Página 1
Sexta-feira, 24 de março de 2023 I Série — Número 105
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
REUNIÃOPLENÁRIADE23DEMARÇODE 2023
Presidente: Ex.mo Sr. Augusto Ernesto Santos Silva
Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Palmira Maciel Fernandes da Costa Lina Maria Cardoso Lopes
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 8
minutos. Foram discutidos em conjunto, na generalidade, a
Proposta de Lei n.º 45/XV/1.ª (GOV) — Determina a cessação de vigência de leis publicadas no âmbito da pandemia da doença covid-19 e os Projetos de Lei n.os 240/XV/1.ª (PSD) —
Procede à décima terceira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença da covid-19, 598/XV/1.ª (IL) — Consagra a transmissão e divulgação das sessões e reuniões públicas das autarquias locais, alterando
Página 2
I SÉRIE — NÚMERO 105
2
a Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, 608/XV/1.ª (CH) — Altera a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, revogando o regime processual excecional e transitório justificado pela pandemia, 620/XV/1.ª (L) — Mantém o regime transitório para a emissão de atestado médico de incapacidade multiúso para doentes oncológicos e prorroga a validade dos atestados médicos de incapacidade multiúso das pessoas com deficiência até que se recuperem os atrasos na realização de juntas médicas, 621/XV/1.ª (L) — Contempla a realização de reuniões de órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais através de meios de comunicação à distância e 622/XV/1.ª (L) — Estabelece um mecanismo extraordinário de regularização de dívidas por não pagamento de propinas, taxas e emolumentos nas instituições de ensino superior públicas devido à crise económica e social causada pela inflação. Usaram da palavra, a diverso título, além do Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (André Moz Caldas), os Deputados Inês de Sousa Real (PAN), Paula Santos (PCP), Márcia Passos (PSD), Joana Cordeiro (IL), Pedro dos Santos Frazão (CH), Rui Tavares (L), Pedro Delgado Alves (PS), Pedro Filipe Soares (BE) e João Cotrim Figueiredo (IL).
Procedeu-se à apreciação conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 512/XV/1.ª (PS) — Restaura a Casa do Douro enquanto associação pública e aprova os seus estatutos, 386/XV/1.ª (PCP) — Aprova os Estatutos da Casa do Douro e 612/XV/1.ª (BE) — Restaura a Casa do Douro como associação pública. Intervieram no debate, a diverso título, os Deputados Agostinho Santa (PS), João Dias (PCP), Pedro Filipe Soares (BE), João Moura (PSD), Rui Afonso (CH), Inês de Sousa Real (PAN), Rui Tavares (L), João Cotrim Figueiredo (IL) e Francisco Rocha (PS).
Seguiu-se a discussão conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 228/XV/1.ª (PCP) — Regime de contratação e colocação de psicólogos nos estabelecimentos públicos de ensino (primeira alteração do Decreto-Lei n.º 190/91, de 17 de maio), 623/XV/1.ª (L) — Determina o dever de as instituições de ensino superior disponibilizarem serviços de saúde mental aos estudantes, 627/XV/1.ª (PAN) — Cria
uma rede de serviços de psicologia nas escolas públicas e instituições de ensino superior e uma linha telefónica de apoio no ensino superior, e 629/XV/1.ª (CH) — Altera o Decreto-Lei n.º 190/91, de 17 de maio, procedendo ao reforço da colocação de psicólogos nos estabelecimentos públicos do ensino básico e secundário. Usaram da palavra os Deputados Manuel Loff (PCP), Rui Tavares (L), Inês de Sousa Real (PAN), Rita Matias (CH), Carla Castro (IL), Maria Emília Apolinário (PSD), Catarina Lobo (PS), Isabel Pires (BE) e Dinis Ramos (PSD).
Foi apreciada a Petição n.º 29/XV/1.ª (Comissão de utentes da saúde do concelho de Peniche) — Garantir o acesso aos serviços dos cuidados de saúde primários e dos cuidados hospitalares no concelho de Peniche, juntamente com os Projetos de Resolução n.os 421/XV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que assegure a criação de um SUB – Serviço de Urgência Básica no Centro de Saúde da Marinha Grande, 431/XV/1.ª (CH) — Garantir o acesso aos serviços dos cuidados de saúde primários e dos cuidados hospitalares no concelho de Peniche, 443/XV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que promova as diligências necessárias à melhoria do acesso ao SNS no Oeste, 464/XV/1.ª (BE) — Acesso a cuidados de saúde no concelho de Peniche, 473/XV/1.ª (PCP) — Recomenda ao Governo o reforço de profissionais de saúde nos cuidados de saúde primários no concelho de Peniche e nas valências do hospital de Peniche, 475/XV/1.ª (L) — Recomenda ao Governo que crie um serviço de urgência básica no centro de saúde da Marinha Grande, e 479/XV/1.ª (L) — Recomenda ao Governo que diligencie por melhorias no acesso ao Serviço Nacional de Saúde no Oeste. Proferiram intervenções os Deputados Hugo Patrício Oliveira (PSD), Gabriel Mithá Ribeiro (CH), Sara Velez (PS), Isabel Pires (BE), João Dias (PCP), Rui Tavares (L), Joana Cordeiro (IL) e Inês de Sousa Real (PAN).
Foi anunciada a entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os 676, 681 e 682/XV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 557 a 558, 560 a 562 e 564/XV/1.ª
O Presidente (Adão Silva) encerrou a sessão eram 17 horas e 59 minutos.
Página 3
24 DE MARÇO DE 2023
3
O Sr. Presidente: — Muito boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados.
Estamos em condições de iniciar os nossos trabalhos.
Eram 15 horas e 8 minutos.
Solicito aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as galerias ao público. Muito obrigado.
Não temos expediente para ler, portanto podemos entrar diretamente na ordem do dia, cujo primeiro ponto
consiste na apreciação conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 45/XV/1.ª (GOV) — Determina a
cessação de vigência de leis publicadas no âmbito da pandemia da doença covid-19 e dos Projetos de Lei
n.os 240/XV/1.ª (PSD) — Procede à décima terceira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova
medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-
CoV-2 e da doença da covid-19, 598/XV/1.ª (IL) — Consagra a transmissão e divulgação das sessões e reuniões
públicas das autarquias locais, alterando a Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, 608/XV/1.ª (CH) — Altera a Lei
n.º 1-A/2020, de 19 de março, revogando o regime processual excecional e transitório justificado pela pandemia,
620/XV/1.ª (L) — Mantém o regime transitório para a emissão de atestado médico de incapacidade multiúso
para doentes oncológicos e prorroga a validade dos atestados médicos de incapacidade multiúso das pessoas
com deficiência até que se recuperem os atrasos na realização de juntas médicas, 621/XV/1.ª (L) — Contempla
a realização de reuniões de órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais através de meios de
comunicação à distância e 622/XV/1.ª (L) — Estabelece um mecanismo extraordinário de regularização de
dívidas por não pagamento de propinas, taxas e emolumentos nas instituições de ensino superior públicas
devido à crise económica e social causada pela inflação.
Para apresentar a Proposta de Lei n.º 45/XV/1.ª (GOV), tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da
Presidência do Conselho de Ministros, André Moz Caldas.
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (André Moz Caldas): — Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Proposta de Lei n.º 45/XV/1.ª procede à revogação de diversos diplomas
aprovados durante a pandemia da doença covid-19.
Esta proposta de lei encontra paralelo no projeto Revoga+. Permitam-me tecer algumas considerações
iniciais quanto a esse projeto.
O Revoga+ é uma iniciativa, enquadrada no programa Simplex, que tem vindo a ser desenvolvida desde o
XXI Governo Constitucional, com o grande objetivo de contribuir para a clarificação do nosso ordenamento
jurídico.
Existem diversos diplomas antigos que já se encontram ultrapassados ou obsoletos, mas que nunca foram
expressamente revogados, tendo alguns deles caducado e outros sido tacitamente revogados, sendo que alguns
ainda se mantêm em vigor, sem prejuízo de a sua finalidade já ter desaparecido.
Pretende-se, em síntese, fornecer ao intérprete aplicador, isto é, a todas as cidadãs e a todos os cidadãos,
uma profunda e sólida clarificação do que ainda está e do que já não está em vigor, garantindo, assim, uma
maior e mais sólida segurança e certeza jurídica, quer para os cidadãos, quer para as empresas.
Importa ter presente que, para além destes ganhos de certeza e segurança jurídica, existe ainda um ganho
de competitividade estratégica para o País, pois o Revoga+ permite eliminar alguns entraves burocráticos
previstos em legislação quando a sua finalidade de proteção para o interesse público já tenha desaparecido,
oferecendo, assim, uma redução dos custos de contexto que incidem sobre as empresas.
Procurando cumprir este desiderato, desde o início do projeto Revoga+, foram revogados mais de 4400
diplomas, encontrando-se atualmente em curso a preparação da quarta fase do projeto, que abrangerá o período
de aprovação dos diplomas compreendido entre 1992 e1996.
Considerando que alguns desses diplomas incidem sobre matéria que integra a reserva absoluta ou relativa
de competência da Assembleia da República, o Governo prevê que, quanto a estes, possa aqui entrada de uma
proposta de lei, já no segundo semestre de 2023.
O combate à pandemia da doença covid-19 implicou, como é sabido, a aprovação de um número
necessariamente significativo e intenso de diplomas, em especial de leis da Assembleia da República, decretos-
leis do Governo e resoluções do Conselho de Ministros.
Página 4
I SÉRIE — NÚMERO 105
4
Estes diplomas permitiram ao Estado, num momento de intensa colaboração entre todos os órgãos de
soberania, aprovar medidas com o objetivo de mitigar a pandemia e os seus efeitos sociais e económicos. Estas
medidas destinavam-se a vigorar durante um período delimitado de tempo, em função do desenvolvimento da
situação epidemiológica, mas também dos impactos a nível social e económico.
Ultrapassada a fase mais complexa da pandemia, e tendo sido possível mitigar muitos dos impactos adversos
que a mesma provocou, assim que foi determinado não prorrogar a situação de alerta no território continental,
o Governo deliberou, em Conselho de Ministros, proceder à revogação da quase totalidade do quadro legal
criado para responder à pandemia.
Assim, foram aprovados o Decreto-Lei n.º 66-A/2022, de 30 de setembro, e a Resolução do Conselho de
Ministros n.º 96/2022, de 24 de outubro, bem como a presente proposta de lei.
No essencial, o que presidiu à existência de três diplomas, digamos assim, «Revoga+ covid» foi a forma dos
diplomas a revogar: os decretos-leis foram revogados pelo referido Decreto-Lei n.º 66-A/2022, as resoluções do
Conselho de Ministros foram revogadas pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/2022 e, com a presente
proposta de lei, pretende-se revogar um número substancial de diversas leis aprovadas pela Assembleia da
República no contexto da pandemia. Propõe-se a revogação quer das medidas de combate à pandemia de
âmbito sanitário, quer das medidas de apoio social e económico às famílias e empresas que foram então
determinadas.
Note-se, porém, que o Governo está aberto a aproveitar aquilo que se mostrou ser vantajoso. Com efeito,
tendo a pandemia sido um evento terrível e traumático para todos e para todas, acabou por trazer algumas
soluções que se revelaram ser vantajosas para os cidadãos, para as empresas e para a Administração Pública,
e, como tal, ao invés da sua revogação, tem-se procurado garantir a sua incorporação de forma estável no
ordenamento jurídico.
Cumprindo este objetivo, a proposta não abrange medidas que se entende que ainda devem vigorar ou que
devem ser incorporadas no ordenamento, como a possibilidade de participação por meios telemáticos em
reuniões de órgãos colegiais e de prestação de provas públicas, prevista no artigo 5.º da Lei n.º 1-A/2020, que
o Governo pretende tornar definitiva na planeada reforma da legislação aplicável à concessão de títulos e graus.
Adicionalmente, esta Casa da democracia terá a oportunidade de enriquecer esta proposta em sede de
especialidade, designadamente, e caso assim o entenda, identificando outras normas que possam ser objeto de
revogação ou, pelo contrário, incorporando definitivamente no ordenamento aquelas que constituam uma mais-
valia para os portugueses e as portuguesas.
O Governo está ao dispor para contribuir para esse trabalho.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário de Estado tem dois pedidos de esclarecimento, aos quais responderá
em conjunto.
Para formular o primeiro pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do
PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Muito obrigada, Sr. Presidente, cumprimento as Sr.as e os Srs.
Deputados, bem como os membros do Governo aqui presentes.
Sr. Secretário de Estado, se é certo que grande parte destas medidas já cumpriu a sua função no que diz
respeito aos desafios que a covid-19 nos trouxe — como é o caso, por exemplo, da proteção das pessoas mais
vulneráveis —, há outras que se mantêm em vigor e com cuja manutenção concordamos.
Falo, por exemplo, da emissão dos atestados médicos de incapacidade multiúso para os doentes
oncológicos, tendo em conta os atrasos que ainda são sentidos e as próprias críticas que foram feitas pela
Provedora de Justiça, em que o regime deve ser aplicado até que esta situação esteja ultrapassada. Portanto,
nessa dimensão, concordamos com esta proposta.
No entanto, há outras medidas cujos efeitos se continuam a fazer sentir. Falo da crise habitacional e da
dificuldade que as famílias continuam a sentir, apesar de já não estarmos em pandemia, em pagar a habitação.
Nesse sentido, o PAN deu entrada de uma proposta que visa a criação, mais uma vez, de um regime excecional
para a suspensão da execução da casa de morada de família.
Página 5
24 DE MARÇO DE 2023
5
De facto, tendo em conta todo o contexto da pandemia e da guerra, parece-nos que, apesar do diploma que
hoje é discutido sobre as mudanças que fazem cessar a vigência destas propostas, tal como o Sr. Secretário de
Estado referiu, é importante identificar o que ainda é relevante para a população que mantenha a vigência,
porque continuam a existir pessoas que não conseguem pagar nem a renda da casa, nem as propinas da escola,
nem os bens essenciais.
Pergunto se estão disponíveis para acompanhar e estudar a possibilidade desta mesma medida.
O Sr. Presidente: — O segundo pedido de esclarecimento pertence à Sr.ª Deputada Paula Santos, do Grupo
Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.
Secretário de Estado, gostaria de lhe colocar uma pergunta sobre três aspetos.
Tendo em conta as referências que fez na sua intervenção, quando disse que houve medidas que o Governo
considerou que faria sentido manter e incorporar no ordenamento jurídico, gostaria de lhe perguntar porque é
que há três medidas que propõe revogar, não tendo merecido a mesma consideração por parte do Governo.
Essas três medidas são a gratuitidade da linha SNS 24 — que, durante este período excecional, foi gratuita,
e pergunto porque é que o Governo não considera que assim se deve manter —, a questão do procedimento
simplificado para a emissão de atestados de incapacidade para doentes oncológicos e a questão da proteção
da casa de morada de família.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado André Moz Caldas.
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, Sr.ª Deputada Paula Santos, as características do ordenamento
jurídico covid não têm apenas a ver com o conteúdo das determinações legislativas que quer o Governo quer
esta Assembleia aprovaram, têm também a ver com o modo e a forma como elas foram adotadas, face ao curto
espaço de tempo de amadurecimento das soluções jurídicas, num contexto de forte pressão para toda a
sociedade portuguesa e também para os órgãos de soberania.
Isto significa que alguns regimes jurídicos, mesmo que mereçam uma adoção mais permanente, merecem
também um processo legislativo mais maduro, para corrigir eventuais erros e deficiências das formulações
entretanto adotadas.
A disponibilidade do Governo para, em sede de especialidade, trabalhar nessas soluções é total, o que não
significa que elas se devam manter como normas excecionais e temporárias, no contexto de uma legislação que
está necessariamente ultrapassada, devendo, sim, ter os processos legislativos próprios para a sua adoção, se
for para serem consolidadas no ordenamento jurídico português.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 240/XV/1.ª (PSD), tem a palavra a Sr.ª Deputada
Márcia Passos.
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Analisamos hoje iniciativas legislativas que pretendem revogar as medidas excecionais e temporárias
implementadas durante o período da pandemia covid-19, medidas aprovadas neste Parlamento e motivadas por
um tempo absolutamente excecional, mas que, naturalmente, originaram enormes atrasos nos processos
judiciais.
Mas, se o dia 13 de março de 2020 não pode deixar de ficar na nossa memória e poderia justificar tais
medidas excecionais e tais atrasos, nada, mesmo nada, justifica o atraso, a inércia, a desatenção e a omissão
da Sr.ª Ministra da Justiça relativamente aos assuntos do Ministério que dirige.
Página 6
I SÉRIE — NÚMERO 105
6
Os atrasos nos processos judiciais que foram provocados pela pandemia covid-19 até podemos perceber,
mas o atraso na resolução dos demais problemas do setor da justiça não tem qualquer justificação para um
Governo que governa há sete anos consecutivos e, há mais de um ano, com maioria absoluta.
Refiro-me, por exemplo, aos oficiais de justiça.
Temos congelamento de promoções e um défice de recursos humanos de cerca de 1000 profissionais, a
quem tudo se exige, e uma Ministra que se atrasa em respostas e ainda lhes imputa responsabilidades pelos
atrasos nos processos, como terá dito, há dias, no XII Congresso dos Juízes Portugueses.
Temos atrasos na prometida reforma dos tribunais administrativos e fiscais, cujos processos se prolongam
no tempo, tornando as suas decisões totalmente ineficazes e injustas — uma decisão cuja distância temporal
dos factos é de 10, 20 ou 30 anos é tudo menos justa.
Aplausos do PSD.
Temos atrasos de quase dois anos, Srs. Deputados, na regulamentação da distribuição eletrónica dos
processos.
Temos uma Ministra da Justiça que chega sempre tarde, ou nem chega, como tem acontecido com a falta
de resposta aos inúmeros problemas que se vivem no setor dos registos e notariado, um setor central da justiça
preventiva e da segurança jurídica da vida das pessoas, das empresas e da economia, e onde a Sr.ª Ministra
não ouve, sequer, os apelos e alertas da Sr.ª Provedora de Justiça.
Temos atrasos também na proposta de lei do Governo que hoje discutimos. Uma vez mais, o Governo do
Partido Socialista andou a reboque do PSD. Já foi assim com o plano de emergência social, já foi assim com as
medidas para a habitação e foi assim também com a iniciativa de revogar as normas criadas num período
excecional, que foi o período pandémico.
Do estado de calamidade ao estado de contingência, e deste ao estado de alerta, o Governo foi aliviando as
medidas decretadas, mas as normas relativas ao funcionamento dos tribunais foram esquecidas. O PSD foi o
primeiro a apresentar, em julho de 2022 — quase há um ano —, o projeto de lei que pretende acabar com as
exceções então criadas para: o prazo de apresentação do devedor à insolvência; os atos a realizar nos
processos executivos e em processos de insolvência; os prazos de prescrição e de caducidade.
Enquanto o Governo do Partido Socialista deixava em vigor um regime excecional e transitório totalmente
desajustado e injustificado, o PSD lembrou, com este projeto de lei, a necessidade de revogar tal regime.
Lamentamos que só passados quatro meses é que o Governo tenha apresentado a sua proposta de lei, que
propõe — também, mas não só — a revogação das mesmas normas.
O atraso do Governo provoca o acumular das pendências judiciais, recursos desnecessários e decisões dos
próprios tribunais, que, com a independência que se impõe, não deixam de dizer ao Governo que é necessário
agir.
Sr.as e Srs. Deputados, o PSD lembrou, teve a iniciativa e, com o mesmo empenho, trabalhará, na
especialidade, para que, com urgência, seja reposta a normalidade no funcionamento dos tribunais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 598/XV/1.ª (IL), tem a palavra a Sr.ª Deputada
Joana Cordeiro, do Grupo Parlamentar da IL.
A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Numa época
de limitações, restrições e mesmo desprezo pelos direitos, liberdades e garantias, como foram os anos da
pandemia, temos de reconhecer que existiram honrosas exceções a esta regra.
