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Quinta-feira, 24 de junho de 2021 I Série — Número 80

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

REUNIÃOPLENÁRIADE23DEJUNHODE 2021

Presidente: Ex.mo Sr. António Filipe Gaião Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Ana Sofia Ferreira Araújo Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Presidente (António Filipe) declarou aberta a sessão

às 15 horas e 5 minutos. Deu-se conta da apresentação do Projeto de Lei n.º

881/XIV/2.ª e dos Projetos de Resolução n.os 1346 e

1349/XIV/2.ª. Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos

Projetos de Lei n.os 807/XIV/2.ª (CH) — Altera o Código Penal e cria o artigo 335.º-A, definindo o crime de

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enriquecimento ilícito ou injustificado, clarificando os seus pressupostos objetivos e subjetivos de aplicação, bem como a moldura penal aplicável, distinguindo ainda consoante o agente seja ou não titular de cargo político, e 881/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Cria o crime de ocultação de riqueza com vista à prevenção da corrupção e aumento da integridade pública.

Usaram da palavra os Deputados André Ventura (CH), Cristina Rodrigues (N insc.), João Oliveira (PCP), Cláudia Santos (PS), José Manuel Pureza (BE), Nelson Silva (PAN), Carlos Peixoto (PSD), José Luís Ferreira (PEV), Telmo

Correia (CDS-PP) e Jorge Lacão (PS). No final, o Projeto de Lei n.º 807/XIV/2.ª foi rejeitado na

generalidade e, a requerimento da proponente, o Projeto de Lei n.º 881/XIV/2.ª baixou à Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, sem votação, por um prazo de 30 dias.

Deu-se conta da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º 102/XIV/2.ª

O Presidente (António Filipe) encerrou a sessão eram 17 horas e 1 minuto.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Muito boa tarde, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade que sejam abertas as galerias.

Antes de iniciarmos o debate de hoje, tem a palavra a Sr.ª Secretária Sofia Araújo para fazer o anúncio à

Câmara da entrada na Mesa de algumas iniciativas.

A Sr.ª Secretária (Sofia Araújo): — Sr. Presidente, muito boa tarde a todas e a todos. Informo a Câmara que deram entrada no gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República, e foram

admitidos, o Projeto de Lei n.º 881/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues), que baixa à 14.ª

Comissão, em conexão com a 1.ª Comissão, e os Projetos de Resolução n.os 1346/XIV/2.ª (PSD), que baixa à

9.ª Comissão, 1347/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira), que baixa à 11.ª Comissão,

1348/XIV/2.ª (PEV), que baixa à 8.ª Comissão, e 1349/XIV/2.ª (PSD), que baixa à 7.ª Comissão.

O Sr. Presidente (António Filipe): — A ordem do dia da sessão de hoje consta de um agendamento potestativo, requerido pelo Chega, para a apreciação conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os

807/XIV/2.ª (CH) — Altera o Código Penal e cria o artigo 335.º-A, definindo o crime de enriquecimento ilícito ou

injustificado, clarificando os seus pressupostos objetivos e subjetivos de aplicação, bem como a moldura penal

aplicável, distinguindo ainda consoante o agente seja ou não titular de cargo político e 881/XIV/2.ª (Deputada

não inscrita Cristina Rodrigues) — Cria o crime de ocultação de riqueza com vista à prevenção da corrupção e

aumento da integridade pública.

Para proceder à apresentação do projeto de lei do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, depois de algumas vezes e de alguns anos, o enriquecimento ilícito volta a ser discutido nesta Casa. Após um conjunto de tentativas falhadas, quase

sempre boicotadas pelo Partido Socialista, o enriquecimento ilícito chega novamente à Casa da democracia. O

enriquecimento ilícito ou a indignação de um País inteiro, que olha, cada vez mais, para os seus

representantes, para aqueles que acumulam riqueza e para os seus mandatários com enorme desconfiança.

O combate ao enriquecimento ilícito não é a única forma de combate à corrupção, mas é uma forma

importante de combate à corrupção. O combate ao enriquecimento ilícito não é a única ferramenta de luta

contra o mal endémico que destrói o tecido social português, envergonha os portugueses, afasta eleitos e

eleitores e afasta as pessoas, cada vez mais, do nosso sistema político. O enriquecimento ilícito tornou-se

numa mancha tremenda sobre a nossa sociedade.

Quem não viu e quem não podia ver, há uns meses, um ex-Primeiro-Ministro ser lavado, completamente,

perante o olhar atónito de um País que via, hora após hora, minuto após minuto, milhões serem

completamente escondidos, lavados, ocultados ou justificados! Isto, perante a indignação de um País inteiro.

Quando discutimos o enriquecimento ilícito devemos saber que esta Câmara já o fez por várias vezes,

algumas vezes com a oposição do Tribunal Constitucional, que se pronunciou. Mas que ninguém tenha

dúvidas de que representantes do povo só são os que aqui estão sentados a decidir. Representantes do povo

e guardiães da Constituição só há aqueles para quem a Constituição serve e que devem, eles próprios, ser o

referencial dessa Constituição. Nenhuma autoridade há, nesta terra ou noutra, acima do povo português, que

decide soberanamente o seu futuro.

A corrupção custa-nos 21 milhões de euros por ano. Poderíamos dizer que quase 10% da riqueza criada

em Portugal se perde no mar tremendo e incrível da corrupção que temos em Portugal. Se estes dados nos

devem perturbar e levar a pensar o que podemos fazer para transformar este País num país melhor, não

devemos esquecer os últimos dados de que dispomos e que são factos — factos! —, para quem tanto gosta

deles.

Assim, 88% dos portugueses acreditam que o Governo é corrupto ou que há corrupção dentro do Governo

— 88%!; 41% dos portugueses têm a perceção de que a corrupção aumentou nos últimos meses em Portugal;

e 60% dizem que o combate à corrupção é ineficiente.

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É importante sabermos isto quando estamos a dias de o Governo vir a esta Casa propor uma nova

estratégia contra a corrupção em que o enriquecimento ilícito fique completamente de fora da equação. É

importante sabê-lo quando o Governo, que prometeu uma grande estratégia de luta contra a corrupção, virá a

esta Casa, nos próximos dias, defender aquilo que é, em tudo, o seu contrário, ou seja, perdoar os corruptos

se eles confessarem. Isso é dar tapete vermelho, via verde e via aberta à corrupção em Portugal!

Além disso, 27% dos portugueses acham que a maioria dos Deputados são abrangidos por fenómenos de

corrupção; 16% acreditam que há ministros corruptos; e 15% acham que o próprio Primeiro-Ministro está

envolvido em corrupção. Trata-se do cenário de um país que poderia ser a Albânia ou a Macedónia, mas que

é aqui mesmo, na ponta oeste da Europa, aqui mesmo no País que podia ser a pérola da Europa e que se

tornou num emaranhado tremendo de corrupção que só destrói e só faz deixar de acreditar aqueles que ainda

acreditavam que era possível fazer Portugal.

Claro que teremos sempre a oposição dos «velhos do Restelo», daqueles que dizem que não podemos

fazer diferente porque o Tribunal Constitucional não deixa, a Constituição não quer, os nossos antepassados

não gostavam ou às nossas avós não alegrava… Mas a verdade é que a Convenção das Nações Unidas

Contra a Corrupção, de 2003, diz: «Cada Estado deve adaptar as medidas legislativas para criminalizar…» —

criminalizar! — «… o enriquecimento ilícito».

Para aqueles que andam sempre com as Nações Unidas na mão e com as convenções para trás e para a

frente, para um lado e para o outro, hoje, quando votarmos a criminalização do investimento ilícito, era um

bom dia para se lembrarem porque é que a Convenção das Nações Unidas disse que deveríamos criminalizar

este fenómeno.

Também não nos devemos esquecer que esta não é a única forma de o fazermos. Por isso, o Chega

propôs, nesta Casa, a duplicação das penas por corrupção em Portugal, proposta a que o Partido Socialista

honrosamente se opôs, perguntando como ficariam os outros fenómenos de corrupção, como a corrupção no

desporto ou a corrupção internacional. Foi o mesmo que dizer «não sancionem os pedófilos, senão como é

que os pobres dos violadores vão ficar a seguir…». É o pior de todos os argumentos!

Hoje, temos uma hipótese única de dar ao País um sinal de que este Parlamento não é condicente nem

complacente, não é condescendente nem aceita que haja gente a chegar a Lisboa com uma mão atrás das

costas e a sair com tesouros escondidos para o resto do País.

Hoje, este Parlamento pode mostrar ao País que não aceita que se chegue a Lisboa sem nada, para fazer

discursos políticos, e daqui se saia com fortunas enormes no cofre da mãe, do pai, da avó ou de outros

quaisquer.

Alguns dizem que não, que é populismo, mas lá fora os portugueses sabem que é tempo de este

Parlamento, finalmente, criminalizar o enriquecimento ilícito.

Olhem para o que dizem os jornais e vejam como nos envergonham títulos como «Entram pobres e saem

ricos. Será possível condenar políticos em Portugal?»

Qualquer um que olhasse para isto, de fora para dentro, pensaria que vivemos no reino da Macedónia ou

numa Albânia escondida pela União Soviética; mas não, é Portugal. É Portugal, parte da Europa ocidental, que

não consegue e continua a não querer criminalizar o enriquecimento ilícito.

Outros dizem-nos que esta é a história de como este Parlamento nunca conseguiu ter um consenso e só

isso deveria fazer-nos parar para pensarmos como é que chegamos a acordo com tanta coisa e não

conseguimos chegar a acordo para criminalizar aqueles que vivem à conta do dinheiro dos portugueses,

ocultando o rendimento aos portugueses e a roubar dinheiro que é de todos e que deveria ser por todos

distribuído. Hoje, este Parlamento tem uma oportunidade única para o fazer.

Queria terminar esta intervenção, Sr. Presidente, deixando claro aquele que é o meu sentimento. Sabemos

que o Tribunal Constitucional, já por duas vezes, aferiu propostas semelhantes a esta e sabemos que tem a

função única de salvaguardar a Constituição, mas também sabemos que somos nós os mandatários desse

povo português e que não podemos ceder naquele que é o objetivo essencial de criminalizar o enriquecimento

ilícito. Todas as outras tentativas, que visam transformar o enriquecimento ilícito numa espécie de obrigação

declarativa acrescida ou numa obrigação fiscal subsequente, podem até vir a passar no crivo do Tribunal

Constitucional, mas não salvaguardarão o essencial, que é dizer aos portugueses que não é tolerável que

quem gere o seu dinheiro, quem dá a cara, todos os dias, pela República chegue sem nada e saia com tudo

sem sequer justificar.

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Essa era a mensagem que deveríamos passar hoje. E deveríamos mostrar, neste Parlamento, um ato de

resistência, porque sabemos que, neste caso, a história está do nosso lado, a razão está certa e aqueles que

esperam de nós ação são os que esperam que criminalizemos o enriquecimento ilícito.

Passaram anos e décadas demais. Várias vezes, em várias décadas, este Parlamento discutiu a

criminalização do enriquecimento ilícito. Mesmo com o Governo a querer esconder este dia, mesmo com o

Governo a querer esconder esta iniciativa, mesmo com a Ministra da Justiça a vir cá dois dias depois, para

fingir e fazer de conta em relação ao enriquecimento ilícito, é a nós, só a nós, só a esta Câmara que cabe dar

o sinal fundamental de que podemos, devemos e queremos criminalizar o enriquecimento ilícito como luta

fundamental contra a corrupção.

Esta é uma proposta equilibrada que remete para a legislação fiscal em muitos domínios, que remete para

um aumento de pena para 5 anos nomeadamente nos casos de titulares de cargos políticos, possibilitando a

aplicação de medidas de coação previstas no Código de Processo Penal. Esta é uma proposta semelhante em

muito ao que de melhor se faz nos países europeus próximos de nós. E hoje podemos escolher entre dar o

passo ou voltar a acobardar-nos, como sempre, perante as trevas de um País que não sai nem consegue sair

da luta fraca, ténue e muito, muito tímida contra a corrupção.

Nós devemos e vamos combater a corrupção.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Não havendo inscrições para pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para apresentar o seu projeto de lei, a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (N insc.): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A legislação em vigor apresenta falhas no cumprimento dos objetivos de combate à corrupção no nosso País, nomeadamente no

que diz respeito à falta de consequências penais para o enriquecimento ilícito e para a ocultação de riqueza. A

situação torna-se especialmente alarmante quando quase 90% dos portugueses acredita que há corrupção no

Governo e que os Deputados na Assembleia da República e os banqueiros estão entre os mais corruptos.

