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13 DE OUTUBRO DE 2022

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Mas olhemos para o segundo exemplo, também imaginário, que é o de Carla, que usou uma aplicação de

encontros e conheceu Daniel. Daniel gravou, sem que Carla soubesse, os momentos íntimos ocorridos durante

a única noite que passaram juntos e depois partilhou essas gravações na universidade onde ambos estudavam

e também as divulgou na internet. Carla abandonou a universidade, mudou de cidade, depois mudou outra vez,

porque as imagens a perseguiam, voltou a mudar, desistiu de encontrar um lugar onde a paz fosse possível e

tentou o suicídio. Neste caso, Daniel praticou um crime de devassa da vida privada, que é punível, hoje, com

pena de prisão até um ano.

Este é o primeiro problema a que o nosso projeto visa responder: se não existir uma relação de conjugalidade

ou de namoro entre quem partilha as imagens e a vítima, não haverá crime de violência doméstica, só haverá

um crime de devassa da vida privada, e o limite máximo de um ano de pena de prisão que, hoje, temos parece-

nos manifestamente insuficiente e, por isso, propomos o seu aumento.

O nosso assunto é a partilha de imagens íntimas sem consentimento. Por isso, o nosso assunto não são os

crimes sexuais, como pretende o projeto do PAN, porque não está em causa a sujeição da vítima à prática de

atos sexuais não desejados; o nosso assunto também não é a pornografia, como pretende o projeto do Bloco

de Esquerda, porque as pessoas retratadas ou filmadas não pretendem a partilha com um círculo mais amplo e

indeterminado de destinatários. O nosso assunto é mesmo a indiscrição e, por isso, achamos que deve ser

tratado no âmbito do crime de devassa da vida privada, que não é um crime público.

Numa série de televisão espanhola, chamada precisamente Intimidade, duas mulheres que não se conhecem

são vítimas deste crime — e só vou referir aspetos do primeiro episódio, para não prejudicar o interesse daqueles

que possam querer ver a série.

Risos.

Uma das vítimas é operária e suicida-se, a outra é Vice-Presidente da Câmara de Bilbao. Em Espanha, este

crime contra a reserva da vida privada também não é um crime público e, por isso, o processo penal depende

de queixa. A certa altura, Malen, a vítima que é política, essa vítima a quem um outro político rival já tinha

perguntado se ela não sentia vergonha, pede ajuda ao pai, um advogado muito conceituado, e questiona: «O

que faço? Devo apresentar queixa? Sei que é a coisa certa, aquilo que é exemplar, mas só quero seguir em

frente e não deixar que isto me destrua a vida.» Sucede, claro, que o escândalo é público e Malen Zubiri é

contactada por uma polícia, a quem diz: «Não quero que investigue o que aconteceu! Não, até eu decidir! Se

decidir! Tenho esse direito.» E a polícia responde-lhe: «Quando quiser, será ouvida sem críticas. Mas lembre-

se, caso se tenha esquecido, de que a senhora é uma vítima.»

Com este projeto de lei, aquilo que queremos é dizer às vítimas destes crimes que as reconhecemos como

tal e queremos assegurar penas mais adequadas à gravidade das condutas dos agressores. Queremos,

sobretudo, que as imagens e as gravações deixem de ser partilhadas e por isso se impõem, aos prestadores

intermediários de serviços em rede, deveres de bloqueio e de comunicação ao Ministério Público.

Nós sabemos bem que o legislador não consegue mudar as perceções sociais através do Diário da

República, mas esperamos contribuir para que mais vítimas possam dizer aquilo que disse Malen Zubiri no

discurso em que anunciou que não ia desistir de nada, e vou citar: «Não sinto vergonha. Deixo isso para quem

tentou usar a minha vida privada para me destruir.»

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome da Iniciativa Liberal, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Patrícia Gilvaz.

A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A divulgação e a disseminação de

conteúdos íntimos sem o consentimento da vítima é um tipo de criminalidade que aproveitou a digitalização e a

massificação das redes sociais para criar um sentimento de impunidade, uma vez que são inúmeras as

plataformas online nas quais se pode divulgar conteúdo de forma anónima e não rastreável, o que dificulta o

combate e a prevenção deste novo crime do século XXI.

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