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II SÉRIE — NÚMERO 39

creio que estas duas situações divergentes são, contudo, complementares, e que a existência de um provedor de justiça atenuaria, inclusive, muitas situações.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: A argumentação do Sr. Vice-Primeiro-Ministro não colhe, na medida em que os serviços públicos dependem dos poderes públicos, estes são responsáveis por aqueles. A própria Constituição o diz e, como já o referiu o Sr. Deputado Herberto Goulart, o Serviço do Provedor de Justiça tem incidido sobre queixas em relação a serviços públicos.

Contudo, se há serviço público no qual a acção'de um provedor de justiça se justifica plenamente, este serviço é, de facto, o das Forças Armadas.

O carácter que as Forças Armadas assumem, carácter marcadamente fechado, não é um entrave, mas sim uma justificação da existência de um provedor de justiça.

Uma das características das Forças Armadas é a da sua tendência à arbitrariedade, à prepotência, à existência de situações como aquelas que o Sr. Deputado César Oliveira descreveu.

Uma organização destas, fechada sobre si mesma, sem qualquer fiscalização democrática do tipo de provedoria de justiça, cai forçosamente no ciclo vicioso da prepotência e da arbitrariedade, quanto à qual se tem que lutar.

Existe aqui como que ainda um complexo em relação aos militares, pretendendo-se civilizar a sociedade — na medida em que se submete o poder militar ao poder civil—, mas, no fundo, cede-se e capitula-se perante aspectos como este. Poucos momentos atrás, o Sr. Vice--Primeiro-Ministro até afirmou que o Provedor de Justiça não se pode intrometer nos poderes legislativo e judicial e muito menos no militar. Não há aqui comparação a fazer-se: o legislativo e o judicial têm características que justificam tal modo de ser; agora, o poder militar não pode ser equiparado àqueles outros dois.

No fundo há aqui como que um compromisso com a hierarquia militar, permitindo-se que ela permaneça com todos os seus tiques, formas antigas e tradicionais, o seu perfil militarista e antidemocrático. Há um compromisso entre a direita e a hierarquia militar. O Governo fica com a sua tutela sobre as Forças Armadas, mas garante que «lá dentro» ninguém tocará e os chefes de estado-maior continuarão com a sua sociedade fechada e estruturada, à antiga.

Apoiamos a opinião que vai no sentido de que a acção do Provedor de Justiça se deve estender às Forças Armadas e consideramos esta solução mais capaz que a da criação de um serviço de provedoria especifica para as Forças Armadas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luis Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Não podemos ignorar a existência da figura do Provedor de Justiça no nosso ordenamento constitucional. Ele existe, é uma figura oriunda do direito anglo-saxónico.

O Sr. Deputado Borges de Carvalho — que agora se dedica à análise do direito sindical — gostará de saber

que a figura do Provedor de Justiça tem origem no bill of right e ê típica da monarquia inglesa. Esta figura era o chamado grito do are. Quando se gritava 3 vezes a palavra ore, era investigada a acção praticada contra tal autoridade.

Pergunta-se se essa figura deve ou não ser consagrada em relação às Forças Armadas.

Ouvi com muita atenção a exposição do Sr. Vice-Primeiro-Ministro, e na nova formulação que demos à nossa proposta procurámos responder a algumas críticas por ele feitas.

A minha formação de advogado, mais do que a minha formação jurídica — formações idênticas, mas distintas—, levou-me a uma análise aprofundada da situação.

Mesmo proibindo-se expressamente o recurso ao Provedor de Justiça, por parte de um militar, haveria sempre uma possibilidade de iludir o cumprimento da lei. Tal far-se-ia por intermédio da mulher ou de outro elemento da família.

Nada impede que uma cidadã, mulher de um militar, faça uma exposição ao Provedor de Justiça dizendo o seguinte: «O cidadão A, meu marido, acaba de ser discriminado desta seguinte forma:... O senhor, que defende o interesse público e faz recomendações para o exercício de determinados poderes, resolva o problema».

Nada impede — e o Sr. Deputado Mário Tomé deve recordar-se de casos deste género ocorridos nos nossos quartéis— que os pais façam exposições aos chefes de estado-maior, exposições às vezes colectivas, sobre a situação de determinado militar.

A nossa proposta visa, portanto, uma intervenção ordenada do Provedor de Justiça contra uma intervenção anárquica. É nesse sentido que sublinhamos dois pontos essenciais: em primeiro lugar, esse recurso só poderia ser promovido após se haverem esgotado todas as vias hierárquicas, ou judiciais, se for caso disso.

Jamais ambicionei ser provedor de justiça, porque sempre tive e possuí um espírito de parte; simplesmente, admitamos que há um recurso ao Provedor de justiça de um militar que não respeita as vias hierárquicas e não exerce o seu direito de queixa. Caso eu exercesse funções de provedor de justiça, recusar-me-ia a receber esse recurso, porque quando um sujeito que não recorreu internamente, pura e simplesmente recorre externamente, o muito que se pode dizer é que praticou um acto ilegal para obtenção de uma reparação moral.

Em segundo lugar, a referência a matéria certa ou a matéria confidencial. E desde o momento em que se discipline a intervenção do Provedor de Justiça dentro das Forças Armadas, evitar-se-à a intervenção anárquica — mas perfeita e legalmente possível— dentro das mesmas.

Portanto, recorrendo a esta minha dupla formação de jurista e de advogado, pensando nos conselhos que daria no meu escritório a um constituinte que me expusesse uma questão deste teor, é que teorizei tal tipo de situações.

E habitual, no que respeita, por exemplo, às presenças em actos públicos, este tipo de expediente: um oficial general, desejando fazer uma manifestação pública, não a faz, mas esta vem a ser promovida pelas esposas de um conjunto de oficiais generais.

Pouco antes do golpe de estado militar no Chile, golpe levado a efeito pelo general Pinochet — a quem muitos tratam por general, mas eu considero o mais especializado constitucionalista no momento actual — ,