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Sábado, 9 de abril de 2022 I Série — Número 4
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
REUNIÃOPLENÁRIADE8DEABRILDE 2022
Presidente: Ex.mo Sr. Augusto Ernesto Santos Silva
Secretárias: Ex.mas Sr.as Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Lina Maria Cardoso Lopes Palmira Maciel Fernandes da Costa Helga Alexandra Freire Correia
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 6 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do Projeto de Resolução n.º 18/XV/1.ª e do Projeto de Deliberação n.º 1/XV/1.ª
Prosseguiu o debate do Programa do XXIII GovernoConstitucional, tendo usado da palavra, a diverso título, além
dos Ministros da Economia e do Mar (António Costa Silva), do Ambiente e da Ação Climática (Duarte Cordeiro) e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (Ana Mendes Godinho), os Deputados Mariana Mortágua (BE), Afonso Oliveira (PSD), Patrícia Gilvaz (IL), Carlos Pereira (PS), Bruno Dias (PCP), Carlos Guimarães Pinto (IL), Jorge Salgueiro Mendes (PSD), Hugo Costa (PS), Inês de Sousa Real (PAN),
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Paula Santos (PCP), Jorge Paulo Oliveira (PSD), Rui Afonso (CH), Pedro Filipe Soares (BE), Luís Soares e Maria Antónia de Almeida Santos (PS), Rui Tavares (L), Rosário Gambôa e Hugo Pires (PS), Bruno Coimbra (PSD), Filipe Melo (CH), Diana Ferreira (PCP), António Prôa (PSD), Nuno Fazenda e Alexandre Quintanilha (PS), Gabriel Mithá Ribeiro (CH), Tiago Barbosa Ribeiro (PS), José Moura Soeiro (BE), Clara Marques Mendes (PSD), João Dias (PCP), Rita Matias (CH), Francisco César (PS), Joana Barata Lopes (PSD), Rui Paulo Sousa, Diogo Pacheco de Amorim e Pedro Pinto (CH) e Eurico Brilhante Dias (PS).
Entretanto, deu-se conta da entrada na Mesa da Moção de Rejeição n.º 1/XV/1.ª (CH) — Do Programa do XXIII Governo Constitucional, que posteriormente foi rejeitada.
Procedeu-se ao encerramento do debate do Programa do XXIII Governo Constitucional, tendo proferido intervenções, além da Ministra da Presidência (Mariana Vieira da Silva), os Deputados Rui Tavares (L), Inês de Sousa Real (PAN),
Catarina Martins (BE), Jerónimo de Sousa (PCP), Rodrigo Saraiva (IL), André Ventura (CH), Rui Rio (PSD) e Eurico Brilhante Dias (PS).
Foi aprovado o Projeto de Deliberação n.º 1/XV/1.ª (PAR) — Elenco e composição das comissões parlamentares permanentes.
Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 18/XV/1.ª (PAR) — Deslocação do Presidente da República a Madrid e a Málaga.
Ao abrigo do artigo 77.º do Regimento da Assembleia da República, o Deputado André Ventura (CH) fez um protesto dirigido ao Presidente por ter sido interrompido durante a sua intervenção no encerramento do debate, tendo o Presidente sustentado a referida interrupção no n.º 3 do artigo 89.º do Regimento.
O Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 21 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 6 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias.
Para a leitura do expediente, tem a palavra a Sr.ª Secretária da Mesa Deputada Maria da Luz Rosinha.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do
Governo, muito bom dia a todas e a todos.
Passo a anunciar que deram entrada na Mesa o Projeto de Resolução n.º 18/XV/1.ª (PAR) — Deslocação do
Presidente da República a Madrid e a Málaga e o Projeto de Deliberação n.º 1/XV/1.ª (PAR) — Elenco e
composição das comissões parlamentares permanentes.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr.ª Deputada.
Srs. Deputados, antes de começarmos, agradeço que façam silêncio.
A ordem do dia de hoje, neste período da manhã, é a continuação do debate sobre o Programa do XXIII
Governo Constitucional.
Saúdo o Governo e todos os grupos parlamentares pela disciplina com que usaram os tempos no dia de
ontem e apelo a que a mesma disciplina possa ser posta em prática hoje. Isso permitir-nos-á concluir esta parte
do debate até às 13 horas e 30 minutos e retomar os trabalhos às 15 horas para o encerramento do debate, o
que, por sua vez, nos permitirá concluir os trabalhos antes das 17 horas.
Para intervir, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva,
a quem saúdo nesta sua primeira intervenção na Assembleia, na XV Legislatura.
O Sr. Ministro da Economia e do Mar (António Costa Silva): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito bom
dia a todos.
Queria começar por saudar o Sr. Presidente da Assembleia da República, o Sr. Primeiro-Ministro, os Srs.
Membros do Governo e os Srs. Deputados.
Quando analisamos, hoje, a situação da economia portuguesa não podemos ter nenhumas ilusões: estamos
a atravessar um momento extremamente difícil.
A economia portuguesa foi duramente fustigada pela pandemia e está a ser duramente fustigada pelos efeitos
da guerra na Ucrânia. A combinação do aumento exponencial dos preços da energia com o aumento dos preços
das matérias-primas e dos bens alimentares, conjugada com as tensões inflacionistas associadas, está a criar
um quadro muito difícil para as famílias e para as empresas portuguesas. É por isso que, desde o primeiro dia,
desde a tomada de posse, o Governo tem feito um esforço grande para ter o mais rapidamente possível no
terreno um pacote de medidas que respondam a estas necessidades.
O Sr. Primeiro-Ministro, ontem à tarde, já elencou algumas dessas medidas, como a contenção dos preços,
com a descida para 13% do IVA (imposto sobre o valor acrescentado) relativamente aos combustíveis, como a
questão da limitação do contágio, no Mercado Ibérico de Eletricidade, dos preços do gás, o que pode
proporcionar poupanças para as indústrias, famílias e empresas nacionais na ordem dos 690 milhões de euros.
Mas também temos um conjunto de medidas para apoiar todo o setor da produção, desde logo, com a criação
do gás profissional para o setor dos transportes de mercadorias, a limitação e flexibilização das obrigações
fiscais das empresas e o diferimento dos pagamentos para a segurança social, um pacote muito significativo
para todas as indústrias que são consumidoras de gás, que vão dos têxteis ao vidro, à cerâmica, aos produtos
químicos, às siderurgias, às indústrias químicas.
Portanto, o conjunto destes pacotes revela que estamos preocupados com o curto prazo, para responder de
uma forma significativa aos desafios que se colocam à nossa frente.
Porém, simultaneamente, temos de ter um pensamento a médio e longo prazos e uma estratégia para o
crescimento da economia do País e para o modelo de desenvolvimento que queremos para o futuro. É nesse
sentido que podemos, nesta fase, nesta encruzilhada difícil em que o País está, lutar para mudar a trajetória de
crescimento, no sentido de o fortalecer, e para mudar o próprio modelo de desenvolvimento.
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Como é que vamos fazer isso? Fazendo chegar mais dinheiro à economia e apostando nas empresas que
produzem bens e prestam serviços competitivos no mercado global, estimulando-as.
Aplausos do PS.
É um esforço extraordinário que temos de fazer e que tem de estar coligado, desde logo, com o aumento da
qualidade de execução dos fundos europeus e, sobretudo, com o aumento da eficácia que o impacto da
aplicação dos fundos europeus pode ter na transformação estrutural da economia portuguesa.
A estratégia económica do Governo repousa em seis pilares fundamentais, seis alavancas que temos de
mover e conjugar, simultaneamente, para alcançar o objetivo, que está no Programa do Governo, de fazer
crescer a economia nacional 0,5 pontos percentuais acima da média europeia nos próximos anos, para
atingirmos 53% do volume das exportações, em proporção do PIB (produto interno bruto), em 2030 e para que
9% dessas exportações respondam a produtos tecnológicos, produtos de alto valor acrescentado.
Vamos fazer esse caminho, apostando na primeira alavanca, que tem a ver com a qualificação e com as
competências dos trabalhadores. O País tem feito um esforço significativo, fez uma trajetória admirável nessa
área, mas temos de fazer muito mais e, sobretudo, temos de aumentar a proporção da população ativa que
termina o ensino secundário e coligar isto com uma revisão de todos os cursos de formação profissional,
alinhando-os com os desígnios das associações setoriais, das associações empresariais e daquilo que é a
resposta às necessidades das empresas.
A segunda âncora tem a ver com a capitalização das empresas. Se olharmos para o nível de capital das
empresas portuguesas, o nível de capital por trabalhador é dos mais baixos, quando o comparamos com o da
União Europeia.
A capitalização das empresas é decisiva, porque não há crescimento económico, não há desenvolvimento
sem capital. Portanto, temos de ter instrumentos no terreno e, desde logo, temos de ter uma banca comercial
saudável. Não há uma economia saudável sem ela, mas, simultaneamente, temos de alinhar isso com o Banco
de Fomento, que está criado, tem um modelo flexível, usa instrumentos de capital e de não-capital e opera em
modalidades que vão desde o investimento público à concessão de garantias, desde o coinvestimento aos
fundos de fundos.
A terceira alavanca fundamental é a inovação tecnológica. Temos de mudar o modelo de desenvolvimento
do País, porque ele não pode basear-se nos baixos salários, tem de se basear na inovação tecnológica.
No Programa do Governo está prevista a descida seletiva do IRC (imposto sobre o rendimento das pessoas
coletivas). Temos de desenhar um pacote que possa suscitar o entusiasmo a esse nível, ligando a descida
seletiva do IRC para as empresas que reinvestem os seus lucros na sua atividade económica, para as empresas
que apostam na inovação tecnológica…
Aplausos do PS.
… e para as empresas que contratem jovens qualificados, sobretudo doutorados, para o seu sistema de
inovação.
A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Muito bem!
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Há uma questão que é fulcral aqui, que é a de pôr em marcha as
Agendas Mobilizadoras, que são parte do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência). No dia 13 de abril, as
empresas vão apresentar as suas candidaturas finais e temos de as selecionar para termos, antes do verão, os
contratos operacionais com o tecido produtivo.
Aplausos do PS.
Estou muito esperançado com as apresentações que as empresas, o tecido tecnológico e o sistema científico
português fizeram. Vislumbramos nestas Agendas a economia do futuro para o País, porque temos não só a
reinvenção dos setores tradicionais da nossa economia, aplicando mais a digitalização, a economia circular,
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temos, enfim, todas as cadeias de valor a reinventar-se, mas temos também projetos relacionados com a
economia do futuro, com as biotecnologias, sobretudo, marinhas.
Portugal pode ser uma referência mundial na área das biotecnologias marinhas, com projetos nas áreas da
economia circular e da sustentabilidade energética. Para mim, um dos grandes polos é o que se passa em Sines.
Sines pode ser um dos grandes polos de desenvolvimento do País para o futuro.
Aplausos do PS.
Podemos ter em Sines não uma, mas duas «Autoeuropas», no futuro. Isto porque pode ser um porto ligado
e digitalizado a toda a rede portuária internacional, pode ser um centro do hub das tecnologias verdes que são
os novos combustíveis para toda a marinha e para as forças que se movimentam no mar, nomeadamente com
o hidrogénio, a amónia e o metanol. Pode ser um centro de tratamento de dados com os cabos submarinos que
existem; pode ser um centro de importação de LNG (liquified natural gas) e, depois, de transshipping para todo
o sistema europeu. Portanto, vamos apostar, a nível do Governo, na mobilização para essa área.
O quarto fator que é decisivo é o da literacia financeira e digital. Quando nos comparamos com os países
mais avançados do mundo, 30% a 40% do diferencial de produtividade que temos em relação a esses países
deve-se à qualidade ainda fraca da gestão financeira e à qualidade que temos nos nossos sistemas.
Temos, assim, de melhorar as nossas instituições a todos os níveis e a nossa ideia é fazer um acordo com
as nossas escolas de negócio, com as escolas de gestão para termos pacotes de formação, em termos de
gestão financeira e económica, para as empresas, para as instituições e para o futuro.
Aplausos do PS.
A quinta grande alavanca que é decisiva é o ecossistema de inovação. O País fez um percurso admirável
nos últimos anos, a nível do seu sistema científico e tecnológico. Conseguimos produzir saber em várias áreas,
a par do que de melhor se faz no mundo, mas temos de revisitar o nosso ecossistema de inovação,
nomeadamente a interação entre as universidades, os politécnicos, os centros de inovação com todo o tecido
empresarial, porque a incorporação de saber no tecido produtivo vai criar a possibilidade de desenvolvermos
novos produtos de alto valor acrescentado, e isso pode ser absolutamente decisivo para o futuro.
A sexta alavanca em que temos de apostar tem de estar ligada à questão das exportações e das importações.
Não podemos só ver as exportações, temos de continuar o esforço admirável que tem sido feito pelas instituições
responsáveis para alargar a nossa penetração nos mercados internacionais e aumentar o volume das nossas
exportações.
Mas isto tem de funcionar numa espécie de hélice dupla, ligando-se também ao mapa das importações.
Temos de ter uma estratégia inteligente de substituição das importações que fazemos do exterior. Porquê?
Porque um dos óbices que não deixa a economia portuguesa crescer e libertar todo o seu potencial é o conteúdo
importado das nossas exportações. Se trabalharmos exportações e importações de forma articulada, vamos ter
um caminho para o futuro.
Queria concluir dizendo que as crises na história dos países são frequentes. As transformações fundamentais
são raras. Temos à nossa frente a oportunidade de fazer uma transformação fundamental no nosso País, mas,
para isso, exige-se que, independentemente das nossas diferenças, saibamos trabalhar uns com os outros,
ombro a ombro, criando grandes plataformas colaborativas, políticas, sociais, empresariais, para mudar para
melhor o nosso tecido produtivo.
O nosso compromisso, o nosso empenho, a nossa dedicação é para com Portugal. É isso que me move, é
isso que nos move.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, a Mesa registou 12 inscrições para pedidos de esclarecimento, sendo que
já fomos informados de que responderá em blocos de seis.
A primeira inscrita para um pedido de esclarecimento é a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de
Esquerda, a quem dou a palavra. Sr.ª Deputada, dispõe de 2 minutos.
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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados,
Sr. Ministro, cumprimento-o, mas confesso que, para mim, ainda não é muito claro quais são exatamente as
competências exclusivas do seu Ministério.
Ainda assim, há um tema que me parece incontornável, que, nas palavras do Sr. Ministro, se trata do aumento
exponencial do preço dos bens da energia e dos bens alimentares, com tendências inflacionistas em toda a
economia.
Gostava de começar por lhe perguntar duas coisas sobre impostos. Em primeiro lugar, qual a razão para
manter um adicional ao ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos), criado quando o preço dos
combustíveis estava em mínimos históricos e que o Governo prometeu que iria eliminar, caso o preço do
combustível subisse?
Em segundo lugar, por que razão insiste o Governo em tributar a eletricidade em sede de IVA, como se se
tratasse de um bem de luxo? Vai ou não vai o Governo descer o IVA da eletricidade para uma taxa razoável?
Mas a inflação não é apenas impostos. Se a direita fala só de impostos por causa da inflação é porque não
quer falar dos lucros das grandes empresas, que estão a aproveitar este momento para aumentar os preços e
as suas margens.
As duas principais empresas de energia em Portugal vão distribuir este ano 1300 milhões aos seus
acionistas. O Primeiro-Ministro disse ontem que não vai atualizar salários e que é preciso atacar as causas da
inflação.
Por isso, pergunto-lhe: o que vão fazer?
Pergunto-lhe se o Governo vai usar o poder legal para limitar as margens da Galp, que aumentaram, em
2001, enquanto as pessoas empobreciam de cada vez que iam à bomba de gasolina.
Pergunto-lhe se o Governo vai explicar às empresas portuguesas que vão pagar mais pela luz porque o
Governo insiste em manter os lucros garantidos da EDP (Energias de Portugal).
Quando o Sr. Primeiro-Ministro anunciou, ontem, que vai baixar a fatura da eletricidade em mais de 600
milhões…
O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Foram 690 milhões.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … não contou a história até ao fim. É que a energia que é produzida pelas
barragens continua a ser paga a quatro vezes mais do que era em 2020, e os seus custos são iguais aos de
2020.
Uma outra coisa que o Sr. Primeiro-Ministro não disse exatamente como vai ser é que o preço do gás vai ser
mais baixo e essa diferença vai ser paga por todos os consumidores, em défice tarifário. São os consumidores
de amanhã que vão pagar a descida do preço do gás que o Sr. Primeiro-Ministro anunciou ontem, na tribuna. E
era importante que o Governo pudesse clarificar isso.
Mas há um outro tema, e não se trata apenas da energia.
O Sr. Ministro já foi ao supermercado? Não achou que se passava alguma coisa estranha nos preços dos
bens básicos alimentares no supermercado? Não achou estranho que, no espaço de um mês, se tenha provado
mais um cartel de preços entre o Auchan, o Modelo/Continente, o Lidl, o Pingo Doce? Não achou estranho que
Pedro Soares dos Santos, presidente da Jerónimo Martins, do Pingo Doce, tenha anunciado um aumento dos
lucros, e que vai entregá-los todos aos acionistas, e que, dias mais tarde, tenha dito que era preciso descer o
IVA dos bens essenciais?
Sr. Ministro, o que é que vai fazer às margens das empresas de retalho, que estão a aumentar os preços?
A questão aqui é muito simples: quem é que vai pagar a inflação? São os salários congelados que vão ser
cortados ou são as margens das grandes empresas?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Oliveira, do Grupo
Parlamentar do PSD.
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O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr. Ministro da
Economia e do Mar, percebo — ao ouvi-lo hoje, aqui — que está a acabar de chegar ao Governo e há aqui um
momento de sonho, de reflexão, de pensamento, ainda do seu momento de visão para Portugal, que teve
recentemente. Mas vai chegar a realidade e vai perceber que a realidade não é bem aquela que transmitiu ali,
na tribuna. Gostávamos que fosse.
Há um conjunto de intenções que ali apresentou e que são só intenções, sonhos, reflexões, desejos. Falamos
aqui da realidade. A economia é muito a realidade, é muito as empresas, as pessoas, os trabalhadores, a forma
como tudo funciona, não é esta forma como hoje, aqui, a apresentou.
Mas, neste segundo dia de debate, já quase na fase final do debate, Sr. Ministro, há uma questão que me
parece muito relevante: este é um Programa do Governo sem ambição. Isto é claríssimo como água: sem
ambição! Essa ambição não existe! Não se percebe qual é a ambição do Governo para os próximos anos, no
País.
Vozes doPSD: — Muito bem!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É um Programa que esquece completamente a realidade do País em que
vivemos, tal como aconteceu aqui ao Sr. Ministro, na sua primeira intervenção, mas veremos, depois, no futuro.
Tem a sua oportunidade, como Ministro da Economia, para apresentar, depois, a sua visão para o País.
É uma cópia do Programa Eleitoral do PS — já foi aqui dito isto. O Sr. Primeiro-Ministro fica muito contente
com isso, está muito satisfeito com isso,…
A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Chama-se coerência!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — … e esquece-se completamente de que a realidade se transformou, se
alterou completamente em dois meses, e não houve nenhuma adaptação. O Governo não se consegue adaptar
à realidade.
Tudo se alterou, tudo mudou, os preços alteraram-se, a inflação está nos níveis em que está, a guerra
começou, mas nada mudou para o Governo. O Governo tinha um Programa feito e resolveu apresentá-lo aqui,
no Parlamento. Tinha-o anunciado, já o fez e, portanto, isso é um facto.
Mas o Governo começa muito mal, porque o Programa do Governo não espelha como objetivo fundamental
o crescimento económico.
Ó Sr. Ministro, sem crescimento económico não vale a pena esta conversa, não vale a pena esta conversa.
Não é possível fazer rigorosamente nada no País, distribuir o que quer que seja, se não houver crescimento.
Políticas de crescimento e um objetivo de crescimento claro para o País são fundamentais.
Os objetivos deste Governo são claramente reduzidos e muito curtos.
Outra questão que o Governo, infelizmente — é uma infelicidade, mas é o Governo que temos, é o que é, foi
o que foi decidido —, não trabalha é o processo de empobrecimento a que levou o País nos últimos anos.
Não há dúvida nenhuma de que Portugal é dos países mais pobres da Europa neste momento, e estamos a
perder completamente em todos os rankings internacionais, estamos a perder sucessivamente com os países
com que nos comparamos. Portanto, no final do mandato, Sr. Ministro, espero bem que o seu trabalho evite que
isto aconteça nos próximos anos, mas é o que está a acontecer. Se reparar, atrás de nós já temos poucos
países: a Roménia, a Letónia, a Croácia, a Eslováquia, a Grécia, a Bulgária. Portanto, o próximo passo será
perdermos mais uma vez, atingirmos um ranking, mas virado ao contrário. Acho que isto não pode ser, e é uma
infelicidade.
O Sr. Ministro tem uma vantagem muito grande em relação a este Governo: integrou agora o Governo, entrou
numa nova remodelação. O Sr. Primeiro-Ministro já fez uma remodelação duas vezes e, na remodelação que
agora concretizou, o Sr. Ministro integrou este Governo e, portanto, não tem nenhuma culpa do que aconteceu
até agora. O que esperamos agora do Sr. Ministro é que haja uma atitude completamente diferente em relação
ao passado.
Pergunto-lhe, Sr. Ministro — termino já, Sr. Presidente, confesso —, porque acho que é importante, como é
que acha que é possível inverter a dinâmica de empobrecimento do País.
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Que políticas públicas pensa apresentar — ou pensa conseguir influenciar junto deste Governo e deste
Primeiro-Ministro — para que o País siga uma política de crescimento? Como é que pensa inverter a forma
como o País empobreceu? É que, se mantiver as políticas que existem neste momento, políticas iguais têm
resultados iguais. Isto faz parte de qualquer manual de gestão. Portanto, se não alterar as políticas, manterá o
processo de empobrecimento.
A pergunta central que lhe quero colocar — nem vou colocar mais nenhuma questão — é mesmo essa: que
políticas vai apresentar ao Governo para inverter o empobrecimento, para apostar claramente no crescimento,
para que seja possível um país mais desenvolvido, que é o que Portugal não tem sido nos últimos anos?!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Patrícia Gilvaz, do
Iniciativa Liberal.
A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia e do Mar, não posso deixar de
assinalar que não adotou nenhuma política direta para os jovens, não referiu aqui nenhuma política direta para
os jovens. Portanto, os jovens que estão lá em casa, sem esperança, continuam sem esperança.
Aplausos do IL.
Até agora, era uma jovem como tantos outros, que via os impactos das políticas dos governos e desgovernos
deste País e sonhava poder, um dia, contribuir para um país onde os sonhos pudessem ser alcançados.
Vozes doIL: — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — Ao contrário da maior parte dos jovens deste País, hoje, tenho a oportunidade
e o privilégio de o interpelar, em nome da frustração que é comum à minha geração.
É comum dizer-se que somos a geração mais bem preparada e qualificada de sempre, mas, se assim é,
ironicamente, também somos a geração mais negligenciada no acesso a oportunidades e ao elevador social,
num país que está estagnado há demasiado tempo.
Aplausos do IL.
Nós, os jovens portugueses, saímos cada vez mais tarde de casa dos nossos pais, porque os salários líquidos
que auferimos não são suficientes para comprarmos a primeira casa…
Protestos do PS.
… ou para constituir família. Isto porque três quartos dos jovens empregados auferem rendimentos líquidos
que não ultrapassam os 950 €/mês e, muitas vezes, não chegam a esse valor.
Vozes doIL: — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É a contratação coletiva que temos!
A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — Portugal precisa de adotar políticas reformistas a sério. Políticas que combatam
o desemprego jovem, que travem a emigração, que criem as condições para os jovens se realizarem pessoal e
profissionalmente,…
Vozes doIL: — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — … e para que possam seguir os seus sonhos.
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A emigração não pode ser uma obrigação, deve ser uma opção.
Aplausos do IL.
Fala no seu Programa do desafio da demografia, da natalidade, de deduções fiscais para famílias com filhos,
de IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) Jovem, e reforça que este País deve ser para uma
geração de jovens altamente qualificados.
Sr. Ministro, o Governo orgulha-se de apresentar o alargamento do IRS Jovem para cinco anos, mas o que
está em causa é isto: um jovem que ganhe 11 000 € brutos/ano, o que equivale a 785 € brutos/mês, vai poupar
menos de 30 €/mês ao longo de cinco anos. Acha, Sr. Ministro, que um jovem talento, que pode ganhar o dobro
noutro país, vai ficar em Portugal só com mais 30 € no bolso?!
Aplausos do IL.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira, do
Partido Socialista.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.
Deputados, Sr. Ministro da Economia e do Mar, a minha primeira palavra é de saudação e para fazer votos de
que exerça o mandato em prol dos portugueses e com grande sucesso.
Antes de começar as minhas perguntas, gostaria de fazer algumas observações no quadro do debate que
ocorreu ontem, aqui, no Parlamento. Julgo que é muito importante esclarecer um conjunto de matérias, até
porque alguns dos Deputados — e o Sr. Deputado Afonso Oliveira foi um deles — voltaram a trazer um dos
temas que foi amplamente debatido ontem. Julgo que o Partido Socialista deve e tem de esclarecer os
portugueses sobre essas matérias.
A primeira tem a ver, naturalmente, com o crescimento económico. Não aceitamos lições do PSD sobre
políticas públicas para crescimento económico.
Protestos do Deputado do PSD Afonso Oliveira.
Percebemos a inquietação do PSD — e de toda a direita em geral — sobre a circunstância de o Partido
Socialista ter sido o único partido em Portugal que, neste século, foi capaz de colocar o País a crescer quatro
anos seguidos acima da média da União Europeia.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Levaram o País à bancarrota!
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Compreendemos essa inquietação, percebemos essas dificuldades!
Mas, Sr. Deputado Afonso Oliveira, além disso, quando se fala nestas matérias, é preciso contar a história
toda, é preciso contar aquilo que é verdadeiramente relevante sobre o crescimento económico.
Sabemos que há limites de competitividade do País e que esses limites são estruturais. E o que este Governo
tentou fazer nos últimos tempos foi, precisamente, ultrapassar esses limites estruturais, que são absolutamente
essenciais.
Aplausos do PS.
E, quando alguns tentam criar um nexo de causalidade entre o Partido Socialista e o facto de alguns países
da Europa crescerem mais do que Portugal, e até ultrapassarem Portugal — ou seja, com o Partido Socialista
os países ultrapassam Portugal —, isso é desonesto.
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Protestos do Deputado do PSD Afonso Oliveira.
Até porque, como o Sr. Deputado sabe, há 20 anos que alguns países vão ultrapassando Portugal. Alguns
ultrapassaram no Governo de Durão Barroso, outros ultrapassaram no Governo de António Costa, naturalmente,
mas, Sr. Deputado, temos de olhar para os limites estruturais e um deles, que já foi ontem aqui referido — e
muito bem — pelo Sr. Primeiro-Ministro, tem a ver com a educação.
Protestos do Deputado do PSD Afonso Oliveira.
A educação é absolutamente essencial. Quando olhamos, por exemplo, para a percentagem da população
com ensino superior em 2020 — não estou a falar em 2004, quando entraram para a União Europeia, mas em
2020 —, percebemos que a Polónia tem 53,8% com ensino superior, a Irlanda tem 52,4%, a Roménia tem
49,7%, a Estónia tem 45,7%, a Bulgária tem 42,4%, a Hungria tem 36,2%, a Lituânia tem 34,8%. Portugal tem
33,6%, tinha, em 2015, 28,5%, está a fazer um esforço grande e isto é absolutamente decisivo.
Aplausos do PS.
Mas há mais, Sr. Deputado. Há, sobretudo o investimento público, o investimento público contra o qual os
senhores vociferaram durante anos. Ora, sabe o que é que aconteceu com a vossa governação, com o
investimento público? Caiu 60%! Com o PS, aumentou 20% nos últimos cinco anos. Fizemos um esforço. É
preciso mais, mas isto é decisivo para o crescimento económico.
Protestos do PSD.
Finalmente, a investigação e desenvolvimento e a produtividade são duas questões fundamentais. Ora,
convosco, a investigação e desenvolvimento no PIB caiu como nunca tinha caído, e caiu muito.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Troica!
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Fizemos um esforço, ao longo dos últimos cinco anos, e finalmente
conseguimos chegar a 1,6% do PIB.
Protestos do PSD.
Isso é uma boa notícia e isso é, de facto, o que tem de se fazer para o crescimento económico.
Aplausos do PS.
Mas há um outro tema que não posso deixar de referir, que tem a ver com a inflação. E a inflação é, na
verdade, um tema muito complexo. É, porventura, o maior desafio que os Governos, hoje — hoje, nesta
conjuntura —, têm, na Europa.
Mas não posso deixar de observar que, ontem, o líder do Partido Social Democrata, o Deputado Rui Rio,…
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Fale da inflação!
O Sr. Carlos Pereira (PS): — … surgiu neste debate de mãos dadas com o Bloco de Esquerda e teve o
desplante de, perante tensões inflacionistas conjunturais, como já foi amplamente demonstrado,…
Protestos do PSD.
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… dizer que bom, bom era acomodar todas essas tensões inflacionistas no aumento dos salários. Não sei
se o Sr. Deputado Rui Rio, economista, compreende a dimensão daquilo que disse e o impacto que isso pode
ter no País, no desemprego e, naturalmente, na conjuntura económica do País.
Protestos do CH.
É, de facto, muito grave que isso assim seja.
Finalmente…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já excedeu o dobro do seu tempo.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Finalmente, as reformas. Aqui tenho de lembrar que o Deputado Afonso Oliveira não trouxe esse tema, mas
o Deputado Rui Rio traz abundantemente a questão de o Programa do Governo não ter reformas. Ó Sr.
Deputado, o PRR tem 22 reformas. E queria lembrar que há uns meses houve uma manchete no Expresso —
montada, aliás, pelo PSD — que dizia que o Governo estava a negociar reformas às escondidas com a União
Europeia.
Ora, foi demonstrado que não havia reformas às escondidas, que havia total transparência. Mas acontece
que isto me faz lembrar um bocadinho aquela lógica de um grupo de amigos que está a falar e em que chega
outro e diz: «O que os senhores estão a dizer é segredo?» E eles dizem: «Não, não é segredo», ao que o
primeiro responde «ah, então não interessa nada!» É que as reformas existem, mas, como não são segredo, os
senhores já não querem saber. São 22 reformas!
Aplausos do PS.
Nem uma palavra os senhores disseram sobre isso.
Finalmente, Sr. Presidente…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, é a segunda vez que diz «finalmente».
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Economia, a
pergunta, que é muito clara: tendo em conta o desígnio nacional, que está claramente expresso no Programa
do Governo, quais são, de facto, os fatores de competitividade que é preciso impulsionar para garantir a
manutenção da convergência com a União Europeia?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo,
Sr. Ministro da Economia, há uma prioridade nas orientações da política económica para Portugal que se coloca
com uma urgência incontornável e que o Programa do Governo simplesmente ignora. Essa prioridade que aqui
queremos destacar é a de assegurar um significativo crescimento do investimento público, fixando a referência
de 5% do PIB ao ano, a par de uma ajustada e integral execução do Plano de Recuperação e Resiliência e dos
demais fundos comunitários, e uma forte promoção do investimento empresarial.
O PCP sempre tem sublinhado a importância vital do desenvolvimento da produção nacional, como motor do
crescimento económico e do pleno aproveitamento das capacidades e dos recursos nacionais, como resposta
à procura interna, como alternativa a muitas importações e como suporte de um setor exportador de maior valor
acrescentado e mais diversificado, nos produtos e nos destinos.
A recuperação e reindustrialização da Europa não pode ser alcançada por conta de uma ainda maior
desindustrialização de Portugal. Veja-se a refinaria de Matosinhos, encerrada pela Petrogal com a cumplicidade
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do Governo. Em Portugal, passámos a importar gasóleo refinado, estamos mais dependentes nesse aspeto e
há quem ganhe com isso, mas perdem o País e os portugueses.
O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O Sr. Ministro reconheceu mesmo agora, no seu discurso, o que nós temos
vindo a sublinhar desde há muito, isto é, há que avançar com a reindustrialização, substituir importações por
produção nacional, aumentar o valor acrescentado nacional e a componente nacional nas exportações e investir
na produção nacional, designadamente de alimentos, medicamentos e meios de transporte.
Mas isso não se faz premiando o desinvestimento e subsidiando o bodo aos ricos, nas distribuições de
dividendos dos grupos económicos, ao mesmo tempo que se restringe, ainda mais, a capacidade de
investimento público, sacrificando-o no altar das imposições de Bruxelas.
Sr. Ministro, o Programa do Governo não faz nenhuma referência à perspetiva de evolução do investimento
público nos próximos quatro anos, desde logo na componente nacional desse investimento, e a pergunta que
se formula é a seguinte: vamos continuar a ter níveis baixíssimos de orçamentação do investimento público, e
ainda mais baixos na execução orçamental?! Vamos continuar a ter o investimento público a níveis inferiores
aos de há uma década?!
Não concorda, Sr. Ministro, que, neste contexto e com estas perspetivas, do que o País precisa é mesmo de
mais investimento, particularmente produtivo, e isso exige uma estratégia de investimento público, que está
ausente deste Programa?!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto, do
Iniciativa Liberal.
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Economia, começo
por lhe desejar muito boa sorte, porque o País bem precisa de um Ministro da Economia com muita sorte, depois
de 20 anos de estagnação.
No Programa do Governo fala-se de uma economia de conhecimento, mas, para termos uma economia de
conhecimento, o primeiro passo é termos um bom conhecimento sobre aquilo que é a economia.
O vosso Programa do Governo fala sobre convergência, e também ouvi, ontem, o seu Primeiro-Ministro a
falar sobre convergência. Vamos ver se temos essa convergência.
Em 2015, o PIB per capita português era de 78% da média da União Europeia. Sabe de quanto é hoje? É de
74%. Onde está a convergência, Sr. Ministro? Digo-lhe onde está: em 2015, neste mesmo indicador, a Roménia
estava 22 pontos atrás de Portugal. Sabe quantos está hoje? Não sabe, pois não?! Está um ponto atrás de
Portugal. É esta a convergência que temos, é a convergência com os países mais pobres da União Europeia!
Aplausos do IL.
O Sr. Primeiro-Ministro disse ontem, também aqui, a propósito da TAP (Transportes Aéreos Portugueses),
que todas as companhias aéreas estavam a reduzir os seus voos para o Porto, desde 2019. Ontem, soubemos
que tanto a Ryanair como a EasyJet irão aumentar o número de passageiros no Porto, este ano, em relação a
2019.
