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Sábado, 9 de Novembro de 1996

II Série-A — Número 5

DIÁRIO

da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

SUMÁRIO

Resoluções:

Aprova, para ratificação, a Convenção sobre a Proibição ou Limitação do Uso de Certas Armas Convencionais Que Podem Ser Consideradas como Produzindo Efeitos Traumáticos Excessivos ou Ferindo Indiscriminadamente, assinada em Nova Iorque, em IO de Abril de 1981 (o). Realização de auditoria externa à Assembleia da República.................................................................................... 54

Deliberação n.° 26-PL/96:

Suspensão dos trabalhos da VI Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar ao Desastre de Camarate............. 54

Projectos de lei (n.» 165/VTJ, 213/VTJ, 221/VTJ, 22WH e 235/VII e 236/VD.):

N.° 165/VII (Cria o Observatório dos Mercados Agrícolas e das Importações Agro-Alimentares):

Relatório e parecer da Comissão de Agricultura..do Desenvolvimento Rural e das Pescas............................... 54

N.° 213/VII (Candidaturas de cidadãos independentes à eleição dos órgãos das autarquias locais):

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.................... 55

Relatório e Parecer da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente 55

N.° 221/VlI (Altera o regime de liberdade condicional):

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos. Liberdades e Garantias...............57

N.° 2267VII (Altera o regime jurídico da liberdade condicional):

V. Projecto de lei n.° 221/V1I.

N.° 235/VD — Altera os prazos de exclusão da ilicitude nos casos de interrupção voluntária da gravidez (apresentado pelo Deoutada Manuel Strecht Monteiro e outros, do PS)........ nn

N.° 236/VII — Interrupção voluntária da gravidez (apresentado pelo Deputado Sérgio Sousa Pinto e outros, do

PS)...................................................................................... 62

Proposta de lei n.° 63/VTI:

Autoriza o Governo a rever o ilícito de mera ordenação social aplicável aó licenciamento dos estabelecimentos que desenvolvem actividades de apoio social no âmbito da segurança social................................................................. 66

Propostas de resolução (n.<* 18/VTI, 25/VTJ. e 27/VTT):

N.° 18/VII [Aprova, para ratificação, a Emenda ao Artigo 20°, Parágrafo 1, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, aprovada pela Resolução n." 50/202 (1995) da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 22 de Dezembro de 1995]:

Relatório e parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação........ 67

N.° 25/VII (Aprova, para ratificação, o Acordo entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República da Letónia sobre a Protecção Mútua de Investimentos e respectivo protocolo, assinados em 27 de Setembro de 1995):

Relatório e parecer da Comissão de Economia, Finanças

e Plano........................................................................... ' • 68

N.° 27/V11 — Aprova, para ratificação, o Acordo Euro--Mediterrâneo Que Cria Uma Associação entre as Comunidades Europeias e os Seus Estados Membros, por um lado, e o Estado de Israel, por outro, incluindo os Proto-. colos n.°* 1 a 5, os anexos 1 a vn, bem como as declarações e troca de carias que constam da Acta Final e que fazem parte integrante do Acordo, assinado em Bruxelas, em 20 de Novembro de 1995 (a).

(a) Dada a sua extensão, vêm publicadas em suplemento a este número.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 5

PROJECTO DE LEI N.a 165/VII

RESOLUÇÃO

REALIZAÇÃO DE AUDITORIA EXTERNA À ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

A Assembleia da República resolve, nos termos do artigo 169.°, n.° 5, da Constituição, o seguinte:

1 — Encomendar uma auditoria externa, a realizar por firma de auditores legalmente habilitada a efectuar auditorias e reputadamente competente e séria, ao sistema de utilização de transportes por todos os Deputados, no período que decorreu desde 1980 até 1988, no sentido de apurar, por cada Deputado que naquele periodo exerceu funções, designamcnte, o montante de dispêndios anuais, os destinos das viagens e a relação entre as viagens realizadas e o trabalho político dos Deputados.

2 — Compete à Secretária-Geral promover e preparar a abertura, no mais curto prazo possível, do concurso público para selecção da firma de auditores à qual a referida auditoria será adjudicada, elaborando o respectivo caderno de encargos e submetendo o processo a aprovação do Presidente da Assembleia da República.

3 — Serão condições de preferência na adjudicação, por ordem de menção:

A idoneidade dos concorrentes; O prazo de execução, por referência ao prazo máximo a determinar no caderno de encargos; O preço proposto.

4 — Deverá mencionar-se, entre as condições do concurso, o dever de informar periodicamente a Assembleia da República do andamento da auditoria e das conclusões interlocutórias a extrair da mesma, que seja possível antecipar às conclusões finais.

Aprovada em 31 de Outubro de 1996.

O Presidente da Assembleia da República, em exercício, Manuel Alegre de Melo Duarte.

DELIBERAÇÃO N.9 26-PL796

SUSPENSÃO DOS TRABALHOS DA VI COMISSÃO EVENTUAL DE INQUÉRITO PARLAMENTAR AO DESASTRE DE CAMARATE.

A Assembleia da República, na reunião plenária de 24 de Outubro de 1996, delibera o seguinte:

1 — Suspender os trabalhos da VI Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar ao Desastre de Camarate até que lhe venha a ser facultado o acesso aos meios de prova solicitados ao Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, indispensáveis ao prosseguimento da sua actividade.

2 — A presente deliberação interrompe o prazo fixado para a duração do inquérito e produz efeitos desde 11 de Outubro de 1996.

Aprovada em 24 de Outubro de 1996.

O Presidente da Assembleia da República, em exercício, Manuel Alegre de Melo Duarte.

(CRIA 0 OBSERVATÓRIO DOS MERCADOS AGRÍCOLAS E DAS IMPORTAÇÕES AGRO-ALIMENTARES)

Relatório e parecer da Comissão de Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas

Relatório A — Introdução

Este projecto de lei, da autoria do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português e admitido em 31 de Maio de 1996, visa, segundo os autores, a criação de um órgão que contribua para um melhor conhecimento da situação dos mercados agro-alimentares, das condições hígio--sanitárias dos produtos importados e consumidos e para a elaboração de propostas políticas que permitam o controlo das importações, o combate à fraude fiscal, a defesa e a promoção da produção nacional.

B — Dos motivos

A diminuição da taxa de cobertura do comércio agro--alimentar de Portugal, deficiências no controlo hígio--sanitário e debilidade perante as políticas estratégicas dos grandes países exportadores são os motivos invocados para a apresentação do presente projecto.

C — Enquadramento legal

A apresentação do projecto de lei é feita nos termos do artigo 170.° da Constituição da República Portuguesa e do artigo 130.° do Regimento da Assembleia da República, tendo, do ponto de vista formal, atendido aos requisitos constantes do artigo 137.° do mesmo Regimento.

D — Análise do diploma

1 — Existe uma Direcção de Serviços de Informação dos Mercados e Estatística, a qual, pelo Despacho n.° 65/ 96 do Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, é colocada na dependência do recentemente criado Gabinete de Planeamento e Política Agro-Alimentar, cujas atribuições poderão também estar abrangidas pelo órgão que agora se propõe instituir.

2—Tendo em conta que iniciativas desta natureza podem também colidir com competências de outros órgãos ou da própria lei, torna-se necessário definir com maior precisão as competências previstas, designadamente quanto «às iniciativas necessárias à prossecução dos respectivos objectivos e funções».

3 — A redacção do artigo 5.° permite a criação desde um pequeno gabinete até um organismo de maior dimensão, pelo que é impossível fazer qualquer previsão de encargos. De qualquer modo, estes poderão sempre ser controlados através do orçamento do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.

E — Da participação das associações

Pela inclusão no conselho de administração do Observatório de representantes seus, constituem parte interessada as diversas confederações agrícoías e sindicais, associações de defesa do consumidor e as Ordens dos Médicos, dos Médicos Veterinários e dos Engenheiros, não sendo até ao momento conhecidas as respectivas reacções ao diploma em apreço.

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F — Conclusão e parecer

A presente iniciativa, respeitando as disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, está em condições de subir a Plenário para discussão e eventual votação.

Palácio de São Bento, 6 de Novembro de 1996. — O Deputado Relator, Carlos Amândio. — O Deputado Presidente, Antunes da Silva.

PROJECTO DE LEI N.s 213/VII

(CANDIDATURAS DE CIDADÃOS INDEPENDENTES À ELEIÇÃO DOS ÓRGÃOS DAS AUTARQUIAS LOCAIS)

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

I — No decurso da anterior legislatura foram apresentadas e discutidas na Assembleia da República três iniciativas legislativas respeitantes à matéria objecto do projecto de lei ora em apreciação.

Foram elas os projectos de lei n.M 196/VI, do Partido Socialista, 227/VI, do Partido Social-Democrata, e 228/VI, do PP.

Destas, só o projecto de lei n.° 221'/VI deu origem a uma lei, a Lei n.° 9/95, de 7 de Abril, que alterou o Decreto-Lei n.° 701-B/76, de 29 de Setembro (Lei Eleitoral das Autarquias Locais).

Os outros dois projectos de lei, apesar de discutidos na generalidade, viriam a ser prejudicados em sede de especialidade, após a apresentação e publicação,, no Diário da Assembleia da República, 2° série-A, n.° 17, de 27 de Janeiro de 1995, de um texto de substituição do projecto de lei n.° 227/VI, da autoria desta Comissão.

O projecto de lei ora em apreciação, da autoria de 12 Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresenta-se como uma quase reedição do citado projecto de (ei n.° 196/VI, discutido na generalidade em sessão plenária de 12 de Novembro de 1992 (v. Diário da Assembleia da República, 1.° série, n.° 13, de 13 de Novembro de 1992, pp. 373 e segs.).

Dissemos «quase» pois, além .de uma pequena actualização na «Exposição de motivos», foi alterada a remissão para o Código Penal constante do n.° 2 do artigo 16.°-D, aproveitou-se da Lei n.° 9/95, citada, o critério de organização das listas propostas por grupos de cidadãos eleitores (artigo 18.°, n.° 6), eliminaram-se a filiação e a profissão do rol dos elementos de identificação dos candidatos (idem, n.° 7) e substituiu-se o texto da norma do artigo 5.°, que previa a regulamentação por lei especial do regime de financiamento da actividade dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, por outro que se limita a estabelecer um período de 90 dias de vacatio legis.

O citado projecto de lei n.° 227/VI previa a possibilidade de grupos de cidadãos eleitores apresentarem candidaturas à eleição de todos os órgãos das autarquias locais — v. propostas de alteração aos artigos 5.°, 22.° e 33.° do Decreto-Lei n.° 701-A/76, de 29 de Setembro (estabelece normas relativas à estrutura, competência e funcionamento dos órgãos do município e de freguesia).

Apesar disso, tais propostas não viriam a ter eco, nem no texto de substituição proposto por esta Comissão, nem na Lei n.° 9/95. A iniciativa legislativa em apreciação retoma-as, com adaptações de pormenor.

Não queríamos terminar a parte introdutória sem trazer à colação a questão da constitucionalidade da apresentação de candidaturas por grupos de cidadãos independentes, suscitada pelo Sr. Presidente da Assembleia da República no despacho de admissão do projecto de lei em apreciação.

É um facto que têm existido dúvidas sobre a constitucionalidade das candidaturas de independentes às assembleias e às câmaras municipais.

Estas dúvidas assentam na interpretação, entre outras, de duas normas da Constituição: o artigo 51.°, que prevê que «a liberdade de associação compreende o direito de constituir ou participar em associações e partidos políticos e de através deles concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e a organização do poder político», e o artigo 246.°, n.° 2, que atribui, específica e expressamente, a titularidade do direito de apresentação de candidaturas às assembleias de freguesia de grupos de cidadãos eleitores, no que poderá ser interpretado como uma norma especial relativamente à norma geral do artigo 51."

