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Sexta-feira, 22 de outubro de 2021 I Série — Número 14

XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)

REUNIÃOPLENÁRIADE21DEOUTUBRODE 2021

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Nelson Ricardo Esteves Peralta Ana Cristina Cardoso Dias Mesquita

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 3

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa do Projeto de Lei n.º

997/XIV/3.ª e do Projeto de Resolução n.º 1480/XIV/3.ª Foram discutidos, em conjunto, na generalidade, os

Projetos de Lei n.os 666/XIV/2.ª (PS) — Procede à primeira

alteração à Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que assegura a execução do Regulamento Geral de Proteção de Dados, assegurando o acesso de estudantes de Medicina a sistemas de informação e a plataformas nos quais são registados dados de saúde dos utentes dos serviços de saúde, e 966/XIV/3.ª (BE) — Permite o acesso a um

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conjunto de dados pessoais por parte de estudantes de Medicina e investigadores científicos, para fins académicos, fins de arquivo de interesse público, fins de investigação científica ou histórica ou fins estatísticos (primeira alteração à Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto). Usaram da palavra os Deputados Sofia Andrade (PS), Luís Monteiro (BE), Miguel Arrobas (CDS-PP), Sara Madruga da Costa (PSD), Bebiana Cunha (PAN), Paula Santos (PCP) e André Ventura (CH).

Foi discutido o Projeto de Resolução n.º 1315/XIV/2.ª (PSD) — Reforço da rede social para a primeira infância, juntamente com, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 371/XIV/1.ª (PCP) — Propõe medidas para o alargamento da gratuitidade das creches e soluções equiparadas, 963/XIV/3.ª (CDS-PP) — Programa de incentivo à criação e flexibilização dos horários das creches e 965/XIV/3.ª (BE) — Cria o programa Rede de Creches Públicas e com o Projeto de Resolução n.º 186/XIV/1.ª (CH) — Alargamento da rede de creches públicas e apoio às famílias quando não existam respostas no setor público. Proferiram intervenções os Deputados Helga Correia (PSD), Diana Ferreira (PCP), Pedro Morais Soares (CDS-PP), Alexandra Vieira (BE), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), Bebiana Cunha (PAN), Hugo Oliveira (PS), Mariana Silva (PEV) e Maria Germana Rocha (PSD).

Foram discutidos, conjuntamente, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 871/XIV/2.ª (BE) — Institui de forma inequívoca o princípio da avaliação mais favorável nas avaliações feitas por junta médica (Terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro) e 916/XIV/2.ª (PCP) — Atestado médico de incapacidade multiusos — clarifica os processos de revisão ou reavaliação do grau incapacidade, através de uma norma interpretativa ao artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro. Usaram da

palavra os Deputados Moisés Ferreira (BE), Diana Ferreira (PCP), Rui Cristina (PSD), Miguel Arrobas (CDS-PP), Bebiana Cunha (PAN), José Luís Ferreira (PEV) e Susana Amador (PS).

Foram discutidos, em conjunto, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 9/XIV/1.ª (PCP) — Estabelece o regime de financiamento permanente do Programa de Apoio à Redução Tarifária nos Transportes Públicos e 964/XIV/3.ª (PAN) — Estabelece o reforço e a avaliação da implementação e execução do Programa de Apoio à Redução do Tarifário nos Transportes Públicos (PART) e do Programa de Apoio à Densificação e Reforço da Oferta de Transporte Público (PROTransP). Intervieram os Deputados Paula Santos (PCP), Nelson Silva (PAN), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Isabel Pires (BE), André Pinotes Batista (PS), Mariana Silva (PEV) e Jorge Salgueiro Mendes (PSD).

Procedeu-se à discussão conjunta do Projeto de Deliberação n.º 2/XIV/1.ª (CDS-PP) — Sessão evocativa do dia 25 de Novembro e dos Projetos de Resolução n.os 70/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que proponha ao Sr. Presidente da República a atribuição da Ordem da Liberdade às personalidades que contribuíram decisivamente para o triunfo da democracia e da liberdade a 25 de Novembro de 1975 e 45/XIV/1.ª (CH) — Pela instauração da celebração solene do 25 de Novembro. Usaram da palavra, a diverso título, os Deputados Telmo Correia (CDS-PP), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), João Oliveira (PCP), Nelson Silva (PAN), André Coelho Lima (PSD), Pedro Delgado Alves (PS) e José Manuel Pureza (BE).

O Presidente (António Filipe) encerrou a sessão eram 18 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes da Autoridade.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 3 minutos.

Podem ser abertas as galerias destinadas ao público.

Antes de dar início à ordem do dia, dou a palavra à Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha para informar a

Câmara do expediente entrado na Mesa.

Faça favor, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, o Projeto de Lei n.º 997/XIV/3.ª (PS, PSD e PCP) e o Projeto de Resolução n.º

1480/XIV/3.ª (PSD), que baixa à 1.ª Comissão, em conexão com a 7.ª Comissão.

É só, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem de trabalhos consiste na discussão, em conjunto, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 666/XIV/2.ª (PS) — Procede à primeira

alteração à Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que assegura a execução do Regulamento Geral de Proteção de

Dados, assegurando o acesso de estudantes de Medicina a sistemas de informação e a plataformas nos quais

são registados dados de saúde dos utentes dos serviços de saúde, e 966/XIV/3.ª (BE) — Permite o acesso a

um conjunto de dados pessoais por parte de estudantes de Medicina e investigadores científicos, para fins

académicos, fins de arquivo de interesse público, fins de investigação científica ou histórica ou fins estatísticos

(primeira alteração à Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto).

Para apresentar o projeto de lei da iniciativa do Partido Socialista, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sofia

Andrade.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Sofia Andrade (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista apresenta hoje um projeto de lei que pretende garantir o acesso de estudantes de Medicina a sistemas de informação e a

plataformas nos quais são registados dados de saúde dos utentes dos serviços de saúde.

Desde já, importa deixar claro que, para o Partido Socialista, os cuidados de saúde são um direito

absolutamente fundamental e que em momento algum podem ser desvalorizados ou negligenciados.

Os cuidados relacionados com a saúde são um dos eixos fundamentais da ação do Partido Socialista. Foi

mesmo o Partido Socialista um dos principais impulsionadores das políticas públicas que visam a melhoria das

condições de saúde dos portugueses, por via do reforço constante do Sistema Nacional de Saúde.

O projeto de lei que hoje apresentamos afigura-se como mais um passo no sentido de melhorar o ensino e

a aprendizagem dos estudantes de Medicina no nosso País, estudantes esses que serão o futuro dos

cuidados prestados pelo Sistema Nacional de Saúde.

Pretendemos, assim, criar as condições legais para que os alunos de Medicina, cumprindo todos os

deveres de confidencialidade no que toca ao tratamento de dados, possam aceder aos registos clínicos dos

utentes.

Na leitura do artigo 29.º da Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, verifica-se que o mesmo artigo dispõe que, e

passo a citar: «Os estudantes e investigadores na área da saúde e da genética e todos os profissionais de

saúde que tenham acesso a dados relativos à saúde estão obrigados a um dever de sigilo.»

Ora, estando todos os estudantes e os profissionais de saúde que tenham acesso a dados relativos à

saúde obrigados a um dever de sigilo, como têm, então, os estudantes acesso a esses dados?

É sobre esta questão que pretendemos dar resposta neste debate, regulando as condições segundo as

quais os estudantes podem aceder aos dados sobre os quais devem guardar sigilo.

Este é o debate que importa fazer.

Sr.as e Srs. Deputados, a presente iniciativa pretende precisamente clarificar que a prestação de cuidados e

tratamentos de saúde ou de serviços de diagnóstico por estudantes de Medicina, nos estabelecimentos onde

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decorre a sua formação, é equiparada àquela que é assegurada por médicos para efeitos de acesso aos

sistemas de informação e às plataformas nos quais são registados dados de saúde dos utentes.

Simultaneamente, esta alteração à Lei n.º 58/2019 quer fazer acrescer à autorização legal a proibição de

práticas abusivas.

De forma a garantir a segurança e a fiabilidade do processo, pretende-se estabelecer que o acesso deve

ser feito através de perfil próprio para estudantes em condições de segurança não inferiores às aplicáveis aos

demais utilizadores.

Por fim, a nossa iniciativa determina que todos os utilizadores devem abster-se de duplicar as bases de

dados consultadas, designadamente por via da criação de ficheiros próprios com informação proveniente das

bases de dados ou das aplicações a que venham a ter acesso, devendo ser tomadas pelas entidades

responsáveis dos sistemas todas as medidas técnicas necessárias para que tal não possa ocorrer.

Sr.as e Srs. Deputados, temos absoluta consciência de que esta proposta que hoje apresentamos é

indissociável de matérias sensíveis, como o é a questão da proteção dos dados clínicos dos utentes. Aliás,

não somos indiferentes aos pareceres que outras entidades apresentaram sobre esta matéria, nomeadamente

a Comissão Nacional de Proteção de Dados.

Consideramos, contudo, que, apesar de ser um assunto que deve ser tratado com a máxima cautela e

prudência, pode ser aprofundado em momento posterior.

O que hoje estamos aqui a fazer é exatamente a dar início a um debate que se quer sério, responsável e

profícuo, com vista a um eventual melhoramento da lei de forma a compatibilizar o acesso dos estudantes de

Medicina aos dados clínicos dos utentes de saúde com os direitos consagrados na lei da proteção de dados.

Entendemos também que, além do debate que façamos hoje, haverá, em sede de especialidade,

oportunidade para fazermos um debate com maior amplitude e profundidade sobre esta matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A pandemia da COVID-19 veio, entre outras coisas, provar a urgência e a necessidade de aproximar as áreas da saúde pública do Serviço Nacional

de Saúde, dos serviços partilhados do Ministério da Saúde e das áreas da investigação da Academia, das

universidades, dos laboratórios associados e de todos os agentes que têm trabalhado ao longo dos últimos

anos na área das biomédicas e da saúde.

Essa mobilização académica nos testes à COVID-19, desde o início da pandemia, em março de 2020, e o

papel dos estudantes de Medicina na primeira linha do combate ao vírus são apenas dois bons exemplos de

como foi possível criar sinergias para combater a COVID-19, compreender a necessidade de uma maior

aproximação entre os serviços já elaborados e efetuados pelo Serviço Nacional de Saúde, pelo seus hospitais,

mas, ao mesmo tempo, pelas faculdades e pelos seus estudantes e, numa outra vertente, a capacidade

também de compreender que as capacidades instaladas nos centros de investigação e nos laboratórios

associados podem e devem dar uma resposta também às políticas públicas em momentos de urgência e de

emergência, como vivemos durante esta pandemia.

Portanto, justamente no sentido de aproveitar essas sinergias já criadas e de dotar estes setores de

instrumentos, nomeadamente no acesso a dados pessoais, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda

apresenta um projeto de lei que tem como principal objetivo, como disse, garantir o acesso a dados por parte

dos estudantes de Medicina e de investigadores científicos com fins académicos, de arquivo de interesse

público e de investigação científica ou histórica.

Sr.as e Srs. Deputados, estas matérias, que já geram consenso entre responsáveis hospitalares,

responsáveis na área da saúde, mas também em responsáveis académicos — os diretores das faculdades de

Medicina, os diretores dos laboratórios e centros de investigação das áreas das biomédicas ou até das áreas

das ciências sociais e humanas, também os estudantes de Medicina, vários cientistas que, principalmente nos

últimos tempos, se têm vindo a debruçar sobre estes e outros temas — têm um consenso gerado e precisam

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do acesso, que cumpra, evidentemente, todos os requisitos da Comissão Nacional de Proteção de Dados, a

um conjunto de dados para avançarem com a sua investigação ou, no caso dos estudantes, para avançarem

com a sua formação.

Saibamos nós aqui, na Assembleia da República, nesta fase de debate na generalidade, mas também na

fase de especialidade, encontrar essas soluções legais, ouvindo todas e todos os interessados,

nomeadamente os laboratórios associados, as faculdades de Medicina, as organizações representativas dos

estudantes e dos cientistas, como também a Comissão Nacional de Proteção de Dados, no sentido de garantir

a proteção de todo e qualquer dado pessoal, no caso dos estudantes através de um debate técnico das

plataformas já existentes, e, no caso dos investigadores, através de um debate técnico de, eventualmente,

novas plataformas que consigam garantir esse mesmo acesso.

Não há razão para que não tenham hoje acesso a estes dados aqueles estudantes que estiveram na linha

da frente do combate à COVID ou mesmo no combate a todos os outros problemas que o Serviço Nacional de

Saúde enfrentou ao longo dos últimos anos, mas também aqueles que monitorizaram os problemas da

COVID-19, que tiveram a capacidade de perceber, além do dia a dia, que mecanismos poderíamos trabalhar

no combate à COVID-19 ou a outras doenças e outros vírus.

Portanto, da parte do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda há uma abertura total para, em sede de

especialidade, se encontrarem todas essas soluções e esperamos que, da parte dos outros grupos

parlamentares, exista também essa mesma abertura, porque o tema que aqui se apresenta é importante e

seria um avanço muito positivo para a comunidade científica e académica.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do CDS, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Miguel Arrobas.

O Sr. Miguel Arrobas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Do que estamos aqui a tratar hoje é de projetos de lei do PS e do BE que pretendem alargar aos estudantes de Medicina e também a

investigadores pertencentes a laboratórios e centros de investigação pertencentes ao perímetro legal e

administrativo das instituições de ensino superior públicas o acesso a um conjunto de dados clínicos.

Esta é uma matéria complexa em que estão em causa dados muito sensíveis dos doentes.

Somos sensíveis, no entanto, aos argumentos apresentados por ambos os partidos. Visam um maior

desenvolvimento da formação e da prática da Medicina, bem como um maior desenvolvimento da investigação

científica, fazendo sentido que os estudantes de Medicina passem a ter acesso, sob determinadas

condicionantes, a determinados dados.

No entanto, não podemos ignorar as ressalvas feitas pela Comissão Nacional de Proteção de Dados, bem

como pela Ordem dos Advogados, nos pareceres que foram enviados à 1.ª Comissão.

Não podemos deixar de estranhar também não ter sido ouvida a Ordem dos Médicos. Parece, ao CDS,

essencial que o Parlamento conheça a sua posição quando se propõe legislar sobre o acesso a dados

pessoais por parte dos estudantes de Medicina. E entendemos também ser fundamental ouvir o Conselho

Nacional de Ética para as Ciências da Vida, porque há aqui também questões éticas, e muito sérias, que se

levantam.

Por isso, questionamos, desde logo, vários aspetos. Um estudante de Medicina que ainda não tenha feito o

Juramento de Hipócrates, como é que se assegura que é mantido o sigilo relativamente aos dados dos

doentes?

Além disso, há que diferenciar dados pessoais de dados clínicos, e estes levantam, em nosso entender,

questões éticas muito complexas.

De que estudantes de Medicina estamos a falar? Com quantos anos de curso? E se, eventualmente,

desistem a meio do curso ou mudam de curso, onde ficam esses dados pessoais que, entretanto,

arrecadaram?

O Bloco de Esquerda restringe a legislação aos estudantes de Medicina dos hospitais universitários. Então,

e os estudantes de Medicina de outras universidades que não sejam hospitais universitários? Por exemplo, os

alunos de Medicina da Universidade Católica passam a ser negativamente discriminados no acesso a dados

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dos doentes face aos estudantes dos hospitais universitários? E faz sentido, conforme defende o PS, que «a

prestação de cuidados e tratamentos de saúde ou de serviços de diagnóstico por estudantes de Medicina, nos

estabelecimentos em que decorrer a sua formação, é equiparada à assegurada por médicos, para efeitos de

acesso aos sistemas de informação e às plataformas nos quais são registados os dados de saúde dos

doentes?

Será ético que, conforme defende o Bloco de Esquerda, os investigadores pertencentes a laboratórios e

centros de investigação pertencentes ao perímetro legal e administrativo das instituições de ensino superior

públicas possam, também, aceder a estes dados?

Estas e muitas outras questões estão, no entender do CDS, sem resposta com estes dois projetos de lei,

que nos levantam as maiores reservas. Se, eventualmente, estas iniciativas baixarem à discussão em sede de

especialidade, terão de ser realizadas várias audições e pedidos diversos pareceres.

Repetimos que o CDS é sensível aos argumentos apresentados. No entanto, a formulação destas duas

iniciativas levanta-nos muitas reservas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PSD. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa.

A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O objetivo das iniciativas legislativas em discussão é simples de enunciar. Trata-se de permitir que os estudantes de Medicina acedam

a dados de saúde e a informação clínica dos doentes nos estabelecimentos onde decorra a sua formação, sob

adequada supervisão técnica, acesso, esse, que, legalmente, lhes está vedado.

Esta alteração legislativa, que visa, portanto, acautelar o interesse da formação dos estudantes, parece

simples e adequada, não fosse dar-se o caso de, aparentemente, atentar contra a vontade do doente,

enquanto titular dos seus dados.

Não somos nós que o dizemos, Sr.as e Srs. Deputados. É a CNPD (Comissão Nacional de Proteção de

Dados) e a Ordem dos Advogados que o afirmam, perentoriamente, nos pareceres juntos ao processo

legislativo.

A CNPD não tem qualquer dúvida em considerar a iniciativa do Partido Socialista um retrocesso na

proteção dos dados pessoais dos doentes, criticando, inclusive, a ficção criada e a duvidosa equiparação do

acesso dos estudantes a um ato médico de prestação de cuidados e de diagnóstico.

Também a Ordem dos Advogados considera que as iniciativas não são conformes ao direito da União

Europeia e que o RGPD (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) não prevê o acesso, por estudantes

de Medicina, a sistemas de informação e a plataformas nos quais são registados dados de saúde dos utentes,

para fins de estudo e ensino, enquanto exceção autónoma ao princípio geral da proibição de tratamento de

dados.

Assim sendo, Sr.as e Srs. Deputados, vemo-nos confrontados com dois interesses aparentemente

contraditórios. Ou seja, por um lado, o interesse do acesso ao processo clínico, pelos estudantes de Medicina,

e, por outro lado, o da proteção dos dados sensíveis e pessoais de saúde dos doentes, cuja conciliação não

parece ter sido encontrada pelas soluções legislativas em discussão.

Sr.as e Srs. Deputados, percebemos a intenção das presentes iniciativas, percebemos o objetivo

prosseguido e somos sensíveis ao problema, mas as soluções preconizadas, objetivamente, não são

suficientes para assegurar o necessário equilíbrio dos interesses em confronto e afastar as reservas e dúvidas

que impendem sobre a sua adequabilidade.

Estas iniciativas não são suficientes, porque põem em causa a garantia do respeito pela autonomia da

vontade dos doentes e o controlo dos seus dados. Não são suficientes, porque não têm em consideração as

conclusões do grupo de trabalho de especialistas criado entre a CNPD, o Conselho de Escolas Médicas

Portuguesas e o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, nem o sistema já desenhado por

estes, que integra um perfil de acesso dos estudantes de Medicina.

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Sr.as e Srs. Deputados, o problema existe, a necessidade merece proteção legal e somos sensíveis à

mesma, mas não podemos resolver um problema, criando um novo. Ora, é esse, exatamente, o risco que

corremos e que não queremos correr.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Bem lembrado!

A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, como referimos, o problema existe, a necessidade merece proteção legal e somos sensíveis à mesma. Por isso, vamos abster-nos,

criando, dessa forma, condições para que o debate não morra aqui e possa prosseguir em sede de

especialidade, na expetativa de poderem ser encontradas as melhores soluções, que permitam colmatar uma

necessidade, mas, simultaneamente, ultrapassar as reservas e as dúvidas muito relevantes que subsistem e

às quais não somos, nem podemos ser, indiferentes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo PAN, a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, para uma intervenção.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No início da nossa participação neste debate, gostaríamos de partir do pedido da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa para

estabelecer um protocolo com o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte e os Serviços Partilhados do

Ministério da Saúde, que visava a criação e a disponibilização de um perfil de acesso de estudantes de

Medicina a dados pessoais de saúde dos utentes deste centro hospitalar.

Temos de trazer para este debate a informação de que a Comissão Nacional de Proteção de Dados

entendeu não dar parecer favorável a esse mesmo pedido, porque considerava não ser lícita a

disponibilização de um perfil de acesso automático que permitiria aos estudantes aceder ao registo clínico de

todos os utentes daquele centro hospitalar.

As iniciativas que discutimos, no fundo, permitem o importante debate que tem de ser feito em torno desta

matéria, para o qual o PAN está, evidentemente, disponível, mas não podemos deixar de lembrar que, para

resolver estas dificuldades, a Comissão Nacional de Proteção de Dados, o Conselho de Escolas Médicas

Portuguesas, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e os representantes dos Serviços

Partilhados do Ministério da Saúde integraram um grupo de trabalho que apresentou, no nosso entendimento,

uma solução exequível para as preocupações veiculadas pelos projetos apresentados.

Essas soluções garantiam o acesso dos estudantes aos dados de que necessitavam para a sua formação,

mas também preservavam a privacidade dos utentes, respeitando o seu consentimento informado, sem haver

necessidade de mudar a lei.

Entendemos que a proposta trazida pelo Partido Socialista, que refere que este mecanismo não seria

possível, nem praticável, carece de uma discussão mais aprofundada, que deve, evidentemente, ser feita em

sede de especialidade.

Neste debate, devemos perguntar, Sr.as e Srs. Deputados, se é lícito um estudante que não vai

acompanhar, no futuro, aquele utente ter acesso a toda a sua informação clínica, sem que este utente o tenha

autorizado. Saberá o doente que o acesso será relativo a todos os seus dados clínicos? Deve esse acesso

existir para todos os dados, independentemente da sua necessidade para a formação específica dos

estudantes?

Estas são perguntas que, evidentemente, temos de trazer para este debate e não podemos ignorar.

Se é verdade que a legislação atual prevê o dever de sigilo quando há acesso a dados pessoais de saúde,

também é verdade que não está prevista a sua regulação.

Ambos os projetos assumem a proibição de práticas abusivas dos utilizadores, referindo, inclusivamente, o

seu impedimento, mas não dizem como vão garantir essa condição.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

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A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Da parte do PAN, estamos disponíveis para este debate, mas entendemos que há uma clara necessidade de fazer um enorme caminho em sede de especialidade.

Muito obrigada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cremos que, neste debate, aquilo que está em discussão é, de facto, o acesso a dados de saúde, que são sensíveis, devendo haver uma

especial atenção na proteção desses mesmos dados.