Este tipo de crença mina a confiança dos cidadãos nas instituições, afastando-os da vida política,

reduzindo a sua participação e, consequentemente, enfraquecendo a democracia. Os titulares de cargos

políticos têm uma responsabilidade acrescida no que diz respeito à transparência dos seus rendimentos. Não

só devem declará-los como devem justificá-los e, por fim, devem ser punidos em caso de ocultação intencional

de riqueza.

Assim, tendo em conta o princípio da boa gestão dos assuntos e recursos públicos, importa tomar medidas

que promovam uma cultura de rejeição da corrupção, devendo, para tanto, ser feito um esforço para impedir a

retirada de vantagens económicas desta prática criminosa.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há 14 anos, o PCP apresentou a primeira proposta sobre criminalização do enriquecimento injustificado que foi discutida na Assembleia da

República. Temos levado essa luta por diante e continuaremos a bater-nos por ela.

Temos muita coisa a dizer sobre o combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira, sobre a

criminalização do enriquecimento injustificado. E diremos tudo o que temos a dizer no debate agendado para a

próxima sexta-feira, para o qual todos os grupos parlamentares tiveram oportunidade de apresentar propostas

e iniciativas legislativas.

Sobre o agendamento de hoje e sobre esta proposta em concreto que o Sr. Deputado do Chega nos traz,

tenho apenas duas notas muito simples a deixar. Uma primeira, para dizer que se trata apenas de um

fingimento sobre o combate ao enriquecimento injustificado, porque quem quer verdadeiramente combatê-lo

não apresenta uma proposta inconstitucional como aquela que o Sr. Deputado do Chega apresentou. E se o

objetivo do Sr. Deputado do Chega era o de falar sozinho sobre enriquecimento injustificado, por nós ficará a

falar sozinho.

Muito obrigado e boa tarde.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cláudia Santos, do PS.

A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é a primeira reunião plenária com a ordem do dia fixada pelo Chega, e o Chega escolheu trazer-nos um projeto de lei que tem uma

exposição de motivos que refere a corrupção endémica em Portugal. Esta seria, pelo menos à primeira vista,

uma iniciativa sobretudo orientada para o combate à corrupção, ainda que não só.

À primeira vista, essa intenção de contribuir para um debate sobre a corrupção mereceria ser saudada.

Estamos todos muito cientes de que a corrupção é um dos principais problemas de todas as democracias e

um dos principais desafios da nossa agenda política. Já ninguém acredita, como se acreditava no século

passado, quando Fukuyama escreveu O fim da História, que tínhamos finalmente descoberto o modelo

perfeito do governo dos povos, o modelo das democracias liberais ocidentais, vitorioso depois da queda do

Muro de Berlim, e que o aperfeiçoamento desse modelo levaria, por si só, à erradicação da corrupção. Hoje,

sabemos que não foi assim, que não é assim. Sabemos que mais corrupção significa menos hospitais e

menos escolas e sabemos que temos de continuar à procura de soluções.

Por isso, à primeira vista, seria de louvar a escolha do Chega de trazer um assunto tão importante a este

debate. O problema é que o Chega escolheu trazer a este debate uma resposta, a criminalização do

enriquecimento ilícito, que sabe ser uma resposta impossível. Ao escolher trazer-nos uma resposta à

corrupção que toda a gente sabe que é impossível, escolheu não nos trazer resposta nenhuma.

Aplausos do PS.

O engano está logo no nome: enriquecimento ilícito. Sabemos todos que o enriquecimento, se é ilícito, já é

crime. Aquilo que o Chega insiste em criminalizar não é o enriquecimento ilícito, o que insiste em criminalizar é

o enriquecimento com origem desconhecida. E o problema está mesmo aí, em querer dar por ilícito um

enriquecimento cuja origem é desconhecida. Há um ponto, que é o ponto de partida em que estamos todos de

acordo, que é o de que a riqueza incompreensível pode ser um sintoma de que foi obtida através da prática de

crimes e o de que a riqueza incompreensível de agentes públicos pode ser um sintoma de corrupção. A

pergunta a fazer é a seguinte: deverá esta riqueza incompreensível ser fundamento para que os seus titulares

possam ser condenados por um crime, sem que sejam provados os crimes geradores do aumento

patrimonial? Mesmo que se admita que sim, que a resposta deve ser afirmativa, que a existência desta riqueza

incompreensível deve ser criminalizada, há, a partir daqui, dois caminhos: um caminho impossível e outro

caminho possível. Os muitos projetos de lei que vão ser discutidos na próxima sexta-feira escolheram o

caminho que parece possível. Ainda que com variações, admitem que seja crime a omissão de declarar

aumentos patrimoniais a partir de um certo montante, porque essa ocultação implica a violação de um dever

de transparência.

Mas o Chega está sozinho na escolha do outro caminho, aquele que o Tribunal Constitucional já declarou,

em 2012 e em 2015, que é impossível. Escolheu aquele caminho em que o que se criminaliza é a detenção de

uma riqueza que é incongruente com os rendimentos lícitos. Escolheu, portanto, o caminho que viola a

presunção de inocência, porque assenta na presunção de que o património resulta de uma atividade criminosa

que não se provou, mas que deve ter existido. Escolheu o caminho que também viola o princípio da

legalidade, por falta de descrição pelo legislador, da ação ou da omissão proibidas, porque aquilo que se quer

criminalizar é um estado — o estar rico — e não alguma coisa, descrita pela lei, que a pessoa fez ou deixou de

fazer. E, por isso, ao escolher um não-caminho, porque um caminho impossível é um não-caminho, o Chega

sabe que não tem nenhum projeto de lei que permita a criminalização da ocultação da riqueza.

Acompanho o entendimento do Sr. Deputado João Oliveira de que não há grande utilidade em perder

tempo a esmiuçar detalhes deste projeto de lei que o próprio Chega sabe que não poderá vingar.

Aquilo que, porventura, vale a pena é sublinhar as razões pelas quais não o aprovaremos. O problema da

criminalização, nestes termos do enriquecimento ilícito, é que não se estaria a criminalizar um enriquecimento

que se prova que é ilícito, mas, sim, um enriquecimento que se presume que é ilícito. Não se faz prova de que

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seja um enriquecimento proveniente da corrupção, do tráfico de droga, da contrafação ou até do assalto a

bancos. É por isso que condenar alguém presumindo que enriqueceu a praticar crimes é tão flagrantemente

violador da presunção da inocência e do princípio da legalidade criminal.

Façamos a justiça ao Chega de reconhecermos que tentou mutilar, antes, a presunção de inocência

através do seu projeto de revisão constitucional. Quis alterar o n.º 3 do artigo 32.º da Constituição, num

sentido que teria amputado a presunção de inocência para abrir a porta a este projeto de lei, mas esse projeto

de revisão constitucional soçobrou. Por isso, permanece apenas a perplexidade. Porque insistiu o Chega em

trazer a este Parlamento um projeto de lei que todos sabemos, até o Sr. Deputado André Ventura, que é

incompatível com a Constituição?

Aplausos do PS.

O Chega sabe que não conseguiu a alteração da Constituição que julgava necessária para criminalizar o

enriquecimento ilícito. Se o sabe, por que razão insistiu em apresentar este projeto, a que deu uns retoques de

última hora que não o tornaram melhor? E, sobretudo, porque insistiu num caminho impossível, quando há

outro caminho que parece possível? Talvez este projeto de lei seja mais fácil de promover em 30 segundos,

talvez votar contra ele precise de uma explicação mais esforçada.

É verdade que a presunção de inocência não é fácil de explicar nas redes sociais, porque não é uma coisa

intuitiva.

Cada um de nós forma as suas convicções pessoais sobre a vida e sobre os outros e não há nada de mal

nisso. Cada um de nós é livre de acreditar naquilo que quiser, e a presunção de inocência, que é um princípio

do processo penal, não o impede. Mas a presunção de inocência é, ainda assim, contraintuitiva, porque nos

diz que ninguém pode ser condenado só porque parece culpado e se, no processo penal, essa culpa não for

provada, porque é preciso compreender que é precisamente a presunção de inocência que dá sentido ao

processo penal. Sem presunção de inocência, esse conjunto encadeado de atos, a que nós chamamos de

«processo», ou não é preciso, porque a pessoa é castigada sem processo, ou é apenas uma farsa orientada

para a confirmação de impressões ou de clamores públicos.

Por isso, a presunção de inocência é a condição da existência de um verdadeiro processo penal; é, ao

mesmo tempo, a sua pedra angular e a sua pedra de toque. E é como a democracia: por mais que, em certos

momentos, nos possa parecer difícil viver com ela, seria seguramente muito pior viver sem ela.

Aplausos do PS.

Nós sabemos que há quem esteja disposto a viver sem democracia, mas nós não estamos.

Aplausos do PS.

Mas talvez tudo isto possa ser dito de uma forma mais simples: a presunção de inocência e o princípio da

legalidade consagram um direito humano, o direito humano que qualquer pessoa tem a não ser privada da sua

liberdade sem que o Estado prove a sua culpa de acordo com a lei. E, nos conceitos de legalidade e de

presunção de inocência, vivem séculos de luta pela liberdade.

Talvez tenhamos, afinal, algo a agradecer ao Chega no final desta reunião plenária. Quando nos

levantarmos para votar contra este projeto de lei, porque ele viola a presunção de inocência e também o

princípio da legalidade criminal, estaremos, juntos, a reforçar o nosso respeito pelo Estado de direito e o nosso

compromisso comum com os direitos humanos.

Aplausos do PS.

O nosso desafio é combater a corrupção em nome do Estado de direito, não contra o Estado de direito, até

porque sem Estado de direito não há nunca menos corrupção, o que pode haver é mais corrupção, mais bem

escondida.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino, dizendo que combater a corrupção defendendo o Estado

de direito não é o desafio do projeto de lei do Chega que discutimos nesta quarta-feira. Esse será o desafio de

sexta-feira para todas as Sr.as Deputadas e todos os Srs. Deputados, a larguíssima maioria deste Parlamento,

da esquerda à direita, que acreditam nos direitos humanos e que têm orgulho na história da justiça penal do

nosso País.

No dia 10 de julho de 1867, foi publicada, no Diário de Notícias, uma carta que Victor Hugo nos escreveu.

Victor Hugo, que já era, à época, o muitíssimo aclamado autor de Os Miseráveis e de Notre-Dame de Paris,

por intermédio do seu amigo Brito Aranha, escreveu a todos os portugueses logo depois de termos abolido a

pena de morte. Referia-se a nós como «um pequeno povo que tem uma grande história» e disse-nos: «Felicito

o vosso Parlamento, os vossos pensadores, os vossos escritores e os vossos filósofos. Felicito a vossa nação.

Portugal dá o exemplo à Europa. A liberdade é uma cidade imensa, da qual todos somos cidadãos».

Há momentos na vida de um povo em que alguns se esquecem de quem somos. Ler cartas como aquela

que Victor Hugo escreveu pode ajudar-nos a recordar não só quem somos, mas também o património jurídico-

penal que é nosso e que temos o dever de honrar.

Aplausos do PS, da Deputada do BE Fabíola Cardoso e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Antes de passarmos à próxima intervenção, gostaria de dizer que o registo de presenças que fizemos até este momento não foi feito como registo para efeitos de votação, mas

deveria ter sido. Por isso, para não termos de fazer um novo registo, pedia aos Srs. Deputados que já se

registaram que desconsiderem esse mesmo registo e façam um novo, de forma a que possa ser considerado

para efeitos de votação. Assim, os Srs. Deputados, ficando registados, já poderão sair da Sala.

Vamos apenas fazer uma breve pausa devido ao ruído do movimento, em simultâneo, dos terminais.

Pausa.

Srs. Deputados, já estamos em condições de continuar.

Para proferir a próxima intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza, do Bloco de

Esquerda.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A agenda desta tarde é um truque. Todos sabíamos, há muito tempo, do agendamento para a próxima sexta-feira de um debate sobre o

combate à corrupção, no qual serão debatidas iniciativas legislativas de todas as forças com representação

parlamentar. Confronto de propostas, identificação de convergências e de diferenças — assim manda a

democracia que se faça.

O Chega sabia desse agendamento e, em vez de pôr a sua proposta em disputa com todas as outras, fez

um truque, marcando para hoje o que vai ser discutido na sexta-feira — malabarismo parlamentar, truque

regimental, jogo político. O Chega gosta muito de se apregoar como partido contra o sistema, mas, na

verdade, mostra-se como partido do pior que o sistema tem — chico-espertismo tático, partidarite primária —,

quando as responsabilidades pela construção de maiorias determinadas contra a corrupção são mais

exigentes.