Num recurso de admissibilidade do projecto de lei n.°227/VI, apresentado por vários Deputados do Partido Socialista na legislatura passada, pode ler-se que «não é possível a interpretação extensiva das normas excepcionais, antes estas confirmam a regra de que são excepção».

Ora, existindo estas dúvidas, tratando-se o artigo 246.°, n.° 2, de uma norma especial e estando a correr um processo de revisão constitucional, parece-nos que seria preferível clarificar primeiro esta questão na Constituição e depois, então, proceder às modificações legislativas ora propostas. De contrário, poderão correr-se riscos tanto mais inúteis quanto é certo que parece haver abertura política para prever a possibilidade de, pelo menos nas autarquias locais, alargar aos órgãos dos municípios a possibilidade já hoje prevista para os órgãos das freguesias.

II — Por várias razões, não é fácil proceder a uma resenha de direito comparado sobre esta matéria, ainda que limitada a alguns dos nossos parceiros na UniãoEuropeia. Desde logo, porque o princípio da autonomia do poder local não tem o mesmo grau de importância nos vários países que compõem a União Europeia.

É assim que, a par da França e da Alemanha, cujas Constituições consagram expressamente o princípio da libre odministration locale (artigo 72.°) ou kommunale Selbsterverwaltung (artigo 28.°), respectivamente, encontramos o Reino Unido e a Irlanda, onde este princípio nem sequer encontra consagração constitucional e, acrescente--se, os órgãos representativos das organizações administrativas e territoriais locais não gozam de grande prestígio.

A dificuldade do enquadramento constitucional, e até político, desta questão mais se agrava se tivermos em conta \ que o número de sistemas de governo local vigentes em diferentes partes da União Europeia suplanta largamente o de Estados membros. Basta pensar nas substanciais diferenças existentes no processo eleitoral local (Kommunalwahlen) em vigor em cada um dos 16 Länder alemães, onde^ os presidentes de câmara, consoante o Länder, tanto podem ser eleitos por sufrágio directo e universal, como de forma indirecta, por um colégio eleitoral restrito.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 5

Não obstante, podemos afirmar com certeza que a lei eleitoral espanhola, Ley Orgánica del Regímen Electoral General 5/1985, de 19 de junio, modificada pela Ley Orgánica 1/1987, de 2 de abril, e pela Ley Orgânica 8/ 1991, de 13 de marzo, prevê expressamente a possibilidade, no capítulo vi, secção u, artigo 44.°, de grupos de cidadãos eleitores apresentarem candidatos ou listas de candidatos às eleições dos órgãos locais, e, que a Lei Federal do Regime Eleitoral alemã, de 7 de Maio de 1956, revista em 1 de Setembro de 1975, prevê, no seu artigo 18.°, n.° 1, a possibilidade de apresentação de candidaturas por parte dos partidos e também de cidadãos com direito a voto (artigo 18.°, n.° 1).

Quanto ao Código Eleitoral francês, publicado em anexo aos Decretos 64-1086 e 64-1098, de 27 de Outubro de 1964, certas disposições parecem autorizar a conclusão de que candidatos ou grupos de candidatos podem concorrer a actos eleitorais, ao lado de partidos ou grupos políticos organizados, com excepção das eleições legislativas, nas quais a capacidade eleitoral passiva é reservada a estes.

m — Quais são as inovações propostas pelo Partido Socialista no seu projecto de lei?

A principal inovação, obviamente, é a que permite aos grupos de cidadãos eleitores apresentarem candidaturas à eleição de todos os órgãos das autarquias locais. Para tanto, propõem os subscritores a alteração do artigo 15.° do Decreto-Lei n.° 701-B/76, citado.

Teria sido preferível, em nossa opinião, manter a redacção actual do n.° 1 do artigo 15.° — cuja alínea b) prevê a apresentação de candidaturas por grupos de cidadãos eleitores nos casos em que a lei o admite —, alterándole, em vez disso, as disposições pertinentes do Decreto--Lei n.° 701-A/76, citado, nomeadamente os artigos 5.°, 22.° e 33.° Tal como se nos apresenta, porém, sem uma norma que preveja expressamente a revogação das referidas disposições do Decreto-Lei n.° 701 -A/76, o projecto de lei parece incompleto.

O projecto de lei é ainda inovador na parte em que simplifica o processo de apresentação de candidaturas por grupos de cidadãos eleitores, eliminando o reconhecimento das assinaturas ,na declaração de propositura (artigo 18.°, n.° 4) e reduzindo a prova de recenseamento na área da autarquia a cujos órgãos apresentam listas a fotocópia simples do cartão de eleitor (artigo 16.°-C, n.° 4), e na parte que simplifica o processo de tramitação jurídica constitutivo das coligações de partidos políticos para fins eleitorais, permitindo que as mesmas sejam comunicadas ao Tribunal Constitucional por mera declaração conjunta dos partidos que as integram, de onde conste o objectivo de apresentar listas únicas à eleição e determinados órgãos das autarquias locais e a denominação, sigla e símbolo adoptados (artigo 16.°-A, n.° 4).

A finalizar, não podemos deixar de registar o consenso que se tem estabelecido em quase todos os partidos de cada vez que uma iniciativa legislativa sobre esta matéria é posta à discussão. A excepção é feita ao Partido Comunista, único que sempre se mostrou renitente a aceitar esta possibilidade por razões que, queremos crer, mais não têm a ver que com alguma hesitação perante a conformidade destas iniciativas com o texto constitucional.

Parecer

Nestes termos, esta Comissão é de parecer que o projecto de lei n.° 213/VII reúne as condições legais e regimentais para ser discutido na generalidade em Plenário.

Assembleia da República, 5 de Novembro de 1996. — O Deputado Relator, Jorge Ferreira. '— O Deputado Presidente, Alberto Martins.

Relatório e parecer da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente

1 —Tal como se transcreve da respectiva «Nota justificativa», «com a apresentação do presente projecto de lei o Partido Socialista visa a cessação definitiva do privilégio institucional dos partidos na apresentação de candidaturas eleitorais aos órgãos do poder local, consignando-se o princípio da livre apresentação 'de candidaturas por grupos de cidadãos eleitorais independentes dos partidos políticos aos órgãos de município — assembleia municipal e câmara municipal», pelo que — e continua a citar-se —, «nos termos do presente projecto de lei, um número de cidadãos, variável em função da relação entre o número de eleitores da respectiva autarquia e o de mandatos de órgãos de integral eleição directa, pode apresentar listas de candidatos para qualquer órgão das autarquias locais».

2 — Embora de há muito tenham vindo a manifestar--se posições favoráveis à consagração destas candidaturas de independentes, e se possa assim perspectivar como globalmente positiva a solução encontrada no âmbito do projecto de lei ora em apreciação, igualmente de há muito se têm vindo a expressar dúvidas quanto à constitucionalidade de uma e de outra. Dúvidas que em absoluto se não desfazem apesar do conteúdo do despacho de admissão do presente projecto de lei exarado pelo Ex.1™ Sr. Presidente da Assembleia da República, o qual, salvo melhor opinião e com o devido respeito, consagra algumas dúvidas, coloca algumas perguntas e não fornece respostas definitivas.

3 — Aliás, é nosso entendimento que as alterações propostas no âmbito do presente projecto de lei se prendem com a «participação na vida pública» e com o «direito de acesso a cargos públicos» consagrados no capítulo n («Direitos, liberdades e garantias de participação política») do título u («Direitos, liberdades e garantias») da parte i («Direitos e deveres fundamentais») da Constituição da República Portuguesa, pelo que deveria esta 4." Comissão aguardar a emissão do relatório e do parecer elaborados no âmbito da 1 .* Comissão, os quais, na matéria em apreço, nos parecem tónicos e prioritários.

4 — Acresce que, solicitados pareceres sobre o presente projecto de lei à ANMPe à ANAFRE, não nos chegaram, até ao momento, quaisquer respostas.

Assim, nas presentes circunstâncias, somos de parecer: Que o projecto de lei n.° 213/VTJ se encontra, neste

momento, em condições de subir a Plenário, atentos os

condicionalismos atrás enunciados.

Assembleia da República, 6 de Novembro de 1996. — O Deputado Relator, José Calçada. — O Deputado Presidente, Eurico Figueiredo.

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PROJECTO DE LEI N.9 221/VII (ALTERA O REGIME DE UBERDADE CONDICIONAL)

PROJECTO DE LEf N.s 226/VII

(ALTERA O REGIME JURÍDICO DA LIBERDADE CONDICIONAL)

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

I — Do objecto e da nota justificativa

1.1 — Projecto de lei n.° 221 ATI (PSD).

O presente projecto de lei tem por escopo último a alteração do regime da liberdade condicional vigente, propondo-se os seus subscritores por um endurecimento desse mesmo regime.

O Grupo Parlamentar do PSD considera que, com alguma frequência, os autores de crimes violentos são, regra geral, reincidentes. Essa reincidência incide muitas vezes em casos de homicídio e em situações em que o condenado a prisão se encontra a beneficiar do regime de liberdade condicional.

Tendo em conta as preocupações recentes do legislador penal quanto à necessidade de agravamento dos crimes relacionados com o tráfico de droga e que se coiporizaram na Lei n.° 45/96, de 3 de Setembro (que alterou o regime jurídico do tráfico e consumo de estupefacientes), consideram que o regime de liberdade condicional deveria acompanhar essas alterações, por forma a tornar-se mais adequado à realidade.

Não obstante o facto de o regime vigente já estabelecer diferenças quanto aos pressupostos e duração da liberdade condicional em função da gravidade do crime cometido, entendem os subscritores ser imprescindível, «no âmbito das medidas a adoptar de prevenção da criminalidade violenta, restringir ou eliminar a possibilidade de colocação em liberdade condicional sempre que os condenados a prisão tenham, respectivamente, praticado ou reincidido na prática de crimes graves contra as pessoas, contra a paz e a Humanidade ou contra a paz pública».

Defendem os seus autores o estabelecimento de um equilíbrio e de necessária ponderação entre a prevenção da prática do crime e a recuperação do delinquente, sem embargo do regime de endurecimento proposto.

1.2 — Projecto de lei n.° 226/VTJ (PP).

O Grupo Parlamentar do PP apresenta um projecto de lei que visa essencialmente tornar mais restriüvo o regime actual atinente à liberdade condicional, que é, inclusive, mais exigente do que o regime que se incluía no projecto de Código Penal que este grupo parlamentar apresentou já no decurso desta legislatura (1." sessão legislativa — projecto de lei n.° 90/VT.I, rejeitado, na generalidade, em 28 de Fevereiro de 1996).

Entendem os subscritores da presente iniciativa que o cumprimento integral das penas de prisão" nos crimes mais graves é uma medida essencial, no sentido de dotar o sistema penal português de mais rigor e eficácia.

Justificam tal postura pelo facto de considerarem que «um dos factores que mais tem contribuído para o crescimento do sentimento de insegurança dos cidadãos e da

sua descrença no sistema penal é precisamente a facilidade com que os condenados são postos em liberdade, muito antes do cumprimento das penas sentenciadas, já de si tantas vezes pouco adequadas à gravidade dos crimes praticados».

II — Breve esboço histórico

O instituto da liberdade condicional, conhecido entre nós desde tempos muito remotos — desde 1893 —, não pode eximir-se à controvérsia gerada em torno da sua própria conveniência e manutenção.

Tem sido controvertida na doutrina a natureza do instituto da liberdade condicional, pois têm sido estruturadas duas posições completamente distintas.

Segundo uns, a liberdade condicional terá a natureza de uma verdadeira pena, substitutiva da pena inicial de prisão em que o réu tenha sido condenado.

Segundo outros, essa liberdade será apenas um ensaio de libertação prévia do condenado, isto é, uma forma de cumprir a sua pena originária de prisão fora de um sistema de encarceramento, para assim se obter, ou tentar obter, uma mais perfeita ressocialização do criminoso através do ensinamento prático da assunção das suas responsabilidades de cidadão útil à sociedade.

