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Quinta-feira, 4 de março de 2021 I Série — Número 48
XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)
REUNIÃOPLENÁRIADE3DEMARÇODE 2021
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 2
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º
75/XIV/2.ª, dos Projetos de Lei n.os 702 a 709/XIV/2.ª e dos Projetos de Resolução n.os 1012 a 1025/XIV/2.ª, da caducidade do processo relativo à apreciação do Decreto-Lei n.º 33-A/2020, que procede à apropriação pública, por via da
nacionalização, da participação social detida pela Winterfell 2 Limited na Efacec Power Solutions, SGPS, S. A. [Apreciações Parlamentares n.os 24/XIII/2.ª) (BE) e 25/XIII/2.ª (PCP)] e da retirada, pelo PSD, do seu Projeto de Lei n.º 390/XIV/1.ª.
Ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, procedeu-se a um debate com o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva).
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O Ministro e a Secretária de Estado das Comunidades Portuguesas (Berta Nunes) deram resposta às perguntas formuladas pelos Deputados Isabel Meireles, Catarina Rocha Ferreira e Nuno Miguel Carvalho (PSD), Pedro Filipe Soares, Fabíola Cardoso e Nelson Peralta (BE), João Oliveira (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), André Silva (PAN), José Luís Ferreira (PEV), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), Luís Capoulas Santos e Lara Martinho (PS), Sérgio Marques, Carlos Alberto Gonçalves, José Cesário e Eduardo Teixeira (PSD), Paulo Pisco, Carlos Brás, Francisco Pereira Oliveira e Paulo Porto (PS), Alexandra Vieira e Beatriz Gomes Dias (BE), Bruno Dias (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Inês de Sousa Real (PAN).
Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 931/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que conclua com urgência o processo de abertura e avaliação de candidaturas, celebre os contratos e proceda aos pagamentos em dívida referente ao apoio à recuperação dos danos causados em infraestruturas municipais nos distritos de Aveiro, Braga, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria, Lisboa, Porto, Santarém, Viana do Castelo, Vila Real e Viseu pelas tempestades Elsa e Fabien ocorridas em 2019.
Foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 884/XIV/2.ª (PEV) — Recomenda ao Governo que crie as condições necessárias para a ratificação do Tratado de Proibição das Armas Nucleares.
Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 712/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo um reforço na estratégia integrada no combate ao desperdício alimentar e 728/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo medidas para redução do desperdício alimentar e promoção da saúde pública.
Foram aprovados requerimentos, apresentados pelo BE e pelo PCP, de avocação pelo Plenário da votação, na especialidade, de propostas suas de alteração ao Decreto-Lei nº 8-B/2021, de 22 de janeiro — Estabelece um conjunto de medidas de apoio no âmbito da suspensão das atividades letivas e não letivas presenciais [Apreciações Parlamentares n.os 39/XIV/2.ª (BE) e 41/XIV/2.ª (PCP)] e ao Decreto-Lei n.º 6-E/2021, de 15 de janeiro — Estabelece mecanismos de
apoio no âmbito do estado de emergência [Apreciações Parlamentares n.os 40/XIV/2.ª (PCP) e 42/XIV/2.ª (BE)]. Após terem usado da palavra os Deputados Diana Ferreira (PCP), Joana Mortágua (BE), Ofélia Ramos (PSD), Rita Borges Madeira (PS), Inês de Sousa Real (PAN), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e José Moura Soeiro (BE), foi aprovada uma proposta do BE de aditamento de um artigo 3.º-D ao Decreto-Lei n.º 6-E/2021, de 15 de janeiro, tendo depois sido aprovados, em votação final global, os textos finais, apresentados pela Comissão de Trabalho e Segurança Social, relativos àqueles decretos-leis.
Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 94/XIV/1.ª (PEV) — Cria maior justiça no direito a prestação por incapacidade decorrente de doença ou acidente de trabalho, 197/XIV/1.ª (BE) — Repõe o direito dos funcionários públicos à reparação pecuniária dos danos resultantes de acidentes de serviço e doenças profissionais e 200/XIV/1.ª (PCP) — Repõe a possibilidade de acumulação das prestações por incapacidade permanente com a parcela da remuneração correspondente à percentagem de redução permanente da capacidade geral de ganho do trabalhador, tendo depois sido aprovado, na generalidade, na especialidade (assunção, pelo Plenário, das votações indiciárias realizadas em sede de Comissão) e em votação final global, o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Administração Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder Local, relativo àqueles projetos de lei.
Foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Administração Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder Local, relativo ao Decreto-Lei n.º 10-A/2021, de 2 de fevereiro, que estabelece mecanismos excecionais de gestão de profissionais de saúde para realização de atividade assistencial no âmbito da pandemia da doença COVID-19 [Apreciação Parlamentar n.º 43/XIV/2.ª (BE)].
Deu-se conta dos Deputados que estiveram presentes, por videoconferência, na reunião plenária.
A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 19 horas e 37 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Srs.
Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Srs. Agentes da autoridade, vamos dar
início à nossa reunião plenária.
Eram 15 horas e 2 minutos.
A Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai começar por dar conta do expediente.
Faça favor, Sr.ª Secretária.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa,
e foram admitidas pelo Sr. Presidente, várias iniciativas legislativas.
Começo por anunciar a entrada da Proposta de Lei n.º 75/XIV/2.ª (Assembleia Legislativa da Região
Autónoma da Madeira).
Deram, ainda, entrada os Projetos de Lei n.os 702/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues),
703/XIV/2.ª (BE), 704/XIV/2.ª (BE), 705/XIV/2.ª (BE), 706/XIV/2.ª (PS), 707/XIV/2.ª (PSD), 708/XIV/2.ª (PS) e
709/XIV/2.ª (PAN).
Refiro também os Projetos de Resolução n.os 1012/XIV/2.ª (BE), 1013/XIV/2.ª (BE), 1014/XIV/2.ª (PSD),
1015/XIV/2.ª (PSD), 1016/XIV/2.ª (PS), 1017/XIV/2.ª (PSD), 1018/XIV/2.ª (CDS-PP), 1019/XIV/2.ª (BE),
1020/XIV/2.ª (PS), 1021/XIV/2.ª (PAN), 1022/XIV/2.ª (PAN), 1023/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina
Rodrigues), 1024/XIV/2.ª (PAN) e 1025/XIV/2.ª (PSD).
Anuncio, agora, a caducidade do processo relativo à apreciação do Decreto-Lei n.º 33-A/2020, que procede
à apropriação pública por via da nacionalização da participação social detida pela Winterfell 2 Limited na Efacec
Power Solutions, SGPS, S.A. [Apreciações Parlamentares n.os 24/XIV/1.ª (BE) e 25/XIV/1.ª (PCP)].
Por fim, anuncio a retirada pelo proponente do Projeto de Lei n.º 390/XIV/1.ª (PSD).
Terminei, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Estamos, assim, em condições de iniciar o primeiro ponto dos nossos trabalhos de hoje,
que trata do debate com o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros sobre política setorial, ao abrigo da
alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento.
Este é o único ponto da nossa ordem do dia, para além das votações regimentais. Devo, aliás, desde já
avisar os Srs. Deputados que já temos quórum para essas votações regimentais, no final do debate.
Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, para dar início
ao debate.
Faça favor, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e
Srs. Deputados: São múltiplas as responsabilidades que impendem sobre Portugal no quadro europeu e
internacional nos dias que correm. A sua assunção cabe ao Governo e, em particular, ao Ministério dos Negócios
Estrangeiros, mas a função de escrutínio do Parlamento é essencial.
Quero inscrever o debate de hoje sob este signo das responsabilidades acrescidas que nos cabem e escolho,
para a minha intervenção inicial, algumas de especial sensibilidade.
A primeira responsabilidade é a do exercício da presidência do Conselho da União Europeia.
A Comissão aprova, esta semana, o Plano de Ação para a implementação integral do Pilar Europeu dos
Direitos Sociais, para o qual o conselho informal de ministros dos assuntos sociais, promovido pela Presidência
portuguesa, já havia tido a oportunidade de contribuir. É um passo muito importante em direção a um dos nossos
objetivos principais: o de ter, em maio, na Cimeira Social realizada no Porto, um endosso e uma orientação, a
nível dos chefes de Estado e do Governo, sobre a indispensabilidade do modelo social europeu para o sucesso
da recuperação económica e da transição verde e digital.
Como tenho dito, a ênfase na dimensão social é mesmo o valor acrescentado da Presidência portuguesa.
Avançando na resposta à pandemia e na construção da União Europeia da Saúde, acordando um roteiro comum
para o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, investindo na educação, na formação, nas políticas de emprego e de
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proteção, promovendo a igualdade, a não-discriminação, a inclusão e a integração social, estaremos mais aptos
a recuperar a economia e o tecido social, sem deixar que se cristalizem novos desequilíbrios e exclusões.
Com o contributo da nossa Presidência, o instrumento de recuperação e resiliência está aprovado e em vigor.
Prosseguem as ratificações nacionais da decisão sobre recursos próprios e os programas do novo quadro
financeiro plurianual começam a chegar ao terreno.
Aplausos do PS.
É, pois, a altura de recordar que o modelo social é um dos motores principais do crescimento europeu e essa
é uma responsabilidade maior do nosso País, como presidência rotativa do Conselho da União Europeia.
Todavia, não é apenas na Europa que são exigentes as tarefas que temos pela frente. Na semana passada,
o Primeiro-Ministro formalizou a apresentação, por Portugal, da candidatura de António Guterres a um novo
mandato como Secretário-Geral das Nações Unidas.
Aplausos do PS.
Em dezembro passado, em resultado de outra candidatura nacional, Teresa Ribeiro foi designada
Representante da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa) para a Liberdade dos Média.
Marta Santos Pais foi, agora, escolhida para a Comissão Internacional contra a Pena de Morte.
Somos, com a Suécia, os dois países da União Europeia que fazem parte do grupo de amigos em defesa da
democracia. Com o Canadá, somos os dois países do Norte campeões na aplicação do Pacto Global das
Migrações, para a Organização Internacional para as Migrações.
Pertencemos à Coligação para o Sahel e foi por nossa proposta que passou a haver presença europeia
permanente no Golfo da Guiné, cooperando com os países costeiros na preservação da segurança marítima.
É portuguesa a nova diretora-geral do departamento relativo à África, do Serviço Europeu para a Ação
Externa, e eu próprio liderei a missão política ao Maputo para averiguar das formas de apoio europeu a
Moçambique na estabilização da província de Cabo Delgado.
Aplausos do PS.
Estes são apenas alguns exemplos e um acrescento de responsabilidade internacional do nosso País.
Há, porém, uma dimensão e um tema em que essa responsabilidade tem um significado específico: a
cooperação com os países africanos de língua portuguesa e com Timor-Leste no combate à pandemia.
Iniciado no segundo semestre de 2020, o nosso programa de apoio a estes parceiros representa um
investimento que se aproxima agora dos 5 milhões de euros, em financiamento direto, equipamentos de proteção
individual, testes e materiais médicos, formação de profissionais e projetos de ação comunitária, realizados por
organizações não-governamentais para o desenvolvimento.
Vamos, agora, passar a uma nova fase deste programa, em que o apoio fundamental estará na vacinação.
O Governo já decidiu doar aos países africanos de língua portuguesa e a Timor-Leste 5% das vacinas que nos
tocam na aquisição europeia.
Aplausos do PS.
É que o combate à COVID-19 também se faz pela solidariedade com os que nos são mais próximos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quis colocar as palavras iniciais deste debate parlamentar sob o signo
das nossas responsabilidades e já me referi às que nos cabem no plano europeu, multilateral e da cooperação
internacional. Devemos, porém, acrescentar outras responsabilidades cruciais para a nossa política externa,
que compete ao meu ministério executar.
Refiro, em primeiro lugar, a promoção internacional da língua e cultura portuguesas. Mesmo nas condições
difíceis da pandemia, este é um encargo em que não podemos vacilar.
Em 2021, o número de cátedras de estudos portugueses, nos vários continentes, ascenderá a 53, enquanto,
em 2016, existiam 39.
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Mercê do financiamento do Instituto Camões, através do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, inicia-
se este ano o projeto de elaboração de um dicionário em Moçambique, o primeiro dicionário da língua comum
de Saramago, Drummond de Andrade e Mia Couto que se publicará fora de Portugal e do Brasil.
Aplausos do PS.
A segunda responsabilidade é a do contributo do investimento e das exportações para a recuperação da
nossa economia.
O Conselho de Ministros aprovou, na passada quinta-feira, o Programa Internacionalizar 2030, com metas
precisas e ambiciosas, das quais destaco o facto de as exportações atingirem 53% do PIB (produto interno
bruto) no fim desta década.
O efeito económico da COVID-19 foi brutal. O PIB caiu, em 2020, 8% e as exportações tombaram 19%. Mas
em vários setores as nossas exportações resistiram e noutros, como o agroalimentar, o das telecomunicações,
o dos serviços financeiros ou o dos produtos farmacêuticos, até aumentaram.
Os 35 projetos de investimento então angariados pelo AICEP (Agência para o Investimento e Comércio
Externo de Portugal), assim como as dezenas de intenções de investimento entretanto sinalizadas, mostram a
resistência e atratividade da economia portuguesa.
A terceira responsabilidade é a do apoio às comunidades portuguesas no estrangeiro.
O Novo Modelo de Gestão Consular constitui um dos projetos-bandeira do Ministério dos Negócios
Estrangeiros, no Plano de Recuperação e Resiliência.
Esse modelo já começou, contudo, a ser preparado e implementado, com resultados. O ato único de inscrição
consular está hoje aplicado em quase todos os postos. O Centro de Atendimento Consular já funciona para
cinco países: Espanha, Reino Unido, Luxemburgo, Irlanda e Bélgica. A plataforma e-Visa recebeu, desde março
do ano passado, 8000 pedidos de vistos processados eletronicamente. Está adjudicada a nova rede de
processamento de vistos.
O objetivo é claro: é o de que todos os atos consulares que dispensem a obrigatoriedade de presença física
possam ser feitos eletronicamente e que os serviços consulares estejam disponíveis 24 horas por dia, 365 dias
por ano, acessíveis digitalmente a partir de qualquer ponto do mundo.
Sr.as e Srs. Deputados, Portugal ocupa a Presidência do Conselho da União Europeia. Em todas as grandes
organizações multilaterais temos projeção e missões importantes. A nossa voz é escutada. A nossa presença é
não só bem-vinda como requerida e ansiada. Isso em nada diminui — pelo contrário, incrementa — as
responsabilidades que nos cabem na cooperação, na promoção da língua, nas exportações, no investimento e
na valorização da diáspora.
Concluo, pois, Sr. Presidente, prestando contas neste Parlamento com a consciência do muito que é exigível
hoje ao Ministério dos Negócios Estrangeiros na prossecução das orientações fundamentais da política externa
portuguesa: a construção europeia, a comunidade transatlântica, a CPLP (Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa), a ligação às comunidades, a internacionalização da nossa língua, cultura, ciência e economia e a
vinculação ao multilateralismo.
Esta é a carta de missão da diplomacia portuguesa e a diplomacia portuguesa trabalha todos os dias para a
sua realização, com profissionalismo e ao serviço de Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Vamos entrar na primeira ronda de perguntas do debate.
Para tal, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Meireles, do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Isabel Meireles (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: Há dois discursos que dominam o relacionamento entre a
União Europeia e a China. O primeiro é o discurso da parceria, da cooperação estratégica baseada nos
interesses comerciais comuns.
Sabemos que a China tem uma presença extraordinariamente significativa na Europa e em Portugal em
vastos setores, muitos deles estratégicos. Tem uma economia forte, baseada nas exportações de empresas
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públicas que, como o Tribunal de Contas Europeu bem lembrou, podem configurar-se como auxílios de Estado,
distorcendo a concorrência e fazendo perigar o mercado único europeu.
Os Estados têm tido, até agora, uma resposta díspar, descoordenada, em função dos seus interesses
nacionais. Contudo, no penúltimo dia do ano transato, a União Europeia e a China concluíram oficialmente as
negociações do seu acordo abrangente sobre investimento que, em princípio, dará aos investidores europeus
uma penetração no mercado chinês como nunca tiveram, comprometendo-se a ter um tratamento equitativo,
sem obrigar à transferência forçada de tecnologia e com promessas de não haver dumping social e,
inclusivamente, com a subscrição dos principais tratados no âmbito da Organização Internacional do Trabalho
(OIT).
Mas falemos, Sr. Ministro, do segundo discurso em relação à China, o dos direitos humanos, dos direitos
políticos e da democracia.
Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, a Europa não pode fazer vista grossa ao que se passa na China. A
Europa é o continente da Revolução Francesa e do Código Alemão (BGB). Foi na Europa que emergiu a ideia
da tolerância e dos valores civilizacionais. Aliás, é contraditório que a União Europeia, ao criticar alguma agitação
democrática em países como a Hungria e a Polónia, não tenha o mesmo discurso claro, firme e inequívoco na
defesa das liberdades na China.
Assim, deixo algumas perguntas. Primeiro, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, enquanto ator
privilegiado na Presidência portuguesa, abordou, nestes dois meses, alguma das questões ditas mais sensíveis
com o seu homólogo chinês Wang Yi?
Segundo, vai a União Europeia contrariar o mito de que a China é uma espécie de território de exceção no
sentido em que não deve ser incomodada na questão dos direitos humanos? Vai a União Europeia aproximar-
se da visão de Biden, que já garantiu que vai recuperar a bandeira da democracia junto da China?
É certo que temos de respeitar a China. Mas respeito não significa que a União Europeia, e esta Presidência
portuguesa, tenha de ser indiferente a assuntos incómodos como Taiwan, a deterioração das liberdades políticas
em Hong Kong, a condenação da repressão contra as minorias uigures, em Xinjiang, o respeito pelo Tibete e o
expansionismo no Pacífico.
Para Portugal, estas são questões muito relevantes, não apenas por causa da nossa ligação a Macau e à
história com a China, mas também devido à questão dos oceanos, cuja conferência foi adiada para 2022.
Pergunto, assim, qual é a posição de V. Ex.ª, Sr. Ministro, e da Presidência portuguesa em todas estas
matérias?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,
Augusto Santos Silva.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço as
questões colocadas pela Sr.ª Deputada Isabel Meireles, mas permita-me que faça uma correção. Não é verdade
que a China tenha uma presença extremamente significativa na economia portuguesa, e é muito importante ter
isso presente. Quem tem, do lado do investimento estrangeiro, uma presença extremamente significativa na
economia portuguesa são os nossos parceiros, a saber: a Alemanha, a França, os EUA, o Reino Unido, a
Espanha, a Bélgica, a Itália, e temos muito orgulho que aqueles investidores estrangeiros que têm mais presença
na nossa economia sejam provenientes dos países que nos são mais próximos, quer geográfica, quer política,
quer normativamente.
É verdade que empresas chinesas participaram com sucesso em processos de privatização conduzidos não
por este Governo, não pelo Governo anterior nem por qualquer Governo de que eu tenha feito parte. No entanto,
cumprem as assunções, as responsabilidades que então assumiram e têm um contributo para a formação de
riqueza portuguesa e do emprego português que o Governo respeita, como, estou certo, qualquer outro Governo
respeitaria. É muito importante ter isto em conta.
Ainda há coisa de duas semanas se reuniu, por videoconferência, o chamado grupo 16+1. O +1 aqui é a
China, que esteve, aliás, representada ao mais alto nível, ao nível do Presidente Xi, e os 16 são todos eles
países europeus, 12 dos quais membros da União Europeia. Mas será em vão a Sr.ª Deputada tentar encontrar
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nesse grupo de países o nome de Portugal. Portugal não pertence a esse grupo de países. Portugal não tem
uma política em relação à China nas costas da política da União Europeia ou diferente da política da União
Europeia a que pertencemos.
Pergunta a Sr.ª Deputada se eu já coloquei questões relativas aos direitos humanos no contacto que tivesse
tido com o meu homólogo chinês, no âmbito da Presidência do Conselho da União Europeia. A minha resposta,
Sr.ª Deputada, é esta: ainda não tive qualquer contacto bilateral com o Ministro dos Negócios Estrangeiros da
China, neste semestre em que ocupo a Presidência do Conselho da União Europeia. Isto por duas razões
cumulativas, ambas muito importantes: porque seria inconcebível para mim ter um contacto com o Ministro dos
Negócios Estrangeiros chinês antes de ter o contacto com o Secretário de Estado norte-americano, ou com o
Ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, com quem estive hoje de manhã, ou, naturalmente, com todos os
meus colegas membros da União Europeia.
A segunda razão é que a política da União Europeia é assumida permanentemente pelo alto representante
para a política externa e eu coordeno todas as ações que realizo, enquanto Ministro dos Negócios Estrangeiros
do país que ocupa a Presidência, com a agenda do alto representante.
Agora, não vamos mais longe. Há dois anos, estive na República Popular da China e pronunciei-me
publicamente, na República Popular da China, não aqui apenas, sobre o processo relativo aos direitos humanos
na China. Disse, lembrando, aliás, a revisão periódica universal do Conselho de Direitos Humanos sobre a
China, que havia a registar positivamente o avanço da China em matéria de direitos económicos e sociais,
designadamente no combate à pobreza, e havia a lamentar retrocessos evidentes nos direitos individuais e nas
liberdades cívicas.
É assim que nós devemos ter uma relação madura e adulta com um país que é nosso parceiro em várias
organizações multilaterais, que é nosso parceiro em agendas específicas, que é nosso competidor em várias
áreas do mundo, mas que, do ponto de vista institucional, não é nada menos do que nosso rival sistémico.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Ainda no tempo atribuído ao PSD nesta primeira ronda, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Catarina Rocha Ferreira, para formular perguntas.
A Sr.ª Catarina Rocha Ferreira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, uma pergunta:
como podemos resumir este último ano de pandemia? Uma resposta: falhanço.
Se 2020 demonstrou que uma pandemia pode surgir a uma escala global, demonstrou ainda que não se trata
de forças incontroláveis da natureza e que a ciência a pode controlar. E a pergunta lógica que me ocorre é:
então, porque é que correu tão mal, com tanto sofrimento, tantas mortes? A reposta é fundamentalmente uma:
devido a más decisões políticas.
Vejamos: no tempo da peste negra ou, mais recentemente, da gripe espanhola, não se conseguia identificar
o vírus mortífero. Mas a ciência evoluiu. Em dezembro soubemos desta pandemia; pouco depois, os cientistas
já tinham isolado o vírus e, em menos de um ano, tínhamos a vacina. A parte científica funcionou. Falhou o
decisor político, falhou em encontrar o equilíbrio entre as considerações médicas, económicas e sociais.
Aliás, todos conhecemos líderes mundiais que preferiram enveredar por teorias da conspiração em vez de
ouvirem os especialistas.
No Reino Unido, o governo esteve inicialmente bem mais ocupado com o Brexit do que com o vírus. Em
Portugal, os senhores permitiram entradas no território sem qualquer tipo de quarentena e facilitaram medidas
de confinamento em períodos cruciais.
Não obstante uns países terem agido melhor que outros, verificaram-se dificuldades ao nível da cooperação
internacional.
Se é certo que existem inúmeras instâncias de cooperação e generosidade, pergunto-lhe, Sr. Ministro: porque
é que não se registou qualquer iniciativa relevante por parte do Governo português no sentido de promover uma
cooperação internacional ao nível de recursos médicos e de profissionais de saúde da primeira linha, neste
combate?
Por fim, Sr. Ministro, há um assunto que nos falta abordar e que é da maior importância para os portugueses:
o passaporte de vacinação.
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Se, por um lado, pode ser uma mais-valia na atração de turismo, por outro, não nos podemos esquecer que
também temos portugueses que residem no estrangeiro e querem vir para Portugal. Que garantias estão a ser
tomadas para os portugueses que se encontram em países onde a vacina é escassa?
Em segundo lugar, este passaporte é também denominado livre-trânsito digital, ou seja, é suscetível de expor
dados extremamente sensíveis de todos nós a novos perigos, ameaças e distopias.
Aliás, enquanto a COVID demorou meses a alastrar-se pelo mundo, um vírus informático é muito mais rápido.
E, Sr. Ministro, da mesma forma que há um ano nenhum de nós sabia que iria enfrentar um vírus orgânico,
também não sabemos se, num futuro próximo, não vamos enfrentar um vírus informático que ataque as nossas
infraestruturas digitais. Mas uma coisa sabemos: o Governo tem a obrigação de planear, o Governo tem a
obrigação de salvaguardar e o Governo tem a obrigação de proteger.
Nesse sentido, Sr. Ministro, que medidas concretas e específicas de proteção estão a ser exigidas pelo
Estado português a nível europeu para que este livre-trânsito digital acautele devidamente a nossa privacidade?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, agradeço as perguntas
colocadas pela Sr.ª Deputada Catarina Rocha Ferreira e começo pela última, que é a mais simples. Que medidas
estamos a tomar? As medidas que impedem que haja transmissão de dados pessoais associadas ao passe
digital. Tão simples quanto isso.
A Sr.ª Deputada exprimiu, não sei se em nome do PSD, duas teorias absolutamente espantosas.
A primeira teoria é a teoria segundo a qual os efeitos da pandemia foram exclusivamente devidos a decisões
políticas erradas. Nunca tinha ouvido essa teoria e essa teoria ficará nos anais da história das epidemias, no
mundo.
Em segundo lugar, expendeu também a Sr.ª Deputada, não sei se em nome do PSD, a teoria segundo a qual
Portugal devia ter imposto a quarentena a todos aqueles que queriam entrar no seu território desde o início da
pandemia, incluindo talvez os nacionais portugueses, incluindo talvez os nossos emigrantes, mesmo quando
não tínhamos qualquer conhecimento direto fundamentado sobre os perigos associados, por exemplo, a novas
variantes. Registo também essa teoria.
Registo ainda que a Sr.ª Deputada formulou a pergunta provavelmente antes de ouvir o meu discurso, porque
há de convir, Sr.ª Deputada, que eu dediquei pelo menos 2 ou 3 minutos do meu discurso justamente a
exemplificar situações de cooperação internacional no âmbito do combate à pandemia.
Portugal foi um dos países que mais depressa mobilizou os voos de ação humanitária da União Europeia, no
projeto e na abordagem chamada Equipa Europa (Team Europe approach). De entre os primeiros voos, cinco
foram realizados para dois países de língua portuguesa, organizados justamente por Portugal, como primeira
grande resposta de apoio. Depois, fizemos novas respostas de apoio a esses países, no combate à pandemia,
designadamente providenciando máscaras, providenciando outros equipamentos de proteção individual,
formação de intensivistas, disponibilização de materiais e de máquinas para a realização de testes PCR
(Polymerase Chain Reaction), entre outras. Não acordámos para isso agora, Sr.ª Deputada. Ao nível da
cooperação, estamos envolvidos com os nossos países parceiros desde a primeira hora.
Depois, se me permite a expressão, é errada a ideia de que de um lado esteve a evolução científica e do
outro lado — o lado errado — teriam estado decisões políticas. Se não fosse a decisão política da União
Europeia, tomada pelos chefes de Estado e de governo, de construir um processo de aquisição em larga escala
e de distribuição das vacinas pelos Estados-Membros, cujo único critério é a população respetiva de cada
Estado-Membro, se não fosse essa decisão política, os laboratórios de investigação, as universidades e as
empresas não teriam as condições financeiras essenciais para que esta fosse a vacina mais rapidamente
produzida da história da Humanidade e fosse a vacina de distribuição mais maciça da história da Humanidade.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — Ainda no tempo do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno
Carvalho.
O Sr. Nuno Miguel Carvalho (PSD): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero cumprimentá-lo, bem como
ao Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado e Srs. Deputados.
Sr. Ministro, quando o oiço falar inglês, oiço-o a assumir culpas. Se calhar, deve falar inglês aqui no
Parlamento, porque o senhor, muito recentemente, assumiu culpas de decisões políticas mal tomadas. Então,
o senhor devia, pelo menos, aqui no Parlamento, ter uma postura igual à que tem lá fora. Aliás, Sr. Ministro, use
a sua velha máxima, se me permite dizê-lo: quando faz política externa, tenha em mente a política interna.
Ora, ter em mente a política interna é, de facto, pensar nas comunidades portuguesas e responder à pergunta
que aqui foi feita: como é que os portugueses que estão lá fora e não têm cobertura pela vacinação, e não são
poucos os países em que isso acontece, podem ou não ter apoio por parte do Estado português? O Sr. Ministro
tem ou não alguma resposta para esta questão? Isto é que é pensar em prioridade, isso é que é pensar nas
comunidades portuguesas.
Sr. Ministro, não é preciso lembrar que as comunidades portuguesas desempenham um papel fundamental
em toda a estrutura da política diplomática de Portugal e, mais do que isso, têm, como sabe, e bem, um peso
fundamental na nossa economia: Mais de 3 mil milhões de euros…. Aliás, perdão, 3,6 mil milhões de euros de
remessas das comunidades portuguesas chegam a Portugal.
Entrando no tema da diplomacia económica, gostava de lhe perguntar, lembrando, como disse, e bem, que
há uma quebra das exportações que é preciso recuperar, para não se perderem essas empresas de vez, se
existe ou não uma perspetiva de acompanhar as empresas exportadoras para recuperar o espaço nos mercados
que estão a desconfinar. Como sabe, temos de olhar para o nosso confinamento, mas nas exportações temos
de acompanhar o desconfinamento de outros países. Está ou não a ser feito algum trabalho nesse sentido?
Sr. Ministro, muitas políticas foram executadas neste País — a bem ou a mal, mas foram-no — com o dinheiro
das empresas exportadoras. Como sabe, de 30% para 44% de 2009 para 2019.
O Sr. Ministro negociou o Orçamento do Estado com o BE e com o PCP. Não o negociou apoiando estas
empresas exportadoras, mas usou o apoio que elas deram ao País. No mínimo dos mínimos, devíamos começar
a devolver.
Sr. Ministro, bem sabe que estas questões são fundamentais para responder àquele que deve ser o papel
da diplomacia económica em Portugal. Devemos ter também a economia na diplomacia e devo dizer-lhe que o
Orçamento do Estado, aprovado no passado mês de dezembro, quando já se sabia que iria aparecer uma
terceira vaga, dá claramente a entender que não foi preparado qualquer tipo de alívio para as empresas
exportadoras.
Verificou-se que havia incentivos fiscais que promoviam a ida das empresas a feiras internacionais. Ora, no
momento em que estamos, o Sr. Ministro acha que temos, do ponto de vista fiscal, condições para arrecadar
apoios para a presença em feiras internacionais? Não acha que temos de rever o apoio às empresas
exportadoras, face ao que está aprovado no Orçamento do Estado? Acha que estamos em condições de
conseguir apoiar as empresas para ir para os mercados que estão a desconfinar e recuperar as nossas
exportações?
