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Quinta-feira, 13 de outubro de 2022 I Série — Número 48
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
REUNIÃOPLENÁRIADE12DEOUTUBRODE 2022
Presidente: Ex.mo Sr. Augusto Ernesto Santos Silva
Secretárias: Ex.mas Sr.as Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Lina Maria Cardoso Lopes Palmira Maciel Fernandes da Costa
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 7
minutos, após o que procedeu à leitura da mensagem do Presidente da República solicitando à Assembleia da República, caso esta considere relevante e necessário, que proceda à revisão da legislação em vigor referente à matéria do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, suas obrigações declarativas e
respetivo regime sancionatório. Deu-se conta da retirada, pela ALRAM, da Proposta de
Lei n.º 9/XIV/1.ª e da entrada na Mesa das Propostas de Lei n.os 36 a 39/XV/1.ª, dos Projetos de Resolução n.os 263/XV/1.ª e 265 a 267/XV/1.ª e dos Projetos de Lei n.os 349 a 351/XV/1.ª
Em declaração política, o Deputado Francisco César (PS) saudou o Governo e a concertação social pela assinatura de
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um acordo de médio prazo sobre rendimentos, salários e competitividade, resultado do diálogo social e político. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Alfredo Maia (PCP), Pedro Roque (PSD), José Moura Soeiro (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Rui Tavares (L), Rui Rocha (IL) e Pedro Pinto (CH).
Em declaração política, a Deputada Carla Castro (IL) criticou a proposta de Orçamento do Estado para 2023, tendo tecido considerações acerca da falta de estabilidade, confiança e compromisso relativamente a famílias e empresas. Em seguida, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Mariana Mortágua (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Pedro dos Santos Frazão (CH), Rui Tavares (L), Hugo Carneiro (PSD), Bruno Dias (PCP) e Sérgio Ávila (PS).
Em declaração política, a Deputada Rita Matias (CH), após ter saudado os estudantes universitários que iniciaram este ano o seu percurso académico, condenou o Estado pelas respostas insuficientes que tem dado no acesso ao alojamento estudantil, tendo referido que o seu partido irá apresentar medidas para mitigar a situação.
Em declaração política, a Deputada Emília Cerqueira (PSD), ao recordar os recentes casos que vieram a público sobre incompatibilidades e conflitos de interesse no exercício de funções políticas por parte de vários membros do atual Executivo, pediu explicações sobre o assunto e apelou a que se cumpra a lei. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Pedro Filipe Soares (BE), Rui Paulo Sousa (CH), Rodrigo Saraiva (IL), Pedro Delgado Alves (PS) e Alma Rivera (PCP).
Em declaração política, a Deputada Paula Santos (PCP) mencionou que a privatização da TAP não é solução para o País, tendo relembrado as sucessivas falhas que já ocorreram no processo, e defendeu que é necessário tomar medidas que protejam os postos de trabalho e os rendimentos dos trabalhadores dessa companhia aérea, salvaguardando a sua frota. Respondeu, de seguida, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Hugo Oliveira (PS), Bruno Nunes (CH), Paulo Rios de Oliveira (PSD), Bernardo Blanco (IL) e Mariana Mortágua (BE).
Em declaração política, o Deputado José Moura Soeiro (BE) teceu críticas ao Governo por ter afirmado que atualizar as pensões à taxa da inflação poria em causa a sustentabilidade da segurança social e traria a falência do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social na
década de 2040, sustentado-se em dados enviados ao Parlamento pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, distintos dos apresentados no Relatório da proposta de Orçamento do Estado para 2023. Posteriormente, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Rui Rocha (IL), Joana Barata Lopes (PSD), Alfredo Maia (PCP) e Rita Borges Madeira (PS).
Foi apreciada a Petição n.º 69/XIV/1.ª (Sara Alexandra Flores Gonçalves) — Pelo encerramento dos shoppings aos domingos, em conjunto com, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 153/XV/1.ª (PCP) — Regulação dos horários de funcionamento das unidades de comércio e distribuição e 345/XV/1.ª (BE) — Regula e estabelece limites aos horários de funcionamento de grandes superfícies comerciais e consagra um regime transitório de redução do período normal de trabalho. Intervieram no debate os Deputados Paula Santos (PCP), José Moura Soeiro (BE), Rodrigo Saraiva (IL), Filipe Melo (CH), Márcia Passos (PSD), José Rui Cruz (PS), Inês de Sousa Real (PAN) e Rui Tavares (L).
Procedeu-se à discussão conjunta da Petição n.º 209/XIV/2.ª (Mariana Franco Fernandes) — Solicitam a atribuição da natureza de crime público à partilha não consentida de conteúdos sexuais e, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 156/XV/1.ª (CH) — Reforça a proteção das vítimas de devassa da vida privada por meio de partilha não consentida de conteúdos de cariz sexual, 157/XV/1.ª (PAN) — Prevê o crime de divulgação não consentida de conteúdo de natureza íntima ou sexual, 208/XV/1.ª (BE) — Criação do crime de pornografia não consentida (quinquagésima quinta alteração ao Código Penal e quadragésima quinta alteração ao Código de Processo Penal) e 347/XV/1.ª (PS) — Reforça a proteção das vítimas de crimes de disseminação não consensual de conteúdos íntimos, alterando o Código Penal e o Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que aprova o comércio eletrónico no mercado interno e tratamento de dados pessoais. Usaram da palavra, a diverso título, os Deputados André Ventura (CH), Inês de Sousa Real (PAN), Joana Mortágua (BE), Cláudia Santos (PS), Patrícia Gilvaz (IL), Sofia Matos (PSD), Alma Rivera (PCP) e Rui Tavares (L).
Deu-se conta da entrada na Mesa do Projeto de Revisão Constitucional n.º 1/XV/1.ª e do Projeto de Lei n.º 348/XV/1.ª
O Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 7 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, já dispomos de quórum, todos os grupos parlamentares estão
agora representados, pelo que está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 7 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias ao público.
Começo pela leitura da mensagem que o Sr. Presidente da República entendeu dirigir à Assembleia da
República. Peço condições para ouvirmos todos a sua mensagem.
«Sr. Presidente da Assembleia da República, no uso da faculdade prevista na alínea d) do artigo 133.º da
Constituição, entendi dirigir à Assembleia da República a seguinte mensagem:
1. A Constituição impõe, no n.º 2 do seu artigo 117.º, que o legislador estabeleça os deveres,
responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, bem como as consequências do
respetivo incumprimento.
2. Neste sentido, o legislador aprovou a Lei n.º 4/83, de 2 de abril, alterada pelas Leis n.os 38/83, de 25 de
outubro, 25/95, de 18 de agosto, 19/2008, de 21 de abril, 30/2008, de 10 de julho, 38/2010, de 2 de setembro,
114/2017, de 29 de dezembro, 52/2019, de 31 de julho, que estabelece o controlo público da riqueza dos titulares
de cargos políticos; a Lei n.º 9/90, de 1 de março, alterada pela Lei n.º 56/ 90, de 5 de setembro, que estabelece
as incompatibilidades de cargos políticos e altos cargos públicos; a Lei n.º 64/93, de 26 de agosto, alterada pelas
Leis n.os 39-B/94, de 27 de dezembro, 28/95, de 26 de agosto, 12/96, de 18 de abril, 42/96, de 31 de agosto,
12/98, de 24 de fevereiro, pelo Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de março, pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de
novembro, e pela Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, que estabelece o regime jurídico de incompatibilidades e
impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos; e a Lei n.º 52/2019, de 31 de julho,
alterada pelas Leis n.os 69/2020, de 9 de setembro, 58/2021, de 18 de agosto, e 4/2022, de 6 de janeiro, que
aprova o regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos.
Igualmente relevante na matéria a Lei n.º 34/87, de 16 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei
n.º 108/2001, de 28 de novembro, a Lei n.º 30/2008, de 10 de julho, a Lei n.º 41/2010, de 3 de setembro, a Lei
n.º 4/2011, de 16 de fevereiro, a Lei n.º 4/2013, de 14 de janeiro (retificada pela Declaração de Retificação
n.º 5/2013, de 25 de janeiro), a Lei n.º 30/2015, de 22 de abril, e a Lei n.º 94/2021, de 21 de dezembro, relativas
aos crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos e, ainda, o Estatuto da Entidade para a
Transparência, aprovado pela Lei Orgânica n.º 4/2019, de 13 de setembro, que procede à 9.ª alteração à Lei
n.º 28/82, de 15 de novembro.
3. Este complexo emaranhado legislativo tem suscitado ampla controvérsia na sociedade portuguesa, numa
matéria essencial para a confiança dos cidadãos nas instituições, a qual resulta, como se viu, de uma imposição
constitucional.
4. As dúvidas interpretativas subjacentes aos regimes em causa foram expressas, inclusivamente, pelo
Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República quando, em dois momentos, se pronunciou sobre a
aplicação deste quadro legislativo: no Parecer n.º 25/2019 e no Parecer n.º 6/2021.
5. No primeiro caso, fazendo referência a uma potencial interpretação conforme à Constituição do regime em
causa, para o conformar com o princípio da proporcionalidade, acaba por operar uma ‘redução teleológica’, para
distinguir as situações previstas na lei.
6. Já no segundo caso, o Parecer refere, na sua conclusão n.º 39, que a ‘fixação literal nos conceitos de
contratação pública e de pessoa coletiva, que se verifica no n.º 4 do artigo 9.º e em outras disposições da Lei
n.º 52/2019, de 31 de julho, representa um duplo fator de obscuridade e que deve ser ponderado
cuidadosamente, quer pelo legislador parlamentar, quer pelo Governo, enquanto órgão superior da
Administração Pública (cf. artigo 182.º da Constituição) e, ao mesmo tempo, dotado de amplos poderes de
iniciativa legislativa em matérias de competência reservada da Assembleia da República (cf. artigo 167.º)’.
7. Não se afigura conveniente que, nesta matéria, o intérprete tenha de se socorrer de métodos interpretativos
como a redução teleológica ou que admita a existência de obscuridades.
8. Por esta razão dirijo a presente mensagem à Assembleia da República solicitando, caso esta considere
relevante e necessária tal reflexão, que proceda à revisão da legislação em vigor referente à matéria do exercício
de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, suas obrigações declarativas e respetivo
regime sancionatório, traduzindo-a num corpo único e claro que regule, nomeadamente, o exercício dos cargos,
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respetivos processos decisórios, suas relações familiares e outras, assim eliminado as dúvidas interpretativas
ou obscuridades que ainda subsistam.
Apresento a Vossa Excelência os meus respeitosos cumprimentos.
O Presidente da República.»
Para a leitura do expediente, passo a palavra à Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, desde logo, refiro a retirada,
pelo proponente, da Proposta de Lei n.º 9/XIV/1.ª (ALRAM).
Deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as Propostas de Lei n.os 36/XV/1.ª, 37/XV/1.ª, 38/XV/1.ª e
39/XV/1.ª (GOV), os Projetos de Resolução n.os 263/XV/1.ª (CH), 265/XV/1.ª (IL), 266/XV/1.ª (CAE) e
267/XV/1.ª (IL) e os Projetos de Lei n.os 349/XV/1.ª (PSD) e 350 e 351/XV/1.ª (PCP).
O Sr. Presidente: — Vamos iniciar o período de declarações políticas.
A primeira declaração política cabe ao Partido Socialista e dou a palavra ao Sr. Deputado Francisco César.
O Sr. Francisco César (PS): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados:
Permitam-me, antes de mais, que as minhas primeiras palavras sejam para saudar o Governo e os parceiros
sociais pelo acordo alcançado em sede de concertação social.
Aplausos do PS.
Num contexto e numa conjuntura internacional com crescentes desafios e dificuldades, com a maior inflação
das últimas décadas a pressionar fortemente o custo de vida, com o aumento das taxas de juro e com uma
guerra como pano de fundo a pintar o horizonte com insegurança e incerteza face ao futuro, alcançar um acordo
nestas circunstâncias é, verdadeiramente, um grande feito político.
Este acordo revela, em primeiro lugar, um elevado sentido de responsabilidade por parte dos seus
intervenientes — de todos os seus intervenientes — que, perante um contexto de grande adversidade,
colocaram acima de tudo o interesse nacional.
O sucesso deste acordo traduz, igualmente, a afirmação coletiva de um caminho alternativo em tempos de
crise — sim, Sr.as e Srs. Deputados, um caminho alternativo ao da direita, um caminho alternativo à austeridade.
É possível repartir os esforços e a riqueza de uma forma socialmente justa; atenuar as dificuldades das famílias
perante o infortúnio; apostar nas condições de vida dos jovens; valorizar os salários e, ao mesmo tempo, reforçar
a produtividade e a competitividade das nossas empresas.
Aplausos do PS.
Este acordo tem, por isso, este grande mérito: o mérito de ser, em síntese, resultado do diálogo social e
político responsável que o povo português nos exige em tempos de crise. É um bom acordo para Portugal e um
bom acordo para os portugueses.
Sr.as e Srs. Deputados, à estabilidade da maioria absoluta do PS exigida pelos portugueses, acrescentamos,
com este acordo, conseguido em diálogo com os parceiros sociais, o valor da estabilidade, da prudência e da
previsibilidade no médio prazo, na implementação de medidas e reformas num conjunto de domínios do
económico e social, que são essenciais para o presente e futuro do País, até porque, como bem lembrou o Sr.
Presidente da República, é muito diferente enfrentar um contexto atual de dificuldades com estabilidade ou com
um clima de permanente tensão social.
Mas, se a forma é, neste caso, tão importante como o conteúdo, atentemos a este último, ao resultado
material do que significa, na prática, para a vida das pessoas e das empresas este Acordo de Médio Prazo de
Melhoria de Rendimentos, Salários e Competitividade. Em síntese, é a valorização dos rendimentos das famílias,
a melhoria das condições de vida dos jovens e o aumento da competitividade das empresas para todo o País
— continente e regiões autónomas.
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A título de exemplo, refiro a valorização dos rendimentos e salários, através também do assumir de um
compromisso político ambicioso em matéria de salário mínimo nacional, que diziam não ser possível nem
desejável: 760 € já em 2023 e valorizações sucessivas até atingir os 900 € em 2026.
Na prática, este objetivo fará com que, entre 2015 e 2026, na vigência da governação socialista, a valorização
do salário mínimo nacional seja superior a 78%, em contraste com uma inflação esperada inferior a 24% para o
mesmo período.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Ah, pois!
O Sr. Francisco César (PS): — É um resultado verdadeiramente histórico!
Aplausos do PS.
Risos do Deputado do CH Pedro Pinto.
Mas, além desta grande conquista, este acordo mantém o objetivo, plasmado no Programa do Governo, de
alcançar, em 2026, um peso relativo das remunerações do PIB (produto interno bruto) de, pelo menos, 48,3%
e, com isso, convergir com a média europeia.
Porém, a par do aumento dos rendimentos por via dos salários ou por via fiscal, este acordo não esquece a
valorização das condições de vida dos jovens, por exemplo, com a criação de um programa anual de apoio à
contratação sem termo de jovens qualificados com salários iguais ou superiores a 1320 €, ou com o reforço do
benefício anual do IRS Jovem, permitindo, desta forma, dar respostas aos anseios de quem acabou de entrar
no mercado de trabalho.
Afirmamos também, neste acordo, o nosso compromisso de apoio às empresas afetadas pela crise da
inflação e da guerra — sim, porque não há economia sem trabalhadores, porque não há economia sem
empresas e não há empresas sem lucro,…
Aplausos do PS.
… em todos os setores da nossa economia, do comércio, ao turismo, da agricultura à indústria —, seja
promovendo o investimento e a sua capitalização através da redução seletiva do IRC (imposto sobre o
rendimento das pessoas coletivas), seja adotando novas medidas de mitigação do aumento dos custos de
contexto, sobretudo na área da energia.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, este acordo acrescenta ambição aos mais de 4250 milhões de euros
que o Governo já mobilizou para as empresas e famílias, a que se somam agora mais medidas previstas no
Orçamento do Estado para 2023.
Este é um acordo que, face à turbulência e adversidade, dá respostas e aponta um caminho. Estes são
objetivos de quem ambiciona e quer mais para o futuro do País, de quem não se conforma nem se resigna, de
quem, em diálogo, em concertação, com espírito de abertura, não se refugia no conforto da maioria que lhe foi
conferida em eleições e, pelo contrário, procura consensos e procura construir soluções que envolvam os
parceiros sociais e demais entidades representativas da sociedade portuguesa.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Francisco César (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Parafraseando o que brilhantemente foi dito há décadas, socorro-me destas célebres palavras para dizer
que, perante este contexto de dificuldades crescentes, este acordo não é o fim da nossa ação no combate à
crise, nem sequer é o começo do fim, mas é, talvez, o fim do começo. Assim saibamos todos seguir o exemplo
do Governo e dos parceiros sociais e, efetivamente, colocar o interesse nacional acima de tudo.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a Mesa regista sete inscrições para pedidos de esclarecimento.
Presumo que talvez responda em dois blocos…
O Sr. Francisco César (PS): — Responderei em dois blocos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — O primeiro pedido de esclarecimento cabe ao Grupo Parlamentar do PCP, tendo para
o efeito a palavra o Sr. Deputado Alfredo Maia.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco César, escutei-o, com muita atenção,
a despender sobre a política de rendimentos, que, na verdade, é uma política de empobrecimento.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — E é de empobrecimento porque, embora o tenha enfatizado, o aumento do
salário mínimo nacional está muito abaixo do necessário, do que é mesmo exigível, não há uma valorização real
dos salários, das pensões e das reformas,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Pelo contrário!…
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — … e verifica-se, de dia para dia, uma grave erosão do poder de compra.
Não há acordo algum que trave a especulação e os grandes lucros, que controle os preços. E mesmo as
taxas sobre os lucros excessivos não abrangem setores essenciais como a grande distribuição, a eletricidade
ou mesmo a banca e os seguros, que têm registado lucros muito significativos.
Ao mesmo tempo, o Governo tende a aumentar as chamadas borlas fiscais para as empresas.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — Um exemplo muito claro é o fim do prazo para os reportes de prejuízo para
abater aos lucros. Não há melhor exemplo disso do que o Novo Banco, que tem registado, como sabemos,
sucessivos prejuízos nos últimos anos. Em 2020, registou 1329 milhões de euros de prejuízos, este ano já vai
nos 266 milhões de euros de lucro e o que é certo é que não vai pagar 1 cêntimo de impostos, uma vez que
pode fazer o reporte desses prejuízos.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Bem observado!
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — Para se compreender a diferença abissal quanto ao tratamento fiscal dado
pelo Estado, pelas mãos do Governo e do Partido Socialista, deixem-me recordar que um trabalhador que veja
recuperados créditos salariais — créditos salariais, dívidas que o patrão lhe deve! — entre meados e o final do
ano económico, subirá de escalão de IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) e verá a sua
taxa fortissimamente agravada.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E de que maneira!…
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — Portanto, Sr. Deputado, pergunto-lhe: que justiça fiscal há nisto? Que ganhos
há para os trabalhadores? Afinal, que política de rendimentos é esta, senão uma política de empobrecimento?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roque, do Grupo
Parlamentar do PSD.
Faça favor, Sr. Deputado.
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O Sr. Pedro Roque (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco César, ouvi com muita atenção a sua
intervenção e permita-me que lhe diga que é sempre importante quando o diálogo social tripartido converge num
acordo de concertação. No governo ou na oposição, o PSD sempre defendeu a concertação.
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Muito bem!
O Sr. Pedro Roque (PSD): — Relembramos o compromisso histórico de janeiro de 2012, responsável pela
criação de um clima de paz social que ajudou a que Portugal vencesse as dificuldades de um resgate financeiro
em plena crise económica.
Mas compreende-se a vossa euforia: pela primeira vez em sete anos, o empenho na concertação social
resulta em acordo estratégico. Bastou, para tal, ter preferido os parceiros sociais aos sócios da geringonça.
Longe vai o tempo da feira do gado, e isso só se pode saudar.
Vozes doPSD: — Muito bem!
O Sr. Pedro Roque (PSD): — Mas, atenção, um acordo estratégico não é um fim em si mesmo mas um
começo e o Governo arranca mal. Enquanto maior empregador de Portugal prepara-se para dar a primeira
machadada neste acordo. A proposta de atualização salarial plurianual para a Administração Pública viola
grosseiramente o acordado. Ela representará uma enorme perda de poder de compra para os trabalhadores do
Estado. Será esta a paga que, por exemplo, professores, profissionais de saúde, ou, ainda, técnicos superiores
terão pelo serviço que prestam a toda a sociedade.
Assim, questiono o Sr. Deputado: como vê, o Partido Socialista, esta contradição entre o que o Governo,
órgão político, assina na concertação social, e o que o Governo, entidade patronal, pratica, ao empobrecer, nos
próximos anos, os seus trabalhadores?
Como se pode esperar que a negociação coletiva setorial alcance os objetivos salariais acordados e o peso
dos salários no PIB atinja a média europeia dos 48% se começamos, no Estado, desta maneira tão infeliz?
Por último, encontra explicação para o facto de a famosa Agenda do Trabalho Digno não se encontrar
plasmada neste acordo?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para formular um pedido de esclarecimento, tem agora a palavra o Sr. Deputado José
Moura Soeiro, do Bloco de Esquerda.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco César, os ganhadores deste
acordo não são o País, nem a estabilidade, nem a coesão, os ganhadores deste acordo são os patrões.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Este foi um excelente negócio para os patrões. O que é que os patrões
têm de dar, neste acordo? Têm um compromisso de aumentos salariais na ordem dos 5%, que dependem da
negociação coletiva e, portanto, é uma meta que depende da negociação coletiva, sendo que os 5% já era o
que estava a ser negociado pelos patrões e pela UGT (União Geral de Trabalhadores) em vários setores antes
do acordo. Portanto, era uma coisa que já estava a ser feita antes do acordo. Ou seja, a contrapartida que lhes
é exigida é algo que já estavam a fazer: aumentos salariais abaixo da inflação, num contexto em que existe uma
pressão pela falta de mão de obra e, portanto, alguma coisa têm de fazer.
Em contrapartida, os patrões recebem um banquete, uma borla fiscal no IRC, em que o desconto dos
prejuízos deixa de ter limite temporal. Aliás, deixam até de ter de fazer contribuições para o Fundo de
Compensação do Trabalho e para o Fundo de Garantia Salarial — outra prenda para os patrões! —;…
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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Claro!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — … e vão ter, ainda não se sabe bem como, os tais 3000 milhões de euros
relativamente às despesas da energia. Ora, se os patrões são tão beneficiados e tão apoiados com este acordo,
o que é proposto para os trabalhadores, aquilo que lhes está consagrado, é o empobrecimento —
empobrecimento! — porque aumentos abaixo da inflação significam perda real do poder de compra, portanto,
empobrecimento.
Confirma-se também que os 20% de aumento de salário durante a Legislatura, de que o Primeiro-Ministro
falava, são só nominais. Está lá no acordo! Os 20% não são um aumento real nos salários, são nominais. Ou
seja, confirma-se que os tais 20% são ou estagnação, dependendo da inflação dos próximos anos, ou até,
eventualmente, perda real do poder de compra. E, se for o caso, o que este acordo produz, o efeito deste acordo,
é o aumento do desequilíbrio de rendimento entre capital e trabalho, aquilo que o Governo tinha dito que queria
combater.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Claro! É verdade!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — O acordo não reforça a contratação coletiva — de que, aliás, dependem
os aumentos de salários —, não tem nada de estrutural para reforçar o equilíbrio nas relações de trabalho, e
nem sequer coisas que vinham de outros acordos são ainda concretizadas: quanto à taxa de produtividade,
vamos ficar à espera não se sabe até quando para a ver concretizada.
Por isso, Sr. Deputado, com este desequilíbrio, o Sr. Deputado não acha que este acordo, realmente, é uma
prenda, uma oferta aos patrões?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de
Sousa Real, do PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco César, começo, desde já, por
saudar o facto de o diálogo com a concertação social ter sido encetado, o que é sempre positivo.
O acordo celebrado pelo Governo tem avanços importantes, como a revisão das metas dos valores do salário
mínimo, e depois tem uma tímida revisão do IRC, que vai chegar apenas a 110 000 empresas, o que é uma gota
no oceano que é o nosso tecido empresarial.
E ficamos por aqui, em termos de avanços. Ou seja, onde se exigiam medidas que fossem um SOS para as
empresas e as famílias, tivemos medidas fiscais que só vão surtir efeitos práticos nas empresas no ano de 2024.
Onde se exigiam medidas que através do IRS compensassem os portugueses face à inflação deste ano e já
do próximo, o que tivemos neste acordo foi uma atualização de escalões que não vai travar, de todo, a perda
de rendimentos para a inflação e que, pior, no caso do 2.º escalão vai dar com uma mão em 2023 aquilo que
vai tirar em 2024.
Mais: exigiam-se medidas que protegessem o direito à habitação aos inquilinos e titulares de crédito à
habitação, mas o que tivemos foi um apoio de 500 milhões para as rendas dos jovens que só vai chegar em
2024, como se os jovens e o problema da crise da habitação pudessem ficar à espera no que é uma autêntica
emergência habitacional.
Onde se exigiam medidas para combater o problema da seca tivemos também zero incentivos para uma
gestão eficiente e equilibrada da água ou para uma agricultura ambientalmente sustentável.
O que lhe pergunto, Sr. Deputado, é se, de facto — e fazendo minhas as suas palavras, há pouco falou do
«interesse nacional acima de tudo» —, é se o PS vai ficar na sua sobranceria da maioria absoluta ou se vai
estar disponível para dialogar e fazer também a concertação política dentro desta Assembleia, para que
possamos dar resposta às preocupações reais dos portugueses que estão lá fora à espera de soluções, não
para 2024, mas para o imediato, para 2023.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco César.
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O Sr. Francisco César (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real,
começo exatamente por aquilo que referiu.
Este acordo faz parte da estratégia que o Governo e o Partido Socialista sempre tiveram, desde o início:
associar a estabilidade de uma maioria absoluta à estabilidade de um conjunto de medidas feitas a médio e a
longo prazo, que permitam às famílias e às empresas poderem programar a sua vida e tomar decisões de forma
correta.
Aplausos do PS.
Mas mais: este acordo — como, aliás, o PSD referiu, citando a frase que utilizei quando terminei a minha
intervenção — não é o começo. Este acordo está incluído num conjunto de medidas que até à assinatura do
mesmo já contabilizavam cerca de 4250 milhões de euros, a que se soma este acordo e a que ainda acresce o
Orçamento do Estado que foi ontem apresentado. Portanto, este não é apenas um momento separado, da parte
do Governo, em termos da sua ação. É um momento que associa valorização dos salários, através do aumento,
por exemplo, do salário mínimo nacional, que, desde 2015 até ao final do acordo de rendimentos, irá aumentar
o seu valor em cerca de 78%, muito acima do valor da inflação.
Mas este acordo também tem medidas pela via fiscal, contempladas igualmente no Orçamento do Estado.
Basta lembrar que, só em matéria de IRS, podemos contabilizar medidas que ultrapassam largamente — repito,
largamente — os cerca de 1000 milhões de euros.