Aplausos do IL.
Protestos do Deputado do PCP João Dias.
Sr. Ministro, como é que querem uma economia de conhecimento, quando são os primeiros a vir aqui
contribuir para que não haja conhecimento sobre o que é a economia real?!
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O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Mas há uma leve esperança, ontem, tive uma leve esperança, quando
o seu Primeiro-Ministro veio aqui falar de uma política social da Holanda, a política de habitação. Tenho a certeza
de que, se soubesse mais sobre essa política do que as duas linhas que lhe deu o assessor, se calhar, não
vinha falar sobre ela… Mas é um sinal de esperança, é um sinal de esperança porque pode olhar para a política
de habitação e pode olhar para a política de educação,…
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — … onde dois terços dos alunos que estudam com dinheiros públicos
o fazem em escolas privadas.
Aplausos do IL.
Pode olhar também para a política social de saúde, onde todas as pessoas, na Holanda, têm o direito de
escolher se querem ser tratadas e onde querem ser tratadas.
Aplausos do IL.
Olhem para as políticas da Holanda, mas não olhem só para a forma como a Holanda gasta o seu dinheiro.
Não vamos imitar os países ricos apenas na forma como gastam, vamos imitá-los também, porque é preciso,
na forma como criam riqueza, Sr. Ministro. É importante, não vamos copiar só uma dessas partes.
Sr. Ministro, está disposto a recomendar ao seu Governo a mesma política fiscal que a Holanda tem? A
mesma política de justiça? A mesma política burocrática?
Aplausos do IL.
Espero que esteja!
Olho para o seu programa eleitoral e vejo um objetivo muito interessante, que é o da economia 4.0. E deixe-
me dizer-lhe que foi um título extraordinariamente bem escolhido, muito bem escolhido. E sabe porquê? Porque
quatro é o número de países da União Europeia que nos ultrapassaram neste ranking, desde que António Costa
é Primeiro-Ministro, e zero é o crescimento económico que o País teve na última Legislatura.
Aplausos do IL.
Protestos do PS.
E não, a pandemia não é uma desculpa! Portugal está entre os — apenas — cinco países da União Europeia
que não conseguiram crescer entre 2019 e 2021.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado…
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Já vou acabar, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, permita-me que o interrompa. O Sr. Deputado não só já excedeu o dobro
do seu tempo como já esgotou o tempo do seu partido…
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Já vou acabar.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, ouça-me e depois intervém.
Peço-lhe, portanto, que conclua o seu raciocínio.
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O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Sr. Ministro, para acabar: o Sr. Primeiro-Ministro disse ontem, aqui,
que o mercado não resolve tudo, e não resolve, porque só nas vossas cabecinhas preconceituosas…
Protestos do PS.
… é que os liberais acham isso, mas o mercado pode resolver muitas coisas. Sabe quem é que não resolve
nada e só cria problemas, há 20 anos? É o Partido Socialista!
Aplausos do IL.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e do Mar.
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, como a Sr.ª
Deputada sabe muito bem, a economia é extremamente complexa, ninguém sabe tudo e, portanto, nós
estaremos sempre prontos a discutir, a debater e a incorporar as ideias que tem, mas a vida ensinou-me, em
relação à economia, que não podemos ver só uma parte da realidade e esquecer a outra. A economia tem as
empresas, são elas as propulsoras do crescimento e do desenvolvimento económico, tem as pessoas e nós
temos de articular ambas e temos de ter um mercado que funcione.
Quanto à sua preocupação relativamente à questão dos preços da energia e a tudo o que se está a passar,
quero dizer-lhe que estamos a acompanhar a situação, evidentemente, com muita preocupação. Já passámos
por muitas outras crises, como a dos anos 70, e temos agora quase uma reprodução dessa crise, com tudo o
que ela tem de impacto na vida das pessoas.
Mas, fundamentalmente, quando refere a sua preocupação com a questão dos impostos e, sobretudo, dos
impostos aleatórios que as empresas têm, devo dizer que nós, em primeiro lugar, não podemos hostilizar as
empresas, o que vamos fazer é falar com elas e, provavelmente, considerar um imposto, um windfall tax, para
os lucros aleatórios e inesperados que elas estão a ter. Com isso, podemos ter uma outra medida para responder
exatamente à sua preocupação.
Sr. Deputado Afonso Oliveira, o senhor colocou a minha intervenção no domínio do sonho e acho que
podemos sempre sonhar, e temos um País que permite sonhar.
Aplausos do PS.
Somos um País de lutadores, um País de resistentes, um País que se mobiliza e se galvaniza quando
enfrenta dificuldades, e é isso que vamos ter de fazer. Muita gente diz que isto é impossível e que o que estamos
aqui a propor é impossível, mas viver, Sr. Deputado, é tornar possível o impossível.
Aplausos do PS.
Fala da realidade e do desconhecimento da realidade, mas posso dizer-lhe, Sr. Deputado, que percorri o
País de norte a sul e a realidade do País é que tem, em Sines, intenções de investimento de 10 mil milhões de
euros, tem, a nível dos grandes polos industriais do País, como Braga, Guimarães, Famalicão ou Barcelos, um
quadrilátero de ouro para os bens de equipamento e para a produção industrial.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Pela parte de Famalicão, obrigado!
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Quando vai à Covilhã, a Castelo Branco ou à Guarda tem centros
que investigam na área das ciências da saúde, tem microcosmos de tecnologias digitais.
O País está a mudar! A realidade é esta e a minha função, aqui, não é puxar o País para baixo, é puxar o
País para cima.
Aplausos do PS.
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Vários dos Srs. Deputados exprimiram preocupações sobre o empobrecimento do País e, como já foi
debatido nesta Câmara, antes da pandemia o País estava a crescer mais do que a média da União Europeia.
Os números são claros! Podemos disputar muitas coisas, não podemos disputar os números, eles estão lá, são
absolutamente claros, pelo que o que temos de fazer agora é recuperar do impacto brutal que a pandemia teve
e que esta crise da guerra da Ucrânia está a ter. Para fazer isso, temos de apostar naquilo que o País tem de
melhor, mas alguns dos Srs. Deputados só pensam naquilo que o País tem de pior, e não é assim.
Aplausos do PS.
Sr.ª Deputada Patrícia Gilvaz, a Sr.ª Deputada exprimiu uma preocupação muito grande com a questão dos
jovens e eu partilho inteiramente da sua preocupação. Fui professor durante muitos anos no Instituto Superior
Técnico e, relativamente aos jovens, temos de encontrar maneira de eles se estabelecerem no País e usarem
as suas qualificações.
Ora, do conhecimento que tenho, o que os jovens querem fazer é trabalhar em todas as áreas de inovação.
E nós, na área das biotecnologias marinhas, dos serviços de software, com as novas competências que temos
a nível de fabricação de código, como demonstram alguns dos «unicórnios» em Portugal, temos de dar um
caminho aos jovens.
Evidentemente, o IRS Jovem é uma medida, mas, se os jovens tiverem possibilidades de desenvolver as
suas carreiras no País e de se centrar nas áreas tecnológicas e de inovação, vamos fazer um caminho para o
futuro.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Se, se, se…
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Os jovens querem isso, querem trabalhar nestas áreas avançadas,
produzir o seu conhecimento. Se formos capazes de corporizar, por exemplo, aquilo que se está a passar em
Sines, que tem uma rede pluricontinental de cabos submarinos, associada a centros de tratamento de dados e
de big data, usando a inteligência artificial, usando as máquinas que aprendem, temos toda uma geração que
pode ter competências a nível destas áreas, que são cruciais para o futuro.
E, se falo disso, falo também das ciências da saúde. Nós temos investigação de ponta na área das ciências
da saúde.
Se conseguirmos ter uma política industrial que corporize esse conhecimento, que o incorpore no tecido
produtivo, temos muito caminho para os jovens ficarem no País.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Carlos Pereira, penso que mencionou — e muito bem — a questão da produtividade e os
fatores que podem explicar o desenvolvimento e a recuperação da produtividade no País. Esses fatores são
claros, estão identificados por inúmeras teorias económicas, e tentei mencioná-los como algumas das alavancas
que acho cruciais para aumentar a resiliência do tecido produtivo do País no que tem a ver com as qualificações
e as competências dos trabalhadores, com o refrescamento dos cursos de ensino profissional e o seu
alinhamento com os desafios das empresas e do tecido produtivo, com a inovação, sobretudo com a inovação
tecnológica, a economia do conhecimento e a economia do saber.
Sr. Deputado Bruno Dias, não podia estar mais de acordo consigo. Partilho inteiramente da sua preocupação
com a indústria nacional e é por isso que a última alavanca que mencionei significa que vamos continuar a
desenvolver as nossas exportações, sobretudo de bens e produtos de alto valor acrescentado, firmar muito bem
isso e alargar o potencial que temos em vários mercados.
Vamos estudar isso com atenção, mas sem nunca esquecer o mapa das importações e tudo aquilo que pode
significar uma estratégia inteligente de substituição das importações, isto é, produzir no território nacional os
produtos, os bens que sejam competitivos à escala global e incorporá-los no nosso tecido, porque isso vai mudar
completamente a trajetória do nosso País.
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O que acho que tem faltado é uma visão da economia portuguesa com todas estas alavancas, alinhadas e
conjugadas para o futuro.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Pois tem!
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, já excedeu o dobro do tempo de que dispunha. Peço-lhe que conclua.
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Sim, Sr. Presidente, só tenho mais uma questão, que é a do
Deputado Carlos Guimarães Pinto, que insistiu no problema do empobrecimento.
Já respondi parcialmente, mas, Sr. Deputado, o que nos move aqui não é olhar para o empobrecimento, é
compreender alguns dos fatores que não têm permitido a libertação de todo o potencial da economia portuguesa
e criar condições para o crescimento sustentável do PIB potencial do País na próxima década. Isto só se faz de
uma maneira: criando mais riqueza e criando condições para as empresas, o tecido produtivo, em articulação
com o sistema científico e tecnológico, criarem mais riqueza. Isto vai ser o futuro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Jorge Mendes, do
PSD.
O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados, o Sr. Ministro parece que tutela — não conhecemos, ainda, a lei orgânica — a maioria
dos setores da economia real: a indústria, o turismo, o comércio, os serviços e, também, o mar.
Em setembro de 2020, aquando de uma audição na Comissão de Economia, o Sr. Prof. António Costa Silva
defendia a necessidade de maior articulação, maior coordenação entre a elaboração do PRR e do Portugal
2030, o que não aconteceu e é manifesto neste Programa do Governo. E também são manifestas algumas
lacunas que considero graves: trata-se de omissões que não entendo, e os portugueses também não, relativas
ao Portugal 2020 e ao Portugal 2030, que são referidos ao de leve, com umas simples remissões, quando
sabemos que o bom desempenho do Programa do Governo estará muito condicionado pela boa execução do
resto do Portugal 2020 e do Portugal 2030, além do PRR.
Do Portugal 2020, ainda temos, penso eu, de acordo com os últimos dados, 5000 milhões de euros para
executar; do Portugal 2030, teremos 26 000 milhões de euros ao nosso dispor. Creio que foi aprovado, no dia 3
de março, em Conselho de Ministros, o acordo de parceria que foi enviado a Bruxelas. Não conheço a versão
final e creio que nem esta Casa a conhece, nem os portugueses, mas a ação deste Ministro, que tutela a área
da economia real, vai estar muito condicionada pelo sucesso da execução dos fundos comunitários, como bem
referiu, há pouco.
A pergunta que gostava de lhe fazer, Sr. Ministro, é esta: estando a execução do Portugal 2030 na alçada
de outro ministro, ou de uma ministra, penso eu, pela forma como isso condiciona a sua tutela, não considera
que fica refém do sucesso dessa execução? Ou está confiante no êxito do Simplex dos fundos europeus?
Gostava também de lhe colocar outras questões ligadas aos setores que o Sr. Ministro tutela.
Em relação ao turismo, tivemos, durante os últimos anos, muita ausência de medidas de apoio, sobretudo
de relançamento, face às dificuldades que o setor atravessou. O Governo propõe-se, agora, executar o Plano
Reativar o Turismo | Construir o Futuro, que será financiado, creio eu, pelo Portugal 2030.
Sr. Ministro, será deste plano que sairá o famoso plano de apoio ao turismo do Algarve, prometido durante
dois anos e sempre adiado? Será do plano ou da medida que o Governo tem inscrita no seu Programa do
Governo — aprovar e dinamizar a competitividade do comércio — que sairão os famosos apoios ao comércio e
ao turismo das regiões de fronteira?
Sr. Ministro, para terminar, aqui chegados, perante o silêncio e, muitas vezes, os atrasos e ausência da tutela
da economia nos últimos anos, será que o Governo do Partido Socialista, este Governo, ainda tem lugar para
um Ministro da Economia com um espaço de intervenção ao serviço da economia portuguesa?
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Costa, do
Partido Socialista.
O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro da
Economia e do Mar, a economia portuguesa atravessa enormes desafios, fruto de fatores externos, mas
devemos ter confiança, porque o alicerce na continuação de uma boa política pró-cíclica vai continuar a ter
resultados. Esta política pró-cíclica permitiu, ao contrário do que certa oposição gosta de propagandear, um
crescimento económico acima da média europeia e com um nível de emprego acima do período pré-pandemia.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Vai correr tudo bem!
O Sr. Hugo Costa (PS): — Sim, estes dados são factuais e não existe forma de os desmentir. Certamente,
são o reflexo do trabalho das empresas, dos trabalhadores portugueses e da sua resiliência, mas só a
desonestidade de uma certa forma de fazer política pode não reconhecer a importância das políticas públicas
para a resolução desta matéria.
Estamos perante um crescimento económico de convergência a nível europeu, mas igualmente com
respostas para combater as desigualdades. Crescemos mais e convergimos com a União Europeia. Mas
falamos igualmente de um crescimento que deve combater as desigualdades territoriais e convergir, também,
do ponto de vista social.
Naturalmente, vivemos uma realidade, no panorama internacional, com novos e importantes desafios. A
pressão inflacionista é uma realidade, mas, ainda ontem, o Governo anunciou, pela mão do Sr. Primeiro-Ministro,
um conjunto de medidas para a contenção dos preços.
O papel do setor empresarial, ao contrário do vaticinado, é crucial neste Programa do Governo, mas também
no Portugal 2030 e no Plano de Recuperação e Resiliência.
Por isso, questionava o Sr. Ministro da Economia e do Mar sobre a importância do investimento público na
resposta, do ponto de vista dos multiplicadores macroeconómicos, para termos crescimento económico, mas
também sobre a importância das empresas quer no Plano de Recuperação e Resiliência, quer no Portugal 2030,
quer na estratégia do Governo para o crescimento económico.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada do PAN, Inês de
Sousa Real.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Ministro da Economia e do Mar, se tivéssemos uma expressão que pudéssemos, de
alguma forma, associar ao Programa do Governo, ela seria «fia-te no PRR e não corras», porque, efetivamente,
parece que é aí que o Governo aposta todas as suas fichas, não obstante o passado já nos ter demonstrado
que Portugal tem sido um mau aluno no que diz respeito à execução dos fundos comunitários. Basta olharmos
para a execução do Portugal 2020 para perceber que ficaram por executar mais de 6000 milhões de euros e,
quando já estamos em tempo de execução do próprio PRR, executámos apenas 2%, ou seja, 359 milhões de
euros.
Por isso, a primeira pergunta que não posso deixar de lhe fazer é a de saber que medidas vai o Governo
promover para garantir uma adequada execução destes fundos comunitários e que a utilização de cada cêntimo,
que tanta falta faz ao nosso País, vai ser não só feita de forma transparente — e, para isso, o PAN já conseguiu
a introdução do Portal da Transparência no Orçamento do Estado —, mas também acompanhada pela
sociedade civil. É que vemos muito Governo e pouca sociedade civil no acompanhamento da execução desses
fundos. E pergunto, também, se concorda, ou não, com a proposta do PAN para a criação de uma assembleia
de cidadãos que possa acompanhar a execução dos mesmos.
Em relação, ainda, àquilo que o Sr. Ministro já referiu, nomeadamente quanto à redução dos impostos sobre
os produtos petrolíferos, mais uma vez, vemos Portugal em contraciclo com aquelas que têm sido as
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recomendações da própria ONU (Organização das Nações Unidas) e da comunidade científica. Estamos a sete
anos do ponto de não retorno e, Sr. Ministro, cada cêntimo deveria estar a ir para as famílias e para as empresas.
Continuar a dar a mão a quem mais polui, a quem mais lucra, claramente, não é uma política pública adequada
aos desafios do nosso tempo.
Como é que vamos garantir a transição verde das empresas? Como é que vamos garantir a autonomia
energética do nosso País, quando a guerra já nos demonstrou a importância de sermos soberanos e autónomos
nesta matéria? Como é que, do ponto de vista alimentar, vamos garantir também a nossa autonomia?
Há pouco, o Sr. Ministro disse que deveríamos ser competitivos e apostar naquilo que era, do ponto de vista
global, a nossa capacidade competitiva. Mas pergunto-lhe, Sr. Ministro, porque vamos ter, agora, a revisão da
nova diretiva do IVA, se está, ou não, o Governo disponível para aplicar um IVA zero em produtos essenciais,
como o pão, os cereais, os legumes, a fruta, todos aqueles que possam ser alimentos de origem 100% vegetal,
porque só assim é que poderemos, garantidamente, apostar na autonomia do nosso País em termos alimentares
e, também, no combate à crise das nossas vidas, que é o combate à crise climática e que não pode ser uma
mera miragem no horizonte.
Por fim, Sr. Ministro, herdou a tutela do mar. Foi com preocupação que verificámos que este ministério deixou
de ter a sua própria autonomia, mas pergunto-lhe o que vai fazer em relação à mineração em mar profundo.
Podemos ficar descansados, no sentido de que o mar vai ser preservado, com os seus habitats e os seus
ecossistemas, ou Portugal também vai destruir aquilo que é um património único e fundamental para o combate
às alterações climáticas, como tem feito no território nacional?!
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, do
Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, da leitura do Programa do Governo,
identificamos que este não dá a resposta necessária para apoiar as micro, pequenas e médias empresas
(MPME).
As micro, pequenas e médias empresas no nosso País estão numa situação de enorme fragilidade. Muitas
delas sofreram encerramentos, reduções de atividade compulsivas, aliás, não foram devidamente apoiadas na
sequência da epidemia da COVID-19. E, não fosse bastante o facto de ainda não terem recuperado a sua
atividade, acresce, agora, já um conjunto de novas dificuldades decorrentes dos impactos da situação
internacional.
Temos de ter presente que a nossa economia assenta, sobretudo, em micro, pequenas e médias empresas
e é importante que o Governo assuma compromissos concretos para apoiar o desenvolvimento desta atividade.
Ao contrário do que é sistematicamente repetido para tentar conter o aumento dos salários, designadamente
do salário mínimo nacional, não são os salários que mais pesam nos custos das MPME, mas, sim, outros custos,
como a energia, seguros, créditos, entre outros. Aliás, o aumento dos salários é decisivo para a dinamização da
atividade económica e tem um impacto positivo nas MPME.
Há muito que suscitamos a necessidade de o Governo intervir sobre os custos da energia, que, em
determinados setores, é o que mais pesa, de facto, nos custos das MPME, situação agora agravada com os
preços especulativos dos combustíveis, do gás e da eletricidade, e que poderá, inclusivamente, colocar em
causa a continuação da atividade de muitas destas empresas.
Ontem, o Governo fez um conjunto de anúncios, aqui, na Assembleia da República, mas o apoio às MPME
exige a regulação dos preços, sob pena de se continuarem a manter intocáveis os lucros das grandes
petrolíferas.
O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Nalguns setores, os custos da energia são, de facto, o principal problema;
noutros serão o aumento do preço de matérias-primas, ou mesmo a escassez dessas mesmas matérias-primas.
Importa, por isso, adotar soluções concretas de apoio às MPME, para evitar a redução da sua capacidade
produtiva.
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A questão que gostaria de lhe colocar é no sentido de saber se, de facto, o Governo admite, ou não, avançar
com o fundo de apoio à tesouraria das MPME, que permitiria dar esse apoio efetivo e assegurar a continuação
da atividade económica das MPME. Trata-se de uma medida concreta, exequível e que faria toda a diferença
para as micro, pequenas e médias empresas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira,
do PSD.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, demais
Membros do Governo, Sr. Ministro da Economia, ontem, com, pelo menos, um mês e meio de atraso, o Sr.
Primeiro-Ministro apresentou, oralmente, ao Parlamento uma adenda ao Programa do Governo para ajudar a
economia portuguesa a enfrentar a atual conjuntura.
Foi, Sr. Ministro, um anúncio interessante. Até ao dia de ontem, já todos sabíamos que o mundo mudara, já
todos sabíamos que tínhamos de mudar de vida, só o Governo queria ficar com a mesma vida que tínhamos até
30 de janeiro e, por isso, durante todo esse tempo, ignorou olimpicamente os efeitos da guerra.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — E o plano ontem anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro, nomeadamente
para responder ao choque energético, já poderia estar em prática há, pelo menos, duas semanas.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É verdade!
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Ministro, não sucedeu nada de novo, rigorosamente nada de novo,
esta semana, que não se conhecesse. Todos sabíamos, menos o Governo — e, pelos vistos, o Sr. Ministro da
Economia —, que há empresas a parar a produção por ser impossível produzir com os custos da energia que
estão em vigor.
Mas o plano anunciado ontem pelo Sr. Primeiro-Ministro não salva o Programa do Governo, pois este, Sr.
Ministro, não oferece medidas, mas apenas desejos ou, na sua própria expressão, sonhos: o sonho do maior
crescimento económico para Portugal, o sonho do aumento do poder de compra dos portugueses, o sonho da
maior produtividade, o sonho da maior competitividade da nossa economia. Depois, depois olha-se para o
Programa do Governo e faltam medidas concretas para materializar esses desejos, para materializar esses
sonhos.
Vamos a alguns exemplos. Na sua vida passada, o Sr. Ministro defendeu que era necessário ultrapassar o
obstáculo dramático que representava o baixo nível de capitalização das empresas, capitalização que não podia
ser feita através de dívida. Lemos o Programa do Governo e, Sr. Ministro, não encontramos medidas efetivas
nesse sentido. Na sua vida passada, o Sr. Ministro defendeu que era imperioso aproveitar toda a capacidade
instalada que temos na Península Ibérica para importar gás e melhorar as ligações energéticas com o resto da
Europa. Lemos o Programa do Governo e não encontramos mais do que a mesma mera proclamação. O Sr.
Ministro, há poucos meses, mostrou-se indignado, ou desagradado, com o facto de o Banco de Fomento não
estar em pleno funcionamento. Lemos o Programa do Governo, Sr. Ministro, e não encontramos sequer a
expressão «Banco de Fomento».
Ó Sr. Ministro, diga-nos: este é mesmo o seu Programa do Governo ou este Programa é nem mais nem
menos do que o espelho da sua afirmação, proferida em junho de 2020, de que integrar o Governo não fazia
parte do seu ADN (ácido desoxirribonucleico)?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Afonso, do partido
Chega.
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O Sr. Rui Afonso (CH): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro e restantes
Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro da Economia, o que me traz aqui é a gestão
económica e financeira das instituições do Estado.
A taxa de desperdício que existe nas instituições é brutal. Vou dar-lhe o exemplo do que acontece com o
Ministério da Saúde. Num passado recente, um ex-Ministro da Saúde afirmava que 10% das verbas da saúde
não chegavam a ser utilizadas na melhoria do SNS (Serviço Nacional de Saúde), ou seja, 1000 milhões de
euros, transferidos diretamente do Orçamento do Estado, são perdidos todos os anos devido ao desperdício ou
à fraude.
Aplausos do CH.
Trata-se de dinheiro que, se fosse recuperado, permitiria investir em vários projetos alternativos, como, por
exemplo, na melhoria da qualidade dos cuidados de saúde e do tempo de resposta do SNS aos cidadãos ou até
no aumento do nível de produtividade e de satisfação dos profissionais do Serviço Nacional de Saúde.
Vozes do CH: — Muito bem!
O Sr. Rui Afonso (CH): — Sr. Ministro, pelo exposto, e considerando a atual situação do País, a miséria em
que nos encontramos, pergunto: quais as medidas concretas que V. Ex.ª irá tomar, conjuntamente com os seus
colegas do Governo, para pôr cobro, de uma vez por todas, a esta situação, pugnando por uma gestão eficiente
dos recursos do Estado?
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e do Mar.
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Sr. Presidente, tentarei, de forma concisa, responder às várias
questões que o Sr. Deputado Jorge Mendes colocou, sobretudo a questão do Simplex na gestão dos fundos
europeus e a questão do turismo, do comércio e serviços.
Vamos ter um programa de apoio ao turismo, e o Banco de Fomento está a pensar numa linha específica
para esse apoio. O turismo é um dos grandes setores da nossa atividade, que representava, antes da pandemia,
13% do PIB, e é fundamental. Portanto, também há um plano em aplicação, a Estratégia Turismo 2027, para
reinventar o setor do turismo, dar-lhe abertura para múltiplas áreas, cobrir o território nacional com o turismo da
natureza, o turismo oceânico, o turismo do património, o turismo cultural. Penso que há um longo caminho a
percorrer e é um setor que tem de ser apoiado.
Em relação ao comércio e serviços, cerca de 50% do volume de negócios que se faz no País depende deste
setor. É um setor absolutamente vital, portanto o que vamos criar é uma agenda para a competitividade do setor
do comércio e serviços, trabalhando com as associações empresariais. Estamos aqui para ajudar, para facilitar
e para proporcionar o desenvolvimento destes setores para o futuro.
Quanto à questão de ser refém, Sr. Deputado, eu sou um homem livre, só sou refém de mim próprio.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Pertenço a um Governo que, como diz o Sr. Primeiro-Ministro, é
uma task force, é uma equipa coesa e, portanto, as alçadas aqui pesam pouco. O trabalho em conjunto, as
interações e o ataque aos problemas do País é o que nos move.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Hugo Costa, penso que as suas questões são muito importantes em termos do investimento
público e do papel das empresas no PRR.
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Em relação ao PRR, há, como referia, o plano das Agendas Mobilizadoras e dos Pactos de Inovação. Vamos
receber na próxima semana, dia 13 de abril, as candidaturas das empresas e vamos mover-nos rapidamente
para apreciar essas candidaturas. Temos de ter uma visão estratégica para o desenvolvimento da economia do
País e, portanto, temos de apostar naqueles setores, quer os tradicionais, que estão a reconfigurar-se e a tornar-
se cada vez mais competitivos, quer os setores do futuro. O plano de investimento público aqui é decisivo, mas
a minha visão sobre o investimento público teve sempre associada uma análise custo-benefício.
Também não nos podemos esquecer de que temos de fazer investimentos em áreas cruciais. A nossa
preocupação são sempre as pessoas e as empresas e, portanto, o investimento no SNS, na habitação, nas
políticas sociais, na proteção dos mais vulneráveis é absolutamente decisivo, combinado com um maior
dinamismo das empresas no tecido produtivo nacional.
Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, colocou aqui questões muito interessantes sobre a execução do PRR e
dos fundos europeus. É uma preocupação que partilhamos. Como disse, vamos tentar aumentar a qualidade da
execução, articular o PRR não só com o que falta do PT 2020, mas também com o PT 2030. Todas as
contribuições serão bem-vindas. Como disse, nós não sabemos tudo, ninguém sabe tudo e a contribuição é
extremamente importante.
Sr.ª Deputada, quanto à questão do ISP e de estarmos a premiar aqueles que poluem, é verdade no contexto
atual, mas, se não fizermos isso, vamos ter o colapso de setores inteiros da economia nacional, e não queremos
isso. Ao mesmo tempo que isso se faz, no nosso Programa, como vai ficar patente hoje, há toda uma área que
promove e acelera a transição energética. Pela primeira vez na história, Portugal pode estar do lado certo da
transição energética. As energias renováveis vão ser cruciais no futuro e o nosso potencial nas energias eólicas,
onshore e offshore, e nas energias oceânicas é imenso. Essa transição vai fazer-se, vai ser propulsionada e,
portanto, temos de olhar para o futuro.
Mas há um elemento que responde parcialmente à preocupação da Sr.ª Deputada e que está patente em
todas as crises energéticas: quando os preços da energia aumentam da forma como estão a aumentar, eles
próprios são inibidores do consumo. Temos, pois, este elemento que existe no terreno e que, conjugado com os
outros, vai fazer caminho para o futuro.
Relativamente ao mar, que, penso, é o maior ativo que temos, a minha grande preocupação é a de não
podermos fazer nada no mar sem o conhecer. É por isso que defendo a universidade do atlântico, nos Açores
e na Madeira, ligada à investigação oceanográfica e climatológica. Há um projeto muito interessante da Marinha
Portuguesa para mapear os fundos oceânicos, e temos de coligar esse projeto com a análise e identificação de
todos os ecossistemas marinhos. Temos ainda de ter uma lei que proteja todos os ecossistemas marinhos. Só
podemos ter economia do mar se o oceano for saudável.
Aplausos do PS.
Queria dizer-lhe também que o mar, a meu ver, vai proporcionar os grandes centros de criação de riqueza
no futuro, desde logo com as biotecnologias marinhas, trabalhando com os biomas oceânicos, com as algas, as
macroalgas e as microalgas. Porquê? Porque temos de substituir os plásticos, temos de substituir os fertilizantes
químicos por produtos biológicos, e são eles próprios degradáveis, que vão transformar a economia e assegurar
a sustentabilidade para o futuro.
Em relação à pergunta que foi colocada pela Sr.ª Deputada do PCP Paula Santos, sobre as PME, é verdade,
Sr.ª Deputada, temos uma preocupação com a saúde delas. Há um programa que está em execução, através
do IAPMEI (Agência para a Competitividade e Inovação), com um rendimento mínimo para as PME. São cerca
de 85 milhões de euros que estão em execução. É evidente que estamos a olhar com preocupação para o
aumento da execução e desses apoios às PME, mas queria ver se conseguíamos ligar isto, no âmbito dos
programas do Banco de Fomento, com o incentivo à agregação das PME, à sua associação, premiando as joint-
ventures que possam criar-se.
Um dos problemas que temos na economia portuguesa é a falta de escala. Quando olhamos para a
competição a nível global, se tivermos mais escala nas nossas empresas, mais cooperação, mais associações
empresariais que fomentem essa cooperação — como foi o extraordinário exemplo do calçado, dos têxteis e de
outros —, podemos competir de uma forma diferente no mercado global.
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Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, mencionou diferentes aspetos e, sobretudo, afirmações minhas do
passado. Essas afirmações mantenho-as integralmente, é a minha leitura da realidade.
Sobre o Banco de Fomento, é uma grande preocupação e estou a estudar com muita atenção esse dossiê.
O Banco de Fomento está operacional, está agora no terreno, mas precisamos de dotá-lo, talvez, de mais
recursos humanos, precisamos de dotá-lo de um chairman que tenha visão estratégica, ligação ao mundo
empresarial e que, trabalhando com a equipa de gestão atual, possa ampliar a intervenção desse Banco.
O Banco de Fomento tem instrumentos de capital e de quase capital, como os empréstimos participativos,
que podem ser um elemento fulcral para ajudar à capitalização das empresas portuguesas, que é, sem dúvida,
um problema decisivo. Mas, para ajudarmos à capitalização das empresas, precisamos também de mudar o
paradigma mental que existe no País, com o recurso excessivo ao endividamento através do crédito bancário.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Concordo inteiramente!
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Portanto, o reforço dos capitais próprios, através de todos os
instrumentos que conseguirmos coligar e pôr no terreno, vai ser, sem dúvida, uma questão fulcral do futuro.
Sobre a questão dos sonhos, Sr. Deputado, não é mau sonharmos. Tudo começa num sonho. Se olhar para
as grandes invenções da história da humanidade, todas elas partiram de uma ideia na cabeça de uma pessoa.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Muito bem! É assim mesmo!
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, tem de concluir, se faz favor.
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — Sr. Presidente, só tenho mais uma questão para responder, que,
creio, é do Deputado Rui Afonso, do Chega, que exprimiu aqui a sua grande preocupação com a eficiência do
funcionamento da máquina do Estado. É um problema para o qual temos de olhar, temos de aumentar a
eficiência. Penso que isso vai ser feito, portanto, temos de ter foco também nessa dimensão.
O Sr. André Ventura (CH): — Não é pensar, é fazer!
O Sr. Ministro da Economia e do Mar: — A utilização dos fundos públicos é, evidentemente, vital. Se olhar
para o PRR, ele tem hoje um portal da transparência, onde tudo é reportado, para onde é que vai o dinheiro,
como é que vai e, portanto, os cidadãos podem fiscalizar. Do que precisamos é de trabalhar ao nível da
administração e também da interação com os cidadãos, para assegurar a melhor execução de todos estes
programas e a aplicação certa dos fundos públicos, sem desperdício. Mas, como sabe, o mundo não é perfeito,
e cabe-nos a nós torná-lo menos imperfeito.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Continuando com as intervenções, pela ordem de inscrição, tem agora a palavra o Sr.
Deputado Pedro Filipe Soares, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as
e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Desde o dia das eleições legislativas até hoje, passaram
mais de dois meses, pouco mais, e o mundo mudou. A expressão não é minha, é da Sr.ª Ministra Ana Catarina
Mendes. Mas, se o mundo mudou, a primeira conclusão que podemos retirar é a de que o Programa do Governo
não. E, desse ponto de vista, aquilo que era óbvio há uma semana — tínhamos um Programa do Governo
desajustado da realidade atual — foi ainda mais óbvio no dia de ontem, quando o Sr. Primeiro-Ministro exprimiu,
logo na intervenção inicial do Governo, que pretendia trazer uma adenda, um anexo a esse Programa do
Governo. Na prática, reconheceu o óbvio: o Programa do Governo já estava ultrapassado pela realidade e era
preciso fazer algo mais.
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Olhando para aquilo que foi dito ontem, para o documento que estávamos a analisar, lembrei-me logo de Sá-
Carneiro — não se enganem, o poeta! —, porque tem um poema que diz o seguinte: «Um pouco mais de Sol —
eu era brasa, / Um pouco mais de azul — eu era além. / Para atingir, faltou-me um golpe de asa…».
É isso que falta ao Governo. Tem quase, quase a ideia para apresentar soluções, mas, num momento tão
difícil como este que o País enfrenta, se não há soluções em cima da mesa por parte do Governo, só temos,
então, problemas. E esses problemas chegam logo, logo, logo com o recibo de vencimento: muito cedo, muito
curto para o mês e para os preços. Em relação à inflação, que é galopante, o Governo diz timidamente que vai
tentar fazer alguma coisa. Mas onde? Nos salários, para garantir que as pessoas têm algum poder de compra?
