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I SÉRIE — NÚMERO 12

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sua tão prolongada capacidade de amesquinhamento das vítimas, leva normalmente décadas a ganhar

condições, no íntimo de quem o sofre, para ser trazido à luz do dia. É por isso — nem mais nem menos do que

por isso — que devemos, do nosso ponto de vista, ampliar o prazo de prescrição dos crimes de abuso sexual

de menores. É para permitir que as vítimas tenham o tempo interior necessário para superar esse trauma que

as bloqueia e possam revelar a violência a que foram sujeitas, e para assim criar, tão determinada quanto

delicadamente, as condições para o imprescindível impulso das vítimas à completa investigação da verdade.

Claro que importa não criar distorções no sistema penal, como as que são apontadas nos pareceres do

Conselho Superior da Magistratura e do Conselho Superior do Ministério Público. Mas essa é uma matéria

que, no trabalho de especialidade, será devidamente regulada.

Tenhamos, pois, a coragem de dar agora este passo importante para, em nome de todos, e em benefício

das vítimas, dar combate à desumanidade destes crimes e ao silêncio que os perpetua.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que me debruce sobre os projetos de lei que obtiveram mais reflexão.

A prevenção e o combate aos crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual de menores fazem-

se, desde logo, na escola. Começa na educação para a cidadania, ali onde as crianças e jovens aprendem,

não qualquer ideologia — como clamam os partidos que querem aumentar penas e apostar num Direito Penal

da vingança —, mas da sua autonomia e da sua liberdade e de como se protegerem.

Quando se ataca a educação sexual nas escolas ou a educação para a cidadania está a atacar-se,

também, a prevenção do abuso sexual de menores. Como disse, e bem, o Secretário de Estado João Costa —

a propósito de um tema tão aflitivo, já aqui citado pelo Deputado José Manuel Pureza —, «em todas as

escolas, por vezes contra ventos e marés e contra setores ultraconservadores, é promovida uma educação

sexual que contempla nos referenciais a tomada de consciência por parte dos alunos do facto de que os

outros não têm direitos sobre o seu corpo e as formas de pedir ajuda».

É também na escola que a todos os profissionais que trabalham com crianças e que as acompanham é

exigido registo criminal, como parte do que atesta da sua capacidade para trabalhar com menores. É na

escola que quaisquer sinais que podem indiciar situações de abuso são detetados pelos professores e

técnicos e são encaminhados para as CPCJ (comissões de proteção de crianças e jovens). É na escola que

temos de ter psicólogos capazes de propiciar o ambiente seguro para reportar eventuais abusos.

O Direito Penal, evidentemente, atua quando o crime não é evitado e dúvidas não há de que o abuso

sexual de menores é uma forma de violência particular e, como tal, tem um tratamento específico. Sabemos

que o autor do crime é, muitas vezes, alguém próximo e aparentemente conhecido, pelo que o desamparo

concreto da criança molda as normas penais em vigor.

O tema do prazo de prescrição dos crimes sexuais contra menores, bem como do crime de mutilação

genital feminina sendo a vítima menor, não é, claro, um tema fechado, mas as soluções concretas que existem

e que, como todos os temas, poderão ser a todo o tempo discutidas, terão de ter em conta a harmonia do

sistema penal, a proporcionalidade e a igualdade.

Concretizando, não nos parece aceitável, por exemplo, como é salientado em parecer do Conselho

Superior do Ministério Público, que um procedimento criminal em que esteja em causa um crime de homicídio,

que protege o bem jurídico vida humana, seja julgado extinto por prescrição num prazo temporal inferior ao de

um processo que, por exemplo, vise a prática de crime de importunação sexual do qual seja vítima pessoa

menor de 14 anos, bastando para tanto que a identificação do autor do primeiro ocorra em momento

temporalmente próximo da preclusão do prazo prescricional. Tem de haver, em suma, harmonia e coerência

do sistema na ponderação da alteração dos prazos prescricionais em causa.

O Chega junta a um debate sobre crimes sexuais contra menores um projeto de lei que repete a receita

penal fácil e contraproducente já aqui debatida várias vezes, essa de aumentar a pena para o crime de

violação e de alterar a sua natureza para crime público.

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