Portanto, este é um Orçamento do Estado virado para as famílias, virado para o aumento do poder de compra,
virado, também, para o aumento das condições de vida dos jovens, através do aumento do benefício ou do
reforço no âmbito do IRS Jovem, como também no apoio à contratação de jovens para salários que não sejam
apenas os mais baixos, mas salários para jovens qualificados, acima dos 1300 €.
Este é um acordo que tem como objetivo melhorar a condição de vida das famílias, mas também tem em
atenção as empresas. Como disse, não há economia sem trabalhadores, mas também não há economia sem
empresas e não há empresas sem lucro.
Portanto, este é o equilíbrio que se consegue fazer e que é assinalado quer pelo acordo, quer por outras
medidas, no sentido de permitir a melhoria da remuneração, a melhoria do rendimento e a melhoria das
condições de vida, mas também o apoio às empresas, numa altura em que estão a passar por dificuldades,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Coitadinha da Sonae!
O Sr. Francisco César (PS): — … apoiando os seus custos de contexto, permitindo que possam melhorar
a sua atividade e, com isso, poder contratar e trazer riqueza para o nosso País.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para formular o seu pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado
Rui Tavares, do Livre.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Caras e Caros Colegas, Sr. Deputado Francisco César, o Governo
quer aumentar a proporção dos salários no PIB de 46% para 48%.
Vamos dar de barato que esse seja o critério correto, apesar de haver várias contraindicações de que pode
não ser. O peso dos salários no PIB do Brasil é maior do que o peso dos salários no PIB da Suécia, e a maior
parte de nós e dos nossos concidadãos quereria ter os salários da Suécia e não os do Brasil. A proporção dos
salários no PIB da Irlanda é mais baixa do que em Portugal, e os nossos concidadãos, em princípio, estariam
mais contentes com os salários irlandeses do que com os nossos.
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Os salários são maiores!
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O Sr. Rui Tavares (L): — É verdade, Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto, mas a Irlanda também tem um
modelo social europeu e, tal como em outros países, foi construído, entre outra parte, pela esquerda e pelo
centro-esquerda europeu.
Há ainda outro problema: se tivermos uma contração do PIB, se tivermos uma recessão e se os salários se
mantiverem mais ou menos estáveis, acontece que o Governo tem a recessão a fazer o seu trabalho de casa
mas, no entanto, os salários não ficam melhores.
Mas dêmos de barato tudo isso. O Governo chega a um acordo em que os patrões conseguem, desde já,
coisas que queriam há bastante tempo, em troca de, a prazo, darem aumentos salariais aos trabalhadores.
Como é que vamos garantir que isso aconteça?
Sr. Deputado Francisco César, nos países que tiveram fortes evoluções salariais ao longo do século XX,
digo-lhe qual foi a forma de garantir isso: foi valorizando a negociação coletiva, foi dando força negocial aos
sindicatos e incluindo os trabalhadores nos conselhos de administração das empresas.
A pergunta que faço é muito simples: onde é que estão as medidas, neste âmbito, por parte do Governo e
do PS?
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem agora a palavra o Sr. Deputado Rui Rocha, da
Iniciativa Liberal.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco César, penso que referiu que só as medidas
relacionadas com o IRS valeriam cerca de 1000 milhões de euros, será mais ou menos esse o número.
O Sr. Francisco César (PS): — Mais ou menos!
O Sr. Rui Rocha (IL): — Recordava-lhe que esse é, exatamente, o número da injeção de capital que vai ser
feita na TAP (Transportes Aéreos Portugueses) até ao final do ano. Nesse sentido, alertava-o para o seguinte:
se estamos a falar de «famílias primeiro», a TAP parece vir antes das famílias, mesmo aceitando essas contas.
O segundo ponto que queria sublinhar é o seguinte: no caso do acordo de rendimentos, foi possível fazê-lo
para quatro anos e, portanto, o PS não tem nenhum problema em falar daquilo que vai acontecer em 2024, em
2025 e em 2026. É curioso que, relativamente aos pensionistas, 2024 seja um ano tabu e que o PS não queira
falar daquilo que se passará em 2024.
O Sr. Francisco César (PS): — Não é tabu!
O Sr. Rui Rocha (IL): — Por último, Sr. Deputado, parece-me que aquilo que está no acordo de rendimentos,
do ponto de vista da evolução salarial, é uma evolução nominal. Relativamente a isso, queria perguntar-lhe se,
de facto, é uma evolução nominal ou uma evolução real, dado que, no caso de ser uma evolução nominal, há
um reconhecimento evidente de que a promessa do Primeiro-Ministro António Costa não vai ser cumprida, de
acordo com o próprio acordo de rendimentos.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a
palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco César, tenho de concordar consigo, e
creio que é a primeira vez que o faço neste Parlamento, quando refere que é um resultado histórico.
É um resultado histórico o que o Partido Socialista está a fazer ao País, com aumentos sem precedentes,
com austeridade sem precedentes, com um cabaz alimentar com um preço como nunca se viu, com
combustíveis a preços como nunca se viu, a eletricidade como nunca se viu. O gás de botija, em Portugal, é
quase o triplo do preço do gás em Espanha. Tudo isto tem um nome: Partido Socialista! Austeridade do Partido
Socialista!
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Aplausos do CH.
Todos os acordos que foram feitos não ajudam os 4 milhões de pobres que vivem em Portugal e que o Partido
Socialista deixou no limiar da pobreza. Não ajudam a sua vida, ajudam, sim, a mantê-los pobres, essa é a única
coisa que o Partido Socialista conseguiu.
Aliás, querem manter as pessoas no limiar da pobreza por uma razão muito simples: para, assim, serem
sugados pela máquina socialista, pela família socialista, e estarem sempre dependentes dos apoios do Estado.
Aplausos do CH.
Este Governo recusa reduzir o IVA (imposto sobre o valor acrescentado) dos produtos alimentares essenciais
para a taxa de 0%. Isso, sim, seria um apoio.
Recusa reduzir para a taxa de 0% o IVA da eletricidade e o IVA do gás. Isso, sim, seriam apoios que as
pessoas sentiriam diretamente, no final do mês.
De que vale aumentar 50 € o salário mínimo nacional quando a perda do poder de compra é superior?
O Governo diz que guardou 1320 milhões de euros para aumentos salariais na função pública, mas os
funcionários públicos vão perder poder de compra. Esta é a realidade. Aliás, a inflação, segundo números do
Governo, que nunca são muito de fiar, é de 7,4% no próximo ano.
À boa maneira socialista, existe alguém que é realmente aumentado acima da inflação, que são os do
rendimento social de inserção, cujo aumento é de 8%. Uma vez mais, premeia-se quem não faz nada e
prejudica-se quem trabalha. É isto o Partido Socialista!
Aplausos do CH.
Na agricultura, a pergunta é muito simples: vão continuar a fazer o que têm feito, ou seja, adiar os apoios,
adiar os pagamentos, ou vão pagar a tempo e horas, como nunca fizeram, inclusive este ano, quando não
pagaram aos agricultores portugueses a tempo e horas?
Outra pergunta direta que gostaria de colocar: o que é que os portugueses vão sentir no bolso, ao fim do
mês, com estes acordos que foram feitos? Não vão sentir nada! Aliás, é uma fraude, como a que fizeram com
os pensionistas e que agora estão a fazer com os restantes portugueses.
Sr. Deputado, falou muito de jovens. Nesse sentido, pergunto-lhe: onde está a melhoria na qualidade de vida
dos jovens? Não existe! Repare, Sr. Deputado, que existem jovens que querem ir para a universidade e não têm
casa, não têm habitação para ficar e, por isso, não podem fazer o seu curso. Essa, sim, seria uma ajuda do
Governo do Partido Socialista, que não a consegue fazer.
Aplausos do CH.
Sabe, Sr. Deputado, «famílias primeiro» só se forem aquelas que têm o cartão do Partido Socialista.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco César.
O Sr. Francisco César (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, vou começar, excecionalmente, por
responder ao Chega.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Obrigado!
O Sr. Francisco César (PS): — Sr. Deputado Pedro Pinto, permita-me que lhe diga que não dá para cantar
e assobiar ao mesmo tempo. Não é possível, por um lado, acusar este Governo e esta bancada socialista de
não apoiarem as famílias quando têm maiores necessidades e, ao mesmo tempo, acusar o Partido Socialista
de ser despesista nos apoios que dá aqueles que mais precisam.
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Aplausos do PS.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Só apoiam os que não trabalham!
O Sr. Francisco César (PS): — Sr. Deputado, não é possível cantar e assobiar ao mesmo tempo, que é o
exercício que V. Ex.a tentou fazer aqui.
Além disso, a Iniciativa Liberal veio, aqui, com o argumento TAP. Veio, aqui, com o argumento costumeiro
da descida de impostos, como se a descida de impostos fosse solução para tudo, referindo, por exemplo, ao
nível do IRS, que há um apoio de pouco mais 1000 milhões de euros para as famílias.
No entanto, nós apresentamos não só um apoio de 1000 milhões de euros na área do IRS para as famílias,
como também um apoio excecional de 125 € para os rendimentos das famílias e um conjunto de apoios para os
mais jovens, que vão desde um apoio de 50 € até à Garantia Jovem, passando por um aumento do abono de
família. Há toda uma panóplia de apoios às famílias que mais precisam e de uma forma que lhes permita serem
elas a decidir qual o melhor uso que devem dar ao rendimento extra que receberam.
Sabemos que os portugueses passam por dificuldades, não ignoramos o efeito da inflação, mas sabemos
que o Partido Socialista afirma o caminho de ser possível, numa altura de crise, dentro daquelas que são as
suas possibilidades, ajudar aqueles que mais necessitam — ajudar as famílias, ajudar as empresas, e ajudar
mediante esta conjuntura.
Este é, portanto, o acordo possível. Um acordo que satisfaz não só o Governo, não só os parceiros sociais
dos patrões, que o assinaram com gosto, mas que também foi assinado por uma central sindical, Sr. Deputado,
que deu o seu acordo a este conjunto de medidas no médio prazo.
Trata-se de um acordo que permite, por um lado, apoiar aqueles que mais necessitam, apoiar os
trabalhadores, e que, por outro, permite confiar que o acordo a que chegámos irá ter, verdadeiramente, efeitos
na vida das pessoas.
São esses os compromissos que foram traçados por este Governo e que nós saudamos aqui, porque
colocaram o interesse nacional acima de tudo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para proferir a declaração política em nome do Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal,
tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Castro.
A Sr.ª Carla Castro (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi entregue, nestes dias, o Orçamento do
Estado para 2023, que é um Orçamento que não serve Portugal.
Está muito longe de ser o Orçamento de que os portuguese precisam. Não serve os portugueses porque
repete as receitas de sempre, as receitas que conduziram Portugal à estagnação e que o impedem de crescer,
sem ambição. Tem medidas avulsas, pontuais, dispersas, sem uma estratégia, sem uma visão.
Diz o Ministro das Finanças que este é um Orçamento de estabilidade, assente na confiança e no
compromisso.
Estabilidade? Sim, mas é uma estabilidade na estagnação, uma estabilidade na sobrecarga fiscal.
Confiança? Não, pois é cada vez mais claro aos olhos de todos os portugueses que a confiança que
depositaram no Partido Socialista está a ser delapidada nas promessas que já quebrou. E não é da conjuntura
ou da instabilidade, é uma escolha que fazem quando comunicaram as pensões da forma como o fizeram ou
quando fazem propaganda.
Compromisso? Nem com as famílias nem com as empresas!
Este é um Orçamento de poucochinho, que atira a muita coisa sem acertar em nada. É um orçamento com
maquilhagem, que nos obriga a passar mais tempo a desmascarar e a desmistificar o que nele é dito, ao invés
de olharmos propriamente para os efeitos das políticas e a preocuparmo-nos com as ações.
Exemplos? Comecemos com as famílias: a redução da taxa do segundo escalão de IRS tem um impacto
máximo de 75 € por ano e não implica uma alteração significativa nos restantes escalões. Mas, por exemplo,
ouvi o Sr. Secretário de Estado dizer, a este propósito, que se trata de «uma medida estruturante».
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Outro exemplo: não se atualizam escalões de IRS por forma a compensar o aumento de inflação 2022, facto
incompreensível para todos menos para o PS.
A maior surpresa é ouvir Deputados do PS dizerem que «austeridade é cortar salários». É que só eles
parecem não ter compreendido que não aumentar escalões de IRS com o intuito de compensar a inflação de
2022 e 2023 tem, na prática, um efeito semelhante a cortar os salários.
E, sim, estamos a voltar à discussão dos termos reais e nominais. Gostaria, se calhar, de fazer um pedido
muito claro à bancada socialista e também ao Governo: não contribuam para a desinformação, não contribuam
para a iliteracia financeira.
E quanto às empresas, mais do mesmo: medidas pontuais, algumas até positivas, mas também as mesmas
ilusões. Não há medidas transversais e vamos continuar a ser os campeões da carga fiscal nas empresas, na
União Europeia, quando comparamos com o IRC, as derramas e toda a carga fiscal. Aquilo que deveríamos
estar a fazer era, isso sim, gerar riqueza, ajudar as empresas a serem competitivas para gerarem valor, para se
pagarem bons salários.
Mais exemplos de medidas de propaganda? Façamos também, então, esse exercício para as empresas.
Ainda hoje foi falado aqui acerca do IRC quanto à valorização salarial. Muito bem, dados do Governo: custo
orçamental, 75 milhões de euros; beneficiários, 500 000; impacto, 2024. Reparem, Srs. Deputados, estamos a
falar desta medida: 150 € em média, por empresa, para 2024.
Agora reparem nos títulos: «IRC seletivo para quem valoriza os salários» ou «No privado, majoração dos
encargos salariais em 50%». Vejam a comparação das realidades.
E os exemplos sucedem-se, os equívocos sucedem-se: são enunciados 1 500 milhões de euros para pagar
dívidas na saúde, com três anos de atraso. Como é que o Estado se vangloria de pagar dívidas que já estão em
atraso nos próximos três anos? Se fossem empresas ou famílias a pagar em atraso ao Estado seriam
penalizadas. Mas não, a um Estado que o PS tão mal gere, tudo é permitido.
Criticamos a forma, mas o pior mesmo é o conteúdo e são as opções, sim, são as opções políticas. Quando
falamos nos benefícios para o IRS, o IRS Jovem e alojamento, ensino superior, benefícios para a família, apoios
para a primeira infância, que vamos debater agora na especialidade, estamos a falar de 900 milhões de euros,
1000 milhões, 1100 milhões. Para a TAP, em dezembro, irão 1000 milhões. São estas as opções políticas
corretas? Para a Iniciativa Liberal, não.
Existem medidas avulsas positivas, algumas das quais de simplificação nas empresas, e, curiosamente,
vimos chumbadas aqui propostas da Iniciativa Liberal no mesmo sentido há poucas semanas. Mas se
procurarmos por aquilo que era efetivamente necessário em termos de reformas neste Orçamento, bem
podemos procurar que não encontramos.
Nada que estranhemos, porque reformas não é uma palavra que combine com o PS. O PS foge das reformas
mesmo quando tem maioria absoluta, mesmo quando recebe o maior volume de sempre de fundos estruturais,
mesmo quando se prepara para receber os milhões de euros do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência).
E sobre a carga fiscal — sim, vou voltar a falar na carga fiscal, aquela que bateu recordes em 2021 e que ia
descer em 2022 —, o que é que o Governo disse? Que em 2022 ia baixar, que não ia lucrar com a inflação, que
aquilo que deveria ter ficado nos bolsos dos portugueses mas que foi para o Estado iria ser devolvido. E o que
é que aconteceu? A carga fiscal manteve-se no recorde.
E agora para 2023? Novas promessas de descida. Vamos ver, mas aquilo que já podemos ver nos mapas
de receitas fiscais é que no IRS as receitas mantêm-se e no IVA vão inclusivamente aumentar 800 milhões de
euros. O IVA que, curiosamente, o Governo disse que não podia baixar nos produtos alimentares porque não
sabia bem se o benefício ia parar às famílias.
Recordemos: «O orçamento das famílias primeiro». Termino, assim, a esclarecer o grande equívoco deste
Orçamento do Estado, o grande equívoco deste slogan. Dizem: «famílias, primeiro; estabilidade, compromisso
e confiança». Vou explicar a verdadeira conjugação, o que afinal querem dizer é isto: «com este Orçamento, o
Governo tem a confiança de que o principal compromisso das famílias é garantir a estabilidade das receitas do
Estado». Com o PS é: Estado primeiro, família depois.
Aplausos da IL.
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O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada tem sete pedidos de esclarecimento e presumo que responda em dois
blocos.
O primeiro pedido de esclarecimento caberá à Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, doBE.
A Sr.a Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada, acompanho as suas
posições na seguinte ideia: se o Governo está tão seguro das medidas que apresentou para combater a inflação,
se está tão seguro do acordo que fez em concertação social e do Orçamento do Estado, porque é que sente
necessidade de enganar as pessoas? Porque é que o Governo sente necessidade até de mentir às pessoas?
Porque foi isso que fez quando acenou com a instabilidade da segurança social, números que foram, entretanto,
desmentidos pelo próprio Orçamento, que eliminou qualquer dúvida sobre a sustentabilidade da segurança
social e sobre a sua resiliência futura.
Mas há mais: há um apoio extraordinário a pensionistas que, afinal, é só uma antecipação da pensão e um
corte em direitos futuros; há uma redução do preço da eletricidade que, quando vamos ver, são menos 9 € na
conta anual da luz; há uma medida fiscal para o crédito à habitação que não vale nada — é rendimento de 2023
trocado por rendimento de 2024 — e hoje soubemos de uma mega proposta para a energia, de 3 mil milhões
de euros, em que metade — metade! — desta mega proposta é dinheiro que já está no sistema e que já teria
este fim, independentemente da ação do Governo.
São tudo truques, truque atrás de truque, menos um: há uma medida que não é truque, uma borla fiscal
inédita aos bancos e às grandes empresas, que agora podem abater prejuízos aos lucros sem qualquer limite
temporal. Estamos a falar, na prática, de uma descida do IRC que o Governo não consegue contabilizar, o
Governo não consegue saber qual o compromisso financeiro desta medida.
Por isso, Sr.ª Deputada Carla Castro, sabendo disto, sabendo que neste Orçamento não há controlo de
preços, não há uma taxa sobre lucros extraordinários da energia, da banca ou do retalho, não há limitações à
especulação imobiliária, não há o fim do regime do residente não habitual e que o Governo até quer desenvolver
uma criptoeconomia, a minha pergunta é: será que a Iniciativa Liberal não gosta mais deste Orçamento do que
aquilo que está disposta a admitir?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real,
do PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente,Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Carla Castro,
para o PAN, há, de facto, aqui uma matéria que nos aproxima: há aqui um conservadorismo fiscal por parte do
Governo que depois se traduz numa asfixia para as famílias e para as empresas, sobretudo para as PME
(pequenas e médias empresas), deixando de fora os grandes lucros e as grandes empresas, bem como a banca.
Este é o traço mais caraterístico, que se vê, por exemplo, naquilo que é a recusa em aumentar os apoios
para o cabaz de bens essenciais. O cabaz de bens essenciais subiu 21 € desde março e em 2023 a escalada
de preços parece não abrandar, mas o Governo só tem uma opção a dar aos portugueses que é mais
conservadorismo fiscal e menos medidas de apoio.
O Governo não aplica o IVA zero nos alimentos essenciais, quando a diretiva assim o permitia; também não
avança com propostas de alteração aos escalões que sejam claras e tenham aplicabilidade no imediato e não
apenas em 2024 ou que não tirem com uma mão aquilo que supostamente vão dar com a outra em 2023.
A própria descida de retenção de IRS na fonte mais não é do que um exercício de ilusionismo, conforme
referi, e as prestações do crédito à habitação sobem 69%, quando o Governo se agarra ao conservadorismo
fiscal com uma redução voluntária na retenção de IRS na fonte que, no fundo, é um «recebe agora, mas paga
depois».
Mas há uma questão que não gostaria de deixar de lhe colocar. Quando temos o fiscal da recessão à porta
e continuamos a dar borlas fiscais a quem mais lucra e mais polui e continuamos a ter apoios aos residentes
não habituais, a pergunta que se impõe é: de que lado é que a Iniciativa Liberal vai estar? Vai estar do lado
ambiental e do lado das famílias e das pequenas e médias empresas, estando disponível para acompanhar
medidas como a taxa sobre os lucros extraordinários — à semelhança do que aconteceu com a vossa família
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alemã, nomeadamente no Ministério das Finanças —, ou vai estar em contraciclo? E no que respeita aos
residentes não habituais, que consomem 66% do dinheiro do IRS gasto em benefícios fiscais, estão, de facto,
disponíveis para acabar com este regime? De que lado é que a Iniciativa Liberal vai estar?
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem agora a palavra o Sr. Deputado Pedro Frazão,
do Chega.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Sr. Presidente,Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Carla Castro, vai-
me perdoar estar a falar de costas, mas os seus colegas de bancada não lhe fizeram a delicadeza de a deixar
vir para a bancada da frente para responder às perguntas. Portanto, peço desculpa, mas irei dirigir-me a si de
costas.
A Sr.ª Deputada Carla Castro fez a declaração política do bota-abaixo, que é exatamente aquilo de que a
Iniciativa Liberal, tantas vezes, acusa o Chega, ou seja, de ser o partido do bota-abaixo.
Vozes do CH: — Muito bem!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — A Sr.ª Deputada Carla Castro chegou ali acima e não deu uma
alternativa, nem uma! Acompanho imenso as suas críticas e muitas das coisas que disse, mas podia, pelo
menos, ter dado uma alternativa.
Falou de reformas. Mas quais reformas, Sr.ª Deputada Carla Castro? Pedi este esclarecimento para lhe dar
oportunidade de nos elucidar a todos sobre quais são as reformas que a Iniciativa Liberal, de facto, tanto
defende.
Sr.ª Deputada, esqueceu-se de um setor importantíssimo em Portugal, a agricultura, e queria pedir-lhe
esclarecimentos nesse âmbito.
No Orçamento do Estado, como podemos ver neste gráfico, a agricultura está nas penúltimas barras e é, de
facto, o Ministério que mais perde verba neste Orçamento do Estado.
O orador exibiu um cartaz com um gráfico.
É, de facto, um desinvestimento brutal na agricultura e sabemos que os nossos agricultores, com a seca,
com o aumento dos custos de produção e com o aumento das matérias-primas para as rações para os animais,
estão a passar tempos muito difíceis, caminhos muito pedregosos.
Sr.ª Deputada Carla Castro, se a Iniciativa Liberal é contra os apoios aos agricultores, tenho aqui uma notícia:
«Europeias: Iniciativa Liberal quer acabar com os apoios da política agrícola comum».
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Já se esqueceram!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — «Legislativas de 2022: a Iniciativa Liberal quer reduzir dependência
direta dos apoios da política agrícola comum».
O orador exibiu notícias de jornal.
Aplausos do CH.
Sr.ª Deputada, explique-nos qual é a reforma que quer para a política agrícola comum, qual é a reforma que
quer para o setor primário. Porque é que a Iniciativa Liberal não deixa de ser um partido do Príncipe Real e
passa a ser um partido dos agricultores,…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Não conseguem, não conseguem!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — … do mundo rural, do Portugal real, das pessoas que vivem na
sua terra e que precisam de subsistir e dar alimento aos seus filhos.
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Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem agora a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares,
do Livre.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Carla Castro, sei qual é a estratégia do Governo
para este Orçamento, não concordo com ela, e sei qual é que seria a estratégia alternativa do Livre.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ah!
O Sr. Rui Tavares (L): — A estratégia do Governo é dar prioridade à consolidação orçamental e eu lembro-
me bem do que disse há 10 anos, quando foi dada prioridade à consolidação orçamental em período de risco
de recessão. Basicamente, garantiu-se que houve uma recessão e que ela foi mais profunda do que precisaria
de ser.
A estratégia do Livre seria a de responsabilidade social ser responsabilidade orçamental. A economia, agora,
precisa de uma ajuda, porque ela já está a perder velocidade, as pessoas precisam de uma ajuda perante a
escalada da inflação e a receita do Estado agradece pelo facto de não deixarmos a economia cair.
O que não sei, no entanto, é se a estratégia orçamental da Iniciativa Liberal é a do Reino Unido, porque
lembro-me de ter tido um debate com o Deputado João Cotrim Figueiredo, nesta campanha eleitoral, e tudo o
que ele me disse nesse debate acerca de corte de impostos é aquilo que a Primeira-Ministra britânica Liz Truss
está agora a implementar.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — E a despesa?
O Sr. Rui Tavares (L): — Na altura, Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo, e deve lembrar-se bem da
expressão que utilizei para o que era a sua aposta política, disse: «uma fezada!» É uma fezada, em que se
cortava nos impostos e a economia crescia.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — E a despesa?
O Sr. Rui Tavares (L): — Pois tenho uma coisa a dizer-lhe: no Reino Unido os fundos de pensão estão em
pânico; a notação do Reino Unido em perspetiva negativa; cortes em investigação e desenvolvimento para
compensar os cortes nos impostos e, hoje, na Comissão do Tesouro da Câmara dos Comuns, os economistas
que lá foram disseram que os alvos de crescimento do governo de Liz Truss são impossíveis de atingir.
A pergunta é muito simples: a estratégia do Reino Unido, a estratégia orçamental da Primeira-Ministra Liz
Truss é ou não uma estratégia na qual a Iniciativa Liberal se revê? Se não se revê, abandonaram o vosso
objetivo dos cortes de impostos para os escalões mais altos?
Protestos do CH e da IL e contraprotestos do L.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Castro.
A Sr.ª Carla Castro (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começando pela pergunta que me foi dirigida
pela Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, de uma forma muito clara direi que não nos podemos rever num
orçamento com este tipo de crescimento, onde há um decréscimo de investimento. A formação bruta de capital
fixo é um elemento muitíssimo preocupante para o potencial de crescimento deste País, onde a produtividade
vai decrescer.
Não podemos ser mais claros: nós precisamos, defendemos e temos alternativas para uma estratégia de
crescimento deste País, e este Orçamento não é de crescimento nem de reforma e, portanto, não nos revemos
nele. Creio que estou a ser extraordinariamente clara.
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Em resposta ao PAN, relativamente às taxas sobre os lucros extraordinários, gostava de lembrar que cargas
extraordinárias de impostos é o que Portugal tem nas empresas. As contribuições extraordinárias já existem em
Portugal. Volto a recordar que temos a taxa estatutária, ou seja, o somatório de IRC, de derramas, mais elevada
da Europa. Isto são facto, não são opiniões.
Portanto, é evidente que não estamos de acordo com um aumento de cargas fiscais nas empresas. Mais
uma vez, estamos a ser extraordinariamente claros em relação a este assunto.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
A Sr.ª Carla Castro (IL): — Propostas de bota-abaixo é coisa que a Iniciativa Liberal não tem. Não podemos
ser acusados de manhã de termos um programa cheio de reformas e à tarde de não as termos ou de não termos
alternativas. Aliás, folgo muito em ver uma preocupação nossa, em ver e analisar as alternativas e as propostas
da Iniciativa Liberal no Orçamento do Estado, sinal, obviamente, de que somos uma alternativa e trazemos
propostas a esta Casa, coisa que está muito em falta.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Isso mesmo!
