sucintamente, referir que, sem prejuízo da continuidade das políticas públicas de habitação que estão em cima da mesa e que

foram aprovadas para 2021 — e que certamente continuaremos —, apresentaremos também o programa

nacional de habitação, que não vai suspender o investimento em habitação.

Há, obviamente, o compromisso e a disponibilidade de perceber quais são os instrumentos necessários, a

curto prazo, para responder à pandemia face à urgência e ao imediatismo de respostas para a população, para

salvaguardar que todos tenham direito à habitação — essa é uma preocupação nossa e estamos disponíveis

para ver quais são os mecanismos mais eficazes de resposta à população —, mas, sem prejuízo disso, quero

mesmo salientar que não vai haver nenhuma suspensão daquilo que é a política pública de habitação.

Por outro lado, traremos a este Parlamento os instrumentos que queremos rever e alguns dos instrumentos

que estão, neste momento, em execução, nomeadamente o programa Porta 65 — e estou a tentar responder à

questão que se colocou —, no sentido de reformular o programa e de tentar dar uma resposta mais eficaz aos

problemas dos mais jovens.

O Sr. Presidente: — Tem ainda a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: No final deste debate, gostava de retomar o guião de reforma do Estado de 2013, onde PSD e CDS espelhavam o seu mantra. Passo a citar: «(…)

adquirem especial significado a reforma do Código do Trabalho e a reforma da Lei do Arrendamento, pelo

impacto que têm na mobilidade dos mercados laboral e habitacional.» Vangloriava-se, assim, o Governo das

direitas do tapete que tirou a milhares de pessoas! Foi o próprio Tribunal Constitucional a pôr em causa alguns

dos pressupostos destas leis insensíveis e, até, criminosas.

Sr. Deputado Carlos Pereira, de facto, o caminho tem de ser outro. E tem de ser outro quer nas questões

habitacionais, quer nas questões laborais. O Bloco de Esquerda não tem falhado a esse compromisso, temos é

alguma reticência relativamente àquilo que o Partido Socialista tem proposto no âmbito da mobilidade quer na

Lei do Arrendamento, quer na lei laboral. Esse caminho, sim, tem de ser alterado.

O desafio que se coloca é o de responder a quem cá habita e a quem cá trabalha. Pergunto: está o Partido

Socialista disponível para, finalmente, responder e contrariar esta sonda de mobilidade que a direita trouxe ao

nosso País? A isto, sim, é importante responder.

Aplausos do BE.

Página 18

I SÉRIE — NÚMERO 27

18

O Sr. Presidente: — Para concluir o debate, tem a palavra a Sr. Deputada Márcia Passos, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal tem mais de 100 anos de políticas públicas de habitação, mas não pode continuar a pensar, Sr.ª Secretária de

Estado, como em 1918 e a construir sem critérios só para responder a modelos que muitas vezes não passam

do papel. Vou citar alguns. Programas como o Da Habitação ao Habitat, o Porta ao Lado ou o Mobilidade

Habitacional são apenas alguns exemplos que não sabemos do que se trata, não sabemos que efeitos práticos

é que tiveram na vida dos portugueses.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — E sim, Sr. Deputado Hugo Costa, defendemos que quem não precisa de casa deve entregar a chave. É verdade, Sr. Deputado! Porque não é possível continuar a sustentar famílias e

mais famílias que deixam de precisar do apoio do Estado. Esse é um dos problemas do Governo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Esse é um dos problemas porque, neste momento, não temos casas para responder à classe média, que vai precisar delas já em janeiro. O problema é a falta de fiscalização, o problema

é não conseguir acompanhar quem cumpre, quem não cumpre e porque é que não cumpre e de auxiliar quem

precisa no momento em que precisa.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — É urgente alterar o paradigma da habitação pública em Portugal. Não pode continuar a ser uma habitação apenas e só para os mais desfavorecidos. Tem de ser uma habitação inclusiva,

que ajude as famílias quando elas precisam, que apoie, que auxilie, que dê a mão, mas que um dia as deixe

caminhar sozinhas, que um dia lhes permita fazer isso.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — E aí, sim, entrega a chave, entrega a casa, porque a casa é necessária para outras famílias, que tanto estão a precisar.

Aplausos do PSD.

E sim, Sr. Deputado do PCP Bruno Dias, nós não conseguimos perceber de que pressupostos é que os Srs.

Deputados partem para invocar que são os senhorios que têm de continuar a sustentar e a apoiar aquilo que o

Governo não faz.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Há quem não pague desde março de 2020, Sr. Deputado. Conseguimos prorrogar até 31 de dezembro de

2020 os efeitos da cessação de contrato,…

Continuação de protestos do Deputado do PCP Bruno Dia.

… mas não é possível continuar com este estado de coisas, porque doseamos os lados da relação jurídica

de um contrato.

Página 19

5 DE DEZEMBRO DE 2020

19

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Diga a verdade!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Há famílias que precisam das rendas para sustentar os seus filhos e restantes familiares.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Isto tem de ser dito.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Diga a verdade!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Os Srs. Deputados têm de partir de outro pressuposto, porque os senhorios não são Governo nem têm a função que é do Estado.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Sr.ª Secretária de Estado,…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, já excedeu o seu tempo.

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente. Sr.ª Secretária de Estado, se o Governo não sabe como fazer, como até parece que assumiu aqui, olhe para

os programas do PSD, que são concretos,…

O Sr. Hugo Costa (PS): — Zero!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — … são sustentáveis e são de inclusão social.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao fim do primeiro ponto da ordem do dia. Passamos ao segundo ponto, com a discussão conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 63/XIV/2.ª

(GOV) — Procede à suspensão excecional de prazos associados à sobrevigência e caducidade de convenção

coletiva de trabalho e dos Projetos de Lei n.os 10/XIV/1.ª (PCP) — Repõe o princípio do tratamento mais

favorável, elimina a caducidade da contratação coletiva e regula a sucessão de convenções coletivas de trabalho

(décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro), 74/XIV/1.ª

(BE) — Promove a contratação coletiva, procedendo à décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado

pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e 130/XIV/1.ª (PEV) — Consagra a reposição do princípio do tratamento

mais favorável ao trabalhador e a eliminação da caducidade da contratação coletiva (décima sexta alteração ao

Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro).

Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação

Profissional, Miguel Cabrita.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional (Miguel Cabrita): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta que hoje aqui apresentamos vem suspender, de modo transitório,

a contagem de prazos de caducidade e sobrevigência dos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.

O objetivo é claro e assumido. A negociação coletiva recuperou, nos últimos anos, dinamismo, mas, durante

a maior pandemia dos últimos 100 anos, é importante agir preventivamente para impedir lacunas na cobertura

da contratação coletiva.

Página 20

I SÉRIE — NÚMERO 27

20

Assim, para um período excecional, propomos uma resposta excecional: a suspensão transitória, durante 24

meses, dos prazos associados à caducidade. E propomos que fiquem sujeitas a esta suspensão não apenas

novas denúncias que possam surgir, mas também a contagem de prazos em processos já em curso.

É, portanto, uma medida com impacto imediato e impacto preventivo. Imediato, porque suspende os prazos

de caducidade já em curso, que impactam sobre dezenas de milhares de trabalhadores. Mas, sobretudo,

preventivo, porque dissuade novas denúncias, protegendo milhões de trabalhadores, para permitir atravessar,

com estabilidade, com segurança, na negociação coletiva, o período de crise e de recuperação que

atravessaremos.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo tem vindo a lançar apoios sólidos e extraordinários de

resposta à pandemia, instrumentos de apoio às empresas, à manutenção do emprego, à proteção social e dos

rendimentos das pessoas. A proposta que hoje aqui defendemos é a peça desta estratégia referente à defesa

da negociação coletiva num período de reconhecida dificuldade.

Os contornos singulares da crise pandémica e os fatores excecionais que lhe estão inerentes justificam a

prevenção de externalidades negativas sobre aspetos fundamentais do nosso modelo de relações laborais e do

mercado de trabalho, como sejam o diálogo social e a negociação coletiva. Isto porque a cobertura e dinâmica

de negociação coletiva é influenciada por diferentes variáveis: pelos ciclos económicos, claro, sendo as crises

momentos de particular risco, mas também pelo enquadramento e pela regulação legal ou o uso de instrumentos

como as portarias de extensão.

Como todos recordamos, na primeira metade da última década houve uma acentuada perda de dinamismo

da negociação coletiva. Foi fruto não apenas da conjuntura económica difícil, mas também de uma estratégia

deliberada do Governo de então, o Governo PSD/CDS, para desvalorizar a negociação coletiva e para promover

a instabilidade e a precariedade no mercado de trabalho.

Aplausos do PS.

Estes tempos ficaram para trás. Assistiu-se, nos últimos anos, a uma recuperação progressiva e sustentada,

não só do número de convenções publicadas, mas também, e em particular, da sua cobertura anual, que andou

perto de 1 milhão de trabalhadores por ano, quatro vezes acima dos anos negros de 2013 e 2014. Esta

recuperação ocorreu num quadro de confiança e de recuperação da economia, mas também de valorização

expressa da qualidade do emprego, do diálogo social e da negociação coletiva. O primeiro trimestre de 2020

confirmava amplamente e reforçava esta trajetória.

Porém, a pandemia interrompeu, de um dia para o outro, bruscamente, esta trajetória de crescimento

económico e criou, de modo totalmente inesperado, uma crise, de magnitude e contornos excecionais, desde

logo, pela incerteza sobre a evolução da própria pandemia. A negociação coletiva ressentiu-se, naturalmente,

no segundo e no terceiro trimestres.

É por isso que, tendo presente que em períodos de crise a retração da confiança e das perspetivas se traduz

numa menor propensão para a negociação e para a sua renovação, queremos impedir e prevenir um eventual

aumento das situações de denúncias de convenções e de surgimento de lacunas na cobertura, sem com isso

prejudicar o dinamismo futuro na renovação das convenções.

Por isso, e para uma situação excecional, respostas excecionais.

E, contrariamente ao que sucedeu na crise anterior, em que nada foi feito para defender a qualidade do

emprego ou a dimensão coletiva das relações de trabalho, antes pelo contrário,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Mentira!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional: — … defendemos que a resposta do País à crise de hoje se deve pautar por princípios diferentes, pelos princípios da qualidade do

emprego e do trabalho e pelo reafirmar da importância da dimensão coletiva das relações de trabalho.

É esta a nossa estratégia, é este o nosso compromisso, é este o espírito e a letra desta proposta de lei.

Aplausos do PS.

Página 21

5 DE DEZEMBRO DE 2020

21

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do PCP.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Foi a luta dos trabalhadores, a sua ação reivindicativa organizada a partir dos locais de trabalho que deu origem à contratação

coletiva, direito fundamental dos trabalhadores, consagrado no artigo 56.º da nossa Constituição da República.

É por isso de um direito constitucional dos trabalhadores que falamos, quando falamos de contratação

coletiva. E é este mesmo direito que está em causa com a caducidade da contratação coletiva.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A contratação coletiva é um meio através do qual se impede a imposição

unilateral da vontade do patrão nas relações do trabalho. É um instrumento indispensável para uma melhor

distribuição da riqueza. Fixa salários, diuturnidades, pagamento de trabalho suplementar e noturno, subsídio de

turno, pausas, descanso suplementar, majoração de dias de férias. Contém regulação e regulamentação do

horário de trabalho e sua organização, do trabalho noturno, das categorias profissionais, dos conteúdos

funcionais, entre outros aspetos das relações de trabalho.

A contratação coletiva garante direitos acima do que está previsto no Código do Trabalho, francamente mais

favoráveis aos trabalhadores.

Por isso mesmo, tem sido alvo de um ataque sistemático por parte das associações patronais e de sucessivos

Governos, apostados numa individualização e numa precarização das relações laborais.

Importa lembrar que foi pelas mãos de um Governo PSD/CDS que, em 2003, foi publicado o Código do

Trabalho, que resultou na admissão da caducidade das convenções coletivas, bem como na eliminação do

princípio do tratamento mais favorável.

Desde logo, o patronato, que nunca se conformou com a perda do poder unilateral de ditar as regras nas

relações de trabalho, empenhou-se numa queda significativa do número de contratos acordados e, sobretudo,

numa brutal diminuição do número de trabalhadores abrangidos pela contratação coletiva, agravando a sua

desproteção.

Desde então, todas as revisões ao Código do Trabalho, feitas às mãos de Governos do PS, do PSD e do

CDS, pioraram este diploma, dificultaram o efetivo exercício do direito de negociação coletiva, ao mesmo tempo

que abriram portas à eliminação de outros direitos.

Falamos também de um bloqueio generalizado da negociação coletiva, incluindo a recusa de negociação por

parte das associações patronais e chantagem sobre os sindicatos nas negociações, recusando aumentar

salários se os sindicatos não aceitarem a redução de direitos.

Se, em 2003, antes da alteração ao Código do Trabalho, a renovação da contratação coletiva abrangia 1

milhão e 500 mil trabalhadores, entre 2012 e 2014 não chegavam a 300 000 os trabalhadores abrangidos. Entre

2016 e 2019 estarão abrangidos cerca de um terço dos trabalhadores declarados nos quadros de pessoal,

números longe dos que existiam em 2003.

Ao contrário do que foi afirmado, estas normas não dinamizaram a contratação coletiva. Há menos contratos,

menos trabalhadores envolvidos. Nunca mais foram atingidos os números existentes em 2003.

Hoje, estão excluídos da contratação coletiva e dos direitos que esta consagra centenas de milhares de

trabalhadores no nosso País.

Hoje, o patronato tem a liberdade de fazer caducar uma convenção coletiva, se assim o entender. Basta não

negociar, de facto, e utilizar recursos vários e diferentes expedientes, como a apresentação de propostas

inferiores ao que a lei geral estipula, a pressão para publicação de avisos de caducidade e a alteração de

estatutos de associações patronais para não negociar a contratação coletiva. Tudo isto para aniquilar o princípio

do direito legal e constitucional de negociação da contratação coletiva.

É a utilização da caducidade como instrumento de chantagem sobre os sindicatos e os trabalhadores, para

retirar direitos.

Em outubro deste ano, trabalhadores das indústrias alimentares exigiam o direito à negociação da

contratação coletiva e melhores salários. A maioria dos contratos coletivos do setor não são revistos há mais de

10 anos e, por isso, a esmagadora maioria dos trabalhadores recebe apenas o salário mínimo nacional. Em

novembro deste ano, no setor químico, exigia-se que as associações patronais retomassem as negociações

para revisão do contrato coletivo de trabalho.

Página 22

I SÉRIE — NÚMERO 27

22

Estes são exemplos que demonstram a urgência da eliminação da caducidade da contratação coletiva.

Impõe-se acabar com a caducidade. Garantir que um contrato é substituído por outro livremente negociado.

Como urge também repor o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador.

É da defesa de direitos dos trabalhadores e da melhoria das suas condições de trabalho que falamos.

São essas as propostas que o PCP aqui apresenta.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de lei do BE, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A contratação coletiva é um dos direitos democráticos mais importantes no nosso País, mas também um dos que mais tem sido atacado nas últimas

décadas.

A contratação coletiva foi um instrumento que permitiu progresso no nosso País e direitos para quem

trabalha. Ela é tão mais importante quanto permite ajudar a equilibrar uma relação desigual: a relação entre

empregador e trabalhador. Este último está numa posição de desvantagem, mas os mecanismos de

sindicalização e negociação coletiva foram, historicamente, no nosso País, essenciais para conseguir avanços.

No entanto, após várias alterações ao Código do Trabalho nos últimos anos, a lei atualmente permite que as

convenções coletivas caduquem por decisão unilateral dos patrões, sucedendo-lhes um vazio.

Esta instituição de um processo rápido e fácil para as entidades patronais determinarem o fim das

convenções coletivas, bem como a não consagração plena do princípio do tratamento mais favorável ao

trabalhador, desequilibraram profundamente as relações laborais, instituíram uma dinâmica de chantagem nas

negociações, contribuíram para degradar o conteúdo das novas convenções e limitaram o número de

trabalhadores protegidos pela contratação coletiva.

Com as alterações feitas, passámos de ter quase 2 milhões de trabalhadores abrangidos por contratação

coletiva em 2008, para 250 000 em 2014. Em 2019, o número subiu para 900 000, mas claramente ainda muito

abaixo dos números anteriores à crise e às políticas da austeridade.

Infelizmente, o entendimento de reformas estruturais para responder às crises tem sido mexer no Código do

Trabalho para piorar as condições de quem trabalha no nosso País. E, apesar de uma inversão desse caminho

na Legislatura passada, o PS e o Governo continuam sem conceder qualquer reversão das medidas impostas

pela troica no Código do Trabalho.

A situação é tão paradigmática que o Governo apresenta, agora, uma nova moratória à caducidade da

contratação coletiva. Ora, se o problema existe e é admitido pelo próprio Governo, por que razão não se retira,

definitivamente, esta norma? Temos tido este debate nas últimas semanas, e o Governo continua a não

conseguir ter uma única justificação viável para esta opção.

Por que razão insiste o Governo em não garantir também em pleno o princípio do tratamento mais favorável?

Falamos tão apenas de nenhum trabalhador poder ter condições inferiores ao que está instituído no Código do

Trabalho.

Sem estas duas alterações tão básicas, mas tão importantes, continuaremos a ter a degradação da

quantidade, mas também e, sobretudo da qualidade dos contratos coletivos.

Reequilibrar as relações de trabalho é condição de justiça para quem trabalha, e é isso mesmo que hoje aqui

propomos. Não propomos moratórias ou tentativas de «sacudir a água do capote» e fingir que não há um

problema. Nem tão-pouco podemos continuar a retirar ao Parlamento a sua competência e o seu papel no que

toca à legislação do trabalho.

Num momento de crise como o que atravessamos e que com certeza ainda iremos atravessar durante algum

tempo, é fundamental termos mecanismos de defesa do trabalho com direitos no Código do Trabalho.

O problema da caducidade, não sendo excecional porque vem de trás, tem de ter soluções definitivas.

Fizemos esta pergunta várias vezes, nas últimas semanas, ao Governo, à Ministra do Trabalho: qual é a

justificação que tem para dar aos milhares de trabalhadores para não aceitar a retirada do fim unilateral da

caducidade do Código do Trabalho? Não conseguiu dar uma única resposta!

Página 23

5 DE DEZEMBRO DE 2020

23

Esperemos que essa resposta possa chegar através da aprovação do projeto de lei que o Bloco de Esquerda

aqui apresenta e que responde efetivamente a um problema concreto, que vem de trás e que precisa

urgentemente de uma solução.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de lei do PEV, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As alterações que a legislação do trabalho foi conhecendo ao longo das últimas décadas, trouxeram elementos

muito negativos para os trabalhadores, tanto do setor privado como da Administração Pública, e vieram acentuar

o desequilíbrio nas relações laborais, com grave prejuízo para quem trabalha.

Como é perfeitamente visível, o Código de Trabalho de 2003 veio enfraquecer aspetos fundamentais do

direito de contratação coletiva, principalmente no que diz respeito à introdução da caducidade das convenções

coletivas de trabalho, mas também com a faculdade de essas convenções poderem fixar regras menos

favoráveis do que aquelas que estão consagradas na lei.

É uma situação que coloca, assim, em causa o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador e que

contraria a própria natureza das convenções coletivas de trabalho, uma vez que estas visam também

estabelecer condições de trabalho mais favoráveis ao trabalhador do que aquelas que resultam da aplicação

das leis laborais.

De facto, a caducidade da convenção coletiva — sejam os contratos coletivos de trabalho, sejam os acordos

coletivos e acordos de empresa negociados entre empregadores e representantes dos trabalhadores —,

representou uma forte limitação ao direito fundamental de contratação coletiva e uma inadmissível restrição à

liberdade negocial das partes.

Na prática, esta fórmula colocou nas mãos do empregador um instrumento de pressão, intencionalmente

destinado a impor a sua vontade, em detrimento dos direitos e interesses de quem trabalha.

Quer isto dizer que às entidades patronais foi-lhes permitida a possibilidade de, em caso de recusa de

negociação, poderem fazer caducar os contratos coletivos de trabalho. A alternativa passou a ser a caducidade

ou a perda de direitos para os trabalhadores.

Ora, como era previsível, estas alterações, no seu conjunto, desequilibraram as relações laborais,

estimularam os despedimentos, colocaram as pessoas a trabalhar mais e a ganhar menos e, sobretudo,

colocaram os trabalhadores numa relação de maior fragilidade em relação aos empregadores.

E como é facilmente percetível, estas alterações ou opções, para além das situações dramáticas que

provocaram, do ponto de vista social e para quem trabalha, não só não vieram resolver nenhum dos nossos

problemas, como ainda os agravaram.

Falamos das alterações de 2003, com o PSD e o CDS, mas também das alterações em 2009, com o PS, e

em 2012, novamente com o PSD e o CDS.

Também na última Legislatura, com o Governo minoritário do PS, esse agravamento não só foi mantido

como, com o apoio do PSD e do CDS, foi acentuado.

Como se vê, estas opções foram assumidas ao longo dos tempos por sucessivos Governos e têm

permanecido no nosso ordenamento jurídico e, naturalmente, sem esquecer várias outras normas em matéria

laboral que também exigem ser alteradas, importa, desde já, corrigir estes erros e injustiças concretas.

É exatamente esse o propósito da presente iniciativa legislativa que Os Verdes hoje apresentam, propondo

alterações ao Código do Trabalho, no sentido de proceder à reposição do princípio do tratamento mais favorável

ao trabalhador, assim como eliminar a caducidade da contratação coletiva e regular a sucessão de convenções

coletivas de trabalho.

Falamos de medidas da mais elementar justiça que pretendem contribuir para a valorização do trabalho e

para a substancial melhoria dos direitos e das condições de vida dos trabalhadores. Aliás, a iniciativa que o

Governo aqui nos traz é o reconhecimento expresso da injustiça das regras atuais da caducidade das

convenções coletivas, mas indicia, ao mesmo tempo e tacitamente, a falta de coragem do Governo para não

Página 24

I SÉRIE — NÚMERO 27

24

eliminar definitivamente as regras da caducidade das convenções coletivas de trabalho, suspendendo-as

excecionalmente.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.

O Sr. Presidente: — Bom dia, Sr.as e Srs. Deputados. A próxima intervenção cabe à Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A contratação coletiva é, sem dúvida, um mecanismo insubstituível para assegurar dinâmica nas relações laborais

com garantia de direitos e condições de trabalho dignas.

O PAN defende que se deve fomentar a contratação coletiva, sendo que esta pode ser, por exemplo, uma

via de desenvolvimento e aprofundamento das regras laborais em matéria de teletrabalho. Esse aprofundamento

poderia trazer uma clarificação benéfica para empregadores e trabalhadores, mas, infelizmente, todos sabemos

que não ocorreu.

Ao longo desta crise sanitária, o PAN tem norteado a sua ação pela defesa do princípio de que ninguém pode

ser deixado para trás, mas o não deixar ninguém para trás é, entre outras coisas, assegurar precisamente a

sustentabilidade e a viabilidade das empresas, sem que isso traga mais precariedade nas relações laborais ou

retrocessos nos direitos, garantias, salários e proteção dos trabalhadores.

Por isso mesmo, esta proposta de suspensão excecional de prazos de sobrevigência e caducidade das

convenções coletivas de trabalho, que hoje nos é trazida pelo Governo, assume-se como positiva e terá, por

isso, o nosso acordo na generalidade, uma vez que é uma forma de assegurar maior estabilidade e

previsibilidade das relações laborais e uma forma de evitar que a crise sanitária seja um álibi para o corte de

direitos.

Contrariamente ao que se possa pensar, esta medida não põe em causa o dinamismo da economia

portuguesa ou a viabilidade das empresas, uma vez que, em 2017, o Governo adotou uma medida similar a esta

que hoje discutimos e as críticas, que hoje vemos repetidas, mostraram-se erradas.

O que vimos na altura foi que, embora fosse possível ir mais longe no combate à precariedade, não existe

nenhuma correlação direta entre desproteção social dos trabalhadores e maior dinamismo económico, e ainda

que é possível um crescimento económico sem cortes nos direitos laborais.

Mas, nesta ocasião, não podemos deixar de mencionar que o prazo de vigência da suspensão, fixado pelo

Governo nos 24 meses, é um critério para a fixação do prazo que é impercetível e parece ser desequilibrado

para o lado do empregador. Nesta, como noutras medidas de proteção em contexto de crise sanitária, o PAN

defende que não se deverá adotar prazos demasiado rígidos e fechados, sob pena de posteriormente se virem

a revelar excessivos ou insuficientes.

Por isso mesmo, para o PAN, o prazo deveria ter por referência o período das fases de prevenção, contenção,

mitigação e tratamento de infeção epidemiológica por COVID-19, bem como a reposição da normalidade na

sequência da mesma. Faremos esta proposta em sede de especialidade, esperemos que prevaleça uma lógica

de proteção que equilibre os dois lados da relação laboral.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Para o Iniciativa Liberal as convenções coletivas de trabalho são importantes para a regulamentação e regulação

das relações laborais. São importantes, sobretudo, porque representam a articulação negociada dos interesses

de trabalhadores e empregadores. São acordos que resultam da livre vontade de partes com poderes negociais

equilibrados.

Mas, para os partidos de extrema-esquerda, já se sabe que os acordos só são para cumprir quando dá jeito

e, mais uma vez, vêm aqui defender que basta a vontade de uma parte para que uma convenção se eternize.

O que as propostas do Bloco, do PCP e do PEV fazem é ignorar por completo o papel dos empregadores na

relação laboral.

Página 25

5 DE DEZEMBRO DE 2020

25

Por isso, opomo-nos à eliminação da caducidade da contratação coletiva e à eternização dos instrumentos

desta contratação.

Quanto à proposta do Governo, baseada numa alegada lacuna evidenciada pela pandemia, ficamos

perplexos. Atualmente, nos termos do Código do Trabalho, uma convenção coletiva de trabalho poderá, após

ser denunciada, vigorar ainda por um período que pode chegar a ser superior a quatro anos e é esse período

que o Governo quer, com a suspensão por 24 meses, aumentar.

Significa isto que o Governo antecipa que a situação excecional e temporária da COVID ainda vai durar mais

dois anos? Nada disto está devidamente justificado na proposta de lei cuja exposição de motivos fala em lacuna.

Pois a única lacuna aqui é a falta de justificação desta proposta e propostas sem justificação merecem o nosso

voto contra.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, do PSD.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Presidente, srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Nesta intervenção, quero fazer uma abordagem por dois pontos. Por um lado, refiro-me aos projetos de lei

apresentados pelo PCP, pelo Bloco e pelo PEV, que são mais do mesmo, revelando sempre a mesma

obstinação em manter e eternizar as convenções coletivas, independentemente das circunstâncias que se vivem

e que não permitem que a concertação social seja uma realidade. A situação das empresas, o mercado de

trabalho, tudo aquilo que são as conjunturas nacionais e internacionais, como iguais que são em sede de

concertação social, não permitem que se possa chegar aos melhores acordos de direitos dos trabalhadores.

Não podemos, também, deixar de dar a seguinte nota: sempre que ouvimos a extrema esquerda falar do fim

da contratação, fala em vazio. Ora, num Estado de direito não existem vazios legais.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Existem o Código do Trabalho e a legislação laboral. Esse é um falso argumento que se ouviu ontem, que se ouve hoje,…

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — É como os do PSD! Também são falsos argumentos!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — … amanhã, todos os dias, e que se repete ad aeternum sem que corresponda à realidade, a não ser que se considere que todos os trabalhadores que estão abrangidos pelo

Código do Trabalho estão à margem da lei…

Vozes do PSD: — Exatamente!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Mas isso seria muito mais grave do que a contratação coletiva, que, aliás, o PSD defende. O PSD defende a contratação coletiva e a concertação social e defende que os parceiros sejam

ouvidos.

Dito isto, Sr. Secretário de Estado, falando da proposta de lei, apraz-me repetir palavras suas: «proteger a

contratação coletiva, defesa da negociação coletiva, diálogo social, estratégia para promover a concertação

social, negociação, situação excecional, resposta excecional».

Sr. Secretário de Estado, falando desta proposta de lei, o Governo comunicou à concertação social este

projeto. Diálogo com todos os parceiros? Zero! Aliás, já nos vem habituando a esta situação! Finge que dialoga

não dialogando e isto tem-se repetido, em sede de concertação social. Foi assim com o anterior Governo e é

assim com este, que é sempre o mesmo, como nós sabemos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Por isso, a pergunta que lhe deixo, desde já, é se vai começar a negociar na concertação social em vez de anunciar aqui palavras vãs que não têm qualquer adesão à realidade? É esta

a pergunta que gostava de lhe deixar.

Página 26

I SÉRIE — NÚMERO 27

26

Assim, e analisando a proposta, Sr.as e Srs. Deputados, a verdade é que o Governo fixa aqui 24 meses, como

poderia fixar qualquer outro prazo, pelos vistos, porque fundamentar não fundamenta.

Poderia o PSD compreender esse prazo se o Governo fizesse uma fundamentação com base no estado de

emergência. Mas não, a verdade é que escolheu 24 meses numa contradição insanável entre os seus

argumentos e aquilo que diz que é a realidade.

