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Quinta-feira, 6 de maio de 2021 I Série — Número 62

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

REUNIÃOPLENÁRIADE5DEMAIODE 2021

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5

minutos. Foi anunciada a entrada na Mesa dos Projetos de Lei

n.os 813, 815 a 817 e 819 a 823/XIV/2.ª e dos Projetos de Resolução n.os 1232 a 1245/XIV/2.ª.

Procedeu-se ao debate, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 745/XIV/2.ª (BE) — Altera o regime jurídico-

laboral de teletrabalho, garantindo maior proteção do trabalhador (Décima nona alteração ao Código do Trabalho e primeira alteração da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais), 765/XIV/2.ª (PCP) — Regula o regime de trabalho em teletrabalho, 535/XIV/2.ª (PAN) — Consagra o direito de desconexão profissional,

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procedendo à décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, 790/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Garante o direito dos trabalhadores à desconexão profissional, 791/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Reforça os direitos dos trabalhadores em regime de teletrabalho, 797/XIV/2.ª (CDS-PP) — Consagra o direito ao desligamento, procede à décima sétima alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do Trabalho, 806/XIV/2.ª (PEV) — Altera o Código do Trabalho com vista a regular o teletrabalho de forma mais justa, 808/XIV/2.ª (PS) — Procede à regulação do teletrabalho, 811/XIV/2.ª (PAN) — Regulamenta o teletrabalho no setor público e privado, cria o regime de trabalho flexível e reforça os direitos dos trabalhadores em regime de trabalho à distância, procedendo à alteração do Código do Trabalho, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas e da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, e 812/XIV/2.ª (PSD) — Altera o regime jurídico-laboral do teletrabalho (Décima nona alteração ao Código do Trabalho e primeira alteração da Lei nº 98/2009, de 4 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais), juntamente com o Projeto de Resolução n.º 1222/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que

promova um amplo debate com os parceiros sociais com vista à celebração de um acordo de concertação social sobre as matérias relativas ao futuro do trabalho, designadamente sobre as matérias do teletrabalho e do trabalho dos nómadas digitais.

Usaram da palavra, a diverso título, além do Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional (Miguel Cabrita) e do Secretário de Estado da Administração Pública (José Couto), os Deputados José Moura Soeiro (BE), Carla Barros (PSD), João Paulo Pedrosa (PS), Pedro Morais Soares (CDS-PP), Diana Ferreira (PCP), Inês de Sousa Real (PAN), Cristina Rodrigues (N insc.), José Luís Ferreira (PEV), Ana Catarina Mendonça Mendes (PS), Isabel Pires (BE), Lina Lopes e Pedro Roque (PSD), Fernando José (PS), João Cotrim de Figueiredo (IL), Clara Marques Mendes (PSD), Alexandra Tavares de Moura e Miguel Matos (PS), André Ventura (CH), Emília Cerqueira (PSD), Elza Pais (PS), António Filipe (PCP), Tiago Barbosa Ribeiro (PS) e Jorge Costa (BE).

Deu-se conta dos Deputados que estiveram presentes, por videoconferência, na reunião plenária.

A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 18 horas e 1 minuto.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes da Autoridade, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Peço que sejam abertas as galerias.

A fixação da ordem do dia, requerida pelo Bloco de Esquerda, consta da apreciação, na generalidade, do

Projeto de Lei n.º 745/XIV/2.ª (BE) — Altera o regime jurídico-laboral de teletrabalho, garantindo maior

proteção do trabalhador (décima nona alteração ao Código do Trabalho e primeira alteração da Lei n.º

98/2009, de 4 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças

profissionais).

O Bloco de Esquerda abriu, desde logo, a possibilidade a todos os grupos parlamentares de apresentarem

projetos sobre o mesmo tema, pelo que serão apreciados em conjunto, na generalidade, os Projetos de Lei

n.os 765/XIV/2.ª (PCP) — Regula o regime de trabalho em teletrabalho, 535/XIV/2.ª (PAN) — Consagra o

direito de desconexão profissional, procedendo à décima sexta alteração ao Código do Trabalho, aprovado

pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, 790/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Garante o

direito dos trabalhadores à desconexão profissional, 791/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —

Reforça os direitos dos trabalhadores em regime de teletrabalho, 797/XIV/2.ª (CDS-PP) — Consagra o direito

ao desligamento, procede à décima sétima alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código

do Trabalho; 806/XIV/2.ª (PEV) — Altera o código do trabalho com vista a regular o teletrabalho de forma mais

justa; 808/XIV/2.ª (PS) — Procede à regulação do teletrabalho; 811/XIV/2.ª (PAN) — Regulamenta o

teletrabalho no setor público e privado, cria o regime de trabalho flexível e reforça os direitos dos trabalhadores

em regime de trabalho à distância, procedendo à alteração do Código do Trabalho, da Lei Geral do Trabalho

em Funções Públicas e da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, e 812/XIV/2.ª (PSD) — Altera o regime jurídico-

laboral do teletrabalho (décima nona alteração ao Código do Trabalho e primeira alteração da Lei n.º 98/2009,

de 4 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças

profissionais), juntamente com a apreciação do Projeto de Resolução n.º 1222/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda

ao Governo que promova um amplo debate com os parceiros sociais com vista à celebração de um acordo de

concertação social sobre as matérias relativas ao futuro do trabalho, designadamente sobre as matérias do

teletrabalho e do trabalho dos nómadas digitais.

Antes de iniciarmos a ordem do dia, para dar informações à Câmara, tem a palavra a Sr.ª Secretária Maria

da Luz Rosinha.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, muito boa tarde a todas e a todos. Passo a anunciar que deram entrada na Mesa, e foram admitidos pelo Sr. Presidente, os Projetos de Lei

n.os 813/XIV/2.ª (CH), que baixa à 3.ª Comissão, 815/XIV/2.ª (PCP), que baixa à 11.ª Comissão, 816/XIV/2.ª

(PSD), que baixa à 14.ª Comissão, em conexão com a 1.ª Comissão, 817/XIV/2.ª (PCP), que baixa à 7.ª

Comissão, em conexão com a 10.ª Comissão, 819/XIV/2.ª (PEV), que baixa à 1.ª Comissão, em conexão com

a 10.ª Comissão, 820/XIV/2.ª (PEV), que baixa à 1.ª Comissão, em conexão com a 13.ª Comissão, 821/XIV/2.ª

(BE), que baixa à 7.ª Comissão, 822/XIV/2.ª (BE), que baixa à 8.ª Comissão, e 823/XIV/2.ª (PCP), que baixa à

1.ª Comissão, em conexão com a 13.ª Comissão.

Deram também entrada na Mesa, e foram admitidos, os Projetos de Resolução n.os 1232/XIV/2.ª (BE), que

baixa à 11.ª Comissão, 1233/XIV/2.ª (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1234/XIV/2.ª (PS), que baixa à 6.ª

Comissão, 1235/XIV/2.ª (PS), que baixa à 11.ª Comissão, 1236/XIV/2.ª (PCP), que baixa à 7.ª Comissão,

1237/XIV/2.ª (PS), que baixa à 8.ª Comissão, 1238/XIV/2.ª (PSD), que baixa à 1.ª Comissão, em conexão com

a 13.ª Comissão, 1239/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues), que baixa à 7.ª Comissão,

1240/XIV/2.ª (PSD), que baixa à 2.ª Comissão, em conexão com a 4.ª Comissão, 1241/XIV/2.ª (Deputada não

inscrita Cristina Rodrigues), que baixa à 1.ª Comissão, 1242/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina

Rodrigues), que baixa à 9.ª Comissão, 1243/XIV/2.ª (BE), que baixa à 8.ª Comissão, 1244/XIV/2.ª (BE), que

baixa à 6.ª Comissão, e 1245/XIV/2.ª (PS), que baixa à 11.ª Comissão, em conexão com as 12.ª e 13.ª

Comissões.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos, pois, entrar na ordem do dia, cuja fixação foi, como referi, requerida pelo Bloco de Esquerda.

Para apresentar o Projeto de Lei n.º 745/XIV/2.ª (BE) — Altera o regime jurídico-laboral de teletrabalho,

garantindo maior proteção do trabalhador (Décima nona alteração ao Código do Trabalho e primeira alteração

da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de

doenças profissionais), tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A apresentação deste projeto do Bloco de Esquerda sobre o teletrabalho teve já o mérito de fazer com que

quase todos os partidos entregassem também as suas propostas para acompanharem o agendamento do

Bloco. A nossa expectativa é de que o debate de hoje seja o pontapé de saída para um processo legislativo

que mude o Código do Trabalho e que proteja os trabalhadores, garantindo direitos, regulação de horários,

compensação por despesas, capacidade de organização coletiva, respeito pela privacidade.

A pandemia obrigou a respostas de emergência sanitária e a uma transição abrupta e improvisada para o

teletrabalho, sem mecanismos de preparação e de negociação coletiva e sem que a proteção dos

trabalhadores fosse plenamente assegurada. O teletrabalho passou de uma realidade relativamente residual

para ter uma expressão massiva, o que, aliás, revelou as ambivalências que lhe estão associadas, bem como

as consequências em várias dimensões da vida.

Ficaram evidentes as dificuldades na gestão dos tempos, com os horários de trabalho a prolongarem-se

informalmente e com a multiplicação de tarefas realizadas fora de horas. Os efeitos do teletrabalho

verificaram-se ao nível do cansaço, da ansiedade, do stress, da tensão familiar, nomeadamente no período em

que pais e mães foram obrigados — injustamente, diga-se! — a acumular o teletrabalho com o cuidar dos

filhos.

Por outro lado, muitas empresas aproveitaram o recurso ao teletrabalho para pouparem custos, imputando-

os aos trabalhadores. A este período de teletrabalho obrigatório durante a emergência sanitária correspondeu,

por exemplo, um aumento de 15% nos custos das famílias com energia, aumentando também o consumo de

internet. As despesas com a manutenção dos locais de trabalho, com equipamentos, eletricidade, água e

ligação à internet foram transferidas para os trabalhadores sem que a isso correspondesse qualquer tipo de

compensação.

Deste processo resultou evidente que a regulação do teletrabalho que hoje existe na lei é frágil e não

protege convenientemente quem trabalha. Em defesa do teletrabalho invocam-se os seus efeitos na redução

das deslocações, nas possibilidades que abre de um maior equilíbrio territorial e ambiental ou de um

aproveitamento melhor do tempo, mas os riscos associados ao teletrabalho são por demais conhecidos:

isolamento, perda dos momentos de partilha com os colegas em ambiente de trabalho, diluição das fronteiras

entre vida profissional e vida familiar e pessoal, descontrolo do tempo de trabalho e violações da privacidade e

da intimidade do trabalhador, além, claro está, da transposição de custos da empresa para os trabalhadores

ou da desarticulação de formas de organização e representação coletivas. A todos estes riscos somam-se os

efeitos diferenciados que têm, por exemplo, em termos de género e, por isso, é preciso mudar a lei.

O teletrabalho não significa isenção de horário ou uma disponibilidade permanente do trabalhador para

atender às solicitações da empresa. O teletrabalho não pode significar um corte de rendimentos pelo aumento

de despesas ou pela perda de complementos ou de subsídios, como o subsídio de refeição. O teletrabalho

não significa que a casa do trabalhador passa a ser uma dependência da empresa, sem direito de privacidade

ou com os bens pessoais do teletrabalhador postos à disposição do patrão.

O teletrabalho não pode ser a desculpa para se fingir que acidentes de trabalho, só porque ocorrem em

casa, são acidentes domésticos e, portanto, excluídos da reparação pelo seguro de acidentes de trabalho.

O teletrabalho não significa que uma comissão de trabalhadores ou um sindicato deixem de poder

contactar os trabalhadores que não estão presencialmente na empresa nem significa que deixam de os

representar.

É também para clarificar tudo isto que é preciso mudar a lei. Nas várias iniciativas que foram apresentadas

e que discutimos é possível identificar uma clivagem essencial. De um lado temos os projetos, como o do

Bloco, que defendem que a lei deve consagrar direitos e obrigações, isto é, que deve ser imperativa, seja

sobre a obrigação de pagar despesas, seja sobre equipamentos, seja sobre o direito dos trabalhadores com

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filhos menores, por exemplo. Do outro lado temos os projetos do PS e do PSD que, em lugar de consagrarem

obrigações, definem possibilidades. Ou seja, permitem que os princípios definidos pela lei fiquem dependentes

do acordo do empregador, como acontece no caso do pagamento de despesas, ou sejam afastados por

convenções coletivas que podem dispor em sentido pior, por exemplo, na salvaguarda da privacidade do

trabalhador.

Discordamos totalmente desta opção porque achamos que, precisamente nestas matérias fundamentais, a

lei tem de definir direitos e não enunciar hipóteses que ficam sujeitas à melhor ou pior vontade do empregador

numa negociação sempre desigual.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Isto não significa ser contra a contratação coletiva, pelo contrário. A contratação coletiva não é uma alternativa à intervenção legislativa, é um complemento a essa intervenção.

Podemos e devemos promover a contratação coletiva sobre estas matérias, sobre estes temas do

teletrabalho, mas nada disso é incompatível com a criação de um quadro legal que defina os patamares dos

quais parte essa negociação.

Sr.as e Srs. Deputados, uma coisa é discutir em negociação coletiva como concretizar um direito, como

concretizar uma compensação específica de despesas, por exemplo, outra coisa totalmente diferente é discutir

em contratação coletiva se esse direito sequer existe. E isso faz toda a diferença, faz mesmo toda a diferença,

quando estamos a falar da regulação legal e do modo como redigimos a lei.

Uma segunda clivagem nestes projetos tem que ver com a regulação do tempo de trabalho. Foi a primeira

convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1919, que limitou o tempo de trabalho para as

8 horas diárias na indústria. Hoje, muitos trabalhadores e trabalhadoras estão conectados ao trabalho muito

mais tempo do que isso e, ao fazer com que a prestação de trabalho como que acompanhe o trabalhador onde

ele estiver, o teletrabalho potenciou a ideia errada de uma conexão permanente, de uma escravização pela

hiperdisponibilidade para responder às solicitações do empregador, mesmo no tempo de repouso.

Ora, como diz a lei, o tempo de descanso é um tempo de não trabalho e, por isso, o direito a «desligar» já

existe e não precisa de ser consagrado como uma coisa nova, mas, sim, de ser exercido. Para que esse

direito de quem trabalha possa ser exercido livremente, o Bloco entende que a lei deve acrescentar-lhe uma

obrigação explícita da entidade empregadora, a de não conexão durante esse tempo de descanso. Isto é,

deve ser explicitado e acrescentado à lei o dever de o empregador se abster de contactar o trabalhador fora do

horário de trabalho.

A este título, queremos sublinhar que a proposta do Partido Socialista é extremamente perigosa porque, à

boleia de um acordo sobre o direito a «desligar», cria um conceito separado do tempo de trabalho, o do tempo

de contacto. Tempo de contacto? Como assim?! O tempo em que um trabalhador pode ser contactado é

tempo de trabalho, é o seu tempo de trabalho, a menos que, paralelamente ao tempo de trabalho, se queira

criar um tempo de disponibilidade não remunerada para ser contactado diferente do tempo de trabalho. Aí,

estaremos perante uma armadilha arriscadíssima na qual não devemos embarcar.

Noutras questões, até por força da diretiva europeia de 2019 sobre a relação entre trabalho e vida

profissional e familiar, a qual Portugal terá, aliás, de transpor até agosto de 2022, cremos que poderá haver

uma base comum com vários partidos para fazermos caminho e garantirmos mais direitos para pais com filhos

menores ou para cuidadores ou cuidadoras informais.

O objetivo do projeto do Bloco e do processo legislativo que hoje desencadeamos é este. Não se trata de

incentivar o teletrabalho ou, sequer, de assumir que ele é o paradigma do futuro. Trata-se, sim, de disciplinar o

teletrabalho, assumindo que depois desta experiência da pandemia haverá uma parte minoritária, mas

existente, de trabalhadores que poderá querer permanecer neste regime e que é responsabilidade da lei

laboral, do Código do Trabalho — que só o Parlamento pode alterar! —, proteger quem trabalha e minorar os

riscos decorrentes do teletrabalho, clarificando conceitos, conferindo maior proteção e direitos, definindo

regras e obrigações imperativas, garantindo a manutenção de uma relação com os colegas e os contactos

presenciais, proibindo violações de privacidade, reparando acidentes, sempre a partir de princípios

fundamentais que enquadram todo o debate sobre o teletrabalho, em Portugal e na Europa. O primeiro é que

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ele só pode existir se for voluntário, se o trabalhador quiser, e o segundo é que ele tem de ser sempre

reversível.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carla Barros, do PSD, e João Paulo Pedrosa, do PS.

Como é que o Sr. Deputado José Moura Soeiro pretende responder?

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Separadamente, a cada um dos Srs. Deputados, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado. Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Barros, do PSD.

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste debate sobre o teletrabalho, começamos por saudar todas as iniciativas hoje apresentadas. Mas queremos também fazer uma referência

especial a todas as organizações, a todos os trabalhadores que, em tempo de pandemia, foram obrigados —

empurrados! — a ir para casa e a ganhar o seu dia a dia a partir de casa, no seio das suas famílias, muitas

vezes em ambiente adverso, com os filhos a estudar ou a trabalhar online e com os idosos para cuidar, pois

alguns dos centros de dia foram encerrados e as suas atividades habituais suspensas.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, neste clima de incerteza, também chegou ao País uma certeza: a certeza

de que o teletrabalho veio para ficar. O teletrabalho irá e deverá ser intensificado de acordo com a base legal e

no cumprimento da base legal que já existe no Código do Trabalho, embora nós saibamos e reconheçamos

todos hoje que é preciso algumas clarificações, algumas alterações e alguns balizamentos na lei, para a

realização dos quais o PSD já disse publicamente que está disponível.

No entanto, também não podemos aqui encurtar o caminho da concertação social e da negociação

coletiva. Temos de deixar espaço para que estes entendimentos possam emergir do diálogo entre

representantes dos patrões e dos trabalhadores. Devemos, sim, mexer, por exemplo, nas seguintes matérias:

na melhoria do conceito de local de trabalho, para que, em caso de acidente, o trabalhador não fique

desprotegido ao abrigo da cobertura do seguro; na privacidade do trabalhador e também do seu próprio

agregado familiar; na modalidade ou na forma como se vai executar, quer para o lado do trabalhador, quer

para o lado dos empregadores, no pagamento das despesas e noutros aspetos pontuais e cirúrgicos que

podemos fazer aqui, no Parlamento.

A pergunta a fazer ao Bloco de Esquerda, Sr. Deputado José Soeiro, é a seguinte: o Bloco de Esquerda

está disponível para acompanhar o PSD nestas clarificações que hoje nos propomos fazer? Está disponível

para se despir de alguns preconceitos ideológicos que tem com a concertação social e com a negociação

coletiva, de modo a podermos incorporar e valorizar esse entendimento que possa emergir desse diálogo

social?