Sr. Ministro, espero que seja claro nas suas respostas, espero que nos possa dar aqui o foco daquele que
deve ser o seu papel, porque Portugal precisa muito mais de um Ministério dos Negócios Estrangeiros que possa
dar resposta a questões como estas, para Portugal perceber, efetivamente, o que o Ministério dos Negócios
Estrangeiros pode fazer pelo País e que é muito mais do que tem feito até agora.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, muito
telegraficamente, quero dizer-lhe, primeiro, que não confunda, por favor, responsabilidade com culpa. Eu
assumo a responsabilidade de estar aqui neste debate; não assumo a culpa pela macedónia da sua intervenção.
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Em segundo lugar, quero dizer-lhe que o Orçamento do Estado tem instrumentos muito importantes de apoio
e de incentivo às nossas empresas, quer na lógica do investimento no estrangeiro, quer na lógica da atração do
investimento estrangeiro para Portugal, que também beneficia as nossas empresas, quer, sobretudo, na lógica
do apoio às exportações. Por isso subimos os valores relativos ao fundo de internacionalização, por isso subimos
os valores relativos aos seguros de crédito e por isso lançámos novas linhas de garantia, tão importantes nos
países em que há um certo risco político e em que as nossas empresas têm uma presença muito significativa.
Finalmente, em relação à questão que colocou sobre as comunidades portuguesas, questão essa que a Sr.ª
Deputada Catarina Rocha Ferreira já tinha colocado, quero dizer-lhe que, evidentemente, acompanhamos muito
atentamente a evolução da situação das nossas comunidades e interviremos, se necessário, nos países em que
seja necessário, como interviemos quando foi necessário organizar voos humanitários, como interviemos
quando foi necessário criar apoios específicos adicionais para as associações, como interviemos quando foi
necessário incrementar os apoios sociais.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Passamos, agora, ao Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, dando a palavra ao
Sr. Deputado Pedro Filipe Sares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro, Sr.as e
Srs. Deputados: O Sr. Ministro anunciou hoje algo que decorreu de uma conversa que tivemos em Comissão e
que tem a ver com a disponibilidade de Portugal garantir uma parte das vacinas a que tenha direito aos seus
parceiros da CPLP.
Registando este facto, não podemos deixar de notar que, à escala europeia, Portugal podia e devia fazer
muito mais, porque, enquanto estamos a discutir o passaporte de vacinação, não há dúvida que esse debate
está instalado para que se crie uma enorme cortina de fumo sobre o falhanço que está a ser o acesso às vacinas
por parte da União Europeia, em particular a forma como, irresponsavelmente, está a ser gerido todo este
processo à escala mundial.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) e a ONU (Organização das Nações Unidas) já disseram que estas
vacinas devem ser um bem comum. Ora, nós já temos vacinas, mas as vidas continuam em suspenso.
A OMS criou há um ano uma plataforma para que se pudesse partilhar informação sobre os avanços
científicos das vacinas; no entanto, nenhuma farmacêutica usou essa plataforma para partilhar informação.
Muita da investigação que foi feita para chegar a essas vacinas foi paga com dinheiro público, com muitas
centenas de milhões de euros, em alguns casos até milhares de milhões de euros; no entanto, apesar de elas
terem sido pagas com dinheiro público, são propriedade privada.
Então, a pergunta que devemos fazer é se estamos condenados a que continuem propriedade privada ou se
algum bem maior podia ser colocado em cima da mesa.
A Organização Mundial do Comércio (OMC) diz que, em caso de pandemia, os direitos de propriedade
intelectual podem ser suprimidos ou suspensos. Desse ponto de vista, a pergunta que lhe faço muito diretamente
é esta: Portugal quer ser liderante na Europa e no mundo ao defender o que é óbvio, ou seja, que a vacina não
seja suspensa, que a produção não seja atrasada e que as nossas vidas tenham uma luz ao fundo do túnel à
escala mundial, rapidamente? Portugal quer levar por diante a luta que garante o fim das patentes das vacinas
e que elas sejam, finalmente, o que devem ser, ou seja, um bem comum de toda a Humanidade?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares, muito obrigado pelas questões.
Para usar a sua expressão, que em nada me repugna, Portugal está envolvido em três lutas complementares:
em primeiro lugar, está envolvido na sua própria luta para apoiar os nossos países-parceiros mais próximos, em
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termos de cooperação internacional, na resposta à pandemia e agora também na aceleração dos respetivos
planos de vacinação. Portanto, já o dissemos, já me referi a isso, e, julgo, essa nossa ação é clara.
Em segundo lugar, está envolvido numa luta à escala global, que tem uma expressão específica no chamado
Mecanismo COVAX, que é a luta de tornar acessível a todos as vacinas que se vão descobrindo e autorizando,
promovendo a vacinação universal.
Portugal esteve na linha da frente da iniciativa da União Europeia de que resultou o Mecanismo COVAX, já
contribuiu na ordem dos vários milhões de euros para esse mecanismo e procura que aumente a capacidade
de produção na Europa e fora da Europa para que o dinheiro angariado no âmbito desse mecanismo cumpra a
função para a qual foi angariado, que é comprar vacinas e torná-las disponíveis para todos.
Hoje, não é tanto um problema de propriedade intelectual que se coloca, é um problema de capacidade de
produção que esteja à altura da dimensão da procura e esta é uma segunda luta na qual estamos envolvidos e
continuaremos a envolver-nos.
Há, depois, uma terceira luta no âmbito da União Europeia. Devo, aliás, dizer ao Sr. Deputado, porque não
cometo nenhuma inconfidência, que foi por pressão muito forte de Portugal, enquanto Estado-Membro da União
Europeia, que um primeiro documento para a criação do mecanismo europeu de partilha de vacinas, que definia
como destinos essenciais dessa partilha a vizinhança sul e a vizinhança leste da União Europeia, fosse corrigido
de forma a incluir toda a África e os países de baixo e médio rendimento na América Latina.
Portanto, estamos envolvidos nas lutas e continuaremos envolvidos até que essas lutas tenham o sucesso
de que a Humanidade precisa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Fabíola Cardoso, do Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda.
A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, cumprimento todas as pessoas que, com
o seu trabalho, contribuem para este debate com o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e
cumprimento, igualmente, o Sr. Ministro e a sua equipa.
O que nos disse aqui o Sr. Ministro foi que não havia problemas com as vacinas, porque é, simplesmente,
apenas uma questão de produção.
Partilhar conhecimento e partilhar tecnologia aumenta a capacidade de produção, territorializa a capacidade
de produção e aumenta a capacidade de vacinação, nomeadamente nos países subdesenvolvidos, mas também
no nosso próprio País, o que seria essencial para resolver este problema gravíssimo.
Exatamente um ano após uma crise global são muitas mais as dúvidas do que as certezas relativamente ao
mecanismo de recuperação e resiliência.
Depois de tantas promessas, sabemos que a primeira tranche destes fundos só chegará no próximo verão.
Há outros países que aprovaram e implementaram pacotes de estímulos orçamentais, encontrando-se
presentemente a debater já o seu reforço em montantes muito superiores ao da própria União Europeia.
Mas não é só o atraso daquela que há alguns meses era a chamada bazuca, que denota, uma vez mais, a
insuficiência da resposta europeia à crise; é também a própria natureza do financiamento de que estamos a
falar, bem como o compromisso da União com os estímulos orçamentais.
Na última crise também os defendeu, mas na hora H recuou. Felizmente, hoje, Bruxelas assumiu, e bem,
que as normas orçamentais não serão aplicadas até 2020…
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — 2022!
A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Sim, 2022, certo, Sr. Ministro, muito obrigada.
Só abandonando essa lógica e essas regras é que poderemos vislumbrar uma diminuição das divergências
entre os países do Norte e os países periféricos como Portugal, caso contrário serão os mesmos de sempre a
pagar a crise, em detrimento dos serviços públicos, do salário e do emprego.
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A pergunta que lhe deixo, Sr. Ministro, é esta: o Governo português, perante esta afirmação, continuará a
perseguir as metas orçamentais, ou aproveitará esta oportunidade para aumentar o investimento público,
necessário e imprescindível para fortalecer a resposta à crise pandémica que atravessamos?
Segundo tema: a 17 de novembro o Sr. Ministro afirmou, em resposta a uma pergunta do Bloco de Esquerda,
e cito: «Uma democracia, para ser plena, não pode admitir discriminações e, portanto, temos de combater
ativamente as discriminações onde quer que elas existam.»
Referia-se, concretamente, à concretização da estratégia europeia contra a discriminação de lésbicas, gays,
bissexuais, trans e intersexuais. Reiterou que a sua concretização será uma das tarefas da Presidência
portuguesa.
As declarações sucedem-se, mas a concretização de ações que reforcem a agenda da igualdade de género
e a agenda da luta antirracista parece estar arredada da prática desta Presidência, que se aproxima já do seu
meio.
A pergunta que lhe deixo, Sr. Ministro, é acerca dos retrocessos como consequência direta da pandemia da
COVID, nomeadamente o agravar das desigualdades salariais, o desequilíbrio entre a vida profissional e familiar
ou a violência doméstica. Será que a tónica colocada pela Presidência portuguesa no pilar europeu dos direitos
sociais, será que o 10.º aniversário da Convenção de Istambul, em abril, conseguirão trazer o tema da luta contra
as desigualdades para a ação política da Presidência portuguesa?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Fabíola Cardoso,
deixe-me começar pela parte final da sua intervenção, apenas para contestar, amigavelmente, se me permite,
a sua referência a Portugal como um país periférico, pois há muitas áreas em que Portugal é um país liderante,
um país de vanguarda. Não sei se a Sr.ª Deputada consegue ver este gráfico, que hoje foi publicado pelo Banco
Mundial, sobre as mulheres, a lei e a economia, cujo título é «Apenas 10 países no mundo têm plenos direitos
iguais para as mulheres».
O orador exibiu um telemóvel com o gráfico que mencionou.
A Sr.ª Deputada é capaz de imaginar qual é um dos países que está entre os 10 países do mundo com essa
igualdade plena de direitos na lei para as mulheres? Esse país é Portugal.
Aplausos do PS.
E há outras áreas em que Portugal não é um país periférico, mas estes bons desempenhos que temos só
significam maior responsabilidade para nós e eu quis colocar este debate sob o signo das nossas
responsabilidades, e fá-lo-ei até ao fim. Por isso, no âmbito da Presidência portuguesa do Conselho da União
Europeia, temos a responsabilidade de apoiar a Comissão Europeia na plena implementação das suas
estratégias contra a discriminação. Ainda hoje, a Comissão Europeia aprovou uma importantíssima estratégia,
também ela contra a discriminação, para a plena implementação dos direitos das pessoas com deficiência.
A União Europeia já aprovou a sua estratégia contra as desigualdades por motivo de orientação sexual e a
Presidência portuguesa tem como uma das suas responsabilidades a contribuição para a implementação dessa
estratégia.
Em relação ao discurso de ódio, ao racismo, ao antissemitismo, esse é também outro tema essencial da
Presidência portuguesa. Aliás, como já recordei em Comissão, em abril, teremos em Portugal, salvo erro, em
Coimbra, a conferência internacional sobre a luta contra o racismo e o discurso de ódio, o que tem sido um tema
recorrente nas reuniões da formação justiça, negócios internos e administração interna, do Programa da
Presidência portuguesa.
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Portanto, reitero que pode a Sr.ª Deputada, bem como todo o Parlamento, contar com o máximo empenho
da Presidência portuguesa do Conselho, não é em somar estratégias àquelas que existem, é em aplicar no
terreno as estratégias que existem, em fazer os nossos atos coincidir com as nossas palavras.
Em relação ao primeiro ponto, Sr.ª Deputada, perdoe-me mas não pode dizer que a minha referência às
dificuldades de produção das vacinas significa contestar que houvesse dificuldades no processo de aplicação
das vacinas. O que significa, sim, é que devemos intervir no momento da cadeia de valor que nos permite mais
rapidamente responder à carência que hoje temos. E a carência que hoje temos não é aquela protegida pela
propriedade intelectual, porque as vacinas existem, o esforço de investigação foi feito, a patenteação
indispensável foi aprovada, mas, sim, uma carência na produção e distribuição massiva das vacinas.
Quanto ao instrumento de recuperação e resiliência, ele está aprovado e é, a todos os títulos, um dos
principais sucessos da Presidência portuguesa do Conselho, até agora. Sr.ª Deputada, uma das condições
essenciais para não nos pensarmos como um país periférico é não termos vergonha de assumir os sucessos
que temos e, portanto, a rapidez da aprovação e da entrada em vigor do instrumento de recuperação e resiliência
é um grande sucesso da Presidência portuguesa do Conselho, até agora.
Aplausos do PS.
Isso permite que, ao longo deste mês e do próximo, os Estados possam apresentar os seus planos nacionais,
e Portugal conta apresentar o seu plano nacional o mais brevemente possível. Acabámos agora uma consulta
pública, temos de analisar os contributos, estamos já a trabalhar com a Comissão Europeia e, por isso mesmo,
esperamos que, ao longo deste semestre, o primeiro pré-financiamento — que pode ir até 13% do valor relativo
aos 60% iniciais do plano — possa estar já disponível na economia portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro esgotou o tempo disponível para responder mas ainda há uma questão
a ser colocada, com todo o direito, aliás, pelo Sr. Deputado Nelson Peralta, à qual o Sr. Ministro fará o favor de
tentar responder noutra ocasião.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nelson Peralta (BE): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro responderá, obviamente, quando puder.
É objetivo deste Governo que a lei europeia do clima seja finalizada durante a Presidência portuguesa, mas
há sinais muito preocupantes de que o Governo está a meter marcha-atrás na ambição.
Vejamos: o Parlamento Europeu votou e aprovou, por maioria, uma meta de redução de emissões de gases
de estufa, até 2030, de 60%, mas, passada uma semana desta votação, o Sr. Primeiro Ministro, António Costa,
assinou uma declaração a dizer que a meta deveria ser só de 55%.
A primeira pergunta que colocamos é, portanto, a seguinte: o Governo vai liderar estas negociações com o
Parlamento Europeu e defender a meta maioritária de 60%, votada, aliás, pelos Eurodeputados do Partido
Socialista, ou vai, por outro lado, fazer marcha-atrás e defender a meta de 55%, defendida apenas por uma
minoria e pelos partidos à direita nesta Câmara?
Essa é, obviamente, a primeira pergunta, mas temos mais. Queremos também saber se as metas terão em
conta a redução efetiva ou se terão uma borla aos mecanismos financeiros e aos mecanismos de compensação.
Gostaríamos ainda de saber se a lei europeia do clima terá, ou não, um orçamento de carbono que irá impedir
que a temperatura aumente além de 1,5 ºC.
Para concluir, devemos dizer que o Governo tem nas mãos o futuro da lei europeia do clima e, portanto,
esperamos que tenha a ambição necessária para fazer uma lei que não seja uma mera decoração. Aquilo que
exigimos ao Governo é, obviamente, que não faça marcha-atrás, que tenha toda a ambição climática e que, no
final do processo, possa ter uma lei europeia do clima que responda ao planeta e à sociedade.
Aplausos do BE.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular perguntas pelo Grupo Parlamentar do PCP, o Sr.
Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Ministro e os demais membros
do Governo.
Sr. Ministro, queria questioná-lo sobre uma matéria que é, de facto, central neste debate e que tem que ver
com a vacinação. Há já algum tempo que se vem registando esta circunstância da escassez de vacinas, em
resultado da incapacidade de produção e de cumprimento dos contratos por parte das farmacêuticas e,
simultaneamente, da sua recusa em fazer suspender as patentes para permitir, de outra forma, o alargamento
da produção.
O Sr. Ministro, há pouco, fez uma referência que eu julgo ser muito útil recuperar para este debate e que tem
que ver com a circunstância em que estamos hoje de produção de vacinas que foram criadas e submetidas a
um modelo de negócio relativamente caricato. Isto porque o modelo de negócio que permitiu a criação destas
vacinas é um modelo de investimento público, lucro privado e comprometimento da capacidade de vacinação.
Ora, Sr. Ministro, há muitas medidas de prevenção da infeção e medidas de contenção e de combate para
travar a epidemia que têm de ser tomadas, mas eu diria que a vacinação é o aspeto essencial da resposta à
epidemia, não apenas no momento em que nos encontramos mas a prazo. A capacidade de vacinar os
portugueses, a capacidade de vacinar os cidadãos de todo o mundo, com alguma uniformidade, de forma a
conseguir-se criar condições para travar a epidemia no plano global, é o aspeto essencial da resposta à
epidemia, a prazo.
Por isso, Sr. Ministro, insistimos em que o valor da vida tem de ser posto acima do valor do negócio e em
que as vacinas têm de ser reconhecidas como bem comum de interesse público e têm de ser colocadas como
o aspeto prioritário da resposta que é preciso dar à epidemia.
Para isso, Sr. Ministro, parece-nos que há duas linhas de intervenção absolutamente essenciais. Por um
lado, a diversificação da aquisição de vacinas por parte do nosso País, assegurando a vacinação em condições
de segurança e eficácia, considerando a disponibilidade global que existe em termos de vacinas. Por outro lado,
a intervenção no sentido da suspensão ou do cancelamento das patentes, para garantir a possibilidade de
alargamento de produção das vacinas.
O PCP apresentou hoje, na Assembleia da República, uma proposta concreta visando estes objetivos,
incluindo também a necessidade de mobilizar o investimento essencial, no plano nacional, para garantir a criação
de condições que nos permitam, também a nós, do ponto de vista nacional, ter capacidade de produção de
vacinas.
A pergunta, muito simples, que lhe coloco é esta, Sr. Ministro: que medidas admite o Governo tomar neste
sentido?
Quanto a problemas ainda decorrentes da COVID, Sr. Ministro, queria falar-lhe de dois aspetos. Um problema
que continua a verificar-se tem que ver com a situação dos portugueses retidos no estrangeiro, a qual se
mantém. Esta situação tem sido mais visível relativamente aos portugueses retidos no Brasil, mas há outros
pontos do mundo onde ela se verifica. São portugueses sem solução para regressar, sem meios de subsistência
e, em alguns casos, em risco de perderem o emprego. Não são portugueses que saíram do País para ir de férias
mas, sim, para tratar de problemas relacionados com familiares que estão no estrangeiro, para tratar de
problemas relacionados com provas de vida de cidadãos portugueses que são casados com cidadãos
estrangeiros, para tratar de situações muito diversas.
Estes problemas estão a atingir a vida de cidadãos portugueses de forma muito dramática e os voos
anunciados pela TAP, nas condições em que são realizados, não correspondem à sua solução.
Deixo-lhe esta pergunta, muito concreta, Sr. Ministro: que medidas é que o Governo vai tomar ainda para
ultrapassar estas dificuldades que estão identificadas?
Uma outra questão relacionada com este problema, Sr. Ministro, é a dos prazos de cancelamento das
autorizações de residência. Há cidadãos estrangeiros com uma autorização de residência em Portugal que está
sujeita, naturalmente, a prazos definidos na lei, mas estando eles retidos nos seus países de origem, sem
poderem regressar a Portugal, correm o risco de, em alguns casos, verem ultrapassados os prazos para a
autorização de residência. É também preciso encontrar uma solução para este problema e a questão que lhe
coloco é esta: que medidas está o Governo a ponderar tomar para ultrapassar este problema?
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Vou procurar concluir as perguntas, para não correr o risco de acontecer o que aconteceu anteriormente,
ficando o Sr. Ministro sem tempo para responder.
Quanto ao acordo de investimento entre a União Europeia e a China, essa questão já foi abordada e a
pergunta que lhe queria colocar, Sr. Ministro, é, muito simplesmente, a seguinte: qual é, verdadeiramente, o
ponto de situação quanto a este acordo? Está ou não em avaliação, ou está já num outro ponto mais avançado
relativamente à sua concretização e à consideração dos aspetos globais que têm sido identificados em relação
a este acordo?
Para terminar, Sr. Ministro, queria colocar-lhe uma questão do ponto de vista da política externa. Poderia ter
outros desenvolvimentos, mas, por questões de tempo, vou limitar-me a colocar as perguntas de uma forma
muito simples. Trata-se do seguinte: terminou, há pouco tempo, a Administração Trump, nos Estados Unidos, e
foram acalentadas esperanças de mudança na política externa por parte da nova administração norte-
americana, encabeçada pelo Presidente Biden. Gostávamos de saber qual é a posição do Governo português
relativamente a essas esperanças acalentadas quanto a medidas tomadas pela anterior Administração Trump,
cujos impactos têm sido profundamente negativos por todo o globo.
Dava apenas os seguintes três exemplos disso mesmo, os quais nos parecem ser muito evidentes: as
decisões relativamente ao bloqueio económico e financeiro à Venezuela, com todos os impactos negativos que
tem tido sobre o povo venezuelano, incluindo sobre a comunidade portuguesa ali residente; a mesma coisa
relativamente a Cuba, com todos os impactos das decisões do bloqueio, depois de decisões em sentido oposto
que tinham sido tomadas anteriormente, por outras administrações norte-americanas, que tinham permitido
alguma reaproximação entre os dois Estados mas que acabaram por inverter esse percurso, com consequências
negativas, como não é difícil de reconhecer; e, também, as tomadas de posição em sentido contrário às
resoluções da ONU, por exemplo, relativamente ao Sáara ocidental.
Gostava de saber, Sr. Ministro, qual é a posição do Governo português relativamente a estas esperanças
que têm sido acalentadas em torno da nova administração dos Estados Unidos e, ainda, que medidas é que o
Governo português pondera tomar para que muitas destas decisões da Administração Trump possam ser
revertidas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, agradeço muito as quatro
questões colocadas pelo Sr. Deputado João Oliveira.
Começando pelo fim, direi que não concordamos com várias decisões que os Estados Unidos tomam no
âmbito da sua política externa. Não concordávamos com decisões tomadas pela Administração Clinton, não
concordamos com decisões tomadas pela Administração Bush, não concordamos com decisões tomadas pela
Administração Obama e não concordamos com inúmeras — ia dizer milhentas! —decisões tomadas pela
Administração Trump.
Não concordamos com o bloqueio económico a Cuba. Aliás, a União Europeia não tem um regime de sanções
que se dirija à economia ou a conjuntos de população. Os regimes de sanções que temos dirigem-se apenas a
pessoas, singulares ou coletivas, individualizadas. Portanto, não concordamos com os regimes de sanções dos
Estados Unidos à Venezuela ou a Cuba e muito menos concordamos com a chamada «extraterritorialidade das
sanções» que os americanos reclamam para si. Os americanos sabem disto e vamos ver se a Administração
Biden tem aí alguma alteração de fundo.
O que sei é que já a anterior Administração, a Administração Trump tinha proposto internacionalmente um
processo de levantamento seletivo das sanções à Venezuela condicionado a passos no processo conducente a
eleições livres e justas, e o Governo venezuelano recusou essa proposta.
Quanto às medidas tomadas pelo Governo português, para além da posição genérica que aqui exprimi, posso
dizer que, na primeira reunião telefónica que tive com o novo Secretário de Estado norte-americano, uma das
decisões que conjuntamente tomámos foi a de manter um canal de contacto específico entre os dois países a
propósito da situação na Venezuela.
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O Sr. Deputado sabe que me interesso pela Venezuela por todas as razões que têm a ver com as questões
humanitárias e de estabilidade regional, porque há centenas de milhares de cidadãos portugueses ou com a
nacionalidade venezuelana e portuguesa que vivem na Venezuela, e, portanto, essa é uma preocupação direta
de mim próprio.
Em relação ao acordo de investimento UE-China e em que ponto é que está, a Presidência alemã e a
Comissão chegaram, no fim do ano passado, a um acordo de princípio. Entretanto, os textos foram concluídos
e, assim como os respetivos anexos, foram disponibilizados nos últimos dias. É agora necessário um trabalho
de tradução técnica e jurídica, tendo em conta as diferentes línguas oficiais da UE, que são 24. Entretanto, o
processo político tem de avançar, no sentido de compreender que reação têm os Estados-Membros e o
Parlamento Europeu em relação a este acordo de princípio e o que é que é necessário esclarecer nesse acordo.
O que tenho dito é que a responsabilidade da Presidência portuguesa do Conselho Europeu — eu próprio
presido ao Conselho dos Negócios Estrangeiros-formação Comércio — é a de fazer esse trabalho com a
Comissão Europeia, com os Estados-Membros, com o Parlamento Europeu, de modo a que fique claro o que
está no acordo de investimento com a China e em que medida esse acordo é conforme, como tem de ser, com
os requisitos próprios da União Europeia quando faz acordos bilaterais.
Em relação às questões da vacinação, o Sr. Deputado pergunta se o Governo vai comprar vacinas fora do
procurement europeu, do processo de aquisição de vacinas europeu. A resposta é: não. Estamos envolvidos e
comprometidos com o processo de aquisição europeu, que, aliás, defendemos desde a primeira hora, pois trata-
se de um processo de aquisição que é mais favorável aos interesses de um Estado como Portugal, para além
de ser o processo mais justo, mais equitativo e também mais poderoso do ponto de vista do incentivo que
representou para a descoberta e a produção das vacinas.
Aplausos do PS.
A Agência Europeia do Medicamento, sem nenhum condicionamento de outra ordem que não sejam critérios
técnicos, vai aprovando as vacinas — já aprovou três e esperamos que aprove a quarta ainda durante este mês
—, num processo que não tem a ver com a nacionalidade das empresas que produzem as vacinas, mas sim
com a sua qualidade e a sua eficiência técnica, e que nós acompanharemos.
Insisto que o nosso principal problema não está a montante da capacidade de produção, mas, sim, na própria
capacidade de produção, mesmo assim numa escala que nunca se tinha atingido. Só para termos todos uma
ideia, do ponto de vista dos calendários de distribuição das vacinas, no âmbito do processo de aquisição
europeu, recebemos 100 milhões de doses no primeiro trimestre, receberemos 600 milhões de doses no
segundo trimestre e receberemos 1100 milhões de doses no terceiro trimestre.
Finalmente, relativamente às questões sobre os portugueses retidos no estrangeiro, compreendo as suas
preocupações, como o Sr. Deputado também conhece as minhas. O que tenho a dizer é que organizaremos os
voos que forem necessários para repatriar os portugueses que têm de ser repatriados por razões humanitárias.
Foi o que fizemos no inverno do ano passado, foi o que fizemos na primavera do ano passado, foi o que fizemos
no verão do ano passado e é o que faremos neste ano sempre que for necessário.
Dito isto, tenho de dizer mais uma vez, publicamente, que por decisão do Sr. Presidente da República,
aprovada por este Parlamento e, depois, regulamentada pelo Governo, vigora, em Portugal, uma interdição de
viagens ao estrangeiro que não se realizem por razões essenciais.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Concluo, Sr. Presidente.
Para a nossa capacidade de resposta à situação crítica que em todo o lado se vive devido à pandemia é
muito importante que saibamos que nenhum português ficará sem apoio, mas todos os portugueses devem ser
exemplares no cumprimento do confinamento, que é absolutamente essencial para que possamos sair da
situação em que nos encontramos.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
Tem a palavra, para formular os seus pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado, Sr. Ministro,
trouxe-nos uma visão que eu diria relativamente otimista para as empresas portuguesas em relação à
internacionalização e à exportação.
A minha pergunta, óbvia, é a seguinte: em que é que o Sr. Ministro baseia essa visão tão otimista? É que o
Sr. Ministro, há dois anos, dizia que havia um problema em Portugal, que era existir um tecido industrial pouco
qualificado, muito pouco capitalizado e, inclusivamente, com fraca qualidade de gestão.
Pergunto-lhe se não terão mais razão os empresários, designadamente os industriais, quando dizem que o
problema é termos uma capitalização que, neste momento, só pode depender dos apoios do Governo, nas
circunstâncias em que estamos, que esses apoios não chegam às empresas e que temos um Plano de
Recuperação e Resiliência que é «público, mais público» e muito pouco para as empresas exportadoras.
Sr. Ministro, em relação às exportações, temos de ter uma visão de médio e longo prazo. Mas as notícias
que temos — ontem mesmo tivemos — são as de que, ao fim deste tempo todo, o aeroporto voltou à estaca
zero, que o Governo admite nacionalizar a Groundforce, que era uma empresa com 150 milhões de passivo
enquanto foi pública e que recuperou depois do processo de privatização, e que o Plano de Recuperação e
Resiliência é estritamente público. Por isso, perguntou-lhe: em que é que se baseia o seu otimismo em relação
às empresas exportadoras? Em que é que baseia esse crescimento para 53%?
Gostaria ainda de lhe deixar duas questões relativamente a um outro assunto, que é o das aquisições no
estrangeiro. Que balanço é que faz, Sr. Ministro, das aquisições que fizemos — sabemos que houve também aí
muitas dificuldades —, seja dos ventiladores que não chegaram, seja dos ventiladores que, tendo chegado, não
funcionam completamente?
Presumo que o Sr. Ministro nos dará um sinal positivo de alargamento de aquisição de vacinas, da resolução
da questão com a AstraZeneca, e, por isso, espero eu, de cumprimento do plano que estava estabelecido, sendo
que, obviamente, na questão das vacinas, um bocadinho ao contrário do que foi dito pelo Sr. Ministro, se trata
de um sucesso da iniciativa privada e não o contrário, sobretudo no que diz respeito à rapidez com que tivemos
várias vacinas no mercado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,
Augusto Santos Silva.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado
Telmo Correia, muito obrigado pelas suas questões.
Adorei como terminou a sua intervenção com essa transformação da Universidade de Oxford em entidade
privada e adorei também a sua ideia segundo a qual quando há um procurement público com a dimensão
financeira do processo de aquisição das vacinas, em nosso nome, por parte da Comissão Europeia, trata-se
apenas da economia privada que está a funcionar. Estamos sempre a aprender!
Pergunta-me o Sr. Deputado quais são as razões para o meu otimismo. Em primeiro lugar, devo dizer que
não estou otimista nem pessimista. Com toda a franqueza, essa é uma querela que não me ajuda nestas
circunstâncias. Limito-me apenas a estar ciente das dificuldades que vivemos, das nossas responsabilidades e
dos caminhos que há para ultrapassar as dificuldades que vivemos, assumindo as nossas responsabilidades.