Por um lado, diz que é importante o diálogo. Por outro, diz, inclusive na nota que enviou, que «a cobertura

dinâmica da negociação coletiva é influenciada por variáveis, como o enquadramento e regulação legal, por

instrumentos, como as portarias de extensão, mas também pelos ciclos económicos correspondendo a períodos

de crise momentos de particular risco e pressão sobre a contratação coletiva».

Todos nós nos revemos nesta afirmação, Sr. Secretário de Estado, exceto o Governo, pelos vistos.

Risos do Secretário de Estado Adjunto do Trabalho e da Formação Profissional.

E porquê? Porque, por um lado, não dialoga, fixa um prazo arbitrário e não tem em conta a realidade. Mas,

mais: só conseguimos, de facto, entender esta proposta dos 24 meses, que aliás, nos lembra já aquilo que

aconteceu no fim do debate do Orçamento do Estado, como mais uma concessão ao PCP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Claro!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Não se vê de outra maneira.

Aplausos do PSD.

Foi o Orçamento, foi o Congresso e agora, assim muito à pressa, vem mais esta concessão ao PCP, que é

mais uma tentativa de bloquear a contratação coletiva, independentemente das circunstâncias, diga o Governo

o que disser.

Outra coisa que nos parece clara é que o Governo anda um bocadinho perdido e não dialoga. Anda tão

perdido que temos hoje a discussão desta proposta que será votada, sem, sequer, permitir que passe o prazo

de discussão pública.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Vai, de facto, o Governo respeitar a concertação social e ir ao encontro daquilo que é a conjuntura atual ou vai persistir neste erro de favores e abébias — permita-me a expressão —

à extrema esquerda que mais não quer do que acabar com a real concertação social e com a contratação

coletiva?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida, do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje o Governo nos traz é mais um episódio do folhetim Orçamento do Estado.

Portanto, o que hoje está aqui em causa não é nenhuma convicção do Governo que nunca a manifestou até

agora, é mais uma cedência a favor designadamente do PCP, para compensar o voto do PCP no Orçamento do

Estado.

Por isso, e só por isso, é que se justifica que um partido que sempre esteve, tradicionalmente, do lado do

diálogo social e da valorização da concertação social apareça aqui, por um lado, fazendo um dos maiores

ataques a esse diálogo social, no que diz respeito à posição de privilégio de uma das partes, e, por outro,

mostrando um total desrespeito pela concertação social, tentando fazer no Parlamento aquilo que se escusou a

fazer em sede própria.

Página 27

5 DE DEZEMBRO DE 2020

27

Por isso, a proposta que o Partido Socialista nos traz não tem nenhuma outra justificação e não pode

encontrá-la de forma alguma.

Já os projetos que os partidos mais à esquerda do PS trazem têm total justificação naquilo que é a sua visão

ideológica da sociedade e, em concreto, a sua visão ideológica do mercado de trabalho. Não tem problema por

ser ideológica, tem problema por aquilo que o ideológico representa, ou seja, um desequilíbrio total das relações

laborais e em relação ao diálogo social e, se for levado avante, um prejuízo absoluto dos trabalhadores.

Isto porque, esta visão sectária, esta visão antidemocrática das relações laborais, não tem outra

consequência que não seja prejudicar os próprios trabalhadores.

Portanto, aquilo que nós defendemos é uma oposição total a esta visão, que faz as delícias dos partidos mais

à esquerda e da ala mais à esquerda do Partido Socialista, deve também reconhecer-se isto, mas que vai ao

arrepio, por exemplo, do insuspeito ex-Ministro do Trabalho, Vieira da Silva, que, na reforma que fez do Código

do Trabalho, seguiu exatamente o caminho inverso àquilo que propõe agora o Governo.

Portanto, o que dizemos é que, se estas alterações fossem positivas, não tinham registado reservas, por

exemplo, nos pareceres de todos os parceiros sociais que conhecemos na Assembleia da República, à exceção

da CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses), em relação à forma como este processo está

a ser feito.

E merece contradição aquilo que já aqui foi dito sobre a atuação do Governo PSD/CDS, porque o que

aconteceu na contratação coletiva foi uma redução quer em relação ao número de acordos, quer em relação

aos trabalhadores abrangidos, entre 2008 e 2012.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — 2014!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Entre 2008 e 2012 são quatro anos, desses quatro anos o Partido Socialista governou três e o PSD e o CDS governaram um.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira concluir.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente. Por isso, esse enorme decréscimo na contratação coletiva deve-se a esse glorioso Governo de José

Sócrates, do Partido Socialista e a inversão desse ciclo deu-se, entre 2012 e 2015, durante o Governo PSD/CDS.

Risos do Secretário de Estado Adjunto do Trabalho e da Formação Profissional.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira terminar.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ó Sr. Ministro, o gráfico é seu, está a rir-se de si próprio e da figura que hoje aqui está a fazer.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro.

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: De uma forma geral, as propostas que hoje aqui debatemos incidem sobre uma problemática fundamental para o equilíbrio das relações

laborais que se relacionam com a contratação coletiva.

É uma matéria central em democracias maduras, democracias que valorizam o diálogo social, mas nunca

esquecendo, como fez agora na sua intervenção o Sr. Deputado João Almeida, que esta negociação incide

sobre uma mesa onde estão duas partes em condições desiguais, correspondendo o trabalho à parte e à

dimensão mais frágil de uma relação que tem de ser, por isso mesmo, regulada e protegida.

Durante os anos de má memória da governação da qual o Sr. Deputado João Almeida fez parte, o ataque à

contratação coletiva foi uma das formas de promover a desvalorização da proteção no trabalho e de

individualizar e enfraquecer as relações laborais.

Página 28

I SÉRIE — NÚMERO 27

28

Foi também com uma machadada na contratação coletiva que a direita quis promover o seu modelo social

de choque de desvalorização interna, individualizando o fator trabalho, tornando-o mais sujeito a pressões

negativas, por parte dos empregadores, e desvalorizando o seu contributo para dar força setorial aos

trabalhadores, à estabilidade no seu emprego, à proteção dos direitos e ao incremento dos salários.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É mentira! Aumentou!

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — O dinamismo da negociação coletiva está associado ao modo como ela se encontra regulamentada mas também às orientações políticas a esse respeito, não podendo, todavia, ser

desligada inteiramente dos ciclos económicos, porque a retração da confiança e o momento que atualmente

vivemos traduz-se, muitas vezes, numa menor propensão para a negociação, para a sua renovação, podendo

inclusivamente levar a um aumento das situações de denúncia unilateral das convenções coletivas e, por isso,

à verificação de lacunas.

A pandemia veio interromper um ciclo e uma trajetória de estabilidade, crescimento económico e de emprego

e criou, de modo súbito e totalmente inesperado, para todos nós, para os empregadores e para os trabalhadores,

um quadro excecional de crise de uma enorme magnitude e de contornos absolutamente excecionais no tempo

das nossas vidas, desde logo pela incerteza sobre a evolução da própria pandemia.

Portanto, é precisamente neste sentido e com o intuito de garantir a estabilidade das convenções coletivas

que o Governo submete esta proposta à Assembleia da República, a qual visa suspender, de modo transitório

e excecional, a contagem de prazos associados à sobrevigência dos instrumentos de regulamentação coletiva

de trabalho, prevenindo o surgimento de lacunas na cobertura da contratação coletiva, seja pelo esgotamento

dos prazos dos processos de denúncia já iniciados, seja pelo desencadeamento de novas denúncias.

A estabilidade no trabalho e o trabalho digno têm sido das principais dimensões da governação do Partido

Socialista desde 2015. Já conseguimos, com o aumento do salário mínimo, uma valorização acumulada superior

a 25%, já conseguimos o aumento do salário médio, já conseguimos o crescimento geral dos salários e também

já efetuámos alterações às leis laborais — isto não é assunto tabu para nós —, como a que fizemos na

transmissão do estabelecimento, na responsabilização subsidiária das empresas de trabalho temporário, nas

limitações ao próprio trabalho temporário, no fim do banco de horas individual ou na impossibilidade de contratar

um jovem a termo só porque é um jovem.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Com isto, e muito mais, conseguimos uma redução histórica do desemprego, níveis historicamente elevados de contratação estável e, de uma forma geral, o crescimento

generalizado dos salários.

Aquilo que vivemos no atual momento é um choque sem precedentes, mas este choque sem precedentes

não pode, todavia, fazer-nos ignorar o caminho que percorremos, nomeadamente na contratação coletiva que

ganhou um novo fulgor, sob a governação socialista.

O Sr. Deputado João Almeida entende que não, mas houve, de facto, um fortíssimo aumento dos

instrumentos de regulamentação e regulação coletiva publicados entre 2016 e 2019, os quais abrangeram, em

média, 862 000 trabalhadores. Sabe o que é isto, Sr. Deputado João Almeida? É precisamente mais do dobro

da média anual do período entre 2012 e 2015, que foi de 366 000 trabalhadores abrangidos.

Esta dinamização da contratação coletiva permitiu uma grande valorização dos salários. Os trabalhadores

abrangidos por contratação coletiva tiveram uma valorização média superior a 13% e uma valorização real de

cerca de 8%, descontados os fatores da inflação.

A contratação coletiva é, pois, um instrumento poderosíssimo de negociação coletiva, de estabilidade das

relações de trabalho, de valorização dos salários, que tem de ser promovida, nunca ignorando os frágeis

equilíbrios com que lidamos, quando tratamos de matérias laborais.

É isso que o Governo faz, e o PS, naturalmente, acompanha-o, ao promover a suspensão excecional dos

prazos associados à sobrevigência e caducidade. Esperamos que esta proposta possa vir a ser aprovada,

porque esta moratória previne externalidades negativas sobre dimensões consolidadas do modelo de regulação

social e laboral que temos em Portugal, como sejam o diálogo social e a negociação coletiva.

Página 29

5 DE DEZEMBRO DE 2020

29

Por isso, entendemos que esta proposta corresponde à defesa do diálogo social, à contratação coletiva de

cariz setorial e empresarial e, de uma forma geral, àquilo que está inscrito e consagrado na Constituição da

República Portuguesa, em termos de contratação coletiva, não por acaso no capítulo que diz respeito aos

direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores portugueses.

Termino, Sr. Presidente, dizendo que, com a aprovação desta proposta, como esperamos que suceda aqui,

hoje, oferecemos um verdadeiro cinto de segurança às relações laborais, numa altura de grande instabilidade,

oferecendo o tempo necessário a trabalhadores e empregadores para trabalharem outras soluções e para que

o Governo possa também, ele próprio, propor outras alterações em matéria de legislação laboral, sem abrir a

porta à desproteção daquilo que, entretanto, ao longo destes anos, já conseguimos construir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, passamos à fase de conclusão deste debate, seguindo, agora, a ordem inversa das autorias das iniciativas legislativas.

Pergunto ao Sr. Deputado José Luís Ferreira se pretende utilizar o tempo de que ainda dispõe.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Então, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas: No final deste debate, há duas notas que não poderíamos deixar de fazer. Por um lado, as intervenções que a direita parlamentar fez

relativamente àquilo que é a essência da relação laboral, do Código do Trabalho e da necessidade de proteção

dos trabalhadores deveriam fazer qualquer pessoa corar de vergonha.

Srs. Deputados, não é possível que venham aqui dizer que, neste momento, se quer proteger mais o

trabalhador, quando, efetivamente, numa relação laboral, o trabalhador é a parte mais fraca. Daí o Código do

Trabalho ter, de facto, como essência, a proteção do trabalhador. E não se lembraram do diálogo social, não se

lembraram de falar com os sindicatos nem de nenhuma concertação social quando foi a hora de esquartejar

completamente o Código do Trabalho e implementar medidas ao arrepio de tudo aquilo que era o bom senso

nas relações laborais.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira concluir, Sr.ª Deputada, por favor.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente. Só usam o diálogo social quando lhes interessa.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sempre!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, mesmo para terminar, a pergunta que fica neste debate para o PS e para o Governo é esta: se se concorda que a caducidade da contratação é um problema e é um mecanismo

que desprotege os trabalhadores e se já vamos na segunda moratória deste mecanismo, porque não avançar

para uma solução definitiva relativamente ao problema?! Isto é o que os sindicatos e os trabalhadores querem

saber neste momento.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, agora, a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há um exercício e uma questão que se impõem neste momento, aliás, duas questões. Uma é a de saber quem é que ganha com a caducidade da

Página 30

I SÉRIE — NÚMERO 27

30

contratação coletiva e a outra é a de saber quem perde com a caducidade da contratação coletiva. E estes

quase 20 anos da introdução deste elemento, porque ele remonta a 2003, a um Governo do PSD/CDS, têm

demonstrado que quem ganha com a caducidade da contratação coletiva é o patronato,…

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Bem lembrado!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … que bloqueia negociações, que faz chantagem sobre os sindicatos, dizendo que não aumenta salários, se os sindicatos não aceitarem reduzir direitos.

São as associações patronais e o patronato que têm ganho com a caducidade da contratação coletiva,

utilizando, aliás, todo o tipo de mecanismos e de subterfúgios para chantagear os sindicatos e os trabalhadores

e para retirar direitos.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira fazer o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Mesmo para terminar, perdem os trabalhadores, os muitos que não estão abrangidos e os muitos que perderam direitos ao longo de todos estes anos. E o exemplo que demos, na

intervenção inicial, dos trabalhadores da indústria alimentar é bem evidente. Srs. Deputados, são mais de 50

000 trabalhadores que, há 10 anos, não têm revisão da contratação coletiva e a esmagadora maioria leva para

casa o salário mínimo nacional, porque o patronato se recusa a negociar, porque o patronato bloqueia a

contratação coletiva. A esses trabalhadores, os Srs. Deputados não dirigiram, sequer, uma única palavra!

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para encerrar este debate, tem, então, a palavra, em nome do Governo, o Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Creio que, neste debate, devemos distinguir a dimensão conjuntural da dimensão estrutural.

Sobre a dimensão conjuntural, percebo que dar um horizonte de segurança e estabilidade aos trabalhadores

e uma proteção especial aos trabalhadores e aos contratos coletivos existentes, durante dois anos, é algo que

as bancadas do PSD e do CDS não compreendem. Não faz as vossas delícias! Percebo isso perfeitamente,…

Protestos do PSD.

… mas acreditem que os trabalhadores também percebem, e aqueles que defendem a negociação coletiva

percebem-no perfeitamente.

Quanto à dimensão estrutural, gostaria de saudar as propostas que foram aqui trazidas. É sabido que temos,

porventura, algumas divergências no modo como vemos a negociação coletiva, mas uma coisa sabemos:

defendemos todos a negociação coletiva e temos uma preocupação genuína com a cobertura dos trabalhadores

por esta realidade.

A direita foi capaz de dizer aqui que, durante o Governo PSD/CDS, houve um aumento da negociação

coletiva. Vejam bem! É falso, Sr. Deputado!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — O documento é seu! É seu!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional: — Consigo, discuto onde quiser, as vezes que quiser, os números que quiser, sobre qualidade do emprego e contratação coletiva.

Aplausos do PS.

É falso o que disse, é literalmente falso! Não há outra maneira de o dizer.

Página 31

5 DE DEZEMBRO DE 2020

31

O que queria dizer sobre isto é que o direito à negociação coletiva tem de ser defendido e valorizado, não

apenas por ser um direito constitucional, que é, obviamente, uma questão fundamental, mas porque é algo

substantivamente importante para os trabalhadores e para as empresas.

Na nossa visão, o direito à negociação é, apesar de tudo, distinto do direito a um contrato em concreto, de

modo eternizado. Entendemos que a negociação coletiva para ser útil, valorizada e sustentável tem de se

conseguir atualizar, tem de ser adequada à realidade e tem de ter mecanismos que promovam a sua renovação.

Hoje em dia, é sabido que existe no Código do Trabalho o mecanismo da caducidade — essa possibilidade

existe —, que os prazos estão longe de ser imediatos e que o tratamento mais favorável existe num conjunto de

matérias muito amplas. Mas significa isto que a lei é perfeita, que não é passível de ser discutida, escrutinada e

alterada? Nesta matéria, como noutras, é evidente que o Governo tem de estar democraticamente disponível

para essa discussão e tem de estar disponível para ouvir não apenas os partidos, mas também os parceiros

sociais, que acompanham o mercado de trabalho e que têm, nessa matéria, uma responsabilidade muito

particular.

Portanto, para concluir, Sr. Presidente, aquilo que queria aqui dizer é que não temos uma visão fixista e

determinista nem dos contratos coletivos nem das leis que os enquadram. Por isso, qualquer lei, incluindo o

Código do Trabalho, está sujeita a discussão e a escrutínio. E, quanto às propostas que existirem, naturalmente,

temos abertura para as discutir, nesta sede, como em sede de concertação social, porque, como também é

sabido, defendemos que as matérias laborais têm de ter um acompanhamento muito próximo dos parceiros

sociais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, a Mesa regista a inscrição do Sr. Deputado João Almeida, pelo que fará o favor de informar a razão da sua inscrição.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, nós vamos ser chamados a votar a proposta de lei que hoje foi aqui apresentada. Essa proposta de lei deu entrada no Parlamento com um documento de suporte

que tem dois gráficos da DGERT (Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho), os quais indicam a

evolução da contratação coletiva em Portugal nos últimos anos.

Protestos do PS.

Esses gráficos demonstram que, entre 2008 e 2011, a contratação coletiva diminuiu e, entre 2012 e 2015, a

contratação coletiva aumentou.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — E a interpelação é…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Como o Sr. Secretário de Estado, que apresentou a proposta de lei, disse o contrário do que diz o documento que o Governo nos apresentou,…

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Isso é uma intervenção!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — … gostaria de saber se a Mesa nos pode informar se, para votarmos de forma conhecedora, devemos fazer fé no documento ou na palavra do Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, naturalmente, não vai querer que lhe responda em quem é que o Sr. Deputado deve fazer fé,…

Página 32

I SÉRIE — NÚMERO 27

32

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Eu tenho de votar esclarecido!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — … o Sr. Deputado fará fé em quem muito bem entender, como é óbvio, e votará, certamente, de maneira esclarecida, no momento de tomar a decisão.

Passamos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, que consiste no debate conjunto do Projeto de

Resolução n.º 729/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo um conjunto de medidas para utilização mais eficaz

e eficiente dos fundos da União Europeia, nomeadamente no âmbito da Política de Coesão, do Plano Estratégico

da Política Agrícola Comum e do Plano de Recuperação da União Europeia, do Projeto de Lei n.º 589/XIV/2.ª

(IL) — Criação e manutenção do Portal da Transparência por uma entidade independente, na generalidade, e

dos Projetos de Resolução n.os 714/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que apresente à Assembleia da

República relatórios trimestrais sobre a negociação e a execução dos fundos europeus atribuídos a Portugal ao

abrigo do Programa Next Generation e do Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 e a respetiva implementação

do plano de recuperação económica Portugal 2020-2030 e 748/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo que

proceda à criação de uma plataforma pública demonstrando, de forma transparente, acessível e territorializada,

a alocação dos fundos europeus atribuídos a Portugal através do Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 e do

fundo de recuperação Próxima Geração UE.

Para apresentar a iniciativa legislativa do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Fazenda.

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para enfrentar a maior crise de sempre, o Estado português terá ao seu dispor o maior pacote de fundos europeus de que há memória.

A gestão dos fundos comunitários em Portugal tem sido reconhecida e elogiada pelas instituições europeias,

nomeadamente pela própria Comissão Europeia.

Todos os anos os relatórios e contas inerentes aos fundos comunitários têm sido aprovados pela Inspeção-

Geral de Finanças e pela Comissão Europeia, os quais são depois supervisionados pelo Tribunal de Contas

Europeu.

A materialidade do erro na gestão dos fundos, em Portugal, tem sido sempre abaixo dos 2% — dos melhores

desempenhos na Europa. Por isso mesmo, Portugal nunca teve qualquer suspensão de pagamentos e somos

dos poucos da Europa que nunca a tivemos.

Não obstante o bom desempenho de Portugal na gestão dos fundos europeus, é sempre possível fazer ainda

mais e melhor, para termos ainda mais transparência, maior escrutínio público e melhores decisões na aplicação

dos fundos europeus. E, tendo em conta o grande volume de fundos europeus que Portugal irá receber, a

responsabilidade é acrescida. Essa é uma responsabilidade que convoca todos, o Governo, os partidos políticos,

as instituições e os promotores de candidaturas que terão de conceber bons projetos e executá-los dentro dos

prazos.

É neste contexto que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista dá também o seu contributo, apresentando

um projeto de resolução com recomendações para uma utilização ainda mais eficaz e eficiente dos fundos da

União Europeia. E, neste sentido, recomenda o seguinte: em primeiro lugar, é essencial a adoção de um

«Simplex» para os fundos comunitários. Sem se perder o rigor e a transparência, é crucial continuar a agilizar

procedimentos e a eliminar barreiras burocráticas, nomeadamente no âmbito do Portugal 2020-2030. Este é um

ponto crítico.

Para isso, recomenda, também, a constituição de um grupo técnico interministerial que formule propostas

para a simplificação na gestão dos fundos europeus, um grupo de trabalho que junte as várias entidades

envolvidas na gestão dos fundos, para termos mais simplificação e menos burocracia.

Em terceiro lugar, recomenda que promova a contratualização de investimentos públicos com sustentação e

com responsabilização das partes envolvidas em torno de prazos, objetivos e resultados, para que haja uma

maior previsibilidade e celeridade na execução dos projetos.

Em quarto lugar, recomenda maior proximidade territorial no modelo de governação dos fundos comunitários,

valorizando as competências das comissões de coordenação e desenvolvimento regional e das entidades

intermunicipais. O modelo de governação do Portugal 2030, aprovado em Conselho do Ministros, aponta

precisamente para este princípio, que deve agora ser concretizado no terreno.

Página 33

5 DE DEZEMBRO DE 2020

33

Em quinto lugar, o reforço das estruturas de gestão dos fundos europeus. O trabalho realizado pelas atuais

estruturas do Portugal 2020 deve ser reconhecido, mas agora a exigência é muito maior, pois Portugal terá de

executar, por ano, duas a três vezes mais do que em qualquer um dos anteriores quadros comunitários. Por

isso, é essencial dotar estas estruturas com mais recursos — humanos e tecnológicos.

Por fim, importa reforçar a informação, a comunicação e o esclarecimento às empresas, às instituições e aos

cidadãos para que possam conhecer melhor os apoios comunitários disponíveis, as suas regras e os

mecanismos de financiamento existentes. É essencial dar a conhecer, de forma mais ampla e mais simples, os

apoios disponíveis dos programas europeus.

Para concluir, a boa aplicação sobre os fundos europeus é um desafio que convoca todos, que não dispensa

ninguém e que ninguém se deve dispensar de fazer. É isto que hoje se coloca, também, à discussão e

consideração desta Assembleia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 589/XIV/2.ª (IL) — Criação e manutenção do Portal da Transparência por uma entidade independente, tem a palavra o Sr. Deputado João

Cotrim de Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Podemos discutir a alocação que cada partido faria dos fundos europeus que Portugal vai receber nos próximos 10 anos, mas creio

que é consensual que, qualquer que seja a alocação, ela deve ser o mais transparente possível. Isto porque a

transparência na alocação destes fundos não é apenas um imperativo ético, é, também, um valioso contributo

para aumentar a sua eficácia.

É fundamental que este dinheiro — que todos iremos pagar, mais tarde ou mais cedo, mesmo o que diz

respeito a subvenções — tenha um impacto real na vida das pessoas, para que Portugal não desperdice esta

oportunidade para se modernizar.

Os fundos estruturais europeus têm sido utilizados, no passado, com eficácia discutível e com transparência

questionável. Agora que vamos ter o dobro, ou mais, dos fundos para executar todos os anos, os riscos de

agravar a situação, seja ao nível da eficácia, seja ao nível da transparência, são grandes.

Talvez por estar ciente disto, este Parlamento aprovou a inclusão da criação do Portal da Transparência no

Orçamento do Estado para 2021. Até o PS, que primeiro votou contra a proposta do Iniciativa Liberal — não sei

se foi a palavra transparência que vos transtornou! —, acabou por viabilizá-la. E o Bloco de Esquerda aparece

aqui, a querer ficar na fotografia, trazendo uma recomendação para o Governo fazer exatamente o que já foi

aprovado no Orçamento.

O que o Iniciativa Liberal traz hoje aqui é diferente. Para que o Portal da Transparência cumpra o seu papel,

consideramos que é essencial que a sua conceção, implementação e manutenção correspondam aos mais altos

padrões técnicos e de fiabilidade. Por isso, propomos que esse trabalho seja executado por uma entidade

especializada e independente, contratada pela Agência para o Desenvolvimento e Coesão, mediante concurso

público.

Seria irónico que o Portal da Transparência não fosse, ele próprio, transparente.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para apresentar o Projeto de Resolução n.º 714/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que apresente à Assembleia da República relatórios trimestrais sobre a negociação

e a execução dos fundos europeus atribuídos a Portugal ao abrigo do Programa Next Generation e do Quadro

Financeiro Plurianual 2021-2027 e a respetiva implementação do plano de recuperação económica Portugal

2020-2030, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Marques.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje é um dia em que se fala de transparência e de boa execução dos fundos europeus. No dia em que se recorda também a morte de Francisco

de Sá Carneiro, é importante falarmos do lado positivo da política.

Estamos aqui reunidos, concordando quase todos com o mesmo, inclusive o Partido Socialista que tanto se

indignou com as críticas que o PSD fez à utilização dos fundos comunitários nos últimos anos e que subscreve

Página 34

I SÉRIE — NÚMERO 27

34

hoje, num projeto de resolução, todas as críticas que nós fizemos. Para um partido laico, é um grande ato de

contrição. Mas isso é positivo e deve merecer o nosso aplauso.

A proposta do PSD é muito simples. No que toca às verbas europeias, as verbas da solidariedade europeias,

o Governo e esta Assembleia da República devem ter um momento em que possamos conhecer concretamente

os dados, os valores da execução, os beneficiários, os indicadores, com total transparência.

Temos uma nova oportunidade de fazer reformas estruturais em Portugal. Temos ainda metade do atual

programa-quadro por utilizar, o valor equivalente ao total da «bazuca» europeia. Temos 12 mil milhões de euros

por usar, quase 13 mil milhões de euros que vêm da «bazuca» europeia e temos ainda o próximo programa-

quadro. É uma oportunidade que não devemos desperdiçar e que devemos às futuras gerações.

O PSD tem três propostas muito concretas, que só podem ter o acordo de todos. Em primeiro lugar, propomos

que o Governo apresente um relatório trimestral sobre a execução dos fundos comunitários quer do atual

programa-quadro, como do próximo, quer da «bazuca» europeia.

Em segundo lugar, defendemos que o ministro responsável por esta área venha trimestralmente ao

Parlamento apresentar e discutir o relatório de execução. Temos de executar rápido e bem. Não é gastar muito

e depressa, é executar rápido e investir bem!

Em terceiro lugar, propomos que a plataforma digital, que toda a gente já defende e que o PSD defende há

vários meses, tenha a documentação relacionada com a execução e com a negociação, e que diga quais são

os projetos candidatos e aprovados, quem são os beneficiários, os produtores, qual a taxa de execução e quais

os objetivos indicadores, para que todos possamos ter a mesma informação.

Não podemos limitar-nos a um ato de fé em relação ao que o Governo anuncia. Temos de ter informação

prática para podermos fazer o nosso trabalho. Se todos soubermos respeitar este princípio, Portugal vai sair

melhor, ou seja, vai sair mais resiliente, com maior capacidade de investimento e a economia vai crescer. Se

tiver transparência, o Governo poderá contar com o apoio de um Parlamento que promove a transparência e,

sobretudo, a boa execução dos fundos comunitários.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para apresentar o Projeto de Resolução n.º 748/XIV/2.ª, em nome do Grupo Parlamentar do BE, tem a palavra a Sr.ª Deputada Fabíola Cardoso.

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos um conjunto alargado de propostas legislativas sobre uma preocupação comum não só ao Bloco de Esquerda e aos outros partidos

políticos, mas a toda a sociedade portuguesa: garantir que a aplicação dos eventuais fundos europeus seja

conduzida de forma eficiente e transparente, sendo disponibilizada a informação necessária para o escrutínio

democrático que se exige.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — O projeto de resolução apresentado pelo Bloco de Esquerda recomenda ao Governo que proceda à criação de uma plataforma digital pública que demonstre, de forma transparente,

acessível e territorializada, a alocação dos fundos atribuídos a Portugal através do Quadro Financeiro Plurianual

2021-2027 e do fundo de recuperação Próxima Geração EU.

Apesar de o Quadro Financeiro Plurianual poder conduzir a uma nova vaga de austeridade — através das

regras de restrição de défice que foram suspensas, mas não eliminadas —, e pese embora a dimensão limitada

do fundo de recuperação Próxima Geração UE, particularmente tendo em conta os cortes anunciados para as

áreas da coesão e da agricultura, ainda assim, é inegável o peso destes fundos no reforço do investimento

público em áreas fundamentais para o nosso País como a saúde, a educação, a agricultura ou as infraestruturas.

A experiência de períodos de programação anteriores evidenciou que a aplicação dos fundos estruturais nem

sempre foi conduzida de forma eficiente. Constataram-se também falhas na divulgação e acessibilidade da

informação. Estes fatores, aliados ao facto de a execução financeira que agora se avizinha ser quase o triplo do

que aconteceu em anos anteriores, aprofundam a importância dos mecanismos de transparência.