A Sr.ª Carla Castro (IL): — Sr. Deputado Rui Tavares, há uma coisa que tenho de lhe perguntar muito
diretamente, que é sobre se todo o seu discurso é desinformação ou desconhecimento. É que eu não sei como
dizer mais, mas vou voltar a dizer: das políticas que refere, de Inglaterra, nomeadamente, onde é que se
esqueceu — não só da parte fiscal, da redução da carga fiscal — do programa de aumento da despesa pública
que foi anunciado? Alguma vez a Iniciativa Liberal defendeu sequer algo perto disso?
E agora pergunto-lhe: acha sério — e já esclarecemos isso por diversas vezes — vir aqui a esta Casa dizer
isto? De uma vez por todas, deixem de desinformar, contribuam, venham falar de alternativas, venham falar de
propostas, venham com seriedade, apliquem aquilo que dizem, só para variar assim de vez em quando.
Aplausos da IL.
Protestos do L.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Rasteirinho! Rasteirinho!
O Sr. Presidente: — Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo
Carneiro, do PSD.
O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Carla Castro, veio aqui falar-
nos sobre o Orçamento, que é uma discussão que está aí à porta, mas foi pertinente a sua intervenção. Há uma
coisa que o Governo tem dito amiúde e eu gostava de aproveitar este momento em que lhe posso pedir
esclarecimentos para perguntar, desde logo, se concorda com aquilo que o Governo diz quando afirma que este
é um Orçamento de reforço dos rendimentos. Este é um Orçamento de reforço dos rendimentos?
Isso está escrito no sumário executivo, o Governo tem-no dito de forma, enfim, abrangente publicamente,
mas gostava de destacar o seguinte: nós não podemos olhar para este Orçamento considerando apenas o ano
de 2023; temos de somar o ano de 2022 e o de 2023, porque eles estão intimamente ligados. Eu diria, eles
estão geneticamente ligados.
Aquilo que nós constatamos é que, considerando as estimativas do Governo, a inflação vai fixar-se em 11,7%
nos dois anos, e estou a ser generoso quando falo das estimativas do Governo, porque, se considerasse outras,
seriam outros os números. Isto significa, então, que, somando os aumentos das pensões em 2022 e 2023, os
aumentos dos funcionários públicos em 2022 e 2023 e os aumentos do IAS (indexante dos apoios sociais) em
2022 e 2023, constatamos que nas pensões existe uma perda de poder de compra de 6,2%, nos funcionários
públicos a perda do poder de compra é de 8,1% e mesmo no IAS — vejam, isto suscita até espanto —, que o
PS diz que vai aumentar 8% no ano de 2023, se somarmos com o aumento de 2022 e considerando o valor da
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inflação, existe uma perda de 3,7%. Como é que podemos dizer que este é um Orçamento de recuperação de
rendimentos?
Sr.ª Deputada Carla Castro, sei que é uma pessoa sensata e, portanto, gostava de lhe perguntar se faz a
mesma análise que o PSD. É que este não é um Orçamento de recuperação de rendimentos, este é um
Orçamento que esmaga os rendimentos dos portugueses, enganando os portugueses com fake news, quando
se afirma, a abrir o sumário executivo do Orçamento do Estado para 2023 — e essa é a fake news —, que este
é um Orçamento de recuperação de rendimentos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, em nome do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno
Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Carla Castro, o PCP já
sublinhou que esta proposta de Orçamento do Estado apresentada pelo Governo não responde aos problemas
que atingem os trabalhadores e o povo português e constitui-se como um fator de agravamento das
desigualdades e das injustiças. Não é um Orçamento de confiança no futuro, como diz o Governo, mas um
Orçamento de comprometimento do futuro.
Este Orçamento pode ter muitos truques e máscaras, como a Sr.ª Deputada afirmou, mas convenhamos que
o essencial das opções políticas está bem à vista, ou seja, este é um Orçamento que consagra o
empobrecimento da imensa maioria dos portugueses, a perda de poder de compra dos trabalhadores e dos
pensionistas, mas que vem apontar para o favorecimento dos grandes grupos económicos, inclusive no plano
fiscal.
A Sr.ª Deputada falou há pouco na taxa estatutária de IRC, pois fica o convite para que nos possa falar da
taxa efetiva do IRC que é pago pelas grandes empresas, nomeadamente pela banca.
Ora o que esta proposta de Orçamento aponta é: a possibilidade dada aos grandes grupos económicos de
reduzirem drasticamente ou até anularem os impostos que têm obrigação de pagar, utilizando, sem limite
temporal, o reporte de prejuízos fiscais, entre outros favorecimentos; o alargamento do financiamento pelo
Orçamento do Estado aos grupos privados da doença, designadamente com 9700 milhões de euros para
aquisição de serviços de saúde pelo Ministério, aumentando essas verbas substancialmente; a recusa da
contratação de trabalhadores para os serviços públicos, com destaque para o SNS (Serviço Nacional de Saúde)
e a escola pública, e a opção pela precariedade laboral e pelo recurso à externalização de serviços e horas
extraordinárias; o estrangulamento do investimento público ou a recusa do combate à especulação dos preços
— como a que se verifica na energia, mas também noutros setores, como o da grande distribuição —, optando
por mobilizar recursos públicos que devem assegurar e dar suporte aos lucros extraordinários destas empresas.
Ora, com estas opções políticas traduzidas no Orçamento, beneficiando com borlas fiscais os grupos
económicos, asfixiando os serviços públicos e agravando o empobrecimento dos trabalhadores, a pergunta que
colocamos é se os senhores estão em desacordo com isto ou se o problema é acharem pouco.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — O último pedido de esclarecimento à Sr.ª Deputada Carla Castro pertence ao Sr.
Deputado Sérgio Ávila, do PS. Faça favor.
O Sr. Sérgio Ávila (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, resolveu a Iniciativa Liberal antecipar a
discussão do Orçamento do Estado, se calhar para omitir e para não falar daquilo que foi o facto mais estrutural
e relevante da última semana, que foi o acordo de médio prazo de melhoria de rendimentos, salários e
competitividade, que abrangeu toda a concertação social.
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Bem lembrado!
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O Sr. Sérgio Ávila (PS): — Por isso mesmo, e em primeiro lugar, o Orçamento do Estado do próximo ano
não é apenas o Orçamento do Estado do Governo, não é apenas o Orçamento do Estado do Partido Socialista,
é a primeira etapa do cumprimento do compromisso assinado na concertação social, a primeira etapa do
cumprimento do compromisso estabelecido com os diversos parceiros sociais, numa estratégia de planeamento
de médio prazo.
Aplausos do PS.
Por isso, não é o Orçamento do Estado apenas de um Governo, não é o Orçamento do Estado apenas de
um partido, é um Orçamento do Estado que assenta nesta estratégia e neste acordo de concertação de médio
prazo.
Em segundo lugar, é um Orçamento do Estado que cumpre claramente a conciliação de três objetivos:
reforçar o rendimento, promover o investimento e reduzir a dívida pública. Nenhuma das abordagens feitas por
qualquer um dos partidos durante este debate conseguiu assegurar o cumprimento destes três objetivos.
Qualquer uma das abordagens pôs em causa um destes três objetivos e só é possível ter uma estratégia
sustentável, equilibrada, de crescimento, de desenvolvimento, de valorização de rendimentos se conseguirmos
que as nossas propostas obedeçam aos três objetivos que cumpre o Orçamento do Estado devidamente
quantificado — reforçar o rendimento, promover o investimento e reduzir a dívida pública.
Neste contexto, foi referido um conjunto de medidas, mas é bom dizer que, do ponto de vista estrutural, em
termos de impacto orçamental, de medidas orçamentais, quer por via da redução fiscal estrutural, quer por via
do aumento de despesas, quer seja para a valorização de vencimentos, quer seja para apoios sociais de
pensões, o Orçamento do Estado do próximo ano reflete um esforço orçamental de 4578 milhões de euros.
Dirão uns que é muito, dirão outros que é pouco, mas é o esforço que resulta da concertação com os
parceiros sociais que assegura sustentabilidade para o futuro do nosso País, porque, ao mesmo tempo que
promove o aumento e o reforço do rendimento nas suas diversas componentes, particularmente daqueles que
têm menos rendimento, promove o investimento, quer seja o investimento privado, quer seja o investimento
público, e assegura a redução da dívida pública, fator estruturante para que aquilo que se gasta hoje não seja
pago amanhã por valor superior àquele que podemos suportar.
Por isso, mais do que um Orçamento do Estado, este documento é a concretização da primeira etapa de um
histórico acordo assinado em concertação social, com os diversos parceiros sociais, e é o início do cumprimento
deste compromisso estrutural para o futuro do nosso País.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Castro.
A Sr.ª Carla Castro (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, se calhar, começava, pela ordem inversa, por
me referir ao comentário que o Deputado do Partido Socialista fez sobre a antecipação deste debate. Gostaria
que perguntasse ao Governo o que tem a dizer sobre o facto de todos os dias estar a fazer conferências de
imprensa em relação ao assunto. Portanto, não me parece que a Iniciativa Liberal esteja a antecipar nada.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O próprio acordo é que se antecipou ao Orçamento!
A Sr.ª Carla Castro (IL): — De qualquer forma, queria agradecer as perguntas de ambas as rondas e pedir
desculpa porque me esqueci de responder há pouco sobre o tema da agricultura.
A Iniciativa Liberal, ao contrário da expetativa de muitos, apresentou no seu programa, e tem defendido no
seu trabalho do dia a dia, o setor primário — e a área da agricultura —, que tem sido pouco dignificado, sendo
um setor económico bastante importante e que, do ponto de vista governativo, tem sido simplesmente
abandonado. Temos propostas concretas,…
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Não são contra a CAP (Confederação dos Agricultores de
Portugal)?!
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A Sr.ª Carla Castro (IL): — … que vão desde a valorização da atividade, aos jovens, aos licenciamentos —
são muitas, mas hoje não é um debate sobre agricultura — e passam por uma política efetiva de água e de
regadio, mas que, certamente, teremos oportunidade de debater.
Em relação às perguntas do PSD, que também agradeço, em concreto sobre se concordo que o Orçamento
esmaga e engana, a resposta é clara: sim. Mas gostaria de acrescentar uma coisa, que é sobre o reforço de
rendimentos. Curiosamente, também reforça os rendimentos, não são é os das famílias, são os do Estado,…
Vozes da IL: — Muito bem!
A Sr.ª Carla Castro (IL): — … consolida os do Estado. Basta olharmos para as receitas fiscais e iremos ver
o detalhe mais uma vez nos próximos dias.
Quanto ao PCP, não vou repetir-me na questão da carga excessiva e recordista dos impostos sobre as
empresas em Portugal, mas gostaria de lhe dizer que, sobre o regime de prejuízos fiscais, de uma vez por todas,
é positivo que olhemos para os melhores sistemas fiscais, e com isso digo de países competitivos e ricos. As
melhores práticas são para ser adaptadas e devemos olhar para os melhores e não para os piores. E, portanto,
esta é uma das medidas. Teria de haver alguma coisa, com certeza, em tamanho documento, com que
concordaríamos, e nesta estamos de acordo.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Eu logo vi!
A Sr.ª Carla Castro (IL): — Vamos ter, certamente, um debate muito interessante nas próximas semanas
sobre o Orçamento do Estado e, mais uma vez, a Iniciativa Liberal irá diferenciar-se pela alternativa e pela
seriedade das discussões.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Segue-se, nas declarações políticas, o Grupo Parlamentar do Chega, pelo que dou a
palavra à Sr.ª Deputada Rita Matias.
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Chega traz hoje a este Plenário algumas
daquelas que são as suas preocupações relativamente ao ensino superior. E não poderíamos começar uma
intervenção sobre esta temática sem uma palavra de saudação a todos os jovens portugueses que iniciaram o
seu percurso académico, sonhando com um espaço de pensamento livre onde o conhecimento é científico, é
objetivo e é despolitizado. No entanto, os jovens deparam-se hoje com currículos enviesados, com um ensino
ideológico e militante e com instituições intoxicadas de teorias marxistas.
Vozes doCH: — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Nas universidades, cada vez mais, a ciência perde o lugar central para a ideologia
e tudo isto tem-se traduzido na discriminação e hostilização de todos aqueles que pensam diferente e que
rompem com as correntes de pensamento único.
Aplausos do CH.
Falo dos jovens patriotas que amam e defendem o seu País, e para todos eles deixo a nossa mensagem de
coragem: não caminham sozinhos!
Aplausos do CH.
Mas falar de ensino superior hoje é lembrar os mais de 5000 jovens que se candidataram ao ensino superior,
foram colocados na 1.ª fase e não realizaram a sua matrícula. Ainda que tentem tapar o sol com a peneira, é
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por demais evidente que o sufoco económico em que as famílias portuguesas se encontram está a impedir o
acesso destes jovens à formação superior.
Vozes doCH: — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — E falar de ensino superior hoje é lembrar que, ano após ano, cerca de 12% dos
jovens estudantes abandonam o seu percurso académico logo no primeiro ano da licenciatura.
E falar de ensino superior hoje é lembrar que, segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico), mais de 60% dos estudantes portugueses não conseguem cumprir o seu plano
de estudos nos três primeiros anos de vida académica.
E falar de ensino superior hoje é lembrar que, de acordo com a OCDE, 20% das mulheres portuguesas
matriculadas nas universidades não conseguem concluir os seus estudos. Mas também os homens estão a ficar
para trás. Diz-nos o mesmo estudo que 40% dos jovens rapazes não concluem o primeiro ciclo de estudos. E
sobre isto pouco vai sendo dito, porque a moda, nesta Câmara, é perseguir as supostas classes dominantes, o
suposto patriarcado, numa tentativa cega de reparar supostas dívidas históricas.
Aplausos do CH.
Falar de ensino superior hoje é lembrar o aumento significativo de pedidos de bolsas de estudo. Este ano,
há mais de 65 000 estudantes a pedir apoio, o que representa um aumento de 16% de pedidos face ao mesmo
período do ano anterior.
Todos estes dados manifestam uma verdade incontornável: o Estado tem falhado aos jovens portugueses, o
Governo socialista falhou e continua a falhar para com os estudantes universitários.
Podem vir agora, no novo Orçamento do Estado, apresentar novas propostas, complementos e apoios, mas
tudo isso é absolutamente insuficiente.
O alojamento é insuficiente. E não sou eu quem o digo, é o Governo socialista, no seu Plano Nacional para
o Alojamento no Ensino Superior, em que admite que para os mais de 175 000 alunos deslocados tem apenas
uma oferta de 15 000 camas — 15 000 não chega nem a 9% das necessidades dos estudantes portugueses —
, plano esse apresentado em 2018 e que previa que nesta altura já existissem mais de 12 000 camas.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Onde é que elas estão?!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Quatro anos depois, concluímos que não houve alargamento nenhum.
No início do ano letivo, o Chega pediu um esclarecimento à Sr.ª Ministra Elvira Fortunato sobre esta matéria
e a Sr.ª Ministra, uma vez mais, ignorou a terceira força política neste Parlamento.
Vozes doCH: — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — E o Partido Socialista diz-nos, neste novo Orçamento, que agora é que vai ser e
que vão começar as obras e o investimento em mais infraestruturas.
No entanto, e imaginando que, desta vez — ao contrário de todos os outros projetos e programas
relacionados com os jovens —, o Governo até cumpre a sua promessa, as metas vão ser atingidas em 2026.
Meus caros, 2026 significa que o jovem que é caloiro neste ano letivo, se sobreviver ao contexto académico
neste tempo de crise, estará no último ano da licenciatura ou, eventualmente, já terá concluído o seu curso.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — O importante, Srs. Deputados, é o agora. Os jovens precisam de soluções
imediatas e não na próxima segunda-feira ou na próxima década.
Aplausos do CH.
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O que os jovens sabem agora é que houve uma redução de cerca de 80% dos quartos privados disponíveis
e que os preços dos quartos estão a disparar a olhos vistos.
E, perante isto, o Governo propõe agora, no novo Orçamento, um «apoiozinho» de 288 € por mês, que não
vai abranger nem 15 000 estudantes.
O que importa dizer, Srs. Deputados, é que só no presente ano letivo o custo médio de um quarto no Porto
aumentou de 250 € para 324 € mensais e, em Lisboa, aumentou cerca de 55 € por mês, fixando-se nos 381 €
— valores exorbitantes para quartos mínimos e camas em despensas, sem condições dignas. Os jovens
estudantes portugueses não vivem, sobrevivem.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Este é um cenário que só se prevê que se agrave e as respostas são insuficientes.
Fica o aviso, Srs. Deputados: não basta orçamentar. Cá estaremos para escrutinar a aplicação das verbas e
exigir responsabilidades.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Identificando esta escassez, o Chega vai apresentar um projeto de lei que pede
a redução de imposto de 28% para 10% de todos os senhorios que realizem contratos de alojamento com
estudantes do ensino superior.
Convido todos aqueles que se dizem preocupados com esta realidade a aprovarem tal proposta, caso
contrário, admitam que a vossa postura de bloqueio ao Chega é uma hipocrisia, porque preferem ser mais fiéis
a cálculos políticos do que aos jovens portugueses.
Aplausos do CH.
Srs. Deputados, o ensino superior deve ser levado com seriedade. De nada serve alargarem o número de
vagas se não assegurarem as condições condignas e necessárias para os estudantes. De nada serve
celebrarmos o segundo maior número de colocados de sempre se a maioria dos estudantes tiver de abandonar
os estudos por falta de condições económicas. De nada serve o sacrifício das famílias para investirem na
qualificação dos seus filhos se, no final, os filhos contam apenas com as portas abertas para emigrarem.
As necessidades estão à vista e são evidentes — aumento generalizado dos preços que torna mais difícil
suportar as despesas alimentares; falta de camas; falta de apoio à integração dos jovens no contexto académico;
défice de profissionais especializados em saúde mental; falta de apoios ao desporto universitário e à promoção
de um estilo de vida saudável; falta de apoio a estudantes com necessidades especiais e dificuldades motoras.
É que, neste País a brincar, um jovem em cadeira de rodas fica impedido de frequentar o ensino superior
porque não há quem o auxilie na alimentação ou no acesso à casa de banho. Estas, Srs. Deputados, são as
casas de banho que vos devem preocupar, e não as casas de banho e as ideologias de género mistas que
querem criar.
Aplausos do CH.
Vergonha de País, que fecha os olhos aos jovens com necessidades especiais e que os impede de chegarem
às faculdades, destruindo os seus sonhos e condenando-os à subsidiodependência. Os jovens não querem
subsídios, querem dar o seu contributo ao País.
Concluo dizendo que estas são as preocupações dos jovens estudantes, as quais querem ver vertidas nos
nossos debates e propostas. Se os senhores não percebem isto, então não percebem nada da realidade de um
jovem português.
Aplausos do CH.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa não regista pedidos de esclarecimento, de forma que passamos
à próxima declaração política.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Quem cala consente!
O Sr. Presidente: — A próxima declaração política cabe ao PSD e, para a fazer, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Emília Cerqueira.
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nas últimas semanas, o País tem
assistido com estupefação a vários casos de opacidade, por parte de vários membros do Governo, respeitantes
ao regime jurídico que regula a atividade dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos.
Qual «caixa de Pandora», têm-se sucedido os casos: ao da Ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa,
seguiu-se o do Ministro da Saúde, Manuel Pizarro, o do Ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno
Santos, e, mais recentemente, o do Secretário de Estado da Conservação da Natureza e o da Secretária de
Estado das Pescas. Um caso a seguir ao outro. Parece que este Governo se esqueceu — ou fingiu esquecer-
se — de que a razão pela qual se impõem limites para a realização de negócios de titulares de cargos políticos
com o Estado é porque podem representar negócios consigo mesmos. E essa razão mostra bem que é
imprescindível criar limites e fronteiras legais do que se pode e do que não se pode fazer.
Além dos outros casos que referi, veio a público que uma empresa do Ministro das Infraestruturas praticou
negócios com o Estado. A este respeito, o PSD, na senda do que tem vindo a dizer desde sexta-feira, reafirma
que o Sr. Ministro Pedro Nuno Santos tem de esclarecer os portugueses, para que estes saibam se os factos
que lhe são imputados são ou não verdadeiros. É uma exigência de responsabilização política, é uma obrigação
de transparência que um membro do Governo tem o dever de fazer espontaneamente e não porque a isso é
impelido.
O Ministro Pedro Nuno Santos, sempre tão palavroso a comentar tudo e todos, deve ao País este
esclarecimento, e não deve brindar-nos com este seu silêncio tão ruidoso. Se não o fizer, tratando-se de um
dever de transparência no exercício de cargos políticos, terá de ser o Primeiro-Ministro a fazê-lo, porque é
insuportável este silêncio que adensa e espalha o clima de suspeição a todos os que se dedicam à causa
pública.
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — O PSD não vai embarcar na presunção de que a verdade dos factos é a
que resulta de uma qualquer investigação jornalística e daí tirar conclusões que podem ser precipitadas — isso
deixamos para outros! —, mas vai exigir ao Sr. Ministro que esclareça imediatamente esta questão. Trata-se de
cumprir com o dever de clarificação que os eleitos devem aos eleitores e que os governantes devem àqueles
que são por si governados.
Não vai também o PSD deixar-se enredar nas críticas à clareza da lei. Diremos apenas o seguinte: se se
confirmarem os factos que foram imputados ao Ministro Pedro Nuno Santos, eles estão regulados, sem margem
para qualquer dúvida, na lei que é clara e cristalina. Basta ler.
Mas, então, se é tão simples, se a lei é assim tão clara, a que se refere, afinal, o tal parecer do Conselho
Consultivo da Procuradoria-Geral da República? É fácil. Refere-se apenas às sociedades que sejam detidas em
mais de 10% exclusivamente por familiares do titular de cargo político, mas de que ele não faça parte.
Para que fique ainda mais claro: se o titular do cargo político tem mais de 10% da sociedade, o que é que
acontece? Resposta: essa sociedade não pode participar em procedimentos de contratação pública.
E se o titular de cargo político tem mais de 10% da sociedade em conjunto com familiares? Resposta simples:
essa sociedade não pode participar em procedimentos de contratação pública.
E se o titular de cargo político não tem qualquer participação e têm apenas os seus familiares? Resposta
simples também: é aqui, e apenas aqui, que se aplica o parecer da Procuradoria-Geral da República. É simples,
não é?
Então, se é tão simples, por que razão veio o Governo, através da Presidência do Conselho de Ministros,
tentar ludibriar as pessoas, fazendo-as crer que o parecer se aplicava a uma situação desta natureza, quando
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o parecer se aplica às situações em que as empresas são apenas de familiares, sem qualquer participação do
titular do cargo político?
Vozes doPSD: — Muito bem!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — É evidente que não se trata da mesma coisa, é evidente que o Governo
sabe disso. E, como sabe tudo isso, é evidente que o Governo tenta, intencionalmente, atirar areia para os olhos
das pessoas e assim enganar os portugueses. É uma postura política lamentável, censurável e que em nada
contribui para a dignificação da classe política e de quem está ao serviço da causa pública.
A lei é o que atribui força obrigatória geral e jus e ética a uma sociedade. O que aqui temos é uma lei
consolidada e em vigor. Como pode, então, compreender-se que se queira agora, à última hora, na pendência
da aplicação de uma lei em vigor há mais de três anos, discutir a justeza da sua formulação?
A lei não é boa nem má, Sr.as e Srs. Deputados. Não é justa nem injusta. A lei é lei — dura lex, sed lex — e
representa exatamente aquilo que os partidos políticos entenderem necessário para salvaguardar o bem jurídico
da transparência.
São, por isso, incompreensíveis as declarações que vêm agora questionar a lei, se é excessiva ou não é
excessiva.
O PS fala agora em revisitar a lei. O mesmo PS, para agradar à geringonça, presumimos nós, foi o seu
grande obreiro, apenas havendo justificação para tais declarações porque a lei se tornou num incómodo.
Mas a questão não é essa. Não está em causa discutir a justiça ou a injustiça desta lei, porque ela está em
vigor. Não estamos a discutir propostas ou projetos de lei, estamos a discutir a aplicação de uma lei da
República, Sr.as e Srs. Deputados, uma lei que está em vigor e que é uma lei da República.
Aliás, não é demais lembrar que num Estado de direito existe o respeito pelo princípio da aplicação da lei no
tempo. E, mesmo que se alterasse a lei, tal não mudava a realidade de que os factos foram praticados ao abrigo
desta lei, circunstância que não pode ser ignorada pelas autoridades judiciárias competentes.
Por isso, o PSD não permitirá que passe a ideia de uma certa impunidade para dirigentes socialistas, como
se as leis não se lhes fossem aplicadas.
O PSD sabe muito bem aquilo que votou. O PSD acredita profundamente no Estado de direito e no regular
funcionamento da justiça. O PSD exige que não se ponha em causa o princípio da legalidade. O PSD não
permite a discussão de leis na pendência da sua aplicação com o único propósito de as ajustar à necessidade
de cada momento, razão pela qual exigimos que o Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, e demais membros do
Governo, venham a público confirmar ou desmentir os factos que lhes são imputados.
Aplausos do PSD.
Caso se confirme a veracidade dos mesmos, caberá ao Tribunal Constitucional aplicar as sanções previstas
na lei por impulso do Ministério Público.
Não podemos demitir-nos da nossa obrigação de esclarecimento e da democracia.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, a Mesa registou cinco inscrições para pedidos de esclarecimento. Como
pretende responder?
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Responderei primeiro a dois e depois a três, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sendo assim, o primeiro pedido de esclarecimentos cabe ao Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares, do Bloco de Esquerda.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, felicito-a por marcar
presença neste debate sobre incompatibilidades e impedimentos.
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Risos do PS.
Gostava de lhe fazer uma pergunta muito direta, começando pela leitura que o Sr. Presidente da Assembleia
da República fez da mensagem do Sr. Presidente da República. A mensagem do Sr. Presidente da República
diz que pretende que a Assembleia da República esclareça sobre a lei em vigor no que toca a incompatibilidades
e impedimentos. Acho extraordinário que o Sr. Presidente da República o faça numa missiva à Assembleia da
República em que diz que o enquadramento legislativo se baseia em seis leis, quando duas das que ele indica
estão revogadas e as outras estão a ser aplicadas, mas dizem respeito a questões diferentes. É que, no que diz
respeito a incompatibilidades e impedimentos, só há uma única lei em vigor.
Penso que é, no mínimo, questionável que o primeiro magistrado da Nação, que é professor doutor em
Direito, envie uma missiva à Assembleia da República em que faz um enquadramento legislativo colocando em
cima da mesa duas leis que já estão revogadas.
Não deve ser por desconhecimento — com certeza, não será — e não deve ser por estar mal informado —
com certeza, também não será, porque, se o próprio não sabe, tem assessores jurídicos para o fazer —, mas
fico sem saber o porquê.
