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Quinta-feira, 15 de Janeiro de 1998

II Sérle-A — Número 23

da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

SUMÁRIO

Deliberações (n.M l-PL/98 e í-PL/98:

N.° I -PL/98 — Prorrogação do período de funcionamento da Comissüo Eventual de Inquérito Parlamentar ao Aval

do Estado à União Geral de Trabalhadores — UGT...... 424

N.° 2-PL/98 — Debate parlamentar sobre o ambiente .... 424

Projectos de lei (n.M 421/V1I, 444/VII e 445/VTI):

N° 421/VII (Amplia a legitimidade de intervenção judicial das associações sindicais):

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias............... 424

Relatório e parecer da Comiss2o de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social................................. 427

N.° 444/Vll — Elevação de Marialva à categoria de vila (apresentado pelo Deputado independente Lemos Damião) 428 N.° 445/V11 — Lei quadro da criação de municípios (apresentado pelo CDS-PP):

Texto e despacho n.° 122/VII, de admissibilidade..... 430

Proposta de lei n.° 96/Vn (Estabelece um novo regime jurídico do contrato de trabalho do praticante desportivo c do contrato de formação desportiva e revoga o Decreto--Lei n.° 305/95, dc 18 de Novembro):

Relatório e parecer da Comissüo de Educação. Ciência e Cultura...............................:................................................ 433

Projecto de resolução n.° 75/VTI:

Proposta de referendo sobre a alteração da lei do aborto (apresentado pelo PSD)..................................................... 434

Propostos de resolução (n.M 82/VII a 86/VH) (a):

N.° 82/VII — Aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão do Governo do Reino da Suécia ao Acordo Relativo à Supressão Gradual dos Controlos nas Fronteiras Comuns, assinado em Schengen a 14 de Junho de 1985. assinado no Luxemburgo a 19 de Dezembro de 1996. N.° 83/VI1 — Aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão do Governo do Reino da Dinamarca ao Acordo Relativo à Supressão Gradual dos Controlos nas Fronteiras Comuns, assinado em Schengen a 14 de Junho de 1985. assinado no Luxemburgo a 19 de Dezembro de 1996. N.° 84/Vli — Aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão do Governo da República da Finlândia ao Acordo Relativo à Supressão Gradual dos Controlos nas Fronteiras Comuns, assinado em Schengen a 14 de Junho de 1985, assinado no Luxemburgo a 19 de Dezembro de 1996. N." 85/VII — Aprova, para ratificação, o Protocolo n.° 2 à Convenção Europeia para' a Prevenção da Tortura e Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes, assinado em Estrasburgo em 4 de Novembro de 1993. N.° 86/V1I — Aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação entre o Reino da Bélgica, a República Federal da Alemanha, a República Francesa, o Grão-Ducado do Luxemburgo, o Reino dos Países Baixos, a República Italiana, o Reino de Espanha, a República Portuguesa, a República Helénica, a República da Áustria, o Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia. Partes Contratantes no Acordo e nà Convenção de Schengen, e a República da Islândia e o Reino da Noruega Relativo à Supressão dos Controlos de Pessoas nas Fronteiras. Comuns, incluindo declarações e inventários das disposições previstas no artigo 1.", assinado no Luxemburgo a 19-de Dezembro de 1996.

(«} Dada a sua extensão, vün puhlteadas cm suplemento a este número.

DIARIO

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DELIBERAÇÃO N.9 1-PU98

PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE FUNCIONAMENTO DA COMISSÃO EVENTUAL DE INQUÉRITO PARLAMENTAR AO AVAL DO ESTADO À UNIÃO GERAL DE TRABALHADORES — UGT.

A Assembleia da República, ao abrigo do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 11° da Lei n.° 5/93, de 1 de Março, com as alterações introduzidas pela Lei n.° 126/97, de 10 de Dezembro, delibera conceder à Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar ao Aval do Estado à União Geral de Trabalhadores — UGT o prazo adicional de 90 dias para a elaboração, discussão e votação do segundo relatório, relativo à matéria constante do n.° 3 da Resolução da Assembleia da República n.° 30/97, de 15 de Maio.

A concessão do prazo adicional referido reporta os seus efeitos a 11 de Dezembro de 1997.

Aprovada em 8 de laneiro de 1998.

O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.

DELIBERAÇÃO N.2 2-PL/98

DEBATE PARLAMENTAR SOBRE O AMBIENTE

A Assembleia da República, nos termos dos artigos 101.°, n.° 1, e 129.°, n.° 2, do Regimento, delibera o seguinte:

1 — Que no dia 5 de Junho de cada ano, ou em data aproximada, se faça um debate parlamentar sobre o ambiente.

2 — O debate decorre com base, designadamente, nos relatórios que nos termos da lei o Governo deve apresentar à Assembleia da República sobre questões ambientais.

Aprovada em 8 de Janeiro de 1998.

O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.

PROJECTO DE LEI N.« 421/VII

(AMPLIA A LEGITIMIDADE DE INTERVENÇÃO JUDICIAL DAS ASSOCIAÇÕES SINDICAIS)

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

I — Nota preliminar

O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República um projecto de lei que amplia a legitimidade de intervenção judicial das associações sindicais.

Essa apresentação foi efectuada nos termos do artigo 167.° da Constituição da República Portuguesa e do artigo 130.° do Regimento.

Por despacho de S. Ex." o Presidente da Assembleia da República, emitido em 17 de Outubro de 1997,'a presente iniciativa baixou à 1." e 8." Comissões para emissão dos respectivos relatórios/pareceres.

O projecto de lei vertente foi admitido com um despacho em separado (despacho n.° 118/VII), no qual foram tecidas pelo Presidente da Assembleia da República algumas dúvidas de (in)constitucionalidade no tocante ao disposto no artigo 1.°, n.° 4, do projecto de lei em causa:

O direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.° da Constituição, compreende, na esfera individual, uma impostergável dimensão volitiva, dimensão essa que o disposto no n.° 4 do artigo 1,° poderá anular ao permitir que as associações sindicais se possam substituir ao trabalhador quando este declare não pretender exercer pessoalmente o seu direito subjectivo de acção.

Considera ainda que, «mesmo no caso de a questão controvertida ser regulada em abstracto por norma de interesse e ordem pública social», o que se pede efectivamente ao tribunal é que dirima um conflito de interesses privados emergente de uma relação jurídica laboral.

O projecto de lei n.° 421/VII encontra-se agendado para discussão, na generalidade, na reunião plenária de 14 de laneiro de 1998, tendo a Comissão Parlamentar de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social remetido o referido projecto de lei para discussão pública junto das estruturas representativas dos trabalhadores, nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis.

II — Do objecto e dos motivos

A iniciativa vertente tem por desiderato último reforçar os direitos de intervenção judicial das associações sindicais, fazendo-se a correspondência na legislação com os princípios que norteiam o direito fundamental à contratação colectiva.

Imbuídos desse espírito, os proponentes pretendem revogar o artigo 6." do Código de Processo do Trabalho em vigor, consagrando a legitimidade das associações sindicais para intervirem em juízo, por si, não só nos casos em que tal intervenção é inquestionável como também nas acções referentes a direitos fundamentais dos trabalhadores e outros de natureza análoga, previstos na Constituição e na lei.

Prevê-se ainda no projecto de lei que, quando num conflito individual esteja em causa a aplicação de uma norma de interesse e ordem pública social, se existir declaração escrita do trabalhador de que não pretende accionar pessoalmente, possa a associação sindical exercer o direito de acção em substituição do trabalhador. Este pode intervir na qualidade de assistente.

Nas acções remanescentes será a associação sindical a poder intervir como assistente, excepciot\awdo-se as situações em que ocorra declaração contrária do trabalhador.

Consagra-se ainda a possibilidade de as associações sindicais poderem constituir-se assistentes no processo penal de trabalho, nos mesmos casos e termos em que têm legitimidade para intervir na acção cível.

III — Dos antecedentes

O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentou na VI e já no decurso da VII Legislatura uma iniciativa legislativa (projecto de lei n.° I33/VII)' que continha uma disposição que ampliava a legiúmidade das associações sindicais.

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Tal iniciativa deu origem à Lei n.° 105/97, de 13 de Setembro (garante o direito à igualdade de tratamento no trabalho e no emprego), da qual nos permitimos destacar, pelo interesse que reveste para a matéria objecto deste parecer, o artigo 4.° («Legitimidade das associações sindicais») do citado diploma:

1 — Sem prejuízo da legitimidade assegurada noutros preceitos legais, podem as associações sindicais representativas dos trabalhadores ao serviço da entidade que desrespeite o direito à igualdade de tratamento propor junto dos tribunais competentes acções tendentes a provar qualquer prática discriminatória, independentemente do exercício do direito de acção pelo trabalhador ou candidato.