Página 35

5 DE DEZEMBRO DE 2020

35

A disponibilidade de toda a informação num portal único, devidamente simplificada e com uma diferenciação

territorial, aumentaria a transparência, facilitaria a proximidade geográfica e a possibilidade de escrutínio dos

processos.

Importa simplificar a informação de modo a permitir um real envolvimento não só das instituições do Estado,

mas também da sociedade civil e das populações em geral, contribuindo para uma melhor utilização destes

fundos.

Para garantir a exigente implementação e funcionamento desta plataforma pública, propomos que se proceda

também a um reforço dos recursos humanos, tecnológicos e financeiros.

Estas caraterísticas, que são as características principais da proposta do Bloco de Esquerda, encontram-se

também nas propostas apresentadas quer pelo PS quer pelo PSD e até na proposta apresentada pelo Iniciativa

Liberal que, em sede de Orçamento do Estado, acompanhámos. Por isso, também as aprovaremos.

Essa aprovação, no entanto, não implica qualquer diminuição do nosso compromisso de continuarmos a

acompanhar aqui, com exigência e rigor, todas as fases do processo relativo aos fundos europeus.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — O projeto apresentado pelo Partido Socialista, que aqui discutimos, refere especificamente o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC), mas, enquanto isso, o Governo

colocou esse mesmo Plano Estratégico em consulta pública só até, pasme-se, dia 11 de dezembro de 2020!

Coincidindo com a discussão do Orçamento do Estado e em plena pandemia, o Governo considera

suficientes escassos 26 dias para a análise de toda a informação que foi disponibilizada apenas no dia 16 de

novembro. Sobre transparência, comunicação e valorização da participação cidadã, estamos entendidos!

Para contribuir para ultrapassar esta situação, o Bloco de Esquerda apresentou um projeto de resolução com

vista ao alargamento do prazo da primeira fase do processo de consulta pública do PEPAC e à capacitação de

pessoas e instituições que contribuam para diminuir os problemas ambientais e socioeconómicos que a sua

implementação tem causado em Portugal.

Estamos disponíveis para, em sede de especialidade, contribuir para a construção de uma proposta que

consensualize a melhor forma de responder à intenção que é comum: simplificar e tornar transparente a

alocação dos fundos europeus a Portugal.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — A proposta apresentada pelo Iniciativa Liberal pretende externalizar a criação e a manutenção deste Portal da Transparência. Propõe um concurso público para uma nova PPP

(parceria público-privada) que seria concretizada, e cito, «(…) através da celebração de contrato de aquisição

de serviços com uma entidade independente (…)», subentende-se, privada.

Não nos parece que seja esta a melhor forma de simplificar e garantir a transparência, pelo que não

acompanharemos a proposta do IL.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Leal, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Leal (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje um conjunto de recomendações no sentido de assegurar uma gestão mais participada dos fundos europeus, as quais

acompanhamos na generalidade.

Vemos, porém, com muitas cautelas a questão da simplificação da gestão, uma vez que, sendo importante

assegurar a execução eficaz e célere destes fundos, não menos importante é a garantia de que essa gestão

não passa por cima dos limites impostos pela lei.

Página 36

I SÉRIE — NÚMERO 27

36

Isto porque, conforme o PAN tem afirmado repetidamente, os riscos de corrupção e de conflitos de interesses

no âmbito da gestão dos fundos europeus não só não desapareceram como são ainda maiores no contexto de

crise sanitária da COVID-19.

Tais riscos têm de nos preocupar e mobilizar a todos, uma vez que, como é sabido, o OLAF (Organismo

Europeu de Luta Antifraude), o organismo anticorrupção da União Europeia, afirmou já que 0,44% dos fundos

estruturais e de agricultura recebidos entre 2015 e 2019 deveriam ser recuperados pela Comissão Europeia

devido ao seu uso indevido e a irregularidades na sua utilização.

Esta percentagem significa que somos o terceiro país que mais perde em fundos europeus para as

irregularidades financeiras e isso tem de ser evitado a todo o custo, principalmente numa altura em que o ritmo

de investimento será duas a três vezes superior ao de anos anteriores, na ordem dos 6 mil milhões de euros por

ano, dinheiro que tanta falta nos vai fazer para a retoma económica do País.

Para o PAN, o caminho para o evitar tem de passar por impedir o aligeiramento acrítico dos mecanismos de

controlo, bem como pela criação de novos mecanismos de transparência e, acima de tudo, de participação

cidadã.

Tem sido esse o caminho que temos feito. Por isso, rejeitámos, com o nosso voto «contra», as recentes

alterações ao Código dos Contratos Públicos que, em nosso entender, aumentavam os riscos que apontamos.

Numa postura proativa, que procura a construção de pontes pela positiva no sentido de assegurar novos

mecanismos de participação cidadã, propusemos e conseguimos aprovar, em sede de Orçamento do Estado

para 2021, o aumento da transparência dos negócios do hidrogénio verde e a criação de um portal da

transparência para os fundos europeus que divulgue aos cidadãos, de forma clara, acessível e desagregada,

em tempo real, as medidas e os projetos apoiados, o seu custo orçamental, o número de beneficiários, as

entidades beneficiárias e os critérios de atribuição, assim como as diferentes fases processuais e o seu grau de

execução.

Conseguimos estes avanços em matéria de transparência, mas agora é tempo de o Parlamento assegurar

que este processo seja o mais participado possível e que, contrariamente ao habitual, não fique de costas

voltadas para o escrutínio da sociedade civil.

Para o assegurar, é essencial que, seguindo os bons exemplos recentes da convenção dos cidadãos pelo

clima, criada em França, ou da assembleia de cidadãos para a reforma do sistema democrático, na Alemanha,

se assegure a criação de uma comissão independente, composta por organizações representativas da

sociedade civil e por cidadãos independentes, sem ligações partidárias. A essa comissão caberá acompanhar

todas estas fases relativas aos fundos europeus que vão chegar em breve, esperando nós que auxilie, com os

seus contributos, a comissão parlamentar de acompanhamento para a fase de recuperação.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — A próxima intervenção cabe ao Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde a primeira hora que o PCP tem manifestado a exigência de uma política de gestão dos fundos estruturais e de investimento que assuma uma

gestão não apenas transparente, mas democrática, descentralizada, orientada para o desenvolvimento público

local e regional e não para uma gestão burocrática fechada, orientada para o financiamento de grandes

empresas e inacessível para agentes locais de desenvolvimento.

A resposta necessária para os problemas nacionais não é compatível com as escolhas que têm sido

expressas nas opções da União Europeia e dos fundos comunitários. A visão e as opções que os percorrem

não inscrevem a necessária valorização dos trabalhadores, dos seus salários e direitos, mas propõem a

manutenção de todos os instrumentos do neoliberalismo, iludem por completo os constrangimentos impostos

pela ausência de uma soberania monetária e por uma dívida pública que consome concursos públicos

indispensáveis, assumem o Estado como facilitador e financiador dos grupos económicos e ignoram o domínio,

pelo capital estrangeiro, de empresas e setores estratégicos.

O desenvolvimento do País exige opções soberanas não dependentes dos critérios e decisões de terceiros.

Precisa de uma agenda própria, que olhe para os problemas nacionais sem condicionamentos nem

constrangimentos, nomeadamente na utilização dos fundos comunitários, mas também exige uma aposta do

Página 37

5 DE DEZEMBRO DE 2020

37

investimento público e no financiamento nacional próprio, que permita enfrentar e vencer esta dependência face

aos fundos europeus, que limita e compromete a capacidade do País, no plano estratégico e até político, nas

opções soberanas de desenvolvimento de que não podemos abdicar.

As várias iniciativas que estão em apreciação neste ponto da agenda da sessão plenária, não merecem, na

generalidade, objeções de fundo quanto às medidas que são propostas. Não podemos é deixar de sublinhar

que, estando em causa questões que remetem para a gestão e aplicação dos fundos estruturais, que se espera

que hão de vir, a verdade é que há opções políticas que estão e estarão plasmadas no acordo de parceria que

irá ainda ser realizado, mas que decorrem, desde logo, das decisões no quadro das instituições da União

Europeia, e tudo indica que vai correr ainda muita água debaixo da ponte, como, aliás, ficará evidente mais logo,

no debate sobre a próxima reunião do Conselho Europeu.

Sr.as e Srs. Deputados, não podemos deixar de fazer também algumas observações, desde logo o facto de

não concordarmos com o alinhamento estratégico e político que o Governo e o PS defendem relativamente à

governação e gestão dos fundos comunitários, no alinhamento dessas opções com as opções da chamada

«descentralização», que mais não é do que a municipalização e a transferência de competências para os

municípios que o Governo tem estado a querer impor.

Por outro lado, não deixamos de sublinhar que é importante salvaguardar não apenas a gestão pública e a

salvaguarda da transparência nesse acompanhamento do escrutínio e monitorização, mas, desde logo, o

controlo público desses mecanismos e não a delegação em medidas de tipo PPP, como temos vindo aqui a

observar.

Por outro lado, ainda, o problema não é tanto o que está lá escrito, mas o que não pode ficar por dizer. É que

a prioridade na aplicação dos fundos estruturais e de investimento tem de ser, de facto, o investimento público

na modernização das infraestruturas nacionais, a concretização dos equipamentos necessários aos serviços

públicos, a resposta aos problemas das populações, e, desde logo, o combate às assimetrias regionais e pela

coesão territorial.

Se isso não for assumido como questão central e prioritária, se tivermos novamente os fundos estruturais

como um mecanismo de financiamento público para interesses privados de grandes grupos económicos, então

aí, Srs. Deputados, não há portais na internet que resolvam o problema. Mais vale mesmo prevenir do que

remediar, e a questão está mesmo ao nível das opções políticas e da estratégia de desenvolvimento que a

gestão destes fundos e a sua aplicação deve corporizar e traduzir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, queria saudar os diferentes partidos por estas iniciativas e frisar que o CDS, em tudo o que seja escrutínio,

transparência, fiscalização daquilo que são os fundos da União Europeia, como é evidente, está e estará de

acordo.

Queria, no entanto, sublinhar o projeto de resolução apresentado pelo Partido Socialista. Devo dizer, Sr.

Deputado Nuno Fazenda, que o CDS estaria em condições de apresentar um texto idêntico ao texto que os

senhores apresentam, porque revela, embora nós tenhamos sentido alguma estranheza, uma enorme

preocupação com aquilo que é a aplicação e o acompanhamento dos fundos comunitários.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem-se revelado uma espécie de repartição do Governo, uma

espécie de direção-geral — vá lá —, e uma direção-geral bastante preocupada, muito preocupada. Basta ler o

texto aqui apresentado pelo Partido Socialista. E o que é que o Partido Socialista, a tal direção-geral, vem pedir

ao Governo? Vem pedir um «Simplex», vem pedir transparência, vem pedir previsibilidade, vem pedir celeridade,

vem pedir mais recursos humanos e mais recursos materiais, vem pedir eficiência, vem pedir escrutínio público,

vem pedir mais mecanismos de informação e de esclarecimento. Portanto, este é o PS do Parlamento que

desconfia do PS no Governo.

Nós, CDS, acompanhamos, precisamente, essa desconfiança sobre o mundo que aí vem.

Página 38

I SÉRIE — NÚMERO 27

38

Mas já não é inédito este travão que o próprio Grupo Parlamentar do PS, a tal direção-geral, aplicou aquando

da contratação pública.

Recordemos: o Governo, naquilo que eram contratações ao nível das consultas prévias, propôs e apresentou

no Parlamento uma proposta de 5,3 milhões de euros. O Partido Socialista reduziu e apresentou aqui uma

proposta de 750 mil. Depois, ficou em 1 milhão de euros. Portanto, há aqui uma grande desconfiança da parte

do Partido Socialista relativamente ao Governo, e nós acompanhamos isso.

Há que destacar, também, o seguinte — é importante, e tenho-o referido aqui várias vezes: o Sr. Primeiro-

Ministro quando anunciou ao País o pacote de medidas de apoio à economia, às empresas, àquilo a que se vão

poder candidatar, estava a falar de qualquer coisa como cerca de 6 mil milhões de euros. O problema é que as

empresas não sabem o que o Primeiro-Ministro está a dizer, o que significa que o Governo e o Sr. Primeiro-

Ministro, para chegarem aos tais 6 mil milhões de euros, fizeram contas, analisaram, souberam exatamente

quais os projetos, quais as candidaturas e que empresas podiam concorrer, precisamente para não se ouvir

aquela coisa muito comum que se ouve: a de que, sempre que há fundos, é para os amigos, é para umas

empresas… É para evitar isso.

Até porque, sendo esta uma oportunidade única que o País tem, é importante que a informação esteja

disponível, e disponível de forma clara, com indicação de prazos, principalmente para as micro e pequenas

empresas, que são as que têm, muitas vezes, mais dificuldades em aceder à informação, de forma a que possam

ter essa informação disponível e, como é evidente, possam candidatar-se e beneficiar, também, desses mesmos

fundos.

A terminar, Sr. Presidente, quero sublinhar a nossa concordância com os projetos apresentados e reafirmar

que acompanhamos o Partido Socialista do Parlamento na desconfiança e nas reservas que tem relativamente

ao Partido Socialista no Governo.

Estaremos, pois, aqui para votar favoravelmente as várias iniciativas.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Emídio Guerreiro, do PSD.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quatro anos! Os Srs. Deputados do Partido Socialista levaram quatro anos para reconhecer a justeza daquilo que aqui fomos defendendo e

solicitando ao Governo!

Não posso deixar de felicitar o Sr. Deputado Nuno Fazenda por, em pouco mais de um ano, ter convencido

os seus colegas de grupo parlamentar a alterar a posição. Felicito-o por isso, porque, de facto, vir agora ao

encontro do que fomos solicitando ao longo destes quatro anos é importante e é uma evolução muito positiva

que o Partido Social Democrata regista.

Mais transparência, mais controlo, mais descentralização, reforço nas estruturas de gestão e de controlo dos

fundos comunitários foi aquilo que nós fomos reclamando ao longo dos últimos anos e que o Partido Socialista

nunca quis. E podia tê-lo feito quando, por ocasião da reprogramação do Portugal 2020, mais uma vez, nós

solicitámos que, nesse âmbito, fossem tomadas medidas para acelerar os procedimentos de modo a que os

fundos chegassem aos seus destinatários.

O que houve foi, de facto, uma preocupação do Governo, acompanhado pelo Partido Socialista, em diminuir

a dotação dos fundos operacionais regionais para os pôr nos fundos de alcance nacional, sem mexer nas regras,

ou melhor, mexendo e diminuindo a capacidade de intervenção das comissões de coordenação, que deviam ser

valorizadas e que, nesse momento, foram claramente ostracizadas. Por isso, reconheço esta evolução do

Partido Socialista, mudança essa que, mais uma vez, saúdo.

Se o Partido Socialista tivesse ouvido aquilo que o PSD solicitou, sobretudo a partir do debate da

reprogramação do Portugal 2020, e ao longo dos múltiplos momentos que aqui tivemos, se calhar, nesta altura,

não faltariam executar 12 mil milhões do Portugal 2020, que, supostamente, termina no final deste mês.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Podíamos ter sido mais céleres e mais eficazes a canalizar as verbas a favor das empresas, das famílias, das autarquias, enfim, do próprio investimento, mas não foi essa a opção.

Página 39

5 DE DEZEMBRO DE 2020

39

Claro que, quando olhamos para os números do investimento público ao longo da governação socialista dos

últimos cinco anos, percebemos que o investimento público andou abaixo dos níveis, batendo records dos

últimos 60 anos, em 2016, do menor investimento público!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — De facto, isso não é alheio à forma como geriram esse investimento. Por isso, tenho dúvidas de que esta evolução do Partido Socialista seja bem acolhida pelo Sr. Ministro Nélson de

Souza, que nunca quis saber de nada disto, ou seja, de criar mais controlo, mais transparência, mais

descentralização, reforçar as competências das CCDR (comissões de coordenação e desenvolvimento

regional), das comunidades intermunicipais.

Pode ser que essa evolução que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista demonstra agora se reflita

também no Governo. Seria bom para todos, porque quando nós olhamos para aquilo que aí vem, a ambição de

executarmos duas ou três vezes mais fundos comunitários por ano do que aquilo que temos executado nos

últimos anos, é, de facto, um trabalho enorme, eu diria que seriam quase os «doze trabalhos de Hércules».

Por isso, se não formos capazes de perceber que é preciso ter confiança nos parceiros a quem compete a

decisão, junto do terreno onde aquilo pode ter eficácia e ser mais rápido, não iremos conseguir. Iremos continuar

a ter anúncios, anúncios, anúncios, e, infelizmente, perderemos a oportunidade.

Espero que assim não seja, porque, para bem de Portugal e dos portugueses, o Governo não pode, de facto,

continuar com esse modo de proceder e de executar os fundos comunitários.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Fazenda, do Partido Socialista.

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por saudar as várias questões que foram colocadas e dizer que, porventura, talvez por distração, alguns dos intervenientes

não terão entendido bem ou não terão ouvido com atenção aquilo que eu disse.

Em primeiro lugar, foi afirmada, e de forma explícita — e é reconhecido, não só pelo Grupo Parlamentar do

Partido Socialista, mas também pelas instituições europeias —, a boa gestão dos fundos comunitários em

Portugal. Isso é feito a vários níveis, mas falemos de dois.

Primeiro, vamos ver como é que tem sido a execução. Referiram que a execução é baixa. Ora bem, eu

mostro-vos um gráfico, que não sei se conhecem, no qual, em 15 países, Portugal é o segundo país com maior

execução de fundos comunitários — em 15 países!

O orador exibiu o gráfico que mencionou.

Trata-se de países com orçamentos acima dos 7 000 milhões de euros.

E esta boa execução dos fundos comunitários quer dizer que Portugal não perdeu fundos comunitários no

âmbito da regra n+3, ao contrário de outros países, como a Espanha, o Reino Unido, e por aí fora.

Aplausos do PS.

Portugal soube gerir bem e conseguiu executar bem os fundos comunitários.

Mas, para além da execução, em que somos, no âmbito europeu, o segundo melhor país de 15 países, temos

de ver também o rigor. Gerimos com rigor ou não gerimos com rigor? E aquilo que nos dizem as instituições

europeias — e não somos nós nem as entidades independentes —, como a Inspeção-Geral de Finanças e o

Tribunal de Contas europeus, é que as contas são certificadas e a materialidade do erro está abaixo dos 2%, o

que coloca também Portugal como o país que tem tido os melhores desempenhos ao nível da transparência e

da gestão dos fundos comunitários.

Página 40

I SÉRIE — NÚMERO 27

40

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — O Governo tem cinco anos!

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Mas isso não quer dizer que esteja tudo bem, com certeza que não. Há sempre margem para se fazer ainda mais e melhor, e é isso que se propõe aqui. O que nós propomos é um «Simplex»

para os fundos comunitários.

Sabem o que é que os senhores fizeram em relação a isso? Acabaram com o Simplex quando foram Governo

e o PS repôs o Simplex para toda a Administração Pública. E esse é um ponto que importa ter presente.

Quanto à proposta do PSD, cabe-me só dizer o seguinte: aquilo que trazem ao debate é solicitarem a

apresentação de três relatórios trimestrais e a vinda cá dos membros do Governo. Ora, o Governo já cá vem e

os relatórios trimestrais já são apresentados.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — E então? Isso não quer dizer nada!

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Os membros do Governo vêm cá quatro vezes por ano, também trimestralmente. Há uma comissão eventual da COVID só para acompanhamento das medidas de

implementação, de recuperação da economia e de aplicação dos fundos comunitários. E, ainda assim, o que os

senhores apresentam é uma redundância daquilo que já existe. Os relatórios já são elaborados pela AdC

(Autoridade da Concorrência). Era bom que pudessem ver que esses relatórios já existem, mas, porventura, não

conseguiram ver e tomar essas notas.

Sr. Presidente, creio que estou a chegar ao fim do tempo de que disponho. Se calhar, posso passar a utilizar

o tempo que tenho para o encerramento do debate, se assim o Sr. Presidente entender.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, peço só um momento.

Pausa.

Pode terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Podemos concluir este debate referindo três ou quatro notas.

A primeira é que o Governo conseguiu, com sucesso, ter o maior pacote de fundos europeus de que há

memória. E não só aproveitou esses fundos europeus para enfrentar a maior crise de sempre, como desenvolveu

uma estratégia para o País. Desenvolveu referenciais estratégicos que foram objeto de debate público, aprovou

recentemente a Estratégia Portugal 2030, aprovou também o modelo de governação para a gestão dos fundos

comunitários e assegurou que não teremos um hiato no recebimento dos fundos comunitários.

O Portugal 2020 estará em vigor até 2023 e há a possibilidade de usar as verbas do futuro Quadro

Comunitário de Apoio com base nas atuais regras.

A verdade é que o Governo, nesse aspeto, tem estado à frente do tempo, na medida em que ainda não temos

os acordos aprovados na Comissão Europeia e temos já a estratégia, temos o modelo de governação definido

e temos também a estratégia para o implementar. Mas, como disse, apesar deste bom desempenho, podemos

fazer sempre mais e melhor, e é por isso que propomos a simplificação de procedimentos e o reforço das

estruturas de gestão, que têm feito um bom trabalho. E, sobre o reforço das estruturas de gestão, o Governo

prevê a contratação de 1000 técnicos superiores para a Administração Pública e também temos em curso a

transição digital. Por isso, apesar de o Governo ter desenvolvido várias sessões públicas de esclarecimento ao

nível dos fundos comunitários, de divulgar tudo o que são apoios, é evidente que temos sempre margem para

simplificar mais a linguagem e para esclarecer melhor os nossos cidadãos e as nossas empresas quanto aos

fundos comunitários.

Foi isto que procurámos trazer com este projeto de resolução, com recomendações pela positiva para

podermos desenvolver melhor a aplicação dos fundos comunitários em Portugal. Lamenta-se que o que tenha

vindo de outros partidos se restrinja a um portal, um portal da transparência que já tinha sido anunciado pelo Sr.

Primeiro-Ministro e que já tinha sido aprovado no Orçamento do Estado,…

Página 41

5 DE DEZEMBRO DE 2020

41

Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

… e, complementarmente, à apresentação de uns relatórios trimestrais, com uma lógica mais burocrático-

administrativa, em vez de acrescentar mais valor, porque essa discussão já é feita e nunca o Grupo Parlamentar

do Partido Socialista se opôs a que qualquer membro do Governo pudesse prestar esclarecimentos sobre as

matérias que quisessem, incluindo as matérias sobre fundos comunitários.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminamos, assim, este ponto da ordem de trabalhos.

Vamos agora interromper os nossos trabalhos.

Entretanto, a Mesa chama a atenção que os nossos trabalhos recomeçarão às 15 horas e, dado que irá ter

lugar uma votação intermédia, fora do período das votações regimentais, sobre a renovação do estado de

emergência, é necessário que as Sr.as e os Srs. Deputados renovem o respetivo registo de presença a partir

dessa hora. Seria muito importante que os grupos parlamentares e as Sr.as e os Srs. Deputados tivessem isso

em devida conta.

Bom almoço. Retomaremos os trabalhos às 15 horas.

Está interrompida a sessão.

Eram 12 horas e 20 minutos.

Após a interrupção, reassumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 4 minutos.

Lembro que, para efeitos de quórum, os Deputados podem desde já registar-se, visto que irá ter lugar uma

votação bastante cedo, durante a tarde.

Vamos, desde já, proceder ao debate do Relatório sobre a Aplicação da Declaração do Estado de

Emergência no período de 9 a 23 de novembro de 2020.

Para abrir o debate, por parte do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna, Eduardo

Cabrita.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Eduardo Cabrita): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo está hoje, como é sua obrigação legal, constitucional e política, a prestar contas daquilo que foi o

primeiro período do estado de emergência, determinado por decreto do Sr. Presidente da República, aprovado

pela Assembleia e executado por decreto de execução da responsabilidade do Governo, correspondente ao

período de 9 a 23 de novembro.

Estamos, aliás, num quadro em que vivemos, neste momento, uma segunda quinzena do estado de

emergência. Faremos seguidamente um debate sobre a nova prorrogação dessa situação de estado de

emergência, nos termos do decreto que o Sr. Presidente da República fez ontem chegar à Assembleia da

República. Portanto, diria que, nesta visão de conjunto, provou-se que esta era uma medida necessária,

adequada e proporcional à adoção deste modelo de recurso à figura do estado de emergência neste período.

O estado de emergência permitiu robustecer, como afirmámos, o quadro jurídico de medidas restritivas de

direitos fundamentais na estrita medida necessária para a prossecução das finalidades de saúde pública que

eram definidas pela estratégia prosseguida pelo Governo. Permitiu, aliás, fazer, pela primeira vez, uma clara

diferenciação territorial das medidas aplicáveis a cada zona do território nacional em função da incidência

epidemiológica. Estas medidas pautaram-se novamente por uma generalizada e exemplar adesão dos cidadãos,

que se traduziu numa intervenção essencialmente pedagógica por parte das forças de segurança.

Página 42

I SÉRIE — NÚMERO 27

42

Neste período, foram mobilizados os recursos quer no lançamento de mecanismos de rastreio

epidemiológico, quer na mobilização de regras sobre o uso de máscara e sobre restrições no acesso a espaços

públicos, que permitiram criar espaço para defender o Serviço Nacional de Saúde (SNS), para defender a

capacidade de utilização de recursos daqueles que, nos hospitais e em tudo o que é a primeira linha de resposta,

garantem aquilo que aos restantes setores de política pública não é possível fazer: defender aqueles que estão

doentes, curá-los e garantir uma rápida recuperação.

As medidas provam, aliás, pela evolução dos seus níveis de incidência, que estão a produzir resultados.

Tivemos um crescimento muito significativo de casos de internamento em unidades de cuidados intensivos

e, infelizmente, em termos de número de óbitos, ao longo de novembro duplicámos o número de casos

registados relativamente ao ocorrido desde o passado dia 2 de março. Estas medidas estão já a produzir efeitos

e levam a que, em profunda solidariedade entre todos os órgãos de soberania, mas, sobretudo, em solidariedade

com a luta pela liberdade, a luta pela saúde dos portugueses, em conjunto, nos mobilizemos para continuar a

adotá-las, garantindo assim a contenção da epidemia e a resposta à doença.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Informo que já há quórum suficiente para procedermos a todas as votações. Estão 159 Sr.as e Srs. Deputados inscritos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que este Relatório nos demonstra é a realidade que não foi apresentada. É que o Governo apresentou as medidas do estado de emergência

escondido dos portugueses, numa noite, em que soubemos que o comércio ia fechar às 13 horas, que ia haver

restrições em vésperas de feriados e outras que não sabíamos. Isto por parte do mesmo Governo que tinha dito,

nas reuniões com todos os partidos neste Parlamento, que o País não suportaria um novo confinamento.

O que se fez foi legislar nas costas dos portugueses e dizer-lhes que tinham de aplicar medidas que,

consensualmente, todos tinham aceite não serem possíveis.

Mas esse foi também o estado de emergência da intolerância, o que demostra bem uma tenda montada à

porta desta Assembleia, durante dias e noites, em greve de fome. E teve de ser o Presidente da Câmara de

Lisboa a fazer uma suposta mediação para acabar com o circo que ali estava montado. Foi o estado de

emergência da intolerância.

Mas esse é ainda outro estado de emergência, aquele que esqueceu os setores que mais tinham contribuído

para a economia durante os últimos anos, aqueles a quem António Costa tinha ligado a dizer «eu preciso da

vossa ajuda para dignificar Portugal e a economia portuguesa». O estado de emergência deixou de fora esses

setores.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já excedeu o seu tempo.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que este Relatório mostra como o Governo só faz relatórios do que lhe interessa. E, para isso, nem valia a pena estarmos a discuti-lo.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, de Os Verdes.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Debatemos hoje o Relatório sobre a Aplicação da Declaração do Estado de Emergência no período de 9 a 23 de novembro.

Os Verdes têm deixado bem claro, desde o início destes tempos difíceis para o País, que não é este o

instrumento necessário para travar a propagação do vírus. Dissemos no passado e dizemos hoje que, enquanto

os portugueses continuarem a olhar com todo o sentido de responsabilidade para as recomendações das

autoridades públicas, o Governo continua a dispor, dentro do quadro legal normal, de todas as condições para

que nada falte neste combate.

Saudamos os portugueses pelo cumprimento das medidas de segurança e que, mesmo depois de um verão

mais calmo no que ao número de infeções diz respeito, souberam fazer o que lhes era pedido.

Página 43

5 DE DEZEMBRO DE 2020

43

Este Relatório fala-nos de normalidade como se normalidade houvesse. Nem todos os trabalhos podem ser

feitos através do teletrabalho e, por isso, são muitos os que precisam de se deslocar para os seus locais de

trabalho, para as escolas em transportes públicos que lhes garantam segurança e onde seja possível manter a

distância exigida.

Contudo, continuamos a assistir a promessas. Apesar de estar estabelecido o limite de pessoas em locais

fechados para os mais diversos espaços, continuamos a não ver aplicada a mesma regra nos transportes

públicos.

Lê-se o Relatório e parece que estamos a falar de outro país.

Refiro os que foram trabalhar mantendo em funcionamento as empresas e os serviços essenciais, os que

assumiram a solidariedade para com os que precisam, mas que não desistiram de agir e lutar por direitos e por

aquilo em que acreditam, e, em particular, os profissionais do Serviço Nacional de Saúde, que, mais uma vez,

deram tudo quanto podiam para minimizar os efeitos do surto epidémico que enfrentamos.

