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Quarta-feira, 27 de outubro de 2021 I Série — Número 16

XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)

REUNIÃOPLENÁRIADE26DEOUTUBRODE 2021

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Nelson Ricardo Esteves Peralta Ana Cristina Cardoso Dias Mesquita

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 4

minutos. Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência

e Estatuto dos Deputados relativo à suspensão do mandato de uma Deputada do PSD e à respetiva substituição.

Deu-se conta da entrada na Mesa do Projeto de Lei n.º 998/XIV/3.ª e dos Projetos de Resolução n.os 1481 a 1485/XIV/3.ª

Na abertura do debate, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 116/XIV/3.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado

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para 2022, usou da palavra o Primeiro-Ministro (António Costa), que respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Rui Rio (PSD), Ana Catarina Mendonça Mendes (PS), Catarina Martins (BE), Jerónimo de Sousa (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Inês de Sousa Real (PAN), José Luís Ferreira (PEV), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), António Maló de Abreu (PSD), João Paulo Correia (PS), José Moura Soeiro (BE), Paula Santos (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP), Nelson Silva (PAN), Mariana Silva (PEV), Clara Marques Mendes (PSD), Ascenso Simões (PS), Joana Mortágua (BE), Bruno Dias (PCP), Sara Madruga da Costa e Paulo Moniz (PSD), Lara Martinho (PS), Diana

Ferreira (PCP) Carlos Pereira (PS), Duarte Alves (PCP), Carlos Eduardo Reis (PSD), Ana Mesquita (PCP) e Bebiana Cunha (PAN).

Usaram ainda da palavra, durante o debate, a diverso título, os Deputados Afonso Oliveira (PSD), Jorge Costa (BE), Fernando Anastácio (PS), José Luís Ferreira (PEV), Tiago Barbosa Ribeiro (PS), André Coelho Lima (PSD), Mariana Mortágua (BE), Luís Moreira Testa (PS), Duarte Alves (PCP), Porfírio Silva e Miguel Matos (PS), Nelson Silva (PAN), José Luís Carneiro (PS) e Duarte Pacheco (PSD).

O Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 18 minutos.

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O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes da autoridade, a quem peço para abrirem as portas ao público.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 4 minutos.

Antes de dar início à ordem do dia, que, como sabem, tem como único ponto a apreciação, na generalidade,

da Proposta de Lei n.º 116/XIV/3.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para 2022, dou a palavra à Sr.ª

Secretária Maria da Luz Rosinha para fazer algumas comunicações.

Faça favor, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, boa tarde a todas e a todos.

Passo a anunciar o parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados no sentido de autorizar

a suspensão do mandato da Deputada Filipa Roseta, do PSD, sendo substituída por Joana Catarina Barata Reis

Lopes, a partir do dia 25 de outubro de 2021, inclusive, e pelo período máximo de 180 dias.

O Sr. Presidente: — Vamos votar, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Queira prosseguir, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, o Projeto de Lei n.º 998/XIV/3.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, e os Projetos de Resolução

n.os 1481/XIV/3.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 1482/XIV/3.ª (BE), que baixa à 11.ª Comissão, 1483/XIV/3.ª

(PAR), 1484/XIV/3.ª (PAR) e 1485/XIV/3.ª (PAR).

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Vamos, então, entrar na apreciação, na generalidade, do Orçamento do Estado para 2022.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, a quem aproveito para saudar, bem como a

todos os membros do Governo.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, há duas perguntas que se impõem ao apreciar uma proposta de Orçamento: primeira, saber se tem as prioridades certas face às

necessidades do País e dos portugueses; segunda, saber se a proposta é coerente com a visão estratégica que

temos para Portugal.

A principal prioridade desta proposta de Orçamento é, inequivocamente, apoiar o crescimento e a

recuperação económica do País, através do aumento do investimento e do rendimento das famílias.

Esta é, desde logo, uma proposta amiga do investimento e das empresas. O investimento público crescerá

no próximo ano perto de 30%, centrado, sobretudo, nas áreas dos transportes públicos, educação, saúde, defesa

e segurança.

A forte dinâmica do investimento empresarial, que teve um máximo histórico no primeiro semestre deste ano,

é agora reforçada com a criação do incentivo fiscal à recuperação. Este incentivo permite deduzir à coleta de

IRC (imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas) 10% do investimento realizado no primeiro semestre,

majorando para 25% essa dedução no caso de investimento adicional.

O incentivo ao investimento é robustecido pelos apoios no contexto do Plano de Recuperação e Resiliência,

que visam, em 2022, apoiar investimentos empresariais de futuro, inovadores, industriais, verdes e digitais, onde

se incluem, por exemplo, 182 milhões de euros para apoiar a descarbonização da indústria, 174 milhões de

euros para a transição digital das empresas e 112 milhões de euros no contexto das agendas mobilizadoras.

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Finalmente, prevê-se ainda uma dotação de até 1300 milhões de euros para o Fundo de Capitalização e

Resiliência, visando o reforço dos capitais próprios das empresas, e apoia-se a sua liquidez, alargando e

facilitando as condições de acesso ao Fundo de Tesouraria para as micro, pequenas e médias empresas, o

alargamento dos planos prestacionais de pagamento das dívidas fiscais e contributivas e com a eliminação total

e definitiva do pagamento especial por conta.

Aplausos do PS.

Outra componente essencial para a recuperação económica é o aumento do rendimento das famílias, seja

por via do aumento dos salários, seja pelo aumento das pensões e prestações sociais, seja pela redução geral

da tributação em IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) ou pelo reforço de acesso a serviços

públicos.

Assumimos um objetivo claro: acelerar a convergência do peso das remunerações no PIB (produto interno

bruto) com a média europeia, que retomámos em 2017, após uma dramática e consecutiva divergência, ano

após ano, entre 2009 e 2016.

Este é um compromisso que buscamos no Acordo Geral sobre Salários, em discussão na concertação social.

É com este objetivo de valorização geral dos salários que o salário mínimo nacional subirá no próximo ano para

705 €, um aumento de 40 €, o maior aumento anual de sempre,…

Aplausos do PS.

… prosseguindo a meta dos 750 €, em 2023, e dos 850 €, dois anos depois.

Também na gestão da função pública, damos cumprimento aos compromissos assumidos. Pelo quinto ano

consecutivo as carreiras vão manter-se descongeladas, prosseguindo as progressões e promoções nos termos

da lei, e, como acontece desde o início da Legislatura, asseguramos a atualização anual dos salários em função

da inflação verificada no ano anterior, além de procedermos à valorização do salário-base da carreira de técnico

superior.

Também as pensões beneficiarão da atualização anual prevista na lei, em função do crescimento do PIB e

da inflação estimada, a que acresce o compromisso assumido de um novo aumento extraordinário, já em janeiro,

este ano alargado a todas as pensões até 1097 € mensais.

Aplausos do PS.

São cerca de 2 milhões e 300 mil pessoas que, em 2022, receberão este aumento extraordinário.

Por outro lado, dando continuidade à reforma iniciada em 2018, prosseguimos no desagravamento e aumento

da progressividade da tributação em IRS.

Um milhão e meio de agregados familiares beneficiarão diretamente do desdobramento do 3.º e 6.º escalões,

poupando-se assim às famílias, no conjunto destas reformas, 500 milhões de euros anuais.

Esta proposta de Orçamento, amigo do investimento e que promove o aumento do rendimento das famílias,

dá assim um contributo decisivo para prosseguirmos um robusto crescimento económico, a redução do

desemprego, permitindo-nos, no final de 2022, ter recuperado totalmente da maior crise económica da nossa

história e retomarmos a convergência com a União Europeia, crescendo 5,5% em 2022, um ponto percentual

acima da previsão para a União Europeia e para a zona euro.

Aplausos do PS.

A segunda prioridade deste Orçamento é dar continuidade ao reforço dos serviços públicos, com o necessário

destaque para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e para a escola pública, à qual dedicamos, além do mais,

900 milhões de euros para, ao longo do corrente e do próximo ano letivo, desenvolver um plano de recuperação

das aprendizagens que responda às necessidades das crianças e dos jovens afetados pelas sucessivas

interrupções letivas durante o combate à COVID.

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Com o reforço previsto este ano para o SNS, asseguramos nesta Legislatura que o SNS dispõe de mais 3300

milhões de euros de dotação inicial, quase o dobro do que foi possível reforçar na totalidade da anterior

Legislatura.

Este aumento não significa só mais investimento em hospitais, no alargamento das redes de cuidados de

saúde primários ou nos cuidados continuados, permite a eliminação final das taxas moderadoras, salvo no

acesso às urgências; permite iniciar a dedicação plena dos profissionais do SNS, com aumento remuneratório

e da prestação de cuidados; permite alargar a autonomia da contratação de pessoal pelos serviços, assegurando

o preenchimento dos mapas de pessoal; permite continuar a aumentar o número de profissionais do SNS, que,

desde 2015, já aumentou em cerca de 30 mil pessoas; permite criar a carreira de técnicos auxiliares de saúde;

permite abrir os concursos para promoções nas carreiras de enfermagem, técnicos superiores de saúde e

farmacêuticos, além dos concursos bianuais para médicos, e permite, ainda, repor os pontos perdidos pelos

enfermeiros aquando do seu reposicionamento na nova carreira.

Aplausos do PS.

Em suma, com esta proposta, o SNS, a escola pública, as forças de segurança e as forças armadas saem

financeiramente fortalecidas.

Risos de Deputados do CDS-PP e do CH.

A terceira prioridade desta proposta é termos um orçamento de contas certas. Reduzir o défice e a dívida

não são um constrangimento, são um objetivo que conjugamos e articulamos com o aumento do investimento,

com o aumento dos salários, com o aumento das pensões e com o aumento das prestações sociais e a melhoria

dos serviços públicos.

Não foram as contas certas que nos impediram de romper com a austeridade em 2015, nem de responder,

em força e com solidariedade, à crise provocada pela COVID.

Aplausos do PS.

São as contas certas que garantem a credibilidade internacional de Portugal, permitindo-nos ter poupado

3000 milhões de euros de juros da dívida face a 2015 e alcançar valores recorde no investimento contratado em

2018, 2019 e, novamente, em 2021 pela AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal).

São as contas certas que nos permitiram devolver a confiança aos pensionistas de que as suas pensões não

sofrem cortes e devolver a confiança aos funcionários públicos de que as suas carreiras passaram a ser

sustentáveis e o seu poder de compra anualmente assegurado.

Aplausos do PS.

São as contas certas que dão segurança e previsibilidade para as empresas continuarem a investir e a criar

mais e melhor emprego. São as contas certas que nos permitem continuar a dar passos no quadro do reforço

do estado social. Que não nos exijam, nunca mais, dar passos atrás!

Foi mesmo o excedente orçamental de 2019 e o aumento em 22 anos, face a 2015, da garantia de

sustentabilidade da segurança social que permitiram a Portugal responder em força à crise da COVID-19, não

só com um reforço extraordinário do Serviço Nacional de Saúde, mas também no apoio às empresas, ao

emprego e aos rendimentos. Foi mesmo termos contas certas que nos permitiu, desta vez, responder a esta

crise com solidariedade e não com austeridade.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assim, a resposta à primeira pergunta é afirmativa. Apoiar a

recuperação económica e reforçar os serviços públicos, com contas certas, são as prioridades para responder

às necessidades de hoje, do País e dos portugueses.

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Aplausos do PS.

Analisemos, então, a segunda questão que se nos coloca: esta proposta de Orçamento do Estado é coerente

com a visão estratégica que temos para Portugal?

O primeiro desafio estratégico que temos de enfrentar é o da demografia. Por isso, esta proposta de

Orçamento dá prioridade particular às famílias com filhos. Primeiro, ao longo dos próximos três anos,

garantiremos a gratuidade das creches para todas as crianças, a começar já em setembro com as que entram

para o primeiro ano. Segundo, haverá a criação da garantia infantil de 600 € para todas as crianças até aos 17

anos, por via da dedução fiscal, do abono de família ou do suplemento ao abono para as famílias isentas de

IRS, elevando-se este valor da garantia infantil para 1200 € anuais, para procurar resgatar da pobreza as mais

de 120 000 crianças em risco de pobreza extrema.

Aplausos do PS.

Em terceiro lugar, majorar-se-á para 900 € a dedução fiscal por cada criança, a partir do segundo filho e até

aos 6 anos de idade.

O segundo grande desafio estratégico de Portugal é o de afirmar a inovação e as qualificações como motores

do desenvolvimento, desde logo com a melhoria do enquadramento fiscal das start ups e com a melhoria do

regime da patent box, que se tornará num dos mais competitivos da Europa, e, depois, com o reforço do

investimento na cultura, na educação e na ciência. Impõe destacar-se, porque é histórica, a criação do Estatuto

do Profissional da Cultura, que garante a adequada e específica proteção social a estes profissionais, o que

nunca até agora existiu.

Aplausos do PS.

Finalmente, temos um pacote muito robusto dedicado aos jovens, de modo a garantir a valorização da nossa

geração mais qualificada de sempre. Primeiro, na prossecução das suas qualificações, aumentar-se-á até ao

triplo o montante das bolsas para frequência de mestrados. Segundo, na valorização excecional das posições

de entrada na carreira de técnico superior, valorizando especialmente a remuneração de doutorados e agilizando

o recrutamento direto de jovens licenciados para a Administração Pública, assim pressionando a melhoria dos

salários e das carreiras dos jovens também no setor privado.

Aplausos do PS.

Terceiro, aumentar-se-á o rendimento disponível dos jovens nos primeiros cinco anos de vida profissional,

com o IRS jovem e com o Programa Regressar, que permitirão a isenção, em IRS, entre 50 e 10% do rendimento

coletável.

Quarto, combater-se-á os dois grandes fatores que limitam a autonomização dos jovens, por um lado, com

um programa sem precedentes de oferta pública de habitação acessível e, por outro, combatendo a incerteza

profissional, o que passa, simultaneamente, pela reforma das profissões reguladas, para garantir a liberdade de

acesso à profissão, e pela consagração, na Agenda do Trabalho Digno, das medidas de conciliação da vida

pessoal, familiar e profissional, da regulação do teletrabalho …

Aplausos do PS.

… e do combate a todas as formas de precariedade laboral, designadamente nas plataformas digitais, nas

empresas de trabalho temporário e no recurso a outsourcing.

Outro grande desafio estratégico é o do combate às desigualdades, que também tem uma expressão bem

clara nesta proposta de Orçamento do Estado. Primeiro, pela maior justiça fiscal que o desdobramento do 3.º e

do 6.º escalões do IRS asseguram às classes médias; segundo, pela maior progressividade que o aumento do

mínimo de existência e o maior englobamento garantem, isentando de IRS mais de cerca de 170 000 pessoas

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e passando a taxar normalmente as mais-valias especulativas de quem está no mais elevado escalão de

rendimentos; terceiro, pela criação, com a garantia infantil, do mais poderoso instrumento de combate à pobreza

infantil da União Europeia, 1200 € anuais, quando o valor atualmente mais elevado é o da Holanda, com 1037

€ anuais.

Aplausos do PS.

Por fim, o maior desafio estratégico que enfrentamos — e que enfrentamos com toda a humanidade — é o

do combate às alterações climáticas, ao qual esta proposta de Orçamento do Estado responde com coerência.

Primeiro, 54% do investimento estruturante previsto neste Orçamento destina-se à mobilidade sustentável, à

ferrovia e aos transportes públicos urbanos e ainda à eficiência da gestão dos recursos hídricos; segundo, este

Orçamento reforça as verbas para a redução tarifária e para a densificação da oferta de transporte público fora

das áreas metropolitanas; terceiro, prossegue a eliminação dos benefícios fiscais prejudiciais ao ambiente, taxa

as embalagens de plástico e o alumínio não reutilizáveis e alarga a taxa de carbono às viagens aéreas e aos

cruzeiros.

Aplausos do PS.

Em suma, também quanto à segunda pergunta a resposta só pode ser positiva. Esta proposta de Orçamento

do Estado é coerente com os quatro objetivos estratégicos que assumimos no nosso Programa do Governo: o

desafio demográfico, as qualificações e a inovação como motores do desenvolvimento, o combate às

desigualdades e às alterações climáticas.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nos últimos meses, como é público, o Governo manteve um diálogo

negocial com as Sr.as Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, com o Partido

Ecologista «Os Verdes», com o Partido Pessoas-Animais-Natureza, com o Partido Comunista Português e com

o Bloco de Esquerda. Estas negociações tiveram já expressão na versão original da proposta de lei de

Orçamento do Estado e em diversos compromissos já publicamente assumidos quanto a alterações a introduzir

na fase da especialidade.

Várias das medidas que aqui apresentei, como o aumento extraordinário das pensões, o aumento do mínimo

de existência ou o reforço das verbas para transporte público em todo o País, são exemplos desse diálogo

frutuoso. Mas posso referir outros exemplos, como a antecipação da reforma para quem tem mais de 80% de

incapacidade, a criação de uma bolsa de intérpretes de língua gestual portuguesa, para garantir a acessibilidade

de todos ao ensino superior, à saúde ou à justiça, a adaptação de salas para a audição de crianças nos tribunais

ou a recuperação da carreira de guarda-rios.

Estas negociações estenderam-se, como é sabido, além do Orçamento do Estado e englobaram alterações

ao código laboral, muito em especial para combater a precariedade, no quadro da Agenda do Trabalho Digno;

ao desenvolvimento da Lei de Bases da Saúde, através do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde; ao Estatuto

dos Profissionais da Cultura e até ao Código Penal, alargando a criminalização dos maus-tratos a outros animais

além dos animais de companhia. Em todos os casos — repito, em todos os casos — o Governo empenhou-se

e concretizou um esforço sério de aproximação aos diferentes interlocutores.

Aplausos do PS.

Como sempre disse, tudo faremos no que estiver ao nosso alcance para assegurar a continuidade da nova

situação política que iniciámos em 2016, para dotar o País de um bom Orçamento para 2022 e para assegurar,

neste momento decisivo de recuperação, a estabilidade das políticas que nos permitiram virar a página da

austeridade, em 2015, e responder com solidariedade à pandemia, em 2020 e 2021.

Aplausos do PS.

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Tudo faremos para obter um acordo, mas não podemos fazê-lo a qualquer preço. Acabar com o fator de

sustentabilidade para todas as reformas antecipadas significaria destruir a garantia de um sistema de segurança

social público que respeite os atuais pensionistas e garanta o futuro dos trabalhadores de hoje e das novas

gerações.

Aplausos do PS.

Um aumento, em 2022, de 28%, ou mesmo de 20%, numa nova versão, no salário mínimo nacional é colocar

em risco a recuperação e a subsistência de milhares de micro, pequenas e médias empresas que enfrentaram

a maior crise económica da nossa história e que ainda enfrentam um quadro de múltiplas incertezas, do

fornecimento de componentes ao custo dos combustíveis. Não, não podemos pôr em causa essas empresas e

os seus postos de trabalho!

Aplausos do PS.

Pedem-nos um passe de mágica, mas não há passe de mágica que nos permita ultrapassar o sentido de

responsabilidade, de equilíbrio e a defesa do interesse nacional. Não fazemos chantagens, ultimatos ou

fechamos portas ao diálogo e este debate, na generalidade, é, aliás, um bom momento para o prosseguir. Se

as Sr.as e Srs. Deputados o permitirem, a fase da especialidade é até o momento adequado para a discussão

em detalhe de propostas e de redações.

Aplausos do PS.

E quanto às matérias extraorçamentais, como a legislação laboral ou o estatuto do Serviço Nacional de

Saúde, o período de debate público, que na semana passada se abriu, proporciona uma larga oportunidade de

procurar soluções até à sua votação final, nesta Assembleia da República, ou à sua aprovação final pelo

Governo.

Vamos consolidar os muitos avanços que já conseguimos. Respeitemos os portugueses que não desejam

uma crise. Compreendamos o momento histórico que o País vive. Haja vontade política, criatividade e espírito

de compromisso e nada justifica pôr termo à caminhada que iniciámos em 2016.

Aplausos do PS.

Ainda há estrada para andar e devemos continuar.

O Sr. Ascenso Simões (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Da parte do Governo, Sr. Presidente Sr.as e Srs. Deputados, «enquanto houver ventos e mar a gente não vai parar».

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem agora questões, colocadas por todos os grupos parlamentares, a que deverá responder uma a uma. Depois, tem mais de 20 perguntas — 21, mais exatamente

— a que poderá responder como entender.

A primeira pergunta cabe ao Sr. Deputado Rui Rio, do Grupo Parlamentar do PSD, a quem dou a palavra.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, manifestamente, nós encontramo-nos numa fase de profunda instabilidade política. Há uma profunda instabilidade política porque o Orçamento do Estado,

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provavelmente, não vai passar, mas eu diria que, mesmo que o Orçamento passe na generalidade, está à vista

que a maioria parlamentar que existiu e que o apoiou se desfez por completo.

O Sr. Primeiro-Ministro, aliás, referiu-o agora, no discurso. Para tentar passar o Orçamento vai ter de andar

a pescar à linha, e pesca à linha mudando o isco no anzol consoante o peixe que quer pescar, o que,

naturalmente, em nada dá estabilidade ao País.

Aplausos do PSD.

E se a geringonça, dissemos nós no ano passado, estava coxa, hoje a geringonça não tem pernas para

andar. Está sentada numa cadeira de rodas à espera que alguém a empurre e ninguém a quer empurrar.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Isto acontece porquê? Acontece porque o Sr. Primeiro-Ministro decidiu, lá atrás, em 2015, acantonar-se à esquerda e colocar-se totalmente nas mãos do PCP e do Bloco de Esquerda.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Pois bem, se há diferença que eu noto do Sr. Primeiro-Ministro relativamente a alguém é precisamente em relação ao Dr. Mário Soares. O Dr. Mário Soares estabeleceu uma linha vermelha

que nunca passou. O Dr. Mário Soares percebeu que nunca podia ficar nas mãos do PCP, neste caso, do PCP

e do Bloco de Esquerda!

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS Ascenso Simões.

O Secretário-Geral do PS António Costa inverteu toda a lógica do Secretário-Geral do PS Mário Soares, e

ainda mais agravou quando disse que não precisaria dos votos do PSD para o Orçamento, porque, se eles

existissem, o seu Governo se demitia de imediato.

Aplausos do PSD.

Qual foi o resultado disto? O resultado disto foram seis — ou mais um, vamos ver, este parece que não —

Orçamentos aprovados à esquerda. Resultado: Portugal na cauda da Europa!

Vai ver o PIB percapita português relativamente à Europa e nós baixámos. Fomos ultrapassados por países

como a Estónia e a Lituânia, países da antiga União Soviética, países pobres, que estão connosco na União

Europeia há pouco tempo e já nos ultrapassaram.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Vamos ver o salário médio na União Europeia, segundo os indicadores de Paridade de Poder de Compra (PPC) calculados pelo Eurostat, Sr. Primeiro-Ministro, e o nosso salário médio, em

Portugal, é o penúltimo. Todos nos ultrapassaram! Só a Bulgária está neste momento atrás de nós.

Protestos do Deputado do PEV José Luís Ferreira.

Esta é a realidade! É o resultado desta política, desde 2015!

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS Ascenso Simões.

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E o Sr. Primeiro-Ministro não pode dizer que viveu num tempo difícil. Viveu num tempo de conjuntura

favorável. Referiu ali que, só em juros da dívida pública, poupou 3000 milhões de euros/ano. É verdade, mas

não é por mérito do Governo, é pela política do Banco Central Europeu (BCE). Foram 3000 milhões todos os

anos.

Vamos para os dividendos do Banco de Portugal e para o IRC do Banco de Portugal, que era quase zero, e

também, por força dessa política monetária, os números estão nos 700/800 milhões de euros. Dá quase 4000

milhões de euros, só nestas duas rubricas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Rui Rio (PSD): — E, depois, o que fez mais? Aumentou os impostos! E depois, com este dinheiro todo, fez o quê? Com este dinheiro todo chamou o PCP e o Bloco de Esquerda, distribuiu ao longo destes seis anos

o que eles quiseram para aprovar o Orçamento, e nós agora estamos cada vez mais na cauda da Europa!

Aplausos do PSD.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Distribuiu a quem?

O Sr. Rui Rio (PSD): — Esta é que é realmente a situação! A despesa corrente primária — que quer dizer sem juros da dívida pública —, nos últimos três anos,

aumentou 11 000 milhões de euros. As pessoas terão dificuldade em entender 11 000 milhões de euros, mas

se eu der um outro número, toda a gente percebe. Nesse mesmo período de tempo, o produto nacional subiu

15 000 milhões de euros, ou seja, para uma subida do produto em 15 000 milhões de euros, a despesa corrente

do Estado aumenta 11 000 milhões de euros!

É assim que o PS governa o País, como um Estado omnipresente em que tudo o que se ganha vai para o

Estado, e só para o Estado, e a sociedade fica presa e não consegue evoluir.

Aplausos do PSD.

Este Orçamento do Estado para 2022, tal como qualquer Orçamento do Estado, tem de dar duas respostas:

respostas a problemas estruturais e respostas a problemas conjunturais.

Na resposta aos problemas estruturais, Sr. Primeiro-Ministro, é aquilo que, mais uma vez, vimos: não produz

riqueza, ou, melhor, produz muito pouca riqueza e distribui tudo aquilo que produz, repito, tudo aquilo que

produz, ou seja, em termos de futuro: nada!

Em termos conjunturais, o que é isso? Problemas que se colocam em 2022 que não se vão colocar em 2023

nem em 2024 ou em 2025 e para os quais tem de haver uma resposta. Problemas ligados, por exemplo, à

restauração, que esteve fechada praticamente dois anos, ligados ao turismo, que esteve fechado praticamente

dois anos. Problemas ligados ao preço dos combustíveis, que subiu de uma forma absolutamente brutal, que

está a condicionar a economia nacional e em relação ao qual se exigia que, neste Orçamento do Estado, o Sr.

Primeiro-Ministro aqui propusesse aquilo que disse, em 2016, que ia fazer: ou seja, «Quando o preço do crude

subir, eu baixo aquilo que subi!»

Aplausos do PSD.

E assim conseguia, obviamente, dar uma resposta conjuntural. Podia subir outra vez o imposto quando

passasse esta onda. É isto a que o Orçamento do Estado não responde, às questões conjunturais. Não responde

às questões estruturais nem às conjunturais.

E ainda há mais qualquer coisa que decorre muito claramente do seu discurso, ali, na tribuna. Ainda deu

mais ao PCP e ao Bloco de Esquerda. Só que desta vez, não chegou, porque o Sr. Primeiro-Ministro colocou-

se de tal ordem nas mãos deles que agora quem manda são eles. E, portanto, como agora quem manda são

eles, o Governo está neste estado que nós vemos!

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Aplausos do PSD.

O Governo e o PS estão a pagar a fatura de terem ultrapassado a linha vermelha que o Dr. Mário Soares

nunca permitiu que se ultrapassasse.

Aplausos do PSD.

Para terminar, coloco uma pergunta concreta. Agora temos um PRR (Plano de Recuperação e Resiliência)

para executar, que tem um tempo muito limitado e o País não pode perder tempo sob pena de perder uma

tranche ou alguma parte desse PRR.

Temos a nossa economia para continuar a desenvolver e ela não pode ficar suspensa por uma crise política.

Temos a inflação a subir na Europa e nos Estados Unidos — na Alemanha já vai para cima de 4% —, o que

anuncia problemas económicos sérios à Europa e a Portugal, que não pode estar suspenso numa crise política.

Temos a coligação parlamentar que o apoiou que faliu, acabou, está na tal cadeira de rodas, e temos o

Presidente da República a dizer o óbvio, que é que, não havendo Orçamento, temos de ir para eleições e para

eleições o mais depressa possível.

A pergunta que lhe faço é esta, Sr. Primeiro-Ministro: perante este cenário, o Sr. Primeiro-Ministro disse que

não se demitia. A minha pergunta é: como é que quer governar com este cenário e manter a lógica de não se

demitir? A minha resposta é esta: está tão agarrado ao lugar que nem sequer consegue ver aquilo que todo

Portugal está já neste momento a ver.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Muito obrigado, Sr. Presidente, muito obrigado, Sr. Deputado Rui Rio. Com toda a franqueza, era a última pessoa que eu imaginava que viesse aqui falar em instabilidade política.

Aplausos e risos do PS.

Mas que estabilidade tem V. Ex.ª a oferecer?!

Orgulho-me muito de, em 2015, ter rompido com um mito da política portuguesa que era o mito do arco da

governação.

Protestos do PSD.

Um mito que estabelecia uma espécie de Muro de Berlim, onde do lado de cá estavam o PSD, o PSD e o

CDS e do outro lado estavam todos os excluídos da participação nas responsabilidades executivas.

Aplausos do PS.

Tenho muito orgulho de ter derrubado esse muro e ainda mais orgulho tenho de o ter feito com o apoio do

então vivo Dr. Mário Soares.

Aplausos do PS.

Entendo, e presumo que V. Ex.ª também entende, que é fundamental para a vivacidade da democracia que

existam alternativas claras, que o povo possa sempre dispor de caminhos alternativos que possa escolher.

Quando quer ser governado à esquerda tem quem governe à esquerda, quando quer ser governado à direita

tem quem governe à direita. Isso é uma das grandes riquezas da nossa democracia que devemos saber

preservar.

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É por isso que eu, como creio que sempre o tenho ouvido a si, temos recusado a solução de bloco central,

porque as soluções de bloco central empobrecem a democracia, criam a confusão entre quem pode liderar a

governança à esquerda e quem pode liderar a governança à direita. É a manutenção dessa clareza política que

é absolutamente fundamental para que o País possa ter uma democracia viva e dinâmica.

Aplausos do PS.

Esta mudança política, Sr. Deputado, ao contrário do que diz, permitiu que Portugal interrompesse 16 anos

de divergência ou estagnação para começar a convergir com a União Europeia, em 2017, 2018, 2019, e

novamente este ano vai voltar a convergir com a União Europeia, crescendo acima da média da União Europeia.

Aplausos do PS.

Todos temos motivos para nos preocuparmos com a despesa, mas o Sr. Deputado há de me recordar qual

foi a proposta que o PSD já apresentou até hoje para diminuir a despesa, e não as propostas que apresentou

para somar-se a outros partidos, para criar maiorias negativas, que formam e aumentam a despesa pública.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, todos nos recordamos do seu discurso no ano passado. Foi muito semelhante ao deste ano.

Disse que não chegaríamos ao final do ano sem um Orçamento retificativo e cá estamos, no final do ano, a

discutir o Orçamento para o próximo ano e sem nenhum Orçamento retificativo.

Aplausos do PS.

E depois, Sr. Deputado, apesar de tudo, um pouco de coerência, porque, quando o Sr. Deputado fala em

receita, tão depressa diz que devíamos aumentar o IVA (imposto sobre o valor acrescentado) da restauração

para criar uma folga para um momento de necessidade, como imediatamente a seguir vem dizer que é

necessário baixar o IVA da restauração.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Lina Lopes.

Sr. Deputado, vamos ser muito claros: nos termos constitucionais, a Assembleia da República é soberana

para aprovar ou não a proposta de lei que o Governo tem o exclusivo de apresentar à Assembleia da República

para o Orçamento. O Sr. Presidente da República tem toda a competência e legitimidade para, avaliando o

quadro político, tomar as decisões que entender sobre a dissolução ou a não dissolução da Assembleia da

República. Mas o Governo também tem o dever de interpretar qual é o seu dever, perante o nosso País e perante

os portugueses.

Aplausos do PS.

E, sobre isso, não tenho a menor dúvida de que o dever do Governo, o meu dever, não é virar as costas no

momento de dificuldade, é enfrentar as dificuldades e, por isso, não me demito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça Mendes, do Grupo Parlamentar do PS.

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, este é, de facto, um dos momentos altos da discussão parlamentar. É o momento

em que o Orçamento do Estado, como instrumento financeiro, coloca a cada um dos Deputados a escolha de

saber que caminho quer para as políticas públicas…

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … e, sobretudo, que visão estratégica tem para o País. E na bancada do Partido Socialista não nos equivocamos. Sr. Deputado Rui Rio, não fazemos um dia um

discurso a favor da valorização dos salários e no outro dia somos contra o aumento do salário mínimo.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Não foi isso que ele disse!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Não, Srs. Deputados, nesta bancada, somos sempre a favor da valorização dos salários e da valorização do salário mínimo.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, chegados à apresentação do sétimo Orçamento liderado por V. Ex.ª, Sr. Primeiro-

Ministro, é tempo de recordar o caminho que os portugueses pediram em 2015, reforçaram em 2019, e faz hoje

dois anos que esse Governo tomou posse.