IV — Do enquadramento legal

O direito de associação encontra-se regulado no Decreto-Lei n.° 594/74, de 7 de Novembro, e comporta enunciados relativos ao exercício do direito de associação e ao modo de aquisição da personalidade.

O artigo 1deste decreto-lei garante a todos os cidadãos maiores de 18 anos no gozo dos seus direitos civis o livre exercício do direito de se associarem para fins não contrários à lei ou à moral pública, sem necessidade de qualquer autorização prévia.

Deste enunciado decorrem limites ao exercício daquele direito, aos quais se deve acrescentar a proibição de formação de associações «que tenham por finalidade o derrubamento das instituições democráticas ou a apologia do ódio ou da violência» (artigo 3.°).

Também neste diploma se reconhece a liberdade de se não associar.

Em matéria de personalização o artigo 4.°, n.° 1, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.° 71/77, de 25 de Fevereiro, afirma que «as associações adquirem personalidade jurídica pelo depósito, contra recibo, de um exemplar do acto de constituição e dos estatutos, no governo civil da área da respectiva sede, após prévia publicação no Diário da República». Por força do artigo 6.° do supracitado diploma, as associações extinguem-se por deliberação da assembleia geral, pelo decurso do prazo ou pela verificação de qualquer outra causa extintiva prevista no acto de constituição.

É, no entanto, no Decreto-Lei n.° 2I5-B/75, de 30 de Abril (lei sindical), que se definem as bases do ordenamento jurídico das associações sindicais, assegurando-se aos trabalhadores o direito de associação sindical para defesa dos seus interesses sócio-profissionais.

A legitimidade das associações sindicais para intervirem judicialmente encontra-se actualmente estabelecida nos artigos 5.°, 6." e 183.° do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 272-A/81, de 30 de Setembro.

Dispõe o artigo 6." do Código de Processo do Trabalho que os organismos sindicais e patronais são parte legítima como autores nas acções respeitantes aos interesses colectivos cuja tutela lhes esteja atribuída por lei.

No âmbito do n.° 2 do artigo 6.° podem ainda os organismos sindicais exercer o direito de acção em representação e substituição do trabalhador quando:

Por virtude do exercício das funções de delegado sindical ou de qualquer cargo na associação sindical, a entidade patronal tenha tomado medidas contra os uabaWiarioTes que exerçam esses cargos ou funções;

Por virtude da publicação de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, a entidade patronal tenha diminuído direitos de trabalhadores representados pela associação.

No n.° 3 desse mesmo preceito prevê-se que nas acções em que estejam em causa interesses individuais dos trabalhadores ou das entidades patronais as respectivas associações podem intervir como assistentes dos seus associados desde que, tratando-se de direitos disponíveis, exista da parte dos interessados declaração escrita no senüdo de que aceitam a intervenção da associação.

Por seu turno, o artigo 183.° do mesmo Código estabelece que podem intervir como assistentes em processo penal do trabalho os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei penal especialmente quis proteger com a incriminação, e os organismos sindicais.

IV — Enquadramento constitucional — artigos 46.", 55." e 56." da Constituição

De acordo com a nossa lei fundamental, os cidadãos têm o direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações desde que estas não se destinem a promover a violência e que os respectivos fins não sejam contrários à lei penal.

Dispõe o artigo 46.°, n.° 2, da Constituição que «as associações prosseguem livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas e não podem ser dissolvidas pelo Estado ou suspensas as suas actividades senão nos casos previstos na lei e mediante decisão judicial.»

Segundo o douto entendimento de J. J. Gomes Canoülho e Vital Moreira, a liberdade de associação é a expressão qualificada da liberdade de organização colecüva privada, ínsita no princípio do Estado de direito democrático, e que pode revestir outras formas mais ou menos institucionalizadas.

Assim, a regra fundamental é a da autonomia e liberdade de organização interna sem ingerências do Estado.

O direito de associação apresenta-se como um direito complexo, com múltiplas dimensões individual e institucional posiüva e negativa, interna e externa — cada qual com a sua lógica própria, complementares umas das outras e que um sistema jurídico-constitucional coerente com princípios de liberdade deve desenvolver e harmonizar.

É nos artigos 55.° e 56.° da Constituição que se confere guarida constitucional à liberdade sindical e aos direitos das associações sindicais.

Assim, por força do artigo 55.°, n.° 2, alínea a), prevê--se que no exercício da liberdade sindical é garantido aos trabalhadores, sem qualquer discriminação, a liberdade de constituição de associações sindicais a todos os níveis.

No artigo 56.° do texto fundamental consagram-se os direitos das associações sindicais e contratação colectiva.

Dispõe o n.° 1 deste preceito constítucional que compete às associações sindicais «defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem».

Os direitos das associações sindicais previstos neste preceito consütucional não são todos exclusivos delas, nem muito menos esgotam os seus direitos. Não são exclusivos, porque alguns deles são compartilhados pelas comissões de trabalhadores; não esgotam os direitos das associações sindicais, porque a própria Constituição prevê outros, e nada impede que o legislador ordinário atribua outros direitos por via de lei.

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Sublinhe-se que no 4.° processo de revisão constitucional estes dois preceitos sofreram alterações, reconhecendo-se agora às associações sindicais, com a eliminação da noção de controlo de execução dos planos, típica de uma perspectiva superada de exercício classista do poder, o direito de pronunciar-se sobre os planos económico-sociais e acompanhar a sua execução.

É-lhes ainda reconhecida, a par das comissões de trabalhadores, o direito de participar nos processos de reestruturação das empresas

V — Dimensão internacional

Os grandes textos internacionais prevêem a liberdade de associação: Declaração Universal (artigos 20.° e 23.°, n.° 4); Convenção da OIT; Convenção Europeia dos Direitos do Homem (artigo 11.°, n.° 1); Carta Social Europeia (artigo 5.°); Pacto Internacional de Dire'tos Económicos, Sociais e Culturais (artigo 8.°, n.° 1); Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (artigo 22.°, n.° 1).

Com efeito, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 10 de Dezembro de 1948 estipula, no seu artigo 20.°, n.° 1, que «toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas», garantindo-se, no n.° 2 do mesmo artigo, que «ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação».

De teor similar ao artigo 20.° da Declaração Universal dos Direitos do Homem é o artigo 11.°, n.° 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o qual preceitua que «qualquer pessoa tem direito à liberdade de reunião pacífica e à liberdade de associação, incluindo o direito de com outrem fundar e filiar-se em sindicatos para a defesa dos seus interesses».

A Lei n.° 65/78, de 13 de. Outubro, aprovou, para ratificação, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, pelo que, com o depósito daquela em 9 de Novembro de 1978, as respectivas normas passaram a vigorar na ordem interna portuguesa (cf. artigo 8.°. n.° 2, da Constituição).

O Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, aprovado pela Assembleia Geral da ONU em 16 de Dezembro de 1966, consagra igualmente como direito fundamental a liberdade de associação, preceituando o seu artigo-22.°, n.° 1, que «toda e qualquer pessoa tem o direito de se associar livremente com outras, incluindo o direito de constituir sindicatos e de a eles aderir para a protecção dos seus interesses», só podendo este direito sofrer restrições impostas por lei quando «necessárias numa sociedade democrática, no interesse da segurança nacional, da segurança publicai da ordem pública e para proteger a saúde ou a moralidade públicas ou os direitos e liberdade de outrem». A defesa dos direitos fundamentais do indivíduo tem sido um dos objectivos que a comunidade internacional organizada tem procurado atingir. Como corolário dessa preocupação surgiram vários instrumentos internacionais sobre direitos humanos, alguns deles consagrando o direito de associação como uma das liberdades fundamentais.

VTi — Do projecto de \ei n.° 421/VII

O projecto de lei compõe-se de cinco artigos, ao longo dos quais se traça o regime da legiümidade das associações sindicais.

Da legitimidade das associações sindicais (artigo 1.") — estabelece-se, como regra geral, que as associações

sindicais são parte legítima como autores nas acções respeitantes aos interesses colectivos cuja tutela lhes pertença.

Possibilita-se ainda a intervenção das associações" sindicais nos conflitos individuais de trabalho em situações que se reportem a direitos fundamentais dos trabalhadores e outros de natureza similar.

São partes legítimas como autores em acções respeitantes a: direitos e liberdade sindicais; a medidas tomadas pelos empregadores contra representantes eleitos dos trabalhadores; no exercício do direito de greve e nas acções em que, por virtude da publicação de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou de cessação total ou parcial de empresa ou estabelecimento, a entidade patronal tenha diminuído direitos dos trabalhadores representados pela associação.