Continua a ser usada a figura do estado de emergência ao fim de quase um ano e as mudanças necessárias

continuam a ser aplicadas a conta-gotas.

Em estado de emergência, opta-se por reduzir novamente os horários dos transportes, que continuam

sobrelotados, apesar de o Relatório nos informar que «têm sido esporádicos e pontuais os eventos em que se

verificaram valores próximos dos 2/3 da capacidade dos veículos».

Existem localidades abandonadas às quais ainda não foi devolvida a mobilidade nem a normalidade dos

cuidados de saúde primários.

As escolas voltaram às suas atividades presenciais, como defendemos, mas não podemos deixar de referir

que é lamentável que um governo que privilegia tanto os meios digitais e o desenvolvimento tecnológico nos

serviços públicos não tenha sido capaz de trabalhar um programa que monitorizasse os casos de COVID-19

nas escolas de todo o território para garantir maior segurança e confiança aos estudantes, à comunidade escolar

e aos encarregados de educação.

E, infelizmente, no presente Relatório nada se diz quanto aos impactos destas medidas na saúde mental,

particularmente dos jovens.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Apreciamos hoje mais um Relatório do estado de emergência, num contexto em que os números são bastante

claros e em que se verifica uma tendência de crescimento que não só se manteve como ganhou proporções

preocupantes, sendo a média dos casos confirmados de infeção por dia mais do dobro em relação aos valores

do mês anterior. Para além destes números, também assistimos, neste período de estado de emergência, a um

aumento muito expressivo dos casos em internamento hospitalar, e são já mais de 4000 as pessoas que

perderam a sua vida para a COVID-19.

Relativamente à crise económica que vivemos, nos indicadores económicos que este Relatório nos traz,

voltamos a observar uma tendência muito negativa, com a retração do indicador de confiança dos consumidores

em novembro e a redução da confiança dos operadores económicos, uma realidade que, para a conhecermos,

não precisávamos de um relatório, pois basta olharmos para as nossas ruas e para o que tem sido o fecho

sistemático dos vários setores, do comércio e serviços, para percebermos a difícil crise socioeconómica que

estamos a atravessar.

Por isso mesmo, reforçamos o que já temos vindo a dizer: é urgente dar estabilidade e previsibilidade às

medidas tomadas. Só assim conseguimos que os portugueses e as portuguesas ganhem confiança no seu

futuro. E conforme ainda ontem o PAN teve a oportunidade de aqui referir, é absolutamente fundamental que,

de forma estruturada e planeada, se garanta a existência de apoios que permitam dar resposta aos diferentes

setores que estão a ser afetados pela crise, como a cultura, a restauração, o comércio, os serviços, entre tantos

outros.

No entanto, sabemos que as medidas que visam conter ou minimizar o risco de propagação do vírus estão

a produzir efeito, pois, como nos aconselham os especialistas, as medidas atualmente em vigor não devem ser

Página 44

I SÉRIE — NÚMERO 27

44

drasticamente levantadas, mas antes devem ser levantadas de forma progressiva e planeada e, evidentemente,

articulada com o que virá a ser o plano de vacinação.

Não podemos deixar de sublinhar, uma vez mais, a importância da preparação, decisão e execução das

medidas ser feita de uma forma responsável e com o absoluto respeito pelo princípio da proporcionalidade e

necessidade, com um equilíbrio entre os sacrifícios pedidos e as vantagens obtidas, sem esquecer a

necessidade de comunicar estas medidas de forma clara e coerente.

Sendo certo que esta crise não é apenas sanitária, mas é também económica, social e ambiental, é

fundamental que as medidas adotadas sejam capazes de dar respostas globais e de prestar um auxílio eficaz a

todos os setores da sociedade, ou correremos o risco de sair do período pandémico em completa catástrofe

social e económica ou também pautado pela incoerência.

O que não pode acontecer é exigirmos medidas e confinamento aos portugueses e termos em contraciclo

ações contraditórias ao que é pedido.

Muito se tem falado também sobre o risco de esta crise sanitária enfraquecer a nossa democracia. Mas o

estado de direito democrático não se garante unicamente em comícios, congressos ou afins; o estado de direito

democrático garante-se neste Hemiciclo, garante-se com a capacidade de esta Assembleia assumir um papel

não meramente de observadora ou de fiscalizadora, mas legislando para dar respostas de que o País tanto

precisa e para que esta crise sanitária não belisque a nossa democracia.

A ponderação do levantamento do estado de emergência até poderia ser, a este tempo, uma medida popular,

mas não é uma medida eficaz para o que estamos a viver. Nesse sentido, teremos de continuar com o esforço

que tem sido feito por todos e por todas, em particular pelos que estão na linha da frente ao combate à COVID-

19 ou a assegurar serviços essenciais e a quem nunca seremos capazes de agradecer o suficiente, planeando,

legislando, garantindo respostas e investimentos nos diferentes setores, da saúde à educação, à habitação,

entre tantos outros que são absolutamente fundamentais para as respostas que esta crise nos exige.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Para avaliarmos a atuação do Governo na aplicação do estado de emergência, temos de

analisar se essa atuação foi geradora de confiança, no sentido em que as medidas que tomou tenham sido

equilibradas, tenham sido bem comunicadas e tenham sido eficazes.

Do ponto de vista do equilíbrio, parece-nos, claramente, que isso não aconteceu. Houve uma restrição de

liberdades desequilibrada, que transpôs para o fim de semana, para a vida familiar e para o justo descanso a

que as pessoas têm direito uma carga negativa, que teve, no início, uma suposta justificação estatística e que,

prontamente, acabou por ser desmentida. Portanto, se a justificação estatística para esta opção era falsa, o

equilíbrio destas medidas restritivas ao fim de semana ficou também por justificar.

Esta restrição repercutiu-se nalguns setores com um peso muito superior ao de outros. Ninguém consegue

compreender porque é que às 13 horas se tinham de fechar os estabelecimentos de restauração quando,

obviamente, por duas horas, isso causava um prejuízo que era desproporcionado com aquilo que, do ponto de

vista da saúde pública, se conseguia proteger.

Depois, noutros setores, como diz o Relatório, como na educação, por exemplo, continua a não se conseguir

resolver problemas de diferenças absolutas entre o que umas e outras escolas fazem, mesmo no que respeita

apenas à oferta pública de ensino.

Por outro lado, temos a comunicação que, para além de ter sido feita a desoras, gerou dúvidas sobre o

conteúdo das medidas e sobre o seu alcance. A certa altura, perante as exceções, já ninguém percebia qual era

a regra. Querendo cumprir, os cidadãos estavam emaranhados numa complexidade entre a regra e as exceções

e não sabiam se as regras se aplicavam a si e, se se aplicassem, quando é que tinham de as cumprir.

Provavelmente, o que é mais evidente na ineficácia das medidas apresentadas é aquilo que constatou

qualquer pessoa que tenha saído à rua numa manhã de sábado dos fins de semana a que respeita este estado

de emergência. É óbvio que a restrição da possibilidade de famílias e de pessoas individualmente poderem

programar a sua vida ao longo do fim de semana e terem de a restringir às manhãs originou congestionamentos

que estão muito longe daquele que seria o objetivo com a entrada em vigor destas medidas.

Página 45

5 DE DEZEMBRO DE 2020

45

Por isso, o que entendemos que o Governo apresenta como relatório da sua atuação neste estado de

emergência é a restrição máxima e a confiança mínima. E num estado de direito, num estado democrático, num

estado em que tem de prevalecer como valor a liberdade, a restrição máxima imposta por um Governo que é

incompetente nunca poderá funcionar bem.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos em crer que este Relatório que o Governo apresenta relativamente ao cumprimento dos primeiros 15 dias do

estado de emergência, declarado já no mês de novembro, levanta dúvidas, ou melhor, não esclarece as dúvidas

que persistem sobre a verdadeira eficácia das medidas restritivas e da necessidade do estado de emergência

para combater a epidemia, nem dá uma cabal resposta à necessidade de se encontrarem soluções de apoio,

particularmente de apoio social e económico, perante o avolumar dos problemas económicos e sociais que

resultam destas medidas restritivas.

Estes são dois dos aspetos que, para nós, continuam a ser fundamentais na abordagem das medidas a tomar

no combate à epidemia, seja ou não no âmbito do estado de emergência, aliás, entendemos nós que para lá do

estado de emergência, sem necessidade do estado de emergência.

Queria dizer, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, que o Relatório não reflete, em nosso

entender, de forma adequada, o avolumar dos impactos económicos e sociais das medidas restritivas em toda

a sua extensão, porque, olhando à volta, contactando com agentes económicos, contactando com pequenos e

médios empresários, contactando com os trabalhadores, com os sindicatos, com as organizações sociais e

culturais, com coletividades de cultura, recreio e desporto por esse País fora, apercebemo-nos de uma realidade

económica e social cujos impactos negativos, que são consequência direta das medidas restritivas, vão muito

para lá daquilo que está refletido neste Relatório que o Governo apresenta à Assembleia da República. E era

importante que essa dimensão da realidade nacional estivesse aqui corretamente identificada para que, do ponto

de vista das medidas a tomar, se pudesse fazer uma verdadeira avaliação da sua adequação e da sua

necessidade.

Simultaneamente, isto implica que o próprio Relatório também não possa refletir as circunstâncias

verdadeiramente dramáticas que resultam da falta de apoio a pequenas e médias empresas, a setores

económicos fustigados pela crise desde há meses e que continuam sem ter resposta às suas necessidades

mais imediatas, não apenas para poderem fazer face a despesas, a encargos e a custos que continuam a ter,

apesar de não terem atividade económica, mas até, sobretudo, para perspetivarem o futuro. Qual vai ser o futuro

de setores económicos que estão impedidos de desenvolverem a sua atividade ou muitíssimo limitados do ponto

de vista das condições que têm e das possibilidades que se lhes colocam para poderem desenvolver a sua

atividade?

Queria terminar com uma referência muito direta às questões relacionadas com a saúde e às medidas que

têm sido tomadas no âmbito da saúde.

Nada do que está refletido neste Relatório sobre o estado de emergência necessitava da declaração do

estado de emergência. Mas registamos positivamente as referências que são feitas a medidas tomadas de

reforço da capacidade de testagem, de aumento do número de ventiladores ou outras medidas que têm sido

tomadas no âmbito da saúde pública. E sublinhamos este aspeto: nenhuma das medidas relacionadas com o

reforço do Serviço Nacional de Saúde, com o reforço das estruturas de saúde pública necessitava da declaração

do estado de emergência.

O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente. E isto deve fazer pensar para que, verdadeiramente, se reflita e se tomem as decisões adequadas, porque

o estado de emergência cada vez mais se confirma como uma desnecessidade face ao que é verdadeiramente

essencial para fazer face à epidemia e aos seus impactos económicos e sociais.

Aplausos do PCP.

Página 46

I SÉRIE — NÚMERO 27

46

O Sr. Presidente: — Segue-se no uso da palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Moisés Ferreira.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Foi há cerca de um mês que a Assembleia da República aprovou, e posteriormente renovou, a declaração do estado

de emergência no País, e essa aprovação deu ao Governo ferramentas adicionais para lidar com a pandemia

nas suas várias vertentes e nas suas várias consequências.

A questão que se coloca nesta avaliação ao estado da emergência é a de saber se o Governo fez ou não

bom uso dessas ferramentas que a Assembleia lhe proporcionou.

Neste momento, Portugal continua com uma incidência alta, mas com tendência de decréscimo de casos de

COVID, e espera-se que já tenhamos ultrapassado o pico da segunda vaga. Continuamos, no entanto, com um

número muito alto de novos casos, com muitos concelhos em risco extremo e com uma pressão enorme sobre

o SNS, nomeadamente sobre a sua capacidade de internamentos, em especial nos cuidados intensivos.

No mês de novembro, o Serviço Nacional de Saúde viveu as suas semanas mais dramáticas desde o início

da epidemia. Foram semanas que, aliás, coincidiram com relatos de perda de profissionais por não renovação

de contratos de quatro meses e que coincidiram com o apelo constante por parte de profissionais e de

instituições do SNS para a contratação de mais profissionais.

Ainda assim, nos vários anúncios que o Governo fez sobre a concretização do estado de emergência, nada

foi dito de substancial sobre essa necessidade de reforço do SNS e, mesmo sobre o setor privado da saúde, o

Governo preferiu sempre optar pela compra de serviços por milhares de euros por dia em vez de integrar, sob

gestão do SNS, os recursos que eram necessários. O Governo preferiu sempre comprar avulso ao setor privado,

de forma pouco planeada, em vez de construir uma resposta mais eficaz e mais robusta, integrando esse setor

privado.

O Governo tinha todo o suporte para fazer essa integração, tinha todo o suporte para fazer essa construção,

mas faltou-lhe coragem para exigir a este setor o tanto que está a ser pedido, exigido, a trabalhadores e a tantos

outros setores da atividade.

Têm faltado também medidas de apoio, ou seja, medidas que façam com que medidas de restrição sejam

acompanhadas de medidas de apoio social e económico. Não ter medidas que cheguem às áreas mais afetadas

pela pandemia é, verdadeiramente, condenar à falência setores de atividade e condenar ao desemprego vários

trabalhadores.

O Governo tem sido generoso nos anúncios, é verdade, mas muito parco nas concretizações. A verdade é

que, ao fim de todo este tempo, muitos pequenos negócios em muitos setores de atividade continuam apenas

com os anúncios, e os anúncios, certamente, não dão para viver, muito menos para sobreviver.

Sr.as e Srs. Deputados, a crise é sanitária, social e económica, todos o sabemos, e vencer a crise é intervir

nestas três áreas, e é intervir com instrumentos robustos, que têm tardado, é intervir com medidas concretas e

decididas e não insistir em responder pelos mínimos, porque isso não é uma solução.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Neves.

O Sr. André Neves (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD, historicamente, sempre se apresentou como um partido responsável e sempre esteve do lado da solução, do

lado do combate a esta pandemia, tendo dito, por diversas vezes, que iria sempre dotar o Governo das

ferramentas, dos instrumentos e dos meios necessários para combater esta pandemia. Por isso, votou

favoravelmente o estado de emergência, que agora analisamos sob o ponto de vista deste Relatório. Mas isso

não quer dizer, Sr. Ministro da Administração Interna, que apesar de pretendermos dar as necessárias

ferramentas ao Governo para poder implementar e regular esse mesmo estado de emergência, ele não está

isento de críticas.

Gostava de salientar duas notas essenciais.

Em primeiro lugar, faltou planeamento e prevenção para a segunda vaga. Chegámos mesmo ao cúmulo de,

aquando do anúncio da regulamentação desse mesmo estado de emergência, prevermos as limitações para os

Página 47

5 DE DEZEMBRO DE 2020

47

concelhos que ultrapassavam os 240 casos por 100 000 habitantes, quando o País, já nessa altura, em média,

tinha infeções na ordem dos 700 casos por 100 000 habitantes. Foi tarde! Notou-se, claramente, a falta de

planeamento e de prevenção por parte do Governo.

Eventualmente, se tivéssemos agido de outra forma, com planeamento, com prevenção, de forma atempada,

as medidas restritivas de circulação de liberdade e prejudiciais à economia teriam sido menores, não tão

gravosas, e os efeitos na economia seriam diferentes daqueles que se estão a sentir hoje.

Planeamento e prevenção salvam vidas, poupam vidas, poupam a economia e poupam empregos, e ficou

claramente demonstrado que a regulamentação deste estado de emergência podia ter sido feita de outra forma,

de uma forma mais eficaz, coisa que, aliás, veio a acontecer na segunda regulamentação do estado de

emergência, ao escalonarem-se as medidas por limite de infeções, de outra forma, que não como da primeira

vez. Se todos nós tivéssemos conhecido no verão, nos meses que antecederam a segunda vaga, as medidas

limitativas nos concelhos mediante a ultrapassagem de determinados limites de infetados, se o tivéssemos

sabido de forma atempada, teríamos agido de outra forma e, se calhar, o SNS não teria entrado na pressão que

entrou e a economia não estaria, hoje, a sofrer o que está a sofrer.

A segunda nota que queria deixar é em relação à economia ou, melhor, à falta de medidas de apoio à

economia. Provavelmente, este deve ser o único Governo que, ao mesmo tempo que anuncia medidas restritivas

para a economia, não apresenta qualquer medida compensatória de apoio à economia. Aquilo que se sente, Sr.

Ministro, é que, neste momento, o Governo está única e simplesmente à espera da chamada «bazuca» para

apoiar a economia, as nossas empresas, os nossos empresários e os nossos trabalhadores, mas não sabemos

quando é que essa «bazuca» vai chegar, nem sequer se ela vai mesmo chegar.

Apresentam medidas restritivas, mas não apresentam medidas de apoio à economia. Apresentam o

Orçamento, mas não temos medidas de apoio à economia. Quando chegar a «bazuca», esperemos que já não

seja tarde demais para salvarmos a economia, para salvarmos empregos. Esperemos, Sr. Ministro!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro da Administração Interna, Sr.ª Ministra da Saúde e Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: A primeira nota que

gostaríamos de deixar é para saudar a informação prestada, não só no âmbito deste Relatório sobre o estado

de emergência, mas durante todo o período em que, não estando em vigor o estado de emergência, o Governo

nunca deixou de permitir à Assembleia ter mecanismos para controlar as medidas excecionais, decorrentes da

Lei de Bases da Proteção Civil, que hoje nos permitem um quadro completo para percebermos a evolução da

pandemia desde que terminou o último estado de emergência, em maio, até ao momento em que, infelizmente,

tivemos de voltar a declará-lo.

Há um contínuo que melhora esta análise e esta avaliação e que também nos permite ser claros na análise

quanto à proporcionalidade das medidas. Esta é a palavra-chave deste debate, esta é a palavra essencial para

percebermos o alcance do que se podia fazer, do que se fez e do que se continua a fazer. É inegável a

necessidade de medidas mais restritivas nesta fase.

Sr. Deputado André Neves, basta olharmos para o que se passa pela Europa fora, basta olharmos para o

que aconteceu noutros Estados, que foram surpreendidos pelas mesmas características, pela mesma dimensão,

pela mesma escala, mas que, ainda assim, adotaram medidas ainda mais gravosas, que mais penalizaram a

sua atividade, para bem vermos que aquilo que encontramos descrito no decreto que declara o estado de

emergência é um quadro mais adequado, mais proporcional, que tenta, tanto quanto possível, proteger a

economia até onde ela possa ser protegida e, acima de tudo, dar prioridade à proteção do Serviço Nacional de

Saúde, porque, queiramos ou não — e concordamos com aquilo que foi dito pelos Srs. Deputados do Bloco de

Esquerda, do PCP, do PAN e por outros Srs. Deputados que usaram da palavra —, são necessários mais meios,

meios esses que estão a chegar.

Infelizmente, a pandemia chega mais depressa do que muitos dos meios que são postos em prática para

reforçar o SNS e, por essa mesma razão, não podemos também prescindir das medidas que restringem as

Página 48

I SÉRIE — NÚMERO 27

48

liberdades em alguns pontos, quando isso é essencial e indispensável para podermos garantir, com

proporcionalidade, com equilíbrio, medidas que assegurem a melhor proteção destes dois eixos: salvaguardar

o SNS e a sua capacidade de resposta e salvar vidas e, ao mesmo tempo, garantir que a economia continua

viva e que terá por onde recomeçar e por onde ser reforçada.

Mais uma vez, Sr. Deputado André Neves, também não é correto aquilo que disse quanto à não apresentação

de medidas. Efetivamente, só no período que estamos a descrever, do final do mês de novembro, um reforço

para dar capacidade de tesouraria às empresas no valor de 1,5 mil milhões de euros, que foi disponibilizado e

reforçado, tem de ser reconhecido como aquilo que a República pode mobilizar neste momento.

Aplausos do PS.

Bem sabemos que, a seguir, teremos oportunidade de beneficiar do esforço europeu para continuar a fazer

essa trajetória, mas, neste momento, as medidas existem. Obviamente, sabemos da grande dificuldade que

muitas empresas enfrentam, sabemos da grande dificuldade que o setor da restauração, em particular, enfrenta,

mas também temos de saber que não é uma arbitrariedade, que estas opções de restringir algumas atividades

não foram um capricho, porque se sabe — sabe-se com evidência científica — que há zonas em que o contágio

é superior.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sabe-se…!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Já agora, em relação ao seu aparte, Sr. Deputado João Almeida, quero dizer-lhe que o que sabemos é que não podemos simultaneamente validar, em abstrato, as medidas — como o

Sr. Deputado e o CDS fizeram em momentos anteriores — e, depois, não querer as consequências, em concreto,

da validação dessas medidas. Se reconhecemos, em abstrato, que há necessidade de proceder a restrições,

infelizmente temos de lidar com a dureza de sentir os efeitos dessas mesmas restrições. Também por essa

razão, não podemos concordar com o equilíbrio, dizer que preferimos medidas ajustadas, mas, depois, não

perceber que, obviamente, isto tem complexidade, é mais difícil de comunicar e pode não ser logo evidente num

primeiro momento.

Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

É por estas razões que este é um esforço particularmente difícil, extraordinariamente difícil, e é por essa

razão que saúdo todos os grupos parlamentares que usaram da palavra, não querendo dividir onde a divisão

nada acrescenta.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Há quem não falhe uma oportunidade para estar sempre ao sabor do vento, pedindo as mais duras das medidas e, depois, vindo criticar as consequências das medidas que, na

véspera, solicitava.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir, por favor.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Portanto, não é manipulando a comunidade nem manipulando a verdade que vamos alcançar algo. É, fundamentalmente, através do reforço do papel de todos na resposta à

pandemia que conseguiremos superar a dificuldade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para encerrar este debate, vão usar da palavra, em nome do Governo, a Sr.ª Ministra da Saúde e o Sr. Ministro da Administração Interna.

Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Ministra da Saúde.

Página 49

5 DE DEZEMBRO DE 2020

49

A Sr.ª Ministra da Saúde (Marta Temido): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muitas vezes, ao longo desta pandemia, esquecemo-nos de que estamos a lidar com uma doença. Faltou a compreensão de que a

COVID-19 é uma doença — uma doença nova, aliás —, que, como qualquer doença, exige respostas dos

sistemas de saúde, mas também respostas sociais e respostas individuais.

O estado de emergência não é, de facto, um instrumento para travar o vírus, é um instrumento constitucional,

e não o usamos nem por gosto nem por motivos ocultos. Aliás, lançamos mão dele porque acreditamos na

democracia e não classificamos como «circo» protestos que, naturalmente, nos angustiam, porque nos

angustiam todas as preocupações dos portugueses.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, não há noites mais duras, não há noites mais escuras do que aquelas em que o

Governo procura equilíbrios difíceis. Para que serviu o estado de emergência? Para a saúde, em três ou quatro

aspetos que destaco: limitação às liberdades de deslocação, controlo do estado de saúde das pessoas com

meios mais agressivos do que o habitual, utilização de meios de prestação de cuidados dos setores privado,

social e cooperativo e convocação de recursos humanos para reforço da capacidade de rastreio.

Quero falar em particular de dois temas, o primeiro dos quais é a utilização de meios de prestação de

cuidados de saúde dos setores privado, social ou cooperativo. Recordo, Sr. Deputado Moisés Ferreira, que é

isso que o decreto presidencial nos atribui: podem ser utilizados pelas autoridades públicas competentes,

preferencialmente por acordo, os recursos, meios e estabelecimentos. Foi isso que fizemos, com a utilização de

cerca de 300 camas na Administração Regional de Saúde do Norte e de cerca de 100 camas na Administração

Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, as duas mais pressionadas.

Além disso, procedemos à utilização de profissionais que não os do setor de saúde para a realização de

inquéritos, com cerca de 170 militares a trabalharem na recuperação de inquéritos epidemiológicos, para além

de técnicos das autarquias e professores.

O resultado e a avaliação estão à vista: o pico foi atingido, os portugueses estão a vencer, estamos todos a

conseguir.

A oradora exibiu um gráfico.

Muito obrigada a todos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Saúdo a abordagem das diversas bancadas que reconhecem quando estamos, neste debate, num exercício de transparência

democrática, num exercício de coesão e num exercício de mobilização de todos os esforços pela defesa das

liberdades democráticas e pela defesa da saúde dos portugueses.

É um exercício de transparência porque este relatório permite um debate circunstanciado com um Governo

que presta provas daquilo a que se comprometeu com o Parlamento e com os portugueses. Este é, aliás, o 10.º

relatório desde março, ao abrigo do estado de emergência ou das diversas situações excecionais previstas na

Lei de Bases da Proteção Civil.

Em segundo lugar, é um exercício de coesão, permitindo explicitar qual o esforço de todos os setores. Queria

que aqueles que dizem que as medidas são exageradas nos dissessem qual é o país, daqueles que estão

próximos de nós, que tem medidas menos restritivas. Espanha, França, Alemanha, Itália ou Reino Unido:

desafio-os a dizer qual foi, destes países, aquele que teve medidas menos restritivas em novembro.

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Ministro.

Página 50

I SÉRIE — NÚMERO 27

50

O Sr. Ministro da Administração Interna: — É um exercício de apoio à economia, de solidariedade com aqueles que sofrem nos setores mais diretamente atingidos. Como veremos no debate seguinte — e os

resultados estão à vista —, este foi um período em que estivemos já a trabalhar pela saúde, mantendo o respeito

pelas liberdades fundamentais, para que a pandemia não ponha em causa a democracia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Chegamos, assim, ao final deste ponto da ordem do dia. Passamos agora ao debate sobre a renovação da autorização, solicitada pelo Presidente da República, para

a declaração do estado de emergência.

Como sabem, foi recebido ontem e distribuído atempadamente o projeto de decreto do Sr. Presidente da

República, de que vos passo a ler o primeiro parágrafo, poupando-vos à leitura dos restantes:

«A situação de calamidade pública provocada pela pandemia COVID-19, com números de infetados e de

falecimentos ainda muito elevados, muito embora se verifique uma evolução da tendência de descida, com

redução da taxa de crescimento desses números, mas com os claros riscos de agravamento em caso de

diminuição das medidas tomadas para lhe fazer face, como alertado pelos peritos e pelo Centro Europeu de

Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC), exige a renovação da declaração do estado de emergência, para

consolidar a atual trajetória.»

Para abrir o debate, em nome do Partido Socialista, tem a palavra a Sr.ª Deputada Constança Urbano de

Sousa.

A Sr.ª Constança Urbano de Sousa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e demais Srs. Membros do Governo: Hoje voltamos a discutir o estado de emergência, pois, infelizmente,

continuamos a necessitar de medidas que contribuam para evitar a propagação da COVID-19.

Como se pode ler no preâmbulo do projeto de decreto do Sr. Presidente da República, as medidas duras

adotadas ao abrigo do estado de emergência contribuíram para melhorar os indicadores da evolução da

pandemia, em especial o risco de transmissão da doença, que regista uma tendência de descida.

A esta notícia animadora soma-se a esperança de termos em breve uma vacina segura, eficaz e validada

pela Agência Europeia de Medicamentos, em especial a da BioNTech, em cooperação com a Pfizer, já

autorizada no Reino Unido. Quis o destino, ou a sua ironia, que esta vacina promissora tivesse sido desenvolvida

pela empresa alemã de um casal de cientistas e imunologistas, Ugur Sahin e Özlem Türeci, filhos de imigrantes

turcos na Alemanha, um país europeu onde a AfD, Alternative für Deutschland, uma espécie de irmão do Chega,

obtém ganhos eleitorais com o discurso binário e fraturante do «nós» e «os outros», que alimenta o ódio contra

as minorias étnicas e religiosas. Em boa hora a Alemanha acolheu estes turcos, que deram origem a este casal

alemão, pois, graças ao seu talento e à sua competência, teremos acesso a uma vacina que nos pode livrar, a

todos, do pesadelo em que vivemos.

Aplausos do PS.

No entanto, apesar de os dados serem mais animadores, de a vacina estar mais próxima e de já termos,

desde ontem, um plano de vacinação, não nos deixemos iludir: a situação pandémica é ainda grave e não

podemos agora baixar a guarda e deitar tudo a perder, pois, infelizmente, todos os dias continuam a morrer

pessoas vítimas deste vírus terrível. Mesmo que a Agência Europeia de Medicamentos declare esta mesma

vacina eficaz e segura, o processo de vacinação de toda uma população, ou de grande parte dela, é muito

complexo, faseado, e nunca poderá ser realizado em poucas semanas ou em poucos meses.

Vamos, assim, continuar a precisar de medidas de segurança e de restringir os nossos contactos ao

estritamente necessário para vencer esta pandemia. Também por isso, precisamos de renovar o estado de

emergência para permitir que o Governo mantenha e adote medidas que contribuam para evitar a propagação

do vírus, salvar vidas e, ao mesmo tempo, não matar a nossa economia, à semelhança do que os outros países

europeus estão a fazer.

Sei bem que, a 4 de dezembro, a todos se coloca a questão de saber como é que vamos passar o Natal e o

Ano Novo, épocas festivas de convívio por natureza, que tanto prezamos. Mas não podemos esquecer que estas

Página 51

5 DE DEZEMBRO DE 2020

51

são festas que o vírus desconhece, pelo que todos temos de ter consciência de que todo o cuidado é pouco e

que nenhum sacrifício é demais quando se trata de salvar uma vida humana.