A transmissão online, gravação e divulgação das sessões e reuniões públicas dos órgãos das autarquias
locais foi uma dessas exceções e trouxe uma mudança muito positiva de paradigma. Os períodos de
confinamento mostraram que a utilização da tecnologia permite que as pessoas comuniquem e trabalhem em
conjunto, independentemente da localização onde se encontrem, e economiza tempo e dinheiro, ao eliminar
necessidades de deslocação.
Página 7
24 DE MARÇO DE 2023
7
Nas autarquias, manter esta boa prática tem assinaláveis ganhos para a democracia local, promove o
escrutínio e a transparência, mas, principalmente, torna a informação mais acessível a todos e permite uma
maior participação dos cidadãos na política local. É que, Srs. Deputados, não basta o poder ser local, o poder
tem de ser próximo das pessoas, e consagrar em lei esta proximidade clarifica interpretações arbitrárias e
impede que a falta de bom senso de alguns se sobreponha ao direito dos cidadãos à informação.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Srs. Deputados, mais democracia, mais transparência e um maior combate à
abstenção, através da maior proximidade aos cidadãos, são os principais objetivos da proposta que trazemos a
este debate, a qual representa um passo em frente na consagração de direitos conquistados e que agora não
podem ser retirados.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 608/XV/1.ª (CH), tem a palavra o Sr. Deputado
Pedro Frazão.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Srs.
Deputados: Há três anos, em março de 2020, quando a DGS (Direção-Geral da Saúde) estava em negação e o
Governo não queria controlar sanitariamente as fronteiras, afinal confirmavam-se dois dos primeiros casos de
covid-19 em Portugal, dois homens que tinham estado no estrangeiro e estavam internados no Porto.
O Sr. Filipe Melo (CH): — É verdade!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Como é típico do Governo PS, a primeira abordagem é sempre a
negação, depois passam à fase compressora. Da negação total passámos diretamente às restrições pelas quais
ninguém esperava passar, com as imposições dos estados de emergência ou de alerta, sucessivamente
renovados, à nossa liberdade a pararem o País e a isolarem as pessoas.
Hoje, três anos depois, tardiamente vemos revogar a legislação no âmbito da pandemia covid-19, através da
cessação de vigência de leis já caducas, anacrónicas ou ultrapassadas pelo evoluir da pandemia. Tardiamente
revogam-se 51 das 57 leis covid. De fora ficou apenas a revogação do uso de máscara em alguns locais de
saúde, o que nos faz perguntar: quantos anos mais serão precisos ainda para caírem estas normas? Quando
devolverão o livre-arbítrio e a liberdade de escolha às populações?
Três anos depois, não faz sentido que, por exemplo, nos tribunais, se continue a limitar o número máximo de
pessoas nas audiências ou a impor a obrigatoriedade da realização de audiências à distância. Também no que
concerne à suspensão de prazos dos processos executivos, tal impede a satisfação dos direitos dos credores
há três anos, direitos legítimos, mas não ressarcidos desde o início de 2020.
Hoje, o ato do Governo tem também um alcance simbólico, que é o de finalmente assinalar o fim de um
período de algum desnorte legislativo, que lançou a geral confusão nos tribunais.
Aqui convocamos à liça, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, o parecer da Ordem dos
Advogados sobre esta proposta de lei do Governo, que utiliza mesmo o termo «caos legislativo» para descrever
o que ocorreu durante o período da pandemia. Aliás, diz mesmo que o «caos legislativo» não fica ainda
completamente sanado, na medida em que é ressalvada da revogação «a produção de efeitos no futuro de
factos ocorridos durante o período de vigência dos respetivos atos legislativos». Significa isto, Srs. Deputados,
Sr. Presidente, que, «no futuro, certamente existirão questões a dirimir sobre o tempo em que se encontrava em
vigor a legislação» que agora é revogada.
O Governo do Partido Socialista é também totalmente responsável pelas medidas às quais o Tribunal
Constitucional impôs o labéu da inconstitucionalidade — sim, medidas inconstitucionais, por serem violadoras
dos direitos, das liberdades e das garantias dos cidadãos portugueses. Sobre isso, o Governo assobia para o
lado, mas cá estamos nós para não deixar esquecer a incompetência e o desejo de totalitarismo sanitário de
quem nos governa.
Página 8
I SÉRIE — NÚMERO 105
8
O Tribunal Constitucional somou 23 declarações de inconstitucionalidade de medidas tomadas durante a
pandemia, precisamente com destaque para as restrições aos direitos, liberdades e garantias. Só no que toca
ao procedimento de validação judicial de quarentena obrigatória ou isolamento profilático, temos cinco acórdãos
que declaram a inconstitucionalidade das respetivas normas.
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Muito bem!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Uma autêntica vergonha nacional! Onde está a liberdade de Abril?
A liberdade ficou engripada com o vírus socialista chinês, um vírus ideológico de muito maior morbilidade…
Aplausos do CH.
… que o temido coronavírus da síndrome respiratória aguda grave 2, SARS-CoV-2 para os amigos.
Por isso, a iniciativa que o Chega traz aqui hoje vem resolver verdadeiras injustiças relacionadas com a
suspensão dos atos de execução da entrega do local arrendado quando o arrendatário esteja em falta. As
situações são tantas e tão dramáticas, que até ouvimos, na televisão, um conhecido advogado relatar a situação
real em que se encontra uma senhora idosa, internada num lar, cuja fonte de rendimento era a renda que recebia
de um único apartamento. O problema é que deixou de receber a renda em 2020. Ora, à mercê do artigo 6.º-E,
segundo o referido advogado, nem recebe a renda nem remove o inquilino dali para poder arrendar novamente,
e assim pagar as suas despesas no lar.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, já é tempo de repor a justiça neste País!
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para apresentar os Projetos de Lei n.os 620, 621 e 622/XV/1.ª (L), tem a palavra o Sr.
Deputado Rui Tavares, do Livre.
O Sr. Rui Tavares (L): — Boa tarde, Sr. Presidente, Caras e Caros Colegas.
Às vezes, é bom começar por reconhecer o óbvio: é uma boa notícia que, três anos depois do início da
pandemia, estejamos aqui a discutir a revogação de algumas medidas que, também reconhecendo o óbvio,
foram necessárias no contexto em que estávamos.
Aplausos de Deputados do PS.
Ainda continuando a reconhecer o óbvio, às vezes, aqueles que têm um enorme problema com o facto de
serem chamados de extrema-direita — ou outra coisa qualquer do género — têm uma enorme facilidade em
chamar totalitarismo a tudo, até às coisas que tivemos de fazer para garantir que alguns dos nossos concidadãos
mais frágeis não morressem.
A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Muito bem! É isso mesmo!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Quer falar de mortalidade? Vamos falar de mortalidade, então!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — E a vacinação? Não fala disso! E as farmacêuticas? Também não fala disso!
O Sr. Rui Tavares (L): — Aprendemos também muita coisa nesses dias de há três anos, que, nessa altura,
parecia que nunca mais iam acabar.
Aprendemos que é possível organizar algumas coisas da nossa vida coletiva de outra forma. Por exemplo, e
daí o Livre trazer uma iniciativa nesse sentido, há organismos da democracia local que funcionam melhor se
estiverem em rede e permitirem reuniões à distância. É mais transparente para os cidadãos e permite mais
participação. Por isso, uma das iniciativas que o Livre aqui traz altera o regime jurídico das autarquias locais
para consagrar a possibilidade de os órgãos reunirem em forma de comunicação digital.
Página 9
24 DE MARÇO DE 2023
9
Mas aprendemos mais: se, durante a pandemia, dissemos que era preciso combatê-la como se fosse uma
guerra, neste momento, em que há uma guerra na Europa e uma situação de inflação que era inesperada, há
dificuldades por que as pessoas estão a passar a que é preciso estar atento. Por isso, o Livre avança com uma
medida que estabelece um mecanismo extraordinário de regularização de dívidas por não pagamento de
propinas, taxas e emolumentos nas instituições de ensino superior públicas.
Em último lugar, há ainda efeitos da pandemia em muitas das coisas que precisamos de fazer todos os dias
para que o nosso Serviço Nacional de Saúde e o nosso regime de trabalho comum funcionem. É necessário
manter um regime transitório para a emissão de atestados médicos de incapacidade multiúso, porque os atrasos
que já havia são maiores ainda. Ora, o Livre considera essencial manter este regime transitório, nomeadamente
para os doentes oncológicos, até que se verifique a recuperação dos atrasos que ainda estamos a viver, por
efeito da pandemia covid-19.
Saudamos, então, este debate e achamos que estas medidas vêm enriquecer as decisões que agora, no
pós-pandemia, finalmente podemos tomar.
O Sr. Presidente: — Apresentadas as iniciativas em debate, passamos à fase das intervenções no debate
propriamente dito, cabendo a primazia à Sr.ª Deputada Paula Santos, do Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, a propósito da iniciativa que o Governo traz a debate, gostaria
de suscitar três questões, até na sequência da pergunta que fizemos ao Secretário de Estado, cuja resposta
procurou encontrar um subterfúgio para, de facto, não ponderar um conjunto de aspetos que é importante que
se mantenham.
Quais são esses três aspetos que gostaria de suscitar, agora de forma mais pormenorizada? É verdade que
as medidas excecionais que foram adotadas no âmbito da covid tiveram um contexto muito concreto. Hoje, a
realidade é diferente no que diz respeito à pandemia.
Mas temos uma realidade social no nosso País que exige, de facto, um olhar para um conjunto de medidas
que são importantes para proteger os arrendatários. Estou a falar, naturalmente, da medida que se prende com
a suspensão do despejo, com a proteção dos arrendatários e com a proteção da casa de morada de família.
As dificuldades com que hoje nos confrontamos, de uma elevada inflação, do aumento especulativo dos
preços e de perda do poder de compra dos salários e das pensões, têm de exigir também, da parte do Governo,
uma intervenção e um olhar, mas não da forma que está aqui a ser colocada, que não dá resposta a esse
problema.
Outra questão prende-se com a emissão dos atestados de incapacidade. O problema não está resolvido, Sr.ª
Ministra e Sr. Secretário de Estado, está longe de estar resolvido. Há doentes que aguardam há um ano, ou há
dois anos, pela marcação de uma junta médica e ainda não têm indicação de uma data.
Isto tem implicações concretas na vida destas pessoas, que perdem acesso a um conjunto de direitos que a
lei prevê. A verdade é que as pessoas acabam por ser penalizadas por algo que não é da sua responsabilidade,
mas sim da responsabilidade do Governo, porque não lhes é assegurado aquilo que está previsto no âmbito da
legislação. E, sim, faz sentido manter o procedimento especial, que, sendo verdade que é dirigido aos doentes
oncológicos, deveria ser até bem mais alargado a outros doentes, considerando a situação que vivemos no
nosso País.
A terceira questão que gostaria de referir prende-se com a gratuitidade da linha SNS 24. Não compreendo
qual é a maturidade, a que o Sr. Secretário de Estado fez referência na sua intervenção, que a gratuitidade da
linha SNS 24 exige.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Ainda mais num contexto em que é sistematicamente recomendado — e não
estamos a colocar em causa essa recomendação, de forma alguma — aos utentes que, antes de se dirigirem a
uma unidade de saúde, telefonem à linha SNS 24 para serem acompanhados e apoiados. Vai-se passar a
cobrar? É isso? Isso significa um custo acrescido para os utentes e para as pessoas em situação de doença.
O Governo vai ou não vai salvaguardar a gratuitidade da linha SNS 24? Esta não é uma questão de somenos,
que creio ser importante que seja assegurada e mantida.
Página 10
I SÉRIE — NÚMERO 105
10
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, do Grupo Parlamentar do
PS.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A iniciativa que hoje temos em
discussão permite-nos, de facto, encerrar parcialmente o capítulo de excecionalidade na criação de legislação
para responder às urgências provocadas pela pandemia.
De facto, muitos de nós ainda se recordarão dessas jornadas parlamentares em que se assegurou o
funcionamento em permanência da instituição Assembleia da República e em momento algum esteve em causa
a possibilidade de se legislar, e de se legislar com caráter de urgência, eliminando, por assim dizer, os prazos
normais do que seria a atividade legislativa, porque a urgência do momento o ditava. Mas em momento algum
esta Câmara deixou de cumprir as suas responsabilidades e de corrigir a mão sempre que necessário.
Efetivamente, a complexidade de muito do que aqui discutimos hoje resulta do facto de ter sido necessário,
sucessivas vezes, afinar, acertar, melhorar, recolher contributos de todos os grupos parlamentares. Em
particular esta Lei n.º 1-A/2020 foi fruto, nas duas ou três vezes que aqui foi objeto de revisão, de um amplo
consenso e de uma construção de soluções em que a experiência e a auscultação do que os profissionais dos
respetivos setores nos diziam tornaram, de facto, um ato legislativo melhor do que o inicialmente proposto e
mais ajustado a essas necessidades.
É este o debate que estamos a fazer, Sr. Deputado Pedro Frazão. Não estamos a discutir jurisprudência do
Tribunal Constitucional sobre matérias que estejam em discussão hoje.
Dos vários processos em relação aos quais houve litigância constitucional, na totalidade, tivemos um número
inferior a 30 que subiram ao Tribunal Constitucional e um número menor ainda em que houve identificação de
uma inconstitucionalidade. E muitos deles foram situações em que houve tomada de decisões, sublinhe-se,
aliás, que nem sequer foi de autoridades da República, em muitos casos apenas foram decisões de direções
gerais ou direções regionais, e em que o que aconteceu foi uma ausência de competência para intervir e para
restringir direitos fundamentais.
Aparentemente há aí uma pulsão negacionista que veio ao de cima, no âmbito deste debate, e que está a
excitar a bancada parlamentar desse lado.
Aplausos do PS.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Vocês é que são negacionistas!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Mas o que aqui discutimos passou o crivo da constitucionalidade em
vários momentos, apesar da sua excecionalidade, apesar da urgência, apesar da necessidade de revisitação e
é isso que, em primeiro lugar, queríamos assinalar.
Em segundo lugar, obviamente, olhando para o conjunto de matérias que aqui temos, há que proceder-se a
uma triagem. Muita da legislação extraordinária foi sendo objeto de derrogação — as aprovadas por decretos-
leis e algumas, também, que constavam de atos legislativos da competência desta Câmara — e outras, até, já
passaram, de alguma maneira, a ser definitivas.
Já lá irei, mais detalhadamente, quanto à transmissão online de reuniões dos órgãos das autarquias locais,
mas a possibilidade de realizar reuniões à distância foi incorporada, como regra geral, na revisão do Código do
Procedimento Administrativo e, portanto, foi um ensinamento da pandemia que foi já introduzido para o
funcionamento da ordem jurídica.
Aplausos do PS.
Reporto-me não à sua transmissão, mas à possibilidade de realização à distância de reuniões, quando algum
dos membros não pode estar presente.
Página 11
24 DE MARÇO DE 2023
11
Protestos do Deputado do CH Pedro dos Santos Frazão.
Sr. Deputado, não se preocupe, acompanharemos a iniciativa porque ela é valiosa e é outro daqueles aspetos
que nos parece passar pela triagem daquilo que deve ficar. Mas, além dessa triagem, definitivamente, para o
futuro, ainda encontramos — e isso já foi referido ao longo do debate — algumas matérias que, transitoriamente,
devem manter-se em vigor. Uma das quais já foi referida, e há toda a nossa disponibilidade para fazer, como o
Sr. Secretário de Estado dava nota, o debate na especialidade da matéria relativa aos atestados médicos
multiusos.
Efetivamente, até que se tenha completado o processo legislativo que os substitua em definitivo, é importante
que se mantenha uma ponte entre regimes e a maneira de acautelar a situação destas pessoas é,
transitoriamente, continuar a ter este regime em vigor e isso, no debate em sede de especialidade, também será
muito fácil de alcançar.
Como dizia há instantes, a matéria da transmissão online das assembleias ou das reuniões das câmaras
municipais é, de facto, complexa, mas em relação à qual estamos, diria, quase por unanimidade, de acordo
quanto ao princípio, ou seja, é um mecanismo adicional de democracia, é um mecanismo adicional de acesso
dos cidadãos à informação. O que nos parece é que temos de melhorar algumas das redações porque há vários
temas que estão misturados debaixo do mesmo chapéu.
Uma questão é saber se uma reunião pode realizar-se remotamente, quando há uma necessidade, ou se um
membro pode intervir remotamente quando, por alguma razão, esteja impedido de o fazer presencialmente.
Esse é um tema e acho que a resposta será tendencialmente positiva.
Depois, temos de saber se deve haver obrigatoriedade de transmissão, algo que muitas autarquias fazem,
voluntariamente, mas que, de facto, não deve passar a ser obrigatório. Hoje em dia, acho que todos o
reconhecemos, é muito difícil encontrar circunstâncias em que é impossível reunir os meios técnicos, pelo menos
no município, para poder fazê-lo.
Podemos discutir se, de facto, todas as freguesias estarão em condições de o fazer, mas, quanto aos
municípios, há um consenso bastante alargado de que tecnologicamente é muito fácil, através de uma rede
social e de uma câmara montada na sala das sessões, fazer essa transmissão.
No entanto, o que temos de verificar é se isso significa que também tem de se guardar no site a gravação
por tempo indefinido, uma vez que ela já foi transmitida. Estas duas temáticas não são necessariamente ambas
merecedoras da mesma conclusão, mas isso é um pormenor para tratarmos na especialidade.
Quer a proposta da Iniciativa Liberal, quer a do Livre merecem, dessa perspetiva, acolhimento e a construção
de uma solução equilibrada que melhore, efetivamente, o escrutínio, a transparência e a proximidade dos
cidadãos que, muitas vezes, não se podem deslocar para intervir e que, assim, podem encontrar um mecanismo
adicional para cumprir esse mesmo objetivo.
Finalmente, uma última nota só mesmo para concluir, Sr.ª Deputada Márcia Passos, o PSD, hoje, achou que
teve um brinde de uma declaração política sobre justiça. Foi o que a Sr.ª Deputada esteve a fazer. Não se
reportou, efetivamente, àquilo que está em cima da mesa e à discussão desta temática.
A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — É verdade!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — E, já agora, não lhe fiz a pergunta há pouco, mas deixo no ar a
interrogação, ainda que possa não ter resposta: o PSD já entregou uma iniciativa sobre esta matéria há muito
tempo, mas nada impediu o PSD de agendar esta discussão. Quem a agendou foi o Governo, quem trouxe a
debate este tema, de forma completa e sobre todas as matérias, foi o Governo da República e o PSD arrastou
a sua iniciativa.
Aplausos do PS.
Portanto, não acho que seja fundamental estarmos a ver quem é que cruzou a meta primeiro, mas, de facto,
quem começou a correr primeiro, neste caso, agendando este tema, foi o Governo.
Aplausos do PS.
Página 12
I SÉRIE — NÚMERO 105
12
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs.
Deputados: A pandemia de covid-19 já passou, felizmente, e não deixa saudades, mas há mudanças na nossa
organização, nas nossas formas de trabalho que não podemos desvalorizar.
Algumas vieram para ficar, como o trabalho à distância que é uma modalidade muito mais recorrente do que
era no passado. A abertura dos serviços públicos para contactos à distância está melhor hoje do que estava no
passado — e ainda bem, porque deslocar-se presencialmente a um serviço público é, muitas vezes, um enorme
sacrifício para cidadãos, não só pela distância, mas por dificuldades de acesso à Administração Pública.
No entanto, há questões concretas que convém parcelarmente identificarmos para garantir que, nestas
mudanças, as coisas positivas que aconteceram não são também levadas e deitadas fora.
Primeiro, o acesso das pessoas, de forma mais livre, desprendida, a órgãos municipais, a órgãos nacionais,
à Administração Pública deve ser mantido ou não deve ser mantido? A nossa resposta é que deve ser mantido.
As reuniões não presenciais de órgãos da Administração Pública devem ser permitidas ou não devem ser
permitidas? Deve ser permitido, mas não deve ser a regra. Esta é a nossa posição, porque nada substitui o
contacto presencial, mas também, na verdade, nada obriga a que esse seja um dogma em cima da mesa, como
a alternativa parece querer colocar.
Do nosso ponto de vista, essas melhorias são positivas, devem ficar.
As excecionalidades que foram criadas por falta de resposta dos serviços públicos para garantir os direitos
que as pessoas tinham e deveriam manter — o caso dos atestados multiusos — não estão ainda corrigidas.