Pediram que pudéssemos devolver uma coisa muito simples, que os senhores retiraram aos portugueses:

dignidade e respeito.

Aplausos do PS.

E dignidade e respeito dá-se na devolução de rendimentos, seja nas pensões ou nos salários; dá-se nos

direitos, dá-se no emprego, dá-se na criação de riqueza, dá-se na valorização dos serviços públicos e na

resposta que estes têm de dar aos cidadãos todos os dias.

Esse caminho foi feito à esquerda e esse caminho teve e tem resultados. Tem resultados de crescimento

económico, tem resultados de criação de emprego, tem resultados de maior proteção social, tem resultados de

um reforço do Estado social, seja no Serviço Nacional de Saúde, seja na proteção social, seja na escola pública.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — E é por isso, Sr.as e Srs. Deputados, que, chegados aqui, os portugueses não compreendem que este caminho não possa continuar a ser feito à esquerda, porque é

convicção desta bancada que há muito caminho para fazer, em nome de Portugal e em nome dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Orçamento que hoje aqui se apresenta é, como os outros seis Orçamentos, fruto de uma proposta do

Governo que inclui já propostas do Bloco de Esquerda, do Partido Comunista Português, do PEV, do PAN, das

Sr.as Deputadas não inscritas. E é por isso…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não, não tem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Tem, tem, Sr. Deputado, porque, quando os Srs. Deputados pedem o reforço do Serviço Nacional de Saúde, são mais 700 milhões neste Orçamento do Estado.

Aplausos do PS.

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Quando os senhores pedem mais investimento na saúde são cerca de mais 4000 profissionais para o Serviço

Nacional de Saúde, e, ao contrário daqueles que, durante a pandemia, vaticinaram o colapso do Serviço

Nacional de Saúde,…

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Bem lembrado!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … foi o investimento nesse Orçamento, no Orçamento para 2021, que permitiu a resposta do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PS: — Bem lembrado! Bem lembrado!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Quando as vozes agoirentas, neste Parlamento, diziam que Portugal não ia conseguir ter sucesso na vacinação, temos hoje 88% da população vacinada e isso deve-

se ao esforço do Serviço Nacional de Saúde e ao investimento que se fez no Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

Tem medidas à esquerda, tem, sim, Srs. Deputados! Porque quando confrontados com uma pandemia, que

ninguém imaginava, a prioridade foi responder com urgência a que ninguém ficasse sem os seus rendimentos,

foi o layoff a 100% que garantiu que 3 milhões de trabalhadores não perdessem o seu rendimento.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Quando foi preciso responder aos desempregados, foi a esquerda parlamentar, sobretudo, o PS e o PCP, no ano passado, com o Orçamento, que aumentaram o

subsídio de desemprego e o subsídio social de desemprego.

Aplausos do PS.

Ora, Sr.as e Srs. Deputados, não se espera que este Orçamento seja diferente. Não me parece que o Sr.

Primeiro-Ministro tenha mudado, parece-me que é o mesmo António Costa de 2015,…

Vozes do PS: — Muito bem!

Protestos do Deputado do IL João Cotrim de Figueiredo.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … não me parece que a bancada do Partido Socialista tenha mudado, e a visão que tivemos sempre para o País foi investir nos rendimentos das pessoas, nos salários,

nas pensões, foi aumentar a melhoria da qualidade dos serviços públicos.

Mas, neste Orçamento, há uma matéria que é cara a esta bancada mas que é muito cara aos portugueses:

o combate à pobreza infantil.

Aplausos do PS.

São hoje milhares de crianças que se encontram na pobreza ou na extrema pobreza. Por isso, a resposta

que este Orçamento dá não merece um voto contra.

Sr.as e Srs. Deputados, estamos no início deste debate. Deixemo-nos da discussão nos órgãos de

comunicação social e tenhamos a discussão de que este Orçamento precisa aqui, nesta Casa,…

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Para melhorar?!

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sim, Sr. Deputado, para melhorar. Assim haja vontade política!

O apelo que aqui faço às bancadas à esquerda, que permitiram um caminho de crescimento, de

desenvolvimento do País e de devolução de dignidade e de rendimentos aos portugueses, é que juntos

possamos continuar este trabalho na especialidade, porque lá fora os portugueses exigem isso de todos nós.

Não querem uma instabilidade política, querem prosseguir o caminho e, sobretudo, querem aproveitar o

momento da recuperação económica que se impõe a alguém que é responsável.

Aplausos do PS.

É para isso que este Orçamento serve, para relançar o País. É para isso que contamos com o Sr. Primeiro-

Ministro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, beneficiando do facto de não me ter feito nenhuma pergunta,…

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Oh!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — … quero simplesmente agradecer o suporte da bancada do Grupo Parlamentar do Partido Socialista à ação do Governo, incansável desde 2016, e para dizer que encontrará, da parte do

Governo,…

Aplausos do PS.

… a mesma correspondência na caminhada e na rota que traçámos em 2016: continuar a desenvolver o

País, não recorrendo à austeridade, e dar sempre um passo firme, nunca maior do que a perna, para que o

caminho seja sempre em frente e nunca tenhamos de voltar atrás.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quando, em 2015, assinámos um acordo de Legislatura, tínhamos um ponto de partida que era claro: virar a página da estratégia de

empobrecimento seguida pelo PSD e pelo CDS.

Esse caminho foi sendo feito, sobretudo no plano da reversão dos cortes nos rendimentos do trabalho, e

estamos orgulhosos dele. Mas não ficou completo.

Há uma razão para que, apesar do caminho feito, os salários continuem estagnados, ou mesmo mais baixos

para quem, agora, inicia a sua vida profissional, para que tantos pensionistas com longas carreiras mantenham

pensões baixas e para que a perda de poder de compra se continue a acentuar. Essa é, ainda, herança direta

da troica, as regras da legislação laboral: despedimentos baratos, horas extra a preço de saldo, dias de férias e

de descanso transformados em dias de trabalho não pago, cortes sem fundamento no cálculo das pensões,

foram as regras da troica para a desvalorização interna, ou seja, para a redução estrutural dos rendimentos do

trabalho, e que permanecem.

Em 2019, o Bloco propôs ao PS um acordo de Legislatura para reverter estas regras e continuar o caminho

de recuperação do País, que iniciámos em 2015. O PS recusou. Lamentámos essa decisão, sem nunca deixar

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de trabalhar para os entendimentos possíveis, mas, chegados ao Orçamento do Estado, o Governo decidiu

substituir a negociação pelo ultimato.

Não nos enganemos. O Governo sabe bem que é minoritário e que está obrigado a negociar. A sua crescente

intransigência nas negociações orçamentais tem apenas um objetivo, o de proteger as regras da troica que

ainda permanecem e que condenam o nosso País a baixos salários e baixas pensões.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — A direita pôs as regras na lei, o PS quer torná-las facto consumado e consolidá-las definitivamente. Para isso, teria de forçar a esquerda a abandonar o seu programa e o seu

mandato, e é mesmo isso que tenta fazer, através da chantagem da crise política.

Aplausos do BE.

Sr. Primeiro-Ministro, nenhuma medida de combate à precariedade será eficaz se não for acompanhada pela

alteração da estrutura das leis do trabalho. Portanto, não vale agitar quinhentas boas intenções futuras. Sabe,

como eu sei, que não se reconstituirão salários, carreiras ou direitos enquanto despedir for fácil e barato,

enquanto compensar às empresas pagar em horas extraordinárias o trabalho que deveria ser outro trabalhador

a fazer, enquanto a contratação coletiva continuar fragilizada.

Se o Partido Socialista sempre foi contra o corte das compensações por despedimento para 12 dias por ano

de trabalho, uma medida da direita que foi além do Memorando da troica, porque não aceita, agora, reverter

esse corte?

Sr. Primeiro-Ministro, por que é que recusa repor o pagamento justo das horas extra? O Governo insiste em

manter o corte remuneratório nas primeiras 120 horas extraordinárias trabalhadas, sendo que nas grandes

empresas só são permitidas 150 horas por ano. Não vale a pena chamar aproximação à recusa. Estamos a falar

de mais do que perceções públicas, estamos a tratar de devolver direitos que contam na vida das pessoas.

Porque recusa o Governo eliminar o corte cego do fator de sustentabilidade, que, aliás, já só atinge uma

minoria de pensionistas? Diz-nos que é insustentável, mas não é isso que os números dizem: o universo de

pessoas que se reformaram antecipadamente, sob as regras da troica entretanto revogadas, não vai além das

62 000.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Quanto aos novos reformados, é o próprio Governo que reconhece que, no ano passado, apenas 1em cada 10 foi atingido pelo corte do fator de sustentabilidade. Então, por que é que não

podemos acabar com este corte?

Cito-lhe o ex-Ministro Vieira da Silva, que iniciou a eliminação progressiva do corte do fator de

sustentabilidade. Afirmava Vieira da Silva, em março de 2019: «Não fará nenhum sentido aplicar o fator de

sustentabilidade a uma idade de reforma que resulta desse fator. Isso seria uma inaceitável dupla penalização.

A idade atual da reforma já ela própria incorpora as consequências do fator de sustentabilidade» — fim de

citação.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O Governo parece ter esquecido o trabalho que fizemos, mas nós lembramo-nos. E também não esquecemos o nosso compromisso com quem tem uma vida de trabalho.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Primeiro-Ministro, os salários e as pensões são cada vez mais curtos, e é assim que o desespero alastra e este, sim, é o maior perigo que enfrentamos.

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O maior problema deste Orçamento é que nada faz para travar este desalento. As tímidas medidas sobre

rendimentos — fiscais, sociais, anémicos aumentos da função pública — são incapazes de travar a perda de

poder de compra de quem vive do seu trabalho.

O que foi anunciado como resposta à crise dos combustíveis é o exemplo acabado do complicar para não

resolver.

Mesmo um cidadão a quem se concedera a totalidade do desconto anunciado pelo Governo, não terá mais

do que 5 € de apoio por mês, e só até março, ou seja, o valor de uma viagem da Lousã para Coimbra. E, sabe,

há quem tenha ficado sem comboio e faça esse trajeto quase 50 vezes por mês para ir e vir do emprego.

Muitos anúncios, poucas soluções.

Sr. Primeiro-Ministro, nenhum programa de recuperação será efetivo se não recuperar salários e pensões.

Nenhuma economia é forte sem respeitar quem trabalha.

Há um ano, quando votámos contra o Orçamento do Estado para 2021, avisámos que o futuro passaria

necessariamente pelo trabalho e pelo Serviço Nacional de Saúde. O Governo ignorou-nos e, ao fazê-lo, não

deteriorou apenas as condições para um entendimento parlamentar, deixou degradar também as condições de

vida de quem trabalha e as condições do Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Há demissões nos hospitais todos os dias. Há mais de um milhão de utentes sem médico de família. Os profissionais de saúde estão exaustos e muitos abandonam o SNS.

Não serve prometer investimentos que, como sabe, não serão executados em 2022. Não serve pagar mais

pelas horas extraordinárias acima das 500, o que, aliás, é ilegal. Não serve trocar a exclusividade por uma

dedicação tão pouco plena que um chefe de serviço do SNS continua a poder acumular com segundos e

terceiros empregos na saúde privada.

O que falta é incentivos claros à opção dos médicos e restantes trabalhadores pelo Serviço Nacional de

Saúde, mas isso o Governo não admite.

Os privados da saúde, claro, agradecem a inação. Assistem ao definhamento do SNS e preparam faturas de

milhões de euros em contratualizações com o Estado. O aumento do orçamento para a saúde, sem regras que

permitam fixar trabalhadores no SNS, acabará como tem acabado, em grande medida, nos bolsos dos privados.

Não peça ao Bloco para fingir que não vê.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Nas propostas de orçamento e de estatuto para o SNS há qualquer coisa que lembra a triste história dos cuidadores informais: o estatuto existe, está sempre a ser tratado, dotado com

verbas, mas acaba sempre adiado e as verbas por executar. Entretanto, à frustração das pessoas com a falta

de resposta junta-se a frustração pela inconsistência dos compromissos políticos.

Sr. Primeiro-Ministro, neste momento, o Governo de Pedro Sánchez propõe a reversão das leis da troica na

legislação laboral em Espanha.

Este é o momento, é o momento do investimento e da reconstrução dos rendimentos e direitos do trabalho.

Se não é agora, com a Legislatura a meio, quando o contexto europeu é de alívio das restrições, quando será?

Se não avança agora, Sr. Primeiro-Ministro, desbarata a esperança do País.

Se amanhã não tiver o Orçamento do Estado aprovado é porque não quer. Uma a uma, o Primeiro-Ministro

rejeitou, sem explicar ao País porquê, todas as nove medidas que o Bloco de Esquerda apresentou. Pela minha

parte, não creio que tenha feito essa recusa por sinceramente acreditar que o Bloco abdicaria de ter objetivos

próprios ou de respeitar o seu mandato político. Sabe bem que não o faríamos, como não o fizemos há um ano.

O Governo fez, portanto, a sua escolha. Mas ir para eleições, Sr. Primeiro-Ministro, é a escolha errada.

Pela nossa parte, honramos o nosso mandato e assumimos a nossa responsabilidade.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

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Faça favor, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, sobre o Orçamento do Estado, devo dizer que tem um aumento histórico nas pensões; é um Orçamento que viabiliza o maior aumento de

sempre do salário mínimo nacional; tem um aumento geral de todos os vencimentos da Administração Pública;

mantém as carreiras pelo quinto ano consecutivo descongeladas; e, no âmbito do Serviço Nacional de Saúde,

não só o dota com mais 700 milhões de euros, a somar a todos os esforços que já fizemos, como resolve

estruturalmente um conjunto de problemas do SNS, desde logo um problema fundamental que tem que ver com

a sua gestão e a autonomia da gestão dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, nos limites dos

respetivos quadros de pessoal. É isto que tem o Orçamento do Estado.

No entanto, registei que a Sr.ª Deputada não falou nada sobre o Orçamento do Estado. A Sr.ª Deputada falou

de inúmeras questões importantes, que têm sido objeto do nosso diálogo, mas que não constam da proposta

de lei do Orçamento do Estado. Constam do estatuto do Serviço Nacional de Saúde ou constam das alterações

à legislação do trabalho. Chamo a sua atenção para o facto de que as alterações à legislação do trabalho terão

de ser votadas aqui, na Assembleia da República.

O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A pergunta que lhe faço é a seguinte: se a Sr.ª Deputada está contra as nossas propostas em matéria de legislação laboral, porque não se reserva para votar contra quando vier à Assembleia

da República a proposta sobre legislação laboral? Porque é que quer votar contra o Orçamento do Estado, que

nada tem que ver com a legislação laboral?

Aplausos do PS.

Sr.ª Deputada, como sabe, ao longo do debate que temos tido — que tem decorrido num bom clima, onde

nunca houve chantagens nem ultimatos, onde o Governo nunca disse que queria ir para eleições —, até

procurámos ir ao encontro, uma a uma, das preocupações do Bloco de Esquerda. Em matéria de horas

extraordinárias, de rescisões, de caducidade, demos sempre passos no sentido do Bloco de Esquerda.

O Bloco de Esquerda diz o seguinte: «Bom, mas os passos são insuficientes.» Serão, mas o Bloco de

Esquerda é que, até agora, não deu um único passo que fosse em direção ao Governo. Isso é que até agora

nunca deu.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Deputada diz que o Governo nunca explicou por que razão discorda das nove questões colocadas

pelo Bloco de Esquerda. Vou pedir que lhe entreguem o documento que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos

Parlamentares publicou, respondendo, extensamente, ponto a ponto, a cada uma das suas afirmações e a cada

uma das nove questões do Bloco de Esquerda, explicando onde é que tinha havido avanços, que o Bloco de

Esquerda fingia ignorar, e, por outro lado, também, respondendo porque não aceitávamos algumas das

propostas do Bloco de Esquerda.

Aplausos do PS.

Finalmente, Sr.ª Deputada, como disse o meu camarada José António Vieira da Silva, «devemos ir revendo

o fator de sustentabilidade, sobretudo quando ele introduz uma dupla penalização.» Foi o que começámos por

fazer com as longuíssimas carreiras profissionais, foi o que fizemos relativamente às profissões de desgaste

rápido como, por exemplo, os pedreiros, e já assumimos, neste quadro e na negociação consigo, o compromisso

de o fazer com as pessoas portadoras de mais de 80% de deficiência.

Mas chamo-lhe a atenção de que o que a Sr.ª Deputada e o Bloco de Esquerda propuseram, pura e

simplesmente, revogar, ressalva, precisamente, da aplicação do princípio da sustentabilidade, na alínea c) do

n.º 5 do artigo 35.º, «pensões de velhice dos beneficiários que passem à situação de pensionistas na idade

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normal ou na idade pessoal de acesso à pensão, ou em idade superior.» É precisamente essa a situação a que

se referia o meu camarada Vieira da Silva.

Como viu, agimos em conformidade e assegurámos a eliminação do fator de sustentabilidade nessa situação.

Aplausos do PS.

Sr.ª Deputada, obviamente, não me cabe a mim condicionar o sentido de voto do Bloco de Esquerda. É livre.

Já no ano passado nos deixaram, quando tínhamos de enfrentar a pandemia, e admito que não queiram agora

regressar ao combate comum que tínhamos iniciado em 2016.

Contudo, Sr.ª Deputada, com toda a franqueza, não vote contra o Orçamento do Estado, apenas porque é

contra uma proposta de lei laboral que está neste momento em debate público e que ainda há de vir à

Assembleia da República e, aí, poderá ter a oportunidade de votar a favor, porque, seguramente, verificará que

corresponde a grande parte das ambições do Bloco de Esquerda.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PCP, e para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: O sentido que queremos dar a este debate é o de reafirmar as soluções que temos para os problemas do País e de confrontar o Governo com

as respostas que são necessárias.

É preciso assumir medidas e compromissos de resposta global aos problemas nacionais, uma resposta

global em que o Orçamento deve inserir-se, mas que vai para lá dele.

O aumento geral dos salários é uma emergência nacional e exige o aumento do salário mínimo nacional e

dos salários na Administração Pública, com recuperação de poder de compra perdido e revogação das normas

gravosas da legislação laboral.

Porque insiste o Governo em deixar mais de dois milhões de trabalhadores desprotegidos nos seus direitos,

deixando nas mãos do capital o cutelo da caducidade da contratação coletiva?

É possível assistir à degradação da capacidade do SNS, vendo esvair os profissionais, aceitando o saque

dos grupos privados de saúde dos recursos e profissionais do SNS, em vez de investir a sério na sua fixação?

É o direito à consulta, ao exame, às cirurgias, ao médico de família que está em causa, tal como a garantia do

direito à habitação, que precisa de ser assegurado. O que explicar aos milhares de pessoas que não conseguem

ter acesso à habitação ou vivem no receio de ficar sem ela?

O aumento extraordinário das pensões e reformas, abrangendo todos os pensionistas, o fim das penalizações

para as longas carreiras contributivas, o avanço nas creches, assegurando a gratuitidade e criando 100 000

vagas em rede pública são necessidades igualmente evidentes para que o défice demográfico seja enfrentado.

É preciso agir sobre os preços da energia. Como admitir que milhões de portugueses não tenham

possibilidade de aquecer as suas casas no inverno que aí vem?

O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A defesa da produção nacional e o apoio às micro, pequenas e médias empresas reclama a recuperação do controlo público dos setores estratégicos, a fixação e controlo do preço da

energia e dos combustíveis e a recuperação dos CTT (Correios de Portugal), como elementos imprescindíveis

à dinamização económica e ao crescimento.

Tudo isso foram questões que ao longo dos últimos meses levámos à discussão com o Governo para que

sobre elas houvesse decisão.

O ponto a que chegámos hoje é conhecido.

Recusando considerar a resposta global que propusemos, o Governo considerou apenas isoladamente

algumas das propostas do PCP. O exemplo do salário mínimo nacional confirma que não foi por falta de

persistência ou abertura do PCP para que fossem encontradas soluções.

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O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Desde 2020, o PCP tem a sua proposta apresentada de aumento do salário mínimo nacional para os 850 €. Desde março deste ano, o Governo fixou o objetivo de 705 €, em 2022,

e 750 €, em 2023.

Entretanto, em Espanha, o salário mínimo está a caminho dos 1000 €. Na Alemanha anunciou-se agora, para

2022, um aumento de 400 €, fixando o salário mínimo em mais de 2000 €.

Portugal arrisca-se a ficar ainda mais para trás numa questão de inegável importância económica e social.

Às centenas de milhares de trabalhadores com um salário de 705 €, o que lhes resta, se quiserem ter o luxo de

sonhar com o direito à habitação? Ou como podem os jovens casais decidir, em liberdade, ter filhos, com este

salário e o seu vínculo precário?

Não há futuro para um País baseado em baixos salários.

Propusemos ao Governo a fixação do salário mínimo nacional em 800 €, em 2022, e 850 €, em 2023.

Chegámos mesmo a propor que se começasse o ano de 2022 com 755 €.

O Governo manteve a mesma proposta que tem desde março, não saindo da posição inicial numa matéria

desta relevância.

Bem sabemos que isso toca nos lucros dos grupos económicos. Para as micro, pequenas e médias

empresas, que vivem do poder de compra dos portugueses, essa é, ao contrário do que afirmou, uma medida

que favorece a dinamização da sua atividade.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Quando era preciso que o Governo fizesse uma opção decidida a favor dos trabalhadores das micro, pequenas e médias empresas e do mercado interno, o Governo preferiu recusar

tal opção.

O País precisa de soluções e o PCP bate-se por elas. Mas, convenhamos, Sr. Primeiro-Ministro, que não é

com as opções que o Governo fez e faz que havemos de conseguir tirar o País da difícil situação em que se

encontra.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, o diálogo que temos mantido este ano, tal como nos anos anteriores, tem sempre permitido avanços. Nem sempre chegando onde ambos

queremos, temos sempre conseguido avançar e este ano já avançámos bastante.

Quanto às pensões, tínhamos previsto um aumento extraordinário em agosto. Em diálogo com o PCP,

aceitámos que esse aumento extraordinário fosse em janeiro e, em vez de ser só para as pensões de até 1,5

IAS (indexante dos apoios sociais), subimos para as pensões até 2,5 IAS. Ou seja, haverá um aumento

extraordinário para as pensões até 1,097 €.

Aplausos do PS.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro (Tiago Antunes): — São 2 milhões e 300 mil pessoas!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Este diálogo com o PCP permitiu assegurar este aumento extraordinário para 2 milhões e 300 mil pessoas.

Em diálogo com o PCP, aceitámos proceder ao desdobramento dos escalões do IRS, sendo 1,5 milhões de

agregados familiares os que serão beneficiados.

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Graças ao diálogo com o PCP, há mais 170 000 famílias que vão ficar isentas de IRS, por termos aceitado a

vossa proposta de aumento do mínimo de existência.

Aplausos do PS.

Por termos aceitado a proposta do PCP, iniciaremos, em setembro do próximo ano e ao longo dos próximos

três, a generalização da gratuitidade das creches para todas as crianças, começando no primeiro ano, no

próximo ano, nos primeiro e segundo anos, no ano seguinte, e nos primeiro, segundo e terceiro anos, finalmente,

no terceiro ano de convergência.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, estes são ganhos efetivos, são progressos efetivos, que resultaram do

trabalho conjunto que vimos desenvolvendo desde julho até agora.

Vozes do PS: — É verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ninguém compreende, no País! As pessoas a quem respondemos não conseguem compreender como se pode votar contra, como podem inviabilizar um Orçamento que inicia a

gratuitidade das creches, que tem este aumento extraordinário das pensões, já em janeiro, que tem este

progresso no regime fiscal, que permite um aumento geral na Administração Pública e continuar a progredir nas

carreiras da Administração Pública. Acho que ninguém, lá fora, vai conseguir compreender a vossa posição!

Sobre o salário mínimo, em concreto, assumimos um compromisso muito importante, que é, de uma vez por

todas, o de fazermos convergir o peso das remunerações no PIB, que está em divergência contínua com a União

Europeia, desde 2008. Começámos a inverter esta situação, em conjunto, em 2016, mas temos de o fazer

convergir rapidamente com a média europeia.

Obviamente, estamos a falar dos salários todos: dos salários médios, que, desde 2015 até agora, já

aumentaram 10%, e também dos salários mínimos, cuja recuperação, ao longo destes anos, tem tido uma curva

muito acentuada.

Sr. Deputado, obviamente, o salário mínimo será sempre inferior àquilo que qualquer um de nós desejava.

Por isso, temos de ter uma medida relativa, para saber se o copo está a encher ou a esvaziar. Em relação ao

aumento de 135 € que propõem para chegarmos aos 800 €, para o conseguir, tínhamos de fazer, num só ano,

um aumento idêntico ao que fizemos ao longo dos quatro anos da anterior Legislatura!

Aplausos do PS.

Protestos de Deputados do PCP.

Pergunto-lhe sinceramente, Sr. Deputado, se tem a certeza de que as micro, pequenas e médias empresas,

que saem da crise económica mais profunda e estão numa dificuldade imensa para resistir, podem, neste ano,

sofrer um choque salarial desta natureza.

Não sou daqueles que diz…

Protestos de Deputados do PCP.

Nunca disse — nem desvalorizei, alguma vez — que o aumento de rendimento não contribui para o

crescimento económico. Pelo contrário, disse hoje, aqui, que a nossa estratégia de recuperação assenta no

aumento do investimento e no aumento do rendimento.

Contudo, é preciso saber se esse rendimento é sustentável. Sabemos que, para o Estado e para as

autarquias locais, dificilmente o é. São 550 milhões de euros a mais na massa salarial da Administração Pública.

Bem sei que as empresas não têm a dimensão que tem o conjunto da Administração Pública,…

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Pois não!!

O Sr. Primeiro-Ministro: — …mas acho que é muito arriscado darmos um passo dessa natureza. Quando estamos a falar de 40 €, Sr. Deputado, com toda a franqueza, não estamos a falar de qualquer coisa.

Trata-se do maior aumento salarial de sempre, repito, de sempre, do salário mínimo nacional, desde que foi

criado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do CDS-PP e tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, para pedir esclarecimentos.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, estas duas últimas perguntas e respostas parecem deixar muito evidente que este debate marca o fim de um ciclo e o fim de um modelo, modelo

esse que o senhor criou para, sem ter ganhado as eleições, chegar ao poder e governar o País.

Protestos do PS.

Na altura, o senhor disse que tinha derrubado um muro. Lembro-me de lhe ter dito que achava que o senhor

tinha caído para o outro lado do muro. A verdade é que, agora, parece muito evidente que o senhor está entre

a espada e o muro e que não tem como sair da situação em que se colocou.

Aparentemente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, a geringonça matou a geringonça.

Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.

Foi o que aconteceu, é disso que estamos a falar e o problema não é nosso, Sr. Primeiro-Ministro. O senhor

acaba de demonstrar que não é nosso.

Este é, do nosso ponto de vista, um mau Orçamento, repete Orçamentos anteriores e é — dessa perspetiva

até concordo — mais socialista ainda do que os anteriores.

É um Orçamento que corresponde à herança de seis anos de geringonça, e a herança é, na verdade,

recuando a 2015, um aumento significativo da dívida pública. Temos, atualmente, mais endividamento, mais

dívida pública do que tínhamos em 2015.

É um Orçamento que apresenta Portugal como tendo um dos piores salários médios da União Europeia, que

tem estado a recuperar, sendo que o nosso está muito longe, muito distante. Porquê? Porque, Sr. Primeiro-

Ministro, ao contrário do que pensam os seus parceiros, quem cria salários, salários bons, não é o Estado, nem

são decretos, são as empresas, como é evidente.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Este é um Orçamento feito contra as empresas! É um Orçamento de um País que teve uma queda significativa do PIB, ao contrário do que diz, e que tem, ao fim de seis anos de

governação socialista, níveis de empobrecimento que não são aceitáveis para um país da União Europeia.

Quase 2 milhões de portugueses estão em risco de pobreza.

É um Orçamento que representa a herança da geringonça. É um Orçamento que não resolve, como aqui foi

dito, e bem, questões da própria conjuntura.

Sobre os combustíveis, apresentámos a proposta de retirar o excesso de imposto e a sobretaxa. Os senhores

chumbaram essa proposta e acham que a questão dos combustíveis se resolve com uma promoção de trocos,

por assim dizer.

É um Orçamento que continua a colocar-nos entre os piores países, atrás da maior parte dos países do

antigo bloco do leste, na recuperação pós-pandemia.

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Mas este Orçamento é o resultado das suas opções e das suas escolhas, Sr. Primeiro-Ministro. O senhor,

de alguma forma, para usar mais uma expressão — já outras foram usadas —, fechou-se dentro de uma espécie

de casa assombrada. Trancou-se lá dentro!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Uh!!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É assustador para o País, é, Sr. Deputado. Tem toda a razão. É muito assustador para o País.

O senhor recusou — e voltou a recusar hoje! — qualquer outra opção que não fosse a da geringonça. O

senhor, ao longo do mandato, teve, mais do que uma vez, sinais, designadamente, do maior partido da oposição,

não tanto do meu partido, no sentido de haver diálogo, e o senhor recusou sempre, fechou-se sempre nesse

modelo.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Diálogo e votos!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O senhor descartou qualquer hipótese de diálogo ou de outra solução e disse sempre que tinha parceiros estáveis e confiáveis. Foi o que o senhor andou a dizer ao País até hoje: que

tinha parceiros estáveis e confiáveis e que tinha uma solução estável e coerente. Até foi duradoura, mas também

dizia que era estável e coerente!

Chegados a este momento, Sr. Primeiro-Ministro, estamos a assistir à continuação daquilo que acho deixar

chocado, por assim dizer, qualquer cidadão normal, qualquer português de bom senso. Assistimos, nestas

últimas três semanas, àquilo que já tínhamos visto, em anos anteriores, num grau superlativo: uma barganha

pública orçamental, um regateio medida a medida, que chega a este momento e não tem resolução nenhuma.

Sr. Primeiro-Ministro, para sair do tal buraco onde se meteu, acho que, nas últimas três semanas, o senhor

comprou um bilhete para um comboio-fantasma. Repito: o senhor comprou um bilhete para um comboio-

fantasma! O senhor andou três semanas a prometer tudo ao partido comunista mais ortodoxo da Europa, para

não dizer o único.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ortodoxos são os católicos!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Andou a prometer-lhes tudo! Andou a prometer-lhes reverter toda a legislação laboral, a mesma legislação laboral que, até 2015, nos permitiu sair de um desemprego de 17%,

reduzindo-o para 6%. O senhor andou a prometer a contratação coletiva vitalícia, ad aeternum. O senhor

continua a prometer isso mesmo, o final da razoabilidade nos contratos a termo. Andou a prometer, como admitiu

agora mesmo, realidades que poriam em xeque grande parte das nossas empresas.

Andou a prometer isso tudo ao PCP e…

Protestosde Deputados do PS.

… chega a este momento e o que tem?! O que tem, depois de prometer isso tudo?! Chega a este momento

e o que é que aconteceu?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso não é um comboio-fantasma!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Bateram-lhe com a porta na cara. Repito, bateram-lhe com a porta na cara! O senhor chegou a este momento e bateram-lhe com a porta na cara.

Quero deixar-lhe uma pergunta final, Sr. Primeiro-Ministro, além de lhe pedir a explicação destes factos.

Protestos do PCP.

Até é bonito, Srs. Deputados. Gosto muito, sinceramente. «Enquanto houver estrada para andar», Sr.

Primeiro-Ministro, é bonito.

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Contudo, acho que o seu problema é que o senhor não tem um pé numa galera: o senhor tem os dois no

fundo do mar, continuando no mesmo autor. O senhor não tem solução.