Não. Vai tentar mexer alguma coisa nos preços — alguma coisa, mas muito pouco. Falta o tal «golpe de asa»
de que o País precisa.
Olhamos para os lucros da EDP — 750 milhões de euros —, para os lucros da Galp — 565 milhões de euros
—, para o que o Pingo Doce vai distribuir aos seus acionistas — 490 milhões de euros — e percebemos que o
Governo, por não mexer ali, por não querer atacar onde o dinheiro realmente está, salva os milhões de alguns,
enquanto o resto do País continua a contar os tostões. É incompreensível, é inaceitável. É uma realidade que
demonstra, até, alguma insensibilidade social. É certo que não é a tal «pressinha» de que ontem o PSD falava,
mas é o mesmo desrespeito perante o salário e perante a inflação que o ameaça.
À pergunta óbvia que ontem foi colocada ao Governo — quando os preços sobem à mesma medida que
sobem os lucros dos grandes grupos económicos, quando sobem à mesma medida que a dificuldade do salário
aumenta, o que é que o Governo vai fazer? —, houve um silêncio enorme, até há pouco. Há minutos, o Sr.
Ministro da Economia disse que talvez, em acordo com as empresas, o Governo possa levantar uma windfall
tax. Traduzido por miúdos, seria uma taxa sobre os lucros abusivos das empresas.
Risos de Deputados do CH.
Ora, é bom começarmos, então, a discutir a sério, dado que, de anexo em anexo, vamos conhecendo, de
facto, alguma coisa que se veja do Programa do Governo. E este anexo é, de facto, muito mais interessante do
que o documento original que o Governo nos trouxe.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Qual taxa? Para que setores? Em que dimensão? Qual a duração? É
que estas são as perguntas essenciais cujas respostas as pessoas precisam de saber. Como é que o Governo
vai agir para que o seu salário dure mais? Sabemos que há um dogma: o Governo não quer mexer nos salários.
Um erro! Um erro brutal. Um erro que custa, no final do mês, a toda a gente e que custa ainda mais quando
sabemos que o aumento das taxas de juro vai levar ao aumento de uma das principais despesas das famílias,
que é o custo do crédito à habitação. Por isso, se o Governo não mexe nos salários, está a deixar as pessoas
ainda mais frágeis nesta disputa económica.
Mas vai mexer nas empresas? Como, quando e onde? Sr. Ministro, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do
Governo, temos até ao final deste debate para saber como, quando e onde. É para levar a sério a promessa do
Governo? Reconhece o Governo, afinal, que há lucros excessivos nos 750 milhões da EDP, nos 565 milhões
da Galp, nos 490 milhões do Pingo Doce? Reconhece, por exemplo, que há cartel nos hipermercados em
Portugal e que as pessoas estão a ser roubadas, quando vão ao hipermercado, por causa desse cartel?
Sabemos que a direita, sobre isto, nada diz: lava as mãos e diz que é a concorrência. E, se a concorrência
assalta as pessoas a cada ida ao supermercado, que se lixe, é a concorrência.
Aplausos do BE.
Sabemos que é a concorrência — que eles aceitam — que leva à cartelização dos preços dos combustíveis,
mas, se isto assalta as pessoas a cada ida à bomba de gasolina, bem, é a concorrência. É isto que diz a direita.
Protestos do Deputado do CH Pedro Pinto.
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Sabemos que a concorrência para eles é mais relevante do que os salários das pessoas. Mas e quanto ao
Governo? Esta imoralidade, este ataque aos salários, vai merecer alguma resposta? Creio que este é o debate
que devemos ter até ao final deste Programa do Governo.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado tem um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Luís Soares, do
Partido Socialista, a quem dou a palavra.
O Sr. Luís Soares (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.
Deputados, Sr. Deputado do Bloco de Esquerda,…
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Filipe Soares!
O Sr. Luís Soares (PS): — … creio que não há como negar que a realidade do dia de hoje mudou face
àquela que tínhamos há um ano. Creio que seria até intelectualmente desonesto não admitir que ela mudou.
Mas também será intelectualmente desonesto não admitir que o Sr. Primeiro-Ministro, quando, ontem, trouxe
um conjunto de medidas para combater a tensão inflacionista que vivemos, o fez reconhecendo que a realidade
mudou.
Mas, Sr. Deputado, queria dizer-lhe que aquilo que discutimos hoje, nesta Câmara, é o Programa do Governo
para quatro anos. É verdade que o momento que hoje vivemos condicionará aquilo que acontecerá nos próximos
quatro anos, mas aquilo que estamos a discutir é um Programa para quatro anos e meio. Que diria a oposição
ao Governo do Partido Socialista se hoje aqui viéssemos discutir apenas aquilo que pensamos para este
momento de emergência mundial? Sim, para este momento de emergência mundial.
Aliás, se há boa característica do Governo do Partido Socialista nestes últimos seis anos, acompanhado em
alguns momentos pelo Bloco de Esquerda, é a capacidade de, em cada momento, olhar para a árvore, mas
também para a floresta.
Aplausos do PS.
Por isso, Sr. Deputado, é que, quando vivíamos um momento de crise e de necessidade de estabilização
orçamental do País, de necessidade de estabilização do sistema bancário, o Partido Socialista nunca deixou de
olhar para a grande floresta que era a necessidade de recuperar rendimentos, de apostar na coesão social do
País, de fazer avançar, de fazer crescer o País, de fazer crescer Portugal.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Tanto cliché!
O Sr. Luís Soares (PS): — É isso que estamos aqui a fazer hoje, Sr. Deputado: a apresentar propostas que
permitam dar uma resposta às necessidades efetivas do País em face desta crise mundial, mas também a olhar
para a grande floresta, para as grandes necessidades do País, a fazer com que o País continue a crescer, a
recuperar rendimentos e a fazer avançar Portugal.
Queria deixar-lhe uma pergunta para terminar. Sr.as e Srs. Deputados, no grande momento de emergência
que o País viveu em 2020 e 2021, com a grande pandemia mundial, a grande pandemia e os seus efeitos
também aqui, na economia portuguesa, os portugueses souberam que não podiam contar com o Bloco de
Esquerda. Afastaram-se, deixaram os portugueses e o País perante a necessidade de lutar contra uma das
maiores pandemias.
Aplausos do PS.
Vozes do BE: — Oh!
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O Sr. Luís Soares (PS): — Volvidas umas eleições, depois de os portugueses terem dito que queriam uma
grande maioria estável, eu pergunto: o Bloco de Esquerda está disponível para agora, novamente, continuar a
construir uma solução, para fazer avançar o País com o Partido Socialista? É esta a pergunta que deixo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Soares, na batida expressão da árvore
e da floresta, devo dizer que a árvore, nesta imagem, é o salário mínimo nacional, que, pela primeira vez em
vários anos, cresce abaixo daquilo que seria necessário para cobrir a inflação. Por isso, este é um aumento que
significa perda de poder de compra.
Mas a floresta é que a larguíssima maioria de todos os outros salários cresce muitíssimo menos do que seria
necessário para cobrir a inflação. Sobre este problema da árvore e da floresta, a única coisa que o Sr. Primeiro-
Ministro ontem disse foi que não podemos tocar nos salários, porque isso aumentará a inflação. É um erro. É
um erro porque, a cada mês que passa, os salários perdem valor.
O Sr. Primeiro-Ministro disse ainda que isto é temporário, mas o Sr. Ministro da Economia disse agora que,
se calhar, esta crise da energia é igual àquela dos anos 70, que esteve longe de ser temporária. Por isso, a
pergunta que lhe coloco é esta: qual é a base do «aguenta-aguenta» do Governo? O povo «aguenta-aguenta»
uma inflação durante dois meses, três meses, quatro meses, um ano, de 5%, 6%, 7%… «Aguenta-aguenta» até
quando?
É que o imobilismo do Partido Socialista deixa marcas permanentes na perda de poder de compra das
famílias e, desse ponto de vista, não ouvi nem uma palavra do Sr. Deputado. Mas agora deixei um repto e o Sr.
Deputado, sendo apoiante do partido do Governo, deveria também ter respondido a esse repto.
Reconhece que há, de facto, lucros abusivos na sociedade, setores económicos que estão protegidos pela
ação governativa e, muitas vezes, pela ação da lei? Esses lucros abusivos vão ter uma ação por parte do
Governo, por parte do Partido Socialista? Vai aceitar, por exemplo, taxar os lucros abusivos da Galp, da EDP —
para citar o setor da energia —, do Pingo Doce ou do Continente — para citar o setor dos hipermercados — ou
vai aceitar que estes setores vivam sempre em cima dos sacrifícios do País? É que gostava de ter ouvido, e não
ouvi, da parte do Partido Socialista, a resposta a esta pergunta. Da parte do Governo, ouvimos um grande «nim».
Esperemos que, até ao final deste debate do Programa do Governo, exista alguma resposta. De outra forma,
calar, Sr. Deputado, é consentir com o grande roubo que estes grandes grupos estão a fazer ao País, e isso nós
não consentimos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra, em nome do Partido Socialista, a Sr.ª Deputada
Maria Antónia de Almeida Santos.
A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, as minhas primeiras palavras são para si:
desejo-lhe o maior êxito nas funções que iniciou há pouco tempo, porque sabemos que o seu êxito será também
o êxito de todos os Deputados.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Iniciar um novo ciclo
governativo desta forma, presencial, é, desde já, um motivo de alegria e um bom indicador da evolução que
estamos a viver. Acresce que Portugal tem hoje uma maioria capaz de gerar uma verdadeira estabilidade
política, tem também um Governo credível e competente e precisa de uma governação séria e responsável. É
isso que esperamos e estamos confiantes.
Por feliz coincidência, assinalou-se ontem o Dia Mundial da Saúde. Quando pensamos no valor da saúde
enquanto bem inestimável, pensamos também em todos aqueles que, diariamente, lutam para alcançar uma
melhor condição de saúde e uma vida com maior qualidade, longevidade e livre de doença. Pensamos nos
profissionais de saúde pela sua dedicação e pelo seu compromisso. Pensamos em todas as pessoas que sofrem
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por uma condição que lhes foi imposta sem qualquer aviso prévio. Vivemos num mundo de incertezas e por isso
é tão necessário antecipar cenários e programar o futuro.
O Programa do Governo, que hoje discutimos, é o reflexo de um longo trabalho de quem está centrado na
resolução dos problemas de Portugal e dos portugueses. Temos um Governo consciente do muito que há a
fazer no setor da saúde e que tem uma estratégia e um projeto ambiciosos, sempre com as pessoas no centro
da decisão.
Pretende fortalecer o Serviço Nacional de Saúde, com uma forte aposta na promoção da saúde, desde logo
com a saúde em todas as políticas, com intervenções transversais orientadas para a melhoria dos determinantes
sociais da saúde. A emergência em saúde pública ganhou uma nova importância e aprendemos todos com a
pandemia que ainda vivemos. Precisamos de continuar a construir um Serviço Nacional de Saúde capaz de
cumprir a sua missão de proteger, promover a saúde e prevenir a doença de todos, desde que nascem até ao
final das suas vidas.
Aplausos do PS.
As prioridades estão claramente definidas. É necessário recuperar a atividade assistencial do Serviço
Nacional de Saúde para dar resposta aos doentes não-COVID e acompanhar os doentes pós-COVID. É
necessário melhorar o acesso aos cuidados de saúde e aumentar o número de médicos de família, melhorando
as condições de atratividade da carreira, sobretudo em algumas regiões mais carenciadas. Na realidade, apesar
de o número de médicos de família e de enfermeiros ter aumentado face à aposentação de muitos, o aumento
do número de inscritos no Serviço Nacional de Saúde, principalmente desde o início da pandemia, porventura
por força da vacinação, não permitiu cumprir a meta que tínhamos definido. É necessário generalizar o modelo
das unidades de saúde familiar, garantindo que cobrem 80% da população nesta Legislatura. É necessário
garantir 30 novas unidades móveis de saúde nas regiões do interior e de baixa densidade. É necessário
aproximar o Serviço Nacional de Saúde dos cidadãos. É necessário melhorar a resposta às necessidades da
população, alargando-a, atuando entre os diferentes níveis de cuidados. E é necessário fazer parcerias dentro
do sistema sempre que possível, aproveitando a capacidade instalada, porque, Sr.as e Srs. Deputados, como é
evidente, não há aqui lugar a preconceito, mas a opções políticas.
Aplausos do PS.
São várias as prioridades. Destaquei as que considero prementes. Se as dificuldades dos últimos dois anos
nos fizeram perceber o papel central do Serviço Nacional de Saúde no combate à pandemia, elas revelaram
também novas e insuspeitas capacidades do SNS para se renovar, reorganizar, mobilizar as capacidades
técnicas e a inexcedível dedicação dos seus profissionais. Essa é a base para que o direito fundamental à saúde,
que a Constituição consagra e os portugueses exigem, se aperfeiçoe.
Queremos melhor Serviço Nacional de Saúde, mais igualdade no acesso à saúde, melhor qualidade de vida
para os portugueses. É para isso que o Programa do Governo aponta. Temos um Governo inclusivo e que não
deixará ninguém para trás.
Nós cá estaremos para ajudar, fiscalizar, fazer as leis de que Portugal precisa, e o povo português saberá
escrutinar-nos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Não se regista nenhum pedido de esclarecimento, de modo que dou a palavra, para
uma intervenção, ao Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Caros Colegas: Queria começar por
lembrar que hoje estamos no Dia Internacional das Pessoas Ciganas, sendo essa a comunidade étnica
minoritária mais longeva do nosso País. Vi, nos arquivos históricos deste País, as leis que os impediam de ficar
mais do que três dias em cada cidade, e lembro-as numa altura em que neste Parlamento se sentam os herdeiros
dessa exclusão e desse preconceito. São de saudar as medidas de inclusão social do Programa do Governo e
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todos nós nos devemos envolver em incluir todas as pessoas que fazem parte da nossa comunidade nacional,
a começar pelos nossos concidadãos ciganos.
Aplausos de Deputados do PS.
Poderíamos ter tido este debate que aqui tivemos durante 300 anos. Ele tem termos muito simples: mão de
obra barata ou alto valor acrescentado? Por extraordinário que nos possa parecer, sistematicamente,
secularmente, a escolha foi feita: mão de obra barata, porque, durante muito tempo, era mais fácil, porque era
mais competitivo, porque criava uma riqueza ilusória — como sucedeu com a mão de obra mais barata que
houve, a da escravatura, que sustentou o modelo económico do ciclo imperial neste País. A mão de obra barata
permitia comprar os produtos que, esses sim, tinham verdadeiro valor acrescentado e incorporação de
complexidade, de tecnologia, de estudo e de conhecimento que outros produziam.
Mas, por incrível que pareça, esse modelo ainda há pouco tempo era o modelo discutido no nosso País,
quando ouvíamos dizer que o importante — o que era mesmo importante — era baixar os custos unitários do
trabalho. E temos ainda aqui, no Hemiciclo, três partidos que, de uma forma ou de outra, são herdeiros, até
órfãos, de Passos Coelho, que propunha essa via.
A nossa via alternativa é muito simples: menos Passos Coelho, mais Passos Manuel. O primeiro Governo
que houve de esquerdas plurais e convergentes neste País foi o que fez um investimento nos liceus, nos
conservatórios, nas bibliotecas. Governou só nove meses, mas muitas destas instituições são as que usamos
hoje.
Por isso, a valorização do capital humano é a mais importante das infraestruturas que podemos deixar para
o nosso País. E aí há perguntas que temos a fazer. Está o Sr. Ministro da Economia disposto a investir, como
em Espanha, num projeto para que as empresas possam experimentar a semana de quatro dias e é possível
que esse projeto possa ser avaliado? Está o Sr. Ministro da Educação disponível para estudar a transição do
12.º ano para um ano zero universitário para universalizar a universidade no nosso País? Estamos dispostos a
fazer alguma coisa para que os 80% de empregos novos que são criados — que são quase todos a recibos
verdes — não tenham de passar o tempo todo sendo os seus próprios contabilistas, juristas e cobradores e
possam partilhar esforços e custos e assim valorizar o seu trabalho? Essas são as perguntas do futuro.
E, quando o Sr. Ministro da Economia nos diz que a primeira coisa que quer fazer com o mar é conhecê-lo,
então, Sr. Ministro, mais uma razão para o mar estar no Ministério do Ambiente, porque uma coisa é conhecer
o fundo do mar para o estudar, outra coisa é conhecê-lo para extrair manganês. Ou seja, para voltar ao
extrativismo, que foi precisamente um dos problemas do nosso modelo económico. Há futuro no mar, sim, e não
o negamos. Mas não vamos repetir os mesmos erros que repetimos em terra e, por isso, o mar deveria estar no
Ministério do Ambiente.
Não queria terminar, Caros Colegas, sem mencionar uma coisa que me surpreendeu ontem. Ontem falou-
se, uma dúzia de vezes, em Europa — contei-as praticamente todas —, 10 das quais para mencionar que o Sr.
Primeiro-Ministro se calhar iria para um cargo em Bruxelas e as outras 2 para falar de dinheiros da Europa. Não
quero chocar ninguém, mas pode-se falar da Europa sem falar de cargos e de dinheiro. Pode-se falar da Europa
falando de valores e de direitos fundamentais. Pode-se até fazer História da Europa nas quatro paredes deste
Parlamento. E, se não acreditam, vamos fazer a prova.
Sr. Primeiro-Ministro, esta semana, o seu homólogo húngaro, Viktor Orbán, declarou que estava disposto a
comprar gás em rublos russos e que estava disposto a vetar medidas de sanções em gás e em petróleo à
Rússia. A isto chama-se minar a União Europeia por dentro. Já sabemos — temos essa diferença — que o Sr.
Primeiro-Ministro não é a favor de usar medidas orçamentais para punir os desvios de Estado de direito na
Hungria. Mas, então, eu não quero convencê-lo da minha posição, quero convencê-lo da sua: está disposto,
finalmente, a fazer qualquer coisa, no Conselho Europeu? A usar o artigo 7.º e a iniciar o procedimento que, no
Conselho Europeu, pode acabar com a suspensão do voto da Hungria? Se nos disser aqui que sim, isso fará
história na Europa. Sairá das paredes deste Parlamento e será assunto em todo o mundo. Se nos disser que
não, isso quer dizer que o Conselho Europeu continua a não estar disposto a fazer sequer o sacrifício de
confrontar os seus para ajudar aqueles que agora, na Ucrânia, sofrem com a invasão da Rússia.
A bola está do seu lado. A escolha é sua.
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O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Rui Tavares tem um pedido de esclarecimento do Partido Socialista,
que, estou certo, dará 1 minuto do seu tempo para que possa responder.
Tem então a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Rosário Gambôa.
A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Cumprimento o Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro, os Srs. Membros
do Governo, as Sr.as e os Srs. Deputados. Referindo-me a si, Sr. Deputado Rui Tavares, é com muito gosto que
o ouvimos e tenho de lhe dizer que, de facto, partilhamos vários problemas e também partilhamos várias causas.
E, seguramente, a causa contra a xenofobia, a causa da Europa, a causa dos salários, da sustentabilidade, que
trouxe aqui hoje, são causas que nós seguimos, às quais aderimos e sobre as quais temos perspetivas.
Obviamente que, dentro das nossas salutares diferenças, nem sempre partilhamos as soluções, mas, acima
de tudo, importa referir que, sim, partilhamos uma coisa muito importante para a democracia: partilhamos os
processos, mas os métodos nunca são neutros, em nenhuma situação, e muito menos em democracia. E essa
é uma referência importante.
Sr. Deputado, ontem tivemos aqui uma intervenção fantástica do nosso Deputado Luís Capoulas Santos, que
nos falou da Europa. Falou da Europa dos valores, da Europa do Estado de direito. E a Europa do Estado de
direito não é exclusivamente a Europa dos cargos e dos fundos comunitários.
Aplausos do PS.
O Livre tem uma expressão que acho muito interessante, que é a questão da armadilha dos baixos salários.
Gostava de lhe dizer que não há aqui, da parte do Partido Socialista, nada que se oponha à subida dos salários
— pelo contrário, há propostas, em relação à anterior Legislatura, de subida do salário mínimo e também do
salário médio — e só é possível fazê-lo através de um conjunto de políticas transversais e setoriais, as quais
têm feito parte do percurso do Partido Socialista. Não é possível de outra forma.
Mas também gostava de lhe dizer que isto se faz no contexto de uma economia do conhecimento. O Livre,
cujo programa conheço bem, tem grandes considerações acerca da economia do conhecimento. Nós também,
e já antes disso. E, como o Sr. Ministro da Economia e do Mar acabou de dizer, na nossa perspetiva da economia
do conhecimento, não se trata meramente de instrumentalizar, no sentido estrito do termo. Trata-se de valorizar
recursos, trata-se de fazer com que o conhecimento esteja ao serviço de uma economia muito mais competitiva,
de valor acrescentado, que gera emprego, que gera sustentabilidade social, que gera sustentabilidade para as
famílias, que gera sustentabilidade para a população mais jovem. E esta, Sr. Deputado, é há muito tempo uma
perspetiva do Partido Socialista que agora é reforçada neste Programa, que hoje está em discussão.
Por isso, gostava, na pergunta que lhe vou dirigir, de chamar a sua atenção para uma coisa que hoje alguém
disse. De facto, há aqui uma metáfora que pode já estar um pouco cansada, mas é pertinente: não basta olhar
a árvore, é preciso olhar a floresta. E eu penso que, muitas vezes, dentro das perspetivas do Livre, há uma
leitura apressada, como se o crescimento se pudesse fazer por saltos disruptivos. No Partido Socialista,
entendemos, contrariamente, que as boas políticas, quando são sustentáveis, não são impostas de cima para
baixo. São políticas que, para serem sustentadas, são construídas em concertação, em participação, e esse é
o verdadeiro sentido da democracia.
Entendemos — e pergunto se está disponível para nos ajustarmos ao tempo presente, mas sem perder o
rumo, como ainda ontem aqui foi dito — que é necessário ter uma sustentabilidade forte, contínua, de diálogo
com os parceiros sociais, na construção de políticas, sejam elas de ambiente, sejam elas de salários, sejam elas
de educação, porque esse é o nosso modo de estar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Rui Tavares tem longos 72 segundos para responder.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, uso apenas os 12 segundos que o Livre conquistou sozinho, não
precisando de depender de mais ninguém.
Sr.ª Deputada, estamos juntos em causas comuns, mas é o seu partido que está no Governo e que precisa
de ser consequente, pedindo ao Sr. Primeiro-Ministro para usar o artigo 7.º no Conselho Europeu em relação
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ao Governo da Hungria ou o artigo 158.º no Tribunal de Justiça da União Europeia também em relação ao
mesmo Governo. Juntem as palavras aos atos.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado, com um cumprimento pela concisão.
Tem agora a palavra, em nome do Governo, para uma intervenção, o Sr. Ministro do Ambiente e da Energia,
Duarte Cordeiro.
O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática (Duarte Cordeiro): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados: Enfrentar as alterações climáticas e garantir uma transição justa é um dos desafios estratégicos do
Programa do Governo. Estes objetivos tiveram especial relevância na última Legislatura e agora teremos de
lhes dar continuidade, com energia reforçada, sabendo que os próximos anos serão decisivos em face da
emergência climática.
Propunha-se o Governo, em 2019, a fechar as centrais a carvão até 2023. Essa meta foi antecipada em dois
anos. Fomos o quarto país da Europa a fazê-lo, mas o segundo que não produz eletricidade a partir do nuclear
a consegui-lo.
Comprometeu-se o Governo a aumentar a quota de renováveis na produção de eletricidade para os 80% até
2030. Com os projetos de produção renovável neste momento em cima da mesa, acreditamos que esse objetivo
será atingido em 2026, antecipando em quatro anos a nossa meta.
Assumiram os Governos socialistas liderados pelo Primeiro-Ministro António Costa que aumentariam a oferta
e sustentariam a procura de transportes coletivos, uma parte dos quais a direita que nos antecedeu quis
privatizar. Pois, entre 2015 e 2019, a utilização de transportes coletivos aumentou em 23%.
Foi assumida a prioridade de transformar a paisagem e os espaços rurais, para termos uma floresta mais
resiliente. Dos 20 programas de reordenamento e gestão da paisagem considerados necessários para operar
essa transformação, estão em curso 12 e, embora tivesse sido planeada a constituição de 60 áreas integradas
de gestão da paisagem, foram aprovadas 70 ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência.
Dito isto, Sr.as e Srs. Deputados, há caminho feito na anterior Legislatura com metas cumpridas e superadas,
que permitiram antecipar benefícios ambientais e económicos para os portugueses.
É, pois, com convicção que afirmo os nossos empenho e dedicação reforçados para enfrentar os desafios
que teremos nesta Legislatura.
No topo das nossas prioridades encontra-se a resposta à crise energética. Não queremos uma resposta
qualquer, mas uma que acautele os limites do nosso sistema natural. Por isso, não pretendemos reativar as
centrais a carvão, que tantos, tantas vezes, insistem que consideremos.
Aplausos do PS.
Esses, os defensores de uma economia dependente e de uma descarbonização adiada, nem pensam no
preço absurdo que a eletricidade atingiria tendo em conta os seus custos de produção e também não consideram
a falta de segurança que representaria a dependência de um mercado, o do carvão, dominado pela Rússia.
A nossa resposta à crise energética assume, por isso, outros contornos: primeiro, negociar mecanismos que
nos permitam desligar o preço da eletricidade do preço do gás natural; segundo, acelerar, sem diminuir os
controlos ambientais, os projetos de fontes renováveis, nomeadamente a partir da energia solar e eólica,
permitindo poupar a energia hídrica e conquistar maior autonomia face aos combustíveis fósseis; terceiro, criar
almofadas para diminuir o preço junto dos consumidores, domésticos e industriais; quarto, reforçar a
diversificação de fornecedores de produtos energéticos, aumentar as interligações, evitando a armadilha de
dependência da Rússia e apostando na nossa soberania e progressiva autonomia.
Em suma, Sr.as e Srs. Deputados, a nossa aposta em renováveis é a sustentabilidade. Ao acelerar estes
projetos, estamos a defender e a salvaguardar o nosso País, os portugueses, a economia e a nossa indústria.
Aplausos do PS.
Sr.as e Srs. Deputados, o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, publicado esta
semana, incita-nos a agir depressa: é preciso descarbonizar a mobilidade e as cidades; é necessário reinventar
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a indústria; é urgente realizar a transição energética, apostando em energias e gases renováveis; é imperioso
salvaguardar a biodiversidade e os serviços dos ecossistemas; é inadiável a preservação do mundo rural e o
equilíbrio das nossas florestas.
Segundo o mesmo relatório, as emissões de gases com efeito de estufa aumentaram, entre 2010 e 2019,
para os níveis mais altos da história da humanidade.
Os especialistas das Nações Unidas dizem-nos que temos de mitigar as alterações climáticas e adaptar-nos
a um mundo onde crescem os riscos delas resultantes. As alterações climáticas não são algo que observemos
do passado, são o nosso presente.
Como afirmou o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, e passo a citar, «a mudança
climática é a maior ameaça à segurança humana e ao desenvolvimento sustentável».
Portugal tem cumprido e correspondido a estes desafios. As nossas emissões de gases com efeito de estufa
reduziram-se em 32%, em relação a 2005, e alcançámos 34% de incorporação de energia de fonte renovável
no consumo final bruto de energia. Agora, queremos aumentar essa fatia de renováveis para 47% até 2030. É
um desempenho que corresponde à ambição que sempre demonstrámos.
Fomos o primeiro país do mundo a comprometer-se com o objetivo de ser neutro em carbono até 2050 e
temos um roteiro ambicioso para a neutralidade carbónica que nos traça um rumo coletivo.
O nosso Programa de Transformação da Paisagem exige-nos um esforço para reorganizar os territórios de
baixa densidade. Aprovámos, durante o semestre da nossa Presidência, a Lei Europeia do Clima, alargando à
União os objetivos a que nos havíamos proposto. E temos a nossa própria lei do clima, aprovada nesta Câmara.
Aplausos do PS.
Recordo: 37% do Plano de Recuperação e Resiliência de Portugal está afeto às alterações climáticas.
Este Programa do Governo valoriza este património e tem a ambição de o enriquecer. Para atingirmos a
neutralidade carbónica em Portugal, temos de reduzir as nossas emissões em mais de 85%, até 2050, e reforçar
a nossa capacidade de sequestro de carbono pelo uso do solo e das florestas até 13 milhões de toneladas de
carbono por ano.
Até 2030, queremos reduzir em 55% os gases com efeito de estufa, sendo que no setor dos transportes
pretendemos reduzir as emissões em 40%.
Por tudo isto, apostamos em eletrificar a mobilidade, em promover a mobilidade ativa e em investir em
transportes públicos, aumentando a sua oferta e atratividade.
Por isso, reforçaremos a nossa capacidade de produção energética a partir de fontes renováveis,
aumentando a nossa soberania energética e garantindo as fontes de energia mais baratas.
Por isso, continuaremos a proteger os nossos cursos de água, a incentivar um uso moderado e regenerador
da água e a realizar os investimentos necessários para a assegurar com qualidade nas parcelas do nosso
território onde escasseia.
Por isso, continuaremos a apoiar os municípios no reforço da sua capacidade de recolha e valorização de
resíduos, promovendo políticas regeneradoras dos recursos.
Por isso, e por último, mas não menos importante, a biodiversidade e a floresta. Estes são temas a que
daremos especial importância neste novo ciclo político.
É certo que nunca como hoje Portugal esteve tão bem apetrechado para fazer a mudança nos territórios de
baixa densidade. Sabemos o quanto valem os serviços de ecossistemas que nos fornecem o ar que respiramos
e a água de que precisamos. Temos programas que nos permitem valorizar economicamente o nosso capital
natural e uma estratégia para a bioeconomia sustentável e circular. Temos os instrumentos financeiros que nos
permitem, a longo prazo, reconverter o nosso território.
Pela primeira vez em muitos anos, queremos aumentar as áreas protegidas e estamos a reequipar os
serviços.
Pela primeira vez, estabelecemos modelos de trabalho colaborativo que permitem às populações dos
territórios de baixa densidade participar nas decisões sobre o seu futuro.
Vozes do PS: — Muito bem!
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O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática: — Para dar continuidade a este trabalho, à conservação
da natureza e da biodiversidade, estão destinados, este ano, no Fundo Ambiental, 19 milhões de euros, sendo
este o maior valor de sempre alocado a estas áreas.
Aplausos do PS.
A esses 19 milhões de euros acresce a dotação da iniciativa REACT-EU (Recovery Assistance for Cohesion
and the Territories of Europe), num total de 45 milhões de euros.
São fundos essenciais para a rearborização de espaços verdes, para a criação de ilhas-sombra, para a
modernização e otimização de viveiros florestais vivos, para a beneficiação de parques naturais e de matas
nacionais e para ações de combate à desertificação, através da rearborização e de ações que promovam o
aumento da fixação de carbono e de nutrientes no solo.
Sr.as e Srs. Deputados, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática valorizará nesta luta a cooperação entre
todos os agentes e entidades, sejam municípios, associações ambientais ou empresas, procurando, de forma
colaborativa, reforçar respostas e capacidade de enfrentar os desafios.
Esta transição exigirá capacidade de decisão, mas isso não significa deixar de ouvir quem é afetado ou até
mesmo quem se opõe ou contesta uma mudança. Não fecharemos nenhuma porta, pois as portas querem-se
abertas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, nove Srs. Deputados, aos quais o Sr.
Ministro responderá em blocos de três.
Para o primeiro pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo,
Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática, perante as profundas incertezas que a evolução da situação
internacional tem trazido, há um conjunto de respostas e de soluções que são indispensáveis para o País, as
quais, se já não estavam no Programa Eleitoral do PS, também não foram colocadas no Programa do Governo.
Em quase todas as áreas, o Governo optou por deixar tudo na mesma e é particularmente significativo que,
na área da energia, o Programa do Governo não tenha introduzido nem uma medida relativa às tarifas
energéticas, na eletricidade, no gás, nos combustíveis.
Na componente fiscal, o Sr. Primeiro-Ministro anunciou ontem uma redução do ISP — já o PCP tinha
apresentado propostas relativas à dupla tributação e ao adicional a esse imposto —, mas, se tiver abertura para
alterações fiscais, perguntamos: tem coragem política de enfrentar os grandes interesses e intervir sobre
margens e preços, usando os instrumentos legais à disposição e outros que se criem para fazer face a estes
aumentos?
É que, até agora, o Governo ignora o problema da cotação internacional dos combustíveis, fixada pelo cartel
das petrolíferas, que está na base da especulação.
O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Até agora, nada foi feito com a «lei das margens» e sabemos bem que a ERSE
(Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) tem protelado esse processo. Mas a verdade é que, quando a
gasolina e o gasóleo são vendidos acima de 2 €/l, um valor muito superior ao que era vendido quando o petróleo
atingiu o seu máximo histórico, isso significa que há quem esteja a ganhar, e muito, com estes aumentos
especulativos.
O PCP apresentou propostas para uma resposta urgente. Usando a própria proposta do Governo, propomos
que as margens brutas de refinação, as que explicam estes aumentos, sejam obrigatoriamente fixadas, retirando
a componente especulativa do mecanismo de formação de preços.
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Propomos tributar os lucros das grandes petrolíferas, dirigindo essa receita fiscal a uma redução do preço,
através do ISP, e voltamos a colocar em cima da mesa a redução do IVA da eletricidade e do gás para a sua
taxa mínima, tributando a energia como bem essencial que é.
O Sr. João Dias (PCP): — Ora aí está!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Por outro lado, as opções do Governo PS não apontam para uma política que
assegure o desenvolvimento nacional, garantindo o controlo público dos setores estratégicos, e o da energia é
um exemplo disso mesmo.
O Governo vai continuar a enfiar a cabeça na areia no que respeita a tarifas, margens, preços? Tem alguma
coisa a dizer? É que, olhando para o Programa do Governo, há um silêncio ensurdecedor sobre este problema
que tanto afeta o povo português. É a essas questões que importa que o Sr. Ministro responda.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do
PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em matéria de alterações climáticas,
invocou o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, e bem, mas esqueceu-se de referir
um aspeto, uma dimensão: é que nós estamos na rota para o desastre climático, e parte dessa responsabilidade
prende-se com o facto de os Governos terem estado a atuar, sobretudo, contrariamente aos compromissos que
deveriam ser assumidos e a empurrar no tempo as metas de descarbonização da economia.