Já antes foram dados exemplos de que o Estado continua a tardar a dar resposta aos atestados multiusos.
A sua renovação e os atrasos vão na escala de anos e é o direito das pessoas que pode ficar em causa. Deve
ser criado um regime excecional para dar mais tempo para o Estado continuar a servir as pessoas e para não
afastar as pessoas dos seus direitos? Deve. E, desse ponto de vista, a abertura para discussão em sede de
especialidade faz sentido e participaremos nesse debate também.
Uma questão que deveria ficar respondida neste debate prende-se com a gratuitidade da linha SNS 24. Isto
porque o que mudou não foi só o acesso à linha SNS 24 para as dúvidas gerais de saúde, foi o Estado
considerar, e bem, que essa linha é uma primeira triagem para todos os casos de saúde — não só para a covid-
19, não só para uma patologia específica, mas para todas.
Ora, tendo nós acabado com as taxas moderadoras, não faz sentido agora criar uma taxa moderadora
indireta. A pergunta é: o que é que o Governo vai fazer sobre isso? É positivo existir a linha SNS 24! É positivo,
desde que ela responda às pessoas, porque é um primeiro acesso, simples, para alguma resposta no âmbito da
saúde. É positivo porque desonera outras instituições, em particular as urgências hospitalares, mas não só,
também os centros de saúde.
Se o Governo e o Ministro da Saúde dizem que querem promover as consultas de telemedicina e a medicina
à distância, etc., e se, por um lado, promovem o relacionamento à distância, mas, por outro, criam dificuldades
onde elas não existem neste momento, a pergunta é se isso faz sentido.
Espero que o Sr. Secretário de Estado nos possa dizer, serenando os ânimos, que, de facto, uma coisa que
é positiva não vai ser atirada com a água do banho, no final deste debate.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo, pela Iniciativa Liberal.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado,
eu pedi para voltar a trazer ao Hemiciclo o «minuto liberal», porque hoje é um dia feliz. É um dia feliz para a
Iniciativa Liberal, é um dia feliz, espero, para todos os Srs. Deputados, para quem nos está a ver e ouvir em
casa, porque acabaram simbolicamente as restrições às nossas liberdades, decretadas aquando da pandemia.
Aplausos da IL.
Página 13
24 DE MARÇO DE 2023
13
É simbólico, eu sei, nem todas foram revogadas, mas é um dia feliz, também, porque se revogam 51 leis.
Para quem, como nós, acha que há leis a mais, intervenção do Estado a mais, é um pequeno princípio. O
programa Revogar Mais, Sr. Secretário de Estado, para nós, deveria chamar-se «Revogar Ainda Mais», porque
se só revogaram 4000 diplomas, deve haver uns 40 000 para revogar.
E as leis que são revogadas, muitas delas, representavam, de facto, restrições às liberdades das entidades
económicas, nas escolas, na utilização de máscaras — que ainda não acabou de vez —, mas também à
liberdade económica e às relações livres nos mercados, sejam eles os mercados de crédito, de arrendamento,
nas moratórias várias que ainda persistiam e nos processos orçamentais e limites de endividamento das
autarquias.
Portanto, este é um dia tardio, mas feliz, de fim destas restrições.
Mas eu pedi este minutinho para alertar para outra coisa: é que as restrições que, hoje, estas revogações
fazem sair pela janela são restrições que podem voltar a entrar pela porta da revisão constitucional.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — É o contrário!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Quando o PS e o PSD querem voltar a introduzir no nosso texto
constitucional a possibilidade de confinamento, sem envolvimento da Assembleia da República — a Assembleia
da República que o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, ainda há minutos, elogiava quanto ao seu funcionamento
—,…
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — É ao contrário. É precisamente para evitar o confinamento. É
exatamente ao contrário!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — … quando o PS e o PSD querem tornar possível, pela primeira vez,
que os serviços secretos usem metadados, sem as salvaguardas do processo penal, estamos a restringir as
liberdades individuais das pessoas. E o nosso artigo 288.º, relativo aos limites materiais da revisão, na sua
alínea d), diz que se deve respeitar direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Não o estamos a fazer!
A Iniciativa Liberal não vai deixar que a revisão constitucional seja inconstitucional e não vai deixar que as
restrições que hoje estão a ser revogadas voltem a entrar por via dessa revisão.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Frazão, do Grupo
Parlamentar do Chega.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado Pedro Delgado
Alves, pedi a palavra para esclarecê-lo — talvez o senhor não estivesse com muita atenção quando eu usei da
palavra —, porque, de facto, quem trouxe à baila as normas constitucionais não foi o Deputado Pedro Frazão.
Foi o parecer da Ordem dos Advogados que emitiu, sobre esta proposta de lei do Governo, essas mesmas
considerações.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Não têm que ver com esta questão.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Portanto, não foi o Pedro Frazão, Deputado do Chega, Sr.
Deputado.
E sobre a pulsão negacionista, ó Sr. Deputado, tenha decoro. Tivemos ontem um debate com o Sr. Primeiro-
Ministro em que todo o Governo negou os problemas que existem no SNS (Serviço Nacional de Saúde), com
pessoas a morrerem nas urgências, as enormes listas de espera e a falta de socorro, e o negacionista sou eu?!
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — O que é que isso tem a ver com esta questão?
Página 14
I SÉRIE — NÚMERO 105
14
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Isso é que é negacionismo!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — O Sr. Primeiro-Ministro negou a problemática da habitação e a
enorme ignorância que foi utilizada na elaboração do PowerPoint sobre a habitação e o populista, o negacionista
sou eu?!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — E és!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — O Sr. Primeiro-Ministro negou os problemas da defesa e o
negacionista sou eu?! Negou os problemas da agricultura e as manifestações feitas pelos agricultores e o
negacionista sou eu?! Negou os problemas com as forças de segurança, a falta de valorização das polícias e o
negacionista sou eu? Continua a negar os problemas dos tribunais,…
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — … continua a negar que o Sr. Ministro das Finanças, Fernando
Medina, disse que a redução do IVA (imposto sobre o valor acrescentado) não ia trazer consequências na
descida dos alimentos, mas, ontem, afinal, o Sr. Primeiro-Ministro já veio anunciar a descida do IVA dos
alimentos?!
Ó Sr. Deputado, tenha decoro, os negacionistas, em Portugal, estão no Governo e estão na vossa bancada!
Aplausos do CH.
Protestos do PS.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Os negacionistas são vocês!
O Sr. Presidente: — Não havendo mais nenhum pedido de palavra, para encerrar o debate, tem a dita o Sr.
Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, André Moz Caldas.
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados, Sr.ª Deputada Márcia Passos, permita-me uma ligeira precisão: o Governo não vai a reboque do
PSD, como já aqui foi lembrado, é a iniciativa do PSD que é arrastada pela iniciativa do Governo. E que triste
vida seria a desse rebocador, porque o que o PSD aqui propõe é a revogação de três números de um artigo de
uma lei. Seria, de facto, penoso que tivessem de ter a reboque as 51 leis que o Governo aqui propõe revogar.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Pedro dos Santos Frazão, não vou perder o pouco tempo que tenho a analisar as suas
incoerências: o Governo, primeiro, enfiou a cabeça na areia, depois, foi assaltado por uma fúria totalitária de
pendor sanitário e, por último, avança tarde na revogação destas leis.
A Sr.ª Rita Matias (CH): — E não foi isso que aconteceu?!
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: — Temos, quando muito, a
proposta do Chega, que se propõe a revogar um artigo, depois de o Governo o ter feito.
E é, por acaso, um artigo que o Governo já se propunha revogar.
Aplausos do PS.
É caso para lhe dizer, Sr. Deputado: «muita parra e pouca uva».
Página 15
24 DE MARÇO DE 2023
15
Quanto ao mais, Sr.as e Srs. Deputados, reitero…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — E qual é o artigo?!
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: — É o artigo 6.º-E da Lei n.º 1-
A/2020, de 19 de março. Não tenho nenhuma dúvida sobre aquilo que estou a dizer.
Sr.as e Srs. Deputados, reitero a disponibilidade do Governo para colaborar, durante a especialidade, em tudo
quanto seja necessário para aprimorar esta proposta de lei, seja do ponto de vista político, seja do ponto de
vista técnico.
Fica essa disponibilidade.
Aplausos do PS.
Protestos do CH.
O Sr. Presidente: — Assim concluímos o primeiro ponto da nossa ordem do dia.
Despedimo-nos do Governo e atacamos o segundo ponto da ordem do dia, que consiste no debate, na
generalidade, do Projeto de Lei n.º 512/XV/1.ª (PS) — Restaura a Casa do Douro enquanto associação pública
e aprova os seus estatutos, que arrasta os Projetos de Lei n.os 386/XV/1.ª (PCP) — Aprova os estatutos da Casa
do Douro e 612/XV/1.ª (BE) — Restaura a Casa do Douro como associação pública.
Damos uns segundos para a recomposição da Assembleia e, entretanto, o Sr. Deputado Agostinho Santa
pode começar a dirigir-se pacatamente ao púlpito para iniciar a intervenção de apresentação do Projeto de Lei
n.º 512/XV/1.ª (PS).
Pausa.
Espere só uns segundos, para as pessoas que estão de pé se poderem sentar.
Pausa.
Muito bem, já estamos com espírito para ouvir o Sr. Deputado Agostinho Santa, do PS.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Agostinho Santa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Saúdo, emocionado, os durienses
que nos aconchegam nas galerias e os que, à distância, nos acompanham.
Manifesto o regozijo em apresentar este projeto de lei de restauração da Casa do Douro como associação
de direito público. Sei bem que esse meu regozijo é coincidente com o que sentem os que vivem, trabalham e
sofrem no país vinhateiro.
Esta iniciativa legislativa não vem resolver todos os problemas da Região Demarcada do Douro, nem dos
vitivinicultores. Pese embora as intenções, a disponibilização de apoios, os esforços, a luta pela sobrevivência
numa terra de contradições e perplexidades, de grandes potencialidades, mas muitas dificuldades e
desequilíbrios, a crise na região do Douro continua a ser real.
É necessária a intervenção regeneradora dos poderes públicos e a implicação dos diversos estratos da
comunidade. O Douro merece conjugação de vontades e sublimação de esforços.
A Casa do Douro não resolve tudo, mas é condição de facilitação da vida dos viticultores. É preciso recuperá-
la no seu estatuto de dignificação, de simbolismo e de pujança, para que possa ter repercussão concreta no
quotidiano dos homens e mulheres que amassam o xisto e acariciam as cepas para que delas brote vida.
É imperioso que a sua ação se associe ao engrandecimento de um monumento vivo, Património da
Humanidade, na certeza de que a sobrevivência dos pequenos e médios viticultores e trabalhadores da vinha é
pressuposto decisivo para que a região preserve a magnificência da paisagem, mas, sobretudo, uma forma de
estar e de viver, com um lastro ancestral de gente que merece dignidade, respeito e efetivo apoio.
Página 16
I SÉRIE — NÚMERO 105
16
Aplausos do PS.
Torna-se vital que a Casa do Douro regresse a uma matriz de representação de todos os produtores desta
região demarcada, interpretando e defendendo os seus interesses específicos. Face ao desequilíbrio cada vez
mais notório, tendo como comparação o poderio do comércio, só uma voz una, coesa e forte e ancorada em
capacidade de intervenção de natureza pública poderá atenuar os efeitos de uma desigual relação de
organização e de poder, sob pena de a parte mais fraca, exaurida na sua resistência ser impedida, no limite, de
defender os seus direitos basilares.
Tendo a Assembleia da República, em 2019, feito percurso legislativo em resposta a esta realidade, entende
agora o Grupo Parlamentar do Partido Socialista aproveitar a dinâmica que então se criou, materializada na
aprovação de uma lei, através de um trabalho conjugado de vários grupos parlamentares e de contributos da
Comunidade Intermunicipal do Douro.
Identificados os estritos termos da declaração de inconstitucionalidade dessa lei, o trabalho essencial ora
feito foi o de alterar as normas assim declaradas. Cuidou-se, sobretudo, seguindo a lição do Tribunal
Constitucional, de dotar de efetivas competências públicas a Casa do Douro em restauração, para que possa
cumprir o desígnio de interpretação e de prossecução reforçada dos interesses da região e seus viticultores.
Eis, portanto, Sr.as e Srs. Deputados, o projeto de lei que vos apresentamos, contando que, desta feita, outros
grupos parlamentares se nos possam juntar, não falhando ao apelo que o Douro, clamando, faz a quem o quer
defender e amar.
Peço que me perdoem, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a ousadia de querer terminar com emoção,
ainda assim outra forma de política, com um poema em que, aproveitando a figura mítica do homem dos cestos,
celebro as mulheres e os homens que construíram e constroem o Douro, para nosso deslumbramento, a poder
de dor, suor e amor: «Oupa! Vai cesto! / E o mosto antecipado corre / pelo rego do pescoço contraído / besuntado
de mel e de ardume. / Oupa! / Gemem as costas / os lábios não que um homem / ao invés de gritar sorri / como
que os sessenta quilos no lombo / fossem deleitoso prazer / e o suor ardido bálsamo puro. / Oupa! / Rangem as
pernas / galgando eternos socalcos de martírio. / O sorriso continua esculpido no rosto / e um que outro brado
de suspeitoso regozijo / grito surdo de raiva e de dor. / Oupa! Venha cesto / que tenho à espera / a mesma
máscara de escancarado prazer / para oferecer ao deus que no olimpo / sabe bem o tom e a côr do meu sorriso.
/ Oupa! / Suas bênçãos deus de impostura / vou dormir toda a noite com as lágrimas / que todo o dia me
encheram / a alma de sal e de amargura.»
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 386/XV/1.ª (PCP), tem a palavra o Sr. Deputado
João Dias.
O Sr. João Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A produção vitícola na Região Demarcada do
Douro é uma realidade absolutamente especial e única no nosso País, com poucas comparações no plano
mundial. É isso que justifica a necessidade de gozar de uma regulação especial que subsiste há mais de dois
séculos. É a essa realidade que o projeto de lei que o PCP traz hoje a debate dá resposta.
Srs. Deputados, não é tudo igual. A marca distintiva desta região é a sua diferença face a outras regiões
vitivinícolas: diferença que faz do Alto Douro Vinhateiro Património da Humanidade e que constitui uma grande
mais-valia; diferença que começa nas condições de produção e trabalho e que se prolonga na relação entre o
comércio e a produção, particularmente desfavorável para esta.
Nesta região, onde milhares de pequenos viticultores completamente desprotegidos se relacionam com
poderosos grupos económicos, é fundamental reconhecer a necessidade de uma regulação especial que
sucessivos Governos têm posto em causa.
Hoje, neste debate, precisamos saber de que lado cada um se posiciona nesta batalha. Se, tal como o PCP,
se posicionam do lado dos pequenos e médios viticultores que defendem o Douro e o construíram, ou se estão
aqui para servir os interesses nunca saciados das casas exportadoras de Gaia.
O Sr. Filipe Melo (CH): — És alentejano!!
Página 17
24 DE MARÇO DE 2023
17
O Sr. João Dias (PCP): — Aqueles que agora acordaram para a necessidade de criar um organismo de
regulação e fiscalização privado só podem apoiar a nossa proposta, ainda que sejam os mesmos que estiveram
na destruição da Casa do Douro. Queremos que sejam os viticultores, aqueles que construíram o Douro, a
mandar na Casa do Douro.
Nesse sentido, o nosso projeto defende: a reconstituição da Casa do Douro enquanto património de todos
os viticultores da Região Demarcada do Douro; que a gestão democrática da Casa do Douro reconstituída seja
assegurada pelos seus legítimos proprietários, na base da regra de um produtor, um voto; a atribuição da
representação da produção no Conselho Interprofissional do IVDP (Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, I.P.);
atribuir à Casa do Douro reconstituída todas as competências históricas que justifiquem a inscrição obrigatória,
que agora estão no IVDP, designadamente o registo dos viticultores da Região Demarcada do Douro, o cadastro
das parcelas dos viticultores da Região Demarcada do Douro, a distribuição anual do benefício a cada produtor,
a promoção do vinho do Porto e dos vinhos da região, bem como manter um stock histórico de vinhos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, os problemas do Douro são bem conhecidos e as soluções também.
Precisamos de defender, de uma vez por todas, os produtores das vontades económico-financeiras do grande
comércio.
A luta do PCP pelo Douro e pelos durienses e, muito em particular, por todos os que, com tremenda
dificuldade, construíram e continuam a construir a paisagem que nos deixa maravilhados de espanto e emoção
— os pequenos e pequeníssimos viticultores do Douro, os trabalhadores rurais do Douro, as gentes sofridas de
muito trabalho —, essa luta não nos cansa nem nos cansará!
Aplausos do PCP e do Deputado do PS Agostinho Santa.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Álvaro Cunhal, 1975!
O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 612/XV/1.ª (BE), tem agora a palavra o Sr.
Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pretende o Bloco de Esquerda,
em conjunto com o PCP e com o PS, concluir o trabalho que, em 2019, não foi possível concluir.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Juntem-se de uma vez!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Restituir a Casa do Douro, restaurar a Casa do Douro é um objetivo
nobre, porque sabemos a história daquela gente e como, ao longo de décadas, aqueles corpos de que falava
há pouco o Sr. Deputado Agostinho Santa foram usurpados de toda a riqueza por quem queria, à sua custa,
tornar o Douro o tal rio que tinha foz em Liverpool e em Londres, mas que exportava também a riqueza e não a
deixava na terra.
Se dúvidas houvesse, hoje é muito visível para toda a gente que esta situação tem, na sua origem, a eterna
contradição entre a produção e a distribuição. E se hoje dizemos que, de facto, há uns que nada ganham e
outros que com tudo ficam, se quem produz fica com tão pouco porque a distribuição ganha tanto, na Casa do
Douro é visível essa realidade. A riqueza não teria ficado naquela região se não tivesse sido, durante décadas,
a Casa do Douro.
É verdade: houve algumas administrações que não estiveram à altura das suas responsabilidades. Não
estiveram à altura da responsabilidade que deviam ter perante aquele povo e aquela gente.
Mas, em nome desses erros, não se pode negar que a defesa da Casa do Douro é a única forma de garantir
uma produção digna na zona do Douro, de garantir a riqueza àquelas gentes.
Sabemos como, no passado, PSD e CDS quiseram destruir a Casa do Douro, e entregar, no fundo, a
capacidade negocial que ela representava para os produtores de mão beijada a uns quantos distribuidores. Essa
elite económica bateu palmas, mas o povo do Douro soube como isso foi um desastre.
Se, em 2019, começámos a reconstruir a Casa do Douro, hoje vamos ultrapassar, de forma definitiva, as
restrições que o Tribunal Constitucional colocou e, creio eu, isso será passível de ser ultrapassado no âmbito
Página 18
I SÉRIE — NÚMERO 105
18
do debate de especialidade. Isto porque sabemos que quem trabalha a terra não pode ser usurpado da sua
riqueza. Quem criou os socalcos do Douro, quem lhe deu corpo, quem dele retira o vinho que deu nome ao
nosso País pelo mundo fora, não pode ser usurpado da sua riqueza. O Douro não tem foz em Liverpool, no Rio de Janeiro, naquelas cidades finas que bebiam a riqueza produzida cá, mas que levavam, também, a riqueza a
que aquele povo merecia ter acesso.
Em nome dessa distribuição, hoje tão visível na contradição entre a produção e a distribuição, recuperamos
a Casa do Douro, garantindo, com a nossa palavra, que não deixaremos este processo, respondendo às dúvidas
constitucionais e assumindo justiça onde ela deveria existir, também na produção do vinho do Porto.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Moura, do Grupo Parlamentar
do PSD.
O Sr. João Moura (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD apresenta-se neste debate com
grande sentido de responsabilidade para com a Região Demarcada do Douro, a região mais antiga do mundo e
que enche de orgulho todos os portugueses. Estamos conscientes das suas diversas dimensões: ambiental,
económica, patrimonial, social, agrícola e territorial.
A Região Demarcada do Douro é muito mais do que uma região de produção de vinho, é um Património da
Humanidade, que cabe a todos cuidar e preservar. É no Douro que é produzido um dos vinhos mais
conceituados do mundo, o vinho do Porto, um produto do mercado mundial, um ex-líbris.