Enfim, o Sr. Deputado José Soeiro e o Bloco de Esquerda também terão outra oportunidade e outro

caminho para escolher, mas será um caminho mais difícil, que pode ser o caminho do Partido Socialista. E

porque é que este é um caminho mais difícil? Porque temos o Partido Socialista, Grupo Parlamentar, que

defende um teletrabalho e um caminho a percorrer no teletrabalho e, depois, temos o Partido Socialista,

Governo, que também defende um caminho, mas outro caminho, para o teletrabalho.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Por isso, Sr. Deputado, o caminho do PSD está muito bem definido e muito bem traçado. E, aí, o Sr. Deputado vai ter uma opção de escolha, hoje, neste debate, ou, então, amanhã, nas

votações.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado José Soeiro vai responder, agora, à Sr.ª Deputada Carla Barros e, depois, responderá, em conjunto, aos Srs. Deputados João Paulo Pedrosa, do PS, e Pedro Morais Soares, do

CDS-PP, o qual, segundo informação da Mesa, se inscreveu mesmo em cima do gongo.

Tem a palavra, para responder, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Carla Barros, diz a Sr.ª Deputada que o teletrabalho deverá ser intensificado. Enfim, o teletrabalho hoje atinge as proporções que atingiu porque há um

regime obrigatório no quadro das medidas sanitárias. Esse regime está a desaparecer, na medida em que

estamos numa fase de desconfinamento, pelo que o teletrabalho, pela lei do trabalho, tem de ser voluntário.

Por isso, creio que há uma parte dos trabalhadores que foram empurrados para o teletrabalho e que passarão

a poder optar. Portanto, não creio que, em termos quantitativos, venha a ser intensificado.

Sobre a contratação coletiva, já tinha dito, na minha intervenção inicial, que a mesma se articula com a lei e

complementa a lei, mas não substitui a lei na definição de direitos e de patamares mínimos. E nisso temos

uma divergência, porque nós achamos que a lei deve definir direitos imperativos para os trabalhadores e que a

contratação coletiva, sim, com certeza, é útil para clarificar especificidades, mas o direito a uma compensação

não pode ser remetido para um acordo individual.

Não podemos dizer que se vai discutir se o trabalhador tem direito à compensação pelas despesas

acrescidas, nos seguintes termos: se houver contratação coletiva, pode ter direito, se não houver contratação

coletiva, não tem direito — e isto, sabendo nós, ainda por cima, que há muitos trabalhadores que não estão

abrangidos por contratação coletiva.

Sobre questões concretas que colocou, relativamente ao projeto de lei do PSD, que fundamentalmente tem

dois artigos…

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Mais, mais!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sim, tem até mais, mas há duas matérias fundamentais que regula, uma das quais é a das despesas e de cuja proposta discordamos completamente. É que a proposta do PSD diz

que «podem ser definidos critérios e montantes a pagar», mas isto no contrato de trabalho ou em instrumento

de regulamentação coletiva. Ora, nós discordamos completamente que a lei diga que a definição de critérios e

o próprio pagamento das despesas dos trabalhadores podem constar do contrato ou podem não constar do

contrato — quer dizer, pode ser ou pode não ser — e, se não constarem do contrato, o trabalhador não tem

direito. Discordamos completamente disso.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Nada disso!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sobre a questão dos acidentes de trabalho, estamos de acordo. Creio que aí, em todos os partidos, há caminho para fazer, porque todos reconhecemos que é preciso clarificar. Mas

preocupa-nos a formulação do PSD, porque a proposta do PSD diz que o trabalhador tem de comunicar por

escrito à entidade patronal qualquer local de trabalho em que esteja que seja diferente do local habitual da

prestação do trabalho. Este dever de comunicação coloca-nos um problema,…

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Diga qual!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — … porque tememos — francamente, estou a pôr uma objeção e estamos a fazer esse debate — que imputar este ónus ao trabalhador de comunicar coloca a questão de saber

se, não tendo ele comunicado, deixa de estar protegido por este regime do acidente de trabalho. Nós

entendemos que não. Ou seja, o acidente de trabalho é todo o acidente que ocorre no local em que o

trabalhador está a prestar o trabalho ou no percurso de deslocação entre a sua residência e o trabalho e

devemos garantir que é este o princípio que prevalece.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Paulo Pedrosa.

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Soeiro, um estudo internacional recente do Economist diz-nos que 90% das pessoas que estiveram em teletrabalho jamais quererão estar a

100% em trabalho presencial e que 50% delas querem o teletrabalho para sempre.

Penso que foi também para corresponder a estas expectativas avassaladoras dos trabalhadores que

estiveram em teletrabalho que todos os partidos — e por isso saudamos todas as iniciativas propostas —

quiseram ir além dos sete artigos que estão plasmados no Código do Trabalho.

São cinco as matérias, a que V. Ex.ª também aludiu aqui, que estão em causa, sendo, na nossa perspetiva,

o projeto de lei do Partido Socialista o que melhor dá resposta a estes cinco problemas e sendo que o Partido

Socialista foi o único que não se esqueceu dos trabalhadores da Administração Pública.

E quais são as cinco matérias essenciais? São elas: o direito a desligar; o direito à privacidade; o direito,

que ainda é reforçado, à saúde e segurança no trabalho; a extensão dos seguros de acidentes pessoais, coisa

que até a proposta do Bloco de Esquerda praticamente não refere; o acordo escrito fundamental entre o

empregador e o trabalhador para que se possa fundir um acordo de teletrabalho; e, por fim, mas não menos

importante, porque até levou, no dia 23 de abril, a um elogio rasgado do Dr. Francisco Louçã — e sabemos

que o Dr. Francisco Louçã é bastante parco em elogios ao Partido Socialista —, o facto de a proposta do

Partido Socialista consagrar a retribuição igual para o trabalhador em teletrabalho e para o trabalhador

presencial, o que, segundo ele, era uma grande conquista e uma grande iniciativa do Partido Socialista.

Risos do BE.

Sr. Deputado José Soeiro, eventualmente em todo o conjunto das propostas, há um elemento que tem a

ver com a forma de cálculo dos encargos, onde provavelmente haverá alguma divergência.

A Sr.ª Deputada Catarina Martins proclamou, há algum tempo, que o Bloco de Esquerda era um partido

social-democrata. Ora, vou fazer-lhe uma pergunta para que o Sr. Deputado tenha a oportunidade de reiterar o

princípio da social-democracia também nos processos do trabalho. A social-democracia moderna pressupõe

que a contratação coletiva, a concertação social, o acordo entre as partes sejam o elemento fundamental a

estabelecer.

Por isso, pergunto se o Sr. Deputado José Soeiro acompanha o princípio da social-democracia moderna

contido na proposta do Partido Socialista para que esses encargos sejam calculados na base da contratação

coletiva e do acordo entre as partes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Por fim, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Morais Soares, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Soeiro, há cinco anos, o CDS apresentou pela primeira vez nesta Câmara, uma iniciativa para a regulamentação do teletrabalho, repetindo

no ano seguinte, com uma iniciativa que referia a necessidade de incluir novas situações para o exercício do

teletrabalho.

Quer aquando da primeira iniciativa, quer aquando da segunda iniciativa, o Bloco de Esquerda votou

contra. Nesse sentido, a minha primeira palavra para o Bloco de Esquerda é: sejam bem-vindos ao debate!

A segunda palavra é de lamento. Lamento porque foram precisos cinco anos para o Bloco de Esquerda e

restantes partidos da esquerda reconhecerem que era muito preciso debater e legislar sobre o teletrabalho. Se

tivéssemos sido ouvidos, muitas das situações que ocorreram durante a atual pandemia poderiam já estar

regulamentadas.

Como defendemos à época, e voltamos a defender hoje, a alteração à legislação quanto ao teletrabalho é

um assunto sério, que merecia ter sido precedido de um debate sério e rigoroso.

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Verificámos que nenhum dos parceiros sociais que compõem a Comissão Permanente de Concertação

Social enviou contributos sobre o projeto de lei do Bloco de Esquerda. Esta matéria, que interfere ao mais alto

nível com a vida dos trabalhadores e com a vida das empresas, deve, no entender do CDS, ser alvo de

auscultação.

Está o Bloco de Esquerda disponível para ouvir os representantes dos empregadores e os representantes

dos trabalhadores?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Morais Soares, houve uma apreciação pública, todos os projetos de lei têm períodos de apreciação pública, em que todas essas

entidades estão obviamente a ser ouvidas.

Queria comentar o que foi dito pelo Sr. Deputado João Paulo Pedrosa, do Partido Socialista, porque, em

matéria do trabalho, não basta o mero acordo entre as partes, pois, para isso, bastar-nos-ia o direito civil. O

fundamento do direito do trabalho é precisamente a necessidade de uma lei que regule aquilo que, em acordo

entre as partes, não é minimamente equilibrado. É por isso que precisamos de uma lei do trabalho que seja

imperativa, que consagre direitos, porque essa homenagem à liberdade de as partes acordarem é, no fundo,

uma forma de ocultar a profunda desigualdade da relação de forças entre essas partes que negoceiam e de,

consequentemente, muitas vezes, legitimar uma ditadura contratual da parte mais forte.

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Tem de ler os clássicos da social-democracia!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — É por isso que precisamos, também no teletrabalho, de alterar o Código do Trabalho, de definir normas obrigatórias e imperativas para quem trabalha, seja na compensação de

despesas, seja no respeito dos horários de trabalho, seja no que diz respeito aos equipamentos ou a matérias

como os acidentes de trabalho.

Curioso é que o Sr. Deputado tenha dito que todos os partidos reconhecem que não nos devemos ficar

pelos sete artigos do Código do Trabalho, ficando mesmo o Partido Socialista pelos sete artigos do Código do

Trabalho. E isto por uma razão simples: é que o Partido Socialista consegue a proeza de apresentar um

projeto de lei para regular o teletrabalho e não mexe no Código do Trabalho, não tem nenhuma alteração ao

Código do Trabalho. Não faz qualquer alteração!

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Então e os elogios do Louçã?!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — O Partido Socialista apresenta um projeto de lei que é uma legislação à parte, paralela ao Código do Trabalho, complicativa, tortuosa, que ainda por cima vai criar um grande

problema e um caos interpretativo. Porquê? Porque várias das matérias que estão aqui enunciadas neste

projeto, que é uma legislação paralela, fora do Código do Trabalho, incidem sobre matérias que também estão

reguladas no Código do Trabalho e fica a questão de saber, mantendo as duas, o que é que vai prevalecer. É

que o Partido Socialista mantém, por exemplo, o artigo do Código do Trabalho que remete, precisamente, a

definição das despesas para o acordo entre as partes. O tal acordo entre as partes.

Mesmo nesta legislação paralela que propõe, e que, de facto, tem muitos elementos de redação bastante

tortuosos, diz, no n.º 2 do artigo 3.º — Aplicação do Regime, que «Por convenção coletiva de trabalho, podem

ser afastados ou modificados regimes definidos por este diploma…» e, depois, os regimes definidos por este

diploma que podem ser afastados são quase todos.

Por exemplo, o que diz aqui sobre privacidade, pode ser afastado, e pode ser afastado em sentido menos

favorável ao trabalhador.

Quanto ao direito a desligar, Sr. Deputado, o direito a desligar não é uma norma imperativa que esteja

neste projeto sequer. Pode ser afastado? Repito: pode ser afastado?

E, sobre o acordo de cessação, também o artigo sobre o duração e cessação do acordo de implementação

de teletrabalho pode ser afastado.

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Portanto, do que precisávamos verdadeiramente não era de fazer esse discurso liberal sobre o acordo

entre as partes mas, sim, conseguir inscrever no Código do Trabalho normas imperativas que protejam os

trabalhadores, desde logo, claro, na compensação das despesas, mas não só.

Aplausos do BE.

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — E os elogios do Dr. Louçã?! Os elogios!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Gostaria de começar por deixar uma saudação aos muitos milhares de trabalhadores que saíram à rua no 1.º de Maio, na

defesa dos seus direitos, contra a precariedade, contra a exploração, por mais e melhores salários, pela

diminuição do horário de trabalho, lutas que continuam tremendamente atuais.

Aplausos do Deputado do PEV José Luís Ferreira.

O atual contexto favoreceu uma mais larga utilização do teletrabalho, facto que alguns pretendem

aproveitar para uma generalização acrítica, promovendo ilusões sobre vantagens para os trabalhadores e

omitindo consequências negativas, que, aliás, este período claramente evidenciou, de uma autêntica tele-

exploração, aparentemente mais moderna mas claramente mais profunda.

Lembramos que o trabalho ao domicílio, à peça, à tarefa, ou mesmo em vão de escada, já existiu de forma

generalizada, uma forma de exploração que foi vencida pela luta dos trabalhadores, que ficou lá atrás mas que

parece que há quem queira recuperar utilizando as novas tecnologias.

Não está em causa o aproveitamento das novas tecnologias, que devem, sim, estar ao serviço do

desenvolvimento e da melhoria das condições de trabalho e de vida. O que está em causa é o aproveitamento

por parte do capital, do patronato, para criar ilusões, para fragilizar os direitos dos trabalhadores.

O endeusamento do teletrabalho e a sua promoção como uma panaceia para todos os males é algo que o

PCP rejeita, alertando para as consequências nefastas, num curto ou num médio prazo, que a generalização

do teletrabalho pode significar para os trabalhadores e para as suas famílias.

A quem serve o recurso alargado a este instrumento? Serve ao capital, que agrava a exploração, com

intensificação do trabalho, com maior pressão para alargamento do período de trabalho, para uma

disponibilidade permanente por parte dos trabalhadores.

Quem sai efetivamente a ganhar — e a acumular — com tudo isto? Saem as entidades patronais,

especialmente as grandes empresas, que reduzem custos, que transferem para os trabalhadores custos de

instalações, de água, de eletricidade e de comunicações, bem como também a pressão para o uso de

instrumentos de trabalho do trabalhador ao serviço da empresa.

O que se pretende verdadeiramente e o que quer o capital com este instrumento? Fazer caminho para

acabar com componentes da remuneração dos trabalhadores, como o subsídio de refeição e outros prémios e

subsídios, seja no imediato ou num mais longo prazo.

E se dúvidas houvesse sobre os objetivos do patronato com a utilização do teletrabalho, elas dissipam-se

bem perante a posição assumida pela Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, no corte do subsídio

de refeição, de penosidade ou outras componentes remuneratórias, que são direitos conquistados e adquiridos

pelos trabalhadores, que são parte integrante do rendimento mensal que os trabalhadores trazem para casa e

com o qual organizam a sua vida e que há quem queira colocar em causa, confirmando os oportunismos e os

ataques aos direitos dos trabalhadores, para os quais o PCP vem alertando e que vem denunciando.

Mas há mais riscos que não podem ser ignorados: a invasão da privacidade e da intimidade da vida dos

trabalhadores; o patrão dentro da casa dos trabalhadores; a confusão entre o espaço de trabalho, o espaço

familiar e pessoal. A casa dos trabalhadores não é uma extensão da empresa nem pode ser encarada como

tal. A casa dos trabalhadores é o seu espaço privado, seu e da sua família, e isso não pode ser colocado em

causa.

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A desresponsabilização das entidades patronais perante matérias de segurança e saúde no trabalho, de

prevenção de acidentes de trabalho e doenças profissionais e de rejeição da sua reparação, num quadro em

que se potencia o desenvolvimento e agravamento de problemas do foro psicossocial resultantes do

isolamento e da solidão, bem como da não diferenciação do ambiente do trabalho e de residência.

O isolamento dos trabalhadores uns dos outros e o prejuízo daí resultante, negando a possibilidade de

partilha de experiências e conhecimentos que favorecem o seu desenvolvimento profissional e pessoal, e

também os impactos negativos no esclarecimento, na unidade, na organização e na luta dos trabalhadores.

Maiores riscos de trabalho à peça, à tarefa, de mais precariedade, de perda de vínculo com a empresa. E

mesmo retrocesso para as mulheres, enviadas novamente para casa, depois de décadas de luta para a sua

emancipação e para que pudessem trabalhar fora de casa.

Para o PCP, é claro que os trabalhadores em teletrabalho têm de ter os mesmos direitos e segurança no

trabalho que os restantes trabalhadores, conforme prevê o Código do Trabalho, e é pela salvaguarda dos

direitos destes trabalhadores que o PCP apesenta esta iniciativa. É que uma relação de trabalho não é uma

relação entre iguais. Não é e nunca foi!

É o trabalhador que é a parte mais frágil, é o trabalhador que tem de ser protegido, especialmente quando

há quem pretenda tornar definitiva uma realidade transitória e temporária para impor o teletrabalho de forma

permanente.

O PCP apresenta propostas que fixam e garantem os direitos dos trabalhadores abrangidos pelo

teletrabalho:

Um valor de 11 € por dia de ajudas de custo para compensar o trabalhador pelos gastos acrescidos com

comunicações, eletricidade, água, entre outros, rejeitando que estas responsabilidades sejam transferidas

para os trabalhadores e que tal seja tratado no plano individual;

Que um trabalhador em teletrabalho tenha um posto de trabalho seu na empresa, rejeitando a ideia de que

a casa do trabalhador seja posto ou local de trabalho, ou uma qualquer extensão da empresa, podendo

também o trabalhador, a qualquer momento, regressar ao posto de trabalho que tem salvaguardado na

empresa, assegurando-se, assim, a preservação de uma lógica temporária e transitória do trabalho a partir do

domicílio;

Que o teletrabalho não se inicie antes das 8 horas da manhã nem depois das 19 horas e que seja cumprido

escrupulosamente o horário de trabalho do trabalhador, devendo qualquer tempo extraordinário de trabalho

ser requisitado por escrito e ser devidamente pago;

Que os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação, o economato

e outros equipamentos de trabalho necessários, nomeadamente de mobiliário, a sua instalação e

acomodação, bem como a sua manutenção, sejam da responsabilidade da entidade patronal;

Que o trabalhador tenha o poder de rejeitar a proposta de teletrabalho quando considere que não estão

reunidas as condições para que preste a sua atividade com dignidade, privacidade e respeito pelas condições

de segurança e saúde no trabalho.

E também o direito de participação sindical e nas organizações representativas dos trabalhadores.

Não é o teletrabalho que resolverá um conjunto de problemas laborais sentidos todos os dias — da

exploração, da precariedade, dos baixos salários, de intensos ritmos de trabalho, de pressões, de

desregulações de horários ou longas jornadas de trabalho —, pelo contrário, poderá, sim, contribuir para o seu

aprofundamento.

Não é o teletrabalho que resolverá as dificuldades no acompanhamento aos filhos, porque teletrabalho

continua a ser trabalho e acompanhamento a filho continua a ser acompanhamento a filho, não são dimensões

conciliáveis, e os trabalhadores em teletrabalho têm o mesmo direito que os demais trabalhadores a

acompanharem os seus filhos, como estas crianças têm o mesmo direito que as demais a serem

acompanhadas pelos pais.

Sobre todas estas matérias o PCP tem intervindo, incluindo com propostas que reforçam o direito de

acompanhamento a filho. Hoje, apresentamos propostas para os trabalhadores em teletrabalho, para que

estes não fiquem desprotegidos nem sejam esvaziados dos seus direitos.

Aplausos do PCP e do PEV.