Hoje, vamos autorizar novamente o estado de emergência, para permitir, à semelhança do anterior, medidas

restritivas diferenciadas consoante o risco de infeção, de modo a reduzir esse risco e a salvar vidas.

Tal como disse há 15 dias, não estamos a suspender a democracia, nem a atentar contra o núcleo duro dos

direitos fundamentais, mas tão-só a equilibrar a nossa liberdade com o bem-estar de todos. Tal como disse há

15 dias, também continuo hoje a ter a plena confiança de que o Governo continuará a usar estes poderes

ampliados com ponderação e proporcionalidade.

O Parlamento, mais uma vez, diz «presente» e participa ativa e democraticamente neste esforço coletivo de

luta contra a pandemia, pois não pode — como nunca poderá — fugir à sua responsabilidade de tomar decisões

difíceis quando se trata de proteger a vida, a saúde e o bem-estar da comunidade que deve servir.

Por todas estas razões, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista vai votar favoravelmente a renovação do

estado de emergência e vai fazê-lo com a certeza de que a sua necessidade vai terminar no dia em que

vencermos juntos esta batalha. Hoje, estamos muito mais próximos de vencê-la do que estávamos ontem, mas,

para tal, precisamos de continuar a correr esta maratona. Sei bem que os últimos quilómetros de uma maratona

são os mais difíceis de percorrer, porque acusam o cansaço de todos aqueles quilómetros que já corremos, mas

o facto de, em breve, termos uma vacina é uma luz ao fundo do túnel, que nos deve dar força para unirmos

todos os esforços para chegarmos a bom porto.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Constança Urbano de Sousa (PS): — Já concluo, Sr. Presidente. Tal não depende das instituições e dos Estados, depende também, e muito, de todos e de cada um de nós,

pois o vírus vive e alimenta-se do nosso comportamento e dele depende a vida de muitas pessoas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PSD, a Sr.ª Deputada Mónica Quintela.

A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Os dados que conhecemos da pandemia mostram que as medidas restritivas dos contactos

sociais têm surtido efeito na diminuição do contágio e da propagação do vírus, levando a um decréscimo do

número de infetados e de mortes.

Os especialistas ouvidos ontem, na reunião do Infarmed (Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos

de Saúde), reiteraram a informação — objetiva, de resto — de que o cumprimento das regras de distanciamento

social, o uso de máscara e a diminuição dos contactos são fundamentais para continuar a achatar a curva do

número de infetados e manter a tendência de descida da doença, o que permite libertar espaço no Serviço

Nacional de Saúde. Quanto maior for a capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde, mais vidas se

salvam e mais tratamentos são assegurados.

A renovação do estado de emergência é essencial para dotar o Governo dos instrumentos legais que o

habilitem a implementar as medidas que entenda adequadas para prevenir o contágio da pandemia, que são

necessariamente restritivas do dia a dia dos cidadãos e das empresas e que contendem com os direitos,

liberdades e garantias constitucionalmente consagrados.

O PSD, responsavelmente e com o sentido de Estado que é seu timbre, manterá uma postura de

colaboração, tendo sempre como primeiro e último escopo o interesse nacional. Portugal está primeiro e, por

isso, não nos pautamos por conveniências circunstanciais e aproveitamentos das manifestas e múltiplas falhas

que o Governo tem tido, porque esse tipo de condutas, em plena situação de calamidade pública, é prejudicial

aos interesses dos portugueses.

Recordo que o Governo beneficiou de condições políticas excecionalíssimas de cooperação, por parte do

PSD, que lhe teriam permitido levar a gestão da pandemia a um porto bem melhor do que aquele em que tem

atracado. Fruto do sentido de Estado que norteia o PSD, o Governo pôde concentrar-se exclusivamente no

Página 52

I SÉRIE — NÚMERO 27

52

combate à pandemia, a bem de Portugal, ao contrário do que sucedeu com outros países, como a vizinha

Espanha, que, a par da situação de calamidade, viu-se a braços com uma fortíssima oposição.

Há um tempo para as coisas e este é o tempo de salvar vidas e de envidar todos os esforços para defender

o nosso País, o nosso povo, em todas as vertentes, desde a saúde à economia, que está tão depauperada.

Por isso, construtivamente, não podemos deixar de condenar que o Governo tenha passado o verão como a

cigarra, sem cuidar de preparar, como era a sua obrigação, a segunda vaga, que todos sabíamos ser certa e

muito difícil, assim como censuramos a falta de articulação entre o Ministério da Segurança Social e o da Saúde,

o que tem sido a causa do flagelo que tem assolado os lares, onde residem tantos idosos.

Não consigo calar a inaceitável falta de assistência, no Serviço Nacional de Saúde, aos doentes que não têm

COVID-19. Não podemos também calar a falta de tratamento dos doentes oncológicos e com outras patologias,

que têm piorado e morrido às mãos da incúria do Ministério da Saúde. Criticamos a impreparação do Serviço

Nacional de Saúde para os doentes com COVID-19 — também para esses. A necessidade premente de salvar

vidas não se compadece com cedências a preconceitos ideológicos de antigos e de ainda parceiros do Governo,

que demandou recursos aos setores privado, social e cooperativo, em conjugação de esforços com o Serviço

Nacional de Saúde.

Continuando na crítica sempre construtiva, fica também o vivo reparo à falta das prometidas vacinas da gripe,

que a Ministra da Saúde afirmou que não iriam faltar. Hoje, o resultado está à vista. O Governo não foi prudente

nem previdente, porque era mais do que óbvio que, por causa da pandemia, a esmagadora maioria da população

iria precisar da vacina.

Não conhecemos ainda as medidas que o Governo pretende implementar, mas não parece desajustado que

sejam atenuadas no Natal, festa da família por excelência, e que sejam mais restritivas na passagem do ano.

Prevê-se um recrudescimento de casos no início de janeiro por causa das festividades e o facto de estarem já

anunciadas vacinas para essa altura não nos pode fazer baixar a guarda na prevenção da pandemia. É certo

que o Governo apresentou ontem o plano de vacinação, mas também já é certo que, durante o primeiro semestre

de 2021, não haverá vacinas disponíveis para todos, de modo a permitir a retoma da velha normalidade com a

celeridade que se impõe e que é necessária.

O Governo deve ajustar as medidas às circunstâncias concretas em cada momento e, agora, fica já a poder

planificar todo o hiato temporal até 7 de janeiro de 2021.

A pandemia está longe de estar debelada, infelizmente, e o próprio plano de vacinação gizado é elucidativo

disso mesmo, pelo que é do interesse nacional a manutenção do quadro legal do estado de emergência. O PSD

votará favoravelmente.

A minha última palavra é para enaltecer a atitude de civismo e de responsabilidade que os portugueses têm

tido nestes tempos tão difíceis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, para uma intervenção.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos perante um pedido, solicitado pelo Sr. Presidente da República, para a terceira

renovação do estado de emergência nesta segunda vaga de COVID-19.

Corremos o risco de entrar numa banalização destes debates e de esquecer que estamos perante um

elemento extraordinário do nosso quadro constitucional. Por isso, é bom lembrarmo-nos da importância que tem

o estado de emergência no combate a esta emergência extraordinária, que é a pandemia da COVID-19. O pior

que poderíamos fazer era banalizar a suspensão de direitos, a limitação de direitos constitucionalmente previstos

e achar que o novo normal é esta vida extraordinária a que estamos agora a assistir.

É, por isso, importante termos sempre a consciência de que, se estamos agora a ver alguns resultados na

redução do número de infeções diárias, esses resultados têm de ser continuados no tempo para garantir que a

rede de saúde pública não faltará a nenhum nem a nenhuma de nós e que o País pode contar com o SNS, que

estará à altura das necessidades em cada um dos momentos da pandemia. Assim, creio que, em primeiro lugar,

nos devemos perguntar, acerca desta renovação do estado de emergência, se ela está à altura desta resposta.

Página 53

5 DE DEZEMBRO DE 2020

53

O Bloco de Esquerda diz hoje o mesmo que disse nos dois anteriores debates que tivemos sobre esta

matéria: não faltarão ao Governo os mecanismos necessários para fazer frente à pandemia.

Sabemos que as restrições de liberdades e de direitos, que afetam não só as pessoas mas também a

atividade económica, têm lançado dificuldades no País. Não ignoramos e apoiamos essas reivindicações de

quem olha para o Governo e diz que as restrições devem ser acompanhadas de apoios à economia e que há

setores fragilizados que precisam de respostas. O Governo tem anunciado apoios, mas tem tardado a

implementá-los.

Creio que este apoio que o Parlamento tem dado ao Governo, para que não lhe faltem os mecanismos

decorrentes do estado de emergência, tem, necessariamente, de ser secundado pela implementação das

necessárias medidas para o setor da economia e para as pessoas, de modo a responder às dificuldades que

enfrentam neste período.

Em nome do Bloco de Esquerda, queria repudiar uma expressão que foi aqui dita hoje, porque, quando

falamos da dificuldade das pessoas, não devemos utilizá-las como meros instrumentos para a demagogia

política. Quando, há minutos, o Sr. Deputado André Ventura, sobre um setor de atividade que se encontra em

dificuldades, como é o caso do setor da restauração, se referiu à luta desse setor como um «circo», creio que

demonstra bem como há oportunistas em todo o lado, à espreita, que vivem da desgraça dos outros em nome

do seu benefício político. Isso é inaceitável neste contexto e, da parte do Bloco de Esquerda, tem todo o nosso

repúdio.

Aplausos do BE.

Devemos, sim, ter uma atitude responsável perante o País e perante as pessoas, não ignorando a dificuldade

das suas vidas e tentando encontrar as soluções para os seus problemas.

Desse ponto de vista, insisto neste ponto, Sr. Primeiro-Ministro: é ao Governo, em primeiro lugar, que cabe

apresentar as soluções para as medidas de restrição de liberdades e de circulação que hoje serão aprovadas.

Da parte do Bloco de Esquerda, consideramos que é necessário haver uma outra vertente, que tem tardado

e não pode faltar. Sabemos que já se anuncia que uma vacina chegará ao País e que começará a ser

administrada no próximo mês de janeiro, mas sabemos também, e isso deve ser repetido, que esse processo

demorará meses, pelo que as necessárias medidas de contenção da pandemia têm de ser uma responsabilidade

individual e coletiva. Não podemos baixar os braços mesmo durante esses meses da vacinação.

Mais: é na comunicação que, muitas vezes, conseguimos sensibilizar as pessoas para o cumprimento destas

medidas. Se há coisa que o País nos tem ensinado a todos, mesmo àqueles que achavam que a lei devia ser

draconiana para com as liberdades individuais, é que a responsabilidade individual tem demonstrado estar à

altura dos acontecimentos. Por isso, uma estratégia de comunicação que explique que não podemos diminuir

os nossos cuidados em relação ao contacto com os outros, mesmo em espaço familiar, mesmo no período

festivo que vamos viver, é fundamental. Se vemos isso em tantos outros países, é estranho que ainda não tenha

acontecido em Portugal também. Creio que esta é uma das medidas que o Governo poderia colocar em cima

da mesa.

Como disse, viabilizámos estados de emergência anteriores e damos agora ao Governo, novamente, essa

possibilidade.

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Termino, Sr. Presidente. Que não faltem estes mecanismos para que, não só na área da saúde pública mas também na da economia,

o Governo não falte ao País, neste período exigente.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, do Grupo Parlamentar do PCP.

Página 54

I SÉRIE — NÚMERO 27

54

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e demais Membros do Governo: Repetindo-se a proposta de declaração da renovação do estado de emergência, o PCP

insiste nos argumentos para a sua rejeição e insiste na necessidade de dar-se resposta à epidemia com o reforço

do SNS, com a definição de regras de segurança sanitária nas diversas atividades e com medidas de apoio para

que essas regras de segurança sanitária sejam implementadas e cumpridas nas diversas dimensões da nossa

vida económica, social, cultural e cívica.

É preciso pôr fim às medidas restritivas que têm sido aplicadas sem certeza nem confirmação dos efeitos

que delas possam resultar, a não ser a ruína e a falência de setores inteiros, o desemprego e a pobreza dos

trabalhadores. Ficámos, ontem, a saber que não há nenhum elemento que demonstre que as limitações de

circulação entre concelhos tenham dado algum resultado positivo em termos de redução de contactos. E ficámos

também a saber que o decréscimo de contágios, que tem vindo a verificar-se nas últimas semanas, se iniciou

antes de ter sido decretado o estado de emergência.

Se é assim, para que serve verdadeiramente o estado de emergência? Para que servem as medidas de

restrição à circulação ou de recolher obrigatório, as medidas de limitação de horários e funcionamento de

estabelecimentos de comércio, serviços ou de restauração, as medidas de limitação da atividade artístico-

cultural? Para que serviu tudo isso se, antes mesmo de essas medidas terem sido decretadas, os portugueses

já tinham adotado comportamentos que permitiram a redução do número de contágios? Esta é,

verdadeiramente, a questão central desta discussão.

Não é possível continuar a discutir a renovação do estado de emergência ignorando que os argumentos que

sucessivamente são utilizados para o sustentar não têm demonstração, passando simultaneamente ao lado de

todas as suas implicações, de todos os problemas que está a criar, de todo o desespero que semeia. Este

desespero tem de ser compreendido e ultrapassado e não caracterizado como «circo», como aqui ouvimos,

hoje, o Sr. Deputado André Ventura dizer. Não é possível sustentar, nesta Assembleia, a declaração do estado

de emergência e suas medidas restritivas, aprovando-as, e depois ir para a rua lamentar os impactos

económicos e sociais que têm, como hipocritamente continua a fazer o PSD. O PSD, que aqui tem aprovado

todas as declarações do estado de emergência e permitido todas as medidas restritivas que daí resultam, anda,

depois, por aí, a dar palmadinhas nas costas dos empresários da restauração, da hotelaria, do turismo ou do

comércio, que arruína com as suas próprias decisões.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: Impõe-se, neste momento, uma reflexão de

fundo sobre os problemas que já hoje estamos a enfrentar e sobre o nosso futuro coletivo. É mais que evidente

que, mesmo com a disponibilização de vacinas já no início de 2021, vai demorar ainda muito tempo até que o

problema da epidemia esteja ultrapassado. E também é evidente que o País não aguenta, durante muito mais

tempo, os impactos económicos e sociais das medidas restritivas que têm sido impostas.

Torna-se cada vez mais evidente o que o PCP, há meses, reclama: reforce-se o SNS, definam-se, apliquem-

se e façam-se cumprir as medidas de segurança sanitária para que a vida nacional prossiga, mas ponha-se

travão às restrições que estão a afundar o País, económica e socialmente, sem resolver os problemas da

epidemia.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essas decisões devem ser tidas em conta adequadamente já para as semanas que aí vêm. Todos sabemos que o vírus não vai desaparecer porque é Natal ou porque o ano de 2020 vai,

finalmente, chegar ao fim. A quadra festiva não é justificação para que desapareçam as preocupações que têm

de ser mantidas no plano da saúde pública, mas é nesse plano que as decisões devem ser tomadas, com a

definição das regras de segurança sanitária que os portugueses devem observar, para que a normalidade

possível, neste período, inclua a garantia da saúde e da segurança sanitária.

Sem imposições ou restrições, mas com pedagogia e medidas claras, de forma a que cada um saiba e todos

cumpram as regras necessárias à segurança sanitária, num período de incontornável importância familiar, social,

mas também económica, insistimos que a resposta à epidemia, hoje como antes, tem de ser encontrada no

reforço do SNS, em especial dos serviços de saúde pública. Insistimos em ir reforçando a capacidade de deteção

e interrupção das cadeias de transmissão, a capacidade de internamento, incluindo em cuidados intensivos, a

Página 55

5 DE DEZEMBRO DE 2020

55

capacidade do SNS na resposta que tem de continuar a dar a todos os outros problemas de saúde dos

portugueses que não podem ficar adiados.

E têm, também, de considerar-se, em simultâneo, as medidas necessárias para que a atividade económica,

social, cultural, cívica ou política prossiga, para que os direitos laborais e sociais sejam respeitados, para que,

ao problema epidémico, não se somem problemas económicos e sociais cuja resolução futura será tão mais

difícil de encontrar quanto mais se avolumarem no presente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do CDS-PP. Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos hoje aqui, mais uma vez, para nos pronunciarmos sobre a autorização de

declaração do estado de emergência, um instrumento absolutamente excecional de restrição de liberdades.

Sendo o estado de emergência um instrumento absolutamente excecional, não pode deixar de merecer

referência o facto de aqui estarmos, mais uma vez, e de parecer que esta renovação já é quase um ato

automático, que esta é a aplicação daquilo que nos vendem como sendo um «novo normal». Não podemos

aceitar, nem podemos conformar-nos com esse suposto «novo normal». O que vivemos, bem como a declaração

do estado de emergência, é anormal, é excecional e tem de ser combatido para que, tão depressa quanto

possível, recuperemos o que é efetivamente normal, ou seja, uma vida em que a liberdade não pode ser posta

em causa e em que a saúde tem de ser garantida para que essa liberdade possa ser exercida.

É por isso que o facto de o Governo, como dissemos na análise do relatório do estado de emergência, não

ter, até ao momento, inspirado confiança nos cidadãos compromete, em muito, a resposta que é possível dar a

esta situação. O Governo não respondeu bem e falhou na preparação. Neste momento, o Governo falhou,

claramente, na preparação do segundo surto, que pareceu surpreendê-lo, quando não surpreendeu mais

ninguém por ser mais previsível. Mas falhou também na preparação, quando não propôs, em Portugal, o que

muitos outros governos propuseram em outros países, isto é, uma lei que se aplicasse a esta situação, uma lei

de pandemias que claramente determinasse quais as medidas e os procedimentos a aplicar numa situação

como esta e que remetesse o estado de emergência para o que fosse especificamente necessário, tirando tudo

aquilo que pode ficar de fora do estado de emergência e fora dessa excecionalidade, permitindo, também, que

os portugueses não estivessem, nas suas liberdades, tão limitados como estão neste momento.

Mas o Governo falhou, também, na resposta aos lares; aos transportes públicos; aos doentes não-COVID;

aos pais cujos filhos não têm escola e que não sabem como gerir a sua vida familiar, porque os filhos estão em

casa e os pais têm de ir trabalhar; à economia, deixando muitos setores sem qualquer tipo de resposta para

constrangimentos que não derivam da sua atividade económica, mas, sim, da atitude e das medidas unilaterais

aplicadas pelo Governo. Vamos ver se o Governo não falha na vacina contra a COVID, tal como falhou com a

vacina contra a gripe.

O Governo falhou, ainda, no equilíbrio das medidas e tal compromete a confiança, pela falta de transparência

das mesmas, pelo cuidado que não teve ao apresentá-las, com tantas exceções que já ninguém sabia qual era

a regra, pela sua apresentação tarde e a más horas, sem que ninguém compreendesse verdadeiramente o seu

objeto, tendo, também, a mais clássica das discriminações pela falta de equilíbrio no tratamento diferenciado

que sempre deu ao PCP em relação ao resto da sociedade portuguesa, dizendo claramente que quem aprova

orçamentos do Partido Socialista pode tudo aquilo que a generalidade dos portugueses não pode. Isto não tem

nada que ver com pandemia, tem que ver com politiquice e com a forma como o Governo geriu, desde o início,

esta situação.

O Governo não fez a lei que devia ter feito, não preparou a resposta que devia ter preparado, não foi

transparente ao dar conhecimento das medidas e ao aplicá-las, mudou de opinião dia sim, dia não. O que era

certo e obrigatório num dia, já não o era no dia seguinte; o que não tinha qualquer efeito na prevenção na

doença, afinal era essencial no dia seguinte. O Governo, quando reagiu, reagiu tarde e manifestou sempre, isso

sim, preocupações de popularidade e de sustentabilidade política. Para o Governo, foram sempre mais

importantes a popularidade e a governabilidade que queria manter.

Página 56

I SÉRIE — NÚMERO 27

56

Portanto, para decidir, neste momento, se viabilizamos ou não um novo estado de emergência e se votamos

ou não a favor deste, há duas questões essenciais. Primeira questão: havia alternativa a este recurso

permanente ao estado de emergência? Do nosso ponto de vista, claramente havia, se o Governo tivesse

legislado e clarificado regras. Se o Governo, com o tempo que teve, tivesse vindo ao Parlamento validar as

soluções que queria aplicar, não tínhamos de estar sempre a recorrer ao estado de emergência. Segunda

questão: não tendo o Governo feito o que devia fazer, é possível responder sem recorrer ao estado de

emergência? Responsavelmente, temos de dizer que não podemos garantir que seja possível dar essa resposta,

dado que é incompetência do Governo.

Portanto, do nosso ponto de vista, o Governo não fez o que devia, o Governo não é credor da nossa confiança

e, por isso, não poderemos passar um cheque em branco a este novo pedido de declaração do estado de

emergência.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Hoje, ninguém duvida que, apesar de termos assumido a COVID-19 como um «novo normal» nas

nossas vidas, o País continua a viver uma emergência sanitária, que exige medidas equilibradas, ponderadas,

proporcionais e com foco na eficácia.

Estima-se que 1 milhão de cidadãos já estiveram em contacto com o vírus. Apesar de, aparentemente, o pico

da segunda vaga ter sido atingido no mês de novembro, chegamos a dezembro, o mês do convívio familiar por

excelência, com um cenário em que, numa refeição à mesa com cinco pessoas, a probabilidade de contágio é

de 20% e de 45% se forem 10 pessoas.

Face aos riscos do mês de dezembro, temos de tomar medidas de salvaguarda do Serviço Nacional de

Saúde que, particularmente ao nível dos cuidados intensivos, está sob alta pressão devido ao pico da segunda

vaga, mas, sobretudo, temos de procurar salvaguardar aqueles que nos são mais próximos. Não podemos

cometer os erros que vimos acontecer na República Checa e na Holanda, que tomaram medidas eficazes de

confinamento e reduziram grandemente o número de infetados, mas que, ao levantarem demasiado

rapidamente as medidas restritivas, deitaram por terra todos os esforços feitos, levando a um novo e expressivo

aumento do número de infeções.

O PAN compreende a necessidade de restrições de mobilidade e de contactos, fundamentais ao

recrudescimento da infeção, mas também entende que o recolher obrigatório nos termos em que tem sido

imposto, ainda que esteja a contribuir para a contenção do vírus, tem, no entanto, levado à asfixia dos setores

dos serviços e da restauração, que, se estavam mal, pior ficaram.

Por isso, daqui apelamos ao Governo que se preocupe com a emergência sanitária, mas que

complementarmente adote medidas racionais e equilibradas que evitem que a emergência social e económica

resulte numa crise aguda de caráter socioeconómico. O que se exige é claro: a adoção de medidas que

contribuam para uma efetiva contenção e redução de contactos, com horários que permitam o funcionamento

do setor da restauração e dos serviços, com regras de segurança, em articulação com um mecanismo de apoio

direto, a fundo perdido e sob a forma de prestação única, que permita a estes setores responderem às respetivas

necessidades de tesouraria.

O PAN propôs a criação desse apoio com um valor correspondente a 50% da perda de receita média de

faturação verificada, comparativamente com o registado em 2019, mas tal proposta foi chumbada, na semana

passada, com os votos contra do PS e a abstenção do PSD e do Iniciativa Liberal. Apelamos, porém, ao Governo

que, de forma sensata, acolha, urgentemente, esta medida. E pedimos sensibilidade para com os empresários

que, por todo o País, estão a desesperar a cada dia.

Nesta ocasião, não podemos deixar de sublinhar que se a última declaração do estado de emergência teve

efeitos negativos claros na economia, no tocante ao recolher obrigatório, a verdade é que noutros casos temos

visto que há disposições que não têm saído do papel, como é o caso do teletrabalho, que é obrigatório na lei,

mas que, na prática, não se está a cumprir na vida das pessoas e das empresas. O que vai o Governo fazer

Página 57

5 DE DEZEMBRO DE 2020

57

para assegurar a efetividade destas disposições? Pelo que espera para assegurar uma ACT (Autoridade para

as Condições do Trabalho) com capacidade de ação?

Este estado de emergência surge-nos, pela primeira vez, sob o espectro da esperança de uma vacina que

chegará em breve. E, neste contexto, também não podemos deixar de alertar o Governo para três preocupações.

A primeira preocupação é com a necessidade de se começar a preparar, desde já, um sistema eficaz de

monitorização dos efeitos da vacina em todas as pessoas a quem venha a ser ministrada, uma vez que é sabido

que, como os especialistas defendem, estamos longe de conhecer tudo sobre este processo, nomeadamente

duração da proteção e efeitos secundários no curto e médio prazo.

A segunda preocupação que deixamos ao Governo é com a circunstância de, em articulação com as

organizações não-governamentais e as organizações da economia social, se poder assegurar o acesso à vacina

e o acompanhamento das populações socialmente mais vulneráveis.

A terceira preocupação passa pela urgência de o Governo acolher as medidas que a Interpol e a Europol

recomendam e não ignorar os riscos de corrupção e criminalidade associados à vacina.

Nas próximas semanas é prioritário evitar a infiltração de redes internacionais criminosas nos circuitos de

distribuição da vacina e de medicamentos, combater a falsificação de vacinas, impedir a compra e venda de

vacinas na internet, sensibilizar os cidadãos para não recorrerem a circuitos paralelos de aquisição da vacina e

combater, sem complacências, as potenciais burlas de vacinas distribuídas porta a porta.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O PAN apoia a Ana Gomes!

O Sr. André Silva (PAN): — Nas semanas que antecedem a chegada da vacina exige-se ação e prevenção, para que não vejamos, novamente, o poder político falhar ou chegar tarde, como chegou à segunda vaga.

Neste estado de emergência, o Governo e o Presidente da República preferiram a zona de conforto do bloco

central a uma lógica de unidade nacional e de consenso alargado e optaram por um estado de emergência sem

adesão à realidade e às necessidades efetivas das empresas, das pessoas e do País. De forma desproporcional,

optaram por um estado de emergência sanitária que não dá garantias claras que evitem que se caminhe a

passos largos para uma catástrofe económica e social.

Por isso mesmo, e face à falta de equilíbrio e proporcionalidade das medidas propostas, o PAN abster-se-á

na votação da declaração do estado de emergência.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República volta hoje a ser convocada para se pronunciar sobre o prolongamento do estado de

emergência, que, sendo um instituto integrante do nosso quadro constitucional, não deixa, no entanto, de ser

encarado, até do ponto de vista da Lei Fundamental do País, como uma solução de fim de linha, ou seja, só

suscetível de ser utilizado quando todos os outros caminhos legais e constitucionais falham nas respostas que

se pretendem com o recurso a este mecanismo extremo.

E, mais uma vez, esta Assembleia é chamada a decidir sobre a renovação, ou não, do estado de emergência,

que, tal como há duas semanas, pretende prolongar o quadro legal extraordinário para permitir ao Governo

tomar medidas, também extraordinárias, para combater a pandemia provocada pela COVID-19.

Ora, perante estas constatações, o que importa apurar é se o prolongamento do estado de emergência é

mesmo necessário e imprescindível para o combate à pandemia ou se, pelo contrário, o nosso ordenamento

jurídico dispõe dos mecanismos legais que permitam proceder a esse combate, sem necessidade de recorrer a

um estado de exceção. Esta é, para nós, a questão central.

Tal como considerámos há duas semanas, as medidas que, de facto, se impõe assumir para travar a

pandemia continuam a dispensar o recurso a este mecanismo extremo e, por isso, Os Verdes vão votar contra

a renovação do estado de emergência. E votamos contra porque, sendo verdade que é ainda cedo para perceber

os eventuais contributos no combate à pandemia da declaração do estado de emergência atual e da sua

renovação, também é verdade que, depois deste tempo todo, continuamos sem identificar qualquer contributo

palpável, nesse combate, decorrente da declaração do estado de emergência da primavera e das suas

renovações.

Página 58

I SÉRIE — NÚMERO 27

58

Aliás, um regresso à primavera aviva-nos a memória e faz-nos lembrar que as medidas mais importantes

nesse combate foram assumidas à margem do estado de emergência, até mesmo antes de ele ser decretado,

como foi o caso do encerramento das escolas e do confinamento voluntário dos portugueses.

Vamos votar contra porque consideramos que as medidas que se impõem assumir dispensam o recurso a

um mecanismo tão extremo como é o estado de emergência.

Sabemos que a situação sanitária que vivemos exige o reforço de medidas urgentes e, face à gravidade da

situação, é imperioso prosseguir e reforçar as medidas de contenção. Mas, mais uma vez, afirmamos que é

importante não confundir as medidas de contenção com o estado de emergência, porque são realidades

diferentes que não podem, nem devem, ser confundidas.

Portanto, medidas de contenção, sim, reforço das medidas, sim, mas estado de emergência, não.

Vamos votar contra porque não é o estado de emergência que permite ao Governo dar as respostas que se

impõem.

Para que não faltem camas aos doentes e para dotar o SNS de mais meios, mais capacidade nos centros

de saúde e nos hospitais, ou para reforçar a sua capacidade de resposta, não é necessário estado de

emergência.

Para reforçar a proteção das condições de trabalho nos locais de trabalho não é necessário estado de

emergência.

Para agilizar excecionalmente os processos concursais, tanto na aquisição de meios técnicos, como na

contratação de profissionais de saúde, não é necessário estado de emergência.