É, também, no Douro que se produzem os vinhos Douro DOC (denominação de origem controlada), que são
considerados dos melhores do mundo. Hoje, a produção vinícola já é capaz de gerar um volume de negócios
que supera os 600 milhões de euros.
O Douro, pela sua beleza, pelo seu património, pelas suas gentes, pelas suas características, pelo seu
encanto único, tem um potencial inigualável e inesgotável. Se tem tudo para dar certo, o que corre mal? O que
falta fazer?
Desde logo, corre mal a inação do Governo. Faz falta um Ministério da Agricultura que acredite, que invista
e ajude a potenciar esta região no mundo, que ajude a financiar as entidades que representam a lavoura.
Mas, antes pelo contrário, o Governo socialista, através do Ministério das Finanças, suga, arrecada e cativa
as verbas do IVDP, um instituto público que é autossustentável e que controla e regula o mercado destes vinhos.
É incompreensível que as receitas anuais provenientes da produção e do comércio não sejam, no mínimo,
devolvidas ao setor.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Francisco Rocha (PS): ⎯ É o estatuto!
O Sr. João Moura (PSD): — A Casa do Douro foi constituída no Estado Novo para representar os homens
da lavoura. Hoje, já pouco ou nada tem a ver com o intuito com que foi criada.
A Casa do Douro deverá ser uma importante peça do puzzle do Douro, uma peça que, quando mexida, não
afete negativamente outras importantes peças.
Sr.as e Srs. Deputados, a questão é a de saber se as iniciativas hoje apresentadas servem o propósito da
região e do País. Será este formato de entidade pública de inscrição obrigatória, com um forte cariz ideológico
de extrema-esquerda, que configura uma compressão da liberdade negativa de associação, que melhor servirá
o interesse nacional, o da região, dos lavradores, dos pequenos produtores, das cooperativas e também do
comércio? Não estará em causa uma duplicação e uma partilha de funções do IVDP?
Protestos de Deputados do PS.
Página 19
24 DE MARÇO DE 2023
19
Nós, no PSD, estamos muito preocupados, porque nos parece que, à boa maneira socialista, estão a criar
mais um organismo público paralelo ao IVDP, que obrigará ao pagamento de novas taxas e a mais impostos
para os contribuintes e, em especial, para os vitivinicultores do Douro.
Quem pagará o custo do controlo atualizado do cadastro previsto para a Casa do Douro? Que tipo de
colaboração dará a Casa do Douro no controlo e na defesa das denominações de origem e indicações
geográficas dos vinhos da região? Que tipo de intervenção terá a Casa do Douro, se tal já é efetuado de forma
adequada e proporcional pelo IVDP?
Com os diplomas apresentados, uma de duas coisas acontecerá: ou o esvaziamento total do IVDP,
contribuindo para mais um desmantelamento do Ministério da Agricultura, ou a duplicação e partilha artificial de
funções do Estado por organismos distintos, concorrentes entre si.
A Casa do Douro possui um valioso património imobiliário em diferentes concelhos da região demarcada.
Por que razão o Governo não assume parcerias com as autarquias, de modo a intervencionar o património
edificado da Casa do Douro? Por que razão não assume a cedência desse património às autarquias?
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Por que carga de água?!
O Sr. João Moura (PSD): — Já agora, aos proponentes das iniciativas, perguntamos: não seria, no mínimo,
ético ouvir a Federação Renovação do Douro, que é a atual legítima representante da Casa do Douro?
O Sr. Francisco Rocha (PS): ⎯ Não é, não!
O Sr. João Moura (PSD): — Porque não ouviram o IVDP, antes de apresentarem os projetos de lei que hoje
discutimos?
Sr.as e Srs. Deputados, o PSD assume o compromisso, com a região do Douro, de devolver dignidade à Casa
do Douro, sem atropelos legais e sem mais impostos para os contribuintes. O PSD defende uma Casa do Douro
virada para o futuro, com a ambição de contribuir para o crescimento e desenvolvimento do negócio dos vinhos
da região, aumentando a faturação anual dos produtos vinícolas e do enoturismo. O PSD defende uma Casa do
Douro que represente, de forma justa, não só toda a produção, mas também o comércio.
O Grupo Parlamentar do PSD assume, aqui e hoje, que apresentará uma iniciativa legislativa para o
enoturismo. O enoturismo não tem qualquer enquadramento legal em Portugal, ao contrário do que acontece
em Espanha e em França.
O PSD afirma, de forma responsável, que está disponível para discutir e apresentar propostas que melhor
defendam a Região Demarcada do Douro. Nunca permitiremos que, por qualquer preconceito ideológico, se
destrua um setor produtivo que tem tudo para gerar riqueza em Portugal. Defendemos, hoje e sempre, o Douro,
Património Mundial, orgulho de Portugal e dos portugueses.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem um pedido de esclarecimento. Já não tem tempo para responder,
mas o Sr. Deputado Agostinho Santa faz questão de fazer o pedido de esclarecimento.
Portanto, para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Santa, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Agostinho Santa (PS): — Sr. Presidente, é um pedido de esclarecimento transformado noutra coisa,
se, entretanto, for necessário.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de se decidir, porque, se for outra coisa, vai para a ordem das
inscrições.
O Sr. Agostinho Santa (PS): — Sr. Presidente, é um pedido de esclarecimento, sim.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
Página 20
I SÉRIE — NÚMERO 105
20
O Sr. Agostinho Santa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Moura, o esclarecimento que quero pedir
é, exatamente, o seguinte: porque é que não vieram a jogo agora e aqui, quanto à Casa do Douro? Porque é
que se estão a refugiar no futuro do enoturismo — que achamos que tem e deve ter futuro — e porque é que
não acham, connosco, que a Casa do Douro é já, no presente, o futuro do Douro?
O Sr. Francisco Rocha (PS): ⎯ Claro!
O Sr. Agostinho Santa (PS): — Que o digam os viticultores!
Acho que é uma pena e gostava que me respondessem a isto: como é que este PSD se sente bem aqui,…
O Sr. Francisco Rocha (PS): ⎯ A dizer uma coisa lá em cima e, aqui, outra!
O Sr. Agostinho Santa (PS): — … a interpretar o seu mandato perante aqueles que representa?
É que o PSD que está lá em cima, no Norte, que sofre lá em cima connosco, já disse, clara e inequivocamente
— designadamente pela voz da CIMDOURO (Comunidade Intermunicipal do Douro), na qual, como sabem, tem
a maioria —, que é favorável à restauração da Casa do Douro, para não haver dúvidas, enquanto associação
pública de inscrição obrigatória.
Aplausos do PS e de elementos do público presente nas galerias.
O PSD na região vai ficar na luz, está a ficar na luz e está a querer ficar na luz connosco. O que se pergunta
é se o PSD, este que aqui está e que ouvimos pela voz do Sr. Deputado João Moura, vai querer continuar a
ficar na sombra, porque, se ficar na sombra, garanto-lhe que sai da fotografia.
Aplausos do PS.
O Sr. João Azevedo Castro (PS): — Ó Douro, vem cá abaixo ver isto!
O Sr. Presidente: — Permito-me recordar às pessoas que temos o gosto de ter na galeria que não se podem
manifestar de nenhuma forma.
Agora, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Afonso, para intervir, em nome do Grupo Parlamentar do Chega.
O Sr. Rui Afonso (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os projetos de lei que debatemos têm
como objeto a restauração da Casa do Douro enquanto associação pública de inscrição obrigatória e a
aprovação dos seus estatutos.
O Chega não pode acompanhar estes propósitos, que representam uma ingerência do Estado nas matérias
que aos durienses respeitam e que os vêm privar da sua liberdade de iniciativa e da livre gestão da sua vida
associativa e produtiva.
Aplausos do CH.
Esta ideia suscita as maiores dúvidas de natureza jurídica e constitucional, e não serve para resolver os
verdadeiros problemas da região do Douro.
Na verdade, é nossa opinião que a restauração da Casa do Douro, enquanto associação pública de inscrição
obrigatória, sofre de desconformidade com o regime constitucional das associações públicas.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Muito bem!
O Sr. Rui Afonso (CH): — Uma parte muito significativa das atribuições específicas que pretendem cometer
neste processo de restauração da Casa do Douro tem por escopo uma mera atividade de prestação de auxílio,
ou colaboração, aos viticultores associados, em termos que qualquer associação de direito privado poderia
desempenhar.
Página 21
24 DE MARÇO DE 2023
21
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Muito bem!
O Sr. Rui Afonso (CH): — Mais grave ainda, pretende-se habilitar a Casa do Douro — pasmem-se! — a
prosseguir atividades comerciais.
As associações públicas revestem-se de natureza excecional e devem estar em linha com o interesse público
geral, de maneira que a sua prossecução deve carecer de personalidade jurídica pública, por implicar o exercício
de poderes de autoridade, ou, pelo menos, de funções administrativas que não possam ser desempenhadas por
associações de direito privado.
Neste caso, não se pode concluir, pela existência de uma tarefa pública, o fim do interesse público, pelo que
nada justifica que tão-somente os viticultores do Douro se encontrem sujeitos ao ónus de integrar uma
associação pública, quando os produtores de outras regiões demarcadas não se encontram sujeitos à mesma
obrigação.
O Sr. Bruno Nunes (CH): — Muito bem!
O Sr. Rui Afonso (CH): — Pelo que, em nosso entender, Sr.as e Srs. Deputados, esta restauração da Casa
do Douro viola grosseiramente o princípio da liberdade de associação.
Aplausos do CH.
Acresce que a missão de promover o controlo da qualidade e quantidade dos vinhos do Porto,
regulamentando o processo produtivo, bem como a proteção e defesa das denominações de origem do Douro
e Porto e a indicação geográfica duriense já são prosseguidas pelo IVDP, pelo que esta missão já se encontra
assegurada eficazmente pelo Estado.
A Casa do Douro, com a sua atual configuração, é representativa e tem todas as condições para colaborar
com o Estado e com o IVDP para promover a inovação e para acrescentar valor, tudo isto por livre iniciativa e
vontade dos produtores do Douro que livremente, e não por imposição do Estado, desejem associar-se.
Esta é a Casa do Douro que defendemos: uma instituição livre, que já promove a qualidade do vinho, a
renovação das vinhas, o aprimoramento das castas, a projeção dos seus produtos em mercados nacionais e
internacionais, a comercialização e a colaboração com todos os parceiros e com o Estado.
Vozes do CH: — Muito bem!
O Sr. Rui Afonso (CH): — Defendemos uma instituição livre e de associação livre para a representação dos
interesses dos produtores, que mantêm o destino da região demarcada nas suas mãos e não sob o jugo de
qualquer poder político, ou interesse partidário.
Aplausos do CH.
Risos do Deputado do PS Francisco Rocha.
Em conclusão, Sr.as e Srs. Deputados, é nosso entendimento que não existe qualquer justificação válida para
a restauração da Casa do Douro como associação pública de inscrição obrigatória.
Aplausos do CH.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Viva a liberdade!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa
Real.
Página 22
I SÉRIE — NÚMERO 105
22
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Saudamos as propostas que
aqui foram trazidas e que acompanharemos. Para o PAN, é da maior importância a restauração da Casa do
Douro como associação pública.
Esta instituição passou por momentos bastante atribulados, sobretudo depois da sua extinção e privatização,
em 2014 — talvez por isso mesmo, e por ter sido pela mão da direita e do Governo de Passos Coelho, hoje
tenhamos esta posição, quer do PSD, quer do próprio Chega —, e até mesmo pelo chumbo do Tribunal
Constitucional da tentativa de reverter esta medida.
Há um processo de degradação e destruição do património da Casa do Douro, uma instituição que, não nos
podemos esquecer, é histórica, numa região demarcada, também antiga e histórica, com muita relevância para
o nosso País.
O PAN entende que, para além da resolução dos problemas das dívidas da Casa do Douro, é importante
que esta instituição seja verdadeiramente útil na defesa dos interesses da população e da região e que possa
contribuir no que certamente vai ser um desafio para esta zona demarcada, que é preparar esta região para ser
resiliente às alterações climáticas, cujo impacto pode pôr em causa os interesses da produção.
Nesse sentido, para além das medidas que discutimos, será importante, no futuro, discutir os eventuais
apoios para a reconversão de produções para práticas mais sustentáveis e adaptadas aos grandes desafios do
nosso tempo.
Termino, saudando não apenas a região, mas todos os que têm atuado na defesa da Casa do Douro, dizendo
que iremos votar favoravelmente todas estas iniciativas.
O Sr. Presidente: — Para intervir, em nome do partido Livre, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na senda do tipo de desenvolvimento que
queremos para o nosso País — um desenvolvimento sustentado e inclusivo, assente numa grande valorização
de pessoas, território e conhecimento —, nem todas as inovações vêm do futuro. Há inovações que vêm do
passado e que podemos estudar na nossa história.
Quando a região do Douro foi demarcada, aquilo que, na altura, o Marquês de Pombal — que ainda não
tinha esse nome — quis fazer foi reequilibrar os pratos da balança do desenvolvimento do País em relação ao
desequilíbrio que se sentia com outros países da Europa de então.
Percebendo que, nas indústrias que queria fomentar — lanifícios, vidro e por aí fora —, íamos demorar muito
tempo a atingir o valor acrescentado que os outros países já tinham, criou-se um perímetro de grande
qualificação do território, que também era de conhecimento e de produção. E funcionou.
Quando a Casa do Douro foi criada, já no século XX, o que se fez foi tentar que pequenos produtores
pudessem juntar o seu poder e, com isso, ter algum equilíbrio em relação a grandes produtores e distribuidores.
Depois, veio Passos — não Passos Manuel, que jamais o faria, mas Passos Coelho — e, tal como aconteceu
com tanta coisa naquela época, destruiu-se valor ao privatizar-se a Casa do Douro.
O Sr. João Moura (PSD): — Não sabes o que dizes!
O Sr. Rui Tavares (L): — O Livre está completamente a favor de uma restauração da Casa do Douro como
associação de direito público…
O Sr. João Moura (PSD): — Não é isso!
O Sr. Rui Tavares (L): — … e está do lado, felicitando-os, do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda, que já
começaram este trabalho numa altura em que o Livre não estava neste Parlamento.
A única coisa que nos resta dizer é que, singelamente, agora há mais uma voz que está com esta vossa
iniciativa, que é, de facto, nobre, como já foi dito.
Aplausos do Deputado do PS Agostinho Santa.
Página 23
24 DE MARÇO DE 2023
23
O Sr. Presidente: — Para intervir, em nome da Iniciativa Liberal, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim
de Figueiredo.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate mostra, à
saciedade, que as forças mais reacionárias e conservadoras deste Parlamento se sentam à esquerda.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
Protestos do Deputado do PCP João Dias.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Digo isto, porque, perante as queixas legítimas dos produtores de que
as vendas não sobem, até descem, de que os preços não são altos, são até baixos — são queixas de hoje —,
o que é que os senhores vêm propor? Vêm propor dois — não um, mas dois! — regressos ao passado. Um
deles é um passado próximo, que é o da geringonça — aí está! O PS, o PCP e o Bloco de Esquerda, juntinhos,
a fazer esta proposta —, e o outro é um passado mais longínquo, um bocadinho mais surpreendente, que é o
do Estado Novo, porque a proposta que vêm aqui trazer é igualzinha à de 1932.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — É verdade!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Reparem! Perante queixas legítimas dos produtores relativamente a
preços e vendas, o que é que os senhores vêm propor? Uma Casa do Douro pública,…
O Sr. João Dias (PCP): — Tem órgãos próprios, eleições!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — … como se o Estado tivesse alguma vez mostrado o mínimo de
competência a gerir uma atividade concorrencial e como se as demais comissões vitivinícolas — que são
organizações de direito privado, de interesse público — não estivessem a fazer o trabalho que a Casa do Douro
deveria estar a fazer.
Depois, vêm propor uma Casa do Douro de inscrição obrigatória — provavelmente, vai bater outra vez na
trave do Tribunal Constitucional —, como se a liberdade de associação fosse um direito menor e como se as
outras comissões vitivinícolas — que, mais uma vez, não são de inscrição obrigatória, mas, sim, voluntária —
não estivessem a fazer um excelente trabalho.
Finalmente, vêm dar à Casa do Douro uma natureza completamente corporativa, de grémio, que é como
quem diz: «Quem está no negócio fica e quem pode, eventualmente, querer entrar no negócio, trazer inovações
e ideias novas, fica, mas fica de fora», porque não consegue entrar nesse negócio do vinho do Porto.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Portanto, isto que os senhores estão a propor não resolve nenhum
dos problemas de que os produtores, legitimamente, se queixam. Nenhum! O que os resolveria seria a
valorização e a promoção do vinho do Porto. Curiosamente, esta é uma competência já acometida ao IVDP —
já lá está! —, um instituto público que tem feito o quê?! Praticamente nada!
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Bola!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Executa quanto do orçamento de promoção?
O Sr. João Moura (PSD): — Zero!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Mal passa de metade.
Página 24
I SÉRIE — NÚMERO 105
24
Consegue, ou não consegue, recrutar os técnicos de que precisa para os seus trabalhos de certificação e de
promoção? Não, não consegue. Porquê?! Porque está, como instituto público, sujeito a cativações — como está
tudo, em Portugal, sujeito a cativações.
Portanto, isto não vai resolver absolutamente nada!
Hoje, os senhores querem debater o regresso ao passado. Haverá um dia em que vamos conseguir discutir
o futuro, o futuro dessa extraordinária região, que é o Alto Douro Vinhateiro, e o futuro desse extraordinário
produto que é o vinho do Porto. Nesse dia, sim, isso merecerá, da nossa parte e, certamente, da parte dos
produtores na zona da Região Demarcada do Douro, um brinde com um belíssimo vintage.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Dias, do Grupo Parlamentar do PCP, para
uma intervenção.
O Sr. João Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É muito tentador dizer que há, nesta Casa, quem
não perceba do que está a falar. É muito tentador, mas não é verdade. Percebem! Efetivamente, percebem!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Dias (PCP): — Os senhores sabem muito bem que a Casa do Douro é propriedade dos
produtores, dos vitivinicultores. Sabem muito bem que a Casa do Douro defende a produção!
Podem vir com a versão mais romantizada de que foi a Dona Ferreirinha ou que foi o Barão de Forrester que
criou o Douro. Mas não foi! Foram os homens e mulheres que, socalco acima, socalco abaixo, colocaram lá
pedras, que vindimaram, que sacharam aquelas encostas!
Aplausos do PCP e do L.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Não é do Estado! É deles!
O Sr. João Dias (PCP): — Foram eles que as construíram e são eles os legítimos proprietários da Casa do
Douro.
Já agora, para terminar, quero relembrar-vos de algo. Quando, em 2014, assaltaram a Casa do Douro e a
destruíram, sabem muito bem quem disse: «Este problema está resolvido! Agora, só falta afastar a nuvem negra
do benefício.» Sabem muito bem as consequências disso! Vocês não são nenhuns inocentes!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado
Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há parte deste debate que advém
de posições previamente assumidas e de escolhas que condenamos.
Condenamos, por exemplo, a escolha do PSD em querer acabar com a Casa do Douro,…
Protestos do Deputado do PSD João Moura.
… mas não pomos o PSD no mesmo bloco da Iniciativa Liberal e do Chega, que, claramente, não percebem
o que é a Casa do Douro ou o que está em cima da mesa. Nem sequer leram com atenção os diplomas — sei
que eles são grandes, são várias dezenas de páginas —, porque, se os tivessem lido, perceberiam que dizer
que o Estado vai mandar na Casa do Douro é um absurdo. Repito, é um absurdo. É uma direção eleita pelos
vinicultores.
Pensam que os vinicultores são todos Estado?! Então, não conhecem o Douro.
Página 25
24 DE MARÇO DE 2023
25
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — É ignorância!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Só pode ser! De outra forma, nunca diriam essa alarvidade, que não tem
outro nome.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Não sabes o que estás a dizer!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Há uma escolha em cima da mesa, isso há, e é tão simples como referi
no início: é a escolha entre quem defende quem produz e quem se coloca ao lado do mercado que favorece
quem distribui.