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O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada do PAN Inês Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo aqui presentes, Sr.as e Srs. Deputados: A crise sanitária veio, sem dúvida, acelerar um processo relativamente à implementação do

teletrabalho.

Se em 2018 existiam no nosso País pelo menos 800 trabalhadores em teletrabalho, hoje sabemos que no

3.º trimestre do ano passado eram cerca de 1 milhão os trabalhadores já em casa a trabalhar à distância.

Neste caso, recordo que o PAN trouxe a esta Assembleia da República um agendamento potestativo para

alertar para esta problemática e aquela decorrente do facto de este processo, ao ser acelerado pela pandemia,

poder trazer consigo virtudes, por um lado, mas também, evidentemente, vários problemas de que hoje temos

consciência, por outro.

Esta implementação que foi imposta demonstrou as vantagens do trabalho à distância, permitiu que as

atividades que, em concreto, pudessem recorrer ao teletrabalho continuassem a laborar e que o País

continuasse a produzir nessa dimensão, mas também trouxe muitas dificuldades, muitas das quais associadas

às assimetrias sociais e regionais que ainda persistem no nosso País.

No que respeita, por exemplo, às potencialidades desta modalidade, para além de ter permitido, de facto,

continuar a laborar, assistimos à redução das emissões poluentes, uma dimensão ambiental que não podemos

menosprezar, em virtude da redução das deslocações diárias casa-trabalho e trabalho-casa, vimos também

aumentar a produtividade e uma maior autonomia na gestão da jornada de trabalho que pode trazer a

conciliação da vida profissional com a vida familiar.

Mas, infelizmente, nem tudo foi um mar de rosas. Existe aqui um conjunto de fragilidades às quais não

podemos virar a cara, desde logo aquelas que têm sido apontadas do contexto socioeconómico e familiar, que

é diferente de trabalhador para trabalhador e que, efetivamente, não tem permitido o exercício de funções à

distância nas mesmas condições.

Por outro lado, não tem existido o mesmo acesso às ferramentas de trabalho e aos meios tecnológicos, e

até a mesma facilidade em conciliar com a própria vida familiar, nomeadamente com os filhos a cargo ou até

com os próprios ascendentes, em particular para as mulheres que, como bem sabemos, foram as mais

afetadas por esta crise.

Acresce ainda aquilo que já foi aqui mencionado quanto aos subsídios de refeição cortados, apesar de

nada na lei o permitir, quanto aos custos adicionais que passaram a constituir um encargo para os

trabalhadores, como a água ou a eletricidade, quanto aos próprios seguros, em que, mesmo estando em casa,

não faz qualquer sentido que não se considere isso como um potencial de risco para o trabalhador.

Segue-se também o risco de invasão da privacidade do trabalhador, havendo uma maior invasão da vida

privada, com sistemas de videovigilância apertada aos trabalhadores, e até mesmo o aumento das horas para

lá do período normal do trabalho sem o direito à compensação remuneratória devidamente acautelada, a par,

evidentemente, daquilo que nos parece ser um fenómeno cada vez mais crescente, decorrente desta

pandemia, e ao qual a matéria laboral não é alheia, como o isolamento, a dificuldade de partilha de informação

entre os trabalhadores, até mesmo de oportunidades de formação e de promoção profissional.

Estes problemas exigem, evidentemente, uma alteração da legislação laboral, que tem de estar atualizada

face a estes novos fenómenos e a esta nova realidade, dando-lhes uma resposta urgente.

O PAN, hoje, traz aqui um conjunto de iniciativas que visam, precisamente, assegurar essa transição e

essa atualidade no que respeita a esta modalidade de trabalho.

Aliás, antes mesmo da crise sanitária, tínhamos sido o único partido a apresentar iniciativas que visavam a

criação de incentivos à implementação do teletrabalho e o alargamento dos direitos dos trabalhadores, que

infelizmente foram rejeitadas por esta Assembleia.

No pacote de medidas que discutimos aqui, hoje, gostaríamos de destacar, desde logo, que é importante,

no nosso entender, a criação de um modelo híbrido e flexível de trabalho, que conjugue o teletrabalho com o

trabalho presencial, neste caso, que conjugue o trabalho à distância com a ida pelo menos uma vez por

semana ao local de trabalho, mantendo assim não só as relações sociais como também as dinâmicas de

trabalho, que é imprescindível que existam em qualquer equipa; a criação dos abonos diários para o

pagamento dos custos acrescidos com o trabalho à distância; a clarificação dos direitos dos trabalhadores em

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trabalho à distância ao subsídio de refeição e à reparação dos danos sofridos por acidente de trabalho e a

prevenção dos riscos psicossociais associados ao trabalho à distância, através, por exemplo, do

acompanhamento do bem-estar psicológico do próprio trabalhador, com serviços de psicologia, sempre que

necessário, ao trabalhador.

Mas, para além destas questões, existe uma outra dimensão que nos parece absolutamente imprescindível

acautelar, que é o alargamento da figura do teletrabalho na conciliação da vida profissional com a vida familiar,

a inclusão social e também a qualificação dos trabalhadores e da coesão territorial.

Por isso, parece-nos importante que os trabalhadores com filhos menores de 3 anos, com filhos menores

de idade com doença oncológica ou até mesmo com outras doenças crónicas, se possam socorrer desta

modalidade de trabalho.

Por outro lado, também é importante que os trabalhadores reconhecidos como cuidadores informais não

principais que queiram manter a atividade possam recorrer a esta modalidade, entre outras soluções e opções

que escolhemos para trazer aqui a esta Assembleia e que nos parece que flexibilizam este mecanismo, de

alguma forma, bastante espartilhado pelo Código do Trabalho e que têm de se adequar a esta realidade.

Para além disso, o PAN volta a insistir com o direito à desconexão familiar. Não faz qualquer sentido que

neste tempo, em pleno século XXI, o estar sempre ligado, esta cultura que nos distancia da família, do tempo

para o lazer e do tempo para nós próprios, sendo uma realidade, não tenha já respaldo na nossa legislação.

Sr.as e Srs. Deputados, Membros do Governo aqui presentes, esta discussão parece-nos ser o início de um

caminho que todos queremos que seja capaz de garantir o equilíbrio na justa e adequada relação laboral entre

direitos e interesses de trabalhadores e de empregadores e, portanto, estaremos inteiramente disponíveis

para, na especialidade, dar início a um debate e a uma discussão que é fundamental fazer-se, acima de tudo

caminhando para reforçarmos os direitos de uns e de outros e termos, assim, uma sociedade laboral mais

justa.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (N insc.): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O stress causado pela vida profissional não é uma novidade para a generalidade das pessoas.

É importante, no entanto, assegurar tempo livre ao trabalhador para que este possa descansar, gozar da

companhia da família ou de amigos.

Cria-se a ideia de que o que se está a fazer é muito importante quando, na verdade, é algo que pode ter

impactos sérios na saúde dos trabalhadores e que muitas vezes é potenciado pelos empregadores, com

chamadas e e-mails fora de horas, com pressão para trabalhar fora do horário de trabalho, não sendo vistos

com bons olhos trabalhadores que não estejam disponíveis 24 horas por dia, sete dias por semana.

A importância do trabalho que se desenvolve não é justificação para abusos, que podem levar à depressão

ou a burnout.

A perda da barreira física entre o trabalho e casa aumentou o desafio e num ano com todas as suas

particularidades, em que o teletrabalho passou da exceção à regra, foi possível verificar que este regime

precisa de ser revisto e melhorado.

É necessário garantir que o trabalhador tem direito a um acréscimo remuneratório para pagamento do

aumento das despesas, é igualmente fundamental reforçar a privacidade do trabalhador e encontrar

mecanismos para assegurar o direito à desconexão profissional.

Já apresentei um requerimento de baixa à comissão sem votação para que se possa aprofundar este

debate na especialidade.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Morais Soares, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: No dia 5 de maio de 2016 — faz hoje exatamente 5 anos — o CDS apresentou pela primeira vez

nesta Assembleia uma iniciativa para a regulamentação do teletrabalho.

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Tivemos a visão de que era necessário regulamentar e debater o teletrabalho muito antes de as nossas

vidas terem sido afetadas pela pandemia e de o mercado laboral ter presenciado uma mudança provocada por

força do vírus.

Se em 2016 e em 2017 entendemos que era oportuno debater e regulamentar o teletrabalho, o tempo veio

tornar este debate e esta regulamentação não só oportuna como necessária e imprescindível.

Sr.as e Srs. Deputados, o que também distingue os partidos políticos é a antecipação das soluções e

legislar para evitar problemas e não para os remediar.

Também distingue os partidos políticos a coerência das suas ideias e das suas propostas e nesse campo o

CDS, também quanto ao teletrabalho, demonstrou a sua linha de coerência.

Defendemos, em 2015 e em 2016, a necessidade de regulamentar o teletrabalho e de proceder a um

debate sobre incluir novas situações admissíveis para o exercício do teletrabalho.

Passados cinco anos, mantemos a mesma visão. Lamentamos que a esquerda tenha necessitado de uma

crise pandémica para nos acompanhar, mas não deixamos de dizer: «Sejam bem-vindos».

Por esse motivo, esperamos que, em sede de especialidade, possa ser feito o debate que esta matéria

exige. Os trabalhadores e os empresários exigem que os partidos políticos olhem para a necessidade de

regulamentar o teletrabalho sem a visão sectária que alguma esquerda gosta de imprimir nestes debates,

virando trabalhadores contra empresários. Quem cria empregos e que quem cria riqueza são as empresas, a

iniciativa privada, e, nesse sentido, entendemos ser necessário ouvir todos os membros da Comissão

Permanente de Concertação Social.

A maioria dos projetos de lei que hoje estão a ser discutidos não receberam quaisquer contributos nem de

representantes dos trabalhadores, nem de representantes dos empregadores. É uma situação que não pode

ser ignorada.

Não se pode legislar numa matéria com a relevância do teletrabalho sem ouvir exaustivamente quem

representa os trabalhadores e quem representa os empregadores. Por isso, sempre defendemos que este

debate deveria ter começado na concertação social.

Não só o CDS foi o primeiro partido a apresentar uma iniciativa sobre o teletrabalho como também fomos o

primeiro partido a apresentar uma iniciativa sobre o direito ao desligamento. Não deixa de ser curioso que a

esquerda que hoje reconhece a necessidade de instituir na lei o direito ao desligamento foi a mesmíssima

esquerda que, em 2016, votou contra.

Contudo, o tempo deu-nos razão e, cada vez mais, estamos convictos que esta matéria carece de ser

consagrada em lei.

Em abril de 2020, um inquérito conduzido pela Eurofound (Fundação Europeia para a Melhoria das

Condições de Vida e de Trabalho) mostrou que 37% das pessoas empregadas começaram a trabalhar em

casa por causa da pandemia.

Em 2017, o Eurostat havia estimado que apenas 5% da população ativa da União Europeia trabalhava

regularmente em casa.

O número de pessoas que mudaram para o teletrabalho atingiu mais da metade da população ativa na

Bélgica, na Dinamarca, no Luxemburgo, na Holanda, e chegou a 60% na Finlândia.

Conforme a página oficial do Parlamento Europeu refere, «embora o teletrabalho tenha salvado empregos

e permitido que muitas empresas sobrevivam à crise do coronavírus, também esbateu a distinção entre o foro

pessoal e o profissional e fez com que muitas pessoas trabalhassem fora do horário normal de trabalho,

piorando deste modo o equilíbrio entre a vida profissional e vida privada».

No referido inquérito da Eurofound, 27% dos entrevistados que trabalham em casa relataram que

trabalharam no seu tempo livre para atender aos pedidos de trabalho.

Antes da atual crise, a França, a Bélgica, a Itália e a Espanha já tinham legislado relativamente aos riscos

relacionados com a conectividade constante e ao direito de os trabalhadores desconectarem no seu tempo

livre. Repito, antes da crise. Em Portugal andamos sempre atrás do prejuízo.

Conforme consta da página oficial do Parlamento Europeu, o direito a desligar não está definido na

legislação da União Europeia e o Parlamento quer mudar isso. No dia 21 de janeiro de 2021, o Parlamento

pediu à Comissão que apresentasse uma lei para permitir aos trabalhadores desligar-se digitalmente do

trabalho durante as horas não laborais, sem quaisquer consequências, e que estabelecesse normas mínimas

para o trabalho remoto.

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Com o desenvolvimento tecnológico, existe hoje um conjunto de instrumentos que potenciam a capacidade

de trabalho à distância, através de dispositivos eletrónicos. Sendo tais instrumentos, em si, uma oportunidade

para ganhos de eficiência indiscutíveis, a verdade é que, quando usados em excesso, representam também

uma ameaça para a qualidade de vida e o equilíbrio entre o trabalho e as outras componentes da vida do

trabalhador.

Vários estudos dão conta do perigo que representa a ideia de que hoje o trabalhador tem de estar sempre

conectado, que a qualquer momento pode e deve responder a todo e qualquer impulso que lhe chega numa

mensagem através de e-mail.

Esta realidade aponta para a importância de se preservar o trabalhador de excessos, reforçando a

importância do descanso, do distanciamento e das pausas, para o próprio equilíbrio da prestação laboral.

Qualquer trabalhador tem de ter direito a poder dispor de períodos do dia em que não tenha de estar

disponível para a entidade empregadora e em que possa utilizar o tempo apenas para seu bem pessoal.

Inclusive em termos de saúde física e mental, o facto de o trabalhador poder desligar-se totalmente das

obrigações laborais e considerar como tempo só para si e para as suas atividades de lazer, ajudam-no a ser

mais saudável e a que encare a atividade laboral de forma mais positiva.

Assim e porque defendemos o bom ambiente no mercado de trabalho e a qualidade de vida de todos,

nomeadamente a conciliação entre a vida pessoal, familiar e laboral, defendemos que deve ficar

explicitamente consagrado no Código do Trabalho o direito de o trabalhador desligar, no qual poderá

desconectar-se. É, pois, essa a intenção da iniciativa do CDS, que esperamos que possa acolher a

concordância dos demais partidos.

Terminando, Sr. Presidente, se há cinco anos tivessem aprovado as propostas do CDS, certamente que

muitas das dificuldades seriam solução e não problemas, como hoje são.

O Sr. Presidente: — É a vez do Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As condições em que vivemos há mais de um ano, decorrentes da pandemia e das medidas assumidas para lhe

fazer face, obrigaram a uma mudança acentuada de hábitos de vida, a períodos extensos de confinamento e à

aplicação do teletrabalho em inúmeros casos.

Com efeito, desde 2003 que a legislação laboral prevê o teletrabalho, mas de forma voluntária e por acordo

das partes. E é esse o pressuposto que norteia as normas relativas a esta específica forma de trabalho.

Ocorre que hoje se discute o teletrabalho partindo de um pressuposto totalmente diferente, que consiste na

sua aplicação como uma obrigação, por motivos de exceção e de saúde pública, o que, aliás, evidencia já

potenciais consequências negativas, identificadas por alguns psicólogos, como sejam o aumento da

instabilidade emocional, a ansiedade e o stress.

Assim, no que ao teletrabalho diz respeito, a atual legislação laboral não dá as respostas que se impõem.

Com a enxurrada de legislação criada para procurar responder ao problema de saúde pública causado pela

COVID-19 procuraram-se mecanismos excecionais. Porém, não pode ser assumido existir à luz dessa

legislação uma resposta às alterações no mundo do teletrabalho e é preciso ter em conta que, por via da

inovação tecnológica e de alterações que estão a ser forçadas pelas entidades empregadoras, caminhamos

para transformar em normal aquilo que é exceção.

Mais: o que se está a verificar é que existem limites da dignidade da pessoa humana que estão,

frequentemente, a ser ultrapassados no regime de teletrabalho, por parte dos empregadores, através de

controlo remoto e abusivo, da desregulação horária e do aumento de formas de pressão sobre os

trabalhadores.

O controlo do cumprimento dos deveres do trabalhador não pode ser efetuado de forma abusiva. Têm de

ser respeitadas as regras do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados e o princípio da não invasão ou

intromissão na vida pessoal do trabalhador, respeitando os seus tempos de trabalho e de não trabalho, quer

existam, quer não existam horários rígidos.

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Sempre que a atividade o justifique, como é o caso de funções em que existe a definição concreta de

horário de trabalho, o rastreamento deve ser feito por escrito e o trabalhador deve ter, inequivocamente,

acesso ao registo dos seus tempos de trabalho.

O teletrabalho realizado hoje é feito, na maioria dos casos, no domicílio. Porém, não tem de ser realizado

no domicílio, podendo sê-lo em instalações da empresa, em locais públicos, em espaços de terceiros ou

mesmo até ao ar livre.

Em bom rigor, o que o define é a forma de comunicação com a organização. Ou seja, é o trabalho realizado

fora do estabelecimento ou centro de produção, dirigido pela organização mas sem contacto pessoal,

mediante a utilização de tecnologias de informação para a receção e a entrega do mesmo.

Os meios tecnológicos e outro material utilizado no teletrabalho devem ser propriedade do empregador,

podendo, ainda assim, ser do trabalhador, mas a verdade é que este pode recusar a prestação de teletrabalho

por ausência de meios e condições.

O trabalhador está, portanto, dependente de instruções de trabalho da organização e tem o direito de

utilizar as ferramentas digitais da mesma, independentemente do local de trabalho.

No caso de isso não acontecer, compete à entidade patronal suportar os custos dos meios tecnológicos,

das ferramentas e dos materiais necessários ao trabalho que não sejam fornecidos pela empresa, bem como

compensar as despesas com o aumento de consumos energéticos, rendas ou outros gastos que recaem sobre

o trabalhador por via da prestação do teletrabalho em espaços onde estes consumos sejam da sua

responsabilidade.

Um estudo de 2017, realizado pela Agência para a Energia, concluiu que as famílias portuguesas gastavam

cerca de 112 € por mês em água e energia elétrica em casa. Ora, o regime de teletrabalho provoca uma

permanência em casa, no mínimo, de mais 7 ou 8 horas diárias, ou seja, mais do que duplicam as horas ativas

na habitação, ampliando, naturalmente, os consumos energéticos também para cerca do dobro.

Naturalmente, os trabalhadores têm de ser compensados, até porque relativamente à empresa o que se

verifica é uma redução de custos, os quais, no caso de não compensação, passam indevidamente a ficar a

cargo do trabalhador.

Em síntese, e para além de todas as obrigações decorrentes da lei para a prestação de teletrabalho, Os

Verdes consideram que há necessidade de alterar a lei em vigor, com vista a permitir, designadamente, que os

trabalhadores com filhos, ou outros dependentes a cargo até aos 12 anos, com deficiência ou com doença

crónica, bem como os cuidadores, os cidadãos portadores de deficiência ou de doença crónica, ou, ainda, os

trabalhadores estudantes, tenham o direito de solicitar, por iniciativa própria, a prestação de trabalho em

regime de teletrabalho.

É também preciso que o trabalhador veja assegurado o pagamento, por parte da empresa, de custos

acrescidos relacionados com o teletrabalho, como consumos de eletricidade, água, internet ou telefone.

Propomos, ainda, que o trabalhador tenha a prerrogativa de rejeitar a proposta de teletrabalho quando

considere que não estão reunidas as condições para que a sua atividade seja prestada com dignidade,

privacidade e respeito pelas condições de segurança e saúde no trabalho.