Pergunto-lhe, até, no dia em que a geringonça mata a geringonça, o que é que tem a dizer ao País para o

futuro. Vamos admitir que, amanhã, a proposta de Orçamento cai e, como o Sr. Presidente da República já

disse, vamos para eleições. Imaginemos — espero bem que não! — que o senhor chega aqui com uma maioria

de esquerda. O que é que o senhor vai dizer?! Que se vai juntar com eles outra vez?!

Protestos do PS.

É capaz de dizer isso? É capaz de dizer isso, hoje, ao País? É capaz de dizer que tem uma solução de

esquerda para o País? Não! O seu modelo acabou, o senhor não tem solução nenhuma e esse é o seu principal

problema.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, ouvindo-o a si e, há pouco, o Sr. Deputado Rui Rio, vejo quem, de facto, são as únicas pessoas que podem ficar contentes com o pré-anúncio

de voto contra este Orçamento que o PCP e o Bloco de Esquerda fizeram. Só mesmo os senhores podem ficar

felizes com um pré-anúncio dessa natureza!

Aplausos do PS.

Mas, Sr. Deputado, em democracia, há sempre soluções. Repito, em democracia, há sempre soluções. Da

nossa parte, até ao último minuto, faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para viabilizar, naturalmente,

este Orçamento do Estado, porque entendemos que é um bom Orçamento e que corresponde às necessidades

do País.

Como tive oportunidade de dizer, faremos de tudo para ter um bom Orçamento do Estado, mas não teremos

um Orçamento do Estado a qualquer preço, porque o País não suporta nem comporta qualquer preço para a

aprovação do Orçamento do Estado.

Por isso, vamos fazer tudo para negociar, para que ele possa ser aprovado e veremos o que acontece.

Depois de a Assembleia da República — que é soberana para aprovar ou não aprovar o Orçamento — tomar a

decisão, veremos o que o Sr. Presidente da República, que também é soberano, decide fazer ou não decide

fazer.

Pela nossa parte, já anunciámos o que tínhamos a anunciar. Não viramos a cara ao País e não viramos a

cara às nossas responsabilidades. Estamos aqui para cumprir as nossas responsabilidades, estamos aqui para

exercer as nossas funções e estamos aqui para governar o País.

É isso que estamos aqui a fazer e é isso que faremos, quaisquer que sejam as circunstâncias em que sejamos

colocados. Governaremos de uma forma, numas condições, e governaremos de outras, em más condições.

Já tivemos de enfrentar as ameaças de procedimento por défice excessivo, já tivemos de enfrentar os

augúrios do Diabo, já tivemos de enfrentar a herança, já tivemos as ameaças das sanções e já tivemos de

enfrentar uma pandemia. Olhe, quem sabe se não temos de enfrentar, também, um País a ser gerido em

duodécimos!?

Não sei. Não o desejo. Aquilo que desejo é que este debate corra bem, de uma forma construtiva e que, com

responsabilidade, se encontre a forma de dotar o País do Orçamento de que precisa para 2022.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos ao Primeiro-Ministro, pelo PAN, a Sr.ª Deputada Inês Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, o nosso País vive, sem dúvida absolutamente nenhuma, momentos bastante

difíceis.

O debate em torno deste Orçamento do Estado tem de ser feito com seriedade, o que não se coaduna com

insinuações simbólicas e os interesses partidários não podem, de forma alguma, estar à frente dos interesses

do País. Não podem estar também à frente da vida das pessoas, do desenvolvimento económico, do

financiamento dos serviços públicos e do combate à crise climática, que também não desapareceu como pano

de fundo.

Juntar uma crise orçamental a uma crise sanitária sem precedentes é mais do que irresponsável, é mais do

que um braço de ferro entre interesses partidários, é causar reais consequências para a vida das pessoas e

para o futuro do País.

Quando fomos todos chamados, nesta mesma Casa, a declarar o estado de emergência, a dizer ao País que

tinha de ficar em casa, todos nos apressámos a dizer que não faltaríamos ao País, que não deixaríamos de dar

respostas — respostas sociais, económicas, respostas que garantissem uma real e efetiva retoma

socioeconómica —, que não deixaríamos ninguém para trás. No entanto, não permitir nem discutir o Orçamento

do Estado na generalidade é faltar ao País.

No PAN, não esperamos milagres. Somos responsáveis e trabalhamos para que, efetivamente, se consigam

respostas, mesmo que o trabalho seja difícil, mesmo que esbarre na intransigência ou que fique aquém daquilo

que pretendemos.

Através da capacidade de negociação e também do sentido de responsabilidade, tal como já foi,

inclusivamente, reconhecido, conseguimos que, neste Orçamento, se aumentassem os rendimentos da classe

média por via das alterações aos escalões do IRS, incluindo o escalão do IRS jovem.

Conseguimos também a bolsa de intérpretes de língua gestual portuguesa, uma matéria da mais elementar

justiça social e de inclusão, para garantir uma meta e uma rota na igualdade no nosso País.

Conseguimos garantir o reforço dos transportes públicos, algo absolutamente fundamental, a par da

Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa 2020-2030, para combatermos não só o que é uma necessidade

social mas também as alterações climáticas e a necessidade da descarbonização.

Conseguimos garantir um reforço, já com espelho no que é a generalidade do Orçamento, no combate à

corrupção.

Conseguimos alargar o programa de defesa animal a todo o País, porque com o PAN os animais também

não ficam para trás, e conseguimos mais apoio para a conservação da natureza e da biodiversidade.

Conseguimos um programa de monitorização e despoluição dos rios, conseguimos investimento no combate

à pobreza energética e respostas para garantir o direito à habitação das pessoas mais vulneráveis.

A par destas medidas que fazem parte da necessidade de consenso e diálogo, foram também conseguidos

compromissos no sentido de avanços civilizacionais hoje imprescindíveis, como é o caso de alargar o Código

Penal a outros seres vivos dotados de sensibilidade que não apenas os animais de companhia.

A pergunta que se faz é: é este Orçamento perfeito? Não, não é. É este o Orçamento que pretendíamos?

Não, também não é.

Aliás, este Orçamento não prioriza a saúde mental, nem aposta na saúde preventiva, mas escolhe, por outro

lado, gastar quase 900 milhões de euros com o regime de residente não habitual, ou seja, para que estrangeiros

venham gozar as suas reformas no nosso País quando temos os nossos pensionistas a passar tantas

necessidades.

Também opta por deixar em falta mais de 1000 milhões de euros para a saúde e não assegura a justa

valorização dos técnicos auxiliares de saúde, quando opta, em contrapartida, por pagar às parcerias público-

privadas (PPP) rodoviárias três vezes mais do que elas custam, inclusive já neste Orçamento do Estado, onde

se prevê uma verba de mais de 1,6 mil milhões de euros. Aliás, este é um dos grandes elefantes na sala de que

ninguém fala, apesar de falarmos tantas vezes na TAP (Transportes Aéreos Portugueses) e no Novo Banco.

É também um Orçamento que escolhe não fazer avanços estruturais na justiça, apesar de perdermos a cada

minuto 34 000 € para a corrupção.

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A par destas questões, não ousa também fazer reformas necessárias na educação, nem valoriza a dedicação

e a vida dos profissionais da educação, apesar de estarmos a falar do presente e do futuro das crianças e jovens.

É um Orçamento que se apresenta também em contraciclo com as exigências da crise climática, não só

reduzindo o valor atribuído como também continuando a dar borlas fiscais e a permitir a existência de subsídios

perversos.

Apesar do recente avanço no estatuto do trabalhador cultural, algo que também foi negociado e conversado

com as restantes forças políticas, continua a não ser valorizada a cultura em Portugal, não havendo sequer

vontade política de termos um mínimo de 1% consignado no Orçamento do Estado para a cultura.

Sr. Primeiro-Ministro, evitar uma crise orçamental também está nas suas mãos. É certo que temos presente

que, se uns querem usar este debate para construir muros, o PAN pretende usar este debate para construir

pontes, para dar respostas ao País, aos desafios que temos pela frente e a uma crise que não desapareceu

nem vai desaparecer tão depressa.

Mas para isso acontecer é preciso que este Orçamento não seja mais do mesmo. É preciso que seja um

Orçamento de mudança, de investimento estrutural, onde é fundamental que esse investimento exista,

nomeadamente em matéria de serviços públicos e também de mudança de paradigma no que respeita ao

desenvolvimento socioeconómico do País. Para isso, precisamos de falar em desenvolvimento económico

responsável e sustentável e não num crescimento desmesurado, que não respeita nem as pessoas nem os

recursos naturais.

É por isso que nos importa ouvir, desde já, respostas a algumas destas questões estruturais, Sr. Primeiro-

Ministro.

No que respeita à saúde, estão, ou não, o Sr. Primeiro-Ministro e o seu Governo, disponíveis para garantir

não só a valorização dos técnicos auxiliares de saúde — um elemento absolutamente imprescindível para

garantir que existe um robustecimento do Serviço Nacional de Saúde —, bem como para, em matéria de

prevenção, numa área tão sensível como os cuidados aos bebés prematuros, criar, pela primeira vez no nosso

País, uma rede de bancos de leites maternos, o que permite salvar vidas a estas crianças?

Em matéria ambiental, Sr. Primeiro-Ministro, a crise climática não só não desapareceu como devemos às

presentes e futuras gerações deixar-lhes um país, um planeta, onde possam viver com qualidade de vida. Para

isso temos de garantir que há um aumento, uma duplicação — foi o que o PAN reivindicou —, da verba prevista

para os transportes públicos e para a Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa 2020-2030. Está ou não

disponível para dar este passo em matéria de justiça social e também de justiça climática?

Está disponível para garantir igualmente o fim da pobreza energética e a adaptação das habitações, para

que não tenhamos pessoas a morrer de frio em Portugal, Sr. Primeiro-Ministro?

Esta é, de facto, uma prioridade e há um aumento do investimento substancial, mas quando falamos de uma

necessidade de 380 milhões não nos podemos contentar com meros milhões de euros que vão chegar a poucas

famílias.

Mais, Sr. Primeiro-Ministro, conseguirá garantir a transformação da agricultura em Portugal, que é

fundamental que seja feita? Proteger os agricultores é garantir que têm, de facto, incentivos para tornar mais

competitivas as boas práticas, como a agricultura biológica, é garantir o aumento da área reservada para boas

práticas e modos de produção sustentáveis no nosso País, a par, evidentemente, de pagar os serviços dos

ecossistemas.

Sem esta visão de médio e longo prazo, Sr. Primeiro-Ministro, não teremos apenas aqui um problema

orçamental, de inviabilização do Orçamento, teremos também um problema da sustentabilidade e do futuro do

nosso País, do nosso Portugal.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês Sousa Real, quero começar por saudar a postura construtiva que o PAN tem mantido ao longo destes trabalhos, que não têm sido fáceis, porque partiram

de um extenso rol de 156 propostas, o que tem exigido da parte de todo o Governo um trabalho muito aturado,

porque eram, de facto, propostas muito transversais.

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Vou direto às questões que colocou. Quanto aos técnicos auxiliares de saúde, já assumimos o compromisso

público de negociar e regulamentar essa carreira e iremos fazê-lo.

Em segundo lugar, já assumimos o compromisso relativamente à criação de quatro bancos de leite materno,

como tinha sido estabelecido com o PAN.

Em terceiro lugar, aceitámos também a duplicação das verbas relativamente à promoção da mobilidade

sustentável.

Em quarto lugar, e relativamente ao combate à pobreza energética, acordámos uma verba de 40 milhões de

euros para, associada ao programa de eficiência energética, podermos assegurar este combate.

Finalmente, temos o objetivo muito ambicioso de, até 2023, podermos ter 15% do nosso espaço agrícola

dedicado à agricultura biológica.

Mas, para maior precisão e para que tudo fique claro entre nós, há o documento escrito que o PAN nos

enviou e hoje o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares enviou também um documento escrito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos ao Primeiro-Ministro, pelo PEV, o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que faça duas notas prévias antes de entrar propriamente no debate.

A primeira é para registar o anúncio feito pelo Sr. Primeiro-Ministro, ali da tribuna, relativamente à criação da

carreira de guarda-rios, porque é uma proposta antiga de Os Verdes a quem o Governo disse sempre «não»,

inclusivamente no âmbito das negociações deste Orçamento do Estado.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Bem lembrado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não, não!

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — A segunda nota prévia é para perguntar se alguém se lembra de quem afirmou, há cerca de um ano, que era demagógico aumentar o salário mínimo nacional.

Ora, se é demagógico aumentar o salário mínimo nacional, como afirmou há cerca de um ano o Sr. Deputado

Rui Rio, o que dizer daqueles que votam contra o aumento do salário mínimo nacional e a seguir se queixam

dos salários baixos no nosso País?!

Portanto, fica a pergunta.

Sr. Primeiro-Ministro, numa altura em que, por um lado, nos encontramos mais libertos da pressão da

pandemia e, por outro, também, com menos condicionalismos vindos da União Europeia, esperávamos que o

Governo apresentasse um Orçamento para 2022 que se mostrasse suficientemente capaz de dar resposta ao

conjunto das dificuldades que estamos a atravessar e que requerem resposta urgente.

Sucede que, como, na altura da entrega do Orçamento, Os Verdes tornaram público, o Orçamento do Estado

para 2022, na nossa perspetiva, está muito longe de dar as respostas que se impõem, face à dimensão e à

gravidade dos problemas. Também na altura, tivemos oportunidade de assinalar ser absolutamente

incompreensível que, prevendo-se um crescimento da economia de 5,5%, esse crescimento não se faça sentir

na garantia de mais qualidade de vida para os portugueses, seja ao nível do seu poder de compra, seja ao nível

da qualidade dos serviços públicos, seja ao nível também de melhores padrões ambientais.

De facto, Sr. Primeiro-Ministro, se não é quando a economia cresce que se procede à recuperação do poder

de compra das pessoas e se investe a sério nos serviços públicos, ou se melhoram os padrões ambientais,

então nunca é tempo nem de melhorar as condições de vida dos portugueses, nem de investir nos serviços

públicos, nem de cuidar dos nossos recursos naturais.

Assinalamos ainda que, estando o Governo mais liberto dos constrangimentos e limitações das regras da

União Europeia não encontramos justificações para que a corrida ao défice continue a ser o farol orientador

deste Orçamento, comprometendo seriamente a resposta emergente aos problemas do País.

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Porém, Sr. Primeiro Ministro, queria trazer para debate uma matéria que tem andado arrastada no tempo e

que está não só a penalizar gravemente os funcionários judiciais, mas também a contribuir para a morosidade

da nossa justiça.

Vejamos, o Orçamento do Estado para 2020 determinava que tanto o Estatuto dos Funcionários de Justiça

como a integração do suplemento de recuperação processual e a criação de um regime diferenciado de

aposentação para os funcionários judiciais fossem negociados com as estruturas representativas dos respetivos

trabalhadores, para que o processo estivesse concluído até ao final do mês de julho de 2020. Sucede que julho

de 2020 já passou, o ano de 2020 também já lá vai há algum tempo e não houve qualquer avanço nesta matéria.

A seguir, veio o Orçamento do Estado para 2021 e, no seu artigo 39.º, é referido que até ao final de março

deste ano, portanto 2021, é publicada em Diário da República a revisão do Estatuto dos Funcionários de Justiça.

Mais uma vez, março já lá vai, estamos em finais de outubro e o processo não conhece qualquer avanço.

Entretanto, saíram já mais de uma centena de funcionários judiciais para a aposentação e mais de duas

dezenas de profissionais «fugiram» para outros serviços da administração, porque sem estatuto não há

progressão na carreira, não há valorização salarial e os funcionários judiciais vão naturalmente continuar a

procurar outros serviços, com graves prejuízos para a celeridade processual e para a própria administração da

justiça.

De qualquer forma, esta situação é absolutamente incompreensível, porque a Assembleia da República

aprova as leis, a Assembleia da República determina os prazos e o Governo não cumpre, sendo que os assuntos

vão passando de ano para ano, de Orçamento para Orçamento e nada se resolve.

O caso dos funcionários judiciais é apenas um entre muitos exemplos que aqui podiam ser referidos, como

é o da criação do fundo de tesouraria para as micro, pequenas e médias empresas. Trata-se de um fundo que

foi, como sabe, uma proposta de Os Verdes, negociada com o Governo, no âmbito do Orçamento do Estado

para 2021, que ficou consagrada no Orçamento do Estado para 2021, e que, representou, aliás, uma medida

decisiva para a construção no sentido de voto de Os Verdes nesse Orçamento. No entanto, o resultado foi o que

se viu e que o Sr. Primeiro-Ministro tão bem conhece.

Mas, voltando aos funcionários judiciais, Sr. Primeiro-Ministro, se a questão do estatuto pode ser mais

demorada porque exige negociações com os representantes dos trabalhadores, o mesmo não podemos dizer

no que se refere à integração do suplemento de recuperação processual, que podia avançar sem quaisquer

entraves.

Sr. Primeiro-Ministro, o que é que justifica este impasse no Estatuto dos Funcionários de Justiça, que vai

passando de ano para ano, que vai passando de Orçamento para Orçamento, mas que não conhece qualquer

avanço?

Aplausos do PEV e do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, no âmbito das conversações que temos mantido, temos procurado obter avanços. Verifico que registou agora que houve um também avanço

em matéria da recuperação da carreira de guarda-rios.

Relativamente à questão geral dos rendimentos, chamaria a atenção porque a proposta que temos, de

aumento do salário mínimo nacional, continua a ser acima do crescimento do produto interno bruto. É verdade

que prevemos um crescimento de 5,5%, mas também é verdade que propomos um aumento do salário mínimo

nacional que é superior aos 5,5%, de forma a ajudar a que os salários voltem a convergir com o salário médio

da União Europeia no peso do PIB. Acho que esse deve ser o objetivo que devemos partilhar.

No que diz respeito aos oficiais de justiça, isso é uma história antiga, que já vem, pelo menos, do tempo em

que eu era Ministro da Justiça, nos anos de 2000.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Veja bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, a razão pela qual isso não aconteceu ainda este ano, deve ser provavelmente a mesma por que não aconteceu nos 19 anos anteriores.

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Porém, creio que estamos, neste momento, a muito pouco tempo de resolver definitivamente esse problema,

porque como está a vigorar um regime extraordinário, criado pelo Ministro Vera Jardim, nos idos de 2007 ou

2008, em 2021, será muito difícil considerá-lo como um subsídio extraordinário e temporário.

Finalmente, no que diz respeito à linha de crédito, propusemos — aliás, no documento escrito que enviámos

— a recuperação desse instrumento, do fundo de tesouraria, ao qual tive também ocasião de me referir no

discurso que fiz aqui há pouco, na apresentação deste Orçamento do Estado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Os vários Orçamentos do Estado socialistas que foram apresentados nesta Câmara são todos maus, mas este consegue

ser o pior deles todos, Sr. Primeiro-Ministro. E consegue ser o pior deles todos, de tal forma que nem os seus

parceiros mais fiéis — exceto o PAN, que tem medo de que isto caia e que tenham de ir a eleições e a quem o

Sr. Primeiro-Ministro deu duas ou três coisas — conseguem agora segurar o seu Governo.

Sr. Primeiro-Ministro, o senhor é o único responsável pela situação que estamos a viver hoje. Confiou em

quem não devia ter confiado, olhou para os sinais económicos e não percebeu o desastre a caminho do qual ia.

E, hoje, está aqui, com todos estes ministros, com o maior Governo da União Europeia, a dizer «segurem-me,

se não eu caio» e «vamos mesmo continuar a governar».

Vamos a factos. O Sr. Primeiro-Ministro veio dizer: «apostámos tudo na concertação social». Porém, ainda

há dois dias tivemos alguns parceiros da concertação social a abandonar uma reunião e a dizer que foi a primeira

vez, desde 1984, que tiveram de o fazer e foi de tal forma que o Sr. Primeiro-Ministro, à noite, lhes pediu

desculpa.

O Sr. Primeiro-Ministro quer convencer o Bloco de Esquerda de que vai pôr 900 milhões de euros no SNS.

O Sr. Primeiro-Ministro: — São 700 milhões de euros!

O Sr. André Ventura (CH): — Mas nós já o conhecemos há muito tempo, Sr. Primeiro-Ministro. Tanto faz serem 900 milhões de euros, como 700 milhões de euros, como 1 milhão de euros, como 20 milhões de euros,

porque não vai pôr nada disso e vai, antes, continuar a cativar e a cativar, como tem feito ao longo dos últimos

seis anos.

O Bloco de Esquerda, assim como o PCP, podem enganar-se uma, duas, três, quatro, cinco, seis vezes,

mas, à sétima vez, não se enganarão certamente.

Tenho de dizer-lhe isto, Sr. Primeiro-Ministro: mesmo que, em desespero, o Bloco de Esquerda viabilize

amanhã este Orçamento do Estado, com medo de ter de ouvir os portugueses, mesmo que esse desespero

vença, Sr. Primeiro-Ministro, o seu Governo acabou, esta maioria parlamentar acabou e conheceu hoje o seu

dia fúnebre, o que, como todos nós, o Sr. Primeiro-Ministro reconhecerá.

Disse o Sr. Primeiro-Ministro que saímos da crise sem austeridade e ouvimos o PAN saudar aqui o esforço

socialista. Meu Deus, onde é que chegámos?! O PAN a saudar o Governo socialista é qualquer coisa de

inacreditável!

Protestos doPS.

Disse o Sr. Primeiro-Ministro que saímos da crise sem austeridade.

Protestos do PS.

Srs. Deputados, deixem-me lá terminar!

Sr. Primeiro-Ministro, explique aos portugueses, lá fora, como é que tivemos um recorde de carga fiscal no

ano passado. Explique lá como é que temos o quinto preço da gasolina mais caro da Europa e como é que

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pagamos um preço da eletricidade dos mais caros em toda a União Europeia! E vem o Sr. Primeiro-Ministro

aqui, a esta Câmara, dizer que saímos desta crise sem austeridade!…

Fala da saúde e acena ao Bloco de Esquerda e ao PCP com verbas para a saúde, mas hoje mesmo, à hora

a que estamos a discutir o Orçamento do Estado, demitem-se médicos nos hospitais em Braga, em Setúbal e

em muitos outros hospitais do País, contra o seu Governo. Se anunciam greves, não é certamente por terem o

melhor orçamento para a saúde, que o senhor tinha prometido aos portugueses.

Sr. Primeiro-Ministro, podem enganar-se algumas pessoas durante algum tempo, pode enganar alguns

parceiros durante algum tempo, mas não pode enganar toda a gente a vida toda!

Protestos doPS.

Está a chegar ao fim e já estão nervosos, mas chega sempre o fim.

Protestos doPS.

Sr. Presidente, peço que me deixem continuar.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, criem condições para que o Sr. Deputado se possa fazer ouvir, por favor.

Sr. Deputado, peço-lhe que prossiga, por favor.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

O Sr. André Ventura (CH): — Não, o Chega vai chegar em janeiro. Nessa altura é que vai chegar! O Sr. Primeiro-Ministro falou em educação. Como é que pode vir a esta Câmara falar em educação, quando

o seu Orçamento tem um artigo sobre educação — um artigo! Como é que quer dar aos portugueses um sinal

de que efetivamente quer apostar na educação, quando o seu Orçamento tem zero sobre educação?!

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, se este Orçamento fosse tão bom, não havia tanta gente a anunciar greves na

próxima semana e na seguinte e o senhor não tinha os seus parceiros, que querem desesperadamente evitar

que a direita volte ao poder, a «roer-lhe a corda», numa altura tão fatal. E se o seu Orçamento fosse tão bom

na luta contra a corrupção, não tinha vindo o diretor do DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação

Penal), na semana passada, dizer que este Orçamento é um zero para a corrupção e pedir-lhe mais meios,

como o senhor tinha prometido.

Sr. Primeiro-Ministro, a responsabilidade do que vai acontecer amanhã será sua ou da cumplicidade com o

Bloco de Esquerda. Mas há uma coisa que lhe quero dizer: aconteça o que acontecer amanhã, o seu Governo

acabou e não passarão muitos meses até que os portugueses possam escolher outro Governo.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, a propósito de enganos, quero só fazer uma correção ligeira: como sabe, há vários anos, não há cativações no Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

Quanto ao mais, Sr. Deputado, devo dizer que até achei comovente ver como conseguiu superar, em alegria,

a perspetiva do Dr. Rui Rio e do Dr. Telmo Correia com a hipótese de o Orçamento do Estado vir a ser chumbado.

E a sua alegria demonstra como será um erro enorme chumbar este Orçamento. Será um erro enorme!

Aplausos do PS.

E a razão pela qual a sua alegria consegue bater a do PSD e do CDS é que, apesar de tudo, eles já têm a

experiência de ir a eleições, ganhar e ser Governo. Agora, V. Ex.ª o que ambiciona é fazer na República o que

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conseguiu fazer na Região Autónoma dos Açores. E é essa alegria que não consegue esconder, na ânsia que

tem de chegar ao poder, custe o que custar. Espero que não chegue!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: Reconheço que é um bocadinho bizarro estarmos aqui no debate de um Orçamento do

Estado, em que sabemos que há debate, mas não temos a certeza se há Orçamento e, se houver, não sabemos

qual das versões desse Orçamento será. Não será certamente aquela que deu aqui entrada no dia 11, mas,

aconteça o que acontecer — e mesmo na hipótese, que hoje parece remota, de o Orçamento do Estado vir a

passar amanhã —, o certo é que a geringonça já morreu. Por mim, «paz à sua alma»!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem me parecia que tinha jeito de padreco!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Posso dizer que é uma derrota pessoal sua, Sr. Primeiro-Ministro, dado até o orgulho, que acabou por reafirmar há pouco, da opção que tomou, em 2015.

Um símbolo desta derrota é também a forma como aparece a apresentar este Orçamento do Estado como

sendo um Orçamento de crescimento, um Orçamento para as famílias, um Orçamento para as empresas, um

Orçamento para o SNS, quando ele não é absolutamente nada disso.

Se fosse um Orçamento para o crescimento, não vinha o Governo gabar-se de ir apresentar, em 2022, o

maior crescimento das últimas décadas, sem assumir simetricamente a responsabilidade pela maior queda do

PIB, desde que há registos, verificada em 2020. Portanto, o crescimento de 2022 mal compensará aquilo que

caiu, em 2020.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — E a pandemia não existiu?!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Portanto, Portugal é dos países que mais cresce e dos que mais lentamente recuperam e daqui também se retira que o Governo tenta esconder um facto óbvio e do qual, julgo,

todos devíamos estar cientes: é que, se olharmos para lá de 2022 — e há quem nos ajude a fazer isso, quer no

Eurostat, quer no Fundo Monetário Internacional —, vemos que Portugal está sistematicamente nos últimos

lugares dos rankings de crescimento dos anos posteriores a 2022. Logo, Portugal não só não irá convergir além

de 2022, como irá divergir além de 2022.

E as empresas, sobre as quais o Partido Socialista gosta, de vez em quando, de dizer que são a fonte de

todo o crescimento e da criação de emprego, também não são bem tratadas neste Orçamento. A menos,

obviamente, que o Sr. Primeiro-Ministro se refira apenas às empresas públicas, porque há empresas públicas

como a TAP que levam 1000 milhões de euros sem bilhete de regresso — lá vão eles a voar! —, ou como a CP

(Comboios de Portugal), que leva 1800 milhões de euros para sanear o seu balanço, mas ninguém viu

exatamente qual é a justificação ou o retorno económico ou social desse investimento.

Porém, quando olhamos para as empresas privadas, o que é que vemos? Vemos o «estonteante» valor de

10 milhões de euros, que é o que vai custar acabar em termos definitivos com o pagamento especial por conta

e vemos um instrumento financeiro de recuperação que tem duas características fantásticas: vai durar durante

seis meses, que é para ser rapidinho, e vai obrigar as empresas a abdicar de parte da liberdade das suas

decisões empresariais.

Também não é um Orçamento para as famílias, porque se me vêm dizer que é um desdobramento de dois

dos escalões do IRS que vai aliviar brutalmente o IRS em algumas famílias portuguesas, digo que isso é

rapidamente comido pela não atualização à inflação dos escalões do IRS e pelo aumento de quase todos os

impostos indiretos.

E também não é um Orçamento de salvação ou de grande empolgamento com o SNS. Aquele SNS que, há

três meses, era exemplar para todos, …

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Estranho, não é?!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — …hoje já ouvimos toda a gente dizer que se está a esboroar — e está!

Há três meses, era exemplar e, agora, estão a dar razão ao que sempre dissemos no Iniciativa Liberal, isto

é, que a pandemia estava a esconder os verdadeiros problemas estruturais do SNS. Portanto, gastar mais 3 ou

4 mil milhões de euros com o SNS, em 2022, do que gastava há alguns anos, só mostra que não é um problema

que se resolva atirando dinheiro para cima.

Portanto, se há coisa de que terei pena, caso não haja Orçamento do Estado aprovado amanhã, é que esta

sessão legislativa acabará e o Iniciativa Liberal não poderá apresentar o seu projeto de reforma estrutural do

SNS, como queria fazer.

Posto isto, Sr. Primeiro-Ministro, e assumindo que vamos ter Orçamento amanhã e que estava a falar a sério

quando disse que quer aprovar o Orçamento, mas não a qualquer preço, diga-me, por favor, quanto é que

custam as cedências que já fez entre a apresentação da proposta de lei de Orçamento aqui, na Assembleia da

República, no dia 11, e o dia de hoje. Quanto é que custam e quanto é que acha que ainda podem vir a custar

estas 24 horas que deu a mais à oposição de extrema-esquerda? E diga-me se vai acomodar esse acréscimo

de despesas, deixando cair o seu grande objetivo de contas certas, ou se vai aumentar mais algum imposto,

coisa que os portugueses têm o direito de saber.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, de facto, é verdade: se a maioria que se formou em novembro de 2015 se considerar esgotada e que não tem mais caminho para andar,

isso, para mim, é uma enorme frustração pessoal. Assumo isso, porque acredito, e acreditei, desde o princípio,

que esta maioria tinha um enorme potencial, um potencial que, indo muito além de desfazer aquilo que o PSD

e o CDS tinham feito, visava construir um futuro robusto para o nosso País.

Portanto, se verificar que isto não é assim, será mesmo uma enorme frustração pessoal — não tenho

qualquer pejo em reconhecê-lo.

Quanto a este Orçamento, insisto: espero que ele passe, tal como os outros seis Orçamentos, que têm

contribuído para o crescimento do País.

Ao contrário do que o Sr. Deputado diz, todas as previsões continuam a colocar Portugal a convergir com a

União Europeia, o que, aliás, acontece pela primeira vez neste século desde 2017, 2018, 2019, 2021, prevendo-

se já o mesmo para 2022. E, se olharmos para os 15 Estados-Membros antigos, somos mesmo o segundo país

com o maior crescimento de toda a União Europeia.

Protestos do IL.

Isto significa que estamos no caminho certo e que temos de continuar a prosseguir nesse caminho.

Aplausos do PS.

Por fim, Sr. Deputado, porque tenho de guardar tempo para as próximas três rondas de perguntas, queria só

dizer-lhe o seguinte: obviamente, ninguém percebe nem acha convincente que o Serviço Nacional de Saúde,

que, quando teve de enfrentar a maior crise sanitária que o País viveu, quando teve de enfrentar uma pandemia

em situação absolutamente dramática, foi unanimemente reconhecido como tendo a capacidade de responder,

esteja agora, que passou a pandemia, a atravessar esse caos, quando ainda nem a gripe chegou.

Sr. Deputado, acredita nisso ou estamos a assistir a um novo episódio de crianças a nascer nas autoestradas

até à demissão do Ministro Correia de Campos?! Receio muito que assim seja. Mas há uma dimensão que é

séria, que é real, e é por isso mesmo que prevemos continuar a investir no Serviço Nacional de Saúde.

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Sabe, Sr. Deputado, o Serviço Nacional de Saúde não se trata com pandemia, trata-se com investimento,

com motivação dos profissionais e valorização das suas carreiras, pelo que é nesse sentido que continuaremos

a trabalhar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos agora entrar numa outra fase de pedidos de esclarecimento.

Há mais 21 Deputados inscritos para pedirem esclarecimentos ao Sr. Primeiro-Ministro, que responderá em

grupos de sete, conforme informou a Mesa.

Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado António Maló de Abreu, do PSD, para pedir esclarecimentos.