Nesta escolha fundamental, o Chega e a Iniciativa Liberal escolheram quem distribui. O PSD já tinha tomado
a sua decisão anteriormente. Ao destruir a Casa do Douro, escolheu também quem distribui. Esse é o problema
na Casa do Douro, hoje!
Podemos estar aqui a fazer arqueologia, podemos estar a discutir o passado — e nem sequer referi Pedro
Passos Coelho sobre esta matéria, porque estive a discutir o futuro da Casa do Douro —, mas o futuro da Casa
do Douro, como sabem os produtores durienses, é o seu futuro. De outra forma, é o próprio vinho do Porto que
fica em causa.
Aplausos do BE.
O Sr. João Moura (PSD): — Não queremos acabar com a Casa do Douro!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — O Deputado João Cotrim de Figueiredo pede a palavra para que efeito?
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Para fazer uma intervenção, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado. Tem 9 segundos.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não acusei ninguém de não saber
do que estava a falar. Acusei pessoas de quererem montar um esquema que não vai favorecer nem a produção
do vinho do Douro, nem, sobretudo, a produção do vinho do Porto.
Pergunto-vos, Srs. Deputados: das várias regiões vitivinícolas de Portugal,…
O Sr. João Dias (PCP): — Aquela é especial!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — … incluindo a região do vinho da Madeira, quais delas estão a
funcionar melhor e quais delas estão a funcionar pior?
Nos últimos 25 anos, dos vinhos que se promoveram no mundo, que se exportaram mais, que cresceram,
que ganharam qualidade, quantos tinham associações públicas a gerir a sua promoção e a sua organização? E
quantas dessas associações eram grémios fechados ao que vem de fora?
Eu respondo-vos! Escusam de procurar. Eram zero. Repito, zero!
Aplausos da IL.
O Sr. João Dias (PCP): — É a chamada folha de Excel! Há que reconhecer a diferença!
O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Rocha, do Grupo
Parlamentar do PS.
Página 26
I SÉRIE — NÚMERO 105
26
O Sr. Francisco Rocha (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2022, as vendas de vinhos da
Região Demarcada do Douro atingiram um novo máximo histórico, 625 milhões de euros, e representaram 70 %
das exportações portuguesas de vinho com Denominação de Origem Protegida, sendo que só o vinho do Porto
representou 58 % dessas mesmas exportações.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Está a correr mal!
O Sr. Francisco Rocha (PS): — São resultados muito importantes para o nosso País, mas não podemos
ignorar que, na base de todo este sucesso, está o elo mais fraco de toda esta fileira: a produção.
Senão, atente-se: 33 % dos viticultores do Douro têm mais de 65 anos,…
O Sr. João Moura (PSD): — Então e na agricultura?! Qual é a diferença?
O Sr. Francisco Rocha (PS): — … 92 % dos lavradores desta região demarcada têm menos de 5 hectares
de vinha e, frequentemente, o preço das uvas pago aos produtores fica abaixo dos respetivos custos de
produção.
Por outro lado, convém não esquecer que a paz e a normalidade institucional que se vive na região
demarcada se deve, em larga medida, à resolução, com elevado sucesso, das questões relativas às dívidas e
à gestão do património da ex-Casa do Douro que a comissão administrativa nomeada para o efeito por esta
Casa ainda está a finalizar. Em relação a esta solução — pasmem-se! —, a direita parlamentar de então, nesta
Casa, votou contra. Repito: votou contra!
Sr. Presidente, Srs. Deputados, chegou, pois, o tempo de dotar a região demarcada de um novo modelo
estatutário, levando em linha de conta os desafios e as oportunidades da mais antiga região demarcada e
regulamentada do mundo. Este modelo deverá ser de natureza pública e de inscrição obrigatória, para que os
seus representantes possam integrar o Conselho Interprofissional do IVDP com uma legitimidade reforçada e,
também, com outra ambição: a de ter uma agenda renovada, com prioridades bem definidas.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Francisco Rocha (PS): — Esta representação deve conseguir contrapor, liderar e também agregar,
fazendo-se ouvir e representando, de forma efetiva e não camuflada, o mosaico social dos seus produtores,
promovendo incessantemente a sua defesa, a sua representação, a sua formação, a sua inovação e adaptação
a novos desafios.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Francisco Rocha (PS): — Em suma, ela deve assegurar, em diálogo com os representantes do
comércio e do Governo, um pacto de desenvolvimento e de sustentabilidade económica, social e ambiental de
todo o Alto Douro Vinhateiro, classificado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura) como Património Mundial da Humanidade.
É, por isso, tempo de concretizar a implementação deste novo modelo estatutário, de forma que contribua
para a construção de uma região demarcada mais forte e resiliente, menos desigual e mais sustentável, para
que o Douro continue a ser, como nos contava Torga: «Um poema geológico. A beleza absoluta».
Oupa! Vamos a isso!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, passamos, assim, ao terceiro ponto da nossa ordem do dia, que
consiste na apreciação, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 228/XV/1.ª (PCP) — Regime de contratação
e colocação de psicólogos nos estabelecimentos públicos de ensino (primeira alteração do Decreto-Lei n.º
190/91, de 17 de maio), 623/XV/1.ª (L) — Determina o dever de as instituições de ensino superior
disponibilizarem serviços de saúde mental aos estudantes, 627/XV/1.ª (PAN) — Cria uma rede de serviços de
Página 27
24 DE MARÇO DE 2023
27
psicologia nas escolas públicas e instituições de ensino superior e uma linha telefónica de apoio no ensino
superior, e 629/XV/1.ª (CH) — Altera o Decreto-Lei n.º 190/91, de 17 de maio, procedendo ao reforço da
colocação de psicólogos nos estabelecimentos públicos do ensino básico e secundário.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Loff, para apresentar o projeto de lei do PCP.
O Sr. Manuel Loff (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: A Lei de Bases do Sistema
Educativo desde há muito que assume que o sistema deve contribuir para o desenvolvimento pleno e
harmonioso da personalidade dos indivíduos e refere que o apoio ao desenvolvimento psicológico dos alunos e
à sua orientação escolar e profissional, bem como o apoio psicopedagógico às atividades educativas e ao
sistema de relações da comunidade escolar são realizados por serviços de psicologia e orientação escolar
profissional.
Um conjunto importante de medidas legislativas, desde o Estatuto do Aluno e Ética Escolar até à promoção
do sucesso educativo, a legislação relativa aos apoios especializados a prestar a alunos com necessidades
educativas específicas, pressupõem, há muito, a existência, com um papel ativo, de serviços de psicologia e
orientação escolar no ensino básico e secundário.
O impacto positivo dos psicólogos no contexto escolar é devidamente reconhecido em áreas como: a saúde
mental global da comunidade educativa; a efetiva educação para a saúde; a melhoria das aprendizagens; a
prevenção do abandono, da insegurança e da indisciplina; a gestão de conflitos entre pares, entre alunos e
professores e entre diversos agentes educativos; a promoção de competências transversais; o processo de
tomada de decisão vocacional; a inclusão de alunos com necessidades educativas especiais e melhoria das
suas aprendizagens; a integração de minorias étnicas e melhoria das suas aprendizagens; a promoção da
igualdade entre homens e mulheres; a aproximação dos encarregados de educação à escola; a melhoria da
saúde mental dos professores; e a formação do pessoal docente e não-docente.
O impacto da pandemia de covid-19 e a estratégia adotada, de longas fases de confinamento, deixou-nos
uma bomba-relógio de explosão retardada.
A Ordem dos Psicólogos alertava, já em 2021, para que, à semelhança do que aconteceu em crises
económicas anteriores, se esperava que a crise atual tivesse também como consequência um aumento das
dificuldades e dos problemas de saúde psicológica e uma diminuição do bem-estar, Um alerta corroborado por
estudos que comprovavam, já há dois anos, um aumento dos problemas de saúde psicológica, nomeadamente
de ansiedade e de depressão.
No ano passado, um outro estudo — elaborado em parceria com várias entidades ligadas ao Ministério da
Educação, como a Ordem dos Psicólogos e a Fundação Gulbenkian — evidenciou a necessidade desta proposta
do Partido Comunista, de reforço da contratação de psicólogos escolares, ao referir que cerca de um terço dos
alunos acusa sinais de sofrimento psicológico e défice de competências socioemocionais em pelo menos uma
das medidas consideradas.
De acordo com as recomendações internacionais, o rácio de psicólogos com intervenção em contexto escolar
não deve exceder os 500 alunos para cada psicólogo.
O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Manuel Loff (PCP): — Ora, de acordo com a análise que foi feita do caso português, continuamos com
um contexto escolar em que temos 694 alunos por cada psicólogo, isto é, 40 % mais do que aquilo que é
recomendado.
Em 1997 tinha sido criada a carreira do psicólogo no âmbito do Ministério da Educação, que permitia não só
o recrutamento e a vinculação destes trabalhadores para a escola pública como também garantia a progressão
na carreira. Mas, em 2018, este regime foi revogado e o recrutamento, desde então, aproxima estes
trabalhadores do contexto de precariedade na escola pública.
O PCP entende a psicologia em contexto escolar como um instrumento de reforço da escola pública de
qualidade e a presente iniciativa legislativa pretende dar um contributo para o ingresso e a estabilidade na
carreira dos psicólogos e na resposta às necessidades das escolas.
Desta forma, pretendemos, entre outras coisas, evidentemente, a recuperação da carreira do psicólogo no
âmbito do Ministério da Educação.
Página 28
I SÉRIE — NÚMERO 105
28
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Adão Silva.
O Sr. Presidente: ⎯ Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Manuel Loff (PCP): — Concluo, Sr. Presidente.
Ao reconhecimento e valorização do trabalho dos psicólogos em meio escolar é fundamental que
correspondam as condições efetivas de estabilidade laboral e pessoal, bem como a possibilidade de ingresso e
progressão numa carreira.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Apresento os meus cumprimentos a todas as Sr.as e Srs. Deputados.
Prosseguindo na apresentação das iniciativas, para uma intervenção pelo Livre, dou a palavra ao Sr.
Deputado Rui Tavares.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria começar por saudar o PCP pelo
agendamento deste debate e, em particular, o Sr. Deputado Manuel Loff, pelo que penso ter sido a sua primeira
intervenção nesta Câmara. É bom ter alguém que, além de ser um colega historiador, conhece bem a realidade
do ensino superior público.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Depois não tens tempo para falar!
O Sr. Rui Tavares (L): — Esta é uma oportunidade, também, para o Livre poder juntar ao debate um projeto
de lei com o qual pretende contemplar, de forma clara, as obrigações do Estado no que concerne ao ensino
superior e, em particular, à ação social, à prestação de serviços de saúde mental; um projeto, no fundo, que
entende como aposta no bem-estar das pessoas que haja uma obrigatoriedade de as instituições de ensino
superior terem serviços de apoio psicológico para os seus alunos.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Trinta segundos em palha!
O Sr. Rui Tavares (L): — É preciso prevenir, ao invés de remediar.
O ensino superior é um ambiente, muitas vezes por fenómenos que nos últimos anos se têm agravado, de
um grande produtivismo, de uma grande competitividade no mau sentido — ainda que no bom também —, o
que coloca uma grande pressão sobre as pessoas e desenvolve fenómenos de fragilidade psicológica, que é
importante poder prevenir em vez de remediar.
É também um ambiente no qual, com a crise pandémica e a atual crise económica, existe toda uma série de
problemas que não ficam à porta da universidade ou do instituto superior politécnico e que é preciso acompanhar
dentro da instituição, porque a pandemia e este contexto de crise económica exponenciam o aparecimento de
problemas de saúde mental.
Os serviços de saúde mental devem estar disponíveis e ser de fácil acesso. Além de ser possível dispor
deles, é preciso que tenham capacidade de resposta.
Portanto, é muito importante que o Estado, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e o
Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos façam um esforço coletivo no sentido de dotarem
as nossas instituições de ensino superior de psicólogos, que não só promoverão a saúde mental dentro das
universidades como ajudarão a que sejamos um País mais inclusivo e também com uma produtividade mais
saudável.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Já tem 2 minutos!
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Passamos, agora, à apresentação da iniciativa do PAN, pelo que tem a
palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.
Página 29
24 DE MARÇO DE 2023
29
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ninguém bateu palmas ao Rui Tavares!
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os jovens de hoje vivem num
mundo frenético, assoberbados, no seu dia a dia, pelo receio do seu futuro, pela incerteza, pela pressão, pelo
stress, pela ansiedade, por não existir uma verdadeira solidariedade entre as gerações que lhes garanta que o
mundo de amanhã será melhor do que o de hoje — entre tantos outros fatores de que se falava antes da
pandemia, mas que a pandemia veio evidenciar ainda mais.
Olhemos para o caso do ensino superior, em que quase metade dos estudantes, cerca de 48 %, mostram
problemas graves do foro psicológico, como depressão, ansiedade ou perda de controlo; e as raparigas, uma
vez mais, são as mais afetadas.
Neste caso do ensino superior, nem todos os estabelecimentos têm acesso à ação social indireta, ou seja,
há estudantes que, para terem acesso a uma consulta, têm de pagar protocolos que existem com o privado, em
que uma consulta, em vez dos habituais 5 €, custa 25 €. E para um estudante que já esteja deslocado da sua
cidade, que tenha de pagar o alojamento, que tenha de pagar a alimentação, que tenha de pagar também outras
despesas inerentes ao estudo, acresce, assim, uma despesa mensal que, em regra, não é inferior a 100 €.
Para dar resposta às queixas dos jovens não podemos remetê-los para uma tal desproteção e é por isso
que, hoje, o PAN propõe a criação de uma rede de serviços de psicologia nas escolas públicas e instituições do
ensino superior, bem como uma linha de apoio no ensino superior. Se, cada vez mais, os jovens falam mais
abertamente sobre os seus problemas, na saúde mental e na necessidade de prevenção — um repto que nos
têm trazido à Assembleia da República tantas associações e federações de estudantes —, é fundamental que
o Estado dê uma resposta pública a estas suas apreensões.
Só através de uma verdadeira rede que abarque todos os jovens que necessitem de ajuda poderemos estar
a apostar, efetivamente, na prevenção. E, aqui, distante de complexos ideológicos, porque a falta desta rede
pública, tal como no caso da habitação e do alojamento estudantil, tem, de facto, deixado para trás muitos
estudantes.
O Ministro da Saúde anunciou, ontem, que irá criar um plano global de intervenção para os problemas de
saúde mental — curiosamente, na véspera deste debate. Esperamos que, efetivamente, agora seja a valer…
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Sr.ª Deputada, tem de concluir.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Vou mesmo concluir, Sr. Presidente.
Esperamos também que amanhã, na hora de votar estas propostas — relativas a um problema que todos,
hoje, dizem que é fundamental resolver —, se vá além das palavras, permitindo a viabilização das várias
iniciativas apresentadas.
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Sr.ª Deputada, a Mesa regista um pedido de esclarecimento, ao qual não
terá tempo de responder.
De qualquer maneira, darei a palavra à Sr.ª Deputada Rosa Venâncio, do Grupo Parlamentar do Partido
Socialista, para formular o pedido de esclarecimento a que a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real não terá
oportunidade de responder.
Tem a palavra, então, a Sr.ª Deputada Rosa Venâncio.
A Sr.ª Rosa Venâncio (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me que comece por saudar
os Deputados únicos representantes do Livre e do PAN por trazerem as iniciativas hoje em discussão.
O Sr. João Dias (PCP): — Nós é que agendámos!
A Sr.ª Rosa Venâncio (PS): — A pandemia que vivemos muito recentemente tornou mais evidente e
agudizou as questões de saúde mental, sobretudo nos jovens.
Página 30
I SÉRIE — NÚMERO 105
30
Das iniciativas legislativas apresentadas, o projeto de lei subscrito pelo PAN pretende alargar a experiência
da Rede de Serviços de Apoio Psicológico no Ensino Superior a todo o sistema de ensino público e criar uma
linha de apoio à saúde mental no ensino superior.
Se é verdade que esta questão se torna, hoje, mais premente, é também verdade que as respostas, há muito,
já eram da preocupação das instituições. Nas últimas duas décadas, as instituições têm feito um enorme esforço
para garantir uma resposta adequada aos desafios da saúde mental que estudantes, investigadores, docentes
e não-docentes têm colocado.
Importa, pois, destacar o trabalho de um número significativo de instituições de ensino superior que
disponibilizam gabinetes de apoio psicológico de promoção de bem-estar.
Bem sabemos que, apesar deste esforço, existe ainda um conjunto de necessidades identificadas, agravado
pelo impacto da pandemia na população mais jovem, que importa resolver.
É conhecido o empenho do Governo nesta matéria. Desde o Orçamento do Estado, está prevista a criação
e envolvimento na intervenção para problemas de saúde mental e será apresentado, em maio, o plano de
prevenção da saúde mental no ensino superior, tendo em vista a sua operacionalização a partir do próximo ano
letivo.
O diploma hoje em apreciação tem o mérito de manter em discussão este tema, que diz respeito a todos nós.
Gostaria de saber o que considera sobre o plano que estamos a implementar porque, no essencial, nada referiu
na sua proposta.
Considera que é extemporânea a apresentação desta iniciativa?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Sr.ª Deputada Rosa Venâncio, é, seguramente, uma pergunta muito
pertinente. Depois, a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real fará o favor de lhe explicar qual é o seu pensamento.
Sendo assim, passamos agora ao Grupo Parlamentar do Chega, tendo a palavra a Sr.ª Deputada Rita Matias,
para intervir.
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, a saúde mental carece de investimento
transversal e é por isso que apresentamos hoje, aqui, uma proposta específica, mas decisiva.
Pedimos o reforço do acesso a serviços de psicologia e orientação escolar para os alunos dos ensinos básico
e secundário, porque os dados não enganam: metade das doenças mentais surgem entre os 10 e os 19 anos,
sendo que a maioria das doenças não são diagnosticadas nem tratadas.
A depressão é a terceira doença mais comum entre adolescentes e o suicídio é a principal causa de morte
nos jovens entre os 15 e os 29 anos.
Por outro lado, o rácio português de psicólogos nas escolas é de mais de 1000 alunos por psicólogo escolar,
segundo a Ordem dos Psicólogos, situação que tende a ser mais alarmante nos contextos mais exigentes e
carenciados.
A crise de saúde mental é cada vez mais inerente ao processo de escolarização, se juntarmos a isto também
o facto de metade dos professores apresentarem sofrimento físico ou psicológico.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Podemos afirmar que nunca se viu uma crise de saúde mental tão grave nas
escolas portuguesas.
Aplausos do CH.
É por isto que temos o dever de exigir mais psicólogos nas escolas e de perceber que salvaguardar o bem-
estar psicológico dos nossos jovens a montante é poupar investimentos em doenças agravadas, e até doenças
físicas, a jusante.
Página 31
24 DE MARÇO DE 2023
31
E se, até aqui, podemos falar em uníssono, a partir daqui, julgo que o Chega está sozinho nesta Casa, porque
não embarcamos na externalização de responsabilidades, ao contrário dos senhores, que falam como se nunca
tivessem tido responsabilidades governativas.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — A crise de saúde mental nos jovens portugueses tem um nome e um responsável:
Governo socialista.
Aplausos do CH.
E, sejamos francos, o partido que se alterna no poder com este partido também não é muito melhor.
Aplausos do CH.
Quando um jovem português sofre com a ansiedade de ter de decidir entre o curso dos seus sonhos e a
opção que não o leva ao desemprego, a responsabilidade é vossa.
Quando um jovem deprime porque vê os seus pares a abandonarem o País, a responsabilidade é vossa.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Aí está!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Quando, na pandemia, isolaram crianças e não acautelaram as consequências
para o seu desenvolvimento e para o seu bem-estar, a responsabilidade foi vossa.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — É verdade!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Quando limitaram a liberdade de culto, continuando a perseguir quem tem fé, a
responsabilidade é vossa.
Aplausos do CH.
Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.
Quando criam dúvidas nas crianças e nos jovens e, acima de tudo, um clima de suspeição perante a primeira
instituição que as ama — e não tenham dúvidas de que é a família! —, a responsabilidade é vossa.