Assim, pergunto à Sr.ª Deputada: há algum motivo para o Presidente da República querer lançar algum tipo
de suspeitas sobre a aplicação da lei de incompatibilidades e impedimentos a quem tem cargos políticos ou
altos cargos públicos? Qual é?
É que não compreendo isto, num momento em que nos parece óbvio e inequívoco que a lei é clara, simples,
direta e, mais, está em vigor e aplica-se a qualquer um e qualquer uma de nós que esteja no desempenho de
altos cargos públicos ou de cargos políticos.
O PSD veio dizer que teria abertura para rever a lei. Entre essa posição e aquilo que a Sr.ª Deputada disse
na sua intervenção, fiquei com dúvidas e, para as tirar, faço-lhe a pergunta muito diretamente: votou o PSD algo
em que não acredita ou acredita na lei que está em vigor? Considera o PSD que a lei que está em vigor é clara
e transparente e que não merece dúvidas quanto à sua interpretação?
Da missiva do Sr. Presidente da República — que, já agora, também faz parte do enquadramento jurídico do
próprio Governo —, há um parecer que não se aplica à lei que está atualmente em vigor e há um segundo
parecer que o que diz que tem obscuridade não é a lei, é a situação que a lei não elimina, que é a possibilidade
de o dirigente ou governante poder decidir em função da distribuição dos fundos comunitários.
Por isso, mais uma vez, a mensagem do Sr. Presidente da República parece querer trazer confusão, onde
há uma clareza inequívoca. Há um parecer que não se aplica à lei atualmente em vigor e há outro parecer cuja
opinião é que a lei não vai suficientemente longe para proteger o interesse público.
Concluo solicitando à Sr.ª Deputada que responda às perguntas que fiz, porque me parece que esta matéria
precisa, acima de tudo, de serenidade e de um pedido que é inequívoco: no que à lei diz respeito, que o Tribunal
Constitucional e o Ministério Público, junto do Tribunal Constitucional, garantam o funcionamento da lei e que,
já agora, mais cedo do que tão tarde, a Entidade para a Transparência também esteja em vigor.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra
o Sr. Deputado Rui Paulo Sousa.
O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada, o PSD veio hoje aqui
falar em transparência, por coincidência também no dia em que o Sr. Presidente da República enviou uma
comunicação à Assembleia sobre este assunto, que, aliás, tem estado na ordem do dia. Falo do regime de
impedimentos.
Isto numa altura em que os casos com os membros do atual Governo acontecem quase numa base diária —
casos como o do Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, da Sr.ª Ministra Ana Abrunhosa ou do Sr. Ministro Manuel
Pizarro. Enfim, já é de perguntar quais os ministros do atual Governo que não têm familiares envolvidos em
negócios com o Estado ou com as diversas áreas que tutela.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — É verdade!
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O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — «Famílias Primeiro»!
O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Mas, apesar de todos estes casos, quando o Chega levou um pedido de
parecer à Comissão de Transparência desta mesma Assembleia sobre um possível conflito de interesses do Sr.
Ministro Manuel Pizarro, devido a ser casado com a atual Bastonária da Ordem dos Nutricionistas, Alexandra
Bento, o mesmo foi chumbado por todos os partidos, incluindo pelo PSD.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ora aí está!
O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Claro que vão dizer que a Comissão de Transparência, apesar do seu nome,
«Transparência», não tinha competência para tal parecer, mas o que temos visto é que, nesta Assembleia, os
pareceres e as competências vão variando conforme quem os pede e conforme a quem se destinam.
Aplausos do CH.
Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, o Chega apresentou o Projeto de Lei n.º 45/XV/1.ª, que altera o regime do
exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos no sentido de limitar negócios com
familiares. Neste projeto, o Chega propõe várias alterações à lei vigente, no sentido de impedir ou dificultar este
tipo de situações, nomeadamente a proibição de quaisquer contratos com empresas cujo titular seja detentor de
participação — independentemente de ser mais ou menos de 10% —, assim como de empresas que tenham
participação de familiares próximos do titular, nomeadamente ascendentes, descendentes, cônjuges ou unidos
de facto.
A existência de impedimentos prevista na lei tem por função assegurar o rigoroso cumprimento dos princípios
da igualdade, da imparcialidade e da transparência, e é isso que se pretende com o presente projeto de lei.
Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, a pergunta que lhe faço é a seguinte: está o PSD disposto a acompanhar o
Chega neste projeto de lei? Também aproveito para lhe perguntar se o PSD, que aparentemente está tão
preocupado com a questão da transparência, vai acompanhar o Chega no próximo dia 21, na interpelação ao
Governo sobre todos estes casos de impedimento que têm surgido. Ou fará como no caso da castração química,
em que se colocou ao lado de toda a esquerda?
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira.
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, começo por agradecer
a sua pergunta e por dizer que não faço julgamentos de intenções do pensamento do Sr. Presidente da
República. Portanto, não tenho condições de lhe responder qual é o pensamento do Sr. Presidente. Aconselho,
aliás, que, numa próxima reunião ou audição, lhe pergunte diretamente, porque não faço exercícios de
adivinhação sobre essa matéria.
Quanto à questão da alteração da lei, acho que, se ouviu a declaração política que fiz aqui hoje, foi muito
clara a resposta sobre essa matéria.
Protestos do Deputado do BE Pedro Filipe Soares.
Aquilo que dissemos foi que, neste momento, está em causa a aplicação da lei e aquela que tem sido a
matriz do PSD ao longo dos tempos é não alterar a lei a reboque do momento, do caso mediático e do instante,
o que não significa, como é óbvio de um partido responsável — aliás, de um partido com longa história na nossa
democracia —, que as leis não sejam revisitáveis quando faz sentido, repito, mas não a reboque de um qualquer
caso mediático.
Nunca devemos confundir as duas realidades, Sr. Deputado. Se me pergunta se o PSD está disposto a
alterar a lei a reboque de um caso mediático, caso tenha ouvido as declarações do presidente do nosso partido,
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perceberá imediatamente que não. Se o PSD está disposto a revisitar uma legislação, seja ela qual for,
obviamente que sim, quando se justifique por se perceber que a lei precisa de ajustes. Aí sim! O PSD está
sempre na solução e não no problema.
Aplausos do PSD.
O Sr. Deputado Rui Paulo Sousa colocou duas questões — aliás, são duas questões bem diferentes e que
tentou aqui confundir —, mas parece-me, com todo o respeito, que o Chega é que não quer discutir esta matéria.
Sr. Deputado, quanto à primeira questão, sobre o pedido de apreciação na Comissão de Transparência, há
questões formais e questões materiais. A Comissão de Transparência é objetivamente incompetente e, portanto,
não se pronunciou sobre o mérito das vossas ideias. Ou se cumpre a lei, como o PSD diz — as leis são para
cumprir, dura lex, sed lex —, ou não se cumpre. Nós respeitamo-las todas, mesmo aquelas que não convêm ao
Chega.
Quanto às outras iniciativas de que aqui falou, elas terão o seu momento para ser discutidas, Sr. Deputado.
Tenho pena que o Chega, parece-me, não queira discutir a sério aquilo que se está a discutir hoje e nos queira
distrair com outros projetos e outras coisas do futuro, querendo discutir tudo menos o essencial.
Aplausos do PSD.
Protestos do CH.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, da
Iniciativa Liberal.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Cara Deputada Emília Cerqueira, de facto, nos últimos tempos,
temos assistido a vários casos que envolvem membros do Governo. Não são todos parecidos. Há uns que são
claramente legais e estão dentro da ética, outros em que é exatamente o oposto. Mas estas não são as únicas
situações do foro do surrealismo que têm acontecido nos últimos tempos.
Mesmo esta missiva que recebemos do Sr. Presidente da República é um pouco estranha, como também é
estranho que — voltando aos casos que envolvem alguns membros do Governo e, em específico, dois deles —
não se perceba porque é que não utilizaram remédios que a lei prevê. Por exemplo, não precisavam de perder
tempo — há processos que demoram algum tempo, por uma questão de venda de participações —, mas
poderiam usar uma das figuras que a lei prevê, que é a suspensão das participações. Portanto, ficamos também
sem perceber porque é que não foram por um caminho tão simples, que evitava toda esta situação e o tempo
que todos perdemos e que o País todo perde a discutir estes casos.
Há uma coisa, para nós, que fica muito clara neste tipo de situações: a extrema necessidade de a Entidade
da Transparência começar a funcionar, de uma vez por todas.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Muito bem!
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Há quem seja responsável por ter de capacitar e criar as condições para que
a Entidade da Transparência comece a funcionar, como já deveria ter começado, com as competências que lhe
estão previstas, para depois, no futuro, até podermos aprofundar as competências dessa entidade de modo a
funcionar de forma autónoma e eficaz.
Tinha uma pergunta para fazer à Sr.ª Deputada, mas, entretanto, já respondeu sobre ela ao Deputado do
Bloco de Esquerda, que era se acha que se deveria legislar em cima de casos ou casinhos. Isto é uma espécie
do que tem acontecido nos últimos anos: de revisão em revisão até à confusão.
Sr.ª Deputada, ainda não percebi o seguinte: na opinião do PSD, a atual legislação serve ou não? Esta é
uma pergunta objetiva.
Não servindo o que está feito — porque achamos que a legislação deveria ter outro tipo de enquadramento
e estamos disponíveis para fazer um processo legislativo sereno e calmo, não agarrado a casos, sobre o tema
na sua globalidade —, na opinião do PSD, o caminho deve ser de mais restrição e de «apertar a malha» ou
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deve ser um caminho diferente, de focar a legislação no ilícito do favorecimento? Até porque, quanto a este
favorecimento, estamos sempre a falar só da questão dos familiares, mas, até desde a história recente, há quem
faça favorecimento não a familiares mas a amigos que lhes dão muito jeito.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimentos, dou a palavra ao Sr. Deputado Pedro Delgado
Alves, do PS.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Emília Cerqueira,
muito obrigado pela sua intervenção. Tenho duas ou três questões prévias, em que é importante sublinharmos
porque é que estamos a fazer este debate.
Uma das razões pelas quais é possível à sociedade portuguesa fazer um escrutínio não é porque há
opacidade, mas é precisamente porque iniciativas legislativas das últimas décadas e até de anos recentes
diminuíram substantivamente a opacidade, permitindo que as declarações de interesses de membros do
Governo e de Deputados estejam disponíveis para consulta de forma mais imediata e garantindo que a
contratação pública, através do Portal BASE, esteja disponível.
Se hoje estamos a fazer este debate, não é por razões de opacidade, é porque a transparência permite que
este debate tenha lugar e que ele esteja a decorrer.
Aplausos do PS.
Em grande parte, algumas das interrogações que deixou têm resposta dada precisamente em muitos desses
sítios.
Suscitou várias questões. Bom, os membros do Governo não se eximiram de prestar esclarecimentos aos
órgãos de comunicação social que as pediam, mas, além disso, pode qualquer cidadão — a Sr.ª Deputada,
inclusivamente — consultar o registo de interesses, disponível através do site da Assembleia da República, e
esclarecer diretamente as dúvidas que tem quanto à titularidade de participação social, e outras, no local próprio,
onde sempre todos os casos elencados declararam as suas participações sociais e as dos restantes. Portanto,
tudo está disponível para consulta e é precisamente este fator que permite a todos os cidadãos fazer esse
escrutínio.
Refiro-me, agora, à segunda parte do debate. Esse é o ponto em que discordo da sua intervenção, Sr.ª
Deputada, quando falava da opacidade do problema. Neste caso, não é um problema de opacidade, é um
problema, esse sim relevante, sobre dúvidas interpretativas da lei e que, goste-se ou não, acompanhou a
democracia ao longo destes mais de 40 anos. Acho que nenhum grupo parlamentar com assento nesta Câmara
se pode arrogar — e falo mesmo em nome do meu próprio grupo — da ideia de que nunca legislou atrás de
casos concretos.
A história da legislação sobre incompatibilidades e impedimentos na República portuguesa, desde 1976, é a
história de impulsos legiferantes, todos feitos tendo por base a situação aqui detetada ou o problema ali detetado,
o que, obviamente, quando produz um debate irrefletido que convide a populismos e sem a devida ponderação,
é um problema, mas, em muitos casos, é o debate que se tem, pode e deve fazer, porque é aquele que faz
corresponder às expectativas dos cidadãos.
Ao longo dos últimos 40 anos, a exigência dos cidadãos mudou. Há coisas que hoje, da perspetiva da
consciência da comunidade, são claramente reprováveis e que há 30 anos não eram. Há matérias, como por
exemplo as próprias regras da contratação pública, que evoluíram e mudaram. Aliás, as próprias configurações
jurídicas das pessoas coletivas públicas não são as mesmas que eram há 20 ou 30 anos, pelo que alarga o
perímetro, o leque e a identificação de quem é que pode e não pode ter intervenção.
São, de facto, questões jurídicas complexas que não se resolvem com uma pincelada e se nem o Presidente
da República — o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares bem identificou —, na mensagem que dirigiu à Assembleia
da República, conseguiu identificar a legislação que está efetivamente em vigor e que resultou do labor desta
Câmara para a simplificar e para aumentar a transparência, de facto, temos aí um problema de partida.
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Ora, face àquilo de que a Sr.ª Deputada deu nota, contamos com o PSD — e há essa disponibilidade, a qual,
aliás, temos manifestado em vários momentos — para olhar para a lei e aprimorar os casos em que existem
dúvidas. Um ponto é certo: existem dúvidas e a razão pela qual existem dúvidas, e sabemo-lo, é porque há uma
intervenção do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, uma não, aliás, duas, porque fez a
interpretação de dois atos legislativos que, por um lado, eram pouco claros no alcance daquilo que propunham
e, por outro lado, aparentavam ir longe demais na restrição de direitos fundamentais e ofereciam soluções que
não eram equilibradas.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Deixo uma pergunta, embora, de certa maneira, a Sr.ª Deputada já tenha respondido. Pergunto, pois, tendo
em conta a responsabilidade que a Sr.ª Deputada deu nota, se o PSD está disponível para, num exercício sério
e equilibrado, exorcizando os populistas que procuram estes momentos para atacar as instituições, fazer o
processo de revisão da lei, que melhorará para todos a transparência e a integridade das instituições.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para o último pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, começo por
cumprimentá-la e dizer-lhe que, sobre a questão concreta e o caso com mais centralidade, entendemos que
todos os esclarecimentos são necessários para que não haja dúvidas relativamente a esta situação. E é preciso
assegurar que não haja, de facto, nenhum benefício indevido e que a lei seja escrupulosamente cumprida.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Mas, independentemente do apuramento sobre esta situação em concreto, até
porque temos tido situações que suscitam precisamente as mesmas questões ao longo de décadas, sobretudo
no que toca ao poder executivo, também por isso o que não se pode escamotear é a subordinação do poder
político ao poder económico, que não é um problema novo, é um problema estrutural. A subordinação do poder
político ao económico observa-se das mais variadas formas — olhemos para as privatizações ruinosas, para as
PPP (parcerias público-privadas), que são um sorvedouro de dinheiro. Mais, vejamos a atribuição de benefícios
fiscais a grandes grupos económicos, como volta a acontecer agora com este Orçamento e com este acordo de
rendimentos. Quanto a isso, de facto, não há leis que valham, porque, mais do que os titulares em si, é preciso
ver o que é que fazem com o título e com o cargo, se utilizam em benefício particular, pessoal ou outro qualquer
ou colocam o interesse público em primeiro lugar.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso mesmo!
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Ora, temos tido casos bem conhecidos em que quem se beneficia ou beneficia
outros nem sequer é familiar. Falo, por exemplo, dos casos bem conhecidos, e é um facto que fala por si, de
antigos ministros de antigos Governos que negociaram PPP e hoje são administradores dessas mesmas PPP.
Ou seja, não há laços familiares, mas fica tudo em família na mesma,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — … enquanto o interesse público, a transparência e a confiança das pessoas já
ficaram para trás.
Assim, a pergunta que quero fazer, Sr.ª Deputada, é se não acha que isto ultrapassa uma questão apenas
legal e que está muito mais relacionado com os titulares e a sua utilização do cargo, nomeadamente se servem
o interesse público ou o interesse privado.
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Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira.
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, grande parte das questões
que colocou tem que ver com a intervenção que eu fiz e que revela as posições do PSD.
Relativamente à pergunta sobre se achamos que o caminho é «apertar a malha» ou o contrário, Sr. Deputado,
essas são aquelas questões que, na senda do que afirmei, se podem pensar no futuro, fazendo uma maturação
sobre qual é o caminho que queremos seguir, e não no momento em que a situação está efervescente, em que
não há um racional com a ponderação e a calma que necessitam matérias desta sensibilidade. Portanto, este
não é o momento, este momento é para aplicar a lei, é para ver até que ponto é que todos nós estamos sujeitos
e respeitamos a lei, pois temos de nos sujeitar a ela mesmo quando não nos agrada.
Essa é uma ponderação para o futuro, pois, como eu disse — e disse o Presidente do PSD —, esta não é
uma matéria para se legislar às pressas em cima de um caso concreto, aliás, agora são uma série deles.
O que é mesmo importante nesta matéria é que nós não permitimos que um caso ou outro faça com que caia
um anátema de suspeição sobre todos aqueles que estão na vida pública. Ora, isso não pode ser, correndo-se
o risco terrível para todos nós de se tornar a parte no todo, ou seja, quando há um prevaricador todos passam
a ser prevaricadores, pelo que temos de lutar contra isso e uma das formas de lutar é precisamente não
embarcarmos nas alterações legislativas a correr, à pressa, sem ponderação, sem maturação. Essa não é a
nossa forma de estar.
Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, agradeço-lhe a questão que colocou, embora ache que houve uma
contradição naquilo que afirmou, se me permite, quando referiu a situação da opacidade e da transparência.
Não foi isso que eu disse, Sr. Deputado. A questão é que a postura dos titulares dos cargos políticos em causa
está a contribuir para uma opacidade, ao invés desta transparência. Quando surgiram as questões concretas,
Sr. Deputado, nomeadamente os pareceres, teria sido importante que, em vez de se ocultar uma alínea da lei,
se usassem todas as alíneas e se esclarecesse tudo o que tinha de ser esclarecido. Aí, sim, não se tentava
enganar os portugueses. Acredito que ninguém ganha com isso, mas — como, aliás, o próprio Sr. Deputado
acabou por admitir — estamos habituados a que, às vezes, se legisle à pressa porque há sempre casos. E o Sr.
Deputado acabou por falar de casos e, de facto, tem razão, porque o PS tem-nos habituado a esse timbre.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Se calhar não é só o PS!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Quanto à legislação, mantenho aquilo que tinha dito: estaremos sempre
com seriedade a fazer qualquer alteração legislativa.
Sr.ª Deputada Alma Rivera, parece-me que muitas das questões que colocou não têm nada que ver com
este debate.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso é o que dizem todos!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Percebo-as perfeitamente tendo em conta a ideologia do PCP, a sua
agenda contra a economia, contra a privatização, contra as PPP, contra tudo aquilo que seja privado. Essa não
é a nossa ideologia. Aquilo que nos interessa — e é a razão pela qual estamos aqui hoje — é que, de facto, haja
transparência na atividade pública. E transparência não significa uma amarra de os políticos serem funcionários
públicos que não podem ter vida própria.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Passamos agora a escutar a declaração política do Partido Comunista Português, pelo
que, para o efeito, dou a palavra à Sr.ª Deputada Paula Santos.
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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A TAP é estratégica para o País e,
por isso, Portugal não pode ficar dependente dos interesses das multinacionais estrangeiras. Também é
estratégica para a coesão territorial, em particular nas ligações às Regiões Autónomas, nas ligações às
comunidades portuguesas e aos países de língua portuguesa, e, aproveitando a nossa localização privilegiada,
nas ligações intercontinentais, sobretudo Europa, América e África.
Alguém tem ilusões que, caso a TAP seja privatizada e gerida por uma multinacional, como pretende o PS,
o PSD e a IL, esses objetivos estratégicos para o nosso País estarão presentes? Olhe-se para a ANA
(Aeroportos e Navegação Aérea), para a EDP (Energias de Portugal), para a Galp ou para os CTT (Correios de
Portugal) e diga-se se é o interesse nacional que hoje determina a sua ação.
O que passará a ditar a operação da TAP? Serão os interesses dessas multinacionais em prejuízo dos
interesses de Portugal. Quem ganha? São os grupos económicos. Quem perde? Perdemos todos, o País, o
povo português, que fica sem um instrumento fundamental para o nosso desenvolvimento e a nossa soberania.
O principal problema da TAP é que, nos últimos 30 anos, esteve sempre a ser preparada para ser privatizada.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — As sucessivas privatizações e tentativas de privatização foram um desastre,
custaram centenas de milhões de euros à TAP e ao Estado português e são as grandes responsáveis por a TAP
não afirmar um caminho coerente ao serviço dos interesses nacionais.
A venda da TAP à Swissair acabou por não se concretizar devido à falência desta. Houve uma nova tentativa
de venda, desta vez à também já falida Avianca, abortada horas antes da sua concretização por falta de
garantias do comprador.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente! Em 2012!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Depois, houve a venda da TAP a David Neeleman, que, enquanto lá esteve,
não fez mais do que pilhar a empresa a favor da Azul, até não conseguir tirar mais vantagens. Quando
começaram a surgir dificuldades com a epidemia, David Neeleman e os seus testas de ferro, pura e
simplesmente, desapareceram. Ao mesmo tempo, a SPdH/Groundforce já vai na sua quarta privatização, cada
uma delas trazendo novos prejuízos à TAP, para além de a TAP ter salvo a Portugália depois da incursão do
BES (Banco Espírito Santo) no setor da aviação.
Para agravar esta situação, o Governo PSD/CDS privatizou a ANA, com impactos profundamente negativos
para a TAP, não só pela imposição da venda das lojas francas, cujos lucros ficam agora na ANA/Vinci, mas
também pelo aumento das rendas e alugueres e pela subordinação das infraestruturas aeroportuárias ao seu
objetivo de maximização do lucro e por travar a construção do novo aeroporto de Lisboa no Campo de Tiro de
Alcochete, fundamental para o crescimento da TAP, para o seu hub e para a sua manutenção e engenharia. É
isto que PS, PSD e IL procuram esconder.
Uma TAP ao serviço do povo e do País só é possível com o seu controlo público. Está comprovado que a
privatização da TAP não é solução. O facto de o Governo PS, com o conforto do PSD e da IL, insistir na
privatização da TAP — intenção aqui expressa pelo Primeiro-Ministro — revela a opção de subordinação aos
interesses dos grupos económicos e também a submissão à perspetiva da Comissão Europeia de destruição da
TAP, concentrando o setor da aviação em duas ou três grandes empresas.
Não é por acaso que a Comissão Europeia impôs um plano de reestruturação à TAP, que o Governo PS e o
PSD anuíram, mas tal, no entanto, não foi exigido à Air France nem a Lufthansa, empresas que tiveram apoios
bem superiores ao autorizado à TAP. Um plano de reestruturação que impôs a redução do número de
trabalhadores, que impôs o corte nos salários, que impôs a perda de slots para atribuir às companhias ditas low
cost. Um plano de reestruturação que conduz à redução da operação da TAP e que, se não for invertido, levará
à sua destruição.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Na altura, o PCP apresentou um plano de contingência para a TAP com o
objetivo de proteger todos os postos de trabalho e os rendimentos dos trabalhadores, salvaguardando a sua
frota e a sua capacidade para ter condições para retomar a atividade. Não foi esta a opção do PS e do PSD.
Em todo o mundo houve necessidade de intervenção nas companhias aéreas. A IATA (The International Air
Transport Association) contabiliza mais de 300 000 milhões de euros de apoios públicos, a TAP até foi das
empresas que teve menor investimento público, mesmo assim não falta a demagogia, a hipocrisia e as mentiras
sobre o apoio atribuído à TAP devido aos impactos da epidemia, numa campanha negra para facilitar a entrega
de uma importante empresa estratégica às mãos do capital estrangeiro.
Alguns dizem que seria preferível ter deixado destruir a empresa, passando a ideia de que tal não teria custos
para o País, mas é preciso falar verdade. A destruição do Grupo TAP, além de implicar perda de soberania e
deixar o País completamente dependente do estrangeiro, iria mandar mais de 10 000 trabalhadores para o
desemprego, iria custar ao País muitas largas centenas de milhões de euros em prestações sociais, outro tanto
em indemnizações e o fim de 3,4 mil milhões de euros em exportações, que corresponde aos valores das vendas
ao estrangeiro de 2019. E, no pós-COVID, iria atrasar ainda mais a recuperação de setores estratégicos para o
turismo, como saberiam até a Iniciativa Liberal e o PSD se a obstinação ideológica não os cegasse para as
causas do caos que se viveu na aviação civil na Europa em maio e em junho deste ano.
Quando agora agitam as ameaças de que a TAP irá desaparecer se não for privatizada, importa recordar
que era exatamente essa mesma afirmação que repetiam à exaustão para impor a venda da TAP à Swissair.
Ora, a Swissair faliu e desapareceu e, se a TAP ainda hoje existe, é porque essa inevitável privatização não
avançou.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ora aí está!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não, a privatização e a destruição da TAP que PS, PSD e outros defendem
só serve os interesses do grande capital estrangeiro.
A TAP é necessária e pode dar muito ao País, haja o investimento e uma clara orientação política na sua
defesa. A TAP faz falta ao País enquanto empresa nacional e só será nacional enquanto empresa pública.
Aplausos do PCP.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Adão Silva.
O Sr. Presidente: — Começo por cumprimentar as Sr.as e os Srs. Deputados.
Sr.ª Deputada Paula Santos, inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados
Hugo Oliveira, Bruno Nunes, Paulo Rios de Oliveira, Bernardo Blanco e Mariana Mortágua.
Uma vez que V. Ex.ª pretende responder em dois grupos, tem, desde já, a palavra o Sr. Deputado Hugo
Oliveira, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Paula Santos, no Partido
Socialista — no Governo do Partido Socialista —, sempre considerámos a TAP uma empresa estratégica para
o País. Mesmo quando aumentámos o capital do Estado na empresa, dissemos, já nessa altura, que queríamos
encontrar um parceiro que fosse estratégico para nos acompanhar na gestão da empresa.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Chamem-lhe parceiro estratégico!
O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Não é algo novo nem é algo que tenha sido apresentado hoje, como, aliás, com
uma simples pesquisa, poderemos facilmente comprovar.
Trago uma das muitas notícias que o comprovam, publicada no Diário de Notícias do dia 21 de dezembro de
2021, que passo a ler: «‘É para nós claro que num negócio altamente competitivo da aviação, uma companhia
aérea não sobrevive isolada e, portanto, estamos a trabalhar para que a TAP possa vir a estar num grupo
importante de aviação, porque essa é a forma mais sólida e consistente de conseguirmos a viabilidade’, afirmou
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o Ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, em conferência de imprensa em Lisboa, após a ‘luz verde’
da Comissão Europeia ao plano de reestruturação da companhia aérea.»