Não podem, naturalmente, todos os dados pessoais ter um tratamento particular para serem protegidos,

mas creio que, nas questões de saúde, essa preocupação ganha outras proporções, tendo em conta as

implicações e a sensibilidade daquilo que estamos a tratar.

Esta é a questão central relativamente a este debate: quem é que deve, ou não deve, ter acesso a esses

dados pessoais?

Estão duas propostas em discussão, uma por parte do Partido Socialista, outra por parte do Bloco de

Esquerda, nas quais se colocam questões que nos suscitam muitas dúvidas, nomeadamente ao quererem

equiparar a intervenção por parte dos estudantes de Medicina, num contexto de aprendizagem, a atos

médicos e às atividades de tratamento ou de diagnóstico realizadas por profissionais de saúde.

Cremos que esta equiparação é, de facto, complexa e perigosa, e deve, na nossa opinião, merecer muita

cautela.

Queremos, naturalmente, que a qualidade da formação na área da Medicina seja reforçada e que a mesma

seja qualificada, mas isto não pode pôr em causa a proteção dos dados de saúde.

Um estudante de Medicina, em contexto de aprendizagem, não está, de forma alguma, a exercer uma

atividade do ponto de vista do tratamento ou do diagnóstico, tal como é afirmado. Estamos a falar de uma

atividade que tem supervisão técnica, exatamente porque os estudantes não têm autonomia. No quadro deste

processo de aprendizagem, têm, de facto, este acompanhamento, esta supervisão técnica.

O parecer da Comissão Nacional de Proteção de Dados é muito crítico relativamente a esta matéria,

suscita um conjunto de preocupações sobre as questões dos dados pessoais e refere um aspeto que nos

parece de extrema relevância, que é a possibilidade de as pessoas poderem dar, ou não, o seu consentimento

para o acesso aos seus dados pessoais.

Esta é uma questão que não pode ser ignorada relativamente a estas iniciativas.

Por isso, da parte do PCP, temos muitas reservas. De facto, os dados de saúde pessoais devem ter a

máxima proteção e, na nossa opinião, não nos parece adequada a forma como está tratada.

O Bloco de Esquerda introduz ainda um outro aspeto no seu projeto, que se prende com o acesso a dados

para efeitos de investigação científica. De facto, entendemos que a evolução do conhecimento é necessária e

é, naturalmente, muito útil, inclusivamente do ponto de vista do desenvolvimento científico na área da saúde.

Consideramos ser, de facto, necessário encontrar uma solução para assegurar a possibilidade do

desenvolvimento científico, mas sem colocar em causa, como é óbvio, a proteção destes dados, que são, de

facto, muito sensíveis e que devem merecer a nossa preocupação e a máxima proteção.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os dois projetos que se encontram em discussão têm leituras diferentes, mas o mesmo objetivo, que é o de permitir que estudantes de Medicina

possam aceder a dados que, em princípio, só médicos de prática e em prática podem aceder.

Em relação ao projeto do PS, este é muito claro. O PS sabe que isto viola o direito da União Europeia e

sabe claramente que viola o Regulamento Geral de Proteção de Dados, até porque a lei, na forma e na

formulação que já tem hoje, permite o acesso a esses dados quando haja consentimento.

Nesta matéria, a lei é muito clara e a lei da União Europeia também o é.

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O que o Partido Socialista quer fazer é transformar algo que sabe não ser possível de passar, nem em

sede de especialidade, nem no crivo do Tribunal Constitucional, para arranjar mais algumas clientelas de votos

entre os estudantes e a comunidade estudantil.

Este projeto não tem sentido; diz que quer dar a estudantes aquilo a que, já hoje, laboratórios e

comunidade científica têm acesso. Não se compreende sequer onde querem chegar.

Mas há um dado que é particularmente mais grave. É que os dois projetos que aqui são hoje apresentados

distinguem entre universidades públicas e universidades privadas, como se, por exemplo, os estudantes de

Medicina da Universidade Católica não tivessem de ter o mesmo acesso dos estudantes de Medicina da

universidade pública. Essa é uma distinção ideológica que nós compreendemos da vossa parte, mas que é

absolutamente intolerável no País que queremos construir.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PS, a Sr.ª Deputada Sofia Andrade, para encerrar o debate.

A Sr.ª Sofia Andrade (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde logo, em nome da bancada do Partido Socialista, quero agradecer aos demais partidos as declarações que aqui proferiram e os contributos

que deram para o debate que aqui realizámos. Aliás, tendo em conta as intervenções que aqui ouvimos, há,

julgo eu que maioritariamente, uma sensibilidade, um cuidado que deve ser associado ao tratamento desta

matéria.

Dito isto, importa clarificar dois aspetos que nos parecem importantes.

Em primeiro lugar, o acesso aos sistemas de informação de saúde, de dados clínicos a estudantes de

Medicina é um fator que contribui para o melhoramento do ensino e da aprendizagem. Para o Partido

Socialista esta alteração à lei é, de facto, um apoio na melhoria do próprio processo da formação médica.

Acresce também que esta permissão de acesso aos sistemas de informação por parte dos alunos de Medicina

pode levar a evitar acessos que são passíveis de acontecer, como por exemplo o recurso à utilização de

passwords, seja de docentes ou de outros profissionais de saúde.

Em segundo lugar, naturalmente que esta é uma discussão que é indissociável das questões de segurança

no que ao tratamento de dados diz respeito. O que queremos deixar claro é que em algum momento pode ser

posto em causa o dever do sigilo, segundo o qual os profissionais de saúde devem reger a sua atuação.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sofia Andrade (PS): — Por isso, admitimos que haja aspetos que sejam suscetíveis de serem ponderados e aprofundados, de modo a salvaguardar o efetivo respeito pela proteção dos dados clínicos dos

utentes.

Haverá, em sede de especialidade, oportunidade de corrigir o que for necessário corrigir, salvaguardando

os interesses quer dos utentes, quer dos serviços de saúde e também dos médicos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao final do primeiro ponto da nossa ordem do dia. Entramos no segundo ponto, que consta da discussão do Projeto de Resolução n.º 1315/XIV/2.ª (PSD) —

Reforço da rede social para a primeira infância, juntamente com, na generalidade, os Projetos de Lei n.os

371/XIV/1.ª (PCP) — Propõe medidas para o alargamento da gratuitidade das creches e soluções

equiparadas, 963/XIV/3.ª (CDS-PP) — Programa de incentivo à criação e flexibilização dos horários das

creches e 965/XIV/3.ª (BE) — Cria o programa Rede de Creches Públicas e com o Projeto de Resolução n.º

186/XIV/1.ª (CH) — Alargamento da rede de creches públicas e apoio às famílias quando não existam

respostas no setor público.

Tem a palavra, para abrir o debate, a Sr.ª Deputada Helga Correia, do Grupo Parlamentar do PSD.

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A Sr.ª Helga Correia (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje o projeto de resolução do Partido Social Democrata de reforço da rede social para a primeira infância, ao qual se juntam

um projeto de resolução e três projetos de lei sobre a mesma matéria.

Sr. Presidente, o nosso projeto de resolução hoje em discussão é o culminar de um trabalho desenvolvido

pelos Deputados do Partido Social Democrata no terreno, nos vários concelhos e distritos do País, no âmbito

de uma iniciativa do Dia da Criança.

Queria dar nota de que ouvimos uma grande parte dos intervenientes ligados à primeira infância, desde as

instituições particulares de solidariedade social (IPSS) às comissões de proteção de jovens e, neste projeto

hoje em discussão, alguns pontos espelham as suas preocupações.

Sr. Presidente, a queda de natalidade é um fenómeno transversal a toda a Europa e que pode colocar em

risco a renovação de gerações. Cabe aos Estados desenvolverem uma política pública integrada de infância,

que permita um reforço do acesso aos serviços e equipamentos sociais de forma a alavancar a renovação

geracional, fundamental para a prosperidade económica futura.

Ademais, as estatísticas disponíveis demonstram que estamos a envelhecer a um ritmo cada vez mais

acentuado.

Na última década, Portugal apresenta um decréscimo populacional de 2% — dados já dos censos

preliminares. Não é de somenos que somos o quarto País mais envelhecido da Europa, que temos a quinta

taxa de natalidade mais baixa da Europa, sendo o número médio de filhos por mulher em Portugal de 1,4,

valor abaixo do mínimo, que é 2,1, o número considerado para a efetiva renovação de gerações dos países

mais desenvolvidos.

Sr.as e Srs. Deputados, a cobertura média das respostas sociais para a primeira infância fixou-se, segundo

os dados da última Carta Social, de 2019 — já disponível —, nos 48,4%, uma taxa que consideramos muito

baixa face à necessidade das famílias.

Se queremos aumentar o crescimento da natalidade ou a fixação de jovens em idade fértil no nosso País

temos de garantir condições, equipamentos a preços comportáveis, com horários adaptados aos dias de hoje,

que permitam uma maior e melhor conciliação da vida profissional e familiar.

Assim, propomos o aumento da cobertura da rede social das creches para 60%, ou seja, o aumento da

capacidade em cerca de 28 000, com especial incidência nas áreas identificadas na Carta Social como as

mais deficitárias, que são os casos de Lisboa, Porto e Setúbal.

Para tal, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Governo deve recorrer aos instrumentos de

financiamento comunitário de que dispõe, nomeadamente o Plano de Recuperação e Resiliência e o próximo

Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027.

Deve também assegurar os meios financeiros necessários à resposta «creche familiar» de forma a

potenciar o alargamento da rede existente, a sua qualidade infraestrutural e humana, e a garantir o

acolhimento e o acompanhamento adequado às crianças no espaço e no tempo, e assegurar também os

meios financeiros e humanos necessários e adequados ao regular funcionamento das creches municipais.

É também fundamental a criação de apoios às empresas que criem uma entidade que invista na abertura

de creche ou jardim de infância que funcione junto de uma zona empresarial e assuma o estatuto de IPSS,

uma proposta que o PSD tem apresentado recorrentemente e que, recorrentemente, o Parlamento tem

rejeitado.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, importa que o Governo promova a calendarização e a respetiva

divulgação pública das verbas do Plano de Recuperação e Resiliência para reconversão ou alargamento do

número de equipamentos para a primeira infância e correspondentes vagas e que assegure, até 2025, a

gratuitidade de frequência das creches até ao 5.º escalão.

Para concluir, queria dizer que a transparência é um pilar fundamental na confiança dos cidadãos com o

Estado. Assim, importa que o Governo garanta a monitorização, acompanhamento e divulgação da evolução

do investimento e do crescimento dos equipamentos e respetivas vagas.

As políticas públicas para a infância devem dar resposta às necessidades sociais, económicas e

educacionais dos cidadãos e das famílias, bem como criar a confiança necessária que as leve a optar por uma

solução de terem mais filhos no nosso País.

O Orçamento do Estado para 2022, entregue no Parlamento e agora em análise, não responde às reais

necessidades das famílias, não é um Orçamento familiarmente responsável.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Garantir o acesso de todas as crianças à creche, todas sem exceção, alargar a gratuitidade das creches a todas as crianças independentemente dos

escalões e implementar uma rede pública de creches que cubra as necessidades existentes no território

nacional são as propostas que o PCP traz à discussão. Medidas necessárias para responder às necessidades

das crianças e das famílias e que têm de ser implementadas sem mais demora.

Se, atualmente, milhares de crianças têm creche gratuita, deve-se à proposta e insistência do PCP, que

tem batalhado por essa resposta tão necessária. Uma resposta que tem de ir mais longe na sua abrangência,

como também o PCP tem insistido e proposto em mais do que um momento. E a realidade confirma a sua

necessidade e urgência.

Os custos com a frequência das creches são elevados. Custos que influenciam as escolhas das famílias

quanto a terem filhos ou quanto a terem mais filhos.

Faltam vagas em creches. Mesmo somando as existentes nas IPSS e entidades privadas estas não são

suficientes para o número de crianças que existem e mesmo considerando que nem todas as famílias querem

ou precisam que o seu bebé frequente a creche logo a partir dos 4 meses, a verdade é que são cerca de

metade as vagas que existem para o universo das necessidades.

Todas as fases de crescimento e de desenvolvimento da criança têm, no nosso País — e bem! — uma

resposta pública e gratuita, à exceção da faixa etária dos 0 aos 3 anos ou até à entrada no pré-escolar, até

porque as 25 creches que existiam geridas diretamente pela segurança social foram privatizadas em 2012, às

mãos do Governo do PSD e do CDS.

Por isso, associado ao alargamento da gratuitidade para todas as crianças, é inadiável a implementação de

uma rede pública de creches.

A implementação de uma rede pública representa o cumprimento de uma função social do Estado que este

deve chamar a si, na sua gestão e funcionamento, sem prejuízo do papel complementar que deve caber às

instituições de solidariedade social.

Num País com um grave défice demográfico, a gratuitidade e a universalidade no acesso à creche são

elementos de segurança para os casais que desejam ter o primeiro filho, bem como para aqueles que, tendo já

filhos nestes grupos etários, desejam ter mais filhos.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, se o envelhecimento da população por si mesmo, enquanto aumento da

esperança média de vida, não é um aspeto negativo pelo que significa de avanço civilizacional, já a queda de

natalidade no nosso País é um aspeto negativo que merece preocupação, sendo necessárias medidas

urgentes e transversais para o ultrapassar.

Para inverter a quebra demográfica é fundamental valorizar os salários, elemento central para melhorar as

condições de vida e para combater a pobreza, incluindo a pobreza vivida por milhares de crianças no nosso

País; erradicar a precariedade, para cumprir o direito à estabilidade no emprego, mas também à estabilidade

na vida, que influencia significativamente no momento de se decidir se se quer ou não ter filhos; combater os

horários desregulados, a proliferação do trabalho noturno e por turnos; e reduzir o horário de trabalho para as

35 horas.

E não, a solução não é alargar horários de funcionamento das creches para que as crianças possam ser lá

deixadas durante 10, 12, 14 horas, quiçá noites ou fins de semana. Até porque as creches não são — e não

podem ser — o sítio onde se deixam os bebés ou as crianças para ir trabalhar. As creches podem — e devem

ser — um espaço que assegure a todas as crianças o direito a um desenvolvimento integral.

A solução é mesmo combater os horários selvagens impostos aos trabalhadores e garantir que os pais e as

mães trabalhadoras têm horários dignos, tempo para viver, tempo para acompanhar os seus filhos e ver os

seus filhos a crescer.

A solução é reforçar os direitos de maternidade e de paternidade, é garantir estabilidade na habitação, é

repor a universalidade do abono de família e valorizar os seus valores, é garantir o pleno acesso de todas as

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crianças a serviços públicos de qualidade, respostas indispensáveis e inadiáveis para problemas centrais do

nosso País, respostas que combatem o défice demográfico e que cumprem os direitos das crianças, dos pais

e das famílias.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Pedro Morais Soares, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP) — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A conciliação da vida profissional e da vida familiar é, atualmente, um dos grandes desafios do nosso modelo de organização social

e económica. Num País em que homens e mulheres trabalham, sobretudo a tempo inteiro, a conciliação

destas duas dimensões, profissional e familiar, tem forte impacto no bem-estar das famílias, no desempenho e

na motivação dos trabalhadores, na produtividade das empresas, na qualidade do emprego, na igualdade

entre homens e mulheres e — muito importante e acima de tudo — na natalidade.

A conciliação destas duas dimensões contribui para que consigamos enfrentar o desafio demográfico de

forma mais robusta.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — É que, muitas vezes, os casais não prosseguem os seus projetos de terem mais filhos — ou mesmo de terem o primeiro filho — não porque não querem, mas porque a

exigência da vida profissional e a escassez de estruturas de apoio não o permitem.

Por estes motivos, promover melhores padrões de conciliação entre o trabalho e a família deve ser objetivo

e prioridade das nossas políticas públicas, tanto as que dizem respeito ao bem-estar das famílias e à

promoção da natalidade, como as relativas às políticas laborais.

De pouco servem os incentivos à natalidade se o quotidiano das famílias for uma luta constante entre a

gestão familiar, a falta de tempo e a escassez de locais adequados e a preços acessíveis para deixar as

nossas crianças.

Contribuir para a resolução deste problema é, desde há muito tempo, uma das prioridades da ação política

do CDS. Entendemos que o aumento do número de creches e a flexibilização dos seus horários pode ter um

efeito muito positivo na melhoria dos nossos indicadores de natalidade, sendo mesmo determinante, no

entender do CDS. Queremos mais casais a terem o primeiro filho mais cedo e mais casais a terem mais filhos.

O Estado deve focar as suas políticas na promoção de um ambiente que permita às famílias escolherem

com liberdade ter mais filhos, se esse for o seu desejo. Como já referi, a decisão de não ter filhos ou de não

ter mais filhos fica a dever-se, muitas vezes, à falta de estruturas de apoio, a preços acessíveis e com horários

adequados às reais necessidades das famílias.

A falta destas estruturas de apoio ou a sua pouca flexibilidade horária limita, sobretudo, os pais que

trabalham aos fins-de-semana, por turnos ou em horário noturno.

Pretendendo contribuir para a resolução deste problema, o CDS apresenta hoje um projeto de lei que visa

a criação de um programa de incentivo à criação e flexibilização dos horários das creches.

Assim, propomos as seguintes três medidas concretas: adequar o modelo de financiamento das creches

sem fins lucrativos, de forma a incentivar o estabelecimento de horários flexíveis e alargados, sempre que se

verifique uma necessidade evidente das famílias, em virtude dos horários das entidades empregadoras;

promover a constituição de instituições particulares de solidariedade social, sem finalidade lucrativa, de modo

a garantir o acesso à celebração de acordos com a segurança social para financiar o funcionamento de

creches que pratiquem um horário flexível e adequado às necessidades dos seus funcionários; fomentar a

celebração de acordos entre estabelecimentos de infância e entidades empregadoras, visando o

estabelecimento de horários e outras condições de acesso, de maneira a conceder mais alternativas aos pais,

apoiando a dinâmica familiar.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Relativamente às iniciativas legislativas que, sobre esta matéria,

apontam como solução a construção de creches públicas, o CDS defende o que sempre defendeu: um Estado

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social de parceria que responda aos seus problemas, convocando todos os setores, a saber, o setor público, o

setor privado e o setor social.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Defendemos, em concreto, que o Estado contratualize com o setor social as vagas necessárias para universalizar o acesso às creches. Esta medida permitirá ter vagas

mais depressa e gastando menos do que construindo novos equipamentos. E se as vagas do setor social não

forem suficientes — como não são — então, deve o Estado contratualizar com o setor privado as vagas em

falta.

Existem muitas creches neste País com vagas suficientes. O setor privado está disponível para

disponibilizar um número significativo de vagas em creches a preços mais acessíveis, que permitam às

famílias suportar os custos que, de outra forma, não consigam suportar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alexandra Vieira, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Alexandra Vieira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda traz a esta Câmara um projeto de lei que visa a criação de uma rede pública de creches.

A primeira infância é um estádio de desenvolvimento da pessoa e requer ser reconhecido como tal e não

como mero compasso de espera até à idade dos 3 anos. Neste sentido, importa refletir sobre a atenção e o

reconhecimento que o Estado português tem vindo a prestar à primeira infância, que, no entender do Bloco de

Esquerda, é pouca ou nenhuma, optando por descarregar na resposta privada e no setor social a

responsabilidade por esta fase tão importante do desenvolvimento da pessoa.

Como tal, e tendo em conta o desenvolvimento integral dos cidadãos e das cidadãs, o Bloco de Esquerda

entende que a primeira infância ou os cuidados nesta etapa da vida têm reflexos no desenvolvimento da

pessoa. O Parecer n.º 8/2008 do Conselho Nacional de Educação sobre A Educação das Crianças dos 0 aos

12 anos salienta — e passo a citar — que «a educação dos 0 aos 6 anos é decisiva como pilar para o

desenvolvimento educativo das crianças e é fator de equidade».

No mesmo sentido, o Seminário A Educação das crianças dos 0 aos 3 anos, realizado no Conselho

Nacional de Educação (CNE), concluiu que «o direito à creche» é um direito a ser reconhecido «enquanto

serviço educativo» que tem «um valor intrínseco e pode contribuir para o desenvolvimento das crianças».

Uma outra recomendação do CNE sobre a educação dos 0 aos 3 anos considera que a concretização do

direito das crianças à creche é «um fator de igualdade de oportunidades, de inclusão e de coesão social». O

mesmo documento sustenta que a responsabilização primeira pela educação da primeira infância pertence às

famílias, não devendo a frequência da creche ser obrigatória, mas devendo «ser universal, de modo a que as

famílias disponham de serviços de alta qualidade a quem entregar os seus filhos, serviços esses que devem

estar geograficamente próximos da respetiva residência ou local de trabalho».

No mesmo sentido, defende que «o Ministério da Educação deve assumir progressivamente uma

responsabilização pela tutela da educação da faixa etária dos 0 aos 3 anos».

Conforme o Estado da Educação 2019 (CNE, 2020), o número de respostas sociais para a primeira

infância tem vindo a decrescer desde 2014, ao mesmo tempo que a procura de creche tem aumentado e, com

ela, o valor da prestação mensal. A falta de vagas e a escassa oferta pública é a realidade com a qual se

deparam milhares de famílias que têm, assim, dificuldades em suportar financeiramente esta despesa.

E há razões que explicam este fenómeno e que são de caráter político: por um lado, as creches não estão

inseridas no sistema público de ensino, mas na segurança social, pelo que a oferta está essencialmente sob a

gestão do setor privado e do setor social; e, por outro, as creches são vistas como assistência às famílias e

não no quadro dos direitos da infância, o que contribui para desresponsabilizar o Estado.

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Esta falta de creches é também reconhecida pelo PRR (Plano de Recuperação e Resiliência), que anuncia

como objetivo «aumentar a capacidade de resposta em creche, fundamentalmente nos territórios que ainda

têm níveis de cobertura muito baixos», nomeadamente as Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto.

Por todos estes factos e razões, o Bloco de Esquerda apresenta à discussão a criação de um programa de

rede de creches públicas, a iniciar em 2022, que permitirá responder a essa debilidade social do País e

concretizará o direito à creche como parte dos direitos constitucionais das crianças ao desenvolvimento

integral.

