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19 DE FEVEREIRO DE 2021

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Como política, tenho a responsabilidade de representar os valores humanitários e democráticos que não

coincidem com aqueles que Marcelino da Mata, a sua vida, história e pensamento representam.

Enquanto luso-guineense, trago a herança de um povo combatente e resiliente que venceu a guerra colonial

e pôs fim ao regime secular do colonialismo, permitiu as condições para o 25 de Abril em Portugal, que hoje

todas e todos celebramos. Enquanto herdeira de duas revoluções pela liberdade e contra o colonialismo, não

subscrevo o nome de Marcelino da Mata.

Como mãe, junto-me à dor das mulheres guineenses que perderam os seus filhos e sofreram a brutalidade

da guerra, da chacina e da matança. Abraço as mães vivas e já falecidas dos combatentes que trouxeram a

libertação política à Guiné-Bissau e a Cabo Verde. E estou do lado das mães portuguesas que sofreram a perda

de entes queridos sem que pudessem interferir e ter voz num mundo de homens que rouba os filhos das

mulheres para a dor e a morte. Marcelino da mata traiu o seu bambaram.*

Marcelino da Mata não merece qualquer honra. Não merece ser votado na casa da democracia porque foi

um antidemocrático e contra a autodeterminação dos seus próprios irmãos e irmãs. Marcelino da Mata não

esteve à altura do seu tempo e tombou pelo lado que considerou mais forte.

Assembleia da República, 18 de fevereiro de 2021.

A Deputada não inscrita, Joacine Katar Moreira.

——

O Voto de Pesar n.º 468/XIV/2.ª, da Comissão de Defesa Nacional, assinala o falecimento do Tenente-

Coronel Marcelino da Mata, no dia 11 de fevereiro, aos 80 anos de idade. Respeitando o seu falecimento, que

lamento como o de qualquer ser humano, não me é possível acompanhar o voto apresentado.

Compreendo que tal opção possa suscitar reações diversas. Cumpre-me, antes de mais, esclarecer que

lamento o falecimento de qualquer ser humano, independentemente da sua história pessoal, das suas

convicções ou das circunstâncias da sua morte, como não poderia deixar ser. Os princípios humanistas e os

valores que me acompanham não me permitiriam fazer outra coisa que não expressar as minhas condolências.

Contudo, um voto de pesar apresentado e votado na Assembleia da República não é um mero formalismo ou

um ato de lamento. De outra forma, todo e qualquer cidadão português, sendo igualmente merecedor de

dignidade e respeito por parte de um órgão de soberania como a Assembleia da República, seria motivo de

apresentação de um destes votos nesta sede. Não o sendo, o voto de pesar não se presta apenas a uma

expressão de pesar, mas também a assinalar a relevância de tal cidadão, consubstanciada nos seus atos

públicos, conferindo-lhe uma avaliação positiva do seu percurso de vida e com o reconhecimento da Assembleia

da República. É essa avaliação que não me permite votar favoravelmente este voto, pelos motivos que passo a

explicar.

Marcelino da Mata, nascido na Guiné-Bissau a 7 de maio de 1940, foi inicialmente incorporado

acidentalmente, sendo depois voluntário em todas as incorporações seguintes, entre os anos de 1961 e 1974.

É, como é sabido, um dos mais condecorados militares do Exército português. Não estão em causa os seus

atos de coragem e bravura individual, que lhe mereceram louvores e condecorações diversos, nem tampouco o

agradecimento pelo cumprimento de missões militares, nomeadamente de salvamento. Esses louvores e

condecorações são, aliás, o reconhecimento atempado que o país fez desses mesmos serviços, mesmo nas

mais controversas condições. Contudo, tais atos eventualmente meritórios não podem esconder as dúvidas

legítimas, consubstanciadas em diversos relatos, dos seus excessos durante a guerra, nomeadamente de atos

que poderiam configurar crimes de guerra à luz das convenções internacionais. Sabemos, é certo, que nunca

foi levado a julgamento e condenado, pelo que não é possível aferir da justeza dessas acusações. O facto de a

guerra colonial não se disputar entre dois países, não havendo declaração de guerra, permitiu que esta se

desenrolasse à margem de tais convenções, a que acrescem dois factos conhecidos. Por um lado, o papel do

Estado Novo na ocultação dos seus crimes, também aplicável a circunstâncias de guerra — não por acaso, não

houve julgamento de responsáveis de massacres como o de Batepá (1953), Pidjiguiti (1959), Mueda (1960),

* Pano tradicional da Guiné-Bissau onde as mulheres carregam os seus filhos.

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