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I SÉRIE — NÚMERO 46

4

Para apresentar os projetos de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

Pausa.

Peço silêncio na Câmara.

Faça favor, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na expectativa de que tenham

interesse por este tema e de que possam querer ouvir aquilo que o Bloco de Esquerda traz hoje a debate,

gostaria de começar por citar o óbvio — há 2 milhões de créditos à habitação em Portugal e 93 % destes

contratos estão associados a uma taxa de juro variável. Ou seja, talvez os Srs. Deputados tenham interesse em

saber que há 1 milhão e 860 000 pessoas que olham com apreensão, muitas delas com medo, para a subida

das taxas de juro.

Falamos, hoje, para todas estas pessoas a quem o Governo diz que não há razões para preocupação, que

devem esperar tranquilamente por um Orçamento do Estado que ninguém conhece e que entrará em vigor no

ano que há de vir.

«Confiem em nós» — pede o Governo que negou a inflação até não poder mais, para depois apresentar um

pacotinho que, em vez de ser um apoio, é uma talhada no direito dos pensionistas.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — «Confiem em nós» — pedia o Primeiro-Ministro no último debate

parlamentar, enquanto tentava convencer os Deputados nesta Sala, e o País, de que não havia e não há um

problema com créditos à habitação. Mas será que não há mesmo razões para preocupação?

Em janeiro deste ano, a taxa de juro média dos novos créditos à habitação era de 0,8 %, mas oito meses

depois tinha superado os 2 % e o Banco Central Europeu (BCE) promete mais aumentos.

Se na zona euro o grande problema é o acesso a novos créditos, em Portugal a situação é muito mais

complexa. Quem o diz é o Banco de Portugal, que cito: «Ao contrário do que se verifica na área euro, em Portugal

a grande maioria dos empréstimos à habitação têm taxa de juro indexada às taxas Euribor a 6 meses ou a 12

meses (…). Como tal, as variações da Euribor transmitem-se mais rapidamente ao stock de empréstimos à

habitação em Portugal do que para a média da área do euro.»

Na prática, estamos a falar de variações na prestação mensal que podem superar, já este mês de outubro,

os 125 € que o Governo atribuiu, de uma só vez, no tal pacotinho para combater a inflação.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Diz-nos o Primeiro-Ministro que 90% dos contratos têm prestações

inferiores a 472 € mensais. A pergunta que se impõe é a seguinte: E então, Sr. Primeiro-Ministro? Até onde

entende o Governo que os portugueses devem aguentar a subida combinada dos juros e dos preços dos bens

essenciais, quando é o próprio Estado que nega atualizações salariais dignas? Até onde entende o Governo

que o empobrecimento é razoável?

Façamos contas para o caso de uma família com um rendimento de 2000 € e uma prestação de 417 €. Em

outubro, essa prestação valerá mais 123 €, sem contar com outros empréstimos que possa ter, sem contar com

o aumento do preço da alimentação, da eletricidade, do gás, do combustível. Sem contar com mais nada, o

rendimento desta família acabou de cair 6 % só em outubro. Pergunto ao Governo se este é o tipo de

empobrecimento que entende ser razoável.

E se o rendimento mensal for de 850 € e a prestação de 417 €? O mesmo aumento de 123 € dita que, neste

mês, 64 % do rendimento é consumido pelo crédito à habitação. Pergunto ao Governo se este é o tipo de

empobrecimento que é aceitável.

Vejamos um empréstimo ainda mais pequeno: uma prestação de 278 € num rendimento de 850 €. Já em

outubro, a prestação será 82 € mais cara e esta pessoa, esta família, acaba de ver o rendimento disponível cair

10 %. Isto é razoável?

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