É dessa maioria que o País precisa para dar, agora, o passo que, há muito, devia ter dado, criminalizando

a ocultação de incrementos patrimoniais por responsáveis de cargos políticos e altos cargos públicos.

O Bloco de Esquerda está totalmente determinado, como sempre esteve, em criar condições para que este

passo seja dado e para que uma maioria o mais ampla possível lhe dê a força política que corresponda à força

de reivindicação social que ela tem. Por isso, será na sexta-feira — e não hoje — que apresentaremos o nosso

projeto e os nossos argumentos, como nos comprometemos a fazer. A competição pequenina entre egos

partidários não é o que nos anima, deixamos isso para o Chega, porque é esse e só esse o campeonato que o

Chega quer jogar.

Hoje, diremos apenas que a pior maneira de contribuir para a luta pela criminalização do enriquecimento

injustificado é propor soluções inconstitucionais, que criam a ilusão de força, mas que se desfazem em nada

por causa da sua impossibilidade de se tornarem em lei. O projeto de lei do Chega enferma de evidentes e

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grosseiras inconstitucionalidades, e o Sr. Deputado André Ventura sabe-o melhor do que ninguém. Vem,

portanto, a jogo com uma proposta que não contará para a solução deste problema e se limitará a criar ruído.

Jogo, truque, ruído, ilusão — eis um partido do sistema a atuar.

O Bloco de Esquerda não quer ruído sem consequências, quer mesmo que a criminalização do

enriquecimento injustificado seja aprovada. Não contem connosco para o campeonato dos decibéis, contem

connosco para uma atuação séria e determinada no combate à corrupção. Esse é o compromisso do Bloco de

Esquerda.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Silva, do PAN.

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que todos e todas convergimos na ideia de que é absolutamente inadmissível que existam casos de titulares de cargos políticos que, quando

saem dos seus cargos, têm acréscimos de património e de rendimentos não justificados, quase como se o

dinheiro aparecesse por simples magia, e sem que isso seja verdadeiramente punido. Isso é tanto mais grave

quanto é conhecido por todos e todas que vivemos num País onde, dizem estudos internacionais, 48% das

pessoas já se serviram das chamadas «cunhas» e 80% dos empresários consideraram que o pagamento de

subornos e a utilização de contactos privilegiados são as formas mais fáceis de conseguir certos serviços

públicos. Esta situação, Sr.as e Srs. Deputados, é absolutamente lamentável e exige medidas de prevenção de

conflitos de interesse e maior transparência em sede de obrigações declarativas e exercício de funções, mas

também de punição.

E, hoje, falamos precisamente de punição. Discutimos se o enriquecimento ilícito deve ser, ou não, punido.

E, aqui, a posição do PAN não podia ser mais clara: sem dúvida alguma que sim, que se deve criminalizar o

incremento do património de um titular de cargo político que não pode ser, por si só, razoavelmente

identificado. Desde logo, porque esta é uma exigência que decorre do direito internacional e que o nosso País,

ano após ano, tem incumprido. A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, ratificada pelo nosso

País em 2007, estabelece que «cada Estado-Parte deverá considerar a adoção de medidas legislativas e de

outras que se revelem necessárias para classificar como infração penal, quando praticado intencionalmente, o

enriquecimento ilícito, isto é, o aumento significativo do património de um agente público para o qual não

consegue apresentar uma justificação razoável face ao seu rendimento legítimo». Esta disposição, tão bem

concretizada, por exemplo, em França, em Hong Kong ou na América do Sul, continua, lamentavelmente, por

cumprir no nosso País, essencialmente por falta de vontade do PS e do PSD.

Sabemos que a criminalização do enriquecimento injustificado é complexa. Sabemos que já foi tentada por

duas vezes e em ambas foi considerada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, que entendeu que, nos

termos em que se apresentava, por não ter um bem jurídico protegido, desrespeitava o princípio da

proporcionalidade e, por não identificar uma ação ou omissão proibida, violava o princípio da legalidade. A

proposta do Chega, assim como a do PCP, que é votada na sexta-feira, insistem nestes erros e são, por isso,

um mero número populista, para eleitor ver, e que não quer, realmente, resolver este grave problema do País.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Que disparate!

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sem prejuízo de entendermos que esta deve ser uma matéria discutida em sede de revisão constitucional, feita sem beliscar o essencial dos princípios do Estado de direito democrático,

entendemos que, à luz do quadro constitucional vigente, é possível criminalizar o incremento significativo de

património de um titular de cargo político. Por isso mesmo, na próxima sexta-feira, levamos a discussão uma

iniciativa que garante um alargamento das obrigações declarativas dos titulares de cargos políticos, passando

a exigir-lhes que, no momento em que deixem o cargo, e até três anos depois, tenham de declarar, por

exemplo, as promessas de vantagem, assim como os factos geradores de alterações patrimoniais relevantes.

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Queremos ainda que se efetive a criminalização de quem não entregar a declaração de rendimentos ou

ocultar património e, claro, não esquecemos as ofertas e hospitalidades, propondo pena de prisão para quem

oculte o recebimento de ofertas e serviços no exercício de cargo público.

Paralelamente, propomos que todos os acréscimos patrimoniais não justificados, uma vez detetados,

passem a ter uma punição por via fiscal, que garante a sua tributação a 100%, em sede de IRS (imposto sobre

o rendimento das pessoas singulares).

Garante-se, assim, a devolução integral do acréscimo patrimonial indevido e melhora-se um regime que,

nos termos em que está atualmente, diz ao infrator que até compensa infringir, porque só tem de devolver 80%

do que recebeu indevidamente, algo que, no mínimo, dá um sinal errado à sociedade civil.

Antes de terminar, não posso deixar de salientar que, hoje, vemos o Chega, que tantas vezes se arroga de

ser o arauto do combate à corrupção, a apresentar em Plenário, quase pela primeira vez em quase dois anos

de mandato, uma proposta que, apesar de ser inconstitucional, visa o combate à corrupção.

Não nos esquecemos de quando o PAN propôs aqui a regulamentação do lobbying, medidas de

transparência da filiação em associações de caráter discreto, um novo modelo de nomeação dos membros do

Conselho de Administração do Banco de Portugal, a criação de um portal da transparência para os fundos

europeus ou a limitação da ligação de Deputados a órgãos sociais de clubes de futebol, e o Chega nada

apresentou, para não mencionar os casos em que nem sequer participou no debate.

Mais grave foi quando o próprio Chega se juntou ao PS e ao PSD para chumbar as propostas do PAN que

visavam o fim dos vistos gold, que são considerados pelo Parlamento Europeu e pelo Comité Económico e

Social Europeu como um dos grandes focos de corrupção do nosso País, ou a realização de uma avaliação de

custo-benefício do regime da zona franca da Madeira, considerada por diversos peritos um foco de

branqueamento de capitais que já serviu de lavandaria à cleptocracia angolana, a magnatas do futebol ou a

empresas ligadas ao BES (Banco Espírito Santo).

Sr. Deputado André Ventura, estar ao lado das pessoas e zelar pelos seus interesses não se faz com

discursos diários populistas e uma postura fraca com os fortes e forte com os fracos. Faz-se, mostrando

coerência. E coerência não é pregar o combate à corrupção e, depois, na prática, não votar em conformidade

as propostas que se fazem nesta Casa. Alguma dúvida sobre o que significa a palavra «coerência» e o PAN

está ao dispor para esclarecer.

Risos do CH.

O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado João Oliveira inscreveu-se para pedir esclarecimentos. Sucede que o Sr. Deputado Nelson Silva já não dispõe de tempo para responder, pelo que

pergunto ao Sr. Deputado João Oliveira se lhe cede tempo para o efeito.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, o PCP cede 1 minuto.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Muito bem, Sr. Deputado. Assim sendo, Sr. Deputado João Oliveira, tem a palavra, para pedir esclarecimentos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nelson Silva, já nem pensava intervir mais no debate, mas a sua intervenção obriga-me a fazer-lhe um pedido de esclarecimento, para o qual espero mesmo

obter uma resposta.

O Sr. Deputado fez uma comparação entre duas iniciativas que nada têm a ver uma com a outra. E, agora,

vai ter de justificar como é que faz essa comparação.

O Sr. Deputado vai ter de explicar como é que compara a iniciativa do Chega, que pretende prender quem

tenha um determinado rendimento ou património, com uma proposta do PCP, que cria uma obrigação fiscal,

cujo incumprimento determina a prática de um crime.

O Sr. Deputado tem de explicar como é que compara um projeto de lei do Chega que inverte o ónus da

prova e obriga as pessoas a fazerem uma prova quase negativa relativamente a uma presunção da prática do

crime que já cometeram com o projeto de lei do PCP, que, fixando a exigência de uma obrigação declarativa e

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verificando o incumprimento dessa obrigação, determina, nessas circunstâncias, a verificação da prática de

um crime, sem inverter o ónus da prova.

O Sr. Deputado vai ter de explicar onde é que encontra, no projeto de lei do PCP, a violação de normas

constitucionais, na comparação que fez com o projeto de lei do Chega.

E até facilito a resposta que pretendo do Sr. Deputado: diga-nos qual é o artigo do projeto de lei do PCP

que é igual ao projeto de lei do Chega que o Sr. Deputado aqui referiu.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Em tempo cedido pelo PCP, tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Nelson Basílio Silva.

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, agradeço o seu pedido de esclarecimento.

Sr. Deputado, o que referi na minha intervenção não foi que é exatamente igual…

Protestos do PCP.

Na verdade, se os Srs. Deputados me ouviram bem — e, se quiserem, posso entregar-vos a minha

intervenção, que está escrita e da qual não me desviei nem um centímetro —, a única comparação que faço é

ao dizer que tanto o projeto de lei do PCP como o projeto de lei do Chega, este último hoje aqui em discussão,

estão feridos no momento da efetiva aplicação da própria lei para resolver o problema.

Protestos do PCP.

E tanto assim é que, inclusivamente, eu disse que o projeto de lei do PCP, que será votado na próxima

sexta-feira, também contém alguns erros de constitucionalidade,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas quais?!

O Sr. Nelson Silva (PAN): — … que não são iguais aos do projeto de lei do Chega. Logo, estar a tentar dizer que eu disse que o projeto de lei do PCP e o projeto de lei do Chega são exatamente a mesma coisa

creio que revela um pouco de desonestidade política. Mas cá estaremos para fazer a discussão.

Risos do Deputado do CH, André Ventura.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se alguém imagina que com a criminalização da ocultação de riqueza — também conhecida por «enriquecimento injustificado» ou

«enriquecimento ilícito» — vai acabar ou diminuir significativamente a corrupção, em Portugal, penso que está

a ser otimista.

É avisado que se diga, desde já, para baixarmos as expectativas, que este passo que é dado por todos,

desde a esquerda à direita deste Parlamento, não é nenhum ovo de Colombo, não é nenhuma cura para todos

os males, nem é nenhuma receita milagrosa.

Quem quiser prevaricar e tiver «dois dedos de testa», só com muita inabilidade se deixará apanhar. E

vamos lá ver se, com estas iniciativas, que são louváveis, não estamos a complicar a vida aos políticos e aos

altos titulares de cargos públicos sérios e honestos e o corrupto escapa na mesma. Vamos lá ver se não é isso

que vai acontecer! Tudo faremos para que não seja assim.

Mas, Srs. Deputados, enquanto o Estado engordar, os salários emagrecerem, a burocracia aumentar e a

qualidade da democracia decrescer, a corrupção continuará a proliferar.

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Ainda assim, estamos perante um avanço que julgamos dever ser assinalado e sublinhado.

Investigar um titular de um cargo político ou de um cargo público, que, consciente e deliberadamente, não

queira justificar a origem da sua riqueza súbita, é um imperativo de decência e de transparência.

Para nós, só exerce estes cargos quem quer. Eles ainda não são uma espécie de serviço militar obrigatório

ou de escolaridade obrigatória.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Bem dito!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Quem quiser exercê-los, sabe de antemão que fica sujeito a obrigações específicas e, se não pretender sujeitar-se a elas, tem bom remédio: não se candidata ou não aceita a

nomeação. É muito simples.

Vozes do PSD: — É verdade!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Portanto, para o PSD, faz todo o sentido que se preveja a necessidade de justificação da proveniência das alterações patrimoniais superiores a 50 salários mínimos. Para que todos

saibam lá fora, estamos a falar de 33 250 €.