No n.° 4 do artigo 1.° deste projecto de lei prevê-se ainda uma situação que visa permitir às associações sindicais estarem em juízo, em substituição de um seu associado., sempre que a questão controvertida seja regulada por norma de interesse e ordem pública social. Exige-se a existência de uma declaração escrita do trabalhador.

O trabalhador só pode nessas situações intervir no processo como assistente.

Quando estejam em causa interesses individuais dos trabalhadores, a associação sindical poderá intervir sempre como assistente em defesa dos seus associados, a menos que, tratando-se de direitos disponíveis, exista da parte dos interessados declaração no sentido de que não aceitam a intervenção da associação.

Verifica-se, assim, que as associações sindicais passam a poder substituir-se ao particular sempre que estejamos perante normas de interesse e ordem pública social, quando este expresse por escrito a vontade de não exercer o seu direito subjectivo de acção (artigo 1 °, n.° 4, do projecto de lei).

É esta substituição da associação ao particular, no tocante ao direito de acção do segundo, que suscita algumas dúvidas de constitucionalidade face ao artigo 20.° da Constituição (acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva) e à impostergável dimensão volitiva deste direito fundamental.

O direito de acesso aos tribunais inclui, desde logo, no seu âmbito normativo o direito de acção, isto é, o direito subjectivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional, solicitando a abertura de um processo, com o consequente dever (direito ao processo) de o mesmo órgão sobre ela se pronunciar mediante decisão fundamentada.

No douto entendimento de Vital Moreira e Gomes Canotilho, «como candidato positivo reentrante no âmbito normativo do n.° 1, deve assinalar-se ainda a proibição de 'indefesa' que consiste na privação ou limitação do direito de defesa perante os órgãos judiciais, junto dos quais se discutem questões que lhe dizem respeito».

A violação do direito à tutela judicial efectiva, sob o ponto de vista da limitação do direito de defesa, verifjcar--se-á, sobretudo, quando a não observância de normas processuais ou de princípios gerais de processo acarreta a impossibilidade de o particular exercer o seu direito de alegar, o que acarreta prejuízos efectivos para os seus interesses.

No caso vertente não se nos afigura a existência de limitação a essa tutela jurisdicional efectiva, porquanto não decorre do artigo em causa (1.°, n.° 4) qualquer derrogação

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ou «mutilação» ao direito de agir em juízo por parte do trabalhador. Tal direito de acção assiste-lhe sempre.

O que se pretende consagrar é a possibilidade de o trabalhador, de forma volitiva e expressa, solicitar que tal acção seja interposta pela associação sindical competente, o que significa que o seu direito fundamental de acesso ao direito e de tutela jurisdicional continua a ser accionado, afigurando-se-nos estarem assegurados ab initio os seus direitos.

Extensão da legitimidade — prevê-se no artigo 2.° do projecto de lei que o regime de legitimidade das associações sindicais será aplicado aos trabalhadores no domicílio e aos trabalhadores com contratos legalmente equiparados a contratos de trabalho.

Da legitimidade em processo penal — estipula-se no artigo 3.° que as associações sindicais podem constituir-se assistentes em processo penal de trabalho em casos similares aos previstos para a acção cível.

Dadas as alterações preconizadas, propõem-se revogar o artigo 6.° do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 272-A/81, de 30 de Setembro.

Tendo em conta as considerações produzidas, é assim nosso parecer:

O texto do projecto de lei n.° 421/VII, do PCP, reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais necessários, pelo que está em condições de subir a Plenário para discussão na generalidade, reservando os grupos parlamentares a respectiva posição de voto para o debate.

Assembleia da República, 14 de Janeiro de 1998. — O Deputado Relator, Strecht Ribeiro. — O Deputado Presidente da Comissão, Alberto Martins.

Nota. — O relatório foi aprovado, com os votos a favor do PS e do PCP e a abstenção do PSD e do CDS-PP. e o parecer foi aprovado por unanimidade (PS. PSD. CDS-PP e PCP).

Relatório e parecer da Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social

Relatório I — Nota prévia

O Grupo Parlamentar do PCP tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República, nos termos do disposto no artigo 167° da Constituição da República Portuguesa e do artigo 230.° do Regimento, um projecto de lei que amplia a legitimidade de intervenção judicial das associações sindicais.

Por despacho de S. Ex." o Presidente da Assembleia da República de 17 de Outubro de 1997, o presente projecto de lei baixou às Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social para emissão dos competentes te\alórios e pareceres.

No despacho de admissão do projecto de lei em análise o Presidente da Assembleia da República.levanta algumas dúvidas de (in)cohstitucionalidade no que respeita ao disposto no artigo 1.°, n.° 4, do projecto em causa, referindo que «o direito de acesso aos tribunais, consagrado no artijjo 20." da Constituição, compreende, na esfera individual, uma impostergável dimensão volitiva, dimensão essa que o disposto no n.° 4 do artigo 1.° poderá anular, ao permitir que as associações sindicais se possam substituir ao trabalhador quando este declare não pretender erarcet pessoalmente o seu direito subjectivo de acção».

E adianta que, «mesmo no caso de a questão controvertida ser regulada em abstracto, por norma de interesse e ordem pública social, o que se pede efectivamente ao tribunal é que dirima um conflito de interesses privados emergente de uma relação jurídica laboral».

O projecto de lei n.° 421/VII encontra-se agendado para discussão na generalidade na reunião plenária de 14 de Janeiro de 1998, tendo a Comissão Parlamentar de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social enviado o referido projecto para discussão pública junto das estruturas representativas dos trabalhadores, nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis.

II — Do objecto e dos motivos

Através do projecto de lei n.° 421/VII, visa o PCP ampliar a legitimidade de intervenção judicial das associações sindicais, designadamente revogando o artigo 6." do Código de Processo de Trabalho vigente, atribuindo legitimidade às associações sindicais para intervirem em juízo, por si, não apenas nos casos em que tal intervenção é inquestionável, como também nas acções referentes a direitos fundamentais dos trabalhadores e outros de natureza análoga, previstos na Constituição e na lei (direitos e liberdades sindicais; medidas tomadas pelos empregadores contra os representantes eleitos dos trabalhadores; exercício do direito de greve; diminuição dos direitos dos trabalhadores em resultado da publicação de instrumentos de regulamentação colectiva ou de cessão da empresa ou estabelecimento).

Consagra ainda o projecto de lei que, quando num conflito individual esteja em causa a aplicação de uma norma de interesse e ordem pública social, as associações sindicais poderão intervir judicialmente, em substituição de um seu associado, se existir declaração escrita do trabalhador de que não pretende accionar pessoalmente, podendo este último intervir na qualidade de assistente.

Nas demais acções em que estejam em causa interesses individuais dos trabalhadores, a associação sindical só pode intervir como assistente, excepto se, tratando-se de direitos disponíveis, o trabalhador declare em sentido contrário.

Por último, estabelece-se ainda a possibilidade de as associações sindicais poderem constituir-se assistentes no processo penal de trabalho nos mesmos casos e termos em que têm legitimidade para intervir na acção cível.

III — Dos antecedentes

Embora a matéria objecto do presente projecto de lei se afigure inovadora, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou nas VI e VII Legislaturas uma iniciativa legislativa, que continha uma disposição que ampliava a legitimidade de intervenção judicial das associações sindicais.

Tratava-se do projecto de lei n.° 133/VI1, que deu origem à Lei n.° 105/97, de 13 de Setembro (direito à igualdade de tratamento no trabalho e no emprego), da qual se destaca, pelo interesse que reveste para a matéria objecto deste parecer, o artigok4.°, «Legitimidade das associações sindicais», do citado diploma:

1 — Sem prejuízo da legitimidade assegurada noutros preceitos legais, podem as associações sindicais representativas dos trabalhadores ao serviço da entidade que desrespeite o direito à igualdade de tratamento propor junto dos tribunais competentes acções tendentes a provar qualquer prática discriminatória, independentemente do exercício do direito de acção pelo trabalhador ou candidato.

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IV — Enquadramento constitucional

• Nos termos da Constituição da República Portuguesa, os cidadãos têm o direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações, desde que estas não se destinem a promover a violência e que os respectivos fins não sejam contrários à lei penal.

Dispõe o artigo 46.°, n.° 2, da Constituição que «as associações prosseguem livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas e não podem ser dissolvidas pelo Estado.ou suspensas as suas actividades senão nos casos previstos na lei e mediante decisão judicial».

É nos artigos 55.° e 56." da Constituição que se confere relevância constitucional à liberdade sindical e aos direitos das associações sindicais.