Garante-se que o trabalhador não veja desregulado o seu horário de trabalho e que seja assegurado o seu

tempo livre e o direito ao desligamento do trabalho.

Por fim, propomos que ao trabalhador em teletrabalho seja assegurado que não lhe é imputada qualquer

falta ou repreensão disciplinar no caso de haver avarias com meios de produção, falhas de energia, internet ou

outras que não sejam da sua responsabilidade.

São, portanto, estas as propostas de Os Verdes, cujo objetivo é trazer mais justiça para o teletrabalho e

evitar, também, os abusos que hoje se estão a verificar por parte de muitas entidades empregadoras.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No futuro, talvez olhemos para 2020 como um ponto de viragem, como o momento em que muitos

trabalhadores e muitas empresas começaram a construir um novo modelo de organização do trabalho há

muito possível, mas até então marginal, o modelo do teletrabalho.

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Poderia pensar-se que foi a pandemia que trouxe a necessidade de regular esta forma de emprego, mas

dir-vos-ei que não. Todas as grandes transições tecnológicas no passado desafiaram o mundo do trabalho e

desencadearam a necessidade de novas respostas.

O Sr. Miguel Matos (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — A transição digital não é por isso exceção. Foi, de facto, a transição digital que ditou a importância e a necessidade de legislar o teletrabalho. A pandemia apenas

tornou esta questão mais urgente e inevitável.

Não é por isso «a espuma dos dias» que nos traz aqui. A necessidade de regular o teletrabalho estava

latente há muito. Aliás, recorde-se que o programa eleitoral do Partido Socialista já assinalava claramente esta

necessidade.

Aplausos do PS.

O teletrabalho que muitos vivemos durante este período não é precedente válido para o teletrabalho

regulado tal como o vemos: não foi por escolha das partes, como defendemos nesta iniciativa, mas foi imposto

pelo contexto, excecional, a que a COVID-19 nos obrigou.

A proposta que trazemos hoje a Plenário não é para a exceção do imediato, é, sim, para o futuro.

Permitam-me, Sr.as e Srs. Deputados, que vos fale de oportunidades, de riscos, de mútuo acordo, de

negociação coletiva e de igualdade de tratamento quando falamos de teletrabalho.

O teletrabalho traz consigo oportunidades, oportunidades para os trabalhadores, para os empregadores e

para a sociedade. Traz oportunidades pela flexibilidade que pode permitir, para ambas as partes, pela eventual

melhor conciliação da vida profissional com a vida pessoal e familiar,…

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … pelo menor uso de tempo de deslocações entre casa e o local de trabalho, pela menor poluição que isso mesmo implica, pelo descongestionamento dos centros

urbanos, pela possibilidade de dispersão das população e das empresas em territórios de baixa densidade,

pela facilidade de acesso global ao mercado de trabalho, independentemente da localização do trabalhador e

do empregador e pela possibilidade de levar a uma mudança qualitativa do trabalho, enriquecendo o conteúdo

e o significado do trabalho.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, se o teletrabalho comporta em si a oportunidade, traz também riscos. Traz

riscos como a atomização e o isolamento do trabalhador, a dificuldade na supervisão pelo empregador, a

diluição das fronteiras entre as diferentes esferas da vida, a indefinição sobre os horários de trabalho e as

solicitações fora de horas, a dispersão dos locais de trabalho, desligando os trabalhadores das comunidades,

o risco de este regime acentuar as desigualdades no mercado de trabalho, quer socioeconómicas, quer

geracionais, quer de género.

Por isso, para o Partido Socialista, a adaptação da relação de trabalho implica relações laborais resilientes,

capazes de equilibrar os interesses das empresas e dos trabalhadores. É preciso, portanto, prevenir os

impactos negativos do futuro que já chegou, contribuindo para a estabilidade do mercado de trabalho,

assegurando que todos os trabalhadores têm acesso às condições decentes de trabalho, independentemente

da sua situação contratual.

A iniciativa do Partido Socialista procura mitigar os riscos, potenciar as oportunidades de forma equilibrada

e de forma a estimular as vantagens para o empregador e o trabalhador.

É por isso que para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista o teletrabalho só avança por mútuo acordo

entre as partes.

Aplausos do PS.

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Sr.as e Srs. Deputados, a questão fundamental é mesmo a de definir como são assegurados os direitos

humanos fundamentais dos trabalhadores,…

O Sr. Miguel Matos (PS): — Ora bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … o funcionamento do mercado de trabalho e qual o papel das políticas públicas e da negociação coletiva no trabalho.

O Partido Socialista respeita, e respeitará sempre, a concertação social, mas também respeita, e respeitará

sempre, a função legislativa da Assembleia da República.

Aplausos do PS.

Por isso, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista assumem a responsabilidade de propor

uma iniciativa legislativa que responda a este desafio.

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Fazemo-lo de forma eficiente e equilibrada, ouvindo e acolhendo as sugestões dos parceiros sociais que tivemos o cuidado de auscultar,…

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Quais?

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … mas ouvindo também as recomendações do Governo e não ignorando a discussão que está a ser feita em sede de concertação social do bem lançado Livro Verde

sobre o Futuro do Trabalho.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o PS sabe bem o que defende, sabe bem em que é que acredita, e

acreditamos profundamente nas virtudes de uma maior intervenção dos que trabalham nos processos de

decisão, quer a nível das empresas e serviços quer a nível da economia no seu conjunto. E isto pode ler-se

não de hoje, mas na declaração de princípios a que estamos vinculados no Partido Socialista. Daí esta

iniciativa deixar um amplo espaço, sim — sublinho «um amplo espaço» —, para que a negociação coletiva

defina, setorialmente, as condições específicas e precisas do teletrabalho.

Sr.as e Srs. Deputados, uma das ideias-chave que define esta iniciativa é mesmo o equilíbrio e a igualdade

de tratamento.

A proposta do PS garante que todos os trabalhadores em teletrabalho têm os mesmos direitos e os

mesmos deveres que os trabalhadores em regime presencial.

Aplausos do PS.

A proposta do PS garante que todos os trabalhadores em teletrabalho têm os mesmos direitos e os

mesmos deveres, sejam do público ou do privado.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — A proposta do PS garante que todos os trabalhadores mantêm a remuneração e os subsídios que recebem quando passam do regime presencial para o de

teletrabalho. Por exemplo, quem recebe subsídio de refeição continua a recebê-lo.

Aplausos do PS.

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Pela mesma ordem de razão, a nossa proposta garante que é ao empregador que cabe assegurar as

ferramentas necessárias ao trabalho.

E mais: as despesas adicionais que, comprovadamente, o trabalhador suporte são compensadas pelo

empregador.

Aplausos do PS.

A nossa proposta garante o direito à privacidade, vedando controlos intrusivos através dos meios digitais.

Ainda mais no tempo em que os meios digitais possibilitam a intrusão sem precedentes, é imperioso defender

sem tréguas o direito fundamental à privacidade e à imagem.

Porque defendemos o teletrabalhador e o trabalhador em regime presencial como iguais, asseguramos ao

teletrabalhador os mesmos direitos sindicais, as mesmas condições de saúde e segurança no trabalho.

Sem perder de vista a conciliação da vida profissional, pessoal e familiar, instituímos o direito a desligar,

para garantir o direito ao descanso, o direito à não-resposta por cada uma das partes, sem que possa daí

resultar qualquer desvantagem.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a pergunta que vos trazemos é fácil: qual vai ser o futuro? Que

futuro vamos nós escolher?

O futuro do trabalho será aquilo que dele quisermos fazer, e esse futuro ditará muitas facetas do futuro das

nossas sociedades modernas.

Podemos escolher enfiar a cabeça na areia e negar que o mundo gira e evolui, ou escolher ser

construtores de uma sociedade decente. O mundo do trabalho evoluirá como resultado das decisões que

tomamos — por ação ou por inação — a nível nacional ou internacional.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista escolhe trabalho digno nos tempos modernos, longe das filas de

gente à espera de emprego e dos gestos mecânicos e repetitivos do passado.

O principal objetivo do Grupo Parlamentar do Partido Socialista é o de garantir oportunidades para que

mulheres e homens possam ter acesso a um trabalho digno e produtivo, em condições de liberdade, equidade

e dignidade. É também assim que se constrói uma sociedade decente.

O teletrabalho é uma das promessas da transição digital e, como todas as mudanças tecnológicas do

passado, terá as consequências que o seu uso social ditar.

Cabe-nos, por isso, enquanto legisladores, assegurar que essas consequências representarão um ganho

para todos, em especial para os trabalhadores, porque onde a lei não regula triunfa o mais forte, cristalizam-se

as más práticas.

Cabe-nos, Sr.as e Srs. Deputados, enquanto legisladores, tudo fazer para que as oportunidades sejam

viabilizadas e os riscos minimizados para que, no futuro, quando olharmos para 2020 como um ponto de

viragem, seja com satisfação e não com pesar pelo que se abateu sobre nós e sobre o mundo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, inscreveram-se quatro Srs. Deputados para pedidos de esclarecimento. Como pretende responder?

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Respondo em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr.ª Deputada. Assim sendo, para formular o primeiro pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel

Pires, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, já aqui dissemos que o debate de hoje é bastante importante e que deve servir, acima de tudo, para clarificar conceitos e conferir

maior proteção aos trabalhadores e às trabalhadoras.

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Ora, é exatamente porque temos este objetivo de conferir mais direitos e mais proteção que continuamos a

considerar que a proposta do Partido Socialista nos levanta algumas dúvidas. E achamos importante que este

debate responda a essas dúvidas, a essas questões, a essas críticas.

O PS, já por várias vezes, em intervenções relativas a esta matéria do teletrabalho, tem falado na

necessidade do acordo mútuo. Já hoje, o teletrabalho existe apenas se houver vontade expressa do

trabalhador. Portanto, sendo isto que existe, a pergunta prévia, até porque a expressão que utilizou na sua

intervenção foi «acordo mútuo», é no sentido de saber se o PS quer ou não alterar esta lógica.

A segunda questão tem a ver com o facto de a proposta do PS criar um regime paralelo, não mexendo no

Código do Trabalho, como já aqui referimos. As justificações para isto são várias, como também ouvimos

durante a sua intervenção, no entanto não podemos deixar de perguntar, novamente, porquê esta opção pela

criação de um regime paralelo. É que nos parece que esta opção acaba por não fazer aquilo que é essencial:

é preciso que a lei garanta os patamares de direitos e de responsabilidades, patamares mínimos de proteção,

que poderão não estar assegurados, exatamente por estarmos a falar de um regime paralelo. Com esta

opção, não havendo esta garantia, perguntamos porquê esta escolha. Além disso, há o risco de ser criada

mais confusão relativamente a esta matéria. Ou seja, o que é que acontecerá quando uma norma deste

regime paralelo não bater certo com o Código do Trabalho ou vice-versa? Como é que estas questões se vão

resolver?

Uma outra questão tem a ver com as despesas com o teletrabalho. Na opção que o Bloco de Esquerda

tomou, no seu projeto, somos claros no que toca à sua imperatividade, porque é a única forma — parece-nos

— de ter esse tal patamar comum, mínimo, que proteja todos os trabalhadores neste seu direito. Ao contrário,

a proposta do PS opta por uma solução que implica um acordo com o empregador. Além de não considerar

devidamente, do nosso ponto de vista, a relação desigual entre trabalhador e empregador, voltamos ao

mesmo erro, ou seja, deixa na indefinição uma matéria central do teletrabalho. Perguntamos porquê e se está

ou não o Partido Socialista disponível para alterar esta solução.

Uma outra matéria tem a ver com a criação do novo conceito de tempo de contacto, separado do tempo de

trabalho. Já colocámos esta questão na nossa intervenção inicial, pois parece-nos uma opção perigosa, Srs.

Deputados e Sr.as Deputadas, que pode criar uma armadilha ardilosa, em que fica a ganhar o empregador,

com um suposto tempo de contacto não remunerado. Portanto, afinal, a pergunta é básica: qual é a

justificação do Partido Socialista para esta proposta? É que não nos parece que exista qualquer justificação.

Achamos, aliás, que deve ser totalmente afastada por apresentar um perigo bastante grande.

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Já vai ser explicado!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Em último lugar, Sr.ª Deputada, a proposta do PS permite que muitas destas regras sejam afastadas por acordo, o que, obviamente, lhes vai retirar eficácia. E volto ao início da minha

questão: sem um patamar de efetividade mínima que esteja previsto na lei, não há forma de proteção efetiva

dos teletrabalhadores. E, se olharmos apenas para a proposta do PS e para o que hoje foi aludido nas várias

intervenções que fizemos, tememos que possa ser mesmo esse o objetivo, isto é, fazer passar a ideia de que

se quer mudar e de que se quer regular sem, na prática, mudar nada ou regular nada, de forma efetiva, na lei.

Aliás, numa das últimas partes da sua intervenção, a Sr.ª Deputada disse que onde a lei não impera pode

triunfar o abuso, e isso é mesmo verdade. Então, por que razão não alteram o Código do Trabalho, que é,

efetivamente, a lei que regula estas situações?

A minha última pergunta é esta: perante as opções que foram tomadas na proposta do PS, o que é que

podem, afinal, os teletrabalhadores, os trabalhadores e as trabalhadoras esperar do PS e que resultados é que

podem mesmo esperar desta discussão?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lina Lopes, do Grupo Parlamentar do PSD.

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A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, ouvi com muita atenção a apresentação que fez do projeto de lei do Partido Socialista e vou deixar-lhe uma reflexão e duas questões.

Penso que todos estamos de acordo quanto a duas coisas. Em primeiro lugar, que estamos a viver uma

situação excecional. A pandemia alterou a nossa forma de viver no dia a dia, a forma como nos relacionamos

e a forma como trabalhamos. Mas esta situação, como disse, é excecional. A pandemia não veio para ficar. A

vacinação vai vencer este vírus e normalizar o quotidiano.

Em segundo lugar, não sabemos ainda o que vem a seguir. Já existem empresas a dizer que não vão

voltar ao trabalho presencial, mas isso será, mais uma vez, algo excecional. A verdade é que não sabemos

como vai ser o trabalho depois da pandemia.

Penso que todos concordamos com estes dois factos: a excecionalidade do presente e a incerteza do

amanhã.

Mas todos concordamos também que o debate acerca do teletrabalho é crucial e inadiável.

Todos sentimos que o trabalho à distância e o teletrabalho vieram para ficar, mas, sublinho, não sabemos

ainda em que moldes.

Existem muitos trabalhadores e empresas que desejam abandonar o trabalho presencial, outros clamam

ansiosamente pelo seu retorno.

Alguns trabalhadores beneficiaram com a redução de despesas, outros, pelo contrário, ficaram em

situações críticas.

Perante estas incógnitas, o Partido Socialista decide acrescentar ainda mais incerteza, mais entropia às

relações laborais.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Sr.ª Deputada, há pessoas que se sentam em duas cadeiras ao mesmo tempo para esconder as suas posições. O PS conseguiu a proeza de se sentar em três: no Parlamento, quer

legislar sobre teletrabalho; na concertação social, o Governo do Partido Socialista ainda debate esta matéria

com as confederações patronais e sindicais e, em simultâneo, entrega-se a reflexões prolongadas sobre o

mesmo tema num livro verde ainda em discussão. Desta forma, condiciona a feitura de uma legislação

ponderada e maturada, condiciona a negociação coletiva e os parceiros sociais e condiciona o próprio

significado do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho. Parece-nos, Sr.ª Deputada, que se começou a casa

pelo telhado.

Por isso, apelo ao Partido Socialista das três cadeiras que, de uma vez por todas, se modere, respeite os

parceiros sociais e estude e debata, em sede de concertação social, as medidas adequadas à regulação do

teletrabalho.

Foi isso que fez o Partido Social Democrata antes de propor medidas cirúrgicas no seu projeto de lei: ouviu

os parceiros sociais e só depois propôs as alterações cirúrgicas ao Código do Trabalho. Não fez como o

Partido Socialista, que, primeiro, apresenta um projeto de lei, fora do Código do Trabalho, e dois dias antes

deste debate — pasme-se! — vai a correr ouvir os parceiros sociais, apenas para cumprir calendário.

Vozes do PS: — Não, não!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Foi na segunda-feira, como sabem!

Protestos do PS.

Está a doer, não está?! Pois está!

Termino, Sr.ª Deputada, com duas perguntas: não lhe parece precipitado avançar com uma legislação

avulsa, fora do Código do Trabalho, em cima do acontecimento, sem deixar um tempo de maturação, sem

saber ao certo que teletrabalho os trabalhadores e empregadores desejam?

Não considera que este assunto deveria ser previamente aprofundado, em sede de concertação social,

ouvindo os primeiros interessados no assunto do teletrabalho, em vez de os condicionarmos com uma

legislação avulsa e precipitada?

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, coloco-lhe uma questão muito concreta, porque, de facto, ouvimos a Sr.ª Deputada referir, em relação ao teletrabalho, que apenas deveria

existir por acordo entre a entidade patronal e o trabalhador e, no entanto, parece-nos que há um PS a dois

ritmos, o PS da Assembleia e o PS do Governo, que, no Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, e do

teletrabalho, defende o alargamento, por exemplo, a trabalhadores com doença crónica ou deficiência,

proposta esta que está também vertida na iniciativa do PAN. E a pergunta que se impõe é no sentido de saber

se o PS vai acompanhar esta iniciativa ou vai ficar aquém da ambição, por um lado, do próprio Governo e, por

outro, de uma medida da maior justiça social.

O Sr. Presidente: — Tem, ainda, a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Pedro Morais Soares, do CDS-PP.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, tal como referi ao Bloco de Esquerda, também o Partido Socialista, há cinco e há quatro anos, votou contra as

propostas do CDS.

Sobre a iniciativa e a posição do Partido Socialista, parece-nos que ela não está a enquadrar de forma

correta a situação do teletrabalho. A opção não pode ser entre trabalho presencial ou teletrabalho, a opção

tem de ser, sim, a de o trabalhador e o empregador conseguirem encontrar formas parciais de trabalho, seja

com dois dias em casa e três dias na empresa ou dois dias na empresa e três dias em casa. Tem de existir, de

facto, flexibilidade, de forma a permitir o trabalho à distância e não a criar uma distância entre as empresas e o

trabalhador. Isto não é compatível com regras rígidas, como a de que o empregador só pode chamar o

trabalhador à empresa com 48 horas de antecedência. Isto é não conhecer o mundo do trabalho, é não

conhecer o mundo das empresas e não confiar na capacidade e no bom senso das partes. Daí perguntar,

diretamente, à Sr.ª Deputada se está o Partido Socialista disponível para alterar regras como estas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder aos pedidos de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, agradeço as perguntas que nos foram colocadas e queria começar por esclarecer o seguinte: não há vários PS, há um PS,

que, por acaso, ganhou as eleições,…

Aplausos do PS.

… que, por acaso, está na bancada do Governo e nesta bancada e que trabalha em conjunto. Srs.

Deputados, escolham o argumento! É preciso escolher o argumento!