Mas aquilo que é extraordinário e não pode passar ao lado deste debate é que muitos daqueles que vieram

agora a correr para o mercadinho da honradez e da probidade — vamos ser sérios — só o fizeram à boleia de

um processo que indignou o País e que tem como alvo e destinatário específicos um ex-primeiro-ministro

socialista.

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Todos aqueles que, durante estes anos todos, não vieram a jogo, agora, depois de andarem longe destes combates e até de enfrentarem quem os quis travar, cá estão, cá vieram.

Mas, se há partido — isto orgulha-nos muito — com pergaminhos e com história nesta matéria e nesta luta

pela criminalização da ocultação de património, esse partido é o PSD.

Querem ver?!

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Sr. Deputado João Oliveira, em 2007, só houve um partido que teve esta preocupação, e esse partido

chama-se PSD.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Está enganado!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — O PCP só veio em 2009! Vamos lá pôr as coisas como elas são! Só veio em 2009!

O PCP fez uma coisa decente: em 2007, quando o PSD propôs a criminalização do enriquecimento ilícito, o

PCP votou a favor. E o Bloco de Esquerda também, e o CDS… Aliás, todos votaram a favor, menos um

partido — não preciso de dizer qual é, já vão descobrir.

Em 2009, o PSD apresentou idêntica proposta e, depois de um sinal positivo, porque a proposta foi

apresentada na generalidade, esse partido, que em 2007 não quis a criminalização do enriquecimento ilícito,

em sede de comissão eventual criada para acompanhar este fenómeno, veio também votar contra.

Qual foi o partido, qual foi?! Adivinhem lá!

Foi o Partido Socialista, é evidente!

Em 2012, o PSD, juntamente com o CDS, voltou a apresentar o mesmo projeto. Foi aprovado por todos,

mas houve um partido, o incontornável Partido Socialista, que votou contra!

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Em 2015, o PSD, insistente, voltou à carga. Nessa altura, o Partido Socialista já foi acompanhado por

aquela que viria a ser a geringonça, que se viria a constituir um pouco depois, e a tal geringonça votou contra

a nossa proposta de criação do crime de enriquecimento ilícito.

O Partido Socialista dirá, em resposta a isto, que o Tribunal Constitucional vetou a lei do enriquecimento

ilícito. É verdade! É verdade, mas isso não é tudo!

Vozes do PS: — Oh!…

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sabem porquê, Srs. Deputados? Porque, nos últimos 14 anos, o PS foi Governo durante 10 anos e, no Governo, o PS podia ter encontrado uma alternativa à lei do enriquecimento

ilícito que o Tribunal Constitucional chumbou, mas nunca veio com essa alternativa.

Aliás, o Governo até excluiu o enriquecimento ilícito desta estratégia recente que aprovou de combate à

corrupção e só apresentou agora uma proposta — esta é que é a verdade — porque percebeu que ficava só e

mal acompanhado. Percebeu-o, portanto veio logo a correr apresentar essa proposta, ao fim de 14 ou 15 anos

de luta do PSD.

Por que razão narro esta história toda? É para dizer a esta Câmara que o PSD está neste debate com uma

enorme autoridade, com uma vontade imensa de discutir esta questão, e está a fazê-lo de cabeça levantada e

de cara lavada. Não tem problema nenhum relativamente a isso.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Não ignoramos, como é evidente, os argumentos que conduziram aos chumbos do Tribunal Constitucional

e, por isso, apresentámos um projeto que entendemos ser prudente e cauteloso.

Daqui a dois dias, é verdade, na sexta-feira, vamos debater todos os projetos com maior detalhe, mas há

uma coisa que, desde já, pode ser adiantada e que é absolutamente irrefutável: o PSD optou por apresentar

um projeto que tem um efeito pedagógico importante e que tem um potencial dissuasor que me parece que o

distingue dos outros projetos. É que o projeto do PSD obriga a que se faça uma comunicação obrigatória ao

Ministério Público no caso de o titular do cargo político ou do cargo público não querer justificar a proveniência

da sua variação patrimonial.

Todos percebem que basta esta comunicação ao Ministério Público para desviar qualquer candidato de

qualquer tentação de não fazer a justificação destes rendimentos, porque só um kamikaze é que não

apresenta a justificação, sabendo que, a seguir, é investigado pelo Ministério Público e é logo rotulado, na

praça pública, de criminoso.

Às vezes, com pequenos passos, arranjamos grandes soluções. Talvez o PSD, com este projeto, consiga

encontrar, do ponto de vista psicológico, sociológico, do exemplo, do dever ser, a solução mais adequada —

não é preciso ser muito musculada, mas adequada — para purificar e higienizar a vida pública e a vida

democrática.

O que queremos dizer é que, mais tarde ou mais cedo, a lei vai ser aprovada. Já sabemos isso. Não há um

único partido que não tenha apresentado a sua proposta, portanto, embora os pormenores estejam no detalhe

— e é em sede de especialidade que vamos ver se isto passa ou não passa —, a verdade é que há um

interesse do País para que a redação a aprovar seja, em primeiro lugar, eficaz e, em segundo lugar, que tenha

conformidade constitucional.

Por isso, sinceramente, parece-nos que ninguém deve adotar posições inflexíveis, dogmáticas

relativamente a esta matéria e que todos deverão estar abertos — entendemo-lo assim — a encontrar

consensos na fase da discussão em sede de especialidade, que se seguirá.

É mais uma lei, não há dúvida nenhuma sobre isso, e não nos podemos livrar das leis. Mas, Srs.

Deputados, penso que todos concordarão com isto: o que faz falta ao País não são tanto leis nesta matéria; o

que faz falta ao País e à justiça são os seus agentes, são meios, são instrumentos e são recursos. E aí — não

me levem a mal — o Governo tem marcado passo, tem parado no tempo. Reparem que, há dois anos,

aprovou a criação da entidade da transparência e ainda não foi capaz, em dois anos, de a criar e de a instituir.

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Como é que os senhores, depois, se admiram, perante este impasse, que, por exemplo, o índice do The

Economist desclassifique Portugal da categoria de «país totalmente democrático»?! Ou, então, como é que se

admiram que, no Índice de Perceção da Corrupção, estejamos em lugares que não nos dignificam? É por isto,

por esta incapacidade!

Portanto, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, encharquem o Diário da República com as leis que

entenderem, mas ou mudamos a sério — e também temos de mudar nas atitudes —, ou, então, tudo ficará na

mesma, o País continuará a andar para trás e, na esmagadora maioria dos indicadores, continuará a estar mal

colocado, o que, porventura, injustamente, imerecidamente, cria uma ideia externa e internacional que talvez

não seja consonante com aquilo que merecemos.

Mas a verdade é esta: que o Governo se está a pôr a jeito, lá isso está! E é uma pena, porque acho que o

nosso País merece, relativamente a esta matéria, uma opção mais corajosa, mais ambiciosa e,

essencialmente, exemplos. Os exemplos têm de vir, e têm de vir do Governo, mas não têm vindo, como

vamos demonstrar à saciedade no debate de sexta-feira.

Neste caso em concreto, acho que todos os partidos estão em harmonia relativamente à necessidade de

se criminalizar a não justificação da ocultação de riqueza. Por isso, acho que vamos dar um passo gigante no

sentido de colocarmos esta questão também como prioritária no combate à corrupção.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado Carlos Peixoto, o Sr. Deputado João Oliveira, do PCP, inscreveu-se para lhe pedir esclarecimentos.

Tem a palavra, Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Peixoto, o meu pedido de esclarecimento é muito simples. Gostava de saber se o Sr. Deputado fez a pesquisa na base de dados que

devia ter feito para procurar o enriquecimento injustificado, porque o Sr. Deputado não tem razão.

É verdade que o PSD apresentou, em 2007, o Projeto de Lei n.º 374/X/2.ª, em que se previa a

criminalização do enriquecimento ilícito, mas fez isso já com a consciência pesada, depois de ter chumbado o

Projeto de Lei n.º 360/X/2.ª, do PCP, que foi apresentado bem antes do Projeto de Lei n.º 374/X/2.ª!

E foi no Projeto de Lei n.º 360/X/2.ª que o PCP trouxe à Assembleia da República a primeira discussão

sobre a criminalização do enriquecimento injustificado.

O título do projeto não tinha essas palavras. Foi, se calhar, por isso que o Sr. Deputado não o encontrou na

pesquisa que fez na base de dados. Mas ele está lá e propõe a criação do artigo 374.º-A, que,

lamentavelmente, só não viu a luz do dia no processo legislativo que foi concluído então porque o PSD se

opôs a ele.

Portanto, Sr. Deputado Carlos Peixoto, o meu pedido de esclarecimento é no sentido de saber se o Sr.

Deputado, efetivamente, tinha noção disso, ou não, e se foi um lapso quando disse que tinha sido o PSD, de

facto, a tomar essa iniciativa.

Mas refiro outra questão, ainda mais relevante.

Quando, na sexta-feira, discutirmos a solução para a criminalização do enriquecimento injustificado, que

não tem problemas de inconstitucionalidade e que permite o combate a esta realidade do ponto de vista penal,

no quadro que a Constituição prevê, que resposta é que o PSD vai dar desta vez? Vai dar a mesma que deu

quando chumbou o Projeto de Lei n.º 360/X/2.ª, que o PCP apresentou em 2007, com esse caráter pioneiro,

para a criminalização do enriquecimento injustificado? Ou, desta vez, vai tomar uma posição diferente e vai, de

facto, contribuir para que esta realidade possa ser punida criminalmente e para que possa haver uma solução

nesse sentido?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto para responder.

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O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, muito obrigado pela questão que me colocou.

Tenho aqui as iniciativas que entraram na X Legislatura e vejo, de facto, o Projeto de Lei n.º 360/X/2.ª, do

PCP, que não só não tinha o alcance que tinha o Projeto de Lei n.º 374/X/2.ª, do PSD, como não tem sequer o

mesmo título.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tem de ler mais do que o título!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — É que o PCP apenas deu, como título, a este projeto «Medidas legais de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira». O título do projeto do PSD era «Crime de

enriquecimento ilícito».

Mas, Sr. Deputado, não é isso que verdadeiramente interessa. Não estamos nessa competição para saber

quem é que veio primeiro.

Vozes do PCP: — Ah!…

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Não estamos e nunca estivemos. Estamos, talvez, mais preocupados em perceber quem é que foi coerente e quem é que o não foi.

É o PCP que tem de explicar por que razão, ao longo destes anos todos, votou sempre ao lado do PSD

quando o PSD propôs o crime de enriquecimento ilícito e, quando passou a estar na geringonça, ou quando a

geringonça estava à beira dos seus olhos, inverteu, deu uma cambalhota,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso não é verdade!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … e passou a votar contra aquilo que o PSD propôs. Isso é que o senhor tem de explicar!

Portanto, não era uma pergunta que o senhor tinha de me fazer a mim, eu é que faço ao Sr. Deputado

João Oliveira a seguinte pergunta: porque é que o PCP mudou de posição quando passou da oposição para

muleta do Governo?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, do PEV.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes consideram que o combate à corrupção é um combate que se impõe por motivos e imperativos éticos e também para melhorar a

nossa vivência democrática e credibilizar as nossas instituições.

É um combate na defesa e na afirmação de uma cultura de responsabilidade, na qual, a nosso ver, ganha

uma importância decisiva a necessidade da criação do crime de enriquecimento injustificado e ocultação de

riqueza.

Bem sabemos que a criação deste tipo criminal não será, certamente, a solução para acabar com a

corrupção, mas assumirá uma importância decisiva para o sucesso no seu combate, porque, de facto, a

impunidade a que os cidadãos tantas vezes vão assistindo perante o enriquecimento estranho de pessoas que

exercem funções públicas não fragiliza apenas a ideia de justiça, acaba por desacreditar também o conjunto

das instituições democráticas, criando fortes desconfianças sobre o seu funcionamento.

Mas, na perspetiva de Os Verdes, a solução a encontrar para quem pretende, de facto, um combate efetivo

e sério à corrupção terá de ser construída de forma a não deixar quaisquer dúvidas relativamente ao respeito

pelas garantias constitucionais, tanto ao nível penal como ao nível processual-penal, desde logo quanto à

presunção de inocência e tudo o que ela pressupõe, nomeadamente as matérias relativas ao ónus da prova.

Como todos estamos lembrados, a discussão que hoje fazemos não é nova. Já por várias vezes se

procurou legislar com o objetivo de criminalizar o enriquecimento injustificado, ainda que sem sucesso, ou

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porque as propostas foram rejeitadas nesta Assembleia ou, como foi o caso dos últimos processos legislativos

sobre a matéria, porque os textos aprovados no Parlamento foram julgados inconstitucionais pelo Tribunal

Constitucional.