Portanto, devo ter em conta que as exportações portuguesas caíram 19% e que, ao mesmo tempo, as
exportações portuguesas no setor agroalimentar, nos produtos farmacêuticos, em certos produtos têxteis, nos
serviços financeiros e nas telecomunicações aumentaram. Devo ter em conta que, ao contrário do que tinha
sucedido em 2018 e 2019, em que a AEICEP angariou, em cada ano, mais de 1000 milhões de euros de
investimento estrangeiro, no ano passado ficou muito longe dessa meta em matéria de angariação de
investimento estrangeiro, mas que ficou longe porque apenas chegou aos 560 milhões de euros. Mas estes
«apenas» 560 milhões de euros são a prova provada de que, mesmo num contexto de pandemia, como o que
vivemos no ano passado, o investimento estrangeiro acredita em Portugal e que a nossa capacidade de atrair e
de incentivar investimento estrangeiro é incólume. E um partido como o CDS tem de, evidentemente, valorizar
este ponto.
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Dizia o INE (Instituto Nacional de Estatística), há poucos dias, que o stock de investimento estrangeiro em
Portugal em 2020 aumentou 1,6%. Esse dado deve ser tido em conta, não para nos ufanarmos dele, não para
nos sentarmos à sombra da bananeira, mas, sim, porque isso significa uma responsabilidade adicional nossa
do que podemos fazer, do que temos de fazer, porque temos condições para o fazer. E se, como Torga dizia,
«se faço o que posso, faço o que devo», essa expressão também tem de ser vista do outro lado: se posso mais,
devo fazer mais, e é desse dever que quero aqui falar, neste debate com o Parlamento português. Portanto,
valorizamos o nosso esforço.
O Sr. Deputado falou dos ventiladores, e bem, sim senhor. Está aqui presente um dos principais responsáveis
por uma das operações mais importantes que o País fez e que permitiu adquirir centenas de ventiladores, que,
por sua vez, permitiram que a nossa capacidade em cuidados intensivos se tenha multiplicado por quatro ou por
cinco, no auge da pandemia em janeiro — sem esse processo de aquisição não teríamos tido essa capacidade
—, com o esforço de todos, naturalmente.
Há problemas no abastecimento de vacinas? Há! Mas é preciso delimitar com clareza esses problemas.
Temos problemas com a Pfizer? Não, já tivemos e eles puderam ser corrigidos. Com a Moderna? Não, não
temos. Temos com uma empresa, com a qual trabalhamos para que eles possam ser superados. Por isso
mesmo é que a nossa meta nacional continua a mesma: até ao fim deste verão, esperamos ter 70% da
população adulta portuguesa vacinada e esperamos cumprir essa nossa meta.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra, para formular pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado
Telmo Correia, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, tanto quanto sei, a Astra era uma empresa
sueca e a Zeneca era uma empresa britânica. Portanto, estamos a falar de economia privada.
Protestos do Ministrode Estado e dos Negócios Estrangeiros.
De resto, a Pfizer e a Moderna também o eram… E Portugal não adquiriu nenhum produto maravilhoso de
nenhum país de socialismo real, tanto quanto sei, nem sequer a vacina chinesa… Portanto, essa questão fica
clara.
Sr. Ministro, mudando um pouco de assunto, gostaria de dizer-lhe o seguinte: relativamente a Moçambique
e a Cabo Delgado, o CDS apresentou um projeto de resolução, que o Parlamento aprovou. E V. Ex.ª esteve
envolvido nesse processo. Pergunto-lhe qual é o ponto de situação que faz, qual é a situação atual, qual é a
intervenção da União Europeia e quais as perspetivas nessa matéria, designadamente também do ponto de
vista humanitário — percebemos que a questão de defesa depende também, obviamente, do Estado
moçambicano.
Outra questão, Sr. Ministro, diz respeito à Venezuela. O Sr. Ministro falou aqui — é relevante que o tenha
feito, e sabemos que se trata de uma questão importante — na existência de vários embaixadores portugueses
com funções importantes no plano internacional que são motivo de orgulho para todos, como é evidente.
Precisamente na Venezuela, a embaixadora da União Europeia, por sinal portuguesa, a embaixadora Isabel
Brilhante Pedrosa, acaba de ser expulsa, numa sanção do regime venezuelano. O problema da Venezuela não
é, ao contrário do que foi dito, a Administração norte-americana, seja ela qual for. O problema da Venezuela é
o regime venezuelano e aquilo que este regime está a impor ao seu próprio povo e, por consequência, aos
portugueses que estão na Venezuela.
Pergunto, Sr. Ministro: qual é a situação em termos de apoio a esses portugueses? Qual é a situação em
termos de apoio consular, da capacidade de chegar ao terreno, neste quadro de pandemia? Com Portugal na
Presidência da União Europeia, qual é o quadro das relações União Europeia-Venezuela, depois da expulsão
da embaixadora, por sinal uma portuguesa?
Já agora, quero fazer-lhe uma outra pergunta que me ocorreu e que me parece interessante, que tem a ver
com o seguinte: o Sr. Ministro disse — e o Governo português tem-no dito — que, no quadro da cooperação,
vamos dispensar vacinas, designadamente para os países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP). Nada
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a opor, Sr. Ministro, estou de acordo com esse princípio. Mas isso suscita-me esta dúvida: e quanto aos
portugueses residentes em países como, por exemplo, a Venezuela? Haverá também alguma maneira de lhes
fazermos chegar as vacinas? É que se é importante ajudarmos os nossos países-irmãos, também me parece
da maior importância ajudarmos os portugueses que estejam, às centenas de milhares, como o Sr. Ministro
referiu, em países onde será muito difícil fazer chegar as vacinas.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Uma última questão — telegráfica, Sr. Presidente — diz respeito aos
espoliados portugueses das nossas antigas colónias. Temos perguntado várias vezes ao Governo se há alguma
novidade, se há algum ponto da situação, se nos pode dizer alguma coisa sobre isto.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia,
em relação a Moçambique, o Serviço Europeu para a Ação Externa está a trabalhar com a Comissão para fazer
o chamado «documento político de abordagem de crise», que é essencial para que a missão de treino possa
fazer-se. Entretanto, incrementámos a ação humanitária e o apoio ao desenvolvimento, designadamente com o
projeto Emprego +, que é gerido pela própria cooperação portuguesa.
Em relação à Venezuela, as questões são claras. Há uma regra básica nas relações internacionais, que é a
regra da reciprocidade, pelo que, se a embaixadora europeia na Venezuela foi declarada persona non grata, a
embaixadora venezuelana junto da União Europeia foi igualmente declarada persona non grata.
O apoio aos portugueses que vivem na Venezuela existe desde o primeiro dia do meu mandato e, antes, os
meus antecessores já tinham a mesma preocupação. E isso também explica a delicadeza e a complexidade do
posicionamento português em relação a essa situação. Sempre tenho dito, porque é a verdade mais pura, que
o critério fundamental para qualquer decisão que tenha de tomar relativamente à Venezuela reside nesta
primeira pergunta, que sempre faço: essa decisão ajuda ou prejudica a situação dos portugueses que vivem na
Venezuela? E todos os meus colegas compreendem que essa seja a primeira pergunta que eu faça.
Finalmente, em relação ao programa de vacinação, devo dizer que os programas de vacinas funcionam pelo
critério da residência, isto é, os residentes em Portugal têm direito à vacina, sejam eles portugueses ou
estrangeiros. Nos países europeus, nos países do hemisfério norte, é esse o critério que vigora e, em muitos
países do hemisfério sul, é também esse o critério que vigora. Quando esse critério não vigorar, a função
supletiva do Estado — e mesmo um conservador aceita-a como essencial — será ativada.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Augusto Santos Silva, sobre o certificado de
vacinação, que se discute na União Europeia, ninguém tem dúvidas de que tem de haver um esforço europeu
para garantir a existência de um mecanismo de circulação que assegure entradas e saídas seguras.
Mas também ninguém duvida de que o certificado de vacinação não é a solução mágica que o garante, até
porque não há ainda dados científicos suficientemente objetivos que permitam definir os critérios de segurança,
especialmente num cenário de grande volatilidade das curvas e de novas estirpes com maiores índices de
transmissibilidade. Além disso, num contexto de escassez de vacinas, a imposição deste certificado traria a
marginalização dos grupos de pessoas ainda não vacinadas, ainda não imunizadas.
Por isso, Sr. Ministro, questiono-o sobre se este certificado de vacinação vai ser o único mecanismo de que
Portugal se valerá para o controlo de entradas sanitariamente seguras, ou se coexistirá com outros,
nomeadamente a testagem de quem entre e saia do País, acompanhada de regras de quarentena, sempre que
se justifiquem como necessárias.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Silva,
agradeço a sua pergunta, porque me permite dar esclarecimentos que são muito importantes.
Nós não estamos a discutir o certificado de vacinação da União Europeia. O que a Comissão Europeia se
prontificou a apresentar como proposta legislativa no próximo dia 17 de março é aquilo a que chamamos de um
«passe digital de imunidade». O que é que isto significa? Significa uma certificação, reconhecida entre nós, de
que a pessoa x foi vacinada, ou fez um teste negativo à COVID-19, ou se encontra imunizada por ter
desenvolvido os anticorpos, porque, por exemplo, já teve a doença. Portanto, esse passe digital de imunidade
não é um certificado de vacinação em sentido próprio.
Outro ponto muito importante da sua pergunta é este: é decisivo não pedir ao passe digital de imunidade
aquilo que ele não conseguirá dar. No momento em que tivermos um teste negativo, ou imunidade, ou sido
vacinados, não ficamos dispensados de nenhuma — mas mesmo de nenhuma! — das medidas de proteção
sanitárias que são essenciais para evitar a contaminação. Eu, que já fui vacinado, posso ser um transmissor e,
portanto, tenho de usar a máscara, tenho de respeitar a distância física, tenho de cumprir todas as regras
sanitárias.
Portanto, o passe digital de imunidade permitir-nos-á conhecer e definir melhor aquela que é a nossa situação
e, sobretudo, ver esse reconhecimento certificado por outros. Mas as medidas de controlo sanitário continuarão
a ser essenciais, até porque novas variantes estão a desenvolver-se, ainda as conhecemos mal e é preciso usar
de toda a cautela. O princípio da prudência, que o Sr. Deputado estima pelo menos tanto como eu, senão mais
do que eu, é aqui absolutamente essencial. Por isso, agradeço a oportunidade que me deu de fazer estes
esclarecimentos públicos que reputo de absolutamente essenciais.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado André Silva.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, a política deste Governo
quanto à China expressa a Realpolitik no seu pior. É simples: braços abertos para o ditador sanguinário Xi
Jinping e para os seus yuans, costas voltadas para as violações dos direitos humanos do povo tibetano e uigur,
ou seja, aquilo a que o Sr. Ministro chama de «relação madura e construtiva».
Há campos de concentração, em Xinjiang, com 2 milhões de uigures e muçulmanos a serem reeducados e
forçados a assimilar a cultura do partido comunista chinês, e sob a sua batuta temos o silêncio de Portugal; com
uigures a serem sujeitos a trabalho escravo que, segundo relatórios internacionais, serve para fornecer mão-de-
obra escrava barata para marcas como a Adidas, a Nike ou a Coca-Cola. E, sob a sua batuta, temos o silêncio
de Portugal; com mulheres uigures forçadas a utilizar contracetivos, a serem sujeitas a esterilização e forçadas
a abortar. E, sob a sua batuta, temos o silêncio de Portugal.
O povo uigur está a ser alvo de um genocídio — ge-no-cí-dio! —, que, como tal, deve ser travado o quanto
antes. E isso não se faz com posições titubeantes que oscilam entre o silêncio e o sussurro, conforme o senhor
tem feito. Faz-se com posições firmes, que exijam que estas práticas sejam qualificadas como genocídio.
Os Estados Unidos, na administração Biden, já o exigiram, assim como o Canadá e a Holanda. O Parlamento
Europeu já condenou este genocídio e, em França, na Suécia, no Reino Unido e na Austrália, a discussão sobre
a qualificação do que se passa em Xinjiang como genocídio vai ocorrer nos próximos dias.
Em Portugal, esta discussão também se vai fazer aqui, no Parlamento, por iniciativa do PAN. Esperemos
para ver se PS e PSD continuarão a dar a mão ao PCP na luta pelo branqueamento das atrocidades cometidas
pelo assassino regime chinês. Xi Jinping, a quem o senhor aperta a mão, tem as mãos sujas de sangue.
Sr. Ministro, queria fazer-lhe duas perguntas. Primeira: vai ou não Portugal juntar-se aos países que
defendem o que está a ocorrer na China, que é um genocídio do povo uigur? Segunda: vai ou não Portugal
colocar-se ao lado de países como o Reino Unido e defender uma investigação independente ao que se está a
passar em Xinjiang?
Aplausos do Deputado do IL João Cotrim de Figueiredo.
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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Silva,
agradeço-lhe as questões que coloca, embora deva dizer-lhe, com toda a franqueza, que considero as
expressões que usou ofensivas para comigo. O Sr. Deputado pode consultar documentação pública sobre as
intervenções que faço, na própria República Popular da China, sobre a situação dos direitos humanos na China.
Não é uma questão de Realpolitik, é uma questão de fazer uma política externa realista, em defesa também
do interesse nacional. Sabe porque é que uso, em relação à Venezuela, tantos cuidados, tantas cautelas, tanta
prudência? Porque é muito fácil fazer aqui uma proclamação retórica, quando, depois, não tem de se responder
pela sorte dos 300 000 portugueses que vivem na Venezuela.
Aplausos do PS.
O Sr. André Silva (PAN): — E na China?!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — É muito fácil fazer aqui uma proclamação
retórica, quando não é a nós que perguntam — mas a mim perguntam, e fazem bem em perguntar — o que é
que fazemos pela sorte dos 130 000 portugueses que vivem na China.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, não é apenas em relação a Hong Kong que o princípio «um país, dois sistemas» tem de ser
aplicado, a lei básica tem de ser cumprida e o processo de transição tem de ser equilibrado. Estas três coisas
também acontecem em relação a Macau. A mesma lei básica tem de ser cumprida, os interesses das pessoas
que lá residem têm de ser respeitados e o princípio «um país, dois sistemas» tem de ser validado, concretizado,
respeitado.
E sabe porque é que em Macau não houve ainda nenhum problema? É também porque, do outro lado, há
uma potência, como Portugal, que conhece o mundo há muitos séculos — há muitos séculos que Portugal
conhece o mundo! —, que respeita todos, que sabe defender os seus interesses e sabe usar as formas mais
inteligentes de os defender.
Portanto, Sr. Deputado, o Governo português…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, vou concluir, e peço desculpa,
mas, como já dizia a minha avó, «quem não se sente…». Com a sua licença, Sr. Presidente, só para concluir,
direi que o Sr. Deputado não pode dizer que o Governo português não condena violações de direitos humanos
onde quer que elas existam.
O Sr. André Silva (PAN): — Há ou não há genocídios na China?!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O Sr. Deputado não pode dizer que a política
externa se pode fazer apenas na base das proclamações retóricas.
Aplausos do PS.
O Sr. André Silva (PAN): — Não quer responder!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», o Sr.
Deputado José Luís Ferreira.
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O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, a estratégia da
União Europeia no que diz respeito ao processo de vacinação assenta, como sabe, em opções que tiveram por
base parcerias público-privadas com meia dúzia de multinacionais farmacêuticas, onde os Estados assumiram
o risco, os contribuintes pagaram a investigação e as empresas ficaram com as patentes.
Ainda assim, estas farmacêuticas estão a falhar, tanto na produção como na entrega de vacinas, face àquilo
que foi acordado. E nós continuamos sem compreender os motivos que levam o Governo português a não
ponderar a diversificação das opções de compra fora do quadro da União Europeia, de forma a garantir um
processo de vacinação mais rápido no nosso País. E insisto na pergunta, porque os motivos que o Sr. Ministro,
há pouco, aqui invocou parecem-nos francamente muito frágeis face àquilo que está em causa, porque aquilo
que está em causa é a vida dos portugueses.
Mudando de assunto, Sr. Ministro, creio que não preciso de me alongar muito para referir a ameaça que as
armas nucleares representam para a humanidade e muito menos as consequências da sua eventual utilização,
porque certamente o Sr. Ministro também está consciente tanto de uma coisa como de outra. Portanto, limitar-
me-ei a referir que o perigo da utilização deste armamento, associado à tensão e às graves ameaças à paz e à
segurança que têm marcado a situação internacional, torna ainda mais urgente exigir o fim das armas nucleares,
porque só assim será possível garantir a paz e a segurança entre os povos.
Ora, foi exatamente com esse propósito que a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou o Tratado de
Proibição de Armas Nucleares, procurando estabelecer um instrumento legalmente vinculativo que proíba as
armas nucleares, levando à sua total eliminação.
Este Tratado ficou, desde setembro de 2017, aberto à assinatura e ratificação pelos Estados-Membros das
Nações Unidas. Sucede que, até hoje, o Estado português ainda não ratificou este Tratado, apesar de, como
membro da ONU e em respeito pela nossa Constituição, dever posicionar-se em defesa da paz e pugnar pela
eliminação das armas nucleares.
Por isso, Os Verdes consideram que o Governo deveria participar num esforço conjunto e num compromisso
permanente e determinado, porque os riscos das armas nucleares são elevadíssimos e o perigo é real.
O que gostaria de saber, Sr. Ministro, é se o Governo está a ponderar assinar este importante Tratado,
adotado pela ONU, e, nesse caso, quando pondera o Governo remetê-lo a esta Assembleia para proceder ao
respetivo processo de ratificação.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira,
agradeço as questões colocadas.
Sobre a eventual compra de vacinas fora do processo de compra europeu, o Governo não tenciona fazê-lo,
por duas razões. Em primeiro lugar, porque isso seria trair uma decisão que tomámos, nós, como europeus, e
que permitiu, insisto, que o processo de descoberta e produção da vacina fosse o mais rápido da história da
humanidade e, sobretudo, que a distribuição das vacinas pela população europeia, pelos diferentes Estados-
Membros tivesse como único critério a distribuição pro rata em função da respetiva população.
Mas também há outra razão: é que não haveria vacinas autorizadas pela Agência Europeia de Medicamentos
que estivessem disponíveis.
Se a primeira razão, que basta em si mesmo, não bastasse, a segunda razão devia ser considerada.
Sr. Deputado, exatamente por causa da vida das pessoas — e a vida das pessoas é o valor mais importante
— só utilizamos em Portugal vacinas devidamente autorizadas pela Agência Europeia de Medicamentos, isto é,
até agora, a vacina da Universidade de Oxford, a vacina da Pfizer e a vacina da Moderna.
Provavelmente, a partir deste mês poderemos aproveitar e utilizar outra vacina.
Portanto, é em função da vida dos portugueses e é em função do facto de sermos um Estado-Membro da
União Europeia, acreditando no processo de aquisição da União Europeia, que não estamos disponíveis para
fazer como aqueles que estão na União Europeia para umas coisas e se esquecem de que estão na União
Europeia para outras.
Em relação à questão nuclear, como sabe, Portugal é um dos países mais empenhados na aplicação do
Tratado de não Proliferação das Armas Nucleares. Mas Portugal não pode assinar nem subscrever o tratado de
eliminação das armas nucleares por uma razão de honestidade elementar: Portugal faz parte de uma aliança
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nuclear, que é a NATO (North Atlantic Treaty Organization). Portanto, Portugal está envolvido no processo de
controlo do armamento — é muito importante o acordo a que Biden e Putin chegaram, há umas semanas, para
prolongar a vigência do Tratado START (Strategic Arms Reduction Treaty) —, está envolvido e empenhado na
lógica de não proliferação do armamento, de desarmamento progressivo, tendo em vista, se tudo correr bem, a
eventual eliminação de todas as armas nucleares à face da Terra.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, há honestidade com a NATO, e também
devia haver honestidade com as Nações Unidas, porque também fazemos parte da Organização das Nações
Unidas, que eu saiba. E era preciso ter também alguma honestidade com a nossa Constituição, porque o seu
artigo 7.º diz que «Portugal preconiza (…) o desarmamento geral (…) e a dissolução dos blocos político-militares
(…)».
Portanto, a haver honestidade, devia ser honestidade também com as Nações Unidas e com a nossa
Constituição.
Para terminar, coloco uma pergunta sobre a EFACEC.
A EFACEC é uma empresa líder de mercado e é uma empresa de enorme relevância estratégica para a
economia. Sucede que a EFACEC viu anulado um concurso de 21 milhões de euros, que tinha ganho na
Noruega, para a construção de uma central de biogás. E isto acontece apesar de a EFACEC ter cumprido todos
os requisitos exigidos para o concurso.
Ora, independentemente das diligências que a própria EFACEC venha a fazer, no sentido de recorrer desta
decisão, importava também, Sr. Ministro, conhecer as diligências que o Governo português fez junto do Governo
norueguês, no fundo saber o ponto da situação, saber se o Governo norueguês já deu alguns esclarecimentos
sobre este processo.
Aplausos do Deputado do PCP Bruno Dias.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro Augusto Santos Silva.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, no cumprimento
de uma responsabilidade que se enquadra na missão dos Negócios Estrangeiros, que é apoiar as empresas
portuguesas no estrangeiro, quaisquer que elas sejam e quaisquer que sejam os setores ou os países em que
estejam, quando tivemos conhecimento desse facto foram dadas instruções ao nosso embaixador para procurar,
junto das autoridades norueguesas, conhecer as razões que terão levado a essa decisão. Depois, o Sr.
Secretário de Estado da Internacionalização dirigiu uma carta à sua contraparte norueguesa para procurar obter
esses esclarecimentos. Estamos à espera da resposta.
Mas a Noruega é um Estado de direito e, portanto, sabemos que a empresa estuda o recurso aos tribunais,
e estou certo de que os tribunais darão razão a quem a tiver.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado André Ventura.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, se Portugal, um dia, tivesse
de se defender, não pense que as Nações Unidas nos vinham defender, certamente. Seria a NATO, que os
senhores tanto criticam, que viria defender o território português!
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Era o André Ventura!…
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O Sr. André Ventura (CH): — Não seriam nem os seus amigos da Venezuela, nem as Nações Unidas que
defenderiam Portugal, seria a NATO que o faria.
Sr. Ministro, há pouco, mostrou um gráfico, no telemóvel, ao Bloco de Esquerda para situar Portugal no
mundo no âmbito da igualdade. Tenho aqui outro número para lhe mostrar, que diz assim: «Portugal é o terceiro
país da zona euro que menos gastou no combate à crise».
Era esse número que o Sr. Ministro devia mostrar e explicar como é que é possível um Ministro dizer que
quer ser liderante, na União Europeia, no combate à pandemia e estar no Governo que menos gasta no combate
à pandemia. É, pelo menos, curioso e irónico que assim seja.
Mas também lhe queria perguntar, Sr. Ministro, se tem no seu telemóvel o relatório Portugal, Balanço Social
2020, que diz que a pobreza e a pobreza extrema aumentaram com o seu Governo, antes de iniciar a liderança
da União Europeia. Que belo Portugal liderante temos para dar lá fora!
Mas não podia terminar esta ronda sem lhe perguntar uma coisa. Sabemos que houve uma espécie de truque
nas nomeações do Governo, que foi noticiado pela imprensa: em 165 nomeações, incluindo no seu Ministério,
129 foram de dirigentes nomeados em substituição anteriormente pelo seu Governo. É esta a transparência que
damos à União Europeia!
O exemplo que damos é de menos combate à pandemia, de menos transparência e de menos empenho a
conseguir contrariar as causas desta pandemia.
Mas, Sr. Ministro, fiquei curioso com uma coisa que disse: que só temos problemas com uma farmacêutica,
com as outras está tudo resolvido. É curioso, porque, no dia 12 de fevereiro, o Sr. Ministro disse: «O fornecimento
de vacinas está muito aquém do que foi contratualizado e é um problema que temos de resolver». Convinha
esclarecer.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr. Presidente, dizendo apenas isto: não se trata apenas de
direitos humanos e da defesa dos portugueses na Rússia, ou na China, ou na Venezuela, Sr. Ministro. Trata-se
de que esses países também têm muita gente na União Europeia. E se fôssemos firmes na defesa daquilo em
que acreditamos, pode estar certo de que a retaliação não seria como teme, nem seria como pode esperar,
porque se temos muitos portugueses a viver na China, também há milhares de chineses a viver em território da
União Europeia. E, para meia ameaça, ameaça e meia, porque não estamos cá para brincar, estamos cá para
defender os interesses dos europeus.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura,
confesso que é muito difícil responder, porque não chego a perceber quais são as perguntas…
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — O telemóvel!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … e também porque a linguagem e os implícitos
da linguagem que utiliza, como essa ideia de que expulsar estrangeiros pode ser uma arma de retaliação, estão
tão longe da minha maneira de pensar, dos meus valores e das minhas conceções políticas que me confesso
incapaz de raciocinar nesses termos.
Aplausos do PS.
Portanto, passo à única questão concreta que o Sr. Deputado, aparentemente, na minha pobre inteligência,
terá mencionado, que é a de nomeações, em regime de substituição, no meu Ministério, de amigos.
Sobre isso, Sr. Deputado, tenho a dizer o seguinte: em primeiro lugar, na maioria dos casos, as nomeações
de dirigentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros têm de ser de diplomatas. Os diplomatas não podem ser
nomeados em regime de substituição, são mesmo nomeados por decisão discricionária do Ministro e do
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Primeiro-Ministro se forem Diretores-Gerais, e é assim que fazemos. Essa é, aliás, uma das razões pelas quais
a nossa diplomacia é tão qualificada.
Em segundo lugar, nunca, na minha vida, muito menos no Ministério dos Negócios Estrangeiros, perguntei a
quem quer que nomeasse quais eram as suas conceções religiosas, com quem era casado, de quem é que
gostava, qual era o clube de futebol, qual era o partido político ou qual era o voto.
Aplausos do PS.
E, Sr. Deputado, se fizer o exercício muito simples de perceber quem é, atualmente, o Secretário-Geral do
Ministério dos Negócios Estrangeiros, a Diretora-Geral de Política Externa, o Diretor-Geral de Assuntos
Europeus, o Diretor-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas, o Inspetor-Geral, o
Diretor-Geral de Administração, o Presidente do Instituto Camões, o Presidente da AICEP, reparará que são,
todos eles, pessoas de altíssima qualificação, todos eles leais ao Governo que está em funções,
independentemente da natureza do Governo, todos eles com carreiras e experiências profissionais, aqui e no
estrangeiro, da mais alta valia, e é por isso que a diplomacia portuguesa é tão forte.
E é também por isso que António Guterres foi eleito Secretário-Geral das Nações Unidas, que António
Vitorino foi eleito Diretor-Geral da Organização Internacional para a Migração, que Teresa Ribeiro foi eleita
Representante para a Liberdade dos Media da OSCE…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — E tantos outros.
Portanto, Sr. Deputado, admito-lhe tudo menos que, comigo presente, queira desqualificar a diplomacia
portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, aterra amanhã, em Lisboa, Svetlana
Tikhanovskaya, líder da oposição bielorrussa ao ditador Aleksander Lukashenko, que há 26 anos oprime o povo
da Bielorrússia.
Saúdo-o a si e ao Governo português por irem recebê-la. Espero que estas conversações sejam produtivas
do ponto de vista da Sr.ª Tikhanovskaya para que ela não saia daqui de mãos a abanar.
A Sr.ª Tikhanovskaya, que vem pedir ajuda a Portugal por estar a presidir ao Conselho Europeu, ainda há
poucos dias dizia que entende que a União Europeia é uma máquina imensa e por vezes lenta. E o tempo, na
Bielorrússia é percecionado de forma diferente, porque para as muitas pessoas inocentes que estão nas prisões
— há 1000 pessoas presas com acusações formais só por protestarem — todos os dias são uma eternidade.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Ministro, o que é que tem para oferecer à Sr.ª Tikhanovskaya
amanhã, ou quinta-feira, ou sexta-feira, para que ela não saia daqui de mãos a abanar?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, sim, confirmo
que amanhã receberei — aliás, receberemos vários, no Governo — a líder da oposição bielorrussa, com todo o
gosto.
A Bielorrússia é, hoje, dos Estados mais autoritários que a Europa tem, e isso é inaceitável para Portugal, é
inaceitável para a União Europeia.
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O que é que fazemos? Fazemos o que fazem as democracias. Não decretamos sanções a economias, não
decretamos a extraterritorialidade das sanções, definimos regimes de sanções que se dirigem especificamente
a pessoas singulares e coletivas, que, aliás, já aprovámos em relação à Bielorrússia, incluindo ao próprio
Presidente da Bielorrússia, e trabalhamos diplomática e politicamente com o isolamento do regime e o apoio à
sociedade civil.
É assim que fazem as democracias. Se o Sr. Deputado conhecer outra maneira de proceder, faz favor.
O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, essas sanções, estendidas agora por
mais um ano, estão há nove meses em aplicação e não se vê grande progresso, antes pelo contrário. Pergunto
porque é que isso não está a funcionar.
Queria falar-lhe agora, também brevemente, de uma outra matéria importante no contexto da revisão de
política comercial da União Europeia, o Trade Policy Review. Todos os ministros com responsabilidade na área
do comércio reuniram-se ontem para apreciar a proposta que a própria Comissão tinha feito, se não me engano
em meados de fevereiro, que tem vários aspetos com os quais concordamos, como a abertura da economia no
contexto da recuperação, multilateralismo, etc., etc., mas que depois fala em «assertividade na defesa dos
interesses e dos valores europeus». E cá vamos nós outra vez — interesses e valores europeus. É que os
valores europeus em matéria ambiental ainda são acautelados neste acordo de comércio livre com o Mercosul
(Mercado Comum do Sul). Quero perguntar-lhe também — vem a talhe de foice — se acha suficientes as
salvaguardas que ambientalmente estão previstas nesse acordo.
Mas, se a matéria ambiental é, volta e meia, considerada, a matéria de direitos humanos, nesses acordos
internacionais raramente é suficientemente salvaguardada.
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Não vou repetir aquilo que já foi dito aqui relativamente ao povo
uigur pelo Sr. Deputado André Silva. Vou dizer que a China não só se comporta mal relativamente ao povo uigur
e à província de Xinjiang, porta-se mal na fronteira com a Índia, porta-se mal nas manobras militares
intimidatórias no mar da China Meridional, porta-se mal no que tem sido o contexto da limitação dos direitos
políticos em Hong Kong.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Portanto, pergunto, concretamente: considera adequadas e
suficientes as salvaguardas nesse acordo com a China?
E considera suficientes as salvaguardas ambientais no acordo com o Mercosul?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, agradeço a sua
pergunta.
Sabe que uma das coisas que leva os europeístas como eu a serem convictamente europeístas é o facto de
a União Europeia ser umas das poucas regiões do mundo em que os interesses coincidem com os valores. E
isso faz muita diferença em relação a outras regiões.
Nós não pomos os nossos interesses à frente dos nossos valores, e nem temos de pôr, porque os nossos
interesses e os nossos valores coincidem.