O que está em discussão em concertação social e que em nada belisca a discussão que estamos a fazer

aqui, hoje,…

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Ah, não?!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … é o livro verde sobre o futuro das relações laborais, que, entre muitas matérias, Srs. Deputados, também tem a matéria do teletrabalho.

A segunda nota que gostava de deixar é para os que, quando dá jeito, acham que os parceiros sociais são

absolutamente necessários e que, quando não dá jeito, acham que os parceiros sociais não são necessários…

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A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Não somos nós, pois não?!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Mas há uma coisa que lhe digo: para o Partido Socialista, o diálogo social, a concertação social é sempre para respeitar!

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, este grupo parlamentar anunciou, em janeiro de 2020, que ia legislar sobre o

teletrabalho. Ainda a pandemia não tinha os efeitos que teve, ainda o teletrabalho não era obrigatório e o

Grupo Parlamentar do Partido Socialista, aliás fazendo fé e justiça ao seu programa eleitoral, já tinha dito que

ia legislar sobre o teletrabalho.

Por isso, nós estamos de acordo com o Governo. Apoiamos, aliás, esta reflexão profunda que está a ser

feita na concertação social, e estou certa de que ouviremos da parte dos Srs. Secretários de Estado que estão

de acordo com as propostas que aqui se apresentam. Ninguém está a competir com ninguém, é só um PS e,

felizmente, estamos a governar para dar os mesmos direitos e igualdade de tratamento aos trabalhadores e

oportunidades para que as empresas se possam modernizar.

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr.as e Srs. Deputados, quero deixar uma segunda nota em nome da bancada do Partido Socialista: não esperem que a legislação do teletrabalho sirva para erguer

trincheiras entre todos nós, porque ninguém me ouvirá dizer que qualquer uma das iniciativas que estão em

cima da mesa é tortuosa, é perniciosa. Não! É a visão dos partidos, com que até posso não concordar, é a

visão que cada um tem do mundo do trabalho. Mas, em democracia, só há uma forma de dirimirmos isto: aqui,

no Plenário, num debate franco sobre as nossas propostas, e em sede de especialidade.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Por isso é que há propostas e debate!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — A Sr.ª Deputada Isabel Pires pergunta por que razão é que nós fazemos a lei extravagante e não colocamos pensos rápidos nos sete artigos do Código do Trabalho.

Não percebo a estranheza! Existe a lei dos acidentes de trabalho, existe a lei dos contratos especiais, existe a

lei de segurança e saúde no trabalho… Alguma vez isso debilitou qualquer norma que esteja no Código do

Trabalho?!

Aplausos do PS.

Calma, isto também precisa de serenidade! Do que se trata aqui, Srs. Deputados, é de regulamentar o que

já hoje existe no Código do Trabalho e as novas realidades que este tempo excecional nos trouxe, garantindo

sempre aquilo que não vejo em muitos projetos: que há igualdade de tratamento, garantindo sempre que há

uma preocupação com a segurança e a saúde no trabalho, que há uma preocupação com as condições de

trabalho, que há uma preocupação genuína com a privacidade e com a proibição de o trabalhador ser

importunado durante as horas do seu período de descanso, como está estipulado no artigo 18.º e também no

artigo 4.º do nosso diploma — basta ler.

Quanto às despesas, há uma coisa que nos divide: esta bancada não acha que só por ir para casa, por

teletrabalho, a empresa tenha de assumir todas e quaisquer despesas do trabalhador. Isso tem de ser objeto

de acordo e tem de ser comprovado qual é o acréscimo de despesa.

Por isso, não dizemos que é preciso estipular já 10 € ou 9 €, dizemos que é preciso encontrar a

racionalidade para isso.

Vozes do PS: — Muito bem!

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Deputado Pedro Morais Soares, convenhamos que há muito que divergimos em matéria de direito do trabalho. É absolutamente normal.

O PS não acompanhou as alterações ao Código do Trabalho em 2003, não acompanhou as propostas que

o CDS apresentou há cinco anos, porque temos, de facto, visões muito diferentes do que é o mundo do

trabalho e do que deve ser uma relação equilibrada.

Por último, Sr.ª Deputada Lina Lopes, quero falar-lhe de uma última questão: não se trata de legislação

avulsa, como já tive oportunidade de explicar, e, sobretudo…

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — É complementar!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Mas sabe o que é uma norma complementar ou extravagante? Quer que lhe explique? Não queria explicar aqui, mas, se for preciso, explico o que é uma

norma extravagante do Código do Trabalho, que em nada belisca o que está no Código do Trabalho.

A certeza desta bancada é apenas uma e só uma. Nos tempos modernos, há duas opções: ou enterramos

a cabeça na areia e continuamos a achar que o mundo do trabalho não mudou e que as regras têm de ser

todas tal e qual como na primeira Revolução Industrial, na segunda, na terceira, ou percebemos que estamos

na quarta revolução industrial, tecnológica, e que é preciso acompanhar os tempos modernos, garantindo

sempre o direito dos trabalhadores e o direito dos empregadores.

Só assim é que se constrói uma sociedade equilibrada e decente.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.

A Sr.ª Presidente: — Cumprimento as Sr.as e os Srs. Deputados, os Srs. Membros do Governo e todos os demais presentes, jornalistas e funcionários.

Continuando com a nossa ordem de trabalhos, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Pedro

Roque, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Pedro Roque (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em função da situação pandémica, o ano de 2020 trouxe mudanças sem precedentes para a economia mundial e

para o mundo do trabalho.

As medidas de confinamento obrigaram boa parte da população ativa a permanecer em casa, mas a

continuar a trabalhar remotamente nos setores onde tal fosse possível, dando origem à mais abrangente

experiência de teletrabalho de sempre.

Importa perspetivar a realidade pós-pandemia, que, em termos de teletrabalho, não será igual à que existia

antes, mas que deve ser, também, diferente da presente, em que o teletrabalho se generalizou como pôde,

afastando um princípio basilar do disposto no Código do Trabalho, isto é, o acordo entre as partes sob a forma

contratual.

Torna-se, assim, importante que se possa revisitar o Código do Trabalho, tendo em consideração a

perspetiva razoável do crescimento de uma realidade laboral que era residual antes desta situação de saúde

pública.

O PSD entende que a legislação laboral deve ser equilibrada e estável. Devem ser os parceiros, em sede

de Comissão Permanente de Concertação Social, e em primeira instância, a discutir esta questão e,

desejavelmente, a chegar a um compromisso tripartido, que possa ser vertido em proposta de lei, por parte do

Governo.

Aplausos do PSD.

Caberá, então, ao Parlamento exercer a sua função legislativa, com o princípio norteador de respeito pelo

equilíbrio, obtido de modo tripartido.

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É nesse sentido que apresentamos um projeto de resolução, recomendando a promoção de um amplo

debate com os parceiros sociais, com vista à celebração de um acordo sobre matérias relativas ao futuro do

trabalho.

O PSD compreende, porém, a necessidade imediata de algumas clarificações.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Exatamente!

O Sr. Pedro Roque (PSD): — Por isso, apresenta, também, um projeto de lei minimalista, após auscultar todos os parceiros sociais.

Aplausos do PSD.

Propomos alterações pontuais, mas necessárias, ao quadro legislativo, no sentido de clarificar e densificar

algumas debilidades que se têm sentido na aplicação do regime do teletrabalho.

Todavia, não deixa de ser curioso aquilo que verificamos por parte de alguns outros partidos.

Por parte do Bloco de Esquerda e do PCP, admitimos que, de modo ideologicamente coerente, temos

projetos de lei que desequilibram profundamente o Código do Trabalho.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Não é verdade!

O Sr. Pedro Roque (PSD): — Não é de admirar. São partidos que têm uma visão conflituante das relações laborais e, desse modo, desvalorizam as convergências alcançadas na concertação social.

Da parte do PS, constatamos o princípio, tão caro a Deng Xiaoping, de «um partido, dois sistemas.»

Aplausos do PSD.

Por um lado, há a sua versão «grupo parlamentar», que apresenta um projeto de lei denso que altera o

Código do Trabalho sob a forma de um novo regime jurídico, uma legislação extravagante. Por outro lado, há o

«PS governante», que encomenda o Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, que o apresenta na concertação

social aos parceiros e que, com eles, inicia um debate que, precisamente em face da iniciativa do seu grupo

parlamentar, se torna inconsequente e desvalorizador do relevante papel da concertação social.

Somos claramente favoráveis ao incremento do teletrabalho em situação pós-pandémica. Apesar de alguns

aspetos menos positivos, as vantagens superam largamente os inconvenientes para os trabalhadores, para as

empresas e até para o próprio ambiente, como seja, por exemplo, evitar os tempos de deslocação pendulares

quotidianos, maior equilíbrio entre a vida profissional, pessoal e familiar, a flexibilidade de horários ou a

possibilidade de trabalho a partir de um local alternativo.

Daí reiterarmos o apelo ao Governo — e saudamos a sua presença neste debate: a concertação social

constitui o palco institucional para a conciliação de interesses entre empresas e trabalhadores.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Pedro Roque (PSD): — A obrigação do Governo, enquanto um dos vértices do tripartismo, é no sentido da promoção do diálogo, da obtenção de um acordo sobre matérias relacionadas com o futuro do

trabalho…

Aplausos do PSD.

… e da sua tradução em proposta de lei, para que o Parlamento altere o Código do Trabalho, mantendo o

seu equilíbrio e a sua estabilidade. O Governo ainda vai a tempo de fazer isto.

São estas as condições sine qua non para que todos os atores laborais conheçam as regras e, desse

modo, se promovam as condições conducentes a uma sempre desejável paz social.

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Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Inscreveu-se o Sr. Deputado Fernando José, do Grupo Parlamentar do PS, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Pedro Roque.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando José (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, começo por saudar todas as iniciativas que nos trouxeram à volta do tema do teletrabalho.

É consensual que as disposições que o Código do Trabalho dedica ao teletrabalho evidenciam que várias

questões essenciais se encontram, neste momento, a descoberto de qualquer regulamentação. Com efeito, ao

tempo em que foi elaborado, a realidade do teletrabalho, em Portugal, era praticamente marginal e muito

pouco conhecida.

Como sempre, essas lacunas de previsão, que não podem ser preenchidas por analogia ou por extensão

de normas referentes ao contrato de trabalho típico, oferecem espaços abertos à determinação unilateral dos

empregadores. A experiência recente do teletrabalho obrigatório em contexto de pandemia confirma essa

ilação.

Temos, pois, de legislar para o futuro e não com a análise presa nos desafios do atual contexto. Temos de

densificar a legislação laboral sobre a matéria do teletrabalho, mas deixar amplo espaço à negociação

coletiva.

Ora, do projeto de lei do Grupo Parlamentar do PSD, retiramos a afirmação de que, na falta de estipulação,

o serviço de internet e de comunicações presume-se do trabalhador — presume-se, cabe esclarecer.

Protestos de Deputados do PSD.

Remete-se o acréscimo de despesas pelo teletrabalho para o disposto no contrato de trabalho ou em

instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, podendo ser definidos critérios e montantes a pagar,

designadamente através de um valor certo pecuniário a entregar ao trabalhador em regime de teletrabalho.

No essencial, não toma posição sobre a parte à qual cabe suportar as despesas, apenas acrescentando a

possibilidade de o pagamento de despesas ser feito através do pagamento de um valor certo pecuniário —

sobre isto também cabe esclarecer.

Por outro lado, na possibilidade de controlo da atividade laboral, com visita ao domicílio do trabalhador em

teletrabalho, concluímos por uma utilização de conceitos indeterminados no n.º 1 e no n.º 2. Discorda-se,

ainda, da proposta de alteração ao ponto n.º 3, uma vez que a legislação laboral já prevê que as visitas

apenas podem ter como objetivo o controlo da atividade laboral, e apenas no período compreendido entre as 9

horas e as 19 horas.

A solução vigente é preferível à da proposta do PSD, que refere que as visitas têm de ocorrer durante o

período normal de trabalho.

Em conclusão, estamos todos de acordo quanto à necessidade de regulamentar uma matéria que irá

potenciar a conciliação entre a vida familiar e profissional. Teremos, agora, de encontrar um consenso, com o

envolvimento dos parceiros sociais, de forma a ser possível encontrarmos as melhores respostas para este

caminho que nos desafia a todos.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roque, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Pedro Roque (PSD): — Sr.ª Presidente, começo por saudar o Sr. Deputado Fernando José e por agradecer as questões colocadas.

Há passos nesta sua intervenção com que concordo em absoluto, nomeadamente quando fala em legislar

para o futuro.

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Trata-se de legislar para o futuro, uma vez que o regime que tem vigorado é o de teletrabalho forçado, em

função das circunstâncias, o que é absolutamente compreensível, porque, de facto, houve que evitar os

contactos físicos, tanto nas deslocações de casa para o local de trabalho ou do local de trabalho para casa,

como no próprio espaço laboral.

Portanto, nos setores em que tal foi possível, é compreensível. Foi algo com que todos concordámos e

compreendemos que aquilo que está disposto no Código do Trabalho, que é o acordo entre as partes,

deixasse de fazer aqui sentido.

Mas trata-se de legislar para o futuro, porque já todos percebemos que a realidade pós-pandemia, em

matéria de teletrabalho, vai ser necessariamente diferente daquilo que era antes. Os trabalhadores e os

empresários viram virtudes no teletrabalho, o que é algo de positivo, e importa legislar sobre isso.

Relativamente ao espaço para a negociação coletiva, entendemos que, para além do Código do Trabalho,

há um amplo espaço para a negociação coletiva em matéria de teletrabalho. Isso pode servir também para

dinamizar a própria negociação coletiva, porque cada setor tem especificidades num conjunto de matérias, e

também nestas matérias relacionadas com o Código do Trabalho.

No entanto, quando o Sr. Deputado vem falar na questão dos parceiros, devo dizer que considero que o

Partido Socialista fez algo que não é concertação social. Isto é, desenhar um projeto de lei e, a posteriori,

chamar os parceiros sociais para lhes pedir, digamos, uma apreciação sobre um projeto de lei que já está feito

é tudo menos concertação social.

A concertação social é algo absolutamente institucional, que replica o modo de funcionamento da

Organização Internacional do Trabalho, o organismo mais antigo das Nações Unidas, fundado em 1919, e que

é tripartida entre Governo, parceiros sindicais e parceiros empresariais.

Isto que vocês fizeram está, pois, longe de ser concertação social.

Cabe ao Governo dinamizar a concertação social, promover os entendimentos, refletir esses

entendimentos — porque são equilibrados, conferem estabilidade à legislação laboral e garantem a paz social,

sempre desejável —, convertê-los numa proposta de lei e apresentar a proposta de lei ao Parlamento. Então,

o Parlamento, respeitando, ou procurando respeitar, o equilíbrio criado na concertação social, legisla.

O que fizeram, como já foi dito, foi «começar a casa pelo telhado». Ora, esse não é um processo correto.

Não quer dizer que não haja virtudes em todos os projetos de lei. Reconhecemos que existem, mas, de

facto, teria sido preferível o caminho normal, aquele que presidiu ao Código do Trabalho inicialmente, às

revisões do Código do Trabalho, e aquele que é sempre o caminho seguido por todos os governos,

independentemente de quem está à sua frente.

Reitero que o Governo ainda pode, na concertação social, obter este entendimento, apresentar uma

proposta de lei e juntar essa proposta de lei ao debate na especialidade que se fará juntamente com estes

projetos de lei, de forma a termos uma lei em matéria de teletrabalho que reflita a realidade e seja útil para os

trabalhadores, os empresários e a economia nacional.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O teletrabalho abre muitas oportunidades. Os trabalhadores podem exercer as suas profissões

com mais autonomia. As empresas podem tornar-se mais produtivas. Os tempos e os impactes ambientais

das deslocações para o trabalho serão reduzidos. Novas formas de trabalho colaborativo serão estimuladas e

até cidadãos nacionais ou estrangeiros poderão trabalhar remotamente a partir de Portugal.

Todas estas oportunidades existem e podem aumentar a qualidade de vida de numerosos portugueses ao

mesmo tempo que estimulam a economia. Compete a este Parlamento garantir que estas oportunidades

sejam proporcionadas a quem delas, livremente, queira fazer uso.

Convém recordar que a contratação coletiva e a concertação social são legítimas fontes de direito do

trabalho. Por isso nos incomoda tanto a desvalorização da contratação coletiva que emerge das várias das

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propostas aqui em discussão. Não faz sentido que seja esta Assembleia a impor um enquadramento único

para o teletrabalho, que todas as empresas, de todos os setores e de todas as regiões do País, seriam

obrigadas a seguir.

Certamente que as empresas, os trabalhadores e os seus representantes legítimos estarão bem mais

preparados para decidir a melhor forma de adaptar o teletrabalho às suas necessidades.

O atual Código do Trabalho tem mais de 560 artigos e já vai em 18 alterações desde 2009. É altura de

conter a pulsão reguladora e respeitar a vontade das partes e dos parceiros sociais. Só assim se poderá

aproveitar as oportunidades abertas pelo teletrabalho e também evitar as suas armadilhas e injustiças.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr.ª Presidente. Só um Estado controlador, que não confia, nem na capacidade de os parceiros sociais chegarem a bons

acordos, nem na expressão da vontade livre das pessoas, é que tem esta ânsia de regular tudo e de sufocar

tudo. Deixem o País respirar. Deixem o País teletrabalhar.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita.

Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional (Miguel Cabrita): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No dia em que são discutidas diferentes propostas legislativas relativas ao

teletrabalho e a matérias conexas, da iniciativa de vários partidos e Deputados, quero, em primeiro lugar,

naturalmente, saudar as propostas, exprimir a posição, aliás conhecida, do Governo sobre várias das matérias

nelas plasmadas e hoje trazidas ao Plenário, e exprimir, também, as nossas preocupações sobre este debate,

debate parlamentar, mas, acima de tudo, um debate que percorre toda a sociedade portuguesa e no qual se

jogam dimensões de grande sensibilidade para os trabalhadores e para as empresas.

Permitam-me, por isso, que aqui deixe algumas notas.

Em primeiro lugar, e como já aqui foi dito, este debate ocorre num momento muito particular do tempo. O

teletrabalho conheceu, ao longo do último ano, uma expansão sem precedentes. Há dez anos, apenas cerca

de 5% das pessoas, em Portugal, tinham tido qualquer experiência de trabalhar com alguma regularidade fora

do local de trabalho, a partir de casa, e em 2019, antes da pandemia, essa percentagem tinha subido para

pouco mais de 14% de pessoas que alguma vez tinham tido essa experiência.

Pelo contrário, no segundo trimestre de 2020, em plena pandemia, a proporção de trabalhadores que

trabalhou sempre ou quase sempre em casa ultrapassou os 23%, mais de um milhão de pessoas, e nalgumas

regiões, como em Lisboa, chegou mesmo a ultrapassar os 35%.

Mas sabemos — já aqui foi dito — que esta expansão ocorreu num quadro de absoluta excecionalidade, a

pandemia, que deu origem, desde logo, a um quadro legal todo ele excecional, por necessidade, já aqui

reconhecida por vários partidos, de agir no quadro da saúde pública.