O nosso sistema jurídico, em matéria de liberdade condicional, tem variado de acordo com quatro regimes fundamentais:

Decreto-Lei n.° 26 643 (Reforma Prisional de 1936)

na sua pureza; Decreto-Lei n.° 34 553, que instituiu os tribunais de

execução de penas; Decreto-Lei n.° 783/76, que regulamentou em novos

moldes aqueles tribunais e o instituto da liberdade

condicional;

Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.° 400/82 e sua legislação complementar.

No primeiro desses regimes, a liberdade condicional tinha uma natureza mista, pois era concedida por período de dois a cinco anos, mas se o respectivo prazo não era computado na pena, no caso de revogação servia o mesmo para determinar o termo da pena quando se lhe desse a seguir a liberdade definitiva (cf. os artigos 390.° e seguintes da Reforma, na parte respeitante à liberdade condicional concedida no decurso da pena, em contraposição com a liberdade do mesmo nome mas com características de medida de segurança).

No regime do Decreto-Lei n.° 34 553 surgiu o entendimento de que a revogação implicava o cumprimento do período de liberdade ainda não cumprido, em virtude da equiparação de tratamento processual desta figura com a liberdade condicional complementar (posteriormente chamada «liberdade vigiada») e que era uma medida de segurança não privativa de liberdade. Em qualquer dos dois regimes, porém, estavam afastadas do cálculo, para efeitos de aplicação do regime da liberdade condicional, as situações de prisão resultante da conversão de multa ou imposto de justiça.

Assim, a partir de 1945, ano em que foi publicado o Decreto-Lei n.° 34 553, a liberdade condicional passou a revestir a natureza de um perfeito substitutivo da pena de prisão imposta ao réu, o que implicava, como se referiu, que, quando houvesse lugar à sua revogação, houvesse que cumprir o respectivo tempo ainda não cumprido e que, quando fosse de conceder a liberdade definitiva, esta só

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II SÉRIE-A — NÚMERO S

pudesse ter os seus efeitos referidos ou à data da respectiva sentença ou à data do termo do prazo pelo qual a liberdade condicional havia sido concedida.

O regime instituído em 1976 com o Decreto-Lei n.° 783/ 76 baseado numa filosofia diferente e, a nosso ver, mais adequada à realidade da vida em sociedade, alterou substancialmente esta matéria, pois a liberdade condicional passou a ser concedida, não por certo prazo, como até então, mas pelo tempo que faltasse para o cumprimento da pena privativa da liberdade, do que resultou que a sua revogação implicava o cumprimento do resto da pena que faltava cumprir no momento da sua concessão, e que a concessão da liberdade definitiva era referida à data do termo da pena privativa da liberdade, a determinar como se não tivesse ocorrido a libertação.

No regime de 1982, ou porque o legislador desconhecia a mudança filosófica operada pela legislação de 1976 ou porque a não considerou como adequada, procedeu-se a um regresso às concepções que haviam enformado o regime jurídico de 1935.

Com efeito, restabeleceu-se um sistema em que a liberdade condicional em vez de ser concedida pelo tempo que falta para o cumprimento da pena o é por período compreendido entre três meses e cinco anos, com possibilidade de prorrogação.

III — O regime da liberdade condicional — Código Penal vigente: artigos 61." a 63.°

3.1 —Na versão originária do Código, os pressupostos e a duração da liberdade condicional, tanto facultativa como obrigatória, encontravam-se estabelecidos no artigo com o mesmo número, que teve por fontes imediatas o direito comparado, o regime anterior, o n.° 2 do artigo 51.° do Projecto de Parte Geral de Código Penal de 1963, discutido na 19.' sessão da Comissão Revisora do Código Penal, em 2 de Março de 1964, e o n.° 1 da base v da proposta de lei n.° 9/X.

Manuel Maia Gonçalves refere-se, na anotação ao artigo 61." do Código Penal, ao facto de os pressupostos e a duração da liberdade condiciona] terem sofrido várias vicissitudes durante os trabalhos preparatórios da versão originária do Código.

A proposta de lei n.° 92/VI (lei de autorização legislativa para revisão do Código Penal) foi alvo de um relatório da 1." Comissão, no qual, no tocante à liberdade condicional, o seu relator teceu as seguintes observações:

1 — Não era até agora óbvio ser a liberdade condicional um incidente de execução de pena de prisão ou antes uma verdadeira medida de segurança, pelo que a considerava a doutrina portadora de natureza híbrida. Contra uma fisionomia inequivocamente punitiva, apontava-se-lhe o facto de prescindir do consentimento do condenado e a possibilidade de ultrapassar em duração o tempo de prisão àquele que faltava cumprir;

2 — A proposta apresenta a liberdade condicional como forma ou incidente de execução da prisão e como meio de socialização do delinquente. É assim que o consentimento do condenado se afirma como imprescindível à sua concretização;

3 — Numa primeira leitura a CRCP aceitou a concessão da liberdade condicional a dois terços da pena mas numa segunda leitura preferiu-lhe a concessão a metade da pena de prisão;

4 — A proposta ministerial, concedível, em regra, a metade da pena de prisão, sê-lo-á a dois terços, desde que se trate de condenação a pena de prisão superior a cinco anos pela prática de crimes contra as pessoas ou de crime de perigo comum (artigo 61.°, n.° 4, do CP);

5 — O artigo 62.° vem preencher uma lacuna que se fazia sentir no regime de liberdade condicional em caso de execução sucessiva de várias penas. Estipula que a solução a adoptar é diferenciada para cada caso, ou seja, tendo em conta a natureza de cada crime cometido e a pena que lhe foi aplicada.

3.2 — A revisão operada pelo Decreto-Lei n.° 48/95, de 15 de Março, ao regime da liberdade condicional veio simplificar de alguma forma o regime originário, que não era suficientemente claro: estabeleceu que a liberdade condicional depende sempre:

Do consentimento do condenado; e Do cumprimento efectivo de, pelo menos, seis meses de prisão.

O legislador penal veio clarificar que a concessão da liberdade condicional, em todas as suas modalidades, incluindo, portanto, a obrigatória, depende do consentimento do condenado e de que o período da liberdade condicional não pode exceder o tempo de prisão que falta cumprir.

«O artigo 61.° procede a uma clara distinção entre a liberdade condicional facultativa e obrigatória. A facultativa depende de requisitos formais e de fundo e a sua aplicação está regulada nos n.os 1, 2, 3 e 4.

Uma vez verificados os requisitos formais e de fundo, é poder/dever do tribunal colocar o condenado em liberdade condicional, sendo então também de certo modo obrigatória.

A liberdade condicional obrigatória, para além do consentimento do condenado, depende tão-só da verificação de requisitos formais, rectius, do requisito enunciado no n.° 5, onde a aplicação desta modalidade de liberdade condicional se encontra prevista (o n.° 5 do artigo 61." inspirou-se em providências semelhantes do direito comparado, nomeadamente do Reino Unido.» (Maia Gonçalves, Código Penal Anotado.)

Entende o Prof. Manuel Maia Gonçalves que possa parecer algo chocante a concessão de liberdade condicional a certas categorias de delinquentes. A ratio última da liberdade condicional reside na necessidade de criar um processo seguro de o Estado não largar inteiramente do seu controlo o condenado, o que pode representar para este, em vez de benefício, um pesado e duradouro encargo, significando ainda este regime uma cautelosa fase de transição entre uma longa prisão e a plena liberdade.

IV — Do enquadramento constitucional

A Constituição da República Portuguesa consagra, no artigo 27.°, o direito à liberdade e à segurança. As restrições ao direito à liberdade, que se traduzem em mecM-as. de privação total ou parcial dela, só podem ser as previstas nos n.M 2 e 3 do artigo 27.°, não podendo a lei criar outras — princípio da tipicidade constitucional das medidas privativas/restritivas da liberdade. Estas medidas, ao constituírem restrições a um direito fundamental integrante da categoria dos «direitos, liberdades e garantias», estão

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sujeitas às competentes regras do artigo 18.°, n.° 2, da Constituição da República Portuguesa.

Em princípio (excepções no n.° 3), as medidas de privação da liberdade, seja total, seja parcial (prisão, semidetenção, regime de prova, liberdade condicional, internamento, etc), só podem resultar, conforme os casos, de condenação de acto punido com pena de prisão ou de aplicação de medida de segurança.

Atente-se ainda ao disposto no artigo 29." da Constituição da República Portuguesa (aplicação da lei criminal), o qual consagra, na expressão feliz de Gomes Canotilho e Vital Moreira, o «essencial do regime constitucional da lei criminal», isto é, da lei que declara criminalmente punível uma acção ou omissão, definindo um determinado crime e prevendo a respectiva pena (a propósito da Consumição Penal, cf. os artigos 3.°, 9.°, 10.° e 11.° da DUDH, os artigos 9.°, 14° e 15." do PEDCP, os artigos 5.°, n.° 5, e 7.° da CEDH e o Protocolo 7.° da CEDH, os artigos 2.°, 3.° e 4.°).

Embora existam muitos bens constitucionais cuja desprotecção penal não seria compreensível (direito à vida, à integridade pessoal, ao bom nome e reputação), a verdade é que, traduzindo-se as penas num sacrifício imposto ao condenado, é a penalização que, normalmente, carecerá de justificação quanto à sua necessidade e quanto à proporcionalidade da medida da pena, devendo entender-se, desde logo, que só podem ser objecto de protecção penal os direitos e interesses constitucionalmente protegidos. Entende-se ainda que só deve haver sanção criminal quando tal se mostre necessário para salvaguardar esses bens constitucionais.

Os princípios constitucionais básicos em matéria de punição criminal são: o princípio da legalidade (só a lei é competente para definir crimes e respectivas penas); o princípio da tipicidade (a lei deve especificar suficientemente os factos que constituem o tipo legal de crime, bem como tipificar as penas); o princípio da não retroactividade (a lei não pode criminalizar factos passados nem punir mais severamente crimes anteriormente praticados).

O artigo 30.° da Constituição da República Portuguesa é também um eixo basilar da Constituição em matéria penal, estabelecendo este preceito os limites das penas e das medidas de segurança, vigorando no nosso ordenamento jurídico o «princípio da humanidade das penas». Todavia, o texto constitucional pouco diz sobre as próprias penas. Para além das penas privativas da liberdade (artigo 27.°, n.° 2), a Constituição não define positivamente quais podem ser as outras penas.

A Constituição impõe limites às penas que resultam, expressa ou directamente, de certas figuras da Constituição, mas confere um amplo campo à discricionariedade legislativa em matéria de definição das penas.

Princípio geral de limitação das penas e dos seus efeitos é, inquestionavelmente, o princípio constitucional da necessidade e da proporcionalidade.

Do texto constitucional, e tal como a maioria da doutrina defende, ressalta a ideia de que o direito penal só deve intervir, só deve querer aplicar-se, só deve tomar cotaá de um certo tipo de actuações ou de actos quando isso for, por um lado, eficaz e, por outro, necessário.

Na esteira do entendimento de Teresa Pizarro Beleza (v. Direito Penal, vol. i, pp. 35 e segs., edição AAFDL, 1984), «só vale a pena, só tem sentido tornar certos actos crimes e, portanto, ameaçá-los com uma pena que pode ser mais grave, quando não for suficiente um outro tipo

de medidas. Por outro lado, é necessário também que essa incriminação seja eficaz».

Está subjacente a essa asserção o princípio da intervenção mínima do direito penal.

Em sede de liberdade condiciona], que é a matéria em apreciação neste parecer, podemos encontrar uma fundamentação última deste instituto no facto de o direito penal, uma vez cumpridos certos pressupostos, ser mais eficaz se não intervier e se permitir a ressocialização do delinquente mediante a substituição da pena privativa da liberdade pela liberdade condicional.

Neste sentido se tem pronunciado, desde sempre, o Conselho da Europa, quando recomenda aos Estados membros que afastem, tanto quanto possível, a aplicação de medidas privativas da liberdade [v. Resolução (76) 10, in BAPIC, n.° 33, 1978).