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Mas foi ele ou o pai?
O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Portanto, continuamos a considerar, como sempre considerámos, que um
parceiro estratégico para a TAP é importante, porque lhe vai permitir aumentar as vendas, reduzir os custos com
fornecedores e criar uma série de sinergias que a tornarão, certamente, bastante mais competitiva.
Aliás, é mesmo este interesse de várias companhias de aviação em entrar no capital da TAP que revela a
confiança no seu futuro, uma confiança que advém do plano de recuperação estratégico que tem vindo a ser
aplicado.
Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Paula Santos, a pergunta que lhe queria fazer — reconhecendo o
interesse na defesa dos trabalhadores — é se, para o PCP, uma TAP mais viável financeiramente não resultará,
também, na possibilidade de termos trabalhadores com melhores condições no futuro, porque essa também é
uma das grandes preocupações do Partido Socialista.
Aplausos do PS.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Foi com esse argumento que ainda agora mandaram milhares para a rua!
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para pedir esclarecimentos, pelo Grupo Parlamentar do Chega, tem a
palavra o Sr. Deputado Bruno Nunes.
O Sr. Bruno Nunes (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Paula Santos, o PCP terá
hoje oportunidade para responder à pergunta à qual não consegue responder há 30 anos: o que é que
pretendem fazer à TAP e qual é o processo de reestruturação?
Os senhores dizem: «tem de ser uma companhia de bandeira», e estamos de acordo; «deve manter as rotas
comerciais essenciais para Portugal», e estamos de acordo; «deve manter a ligação à diáspora, para não
perdermos a ligação com os nossos emigrantes», e estamos de acordo. O que os senhores não explicam,
quando dizem «queremos aumentos salariais aqui, aqui e aqui…», é quanto querem nem o que querem, em
concreto. Fica sempre tudo muito no ar! Parecem aqueles aviões que, quando estão a chegar a Lisboa, como
não sabem como é que vão aterrar, dão mais uma volta, até Santarém, para gastarem gasolina. E o que os
senhores fizeram à TAP, ao longo dos últimos 30 anos, foi, de facto, gastar gasolina sem se perceber
exatamente o que querem.
A Sr.ª Deputada fez uma afirmação que eu quase diria tratar-se de xenofobia financeira, quando disse que
não quer cá os estrangeiros a investir.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Exatamente!
O Sr. Bruno Nunes (CH): — O que os portugueses querem é que a TAP seja viável. O que os portugueses
não querem é perder a sua companhia de bandeira. Estamos de acordo com isso! Mas, de uma vez por todas,
ao final de 30 anos, expliquem o que querem fazer.
Da nossa parte — e vocês tanto gritam que somos populistas e não temos propostas —, já admitimos que o
financiamento à TAP pode ser feito. O que queremos saber é como é que a TAP vai devolver o dinheiro aos
portugueses, coisa que nenhum dos outros partidos aqui presentes está interessado em saber.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Claro!
O Sr. Bruno Nunes (CH): — Interessa, para si e para o seu partido, que se injete muito dinheiro na TAP,
mesmo que fique lá todo enterrado; para a Iniciativa Liberal, que se privatize e se venda a TAP, toda, até ao
último parafuso, porque isto de ter coisas que pertencem ao Estado é uma chatice…
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Protestos do Deputado da IL João Cotrim Figueiredo.
Fazem isto para a TAP, fazem isto para tudo e mais alguma coisa, acham que estas situações das
privatizações são a sobreposição do indivíduo aos valores sociais e querem, cada vez mais, destruir a
sociedade. Não é aí que nós estamos!
Protestos de Deputados da IL.
Ficam muito exaltados, e também percebo porquê. É porque, pela primeira vez, um tema que achavam que
era só deles vem a debate por todos os outros e, agora, ficam sem tema para falar durante as próximas semanas.
Já não sabem outro assunto a não ser a TAP, a TAP e a TAP.
Aplausos do CH.
A partir daqui, para a Iniciativa Liberal, o avião aterrou e não se passa mais nada.
Em relação aos senhores do Partido Comunista, aquilo que precisamos de saber é, de uma forma séria, o
que é que indicam como reestruturação da TAP. Porque vender essa ideia aos trabalhadores, meter a CGTP-
IN (Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses-Intersindical Nacional) à porta dos aeroportos a tentar
alavancar mais despesa numa empresa que, neste momento, não tem viabilidade financeira…
Protestos do Deputado do PCP João Dias.
O que queremos saber é se acompanham o Chega na questão da reestruturação da TAP, em que o
importante é perceber como é que, depois da injeção financeira, o dinheiro vai ser devolvido aos trabalhadores
e aos contribuintes portugueses.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Pelo Grupo Parlamentar do PSD, para pedir esclarecimentos, tem a palavra
o Sr. Deputado Paulo Rios de Oliveira.
O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Paula Santos,
o Partido Socialista transformou a TAP numa tragédia nacional. A TAP era uma empresa que acumulava
prejuízos, ano após ano, e, em 2011, pela pena do Primeiro-Ministro José Sócrates, no célebre Memorando da
troica, foi assinada a privatização da TAP.
Quem é que a teve de a cumprir? O Governo do PSD! E nós, corajosamente, o fizemos.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Contudo, em 2016, num acesso patrioteiro e muito socialista, o
Partido Socialista decidiu que tinha de nacionalizar a TAP porque esta era uma empresa de bandeira essencial.
Uma empresa de bandeira que é desconhecida no aeroporto do Porto, empresa de bandeira que é desconhecida
no aeroporto de Faro, empresa de bandeira que é desconhecida da maior parte dos portugueses, que não a
usam ou a ela não acedem.
Mas, muito pior do que isso, o PS decidiu, também, transportar para a TAP 3200 milhões de euros. É mesmo
muito dinheiro! Basta pensar que é três vezes o que foi roubado ao futuro dos pensionistas e aposentados deste
País.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Muito bem!
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O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Com isso, não só comprimiu e esmagou, nomeadamente, os direitos
dos trabalhadores como, agora, aconteceu uma desgraça: é que o processo de reestruturação não vai relançar
a TAP e, pior do que isso, a União Europeia diz que durante 10 anos não há mais dinheiro para a TAP.
Ora, nós sabemos que o socialismo acaba quando acaba o dinheiro dos outros. O dinheiro dos outros está
a acabar e, portanto, está a acabar o socialismo. E quando acaba o socialismo também acaba o preconceito!
Aplausos do PSD.
O Partido Socialista, de repente, descobriu que, afinal, um parceiro estratégico… Descobriu que essa coisa
da nacionalização não era tão produtiva e, então, passou a encontrar méritos nos particulares.
Sr.ª Deputada, pior que isto é quase impossível, mas gostava de ouvir a opinião do PCP.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para dar essa e outras respostas tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada
Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as questões formuladas.
Gostaria de começar pelas perguntas feitas pelo Partido Socialista, que parece querer recuperar a opção da
política de direita, para não perder o comboio das forças políticas mais à direita e ser o grande defensor da
privatização da TAP.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!
Protestos do Deputado do PS Hugo Oliveira.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Mas o que está em causa, se tomou atenção à declaração política proferida
pelo PCP, é que ficou comprovado que as tentativas de privatização que ocorreram, e a própria privatização,
foram altamente prejudiciais para a TAP e para o País, com custos de milhões e milhões de euros para a TAP
e para o Estado português.
Não é verdade que estejamos isolados e que a TAP esteja isolada, mas aquilo que o Partido Socialista
pretende — aliás, com as demais forças políticas à direita — com o processo de privatização da TAP é
transformá-la numa empresa regional, levando-a a perder a sua capacidade, a sua atividade e a não garantir
essas mesmas condições de trabalho a que o Sr. Deputado fez referência.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Quanto a encontrar um parceiro estratégico, está a vista o que isso significou,
nomeadamente, na sequência da privatização por parte do PSD e do CDS.
O Sr. João Dias (PCP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Enquanto era vantajoso, retiraram-se recursos à empresa; quando já não
interessava, disse-se «vamos embora, porque não temos nada que ver com isto».
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso mesmo!
O Sr. João Dias (PCP): — É verdade!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — E é isso que não queremos para o nosso País. Repito: é isso que não
queremos para o nosso País.
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Relativamente às questões colocadas pelo Chega, o que gostaria de perguntar ao Sr. Deputado, tendo em
conta a intervenção que acabámos de ouvir, é se o seu partido assume que está contra a devolução dos cortes
dos salários aos trabalhadores da TAP.
O Sr. João Dias (PCP): — Exato!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — É de uma enorme injustiça aquilo que, no plano de reestruturação, foi imposto
à TAP pela União Europeia e aceite pelo PS e pelos partidos à direita.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Claro!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — O que aquilo significa é a redução do número de trabalhadores, que hoje são
necessários para que a TAP mantenha a sua operação.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E nós avisámos! Nós avisámos!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Aquilo que, hoje, é necessário é garantir os salários e os direitos dos
trabalhadores, precisamente para os fixar na TAP,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Claro, mas para o Chega parece ser um problema.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … porque tem havido uma saída muito significativa de trabalhadores que são
necessários à sua operação e manutenção.
É também importante que se clarifique que o que foi ruinoso para a TAP foram os negócios com uma série
de grupos privados, que lhe retiraram um conjunto de recursos. Vejamos os dados oficiais relativamente a esta
matéria: nos últimos 10 anos, a TAP S.A. deu lucro em seis e os prejuízos resultaram, sobretudo, dos anos em
que a TAP esteve privatizada.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Pedro Pinto (CH): — A pergunta não foi essa!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Por isso, fica aqui bem claro que é uma empresa viável e necessária para o
nosso País.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Não nos respondeu!
O Sr. Bruno Nunes (CH): — Tiveram 30 anos para responder, mas não respondem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Num último aspeto, quero referir, Sr. Deputado Paulo Rios de Oliveira, que
nós defendemos que uma das responsabilidades da TAP é, naturalmente, assegurar a coesão territorial, bem
como uma maior resposta e o serviço às diversas regiões do nosso País.
O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Mas isso não está a acontecer!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Nunca ouviu nada em contrário por parte do PCP relativamente a essa
matéria. É, de facto, uma resposta que deve ser assegurada e é nesse sentido que também temos intervindo.
Quando falamos da necessidade de termos uma TAP com maior capacidade, que garanta a coesão territorial,
que garanta a ligação às nossas comunidades, aos países de língua portuguesa, com o importante papel que
tem de ligação a um conjunto de continentes no mundo, naturalmente, essa é uma das questões que temos
presente. Porém, isso não se faz com uma TAP privatizada, como os senhores fizeram quando estiveram no
Governo, mas sim com o controlo público da empresa.
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — É isso mesmo!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — É isso que nos garante que a sua intervenção vai ao encontro dos nossos
interesses e não ao encontro dos interesses do lucro dos grupos económicos e das multinacionais deste setor.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Vamos, então, para o segundo grupo de pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra para o efeito, pelo Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal, o Sr. Deputado Bernardo Blanco.
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, tenho de começar por dar quatro
notas relativas a quatro mitos que foram enunciados. A primeira é relativamente aos 10 000 trabalhadores. Bem,
3200 milhões de euros para 10 000 trabalhadores… São os empregos mais caros da história. São 320 000 €
por trabalhador.
Bastaria dar metade disso aos trabalhadores, que iam muito bem de férias, à sua vida, por uns quantos anos
e os contribuintes ainda poupavam metade.
O Sr. João Dias (PCP): — Isso é de uma inteligência!…
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — A segunda é quanto à parte estratégica, seja lá o que for isso da empresa
estratégica, porque a TAP já é uma empresa regional, que serve, essencialmente, Lisboa, não serve as ilhas.
Como acontece noutros países, esses serviços a ilhas e a territórios mais afastados podem ser contratualizados
com privados.
A TAP era estratégica quando o Sr. Primeiro-Ministro foi aos Açores pela Ryanair? Ou quando os militares
foram para a Roménia noutra companhia? Ou quando o repatriamento na pandemia não foi feito pela TAP, mas
pela Hi Fly?
Não sei que companhia estratégica é esta. Sempre que ouvimos aquelas bancadas a falarem de empresas
estratégicas, já sabemos que os contribuintes vão sofrer.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Cuidado com o bolso!
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — A terceira nota é quanto à Europa, em que a esmagadora maioria dos países
tem companhias maioritariamente privadas. Isto que fizemos foi um caso único: nacionalizou-se a empresa por
cegueira ideológica.
O último ponto é relativo à intervenção do Sr. Deputado Bruno Nunes, a quem quero dar os parabéns pelo
excelente discurso comunista. A resposta à questão de quando é que a TAP devolve o dinheiro é «não devolve».
O ponto é exatamente esse, para o qual estamos a avisar há mais de dois anos.
A TAP não tem condições para devolver o dinheiro!
Protestos do Deputado do PCP João Dias.
E há um conceito económico chamado «falácia dos custos afundados», segundo o qual não vamos agora
deixar a companhia porque já lá pusemos dinheiro; temos de pôr mais, porque já pusemos antes; e temos de
continuar a pôr mais para salvar o que já pusemos. E não paramos de pôr.
O ponto é esse mesmo, não podemos pôr mais porque aquilo que já pusemos não vai voltar.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Muito bem!
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — Sr. Presidente, queria fazer uma análise histórica muito rápida. Em janeiro
de 2020, antes da pandemia, propusemos a privatização da TAP e toda a gente votou contra exceto o PSD, que
se absteve.
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Em maio de 2020, propusemos, tal como alguns partidos propunham para o Novo Banco, que as verbas
tivessem de ser aprovadas pelo Parlamento, mas PS, PCP, Bloco de Esquerda e PSD votaram contra.
Em novembro, propusemos que o Tribunal de Contas tivesse de fazer uma fiscalização prévia às novas
verbas para a TAP, mas, outra vez, PS, PCP e Bloco votaram contra, com a abstenção do Chega.
Fizemos tudo o que podíamos, em termos de propostas, para evitar o que já era óbvio, que os contribuintes
iam perder milhares de milhões numa empresa de aviões, mas o PCP ganhou — dou-lhe os parabéns, ganhou
esse debate e nós perdemo-lo! — e a TAP foi nacionalizada, 100% da companhia. Espetacular!
O Sr. João Dias (PCP): — Não espere pela demora!
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — Quanto às consequências, há algumas das quais acho que o PCP não gosta.
Os trabalhadores deixaram de ser acionistas, perderam poder — acho que o PCP não gosta! Milhares de
trabalhadores foram despedidos, apesar de lá termos posto este dinheiro todo — acho que o PCP não gosta! A
paz social que havia nos anos anteriores, e todos os sindicatos disseram isto nas audições, acabou — acho que
o PCP também não gosta disso.
Mais importante: 3200 milhões de euros dos contribuintes desapareceram.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Uma família, um casal com um filho, paga 1000 € para salvar uma companhia aérea que não usa. A
esmagadora maioria do País não a usa.
Por isso, pergunto ao PCP: isto não é a exploração dos portugueses pelo grande capital público? A partir de
que valor é que isto será a grande exploração? Tem alguma medida para a TAP que não implique ir novamente
ao bolso dos portugueses? Nós temos, é a privatização da TAP.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para formular um pedido de esclarecimento, pelo Grupo Parlamentar do
Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Paula Santos, queria agradecer-lhe
por trazer este tema a debate, que nos recorda, sempre, como as privatizações são a história de um saque ao
País.
Basta olhar para a Portugal Telecom e para a Cimpor — as duas destruídas, depois da privatização, em
jogos de poder da banca e dos «donos disto tudo» —, mas também para a EDP, para a ANA – Aeroportos de
Portugal, para os CTT, para a Galp, empresas que não melhoraram os seus serviços à população, que não
melhoraram o seu serviço ao País, que põem em causa a soberania e a autonomia estratégica do País em
decisões essenciais e que, além disso, privaram o Estado de uma importante fonte de receita.
Todas estas empresas eram lucrativas quando eram públicas e esses lucros, hoje, são entregues a fundos
internacionais abutre, quando, antes, eram entregues aos «donos disto tudo». Ricardo Salgado bem lucrou com
estas operações.
Nunca é demais lembrar, Sr.ª Deputada, que as regras da concorrência, que supostamente igualam o público
e o privado, são um garrote às empresas públicas, implicando uma desvantagem competitiva das empresas
públicas. Porquê? Porque qualquer empresa privada pode ser capitalizada pelo seu acionista, mas a empresa
pública é proibida de o ser.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Ainda queriam mais?!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É uma deslealdade que joga contra as empresas públicas.
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A TAP não levou 1 cêntimo do Estado em 25 anos. A TAP nunca foi capitalizada. Digam-me os Srs.
Deputados da IL como é que se gere uma empresa que não se pode capitalizar! Essa empresa vai, ou não, ter
de concorrer em condições menos favoráveis, ou até mais desfavoráveis?
Quando é que a TAP foi recapitalizada? Foi recapitalizada durante pandemia, porque o privado não o fez,
com o Governo dizendo que ela era estratégica para o País.
Sr.ª Deputada, o que eu gostaria de lhe perguntar é como é que se explica que o Governo, que fez a
recapitalização, que despediu trabalhadores e cortou salários, dizendo que estava a fazê-lo porque a empresa
era estratégica e porque a queria salvar, agora vai privatizar a empresa.
O Governo limpou a empresa, injetou dinheiro e, agora, vai privatizá-la para ela entregar os lucros futuros a
um privado que, muito provavelmente, a transformará numa pequena companhia regional, porque nenhuma
companhia de bandeira o é sem pertencer ao Estado.
Se integrar uma empresa privada, a TAP será uma companhia regional. Pergunto se é isto que defende os
interesses do País e, até, a argumentação que o Governo deu para recapitalizar a TAP e fazer este conjunto de
operações.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço ao Sr. Deputado Bernardo Blanco
e à Sr.ª Deputada Mariana Mortágua pelas questões que nos dirigiram.
Gostaria de dizer o seguinte: nos 10 anos anteriores à pandemia, os apoios atribuídos à Ryanair foram bem
superiores aos apoios atribuídos à TAP. Relativamente à TAP, houve uma feroz intervenção por parte da
Iniciativa Liberal contra esta empresa — por ela, a TAP poderia ter sido destruída que não haveria problema
nenhum —,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Algum dia ainda haveremos de perceber porquê!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … mas quanto à Ryanair não lhe ouvimos uma única palavra. Aí, os apoios
públicos já não têm nenhum problema.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — São muito amigos!
Protestos do Deputado da IL Bernardo Blanco.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Ainda se está para perceber, de facto, qual a razão deste empenhamento por
parte da Iniciativa Liberal contra a TAP, uma empresa que é fundamental para o nosso País, para o nosso
desenvolvimento, para a nossa economia e, sobretudo, para a nossa soberania.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Eles sabem lá o que é isso!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Para a Iniciativa Liberal, isso pode dizer pouco, mas para os portugueses e
para o País não é uma questão menor, é uma questão de grande importância.
A TAP é de tal forma importante e de tal forma viável que, nos últimos 25 anos — a Sr.ª Deputada Mariana
Mortágua fez referência a isso — não recebeu qualquer apoio por parte do Estado,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): —Nem 1 cêntimo, desde 1997!
Protestos do Deputado da IL Bernardo Blanco.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … o que revela que o quadro da sua atividade é, de facto, viável.
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Aquilo que importa referir, relativamente às opções em cima da mesa — e aproveito para responder a Sr.ª
Deputada —, é que o plano de reestruturação, que foi aceite pelo Partido Socialista e que foi imposto, foi visto
como uma oportunidade para preparar a TAP para a privatização.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É uma evidência!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Essa é que é a questão de fundo. E por isso é que há este conforto e esta
convergência, por parte do PS, com as demais forças políticas.
Este caminho está já a prejudicar a TAP. Veja-se o objetivo de retirar a TAP, já, do aeroporto da Portela e de
fazer com que a sua sede passe para as instalações dos CTT, no Parque das Nações. É que há um conjunto
de apoios para os próprios trabalhadores, nomeadamente o refeitório ou o infantário, que eles vão perder com
esta saída do aeroporto da Portela. Não nos parece que essa seja a solução para assegurar uma resposta
adequada.
Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de dizer que — não é de hoje nem de há 30 anos — o PCP sempre
considerou que a TAP é uma empresa estratégica, e já aqui referimos porquê. Isto exige, naturalmente, uma
opção política de garantia do seu controlo público,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … mas uma opção política que garanta, de facto, que a sua gestão vai ao
encontro e está ao serviço dos interesses do nosso País e do nosso povo, pelo nosso desenvolvimento.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Isto exige, do ponto de vista da opção política, um caminho que garanta, não
só, as condições para a TAP assegurar, no seu exercício, condições para os seus trabalhadores e o reforço da
sua capacidade, mas também, naturalmente, condições para que possa desenvolver a sua atividade.
Há aqui um aspeto muito importante, que é o da construção do novo aeroporto no Campo de Tiro de
Alcochete, porque é isso que vai permitir também o desenvolvimento e o crescimento da TAP,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … um hub que é tão importante para o nosso País, para a nossa afirmação,
para o desenvolvimento da nossa economia, mas também — e não podemos deixar de o dizer — para o reforço
das condições de trabalho e dos direitos dos próprios trabalhadores, porque eles são fundamentais para
assegurar a atividade da TAP.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Passamos, agora, a uma declaração política por parte do Bloco de
Esquerda.
Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estarão certamente lembrados
destas três folhas que a Sr.ª Ministra do Trabalho remeteu ao Parlamento no dia 18 de setembro.
O orador exibiu o documento a que se referiu.
Há menos de um mês, o Governo dizia que aumentar as pensões pela lei, ou seja, à taxa de inflação, poria
em causa a sustentabilidade do sistema de segurança social. Perante as críticas dos pensionistas contra o
«presente envenenado» que lhes era oferecido — a expressão é da presidente da APRe! (Associação de
Reformados, Pensionistas e Idosos) —, isto é, perante uma antecipação, para outubro deste ano, de parte da
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pensão do próximo ano, com a garantia de cortes futuros, a Sr.ª Ministra recorreu a um argumento tremendista:
cumprir a lei de Vieira da Silva faria o sistema perder 13 anos de vida, provocando saldos negativos na segurança
social ainda antes de 2030.
O argumento não batia certo, entre outras coisas, porque era sabido que as receitas têm vindo a aumentar
todos os anos e, até, a um ritmo mais acelerado, neste ano, do que o previsto. Por isso, pedi as contas à Ministra
do Trabalho, aqui, no Parlamento, repetidamente.
Depois de muita insistência, chegou aos Deputados este documento com uma tabela em que a Sr.ª Ministra,
na rúbrica das despesas, pôs mais 1000 milhões de euros, mas esqueceu-se de atualizar as receitas, que já se
sabia que tinham subido.
Não é preciso ser nenhum génio, nem sequer um especialista no tema, para saber que, para aferir os saldos
da segurança social, é preciso considerar despesas e receitas. Isso é que é um saldo.
Este documento, enviado ao Parlamento, foi uma aldrabice, porque, desde julho, por dados do próprio
Governo, sabíamos que havia um crescimento de 12,9% das contribuições da segurança social neste ano. Este
documento foi um insulto à inteligência de todos os Deputados, de todos os grupos parlamentares, sem exceção,
e um desrespeito pela seriedade do debate.
A Sr.ª Ministra quis, sim, omitir o aumento de receitas para manipular os termos do debate público, agitando
o fantasma da insustentabilidade, imitando o método que a direita usou quando quis cortar pensões,
reproduzindo a tese da direita e repetindo a sua coreografia.
A trapaça estava à vista e foi confirmada pelo relatório da proposta de Orçamento do Estado para 2023,
entregue esta semana no Parlamento.
Na página 26 desse relatório, que está disponível online e que vem anexo ao Orçamento, ao contrário de
nos números martelados de há três semanas, a rúbrica das receitas aparece agora com mais 2110 milhões de
euros do que no documento anterior enviado ao Parlamento. Fica demonstrado que, com um aumento de 8%
nas pensões, os saldos seriam positivos, em 2023, em mais de 2 mil milhões de euros.
Na projeção sobre o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social — o instrumento que serve para
compensar saldos negativos, quando existirem, e que, aliás, foi reforçado com novas fontes de financiamento
negociadas à esquerda, em 2018 —, que vem no relatório do Orçamento, fica explícito o seguinte: o Fundo não
só não se extingue nos próximos anos, embora o Governo dissesse que tal poderia acontecer já no início da
primeira metade de 2040, como chegará a 2060 melhor do que está agora.
De acordo com este relatório, a almofada financeira da segurança social terá, em 2060, mais de 34 mil
milhões de euros, mais 8 mil milhões do que tem agora. Nunca esteve em causa, por isso, a sustentabilidade
da segurança social.
O corte estrutural nas pensões, que o Governo decidiu fazer a partir de 2024, não resulta de nenhuma
preocupação com a sustentabilidade do sistema público, que, aliás, se garante com mais emprego, melhores
salários, combate à evasão contributiva, acolhimento de imigrantes e diversificação das fontes de financiamento.
Não! O corte das pensões não tinha nenhuma relação com a sustentabilidade, que está garantida, mas antes
com uma escolha de redução do défice a um ritmo superior ao previsto, à custa do rendimento atual dos
pensionistas, que terão atualizações abaixo da inflação.
Sr.as e Srs. Deputados, o que Sr.ª Ministra disse e que o Primeiro-Ministro repetiu — que atualizar as pensões
pela lei de Vieira da Silva faria perder 13 anos de vida ao sistema — era uma mentira, e, ao utilizá-la, o Governo
sabia que estava a falsear o debate.
Quando o Governo inventou, em desespero de causa e para amparar a sua escolha, o pretexto da
insustentabilidade, tendo cometido a irresponsabilidade de anunciar a falência — sim, a falência! É o que está
no documento que foi enviado em 18 de setembro — do Fundo de Estabilização na década de 2040, já sabia
que não era assim. Mas, por mero oportunismo conjuntural e tático, para tentar neutralizar o coro de críticas dos
reformados e para apresentar o corte real das pensões como inevitável, o Governo não hesitou em usar o falso
fantasma da falência do sistema se a lei Vieira da Silva fosse cumprida.
O Governo não hesitou em fingir que o que nos mandou era um documento do Gabinete de Estudos e
Planeamento, quando é evidente que não é. Não hesitou em contribuir para minar a confiança dos mais jovens
no sistema e para alimentar o apetite dos fundos privados de pensões, que querem entregar, pelo menos
parcialmente, aos mercados financeiros e à sua roleta.
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O que o Governo fez, o que António Costa e Ana Mendes Godinho fizeram, é um gesto imperdoável para
qualquer pessoa, de qualquer partido, que preze o legado do Estado social e se bata pela sua legitimidade social
e popular.
Discutir, melhorar, ampliar, aperfeiçoar o sistema público de pensões, de segurança social, reforçar o seu
financiamento, é sempre um desafio em aberto. Nós temos estado aqui para esse debate, com propostas, mas
o que o Governo fez não foi isso. Porque não foi sério, porque foi irresponsável, porque lançou a suspeição
sobre um pilar fundamental do Estado social, fazendo um favor a quem quer miná-lo e pô-lo em causa, porque
forjou uma fraude para tentar legitimar o corte de 1000 milhões de euros nas pensões.