Assim, o artigo 55.°, n.° 2, alínea a), prevê que no exercício da liberdade sindical é garantido aos trabalhadores, sem qualquer discriminação, a liberdade de constituição de associações sindicais a todos os níveis.

Por seu lado, o artigo 56.° da Constituição consagra os direitos das associações sindicais e a contratação colectiva.

Nos termos do n.° 1 daquele artigo, «compete às organizações sindicais defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representam».

V — Do enquadramento legal

É no Decreto-Lei n.° 215-B/75, de 30 de Abril (lei sindical), que se definem as bases do ordenamento jurídico das associações sindicais, assegurando-se aos trabalhadores o direito de associação sindical para defesa dos seus interesses sócio-proftssionais.

Todavia, a legitimidade das associações sindicais para intervirem judicialmente encontra-se presentemente estabelecida nos artigos 5.°, 6." e 183.° do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 272--A/81, de 30 de Setembro.

Dispõe o artigo 6." do Código do Processo do Trabalho que os organismos sindicais e patronais são parte legítima como autores nas acções respeitantes aos interesses colectivos cuja tutela lhes esteja atribuída por lei.

As associações sindicais podem ainda, nos termos do citado artigo, exercer o direito de acção em representação e substituição do trabalhador quando:

Por virtude do exercício das funções de delegado sindical ou de qualquep cargo na associação sindical, a entidade patronal tenha tomado medidas contra os trabalhadores que exerçam esses cargos ou funções;

Por virtude da publicação de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, a entidade patronal tenha diminuído os direitos de trabalhadores representados pela associação.

No n.° 3 do referido preceito prevê-se que nas acções em que estejam em causa interesses individuais dos trabalhadores ou das entidades patronais, as respectivas associações podem intervir como assistentes dos seus associados, desde que, tratando-se de direitos disponíveis, exista da parte dos interessados declaração escrita no sentido de que aceitam a intervenção da associação.

É, pois, o regime jurídico da legiümidade de intervenção judicial que se encontra em vigor que o Grupo Parlamentar do PCP visa alterar no sentido da sua ampliação.

VI — Consulta pública

A Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social enviou o projecto de lei n.° 421/Vil para discussão pública pelas estruturas representativas dos trabalhadores, cujo período decorreu entre 12 de Novembro e 11 de Dezembro, não tendo recebido qualquer parecer.

VII — Parecer

A Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social é do seguinte parecer:

a) O projecto de lei n.° 421/VII preenche os requisitos constitucionais e legais para subir ao Plenário da Assembleia da República para apreciação e votação.

b) Os grupos parlamentares reservam as suas posições para o Plenário da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 12 de Janeiro de 1998.— O Deputado Relator, Barbosa de Oliveira. — A Deputada Presidente da Comissão, Elisa Damião.

Nota. — O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade.

PROJECTO DE LEI N.e 444/VII

ELEVAÇÃO DE MARIALVA À CATEGORIA DE VILA 1 — Breves notas históricas

Marialva, freguesia do concelho e comarca de Meda, distrito da Guarda, diocese de Lamego, relação de Coimbra, orago, Santiago, população, 730 habitantes, em 216 fogos. Dista 7 km da sede do concelho. Tem serviço de correio, escola primária e fábrica de moagem. Tem feira anual no dia 25 de Julho (feira de Santiago) e mercado no 2." domingo de cada mês. Produz batata, cereais e algum vinho e azeite. A povoação, «situada em um monte rodeado de penhascos e outeiros» (como diz o reitor Luis Amado, na sua memória de 1758), na margem de um pequeno rio, é antiquíssima. Junto dela, segundo o dito pároco, via-se uma naumaquia ou «lago com bastante grandeza que conserva algumas águas no inverno, com seus aquedutos com que na antiguidade, bem se deixa ver, se encaminhava a água para regar os campos em o sítio da Devesa, onde presentemente se faz a feira, e algum dia se achava situada a cidade de Aravor, mas [a] tem arruinado o poderoso domínio do tempo». A este propósito, o abade Bernardo José Carvalho e Meneses, na sua memória do mesmo ano,' refere que em sua casa se conservava «uma pedra mármore, quadrangular, mais comprida que larga e da grossura de meio palmo, a qual foi achada dentro do castelo, e nela se vê esculpido um letreiro latino que, ainda com vocábulos breves e letras jà apagadas, se deixa perceber ser do tempo do Imperador Trajano e Adriano, e existir nesse mesmo [lugar] e nessa mesma paragem, a cidade chamada Aravor». Por sua vez, o padre Viterbo outros esclarecimentos curiosos ajunta, dizendo que, do sul, «se vê uma grande e alta naumaquia, que ainda hoje se chama o lago, porque se conserva cheia de água; poucos anos há foi aberta, e se viu que se fechava com uma grande pedra quadrada, em que estaNa chumbado um grosso argolão de bronze; hoje cultiva-se o fundo desta

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naumaquia, e as suas ruínas nos informam dos seus fabricadores». O mesmo sábio antiquário pretende derivar de Aravor o topónimo, por «Maravon> ou «Maralvor» — o que não parece aceitável; e tanto ele como Huebner

reproduzem a referida inscrição, que é:

Imp.cae.dni.traia/particip.f.traianv/hadriano.avc/ pont.max.trib/potes.i.cos.ii/civitas aravor [ano de 119, diz Viterbo].

Parece que à época romana deveriam remontar dois outros edifícios: «do primeiro já se tem demolido a melhor parte; parece já nos tempos antigos serviu de igreja; a sua grossa cantaria é escudada, e a sua arquitectura lhe promete o triunfar dos séculos». O referido abade Bernardo José diz que este edifício arruinado era chamado «a torre da Moura». A outra construção «já serviu de capela em outro tempo; é toda um monstruoso perpeanho quadrado, desempanado a picão, e só nas juntas maravilhosamente unido». Junto deste edifício se descobriu uma lápide, votiva a Júpiter. Óptimo Máximo: «JOVI.O.M./K.AD.», pelo que diz o padre Viterbo estar inclinado a suspeitar que esta construção «seria algum sácelo ou delubro dedicado a Júpiter». O padre Carvalho é de opinião que a cidade de Aravor é fundação dos Túrdulos. Da sua história seguinte nada se sabe, mas deve ter-se arruinado esta urbe com as invasões bárbaras, árabes e cristãs até ao século xi. Nesta altura, às suas fortificações se dava o nome de «castro de S. Justo» que lhe deve ter sido dado pelos Godos, pois a aplicação do nome de um santo a um castro que depois os Árabes vieram a possuir representa, segundo Leite de Vasconcelos, «cristianização de um culto pagão», sendo certo que os Romanos aqui dedicaram templos aos seus deuses, aos quais templos árabes e cristãos depois adaptaram aos seus ritos. Sob os árabes, a designação «castro de S. Justo» manteve-se como èm muitos outros casos, se bem que Leite de Vasconcelos, influenciado por frei Manuel da Rocha, diga que este castro é o que está acima de Mondim da Beira. Esta persuasão, porém, se não admite, pois que, trazendo o Silense que o rei Fernando, o Magno, de Leão, além de muitos outros castelos e castros, «cepit etiam... castrum sancti Justi super flumen MaJva situm», feriamos de aceitar que o Barosa, rio a que estão iminentes Mondim e o castro, sem haver outro próximo, se denominava Malva; ora aquele rio já no século x se chamava Barrosa e com este nome figura no inventário dos bens do cenóbio vimaranense nesta região, feito em 1055, isto é, precisamente quando o dito rei andava expulsando daqui os Mouros, na sua entrada por Cima-Coa. Alguns autores citados dizem mesmo que foi o rei Fernando que pôs ao lugar o nome de Malva, tirado do rio que o banha, e que é deste nome que derivou o de Marialva. O aforamento da estremadura (a região ribeirinha do Douro em que se situava Marialva) foi continuado por D. Afonso Henriques, o qual, na sua carta de foral a esta povoação (1179), diz que foi ele que mandou «pobradores» para a/, com a concessão de muitos privilégios — entre estes o de os moradores da vila não terem o senhor que não quisessem. Este privilégio confundiu-o J. A. de Figueiredo com o de beetria, motivo que o levou a incluir Marialva entre as beetrias portuguesas — o que Herculano demonstrou ser erróneo. A colonização deu origem, no local, à instituição canónica de duas paróquias — a de São Pedro, que foi reitoria e comenda da Ordem de Cristo, e Santiago, abadia do padroado real, intramuros. Estes devem ter %\do levantados sobre as ruínas do castro de São Justo,