O programa de rede de creches públicas tem como objetivo: promover o acesso à creche; alargar a

gratuitidade de frequência da creche a todas as crianças que frequentem a creche pública ou abrangida pelo

sistema de cooperação e cujo agregado familiar pertença ao 3.º escalão; fazer o levantamento das

necessidades de resposta de creches públicas e de educação pré-escolar, designadamente de meios e

instalações, bem como de recursos humanos; requalificar e até construir de novo creches; criar uma equipa de

monitorização sob a tutela conjunta do Ministério da Educação e do Ministério do Trabalho e Segurança

Social; e também, não menos importante, contabilizar o tempo de serviço de educadores e educadoras de

infância para efeitos de carreira.

Por isso, o Bloco de Esquerda quer também iniciar um processo, com vista à inclusão da rede de creches

no sistema educativo.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desafio da natalidade é, hoje, em Portugal, um desafio fundamental. Estima-se que um terço ou metade dos rendimentos familiares sejam, hoje,

gastos em creches. Nas famílias, quer mais numerosas, quer menos numerosas, famílias das cidades ou dos

subúrbios, uma parcela fundamental do seu rendimento é hoje gasto em creches: de um terço a metade é uma

fatia fundamental e importantíssima do orçamento familiar.

Seria hoje aqui o dia de recordarmos — pelo menos, por parte da oposição — que foi o Primeiro-Ministro

que prometeu, em 2020, criar 7000 novas vagas em creches de IPSS. Essas 7000 novas vagas nunca

surgiram. E não esperávamos que fosse o Bloco ou o PCP a apontar isto. Mas esperamos que a oposição

hoje aqui o faça.

Em 2021, à saída de um encontro socialista, António Costa disse «agora é que vai ser» e prometeu 10 000

novos lugares em creches e uma dedução fiscal de 900 € para estas situações. Mais uma vez, não só isso não

consta do Orçamento do Estado para o próximo ano como não se encontra nenhuma proposta socialista

nessa matéria.

Estes são a situação e o ponto a que chegámos, em Portugal. Todos os relatórios, nacionais e

internacionais, apontam como decisivo e fundamental a criação de uma rede de suporte em parceria e em

financiamento direto de creches, em Portugal, para obviar a um problema fundamental de apoio à família e de

desenvolvimento da natalidade. Porém, deixamos que um Primeiro-Ministro «passe pelos pingos da chuva», a

prometer tudo e o seu contrário, à medida que os anos passam.

É isto que temos de denunciar hoje, aqui. Se, hoje, o País precisa de mais 20 000 lugares em creches é

porque nem 7000, nem 10 000 lugares foram criados. O Primeiro-Ministro socialista, que prometeu, há três

anos, criar 7000 e depois 10 000 lugares, não deu nem mais um lugar em creche, em Portugal, financiado pelo

Estado ou em parceria para criação em entidades privadas ou em IPSS.

Era a isto que o Partido Socialista, hoje, deveria vir aqui responder: onde estão esses lugares em creches?

Onde está a dotação orçamental? E como é que a esquerda pode sequer pensar em viabilizar o Orçamento do

Estado, que, há anos, promete mais lugares em creches e, mais uma vez, chega aqui sem mais um único

tostão, sem mais um único euro para lugares em creches?

Esta é a hipocrisia portuguesa. Por isso, é fundamental criarmos uma rede em parceria, uma rede de

financiamento direto, que permita às nossas famílias ter, pela primeira vez na sua história, a dignidade que

outros Estados da União Europeia já têm.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do IL.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Alguns, à esquerda, têm usado a possível obrigatoriedade da frequência das creches como uma espécie de fogo de artifício para que

não se discuta o que é previamente necessário. Só se pode tornar obrigatória a frequência de creches se o

Estado garantir as condições de acesso à oferta, coisa que, hoje em dia, o Estado não faz.

E não faz porquê? Porque a forma mais rápida de o fazer é devolver poder às pessoas, financiando

diretamente as famílias para que estas acedam à rede não pública. E o Governo não o quer fazer, mais uma

vez, por cegueira ideológica.

Apesar de não ser obrigatório, quase 100% das crianças com 4 e 5 anos de idade estão no pré-escolar. Já

só 85% das crianças com 3 anos de idade o estão, porque as famílias mais carenciadas não conseguem uma

das poucas vagas da rede estatal e ficam de fora. Diga-se que, nesta faixa etária, cerca de 60% das crianças

frequentam instituições privadas, com ou sem financiamento público.

O que interessa verdadeiramente é garantir a todos as condições de acesso a creches, sejam elas

públicas, sociais ou privadas, com fins lucrativos, ou de IPSS criadas até pelas próprias empresas. É preciso

garantir o acesso, com mais liberdade para escolher creches e projetos educativos diferentes.

É que, «de pequenino não se torce só o pepino», também se torce esta mania de que o Estado tem de

prestar todos os serviços públicos, com isso impedindo que a base de uma sociedade livre se fortaleça. E a

base é que todos tenham as mesmas oportunidades.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaríamos de saudar o espírito dos vários projetos trazidos a esta discussão, que são por demais reveladores das necessidades estruturais

do nosso País, nomeadamente no que diz respeito ao acesso às creches, aos jardins de infância, às respostas

às famílias nesta matéria.

A verdade, Sr.as e Srs. Deputados, é que, na urgência de fazer face àquela que é uma bola de neve das

despesas das famílias, àquilo que são os custos associados aos compromissos familiares, as creches colocam

aqui as famílias, muitas vezes, num enorme desespero, porque efetivamente, não se consegue, tantas vezes,

pagar as mensalidades destes equipamentos.

Sr.as e Srs. Deputados, a realidade das famílias é, de facto, difícil em Portugal. Não se consegue assegurar

vagas, seja por falta de resposta nas respetivas comunidades ou por termos excessivos valores nas

mensalidades, isto, evidentemente, quando há vagas disponíveis.

Sabemos bem que, com a crise sanitária que atravessamos, muitas famílias perderam poder de compra,

perderam empregos e mais pessoas se aproximaram do limiar de pobreza, pelo que consideramos que estas

propostas são, genericamente, positivas, na medida em que tentam alargar a resposta das creches no nosso

País.

Para o PAN, essa resposta deve ser universal e, por isso, tendencialmente gratuita. Enquanto tal não for

possível para todas as famílias, o Estado deve garantir a sua progressividade, começando pelas famílias com

menor capacidade financeira para o efeito.

Sabemos bem que a integração das crianças nestes equipamentos desempenha um papel fundamental no

desenvolvimento infantil, permitindo uma maior igualdade de oportunidades e a inclusão social, além de ser,

claramente, a única resposta que muitas famílias têm, fruto da inexistência de outra rede de apoio. É, portanto,

uma resposta necessária em todo o território nacional.

É também muito importante a possibilidade de fazermos caminho para as entidades empregadoras, em

articulação com o Estado, implementarem respostas de conciliação entre a vida familiar e o trabalho e é

fundamental garantirmos a qualidade destas respostas.

O que não podemos aceitar é que, à boleia desta necessidade e desta resposta, se tentem justificar abusos

laborais e cargas horárias além das previstas, sob a ideia de que se os filhos ou as filhas estão assegurados

num equipamento promovido pela empresa, então, os pais poderão estar lá as horas que sejam necessárias.

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Também não se pode considerar que, no caso das empresas que exigem horários além dos previstos,

deva ser a segurança social a ter de pagar os custos dessa opção da entidade organizacional.

Os protocolos de cooperação com a segurança social devem ser um mecanismo a ter em cima da mesa,

não para pagar as opções de horários destas entidades privadas, mas para assegurar que as famílias que não

tenham outro tipo de resposta naqueles horários possam, efetivamente, ter aqui soluções.

Para concluir, queria dizer apenas que não se trata de ter de construir de novo. Muitas vezes, trata-se de

adaptar as respostas existentes, no fundo, procurando uma rede integrada e eficiente, adaptando sempre que

possível e cooperando com as entidades solidárias ou privadas quando essa resposta for a melhor para as

crianças e para as famílias.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar do PS, o Sr. Deputado Hugo Oliveira.

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste ponto da ordem de trabalhos, temos cinco projetos em discussão — do Chega, do PSD, do PCP, do BE e do CDS.

Este é um tema muito importante e, como tal, deve ser tratado com a seriedade e a responsabilidade que

nos merece. Por isso, nesta discussão, irei separar a seriedade dos projetos da falta dela.

Comecemos, então, pela falta de seriedade. O projeto apresentado pelo Chega afirma, logo no início, e

cito, que «o Chega defende e refere, no seu programa e num conjunto de medidas a concretizar, o apoio à

natalidade e a criação de creches».

Sr. Deputado André Ventura, fui ler o seu programa, o seu novo programa — e olhe que já vão sendo

muitos! —, aprovado no último Congresso do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Já está a acompanhar os congressos?

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Sr. Deputado, nada refere sobre o alargamento das creches! Nem um único parágrafo, nem uma única linha!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, nem sequer refere a palavra creche, quanto mais o alargamento da rede das creches.

O Sr. André Ventura (CH): — Foi assim que pesquisou?!

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Perante isto, e com o respeito que este tema nos deve merecer, para o PS debater o seu projeto damos-lhe duas opções, Sr. Deputado: ou corrige o seu programa político — e todos nós

já sabemos que é muito rápido e que consegue fazê-lo na calada da noite, da noite para o dia — ou, então,

corrige o projeto que aqui apresentou.

Protestos do Deputado do PCP João Dias e contraprotestos do CH.

Este tema requer respeito e seriedade, e não apenas gritos meramente propagandísticos.

Voltemos à seriedade do debate. Voltemos, então, aos projetos do PCP, do Bloco de Esquerda, do CDS e

do PSD.

Protestos do CH.

Sr. Deputado, oiça, oiça! Como vai corrigir, e escrever, o programa pode ser interessante para si ouvir

algumas medidas que o Governo do Partido Socialista já implementou. Vai ser-lhe útil! Não fale tanto e oiça

mais, Sr. Deputado.

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Dizia eu que muito do que é proposto nestes projetos — sérios! — já foi feito ou está contratualizado.

Passarei, assim, a enunciar um conjunto de medidas alusivas a isso mesmo. Refiro primeiro o programa

PARES 2.0 (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais — 2.ª Geração), que foi lançado

para projetos de investimento exclusivamente direcionados para a remodelação e criação de novos lugares na

resposta social de creche, nos concelhos com taxa de cobertura menor, e até ao momento já foram

intervencionados 3500 lugares, num investimento público de cerca de 22 milhões de euros.

Depois, no PRR, estão previstos 54 milhões de euros para o alargamento da rede de creches. Refiro ainda

a gratuitidade no primeiro e segundo escalões e a garantia para a infância.

Este pacote é composto por três medidas que visam reforçar o apoio do rendimento das famílias com

crianças e jovens, colocando o combate à pobreza infantil como a prioridade das prioridades do Estado. São

elas: o reforço do abono de família para o primeiro e segundo escalão, de forma faseada, nos próximos dois

anos, até garantir o valor de 600 € por criança, por ano; o complemento do abono de família, que irá garantir a

todas as crianças e jovens em risco de pobreza extrema o montante anual de 1200 €; e o complemento da

garantia para a infância, que assegura que os titulares do direito do abono de família acima do segundo

escalão, que não obtenham um valor total anual de 600 € por criança ou jovem entre o abono de família e a

dedução à coleta do IRS (imposto sobre os rendimentos das pessoas singulares), venham a receber a

diferença entre esse valor.

É de salientar, também, que já está previsto que as creches que tenham um conjunto representativo de

crianças cujos pais trabalham por turnos possam estabelecer protocolos com a segurança social para terem

direito a um suplemento financeiro para promoverem horários específicos para essas crianças, como tenta

enunciar o projeto do CDS.

Termino, Sr.as e Srs. Deputados, com o compromisso de que o Partido Socialista e o Governo continuarão

a trabalhar este tema com seriedade. Muito já foi feito, mas mais queremos fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra para uma intervenção a Sr.ª Deputada Mariana Silva, de Os Verdes. Entretanto, o Sr. Deputado André Ventura fez sinal à Mesa. É para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. André Ventura (CH): — É para fazer um ponto de ordem à Mesa, Sr. Presidente, a fim de solicitar a entrega de um documento, se for possível.

O Sr. Presidente: — Para fazer uma interpelação à Mesa, em que sugere a entrega de um documento. É isso?

O Sr. André Ventura (CH): — É o que quero fazer, Sr. Presidente. O Sr. Deputado do Partido Socialista referiu que leu os vários documentos do Congresso do Chega…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, não dê muitas explicações.

O Sr. André Ventura (CH): — É muito rápido.

O Sr. Presidente: — Qual é o documento que quer entregar?

O Sr. André Ventura (CH): — O Chega entregará hoje, à Mesa, não só o programa como a proposta…

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado. Faça chegar os documentos à Mesa, então.

O Sr. André Ventura (CH): — Faremos chegar à Mesa, para entregar ao Partido Socialista, a proposta do Orçamento do Estado do ano passado onde propomos uma rede de creches pública, para o Sr. Deputado ler.

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Protestos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra, como previsto, a Sr.ª Deputada Mariana Silva, para uma intervenção.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ainda que o tema do reforço das medidas para a primeira infância seja importante, alguns teimam em retirar-lhe importância e, apesar dos

constantes avisos para as dificuldades, apesar das propostas para as superar e até dos anúncios de medidas

de apoio à natalidade, o que se verifica é que estas medidas não foram devidamente desenvolvidas nos

últimos anos.

São públicas as preocupações com o facto de nascerem poucas crianças em Portugal, o que tem como

consequência o rápido envelhecimento da população portuguesa, mas o que encontramos no terreno são as

dificuldades muito concretas dos pais e, particularmente, dos jovens, fruto da falta de apoio à infância.

Como se espera que um jovem casal, que vive com dois salários mínimos ou pouco mais, decida assumir

uma opção que lhe custará, logo à partida — além do leite, das fraldas, dos produtos de saúde e higiene, da

roupa — uma despesa de centenas de euros para pôr a criança numa creche, isto se tiver a sorte de encontrar

uma?

Não existem creches para todas as crianças cujos pais precisem e queiram compatibilizar o trabalho com a

paternidade e a maternidade nem espaços que, posteriormente, as crianças possam frequentar. O que é ainda

pior se falarmos de espaços com equilíbrio, para que elas possam desenvolver capacidades cognitivas, para

que possam crescer com os seus pares, para que socializem e se desenvolvam, mental e fisicamente, de

forma saudável.

Os Verdes não concordam que as crianças e os jovens passem mais horas nas creches e nas escolas do

que as que os seus pais passam no trabalho, mas é urgente que se trabalhe na construção de uma rede de

creches públicas que cubra todo o País, com vista a garantir creche gratuita a todas as crianças até aos 3

anos. Isto, para que não fiquem de fora crianças cujos pais não conseguem pagar uma mensalidade e para

que as mães ou os pais não tenham de desistir da sua vida profissional por terem mais do que um filho.

Mas, além disso, é realmente necessário que se regulem os horários de trabalho, que se ponha fim ao

trabalho precário, que se aumente o salário mínimo nacional para que todos os que pretendam formar família

o possam fazer e não se limitem porque o País onde vivem não lhes permite isso e apenas lhes coloca

entraves.

Sr.as e Srs. Deputados, a baixa natalidade é um problema sério que precisa de respostas determinadas,

mas elas não virão, seguramente, de quem vota contra o aumento do salário mínimo nacional, de quem

roubou, a milhares de crianças, o abono de família, de quem quer o retrocesso da legislação laboral, de quem

aumentou o horário de trabalho, de quem fragilizou, até ao estado que hoje conhecemos, o direito à habitação.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Nem virão dando mais dinheiro às empresas para abrirem novas linhas de negócio com as crianças.

A resposta virá de outra política, diferente, que ponha no centro das preocupações os direitos das crianças

e o futuro do País.

Aplausos do PEV e do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra para uma intervenção a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a resposta que se impõe dar à realidade que temos no nosso País, de falta de vagas em creches para as crianças e das muitas dificuldades que as

famílias enfrentam todos os meses para pagar as creches — que é, aliás, inseparável da realidade de baixos

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salários que temos também no nosso País —, passa pelo alargamento da gratuidade, como o PCP propõe,

além dos dois escalões que estão já considerados.

É uma proposta em que o PCP tem insistido. Nós dizemos que todas as crianças, independentemente dos

escalões, têm de ter assegurado o seu direito à creche porque estamos a falar de direitos. Estamos a falar dos

direitos das crianças no acesso à creche, mas também estamos a falar do direito que as crianças têm de que a

creche seja um espaço de desenvolvimento integral e não um sítio onde sejam deixadas para que os pais

possam ir trabalhar.

As creches não têm de estar ao serviço das vontades e dos horários do patronato. Falamos do direito de as

crianças serem também acompanhadas pelos pais e, por isso, insistimos no combate aos horários

desregulados, insistimos nas 35 horas de trabalho para todos os trabalhadores e no combate ao abuso no

âmbito do trabalho extraordinário, do trabalho por turnos e do horário noturno.

O que se impõe, efetivamente, é o alargamento da gratuitidade, mas também uma rede pública de creches.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Mesmo para terminar, Sr. Presidente, impõe-se garantir a universalidade e a gratuidade, porque estamos a falar de direitos fundamentais das crianças, dos pais e das mães

trabalhadores, das famílias do nosso País.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Para encerrar este debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Germana Rocha, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Maria Germana Rocha (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No final deste debate, agendado pelo Grupo Parlamentar do PSD, sobre o reforço da rede social para a primeira infância, podemos

concluir que dúvidas não restam de que um dos mais graves problemas da realidade em que vivemos, o qual

hipoteca o futuro das atuais e próximas gerações, e o próprio País, é o envelhecimento demográfico, fruto da

reduzida taxa de natalidade, que está diretamente ligada à falta de condições das famílias e de muitos jovens

que anseiam, mas não conseguem, constituir família.

Os primeiros anos de vida são decisivos na aquisição de competências, permitindo às crianças um melhor

percurso escolar e uma vida adulta menos vulnerável, constituindo o primeiro passo para o chamado elevador

social. É, por isso, fundamental, como foi amplamente reconhecido neste debate, a existência de respostas

adequadas no apoio às famílias, quer a nível dos meios, quer a nível dos equipamentos onde os pais possam

deixar os seus filhos em segurança enquanto trabalham, nomeadamente no que respeita ao aumento do

número de vagas e de valências de apoio à primeira infância, um contributo essencial para a conciliação da

vida pessoal, profissional e familiar.

Sr.as e Srs. Deputados, se temos como certo que a inversão desta preocupante trajetória demográfica

dependerá das soluções a adotar neste âmbito, também sabemos que o tempo urge para quem governa e

para quem suporta a atual governação para que, de uma vez por todas, passem dos anúncios aos atos,

nomeadamente através do atual Orçamento do Estado e da execução das verbas previstas no Programa de

Recuperação e Resiliência e restantes programas de fundos europeus. Isto para que não transformem uma

oportunidade única em mais uma oportunidade perdida, como outras a que temos assistido nestas matérias.

A Sr.ª Helga Correia (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Maria Germana Rocha (PSD): — É uma oportunidade única e, provavelmente, irrepetível para a adoção de políticas públicas integradas que melhorem as condições determinantes na concretização dos

projetos de vida dos portugueses.

Aplausos do PSD.

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Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, boa tarde a todos. Vamos passar ao ponto três da nossa ordem do dia que consiste na apreciação conjunta, na generalidade,

dos Projetos de Lei n.os 871/XIV/2.ª (BE) — Institui de forma inequívoca o princípio da avaliação mais favorável

nas avaliações feitas por junta médica (Terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro) e

916/XIV/2.ª (PCP) — Atestado médico de incapacidade multiuso — clarifica os processos de revisão ou

reavaliação do grau incapacidade, através de uma norma interpretativa ao artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 202/96,

de 23 de outubro.

Para apresentar o projeto de lei do Bloco de Esquerda, dou a palavra ao Sr. Deputado Moisés Ferreira.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda traz a debate um projeto de lei para consagrar, de forma clara, expressa e inequívoca, o princípio da avaliação mais

favorável nos processos de revisão ou de reavaliação de incapacidade por junta médica.

Em termos práticos, e usando um exemplo, a um doente oncológico a quem tenha sido atribuída uma

incapacidade de 60% e que com isso teve, e bem, acesso ao atestado multiuso, se, numa reavaliação

subsequente, for atribuída, por hipótese, 50% de incapacidade isso levaria à perda do atestado e apoios

inerentes.

Aquilo que deve prevalecer é, na opinião do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, o princípio da

avaliação mais favorável que permite que durante mais um período esta pessoa continue a ter os 60% de

incapacidade e a usufruir dos apoios sociais e fiscais inerentes, em primeiro lugar, porque a doença não

desapareceu, e, em segundo lugar, porque as consequências sociais e económicas da doença, além das que

se verificam na saúde, como é óbvio, não desapareceram.

Por que razão está o Bloco de Esquerda a apresentar este projeto de lei neste momento? Porque desde há

uns meses são muitas as pessoas com doenças incapacitantes neste País que estão a perder o acesso ao

atestado multiuso e a apoios sociais e fiscais, pois este princípio da avaliação mais favorável, que já existiu,

não está a ser cumprido, deixou de existir. Foi uma prática durante muitos anos, mas tudo isso mudou quando

o atual Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais decidiu fazer uma reinterpretação criativa da lei. Sem alterar

a lei, o Governo achou que podia, por despacho, e a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) achou que podia,

por ofício circulado, deixar de fazer com que a avaliação mais favorável fosse uma realidade.

A consequência, Sr.as e Srs. Deputados, é que, neste momento, existem centenas — aliás, a Liga

Portuguesa Contra o Cancro fala em milhares — de utentes que estão a perder apoio sem qualquer tipo de

aviso prévio. Inclusive alguns destes doentes estão a ser contactados até para devolver apoios que já lhe

tinham sido atribuídos — e atribuídos devidamente. Esta é uma forma de atuar intolerável, com consequências

muito graves.

Dois casos reais: o pai da Manuela foi diagnosticado com cancro em 2014, foi-lhe atribuída uma

incapacidade de 60%, o respetivo atestado e os respetivos direitos e apoios fiscais; em 2018, foi reavaliado

com 50% de incapacidade, mas prevaleceu na altura, e bem, o princípio da avaliação mais favorável,

mantendo-se, por isso, os apoios existentes.

Acontece que, depois da reinterpretação criativa do Sr. Secretário de Estado e do Governo, a Autoridade

Tributária decidiu exigir a devolução dos apoios em sede de IRS e em sede de IUC (imposto único de

circulação).