Os dados públicos do Orçamento, que estão neste documento — vão à página 26, Sr.as e Srs. Deputados —
, confirmam-no, hoje, impiedosamente.
O orador exibiu o relatório da proposta de Orçamento do Estado para 2023.
O Governo deve ao Parlamento um pedido de desculpas por mais este truque e deve aos reformados o
aumento das pensões a nível da inflação, ou seja, o cumprimento da lei.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — A Mesa regista quatro pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado José
Moura Soeiro, cuja intervenção agradecemos, nomeadamente dos Srs. Deputados Rui Rocha, da IL, Joana
Barata Lopes, do PSD, Alfredo Maia, do PCP, e Rita Madeira, do PS.
Como deseja responder a estes pedidos de esclarecimento, Sr. Deputado?
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Dois a dois, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Muito bem.
Sendo assim, para pedir esclarecimentos pelo Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal, tem a palavra o Sr.
Deputado Rui Rocha.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Soeiro, o tema é a sustentabilidade e eu queria
perguntar-lhe se considera sustentável que, de acordo com o mais recente AgeingReport da Comissão
Europeia,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Se é da Comissão Europeia, então é bom!…
O Sr. Rui Rocha (IL): — … quem se reformar em breve tenha uma pensão correspondente a 85% do
rendimento do último mês; quem tem hoje 50 anos vá receber uma pensão correspondente a 55% do rendimento
do mês anterior àquele em que entrar na situação de reforma; quem tem hoje 40 anos vá usufruir, quando passar
à situação de reforma, de 44% do rendimento do último mês; e quem tem hoje 20 anos tenha uma perspetiva
de vir a auferir 41% de pensão de reforma, por comparação ao rendimento do mês anterior àquele em que entrar
na situação de reforma.
Esta informação é do AgeingReport, da Comissão Europeia, e o Sr. Deputado poderá dizer se confia, ou
não, nela. Também há um estudo da SEDES – Associação para o Desenvolvimento Económico e Social que vai
no mesmo sentido, e que é até mais drástico.
As minhas perguntas são: confia nestes dados? Acha que isto é sustentável? Tem outros dados? Tem outra
informação melhor?
É que se estes dados, que são os que conhecemos, são as projeções que existem quanto à sustentabilidade
do sistema de segurança social, pergunto o que é que podemos dizer aos jovens que hoje têm 20 anos e que
vão entrar no mercado de trabalho em breve, aos que têm 30 anos ou aos que 40 e 50 anos, que já não são tão
jovens quanto isso.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — São jovens há mais tempo!…
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O Sr. Rui Rocha (IL): — Isto é, basicamente, uma situação de insustentabilidade.
Portanto, são estas as minhas perguntas, Sr. Deputado.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Pelo Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana
Barata Lopes para pedir esclarecimentos.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Sr. Presidente, agradeço ao Sr. Deputado José Moura Soeiro por ter
trazido este tema, que nos permite falar sobre um assunto que, como é timbre do Partido Socialista, vem
evidenciar a propaganda que o Governo costuma empregar para enganar os portugueses.
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Senão, vejamos o que dizia o Primeiro-Ministro, em junho deste ano:
«Costa antecipa que em 2023 haverá um ‘aumento histórico’ das pensões.» Disse também, no seguimento
disso, que «não há a mínima dúvida de que iremos cumprir a fórmula que existe desde a reforma de 2007. As
leis existem para serem cumpridas».
Ora, acontece que, afinal — e foi em junho deste ano! —, o Governo entende que as leis não existem para
serem cumpridas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Mas, então, o Governo tem de assumir que, quando não cumpre esta
lei, o que está verdadeiramente a fazer é um corte nas pensões que, ao dia de hoje, os pensionistas estão a
receber.
Aplausos do PSD.
Atenção que, nesta coisa da propaganda, em que, como sabemos, o Governo é bom — aliás, já no
Orçamento do Estado para 2011, o Partido Socialista congelava todas as pensões, incluindo as mais baixas, o
que convém não esquecer! —, aquilo que ele diz que vai dar agora como acréscimo aos pensionistas não é um
aumento, é um adiantamento daquilo que, na realidade, os pensionistas já iriam receber. Ou seja, dá agora para
tirar depois.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Portanto, o que se passa é, mais uma vez, o Governo a tentar enganar
os portugueses com uma linguagem que eles não compreendem, a não ser para dizer «nós vamos dar-vos
dinheiro agora e não, não há corte nenhum!»
Sr. Deputado, é ou não verdade que isto é uma tentativa de enganar os portugueses, representando, na
realidade, um corte de 1000 milhões de euros para os pensionistas, a partir de 2024?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para responder a estes dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o
Sr. Deputado José Moura Soeiro.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, que esta medida para as pensões é um
corte de 1000 milhões de euros, creio que não está em discussão. Isso está nas perguntas e respostas
publicadas no site da segurança social. Está lá!
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Há menos 1000 milhões que serão transferidos aos pensionistas, a partir de 2024, e, portanto, trata-se de
um corte que ficará, estruturalmente, no sistema de pensões. É um corte estrutural nas pensões de quem precisa
desse rendimento para viver, e creio que sobre isso não há discussão.
É por isso que esta medida que o Governo começou por apresentar como se fosse um apoio à família, um
apoio aos pensionistas, é uma pura medida de contenção orçamental. É uma engenharia orçamental para, sob
a forma de uma antecipação em outubro, implementar o que, depois, será um corte que se fará sentir, não num
ano, mas perpetuamente, em todas as pensões, até as pessoas morrerem. É isto a proposta do Partido
Socialista.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Grave é que, para isto, o Partido Socialista tenha reeditado os argumentos
da direita, que tenha recorrido às teses da direita e recorrido a uma mentira sobre a insustentabilidade do
sistema, que é desmentida pelo relatório do Orçamento.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem lembrado!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sabemos qual é o modelo dos liberais, designadamente da Iniciativa
Liberal — o PSD, volta e meia, também o vai propondo. É um modelo de capitalização, ou seja, consiste em
entregar uma parte das pensões aos fundos privados.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Em Inglaterra funcionou bem!…
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — E também sabemos qual é a consequência desse modelo. É que as
pensões são jogadas no casino e na roleta russa do sistema financeiro e as pessoas, depois, ficam sem
pensões.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Qual é a consequência do modelo atual?
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Agora, é o que se passa em Inglaterra.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Não, qual é a consequência do Fundo português?
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — O modelo da Iniciativa Liberal é o modelo da Inglaterra, que não garante
as pensões às pessoas.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Por isso, o que devemos dizer aos jovens é que — sim! — se deve lutar
por um sistema público de segurança social. Quem defende a diminuição das taxas de substituição, ou seja,
quem defende que, quando se reforma, uma pessoa tenha um rendimento muito inferior ao rendimento que tinha
quando trabalhava, quem está a produzir a diminuição das taxas de substituição está a fazer um favor aos
fundos de capitalização e aos argumentos da direita.
Devemos dizer aos jovens que o nosso sistema é sustentável, baseado em princípios de solidariedade e de
repartição, que os contratos de trabalho são um mecanismo de proteção das pessoas e do seu futuro, que os
descontos nos protegem na velhice e que, por isso, é preciso lutar pela segurança social e alargá-la, trazendo
os precários, os trabalhadores informais e os trabalhadores migrantes para o sistema público de segurança
social. Devemos dizer-lhes que, pelo contrário, os fundos de pensões são uma roleta que põe em causa o nosso
futuro.
Aplausos do BE.
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O Sr. Presidente (Adão Silva): — Passamos ao segundo grupo de pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado Alfredo Maia.
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Moura Soeiro, agradecemos ao Bloco por
ter trazido este tema — que, de resto, foi recorrente no último mês, não é verdade? —, pois importa continuar a
dilucidar em relação a alguns aspetos fundamentais.
Desde logo, já vimos comprovado o embuste do discurso que o Governo construiu sobre esta matéria, assim
como não temos dúvidas de que a invocação do risco da insustentabilidade não visa resolver nenhum problema
de fundo, mas sim abrir caminho para outras medidas,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exato!
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — … aliás, muito caras ao PS e também à direita, como já foi aqui esboçado.
Também se confirma que esta narrativa do Governo e da direita acerca da suposta insustentabilidade da
segurança social, agitando o fantasma e a ameaça de que pode tornar-se insustentável a breve prazo, por um
lado, tem muito que ver com o garrote orçamental que nos querem impor e, por outro lado, é sempre usada para
responder ao clamor da exigência de aumento real das pensões e reformas.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — Por conseguinte, Sr. Deputado, para lá da demonstração que fez, gostaria de
colocar-lhe algumas questões, que se sintetizam desta forma: concorda com o PCP em que é necessário
construir um conjunto de soluções de fundo, designadamente com o investimento na capacidade produtiva
portuguesa — na agricultura, nas pescas, na indústria —, com a aposta na criação de emprego e com a aposta
decisiva na melhoria dos salários dos trabalhadores, incluindo a regularização dos precários, dos trabalhadores
migrantes?
Estas soluções são, ou não, medidas de robustecimento das receitas normais da segurança social?
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — Por fim, certamente estará de acordo, e por isso também gostaria de saber a
sua opinião sobre se devemos, ou não, apostar na diversificação das fontes de financiamento da segurança
social,…
O Sr. João Dias (PCP): — Isso mesmo!
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — … uma matéria, aliás, em relação à qual o PCP já apresentou propostas, que,
como sabemos, foram chumbadas.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Alfredo Maia (PCP): — Concluí, Sr. Presidente.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Sr. Deputado, espero que não se tenha sentido pressionado pela minha
interpelação.
Tem agora a palavra, para pedir esclarecimentos pelo Grupo Parlamentar do PS, a Sr.ª Deputada Rita Borges
Madeira.
A Sr.ª Rita Borges Madeira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado José Soeiro, ao
contrário do que outros fizeram no passado, na crise, o Governo do Partido Socialista responde sem penalizar
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os pensionistas e sem se aproveitar do momento para impor um modelo de privatização do sistema de
segurança social.
Relativamente aos pensionistas, e sabendo do impacto que o momento que atravessamos tem para os
mesmos, além dos dois aumentos de pensões efetuados já neste ano, o Governo atribuiu um complemento
excecional de 50% do valor da pensão. Isto significa uma despesa total, só em 2022, de mais 20 mil milhões de
euros, um aumento de 32% face a 2015.
Aplausos do PS.
O Partido Socialista, desde 2016, aumentou as pensões todos os anos, fazendo aumentos extraordinários
em seis momentos.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Propostas do PCP!
A Sr.ª Rita Borges Madeira (PS): — Estes aumentos extraordinários garantiram um aumento acumulado de
14% nas pensões médias, face ao aumento de 6% que existiria se apenas fosse aplicada a fórmula, devolvendo
às pessoas os rendimentos que tinham sido cortados pelo Governo do PSD e do CDS.
Mas o Governo do Partido Socialista não fica por aqui e propõe, para 2023, uma atualização histórica — sim,
Sr.ª Deputada do PSD, histórica! — das pensões, com aumentos desde 4,43%.
Sr.as e Srs. Deputados, em julho, foi criada a Comissão para a Diversificação das Fontes de Financiamento
e Sustentabilidade da Segurança Social, coordenada pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), sendo
um dos seus objetivos o de indicar medidas que garantam a sustentabilidade da segurança social e alternativas
às suas fontes de rendimento.
Foi assinado, ainda nesta semana, com os parceiros sociais, o acordo de rendimentos que garante um
aumento de contribuições para a segurança social de 2,2 mil milhões de euros, em linha com o aumento dos
salários.
Vivemos momentos difíceis, momentos incertos e voláteis que convocam qualquer prudência, em que não é
fácil trabalhar cenários macroeconómicos de curto prazo. Por isso, atendendo à evolução do País e às
conclusões do Livro Verde, o Governo compromete-se a avaliar, no final de 2023, o aumento previsto das
pensões para 2024.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Rita Borges Madeira (PS): — Sr. Deputado, diga-me se prefere regredir às políticas dos cortes dos
rendimentos, receita que a direita tem adotado quando está no Governo, ou acompanhar as políticas de
valorização dos mesmos.
Que os portugueses não esqueçam que, para o Partido Socialista, aumentar as pensões foi e será sempre
um compromisso que iremos honrar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Alfredo Maia, de facto, a esquerda à
esquerda do Partido Socialista…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ou seja, a esquerda!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — … tem-se batido pelo reforço do regime público da segurança social.
Quando mudámos o regime de contribuições dos trabalhadores a recibo verde, reforçámos a segurança
social porque trouxemos mais pessoas para o sistema.
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Quando discutimos aqui a ação especial de reconhecimento do contrato de trabalho e criámos um
mecanismo para reconhecer contratos de trabalho, reforçámos a segurança social porque trouxemos mais
pessoas para o sistema.
Quando mudamos a lei relativamente ao trabalho clandestino, para reforçar a responsabilização das cadeias
de contratação e combater o trabalho forçado, nomeadamente na agricultura, reforçamos o sistema porque
estamos a trazer mais gente para a segurança social.
O mesmo quando discutimos a diversificação das fontes de financiamento. O chamado «imposto Mortágua»,
o adicional ao IMI (imposto municipal sobre imóveis), traz, todos os anos, 150 milhões de euros para o Fundo
de Estabilização Financeira da Segurança Social. E o adicional ao IRC, ou seja, a consignação de 2% do IRC
para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, também reforçou esse fundo.
Aliás, no acordo de rendimentos, quando o Governo do Partido Socialista negoceia uma baixa do IRC e
permite a empresas com lucros deduzirem prejuízos antigos para não pagarem IRC, está a retirar dinheiro à
segurança social; tal como faz quando retira a obrigação das contribuições das entidades empregadoras para
os fundos de garantia ou de compensação.
E, sim, Sr. Deputado Alfredo Maia — já o discutimos aqui e estamos de acordo —, também defendemos que
possa haver outras fontes de financiamento, nomeadamente por empresas que têm muitos lucros, mas poucos
trabalhadores, através de uma contribuição sobre o valor acrescentado líquido. O Partido Comunista já
submeteu a debate um projeto nesse sentido e nós também já o defendemos, simplesmente ele foi chumbado
pelo Partido Socialista e pelo PSD.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Deputada do Partido Socialista, quando o Sr. Primeiro-Ministro e a
Sr.ª Ministra do Trabalho disseram que aumentar as pensões pela lei poria em causa o sistema de segurança
social, que faria com que ele perdesse 13 anos de vida e com que o fundo estivesse falido em 2040, disseram
uma mentira. E não foi uma mentira dita apenas ao Bloco de Esquerda, foi uma mentira dita ao País, aos
pensionistas e também aos Deputados do Partido Socialista.
Quando a Sr.ª Ministra enviou aquele documento à Comissão — a Sr.ª Deputada também o recebeu, pois
está na Comissão —, a Sr.ª Deputada não se sentiu insultada na sua inteligência?
O orador exibiu o documento que mencionou.
O que é que diz desta fraude, desta trapaça, deste documento inapresentável?
O Governo do Partido Socialista deve, de facto, um pedido de desculpas ao Parlamento, por ter enviado esta
vergonha, e ao País, por ter mentido sobre este assunto.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — E o Bloco e o PCP também!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Deputada, quando diz que o que estão agora a fazer é um aumento
histórico, sendo que o aumento histórico do Partido Socialista é suspender a lei de Vieira da Silva e cortar para
metade o aumento que resultaria da lei, sinceramente, triste história! Triste história, repito.
A Sr.ª Berta Nunes (PS): — Então, e a antecipação é o quê?
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — É exatamente isto: o Governo suspendeu a lei de Vieira da Silva e vai dar
um aumento que é metade daquele que a lei estipularia, que seria à volta dos 8%, como sabemos.
Portanto, Sr.ª Deputada, esta é uma triste história e o que sugiro ao Partido Socialista e ao Governo do
Partido Socialista é que recuem.
Temos os dados, a segurança social é sustentável, era uma mentira o que disseram e, portanto, recuem e
apliquem a lei, aumentando as pensões pelo valor da inflação. É isso que merecem os pensionistas. Isto é o
mínimo de justiça para não fazer com que os pensionistas empobreçam ainda mais.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Desta forma, damos por encerrado o primeiro ponto da ordem de trabalhos,
que constou de declarações políticas.
Lembro às Sr.as e Srs. Deputados que temos ainda dois pontos na ordem de trabalhos e, portanto, os
trabalhos deverão prolongar-se até por volta das 19 horas e 5 minutos ou 19 horas e 10 minutos.
Vamos dar início ao segundo ponto da ordem do trabalhos, relativo ao debate em torno da Petição
n.º 69/XIV/1.ª (Sara Alexandra Flores Gonçalves) — Pelo encerramento dos shoppings aos domingos, em
conjunto com, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 153/XV/1.ª (PCP) — Regulação dos horários de
funcionamento das unidades de comércio e distribuição e 345/XV/1.ª (BE) — Regula e estabelece limites aos
horários de funcionamento de grandes superfícies comerciais e consagra um regime transitório de redução do
período normal de trabalho.
Tem a palavra para intervir, pelo Grupo Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero deixar uma primeira palavra de
saudação aos peticionários, que trouxeram a debate na Assembleia da República um problema muito sério,
sentido pelos trabalhadores das grandes superfícies, que trabalham nos centros comerciais.
O que identificamos hoje relativamente à questão é que, de facto, há uma desregulação do horário de
trabalho, elevados ritmos de trabalho e dificuldade, por parte destes trabalhadores, em conciliarem a vida
profissional com a vida pessoal. Portanto, a reivindicação aqui trazida, de que os centros comerciais, as grandes
superfícies, encerrem aos domingos, é justa e faz sentido.
Assim, quisemos acompanhar esta petição com um projeto de lei cujo objetivo é o de regular os horários de
funcionamento das unidades de comércio e distribuição.
A nossa proposta assenta em três princípios, desde logo o do direito ao descanso semanal de todos os
trabalhadores. Sim, é justo que todos os trabalhadores tenham um dia de descanso ao fim de semana,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Pelo menos!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … que possam utilizar como bem entenderem, com os seus familiares, em
atividades de lazer. Que seja, pelo menos, um dia para os trabalhadores.
O segundo princípio é o da regulação do horário de abertura dos estabelecimentos comerciais, que é uma
regulação do mercado de bens de consumo.
O terceiro princípio é o de que o ordenamento do comércio exija a regulação dos horários como elemento
fundamental.
O que identificamos é que a liberalização do funcionamento destas unidades comerciais teve impactos
profundos no comércio e serviços, em particular para as micro e pequenas empresas e para a vida dos
trabalhadores destes setores. E verificamos que quem beneficia com estes horários são, somente, os grupos
económicos, que violam as ditas regras da concorrência, pelo que o que se aplica na atividade económica é, de
facto, a lei do mais forte.
Quando trazemos a proposta de regular o horário do comércio é para que haja o encerramento ao domingo,
em regra, um princípio que deve ser aplicado aos horários das unidades de comércio e serviços.
Além da regulação do horário, na nossa proposta trazemos também um procedimento para que esta
regulação passe a ser da responsabilidade de entidades da administração central, para que não sejam os
municípios a tomar estas decisões. Esta alteração à legislação foi um truque para que tudo — estes elevados
ritmos de trabalho, esta desregulação do horário de trabalho, este desrespeito pelos direitos dos trabalhadores
— se mantenha tal qual está.
Noutros países europeus, os centros comerciais e as grandes superfícies estão fechados ao domingo.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Claro!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Segundo consta, pelo menos não temos nenhuma informação em contrário,
do ponto de vista da atividade económica não traz nenhum problema, mas do ponto de vista dos trabalhadores
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traz grandes benefícios, porque permite, pelo menos, um dia fixo ao fim de semana para descanso dos
trabalhadores.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Para o conjunto dos trabalhadores!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Este não é um aspeto de somenos, é um aspeto de grande importância.
Quando falamos da valorização do trabalho e dos trabalhadores, o respeito pelo descanso é também um dos
aspetos fundamentais que devemos proteger.
É com esse objetivo que o PCP traz esta iniciativa a debate, uma iniciativa que permite regular os horários
de funcionamento das grandes superfícies, dos centros comerciais. Mais do que isso, permite reforçar os direitos
destes trabalhadores. Esta reivindicação é justa.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Deixe-me reiterar, Sr. Presidente: é de enorme justiça trazer esta reivindicação
e, com a nossa proposta, está aqui uma oportunidade de irmos ao encontro desta reivindicação. Deixo o desafio,
às demais forças políticas, no sentido da aprovação desta iniciativa, porque podemos dar passos significativos
para a valorização dos direitos destes trabalhadores.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 345/XV/1.ª (BE), tem a palavra o Sr.
Deputado José Moura Soeiro.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria começar por saudar, em
nome do Bloco de Esquerda, as dezenas de milhares de peticionários que se dirigem a este Parlamento em
torno desta causa, e a própria autora da petição, que, emigrada em Lyon, se apercebeu, primeiro com
estranheza, de que os shoppings e os hipermercados estavam encerrados ao domingo, mas que depois foi
vendo a questão de outra forma, identificando e compreendendo as vantagens de uma tal decisão. Aliás, em
vários países e cidades da Europa existe este tipo de regulação de horários.
Em Portugal, até 2010, as grandes superfícies encerravam aos domingos e feriados, entre os meses de
janeiro e outubro, a partir das 13 horas. Depois, desde 2013, houve um movimento de liberalização dos horários
para as grandes superfícies, que passaram a poder estar abertas todos os dias.
Mais de 10 anos depois, o que é que temos? Temos grandes superfícies abertas, em todo o território nacional,
sem limitação de horário, com consequências para o pequeno comércio, naturalmente, mas também para os
trabalhadores do setor, que se veem, assim, privados do direito ao descanso ao domingo, que é um dia diferente
dos outros, porque é o dia em que não existe escola e em que as pessoas com quem convivemos também estão
livres.
Portanto, achamos que é importante regular os horários, também por uma questão de limitação dos horários
de trabalho e de conciliação com a vida pessoal e familiar.
Propomos que, por regra, os estabelecimentos de venda contínua acima de uma determinada área estejam
encerrados ao domingo. Também propomos que possam estar abertos em quatro domingos ou feriados por
ano, bem como salvaguardar situações excecionais, regimes excecionais, em negociação com as autarquias e
as organizações representativas dos trabalhadores.
Protestos de Deputados do PSD.
E porque o fantasma agitado por quem defende a liberalização dos horários é sempre o de dizerem que
regular os horários vai provocar desemprego, propomos um regime transitório em que a adaptação ao novo
regime de regulação de horários implique também a inscrição das 35 horas semanais nos contratos coletivos,
ou seja, uma diminuição do tempo de trabalho e a garantia de que não haverá perda salarial nesse processo.
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Parece-nos uma solução equilibrada, mas estamos, obviamente, abertos a discutir, a melhorar, a aperfeiçoar,
a dialogar com os peticionários e as peticionárias, a dialogar com organizações que representam os
trabalhadores, a dialogar com as CCDR (comissões de coordenação e desenvolvimento regional) e as
autarquias e a encontrar uma solução que seja melhor do que aquela que hoje temos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Vamos passar agora às intervenções dos grupos parlamentares que não
apresentaram iniciativas legislativas.
Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal, o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por cumprimentar os
peticionários que nos trazem este tema, um considerável número de mais de 81 000 portugueses que
subscreveram estas ideia num ato e ferramenta legítimos que a Assembleia da República tem o prazer de
receber.
Num processo democrático, naturalmente, nem sempre podemos e nem sempre devemos concordar, e este
é um desses casos. O Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal não acompanha esta petição, o objetivo da
mesma, nem o proibicionismo das propostas que se lhe associaram, do Bloco de Esquerda e do PCP.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Muito bem!
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Não nos cabe, como legisladores, julgar as opções de cada indivíduo sobre
como passar os seus domingos à tarde nem propor alternativas, mesmo que consideremos, pessoalmente, que
são mais saudáveis.
Também não acompanhamos, obviamente, estas propostas do Bloco de Esquerda e do PCP, que são
proibicionistas, retiram flexibilidade aos consumidores e retiram oportunidades de emprego a muitos
trabalhadores. O Bloco de Esquerda e o PCP, que tanto falam nos trabalhadores, trazem propostas que o que
vão fazer é criar desemprego, e isso é claro.
A pergunta fica: têm estudos com a quantificação do desemprego que vão criar com estas propostas?
Pressupomos que fizeram esse estudo e essas análises.
O Bloco de Esquerda e o PCP estão, mais uma vez, a demonstrar que eles é que são, de facto, os amigos
do grande capital. É assim na saúde, com o que conseguiram pressionar o PS nas últimas legislaturas, fazendo
crescer os seguros privados de saúde, e é também assim quando defendem a segurança social, que agora joga
na Bolsa. O Fundo de Estabilização já joga na Bolsa, na especulação e nessas coisas todas que vocês tanto
criticam! Todos nós somos acionistas da Louis Vuitton, da Coca-Cola, dessas empresas.
Esta é a realidade! Vocês é que são os amigos do grande capital, escusam de continuar a apontar para aqui.
Gostam ambos de falar muito de outros países europeus, mas, felizmente, nesses países europeus há
pequeno comércio e há grandes superfícies. Porque nos países que têm os modelos de sociedade que vocês
defendem, grandes superfícies não há. Ponto! Nem ao domingo, nem a qualquer dia da semana.
Nós respeitamos a liberdade individual, não aceitamos sociedades desenhadas a régua e esquadro e, muito
menos, vamos votar a favor de propostas que retirem possibilidades de escolha aos consumidores, aos
portugueses, seja qual for o dia da semana.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem a palavra, para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar do Chega,
o Sr. Deputado Filipe Melo.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cumprimento, também, a autora desta
petição, a Sr.ª Sara Gonçalves.
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Naturalmente, este é um debate interessante. Pensávamos que os três partidos da extrema-esquerda se
iriam posicionar no mesmo sentido, mas, estranhamente, a Iniciativa Liberal deu um passo atrás e é contra esta
proposta.
Risos de Deputados do CH.
Deixem-me dizer que consideramos muito estranho que os arautos do emprego, dos salários e por aí fora,
venham defender o encerramento destas unidades ao domingo. Bem sabemos que, por parte do Bloco de
Esquerda, o mais importante seria estarem sentados em casa e, de preferência, até, que lhes levassem o salário
à porta, mas isso não é possível. Vivemos num país real e não num país do Bloco de Esquerda!
Portanto, o que dizemos, e somos totalmente contra esta proposta, é que estas unidades dão emprego às
pessoas, fazem a economia avançar. Não vamos cair no ridículo de pedir que os hospitais fechem ao domingo
porque os médicos têm de ter descanso ao fim de semana.
Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Mas será que um centro comercial é o mesmo que um hospital?!
O Sr. Filipe Melo (CH): — Ou que os estádios de futebol fechem, porque os jogadores também têm de ter
descanso ao domingo e não podem jogar, têm de jogar durante a semana. Ou, então, que as esquadras da
polícia fechem, porque os agentes da polícia também têm direito a descansar ao sábado e ao domingo.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Filipe Melo (CH): — Vamos ser sérios e olhar para este debate de forma séria e consciente.