Em relação às duas perguntas concretas que me colocou, a minha resposta é muito simples, e posso dá-la
como Presidente em exercício do Conselho dos Negócios Estrangeiros-formação Comércio, que é um dos meus
«chapéus» atuais.
Digo-lhe a si, como digo a todos os meus colegas, que são necessárias clarificações adicionais para garantir
que todos os padrões exigíveis para o cumprimento do acordo com o Mercosul e em relação ao acordo de
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princípio de investimento com a China sejam respeitados. Aliás, por isso, estamos a trabalhar com os países do
Mercosul uma clarificação adicional em relação ao acordo com o Mercosul e por isso também temos todo o
tempo que seja necessário à nossa frente para assegurar o mesmo tratamento do acordo de princípio com a
China.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, o Grupo Parlamentar do PS gostaria de
iniciar esta intervenção felicitando o Governo pela boa prestação no que concerne à Presidência do Conselho
da União Europeia. O estatuto e a perceção de Portugal, hoje, nas instituições e na opinião pública europeias,
mudaram muito desde 2015, sobretudo devido à demonstração prática de que, com realismo e moderação,
existiam outras vias no quadro europeu para além da receita austeritária que quase asfixiou o País até 2015, e
pela postura serena, responsável e pragmática, assumida pelo Governo português no processo de ressurreição
do projeto europeu, iniciado com a nova Comissão, e que teve a sua prova de fogo nas históricas decisões de
julho de 2020.
Quis o destino que coubesse a Portugal, sob o lema por si escolhido — «Tempo de agir: por uma recuperação
justa, verde e digital» —, a complexa tarefa de, em seis meses, passar das proclamações à execução concreta
dos principais instrumentos para combater a crise e preparar o futuro para além dela. Infelizmente, alguns desses
instrumentos, como as ratificações parlamentares sobre os recursos próprios, de que a Assembleia da República
se orgulha de ter sido um dos primeiros parlamentos a concretizar, não dependem da Presidência.
A Assembleia da República, com autonomia própria face ao Governo, que decorre da separação de poderes,
tem vindo, sobre esta matéria, a manter uma postura de acompanhamento e de colaboração institucional, bem
expressa na harmonização de prioridades, espelhada no programa da dimensão parlamentar da Presidência
portuguesa, que também tem vindo a decorrer a bom ritmo, com a prestação competente e empenhada do Sr.
Presidente da Assembleia da República e de muitas Deputadas e Deputados, de todos os grupos parlamentares
e de várias comissões parlamentares. Trata-se de um programa que engloba cerca de dezena e meia de
iniciativas, o que significa uma iniciativa, em média, por cada duas semanas.
Estas, para além do número considerável de Deputados dos 27 Estados-Membros, têm contado com a
participação de atores políticos de primeira grandeza, europeia e mundial, tais como o Secretário-Geral da ONU
António Guterres, o Presidente do Parlamento Europeu, inúmeros eurodeputados e membros do Governo de
Portugal e de outros Estados-Membros — ainda hoje, de manhã, estivemos com o Ministro dos Negócios
Estrangeiros grego —, a Presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, a Diretora-Geral do FMI (Fundo
Monetário Internacional), Kristalina Georgieva, o Secretário-Geral da NATO, o Alto Representante da União para
os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Josep Borrel, o ex-negociador chefe do Brexit e vários
comissários europeus.
Nestes dois meses de exercício, a Presidência portuguesa do Conselho tem tido grande visibilidade sobre
as questões que mais preocupam os cidadãos europeus: a crise sanitária, a vacinação e a resposta à crise
económica, já trazidas a este debate por colegas que me precederam e que mereceram respostas
esclarecedoras de V. Ex.ª, Sr. Ministro.
Contudo, a Presidência tem vindo a trabalhar no relançamento de outros dossiers de grande relevância,
alguns deles há anos bloqueados, como a taxação das transações financeiras ou as diretivas sobre a tributação
das multinacionais e sobre o branqueamento de capitais ou ainda sobre a prorrogação das regras de flexibilidade
do Pacto de Estabilidade e Crescimento, de que ouvimos, hoje, boas notícias.
Aplausos do PS.
Gostaria que o Governo pudesse esclarecer esta Câmara sobre a posição da Presidência nestas questões.
Por fim, gostaria também de questionar a Presidência sobre os rumores que correm em Bruxelas de que, por
mais uma boa iniciativa da Presidência, estará para breve o desbloqueamento do impasse para o lançamento
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da Conferência sobre o Futuro da Europa. Pelo silêncio a que se remeteu o Eurodeputado Paulo Rangel, tudo
leva a crer que tais rumores devem ter fundamento.
Aplausos do PS.
Gostaria, contudo, de lembrar o Sr. Ministro de que a Assembleia da República, em coerência com as
posições que a Comissão de Assuntos Europeus tem assumido na Presidência da COSAC (Conferência dos
Órgãos Especializados em Assuntos Comunitários), aprovou, há poucos dias, por larga maioria, uma resolução
que foi também subscrita por quase todos os parlamentos nacionais, reclamando um estatuto condigno à troica
da COSAC na comissão executiva da Conferência, incluindo a possibilidade de apresentar propostas e de
participar nas discussões, em pé de igualdade com os representantes da Comissão, do Parlamento e do
Conselho.
Gostaria de saber, Sr. Ministro, o que nos pode dizer sobre esta matéria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Agradeço as questões colocadas pelo Sr. Deputado Capoulas Santos e, se me permite, queria devolver-lhe
o elogio, sendo que, no meu caso, o elogio que faço ao Parlamento é mais justificado do que o elogio que o
Parlamento me faz a mim.
De facto, a dimensão parlamentar do programa da Presidência portuguesa é, a todos os títulos, notável.
Notável pelo nível de participações que conseguiu mobilizar, mas, sobretudo, notável pelas temáticas que
escolheu, pela oportunidade dessas temáticas e também pelo alinhamento, pelo encaixe perfeito entre as
prioridades da Presidência portuguesa e as prioridades do trio de presidências a que nós pertencemos.
E essa é uma boa passerelle, uma boa passagem para o tema da Conferência sobre o Futuro da Europa. De
facto, hoje de manhã, o Conselho chegou a acordo com uma proposta portuguesa, que permitiu desbloquear
uma situação de impasse que se vivia. E o Conselho — julgo, aliás, por unanimidade — apoiou uma proposta
portuguesa de uma presidência tripartida da Conferência sobre o Futuro da Europa e também a proposta de
organização executiva dessa presidência, que não só envolve todas as três instituições, o Parlamento, o
Conselho e a Comissão, como também permite que outras formações parlamentares que acrescentam valor,
entre as quais a COSAC e as diferentes comissões de assuntos europeus dos parlamentos nacionais, possam
também contribuir para o sucesso desta conferência.
É muito importante que esta conferência não seja a enésima discussão sobre leis e arquiteturas jurídicas e
seja uma discussão forte, livre com os cidadãos e a sociedade civil, mas também com os parlamentos e as
demais instituições sobre o futuro da Europa, isto é, o futuro das nossas políticas públicas, que respondam às
ansiedades, aos desejos e também aos projetos dos cidadãos europeus.
Agradeço também a referência que o Sr. Deputado fez à capacidade que, até agora, a Presidência
portuguesa tem e, estou certo, continuará a ter, tal é a altíssima qualidade de quem a dirige, a começar pela Sr.ª
Embaixadora Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, continuando com o nosso representante
permanente e representante permanente-adjunto e todas as suas equipas e a Direção-Geral dos Assuntos
Europeus. A excelência profissional de todas essas equipas tem permitido superar alguns impasses que se
viviam há anos ou desenterrar decisões muito importantes, mas que estavam paralisadas por dificuldade de
entendimento, também há anos.
Dou apenas alguns exemplos, se me permite. O exemplo do combate à própria burocracia da construção
europeia: depois de cinco anos de discussões infrutíferas, foi a Presidência portuguesa que conseguiu fazer
passar uma revisão das instâncias preparatórias das reuniões do Conselho, que significa eliminar um quinto dos
grupos de trabalho que até agora reuniam para que o Conselho pudesse reunir a seguir.
Outros exemplos muito importantes, designadamente do ponto de vista da transparência fiscal e da prestação
de contas, estão na diretiva chamada CBCR (Country-by-country reporting), finalmente sob Presidência
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portuguesa. Conseguiu-se o apoio maioritário necessário no Conselho para que as grandes empresas
multinacionais passem a ser obrigadas a reportar os seus lucros, país por país.
A Presidência portuguesa, fiel ao seu próprio compromisso, na cooperação reforçada em que estava
envolvida, repôs em cima da mesa a questão da taxação das transações financeiras, essencial também para
garantir que o pagamento do empréstimo de 750 mil milhões de euros que a Comissão Europeia, em nosso
nome, levanta no mercado, não esteja, apenas, nos ombros das contribuições nacionais, mas, sim, possa ser
parcialmente, pelo menos, assegurado por novos recursos próprios da União Europeia.
Conseguimos desbloquear a diretiva sobre a privacidade nas comunicações eletrónicas e estamos a
conseguir, também, avançar na negociação com o Parlamento Europeu de forma a que todos os programas do
Quadro Financeiro Plurianual possam estar no terreno o mais cedo possível. Por exemplo, os regulamentos
relativos aos fundos estruturais, ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e ao Fundo de Coesão, estão
bloqueados, o que significa que 240 mil milhões de euros de recursos financeiros vão passar a estar disponíveis.
O Programa Horizonte já está no terreno. São 95 mil milhões de euros de apoio à investigação, à inovação e à
tecnologia.
As ratificações nacionais da decisão sobre os recursos próprios estão em curso e já foram concluídas por
sete Estados-Membros, um dos quais Portugal, com a preciosa intervenção da Assembleia da República e de
V. Ex.ª, Sr. Presidente, em particular. Mais dois Estados-Membros estão a terminar o seu processo e já 18
Estados-Membros entregaram as primeiras versões dos respetivos planos nacionais. Portanto, julgo que
chegaremos ao fim de junho podendo dizer que foi tempo de agir, que agimos e obtivemos resultados.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Ainda no tempo do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lara
Martinho.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Lara Martinho (PS): — Antes de mais, cumprimento o Sr. Presidente, o Sr. Ministro, a Sr.ª e o Sr.
Secretários de Estado, as Sr.as e os Srs. Deputados.
Sr. Ministro, depois de anos de ceticismo sobre o futuro da relação transatlântica, de divergências sociais,
económicas e ambientais e de sistemáticas tentativas de desvalorização do sistema multilateral, as recentes
semanas marcam o início da concretização de uma esperança que não morreu, marcam o início da esperada e
desejada reaproximação entre os Estados Unidos da América e a União Europeia.
Num diálogo recente entre a União Europeia e a nova administração norte-americana, ficou clara a intenção
não só de aprofundar a parceria União Europeia/Estados Unidos da América, mas também de construir uma
aliança global, conjunta, na luta contra a pandemia, na recuperação e na mitigação das alterações climáticas,
promovendo e garantindo os valores democráticos.
Poderá ter sido mera coincidência, mas não posso deixar de assinalar que, ontem, quer os Estados Unidos,
quer a União Europeia anunciaram novas sanções relativas à violação dos direitos humanos na Rússia.
A realidade é que agora, mais do que nunca, percebemos e sentimos que a democracia não é um dado
adquirido, que a democracia tem de ser protegida. Aliás, como referiu o Presidente Joe Biden, em tantos lugares,
incluindo os Estados Unidos e a Europa, o progresso da democracia está sob ataque e, por isso, hoje, talvez
mais do que nunca, necessitamos de uma relação transatlântica forte, resiliente, que promova a paz e a
segurança mundial, que defenda os direitos humanos e a ordem internacional, promovendo o multilateralismo
como caminho para encontrar soluções para os problemas mundiais.
Para problemas partilhados soluções partilhadas, deve ser este o desígnio. E se há algo que esta pandemia
evidenciou foi mesmo a importância de uma resposta concertada a crises, ameaças e desafios que são globais,
como a paz, a segurança, os direitos humanos, o Estado de direito, o desenvolvimento sustentável, a saúde
pública ou alterações climáticas. Só com um sistema multilateral eficaz, assente em regras e valores universais,
é possível enfrentarmos, com sucesso, estes desafios.
Daí ser tão relevante que Portugal e a União Europeia continuem a apoiar os esforços de reforma envidados
pelo Secretário-Geral das Nações Unidas, Eng.º António Guterres, cuja recandidatura, para além de motivo de
grande orgulho para Portugal, é, sem dúvida, uma mais-valia para a Humanidade, e que muito saudamos.
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Sr. Ministro, aos desafios mundiais emergentes, desde o reforço do multilateralismo às alterações climáticas,
à globalização, à evolução tecnológica e ascensão da China, acresce o novo paradigma provocado pela
pandemia. Importa tirar o máximo partido da política comercial para apoiar a recuperação da pandemia COVID-
19 e a transformação tecnológica e digital da economia europeia, com a ambição de criar uma Europa mais
forte, uma Europa mais resiliente no mundo.
Sr. Ministro, colocava-lhe, por isso, três questões.
A primeira questão, sobre a relação transatlântica, é a seguinte: o que pode significar ter novamente os
Estados Unidos com uma visão aberta de união e partilha de objetivos estratégicos comuns para o reforço do
multilateralismo?
A segunda é sobre a nova política comercial europeia. Já aqui foi referida a reunião que ocorreu ontem e
perguntava-lhe as principais conclusões deste encontro informal do Conselho de Negócios Estrangeiros, que
perspetivas terá esta revisão da política comercial relativamente ao desenvolvimento de parcerias comerciais e
económicas com África e com o Mediterrâneo e, por fim, de que forma Portugal poderá beneficiar da sua
concretização e, aliado ao novo Programa Internacionalizar 2030, que contributo pode dar para o crescimento
das exportações portuguesas.
Uma última questão sobre a transformação digital. A soberania e a liderança europeia na área do digital,
assim como a sua competitividade internacional e afirmação enquanto player relevante no cenário geopolítico e
estratégico mundiais, são indissociáveis, por exemplo, da questão da conectividade internacional. E é de
extrema relevância que a Presidência portuguesa tenha colocado particular ênfase justamente nesta questão,
sendo a conectividade internacional um pilar fundamental para a Europa assegurar a liderança digital na cena
internacional, na qual Portugal e as suas regiões autónomas poderão desempenhar um papel fundamental, pela
sua localização geoestratégica.
Pergunto que passos concretos Portugal tem dado neste domínio, que papel tem desempenhado a
Presidência portuguesa na afirmação da soberania estratégica e digital da União e de que forma esta aposta na
conectividade internacional, através de novas rotas de cabos submarinos, poderá beneficiar a União Europeia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,
Augusto Santos Silva.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, agradeço as
questões que colocou.
A Sr.ª Deputada já sabe que sempre que antecipo ter o gosto de estabelecer uma interação com Deputados
açorianos, trago a minha gravata açoriana, dos escritores açorianos, e um dos autógrafos que ela contém é o
de Natália Correia.
Natália Correia, em 1950, fez uma viagem aos Estados Unidos, levava uma missão específica, encomendada
por António Sérgio, a de se pôr em contacto com quem, nos Estados Unidos, pudesse apoiar a resistência
antifascista portuguesa. Natália Correia tinha, então, 26 anos. Escreveu um documento, sobre essa viagem, que
intitulou Descobri que era europeia, porque o que a mais impressionou foi o que ela considerava ser a profunda
diferença estrutural entre a maneira de ser dos europeus e a maneira de ser dos americanos. Mas desconfio
que Natália Correia, depois, mais tarde, talvez, lendo o grande romance norte-americano de Henry James, Os
Europeus, percebeu que essa diferença era mais aparente do que real e que a matriz europeia está mesmo no
âmago da civilização americana. E nós ou, pelo menos, eu, desde o dia 20 de janeiro passado, sinto esse
mesmo novo encontro, uma reaproximação entre esses dois lados europeus do Atlântico, um mais antigo, que
somos nós, a Europa, e outro mais recente, que são eles, os Estados Unidos. E lembro-me sempre do primeiro
poema da Mensagem, de Fernando Pessoa, quando Fernando Pessoa diz que a Europa jaz sobre os cotovelos,
olha para o futuro, olha para o Ocidente, futuro do passado, e o rosto com que mira é Portugal.
Portanto, em tudo o que a Sr.ª Deputada disse sobre a importância da relação transatlântica, o papel de
Portugal nessa relação e, especificamente, o papel das regiões autónomas, e também, naturalmente, dos
Açores — e nunca nos esqueçamos que Roosevelt dizia que estavam mais perto da costa leste dos Estados
Unidos do que o Havai da costa oeste dos Estados Unidos —, é absolutamente essencial. Isto pode parecer
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poesia, e não tenho nenhuma vergonha de que pensem que estou a fazer poesia, mas é política externa da
mais pura. É que, quando falamos na revisão da política comercial, mas também falamos na cimeira entre Biden
e os líderes europeus, que esperamos que se realize este semestre, na próxima cimeira da NATO, na
participação com os americanos na cimeira das democracias e no olhar em conjunto para as grandes regiões
do mundo, para o muito que temos de fazer na cooperação com África, na ligação com a América Latina, na
atenção equilibrada à Ásia pacífica, falamos em concretizações muito específicas, muito reais e que podem ser
muito valorosas desta nossa ligação matricial, que não há que ter nenhuma vergonha em assumir. O que nós,
portugueses, fazemos é, um pouco, acrescentar José Saramago a Natália Correia e dizer aos nossos amigos
americanos que a América não fica apenas entre o Oregon e a Flórida, que a América é também a América do
Sul, é também a América Latina e, portanto, a comunidade transatlântica de que nós precisamos é uma dupla
comunidade transatlântica, com o Atlântico Norte e o Atlântico Sul, sem esquecer que o Atlântico Sul tem duas
margens e na outra margem está África, África sem a qual a Europa não tem futuro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à segunda ronda de perguntas, mas, antes, peço à Sr.ª
Vice-Presidente Edite Estrela para me substituir na presidência da Mesa.
Neste momento, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.
A Sr.ª Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, os meus cumprimentos.
Vamos, então, dar início à segunda ronda de perguntas neste debate.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Marques, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Sérgio Marques (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,
permitam-me que traga a este debate a problemática das regiões ultraperiféricas (RUP).
Características geográficas muito particulares ditam-lhes uma identidade comum.
O princípio da ultraperiferia, consagrado nos tratados, permitiu a estas regiões uma integração plena, mas
diferenciada, na União Europeia. Tratar diferente aquilo que é diferente é uma exigência do valor da igualdade
que tanto prezamos e que tão bons resultados produziu neste contexto.
A afirmação do princípio da ultraperiferia é um processo sempre inacabado. Interpela-nos para uma procura
constante das melhores soluções para concretizar o tratamento e o apoio específico que é devido às regiões
ultraperiféricas.
A Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia constitui, assim, uma excelente oportunidade, que
não podemos desperdiçar, de promover e abraçar a causa ultraperiférica.
Sr. Ministro, como está o Governo a utilizar a Presidência portuguesa para afirmar a causa ultraperiférica?
Como o Sr. Ministro sabe, estão pendentes, no plano europeu, dossiers relativos às RUP que exigem uma
atenção e um acompanhamento muito próximos. Refiro-me, por exemplo: à perspetiva de redução dos apoios
para a agricultura, na sequência da reforma da política agrícola comum (PAC); à não comparticipação europeia
no esforço de renovação de frotas pesqueiras regionais; à incapacidade de resposta a atividades gravemente
atingidas pela crise pandémica, como o turismo; à ausência de resposta europeia a problemas migratórios, como
seja o êxodo da Venezuela.
Mas, Sr. Ministro, existe um outro dossier para o qual gostaria de convocar a sua atenção e o seu
acompanhamento. Refiro-me à imperiosa necessidade de rever a estratégia europeia para as RUP, que foi
estabelecida em 2017. A radical alteração das circunstâncias, decorrente da pandemia, impõe uma revisão
urgente desta estratégia.
A estratégia europeia não pode deixar de refletir o impacto ainda mais avassalador da pandemia nestas
regiões. Aponto o exemplo da Madeira, que teve uma contração brutal do seu produto interno bruto em 2020, a
qual pode ultrapassar o dobro da redução ocorrida em termos nacionais. E, em 2021, este cenário ameaça
repetir-se.
Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, os tempos muito perturbadores que vivemos interpelam-nos para a
convergência, o entendimento e a solidariedade, para a solidariedade europeia, mas também para a
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solidariedade nacional, e que a primeira não dispense ou substitua a segunda. Ambas são indispensáveis para
apoiar as regiões ultraperiféricas a enfrentarem com sucesso a missão de vencer a pandemia, erradicar o vírus,
salvar vidas, vacinar e reconstruir e renovar o tecido económico e social.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Sérgio Marques,
agradeço as suas questões. Quis o acaso, um feliz acaso, que as duas regiões autónomas se sucedessem nas
suas intervenções e, portanto, queria aproveitar a oportunidade para dizer quão importantes são quer do ponto
de vista da política nacional, quer do ponto de vista da política europeia e externa, que é aquela de que trato
presentemente. E temos, no âmbito da Presidência, trabalhado bem, sabendo que temos ativos muito
importantes, designadamente o facto de a presidência da Conferência das Regiões Ultraperiféricas caber, neste
momento, a um português.
A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, nas suas missões, tem também, no seu caderno de
encargos, o trabalho com a Comissão Europeia sobre vários temas, entre os quais uma possível revisão da
estratégia de 2017. E, por isso, temos de usar de todo o equilíbrio, de toda a prudência e, também, de toda a
inteligência na forma como vamos construindo, nacionalmente, uma plataforma de interação que possa ser
frutífera com Bruxelas. Temo-lo feito, com a preciosa ajuda do Sr. Deputado noutras funções, em relação à
integração de tantos venezuelanos que demandaram Portugal e, em particular, a Região Autónoma da Madeira,
para além do distrito de Aveiro e de outros pontos do nosso território, e estou certo de que, com a sua sageza,
o Sr. Deputado contribuirá para que esta Assembleia chegue a uma posição consensual e forte que nos permita
responder positivamente aos pedidos que a Comissão Europeia nos tem feito sobre a reforma de certos aspetos
do regime da zona franca da Madeira, de forma a salvaguardar o essencial desse regime.
Evidentemente que todos temos de nos preparar para a transição, porque a reforma da PAC vai num sentido
mais verde, num sentido ambientalmente mais exigente, e temos de assegurar ter as condições para essa
transição inelutável. Mas a principal condição que temos é a enorme valia das nossas duas regiões
ultraperiféricas, falemos assim, dos Açores e da Madeira, do ponto de vista ambiental, do ponto de vista de
recursos energéticos, do ponto de vista da economia azul e da economia verde, que são tão essenciais à
transformação da economia europeia.
Portanto, estou certo de que o caminho que temos feito em conjunto com as duas regiões autónomas, no
âmbito das competências deste ministério, continuará a ser trilhado.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para dirigir uma pergunta ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado
Carlos Gonçalves, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros, a decisão do Reino Unido, de deixar formalmente a União Europeia, levou as autoridades
britânicas a criar um estatuto de residência permanente, o settled status, um estatuto vital para a nossa
comunidade a viver no Reino Unido.
Por isso, temos vindo a apelar ao Governo para tomar as medidas necessárias a que a rede consular esteja
capacitada para dar resposta às necessidades dos portugueses que residem naquele país e apelámos a que
fosse realizada uma campanha de informação sobre o settled status, nomeadamente utilizando a publicidade
institucional, apelos que, infelizmente, não foram ouvidos.
Estamos a falar de uma comunidade estimada em cerca de 400 000 nacionais. Com efeito, se o total de
portugueses com morada britânica no cartão do cidadão ascende a 335 000, as dificuldades de atendimento da
nossa rede consular naquele país levaram a que muitos portugueses optassem por fazer os seus documentos
no território nacional, sendo expectável atingir o tal valor de 400 000.
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Ora, na semana passada, saíram números que nos dizem que o estatuto de residência já foi pedido por 331
000 portugueses. Estes números apontam para uma situação em que podemos ter várias dezenas de milhares
de portugueses que ainda não formalizaram a sua candidatura e para a qual também necessitam, até ao final
de junho, de documentos portugueses válidos.
Infelizmente, as marcações nos postos consulares já vão para lá dessa data e, neste momento, todos
sabemos que vir a Portugal fazer os documentos não é opção.
Assim, é imperioso que o Sr. Ministro esclareça esta Câmara sobre se, entre outras medidas, os nossos
consulados adotaram um sistema de atendimento prioritário — tipo porta aberta —, capaz de dar resposta
imediata aos pedidos urgentes destes cidadãos. E gostaria também que esclarecesse se foi criado um serviço
específico com vários funcionários para acompanhar esta situação e apoiar estes portugueses.
O tempo é curto, mas talvez seja ainda o tempo de o Governo, finalmente, ser sensível a esta questão. Sr.
Ministro, o que está em causa é a vida e o futuro de muitos portugueses.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, agradeço ao Sr. Deputado
Carlos Gonçalves, cujas preocupações são inteiramente legítimas.
Essas são as preocupações de todos nós, sejamos Governo ou oposição circunstancialmente, portanto,
posso garantir-lhe o seguinte: nós criaremos todas as condições indispensáveis para que todos os portugueses
possam registar a sua residência no Reino Unido, querendo fazê-lo. O ritmo de registo está a ser bom —
bastante melhor do que tinha sido antecipado no início — e, já como disse, ultrapassámos os 330 000 pedidos
processados, mas evidentemente o que conta é chegarmos, tão próximo quanto possível, aos 100% dos que
precisam ou querem proceder a esse registo. Com isso, o que continuaremos a fazer é o que temos feito ao
longo destes anos, ou seja, reforçar a nossa capacidade, designadamente consular, adequando o modo de
funcionamento às próprias regras sanitárias e outras que o Reino Unido impõe. Naturalmente, os consulados
portugueses de Londres e de Manchester não podem funcionar à revelia e ao arrepio das regras das autoridades
públicas britânicas decididas por razões de natureza sanitária.
A nossa relação com o Reino Unido é crucial, também por um feliz acaso. Antes deste debate em Plenário,
o que de mais importante fiz hoje foi uma conferência telefónica com o meu colega britânico, o Ministro Dominic
Raab, que foi muito produtiva e na qual fomos unânimes em dizer que, no quadro do pós-Brexit, o incremento
das relações bilaterais entre o Reino Unido e Portugal era uma prioridade absoluta em todas as dimensões, do
contacto entre as pessoas às relações económicas e à nossa cooperação na política externa, nas organizações
multilaterais e nas grandes agendas comuns. O Reino Unido prepara, hoje, a COP26 (United Nations Climate
Change Conference of the Parties) e Portugal prepara a Conferência dos Oceanos, sendo a ligação evidente,
isto é, a maneira como nós podemos cooperar conjuntamente na nossa relação com a África Oriental, onde quer
o Reino Unido como Portugal têm tanta influência e tanta presença, ou na América Latina. Todo esse vasto
leque de temas que constituem a agenda bilateral e a agenda da cooperação em questões multilaterais foi
percorrida.
Portanto, Sr. Deputado, a minha melhor expectativa é a de que chegaremos ao fim do mês de junho com os
problemas pendentes, em todas as áreas, resolvidos, tal como chegámos ao fim de dezembro de 2019
convenientemente preparados para o caso de haver uma saída sem acordo e tal como chegámos ao fim de
2020 completamente preparados para aplicar o acordo de saída.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para também questionar o Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado
José Cesário, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. José Cesário (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, Sr.ª Secretária de Estado,
Srs. Secretários de Estado, ontem, na Comissão dos Negócios Estrangeiros, aconteceu o que temíamos. O
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Governo confirmou o que nós temos vindo a denunciar: a existência de um autêntico lapso nos serviços
consulares.
Em 2020, realizaram-se 50% dos atos consulares realizados no ano anterior, em 2019. Também nesse ano,
em 2020, só foram realizadas 20% das permanências consulares de 2019. Soubemos, também, que a
plataforma de agendamento online, que não funcionou durante grande parte do ano de 2020, não funcionou
porque, exatamente, é uma plataforma antiga e não tem condições para responder eficazmente. Soubemos,
ainda, que nos grandes postos da rede consular, em São Paulo, em Paris, os agendamentos são feitos, hoje, a
quatro e cinco meses. Sabemos mais: há embaixadas que funcionam, hoje, sem qualquer funcionário que
consiga emitir atos que envolvam portugueses. Ontem, no Congo, foram detidos portugueses porque, não tendo
documentos válidos, não conseguiram obter as respetivas autorizações de residência.
Perante isto, que soluções? É isto que nos importa saber! Gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse,
exatamente, como é que o novo modelo de gestão consular vai em concreto responder às necessidades destes
portugueses — e não só — que necessitam de renovar documentos, de tratar dos mais variados tipos de
problemas.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, agradeço as questões
colocadas pelo Sr. Deputado José Cesário.
A minha resposta tem uma dupla dimensão. Em primeiro lugar, o Sr. Deputado queixa-se de que, no ano
passado, realizámos 50% dos atos consulares que tínhamos realizado nos anos anteriores. Tenho uma notícia
para dar ao Sr. Deputado: no ano passado, vivemos em pandemia; em muitos países, vigorou um confinamento
geral; em muitos países, os serviços públicos tiveram de ser fechados; em muitos consulados portugueses, o
atendimento ao público teve de ser suspenso. Diz o Sr. Deputado que só realizámos 20% das permanências
consulares no ano passado, comparando com anos anteriores. É claro, Sr. Deputado, em muitos países, a
circulação entre regiões esteve interdita; em muitos países, a circulação de pessoas esteve severamente
condicionada.
Portanto, não vou agora aqui falar como se não tivesse havido uma pandemia e como se nós não vivêssemos
em pandemia e tal não obrigasse a limitações muito severas no funcionamento dos serviços consulares, como
de todos os outros serviços públicos, portugueses ou de qualquer outro país.
Sobre o futuro? O futuro é aquele que está inscrito, aliás, no Plano de Recuperação e Resiliência, sendo um
dos seus projetos principais um novo modelo de gestão consular, com 14 milhões de euros alocados. A lógica
é sempre a da simplificação dos procedimentos. Passando a ter um único registo de inscrição consular, as
pessoas deixam de ter de contactar o consulado com as mudanças de residência. É a máquina do Estado que
as acompanha e não é a pessoa que, a cada momento, tem de comunicar à máquina do Estado onde está.
Aprovando coisas tão simples, como, por exemplo, uma portaria que eu próprio assinei há dias, que permite a
entrega pelo correio de cartões de cidadão, libertámos as pessoas da presença física em consulados na ordem
das muitas dezenas de milhares de atos por ano. Procedendo à desmaterialização do processo, permitimos que
as pessoas, a qualquer hora e a qualquer momento, possam pedir documentos e possam acompanhar depois,
subsequentemente, o processamento desse pedido.
