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16 DE MAIO DE 1996

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Finalmente, o n.° 3 do artigo 286-bis reconhece a possibilidade de o juiz ordenar a colocação provisória em estrutura hospitalar idónea, adoptando, se necessário, as providências necessárias a prevenir o perigo de fuga, quando

ocorram exigências de diagnóstico para verificação da \n-

çompaúbilidaâe com o estado de detenção ou, fora dos

casos do n.° l, quando ocorram exigências terapêuticas por infecção por HIV e sempre que tais exigências não possam ser satisfeitas no âmbito penitenciário.

O n.° 3 do artigo 146.° do Código Penal vem estabelecer a obrigatoriedade de adiamento de execução da pena privativa de liberdade de condenados afectados por HIV nos casos de incompatibilidade com o estado'de detenção, no sentido que lhe é conferido pelo n.° 1 do artigo 286-bis do Código de Processo Penal, à semelhança do previsto para os casos em que a execução se dirige contra uma mulher grávida ou contra uma mulher que tenha tido um parto há menos de seis meses. Trata-se de uma solução normativa de natureza excepcional, justificada pela especial gravidade da doença, .que, por si, constitui fundamento de incompatibilidade com o estado de detenção, e pelas suas implicações no âmbito prisional.

Anteriormente à alteração de 1993, o adiamento da execução da pena aplicada a doentes com sida/HIV em estado grave só podia ser avaliado no âmbito do artigo 147.° do Código Penal, que prevê a possibilidade de adiamento facultativo da execução no caso de o condenado estar afectado de doença física grave.

Embora reconhecendo a importância da intervenção na perspectiva da gravidade da situação dos doentes com sida em fase terminal, a solução do legislador de 1993 não deixou de ser alvo de críticas e reservas. Criticou-se, designadamente, a falta de reflexão sistemática, de oportunidade e de debate científico e cultural; a dificuldade em estabelecer, em abstracto, um quadro de incompatibilidade entre a doença e a detenção, considerando, nomeadamente, a natureza dinâmica da doença, a diversidade de situações clínicas e a previsibilidade da sua evolução, e o carácter discriminatório da medida face à situação de detidos portadores de outras doenças graves e irreversíveis, apontan-do-se a dificuldade da sua conciliação com as regras constitucionais do direito à saúde, da proibição de tratamento penal desumano ou degradante e do princípio da igualdade. Nesta conformidade, diz-se, deveria manter-se o anterior sistema de adiamento facultativo, que, permitindo o exame casuístico pelo juiz, realizaria o equilíbrio dos interesses em presença, de acordo com as regras gerais do processo penal.

3.6 — Na Suíça, a possibilidade de libertação do recluso com sida depende de confirmação médica de proximidade da morte, de declaração médica de necessidade de seguir determinado tratamento médico incompatível com o estado de detenção e do facto de o recluso sofrer de uma incapacidade de tal ordem que torne desumana a detenção.

3.7 — Na Polónia, quando o estado da doença coloca em perigo a vida do recluso, é admissível a suspensão da execução da pena ou a sua libertação antecipada. A situação, porém, é sempre estudada caso a caso pelos tribunais, que decidem livremente, de acordo com o interesse geral e o do recluso.

4 — A questão face ao direito português

O tema da libertação antecipada de reclusos afectados de doença grave, não obstante não ter concitado o debate político nem ter sido objecto de análise na doutrina e na

jurisprudência nacionais, não é estranho ao ordenamento jurídico português. Não se dirigindo especificamente aos problemas relacionados com a sida no meio prisional (que, aliás, ainda não existiam), já os artigos 304." e 305.° do Código de Processo Penal de 1929, na redacção de 1972, abordavam a possibilidade de suspensão da execução da prisão preventiva — mesmo por crimes então considerados incaucionáveis — quando fosse caso de «doença que ponha em risco a [...] vida [do arguido], comprovada por atestado médico, podendo o juiz mandar examinar o doente por um ou mais médicos e resolver .em face dos respectivos pareceres». Nessa linha, aliás, veio também dispor o artigo 211." do Código hoje vigente sempre que «tal for exigido por razão de doença grave do arguido», caso em que aquela medida de coacção será transitoriamente substituída pela de obrigação de permanência na habitação ou pelo puro e simples internamento hospitalar.

No referente à execução de medidas de segurança de internamento aplicadas a inimputáveis, podemos igualmente afirmar que a sua libertação antecipada se encontra salvaguardada, por via do artigo 92.° do Código Penal, ao nível da valoração do seu estado de perigosidade.

Porém, diversamente do que sucede em sistemas penais estrangeiros, de que se deram algumas notas essenciais relativas aos mais próximos, não está consagrada expressamente a possibilidade de adiamento da execução da pena privativa de liberdade ou de encurtamento do cumprimento da pena de prisão quanto a doentes com sida em fase terminal, por razões humanitárias, tal como sucede, aliás, quanto a doentes afectados por outras doenças graves e incuráveis.

O.estudo da situação destes doentes e a resposta do sistema penal tem-se reconduzido aos quadros e regras gerais do processo de liberdade condicional e, com alguma boa vontade dos agentes intervenientes, aos dó processo de indulto.

5 — A presente intervenção legislativa

A especificidade e gravidade dos problemas suscitados pela sida, em particular no meio prisional, justificam intervenção ao nível legislativo, em conformidade com as Recomendações R 1080 (1988), da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, e R(93) 6, do Comité de Ministros do Conselho da Europa, de modo a reforçar e a tornar mais céleres e eficientes os mecanismos de resposta e as condições de tratamento, humanidade e dignidade dos estabelecimentos prisionais e, quanto aos doentes em estado terminal —relativamente aos quais perde sentido a realização das finalidades de execução da pena de prisão —, a permitir uma saída do meio prisional, de modo a possibilitar o direito a uma morte digna, porventura no seio da família.

Porém, as soluções a ponderar deverão considerar os problemas de saúde no seu conjunto, globalmente.

E, de facto, bem verdade que, ao lado da sida, e preexistentes relativamente a ela, existem nos estabelecimentos prisionais portugueses outras doenças graves e irreversíveis — como a hepatite, o cancro, a leucemia — cujos pacientes reclusos devem ter idêntico tratamento jurídico-penal.

Ora se, por um lado, parece claro que a restrição da consagração legal da saída do meio prisional aos doentes com sida não deixaria de assumir tratamento de favor relativamente aos reclusos afectados por esses outros tipos de doença de idêntica gravidade — o que seria de duvidosa constitucionalidade por violação do princípio da

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