I SÉRIE — NÚMERO 86
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O Sr. Presidente: — Vamos, então, passar ao ponto dois da ordem do dia, que consiste no debate
preparatório do Conselho Europeu, com a participação do Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do
artigo 4.º da Lei de acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do
processo de construção da União Europeia.
Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.
O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Eu diria que há dois
pontos fundamentais no Conselho Europeu de amanhã.
Em primeiro lugar, destaco a reunião com o Presidente Zelenskyy, que participará presencialmente no
Conselho Europeu de amanhã, permitindo-nos debater, em conjunto, não só o processo de apoio à Ucrânia,
para continuar a fazer frente à agressão por parte da Rússia, mas também as perspetivas europeias da Ucrânia.
É importante reafirmar que, além de a Ucrânia ter de cumprir os critérios de adesão, é sobretudo a União
Europeia (UE) que tem de se interrogar sobre a necessidade de fazer as reformas institucionais e orçamentais
para que as expetativas que criou não se traduzam numa frustração amanhã. Portanto, para que esses
alargamentos sejam bem-sucedidos, é fundamental que a União Europeia não ignore a necessidade de se
reformar previamente.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O segundo tema tem a ver com a questão da competitividade das empresas
europeias face ao choque energético e também às medidas adotadas pelos Estados Unidos da América em
resposta à inflação.
A posição de Portugal sobre esta matéria assenta em três pontos fundamentais.
Em primeiro lugar, reconhecemos que é imprescindível, no atual contexto, que haja uma agilização dos
mecanismos de ajuda do Estado, desde que seja de uma forma temporária, proporcional e focada nos setores
efetivamente em risco de perda de competitividade.
Em segundo lugar, essas ajudas do Estado devem ter em conta que a maior conquista da União Europeia
foi a criação do seu mercado interno, que é a melhor garantia de competitividade das nossas empresas. Significa
isto que as ajudas do Estado não devem comprometer a integridade do mercado interno e devem evitar a sua
fragmentação.
Ora, ajudas do Estado que dependam da diferenciada capacidade orçamental de cada um dos Estados criam
necessariamente essa fragmentação. Não é por acaso que 77 % das ajudas do Estado concedidas ao abrigo
do regime temporário da covid, e que se têm mantido em vigor, são essencialmente de dois Estados-Membros
da União Europeia, sendo o resto dos outros 25.
Há duas medidas que, por proposta de Portugal, a Comissão Europeia considera, na comunicação que
apresentou, para ajudar a mitigar este efeito fragmentário.
Em primeiro lugar, e, eu diria, mais importante, tratando-se de ajudas do Estado para garantir que não há
uma diminuição da capacidade produtiva na União Europeia, quando um Estado apoia uma empresa que tem
atividade em vários Estados-Membros, ela tem de dar a garantia de que não há diminuição da capacidade
produtiva em nenhum dos Estados-Membros onde tem atividade. Ou seja, por exemplo, se a Alemanha atribuir
uma ajuda do Estado a uma empresa que tem filiais em vários Estados-Membros, essa garantia de não
deslocalização e de manutenção da capacidade produtiva deve ser assegurada para todos os Estados-
Membros.
Em segundo lugar, deve haver uma majoração dos limites às ajudas do Estado quando se formem consórcios
entre países, e em particular entre países de pequena e média dimensão, que, em conjunto, podem ajudar a
equilibrar a diferenciação relativamente a países de maior capacidade orçamental, assim ajudando a estabelecer
cadeias de valor verdadeiramente integradas à escala europeia.
Se as ajudas do Estado são importantes, do mesmo passo, temos de reforçar as condições de financiamento
europeu às empresas europeias. Como disse, de forma muito clara, a Presidente Ursula von der Leyen,
recentemente, no Colégio da Europa, uma política industrial comum exige financiamento europeu comum. Não
poderíamos dizê-lo de forma mais clara, e o mecanismo de agilização das ajudas do Estado tem de ser
complementado com a existência deste financiamento comum.