Repare-se: a pessoa em causa continua a ser um doente oncológico, continua a ter de lidar com as

consequências sociais e económicas da doença, não fez nada de mal, não ludibriou nenhum sistema, nada,

apenas teve acesso a um direito que era seu. No entanto, o Governo decidiu retirar-lhe, e retroativamente,

esse direito.

Outro exemplo: a Olívia foi diagnosticada com um mieloma múltiplo e até já fez dois autotransplantes da

medula, foi-lhe atribuído um grau de incapacidade de 80%, requereu e teve acesso à prestação social de

inclusão. Em 2019, foi reavaliada e foi-lhe atribuída uma incapacidade de 72% e, como vigorou o princípio da

avaliação mais favorável, e bem, manteve o apoio social.

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O problema é que, por causa da reinterpretação do Sr. Secretário de Estado e do Governo, em 2020, foi-

lhe cortada esta prestação e agora ela deve à segurança social uma série de meses da prestação que

retroativamente foi considerada indevida.

Estas situações, Sr.as e Srs. Deputados, multiplicam-se por centenas no País e são inaceitáveis.

O Bloco de Esquerda teve oportunidade de chamar o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais ao

Parlamento para o confrontar com as consequências do seu despacho e, nessa audição, ficou claro que a

intenção do Governo era mesmo a de cortar apoios sociais e fiscais. Era mesmo essa a intenção do Governo!

Por isso, o que dizemos com este projeto de lei é: se a intenção do Governo é insensibilidade, então, a

exigência da Assembleia da República deve ser a de impor a solidariedade social; se a intenção do Governo é

a de cortar apoios sociais, então, a exigência da Assembleia da República é a de manter esses apoios sociais.

Ora, é isso que o Bloco de Esquerda faz com a apresentação deste projeto de lei ao dizer, de forma clara e

inequívoca, que o direito à avaliação mais favorável é um imperativo legal e que o acesso a este direito não

pode ser revogado ou cortado, muito menos por um despacho fruto de uma interpretação criativa, que é

destrutiva para muitas pessoas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É para corrigir uma injustiça e para garantir que as pessoas com deficiência e com incapacidade não perdem direitos adquiridos que o PCP

apresenta esta iniciativa legislativa.

A avaliação da incapacidade é calculada de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente

de Trabalho e Doenças Profissionais, recorrendo-se para o efeito ao anexo do qual constam todas as

instruções para avaliação do universo de disfunções, lesões e deficiências às quais corresponderá a atribuição

de um determinado grau de incapacidade.

O Decreto-Lei n.º 291/2009, associado ao Regime de Avaliação das Incapacidades das Pessoas com

Deficiência, remetendo também esta mesma avaliação para a tabela nacional de incapacidades, é um diploma

que prevê também que, quando haja lugar a revisão ou reavaliação da incapacidade, o grau de incapacidade

resultante da aplicação desta mesma tabela nacional vigente à data da avaliação ou da última reavaliação seja

mantido sempre que, de acordo com a declaração da junta médica, se mostre mais favorável ao avaliado.

Este mesmo diploma no seu n.º 8 do artigo 4.º considera que «o grau de incapacidade é desfavorável ao

avaliado quando a alteração do grau de incapacidade resultante de revisão ou reavaliação implique a perda de

direitos que o mesmo já esteja a exercer ou de benefícios que já lhe tenham sido reconhecidos». Lemos o que

está neste diploma, porque importa perceber que é isto que está consagrado em lei.

A questão é simples: se a patologia que esteve na origem da atribuição da incapacidade permanece e

continua a constar do atestado médico de incapacidade multiuso, o que releva para o reconhecimento de

direitos e benefícios previstos na lei é o grau de incapacidade que, de acordo com a declaração da junta

médica, se mostre mais favorável ao cidadão que é avaliado. Justifica-se este entendimento, porque a

patologia que conduziu à atribuição do grau de incapacidade não desapareceu.

No entanto, em ofício da Autoridade Tributária e Aduaneira, que materializa, aliás, uma decisão emanada

por despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, são feitas uma introdução e uma nova

interpretação da lei cujo resultado prático é a eliminação do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de

outubro.

Esta interpretação, além de se revelar contrária à lei, revela também uma profunda insensibilidade para

com a situação das pessoas com deficiência e incapacidade, subvertendo, inclusive, os objetivos que

estiveram na base desta lei. Ela traz profundos prejuízos a pessoas com incapacidade e deficiência com

direitos já adquiridos e que estão, efetivamente, a perdê-los neste momento: falamos de isenções em sede de

IRS ou de IUC, ou do acesso a prestações sociais às quais tinham direito e que deixam de ter.

É neste sentido que o PCP apresenta uma norma interpretativa que clarifica que, nas situações de revisão

ou reavaliação de incapacidade, sempre que resulte desse mesmo procedimento a atribuição de um grau de

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incapacidade inferior ao anteriormente certificado e que possa significar uma perda de direitos ou de

benefícios já reconhecidos, se mantenha a avaliação mais favorável ao cidadão desde que referente à mesma

patologia clínica que determinou a atribuição da incapacidade em questão.

A atual situação fragiliza quem, por força de deficiência ou incapacidade, está já numa situação de

vulnerabilidade e é para corrigir esta injustiça e também para manter os direitos das pessoas com deficiência e

incapacidade que o PCP apresenta esta proposta.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Cristina, do PSD.

O Sr. Rui Cristina (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje dois projetos de lei, um do Partido Comunista Português e outro do Bloco de Esquerda, ambos propondo alterar, ou melhor,

clarificar o regime de revisão ou reavaliação de incapacidades em vigor.

Trata-se de uma questão relativamente recente, que surgiu como consequência de uma alteração da

interpretação da legislação em vigor sobre benefícios fiscais, da responsabilidade do atual Governo, e que vai

num sentido que prejudica e retira esses benefícios a muitos doentes que tinham um grau de incapacidade

fiscalmente relevante.

A questão é, fundamentalmente, a seguinte: atualmente, os doentes portadores de atestado multiuso com

grau de incapacidade igual ou superior a 60% têm um regime fiscal mais razoável, especialmente em sede de

IRS. Se, mais tarde, o estado de saúde do doente melhorar e uma junta médica apurar, em sede de

reavaliação da incapacidade, um grau de incapacidade inferior ao grau inicial, esse doente continua a usufruir

dos benefícios ao nível fiscal já reconhecidos, desde que, evidentemente, a sua incapacidade respeite à

mesma patologia — é o que decorre do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 291/2009 na sua redação atual.

Sucede que, como é de todos sabido, o atual Governo, através de um inusitado despacho do Secretário de

Estado dos Assuntos Fiscais, resolveu deixar de aplicar o regime mais favorável ao doente numa clara e

flagrante violação da letra e do espírito da lei.

Esta nova interpretação não desconsidera apenas a situação do doente ao qual foi aplicada uma

incapacidade elevada, como ignora as elevadas despesas de saúde e de outra natureza que esse doente, não

raro, tem de efetuar, negando-lhe, também, os apoios que a lei lhe concede mercê da patologia de que padece

e que determinou a atribuição de um elevado grau de incapacidade.

Mais: a interpretação do atual Executivo do Partido Socialista põe seriamente em causa a segurança

jurídica, viola direitos adquiridos e é, sobretudo, profundamente desumana.

Veja-se bem: nem durante a difícil governação do tempo da troica estes benefícios e apoios aos doentes

com patologias graves foram postos em causa, precisamente por não se ignorar os custos sociais e

económicos que estas patologias acarretam para os seus portadores e respetivas famílias.

Dito isto, Sr.as e Srs. Deputados, importa não avançar para soluções legislativas simplistas, suscetíveis de

gerar indesejáveis injustiças fiscais ou no sistema de atribuição de apoios públicos.

O Partido Social Democrata tem uma posição clara sobre esta matéria: consideramos que, em situações de

revisão ou de reavaliação da incapacidade das pessoas com deficiência, sempre que resulte desse

procedimento a atribuição de grau de incapacidade inferior ao anteriormente certificado, deve manter-se o

grau mais favorável ao doente, desde que respeite à mesma patologia clínica. O ponto é que essa patologia

não tenha sido ainda debelada e que o grau de incapacidade apurado posteriormente continue a acarretar

encargos financeiros ou a implicar perdas ou outras dificuldades relevantes, por exemplo, a nível da sua

atividade económica.

Por isso, para o PSD, esta é a posição mais justa, por ser também a que melhor protege a pessoa com

deficiência.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Miguel Arrobas, do CDS-PP.

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O Sr. Miguel Arrobas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. e Sr.as Deputados: Vêm os grupos parlamentares do BE e do PCP apresentar dois projetos de lei que visam reforçar o princípio da avaliação mais favorável, nas

avaliações feitas por junta médica.

Estes projetos visam clarificar e reforçar a interpretação do que está já consagrado na legislação vigente,

nomeadamente, no Decreto-Lei n.º 202/96, com a redação do Decreto-Lei n.º 291/2009. Este refere — e bem

— que, nos processos de revisão ou reavaliação, o grau de incapacidade, resultante da aplicação da Tabela

Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais vigente à data da avaliação ou

da última reavaliação, é mantido sempre que, de acordo com uma declaração da junta médica, se mostre mais

favorável ao avaliado. Mais, considera-se que o grau de incapacidade é desfavorável ao avaliado quando a

alteração do grau de incapacidade resultante de revisão ou reavaliação implique a perda de algum direito que

o mesmo já esteja a exercer ou de benefícios que já tenham sido reconhecidos.

Portanto, quando, numa reavaliação, é atribuído ao doente um grau de incapacidade inferior ao que tinha

antes, prevalece o que lhe for mais favorável, isto é, o grau de incapacidade anterior. É ainda de referir que

quando uma pessoa tem um grau de incapacidade igual ou superior a 60% tem direito ao atestado médico de

incapacidade multiuso, que lhe dá acesso a diversos apoios e benefícios fiscais em sede de IRS, de IVA

(imposto sobre o valor acrescentado), de imposto sobre veículos, de isenção de IUC e de isenção do

pagamento de taxas moderadoras, entre outros.

No entanto, um ofício de 2019 da Autoridade Tributária e Aduaneira veio, em consequência de um

despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, introduzir — pasme-se! — uma nova interpretação,

eliminando, assim, nos casos de reavaliação, a prevalência do grau de incapacidade mais favorável. Em

consequência, muitas pessoas viram, desta forma, ser-lhes repentinamente retirados apoios e benefícios que

tinham, sem serem tidos nem achados.

Assim, o Bloco de Esquerda e o PCP vêm propor que se adite ao Decreto-Lei n.º 202/96 um novo artigo

4.º-A, instituindo o princípio da avaliação mais favorável ao avaliado, o que nos parece fazer todo o sentido.

Recordamos que, já em maio, o CDS enviou uma pergunta escrita ao Ministro de Estado e das Finanças, na

qual afirmámos que esta nova interpretação que a Autoridade Tributária e Aduaneira está a fazer, resultante

do despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, é altamente condenável e reprovável.

Esperamos, assim, que estas iniciativas, ao serem trabalhadas na especialidade, possam ser

harmonizadas nas diferenças que existem entre si, estando o Grupo Parlamentar do CDS empenhado em

contribuir para um texto final que assegure um verdadeiro sentido de justiça social, que é um valor do qual não

prescindimos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do PAN, para uma intervenção.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A realidade das juntas médicas e os atrasos que sofreram ao longo dos últimos tempos, resultantes da crise sanitária que vivemos, tem levado e

trazido a esta Casa diversas preocupações por parte dos utentes e também, evidentemente, por parte das

suas famílias.

Apesar das várias resoluções tomadas e dos debates tidos em sede de especialidade, na Comissão de

Saúde, o PAN nunca deixou de apresentar várias soluções que visavam melhorar estas respostas a nível do

funcionamento imediato das juntas médicas não só no âmbito da crise sanitária, como também fora dela. É

necessário trabalharmos conjuntamente para um modelo inovador e de maior eficiência, como, aliás, deixaram

bem claras as audições realizadas na Comissão de Saúde.

Relativamente às propostas apresentadas, estas trazem a vontade clara de, no fundo, esclarecer e trazer

as interpretações corretas sobre os processos de revisão e reavaliação do grau de incapacidade, garantindo,

então, que é sempre aplicado o princípio mais favorável para o utente que está a ser avaliado.

Sabemos, efetivamente, que a nova interpretação resultou na eliminação de um artigo e que, no fundo,

representa um prejuízo para as pessoas a quem, de alguma forma, já tinha sido atribuído um grau de

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incapacidade e, consequentemente, uma série de apoios sociais que são tão necessários e justificados devido

às dificuldades que as pessoas com estas doenças enfrentam no seu dia a dia e nos acessos às respostas

existentes.

Julgamos que algumas das questões que podem colocar-se neste debate devem passar, por exemplo, pelo

que a própria Liga Portuguesa Contra o Cancro tem referido nesta matéria, nomeadamente sobre a

necessidade de haver uma avaliação do estado clínico do paciente e de uma possível redução da sua

incapacidade e de esta reavaliação poder claramente trazer uma outra perspetiva sobre a doença.

Concordamos que, sempre que haja uma nova reavaliação, esta deve, evidentemente, ter em conta a

história clínica desta pessoa e acompanhar sempre o que se mostre como mais favorável à pessoa que está a

ser avaliada. Por exemplo, o caso de os doentes oncológicos passarem a ter, nuns casos, incapacidade de

60%, durante o período inicial de cinco anos após o diagnóstico, e, noutros casos, de 80%, durante sete anos,

torna perfeitamente legítima esta reivindicação também de outros doentes.

Por isso, entendemos que as propostas aqui apresentadas e a sua preocupação com o impacto desta

alteração na vida das pessoas deve ser tratada com a maior sensibilidade. Há um caminho que, claramente,

tem de ser feito nesta Casa. Se é verdade que, havendo melhoria do estado clínico ou da limitação, é

importante que haja uma reavaliação, é preciso também considerar de que forma é que ela vai impactar a vida

das pessoas que, até àquele momento, obtiveram, de forma justa e legítima, os apoios sociais, fruto da

situação em que se encontravam.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, do PEV.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos, hoje, em discussão duas iniciativas legislativas, uma do BE e outra do PCP, incidindo ambas sobre a mesma matéria e com o

mesmo propósito, ou seja, afastar quaisquer dúvidas relativamente à aplicação do princípio da avaliação mais

favorável nas avaliações realizadas por junta médica.

De facto, atento o quadro legislativo atual, mais concretamente o Decreto-Lei n.º 202/96, com a redação

que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 291/2009, que são os diplomas que, enfim, enquadram o regime de

avaliação de incapacidades para efeitos de acesso às medidas e aos benefícios previstos na lei, resulta

expressamente, aliás, de forma muito clara e inequívoca, que, nos processos de revisão ou reavaliação, o

grau de incapacidade resultante da aplicação da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho

e Doenças Profissionais, vigente à data de avaliação ou da última reavaliação, é mantido sempre que, de

acordo com a declaração da junta médica, se mostre mais favorável ao avaliado.

Dito por outras palavras, quando, numa reavaliação, for atribuído um grau de incapacidade mais baixo do

que aquele que resultou da avaliação inicial ou da última reavaliação, o que foi atribuído na anterior avaliação

é o que tem relevância, isto é, mantém-se aquele grau de incapacidade sempre que, de acordo com

declaração da junta médica, se mostre mais favorável à pessoa que está a ser objeto de avaliação.

Acontece que, apesar da clareza das disposições legais aplicáveis, a Autoridade Tributária e Aduaneira,

através de um ofício circulado, veio trazer uma nova e inédita interpretação das normas legais, subvertendo

literalmente o regime jurídico existente e os objetivos e os pressupostos que nortearam a construção desse

regime legal. Estamos, assim, diante de uma novidade, diante de um inédito processo que seria bom não fazer

escola, porque, em bom rigor, o que resulta deste processo é que um ofício circulado da Autoridade Tributária

e Aduaneira altera um ato legislativo, altera um diploma legal. Em termos práticos, o que temos é um ofício

circulado da Autoridade Tributária e Aduaneira a revogar literalmente o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 202/96.

Ora, um ofício circulado da Autoridade Tributária e Aduaneira ou um ofício de qualquer outro órgão da

administração central não pode alterar ou revogar disposições legais. Por este caminho, um dia ainda teremos

um qualquer ofício circulado de um qualquer órgão da administração central a pretender fazer revisões do

nosso texto constitucional.

Portanto, vemos com bons olhos as iniciativas legislativas que estamos a discutir, tanto a do BE como a do

PCP, porque também consideramos que é necessário afastar qualquer possibilidade de haver situações como

a que esta interpretação acabou por criar. Além de ser uma manifesta e grosseira violação da lei e, portanto,

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contrária ao nosso ordenamento jurídico, é ainda o reflexo de uma absoluta insensibilidade pelas pessoas com

grau de incapacidade, que se veem, assim, penalizadas quando a lei o não permite.

Aplausos do PEV e do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Susana Amador, do Partido Socialista.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O acompanhamento da atividade assistencial não COVID-19, e das juntas médicas em particular, e a sua coexistência com a resposta às

necessidades assistenciais decorrentes da pandemia têm sido uma das preocupações essenciais do Ministério

da Saúde e, igualmente, do Parlamento e deste grupo parlamentar, ao longo do último ano e meio.

Os dados mais recentes demonstram e evidenciam um percurso assinalável de recuperação da atividade

do SNS (Serviço Nacional de Saúde), a qual já está alinhada com a realizada em igual período de 2019, o ano

em que se verificou o volume assistencial mais elevado no nosso SNS.

Relativamente à recuperação da atividade assistencial nos cuidados de saúde primários, os dados

provisórios acumulados a agosto de 2021 demonstram que foram feitas 24 milhões de consultas médicas

totais, o que representa um aumento de 19,7% em relação a igual período de 2020 e um acréscimo de 14,5%

em comparação com o período homólogo de 2019. Foram também realizadas 18,3 milhões de consultas de

enfermagem.

Igualmente, as juntas médicas, que temos vindo a acompanhar, têm paulatinamente retomado o seu curso,

com a consequente emissão de atestados de incapacidade multiuso, nos casos aplicáveis, sendo urgente que

se continue a agilizar e a simplificar as mesmas.

A saúde tem estado sempre no centro das prioridades e do investimento público do Governo socialista e

deste grupo parlamentar. Aliás, basta olhar para o Orçamento do Estado: temos alocados 700 milhões de

euros ao SNS. É também, de facto, um Orçamento amigo da saúde e das pessoas.

As iniciativas legislativas hoje em discussão, da autoria dos Grupos Parlamentares do PCP e do Bloco de

Esquerda, que se saúdam e são meritórias no seu objeto, incidem sobre o regime jurídico de avaliação de

incapacidades para efeitos de acesso às medidas e aos benefícios sociais e fiscais.

Em termos complementares, estes projetos instituem, no essencial, o princípio da avaliação mais favorável

nos processos de revisão ou reavaliação das incapacidades. Deste modo, prevê-se que, nos casos de

incapacidade temporária, além das situações de alteração do grau de incapacidade resultante da alteração de

critérios da tabela de avaliação, vigore o princípio da avaliação mais favorável quando ocorra uma alteração do

grau de incapacidade na sequência de evolução positiva da situação clínica.

Sr.as e Srs. Deputados, vejamos cada assunto per se. Quanto à necessidade de clarificação dos processos

de revisão ou reavaliação do grau de incapacidade é importante sublinhar e esclarecer que, sempre que se

registem ou forem introduzidas alterações nos critérios da definição dos diferentes níveis de incapacidade,

será sempre reconhecido o benefício fiscal mais favorável ao utente.

Ou seja, desde que se mantenha a situação clínica do indivíduo, continua a ser reconhecido o benefício

fiscal quando a reavaliação determine uma incapacidade inferior a 60% apenas pela aplicação dos novos

critérios. Esta exceção prevista na lei permite salvaguardar as situações que sairiam prejudicadas pela

alteração de critérios de avaliação da incapacidade, permitindo a aplicação da situação mais favorável.

No entanto, e esta é outra situação, se, na reavaliação, a incapacidade passar a ser inferior a 60% devido à

evolução clínica do utente, afigura-se que deixa de haver o pressuposto para acesso ao benefício fiscal,

porque a incapacidade é inferior ao limite de acesso a esse benefício — sem prejuízo de se salvaguardarem

as situações já constituídas ou já reconhecidas, que deverão vigorar até ao respetivo termo ou caducidade.

As perguntas que deixo em cima da mesa, e que são um contributo útil do PS para este debate, são as

seguintes: será adequado ou não que, após uma reavaliação da situação clínica do indivíduo que determine a

redução da sua incapacidade abaixo dos 60%, se mantenha a qualificação de deficiência fiscalmente

relevante? Será equitativo e justo que alguém com 65% de incapacidade, que tenha uma evolução clínica que

permita uma reavaliação que determina, por exemplo, 5% ou 10% de incapacidade, mantenha a qualidade de

«pessoa com deficiência fiscalmente relevante» e subjacentes direitos?

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A título de exemplo, a lei estaria então a reconhecer direitos a alguém que tem apenas 5% ou 10% de

incapacidade há vários anos, apenas porque no início dos tratamentos tinha uma incapacidade superior a

60%, quando limita claramente o acesso aos benefícios a um específico nível de incapacidade, vedando por

isso o seu acesso a quem tenha durante vários anos uma incapacidade de 50%.

São questões complexas? São. São questões sensíveis e delicadas? São. Por isso exigem um debate

aprofundado no qual o PS quer ser contribuinte líquido para o mesmo.

Não vale a pena, Srs. Deputados, termos aqui o discurso maniqueísta dos sensíveis e dos insensíveis. Se

há Governo e se há grupo parlamentar sensível à área da saúde e focado na defesa intransigente do SNS e

dos seus utentes tem sido este grupo parlamentar, tem sido o Partido Socialista.

Acresce que os projetos de lei em apreço também podem criar outra entropia com o diploma que será em

breve aprovado e que procederá a uma alteração ao Decreto-lei n.º 202/96, de 23 de outubro, o qual procura

agilizar, desmaterializar e desburocratizar os procedimentos inerentes à constituição de juntas médicas de

avaliação de incapacidades e que fixa um entendimento diferente daquele que motiva as presentes iniciativas.

Temos, pois, de convergir e olhar para esta pluralidade de leis que não podem ser, depois, contraditórias.

Por último, a rigidificação do grau de incapacidade e deficiência, ainda que o cidadão tenha evoluído

positivamente na sua patologia, afigura-se até contraditória com legislação recente aprovada por este

Parlamento onde se proclama, e bem, o direito ao esquecimento, impedindo que, no futuro, as pessoas que

tenham vencido doenças graves, como o cancro, sejam discriminadas.