Poderia continuar, não tivesse eu de guardar algum tempo para a próxima pergunta, que deve ser difícil.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Ainda da bancada do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo
Teixeira.
O Sr. Eduardo Teixeira (PSD): — Sr.ª Presidente, queria cumprimentar o Sr. Ministro e os Srs. Membros do
Governo.
Os tempos que vivemos, do ponto de vista global, são preocupantes e de exceção. Urge ter respostas prontas
aos constrangimentos, nesta luta pela sobrevivência coletiva, na saúde e na economia, para garantir o nosso
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futuro. Daí que hoje traga, a esta Câmara, o tema dos territórios transfronteiriços e dos efeitos nefastos na nossa
diplomacia económica, pelo encerramento ou condicionamento de fronteiras terrestres com o nosso único país
vizinho, Espanha, cujos efeitos têm sido muito difíceis para a nossa economia.
Mas é no comércio internacional que temos uma enorme preocupação, pois o défice de 2020, com o exterior,
engordou 2,8 mil milhões de euros, sendo a principal contração o colapso das nossas exportações, que
regrediram 18,6%, e as importações que ficaram apenas nos 12%. Não há memória de tamanho trambolhão e,
hoje, o ritmo de importações decresce menos do que as exportações. Não, não pode ser só pela pandemia a
justificação para tamanha regressão do tecido económico português fora de portas. Em especial, o trânsito de
mercadorias das nossas empresas e dos trabalhadores são reveladores dos enormes prejuízos causados.
Se só em apenas três meses de 2020 o encerramento das fronteiras provocou perdas de quase 100 milhões
de euros nos concelhos do Norte transfronteiriço e condicionou quase 25 000 trabalhadores, estes últimos dois
meses têm sido também muito drásticos. Não é compreensível manter fronteiras, como a de Vila Nova de
Cerveira, encerradas ou, como em Melgaço, Monção, Ponte da Barca e Madalena, a funcionarem duas ou três
horas por dia, quando as longas filas detetadas de espera, no trânsito de mercadorias, são de horas, tendo a
economia desta região centenas de milhares de horas efetivas perdidas que dificultam as nossas exportações,
bem como a vida das pessoas que trabalham fora, mas vivem em Portugal.
É preciso agilização, Sr. Ministro! Por isso, pergunto-lhe quando procederá à abertura, para os trabalhadores
e para a economia, das várias fronteiras, em especial a de Vila Nova de Cerveira, que se encontra encerrada,
ou a das condicionadas a poucas horas de abertura diária, como é o caso de tantas por esse País. Que medidas
prevê tomar para ultrapassar esta problemática e se estas passam pela compensação financeira a todos os
prejudicados?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Eduardo Teixeira (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Admite criar, com os nossos vizinhos, um cartão do trabalhador transfronteiriço, para criar maior agilização
nos pontos de controlo, evitando a burocracia que se tem verificado nas passagens?
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Eduardo Teixeira,
agradeço as suas observações e permita-me que comece também eu com uma observação.
Este é um debate setorial sobre o Ministério dos Negócios Estrangeiros e não sobre matérias da competência
do Ministério da Administração Interna. O Sr. Deputado sabe melhor do que eu que a gestão das fronteiras cabe
a quem tem a responsabilidade de gerir o território e não a quem tem a responsabilidade de gerir a relação
externa.
Como o Sr. Deputado já sabe, eu adoro falar sobre tudo e limito-me apenas a recordar-lhe que a intervenção,
neste debate, do seu Grupo Parlamentar começou com uma Sr.ª Deputada a criticar-me por eu não ter imposto
quarentena logo no início da pandemia. Portanto, entendam-se, harmonizem-se, articulem-se!
Protestos do Deputado do PSD Eduardo Teixeira.
Sobre a questão do saldo comercial, também tenho uma notícia para dar ao Sr. Deputado: no ano passado,
as viagens internacionais ficaram paradas, a aviação esteve parada, o turismo internacional foi reduzido a uma
expressão absolutamente residual. Se o Sr. Deputado quiser responder à pergunta «Qual é o fator principal que
explica a quebra das exportações, no ano passado, em Portugal», verificará que o primeiro e o segundo setores
mais importantes para as exportações portuguesas — a saber, o turismo e as viagens — sofreram uma queda
brutal, no ano passado.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Ministro.
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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sim, Sr.ª Presidente.
Portanto, é natural que essa quebra se tenha refletido nos valores globais. Por isso, aliás, é que devemos
ser muito cuidadosos no desconfinamento, para evitar outra lógica de para-arranca, porque isso contribuirá
novamente para que a economia não possa levantar-se.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — É agora a vez do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Para o efeito,
tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pisco.
O Sr. Paulo Pisco (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Secretários de Estado, nós vivemos um
tempo de pandemia, mas o PSD parece que ficou cristalizado no tempo, ainda em janeiro de 2020. Tal significa,
em primeiro lugar, que parece que está fora da realidade não só em relação às políticas para as comunidades,
que são, claramente, uma das nossas prioridades, mas também em relação a todas as outras matérias.
Sr. Ministro, Portugal assume a presidência do Conselho da União Europeia precisamente no momento de
viragem nas relações internacionais, o que é uma excelente oportunidade para, mais uma vez, podermos deixar
uma marca própria, como aconteceu nas presidências anteriores, com a Estratégia de Lisboa e também com o
Tratado de Lisboa. Podemos fazê-lo dando o nosso contributo para a reforma das organizações multilaterais e
para a convergência com os Estados Unidos, na defesa dos valores da democracia, dos direitos humanos e de
um mundo em que os autocratas já não podem fazer o que lhes apetece.
A União está mais assertiva na defesa dos valores, mais determinada a encontrar o seu lugar no mundo e
em fazer ouvir a sua voz. Por isso, é um excelente sinal a recente aprovação do novo mecanismo de sanções
por violação dos direitos humanos e da determinação em avançar para a reforma das organizações multilaterais,
a começar pelas Nações Unidas e pelas suas agências.
O mundo precisa de instituições multilaterais operantes para proteger as pessoas das guerras, das injustiças,
da pobreza, das doenças e da degradação ambiental. Precisa de um Conselho de Segurança com mais
membros, sem que o direito de veto esteja transformado num instrumento para eternizar conflitos dramáticos,
de que a Síria é um dos tristes exemplos.
Depois deste período de deriva e de distanciamento da Administração Trump, percebemos hoje melhor que,
sozinha, a União Europeia não tem capacidade para projetar os seus valores, precisando, para isso, de aliados
fortes. Esses aliados não são nem a China, nem a Rússia, nem a Índia, nem a Turquia, com quem temos outro
tipo de vínculos, porventura até bastante importantes, mas não aqueles que são constitutivos da nossa
identidade assente nos valores humanistas e na defesa das liberdades.
Sr. Ministro, até onde pode ir a União Europeia na defesa dos seus valores e na reforma das organizações
multilaterais? Estará à altura de ser um igual na relação com os Estados Unidos? Terá capacidade para procurar
o justo equilíbrio entre o diálogo, a cooperação e a necessidade de firmeza, quando os nossos interesses e
valores estão em jogo? Terá condições para enfrentar eficazmente desafios como o da ascensão da China ou
o das provocações da Rússia?
É precisamente neste contexto de transformação que o Eng.º António Guterres apresenta a sua candidatura
a um segundo mandato nas Nações Unidas, ele mesmo a expressão da nossa vocação universalista, como o
são as comunidades portuguesas no mundo — um dos nossos mais preciosos ativos — e o esforço muito
importante de expansão da nossa língua e cultura por todos os continentes, do ensino básico às universidades,
como, de resto, o Sr. Ministro também referiu.
Esta é, claramente, uma candidatura que une o País, que nos enche de orgulho e que dá, mais uma vez, a
oportunidade à nossa diplomacia para mostrar a sua desenvoltura.
De todas as vezes que se apresentou a um lugar nas Nações Unidas, António Guterres conquistou-o por
mérito próprio, pelo seu humanismo inquebrável e pela sua experiência política ao serviço dos povos.
António Guterres tem sido perentório na defesa das vacinas como um bem público global, acessível e
económico para todos, em todo o lado, e não como alguns países têm feito, utilizando-as como um instrumento
perverso da geopolítica, para troca de favores ou ganhos de influência.
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A verdade é que, um ano após ser declarado o estado de pandemia, houve uma verdadeira solidariedade
europeia e um progresso extraordinário no combate ao vírus, com um investimento sem precedentes para
acelerar a criação de uma vacina e fazer a sua distribuição equitativa pelos Estados-Membros. Mas persistem
muitos desafios, como a necessidade de fazer chegar as vacinas o mais rapidamente possível a todos, tanto
aos europeus, como aos países com menos recursos, designadamente através da plataforma Covax.
É preciso derrotar as novas variantes do vírus e garantir que não haverá exclusões ou discriminações com o
passaporte vacinal ou com o certificado de imunidade.
Este é um dos domínios em que a solidariedade europeia tem de ser global, tal como fica demonstrada a
nossa solidariedade para com os países irmãos de expressão portuguesa, que irão receber 5% das nossas
vacinas, como anunciou o Sr. Primeiro-Ministro.
Sr. Ministro, que possibilidades tem António Guterres de ser reeleito para um segundo mandato? Quais os
desafios mais prementes que o combate à pandemia nos coloca? Em que moldes vai Portugal ceder os 5% das
vacinas aos países de expressão portuguesa?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, formalizámos a
apresentação da candidatura do Eng.º António Guterres, atual Secretário-Geral das Nações Unidas, a um novo
mandato e não antecipamos nenhuma dificuldade nessa reeleição por três razões fundamentais.
Em primeiro lugar, porque António Guterres deu, ao longo do mandato que exerceu, suficiente prova da sua
capacidade de gerir uma organização baseada no multilateralismo, portanto baseada no consenso, nas
aproximações, no sentido de compromisso, no sentido de integração de regiões, de países, de valores e de
interesses, os mais diferentes e, aparentemente, às vezes, incompatíveis entre si.
Em segundo lugar, porque António Guterres — como, aliás, tinha prometido na sua candidatura em 2016 —
trouxe uma agenda reformista para as Nações Unidas, quer em relação ao Conselho de Segurança, quer em
relação à arquitetura de paz e segurança, quer em relação ao sistema para o desenvolvimento, quer em relação
à promoção da igualdade de género em todos os postos das Nações Unidas.
Em terceiro lugar, porque António Guterres soube ser o que um Secretário-Geral das Nações Unidas tem de
ser, que é ter uma consciência moral da humanidade, mas, ao mesmo tempo, ser capaz de identificar com
precisão quais são as questões que a humanidade enfrenta como tal, para as quais é preciso o concurso de
todos. Guterres foi absolutamente inequívoco na identificação do desafio climático, do desafio ambiental, como
essa questão existencial que a humanidade enfrenta e que é essencial ultrapassar, para assegurar a
sobrevivência da humanidade, e que a humanidade só pode enfrentar em conjunto.
Portanto, as nossas expectativas são as melhores. De uma coisa estamos certos: António Guterres merece
o novo mandato e será um excelente Secretário-Geral no segundo mandato, como o foi no primeiro.
Em relação à intervenção das Nações Unidas e ao papel da Europa como ator global — como gostamos de
dizer nesse elã —, queria referir o quão importante é a agenda reformista em todas as grandes organizações
das Nações Unidas.
Vou dar só um exemplo, porque não tenho tempo para abordar outros, que é o da Organização Mundial do
Comércio. Começo, talvez, de uma maneira que será inesperada para alguns Srs. Deputados, que é por
identificar onde o Presidente Donald Trump tinha razão.
O Presidente Donald Trump tinha razão na identificação do problema de a China, depois da sua adesão à
Organização Mundial do Comércio enquanto país em desenvolvimento, se ter tornado, entretanto, na segunda
maior economia do mundo, mas querer ser tratada e continuar a ser tratada, no âmbito da Organização Mundial
do Comércio, como se fosse, ainda, uma economia em desenvolvimento.
Esta adaptação tem de se fazer, mas não se pode fazer à maneira do Presidente Trump, que foi bloquear a
instância de recurso, bloquear as instâncias de apelo, bloquear o funcionamento da organização e, no fim, até
bloquear a escolha da sua nova diretora-geral.
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Felizmente, os sinais e os atos da Administração Biden têm sido no sentido contrário. Com Biden na Casa
Branca, foi imediatamente possível desbloquear a escolha da nova diretora-geral, que é, aliás, uma cidadã de
dupla nacionalidade, nigeriana e americana, e esperamos poder trabalhar com os Estados Unidos, tendo em
conta a próxima conferência ministerial, provavelmente no fim deste ano, nesta agenda da reforma da
Organização Mundial do Comércio.
Como União Europeia, prezamos a transparência, portanto, em anexo à comunicação sobre a revisão da
política comercial, lá vem a agenda da União Europeia para a reforma da OMC. Na reunião a que presidi ontem,
entre os ministros do comércio, essa agenda da Comissão foi amplamente acolhida.
Sr. Deputado Paulo Pisco, devemos ter sempre a consciência de que foi feito um caminho para chegar às
posições que Portugal hoje ocupa no sistema das Nações Unidas. Não teria sido possível o tipo de posições
que hoje ocupamos sem o belíssimo trabalho feito pelo Prof. Diogo Freitas do Amaral, o saudoso Diogo Freitas
do Amaral, como Presidente da Assembleia Geral das Nações Unidas; sem o trabalho do Dr. Jorge Sampaio,
como enviado especial do Secretário-Geral das Nações Unidas, primeiro, para a Aliança das Civilizações, e,
depois, para a Luta contra a Tuberculose; sem o trabalho de vários altos funcionários, que fazem hoje com que,
nas Nações Unidas, deixando Guterres, deixando Vitorino, tenhamos uma das vice-presidentes do Banco
Mundial, que seja português o coordenador da elaboração do Índice de Desenvolvimento Humano, que seja
português o police adviser para as missões de paz das Nações Unidas, que estejam portugueses em tão
destacados lugares no Programa Alimentar Mundial, que seja português o subsecretário-geral para assuntos
jurídicos, e por aí fora. É esta constelação que é importante para nós.
Dada a nossa história, dada a nossa vocação, dado o facto de sermos um Estado de dimensão média, é
muito importante, para nós, não só o multilateralismo, como, ao mesmo tempo, a capacidade de construir pontes
e a consciência de que os problemas coletivos da humanidade se resolvem melhor por via da concertação do
que por via da confrontação.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para dirigir, também, uma pergunta ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr.
Deputado Carlos Brás, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Carlos Brás (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
Ministro, em primeiro lugar, queria dirigir uma saudação ao Governo, na pessoa de V. Ex.ª, pelo agendamento
da Cimeira União Europeia-Índia para o próximo dia 7 de maio, ainda por cima numa localização tão feliz como
é a cidade do Porto.
Sabemos que as democracias não se medem aos palmos, mas, de facto, quer a União Europeia, quer a Índia
são os dois maiores blocos democráticos do mundo. Ainda por cima, a Índia é uma potência económica em
crescimento e há estudos que indicam que, brevemente, até 2050, será a segunda economia mais forte do
mundo, logo a seguir à da China.
Portanto, esta cimeira reveste-se de particular importância.
Mas queria introduzir uma outra questão, que tem a ver com o peso do comércio na economia europeia, para
dar oportunidade ao Sr. Ministro de nos clarificar um pouco a nova linha de orientação da política comercial
europeia que foi difundida na semana passada. Sabemos que a pandemia tem sido um catalisador nesta matéria
e que se tem acelerado a busca de novas parcerias comerciais. Sr. Ministro, peço, então, que clarifique qual é
o ponto de situação relativamente à reforma da Organização Mundial do Comércio e aos acordos multilaterais
que estão a ser firmados.
Queria, ainda, que nos clarificasse o que significa esta dinâmica de procura de uma política comercial mais
aberta, sustentável e assertiva, sobretudo que nos clarificasse este último adjetivo — «assertiva».
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, começo mesmo
por responder à sua pergunta, sobre o que significa o adjetivo «assertivo», com um exemplo prático: já sob a
Presidência portuguesa, no mês passado, concluímos a aprovação de um instrumento — cujo nome é muito
difícil de traduzir em português —, o Enforcement, portanto, pôr em vigor, pôr em execução. É um instrumento
comercial de que a União Europeia se dota exatamente para exercer os seus direitos quando a outra parte num
acordo bilateral se recusa a seguir para a arbitragem ou, no caso de um acordo multilateral, a arbitragem não
se fazer por paralisia da instância de recurso da OMC.
É apenas um exemplo, podia dar outros. A designação antepassada do Chief Trade Enforcement Officer, por
parte da União Europeia, inscreve-se na mesma linha.
O objetivo é ser mais firme na defesa dos nossos interesses, porque um dos nossos interesses também é o
de controlar melhor as cadeias de produção e de abastecimento de bens que são críticos para nós.
Há duas maneiras de fazer isso: uma maneira é pensarmos que ainda estamos no século XVII e que lidamos
com as correntes mercantilistas; a outra maneira é percebermos que estamos no século XXI e que a União
Europeia é o primeiro parceiro comercial mundial em matéria de bens, é o primeiro em matéria de serviços e é
o primeiro investidor mundial.
Portanto, autonomia, sim, mas ela tem de ser aberta pela diversificação das fontes de fornecimento. É nesse
âmbito que entra a necessidade evidente, para a Presidência portuguesa, de concluir os processos negociais
que estão em curso, quer com o Mercosul, quer com o México, e acelerar com o Chile, com a Nova Zelândia e
com a Austrália.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Oliveira, do Grupo Parlamentar
do PS, para colocar questões ao Sr. Ministro.
O Sr. Francisco Pereira Oliveira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as Secretárias de Estado, Srs.
Secretários de Estado, vou ser muito breve.
Trata-se de uma situação preocupante que tem a ver com as questões dos países do sul, nomeadamente do
Norte de África, incluindo o Magrebe. Sabemos das dificuldades económicas desses países, que foram
agravadas pela pandemia, sendo que a situação de muitos cidadãos destes países é bastante difícil. Se na
Europa se enfrenta uma crise tremenda, nestes países, então, a crise é bastante mais dramática.
Um dos setores que mais tem sofrido com esta pandemia — e o Sr. Ministro há pouco referiu-o — é o do
turismo, que é forte nessa zona, situação que tem atirado para o desemprego muitos cidadãos.
Tudo isto para dizer que as questões referentes às migrações agravar-se-ão em virtude da necessidade de
essas pessoas procurarem melhores condições de vida noutros países, nomeadamente na Europa.
No verão, é evidente o aumento das migrações com origem nesses países do Norte de África e a questão é
se irão agudizar-se os problemas humanitários já existentes, havendo tendência de muitos países limitarem a
entrada dos migrantes.
Neste sentido, a questão que lhe coloco é a de saber que caminhos irá a Presidência portuguesa do Conselho
da União Europeia seguir no sentido de obstar ao agravamento das questões humanitárias que poderão ocorrer.
Sr. Ministro, tinha mais outra questão, mas deixo-a para o meu colega colocar depois.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, tem toda a razão.
Por isso mesmo, uma das inovações da Presidência portuguesa é convocar uma reunião conjunta de Ministros
da Administração Interna e Ministros dos Negócios Estrangeiros para endereçar e enfrentar a questão da
dimensão externa das migrações. A mesma realizar-se-á no próximo dia 15 de março e eu terei todo o gosto
em reportar os seus resultados à Assembleia.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para formular as suas perguntas, o Sr. Deputado Paulo
Porto, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Paulo Porto (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro,
o Governo da Venezuela acaba de expulsar a Embaixadora da União Europeia em Caracas em virtude das
posições assumidas em defesa da democracia, do Estado de direito e contra a degradação económica e social
que tanto tem afetado os venezuelanos e, claro, toda a importante comunidade portuguesa residente na
Venezuela.
Diante deste quadro, pergunto de que forma é que Portugal, que conhece bem a Venezuela e que nunca
fechou as portas ao diálogo com o Governo venezuelano, pode contribuir para que a resolução dessa tensão
entre a União Europeia e a Venezuela possa ter uma boa solução.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, agradeço a pergunta colocada
pelo Sr. Deputado.
Julgo, do pouco que tenho aprendido com a diplomacia, que é mesmo altura de utilizar dois verbos que são
um bocadinho estranhos à língua portuguesa, mas que podem utilizar-se sem nenhum gramático «dar pulos».
São os verbos «reciprocar» e «desescalar».
A Embaixadora Isabel Pedrosa foi declarada persona non grata. A União Europeia não podia senão
«reciprocar» e, portanto, a Embaixadora da Venezuela junto da União Europeia foi declarada persona non grata.
Feito esse ajuste, agora é altura de «desescalar», isto é, é altura de conter, é altura de não prosseguir. Isto
porque — e o Sr. Deputado certamente reparou — o único comentário público que fiz em relação à decisão do
Governo venezuelano foi dizer que a lamentava porque agravava o isolamento internacional da Venezuela e,
para resolver a crise que se vive na Venezuela, o agravamento do isolamento internacional daquele país é má
solução.
A União Europeia não é adversária de ninguém na Venezuela e quer ser parceira dos venezuelanos a
encontrar soluções para a crise humanitária, económica e social que lá se vive. Ora, essas soluções só podem
existir se resolvermos a crise política.
A Venezuela não tem problemas de recursos.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Concluo, Sr.ª Presidente.
A Venezuela é um dos países mais ricos do mundo em recursos naturais, é dos países da América Latina
mais dotados em capital humano e é um país com um quadro institucional tradicionalmente muito forte. Tem um
problema político, tem de resolver esse problema político e o que nós pudermos fazer para ajudar a resolvê-lo
fá-lo-emos.
Porque é que esse é o nosso interesse? Porque neste momento há um milhão de cidadãos que vivem na
Venezuela e que têm também cidadania europeia.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos agora ao tempo do Bloco de Esquerda, pelo que tem a
palavra a Sr.ª Deputada Alexandra Vieira para formular perguntas.
A Sr.ª Alexandra Vieira (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
Ministro, há dias foi tornado público o relatório da Amnistia Internacional sobre a situação grave, do ponto de
vista dos direitos humanos, que se vive na província moçambicana de Cabo Delgado, localizada no norte do
país.
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Conhecida também como o «Cabo Esquecido», a região carece de infraestruturas e, sem a presença do
Estado, as populações sobrevivem como podem. Moçambique é dos países mais pobres do mundo e Cabo
Delgado a sua província mais carente.
Desde há muito que as organizações não-governamentais para o desenvolvimento (ONGD) têm vindo a
desenvolver ações na região. Aldeias, casas, escolas, igrejas, mesquitas, centros médicos, distribuição de
alfaias agrícolas, sementes e formação em técnicas agrícolas, entre outras atividades, foram sendo
implementadas na região. Segundo o último relatório da UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância),
de há uns anos, os níveis de pobreza e de escolaridade tinham vindo a aumentar substancialmente.
No entanto, desde 2017 que um grupo de insurgentes, forças mercenárias e o Exército moçambicano se
digladiam num conflito sem fim à vista, com quase 2000 mortos, mais de 500 mil pessoas deslocadas, das quais
250 mil são crianças.
Este drama ocorre num remoto canto do mundo que de pobre nada tem: as maiores jazidas de gás natural
situam-se a norte da província. As multinacionais preparam já a sua exploração e extração para a qual não
podem contar com os trabalhadores locais por não terem as qualificações necessárias.
Se a História não se repete, poderemos dizer o mesmo dos erros? Tudo indica que não. Riquezas naturais
valiosas para o mundo desenvolvido são cobiçadas vorazmente, sem que nada seja devolvido às populações
locais, sobretudo aos mais jovens, desesperançados numa vida melhor. Não há investimentos sociais e em
infraestruturas, a corrupção abunda, a riqueza concentra-se nas elites locais ligadas ao poder central e o
descontentamento em relação ao Governo é crescente.
Podemos ainda dizer que é surpreendente que os jovens adiram aos radicalismos religiosos que se estão a
implantar na região a partir da Tanzânia? A resposta é «não»!
Os ataques continuam neste momento. Pessoas morrem, vivem no desespero e na violência. A piorar a
situação, o Bloco de Esquerda sabe que a ajuda humanitária que consegue chegar aos acampamentos, em
Pemba, a capital, não está organizada. Ninguém sabe quem distribui nem quem recebe e o mercado negro
floresce. É a descoordenação total e o Governo moçambicano também não está a ser capaz de resolver.
O Sr. Ministro está incumbido de liderar a missão da União Europeia em Moçambique. Sendo a formação
militar do Exército moçambicano importante, não resolve a questão da crise humanitária.
Perante a circunstância histórica de Portugal presidir ao Conselho Europeu, está disponível para diligenciar
e liderar os esforços multilaterais com vista a contribuir para a resolução das razões estruturais que estão na
origem do conflito, começando por garantir que a ajuda humanitária chega às pessoas de Cabo Delgado?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, permita-me que
comece por delimitar o espaço da minha resposta de duas maneiras.
Em primeiro lugar, lembrando que reuni à porta fechada com a Comissão de Negócios Estrangeiros e
Comunidades Portuguesas, no passado dia 17 de fevereiro, exatamente para podermos, em conjunto, abordar
todos os temas que naturalmente não podem ser abordados senão com reserva.
Em segundo lugar, do mesmo modo que eu não gostaria que no Parlamento em Maputo, na Assembleia
Nacional, a minha colega Ministra dos Negócios Estrangeiros participasse num debate em que os Srs.
Deputados se referissem ao Governo português nos termos em que, legitimamente, a Sr.ª Deputada se referiu,
não irei entrar por esse tipo de considerações.
Portanto, vou centrar-me num dos pontos que a Sr.ª Deputada mencionou e em que tem toda a razão, que
é o da importância de ter uma resposta que não seja exclusivamente securitária aos problemas vividos em Cabo
Delgado.
Os problemas vividos em Cabo Delgado não se equivalem. Não se trata de uma digladiação entre forças
insurgentes, terroristas ou como lhes quiser chamar e as forças governamentais. É mesmo uma rede terrorista
internacional que invade populações, viola mulheres, decapita pessoas e força à fuga de populações inteiras. É
disso que estamos a falar.
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É evidente que a solução mais sustentável é aquela que procura criar condições para que a população de
Cabo Delgado possa aproveitar os benefícios das enormes riquezas que tem não só em gás como também em
madeiras preciosas e minérios, entre outras.
Por isso, chamo a atenção para a importância da dimensão de apoio ao desenvolvimento na resposta
europeia e na participação liderante de Portugal nessa resposta.
Nós geriremos, através da nossa cooperação portuguesa, isto é, através do Instituto Camões, o projeto
+Emprego, que se iniciará agora e cujo público-alvo são mais de 1200 pessoas. Que pessoas são essas? São
os jovens. O que é que queremos fazer com elas? Garantir-lhes formação profissional. Para quê? Para terem,
justamente, as qualificações profissionais indispensáveis para que não só as empresas possam aproveitar as
riquezas naturais, criando riqueza para a população, como também haja oportunidades de emprego e de trajetos
de vida positivos para as jovens gerações dessa região.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Beatriz Gomes Dias, do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda, para formular perguntas.
A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
Ministro, a situação nos campos de refugiados continua dramática. A crise humanitária mantém-se inalterada.
Uma mulher afegã, grávida, que vivia no campo de Lesbos, tentou suicidar-se quando soube que não podia
viajar para a Alemanha para dar à luz. Esta situação revela a aflição e a angústia de quem vive há vários meses
nestes centros de detenção sobrelotados, insalubres, onde faltam alimentos e assistência médica.
As organizações governamentais têm chamado a atenção das instituições europeias para a falta de
condições básicas no novo campo de Lesbos, erguido como uma solução temporária para acolher os
desalojados de Moria.
A International Rescue Committee (IRC) destaca a crise de saúde mental que se instalou devido ao
confinamento imposto pela pandemia. Um relatório publicado por esta organização revela que uma em cada
três pessoas a sobreviver nestes locais já considerou o suicídio.
Esta situação não é nova, já foi reportada várias vezes e é incompreensível que a União Europeia ainda não
tenha uma solução definitiva para estas pessoas. Uma resposta humanitária terá de passar pela alteração
profunda deste modelo iníquo de acolhimento. Uma medida essencial será a da evacuação das pessoas das
ilhas para o território continental grego, dando prioridade aos mais vulneráveis, incluindo as mulheres grávidas.
Irá o Governo, no âmbito da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, apoiar esta solução?
Dadas as condições em que as pessoas vivem nos campos de refugiados, queremos saber quais são as
medidas que têm sido implementadas para o controlo e prevenção da pandemia da COVID-19 e queremos saber
o ponto de situação sobre o plano de vacinação nos campos de refugiados.
A ONU estima que 250 milhões de pessoas, em 2050, serão severamente afetadas pelas alterações
climáticas, ficando a sua existência em perigo e afetando seriamente a sua condição de vida.
Numa recente deliberação do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, este Conselho defendeu
que quem foge por efeitos das alterações climáticas não pode ser obrigado a voltar, tendo de ser acolhido. Esta
importante decisão abre a possibilidade de pessoas afetadas pelo clima receberem proteção internacional.
Consideramos este reconhecimento do refugiado climático uma medida fundamental e entendemos que esta
medida deve ser tida como parte integrante de uma resposta climática justa, solidária e humanista, sendo que
integrámos esta medida na proposta de Lei de Bases do Clima que apresentámos.
Tendo em conta que o Primeiro-Ministro anunciou o apoio do Governo à candidatura de António Guterres ao
cargo de Secretário-Geral das Nações Unidas e face às informações que o Sr. Ministro deu hoje quanto à
formulação desta candidatura, queremos saber se o Estado português vai acompanhar esta decisão da ONU, e
a proposta do Bloco de Esquerda, e reconhecer o estatuto de refugiado climático a pessoas que se vejam
forçadas a sair do seu território em resultado de uma situação de emergência climática. Irá Portugal declarar-se
país de acolhimento de refugiados climáticos?
A minha última pergunta tem a ver com o relatório da CIA (Agência Central de Inteligência) que foi divulgado
pela Administração Biden sobre o assassinato de Jamal Khashoggi. Este relatório, amplamente citado nos meios
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de comunicação social e cuja autenticidade não foi negada, confirma o envolvimento do príncipe herdeiro da
Arábia Saudita no hediondo homicídio do jornalista.
Pergunto-lhe: perante esta nova informação e tendo Portugal a Presidência da União Europeia, o que irá o
Sr. Ministro fazer? Irá pedir responsabilidades ou deixar que os assassinos e responsáveis permaneçam
impunes?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, agradeço as questões
colocadas pela Sr.ª Deputada Beatriz Gomes Dias e, começando pela última, registo que aceita — e é normal
e é bom que aceite — que haja relatórios da CIA que têm informação credível e que podem ser úteis para a
nossa ação.