Também não nos pode, desde logo, deixar de preocupar a junção do Ministério do Ambiente ao da Energia.
O Sr. Ministro estará ou não em condições de nos garantir que a política ambiental de conservação da natureza
e a política climática não vão continuar reféns dos interesses económicos, que até aqui têm marcado e posto
em causa a salvaguarda do bem comum?
É que precisamos de garantir a independência energética — não poderíamos estar mais de acordo —, mas
isso não pode significar destruir área protegida, área florestal, área agrícola. Temos todos presente o que
aconteceu na Herdade da Torre Bela, na Azambuja, ou no Cercal do Alentejo, em que foram postos em causa,
inclusivamente, a sobrevivência e o alimento de pequenos agricultores. Não podemos continuar dependentes
do exterior, mas a estratégia não pode ser, efetivamente, a de pôr em causa os bens naturais.
Em relação à autonomia energética, a recente alteração da legislação para as comunidades energéticas foi
um passo positivo, mas temos de ir mais longe, temos de garantir que, em Portugal, se deixa de morrer de frio
nas habitações.
Por isso, pergunto o seguinte ao Sr. Ministro: para quando uma política que dê diretamente apoio aos 2
milhões de pessoas que, em Portugal, não têm dinheiro para aquecer as suas casas?
Também em matéria de transportes e energia não podemos compreender o que aconteceu pela calada: a
taxa de carbono para os transportes marítimos, fluviais e aéreos passar a ser a favor das administrações
portuárias, desvirtuando, assim, uma portaria que nasceu através da iniciativa do PAN, no Parlamento, no âmbito
do Orçamento do Estado para 2021. Essa portaria deveria estar a ser utilizada para os transportes públicos e
não para as administrações portuárias.
Por fim, Sr. Ministro, não encontramos no Programa do Governo uma única referência à matéria da proteção
animal e temos, neste momento, não só de alargar a criminalização dos maus-tratos, mas também de apoiar as
famílias que têm animais de companhia, criando hospitais veterinários. Além disso, temos de pôr fim a atividades
anacrónicas, como a tauromaquia, no nosso País. Bem sabemos que o seu colega de bancada Adão e Silva
acha que esta, de facto, não devia ser uma questão discutida do ponto de vista civilizacional. Pergunto: quando
é que o Governo vai ter a coragem de enfrentar este lobby?É que são 16 milhões de euros para a tauromaquia
todos os anos, e para a proteção animal nem uma palavra.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Pires, do Partido
Socialista.
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O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e
Srs. Deputados, Sr. Ministro, ouvimos nesta Câmara vários discursos, sobretudo em matéria de ambiente, que
são discursos estafados, gastos e que não trazem qualquer novidade ao debate. Arrisco-me a dizer que alguns
dos partidos que intervieram hoje não leram o Programa do Governo, ou leram-no mas prestaram muito pouca
atenção, preferindo vir aqui lançar soundbites, num exercício retórico sem nenhum valor acrescentado.
Da nossa parte, da parte do Partido Socialista, cá estaremos, sem a mínima tibieza ou a mínima hesitação,
para fazermos aquilo que temos de fazer, para combatermos as alterações climáticas com energia renovada e
com a ambição de continuar a melhorar e a transformar Portugal.
Arrancamos, com este debate, para um novo ciclo. Um novo ciclo para o Governo, um novo ciclo para o
Parlamento, um novo ciclo para os portugueses. Um ciclo que começa de forma muito difícil, com uma conjuntura
muito difícil: uma guerra, uma pandemia da qual estamos ainda a sair e uma crise energética. Há uma crise
energética à qual é preciso dar respostas urgentes, eficazes e de curto prazo — que, ontem, o Sr. Primeiro-
Ministro já enunciou —, mas que também exige respostas estruturais que avancem para a transição energética,
que aproveitem os nossos recursos naturais para a produção de energia, que assegurem a nossa segurança
energética, que promovam a redução dos preços da eletricidade e que, ao mesmo tempo, reduzam as emissões
de carbono, para caminharmos para a neutralidade carbónica.
Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Portugal tem tido muito sucesso, nos últimos tempos, nos
leilões do solar e, sobretudo, na política ambiental e nas renováveis. Aliás, Portugal antecipou em cinco anos as
metas para 2030 no que diz respeito à injeção de renováveis na rede.
A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Muito bem!
O Sr. Hugo Pires (PS): — Nesta semana, tivemos conhecimento de mais um sucesso de um leilão solar
para um projeto eólico e solar flutuante.
As perguntas que lhe queria fazer, muito simples, são as seguintes: quais são os ganhos para os
consumidores finais relativamente a estes projetos do leilão de energia eólica e solar flutuante? O que ganham
os consumidores com estes leilões? E quais são os próximos projetos de produção de energia, nomeadamente
de energia offshore?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e da Energia.
O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática: — Sr. Presidente, agradeço as perguntas que me foram
colocadas.
Quero começar por dizer que há uma razão para Portugal ser dos países que têm tido menor pressão na
inflação dos preços da energia para os consumidores: é que o trabalho que tem sido feito para proteger o preço
da energia para os consumidores não começou agora, com a crise da Rússia.
Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.
Todo o trabalho que tem sido feito nos últimos anos — e volto a referir, tal como tive oportunidade de dizer
na minha intervenção, que não só partilho o orgulho desse caminho como pretendo, objetivamente, reforçar o
empenho no caminho que definimos — permitiu, entre outras coisas, trabalhar a vários níveis. Permitiu-nos
alargar a tarifa social e permitiu-nos apostar no que diz respeito ao lançamento de um conjunto de produção
elétrica por fontes renováveis, o que nos possibilitou termos tarifas baixas.
Como aqui foi dito, e bem, pelo Sr. Deputado Hugo Pires, o leilão do solar flutuante foi uma inovação, uma
novidade lançada pelo Governo. Foi um sucesso e permitiu bater um recorde ao registar, pela terceira vez
consecutiva, o mais baixo preço de energia a nível mundial.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas a questão não é essa!
O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática: — E sabe o que significa isto, Sr. Deputado Bruno Dias?
Significa ganhos para os consumidores, porque, ao registarem-se esses ganhos, foram os consumidores de
eletricidade que beneficiaram deles, em cerca de 114 milhões de euros, na tarifa. É um ganho concreto, que
retira pressão para o que pode vir a ser a revisão da tarifa.
Da mesma maneira, isso aconteceu nos leilões que tivemos em 2019, com ganhos efetivos de cerca de 600
milhões de euros, ou mesmo nos leilões de 2020, com ganhos de cerca de 559 milhões de euros, num conjunto
global de 1,3 mil milhões de euros do ponto de vista dos ganhos.
Portanto, o caminho não é uma oposição entre a valorização das energias renováveis e os preços. Hoje,
temos oportunidade de conjugar a segurança, a sustentabilidade e a poupança do ponto de vista energético.
Olhar de forma desligada para tudo o que foi feito no último Governo e se pretende valorizar neste Governo
e achar que isso não significa poupar os consumidores é não estar a olhar para toda a política e para todos os
ganhos que temos com essas mesmas políticas.
Aplausos do PS.
Por isso, o nosso caminho é para continuar. O mesmo se verifica para as eólicas, cuja capacidade de
produção temos de aumentar, e o mesmo poderia dizer relativamente ao preço dos combustíveis, porque,
realmente, adotámos o seguinte conjunto de políticas: quanto à suspensão da taxa de carbono — cuja
atualização tínhamos suspendido até 30 de junho —, o Sr. Primeiro-Ministro anunciou agora que se manterá até
ao final do ano; um mecanismo de compensação automática da subida do IVA no preço dos combustíveis, por
via do ISP; o «AUTOvoucher», que já tivemos oportunidade de reforçar; e também a lei relativamente às
margens, que o Sr. Deputado referiu e que esperamos que seja possível operacionalizar a partir do dia 23 de
maio, porque está neste momento a ser terminada, nomeadamente por parte do regulador.
Portanto, há um conjunto muito significativo de medidas que têm como objetivo beneficiar e proteger os
consumidores. O caminho que queremos seguir é esse, um caminho de valorização e de articulação de todas
as políticas que permitem perceber, por um lado, que a energia é sustentabilidade e, por outro, que há uma
compatibilização entre as metas que queremos atingir e os objetivos de política energética que o País tem
promovido.
Depois, quero dizer também à Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real que não há nenhum ministério refém de
interesses económicos. Nós vamos defender os interesses ambientais e isso também é, em muitos aspetos,
defender a sustentabilidade e a segurança energética do País.
Quero também dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que se não viu nenhuma referência à proteção animal foi por falta
de atenção, porque o compromisso que assumimos com o PAN, na última Legislatura, quanto ao alargamento
da lei da criminalização dos maus-tratos a animais não só está no nosso Programa como é uma matéria que,
obviamente, durante a campanha eleitoral, assumimos que seria um compromisso deste Governo e será,
naturalmente, um compromisso para o futuro.
Aplausos do PS.
Portanto, queria assegurar-lhe que isso sempre foi um compromisso. Independentemente das minhas atuais
funções, tive oportunidade de partilhar com o Sr. Primeiro-Ministro uma longa história relativamente ao progresso
na proteção do bem-estar animal e espero, certamente, continuar a dar força a essa agenda, agora no Ministério
do Ambiente e da Ação Climática.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática — e assim fica corrigido
o lapso que há pouco cometi.
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Seguimos com os pedidos de esclarecimento, cabendo agora a palavra ao Sr. Deputado do PSD Bruno
Coimbra.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.
Ministro, gostaria de começar, obviamente, por cumprimentá-lo, agradecer a sua exposição e desejar-lhe
sucesso nas novas funções, o que é muito importante, até porque tem muito trabalho pela frente e, ao contrário
do que disse, tem muito tempo perdido para recuperar.
Vamos fazer um escrutínio muito assertivo da sua ação governativa, até porque a governação que o
antecedeu ficou marcada pela ausência de reformas, por medidas curtas e por uma divergência entre a narrativa
do Governo e a realidade. E o Programa que hoje nos apresenta, infelizmente, segue no mesmo sentido.
Perante a crise energética, temos anúncios, medidas ad hoc, mas não há um plano de conjunto. Aliás, agora
até parecem mais preocupados em abraçar as propostas do Podemos espanhol do que, propriamente, em estar
focados nos portugueses, que já não sabem o que hão de fazer para pagar as suas contas de eletricidade e de
combustível.
O Sr. António Prôa (PSD): — Muito bem!
O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — As interligações energéticas, que foram abandonadas por VV. Ex.as, voltam
agora ao Programa, mas sem dizer o que vai ser feito e como. Falam em mais 2 GW de energia solar, mas nem
sequer conseguiram resolver os estrangulamentos na rede e ainda há painéis dos sucessivos leilões por instalar.
Sobre os resíduos, as suas palavras não apagam o incumprimento generalizado de metas nem o caos que
se instalou no setor e, quanto aos solos contaminados, depois de seis anos de apatia e de inúmeros alertas, o
seu antecessor veio a esta Casa, em maio do ano passado, pedir desculpa e dizer que em dois meses tudo
estaria resolvido. Pois bem, passaram-se sete meses até à dissolução da Assembleia da República, nada foi
feito e no Programa do Governo também nada está.
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Exatamente!
O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Continuando no tema da água — ou da falta dela! —, o seu Programa do
Governo remete para a seca de 2017, ignorando olimpicamente a situação que atravessamos.
A lista continua — assim o tempo nos permitisse — na conservação da natureza e dos ecossistemas, em
que foi o próprio Governo que reconheceu o fracasso, na qualidade do ar ou mesmo no ruído, em que é Bruxelas
que nos lança alertas e nos coloca em tribunal, e, Sr. Ministro, nem vale a pena falar na remoção do amianto
das escolas, na rede de carregamentos elétricos ou até na fiscalidade verde, que mataram e usaram apenas
para engordar o Fundo Ambiental e que agora, talvez imbuídos deste espírito pascal, dizem querer ressuscitar.
O Sr. António Prôa (PSD): — Muito bem!
O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Também na orgânica do Governo há riscos e problemas, porque juntar
pastas tão densas como o Ambiente e a Energia sob a tutela de um Secretário de Estado que sempre desprezou
o ambiente e a opinião das populações nos casos do lítio e da mineração não deixa nada de bom em aberto.
Não augura nada de bom.
E, já que falamos em lítio, também esse desapareceu do Programa do Governo, mas sabemos bem como
contam com ele e como querem fazer a coisa.
O Sr. António Prôa (PSD): — Está escondido!
O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Portanto, Sr. Ministro, o que é realmente importante saber é se este
Programa é para fazer ou se é só para dizer e se a sua chegada significa mesmo alguma mudança no Ministério.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, por falar em interesses económicos, diga-nos,
por favor, se a EDP já pagou, ou não, o imposto sobre a venda das barragens à Engie e não se engane sobre
a matéria.
Até hoje, o Governo não tocou com um dedo nas rendas milionárias da EDP. A descida do preço do gás vai
a défice tarifário e vai ser paga pelos consumidores. As barragens da EDP e das outras empresas são pagas a
um preço quatro vezes superior ao de 2020. A EDP vai distribuir 750 milhões de euros enquanto lucra com o
aumento dos preços da energia para quem precisa de aquecer a sua casa e não pode.
Por isso, Sr. Ministro, tem de nos dizer: vai ou não vai criar uma taxa sobre os lucros extraordinários da EDP?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Chega,
o Sr. Deputado Filipe Melo.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados,
Sr. Ministro, face ao contexto de guerra que atravessamos e à consequente crise energética, as prioridades
alteraram-se, ou deveriam ter sido alteradas, mas o Programa do Governo que o senhor integra mantém-se
exatamente o mesmo.
As prioridades do nosso País e da Europa já não devem ser a transição climática ou digital, mas, sim, a
soberania energética e hídrica.
O Governo parece achar que a guerra na Ucrânia é um acontecimento isolado no tempo e não tem uma
estratégia robusta de resposta à guerra e ao pós-guerra. É vago e ausente de medidas de ação executiva
direcionadas a esta realidade. Deve o Governo pensar macro e não com medidas avulsas, ao sabor do
calendário e das agendas políticas que o caracterizam.
Deixava-lhe duas questões muito sucintas, Sr. Ministro. Primeiro, face à instabilidade que vivemos no setor
da energia, prevê este Governo proceder ao revisionismo político e à redefinição de prioridades dos planos,
nomeadamente dos relacionados com a transição energética, pela conquista da sua independência energética?
Será este um objetivo político de prioridade máxima?
O Sr. Ministro disse também, há pouco, que o trabalho desta tutela não é de agora, que já vem a ser feito
por anteriores Governos socialistas. Então, em relação à referida concretização do ECO.AP 2030 (Programa de
Eficiência de Recursos na Administração Pública), pergunto ao Sr. Ministro quais os resultados obtidos até à
presente data e, já agora, qual a metodologia por vocês utilizada no que respeita à monitorização do consumo
de energia e de água nos referidos edifícios geridos pela administração central.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática.
O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática: — Sr. Presidente, quero agradecer as perguntas que me
foram feitas.
Sr. Deputado Bruno Coimbra, muito obrigado, também estou ansioso pelos nossos debates — não vai ser
possível fazê-los todos no dia de hoje, apesar do elencar exaustivo dos temas — e pelos contributos que o PSD
tenha relativamente a esta matéria. Não tenho uma visão da política em que não existe contributo por parte dos
partidos, a não ser daquele que apoia o Governo, em especial numa matéria que nos é tão cara a todos.
Aplausos do PS.
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Tive a oportunidade de ler o Programa Eleitoral do PSD e há bons contributos, contributos válidos, e também
fico ansioso por esses momentos em que o PSD possa contribuir para a valorização da política ambiental do
nosso País.
Quero ainda dizer-lhe que o sucesso que tivemos no solar flutuante, nesta semana, nos diz que temos,
obviamente, um caminho pela frente, um caminho que permite expandir e atingir os objetivos do solar que temos
no nosso programa eleitoral. Não há nada que nos leve a crer que não o possamos fazer.
Ainda assim, ontem, o Sr. Primeiro-Ministro anunciou que estamos a trabalhar em mecanismos que permitam
agilizar o processo de licenciamento dos painéis fotovoltaicos. Para quê? Exatamente para se conseguir acelerar
a estratégia no que diz respeito à instalação de solar.
No que respeita à questão relativa à gestão da seca, com as chuvas que tivemos em março, felizmente,
temos hoje uma situação um bocadinho melhor. Já não estamos em situação de seca extrema, mas temos um
longo caminho pela frente. Temos um caminho de trabalho no que diz respeito à eficiência no consumo das
águas, seja do ponto de vista doméstico, seja do ponto de vista da agricultura, e é um trabalho que tenho de
fazer, obviamente, com a minha colega do Governo.
Temos um caminho para fazer, nomeadamente no que diz respeito — e está no Programa do Governo — à
questão dos planos hídricos. Temos de os adotar, especialmente nas regiões que têm sido mais atingidas pela
seca, e temos todo um trabalho de eficiência da própria estrutura da rede e de aproveitamento das nossas águas
residuais, das nossas águas pluviais, bem como de planos de inovação, nomeadamente nos projetos de
dessalinização que temos no Algarve, que, se correrem bem, permitirão expandir esse tipo de novas soluções
que nos possibilitem retirar pressão sobre o atual sistema.
Mas quero dar-lhe também, de forma muito concreta, uma resposta à pergunta, que agradeço, sobre a
orgânica do Ministério do Ambiente e da Ação Climática, que já tinha o ambiente e a energia. Portanto, de
alguma forma, essa compatibilização já existia.
Sobre as preocupações que têm existido e que o Sr. Deputado expressou, também quero deixar bem claro
que, dentro do Ministério, vamos saber separar as responsabilidades de cada um. A parte empresarial do Estado
ficará com o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e da Energia, a parte dos recursos hídricos ficará com o
Sr. Secretário de Estado da Conservação da Natureza e eu próprio ficarei com as licenças ambientais. Desta
forma, ficam salvaguardadas todas as preocupações que possam existir relativamente a essa matéria, fazendo-
nos avançar em relação a isso.
Aplausos do PS.
Esse não deve nem deveria ser tema que nos preocupasse, porque, da mesma maneira que estas
competências já existiam no passado, saberemos lidar com elas no futuro. Quero que fique absolutamente claro
que este Ministério é mesmo para fazer, não é apenas para dizer.
Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, aproveito para agradecer a sua pergunta, mas devo dizer-lhe, em primeiro
lugar, que não sou Ministro das Finanças, pelo que deverá dirigir ao Ministro das Finanças algumas das
perguntas que me fez.
Em segundo lugar, o mecanismo que estamos a negociar com Espanha, e que foi, obviamente, resultado de
uma vitória do Primeiro-Ministro e do Governo português, no último Conselho Europeu, para isolar a Península
Ibérica da pressão do preço do gás relativamente ao preço da eletricidade, de alguma forma, mutualiza os
ganhos que a Sr.ª Deputada quer taxar. Portanto, o que estamos a fazer é a pegar nos ganhos do sistema e a
suportar tarifas mais baixas para os consumidores.
Os consumidores vão beneficiar da tarifa mais baixa do gás, porque se fixarmos uma tarifa mais baixa do
gás estaremos a fixar uma tarifa mais baixa da eletricidade.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — E quem é que paga?
O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática: — Temos neste momento, felizmente, um sistema mais
protegido do que o resto da Europa e é por isso que temos uma menor pressão inflacionista sobre o preço da
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eletricidade. Porquê? Porque, felizmente, temos muitas empresas que têm contratos de médio e longo prazos e
temos tarifa regulada para os consumidores.
Tivemos agora um aumento de 3%. Se conseguíssemos que a medida que estamos a negociar com a
Comissão Europeia fosse aprovada, poderíamos até diminuir a reversão do aumento que agora tivemos na tarifa
da eletricidade para os consumidores.
Aplausos do PS.
Portanto, se isto não é um ganho para os consumidores, então não sei o que será ganho para os
consumidores, Sr.ª Deputada.
Aplausos do PS.
Muitas vezes, temos de conseguir encontrar as melhores soluções, que são aquelas que nos permitem
responder ao problema, proteger os consumidores — concordo consigo —, mas, simultaneamente, proteger o
mercado, ou seja, proteger as empresas em soluções virtuosas que nos consigam, a nós e à Comissão Europeia,
fazer progredir no objetivo que temos: isolar e proteger os consumidores e as empresas da pressão que estamos
a ter, neste momento, no mercado do gás.
Portanto, nesse campo, estamos unidos no mesmo objetivo e vamos, obviamente, com tempo, partilhar as
soluções, assim que elas fiquem claras.
Relativamente ao Sr. Deputado Filipe Melo, devo dizer-lhe que há um mundo que nos separa, porque a sua
estratégia relativamente à guerra é a de ficar mais dependente da Rússia.
Protestos do CH.
A nossa estratégia é a de ficarmos menos dependentes da Rússia, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado deveria ler muito bem o Programa Eleitoral do Partido Socialista e o Programa do XXIII
Governo Constitucional. É muito grande, eu sei, mas o Sr. Deputado deveria esforçar-se por lê-lo.
O Sr. Filipe Melo (CH): — É curto, eu li!
O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática: — Há, neste momento, a capacidade de conjugarmos as
prioridades do País de maior segurança e soberania energética com as prioridades de maior sustentabilidade e
melhor preço para os consumidores. E isto tudo se consegue de uma forma muito simples. Sabe como?
Valorizando as energias renováveis.
Vou citar um político de direita — não vai, com certeza, sentir afinidades, porque ele é liberal —, que é o
Ministro das Finanças alemão.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Liberal não é direita!
O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática: — Não vai sentir grandes afinidades, penso eu, porque
ele é liberal, mas em algumas coisas os senhores devem partilhar o pensamento.
O Sr. Ministro das Finanças alemão, ministro liberal, disse, de uma forma muito sintética, algo que subscrevo:
«As renováveis são, neste momento, a energia da liberdade.» É isto que move a ação deste Governo.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do CH Filipe Melo.
O Sr. Presidente: — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira,
do Grupo Parlamentar do PCP.
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A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro, o
Programa apresentado promete enfrentar o desafio das alterações climáticas. Lembra-nos, e bem, que Portugal
é um dos países da União Europeia mais vulneráveis às alterações climáticas e aos seus impactos, que nos
afetam já no presente, com grandes períodos de seca ou de incêndios.
Daí que estranhemos olhar para este Programa e perceber que é mais do mesmo. Constata-se o óbvio, Sr.
Ministro, mas não se assumem medidas de fundo. Por exemplo, o Governo assume querer reduzir, até 2030,
40% das emissões no setor dos transportes e da mobilidade, mas, pergunto: como pretende fazê-lo, se não dá
nenhum passo que reforce as condições de acesso ao passe social, que tem de ser alargado a todo o território
nacional e acompanhado do reforço da oferta de transportes públicos rodoviários, fluviais e ferroviários?
O Governo reconhece que, entre 2015 e 2019, houve um aumento de 23% na procura de transportes públicos
— aliás, o Sr. Ministro referiu-o na intervenção que proferiu —, a partir da aprovação de uma medida do PCP
sobre o passe social. Então, se reconhece que esta é a medida mais eficiente das últimas décadas no âmbito
da transição para o transporte público e para a proteção do ambiente, porque não se avança na gratuitidade
deste passe para todos os jovens até aos 18 anos e porque não se assume o objetivo claro de trilhar um caminho
que assegure a gratuitidade dos transportes públicos?
Sr. Ministro, deixo ainda uma referência à política de conservação da natureza. Tendo sido assumido pelo
anterior Ministro do Ambiente que esta vertente ficou aquém do necessário, questionamo-nos se o Governo não
percebeu que tem de mudar de tática. Pelo Programa apresentado, parece-nos que recusa tomar medidas para
reforçar o ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas), serviço essencial para a conservação
dos ecossistemas e dos valores ambientais, e insiste na desresponsabilização sobre as áreas protegidas.
O Governo fala-nos dos recursos hídricos na sua Estratégia Nacional de Reabilitação de Rios e Ribeiras,
mas ficamos sem perceber como pretende proteger as massas de água sem trabalhadores para o fazer, sem
meios técnicos e humanos, sem um plano integrado e sem planos de gestão hidrográfica.
O Programa do Governo não assume o compromisso da gestão pública da água, fundamental para assegurar
o acesso à água a preços acessíveis, lembrando aqui que a água é um bem essencial à vida. O Governo insiste
em fazer dos resíduos um negócio, não revertendo a privatização da EGF (Empresa Geral do Fomento), que
significou a degradação da qualidade dos serviços, a redução do investimento, ataques aos direitos dos
trabalhadores do setor e o aumento dos preços para os utentes, tudo para satisfazer os lucros da empresa
concessionária.
Também este caminho de mercantilização do ambiente e da natureza tem de ser combatido e revertido, mas
fica claro que no Programa do Governo essa não é uma opção.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado do PSD António Prôa.
O Sr. António Prôa (PSD): — Sr. Presidente, permita-me que o cumprimente nesta minha primeira
intervenção após o regresso ao Parlamento.
Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática, o senhor assumiu uma pasta central para o futuro do País: o
Ambiente. Entre as questões relevantes está o problema da pobreza energética, que assume particular
gravidade por afetar perto de um terço dos portugueses.
Cerca de 3 milhões de portugueses vivem em pobreza energética e todos os anos morrem pessoas por frio
ou calor excessivo. Esta situação é particularmente grave em Portugal, que é o 4.º país europeu com maior
índice de pobreza energética e foi, apenas, o 19.º no esforço de diminuição desta grave situação.
A elevada percentagem de população idosa, os custos de eletricidade dos mais elevados da Europa e uma
das maiores cargas fiscais sobre a energia agravam ainda mais o problema. Acresce, ainda, o aumento do preço
da eletricidade, que já está a ser sentido.
Sr. Ministro, perante este cenário, a resposta do Governo é manifestamente insuficiente, no tempo e no
modo.
Em relação à subida do preço da eletricidade, anuncia medidas que, ao contrário do que quer fazer crer, não
irão diminuir o seu custo, mas apenas mitigar a sua subida. Ou seja, o preço da eletricidade em Portugal
continuará a subir, agravando o problema da pobreza energética.
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O Governo acena também com o Programa de Apoio a Edifícios Mais Sustentáveis, que é positivo, e até com
uma «chuva» de milhões do PRR, mas esta iniciativa não resolve o problema no imediato e está longe de
satisfazer as necessidades.
No Programa do Governo, a questão da pobreza energética é remetida para a Estratégia Nacional de Longo
Prazo para o Combate à Pobreza Energética 2021-2050, que esteve em consulta pública, mas que, entretanto,
ficou na gaveta. Com este mecanismo, o Governo propõe-se demorar 30 anos para resolver a pobreza
energética. Repito: 30 anos!
Sr. Ministro, está satisfeito com a perspetiva de demorar 30 anos para resolver o problema da pobreza
energética em Portugal? Não considera que as carências de 3 milhões de portugueses merecem mais
empenho? Consegue estar de consciência tranquila quando todos os anos morrem portugueses por causas
relacionadas com frio ou calor excessivo?
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o drama da pobreza energética, que afeta quase um terço dos
portugueses, é uma das mais gritantes desigualdades sociais e impõe mais ambição, outra prioridade e medidas
imediatas, e não a 30 anos.
O Programa do Governo, sobre a pobreza energética, é de uma pobreza franciscana!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem agora a palavra o Sr. Deputado Nuno Fazenda, do PS.
O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Portugal tem
estado na liderança da ação climática à esfera internacional e são os factos e os resultados que o demonstram.
Entre 2015 e 2019, reduzimos em 26% as emissões de CO2. Reduzimos mais do que no contexto europeu e
fizemo-lo com mais crescimento económico, com um crescimento acima da média da União Europeia. É por
isso mesmo que Portugal é reconhecido pela própria Comissão Europeia como um dos países que estão em
melhores condições para alcançar as metas traçadas para 2030.
Apesar do bom desempenho dos últimos anos, este é um desafio contínuo e é precisamente por isso que o
Governo continua — e bem! — a colocar no topo das prioridades a transição climática, com uma ambição
renovada. E aqui inscreve, conforme o Sr. Ministro referiu há pouco, 37% do volume de investimento do PRR
precisamente para a transição climática.
Neste contexto, há dois grandes desafios que se colocam à tutela do Sr. Ministro e que, aliás, dizem respeito
à autonomia e à soberania do nosso País: a energia e a água.
Sobre a energia, a aposta nas renováveis foi e é uma aposta vencedora que tem de continuar a avançar.
Conforme já foi sublinhado durante este debate, cerca de 60% da eletricidade produzida em Portugal tem origem
nas energias renováveis e temos a ambição de que, em 2026, seja de 80%. Isto significa que teremos maior
autonomia energética e menores custos para as famílias e para as empresas.
Há também outro desafio estratégico muito importante, o da água, importando prosseguir e reforçar os
investimentos neste domínio. Muito foi feito em matéria de investimentos nos rios e ribeiras, no ciclo da água, e
temos ainda investimentos previstos no PRR e no Portugal 2030.
Este é, como há pouco o Sr. Ministro referiu, um desafio estratégico. Nos últimos 20 anos, em Portugal, a
precipitação diminuiu cerca de 15% e continuará a decrescer no futuro. A seca em Portugal não é conjuntural,
é estrutural, e, portanto, este tem de ser um desígnio estratégico que convoque todos: as entidades públicas, as
empresas, as autarquias, o setor agrícola — que é responsável por cerca de 70% do consumo da água —, os
cidadãos e também, naturalmente, o Governo, que o inscreveu como prioridade no Programa do Governo e nos
instrumentos de política pública.
É sobre este tema que gostaria de questionar o Sr. Ministro. Que investimentos estão previstos no próximo
ciclo de fundos comunitários, designadamente no Portugal 2030 e no PRR, para um melhor aproveitamento e
uma gestão mais eficiente da água?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática.
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O Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática: — Sr. Presidente, quero agradecer as perguntas que me
foram feitas.
Sr.ª Deputada Diana Ferreira, gostaria de lhe dizer que nos une a prioridade ao transporte coletivo público,
à valorização da oferta e também à acessibilidade dos preços do transporte, mas é importante termos
consciência do ponto onde nos encontramos. Tivemos um crescimento muito significativo, de cerca de 23%, do
número de passageiros até 2019 e, depois, tivemos a pandemia. Ainda não recuperámos o número de
passageiros que tínhamos antes da pandemia.
Temos, neste momento, um valor muito significativo inscrito no PART (Programa de Apoio à Redução
Tarifária nos Transportes Públicos), em sede de Orçamento, que permite às áreas metropolitanas definir muitas
das suas estratégias no que diz respeito à política tarifária e à oferta.
Temos, neste momento, inscritos no PRR cerca de 1000 milhões de euros para programas relativos à oferta
de transportes públicos nas áreas metropolitanas, mas não só. A nossa estratégia, do ponto de vista dos
transportes, é muito simples, Sr.ª Deputada, não obstante podermos ter, no imediato e no curto prazo,
perspetivas diferentes. Antes de alargar as condições a quem já tem transporte, o objetivo do Governo, neste
momento, é o de assegurar transporte público a quem não o tem.
Aplausos do PS.
Portanto, por um lado, queremos recuperar os passageiros que fomos perdendo por causa da pandemia —
e temos um longo trabalho a fazer! — e, por outro, queremos garantir que este ciclo de investimentos que temos
pela frente se concretiza para transformar, revolucionar a oferta de transporte público no nosso País. É esse o
nosso foco.
Não nos distinguem, nem nos separam, do ponto de vista da conceção da política de transportes, algumas
das propostas que a Sr.ª Deputada nos apresentou, mas é importante termos as prioridades definidas e
sabermos distribuí-las no tempo. É isso que vamos fazer, não obstante concordar consigo, Sr.ª Deputada, em
que é desejável, no longo prazo, continuar a ter uma política atrativa de transportes, especialmente para os mais
novos, para os seduzir para hábitos de circulação mais positivos para o ambiente, nomeadamente em espaços
urbanos.
Essa é uma matéria a discutir no tempo, mas quero que as nossas prioridades fiquem absolutamente claras.
Queria dizer ao Sr. Deputado António Prôa — folgo em vê-lo, agora nesta circunstância — que a política de
combate à pobreza energética é feita por várias estratégias e não apenas por uma e temos de saber, de uma
vez por todas, quebrar as dicotomias.
Uma estratégia de longo prazo para a pobreza energética é isso mesmo, uma estratégia de longo prazo para
a pobreza energética. Não significa isso que o Governo não trabalhe no curto prazo para as respostas que são
necessárias para as famílias que delas precisam. É por isso que, volto a referir, temos trabalhado na redução
do preço, nomeadamente da tarifa, e temos tido dos aumentos tarifários mais baixos para os consumidores
quando os comparamos com outros países a nível europeu.
Foi por isso que alargámos a tarifa social. Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não foi certamente o PSD que
se preocupou com a tarifa social, porque, em 2014, havia 47 000 beneficiários da tarifa social e, em 2022, há
762 000. No gás, Sr. Deputado, em 2014, havia 5000 beneficiários da tarifa social e, hoje, em 2022, há 48 000.
Sabe o que é que isto foi, Sr. Deputado? Foram mudanças, nomeadamente do último Governo, para alargar
a tarifa social a quem mais precisa.
Aplausos do PS.
Mas não nos ficamos por aqui. Ainda ontem, o Sr. Deputado Rui Tavares falou de um programa importante
de valorização da eficiência energética, nomeadamente para as famílias. O Sr. Primeiro-Ministro disse, e bem,
que queremos ter a ambição de ser mais rápidos na execução desse mesmo programa e nós vamos fazer a
execução mais rápida dos vales de apoio à eficiência energética.
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Mais uma vez, foi ontem anunciado, e espero que isso esteja presente na proposta que vamos apresentar,
que pretendemos reduzir à taxa mínima, à taxa reduzida do IVA, todo o tipo de equipamentos que permitem a
qualquer família ficar menos dependente do gás e com consumos de energia mais reduzidos.
Aplausos do PS.
Essa é uma das medidas do pacote de emergência que vamos apresentar.
Sr. Deputado Nuno Fazenda, subscrevo integralmente o que disse relativamente às prioridades e aos
objetivos que temos pela frente — mal seria, se assim não fosse. Haveremos também de ter as nossas
divergências, certamente, ao longo desta Legislatura, mas queria reafirmar que, obviamente, a água é uma das
prioridades mais importantes que vamos ter, até porque, infelizmente, vamos ter de nos adaptar à circunstância
de ter menos água disponível.
Por isso é que é fundamental aplicar o que temos previsto no que diz respeito aos planos de eficiência hídrica
e apostar na eficiência do consumo da água, quer no contexto doméstico, quer no da agricultura, que é um
grande consumidor de água no nosso País.