Aliás, o processo de 2015 já tinha um fim mais que previsível, na medida em que repetia a fórmula de

2012, que já tinha sido declarada inconstitucional, pelo que não passou, por isso, de uma forma, por parte do

PSD e do CDS, de aparentar que algo se estava a fazer quando era certo e sabido que daí nada resultaria

para reforçar a via legislativa de prevenção e combate à corrupção, o que, de resto, se veio a confirmar com a

nova decisão de inconstitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional.

E do mesmo pecado padece esta iniciativa legislativa do Chega, como, de resto, aliás, já foi alertado pelo

Conselho Superior do Ministério Público, que considera que o projeto do Chega é o que levanta maiores

problemas jurídico-constitucionais, exatamente por reproduzir uma solução já chumbada pelo Tribunal

Constitucional por duas vezes, uma em 2012 e outra em 2015.

Foi também tendo presente estas duas decisões do Tribunal Constitucional que Os Verdes optaram por

seguir outro caminho para alcançar o mesmo objetivo e cuja discussão decorrerá na próxima sexta-feira. E

optámos por esse caminho exatamente porque nos parece que, dessa forma, não se correm riscos de

inconstitucionalidade, como aconteceu com as propostas de 2012 e de 2015 e como, certamente, aconteceria

se eventualmente o projeto do Chega fosse aqui aprovado — como, de resto, todos sabemos, inclusivamente

o Sr. Deputado André Ventura, que está farto de o saber.

É que se é verdade que o combate à corrupção pressupõe a consagração do crime de enriquecimento

ilícito e ocultação da riqueza e se é verdade que Portugal assumiu até o compromisso, no plano internacional

— designadamente na Convenção de Mérida —, de incluir o crime de enriquecimento injustificado no nosso

ordenamento jurídico, também é verdade que devemos caminhar por soluções que não ofereçam dúvidas de

conformidade constitucional, porque, de outra forma, o desfecho é mais do que previsível, é uma perda de

tempo.

Portanto, não acompanhamos a proposta do Chega, a qual votaremos contra, até porque, em bom rigor, a

intenção do proponente não é seguramente criminalizar o enriquecimento injustificado ou ilícito, a intenção do

proponente não é combater a corrupção, porque, se assim fosse, não apresentava uma proposta com morte

anunciada, que já foi declarada duas vezes inconstitucional pelo Tribunal Constitucional. A intenção que fica

visível é apenas a de fazer o número a que o Sr. Deputado André Ventura nos vai habituando — o costume,

portanto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: A primeira coisa que me ocorre dizer neste debate é que, independentemente de todas as outras considerações, o tema em si e a sua relevância

para o Parlamento deveriam exigir que o discutíssemos com seriedade, e a primeira questão é a de saber se é

ou não relevante criminalizar um enriquecimento injustificado, é ou não relevante o Parlamento pronunciar-se

sobre esta matéria. Essa é a primeira questão, independentemente de tudo o resto, e parece que, às vezes,

fica esquecida neste debate.

É evidente que, como aqui também já foi dito — e estou muito de acordo —, o combate à corrupção não se

faz só por aqui. Disse ainda agora o Sr. Deputado, e estou de acordo, que, enfim, sem meios, sem tecnologia,

sem investigadores podemos criar as leis mais extraordinárias do mundo — e nem todos os países adotaram

esta solução, como sabemos, são, de resto, muito poucos os países que têm soluções deste tipo — mas não

vamos lá. Ainda há poucos anos eram os responsáveis da Polícia Judiciária, já com este Governo em funções,

que falavam em asfixia no combate à corrupção, o que não podemos esquecer, nunca, neste debate.

De resto, é curioso — como aqui também já foi dito — que o Governo apresente um vasto pacote

legislativo de combate à corrupção, que aqui discutiremos na sexta-feira, juntamente com as iniciativas dos

partidos, e tenha precisamente deixado este tema de fora, que não se tenha preocupado com ele e não se

tenha interessado por ele.

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Curiosamente, deixou-o de fora mas é um pouco «gato escondido, com a proposta do Partido Socialista de

fora», por assim dizer, porque o Governo não apresenta mas vem o Partido Socialista apresentar uma

proposta precisamente para cobrir aquilo que o Governo não fez, ou que não quis fazer, nesta matéria.

Queria dizer também que esta não é uma questão nova. E tem razão o Sr. Deputado João Oliveira quando

refere que o Partido Comunista Português, em várias versões e por várias vezes, veio apresentar iniciativas,

sendo que sempre numa lógica muito declarativa. Portanto, não era o crime de enriquecimento injustificado,

como foi proposto mais recentemente por PSD e CDS, era um outro modelo, que, de resto retomam com toda

a legitimidade.

Em relação ao CDS, quero dizer que propusemos, em 2012, conjuntamente com o PSD, e depois, de novo,

em 2015, também com o PSD, a criação deste tipo criminal. Não o fizemos de ânimo leve. Fizemo-lo depois

de muitas dúvidas, depois de muito tempo de trabalho, depois de muita análise jurídica, depois de ouvir muita

gente e de uma forma séria, para tentar, de facto, que este crime fosse criado e não houvesse uma

inconstitucionalidade. Mas não é fácil. Com a atual Constituição, com a Constituição que temos — não estou a

dizer se bem se mal, não me pronuncio sobre isso —, com o modelo constitucional que temos, não é, de facto,

fácil, mas fizemo-lo de forma séria. E foi por isso que fomos lá duas vezes, mudando da primeira para a

segunda.

Indo agora à questão do Chega, diria que se o Chega pretende com isto, essencialmente, fazer um número

— e não fico com grandes dúvidas sobre isso, porque nem eu, nem o Sr. Deputado André Ventura, nem

ninguém tem dúvidas sobre o sucesso desta iniciativa de hoje — de afirmação política, diria que o

contranúmero é pior ainda, que algum do contra número a que aqui assistimos hoje é pior ainda. Porquê?

Dizem que é tática, que é inaceitável usar um potestativo para isto, que é malabarismo. Enfim, ouvimos de

tudo, como se os autores destas expressões nunca tivessem feito nenhum malabarismo no passado.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Como se nunca o tivessem feito! Em segundo lugar, é tão curioso quanto isto, Srs. Deputados: estive, por inerência de funções, na

Conferência de Líderes e aí havia dois partidos, e não um, que queriam antecipar esta matéria, era o Chega

que queria antecipar para hoje, dia 23, e o Partido Socialista que queria antecipar para amanhã, dia 24.

Entretanto, o Partido Socialista — e bem — desistiu. E bem! Desistiu, mas a intenção era a mesma, Sr.

Deputado João Oliveira. Quando chegámos lá, a intenção do Sr. Deputado André Ventura era a mesma do

PS, ou sejam, ambos queriam discutir o enriquecimento ilícito antes da discussão do pacote da corrupção.

Portanto, algumas das críticas que aqui são feitas não têm que ver nem com o tema — porque acho que o

tema é reconhecido por todos, é relevante —, nem com a iniciativa em concreto, têm que ver só com o autor.

Compreendo isso, mas acho que é preferível não fazermos a discussão nesses termos, é preferível

olharmos para a matéria e discuti-la de forma séria, sob pena de não discutirmos nada.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Claro!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sob pena de não discutirmos nada, repito! Não concordo com inúmeras propostas de vários partidos e não concordo com grande parte das propostas

do Chega, mas não vou dizer que não discuto só por causa do autor, porque senão não discutiria nenhuma

proposta vinda das bancadas de esquerda que estão à minha frente, cujo respeito democrático é igual ao que

tenho em relação a qualquer Deputado eleito presente nesta Câmara.

De resto, convém dizer uma coisa: a proposta do Chega, com algumas alterações — e também aí não

elogio o mérito do Deputado André Ventura — é decalcada, é a caminho do copy paste, da proposta que PSD

e CDS fizeram, como diz a Ordem dos Advogados — e bem! — no seu parecer, e que foi chumbada, do ponto

de vista constitucional, pelo Tribunal Constitucional. Portanto, não há aí grandes diferenças com o Decreto n.º

369/XII, que depois é chumbado pelo Acórdão n.º 377/2015 do Tribunal Constitucional.

É a mesma proposta, e não me vou pôr aqui a acompanhá-la, é uma proposta de partidos — enfim, penso

que não terão dúvidas — de centro e de centro-direita tradicionais, pelo que toda essa retórica de que isto é o

fim do mundo pelo seu conteúdo é absolutamente disparatada. Não faz sentido nenhum!

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Foi declarada inconstitucional? Foi! Tem dois ou três problemas do ponto de vista constitucional: primeiro, a

questão da presunção de inocência, que é difícil de contornar; segundo, a questão do ónus da prova, que é

também difícil de contornar, e na última versão do PSD e do CDS até a questão essencial para o Tribunal

Constitucional era a definição do bem jurídico a proteger. Essa era a questão essencial.

Dito isto, não persistimos nessa matéria. A proposta que aqui traremos na sexta-feira é, à semelhança de

outros partidos — e com alguma inspiração, até, da Associação Sindical dos Juízes Portugueses nas várias

propostas que vimos —, uma proposta que faz o encaminhamento para o declarativo e para a exclusividade,

simultaneamente. Portanto, não insistimos numa matéria que é inconstitucional e não propusemos ainda uma

alteração da Constituição.

Mas alguma diabolização da proposta do Chega não faz também nenhum sentido. Convém tratar isto com

seriedade e reconhecer que, obviamente, isto é um número político, que o Chega não trabalhou muito para

chegar a esta proposta pois pegou numa proposta que já existia, alargou-a dos titulares de cargos políticos,

para toda a gente, e agravou ainda mais as penas — basicamente é isto, é tão simples como isto trazer aqui

esta proposta. E o Chega aproveitou o agendamento potestativo para dizer: «Fomos os primeiros, sozinhos, e

fomos chumbados». É esse o objetivo e será conseguido pelo partido proponente, ou seja, ser o primeiro a

apresentar e ser chumbado.

Portanto, não é mais do que isso e não vale a pena fazermos um filme à volta disto. Ou queremos, de

facto, encontrar uma solução ou não queremos; se queremos encontrar uma solução, vamos discuti-la, vamos

trabalhá-la em sede de especialidade…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … e isso será feito, na minha opinião, na sexta-feira, com seriedade, como nos é exigido e como é nossa responsabilidade parlamentar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — 20 valores na abordagem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma nova intervenção, o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Faço uma intervenção porque, por rejeição, os partidos aqui presentes decidiram não fazer pedidos de esclarecimento. Penso que foi a primeira

vez que aconteceu e agradeço-vos muito.

Cada passo que dão no sentido de se destruírem a vocês próprios é um passo enorme, extraordinário, que

eu agradeço e que os portugueses lá fora reconhecerão.

Mas, ainda assim, vou responder ao Sr. Deputado João Oliveira, dizendo-lhe uma coisa nesta intervenção.

Referiu que isto era um fingimento, que a luta contra o enriquecimento ilícito é um fingimento e que ficaríamos

a falar sozinhos. Sabe, Sr. Deputado, o Chega nunca tem medo de ficar a falar sozinho, porque fica a falar

com milhões de portugueses lá fora, que estão a assistir, neste momento, à recusa do PCP, que durante anos

andou a falar de enriquecimento ilícito, a discutir hoje o enriquecimento ilícito.

Mas também era bom o Sr. Deputado explicar porque é que, em 2015, votou contra o enriquecimento

ilícito, porque é que veio aqui, a este Parlamento, votar contra, ao lado do Partido Socialista, a 29 de maio —

já que gosta tanto de bases de dados, vá lá confirmar —, quando votou contra o enriquecimento ilícito.

Queria também dizer-lhe, Sr. Deputado, que falou muito do projeto do PCP, mas pode pedir-me

esclarecimentos, que lhos dou, porque se quiser falar de direito, falamos.

O vosso projeto mais não é do que um acréscimo de deveres declarativos, que, basicamente, diz que quem

tiver património que ninguém consiga explicar como apareceu, que tenha aparecido por acaso, como diz o

Bloco de Esquerda que tenha «caído do céu», basta enviar à Autoridade Tributária e Aduaneira, no prazo

previsto, uma declaração para efeitos fiscais, após o início dos efeitos da presente lei.

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Olha que bonito! Eu tenho património que não sei como explicar, o que é que faço? Faço o Modelo 10 do

IRS: «Olhe, foi assim, o património caiu-me do céu, agora está aqui. Foi um incremento de Categoria G, levem

lá com isto e esqueçam!» Isto é o projeto do PCP. E se quiser pedir-me esclarecimentos, peça que eu tenho

aqui o seu projeto e sei bem que se há coisa que este projeto não faz é combater a corrupção e combater o

enriquecimento ilícito.