Protestos do PCP e do BE.
Basta olharem para o Esquerda.net e veem quem é que intervém nesta petição: fala-se imensas vezes no
Secretário-Geral da CGTP-IN. Portanto, CGTP-IN, Bloco de Esquerda e PCP, tudo misturado, com um único
propósito, que é baixar, de todo, os salários, é criar mais desemprego, é criar, uma vez mais, o recuo da
economia, com a vossa cegueira ideológica de que as pessoas têm de estar em casa ao fim de semana.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Filipe Melo (CH): — Não podemos esquecer que esta questão dos shoppings tem a ver, também, com
uma questão cultural: as pessoas estão habituadas a poderem fazer as suas compras ao fim de semana, porque,
durante a semana, as pessoas que trabalham, que têm os filhos nas escolas e têm de os ir buscar, têm as suas
vidas.
Protestos do PCP e do BE.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — É que há gente que trabalha!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Nos países onde estão encerrados, como é que fazem?! Não devem ir às
compras!…
O Sr. Filipe Melo (CH): — Mas, Srs. Deputados, presumo que, com este receio de que os shoppings
encerrem ao domingo, toda a bancada socialista já tenha ido às compras.
Aplausos do CH.
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O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PSD, vai usar da palavra
a Sr.ª Deputada Márcia Passos.
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cumprimento, naturalmente, os
peticionários de uma petição que se intitula «Pelo encerramento dos shoppings aos domingos».
Esta petição leva-nos, de facto, a uma reflexão importante e que, à primeira leitura, apenas parece contrapor
o direito ao descanso semanal dos trabalhadores e o interesse individual e coletivo de dispor de espaços
comerciais, acessíveis a todos, em qualquer dia da semana, nomeadamente ao domingo.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Desde que as compras não se sobreponham ao direito ao descanso!…
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Entendem os peticionários que o domingo é, classicamente, aquele dia que
devia ser dedicado à família e que, cito, «com o encerramento das grandes superfícies comerciais ao domingo
as pessoas seriam confrontadas com novos desafios», dispondo de «mais tempo de qualidade, para si e para
os seus».
Não questionamos, Srs. Deputados, o necessário e imprescindível descanso para todos aqueles que
trabalham, e não duvidamos que uma vida saudável se atinge à custa de equilíbrios, nomeadamente à custa do
equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal e familiar.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tem de fazer um workshop no Continente!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Porém, temos muitas dúvidas acerca de um qualquer nexo de causalidade
entre shoppings abertos ao domingo e portugueses infelizes ou menos saudáveis.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vá falar com os trabalhadores para ver o que eles dizem!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Não existem estudos, nem científicos, nem empíricos, que o comprovem.
Entendemos, Srs. Deputados, tal como entendem a ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias), a
Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Confederação de Comércio e Serviços de Portugal, que
cada vez mais assistimos a um crescente dinamismo nas zonas urbanas, com grande predomínio do comércio,
funcionando, também, em sete dias da semana.
Fruto deste dinamismo, temos hoje cidades onde existem mais opções para as famílias, mais oportunidades
de ir ao cinema, visitar espaços, como museus e livrarias, e deter mais opções para comprar bens e aceder a
serviços.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vai-se ao museu, porque o Continente está aberto!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Os shoppings, Srs. Deputados, são apenas mais uma dessas opções e, por
isso, cumpre perguntar: porquê encerrar os shoppings em nome do descanso semanal? E os museus? E os
cinemas?
Se quisermos, em nome de um alegado equilíbrio saudável, como seria, então, com todos aqueles que
trabalham nas forças policiais, nos hospitais, nos aeroportos?
Encerrar os shoppings ao domingo, em nome do descanso semanal, como defende o PCP, no projeto de lei
que nos apresenta, deixa-nos mesmo muitas dúvidas.
O descanso semanal, Srs. Deputados, não está e nunca pode estar em causa…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O descanso semanal é um luxo!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — … para quem trabalha nos shoppings, nas lojas de rua ou em qualquer outra
atividade económica ou serviço público ou privado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Porque só roubam os que lá trabalham!
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A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — O que está em causa, isso, sim, em iniciativas desta natureza, como,
também, acontece com a iniciativa do Bloco de Esquerda, é o potencial desemprego que uma regulação de
horário, feita «às cegas», significaria.
O que está em causa é a privação de crescimento das pequenas e médias empresas, que acabam de sair
de uma crise pandémica, em que foram obrigadas a fechar portas, e que os senhores querem mandar fechar
outra vez, quando enfrentam, agora, uma crise económica e social.
O que está em causa, Srs. Deputados, é não perceber que a última palavra, nesta questão, deve ser dos
municípios e das freguesias,…
O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — … pois são estes que estão mais perto das suas populações, que melhor
conhecem a realidade e que sabem o que faz sentido para quem ali vive e para quem os visita.
Se estes tivessem sido ou se estes vierem a ser, porventura, os princípios desta reflexão, o PSD está e
estará sempre disponível.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, dou
agora a palavra ao Sr. Deputado José Rui Cruz.
O Sr. José Rui Cruz (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Caras e Caros Peticionários:
Apreciamos, hoje, a Petição n.º 69/XIV/1.ª, subscrita por 81 774 peticionários, bem como os Projetos de Lei
n.os 345/XV/1.ª (BE) e 153/XV/1.ª (PCP).
A petição pretende o encerramento, ao domingo, das grandes superfícies comerciais, em Portugal. Esta
pretensão, claramente expressa no texto da petição, tem como principal objetivo suscitar a reflexão sobre se
existe uma real necessidade e benefício para a sociedade, e para os próprios trabalhadores desses
estabelecimentos, decorrente do seu funcionamento sete dias por semana, entre as 10 horas e as 23 horas.
Os peticionários defendem que o encerramento, aos domingos, das grandes superfícies comerciais
promoveria um maior equilíbrio da vida familiar e profissional dos trabalhadores, com impacto na sua saúde e
felicidade e, consequentemente, na sua produtividade. Referem-se, inclusivamente, a estudos que demonstram
essa mesma correlação.
Referem, também, que tal alteração provocaria, necessariamente, uma mudança de hábitos nos
consumidores, nomeadamente na procura de outras formas de entretenimento e de consumo. Os peticionários
veem, nessa alteração de comportamento, um estímulo para o comércio local nos centros urbanos.
Paralelamente, registam que, ao contrário, a maioria dos serviços públicos está encerrada aos fins de semana.
O PCP e o Bloco de Esquerda apresentam, sucessivamente, projetos de lei que acompanham, sob pontos
de vista diversos, a petição agora em discussão.
O PCP defende o aprofundamento da regulação deste setor da economia, como forma de garantir o direito
ao dia de descanso semanal, de forma igual, para todos os trabalhadores, considerando que o aprofundamento
da regulação garante mais igualdade às pequenas e microempresas do setor do comércio, no acesso ao
mercado de consumo.
Por seu lado, o projeto de lei do Bloco de Esquerda defende o encerramento das grandes superfícies aos
domingos e feriados, por forma a garantir o equilíbrio entre a vida familiar e profissional dos trabalhadores. Lê-
se, no projeto de lei, que se propõe «um regime transitório que inclua a diminuição do período normal de trabalho
nestes setores, sem perda de quaisquer direitos ou remuneração». No entanto, o Bloco de Esquerda ressalva
que esses mesmos estabelecimentos possam abrir ao público quatro domingos ou feriados por ano, mediante
a prévia informação às câmaras municipais. Prevê, também, que possam existir regimes especiais, a serem
fixados pelas autarquias locais.
Os representantes patronais do setor defendem a necessidade de avaliar bem os impactos económicos de
uma alteração desta natureza, dada a expressão significativa do setor do comércio na economia e no emprego.
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Já a Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME) defende propostas para
um urbanismo e comércio sustentáveis que, tendencialmente, conduzam à limitação do crescimento do número
de superfícies comerciais e a uma revitalização e qualificação do comércio nos centros urbanos e históricos.
Em 2020, quando esta petição foi apresentada, o Governo foi consultado pela Comissão de Economia acerca
desta matéria.
À data, era convicção do Governo que a proposta tinha um alcance claramente social, nomeadamente quanto
ao reforço das condições de conciliação entre a vida familiar e profissional, e quanto aos benefícios indiretos
para as atividades lúdicas e culturais.
À data, o Governo não acompanhava, tal como nós também não acompanhamos, os argumentos de natureza
económica da petição, já que, em primeiro lugar, do ponto de vista do consumo, as grandes superfícies
comerciais absorvem uma larguíssima maioria dos consumidores.
Em segundo lugar, qualquer alteração aos horários de funcionamento provocaria um ajustamento quase
automático dos operadores económicos, dada a concentração da distribuição nestas superfícies.
Em terceiro lugar, as alterações às rotinas dos consumidores portugueses poderiam ter impactos económicos
sérios para o setor, e estes dados não foram previstos pela proposta em análise.
Tal era verdade em 2020, quando vivíamos uma emergência global, provocada pela pandemia, como
também é verdade hoje, quando vivemos sob o efeito da guerra da Ucrânia, cujos impactos nas atividades
económicas são sentidos diariamente e seriam fortemente agravados com uma medida desta natureza.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — E a poupança energética?!
O Sr. José Rui Cruz (PS): — No momento em que o Governo se prepara para apresentar novas medidas
de apoio às empresas e às famílias, o encerramento ao domingo não parece contribuir para esse esforço coletivo
que nos preparamos para fazer.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — E a poupança energética?!
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Dou agora a palavra, para uma intervenção, à Sr.ª Deputada Inês Sousa
Real, do PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar, na pessoa
da primeira peticionária, os mais de 80 000 peticionários desta petição, pela matéria que nos trazem e pela
reflexão a que nos convocam, desde logo, sobre o direito à desconexão com a vida laboral, mas também ao
lazer e à vida familiar, bem como ao descanso, que são valores absolutamente fundamentais na nossa
sociedade.
Não podemos esquecer que também é importante — num momento em que já se fala e em que se debate
globalmente a semana de trabalho de quatro dias e a equiparação das 35 horas semanais do serviço público
para o serviço privado — debatermos o modelo de funcionamento das várias áreas económicas da nossa
sociedade, sem com isso deixar de fora a necessária harmonização dos direitos dos trabalhadores, a
prossecução económica e, evidentemente, o direito de acesso dos próprios consumidores a estes espaços.
Há uma dimensão que, a este tempo, dificulta este debate, que é a do contexto socioeconómico em que
vivemos, como bem sabemos, assim como os direitos dos trabalhadores.
Não queremos com isto dizer que não haja um debate a fazer e um caminho a ser feito — que, no entender
do PAN, importa ser feito —, até para que possamos também proteger o comércio tradicional, que é uma das
dimensões que tem ficado de fora deste debate.
Estaremos inteiramente disponíveis, nomeadamente em sede do processo de especialidade, para dar os
nossos contributos.
Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Augusto Santos Silva.
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O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Caras e Caros Colegas: Este é um debate importante, porque é um
debate sobre liberdade. Sobre liberdade no concreto e não no abstrato e não só sobre a minha liberdade, mas
sobre a liberdade dos outros.
Aprecio, não o vou negar, a minha liberdade de, se for necessário, fazer compras ao domingo, num centro
comercial. No entanto, essa liberdade não deve ser usufruída à custa da opressão de alguém…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Não é opressão, é trabalho!
O Sr. Rui Tavares (L): — … que não pode ver os filhos ao domingo, porque esse é o dia em que os filhos
estão em casa.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Mete lá um robô!
O Sr. Rui Tavares (L): — Falo da liberdade das pessoas concretas, mais do que da liberdade das entidades
abstratas e coletivas. E é com algum espanto que vejo, aqui, pessoas defenderem que é tabu discutir que essas
entidades coletivas e abstratas, como as empresas, tenham de dar passo à liberdade das pessoas reais e que,
depois, nos apresentem uma versão da geografia política europeia que é deveras estranha. E, aqui, estou a
falar principalmente para os nossos colegas da bancada da Iniciativa Liberal.
Vozes da IL: — Ah!
O Sr. Rui Tavares (L): — Sim, Sr. Deputado Rodrigo Saraiva! Começa a não se perceber porque é que os
países liberais, que são tão elogiados, quando fecham as lojas ao domingo — Alemanha, Suíça, Noruega e por
aí fora — já não são liberais. São economias desenvolvidas, mas passaram a ser atrasadas por fecharem as
lojas aos domingos?!
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Essa é a diferença! Nós não somos uma economia desenvolvida!
O Sr. Rui Tavares (L): — As pessoas são menos ricas? Há menos emprego? Não, não há!
É uma discussão que devemos fazer sem tabus, mas, evidentemente, é uma discussão que também não
deve deixar de ser acompanhada, como foi aqui lembrado, pela bancada do Chega, da discussão da semana
de trabalho dos quatro dias, ou seja, é preciso que as pessoas tenham tempo…
O Sr. Filipe Melo (CH): — Fecham três dias seguidos!
O Sr. Rui Tavares (L): — … para irem fazer compras noutros dias da semana.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Fecha tudo!
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, estou à espera de que os senhores Deputados do Chega
reconheçam que estou a tentar responder a um argumento que fizeram, e que queiram ouvir a resposta, mas,
aparentemente, não gostam de ouvir.
O Sr. Presidente: — Mas, entretanto, tem de concluir.
O Sr. Rui Tavares (L): — Portanto, com a semana de quatro dias de trabalho, queremos que haja mais dias
para o comércio, que haja mais dias para a família e que haja mais produtividade e desenvolvimento económico.
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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro, do BE.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Filipe Melo: Viu dirigentes da CGTP-IN na
petição, mas também poderia ter visto bispos, que também a subscrevem. Há muitas razões diferentes para se
subscrever a petição, não vale a pena descredibilizar os 80 000 peticionários nem caricaturar as suas posições,
mesmo que não concordemos com o que estão a trazer a este Parlamento.
Depois, foram apresentados argumentos absurdos. Disseram: «também querem encerrar os hospitais?
Também querem encerrar as esquadras?»… Mas a nossa vida e a nossa segurança, a soberania estão
dependentes da abertura dos shoppings?!
Aquando da pandemia, nunca se encerraram hospitais, nunca se encerraram esquadras, mas limitou-se o
horário de funcionamento do comércio. Uma coisa não tem nada a ver com a outra, como todos percebemos.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Claro!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Depois, o argumento do proibicionismo da Iniciativa Liberal é um
argumento frágil, não apenas pelos exemplos internacionais, mas porque a Iniciativa Liberal não propôs mudar
a lei, e hoje já existem limites. Ou a Iniciativa Liberal defende que todos os estabelecimentos comerciais
deveriam poder estar abertos toda a noite? É essa a meta da nossa civilização? É ter tudo a funcionar, toda a
noite?
A Sr.ª Deputada do PSD falou dos municípios: sim, consideramos os municípios e a sua participação no
nosso projeto de lei.
Agita-se o fantasma do desemprego: nós prevemos um regime transitório de redução do período normal de
trabalho, para a preservação dos empregos.
Finalmente, penso que neste debate, como noutros, o que precisamos de saber é se queremos que todas as
horas, sem exceção, sejam horas de produção de bens, de circulação de mercadorias e de acumulação de
capital, no momento em que, sim, o capitalismo vai à conquista de todo o tempo possível. Veja-se isso na
laboração contínua, na forma como se coloniza e se mercantiliza o próprio sono! É isto que devemos discutir e
se faz sentido termos regras que pensam noutras lógicas, noutras formas de sociabilidade e noutra forma de
organizar o tempo e a sociedade.
O nosso projeto, que nos parece bastante equilibrado, porque prevê precisamente essa latitude na gestão
da regulação dos horários, pensa nestas outras lógicas e penso que, pelo menos nesse sentido, vai também ao
encontro de uma preocupação legítima que foi colocada pelos peticionários e pelas peticionárias.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Melo, do Chega.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não podia deixar passar em claro a intervenção
do Sr. Deputado do Bloco de Esquerda, quando traz para este debate os bispos, e a quem o Sr. Deputado se
refere é ao Bispo do Porto, o mesmo que teve declarações infelizes, aquando destes casos de pedofilia, e não
vi os senhores insurgirem-se contra isso,…
Protestos do BE.
… porque é um tema que vos agrada, é um tema que vos interessa.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não ouve, não ouve!
O Sr. Filipe Melo (CH): — Tal como não questionaram a posição do Sr. Presidente da República em relação
a esta temática.
Já estamos habituados: o Bloco de Esquerda tem este discurso que nem é para um lado, nem é para o outro,
é para o extremo que mais vos convém. Portanto, não vamos dar palco a isso, simplesmente vejam o que está
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na vossa própria página; nós não tivemos o cuidado de ir ver, caiu-nos nas mãos, porque, sinceramente, não
perdemos tempo a ver a quantidade de asneiras que passam pela vossa página.
Em relação ao Sr. Deputado do Livre, sei que o senhor é obstinado por esta bancada.
O Sr. Rui Tavares (L): — É uma tara, é uma tara!
O Sr. Filipe Melo (CH): — Certamente, terá alguns pesadelos com esta bancada.
Protestos do L.
Sr. Deputado, deixe que lhe diga que a sua ideia, também, tal como a do Bloco de Esquerda, é tirar mais um
dia da semana de trabalho, é fechar ao sábado e ao domingo. Provavelmente, o que o senhor quer é acabar
com o emprego e que o Estado vos vá entregar o salariozinho a casa. Connosco não contem para esses vossos
delírios! O senhor está bem é junto do Bloco de Esquerda e não conte, nem pouco mais ou menos, com o nosso
contributo.
Aplausos do CH.
O Sr. Rui Tavares (L): — Estou melhor ao pé do Bloco de Esquerda do que ao pé dos senhores, isso, com
certeza!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, da IL.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que não vou consumir o tempo que
me resta, queria apenas agradecer ao Sr. Deputado Rui Tavares, que agora está ao telefone, pelas suas
intervenções, sempre muito focadas em nós, quando não está a fazer o respaldo ao Partido Socialista. E, nesta
sua intervenção, falou de vários países, sobretudo nórdicos, e depois disse duas palavrinhas mágicas:
«economias desenvolvidas». Não sei se vive no Portugal em que nós vivemos, mas, infelizmente, não somos
uma economia desenvolvida. Esse é o nosso desejo, essas são as políticas que nós defendemos, para que nos
tornemos numa economia desenvolvida.
Protestos do PS.
O Sr. Rui Tavares (L): — Então, aí, já fecha ao domingo?! Se calhar, quando nos tornarmos uma economia
desenvolvida, já concorda…
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, encerramos, assim, o segundo ponto da ordem de trabalhos.
Passamos ao terceiro ponto, que é o do debate conjunto da Petição n.º 209/XIV/2.ª (Mariana Franco
Fernandes) — Solicitam a atribuição da natureza de crime público à partilha não consentida de conteúdos
sexuais e, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 156/XV/1.ª (CH) — Reforça a proteção das vítimas de
devassa da vida privada por meio de partilha não consentida de conteúdos de cariz sexual, 157/XV/1.ª (PAN)
— Prevê o crime de divulgação não consentida de conteúdo de natureza íntima ou sexual, 208/XV/1.ª (BE) —
Criação do crime de pornografia não consentida (quinquagésima quinta alteração ao Código Penal e
quadragésima quinta alteração ao Código de Processo Penal) e 347/XV/1.ª (PS) — Reforça a proteção das
vítimas de crimes de disseminação não consensual de conteúdos íntimos, alterando o Código Penal e o Decreto-
Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que aprova o Comércio Eletrónico no Mercado Interno e Tratamento de Dados
Pessoais.
Vamos começar pela fase de apresentação dos projetos de lei e, para apresentar o Projeto de Lei
n.º 156/XV/1.ª, do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.
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O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Chega queria começar por saudar os
peticionários que trouxeram este tema a debate e mencionar especificamente duas associações — Corta a
Corrente e Não Partilhes —, pelo trabalho que têm feito nesta matéria.
Todos os meses, cerca de 500 000 pessoas denunciam ao Facebook, só ao Facebook, que são alvo/vítimas
de partilha de conteúdos não consentidos de cariz sexual. Meio milhão de homens, mulheres, por vezes
crianças, denunciam a uma única rede social, todos os meses, o que acontece com esta partilha. Se juntarmos
o agregado de redes sociais que temos e as atuais plataformas, percebemos que, com facilidade, chegamos a
vários milhões de pessoas.
Durante a pandemia, dado o aumento brutal de consumo tecnológico, houve também, associado, um
aumento brutal da partilha destes conteúdos. Estes conteúdos geram sofrimento, geram destruição de vidas, de
famílias e, acima de tudo, a destruição imensa, consecutiva, de personalidade e de vida social.
Os pareceres são claros e os estudos também: estamos perante uma das áreas da vida social capaz e com
enorme potencial para destruir a vida de qualquer um de nós e de qualquer um ou uma que connosco se
relacione.
O projeto que o Chega traz a esta Assembleia assenta na experiência legislativa passada, mas também nos
pareceres que o Conselho Superior da Magistratura, a Ordem dos Advogados e o Ministério Público
apresentaram, devidamente e em tempo, a esta Casa.
Propomos autonomizar o crime de devassa da vida privada neste modelo específico de partilha não
consentida de imagens ou vídeos de cariz sexual. O nosso Código Penal atual não o faz, integra este crime no
âmbito de um outro crime, o de devassa da vida privada, ou, num modelo próprio, no âmbito da violência
doméstica. É um erro sistemático fazê-lo desta forma.
Devemos por isso, olhando para os pareceres que temos, saber adaptar-nos à realidade e às circunstâncias.
Não podemos dizer que partilhar imagens sexuais não consentidas é o mesmo que partilhar a fatura da luz ou
do telefone. Não podemos juntar, no crime de devassa da vida privada, do artigo 192.º, as mesmas coisas,
quando são coisas absolutamente diferentes. Este projeto legislativo vai no sentido de garantir que a partilha
destes conteúdos, que destroem vidas humanas, é autonomizada, pelo seu valor diferenciado do ponto de vista
da culpa, do ponto de vista da ilicitude e, sobretudo, do ponto de vista da danosidade pessoal e social que
provoca.
Por isso, além da autonomização, no artigo 192.º-A, propomos um aumento à pena geral de cinco anos —
aliás, na senda de outro projeto, como o do Partido Socialista —, para que a distinção que temos atualmente
entre o cometimento destes crimes, no âmbito de uma relação e fora de uma relação, deixe de ser tão
diferenciada. Aliás, o parecer do Conselho Superior da Magistratura aponta exatamente no sentido de acabar
com a divergência fundamental e injustificada que há, hoje, no sistema jurídico português, entre a partilha destes
conteúdos no âmbito de uma relação e fora de uma relação. Porquê? Porque, em ambos os casos, o sistema
de confiança pode ser diferente, mas o dano pode ser exatamente igual e, do ponto de vista da danosidade
social, a destruição pode ser brutal.
Aplausos do CH.
A par disto, Sr. Presidente, o Chega propõe também uma alteração ao Decreto-Lei n.º 7/2004, para
acabarmos com este inferno que é o das partilhas não consentidas que o sistema não consegue retirar do
espaço público.
Por isso, propomos uma alteração à nossa legislação, em matéria de proteção de dados, que permita, em
casos destes, que haja um bloqueio de conteúdos efetivo na internet, de conteúdos que destroem a vida das
nossas famílias, muitas vezes a vida das nossas crianças, e põem em causa o equilíbrio do tecido social.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 157/XV/1.ª, do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Inês Sousa Real.
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A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os
peticionários e as associações que se mobilizaram em torno desta petição.
Diariamente, são apresentadas quatro queixas, por divulgação de fotografias de natureza íntima ou sexual,
junto das nossas autoridades. Perante este fenómeno, aquilo a que continuamos a assistir é a perguntas e
comentários às vítimas, como, por exemplo, «porque é que filmaram?», «porque é que deixaram?», «estava-se
mesmo a ver», «tens de te dar ao respeito!», culpando, assim, as vítimas pelas agressões a que foram sujeitas,
ao invés de se responsabilizar o agressor. E fazemos isto demasiadas vezes e em várias dimensões da vida
das mulheres.
Em Espanha, num caso semelhante, uma mulher de 32 anos, mãe de duas crianças, pôs termo à própria
vida, quando chegou ao conhecimento da sua família um vídeo seu de teor sexual, que fora difundido de forma
criminosa entre os colegas de trabalho, por uma pessoa com quem tinha tido uma anterior relação.
Não duvidamos de que este tipo de práticas constitui crime, e um crime que deve ser visto na dimensão
contra a liberdade sexual. A resistência a ser assim considerado parece-nos relativamente simples: a nossa
sociedade ainda continua a olhar de forma anacrónica e misógina para a liberdade sexual da mulher. A
sexualidade feminina continua a ser olhada com voyeurismo e a ser objeto de escárnio, de reprovação e até
fonte de humilhação.
É por isso que hoje, mais uma vez, falamos de violência sexual e de género, e classificamo-la como tal, não
apenas como devassa da vida privada. Pretendemos que se reconheça que esta é uma forma de coação e de
violência que é inaceitável: uma violência que interceta com muitas outras dimensões, como a violência
doméstica e no namoro, podendo ser usada como forma de vingança, em contexto de rutura de relações, de
controlo, de coação, extorsão e disseminação criminosa, e que deve ser atempadamente retirada da internet.
Mais, que se espalha com uma velocidade e com um alcance que só são possíveis numa sociedade digital e
que deve ser rejeitada de forma veemente pela sociedade e pelo legislador.
Sr.as e Srs. Deputados: parece-nos, por isso, que está claro que este tipo de violência vai além do mero crime
de devassa da vida privada e do que a lei prevê, presentemente, para este tipo de práticas e constitui uma
violação da autonomia da liberdade sexual das mulheres, devendo acompanhar as recomendações do GREVIO
(Group of Experts on Action against Violence against Women and Domestic Violence) que vão neste mesmo
sentido, da criminalização destas condutas e da retirada imediata do conteúdo da internet.
Da nossa parte, estamos inteiramente disponíveis para o trabalho na especialidade, em prol da dignidade
que esta matéria merece por parte da Assembleia da República.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 208/XV/1.ª, do BE, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Joana Mortágua.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Saúdo as peticionárias e os peticionários
por terem trazido ao Parlamento o tema da partilha não consentida de conteúdos sexuais.
Para o Bloco de Esquerda, este tema exige um tratamento abrangente, incluindo os fenómenos de captação
e de difusão não consentidos, bem como o reconhecimento do caráter de violência sexual que este crime
comporta.
A pornografia não consentida, com recurso à fotografia e vídeo digitais e à massificação das redes sociais
online, é um fenómeno essencialmente novo na sua natureza e de contornos mais graves do que a compreensão
que antigamente tínhamos dele. Em poucos minutos, milhares de pessoas podem ter acesso a uma gravação
ilícita de relações íntimas de terceiros, a uma fotografia com nudez ou seminudez, a um vídeo de caráter sexual
criado pelo casal. Quando estes materiais são obtidos de forma consentida, numa interação entre adultos, esse
é um assunto da vida privada dessas pessoas; no entanto, a sua divulgação sem consentimento ou a obtenção
de mais materiais, através da ameaça de divulgação, consistem em crimes contra a liberdade sexual. Neste
fenómeno incluem-se as situações de pornografia de vingança, em que tipicamente ex-companheiros divulgam
fotografias ou vídeos de ex-companheiras, como retaliação pelo fim da relação.