Para preservar a capacidade de resposta hospitalar à COVID-19 também não é necessário estado de

emergência.

Para criar as condições de forma a que as pessoas possam respeitar as regras, por exemplo nos transportes

públicos — onde, mesmo querendo, as pessoas não conseguem, objetivamente, cumprir as regras de

distanciamento social —, não é preciso estado de emergência.

Se pretendemos favorecer a escola presencial, é preciso garantir as condições para que os alunos possam

respeitar as regras. Mas, para isso, não é necessário estado de emergência.

Por fim, o Governo também não precisa do estado de emergência para explicar muito bem as medidas que

se vão assumindo, porque, se as pessoas não compreendem as razões das medidas que lhes são impostas,

tendem, naturalmente, a desvalorizá-las.

Por mais úteis que sejam as medidas, as pessoas continuam sem perceber, por exemplo, porque é que, ao

fim de semana, têm de ir todas juntas às compras de manhã e à tarde têm de ficar em casa. Basta ver as filas

e os aglomerados de pessoas que se juntaram à porta das grandes superfícies comerciais nas manhãs destes

últimos fins de semana.

Ora, naturalmente que as pessoas questionam se não seria mais útil e eficaz umas irem às compras de

manhã e outras à tarde, em vez de ir tudo junto de manhã.

Mas o Governo não explicou a medida e aquilo que percebemos, sobre o encerramento dos estabelecimentos

comerciais às 13 horas, é que essa medida apenas contribuiu para dificultar ainda mais a vida das pessoas e

para empurrar muitos pequenos empresários, sobretudo os da restauração, da hotelaria e do turismo, para o

encerramento definitivo dos seus estabelecimentos, vendo-se obrigados a despedir trabalhadores.

O setor da restauração — que, para uns, pode ser um circo — é, para nós, um setor importante da nossa

economia, que, tal como outros setores, está numa situação verdadeiramente sufocante e a clamar por apoios

que são mais que justificados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Deputados: Este estado de emergência é um desastre — um desastre de comunicação, em que não sabemos o que são proibições e o que

são recomendações, ou uns acham que são proibições e outros acham que são recomendações.

Página 59

5 DE DEZEMBRO DE 2020

59

Este é o estado de emergência mais desastroso no que respeita à classificação do nível de concelhos e

parece o maior jogo de Tetris que alguma vez que o Governo decidiu aplicar, pois a terminologia é entre o «muito

complexo», o «pouco complexo», o «talvez complexo» e o «amanhã menos complexo».

É um desastre a todos os níveis, com o rosto de António Costa, Primeiro-Ministro de Portugal!

É também um desastre de comunicação: com estabelecimentos a fechar à uma da tarde e com os

supermercados cheios durante toda a manhã, num nível de concentração de pessoas impensável para a

proteção da saúde pública; com um plano de vacinação que já devia estar feito e que foi apresentado em último

lugar à União Europeia, mostrando a falta de respeito que há na tal luta pela saúde pública; e com os sites de

apoio, como o do programa Apoiar.pt, em baixo durante mais de 24 horas, depois de ter sido dito que era a

grande ferramenta de apoio à restauração.

Mas o PS encontrou, hoje, todo um novo argumentário: atacar o Chega com o casal de turcos que inventou

a vacina. Seria o mesmo que dizer que ciganos destruíram um café em Odivelas durante o estado de

emergência. E, por isso, o Chega tem razão ao dizer que em alguns bairros à volta de Lisboa a taxa de

incumprimento é maior. O Chega tem razão.

Haja noção e haja decoro naquilo que se diz aos portugueses. Dissemos que não deixaríamos ninguém para

trás, mas deixámos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ai deixaram, deixaram!

O Sr. André Ventura (CH): — Deixámos os idosos, nos lares, para trás, com taxas de infeção que envergonhariam a maior parte dos países da Europa; deixámos a restauração e o comércio para trás, com

apoios que nem nos países da América do Sul seriam considerados dignos; deixámos a cultura, os espetáculos

e os eventos para trás, com um Governo que ficará marcado por destruir, de uma vez por todas, alguns dos

setores da atividade portuguesa.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, faz hoje 40 anos que desapareceu Francisco Sá Carneiro. Acho que o

Sr. Primeiro-Ministro devia atender às palavras que ecoam na memória dos povos e que não permanecerão

enquanto o seu Governo aqui estiver: o sistema não é feito para e por, para e por, para e por as pessoas, são

as pessoas que devem lá estar para ser servidas pelo sistema. Isto foi dito por Francisco Sá Carneiro!

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Oxalá, Sr. Primeiro-Ministro, que nunca se esqueça que o estado de emergência, o seu Governo, as suas medidas e as suas leis não são para o servir a si, nem ao seu Governo,

são para servir as pessoas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de terminar.

O Sr. André Ventura (CH): — Hoje, devíamos todos homenagear Francisco Sá Carneiro!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O PSD enfia o barrete até ao calcanhar!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Pode haver quem ache que está tudo na mesma, quando se passa mais uma quinzena,

quando vem mais uma renovação do estado de emergência, quando vem o mesmo decreto presidencial, quando

há a mesma desorientação no Governo, quando há a mesma falta de fundamentação científica ou empírica das

medidas tomadas. Mas não está tudo na mesma.

Nesta quinzena, foram infetados mais uns milhares de portugueses, outros tantos perderam o emprego e

todos — todos! — viram as suas liberdades cerceadas.

Página 60

I SÉRIE — NÚMERO 27

60

Mas nem assim o Governo dá atenção aos dados que já existem sobre o equilíbrio essencial entre o combate

à pandemia e a recuperação social e económica. Há dados que mostram que medidas como o limite à lotação

dos transportes públicos ou o teletrabalho estão do lado certo desse equilíbrio, enquanto medidas que restringem

o comércio, o trabalho alternado, a limitação à circulação entre concelhos ou o recolhimento à uma da tarde aos

fins de semana causam um dano desproporcionado e estão do lado errado desse equilíbrio.

Com tudo isto, acabamos por não falar do que deveria ser a prioridade nesta altura, a recuperação social e

económica de Portugal.

Nessa recuperação, o primeiro e essencial passo será a vacinação, cujo plano conhecemos ontem. Para

além de uma série de dúvidas sobre a logística, o plano revela, sobretudo, uma preocupante falta de urgência,

ao limitar os locais de vacinação ao SNS, sem prever alargamento de horários e sem incluir as farmácias.

Esta falta de urgência tem custos. Tem custos em sofrimento e em vidas humanas e tem custos para a

economia, algo próximo dos 2000 milhões de euros por mês. Perante estes valores, não investir num plano de

vacinação ambicioso é uma péssima decisão.

Basta pensar no que acontecerá ao turismo se, na época alta, Portugal estiver atrasado na vacinação em

relação aos seus concorrentes europeus.

Mas a recuperação económica, quer dizer, da vida das pessoas, passa também por não falhar nos

instrumentos que permitem às pessoas e às empresas iniciar a recuperação, e estes falham demasiadas vezes.

Para os setores mais afetados, os Programas Apoiar.pt e Apoiar Restauração exigem: contabilidade

organizada, deixando de fora metade das empresas, as que legalmente escolhem o regime simplificado; ter a

situação tributária regularizada, que é como quem diz, antes de pagar, o Estado tem, primeiro, de receber; e

estar em concelhos em que houve confinamento, como se muitos negócios, sobretudo os ligados ao turismo,

não dependessem, exatamente, de visitantes de fora do seu concelho.

Mesmo as medidas de fundo para todos os outros setores económicos já estão a falhar. Temos o Banco de

Fomento que não arranca e os fundos europeus para os quais o PS só agora acordou, para mudar a governação

(com mais um Simplex) e a monitorização (com um portal da transparência, que propusemos) da aplicação de

fundos europeus.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr. Presidente. Todas estas discussões à volta do estado de emergência impedem-nos de discutir o essencial, enquanto

restringem as nossas liberdades.

E é exatamente por falar em liberdades que quero lembrar, aqui, o que Francisco Sá Carneiro, que

desapareceu faz hoje 40 anos, escreveu em 1973, e cito (oiçam porque podem aprender alguma coisa!): «Falar

em liberdade, num país livre, deixa as pessoas simplesmente indiferentes». É contra esta indiferença que o

Iniciativa Liberal continuará a lutar.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A eficácia das medidas contra a COVID-19 irá ser também avaliada pela forma como nós ficarmos depois da renovação de tantos

estados de emergência, da limitação de direitos e de liberdades.

É urgente que se faça hoje o reforço do Serviço Nacional de Saúde e uma aposta forte na saúde mental.

É também necessário apoiarmos os trabalhadores essenciais e lutarmos conjuntamente para evitarmos que

se agigantem excessivamente as pandemias da desigualdade e da pobreza.

Simultaneamente, precisamos de unir-nos para lutarmos contra uma onda, uma onda que, unindo uma ala,

se está a levantar em cada dia com mais ênfase: a onda do populismo, a onda dos ataques à democracia e ao

Estado de direito.

Esta é uma onda contra a qual temos de lutar para evitar que ela se agigante, porque é preciso lembrar que

a luta contra a pandemia não é objetivo, necessidade e problema a resolver unicamente pelo Executivo. Cabe-

nos, individual e politicamente, unir esforços nesse sentido.

Página 61

5 DE DEZEMBRO DE 2020

61

Não posso terminar sem saudar o Primeiro-Ministro, a Ministra da Saúde, a Diretora-Geral da Saúde e todos

aqueles e aquelas que têm feito um esforço, mais ou menos eficaz, mas um esforço verdadeiro, para salvarem

a vida de milhares de indivíduos e, ao mesmo tempo, relacionarem-se e terem de lidar com o oportunismo

político, o negacionismo e a manipulação mediática de indivíduos que não fariam melhor. E não fariam melhor

porque esses são os indivíduos que desejam desmantelar o Serviço Nacional de Saúde e que querem privatizar

tudo aquilo que funciona neste País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Num ambiente em que deveríamos estar unidos, não o estamos, porque há indivíduos, nomeadamente partidos, que estão numa ansiedade enorme, a ver se se elegem, a ver

se arrasam, a ver se se agigantam, reduzindo a democracia e as oportunidades.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. André Ventura (CH): — Batam lá palmas, batam lá palmas!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (N insc.): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Começam, finalmente, a ser visíveis os resultados do esforço coletivo que todos temos feito. Os estudos

demonstram que já atingimos o pico, que o número de casos está a diminuir e que o índice de transmissão

reduziu. Por isso, importa não baixar os braços.

Mas, para além da crise sanitária, não podemos esquecer outras urgências que se mantêm por resolver.

De acordo com dados da OIT (Organização Internacional do Trabalho), Portugal foi o país europeu que

registou maiores perdas na massa salarial por causa da crise provocada pela pandemia, penalizando, sobretudo,

as mulheres. Os salários das mulheres tiveram uma queda de 16%, a mais elevada entre os 28 países

analisados.

Para além disso, a instabilidade provocada pela COVID-19 tem particular impacto nas mulheres que, por

medo de expor os filhos ao vírus, medo do desemprego ou da crise económica, ficam especialmente vulneráveis

perante cenários de violência doméstica.

A desigualdade entre mulheres e homens continua a ser uma realidade que tem de ser combatida e para a

qual as associações de mulheres têm um papel determinante, pelo que urge também apoiá-las.

Apesar de o teletrabalho constituir uma medida fundamental para combater a propagação da pandemia, a

verdade é que o Ministério do Trabalho fez um inquérito a 10 300 empresas e concluiu que dois terços não o

implementaram.

Insisto, por isso, que é essencial adotar medidas que garantam a sua implementação e que a ACT tenha

condições para fiscalizar esta situação, sem que isso comprometa a sua atividade normal.

Chamamos novamente a atenção para os setores que estão a ser particularmente afetados por esta crise,

nomeadamente a cultura, a restauração e mesmo os bares e as discotecas.

Com o aumento de desemprego, não podemos não apoiar estas empresas, pelo que apelo ao Governo que

pense neste setores, que ouça as suas preocupações e que reforce os apoios, porque a imposição de medidas

sanitárias, que concordamos ser fundamental, deve encontrar um equilíbrio com a necessidade de garantir a

sustentabilidade das empresas e, consequentemente, a manutenção dos postos de trabalho.

Que mantenhamos este caminho de responsabilidade, com vista ao fim da pandemia, sem esquecer aqueles

que neste momento mais precisam, nem os que todos os dias trabalham na linha da frente para que os restantes

possam viver a sua vida com a normalidade possível.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

Página 62

I SÉRIE — NÚMERO 27

62

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos, hoje, a discutir o pedido de renovação de um terceiro período de estado de emergência desde que, no início de novembro,

retomámos a adoção destas medidas de caráter tão excecional que, ao longo de 2020, temos vindo a adotar,

pela primeira vez, no nosso quadro constitucional democrático.

Fazemo-lo no quadro daquela que é a maior crise global, afetando as dimensões sanitária, económica e

social, num verdadeiro teste à afirmação dos nossos valores coletivos.

Diria que não podemos banalizar a adoção de medidas excecionais, mas devemos perceber aqui hoje que

estamos num momento decisivo, em que temos de mobilizar todo o esforço, como naquela fase mais difícil de

uma maratona, em que a esperança de chegar à meta começa a estar ao nosso alcance, mas em que as

dificuldades nos podem, por vezes, levar a fraquejar neste esforço coletivo.

Hoje, o que estamos a fazer prova que estamos no caminho certo. Estamos naquilo que é um desafio global.

Desde que aqui estive no início de novembro, no primeiro debate sobre a declaração de um estado de

emergência, mais 15 milhões de pessoas foram infetadas e mais cerca de meio milhão de mortos ocorreu, a

nível mundial.

Também no nosso País tivemos, em novembro, um quadro particularmente difícil, marcado por uma elevada

incidência de casos, por um elevado nível de internamentos e de utilização de camas de cuidados intensivos e,

pior do que tudo, por um nível significativo de óbitos.

Mas diria que a concertação e a coesão nacionais que temos verificado, a coesão dos órgãos de soberania,

Presidente da República, Assembleia da República — hoje, aqui, manifestada pela viabilização, mais uma vez,

por mais de 90% dos Srs. Deputados, deste decreto de estado de emergência — e Governo, com o papel de

unir os portugueses em torno de medidas estáveis, claras e determinadas, tem tido a compreensão e apoio dos

portugueses.

O apoio dos portugueses, antes de mais, na forma exemplar como as medidas, determinadas em execução

dos decretos do Presidente da República, têm vindo a ser acolhidas e têm permitido uma intervenção totalmente

marcada por uma dimensão pedagógica e de sensibilização por parte das forças de segurança.

E também uma adesão dos portugueses, que se tem refletido em todos os estudos de opinião, uma adesão

muito elevada e muito significativa às medidas que têm vindo a ser adotadas.

Mas fundamentais são os resultados que começamos a registar. Nós atingimos, durante o primeiro período

de estado de emergência, o número mais elevado de casos ativos, desde que a pandemia chegou a Portugal:

88 000 casos ativos, no dia 15 de novembro. Desde então, temos vindo a reduzir este número de casos até aos

cerca de 73 000, que hoje se registam.

E a aplicação deste conjunto de medidas, proporcionais, adequadas e necessárias — marcadas pelo respeito

dos direitos fundamentais, pela salvaguarda do direito ao trabalho e, garantindo a esperança às novas gerações,

pela salvaguarda do funcionamento do sistema educativo, e marcadas pela salvaguarda da afetação mínima

das atividades económicas —, tem produzido efeitos.

Estamos, hoje, num momento em que não podemos desistir, até porque os níveis extremamente elevados

de incidência têm vindo a reduzir-se nas últimas semanas. Isso não nos permite, porém, deixar de continuar o

rumo seguido, com medidas que, ao contrário do que alguns aqui disseram, são claras, apesar de difíceis, e daí

a solidariedade com os trabalhadores e com as empresas, com medidas como o prolongamento do layoff e dos

subsídios de desemprego, e com medidas excecionais de apoio aos setores mais diretamente atingidos. Não

toleramos que se confunda restauração com artes e espetáculo, se confunda, enfim, todas as áreas de trabalho

que são legitimamente merecedoras do nosso respeito e apoio.

É por isso que é tão decisivo nesta fase fazermos todos os esforços para defender o Serviço Nacional de

Saúde, mobilizando mais profissionais e concentrando os meios que permitam defender a saúde dos

portugueses. Mas também mobilizando cerca de 1000 elementos das Forças Armadas, das forças de segurança

e da proteção civil, bem como funcionários das câmaras municipais, professores e de outras áreas da

Administração Pública para agilizar os processos de rastreio. Assim como criando uma rede nacional de

estruturas de apoio de retaguarda (EAR), o que foi feito em todo o País e, sobretudo, nas áreas mais atingidas,

como na região norte e, designadamente, no distrito do Porto, onde estão em funcionamento, permitindo dar aí

apoio àqueles que, não carecendo de internamento hospitalar, precisam de cuidados.

Finalmente, com o lançamento, num quadro de igualdade, num quadro de gratuitidade, num quadro de

universalidade, de um programa amplo de vacinação que cria o caminho para a esperança a partir do início do

Página 63

5 DE DEZEMBRO DE 2020

63

próximo ano, logo que a Agência Europeia do Medicamento tomar as decisões necessárias, viabilizando aquele

que é o exemplo de um grande esforço europeu, um esforço em que só pelo facto de estarmos na União

Europeia, na União Europeia dos valores, da democracia e de um espaço de liberdade, segurança e de justiça,

nos permite a todos ter a vacina ao mesmo tempo, num quadro de, repito, igualdade e de solidariedade.

Aplausos do PS.

É por isso que, neste momento, nada mais absurdo seria fazer o que defendeu o CDS, isto é, em vez de

estarmos unidos neste combate, envolvermo-nos num debate jurídico-constitucional sobre a revisão da lei do

estado de sítio e do estado de emergência.

Nunca foi um quadro legal que tem décadas que nos impediu aqui, como na utilização de mecanismos da

Lei de Bases de Proteção Civil ou da lei de vigilância em saúde pública, de mobilizar o esforço dos portugueses.

Por isso, é importante esta renovação e devemos fazê-la com estabilidade e com previsibilidade. É certo que

a declaração do estado de emergência, nos termos da lei do estado de emergência, vigorará apenas nos

próximos 15 dias, mas o decreto do Sr. Presidente da República estabelece já um compromisso de estabilidade

que se prolonga até 7 de janeiro, englobando o período do Natal e do Ano Novo. Permite-se, assim, ao Governo

tomar as medidas adequadas e equilibradas que sinalizem a prossecução deste esforço coletivo, este esforço

de mobilização dos portugueses que é compreendido e que está dia a dia a mostrar os seus resultados com

medidas que são as menos restritivas de todos os países europeus que nos são próximos — medidas que são

as que menos afetam o direito à educação e que são mais proporcionais na salvaguarda da defesa das

atividades económicas, mas que respondem àquilo que é decisivo. Sem limitar os contágios, não haverá

limitação do crescimento da doença, sem limitar os contactos não será possível salvaguardar a mobilização de

esforços do Serviço Nacional de Saúde.

Por isso, nas próximas semanas, é tão importante criarmos condições não apenas para viver o Natal em

família, para viver o Natal com precaução e defesa da saúde coletiva, mas também para que o novo ano, iniciado

com a esperança da vacina, permita consolidar estes resultados.

Que o novo ano nos permita abrir uma via para recuperar plenamente o caminho para a normalidade, para

defender a saúde e afirmar a liberdade, num quadro em que dizemos sempre que esta pandemia é feita em

coesão, em solidariedade, sem pôr em causa a democracia, sem pôr em causa a coesão entre os portugueses.

Também aqui ninguém ficará para trás!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, conforme está previsto na ordem do dia, e uma vez que temos quórum de deliberação, vamos passar à votação da renovação da autorização, solicitada pelo Presidente da República,

para a declaração do estado de emergência.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e da Deputada não inscrita Cristina

Rodrigues, votos contra do PCP, do PEV, do CH e do IL e abstenções do BE, do CDS-PP, do PAN e da Deputada

não inscrita Joacine Katar Moreira.

A renovação do estado de emergência foi aprovada, e assim seguirá o seu caminho.

Passamos ao sexto ponto da nossa ordem do dia, que consiste no debate preparatório do próximo Conselho

Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela

Assembleia da República no âmbito do Processo de Construção da União Europeia.

Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa, que aproveito para saudar e cumprimentar, uma vez

que não o fiz há pouco.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O primeiro tema que ocupará o Conselho Europeu da próxima semana

tem a ver com o ponto de situação da COVID.

Página 64

I SÉRIE — NÚMERO 27

64

O primeiro elemento tem a ver com os seis contratos de aquisição de vacinas, já assinados pela Comissão

Europeia, e a verificação de que todos os Estados-Membros estão a apresentar os seus planos nacionais de

vacinação, tal como nós próprios estamos a fazê-lo, assegurando que há uma justa, equilibrada e simultânea

distribuição das vacinas em todos os Estados-Membros.

O segundo elemento importante na coordenação da luta anti-COVID tem a ver com a estratégia de testes

rápidos. Portugal já tem a sua estratégia nacional de testes e consideramos que é fundamental o

estabelecimento de critérios comuns que permitam e facilitem o conhecimento mútuo. Essa é uma condição

essencial para podermos ter todas as fronteiras abertas e não voltarmos a ter situações de bloqueio quanto à

liberdade de circulação entre os diferentes Estados-Membros.

O segundo tema fundamental do Conselho Europeu tem a ver com as alterações climáticas. O objetivo é o

de que haja um compromisso comum quanto à redução de 55% das emissões até 2030, comparativamente com

os níveis de 1990.

Portugal, que foi o primeiro País do mundo a assumir o objetivo de neutralidade carbónica em 2050, tem bem

consciência de que o esforço maior que tem de ser feito é o da próxima década e apoiamos, claramente, a

proposta da Comissão no sentido de que haja um compromisso de todos os Estados-Membros para que se

verifique 55% de redução até 2030.

Aplausos do PS.

O terceiro tema que estará em consideração no Conselho Europeu tem a ver com as questões da segurança

e das relações externas. Em matéria de segurança, estará particularmente em cima da mesa o debate sobre as

questões relativas ao terrorismo, ao radicalismo e ao extremismo violento, designadamente no espaço virtual.

Portugal, para além de expressar renovadamente a sua solidariedade com os Estados-Membros que têm

sido alvo de ataques terroristas, como a Áustria, a Alemanha ou a França, apoia, também, o desenvolvimento

das medidas antiterroristas, designadamente as que a Comissão tem vindo a propor e que serão objeto de um

forte impulso durante a próxima presidência portuguesa.

Por outro lado, e no que diz respeito às relações externas, há vários temas em análise: em primeiro lugar, a

situação no Mediterrâneo Oriental. Portugal, mais numa vez, para além de expressar solidariedade com Chipre

e com a Grécia, considera que é necessário que, de uma vez por todas, a União Europeia clarifique o seu nível

de relacionamento com a Turquia, não continuando a alimentar mal-entendidos, assentes em falsas

expectativas, mas, pelo contrário, possamos ter uma relação clara.

A Turquia é nossa aliada na NATO (North Atlantic Treaty Organization), a vizinhança com a Turquia é

fundamental no quadro da União Europeia, temos de ter relações claras, transparentes com a Turquia, e isso

tem de ficar, de uma vez por todas, clarificado.

Em matéria de vizinhança, e será outro tema das relações internacionais, será desenvolvido o debate sobre

as relações com a vizinhança sul. Portugal apoia, designadamente, a renovação desta relação, mas entendemos

que não pode substituir aquela que é a parceria estratégica entre a Europa e o conjunto do continente africano,

que não deve, em caso algum, ser prejudicada.

Ainda no que diz respeito às relações externas, existe uma nova oportunidade em matéria de

desenvolvimento das relações transatlânticas, desde logo, marcadas pelo trabalho conjunto que pode ser feito

no combate às alterações climáticas, tanto mais que a Administração Biden anunciou que, no primeiro dia da

sua nova Administração, regressará ao Acordo de Paris. É uma parceria que se restabelece e que é, certamente,

bom augúrio para o futuro da humanidade.

Aplausos do PS.

Por fim, o Conselho do dia 11 será marcado por uma cimeira da zona euro, em formato alargado, que incidirá

particularmente sobre os temas relativos à união bancária e à união de mercados de capital. Gostaria, sobretudo,

de enfatizar a importância de o Conselho Europeu vir a endossar o acordo histórico alcançado na última reunião

do Eurogrupo, sobre a reforma do Mecanismo Europeu de Estabilidade e a introdução antecipada do mecanismo

de apoio ao Fundo Único de Resolução, que entrará em vigor em 2022.

Página 65

5 DE DEZEMBRO DE 2020

65

Portugal muito se empenhou, enquanto Estado-Membro, e também enquanto exerceu a presidência do

Eurogrupo, para que esses resultados fossem alcançados, como peça essencial para complementar a união

económica e monetária e dar um passo concreto no aprofundamento da união bancária e no reforço da confiança

dos mercados no sistema financeiro europeu.

Aplausos do PS.

Em síntese, Sr.as e Srs. Deputados, estes são os temas que constam da agenda do próximo Conselho

Europeu e que aqui resumidamente enunciei, dando assim espaço para poder responder às questões que,

seguramente, não deixarão de colocar.

O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Capoulas Santos.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Conselho Europeu da próxima semana ocorre no culminar de um ano em que tiveram lugar

factos que ilustram bem o que a Europa tem de melhor e de pior.

Do lado negativo, destacaria o penoso processo negocial do Brexit e a sucessão de peripécias que têm

envolvido este divórcio litigioso e o significado político que tem o facto de, pela primeira vez desde a sua

fundação, a União Europeia assistir à saída de um dos seus membros, ainda por cima dos mais relevantes, pese

embora a atitude, desde sempre reservada, do Reino Unido face ao projeto europeu. Reserva que o processo

negocial de saída tem evidenciado ao ponto de, a escassos 27 dias da sua consumação, não sabermos se

iremos assistir a uma saída regulada ou a uma saída caótica. Menos positiva é também a reação inicial da

Comissão à pandemia, hesitante e descoordenada.

Mas o facto mais negativo de todos, e que marcará o ano 2020, é certamente a postura de dois Estados-

Membros da União, assumida no COREPER (Comité dos Representantes Permanentes) de 16 de novembro e

confirmada no dia seguinte no Conselho dos Assuntos Gerais, de veto à versão final, melhorada, negociada

pelo Parlamento Europeu, de que merece destaque o trabalho desenvolvido pelos Eurodeputados portugueses

Margarida Marques e José Manuel Fernandes, referente ao quadro financeiro plurianual e ao plano de

recuperação para responder às consequências da crise decorrentes da COVID-19.

Por outro lado, felizmente, 2020 será igualmente marcado por algum facto extraordinariamente positivo no

plano europeu, de que se destaca, para além da agradável surpresa da nova liderança da Comissão, o acordo

histórico de julho referente aos instrumentos financeiros referidos, não só pelos elevados montantes envolvidos,

mas, sobretudo, pela engenharia financeira encontrada e pelos princípios que lhe estão subjacentes que, na

prática, consagram o que era até então impensável, mesmo para os europeístas mais otimistas, a mutualização

da dívida, para cujo desfecho o Governo português deu um contributo relevante.

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): — Igualmente merecedoras de aplauso são as novas orientações políticas da Comissão, as quais encaixam bem nas prioridades da presidência portuguesa do Conselho do

próximo semestre; resiliência e resposta à crise, reforço do modelo social europeu, integração do Pacto

Ecológico em todas as políticas da União, reforço da soberania digital, afirmação da Europa no plano global com

especial enfoque para a relação UE/África, UE/Ásia, Índia e China e restabelecimento da relação transatlântica.

Ainda merecedores de registo positivo são os passos dados na direção certa para uma política europeia de

saúde, cujo aspeto mais imediato e visível é o plano europeu de vacinação, fiel aos princípios de equidade e

solidariedade que constituem o ADN (Ácido desoxirribonucleico) do projeto europeu que, no nosso caso,

enquanto portugueses, nos esforçámos por construir nos últimos 34 anos.

Da ordem de trabalhos conhecida do Conselho Europeu, e que o Sr. Primeiro-Ministro acabou de enunciar

ponto a ponto, não consta um tema que, certamente, nele, à sua margem, assumirá uma importância

incontornável. Trata-se da questão da ultrapassagem do veto húngaro e polaco ao quadro financeiro e ao plano

de recuperação, aliás, decisões já assumidas favoravelmente por estes mesmos Estados-Membros em julho

passado. Todos estamos conscientes do complexo processo de decisão nas instituições europeias e

Página 66

I SÉRIE — NÚMERO 27

66

frequentemente esquecemos o quão admirável é a arquitetura institucional da União Europeia, que tem

permitido, ao longo de 70 anos, tomar decisões maioritariamente por consenso, num espaço geopolítico tão

heterogéneo como o que vai do Ártico ao Mediterrâneo e do Atlântico ao Mar Negro e onde coexistem realidades

políticas e soluções governativas de esquerda, de direita, e coligações de todas as cores, e uma Comissão, um

Conselho e um Parlamento que são o seu reflexo. As decisões são, por isso, sempre lentas, exigindo paciência

e muita imaginação, por forma a que, no final, todos se possam ver nelas refletidos.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista é, assim, favorável a um posicionamento de Portugal, no Conselho

Europeu, agregador, não radical, contrariamente ao que nos últimos dias têm expressado alguns líderes

europeus, como, aliás, ainda ontem pudemos testemunhar, na reunião na qual participaram o Sr. Presidente da

Assembleia da República, o Presidente do Parlamento Europeu e os líderes dos grupos parlamentares europeus

e nacionais.