É fundamental apostar em manter o equilíbrio no que diz respeito aos consumos de água, salvaguardando
sempre que o consumo humano é a nossa prioridade. E é preciso continuar a ter conversas com os autarcas,
procurando soluções para todos os locais onde temos, obviamente, maiores problemas com a seca, não
deixando de ter presente que uma das formas inteligentes de valorizar os recursos que temos é, por exemplo,
a expansão das águas residuais. Esta é uma forma inteligente de aproveitar águas que temos para múltiplos
usos, tirando pressão sobre a água potável.
Termino, referindo que projetos inovadores, como o da dessalinização, também nos permitirão recuperar
novas fontes e, dessa forma, tirar pressão ao sistema.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Agradeço ao Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática, aproveitando para o saudar
nesta sua primeira intervenção neste Plenário, nesta Legislatura.
Seguindo a ordem das intervenções, tem agora a palavra o Sr. Deputado Alexandre Quintanilha, em nome
do PS.
O Sr. Alexandre Quintanilha (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: É normal que, no início de qualquer legislatura, procuremos identificar os alicerces que nos
ajudam a confiar num futuro melhor.
São vários os atuais desafios. Além da pandemia, que ainda não terminou, das alterações climáticas, da
fragilização do emprego, da instabilidade económica, do ataque à igualdade de direitos e oportunidades e das
autocracias que dominam a maior parte dos cidadãos deste planeta, temos agora a guerra na Ucrânia, com as
incertezas e o medo a ela associados.
A esse alicerce damos o nome de conhecimento. Porquê? Porque queremos confiar que as decisões — as
nossas e as dos que nos governam na saúde, na energia, na segurança social e na economia — se baseiam
no conhecimento existente e não nas múltiplas opiniões, que, como sabemos, não só proliferam como se
contradizem frequentemente.
Aplausos do PS.
No entanto, esquecemo-nos de que o conhecimento leva tempo. E leva tempo porque se baseia em três
pilares essenciais: a educação, a investigação e a inovação. São pilares que se alimentam mutuamente, de
forma lenta e nunca linear, e exigem confiança, confiança também na própria democracia.
Será sempre um trabalho inacabado, que exige uma aposta continuada. O conhecimento tem como origem
a dúvida e o seu objetivo será sempre o de reduzir a incerteza. Das respostas que se acumulam, surgem
invariavelmente mais perguntas e dúvidas. A COVID-19 é um excelente exemplo desse processo, não só em
Portugal como no mundo.
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Não deveria surpreender ninguém que certas decisões tenham de ser revistas regularmente. É sempre um
trabalho inacabado.
É neste contexto que iniciamos esta Legislatura, uma Legislatura que tem na sua base um voto claríssimo
de confiança no trabalho que tem vindo a ser feito pelo Governo de António Costa.
É uma confiança que foi construída paulatinamente ao longo de seis anos de governação e que deu
continuidade à visão e à memória de grandes socialistas, como Mário Soares e Jorge Sampaio.
Aplausos do PS.
Trata-se de uma confiança que foi reforçada durante estes mais de dois anos de pandemia, não só pela
aposta na recusa sistemática da austeridade como pela transparência junto dos meios de comunicação e
população em geral.
É uma confiança que se traduz no resultado revelado no último Eurobarómetro, publicado no fim do ano
passado, sobre os 27 países da União Europeia e mais 11 outros países. Os portugueses estão em 1.º lugar no
que diz respeito à confiança e à curiosidade pelo conhecimento, mas também na capacidade de esse
conhecimento resolver os desafios que enfrentamos.
Ninguém pode duvidar de que este 1.º lugar é o resultado do investimento sempre crescente e continuado,
durante os últimos seis anos, nas áreas da educação, da investigação e da inovação, assim como na da cultura
científica.
Aplausos do PS.
Hoje, a maioria dos portugueses, incluindo os mais qualificados de sempre, confia no conhecimento e confia
que o Governo usará o conhecimento nas suas políticas.
Levou tempo e será sempre um trabalho inacabado. O desejo de chegar aos 3% do PIB investido em
investigação e inovação até 2030 é uma ambição antiga que nos apraz ver agora concretizada no Programa do
Governo, assim como a lei da programação do investimento em ciência.
Como também já tive ocasião de dizer neste fórum, é sempre quando enfrentamos grandes desafios que
percebemos que o maior inimigo da democracia e do conhecimento não é a incerteza, é a mentira.
Aplausos do PS.
A mentira é sempre assertiva e categórica. Nunca tem dúvidas, porque se baseia na ignorância. É fácil, é
simplista e explora a fragilidade do outro. Normalmente, esconde poderosos interesses económicos, políticos e
ideológicos e, por isso mesmo, é amplamente financiada, mesmo a nível internacional. Repetir muitas vezes a
mesma mentira funciona e a insegurança e o medo são fáceis de vender. E talvez o mais grave de todos estes
aspetos seja o de que a mentira está na base da autocracia.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, promover o
conhecimento, em todos os domínios do saber, será sempre a forma mais eficaz de lutar contra a insegurança,
o medo e a mentira.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Segue-se a intervenção da Sr.ª Ministra do Trabalho…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — É para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, o Chega tinha feito chegar à Mesa a inscrição do Sr. Deputado
Gabriel Mithá Ribeiro para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Alexandre Quintanilha.
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O Sr. Presidente: — Peço desculpa, Sr. Deputado.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gabriel Mithá Ribeiro.
O Sr. Gabriel Mithá Ribeiro (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, restantes membros do Governo,
Srs. Deputados, antes da intervenção dirigida ao Deputado Alexandre Quintanilha, queria deixar esta nota ao
Sr. Primeiro-Ministro: ontem, registei o seu estado de negação, talvez até uma certa hipocrisia. Isto para lhe
dizer que há mais lusofonia no Grupo Parlamentar do Chega do que em muitos grupos parlamentares neste
Parlamento.
Aplausos do CH.
Fica o registo.
A questão que irei fazer ao Deputado Alexandre Quintanilha é esta: como é que se pode falar numa sociedade
do conhecimento, interessada no conhecimento, quando há problemas fundamentais no ensino que estão
recalcados há décadas pela classe política?
O que quero dizer é que os professores continuam desautorizados,…
Vozes do CH: — Exatamente!
O Sr. Gabriel Mithá Ribeiro (CH): — … emocionalmente fragilizados, humilhados, desmotivados, insultados,
agredidos, deprimidos.
Aplausos do CH.
Não é possível construir uma sociedade do conhecimento com este ambiente que temos nas nossas escolas.
Pergunto: por que razões, no Programa do Governo socialista para este ciclo de 2022 a 2026, não existe
uma única palavra de combate à indisciplina nas escolas?
Vozes doCH: — Muito bem!
O Sr. Gabriel Mithá Ribeiro (CH): — Faço a questão de uma outra forma: por que razões continua a não
existir uma defesa intransigente da autoridade dos professores?
Aplausos do CH.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — E da pancada!
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Uns tabefes resolvem isso!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Quintanilha.
O Sr. Alexandre Quintanilha (PS): — Bem, Sr. Deputado, confesso que tenho alguma dificuldade em
encontrar uma resposta, porque pensava que o domínio das reguadas na escola e a forma como a autoridade
é paga…
Aplausos do PS e do BE.
… já não fizesse parte da nossa vivência nas escolas.
Protestos do Deputado do CH Gabriel Mithá Ribeiro.
Portanto, a única coisa que posso dizer é que espero que não voltemos a essa situação.
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Aplausos do PS e do BE.
O Sr. André Ventura (CH): — Estão a bater palmas ao PS, o PS agradece.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Há para aí muita coisa recalcada!
O Sr. André Ventura (CH): — Continuem a bater palmas… Quando ficarem só com um Deputado,
agradeçam ao PS!
O Sr. Presidente: — Segue-se, então, uma intervenção da Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e
Segurança Social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (Ana Mendes Godinho): — Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados: Apresentamos o Programa do Governo numa conjuntura, mais uma vez, desafiante, sob
o peso de uma terrível guerra. Mas isto não inibe a nossa permanente determinação, muito pelo contrário.
Sabemos — e como sabemos bem! — o que são desafios. Enfrentámos, nos últimos dois anos, o desafio
mais interpelante das nossas vidas, causado por uma pandemia. Uma pandemia que nos abanou a todos e que
precisou de respostas fortes do Estado social. Respostas novas, nunca antes testadas, nunca antes
experimentadas, que exigiam uma reorganização e uma mobilização total da segurança social e um foco
permanente na proteção dos cidadãos, dos rendimentos, do emprego, do apoio às famílias, às empresas e ao
setor social.
Em tempo recorde, 3 milhões e meio de pessoas foram abrangidas por mecanismos de proteção novos,
diferentes, criados à medida das novas necessidades que surgiram.
Srs. Deputados, os resultados demonstram que este tem sido um caminho certo. Dois anos depois, com todo
o impacto da pandemia, temos um valor mínimo histórico de 6% na taxa de desemprego, nomeadamente com
os números que já nos indicam, para março de 2022, mais uma vez, a redução de cerca de 18 000 pessoas
inscritas no IEFP (Instituto do Emprego e Formação Profissional) e um recorde de trabalhadores declarados à
segurança social, que atingiu, pela primeira vez, o número de 4 milhões e 800 mil pessoas.
Srs. Deputados, a pandemia não nos impediu de continuar a avançar com reformas estruturantes no Estado
social e no emprego. Aumentámos o salário mínimo, o que — pasme-se a direita — não provocou aumento do
desemprego.
Aplausos do PS.
Pelo contrário, tivemos o maior número de sempre de trabalhadores a contribuírem para a segurança social
e a fazerem parte do sistema.
Ganhámos 26 anos na sustentabilidade da segurança social face a 2015, fruto da capacidade de manutenção
e de criação de emprego, com mais de 600 000 novos postos de trabalho e um aumento de 40% das
remunerações declaradas à segurança social.
Temos, hoje, todos, mais confiança no sistema público de proteção social e, não por acaso, desapareceram
do discurso público as soluções milagrosas, que pareciam únicas, de privatização da segurança social.
Aplausos do PS.
Mobilizámos investimento estrutural, com a aprovação de 250 milhões de euros de investimento em novos
equipamentos sociais, em plena pandemia, para 21 000 pessoas.
Lançámos a gratuitidade das creches. Criámos a «Pensão na Hora», em plena pandemia, que neste
momento já abrangeu 13 000 pessoas, as quais tiveram a sua pensão atribuída no próprio dia, num momento
de simplificação disruptiva do sistema.
Aplausos do PS.
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Assinámos o acordo de concertação social dedicado à formação e ao investimento nas qualificações.
Construímos, em conjunto, a Estratégia Nacional de Combate à Pobreza, focada pela primeira vez em
públicos-alvo e com medidas muito concretas para retirar, até 2030, 660 000 pessoas da condição de risco de
pobreza ou exclusão, entre as quais 230 000 trabalhadores.
Aqui chegados, Srs. Deputados, vivemos o tempo de um novo ciclo, com uma legitimidade social acrescida
e com uma opção expressa e clara do País, feita em 30 de janeiro, para um quadro de estabilidade suportado
nos valores do Estado social.
A escolha do XXIII Governo Constitucional traduz esta opção clara do País pelo caminho que aposta num
crescimento que só pode ser inclusivo, que assume o imperativo de garantir que todos — mas mesmo todos —
fazem dele parte.
Aplausos do PS.
Desde logo, quanto à demografia. Neste contexto, em que é evidente que as pessoas são o recurso mais
valioso que qualquer país tem e em que é evidente a evolução da pirâmide demográfica, é crítico garantirmos,
como País, que criamos as condições para atrair e fixar jovens.
É por isso que assumimos a prioridade de concluir, finalmente, a Agenda do Trabalho Digno como pilar-base
para a valorização dos jovens no mercado de trabalho, enquadrando novas formas de trabalho, garantindo a
estabilidade nas relações laborais e promovendo a real conciliação da vida pessoal, familiar e profissional —
matéria em que Portugal, aliás, é, hoje, pioneiro no debate —, promovendo uma real partilha entre homens e
mulheres, nomeadamente nas responsabilidades parentais e no mercado de trabalho,…
Aplausos do PS.
… procurando atingir a meta ambiciosa, que assumimos no plano do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, de
reduzir para metade a diferença na taxa de emprego entre homens e mulheres e a sua participação ativa no
mercado de trabalho.
Mas também assumimos como prioridade garantir um compromisso com os parceiros sociais no acordo de
rendimentos e competitividade que garanta aos jovens, aos trabalhadores, às empresas um quadro de confiança
e que permita aumentar, até 2026, o peso das remunerações no PIB em 3 pontos percentuais, reequilibrando o
peso dos salários na riqueza nacional, e, em paralelo, continuar o aumento do salário mínimo sem tabus.
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Assumimos ainda a necessidade de
investimento focado e uma resposta ao desemprego jovem e aos jovens NEET (not in education, employment
or training), com uma meta ambiciosa de baixar para menos de 8% a taxa de jovens NEET.
Assumimos igualmente a necessidade de atrair trabalhadores para Portugal, sem complexos, posicionando
o País na vanguarda do acolhimento de novas formas e modelos de trabalho, assim como de captação de
nómadas digitais e de trabalhadores remotos, que podem trabalhar daqui para qualquer sítio do mundo. Mas
também assumimos continuar a garantir a inclusão e o reconhecimento fácil no sistema de segurança social de
qualquer pessoa que escolha Portugal para viver e de qualquer emigrante português, onde quer que ele esteja.
Aplausos do PS.
Fazer parte do sistema de segurança social é estar integrado e garantir que eliminamos redes que aproveitam
a exclusão como forma de riqueza sobre as pessoas. E é por isso que, com a medida que criámos da atribuição
do número de segurança social na hora, conseguimos, em dois anos, trazer para dentro do sistema 300 000
pessoas que já cá estavam, mas que estavam à margem de todo o sistema.
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Também com o exemplo do que tem acontecido com o acolhimento de refugiados que vêm da Ucrânia, fruto
desta capacidade de reinvenção e de integração no sistema, temos já 530 pessoas a trabalhar em Portugal
abrangidas por este sistema de inclusão.
Aplausos do PS.
Queremos ainda continuar a promover as políticas ativas de repovoamento do interior, com discriminação
positiva, dinamizando a mobilidade geográfica dos trabalhadores e tirando partido das novas formas de trabalho,
que permitem que se possa trabalhar daqui, do interior, do nosso centro nevrálgico na Península Ibérica, para
qualquer parte do mundo, e também para levar trabalhadores da Administração Pública, que, a partir do interior,
podem trabalhar para qualquer sítio do País.
Paralelamente, assumimos a prioridade no apoio à infância, que é o foco primeiro para a igualdade de
oportunidades e de quebras reais de ciclos de pobreza, com objetivos e metas muito claros: retirar 170 000
crianças da situação de pobreza ou exclusão até 2030; alargar a capacidade das creches, para que todos
tenham acesso, e a sua gratuitidade para todas as crianças; criar a garantia para a infância, assegurando um
valor mínimo de 1200 € para as crianças que se encontram em risco de pobreza ou exclusão e assumindo-o
como a nossa missão coletiva fundamental; reforçar o abono de família e as deduções fiscais às famílias; e
promover a desinstitucionalização das 8000 crianças que estão hoje em casas de acolhimento — sendo que
muitas delas poderiam estar em acolhimento familiar — e apostar nos modelos de apartamentos de autonomia
para os jovens que estão institucionalizados.
Aplausos do PS.
Não podemos desperdiçar 20% das nossas crianças, que estão em risco de pobreza, e essa tem de ser a
nossa missão.
Quanto aos mais velhos e às pessoas com deficiência e incapacidade, os nossos compromissos são também
muito claros. Promoveremos uma agenda dedicada à longevidade e à promoção da participação e cidadania
ativa dos mais velhos. Criaremos um mecanismo de reforma a tempo parcial, como forma de transição
progressiva do mercado laboral. Implementaremos também novas respostas dedicadas ao envelhecimento ativo
e saudável, com a promoção da autonomia e a não-institucionalização dos idosos e das pessoas com
deficiência. Continuaremos a atualização das pensões, a reposição do valor de referência do complemento
solidário para idosos e do complemento da prestação social para a inclusão para acima do limiar da pobreza.
Mas para tudo isto e como base de tudo isto é essencial e crucial continuar a revolução digital na segurança
social, tornando-a mais próxima e mais compreensível para os cidadãos e para as empresas e mais apta para
os desafios que enfrentamos. Desde logo, reorganizando a segurança social — uma segurança social que a
pandemia abanou —, expondo a urgência da sua transformação e da sua digitalização ao serviço das pessoas,
criando uma prestação social única para eliminar complexidade, ruído, dificuldade, tornando a segurança social
mais simples e eficaz. Tornando as prestações sociais em prestações sociais automáticas, sem necessidade de
pedido, a exemplo do que é evidente que podemos fazer com o abono de família.
Aplausos do PS.
Uma segurança social que só cumpre a sua função de promover a igualdade de oportunidades se for simples,
próxima e acessível a todos, em particular aos que dela mais precisam e que estão em situação de maior
vulnerabilidade e com menos informação.
Uma segurança social das pessoas, é esta a nossa missão. Uma sociedade que só cresce com
oportunidades iguais para todos, num País que se renova, num País para todos e que precisa de todos, um País
que só cresce com inovação, com diversidade, com inclusão e com a força e a missão que nos move e — estou
certa — que nos une a todos.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra, que desde já saúdo, nesta que foi a sua primeira
intervenção em Plenário, nesta Legislatura.
A Mesa registou a inscrição de oito Srs. Deputados para lhe fazerem pedidos de esclarecimento e foi
informada de que a Sr.ª Ministra responderá em blocos de quatro.
Assim sendo, para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do PCP.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra,
são os trabalhadores do nosso País que produzem a nossa riqueza. Os que no presente trabalham e mantêm o
País a funcionar e os que, estando hoje reformados, trabalharam no passado, muitos com longas décadas de
contribuição para a segurança social.
Ao aumento geral dos salários, que é uma emergência nacional, tem de se juntar também aquela que é a
premente necessidade de se assegurar um aumento extraordinário de todas as pensões, de forma a repor o
poder de compra perdido ao longo dos anos e o que se está a perder face aos números da inflação. Quem
trabalhou toda uma vida está hoje a escolher que conta pagar este mês, porque a reforma não estica no fim do
mês.
É que o brutal aumento do custo de vida que está a ser imposto é, também ele, uma forma de cortar salários
e pensões, Sr.ª Ministra. E se há partido que se tem batido pela valorização das pensões é o PCP, e os cinco
aumentos consecutivos extraordinários que foram alcançados resultam exatamente dessa insistência que
tivemos,…
O Sr. João Dias (PCP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … embora tivessem ficado aquém do que propomos, porque o Governo
apresentou resistências a garantir este aumento a todos os reformados e pensionistas.
O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Mas o que se impõe também, face à realidade que hoje temos, face às
dificuldades sentidas, é mesmo um aumento extraordinário das pensões para todos os reformados e
pensionistas que reponha, efetivamente, o poder de compra que está a ser perdido.
É igualmente fundamental, Sr.ª Ministra, reconhecer e valorizar as longas carreiras contributivas de quem
contribuiu com uma vida de trabalho para o País, assegurando o direito à reforma sem qualquer penalização a
quem tenha 40 anos de descontos, independentemente da idade, e acabar com o fator de sustentabilidade, bem
como com penalizações que atingem trabalhadores que foram empurrados para reformas antecipadas e que
continuam com cortes injustos nas suas pensões e reformas, e este não é um caminho que o Governo assuma
no Programa que aqui apresenta.
Sr.ª Ministra, a senhora falou da segurança social. A defesa da segurança social pública, universal e solidária
exige que a mesma tenha condições para cumprir a sua missão. Isso exige o reforço de trabalhadores, não
trabalhadores com vínculo precário, mas trabalhadores com vínculo efetivo à segurança social, que sejam
devidamente valorizados, e exige também a criação de emprego com direitos, a valorização dos salários, o
combate ao desemprego, o fim da precariedade e não a sua legitimação, o combate à fuga e à evasão
contributivas e a ampliação das fontes de financiamento da segurança social, mas bem além daquilo que o
Governo propõe no seu Programa.
A garantia da proteção social e dos direitos sociais dos trabalhadores, das famílias, dos reformados, das
crianças, das pessoas com deficiência exige melhores condições de proteção no desemprego, a que o Governo
tem fugido, mas também o reforço das prestações sociais, a universalidade do abono de família, enquanto direito
da criança, o reforço dos valores da prestação social para a inclusão, bem como o melhor acesso a esta mesma
prestação.
Mas exige também, Sr.ª Ministra, uma rede pública de equipamentos sociais — lares, creches e outros. A
Sr.ª Ministra falou dos equipamentos sociais, mas o que se exige é uma rede que tenha gestão pública, na
responsabilidade da segurança social, que responda às carências que ainda persistem, combata as
desigualdades no acesso a estes equipamentos e promova os direitos dos utentes.
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Sr.ª Ministra, que respostas é que, efetivamente, o Governo dá aos reformados, às crianças, às pessoas com
deficiência e às famílias no âmbito da proteção social e dos seus direitos sociais?
É que aquilo que está neste Programa fica muito aquém daquilo que é necessário e também daquilo que é
possível.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro, do
PS.
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, este
debate do Programa do XXIII Governo Constitucional ocorre no contexto da devastadora guerra que foi lançada
pela Federação Russa à Ucrânia, com todas as suas consequências militares, sociais e económicas, que são
sentidas pelas empresas, pelos trabalhadores, pelos pensionistas, pelos portugueses em geral.
Combatemos esta turbulência com várias medidas para salvaguardar o poder de compra e combater as
pressões inflacionistas no curto prazo, sobretudo nos setores agroalimentar e da energia, que o Sr. Primeiro-
Ministro aqui ontem anunciou, mas este é um Programa para uma legislatura de quatro anos e meio, com um
conjunto de objetivos estruturantes, de crescimento com coesão social, que a Sr.ª Ministra do Trabalho,
Solidariedade e Segurança Social aqui agora apresentou.
Sabemos que várias das medidas que a Sr.ª Ministra aqui apresentou e que constam do Programa já podiam,
de facto, estar em vigor, com os portugueses a senti-las no bolso desde janeiro. Agora, ouvi a intervenção do
PCP sobre esta matéria, nomeadamente sobre as pensões, e, com toda a estima, Sr.ª Deputada Diana Ferreira,
os pensionistas só não sentem o aumento extraordinário de pensões porque o PCP se juntou à direita para
chumbar o Orçamento do Estado onde esses aumentos constavam.
Aplausos do PS.
De facto, houve quem decidisse interromper a trajetória que vínhamos seguindo desde 2015, abrindo uma
crise política que os portugueses resolveram dando uma sólida maioria ao Partido Socialista, ao Primeiro-
Ministro e a este Governo.
Srs. Deputados, os portugueses que acompanham as várias intervenções proferidas por parte dos partidos
da oposição devem ouvir, de facto, com muita estranheza aquilo que estamos aqui a ouvir, aquilo que temos
ouvido ontem e hoje. Isto porque esta maioria absoluta, que é exercida e será exercida com espírito de diálogo
e de humildade, não é uma maioria que vá substituir o programa de quem ganhou pelo programa de quem
perdeu as eleições, como os partidos da oposição aqui parecem querer fazer.
Aplausos do PS.
Porque foi mesmo o Partido Socialista quem ganhou as eleições, porque foi este Primeiro-Ministro que
ganhou as eleições e porque será este Governo, com o apoio maioritário dos portugueses, que vai levar o País
para a frente.
Este Programa que aqui é apresentado segue uma linha de reformismo com coesão, que é a marca
estruturante da governação do Partido Socialista — entre 2015 e o ano passado, o aumento da dotação
orçamental da segurança social foi de 5,2 mil milhões de euros.
Aumentámos cumulativamente o salário mínimo em 40%, valorizando a vida de quem trabalha; aumentámos
pensões ano após ano; aumentámos o salário médio; fizemos reposição de rendimentos, de carreiras, de
direitos; aumentámos prestações sociais e criámos novas prestações sociais; revertemos privatizações e outras
medidas de desmantelamento, com as privatizações que os senhores fizeram no País, e fizemos alterações à
legislação laboral.
Aplausos do PS.
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Mais recentemente, combatemos a maior emergência social e sanitária do último século, protegendo
cidadãos e empresas, mostrando bem a diferença que faz a governação do Partido Socialista na resposta a uma
crise, porque nós, ao contrário da direita, ao contrário do que outros fizeram, substituímos a austeridade pela
solidariedade e substituímos o medo pela esperança.
Aplausos do PS.
Risos do CH.
Protestos do PCP.
Srs. Deputados, sei que não gostam de ouvir, mas vão ter mesmo de ouvir até ao fim.
Protestos da Deputada do PSD Joana Barata Lopes.
Tenha calma, Sr.ª Deputada! Tenha calma, não há segunda volta das eleições! Tenha calma!
Tudo isto permitiu crescimento económico, queda histórica do desemprego, convergência com a Europa,
contas certas, recuo da pobreza e melhoria generalizada das condições de vida dos portugueses.
No coração da solidariedade nacional, em apenas seis anos, uma em cada quatro pessoas que estavam em
risco de pobreza deixou essa condição.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Foram retirados mais de 700 000 compatriotas da condição de
exclusão social.
Estes foram anos de avanços que nos orgulham, que os portugueses reconheceram nas eleições legislativas,
e é isso que continuaremos a fazer: a avançar, a avançar, a avançar, mesmo que os senhores não queiram.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já excedeu o dobro do seu tempo.
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sr.ª Ministra, gostaria de questioná-la sobre a Agenda do Trabalho
Digno e a política de valorização de rendimentos neste Programa, aprofundando, em concreto, o vetor dos
salários e das condições laborais dos mais jovens, assumindo nestas preocupações uma maioria de
estabilidade, de progresso e de desenvolvimento que responda a todas as gerações nacionais.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro, do Bloco
de Esquerda.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, ouvi a sua intervenção, naturalmente lemos
o Programa do Governo e, deixando de lado a euforia com nómadas digitais e «unicórnios», com Startup Nations
e incubadoras, não se anuncia nenhuma vontade de qualquer transformação a sério no campo do trabalho:
salários que se vejam, garantia de contratos, combate real ao abuso, fim da impunidade, proteção social para
todos.
Não têm faltado, nos últimos anos, discursos do Governo sobre a inclusão, sobre as gerações qualificadas,
sobre a importância de combater a precariedade, de garantir um trabalho digno, mas, ao mesmo tempo que esta
retórica se tornou corrente, o padrão de precariedade manteve-se intacto.
Continuamos a ter 10% de trabalhadores pobres; quem estudou e achou que ia ter um emprego decente
continua a saltar entre contratos a prazo; quem ganha 850 € ou 900 € numa profissão qualificada tem de fazer
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uma ginástica absurda para conseguir pagar a renda de casa e a situação está pior com a inflação. Quem
trabalha na cultura continua a recibo verde e sem ter acesso a subsídio de desemprego; quem é roubado pelas
empresas de trabalho temporário ou é atirado para uma situação de outsourcing para ganhar menos que o seu
colega continua a sentir que as empresas gozam com a lei e com a fiscalização do trabalho.
E, no mesmo Pingo Doce que especula, agora, com os preços e que distribui milhões em dividendos, um
trabalhador com o salário mínimo teria de trabalhar 257 anos para ganhar o que o administrador da sua empresa
ganha num ano.
Sr.ª Ministra, Srs. Membros do Governo, isto gera descrédito, sentimento de injustiça para quem trabalha e
não consegue sair da cepa torta, gera um sentimento de impunidade, porque entre o que dizem os programas,
as leis, as regras e aquilo que realmente acontece na prática vai um mundo de distância.
O Governo tem no seu Programa promessas que se arrastam há anos. Anuncia neste Programa do Governo
que vai agora — atenção! — aplicar a taxa de rotatividade, que anunciou umas 50 vezes nos últimos seis anos
e que continua a não existir, mesmo depois de estar na lei. E não é caso único.
Da chamada Agenda do Trabalho Digno, o Governo decidiu pôr umas partes no Programa do Governo e não
pôr outras. Qual foi o critério? Deixou de lado o que poderia causar algum irritante às confederações patronais,
que já saudaram a maioria absoluta.
Srs. Membros do Governo, precisamos de uma transformação contra a injustiça e não das mesmas palavras
de sempre e precisamos, no imediato, de uma subida intercalar de salários,…
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Muito bem!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — … no público e no privado, porque se isso não for feito o que o Governo
está verdadeiramente a anunciar neste debate é uma condenação. Quem vive do seu trabalho vai ter uma parte
do seu salário comida pela inflação e, portanto, vai ser punido por esta política, ao mesmo tempo que os grandes
grupos da energia e da grande distribuição se mantêm intocados nos seus lucros e na sua prática especulativa.
Ora, isto, na prática, na vida real, não será mais, Sr.ª Ministra, do que uma revisão em alta da desigualdade.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes, do
PSD.
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, tenho um esclarecimento muito simples para lhe pedir, muito simples mas muito
relevante, porque tem que ver com matérias da vida dos trabalhadores, das famílias e das empresas. Trata-se
das alterações à legislação laboral, da Agenda do Trabalho Digno e do diálogo social. É que, a este respeito, o
Governo tem falado a várias vozes e o Programa do Governo também não nos esclarece.
Ontem, o Sr. Primeiro-Ministro disse aqui que esta maioria absoluta iria promover o diálogo social e a Sr.ª
Ministra, hoje, falou na concertação social e disse que iria promover o diálogo social. Na passada semana, a
Sr.ª Ministra da Presidência disse que as alterações à lei laboral seguem para o Parlamento sem voltarem à
concertação social. É assim que os senhores veem o diálogo social?
Aplausos do PSD.
Vou lembrar ao Governo que estas alterações, aprovadas no final da anterior Legislatura, levaram a que,
pela primeira vez, os parceiros sociais anunciassem o abandono da concertação social, tal foi o desrespeito com
que os trataram. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro teve a oportunidade de lhes pedir desculpa.
Portanto, é fundamental perceber se o Governo vai efetivamente levar esta matéria, tal como deve ser, à
concertação social ou se vai começar aqui a dar o exemplo de maioria absoluta/poder absoluto.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados,
procurando responder a cada uma das perguntas que me foram colocadas, desde logo, começarei pela Sr.ª
Deputada Diana Ferreira.
Sr.ª Deputada Diana Ferreira, o que é essencial, neste momento, é mesmo garantir que o Orçamento do
Estado entre rapidamente em vigor, pois o Orçamento do Estado vem já responder aos problemas,
nomeadamente os que identificou, desde logo, garantindo o aumento extraordinário dos pensionistas, com
retroatividade desde janeiro. Isso é crucial no momento que vivemos e, portanto, é urgente que este Orçamento
do Estado entre rapidamente em vigor. Acho que todos já perdemos demasiado tempo para garantir que estas
medidas são colocadas, de facto, no terreno.
Com o Orçamento do Estado que teremos para 2022, iremos abranger 2 milhões e 300 mil pensionistas, com
uma atualização extraordinária, com efeitos a janeiro, para garantir que todas as pessoas que têm uma pensão
até 1108 € tenham, de facto, este aumento extraordinário de 10 €, que corresponde a 200 milhões de euros em
termos do orçamento da segurança social.
Aquilo que assumimos, após aprovação do Orçamento do Estado, foi também garantir, desde logo, as
medidas de apoio às famílias, concretamente, o reforço do abono de família e a implementação, pela primeira
vez, da garantia para a infância, para responder às situações de pobreza extrema das crianças, o que, no
momento que vivemos, diria que é ainda mais crítico e crucial. Portanto, precisamos rapidamente que o
Orçamento do Estado entre em vigor para chegar às populações mais vulneráveis.
Dito isto, Sr.ª Deputada, como também colocou a questão da diversificação das fontes de financiamento da
segurança social, dir-lhe-ia que esse é, de facto, um dossiê que queremos que tenha um debate alargado e
informado, por parte de todos e com a mobilização de todos, para uma reflexão sobre a diversificação das fontes
de financiamento e sobre os modelos de financiamento face, também, às mudanças do mercado de trabalho
que temos vivido. É crítico colocar este tema no centro da nossa agenda, sem alterações avulsas ou
intempestivas, pois esta precisa de uma leitura global para garantir que continuamos com a confiança e a
segurança do sistema que conseguimos atingir, coletivamente, desde 2015, e que nos permitiu, aliás, passar a
ter este debate e não outro debate, que é o da privatização.
Aplausos do PS.
Portanto, este é mesmo o tempo da discussão de fundo estratégica sobre novas formas de financiamento e
de modelos de financiamento da segurança social, para a qual, aliás, lançamos, desde já, o repto para o
envolvimento de todos.
Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro, perguntou como colocamos na agenda e garantimos que é dada
prioridade à valorização dos rendimentos e à valorização dos jovens no mercado de trabalho. Essa, diria, é
mesmo, neste momento, a maior prioridade do País. Não se trata de um problema só dos jovens, mas também
do País e das empresas, se não os conseguirmos reter e atrair.
Portanto, este é um desafio global, a que temos de responder de uma forma global. Por isso, este
compromisso tem de ser um compromisso de todos, envolvendo todos os parceiros sociais nesta discussão e
garantindo que temos, de uma forma estável, um quadro previsível que nos permita, de facto, esta solução, de
uma forma tripartida, entre Estado, parceiros sociais, representantes dos empregadores e representantes dos
trabalhadores, para que cada um, dentro das suas responsabilidades e das suas capacidades, assuma também
o esforço partilhado para que isto aconteça: o Estado, naturalmente, naquela que é a sua dimensão para a
discriminação e o incentivo das empresas que valorizem os salários e que valorizem os jovens no mercado de
trabalho e a inovação, nomeadamente por via do alargamento do IRS Jovem ou de mecanismos fiscais, e
também, naturalmente, as empresas, no seu esforço partilhado por via da valorização e do aumento salarial,
que é mesmo crítico para conseguirmos reter talento, o fator decisivo da nossa afirmação e do nosso futuro
coletivo.
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Muito bem!
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A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Naturalmente, este compromisso global
deve ter várias dimensões, além da valorização dos salários, mas também a capacidade de encontrar os
instrumentos que incentivem e valorizem a negociação coletiva como o espaço privilegiado para que isso
aconteça ao longo dos próximos anos, com a criação, nomeadamente, de instrumentos de discriminação
positiva, de incentivos e de condições de acesso para as empresas que tenham contratação coletiva, dinâmica
e diálogo social ativo.