Esse quadro rompeu com o princípio basilar do acordo entre empregador e trabalhador, tornou o

teletrabalho, em diferentes momentos, ou isento de acordo ou mesmo obrigatório, como sucedeu no último

confinamento, e sabemos, também, que foi operacionalizado com a urgência exigida pelas circunstâncias.

Portanto, neste quadro de saúde pública, em que houve períodos de confinamento, setores encerrados,

escolas encerradas, um quadro que motivou muitas empresas e trabalhadores a optarem transitoriamente pelo

teletrabalho, total ou parcial, para proteção própria e dos outros, a expressão que o teletrabalho ganhou tem

duas características que, neste momento, nos devem fazer ter a maior cautela ao debater o tema, em

particular para fins legislativos.

A primeira característica é que, sim, o teletrabalho foi experimentado por um número sem precedentes de

trabalhadores e de empresas e que esse alargamento da experiência agudizou a nossa consciência coletiva e

individual sobre as potencialidades e os riscos do teletrabalho.

Mas há uma segunda característica: essa experiência e consciência não ocorreram num quadro de

normalidade, nem sequer replicável. Pelo contrário, incluíram pessoas e empresas que nunca teriam optado

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pelo teletrabalho caso tivessem tido essa possibilidade ou caso as circunstâncias fossem diversas. Por isso, a

experiência do último ano tende a enfatizar as dificuldades e os riscos do teletrabalho.

Assim, na perspetiva do Governo, a experiência do teletrabalho neste último ano, por ter ocorrido em

circunstâncias tão difíceis, tão urgentes, tão diferentes da normalidade e fora do quadro habitual de

voluntariedade e acordo, não pode corresponder à avaliação que fazemos do teletrabalho em geral e para o

futuro, que é o que procuramos fazer neste debate.

Aplausos do PS.

É fundamental, por isso, ter presente — e sobretudo no momento presente — que o teletrabalho em

pandemia não foi e não é «o» teletrabalho. Pelo contrário, foi uma pandemia que obrigou a que houvesse

teletrabalho em situações onde, porventura, ele não era imaginado, antecipado, desejado por uma ou

nenhuma das partes. Mas foi necessário.

Esta é uma diferença fundamental que aconselha — aconselha mesmo! — prudência, equilíbrio e uma

reflexão aprofundada sobre cada uma das questões que estão em cima da mesa, para que não se confunda o

teletrabalho, o seu potencial e riscos, com a pandemia e os seus efeitos. E é esta capacidade para discernir

entre o que é resultado do teletrabalho ou resultado da pandemia que é absolutamente essencial num quadro

de enorme exigência para empresas e trabalhadores. Seria sempre um desafio enorme num debate desta

natureza, mas tenho a certeza de que, no momento em que ele é travado, haverá capacidade para discernir

estas duas realidades.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Portugal foi um dos primeiros países a ter um quadro de regulação

do teletrabalho, que, apesar das mudanças que houve ao longo do tempo no mundo do trabalho, na tecnologia

e na capacidade para a usar, tem observado princípios que se têm mantido relativamente estáveis: o acordo

escrito entre o empregador e o trabalhador, salvo quando estipulado, em contrato de trabalho, que os

instrumentos de trabalho, nomeadamente os respeitantes às tecnologias de informação, são fornecidos pelo

empregador, que deve assegurar a sua instalação, manutenção e, também, o pagamento das despesas

inerentes; o princípio fundamental de que o teletrabalhador tem de ter os mesmos direitos e deveres dos

demais trabalhadores; e o respeito pela privacidade do trabalhador e dos seus tempos de descanso, bem

como o proporcionar, pelo empregador, das mesmas condições de trabalho que são asseguradas a outros

trabalhadores.

Na perspetiva do Governo, estes princípios básicos têm todo o sentido e permanecem atuais num quadro

de normalidade, sem prejuízo da necessidade, reconhecida, de terem aprofundamento, densificação e de

serem objeto de um novo olhar à luz da evolução do teletrabalho, da evolução dos meios tecnológicos e,

também, das relações de trabalho. Precisamos de garantir um quadro legislativo que assegure os direitos aos

trabalhadores, dando espaço ao acordo, à negociação coletiva e, acima de tudo, incorporando a

especificidade destas relações de trabalho.

Aplausos do PS.

É por isso que no Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho — que já aqui foi invocado e que era um

compromisso do programa eleitoral e do Programa do Governo — o Governo identificou, claramente, algumas

das questões que nos preocupam e que, na nossa ótica, devem nortear a ponderação coletiva das questões

relativas ao teletrabalho: salvaguardar este princípio basilar do acordo entre empregador e trabalhador;

reforçar a negociação coletiva neste domínio; assegurar que este acordo consegue o equilíbrio entre as partes

e previne muitos dos riscos e problemas que podem advir das situações em que o teletrabalho foi imposto e foi

necessário no quadro da pandemia; densificar as possibilidades e modalidades de adoção de modelos

híbridos entre trabalho presencial e à distância, desde logo prevenindo os riscos de isolamento; garantir que o

teletrabalho não implique acréscimo de custos para os trabalhadores, e que há clareza — clareza! — deste

ponto de vista, na questão do pagamento das despesas relativas aos instrumentos de trabalho utilizados.

Aplausos do PS.

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Não menos importante é garantir o cumprimento de regras de segurança e saúde no trabalho. Vários

destes aspetos estão presentes nas propostas e, em particular, nas propostas do Partido Socialista. E há outro

aspeto muito importante: a garantia da salvaguarda da privacidade dos trabalhadores, encontrando

mecanismos concretos para operar essa salvaguarda.

Claro que este debate sobre o teletrabalho não se esgota nestas matérias, mas também nas questões para

as quais o teletrabalho tem implicações muito significativas, como a conciliação entre trabalho e vida familiar e

a assimetria entre homens e mulheres, questões que devem ser ponderadas num quadro mais vasto. Aliás,

está também em curso, na concertação social, esse debate acerca do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho

e matérias conexas — e, sublinho, não é apenas sobre teletrabalho, que é uma das muitas matérias tratadas

nesse Livro —, que é um debate muito mais amplo, que toca muito mais matérias e que tem enorme

centralidade na concertação social.

Aplausos do PS.

Queria concluir, Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, dizendo que parte das linhas de reflexão e

orientação que identifiquei encontram reflexo em propostas que estão em discussão no quadro parlamentar.

Citei algumas do Partido Socialista, mas, obviamente, outras têm também virtualidades, não inteiramente

coincidentes com a reflexão que desenvolvemos — como é normal num quadro parlamentar que é diverso —,

mas, ainda assim, com margem, esperamos, para encontrar as soluções e os equilíbrios que respondam a

vários dos desafios que aqui se colocam.

Os votos que formulo, em particular num debate que decorre num tempo ainda de pandemia e quando

procuramos virar esta página e perspetivar o futuro, são os de que este debate, em particular o que decorre no

Parlamento, seja feito com tempo, ponderação, profundidade e equilíbrio dos diferentes valores que estão em

presença. O teletrabalho é uma questão marcante do nosso tempo e em que se exprimem quer os riscos, quer

o potencial, nas condições certas, das mudanças nas nossas sociedades e no mercado de emprego. É esse

caminho de melhoria e de potenciação de oportunidades, mas também de mitigação de riscos, que, como aqui

já foi dito, tem de ser encontrado. E faço votos para que assim seja.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Secretário de Estado, a Mesa regista três inscrições para pedidos de esclarecimento. Como deseja responder?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional: — Responderei em conjunto, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para formular o primeiro pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, o senhor falou na densificação das normas do teletrabalho, mas há uma questão prévia que tem atravessado este debate para lá

do conteúdo concreto das normas da regulação do enquadramento, que é saber como se faz.

O Partido Socialista tem esta proposta extravagante — não quero ofender a Sr.ª Deputada Ana Catarina

Mendes, mas foi a expressão que utilizou —, uma proposta de uma legislação paralela, extravagante, fora do

Código do Trabalho. Ou seja, é uma regulação do teletrabalho fora do Código do Trabalho e, francamente,

ainda não se ouviu aqui nenhum argumento convincente para que seja essa a opção.

Diz o Partido Socialista «mas já existe, o regime de reparação dos acidentes de trabalho já é um regime à

parte». Pois é, mas o teletrabalho, hoje, já está dentro do Código do Trabalho. Não deve haver um regime

paralelo, à parte, fora do Código do Trabalho. Aliás, aqui, no Parlamento, ninguém concorda. Talvez haja uma

grande convergência entre o Partido Socialista e o Governo sobre esta solução, mas pergunto-lhe, Sr.

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Secretário de Estado: com quem vai convergir o Partido Socialista, no Parlamento, sobre o teletrabalho? Com

o Governo, certamente, converge!

Do nosso ponto de vista, esta é uma solução esquisita, que vai criar ruído, caos interpretativo. Os

trabalhadores em teletrabalho não são trabalhadores à parte, não devem ter um regime paralelo que contenda

com o Código do Trabalho. Isso não faz sentido!

Sobre o acréscimo de despesas, a proposta do Partido Socialista faz depender esse pagamento do acordo

do empregador. Ou seja, ele não é imperativo, pode ser feito, pode não ser feito, depende do acordo do

empregador. Isto é o que diz a norma.

Vozes do PS: — Leia, leia!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Eu leio, não há problema, mas conheço bem a proposta do Partido Socialista! A proposta diz assim: «As despesas que, comprovadamente, e com o acordo do empregador, o

trabalhador suporte como direta consequência da aquisição». Ora, faz depender o pagamento do acordo do

empregador.

Portanto, o que o Partido Socialista aqui anunciou como sendo um avanço imperativo relativamente ao

pagamento, à remuneração dos trabalhadores foi o pagamento do subsídio de refeição. Estamos de acordo.

Como é evidente, entendemos que a lei deve garantir condições iguais aos trabalhadores presenciais e aos

teletrabalhadores, mas, francamente, também não é uma grande novidade porque, no dia 3 de abril de 2020, o

Governo — e bem! —, a Autoridade para as Condições do Trabalho e a Direção-Geral do Emprego e

Relações do Trabalho emitiram uma circular de perguntas e respostas sobre o teletrabalho, e à pergunta 19,

«Se eu estiver em teletrabalho, tenho direito ao subsídio de refeição?», a resposta é «Sim, tem».

Portanto, claro, é muito bom que fique na lei, mas mau seria se não ficasse. Não é essa a grande novidade.

Não íamos agora, depois desse esclarecimento do Governo, fazer uma legislação que retirasse o subsídio de

refeição aos trabalhadores. Estamos de acordo.

Aquilo em que, de facto, não estamos de acordo — e gostávamos de saber a opinião do Governo sobre

isso — é quando o Partido Socialista, por exemplo, diz: «Nós vamos defender, sem tréguas, o direito à

privacidade». Ora, o direito à privacidade está no projeto de lei apresentado pelo Partido Socialista onde se

diz, no artigo 10.º n.º 3, o seguinte: «é vedada a captura de imagem, de registo de som, de registo de escrita,

de acesso ao histórico ou o recurso a outros meios de controlo que possam afetar o direito à privacidade do

trabalhador». Muito bem, estamos de acordo.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Concluo, Sr.ª Presidente. Só que na aplicação da lei diz-se que esta norma — esta norma, entre outras — pode ser afastada por

acordo. Isto é que não faz sentido!

Pergunto, pois, ao Governo se não considera que a regulação do teletrabalho deveria ser feita com normas

imperativas e com uma alteração ao Código do Trabalho e não com esta confusão que foi aqui proposta.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, depois de o ouvir fiquei um pouco mais confusa quanto à posição do Governo sobre a

matéria do teletrabalho. E se eu fiquei confusa, naturalmente, os portugueses que nos estão a ouvir também

ficaram.

Antes de lhe colocar algumas questões, e para centrar o debate na verdade e na realidade, vamos

começar por duas notas. Primeira nota: ao contrário do que foi dito ao longo desta tarde, designadamente pelo

Partido Socialista, o teletrabalho, conforme está previsto no Código do Trabalho, desde 2003 — ou seja, desde

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2003 que temos o regime de teletrabalho fixado no Código do Trabalho —, é um regime que visa o acordo das

partes. Portanto, não é uma novidade.

A novidade foi o que vivemos e o que temos vivido ao longo deste ano, a excecionalidade da situação.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — E o facto de o Governo ter imposto, como medida sanitária — porque foi uma medida sanitária —, o teletrabalho desvirtua, porque é diferente, o que está no Código do

Trabalho.

Como o Sr. Secretário de Estado disse — e bem —, e o PSD concorda, de facto, não podemos partir para

um debate sobre o teletrabalho, sobre o futuro do teletrabalho, com as premissas erradas,…

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — … ao contrário daquilo que está a ser feito esta tarde por alguns partidos.

O Sr. Pedro Roque (PSD): — Exatamente!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Também concordamos com o Sr. Secretário de Estado quanto ao facto de que deve haver uma reflexão, um debate profundo sobre esta matéria, e que não devemos partir da

experiência da pandemia para discutir o futuro do teletrabalho.

Aqui chegados, pergunto ao Sr. Secretário de Estado como é que se sente quando representa um Governo

socialista que apresentou o Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, que mandou elaborar à concertação

social, e quando depois, nas costas do Governo,…

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — … nas costas da concertação social, o Partido Socialista, no Parlamento, apresenta este projeto de lei.

Aplausos do PSD.

Além do desrespeito pela concertação social, considero que é um desrespeito pelo próprio Governo e pelo

Partido Socialista, que está a governar.

Aplausos de Deputados do PSD.

Sobre este ponto, há outra pergunta a que também é importante que o Governo responda. É que o Sr.

Secretário de Estado disse que é necessária a dita reflexão e que a reflexão está a ser feita em concertação

social. Ó Sr. Secretário de Estado, qual é o objetivo de ter levado um Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho à

concertação social? É trazer depois, ao Parlamento, uma proposta de lei sobre o futuro do trabalho, na qual

está incluído o teletrabalho?

O Sr. Pedro Roque (PSD): — Essa é que é a questão!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Essa é uma resposta que o Sr. Secretário de Estado tem de dar. Isto porque o Partido Socialista ignorou por completo aquilo que o Governo quer fazer e avançou com esta

iniciativa.

Para terminar, quero dizer o seguinte: de facto, isto parecem dois Partidos Socialistas. Mas eu até tendo a

concordar com a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes quando diz que não, que é só um Partido Socialista.

Está é completamente à deriva!

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Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Morais Soares do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, o que se espera do Governo, em primeira análise, não é que resolva os problemas, mas que legisle a priori e que

não ande sempre atrás dos acontecimentos. O Governo, Sr. Secretário de Estado, está sempre atrás do

prejuízo.

O que fez o atual Governo relativamente ao teletrabalho? Não foi só não evitar os problemas, como deveria

ter feito, pois, desde 2015, que é alertado pelo CDS para a necessidade de promover um debate sério, em

sede de concertação social, sobre o teletrabalho, o Governo não fez rigorosamente nada.

Lamentavelmente, só no passado dia 26 de abril, após já saber que diversos partidos tinham entregado

propostas sobre o teletrabalho, é que o Governo anunciou que tinha convocado os parceiros sociais para uma

reunião da concertação social sobre o futuro do teletrabalho.

O Governo não fez o que deveria ter feito, não previu, andou a reboque da situação e dos partidos

políticos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Termino já, Sr.ª Presidente. Por isso perguntamos, Sr. Secretário de Estado, porquê este atraso? Porque é que não deu ouvidos ao

CDS? Porque é que foi preciso uma crise pandémica para despertar para o teletrabalho?

De facto, é lamentável.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Morais Soares, agradeço a sua pergunta. O Sr. Deputado está, claramente, mal informado.

Como já aqui foi dito, estas matérias estavam previstas no programa eleitoral e, acima de tudo, no

Programa do Governo. Em relação ao Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, que foi aprovado, estava já

anunciado que seria feito em 2020, mas, entretanto, aconteceu uma pandemia. Talvez o Sr. Deputado a

tivesse previsto, mas eu, pessoalmente, não a previ, ninguém a previu. Fomos todos apanhados de surpresa,

menos o Sr. Deputado, porventura.

Risos do PS.

Em qualquer caso, queria dizer que, durante a pandemia, agimos a tempo e quando foi necessário. Foi isso

que fez com que muitos locais de trabalho — embora criando problemas sobre a aplicação das normas sobre

teletrabalho — tivessem um quadro de regras que é absolutamente excecional e que permitiu, em qualquer

caso, que muitos setores e empresas pudessem funcionar, pois, ao receberem apoios, a economia não

paralisou e os trabalhadores não ficaram ainda mais expostos ao risco de desemprego e de outros problemas

sociais decorrentes do quadro económico e social que, entretanto, se gerou.

Agradeço também as perguntas da Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes. Creio, no entanto, que há aqui

algum défice de perceção sobre a atuação do Governo nesta matéria.

O Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho percorre muitíssimas matérias. O teletrabalho será uma pequena

parte da discussão, porque há um conjunto de áreas muito diversas, algumas relativas a questões

tecnológicas, outras relativas às relações de trabalho, outras relativas a áreas conexas à própria evolução do

mercado de emprego. Portanto, é um trabalho que tem vindo a ser desenvolvido, que foi partilhado em

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primeira mão com os parceiros sociais, com as principais linhas de orientação, em novembro de 2020, e que

foi agora apresentado aos parceiros e está em discussão.

Há, no entanto, uma coisa que lhe quero dizer, Sr.ª Deputada: naturalmente, cada instituição, cada

entidade e cada órgão de soberania tem a sua esfera de atuação, tem a sua legitimidade, tem os seus tempos.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Eu disse isso!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional: — Mal seria que cada uma das áreas e os órgãos de soberania não tivessem a sua autonomia para poderem fazer o seu trabalho

como entendem e, no quadro parlamentar também, perante as iniciativas apresentadas pelos diferentes

partidos.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Deputada fala-me de contradições, mas houve até um partido — veja lá, Sr.ª Deputada — que

apresentou um projeto de resolução para recomendar ao Governo que discutisse em concertação social as

questões do teletrabalho no dia 22 de abril de 2021 e, quatro dias depois, apresentou uma iniciativa legislativa

para alterar as questões de teletrabalho.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Não, não!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Ouviram a concertação social?!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional: — Desculpe, e era em quatro dias que íamos fazer o debate em sede de concertação?!

Houve um projeto de resolução do PSD para se fazer uma discussão em sede de concertação e, quatro

dias depois, entregaram uma iniciativa legislativa, nesta Câmara. Portanto, Srs. Deputados, isto ficará com

certeza com o vosso partido e com as opções que toma, com toda a legitimidade.

Por fim, respondendo ao Sr. Deputado José Soeiro, a quem agradeço as notas que deixou, far-me-á o

favor de não me pedir para me pronunciar sobre matérias que foram apresentadas pelos diferentes partidos.

Não seria curial que o fizesse. Foram iniciativas parlamentares dos diferentes partidos — do PS, como de

outras forças políticas. Como compreenderá, o Governo estará seguramente mais perto da orientação da

proposta do PS do que está das de outros partidos. É natural que assim seja, seria, aliás, estranho que não

fosse assim.