Vozes do CH: — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Quando, numa sala de aula, doutrinam crianças com a ideologia de género e
lhes dizem que não podem confiar na natureza nem naquilo que veem ao espelho, a responsabilidade é vossa.
Aplausos do CH.
Quando iniciam processos de transição social, mutilam crianças ou começam a entupi-las de bloqueadores
hormonais sem terem um parecer de psicólogo ou psiquiatra, a responsabilidade é vossa.
Protestos do Deputado do PS Miguel Matos.
Por isto, devemos ter vergonha destes políticos que promovem uma cultura de destruição. Os senhores têm
as mãos manchadas com o sofrimento físico e psicológico dos jovens portugueses.
Aplausos do CH.
Página 32
I SÉRIE — NÚMERO 105
32
Se, uma vez mais, chumbarem a proposta do Chega, perante o cenário que se avizinha de crise social e
económica, resta-me dizer: que Deus nos ajude e que ajude Portugal.
Aplausos do CH, tendo o Deputado Pedro dos Santos Frazão aplaudido de pé.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Vergonha!
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Castração física dos jovens, é o que fazem!
Protestos de Deputados do PS e contraprotestos do CH.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Peço alguma serenidade à Câmara.
Temos de prosseguir com o nosso debate e não é desta maneira que se resolvem os nossos pontos de vista.
Na democracia, é usando a palavra que se resolvem os pontos de vista.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): ⎯ Mande calar a bancada do PS!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — É chamar o diretor espiritual!
Protestos do Deputado do CH Pedro Pinto.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Num intento desesperado de serenar a Câmara, dou a palavra à Sr.ª
Deputada Carla Castro, da Iniciativa Liberal.
Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva e contraprotestos do Deputado do CH Pedro Pinto.
Pausa.
Peço a vossa atenção para a intervenção da nossa colega, a Sr.ª Deputada Carla Castro, a quem dou a
palavra.
A Sr.a Carla Castro (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que todos nós nesta Casa, sem exceção,
consideramos que há necessidade de manter a saúde mental como uma prioridade absoluta nas diversas
vertentes, sejam educativas, preventivas, remediativas ou de acompanhamento.
A Iniciativa Liberal considera que a qualidade na saúde mental de todos os cidadãos — incluindo crianças,
jovens e jovens adultos — deve resultar de políticas articuladas que, transversalmente, envolvam os setores
implicados, as diversas tutelas, como por exemplo a educação e a saúde, mas que assuma também uma
dimensão pessoal e de capacitação, que é importante não esquecer.
Consideramos que ainda, e de forma muito vincada, continua a ser necessário combater o estigma associado
à doença mental. A formação e a educação para a literacia psicológica são fundamentais.
Este é um problema que tem vindo a crescer. Era grave antes da pandemia — visível, por exemplo, no
elevado nível de ansiolíticos e de automedicação na população portuguesa — tendo passado, durante a
pandemia, a uma dimensão conhecida como «pandemia silenciosa».
No que diz respeito à realidade sobre a saúde mental nas escolas públicas, identificam-se vários problemas,
dos quais destacamos, por exemplo, o pouco tempo alocado ao apoio psicológico e psicopedagógico, ou, tal
como temos vindo a repetir variadíssimas vezes, a ausência de um mapeamento nacional de recursos.
Quanto às medidas aqui hoje trazidas, no contexto do ensino superior, compreendendo as suas boas
intenções, consideramos que os resultados de algumas correspondem à duplicação de serviços.
O Governo anunciou, ainda ontem, a criação de um plano nacional de saúde mental no ensino superior,
reconhecendo, nomeadamente, o agravamento das queixas, e a Iniciativa Liberal cá estará para ver se esse é
um plano que sairá do papel.
Página 33
24 DE MARÇO DE 2023
33
O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Já tinha anunciado em outubro!
A Sr.ª Carla Castro (IL): — Como em tudo, importa também ir à base do problema.
O que faz com que a saúde mental, em Portugal, esteja em estado tão clamoroso? O que provoca tamanha
desesperança? O que é que faz com que, em particular, assim se esteja na juventude, que é uma época de
realizações e de ânsias, certamente, mas também de esperança, de energia, de stamina?
Relembremos, por exemplo, o relatório Observatório Escolar: Monitorização e Ação | Saúde Psicológica e
Bem-Estar, de 2022, que nos mostrou evidências de que quase 30 % dos adolescentes portugueses se sentem
infelizes — quase o dobro do verificado em 2014 —; que 18 % dos adolescentes têm dificuldades em adormecer,
comparativamente com 8 %, em 2014; e que 25 % têm comportamentos autolesivos, em comparação com 20 %,
em 2014. Isto é um desastre!
Precisamos, em Portugal, de uma visão de futuro, de uma esperança e — sim! — de uma cultura de
realização, de esperança, de suporte, de risco e sempre, sempre em respeito pelas liberdades individuais. Com
isto teremos, sobretudo, uma base para uma menor incidência de problemas de saúde mental.
Precisamos também de uma maior capacitação e capacidade de realização de cada um, e estas são
legítimas aspirações que falham num País que parece estar sem rumo e sem futuro. Os sinais estão por todos
os lados e, como sociedade, não podemos olhar para o lado.
É essencial melhorar os instrumentos que existem e divulgá-los, para uma maior utilização e expansão. Isto
inclui ajudar a comunidade escolar e passa, sim, por intervir e direcionar.
Em suma — o que é muito importante —, precisamos de um País com futuro, com esperança e que, quanto
à saúde mental, tenha uma sociedade tolerante e aberta, que saiba, em geral, prevenir, identificar, não julgar e
ajudar a tratar.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — A Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real pediu a palavra. É para uma
interpelação à Mesa, Sr.ª Deputada?
A Sr.a Inês de Sousa Real (PAN): — Sim, Sr. Presidente, não tendo tempo para responder, irei pedir à Mesa
que distribua e faça chegar à bancada do Grupo Parlamentar do Partido Socialista a notícia de ontem que dá
nota de que o plano que foi anunciado, precisamente ontem, ainda nem sequer está em vigor.
A oradora exibiu a notícia a que se referiu.
Portanto, a extemporaneidade, a existir, será sempre do PS, e não do PAN.
Protestos de Deputados do PS.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Pode, então, enviar o documento à Mesa, Sr.ª Deputada.
A Sr.a Inês de Sousa Real (PAN): — Muito obrigada, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Prosseguindo, agora, para o Grupo Parlamentar do PSD, dou a palavra à
Sr.ª Deputada Maria Emília Apolinário.
A Sr.ª Maria Emília Apolinário (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP e o Chega
convocam-nos para a discussão da necessidade de psicólogos nos estabelecimentos públicos dos ensinos
básico e secundário, existindo algumas diferenças entre ambas as propostas.
O projeto de lei do Chega propõe o reforço da colocação de psicólogos nos estabelecimentos públicos dos
ensinos básico e secundário. Na composição das equipas técnicas, define um rácio de 1 psicólogo para 500
Página 34
I SÉRIE — NÚMERO 105
34
alunos, e também diz que, sempre que não possa ser cumprido esse mínimo, deve haver protocolos com
diversas entidades, desde o SNS aos serviços privados ou sociais.
Neste momento, o rácio, no continente, é de 1 psicólogo para 744 alunos.
Em contrapartida, o projeto de lei do PCP incide no recrutamento e colocação de psicólogos nas escolas
públicas, fala da composição das equipas técnicas e define, também, um rácio de 1 para 500, mas, sobretudo,
propõe a criação de uma carreira especial no Ministério da Educação, a aprovar no prazo de seis meses, bem
como a abertura de um processo negocial no prazo de 30 dias após a publicação da lei.
Ora, quanto a nós, isso interfere com a autonomia do Governo, uma vez que dá uma orientação concreta de
fixação de prazos. Além disto, tenho de avivar a memória do PCP, uma vez que, em 1997, foi criada a carreira
de psicólogo no Ministério da Educação, mas 21 anos depois, em 2018, esse diploma foi revogado, no âmbito
da legislação para a educação inclusiva, e os psicólogos transitaram para a carreira geral de técnico superior,
passando a ser contratados pelas escolas.
Em 2018, o Governo era de António Costa — era a geringonça! — e tinha o suporte do PCP, do PEV e do
Bloco!
Protestos dos Deputados do PCP Duarte Alves e João Dias.
Aplausos do PSD.
Tinha, tinha!
Agora, o PCP decidiu não se lembrar da geringonça, apagou-a da memória, tal como costuma apagar da
história as coisas de que não gosta.
Porque consentiu então o PCP que fosse revogado este diploma, em 2018, que acabou com a carreira de
psicólogo? Arrependeu-se e vem agora exigir a carreira de volta?!
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Maria Emília Apolinário (PSD): — No PCP há razões que a razão desconhece.
O Sr. António Cunha (PSD): — Bem visto!
A Sr.ª Maria Emília Apolinário (PSD): — O PSD, pelo contrário, tem memória, é um partido responsável,
apresentou um projeto de resolução sobre esta matéria, na Legislatura anterior, e acompanhará as propostas
que reforcem os psicólogos nas escolas, até porque são necessários e a recente pandemia deixou-nos de
herança uma espécie de estado de angústia coletiva.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem agora a palavra para intervir, pelo Grupo Parlamentar do Partido
Socialista, a Sr.ª Deputada Catarina Lobo.
A Sr.ª Catarina Lobo (PS): — Sr. Presidente, Caras Deputadas e Caros Deputados: Em boa hora, o PCP e
o Chega trazem projetos de lei que nos permitem discutir e demonstrar o longo caminho trilhado no reforço e na
colocação de psicólogos escolares, com efetiva preocupação e demonstrada ação por parte dos Governos dos
últimos anos.
Falamos da visão, da preocupação e, acima de tudo, da ação que ilustram a importância dos psicólogos, da
saúde mental e das respostas às constantes necessidades.
Afirmamos a visão que reconhece a psicologia em contexto escolar como um instrumento de reforço da
escola pública de qualidade e embora as iniciativas apresentadas possam convergir, genericamente, no seu
objeto, radicam numa visão da psicologia escolar muito diferente uma da outra.
Página 35
24 DE MARÇO DE 2023
35
A visão enviesada do projeto do Chega exige que sejamos inequívocos e que clarifiquemos de que perfil
profissional estamos a falar. Os psicólogos da educação intervêm não só no microssistema de cada indivíduo,
mas, preferencialmente, nos contextos e interações que promovam o desenvolvimento integral da pessoa.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Lobo (PS): — Quer isto dizer que a intervenção destes profissionais deverá ser multinível,
de forma a adequar a natureza dos serviços prestados às necessidades dos diferentes segmentos da população
escolar.
A psicologia em contexto escolar não é — nem pode ser! — uma versão da psicologia clínica e, por essa
razão,…
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Vergonha!…
A Sr.ª Catarina Lobo (PS): — … não se cinge à saúde ou doença mental e não assenta apenas numa lógica
de atendimento individual, numa relação de um para um.
Aplausos do PS.
Por isso, toda e qualquer proposta que assente nestas ideias é redutora, partindo mesmo de pressupostos
que estão errados.
Srs. Deputados, bastava ler atentamente o Decreto-Lei n.º 54/2018, do qual os psicólogos são parte
integrante. Os psicólogos contribuíram para esse enquadramento legislativo e o psicólogo escolar consta como
elemento permanente da equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva.
O Sr. Bruno Nunes (CH): — E onde é que estão?
A Sr.ª Catarina Lobo (PS): — Como resultado de todo o trabalho já realizado, temos, neste momento, 150 %
dos psicólogos que as escolas tinham em 2018.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): ⎯ Quantos são?!
A Sr.ª Catarina Lobo (PS): — Facto, aliás, que levou a Ordem dos Psicólogos Portugueses, no seu último
Congresso, em outubro de 2022, a assinalar esta significativa evolução no rácio do número de psicólogos por
aluno.
É hora, agora, de dar mais um passo rumo à estabilidade destes profissionais, estando em cima da mesa
negocial, como vimos ontem, uma relevante proposta para a vinculação de técnicos especializados das nossas
escolas, categoria onde se enquadram os psicólogos escolares.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): ⎯ Quantos?
A Sr.ª Catarina Lobo (PS): — Este tem sido um longo e sempre profícuo caminho…
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Profícuo?!
A Sr.ª Catarina Lobo (PS): — … na afirmação do papel dos psicólogos escolares e da sua importância,
como, aliás, se reconfirmou nas medidas do Plano de Recuperação de Aprendizagens pós-pandemia, no qual
muitos dos nossos agrupamentos escolares escolheram, precisamente, reforçar o serviço de psicologia e
orientação.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): ⎯ Porque será?
Página 36
I SÉRIE — NÚMERO 105
36
A Sr.ª Catarina Lobo (PS): — Este tem sido o percurso feito com os psicólogos, sabendo que ainda não
chegámos ao destino, mas estamos a fazê-lo, pelos psicólogos e, sempre e acima de tudo, pelos alunos e pelas
alunas.
Aplausos do PS.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): ⎯ Isso é que é negacionismo!
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria agradecer ao PCP pelo
agendamento deste tema, deste debate. De facto, a falta de psicólogos nas escolas, nas universidades, no SNS,
é um problema crónico, em Portugal.
É um problema que tem reflexos que são óbvios na alta prevalência de doença mental, mas não só. Tem
também reflexos nos problemas de aprendizagem, no desenvolvimento socioemocional, na perpetuação e
ampliação de desigualdades sociais e económicas que acontecem dentro da própria escola.
Estas consequências negativas são especialmente expressivas em momentos de crise, como aquele que
vivemos até há pouco tempo por razões sanitárias e o que estamos a viver agora por razões económicas. Fala-
se, obviamente, da pandemia e, agora, da conjuntura de inflação, que está a reduzir brutalmente o poder de
compra e a qualidade de vida de muitas famílias.
A pandemia foi já um episódio disruptivo e todos os estudos indicam que foram os mais jovens quem mais
sofreu psicologicamente, o que significa que o isolamento, a perda de contextos de socialização, os obstáculos
à emancipação ou o impedimento de certos rituais de socialização e transição tiveram impactos.
Neste momento, acresce a incerteza económica, que está a assaltar muitas famílias com impactos óbvios na
saúde e no bem-estar mental dos mais jovens pertencentes a essas mesmas famílias. Por exemplo, os
estudantes do ensino superior não conseguem encontrar quartos a um preço comportável, estão a aumentar os
pedidos para apoios de emergência, os rendimentos baixam e a precarização aumenta e só inocentes ou cínicos
é que podem achar que tudo isto não tem reflexo na saúde mental.
Se em todas as alturas se deve reforçar o número de psicólogos, nomeadamente em contexto escolar e
universitário, esse reforço é especialmente necessário no contexto em que vivemos. Por isso, já no Orçamento
do Estado para 2023, propusemos que o Governo contratasse psicólogos para os quadros das instituições de
ensino superior público, de modo a concretizar o rácio de um psicólogo para 500 alunos.
Contudo, apesar de ser uma reivindicação de federações, associações académicas, associações de
estudantes e de, inclusivamente, ir em linha com o que têm sido os pedidos da Ordem dos Psicólogos, esta
proposta foi chumbada pelo PS e pelo PSD, não reconhecendo, nessa altura do Orçamento, a necessidade de
aumentar o apoio aos estudantes em matéria de saúde mental.
Temos, atualmente, o negacionismo em relação à crise que vivemos e às suas consequências por parte do
Governo, em particular em relação à saúde mental, e isso só pode significar que as propostas que estão neste
momento em discussão, no sentido de aumentar o número de profissionais em contexto escolar e no ensino
superior, são muito importantes.
Basta-nos ouvir o que os próprios alunos dizem. Ainda há pouco tempo, Margarida Constantino, aluna do
11.º ano, escrevia no Público pedindo exatamente a contratação de mais psicólogos, a pretexto do estudo que
saiu e que dava indicação de que um terço dos alunos e metade dos professores apresentam sinais de
sofrimento psicológico. A própria Ordem dos Psicólogos apresentou duas propostas muito importantes de
reforço do número de psicólogos nos agrupamentos escolares, mas também nas instituições de ensino superior.
Portanto, para terminar, Sr. Presidente, há muitas pressões sentidas pelos jovens e pelas jovens — stresse,
ansiedade, depressão. Infelizmente, o Serviço Nacional de Saúde, no que toca à saúde mental, ainda está muito
aquém do necessário e é por isso que, genericamente, acompanhamos as iniciativas que estão hoje em
discussão.
Aplausos doBE.
Página 37
24 DE MARÇO DE 2023
37
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Voltamos ao Grupo Parlamentar do PSD, dando agora a palavra ao Sr.
Deputado Dinis Ramos.
O Sr. Dinis Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: «Um país que não tenha os seus jovens
com uma saúde mental razoável não é um país com um grande futuro.» A afirmação é de Miguel Xavier, da
Coordenação Nacional para as Políticas de Saúde Mental, e é uma afirmação, Srs. Deputados, que contrasta
com a realidade portuguesa.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Dinis Ramos (PSD): — Portugal é o segundo país da União Europeia com maior prevalência de doença
mental, tanto na população adulta, como na população jovem.
Posto isto, pergunto: o que é que fez o Partido Socialista até agora?
Aplausos do PSD.
Pois bem, no ano passado, anunciou um programa para a saúde mental no ensino superior, um anúncio
reforçado, em fevereiro, pelo Ministério do Ensino Superior e, no dia de ontem, pelo Ministério da Saúde. Mas o
que os senhores do Partido Socialista não sabem é que a saúde mental dos estudantes portugueses é um
assunto demasiado sério para viver de anúncios.
Aplausos do PSD.
Desafiamos, por isso, esta maioria parlamentar a sair da bolha em que se encontra e a conhecer a realidade.
O PSD apela a que se oiçam os estudantes e a que se atue rapidamente, porque, Srs. Deputados, a realidade
do País é esta: o Iscte (Instituto Universitário de Lisboa) tem cinco psicólogos para 13 000 alunos, sendo que
dois deles são pagos pela Associação de Estudantes; a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa tem
dois psicólogos para mais de 5000 alunos, os dois pagos também pela Associação de Estudantes; a
Universidade do Minho tem um psicólogo, imagine-se!, para toda a comunidade académica — estudantes,
docentes e pessoal não docente, num total de, sublinho, 23 000 pessoas.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Dinis Ramos (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr.as e Srs. Deputados, é esta a realidade da saúde mental nas universidades portuguesas, uma realidade
que o Partido Socialista parece não ter pressa em resolver.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Vai de novo usar da palavra o Grupo Parlamentar do Chega, através da
Sr.ª Deputada Rita Matias. Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Sr. Presidente, escutei atentamente a Sr.ª Deputada Catarina Lobo, do Partido
Socialista, que dizia que a nível da saúde mental dos nossos estudantes o Partido Socialista tem feito um longo
caminho e que tem demonstrada ação.
Ora, a demonstrada ação do Partido Socialista — e isso é dito pela Ordem dos Psicólogos Portugueses — é
que 61 % dos psicólogos escolares afirmam ultrapassar o rácio de psicólogos por 1000 alunos.
Não fui eu que o disse, não é o Chega que o diz, é a Ordem dos Psicólogos. Afinal, o Partido Socialista não
trilhou um caminho assim tão longo e glorioso como querem fazer querer.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
Página 38
I SÉRIE — NÚMERO 105
38
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Além disso, claramente, não terá lido aquilo que o Chega propõe, porque o Chega
propõe que haja um reforço do número de psicólogos nas escolas e que, onde a resposta pública não chegue,
se possa contar com o privado e com o setor social. Isto porque o que é fundamental é que os alunos não fiquem
para trás. É preciso definir onde é que queremos estar focados, se é nos alunos ou se é na vocação dos
psicólogos.
Aplausos do CH.
Pouco me importa se os psicólogos são mais vocacionados para uma coisa ou para outra. A questão é esta:
se as crianças e os jovens não têm acesso a psicólogo no centro de saúde, se as crianças e os jovens não têm
acesso a psicólogo no Serviço Nacional de Saúde, se não têm acesso a psicólogo na escola, onde é que as
crianças vão poder ter o apoio psicológico de que necessitam? E a isto o Partido Socialista não consegue
responder.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Claro! Têm de ler o projeto do Chega!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Mas também não conseguiu responder à provocação sobre o experimentalismo
social, sobre a ideologia de género e sobre a perversidade dos currículos que têm sido levados a cabo nas
escolas portuguesas e que têm taxas de arrependimento altíssimas. Isto deve-se ao sentimento de culpa e ao
facto de saberem que vão ficar no lado errado da História, com culpas piores do que, eventualmente, as do
experimentalismo nazi.