Os avanços da ciência e a inovação terapêutica trazem-nos cada vez mais histórias de superação, mais

histórias de sucesso no combate a doenças grave. Que o futuro, neste domínio, continue cada vez mais a

inscrever-se profundamente no presente, a bem da comunidade, a bem de todos nós.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, dado que a Mesa não regista inscrições, pergunto se os partidos que dispõem de tempo ainda o pretendem utilizar?

Pausa.

A Sr.ª Deputada Diana Ferreira sinalizou à Mesa que sim, pelo que tem a palavra, para uma intervenção, a

Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do PCP.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, depois do debate feito sobre a iniciativa legislativa do PCP, importa dizer o seguinte: do que estamos aqui a falar com esta proposta que o

PCP traz para ser votada na Assembleia da República é de uma clarificação, através de uma norma

interpretativa que nós redigimos, face a uma circular que foi emitida pela Autoridade Tributária, materializando

um despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que, na prática, retirou direitos que estavam

adquiridos a pessoas com deficiência ou incapacidade.

Sr.ª Deputada Susana Amador, a Sr.ª Deputada utilizou o exemplo de quem, de repente, fica com uma

incapacidade de 5%, e eu dou-lhe o exemplo de quem perde isenções fiscais ou de quem perde até isenção

nas taxas moderadoras com uma incapacidade de 58%, Sr.ª Deputada.

Não podemos fazer esta avaliação da maneira que a Sr.ª Deputada aqui referiu. Do que estamos a falar é

de direitos adquiridos pelos utentes. São estes direitos que têm de ser mantidos, nomeadamente numa

avaliação mais favorável a quem tem a mesma patologia após a reavaliação em junta médica.

Sobre o funcionamento das juntas médicas, muito haveria a dizer, nomeadamente o tempo que as pessoas

esperam para poder ter a necessária reavaliação que lhes confirme os direitos que já têm.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — É desta realidade que estamos a falar e é nesta realidade que temos de intervir.

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O que importa aqui saber, considerando a intervenção que a Sr.ª Deputada fez, é de que forma o PS se vai

posicionar em relação a esta iniciativa legislativa, em concreto, que repõe direitos que estão a ser retirados por

um despacho e por uma circular que dá corpo a esse mesmo despacho.

Aplausos do PCP e PEV.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Passamos à fase de encerramento. Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, na verdade, não deveria ser preciso estarmos a debater estes projetos de lei aqui na Assembleia da República, porque a atual legislação e aquilo

que vinha a ser a prática, até da Autoridade Tributária, aquilo que vinha a ser a interpretação da atual

legislação, que é clara, era só uma. Era que, independentemente de haver alteração de critérios de tabela ou

alteração ao estado clínico — as duas coisas, Sr.ª Deputada! —, vigorava sempre a avaliação mais favorável.

Sempre foi assim, até que houve um despacho do Sr. Secretário de Estado que resultou num ofício

circulado da Autoridade Tributária que, com a mesma legislação em vigor, afinal, acabou com este princípio da

avaliação mais favorável e acabou até, retroativamente, a retirar direitos que tinham sido atribuídos.

Perante aqueles dois casos concretos que o Bloco de Esquerda deu como exemplo, uma pessoa que tinha

tido uma incapacidade de 80% e que passa, numa reavaliação, para uma incapacidade de 72% — não é 5%,

Sr.ª Deputada, é 72% —, com isso perdeu retroativamente o direito à PSI (prestação social para a inclusão), e

aquilo que se pergunta é: acha justo isso? Acha mesmo justo? Uma pessoa que tinha uma doença oncológica,

com uma incapacidade de 60% e que na reavaliação passa para 50%, retroativamente tem a Autoridade

Tributária a dizer que agora vai ter que devolver o IRS e o IUC. Acha justo?! Não, não é justo!

Protestos da Deputada do PS Ana Catarina Mendonça Mendes.

Não é justo e por isso é que nós apresentámos este projeto de lei. É exatamente porque tem de ser reposto

aquele que era o direito que existia.

Se o Governo e o Partido Socialista queriam alterar isso, alteravam na lei. Não alteravam à socapa, através

de um despacho e de um ofício circulado que depois tem estas consequências. Por isso, se querem alterar,

têm de ter a coragem de dizer que querem acabar com estes apoios. Não o podem fazer à socapa através de

um despacho do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

Somos pela manutenção desses direitos e por isso dizemos que deve haver, inequivocamente, na lei, este

princípio da avaliação mais favorável.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar ao quarto ponto da nossa ordem de trabalhos de onde consta a apreciação conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 9/XIV/1.ª (PCP) —

Estabelece o regime de financiamento permanente do Programa de Apoio à Redução Tarifária nos

Transportes Públicos e 964/XIV/3.ª (PAN) — Estabelece o reforço e avaliação da implementação e execução

do Programa de Apoio à Redução do Tarifário nos Transportes Públicos (PART) e do Programa de Apoio à

Densificação e Reforço da Oferta de Transporte Público (PROTransP).

Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O alargamento do passe social intermodal a todas as carreiras e a todos os operadores e a redução dos preços dos transportes públicos,

proposta há muito defendida pelo PCP, significou um enorme avanço na acessibilidade e mobilidade das

populações — de crianças e jovens, de reformados, pensionistas e idosos, em particular.

Do ponto de vista ambiental, foi a medida de maior alcance para promover a utilização do transporte

público e a diminuição do uso do transporte individual, o que contribui para a redução das emissões de gases

poluentes, para o descongestionamento urbano e para a redução da dependência energética.

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Só por esta via, permitiu também que os trabalhadores ficassem com mais rendimento disponível ao final

do mês. Nalguns casos, esse rendimento disponível atingiu mais de 100 €.

Durante anos e anos, o PCP propôs o alargamento do passe social intermodal a todos os operadores e a

redução de preços, proposta sistematicamente rejeitada com argumentos que a vida se encarregou de

comprovar que não tinham nenhuma correspondência com a realidade.

Foi a luta das populações, das comissões de utentes de transportes, das autarquias, em particular das

autarquias geridas pela CDU (Coligação Democrática Unitária), e a intervenção determinada do PCP que

permitiu que a redução dos preços e o alargamento do passe seja hoje uma realidade.

Não restam dúvidas sobre a importância desta medida. Importa agora a sua consolidação, atribuir-lhe a

força de lei através da criação do regime de financiamento do Programa de Apoio à Redução do Tarifário nos

Transportes Públicos, como o PCP propõe na iniciativa que traz hoje a discussão na Assembleia da República,

para assegurar estabilidade e não ficar dependente de vontades momentâneas nem da inscrição anual de

verbas no Orçamento do Estado para este fim.

A iniciativa do PCP responde a três questões centrais: a progressão da redução dos custos de transportes

públicos no sentido da gratuitidade, a abrangência nacional dessa gratuitidade e o reforço do serviço que deve

ser assegurado.

Garantir o futuro da concretização da redução dos preços nos transportes assim como o alargamento da

sua oferta em todo o País exigem o reforço do financiamento sem que isso se traduza, obviamente, no

aumento de preços às populações.

Assim, o PCP propõe a redução da contribuição do serviço rodoviário no valor correspondente ao que

passa a ser realizado por via da contribuição de serviço público de transportes públicos, permitindo, de forma

célere, estabelecer o mecanismo duradouro de financiamento do PART.

Com esta proposta é assegurado que não há aumentos da carga fiscal, mantendo o montante total das

taxas nos valores atuais, direcionando uma parte dos recursos do transporte público para o financiamento do

PART.

A redução proposta para a contribuição do serviço rodoviário não compromete as necessidades de

financiamento da IP (Infraestruturas de Portugal), desde logo porque o Governo a pode compensar através do

Orçamento do Estado, mas fundamentalmente porque devem ser acionadas respostas de fundo,

nomeadamente: a de enfrentar o problema das PPP (parcerias público-privadas) rodoviárias, interrompendo o

ciclo vicioso de despesa pública no negócio ruinoso para o Estado e para o interesse público; a adoção de

uma política de financiamento que garanta a estabilidade, a previsibilidade, a perspetiva futura de investimento

e de desenvolvimento nas infraestruturas; e a reversão da fusão da Estradas de Portugal (EP) e da REFER

(Rede Ferroviária Nacional), que revelou ser desastrosa.

Persistem problemas na implementação do PART, problemas que não ignoramos e que exigem uma

resposta concreta, designadamente a necessidade de assegurar a sua cobertura em todo o território. As

populações da região do interior continuam a confrontar-se com problemas de custos e com a quase

inexistente rede de transportes públicos, situação que deve ser revertida para que tenham acesso a uma

adequada oferta de transporte público, a preços acessíveis, garantindo assim o seu direito à mobilidade.

Persistem igualmente problemas no que diz respeito às ligações entre regiões, com os tarifários nessas

ligações a não refletirem ainda, adequadamente, as reduções que desde o início defendemos, sem

discriminações, e em particular porque o Governo, enquanto autoridade de transportes com competência no

setor ferroviário, não tomou as medidas necessárias para garantir o financiamento dessa redução tarifária.

Em todo o País há a necessidade de reforçar a oferta de transportes, com mais disponibilidade, qualidade,

regularidade. O que existe exige um investimento sério não só nas infraestruturas e frotas, mas, desde logo,

na contratação dos trabalhadores necessários nas diversas áreas.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, há condições para irmos mais longe com a aprovação da proposta

do PCP, assegurando o adequado financiamento do PART para que chegue a todo o território efetivamente,

para que se avance na redução de preços até à sua gratuitidade e no alargamento da oferta da rede dos

transportes públicos.

Aplausos do PCP e do PEV.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de lei do PAN, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Silva.

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 aponta como potencial de redução de emissões em 2030 no setor dos transportes entre 43%

a 46%, face a 2005, e afirma, e passo a citar, que «A descarbonização do setor dos transportes será

alicerçada fundamentalmente no reforço do papel do sistema de transporte público e na substituição dos

atuais veículos a combustíveis fósseis por uma frota essencialmente elétrica».

A necessidade e urgência da descarbonização do setor dos transportes tem como solução, em grande

medida, e conforme salientado no Roteiro de Neutralidade Carbónica para 2050, a aposta no aumento da

utilização dos transportes coletivos.

Os dois programas que apreciamos pretendem, precisamente, atrair pessoas para o uso do transporte

coletivo em detrimento do transporte particular.

O PART, ao permitir a redução do preço de utilização dos transportes coletivos, constitui um incentivo ao

seu uso. Contudo, o País necessita de tornar o uso de transportes coletivos mais atrativo, através do aumento

da oferta e melhoria da qualidade e intermodalidade, objetivo a que o PROTransP pretende responder.

Para que os objetivos de descarbonização do setor sejam efetivamente ambiciosos e alcançados já em

2030 é fundamental, nesta fase, avaliar os resultados do PART e do PROTransP, de forma a que se possa

saber como melhorar ambos os programas e alcançar os objetivos de reforço do uso de transportes coletivos e

redução do uso de transportes privados.

Em função da avaliação efetuada, o Governo deverá propor à Assembleia da República a adoção de

medidas devidamente fundamentadas que permitam reforçar e aumentar a eficácia dos programas PART e

PROTransP.

Estamos a menos de sete anos do ponto de não retorno da estabilidade climática do nosso planeta. O setor

dos transportes representa 25% dos gases com efeito de estufa. Não podemos continuar a fazer de conta que

apostamos na descarbonização deste setor sem fazer uma aposta grande e efetiva nos transportes coletivos,

para que as pessoas sintam que têm efetivamente condições para abandonar o transporte particular.

E fazer de conta é o lema deste Governo. Num momento em que temos de ser cada vez mais ambiciosos

na ação climática e em que ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro defender a descarbonização por aí fora, o que fez

o Governo no Orçamento do Estado para 2022? Baixou as verbas dedicadas ao PART e ao PROTransP em

140 milhões de euros, face a 2021, ou seja, reduziu em mais de 40% as verbas dedicadas à aposta nos

transportes coletivos em Portugal. Já para subsidiar o uso de produtos petrolíferos e as empresas elétricas, o

Governo continua a usar centenas de milhões de euros dos contribuintes.

Sr.as e Srs. Deputados, sim, temos um Governo especialista em lavagem verde em Portugal, um Governo

que diz que a ação climática é uma prioridade e que faz precisamente o contrário. E isto não pode continuar

assim. O investimento nos transportes públicos é essencial para uma efetiva descarbonização e mitigação das

alterações climáticas e o PAN continuará a exigir estes compromissos para o bem do futuro do País e para o

nosso futuro neste planeta.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, pelo CDS-PP, o Sr. Deputado João Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As iniciativas que hoje o PCP e o PAN aqui nos trazem, referentes ao Programa de Apoio à Redução Tarifária, têm objetivos

diferentes e merecem, da nossa parte, também análises diferentes.

Começo pelo projeto do PAN, que é mais simples, uma avaliação da aplicação deste tipo de programas,

não só do PART, mas também do PROTransP e das suas consequências. Até porque essa aplicação tem sido

assimétrica, não é igual em todas as regiões do País, e também não podia ser porque — e é importante dizer-

se — a realidade do transporte público é muito assimétrica ao longo do território nacional e o facto de termos

uma grande concentração de população nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto faz com que, às

vezes, haja uma ideia no País de que a realidade do transporte público é aquela que existe em Lisboa e no

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Porto, quando é exatamente o contrário, essa realidade só existe mesmo nas Áreas Metropolitanas de Lisboa

e do Porto.

Discutindo-se esta matéria, não deixamos de dizer aquilo que dizemos sempre: uma das grandes

preocupações relativamente ao transporte público em Portugal deve ser a de conseguir generalizar a todo o

território nacional a possibilidade de dispor desse transporte público, o que não acontece hoje em dia.

O PAN propõe essa monitorização, chamar-lhe-ia assim. Do nosso de vista, nada contra, a não ser que

aquilo que aponta o projeto de lei, a criação de um grupo de trabalho, crie encargos adicionais, que devem ser

aplicados no transporte público e não na burocracia associada a isso; portanto, se assim não for, não temos

nada contra.

Relativamente ao PCP, a questão é diferente. O PCP quer consagrar uma solução definitiva, e aí,

responsavelmente, faz toda a estrutura de financiamento dessa realidade definitiva para a redução tarifária e

para o seu financiamento.

É aí que encontramos os problemas, porque não basta dizer que através da redução da contribuição para

serviço rodoviário se consegue financiar uma nova contribuição de serviço público de transportes e que isso

não tem impactos financeiros. Bom, tem impactos. Numa altura em que a grande discussão, do nosso ponto

de vista, é a redução da carga fiscal sobre os combustíveis, dizer que não aumenta a carga fiscal é dizer que a

mantém. Nós somos completamente contra isso e achávamos que o PCP também seria, porque ouvimos o

PCP dizer que também iria propor ao Governo a redução da carga fiscal sobre os combustíveis. Ora, se está

agora a consagrar, aqui, uma estagnação daquilo que é a contribuição do serviço rodoviário, ainda que lhe

chame oura coisa, está a fazer exatamente o contrário e isso nós não podemos apoiar.

Por outro lado, o PCP diz também uma coisa extraordinária, diz que reduzir a contribuição de serviço

rodoviário não afeta o orçamento da Infraestruturas de Portugal e nós vamos ver, então, porque é que não

afeta. Não afeta, ao bom estilo do PCP, porque o Orçamento do Estado está lá para cobrir aquilo que sai da

contribuição do setor rodoviário, portanto, sai do orçamento da Infraestruturas de Portugal e entra através do

Orçamento do Estado. Portanto, tudo aquilo que o PCP tinha dito anteriormente sobre não aumentar a carga

fiscal vai por água abaixo, porque, obviamente, se o Orçamento do Estado tem de aumentar para financiar,

não há outra forma de este dinheiro vir que não seja por aumento da carga fiscal e por os portugueses

pagarem mais impostos.

Portanto, o que temos a dizer relativamente ao projeto do PCP é que toda a estrutura financeira que aqui é

proposta…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente. É insustentável e a única maneira que havia de a sustentar era aumentar a oneração fiscal sobre os

portugueses, o que não apoiaremos, de forma alguma.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do BE.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas: Debatemos hoje, aqui, um tema relevante, na medida em que falamos da aposta nos transportes públicos, a sua progressiva gratuitidade,

o aumento da oferta, que tem um impacto absolutamente fundamental no combate às alterações climáticas,

em particular nos grandes centros urbanos, tal como também tem um impacto muito positivo nos rendimentos

das famílias.

Aliás, se no início deste processo da criação do Programa de Apoio à Redução Tarifária houve reserva

quanto a uma proposta com as características que referi, na verdade, os resultados acabaram por demonstrar

e por provar que aqueles e aquelas que diziam que viria uma hecatombe com a redução dos preços estavam

completamente errados. Aliás, em 2019, ano da implementação do PART, por exemplo, em Lisboa, mais de

150 mil novos passes foram vendidos na Área Metropolitana e no total nacional houve mais 22% de passes

vendidos, só nos primeiros seis meses.

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Portanto, apesar do atraso na publicação do relatório de avaliação do PART, o programa acabou por

demonstrar não só um substancial aumento do número de pessoas a utilizar o transporte público, mas também

demonstrou uma importante redução de emissões, que é um objetivo central neste tipo de medidas e que deve

ser continuado. Sendo um programa financiado, neste momento — e bem, parece-nos a nós —, pelo fundo

ambiental, desde a sua criação que, nos vários Orçamentos do Estado, tem sofrido alterações para aumentar

o valor da verba destinada tanto para o PART como para o PROTransP, coisa, que, aliás, teria de voltar

acontecer, visto que a proposta atual do Orçamento do Estado volta a ter um valor inferior ao que tinha no ano

anterior.

Isto também aconteceu porque desde cedo se percebeu a necessidade de um forte investimento em

política tarifária e na criação e reforço da rede onde ela não existe, nomeadamente nas regiões do interior e no

apoio às comunidades intermunicipais, que são aquelas que têm mais dificuldade.

Portanto, tendo começado como uma ideia algo tímida por parte do Governo, a verdade é que se

conseguiram avanços nos vários Orçamentos, com aumento de verbas alocadas ao programa e a expansão a

todo o território. Mas há ainda alguns desafios, como, por exemplo, a redução tarifária para os movimentos

entre comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas ou entre comunidades intermunicipais diferentes,

pois sabemos que ainda não existe esta integração de passes, ou, então, a falta de oferta no interior do País.

Estes são os principais desafios que ainda temos pela frente e, portanto, parece-nos que é preciso avançar

para a integração dos passes neste tipo de deslocações, bem como a articulação e também a integração dos

passes da CP (Comboios de Portugal), que ainda não acontece em muitas regiões, ainda nem todas as

autoridades de transporte o fizeram, pelo que é preciso continuar a alavancar este esforço.

Neste momento, os projetos de lei que estão hoje, aqui, em debate prendem-se, no caso do projeto do

PCP, com a continuidade e com uma forma de financiamento permanente deste programa, sendo o do PAN é

ligeiramente diferente.

O PCP reapresenta, na realidade, um projeto que já havia apresentado anteriormente, sobre o qual não

houve oportunidade de debate e, de facto, do nosso ponto de vista, o fundo ambiental deve ser o instrumento

primordial do financiamento deste tipo de políticas. Aliás, considerando o seu objetivo, o seu âmbito, a razão

pela qual foi criado, faz sentido que assim seja e, portanto, parece-nos relevante manter as verbas deste

fundo. Apesar disso tudo, estamos abertos às formas mais permanentes de financiamento, que possam estar

menos dependentes de uma decisão anual que é tomada no Parlamento, para assegurar esta estabilidade no

serviço público de transportes.

Temos aqui, de facto, algumas questões, que podem ser esclarecidas, nomeadamente de que forma é que

a solução preconizada no projeto do PCP é ou não uma receita própria, considerando que mantém esta

contribuição no fundo ambiental, que já é o que financia o PART. Portanto, gostávamos apenas de esclarecer

esta matéria.

Para terminar, quanto ao projeto do PAN, ele levanta-nos algumas dúvidas, especialmente quanto à forma

como é apresentado. Quando propõe, em forma de projeto de lei, um estudo parece-nos que está a ignorar a

obrigatoriedade, que na verdade já existe na lei, de avaliação do PART, de forma anual. Aliás, o relatório de

avaliação do impacto do PART foi inscrito na lei, portanto, já é obrigatório. E se atualmente temos os dados é

porque esse relatório existe e não me parece que fará muito sentido, sendo redundante, existir esta proposta

no projeto do PAN.

Depois, no outro artigo, deixa apenas para o Governo a possibilidade da apresentação de medidas de

reforço,…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente. … sem explicar exatamente o que é. Parece-nos haver aqui uma indeterminação muito grande,

especialmente para um projeto de lei.

Portanto, para terminar, acompanharemos, de facto, as propostas que forem sendo apresentadas neste

Parlamento que tenham como objetivo um benefício claro e inequívoco do reforço destes dois programas,

porque é esse caminho que temos feito e é esse o caminho que vamos continuar a fazer.

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Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra, pelo PS, o Sr. Deputado André Pinotes Batista.

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Sr. Presidente, começo, antes de mais e na sua pessoa, por saudar todos os Colegas e deixar uma saudação particular a quem nos trouxe hoje, a esta Casa, o Projeto de Lei n.º

9/XIV/1.ª, do PCP, e o Projeto de Lei n.º 964/XIV/3.ª, do PAN, que visam, nomeadamente, as questões que

têm que ver com o financiamento, com a monitorização e com a fiscalização do Plano de Apoio à Redução

Tarifária, mas também do PROTransP.

É muito importante que comecemos por uma referência de superior importância no momento político que

vivemos.

A Sr.ª Deputada do PCP teve a oportunidade de saudar, justamente, o papel dos trabalhadores, o papel

das comunidades de utentes, o papel da luta de muita gente, mas não sublinhou — e eu queria fazê-lo — o

papel que esta Casa teve, o papel do Parlamento, no mais revolucionário pacote de redução dos transportes

públicos.

Aliás, por uma questão de justiça, diria que não é só o papel da Assembleia da República, é o papel dos

partidos de esquerda na Assembleia da República, que demonstram que quando a esquerda está unida,

quando a esquerda está coesa nestes objetivos, isso faz uma diferença na vida das pessoas.