O Sr. António Maló de Abreu (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, é disso mesmo que quero falar-lhe, de saúde. Ou, melhor, da falta de saúde que temos. Mas

não lhe quero falar do sistema nacional de saúde, porque VV. Ex.as são ou fazem-se donos dele. Intitulam-se,

até, como sendo os pais do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PS: — É verdade!

O Sr. António Maló de Abreu (PSD): — Às vezes, penso que o Serviço Nacional de Saúde deveria ser retirado aos pais por excesso de maus-tratos,…

Aplausos do PSD.

… porque VV. Ex.as têm contribuído para a degradação dos serviços de saúde, com a falta de recursos

humanos e materiais. Não sou eu quem o diz, são os profissionais de saúde, são os diretores dos hospitais, são

os chefes de serviço, que se demitem, são os médicos, são os enfermeiros, são os utentes. Todos falam disto,

não é preciso que eu o diga.

Sr. Primeiro-Ministro, também não vou falar-lhe da maternidade de Coimbra. Há pouco, citou o seu camarada

Vieira da Silva e eu julgo que o Sr. Primeiro-Ministro conhece bem o seu camarada António Costa, que anunciou,

em Coimbra, que iríamos ter maternidade e que, depois das eleições, o Sr. Primeiro-Ministro António Costa iria

a Coimbra dizer qual seria o local onde seria colocada essa maternidade. Não teve foi a coragem de dizer qual

era o sítio, isso apareceu depois, porque o sítio não era aquele que os seus camaradas pretendiam.

Sr. Primeiro-Ministro, em boa verdade, pedi a palavra para lhe falar das promessas que não cumpre. Ainda

recentemente, o Sr. Primeiro-Ministro pediu desculpa aos parceiros sociais e eu pedi a palavra para lhe

perguntar se pede desculpa ao milhão de portugueses que continuam sem médico de família. Essa é a grande

pergunta, porque a compaixão mora nos atos e 1 milhão de portugueses não é um número, não é um gulag, são

pessoas concretas, com dores e sofrimento concreto, que foram abandonadas por si.

O Sr. Santinho Pacheco (PS): — Não diga uma coisa dessas!

O Sr. António Maló de Abreu (PSD): — Cito-lhe o seu Programa do Governo de 2015, que dizia «o objetivo de garantir que todos os portugueses têm médico de família atribuído». Viste-os? Não!

Em 2016, prometeu solenemente, na Assembleia da República: «2017 é, de uma vez por todas, o ano em

que todos os portugueses terão um médico de família atribuído».

V. Ex.ª prometeu em 2015, em 2016, em 2017, em 2018, em 2019, em 2020 e agora, em 2021, com 1 milhão

de portugueses sem médico de família, volta a prometer, tendo a subtileza, para não dizer o atrevimento, de não

lhe chamar «médico de família», mas «equipa de saúde familiar».

Sr. Primeiro-Ministro, dizer é diferente de pensar e agir é diferente de dizer e de pensar. Acredito que diga o

que pensa, mas não faz o que diz. Creio que acredita, como nós, que nenhuma família deve ficar sem médico,

mas não o faz; que nenhum utente deve ficar sem médico de família, mas não o faz; e que nenhum português

deve ficar sem direito à saúde, mas não o faz.

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Sr. Primeiro-Ministro, a vida é feita de «fazes» — ou fazes ou não fazes! — e V. Ex.ª não faz.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado João Paulo Correia, do PS.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o aumento do rendimento das famílias tem sido uma aposta central prioritária na política económica e orçamental do Governo ao longo dos,

diria, sete Orçamentos do Estado.

O aumento do rendimento disponível das famílias tem sido uma aposta, algo que une PS, Bloco de Esquerda,

PCP e PEV e, ao longo destes anos, temos feito um caminho muito positivo, com ganhos muito fortes para as

famílias. E temo-lo feito contra a direita,…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Ainda bem que admite!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — … que sempre se opôs a essas medidas ao longo dos Orçamentos do Estado.

Temo-lo feito na valorização salarial, no aumento dos salários, com o aumento do salário mínimo nacional

em cerca de 40%, ao longo dos anos; ou na valorização salarial da Administração Pública — recordo a

integração de 20 000 precários da Administração Pública, uma matéria que uniu a esquerda parlamentar.

Aplausos do PS.

Relembro, também, o descongelamento das promoções e das progressões, outra medida emblemática que

uniu a esquerda parlamentar, e lembro ainda o aumento contínuo da retribuição mínima na Administração

Pública, uma matéria que também uniu a esquerda parlamentar.

Fizemo-lo, igualmente, através do aumento das pensões, não só com o aumento automático, mas, inclusive,

através do aumento extraordinário das pensões, que tem sido efetuado desde 2016; do aumento das prestações

sociais, repondo, não só, os cortes feitos pela direita, como aumentando o abono de família e o subsídio de

desemprego; e também através de medidas indiretas, que têm contribuído para aumentar o rendimento

disponível das famílias, tais como a gratuitidade das creches, a oferta dos manuais escolares, o alargamento da

tarifa social de energia, que hoje abrange 800 000 famílias, e o passe nos transportes coletivos.

Essas foram medidas emblemáticas que uniram a esquerda parlamentar ao longo destes anos e que foram

fundamentais para aumentar o rendimento disponível das famílias.

Mas não esqueçamos também o caminho que fizemos pela via fiscal: a eliminação da sobretaxa de IRS, que

era uma pesada herança da direita; os dois escalões de IRS que foram introduzidos em 2018 para aliviar os

rendimentos mais baixos; o aumento consecutivo do mínimo de existência — são hoje muitas as famílias que

deixaram de pagar IRS por causa desta medida, que tem sido central na viabilização dos Orçamentos do Estado

anteriores; a substituição do quociente familiar pelas deduções fixas por filhos, uma medida que permitiu a

muitas famílias poupar e deduzir muito dinheiro no IRS; e também o aumento das deduções à coleta.

Hoje, podemos dizer que, depois destas medidas todas em sede de IRS, os portugueses pouparam 1600

milhões de euros face à carga tributária de IRS no final de 2015, quando chegámos ao Governo.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, este é um caminho que não pode nem deve ser interrompido. E é exatamente isto que

traz o Orçamento do Estado para 2022, um conjunto de avanços naquelas áreas que foram sempre prioritárias

para o Bloco de Esquerda, para o PCP, para o PEV, áreas para as quais o Governo traz avanços substanciais.

Nós não compreendemos, os portugueses não compreendem como é que um Orçamento que aposta no

maior aumento de sempre do salário mínimo nacional tem o voto contra do Bloco de Esquerda, do PCP e do

PEV. Os portugueses não compreendem como é que o Orçamento que, pela primeira vez nos últimos anos,

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desde o início deste ciclo político, prevê o aumento extraordinário das pensões, abrangendo as pensões acima

dos 658 € até aos 1097 €, conta com voto contra do Bloco de Esquerda, do PCP e do PEV.

Este é também o Orçamento que prevê o maior aumento de sempre do abono de família, uma medida

altamente eficaz no combate à pobreza infantil e juvenil. Mas, apesar disso, tem o voto contra anunciado pelo

Bloco de Esquerda, pelo PCP e pelo PEV.

Também em matéria de IRS, apesar dos dois novos escalões, apesar de o IRS Jovem ser alargado, apesar

do aumento das deduções por filhos, este Orçamento conta com o anunciado voto contra do Bloco de Esquerda,

do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente. Pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, se este Orçamento traz, ou não, avanços significativos nas áreas

prioritárias que fizeram sempre parte da agenda central dos tradicionais parceiros parlamentares, o Bloco de

Esquerda, o PCP e o PEV.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado José Soeiro, do BE, para pedir esclarecimentos.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, um dos instrumentos mais fortes de precarização do trabalho tem a ver com a facilidade dos despedimentos baratos e

com a chantagem que leva trabalhadores com direitos a aceitarem rescisões para depois serem substituídos

por trabalhadores precários.

A nossa proposta é simples: retomar o valor das compensações por despedimento que existia no Código do

Trabalho de Vieira da Silva, ou seja, 30 dias por cada ano de trabalho. Era uma lei do Partido Socialista.

O Sr. Primeiro-Ministro não esteve, até hoje, disponível para anular este corte da troica e voltar ao Código

do Trabalho do Partido Socialista de 2009. O Governo tentou desviar o debate para as compensações sobre os

contratos a prazo, que é outro tema, e que, aliás, é outro artigo do Código do Trabalho. Sobre as compensações

por despedimento não aceitou, sequer, discutir.

Como sinal de boa vontade negocial, e ao contrário do que disse o Sr. Primeiro-Ministro, já no ano passado

o Bloco abriu a porta para que, pelo menos — repito, pelo menos! — se recuperassem os 20 dias, em vez dos

atuais 12 dias. Os 20 dias eram a compensação que estava prevista no Memorando da troica, ao passo que os

12 dias que hoje existem são resultado do extremismo do PSD e do CDS, que foram além da troica. Mas nem

a esses 20 dias do Memorando o Primeiro-Ministro aceita voltar.

Quando a direita, indo além da troica, aprovou os 12 dias de compensação, disse, neste Plenário, o então

Deputado Vieira da Silva: «Os Srs. Deputados da maioria…» — na altura havia uma maioria de direita — «…

sabem perfeitamente que esta nova redução não foi uma exigência dos parceiros sociais, tal como ouviram dizer

que o estudo que fundamentou esta nova redução não tem nenhuma solidez nem credibilidade técnica e

política».

Em nome do Partido Socialista, Vieira da Silva disse, então, aos Deputados da direita: «Não souberam

defender os interesses de Portugal, que passavam por não introduzir mais este fator de perturbação nas nossas

relações laborais. Este é o vosso projeto,…» — o da direita! — «… este é o vosso caminho, e neste caminho e

neste projeto, meus senhores, não estão acompanhados por nós».

A proposta que apresentamos é a proposta do Partido Socialista. Difícil é perceber por que razão tal proposta,

defendida por Vieira da Silva em junho de 2013, neste Parlamento, haveria de ser agora considerada por António

Costa como tão radical e tão inaceitável que valeria para o Sr. Primeiro-Ministro uma crise política.

Está nas suas mãos — ainda! —, Sr. Primeiro Ministro, evitar essa crise. Basta abandonar a obsessão com

a manutenção destas regras iníquas do PSD e do CDS, em vez de querer gravá-las na pedra e forçar a esquerda

a engoli-las contra o mandato que nos elegeu.

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Aplausos do BE.

OSr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Paula Santos, do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, o PCP discutiu com o Governo soluções inadiáveis para contratar e fixar profissionais no SNS: a valorização e dignificação das

carreiras e remunerações, a implementação da dedicação exclusiva, a autonomia das unidades de saúde na

contratação de trabalhadores e na realização de investimentos, o reforço dos incentivos para a fixação de

médicos e enfermeiros nas áreas carenciadas.

Sobre a dedicação exclusiva, propusemos que fosse de natureza opcional, com majoração de 50% da

remuneração base, majoração de 25% do tempo de serviço para efeitos de progressão e com a aplicação dos

incentivos já hoje previstos no regime das vagas carenciadas.

Considerando que se trata de propostas urgentes cuja aplicação tem de se iniciar a partir de 1 de janeiro de

2022, pedimos ao Governo que concretizasse o texto a fixar no Orçamento que desse essa garantia. A resposta

do Governo foi uma promessa de regulamentação até março de 2022, e todos sabemos o que significam as

promessas de regulamentação futura, com o arrastar no tempo, a limitação, o adiamento.

O País e os portugueses precisam que seja assumido o investimento no SNS, pondo fim ao gasto de milhões

de euros, anualmente, em contratação de empresas de trabalho temporário e na transferência de cuidados para

o setor privado, com recursos que podiam, e deviam, ser investidos para reforçar o Serviço Nacional de Saúde.

Sr. Primeiro-Ministro, recusar as propostas do PCP, não dar a resposta necessária aos profissionais de saúde

e aos utentes significa negar o direito à consulta, à cirurgia, aos exames, significa deixar milhares de utentes

sem médico de família e empurrar o Serviço Nacional de Saúde para uma situação com impactos negativos

tremendos.

A atual situação do SNS exige soluções. O PCP apresentou-as ao Governo e bate-se por elas. Por isso, Sr.

Primeiro-Ministro, que resposta dá o Governo às soluções que o PCP apresentou? Quer, ou não, assumir a sua

concretização já a partir de 1 de janeiro de 2022?

Aplausosdo PCP.

OSr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, afirmou, numa das suas respostas, que tinha muito orgulho em ter rompido com o chamado

«arco da governação». Pois o Sr. Primeiro-Ministro apresenta-se, hoje, aqui, com um Orçamento que não

consegue aprovar e com um País que, objetivamente, tornou ingovernável. Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, pode

orgulhar-se muito e pode estar muito feliz, mas eu garanto-lhe que o País não partilha nem desse orgulho, nem

dessa felicidade.

Vozesdo CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — A situação que tem agora de enfrentar é fruto, sim, da sua estratégia de chegada e manutenção no poder, e conduziu o País, no pior momento — o momento de saída da pandemia

—, a uma situação muitíssimo difícil.

E já que falou tanto de Estado e de serviços públicos e de funcionalismo público com os seus parceiros,

gostava de lhe deixar três perguntas, uma de esclarecimento de uma contradição e as outras duas sobre

incoerências.

O Sr. Primeiro-Ministro disse aqui que o grande objetivo deste Orçamento é o crescimento económico. Aliás,

no próprio relatório do Orçamento pode ler-se que a recuperação dos níveis de riqueza pré-pandemia, já em

2022, constitui um objetivo ambicioso. Eu gostaria de saber porque é que isso é ambicioso, Sr. Primeiro-Ministro.

É que, olhe, a meio deste ano, de 2021, já a Irlanda, o Luxemburgo, a Estónia, a Roménia, a Lituânia, a

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Dinamarca, a Hungria, a Polónia e a Letónia tinham recuperado esse tal objetivo que o Sr. Primeiro-Ministro

considera que é muito ambicioso em 2022,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — …prevendo-se que, no fim deste ano, também a Holanda, a Suécia, a Finlândia e a Bulgária lá cheguem. Aliás, Portugal vai ser dos últimos países a lá chegar. Gostava de saber

porque é que esse objetivo é ambicioso, porque menos ambicioso só se fossemos o país mais lento da Europa,

Sr. Primeiro-Ministro.

Em segundo lugar, sobre contrastes e sobre incoerências, relativamente aos combustíveis gostava de saber

porque é que o seu partido chumbou aqui, há um mês, uma proposta do CDS para baixar o ISP (imposto sobre

os produtos petrolíferos e energéticos) tendo depois, passado um mês, anunciado que ia devolver aos

contribuintes uma parte do ISP. Então, se o vai devolver, não faria mais sentido não o cobrar?

O senhor diz que essa medida relativa aos combustíveis, de que vai devolver, na melhor das hipóteses, 5

€/mês em cinco meses, custa 133 milhões de euros. Sr. Primeiro-Ministro, o aumento do ISP que o senhor fez

em 2016, mas que diz que não fez, afirmação que até o Polígrafo já desmentiu,…

Risosdo Primeiro-Ministro.

…permitiu ao Estado encaixar 313 milhões de euros. O senhor, cinco ou seis anos depois, não vai devolver

nem metade daquilo que já cobrou. Eu gostava de saber se é isso que acha que é razoável, numa altura de tão

grande aumento dos combustíveis.

Uma última pergunta, relativamente à contradição que eu chamo de «bem prega Frei Tomás», tem que ver

com uma das medidas aprovadas para agradar à geringonça — são muitas; entre os guarda-rios e os bancos

de leite materno, nem sei para que lado me hei de virar entre tantas. De facto, são Orçamentos que se vê que

são pensados com uma estratégia de fundo, virada para as pessoas e para o crescimento…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Relativamente à medida anunciada pelo Governo de que iria proibir a contratação de trabalhadores precários nas empresas que prestassem serviços ao Estado, eu gostaria de saber

se o Sr. Primeiro-Ministro vai aplicar essa mesma proibição ao próprio Estado, porque, se o fizer, vai tudo parar

de funcionar. Segundo a DGAEP (Direção-Geral da Administração e do Emprego Público), o número de

precários no Estado era de quase 100 mil! São os últimos números que há e que, aliás, aumentaram 37% com

o seu Governo, sendo a maior parte na saúde e na educação. Se proibir estes serviços todos de prestarem

serviços ao próprio Estado, Sr. Primeiro-Ministro, vai paralisar o Estado. Portanto, eu gostava de saber qual é o

sentido de uma medida que exige às empresas aquilo que o próprio Estado não faz.

Aplausosdo CDS-PP.

OSr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Nelson Silva, do PAN.

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, nós já temos em mãos uma crise social e uma crise climática. Precisamos de mostrar responsabilidade e maturidade face aos

verdadeiros desafios que enfrentamos.

Se o PAN considera que o Governo faz o que devia em matéria ambiental e climática? Não, longe disso. Se

o PAN atira a toalha ao chão ao invés de procurar conquistar avanços nestas matérias? Também não.

Somos um partido responsável, que tem mostrado que consegue pôr os interesses das pessoas acima de

qualquer calculismo partidário.

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Caso se venha a confirmar o chumbo deste Orçamento graças à irresponsabilidade de forças políticas aqui

presentes, existem avanços que o PAN já conquistou, ou que tinha boas hipóteses de conquistar, que caem por

terra. Porque é disso que estamos a falar: de não discutir o Orçamento do Estado em sede de especialidade.

Começo pelo combate à pobreza energética, que afeta 20% da população nacional, obrigada a escolher

entre comer ou passar frio. Uma em cada cinco pessoas tem de fazer esta escolha no nosso País. E estes

pacotes, que o PAN vai apresentar em sede de especialidade e que já apresentou ao Governo não vão acontecer

graças à irresponsabilidade de forças políticas aqui presentes.

Saliento, também, o apoio ao uso de transporte coletivo, aparentemente uma prioridade para algumas destas

forças políticas. Finalmente, neste Orçamento, queríamos conseguir um reforço significativo das verbas

alocadas ao aumento e diversificação da oferta do transporte público. Graças à irresponsabilidade destas forças

políticas, isto não vai acontecer.

Não posso deixar, também, de reforçar a aposta do PAN em que se taxe o carbono e não as pessoas.

Pretendíamos, neste Orçamento, ir mais longe do que a proposta do Governo e reduzir, adicionalmente, num

ponto percentual, o IRS da classe média entre os 3.º e 7.º escalões. Graças à irresponsabilidade de alguns

partidos, tal não vai acontecer.

Se a proposta de Orçamento do Estado é perfeita? Não, não tem nada a ver com isso. Mas, por força destes

calculismos partidários, nenhum destes avanços poderá melhorar este Orçamento do Estado, e isso é a

demissão da responsabilidade enquanto representantes das pessoas deste País. E isso o PAN não vai fazer!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Demagogo!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O PS é pobre e mal-agradecido. Está o rapaz a fazer aquela figura e, depois, nem umas palmas batem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Mariana Silva, do PEV.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, quantas vezes ouvimos falar, no último mês, das alterações climáticas? Quantas vezes

ouvimos falar, no último ano, do perigo que representam e da necessidade de encontrar estratégias para as

mitigar, das chuvas diluviais, dos incêndios florestais de dimensão brutal, dos fenómenos extremos que têm sido

cada vez menos esporádicos e raros?

Setores cada vez mais amplos da sociedade ganham consciência da dimensão do perigo e da necessidade

de lhe dar respostas. Mesmo sem alimentar projeções fatalistas, é necessário dar passos na boa direção.

Alguns dos que referem mil vezes que é preciso ouvir os cientistas fazem ouvidos moucos aos alertas do

painel de cientistas da ONU (Organização das Nações Unidas), que nos apontam a necessidade de tomar

medidas. Quantos mais estudos e projeções serão necessários para abrirmos os olhos?

O Ministro do Ambiente foi à COP25 (25th Conference of the Parties to the United Nations Framework

Convention on Climate Change), há dois anos, dizer que Portugal dava cartas nessa matéria, e que regressaria

rapidamente ao lugar destacado no índice de desempenho das alterações climáticas.

De então para cá, o que vimos?

Nós dizemos o que todos vimos! Vimos o apoio crescente à agricultura superintensiva e ao seu manto de

consumos excessivos de água, de pesticidas, de fertilizantes químicos, de fitofármacos. Nem o drama que, por

causa da COVID-19, envergonhou o País, expondo as indignas condições de vida de milhares de migrantes

quase escravos, em que assentam essas explorações, fez o Governo mudar de rumo.

Foi por isso que propusemos ao Governo o apoio reforçado à agricultura familiar, adequando as suas

contribuições para a segurança social aos seus parcos rendimentos ou estabelecendo uma estratégia de

abastecimento das cantinas públicas por produtos oriundos deste tipo de agricultura.

O Governo enche muitas vezes a boca com a defesa da pequena e média agricultura, mas nem esta segunda

proposta, que não tem impactos orçamentais, quis aceitar.

Vemos, todos vemos, a obsessão com a exploração garimpeira de lítio, anunciando o esventrar de zonas

das mais equilibradas e com importante biodiversidade do nosso País e fazendo ouvidos moucos à voz e à

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vontade das populações, como ainda este fim de semana ouvimos em Viana do Castelo, numa grande

manifestação, que daqui saudamos, fazendo ouvidos moucos mesmo aos seus próprios autarcas que se têm

manifestado contra tais opções, não sendo capaz de assumir, aqui, o compromisso de respeitar as vontades

das populações, como Os Verdes desafiaram o Governo a fazer.

Quanto ao transporte público, depois de um avanço muito positivo a que o Governo do PS foi obrigado no

Orçamento de 2019, com a redução do preço do passe social intermodal e com o alargamento do seu âmbito,

que retirou, quase de imediato, milhares de carros das grandes cidades, após a dificuldade que enfrentámos

com a epidemia, que levou muita gente a deixar de usar o transporte público, por causa do medo que foi

promovido, agora, hoje, era o tempo de dar um sinal. Desde logo, assegurando oferta de qualidade de

transportes públicos em todo o País, a começar pelas muitas localidades onde ele, ainda hoje, não chega. E

isso não está garantido nesta proposta de Orçamento do Estado para 2022. Mas, também, fazendo o caminho

da gratuitidade dos transportes públicos, porque não se defende o ambiente trocando viaturas individuais

movidas a combustíveis fósseis por igual número de viaturas individuais movidas a eletricidade ou outra.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — A resposta é a massificação do transporte público, e isso exige medidas de grande envergadura.

Por isso, propusemos ao Governo inserir na proposta de Orçamento do Estado para 2022 a gratuitidade dos

transportes públicos para todos os jovens até aos 18 anos. Veja-se que não estamos a pedir tudo. E, se

pedíssemos, nem seríamos o primeiro país da União Europeia a assegurar essa gratuitidade total.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Nem o segundo, nem o terceiro!

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Mas nós admitimos ir por passos. Passos comportáveis, uma vez que uma boa parte dos jovens já tem acesso ao passe escolar. Trata-se de generalizar a todos e alargar o seu âmbito.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente. Sr. Primeiro-Ministro, é urgente que se iniciem estes passos importantes. É urgente que se comece pelos

jovens, promovendo o uso do transporte público desde tenra idade, com impactos imediatos e para o futuro.

Sr. Primeiro-Ministro, nem esse passo o Governo quis dar.

Qual é, então, a estratégia, Sr. Primeiro-Ministro?

Porque o Orçamento do Estado é um exercício de fazer opções. As opções que o Governo insiste em fazer

e, sobretudo, as que insiste em não fazer dão bem conta das suas prioridades.

Aplausosdo PEV.

OSr. Presidente (António Filipe): — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado pelas questões colocadas. Sr. Deputado Maló de Abreu, recomendo-lhe que leia o Diário da República do passado dia 20, onde consta

a abertura do concurso para a elaboração do projeto da maternidade de Coimbra no Centro Hospitalar da

Universidade de Coimbra, depois de termos obtido, como disse na última vez que aqui estive, o acordo do novo

presidente da Câmara Municipal de Coimbra, porque, obviamente, não fazia sentido anunciarmos uma solução

sem ouvir o atual presidente da Câmara Municipal de Coimbra.

Aplausos do PS.

Relativamente aos médicos de família, é verdade, não conseguimos ainda cumprir o objetivo, todavia temos

mais 1000 médicos de família do que tínhamos em 2015. Acontece que temos também mais 400 000 utentes

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do que tínhamos em 2015. É porque sabemos que temos problemas na fixação e na atração dessa carreira que

temos previsto neste Orçamento do Estado incentivos para atrair mais médicos de família e fixá-los nas zonas

carenciadas.

O Sr. Deputado José Soeiro não disse uma palavra sobre o Orçamento do Estado. Falou, exclusivamente,

de um projeto sobre legislação de trabalho que há de vir a debate nesta Assembleia da República.

O que lhe pergunto é o seguinte: porque é que amanhã vai votar contra o Orçamento do Estado quando,

verdadeiramente, está é contra legislação de trabalho que não vai estar amanhã em votação? Isto é que eu não

percebi!

Aplausos do PS.

Sobre a legislação de trabalho, não me frustro à discussão. A grande prioridade que definimos na Agenda

do Trabalho Digno é o combate à precariedade, a maior chaga que existe nas nossas relações laborais.

Disciplinar o teletrabalho, disciplinar as plataformas digitais, obrigar à contratação, por parte das empresas

de trabalho temporário, daqueles que trabalham para as empresas de trabalho temporário é ir ao coração do

problema e resolver o problema.

Quando o Sr. Deputado desvaloriza a medida, a que nós já nos comprometemos, em matéria de

compensações por despedimento,…

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Não é despedimento!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … é porque o Sr. Deputado não está a ter em conta que 80% a 85% dos despedimentos que ocorrem por ano são relativos a contratos a termo e não a contratos sem termo.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Não é despedimento!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O que nós estamos a fazer é mesmo ir ao encontro do problema.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado está a ir ao lado, porque quer um pretexto para votar contra um Orçamento de Estado onde

nada disto está em discussão.

Sr.ª Deputada Paula Santos, a questão relativa à densificação da regulamentação da dedicação exclusiva

consta do projeto de Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, que, aliás, já está em discussão pública.

Mas pergunto à Sr.ª Deputada: se pegarmos no que temos regulamentado no Estatuto do Serviço Nacional

de Saúde e o introduzirmos, como norma, no Orçamento do Estado está disponível para viabilizar o Orçamento

do Estado na especialidade, ou não está disponível? É que assim resolve a sua dúvida sobre o que é deixar

para regulamentar em março, fica já regulamentado no Orçamento do Estado. Temos é de chegar à fase da

especialidade do Orçamento, Sr.ª Deputada, e sem o seu voto não chegamos.

Aplausos do PS.

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, sim, o nosso principal objetivo é apoiar o crescimento económico.

O que acho estranho é que uma Deputada que foi, ainda que por pouco tempo, Secretária de Estado do

Turismo não dê conta da diferença que o turismo tem em Portugal relativamente a todos os países que referiu.

Compare o crescimento em Portugal com o dos outros países da Europa onde o turismo tem um peso na

economia semelhante ao que tem na economia portuguesa.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Ah, agora o problema é o peso!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Compare, e vai ver como comparamos bastante bem.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Olhe que não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sei que parece que a pandemia não ocorreu, mas nós vivemos dois anos de uma pandemia muito difícil, e essa pandemia exigiu a contratação a termo de muitos recursos humanos para

reforçar as necessidades de resposta nas escolas e no Serviço Nacional de Saúde. Aliás, foi por isso que

tivemos um incremento significativo de contratos a termo, e ainda bem que os tivemos, senão não teríamos sido

capazes de responder à pandemia.

O Sr. Deputado Nelson Silva pôs o dedo na ferida. Efetivamente, impedir o debate na especialidade é impedir

todas as forças políticas de contribuírem, com a vontade que tiverem, para melhorar esta proposta de Orçamento

do Estado. Há uma parte deste Parlamento que, sabemo-lo, tem uma discordância de fundo com este

Orçamento e que, portanto, por mais alterações que se fizessem ele não ia a lado nenhum. Mas há outra metade

deste Parlamento que, efetivamente, pode e deve contribuir, em sede de especialidade, como o PAN está a

fazer, para melhorar o Orçamento. Condição fundamental é que o Orçamento, amanhã, seja viabilizado para

poder ser melhorado na fase de especialidade.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Os Verdes não têm direito a resposta!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar a uma próxima ronda de pedidos de esclarecimento.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, o País está na iminência de uma crise política, uma verdadeira irresponsabilidade nacional.

Acrescentar crise política à crise económica e social que vivemos, à crise energética que temos e à crise da

falta de matéria-prima, que muitas empresas sentem, é uma completa irresponsabilidade, e a irresponsabilidade

neste caso, Sr. Primeiro-Ministro, tem um rosto, tem um nome e os principais responsáveis são o senhor, o

Governo e o Partido Socialista.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — A responsabilidade é sua, Sr. Primeiro-Ministro. Foi o Sr. Primeiro-Ministro que, há seis anos, apresentou a geringonça, dizendo que era uma solução estável e duradoura. Agora,

verificamos que, além da incompetência e de maus resultados, deu também lugar a uma crise e a instabilidade

política.

A responsabilidade é sua, Sr. Primeiro-Ministro. Foi o senhor que confiou no Bloco de Esquerda e no Partido

Comunista como sendo partidos responsáveis. Afinal, com o tempo, vê-se que não apresentam soluções, não

têm visão de futuro, como o Sr. Primeiro-Ministro já admitiu, e não têm responsabilidade política.

A responsabilidade política é, pois, sua, Sr. Primeiro-Ministro. Foi o Sr. Primeiro-Ministro que, há um ano,

disse que não queria nada do PSD em termos orçamentais, numa atitude de arrogância inqualificável e, agora

vê-se, de total irresponsabilidade.

A responsabilidade é sua, Sr. Primeiro-Ministro. Foi o Sr. Primeiro-Ministro que, ainda na semana passada,

permitiu mais uma machadada na concertação social.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — A forma como foram desrespeitados os líderes empresariais é totalmente inaceitável. É certo que o Sr. Primeiro-Ministro pediu desculpa, mas estes são casos em que as

desculpas não se pedem, evitam-se.

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O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — A responsabilidade é sua, Sr. Primeiro-Ministro. Foi o senhor que, ao longo destas semanas, não foi capaz de, de forma eficaz, de forma competente, e com total capacidade,

fazer com sucesso esta negociação orçamental e evitar a situação de crise.

A responsabilidade é sua, Sr. Primeiro-Ministro. Foi o senhor que, ao longo destes meses, muitos meses,

não foi capaz de fazer reformas, não foi capaz de resolver os problemas e criou uma instabilidade política e uma

situação que faz com que estejamos num beco sem saída.

Termino, deixando uma pergunta que é também um desafio, Sr. Primeiro-Ministro: é agora que o Sr. Primeiro-

Ministro vai assumir as suas responsabilidades? É que, de facto, é tempo de assumir as responsabilidades.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Ascenso Simões.

O Sr. Ascenso Simões (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que inicie a minha intervenção com uma referência a algumas palavras do Sr.

Deputado Rui Rio.

O Dr. Francisco Sá Carneiro e o Dr. Mário Soares são pessoas da fundação da nossa democracia,…

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!

O Sr. Ascenso Simões (PS): — … tiveram o seu percurso e tiveram os seus momentos. O Dr. Mário Soares não pode ser aqui trazido pelo Dr. Rui Rio para confirmar as opiniões do Dr. Rui Rio. O Dr. Mário Soares, na sua

primeira eleição presidencial, teve o apoio do PCP…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Está enganado!

O Sr. Ascenso Simões (PS): — Foi aí que se iniciou o processo de aproximação do Dr. Mário Soares ao PCP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não é verdade! Está enganado!

O Sr. Ascenso Simões (PS): — O Dr. Mário Soares, mais tarde, promoveu o movimento «Portugal, que futuro?», que era uma tentativa de criar, dentro do Partido Socialista, uma aliança à esquerda…

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Bem lembrado!

Vozes do PSD: — Não tem nada a ver!

O Sr. Ascenso Simões (PS): — E, por fim, o Dr. Mário Soares, nos grandes movimentos, na Aula Magna, soube sempre onde devia estar.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, há uma palavra que tem atravessado todas as intervenções: instabilidade.