Sr.ª Deputada Cláudia Santos, eu tinha de guardar para si uma grande parte desta intervenção. Quando diz

que a riqueza incompreensível num cargo político devia ser criminalizada, de facto, é verdade. Mas isso é só a

conversa do Partido Socialista, porque todas as vezes que isso aqui veio votaram contra. Com cartas do Victor

Hugo ou sem cartas do Victor Hugo, e se quiser cartas do Lenine, também lhe envio, a verdade é que o PS só

quer é votar contra.

José Sócrates dizia que não porque não era o momento, António Guterres dizia que não porque a questão

não se está a colocar lá fora e a Dr.ª Cláudia Santos diz que não porque o Victor Hugo não gosta e porque

gosta muito do nosso sistema judicial penal e da nossa tradição. Cada um escolhe os motivos que entende!…

A verdade é esta: o PS não quer criminalizar o enriquecimento ilícito, porque se quisesse, na sexta-feira,

trazia aqui o enriquecimento ilícito. Ou vai dizer que não tem meios para o fazer, com cento e não sei quantos

Deputados para preparar um projeto?! Tinha todas as formas e momentos para o ter feito e não o quis fazer.

Disse que a presunção de inocência é um motivo atendível. E é, sem dúvida, Sr.ª Deputada. Por isso, no

nosso projeto, fizemos questão de referir o motivo justificado, que caberia ao próprio para justificar como é que

aquele património ocorreu. É que não há outra forma de fazer isto!

A outra forma é seguir esta via do PCP, que é aumentar obrigações declarativas e criminalizar uma

obrigação declarativa. Isso, sim, é um truque — um truque penal! —, porque é dizer que o crime não está no

enriquecimento está em falhar uma obrigação declarativa.

A Sr.ª Deputada sabe isso muito bem, porque isso já foi dito não por mim mas por muita gente antes de

mim, e muito melhor do que nós os dois que aqui estamos hoje sentados. Portanto, se esses o dizem, e a Sr.ª

Deputada sabe bem que o dizem, o que estamos a fazer com estas propostas é criminalizar obrigações

declarativas acrescidas. E isso, com uma pena de prisão até cinco anos, é risível, risível face ao nosso

ordenamento jurídico e risível face aos ordenamentos jurídicos lá fora, como a Sr.ª Deputada sabe bem.

Temos é de ter coragem de resistir e dizer que o que estamos a criminalizar é aqueles que enriquecem

sem justificação. Isso é que devíamos ter coragem de fazer: criminalizar quem não tem um mínimo de

justificação, porque, de facto, o dinheiro não cai do céu. Se eu começar a andar de barco e se chegar de avião

ao Parlamento, não podemos dizer que é tudo normal, com o meu salário de Deputado.

Portanto, é isso que temos de dizer, sem papas na língua — claro, para os portugueses perceberem que é

isso que queremos criminalizar —, e não andar aqui à volta com as cartas do Victor Hugo e as cartas do Papa,

porque o que precisamos é de criminalizar o enriquecimento ilícito.

Sr.ª Deputada, no filme Feios, Porcos e Maus havia a expressão seguinte: «andar à procura de trabalho e

pedir à Virgem Maria para nunca o encontrar». É isto o que o PS faz com o enriquecimento ilícito, ou seja, vem

aqui falar do Victor Hugo, falar disto e daquilo, mas quando chega ao momento de votar: «Ai, é a democracia;

ai, são os direitos humanos; ai, é a presunção de inocência». Boa sorte a explicarem lá fora o que é a

presunção de inocência na luta contra a corrupção e contra o enriquecimento ilícito.

Sr. Deputado José Manuel Pureza, reservei também para si uma parte significativa desta intervenção

porque disse — e disse com firmeza, com aquela firmeza que o caracteriza — que este agendamento era um

truque.

Procurei lembrar-me de quais tinham sido os agendamentos do Bloco ao longo dos últimos tempos. Além

das tretas habituais das nacionalizações, que vêm sempre a reboque — depois o PCP vem atrás do Bloco,

etc., etc., —, acho que se há partido que não pode falar de truques no Regimento e no Estatuto, Sr. Deputado,

é o Bloco de Esquerda. E não me faça falar mais!… Acho que, neste momento, o Bloco falar de truques no

Regimento e no Estatuto não é o mais indicado, mas isso ficará com a sua consciência.

Agora, há uma coisa a que o Sr. Deputado tem de responder sobre se quer ou não — disse o Sr. Deputado

— criminalizar este comportamento em titulares de cargos políticos. E os outros? Repito, e os outros?! Ficam

fora do projeto do Bloco de Esquerda?

O próprio Bloco, que pôs cartazes pelo País inteiro a dizer, «Meus senhores, o dinheiro não cai do céu!»,

vem agora à Assembleia dizer que só quer criminalizar os titulares de cargos políticos. E os outros, Sr.

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Deputado?! E os outros que enriquecem à custa do dinheiro dos portugueses e não conseguem explicar nunca

como é que o dinheiro lhes apareceu?! Se o dinheiro não cai do céu, como diz o Bloco de Esquerda, deviam

ter coragem de hoje votar a favor deste projeto, porque considera e toca no ponto verdadeiro, que é

criminalizar quem enriquece sem motivo, dar uma justificação para isso, e combinar isso com declarações

fiscais, que era o que deveria ser feito. Se o Sr. Deputado fosse coerente com aquilo que defendeu hoje e no

passado, votaria favoravelmente o projeto do Chega.

Sr. Deputado Nelson Silva, vai-me desculpar eu ter de lhe referir isto mas vê-se que o Sr. Deputado chegou

aqui há pouco tempo. Hoje deixaram-no sozinho e não sei se já foi por causa disso ou se foi por causa do que

vou dizer agora. O Sr. Deputado vem aqui dizer que esta proposta é inconstitucional e que a do PAN é a de

fazer uma tributação a 100% no IRS.

Mãe do céu! Se isto não é inconstitucional, não sei o que é inconstitucional! Conhece algum país do mundo

que tribute a 100% alguma coisa?! Isso é o que se chama — vou-lhe explicar — confisco! Chama-se confisco,

na lei fiscal, e é claramente inconstitucional, conforme o Tribunal Constitucional várias vezes já disse.

Portanto, vir aqui dizer que a nossa proposta é inconstitucional quando a que apresenta é claramente

inconstitucional, só pode ser uma brincadeira.

Mas gostei quando disse que a coerência é a marca de água do PAN e que, por isso, está disponível para

me explicar o que é a coerência. Falou dos vistos gold. Ouvi ali: «os vistos gold que a direita chumbou» Mas

ao menos não são vistos green, Sr. Deputado! Não são vistos propostos pelo PAN, à revelia daquilo que

defende, porque foi o seu partido que defendeu a instauração de uma política de vistos green. Já agora, devia

explicar também — não tem tempo, mas eu posso dar-lhe — como é que vem atacar os vistos gold e deixa

que haja vistos green. Quer dizer, é um pouco… Sempre esperei que green ficasse ali para Os Verdes, mas,

aparentemente, o PAN preferiu, mesmo assim, copiar isso.

Sobre coerência, Sr. Deputado, nós não dizemos que queremos combater os crimes sexuais e depois

fazemos uma espécie de lei de terapia de grupo de reconciliação entre violadores e violados e «tudo ao molho

e fé em Deus». Isso fica para o PAN. Por isso, reitero-lhe as palavras: quando quiser coerência, fale com o

Chega, que o Chega certamente terá a habilidade, a capacidade e a coragem de lhe explicar o que é a

coerência.

Sr. Deputado Carlos Peixoto, de facto, é verdade e perguntamo-nos como é que o Partido Socialista, no

centro deste debate, sempre votou contra estas propostas. Mas também lhe pergunto, Sr. Deputado, se seria

expectável que um Primeiro-Ministro como José Sócrates permitisse à sua bancada votar a favor do

enriquecimento ilícito. Não seria expectável!

Portanto, temos de dar o seu a seu dono. A verdade é que José Sócrates foi coerente, do minuto um ao

último, ao dizer que o enriquecimento ilícito é uma vergonha. E eu percebo que, para ele, seja uma vergonha.

Todos vimos o que aconteceu — o Sr. Deputado referiu-o, e bem — naquele (vou tentar ser respeitoso) juízo

de instrução, em que o enriquecimento ilícito ia sendo «lavado» à medida que a hora avançava e com os

portugueses a verem, em direto, na televisão, assistindo atónitos a essa situação.

Mas também devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que o anterior projeto do PSD diz que combater o

enriquecimento ilícito é uma forma importante de combate à corrupção. E nós devemos lembrar-nos de algo

que o PSD hoje recordou também, que é o que é que o PS fez quando o Tribunal de Contas alertou para os

riscos de corrupção, nomeadamente para os riscos de corrupção na contratação pública: afastou o presidente

do Tribunal de Contas e fez dispensa de visto prévio para a contratação pública. Foi isto que fizeram em

matéria de corrupção e por isso não me espanto que o PS queira efetivamente votar contra esta proposta

relativa ao enriquecimento ilícito.

Sr. Deputado José Luís Ferreira, é verdade que esta proposta é um risco. Mas sabe que Sá Carneiro dizia

que a política sem risco é uma chatice e quando temos a certeza de que estamos certos e de que os

portugueses, lá fora, sabem que é isto que querem e não artifícios legislativos de criminalizar obrigações

conexas, declarativas ou outro tipo de acessórias, devemos insistir naquilo em que acreditamos, mesmo que

seja inconstitucional. Mesmo que o Tribunal venha a declará-la inconstitucional, mantivemo-nos firmes, porque

esta Assembleia não é eleita pelo Tribunal Constitucional, é eleita por todos os portugueses, lá fora, e se

perguntasse aos portugueses o que é que querem, se querem criminalizar o enriquecimento ilícito ou as

obrigações acessórias, tenho a certeza de que 95% diriam que querem criminalizar o enriquecimento ilícito —

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não seria o Victor Hugo, certamente, nem seriam alguns dos nossos melhores especialistas, seria o povo

português, soberano na decisão que tem de tomar em matéria de justiça.

Sr. Deputado Telmo Correia, vou apenas dizer-lhe o seguinte: não é verdade que esta proposta seja

equivalente, porque ela transforma duas coisas muito importantes: uma, o motivo, que tem de ser sempre

apresentado para o enriquecimento injustificado; a outra, a remissão para a legislação fiscal, nomeadamente

para as manifestações de fortuna, artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária. Esta remissão pode permitir contornar

não só a identificação do bem jurídico como pode permitir, além disso, que a presunção de inocência não fique

tão gravemente afetada e que consigamos fazer, efetivamente, uma criminalização do enriquecimento ilícito.

Esta é uma proposta possível. Há outras, que discutiremos, mas queria recordar os Srs. Deputados que se

houve proposta que foi primeiro anunciada que viria no dia 23 ao Parlamento — foi conhecido de todos, foi

tornado público —, foi a de que o Chega traria o enriquecimento ilícito a esta Câmara, neste dia. Por isso, não

venham dizer que o Chega usou um truque para vir aqui trazer o enriquecimento ilícito e jogar com ele, porque

já estava há muito anunciado e não há ninguém nesta Câmara que não soubesse que o Chega iria discutir o

enriquecimento ilícito neste dia.

Quem fez um truque foi o Governo e o Partido Socialista, e todos caíram nele, pois, mais uma vez, o que

vamos fazer é aprovar, ou não, uma estratégia contra a corrupção que de enriquecimento ilícito fala zero! Se

aprovarmos a estratégia do Partido Socialista, é o pior golpe que damos na luta contra a corrupção em

Portugal.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma nova intervenção, tem a palavra a Sr. Deputada Cláudia Santos, do PS.

A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não é verdade que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não tenha nenhuma iniciativa legislativa. Tem uma iniciativa legislativa sobre

ocultação de riqueza nos moldes que são possíveis face à Constituição que, felizmente, temos.

Houve, todavia, um aspeto que me pareceu relevante na intervenção do Sr. Deputado, quando afirmou,

dirigindo-se ao Sr. Deputado do PAN: «Quando quiser coerência, fale com o Chega». Curiosamente, não disse

«Quando quiser coerência, fale com o Sr. Deputado André Ventura», o que nos abre um espaço de debate

interessante, porque o Sr. Deputado André Ventura não gosta que se cite Victor Hugo, mas talvez possamos

citar o Sr. Professor André Ventura, com quem eu tinha a esperança de hoje debater política criminal, porque

este é um agendamento sobre política criminal.