Gostaria, assim, que o Sr. Primeiro-Ministro esclarecesse esta Câmara, tanto quanto lhe for possível, sobre

a posição que vai assumir quanto a esta matéria, muito provavelmente à margem do Conselho Europeu, de

modo a que este impasse tão preocupante e negativo para Portugal e para a Europa possa ser rapidamente

ultrapassado e iniciada a tão necessária recuperação da nossa economia, duramente atingida pela pandemia,

e para que possamos ver a nossa vida coletiva também normalizada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, é a vez do Grupo Parlamentar do PSD, com duas intervenções. Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Paulo Moniz.

O Sr. Paulo Moniz (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Nós vamos ter, de facto, o Conselho Europeu mais importante do resto das nossas vidas.

Vimos, no debate anterior, que a pandemia, para além do aspeto sanitário, é um problema gravíssimo do

ponto de vista económico e que urge resolver.

Na sequência do Conselho de julho, onde foram encontradas ferramentas, instrumentos e mecanismos para

acudir às famílias, à economia e às empresas, e da «bazuca» de que o Sr. Primeiro-Ministro tem falado, desde

julho até agora, findo o ano, em dezembro, na verdade, ainda não veio a ordem de «fogo à peça».

Como sabe, isto é absolutamente dramático, porque este tempo já não tem tempo para esperar por decisões

que são da Europa e que, inclusive, vão ao encontro do pilar discutido pela Sr.ª Presidente da Comissão

Europeia, de o sentido de cidadania europeia ser exacerbado na eficácia que os cidadãos e as empresas sentem

na resolução dos seus problemas.

Não posso deixar de referir, como temos feito inúmeras vezes, que o País vai receber, nos próximos 10 anos,

cerca de 57,9 mil milhões de euros e há uma opção estratégica política que deve ser tomada. No nosso

entendimento, reforçamos que estas verbas, maioritariamente, devem dirigir-se às empresas, às famílias, mas

fundamentalmente a quem tem a capacidade de criar riqueza. Só assim Portugal poderá sair do círculo vicioso

de estar permanente e fortemente dependente de fundos europeus e, quando esses não existem ou não estão

disponíveis, recorrer ao endividamento. Temos de quebrar este círculo vicioso que nos trouxe, nos primeiros 20

anos deste século, a um crescimento anémico e a uma situação das mais débeis para enfrentar a crise que

agora temos.

Ontem, a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) disse, perentoriamente,

que Portugal vai ser o país mais afetado, do ponto de vista económico, na decorrência desta crise.

Sr. Primeiro-Ministro, ouvi-o dizer que só tem o plano A. Posso entender que, naturalmente, no âmbito do

interesse da negociação, esta seja uma forma de pressão que esteja a utilizar, mas o País não pode ter um

Governo que só tem o plano A. O País quer um Governo que seja esperança, que seja confiança e que, se

falhar o plano A, tem o plano B e, se falhar o plano C, terá o plano D. O País e o povo português têm de rever

no seu Governo o último elo da esperança e da confiança no futuro.

Deixe-me recordar-lhe também, hoje em particular, porque é um dia especial, palavras de Sá Carneiro. Ele

disse aqui, nesta Câmara, em 3 de janeiro de 1980, na posse do VI Governo Constitucional, e cito: «A força

forja-se na luta, a firmeza no combate pelos princípios, a coragem no enfrentar da crise». Sr. Primeiro-Ministro,

nós precisamos, mais do que nunca, desta coragem, desta confiança e desta esperança.

Página 67

5 DE DEZEMBRO DE 2020

67

Não posso deixar de falar num tema que será do âmbito da próxima reunião do Conselho e que, inclusive,

V. Ex.ª mencionou na sua intervenção: a nova agenda das relações transatlânticas União Europeia/Estados

Unidos da América. De facto, a chegada ao Governo do Presidente Biden vem abrir a oportunidade de relançar

estas conversações, de nos aproximarmos dos Estados Unidos, nosso parceiro estratégico importante. O

Presidente Charles Michel fez chegar à próxima reunião do Conselho Europeu uma intenção de promover duas

cimeiras, ao mais alto nível, União Europeia/Estados Unidos da América, uma em formato digital e outra em

formato presencial. É evidente que o País que tem uma vocação atlântica e uma presença que mais nenhum

outro tem no contexto europeu é Portugal, e esta presença, esta dimensão atlântica, histórica, advém também

do posicionamento geoestratégico e geopolítico dos Açores.

A pergunta que lhe faço, Sr. Primeiro-Ministro, tem a ver com o seguinte: quem irá definir os termos e o local

da realização da cimeira física será o Governo que terá a responsabilidade de conduzir os destinos da União

Europeia no primeiro semestre de 2021, ou seja, será Portugal. Estará V. Ex.ª em condições únicas para

promover a possibilidade de esta conferência se realizar nas Lajes, na Ilha Terceira, sendo esse o palco desta

dimensão transatlântica que queremos recuperar e que muito importante é para o País e para a Europa?!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Luís Leite Ramos está inscrito, ainda no tempo do PSD, que é muito pouco, para uma intervenção, pelo que tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, quero fazer uma interpelação à Mesa, porque, inicialmente, o tempo afixado no painel eletrónico era de 9 minutos e, entretanto, decidimos distribuí-lo em função…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, vou interrompê-lo já, apenas por uma questão de esclarecimento. É que o painel estava errado e o que está na página da agenda que foi distribuída aos grupos parlamentares é muito

claro e é o que conta.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Não me parece que seja correta essa interpretação, porque aquilo que valeu para as intervenções anteriores foi o que estava afixado…

O Sr. Presidente: — Aconselho-o a não perder muito tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: O próximo Conselho Europeu volta ao tema das alterações climáticas, para tentar um acordo sobre uma nova meta

de redução das emissões na União Europeia em 2030. Este acordo permitirá que a União Europeia apresente

um contributo atualizado, determinado a nível nacional, para a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre

Alterações Climáticas, até ao final de 2030.

Em outubro passado, o Conselho Europeu já tinha debatido uma comunicação da Comissão sobre a mesma

matéria e, como o Sr. Primeiro-Ministro referiu, fixou uma redução das emissões para, pelo menos, 55% até

2030.

Ora, o Sr. Primeiro-Ministro tem insistido, e bem, na nossa opinião, que a pandemia não pode ser uma

justificação para reduzirmos e desacelerarmos o combate à urgência climática. Nós estamos inteiramente de

acordo e entendemos que, pelo contrário, é mesmo uma justificação para podermos acelerar este combate. Mas

o que é verdade é que os resultados e aquilo que vamos ouvindo nem sempre bate certo com as declarações

de intenções e com os anúncios que têm sido feitos. Por exemplo, a Rede Europeia de Ação Climática, uma

coligação de ONG (organizações não governamentais) para a energia e o clima, considerou que o trabalho que

está a ser feito em vários países, incluindo Portugal, tem preocupações e problemas adicionais enormes,

nomeadamente em termos de capacidade para alcançar os objetivos de longo prazo do Acordo de Paris, e

criticou os planos nacionais de energia e clima pelas suas insuficiências. E as insuficiências estão, por exemplo,

em matérias como a da eficiência energética, que o PSD tem denunciado e cujas limitações tem sublinhado, em

matérias como a dos resíduos ou em matérias muito importantes como a da monitorização e transparência

Página 68

I SÉRIE — NÚMERO 27

68

dessa monitorização. Ora, este, o problema da falta de instrumentos e mecanismos para monitorizar, ir

acompanhando aquilo que tem sido anunciado nos mesmos planos, parece-nos um problema essencial. E,

naturalmente, essas falhas fazem com que haja muitas dúvidas quanto à capacidade do País para poder

concretizar os objetivos.

A minha pergunta, Sr. Primeiro-Ministro, tem a ver exatamente com isso. Como é que o Sr. Primeiro-Ministro

e o Governo entendem o modo como podemos garantir o cumprimento dessas mesmas metas e, de alguma

forma, credibilizar de novo a União Europeia e o País neste domínio? É que de boas intenções estamos nós

cheios e os resultados mostram mesmo que essas boas intenções não ajudarão naquele combate que é

necessário.

De qualquer maneira, Sr. Primeiro-Ministro,…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado. A intervenção foi preparada, certamente, com base na agenda e não no quadro eletrónico.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — … o que temos, na prática, são as intenções do Governo e a palavra do Sr. Primeiro-Ministro, mas isso, naturalmente, não nos deixa descansados. Nós não temos boas razões para

ficar descansados unicamente com as intenções do Governo e a palavra do Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, a Sr.ª Deputada Fabíola Cardoso.

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. e Sr.as Deputadas e demais participantes nestes trabalhos parlamentares: Independentemente da agenda oficial, este

Conselho Europeu será definido pela forma como os 27 forem capazes de responder, ou não, à emergência

pandémica, aprovando o fundo de recuperação, garantindo o próximo quadro financeiro plurianual e, assim, o

futuro próximo da própria União Europeia.

Tem vindo a público um conjunto de impasses criados pelo veto da Polónia e da Hungria, causado pela

associação do mecanismo do Estado de direito ao acesso aos fundos europeus.

Independentemente dos meios utilizados para ultrapassar o impasse, a União Europeia dispõe de

mecanismos próprios, ancorados no Tratado, nomeadamente no artigo 7.º, que devem ser cumpridos,

garantindo o respeito pela dignidade humana, a liberdade, a democracia, a igualdade, o Estado de direito, os

direitos humanos, incluindo os das pessoas pertencentes a minorias.

Está em curso um processo de sanções à Polónia e à Hungria, ainda que bloqueado há demasiado tempo.

É, por isso, estranho aquilo a que estamos a assistir.

Sr. Primeiro-Ministro, esta é uma forma de colocar na gaveta o processo de sanções que foi levantado à

Polónia e à Hungria? Qual a opinião do Governo português sobre esta matéria? Desiste a União das sanções

previstas, ao abrigo do artigo 7.º, por uma nova forma de penalização económica?

O cumprimento do Estado de direito não tem preço, deve ser condição sine qua non da pertença à União

Europeia e não moeda de troca para a obtenção de fundos.

Perante o previsível impasse do Conselho Europeu, tem sido avançado como possível um plano de

cooperação reforçada, a 25, que permita avançar com o fundo de recuperação Próxima Geração. Qual a posição

do Governo português sobre esta possibilidade?

Mas há outras questões que lhe queria colocar. Os socialistas europeus aceitaram incluir um mecanismo

sancionatório e punitivo associado ao fundo de recuperação. Considera o Sr. Primeiro-Ministro aceitável que

sejam introduzidas, no regulamento do fundo de recuperação, regras como aquelas, de má memória para o

nosso País, que fazem lembrar as exigências do cumprimento do Memorando da troica? Não é isto uma afronta

a Governos democraticamente eleitos e uma ingerência nas escolhas democráticas dos povos? Aceitará o

Governo, Sr. Primeiro-Ministro, um estado de troica permanente?

Página 69

5 DE DEZEMBRO DE 2020

69

Terceira e última questão: qual a posição do Governo português sobre a manutenção dos apoios

disponibilizados, no âmbito do fundo de recuperação, às indústrias poluentes, que continuam a basear o seu

funcionamento em combustíveis fósseis?

Os socialistas e mesmo os Verdes desertaram deste debate no Parlamento Europeu.

A União Europeia contratou, para gerir a sua política contra as alterações climáticas, a BlackRock, um dos

maiores investidores mundiais da indústria dos combustíveis fósseis e em setores associados à desflorestação,

o que é colocar a raposa no galinheiro.

Sr. Primeiro-Ministro, a crise pandémica que atravessamos não apagou nem resolveu a crise climática que

também ameaça o presente e o futuro do planeta.

Este é o momento adequado para avançar, finalmente, com medidas que permitam reduzir, de uma vez por

todas, a dependência externa, alimentar, industrial e energética das energias fósseis e, assim, prosseguirmos

para um paradigma de produção e consumo que seja verdadeiramente sustentável.

Ações concretas para além das palavras: é isto que devemos às próximas gerações. Não concorda, Sr.

Primeiro-Ministro?

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Para além das importantes questões relacionadas com os testes e as vacinas, gostaria de perguntar

ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Governo qual é o ponto da situação quanto a uma abordagem mais ampla — que

é necessária e não deve ficar reduzida a essas questões —, nomeadamente da coordenação e articulação a

nível europeu do combate à pandemia.

Pergunto, desde logo, se haverá a criação de condições para o investimento nos serviços públicos, como o

SNS, no caso de Portugal, e sem a pressão do condicionamento de que nos lembramos bem e que sucedeu

com as famosas recomendações específicas, por país, e outras intervenções ao nível da União Europeia, que,

no passado recente, tentaram recomendar, digamos assim, o corte orçamental na área da saúde.

Portanto, é preciso uma outra política no contexto europeu que ponha fim a estes condicionamentos que

ciclicamente têm surgido relativamente ao investimento e desenvolvimento dos serviços públicos. Ou seja, são

precisas opções políticas que promovam e permitam medidas efetivas e concretas a este nível para 2021.

Esta é, pois, a primeira questão que gostaríamos de colocar, independentemente de abordagens mais

conceptuais sobre uniões europeias da saúde e outras discussões conexas. No concreto, importa também

discutir e avaliar um acompanhamento e uma coordenação no combate à epidemia.

Por outro lado, há a questão relativa ao ambiente e às alterações climáticas, que surge na agenda dos

trabalhos. Temos chamado a atenção para a contradição perversa entre os objetivos proclamados de ação pela

defesa do ambiente e da mitigação ao nível das emissões de gases com efeitos de estufa e a mercantilização

dessas ações de defesa do ambiente, nomeadamente com os diversos comércios de licenças de emissão.

Na prática, esses comércios, em vez de levarem a um combate mais efetivo a essas emissões, acabam por

transformá-las em bens ou títulos transacionáveis em que os mais poderosos economicamente acabam por

beneficiar dessa lógica e dessa capacidade de adquirirem aos outros a liberdade de poluir. Ora, esta é uma

experiência que não podemos ignorar e uma preocupação que não podemos deixar de exprimir nesta fase do

debate.

Ao olhar para a agenda dos trabalhos que está definida para esta reunião, dir-se-ia que estamos perante

mais uma reunião de business as usual, que, na língua portuguesa, seria «de negócios do costume». O certo é

que há um «elefante na sala» que tem a ver com as decisões do Conselho relativamente ao fundo de

recuperação e ao quadro financeiro plurianual.

No que diz respeito a essa abordagem, a abordagem punitiva no quadro dos fundos comunitários em nome

do Estado de direito, não temos boas experiências e a história tem dado lições importantes sobre a questão dos

polícias do mundo ou dos polícias da Europa. Em todo o caso, está aí a complicação e a confusão que o próprio

Governo alertou que seria previsível!

Página 70

I SÉRIE — NÚMERO 27

70

Portanto, para além de reiterar as posições que têm sido afirmadas ao nível do Conselho, que perspetivas é

que existem para que rapidamente, de forma eficaz e concreta, a União Europeia dê resposta na mobilização

de recursos que são tão urgentes e necessários para fazer face aos problemas e às situações que estão

colocadas em relação ao nosso País e a outros países e povos da Europa?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Termino, Sr. Presidente. Sobre o processo da saída do Reino Unido e ao ponto da situação atual, há uma abordagem que, não estando

na agenda, interessaria fazer relativamente às evoluções que possam surgir no que diz respeito a este processo,

até porque estamos a poucas semanas da Presidência portuguesa e dos impactos concretos, designadamente

nos nossos concidadãos que vivem no Reino Unido.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida, do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Gostaria de abordar três pontos relativamente a este Conselho e à intervenção do Sr. Primeiro-Ministro no início

deste debate, sendo que o primeiro tem a ver com o fundo de recuperação, com o orçamento da união e com a

questão do Estado de direito. Penso que é de toda a utilidade, desde logo para o Governo, que seja clarificado

o que está em causa, bem como a posição do Governo de Portugal.

Neste momento, sabendo-se da intenção da Hungria e da Polónia — embora na Polónia tenha havido um

desenvolvimento, entretanto —, como e quando é que podemos esperar que este processo se resolva? Isto

porque, como já foi dito por outras bancadas, a questão a que o Sr. Primeiro-Ministro chamou «bazuca»

financeira é essencial para sabermos quando é que se concretiza muita da resposta portuguesa, também ela

financiada com recursos europeus, à situação que vivemos.

Soubemos que ainda esta semana tivemos uma transferência do SURE (Support to mitigate Unemployment

Risks in an Emergency), mas essa transferência cobre essencialmente despesa que já está realizada. Portanto,

é fundamental saber quando e que instrumentos vamos ter para o futuro.

Depois, a questão da posição portuguesa relativa ao Estado de direito. Não fomos nós, não foi o Parlamento

português que gerou alguma confusão sobre isso. Terá sido o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Polónia,

terá sido algum artigo de opinião publicado no Wall Street Journal, os esclarecimentos do Sr. Ministro dos

Negócios Estrangeiros no Público.

O importante é saber qual será a posição de Portugal, se for confrontado com duas opções: ou não haver

acordo ou haver um acordo que implique uma cedência à posição da Hungria e da Polónia. Se as duas opções

forem estas, qual é a posição de Portugal?

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva): — E qual é a sua?

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Segundo ponto: Brexit. No dia 1 de janeiro inicia-se a Presidência portuguesa e concretiza-se a saída do Reino Unido da União Europeia. A menos de um mês desta

concretização, as perguntas são óbvias: quais são as expectativas de ainda poder haver um acordo? Qual é a

solução para o caso de não haver acordo e, por exemplo, entrarem em vigor, a 1 de janeiro, os acordos

aduaneiros no âmbito da OMC (Organização Mundial do Comércio)? Como é que as autoridades nacionais de

cada país estão preparadas para lidar com isso?

O terceiro ponto diz respeito à reforma do Tratado do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE). Nesta

reforma, o MEE assume a responsabilidade de backstop do Fundo Único de Resolução (FUR). Ou seja, passa

a ser responsável por essa obrigação na resolução bancária.

Isso tem alguma consequência do ponto de vista das transferências para o Fundo de Resolução português

que, por sua vez, depois transfere para o Novo Banco ou não? Há alguma consequência desta reforma na

situação do Novo Banco ou não?

Página 71

5 DE DEZEMBRO DE 2020

71

Questão estrutural é a questão para o futuro: se houver necessidade de alguma resolução de um banco que

está integrado no sistema europeu, a resolução implicará recurso a financiamento pelos contribuintes

portugueses ou passará o Mecanismo Europeu de Estabilidade a responder por essa resolução?

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Como bem sabe, o projeto europeu faz-se de solidariedade, mas não pode passar por cima do Estado de direito democrático.

A União Europeia não se cumpre quando existem ataques sem precedentes aos direitos LGBTI (Lésbicas,

Gays, Bissexuais, Transgénero e Intersexo), quando se limita a liberdade de escolha das mulheres, quando se

fecham as fronteiras aos migrantes, quando se promovem mudanças que limitam os direitos políticos dos

partidos da oposição e se reprimem violentamente manifestações pacíficas, quando se limita a liberdade de

imprensa e quando se põe em causa a independência do poder judicial e dos tribunais constitucionais.

Sr. Primeiro-Ministro, a Hungria e a Polónia não cumprem os valores do projeto europeu. E aqui não há meios

termos. Ou se está do lado dos autocratas que querem minar e destruir a União Europeia ou se está do lado

dos que querem uma União Europeia que seja uma união de direito.

Portugal não pode ceder à chantagem da Hungria e da Polónia. Tem de ser firme e não pode aceitar que a

complacência para com os atentados ao Estado de direito democrático sejam a moeda de troca da «bazuca»

europeia. Por isso, o que lhe pergunto é que postura irá adotar na reunião do Conselho Europeu quanto a esta

nova chantagem da Hungria e da Polónia.

Em segundo lugar, gostava de lhe falar da famosa diretiva CbCR (Country-by-Country Reporting), uma

diretiva fundamental para o planeamento fiscal abusivo, uma vez que vai exigir que as multinacionais divulguem

informações sobre onde obtêm os seus lucros e pagam os seus impostos.

Nesta fase o que nos preocupa é que esta diretiva está bloqueada no Conselho Europeu há quatro anos,

pelo que lhe pergunto se no quadro da Presidência portuguesa está a planear encetar as diligências necessárias

para desbloquear este impasse e assim dar um contributo inequívoco no combate aos paraísos fiscais.

Por fim, em terceiro lugar, ouvimos recentemente, da parte da Comissão Europeia, a referência à abertura

para um sistema fiscal que, para além dos custos de fabrico e de transporte, tenha também em conta o custo

ambiental, defendendo a criação de novos impostos sobre o carbono da indústria e da aviação.

O último Orçamento, pela mão do PAN, deu avanços nesta matéria com uma taxa sobre o carbono nas

viagens aéreas e marítimas, o que está, no fundo, alinhado com o espírito da União Europeia. Deste modo, o

que pergunto é sobre que outras indústrias incidirão estes impostos e se é expectável que a Presidência venha

a defender que os mesmos devem abranger a pecuária intensiva, uma atividade ambientalmente devastadora.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, do PEV.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: O próximo Conselho Europeu realiza-se num quadro de grande instabilidade e é fundamental que seja assertivo

nas suas decisões.

Em matéria da COVID-19, Os Verdes reiteram que a União Europeia tem de dar respostas livres de quaisquer

constrangimentos e que vão ao encontro das necessidades das pessoas e dos setores estratégicos, permitindo

o desenvolvimento dos Estados, o relançamento da economia e o combate às assimetrias, usando o potencial

de cada um dos Estados-Membros.

A vacina é uma das grandes prioridades e é preciso assegurar que chegue a todos os países e que seja

distribuída de forma justa e acessível. Falamos de vidas humanas e a vacina tem de ser encarada como um

verdadeiro bem público global.

Mas esta crise é também uma crise ecológica. Destruir a natureza e colocar o clima em segundo plano torna-

nos mais vulneráveis e aqui não há plano B nem há negociação possível.

É verdade que foram traçadas metas de redução da emissão de gases com efeito de estufa, mas não podem

ser apenas números bonitos no papel. O tempo é de ações reais no âmbito das alterações climáticas, garantindo

que a transição ecológica não deixe ninguém para trás, porque não há justiça ecológica sem justiça social.

Página 72

I SÉRIE — NÚMERO 27

72

Por isso mesmo, Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta que fazemos é se da parte do Governo vai haver uma

ação rápida e decisiva, cujas medidas estejam à altura dessa meta e que garantam que ninguém fica para trás.

No campo da segurança e em especial na luta contra o terrorismo, urge reafirmar os valores da tolerância,

da democracia e da liberdade, e colocar um fim às ingerências e agressões contra os Estados soberanos, como

na região do Médio Oriente, o que tem levado ao crescimento de grupos terroristas. A vocação securitária da

União Europeia não pode atentar contra as liberdades e os direitos dos cidadãos nem contra a soberania dos

Estados, numa visão militarista que acaba por alimentar o ódio e as forças racistas e xenófobas.

Termino, Sr. Primeiro-Ministro, perguntando: até que ponto está o Governo disposto a ir para esta mudança

que se impõe, contribuindo para uma política de paz no mundo e de respeito pelo direito internacional?

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Falou hoje da relação da União Europeia com os seus parceiros ou, pelo menos, com os seus vizinhos próximos. Acho que é tempo de os portugueses

saberem qual é a sua posição definitiva sobre a Turquia e sobre a sua entrada na União Europeia. Não basta

dizer, como disse há dias, que a Turquia apresentou uma proposta muito ambiciosa para a União Europeia.

O Sr. Primeiro-Ministro disse que queria combater o terrorismo. Ora, deixar entrar na União Europeia um país

com as características da Turquia é tudo menos combater o terrorismo.

De qualquer forma, convém que o Primeiro-Ministro português tenha a oportunidade de, perante o País todo,

dizer se concorda ou não com a entrada da Turquia na União Europeia, em vez de andar a fazer o jogo que os

outros líderes europeus estão a fazer, que é, ora sim, ora não, e vamos lá ver no que é que isto dá mais para a

frente.

Tenha coragem. Diga-nos! Concorda ou não concorda com a entrada da Turquia na União Europeia?

Também gostaríamos de saber qual vai ser a sua posição no Conselho sobre a Hungria e a Polónia. Isto

porque, num dia, diz aqui aos seus aliados do PAN que não há União Europeia sem o mecanismo do Estado de

direito — ainda agora ouvimos o Deputado André Silva frisar o mesmo —, no outro dia, vai à Hungria e é elogiado

pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, que dizem que António Costa é um líder forte,

que sabe separar o que tem de ser separado.

Não vou comentar os elogios que lhe fazem, Sr. Primeiro-Ministro, mas, pelo menos, é um pouco curioso que

alguém que é atacado aqui dentro pelo Partido Socialista, elogie António Costa. Portanto, se calhar, o que o Sr.

Primeiro-Ministro está a dizer na Hungria não é o mesmo que está a dizer, aqui, em Portugal.

Mas convinha dizer-nos se vai ou não fazer finca-pé na cláusula do Estado de direito ou se vai voltar a dizer

assim: «Eu acho que não se devem misturar as coisas. Uma coisa são atuações disciplinares, outra é o

Orçamento. Como precisamos de dinheiro, o resto já pouco importa. Vamos lá despachar o dinheiro, depois

resolvem-se as coisas do Estado de direito». Aliás, essas já estão paradas há meses, como se sabe, sem a

aplicação do artigo 7.º, que há muito podia ter sido aplicado,…

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — … mas que o PS e o PSD, na União Europeia, ainda não conseguiram realizar. Finalmente, termino, Sr. Presidente, perguntando apenas como é que o Governo pensa lidar com os muitos

emigrantes portugueses em Inglaterra e também com os ingleses que residem em Portugal, após o Brexit.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado: Neste Conselho Europeu — até porque será o último antes da Presidência portuguesa

no mês que vem — o Iniciativa Liberal gostava de saber como é que o PS vai descalçar duas botas.

A primeira, está bom de ver, é esta ameaça da Hungria e da Polónia de travarem a «bazuca» europeia por

discordarem da condicionalidade de respeito pelo Estado de direito no acesso aos fundos. Isto porque o

Página 73

5 DE DEZEMBRO DE 2020

73

Primeiro-Ministro que vem agora dizer que não há plano B e a proporção na Hungria, é o mesmo Primeiro-

Ministro de um Governo, que, como o jornal Público recentemente demonstrou, criticava aqui há uns meses a

existência dessa condicionalidade e é também o mesmo Primeiro-Ministro que, em julho, foi a Budapeste dar

apoio a Viktor Orbán nesta matéria.

A verdade é que este tema pode não ficar decidido na próxima semana e vai cair na Presidência portuguesa

e, portanto, gostávamos de saber como é que o Governo português vai atuar: se seguirá o caminho da

cooperação forçada dos outros 25 países, se vai recorrer à justiça ou se espera ainda renegociar o acordo.

A outra bota a descalçar resulta da prioridade, assumida pela Presidência portuguesa, de defender o pilar

dos direitos sociais, incluindo a não discriminação e a inclusão social. Muito bem, até aqui muito bem.

Já não está tudo bem quando, de seguida, aparece a relação com a Índia, um país com diversas violações

de direitos humanos, conhecidas recentemente, e um país com um governo nacionalista hindu, rotulado por

muitos como de extrema-direita e autor de medidas como: a rogação da autonomia especial de Caxemira e

Jammu, a lei da nacionalidade, que discrimina com base em critérios religiosos, perseguições e detenções de

defensores de direitos humanos e de jornalistas.

Sr. Primeiro-Ministro, imagino que me vá falar da importância das relações históricas entre Portugal e a

Índia,…

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Não!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — … mas será que devemos fingir que não vemos as violações de direitos humanos em qualquer país com o qual temos uma história comum? Porque quer em relação ao regime

de Narendra Modi, na Índia, como em relação ao regime comunista chinês, a bota a descalçar é a mesma: é

imperioso exigir o cumprimento das regras básicas do Estado de direito e dos direitos humanos que, na nossa

opinião, são valores que não devem estar à venda.

O Sr. André Silva (PAN): — Muito bem, João!

O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento deste debate, tem a palavra o Governo, pelo Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

Faça favor, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, primeiro, quanto à Índia, não tem a ver com a História, tem a ver com o presente e com o futuro.

Para a Europa é fundamental que o mundo não seja um mundo bipolar. É fundamental, designadamente,

que a Europa tenha uma presença cada vez mais forte na região Indo-Pacífico e essa relação deve ser plural.

E da mesma forma que para nós é prioritário concluir acordos de comércio, por exemplo, com a Austrália e com

a Nova Zelândia, que estão em curso, é absolutamente fundamental valorizar aquele que é o segundo grande

país do Indo-Pacífico e que é a Índia.

Aplausos do PS.

Relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado André Ventura, a resposta é muito simples: a Turquia

não cumpre com os critérios de Copenhaga, portanto, a Turquia não pode entrar para a União Europeia.

O Sr. Deputado José Luís Ferreira sublinhou a importância da vacina, que, como já o disse aqui, é

fundamental e é um bom exemplo de como a União Europeia pode agir de uma forma solidária, cooperando

para enfrentarmos um problema que é também um desafio global. Este ano, ou melhor, o próximo ano, sendo o

ano europeu da ferrovia, é, aliás, uma excelente ocasião, que a Presidência portuguesa colocará no centro das

suas prioridades, de valorizar esse instrumento fundamental para combater as alterações climáticas.