Paralelamente, também a capacidade de retermos e atrairmos talento e jovens, em Portugal, depende de um
quadro global de intervenção mais vasto, que precisa, também aqui, desta capacidade de mobilização, não só
dos programas de políticas de habitação pública, que estão a ser desenvolvidos e que estão a ser reforçados,
mas também ao nível de medidas de apoio às famílias, concretamente através do alargamento da rede de
creches e também da gratuitidade, que é crítica para que os jovens tenham condições para aqui decidirem, com
liberdade e capacidade de decisão, sem constrangimentos, a sua opção por Portugal.
Sr. Deputado José Soeiro, em relação às dúvidas que colocou, mais uma vez aqui reitero que é urgente, de
facto, conseguirmos implementar a Agenda do Trabalho Digno, que, por razões que não são imputáveis ao
Governo, ficou interrompida precisamente pela dissolução do Parlamento.
Portanto, temos de garantir, mais uma vez, que aceleramos e recuperamos o tempo perdido. Estamos numa
fase em que é fundamental garantir a Agenda do Trabalho Digno — a evidência demonstra-o nas próprias
empresas, que, neste momento, já demonstram a grande dificuldade em contratação e em encontrar recursos
humanos disponíveis para trabalhar — como o elemento decisivo para demonstrar aos jovens que este é o País
para decidirem viver e trabalhar.
Desde logo, e olhando para a evolução dos números da precariedade nos últimos anos, a verdade é que
tivemos taxas de contratos a termo e não permanentes muito fortes, nomeadamente no pós-troica, de cerca de
22% em 2015, e, neste momento, a percentagem de contratos não permanentes é ainda de 14,4%, o que
significa que temos ainda um longo caminho a percorrer e que essa tem de ser a nossa prioridade total, não só
através…
O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, permita-me recordar-lhe que ainda tem quatro pedidos de esclarecimento.
O Sr. André Ventura (CH): — Deixe andar!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Não só através do reforço dos
mecanismos legais, através da Agenda do Trabalho Digno, que é uma Agenda, aliás, muito extensa e forte, mas
também em termos de reforço de fiscalização e, também, de novas formas de enquadramento de trabalhadores,
como foi o caso do Estatuto da Cultura, que temos de, aliás, alargar a outro tipo de situações para enquadrar
cada vez mais novas formas que se adaptem ao mercado trabalho.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, antes de passar à segunda série de pedidos de esclarecimento, devo
informar a Câmara de que acaba de entrar na Mesa uma moção de rejeição do Programa do Governo,
apresentada pelo Grupo Parlamentar do Chega, que será imediatamente distribuída por todos os grupos
parlamentares, assim como à bancada do Governo.
Aplausos do CH.
Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Dias, do PCP.
O Sr. João Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Deputado Tiago
Barbosa Ribeiro, permita-me, antes de mais, dizer que lhe fica mal faltar à verdade. O Sr. Deputado sabe
perfeitamente que os aumentos extraordinários das pensões só ocorreram por iniciativa e proposta do PCP e
só não fomos mais longe porque o Governo PS não quis. Poderia ter ido, tinha condições económicas e políticas
para o ter feito, e não o fez porque não quis.
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Aplausos do PCP.
Pelo menos assuma a verdade do que foi feito!
Sr.ª Ministra, o Programa do Governo diz que «as condições para as pessoas terem e criarem filhos em
Portugal são ainda percecionadas por muitos casais jovens como insuficientes».
O PCP quer aqui deixar claro que não se trata de um problema de perceção. A política de desvalorização do
trabalho, dos trabalhadores, dos salários, dos serviços públicos, isso sim, tornou cada vez mais difícil a um
jovem autonomizar-se, quanto mais ter filhos, ter um projeto de vida e criar condições para ter uma família em
tranquilidade.
Como podem os jovens planear seja o que for quando a instabilidade dos vínculos já é mais regra do que
exceção? Como pode um jovem ser autónomo sem saber se terá emprego amanhã ou, então, sabendo que, em
breve, será substituído por outro, igualmente precário, quando os salários não são dignos e não chegam para
pagar uma renda, quando os elevados custos com habitação são o que são, esmagando qualquer possibilidade
de ter o seu espaço? Quando os horários de trabalho são cada vez mais desregulados, impedindo a conciliação
da vida profissional com qualquer aspeto da vida pessoal, não terão, certamente, a possibilidade de ter filhos e
de poder acompanhá-los, como é seu direito e o direito das crianças.
Sr.ª Ministra, que resposta dá o Governo a estas questões?
No que toca à precariedade, Sr.ª Ministra, o Governo acaba por legitimá-la quando deveria simplesmente
acabar com a permissividade e fazer cumprir o princípio de que a um posto de trabalho permanente deve
corresponder um vínculo efetivo.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua a sua intervenção.
O Sr. João Dias (PCP): — Termino já, Sr. Presidente, dizendo que, se não tivermos uma rede pública de
creches gratuita, não estarão garantidos o presente e o futuro das crianças. Porque recusa o Governo assumir
este compromisso, Sr.ª Ministra?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Matias, do
Chega.
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.ª Ministra, hoje, já aqui
tínhamos falado sobre jovens e a resposta do Sr. Ministro da Economia foi a de que vão tentar encontrar um
caminho.
As respostas da Sr.ª Ministra são igualmente vagas. Pergunto: seis anos depois, ainda estão à procura de
um caminho? É que os jovens portugueses não têm mais tempo, porque ser jovem em Portugal, atualmente,
significa pertencer a um verdadeiro grupo de risco.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Temos a quinta taxa mais alta de desemprego jovem na União Europeia. Os
jovens portugueses são, na Europa, os que têm mais dificuldades para sair de casa dos pais. Mais de 70% dos
jovens trabalhadores portugueses recebem menos de 950 €/mês. Isto deveria envergonhar os Srs. Ministros.
Aplausos do CH.
Com este valor, e face a despesas básicas, como renda, água, luz, como é que é possível para um jovem
português chegar ao fim do mês com um saldo positivo na conta? Como é que é possível poupar para juntar a
verba necessária para dar entrada para uma casa? Estas são as perguntas que os jovens portugueses querem
ver respondidas aqui.
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Até hoje, a resposta dada pelos Governos socialistas é que os jovens não saiam de casa dos pais e, caso o
tenham feito, que regressem o mais rápido possível ou, então, que procurem um futuro lá fora.
Vemos no documento que debatemos uma série de programas e metas para os jovens, para o emprego
jovem. É tudo muito bonito, mas questiono qual é o realismo dos mesmos. Se olharmos para os programas que
já existem, como o Porta 65, e os compararmos com a realidade, percebemos um desfasamento. Este programa,
no presente ano, defende como renda máxima admitida para financiamento, por exemplo, na cidade de Lisboa,
T0 e T1 até aos 581 €. Onde é que encontra um T1 em Lisboa por este valor? Talvez só mesmo uma tenda num
parque de campismo.
Aplausos do CH.
Os jovens portugueses não precisam que desperdicem verbas em disciplinas de cariz ideológico nas escolas,
em questionários ridículos ou em programas alheios à realidade.
Aplausos do CH.
Os jovens precisam de saber se podem ter um futuro em Portugal. E o que eu pergunto é se terão coragem
de ir além deste programa, que, como já se viu, promete uma mão cheia de nada aos jovens portugueses.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco César, do
PS.
O Sr. Francisco César (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e restantes
membros do Governo, Sr.ª Ministra, permita-me que a cumprimente pelo seu novo mandato, mas também por
ser responsável, ou parcialmente responsável, por um Orçamento que foi, provavelmente, dos orçamentos mais
à esquerda da história da democracia portuguesa. Foi dos orçamentos que maior preocupação teve com as
questões sociais, com o crescimento inclusivo, e foi este Orçamento que, por acaso, foi chumbado pela
esquerda, pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista Português.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Ministra terminou a sua intervenção com uma frase que é muito significativa daquilo que é o programa
e a matriz do Partido Socialista: uma sociedade só cresce quando proporciona igualdade de oportunidades para
todos.
O trabalho feito pelo Governo da República foi providencial, essencial durante a COVID-19. Foi também um
trabalho de combate à precariedade, de fomento do trabalho digno, tendo como prioridade a conciliação da vida
profissional com a vida pessoal. Foi igualmente um trabalho de estabelecimento de uma rede social sem paralelo
na história da democracia portuguesa, rede social que é, aliás, complementada por IPSS (instituições
particulares de solidariedade social) e mutualidades.
É nesse sentido que lhe pergunto, Sr.ª Ministra, qual é a previsibilidade que pode dar a estas instituições, em
termos de apoios, no sentido de poderem ajudar e complementar o Estado no seu trabalho de apoio social.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Por último, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e
Segurança Social, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Barata Lopes, do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª
Ministra, dizia ontem o Sr. Primeiro-Ministro: «Agora temos as condições para fazer o que é necessário fazer.»
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Tive, portanto, esperança de que a Sr.ª Ministra aqui falasse, com clareza e concretização, da necessidade de
debater a sustentabilidade do sistema de pensões, sem dogmas ou papões ideológicos,…
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — … a sustentabilidade a sério e não aquela que recai naqueles que
tentam aceder à pensão e estão cerca de um ano, ou mais, à espera de a receber.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — É que a defesa do Estado social, de que o Sr. Primeiro-Ministro nos
falou tanto ontem, é a defesa de todos, dos que hoje recebem pensões e daqueles que as virão a receber, e só
é verdadeiramente defesa do Estado social se defender a tutela dos direitos adquiridos e dos direitos a
informação, como o todo que deve ser.
O Sr. Primeiro-Ministro disse que iria garantir que a geração mais preparada fosse também, no nosso País,
a geração mais realizada. Sr.ª Ministra, a Comissão Europeia antecipa que alguém que se reforme em Portugal
daqui a 20 anos vá viver com uma pensão correspondente a cerca de metade do salário com que vivia até
àquele momento, numa acentuada tendência para piorar até 2070. Sr.ª Ministra, parece-lhe que esta geração
vai sentir-se realizada?
Dir-me-á que robusteceram financeiramente a segurança social durante a pandemia. Sr.ª Ministra, este
relatório de que lhe falo é o da atualização de pensões em 2021 e os senhores, que vêm, no vosso Programa,
falar em estimular a adesão a certificados de reforma ou poupanças idênticas, são incapazes de reconhecer que
as tais medidas avulsas são insuficientes para resolver a deterioração da resposta do nosso sistema de pensões.
O Sr. Presidente: — Peço à Sr.ª Deputada que conclua, porque terminou o seu tempo.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
O PS chumbou aqui todas as propostas que o PSD apresentou pela transparência e pelo debate. Dizem que
agora têm condições para fazer o que é necessário; pergunto se terão a coragem.
Termino, Sr. Presidente, lembrando que o Sr. Primeiro-Ministro já aqui citou Jorge Palma, e eu retribuo: «Ai,
Portugal, Portugal, de que é que tu estás à espera?» É que a reforma das pensões não pode esperar mais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança
Social.
Sr.ª Ministra, dispõe apenas de 3 minutos e 10 segundos.
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados,
quero, desde logo, reiterar a preocupação que transmiti anteriormente, que é a seguinte: não podemos atrasar
mais a implementação do que é urgente e crítico para Portugal. Já perdemos demasiado tempo com
interrupções.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — É mesmo fundamental acelerarmos.
De facto, atrasarmos a implementação da Agenda do Trabalho Digno resultou da incapacidade que houve de
percebermos que esse era um interesse que nos unia a todos e que deveria ter permitido ultrapassar barreiras,
muros e ameias. Claramente, não podemos atrasar mais a implementação.
Não podia estar mais de acordo, e esta é uma questão que, com os parceiros sociais — aproveitando também
para responder à Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes —, foi muito debatida ao longo de dois anos, em que
trabalhámos em conjunto sobre o Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, e assim continuaremos sempre a
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fazer, num permanente diálogo e sem nunca fecharmos portas a melhorar tudo aquilo que fizermos. Aliás,
também teremos o espaço aqui, no Parlamento, para o fazer,…
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Mas vai ou não à concertação social?!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — … mas sempre de portas abertas, com
os parceiros sociais, e para melhorar tudo aquilo que conseguirmos, de forma conjunta e em diálogo social.
Sr.ª Deputada Rita Matias, eu imagino o que seria, com um Governo do Chega, o apoio às medidas do
emprego jovem ou às medidas de política pública de apoio aos jovens. Basta pensarmos ou relembrarmos a
teoria de que se deve distinguir entre pessoas de bem e pessoas que não o são. Pergunto-me se iríamos
distinguir, então, quem seriam os jovens de bem que iríamos apoiar.
Aplausos do PS.
Protestos do CH.
Por outro lado, tenho de dizer que a pandemia mostrou, de facto, e deu-nos a todos uma legitimidade social
acrescida para acelerar investimento e focar investimento, aliás, com a oportunidade de instrumentos financeiros
que foram mobilizados de forma inédita, também para responder às fragilidades sociais e aos problemas a que
tivemos de dar resposta de uma forma mais acelerada, como foi o exemplo do apoio ao emprego jovem.
Foi nesse sentido, aliás, que mobilizámos uma grande parte dos recursos do PRR, e também serão
mobilizados do PT 2030, para apoio às qualificações e à formação, nomeadamente em áreas estratégicas de
desenvolvimento.
O Sr. André Ventura (CH): — Quais são?
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Nesse sentido, aproveito para dizer
que temos já previsto, neste momento, um grande investimento por parte do IEFP em áreas decisivas, como a
área digital, a área ambiental e a área do setor social. Além disso, temos também um programa, que já lançámos
em março, dedicado ao apoio à contratação de jovens em contrato permanente, pela primeira vez, para apoiar
o combate decisivo à precariedade, apoiando apenas contratos que sejam contratos permanentes. Em 15 dias,
o programa já abrangeu 3300 jovens, mostrando a sua grande capacidade de mobilização no terreno.
O Sr. Presidente: — Peço, Sr.ª Ministra, que conclua, se faz favor.
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Sr. Presidente, termino, aproveitando
o repto do Sr. Deputado Francisco César, para dizer que, neste momento, assumimos como grande prioridade,
fruto também do acordo que foi assinado com o setor social, a criação, pela primeira vez, de um centro de
competências dedicado à economia social, que vai ficar na Guarda. Trata-se de um centro ibérico, com uma
parceria com Espanha, para atingir toda a economia social da Península Ibérica, ganhando aqui escala, e com
a assunção de uma partilha equitativa nos custos das respostas sociais, nomeadamente às pessoas mais
vulneráveis, porque este é um compromisso de todos, do Estado social, e o Estado social faz-se com todos,
com o setor público, mas também com o setor social, a quem agradeço profundamente todo o trabalho durante
a pandemia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Rui Paulo Sousa, do Grupo
Parlamentar do Chega. Faça favor.
O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e restantes membros do Governo, Srs.
Deputados: No seu Programa, o Governo propõe-se travar um combate à fraude e à evasão fiscal e construir
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um sistema fiscal mais justo. Porém, não conseguimos compreender, e talvez nos possam explicar, como pode
haver um combate efetivo à fraude e à evasão fiscal sem uma justiça célere. Como se quer combater a fraude
e a evasão fiscal se os infratores podem contar com uma justiça lenta e ineficaz, que traz consigo a impunidade?
No Programa do Governo afirma-se que se pretende tornar a justiça mais próxima, mais eficiente e mais
célere, mas nada de concreto se propõe para a resolução dos atrasos nos tribunais fiscais, que, nalguns casos,
chegam aos 20 anos na primeira instância e mais de 10 anos nos tribunais superiores.
Aplausos do CH.
Será que o desinteresse do Governo em resolver, de forma contundente, imediata e efetiva, a morosidade
processual destes tribunais reside no facto de o seu deficiente funcionamento justificar a existência de uma
espécie de «tribunais privados dos grandes contribuintes», que é a chamada arbitragem tributária?
É uma vergonha que, neste momento, existam duas justiças fiscais no nosso País, a justiça dos ricos e a
justiça dos pobres.
Pergunto: como pode o cidadão de bem compreender que os grandes grupos empresariais e os BES (Banco
Espírito Santo) do nosso País possam ter uma decisão em pouquíssimos meses e o pequeno contribuinte, para
resolver o seu litígio de pequenas quantias de IRS e outros impostos, tenha de esperar, por vezes, 10 e 20
anos? É que o pequeno contribuinte não pode pagar os elevadíssimos montantes das custas exigidos na
arbitragem tributária. Aliás, o pequeno contribuinte mal pode pagar a brutalidade das custas que são hoje
exigidas para o acesso aos tribunais em geral.
Então, vejamos: a justiça fiscal não funciona, tem atrasos dantescos e, ainda assim, os contribuintes têm de
continuar a pagar custas processuais de valores excessivos. É intenção do Governo transformar a justiça fiscal
numa justiça voltada apenas para os ricos? É que, como sabe, Sr. Primeiro-Ministro, uma justiça lenta não é
justiça.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Pacheco de Amorim, do
Chega. Faça favor.
O Sr. Diogo Pacheco de Amorim (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados:
Para ser sucinto, diria, com alguma ironia, que este Programa do Governo se divide, grosso modo, em duas
partes: uma primeira, onde se cantam os feitos gloriosos dos dois anteriores Governos do Partido Socialista, é
poesia épica, questão de jogo de palavras. Aliás, há bocado, ouvindo o Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro,…
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Outra vez?!
O Sr. Diogo Pacheco de Amorim (CH): — … percebemos o que se passa: chama-se sobriedade à
austeridade e passamos de Portugal para a Suíça num passe de mágica.
Aplausos do CH.
Temos, depois, uma segunda parte, onde se desenham os quatro anos a vir, e é poesia lírica. Aliás, nunca
se cumpre, está sempre previsto, mas nunca está realizado.
Tendo em conta os programas dos dois anteriores Governos da responsabilidade do PS, nunca cumpridos,
nada terá que ver com a realidade futura, porque, mais uma vez, ficará seguramente por cumprir.
A título de exemplo, no que se passa com as comunidades: no Programa de 2015, que lhe dedicou cinco
páginas, nenhuma das muitas promessas foi cumprida; o Programa de 2019, que foi mais modesto ou mais
prudente, a essas comunidades dedicou apenas uma página e tudo ficou por cumprir; ora, neste atual Programa,
que faz praticamente as mesmas promessas e numa mesma página, também ela quase igual à de 2019, tudo
nos leva a concluir que essas promessas não serão cumpridas.
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Tentemos ajudar o Governo com uma sugestão. Este Programa promete reforçar as condições de
participação cívica e política dos portugueses residentes no estrangeiro. Para materializar esta vaga promessa,
estará o Governo disposto a promover a maioria qualificada necessária para abrir a possibilidade de os membros
das comunidades com residência também em Portugal poderem votar nas autárquicas na autarquia da sua
residência? Estou em crer que o Governo encontrará um apoio bem claro nos demais partidos para estas
alterações. Com o do Chega, seguramente, poderá contar.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto, do Chega, a quem
recordo que só dispõe de 30 segundos.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Depois de termos
estado toda a manhã a assistir a este arrufo de namorados entre o Partido Socialista, o PCP e o Bloco de
Esquerda, o namoro acabou, o casamento acabou, já percebemos, vamos continuar.
É bom que este Governo reconheça que a segurança constitui um pilar fundamental do Estado de direito
democrático. O que é estranho é, simultaneamente, desvalorizar o trabalho das forças de segurança pública.
Muito rapidamente: é estranho que neste Programa do Governo não haja uma palavra para com os polícias,
que todos os dias estão nas ruas a zelar pela nossa segurança e pela das nossas famílias,…
Aplausos do CH.
… apesar da falta de valorização do seu trabalho, da falta de condições para o exercício das suas funções e
da falta de respeito a que muitas vezes são sujeitos.
Aplausos do CH.
Nas últimas duas décadas, 160 polícias portugueses, 80 da PSP (Polícia de Segurança Pública) e 80 da
GNR (Guarda Nacional Republicana), terminaram com a própria vida.
Deixo duas perguntas, às quais responderão quando puderem, e não será agora, certamente: o que é que o
Sr. Primeiro-Ministro e o seu Governo estão a fazer para combater a violência contra membros das forças de
segurança?
Para finalizar, o Chega quer saber quando é que o Governo vai, finalmente, reconhecer e valorizar o trabalho
destes profissionais e atribuir-lhes um subsídio de risco digno, que não sejam meras migalhas.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já excedeu o seu tempo, tem de terminar.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, peço-lhe 10 segundos.
Sr. Deputado Rui Tavares, vir aqui valorizar as famílias de etnia cigana é uma coisa, mas tem de dizer
também a verdade: tem de valorizar também a família desses GNR que foram agredidos na vila de Cuba e para
os quais o senhor não tem uma palavra. Esses foram agredidos por uma família de etnia cigana…
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — E mais: com os enfermeiros do Hospital de Vila Nova de Famalicão foi igual. Mas
o senhor tem zero palavras. Hipocrisia, é a única coisa que tenho a dizer!
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, fica prejudicada, por manifesta falta de tempo, a outra intervenção que o
Grupo Parlamentar do CH tinha inscrito.
O Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias está inscrito e dispõe de 15 segundos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, são
15 segundos, mas é suficiente.
Meus senhores, apresentaram uma moção de rejeição, mas devo dizer já: não passa! Não passa!
Aplausos do PS.
Esta é uma maioria eleita democraticamente. Os senhores não têm alternativa. Não passa! Não passa!
Aplausos do PS.
Protestos do CH.
Não passa! E devo dizer mais: aqui o debate é democrático; monólogos não é na democracia participativa
do 25 de Abril.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, agradeço a todos o esforço de contenção
de que deram provas e peço-lhes igualmente um esforço de contenção de tal forma que possamos recomeçar
os nossos trabalhos às 15 horas.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão.
Eram 13 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados, temos quórum para continuar os nossos trabalhos.
Eram 15 horas e 10 minutos.
Saúdo o Sr. Primeiro-Ministro e os Srs. Membros do Governo.
Srs. Deputados, vamos iniciar a fase de encerramento do debate sobre o Programa do XXIII Governo
Constitucional.
A primeira intervenção cabe ao partido Livre, pelo que dou a palavra ao Sr. Deputado Rui Tavares para
proferir a sua intervenção, pedindo às Sr.as e aos Srs. Deputados que ocupem os seus lugares, criando, assim,
condições para que toda a Câmara oiça o Sr. Deputado.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Caras e Caros Colegas: Dizia
eu há pouco que, a discussão entre mão de obra barata ou alto valor acrescentado, já a fazíamos talvez há 300
anos, mas agora quero dizer-vos que não a podemos fazer, sequer, durante mais 30 anos. Não podemos fazê-
la porque, num contexto de liberdade de circulação, o País se torna insustentável se não apostarmos, de uma
vez por todas, no alto valor acrescentado.
O Sr. Primeiro-Ministro diz que temos de ter salários à proporção do PIB na mesma proporção que existem
salários à proporção do PIB no resto da Europa. Só que há um problema: o PIB dos outros é maior, o PIB per
capita é maior e a liberdade de circulação permite que as pessoas vão ganhar salários maiores em países que
têm o PIB per capita maior.
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É por isso que digo que a mera convergência com a média da União Europeia não basta e é preciso que
Portugal seja uma economia de vanguarda dentro da União Europeia, e podemos sê-lo, porque está aí a geração
que nos vai pôr aos níveis de qualificação do resto da Europa.
Creio que, se calhar, a principal diferença que fica expressa neste debate entre o Programa do Governo e o
programa do Livre é que, naquilo em que o Governo acredita que as mudanças que aí estão são conjunturais e
podem vir a passar, o Livre acredita que elas são estruturais e acredita que mesmo as conjunturais devem ser
tratadas como estruturais, porque cada uma delas nos oferece uma oportunidade para fazer as transformações
de que a economia e a sociedade do nosso País precisam.
Vamos criar novos modelos de transporte público, criando uma nova rede de transporte escolar.
Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Ministros, é possível fazê-lo da mesma maneira que foi feito o PART, mas agora
apoiando uma frota de veículos elétricos que faça transporte escolar e que, fora dos horários do transporte
escolar, faça apoio aos cidadãos séniores nas zonas rurais e nas urbanas.
Vamos mudar a forma de acesso ao subsídio de desemprego para que, se um membro de um casal receber
um convite para trabalhar no interior, o outro possa receber o subsídio de desemprego enquanto ambos se
deslocam para o interior, ou enquanto alguém termina as suas qualificações.
Vamos, acima de tudo, fazer desta Legislatura uma Legislatura diferente, porque ela é a dos 48 e dos 50
anos do 25 de Abril e porque uma democracia que não tem objetos de desejo político não poderá perdurar.
Por isso, ao trabalho, ao trabalho, porque, como dizia Manuel António Pina, «ainda não é o fim / nem o
princípio do mundo», mas, de facto, já se está a fazer um bocado tarde.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento, em nome do partido Pessoas-Animais-Natureza,
dou a palavra à Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: As eleições passaram e não são precisas segundas voltas. Já este Programa vai precisar de
muitas voltas, se é realmente para se aplicar em quatro anos e seis meses, como nos disse o Sr. Primeiro-
Ministro.
Mas, antes de mais, vamos às dúvidas: será que os portugueses perceberam que o Governo só quer acabar
com a pobreza energética em 2050 e que até lá vão ter de continuar a passar frio em casa? São 2 milhões de
pessoas sem dinheiro para aquecer as suas casas e, com o fiasco que tem sido o Programa Vale Eficiência,
realmente, o País pode esperar 28 anos.
Será que os portugueses perceberam que o mar passou a estar sob a tutela do Ministro da Economia, que
diz que ainda tem de conhecer o oceano, quando é real o risco de o mar ser posto em causa por um extrativismo
voraz de recursos minerais e quando se exige mais ação climática e menos ambientalismo de circunstância?
Será que os portugueses perceberam que o aumento que vão ter os seus salários não cobrirá, nem de perto
nem de longe, o aumento brutal dos preços dos bens essenciais, onde se inclui o pão?
E, quando a Europa discute o IVA para o pão, a fruta, os legumes, pondo em cima da mesa aquilo que é um
IVA zero, o Governo não é capaz de se comprometer e apenas reduz o ISP, não fixa critérios ambientais e
mantém as borlas fiscais para as grandes poluidoras.
Será que os portugueses perceberam que o Programa do Governo não tem uma única medida de proteção
animal? Entre as propostas do Orçamento do Estado de novembro e a campanha eleitoral, ficaram pelo caminho
os hospitais veterinários públicos. E, quando falta dinheiro para enfrentar, na generalidade, os preços que estão
a aumentar, continuamos a dar borlas fiscais, incompreensíveis, aos toureiros e dinheiros públicos para o
baronato da caça.
Com este Programa, em quatro anos e seis meses, os jovens também não conseguirão ter emprego estável,
comprar casa própria, constituir uma família. Tudo isso é uma miragem. As mulheres vão ter de continuar a
enfrentar o muro da desigualdade. Mais: com salários mais baixos do que os homens, com o acesso vedado a
cargos de topo e a ter de calar perante os comportamentos de assédio, assim como fomos também arredadas
do próprio Hemiciclo da Assembleia da República.
Com este Programa, quem está em situação de pobreza continuará a ver o elevador social parado. Sr.
Primeiro-Ministro, este Programa precisa de muitas voltas. Esperemos que a primeira grande volta chegue,
desde já, na proposta do Orçamento do Estado.
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Estamos a sete anos do ponto de não retorno, a menos de uma década para cumprir a Agenda 2030 para o
desenvolvimento sustentável, estamos longe de conseguir mitigar os efeitos das alterações climáticas, longe de
erradicar a pobreza, as barracas e de ter um País que seja para os jovens, para os maiores, inclusive também
para os animais, que seja para todas e para todos.
Um Governo de maioria absoluta, Sr. Primeiro-Ministro, não terá qualquer desculpa para não dar as respostas
de que o País precisa; só está dependente da sua própria vontade política.
Quanto à moção de rejeição do Chega, o PAN, desde já, anuncia que irá votar contra. As soluções de que o
País precisa não passam por show-offs populistas e não encontram resposta em forças políticas
antidemocráticas…
Protestos do CH.
… e que não respeitam a igualdade plena entre todos, sem exceção.
Da parte do PAN, o País sabe com o que contará: uma agenda verde, ambientalista, progressista, feminista,
animalista e fortemente comprometida com os direitos humanos. Uma voz dialogante sem deixar de ser
oposição.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Estou mesmo a concluir, Sr. Presidente.
O País contará com uma voz que seja um lugar de defesa para todas as causas.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento, em nome do Bloco de Esquerda, dou a palavra à
Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Fazemos este debate num momento particular e, perante o anúncio de estagflação, um
palavrão económico para dizer que aumentam os preços mas não os salários, a maioria absoluta do Partido
Socialista chegou a este debate com um ruidoso silêncio. Nas 181 páginas do Programa do Governo, zero
referências ao problema da inflação.
Mas, é certo, o Primeiro-Ministro quebrou o silêncio no início do debate e, onde antes não existia uma palavra,
há agora duas garantias: primeira, ainda agora começou o aumento dos preços e o Governo já desistiu de
aumentar os salários; segunda, a solução do Governo para combater a inflação é esperar que passe.
No momento em que as famílias olham com angústia para uma previsão de inflação superior a 4%, ouvimos
o Primeiro-Ministro, orgulhoso, repetir que o problema agora apresentado é exatamente igual ao problema
apresentado no momento em que a previsão da inflação era quatro vezes menor. Se o mundo mudou, o Governo
ficou no mesmo sítio.
Sr. Primeiro-Ministro, só desde que começou a guerra na Ucrânia, o preço do cabaz de bens essenciais
aumentou mais de 5%. Repito: ainda agora entrámos neste ciclo de inflação e o preço dos bens essenciais já
aumentou 5%! Quer isto dizer que a vida da maioria da população, das famílias, que já faziam contas a cada fim
do mês, ficou mais difícil. Isto no mesmo momento em que a EDP, a Galp, o Pingo Doce e o Continente
distribuem mais de 2000 milhões de euros em dividendos.
A questão que se coloca é, portanto, sobre justiça. Perguntamos: o que é mais justo? Uma família pagar
mais no supermercado para proteger os lucros da grande distribuição ou uma cadeia de hipermercados lucrar
menos para proteger os rendimentos de uma família?
O Programa do Governo dá a resposta errada a esta pergunta. Sem garantias de controlo de preços e sem
uma única medida para o aumento de salários, deixa intactas as margens de lucro das grandes empresas e
passa a fatura da inflação toda para as famílias. A Jerónimo Martins ou a Sonae agradecem a simpatia enquanto
distribuem lucros aos acionistas com uma única certeza: o único momento em que sabe bem pagar tão pouco
é na folha de vencimentos dos funcionários.
Aplausos do BE.
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Simpatia também neste debate para com a EDP, que, ao que se sabe, continua sem pagar os impostos da
venda de seis barragens à Engie e ainda leva a garantia de que nada lhe cortará os lucros caídos do céu.
Diz o Governo que baixará a conta da luz com o pedido que fez em Bruxelas para impor tetos máximos ao
gás. Nada contra! Mas não conta a história toda. Toda a energia continuará a ser paga ao preço da mais cara,
o gás, o que quer dizer que, mesmo com o corte prometido, a energia produzida pelas barragens, por exemplo,
continuará a ser paga quatro vezes acima do preço, já exagerado, de 2020.
Por outro lado, não serão as energéticas a pagar a diferença entre o preço do gás e o máximo que o Governo
diz agora que vai impor.
Ou seja, essa diferença entra no sistema e acabará a ser paga pelos consumidores, que sabem já que
pagarão, em qualquer caso, a energia muito mais cara do que pagavam em 2020. Neste debate, o Ministro da
Economia ainda aventou a hipótese de uma taxa sobre os lucros caídos do céu. Nesse caso, os ganhos
extraordinários da EDP com as barragens, por exemplo, poderiam ser usados para baixar mais a conta da luz e
neutralizar subidas futuras. Mas essa taxa teve uma vida muito curta, não chegou a uma manhã. O Ministro da
Economia aventou a hipótese ao princípio da manhã e ao fim da manhã já o Ministro do Ambiente tinha deixado
cair tal ideia.
Vozes do PSD: — Ah!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — A EDP sorriu e os consumidores ficaram a saber que, de uma forma ou de
outra, não se livram de pagar os lucros astronómicos e crescentes das elétricas, com os seus salários cada vez
mais curtos.
Aplausos do BE.
Sr.as e Srs. Deputados, neste debate é bom não esquecer o papel da direita. Ouvimos de tudo, mas não
ouvimos uma palavra da direita sobre quem está a jogar e a ganhar com a inflação. Ouvimos até uma Deputada
do PSD, num momento raro, assumir um erro dos anos da austeridade da troica. O erro do PSD, disse, foi não
deixar os funcionários públicos sem um ou dois meses de salário. Isto porque — garantia a Deputada — seria
uma lição para o povo, «uma pressinha». Ontem, como hoje, o PSD só tem uma pressinha: cortar nos salários
de quem trabalha, para proteger a economia do privilégio.
Aplausos do BE.
Protestos do PSD.
Vale a pena lembrar que, em 2002, houve um Primeiro-Ministro, imbuído de espírito liberal, que fez uma
profecia: a liberalização dos combustíveis iria fazer baixar os preços, porque, e cito, «a concorrência,
normalmente, funciona a favor dos consumidores». Sabem quanto custava um litro de gasóleo em 2002?
Custava 67 cêntimos. Hoje, está acima dos 2 €.
A direita bem pode querer esconder o seu passado, mas o País sabe que terá havido poucas «reduções de
preço» que tenham saído tão caras à carteira dos consumidores.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — E não deixa de ser extraordinário que uma direita liberal, que se apresenta
como nova, não tenha tido uma palavra sobre os oligopólios que estrangulam a economia — liberais, mas pouco.
Até os tão amados «unicórnios» e start-ups terão de pagar as rendas garantidas à EDP, porque aos donos disso
tudo nunca se faz a voz grossa.
Aplausos do BE.
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Mas, Sr. Primeiro-Ministro, a irresponsabilidade da direita não iliba as responsabilidades do Partido Socialista
em responder ao País. E a resposta que propõe, por muito que lhe queira chamar de esquerda, não passa pelos
testes mais simples.
O Governo, no seu Programa, abandona o objetivo do Serviço Nacional de Saúde, de garantir médico de
família a toda a população, e resigna-se à falta de professores na escola pública. É uma boa notícia para os
privados, é uma péssima notícia para quem não os pode pagar e é uma péssima notícia para a democracia, que
não dispensa as condições de igualdade que só os serviços públicos universais podem garantir.
E volto ao início: quem paga esta crise? Há setores a especular e a ganhar milhões com a inflação. Assim
continuará. Já os salários estão a perder, a cada dia, com o aumento dos preços. Assim continuará também.