Nós somos bastante idosos para nos lembrarmos de como o PSD e o CDS deixaram o País em 1983. Foi

nessa altura que nós chamámos pela segunda vez o FMI (Fundo Monetário Internacional).

Também somos suficientemente idosos para nos lembrarmos como é que o PSD e o CDS deixaram o País

em 2004, com aquele menino da Figueira da Foz que transformou o Governo numa autêntica «casa de

meninos», ou outra…

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O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — E em 2011?

O Sr. Ascenso Simões (PS): — Também sabemos como é que o PSD e o CDS, no Governo anterior, deixaram a política, a política do irrevogável.

E sabemos hoje como é que o PSD e o CDS estão nos seus próprios partidos, ou seja, se há instabilidade

política no momento é mesmo a instabilidade política de uma direita que se apresenta aqui neste Parlamento.

Aplausos do PS.

Protestos de Deputados do PSD.

Há, hoje, um problema com a direita portuguesa, e esse problema chama-se ultramontanismo, trauliteirismo.

A direita portuguesa, hoje, é a mais ultramontana e a mais trauliteira de todas as direitas que tivemos até hoje.

Aplausos do PS.

Nós não podemos, como o Sr. Primeiro-Ministro tem vindo a dizer, e como eu evoluí na minha própria

posição, fazer acordos com a direita quando a direita não quer fazer acordos. O problema do nosso sistema

político é que esta direita não quer fazer acordos. Esta direita ficou-se na troica e nunca mais da troica saiu…

Protestos de Deputados do PSD.

… e esta direita quer eleger um falsete para seu líder, porque tem saudades da troica. Esse é que é o ponto,

essa é que é a circunstância!

Aplausos do PS.

Nós não temos medo da democracia. A democracia é aquilo que está no ADN (ácido desoxirribonucleico) do

PS. Se tiver que haver eleições haverá, mas não queremos criar uma crise: não queremos criar uma crise que

impeça que, em janeiro, as pessoas tenham aumento do salário mínimo nacional; não queremos criar uma crise

para que as pessoas sejam impossibilitadas, por exemplo os funcionários públicos, de terem aumento em janeiro

e terem as suas próprias carreiras revalorizadas; não queremos criar uma crise para que os pensionistas não

tenham um aumento extraordinário em janeiro; não queremos criar uma crise para que os pensionistas não

tenham um aumento e que aqueles pensionistas que vão além dos 1000 € tenham um aumento significativo das

suas pensões; não queremos criar uma crise, porque queremos continuar a investir, queremos que as empresas

usem os fundos públicos para continuar a investir.

Portanto, nós não queremos criar qualquer crise. O nosso Orçamento é moderado, é um Orçamento que olha

para o emprego, é um Orçamento que olha para as empresas, é um Orçamento que olha para a dignidade das

pessoas.

É, por isso, Sr. Primeiro-Ministro, que foi com surpresa que eu ouvi as intervenções dos partidos que têm

suportado esta solução governativa.

Eu não compreendo a intervenção da Sr.ª Deputada Catarina Martins quando, olhando para as suas nove

propostas, não consegue encontrar a evolução que o Governo foi fazendo. Essa evolução é nítida! Agora, se a

Sr.ª Deputada Catarina Martins quer ir a 100 Km/h e nós queremos ir a 80 Km/h é porque sabemos que à frente,

nos 100 Km, nós temos um problema que poderemos não saber resolver…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Ascenso Simões (PS): — Esta é a questão central. Mas, para mim, ainda mais duro de ouvir é a intervenção do Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, porque o PCP,

um partido institucional, um partido dos sindicatos, um partido que olha para os trabalhadores, com a sua longa

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história de 100 anos, sabe que a não aprovação deste Orçamento do Estado é o regresso a outras formas de

governo que serão danosas para os trabalhadores.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir. Já excedeu largamente o seu tempo.

O Sr. Ascenso Simões (PS): — Sr. Deputado João Oliveira, avante camaradas! Juntai a vossa à nossa voz, e teremos, com certeza, um Orçamento que permite aos trabalhadores o encontro de uma solução, de um

caminho e de um progresso que é essencial para continuarmos este caminho.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado João Oliveira, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, devem estar à altura das circunstâncias. Nós

estamos aqui, nas próximas horas, à altura de continuar a negociar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é na negociação anual do voto do Orçamento que o Governo minoritário tem de criar condições de apoio parlamentar. O País sabe isso há seis

anos, o Sr. Primeiro-Ministro também o sabe e não está a descobri-lo agora.

A matéria que queria abordar, hoje e agora, é estritamente orçamental e, por isso, espero que tenha uma

resposta direta. Queria perguntar-lhe diretamente quais são as razões que levam o Partido Socialista a defender

o que resta do regime de pensões antecipadas do Governo da direita. O chamado «fator de sustentabilidade»

foi criado como uma penalização de 0,56% para compensar a existência de uma idade legal de reforma, que

era uma idade fixa. A partir do momento em que a direita aumentou a idade de reforma, de acordo com a

esperança média de vida, esse corte deixou de ter qualquer relação com a sustentabilidade da segurança social.

O que a direita fez, a partir de 2014, foi quadruplicar a penalização para as reformas antecipadas e criar uma

fórmula que fazia com que essa penalização não parasse de subir. Assim, ela foi de 12% até mais de 15%. O

resultado foi o saque a milhares de pessoas cansadas de uma vida inteira de trabalho ou empurradas, pelo

desespero do desemprego de longa duração, para as reformas antecipadas e à condenação a reformas de

miséria.

No início das negociações de 2016, o Partido Socialista e o Ministro Vieira da Silva reconheceram que este

regime de injustiça teria de acabar progressivamente. E, por negociação com o Bloco de Esquerda, esse duplo

castigo foi sendo retirado para a maioria dos pensionistas.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Há, no entanto, um grupo de 62 000 pensionistas, de acordo com o Governo, que teve o azar de se reformar entre 2014 e 2018 e um outro grupo, que abrange 10% dos que se irão reformar

nos próximos anos, que mantêm esse corte como marca da austeridade que já tomou conta do País e da qual

quisemos libertar-nos. Essas pessoas têm uma dupla penalização na reforma porque anteciparam a idade da

reforma e, desde 2014, o fator de sustentabilidade só se aplica a reformas antecipadas.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Exatamente!

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — São essas que sofrem a dupla penalização; são essas a que Vieira da Silva se referia em 2019.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Exatamente!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Duarte Cordeiro): — Não!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — São essas que queremos corrigir e que nada têm que ver com a alínea c) que o Sr. Primeiro-Ministro aqui citou.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Primeiro-Ministro, o corte do fator de sustentabilidade nas pensões de reforma de milhares de trabalhadores é injusto, é aleatório, é um resquício do miserabilismo da troica. Como é

que aquilo a que Vieira da Silva chamou de «dupla penalização inaceitável» pode ser agora qualificado, pelo

Primeiro-Ministro António Costa, de indispensável, a ponto até de criar uma crise política que ninguém deseja?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, o Governo sabe que as questões da habitação têm vindo a ser sistematicamente colocadas pelo PCP

no debate sobre as respostas de que o País precisa para os problemas que são sentidos, no dia a dia, pelas

pessoas. O Governo sabe que a perspetiva de resposta a esta questão está muito longe de responder não ao

PCP, mas aos portugueses, quer sobre o parque público de habitação, quer sobre o regime do arrendamento.

O Governo apresenta um Orçamento que é uma espécie de capa de encadernação do PRR. «Investimento

público na habitação!», reclama o País. «PRR!», responde o Governo. Orçamento, nem vê-lo! Pois bem, se há

uma verba plurianual do PRR para habitação condigna para 26 000 famílias, onde é que isso já vai, quando só

em 87 municípios o Estado assumiu a necessidade imediata de 29 000?! Repito: há 29 000 famílias que

precisam de casa, só em 87 municípios portugueses e o PRR, que é a santa milagreira do Governo, só nesse

lote já ficou ultrapassado!

No arrendamento, a solução que o Governo apresenta é a de adiar, por um ano, a aplicação da lei dos

despejos para os contratos anteriores a 1990? Empurra com a barriga, deixando a ameaça a pairar sobre os

inquilinos e abandonando todos os outros que, já hoje, enfrentam os problemas de um regime desumano que

está em vigor?

Nós sabemos que, no mês passado, quando o PCP trouxe a esta Assembleia as propostas e as soluções

concretas para revogar essas normas gravosas da lei dos despejos, a «lei Cristas» como é conhecida, o PS

votou ao lado da direita e chumbou as propostas do PCP sobre o arrendamento. Sr. Primeiro-Ministro, não se

esqueceu, pois não?

Agora o que pretende o Governo, afinal? Que resposta dá o Governo não ao PCP, mas aos milhões de

famílias que estão perante esta ameaça concreta de serem expulsas das suas casas e dos seus bairros? E até

aos milhares de micro, pequenas e médias empresas, condenadas a fechar as portas e a procurar outras

paragens? Diga-nos lá, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do PAN.

Pausa.

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Creio que a Sr.ª Deputada não está na Sala, portanto vamos passar ao próximo pedido de esclarecimento,

com o qual concluiremos esta ronda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa, do PSD.

A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, esteve seis longos anos à frente do Governo. Seis anos! Nesses seis anos, não foi capaz de cumprir com a sua

palavra, não foi solidário, nem resolveu nenhum dos problemas dos madeirenses.

Não cumpriu com a sua palavra em relação ao ferry, que prometeu para todo o ano, não corrigiu a resolução

do Conselho de Ministros, nem clarificou os 50% que prometeu para o novo hospital da Madeira. Recusou todos

os pedidos de ajuda, incluindo moratórias. Não regulamentou o subsídio social de mobilidade, não avançou com

os equipamentos de deteção de turbulência no aeroporto da Madeira, nem com a remodelação das esquadras

da PSP, nem com a majoração do financiamento da Universidade da Madeira, entre muitos outros assuntos.

Sr. Primeiro-Ministro, também não assumiu aquelas que são as suas responsabilidades na Madeira. Continua

a recusar pagar o que deve de acertos fiscais e os cuidados de saúde e os medicamentos da PSP (Polícia de

Segurança Pública), da GNR (Guarda Nacional Republicana) e das Forças Armadas.

Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, seis anos depois está praticamente tudo igual! Este Governo

não resolveu nenhum dos problemas da Madeira naquelas que são as suas responsabilidades. Sr. Primeiro-

Ministro, teve várias oportunidades para resolver estes problemas, no entanto, optou por não o fazer e por

continuar a prejudicar os madeirenses.

Sr. Primeiro-Ministro, como foi capaz de virar as costas aos madeirenses? Esta é a pergunta que os

madeirenses fazem, mas que eu não vou fazer-lhe. E não vou fazê-la, porque nós sabemos muito bem porque

não quis resolver estes problemas.

Sr. Primeiro-Ministro, termino, dizendo que cá estaremos, como sempre, a reivindicar aquilo a que temos

direito e a defender, de forma intransigente, a Madeira e os madeirenses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Nesta ronda, estava previsto haver sete pedidos de esclarecimento, mas houve apenas cinco. Pergunto se o Governo pretende que fiquemos com seis ou se dou, de imediato, a

palavra ao próximo interveniente.

Pausa.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Moniz, do PSD.

O Sr. Paulo Moniz (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, ouvi o Sr. Primeiro-Ministro com toda a atenção. E houve duas expressões que utilizou amiúde na

tribuna — «solidariedade» e «contas certas».

Além de contas certas, julgo ser muito importante que estas sejam acertadas. Em relação aos Açores, esta

proposta de Orçamento retira mais de 20 milhões de euros à dotação das transferências comparativamente ao

outro Orçamento. É certo que esta redução se funda na regra da Lei das Finanças das Regiões Autónomas.

Vozes do PS: — Ah!

O Sr. Paulo Moniz (PSD): — Contudo, apesar de ser uma conta certa, não é uma conta acertada, porque não tem em conta a enorme dificuldade económica e de desenvolvimento e de enfrentar a crise pandémica,

como os Açores o fizeram. Era uma obrigação de contas acertadas e certas ter esta consciência. Nós não somos

filhos de um deus menor. Da mesma forma que V. Ex.ª, perante a Europa, apela à compreensão e ao estímulo

económico para vencer as dificuldades, os açorianos têm a mesma legitimidade e a mesma dificuldade. O que

esperávamos de si era exatamente que, tendo isso em linha de conta, e como Primeiro-Ministro de todo o País,

reconhecesse que os 20 milhões de euros, além de virem de uma conta que é certa, não é uma conta acertada

neste objetivo e nessa justificação.

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Protestos de Deputados do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, em matéria de solidariedade, os Açores têm feito emissão de dívida para fazer face às

dificuldades que decorrem de enfrentar uma pandemia, mas muitas destas dificuldades advêm da herança de

uma dívida pública de 24 anos de governos socialistas. O Governo presidido por José Manuel Bolieiro, de forma

hercúlea, tem tentado suprir essas dificuldades que herdou.

Esta solidariedade deveria levar a que, pelo menos, o juro deste endividamento fosse o mesmo do País. Não

é possível compreender que, no mesmo País, se permita que os Açores emitam dívida muitas vezes com juros

que são o dobro e o triplo daquilo que o País consegue obter. Isto não é solidariedade, não é o que Robert

Schuman disse, ou seja, que a solidariedade é de facto e que se constrói com base em ações concretas. O que

se esperava de si, que tanto apregoa a solidariedade, era que os juros a que os Açores têm necessidade de

recorrer para fazer face às dificuldades fossem alinhados com os melhores juros que o País consegue.

Não faz sentido chamar à solidariedade europeia a mutualização da dívida e o benefício de juros

historicamente baixos quando esta estratégia e esta justiça não são feitas em relação aos Açores.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder a estas questões.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes, em democracia, nunca há becos sem saída! Em democracia, há sempre saídas, umas melhores, outras piores.

A primeira boa saída é o Orçamento ser aprovado e tudo continuar bem. A segunda saída é o Orçamento

não ser aprovado e termos de governar em duodécimos. A terceira saída, que não compete a nenhum de nós

comentar, porque depende única e exclusivamente da avaliação que S. Ex.ª o Presidente da República fizer, é

haver ou não eleições.

No que nos diz estritamente respeito, há algo que posso garantir-lhe: assumimos todas as nossas

responsabilidades, no entendimento de haver eleições ou no entendimento de não haver eleições. Havendo

eleições, há algo que pode ter como certo: a Sr.ª Deputada não sabe quem será o seu líder, …

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Ah!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas eu sei que liderarei o meu partido nestas eleições. Esta é já uma enorme diferença em matéria de estabilidade!

Aplausos do PS.

Também devo dizer-lhe o seguinte, puxando um pouco pela memória: das soluções de estabilidade que a

direita, até hoje, apresentou ao País, nenhuma resistiu seis anos. Quando se coligaram, pela primeira vez, com

o CDS-PP, governaram de 1979 a 1983, ou seja, cerca de quatro anos; a segunda vez que governaram com o

CDS-PP foi entre 2002 e 2005, ou seja, cerca de três anos. A única vez que conseguiram cumprir uma legislatura

completa coligados com o CDS-PP foi no Governo do Dr. Passos Coelho, que, como se lembram, foram quatro

anos particularmente agitados pela irrevogabilidade das demissões do líder do CDS-PP do Governo.

Aplausos do PS.

Portanto, Sr.ª Deputada, na solução política que temos tido desde 2016, com um Governo minoritário do PS,

que umas vezes tem tido mais apoio e outras menos das bancadas do PCP, do Bloco de Esquerda e do PEV,

e, na última Legislatura, também do PAN, a verdade é que já superámos todo esse grau de instabilidade que a

direita transporta consigo sempre que chega ao poder.

As únicas vezes que assim não sucedeu foi quando o Professor Cavaco conseguiu ter duas maiorias

absolutas. Com essa exceção, a direita foi sempre o maior fator de instabilidade governativa neste País. Sempre!

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Aplausos do PS.

Sr.ª Deputada Joana Mortágua, em primeiro lugar, não há 60 000 pessoas — que foi o que disse —, há 250

000 pessoas.

Protestos do BE.

Em segundo lugar, aquilo que foi estabelecido em 2015 e que temos vindo a executar paulatinamente é a

eliminação dos fatores de sustentabilidade para aquelas circunstâncias a título excecional: primeiro,

longuíssimas carreiras contributivas; segundo, atividades de desgaste rápido, como aconteceu recentemente

com a situação nas pedreiras.

Poderá ter lugar, neste Orçamento, a consagração da proposta do Bloco de Esquerda de eliminar o princípio

da sustentabilidade para as pessoas com mais de 80% de incapacidade, desde que, obviamente, o Orçamento

chegue à fase da especialidade.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Não disse isso!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado Bruno Dias, o que está previsto neste Orçamento do Estado é o adiamento por mais um ano dessa norma da «lei Cristas» de forma a podermos fazer o recenseamento do

universo das pessoas abrangidas e podermos tomar decisões sobre o subsídio de renda.

A intervenção sobre o mercado do arrendamento, como a história nos indica, deve ser muito prudente, muito

cautelosa, de forma a que não oscilemos entre a tragédia que foram décadas de congelamento, que conduziram

à degradação do património, ao esvaziamento das cidades, ao abandono das casas e ao que tem sido a

liberalização, sem regras, introduzida pela legislação Cristas que, numa conjuntura de forte crescimento

económico, em particular do turismo, desequilibrou particularmente o mercado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Foi o que eu disse!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa teve a gentileza de dizer que não me faz nenhuma pergunta, portanto dispensa-me de responder.

Sr. Deputado Paulo Moniz, primeiro, como disse, e bem, quanto à lei das finanças regionais, estamos a

cumpri-la. Lei é lei, portanto estamos a cumpri-la!

Quanto aos juros da dívida, chamo a atenção para o seguinte: quando a dívida é contraída perante a

República, nós temos estado a repercutir sobre a região autónoma a capacidade que a República tem tido de

reduzir, graças à sua credibilidade, o montante dos juros da dívida. Quando as regiões autónomas vão ao

mercado com a sua própria credibilidade, pagam, obviamente, o custo da dívida que o mercado cobra. Mas

sempre que a dívida é da República, nós, há vários anos — há vários anos, quer dizer, desde que nós somos

Governo, porque no tempo do Governo anterior isso não acontecia —, temos repercutido, relativamente às

regiões autónomas, a redução da taxa de juro que, felizmente, temos obtido no mercado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, cometi um lapso na ordem das inscrições, que acabou por levar a que dois Srs. Deputados do PSD tivessem feito intervenções seguidas, o que não deveria ter

acontecido. Peço desculpa à Câmara por esse facto.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Foi ultraperiférico!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos entrar na última ronda de perguntas ao Sr. Primeiro-Ministro, que volta a ter sete pedidos de esclarecimento na medida em que a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha não estava

presente na ronda anterior por razões que não são da sua responsabilidade.

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Portanto, temos ainda sete pedidos de esclarecimento, cabendo o primeiro à Sr.ª Deputada Lara Martinho,

do PS.

A Sr.ª Lara Martinho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, este é um bom Orçamento do Estado. É um Orçamento que, se não for aprovado, irá impedir a consolidação dos avanços iniciados em 2015!

Irá impedir também a continuação de um caminho que foi totalmente ignorado pelo Sr. Deputado Paulo Moniz

e que, no caso dos Açores, significou o cumprimento integral da lei das finanças regionais, o que nunca

aconteceu com PSD/CDS.

Aplausos do PS.

Uma lei das finanças regionais que foi aprovada pelo PSD, facto que o Sr. Deputado também se esqueceu

de mencionar.

Esqueceu-se, igualmente, de mencionar que o rácio da dívida pública dos Açores é o mais baixo do País.

Aliás, esqueceu-se de mencionar também que o caminho que percorremos desde 2015 permitiu, pela

primeira vez, uma comparticipação financeira das ligações aéreas interilhas, com o apoio à SATA; a instalação

de projetos internacionais nos Açores, como o Observatório do Atlântico, o AIR Center, o Centro de Operações

Espaciais e o Atlantic Centre; o apoio à revitalização da ilha Terceira; a criação da rede de radares

meteorológicos e dos novos cabos submarinos; uma forte aposta na agenda espacial, com a criação da Portugal

Space, nos Açores, e o desenvolvimento do Porto Espacial;…

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Lara Martinho (PS): — … a comparticipação em 85% para colmatar os estragos provocados pelo furacão Lorenzo, em que se manifestou profundamente a solidariedade da República; ou a distribuição de 5%

da bazuca europeia para os Açores.

Aplausos do PS.

Mas o que fez o atual Governo dos Açores, liderado pelo PSD, pelo CDS e pelo PPM, com o apoio do Chega

e do Iniciativa Liberal?

O Porto Espacial está hoje posto em causa devido à inação do Governo regional. Quanto ao furacão Lorenzo,

o Governo regional, liderado pelo PSD, num ato que só podemos classificar de pura incompetência,

simplesmente esqueceu-se de solicitar mais de 60 milhões de euros à República. Quanto à bazuca, os primeiros

117 milhões para os Açores, no âmbito das agendas mobilizadoras, foram distribuídos pelo Governo regional à

surdina, numa total falta de transparência, a apenas 30 empresas açorianas.

Aplausos do PS.

Liderados pela direita, reina nos Açores um clima de desconfiança, de suspeição, de falta de transparência.

Pergunto: é este o futuro que queremos para o nosso País? Não é, de certeza, este o futuro que quero para

a minha terra!

Sr. Primeiro-Ministro, nós sabemos que «às vezes não corre tudo bem» e que às vezes as coisas «levam

mais tempo» do que o desejado. Mas ao longo destes seis anos foram muitas as reivindicações dos açorianos

que viram a luz do dia e este caminho será posto em causa se amanhã prevalecer o voto contra do PSD, do

CDS, do Iniciativa Liberal, do Chega, do Bloco de Esquerda e do PCP. Se prevalecer a insensatez, a história

não os julgará com bondade!

Resta-me, Sr. Primeiro-Ministro, agradecer a sua sempre pronta disponibilidade para apoiar a nossa região,

para fazer mais e melhor e torná-la um elemento fundamental da projeção do nosso País no mundo.

Foram muitas as conquistas alcançadas e estou certa de que o futuro reserva muitas mais!

Os Açores puderam sempre contar com o PS quando este foi Governo na República. O mesmo não se pode

dizer em relação ao PSD.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do PCP.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, o PCP tem apresentado e defendido soluções para que a resposta aos problemas dos trabalhadores

seja concretizada.

É urgente uma efetiva valorização dos trabalhadores da Administração Pública, que levam já 11% de perda

do poder de compra com os seus salários congelados.

Foram considerados imprescindíveis, foram aplaudidos, foram-lhes exigidos esforços adicionais no combate

à crise sanitária e nem o Orçamento nem os compromissos do Governo lhes dão resposta na efetiva valorização

dos seus salários e das suas carreiras.

A realidade do País, Sr. Primeiro-Ministro, exige um travão nos despedimentos, a defesa dos postos de

trabalho, o combate à precariedade e aos horários de trabalho selvagens, o combate aos abusos no trabalho

noturno e por turnos, a garantia de horários dignos e de tempo para viver.

Recusar estas medidas é permitir os oportunismos do patronato que, a pretexto da epidemia, despede em

catadupa, atropela direitos e aumenta a exploração.

É preciso pôr fim à substituição de trabalhadores com direitos por trabalhadores sem direitos, erradicar a

precariedade, incluindo no Estado, e garantir o vínculo efetivo a todos os trabalhadores que respondem a

necessidades permanentes.

Para tudo isto o PCP tem apresentado soluções. Tal como temos feito para garantir uma justa proteção no

desemprego, alargando o acesso ao subsídio de desemprego e reforçando esta resposta.

Em 2021, foi preciso aprovar a renovação automática do subsídio por desemprego, porque as regras que

existem não garantem essa proteção. O Governo não quis aprender com essa lição e não só não mantém a

renovação automática como se recusa a alterar essas regras para que a proteção no desemprego seja

efetivamente assegurada.

A recusa do Governo em dar a resposta que se impõe e assumir os compromissos necessários tem como

consequência o avolumar dos problemas dos trabalhadores e a sua desproteção social.

A questão que se impõe é a de saber que opção quer o Governo fazer? Que resposta quer dar, não ao PCP,

Sr. Primeiro-Ministro, mas aos milhões de trabalhadores sujeitos à precariedade, aos despedimentos, à

desregulação de horários e ao desemprego?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira, do PS.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, depois de tantas intervenções, não poderia deixar de trazer a este debate um tema que foi recorrente

e que, do meu ponto de vista, merece ser revisitado, até porque, na perspetiva do Grupo Parlamentar do Partido

Socialista e do Governo do Partido Socialista, é absolutamente essencial: o crescimento económico. O

crescimento económico é, de facto, central para o Partido Socialista e tem um lugar central neste Orçamento.

Mas convém fazer uma clarificação sobre muitas das coisas que se disseram sobre o crescimento económico

neste debate, até agora. Nós não sabemos verdadeiramente o que é que a direita — o PSD, o CDS, o Iniciativa

Liberal e até o Chega — quer fazer do ponto de vista do modelo económico para o País. Mas nós já sabemos

hoje onde é que estiveram o PSD e o CDS entre 2012 e 2015. Isso, nós já sabemos!

E sabemos algo que nos parece muito importante sobre crescimento económico. Este gráfico que aqui está

— porque, como diz o povo, mais vale uma figura, um desenho do que mil palavras — é muito claro.

Neste momento, o orador exibiu o gráfico que mencionou.

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Esta linha vermelha que aqui está é o PIB. O PIB caiu como nunca quando os senhores governaram.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Aliás, até há uma tempestade perfeita, Srs. Deputados, que os senhores ainda não referiram hoje, que é

linha da carga fiscal. A carga fiscal subiu como nunca, Srs. Deputados!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, este é o resultado das vossas políticas!

Mas eu ouvi outras coisas sobre crescimento económico. Ouvi que o crescimento económico tinha sido muito

fraco e por aí adiante, e blá, blá, blá, e blá, blá, blá…

Srs. Deputados, vamos aos factos e vamos a mais uma figurinha.

O orador exibiu o gráfico que mencionou.

O crescimento económico de Portugal, que está a vermelho, está abaixo da média da União Europeia quando

os senhores governaram o País. A receita que os senhores implementaram está abaixo da média europeia

Aplausos do PS.

Ora, o crescimento económico só está acima da média da União Europeia nos anos em que o PS governou

o País. Portanto, convergimos com a União Europeia quando conduzimos o País.

Protestos do PSD.

Mas eu ouvi algo ainda mais surpreendente da parte da Sr.ª Deputada Cecília Meireles e até do Sr. Deputado

Telmo Correia, que foi dizerem que o País estava a recuperar mal.

Este é outro gráfico do Eurostat. Não sei se viram este gráfico do Eurostat.

O orador exibiu o gráfico que mencionou.

Este é do 2.º trimestre e mostra que o País é, apesar de tudo, o segundo país da União Europeia que está a

recuperar melhor!!

Aplausos do PS.

É o segundo país que está a recuperar melhor!

Mais, se virem, em termos homólogos, é o quinto país da União Europeia que está a recuperar melhor.

Mas, Srs. Deputados, para terminar, quero dizer o seguinte: cada um faz o que tem de fazer.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Claro!

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Os senhores fizeram o vosso papel entre 2012 e 2015 e a economia cresceu 6%. Nós fizemos o nosso papel entre 2016 e 2019 e a economia cresceu 9,3%. Portanto, esse é o contributo

que os senhores deram para que nos tenhamos afastado da União Europeia e nós demos o contributo para

estarmos mais próximos da União Europeia.

Vozes do PS: — Muito bem!

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O Sr. Carlos Pereira (PS): — Finalmente, termino perguntando ao Sr. Primeiro-Ministro se este Orçamento traz ou não traz o mesmo impulso que demos no passado para o crescimento económico e para podermos

distribuir aquilo que o Sr. Deputado Rui Rio não queria distribuir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do PCP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Peço desculpa, Sr. Deputado Duarte Alves. A Sr.ª Deputada Cecília Meireles pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Queria interpelar a Mesa no sentido de ser distribuído um documento, tendo em conta que fui diretamente citada pelo Sr. Deputado que acabou de usar da palavra.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, se quiser dizer-nos qual é o documento…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É um documento que foi publicado hoje e que diz o seguinte: «Fact Check. Economia portuguesa é das que estão a recuperar mais rapidamente da pandemia, como diz o PS?»,

afirmação classificada como enganadora!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, se quiser fazer chegar o documento à Mesa, o mesmo será distribuído.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Já tive esta discussão hoje de manhã e peço que o documento seja distribuído a toda a Câmara.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, terão a possibilidade de ler o documento. Não precisam de o comentar agora.

Sr. Deputado Duarte Alves, tem a palavra.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o PCP tem trazido à discussão soluções para a intervenção do Estado em empresas e setores estratégicos, em especial soluções para os custos da

energia e dos combustíveis. A lógica especulativa que está por detrás dos aumentos dos preços da energia e

dos combustíveis podia ser resolvida se o Estado tivesse o controlo sobre o setor energético.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Se o Estado tivesse em mãos uma empresa como a Galp poderia intervir no mercado determinando um preço ao qual os restantes concorrentes do mercado teriam de se adaptar. Mas o

Governo recusa essa linha de solução apresentada pelo PCP, tal como recusa a solução para o estabelecimento

de um regime de preços máximos.

As medidas que o Governo anunciou há uns dias confirmam que a opção do Governo é a de devolver uma

pequena parte dos impostos pagos pelo preço dos combustíveis e deixar intocados os milhões de lucro dos

grupos económicos do setor da energia.

Sendo inegável o peso da fiscalidade sobre os combustíveis, ficou já claro que medidas de redução fiscal,

sem um regime de preços máximos, significam pouco mais do que zero na redução de custos para os

consumidores.

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Aliás, a recente redução de 2 cêntimos no preço dos combustíveis, por redução do ISP, foi imediatamente

absorvida pelo aumento seguinte, o que mostra, precisamente, que uma coisa sem a outra não faz sentido.

É preciso, por isso, trabalhar em duas frentes: no alívio fiscal, com o fim do adicional e da dupla tributação,

mas também nas margens e nos preços máximos, garantindo que essas medidas fiscais têm impacto no preço.

No quadro em que estamos, que opções toma o Governo? Continua irredutível na sua posição e a recusar

as soluções apresentadas pelo PCP? Recusa as medidas para um alívio fiscal, articulado com uma fixação de

preços máximos?

Diga-nos, Sr. Primeiro-Ministro: que opções quer o Governo tomar para combater este problema do preço

dos combustíveis, que, neste momento, é muito grave para as famílias?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Carlos Reis, do PSD.

O Sr. Carlos Eduardo Reis (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, em agosto de 2020, no verão passado, Sua Excelência o Primeiro-Ministro disse ao País que, no dia em que a sua

subsistência dependesse do PSD, o seu Governo acabava.

Já aqui a frase foi relembrada pelo Sr. Presidente do partido, mas faço-o novamente porque se encontra

intimamente ligada a um tema que quero aqui trazer, que é o da defesa nacional.

Ao fim de seis anos de Governo, a única reforma verdadeiramente estrutural que este Governo tem para

apresentar ao País dependeu do PSD para ser aprovada. Falo, naturalmente, da alteração da Lei de Defesa

Nacional e da Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas.

Sei que é a instabilidade política que está hoje, aqui, na ordem do dia, mas insisto em recordar que, em

matérias de soberania, o País contou com um partido na oposição e nenhum outro, o PSD.

No Orçamento que o Governo apresenta esta semana, é aplicado um corte de 25% — 25% — na saúde

militar, Sr.as e Srs. Deputados, em relação ao valor estimado para este ano.

Foi assim no Orçamento do ano passado, com um corte de 44% em relação à estimativa de execução e foi

assim em 2020, com um corte de 42% da estimativa de execução face a 2019.

Para quem ia virar a página da austeridade, Sr. Primeiro-Ministro, no caso da saúde militar, escreveu, aqui,

todo um novo volume, todo um novo capítulo.

E, se há portugueses que não poderiam ser esquecidos neste Orçamento do Estado são exatamente aqueles

que servem o País nas nossas Forças Armadas.