Gostaria, em qualquer caso, de deixar duas notas sobre as perguntas que fez. A primeira foi a referência

que fez a aspetos que foram clarificados recentemente por serviços do Estado, com a intervenção na área do

trabalho. Como compreenderá, Sr. Deputado, é bastante diferente que haja um esclarecimento dos serviços

públicos ou estar plasmada na lei a clarificação acerca do aspeto que referiu, como, aliás, de outros.

Por outro lado, também tenho de dizer — e não será novidade para ninguém— que temos uma visão um

pouco diferente e que, creio, também perpassa a proposta do PS, a que o Sr. Deputado fez referência, da

relação entre a lei, que, estamos completamente de acordo, é absolutamente necessária, em particular num

quadro de desigualdade como é o das relações laborais, e aquele que é o espaço de autonomia que,

acreditamos, deve existir para a negociação coletiva. Isto porque ter uma negociação coletiva só de nome, que

não tem autonomia em relação à lei, não é negociação coletiva, é apenas pegar em pequenos aspetos da lei e

clarificá-la.

Ora, não é essa a nossa visão. Como sabe, o Código do Trabalho prevê um conjunto de matérias que

estão reservadas, do ponto de vista do chamado tratamento mais favorável, normas que não podem ser

afastadas, mas há matérias em que pode e deve ter autonomia. A matéria de teletrabalho, salvaguardando as

questões fundamentais, é claramente uma das matérias em que há margem para que a autonomia da

negociação, do acordo da vontade das partes, em particular, na negociação coletiva, seja respeitada e até

promovida.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, José Couto.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (José Couto): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Programa do Governo preconizava já uma aposta no teletrabalho no sentido de fomentar a

autonomia dos trabalhadores, através da flexibilização da prestação do trabalho, mas não da flexibilização dos

vínculos laborais. O Programa do Governo promovia a conciliação da vida profissional com a vida pessoal e

familiar, também por esta via.

A Administração Pública não desconhecia esta modalidade de trabalho, embora fosse vista com alguma

desconfiança ou ceticismo por parte de alguns dirigentes e de algumas organizações.

O contexto pandémico veio, reconhecidamente, acelerar a transformação tecnológica da Administração

Pública e comprovar que é possível mudar processos e torná-los mais eficientes, desconstruir preconceitos

sobre o teletrabalho, designadamente ao nível da produtividade, da destruição da cultura organizacional e de

equipas e da segurança de dados, entre outros.

É, portanto, certo que, durante a pandemia, o recurso ao teletrabalho na Administração Pública veio

demonstrar que trabalhadores e dirigentes conseguiram, e conseguem, trabalhar em rede e em colaboração,

além das lógicas formais e das fronteiras das organizações e dos circuitos clássicos a que estava habituada.

Isto mesmo comprova o recente estudo feito pela Direção-Geral da Administração e do Emprego Público

(DGAEP), um estudo feito pela Administração Pública e sobre a Administração Pública, que incide sobre a

adaptação dos modelos de organização do trabalho na Administração Pública durante a pandemia.

O Sr. Miguel Matos (PS): — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Mas, Srs. Deputados, também é verdade que o recurso ao teletrabalho obrigatório, em massa, em permanência e com todos os membros do agregado

familiar confinados no domicílio, não faz transparecer aquilo que pode ser esta modalidade de prestação de

trabalho em tempo de normalidade nem aquilo que queremos que seja o recurso ao teletrabalho no futuro.

Tenho dito que não vemos no teletrabalho nenhuma panaceia dos tempos modernos, como já foi repetido

aqui por algumas bancadas. Sabemos, com certeza, que o teletrabalho é uma realidade que veio para ficar,

porque assim o querem trabalhadores e porque assim o querem empregadores. O que queremos é tirar dele

as vantagens que possa ter, seja ao nível da conciliação da vida profissional com a vida pessoal e familiar,

seja ao nível da potenciação das tecnologias de informação, seja ao nível da formação e capacitação, seja

ainda ao nível da coesão territorial e de questões ambientais, muito pertinentes nos nossos dias.

Queremos fazer esse percurso de forma participada, com respeito pelos direitos laborais, pelos direitos à

privacidade dos trabalhadores e das suas famílias, pelos limites da duração do período normal do trabalho, do

direito ao descanso, da igualdade de género — foi muito difícil pôr as mulheres no espaço público e não

queremos tirá-las, por esta via, desse espaço —, prevenindo a alienação de trabalhadores face às suas

equipas, ou em matérias de acidentes de trabalho que garantam o nexo de causalidade entre a prestação de

trabalho e o facto danoso.

Foi por isso que, em julho — em julho, Srs. Deputados! —, quisemos ouvir os sindicatos da Administração

Pública sobre esta matéria, que nos trouxeram importantes contributos de reflexão sobre esta questão.

Temos promovido um conjunto de formas de discussão através de oficinas participativas com dirigentes e

trabalhadores sobre este tema e é por isso, também, que vemos com agrado que esta discussão se faça no

Parlamento, com um debate democrático alargado, com diversos projetos de lei e com diversas soluções que,

certamente, serão consensualizadas na Assembleia da República e sairão melhores do que as iniciativas

parcelares de cada grupo parlamentar.

Penso que temos toda a vantagem em fazê-lo, mantendo a flexibilidade deste instrumento e os direitos dos

trabalhadores, olhando para os ganhos e para as eventuais poupanças e para o ónus que aqui existam para

ambas as partes, salvaguardando sempre a voluntariedade e a reversibilidade deste instrumento.

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A Administração Pública pode e deve ser o catalisador destas novas formas de trabalho para outras

realidades do País e o Estado empregador tem não só esta capacidade de se apresentar como foco de

transformação neste processo, mas também como um importante papel de multiplicador de boas práticas e de

disciplinador da relação laboral nestes novos modelos.

Aplausos do PS.

A Administração Pública não se demitirá, nem neste nem noutros temas, de ter este papel.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Secretário de Estado, tem um pedido de esclarecimento. Para formular esse mesmo pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alexandra Tavares de Moura,

do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Alexandra Tavares de Moura (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, no debate de julho de 2020, afirmei que o teletrabalho se constituía como um importante

instrumento de diferenciação, de melhoria, de eficácia e de eficiência da Administração Pública portuguesa.

A modernização administrativa passa pela inovação de estratégias, pela inovação de práticas que apoiem a

construção de uma sociedade digital, uma sociedade de futuro onde cabe o estímulo do trabalho à distância,

que deve ser encarado como uma oportunidade de promover a descentralização e desconcentração gradual

da Administração Pública.

Aplausos do PS.

De acordo com a Eurofound, é bastante provável que as taxas de teletrabalho permaneçam

significativamente mais altas do que eram antes do início da pandemia. Um estudo, apresentado pela DGAEP,

sobre as transformações que se operaram na Administração Pública, revela que a grande maioria de

dirigentes públicos considera que o teletrabalho não teve um impacto negativo na produtividade, nem afetou a

motivação dos trabalhadores.

Para a maioria dos dirigentes, este é o momento-chave para se reverem os modelos de organização do

trabalho na Administração Pública, bem como para proceder a uma regulamentação mais fina e rigorosa.

Acrescento que 68% dos trabalhadores em funções públicas inquiridos considera que o teletrabalho concilia

de forma muito positiva a vida pessoal, familiar e profissional.

Paralelamente, e porque defendemos que esta forma de trabalho pode e deve ser mobilizadora do interior

e da sua valorização e porque o teletrabalho não é trabalho em casa, lembramos que já foram protocolados 57

espaços de coworking no interior.

Aplausos do PS.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o mundo mudou. Sabemos que, em muitas áreas das nossas

vidas, as mudanças são irreversíveis. O teletrabalho é uma realidade, veio para ficar. E, ao contrário do

expectável, é acolhido de forma muito positiva pelos trabalhadores em funções públicas. É nossa obrigação

garantir que os direitos dos trabalhadores são salvaguardados, sem prejuízo dos objetivos das organizações,

encontrando o equilíbrio entre a mitigação das desvantagens e a ampliação das vantagens.

Sr. Secretário de Estado, aproveitaria para o questionar se não considera que é nossa obrigação garantir

este passo como sendo um passo fundamental na construção de uma sociedade mais justa, mais coesa e

mais igual.

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, José Couto.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Sr.ª Deputada, agradeço a sua pergunta. Queria dizer-lhe que nós consideramos, desde a primeira hora, que as oportunidades de valorização do

interior por essa via são enormes.

Queremos desenvolver um conjunto de espaços de coworking que possa envolver trabalhadores da

Administração Pública de diversas áreas, fomentando até lógicas de trabalho colaborativo, para que as

organizações e os seus trabalhadores não se fechem sobre os seus espaços e as suas atribuições, mas

possam, também por essa via, cooperar.

Com isso, poderemos ter efeitos positivos no despovoamento do interior, que é um flagelo terrível que o

País vive, sendo necessário começarmos a fazer caminho. Se esse instrumento também serve este propósito,

achamos que sim e achamos que o devemos fazer por essa via também, com ganhos, como dizia, de

participação e de colaboração entre as organizações porque são espaços que reunirão, num mesmo sítio, em

colaboração com as autarquias locais, de resto, diversos trabalhadores da Administração Pública no sentido

de fomentar a cooperação e de podermos ter um interior mais valorizado e mais povoado.

Não há sentido nenhum em mantermos as lógicas clássicas de serviços localizados nas grandes cidades,

quando podemos usar esse instrumento para também fazermos caminho neste aspeto da coesão territorial.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Costa Matos, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: Hoje, falamos de trabalho e a grande lição dos últimos 200 anos é que o trabalho gera riqueza, mas que esta só é

sustentável quando o trabalho é digno, quando tem direitos, quando os salários são justos e os horários

decentes. Essa é uma verdade que tem de perdurar perante a transformação do trabalho, da sua forma e da

substância.

Antes da pandemia, já a transição digital dava a conhecer novas formas de trabalho e, associados, os

mesmos, velhos problemas: em plataformas digitais, tantas vezes associadas a falsos recibos verdes; na

robotização, substituindo empregos; na digitalização de processos, que, embora positiva, às vezes é difícil e

desigual; e, claro, no teletrabalho.

Devemos encarar o futuro do trabalho com exigência, abraçando-o, sim, mas, sobretudo, transformando-o.

É por isso que o Parlamento deve, em diálogo com os parceiros sociais, legislar para o futuro, sem ignorar as

lições do presente. É a isso que o Partido Socialista se propõe.

A experiência e o investimento no teletrabalho a que a pandemia nos obrigou será, no futuro, uma opção

que muitos escolherão. Essa tem de ser uma escolha livre, que depende de uma relação voluntária e

equilibrada, com direitos e deveres, do trabalhador e do empregador.

O teletrabalho pode permitir melhor conciliação, permite aos trabalhadores fazerem valer-se pelo mundo

todo e aos empregadores encontrar talento pelo mundo todo, mas tem custos e consequências que temos de

regular e, obrigatoriamente, compensar. Devemos fazê-lo muito conscientes de que o teletrabalho não é a

mesma coisa do que o trabalho presencial, não é uma panaceia a tornar regra no futuro, não é um martírio

também.

Pelo contrário, o teletrabalho exige de nós uma responsabilidade redobrada para com o equilíbrio das

relações laborais — é isso o que o PS propõe.

Porque sabemos as consequências do teletrabalho, na saúde física e mental, propomos um

acompanhamento de saúde e de segurança no trabalho, todos os anos, em vez de a cada dois anos.

Porque se perde a comunicação imediata e pessoal, no local de trabalho, entre colegas, com

consequências no desenvolvimento profissional, asseguramos encontros presenciais a cada dois meses e

uma antecedência de 48 horas para convocatórias de reuniões presenciais.

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Porque o portátil e o smartphone facilitam o contacto fora de horas e o trabalho permanente — como

muitos testemunhamos — o teletrabalho torna-se, assim, com muita facilidade não um paraíso, mas um

inferno na conciliação da vida profissional e pessoal.

Sr.as e Srs. Deputados, para os portugueses, os horários longos não são nenhuma novidade. Somos dos

países onde mais horas se trabalha e onde quase metade das horas extraordinárias não são remuneradas,

tirando 600 milhões de euros dos bolsos dos trabalhadores. É para esses trabalhadores que deve falar quem

diz que não é preciso regulamentar o direito a desligar, que os horários de trabalho e de descanso já estão na

lei. Isto porque quem trabalha sabe que as leis que temos não chegam. Nós queremos mais tempo, para nós,

para as nossas famílias, para as nossas vidas.

Aplausos do PS.

O PS é muito claro: não só têm os trabalhadores o direito a desligar, como os empregadores têm o dever

de não contactar os trabalhadores no seu período para «desligar». E para que os teletrabalhadores sejam

livres de organizar o seu tempo de trabalho, limitar o tempo de contacto implica, necessariamente, fixar

horários para o contacto, o que, na falta de acordo, é apenas e só o horário de trabalho, apenas e só a

vontade do trabalhador.

É assim, com direitos, que asseguramos igualdade entre quem trabalha no digital e quem trabalha no

presencial. É assim que rompemos com a precariedade, como fizemos na reforma dos estágios profissionais

ou com a reforma das leis laborais.

Fazendo-o não fazemos apenas a transição digital, mas também a transição climática — com menos

deslocações, com mais comércio local, com mais tempo e proximidade às nossas famílias e às nossas

comunidades, com mais liberdade.

É tempo de agir para transformar o futuro do trabalho. É tempo de agir para assegurar uma transição digital

e climática justa. É tempo de agir para regulamentar o teletrabalho, para que seja um teletrabalho com direitos

e com futuro.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista tem razão: o mundo mudou. E mudou tanto que, no seu programa de 2019, dizia o seguinte: o teletrabalho deve ser incluído na

negociação coletiva e, sobretudo, deve ser alvo de um amplo debate de concertação social. Isto é

precisamente o contrário do que fez neste ano, com as críticas de todos os sindicatos por não ter participado

no processo de negociação.

O mesmo PS que dizia que iria integrar este processo na negociação coletiva, criou um anacronismo legal,

criando um regime complementar, quando Portugal, a par de Itália, foi o primeiro país da Europa a incluir no

Código do Trabalho a legislação do teletrabalho.

O Partido Socialista de então parece não ser o Partido Socialista que hoje temos aqui. Portugal e Itália

foram dos primeiros países, em 2003, a regular o teletrabalho e fizeram-no no Código do Trabalho e não em

qualquer regime complementar que, amanhã, estará nas mãos de outro qualquer Governo transitório que o

queira fazer.

Mas a tendência e o padrão do Partido Socialista, neste momento, mantiveram-se. O mesmo Governo que

fez uma requisição do Zmar para tirar as casas aos moradores, é o mesmo Governo que impõe o teletrabalho

como sendo obrigatório, mesmo que 80% das empresas discordem disso. São 80% os empresários que

discordam do teletrabalho obrigatório!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, vou terminar.

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E o que fez o Governo do Partido Socialista? Ignorou e esqueceu! Esta é a tendência da governação

socialista que temos e isso, também em relação ao teletrabalho, vê-se perfeitamente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: No fim deste longo debate, estivemos a discutir, nestas intervenções, algo que não é o que está em causa.

Passou-se o debate inteiro a confundir o regime do teletrabalho, dizendo-se que, agora, iria passar a ser

voluntário, com horários de trabalho, com direito a «desligar». Permitam-me, mas o PSD não pode sair deste

debate sem vos recordar o n.º 5 do artigo 166.º do atual Código do Trabalho, que diz respeito ao teletrabalho,

porque é bom que todos nos recordemos do que ele diz: o contrato está sujeito a forma escrita e deve conter a

identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes; a indicação da atividade, com menção expressa do

regime de teletrabalho e correspondente retribuição; a indicação do período normal de trabalho…

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Exatamente!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — … se o período previsto para a prestação de trabalho em regime de teletrabalho for inferior à duração previsível do contrato de trabalho; a indicação do responsável pela respetiva

instalação e manutenção dos equipamentos e pelo pagamento, bem como a identificação do estabelecimento.

O que parece que se debateu hoje foi a imposição aos trabalhadores, pelo Governo, da prestação de

trabalho domiciliário. Isso não é teletrabalho! Esse é voluntário, por natureza. Foi aqui anunciado como se de

algo de novo se tratasse. Não é!

Aplausos do PSD.

O que aconteceu foi que vimos milhares e milhares de trabalhadores relegados para o seu domicílio,

enquanto tomavam conta dos seus filhos, que estavam em casa por causa da pandemia e não podiam

frequentar a escola. Tinham os seus dependentes sem tempos livres, sem apoio domiciliário, sem centros de

dia, sem absolutamente nada, e viram-se obrigados a conciliar o impensável: tomar conta dos filhos, dos

dependentes, dos idosos e, simultaneamente, exercer as suas funções, funções que nunca pensaram exercer

em regime de teletrabalho. Isso foi o que aconteceu!

O PSD, ao contrário do PS, ouviu os parceiros sociais no seu grupo parlamentar, antes de apresentar as

propostas e isso é fundamental. Não falamos em concertação social para, depois, ignorarmos os parceiros

sociais. Somos coerentes, hoje, ontem e sempre, portanto, antes de apresentar qualquer iniciativa, sim,

ouvimos os parceiros sociais e todos nos disseram: «É necessário um amplo debate.»

Neste momento, ainda não se consegue perceber exatamente o que é preciso mudar, porque não se

legisla bem quando não se está em tempo de normalidade.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Exatamente!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Por isso, o PSD, de forma muito coerente, apresentou um projeto de resolução que recomenda ao Governo que dialogue na concertação social. E, Sr. Secretário de Estado, ainda

bem que o apresentámos, porque pode ser que, assim, ouça os parceiros sociais. Tendo em conta a postura

do Partido Socialista e do Governo, é preciso recordar-lhe que tem de respeitar os parceiros sociais, o que

sistematicamente não tem feito, como, aliás, eles nos têm dito ao longo desta e da anterior Legislaturas — o

pró-formanão é concertação, não é diálogo. Ainda bem que apresentámos o projeto de resolução para vos

lembrar que é importante dialogar.

Relativamente ao projeto de lei, o PSD, em coerência, fez aquilo que sempre disse que iria fazer:

apresentou as alterações cirúrgicas que todos sentimos que seriam necessárias, nomeadamente em relação

ao pagamento de despesas e aos acidentes de trabalho, porque parece que se confunde teletrabalho com

trabalho no domicílio. Teletrabalho é trabalho fora do local da empresa e é importante que o trabalhador não

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veja os seus direitos coartados porque não comunicou a tempo à companhia de seguros onde estaria a

exercer as suas funções. Esta flexibilidade parece-nos fundamental para salvaguardar os direitos e os

melhores interesses do trabalhador em caso de acidente de trabalho.

Não é, também, das 9 horas às 19 horas que a privacidade do trabalhador deve ser respeitada — mas por

que carga de água é das 9 horas às 19 horas se não for esse o horário de trabalho do trabalhador? O

trabalhador pode trabalhar das 8 horas ao meio dia, das 8 horas às 14 horas e é nesse período que deve ser

fiscalizado.

Mas percebemos que a extrema-esquerda e, infelizmente, uma parte do PS queiram «rigidificar» e, cada

vez mais, impor e coartar os direitos das partes na concertação social. É, aí, no diálogo, que se vai àquele que

é o melhor interesse de todos, das entidades patronais e dos trabalhadores. O mundo do trabalho só funciona

se for ao encontro do interesse de todos, não de uma qualquer imposição ideológica, sem qualquer relação

com a realidade.