V — Da análise e do enquadramento

5.1 —Apreciação jurídica do projecto de lei n.° 221/ \TJ (PSD).

O presente projecto de lei é composto por quatro artigos, nos quais o legislador se propõe alterar os pressupostos e a duração da liberdade condicional (artigo 61." do Código Penal); o regime de liberdade condicional em caso de execução sucessiva de várias penas (artigo 62.°) e o regime de execução de pena e de medidas de segurança privativas da liberdade (artigo 99.°).

Propõe-se ainda alterar o artigo 49.°-A do Decreto-Lei n.° 15/93, aditado pela Lei n.° 45/96, de 3 de Setembro, bem como o regime das saídas precárias previsto nos artigos 34.°, 38.° e 92.° do Decreto-Lei n.° 738/76, de 29 de Outubro.

No artigo 4.° salvaguarda-se o princípio da não retroactividade, uma vez que o regime proposto só será aplicável aos condenados por crimes cometidos após a sua entrada em vigor.

Vejamos cada uma das alterações propostas de per si:

a) Pressupostos e duração da liberdade condicional.

O presente projecto aumenta, de dois terços para três quartos, o tempo de cumprimento de pena necessário para que a liberdade, condicional possa ter lugar, quando o condenado a prisão tenha sido autor de crimes violentos.

O instituto da liberdade condicional não será, contudo, aplicável quando estejam em causa condenações por crimes de homicídio qualificado (artigo 132.° do Código Penal), tráfico de droga, violação de menores (artigo 164.° do Código Penal), terrorismo e associação criminosa, de reincidência e de concurso de crimes.

Como decorrência lógica destas novas previsões legais [artigo 61.°, n.° 2, alíneas a) e b)', do projecto de lei] opta--se pela eliminação da determinação constante do n.° 5 do artigo 61." do Código Penal, que, actualmente, prevê a obrigatoriedade de o condenado ser colocado em liberdade condicional quando tenha cumprido cinco sextos da pena.

b) Liberdade condicional em caso de execução sucessiva de várias penas.

Se houver lugar à execução de varias penas de prisão, a execução da pena que deva ser cumprida em primeiro lugar é interrompida quando se encontrem cumpridos três quartos da pena (regime vigente: metade da pena) no caso da alínea b) do número anterior.

É também eliminado o n.° 3 do artigo 62.°, que permitia a colocação do condenado em liberdade condicional logo que se encontrem preenchidos cinco sextos da soma das

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penas e se a soma das penas que devam ser cumpridas sucessivamente exceder seis anos de prisão.

c) Liberdade condicional — artigo 49.°-A do Decreto--Lei n.° 15/93 de 22 de Janeiro, com as alterações operadas pela Lei n.° 45/96, de 3 de Setembro.

Por força do presente projecto de lei estipula-se que, tratando-se de condenação a pena de prisão pela prática de crime previsto nos artigos 21." a 23." (tráfico e outras actividades ilícitas/precursores/conversão, transferência ou dissimulação de bens ou produtos) e 28." (associações criminosas), o regime da liberdade condicional não é aplicável.

No regime actual, a liberdade condicional pelos crimes supra-referidos apenas poderá ter lugar quando se encontrem cumpridos dois terços da pena e uma vez verificadas as alíneas a) e b) do n.° 2 do artigo 61.° do Código Penal.

d) Saída precária prolongada e processo de concessão da liberdade condicional — Decreto-Lei n.° 783/76.

Também este regime sofre uma forte restrição, permitindo-se somente a autorização de saídas precárias prolongadas quando os condenados a penas e medidas de segurança privativas da liberdade, de duração superior a seis meses, hajam cumprido um terço da pena (regime actual: um quarto). .

No tocante à revogação de saída precária propõe-se que não possa ser concedida nova saída sem que decorram dois anos (regime actual: um ano).

Quanto ao processo de concessão de liberdade condicional, estipula-se que com a antecedência não inferior a 60 dias do cumprimento do período de pena previsto no artigo 61.° do Código Penal, indispensável para o condenado ser colocado em liberdade condicional, a administração prisional remeterá ao tribunal de execução das penas um extracto do processo individual do condenado (regime actual: com antecedência não inferior a 60 dias do cumprimento de metade da pena).

e) Princípio da não retroactividade.

No artigo 4.° do projecto de lei consagra-se o princípio de que o disposto na presente lei é aplicável apenas aos condenados por crimes cometidos após a sua entrada em vigor, norma que merece acolhimento.

Este artigo é reflexo directo do disposto na parte geral do Código Penal (aplicação no tempo), no qual se dispõe, como regra geral, que as penas são determinadas pela lei que vigora no momento da perpetração do crime e as medidas de segurança são-no pela que vigora no momento do preenchimento dos pressupostos de que depende a respectiva aplicação. Esta regra, conhecida como da não retroactividade das leis penais, que é também corolário do princípio da legalidade, encontra-se consagrada no artigo 2.°, n.° 1, do Código Penal.

No presente projecto de diploma não existe qualquer disposição legal sobre a entrada em vigor da presente lei, o que implica que o diploma entre em vigor no 5.° dia após a publicação, tal como se encontra previsto no artigo 2.°, n.° 1, da Lei n.° 6/83, de 29 de Julho (publicação, identificação e formulário dos diplomas).

5.2 — Apreciação jurídica do projecto de lei n.° 226/ VTJ (PP).

O presente projecto de lei é composto por dois artigos, por força dos quais se alteram os pressupostos e a duração do regime da liberdade condicional (artigo 61." do Código Penal) e se revoga o artigo 49."-A do Decreto-Lei n.° 15/ 93, de 22 de Janeiro, com a redacção que lhe foi conferida pela Lei n.° 45/96, de 3 de Setembro.

Esta iniciativa legislativa vem introduzir três grandes alterações neste instituto (sendo mais restritivo do que o proposto em matéria de liberdade condicional no projecto de lei n.° 90/VTJ).

Vejamos as alterações ora preconizadas:

a) Consagração da obrigatoriedade de verificação do comportamento prisional exemplar como primeiro requisito da concessão de liberdade condicional, nos casos em que é admitida.

Consideramos que esta nova alínea acaba por estar consumada na actual alínea d) do artigo 61.°, n.° 2, do Código Penal, quando se refere «a personalidade e a evolução deste durante a execução da pena de prisão».

Com efeito, o técnico que elabora o relatório social indica sempre no mesmo o comportamento e evolução do condenado no meio prisional (v. artigos 484.° e seguintes da Constituição da República Portuguesa).

b) A aplicação da liberdade condicional será interditada a um conjunto de crimes graves, praticados contra as pessoas e em relação aos quais se tem manifestado uma especial repulsa por parte dos cidadãos, tendo sobretudo em conta ou as penas concretas que são aplicadas ou a enorme qualidade social de que se revestem.

O projecto vertente alarga ainda mais o leque de crimes que não admitem aplicação da liberdade condicional, quando comparado com o que é proposto no projecto de lei n.° 221/VTJ do Grupo Parlamentar do PSD.

Estão, assim, abrangidos os crimes de homicídio, homicídio qualificado, ofensa à integridade física grave de que resulte a morte, sequestro, escravidão, rapto, tomada de reféns, violação, abuso sexual de criança, genocídio, discriminação racial, crimes de guerra contra civis, organizações terroristas e terrorismo.

O regime de liberdade condicional também não-é aplicável aos crimes previstos nos artigos 21." a 23.° e 28.° do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, e nos casos de reincidência (tráfico de droga, precursores, associações criminosas).

Face ao exposto, somos de crer que as presentes iniciativas carecem de vários aperfeiçoamentos e de uma ponderação amadurecida sobre o necessário equilíbrio entre os valores que se equacionam.

Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emite quanto aos projectos de lei em apreço o seguinte parecer:

Os projectos de lei n.° 221/VTJ e n.° 226/V7J reúnem as condições constitucionais e regimentais necessárias à sua apreciação pelo Plenário.

Palácio de São Bento, 6 de Novembro de 1996. — O Deputado Presidente, Alberto Martins. — O Deputado Relator, Osvaldo Castro.

PROJECTO DE LEI N.s 235/VH

ALTERA OS PRAZOS DE EXCLUSÃO DA ILICITUOE NOS CASOS DE INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ

Nota justificativa

O presente projecto de lei não desconhece que invade terreno polémico e que, um pouco por toda a parte, os

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responsáveis políticos se debatem com idênticos problemas e verdadeiros conflitos de deveres.

A resposta hospitalar aos pedidos de interrupção voluntária da gravidez (IVG) revelou por outro lado que a IVG legal ocupa uma dimensão diminuta nó conjunto das IVG realizadas em Portugal, devido, por um lado, às restrições da lei e, fundamentalmente, às dificuldades institucionais na aplicação da lei, das quais sobressai a inexistência de critérios bem definidos e de serviços apropriados e a objecção de consciência.

Urge, no entanto, enfrentar o problema da interrupção voluntária da gravidez de forma técnica, no sentido de legalizar as situações clínicas de malformações fetais que ora se podem diagnosticar com melhor precisão pela evolução da técnica e mesmo de se obviarem alguns casos que às 16 semanas mascaram malformações e que, com o evoluir da gravidez, passam a morfologicamente normais.

Em termos' de direito comparado das legislações existentes nos países da União Europeia, a legislação portuguesa é das legislações menos abrangentes quer em relação aos prazos para a IVG quer em relação aos motivos/causas de exclusão da ilicitude.

A situação portuguesa, embora tenha avançado qualitativamente com as alterações operadas ao Código Penal pela Lei n.° 6/84, de 11 de Maio, e posteriormente com o Decreto-Lei n.° 48/95, de 15 de Março, é ainda reveladora de muitas lacunas e imperfeições, verificando-se na última década a continuação de um elevado número de abortos ilegais, por isso feitos sem qualquer supervisão e cuidados mínimos de assistência e higiene, o que acarreta em casos extremos a morte da paciente e que, em muitas situações, provoca lesões irreversíveis e traumas que se perpetuam ao longo da sua vida.

Face à situação vigente em que a mulher é uma vítima, onde em seu redor se cria uma teia de interesses económicos e meramente mercantilistas em prejuízo muitas vezes da sua saúde física e mental, e da própria vida, a «legalização» da prática do aborto no nosso país, nas condições ora propostas, torna-se necessariamente um imperativo ético.

Através do presente projecto de lei assegura-se:

A exclusão da ilicitude da interrupção voluntária da gravidez sem limite gestacional nas situações de feto inviável;

Alargamento de 16 para 24 semanas, comprovadas ecograficamente, nos casos de aborto eugénico. Em sequência dos estudos mais recentes revelados por profissionais do foro médico verifica-se que só é possível determinar com segurança a evolução ou existência de malformação a partir da 16.° semana. Os exames complementares sequentes dificilmente permitem obtenção de resultados de certeza de cromossomopatia ou de alterações da morfologia antes daquele tempo.

Ao contrário do que possa parecer, este alargamento será uma medida claramente pró--natalista, tanto mais que a manutenção dos limites actuais implica por vezes IVG que poderiam ser evitáveis, dado que são efectuadas com base em índices de risco, falsos positivos ou, mesmo, alterações morfológicas que ao evoluir da gestação se tornam inaparentes;

Alargamento de 12 para 16 semanas do prazo dentro do qual a IVG pode ser praticada sem punição no caso de vítimas de crimes contra a liberdade e

autodeterminação sexual e quando menores de 16 anos ou incapazes por anomalia psíquica.

As situações de crimes contra a liberdade sexual ou quando praticadas contra menor de 16 anos ou incapaz por anomalia psíquica justificam um alargamento do prazo para a IVG por se tratarem de situações delicadas e de grande melindre, assaz condicionadoras e inibitórias do comportamento da mulher, o que conduz consequentemente a uma morosidade da decisão de interrupção voluntária da gravidez; Deverá ser criada uma comissão técnica de avaliação de defeitos congénitos com competências para a emissão de parecer prévio quando estejamos perante IVG por malformação ou doença grave do embrião ou feto. Esta.comissão deverá ser instituída em todos os estabelecimentos autorizados a praticar, a IVG e definida nos termos regulamentares e nomeada anualmente pelo conselho de gerência de cada estabelecimento de saúde.