O Sr. Deputado André Ventura tem uma dissertação de doutoramento cujo subtítulo é, precisamente: Os

maiores desafios para a legislação processual penal.

Como o Sr. Deputado não gosta de Victor Hugo, vou então citar o Sr. Dr. André Ventura: «Os países

ocidentais produziram uma quantidade incrível de nova legislação sobre a luta contra a fraude fiscal, o

branqueamento de capitais e a corrupção. Um caso paradigmático é Portugal. Um país do sul da Europa, com

práticas de corrupção profundamente enraizadas, que nos últimos seis anos fez uma verdadeira revolução

paradigmática na supervisão bancária e na luta contra a evasão fiscal» — página 25.

Depois, na página 29, diz: «Até países como Portugal ou a Irlanda conhecem propostas legislativas cada

vez mais duras e inflexíveis relativas aos direitos fundamentais».

Mais à frente, na página 119, diz: «A razão desse fenómeno de hipercriminalização contra os direitos

humanos reside num contexto social acrítico de legitimidade que, na verdade, explica a aprovação pelos

parlamentos nacionais, no direito penal e no processo penal, de medidas altamente restritivas de direitos

fundamentais, sem qualquer justificação». Dizia o Sr. Deputado, e repito: «medidas altamente restritivas de

direitos fundamentais sem qualquer justificação» — página 119.

Na página 121, diz: «Estas mudanças revelam, tanto em Portugal como em Espanha, um progressivo

enfraquecimento do direito à liberdade».

Diz, na página 146, que: «Os valores fundamentais e os princípios dos modelos de processo penal estão

em perigo».

Depois — vou concluir, para não ser muito maçadora — diz, na página 209: «Parece evidente que há uma

aniquilação progressiva e extensa dos direitos fundamentais em aspetos básicos da vida dos cidadãos». E

conclui: «As alterações legislativas em países como Portugal, Espanha, Irlanda, Estados Unidos minaram a

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estrutura fundamental do Estado democrático de direito e a sua natureza herdada da política liberal dos

séculos XVIII e XIX» — encontramo-nos aqui com o Victor Hugo.

E continua: «Por um lado, o direito penal humanista, como Figueiredo Dias apelidou, foi definitivamente

dominado» — nesta época, o Sr. Deputado lia Figueiredo Dias e suponho que também lesse Victor Hugo —, e

avança defendendo a necessidade de respeitarmos a presunção de inocência, na página 234.

Portanto, falar sobre coerência neste debate torna-se problemático.

Aplausos do PS.

É evidente que o Sr. Deputado me poderá dizer a seguir que a coerência é na vida académica e que não

estamos na universidade, estamos no Parlamento. Mas uma coisa também lhe posso responder: desde 2003

que escrevo exatamente o mesmo sobre corrupção e sobre processo penal e aquilo que defendi hoje é

totalmente coerente com o que escrevo desde essa altura.

Só para concluir, dir-lhe-ia que essa linha argumentativa segundo a qual os factos ou a ciência não

interessam à política é um argumento que nós conhecemos, por exemplo, em português com açúcar, dito pelo

presidente de um país irmão, quando diz, por exemplo: «Vacinem-se se quiserem, corram o risco de virar

jacaré». Enfim, um político pode dizer isso quando não é doutor em bioquímica. Agora, um político que é

Doutor em política criminal,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Saiu na farinha Amparo!

A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — … vir defender uma iniciativa legislativa que é claramente impensável sob o ponto de vista da presunção da inocência, do princípio da ofensividade, do princípio da legalidade, é uma

incoerência que, no caso do Sr. Deputado, é mais difícil de justificar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma nova intervenção, tem palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Obrigado pelas palmas à citação fantástica. Sr.ª Deputada, penso que não ouviu aquilo que eu disse, mas vou explicar outra vez: esta proposta em

nada ou em muito pouco fere aquilo que nós entendemos que deve ser a presunção de inocência. E, como a

Sr.ª Deputada referiu, e bem, se há alguma coisa que podemos ter é coerência, porque quisemos acabar com

esta regra prevista na Constituição, não da presunção de inocência, mas da forma como é vista e interpretada.

É que não há uma interpretação da presunção de inocência, conforme a Sr.ª Deputada, académica, sabe bem,

há várias e — como eu disse e citei — de alguns muito melhores do que nós.

A Sr.ª Deputada reconhecerá que nos próprios acórdãos do Tribunal Constitucional houve quem

entendesse que esta proposta, ou outra parecida, não violava a presunção de inocência e reconhecerá que,

em muitos países da Europa e do mundo, há propostas semelhantes a esta com um princípio da presunção de

inocência tão ativo e tão firme como a nossa. Se gosta de Direito Comparado, vá lá estudar Direito Comparado

para ver como há países do mundo onde o princípio da presunção de inocência é levado muito mais a sério do

que em Portugal, nomeadamente em termos de prisão preventiva e de medidas de coação, e têm,

efetivamente, este tipo de modelo e de proposta.

Não se refugie na coerência, Sr.ª Deputada, para justificar o que o PS não quer fazer: criminalizar o

enriquecimento ilícito. Se não quer citar Victor Hugo, nem André Ventura, cite António Guterres: «Quando há

uma injustiça e a deixamos perpassar somos nós que falhamos por a deixarmos acontecer». Oxalá o Partido

Socialista, que gosta tanto de citações, ouvisse António Guterres sobre esta matéria do enriquecimento ilícito.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Lacão, do PS.

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O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há quem ache que ser democrata é cumprir as regras processuais da democracia. É certamente uma componente, mas eu acredito que ser democrata é mais

do que isso e implica uma forte adesão ética a valores e a princípios e creio que essa forte adesão ética a

valores e princípios passa, por parte de um democrata, em ter sempre a preocupação de defender o rigor e a

verdade e recusar a instrumentalização demagógica da opinião pública.

Ora, o que acontece aqui, hoje, é que vimos, de maneira fácil demais, a busca da instrumentalização

grosseira da opinião pública, partindo, desde logo, da ideia de que temos de criminalizar um tipo legal de

enriquecimento ilícito porque tal não existe na nossa ordem jurídico-penal.

Pergunto: o que é, por exemplo, o crime do recebimento indevido de vantagem? O que é o crime da

corrupção, certamente carecido de aperfeiçoamento quanto ao tipo? O que é o crime do peculato? O que é o

crime da participação ilegítima em negócio, para dar alguns exemplos? São, evidentemente, manifestações de

formas de enriquecimento ilícito presentes na nossa ordem jurídico-constitucional.

Então, talvez seja outra coisa que esteja em causa e essa outra coisa, presente no projeto de lei do Chega,

como a Sr.ª Deputada Cláudia Santos tão eloquentemente demonstrou, é, mais uma vez, a tentativa de eludir

o princípio penal da presunção de inocência e a proibição da inversão do ónus da prova.

É exatamente isto que está em causa e, sendo isto que está em causa, a pior coisa que se pode fazer é

pretender levar os outros a bater com a cabeça na parede em relação a uma impossibilidade constitucional. É

isso que o Sr. Deputado André Ventura veio convidar a que se fizesse, ou seja, que os outros batessem com a

cabeça na parede em relação a algo que sabem que não é possível.

Não é possível porque a nossa Constituição não o permite, não é possível porque o Tribunal Constitucional

já, unanimemente, o declarou, mas não é possível também em razão dos princípios e dos valores. É que

desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos, desde a Convenção Europeia dos Direitos Humanos,

desde a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais que todos sabemos que estes princípios não são apenas

de portugueses, são princípios adquiridos da civilização democrática e quem é democrata deve saber respeitar

os princípios em nome dos quais se constrói a democracia e o Estado de direito.

Aplausos do PS.

É por isso que se alguma aberração aqui existe é a tentativa de esgrimir uma impossibilidade. Ora, não

deixa de ser curioso que, a propósito dessa impossibilidade, tenhamos visto, em particular o Sr. Deputado

Carlos Peixoto, arvorar a suposta coerência do seu partido, no passado, em legislaturas anteriores, quando

aqui apresentou, precisamente, soluções que eram, como o Tribunal Constitucional demonstrou,

grosseiramente inconstitucionais.

Esteve o Partido Socialista quieto nessas alturas, particularmente em relação às iniciativas legislativas de

2012 e 2015? Não, Srs. Deputados. O PS apresentou as suas próprias iniciativas para aprofundar o princípio

da transparência, para aprofundar o âmbito dos deveres declaratórios dos responsáveis políticos, para

aprofundar o regime de sanção, em caso de violação desses deveres declaratórios.

O que fez a maioria de então, a maioria do PSD e do CDS? Votou contra essas iniciativas. E o que fez

essa mesma maioria? Insistiu em 2012 e insistiu em 2015 nas tais soluções grosseiramente inconstitucionais.

Já tinha, nessa altura, a obrigação de saber que eram redondamente inconstitucionais e, portanto, desde

então, do que é que o PSD e o CDS se revelaram responsáveis? Ao votar contra os projetos apresentados

pelo PS, nessas ocasiões, o que eles fizeram foi revelar-se responsáveis por termos atrasado a melhor

clarificação do princípio da transparência e dos deveres cometidos aos responsáveis de titulares de cargos

políticos.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Quando, então, é que esta matéria foi clarificada? Foi clarificada quando foi possível mudar a maioria parlamentar, ou seja, na XIII Legislatura. Quando, finalmente, PSD e CDS deixaram

de ter uma maioria de controlo no Parlamento, então, foi possível, com a Lei n.º 52/2019, alargar claramente o

âmbito da transparência devida pelos responsáveis políticos, alargá-la, no âmbito dos deveres de declaração,

alargá-la no sentido da criminalização das falsas declarações e da ocultação ilegítima de enriquecimento,

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alargá-la, portanto, no sentido correto, que é aquilo que eu auguro que, na sexta-feira, voltaremos a discutir e

a aprofundar, no sentido do aperfeiçoamento.

Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, voltando ao princípio das minhas palavras, se queremos ser democratas,

saibamos não iludir a opinião pública, saibamos falar verdade, mas saibamos também, cada um, assumir as

suas responsabilidades.

As boas soluções de 2019 deveram-se à alteração da composição da maioria parlamentar. Não foram

obtidas antes porque a antiga maioria o não permitiu e hoje, igualmente, já todos estão capacitados — pelos

vistos, com a única exceção do Deputado André Ventura — que insistir no erro não só é um disparate como é

pôr em causa a credibilidade das pessoas nas instituições.

Pela nossa parte, tal como em 2012, tal como em 2015, tal como em 2019, vamos, construtivamente,

continuar a colaborar para que as instituições se credibilizem e para que os cidadãos tenham razões para

confiar naqueles que elegem para a assumir as causas do interesse e do bem públicos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, darei a palavra ao Sr. Deputado André Ventura, para, querendo, encerrar este debate.

Sr. Deputado André Ventura, tem a palavra.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate que aqui tivemos hoje foi particularmente revelador, revelador de como uma grande parte dos representantes eleitos pelo povo

português não tem vontade nem quer combater o enriquecimento ilícito.

Uma boa parte dos eleitos do povo português, traindo a sua confiança, porque aqui disseram o contrário do

que disseram nas últimas eleições, não têm, na verdade, nenhum interesse em combater o enriquecimento

injustificado, que é o mesmo que dizer — para que oiçam lá fora — aqueles que chegam sem nada e saem

com tudo, sem nenhum dever de demonstrar aquilo que fazem e porque o fazem, dizendo que isso colocaria

em causa a presunção de inocência. Como se fosse normal, no exercício de funções públicas, chegar com um

salário padronizado e sair com as mãos cheias de dinheiro para empregos dourados lá fora, como se fosse

aquilo que deve fazer um democrata e fosse isso defender a democracia.

Foi isso que ouvimos aqui, hoje, neste Parlamento: retórica para a esquerda e para a direita, impedindo

aquilo que os portugueses querem fazer, que é criminalizar o enriquecimento ilícito.

Citaram a carta de Victor Hugo. Certamente que Victor Hugo não conhecia este País tão bem como os

milhões de portugueses que, todos os dias, têm de viver ao seu lado, têm de olhar para a corrupção na porta

da sua câmara municipal, na porta da sua junta de freguesia, têm de ver um ex-Primeiro-Ministro ser julgado e

ser completamente branqueado, têm de ver Deputados e presidentes de câmara serem detidos, dia após dia,

e olharem para a carta de Victor Hugo como se fosse a solução dos seus problemas.

