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I SÉRIE — NÚMERO 36

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Se, à partida, ambos os caminhos aparentemente se afiguram conformes, uma avaliação dos efeitos de cada

uma das opções iluminará melhor, em meu entender, quais os direitos e interesses juridicamente relevantes que

estão em causa e que importa salvaguardar.

Em causa não está, para o Deputado dispensado — qualquer que seja a opção — eventual prejuízo na sua

esfera pessoal, mormente de natureza pecuniária, em função da especial proteção que lhe é dada pelo referido

n.º 1 do artigo 6.º da LEPR.

Em causa estão, porém, outros aspetos relevantes, a saber:

Primeiro aspeto, a estabilidade da composição da Assembleia da República de acordo com o disposto na

respetiva Lei Eleitoral que fixa o número de Deputados não de modo variável mas fixo, em 230. Portanto, 230 e

não 229 por efeito eventual de uma deliberação de dispensa, ainda que temporária, mas, nesse período,

constante, de exercício das funções de Deputado. Tal redução, ainda que circunstancial e limitada, não tem

base legal em todos os casos em que ao mandato subjaz o direito à representação efetiva por parte dos

correspondentes partidos políticos ou coligação de partidos, que dessa representação não podem ser

destituídos, ainda que transitoriamente, por opção alheia. É o que resulta implícito na razão de ser de normas

constitucionais como as do artigo 160.º, n.º 1 c) (perda de mandato de Deputados que se inscrevam em partido

diferente) ou do artigo 180.º (Direitos dos Deputados eleitos por partidos);

Segundo aspeto, e por derivação do anterior, o direito subjetivo, não privatístico mas de natureza institucional,

dos partidos políticos e dos cidadãos eleitores à representação parlamentar efetiva em correspondência com a

conversão de votos em mandatos, mais uma vez de acordo com a Lei Eleitoral. Direito que, a ser denegado,

nos casos de Deputado único representante de um Partido torna ainda mais evidente a quebra do direito à

representação efetiva.

Por uma razão e por outra se deve concluir que a Assembleia da República não tem a faculdade legal de

tomar deliberações das quais resultem como consequência a permanência de «cadeiras vazias» em prejuízo da

vontade dos representados.

Obstando a esta consequência poderá alegar-se que a simples dispensa de funções não implicaria

necessariamente a «cadeira vazia» pois sempre o Deputado dispensado poderia retomar intermitentemente o

exercício da função. Creio, perante tal argumento, ser imprescindível levar em conta que esse não é o propósito

requerido pelo Deputado — que tem direito a ver considerada a sua pretensão com o propósito com que o

formula. Ao invés, a manter o Deputado na contingência do exercício intermitente de atividade entre a sua

condição parlamentar e a condição de candidato, tal redundaria, por um lado, no desempenho necessariamente

prejudicado dos deveres de representação parlamentar — entre os quais se contam os da assiduidade, pois

(segundo o artigo 14.º ED) «o exercício de quaisquer outras atividades, quando legalmente admissível, não pode

por em causa o regular cumprimento dos deveres previsos», designadamente o de «participar nos trabalhos

parlamentares». E, por outro, num prejuízo (maior ou menor não nos compete aqui julgar) do direito à igualdade

de condições entre candidatos, neste caso por afetação da disponibilidade integral do candidato para o seu

desempenho na campanha eleitoral.

Se outros candidatos, no passado, sendo Deputados, não consideraram colocar a questão à ponderação da

Assembleia da República e resolveram harmonizar com o exercício do mandato parlamentar os seus atos de

campanha, isso não constitui qualquer precedente digno de fazer jurisprudência pelo simples facto de essa

opção ter resultado das suas opções próprias e, consequentemente, a Assembleia, por desnecessidade, não

ter sido chamada a pronunciar-se sobre tal opção. O que, tanto quanto sei, acontece agora, pela primeira vez.

Assim, e em conclusão,

Face à natureza dos direitos a salvaguardar e dos interesses a proteger — a de candidatura em condições

de igualdade e a da representação parlamentar efetiva a que os partidos, com eleitos, têm direito —, a solução

do caso deve derivar da aplicação do artigo 6.º, n.º 1, da LEPR, que configura um «motivo relevante» para

dispensa de funções. Partindo dessa norma, trata-se de proceder à receção interna, no âmbito do Parlamento,

desse «motivo relevante». Aplicando o método interpretativo da identidade de razão, por aplicação analógica,

verifica-se que o procedimento previsto para os demais motivos relevantes é o consignado nos artigos 4.º e 5.º

do ED. Ou seja: reconhecimento da pretensão à suspensão temporária do mandato e substituição do Deputado

pelo correspondente período, nos termos do ED e da Lei Eleitoral para a Assembleia da República.

Acresce, para além da fundamentação jurídico-constitucional acima expressa, ser ainda ela a que configura

a opção mais conforme ao princípio constitucional que veda, em geral, interpretações restritivas em matéria de

direitos fundamentais — sendo que, no caso, é o exercício de um direito de participação política que está em

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