A comissão deverá ser constituída por um mínimo de três e um máximo de cinco médicos, sendo sempre obrigatório pelo menos a presença de um obstetra/ecografistá e um neonatologista;

A obrigação de reorganização dos serviços hospitalares para que estejam dotados de estruturas adequadas à prática da IVG;

O acesso e o apoio pré e pós-IVG, bem como o direito a consultas de planeamento familiar.

Nos termos constitucionais e regimentais, os Deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1."

O artigo 142.° do Código Penal, com a redacção que lhe foi introduzida pelo Decreto-Lei n.° 48/95, de 15 de Março, passa a ter a seguinte redacção:

Artigo 142.° Interrupção da gravidez não punível

1 — Não é punível a interrupção da gravidez efectuada por médico, ou sob a sua direcção, em estabelecimento de saúde público, convencionado ou privado, oficialmente reconhecido, e com o consentimento da mulher grávida, quando, segundo o estado dos conhecimentos e da medicina:

Houver seguros motivos para crer que o nasci-turno virá a sofrer, de forma incurável e irreversível, de doença grave, ou malformação congénita e for realizada nas primeiras 24 semanas de gravidez, comprovadas ecograficamente, excepcionando-se os casos de fetos inviáveis cuja interrupção poderá ser praticada a todo o tempo;

Houver sérios indícios de que a gravidez resultou de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual ou nos casos de vítima menor de 16 anos ou incapaz por anomalia psíquica, e for realizada nas primeiras 16 semanas.

2 — A verificação das circunstâncias que tornam não punível a interrupção da gravidez referidas no

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número anterior é certificada em relatório médico, escrito e assinado, antes da intervenção, pelos médicos que compõem a comissão técnica de avaliação de defeitos congénitos.

3 ...................................................................'......

4—.........................................................................

Artigo 2."

Comissão.técnica de avaliação de defeitos congénitos

1 — Para efeitos da alínea c) do artigo 142.° do Código Penal, a verificação das circunstâncias que tornam não punível a interrupção da gravidez é certificada em relatório médico, após a emissão de parecer prévio pela comissão técnica de avaliação de defeitos congénitos constituída por um mínimo de três e um máximo de cinco médicos, sendo sempre obrigatória, pelo menos, a presença de um obstetra/ ecografista e um neonatologista, tendo os restantes elementos conhecimento categorizado para a avaliação em causa.

2 — A constituição e respectivos estatutos da comissão serão regulados em lei própria, sendo que a nomeação da comissão ocorrerá obrigatoriamente no início de cada ano e ficará a cargo do conselho de gerência de cada estabelecimento público de saúde, instituições de saúde convencionadas ou privadas oficialmente reconhecidas para a prática da IVG.

. Artigo 3.°

Os artigos 3.°, 4.° e 5.° da Lei n.° 6/84, de 11 de Maio. passam a ter a seguinte redacção:

Artigo 3.° Organização dos estabelecimentos de saúde

1 — Quando se verifiquem circustâncias que excluam a ilicitude do aborto, pode a mulher grávida solicitar a interrupção da gravidez em estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhecido, entregando de imediato o seu consentimento escrito e, até ao momento da intervenção, os documentos ou relatórios médicos legalmente exigidos.

2 — Os estabelecimentos de saúde públicos ou oficialmente reconhecidos onde seja praticada licitamente a interrupção voluntária da gravidez organizar--se-ão de forma adequada para o efeito.

3 — Os estabelecimentos referidos no número anterior adoptarão os meios e as providências necessários para que a interrupção voluntária da gravidez se verifique nas condições e nos prazos legalmente previstos.

4 — Os serviços que pratiquem diagnóstico pré--natal serão obrigados a levar a termo essa investigação, incluindo, se necessário, a interrupção voluntária da gravidez.

Artigo 4.° Objecção de consciência

1 — É assegurado aos médicos e demais profissionais de saúde, relativamente a quaisquer actos respeitantes à interrupção de gravidez, ainda que voluntária e lícita, o, direito à objecção de consciência.

2 — A objecção de consciência é manifestada em documento assinado e fundamentado pelo objector e a sua decisão é imediatamente comunicada à mulher ou a quem no seu lugar pode prestar o consentimento, ficando obrigado a incluir a indicação sobre o profissional que praticará a interrupção voluntária da gravidez.

Artigo 5."

Dever de sigilo profissional

Os médicos, demais profissionais de saúde e restante pessoal dos estabelecimentos de saúde pública ou oficialmente reconhecidos em que se pratique a IVG ficam vinculados ao dever desigilo profissional relativamente a todos os actos, factos ou informações de que tenham conhecimento, no exercício das suas funções, ou por causa delas relacionados com aquela prática, nos termos e para os efeitos dos artigos 195.° e 196.° do Código Penal, sem prejuízo das consequências estatutárias e disciplinares da infracção.

Artigo 4.° Aconselhamento e planeamento familiar

1 —Nas instituições onde se pratique a interrupção voluntária da gravidez deverá ser fornecida uma adequada preparação aos profissionais de psicologia e serviço social dos estabelecimentos hospitalares para informação e aconselhamento nos pedidos de IVG.

2 — Providenciar-se-á para que a mulher tenha acesso a consulta de planeamento familiar.

Artigo 5.'° Regulamentação

O Governo aprovará, no prazo de 120 dias após a publicação da presente lei, a legislação necessária à sua execução.

Artigo 6.° Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 90 dias após a sua publicação.

Assembleia da República, 29 de Outubro de 1996. — Os Deputados do PS: Manuel Strecht Monteiro — Agostinho Moleiro — Raimundo Narciso — Nelson Baltazar — José Barradas — Alberto Marques — António Reis — José Saraiva — Helena Roseta — Maria Amélia Antunes (e mais uma assinatura ilegível).

PROJECTO DE LEI N.s 236/V»

INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ

Nota justificativa

O aborto é uma violência, uma violência profunda e desesperada infligida por uma mulher, primeiro que tudo, sobre si própria.

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No conflito entre a vida e a liberdade que o aborto encarna, será talvez mais honesto admitir que a nossa civilização não foi capaz de reconciliar os dois valores com absoluta consistência em todas as escolhas que fazemos.

Sendo o aborto intrinsecamente um mal, urge, no entanto, alterar a actual situação portuguesa.

Portugal, à excepção da Irlanda, é o país da Europa comunitária com uma legislação mais restritiva no referente à interrupção voluntária da gravidez (IVG), o que poderá estar na origem da assustadora taxa de IVG ilegais que se praticam no nosso país.

O aborto clandestino e inseguro continua a ser um dos mais graves problemas de saúde reprodutiva das mulheres portuguesas. Com efeito, segundo o Instituto Nacional de Estatística a prática do aborto constitui a segunda causa de morte materna e é responsável por inúmeros atendimentos e internamentos nos hospitais portugueses.

Ciente desta situação, a Juventude Socialista defende, ab initio, uma legislação adequada à realidade actual numa linha de defesa dos direitos fundamentais da mulher, preconizando a implementação de um quadro legal «pró--vida» e não «pró-hipocrisia».

Os estudos realizados sobre a prática de aborto pelas mulheres portuguesas confirmam que uma percentagem elevada de mulheres fez um ou mais abortos ao longo da sua vida, como resultado de gravidezes não desejadas. Destas, cerca- de 50% fizeram mais do que um aborto.

Segundo as mais recentes estimativas, calcula-se que são praticados no nosso país cerca de 16 000 abortos ilegais, feitos muitas vezes em condições higiénicas e sanitárias deploráveis.

Para além das complicações trágicas, como a morte da mulher ou intervenções cirúrgicas por perfuração uterina, infecções ou hemorragias graves, outras sequelas passam despercebidas no pós-aborto imediato, mas podem marcar o futuro reprodutivo das mulheres — é o caso das infecções subclínicas que originam obstrução das trompas e mais tarde infertilidade ou risco de gravidez extra-uterina.

O quadro legal português, embora tenha sofrido um avanço significativo com a Lei n.° 6/84, de 11 de Maio, que veio consagrar a exclusão da ilicitude nas situações de aborto terapêutico, eugénico e ético, e, posteriormente, com as alterações operadas pela revisão do Código Penal através do Decreto-Lei n.° 48/95, de 15 de Março, é revelador, ainda, da existência de muitas lacunas e imperfeições, que se acentuaram devido à falta de regulamentação da Lei n.° 6/84.

A Comissão de Revisão do Código Penal (CRCP) propôs, em 1994, o prazo de 22 semanas no tocante à interrupção da gravidez nos casos designados de aborto eugénico.

Porém, não foi esse o entendimento governamental, dado que a proposta de lei n.° 927VI retomou o período de 16 semanas de gravidez, já constante da Lei n.° 6/84. Aquando desta últíma revisão do Código Penal foi evitada, pela então maioria, qualquer correcção ou revisão da lei, mesmo aquela que se referia aos erros técnicos flagrantes que a Lei n.° 6/84 contém (inadaptação dos prazos de IVG por malformação do feto aos prazos necessários para que tais malformações sejam detectadas). °

A proposta da CRCP afigurava-se mais equilibrada e até de harmonia com as soluções da Alemanha e da Espanha. Apontaram-se mesmo soluções mais permissivas nos casos da Dinamarca, França, Grécia, Luxemburgo e Inglaterra, que despenalizaram o aborto eugénico até às 25.* ou 28.° semanas.

O direito comparado das legislações existentes na União Europeia situa a legislação portuguesa nas legislações menos abrangentes, quer no referente aos motivos quer em relação aos prazos para a IVG. Em particular, os prazos para uma IVG nos casos de malformação do feto são muitas vezes impraticáveis face ao tempo de gravidez exigido legalmente, o qual não permite claramente a comprovação daquele facto.

Assim, em termos de legislação comparada, podemos constatar que na Dinamarca, França e Grécia é permitida a IVG a simples pedido da mulher, sem invocação de motivos, até às 12 semanas.

Por outro lado, assiste-se, desde a década de 70, à despenalização da IVG por indicações sociais na Dinamarca, Alemanha, Itália, Luxemburgo e Inglaterra, oscilando os prazos entre as 12.° e 28." semanas.

A Holanda e a Bélgica incluem, ainda, no seu ordenamento jurídico a possibilidade de prática de IVG por situação intolerável ou por angústia até às 12.° e 24.° semanas, respectivamente.

Acresce que a taxa de aborto diminuiu consideravelmente nos países em que o mesmo foi inserido e tratado em programas de planeamento familiar, sustentados por serviços de saúde adequados e eficazes e acompanhados de informação e formação nesta área.

A resposta hospitalar aos pedidos de IVG revela que a IVG legal ocupa uma dimensão diminuta no conjunto das IVG realizadas em Portugal, devido, por um lado, às restrições legais e, por outro, às dificuldades institucionais na aplicação do quadro legal, das quais sobressai a inexistência de critérios bem definidos e de serviços apropriados, bem como a objecção de consciência. ' Feito o diagnóstico da aplicação da Lei n.° 6/84, constata-se que a mesma se caracterizou por grandes falhas na sua implementação e pela disparidade de critérios na sua aplicação, associada ao facto de não ter contemplado a maior parte dos motivos que levam uma mulher a interromper uma gravidez que não desejou (motivos emocionais, erros técnicos, falhas dos métodos contraceptivos e da sua utilização, impossibilidade por motivos económicos, habitacionais) e que condicionam uma mulher ou o casal a decidir de forma irreversível e sempre penosa, que não quer ou não pode, naquele momento, levar até ao seu término aquela gravidez.

