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11 DE JUNHO DE 2022

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Não surpreende, pois, que as iniciativas em debate sejam praticamente coincidentes, pelo que coincidente

será também a apreciação que fazemos sobre elas.

A nossa posição não foi tomada de ânimo leve e não se baseia em maniqueísmos ou em ideias feitas. É uma

opção que resulta de uma reflexão profunda sobre um tema que, pela sua complexidade, pelas inquietações

que suscita e pela importância dos valores em causa, dispensa qualquer atitude de arrogância intelectual ou

invocação de superioridade moral.

O PCP sempre se recusou a encarar este debate como uma guerra de trincheiras, de religiões contra

ateísmos, de pessoas de esquerda contra pessoas de direita, de iluminados contra obscurantistas. O PCP é um

partido laico e de esquerda, baseando as suas posições numa reflexão onde não cabem dogmas nem anátemas.

O que está em causa é uma opção legislativa, uma opção do Estado e não um julgamento sobre consciências

individuais. Não estamos a decidir da opção individual de cada um sobre o fim da sua vida, mas da atitude a

tomar pelo Estado relativamente à fase terminal da vida dos seus cidadãos e ao objetivo para o qual deve a

sociedade mobilizar os seus recursos, a sua ciência, o seu progresso tecnológico.

Enfim, a autonomia individual é algo que deve ser respeitado, mas uma sociedade organizada não é uma

mera soma de autonomias individuais. Não se pode assumir uma opção legislativa sobre a vida e a morte das

pessoas sem ter em conta as circunstâncias e as consequências sociais dessa opção.

Este não é um debate entre quem preza a dignidade da vida humana e quem a desvaloriza. A dignidade de

cada ser humano tem de ser reconhecida, independentemente do posicionamento de cada um perante a sua

própria morte.

Se a questão da eutanásia for encarada estritamente no plano individual, não há como não respeitar a

posição de quem afirma pretender ter o direito de pôr termo à vida perante uma situação-limite. Nenhum de nós

receia morrer, porque todos sabemos que morreremos um dia, mas todos receamos o sofrimento que pode

preceder a morte. É humano e compreensível que assim seja.

Não se discute a dignidade individual seja de quem for, o que se discute é o sentido em que a sociedade se

deve organizar e como os seus recursos devem ser mobilizados perante a doença e o sofrimento. Continuamos

a considerar que o sentido do progresso das sociedades humanas é o de debelar a doença e o sofrimento,

mobilizando os seus recursos, o conhecimento científico e a tecnologia, assegurando que todos os seres

humanos beneficiam desses avanços.

É nesse sentido de progresso que o Estado se deve empenhar e não no de criar condições para antecipar a

morte.

O Estado português não pode continuar a negar a muitos dos seus cidadãos os cuidados de saúde de que

necessitam, particularmente nos momentos de maior sofrimento. A criação de uma rede de cuidados paliativos

com caráter universal tem de ser uma prioridade absoluta. Ninguém entende a eutanásia como um sucedâneo

dos cuidados paliativos e para o PCP há uma questão incontornável: um país não deve criar instrumentos legais

para antecipar a morte e ajudar a morrer quando não garante condições materiais para ajudar a viver.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Muito bem!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Inquietam-nos, neste processo legislativo, as consequências sociais que dele podem decorrer, sobretudo, pensando nas camadas sociais mais fragilizadas, nos mais idosos, nos mais pobres,

nos que têm mais dificuldades no acesso a cuidados de saúde, naqueles a quem aparecerá de forma mais

evidente a opção pela antecipação da morte.

A evolução da ciência e da tecnologia tem permitido avanços da medicina que eram impensáveis ainda há

poucos anos. Essa evolução é inexorável e cada vez mais rápida, a questão está em os recursos disponíveis

serem postos ao serviço de toda a comunidade, através de boas práticas médicas que rejeitem o recurso à

obstinação terapêutica e que respeitem a autonomia da vontade individual, expressa através das manifestações

antecipadas de vontade que a lei já permite.

O dever do Estado é o de garantir que a morte inevitável seja sempre assistida, mas não que seja antecipada.

Num quadro em que, com frequência, o valor da vida humana surge relativizado em função de critérios de

utilidade social, de interesses económicos, de responsabilidades e encargos familiares ou de gastos públicos, a

legalização da eutanásia acrescentará novos riscos que não podemos eludir.

O PCP manterá, assim, o voto contra as iniciativas legislativas em debate.

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