que o Silense diz destruído por Fernando, o Magno, «até os alicerces», para evitar que os Mouros, expulsos de Lamego, aí fossem fortificar-se; à entrada do castelo há uma data (1559) que é de uma reconstrução. Existiu ainda

outra igreja, a de São João, na qual D. Dinis apresentou em 1289 João Soares, freire do templo (sem que se saiba se este templo é aquela «ermida» de São João Baptista, onde, diz o padre Carvalho, existiu um convento dos Templários, sem embargo de que o mesmo rei deu, depois, a mesma igreja à Ordem do Hospital). Outro mosteiro floresceu aqui, o de Nossa Senhora dos Vilares, franciscano, fundado em 1447, a duas léguas e meia da vila (do qual era padroeiro, cerca de 1750, o capitão-mor da Meda, Cristóvão Pereira). Além destes mosteiros, «parece que no tempo dos Godos, para nascente, e não longe desta cidade (Aravor), existiu um mosteiro, num sítio em que se têm desenterrado colunas, vestígios de claustros e oficinas», diz o padre Viterbo. No. século xvni eram comendadores de Cristo em Marialva Manuel Inácio da Cunha e Meneses e, depois, José Félix da Cunha. D. Dinis, por sua carta, concedeu ao concelho licença de feira franca, mensal, a qual se fazia no arrabalde ou na vila. D. Pedro I, por sua carta, confirmou todos os antigos privilégios da terra, fazendo mercê da abadia a Afonso Giraldes; este mesmo rei concedeu aos anadéis e besteiros da vila o privilégio de cavaleiros, o de montaria livre, a isenção de tributos por posse de animais, etc; o «anadel e os besteiros de Marialva me enviaram dizer que eles e os besteiros que antes deles foram na dita vila e no termo, foram sempre privilegiados e honrados, assim no meu tempo como no tempo dos outros reis que antes de .mim foram [...] Primeiramente, outorgo-lhes que eles hajam privilégios de cavaleiros [...] que quando houverem de ser chamados para serviço que sejam chamados por seu anadel, e não pelo alcaide nem pelos homens da justiça desse lugar. E outrossim lhes outorgo que eles não sejam teúdos a pagar em peita nem em talha», etc. Por carta de 25 de Outubro de 1359, D. Pedro I mandou entregar o seu castelo de Marialva a Domingos Anes, morador na vila, o qual fez dele menagem ao dito rei. Nos inícios do século xvin, ainda este castelo era «todo murado de canteria», com quatro torres (uma, a do relógio) e quatro portas; mas, meio século depois, estão já «arruinados os muros em parte»; e a paróquia de São Pedro, intramuros, que em 1700 ainda contava 40 fogos, despovoou-se tão rapidamente que, então, eram só oito os fogos, porque os habitantes saíam de lá e as casas caíam em ruínas, apesar de intramuros estarem a igreja, a casa da câmara, a cadeia e o pelourinho. Cerca de 1758, o alcaide do castelo era o marquês de Tavira. Marialva foi cabeça de condado por mercê de D. Afonso V a Vasco Fernandes Coutinho e de marquesado por mercê de D. Afonso VI a D. António Luís de Meneses, agraciado a 11 de Junho de 1661. D. Manuel I concedeu à vila e seu termo foral novo, em Lisboa, em 16 de Dezembro de 1512, do qual se sabe que a coroa possuía aí 3600 réis de direitos (2880 do concelho e 720 pela pensão dos tabeliães); todos os outros direitos reais haviam sido dados aos moradores por 100 libras «da moeda antiga», pelo que escreve o citado abade de Marialva em 1758 que a vila tinha o privilégio «de não terçar Sua Majestade .nos baldios do concelho, nem nas portagens», porque estes direitos reais D. Manuel «os vendeu à Câmara por 100 libras», como constava do foral «que se acha no arquivo da Câmara». O concelho ÜC Marialva era composto das duas freguesias da sede e de oito no termo, a saber: Aldeia Rica, Barreira. Carvalhal,

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Coriscada, Gateira, Paipenela, Rabaçal e Vale de Ladrões; foi extinto em 24 de Outubro de 1855 (cf. Viterbo, Elucidário (s. v. Aravor); Mendrias Paroquiais, vol. xxii, n.re 56-57, in Arq. Nac; Liv. de Forais Novos da Beira, fl. 30; Chancelarias: de D. Dinis (liv. 1.° fl. 182 v.°), de D. Pedro I (liv. 1.", fls. 18, 74 e 124 v.M25), in Arq. Nac; Huebner, Corpus, ii, 48).

Ribeira que nasce na serra da Senhora da Mó, a NE da vila de Arouca, junta-se cóm a ribeira de Silvares, formando ambas a ribeira de Arada.

II — Equipamentos e outros serviços públicos

Equipamentos:

Jardim-de'-infância;

Escola primária;

Correios;

Farmácia;

Posto médico;

Consultório dentário;

Sede da junta de freguesia;

Centro de dia da terceira idade;

Bomba de gasolina;

Dois cemitérios;

Casas de turismo rural de habitação.

Serviços:

Luz eléctrica; Água ao domicílio; Transportes públicos; Três cafés; Duas mercearias; Uma taberna;

Correspondente de seguros; Correspondente bancário; Duas oficinas mecânicas.

Associações:

Associação Recreativa, Cultural e Desportiva de

Marialva; Liga dos Amigos de Marialva; Jornal Notícias de Marialva.

Feiras e mercados:

Feira Anual de São Tiago (25 de Julho).

Festas e romarias:

Festas de Nossa Senhora de Fátima (13 de Maio); Festas de Nossa Senhora dos Remédios (15 e 16 de Agosto).

Edifícios religiosos e históricos:

Duas igrejas paroquiais; ■ Cinco capelas; Fontes romanas.

Ambiente:

Jardins e espaços verdes.

Nestes termos, o Deputado abaixo assinado, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projecto de lei:

Artigo único. A povoação de Marialva, no concelho de Meda, é elevada à categoria de vila.

Palácio de São Bento, 8 de Janeiro de 1998. — O Deputado Independente, Lemos Damião.

PROJECTO DE LEI N.9 445/VII LEI QUADRO DA CRIAÇÃO DE MUNICÍPIOS

Exposição de motivos

O Partido Popular apresenta à Assembleia da República um projecto de lei quadro de criação de municípios.

Honra, assim, um seu compromisso, que visa pôr termo ao bloqueio que a Lei n.° 142/85, de 18 de Novembro, apresenta. .

Durante a discussão parlamentar do projecto de lei n.° 96/VII tivemos oportunidade de demonstrar que a revogação do n.° 4 do artigo 14.° da Lei 142/85 não permitia, só por si, a satisfação da maior parte das pretensões que visam a criação de novos concelhos, pois que o actual regime é, ele próprio, um obstáculo intransponível aos justos anseios de muitos milhares de portugueses que pretendem ter mais próximo de si a administração municipal.

Com efeito, é disto mesmo que se trata.

A proximidade do poder decisório é uma exigência irreversível dos cidadãos, que só se alcançará com a redefinição das fronteiras de muitos concelhos, cuja dimensão está hoje ultrapassada.

Descentralizar não é criar patamares mais distantes, mas, pelo contrário, torná-los mais próximos e mais acessíveis.

Actualmente, com maior ou menor organização, com maior ou menor legitimidade, são conhecidas as pretensões para a criação dos concelhos de Rio Tinto, Trofa, Lixa, Tocha, Esmoriz, Fátima, Odivelas, Amora e Pinhal Novo, para além de Vizela.

Não interessa agora conhecer as razões de cada um destes casos, embora seja indiscutível a legitimidade dos órgãos autárquicos e dos cidadãos das freguesias envolvidas em desenvolverem as acções e proporem as iniciativas que reputam mais conformes aos seus interesses.

Mas ou a lei muda ou continuarão a ser defraudadas as expectativas daqueles que se sentem insuficientemente representados pelas suas actuais autarquias municipais.

Na verdade, a actual lei quadro é anacrónica, está ultrapassada e é, ela própria, um travão à eficácia, à descentralização e à aproximação entre eleitos e eleitores.

Aquilo que hoje se exige é que se definam novos critérios para a criação de municípios, que se ligue a criação de municípios às realidades das áreas a destacar, e não às realidades dos municípios de origem, que se tenha em conta a vontade das populações expressa de forma referendária e que se introduzam elementos que tornem expedito o processo de criação.

O projecto de lei que o Partido Popular agora apresenta atende a todas estas exigências.

Antes de mais, o diploma tem em conta, tão-só, as realidades das freguesias que se pretendem constituir em novo concelho e acaba com a exigência de requisitos relativos aos concelhos de origem.