A realidade é visível: milhares e milhares de mulheres portuguesas continuam a recorrer ao circuito do aborto ilegal. Por isso, entendemos que a lei vigente deverá ser corrigida, quer nos seus erros técnicos quer na sua abrangência, e, à semelhança das leis existentes nos demais países da União Europeia, que a IVG possa ser feita até à 12.* semana a pedido da mulher, por motivos ligados à defesa da sua própria liberdade pessoal em matéria de maternidade ou à defesa da sua dignidade moral ou social.

Na verdade, «todos os indivíduos têm o direito de ser livres, tendo em conta os direitos dos outros, para usufruir e controlar a sua vida sexual e reprodutiva» (in Carta sobre Direitos Sexuais e Reprodutivos, de 1995).

As últimas conferências internacionais que se debruçaram sobre o tema do aborto, nomeadamente as Conferências de Tbilissi (1990), Cairo (1994) e Pequim (1995), adoptaram conclusões similares, ou seja, que «o aborto ilegal é um problema de saúde pública que afecta milhões de mulheres em todo o mundo».

Os Deputados da Juventude Socialista e outros do PS, em estreita coerência com os seus princípios e após auscultação das principais organizações especializadas

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nesta área, visam essencialmente com esta iniciativa que, à semelhança de outros países europeus, o aborto ilegal seja erradicado da sociedade portuguesa.

As alterações preconizadas com a presente iniciativa contribuirão de forma inequívoca para o combate ao aborto ilegal, não se traduzindo a sua aprovação no aumento do aborto mas tão-somente na possibilidade de, em certas condições e situações, com vista à preservação da dignidade social e morai e de uma maternidade consciente e livre, a mulher que pratica o aborto ilegal o possa fazer em condições de segurança física e psíquica.

Através do presente projecto de lei, os Deputados do PS abaixo assinados propõem:

A exclusão da ilicitude da interrupção voluntária da gravidez quando realizada nas primeiras 12 semanas a pedido da mulher.

Entende-se que não deverá ser susceptível de procedimento criminal a interrupção voluntária da gravidez até às 12 semanas, nos casos em que a mulher considerou não poder exercer a maternidade consciente, tal como constitucionalmente consagrada no artigo 67.° da Constituição da República Portuguesa; O alargamento do prazo de 16 para 24 semanas de gravidez, quando haja seguros motivos para crer que o nascituro virá a sofrer de forma incurável de doença grave ou malformação congénita.

Com efeito, vários estudos científicos realizados a níveis nacional e internacional apontam para a conclusão de que só é possível determinar com segurança a evolução ou existência de malformação a partir da 16.* semana.

Estamos, assim, perante um normativo que pode, em certas situações, corresponder a uma medida pró-natalista, dado que com este alargamento é possível evitar IVG baseadas meramente em índices de risco, uma vez que a prática médica demonstra que o feto pode recuperar após as 16 semanas a sua malformação inicial; Alargamento do prazo de 12 para 16 semanas em que a prática da IVG surge por se mostrar indicada para evitar perigo de morte ou de grave lesão para o corpo ou saúde física e psíquica da mulher grávida.

Alargamento do prazo de 12 para 16 semanas no caso de vítimas de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, aumentando-se aquele prazo para as 18 semanas, quando praticados contra menores de 16 anos ou incapazes por anomalia psíquica.

As situações de crimes contra a liberdade sexual justificam um tratamento específico, tendo em conta as repercussões ao nível do foro psicológico, que se agravam tratando-se de menor de 16 anos ou incapaz por anomalia psíquica.

De facto, qualquer das situações referidas comportam aspectos de natureza inibitória, levando na maioria das vezes as suas vítimas ao silêncio, ao sofrimento e, por consequência, a uma maior morosidade da tomada de decisão IVG.

Penalizar a propaganda à IVG com uma pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.

Defende-se o direito da mulher a decidir, em consciência se quer ou não interromper volunta-

riamente a sua gravidez, pelo que todos os comportamentos indutores de tal prática, por maioria de razão, devem ser penalizados, tendo os autores do presente projecto de lei optado pela moldura penal prevista para o crime de propaganda ao suicídio previsto, punido nos termos do Código Penal vigente; Desenvolver, no âmbito da rede pública de cuidados de saúde, a valência de aconselhamento familiar, que deverá organizar-se por .distrito, devendo os mesmos ser de fácil acesso a todas as mulheres grávidas, quer numa fase de pré-aborto, quer em fase pós-abortiva.

Os centros de aconselhamento familiar destinam-se a fornecer o aconselhamento e o apoio necessários à mulher grávida, visando a superação de problemas relacionados com a gravidez, contribuindo através dos recursos técnicos nela integrados para uma decisão responsável e consciente;

Organizar de forma adequada os estabelecimentos públicos de saúde ou convencionados à prática da IVG, de molde que esta se verifique nas condições e nos prazos legalmente estatuídos.

Pretende-se, assim, corrigir a situação actual em que somente 17 hospitais praticam IVG legais, invocando os restantes falta de meios e recursos adequados, entre outros factores.

Assegurar um direito à objecção de consciência que não colida com o direito da mulher à IVG, estabe-lecendo-se regras claras e exigindo-se que o médico objector inclua no documento onde fundamenta a sua objecção o nome de outro profissional do foro, que assegurará a prática da IVG;

Estabelecimento do dever- de sigilo dos médicos, demais profissionais de saúde e restante pessoal de saúde pública ou convencionada em que se pratique a IVG.

Com o presente projecto de lei pretendem os Deputados do PS abaixo assinados que se implemente um regime legal adequado à realidade portuguesa, enquadrando de forma harmoniosa as soluções europeias vigentes nesta matéria.

Os Deputados do PS abaixo assinados, estando conscientes de que nesta sede o planeamento familiar e a educação sexual dos cidadãos são as pedras de toque para evitar o flagelo social que é o aborto, consideram que urge alterar o actual quadro legal da IVG, quadro esse que abarca no seu seio disposições relativas ao planeamento e à educação sexual e que tenta conciliar os direitos fundamentais que se encontram sempre em jogo aquando de uma IVG.

Nos termos constitucionais e regimentais, os Deputados do PS abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.°

O artigo 142.° do Código Penal, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 48/95, de \5 de Março, passa a ter a seguinte redacção:

Artigo 142.° Interrupção da gravidez não punível

1 — Não é punível a interrupção da gravidez efectuada por médico ou sob a sua direcção, em estabele-

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cimento oficial ou oficialmente reconhecido e com o consentimento da mulher grávida, nas seguintes situações:

a) A pedido da mulher nas primeiras 12 semanas de gravidez, para preservação da sua integridade moral, dignidade social e ou maternidade consciente;

b) [Actual alínea a).)

c) Se se mostrar indicada para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida e for realizada nas 16 primeiras semanas de gravidez;

d) Se houver seguros moüvos para crer que o nascituro virá a sofrer, de forma incurável, de grave doença ou malformação congénita e for realizada nas primeiras 24 semanas de gravidez;

e) Se houver sérios indícios de que a gravidez resultou de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual e for realizada nas primeiras 16 semanas de gravidez ou nas primeiras 18 semanas de gravidez nos casos de vítima menor de 16 anos ou incapaz por anomalia psíquica.

2—.........................................................................

3—.........................................................................

4—........................................................................

Artigo 2.°

É aditado um artigo 140.°-A ao Código Penal, com a seguinte redacção:

Artigo 140.°-A

Propaganda & interrupção voluntária da gravidez

Quem, por qualquer modo, fizer propaganda ou publicidade de produto, método ou serviço próprio ou de outrem como meio de promover a interrupção voluntária da gravidez será punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.

Artigo 3.° Rede pública de aconselhamento familiar

1 — Será desenvolvida na rede pública de cuidados de saúde a valência de aconselhamento familiar, que deverá estabelecer, pelo menos, um centro de aconselhamento familiar (CAF) em cada distrito.

2 — Os CAF enquadram-se no âmbito dos centros de saúde, devendo as suas constituição e organização interna ser regulamentadas por decreto-lei do Governo.

Artigo 4.°

Funcionamento dos centros de aconselhamento familiar

( — Os CAF devem ser de fácil acesso a todas as mulheres grávidas que pretendam, nos termos da lei, realizar uma interrupção voluntária da gravidez ou que já a tenham praticado.

2 — As consultas realizadas pelos CAF são gratuitas, confidenciais e realizadas sob anonimato, se essa for a vontade expressa da mulher grávida.

Artigo 5.° Competências

1 — Compete aos CAF fornecer o aconselhamento e o apoio necessários à mulher grávida visando a superação de problemas relacionados com a gravidez, contribuindo desta forma para uma decisão responsável e consciente.

2 — Os CAF serão incumbidos, entre outras, das seguintes funções:

a) Informar e encaminhar a mulher grávida para os estabelecimentos onde se pratiquem as interrupções voluntárias de gravidez, após o devido aconselhamento;

b) Informar a mulher grávida dos direitos consagrados em legislação laboral no tocante à maternidade, bem como quanto aos direitos que lhe assistem relativamente às prestações médico-- sociais;

c) Aconselhar, informar e sensibilizar as mulheres sobre a forma mais adequada para organizarem o seu planeamento familiar;

d) Suscitar, se necessário, a intervenção dos serviços sociais que operem no sector, verificando-se a possibilidade de essa intervenção resolver problemas de ordem social decorrentes da maternidade.

3 — O CAF poderá, no processo de consultas, ouvir o autor da concepção, desde que a tal a mulher grávida não se oponha.

Artigo 6." Organização dos estabelecimentos de saúde

1 — Quando se verifiquem circunstâncias previstas no n.° 1 do artigo 142.° do Código Penal, pode a mulher grávida solicitar a interrupção voluntária da gravidez em estabelecimento de saúde oficial ou convencionado, entregando de imediato o seu consentimento escrito e, até ao momento da intervenção, os documentos ou atestado médico legalmente exigidos.

2 — Os estabelecimentos de saúde oficiais ou convencionados onde seja praticada licitamente a interrupção voluntária gravidez organizar-se-ão de forma adequada para o efeito.

3 — Os estabelecimentos referidos no número anterior adoptarão os meios e as providências necessários para que a interrupção voluntária e lícita da gravidez se verifique nas condições e nos prazos legalmente previstos.

Artigo 7.° Objecção, de consciência

1 — É assegurado aos médicos e demais profissionais de saúde, relativamente a quaisquer actos respeitantes à interrupção voluntária de gravidez, ainda que licita, o direito à objecção de consciência.

2 — A objecção de consciência é manifestada em documento assinado e fundamentado pelo objector, e a sua decisão é imediatamente comunicada à mulher, ou a quem no seu lugar pode prestar o consentimento, e deverá incluir

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a indicação sobre o profissional que praticará a interrupção voluntária de gravidez.

Artigo 8.° Dever de sigilo

Os médicos e demais profissionais de saúde e restante pessoal dos estabelecimentos de saúde públicos ou convencionados em' que se pratique a interrupção voluntária da gravidez ficam vinculados ao dever de sigilo profissional relativamente a todos os actos, factos ou informações de que tenham conhecimento no exercício das suas funções ou por causa delas, relacionados com aquela prática, nos termos e nos efeitos do disposto nos artigos 195.° e 196.° do Código Penal, sem prejuízo das consequências estatutárias e disciplinares da infracção.

Artigo 9.°

Regulamentação

O Governo regulamentará o presente diploma no prazo de 90 dias a contar da data da sua entrada em vigor.

Artigo 10.°

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a lei do Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.

Assembleia da República, 28 de Outubro de 1996. — Os Deputados do PS: Sérgio Sousa Pinto — Afonso Candal — Ricardo Castanheira — Sérgio Silva — Fernando Pereira Marques — Natalina de Moura — Maria da Luz Rosinha — Elisa Damião — Manuel Alegre — Barbosa de Oliveira (e mais duas assinaturas ilegíveis).

PROPOSTA DE LEI N.s 63/VII

AUTORIZA 0 GOVERNO A REVER 0 ILÍCITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL APLICÃVEL AO LICENCIAMENTO DOS ESTABELECIMENTOS QUE DESENVOLVEM ACTIVIDADES DE APOIO SOCIAL NO ÂMBITO DA SEGURANÇA SOCIAL.