E nós sabemos, Srs. Deputados — nomeadamente os Deputados de esquerda que operaram esta

revolução, do Bloco de Esquerda, do PEV, do PAN, do PCP, do PS —, que se olharmos para um outdoor onde

conste Rui Rio ou Paulo Rangel, onde conste Nuno Melo ou Francisco Rodrigues dos Santos, onde conste

João Cotrim de Figueiredo ou André Ventura, não será deles a resposta para o transporte público, não será

deles, aliás, a resposta para a mobilidade social, que é algo que, a nós, nos diz muito.

Mas é relevante irmos a cada uma destas medidas.

Naquilo que diz respeito à iniciativa do PAN, diríamos que o espírito da proposta é de louvar. No entanto,

não podemos ignorar que o IMT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes) já apresenta um relatório anual,

que é aquele em que nos baseamos. São daí as informações que aqui trazemos quando falamos da redução

dos gases de efeito de estufa, quando falamos do aumento de passageiros na Área Metropolitana de Lisboa,

na Área Metropolitana do Porto, nas 21 CIM (comunidades intermunicipais), no número de passageiros

transportados. Conhecemos tudo isso porque existe uma informação detalhada, de âmbito nacional e regional.

O Sr. Deputado sinaliza, e com razão, que podemos ir mais longe na abrangência. Não entendemos, no

entanto, que isso deva ser feito sob a forma de letra de lei, até porque, na audição que fizemos nesta mesma

Casa, tivemos a oportunidade de instar o IMT, que recebe das autoridades de transportes a informação, a que

pudesse ser mais abrangente. E temos satisfação nesta legislação mais modernizada, que não só impõe os

caminhos a fazer, como vai dando ao Parlamento as informações de que precisamos. Portanto, entendemos

como redundante a iniciativa, apesar de lhe louvarmos o espírito.

No que diz respeito à iniciativa do PCP, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista gostaria de iniciar por

dizer que é favorável, por princípio, à perenidade das fontes de receita do PART e do PROTransP. Esse é,

aliás, um caminho que tem de ser trilhado. Não entendemos que ela possa ser feita com desequilíbrio de

outros organismos e empresas públicas, nomeadamente da IP. Senão, vejamos: quando falamos na criação

de uma contribuição de serviço público que iria buscar um terço da atual contribuição para o serviço rodoviário,

o que estamos a dizer é que, dos 675 milhões que estão previstos no Orçamento para 2022 para a IP, iríamos

retirar 225 milhões. É, pois, evidente que existe um impacto.

Aduz o Partido Comunista que poderíamos aumentar a dotação orçamental. Pois é evidente que o

poderemos sempre fazer, mas o Partido Socialista não prescinde do rigor nas boas contas e, como tal, temos

sempre de nos questionar a nós próprios e a todos os demais colegas se estamos a falar de um aumento da

despesa que é para ser coberto com mais impostos ou se estamos a falar de um aumento de despesa que é

para ser feito com sacrifício de outros serviços públicos.

Portanto, diria que estamos de acordo com o princípio. É, aliás, um caminho que consideramos inevitável.

Não podemos é considerar que seja através da redução das PPP que isso vá acontecer porque sabemos,

hoje, que, também por ação da maioria de esquerda, os encargos com PPP têm vindo a reduzir-se, entraram

numa trajetória de redução que até 2036 será bastante assinalável, continuada e estável. Essas margens que

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vão sendo libertas vão sendo reaplicadas, mas não podemos dizer que é apenas num momento, em 2022, que

virá o financiamento.

A questão que se coloca é, pois, uma questão de equilíbrio na formulação e na arquitetura da solução que

desejamos, por uma razão muito simples: hoje, sabemos que a direita passou a ser a favor daquilo a que, no

passado, votou contra. Acontece, quando a esquerda se une para trazer mais sustentabilidade ambiental,

melhor serviço público, mais qualidade de vida, mais rendimentos, a direita começa por dizer que não, começa

por gritar e clamar por irresponsabilidade, mas quando a medida é um sucesso, cá estão para dizer: «Afinal,

nós votámos contra, mas queríamos votar a favor».

Independentemente dos sentidos de voto de cada um, o PART e o PROTransP são uma realidade que

apenas teve uma interrupção, que foi a pandemia, e que nos fez, aliás, refletir bastante. Mas há uma questão

que é muito mais importante do que a arquitetura desta medida e que tem que ver com o seguinte: nós

sabemos e os portugueses sabem que é mesmo à esquerda, é mesmo só pela esquerda que podemos fazer

este caminho e é, pois, muito importante que nos possamos continuar a centrar no diálogo, porque foi com o

diálogo da esquerda, foi com ambição da esquerda, foi com o papel deste Parlamento, que conseguimos a

maior transformação do transporte público, a mais sustentável medida e aquela que mais justiça social trouxe.

É, pois, um caminho que, à direita, não fazemos e, à esquerda, cá estaremos para continuar.

Aplausosdo PS.

OSr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mariana Silva, do PEV.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes consideram que é importante a discussão sobre os transportes públicos e saudamos o facto de estarmos a discutir, de novo, a

questão do Programa de Apoio à Redução Tarifária, prosseguindo uma ação de décadas em que nunca

desistimos de lutar pelo objetivo de assegurar a todos os cidadãos o direito à mobilidade.

Nesse sentido, o Partido Ecologista «Os Verdes» tem vindo a defender um conjunto de medidas, como o

aperfeiçoamento e o alargamento do passe social intermodal, preços socialmente justos, aumento da oferta,

da qualidade, do conforto e da segurança dos transportes coletivos, com horários ajustados às necessidades

das populações, a contratação dos trabalhadores necessários e o combate à privatização do setor dos

transportes. Em suma, tem vindo a defender que se faça um investimento sério nos transportes públicos.

Consideramos que é mesmo necessário incentivar as pessoas a optarem pelo transporte público coletivo e

o Programa de Apoio à Redução Tarifária foi uma das mais importantes medidas, dos últimos anos, no plano

social, com poupanças muito significativas para as famílias, mas, sobretudo, no plano ambiental.

Com a redução do preço e o alargamento do âmbito do passe social, houve milhares de viaturas que

deixaram de entrar nas cidades. Os efeitos da pandemia e do medo que foi promovido nos últimos meses

podem significar retrocessos que é urgente combater. O caminho da descarbonização, da sustentabilidade, do

respeito e proteção do planeta passa, obrigatoriamente, pela promoção da mobilidade coletiva, pelo

desenvolvimento do transporte ferroviário, fazendo-o chegar a todas as capitais de distrito, com preços

acessíveis, pela potencialidade que tem na fácil e rápida mobilidade dos cidadãos, na mitigação das

alterações climáticas e no combate às assimetrias regionais, aproximando as diferentes localidades do País,

tornando-o mais próximo.

Após muitos anos de lutas a reivindicar a redução do preço dos transportes, o PART nos transportes

públicos foi criado através do Orçamento do Estado para 2019, representando uma significativa redução do

preço dos transportes, sobretudo com maior alcance nas áreas metropolitanas, dando resposta a uma

reivindicação antiga das populações, dos utentes e das autarquias.

Este era o passo decisivo que faltava e, para que esta medida seja inteiramente bem-sucedida e se

concretize a mudança de paradigma por que lutamos há muito, importa, agora, que as reduções tarifárias

atinjam todo o seu potencial e se prossiga o caminho até à gratuitidade, para que haja efetivamente uma

aposta na promoção dos transportes públicos, concretizando o direito à mobilidade e contribuindo para o

combate às alterações climáticas e para a coesão territorial em todo o País.

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No entanto, os níveis de investimento nos transportes públicos não são ainda suficientes e não respondem

cabalmente aos interesses das populações de todo o País. E não podemos ignorar que a oferta de transportes

públicos fora das áreas metropolitanas, quando existe, é muito reduzida face às necessidades — Os Verdes já

o relembraram vezes sem conta —, empurrando milhares de cidadãos para o transporte individual por falta de

alternativa.

Estabelecer o regime de financiamento permanente do Programa de Apoio à Redução Tarifária nos

Transportes Públicos é o caminho, consolidando as decisões tomadas até aqui.

Aplausosdo PCP.

OSr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Mendes, do PSD.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PART, visando atrair passageiros para o transporte público, procura igualmente combater as externalidades negativas associadas à

mobilidade e à exclusão social.

Ao nível do financiamento, e conforme legislado, é necessário apoiar as autoridades de transporte com

uma verba anual que lhes permita operar um criterioso ajustamento tarifário e da oferta, através de um

mecanismo que fomente coesão territorial e com um modelo de financiamento que garanta a equidade entre

as Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto e o restante território nacional.

O projeto de lei do PAN, em debate, visa o reforço e avaliação da implementação e execução do Programa

de Apoio à Redução do Tarifário dos Transportes Públicos e do Programa de Apoio à Densificação e Reforço

da Oferta de Transporte Público, no contexto das metas da descarbonização para 2030 e neutralidade

carbónica em 2050. Ou seja, o PAN propõe que se estude a eficácia das medidas em vigor, os recursos

financeiros afetos e a relação custo-benefício para se decidir, eventualmente, novas medidas de reforço do

uso do transporte coletivo e do seu financiamento.

A iniciativa legislativa do PCP, também em debate, é pragmática e objetiva, pretendendo estabelecer um

regime de financiamento sustentável do Programa de Apoio à Redução Tarifária nos Transportes Públicos,

com a criação da contribuição de serviço público de transportes públicos, sendo esta receita consignada ao

financiamento do PART.

Em suma, o PCP estipula que um terço do valor da comparticipação de serviço rodoviário passará a ser

afeta ao PART. Suportada pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos,

esta receita será integrada no Fundo Ambiental e distribuída, anualmente, pelas autoridades de transporte.

Sr.as e Srs. Deputados, sendo a história filha do seu tempo e a experiência a mãe de todas as coisas, o

Grupo Parlamentar do PSD constata que a problemática da sustentabilidade financeira do PART passou a

preocupar outras forças políticas, por coincidência, ou não, com o debate do Orçamento para 2022. Ainda

agora, há poucos minutos, observámos o Sr. Deputado do Partido Socialista André Pinotes Batista a piscar o

olho à esquerda, neste contexto de necessidade de aprovação do Orçamento para 2022. O PCP percebeu,

agora, tarde, que as reservas do PSD à aprovação do PART, à época, faziam sentido, embora politicamente

pouco simpáticas, porque este Programa, merecedor da concordância do PSD nos seus fins e objetivos, ficava

muito aquém do desejável em termos de coesão e sustentabilidade.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — É verdade!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Como sempre afirmámos, o PART enfermava de três problemas, que, mais dia menos dia, seriam incontornáveis, a saber: primeiro, o PART não é equitativo — as regiões mais

beneficiadas são as áreas metropolitanas, em especial a de Lisboa, contrariamente à generalidade do País,

conforme comprovado no último Relatório de Avaliação do Impacto do PART pelo IMT. Só a Área

Metropolitana de Lisboa recebeu 70% de todas as verbas do PART do País, com uma capitação de 26,5

€/habitante, contrariamente ao resto do País, nomeadamente o Alto Minho, que recebeu menos de 3

€/habitante.

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O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Exatamente!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Segundo, o PART não é socialmente justo — passámos a ter portugueses de primeira, os que vivem nas áreas metropolitanas, e portugueses de segunda, os que vivem no

resto do País.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Exatamente!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Por fim, o PART nunca garantiu a sua sustentabilidade, pressuposto fundamental e que deveria ter sido assegurado para não comprometer este programa.

Contudo, Sr.as e Srs. Deputados, a proposta virtuosa do projeto lei do PCP, procurando resolver a

sustentabilidade do PART, cria um novo problema, porventura, ainda mais grave, à empresa Infraestruturas de

Portugal, ao privar esta de parte das suas fontes de financiamento, que o PCP considera facilmente

ultrapassável pelo Orçamento do Estado ou revisão das PPP. Ou seja, o PCP ainda acredita que existem

almoços grátis!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Como a realidade ultrapassou a ficção, muitas das observações e sugestões da ANMP (Associação Nacional de Municípios Portugueses), algumas vertidas nas conclusões do

relatório do IMT sobre o PART, vêm ao encontro das preocupações do PSD, embora reconheçamos o

contributo positivo do PART na atração de mais passageiros para o sistema público de transportes.

Em suma: urge concretizar um programa de investimento que priorize o transporte coletivo e público, com o

aumento da oferta em quantidade e qualidade, promovendo o desenvolvimento económico e social e a coesão

territorial; é imperioso reforçar os montantes afetos ao PART, de forma a assegurar a capacidade de

financiamento das autoridades de transportes em todo o País, eliminando a máxima atual «um País, duas

realidades»; finalmente, a solução para a sustentabilidade financeira do PART não pode ser alcançada à custa

de mais impostos nem da subtração de receita de outras entidades, cuja atividade é fundamental para a

coesão territorial e desenvolvimento do País.

Aplausosdo PSD.

OSr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, com o tempo de que ainda dispõe, o Sr. Deputado Nelson Silva, do PAN.

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de deixar aqui algumas notas do que foi o debate.

Em primeiro lugar, Sr. Deputado André Pinotes Batista, o PAN não é um partido de esquerda, também não

é um partido de direita, mas, como partido moderado e de pontes, havemos de negociar até ao último minuto,

até ao último segundo.

Depois, em particular, claramente, quanto a algumas críticas de redundância que foram feitas, não se

soube distinguir o que é um relatório de um estudo. O que o PAN propõe não é um relatório. O que o PAN

propõe é um estudo sério, aprofundado, para perceber se foi através do PART que as pessoas que utilizam os

transportes públicos abandonaram o seu transporte particular, ou não, porque não esqueçamos que este é o

principal motivo da existência do PART, algo que o PAN, obviamente, apoia e para o qual quer um

financiamento maior, mas quer, também, um financiamento mais responsável, mais equitativo, e que também

vá para áreas que não sejam só as Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Creio que podemos passar ao encerramento deste debate. Para esse efeito, tem a palavra, pelo PCP, a Sr.ª Deputada Paula Santos.

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, no fim deste debate, gostaríamos ainda de acrescentar o seguinte: a proposta que aqui trazemos relativamente ao PART e à necessidade do

reforço do seu financiamento, para avançarmos no sentido da redução tarifária dos transportes públicos e

alargamento da oferta, é um bom exemplo das respostas que são necessárias dar para os problemas com que

os trabalhadores, o povo e o País estão confrontados.

Aliás, trouxemos hoje a debate esta matéria, mas poderíamos falar de muitas outras, e a questão, de facto,

está em sabermos qual é a resposta que se pretende efetivamente dar às populações perante estes

problemas, se é deixá-los à mercê das opções dos partidos de direita. Nós consideramos que não.

Se fosse pelo PSD e pelo CDS, hoje, não haveria um passe social com preços muito mais reduzidos,

haveria trabalhadores a continuar a pagar passes na ordem dos 100 € ou dos 150 €. De facto, esta redução foi

muito significativa, não só do ponto de vista do rendimento disponível das famílias e dos trabalhadores, mas

também na opção pelo transporte público.

Temos um problema: é necessário articular as ofertas dos vários operadores de transporte público, é

necessário reforçar a oferta de transporte e não estamos a falar somente das áreas metropolitanas.

Consideramos que estas medidas têm de ser transversais a todo o País e que o alargamento da rede de

transportes públicos deve, de facto, ser feito a nível nacional, como elemento de coesão, mas também como

elemento que contribui para a melhoria das acessibilidades e da mobilidade das populações. Esta é a questão

central, porque à redução do tarifário, que é necessário assegurar para todo o País, é preciso adicionar o

aumento da oferta.

Para terminar, gostaria de dizer o seguinte: não têm faltado propostas por parte do PCP — porque este foi

um elemento invocado aqui na discussão — para aumentar a receita, inclusivamente a do Estado. Temos

apresentado várias para tributar os grupos económicos e o grande capital, mas o que vemos é uma

convergência para impedir essas propostas. Mesmo a reversão das PPP é algo de muito significativo, porque

permitiria a canalização de recursos públicos que, em vez de irem para os grupos económicos, seriam

investidos, neste caso concreto, por exemplo, na melhoria dos transportes públicos.

Não iremos acompanhar a iniciativa do PAN porque a prioridade é, efetivamente, avançar no sentido da

redução dos custos e alargar a rede de transportes públicos e, como todos sabemos, é necessário esse

alargamento porque em muitas regiões ela é muito insuficiente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira terminar, Sr.ª Deputada, por favor.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente. As propostas que o PCP aqui traz são uma boa base de trabalho para se poder avançar ao encontro de

soluções que permitam a consolidação deste programa e que ele possa progredir nestes objetivos: avançar na

redução tarifária até à sua gratuitidade e alargar a oferta de transporte público, tão importante que é para o

desenvolvimento do nosso País.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos passar agora ao quinto ponto da ordem de trabalhos, a discussão conjunta do Projeto de Deliberação n.º 2/XIV/1.ª (CDS-PP) — Sessão evocativa do dia 25 de

Novembro e dos Projetos de Resolução n.os 70/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que proponha ao

Sr. Presidente da República a atribuição da Ordem da Liberdade às personalidades que contribuíram

decisivamente para o triunfo da democracia e da liberdade a 25 de Novembro de 1975 e 45/XIV/1.ª (CH) —

Pela instauração da celebração solene do 25 de Novembro.

Para apresentar os projetos do CDS, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero responder a uma pergunta, que é o porquê de discutirmos hoje este projeto.

Normalmente, em muitas sessões legislativas, há a dificuldade de a discussão deste projeto poder coincidir

com a própria data, ou seja, o dia 25 de Novembro, e este ano não será exceção, porque muitas vezes

estamos em trabalhos orçamentais.

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Em segundo lugar, a razão por que apresentamos estes dois projetos é porque a data de 25 de Novembro

é não só uma data histórica como uma data decisiva no processo democrático em Portugal.

Respondendo por antecipação ao fim de muitos debates sobre esta matéria, convém sublinhar que, do

nosso ponto de vista, a evocação do 25 de Novembro em nada diminui a importância, o peso, a solenidade e a

relevância que tem, como dia de celebração da liberdade e da democracia, o dia 25 de Abril. Nada! Uma coisa

não obsta à outra.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A 25 de Abril, pela ação determinada e corajosa dos Capitães de Abril, dos militares que com eles estiveram e do povo que a eles se juntou nas ruas de Portugal, caiu um regime

autoritário e caduco. Iniciou-se uma revolução.

No dia 25 de Novembro, garantiu-se, mais uma vez através da ação de militares moderados e corajosos —

lembro um que se sentou aqui tantos anos connosco, na bancada do Partido Socialista, Marques Júnior, um

homem do 25 de Abril, um homem do 25 de Novembro e um grande parlamentar —, que a revolução iniciada

seria para uma democracia pluralista e de modelo ocidental, abrindo caminho para a Constituinte e para a

própria Constituição de 1976.

O 25 de Novembro marcou o fim do PREC (Período Revolucionário em Curso), ou seja, marcou o fim do

«verão quente», que passou, a partir dali, a ser um outono suave e democrático.

Antes tínhamos tido o cerco do Parlamento, um governo em greve, os atentados bombistas, e foi a ação

destes militares que garantiu a vitória daqueles que impuseram que Portugal fosse uma democracia como é

hoje e não uma ditadura ao estilo cubano, albanês ou norte-coreano. Foi isso que o 25 de Novembro

determinou.

Alguns, mesmo alguns ligados ao 25 de Novembro, dizem-nos: «Não devemos celebrar o que nos divide.»

Eu perguntaria: divide?! Não, não nos divide, estamos aqui todos, das bancadas mais à esquerda às bancadas

mais à direita, estamos aqui por causa do 25 de Novembro. O 25 de Novembro não nos divide, junta-nos,

junta-nos nesta Sala, junta-nos à volta da democracia.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Quem pode estar contra? Quem pode sentir essa divisão? Serão, obviamente, alguns nostálgicos do PREC ou alguns que têm o saudosismo de pensar que teria sido bom que

Portugal se tivesse transformado numa ditadura comunista, substituindo uma ditadura por outra.

O que é que propomos? Propomos duas coisas muito simples. Primeiro, uma sessão evocativa. Já houve

quem defendesse mais do que isso, quem defendesse uma sessão solene anual, quem defendesse, até, um

feriado, mas aquilo que trazemos hoje é, também desse ponto de vista, moderado: uma sessão evocativa,

uma sessão sob a forma que o Parlamento venha a decidir, sob o modelo que esta Câmara venha a decidir,

mas que, ano após ano, recorde essa data história, importante e decisiva.

Por outro lado, propomos que as personalidades que estiveram envolvidas no 25 de Novembro sejam

distinguidas, que seja proposto ao Sr. Presidente da República distinguir com a Ordem da Liberdade muitas

dessas personalidades. Muitas delas foram distinguidas, a vida distinguiu-as: Mário Soares, Sá Carneiro,

Freitas do Amaral, Ramalho Eanes — que foi Presidente da República —, o heroico Coronel Jaime Neves,

Tomé Pinto. Muitos deles merecem ser homenageados e distinguidos, mas também, se calhar, aqueles que,

de forma mais anónima, estiveram no 25 de Novembro, personalidades civis e militares, lembrando, por

exemplo, que houve dois jovens comandos, José Coimbra e Joaquim Pires, que foram mortos a subir a

Calçada da Ajuda com o Regimento de Jaime Neves. Todos esses, todos aqueles que fizeram o 25 de

Novembro, merecem essa distinção, merecem ser evocados como heróis da liberdade que são.

Aplausos do CDS-PP, do CH e do IL.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto do partido Chega, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

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Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A 25 de Abril de 1974 caiu um regime que já pouco dava aos portugueses, mas foi a 25 de Novembro que o 25 de Abril se cumpriu plenamente.

O que aconteceu a 25 de Novembro foi não só a restauração da liberdade como a sua efetivação plena, do

sonho que tinha sido uns meses antes o pensamento dos militares de Abril. Não há 25 de Abril sem 25 de

Novembro.

Por isso, Sr. Deputado Telmo Correia, talvez a nossa proposta seja um pouco mais ambiciosa do que a

proposta do CDS. Nós queremos um feriado a 25 de Novembro e uma sessão evocativa a 25 de Novembro.

Se não fosse o 25 de Novembro, provavelmente, hoje o Parlamento acabaria nesta linha que está aqui à

minha frente. Nada disto existiria neste Parlamento e acho que todos, à esquerda e à direita, reconhecem a

importância do pluralismo e da liberdade na sociedade em que vivemos hoje.