O Sr. Paulo Moniz (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Eduardo Reis (PSD): — Mas, na verdade, no PSD, já não esperávamos que fosse este Orçamento a dar resposta aos problemas de recrutamento e retenção nas Forças Armadas, já não esperávamos

que valorizasse os deficientes das Forças Armadas, com quem Portugal tem uma dívida de gratidão evidente.

E também já esgotámos a esperança de que nas indústrias de defesa a visão do Governo se altere. Continuarão

a condenar o Arsenal do Alfeite a mais um ano de greves, a mais um ano de problemas de tesouraria, a mais

um ano de desinvestimento nas suas infraestruturas.

O vosso Orçamento, nesta área, refugia-se, apenas, na aquisição de novos navios de patrulha oceânicos,

quando grande parte dos navios da Marinha se encontram parados e a aguardar por uma solução, como é

público e notório.

Todos os ramos das Forças Armadas, todos os três ramos das Forças Armadas — note-se bem! — veem,

neste Orçamento do Estado, a sua verba reduzida.

Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, trata-se de uma situação infeliz esta, em que o Governo

esquece, no seu Orçamento, os homens e mulheres que salvaram a maior empreitada logística de saúde nas

últimas décadas: o processo de vacinação.

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Se já se concluiu que o Orçamento do seu Governo não serve para o PCP, se já se concluiu que o Orçamento

deste Governo não serve para o Bloco de Esquerda, também podemos concluir que este Orçamento do Estado

não serve aos militares e não serve às Forças Armadas.

Aplausos do PSD.

Este Governo teve a oportunidade de contar com uma liderança de oposição responsável e com sentido de

Estado. E é isso mesmo: sentido de Estado. É esse sentido de Estado que nos obriga a dizer, aqui, que este é

um documento orçamental que não reconhece, que não valoriza, que não apoia os homens e mulheres que dão

a vida pelo nosso País.

E, por isso, só pode ser um mau Orçamento para Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita, do PCP, para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, a escola pública precisa de professores qualificados, valorizados e em número adequado para que se possa diminuir o número de alunos por turma e

para que nenhum aluno fique sem professor a alguma disciplina, como ainda hoje acontece.

O PCP tem proposto medidas concretas para combater o envelhecimento do corpo docente e criar condições

de atratividade dos jovens para a docência. Propostas que passam, na primeira linha, pelo combate à enorme

precariedade dos mais de 20 000 professores contratados, procedendo à vinculação extraordinária, em 2022,

dos docentes com 10 ou mais anos de serviço e, em 2023, dos professores com três ou mais anos de serviço;

por criar incentivos à deslocação dos professores para as regiões deles mais carenciadas, como é o caso da

Grande Lisboa ou do Algarve; e, ainda, por resolver problemas que se arrastam há muito, como as limitações

da norma-travão, os constrangimentos à progressão na carreira, a contagem do tempo de serviço e a

recomposição da carreira, a organização adequada do trabalho, o acesso à aposentação.

Sr. Primeiro-Ministro, recusar as soluções que o PCP apresenta significa o afastamento dos jovens da

docência e o agravamento do problema da falta de professores, nomeadamente de professores qualificados;

não contrariar, e antes concretizar, a previsão de saída de mais de metade dos atuais professores até ao final

da década, num contexto em que cerca de 7500 professores saíram das escolas, entre 2016 e 2021. Isto terá

consequências muito negativas na capacidade de resposta da escola pública e na qualidade do ensino no nosso

País.

Não há, neste Orçamento, quaisquer medidas concretas que combatam estes problemas, nem se conhece,

por parte do Governo, qualquer compromisso para os resolver, nem sequer no plano de recuperação das

aprendizagens. Pelo contrário, tudo o que se conhece até agora é o arrastar do bloqueio negocial com os

sindicatos.

Sr. Primeiro-Ministro, face à dimensão destes problemas e à urgência da sua solução, como se justifica que

o Governo continue a recusar as soluções propostas pelo PCP, recusando as soluções para este grave

problema?

Aplauso do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Finalmente, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, antes de mais, Sr. Presidente, devo dizer que estou muito grata pela sua compreensão, face à

minha ausência no momento anterior.

Gostaria de fazer uma espécie de preâmbulo, porque já hoje, nesta Casa, ouvimos, diversas vezes, um certo

regozijo com a possibilidade de chumbo deste Orçamento e o PAN reitera aquela que é a sua posição:

entendemos que devem ser feitos todos os esforços para que este Orçamento chegue à especialidade, para

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que se faça o diálogo que tem de ser feito até amanhã. Pelos portugueses a quem, tantas vezes, nesta Casa,

agradecemos e porque precisam de um Orçamento do Estado, a tempo e horas, para o ano 2022, é fundamental

que ainda seja possível que essas pontes se façam.

Mas gostaria de colocar, neste momento em particular, algumas questões ao Sr. Primeiro-Ministro,

nomeadamente no que diz respeito à saúde, em particular à saúde mental. Isto porque passámos por uma crise

sanitária, em que as linhas de emergência foram fundamentais, mas sabemos bem que, apesar de urgentes e

fundamentais, elas não são suficientes para resolver estruturalmente os problemas que existem, nem para dar

resposta às reais necessidades de saúde mental e, inclusivamente, fazer sair da gaveta um plano nacional de

saúde mental, que tem sido adiado constantemente. Também as equipas comunitárias de saúde mental, que já

eram urgentes antes desta crise sanitária, são, de todo, insuficientes para cobrir todo o território nacional.

Igualmente não podemos deixar de lembrar que, desde 2018, por proposta do PAN, em Orçamento do

Estado, foi inscrita a contratação de 40 psicólogos para o Serviço Nacional de Saúde e tem faltado a vontade

política necessária para concluir este processo.

Quanto às respostas de saúde mental de proximidade, nomeadamente nos centros de saúde, tão

necessárias às necessidades da nossa população, nomeadamente para evitar outros custos ao erário público,

não podemos, pois, deixar, neste debate na generalidade, de perceber qual é, afinal, a real disponibilidade do

Governo para implementar e desbloquear os concursos para os psicólogos nos nossos centros de saúde.

Aplausos da Deputada do PAN Inês de Sousa Real.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar, Sr.ª Deputada Lara Martinho, agradeço a síntese que fez do trabalho que temos desenvolvido ao longo destes seis anos em prol da

defesa das regiões autónomas, designadamente da Região Autónoma dos Açores.

Queria sublinhar, aqui, que este deve ser dos primeiros debates orçamentais em que ninguém põe em causa

dois factos que se têm vindo a tornar tão comuns que deixaram de ser tema: estes Orçamentos cumprem não

só a lei das finanças regionais, como também cumprem a lei das finanças locais, que continuam, ambas, a ser

cumpridas também neste Orçamento do Estado.

Sr.ª Deputada Diana Ferreira, em primeiro lugar, não há congelamento neste Orçamento do Estado. Desde

o início desta legislatura, fixámos o princípio de que deveria haver uma atualização anual dos salários na

Administração Pública, depois de anos sem haver essa atualização, em função da inflação estimada para o ano

anterior.

Foi assim que logo, em 2020, houve uma atualização salarial de 0,3%, que era a avaliação estimada para o

ano de 2019; em 2021, não houve, porque a inflação, em 2020, foi negativa, de menos 0,1%; e é por isso que

este ano, sendo a inflação estimada em 1%, atualizamos em 0,9%, que corresponde à inflação de 2020 e de

2021. Não há qualquer tipo de congelamento.

Em segundo lugar, repusemos em vigor as carreiras da Administração Pública, porque os funcionários

públicos têm direito à previsibilidade da sua carreira e este é o quinto Orçamento consecutivo para que vamos,

em que há descongelamento nas carreiras da Administração Pública. É por isso que, no conjunto dos salários,

há uma valorização de 2,5% e, se tivermos em conta as novas contratações, a massa salarial aumenta, no

próximo ano, 3%, relativamente ao ano anterior, sendo, aliás, o último ano de pagamento da famosa recuperação

do tempo de serviço dos professores — para o próximo ano, regularizaremos, finalmente, essa recuperação.

Quanto à legislação do trabalho, repito, está, neste momento, em discussão pública, virá, necessariamente,

à Assembleia da República, porque é da sua competência, e até lá teremos muito tempo para trabalhar no

sentido de melhorar essa legislação e para que ela possa ser aprovada nesta Assembleia, como deve ser. Até

lá, não faz sentido votar o Orçamento em função de uma legislação do trabalho, que, neste momento, não está,

aqui, em votação.

O Sr. Deputado Carlos Pereira pergunta se há um maior impulso no crescimento económico e eu direi que

nunca houve um impulso tão grande. O investimento público cresce 30% e não venham dizer que não cumprimos

o Orçamento, porque, na média dos últimos cinco anos, relativamente ao investimento público, executámos 85%

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e, no ano passado, executámos mesmo 91%. É um grande impulso, para além dos incentivos fiscais atribuídos

à recuperação por parte das empresas.

Sr. Deputado Duarte Alves, em primeiro lugar, tenho dificuldade em compreender a questão que coloca

relativamente à diferença que existiria se a empresa fosse pública. Significaria isto que compraríamos a um

preço mais elevado no mercado internacional e incorporaríamos, como prejuízo da empresa, o diferencial desse

preço? Mas isso era uma coisa que destruiria a empresa a muito curto prazo. Ora, nós não podemos gerir assim.

Foi por isso que interviemos, em primeiro lugar, com a legislação sobre a margem de lucro. Foi aprovada, nesta

Assembleia, aliás, com o voto contra da direita e que o Sr. Presidente da República já promulgou, e temos vindo

a adotar as medidas fiscais para procurar controlar o preço, chamando a atenção que, até agora, só a França e

Portugal adotaram medidas para o controlo do preço do combustível.

Relativamente ao Sr. Deputado Carlos Reis, que nos coloca a questão do tema da estabilidade, devo dizer,

primeiro, que — e isso é muito claro — não há qualquer redução do orçamento da defesa. Em 2021, houve um

aumento extraordinário para pagar e assumir uma dívida do IASFA (Instituto de Ação Social das Forças

Armadas). Essa dívida está paga, desaparece, e é por isso que há continuidade.

Quanto à manutenção, a boa notícia é a de que entrou nesta semana em serviço, como era previsto, a fragata

da classe Bartolomeu Dias, da Marinha, que estava em reparação, e aguardamos para julho do próximo ano

que entre em vigor a outra, mantendo, assim, o esforço de recuperação.

Sr.ª Deputada Ana Mesquita, a despesa com professores para 2022 aumentará 5,5% — 5,5%. Temos vindo

a ter um aumento constante das vinculações. Durante os últimos seis anos, vincularam 11 000 professores; no

concurso externo de 2021, vincularam 2424; e no ano de 2020-2021, por via do reforço de horário ou das tutorias,

houve uma contratação de mais 3300 professores.

Contudo, temos bem consciência da gravidade da transição demográfica no corpo docente. Foi por isso que

encomendámos um estudo, que está concluído, e estamos neste momento disponíveis para trabalhar com as

estruturas sindicais, e também com o PCP, para adotar as medidas concretas, tendo em vista assegurar a

resposta à necessidade de rejuvenescimento do corpo docente e assegurar que não haverá falta de corpo

docente.

Finalmente, Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, temos toda a disponibilidade para trabalhar em sede de

especialidade e quero recordar que, no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência, reservámos 88 milhões

de euros especificamente para dar execução ao Programa Nacional para a Saúde Mental, que, sabemos bem,

é uma prioridade que esta pandemia tornou ainda mais presente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar agora a intervenções por parte das diversas bancadas.

Para uma intervenção pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Oliveira.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro e o Secretário-Geral do Partido Socialista são — os dois! — responsáveis

pela geringonça!

Neste filme temos de acrescentar o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português como protagonistas

de uma solução de Governo que foi «vendida» nas últimas eleições, ao País e aos portugueses, como uma

solução mágica para os problemas do País.

Diziam que era uma solução que garantia estabilidade. Afirmavam aos sete ventos que eram autossuficientes

e, claro, não precisavam de falar com mais ninguém! Sobranceria e falta grave de humildade democrática nunca

foram características de um bom Governo e muito menos de um Governo minoritário. E, cereja no topo do bolo,

relembro a afirmação do Sr. Primeiro-Ministro — que, neste momento, não está presente, mas disse-me que já

chegaria — ou do Secretário-Geral do Partido Socialista, ou talvez dos dois: «No dia em que precisarmos do

PSD para aprovar o Orçamento do Estado, o Governo cai!».

Sr. Primeiro Ministro, afinal havia outra! E reza assim: «No dia em que os parceiros da geringonça votarem

contra o Orçamento do Estado, o Governo cai!». Esta é uma variável que não considerou na sua governação, o

que é absolutamente lamentável, porque era fundamental essa variável!

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Mas, então, no dia de hoje, qual é o estado da arte?

A crise pandémica ainda não terminou, estamos perante uma profunda crise económica de dimensões que

ainda não estão devidamente avaliadas e temos agora uma crise política.

Perante a dimensão dos desafios que o País tem pela frente, era absolutamente fundamental que tivéssemos

um Governo capaz de estar à altura das suas responsabilidades. Mas, como já vimos, não temos.

O Sr. Primeiro-Ministro, e Secretário-Geral do Partido Socialista, é o grande responsável por esta crise

política — ainda bem que já chegou, Sr. Primeiro-Ministro, porque assim já me permite falar consigo: criou uma

geringonça que só existiu com o único objetivo de desfazer aquilo que o Partido Socialista nos tinha trazido com

o Memorando da troica; criou um modelo de governação em que os Orçamentos são negociados à linha e

subordinados às exigências dos parceiros da extrema-esquerda.

Com a crise económica provocada pela pandemia e quando já era necessário fazer e não destruir o que

estava feito, os protagonistas estão a fazer tudo para sair de cena.

O País assiste a uma negociação onde a única prioridade de cada um dos partidos da geringonça é ver como

é que saem de um filme ou, talvez, de um pesadelo, que ajudaram a produzir e a realizar.

Quando deveriam colocar Portugal e os portugueses no topo das prioridades, estão focados em si próprios,

numa representação do filme Geringonça que deveria envergonhar os protagonistas. «Tirem-me deste filme!»,

é a expressão que lhes tem estado na mente nos intervalos desta realização. E, ontem, anunciaram, com

acusações mútuas, a que já assistimos hoje também, que sairiam de cena!

Na verdade, esta solução, que nunca foi uma boa solução para Portugal e para os portugueses, acabou. E

acabou porque há uma grande irresponsabilidade do Sr. Primeiro-Ministro, do Partido Socialista e dos parceiros

da extrema-esquerda! Repito: o momento que vivemos tem um nome: irresponsabilidade!

O Sr. Paulo Moniz (PSD): — Muito bem!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Na verdade, a proposta de Orçamento do Estado que o Governo apresentou na Assembleia da República é irmã de mais seis Orçamentos aprovados pelo Partido Socialista, com o apoio

mais ou menos entusiástico dos parceiros da extrema-esquerda.

Este sétimo Orçamento do Governo Socialista é um Orçamento de continuidade, que esquece totalmente a

necessidade de recuperar o País e promover o crescimento. Estamos perante um modelo de navegação à vista,

um Orçamento sem rumo, sem visão, sem estratégia, sem futuro!

Este Orçamento tinha a obrigação de ser um farol para uma efetiva recuperação da nossa economia. Mas

não é, porque, infelizmente, a opção do Governo é a de ignorar os problemas reais do País e as políticas de

recuperação e crescimento.

Faltam políticas de produtividade, faltam políticas para a competitividade. Portugal tem vindo, gradualmente,

a perder em produtividade face à média da União Europeia, como já hoje aqui vimos, e isto é dramático para o

futuro do País.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este Orçamento tinha obrigação de ser muito diferente. Exigia-se que

transmitisse confiança num tempo de dúvidas, exigia-se que estimulasse a iniciativa num tempo de desalento e

fadiga, exigia-se que promovesse o crescimento num tempo de recuo, exigia-se que apostasse num rumo e

numa estratégia, num tempo de desorientação!

Infelizmente, o Governo, que está condicionado pela sua própria incapacidade, esteve sempre capturado

pelos seus parceiros da extrema-esquerda e apresenta uma proposta de Orçamento que não responde aos

desafios do crescimento.

O exemplo talvez mais escandaloso do crescimento da carga fiscal nos últimos anos é vermos que a receita

fiscal do imposto sobre produtos petrolíferos, prevista para 2022, é de mais 1265 milhões de euros face a 2015.

Repito: mais 1265 milhões de euros! E são os portugueses que suportam este acréscimo de receita fiscal do

Estado, com o Governo sempre a anunciar o fim da austeridade.

Perante uma crise energética com dimensões brutais, o Governo andou a assobiar para o lado e a brincar

com os portugueses, negando a realidade ou criando soluções que demonstram a ausência de compreensão

sobre a vida diária dos portugueses.

Outro exemplo é a opção do Governo de injetar na TAP mais 990 milhões de euros em 2022, depois de já

ter injetado 998 milhões este ano e 1,2 mil milhões no ano passado. Dinheiro dos contribuintes que ninguém

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sabe se não vai ficar literalmente «a voar», caso a companhia não consiga sobreviver. É só injetar dinheiro sem

que o Governo consiga garantir a viabilidade da TAP!

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Mais uma vez, esta proposta de Orçamento para 2022 continua a

ignorar ostensivamente as empresas portuguesas. Preconceito ideológico? Necessidades de negociar à

esquerda, que nem sequer estão a resultar?

Na verdade, mais uma vez, a economia está ausente do Orçamento de Estado, e esta ausência de políticas

públicas prejudica a criação de riqueza e a criação de mais e melhor emprego.

Para o Governo do Partido Socialista e para os seus parceiros à esquerda, o País tem que estar condenado

à pobreza e cada vez mais a divergir dos nossos parceiros europeus.

Na verdade, não valorizam a importância das empresas que criam riqueza, que criam emprego, que

exportam, mas que suportam uma brutal carga fiscal todos os dias.

É unânime a crítica de uma total ausência de apoios direcionados às empresas no sentido da recuperação

económica do País.

O Governo suporta a recuperação económica no Plano de Recuperação e Resiliência com uma total

dependência da sua execução. O problema é que conhecemos bem a incapacidade que o Governo tem

demonstrado em fazer. Talvez o Governo desconheça o verbo «fazer» e prefira os verbos «prever» e «cativar»,

e este é também um dos riscos desta proposta de Orçamento.

Acresce que, num momento em que os custos de energia, dos combustíveis e das matérias-primas

continuam a subir descontroladamente; numa altura em que os setores mais afetados pela crise lutam

desesperadamente pela sobrevivência, quando o País precisa de políticas públicas para a recuperação

económica para reerguer o nosso tecido económico e empresarial, o que é que o Governo faz? Praticamente

nada!

Aplausos do PSD.

Lança meia dúzia de medidas sem alcance nem impacto na economia e mantém uma pressão fiscal

verdadeiramente asfixiante sobre as empresas.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: São demasiados os sinais de que o Orçamento do Estado para 2022

vai, ou ia, no sentido errado e numa trajetória que transforma o objetivo da convergência europeia num lugar

cada vez mais inalcançável. A cada ano que passa, há um país que nos ultrapassa, deixando Portugal cada vez

mais próximo da cauda da Europa.

Os portugueses não se podem conformar com este estado de coisas, com um País constantemente adiado

e condenado ao empobrecimento. Não tem de ser uma fatalidade! Não é uma fatalidade!

Só com uma mudança profunda das políticas poderemos inverter este caminho socialista. Seis ou sete

Orçamentos do Estado depois, os portugueses continuam a ser dos que pagam mais impostos na Europa,

continuam a ser dos que têm salários mais baixos, dos que têm os serviços públicos com uma crescente

degradação e o risco de pobreza e de exclusão social continua a ser inquietantemente elevado, atingindo cerca

de dois milhões de pessoas.

Num momento em que a Europa inicia o debate sobre as novas regras da governação económica para o

período pós-pandemia, é difícil imaginar uma posição pior para Portugal em dois indicadores: somos, entre os

27, o País com o investimento público mais baixo. Perante o crescimento previsto, o Conselho das Finanças

Públicas também refere que há um «risco, neste Orçamento, associado à execução do PRR», como já referi

anteriormente.

Acresce, ainda, que Portugal, segundo os últimos dados do Eurostat relativos a 2020, tem a terceira maior

dívida pública. Recordo, para quem tem a memória seletiva — o que acontece sempre nestes momentos, como

já percebemos neste debate! —, que o stock de dívida pública era cerca de 230 000 milhões de euros em 2015

e será de 290 000 milhões de euros em final de 2022. Mais 60 000 milhões de euros! Repito: mais 60 000

milhões de euros!

Já é tempo de o Governo perceber que não adianta esperar resultados diferentes fazendo as coisas sempre

da mesma maneira. Como já percebemos também neste debate, esta não é a melhor forma que o Governo tem

de avançar, mas é assim que ele faz.

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Perante todo este cenário, o Governo consegue ainda a proeza de tratar mal a concertação social e aprovar

legislação sem ouvir os parceiros sociais, o que já levou o Sr. Primeiro-Ministro a pedir desculpas públicas.

Sr. Primeiro Ministro, esta atitude do Governo é indesculpável e revela o desnorte de um Governo cansado

e sem soluções!

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O caminho percorrido foi uma escolha do Sr. Primeiro-Ministro e do

Partido Socialista e o resultado está à vista: seis anos de governação errática; o País a caminhar para um

empobrecimento acelerado; um País afogado em impostos!

Mas pode ter a certeza Sr. Primeiro Ministro, esta profunda irresponsabilidade a que estamos a assistir — e

saberemos amanhã se temos, ou não, Orçamento para 2022 — é da sua responsabilidade e dos seus parceiros

da extrema-esquerda!

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para o PSD, este Orçamento não está à altura das necessidades de

recuperação do País. É, mais uma vez, uma oportunidade perdida. É um mau Orçamento para Portugal e para

os portugueses, é um Orçamento que, obviamente, conta com o voto contra do Partido Social Democrata.

Termino, Sr. Presidente, afirmando que o PSD está onde sempre esteve: como uma alternativa clara ao

caminho seguido pelo Partido Socialista com os seus parceiros da extrema-esquerda e com Portugal e os

portugueses sempre, mesmo sempre!, acima de interesses individuais ou partidários.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, a Mesa regista a inscrição de três Srs. Deputados para pedir esclarecimentos e o Sr. Deputado Afonso Oliveira informou que pretende responder em conjunto.

Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Jorge Costa.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a direita tem, neste debate, um problema de relevância. Não é porque esteja a decidir a sua liderança, nos vários partidos aqui representados, mas porque

essa disputa se faz em torno de um enredo que é uma verdadeira — para tomar a expressão do Deputado

Telmo Correia — «casa assombrada». É para saber se já está em estado de moderação suficiente aquele partido

que defende o confinamento específico da comunidade cigana ou a castração química e a pena de morte, é

para saber se já está amadurecido o suficiente para poder ser um parceiro credível de um projeto de governação.

Quando não está nestes enredos, a direita dedica-se a dois tópicos principais: lamber as feridas do fracasso

da saúde privada durante a pandemia e do descrédito em que caiu o projeto de privatização da saúde em

Portugal e discutir quando é que a TAP cai nas mãos da Lufthansa, que é o projeto que alimenta e cuja

propaganda aqui faz reiteradamente todas as semanas.

Mas, quando tenta sair desta «casa assombrada», deste «comboio-fantasma» — usando, outra vez, uma

expressão do Deputado Telmo Correia —, o que é que a direita nos traz? Traz-nos o de sempre. Quem ouviu a

intervenção inicial do Deputado Rui Rio percebeu que o seu centro foi o de que, quando há folga orçamental, se

há folga no serviço da dívida, se há mais dividendos do Banco de Portugal, ai de nós, que ainda se vai gastar

esse dinheiro em prestações sociais, em serviços públicos e a «dar tudo a todos», como a direita gosta de dizer!

Claro que não pode ser para todos, tem de ser só para alguns!!

Portanto, a pergunta, Sr. Deputado Afonso Oliveira, é a de saber que projeto o Partido Social Democrata

pretende apresentar ao País, quando vive enredado em permanência nestas obsessões programáticas da

privatização da saúde, da venda da TAP aos alemães, e como pretende, perante este Orçamento, esclarecer a

posição do seu partido.

É que, depois disto tudo, ainda não se percebeu se a crítica do PSD é a de que este Orçamento tem despesa

social a mais ou se tem despesa social a menos. A crítica é a de que este Orçamento tem benefícios fiscais,

seja para os falsos incentivos à inovação, seja para os reformados estrangeiros, por exemplo, suecos, que têm

direito a um paraíso fiscal em Portugal? Há benefícios fiscais a mais ou há benefícios fiscais a menos?!

O facto de, a caminhar para o fim do primeiro dia deste debate, ainda não se ter conseguido perceber, no

discurso do PSD, coisas tão simples como estas só mostra que o PSD não consegue desenredar-se dos seus

fantasmas, como diria o Deputado Telmo Correia.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, também para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Fernando Anastácio.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Começo por dizer que me revejo completamente na intervenção do Sr. Deputado Jorge Costa.

Risos do PSD.

Portanto, espero que, amanhã, seja consequente com a intervenção que acabou de fazer.

Mas, voltando à intervenção do Sr. Deputado Afonso Oliveira…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, peço desculpa, mas, antes de mais, tem de se dirigir à Mesa.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — As minhas imensas desculpas ao Sr. Presidente, ao Sr. Primeiro-Ministro, aos restantes membros deste Governo, aos Srs. Deputados e às Sr.as Deputadas desta Assembleia da

República.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Está desculpado, Sr. Deputado, mas é o nosso Regimento que o refere.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Foi a emoção da intervenção do Sr. Deputado Jorge Costa que me levou a cometer tal…

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Afonso Oliveira, falou-nos de responsabilidade, de crise económica e de crise social. Sr.

Deputado, o que falta, o que tem faltado a este País não é responsabilidade por parte do Governo; é uma

oposição responsável. É isso que não temos tido, nestes seis anos. Essa, sim, é uma falta que o País tem

notado.

Mas o Sr. Deputado falou em pesadelo. Recordo aquele que decorreu entre 2011 e 2015.

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Esse, sim! Eu e os portugueses lembramo-nos desse pesadelo!

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado falou, mais uma vez, daquela narrativa habitual sobre as empresas. Antes de ir a esse

assunto, vou poupá-lo a uma dificuldade, que é a de explicar as contradições do seu líder a respeito de salários,

porquanto tanto é contra o salário mínimo, como, hoje, o ouvimos a perorar pelo aumento dos salários. É uma

pergunta que não lhe faço. Deixo-lhe esta contradição. Sei que seria difícil, por isso, poupo-o à resposta sobre

essa matéria.

Mas, a respeito da chamada «carga fiscal», a que mais uma vez aludiu, e do seu amor pelo IRC, quero

recordar-lhe algo. Estive hoje, aliás, a ver uns números que comparavam a taxa efetiva de IRC, na altura do

Governo do seu partido, entre 2011 e 2015, com os números da taxa efetiva de IRC, na altura do Governo do

Partido Socialista, apoiado pela esquerda, entre 2016 e 2019. Sabe o resultado? A taxa efetiva de IRC no

Governo do Partido Socialista é inferior àquela que vocês praticaram!

«Bem prega Frei Tomás», mas é isto, Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

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Se formos falar, ainda, daquele fantasma de que, com a esquerda, não há investimento privado, então,

convido-o a ir ver os números, por exemplo, que estão no PORDATA (Base de Dados Portugal Contemporâneo),

do investimento privado entre 2011 e 2015 e os números do investimento privado entre 2016 e 2019. Mais uma

vez, verá que os empresários não seguem a cartilha do PSD e investem em Portugal, ao contrário do PSD, que

diz mal do País.

Aplausos do PS.

Por último, Sr. Deputado, a respeito de pensões, sabe que este Orçamento do Estado — apesar de não o

ter ouvido falar numa única medida do Orçamento do Estado, mas pronto! — prevê um aumento das pensões

extraordinárias em 10 €, assumindo, aliás, já agora, este compromisso com as pensões até 1097 €, a partir de

janeiro. Compreendo que o Sr. Deputado não seja sensível a isso. Aliás, Passos Coelho não o era, quando quis

cortar 600 milhões de euros em pensões. E sabe como lhe chamou? Não falou em corte. Disse que era um

grande contributo para a sustentabilidade da segurança social.

Aplausos do PS.

Cada um tem o seu amor e a sua maneira de defender a segurança social, mas esta era a posição do PSD,

na altura.

Vozes do PS: — É verdade!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Também lhe digo, com toda a sinceridade, e isto não é só para si: compreendo que o Sr. Deputado, que vocês, PSD, não concordem com o aumento das pensões. Entendo isso.

Tenho é alguma dificuldade — e penso que os portugueses também — em compreender que, à esquerda, não

estejam de acordo com tal medida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Oliveira, ouvi-o com toda a atenção dizer que é de uma enorme irresponsabilidade os partidos da esquerda não viabilizarem este Orçamento do

Estado. Não foi, aliás, a primeira vez que o Sr. Deputado faz esta acusação, ou juízo, em público.

Mas, Sr. Deputado Afonso Oliveira, então, o Sr. Deputado e a sua bancada andaram, nestes últimos anos, a

acusar os parceiros do Partido Socialista, aliás, até de dedo apontado, de sermos responsáveis por viabilizar os

vários Orçamentos do Estado do Governo do PS e agora vem dizer que é uma irresponsabilidade votar contra

este Orçamento.

Sr. Deputado, parece que nunca está nada bem. «Paga-se por ter cão e por não ter.» Sr. Deputado, em que

é que ficamos, afinal?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado Afonso Oliveira, tem a palavra, para responder.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, agradeço as perguntas formuladas pelos Deputados Jorge Costa, José Luís Ferreira e Fernando Anastácio. Fiquei profundamente comovido, devo dizer,

desde já, com este namoro do Sr. Deputado Fernando Anastácio em relação à intervenção do Sr. Deputado

Jorge Costa. Aliás, a intervenção tem várias componentes, mas percebi que há um namoro, um bocado tardio,

devo dizer.

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O Sr. Adão Silva (PSD): — É paixão!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — O divórcio aconteceu ontem e, hoje, tenta o namoro. Acho um bocadinho tarde. Vamos ver!

Sr. Deputado Jorge Costa, os senhores deviam vir ao Parlamento, perante os portugueses, explicar por que

motivo têm essa atitude em relação ao Orçamento, em relação ao País. Por que razão estiveram na geringonça

até agora, no ano passado resolveram divorciar-se da geringonça e este ano voltam a votar contra este

processo?

A obrigação de ter um Orçamento do Estado compete ao Governo, sem dúvida, mas os senhores estiveram

nesta solução e, agora, resolveram sair. Expliquem aos portugueses!

Garanto-vos uma coisa, ou, pelo menos, a minha perceção é essa — não tenho a arrogância de dizer que

sei algo sobre o assunto, mas tenho, pelo menos, essa perceção: os portugueses não vão perceber a vossa

posição, não vão perceber a posição do Partido Socialista, nem a do PCP.

Protestos do BE e do PCP.

Portanto, há algo que têm de explicar aos portugueses. Isso é fundamental.

Já agora, antes de responder ao Deputado Fernando Anastácio, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Jorge

Costa que o nosso modelo de sociedade, digamos, o nosso modelo para o País não tem rigorosamente nada a

ver com o do Bloco de Esquerda. Sabemos disso. Queremos um País desenvolvido, integrado na União

Europeia, em que o crescimento é a base fundamental para criar riqueza, pois, criando riqueza, cria-se emprego.

Todos estes são fatores que os senhores desvalorizam completamente.

Aliás, se repararem, os últimos dias foram dias de negociação, de oferta por parte do Governo de várias

medidas, nas quais nenhum dos senhores se revia, ou não chegavam para aquilo que queriam.

Portanto, nem nós percebemos, nem nenhum português percebe, o que está em causa, nem qual é a versão

final do Orçamento do Estado. Ninguém percebe. Mas também, se for chumbado amanhã, logo veremos.