Porém, o Partido Socialista veio fazer tábua rasa de um dos maiores esforços que se fez, que foi codificar a

legislação do trabalho para que ela fosse entendível por todos, criando um diploma extravagante — é esta a

expressão legal e a expressão técnica —,…

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Duarte Cordeiro): — É, é fashion!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — … completamente à revelia das boas práticas e, ainda por cima, limitando-se a copiar e a decalcar o regime do Código do Trabalho com duas ou três pequeníssimas

alterações, que, aliás, em nada o vieram melhorar, fingindo que é um regime novo.

Mesmo em relação aos trabalhadores em funções públicas em teletrabalho, não devem ter lido a lei que

afirma que a estes se aplica o que está no Código do Trabalho. Bastava terem-no feito em coerência e

alterado o Código do Trabalho.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente. Acreditamos, no entanto, que a descida à especialidade nos vai permitir fazer as melhores alterações e que, no fim, iremos ao encontro das

necessidades do mercado de trabalho nacional.

É para isso que estamos aqui, não para quaisquer agendas ideológicas, à revelia de tudo, de todos e da

concertação social.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS Tiago Barbosa Ribeiro.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Elza Pais, do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: No final deste debate, verificamos que não podemos falar de teletrabalho sem falar de igualdade de género, como se vê,

aliás, na proposta do Partido Socialista.

Por isso, os novos regimes de teletrabalho devem oferecer iguais oportunidades para homens e mulheres,

como recomenda, aliás, a OIT. O teletrabalho não pode, nem deve ser sinónimo de recuo das mulheres para o

trabalho em casa.

O teletrabalho tem, obviamente, muitas vantagens que já foram indicadas — não tenho tempo para as

referir —, mas tem alguns riscos. Ele não pode diluir as fronteiras entre a esfera privada e a profissional, não

pode impedir o direito a desligar, não pode dificultar a conciliação entre vida familiar, pessoal e profissional e

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também não pode acentuar as desigualdades sociais, nem as desigualdades de género. Mas isso só poderá

ser evitado se o teletrabalho for regulamentado.

A negociações para a sua regulamentação devem, como já dissemos, ser feitas em sede de convenção

coletiva de trabalho, no que diz respeito às condições de flexibilidade ou à gestão por resultados.

O teletrabalho não pode prescindir, antes pelo contrário deve promover, como em qualquer outro regime de

trabalho, de licenças para cuidadores e licenças parentais, que estimulem os homens para este tipo de

cuidado, como a nossa legislação tem feito desde 2009, com resultados visíveis.

As culturas organizacionais são sempre importantes para a igualdade, mas ainda são mais importantes em

alturas destas. Por isso, Sr.ª Presidente, gostaria de dizer que a casa não pode ser mais um espaço de

trabalho doméstico, apenas para as mulheres, mas também um espaço de trabalho para homens e mulheres.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Filipe, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: Importa não perder de vista que o que estamos a discutir são relações laborais,…

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — … não estamos apenas a discutir tecnologia. Sabemos da importância da tecnologia em todas as esferas da vida, mas o que importa reter é que o teletrabalho é uma nova forma de

exploração da força de trabalho. O resto é música celestial!

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — É bom que nos entendamos: o que caracteriza o direito do trabalho não é o mútuo acordo. Se perguntarmos, um a um, aos trabalhadores que são explorados em Odemira, como foram

para lá trabalhar, eles vão responder que estão lá por mútuo acordo. O que caracteriza o direito do trabalho

são os direitos dos trabalhadores e a negociação coletiva. É isso que caracteriza o direito do trabalho.

Aquilo que queremos salvaguardar, quando se regula o teletrabalho, é que não estejamos a trabalhar com

a tecnologia do século XXI e com as relações laborais do século XIX, que é, efetivamente, aquilo que o

patronato pretende impor. Por isso é que não alinhamos no fado da concertação social com que o PSD nos

tem embalado, ao longo de toda a tarde, porque quem tem a competência para legislar são os representantes

do povo.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — E a concertação social serve para quê?!!

O Sr. António Filipe (PCP): — A Assembleia da República não pode ser substituída por nenhuma forma de câmara corporativa. O diálogo é importante e o Governo que faça o diálogo que entender com os parceiros

sociais, mas ninguém pode substituir a legitimidade da Assembleia da República para legislar sobre as

relações laborais.

Sr.ª Presidente, queria deixar só mais um sublinhado. Para nós não há um contrato de trabalho e um

contrato de teletrabalho. O teletrabalho é uma forma de relação laboral dentro do contrato de trabalho e o

contrato de trabalho pode assumir, em condições que consideramos que deveriam ser excecionais e

reguladas, uma forma de teletrabalho, que não pode prescindir do acordo do trabalhador.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Isso é o que está na lei!

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O Sr. António Filipe (PCP): — Mas deve haver um padrão mínimo de regulação e o teletrabalho não pode ser deixado exclusivamente à livre negociação entre uma parte mais fraca e uma parte mais forte, pois

sabemos em que é que isso se traduz.

Portanto, é importante que se estabeleça um critério mínimo de pagamento, ao trabalhador, dos encargos

com o teletrabalho, que não pode ser deixado à comprovação. Se estiver a trabalhar em casa, o trabalhador

tem de comprovar que acende o interruptor da luz e que não trabalha à luz das velas?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Tem de demonstrar que tem custo com telecomunicações? Evidentemente que não! É algo que não carece de demonstração!

Finalmente, Sr.ª Presidente, não entendemos que o teletrabalho seja um privilégio do trabalhador e que

seja uma forma de conciliar a vida profissional com a vida familiar. Não podemos considerar o teletrabalho

com a ideia de que o trabalhador, enquanto está em teletrabalho, faz outras coisas, que toma conta dos filhos

ou que é cuidador informal. Não, não pode ser.

Protestos de Deputados do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. António Filipe (PCP): — Concluo, Sr.ª Presidente, deixando só este último sublinhado: o teletrabalho não é um privilégio e o trabalhador deve ser compensado e deve haver uma forma de regulação muito clara de

um padrão mínimo social, relativamente à utilização desta forma de trabalho.

Aplausos do PCP e do PEV.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ao longo desta tarde, tivemos um importante debate para encontrarmos soluções para a problemática do

teletrabalho.

Se podemos não convergir na totalidade das soluções, como, aliás, para já, ficou claro das diferentes

intervenções, creio que todos coincidimos na necessidade imperiosa de dar resposta às consequências da

significativa expansão do teletrabalho ao longo do último ano, mas também dos desafios estruturais da

transição digital, tal como constava do programa eleitoral e do Programa do Governo do Partido Socialista,

respondendo a anseios dos trabalhadores, respondendo a dificuldades dos empregadores, ultrapassando

inquietações de uns e de outros, oferecendo as melhores soluções para que o teletrabalho seja mais equitativo

e mais justo para todos.

O trabalho que nos espera na especialidade permite construir e não dividir, partindo das naturais opções de

cada partido. Conforme dissemos esta tarde, o Partido Socialista não olha para este tema numa perspetiva

divisionista, nem numa perspetiva conflituante.

O teletrabalho, para aqueles que podem recorrer a ele — não são todos os setores da economia, como

sabemos —, engloba realidades muito complexas e muito díspares que não se compadecem com uma leitura

a preto e branco do mundo. Há bons e maus exemplos em tudo, existindo empresas bastante preparadas para

o trabalho à distância e outras que o estão menos, na sua dinâmica organizativa, aquelas que respeitam os

horários estabelecidos para os seus trabalhadores e outras que não o fazem, aquelas que compreendem a

necessidade de ressarcir os trabalhadores por custos acrescidos em teletrabalho e outras que não.

Porém, existem igualmente trabalhadores que estão confortáveis em teletrabalho e outros que não estão,

aqueles que preferem o escritório ao trabalho em casa, podendo escolher, os que não conseguem estabelecer

uma fronteira clara entre tempos de trabalho e tempos de lazer, os que quebram vínculos sociais que só

encontram, ou encontram maioritariamente, no seu espaço laboral, os que têm mais custos mas também os

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que, eventualmente, possam poupar, por exemplo, em deslocações diárias, os que não têm uma habitação

adequada à gestão do trabalho e à gestão familiar, ou as mulheres trabalhadoras, por exemplo, como agora foi

lembrado pela minha camarada Elza Pais, sempre elas e muitas delas, que em teletrabalho veem agravado o

peso da dupla jornada de tempos de trabalho, entre o trabalho oficial e o trabalho doméstico, que continua a

recair maioritariamente sobre elas.

A tudo isso, e a muito mais, é preciso dar resposta, compreendendo que tudo isso existe, que não há

respostas universais, que não há respostas unívocas e que o teletrabalho não é, estruturalmente, bom ou

mau, favorável ou desfavorável, dependendo sempre da realidade concreta de cada empresa, de cada

trabalhador e do seu contexto pessoal e familiar.

Sabemos, também, que a enorme expressão que o teletrabalho tem atualmente, consequência direta da

pandemia, dificilmente se irá manter nos próximos meses, ou mesmo anos, com a progressiva normalização

da nossa vida coletiva, mas a experiência que adquirimos ao longo destes meses permite perceber falhas e

abrir o espaço para este debate e para novas abordagens legislativas. Ele tem sido feito não apenas em

Portugal, mas também noutros países, com mudanças significativas já operadas em França e Espanha,

respondendo a essas necessidades.

Além das alterações que o próprio Governo já assumiu querer introduzir e hoje aqui reiterou, alterações

que têm vindo a ser debatidas em sede de concertação, gostaria de aproveitar esta fase final do debate para

reiterar as linhas-mestras que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista defende no seu projeto para

efetuarmos as necessárias mudanças à lei, que queremos válidas e em igualdade de circunstâncias tanto para

trabalhadores do setor privado como para trabalhadores do setor da Administração Pública.

Sumariamente, começamos pelo acordo mútuo. O teletrabalho, na perspetiva do Partido Socialista, tem de

resultar do acordo entre trabalhador e empregador, seja no contrato inicial, seja no contrato específico de

teletrabalho.

Protestos da Deputada do PSD Emília Cerqueira.

Esta posição, ao contrário do que aqui ouvi, assume que o trabalhador é mesmo a parte mais frágil da

relação a estabelecer nesse contrato e, portanto, o teletrabalho só pode ocorrer por mútuo acordo e, no caso

de ser recusado pelo empregador, isso tem de ser justificado por escrito.

Protestos da Deputada do PSD Emília Cerqueira.

Em segundo lugar, destaco a identificação de direitos e deveres que têm de estar consagrados e que são

válidos tanto para empregadores como para trabalhadores.

Em terceiro lugar, refiro a garantia de igualdade entre o trabalhador presencial e o teletrabalhador,

nomeadamente ao nível de salários e subsídios, equipamentos, ferramentas necessárias ao trabalho, horário

de trabalho, direitos sindicais e cumprimento das regras de segurança e saúde no trabalho.

Asseguramos o direito à privacidade, vedando e vetando controlos intrusivos através de meios digitais.

Asseguramos o direito a desligar para garantir o direito ao descanso e ao cumprimento dos horários no

equilíbrio vida-trabalho.

Protestos da Deputada do PSD Emília Cerqueira.

Tenha calma, Sr.ª Deputada, que estou mesmo a terminar e a Sr.ª Deputada já teve oportunidade de falar.

Vozes do PS: — Muito bem.

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Definimos que não pode existir diferença salarial entre teletrabalhador e trabalhador presencial, estabelecendo, ao mesmo tempo, que as despesas têm de ser

asseguradas pelo empregador, sendo que o valor, sendo impossível — todos nós compreendemos isto — de

definir universalmente para todos os trabalhadores de todos os setores em teletrabalho, deve ser concretizado

por acordo entre as partes ou em sede de negociação coletiva.

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Vozes do PS: — Exatamente!

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Por fim, e entre outras dimensões do nosso projeto, que não tenho tempo agora de aprofundar nesta intervenção final, deixamos espaço para a negociação coletiva, dinamizando

a negociação coletiva, dinamizando a contratação coletiva, um valor caro à esquerda democrática,

dinamizando-a na definição das condições do teletrabalho.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Entre outros, estes são alguns dos eixos do nosso projeto que já apresentámos aos parceiros sociais e que agora avançará para o processo da especialidade onde, no respeito

pela integridade da nossa proposta e dos princípios que a orientam, estaremos, naturalmente, disponíveis para

o diálogo com todos os partidos, ao encontro das melhores soluções.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para concluirmos este debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Costa, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Tem-se falado neste debate dos riscos do teletrabalho, das suas enormes vantagens — e, sobre isso, ouvimos muito canto de sereia ao

longo dos últimos meses —, mas também dos seus riscos.

Sucede que não estamos perante riscos, estamos perante uma experiência concreta feita em escala

planetária sobre as consequências já verificadas, os abusos já consumados, sobre milhares e milhares de

trabalhadores em Portugal, e milhões em todo o mundo, pela imposição do teletrabalho. São abusos nos seus

horários de trabalho, alargados indefinidamente, com o aumento da exploração, na degradação das condições

de vida familiar, pela presença do contacto contínuo e da conexão permanente, na quebra de rendimento

resultante da imputação dos custos do teletrabalho ao trabalhador.

Isto não são riscos, isto é o que já aconteceu e é aquilo que é preciso prevenir, através da legislação. É

esse o objetivo do Bloco de Esquerda com este agendamento, com a proposta que apresentou e com a

abertura deste debate no Parlamento. E há muito trabalho pela frente.

Queremos fazer esse trabalho de boa-fé e temos a expectativa de que o Parlamento possa fazer face a

este objetivo. E, por isso, solicitámos a baixa à comissão para discussão na especialidade, sem votação, do

projeto do Bloco de Esquerda. Os outros partidos seguirão esse caminho também, para que todos possam

contar os prazos do debate público dos respetivos projetos e possam ter os seus projetos devidamente

presentes no trabalho de especialidade.

Sr.as e Srs. Deputados, a relação laboral não é uma relação entre partes iguais. Existe, na relação laboral,

uma parte mais vulnerável. É essa parte mais vulnerável que é protegida pela lei. E quando olhamos para o

projeto do Partido Socialista trazido a este debate, verificamos que é uma espécie de «minuto liberal» do

Partido Socialista no debate do teletrabalho: tudo é garantido, todos os direitos que são previstos são

condicionados à existência de convenção coletiva que confirme. Portanto, não são direitos legais garantidos,

são possibilidades de direitos, que a convenção coletiva confirmará ou não.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Costa (BE): — E esta conceção das relações laborais entra em choque direto com uma conceção democrática destas relações.

O PS apresenta uma norma forte sobre a obrigação de a entidade empregadora fornecer os equipamentos

e sistemas, mas é se a convenção coletiva não afastar esse direito; uma norma fortíssima sobre proteção da

privacidade, mas é se a convenção coletiva não anular essa norma; uma norma contundente sobre acidentes

de trabalho, mas é se a convenção coletiva a confirmar;…

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A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Não, isso está na lei!

O Sr. Jorge Costa (BE): — … e até sobre o direito a desligar, se a convenção coletiva permitir que esse direito permaneça.

Protestos da Deputada do PSD Emília Cerqueira.

Pior ainda, na questão do direito a desligar, é inserido o tempo de contacto, possibilidade que a convenção

coletiva vem introduzir, em que, além do seu horário de trabalho, o trabalhador fica sujeito a disponibilidade

sem qualquer remuneração. Isso não é um progresso, isso é, evidentemente, um retrocesso.

Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado, a convenção coletiva serve para adicionar à lei, não pode

servir para empobrecer a proteção legal do trabalhador, como o PS veio agora admitir com o seu projeto, e

como o Sr. Secretário de Estado Miguel Cabrita referiu, ao dizer que a proteção do trabalhador prevista no

diploma do Partido Socialista não está incluída e está a coberto do princípio do tratamento mais favorável, ou

seja, está mesmo dependente da vontade patronal de celebrar essa convenção coletiva. E, portanto, se a

convenção coletiva desdisser os direitos que a lei prevê, o trabalhador deixa de ter esses direitos.

É, portanto, com este balanço sobre as propostas em presença que nos dirigimos ao debate de

especialidade, não sem expectativa, como disse de início, porque iremos para este processo com a maior boa-

fé e com a maior vontade de trabalhar para uma regulamentação do teletrabalho que seja protetora e que tire

os devidos balanços da experiência já vivida durante o período da pandemia.

Mas o PS vai ter duas opções, uma é alinhar com os partidos da direita em direitos que podem existir ou

não. Não viemos a este debate e não viemos a este processo legislativo para conceber direitos que podem

existir ou não.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Vou concluir, Sr.ª Presidente. Viemos a este debate porque achamos que o diálogo, o trabalho e a elaboração política necessária do

Governo e do Partido Socialista com a esquerda dependem de conseguir responder nas questões do trabalho.

E é com este objetivo e com a expectativa de que o PS corrija os graves erros do seu projeto no processo

de especialidade e de que a Assembleia da República seja capaz de legislar para proteger os trabalhadores

dos riscos já provados durante o período da pandemia — aqueles que sofreram esses abusos —, que vamos

procurar desenvolver o trabalho em especialidade.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, houve aqui uma certa confusão com os tempos, por parte dos serviços e da Mesa. Regimentalmente, tinha 2 minutos para o encerramento, mas como também

dispunha de algum tempo das intervenções anteriores, houve a junção de ambos. Portanto, o Sr. Deputado

ainda falou mais 1 minuto e meio.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Não, não! Tínhamos 7 minutos!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, chegámos ao fim deste debate. A Sr.ª Secretária da Mesa vai ler as informações habituais. Faça favor, Sr.ª Deputada Sofia Araújo, tem a

palavra.

A Sr.ª Secretária (Sofia Araújo): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, informo a Câmara que estiveram presentes, por videoconferência, os seguintes Srs. Deputados: José Cesário e Ivan Gonçalves, ambos do PS.

É tudo, Sr.ª Presidente.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, a nossa sessão plenária de amanhã começa às 14 horas, tendo como primeiro ponto um debate de urgência, requerido pelo PAN, sobre imigração ilegal,

redes de tráfico de pessoas, escravatura laboral, sobrelotação e insalubridade de habitações dos

trabalhadores agrícolas no município de Odemira e consequente risco para a saúde pública, bem como a

problemática de cariz ambiental afeta ao Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina.

Temos, como segundo ponto, declarações políticas, a que se segue, num terceiro ponto, o debate da

Proposta de Lei n.º 81/XIV/2.ª (GOV) — Autoriza o Governo a estabelecer o Sistema de Gestão Integrada de

Fogos Rurais no território continental e define as suas regras de funcionamento.

De um quarto ponto da ordem do dia consta ainda o 1.º Orçamento Suplementar da Assembleia da

República para 2021, para o qual não há tempos de discussão atribuídos.

Como quinto e último ponto da nossa agenda temos as votações regimentais.

Desejo a todos um bom resto de dia e de noite.

Está encerrada a sessão. Até amanhã.

Eram 18 horas e 1 minuto.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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