O que aconteceu a 25 de Novembro foi a efetivação plena do que teria sido o 25 de Abril que não tivesse

originado o PREC, que não tivesse originado a contenção e a eliminação da economia liberal, que não tivesse

acabado com as liberdades e que não tivesse proposto o fim da liberdade de imprensa. A 25 de Novembro

efetivámos, com a memória e a história de muitos, como do Presidente Ramalho Eanes, a História de Portugal

tal como a celebramos hoje, em democracia.

Alguns dizem que a história é divisiva e que, por isso, não devemos celebrar datas divisivas. Mas celebrar

o 25 de Abril sem o 25 de Novembro é dizer a uma parte do País que está errada e à outra parte que está

certa.

Quando todos celebramos a liberdade devemos fazê-lo por todos e para todos e não apenas para uma

parte da sociedade que, no 25 de Abril ou no 25 de Novembro, conseguiu triunfar. Este Parlamento é de todos,

de todos os portugueses que se reviram ou não no 25 de Abril e no 25 de Novembro. É de todos, daqueles

que gostaram e dos que gostaram menos. É daqueles que estão lá fora, dos que gostam e dos que não

gostam das forças políticas que aqui estão.

Dizer «sim» ao 25 de Novembro é dizer «sim» ao enorme pluralismo que há hoje na sociedade portuguesa,

é exigir e ter coragem de fraturar com a extrema-esquerda mais agressiva que temos em Portugal e que quer

fazer um revisionismo histórico que nunca se viu na nossa história; é termos a coragem de dizer que é por

essa liberdade que estamos aqui hoje e é por essa liberdade que podemos celebrar a democracia portuguesa.

Sr. Presidente, vou terminar esta intervenção pedindo o seguinte: nós estamos há décadas a olhar para o

25 de Novembro com imensos fantasmas históricos. Este é o momento de olharmos para o 25 de Novembro

como um episódio de liberdade e luta, que todos, da esquerda à direita, podemos celebrar, juntos, por um País

melhor. Fazer o contrário é dizer que uns estavam errados e outros certos.

Quero continuar a acreditar que em democracia há lugar para todos, mesmo quando estão errados, mesmo

quando acho que uma grande parte das nossas forças políticas de hoje está errada. A democracia é de todos

e é para todos que a devemos fazer.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Celebrar o 25 de Novembro com um feriado e uma sessão evocativa é fundamental para assumirmos a democracia em Portugal.

Aplausos do Deputado do CDS-PP Miguel Arrobas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra, pelo Iniciativa Liberal, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para aqueles que acham que se temos hoje uma democracia liberal isso não se deve ao 25 de Novembro, lembro só esta efeméride: no

próximo dia 12 de novembro vão passar-se 46 anos desde que esta Assembleia foi sequestrada. Um órgão de

soberania sequestrado por sindicatos controlados pelo PCP, que nunca digeriu ter tido só 12% nas primeiras

eleições democráticas, as desse ano. Quem vos dera agora ter esses 12%!

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Esse foi o culminar de um ataque sistemático ao Estado de direito democrático, a que chamaram PREC,

processo que o PCP iniciou e do qual a extrema-esquerda, da qual o Bloco é herdeiro, às tantas, se apropriou.

É ao PREC que ficamos a dever as nacionalizações «às três pancadas», cujas repercussões ainda hoje

estamos a pagar; as ocupações selvagens, em que nem os camponeses percebiam porque é que a enxada

era da cooperativa; os saneamentos políticos aos milhares; os mandados de prisão em branco; os assaltos e

pilhagens de embaixadas e o encerramento de jornais livres.

O PREC começou um sistema de terror; o 25 de Novembro acabou com o PREC.

Quarenta e seis anos depois há partidos que só celebram o 25 de Abril e outros que só celebram o 25 de

Novembro. E temos o PS, que, porque se aliou aos comunistas e bloquistas, optou por passar a desvalorizar o

25 de Novembro e, assim, trair o seu legado histórico.

No Iniciativa Liberal celebramos com alegria ambas as datas: a primeira, que nos libertou de uma ditadura,

e a segunda, que impediu que caíssemos noutra. Para nós, só em Novembro se começou, efetivamente, a

cumprir Abril.

Um país que não cuida da sua memória histórica está condenado a repetir os mesmos erros. Por isso,

temos o dever de evocar o 25 de Novembro, porque sem ele não teríamos hoje a liberdade de lutar por um

Portugal melhor e mais liberal.

Aplausos do CDS-PP, do CH e de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O 25 de Abril é, de facto, o momento mais luminoso da história do nosso País, o momento mais luminoso da luta secular que o povo português tem

travado contra todas as formas de opressão, obscurantismo e repressão.

O 25 de Abril é, de facto, esse momento mais luminoso da história nacional, não apenas por ter posto fim a

48 anos de uma tenebrosa ditadura fascista, mas, sobretudo, por ter conseguido rasgar horizontes de

esperança, de construção de uma sociedade verdadeiramente livre e democrática, onde o respeito de cada

um pelo seu semelhante e os princípios da igualdade, da democracia e da liberdade fossem «prova viva» na

construção da vida social, onde o progresso, o desenvolvimento e a justiça social fossem, de facto, objetivos a

prosseguir por toda a sociedade.

Esse momento luminoso da história nacional deu-nos muitas das conquistas que ainda hoje procuramos

valorizar e temos de valorizar, no nosso dia a dia, pela importância que, ainda hoje, mais de 40 anos depois do

25 de Abril, continuam a ter na nossa vida.

O 25 de Abril pôs fim à guerra, trouxe-nos a paz e, com a nossa paz, trouxe também a paz de outros povos

que lutavam pela sua liberdade e pela sua independência.

O 25 de Abril trouxe àqueles que só conheciam sapatos ao domingo condições de vida, o acesso à saúde,

à educação, o direito a um salário digno, ao salário mínimo. Àqueles que nunca tinham conhecido outra coisa

que não fosse a exploração, a doença, as desigualdades, trouxe-lhes o direito a uma vida feliz, em que se

pudessem realizar pessoal e profissionalmente, em que tivessem acesso a cuidados de saúde mesmo que

não tivessem dinheiro para os pagar, em que tivessem a proteção na velhice, na doença, na deficiência, em

que tivessem o direito, de facto, a serem homens e mulheres de corpo inteiro, com acesso à educação e à

cultura, para poderem ser verdadeiramente livres.

O 25 de Abril foi, de facto, um momento luminoso na nossa história.

Podemos dizer que todas essas conquistas do 25 de Abril ficaram plasmadas no texto da Constituição. É

verdade que muitas delas foram conquistadas e impostas na prática e só depois legitimadas pelo poder,

reconhecidas pela lei e até reconhecidas pela Constituição, mas a Constituição de 1976 é o reflexo de todas

essas conquistas e desse processo de avanço sem par que a sociedade e o povo portugueses conseguiram

conquistar e construir.

A nossa Constituição, ainda hoje, 45 anos depois de ter sido aprovada, continua a ter um papel

importantíssimo, não apenas na direção desse futuro de progresso, de desenvolvimento e de justiça social que

queremos construir no nosso País, mas até do ponto de vista internacional, afirmando-se como uma das

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Constituições mais progressistas e mais avançadas de todo o mundo. É uma das Constituições mais

progressistas e mais avançadas não apenas pelas conquistas, pelos direitos individuais, pelas liberdades

individuais, pela garantia das liberdades políticas e democráticas, mas, sobretudo, pelo importantíssimo

conteúdo dos direitos sociais que consagra, dos direitos coletivos de que não abdica, dessas bases para um

futuro de desenvolvimento, de progresso e de justiça social.

Sabemos que essa Constituição contou, na votação para a sua aprovação, com o voto contra do CDS, o

autor das iniciativas que motivaram o agendamento deste debate.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Bem lembrado!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Pelo CDS, não haveria a Constituição, como ela existe. Não haveria a consagração constitucional das liberdades, da democracia, da igualdade, da justiça social, do progresso e do

desenvolvimento.

Aplausos do PCP e do PS.

Protestos do CDS-PP e do CH.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — O PS a bater palmas?! É extraordinário! Têm de aprender alguma coisa com a história!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Também o Chega traz uma iniciativa a este debate, o que não admira, tratando-se dos herdeiros daqueles que foram derrotados pelo processo do 25 de Abril, derrotados por esta

construção luminosa que foi a Revolução de Abril. Não admira que o tenha feito.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Tanta ignorância!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.as e Srs. Deputados, olhando para a situação de hoje, olhando para o País e para a realidade nacional de hoje, podemos dizer que, felizmente, o CDS e o Chega ficaram arrumados

sozinhos neste debate e não tiveram quem mais os acompanhasse nestas iniciativas.

Mas o desafio que deixo a todos é o de que reflitam sobre os caminhos que há a fazer para desenvolver e

concretizar plenamente esse horizonte de esperança que o 25 de Abril nos trouxe, concretizando os valores e

o projeto de Abril que a Constituição continua a consagrar, levando tão longe quanto é necessário que seja

levada a resposta aos problemas do povo português, porque é na resposta ao povo português que está a

chave que impede que as forças reacionárias e antidemocráticas possam manipular as pessoas a partir do seu

desespero.

Demos essa resposta que o povo português nos exige. Cumpramos o projeto libertador de Abril, porque

essa é a melhor homenagem que podemos fazer a todos aqueles que, durante 48 anos, lutaram por ele e o

construíram.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo, Sr. Presidente. O desafio que queria deixar a todos os Deputados desta Assembleia que se reveem no projeto libertador,

democrático e emancipador do 25 de Abril e na Constituição que o consagra, para além de sacudirem o mofo

das intervenções anteriores,…

Aplausos do PCP, do PEV e de Deputados do PS.

… que me acompanhem na verdadeira saudação que hoje se justifica: viva o 25 de Abril!

Vozes do PCP: — Viva!

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Aplausos do PCP, do PS, do PEV e do Deputado do BE José Manuel Pureza.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ainda bem que o Mário Soares não está cá para ver isto!

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado André Ventura, pede a palavra para que efeito?

O Sr. André Ventura (CH): — Para defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Pode dizer, Sr. Deputado, em que é que se sentiu ofendido?

O Sr. André Ventura (CH): — O Sr. Deputado João Oliveira associou o partido Chega às forças derrotadas no dia 25 de Abril de 1974.

Risos do BE e do PCP.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Ninguém sabia!

O Sr. André Ventura (CH): — Isso, naturalmente, é algo com que não podemos conviver.

O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado dispõe, então, de 2 minutos para intervir. Tem a palavra, para a defesa da honra, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, temos certamente visões muito diferentes do mundo e da sociedade portuguesa, mas há uma coisa que o Sr. Deputado não é: dono do 25 de

Abril de 1974, como eu não sou e como ninguém nesta Casa é.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. André Ventura (CH): — O Sr. Deputado e essa bancada não são donos do 25 de Abril, não são donos daqueles que devolveram a liberdade a Portugal.

O Sr. Deputado, como muitos outros que aqui estão hoje, talvez não estivesse em lado nenhum no 25 de

Abril de 1974, como, certamente, eu não estava no 25 de Abril de 1974.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não era nascido! Que disparate!

O Sr. André Ventura (CH): — Mas o Sr. Deputado não tem o direito de ir ali acima, à tribuna, e dizer que aqui, deste lado da bancada, estão os inimigos de Abril e que aí, desse lado da bancada, estão os grandes

apoiantes de Abril,…

Protestos do Deputado do PS Eduardo Barroco de Melo.

… até porque, Sr. Deputado, fica-lhe muito mal dizer que o Chega é um partido contra o 25 de Abril quando

tantos eleitores seus votam, atualmente, no Chega, no Alentejo e em Setúbal. Fica-lhe muito mal trair dessa

forma o seu eleitorado, trair dessa forma tantos que, ainda em janeiro, deram meio milhão de votos a uma

candidatura presidencial e deixaram a sua com 3% ou 4%.

Dizer que esse meio milhão de portugueses é fascista, que esse meio milhão de portugueses gostava de

ter Oliveira Salazar ou Marcelo Caetano à frente do Governo é uma desonra e uma ignomínia que o Sr.

Deputado, certamente, reconhecerá que não lhe atribuímos a si.

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O Sr. Deputado pode não gostar do Chega, do CDS, do PSD. Está no seu direito. Não tem é o direito de

dizer que a liberdade é só vossa.

Se estamos hoje neste debate é porque temos visões diferentes do mundo. Era muito fácil, para mim,

chegar aqui e dizer que o Sr. Deputado é o herdeiro da União Soviética, da Albânia, da Roménia ou de Cuba.

Risos de Deputados do PCP e da Deputada do PEV Mariana Silva.

Certamente, o Sr. Deputado não ficaria contente em ouvir dizer que o seu partido é o sucessor dessas

forças, porque reconheço a participação no regime democrático, o direito a participar no regime democrático e

a intervenção inteligente e racional de participação num regime democrático.

É por isso que acho que não lhe fica bem ostracizar outras forças do Parlamento, como se uns fossem os

arautos de Abril e outros fossem contra Abril.

Aqui, acho que todos podemos dizer isto: todos somos pela liberdade, ainda que tenhamos visões

diferentes do País que queremos construir.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para dar explicações, o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, de facto, nunca pensei que, ao invocar a defesa da honra, o Sr. Deputado André Ventura quisesse recuperar referências de resultados de

eleições, sobretudo depois de ainda estar à procura de quem foi a terceira força política nas eleições

autárquicas.

Risos do PCP e daDeputada do PEV Mariana Silva.

De qualquer forma, queria dizer-lhe o seguinte: é óbvio que este debate será sempre suscetível de uma

apreciação subjetiva de cada um de nós, mas há alguns elementos objetivos que podemos comprovar.

Com o 25 de Abril pusemos fim a um regime de ódio, repito, de ódio, em que algumas pessoas eram

odiadas pela cor da pele, pela sua proveniência étnica e social. Pusemos fim a esse regime de ódio.

Não podemos tornar irrelevantes declarações que, em muitas circunstâncias, recuperam esse registo de

discussão, de clivagens, de acentuação do ódio,…

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … em função de características fundamentais de cada pessoa, que devem, fundamentalmente, ser respeitadas tal como são.

O Sr. Bruno Aragão (PS): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Quando o povo português, em 25 de Abril, pôs fim ao regime fascista, pôs fim a um regime que condenou, durante quase meia centena de anos, portugueses à mais profunda miséria,

repito, à mais profunda miséria, pôs fim a um regime em que se dava a pessoas a possibilidade de serem

decisoras relativamente à vida das outras, pelas condições de desigualdade socioeconómica que eram

impostas, pela verdadeira ditadura dos monopólios e dos latifúndios que constituía o regime fascista.

Ora, todo o branqueamento desse regime,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Qual branqueamento?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … toda a tentativa de apagamento do carácter absolutamente corrupto do regime fascista, toda essa tentativa de branqueamento daquela que foi, durante 48 anos, a violência da

ditadura dos monopólios e dos latifúndios,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Está a falar de quê?!

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O Sr. João Oliveira (PCP): — … têm de ser assumidos por quem faz esses discursos. Se o Sr. Deputado André Ventura se sentiu, de alguma forma, atingido pelo facto de eu ter dito, do alto

daquela tribuna, que o Chega é um partido herdeiro daqueles que foram derrotados pelas forças do 25 de Abril

é porque o Sr. Deputado André Ventura lá encontrou algum elemento que o identificasse com isso.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Oh! É ridículo!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Com isto, concluo, Sr. Presidente. O Sr. Deputado André Ventura tem de passar um outro teste, que é o teste da prática, porque é na prática

que as ações das pessoas e os seus intentos têm de ser verdadeiramente avaliados.

Quero dizer-lhe uma coisa, Sr. Deputado André Ventura: a propósito de Moura, julgo que aquilo que vimos

nos últimos dias lhe dá grandes exigências de explicar verdadeiramente onde está o senhor, enquanto

democrata, quando devia estar a combater o ódio,…

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … quando, na verdade, cada vez mais cria condições para que o ódio entre pessoas, seja por motivo racial, seja pelo que for, seja uma dominante na vida portuguesa.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Pode contar com o contributo deste partido, tal como aconteceu antes do 25 de Abril, para darmos combate, com todas as nossas forças, a esse discurso de ódio, de fratura e de conflito

entre os portugueses, que os senhores procuram incentivar.

Aplausos do PCP, do PS, do BE, do PAN e do PEV.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Esta graxa deve ser toda por causa do Orçamento!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos retomar o debate no ponto em que se encontrava. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Silva, do PAN.

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como vimos, este debate está vivo e, obviamente, datas tão importantes como o 25 de Abril ou o 25 de Novembro remetem-nos sempre para

memórias de tempos que não queremos voltar a passar.

De facto, neste debate, já muito foi dito, até por palavras do Sr. Deputado João Oliveira, que, obviamente,

subscrevo inteiramente, quando diz que o 25 de Abril terminou um regime de ódio: ódio social, ódio étnico,

ódio a vários níveis. Tem toda a razão. Mas o 25 de Novembro terminou também um regime de ódio

socioeconómico ou até de divergências sociais.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ora, bem! Pois é!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É verdade!

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Por isso mesmo, consideramos que o 25 de Novembro foi e é importantíssimo para assegurar a estabilidade política do País, estabilidade essa de que o País precisou

exatamente para conseguirmos alcançar a Constituição da República Portuguesa.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem! Grande lição de democracia que o PAN dá ao PS!

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O Sr. Nelson Silva (PAN): — Mais uma vez sublinho e subscrevo as palavras do Sr. Deputado João Oliveira, quando diz que o 25 de Abril é uma das mais luminosas épocas da história do nosso País. Sem

dúvida alguma!

O 25 de Abril iniciou um processo verdadeiramente revolucionário, mas também originou, obviamente, um

forte período de instabilidade, que culminou no Verão Quente de 1975. Mas era necessário fazer este

processo, senão nunca teríamos saído da cepa torta em que estivemos durante o período do Estado Novo.

Para o PAN, o 25 de Novembro marcou, efetivamente, o fim desse período de instabilidade, por isso, é

parte integrante do processo revolucionário iniciado pelo 25 de Abril.

No entanto, voltando a falar das questões das propostas apresentadas, pensamos que a sessão evocativa

ou solene do 25 de Novembro até poderia fazer algum sentido, mas, para nós, seria muito mais importante

termos, de facto, uma sessão evocativa ou solene, neste Parlamento, para celebrar o dia 2 de abril de 1976, o

dia da aprovação da Constituição da República Portuguesa.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Isso, sim, faria muito mais sentido esta Assembleia celebrar. Por último, a proposta do CDS recomenda consagrar com a Ordem da Liberdade as principais figuras do

25 de Novembro.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Pois é! Mário Soares!

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Na realidade, isso já foi feito. As principais figuras do 25 de Novembro de 1975 já têm essa condecoração e, por isso, consideramos não ser minimamente necessária.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra, pelo PSD, o Sr. Deputado André Coelho Lima.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começando por falar do tema que nos trouxe a este debate, que é o 25 de Novembro e um conjunto de propostas relativas ao 25 de

Novembro, atrevia-me a dizer que a quase totalidade da intervenção do Deputado João Oliveira poderia servir

para fundamentar as propostas apresentadas pelo CDS.

É que há factos históricos que são inolvidáveis e quando queremos olhar para a história como um todo não

podemos olhar para parte da história e não olhar para toda ela.

Leio um texto curtíssimo da historiadora insuspeita Raquel Varela, que diz: «No contexto da crise das

Forças Armadas,…»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Insuspeita, insuspeita, mas…

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Insuspeita! Diz o texto: «No contexto da crise das Forças Armadas, a aliança do PS, do Grupo dos Nove e de toda a

direita procurou criar uma direção sólida e organizou e preparou um golpe militar que vai dar-se no dia 25 de

Novembro de 1975, iniciando a consolidação do regime democrático, liberal, em Portugal». Foi isto que

começou a 25 de Novembro. Mas foi isto que se conquistou a 25 de Abril.

Aliás, queria dizer uma coisa muito clara: se foi dito pelo Sr. Deputado André Ventura que o 25 de Abril é

«de parte», pois não sei de que parte é. É do PSD de certeza absoluta. O 25 de Abril é também do PSD, como

é vosso e daqueles que o considerem seu. É de Portugal.

Mas vamos pôr a história como ela é, e é exatamente como disse o Sr. Deputado Telmo Correia: o 25 de

Novembro é decisivo no processo democrático nacional. Não querer assumir isto é não querer ver a história

como ela é. É o Partido Socialista não querer honrar a sua própria história.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente, a sua própria história!

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O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Honrar a sua própria história e a importância fundamental que Mário Soares teve nesse momento histórico português, designadamente nas ligações internacionais com Inglaterra.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Se me permitem, ao falar do 25 de Novembro lembrei-me que, há muitos anos, em 2006, fiz um discurso,

no 25 de Abril, em Guimarães, na minha terra, na Assembleia Municipal. E disse, na altura, isto: «Invocar a

democracia é recordar que esta não consente donos e não permite exclusões, reclamar a propriedade de

valores e alegar a paternidade exclusiva de um regime é pura exibição de arrogância. Ao celebrar a

democracia é forçoso que seja lembrada a importância de figuras como Mário Soares, Francisco Sá Carneiro

ou Freitas do Amaral, que impediram que Portugal se tivesse transferido de um extremo para o outro,…»

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — «…mantendo apenas a afinidade ditatorial. É forçoso lembrar que foi também no 25 de Novembro de 1975 que se consolidou o 25 de Abril de 1974, escancarando-se a partir daí as

portas da democracia e da liberdade.»

Ou seja, teve graça lembrar-me de ter feito esta intervenção há 15 anos, que, no fundo, hoje, posso trazer

à atualidade. E posso verificar a coerência destas palavras face àquilo que são as minhas e as nossas

convicções ainda hoje.

Por isso, aquilo que é importante é o seguinte: ponto um, a história não se refaz, ela é como é; ponto dois,

vamos relativizar a importância dos diferentes momentos, porque se o 25 de Novembro consolidou a

democracia, ela foi conquistada a 25 de Abril. E se Portugal comemora o 25 de Abril, não vemos necessidade

de comemorar adicionalmente o 25 de Novembro, apesar disto que acabámos de dizer.

Quando é que se fundou Portugal? Em 24 de junho de 1128, na batalha de S. Mamede? Será que foi a 5

de outubro de 1143, no Tratado de Zamora? Será que foi a 23 de maio de 1179, na Bula Manifestis Probatum?

Realmente até foi nesta data, mas sem as outras não tinha acontecido esta.

Portanto, o PSD está confortável com a importância que o Estado português dá ao 25 de Abril, porque

consideramos que essa importância integra a importância que inequivocamente teve o 25 de Novembro.