Sr. Deputado Fernando Anastácio, acho extraordinária a sua pergunta. O Partido Socialista fez um acordo

com o PSD e o CDS, no Governo em que fomos chamados a tratar dos problemas que o PS criou em 2011…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Aliás, o senhor esqueceu-se de referir — esquece-se sempre, é uma coisa inacreditável e obriga-me a fazer uma coisa que nem gosto de fazer, mas tenho de o dizer — que José Sócrates,

em 2011, trouxe o memorando…

Protestos do PS.

Desculpe, o senhor puxa por mim e obriga-me a dizer isto.

Como eu estava a dizer, José Sócrates, em 2011, trouxe o memorando que obrigou o Governo a salvar o

País,…

Protestos do PS.

Calma! Tenham calma!

… mas houve um acordo feito com o Partido Socialista, que os senhores rasgaram a seguir, em relação ao

IRC. Havia uma política para seguir, de redução gradual do IRC, e o Partido Socialista, depois das eleições

internas, resolveu rasgar esse acordo. Esta não é forma de estar na vida pública, mas a opção é vossa!

Agora, os senhores têm de explicar ao País o que fizeram, em todos estes anos. Têm de explicar ao País

por que razão têm uma solução de geringonça que não funciona. Têm de explicar ao País por que razão o País

está a empobrecer, em vez de estar a aproximar-se da Europa.

Isto é que é fundamental, esta é que é a realidade. Não vale a pena pegar em gráficos que demonstram,

precisamente, o contrário.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Passamos, agora, a uma intervenção do Partido Socialista. Tem a palavra, para o efeito, o Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro.

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2015, quando iniciámos este caminho, encontrámos um País devastado pelas políticas

de austeridade, pelo experimentalismo daqueles que acreditavam que era cortando e empobrecendo que

conseguíamos regenerar-nos, purificar-nos, punindo os portugueses com um programa que tinha tanto de

ideológico como de moral. Eles falharam, mas as suas consequências foram bem sentidas pelo País.

Os portugueses sabem e não esquecem o tempo dos Orçamentos do Estado com recuos e não avanços,

quando os portugueses tremiam sempre que o ministro das Finanças marcava uma conferência de imprensa,

quando os Orçamentos do Estado tinham cortes nos salários, que queriam tornar permanentes, cortes nas

pensões, enormes aumentos de impostos, cortes no subsídio de Natal, cortes no subsídio de férias,

congelamento, eliminação de feriados, cortes nas prestações sociais, privatizações, enfraquecimento do Estado,

tendo sempre, como resultado, um aumento do desemprego, um aumento da pobreza, um aumento do

desespero e uma economia ligada às máquinas.

Foi assim, Orçamento atrás de Orçamento, retificativo atrás de retificativo, sempre com o mesmo resultado:

recuos, falhanços, empobrecimento. Os portugueses sabem e não esquecem.

Em 2015, iniciámos uma viragem, numa alternativa política liderada pelo Partido Socialista, uma alternativa

económica, social e política, com entendimento, então e agora, maioritário, na Assembleia da República, que

demonstrou as virtudes de um rumo alternativo.

É impossível, agora, listar todos os avanços conseguidos, mas os portugueses sabem e não esquecem:

solidariedade, em vez de austeridade; aumento generalizado de pensões e salários; reposição de rendimentos,

de carreiras e direitos; aumento das prestações sociais; criação de novas prestações; reversão de privatizações

e outras medidas de desmantelamento do Estado social, levado a cabo pela direita; alterações à legislação

laboral; limitação do trabalho temporário; combate ao trabalho forçado; aumento do salário mínimo nacional;

nova lei para a transmissão de estabelecimento ou empresa; melhoria das muito longas carreiras contributivas;

reforço da Autoridade para as Condições do Trabalho; fim do banco de horas individual; regularização de

milhares, milhares e milhares de precários na Administração Pública; melhoria e investimento no Serviço

Nacional de Saúde; investimento público; revalorização da escola pública; melhoria dos transportes públicos;

recuperação da economia; queda histórica do desemprego; crescimento acima da média europeia, portanto,

convergência; contas certas.

Isto foi importante em Portugal e, já agora, também na Europa, mostrando que era possível um modelo

alternativo ao dos ortodoxos e, com isso, aliás, ter mais sucesso económico, político e no domínio do emprego.

Aplausos do PS.

Há muitas medidas para medir o sucesso governativo desta fórmula, mas deixo uma emblemática: em seis

anos, a percentagem de pessoas em risco de pobreza e exclusão social em Portugal baixou de 26,4% para

20%. Em apenas seis anos, uma em cada quatro pessoas que estavam em risco de pobreza deixou essa

condição, mesmo em ano de pandemia.

É para isso que governamos, é para isso que legislamos, para melhorar a vida das pessoas. E se hoje o Dr.

Rui Rio aqui, no início deste debate, questionava quais foram as melhorias para o País, pois vá perguntar a cada

uma destas pessoas que saíram da pobreza e sabem bem a diferença que faz um Governo liderado pelo Partido

Socialista.

Aplausos do PS.

Os portugueses sabem e não esquecem.

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Depois veio a pandemia do século, a maior crise social e económica que já vivemos. Medo, confinamento,

paralisação da economia, possível devastação da economia e da sociedade. Possível mas não. Porquê? Porque

liderava o Partido Socialista, porque o PS estava no Governo. Não foi assim porque defendemos o Estado social

e as políticas públicas para combater a pandemia com solidariedade, como comunidade, como uma sociedade

em que os problemas de uns são os problemas de todos, não como indivíduos isolados e desligados entre si.

Foi com esse espírito que trabalhámos e foi com esse espírito que vencemos a pandemia em Portugal.

Aplausos do PS.

Foi assim que preservámos empregos e, ao contrário da resposta da direita à anterior crise, conseguimos

fazê-lo recuperando já os níveis de desemprego que tínhamos antes dos níveis pré-pandémicos.

E para isso foram também precisas opções orçamentais, foi preciso financiamento, foi preciso dotação

orçamental da segurança social, que cresceu 5,2 mil milhões de euros entre 2015 e o ano passado — 5,2 mil

milhões de euros, repito. Os portugueses sabem e não esquecem.

Mas não ficámos por aqui. Com o sucesso da vacinação, com o esforço de todos, com o esforço da

sociedade, conseguimos virar a página da pandemia e iniciar um processo de recuperação económica num

contexto ainda de enorme incerteza, dificuldades e fragilidades.

Queremos avançar com firmeza e não dar um único passo atrás. Porquê? Porque o Orçamento do Estado

é, sempre foi, um instrumento político e não um mero instrumento contabilístico. Debater o Orçamento do

Estado, como aqui fazemos, é falar para as pessoas, é falar de pessoas, para o futuro que queremos construir

coletivamente.

Srs. Deputados, olhamos para este Orçamento do Estado e vemos um bom futuro para as pessoas, vemos

um bom futuro para Portugal.

Aplausos do PS.

Vemos um Orçamento do Estado para 2022 que tem o maior investimento social de sempre, são mais 7000

milhões de euros face a 2015; o maior investimento de sempre nas prestações sociais familiares; a progressiva

gratuitidade das creches para todas as crianças de todos os escalões; a Estratégia Nacional de Combate à

Pobreza 2021-2030 e garantia para a infância que é criada pela primeira vez; a atualização extraordinária das

pensões; a atualização regular de todas as pensões; o aumento de 40 € do salário mínimo nacional, o maior

aumento de sempre e que consolida um aumento de 40% desde 2015; o aumento das prestações sociais; o

valor mais alto de sempre para as políticas de formação e de emprego; o reforço das respostas às pessoas com

deficiência; as medidas de apoio ao investimento; o IRS Jovem alargado para cinco anos; dois novos escalões

de IRS; a valorização dos trabalhadores da Administração Pública; o reforço dos serviços públicos; o fim das

taxas moderadoras em todos os cuidados do SNS, exceto nas urgências; a conjugação de tudo isto com a

Agenda do Trabalho Digno, com o estatuto do Serviço Nacional de Saúde e o estatuto profissional para os

trabalhadores da cultura.

Sr.as e Srs. Deputados, os portugueses olham e não esquecem!

Aplausos do PS.

É óbvio — e termino — que no contexto de uma negociação, e em particular numa negociação orçamental,

nunca conseguimos tudo. Nunca ninguém consegue tudo, nunca nenhum partido consegue tudo. Negociar é

isso mesmo, sobretudo quando falamos de opções orçamentais que têm usos alternativos.

O que é inequívoco é que este é um orçamento de avanços, que merece aprovação para podermos seguir

com estes avanços, com os avanços que estão no centro deste debate, assumindo o equilíbrio entre

recuperação económica e proteção social.

Não há nenhuma razão para cavar trincheiras onde antes construímos pontes.

Aplausos do PS.

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Ainda há tempo para estarmos à altura das responsabilidades.

Há estrada para andar e há estrada para pavimentar. Temos um dia e estamos disponíveis até ao último

momento. Que ninguém falte à chamada desse momento, porque os portuenses…

Risos do PS.

… dizia, os portugueses, os portugueses sabem, não esquecem — seguramente os portuenses também —

e não vão perdoar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado André Coelho Lima, do PSD.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro, há aqui um problema no debate político a que alguns têm

chamado arqueologia histórica: é que os senhores só começam a contar a história da política portuguesa em

2011 e esquecem-se do que aconteceu até 2011.

Temos de ter aqui um revisionismo. A história da humanidade tem antes de Cristo e depois de Cristo e é

muito importante sabermos o que aconteceu antes de Cristo, senão não conhecemos o antigo Egito, nem Roma,

enfim, não conhecemos coisas que são importantes para a nossa formação. Mas convém não esquecer que

aquilo a que o Sr. Deputado Fernando Anastácio aqui chamou pesadelo de 2011-2015 é antecedido daquilo

que, isso sim, é o verdadeiro pesadelo de 2005-2011, que nos trouxe onde ainda estamos hoje.

Aplausos do PSD.

Repito, que nos trouxe onde ainda estamos hoje!

Por isso, Srs. Deputados do Partido Socialista, queria dizer que há sementeira e há colheita, como se diz na

minha terra — e em todas as terras onde há cultivo — e, portanto, o PS está a colher o que semeou, repito, está

a colher o que semeou. O PS semeou uma solução contranatura, que visava não governar mas apenas manter

o poder.

Vozes do PSD: — Exatamente!

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — O PS descobriu uma solução que, além de ser contranatura, expõe a hipocrisia política desta solução de Governo. E digo porquê. Hipocrisia política, em primeiro lugar, pela

transmutação ideológica, mas depois também — e volto lá — porque é assente num pacto anti-troica quando,

primeiro, foi o Partido Socialista que pôs o País em condições de ter de ter assistência financeira e, segundo,

foi o Partido Socialista que assinou o Memorando de Entendimento que anda a combater.

Aplausos do PSD.

Esta é que é a realidade! Foi o PS que o assinou e pôs outros a cumprir. E assinou na qualidade de Governo

de Portugal.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, a pergunta, ao Partido Socialista e à bancada do Partido Socialista, é: qual

é o preço da estabilidade? Os apelos já não são para que o País tenha um bom orçamento.

E, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, o Orçamento não é um instrumento financeiro,…

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Não disse isso!

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — … é um instrumento de visão política e económica, não financeira; isso é um relatório e contas.

Como disse no início, já não queremos sequer um bom orçamento, já só queremos um qualquer orçamento,

ainda que seja uma manta de retalhos. E por isso a pergunta a que o Partido Socialista tem de responder é de

que é o País precisa, se precisa de um orçamento que tenha um rumo, ainda que discordemos desse rumo —

mas que tenha um rumo claro —, ou se precisa de um conjunto de reivindicações desconexas, que fazem disto

uma manta de retalhos que não aproveita a ninguém, sobretudo ao País e aos portugueses.

A verdade é que o Governo não quis acordo para esta Legislatura, o Sr. Presidente da República não o

exigiu, e não podemos ficar surpreendidos com o que, entretanto, sucedeu. Ou será que o PS esperava que o

Bloco e o PCP fossem meros anexos acríticos do vosso mandato, que exercem como se tivessem maioria

absoluta quando, na realidade, não têm?

Este é o equilíbrio político que os senhores quiseram, não podem queixar-se das suas consequências, porque

elas são — aliás, eram — bastante previsíveis.

E agora queria dizer-vos isto também, Srs. Deputados do Partido Socialista, e, naturalmente, Sr. Deputado

Tiago Barbosa Ribeiro: o que é que fica para Portugal deste equilíbrio em andas? O que fica para Portugal já

aqui foi dito várias vezes: é o vergonhoso número de 20% da população em situação de pobreza.

Diz o Sr. Deputado que os portugueses que saíram da pobreza têm de agradecer, quando temos 20% da

população em situação de pobreza?! Mas nós — nós plural majestático — não temos vergonha deste número?!

Conseguimos ainda ter a retórica que aqui temos com um número desta natureza?!

Mais: ocupar os últimos lugares da competitividade europeia e a perder lugares, ano após anos, para os

nossos congéneres da União Europeia, mas ocupar os primeiros lugares, sim, nos preços da energia, do gasóleo

e da gasolina, que são fatores de competitividade para a nossa economia.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente. Srs. Deputados, esta é a herança que este Governo deixa ao País, conduzindo o País para um beco sem

saída. E o problema é que as vítimas deste equilibrismo em andas são sempre os mesmos, são os portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro.

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Coelho Lima, já trazia uma intervenção e falou de tanta coisa, mas falou de pouco sobre o que eu, efetivamente, aqui disse.

Vozes do PS: — Muito bem.

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sobre fazer arqueologia ou pouca arqueologia, o Partido Socialista tem muito orgulho em toda a sua história desde que foi fundado para combater a ditadura, no fortalecimento do

Estado social em Portugal, na criação do Serviço Nacional de Saúde, na escola pública, nas prestações sociais,

no desenvolvimento económico, na opção europeia. O Partido Socialista tem muito orgulho em tudo aquilo que

fez.

Aplausos do PS.

Mas sabe o que é que o Partido Socialista não fez? O Partido Socialista não fez um programa para si próprio,

para ir além da troica, como os senhores fizeram,…

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Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

…quando no Plano de Estabilidade e Crescimento de 2015 inscreveram um corte permanente de 600 milhões

de euros nas pensões em pagamento, apresentado pela Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

Aplausos do PS.

Isto é verdade! Isto é verdade, como sabe, e não havia troica.

Aliás, hoje em dia só não tivemos…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sei que não gostam de ouvir, Srs. Deputados, sei que não gostam de ouvir, mas esta é mesmo a história

toda! Esta é a história toda e têm de a ouvir. Têm de a ouvir!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro, espere só um momento. Srs. Deputados, assim não se ouve.

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Estão nervosos, é bom sinal. Eu repito.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira prosseguir, Sr. Deputado.

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Repito: os senhores inscreveram no Plano de Estabilidade e Crescimento que apresentaram a Bruxelas em 2015 um corte nas pensões a pagamento dos portugueses de

600 milhões de euros porque acreditavam nesse corte, porque queriam cortar as pensões.

Aplausos do PS.

E fizeram mais. Queriam, como todos os portugueses sabem, subir a TSU (taxa social única) paga pelos

trabalhadores, fazendo, aliás, uma alteração no nosso sistema sem passar pela concertação social — os

grandes defensores da concertação social! — e só recuaram porque houve milhões de portugueses que foram

às ruas dizer que não ao então Governo PSD/CDS,…

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — … que queria aumentar a TSU para os trabalhadores, cortar pensões, cortar rendimentos, cortar salários, que então designavam como cortes permanentes.

E sabem porque é que não são cortes permanentes? Não são cortes permanentes porque o Partido Socialista

governou a partir de 2015, revertendo os cortes que os senhores fizeram aos rendimentos dos portugueses.

Aplausos do PS.

Mas sobre pobreza infantil, Sr. Deputado, como é que tem coragem de vir aqui falar de pobreza e de pobreza

infantil quando a pobreza e a pobreza infantil aumentaram neste País quando os senhores cortaram o RSI

(rendimento social de inserção) de 26 000 pessoas, em especial crianças, aumentando a pobreza entre

crianças?!

Aplausos do PS.

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Como é que tem coragem de vir aqui falar de pobreza quando os senhores aumentaram a pobreza entre

idosos, não só cortando pensões mas cortando no complemento solidário para idosos, com uma visão ideológica

de compressão dos rendimentos, de compressão das prestações sociais, de desvalorização interna?!

Os senhores fizeram tudo isso e muito mais. Agora não tenho mais tempo, mas terei todo o gosto em debater

consigo este tema.

Os senhores não têm moral para falar de apoios sociais aos portugueses, depois da forma como governaram.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção pela bancada do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr. Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2015 participei nas negociações que levaram a um notável acordo que

estabilizou o País a partir de um projeto de recuperação imediata da crise económica e social deixada pela

direita.

Bem se sabe que não foi fácil. O Bloco aceitou compromissos em nome de medidas que o Partido Socialista

não tinha no seu programa, como o descongelamento das pensões, as alterações ao IRC, a tarifa social de

energia, sem falar no ritmo da recuperação de rendimentos.

Como hoje, não faltaram então as vozes da Comissão Europeia à direita portuguesa, passando pelos serões

televisivos, que asseguravam que as medidas da esquerda eram irresponsáveis e despesistas.

Naquela altura, para ser Governo, o PS não fez coro com os céticos e, assim, o resultado foi mais emprego

e mais justiça para quem sofreu tanto às mãos do Governo PSD/CDS.

O resultado destes anos de governação foi tudo aquilo que o Deputado Barbosa Ribeiro aqui enunciou.

Sabemos, Sr. Deputado, nós votámos a favor desses orçamentos e com orgulho.

Com o fim da Legislatura que conhecemos por geringonça, a situação mudou, o PS recusou um acordo

escrito com o Bloco após as eleições de 2019, não fez caminho para entendimentos em matérias essenciais,

como a lei laboral, e agora recusa as soluções concretas que o Bloco trouxe a negociação.

E sou obrigada a corrigi-lo, mais uma vez, Sr. Primeiro-Ministro: o fim do contrato a termo, seja certo ou

incerto, não é um despedimento. O despedimento é para trabalhadores efetivos, com anos de serviço, como no

Santander ou na Altice, fragilizados pela lei da troica que o Governo insiste em manter em vigor.

Aplausos do BE.

Assim, chegamos aqui com um problema, que é a falta de credibilidade do Orçamento e a insuficiência das

suas soluções. Ano após ano, confrontamo-nos com verbas que não são executadas. Em contabilidade pública,

são menos 923 milhões de euros em despesa corrente, menos 800 milhões de euros em despesas de capital,

menos 100 milhões de euros em pessoal, ou seja, o défice proposto tem uma folga de 1200 milhões de euros.

Sabemos o que dirá o Ministro João Leão. Dirá que as verbas orçamentadas são meramente indicativas e

que nem têm de ser executadas. Mas, então, se tudo não passa de um mero exercício e se os números são

inúteis para verificar compromissos, por que é que o Governo recorre a esses mesmos valores para fazer

propaganda do reforço orçamental das mais variadas verbas do Orçamento?

«Insistimos em contas certas, porque são um compromisso com o País», diz o Governo. Então, veja-se o

Estatuto do Cuidador Informal, que volta a ser contemplado, pelo terceiro ano consecutivo, com 30 milhões de

euros no Orçamento. Apesar do acordo com o Bloco, a execução desta medida foi de 1%, em 2020, e de 2%,

até junho de 2021. Por isso, contas certas é responder a quem cuida dos seus e o Governo falhou.

Na saúde, há verbas de investimento que atravessam orçamentos, sem nunca saírem do papel, como os

casos dos hospitais do Seixal, de Setúbal e de Évora. Para o Hospital de Lisboa Oriental, o Governo chega até

a prometer 10 milhões de euros em equipamentos, em 2021, quando a obra ainda nem sequer foi adjudicada.

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Não ignoramos outras medidas na saúde, mas não se sabe quanto das verbas anunciadas é que servirá

para investir nas condições estruturais do SNS ou será canalizado para o privado. Em 2020, o Estado gastou

130 milhões de euros em contratações externas, nos chamados «tarefeiros», e 334 milhões de euros no

pagamento de horas extraordinárias. No entanto, não há no Orçamento do Estado uma verba para o anunciado

regime de dedicação plena e muito menos para um regime de exclusividade, que consiga acabar com a

promiscuidade entre o público e o privado e reter e motivar profissionais da saúde.

Perante a carência de médicos e de enfermeiros, perante concursos meio vazios, o Governo aumenta a

carga laboral aos trabalhadores que já existem no SNS. Assim, é previsto o acréscimo de pagamento da hora

de trabalho em 25%, a partir das 250 horas extraordinárias, e em 50%, a partir das 500 horas extraordinárias,

sendo que o limite legal das horas extraordinárias para médicos são 200 horas extraordinárias.

Nos impostos, a escolha do Governo não foi o IVA da eletricidade, que carrega nos impostos indiretos e no

bolso das famílias, foi, sim, o IRS. Mas, feitas as contas, a reforma do IRS representa menos do que a medida

isolada dos escalões e é mais injusta do que a medida isolada dos escalões aprovada em 2018.

E isto enquanto o Governo insiste em manter o benefício fiscal aos residentes não habituais, que, só em

2020, teve uma despesa de 770 milhões de euros.

Contas certas, Sr. Primeiro-Ministro!… Mas, um dia, se tiver paciência, explicar-me-á porque é que os

pensionistas suecos devem pagar cá menos impostos do que os pensionistas que aqui trabalharam uma vida

inteira e têm pensões tão baixas.

Aplausos do BE.

Quando ao englobamento das mais-valias de curto prazo, Sr.as e Srs. Deputados, há uma razão para ninguém

falar dele. É que a medida que o Governo fingiu dialogar à esquerda não passa de um símbolo sem qualquer

efeito prático. Contas certas: o englobamento de nada, dá nada!

Não ignoramos as medidas que consolidam avanços anteriores, nomeadamente nas pensões e no abono de

família. Concordamos com essas medidas e temos gosto em dizê-lo. Mas registamos que o Governo prometeu

uma nova abordagem no combate à pobreza e acabou a apresentar medidas limitadas e dispersas.

Por que razão insiste o Governo em manter a atual estrutura dos apoios sociais que conta cada criança pela

metade? São isto contas certas?! Como se pode manter esta regra, em que cada criança conta pela metade, e

dizer, ao mesmo tempo, que se quer fazer do combate à pobreza infantil uma prioridade?

Pergunto também porque devem ser lei perpétua os cortes absurdos introduzidos pelo PSD pelo CDS, aliás,

contra a lógica do PS, nos sistemas de pensões. Contas certas, Sr. Primeiro-Ministro, seria voltar aos

compromissos de ministros que tomaram o futuro e a estabilidade da segurança social como base para o diálogo

à esquerda e para decisões concretas.

Srs. Deputados, descontando o que é devolvido pelos funcionários públicos em impostos e segurança social,

o aumento de 0,9% da função pública vale 128 milhões de euros, pouco mais do que a EDP deixou de pagar

em imposto de selo no extraordinário negócio das barragens. Depois de uma década de congelamento, é isto

que o Governo apresenta aos milhares de pessoas que mantêm os serviços públicos do País?! Contas certas

seria cobrar os impostos ao negócio das barragens e compensar trabalhadores e pensionistas acima da inflação,

sem lhes cortar, mais uma vez, os rendimentos.

Em respeito pelo que fizemos na anterior Legislatura, e sobretudo em respeito pelo nosso povo, temos a

obrigação de responder aos problemas estruturais do País com muito mais do que promessas, medidas

simbólicas ou de circunstância.

Bem sei que as bancadas da direita fazem aqui um exercício mórbido sobre a geringonça. Os filhos da política

do empobrecimento do País têm saudades do poder. Mas o País olha para essas bancadas e o que vê são

partidos engalfinhados sobre a castração e a pena de morte, sobre como castigar os ciganos por serem

ciganos…

Protestos doPSD.

…sobre como entregar hospitais públicos ao Mello e à Fosun, sobre como lançar milhões de euros para a

incompetência. O País vê o panorama da vingança social que a direita quer impor a Portugal.

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O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Uma vergonha!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Deste lado do Parlamento, o País vê divergências — e é verdade que elas são sérias — que impedem, agora, um compromisso neste Orçamento mas que antecipam a discussão que vai

determinar o futuro: a alteração das regras que determinam o valor do salário e da pensão, que protegem os

serviços públicos, a começar pelo SNS, e que combatem estruturalmente a pobreza, as desigualdades e as

alterações climáticas.

São estes os objetivos pelos quais temos a obrigação de lutar no tempo das nossas vidas. E esse tempo é

agora! Esse é o nosso mandato, agora!

O Governo pode dizer que este é o seu Orçamento, que estas são as suas prioridades e as suas medidas e

que não pretende aceitar as propostas apresentadas pelo Bloco. E é legítimo que o faça. Mas, com a mesma

legitimidade, afirmamos que este Orçamento não traduz uma negociação à esquerda e não resolve os problemas

que o País enfrenta.

Neste primeiro dia de debate, estamos disponíveis, repito, para viabilizar um Orçamento que integre

compromissos razoáveis que sejam soluções estáveis, mas não nos peçam que abdiquemos dessas soluções.

Não nos peçam que vivamos bem com a eternização da troica nos salários e nas pensões, não nos peçam que

deixemos para outro momento estes debates, porque sabemos bem que, em todos os outros momentos,

sobretudo na discussão laboral, quase sempre o PS votou com a direita ou arrastou processos sem soluções.

É na negociação anual do voto do Orçamento que o Governo cria as condições para o apoio parlamentar

que pretende. Pois, crie essas condições no trabalho, nas pensões e na saúde e terá um Orçamento.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Luís Moreira Testa.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, o documento a que a Sr.ª Deputada se referia como sendo a base de um acordo a chegar com o Governo, provavelmente será esta

folha A4, que exibo nesta Câmara — e se a Sr.ª Deputada não tiver um exemplar, terei todo o gosto em distribuir-

lho.

É que este memorando — é assim que é tratado — aponta como premissas prévias um conjunto de

pressupostos sem os quais será impossível chegar a acordo. Desde logo, o método é estranho, é pouco rigoroso

e, aliás, é pouco leal relativamente a parceiros de negociação.

Contudo, passando este pormenor — aliás, pormaior —, vejamos a que correspondem as célebres nove

propostas do Bloco de Esquerda.

Pois bem, quanto à autonomia de contratação, o Governo deu passos em frente e aproximou-se da posição

do Bloco de Esquerda. Relativamente ao regime de dedicação plena, o Governo deu passos em frente e

aproximou-se da posição do Bloco de Esquerda.

Risos do BE.

Quanto à carreira para técnicos auxiliares de saúde, o Governo deu passos em frente e aproximou-se da

posição do Bloco de Esquerda.

Aplausos do PS.

Quanto à compensação por despedimento, o Governo deu passos em frente e aproximou-se da posição do

Bloco de Esquerda.

Relativamente às horas extraordinárias, o Governo deu passos em frente e aproximou-se da posição do

Bloco de Esquerda.

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E podia continuar aqui a repetir eternamente aquelas que são as nove posições do Bloco de Esquerda.

Aplausos do PS.

Mas onde é que está a boa vontade do Bloco de Esquerda para se aproximar das posições do Governo e

das posições do Partido Socialista?!

Contudo, façamos, relativamente a esta aproximação, o mesmo que fizemos em relação àquele memorando

a que chamavam «propostas de intenção de acordo».

Este Orçamento traz novidades. Quanto ao IRS, traz uma aposta acima dos 230 milhões de euros de

devolução às famílias e aos portugueses. Quanto ao abono de família, traz uma aposta acima de 70 milhões de

euros, na devolução de rendimentos aos portugueses. Quanto ao salário mínimo nacional, o mesmo subirá, no

próximo ano, para 705 € e, até 2025, para 850 €. Este Orçamento traz ainda um reforço do SNS, o segundo

maior de sempre, de mais 700 milhões de euros, e um reforço das pensões, abrangendo 2,3 milhões de

portugueses.

Os senhores do Bloco de Esquerda não estão de acordo com estas medidas tomadas em Orçamento do

Estado? Certamente, estarão. Certamente compreendem o esforço negocial feito pelo Governo na aproximação

às vossas propostas. Poderão dizer que são insuficientes, mas, num processo negocial, não há plena vantagem

de nenhum dos negociadores, é preciso todos cedermos para atingirmos acordo. É isso que se nos coloca, a

nós, como se coloca a VV. Ex.as.

Aquilo que o Bloco de Esquerda enuncia neste início de debate orçamental é tão-somente o seguinte: face

a um Orçamento insuficiente, no vosso julgamento, a alternativa é não haver Orçamento. É este o vosso

julgamento, mas nós não podemos estar de acordo com isto, porque, se percorremos o caminho que

percorremos até hoje, também será possível percorrer mais caminho. É que a alternativa a um Orçamento

insuficiente — no vosso julgamento —, é melhorar esse Orçamento. E para fazer isso o Orçamento não se pode

extinguir no dia de amanhã, tem de percorrer o processo de especialidade, o que só se faz com o vosso voto e

com o nosso apoio a essas medidas, que também são um processo comum.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Moreira Testa, uma coisa é certa: o Sr. Deputado tem um documento do Bloco de Esquerda porque é assim que o Bloco de Esquerda negoceia, com

documentos públicos, com medidas concretas, que podem ser escrutinadas em qualquer momento. Isso dá-me

agora a vantagem de conseguir explicar essas medidas e também de desmontar os supostos avanços que o

Governo fez, e penso que ficará muito claro que natureza têm esses avanços.

Quanto à carreira para técnicos auxiliares de saúde, apesar de haver aqui um processo, em sede de

especialidade, que já avançou na definição do conteúdo funcional dessa carreira, o Governo aponta a definição

desse conteúdo funcional para depois de 2022.

Quanto ao regime de dedicação plena, não há exclusividade de médicos, o que há é mais pagamento por

mais horas dos médicos no serviço público, os quais continuam a poder acumular no privado e continuam a

poder trabalhar no privado.

Quanto à compensação por despedimento, acabei de explicar na minha intervenção que aquilo que foi

proposto pelo Governo não é a compensação por despedimento; é uma medida para o fim dos contratos com

termo e sem termo, mas não é a compensação por despedimento. O Sr. Deputado não me consegue explicar

por que é que esteve contra o avanço da direita face à medida da troica e, agora, nem aí consegue ir,…

Protestos doPS.

… nem consegue aprovar aquilo que defendeu no seu tempo.

Quanto às horas extra, o Bloco queria fazer a reposição do pagamento pelas horas extra até 150 horas. O

que é que faz o Governo? Propõe a partir das 120 horas e, com as primeiras 120 horas, concorda, entre as 120

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e as 150 horas, lá no fundo, enfim, há uma reposição e diz que isto é cumprir a proposta que o Bloco de Esquerda

fez.

Quanto à proposta do Bloco sobre as férias, nada! Quanto ao fator de sustentabilidade, nada! Aliás, recusa

o próprio princípio da dupla penalização, defendido pelo Ministro do Trabalho e Segurança Social, do Partido

Socialista, na anterior Legislatura.

Portanto, Srs. Deputados, há esta vantagem: o Partido Socialista conhece as propostas do Bloco de

Esquerda, elas estão escritas. O Governo conhece as propostas do Bloco de Esquerda, o País conhece as

propostas do Bloco de Esquerda.

O que nós não conseguimos compreender e o Partido Socialista não conseguiu explicar é porque as recusa.

Porque é que recusa medidas que são justas, concretas e exequíveis?

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Gostava que me dissesse qual destas medidas — a reposição das horas extraordinárias, a exclusividade, os dias de férias ou a compensação por despedimento, que o PS já defendeu

— vale a crise política que o PS quer provocar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, pela bancada do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A resposta global aos problemas nacionais, aos problemas que pesam na vida dos trabalhadores e

do povo não pode ser adiada.

Para o PCP, a questão que sempre se pôs foi a de saber se este Orçamento e o quadro de opções políticas

em que ele se insere abre, ou não, perspetivas para a superação desses problemas. Foi sempre esse, e

continuará a ser, o sentido da intervenção do PCP.

A exigência de hoje é fazer as opções que concretizem e apontem essa perspetiva de resposta global aos

problemas nacionais, problemas que o Governo secundariza, não por falta de recursos, mas sim por opções

políticas em sentido contrário às necessidades dos trabalhadores e do povo.

