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4 DE ABRIL DE 1986

1801

Requerimento n.° 985/IV (1.a)

Ex.1"0 Sr. Presidente da Assembleia da República:

O Convento de São Francisco, da cidade de Lisboa, com uma história rica de 769 anos, está ameaçado como bem do património cultural português.

O recente despacho conjunto dos Ministros da Administração Interna, das Finanças e da Educação e Cultura de 7 de Janeiro de 1986 prevê a ocupação futura do edificio pelos serviços do Governo Civil e da Polícia de Segurança Pública e a passagem da Academia Nacional de Belas-Artes, da Faculdade de Arquitectura e da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa para outros edifícios.

Considerando que a reutilização prevista não é compatível com as qualidades e valores artísticos, urbanos, . culturais e sociais do imóvel;

Considerando que o edifício tem um valor histórico rico, pela sua antiguidade e pelas funções desempenhadas ao longo do tempo, como um dos principais conventos da Ordem de São Francisco, desde 1217, e como instituição académica ligada ao ensino das artes e a protecção e estudo do património artístico português a partir de 1836;

Considerando que, pelas suas funções culturais, o conjunto construído assumiu ao longo dos tempos um valor existencial e constitui como uma referência importante para os cidadãos no contexto da cidade de Lisboa e em particular do espaço histórico-cultural do Chiado;

Considerando que do complexo arquitectónico (noutros tempos chamado «Cidade de São Francisco») ainda hoje resta um núcleo considerável, que se apresenta com grande expressão, pese embora a degradação física e ambiental a que urge pôr cobro;

.Considerando que este valor arquitectónico se expressa essencialmente na organização espacial, funcional e simbólica, visível nos percursos e na vivencia do espaço interior, nomeadamente no magnífico claustro, no pátio, nas escadarias, nas galerias, nas celas, na cisterna, nos sistemas construtivos, na decoração arquitectónica, na tumularia, na estatutária, nos azulejos e na valiosa colecção de pintura que entrosa a história local e nacional do século xiii à actualidade;

Considerando que o conjunto assumiu um valor urbano na história e desenvolvimento da cidade, como pólo agregador e dinamizador do povoamento e expansão de Lisboa e simultaneamente como núcleo regularizador do tecido urbano;

Considerando que, como centro académico, o edifício tem assumido funções de relevo e, nestes últimos 150 anos, apresentou-se como um valor sócio-cultural acrescido de extremo significado;

Considerando que, para além do valor cultural, que ultrapassa e se sobrepõe aos interesses materiais, tem indubitavelmente um valor económico pela localização e qualidade do solo urbano;

Considerando que a utilização de um edifício condiciona a sua valorização e constitui uma questão fundamental e delicada no contexto da conservação activa e de reutilização dos edifícios de valor histórico, artístico e cultural;

Considerando que a doutrina e princípios adoptados e recomendados por organismos internacionais são bem claros nesta matéria;

Considerando que o património cultural, arquitectónico e urbano se íntegra na vida contemporânea e constitui uma permanência qualitativa co passado no nosso quotidiano;

Considerando que os monumentos e edifícios históricos antigos têm de responder a novas funções de modo a serem vivificados e assumidos como referência da identidade de uma comunidade;

Considerando que as novas funções atribuídas podem deturpar ou valorizar a identidade, o vaior de urn edifício;

Considerando que o critério que determina a reutilização desses edifícios deve ser enformado pelo conhecimento profundo de cada situação e regido pelo bom senso e pelas orientações técnico-científicas nesta matéria, tais como as emanadas pelo Ccnseiho da Europa (Recomendação sobre a Reutilização dos Monumentos de Interesse Cultural nos Respectivos Conlextos Estéticos ou Materiais, embora Desprovidos das Funções Originais — Convénio de Viena, 3965; Convenção sobre a Preservação Activa dos Sítios, Monumentos e Conjuntos de Interesse Hisíórico-Artístico, Haia, 1967; Declaração sobre Preservação de Bens Culturais, Amsterdão, 1975; princípios divulgados peia Europa Nostra acerca desta matéria), peia UNESCO (Convenção para a Protecção do Património Mundial. Cultural e Natural, Paris, 1972; Recomendação sobre a Salvaguarda dos Centros Histories ou Tradicionais e o Seu Papel na Vida Contemporânea, Nairobi, 1976) e pelo ICOMOS (Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios) — Carta Internacional sobre a Conservação e Restauração dos Monumentos — Carta de Veneza, 1964; Princípios sobre a Reanimação da Cidade, reunião do México, 1972; etc;

Considerando que o referido despacho ignora o valor intrínseco do edifício como bem do património cultural, o que é um mau princípio para este e para qualquer outro processo semelhante;

Considerando que o edifício só é compatível com um uso que respeite o carácter sócio-culturaí, o valor arquitectónico e a função específica deste núcleo na imagem e no universo cultural da cidade:

Considerando que este edifício, que tem uma tradição de espaço público e de uso cultural na cidade, não se ajusta nem é compatível com funções administrativas ou burocráticas;

Considerando que acções levadas a cabo em outras capitais europeias têm vindo a retirar funções administrativas a edifícios de valor histórico-cultral, de modo a criar novos espaços vivenciais, devolvendo a urbe ao cidadão (exemplos: Paris, Madrid, Roma, Londres, etc);

Considerando que o espaço urbano desta área da cidade não é compatível funcional, estética e culturalmente com usos como o de um aquartelamento (v. a capacidade de circulação e estacionamento do Chiado, nomeadamente nas Ruas de ívens, Capelo, Serpa Pinto, Largo da Academia Nacional de Belas-Artes, Largo do Teatro-Ôpera Nacional de São Caríos);

Considerando que o complexo arquitectónico fica na envolvente física do Teatro Nacional de São Carlos e de outros edifícios com interesse histórico e cultural;

Considerando que a Polícia de Segurança Pública é um serviço de utilidade pública que psías suas funções sociais é, por natureza, um organismo miiitarizadu (o que pressupõe natural e logicamente a existência de armas, munições e outros materiais explosivos);

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