Pode o Governo chamar-lhe um problema transitório. Mas, na verdade, o mesmo António Costa que assegura
que a crise é transitória reconhece que o fim da guerra é imprevisível. Uma única certeza, portanto: com a recusa
da atualização de salários e de pensões pela inflação, o que o Governo veio anunciar a este debate é o corte
real de salários, mais ou menos transitório, por um período mais ou menos imprevisível, mas é o corte de
salários.
A garantia do Bloco, pelo nosso lado, é a de que seremos oposição a este Programa. Portugal defende-se
com justiça na economia e com respeito por quem trabalha.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento, em nome do Partido Comunista Português, tem
a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e demais
membros do Governo: Depois de obter a maioria absoluta que ambicionava, o Governo PS inicia agora funções
com a certeza prévia quer da aprovação de todos os Orçamentos do Estado e propostas de lei que apresentar
à Assembleia da República, quer da confirmação das decisões que vier a tomar no Conselho de Ministros, quer
ainda da capacidade de derrotar qualquer proposta que não seja sua.
Se, desde 2015, o PS não dispunha das condições institucionais para levar por diante todas as suas opções,
agora esse condicionamento deixa de existir. E o debate do Programa do Governo já deixa antever o que se
pode esperar da sua ação e das suas opções nos próximos quatro anos. Quer no Programa que apresenta, quer
na forma como considera a sua execução, o Governo nega-se a reconhecer a existência e profundidade dos
problemas estruturais do País, para não ter de se confrontar com a responsabilidade e as consequências desses
problemas na vida dos trabalhadores e do povo e o fator constrangedor e bloqueador que constituem de um
projeto de desenvolvimento soberano do País. Limita-se a apontar medidas temporárias ou transitórias. Para as
atenuar, recusa as soluções que poderiam assegurar uma resposta global aos problemas nacionais e remete
para terceiros, nomeadamente para a União Europeia, a possibilidade de condicionar as decisões sobre eles.
O PCP trouxe a este debate cerca de três dezenas de soluções e compromissos concretos de resposta a
problemas nacionais, uns mais imediatos, outros mais de fundo. Não houve um a que o PS ou o Governo dessem
perspetiva de querer corresponder, e assim deixaram levar pelo vento as vãs proclamações de abertura e
disponibilidade para o diálogo e para a convergência. Nem sequer manifestaram abertura para aqueles que são
mais urgentes, como a valorização de todos os salários, incluindo do salário mínimo nacional para 850 € no
curto prazo, mas também das reformas e pensões, assegurando um aumento extraordinário que reponha o
poder de compra perdido com a inflação.
Não surpreende que sejam essas as opções do PS nem essa a atitude da sua maioria absoluta, o que pesa
negativamente nesta circunstância é o que elas revelam de recusa na resposta aos problemas que infernizam
a vida aos trabalhadores e ao povo e comprometem o desenvolvimento do País.
Os grandes problemas que o País enfrenta não são novos nem inesperados ou desconhecidos. Os grandes
problemas que o País enfrenta são as injustiças e as desigualdades, a falta de produção e o desaproveitamento
dos recursos produtivos, o défice demográfico, a dependência externa, a falta de investimento público na
modernização do País e das suas infraestruturas económicas, sociais, científicas ou tecnológicas, a negação
aos cidadãos dos seus direitos sociais.
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A precariedade, a incerteza de ter trabalho e salário expuseram a debilidade dos mecanismos de proteção
social, expuseram a incapacidade de rápida recuperação das consequências de anos de desinvestimento nas
funções sociais do Estado e em serviços públicos, como o SNS, a escola pública, a segurança social ou a
proteção civil.
Durante estes anos de epidemia, milhões de portugueses viram as suas condições de vida degradar-se
significativamente e a situação só não foi ainda mais dramática porque foram adotadas algumas das medidas
propostas pelo PCP. Mas, no mesmo período, os grandes grupos económicos que controlam empresas e setores
estratégicos e essenciais ao funcionamento da vida nacional acumularam lucros e distribuíram dividendos de
milhares de milhões de euros.
Nos últimos meses, a inflação, a guerra e as sanções, que o nosso povo já está a pagar, enquanto outros
amealham milhões de lucro, voltam a expor a dependência de um País que desperdiça capacidades e recursos
produtivos na produção agroalimentar de bens intermédios ou fatores de produção, voltam a expor a
vulnerabilidade de um País à mercê do mercado liberalizado da energia e dos combustíveis, em que prevalece
a ganância do lucro, voltam a expor as fragilidades de um País em que os salários, as pensões e o poder de
compra do povo são sempre designados como fator de ajustamento económico, utilizado para acudir às crises
da economia de casino.
Quanto ao Governo, quando afirma que a resposta à inflação não pode ser o aumento dos salários e das
pensões, então, está a dizer que serão os trabalhadores e os reformados a pagar a crise com as suas condições
de vida.
Quando o Governo apenas considera medidas fiscais sobre a energia e os combustíveis, recusando-se a
controlar e a fixar os preços, o que está a dizer é que os lucros das petrolíferas ficarão intocados e não deixarão
de pesar na economia e na vida do povo enquanto o Estado os puder subsidiar com o dinheiro dos impostos,
mesmo que fique a fazer falta no Serviço Nacional de Saúde, nos serviços públicos, no investimento público, na
habitação ou nas creches.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo: Portugal precisa de
uma política de combate às desigualdades e injustiças, de valorização do trabalho e dos trabalhadores, de uma
política que garanta o futuro das novas gerações e os direitos dos pais e das crianças, de defesa de direitos
sociais e reforço dos serviços públicos, uma política capaz de romper com a dependência externa e assegurar
o desenvolvimento nacional, defendendo os direitos, liberdades e garantias e combatendo a corrupção.
Uma política que valorize os salários e as pensões, que altere a legislação laboral para defender os
trabalhadores dos despedimentos, da precariedade, da desregulação dos horários de trabalho e de outras
formas de agravamento da exploração, de uma política que assegure o investimento público necessário à
modernização do País e à garantia do futuro, com a criação de uma rede pública de creches, o acesso à
habitação, a qualificação dos serviços públicos no SNS, na escola pública ou na cultura, de uma política que
garanta proteção social aos desempregados, às pessoas com deficiência, a todos quantos são vítimas da
exclusão social.
Portugal precisa de uma política que aposte na produção nacional, na agricultura, nas pescas e na indústria,
de uma política que ponha empresas e setores estratégicos ao serviço do desenvolvimento nacional, seja na
banca, nos transportes, nas comunicações, na energia ou na ciência, de uma política fiscal que alivie os impostos
sobre o trabalho e os rendimentos mais baixos e intermédios, tributando de forma efetiva os rendimentos mais
elevados e os lucros dos grupos económicos, combatendo a fraude e a evasão fiscal.
É dessa política que o povo e o País precisam, de que o Programa do Governo não fala e que o PS recusa.
Mas é essa a política capaz de garantir a resposta global aos problemas do País, de assegurar o
desenvolvimento soberano e um futuro de progresso e justiça social, é essa a política por que o PCP continuará
a bater-se.
Não há razão para baixarmos os braços.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento, em nome do partido Iniciativa Liberal, tem a
palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva.
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O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.
Deputados: Estes dois dias de debate em torno do Programa do Governo mostraram mais do mesmo: o Partido
Socialista não faz ideia de como pôr Portugal a crescer. E esta incapacidade não é meramente conjuntural.
Estamos perante um documento estruturalmente parecido com o Programa de 2019, foi só cortar e colar, é «vira
o disco e toca o mesmo».
Estamos perante um documento que nega os impactos da pandemia e das decisões erradas que o anterior
Governo tomou. Estamos perante um Programa do Governo que nega a existência de uma guerra na Europa,
com impactos que já se fazem sentir, e far-se-ão sentir ainda mais, no dia a dia dos portugueses.
O Partido Socialista junta à sua incompetência, em não saber como pôr o País a crescer, a característica da
negação da realidade. O Partido Socialista recusa ver os problemas, para imaginar que eles não existem.
Estamos a falar do Programa do Governo de um partido, o PS, que insiste em negar que Portugal está
estagnado há mais de 20 anos. Um PS que insiste em negar que Portugal continua a ser ultrapassado por outros
nos mais diversos rankings de desenvolvimento, nomeadamente económicos. Um PS que insiste em negar que
a elevada carga fiscal é um obstáculo ao crescimento e à competitividade. Um PS que insiste em negar que o
esforço fiscal limita a liberdade dos portugueses, impedindo-os de subir na vida. Um PS que insiste em negar
que Portugal é o quinto país europeu com maior percentagem de desemprego jovem, acima dos 20%.
Diz a propaganda do Governo que esta é a geração mais capaz de sempre, e o que a realidade demonstra
é que o PS é um partido incapaz de criar oportunidades para esta geração.
Aplausos do IL.
O PS é um partido incapaz de reter esse talento em Portugal. É um partido que se resigna a ver partir os
mais capazes, os mais qualificados. É um partido que condena os mais jovens à emigração.
Este PS insiste em negar que a pobreza tem vindo sempre a aumentar. Nega que há 1,6 milhões de
portugueses a viver com rendimento inferior ao limiar de risco de pobreza. Este PS é um partido que fala de um
Portugal cor-de-rosa que mais ninguém vê, que nega que o SNS esteja em colapso, nega que o elevador social,
a educação, esteja avariado. Num caso como noutro, não se vê qualquer vontade de reformar. Num caso como
noutro, o PS é um partido que não confia nos portugueses, não lhes dando possibilidade de escolha, a cada um
dos portugueses.
Reformar o sistema de saúde? Nada fazem, nada muda. Com este PS, a única garantia são as listas de
espera, e ainda iremos sentir os impactos de todos os diagnósticos que ficaram por fazer nos últimos anos.
Reformar na educação? Nada fazem, nada muda. Com este PS, a única garantia é a imposição da escola e
de um regime centralizado, escolas e creches onde insistem no absurdo da imposição das máscaras. Há
crianças que ainda não conheceram o sorriso de colegas, professores e educadoras. Urge mudar! Aproveite as
férias das escolas, Sr. Primeiro-Ministro!
Aplausos do IL.
E na justiça, que é lenta e onde os mais desfavorecidos são prejudicados perante os mais fortes, onde se
inclui o próprio Estado, as reformas são inexistentes. Também na justiça, nada fazem, nada muda.
Combate à corrupção? Nada fazem, nada muda, como se o problema não existisse, como se a corrupção
não fosse uma chaga social, como se a corrupção não minasse a democracia.
Na segurança social, ameaçada a prazo, não há um caminho de reforma que garanta um futuro além de
2050. Uma vez mais, nada fazem, nada muda.
O Partido Socialista é o partido do imobilismo.
Este PS é incapaz de mudar, este PS é incapaz de inovar, este PS é incapaz de dar resposta aos problemas
concretos de várias gerações, nomeadamente das gerações mais jovens.
Nem uma pandemia, nem uma guerra, nem uma maioria absoluta parlamentar são suficientes para que o PS
mude. Por isso, o Programa do Governo é mais do mesmo, é um programa que só propõe mais Estado, só
propõe mais dirigismo, seja nas áreas já mencionadas, como na saúde, na educação ou na segurança social,
seja também na economia real.
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O País gerido pelo PS é completamente dependente das torneiras financeiras europeias. Perante a maior
quantidade de dinheiro vinda da Europa, perde mais uma oportunidade para mudar de vida, para fazer reformas,
para aplicar esse dinheiro na economia que gera emprego e faz crescer Portugal.
O Partido Socialista junta, assim, à incompetência, à negação da realidade e ao imobilismo outra
característica: é «Estadocêntrico». Ao invés de acreditar na capacidade criativa e empreendedora dos
portugueses, o Governo do PS insiste em engordar o Estado. Ao invés de disponibilizar recursos a pessoas e
empresas, o PS soterra os portugueses em impostos e inferniza-os em burocracia. Sempre e cada vez mais
burocracia. É um partido que, tendo na sua mão a capacidade de baixar já os custos energéticos, sobretudo os
combustíveis, baixando os impostos, opta por soluções complicadas, como foi o caso do «AUTOvoucher».
Complicar é um dos lemas do PS. Veja-se o sistema fiscal que temos: entre escalões, isenções e deduções,
são só complicações. E ainda querem mais, ainda querem complicar mais.
O Partido Socialista junta à incompetência, à negação da realidade, ao imobilismo e ao estatismo a
incapacidade de simplificar.
Perante o Programa do Governo deste PS não se pode mesmo esperar algo de novo. Mas era possível,
porque existem caminhos alternativos.
Nos serviços ao dispor dos cidadãos, em especial na saúde e na educação, a aposta deveria ser em mais
liberdade de escolha, como defende o Iniciativa Liberal e como é prática em tantos países europeus, melhorando
assim o acesso e a vida dos portugueses.
No sistema fiscal, a aposta deveria estar na simplificação, começando por reduzir escalões e taxas no IRS,
como defende o Iniciativa Liberal e é prática na maioria dos países europeus, criando, assim, condições para
melhores salários, mais capacidade de poupança e mais poder de compra dos portugueses.
Para as empresas, a aposta deveria ser numa efetiva baixa de impostos, começando no IRC, sem esquecer
as muitas taxas que oneram as empresas e aumentam a burocracia. Num país com um tecido empresarial
assente em pequenas e médias empresas, é indispensável começar por descomplicar a vida a quem quer
produzir.
Na segurança social, é urgente abandonar um sistema com um fim previsto e que não garante o futuro a
quem agora começa a trabalhar. É preciso que cada um, sem deixar de contribuir para o bem de todos, possa
criar o seu próprio plano e garantir a sua reforma.
No sistema eleitoral, é inadiável criarmos um modelo que aproxime eleitos e eleitores, os círculos
uninominais, garantindo o pluralismo e aumentando a representatividade, um círculo nacional de compensação.
Só assim se combate a abstenção, só assim será possível pôr fim ao inaceitável desperdício de votos, que, nas
últimas eleições, foi de cerca de 700 000.
Aplausos do IL.
Na justiça, há que fazer reformas efetivas e não mera cosmética. É urgente uma justiça célere, onde
processos não se prolonguem anos a fio. Uma justiça onde o Estado não tenha prerrogativas que inibem
contestações. Uma justiça eficiente, especializada e íntegra é essencial, também, para combater a corrupção,
que deve ser uma prioridade nacional.
Estes são alguns dos exemplos de onde e como é possível pensar e fazer diferente. Será preciso contrariar
e combater interesses instalados? Certamente. Será preciso combater corporativismos? Sem dúvida! Será
preciso contrariar clientelas? Obviamente! Será preciso contrariar hábitos enraizados? Sem hesitação! Mas,
para isso, é preciso coragem, que é algo que o PS não tem demonstrado.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Os portugueses estão
de olhos em todos nós. Não podemos perder mais uma oportunidade de colocar Portugal na rota do progresso
e do futuro. Não podemos resignar-nos ao imobilismo enquanto outros países nos ultrapassam. Merecemos
muito melhor, não merecemos mais do mesmo.
Na Europa, há muitos países desenvolvidos, com economias robustas. Vários destes países têm-nos
ultrapassado em anos recentes, desde que o Sr. Primeiro-Ministro iniciou funções como Chefe do Governo.
Sr. Primeiro-Ministro, Portugal vai ficando para trás.
Sr. Primeiro-Ministro, ainda bem que trouxe ontem o exemplo da Holanda, dos Países Baixos, como sua
inspiração em matéria de habitação. Mas o sucesso ali registado não acontece por acaso. Esse é um país que
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aposta sem complexos em políticas liberais na educação, na saúde e na fiscalidade, tanto para pessoas como
para empresas.
Aplausos do IL.
Se se inspira na habitação, deveria também inspirar-se nos outros exemplos liberais da Holanda. Ainda vai
a tempo de aprender com os bons exemplos. É que são exatamente essas as políticas de que Portugal precisa,
são as políticas que podem tornar Portugal um país próspero e de oportunidades para todos e não só para
alguns.
O liberalismo é a alternativa que nos aproxima da Europa próspera e dinâmica que nos serve de modelo.
Terminando, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como ontem falou de Coca-Cola, e passe a publicidade,
permita-me que cite um grande português, que disse sobre essa bebida: «Primeiro estranha-se, depois
entranha-se.» Esse mesmo, Fernando Pessoa, um liberal, que do liberalismo diria o mesmo que disse da Coca-
Cola: «Primeiro estranha-se, depois entranha-se.»
Protestos do PS.
Se Pessoa, hoje, estivesse aqui, estou certo de que também diria: «O liberalismo funciona e faz falta a
Portugal.»
Aplausos do IL, de pé.
O Sr. Presidente: — Para proferir a intervenção de encerramento, em nome do partido Chega, tem a palavra
o Sr. Deputado André Ventura.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este Programa e este Governo que
hoje aqui são apresentados devem ser rejeitados por este Parlamento. Devem ser rejeitados por ineficácia,
devem ser rejeitados por incapacidade de responder aos problemas da população e, sobretudo, devem ser
rejeitados porque não apresentam o elenco de ministros de que precisávamos para Portugal.
Já sabíamos que, entre ministros, tínhamos os que destroem a TAP intensamente, os que contribuem com
os russos intensivamente e os que preparam o 25 de Abril a preço de ouro.
Mas este Governo não é só sobre os que aqui estão, é também sobre os que saíram. Sim, os que saíram e
que hoje soubemos que saíram com uma reforma de 6750 € por mês. Olho para os portugueses que nos estão
a ver, cara a cara, e pergunto se acham normal que uma Ministra da Justiça se reforme com 6750 € por mês,
quando há bombeiros a receber 300 € e 400 € todos os meses. Pergunto se acham normal que isto aconteça.
Aplausos do CH.
Pergunto se acham normal este País de impunidade e este paraíso em que vivemos, em que, depois de
fazerem trapalhada após trapalhada, neste Governo, alguns saem para uma reforma dourada. Não é A Gaiola
Dourada do cinema, é mesmo a reforma dourada com que alguns insistem em gozar com os portugueses.
No meio desta reforma e desta gaiola dourada, os polícias continuam com subsídios de risco que
envergonham qualquer país da Europa, os bombeiros continuam com instalações a cair de podres e os
professores continuam sem autoridade e sem carreiras. Ontem mesmo, um professor disse-me, pessoalmente,
que estar a 500 km de casa ou a 1 km de casa, neste País, é praticamente o mesmo. Gostava que esses
portugueses soubessem que há uma ministra e vários ministros que, enquanto eles não têm nenhum dinheiro
no bolso, estão a aglomerar milhares de euros todos os meses para o seu próprio bolso, para a sua própria
riqueza e para a sua própria ganância pessoal. Era isto que gostava de ver em Portugal.
Aplausos do CH.
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Mas não. O Governo de António Costa veio aqui dizer que está tudo bem. Anuncia descidas no ISP, mas
sabe que pode fazer muito mais e muito melhor; ignora um dado que hoje todos conhecemos, a partir das
12 horas e 15 minutos da tarde, ou seja, que a carga fiscal deste ano foi a maior de sempre.
O Primeiro-Ministro, que está aqui mesmo, simetricamente, abaixo de mim, impávido e sereno, perante um
País que tem a maior carga fiscal de sempre em 2021, não pede desculpa aos portugueses! Se eu fosse
Primeiro-Ministro, hoje, começaria por chegar aqui e dizer: «Portugueses, desculpem, porque, de facto,
expropriar-vos e continuar a tirar-vos o dinheiro do bolso é algo que nenhum Primeiro-Ministro deveria fazer.»
Seria isso que eu faria aqui, na tribuna!
Aplausos do CH.
Somos esse País muito curioso em que os partidos políticos não pagam IMI (imposto municipal sobre
imóveis), mas os portugueses estão afundados em IMI. Somos esse País curiosíssimo, em que nós, aqui
sentados, não pagamos impostos, os partidos não pagam impostos, mas os portugueses, lá fora, pagam um IMI
que envergonha qualquer país da Europa.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, peço…
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, o que não…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, estou a falar.
Sr.as e Srs. Deputados, peço-vos que sejam criadas as condições para ouvir o orador.
Pode prosseguir, Sr. Deputado.
O Sr. André Ventura (CH): — Não compreendo como é que, enquanto a Sala protesta, o tempo do Chega
continua a descontar, mas fica para memória futura que isso continua a acontecer.
Sim, os partidos não pagam IMI e aprovam medidas para que os portugueses paguem cada vez mais IMI.
Podem gritar à vontade, Srs. Deputados, quem está lá fora sabe bem do que estou a falar!
Sim, este é o Governo socialista que disse que ia resolver os grandes problemas demográficos do nosso
tempo: o problema da natalidade e da sua descida crónica, que temos enfrentado em toda a Europa. E como é
que o resolve? Abrindo as portas a todo o tipo de imigração! É assim que este Governo quer abrir as portas. E
temos uma Ministra do Trabalho que vem aqui dizer: «Não, pela primeira vez houve descontos em número muito
superior.» Claro que houve, abrimos as portas a todos, foi a política do «entrem de qualquer maneira, venham
tirar-nos tudo o que temos»! E, hoje, chegamos ao ponto de termos refugiados a ganhar 600 € em Portugal e
pensionistas a receber 200 €. É isso que temos hoje em Portugal!
Aplausos do CH.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, a Ministra da Saúde ficou em silêncio
durante este debate, agarrada ao seu próprio telemóvel. Compreendo — agora mais vale manter, Sr.ª Ministra,
já está toda a gente a olhar! —,…
Risos do CH.
… há debates em que mais vale, de facto, não dizermos nada. Depois de dois anos de COVID-19, em que
as consultas ficaram para trás e em que milhões de portugueses não tiveram acesso a cuidados de saúde, mais
vale estar em silêncio, quando se chega aqui, ao Parlamento.
Penso que era Wittgenstein que dizia que, daquilo que não se sabe, mais vale guardar silêncio. De facto, Sr.ª
Ministra, sobre o caos na saúde, mais vale guardar silêncio.
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Uma ministra que vem à apresentação do Programa do Governo, do Governo liderado pelo mesmo homem
que nos liderou no anterior, e não tem uma palavra sobre milhões sem consultas,…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. André Ventura (CH): — … sobre milhares que não tiveram os seus atos cirúrgicos realizados, sobre
milhares que morreram por falta de atendimento, sobre ambulâncias à porta de hospitais, enquanto nós, em
casa, assistíamos a isto, impávida e serenamente, neste País à beira-mar plantado.
Aplausos do CH.
Três anos, repito, três anos: há portugueses, como nós, que não são diferentes de nós, que são iguaizinhos
a nós, que passam três anos à espera de uma consulta. Três anos! Por isso é que a Sr.ª Ministra está agarrada
ao telemóvel. São três anos à espera de uma consulta!
Se eu estivesse três anos à espera de uma consulta, se vocês todos estivessem três anos à espera de uma
consulta, talvez pensássemos duas vezes e, em vez de estarmos aqui só a dizer segundas, terceiras e quartas
voltas, começássemos por resolver um problema que é estrutural em Portugal e que viola o direito que os
portugueses têm à saúde neste País.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, hoje é o Dia Internacional das Comunidades Ciganas. Como já hoje foi
aqui bem lembrado, é um dia em que devemos não esquecer as minorias e aquela conversa que nos alimenta
a todos há 47 anos — muito bem! —, que é porreira para o chá das cinco e que todos gostamos muito de ouvir.
O que não compreendemos é que este Parlamento esteja sempre tão pronto para aplaudir a comunidade cigana.
E todos vemos estas notícias: «primeira cigana licenciou-se»; «primeira cigana é médica»; «primeira cigana é
juíza». Contudo, nunca vemos notícias de que os ciganos agrediram a GNR, no Alentejo, ou os bombeiros, no
Alentejo, em Lisboa, no Porto ou em Leixões.
Aplausos do CH.
Esta capacidade de dizer que sim à comunidade cigana tem de acabar em Portugal! Porque, sim, as minorias
não devem ser confrontadas por nós, mas também não podem ser apaparicadas, ao ponto de se ignorar que
têm de ter os mesmos deveres que todos os portugueses!
Sei que muitos dos que nos estão a ver agora sabem bem, no Alentejo, no Algarve, à volta de Lisboa ou do
Porto, do que estou a falar aqui. Sabem que há um paraíso de impunidade que ainda agora, na morte de um
agente da PSP, mais uma vez se fez valer.
Sim, Sr. Primeiro-Ministro, há um cigano fugido, que está noutro país, depois de ter matado um PSP. E diz o
patriarca da comunidade cigana que, no seu modo, no seu tempo, o entregará à justiça. Sobre isso, este
Parlamento não teve nem uma palavra!
O meu respeito ao agente da PSP que morreu às mãos deste homem.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, permita-me que o interrompa para dizer que não há atribuições coletivas
de culpa, em Portugal.
Aplausos do PS, do IL, do PCP, do BE, do L, de pé, do PSD, com Deputados de pé, e do PAN.
Protestos do CH.
Portanto, solicito-lhe que continue livremente a sua intervenção, como é seu direito, respeitando este
princípio. Muito obrigado.
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O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, vou retomar a minha intervenção, dizendo-lhe isto: como
Deputado, não aceito que nenhum outro Deputado ou o Presidente da Assembleia limitem a minha intervenção
nesta Casa.
Aplausos do CH, de pé.
Afinal, onde está o 25 de Abril de 1974,…
Vozes do PS e do BE: — Está aqui!!
O Sr. André Ventura (CH): — … em que podíamos exprimir-nos livremente?!
Protestos do PS e do BE e contraprotestos do CH.
Agora, querem tirar-nos esse direito?!
Sr. Presidente, vou continuar a usar a expressão «ciganos» sempre que tiver de a usar e o Sr. Presidente,
no seu direito, sancionará, quando tiver de sancionar, sabendo que nunca deixarei de dizer aquilo em que
acredito, em que milhões de portugueses acreditam, porque sabem e porque o vivem todos os dias na sua pele.
Aplausos do CH.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falamos agora do Governo e de educação. Sim, num Governo que nada diz
sobre corrupção no seu Programa e que, inclusive, tem um secretário de Estado a ser investigado pelo DCIAP
(Departamento Central de Investigação e Ação Penal), gostava de prestar a minha homenagem ao Ministério
Público e a todos os que têm tido, mesmo nas garras de um Governo absoluto, a capacidade de prosseguir com
independência os seus esforços. Como é possível que um secretário de Estado que todos sabemos estar sob
investigação continue a ser secretário de Estado?!
Soubemos, hoje, que há um questionário sobre educação que anda a percorrer todo o nosso espaço público.
Quero dizer-vos as perguntas que são feitas a alunos que têm 12 anos: é possível que ser heterossexual seja
por sentir medo de pessoas do mesmo sexo que tu? Porque é que existem tantos doentes mentais
heterossexuais? A maioria dos abusadores sexuais é heterossexual; acha que é seguro expor menores a
heterossexuais? Isto está a ser distribuído ou foi distribuído a crianças com 12 anos!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É falso!
O Sr. André Ventura (CH): — Repito: 12 anos!
É isto que estamos a dar às nossas crianças. Qualquer dia, ser branco e heterossexual é um crime neste
País!
Dirijo-me, pois, aos milhões que o são, lá fora, em Portugal, para que sejam a maioria de bloqueio a esta
minoria de interesses que quer destruir a educação em Portugal!
Aplausos do CH.
Dirijo-me ao mundo rural, aos agricultores, aos que sabem o que é realmente este País e que veem, com os
seus olhos, os impostos que não param de aumentar, o preço dos bens alimentares que não para de aumentar,
a incapacidade de terem o mínimo de produção às mãos de uma União Europeia cada vez mais selvagem na
agricultura, na produção e no mar.
Dirijo-me ao mundo rural e aos pescadores, aos agricultores, ao setor tauromáquico, a todos aqueles que
fazem o Portugal que conhecemos.
Aplausos do CH.
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Dirijo-me àqueles que fazem o Portugal que conhecemos e que o Partido Socialista quer destruir: tenham
esperança, nós ainda aqui estamos para defender esse Portugal profundo que não se revê nas elites de meia
Lisboa e que quer, efetivamente, ser representado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentámos hoje uma moção de rejeição a este Programa do Governo.
Este Governo é ineficaz e será incapaz de nos levar a bom porto em tempos de crise profunda.
Apelo diretamente ao Partido Social Democrata e ao Iniciativa Liberal.
Risos de Deputados do PS.
A verdade é que é preciso clarificar hoje quem está do lado em que estiveram o Bloco de Esquerda e o PCP
— e viu-se como terminaram com o partido do táxi e da bicicleta! —, ou se queremos, verdadeiramente, ser
oposição em Portugal.
O caminho que foi seguido por esses dois partidos ficou à vista: ser a marioneta e o suporte de António Costa
leva inegavelmente à destruição e ao desaparecimento. O Livre, simpaticamente, vai pelo mesmo caminho. Ao
PAN nem me vou referir.
Refiro-me a vocês, PSD e IL, diretamente e, sobretudo, a si, Dr. Rui Rio, porque o tenho como um homem
que sabe liderar e que é capaz de o fazer.
Risos do PS.
Hoje, quando o PSD votar esta moção de rejeição, sei que o Dr. Rui Rio está de saída da liderança do partido.
Não está apenas em causa como é que o PSD se vai posicionar ao longo dos próximos anos, mas se vai ser
oposição ao PS ou se vai sustentar este Governo do PS.
Hoje, vai começar esta Legislatura e dirijo-me a si, Dr. Rui Rio, para lhe perguntar se vamos conseguir criar
uma alternativa à direita ao Partido Socialista ou se é o Chega, sozinho, que terá de fazer oposição ao Partido
Socialista.
Aplausos do CH.
É essa a pergunta que lhe deixo.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.
É essa a pergunta que lhe deixo, Dr. Rui Rio, com toda a estima que sabe que tenho por si.
Vozes do PS e do PSD: — Ah!
O Sr. André Ventura (CH): — Que legado quer deixar neste PSD: o legado de colaborar com o PS ou o de
se juntar a nós na luta contra o PS?
Aplausos do CH, de pé.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento, em nome do PSD, dou palavra ao Sr. Deputado
Rui Rio.
O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo, Sr.as e Srs.
Deputados: Entre o programa que o PS apresentou nas recentes eleições legislativas e o do Governo, que aqui
apreciamos, a diferença é pouca, mas a realidade que vivemos é substancialmente diferente.
A inqualificável invasão da Ucrânia, por parte da Rússia, com crimes de guerra intoleráveis, transformou a
realidade que vivemos e, acima de tudo, a realidade que iremos viver.
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Teremos, seguramente, um abrandamento da globalização da economia, com óbvias implicações a nível do
crescimento económico.
Teremos de fazer um maior esforço em matéria de despesa com a área da defesa nacional, com o
consequente reflexo ao nível do Orçamento do Estado.
Teremos o efeito «ricochete» das imprescindíveis sanções económicas à Rússia, com uma ainda maior
pressão sobre os preços das matérias-primas.
Teremos, a reboque dessa pressão, um forte aumento da inflação, com a inevitável subida das taxas de juro,
o que é particularmente penoso para Portugal, devido ao gigantesco endividamento da nossa sociedade a todos
os níveis: Estado, famílias e empresas.
Esta nova realidade, que não existia em 30 de janeiro, mas que existe desde 24 de fevereiro, deveria levar
a uma maior diferença entre os dois programas que referi.
A inflação é, desde logo, um novo fenómeno que altera significativamente as circunstâncias em que o
Governo tem de operar. Cumprir o prometido nas eleições legislativas implica uma política de rendimentos que
acomode uma inflação como há muito não conhecíamos.
Para as promessas feitas pelo PS serem cumpridas e para a palavra dada ser honrada, então, os valores
prometidos, seja para o salário mínimo nacional, para as pensões de reforma ou para os salários da função
pública, têm de ser ajustados com o nível de inflação que temos de enfrentar.
Se assim não for, teremos uma acentuada perda do poder de compra dos pensionistas, dos funcionários
públicos e dos trabalhadores em geral, ou seja, o contrário do que foi repetidas vezes prometido.
Mais evidente ainda é, nesta matéria, o preço dos combustíveis. Sobre eles, a carga fiscal foi sempre pesada,
mas, com o PS a governar, ela atingiu máximos históricos. Mais de metade do preço que os portugueses pagam
pelo gasóleo e pela gasolina são impostos que, no que ao IVA concerne, estão a encher os cofres do Estado
num montante nunca antes visto nem previsto.
O ajustamento do ISP, ontem anunciado, reduz um pouco, a partir de agora, o ganho extraordinário do
Governo, mas não deixa de manter a aberração de termos as famílias em dificuldades económicas e o Governo
a lucrar fiscalmente com a guerra.
Impostos a mais, como é timbre da governação socialista, originam sempre menos iniciativa empresarial e
menos crescimento económico.
Por isso, exigia-se, também, neste Programa, um maior apoio às empresas, exigia-se, no fundo, que elas
fossem vistas com a relevância que realmente têm, relevância que é pouca, em matéria de conquista imediata
de votos, mas que é muita, em termos da construção de uma economia mais robusta e mais competitiva.
São as empresas que podem criar os melhores empregos e os melhores salários que todos reclamamos.
Apoiá-las hoje é concretizar no futuro as promessas de uma vida melhor para todos os portugueses. Fazer o
contrário, como, vulgarmente, o PS tem feito, é, na prática, enganar as pessoas, seja as que gostam de ser
enganadas ou as que, ingenuamente, insistem em acreditar no Pai Natal cor-de-rosa.
Aplausos do PSD.
Não vale a pena mostrar preocupação com a crescente emigração dos nossos jovens, quando as políticas
socialistas continuam a aproximar o nosso salário médio do salário mínimo nacional, nivelando a sociedade por
baixo.
Se queremos dar uma oportunidade aos jovens e oferecer-lhes algum futuro em Portugal, tal não é
compatível com uma visão de curto prazo que apenas se orienta para a conquista do voto fácil.
Se queremos, efetivamente, construir um País onde os jovens tenham futuro, temos de melhorar a nossa
competitividade, promovendo o rigor, aumentando a produtividade, premiando o mérito e apoiando quem se
esforçou por ter melhor preparação para se enquadrar num mercado de trabalho que necessitamos que seja
mais qualificado.
Distribuir antes de produzir é fomentar a inflação e o endividamento externo. O caminho é produzir mais e
melhor, conseguindo empresas tecnologicamente mais avançadas e, por consequência, mais competitivas. Na
verdade, o Governo até tem apoiado algumas empresas, justamente as que não devia apoiar: as grandes
empresas, com maior dependência do Estado e do poder político.