Portugal é a favor da Diretiva CbCR (Country-by-Country Reporting), que obrigará as multinacionais a

divulgar os seus rendimentos país a país. Desde que haja condições no Conselho para a sua aprovação, que

requer maioria qualificada, agendá-la-emos para o Conselho e faremos avançar essa temática.

Página 74

I SÉRIE — NÚMERO 27

74

Quanto à questão do backstop, aquilo que garante é a capacidade de financiar fundos de resolução quando

estes não tiverem capacidade de assumir as suas obrigações. Entrará em vigor em 2022 e é uma das peças

fundamentais para a estabilização do sistema financeiro, da mesma forma que também é absolutamente

fundamental o mecanismo de garantia comum de depósitos para completar a união bancária. Trabalharemos

neste segundo dossier, mas é importante que esse primeiro tenha sido, desde já, encerrado.

Sobre a questão do Brexit, que está em discussão, há dois temas fundamentais que separam ainda a União

Europeia do Reino Unido: um tem a ver com as pescas, outro tem a ver com as condições de acesso ao mercado

interno.

De qualquer forma, relativamente aos cidadãos portugueses no Reino Unido, a situação está acautelada.

Neste momento, já há mais 300 000 cidadãos portugueses que estão registados, têm até junho do próximo ano

para o fazer e, aliás, o número de cidadãos britânicos registados em Portugal duplicou desde o início da situação

do Brexit.

Relativamente às duas questões colocadas pelos Srs. Deputados do PSD, percebo a preocupação de limpar

as Lajes das más memórias de cimeiras.

Aplausos do PS.

Acontece que as cimeiras, hoje em dia, são fixadas em determinados locais pelo Presidente do Conselho.

Aquilo que está acordado entre nós e o Presidente do Conselho é que a cimeira terá lugar em Bruxelas ou por

ocasião de uma cimeira da NATO ou aproveitando a deslocação do futuro Presidente americano à reunião do

G7, em Londres, no final de junho. De qualquer forma, ocorrerá durante o primeiro semestre do próximo ano.

Sr. Deputado, se for ver o conjunto das verbas do programa de estratégia e resiliência português, verá que

cerca de 50% das verbas são acessíveis às empresas.

Quanto ao Sr. Deputado Luís Leite Ramos, recomendo simplesmente que leia o que a União Europeia disse

esta semana: Portugal é o país mais próximo de atingir as metas climáticas de 2030.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Com as medidas atuais, Portugal ultrapassará em 23% a meta de 2030. Reduzimos já as emissões em 40%.

Aplausos do PS.

Finalmente, sobre aquele que é o «elefante», que não está na ordem de trabalhos, mas que está, obviamente,

na Sala, que o Sr. Deputado Capoulas Santos começou por enunciar e que, depois, vários Srs. Deputados aqui

enunciaram: em primeiro lugar, o Conselho Europeu estabeleceu um acordo sobre o futuro Quadro Financeiro

Plurianual, sobre o Plano de Recuperação e Resiliência para os próximos anos no Conselho de julho. É um

acordo fechado, que não deve ser reaberto e que, desde logo, previa os mecanismos necessários para garantir

um Estado de direito eficaz no controlo da aplicação dos fundos comunitários.

A presidência alemã logrou um consenso realizado com o Parlamento Europeu que criou um mecanismo de

condicionalidade de acesso aos fundos. Esse é um acordo fechado e que não deve ser reaberto. Aceitar reabrir

qualquer acordo é abrir uma porta para o desconhecido, que não tencionamos abrir.

Nenhum país da União Europeia pode aceitar que qualquer outro país da União coloque o conjunto dos

outros países numa posição de chantagem. E, portanto, sempre que um país da União Europeia procurar colocar

os demais em situação de chantagem, só há uma resposta, que é perder a aposta e perder a chantagem.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, o acordo tem mesmo de ser obtido neste Conselho, cuja reunião pode não acabar no dia

11 e prolongar-se até ao dia 12 ou 13. Mas, tem de haver um acordo neste Conselho e tem de haver um acordo

neste Conselho por uma razão fundamental, é porque aquilo que está em causa não é só o Plano de

Recuperação e Resiliência, o que está em causa…

Página 75

5 DE DEZEMBRO DE 2020

75

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É o Orçamento!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … é, desde logo, o Orçamento, que tem de entrar em vigor às zero horas do dia 1 de janeiro do próximo ano.

Os mecanismos da União Europeia não são tão dramáticos como o shutdown americano, mas são bastante

dramáticos. Só para termos uma ideia, só haverá pagamentos para o primeiro pilar da PAC, só haverá

pagamentos para o funcionamento das instituições europeias, mas, por exemplo, pagamentos em sede de

Fundo de Coesão praticamente desaparecerão.

Portanto, não é só não haver «bazuca», é que mesmo a espingarda de que hoje já dispomos deixará de

poder disparar. E isso acontece em Portugal e em todos os outros países. Portanto, não vale a pena ter ilusões

de que é possível adiar aquilo que, pura e simplesmente, tem de ser resolvido.

Quanto à questão de fundo, ela é muito clara: os mecanismos foram criados, estão aprovados e não devem

ser mudados. Pode-se trabalhar sobre eles, mas não se pode trabalhar na revisão dos mecanismos que estão

estabelecidos.

E ainda quanto à questão de fundo, aquilo que digo aqui, que digo no Conselho, como, aliás, disse em

Budapeste, é muito simples: os critérios de Copenhaga, que servem para a adesão à União Europeia, são os

critérios que estão também espelhados nos valores fundamentais que constam do artigo 2.º do Tratado de

Lisboa e que não são meros requisitos para aceder aos fundos comunitários, são requisitos para a pertença à

União Europeia.

Para um país da União Europeia que não cumpra os valores constantes do artigo 2.º, a questão não é a de

não poder ter fundos, mas, é, pura e simplesmente, a de não poder fazer parte da União Europeia.

Aplausos do PS.

E é isso que decorre, aliás, do artigo 7.º do Tratado de Lisboa. E, portanto, o artigo 7.º do Tratado de Lisboa

tem de ser aplicado…

O Sr. André Ventura (CH): — Mas não é!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … sempre e quando haja qualquer suspeita sobre qualquer Estado-membro de ter uma violação não só dos princípios do Estado de direito, mas de qualquer um dos valores fundamentais

constantes do artigo 2.º.

Há dois processos que estão abertos…

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — E parados!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e aquilo que temos dito é que, se estão abertos, é altura de deixarem de estar parados e de serem submetidos a uma decisão.

Protestos da Deputada do BE Fabíola Cardoso e do Deputado do CH André Ventura.

E se alguém não agenda porque tem receio de não haver uma maioria necessária, essa consequência

política também tem de ser assumida.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Agora, o que não é possível é este jogo de espelhos, em que se quer resolver um problema de viés em vez de assumir os problemas de frente. Daí nós termos dito, desde o início, que os

valores não são passíveis de comercialização. Por isso, a criação de uma cooperação reforçada não resolve o

problema do Orçamento — pode resolver o problema do programa de recuperação, mas não resolve o problema

do Orçamento — e, sobretudo, não resolve o problema da violação do Estado de direito.

Página 76

I SÉRIE — NÚMERO 27

76

Aplausos do PS.

Ora, o que nós queremos não é só que haja um Orçamento, é que haja um Orçamento em que o Estado de

direito seja cumprido e garantido em todos os Estados-membros.

O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Primeiro-Ministro. Tem de terminar.

O Sr. Primeiro-Ministro: — E para terminar, Sr. Presidente, gostaria só de recordar o seguinte: espero que, em Portugal, ninguém tenha dúvidas sobre qual é a posição deste e de qualquer outro Governo português. Isto

porque o que levou Portugal a pedir a adesão à União Europeia não foi para termos uma moeda única que, na

altura, nem sequer existia, não foi para aderir ao mercado interno, que, na altura, também não existia e tenho a

certeza de que não foi para aderir a uma união aduaneira, que já existia.

Aquilo que determinou a apresentação do pedido de adesão de Portugal à, então, Comunidade Económica

Europeia, em 1977, não foi nem a moeda, nem o mercado, nem a união aduaneira, foi mesmo os valores, foi

consolidar a nossa democracia e a nossa liberdade. Foi por isso que entrámos na União Europeia e é por isso

que estamos na União Europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao final deste debate do sexto ponto dos nossos trabalhos. Temos, agora, o sétimo ponto da nossa agenda, composto pela apreciação, sem tempos, do Relatório e

Conta de Gerência da Assembleia da República relativos ao ano de 2019.

Segue-se o oitavo ponto, que consiste na apreciação, na generalidade, sem tempos, das Propostas de

Resolução n.os 5/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o acordo sobre a participação da Croácia no espaço económico

europeu, assinado em Bruxelas, em 11 de abril de 2014, 8/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o protocolo sobre os

privilégios e imunidades do Tribunal Unificado de Patentes, feito em Bruxelas, a 29 de junho de 2016, 9/XIV/1.ª

(GOV) — Aprova o acordo sobre transporte aéreo entre a República Portuguesa e a República do Peru, assinado

em Lisboa, a 26 de fevereiro de 2019, 12/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Acordo-quadro entre a República

Portuguesa e as Nações Unidas sobre Reuniões das Nações Unidas a ter lugar na República Portuguesa,

assinado em Nova Iorque, em 11 de maio de 2020, 14/XIV/2.ª (GOV) — Aprova a convenção sobre a repressão

de atos ilícitos relacionados com a aviação civil internacional, adotada em Pequim, em 10 de setembro de 2010,

e 15/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o acordo entre a República Portuguesa e a República do Paraguai sobre a

transferência de pessoas condenadas, assinado em Lisboa, em 11 de maio de 2017.

Como são pontos sem atribuição de tempos para discussão, vamos passar diretamente às votações

regimentais, para as quais temos quórum.

Começamos pelo Projeto de Voto n.º 410/XIV/2.ª (apresentado pelo PAR e subscrito por Deputados do PSD,

do BE, do PAN e do IL, pela Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e por Deputados do PS) — De pesar

pelo falecimento de Eduardo Lourenço, que era uma pessoa com quem eu tinha uma relação afetiva de muitos

anos.

Peço à Sr.ª Vice-Presidente Edite Estrela o favor de proceder à respetiva leitura.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o projeto de voto é do seguinte teor:

«Faleceu, no passado dia 1 de dezembro, o professor, filósofo, crítico e ensaísta Eduardo Lourenço, aos 97

anos.

Nascido a 23 de maio de 1923, em São Pedro do Rio Seco, Guarda, Eduardo Lourenço de Faria encontrou

na Universidade de Coimbra as condições propícias à reflexão que haveria de prosseguir durante toda a sua

vida. Licenciado em Ciências Histórico-Filosóficas em 1946, é Assistente da Faculdade de Letras entre 1947 e

1953, ano em que assume as funções de Leitor de Cultura Portuguesa nas Universidades de Hamburgo e de

Heidelberg, exercendo idênticas funções na Universidade de Montpellier entre 1956 e 1958. Depois de uma

Página 77

5 DE DEZEMBRO DE 2020

77

breve passagem pelo Brasil, como Professor Convidado de Filosofia na Universidade Federal da Bahia, regressa

a França, onde passa a viver a partir de 1960.

Leitor de Língua e Cultura Portuguesas na Faculdade de Letras da Universidade de Grenoble entre 1960 e

1965, a convite do Governo francês ocupa o cargo de maître assistant e, mais tarde, de maître deconférences

na Universidade de Nice até 1987, jubilando-se como professor da Faculdade de Letras em 1989. Nesse ano, é

nomeado Conselheiro Cultural da Embaixada de Portugal em Roma pelo Governo português, cargo que ocupa

até 1991.

Colaborador de longa data da Fundação Calouste Gulbenkian, foi seu administrador não executivo entre

2002 e 2012. No ano seguinte, 2013, com a morte de Annie Salomon de Faria, a companheira de quatro décadas

— de vida, de destino partilhado, de caminho comum —, radica-se definitivamente em Lisboa.

Eduardo Lourenço deixa um legado que vai muito além da vasta obra publicada, sobre uma grande variedade

de temas — filosóficos, políticos, culturais, religiosos e literários —, traduzindo-se na intervenção de toda uma

vida nas áreas da educação, da cultura e da cidadania, justamente reconhecida por inúmeros prémios, incluindo

os prémios Camões (1996), Pessoa (2011) e da Academia Francesa (2016), e condecorações, distinguido por

quatro vezes com ordens nacionais, com destaque para a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, em 2014, e

reconhecido no estrangeiro, muito em particular na França, que o acolheu por três décadas, como Cavaleiro da

Ordem das Artes e das Letras (2000) e da Ordem Nacional da Legião de Honra (2002).

Desde abril de 2016, integrava o Conselho de Estado por designação pessoal do Presidente da República,

Marcelo Rebelo de Sousa.

De uma envergadura intelectual sem paralelo, Eduardo Lourenço foi, sem dúvida, quem melhor refletiu a

identidade nacional, tantas vezes a desconstruindo, sobre o que é ser português, na Europa e no mundo, sobre

o que nos diferencia e nos assemelha a outros povos.

Homem de imensa cultura, alavancada por uma enorme sede de conhecimento, o seu desaparecimento

constituiu uma perda irreparável para Portugal e para a lusofonia, de que era uma das suas maiores referências

intelectuais.

A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, manifesta o seu profundo pesar pelo falecimento

de Eduardo Lourenço, figura fundamental do Portugal contemporâneo, prestando homenagem ao professor e

pensador e transmitindo à sua família e amigos as mais sentidas condolências.»

O Sr. Presidente: — Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr.as e Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Sr.as e Srs. Deputados, prosseguimos, com a votação do projeto de voto n.º 374/XIV/2.ª (apresentado pelo

PSD) — De congratulação pelo título de vice-campeão mundial de maratona BTT alcançado pelo ciclista Tiago

Ferreira.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Segue-se o projeto de voto n.º 409/XIV/2.ª (apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais,

Direitos, Liberdades e Garantias e subscrito por Deputados do PS) — De saudação pelo Dia Internacional pela

Eliminação da Violência contra as Mulheres.

Peço à Sr.ª Secretária Lina Lopes que faça o favor de proceder à respetiva leitura.

A Sr.ª Secretária (Lina Lopes): — Sr.as e Srs. Deputados, o projeto de voto é do seguinte teor: «O dia 25 de novembro assinala o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres, com o

intuito de denunciar e condenar os vários tipos de violência contra as mulheres no mundo — sejam elas a

Página 78

I SÉRIE — NÚMERO 27

78

violência física, psicológica ou simbólica, cometidas tanto no espaço doméstico como no espaço público —,

sensibilizar a opinião pública e exortar à promoção de políticas públicas para prevenir e combater este flagelo.

A pandemia COVID-19 e as medidas associadas ao seu combate, nomeadamente o distanciamento social e

o isolamento durante os períodos de confinamento, assim como a combinação das tensões económicas e sociais

daí decorrentes, deixam mais vulneráveis e mais expostas à ocorrência de situações de violência doméstica as

mulheres, mas também as crianças e as pessoas idosas. Lutar e ultrapassar a grave crise de saúde pública que

vivemos exige medidas concretas e uma atenção redobrada para melhor proteger as vítimas de violência.

Os números já eram alarmantes antes da pandemia – 249 milhões de mulheres e raparigas, dos 15 aos 49

anos, foram vítimas de violência nos últimos 12 meses, de acordo com os dados da ONU – e subiram em tempos

de confinamento, tornando-se numa verdadeira «epidemia escondida».

Estudos promovidos pela Comissão Europeia mostram que o confinamento, ao promover o isolamento e um

maior contacto entre vítimas e agressores, aumenta o nível de violência a que as mulheres são sujeitas, devendo

desencadear um aumento dos níveis de alerta e de vigilância com o objetivo de combater a violência doméstica

e proteger as vítimas.

Neste sentido, a Assembleia da República, reunida em Plenário, saúda o Dia Internacional pela Eliminação

da Violência contra a Mulher e reafirma o seu empenho e compromisso permanentes na prevenção e combate

com vista à eliminação desta grave violação dos direitos humanos.»

O Sr. Presidente: — Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos passar à votação do Projeto de Resolução n.º 653/XIV/2.ª (BE) — Pela valorização da carreira

docente.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do CDS-PP, votos a favor do BE, do PCP, do

PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD,

do CH e do IL.

Prosseguimos, com a votação do Projeto de Resolução n.º 660/XIV/2.ª (PCP) — Valorização dos professores

e educadores e melhoria das suas condições de trabalho.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do

PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções

do CH e do IL.

Passamos à votação do Projeto de Resolução n.º 716/XIV/2.ª (PEV) — Atribuição de direitos devidos aos

professores.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP e do IL, votos a favor do

BE, do PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a

abstenção do CH.

Prosseguimos, com a votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 63/XIV/2.ª (GOV) — Procede à

suspensão excecional de prazos associados à sobrevigência e caducidade de convenção coletiva de trabalho.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do BE, do PAN e das Deputadas não inscritas

Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PSD, do CDS-PP e do IL e abstenções do PCP, do

PEV e do CH.

A proposta de lei baixa à 10.ª Comissão.

Página 79

5 DE DEZEMBRO DE 2020

79

Vamos passar à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 10/XIV/1.ª (PCP) — Repõe o princípio do

tratamento mais favorável, elimina a caducidade da contratação coletiva e regula a sucessão de convenções

coletivas de trabalho (décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de

fevereiro).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL, votos a

favor do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do PAN e da

Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

Vamos prosseguir, Srs. Deputados, com a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 74/XIV/1.ª (BE) —

Promove a contratação coletiva, procedendo à décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela

Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL, votos a

favor do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do PAN e da

Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 130/XIV/1.ª (PEV) — Consagra a reposição do princípio

do tratamento mais favorável ao trabalhador e a eliminação da caducidade da contratação coletiva (décima sexta

alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL, votos a

favor do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do PAN e da

Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

Passamos agora à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 729/XIV/2.ª (PS) — Recomenda

ao Governo um conjunto de medidas para utilização mais eficaz e eficiente dos fundos da União Europeia,

nomeadamente no âmbito da Política de Coesão, do Plano Estratégico da Política Agrícola Comum e do Plano

de Recuperação da União Europeia.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do IL e

das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP, do PEV e do

CH.

O projeto de resolução baixa à 6.ª Comissão.

Prosseguimos, com a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 589/XIV/2.ª (IL) — Criação e

manutenção do Portal da Transparência por uma entidade independente.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do BE, votos a favor do PSD, do CDS-PP, do

PAN, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do

PCP e do PEV.

Vamos agora votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 714/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao

Governo que apresente à Assembleia da República relatórios trimestrais sobre a negociação e a execução dos

fundos europeus atribuídos a Portugal ao abrigo do Programa Next Generation e do Quadro Financeiro

Plurianual 2021-2027 e a respetiva implementação do plano de recuperação económica Portugal 2020-2030.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL e

da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues, votos contra do PS e abstenções do PCP, do PEV e da Deputada

não inscrita Joacine Katar Moreira.

O projeto de resolução baixa à 6.ª Comissão.

Página 80

I SÉRIE — NÚMERO 27

80

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 748/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao

Governo que proceda à criação de uma plataforma pública, demonstrando, de forma transparente, acessível e

territorializada, a alocação dos fundos europeus atribuídos a Portugal através do Quadro Financeiro Plurianual

2021-2027 e do fundo de recuperação Próxima Geração EU.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do

PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do

PS.

O projeto de resolução baixa à 6.ª Comissão.

Sr.as e Srs. Deputados, vamos votar o Relatório e Conta de Gerência da Assembleia da República relativos

ao ano de 2019.

Submetido à votação, foi aprovado, comvotos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN,

do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a abstenção do IL.

Passamos agora à votação global da Proposta de Resolução n.º 5/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Acordo sobre

a Participação da Croácia no Espaço Económico Europeu, assinado em Bruxelas, em 11 de abril de 2014.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH,

do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP e do PEV.

Vamos passar à votação global da Proposta de Resolução n.º 8/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Protocolo sobre

os Privilégios e Imunidades do Tribunal Unificado de Patentes, feito em Bruxelas, a 29 de junho de 2016.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL e

das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do BE, do PCP e do PEV.

Vamos passar à votação global da Proposta de Resolução n.º 9/XIV/1.ª (GOV) – Aprova o Acordo sobre

Transporte Aéreo entre a República Portuguesa e a República do Peru, assinado em Lisboa, a 26 de fevereiro

de 2019.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos passar à votação global da Proposta de Resolução n.º 12/XIV/2.ª (GOV) – Aprova o Acordo-Quadro

entre a República Portuguesa e as Nações Unidas sobre Reuniões das Nações Unidas a ter lugar na República

Portuguesa, assinado em Nova Iorque, em 11 de maio de 2020.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos passar à votação global da Proposta de Resolução n.º 14/XIV/2.ª (GOV) – Aprova a Convenção Sobre

a Repressão de Atos Ilícitos relacionados com a Aviação Civil Internacional, adotada em Pequim, em 10 de

setembro de 2010.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH,

do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP e do PEV.

Vamos passar à votação global da Proposta de Resolução n.º 15/XIV/2.ª (GOV) – Aprova o Acordo entre a

República Portuguesa e a República do Paraguai sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, assinado em

Lisboa, em 11 de maio de 2017.

Página 81

5 DE DEZEMBRO DE 2020

81

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH,

do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP e do PEV.

Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 644/XIV/2.ª (PSD) – Recomenda ao Governo o envolvimento das

Forças Armadas nas ações de planeamento e operacionalização das medidas e ações que vierem a ser

adotadas nesta nova fase de combate à pandemia, nomeadamente no apoio aos cidadãos em situação de maior

vulnerabilidade e risco, como é o caso do apoio aos lares e instituições sociais de todo o país que prestam

serviços a esta franja da população mais vulnerável.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PS, do BE, do PCP e do

PEV.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, queria informar que o Grupo Parlamentar do PS apresentará uma declaração de voto sobre esta votação.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado. Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 739/XIV/2.ª (CH) – Pela criação de uma entidade independente que

fiscalize a execução dos fundos europeus consignados ao plano de recuperação e resiliência da União Europeia.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita

Joacine Katar Moreira e votos a favor do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL e da Deputada não

inscrita Cristina Rodrigues.

Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 689/XIV/2.ª (BE) – Pela criação de um fundo de apoio ao desporto,

relativamente ao qual há um requerimento do PSD para que sejam votados, separadamente, os pontos 1 e 2.

Srs. Deputados, vamos, então, votar o ponto 1.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do

PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PS e

do IL.

Srs. Deputados, vamos votar o ponto 2.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do IL e abstenções do PS, do

PSD e do CDS-PP.

Vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias,relativo aos Projetos de Lei n.os 196/XIV/1.ª (BE) - Altera a composição do Conselho Nacional de Bombeiros, possibilitando a representação da Associação Portuguesa

dos Bombeiros Voluntários (1.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril), e 203/XIV/1.ª (PAN) - Altera

a composição do Conselho Nacional de Bombeiros, regulada pelo Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril (1.ª

alteração ao Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do

CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, temos ainda de votar um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados

do qual o Sr. Secretário Nelson Peralta vai dar conta.

Página 82

I SÉRIE — NÚMERO 27

82

O Sr. Secretário (Nelson Peralta): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Juízo Central Criminal de Leiria – Juiz 1 – Processo 2160/18.5T9LRA, a Comissão de

Transparência e Estatuto dos Deputados decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado João

Gomes Marques (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário vai ainda dar conta à Câmara de outras informações. Tem a palavra.

O Sr. Secretário (Nelson Peralta): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa os Projetos de Lei n.os 590/XIV/2.ª (PEV), que baixou à 10.ª Comissão, e 591/XVI/2.ª (PSD), que baixou à 1.ª Comissão.

Finalmente, queria ainda dar conta que estiveram presentes nesta sessão plenária, através de

videoconferência, os seguintes Srs. Deputados: Marta Freitas, do PS, eleita pelo círculo eleitoral da Madeira, e

Sara Madruga da Costa e Sérgio Marques, do PSD, também eleitos pelo círculo eleitoral da Madeira.

Em isolamento profilático estão os Srs. Deputados Miguel Matos, Marques Perestrelo e Sofia Araújo, do PS,

e Telmo Correia, do CDS-PP, que também participaram por videoconferência.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado. Falta apenas anunciar que a próxima reunião plenária terá lugar na quinta-feira, dia 10 de dezembro, às 15

horas.

Do primeiro ponto da ordem do dia consta a apreciação conjunta do Projeto de Lei n.º 579/XIV/2.ª (PSD) —

Altera o artigo 36.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho,

de modo a prorrogar o período de admissão de novas entidades ao Regime do Centro Internacional de Negócios

da Madeira ou Zona Franca da Madeira até 31 de dezembro de 2023, em conformidade com o Regulamento

(UE) 2020/972 da Comissão, de 2 de julho de 2020, e do Projeto de Resolução n.º 648/XIV/2.ª (PAN) —

Recomenda ao Governo que adote um conjunto de medidas de combate aos paraísos fiscais e que realize uma

avaliação de custo-benefício do impacto global económico, social e fiscal da Zona Franca da Madeira.

Do segundo ponto consta a apreciação conjunta dos Projetos de Lei n.os 165/XIV/1.ª (BE) — Redução da

idade da reforma das pessoas com deficiência e 588/XIV/2.ª (PCP) — Condições de acesso à reforma para as

pessoas com deficiência.

Do terceiro ponto consta a apreciação conjunta dos Projetos de Lei n.os 523/XIV/2.ª (PCP) — Prorroga o

prazo para a prova de detenção de cofre pelos detentores de armas de fogo (1.ª alteração à Lei n.º 50/2019, de

24 de julho), e 554/XIV/2.ª (CDS-PP) — Consagra um período extraordinário de entrega voluntária de armas de

fogo não manifestadas ou registadas e do Projeto de Resolução n.º 526/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao

Governo que interdite a utilização de chumbo nas munições da atividade cinegética e nos campos de tiro.

No quarto ponto 4 será apreciado o Projeto de Resolução n.º 693/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao

Governo que divulgue informação sobre a COVID-19 em contexto escolar e desenvolva um programa de

rastreio.

No quinto ponto procederemos à apreciação conjunta do Projeto de Lei n.º 134/XIV/1.ª (PAN) — Visa a

interdição do fabrico, posse, utilização e venda de artefactos que sirvam unicamente para a captura de aves

silvestres não sujeitas a exploração cinegética, do Projeto de Lei n.º 215/XIV/1.ª (PAN) — Retira o coelho-bravo

das espécies sujeitas a exploração cinegética, do Projeto de Resolução n.º 140/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda

ao Governo que institua um regime de moratória temporário para a caça da rola-comum, do Projeto de Lei n.º

158/XIV/1.ª (PEV) — Proíbe a caça à raposa, exclui esta espécie da lista de espécies cinegéticas e procede à

alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, do Projeto de Lei n.º 159/XIV/1.ª (PEV) — Proíbe a

caça ao saca-rabos, exclui esta espécie da lista de espécies cinegéticas e procede à alteração ao Decreto-Lei

n.º 202/2004, de 18 de agosto, do Projeto de Lei n.º 160/XIV/1.ª (PEV) — Proíbe a caça ao melro, exclui esta

espécie da lista de espécies cinegéticas e procede à alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto,

do Projeto de Lei n.º 161/XIV/1.ª (PEV) — Proíbe a caça à gralha-preta, exclui esta espécie da lista de espécies

Página 83

5 DE DEZEMBRO DE 2020

83

cinegéticas e procede à alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, do Projeto de Lei n.º 162/XIV/1.ª

(PEV) — Proíbe a caça ao gaio, exclui esta espécie da lista de espécies cinegéticas e procede à alteração ao

Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, do Projeto de Lei n.º 163/XIV/1.ª (PEV) — Proíbe a caça à pega-

rabuda e exclui esta espécie da lista de espécies cinegéticas e procede à alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004,

de 18 de agosto, do Projeto de Lei n.º 586/XIV/2.ª (BE) — Condiciona o exercício da caça a espécies cinegéticas

que não se encontrem ameaçadas, ou quase ameaçadas e que apresentem estatuto de conservação conhecido

(8.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto) e do Projeto de Lei n.º 587/XIV/2.ª (BE) — Interdita

a produção, posse, utilização e comercialização dos meios e formas aplicados exclusivamente na captura ou

abate de exemplares de espécies não cinegéticas de aves selvagens (3.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 140/99,

de 24 de abril).

Do sexto ponto consta a apreciação do Projeto de Resolução n.º 429/XIV/1.ª (PEV) — Informação aos

cidadãos sobre as melhores práticas de utilização corrente de material de proteção individual, como máscaras,

viseiras ou luvas, e incentivo à opção por material reutilizável.

Srs. Deputados, chegamos, assim, ao fim dos nossos trabalhos de hoje. Relembro que temos reunião de

Conferência de Líderes na quarta feira e que na quinta teremos reunião plenária com esta agenda ambiciosa.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 11 minutos.

———

Nota: A declaração de voto anunciada pelo Deputado do PS João Paulo Correia, referente a esta reunião

plenária, não foi entregue no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

Páginas Relacionadas
Página 0080:
I SÉRIE — NÚMERO 27 80 Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Re

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×