Em segundo lugar, define com rigor os- prazos para o cumprimento das diversas etapas do processo de criação, com a expressa finalidade de evitar dilações naqueles processos.

Por último, introduz o instituto do referendo local, corri carácter vinculativo, para se aferir da vontade das populações.

O Partido Popular assume que esta solução é claramente alternativa à regionalização, a que Portugal não está condenado, sendo que o esquartejamento do País em parcelas artificiais, onde ninguém tem a ver com ninguém, é uma fatalidade que podemos evitar.

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Artigo 1." A presente lei estabelece o regime de criação de municípios.

Art. 2." A Assembleia da República, na apreciação das iniciativas que visem a criação de municípios, terá em conta:

a) A vontade das populações que integrarão o futuro município, expressa em referendo organizado nos termos da lei;

b) Razões de ordem histórica e cultural;

c) Factores de ordem geográfica, demográfica, económica, social e administrativa;

d) Interesses de ordem geral e local em causa;

e) Pareceres de carácter consultivo dados pelos órgãos deliberativos do município de origem e das freguesias a destacar.

Art. 3.° Não poderá ser criado nenhum município se se verificar que as suas receitas, bem como as do municipio ou municípios de origem, não são suficientes para fa prossecução das atribuições que lhe estiverem cometidas.

Art. 4.° — 1 — A criação do novo municipio será submetida a referendo organizado nos termos da lei e onde votarão os eleitores recenseados na área da freguesia ou das freguesias que integrarão o futuro municipio.

2 — Caso, em alguma ou algumas das freguesias a integrar, o resultado do referendo não seja favorável à criação do município, esta ficará inviabilizada, sem prejuízo de se ciar novo processo legislativo, com as devidas alterações.

3 — A Assembleia da República promoverá a audição, com carácter consultivo, dos órgãos deliberativos do município ou municípios de origem e das freguesias a destacar.

Art. 5.° — 1 — A criação de novos municípios deverá ter em conta os seguintes requisitos geodemográficos:

a) Quando a área da futura circunscrição municipal for superior a 100 km2, deverá ter um número de eleitores superior a 10 000;

b) Quando a área da futura circunscrição municipal for inferior a 100 km3 e superior a 80 km2, deverá ter um número de eleitores superior a 15 000;

c) Quando a área da futura circunscrição municipal for inferior a 80 km2 e superior a 50 km2, deverá ter urh número de eleitores superior a 20 000;

d) Quando á área da futura circunscrição municipal for inferior a 30 km2 e superior a 20 km2, deverá ter um número de eleitores superior a 30 000.

2 — Além dos requisitos mencionados no número anterior, a futura circunscrição municipal deverá dispor já dos seguintes equipamentos:

Posto médico, com serviço permanente;

Farmácia;

Mercado;

Casa de espectáculos; Transportes públicos colectivos; Estação dos CTT;

Instalações de hotelaria de 3 estrelas; Estabelecimentos de ensino preparatório e secundário; Creche e infantário; Corporação de bombeiros; Agência bancária; Parque e jardim público;

Recinto desportivo; Posto policial.

3 — O novo município a criar deve ter fronteira com mais de um município, caso não seja criado junto à orla marítima ou à fronteira com país vizinho, e ser geograficamente contínuo.

Art. 6.° — 1 — Admitidos o projecto ou a proposta de lei, o Presidente da Assembleia da República ordenará a sua baixa à competente comissão parlamentar, com vista à abertura do processo a organizar nos termos da presente lei.

2 — Aberto o processo, e após comunicação ao Governo, este tem 90 dias para fornecer à Assembleia da República, sob a forma de relatório, todos os elementos necessários para a instrução daquele.

3 — 0 relatório a que se refere o número anterior será elaborado por uma comissão que funcionará junto do Ministério da Administração Interna, que presidirá, e será ainda integrada por dois representantes do município ou municípios de origem, por dois representantes de cada freguesia a destacar, todos a indicar, respectivamente, pelo órgão executivo e pelo órgão deliberativo, e por representantes dos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e das Finanças e do Instituto Português de Geografia e Cadastro.

Art. 7." O relatório referido no artigo anterior incidirá, nomeadamente, sobre os seguintes aspectos:

d) Viabilidade do novo município e do município ou municípios de origem, nos termos do artigo 3.°;

b) Delimitação territorial do novo município, acompanhada de representação cartográfica em planta à escala de 1:10 000;

c) Alterações a introduzir no território do município ou municípios de origem acompanhadas de representação cartográfica em escala adequada;

d) Indicação da denominação, sede e categoria administrativa do futuro município, bem como do distrito em que ficará integrado;

e) Discriminação, em natureza, dos bens, universalidades, direitos e obrigações do município ou municípios de origem a transferir para o novo município;

f) Enunciação de critérios suficientemente precisos para a afectação e imputação ao novo município de direitos e obrigações, respectivamente.

Art. 8.° — 1 — Aprovado o relatório, o Governo abrirá, no prazo de 15 dias, o processo de organização do referendo.

2 — Apurados os resultados do referendo, a Assembleia da República agendará, para os 30 dias seguintes, a discussão e votação do projecto ou proposta de lei de criação.

Art. 9.° A lei criadora do novo município deverá:

a) Determinar as freguesias que o constituem e conter, em anexo, um mapa, à escala de 1:10 000, com a delimitação da área do novo município e a nova área dos municípios de origem;

b) Incluir os elementos referenciados nas alíneas d), e) ef) do n.° 1 do artigo 7°;

c) Definir a composição da comissão instaladora;

d) Estabelecer o processo eleitoral.

Art. 10." — 1 — Após a publicação da lei de criação do novo município, caberá à comissão referida no n.° 3 do

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artigo 6.° viabilizar a partilha de patrirnónios e a determinação de direitos e de responsabilidades, dentro dos critérios orientadores definidos no artigo 7.°, mas sem prejuízo do que sobre as mesmas matérias se disponha especialmente na lei de criação.

2 — Os documentos elaborados pela comissão nos termos destes artigos deverão ficar concluídos nos 60 dias seguintes à publicação da lei de criação.

3 — A transmissão de bens, universalidades, direitos e obrigações para o novo município efectua-se por força da lei que o criar, sendo o registo, quando tenha lugar, lavrado mediante simples requerimento instruído com os documentos referidos no número anterior.

4 — Todos os serviços já existentes na área do novo município passam de imediato, após a entrada em vigor da lei de criação, a ser dirigidos pela comissão instaladora, sem prejuízo da manutenção do apoio em meios materiais e financeiros dos municípios de origem indispensáveis à continuidade do seu funcionamento e até que sejam formalmente recebidos por aquela comissão, nos termos do n.° 2 deste artigo.

5 — Consideram-se em vigor na área do novo município todos os regulamentos municipais que aí vigoravam à data da criação, cabendo à comissão instaladora, no caso de regulamentação proveniente de mais de um município, deliberar sobre aquela que passa a ser aplicada.

Art. 11." — 1 — A criação de um novo município implica a realização de eleições para todos os órgãos dos diversos municípios envolvidos, salvo se a respectiva lei for publicada nos 12 meses anteriores ao termo do prazo em que legalmente se devem realizar as correspondentes eleições gerais.

2 — A data das eleições intercalares, o calendário das respectivas operações de adaptação de recenseamento e as operações eleitorais serão fixados pelo órgão competente no prazo máximo de 30 dias após a entrada em vigor da lei.

Art. 12.°— I — Salvo o que especialmente se dispuser na lei de criação, a partilha de patrimónios e a determinação de direitos e responsabilidades a que se refere o n.° 1 do artigo 7.° atender aos seguintes critérios orientadores:

á) Transmissão para a nova autarquia, sem prejuízo do disposto na alínea d), de uma parte da dívida e respectivos encargos dos municípios de origem, proporciona] ao rendimento dos impostos ou taxas que constituam, nos termos da lei, receita própria dos municípios;

b) Transferência para o novo município do direito aos edifícios e outros bens dos municípios de origem situados na área das freguesias que passam a integrar a nova autarquia;

c) Transferência para o novo município das instalações da rede geral dos serviços pertencentes ou explorados na área das freguesias que passam a integrar a nova autarquia, salvo tratando-se de serviços indivisíveis por natureza ou estrutura e que aproveitem as populações de mais de uma autarquia, caso em que os municípios interessados se associarão por qualquer das' formas previstas na lei para a sua detenção e exploração comum;

d) Transferência para o novo município do produto e correspondentes encargos de empréstimos contraídos para a aquisição, construção ou instalação dos bens e serviços transferidos nos termos das alíneas b) e c);

e) Transferência para o novo município do pessoal adstrito a serviços em actividade na sua área e ainda daqueles que passam a caber-lhe.

