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11 DE JUNHO DE 2022

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de «liberdade q.b.». A presença de uma validação externa da vontade do doente só reflete que não é admissível

que uma pessoa possa exigir ao Estado que a mate. O argumento da liberdade é falível e não se verifica, tendo

em conta todo o processo e exigências para que a morte assistida tenha lugar.

Esta minha posição não é moralista ou conservadora, mas fundada em reservas e dúvidas significativas

sobre o que está a Assembleia da República a legislar para o futuro da nossa sociedade.

Uma sociedade que promove a igualdade de oportunidades não é uma sociedade em que o acesso a

cuidados paliativos é dado apenas a 30% da população. Não é uma sociedade em que as camas e as equipas

comunitárias de cuidados paliativos ficam muito aquém das recomendações internacionais e também muito

longe de cumprir o próprio Programa Nacional de Cuidados Paliativos. Uma sociedade que promove a igualdade

de oportunidades — aquela em que eu acredito — é uma sociedade que promove em todo o nosso território, do

norte ao sul e nas regiões autónomas, o acesso a cuidados dignos em fim de vida, independentemente do

prestador ser público, privado ou uma instituição particular de solidariedade social, que sejam universais e

tendencialmente gratuitos. Infelizmente, esta não é a realidade em Portugal.

Sou contra a distanásia e a obstinação terapêutica, e reconheço a boa prática da medicina que é a decisão

clínica centrada no doente. A decisão tomada entre o médico e o doente, tendo o médico a obrigação de informar

e esclarecer o doente, de forma isenta, sobre todas as opções que estão disponíveis, representa aquela que é

uma das mais ricas armas terapêuticas da medicina: a relação médico-doente, uma relação de profunda

confiança mútua e de um profundo respeito pelos direitos dos doentes, como o direito, consagrado na lei

portuguesa, de qualquer doente recusar medidas invasivas, terapêuticas que considere intoleráveis ou qualquer

medida que, alegadamente, prolongue a sua vida.

Assim sendo, e conforme fiz na XIV Legislatura, votei contra os diferentes projetos de lei para a

despenalização da eutanásia.

Assembleia da República, 9 de junho de 2022.

O Deputado do Grupo Parlamentar do PSD, Alexandre Poço.

——

A eutanásia é um assunto que está no âmago do que somos e queremos ser como sociedade. Todos nos

confrontamos com o sofrimento humano, todos partilhamos fraquezas, todos temos dúvidas. A evolução da

medicina deu-nos vidas mais longas, permitiu-nos controlar muitas doenças e melhorar a qualidade da vida

quando deixamos de ser saudáveis. O reverso da medalha é que também nos coloca mais vezes perante

questões para as quais não há respostas simplistas, perguntas sobre o prolongamento da nossa vida, ou da

vida dos que nos são queridos, por vezes à custa de uma expetativa de sofrimento que admitimos que seja difícil

tolerar. Tudo temas difíceis, de resposta tão incerta como certa é a morte que anda por perto.

No plano dos princípios, todos concordam que uma sociedade deve fazer o que estiver ao seu alcance para

reduzir a dor e o sofrimento dos seus membros, em particular os mais fragilizados e com menos saúde. Será

que, no concreto, é isso que estamos a fazer? Como prova o baixíssimo investimento português em cuidados

paliativos, a resposta só pode ser um rotundo não.

Melhorar a qualidade do fim da vida (a «boa morte») não tem sido uma prioridade do Serviço Nacional de

Saúde, o que faz com que alguns, ao confrontarem-se com um caminho de sofrimento que obviamente temem,

concluam que apenas lhes resta apressar a sua morte. Ao não investir minimamente nas condições para que

cada um possa ter uma «boa morte», Portugal não está a deixar ninguém escolher em liberdade: escolher

implica ter alternativas e não pode haver escolha livre quando a única alternativa a pedir a morte é a perspetiva

do sofrimento sem ajuda.

Deverá uma sociedade em que nos preocupamos uns com os outros limitar-se a deixar que cada um defina,

dentro dos graus de liberdade que o coletivo lhe conceda, quando e como quer morrer, resignando-se a

sociedade a essa vontade e ajudando a executá-la? A nossa resposta é clara: não, não é isso que se espera de

uma comunidade comprometida com os seus. Daí que, com a mesma clareza, tenhamos votado «não» em todos

os projetos de despenalização da eutanásia. Por maior que seja o esforço legislativo, a experiência de países

em que esse passo inicial foi dado mostra que a legalização da eutanásia acaba por abrir caminho à sua

extensão e normalização.

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