Dito isto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria dizer o seguinte: só lamentamos que estes temas

sirvam para uma espécie de um braço de ferro político onde se procura exibir o que desune em vez de se

procurar o que une.

É uma posição na qual o PSD não está, porque está confortável com a enormíssima importância do 25 de

Abril e com a enormíssima importância do 25 de Novembro.

Achamos, claramente, que aquilo de que a democracia portuguesa precisa é de não estar a discutir temas

e datas que, porventura, nos dividem. Aquilo de que precisa a democracia portuguesa é que os partidos

procurem aquilo que nos une, que procurem entendimentos, ao invés de procurar desentendimentos. E é

neste papel de moderação e de não ver apenas uma parte ou uma página da história, mas de ver as páginas

todas, de não negligenciar nunca — pelo contrário, honrar — a importância do 25 de Novembro, que o PSD

está confortável a festejar o 25 de Abril, que foi, efetivamente, a data da liberdade em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na sequência de várias intervenções, acho que é lúcido perguntarmos sobre o que é que versa verdadeiramente este debate, porque,

tanto quanto nos é dado compreender, ninguém nega o relevo do 25 de Novembro na história de Portugal

contemporânea.

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O Sr. André Ventura (CH): — Negam, negam!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — A história aborda-o sistematicamente. Alguém apagou o 25 de Novembro da memória histórica coletiva? Não.

As figuras principais do 25 de Novembro foram ou não foram figuras fundamentais da democracia

portuguesa naquele momento e posteriormente? A resposta é sempre positiva.

O 25 de Novembro não foi apagado, não se trata de recuperar algo que desapareceu ou de reavivar uma

memória de algo que se perdeu.

A pergunta, portanto, é: do que é que se trata neste debate?

Fundamentalmente, e com todo o respeito pelos proponentes, este debate, acima de tudo, é uma

provocação trazida a esta Câmara, com intuito de semear a discórdia, por parte de quem, não tendo uma

visão de futuro, se refugia no passado.

Aplausos do PS.

E é um erro para a memória coletiva, é um erro para a história e para a forma como a encaramos e como

construímos a nossa instituição trazer uma opção que, não inocentemente, desvaloriza o 25 de Abril,

relativizando-o.

É precisamente isso que gera a contestação a esta iniciativa.

Não se trata de negar o 25 de Novembro ou o papel histórico que o Partido Socialista nele desempenhou.

Isso está fora de questão neste debate, assumido como parte da história integrante desta bancada, que aqui

se apresenta de cara erguida em todos os momentos.

Mas não instrumentalizamos o 25 de Novembro para relativizar a importância do 25 de Abril e do momento

verdadeiramente fundador da democracia portuguesa, da liberdade, do momento em que todos os

portugueses, quase sem exceção, estiveram na rua, no 1.º de Maio, a afirmar «somos livres, finalmente, ao fim

de 48 anos de ditadura».

Aplausos do PS.

E a relativização é fácil de demonstrar. Esta Câmara, porventura, celebra o 1.º de Dezembro de 1640?!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas o País celebra!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Esta Câmara celebra o 5 de Outubro de 1910 com uma sessão solene?!

Esta Câmara celebra o 10 de Junho…

O Sr. André Ventura (CH): — É feriado!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … ou o 24 de Agosto de 1820?! Não o faz, apesar de serem feriados nacionais, porque, precisamente, encontrou uma modalidade de união

nacional em torno de datas fundadoras, datas essas que têm o seu espaço próprio, seja no município de

Lisboa, para celebrarmos a República, seja descendo a Avenida da Liberdade, no 25 de Abril, com as

comemorações populares, seja através da organização da Sociedade Histórica da Independência de Portugal,

no 1.º Dezembro, nos Restauradores.

Portugal tem tido sempre a capacidade de celebrar as datas que unem, que federam, que fazem desta

comunidade com 900 anos, hoje, uma comunidade livre que escolhe as suas datas, mas que, claramente, em

todos os momentos, quando as celebra, quando valoriza a memória coletiva, quando valoriza a independência,

o constitucionalismo liberal, a República, o dia nacional — somos dos poucos países que celebram um poeta

no seu dia nacional, o que também diz muito sobre a alma nacional, e que é algo de relevo —, nunca

nenhuma dessas datas é usada e instrumentalizada contra o outro.

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Acho que, hoje — o Sr. Deputado André Coelho Lima falava deste mesmo espírito, que partilhamos —, o

que nos deve mobilizar nesta Câmara deve ser, precisamente, encontrar os pontos comuns, aqueles que, sem

qualquer dúvida, para todos os que são inequivocamente democratas — hoje, infelizmente, não podemos

dizer, como dizíamos no passado, para todos os 230 que aqui se sentam e que são democratas —,…

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Outra vez a mesma conversa?

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … esta data federa e deve continuar a federar. A concluir, se querem homenagear o 25 de Novembro e os homens e as mulheres que o fizeram e que

garantiram que a democracia seguia o caminho da liberdade, aprendam, então, a lição dos homens e das

mulheres que fizeram o 25 de Novembro. Recordem as palavras de Melo Antunes no dia seguinte, recordem

aquilo que foi o legado e a construção que Ramalho Eanes, Vasco Lourenço e tantos outros do Grupo dos

Nove construíram, que foi sempre de um espírito de moderação, de reconciliação nacional e nunca de utilizar

aquele dia como um subterfúgio, como uma forma, no fundo, de desempatar, ou de fazer uma segunda ronda

do 25 de Abril, excluindo alguns de algo que devia ser de todos.

Se queremos homenagear os moderados do 25 de Novembro, se queremos homenagear os homens do

Grupo dos Nove, se queremos homenagear as pessoas que saíram à rua naquele dia e que garantiram o

caminho que a República e a democracia construíram, então não é com iniciativas destas que o fazemos, pois

desonramos o esforço daqueles que perderam a vida naquele dia, desonramos o esforço daqueles que

quiseram que a comunidade nacional voltasse a ser una e aprovasse uma Constituição e aqui a defendesse

durante 45 anos e a continue, esperemos, a defender, durante os 45 anos que se seguem.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É só escondendo que celebramos?

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Para isso, para tudo isso, não há que usar elementos destes, que semeiam discórdia. Não há que usar elementos que nos afastam quando devíamos procurar voltar a

aproximar-nos.

É por isso que não acompanharemos esta proposta de sessão solene. Não é porque tenhamos qualquer

vergonha do 25 de Novembro ou que deixemos de reconhecer a sua importância histórica, é porque — e como

também o Sr. Deputado André Coelho Lima dava nota — nos revemos na celebração do 25 de Abril como

sendo o momento fundador desta democracia que aqui está. E se queremos relativizá-lo, o melhor contributo

para tal era tentar fazer de conta que não é essa a data que, de facto, mobiliza centenas de milhares de

pessoas naquele dia e que, hoje, milhões de portugueses continuam a rever como sua.

Neste contexto, já agora, a sugestão das condecorações — para acrescentar e para terminar — também

nos parece tonta, por assim dizer, uma vez que a Assembleia tem, ela própria, através do seu Presidente, a

possibilidade de fazer estas sugestões. Que sentido faz a Assembleia, de alguma maneira, recomendar ao

Governo que proponha ao Presidente da República algo que, na própria esfera parlamentar, é possível fazer?

Na nossa perspetiva, é claro, desde sempre, quais são os valores em que nos revemos.

E devia ser também claro para todos, na Câmara, que aquilo que nos devia mobilizar, fundamentalmente, é

construirmos uma sociedade e uma comunidade inclusivas, com espaço para todos e sem a procura

oportunista de elementos para dividir onde devíamos federar.

Nesse sentido, talvez com menos ênfase…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente. Nesse sentido, talvez com menos ênfase, que viva a República, a democracia, o 25 de Abril e que, nestas

palavras, continuemos a recordar aquilo que nos une e que faz de nós portugueses orgulhosos de ser livres.

Aplausos do PS.

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O Sr. André Ventura (CH): — O que é que Mário Soares diria disto?!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Bloco de Esquerda, o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Disputar o passado é disputar o presente e o futuro. Este debate é sobre isso. É uma disputa retroativa do alcance da transformação da

sociedade portuguesa aberta pelo 25 de Abril que o CDS e o Chega querem fazer ao apresentarem, hoje,

estas propostas.

O Bloco de Esquerda aceita, com entusiasmo, esse desafio.

A ênfase celebratória dada pela direita ao 25 de Novembro é a forma que a direita tem de diminuir aquilo

que celebramos no 25 de Abril.

O que a direita pretende com o destaque celebratório do 25 de Novembro é que celebrar o 25 de Abril seja

celebrar um dia, mas não a rutura que esse dia abriu.

A direita nunca perdoou as mudanças fundas começadas em Abril. Nunca perdoou que a conquista de

direitos pelos de baixo não tenha sido apenas uma concessão limitada de direitos pelos de cima. Nunca

perdoou que essa conquista tenha sido, como sempre tem de ser, fruto de uma revolução com tudo o que as

revoluções têm de turbulência, de desinstalação, de crítica consequente dos poderes — os macro e os micro

poderes — instalados.

A direita nunca perdoou que o poder económico dos de sempre, que a dominação cultural dos de sempre,

que a quietude política pretendida pelos de sempre tenha sido radicalmente posta em causa.

Celebrar o 25 de Novembro a par da celebração do 25 de Abril é a expressão de uma vontade da direita de

apagar a Revolução, de a apagar no passado para poder mais facilmente apagar o que ela deixou para o

presente que temos e para o futuro que queremos.

A esse olhar revanchista nós opomos a lucidez corajosa que fez Jorge Sampaio cunhar com uma palavra

de ordem o mais ambicioso dos programas para a sociedade portuguesa: 25 de Abril sempre!

Nós não nos arrependemos dos caminhos de transformação caminhados depois de Abril, orgulhamo-nos

deles. Na habitação, nos direitos das mulheres, nas práticas educativas, no Serviço Nacional de Saúde, no

trabalho, nos bairros e nas aldeias, na política da terra, na determinação da vida de cada um e de cada uma,

as mudanças que foram conquistadas, e que a direita sempre abjurou, foram a liberdade a passar por aqui.

Sim, a direita combateu sempre — e combate aqui hoje outra vez — o sentido desafiante do que a canção

proclama: «Só há liberdade a sério quando houver a paz, o pão, habitação, saúde, educação. Quando

pertencer ao povo o que o povo produzir».

Não, os caminhos que andámos para se cumprir este enunciado não foram desvios ao 25 de Abril, foi o 25

de Abril a fazer-se.

A história que o CDS e o Chega querem entronizar com estas propostas é a história da normalização do

poder económico e social que foi abalado nas semanas e meses depois de Abril.

O que o CDS e o Chega querem que celebremos é o resgate do poder das famílias que eram donas do

País e que as privatizações trouxeram de volta, atapetando o caminho para a desvergonha de cambalachos

gigantescos, como o do BES (Banco Espírito Santo), que o País pagará durante décadas com o dinheiro dos

salários, das pensões e dos serviços públicos.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Como a TAP!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Quando Portugal se abeira de ter mais tempo de democracia do que de ditadura e se abeira do cinquentenário do 25 de Abril, é a história de uma Revolução, em toda a sua

dimensão, que somos chamados a celebrar. Sem nenhum pedido de desculpa. E com toda a determinação em

derrotar democraticamente os que gostariam que a Revolução, enquanto processo de mudança grande, não

tivesse acontecido. Mas aconteceu. E é isso que, deste lado, celebramos.

Aplausos do BE e do Deputado do PCP João Oliveira.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado Telmo Correia, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Para exercer o direito regimental de defesa da honra da bancada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, quer dizer-nos em que é que sentiu que a honra da sua bancada foi ofendida?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O Sr. Deputado José Manuel Pureza acaba de fazer uma série de afirmações e outras tantas insinuações no sentido de que o CDS seria um partido revanchista, contra o 25 de

Abril, que queria apagar o 25 de Abril, etc.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, Sr. Deputado. Como sabe, dispõe de 2 minutos.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, queria dizer ao Sr. Deputado José Manuel Pureza, serenamente, o seguinte: todo o radicalismo ideológico que pôs nas suas afirmações e intervenções não tem

nada de novo, é conhecido, e nem sequer o valorizo demasiado. É, no fundo, o radicalismo ideológico de

quem tem como ídolos, como heróis e como figuras que mais admira aqueles que, nesses tempos, nos teriam

conduzido, a todos nós, àqueles a quem o senhor chama de «direita», a um qualquer Campo Pequeno. Nada

disso é novo. Sabemos disso, acompanhámos essa história. Se outros se esqueceram dela, nós não nos

esquecemos.

O que lhe queria dizer que é ofensivo e que não lhe admito e que, além do mais, é profundamente injusto

— devo dizer-lhe que não o esperaria de si — é quando nos diz que queremos apagar o 25 de Abril. Leia o

nosso projeto! O 25 de Abril é o dia da Revolução, e será sempre o dia da Revolução. De uma Revolução que

não é sua, porque a sua foi derrotada a 25 de Novembro. De uma Revolução que é de todos os portugueses e

que nos trouxe a democracia.

Não proponho substituir um feriado pelo outro… E, já agora, informava o Sr. Deputado Pedro Delgado

Alves, porque se calhar, não sabe, que os dias 5 de Outubro e 1 de Dezembro são feriados…

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Graças à esquerda parlamentar!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … e não penso que haja um problema com isso. É que parece que não sabe.

A única coisa que proponho é que esta data, pela importância que ela teve no processo revolucionário, seja

assinalada com uma sessão evocativa. Pode até, Sr. Deputado, na minha opinião, ser uma conferência, um

colóquio — como o CDS sempre fez e continuará a fazer —, mas que haja uma evocação no quadro

parlamentar de uma data marcante.

Por isso, a sua afirmação de que queremos apagar o 25 de Abril e a sua importância, além de ser ofensiva

— não o faríamos nunca, nem é essa a minha intenção —, é profundamente injusta, porque não é isso que

propomos.

A graduação está feita na proposta em si. O 25 de Abril é feriado, tem sessão solene na Assembleia todos

os anos. O que propomos é que haja uma evocação desta outra data. E concordamos com a proposta de que

haja também a evocação da aprovação da Constituição da República Portuguesa. Porque não? Votámos

contra a Constituição da República Portuguesa de 1976, mas votaríamos a favor da Constituição como ela é

hoje — entretanto, houve revisões constitucionais e todos percebem por que razão, em 1976, votámos contra

—, não teríamos qualquer problema em fazê-lo, é uma data importante que achamos que deve ser evocada.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E a Ordem da Liberdade é não para as grandes figuras, pois essas já foram homenageadas, mas precisamente para aquelas outras figuras, os militares, aqueles que participaram,

os que ajudaram a que houvesse o 25 de Novembro.

É isso que propomos. E fica clara a nossa posição.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, como referi, acho que a intervenção do Sr. Deputado José Manuel Pureza, além de ser uma afirmação ideológica, foi profundamente injusta em relação à proposta

que fazemos hoje.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado José Manuel Pureza, querendo, tem a palavra para dar explicações.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, confesso que, se maculassem a minha honra, eu defendê-la-ia de uma forma bastante mais veemente, bastante mais forte, bastante menos chocha do que

aquela que o Sr. Deputado Telmo Correia colocou naquilo a que chamou de «defesa da honra» e que não foi

defesa da honra coisa nenhuma.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ao radicalismo responde-se com moderação!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Deputado Telmo Correia, agora sou eu a responder. Ouvi-o com todo o respeito, agora deixe-me responder e oiça com o respeito que puder.

O Sr. Deputado Telmo Correia disse que não esperava de mim uma afirmação como aquela que fiz. Já eu

não esperava de si outra coisa. Com toda a franqueza, não esperava de si outra coisa na reiteração da defesa

do ponto de vista que fez com que o CDS apresentasse este projeto.

Este projeto, Sr. Deputado Telmo Correia, como já foi dito — e não apenas por mim —, é um projeto que

claramente quer dividir e quer marcar uma posição relativamente à história. Aliás, são dois projetos que

pretendem, nem mais nem menos, do que fazer uma afirmação histórica, moldar um entendimento da história.

E os senhores bem podem dizer que não querem que se ataque o 25 de Abril. Porém, o que os senhores

querem significar é, claramente — e mantenho isso —, que há um processo de transformação social profunda

que começa no 25 de Abril e que os senhores não aceitam,…

O Sr. André Ventura (CH): — Não é verdade!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — … que os senhores julgam de maneira totalmente crítica. Ora, é exatamente isso que nos divide.

E o senhor sabe, toda a gente sabe que não é outro o propósito da apresentação da proposta do CDS —

evidentemente, já nem falo da proposta do Chega — que não seja, justamente, por um momento, o de

proclamar, uma vez mais, essa divisão. E nós aceitamos isso, mas aqui estamos. Estamos, realmente,

divididos quanto a essa interpretação da história.

Quanto ao mais, quanto a dizer que isto ataca a honra da sua bancada não tem rigorosamente nada de

verdade.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, pegando na conversa onde estávamos, começaria por dizer que, de facto, se há frase que fica daqueles dias e daqueles tempos é a frase do Almirante Pinheiro de

Azevedo que, perante explosões e granadas de fumo e toda a agitação no Terreiro do Paço, respondeu, como

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eu responderia agora ao Sr. Deputado José Manuel Pureza, o seguinte: «Calma! É só fumaça! O povo é

sereno!»

O Sr. André Ventura (CH): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Foi assim que se respondeu, na altura — e é assim que vale a pena responder —, ao radicalismo daqueles que queriam execuções, dos que queriam a violência.

E vale a pena, no final deste debate, dizer ao Sr. Deputado João Oliveira que é verdade que o regime que

tivemos, em Portugal, até ao 25 de Abril, tinha componentes de ódio, com certeza, de perseguição política de

camaradas seus daquele tempo que foram presos, torturados, tudo coisas inaceitáveis. Mas o que é que

acontecia na União Soviética? O que é que acontecia nas ditaduras comunistas? Não era exatamente o

mesmo? As ditaduras são iguais, são irmãs desse ponto de vista. E aquilo que muitos queriam era que, em

Portugal, caísse um regime autoritário e uma ditadura para instituir uma outra ditadura.

O Sr. Miguel Arrobas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E foi isso que foi derrotado no 25 de Novembro. Foi isso que abriu o caminho à Constituição, à Constituição democrática que os partidos aqui votaram democraticamente. E é por

isso que a data de 25 de Novembro nos une a todos, hoje em dia.

Faço justiça — mais uma vez com moderação e serenidade, porque, a qualquer radicalismo, responde-se

com moderação e serenidade — ao Partido Comunista Português, assim com faço justiça ao Bloco de

Esquerda, da convivência democrática que temos e de serem partidos que respeitam as regras da

democracia. Não tenho dúvidas sobre isso. Mas, se isso é assim, foi porque na altura não triunfou um

radicalismo, não triunfou um tipo de revolução que alguns pretendiam para Portugal.

Quanto ao Partido Socialista — e tantos de nós estivemos na Fonte Luminosa, atrás de Mário Soares,

porque era ele que conduzia antes de outros —, devia ter vergonha do que diz aqui hoje, porque os senhores

ignoram essa história, ignoram aqueles que se atravessaram pelo lado da liberdade.

Protestos do Deputado do PS Bruno Aragão.

Tanto o 25 de Novembro como o 25 de Abril são datas que unem todos os portugueses, que unem a nossa

história, que unem uma democracia e que nos juntam a todos neste Hemiciclo. E tenho gosto em estar aqui.

Tenho gosto em estar aqui a debater com o Sr. Deputado José Manuel Pureza, com o Sr. Deputado João

Oliveira, num confronto democrático, num confronto tolerante. Isso deve-se à data maior que é o 25 de Abril.

Ninguém a quer apagar, façam-nos essa justiça! O 25 de Abril é a data maior de uma Revolução que foi uma

Revolução e não um golpe de Estado, como alguns pretendem. Foi uma Revolução que mudou

profundamente a ordem jurídica e aquilo que é o nosso País.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Foi outro País, e melhor, o que saiu do 25 de Abril. Mas há outras datas que podem ser celebradas e que podem ser evocadas, até para a compreensão de todo o processo em si.

Foi só isso que propusemos e é isso que mantemos: uma data de unidade e não de divisão.

Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Está, assim, concluído o debate conjunto do Projeto de Deliberação n.º 2/XIV/1.ª (CDS-PP) e dos Projetos de Resolução n.os 70/XIV/1.ª (CDS-PP) e 45/XIV/1.ª (CH).

Prosseguiremos os nossos trabalhos amanhã, às 10 horas, com toda a normalidade democrática e nos

termos da Constituição da República Portuguesa, aprovada em 2 de abril de 1976 e aqui evocada,…

Aplausos do PAN.

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… com a seguinte ordem do dia: no primeiro ponto, faremos a discussão, em conjunto, na generalidade,

dos Projetos de Lei n.os 746/XIV/2.ª (PAN) — Determina a instalação de circuitos fechados de televisão em

matadouros e 764/XIV/2.ª (PAN) — Determina a obrigatoriedade da instalação de sistema de deteção de

incêndio em explorações pecuárias das classes 1 e 2, em regime intensivo, procedendo à quinta alteração ao

Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro.

No segundo ponto, terá lugar o debate, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 185/XIV/1.ª (PEV) —

Consagra a terça-feira de Carnaval como feriado nacional obrigatório (Décima sexta alteração ao Código do

Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro) e 969/XIV/3.ª (PAN) — Consagra a terça-feira de

Carnaval como feriado nacional obrigatório, procedendo à décima sétima alteração ao Código do Trabalho,

aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

No terceiro ponto, procederemos à apreciação conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os

581/XIV/2.ª (Cidadãos) — Proibição das corridas de cães em Portugal, 219/XIV/1.ª (PAN) — Determina a

proibição das corridas de cães mais conhecidas por corridas de galgos, 783/XIV/2.ª (BE) — Interdita as

corridas de galgos e de outros animais da família canidae enquanto práticas contrárias ao comportamento

natural dos animais e 970/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Determina a proibição das

corridas de cães com fins competitivos.

No quarto ponto, apreciaremos o Relatório Final da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às Perdas

Registadas pelo Novo Banco e Imputadas ao Fundo de Resolução.

Do quinto ponto consta o Projeto de Lei n.º 997/XIV/3.ª (PS, PSD, PCP) — Terceira alteração à Lei n.º

24/2009, de 29 de maio, que aprova o regime jurídico do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida

(CNECV), ao qual não foi atribuído tempo de discussão.

Por fim, haverá votações regimentais.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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