Certamente que os portugueses esperariam daqueles eleitos muito mais do que ler cartas de Victor Hugo,

esperariam ação, esperariam firmeza, e não teriam medo nem receio dos resultados quando temos a razão

certa e temos a história do nosso lado.

Num último aparente julgamento de instrução, um juiz descreveu o caso escandaloso como fantasia, delírio

e a palavra que mais ouvimos foi «prescreveu» — uma vergonha à vista, a céu aberto, de Portugal, que olhava

incrédulo. Enquanto outros, aqui, faziam citações e diziam que à justiça o que é da justiça, o País via como é

possível sair deste lugar de Primeiro-Ministro e ter uma vida dourada, com gozo e escárnio do dinheiro dos

portugueses que tanto lhes custa todos os dias a ganhar.

Era Rui Barbosa que dizia que a justiça se pode irritar porque é precária, mas a verdade nunca é

impaciente porque é eterna. Sei que nós temos razão e um dia, mais cedo do que nunca e mais cedo do que

esperam, este Parlamento aprovará uma norma de enriquecimento ilícito. Se não for nesta Legislatura será na

próxima, porque o compromisso com os portugueses, nas próximas eleições, terá de ser falar claro e falar

verdade sobre quem quer criar artifícios declarativos e quem quer, efetivamente, criminalizar o enriquecimento

ilícito.

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Por isso, há uma coisa que a direita deve saber: é que não haverá qualquer solução à direita sem que a

criminalização do enriquecimento ilícito seja uma realidade, no que depender do Chega e no que no Chega a

sua força depender.

Disse o Sr. Deputado Jorge Lacão: «sejamos democratas». É isso mesmo que os portugueses esperam

ouvir esta tarde, «sejamos democratas», enquanto olham para o presidente de câmara que está a ser julgado

por corrupção, enquanto olham para o presidente de junta que desviou dinheiro para carros pessoais e que

andou a fazer viagens com o dinheiro dos contribuintes — meus amigos, sejamos democratas! Afinal, têm de

ter cuidado com aqueles que só acham que a democracia é um processo e que estão cá para a destruir,

porque são os mauzões, e que, quando puderem, farão deste Parlamento uma Câmara unitária e securitária.

Mas não é assim, Sr. Deputado: é que entre ser democrata e olhar para as pessoas como estúpidas, vai

uma grande diferença, entre dizer que somos democratas e gozar com os portugueses, vai uma enorme

diferença. Os portugueses veem-se com a maior carga fiscal de sempre, veem-se a pagar impostos que nunca

mais acabam e veem que políticos, ou não políticos, conseguem pôr o dinheiro atrás das costas, sair pela

porta de trás e desaparecer sem serem vistos, uns em Cabo Verde, outros nas Filipinas, outros, aqui, na

Ericeira ou em Cascais,…

Protestos do PS.

… a gozar com quem paga o salário dos portugueses e com quem, efetivamente, faz de Portugal um país

que ainda possa ser decente.

Mas diz também o Partido Socialista que insistir no erro é um disparate. Não sei se insistir no erro é um

disparate ou não. Há muitos erros na História que começaram por ser defendidos por um e passaram a ser

defendidos por cem, por mil, por um milhão, por vários milhões. Ontem talvez fôssemos poucos, hoje somos

muitos e um dia creio que poderemos ser milhões a defender aquilo que, efetivamente, é o correto.

O que não poderemos dizer, porque não temos esse direito, é que qualquer solução que queira criminalizar

o enriquecimento ilícito, não pelos deveres declarativos, mas pelo aumento injustificado do património, colide

de frente com a presunção de inocência ou com os direitos humanos.

O que não podemos dizer aos portugueses é que a razão pela qual ex-primeiros-ministros, como aquele

que referi, sairão impunes de grande parte dos seus crimes é porque os direitos humanos, a presunção de

inocência e o «sejamos democratas» assim o exigem. Boa sorte, a explicar isso aos portugueses!

E boa sorte a explicar que aqueles que tinham o dever primeiro de gerir e zelar pela coisa pública foram os

primeiros a enriquecer à sua custa e a desaparecer, escudados por uma lei que já poderia ter sido alterada e

não o foi porque a esquerda e a extrema-esquerda não o quiseram.

A verdade, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, é que o Partido Socialista está no Governo há sete anos,

tem, ou teve, uma maioria estável durante cinco anos e tem o PCP sempre pronto a dar-lhe a mão em todos

os anos que se seguirão, com medo de eleições antecipadas. Com todo este cenário extraordinário, como é

que não se consegue aprovar uma norma sobre o enriquecimento injustificado ou ilícito?

Com uma maioria parlamentar clara, que os portugueses concederam em 2015 e 2019, só não a aprovam

se não quiserem. Mas a regra e a justificação vão sempre ser as mesmas: «Ah, não podemos, por isto; não

podemos, por aquilo; não é o momento, mais para a frente será.» Entretanto, a legislatura acaba, já não

estarão em maioria e a culpa será da direita que não quis fazer o seu trabalho.

Tem sido este o papel do PS e da esquerda nos últimos anos e é contra isto que temos de nos elevar,

porque as maiorias desta Casa vão e vêm, ao sabor das eleições, as maiorias desta Casa vão e vêm, ao

sabor da vontade dos portugueses, mas o enriquecimento ilícito e as suas vítimas continuarão a persistir na

memória de todos e na destruição de Portugal.

Portugal tem descido sistematicamente nos índices de transparência e contra a corrupção. Portugal tem

sido dos países do mundo onde um primeiro-ministro está a ser julgado, e de forma inacreditável, perante a

opinião pública. Portugal tem descido sistematicamente, na avaliação da OCDE (Organização para a

Cooperação e Desenvolvimento Económico), na luta contra a corrupção, na luta contra a fraude fiscal e

branqueamento de capitais e na luta contra o tráfico de influências.

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Temos um antigo ministro preso na cadeia de Évora por tráfico de influências, um antigo ministro preso a

receber uma subvenção vitalícia paga por todos os portugueses. E a isso continuamos a olhar e a dizer: «Não

podemos fazer nada!», ou, como diria o Sr. Deputado Jorge Lacão: «Sejamos democratas!»

Este é o cenário de um país destruído, um país desiludido, um país atraiçoado, para quem as palavras

«sejamos democratas» valem pouco, ou as palavras «temos de defender a democracia dos seus inimigos»

valem o papel que voa ao sabor do vento, porque as pessoas querem soluções e sentir que têm uma justiça

que funcione.

Mais de 80% dos portugueses diz que a justiça não funciona ou funciona mal, em Portugal. Nós fomos

eleitos por bem menos que 80% dos portugueses. Aqueles que votaram para que estejamos aqui sentados e

olham expectantes cá para dentro foram muito menos do que os que dizem que a justiça em Portugal não

funciona. E se assistissem, telecomandados, ao debate de hoje perceberiam que frases bonitas, frases com

glória ou sem glória, apelos à democracia, à liberdade e à dignidade, apelos aos valores, são muito belos, mas

não resolvem o problema ali mesmo ao lado, na sua terra, não resolvem o que tiveram de viver durante os

últimos 10, 20, 30 e 40 anos, não resolvem a saúde da nossa democracia.

Por isso, não vale de nada em abril virmos com cravos ao peito,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Você não!

O Sr. André Ventura (CH): — … louvarmos as grandes instituições que temos ou citar Victor Hugo, para dizer que adoramos a nossa democracia e as nossas instituições, quando, na verdade, sabemos que não é

esse o sentimento dos portugueses e a desilusão impera e progride a cada dia que passa.

Cada voto contra o enriquecimento injustificado é uma maior quebra na nossa democracia, cada voto

contra esta proposta sobre o enriquecimento injustificado terá de ser justificado aos portugueses. Qual a razão

pela qual, com a oportunidade nas mãos, decidimos, mais uma vez, pela décima oitava vez, não criminalizar o

enriquecimento injustificado.

Agora não será tempo de conversa nem de frases. Temos uma proposta que tem riscos, que pode ser

melhorada, mas, sobretudo, que toca no ponto essencial: aqueles que enriquecem à conta dos portugueses

devem ser exemplarmente punidos.

Sejamos democratas e a democracia exige ser defendida daqueles que a querem insistentemente destruir.

E não tenham dúvidas, Srs. Deputados, que enquanto se grita por fascista, racista e extremista, quem

verdadeiramente destrói a democracia são os que pegam no dinheiro dos portugueses, o põem ao bolso,

desaparecem e destroem a confiança no sistema. Esses são aqueles que destroem a democracia e esses são

aqueles que queremos sentar no banco dos réus da História…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado,…

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, dê-me licença que lhe diga o seguinte: o Sr. Deputado dispõe de 2 minutos para fazer a intervenção de encerramento. Portanto, a partir deste momento, dou-lhe a

palavra para esse efeito.

O Sr. André Ventura (CH): — Obrigado, Sr. Presidente. Aqueles que destroem a democracia não são os que o Partido Socialista, o PCP ou o Bloco de Esquerda

apelidam de extremistas, racistas ou fascistas. Aqueles que destroem a democracia são os que, usando e

abusando das instituições do Estado, usando e abusando do poder público, vão minando a confiança dos

portugueses apropriando-se dos seus bens sem terem de dar qualquer justificação.

Sacos de plástico, artifícios banais, fogo de artifício: seria assim que lá fora as pessoas hoje olhariam para

este Parlamento que encontrou uma camada de belos argumentos para votar mais uma vez contra o combate

ao enriquecimento injustificado ou ilícito. Saco de plástico que nunca vai abaixo, está sempre à superfície a

proteger daqueles que querem fazer verdadeiras mudanças na sociedade portuguesa. Mas isto tem sempre o

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seu significado positivo e o significado positivo é que os portugueses saberão quem, efetivamente, quer fazer

mudanças e quem usa a argumentação para manter exatamente tudo na mesma.

Há pouco citei António Guterres e por isso agora vou citar alguém talvez mais caro à esquerda deste

Plenário. Dizia Ghandi: «se ages contra a justiça e eu te deixo agir, então a injustiça é minha», ou seja,

quando agimos contra a justiça, estamos todos a cometer a mesma injustiça. Quando deixo alguém cometer

uma injustiça sabendo que o é, então, essa injustiça é minha também.

Ghandi, se olhasse hoje para este Parlamento e para todos os partidos a dizerem que «é um crime, é grave

e tem de ser punido», mas na hora de votar todos se levantarão contra este projeto, diria que a mesma

injustiça é a vossa injustiça.

Protestos da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e risos do Deputado do BE José Manuel Pureza.

E para aqueles que dizem que nunca o levaremos a bom porto porque é contra a Constituição, eu direi

sempre que a verdadeira Constituição é o povo português. Tenho a certeza de uma coisa: se a luta for entre o

povo português e a Constituição, não será a Constituição a vencer, será o povo português a vencer, porque é

isto que o povo português quer e é isto que o povo português merece.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir, porque já concluiu o seu tempo.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente. Se soubéssemos ser democratas…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Obrigado, Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr. Presidente. Se soubéssemos ser democratas hoje honraríamos a vontade do povo português.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Recebia quatro salários e agora vem dar lições de moral!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar ao período de votações. Temos 200 Deputados inscritos, pelo que temos quórum mais do que suficiente.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 807/XIV/2.ª (CH) — Altera o Código Penal e cria o artigo

335.º-A, definindo o crime de enriquecimento ilícito ou injustificado, clarificando os seus pressupostos objetivos

e subjetivos de aplicação, bem como a moldura penal aplicável, distinguindo ainda consoante o agente seja ou

não titular de cargo político.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV,

do IL e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, o voto a favor do CH e abstenções do PAN e da

Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

Vamos votar agora um requerimento, apresentado pela Deputada não inscrita Cristina Rodrigues, de baixa

à Comissão por 30 dias, sem votação, do Projeto de Lei n.º 881/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina

Rodrigues) — Cria o crime de ocultação de riqueza com vista à prevenção da corrupção e aumento da

integridade pública.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Deputada Sofia Araújo tem um anúncio a fazer à Câmara.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Secretária (Sofia Araújo): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, informo a Câmara que deu entrada no Gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 102/XIV/2.ª (GOV),

que vai baixar à 1.ª Comissão.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, a próxima reunião plenária será amanhã, às 15 horas, e dela constará o debate, requerido pelo PS, sobre o PRR: um instrumento para a recuperação

económica e social do País.

Por hoje concluímos os nossos trabalhos.

Desejo muito boa tarde a todos. Quem não tiver o que fazer cá dentro poderá juntar-se aos portugueses lá

fora.

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 1 minuto.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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