Aplausos do CH.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Sr.as e Srs. Deputados, estamos agora em condições de passar ao
encerramento deste ponto da ordem do dia e, por isso, dou a palavra ao Sr. Deputado Manuel Loff.
O Sr. Manuel Loff (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o debate demonstrou haver um consenso
— aparentemente, pelo menos — sobre os problemas de saúde mental, mas, seguramente, não há consenso
nem sobre as causas, nem sobre a multidimensionalidade da intervenção dos psicólogos escolares.
Neste debate há, pelo menos, um grupo parlamentar que participa retratando a realidade em termos
semelhantes a um filme de ficção-catástrofe, usando linguagem de há 70 ou 80 anos, mas nós precisamos de
um debate sério, sobre problemas sérios!
Aplausos do PCP e de Deputados do PS.
Quem nas nossas escolas precisa de apoio psicológico precisa de ser levado a sério.
Protestos do CH.
Com a apresentação deste projeto de lei, o PCP pretende que os estabelecimentos públicos de educação
pré-escolar e dos ensinos básico e secundário tenham, nos seus quadros de pessoal, e de acordo com as
necessidades específicas da comunidade escolar, o número adequado de psicólogos, justamente, de acordo
com o rácio que citamos no nosso projeto, de um psicólogo para 500 alunos, e que, de resto, está estabelecido
nas normas internacionais.
Neste sentido, o que pretendemos não é criar, é recriar, é restaurar uma carreira de psicólogos. Entendemos
que o regime de recrutamento, contratação e vinculação deixe de aplicar a estes trabalhadores as normas do
regime de recrutamento e contratação de docentes, pelo que o anúncio — é verdade, anúncio! — da vinculação
iminente de uma série destes técnicos, a nós, não nos satisfaz.
Página 39
24 DE MARÇO DE 2023
39
Em 1997 e até 2018, havia uma carreira de psicólogo e entendemos que ela deve ser restaurada.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Manuel Loff (PCP): — O nosso projeto prevê ainda um processo negocial neste mesmo sentido. Ao
reconhecimento e valorização do trabalho dos psicólogos em meio escolar é fundamental que correspondam
condições efetivas de estabilidade laboral e pessoal, bem como a possibilidade de ingresso e progressão numa
carreira. Isto é válido para todos os trabalhadores, mas é, sobretudo, coerente num contexto de pós-pandemia
marcado pelo impacto que, nos alunos do ensino básico e secundário, teve o ambiente social e emocional vivido
nos períodos de confinamento e de encerramento das escolas.
Não podemos continuar a diagnosticar problemas sem contribuir decisivamente para a sua resolução.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Adão Silva): ⎯ Ficou assim concluído o debate sobre o ponto 3 da ordem de trabalhos de
hoje.
Vamos passar agora ao ponto 4 que consiste na apreciação da Petição n.º 29/XV/1.ª (Comissão de utentes
da saúde do concelho de Peniche)…
Protestos do Deputado do CH Pedro Pinto.
Peço aos Srs. Deputados que respeitem a Mesa, sobretudo no anúncio de uma petição que é a voz direta
dos cidadãos nesta Câmara.
Pausa.
Como estava a dizer, vamos proceder à apreciação da Petição n.º 29/XV/1.ª (Comissão de utentes da saúde
do concelho de Peniche) — Garantir o acesso aos serviços dos cuidados de saúde primários e dos cuidados
hospitalares no concelho de Peniche, juntamente com os Projetos de Resolução n.os 421/XV/1.ª (PSD) —
Recomenda ao Governo que assegure a criação de um SUB – Serviço de Urgência Básica no Centro de Saúde
da Marinha Grande, 431/XV/1.ª (CH) — Garantir o acesso aos serviços dos cuidados de saúde primários e dos
cuidados hospitalares no concelho de Peniche, 443/XV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que promova as
diligências necessárias à melhoria do acesso ao SNS no Oeste, 464/XV/1.ª (BE) — Acesso a cuidados de saúde
no concelho de Peniche, 473/XV/1.ª (PCP) — Recomenda ao Governo o reforço de profissionais de saúde nos
cuidados de saúde primários no concelho de Peniche e nas valências do hospital de Peniche, 475/XV/1.ª (L) —
Recomenda ao Governo que crie um serviço de urgência básica no centro de saúde da Marinha Grande, e
479/XV/1.ª (L) — Recomenda ao Governo que diligencie por melhorias no acesso ao Serviço Nacional de Saúde
no Oeste.
Tenho o maior gosto em saudar as Sr.as e os Srs. Peticionários desta petição n.º 29/XV/1.ª que arrasta, para
discussão, sete projetos de resolução — veja-se o interesse que esta matéria suscitou no Parlamento.
Sendo assim, dou a palavra, de imediato, ao Sr. Deputado do Grupo Parlamentar do PSD, Hugo Oliveira,
para fazer a apresentação do projeto de resolução do seu grupo parlamentar.
O Sr. Hugo Patrício Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo, naturalmente, por
saudar os peticionários que nos acompanham e nos trazem aqui uma preocupação latente com os cuidados de
saúde primários e cuidados de saúde hospitalares no concelho de Peniche.
O concelho de Peniche é um concelho predominantemente ligado à agricultura e à pesca, mas está também
ligado ao turismo e duplica, pelo menos, diria eu, os seus habitantes no verão. Estes utentes, sazonais ou não,
têm claramente dificuldades no acesso aos cuidados de saúde nesse concelho.
Vejamos: no que diz respeito aos cuidados de saúde primários, cerca de 50 % dos utentes não têm médico
de família; os quatro centros de saúde existentes têm uma dificuldade terrível, por falta de profissionais, em
Página 40
I SÉRIE — NÚMERO 105
40
conseguir prestar os serviços nos cuidados de saúde primários a todos estes utentes; a falta de profissionais é
gritante.
Mas quando falamos nos cuidados de saúde hospitalares em Peniche, verificamos também que as equipas
médicas precisam de ser reforçadas, que o hospital precisa de obras e que os cuidados de saúde deixam muito
a desejar.
Estou certo de que não é o momento para falarmos do hospital do Oeste ou sobre a sua localização — não
é, por certo! —, mas há necessidade de falar da importância desse hospital e da sua criação, para garantir que
estes utentes tenham melhores condições de acesso aos cuidados de saúde.
Percebemos que um hospital não se faz com um estalar de dedos, mas, porque a população merece essa
atenção e esses cuidados de saúde, será fundamental garantir as obras previstas no plano diretor do Centro
Hospitalar do Oeste — não somente para Peniche, mas para as Caldas da Rainha e Torres Vedras — para dar
condições condignas a estes utentes.
Deixem-me olhar para esta matéria na perspetiva do distrito de Leiria: a melhoria dessas condições é
fundamental quando falamos no sul do distrito, já na entrada do distrito de Lisboa, mas é quando falamos no
norte do distrito que entra o projeto de resolução que aqui apresentamos hoje.
O projeto refere a necessidade da criação de um serviço de urgência básica no concelho da Marinha Grande.
Este concelho é predominantemente industrial. Tem indústria pesada e de alguma perigosidade, que trabalha
24 horas sobre 24 horas, e, existindo um acidente, a prestação de cuidados imediatos não se compadece com
a distância do hospital, em Leiria, para onde se vão transportar esses acidentados.
Assim, a criação do SUB (Serviço de Urgência Básica) na Marinha Grande é uma necessidade que permitirá
também aliviar a carga sobre o Hospital de Leiria, que foi construído para 230 000 utentes e hoje tem perto de
400 000, bem como sobre o serviço de atendimento permanente, que existe e que já dá também apoio ao norte
do concelho de Alcobaça até ao concelho da Nazaré.
Aquilo que se pretende — e para terminar —, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, é que, quer seja a norte,
quer seja a sul do distrito de Leiria, se garantam os cuidados de saúde primários com a contratação de mais
profissionais e criando condições nos centros hospitalares para garantir esses cuidados aos utentes do distrito,
mas também a quem nos visita, porque somos um distrito bastante turístico.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Pelo Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado Gabriel
Mithá Ribeiro.
O Sr. Gabriel Mithá Ribeiro (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na qualidade de Deputado
eleito pelo distrito de Leiria pelo Partido Chega, cumprimento a Comissão de utentes da saúde do concelho de
Peniche, peticionários que reivindicam o reforço do acesso a cuidados de saúde.
A questão prioritária remete para os centros de saúde, pequenas unidades de consultas e cuidados primários
que são muitíssimo diferentes da grandeza e multiplicidade de valências de um hospital.
Claro que as populações envelhecidas da região precisam da construção do novo hospital do Oeste. Essa
questão é crucial, mas esse não é o tema. O que está em causa é o vício de responder às queixas de cima para
baixo, do grande para o pequeno,…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Gabriel Mithá Ribeiro (CH): — … do maior hospital de uma grande cidade para o menor centro de
saúde de uma pequena freguesia rural. Contudo, as soluções nunca chegam.
As populações do concelho de Peniche estão a confrontar o Parlamento com o inverso: exigem respostas do
micro para o macro, de baixo para cima, do pequeno para o grande. Quem tem de resolver um problema grande
e complexo falha, se começar por soluções grandiosas.
Rigor no método é fragmentar o problema grande em pequenas unidades. Depois, procurar soluções micro
para cada uma dessas pequenas unidades — chama-se a isto racionalidade.
Página 41
24 DE MARÇO DE 2023
41
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Gabriel Mithá Ribeiro (CH): — Já seria uma grande vitória encontrar soluções para o centro de saúde
de uma única freguesia.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Claro!
O Sr. Gabriel Mithá Ribeiro (CH): — Por exemplo, a extensão de saúde de Atouguia da Baleia, a maior
freguesia rural do concelho de Peniche, não tem qualquer médico de família e o centro de saúde de Ferrel só
tem um médico de família e um enfermeiro para cerca de 3000 utentes. Bastaria a contratação direta de dois,
três, quatro ou cinco médicos, para responder às reivindicações das populações.
Não estamos a falar de um hospital. O básico racional recomendaria, por exemplo, que a Câmara Municipal
de Peniche pudesse contratar dois, três, quatro, cinco médicos, como contrata engenheiros, projetistas ou
arquitetos.
Aplausos do CH.
O poder municipal existe para encontrar soluções de proximidade para a sua população. Uma classe política
que não consegue implementar uma descentralização micro desta natureza é porque prefere processos de
descentralização grandiosos e vagos, que não beneficiam as populações, apenas a própria classe política.
O poder central do Estado, o Ministério da Saúde, dá provas de não ser mais capaz de gerir um número
volumoso de médicos, enfermeiros e demais pessoal especializado da área da saúde. As populações
carenciadas beneficiariam se o Ministério da Saúde se concentrasse em resolver os problemas das unidades
macro, das grandes unidades dos hospitais, e deixasse as unidades micro, os centros de saúde das freguesias,
entregues às câmaras municipais. Isso seria reforçar o Estado social.
Façam-se experiências-piloto, pelo menos no caso das martirizadas freguesias rurais ou de pouca densidade
populacional. Contratar dois, três, quatro, cinco médicos ou enfermeiros para os centros de saúde das freguesias
de Atouguia da Baleia, Serra d’El Rei, Ferrel ou Peniche não transformaria a Câmara Municipal de Peniche
numa espécie de Ministério da Saúde. O município apenas acrescentaria meia dúzia de funcionários aos seus
quadros.
O problema é que Governos e forças políticas centralizados e centralizadores não toleram que uma câmara
municipal de outra orientação política, politicamente desalinhada, possa ter a mínima influência sobre
professores, médicos ou enfermeiros. Esses são os grandes grupos socioprofissionais que decidem eleições.
A forma irracional como se defende o Estado social é a máscara da pulsão política da esquerda de controlo
eleitoral centralizado dos grandes grupos socioprofissionais.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Gabriel Mithá Ribeiro (CH): — Vou já concluir, Sr. Presidente.
Essa subversão da democracia sacrifica a saúde e a qualidade de vida das populações, agrava, há décadas,
a coesão do território nacional, a desertificação do interior, a excessiva concentração da população no litoral.
A política não pode continuar inimiga da racionalidade e da responsabilidade.
Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Passamos, agora, à intervenção do Grupo Parlamentar do Partido
Socialista, pela Sr.ª Deputada Sara Velez.
A Sr.ª Sara Velez (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, gostaria de começar por
saudar os 7581 peticionários e os autarcas que os acompanham e que estão hoje, aqui, abundantemente
representados nesta Assembleia da República.
Página 42
I SÉRIE — NÚMERO 105
42
Quero saudar estes peticionários, que, num ato de responsável participação cidadã, se mobilizaram para
defender os seus direitos, nomeadamente o direito constitucionalmente garantido de acesso a cuidados de
saúde.
Os peticionários clamam pela resolução do problema de garantia de acesso a médicos de família no concelho
de Peniche, contando-se em 45 % a população deste concelho sem acesso a médico de família. Esta situação,
ao momento da realização da petição, era particularmente grave na extensão da Atouguia da Baleia, a maior
freguesia rural deste concelho, e onde não existia qualquer resposta nesta área.
Efetivamente, Sr.as e Srs. Deputados, a área do ACES (agrupamento de centros de saúde) Oeste Norte, que
abrange também o concelho de Peniche, bem com a área do ACES Oeste Sul são das mais atingidas, no País,
pela falta de médicos de família, comprometendo o funcionamento das diferentes unidades e extensões de
saúde e deixando centenas de utentes sem acesso a cuidados de saúde primários.
No ACES Oeste Norte temos, no dia de hoje, 46 928 utentes sem médico de família, no ACES Oeste Sul são
70 835 — dados do portal da Transparência, do SNS, hoje mesmo consultados. No total, a região do Oeste tem
mais de 100 000 utentes inscritos sem médico de família, uma população com um perfil demográfico envelhecido
e caracterizado por uma forte prevalência de doenças crónicas.
Algumas destas unidades encontram-se desdobradas em extensões que não têm, neste momento, qualquer
equipa médica. Estão ainda localizadas a distâncias consideráveis das sedes das unidades de saúde familiar
(USF) a que pertencem, pelo que o seu encerramento, por falta de profissionais de saúde, e, às vezes, também,
por falta de administrativos, impossibilita mesmo a deslocação de pessoas mais vulneráveis, económica e
socialmente, às sedes destas USF.
Acresce a estas dificuldades na região, o facto de, também ao nível dos cuidados hospitalares, a resposta
estar bastante comprometida quer pela sobrecarga de procura das unidades hospitalares das Caldas da Rainha,
de Peniche e de Torres Vedras, que integram o Centro Hospitalar do Oeste e que servem toda esta população,
quer pela própria idade, obsolescência e condições estruturais e de equipamentos destes três hospitais, com
distâncias bastante consideráveis entre si.
É, por isso, consensual, como é sabido, a necessidade da construção de uma nova unidade hospitalar que
sirva a população desta região.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Sara Velez (PS): — Sublinhamos, com agrado, o compromisso recentemente assumido pelo Sr.
Ministro da Saúde, e expresso no Relatório do Orçamento do Estado para 2023, sobre a concretização do novo
Hospital do Oeste.
De referir, também, a recente publicação do Despacho n.º 556/2023, de 11 de janeiro, que: «Constitui um
grupo de trabalho para análise técnica com vista à decisão sobre a localização do futuro hospital do Oeste e
respetivo perfil funcional, bem como sobre a calendarização, o modo de operacionalização e o financiamento do
processo da sua construção.»
Reconhecem-se também os diferentes investimentos que têm vindo a ser feitos nas diferentes unidades
hospitalares que integram o Centro Hospitalar do Oeste, e que têm de continuar a ser feitos para que estas
unidades possam dar resposta efetiva e eficaz àquelas que são as necessidades das populações que servem.
Registamos, também, como muito positivo o compromisso para a elaboração de um plano, por parte do Sr.
Ministro da Saúde, que possa mitigar a falta de médicos especialistas de medicina geral e familiar nas diferentes
regiões do País.
Assim, e não só para dar resposta às necessidades do concelho de Peniche, mas a todo o Oeste, o Grupo
Parlamentar do PS apresenta este projeto de resolução, que recomenda ao Governo que identifique as áreas
de influência do ACES Oeste Norte e Sul como áreas de intervenção prioritária no plano que está a elaborar
para resolver os problemas da falta de médicos especialistas em medicina geral e familiar.
Recomendamos também que aumente, na região Oeste, a capacidade de transposição das USF de modelo
A para B e que promova a criação de centros de responsabilidade integrados ao nível hospitalar, tornando, desta
forma, estas estruturas mais atrativas para a fixação de médicos e outros quadros clínicos.
Página 43
24 DE MARÇO DE 2023
43
Por fim, propomos ao Governo que crie as condições necessárias para que sejam realizados os
investimentos previstos no Plano Diretor do Centro Hospitalar do Oeste, permitindo que estas unidades possam
continuar a dar uma resposta eficaz aos seus utentes.
Em conjunto com a petição que hoje aqui discutimos, deram igualmente entrada duas iniciativas sobre a
criação de um serviço de urgência básica no concelho da Marinha Grande, que, desde já, gostávamos, não só
estas iniciativas, mas todas elas, saudar.
Embora este último projeto tenha tido por motivação — declarada, aliás, nas exposições de motivos que
acompanham as iniciativas — uma outra petição, desta feita, na Marinha Grande, a verdade é que,
curiosamente, diria eu, os autores das iniciativas resolveram arrastá-las para este debate e por isso vamos então
falar sobre elas.
Sobre estes projetos, importa referir o seguinte: em primeiro lugar, o Governo tem vindo a implementar
medidas de acesso às urgências e aos cuidados de saúde, entre as quais o funcionamento de mais 221 centros
de saúde abertos aos sábados e 180 em desdobramento abertos aos domingos, com horários de atendimento
alargado nos dias úteis e complementares aos fins de semana e aos feriados, disponibilizando uma resposta de
proximidade à comunidade em situações de saúde não emergentes. Acrescento também que a Marinha Grande
dispõe de um SAP (Serviço de Atendimento Permanente).
Em segundo lugar, importa igualmente recordar que os serviços de urgência básica funcionam, por regra,
em ambiente hospitalar e/ou são criados quando a distância a um hospital de referência seja significativa, sendo
que, no caso particular, estamos a falar de uma distância de cerca de 5 km.
Acresce ainda que está em curso, como deverá ser do conhecimento de todas as Sr.as e os Srs. Deputados,
a criação de uma unidade local de saúde que envolve estes ACES (Agrupamentos de Centros de Saúde), pelo
que a reorganização, quer dos serviços, quer das configurações, está, no momento em que discutimos estas
iniciativas, a ser estudada e a sua posterior configuração e implementação irão certamente alterar a forma como
estes serviços se organizam nesta área de abrangência.
Recomenda a prudência, as boas práticas e até a racionalidade e o rigor que se deve dar a estas medidas
que possamos esperar pela resposta que daí surgir.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Sr.ª Deputada, tem de concluir.
A Sr.ª Sara Velez (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr.as e Srs. Deputados, para terminar, deixo aqui o nosso compromisso — desta bancada parlamentar e do
Governo — aos peticionários e ao País de continuarmos todos os dias a trabalhar para que os serviços de
saúde, as suas condições e o acesso na sua resposta melhorem, procurando, desta forma, ir ao encontro das
necessidades das populações que, muito justamente, trazem aqui as suas preocupações que precisam de uma
resposta.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para apresentar o projeto de resolução do Bloco de Esquerda, tem a
palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, o Grupo Parlamentar
do Bloco de Esquerda quer saudar os mais de 7500 peticionários que trouxeram o tema do acesso a cuidados
de saúde no concelho de Peniche ao Parlamento, em particular a comissão de utentes que dinamizou esta
petição.