2 — Em todas as demais situações em que hajam de determinar-se direitos ou obrigações serão estes apurados proporcionalmente ao número de eleitores inscritos à data da criação.

3 — Os critérios enunciados deverão ser igualmente tidos em conta pela comissão parlamentar quando o relatório for omisso, inconclusivo ou não fundamentado no que respeita às exigências do artigo 8.°

Art. 13.°— 1 —Com vista a proceder à implantação de estruturas e serviços, funcionará no período que decorrer entre a publicação da lei e a constituição dos órgãos do novo município uma comissão instaladora, que promoverá as acções necessárias à instalação daquele órgão e fará a gestão corrente da autarquia.

2 — Ao Ministério da Administração Interna compeürá assegurar as instalações e os meios materiais e financeiros necessários à actividade da comissão instaladora.

Art. 14.° — 1 — A presente lei é aplicável a todos os projectos e propostas de lei de criação de novos municípios pendentes na Assembleia da República.

2 — A aplicação da presente lei às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira depende da publicação de normas especiais que tomem em conta o particular condicionalismo geográfico e populacional dos correspondentes arquipélagos.

Palácio de São Bento, 7 de Janeiro de 1998.— Os Deputados do CDS-PP: Gonçalo Ribeiro da Costa — Nuno Abecasis — Nuno Correia da Silva.

Despacho n.» 122/VII, de admissibilidade do projecto de lei

Admito o presente projecto de lei, formulando, no entanto, as seguintes reservas de natureza jurídico--constitucional:

1 — Apesar de na ultima revisão constitucional ter sido eliminada a exigência da «competência exclusiva» das autarquias nas matérias submetidas a referendo local, julgo ser de duvidosa constitucionalidade sujeitar o processo de criação de novos municípios a referendo obrigatório e vinculativo.

Creio poder faltar, desde logo, credencial constitucional que habilite o legislador a prever a sujeição de determinadas matérias a referendo obrigatório, para além, obviamente, do caso previsto no artigo 256.° da Constituição.

Acresce que a sujeição desta matéria a referendo vinculativo reduz a uma mera formalidade, sem quaisquer consequências relevantes, a «consulta dos órgãos das autarquias abrangidos», único procedimento constitucionalmente exigível nos termos do artigo 249." da Constituição da República Portuguesa.

2 — Para além desta dúvida de fundo, também a limitação do direito de sufrágio referendário aos «eleitores recenseados na área da freguesia ou das freguesias que integrarão o futuro município» (cf. n.° 1 do-artigo 4.° do projecto de lei) poderá restringir de Forma inconstitucional os direitos de participação política dos eleitores recenseados nas restantes freguesias do município ou municípios de origem, por se tratar de matéria que também a eles especialmente interessa e respeita.

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3 — Dúvidas, ainda, quanto à possibilidade «de se iniciar novo processo legislativo com as> devidas alterações» no caso de o resultado do referendo ser, em alguma ou algumas freguesias, desfavorável à criação do município (cf. n.° 2 do artigo'4.° do projecto de lei), por poder conflituar com o disposto no n.° 10 do artigo 115.° da Constituição, que julgo subsidiariamente aplicável ao caso.

4 — Dúvidas, finalmente, face à não sujeição a fiscalização preventiva obrigatória da constitucionalidade e da legalidade da proposta de referendo [artigos n.os 115, n.° 8, e 223, n.° 2, alínea 0 da Constituição], por me parecer segura a inaplicabilidade ao caso das normas relativas ao processo de consulta, previstas na Lei n.° 49/ 90, de 24 de Agosto.

Baixa às 1." e 4." Comissões. Registe-se, notifique-se e publique-se.

Palácio de São Bento, 13 de Janeiro de 1998.— O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.

PROPOSTA DE LEI N.9 96/VII

(ESTABELECE UM NOVO REGIME JURÍDICO DO CONTRATO DE TRABALHO DO PRATICANTE DESPORTIVO E DO CONTRATO DE FORMAÇÃO DESPORTIVA E REVOGA O DECRETO-LEI N.s 305/95, DE 18 DE NOVEMBRO.)

Relatório e parecer da Comissão de Educação, Ciência e Cultura

Relatório

Nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei que estabelece um novo regime jurídico de trabalho do praticante desportivo e do contrato de formação desportiva e revoga o Òecreto-Lei n.° 305/95, de 18 de Novembro, a qual foi admitida e baixou às 6.° a e 8.° Comissões em 15 de Maio de 1997, tendo-lhe sido atribuído o n.° 96/VII.

Sobre ela cumpre fazer relatório e dar o seguinte parecer.

Nota. — O diploma esteve em discussão pública entre 17 de Junho e 16 de Junho de 1997, não lendo sido recebidos na Comissão quaisquer pareceres.

1 — Exposição de motivos

A proposta de lei vertente tem por escopo final o estabelecimento de um novo regime jurídico do contrato de trabalho do praticante desportivo e do contrato de formação desportiva e a revogação do Decreto-Lei n.° 305/ 95, de 18 de Novembro.

Os motivos subjacentes à sua propositura consubstanciam-se — na perspectiva do .Governo'— na necessidade premente de proceder à actualização do regime jurídico em análise, atendendo à aprovação do Acórdão Bosman, adaptando-o aos princípios da livre circulação quando aplicados ao desporto e flexibilizando as respectivas regras, de .molde a que os clubes portugueses enfrentem eficazmente a concorrência acrescida no âmbito da União Europeia.

2 — Enquadramento legal

A Lei de Bases do Sistema Desportivo — Lei n.° 1/90, de .13 de Janeiro— prevê que o regime contratual dos

praticantes desportivos profissionais é definido por diploma próprio, ouvidas as entidades representativas dos interessados e as federações desportivas, tendo em conta a sua especificidade em relação ao regime geral do contrato de trabalho (artigo 14.°, n.° 4).

Por sua vez, o Decreto-Lei n.° 305/95, de 18 de Novembro, estabelece o regime jurídico do contrato de trabalho do praticante desportivo e do contrato de formação desportiva.

3 — Análise da proposta de lei

A proposta de lei em análise é composta por 40 artigos, divididos em seis capítulos. No âmbito das disposições gerais não constatamos diferenças assinaláveis na perspectiva formal entre a proposta de lei e o Decreto-Lei n.° 305/95, de 18 de Novembro,'exceptuando a «atribuição dos direitos, deveres e garantias das partes», que passam a integrar o capítulo u, bem como as normas atinentes à retribuição, período normal de trabalho, férias, feriados e descanso semanal e poder disciplinar.

Todavia, numa perspectiva material, depara-se-nos uma alteração assinalável no que concerne à. liberdade de trabalho. Isto na medida em que o artigo 22.°, n.° 2, do decreto-lei em vigor dispõe:

Pode ser estabelecida, por convenção colectiva ou regulamento federativo, a obrigação de pagamento de uma justa indemnização, a título de promoção ou valorização do praticante desportivo, à anterior entidade empregadora desportiva que com esse praticante desportivo celebre, após a cessação do anterior, um contrato de trabalho desportivo.

Ao invés, o artigo 18.°, n.° 2, da proposta de lei não se refere ao estabelecimento da obrigação de pagamento mediante regulamento federativo, o que vale por dizer que a aprovação da proposta de lei implica a revogação dos actuais regulamentos federativos na parte em que estabeleçam indemnização aos clubes de origem em caso de transferência dos praticantes.

Da proposta de lei do Governo resulta também que nos casos de rescisão por justa causa se aplica o artigo 18.°, n.°. 2.

Quer as normas atinentes à cedência e transferência de praticantes desportivos quer as disposições relativas à cessação do contrato de trabalho desportivo passaram a ser regulamentadas em capítulos próprios (respectivamente o capítulo ni e v).

No âmbito dos requisitos cumulativos para a celebração do contrato de formação desportiva, a idade mínima compreendida passa a ser de 15 anos, de acordo com o artigo 30.°, n.° 1, alínea b), em vez de 14, nos termos do artigo 26.° do decreto-lei em vigor.

Quanto ao período de duração máxima do contrato de formação, passa a ser de três, em vez de quatro, em obediência ao artigo 32.°, n.° l.

No que diz respeito a alíneas novas, afigura-se-nos um novo dever da entidade formadora, consubstanciado na alínea e) do n.° 1 do artigo 34.°:

Proporciona ao formando a frequência e a prossecução dos seus estudos.

Por último, o artigo 40.° vem revogar o Decreto-Lei n.° 305/95, de 18 de Novembro.