Exposição de motivos

O bem-estar dos utentes dos equipamentos de apoio social constitui uma condição para o exercício do direito de cidadania, cujo aperfeiçoamento é um dos objectivos prioritários do XEQ Governo Constitucional.

Para atingir plenamente tal desiderato, torna-se necessário reformular o regime legal do licenciamento e funcionamento dos estabelecimentos que desenvolvem actividades no âmbito da protecção social.

Nestes termos, adquire especial importância o quadro sancionatório, importando adoptar medidas efectivamente inibitórias da prática de actos que ponham em causa o bem-estar dos utentes.

Assim, atribuindo-se ao valor das coimas e à sua publicidade uma função efectivamente preventiva da prática das infracções, torna-se necessário que os seus montantes sejam superiores aos previstos no regime geral das contra-

-ordenações, matéria que carece de prévia autorização legislativa da Assembleia da República. Assim:

Nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 200.° da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:

A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164.°, alínea e), 168.°, n.° 1, alínea d), e 169°, n.°3, da Constituição, o seguinte:

Artigo 1.° Objecto

Fica o Governo autorizado a aprovar o regime do ilícito de mera ordenação social aplicável à violação de normas relativas ao licenciamento e à fiscalização dos estabelecimentos que desenvolvam actividades de apoio social no âmbito da protecção social.

Artigo 2."

Sentido e extensão

A autorização referida no artigo anterior tem os seguintes sentido e extensão:

a) Estabelecer contra-ordenações aplicáveis às pessoas singulares, puníveis com coima cujo montante se poderá elevar até ao valor máximo de 2 000 000$, visando sancionar:

1) A abertura e o funcionamento dos estabelecimentos que não se encontrem licenciados nem disponham de autorização provisória de funcionamento de harmonia com a legislação aplicável;

2) A inadequação das instalações, bem como as deficientes condições de higiene e segurança, face aos requisitos legalmente estabelecidos;

3) A inexistência injustificada do pessoal técnico e auxiliar indicado no respectivo mapa;

4) A alimentação claramente deficiente para as necessidades dos utentes;

5) O excesso de lotação em relação à capacidade autorizada para o estabelecimento;

6) O impedimento das acções de fiscalização;

7) A violação de quaisquer outras normas ou exigências legais;

b) Punir os factos praticados com negligência, sendo em tais casos os limites mínimos e máximos das coimas reduzidos a metade;

c) Estabelecer, simultaneamente com a coima, as seguintes sanções acessórias: '

1) Interdição do exercício da actividade em quaisquer estabelecimentos abrangidos pelo artigo 1.°;

2) Privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidade ou serviço público;

3) Encerramento do estabelecimento;

4) Suspensão do alvará ou da autorização provisória;

d) Determinar a publicidade das decisões definitivas que apliquem coima de montante igual ou superior a 200 000$ ou decretem o encerramento do estabelecimento.

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Artigo 3.° Duração

A autorização concedida pela presente lei tem a duração de 90 dias.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 10 de Outubro de 1996. — O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres. — O Ministro da Presidência, António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino. — O Ministro das Finanças, António Luciano Pacheco de Sousa Franco. — O Ministro da Solidariedade e Segurança Social, Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.9 18/VII

[APROVA, PARA RATIFICAÇÃO, A EMENDA AO ARTIGO 20.», PARÁGRAFO 1, DA CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO CONTRA AS MULHERES, APROVADA PELA RESOLUÇÃO N.9 50/ 202 (1995) DA ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, DE 22 DE DEZEMBRO DE 1995.]

Relatório e parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.

Relatório

O Governo remeteu à Assembleia da República, para efeitos de ratificação, a proposta de resolução n.° 18/VTI, que visa a ratificação de uma emenda ao artigo 20.° da Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, tendo sido distribuída à Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação para a elaboração dos respectivos relatório e parecer.

Ao apreciarmos esta proposta de lei, deve assinalar-se que a Carta das Nações Unidas estabelece a igualdade de direitos dos homens e das mulheres e assume, como preocupação dominante, o respeito pelos direitos fundamentais do homem e da dignidade humana.

Esles são princípios pelos quais a Humanidade se deve sempre reger, pelo que os Estados membros da ONU, perante as dramáticas circunstâncias em que viviam, e em grande parte ainda vivem, inúmeras mulheres, decidiram adoptar uma Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, que entrou em vigor há precisamente 15 anos, em 3 de Setembro de 1981, através da Resolução n.° 34/180, aprovada por 130 países, com a abstenção de 11 países.

Nesse relevante documento que se pretendia fosse eficaz e cumprido em todos os países — o que parece não se verificar na sua totalidade — faz-se alusão à Declaração Universal dos Direitos do Homem, que consagra o princípio da não discriminação e onde se proclama que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Daqui se extrai a conclusão de que às mulheres se deve assegurar o exercício de todos os direitos, sejam eles económicos, sociais, culturais, civis e políticos. Não pode haver distinção ou discriminação em função do sexo. Estas são normas que devem ser imperativas e sobre as quais não pode haver qualquer contestação.

Não obstante as convenções internacionais e as múltiplas resoluções, declarações ou recomendações aprovadas na ONU, a mulher ainda sofre, em todos os continentes, tratamentos desumanos, diferenciados e discriminatórios, dificultando-lhe a assunção plena dos seus legítimos direitos de cidadania. Em pleno século do desenvolvimento tecnológico, mesmo em sociedades consideradas como mais avançadas e civilizadas, a mulher continua sujeita a atitudes vexatórias e desrespeitadoras daqueles princípios e direitos.

Exemplos não faltam e através-deles pode observar-se como o homem submete a mulher à sua vontade, discri-minando-a e agindo, em muitos casos, como se ela fosse um mero objecto ao seu dispor, negando-lhe direitos inalienáveis e impedindo-a de participar, em plena igualdade, em todos os domínios de actividade.

A Convenção visa a adopção de medidas tendentes à eliminação de qualquer tipo de discriminação. Cada Estado subscritor comprometeu-se, quando a aprovou, a inscrever na sua Constituição nacional ou em qualquer lei apropriada o princípio da igualdade entre homens e mulheres e a assegurar, por via legislativa ou por outros meios, a aplicação efectiva deste princípio.

Mas vai mais longe a Convenção. Na realidade, os Estados acordaram também em proibir toda a discriminação, a aplicar sanções em caso de necessidade, a proteger com jurisdição adequada os direitos das mulheres em pé de igualdade com os homens, a abster-se de práticas discriminatórias, a pôr em prática medidas para eliminar a discriminação praticada contra as mulheres por uma ou mais pessoas, por organizações ou por empresas, a aprovar, alterar ou revogar leis no sentido de a protecção da mulher ser eficaz.

Sem pretendermos analisar exaustivamente toda a Convenção — nem é essa a intenção —, consideramos que não é despicienda essa apreciação a propósito da emenda à Convenção, pois é entendimento nosso que, para uma melhor compreensão do objectivo prosseguido com tal proposta de alteração, é conveniente relembrar alguns dos preceitos que constam daquele instrumento diplomático adoptado nas Nações Unidas. Assim, cita-se a obrigatoriedade de os Estados Partes «tomarem medidas para modificar os esquemas de comportamento sócio-cultural dos homens e das mulheres com vista a alcançar-se a eliminação dos preconceitos e das práticas costumeiras, ou de qualquer outro tipo, que se fundem na ideia de inferioridade, ou de um ou de outro sexo ou de um papel estereotipado dos homens e das mulheres».

Esta.é uma síntese que convém reter.

Depois da elencagem das obrigações a que ficam sujeitos os Estados, a Convenção prevê, e assim se cumpriu, a criação de um Comité para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres. Os Estados Partes comprometem-se a enviar ao Secretário-Geral da ONU, para exame no Comité, um relatório sobre as medidas de ordem legislativa, judiciária, administrativa, ou qualquer outra, que tenham adoptado para dar aplicação às disposições da Convenção e sobre os progressos realizados a este respeito.

Os relatórios são apresentados de quatro em quatro anos e sempre que o Comité o solicite. O Comité é constituído por 23 peritos de comprovadas idoneidade moral e competência nos domínios abrangidos pela Convenção. São eleitos, por escrutínio secreto, de uma lista de candidatos designados pelos Estados e a sua composição deve ter em conta o princípio de uma repartição geográfica equitativa

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e de representação das diferentes formas de civilização, assim como dos sistemas jurídicos. O mandato é de quatro anos. O nosso país já fez parte deste Comité.

Segundo o artigo 20.° — o que está em causa nesta proposta de resolução — o «Comité reúne normalmente durante um período de duas semanas no máximo» de cada ano para examinar os relatórios apresentados e prestar contas anualmente à Assembleia das Nações Unidas através do ECOSOC (Conselho Económico e Social) e pode formular recomendações ou sugestões a partir do exame dos relatórios e ainda-das informações que cada Estado Parte forneça.

Ora, acontece que desde há muito tempo se considera como francamente limitado o período de apenas duas semanas em que o Comité reúne, uma vez que tem originado grande atraso na evolução dos respectivos trabalhos, pois em tão curto prazo não se torna possível avaliar convenientemente todos os relatórios. Daí, a falta de eficácia do Comité, que propôs a alteração da citada cláusula de forma a possibilitar o alargamento do prazo da reunião anual a fim de se poder cumprir, com eficácia, a análise dos relatórios, tarefa esta essencial para uma boa interpretação das situações detectadas e, possivelmente, sugerir actuações ou elaborar recomendações.

A ser ratificada a emenda, a duração das sessões do Comité passa a ser determinada por uma reunião dos Estados Partes na presente Convenção, sujeita a aprovação da Assembleia Geral. Dá-se, assim, satisfação a uma antíga aspiração do Comité, o que facilitará, por certo, um estudo mais aprofundado de uma complexa problemática longe de estar regularizada em todos os países do mundo.

As Nações Unidas estão preocupadas com a situação das mulheres e tanto assim é que organizou há cerca de um ano, de 4 a 15 de Setembro, na República Popular da China, em Pequim, mais uma — a quarta — Conferência Mundial sobre a Mulher, na qual o nosso país se fez representar por uma delegação governamental adequada.

Recorde-se que na altura se deslocaram à capital chinesa milhares de mulheres de todo o mundo, quer individualmente quer integradas em organizações não governamentais, que promoveram uma série de iniciativas paralelas de grande impacte.

A Conferência constatou que, embora a situação tenha avançado positivamente no último decénio, subsistem desigualdades entre mulheres e homens, continuando a haver obstáculos e múltiplos motivos que determinam em vários pontos do globo actos discriminatórios e o uso de violência sobre as mulheres, situação esta agravada por uma pobreza cada vez maior que afecta a vida da maior parte da população do mundo.

Na Declaração de Pequim, longo documento de 38 artigos, os governos participantes na Conferência manifestam a sua disposição de, entre muitos outros compromissos, «combater, sem reservas ou limitações, os obstáculos existentes e promover a potencialidade do papel da mulher em todo o mundo, e compreendemos que esta tarefa exige uma acção urgente, com espírito decidido, esperança, cooperação e solidariedade, agora e nos alvores do novo século».

Manifestam ainda a sua intenção em promover a independência económica da mulher, incluindo o seu emprego, a erradicar a carga negativa e persistente, e cada vez mais notória, que recai sobre as mulheres, combatendo as causas estruturais da pobreza através de mudanças nas estruturas económicas, garantindo a igualdade de acesso a todas as mulheres, incluindo as das zonas rurais, como agentes

vitais do desenvolvimento, aos recursos produtivos, oportunidades e serviços públicos.

Salientamos mais dois pontos da Declaração de Pequim

nos quais os governos se manifestam decididos a prevenir e eliminar todas as formas de violência contra as mulheres e as meninas e a promover e proteger todos os seus direitos humanos.

Em Pequim foi aprovada uma plataforma de acção para o período compreendido entre os anos de 1996 e 2000, o que vem demonstrar como este problema continua a ser preocupante e a dominar as atenções.