Devo dizer que a União Europeia reagiu, mas não agora; reagiu quando ocorreu o assassinato do jornalista
Khashoggi, se não me falha o apelido, mas a Sr.ª Deputada sabe a quem me refiro, exigindo um inquérito,
acompanhando um inquérito internacional das Nações Unidas, valorizando e apoiando a relatora desse inquérito
e tomando as medidas que — e não vale a pena recordá-las outra vez — as democracias tomam em matéria de
relações internacionais.
Devo dizer que o conceito de refugiado climático faz sentido, porque o que acontece com os refugiados, o
que os distingue dos migrantes e os torna beneficiários do direito internacional humanitário, e, portanto, há uma
obrigação não só moral como legal de os acolher e defender, é o facto de um refugiado ser alguém que teve de
abandonar o seu país ou região de origem porque a sua vida corria perigo nesse país e, assim, ao contrário do
que sucede com migrantes, não podemos exigir a refugiados o retorno, mas devemos acolhê-los em sede de
direito internacional humanitário.
Ora, isso pode acontecer porque decorre uma guerra civil ou internacional nesse país, porque há
perseguições étnicas nesse país, porque há conflitos armados, porque há violações grosseiras da dignidade
humana, mas também pode acontecer porque há seca, há fome, há consequências das alterações climáticas e,
portanto, o refugiado climático não deixa de ser um «refugiável». Aliás, não há ninguém que o possa
compreender melhor do que António Guterres, que foi, justamente, durante 10 anos, o Alto Comissário das
Nações Unidas para os Refugiados que se destacou pelo empenhamento pessoal, pela independência e pela
bravura que pôs no exercício das suas funções.
Aproveito a oportunidade, porque há pouco não tive tempo para responder ao Deputado Nelson Peralta, para
dizer que é preciso intervir a montante para que as alterações climáticas possam ser controladas e a única coisa
que queria dizer é que temos de agir efetivamente.
Posições que, por vezes, podem parecer bondosas podem ser contraproducentes por causa do seu
maximalismo. Já foi tão difícil chegar a acordo entre os Estados-Membros da União Europeia para a meta dos
55% de redução das emissões de gás no horizonte de 2030 que se agora pusermos esse consenso em questão,
porque queremos, à viva força, passar para os 60%, podemos estar involuntariamente a fazer o jogo daqueles
que não querem metas nenhumas.
Portanto, como em qualquer atividade política, temos de combinar as condições finais do que queremos
atingir com as condições instrumentais do que é preciso fazer para atingir o que queremos.
Em relação à primeira questão da Sr.ª Deputada, que é muito importante, como, aliás, todas as que a Sr.ª
Deputada habitualmente coloca, quero dizer-lhe que no âmbito da Presidência portuguesa da União Europeia,
em que temos, entre outras, a presidência do Conselho de Ministros da Administração Interna, o que estamos
a fazer, o que o Ministro Eduardo Cabrita fez desde a primeira hora, é não ter medo de colocar o dossier mais
difícil desta Presidência, que a presidência alemã contornou sem sequer beliscar a prioridade n.º 1 da nossa
Presidência.
Estou a falar do novo pacto para as migrações e o asilo nas três dimensões que o comportam: a dimensão
do chamado equilíbrio entre responsabilidade e solidariedade no acolhimento de migrantes e no tratamento de
requerentes de asilo; a dimensão externa, a que já me referi em resposta anterior; e a dimensão relativa à gestão
das fronteiras, que tem de ser, ao mesmo tempo, conduzida por uma preocupação de segurança, mas também
por uma preocupação humanista.
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Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado
Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Cumprimento o Sr. Ministro e os Srs.
Secretários de Estado e das quatro questões que pretendo colocar ao Sr. Ministro, na primeira, vou retomar o
tema das vacinas.
O Sr. Ministro, há pouco, foi taxativo ao dizer que Portugal não vai adquirir vacinas fora do processo do
chamado procurement europeu, mas há poucas semanas, aqui, na Assembleia da República, o Sr. Ministro
afirmou que iriam ser, de forma complementar e sucessiva, adquiridas outras vacinas para diversificar o
fornecimento a Portugal.
Pergunto: em que é que ficamos? Não vai, de facto, haver essa diversificação que tanta falta faz ao nosso
País? Onde é que fica, então, essa afirmação que o senhor fez recentemente?
Por outro lado, o Sr. Ministro também afirmou que a Agência Europeia de Medicamentos vai aprovando as
vacinas sem interferência política. Isto, só por si, é verdade, mas há mais para contar e ainda ontem tivemos
esta discussão com a Sr.ª Secretária de Estado.
Então, a questão é que a Agência Europeia de Medicamentos não é, na Europa, a única entidade que tem
essa competência. Sr. Ministro, pergunto-lhe se tem razões para não confiar no Infarmed (Autoridade Nacional
do Medicamento e Produtos de Saúde), que, nos termos da lei, tem competências próprias. Qual é o regime de
reconhecimento que se vai aplicar em Portugal às vacinas reconhecidas no quadro da OMS e às pessoas
vacinadas com elas? O que é que está previsto nesse aspeto?
Quanto à questão da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, como o Sr. Ministro sabe, o
PCP tem vindo a sublinhar a importância de que esta presidência constitua uma oportunidade para colocar na
agenda da União Europeia a necessidade de questionamento do rumo e das políticas que esta impõe aos pobres
e que estão na origem das desigualdades sociais e das assimetrias de desenvolvimento que a percorrem.
Mas, pelo contrário, o que verificamos é uma perspetiva de novas etapas e novas roupagens para as mesmas
opções e a mesma política: subserviência face às grandes potências, submissão e favorecimento de interesses
e do poder económico das multinacionais; aprofundamento das desigualdades e da exploração.
É inaceitável que sejam estas as marcas essenciais das opções seguidas. Mesmo que apresentadas no meio
de proclamações e de intenções declaradas, mesmo quando se fala no chamado pilar dos direitos sociais,
mesmo quando se prepara a designada Cimeira Social, que é indispensável, é assumido claramente que o
nivelamento não pode ser no retrocesso.
Ao assumir referências comuns e ao definir uma fasquia para os diferentes países, o que é preciso é convergir
no progresso social e não baixar a fasquia, o que é preciso é romper com a precariedade, a exploração, a
destruição de direitos, romper com estas políticas, erradicá-las e não legalizar, regulamentar e normalizar essas
pragas.
A questão das chamadas plataformas eletrónicas é um exemplo particularmente claro e atual desta matéria,
mas está longe de ser o único. Daí que seja importante abordar a responsabilidade da Presidência portuguesa,
desde logo, de não contribuir para uma opção que, na verdade, seja nivelar por baixo.
Ainda no que respeita à Presidência portuguesa, Sr. Ministro, queremos retomar uma questão que já
colocámos ao Governo na Comissão. Falamos do posicionamento e da intervenção da Presidência portuguesa
sobre a situação da Palestina e do seu povo.
Sr. Ministro, preconizar nas palavras uma solução de dois estados e nem sequer reconhecer um deles, que
é o Estado da Palestina, manter uma relação profundamente desigual no plano político, jurídico, institucional e
até de acesso a recursos financeiros, deixar passar o tempo assistindo à sistemática violação do direito
internacional por parte da potência ocupante e anunciar na Assembleia da República que, conforme o desfecho
das eleições deste ano, poderemos convocar ao Conselho os acordos de associação e rever algumas dessas
cláusulas, este, Sr. Ministro, não é o papel que deve ter Portugal e a Presidência portuguesa.
Esse alinhamento estratégico, que aqui defendeu, com os Estados Unidos da América, desde logo, neste
domínio, significa, objetivamente, uma cumplicidade com uma ocupação criminosa. É que, enquanto a Casa
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Branca mantém a embaixada em Jerusalém e todo o apoio à potência ocupante, essa mesma potência
ocupante, Israel, mantém centenas de presos políticos palestinos. Ainda nesta semana condenou a mais dois
anos de prisão a deputada do parlamento palestiniano, Khalida Jarrar, e há um ensurdecedor silêncio da União
Europeia e também do Governo português a este respeito. Daí que tenhamos, forçosamente, de colocar a
questão neste debate.
Para terminar, Sr. Ministro, uma questão sobre o pacto de estabilidade e o anúncio recente da Comissão
Europeia de recomendar a continuidade da suspensão dessas regras no próximo ano, fazendo-as regressar no
ano seguinte, no ano 2023.
Ora, se manter a suspensão destas regras é uma opção que não surpreende ninguém, já a perspetiva do
regresso no final do ano desse brutal fator de constrangimento para a nossa recuperação, desenvolvimento e
soberania económica é um objetivo que não podemos deixar de repudiar.
Sr. Ministro, é uma evidência que os países não estão a recuperar e a responder à crise pandémica todos
ao mesmo tempo e da mesma forma. Nesse sentido, importa, naturalmente, assumir uma posição, quer por
parte do Estado português, quer por parte da Presidência portuguesa, que coloque, de facto, a necessidade de
não termos, mais uma vez, um espartilho ao nosso desenvolvimento e mesmo ao investimento que nos é
requerido para os próximos anos e sem o qual os próprios fundos da bazuca, que não era bazuca nenhuma,
acabam por não ser elegíveis ou acessíveis.
Portanto, esse investimento, esse desenvolvimento e essa soberania carecem, de facto, de um
questionamento frontal relativamente a estas regras quer do tratado orçamental, quer do pacto de estabilidade
e é sobre essa matéria que o questionamos.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, muito
obrigado pelas suas questões.
Começo, se me permite, pela última pergunta, dizendo-lhe que a Comissão Europeia propôs hoje que a
suspensão das cláusulas dos chamados critérios de Maastricht, que vigora em 2021, fosse prorrogada até 2022.
É uma excelente decisão, do nosso ponto de vista, é uma decisão oportuna, que nos dá tempo para ver como
é que vai evoluir a economia europeia, para ver como é que vai evoluir a situação sanitária que Europa enfrenta
e para ver como vão evoluir as contas públicas na Europa.
Evidentemente que temos compromissos comuns, porque fazemos parte de uma única zona monetária,
pertencemos à zona euro, portanto, há certas regras de disciplina orçamental que têm de ser comuns e é
evidente também que a regra n.º 1 da política orçamental é mesmo a natureza contracíclica dessa política.
Portanto, quando vivemos períodos de crise não podemos exigir à política orçamental que esteja em contraciclo
e esse é o erro capital dos programas de austeridade.
Vamos aguardar, temos tempo, damos a nós próprios mais uma moratória absolutamente essencial e que
nos permitirá preparar com cuidado e, certamente, com a colaboração da sua bancada o Orçamento do Estado
para 2022 de que a economia portuguesa necessita.
Se me permitir, passo agora à questão da autorização das vacinas, sobre a qual tenho sempre de fazer esta
chamada de atenção: quando dizemos que as instâncias europeias decidem não quer dizer que seja uma
realidade à qual sejamos exteriores. São instâncias em que nós próprios participamos. O facto de não ser o
Infarmed, o «Infarmed» espanhol, o «Infarmed» luxemburguês, o «Infarmed» italiano, o «Infarmed» lituano, o
«Infarmed» grego e o «Infarmed» checo que, um a um, averiguam a qualidade técnica das vacinas, fazem os
testes indispensáveis e decretam ou não a sua autorização, dá uma economia de escala, um ganho de tempo,
um ganho de eficácia brutal.
É por isso que a Agência Europeia de Medicamentos o faz, mas com a nossa participação, com o nosso
controlo, com o nosso engajamento, como diria um falante da variante brasileira, e não nas nossas costas,
contra nós ou contra os nossos interesses.
Portanto, tenha o Sr. Deputado a certeza de que os únicos critérios que valem na ponderação que faz a
Agência Europeia de Medicamentos seriam os únicos critérios que valeriam se a ponderação fosse feita pelo
Infarmed português, mas com perdas de eficiência, de tempo, de economia e de custos que me parecem
evidentes.
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Na formulação da sua primeira pergunta, parecia eu nas respostas. Conhecemo-nos há muito tempo e houve
ali um jogo de palavras que não é sua característica, é mais característica minha. Evidentemente, quando o Sr.
Deputado João Oliveira perguntava porque é que nós não compramos vacinas — vejam o esforço que faço,
durante toda esta Sessão, para não dizer «vácinas», como na minha terra.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas pode dizer!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Eu adequo-me!
Quando o Sr. Deputado João Oliveira perguntava, há pouco, porque é que Portugal não está a comprar
outras «vácinas», evidentemente que o pressuposto da pergunta é porque é que não estão a comprar agora.
Quando terminar o processo de aquisição europeu, quando os 38 milhões de doses a que Portugal tem direito
chegarem a Portugal, se for necessário um outro esforço, por haver variantes que, entretanto, se desenvolveram,
por haver a necessidade — não sei! — de tornar o processo de vacinação um processo regular, a questão
colocar-se-á.
Portanto, tenho razão quando digo que não há nenhum impedimento a que, sucessivamente, se utilizem
outros processos que sejam, outra vez, europeus — espero eu, que sou um europeísta —, mas, evidentemente,
quando os Srs. Deputados perguntam porque não estamos a comprar novas vacinas, embora não digam o
«agora», só é possível perceber que é de agora que se trata.
Vamos então à questão da Palestina. Sr. Deputado, como sabe, a política externa da União Europeia é
assumida pelo Alto Representante, sob o nosso mandato. Neste momento, estamos numa época em que há um
elemento positivo, que é a mudança da Administração norte-americana e da sua política em relação à Palestina
e a Israel, mas há, também, um momento de alguma expectativa, visto que decorre um processo eleitoral em
Israel, com eleições em fim de março, e decorre um processo eleitoral na Palestina, com eleições sucessivas,
julgo que, primeiro, presidenciais e, depois, legislativas, na primavera e no verão. Portanto, temos, se queremos
ser razoáveis e efetivos na política externa, de ter isso em atenção.
A nossa linha de conduta é sempre mesma: é a defesa de que não há nada que melhor defenda os interesses
de Israel e os interesses da Palestina do que dois Estados vivendo pacificamente lado a lado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vai daí?...
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Vai daí que é preciso que todos sejamos claros
a admitir o direito de Israel à existência como Estado independente e a admitir o direito da Palestina a ter um
Estado independente.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vai daí?...
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — E esses dois processos são paralelos.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O «vai daí» é que acompanho o Sr. Deputado
quando critica as políticas de colonização do Estado de Israel, mas faço questão de criticar, ao mesmo tempo,
o lançamento de rockets sobre população civil israelita.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — E gostaria que o Sr. Deputado me
acompanhasse nessa crítica. No dia em que todos nós sejamos claros, teremos avançado muito no processo
de paz no Médio Oriente.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, tem a palavra, para
formular os seus pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado João Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Secretários de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados: Sr. Ministro, já passou algum tempo mas, na primeira ronda, o meu colega Telmo Correia
questionou o Sr. Ministro sobre várias matérias e o Sr. Ministro respondeu a quase todas as questões, exceto a
uma, que eu lembrava agora, para o caso de poder responder, e que tem a ver com a questão dos espoliados.
Pela informação que temos, o Governo tem mantido um diálogo no sentido de se encontrar uma solução —
penso que é, inclusivamente, o Sr. Secretário de Estado Eurico Brilhante Dias que tem essa responsabilidade
—, mas o que queríamos saber, até porque, obviamente, o tempo passa e numa questão como esta é muito
relevante, é o que é que, efetivamente, pode esperar-se deste processo.
Indo às questões da segunda ronda, mais concentradas nos assuntos europeus, o Sr. Ministro presidiu à
reunião informal de ministros responsáveis pela área do comércio — aliás, o Sr. Ministro tinha anunciado isso
mesmo na Comissão — onde foram discutidos a política comercial da União Europeia e, pelo que lemos, três
propósitos essenciais: abertura, sustentabilidade e assertividade.
O que queremos saber é como é que isso se concretiza em alguns casos concretos. Primeiro caso concreto,
o do Mercosul.
É muito importante para um país como Portugal, que tem relações comerciais forte com países membros do
Mercosul, haver um acordo que permita a muitas empresas portuguesas evitar quer os entraves alfandegários,
quer burocráticos para que consigam, efetivamente, beneficiar do acordo que a União Europeia possa
estabelecer com o Mercosul.
Depois, o caso do acordo com a China, de que também já tínhamos conversado na Comissão, e a importância
que tem a questão de um acordo na relação transatlântica, e numa política transatlântica relativamente à China,
e não ser a União Europeia a inviabilizar uma política comum e articulada ao nível dos Estados Unidos e da
União Europeia, para a qual os Estados Unidos da América já demonstraram estar disponíveis.
Por fim, no caso da relação direta com os Estados Unidos e a questão do TTIP (Transatlantic Trade and
Investment Partnership), pelo que nos apercebemos, não houve, nesta reunião, nenhuma abordagem direta a
esta matéria. Agora, que mudou a Administração norte-americana, há a possibilidade de se poder voltar a discutir
um eventual acordo, que, nos termos em que estava a ser discutido, quando deixou de o ser, tinha aspetos
muito positivos também para as empresas portuguesas?
Portanto, o que queremos perguntar é como é que se concretiza esta revisão da política comercial,
essencialmente nestes três pontos que têm diretamente a ver com interesses portugueses.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado: Em relação à
primeira questão, relativa aos espoliados, trata-se, como sabe, de um processo que envolve vários
departamentos do Governo. No que diz respeito ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, a nossa
responsabilidade era com o arquivo e o tratamento jurídico dos milhares de processos que foram confiados à
guarda do Instituto Camões e esse processo decorre. Depois, há uma dimensão financeira igualmente
importante.
Em relação às questões que coloca do ponto de vista prático, no que diz respeito ao Mercosul, é muito
simples: como Presidência, sou forçado a constatar que, neste momento, não há condições para a maioria
necessária à aprovação de um acordo, seja em sede de Conselho, seja em sede de Parlamento Europeu. Como
o acordo concluído é, do meu ponto de vista, um bom acordo, quer no plano económico, quer, sobretudo, no
plano geopolítico, é muito importante criar condições para que este impasse possa ser ultrapassado.
As condições de que precisamos passam pela criação de um instrumento adicional — chamamos-lhe um
instrumento, porque os serviços legais ainda não chegaram à definição da sua natureza jurídica, ou seja, se é
um protocolo, se é um adicional ou se é um anexo — que permita clarificar as vinculações das duas partes,
reciprocamente, e, aliás, também as condições financeiras para apoiar uma das partes no cumprimento dessas
condições, em três matérias essenciais.
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Uma dessas matérias, que me parece absolutamente evidente, diz respeito às questões ligadas à segurança
alimentar. Outra diz respeito às questões ligadas ao cumprimento do Acordo de Paris. Ainda ontem, tive a
oportunidade de recordar, em Bruxelas, que, dos 31 países que compõem a União Europeia e o Mercosul, houve
um que exprimiu a vontade de se desvincular do Acordo do Clima. Esse país não era membro do Mercosul mas,
sim, membro da União Europeia.
A terceira matéria, talvez a mais difícil, diz respeito à área da biodiversidade e, em particular, do combate à
desflorestação.
Há, da parte do Mercosul, disponibilidade para trabalhar neste instrumento. Nós próprios estamos,
internamente, a discuti-lo e a minha expectativa é a de que, durante a Presidência portuguesa da União
Europeia, se possa avançar com essa clarificação.
Em relação ao acordo com a China, repito o que disse: o acordo de princípio foi atingido nos últimos dias da
Presidência alemã, mas não constituía uma prioridade para o programa da Presidência portuguesa. A nossa
prioridade é mesmo o relançamento das relações económicas com a Índia.
Já expliquei que, entre outros motivos, há um motivo de equilíbrio geopolítico que é muito importante para
nós e, repito, temos todo o tempo do mundo para, também aí, clarificar bem o que está no acordo de princípio
e a conformidade do que lá está com os padrões europeus.
Em relação ao TTIP, vivemos um momento que é, digamos, promissor, mas ainda é um momento, se me
permite a metáfora automobilística, em que a outra parte só acaba de meter a «primeira mudança», porque a
nova Secretária do Comércio americana foi confirmada pelo Senado, ontem. Portanto, temos de ter tempo.
Depois, metemos a «segunda», vamos à «terceira» e vamos por aí fora.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de novo a palavra, para formular as suas perguntas, o Sr. Deputado
João Almeida, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: Sr. Ministro, relativamente a esta última matéria, naturalmente, é preciso tempo, mas convém
que, do nosso lado, havendo essa expectativa, saibamos o que queremos do ponto de vista dessa relação com
os Estados Unidos em termos comerciais. Do lado dos Estado Unidos pode ainda faltar algum tempo, mas, do
nosso lado, convém que haja uma confirmação, ou não, daquele que era o ponto, quando esta matéria deixou
de estar na agenda.
Uma questão, noutra área, tem a ver com a agricultura. A Agri Europe, uma publicação respeitada, em
Bruxelas, sobre matérias de agricultura relacionadas com a política europeia, denunciou recentemente algo que
é, para nós, muito preocupante, que é a ausência da Ministra portuguesa da Agricultura na condução do
processo de negociação da PAC.
Isso foi denunciado por esta publicação, sustentada em várias fontes, quer da Comissão, quer do próprio
Conselho, em que vários Estados-Membros disseram que estavam preocupados com o facto de a Ministra
portuguesa não estar a conduzir essa negociação e estar a deixar essa negociação nas mãos dos burocratas.
O que lhe quero perguntar, Sr. Ministro, é se é uma prioridade, ou não, para a Presidência portuguesa e, em
concreto, para a Presidência portuguesa na área da agricultura, conseguir aproveitar esta Presidência para
conduzir a negociação da PAC, que, como sabemos, é uma política europeia essencial para Portugal.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado: Serei então mais
preciso no que diz respeito às relações comerciais com os Estado Unidos.
Em primeiro lugar, temos de perceber o que é que quer dizer, do lado americano, isto do «buy american» e,
portanto, se haverá, aí, uma linha de continuidade entre as duas Administrações ou se haverá alguma abertura.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ora!
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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O Sr. Deputado sabe melhor do que União
Europeia que, de uma perspetiva europeia, os Estados Unidos são um País bastante protecionista. Agora, nós
já fizemos propostas concretas. A primeira, naquilo que em diplomacia se chama de medidas criadoras de
confiança, foi mesmo eliminarmos, reciprocamente, as medidas de retaliação, portanto as sanções, o
agravamento de tarifas que decidimos — os americanos contra nós — por causa da Airbus e — nós contra os
americanos — por causa da Boeing. Também algum movimento no sentido de esclarecer a conflitualidade que
exista a propósito do alumínio e do aço facilitaria esse clima de criação de confiança.
Mas não tenhamos dúvidas: há interesses divergentes, e aqui e ali contraditórios, em matéria comercial entre
os Estados Unidos e a Europa. Podemos tratar essas divergências como amigos, e é esse o nosso propósito e
também o da Administração Biden.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Ministro, peço-lhe que conclua.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, só para esclarecer, em relação
à questão sobre a PAC, não conheço essa revista e, enfim, a intriga na corte de Bruxelas também é grande.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não é intriga, Sr. Ministro!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Mas acho que há uma grande injustiça, por
duas razões. Em primeiro lugar, porque a Sr. Ministra da Agricultura estava contaminada pela COVID-19 e
presidia, a partir de sua casa, a uma reunião informal dos Ministros da Agricultura. Portanto, se há pessoa que
não pode ser acusada de não assumir plenamente, às vezes em condições pessoalmente muito difíceis, as suas
responsabilidades com a Presidência é a minha colega Maria do Céu Antunes.
Em segundo lugar, porque a nossa ambição, com a condução política da Sr.ª Ministra da Agricultura, é
justamente a de concluir, durante a nossa Presidência, os três regulamentos, cuja aprovação significará uma
importantíssima reforma da PAC.
Mas o Sr. Deputado sabe, tão bem como eu, que há questões que são preparadas ao nível técnico, há
questões que são preparadas ao nível diplomático e há questões em que nós entramos que são de natureza
política.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Em nome do Grupo Parlamentar do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Inês de Sousa Real.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e demais
membros do Governo, um dos temas acerca dos quais gostaríamos de começar por questionar o Sr. Ministro
de alguma forma já aqui foi abordado hoje, ainda que não na sua plenitude e dimensão. Falo daquilo que são
crimes contra a humanidade, que têm vindo a ser perpetrados não só em Moçambique, mas também na
República Democrática do Congo, para além dos recentes episódios ocorridos na Nigéria.
Esta crise sanitária trouxe, de alguma forma, um silêncio ensurdecedor em torno deste tipo de crimes. A
comunidade internacional, acredito que com mais dificuldade, não se tem mobilizado como habitualmente para
contribuir para o restabelecimento da paz nestes países e, menos ainda, este contexto que vivemos fez
desaparecer estes próprios crimes.
Infelizmente, parece ser o caso do que se passa em Cabo Delgado, Moçambique, onde, desde há três anos,
forças terroristas têm plantado o medo e a violência, de que têm resultado milhares de mortes bárbaras, diversos
casos de tortura, mais de 300 000 deslocados, assim como outro tipo de atropelos às liberdades e garantias
individuais, a saber casamentos forçados, violação e escravidão de mulheres e crianças.
Sr. Ministro, recentemente, ocorreu um episódio na Nigéria em que mais de 300 meninas foram raptadas de
uma escola. Felizmente, já foram libertadas. Mas estes são casos que reiteradamente acontecem e para os
quais tem de haver uma resposta e uma mobilização.
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Mais recentemente, na floresta de Virunga, localizada na República Democrática do Congo e no Ruanda, a
recente morte de um embaixador italiano expôs a gravidade do que ali se passa: mais de 15 000 milícias
armadas terroristas atacaram e saquearam as aldeias da região, sequestraram ativistas de ONG (organizações
não governamentais) e turistas para pedir resgates e, mais grave ainda, mais uma vez, raptaram crianças,
violaram mulheres, sujeitando aldeias inteiras à devastação e à violência, bem como à escravidão.
Inclusivamente, colocaram punhais nas mãos dos meninos para torturarem os prisioneiros e, assim, serem
educados no terror. Há ainda relatos de que, em Virunga, estes grupos mataram elefantes, para colocar o seu
marfim no mercado negro, e gorilas, para vender a sua carne, o que também é contrário aos tratados em matéria
de proteção das espécies selvagens.
Contudo, apesar destes atos de terror que têm sido perpetrados em massa e que constituem crimes contra
a humanidade — e, aqui, não devemos ter medo das palavras —, a resposta da comunidade internacional tem
sido o silêncio.
Por isso, Sr. Ministro, quanto a Moçambique, este Parlamento, por proposta do PAN, já instou o Governo a
atuar, tendo feito uma recomendação recente.
Sabemos que uma das prioridades da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia é
precisamente África. Por isso mesmo, Sr. Ministro, gostaríamos de lhe perguntar se Virunga e Cabo Delgado
também estão na sua lista de prioridades. Que medidas vai Portugal defender para que, precisamente quanto a
estes dois casos, se promova uma cultura de apoio humanitário nestas duas regiões?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa
Real, imagino que tenha guardado tempo para uma próxima pergunta, pelo que serei agora mais sintético do
que gostaria.
Tem a Sr.ª Deputada toda a razão em identificar problemas. Aliás, poderia dar-lhe outros exemplos. Não sou
muito sectário em utilizar conceitos que estão bem enraizados no direito internacional e até na consciência moral
da humanidade de forma demasiado lata, mas há um ponto muito importante, que é este: hoje, temos, em várias
regiões do mundo, ataques de redes terroristas que, aliás, habitualmente trabalham em articulação com redes
dos mais variados tráficos — de pessoas, de droga, de matérias preciosas, de minérios, de pirataria — e que
semeiam o terror, no sentido técnico e próprio da palavra, isto é, atacam preferentemente populações civis e
preferentemente mulheres e crianças e não respeitam nenhuma lei da guerra na sua ação. E nós temos de
responder, mas não podemos fazê-lo apenas numa dimensão securitária. O meu colega norte-americano acaba
de fazer um discurso exatamente no mesmo sentido, dizendo que não é só a intervenção militar que é necessária
para estabilizar regiões.
A União Europeia, na minha opinião, nesta como em várias outras áreas, vai bastante à frente, fazendo
sempre questão de dizer as coisas às pessoas com palavras tão difíceis que, às vezes, os nossos cidadãos não
conseguem compreender o que nós queremos dizer. É o caso, por exemplo, do triplo nexo, de que falamos no
nosso linguajar, mas que quem ouvir pensa: «de que é que estes estão a falar?». Estamos a falar de uma coisa
muitíssimo importante, que é a necessidade de agir, ao mesmo tempo, em três dimensões: numa dimensão de
ação humanitária, que é a política independente, imparcial, neutral em matéria de conflitos, seja da Cruz
Vermelha Internacional, do Crescente Vermelho, da União Europeia como tal, da Organização das Nações
Unidas, etc.; numa dimensão de apoio ao desenvolvimento, de projetos de desenvolvimento, intervenção
comunitária, trabalho com as comunidades, aposta na fortificação do tecido económico e social, aproveitamento
local dos recursos, formação, etc.; e numa dimensão securitária, que, muitas vezes, também é necessária, até
para que a ação de apoio ao desenvolvimento seja possível. E quando dizemos «triplo nexo», «nexo» é porque
há uma ligação entre as três áreas e «triplo» porque são três.
Mas é exatamente aquilo que a Sr.ª Deputada estava a dizer, e tem toda a razão no que disse.
Vamos, então, à pergunta difícil que a Sr.ª Deputada guardou para o fim.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, tem a palavra.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, é uma pergunta bem difícil, porque
efetivamente a retoma económica não pode deixar para trás os compromissos ambientais.
Nesse sentido, gostaria de lhe falar sobre o Tratado da Carta da Energia, que tem um conjunto de disposições
que permitem aos investidores estrangeiros no setor da energia processar diretamente os Estados signatários,
em tribunais internacionais sigilosos compostos por árbitros privados. Isto vai permitir aos investidores reivindicar
quantias exorbitantes como compensação por iniciativas governamentais que se destinam a reduzir a utilização,
por exemplo, de combustíveis fósseis e mesmo naquilo que possa ser a descarbonização das economias.
Significa isso que Portugal, quando decidir, por exemplo, implementar o Roteiro para a Neutralidade
Carbónica ou aprovar uma lei do clima, pode ver-se a braços com aquilo que possa ser a reivindicação de
indemnizações milionárias por parte das grandes poluidoras.
Por isso, Sr. Ministro Santos Silva, o que gostaríamos de saber é quando vai Portugal desvincular-se deste
Tratado, que em nada beneficia o interesse público e que pode travar a descarbonização da economia, tão
necessária para o nosso País e para o próprio planeta.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.