O que está em causa não é o ato captado em si, mas a sua captação sem consentimento e a sua divulgação
sem consentimento. E este é um crime com marca de género. Isabel Ventura, investigadora da Universidade do
Minho, sublinha que as consequências serão diferentes para homens e para mulheres. «Há uma dupla moral
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sexual» — diz a investigadora — «A exposição pública da nudez, atos sexuais ou sexualizados provoca um
downgrade na reputação das mulheres e um upgrade na reputação dos homens».
Como explana a petição, as imagens são vistas pelo público geral, incluindo a família da vítima, os seus
amigos, parceiros românticos e colegas de profissão, e as consequências para as vítimas são dramáticas.
É do nosso entender que os crimes atualmente previstos são insuficientes para abarcar esta realidade social.
As características que o crime ganhou com a generalização da socialização online aconselham um tratamento
adequado a este novo tempo. Este é um crime contra a liberdade sexual, que, no nosso entendimento, tem de
estar tipificado enquanto tal.
Nos últimos anos — e é importante reconhecer isto —, a vida sexual, tal como outros aspetos da vida social,
passou a ser vivida também através dos meios online. Captar sem consentimento ou divulgar sem
consentimento imagens ou sons passíveis de serem usados como conteúdo pornográfico é um atentado à
liberdade sexual, porque subtrai essas gravações à livre decisão da pessoa gravada.
O conceito de «pornografia não consentida» aqui utilizado, com as adaptações adequadas por se referir a
adultos, tem uma definição consistente com o conceito de «pornografia» que já está presente no Código Penal.
Se é verdade que o Conselho Superior da Magistratura, em parecer sobre a iniciativa do Bloco de Esquerda, se
revelou preso a uma conceção que, no nosso entender, é mais conservadora sobre o que significa
«pornografia», também é verdade que, para o Ministério Público, segundo o seu parecer, a definição de
«pornografia» utilizada no projeto do Bloco de Esquerda contribui para uma melhor e mais segura subsunção
ao tipo objetivo de ilícito, não merecendo qualquer reparo por parte desta entidade.
Indo das palavras às consequências das iniciativas legislativas, a petição defende que a divulgação destas
gravações deve ser um crime público em qualquer circunstância.
A proposta do Bloco de Esquerda faz uma ponderação sobre situações diferentes. Se na simples gravação
ilícita a vítima poderá defender-se melhor, através da sua própria decisão sobre fazer ou não fazer queixa, o
mesmo não sucede quando as fotografias ou vídeos são amplamente divulgados. Nestas circunstâncias,
estamos em crer que as pessoas que recebem ou encontram estas fotografias ou estes vídeos nem sempre têm
conhecimento de quem é a vítima para a alertar, tornando impossível qualquer ação que trave a divulgação que
não a denúncia possível, de uma forma generalizada, através do crime público.
Este é o caminho que o Bloco de Esquerda considera ser o melhor para reconhecer e proteger as vítimas da
pornografia não consentida. Estamos conscientes de que caminhos diferentes foram apresentados por outros
partidos e estamos disponíveis para debater todos estes projetos na especialidade.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 347/XV/1.ª, do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Cláudia Santos.
A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aumentar penas não é o melhor
remédio para os problemas sociais e, por isso, o projeto de lei que, hoje, apresentamos tem uma natureza
absolutamente excecional, porque propomos que se aumente a pena aplicável ao crime de devassa da vida
privada para pena de prisão até cinco anos.
Todavia, o projeto tem outra dimensão, e é essa que queremos especialmente enfatizar, que é a cessação
imediata da divulgação das imagens. A Petição n.º 209/XIV/2.ª e, sobretudo, a audição dos peticionários, que
saúdo na pessoa da primeira subscritora, Mariana Fernandes, ajudaram-nos a pensar. Aqui fica, por isso, o
registo da nossa gratidão e do nosso respeito.
Não convergimos nas soluções, mas convergimos no diagnóstico. As respostas penais que hoje temos são
insuficientes e dois exemplos podem ajudar-nos a compreender o porquê dessa insuficiência.
O primeiro exemplo imaginário é o de Alice, que é casada com Bernardo, e ambos concordaram em gravar
momentos da sua intimidade sexual. Quando Alice decidiu divorciar-se, Bernardo partilhou as gravações na
internet, com o propósito de a maltratar. E conseguiu. Alice ficou doente, fechou-se em casa, deixou de trabalhar,
procurou apoio psiquiátrico. Neste caso, Bernardo praticou um crime de violência doméstica, que é punível com
pena de prisão até cinco anos.
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Mas olhemos para o segundo exemplo, também imaginário, que é o de Carla, que usou uma aplicação de
encontros e conheceu Daniel. Daniel gravou, sem que Carla soubesse, os momentos íntimos ocorridos durante
a única noite que passaram juntos e depois partilhou essas gravações na universidade onde ambos estudavam
e também as divulgou na internet. Carla abandonou a universidade, mudou de cidade, depois mudou outra vez,
porque as imagens a perseguiam, voltou a mudar, desistiu de encontrar um lugar onde a paz fosse possível e
tentou o suicídio. Neste caso, Daniel praticou um crime de devassa da vida privada, que é punível, hoje, com
pena de prisão até um ano.
Este é o primeiro problema a que o nosso projeto visa responder: se não existir uma relação de conjugalidade
ou de namoro entre quem partilha as imagens e a vítima, não haverá crime de violência doméstica, só haverá
um crime de devassa da vida privada, e o limite máximo de um ano de pena de prisão que, hoje, temos parece-
nos manifestamente insuficiente e, por isso, propomos o seu aumento.
O nosso assunto é a partilha de imagens íntimas sem consentimento. Por isso, o nosso assunto não são os
crimes sexuais, como pretende o projeto do PAN, porque não está em causa a sujeição da vítima à prática de
atos sexuais não desejados; o nosso assunto também não é a pornografia, como pretende o projeto do Bloco
de Esquerda, porque as pessoas retratadas ou filmadas não pretendem a partilha com um círculo mais amplo e
indeterminado de destinatários. O nosso assunto é mesmo a indiscrição e, por isso, achamos que deve ser
tratado no âmbito do crime de devassa da vida privada, que não é um crime público.
Numa série de televisão espanhola, chamada precisamente Intimidade, duas mulheres que não se conhecem
são vítimas deste crime — e só vou referir aspetos do primeiro episódio, para não prejudicar o interesse daqueles
que possam querer ver a série.
Risos.
Uma das vítimas é operária e suicida-se, a outra é Vice-Presidente da Câmara de Bilbao. Em Espanha, este
crime contra a reserva da vida privada também não é um crime público e, por isso, o processo penal depende
de queixa. A certa altura, Malen, a vítima que é política, essa vítima a quem um outro político rival já tinha
perguntado se ela não sentia vergonha, pede ajuda ao pai, um advogado muito conceituado, e questiona: «O
que faço? Devo apresentar queixa? Sei que é a coisa certa, aquilo que é exemplar, mas só quero seguir em
frente e não deixar que isto me destrua a vida.» Sucede, claro, que o escândalo é público e Malen Zubiri é
contactada por uma polícia, a quem diz: «Não quero que investigue o que aconteceu! Não, até eu decidir! Se
decidir! Tenho esse direito.» E a polícia responde-lhe: «Quando quiser, será ouvida sem críticas. Mas lembre-
se, caso se tenha esquecido, de que a senhora é uma vítima.»
Com este projeto de lei, aquilo que queremos é dizer às vítimas destes crimes que as reconhecemos como
tal e queremos assegurar penas mais adequadas à gravidade das condutas dos agressores. Queremos,
sobretudo, que as imagens e as gravações deixem de ser partilhadas e por isso se impõem, aos prestadores
intermediários de serviços em rede, deveres de bloqueio e de comunicação ao Ministério Público.
Nós sabemos bem que o legislador não consegue mudar as perceções sociais através do Diário da
República, mas esperamos contribuir para que mais vítimas possam dizer aquilo que disse Malen Zubiri no
discurso em que anunciou que não ia desistir de nada, e vou citar: «Não sinto vergonha. Deixo isso para quem
tentou usar a minha vida privada para me destruir.»
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome da Iniciativa Liberal, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Patrícia Gilvaz.
A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A divulgação e a disseminação de
conteúdos íntimos sem o consentimento da vítima é um tipo de criminalidade que aproveitou a digitalização e a
massificação das redes sociais para criar um sentimento de impunidade, uma vez que são inúmeras as
plataformas online nas quais se pode divulgar conteúdo de forma anónima e não rastreável, o que dificulta o
combate e a prevenção deste novo crime do século XXI.
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A resposta a este problema não pode fugir à realidade com que se depara quem pretende combater ou adotar
políticas de combate a estes crimes, uma realidade, aliás, na qual se revelam complicadas a identificação dos
autores dos crimes e a interrupção da partilha destes conteúdos.
Este Parlamento, enquanto legislador, pode estabelecer um aumento das penas para o crime de devassa da
vida privada e até pode criar um novo tipo legal de crime, que abarque a complexa questão da propaganda de
pornografia de vingança e da disseminação de conteúdos íntimos online sem consentimento. Contudo, o
combate a esta triste realidade não poderá estar desligado de uma atuação preventiva, utilizando campanhas
de sensibilização e prevenção junto das mais diversas faixas etárias.
Dito isto, conscientemente, e neste caso concreto, não seremos contra um agravar das penas, que são
atualmente reduzidas, quando comparadas com outros tipos legais de crimes e quando sopesadas com os
prolongados efeitos e danos psicológicos e sociais que são causados às vítimas. Restam-nos, no entanto,
algumas dúvidas relativamente aos procedimentos que estão previstos e impostos aos prestadores
intermediários dos serviços. Serão estes eficazes no que diz respeito à retirada dos conteúdos online?
Não podemos ignorar que os danos sofridos pelas vítimas são potenciados pela permanência das fotografias
e dos vídeos na internet.
Como já é nossa característica, com uma postura séria e responsável, a Iniciativa Liberal estará empenhada
e atenta ao debate que se fará sobre este tema.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata,
tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Sofia Matos.
A Sr.ª Sofia Matos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na Califórnia, em 2012, uma miúda de
15 anos suicidou-se depois de terem sido divulgadas, por toda a escola, fotografias de si, nua, e após uma
violação que foi perpetrada pelos seus colegas de escola.
Ann Marie viu espalhadas pelo eBay fotografias suas, nua, que estavam num disco rígido e que mais tarde
foram parar a um site pornográfico, pela mão do seu ex-namorado.
Karla tinha um namorado fotógrafo que, depois de terminar o namoro, espalhou pelo local de trabalho dela e
do atual namorado fotografias suas, nua.
Regina foi drogada e violada pelo seu ex-marido e por outro homem ao mesmo tempo. Os vídeos da violação
foram parar aos diretores da escola onde ela trabalhava e, adivinhe-se, foi despedida por causa disso.
O ex-namorado de Nikki criou um site e, no mesmo, publicou vídeos que eram provenientes de câmaras
ocultas que ele espalhou pelo quarto dela.
Estas histórias parecem-nos muito longínquas, porque nunca fomos vítimas delas, mas podiam ser a história
da Sofia, do Alexandre, da Patrícia ou mesmo do Augusto.
Risos.
Podiam ser as nossas histórias — e não se riam, porque não tem piada —, podiam ser as histórias das
vossas filhas e dos vossos filhos.
Pergunto-vos: se isto nos acontecesse, que impacto é que teria uma coisa destas nas nossas vidas e nas
vidas das nossas famílias? É uma pergunta para ficar nas nossas cabeças.
Por isso, e antes de mais, quero agradecer à Mariana Fernandes, assim como aos 8513 subscritores desta
petição, que nos colocaram hoje a debater um assunto tão pertinente e que, de facto, merece uma atenção
especial do legislador. Digo «atenção especial» e não é por acaso, é porque estes casos já encontram no Código
Penal português tutela e proteção. A disseminação não consentida de conteúdos íntimos é já uma conduta que
está tipificada na lei, desde logo no artigo 192.º do Código Penal, cuja epígrafe nos remete para a devassa da
vida privada.
Mais, também o quis o legislador, ao estabelecer uma componente agravante da pena, quando o facto for
praticado através de meio de comunicação social, internet ou outros meios de difusão generalizada.
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Não obstante, numa sociedade que é cada vez mais digital, em que proliferam as novas tecnologias e em
que a disseminação da informação se dá de forma quase, ou praticamente, instantânea — especialmente
através das redes sociais —, o que não nos parece fazer sentido, desde logo, é colocar no mesmíssimo patamar
de gravidade, até pelo impacto que isto tem na vida das vítimas, a devassa da intimidade da vida familiar e a
devassa da intimidade da vida sexual.
Passo a exemplificar: gravar uma conversa, escutar atrás das portas ou divulgar uma fatura detalhada, da
eletricidade ou do gás, não pode merecer a mesma tutela penal do que, à falsa fé, capturarem-se e divulgarem-
se imagens de um homem ou de uma mulher nua, de um homem ou de uma mulher a praticar sexo. Trata-se
de esbulhar, de roubar e espalhar por desconhecidos aquilo que há de mais íntimo, o nosso «eu», a nossa alma,
o nosso corpo! E mesmo que não seja à falsa fé, e mesmo que esse sexo seja consentido ou essas fotografias
sejam consentidas, a partilha não o é, é sempre intolerável fazê-lo e trata-se de um crime!
Aliás, fiquemos todos bem cientes, cá dentro e lá fora, de que não só comete o crime quem captura, como
também comete o crime quem divulga através das redes sociais ou do WhatsApp.
Aplausos do PSD.
Por tudo isto e porque as vítimas deste crime são, inevitavelmente, vítimas de um crime que é perpétuo —
dificilmente conseguiremos apagar o conteúdo para o resto da vida das vítimas —, porque nos últimos anos
temos assistido a um aumento exponencial da divulgação não consentida destas imagens de carácter sexual,
porque a divulgação destas imagens ou vídeos pode causar danos graves e irreparáveis às vítimas — como,
aliás, já foi aqui dito —, afetando a sua vida pessoal, profissional e social, porque cada vez mais são cada vez
mais jovens aqueles que cometem e aqueles que são vítimas deste crime e porque, no nosso entendimento, as
necessidades de prevenção geral o justificam, o PSD não pode deixar de se associar ao que está no âmago
destes projetos, apresentados por todos os partidos — que aproveito para cumprimentar —, que estão, hoje,
aqui a ser debatidos e em relação aos quais o PSD está disponível para, em sede de processo de especialidade,
discutir e aprovar o aumento da moldura penal deste crime, de forma responsável, proporcional e equilibrada,
nunca perdendo de vista o contexto de um sistema penal que é regido por princípios inalienáveis.
Aplausos do PSD, da IL e da Deputada do BE Joana Mortágua.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do…
A Sr.ª Joana Sá Pereira (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?
O Sr. Presidente: — Pede a palavra para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Joana Sá Pereira (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas inscrevemo-nos para um pedido de
esclarecimento à Sr.ª Deputada Sofia Matos.
O Sr. Presidente: — A Mesa não o compreendeu, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Deputada Sofia Matos tem 38 segundos, mas são negativos, o que significa que o Partido Socialista
pode fazer a pergunta, não pode é obter a resposta.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas a Iniciativa Liberal cede o tempo de que
ainda dispõe à Sr.ª Deputada Sofia Matos, para que possa responder.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Então, para um pedido de esclarecimento à Sr.ª Deputada Sofia Matos, tem a palavra
a Sr.ª Deputada Cláudia Santos.
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A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, temos em debate quatro projetos de
lei; por ordem de entrada, o do Chega, o do PAN, o do Bloco de Esquerda e o do Partido Socialista. E a Sr.ª
Deputada Sofia Matos veio aqui manifestar o profundo empenho do PSD, que não tem iniciativa legislativa, em
propor uma solução relativamente à disseminação não consensual.
Há vários modelos de intervenção legislativa em debate. A minha pergunta é: acham que deve ser um crime
contra a liberdade sexual, como pretendem o Bloco de Esquerda e o PAN, ou um crime contra a reserva da vida
privada? Acham que deve ser um crime público ou, como entendemos nós, um crime semipúblico?
Gostaríamos de ouvir a opinião do PSD sobre estas questões.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, num longo segundo, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sofia Matos.
A Sr.ª Sofia Matos (PSD): — Sr. Presidente, o cumprimento que lhe fiz, com antecedência, contribuirá, com
certeza, para que tenha alguma parcimónia da sua parte.
Em relação à pergunta que me fez o Partido Socialista, que agradeço, relativamente à intervenção legislativa,
de facto, acompanhamos a proposta do Partido Socialista, quando enquadra isto num crime que tem que ver
com a devassa da vida privada e já não nos crimes contra a liberdade sexual. Por isso, em relação a esta
questão, estamos esclarecidos.
Em relação a ser ou não um crime público, atualmente é um crime semipúblico. Neste momento,
concordamos com a forma como o sistema programou este crime e também o Conselho Superior da
Magistratura assim como o direito comparado nos dão razão. Por isso, é assim que lhe posso responder,
manifestando novamente a nossa vontade de contribuir, em sede de processo de especialidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Agora, sim, para uma intervenção, em nome do Partido Comunista Português, tem a
palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria cumprimentar, antes de mais,
os peticionários, por trazerem esta questão a debate.
Por diversos fatores, os casos de disseminação não consensual de conteúdos íntimos têm vindo a aumentar.
E, apesar de estes casos assumirem diversos contornos, o que se tem verificado é que este crime visa atingir
maioritariamente mulheres, muito por conta dos conceitos e preconceitos retrógrados. Assim como se verifica
que, na maioria das vezes, estas imagens ou conteúdos vários são primeiramente divulgados para humilhar um
ex-parceiro ou uma ex-parceira, mas também podem ser usados para ameaçar, assediar e controlar o parceiro
atual ou antigo, sendo que estes comportamentos de ameaça já constituem, por si mesmos, uma forma de
violência sobre o outro, trazendo, só por si, impactos muito negativos.
Sabe-se também que as vítimas acabam silenciadas, porque, além de toda a vergonha associada, de todo
o medo e sofrimento, está ainda o temor da revitimização e culpabilização da vítima e da sua humilhação pela
ação que deu origem à partilha não consentida. Não é preciso enumerar casos, infelizmente, conhecidos pelas
piores razões, porque levaram a desfechos desesperados.
Está em causa a violação de direitos fundamentais, como o direito ao livre desenvolvimento da personalidade
e o direito à integridade pessoal, que incluem a liberdade e a autodeterminação sexual, mas também a reserva
da vida privada. E estão, ainda, em causa outras dimensões da vida, como o direito ao trabalho, muitas vezes
de forma duradoura.
De facto, há um consenso de que são necessárias melhores soluções jurídicas para acautelar estes valores.
Soluções que apontem no sentido de traduzir a censura social que este crime merece no Código Penal, fazendo
corresponder uma realidade social à lei; soluções que visem fazer cessar o dano o quanto antes, que
responsabilizem a disseminação e que tutelem, também, o direito a impedir essa disseminação. A cessação da
disseminação não consensual dos conteúdos íntimos é, de facto, a condição essencial para a reparação dos
danos causados.
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Estas soluções devem ser melhoradas, em matéria de especialidade, nomeadamente a questão de se
autonomizar ou não o crime. Esta questão é suscitada também nos pareceres que chegaram à Assembleia da
República e merece reflexão.
O projeto de lei do Partido Socialista parece-nos uma boa base para partirmos para um trabalho de
especialidade com vista a uma maior proteção da vítima.
Por outro lado, não entendemos que devam ser adotadas soluções que apontem no sentido de tornar este
um crime público. A justiça tem de ser feita, sim, mas não apesar da vontade da vítima; tem de ser feita com a
vítima. A autonomia da vítima é para ser respeitada e a vontade da vítima não pode ser apenas instrumental à
ideia de justiça. É preciso, sim, criar as condições para que cada um jamais deixe de demandar justiça por medo,
vergonha ou descrença na própria justiça.
Mas também não somos favoráveis, por exemplo, a soluções que involuntariamente perpetuem a
responsabilização da vítima, nomeadamente com a denominação adotada para o crime de «pornografia não
consentida».
Tendo isto em mente, trabalharemos, em sede de especialidade, para encontrar uma alteração legislativa
que sirva os nossos objetivos comuns: criar uma sensibilização real para estas questões, uma consciência
diferente em matéria de sexualidade e, sobretudo, melhores condições para a realização de justiça e proteção
da vítima.
Aplausos do PCP e de Deputadas do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do partido Livre, tem a palavra o Sr. Deputado Rui
Tavares.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por agradecer aos
peticionários e às peticionárias e a todos os grupos parlamentares que apresentaram aqui projetos, porque nos
convocam para um debate sobre uma realidade que é crescente, que não é diminuta, que é real, que está
presente na vida — sobretudo com uma dimensão de género — de muitas mulheres e de muitos jovens, hoje
em dia, e que, apesar de ser uma devassa da vida privada, tem também um aspeto de nova forma de controlo
da sexualidade e da autodeterminação, em particular de mulheres e jovens.
Não está nem deve estar em causa a vontade da própria pessoa em fotografar-se ou filmar-se, mas a partilha
não consentida desses conteúdos, a partilha desses conteúdos sem autorização do próprio ou, na maioria dos
casos, da própria.
Nesta discussão é importante determinar de que tipo de crime estamos a falar, mas é também importante
determinar as competências, as atribuições e a capacidade de investigação das instituições da investigação
criminal, porque senão criamos novos crimes, mas não temos capacidade de poder investigar, de poder julgar
e punir.
Depois, é importante, na altura do julgamento, ter a certeza de que os conteúdos são retirados da rede,
preventivamente — que não esperam que o julgamento termine —, e que depois desse julgamento haja um
efetivo direito ao esquecimento, por parte da vítima.
É com base nestes pressupostos que o Livre participará na discussão, em sede de especialidade.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr.
Deputado André Ventura.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Chega reconhece a participação de todos
neste debate que é importante e que vai, certamente, em sede de especialidade, poder trazer-nos pelo menos
uma proposta minimamente consensual, embora tenhamos de reconhecer que algumas das intervenções que
aqui foram feitas — nomeadamente do PSD e da Iniciativa Liberal — não se tenham traduzido em nenhum
projeto de lei trazido a esta Casa, quando se sabia que este trabalho estava a decorrer, que estava a ser feito,
e com a importância pública que lhe foi dada.
Depois, também é preciso dizer o seguinte: a proposta do Partido Socialista não autonomiza este crime,
mantém-no como parte da devassa da vida privada.
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O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente!
O Sr. André Ventura (CH): — Portanto, basicamente, do ponto de vista dogmático, significa que mostrar
uma fatura da eletricidade ou uma fotografia de cariz sexual é a mesma coisa, e isto não faz sentido do ponto
de vista jurídico. Este é um dos problemas: a autonomização. Pode-se concordar ou discordar, mas a não
autonomização deste crime traz problemas sistemáticos sérios, nomeadamente à sua aplicação pelos tribunais.
O segundo problema é o da diferenciação, quando se refere, por exemplo, um caso que acontece no âmbito
de violência doméstica e outro que não. O parecer do Conselho Superior da Magistratura diz o seguinte: «(…)
há que reconhecê-lo, no quadro atual, existe uma enorme assimetria entre a punição prevista para este (…)
comportamento (…) em contexto de violência doméstica, ou fora dele,…» — e sublinho agora para os que
falavam do aumento das penas — «… sendo manifestamente branda a punição…», como foi reconhecido pelo
PS, «… estatuída para estes últimos casos, o que torna, de facto, imperioso o reconhecimento por parte do
legislador da gravidade deste tipo (…)» de crimes.
Portanto, o parecer do Conselho Superior da Magistratura é claro: aponta no sentido de que têm de ser
aumentadas as penas, não esclarece, de facto, sobre o sentido da autonomização, mas dá-nos uma pista. E a
pista que temos aqui é a de que não se trata de um crime de agressões sexuais, trata-se de um crime de devassa
da vida privada.
Dogmaticamente falando, os crimes relacionados, tipologicamente, com os crimes de agressão sexual…
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Não é agressão sexual!
O Sr. André Ventura (CH): — … não têm nada que ver com isto. Desculpem a franqueza e a sinceridade,
mas não têm nada a ver. Podemos misturar tudo, se quisermos, mas não têm nada a ver.
Finalmente, Sr. Presidente — e sei que o meu tempo também já não é muito —, sobre o tema da vontade da
vítima, admitimos que há uma questão que tem de ser discutida, a de saber se o crime deve ser de natureza
pública ou semipública. É uma discussão profunda — vou mesmo terminar, Sr. Presidente — e que parece fazer
sentido. Mas não devemos esquecer-nos disto: temos, no nosso Código de Processo Penal, um instrumento
chamado «suspensão provisória do processo», que pode e deve ser aplicado nestes casos — como, aliás, é
reconhecido noutros projetos de lei —, sem termos necessidade de chorar sobre o facto de ser público ou não
público. A suspensão provisória do processo pode resolver a situação.
Temos aqui uma boa base para partir para a discussão em sede de especialidade.
Sr. Presidente, obrigado pela tolerância.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Assim terminamos o debate deste ponto e, com ele, a ordem do dia.
Dou a palavra à Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha, para nos dar conta de expediente.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas pelo Sr. Presidente, as seguintes iniciativas legislativas: Projeto de Revisão Constitucional
n.º 1/XV/1.ª (CH) e Projeto de Lei n.º 348/XV/1.ª (PS), que baixa à 10.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a nossa próxima reunião plenária será amanhã, às 15 horas.
Em primeiro lugar, iremos proceder a um debate de atualidade, requerido pelo PSD, sobre a privatização da
TAP.
Procederemos, depois, à discussão da Proposta de Lei n.º 24/XV/1.ª (GOV) — Aprova a Lei de Saúde Mental
e altera legislação conexa, conjuntamente com os Projetos de Lei n.os 335/XV/1.ª (L) — Cria um plano de saúde
mental em centros educativos e estabelecimentos prisionais, 339/XV/1.ª (CH) — Cria o Cheque de Saúde
Mental, com o propósito de garantir o acesso em tempo útil a consultas de psiquiatria e a consultas de psicologia
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e 346/XV/1.ª (BE) — Lei de meios para a saúde mental e com o Projeto de Resolução n.º 177/XV/1.ª (PAN) —
Recomenda ao Governo que coloque em ação o Plano Nacional de Saúde Mental.
Por último, apreciaremos, ainda, a Proposta de Lei n.º 36/XV/1.ª (GOV) — Autoriza o Governo a transferir
para os municípios uma subvenção adicional específica do Fundo Social Municipal no ano de 2022.
Muito boa tarde e até amanhã.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 7 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.