Sim, há recursos para dar essa resposta e, se houvesse vontade política do Governo, ela poderia ser dada.

Hoje, quando os problemas se avolumam, apesar de existirem meios para lhes responder, o Governo insiste

em recusar a construção das soluções que, dentro do Orçamento e fora dele, permitiriam a resposta global de

que o País necessita.

O País precisa do aumento geral dos salários e o PCP propôs soluções para isso. O PCP propôs um aumento

do salário mínimo que convergisse com o valor de 850 € a breve prazo; apresentámos uma proposta para que

se fixasse nos 755 € já em janeiro e atingisse os 800 € no final do ano. Apesar dessa disponibilidade do PCP, o

Governo manteve-se irredutível na posição que assumiu em março e não aceitou, até hoje, sair do aumento

para os 705 €.

Na legislação laboral, o PCP propôs a revogação da caducidade da contratação coletiva para proteger e

aumentar os salários intermédios, a reposição do princípio do tratamento mais favorável e também o aumento

dos salários na Administração Pública, depois de anos de congelamento e de 11% de perda de poder de compra.

O Governo rejeita estas soluções e recusa fazer a opção de avançar com a valorização dos trabalhadores e dos

seus salários.

No SNS, o País precisa de contratar e fixar profissionais. O PCP apresentou soluções para valorizar carreiras,

remunerações e incentivos, contribuindo para a fixação de profissionais no SNS. O PCP propôs medidas

concretas para a exclusividade, com a majoração de 50% na remuneração e de 25% na contagem do tempo de

serviço para efeitos de progressão na carreira. Apresentámos soluções concretas para o investimento e reforço

da capacidade de resposta do SNS.

No entanto, quando apenas se pedia ao Governo que garantisse a concretização dessas medidas a 1 de

janeiro, a resposta que este deu foi uma promessa de regulamentação no primeiro trimestre do próximo ano.

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Sabendo todos nós o que têm significado as promessas de regulamentação posterior de medidas que, depois,

acabam por nunca chegar ou por chegar tarde, mutiladas na sua extensão e limitadas nas condições de

aplicação, convenhamos que não é com promessas destas que se pode confiar num compromisso sério do

Governo com as soluções para defender o SNS do assalto que lhe estão a fazer os grupos privados da doença.

O mesmo se pode dizer relativamente à falta de opções no sentido de reforçar outros serviços públicos. Na

escola pública, na segurança social, nas forças e serviços de segurança, na justiça e em áreas como o desporto

ou mesmo a cultura — que continua mais perto do zero do que do 1% do Orçamento — não encontramos, da

parte do Governo, opções que se insiram na resposta global aos problemas nacionais.

O País precisa de garantir o direito à habitação, que é o grande problema de muitas famílias, dos mais jovens

aos mais idosos. O PCP propôs o aumento da construção de habitação pública, além da alteração à lei dos

despejos — a lei Cristas —, no sentido de proteger o direito à habitação, travando os despejos e a subida das

rendas.

O País precisa também de dinamizar a economia, a produção nacional, a partir da recuperação do controlo

público sobre setores estratégicos e do apoio às micro, pequenas e médias empresas. Em particular, precisa de

medidas que contrariem os aumentos do preço da energia e dos combustíveis, que travam a recuperação da

economia.

Também nestes planos nada de novo, apenas a recusa pelo Governo das soluções avançadas, assumindo

frontalmente a recusa de qualquer medida que afronte os interesses dos grupos económicos e da especulação

imobiliária.

O País precisa de garantir os direitos das crianças e dos pais, de promover a natalidade, de inverter a quebra

demográfica, mas também de valorizar as pensões e as carreiras contributivas.

O PCP propôs soluções concretas: a gratuitidade das creches em 2022 e a criação de uma rede de creches

públicas; um aumento de 1,8% das pensões, com um mínimo de 10 €, de forma a valorizar também as pensões

de quem descontou uma vida inteira; eliminar os cortes nas pensões para quem tenha 40 anos de descontos e

criar uma rede pública de lares.

O País precisa de uma política fiscal mais justa. O PCP propôs um alívio do IRS para os rendimentos mais

baixos e intermédios, a redução do IVA da eletricidade e medidas para tributar em Portugal os lucros aqui

realizados.

Todas as soluções defendidas pelo PCP têm o seu valor e é por serem importantes que o PCP se bate por

elas. A opção feita pelo Governo, no entanto, foi a de selecionar isoladamente algumas dessas soluções, na sua

maior parte de forma parcial, reduzindo o seu valor e impacto pela forma desarticulada e desgarrada como as

considerou.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a recusa pelo Governo das várias soluções apresentadas pelo PCP,

que permitiriam dar resposta urgente a questões imediatas, apontar sinais de um caminho diferente na solução

dos problemas nacionais e que se inserem na resposta global de que o País necessita, é o verdadeiro problema

neste debate da proposta de Orçamento do Estado.

Recusando essa resposta global aos problemas nacionais, o Governo recusa dar aos trabalhadores, ao povo

e ao País uma perspetiva de futuro de confiança.

O Governo não pode esperar que seja o PCP a desistir de lutar pelos salários e pelos direitos dos

trabalhadores, pelas pensões e pelas creches, pelo SNS e pelo direito à habitação, pelo reforço dos serviços

públicos e da justiça fiscal. E não pode esperar que seja o PCP a desistir da luta por uma resposta global que

integre o conjunto de soluções que apresentou em nome de um tratamento desvalorizador de cada uma das

suas propostas, isoladamente.

Há soluções para os problemas do País e o PCP bate-se por elas. O PCP não prescinde de lutar, seja em

que circunstâncias for, por essa resposta de que o País necessita.

A intervenção e o voto do PCP confirmarão esse sentido de exigência e possibilidade de uma política

alternativa de desenvolvimento, de elevação das condições de vida e de concretização de direitos num País

mais justo.

Aplausos do PCP e do PEV.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.

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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado Duarte Alves, no dia 5 de dezembro de 1989, Jorge Sampaio dizia, ali da tribuna, que «socialistas

e comunistas conhecem as suas divergências como ninguém. Traçaram mutuamente uma fronteira que é

mutuamente assumida e são raianos. Ninguém conhece as fronteiras como os raianos».

Nesse momento histórico, Jorge Sampaio liderava uma coligação de socialistas e comunistas à Câmara de

Lisboa, que tão bem-sucedida foi. Nós somos dessa escola, que não disfarça as divergências, mas une forças

para fazer à esquerda o que falta fazer, e é por aí que vão as minhas perguntas.

Aplausos do PS.

Este documento, Balanço do Trabalho Parlamentar — XIII Legislatura, do Grupo Parlamentar do PCP, faz

uma lista das provas concretas de que a Legislatura anterior foi, e cito, «um tempo de recuperar e conquistar

direitos e rendimentos com inúmeros avanços e conquistas».

Embora, assumidamente, não seja exaustiva, é uma lista extensa que se espraia por três páginas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Nós conhecemo-la!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Será que o PCP de hoje desvaloriza estas conquistas de direitos e rendimentos? Depois, evidentemente, o documento diz que não vamos suficientemente longe. Todos queremos mais, é

certo, mas será razoável chumbar o aumento extraordinário de todas as pensões até 1097 €? Vamos travar a

universalização das creches gratuitas? Vamos travar o aumento do investimento público?

São questões que nos deveriam preocupar, em nome do País, e creio que o PCP também se preocupa com

isso.

Sr. Deputado Duarte Alves, queria fazer-lhe, especificamente, uma pergunta.

O PCP sempre disse que não misturava o Orçamento do Estado com outras matérias. Ainda em julho, o líder

parlamentar do PCP, que está sentado ao seu lado, dizia que não era responsável nem digno misturar

Orçamento com matéria laboral, mas agora mudou.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Outra vez essa conversa?!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — O PCP explica o seu voto contra o Orçamento mais à esquerda de sempre com variadas matérias extraorçamentais.

Então, se a ideia era a de exigir um acordo abrangente, porque é que o PCP inviabilizou à nascença a

possibilidade de acordos escritos de Legislatura à esquerda, que, mesmo num formato mínimo, tão bons

resultados deram na Legislatura anterior?

Sr. Deputado Duarte Alves, estão lá fora milhões de eleitores de todos os partidos de esquerda — PS, Bloco,

PCP — que se entusiasmaram com o que conseguimos fazer em conjunto na Legislatura anterior e que agora

se perguntam: não terá o PCP dado um mau passo quando se apressou a dizer que não voltava a haver papel

algum assinado à esquerda?

Não deveríamos todos robustecer os esforços na recuperação da crise social e económica provocada pela

pandemia para que essa recuperação seja solidária e progressista? Faço esta pergunta muito simplesmente,

porque achamos que o PCP é fundamental nessa resposta.

Por isso, gostávamos muito de ouvir a vossa resposta, para sabermos se vamos poder continuar a discutir o

Orçamento na especialidade, para dar a resposta de que o País precisa, ou se vamos ficar por aqui.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves.

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O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, agradeço as perguntas, Sr. Deputado Porfírio Silva, e, relativamente à questão de haver um papel escrito, pode falar com o Sr. Primeiro-Ministro, porque isso nunca

foi um problema para ele, não sei se é um problema para o Partido Socialista. Para nós também nunca foi um

problema, porque não era o haver ou deixar de haver um papel que diminuía a responsabilidade do PCP e a

sua vontade de contribuir para soluções.

Aplausos do PCP.

Relativamente às questões que levantou sobre a consideração de matérias para lá do Orçamento do Estado,

relembro-lhe o que dissemos no Orçamento do Estado para 2018: «A concentração, neste momento, da atenção

em torno do Orçamento do Estado não apaga a avaliação geral da política do atual Governo, designadamente

a persistente recusa de eliminação das normas gravosas do Código do Trabalho e da resistência à valorização

dos salários».

Isto foi dito a propósito do Orçamento do Estado para 2018, portanto o PCP nunca deixou de considerar as

questões do Orçamento no quadro geral das opções políticas tomadas pelo Governo e da falta de resposta a

elas, e foi isso que dissemos, hoje, na nossa intervenção.

O que encontramos nesta proposta do Governo não é uma resposta global a esses problemas. O Sr.

Deputado Porfírio Silva pode referir um conjunto de matérias pelas quais o PCP se bateu e que consideramos

importantes — por isso é que nos batemos por elas! —, mas a consideração, de forma isolada, de outros

problemas que são mais globais e que necessitam de uma resposta urgente é que menoriza esses avanços

conseguidos pela persistência do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Repare, quando se fala no aumento de 10 € nas pensões, é verdade que essa foi uma medida pela qual o PCP se bateu e, aliás, defendemos que deve chegar a todas as pensões. Contudo,

o que pode acontecer, se não forem encontradas outras soluções, é que um pensionista até pode ter um

aumento de 10 €, mas se chegar ao centro de saúde ou ao hospital e não tiver lá um médico ou um enfermeiro,

porque não há medidas para a fixação de profissionais, vai ter de ir ao privado e gastar lá os 10 €.

Aplausos do PCP.

Protestos do PS.

E se tiver um aumento das rendas, porque não há nenhuma medida para acabar com a lei dos despejos, o

que vai acontecer é que o pensionista ainda vai gastar muito mais do que esses 10 €.

Aplausos do PCP.

É por isso que dizemos que é necessária essa resposta global aos problemas do País, uma resposta que

não pode ficar limitada a uma ou outra medida. Até agora, o Governo não quis dar essa resposta global, o que

faz com que o PCP tenha a avaliação que tem sobre o Orçamento e sobre o que está para lá dele.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Miguel Costa Matos, do Grupo Parlamentar do PS, para uma intervenção.

O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as Ministras, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Encontramo-nos num momento decisivo da nossa história

democrática. Estamos a recuperar de uma pandemia que nos impôs a maior recessão económica em 100 anos,

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com pesadas repercussões sociais e humanas. Estamos a recuperar com mérito. Somos dos países que mais

vacinou e, apesar da dimensão da crise, o desemprego não galopou e já está abaixo do seu valor pré-pandemia.

Hoje, mesmo perante adversidades como o preço crescente dos combustíveis, somos um País seguro na

retoma que nos espera ao virar da esquina e, neste momento decisivo para o progresso do nosso País, temos

uma responsabilidade ímpar de agir, de escolher, de continuar a fazer avançar uma recuperação socialmente

justa e sustentável.

O Governo apresenta à Assembleia da República a proposta de Orçamento do Estado mais à esquerda de

que tenho memória. Isso é importante, não por causa da geometria parlamentar ou da tática política, não, isso

interessa porque o País precisa de crescer, porque o País cresce mais quando todas as pessoas participam no

crescimento, quando valorizamos o trabalho, quando investimos nos serviços públicos, na escola pública, no

SNS, quando damos um futuro aos jovens no seu País.

É disso que este Orçamento trata: de garantir o futuro. Isto porque, ao invés de contratos de associação, este

Orçamento investe na recuperação da aprendizagem na escola pública. Contra quem dizia que tínhamos

licenciados a mais, prosseguimos a democratização do ensino superior, triplicando — repito, triplicando! — as

bolsas dos mestrados.

Porque o custo da habitação é, muitas vezes, uma segunda propina que impede muitos jovens de se

qualificarem, de sonharem, investiremos 85 milhões de euros em residências, a juntar aos 318 milhões de euros

de habitação pública e de reforço do programa Porta 65-Jovem.

Porque à emergência dos baixos salários, o Governo responde, também, com os estágios IEFP (Instituto do

Emprego e Formação Profissional), com uma subida das bolsas, com um IRS Jovem automático, alargado de

três para cinco anos, com um aumento do salário de entrada dos técnicos superiores e com o maior aumento

do salário mínimo nacional, elevando a fasquia para 850 €, até 2025.

Os muitos que tiveram de aceitar o convite para emigrar terão agora mais tempo para regressar, com metade

do rendimento isento de impostos.

Mais: porque não é aceitável que a nossa geração tenha de pagar mais para ter um filho na creche do que

no ensino superior, propomo-nos criar 10 000 vagas em creche e tornar as creches gratuitas para todas as

crianças, nos próximos três anos, começando, já, no primeiro ano de creche e nos primeiro e segundo escalões

da ação social.

Porque o SNS se revela imprescindível, também para a nossa geração, este Orçamento consagra, como

tantos reivindicavam, a autonomia das contratações, a dedicação plena, mas também um reforço de 700 milhões

de euros que, em conjunto com o resto da Legislatura, é só o dobro do que, juntos, investimos na anterior

Legislatura.

Mas porque há problemas que, de facto, vão além do horizonte do Orçamento, criámos um estatuto

profissional do artista e, também, uma Agenda do Trabalho Digno para encarecer e penalizar a precariedade e

os horários indecentes, dando poder real à ACT (Autoridade para as Condições do Trabalho) para travar a

impunidade nas leis laborais.

Sr.as e Srs. Deputados, nada neste caminho é novidade. Já sabiam disto.

Este é um caminho que vai longo e que ainda tem muita estrada para andar. É um caminho que deu

horizontes de esperança a esta minha geração e o que irrita tantos neste País, sobretudo à direita, é que se

trata de um caminho com resultados com contas certas, sim, mas, muito mais do que isso, com convergência,

pela primeira vez neste século, com um crescimento para todos, mais emprego, melhores salários, menos

precariedade. É um crescimento para continuar, com inovação, com investimento estrangeiro com três vezes

mais ganhos de quota de mercado nas exportações.

Este é o nosso caminho, um caminho que não se esgotou e não se esgotará enquanto houver injustiça e

desigualdades no nosso País. Mas só há estrada para andar para quem quer continuar.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, é tempo de escolhas. Como e com quem iremos votar amanhã? Quem ganha

e quem perde com essa votação? Vamos avançar, temos tempo para parar ou queremos arriscar recuar? Vamos

continuar a discutir qual o justo aumento do salário mínimo e não quais os subsídios de férias e de Natal para

cortar? Vamos continuar a discutir como reforçar os serviços públicos e não como os cortar ou privatizar?

Sr. Presidente, Srs. Deputados, neste momento decisivo, perante esta responsabilidade ímpar, está na hora

de escolher. Dirijo-me, assim, às bancadas do PCP, do PEV e do Bloco de Esquerda: com quem se querem

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levantar amanhã, na altura de votar o Orçamento do Estado? Por mim, e por muitos da minha geração, respondo:

quero levantar-me convosco, para cumprir o que começámos e para aprovar este Orçamento do Estado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PAN, o Sr. Deputado Nelson da Silva.

O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Este é um Orçamento cujo cenário macroeconómico não tem em conta um possível retorno ao

confinamento e a políticas restritivas, como ainda ontem admitiu a Direção-Geral da Saúde (DGS).

Este Orçamento, cujo cenário macroeconómico não contempla o impacto das alterações climáticas ao nível

económico, também não contempla a crise energética que assola milhões de pessoas, nem os seus impactos,

como a inflação galopante em toda a zona euro.

Este Orçamento, de facto, não tem a marca ecologista que o PAN tanto anseia, não tem a marca social que

o PAN tanto defende e não tem a marca no combate à corrupção que o PAN e Portugal esperam.

No entanto, Sr.as e Srs. Deputados, sem demagogias, sem palavras vazias, nem retórica vã, o PAN

apresentou, de facto, soluções e continuará a apresentar soluções concretas que têm um impacto real na vida

das pessoas, principalmente na vida dos nossos jovens.

Por isso, continuaremos, neste debate, e até à votação do Orçamento, a dialogar, a convergir e a construir

soluções para um Portugal cada vez maior e melhor.

Precisamos de que as empresas recebam os seus incentivos, que sejam incentivadas, precisamos que o

investimento público saia da gaveta, que saia dos cofres do Estado e vá para as ruas.

Precisamos, também, que o PRR, apesar de fraco, no que tem que ver com a transição climática e a transição

energética, faça avanços importantes. E este é um aspeto que não pode ser ignorado na análise a este

Orçamento do Estado.

Estes não são apenas os objetivos do PAN, são os objetivos que Portugal precisa de atingir.

Este é capaz de ser um dos maiores desafios da história recente da nossa jovem democracia, e nós,

enquanto representantes da democracia, não podemos de ânimo leve ignorar. Este é o contexto político atual.

Não querer discutir este Orçamento é escancarar a porta a quem quer matar a democracia — 46 anos de

democracia. Não nos esqueçamos de que quem votar contra este Orçamento, na generalidade, vai, de facto,

deixar a porta bastante escancarada.

Aplausos de Deputados do PS.

O PAN não tem medo de ir a eleições, não tem medo da democracia. Se o Bloco de Esquerda, o PCP e o

Partido Ecologista «Os Verdes» decidirem, desta maneira, escancarar a porta para os tempos da «outra

senhora», o PAN garante que não deixará que essa direita passe para dentro deste Parlamento. Cá estaremos

para responder a esse desafio.

Aplausos do PAN e do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, o Sr. Deputado José Luís Carneiro.

Protestos de Deputados do PSD e do CH e contraprotestos do PS.

Há muito ruído na Sala, pelo que peço aos Srs. Deputados para baixarem o tom, e o som, por favor.

Tem a palavra, Sr. Deputado José Luís Carneiro.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresentou a este Parlamento uma proposta de Orçamento assente nos valores da autonomia, da

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responsabilidade, do progresso e da justiça social. A quem se destina, a quem serve esta proposta de

Orçamento?

Serve as famílias da classe média, que querem pagar menos impostos e manter os progressos na sua

qualidade de vida. Serve os jovens, que aguardam por um contrato de trabalho com justa remuneração.

Serve os trabalhadores, cuja remuneração ainda não cobre os custos de vida. Serve as pessoas que

precisam de serviços de saúde de proximidade. Serve as crianças e os jovens, que precisam de recuperar as

aprendizagens e em quem as famílias depositam as suas esperanças de futuro.

Serve os empresários, que querem salvar a sua honra como empreendedores, que pagam os salários justos

e que têm nos trabalhadores os seus maiores aliados.

Serve os centros de conhecimento e de inovação do País, que nos permitem progredir. Serve os profissionais

da cultura, que são um importante esteio de coesão, fonte de criação e previsão do futuro.

Serve os cidadãos, que querem um País com habitação condigna para todos. Serve os cidadãos, que querem

transportes públicos de qualidade e acessíveis.

Enfim, serve uma democracia de qualidade.

Tratando-se de um dos mais importantes instrumentos de ação política, a sua aprovação é, portanto, da

maior responsabilidade. O voto contra é uma irresponsabilidade, porque tem graves consequências.

Aplausos do PS.

Dificulta, como, hoje, bem lembrou a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), a execução

dos fundos europeus, fragilizando as condições de recuperação económica e social. Dificulta o combate ao

trabalho precário, debilita os instrumentos de combate à pobreza e às desigualdades e faz perder a oportunidade

de realizar uma ampla redução da carga fiscal para as classes médias, para as famílias com filhos e para os

jovens no início da sua atividade profissional.

O Governo e o seu Primeiro-Ministro, António Costa, têm mostrado uma irrepreensível cultura de humildade

democrática, de diálogo e de abertura, por isso mesmo, foi possível ir além da proposta de Orçamento, alargando

e densificando matérias de uma renovada agenda política, como a criação do Estatuto do Serviço Nacional de

Saúde, a Agenda do Trabalho Digno e a criação do Estatuto dos Profissionais da Cultura.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, a proposta de Orçamento tem uma opção clara com um investimento, público e

privado, com uma economia baseada na inovação e no conhecimento, com a valorização dos salários e dos

rendimentos e com a justiça social. Assenta, pois, no mais avançado modelo europeu de harmonia entre a

competitividade e a coesão.

As prioridades no investimento público são assumidas de forma clara, na modernização, qualificação e

valorização da Administração e serviços públicos, nomeadamente no Serviço Nacional de Saúde, mas também

na educação, na valorização e na aposta na habitação com dignidade, nos transportes e na mobilidade.

É também um bom Orçamento, porque não esquece a importância das empresas e do investimento privado

na criação de riqueza e na criação de emprego. Por isso, prevê 1400 milhões de euros de apoio ao investimento

e à sua capitalização.

Aplausos do PS.

É um bom Orçamento, porque aposta na valorização do rendimento disponível das famílias, os rendimentos

que contribuem para os consumos, que estimulam a produção, a criação de emprego, a diminuição da despesa

social e a sustentabilidade das funções redistributivas do Estado.

É, ainda, um bom Orçamento, porque olha para as classes médias, para as famílias com filhos e para os

jovens. As mudanças previstas no IRS reforçam os rendimentos das famílias em mais de 200 milhões de euros.

Importa ainda sublinhar o aumento das pensões e os aumentos previstos para a Administração Pública.

Além do Orçamento, o Governo legislou para melhorar a eficiência e a eficácia do Serviço Nacional de Saúde

e para combater a precariedade e defender a dignidade laboral.

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A dedicação plena, a maior autonomia dos hospitais e os incentivos à fixação dos médicos de medicina geral

e familiar no interior são provas claras de uma visão reformista e atenta aos problemas dos cidadãos.

Aplausos do PS.

O mesmo esforço é evidente nas questões laborais. A valorização da contratação coletiva, o reforço da

compensação por despedimento, o aumento da remuneração do trabalho suplementar e o reforço dos meios da

Autoridade para as Condições do Trabalho mostram a vontade de romper e de avançar no caminho do progresso

e da justiça social.

E o que dizer dos esforços para universalizar o acesso gratuito às creches, para aumentar o salário mínimo

nacional, para antecipar o tempo de aplicação e alargar o âmbito do aumento extraordinário das pensões?

Sr.as e Srs. Deputados, a proposta de Orçamento vai muito mais longe do que as anteriores. Corresponde às

necessidades das pessoas e às prioridades do País, é responsável em termos orçamentais e, assim como

aconteceu em 2017, 2018 e 2019, estima um crescimento acima da média europeia, permitindo convergir mais

do que os restantes países da União Europeia.

Sr.as e Srs. Deputados, temos metas ambiciosas, mas realistas, para cumprir em tempos muito difíceis.

Tempos, ainda, de pandemia e dos seus efeitos económicos e sociais, da subida abrupta dos custos da energia

e dos transportes internacionais, da escassez de matérias-primas e da inflação.

São desafios e exigências que nos devem interpelar, no mais fundo das nossas consciências, para a

importância da estabilidade política e para o serviço ao nosso País.

Aplausos do PS.

Caras e Caros Deputados, por nós, continuaremos a lutar pelos nossos valores de sempre: responsabilidade,

progresso e justiça. Eis o que move o Partido Socialista no serviço a Portugal.

Sr.as e Srs. Deputados, nada supera a nossa vontade. A decisão está mesmo nas nossas mãos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Duarte Pacheco, a quem dou a palavra.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Carneiro, a sua intervenção ficará já guardada, certamente, para os tempos de antena que vai fazer na campanha eleitoral nos próximos meses.

Foi um momento de propaganda pura e simples, sem qualquer adesão à realidade.

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Olhe que não!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E porquê, Sr. Deputado? Porque o Sr. Deputado limitou-se a fazer propaganda, esquecendo-se que este Orçamento, possivelmente, servia para tanta coisa, mas não serve o País.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E é porque não serve o País que não pode ter o voto favorável da maioria nesta Casa, nomeadamente do Partido Social Democrata.

E sabe porquê? Em primeiro lugar, porque não é um Orçamento, é uma lista de supermercado com um

conjunto de medidas completamente desgarradas umas das outras.

Aplausos do PSD.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Tal e qual! É uma manta de retalhos!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas é uma lista de supermercado que nem sequer é para quem vai às compras a cumprir, ou, neste caso, para que o Governo a execute. É uma lista só para inglês ver ou, neste caso,

para português ver.

Aquilo que sabemos é que esta lista de supermercado que o senhor aqui nos apresentou baseia-se não nas

palavras lindas e magníficas que expressou, mas no comportamento do Governo apoiado pelo Partido Socialista

ao longo dos últimos seis anos.

É que promessas há muitas e podem até enganar as pessoas durante algum tempo, mas chega o momento

em que as pessoas dizem: «Basta! Basta!» E sabe porque é que basta? Porque, nos anúncios que são feitos

relativos a médicos de família, todos os anos se diz «é agora!», mas as pessoas continuam sem médico de

família.

Sobre os investimentos nos hospitais, os senhores dizem que vão acontecer, mas não acontecem e os

anúncios repetem-se ano após ano para os mesmos hospitais.

Os computadores que eram para chegar às famílias não chegam.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Exato!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Tudo isso porque os investimentos não se concretizam, seja na ferrovia, seja nas outras áreas.

Portanto, são palavras lindas, mas a realidade é bem diferente.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — O que os senhores nos têm vendido são ilusões. Ilusões! E quando as pessoas despertam concluem que a realidade é muito diferente.

Ora, é essa diferença que vai hoje e amanhã ficar aqui evidente para todos. É que o Partido Socialista vendeu

ilusões, mas, cada vez mais, nós estamos mais na cauda da Europa e, por isso, é preciso uma política diferente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Carneiro.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Duarte Pacheco, como é evidente, e como resulta das palavras de grande

responsabilidade que o Sr. Primeiro-Ministro tem pronunciado publicamente, o Partido Socialista e o Governo

não querem eleições. Aliás, o esforço que têm feito — esforço sincero, autêntico, genuíno — mostra que há uma

vontade muito forte de aproximação das posições políticas com aqueles que têm suportado as opções políticas

do Governo para, neste momento tão exigente para o País, garantirmos condições de estabilidade política,

dados os compromissos não apenas com as instâncias que contribuem, de forma decisiva, para financiar os

nossos níveis de vida e os nossos níveis de investimento, mas também para cumprirmos na plenitude os

compromissos que assumimos com os cidadãos.

Mas há uma coisa que lhe posso dizer, Sr. Deputado Duarte Pacheco, como também já foi dito pelo nosso

Primeiro-Ministro: nós, em circunstância alguma, desejamos eleições, mas também não temos medo de

eleições, e espero que, se elas ocorrerem, sejamos mais bem-sucedidos do que o senhor foi na sua última

campanha eleitoral. É que nós esperamos mesmo ganhar as eleições se elas vierem a ocorrer.

Aplausos do PS.

Agora, se me derem um minuto de atenção, queria mostrar-lhes alguns gráficos.

Protestos de Deputados do PSD.

Srs. Deputados do PSD, pedia-lhes que respeitassem os argumentos das outras bancadas.

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Pedia ao Sr. Deputado Duarte Pacheco que olhasse para os indicadores de desenvolvimento do País que

vou passar a mostrar.

O orador passou a exibir diversos gráficos.

Vejamos, em primeiro lugar, relativamente à população entre os 30 e os 34 anos com curso superior, a

evolução do número de alunos que passaram a frequentar o ensino superior.

Mas veja também, Sr. Deputado Duarte Pacheco, qual foi a despesa total em Inovação e Desenvolvimento

no País e o percurso que foi feito desde o tempo em que os senhores tinham responsabilidades governativas.

Vejam, agora, o esforço que foi feito no investimento público e no investimento privado no nosso País, que

tem crescido.

É bom que olhem para estes números…

Aplausos do PS.

Protestos de Deputados do PSD.

Sei que não querem olhar, sei que custa olhar, porque estes números relativos ao investimento público e ao

investimento privado mostram que a economia nacional está mais competitiva do que quando os senhores

tinham responsabilidades no Governo.

Aplausos do PS.

Mas, caso os senhores queiram ficar ainda mais persuadidos, olhem para os níveis da taxa de desemprego.

Vozes do PSD: — Mostre ao PCP!

Protestos do PCP.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Não, os senhores é que precisam de verificar. Trata-se da taxa de desemprego. Vejam que, no vosso tempo, Srs. Deputados,…

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, deixem o orador intervir e mostrar os gráficos, o que é uma prática comum.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Srs. Deputados, gostava que não se sentissem acanhados nas críticas, mas também que me deixassem falar e apresentar estes dados.

Srs. Deputados, em 2013, estávamos com cerca de 17% de desemprego e, hoje, estamos com 6,5%.

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, para que se voltem a lembrar, em 2011 as transferências para o SNS foram de 8100 milhões

de euros, em 2012 ficaram-se pelos 7500 milhões e vejam que, desde 2012 até 2022, na previsão de

investimento para 2022, estamos a falar de um reforço substantivo na qualidade do serviço de resposta do

Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

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Srs. Deputados, se me permitem, não podemos perder, de alguma forma, a oportunidade de olhar para o

gráfico seguinte.

Há dias, o responsável pelo Conselho Estratégico Nacional do PSD — eu pensava que tinham aprendido

alguma coisa com os resultados que vieram a desenvolver-se no decurso das vossas políticas de

sobreausteridade, mas verifiquei que não aprenderam —, responsável pelo vosso pensamento estratégico a

nível económico, veio dizer que, afinal, era necessário mesmo continuar a apostar em salários baixos para que

o País fosse competitivo,…

Vozes do PSD: — Não é nada disso!

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — … e é por isso que não gostam de olhar para este gráfico, onde partimos de um salário mínimo de 485 € para 850 € — previsão até 2024/2025.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, se me permite, como bem se sabe, também os transportes e a mobilidade são um fator

fundamental de cidadania, um fator de igualdade, um fator de coesão, um fator de ordenamento do território.

Pois olhem bem para os valores dos investimentos nos transportes e na mobilidade: em 2015, 0,3 e, em

2021, 522 milhões de execução.

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, concluindo, o que estes números mostram, porque os números são importantes porquanto

mostram realidades, é que nós somos portadores de uma causa de desenvolvimento nacional, de uma causa

de desenvolvimento do País.

Aplausos do PS.

Ora, Sr. Deputado, essa visão sobre o desenvolvimento é uma causa que aposta, simultaneamente, nas

políticas de investimento, de inovação, de desenvolvimento, de qualificação das pessoas, de estímulo aos

rendimentos, porque estimulam os consumos, porque estimulam a produção, porque estimulam o emprego,

porque garantem a sustentabilidade das funções sociais do Estado.

É por esta visão diversa em que nos posicionamos que continuamos a crer que a nossa ambição para o País

é uma ambição que serve os interesses dos portugueses e que serve os interesses de Portugal. Por isso,

continuamos a ser merecedores da grande confiança dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições para o debate de hoje, anuncio que amanhã recomeçaremos os nossos trabalhos às 10 horas com a continuação da discussão, na generalidade,

da Proposta de Lei n.º 116/XIV/3.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para 2022.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 18 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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