Na verdade, os dados são muito preocupantes. A população de Peniche está inserida na ARS (Administração
Regional de Saúde) de Lisboa e Vale do Tejo, onde, em janeiro de 2023, existiam mais de 1 milhão e 70 mil
utentes sem médico de família, ou seja, mais de 25 % de utentes dessa região. A mesma percentagem se regista
no Agrupamento de Centros de Saúde Oeste Norte, onde se insere Peniche.
Conforme nos indicam os dados constantes no siteBI-CSP — Bilhete de Identidade dos Cuidados de Saúde
Primários, referentes também a janeiro de 2023, na unidade de cuidados de saúde personalizados, mais de
35 % dos utentes não tinha médico de família atribuído, existindo apenas 7 clínicos para cerca de 18 900 utentes
Página 44
I SÉRIE — NÚMERO 105
44
inscritos e para 4 edifícios. Mesmo a USF (unidade de saúde familiar) Marés registava, novamente em janeiro
de 2023, quase 20 % de utentes sem médico de família.
Como disse, os dados são preocupantes e traduzem-se num entrave objetivo ao acesso a cuidados de saúde
primários.
Mas há outros problemas. O hospital de Peniche, que está inserido no Centro Hospitalar do Oeste, tem sido
palco de vários problemas relacionados com a falta de profissionais, o que é reflexo de um óbvio desinvestimento
do Governo no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Por exemplo, o serviço de urgência do Hospital S. Pedro
Gonçalves Telmo, em Peniche, esteve totalmente encerrado em alguns dias do final de 2022.
Na verdade, os números apresentados para este concelho não são aceitáveis e colocam em causa o direito
à saúde da população e demonstram, uma vez mais, a degradação do SNS que está a ser levada a cabo pelo
PS.
Existem cada vez mais utentes sem médico de família e sabemos que existem médicos de família, porque
eles são formados todos os anos no SNS. Mas o Governo não tem políticas que lhes permitam fixar-se. Por
exemplo, no último concurso para contratação de especialistas em medicina geral e familiar, não só foram
abertas menos vagas do que concorrentes como se manteve uma altíssima taxa de vagas desertas,
nomeadamente nas regiões mais carenciadas.
Por isso, e por forma a garantir o acesso a cuidados de saúde por todas as populações, em especial de
Peniche, que hoje aqui discutimos, propomos que se abram, de imediato, concursos para médico de família,
priorizando zonas onde há ficheiros a descoberto e garantindo cobertura à população do concelho de Peniche.
Mas, para que estes concursos não voltem a ficar desertos, propomos também que o Governo preveja a
revisão da carreira e da remuneração dos profissionais, criando assim incentivos à fixação e à exclusividade no
SNS. Igualmente propomos que se retirem as barreiras à criação e evolução de unidades de saúde familiar
modelos A e B; que o Governo vede a possibilidade de privatização dos cuidados de saúde primários; que invista
nos cuidados de saúde de nível hospitalar, nomeadamente no Centro Hospitalar do Oeste e no hospital de
Peniche; e que, para a efetivação do número anterior, sejam contratados profissionais e adquirida a tecnologia,
sendo abertos imediatamente os respetivos concursos, porque o direito do acesso à saúde deve chegar, sim, a
todas as populações do nosso País.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para apresentar o projeto de resolução do PCP, tem a palavra o Sr.
Deputado João Dias.
O Sr. João Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, saudar, cumprimentar
e felicitar os mais de 7500 peticionários que fizeram da luta do concelho de Peniche sobre o acesso aos cuidados
de saúde primários uma luta de longa data e constante, organizada em torno da defesa não só do hospital de
Peniche, mas também dos cuidados de saúde primários, que foi possível manter abertos no hospital de Peniche,
assumindo o serviço de urgência básica e um serviço de medicina, assim como o serviço de fisiatria.
Quero, antes de mais, deixar claro que, atualmente, o concelho de Peniche está a atravessar uma situação
gravosa relativamente ao acesso aos cuidados de saúde, sobretudo a nível dos cuidados de saúde primários.
Cerca de 45 % da população está sem médico de família, sendo o caso da população da freguesia de Atouguia
da Baleia a mais gravosa, tendo apenas como resposta um médico de reforço para 6000 utentes.
É urgente uma solução, no mais curto intervalo de tempo possível, para os problemas de acesso à saúde do
concelho de Peniche, com implicações graves na população ao nível preventivo, curativo e de reabilitação,
pondo em causa o direito constitucional do acesso à saúde desta população.
Srs. Deputados, é necessário intervir e com urgência na situação atual e antecipar as dificuldades que se
avizinham, nomeadamente a aposentação de médicos de família, situação que se prevê para breve prazo. Trata-
se de uma situação de escassez de recursos que não se limita unicamente aos médicos de família. Estende-se
também aos enfermeiros e mesmo aos secretários clínicos. Presentemente, cada enfermeiro tem a seu cargo
uma média de 2400 utentes com uma prestação de cuidados de enfermagem que vai às extensões de saúde,
com cuidados domiciliários. Portanto, também o setor de enfermagem se encontra envelhecido e, a breve prazo,
vários enfermeiros irão aposentar-se.
Página 45
24 DE MARÇO DE 2023
45
A falta de resposta em matéria de cuidados de saúde primários, quer aos residentes do concelho, quer à
população dita flutuante ou sazonal, faz com que esta resposta de cuidados médicos recaia sobre o serviço de
urgência do hospital de Peniche, demonstrando, uma vez mais, a fragilidade e a falta de investimento na saúde
no concelho de Peniche.
A falta de investimento não se verifica unicamente nos cuidados de saúde primários, mas também no hospital
de Peniche.
É por isso, Srs. Deputados, que o PCP traz a esta Casa um projeto de resolução que recomenda ao Governo
a garantia do direito e do acesso à saúde da população do concelho de Peniche, através da contratação de
profissionais de saúde em falta, nomeadamente de médicos e enfermeiros de família, de psicólogos, de
assistentes técnicos, de assistentes operacionais, para assegurar médico de família e equipa de saúde familiar
a todos os utentes do concelho de Peniche.
Recomenda também a dotação de mais profissionais de saúde para reforçar as diversas unidades funcionais
do ACES Oeste Norte, a melhoria das condições de prestação de cuidados de saúde no hospital de Peniche, a
nível do serviço de urgência básica; e a manutenção das valências de fisiatria e ortopedia e a criação de novas
valências, designadamente a psiquiatria, tão importante.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Dias (PCP): — Recomenda a mobilização de fontes de financiamento para o investimento nas
instalações e nos equipamentos do hospital de Peniche, através do recurso a fundos comunitários e à alocação
de verbas do Orçamento do Estado para esse fim.
Finalmente, recomenda o reforço do recrutamento de profissionais de saúde para suprir as necessidades e
a criação de condições para a fixação de profissionais de saúde, designadamente médicos, enfermeiros e
secretários clínicos, no hospital de Peniche, e que considere também a importante valorização profissional,
social e remuneratória, através da dignificação das carreiras e da implementação de um regime de dedicação
exclusiva que garanta condições de trabalho e modernização de equipamentos.
A população de Peniche pode contar com o PCP nesta luta.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para apresentar os projetos de resolução do Livre, tem a palavra o Sr.
Deputado Rui Tavares.
O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por saudar, como já
foi feito pelos anteriores oradores, os peticionários e peticionárias do concelho de Peniche, que nos trazem aqui
não só um ato de cidadania, mas acima de tudo um alerta motivado por razões da necessidade mais básica.
Quando nos dizem que na freguesia da Atouguia da Baleia não há médico de família, isso significa praticamente
metade do concelho ou talvez mesmo mais de metade do concelho de Peniche.
É por isso que, num dos dois projetos de resolução que o Livre apresenta neste debate, que recomenda ao
Governo melhorias no acesso ao Serviço Nacional de Saúde no Oeste, logo o nosso primeiro ponto recomenda
ao Governo que «invista no sentido de estabelecer as condições de funcionamento adequadas no Hospital de
Peniche e na Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados de Peniche, nomeadamente nos seus polos de
Atouguia da Baleia, de Serra d’El Rei e de Ferrel».
É uma realidade que, infelizmente, não é só restrita a Peniche. Mas também é verdade que contribuir para
resolver estes problemas em Peniche ajuda toda a região do Oeste. Mais do que isso, nos distritos de Lisboa e
de Santarém e nas regiões ribatejanas que são contíguas ao Oeste, na verdade, há uma enorme falta de
cuidados de saúde. Portanto, precisamos de um reforço muito grande nos cuidados de saúde naquela região.
A Sr.ª Deputada Sara Velez, do PS, que falou antes de mim, mencionou que o Livre apresentava aqui um
projeto que tem a ver com outra região do distrito de Leiria, a Marinha Grande. É verdade e é importante explicar
porquê. Em primeiro lugar, porque os Deputados únicos na Assembleia da República, do Livre e do PAN, não
têm os mesmos direitos de agendamento que têm os grupos parlamentares.
Página 46
I SÉRIE — NÚMERO 105
46
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Oh!
O Sr. Rui Tavares (L): — As ocasiões de apresentar projetos de resolução como estes são as ocasiões nas
quais outros projetos de resolução são agendados e, portanto, podemos associar os nossos.
Mas creio que não é certamente desprimor nem desdouro para Peniche sabermos que no norte do distrito
de Leiria também há problemas a resolver.
Já foi aqui lembrado que a Marinha Grande é uma região também muito populosa, onde vivem cerca de
40 000 pessoas. Tem um hospital em Leiria, mas esse serve mais de 200 000 pessoas e também precisa de
cuidados.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — O debate é sobre Peniche!
O Sr. Rui Tavares (L): — Este País faz-se na entreajuda, na solidariedade e na coesão.
Votando a favor dos dois projetos de resolução do Livre, o que espero que o PS, Sr.ª Deputada Sara Velez,
venha a fazer, contribui para ajudar a resolver os problemas no Oeste, mas também no norte do distrito de Leiria,
na região do Pinhal.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Passamos agora às intervenções dos grupos parlamentares que não têm
iniciativas.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Cordeiro, do Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal.
A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por cumprimentar os 7581
subscritores desta petição, que nos alerta para os constrangimentos no acesso a cuidados de saúde no concelho
de Peniche.
Como se sabe, e como podemos verificar também pelas várias iniciativas legislativas arrastadas a esta
petição, infelizmente a falta de acesso a cuidados de saúde não se verifica apenas em Peniche. Estes
constrangimentos verificam-se por todo o País, nomeadamente em toda a região do Oeste, tema que, aliás, já
tem aqui sido abordado.
Como a Iniciativa Liberal tem vindo a afirmar, a defender e a propor, reforço que a abordagem na área da
saúde deve ser transversal e com visão de futuro.
As soluções não podem ser sempre aleatórias, feitas em cima do joelho, e muito menos podem estar limitadas
a encerramentos de unidades de saúde, por falta de capacidade em reter profissionais para as manter abertas.
Importa acautelar previsibilidade, mas, acima de tudo, importa que ninguém fique privado do acesso a cuidados
de saúde. O superior interesse das pessoas e o seu direito de acesso, que está constitucionalmente garantido,
não pode, em momento nenhum, ser comprometido por interesses partidários, por incapacidade estratégica de
gestão e, muito menos, por preconceitos ideológicos.
A região do Oeste é, há muitos anos, paradigmática da falta de visão estratégica de sucessivos Governos, e
o Partido Socialista, tendo governado 20 dos últimos 27 anos, não pode sacudir a água do capote.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Durante anos, não se acautelaram as previsíveis reformas de médicos que,
como era evidente, iriam deixar populações desprotegidas, e o resultado está à vista de todos. E, se este é um
problema transversal a todo o País, mais grave se torna quando impacta regiões com populações mais
envelhecidas ou cuja população aumenta em determinadas épocas do ano, como é o caso de Peniche, da
Marinha Grande ou do Oeste, em geral. Os habitantes e os turistas do Oeste não podem continuar a ser
ignorados por este Governo. São promessas de médicos que não chegam e promessas de hospitais que não
saem do papel.
O País está farto de incompetência e está farto de mentiras. E é verdadeiramente extraordinário ver o projeto
de resolução que o PS traz a este debate, em que até faz um retrato bastante razoável das várias dificuldades,
mas, Srs. Deputados, quem é que está no Governo há oito anos? Se conhecem tão bem os problemas do Oeste,
porque é que não usam a vossa influência para, junto do Governo, resolver estes problemas?
Página 47
24 DE MARÇO DE 2023
47
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Mais nada!
A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Sobre os projetos de lei do Bloco de Esquerda e do PCP, novamente a fórmula
mágica: preconceitos contra o setor privado e a exclusividade dos médicos. E, enquanto isso, as pessoas ficam
sem resposta.
Sr.as e Srs. Deputados, para a Iniciativa Liberal, os problemas resolvem-se com liberdade de escolha, para
as pessoas e para os profissionais de saúde. Tivessem sido aprovadas as nossas propostas para dar um médico
de família a todas as pessoas, para a implementação das USF modelo C, e muitos dos constrangimentos desta
região poderiam estar resolvidos. E quanto à localização do novo hospital do Oeste, o que pedimos é que se
defenda o interesse das pessoas em detrimento de qualquer outro interesse.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Pelo PAN, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Inês de
Sousa Real.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de começar por saudar os
peticionários, bem como a Comissão de Utentes da Saúde do Concelho de Peniche, quer pelo trabalho que têm
desenvolvido, quer também por nos trazerem este tema a debate.
Antes de entrar no tema em concreto, permita-me apenas que diga, Sr.ª Deputada Joana Cordeiro, da
Iniciativa Liberal, que falar em liberdade de escolha, quando não há opção nem no privado nem no público e
quando as pessoas não têm os mesmos rendimentos, é falaciar aquilo que, efetivamente, é o elevador social,
que há muito está avariado no nosso País.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Vá estudar!
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — É por isso que o PAN se põe ao lado da oferta pública, no que diz
respeito à saúde. Porque quando falamos — aliás, é impossível ficarmos indiferentes ao número absolutamente
elevado e assustador — que mais de 35 % da população em Peniche não tem médico de família,…
O Sr. João Dias (PCP): — É 45 %, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — … aliás, que mais de 45 %, Sr. Deputado, da população não tem
médico de família, percebemos a importância do Serviço Nacional de Saúde, dos centros de saúde e de termos
acesso público àquilo que tem de ser um direito de todos os nossos concidadãos.
De facto, é intolerável hoje, não só este rácio, mas também que mais de metade do investimento que é
dedicado à saúde vá, também, para serviços privados,…
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Públicos ou privados não interessa, têm é de existir!
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — … porque esse é um argumento absolutamente falacioso, quando
olhamos para os números e para o investimento que o Estado acaba por fazer.
Tem havido, também, um debate em torno daquela que possa ser a opção de um centro hospitalar do Oeste.
Sabemos que uma futura solução irá servir parte da população, independentemente da localização que está a
ser discutida, mas, enquanto se discutem localizações, o problema local e nacional continua sem resposta e é,
por isso, fundamental garantir que, quer para Peniche, quer para o demais País, existam respostas e soluções.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Página 48
I SÉRIE — NÚMERO 105
48
O PAN estará ao lado daqueles que apresentam soluções neste debate e iremos votar favoravelmente as
propostas, não só para este problema, como para os demais.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — O debate sobre esta petição chegou ao fim.
Quero agradecer, em nome do Parlamento, às Sr.as e aos Srs. Peticionários que tiveram a bondade de estar
connosco. Foi um prazer ter-vos connosco.
Vou, agora, passar a palavra à Sr.ª Secretária Palmira Maciel, que tem informação importante para dar às
Sr.as e aos Srs. Deputados.
Tem a palavra, Sr.ª Secretária.
A Sr.ª Secretária (Palmira Maciel): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidos pelo Sr. Presidente, os Projetos de Lei n.os 681/XV/1.ª (PS), que baixa à 1.ª Comissão, 676/XV/1.ª (L),
que baixa à 1.ª Comissão, em conexão com a 10.ª Comissão, e 682/XV/1.ª (CH), que baixa à 9.ª Comissão.
Deram ainda entrada os Projeto de Resolução n.os 558/XV/1.ª (CH), que baixa à 11.ª Comissão, 561/XV/1.ª
(PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 560/XV/1.ª (CH), que baixa à 11.ª Comissão, 564/XV/1.ª (PSD), que baixa à
11.ª Comissão, 562/XV/1.ª (L), que baixa à 5.ª Comissão, e 557/XV/1.ª (CH), que baixa à 9.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Agora, se me permitem, vou ler a agenda de trabalhos para sessão plenária
de manhã, às 10 horas, que tem cinco pontos.
O primeiro ponto consta da apreciação conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 61/XV/1.ª (GOV)
— Altera o regime financeiro das autarquias locais e das entidades intermunicipais e dos Projetos de Lei
n.os 415/XV/1.ª (PAN) — Aprova um regime excecional de endividamento municipal aplicável às despesas
destinadas a fazer face aos prejuízos causados pelas situações de cheia ocorridas em dezembro de 2022,
615/XV/1.ª (CH) — Pelo fim da cobrança da taxa de ocupação do subsolo aos consumidores, 618/XV/1.ª (PCP)
— Procede à décima primeira alteração à Lei n.º 73/2013, de 3 de setembro, que estabelece o regime financeiro
das autarquias locais e das entidades intermunicipais, e 624/XV/1.ª (PAN) — Estabelece a possibilidade de
reforço das verbas dos municípios para assegurar a proteção das áreas protegidas, o cumprimento do disposto
na Lei de Bases do Clima e a implementação de planos de promoção do arrendamento acessível, de alojamento
para o ensino superior ou de arrendamento jovem, alterando a Lei n.º 73/2013, de 3 de setembro.
No segundo ponto, debate-se o Projeto de Resolução n.º 501/XV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a
clarificação da abrangência de critérios de priorização de crianças abrangidas pelo programa Creche Feliz,
juntamente com, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 626/XV/1.ª (PAN) — Altera a Lei n.º 2/2022, de 3 de
janeiro, por forma a clarificar os termos da gratuitidade da frequência da creche e a prioridade de admissão das
crianças com irmãos a frequentar a creche abrangida por esta medida e 628/XV/1.ª (CH) — Altera a lei que
aprova o alargamento progressivo da gratuidade das creches e das amas do Instituto da Segurança Social, I.P.,
assegurando uma compensação às famílias não contempladas, sendo também apreciados os Projetos de
Resolução n.os 510/XV/1.ª (PSD) — A abrangência territorial para a aferição de vagas da gratuitidade das
creches seja feita ao nível de freguesia e 515/XV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo o alargamento progressivo
da gratuitidade das creches e amas do Instituto da Segurança Social, I.P.
Do terceiro ponto consta a discussão conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 485/XV/1.ª (IL) —
Colocar no recibo de vencimento dos trabalhadores por conta de outrem os custos suportados pela entidade
patronal no âmbito das contribuições para a segurança social e 616/XV/1.ª (CH) — Altera o Código do Trabalho,
aumenta a informação disponível aos trabalhadores por conta de outrem nos recibos de vencimento.
No quarto ponto debate-se a Petição n.º 331/XIV/3.ª (Luís Manuel Marques Bugalhão e outros) — Revisão e
alteração do sistema remuneratório dos Militares!, juntamente com, na generalidade, o Projeto de Lei
n.º 617/XV/1.ª (CH) — Procede ao aumento do valor do capital de risco do seguro de vida não contributivo dos
militares em missões humanitárias e de paz fora do território nacional e com os Projetos de Resolução
n.os 399/XV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que emita orientações para garantir a efetiva, uniforme e
coerente aplicação do direito à contabilização das avaliações de serviço a todos os ex-militares após ingresso
na Administração Pública, 446/XV/1.ª (PCP) — Pela valorização remuneratória e social dos militares das Forças
Armadas, 457/XV/1.ª (PSD) — Revisão do regime remuneratório dos militares das Forças Armadas, e 509/XV/1.ª
Página 49
24 DE MARÇO DE 2023
49
(BE) — Recomenda ao Governo a revisão do regime remuneratório aplicável aos militares dos quadros
permanentes e em regime de contrato e de voluntariado dos três ramos das Forças Armadas.
Finalmente, no quinto ponto, teremos as votações regimentais.
A todas as Sr.as e os Srs. Deputados, uma boa tarde.
Eram 17 horas e 59 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.