É que, de facto, aquilo que também não podemos deixar para trás é a crise climática, que continua como
pano de fundo a toda esta crise que estamos a viver.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa
Real, afinal, a pergunta não era difícil.
Em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada certamente já olhou para o Plano de Recuperação e Resiliência que está
em discussão pública e sabe que ultrapassámos a meta dos 37% alocados à transição verde em 10 pontos
percentuais. No nosso Plano, a despesa alocada à transição verde representa quase metade do conjunto dos
investimentos dele constantes.
Em segundo lugar, sou um pobre sociólogo, nunca frequentei nenhuma faculdade de Direito, mas vou
ouvindo umas coisas, e uma das coisas que costumo ouvir aos meus colegas de Direito é que a lei sucessiva
derroga as leis anteriores.
O Sr. João Oliveira (PCP): — A lei posterior!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — A lei posterior. Tem razão, Sr. Deputado.
Portanto, vamos trabalhar na nossa lei europeia do clima e, se me permite um pequeno recado ao PAN, não
perturbemos a aprovação com lógicas maximalistas, que só atrasarão, para ficarmos fortes em relação a todos
aqueles que nos queiram impedir de tornar o planeta mais limpo, mais azul e mais habitável.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Em nome do Grupo Parlamentar de PEV, tem a palavra o Sr. Deputado
José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, o Conselho
Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas enviou para o Governo, no mês passado, um conjunto
de recomendações, de que destacamos duas. A primeira tem a ver com a necessidade de se proceder a um
levantamento nominal das atividades da comunicação social nas comunidades portuguesas no estrangeiro, com
vista a ficarmos na posse de informação exata de quantos e quais são esses órgãos de raiz portuguesa nos
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países de acolhimento. A segunda recomendação diz respeito à necessidade de integrar, de forma obrigatória,
na publicidade institucional do Estado, os órgãos de comunicação social de raiz portuguesa nas comunidades.
Portanto, Sr. Ministro, estas medidas seriam uma forma de se conhecer a realidade da comunicação social
nas comunidades e, sobretudo, representariam novas oportunidades para que o Estado português cumpra o
dever de difundir no seio das comunidades a informação de natureza institucional a que os portugueses que
vivem no estrangeiro também têm direito, e pleno direito.
Por isso, Sr. Ministro, seria importante que nos dissesse como é que o Governo encara estas recomendações
do Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP), se são para levar a sério ou não.
Sr. Ministro, quero falar-lhe também do Tratado da Carta da Energia (TCE). Este Tratado, como o Sr. Ministro
certamente reconhecerá, está completamente obsoleto e não há evidências de que facilite o investimento ou
reduza o custo da energia, havendo até interesses contrários aos da generalidade dos cidadãos. Na sua atual
forma, o principal efeito deste Tratado é proteger as indústrias do combustível fóssil — e as respetivas emissões
de gases com efeito de estufa — e ameaçar até as finanças públicas dos Estados signatários.
Isto já para não falar do controverso sistema de arbitragem ISDS (Investor-State Dispute Settlement), em que
os Estados acabam por renunciar aos seus próprios sistemas de justiça para confiar os litígios a essa arbitragem
que as multinacionais tanto apreciam.
Mas trata-se também de um mecanismo que representa um ataque à soberania dos Estados e até à
capacidade de definir livremente políticas económicas, sociais e ambientais, como, de resto, temos vindo a
assistir ao longo do tempo e em casos muito pontuais.
Para além disso, Sr. Ministro, este Tratado tem muitos pontos que estão em conflito direto com o
desenvolvimento sustentável, representando um enorme risco para qualquer governo que esteja realmente
empenhado em combater as alterações climáticas.
Ora, o que Os Verdes consideram é que Portugal não deve pactuar com um Tratado da Carta da Energia
que seja contrário às preocupações e aos compromissos ambientais e também aos interesses das populações
e do País.
Por isso, entendemos que Portugal deve defender um tratado alinhado com os objetivos da sustentabilidade
do desenvolvimento.
O que lhe pergunto, Sr. Ministro, é se podemos contar com o Governo para, no quadro das negociações da
reformulação deste Tratado, exigir o cumprimento dos compromissos ambientais e de desenvolvimento
sustentável, pela defesa dos direitos dos cidadãos e pela exclusão das tais cláusulas de arbitragem. Podemos,
ou não, contar com o Governo neste propósito? E, se isso não for conseguido, o Governo pondera a
possibilidade de abandonar este Tratado da Carta da Energia?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado das
Comunidades Portuguesas.
A Sr.ª Secretária de Estado das Comunidades Portuguesas (Berta Nunes): — Sr.ª Presidente, Sr.
Deputado José Luís Ferreira, em relação à questão dos órgãos de comunicação social da diáspora, esse
levantamento já foi feito pela Secretaria de Estado das Comunidades quando decidimos dar o apoio pontual
extraordinário aos órgãos de comunicação social da diáspora.
Ao mesmo tempo, temos trabalhado com uma plataforma de órgãos de comunicação social da diáspora, que,
neste momento, está a ter uma nova dinâmica e que já apresentou uma candidatura ao concurso anual da
DGACCP (Direção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas) exatamente para nos
apoiar nesse trabalho e noutras medidas que eles considerem importantes para apoiar os órgãos de
comunicação social da diáspora.
Por outro lado, os Srs. Deputados do Partido Socialista Paulo Pisco e Paulo Porto apresentaram uma
proposta de alteração à lei de 2015, que é exatamente a lei da publicidade institucional, onde serão incluídos,
por nessa altura aí ter sido esquecida a sua inclusão, os órgãos de comunicação social da diáspora, obrigando
a que 10% de todas as campanhas de publicidade institucional feitas pelo Governo português, desde que
superiores a 5000 €, sejam alocadas aos órgãos de comunicação social da diáspora. Essa alteração à lei já foi
debatida na Comissão de Cultura e Comunicação e julgo que subirá a Plenário brevemente.
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem, agora, a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros, para completar a resposta.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Luís
Ferreira, em relação ao Tratado da Carta da Energia, a primeira coisa que a boa governação exige é um
conhecimento aprofundado do que dispõe esse Tratado e quais são as obrigações que a parte contratante,
neste caso o Estado português, assume.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Portanto, o Departamento de Assuntos
Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros está a fazer essa análise, que depois tem de ser confrontada
com o ministério setorial, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática.
Sendo essencial um acerto, uma concertação ao nível europeu, não sei se se colocará a questão de alteração
do Tratado, da sua denúncia, se mesmo do seu recesso ou de outra figura, sendo um tratado multilateral.
O que queria dizer é que não devemos ter nenhuma espécie de ilusão de que aquilo que é essencial que
façamos para assegurar as condições de habitabilidade do planeta e, portanto, a sobrevivência da nossa
espécie, do chamado Homo sapiens sapiens, ferirá muitos interesses, e esses interesses usarão todas as armas
contra nós. Por isso, repito o meu apelo: é preciso que sejamos rápidos e fortes na aprovação dos instrumentos
legislativos, ao nível europeu, indispensáveis para que possamos vencer esses interesses, porque eles têm
algum poder, e é preciso ter isso sempre em boa conta.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem, agora, a palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado André
Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, disse há pouco que não
conseguia raciocinar nos meus termos. Sei que não, porque, de facto, Sr. Ministro, não me envergonha nada
dizer que, se houver estrangeiros que cometam atos de terrorismo na União Europeia, se fizerem tráfico de
drogas na União Europeia e forem expulsos não durmo pior por causa disso. Nem o Sr. Ministro devia dormir
pior por defender a segurança dos cidadãos europeus. E um dia, se Deus quiser, assim será: quem cometer
crimes vis em território europeu deverá ser devolvido ao seu território de origem.
Mas já que tão enfaticamente disse que o novo Presidente norte-americano era uma mudança, pergunto-lhe
o que é que acha do bombardeamento feito à Síria, na semana passada, pela administração Biden, que tinha
dito que resolveria o problema diplomaticamente. Parece que os seus aliados não estão a funcionar muito bem
nessa matéria.
Mas falemos de sanções, Sr. Ministro, porque disse que se orgulhava de uma União Europeia que não tem
sanções contra a economia de um país, que tem sanções individualizadas. E, de facto, estão a funcionar bem,
como se viu no caso da Ucrânia, em que funcionaram perfeitamente, como se viu em todo o lado onde a União
Europeia anda, em que têm funcionado na perfeição, seja no Médio Oriente, seja na Ucrânia… O respeito que
a Rússia nos tem, com os senhores na liderança, é zero, como se viu na visita de um diplomata europeu, há
pouco tempo, em que fomos humilhados! E o Sr. Ministro disse «vamos ter calma, vamos manter a cabeça fria».
Não podemos ter calma quando somos humilhados na nossa dignidade, devemos ter a capacidade e a coragem
de responder!
Por isso, Sr. Ministro, pergunto-lhe: será ou não sob a Presidência portuguesa que, pela primeira vez, vamos
conseguir impor sanções a sério àqueles que são os nossos inimigos?
Termino com uma questão que foi levantada pelo Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados,
que disse que a Presidência portuguesa seria a última oportunidade para se levar a cabo um plano a sério para
o combate à imigração…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
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O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Como dizia, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados disse que a Presidência portuguesa
seria a última oportunidade para se levar a cabo um plano a sério para o combate à imigração ilegal no
Mediterrâneo.
Houve mais de 100 000 travessias no último ano e meio milhão de pedidos de asilo — meio milhão! Não há
bloco que aguente este número de requerimentos…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Não há bloco que aguente este número de requerimentos e este número de pedidos de asilo. Será ou não
com Portugal que vamos combater, finalmente, este fenómeno?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado André Ventura,
queria chamar a atenção para o facto de aquilo que o Sr. Deputado disse há pouco não ser propriamente propor
que fossem deportados criminosos, mas sim que fosse utilizada a expulsão de estrangeiros como medida de
retaliação.
Aliás, devo dizer que a minha formação cristã convive mal com o facto de o Sr. Deputado invocar Deus ao
mesmo tempo que diz isto.
O Sr. André Ventura (CH): — Oh! Por amor de Deus!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Deputado, não houve nenhum
bombardeamento norte-americano à Síria, houve uma intervenção militar americana sobre instalações de
milícias, num território que é sírio, que se inscreve, aliás, na diferença, que no direito internacional há muito está
consolidada, entre as ações preventivas, que são admissíveis, e as ações «preemptivas», que são condenáveis.
Em relação às afirmações que atribui ao Alto Comissário Filippo Grandi, é impossível que ele as tenha feito.
O Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados está nos antípodas dos seus termos de referência,
Sr. Deputado.
Como não fez nenhuma pergunta, também não tenho nenhuma resposta a dar.
Aplausos do PS.
O Sr. André Ventura (CH): — Não tem resposta!
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado João Cotrim
de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados,
Sr. Ministro, não sei se reparou, mas, na primeira ronda, houve aqui uma coisa divertida, que foi, na resposta a
um Sr. Deputado, o Sr. Ministro ter dito — cito de memória, mas acho que não cito mal: «Isto não é Realpolitik,
é realismo na política externa», fazendo aquela coisa divertida que é fazer a tradução da palavra alemã numa
boa tradução de português — dou-lhe, aliás, os parabéns, porque foi rápido a fazer uma tradução exata de
Realpolitik.
Isto seria divertido, se não fosse um bocadinho trágico, porque Realpolitik parece que se justifica sempre que
há uma comunidade de compatriotas algures e que isso justifica os temores ou os pudores que temos
relativamente a esses regimes, por muito violadores que sejam de determinados direitos.
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Mas mesmo as comunidades de compatriotas não justificam tudo, Sr. Ministro. Dou-lhe este exemplo: o Reino
Unido tem uma comunidade de compatriotas seus em Hong Kong maior do que a nossa na China e não foi isso
que os inibiu de ter posições muito mais assertivas e duras relativamente ao regime chinês quando aí tiveram
lugar os eventos que todos conhecemos.
Ao invés, a Alemanha, que não tem praticamente nenhuma comunidade de compatriotas na China, tem
imensos pruridos relativamente àquilo que faz e não faz na defesa dos direitos humanos na China. Um amigo
meu alemão, que tem graça — uma daquelas exceções — costuma dizer: «Isto é política externa Volkswagen».
Tem a sua graça, mas também tem a sua tragédia aqui metida.
Portanto, se isto não é Realpolitik que estamos a fazer na União Europeia — e agora com Portugal na
Presidência preocupa-me mais —, não sei, de facto, o que é que é Realpolitik.
E, mais, a história ensina-nos que de Realpolitik em Realpolitik vamos talvez defender alguns interesses,
mas vamos, certamente, hipotecar os valores e os princípios, os tais de que falávamos na primeira ronda, o que
me preocupa. A história ensina-nos isso, e o Sr. Ministro sabe isso bem.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exato!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Por isso, vou voltar ao tema dos direitos humanos, porque penso
que foi na última ou na penúltima reunião do Consilium, portanto, do Conselho dos Negócios Estrangeiros da
União Europeia, que apanhei meia dúzia de temas, todos eles de relevância para direitos humanos ou direitos
políticos: a detenção de Alexei Navalny; Hong Kong; Turquia; Venezuela; Moçambique. Todos estes temas,
relativos a violações dos direitos humanos e dos direitos políticos, parece que dão razão ao relatório Liberdade
no Mundo, da Freedom House, que, desde 2006, mostra a democracia liberal e as liberdades em regressão no
mundo inteiro, que é, como quem diz, os direitos humanos e os direitos políticos em regressão no mundo inteiro
há 14 ou 15 anos.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr.ª Presidente, fazendo esta pergunta: o que é que
vai, finalmente, a União Europeia e a Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia fazer para que
não acordemos um dia com a Realpolitik a ter-nos dado cabo dos nossos valores?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros para responder.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, muito obrigado pela
oportunidade que me dá de citar Bismarck.
Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, igualmente os meus agradecimentos por essa oportunidade.
Realpolitik é uma corrente, é uma escola, em política externa, que é associada à figura tutelar de Bismarck,
o tal que dizia que havia cinco potências que contava — a Prússia, a Áustria, a Rússia, a França e a Inglaterra
— e que tudo se resumia, para os interesses da Prússia, a não deixar que houvesse constituições de três contra
dois em que eles estivessem do lado dos dois em vez de estarem do lado dos três. Isso é que é a Realpolitik.
Realismo em política externa é diferente. Realismo em política externa foi o de Churchill, quando, ao contrário
de Chamberlain, que nessa altura foi um idealista, percebeu bastante bem que a besta — a besta! — que
enfrentava não era acomodável, portanto, quando disse, em pleno blitzkrieg: «Nós não nos rendemos, e os
alemães vão-se render, porque nós não aceitamos negociar». Isso é que é realismo na política externa.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Bom exemplo!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — E é também em nome desse realismo na
política externa que a União Europeia se dotou, em dezembro passado, com o voto favorável de Portugal, de
um regime próprio por violações grosseiras dos direitos humanos, de que, aliás, a aplicação agora, no caso de
Myanmar e no caso da Rússia, é o primeiro exemplo de concretização. Também aí é realismo na política externa.
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Mas é também realismo na política externa percebermos o seguinte: não estamos agora, ao contrário de
outros Estados-Membros, com interesses em territórios que pertencem à República Popular da China.
Portugal não está a dizer que os cidadãos residentes em Macau e que têm passaporte português vão ter a
cidadania portuguesa plena, porque sempre tiveram. Sempre tiveram, não fazemos diferenças entre
portugueses do ultramar e portugueses da Europa. Isso também é realismo na política externa.
Como, finalmente, é realismo na política externa percebermos que a dimensão dos direitos humanos é uma
dimensão essencial, mas que quando conduzimos processos de isolamento internacional de Estados devemos
sempre perguntar-nos se esses processos de isolamento internacional dos Estados são aqueles mais favoráveis
para a preservação de um espaço mínimo de afirmação das sociedades civis nesses Estados. É que quando
Portugal vivia no fascismo, e Portugal era…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Concluo, sim, Sr.ª Presidente.
Como dizia, quando Portugal vivia no fascismo e era, ao mesmo tempo, membro da NATO, isso permitiu que
um conjunto de oficiais generais portugueses, a começar por Humberto Delgado, tivessem uma experiência
junto do exército americano, que consolidou as suas convicções democráticas. Se os Estados Unidos, nessa
altura, tivessem raciocinado como o Sr. Deputado agora está a propor, o General Humberto Delgado não teria
tido essa oportunidade.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Agora sim, chegámos ao fim deste debate sobre política setorial.
Despeço-me do Sr. Ministro e dos Srs. Secretários de Estado.
Vamos passar ao último ponto da ordem de trabalhos, que consiste em votações regimentais.
Pergunto se todos os grupos parlamentares estão preparados para passarmos às votações.
Pausa.
Vamos então começar com as votações.
Começamos por votar o Projeto de Resolução n.º 931/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que conclua
com urgência o processo de abertura e avaliação de candidaturas, celebre os contratos e proceda aos
pagamentos em dívida, referente ao apoio à recuperação dos danos causados em infraestruturas municipais
nos distritos de Aveiro, Braga, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria, Lisboa, Porto, Santarém, Viana do
Castelo, Vila Real e Viseu pelas tempestades Elsa e Fabien ocorridas em 2019.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do
PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do
PS.
Votamos agora o Projeto de Resolução n.º 884/XIV/2.ª (PEV) — Recomenda ao Governo que crie as
condições necessárias para a ratificação do Tratado de Proibição das Armas Nucleares.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL e votos a
favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.
Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 712/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda do
Governo um reforço na estratégia integrada no combate ao desperdício alimentar.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do
PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a abstenção do
PS.
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Esta iniciativa baixa à 7.ª Comissão.
Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 728/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao
Governo medidas para redução do desperdício alimentar e promoção da saúde pública.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do
PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a abstenção do
PS.
Este projeto baixa, igualmente, à 7.ª Comissão.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, permite-me o uso da palavra?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, para sugerir que pudéssemos votar agora, em conjunto,
todos os requerimentos de avocação que constam do guião de votações.
Também gostaria de dizer que prescindimos — penso que o PCP também — dos 2 minutos destinados à
apresentação de cada requerimento, em detrimento de um período de debate de 2 minutos por grupo
parlamentar, como é da praxe fazer, e para o qual já demos a indicação de inscrição à Mesa, tal como o Partido
Comunista.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, do guião de votações que tenho não consta o
requerimento do CDS — não sei se foi distribuído posteriormente — que pede a desagregação de uma votação
por pontos. E a minha solicitação é a de que esse requerimento seja considerado.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, irá ser considerado oportunamente.
Srs. Deputados, vamos, então, votar conjuntamente quatro requerimentos, do PCP e do BE, de avocação
pelo Plenário da votação, na especialidade, de propostas de alteração e de aditamento ao texto final,
apresentado pela Comissão de Trabalho e Segurança Social, relativas ao Decreto-Lei nº 8-B/2021, de 22 de
janeiro — Estabelece um conjunto de medidas de apoio no âmbito da suspensão das atividades letivas e não
letivas presenciais [Apreciações Parlamentares n.os 39/XIV/2.ª (BE) e 41/XIV/2.ª (PCP)] e ao Decreto-Lei n.º 6-
E/2021, de 15 de janeiro — Estabelece mecanismos de apoio no âmbito do estado de emergência [Apreciações
Parlamentares n.os 40/XIV/2.ª (PCP) e 42/XIV/2.ª (BE)].
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.
Segue-se, agora, o período de intervenções.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em boa hora o PCP apresentou as
apreciações parlamentares, agendou o seu debate e insistiu nos alertas sobre os problemas sentidos por muitos
trabalhadores e por muitas famílias, nomeadamente no que se refere ao teletrabalho e ao acompanhamento aos
filhos, mas também nas matérias de proteção social para quem está em situação de desemprego.
Neste momento de debate, lembramos também que, se tivessem sido aprovadas as propostas que o PCP
apresentou, em 2020, sobre estas matérias, não teria havido um único dia, neste mesmo ano, em que os
trabalhadores e as famílias se tivessem confrontado com os problemas e as dificuldades relacionadas com o
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teletrabalho, com o acompanhamento aos filhos, mas também com o risco de desproteção social de muitos
beneficiários do subsídio de desemprego e do subsídio social de desemprego.
As propostas do PCP visam garantir o pagamento do salário a 100% a todos os trabalhadores, incluindo os
que estão em teletrabalho ou em situação de acompanhamento dos filhos, sem qualquer tipo de obstáculo ou
entrave. Neste momento, só têm o salário a 100% as famílias monoparentais ou os casos em que os pais se
podem revezar, semanalmente, para cuidar dos filhos. Há, no entanto, muitas famílias para quem essa
alternância não é possível, sendo negado a estas crianças o seu direito a serem acompanhadas pelos pais,
porque estes ficam sem um terço do salário para cuidar dos filhos ou porque se mantêm a trabalhar para receber
o salário por inteiro, não acompanhando os seus filhos.
Alargar o apoio dos pais para assistência a filho até aos 16 anos, relembramos, é um direito das crianças,
especialmente num momento em que as suas rotinas, as suas dinâmicas e as suas realidades estão
profundamente alteradas e são também, em muitas situações, geradoras de angústias, de ansiedades e de
dificuldades, que exigem o acompanhamento e a proximidade dos seus pais.
Deve-se assegurar, de forma inequívoca, a todos os trabalhadores, cujo subsídio de desemprego ou subsídio
social de desemprego tenha terminado em 2020, que tenham acesso ao apoio extraordinário.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Falamos em garantir os direitos das crianças, garantir o direito dos trabalhadores à articulação entre a vida
pessoal, familiar e profissional…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, tem mesmo de terminar.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … e garantir o reforço da proteção social dos trabalhadores em situação de
desemprego.
Aplausos do PCP e do PEV.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Por 2 minutos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua, do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: O Governo não pode continuar a desenhar
medidas de apoio social com regras que excluem pessoas que precisam de aceder a esses apoios e depois
dizer que sobra dinheiro, como se o País não estivesse aflito.
Neste momento, há dezenas de milhares de trabalhadores com cortes salariais, dezenas de milhares de
trabalhadores independentes que não acedem ao apoio para ficar em casa com os seus filhos. O PS e o PSD
juntaram-se, na apreciação parlamentar, para impedir aquilo que o Bloco propôs, ou seja, que os trabalhadores
recebam o salário por inteiro, nos limites definidos quando ficam em casa com os filhos, e que os trabalhadores
independentes recebam, pelo menos, o salário mínimo nacional e tenham direito a este apoio também.
É isso que hoje avocamos: uma nova oportunidade para reconhecer a estes trabalhadores o salário por
inteiro e reconhecer também os direitos dos trabalhadores independentes.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ofélia Ramos, do Grupo Parlamentar do
PSD.
A Sr.ª Ofélia Ramos (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Da experiência acumulada, neste último
ano, ficou bem patente que teletrabalho e assistência a filhos não é conciliável. Quem está em teletrabalho não
consegue prestar a necessária assistência a filhos.
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Ainda assim, o Governo, ignorando as dificuldades que as famílias enfrentaram em 2020, determinou o
encerramento das escolas no passado mês de janeiro e recuperou o mesmo regime que vigorou em 2020,
regime este que impedia o acesso ao apoio excecional à família para todos aqueles que estivessem em
teletrabalho.
Tal é a insensibilidade do Governo para com os problemas das famílias que só passado um mês após o
encerramento das escolas é que tentou corrigir esta injustiça. Só o fez não porque reconheceu as dificuldades
das famílias mas, sim, porque foi compelido pelas iniciativas do PSD e de outros partidos políticos que,
entretanto, foram apresentadas e que podiam reunir maioria parlamentar.
E por considerarmos que as medidas apresentadas pelo Governo estão aquém daquilo que são as
necessidades das famílias, o PSD apresentou uma proposta que não só vai ao encontro dessas necessidades,
como também é uma proposta equilibrada e justa para as famílias e para as empresas, sem os excessos
fundamentalistas a que os partidos de extrema-esquerda já nos habituaram.
A proposta do PSD permite que as famílias monoparentais e todas as famílias com filhos menores de 12
anos, bem como as famílias com filhos ou dependentes com deficiência ou doença crónica, independentemente
da idade, possam aceder ao apoio excecional à família em alternativa ao teletrabalho.
O PSD entende, assim, que deve ser garantida a necessária proteção social aos pais que tenham de faltar
ao trabalho para prestar a necessária assistência aos filhos, enquanto as escolas e as creches se mantiverem
encerradas, proteção esta que deve ser garantida não só aos trabalhadores por conta de outrem, mas também
aos trabalhadores independentes.
Por isso mesmo, o PSD congratula-se pela maioria alcançada em comissão parlamentar com vista à
eliminação de uma discriminação negativa…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, peço-lhe para concluir. O tempo de cada intervenção é
de 2 minutos.
A Sr.ª Ofélia Ramos (PSD): — Com a tolerância da Sr.ª Presidente, quero dizer apenas, para terminar, que
o PSD se congratula com a maioria alcançada em comissão parlamentar…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada. Tem mesmo de terminar.
A Sr.ª Ofélia Ramos (PSD): — Deixe-me terminar, Sr.ª Presidente, na medida em que também concedeu
tolerância ao Sr. Ministro e, portanto, permita-me terminar.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, são coisas distintas. O tempo de intervenção, para este
debate, é de 2 minutos.
A Sr.ª Ofélia Ramos (PSD): — Pensava que os direitos eram os mesmos,…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ofélia Ramos (PSD): — … mas pronto.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Rita Borges Madeira, do Grupo
Parlamentar do PS.
A Sr.ª Rita Borges Madeira (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não acompanhará
as propostas aqui hoje avocadas, como já o fez em sede de votação, na especialidade, na Comissão de Trabalho
e Segurança Social. E não acompanha estas propostas não porque seja contra a proteção aos trabalhadores,
aos desempregados e aos mais necessitados, mas exatamente pelo contrário.
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O Governo já promoveu alterações para apoiar as famílias: alterou o Decreto-Lei n.º 8-B/2021, com a
publicação do Decreto-Lei n.º 14-B/2021, estendendo o apoio extraordinário à família, não só aumentando o
leque dos seus beneficiários, mas também alargando os montantes da cobertura, passando a beneficiar deste
apoio a 100% as famílias monoparentais e as famílias em que os dois progenitores beneficiem do apoio
semanalmente, de forma alternada.
Não podemos permitir redundâncias legislativas e concorrência de apoios. O Orçamento do Estado para
2021, hoje em vigor, já contempla várias medidas de apoio aos trabalhadores e desempregados, como o apoio
extraordinário ao rendimento dos trabalhadores, que assegura a continuidade dos rendimentos àqueles que os
perderam e não reúnem as condições de acesso às prestações sociais que os protegem na eventualidade de
desemprego, tal como o subsídio social de desemprego subsequente, a prorrogação do período de concessão
do subsídio de desemprego e a majoração do limite mínimo do subsídio de desemprego.
O Partido Socialista estará sempre ao lado dos trabalhadores, e que não existam, nunca, dúvidas sobre isto.
Apresentámos uma proposta de alteração ao Decreto-Lei n.º 8-B que foi aprovada por unanimidade, em
comissão, relativa à possibilidade de o pessoal docente, cuja atividade letiva seja desenvolvida em tempo real
e que permita a interação on-line, recorra a estabelecimentos de ensino, creches, creches familiares ou amas
para o acolhimento de filhos ou outros dependentes a cargo, à semelhança daquilo que acontece com os
trabalhadores considerados essenciais.
Estamos cá desde o início a apoiar todos os portugueses nesta batalha contra a pandemia e contra tudo
aquilo que ela nos retirou, mas também cá estaremos amanhã, ao lado dos mesmos portugueses, a trabalhar
na retoma económica e na recuperação dos rendimentos e dos empregos perdidos.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do Grupo
Parlamentar do PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Efetivamente, o direito de todas
e de todos os trabalhadores não pode ser deixado para trás, nomeadamente não só nas malhas burocráticas,
como até aqui temos vindo a verificar que tem acontecido ao longo desta pandemia, como também no agravar
de muitas desigualdades do ponto de vista social.
Ter filhos a seu cargo e ter de assumir, também, funções laborais não pode significar a perda de rendimentos
e não pode significar uma sobrecarga absolutamente inaceitável. É por isso que o PAN se posiciona ao lado do
reforço destes direitos. Iremos acompanhar, evidentemente, as propostas avocadas e viabilizar o texto conjunto
que, em comissão, se consensualizou.
No entanto, lamentamos que esta Assembleia não vá mais longe e não proteja, efetivamente, a 100% aquilo
que é a remuneração devida a quem fica em casa a cuidar dos filhos, independentemente de o outro progenitor
estar em teletrabalho, porque não se pode confundir estas duas tarefas que são completamente distintas. Tem
havido, aliás, uma dificuldade acrescida para as mulheres — e em relação à qual as organizações não
governamentais têm vindo a alertar sucessivamente —, que têm visto um retrocesso nos seus direitos em
matéria de igualdade, ou até mesmo para as famílias monoparentais, que não conseguem conciliar ambas as
funções.
Sr.as e Srs. Deputados, havendo apoios não significa que não tenha de existir igualdade entre homens e
mulheres.
De facto, perdemos a oportunidade, em comissão, de encontrar um texto mais robustecido, que desse, de
alguma forma, resposta às várias preocupações deste tempo e que conseguisse reforçar esta proteção.
Seria fundamental que esses apoios abrangessem todos os trabalhadores, incluindo as famílias
monoparentais, e, portanto, lamentamos profundamente que esse caminho não tenha sido feito. Assim, iremos
acompanhar as iniciativas que estão a ser debatidas.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida, do Grupo
Parlamentar do CDS.
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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde o ano passado,
quando as famílias foram confinadas e os seus filhos também ficaram nessa situação, que o CDS tem alertado
para aquilo que cedo se percebeu, que é a incompatibilidade absoluta entre teletrabalho e apoio à família. Ou
seja, quem está em casa a trabalhar não está em casa, nem pode estar em casa, ao mesmo tempo, a
acompanhar os seus filhos, que têm tarefas escolares e uma necessidade de acompanhamento que não permite
essa conciliação.
Infelizmente, durante quase um ano, o Governo insistiu em algo que é impraticável, levando muitas famílias
ao limite. Não estamos só a falar — e vamos aqui votar algumas propostas que alargariam essa hipótese — das
crianças até aos 12 anos e das crianças em idade escolar. Muitas famílias têm crianças mais novas e que ainda
não estão em idade escolar mas que precisam de cuidados quando os seus progenitores estão em casa, tal
como há muitas famílias que também têm filhos com idades superiores a 12 anos e que, estando com aulas à
distância, precisam de acompanhamento. E, portanto, muitas famílias viveram um verdadeiro tormento por não
conseguirem conciliar estas duas realidades.