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4 — Parecer

A Comissão dê Educação, Ciência e Cultura é do seguinte parecer:

a) A proposta de lei n.° 96/VII preenche os requisitos constitucionais e legais para subir ao Plenário da Assembleia da República para apreciação e votação;

b) Os grupos parlamentares reservam as suas posições para o Plenário da Assembleia da República..

Palácio de São Bento, 14 de Janeiro de 1998.— O Deputado Relator, .Sílvio Rui Cervan. — O Deputado Presidente da Comissão, Pedro Pinto.

Nota. — O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.9 75/VII

PROPOSTA DE REFERENDO SOBRE A ALTERAÇÃO DA LEI DO ABORTO

No decurso da úlüma sessão legislativa foram rejeitados na Assembleia da República projectos de lei visando a liberalização da interrupção voluntária da gravidez, ainda que temporalmente limitada. Sem modificações quanto à substância, recebe, de novo, o Parlamento iniciativas sobre a matéria.

Trata-se, sempre o dissemos, de matéria extremamente delicada e sensível que se inscreve na reserva mais íntima da consciência moral de cada cidadão, atravessando, de forma indiscriminada, os vários partidos e os respectivos eleitorados.

De facto, a posição a adoptar sobre a liberalização da interrupção voluntária da gravidez, não se podendo catalogar na esfera das normais opções ideológicas ou político-partidárias, é essencialmente do foro individual de cada um, encontrando resposta nas convicções e no posicionamento que cada qual assume perante valores e direitos fundamentais.'

O PSD entende, a este respeito, existirem dois planos distintos, a merecer uma forma de apreciação e decisão igualmente distinta.

Assim, a matéria respeitante à interrupção da gravidez com base em razões médicas —já hoje plasmada na nossa legislação — deve ser eminentemente abordada de um ponto de vista técnico e científico. Independentemente das posições a adoptar, designadamente quanto à extensão dos prazos fixados na lei, o certo é que não se justifica, nestes casos, a consulta referendária.

Foi o que sucedeu a propósito da aprovação da Lei n.° 90/97, de 30 de Julho, cujo conteúdo normativo se queda exactamente por essas alterações ditadas por razões de carácter científico.

Outro plano distinto de abordagem da questão, e que as iniciativas referidas expressamente suscitam, tem a ver com a liberalização da interrupção voluntária da gravidez, ainda que temporalmente limitada. É esta a questão que, na perspectiva do PSD, deve ser objecto de decisão dos Portugueses por via de referendo, por ser justamente aquela que, propondo-se provocar uma alteração de fundo — uma verdadeira ruptura — na legislação actual, toca essencialmente valores e direitos fundamentais e cuja decisão deve ser assumida na base da liberdade de convicções próprias e íntimas de cada português.

É nosso entendimento que só na eventualidade de um pronunciamento favorável dos portugueses sobre esta matéria é que a Assembleia da República estará habilitada a discutir e votar legislação nesse sentido.

Entendimento que, de* resto, foi já parcialmente assumido também pelo Partido Socialista. O líder da bancada socialista declarou, no Plenário da Assembleia da República:

O Sr. Deputado Luís Marques Mendes sabe, mas escamoteou, que o Grupo Parlamentar do PS apresentará uma proposta para uma consulta directa aos Portugueses no caso de esta Assembleia se pronunciar favoravelmente em relação àqueles projectos que representam uma alteração do regime da ilicitude quanto à interrupção voluntária da gravidez.

Por isso, Sr. Deputado Luís Marques Mendes, neste debate e na votação que vai ter lugar só há uma resposta: serão os seus Deputados, essencialmente os seus Deputados, que vão determinar se o PSD é a favor ou contra um referendo nesta matéria. [Diário da Assembleia da República, de 21 de Fevereiro de 1997.]

Estas declarações, diga-se, mais não foram do que a expressão de uma orientação política assumida, dias antes, pelo próprio Partido Socialista, ao nível mais elevado do seu Secretariado Nacional, por iniciativa pessoal do Primeiro-Ministro: «A proposta de realização de um referendo [...], ontem anunciada por Jorge Lacão [...], afinal partiu e foi defendida pelo próprio António Guterres durante a última reunião do Secretariado Nacional do PS» (entre outros, Jornal de Notícias, sob o título «Guterres deu um empurrão») e «...o líder parlamentar do PS manifestou a disponibilidade, e é uma questão que devwa ser ponderada, para, no caso de vir a haver uma alteração substancial da legislação, a Assembleia poder recorrer a uma'consulta pública» (declarações do próprio Primeiro--Ministro, em entrevista à Rádio Renascença, e divulgadas em vários órgãos de comunicação social poucos dias antes do debate parlamentar).

Como é, também, o entendimento expresso e defendido por outras personalidades, como o Sr. Presidente da Assembleia da República, que declarou, em entrevista ao Independente, de 28 de Fevereiro de 1997:

Diria que o aborto é um dos temas que têm dignidade para só poderem vir a ser definitivamente resolvidos através dum referendo, porque aí ninguém se queixa. Foi o povo que quis assim, e acabou. Não foi o partido A ou o partido B.

Ou como o Dr. Vital Moreira, em artigo publicado no mesmo jornal:

Pessoalmente, sendo em princípio favorável a uma moderada despenalização do aborto, penso que, tendo-se acabado por aceitar o referendo, então o melhor teria sido devolver a questão directamente para a decisão popular, em vez de se ter optado pela . fórmula híbrida de um referendo condicionado, a título de ratificação de uma prévia decisão parlamentar,

embora neste caso com uma posição já não pateva1. mas antes totalmente concordante com aquela que o PSD defende.

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É no perfeito conhecimento das posições e dos compromissos políticos assumidos nos vários quadrantes que importa, pois, dar solução a esta questão.

Está claro que a solução correcta e adequada é, mantemos, a de subordinar qualquer iniciativa legislativa neste contexto à realização de um referendo prévio. Mas em alternativa, e como «mal menor», a fórmula híbrida de um referendo sobre uma prévia decisão parlamentar sempre será a resposta política mínima para a salvaguarda da questão essencial, que é a de fazer depender a decisão da vontade dos Portugueses.

Numa palavra, a posição do PSD é muita clara:

A decisão sobre uma alteração substancial e de filosofia da legislação sobre a interrupção voluntária da gravidez deve ser tomada pelos Portugueses por via de referendo, antes de qualquer decisão parlamentar. Foi o que sempre defendemos, designadamente no debate travado na última sessão legislativa, e que posteriormente reiterámos e agora voltamos a reafirmar;

Se, porém, a maioria parlamentar assim o não entender e voltar a sustentar que deve ser o Parlamento a decidir na generalidade sobre a matéria, então, como segunda hipótese — para a eventualidade de existir uma aprovação na generalidade das iniciativas legislativas anunciadas —, deve desencadear-se o referendo imediatamente a seguir, ficando o processo legislativo na especialidade suspenso e a aguardar a decisão soberana dos portugueses. É, do mal o menos, a única solução compatível com os compromissos políticos firmados, há cerca de um ano, de forma explícita e muito clara, dentro e fora do Parlamento, pelo Primeiro-Ministro, pelo Secretariado Nacional do PS e pelo Grupo Parlamentar Socialista;

Em qualquer das hipóteses —preferencialmente a primeira, supletivamente a segunda —, o que deve é garantir-se que o referendo se realiza e que a decisão final,' soberana e vinculativa, competirá aos Portugueses.

Desdizer agora o que foi dito há um ano, tentar esquecer o compromisso assumido há cerca de um ano — quando a substância e a filosofia da matéria se mantêm inalteradas, ou seja, decidir sobre sim ou não à liberalização da interrupção voluntária da gravidez — é que não seria ética e politicamente admissível.

Neste termos, ao abrigo do artigo 115.° da Constituição da República Portuguesa, dos artigos 2.°, 5.°, 7.° e 10.° da Lei n.° 45/91, de 3 de Agosto, e demais legislação e disposições regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de resolução:

A Assembleia da República apresenta a S. Ex.° o Presidente da República a proposta de realização de um referendo, prévio à. votação final de qualquer iniciativa legislativa que vise a liberalização, ainda que limitada temporalmente, da interrupção voluntária da gravidez, em que os cidadãos eleitores sejam chamados a pronunciar-se directamente, a título vinculativo, sobre a seguinte questão:

Não existindo razões médicas, o aborto deve ser livre durante as primeiras 10 semanas?

Palácio de São Bento, 9 de Janeiro de 1998.— Os Deputados do PSD: Luís Marques Mendes — Manuela Ferreira Leite — Jorge Roque Cunha — Correia de Jesus — Fernando Pedro Moutinho — Castro de Almeida — Carlos Encarnação -r- Luís Marques Guedes — Carlos Coelho — José Cesário — Fernando Santos Pereira.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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