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Não tem faltado dinheiro público para o Novo Banco, para a TAP ou para perdões fiscais à EDP. Aliás, a TAP
não para de desrespeitar descaradamente os contribuintes. Depois de ter acumulado prejuízos durante décadas,
que o Estado foi penosamente pagando, acaba de receber mais 3,2 mil milhões de euros, ou seja, em média,
mais 320 € de cada português. Ainda assim, tem o desplante de renunciar à sua obrigação de serviço público,
tendo decidido, recentemente, eliminar mais sete destinos e mais 700 lugares, neste caso a partir do Porto.
No que à TAP concerne, é tempo de dizer «basta». É um sorvedouro de dinheiros públicos que, pelos seus
resultados negativos e pelo seu comportamento, não merece o respeito dos contribuintes portugueses.
Vozes do PSD: — Isso mesmo!
O Sr. Rui Rio (PSD): — Com a cumplicidade ativa dos dois últimos Governos, a TAP transformou-se ainda
mais numa má empresa regional paga com o dinheiro de todos nós, mesmo daqueles que ela vergonhosamente
despreza.
É certo que os resultados eleitorais legitimam o Governo nesta sua política, mas isso não pode ser razão
para que o PSD cale a sua voz de profunda discordância e indignação com aquilo que classificamos como uma
autêntica pouca-vergonha.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No Programa que apreciamos, parece ler-se nas entrelinhas que o
Governo começou, finalmente, a perceber a desgraça para que atirou os nossos serviços públicos. Há décadas
que eles não estavam tão ineficientes e tão desmazelados como hoje estão, após seis anos de uma governação
marcada pelo facilitismo e pela falta de rigor.
Tirar o cartão de cidadão, a carta de condução ou o passaporte é hoje uma aventura burocrática com que os
portugueses têm de viver. A incompetência e o desleixo são evidentes e atingem o seu expoente máximo quando
a segurança social chega a demorar bem mais de um ano para o simples deferimento da pensão de reforma de
quem trabalhou uma vida inteira.
Aplausos do PSD.
Esta desorganização é própria de um país subdesenvolvido, um país governado por quem mostra não ter
capacidade, nem sequer amor-próprio, para gerir razoavelmente os serviços que estão sob a sua
responsabilidade.
A mesma conclusão se tem de tirar se olharmos para o setor da saúde ou da justiça, onde o desempenho
também se tem vindo a degradar de forma acentuada. Na saúde, das listas de espera para cirurgias ou consultas
de especialidade até à falta de médicos de família ou à dificuldade em conseguir atendimento nos centros de
saúde, tudo concorre para o preocupante crescimento da taxa de mortalidade em Portugal.
O PS foi lesto a deturpar as propostas do PSD na área da saúde, inventando que queríamos alterar
substancialmente a Constituição, mas, na verdade, é o próprio Governo que não cumpre essa mesma
Constituição quando, na prática, nega o acesso dos cidadãos aos serviços públicos de saúde em tempo útil.
Aplausos do PSD.
Na justiça, posso repetir ipsis verbis o que aqui disse aquando da discussão do Programa do anterior
Governo, porque nada de novo aconteceu, porque nada de relevante o anterior Governo fez nesta degradada
área de governação: «… os tribunais administrativos e fiscais continuam a demorar longos anos a decidir; os
truques processuais continuam a imperar; os juízos de execução e de comércio a arrastarem-se, penosamente,
para desespero dos credores; os tribunais a funcionarem sem condições; as investigações criminais a serem
partilhadas na praça pública, para gáudio dos adversários dos direitos humanos e desalento dos democratas; e
o corporativismo a imperar no setor.» Assim me pronunciei e assim tenho de me continuar a pronunciar perante
a apatia e a conivência cúmplice do Governo para com tal estado de coisas.
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Sr. Presidente, como há muito venho referindo, é para mim absolutamente inequívoco que, quase meio
século depois do 25 de Abril, se tornou imperioso revitalizar o regime. Não basta reduzir a democracia à sua
componente formal para avaliarmos a sua qualidade. Do ponto de vista substantivo, a sua evolução é a de uma
óbvia erosão às mãos do tempo.
A crescente preponderância dos poderes minoritários, que, numa lógica corporativa, se vão impondo a um
poder político com notórios problemas de credibilidade e de respeitabilidade pública, evidencia um desgaste que
urge corrigir através de reformas estruturais aos mais diversos níveis. Sem essas reformas, não rasgaremos
novos horizontes nem poderemos esperar que a degradação passe como que por milagre.
Revisitar a Constituição, reformar o sistema eleitoral, modernizar a Lei dos Partidos Políticos e o seu
funcionamento, promover a descentralização e modernizar a justiça, reforçando a eficácia e a transparência no
seu funcionamento, são aspetos nevrálgicos para a qualidade da democracia e para o potencial de
desenvolvimento do País. São aspetos fundamentais para devolver a ação e a decisão a quem verdadeiramente
se empenha ao serviço do interesse coletivo e não em prol do interesse que mais lhe convém. Era isto que
gostaríamos de ver vertido nas intenções políticas para esta Legislatura. É isso que não descobrimos na vontade
política de quem nos vai continuar a governar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Por força dos resultados eleitorais, o PS tem toda a legitimidade para
formar Governo e apresentar o Programa que muito bem entende. Da parte do PSD, e tal como seria de esperar,
estamos perante um documento e uma postura política em que não nos revemos. Por nós, haveria mais rigor e
menos facilitismo, mais visão de longo prazo e menos preocupações com o marketing, mais espírito reformista
e menos foco na comunicação social, mais apoio às empresas e menos carga fiscal e, muito claramente, menos
Estado e mais sociedade civil.
Foi este o rumo que sempre defendemos. É, pois, com ele em mente que, com convicção e coerência,
continuaremos a defender o interesse de Portugal.
Aplausos, de pé, do PSD.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a
palavra o Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Este é o primeiro debate da XV Legislatura. É o debate de um Programa do Governo
assente numa maioria absoluta, que não é poder absoluto, mas uma maioria construída pelo voto popular,
secreto, em que cada português na cabine de voto pôde escolher e, escolhendo, escolheu o PS e o seu
Programa Eleitoral.
Por isso também não é surpreendente, e ficou bem presente durante todo o debate, que este Programa do
Governo, do XXIII Governo Constitucional, deste nosso Governo, seja o nosso Programa, assente na escolha
livre dos portugueses.
Aplausos do PS.
A democracia defende-se todos os dias. A democracia e a liberdade, que conquistámos, defendem-se todos
os dias. Sim, é preciso dizê-lo, tenho de o dizer: o 25 de Abril passou mesmo por aqui.
Aplausos do PS.
Devo sublinhar, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que esta Legislatura ocorre tendo transcorrido mais
tempo que o tempo da ditadura. Este Governo tomou posse passados mais dias de democracia do que da
ditadura fascista. Esta Assembleia, filha do voto popular, é a escolha da nossa comunidade, uma comunidade
que lutou pela democracia e, há que dizê-lo, por um percurso único, que tem, no 25 de Abril de 1974, um lugar
único e cimeiro e que iremos celebrar nesta Legislatura como um dia único, «inteiro e limpo», como dizia Sophia,
que nos permite, em comunidade, desenvolver políticas públicas.
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O País não está hoje pior do que estava no 25 de Abril de 1974, apesar daquilo que alguns dizem. O País
está melhor. Está melhor porque foi em comunidade que desenvolveu políticas públicas na educação, no Serviço
Nacional de Saúde, na segurança social e porque, coletivamente, apesar das divergências democráticas, foi
sempre capaz de encontrar soluções para os seus problemas.
No encerramento deste debate, a 8 de abril de 2022, também se celebra uma efeméride, e eu quero sublinhá-
la: hoje passam 49 anos do 8 de abril de 1973. A 8 de abril de 1973, encerrava o III Congresso da Oposição
Democrática, em Aveiro, onde, entre tantos outros, se encontravam Maria Barroso, Arons de Carvalho, Pedro
Coelho ou Manuel José Tengarrinha. A 8 de abril de 1973, discutia-se um Portugal democrático. A evocação
histórica que faço não é apenas um testemunho merecido àqueles que lutaram, na altura, em Aveiro, pela
democracia, é porque eles continuam a ser a inspiração, a inquietação contínua que temos na defesa da
democracia e da liberdade. E aqui, neste Hemiciclo, nada se faz sem democracia e sem liberdade.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, Portugal enfrenta, neste momento,
um desafio central: o do ajustamento do seu modelo de crescimento e desenvolvimento económico às legítimas
expectativas da denominada «geração mais bem preparada de sempre». É aqui que está uma parte importante
do potencial de inovação, de criatividade, de novos saber-fazer, após anos de investimento na educação, na
formação profissional, na ciência, nos centros de investigação e desenvolvimento, na qualificação de pessoas e
instituições, que, acima de tudo, permitiram alterar expectativas, construir uma nova realidade no País, alterar o
perfil de valor da economia portuguesa. Se é certo que muito está por fazer, a verdade é que hoje o País é capaz
de produzir bens e serviços mais complexos, com mais valor acrescentado, com uma comunidade mais coesa.
É essa a ambição de prosseguir este caminho. É esta ambição de construir um futuro de oportunidades que
está bem plasmada no Programa deste XXIII Governo Constitucional. E é por isso que este Programa do
Governo, com base no Programa do Partido Socialista, é, no essencial, um Programa para aproveitar a energia
de todos, a energia de cada um, a energia daqueles que são capazes de inovar e de transformar, mas sempre,
sempre sem deixar ninguém para trás, procurando remunerar melhor o trabalho, procurando remunerar melhor
os fatores de produção, mas continuando a apostar nas qualificações e nas oportunidades que só os mais jovens
devem e podem agarrar para podermos ter um País mais coeso, com políticas públicas sustentáveis, e para não
quebrarmos o laço intergeracional que é fundamental para mantermos a nossa comunidade coesa e com justiça
social.
Aplausos do PS.
Para aqueles que dizem que Portugal não mudou, que está tudo igual, que o Portugal de 2022 é pior que o
Portugal do passado, deixava dois apontamentos. Em 1986, quando Portugal aderiu à Comunidade Económica
Europeia, passados já 10 anos da Revolução de Abril, quase 40% das exportações de bens eram do setor têxtil,
do vestuário e do calçado, com base em salários baixos, com uma competitividade centrada na baixa
remuneração do trabalho.
Hoje, Portugal exporta muito mais. Não só muito mais têxtil, vestuário e calçado, mas Portugal exporta com
mais valor acrescentado, com melhores salários, e foi capaz de, com uma economia aberta, no ano passado,
ultrapassar pela primeira vez os 75% de investimento direto estrangeiro no produto interno bruto. Este é um País
moderno, aberto, com uma matriz industrial, com um perfil de valor cada vez mais próximo dos nossos
congéneres da União Europeia. Este é um País com mais oportunidades, que mudou, mas que tem de continuar
a mudar.
E, se é certo que este território mudou, mudou a realidade concreta de cada português. É verdade que tem
de se criar mais oportunidades, que a sincronização entre qualificações e a oferta do mercado de trabalho
continua a ser um desafio que temos de desenvolver, mas também é verdade que, se não formos capazes de
fazê-lo em conjunto, em comunidade, se não formos capazes de desenvolver as políticas públicas adequadas
na qualificação de pessoas e instituições, se nos deixarmos cada um por si, se deslaçarmos a comunidade e
seguirmos o exemplo dos neoliberais, do «cada um por si», a comunidade vai deslaçar, como disse: menos
oportunidades para os mais pobres, mais concentração de riqueza, mais injustiça social.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, emigrar é legítimo. Emigrar, sair, conhecer outros territórios é legítimo.
Portugal e os portugueses partiram e é bom acolher gente diferente também no nosso País.
Mas emigrar por necessidade não é justo. Emigrar porque temos de emigrar não é justo. Emigrar porque não
temos condições de cumprir aquilo que queremos para a nossa vida não é justo e não deve ser possível
acontecer no nosso território.
Mas a grande verdade, a grande questão, é que, para fazermos isso coletivamente, temos de manter o nosso
estatuto de Estado social como um ativo precioso, com a educação pública, com o Serviço Nacional de Saúde,
porque senão, senhores do Iniciativa Liberal, ficarão uns e partirão outros, ficarão os mais ricos e partirão os
mais pobres. E, connosco, isso não.
Aplausos do PS.
Protestos do IL.
É por isso que o Governo apresenta uma agenda ambiciosa para os mais jovens. É por isso que o Governo
apresenta o IRS Jovem, uma política de habitação ambiciosa e coerente e também o Programa Regressar.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, este foi o momento escolhido pelo povo
português para que o Partido Socialista, como partido central da democracia portuguesa, pudesse exercer a
maioria absoluta, pudesse ter, nesta Câmara, a maioria absoluta. A maioria absoluta não é um refúgio dos
portugueses — é uma escolha dos portugueses. É uma escolha porque têm a confiança e a segurança de que
este Programa é o Programa que melhor serve a sua vida, as suas escolhas, as suas opções.
Mas é uma escolha que não só permite ao Partido Socialista cumprir o seu Programa, como também nos
mandata necessariamente — porque maioria absoluta, como disse, não é poder absoluto — para poder com
cada uma das oposições democráticas discutir as alternativas, melhorar as propostas. Mas, é certo, este
Programa do Governo é o Programa do Governo escolhido pelos portugueses e, se não há uma maioria absoluta
que seja poder absoluto, também não há nenhuma minoria absoluta que trave a maioria absoluta na
concretização dos seus objetivos.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, o Parlamento vai ser confrontado, dentro de
momentos, dentro em pouco, com uma moção de rejeição; mas é mais uma moção de rejeição apresentada à
oposição do PS do que propriamente uma moção de rejeição ao Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Vamos ver!
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Durante este debate do Programa do Governo, não foi apresentada
nenhuma alternativa.
O Sr. André Ventura (CH): — Foram só 20 alternativas!
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Nenhuma alternativa. Este Programa do Governo é o Programa da
maioria, mas é também o único Programa que, para além da legitimidade democrática, foi discutido naturalmente
neste Hemiciclo. E a maioria absoluta de 120 Deputados é a maioria absoluta que não apenas garante a
viabilidade do Governo, mesmo com abertura às oposições, é uma maioria que aqui suporta quatro anos e meio
de Governo e, quando se apresenta uma moção de rejeição, é bom, é responsável que se apresente uma outra
maioria neste Hemiciclo. Mas, mais uma vez, temos uma moção de rejeição que não é uma moção de rejeição
ao Governo, porque outro não pode haver, mas um namoro pegado da extrema-direita com a direita democrática.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Isso foram vocês com a esquerda. Andaram seis anos a namorar!
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O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Por isso, neste momento, há que dizer aos portugueses com
tranquilidade, com confiança: a vossa escolha vai ser respeitada. O PS está aqui para garantir que isso aconteça.
Aplausos, de pé, do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para fazer a intervenção de encerramento, em nome do Governo, a Sr.ª
Ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, que saúdo nesta sua primeira intervenção em Plenário na XV
Legislatura.
A Sr.ª Ministra da Presidência (Mariana Vieira da Silva): — Sr. Presidente: Permita-me, nesta que é a minha
primeira intervenção nesta Legislatura, que saúde o Sr. Presidente pela sua eleição, que tanto nos honra, e que,
na sua pessoa, saúde as Sr.as e os Srs. Deputados, que, nesta Assembleia, representam os portugueses na sua
pluralidade e diversidade, desejando a todos um bom mandato.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, no último dia e meio, esta Assembleia debateu o Programa do XXIII
Governo Constitucional. E aquilo a que pudemos assistir foi ao mesmo tipo de acusações e prognósticos que
aqui se fizeram em 2015 e em 2019: de que as políticas então previstas destruiriam o emprego e penalizariam
o crescimento, de que não estaríamos preparados para governar em momentos difíceis, de que não estávamos
a preparar o País para os desafios do futuro.
Garantiram-no no passado. Repetiram-no hoje. Falharam no passado e falharão também hoje.
Aplausos do PS.
A verdade é esta: os prognósticos e maus augúrios que as oposições aqui apresentaram foram sendo, ano
após ano, desmentidos. Desmentidos pelos factos. E desmentidos pelos votos dos portugueses.
Todos os males avistados foram desmentidos pelos factos: no emprego, nos rendimentos, no crescimento e
na política orçamental.
Temos hoje, apesar da pandemia, os níveis de emprego em máximos históricos; convergimos com a União
Europeia em 2016, 2017, 2018 e 2019 e retomaremos esse caminho já em 2022; o salário mínimo nacional
subiu 40% desde 2015 e o rendimento médio mensal líquido da população empregada subiu 23%; tivemos o
primeiro saldo orçamental positivo da democracia e, apesar da pandemia, em 2021 já estamos abaixo dos 3%.
Os pessimismos das oposições foram também sendo derrotados pelos votos; todas as vezes que os
portugueses foram chamados às urnas em eleições legislativas, desde 2015, deram mais força ao caminho que
vimos trilhando e às políticas que fomos prosseguindo.
O Programa que apresentámos é, por isso — como não podia deixar de ser —, o mesmo que foi sufragado
pelos eleitores. E a composição desta Assembleia é, aliás, a representação mais fiel da aprovação maioritária
dos portugueses a este Governo, ao Programa que aqui apresentámos e discutimos, à estratégia que definimos
para o País e também aos seus resultados.
Os eleitores votam para escolher Deputados, mas também para escolher um programa eleitoral, um caminho
para o seu país. Forma Governo quem tem a capacidade de aprovar o seu programa. Ora, aquilo a que
assistimos no último dia e meio é que parece que alguns partidos estavam à espera de que o Governo fizesse
tábua rasa dos seus compromissos eleitorais e dos resultados eleitorais e aparecesse aqui com as ideias e o
programa dos partidos da oposição.
E não nos equivoquemos. Podemos ter — e muito bem — nesta Assembleia críticas, muitas vezes simétricas,
da esquerda à direita. Mas, lá fora, foi este o caminho que os portugueses escolheram para Portugal.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, este é um Programa de desafios e convicções.
Sabemos bem que o desafio climático e ambiental é decisivo e urgente. E Portugal pode vencer esse desafio
se reforçar o peso das renováveis, se investir mais na eficiência energética e se aumentar o peso da economia
circular. São essas as respostas que dão corpo ao Programa do Governo.
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Sabemos que não consolidamos o caminho para o desenvolvimento para todos se não respondermos à crise
demográfica que vivemos. E podemos responder a essa crise se avançarmos com a Agenda do Trabalho Digno
e a agenda da conciliação, com o compromisso de creches para todos e de habitação acessível, se não
desistirmos de um País aberto à imigração sustentada e inclusiva. São esses os compromissos que dão sentido
a este Programa.
Sabemos que temos uma oportunidade de convergência e desenvolvimento, mas que só o faremos se
estivermos preparados e aproveitarmos plenamente a transição digital. E podemos aproveitar essa oportunidade
se dermos um novo salto nas qualificações, se apostarmos no conhecimento, na ciência, na inovação para
transformar o nosso tecido produtivo e se apostarmos na digitalização para tornar as empresas e a
Administração Pública mais produtivas e mais capazes de dar respostas eficazes às necessidades dos cidadãos.
E é para isso mesmo que aqui assumimos compromissos e medidas.
Finalmente, sabemos que o combate às desigualdades é um imperativo de justiça social e de cidadania, mas
também de crescimento sustentável. E podemos responder a este desafio se levarmos a cabo um combate sem
tréguas à pobreza, se apostarmos no apoio à infância e na educação para erradicar a reprodução das pobrezas,
se aumentarmos o peso dos salários na riqueza do País e se continuarmos a remover os obstáculos à plena
realização pessoal, social e profissional das mulheres, porque um país que abdica do pleno potencial de metade
da sua população está a autolimitar-se no seu desenvolvimento.
Aplausos do PS.
E, mais uma vez, são estas as políticas que estão incluídas neste Programa.
Este é um Programa que prossegue a trajetória de crescimento e de desenvolvimento, uma trajetória de
convergência com a União Europeia.
Trata-se de um projeto para quatro anos e meio de trabalho intenso, focado na recuperação do País, que
responde às necessidades das famílias e das empresas, para alcançarmos mais prosperidade, justiça e
igualdade. E foi este o caminho de progresso, de olhos postos no futuro, que os portugueses escolheram para
Portugal.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, outra das críticas aqui muito repetidas foi a de que o Governo não
estará preparado para responder à emergência do momento que vivemos. Depois de dois anos e meio a ouvir
que o Governo anterior mais nada fez do que responder às urgências da pandemia, não deixa de ser
surpreendente ouvir agora esta acusação.
Perante uma crise inédita e absolutamente imprevista, soubemos adaptar-nos a circunstâncias que alteraram
profundamente as condições de governação e provámos ser capazes de desenhar políticas públicas inéditas
para responder a essa emergência, garantindo a vitalidade do nosso tecido económico e assegurando que
ninguém ficava para trás.
Já demonstrámos que nos batemos na Europa pelas melhores soluções para os problemas que partilhamos.
Fizemo-lo na resposta à pandemia. Estamos a fazê-lo na resposta à crise provocada pela invasão russa da
Ucrânia. Nas dificuldades que já conhecemos e naquelas que ainda não imaginamos, mas que poderão chegar,
venha o que vier, cá estaremos para responder, para proteger os portugueses e defender Portugal.
Aplausos do PS.
Foi precisamente um Governo com esta capacidade de responder às mais inimagináveis conjunturas e às
maiores tormentas que os portugueses escolheram para Portugal.
Por isso mesmo, ainda hoje serão aprovadas as medidas ontem anunciadas pelo Sr. Primeiro-Ministro. São
medidas que acrescem a medidas que já tomámos e que tomaremos sempre que necessário.
A atual evolução de preços, que todas as instituições avaliam neste momento como conjuntural, impõe uma
ação imediata. Uma ação que responda às pressões inflacionistas, agindo sobre os preços e não com medidas
que podem, aliás, ter o efeito perverso de agravar a inflação. É que, às vezes, as respostas simples mais não
fazem do que agravar os problemas a que queremos responder.
Essas medidas visam, como aqui já foi dito, conter os preços da energia, nomeadamente com a descida do
ISP num valor equivalente à redução do IVA para 13%; apoiar as empresas, suportando parte dos custos com
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energia das indústrias intensivas em energia; apoiar as famílias, alargando o âmbito dos apoios aos agregados
mais vulneráveis; e acelerar a transição energética, com destaque para a redução do IVA dos equipamentos
elétricos que permitam uma menor dependência do gás por parte das famílias.
Muitas vezes, ao longo do último dia e meio, pareceu haver, em alguns grupos parlamentares, uma estranha
convicção de que há uma fronteira rígida entre os compromissos estruturais e as respostas conjunturais.
Mas pergunto: onde estaríamos, Sr.as e Srs. Deputados, na resposta à inflação nos preços da energia se não
tivéssemos avançado, como avançámos, na transição energética? Onde estaríamos sem o reforço nos
rendimentos das famílias? Onde estaríamos sem o reforço que fizemos no nosso sistema científico nacional?
A nossa ambição é a de não permitir que a pressão conjuntural trave a resolução dos desafios estruturais,
tantos deles tão urgentes, mas também a de fazer com que as respostas estruturais apoiem a emergência da
conjuntura. E foi também essa capacidade de conciliar permanentemente os avanços estruturais com as
respostas conjunturais que os portugueses escolheram para Portugal.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, para cumprir o Programa, para governar Portugal, estaremos sempre
atentos às vozes de todos. Estaremos abertos a convergências políticas e à concertação política e social. Mas
ninguém duvide: seremos fiéis à nossa história e aos nossos valores.
Sabemos que este é um momento crítico da história da Europa e do mundo, mas defendemos o nosso legado
único, a herança dos que sempre acreditaram ser possível conciliar firmeza e tolerância, liberdade e igualdade,
Portugal e a Europa.
Aplausos do PS.
Hoje, como poucas vezes no passado recente, temos a consciência da firmeza necessária para garantir a
liberdade de investir e de criar, de inovar e de empreender. Sem essa liberdade, o progresso é um objetivo
longínquo, se não mesmo inatingível.
Mas sabemos, igualmente, a urgência de afirmar que o desenvolvimento humano exige políticas públicas
fortes e eficazes. Foi assim no passado, com a erradicação do trabalho infantil, com a escolaridade obrigatória,
com a saúde universal, com a proteção dos mais frágeis. Foram sempre o primado da lei e a força das políticas
públicas e do Estado que nos fizeram avançar para uma sociedade mais decente.
Foi assim no passado. Terá de ser assim no presente e no futuro, garantindo a equidade, estimulando a
inovação, apoiando os mais frágeis, nunca hipotecando a coesão social aos interesses dos mais fortes.
Aplausos do PS.
Para prosseguir esse caminho de ambição e de equilíbrio entre uma economia dinâmica e inovadora e um
Estado social forte e sustentável, tem o Governo da República recursos decisivos. Tem os recursos do PRR e
de outros fundos estruturais, pelos quais nos batemos como poucos. Tem os recursos de um apoio livre mas
determinado da maioria desta Assembleia. Mas tem, acima de tudo, a tranquilidade e a convicção que nos vêm
do facto de ter sido este o caminho que o povo escolheu.
Aplausos do PS.
Este caminho, e não qualquer outro, que pode ser e deve ser debatido nesta Assembleia. É por isso que aqui
estaremos, ou seja, para o cumprir pelas portuguesas e pelos portugueses. Por Portugal!
Aplausos do PS, de pé.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Assim concluímos o período de encerramento do debate sobre o Programa do Governo e, portanto, todo
esse debate.
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Fazendo uso de um direito que o artigo 217.º do Regimento lhe concede, o grupo parlamentar proponente
da moção de rejeição, o Grupo Parlamentar do Chega, solicitou uma interrupção dos trabalhos por 15 minutos,
pelo que os retomaremos às 17 horas e 5 minutos. Peço a todos que compareçam nessa altura.
Está interrompida a sessão.
Eram 16 horas e 51 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 17 horas e 5 minutos.
Srs. Membros do Governo, peço que ocupem os seus lugares.
Pausa.
Julgo que estamos em condições de passar ao período de votações, sendo que a primeira diz respeito à
moção de rejeição do Programa do Governo, apresentada pelo Grupo Parlamentar do Chega.
Peço a todas as Sr.as e a todos os Srs. Deputados que ainda não o tenham feito que procedam ao registo da
sua presença. Solicito aos serviços que acionem o sistema de verificação de quórum, necessário para a votação.
Recordo que a votação da moção de rejeição exige o apuramento de uma maioria qualificada e, portanto,
recorreremos à votação eletrónica. Isto significa que, estando aberto o sistema de verificação de quórum, os
Srs. Deputados e as Sr.as Deputadas se devem registar para esse efeito de apuramento de quórum.
Quem não se registar agora ficará impedido de votar, porque o sistema o impedirá. Portanto, todos devem
registar-se para efeitos de verificação de quórum.
Pausa.
Srs. Deputados, o quadro eletrónico regista 225 presenças, o que significa que temos quórum para proceder
às votações.
De qualquer forma, pergunto se algum Sr. Deputado ou alguma Sr.ª Deputada não se conseguiu registar.
Caso isso tenha acontecido, peço que o indiquem à Mesa.
Pausa.
Julgo que um Sr. Deputado da bancada do PSD não se conseguiu registar. O Sr. Deputado pede a palavra?
O Sr. Artur Soveral Andrade (PSD): — Sim, Sr. Presidente, eu não consegui registar-me.
O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado, fica registado.
Vamos então proceder à votação da Moção de Rejeição n.º 1/XV/1.ª (CH) — Do Programa do XXIII Governo
Constitucional.
Quem vota a favor faça o favor de se levantar e de votar no sistema eletrónico nesse sentido.
Pausa.
Quem vota contra faça o favor de se levantar e de carregar no respetivo símbolo no sistema eletrónico.
Pausa.
Quem se abstém faça o favor de se levantar e de carregar no respetivo símbolo eletrónico.
Pausa.
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Todos os presentes puderam exercer o seu direito de voto, mas há Colegas que, em virtude de estarem em
confinamento, estão a assistir e a participar na sessão por via remota, pelo que dou a palavra à Sr.ª Deputada
Maria da Luz Rosinha para proceder à respetiva identificação e para lhes conceder a possibilidade de exercerem
o seu direito de voto.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, passo a chamar a Sr.ª Deputada Alma Rivera,
do PCP.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Boa tarde.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr.ª Deputada, peço-lhe que diga à Câmara de que modo vota.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Voto contra.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.
Peço agora à Sr.ª Deputada Alexandra Tavares de Moura, do Partido Socialista, que nos diga de que modo
vota.
A Sr.ª Alexandra Tavares de Moura (PS): — Boa tarde, voto contra.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Muito obrigada.
Chamo agora a Sr.ª Deputada Cristina Mendes da Silva, do Partido Socialista.
A Sr.ª Cristina Mendes da Silva (PS): — Boa tarde.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Boa tarde, Sr.ª Deputada.
Pode dizer-nos em que sentido vota?
A Sr.ª Cristina Mendes da Silva (PS): — Voto contra.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Muito obrigada.
Sr. Presidente, está terminada a votação.
O Sr. Presidente: — Estamos em condições de indicar o resultado da votação da Moção de Rejeição n.º
1/XV/1.ª (CH) — Do Programa do XXIII Governo Constitucional.
Submetida à votação, não obteve os votos da maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções,
tendo-se registado 133 votos contra (120 do PS, 6 do PCP, 5 do BE, 1 do PAN e 1 do L), 12 votos a favor (CH)
e 81 abstenções (73 do PSD e 8 do IL).
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — É para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, é para indicar à Mesa que daremos entrada de uma declaração
de voto escrita sobre esta votação e para informar que, nos termos do artigo 77.º do Regimento, pretendemos
fazer uma intervenção de protesto em relação ao que sucedeu.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, não tenho presente, mas julgo, de memória, que o Regimento permite
que as intervenções de protesto possam fazer-se no fim das votações. Portanto, se não houver objeção, assim
faremos.
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Srs. Deputados, passamos, agora, à votação do Projeto de Deliberação n.º 1/XV/1.ª (PAR) — Elenco e
composição das comissões parlamentares permanentes.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Votamos de seguida o Projeto de Resolução n.º 18/XV/1.ª (PAR) — Deslocação do Presidente da República
a Madrid e a Málaga.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos agora ouvir o protesto apresentado pelo Chega.
Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, usando o minuto de que o Chega dispõe para o protesto,
gostaria de deixar claro o seguinte: não tenho memória, e certamente que muitos portugueses também não
terão, de uma intervenção feita na Assembleia da República por um Deputado eleito pelo povo português, com
a mesma legitimidade de todos os outros, ser interrompida pelo Presidente da Assembleia da República…
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço que criem as condições para o Sr. Deputado André Ventura se
poder exprimir.
O Sr. André Ventura (CH): — Não tenho memória, Sr. Presidente, de um Deputado eleito pelo povo
português, tão Deputado como todos os que aqui estão, ser interrompido pelo Presidente da Assembleia da
República em relação ao conteúdo da sua intervenção.
Certamente que desde o 25 de Abril, que se vai celebrar daqui a alguns dias, não acontecia nesta Assembleia
tamanho ato de censura sobre um partido e sobre um grupo parlamentar.
Aplausos do CH.
Protestos do PS e do L.
Por isso, Sr. Presidente, este protesto é dirigido a si diretamente. Penso que, nos termos do Regimento,
poderá fazer um contraprotesto, se assim o entender.
Aplausos do CH.
Em qualquer caso, não queria deixar de registar, para memória futura e para os portugueses que nos estão
a ver, que a partir de hoje, dia 8 de abril, há nesta Casa palavras que se podem usar e outras que não se podem
usar. Que belo exemplo de censura quando vamos celebrar o 25 de Abril!…
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o n.º 3 do artigo 89.º do Regimento determina o seguinte: «O orador é
advertido…» — não diz que pode ser advertido, diz que é advertido! — «… pelo Presidente da Assembleia…»,
que sou eu próprio, «… quando se desvie do assunto em discussão ou quando o discurso se torne injurioso ou
ofensivo, podendo retirar-lhe a palavra.»
Aplausos do PS, com Deputados de pé.
O Sr. André Ventura (CH): — Não foi o caso!
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O Sr. Presidente: — O que eu fiz foi cumprir esta obrigação que a Assembleia da República, que é soberana
e aprovou o seu próprio Regimento, me comete e tenciono fazê-lo sempre que for necessário.
Aplausos do PS.
Sr.as e Srs. Deputados, antes de ler a agenda da próxima sessão plenária, devo esclarecer que, tendo sido
votada e rejeitada a moção de rejeição do Programa do Governo, o Governo tem o seu Programa devidamente
apreciado pela Assembleia da República e, doravante, exerce plenamente as suas funções.
Aplausos do PS, de pé.
Desejo, naturalmente, as maiores felicidades ao Governo no exercício das suas funções.
Recordo à Câmara que a próxima reunião plenária terá lugar na quarta-feira, dia 13 de abril. Na ordem do
dia constam, no primeiro ponto, declarações políticas e, no segundo ponto, um debate sobre a situação na
Ucrânia, seguidos, excecionalmente, por um período de votações.
Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado pela vossa participação no debate e bom fim de semana.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas não nos falta fazer uma votação?
O Sr. Presidente: — Todas as votações foram feitas, Sr.ª Deputada, mas, de qualquer modo, agradeço a
sua intervenção.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 21 minutos.
———
Declaração de voto enviada à Mesa para publicação
Relativa à Moção de Rejeição n.º 1/XV/1.ª (CH) — Do Programa do XXIII Governo Constitucional:
A mencionada Moção não foi aprovada, tendo recolhido os votos favoráveis dos Deputados do partido Chega,
a abstenção dos Deputados do PSD e do IL, bem como os votos contra das restantes bancadas.
O Chega considera que o Programa do XXIII Governo Constitucional não passa de verdadeira propaganda
eleitoral, um programa vazio de conteúdo e de propostas concretas, um programa que não dá resposta às
preocupações e, sobretudo, às necessidades dos portugueses e que não leva em conta a situação geopolítica
e económica da Europa.
O Chega lamenta ainda a postura dos restantes partidos, em particular do PSD e do IL, que não
demonstraram ter a coragem de se assumirem como oposição. Ficou provado que nesta Legislatura só existirá
uma oposição ao Governo, a do Chega.
Fica assim registado nesta votação e com esta declaração de voto que na presente Legislatura só existirá
uma oposição ao Governo, a do Chega.
Os Deputados do Chega, André Ventura ― Diogo Pacheco de Amorim ― Bruno Nunes ― Pedro Pinto ―
Rui Paulo Sousa ― Rita Matias ― Gabriel Mithá Ribeiro ― Jorge Galveias ― Filipe Melo ― Pedro Pessanha
― Rui Afonso ― Pedro dos Santos Frazão.
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Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.