Congratulamo-nos, naturalmente, com a aprovação da proposta do CDS no sentido de não ser necessário
que nenhum dos progenitores esteja em teletrabalho, ou melhor, se um dos progenitores estiver em teletrabalho,
o outro poderá prestar apoio à família. Essa proposta do CDS foi aprovada e passará a ser lei, tal como foi
aprovada a proposta do CDS para que não sejam discriminados os trabalhadores independentes.
Gostávamos de ter ido mais longe. Gostávamos que tivesse sido, também, aprovada a nossa proposta para
que o pagamento a estas pessoas que ficam em apoio à família fosse feito a 100%. Há propostas que vão agora
ser votadas e que permitem essa possibilidade, pelo que nós, naturalmente, iremos votá-las a favor.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A aprovação, na comissão, da alteração
do valor de referência do apoio à redução de atividade dos trabalhadores independentes, que o Bloco de
Esquerda apresentou, é muito importante, porque significará, para alguns trabalhadores, a diferença entre
receberem 219 € ou 657 €, que é o que faz esta proposta do Bloco de Esquerda.
O que já não se compreende é como é que o PS e o PSD conseguem explicar que tenham chumbado e se
preparem para chumbar o pagamento a 100% a quem está em casa a cuidar dos filhos, mas também a
prorrogação dos subsídios, das prestações de desemprego em 2021, a facilitação do acesso à proteção no
desemprego, pela redução dos prazos de garantia, que é uma medida que esteve em vigor em 2020, e o
Governo não aceitou prolongá-la para 2021, e que vai ser chumbada hoje pelo PS e pelo PSD.
Como é possível que o PS e o PSD se tenham juntado para impedir que o apoio aos desempregados de
longa duração chegue aos trabalhadores e que se mude a regra, obrigando-os a estar seis meses sem
receberem nenhum apoio para terem acesso ao apoio aos desempregados de longa duração?!
Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, não é apenas uma insensibilidade, é uma decisão estranhíssima, tendo
em conta que estes apoios existiram em 2020 e que os Srs. Deputados não só rejeitaram inscrevê-los no
Orçamento do Estado para 2021 como também em sede de comissão, mas têm aqui, hoje, a oportunidade de
corrigir aquilo que fizeram, que foi rejeitar que eles fossem aprovados para 2021.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação, na especialidade,
do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e Segurança Social, relativo ao Decreto-Lei n.º 8-B/2021,
de 22 de janeiro, que estabelece um conjunto de medidas de apoio no âmbito da suspensão das atividades
letivas e não letivas presenciais [Apreciações Parlamentares n.os 39/XIV/2.ª (BE) e 41/XIV/2.ª (PCP)], constante
do Guião Suplementar I.
Começamos por votar a proposta, apresentada pelo PCP, de substituição do n.º 1 do artigo 2.º daquele
decreto-lei.
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Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do CDS-
PP, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a
abstenção do IL.
Era a seguinte:
1 — Consideram-se justificadas, sem perda de direitos, incluindo quanto à retribuição, as seguintes faltas:
a) As motivadas por assistência inadiável a filho ou outro dependente a cargo menor de 16 anos ou,
independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica, decorrente da suspensão das atividades
letivas e não letivas presenciais em estabelecimento escolar ou equipamento social de apoio à primeira infância
ou deficiência, e enquanto estas durarem, incluindo nos períodos de interrupção letiva;
b) As motivadas por assistência a cônjuge ou pessoa que viva em união de facto ou economia comum com
o trabalhador, parente ou afim na linha reta ascendente, parente ou afim até ao 3.º grau da linha colateral, que
se encontre a cargo do trabalhador e que frequente equipamentos sociais cuja atividade seja suspensa por
determinação da autoridade de saúde, no âmbito do exercício das suas competências, ou pelo Governo.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Segue-se a votação da proposta, apresentada pelo PCP, de emenda
do proémio do n.º 1 do artigo 3.º do mesmo decreto-lei.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do CDS-
PP, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a
abstenção do IL.
Era a seguinte:
1 — Nas situações referidas no n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador por conta de outrem, o trabalhador
independente e o trabalhador do regime de proteção social convergente, incluindo aqueles que se encontrassem
em regime de teletrabalho, têm direito, respetivamente, aos apoios excecionais à família previstos nos artigos
23.º a 25.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, na sua redação atual, com as necessárias adaptações
e em montante correspondente a 100% da remuneração de referência, sendo considerado para efeitos de
cálculo:
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos, agora, votar a proposta, apresentada pelo PCP, de aditamento
de um novo n.º 3 ao artigo 3.º.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do CDS-
PP, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a
abstenção do IL.
Era a seguinte:
3 — O disposto no presente artigo é aplicável a cônjuge, pessoa que viva em união de facto ou economia
comum com trabalhador considerado essencial nos termos previstos no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020,
de 13 de março, na sua redação atual, e que não aceda ao mecanismo de acolhimento previsto na Portaria n.º
25-A/2021, de 29 de janeiro.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, passamos à votação da proposta, apresentada pelo
Bloco de Esquerda, de aditamento de um artigo 3.º-A ao mesmo decreto-lei, relativamente à qual foi requerida,
pelo CDS-PP, a votação em separado do n.º 1.
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Pelo PSD!
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Assim, vamos votar o n.º 1 do artigo 3.º-A, constante da proposta de
aditamento do Bloco de Esquerda.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV
e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD, do CDS-PP,
do CH e do IL.
Era o seguinte:
1 — Nas situações referidas no artigo anterior, o trabalhador por conta de outrem tem direito a receber um
apoio excecional mensal, ou proporcional, correspondente à totalidade da sua remuneração base, pago em
partes iguais pela entidade empregadora e pela segurança social.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos proceder à votação dos n.os 2 a 9 do mesmo artigo 3.º-A.
Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do
CDS-PP, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e
a abstenção do IL.
Eram os seguintes:
2 — O apoio a que se refere o número anterior tem por limite mínimo uma remuneração mínima mensal
garantida (RMMG) e por limite máximo três RMMG.
3 — O apoio a que se refere o presente artigo é deferido de forma automática após requerimento da entidade
empregadora, desde que não existam outras formas de prestação da atividade, nomeadamente por teletrabalho,
sem prejuízo do disposto no artigo 3.º-D.
4 — A parcela da segurança social é entregue à entidade empregadora que procede ao pagamento da
totalidade do apoio ao trabalhador.
5 — Salvo o disposto no n.º 7, sobre o apoio incide a quotização do trabalhador e 50 % da contribuição social
da entidade empregadora, devendo o mesmo ser objeto de declaração de remunerações autónoma.
6 — Os apoios previstos no presente artigo e no artigo seguinte não podem ser percebidos simultaneamente
por ambos os progenitores e só são percebidos uma vez, independentemente do número de filhos ou
dependentes a cargo.
7 — Quando a entidade empregadora revista natureza pública, com exceção do setor empresarial do Estado,
o apoio previsto no presente artigo é assegurado integralmente pela mesma.
8 — Para os trabalhadores do serviço doméstico, o valor do apoio corresponde à média mensal da
remuneração registada no último trimestre de 2020, com os limites previstos no n.º 2, sendo paga metade pela
segurança social, mantendo as entidades empregadoras a obrigação de:
a) Pagamento de metade da remuneração;
b) Declaração dos tempos de trabalho e da remuneração normalmente declarada relativa ao trabalhador,
independentemente da suspensão parcial do seu efetivo pagamento; e
c) Pagamento das correspondentes contribuições e quotizações.
9 — O apoio previsto no presente artigo não é cumulável com os apoios previstos no Decreto-Lei n.º 10-
G/2020, de 26 de março.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, passamos à votação da proposta, apresentada pelo
Bloco de Esquerda, de aditamento de um artigo 3.º-B ao Decreto-Lei n.º 8-B/2021, de 22 de janeiro.
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Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do CDS-
PP, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a
abstenção do IL.
Era a seguinte:
Artigo 3.º-B
Apoio excecional à família para trabalhadores independentes
1 — Nas situações análogas às da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, caso o trabalhador independente sujeito
ao cumprimento da obrigação contributiva em pelo menos 3 meses consecutivos há pelo menos 12 meses, não
possa prosseguir a sua atividade, tem direito a um apoio excecional mensal, ou proporcional.
2 — O valor do apoio é correspondente à base de incidência contributiva mensualizada referente à média de
2019.
3 — O apoio a que se refere os números anteriores tem por limite mínimo uma remuneração mínima mensal
garantida (RMMG) e por limite máximo três RMMG, não podendo, em qualquer caso, exceder o montante da
remuneração registada como base de incidência contributiva.
4 — O apoio é objeto de declaração trimestral de rendimentos, estando sujeito à correspondente contribuição
social.
5 — O apoio a que se refere o presente artigo é atribuído de forma automática após requerimento do
trabalhador independente, desde que não existam outras formas de prestação da atividade, nomeadamente por
teletrabalho.
6 — Os apoios previstos no presente artigo e no artigo anterior não podem ser percebidos simultaneamente
por ambos os progenitores e só são percebidos uma vez, independentemente do número de filhos ou
dependentes a cargo.
7 — O apoio previsto no presente artigo não é cumulável com os apoios previstos no Decreto-Lei n.º 10-
G/2020, de 26 de março.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos, agora, votar a proposta, apresentada pelo PCP, de aditamento
de um artigo 4.º-C ao mesmo decreto-lei.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do CDS-
PP, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a
abstenção do IL.
Era a seguinte:
Artigo 4.º-C
Alteração ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março
O artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, na sua redação atual, passa a ter a seguinte
redação:
«Artigo 21.º
Subsídios de assistência a filho e a neto
1 — (…).
2 — Nas situações referidas no número anterior, é atribuído um subsídio no valor de 100% da remuneração
de referência.
3 — (Anterior n.º 2).
4 — (Anterior n.º 3).
5 — (Anterior n.º 4).
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6 — A atribuição do subsídio de doença nos termos previstos no n.º 2, não dispensa o integral cumprimento
das obrigações contributivas, a incidir sobre a totalidade da remuneração de referência.
7 — O regime previsto no presente artigo é aplicável aos trabalhadores independentes.
8 — O disposto no presente artigo é aplicável, com as necessárias adaptações, aos trabalhadores estagiários
ao abrigo da medida de estágios profissionais, prevista e regulada na Portaria n.º 131/2017, de 7 de abril, e na
Portaria n.º 206/2020, de 27 de agosto, na sua redação atual.
9 — O disposto no presente artigo é aplicável a cônjuge, pessoa que viva em união de facto ou economia
comum com trabalhador considerado essencial nos termos previstos no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020,
de 13 de março, na sua redação atual, e que não aceda ao mecanismo de acolhimento previsto na Portaria n.º
25-A/2021, de 29 de janeiro.»
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, voltamos, agora, ao Guião Regimental de votações,
para proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e Segurança Social,
relativo ao Decreto-Lei n.º 8-B/2021, de 22 de janeiro, que estabelece um conjunto de medidas de apoio no
âmbito da suspensão das atividades letivas e não letivas presenciais [Apreciações Parlamentares n.os 39/XIV/2.ª
(BE) e 41/XIV/2.ª (PCP)], que acabámos de votar na especialidade.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do
PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PS e
do IL.
Srs. Deputados, segue-se a votação, na especialidade, nos termos dos requerimentos de avocação
aprovados, do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e Segurança Social, relativo ao Decreto-Lei
n.º 6-E/2021, de 15 de janeiro, que estabelece mecanismos de apoio no âmbito do estado de emergência
[Apreciações Parlamentares n.os 40/XIV/2.ª (PCP) e 42/XIV/2.ª (BE)].
Passamos, então, ao Guião Suplementar II e começamos por votar a proposta, apresentada pelo PCP, de
aditamento de um artigo 3.º-A ao Decreto-Lei n.º 6-E/2021, de 15 de janeiro.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD e votos a favor do BE, do PCP, do
CDS-PP, do PAN, do PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar
Moreira.
Era a seguinte:
Artigo 3.º-A
Acesso ao apoio extraordinário ao rendimento dos trabalhadores
Os trabalhadores cujo subsídio de desemprego ou subsídio social de desemprego tenha cessado durante o
ano de 2020 têm direito ao apoio extraordinário ao rendimento dos trabalhadores, previsto no artigo 156.º da Lei
n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, nos termos previstos nos n.os 5 e 6 daquele artigo.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Segue-se a votação da proposta, apresentada pelo Bloco de Esquerda,
de aditamento de um artigo 3.º-A ao mesmo decreto-lei.
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Há um requerimento do PSD para votação em separado, Sr.ª
Presidente.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Não temos nenhum requerimento.
Pausa.
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A Mesa não dispõe de nenhum requerimento para votação em separado. Portanto, Sr.ª Deputada Clara
Marques Mendes, tem a palavra para formular o requerimento oral.
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Não, não, Sr.ª Presidente, quero apenas dizer que o requerimento,
de facto, foi entregue a todas as bancadas e deu entrada.
No entanto, informo, para que possamos saber, que aquilo que foi pedido pelo PSD foi para votar, em
separado, os n.os 1 e 2 e, depois, os n.os 3 e 4 do artigo 3.º-A, constante da proposta de aditamento do Bloco de
Esquerda.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.
Srs. Deputados, vamos votar e peço aos serviços que, depois, façam chegar à Mesa esse requerimento, que
ainda não chegou.
Vamos, então, votar os n.os 1 e 2 do referido artigo 3.º-A.
Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PS, votos a favor do BE, do PCP, do CDS-PP,
do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções
do PSD e do IL.
Eram os seguintes:
Artigo 3.º-A
Redução para metade do prazo de garantia do subsídio de desemprego, do subsídio por cessação de
atividade e do período de carência para acesso ao apoio aos desempregados de longa duração
1 — Têm direito ao subsídio de desemprego os trabalhadores que tenham 180 dias de trabalho por conta de
outrem, seguidos ou interpolados, com o correspondente registo de remunerações, num período de 24 meses
anterior à data do desemprego.
2 — Têm direito ao subsídio por cessação de atividade os beneficiários que tenham 180 dias de exercício de
atividade independente economicamente dependente, com o correspondente pagamento de contribuições, num
período de 24 meses anterior à data da cessação do contrato de prestação de serviço.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos, agora, votar os n.os 3 e 4 do mesmo artigo 3.º-A.
Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do
CDS-PP, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e
a abstenção do IL.
Eram os seguintes:
3 — O acesso ao apoio aos desempregados de longa duração é possível decorrido o prazo de 90 dias após
a data da cessação do período de concessão do último subsídio social de desemprego.
4 — Estas regras vigoram excecionalmente durante o ano 2021.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos à votação da proposta, apresentada pelo Bloco de Esquerda,
de aditamento de um artigo 3.º-B.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do IL e votos a favor do BE, do PCP,
do CDS-PP, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.
Era a seguinte:
Artigo 3.º-B
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Prorrogação automática de prestações de desemprego e de cessação de atividade
As prestações por desemprego, incluindo subsídio social de desemprego, cessação de atividade, cessação
de atividade profissional e restantes prestações sociais cujo período de concessão ou prazo de renovação tenha
terminado em 31 de dezembro, ou em data posterior, são prorrogadas ou renovadas automaticamente durante
o ano de 2021.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos votar a proposta, apresentada pelo Bloco de Esquerda, ainda
de aditamento de um artigo 3.º-C.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do CDS-
PP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções
do CH e do IL.
Era a seguinte:
Artigo 3.º-C
Alteração da condição de recursos do apoio extraordinário ao rendimento dos trabalhadores
1 — Para efeitos de acesso e cálculo do valor do apoio extraordinário ao rendimento dos trabalhadores, no
ano de 2021, o rendimento mensal por adulto equivalente do agregado familiar é calculado com as seguintes
adaptações:
a) é definida uma capitação de 1 para cada elemento do agregado;
c) são excluídos da consideração do rendimento do agregado as prestações destinadas a cobrir encargos
familiares, incluindo a pensão de alimentos devida a menor.
2 — Para os efeitos do número anterior, os descendentes que, apesar de viverem em coabitação, apresentem
uma média mensal de rendimentos do trabalho igual ou superior de 1,15 IAS, aferida com base nos rendimentos
dos três meses anteriores ao requerimento inicial, constituem um agregado autónomo.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos, ainda, votar uma proposta, apresentada pelo Bloco de
Esquerda, de aditamento de um artigo 3.º-D.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do
PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do
PS.
É a seguinte:
Artigo 3.º-D
Alargamento do âmbito do programa APOIAR + SIMPLES
São beneficiários do Programa APOIAR, aprovado em anexo à Portaria n.º 271-A/2020, 24 de novembro,
alterado pela Portaria n.º 15-B/2021, 15 de janeiro, os empresários em nome individual (ENI) sem contabilidade
organizada, independentemente de terem trabalhadores a cargo.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Antes de prosseguir, queria dizer à Sr.ª Deputada Clara Marques
Mendes que, há pouco, tinha razão, pois, neste momento, já chegou à Mesa o requerimento do PSD que, antes,
não havia chegado.
Srs. Deputados, vamos regressar ao Guião Regimental de votações, para proceder à votação final global do
texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e Segurança Social, relativo ao Decreto-Lei n.º 6-E/2021,
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de 15 de janeiro, que estabelece mecanismos de apoio no âmbito do estado de emergência [Apreciações
Parlamentares n.os 40/XIV/2.ª (PCP) e 42/XIV/2.ª (BE)].
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do
PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do
PS.
Vamos, agora, votar, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 94/XIV/1.ª (PEV) — Cria maior justiça no direito a
prestação por incapacidade decorrente de doença ou acidente de trabalho.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP e do IL, votos a favor do BE, do
PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções
do PS e do CH.
Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 197/XIV/1.ª (BE) — Repõe o direito dos
funcionários públicos à reparação pecuniária dos danos resultantes de acidentes de serviço e doenças
profissionais.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH, do
IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do PSD e do CDS-
PP.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, queria apenas clarificar que votei contra o Projeto
de Lei n.º 197/XIV/1.ª.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Então, votaram contra o PSD, o CDS-PP e o IL.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado André Ventura?
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, é só para informar que o voto do Chega foi favorável e iremos
entregar uma declaração de voto escrita.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Fica registado, Sr. Deputado.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr.ª Presidente, já agora, se me permite, gostaria também de usar da
palavra.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr.ª Presidente, queria corrigir o sentido de voto do PS na votação
anterior, do Projeto de Lei n.º 94/XIV/1.ª, uma vez que o PS se absteve, mas pretendia votar a favor.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Então, Sr. Deputado, assim sendo, o projeto de lei é aprovado, pelo que
vamos repetir a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 94/XIV/1.ª (PEV) — Cria maior justiça no direito
a prestação por incapacidade decorrente de doença ou acidente de trabalho.
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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das
Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PSD, do CDS-PP e do IL
e a abstenção do CH.
Já agora, para clarificar, vamos também repetir a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 197/XIV/1.ª
(BE) — Repõe o direito dos funcionários públicos à reparação pecuniária dos danos resultantes de acidentes de
serviço e doenças profissionais.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH e das
Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do PSD, do CDS-PP e do IL.
Entretanto, o Sr. Deputado André Ventura indicou que iria apresentar uma declaração de voto escrita
relativamente a esta votação.
Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 200/XIV/1.ª (PCP) — Repõe a possibilidade de
acumulação das prestações por incapacidade permanente com a parcela da remuneração correspondente à
percentagem de redução permanente da capacidade geral de ganho do trabalhador.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH e das
Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do PSD, do CDS-PP e do IL.
Srs. Deputados, vamos, agora, votar, na generalidade, o texto de substituição, apresentado pela Comissão
de Administração Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder Local, relativo aos Projetos
de Lei n.os 94/XIV/1.ª (PEV) — Cria maior justiça no direito a prestação por incapacidade decorrente de doença
ou acidente de trabalho, 197/XIV/1.ª (BE) — Repõe o direito dos funcionários públicos à reparação pecuniária
dos danos resultantes de acidentes de serviço e doenças profissionais e 200/XIV/1.ª (PCP) — Repõe a
possibilidade de acumulação das prestações por incapacidade permanente com a parcela da remuneração
correspondente à percentagem de redução permanente da capacidade geral de ganho do trabalhador.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PAN, do PEV, do CH e das Deputadas
não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do
PCP e do IL.
Vamos, ainda, votar a assunção pelo Plenário das votações indiciárias realizadas na especialidade, em sede
de comissão, relativas ao texto de substituição que acabámos de votar.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.
Segue-se a votação final global do mesmo texto de substituição.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PAN, do CH e das Deputadas não
inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP,
do PEV e do IL.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, queria anunciar que iremos apresentar uma declaração de
voto escrita sobre a última votação.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Fica registado, Sr. Deputado.
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O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado André Ventura, pede a palavra para que efeito?
O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, é para o mesmo efeito.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Fica registado, Sr. Deputado.
Vamos agora votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Administração
Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder Local, relativo ao Decreto-Lei n.º 10-A/2021,
de 2 de fevereiro, que estabelece mecanismos excecionais de gestão de profissionais de saúde para realização
de atividade assistencial, no âmbito da pandemia da doença COVID-19 [Apreciação Parlamentar n.º 43/XIV/2.ª
(BE)].
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do
PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do
PS.
Chegámos ao fim das nossas votações, mas não ao fim da nossa ordem de trabalhos. A próxima sessão
plenária realizar-se-á no dia 9 de março, terça-feira, às 10 horas, com a Sessão Solene de Tomada de Posse
de Sua Excelência o Presidente da República.
O Plenário voltará, depois, a reunir-se no dia 11 de março, às 15 horas, constando do primeiro ponto da
ordem do dia o debate sobre o pedido de autorização de renovação do estado de emergência.
No segundo ponto far-se-á a discussão conjunta da Petição n.º 40/XIV/1.ª (Movimento pela Autonomia da
Escola Superior de Gestão de Idanha-a-Nova) — Pela autonomia e manutenção da sede da Escola Superior de
Gestão de Idanha-a-Nova, bem como dos Projetos de Resolução n.os 651/XIV/2.ª (BE) — Pela autonomia da
Escola Superior de Gestão de Idanha-a-Nova, 661/XIV/2.ª (PCP) — Pela salvaguarda da autonomia da Escola
Superior de Gestão de Idanha-a-Nova, 662/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que encontre uma
solução para a Escola Superior de Gestão de Idanha-a-Nova social e territorialmente justa para o concelho,
683/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova esforços concertado para que sejam encontradas
soluções alternativas que garantam, simultaneamente, a sustentabilidade financeira do Instituto Politécnico de
Castelo Branco e a sua permanência no território de Idanha-a-Nova, contribuindo assim para a coesão territorial
e o desenvolvimento de toda esta região do interior do país, 713/XIV/2.ª (PEV) — Autonomia administrativa,
pedagógica e científica da Escola Superior de Gestão de Idanha-a-Nova, e 730/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao
Governo que promova uma solução que salvaguarde o projeto educativo da Escola Superior de Gestão da
Idanha-a-Nova e do Instituto Politécnico de Castelo Branco.
No terceiro ponto serão apreciados, conjuntamente, a Petição n.º 32/XIV/1.ª (Liga dos Amigos do Douro
Património Mundial) — Pela completa requalificação e reabertura da Linha do Douro (Ermesinde-Barca d’Alva)
e subsequente ligação a Salamanca, bem como os Projetos de Resolução n.os 822/XIV/2.ª (BE) — Pela
requalificação de toda a Linha do Douro (Ermesinde-Barca d’Alva e subsequente ligação a Salamanca),
834/XIV/2.ª (PAN) — Requalificação e funcionamento da Linha do Douro (Ermesinde-Barca d’Alva) e
subsequente ligação a Salamanca, 843/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova a modernização
e eletrificação da Linha do Douro até Barca d’Alva e a reposição da sua conexão com a rede ferroviária
espanhola, 847/XIV/2.ª (PCP) — Pela requalificação e reabertura da Linha do Douro até Barca d’Alva e
restabelecimento da ligação ferroviária internacional, e 986/XIV/2.ª (PEV) — Em defesa da Linha do Douro e
pela reativação dos ramais.
No quarto ponto procederemos ao debate conjunto da Petição n.º 628/XIII/4.ª (Vítor Alexandre Lopes Pereira
Vicente e outros) — Solicitam a adoção de medidas contras as bases de dados da Autoridade Tributária, dos
Projetos de Lei n.os 655/XIV/2.ª (PCP) — Altera os procedimentos da entrega do ficheiro SAF-T(PT) relativo à
contabilidade (Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 48/2020, de 3 de agosto) e 683/XIV/2.ª (CDS-PP) —
Procede à revogação do big brother fiscal revogando o Decreto-Lei n.º 48/2020, de 3 de agosto, e do Projeto de
Resolução n.º 886/XIV/2.ª (PCP) — Recomenda ao Governo que altere os procedimentos da entrega do ficheiro
SAF-T(PT) relativo à contabilidade.
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O quinto ponto diz respeito às votações regimentais, que terão lugar no final do debate.
Passo agora a palavra à Sr.ª Secretária Ana Mesquita, para que nos dê as informações habituais.
A Sr.ª Secretária (Ana Mesquita): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria informar a Câmara de
que esteve presente, através de videoconferência, a Sr.ª Deputada Marta Freitas, do Grupo Parlamentar do
Partido Socialista, eleita pelo círculo eleitoral da Madeira.
É tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr.ª Secretária.
A Mesa despede-se das Sr.as e dos Srs. Deputados, desejando um bom resto de dia.
A sessão está encerrada.
Eram 19 horas e 37 minutos.
———
Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação
Nota: As declarações de voto anunciadas pelo Deputado do PCP João Oliveira e pelo Deputado do CH André
Ventura referentes a esta reunião plenária não foram entregues no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do
Regimento da Assembleia da República.
———
Relativa ao Projeto de Resolução n.o 801/XIV/2.ª [votado na reunião plenária de 18 de fevereiro de 2021 —
DAR I Série n.º 46 (2021-02-19)]:
Na última Legislatura, o Grupo Parlamentar do PS votou favoravelmente o relatório final da Comissão
Parlamentar de Inquérito ao Pagamento de Rendas Excessivas aos Produtores de Eletricidade. O mesmo
relatório apresenta uma declaração de voto anexa do Grupo Parlamentar do PS que deve ser considerada na
análise desta resolução. Dessa forma concordamos com a efetivação das medidas, com a exceção dos casos
judiciais pendentes e dos contratos, que só podem ser alterados por negociação, conforme sempre defendemos.
Sublinhamos ainda que a resolução, ao recomendar ao Governo «um plano calendarizado para a efetivação das
recomendações constantes do Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito ao Pagamento de Rendas
Excessivas aos Produtores de Eletricidade, criada pela Resolução da Assembleia da República n.º 126/2018»,
está apenas a recomendar algo já recomendado em 2019. Dessa forma optámos pela abstenção.
O Deputado do PS, Hugo Costa.
[Recebida na Divisão de Redação em 5 de março de 2021].
———
Relativa ao Projeto de Resolução n.o 894/XIV/2.ª [votado na reunião plenária de 25 de fevereiro de 2021 —
DAR I Série n.º 47 (2021-02-26)]:
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou contra o Projeto de Resolução n.º 894/XIV/2.ª, apresentado
pelo PAN, com os seguintes fundamentos:
1. Desde logo porque em dezembro de 2020 foram concluídas as negociações técnicas e políticas relativas
ao Acordo Interinstitucional sobre um Registo de Transparência comum às três instituições (Comissão
Europeia, Parlamento Europeu e Conselho). Do ponto de vista formal, a PPUE pretende concluir
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formalmente este dossier, com a adoção pelas três instituições e entrada em vigor do Acordo
Interinstitucional. Recorda-se que o atual Registo de Transparência abrange apenas a Comissão
Europeia e o Parlamento Europeu, esta última instituição numa base voluntária, e que a proposta da
Comissão data de 2016.
2. Por outro lado, Portugal, através da sua Representação Permanente junto da União Europeia, aderiu,
voluntariamente, ao Registo de Transparência, passando a publicitar, desde 1 de julho de 2020, as
reuniões com representantes de interesses.
3. Pelo supra exposto, são extemporâneos os pontos 1 e 2 da presente iniciativa legislativa.
4. Além da referida extemporaneidade, o projeto de resolução em causa padece de lucidez democrática,
tão necessária nos tempos que correm, quando, perante supostas bandeiras erguidas em nome da
transparência, se esconde um falso moralismo que olha a outros fins e fica indiferente não apenas aos
meios de que se socorre, mas também às suas consequências — é o típico caça ao voto, com
pretensiosismo de moralidade, que destrói o que devia reforçar e que, no caso concreto, destrói a
obtenção de decisões por consenso entre quem legitimamente tem o mandato popular.
5. Referimo-nos, neste particular, à proposta, incluída neste projeto de resolução, de obrigatoriedade de
«publicitação das atas dos trílogos e das reuniões do órgão preparatório do Conselho da União
Europeia» e à «publicitação das suas propostas de posições sobre matérias inseridas no âmbito do
processo legislativo e das políticas da União Europeia antes de serem discutidas nas reuniões do
Conselho».
6. As decisões obtidas no Conselho da União Europeia são, como é público, resultado de longas
negociações entre todos os Estados-Membros, com vista a um consenso comum que salvaguarde os
interesses essenciais da União Europeia.
7. Exigir essa publicitação, que por natureza implicaria um compromisso público na defesa de uma
determinada posição, não apenas inviabilizaria o consenso a alcançar, como conduziria, também por
natureza, à radicalização de posições políticas que, em democracia, se devem evitar. A título de mero
exemplo, dificilmente o Mecanismo de Recuperação e Resiliência teria conhecido a luz do dia, tal como
o conhecemos, se cada Estado-Membro se radicalizasse numa posição prévia e publicamente
assumida.
8. Por analogia — importa sublinhar —, é como se um partido político, em nome da transparência das suas
decisões, obrigasse os seus dirigentes políticos a publicitarem as suas posições antes de os seus órgãos
máximos reunirem para decidir questões fundamentais da sua vida política e, por reflexo, para o país.
9. É destes ímpetos legislativos — que minam a democracia — que se alimentam os extremismos que
crescem pela Europa fora e entre nós.
10. É fácil — e também demagógico — acusar os partidos que não acompanham o presente projeto de
resolução de fomentarem o obscurantismo. Crítica que só pode partir de quem desconhece o contributo
do Partido Socialista para a conquista e a consolidação da democracia, num percurso de muitos
consensos em nome da liberdade e do melhor interesse do país.
11. Em todo o caso, não descuramos um mérito que este projeto de resolução traz ao debate sobre a
transparência política — a de procurarmos conhecer os seus limites, para além dos quais é a própria
democracia a sua principal vítima.
Os Deputados do Grupo Parlamentar do PS.
[Recebida na Divisão de Redação em 4 de março de 2021].
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Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.