O que à primeira vista pode parecer apenas uma superficial alteração do articulado da Convenção revela-se de particular importância, já que radica em razões bem sérias e profundas. O objectivo da emenda que o Governo propõe à ratificação por parte da Assembleia da República está plenamente justificado pela premência do aprofundamento da avaliação dos relatórios que não se compadece com a imposição de prazos muito curtos para a actividade do Comité para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, que têm o direito à igualdade, ao desenvolvimento e à paz.

Parecer

Apreciada a emenda ao artigo 20.° da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, a Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação é de parecer que a proposta de resolução n.° 18/VII reúne as condições regimentais e constitucionais para ser apreciada em Plenário.

Assembleia da República, 23 de Outubro de 1996. — Pelo Deputado Presidente, Carlos Beja. — O Deputado Relator, João Corregedor da Fonseca.

Nota. — O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade.

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.9 25/Vff

(APROVA, PARA RATIFICAÇÃO, O ACORDO ENTRE 0 GOVERNO DA REPÚBLICA PORTUGUESA E 0 GOVERNO DA REPÚBLICA DA LETÓNIA SOBRE A PROTECÇÃO MÚTUA DE INVESTIMENTOS E RESPECTIVO PROTOCOLO, ASSINADOS EM 27 DE SETEMBRO DE 1995.)

Relatório e parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano

Relatório

O Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de resolução que visa a ratificação de um acotdo com a República da Letónia sobre a promoção e protecção mútua de investimentos.

A — Factos, situações e realidades

O Acordo define as regras, os objectivos a observar, tendo em vista o encorajamento e a criação de condições favoráveis para a realização de investimentos entre os dois países, na base da igualdade e do benefício mútuos, pretendendo-se incrementar as relações económicas, e

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promover a expansão do comércio e relações económicas harmoniosas entre as Partes, fomentando assim um desenvolvimento económico dinâmico.

B — Enquadramento

A proposta de resolução, caso seja aprovada, regulará o âmbito do Acordo.

Entre outras disposições sàlientam-se as seguintes:

1 — Ambas as Partes Contratantes promoverão e encorajarão, na medida do possível, a realização de "investimentos de investidores da outra Parte Contratante no seu território, admitindo tais investimentos no seu território de acordo com as suas leis e regulamentos. Em qualquer caso concederão aos investimentos tratamento justo e equitativo.

2 — Os investimentos realizados por investidores de qualquer das Partes Contratantes gozarão de plena protecção e segurança no território da outra Parte Contratante.

3 — Nenhuma Parte Contratante sujeitará a gestão, manutenção, uso, fruição ou disposição dos investimentos realizados no seu território por investidores da outra Parte Contratante a medidas injustificadas, arbitrárias ou de carácter discriminatório.

4 — Os investimentos realizados por investidores de uma Parte Contratante no território da outra Parte Contratante, bem como os respectivos rendimentos, serão objecto de tratamento justo e equitativo e não menos favorável do que o concedido pela última Parte Contratante aos investimentos e rendimentos dos seus próprios investidores ou a investidores de qualquer terceiro Estado.

5 — Os investidores de uma Parte Contratante receberão da outra Parte Contratante, no que respeita à gestão, manutenção, uso, fruição ou disposição dos investimentos realizados no seu território, um tratamento justo e equitativo e não menos favorável do que o concedido pela última Parte Contratante aos seus próprios investidores ou a investidores de qualquer terceiro Estado.

6 — As disposições deste artigo não implicam a concessão de qualquer tratamento, preferência ou privilégio por uma das Partes Contratantes a investidores da outra Parte Contratante, que possa ser outorgada em virtude de:

a) Participação em zonas de comércio livre, uniões aduaneiras, mercados comuns existentes ou a criar e em outros acordos internacionais semelhantes, incluindo outras formas de cooperação económica, aos quais uma das Partes Contratantes tenha aderido ou venha a aderir;

b) Acordos internacionais de natureza total ou parcialmente fiscal.

7 — Os investimentos efectuados por investidores de qualquer das Partes Contratantes no território da outra Parte Contratante não poderão ser expropriados, nacionalizados ou sujeitos a butras medidas com efeitos equivalentes à expropriação ou nacionalização (adiante designadas como expropriação), excepto por força da lei no interesse público, sem carácter discriminatório e mediante pronta indemnização.

8 —Cada Parte Contratante, em conformidade com a sua lei, garantirá aos investidores da outra Parte Contratante a livre transferência das importâncias relacionadas com os investimentos, em particular mas não exclusivamente:

a) Do capita/ e das importâncias adicionais necessárias à manutenção ou ampliação dos investimentos;

b) Dos rendimentos definidos no n.° 2 do artigo 1.° deste Acordo;

c) Das importâncias necessárias para o serviço, reembolso e amortização de empréstimos, reconhecidos por ambas as Partes Contratantes como investimentos;

d) Do produto resultante da alienação ou da liquidação total ou parcial dos investimentos;

e) Das indemnizações ou outros pagamentos previstos nos artigos 4." e 5.° deste Acordo; ou

f) De quaisquer pagamentos preliminares que possam ter sido efectuados em nome do investidor, de acordo com o artigo 7.° do presente Acordo.

9 — As transferências referidas neste artigo serão efectuadas sem restrições ou demora, em moeda convertível, à taxa de câmbio aplicável à data de transferência.

10 — No caso de uma das Partes Contratantes, ou a agência por ela designada, efectuar qualquer pagamento a um dos seus investidores em virtude de uma garantia prestada a um investimento realizado no território da outra Parte. Contratante, ficará, por esse facto, sub-rogada nos direitos e acções desse investidor, podendo exercê-los nos mesmos termos e condições que o titular originário.

11 —Os diferendos que surjam entre as Partes Contratantes sobre a interpretação ou aplicação do presente Acordo serão, na medida do possível, resolvidos através de negociações, por via diplomática.

12 — Se as Partes Contratantes não chegarem a acordo no prazo de seis meses após o início das negociações, o diferendo será submetido a um tribunal arbitral, a pedido de qualquer das Partes Contratantes, de acordo com o disposto neste artigo.

13 — O tribunal arbitral será constituído ad hoc, do seguinte modo: cada Parte Contratante designará um membro e ambos os membros proporão um nacional de um terceiro Estado como presidente, que será nomeado pelas duas Partes Contratantes. Os membros serão nomeados no prazo de dois meses e o presidente no prazo de três meses a contar da data em que uma Parte Contratante tenha comunicado à outra que deseja submeter o diferendo a um tribunal arbitral.

14 — Se os prazos fixados no n.° 3 deste artigo não forem observados, cada uma das Partes Contratantes poderá, na falta de qualquer outro acordo, solicitar ao Presidente do Tribunal Internacional de Justiça que proceda às necessárias nomeações. Se o Presidente estiver impedido ou for nacional de uma das Partes Contratantes, as nomeações caberão ao Vice-Presidente.

Se este também estiver impedido ou for nacional de uma das Partes Contratantes, as nomeações caberão ao membro do Tribunal que se siga na hierarquia, desde que não seja nacional de qualquer das Partes Contratantes.

15 — O presidente do tribunal arbitral deverá ser nacional de um Estado com o qual ambas as Partes Contratantes mantenham relações diplomáticas.

16 — O tribunal arbitral decidirá por maioria de votos. As suas decisões serão definitivas e obrigatórias para ambas as Partes Contratantes. Cada uma das Partes Contratantes será responsável pelas despesas do respectivo árbitro, bem como da respectiva representação no'processo perante o tribunal arbitral. Ambas as Partes Contratantes suportarão, em partes iguais, as despesas do presidente, bem como as demais despesas. O tribunal arbitral poderá adoptar um regulamento diferente quanto as despesas. O tribunal arbitral definirá as suas próprias regras processuais.

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17 — Os diferendos que surjam entre o investidor de uma das Partes Contratantes e a outra Parte Contratante relacionados com um investimento do primeiro no território da segunda serão resolvidos de forma amigável, através de negociações.

18 — Se esses diferendos não puderem ser resolvidos no prazo de seis meses contados da data em que uma das partes litigantes o tiver suscitado, o investidor poderá, a seu pedido, submeter o diferendo:

a) Ao tribunal competente da Parte Contratante; ou

b) Ao Centro Internacional para a Resolução de Diferendos Relativos a Investimentos (CIRDI), por meio de conciliação ou arbitragem, nos termos da Convenção para a Resolução de Diferendos entre Estados e Nacionais de Outros

• Estados, celebrada em Washington, D. C, em 18 de Março de 1965.

19 — Nenhuma das Partes Contratantes poderá recorrer às vias diplomáticas para resolver qualquer questão relacionada com a arbitragem, salvo se' o processo já estiver concluído e a Parte Contratante não tenha acatado nem cumprido a decisão do CIRDI.

20 — A sentença será obrigatória para ambas as partes e não será objecto de qualquer tipo de recurso para além dos previstos na referida Convenção. A sentença será vinculativa, de acordo com a lei interna da Parte Contratante, no território da qual se situa o investimento em causa.

21 — Se para além do presente Acordo as disposições da lei interna de uma das Partes Contratantes ou as obrigações emergentes do direito intencional em vigor ou que venha a vigorar entre'as duas Partes Contratantes, em adição a este Acordo, estabelecerem um regime geral ou especial que confira aos investimentos efectuados por investidores da outra Parte Contratante um tratamento mais favorável do que previsto no presente Acordo, prevalecerá sobre este o regime mais favorável.

22 — O presente Acordo aplicar-se-á aos investimentos realizados, antes ou após a sua entrada em vigor, por investidores de uma das Partes Contratantes no território da outra Parte Contratante, em conformidade com as respectivas leis e regulamentos, mas não se aplica aos diferendos surgidos antes da sua entrada em vigor.

23 — Os representantes das Partes Contratantes deverão, sempre que necessário, realizar reuniões sobre qualquer matéria relacionada com a aplicação deste Acordo. Estas reuniões serão realizadas sob proposta de uma das Partes Contratantes, em lugar e data a acordar por via diplo-

mática. A pedido de qualquer das Partes Contratantes, serão trocadas informações sobre o impacte de leis, regulamentos, decisões, práticas ou procedimentos administrativos ou políticas que a outra Parte Contratante possa adoptar em relação a investimentos abrangidos por este Acordo.

24 — Este Acordo entrará em vigor 30 dias após a data em que ambas as Partes Contratantes tiverem notificado uma à outra, por escrito, do cumprimento dos respectivos procedimentos constitucionais internos.

25 — Este Acordo permanecerá em vigor por um período de 10 anos e será automaticamente prorrogado por períodos sucessivos de 5 anos, excepto se denunciado por escrito por uma das Partes Contratantes 12 meses antes da data do termo da sua vigência.

26— As disposições dos artigos 1." a 12.° permanecerão em vigor por um período de 10 anos a contar da data de denúncia do presente Acordo, relativamente aos investimentos realizados antes daquela denúncia.

Nota final

O acordo de investimentos com a Letónia baseia-se em diversos acordos europeus já celebrados anteriormente, nomeadamente os acordos de comércio livre, que entraram em vigor em 1 de Janeiro de 1995 e foram celebrados entre a União Europeia e os Estados Bálticos, constituindo um passo importante para a aproximação destes países ao Ocidente.

Sublinha-se ainda a importância de um diálogo político com a União Europeia, já que um dos seus objectivos é. promover uma maior cooperação nas áreas da política externa e da segurança comum (PESC) nos Estados membros, que se reforça com a participação dos Estados Bálticos na UEO, desde Maio de 1994, por iniciativa da OTAN.

Parecer

A proposta de resolução preenche os requisitos formais aplicáveis, pelo que está em condições de ser presente a Plenário.

Lisboa, 6 de Novembro de 1996. — A Deputada Relatora, Teresa Gil Narciso. — A Deputada Presidente, Manuela Ferreira Leite.

Noia. — O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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