O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

17 DE ABRIL DE 1999

1535

4 — Tudo isto aponte para a necessidade de distinguir entre as finalidades da intervenção tutelar de protecção e as finalidades da intervenção tutelar educativa.

A intervenção protectora do Estado justifica-se quando o gozo ou o exercício de direitos cívicos, sociais, económicos ou culturais do menor são ameaçados por factores que lhe são exteriores (incuria, exclusão social, abandono ou maus tratos).

A fragilidade do menor face à adversidade levou, aliás, a Constituição da República a cometer à sociedade e ao Estado um dever de protecção das crianças, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente no que diz respeito a órfãos e abandonados (artigo 69.°). Relativamente a estas situações, os instrumentos jurídicos disponíveis, associados à expansão geográfica das comissões de protecção de menores, constituem um conjunto coerente de soluções, que culminará com um diploma de enquadramento que institucionalize, no mesmo espírito, um sistema global de protecção.

A intervenção tutelar educativa tem outra razão de ser.

Deve confinar-se aos casos em que o Estado se encontra legitimado para educar o menor, mesmo contra a vontade de quem está investido no poder paternal, o que apenas pode admitisse quando se tenha manifestado uma situação desviante que tome clara a ruptura com elementos nucleares da ordem jurídica.

5 — Justificada a legitimidade da intervenção tutelar educativa, importa definir o tipo de respostas.

Uma solução, aliás vigente em alguns países, seria a de realizar esta intervenção no âmbito estrito do direito penal, mediante o abaixamento do limite etário da imputabilidade.

A favor desta solução argumenta-se que a inimputabili-dade em razão da idade já não corresponde a uma presunção legal de imaturidade. Se assim fosse — diz-se —, a presunção encontrar-se-ia desligada da realidade e inevitavelmente necessitada de modificação.

Mas não parece um caminho aceitável.

A sua rejeição encontra sentido político-criminal na necessidade de defender o menor de 16 anos contra a mais gravosa das intervenções estaduais (a acção penal) e de evitar a sua sujeição a um sistema fortemente estigmatizante e carregado de simbolismo social. E colhe fundamento dogmático na incapacidade de culpa do menor, desde que entendida em certa acepção.

Se é verdade que a idade inferior a 16 anos não retira necessariamente ao menor a capacidade para «avaliar a ilicitude da sua conduta» ou «para se determinar de acordo com essa avaliação», nem por isso a posse desta capacidade faz supor juridicamente a capacidade de culpa. A culpa ju-rídico-penal consiste num juízo de censura ético-social à personalidade do agente. Mas é legítimo e plausível considerar que a personalidade do indivíduo, em sentido jurídi-co-penal, não esteja formada antes dos 16 anos.

6 — Se a intervenção tutelar não deve realizar-se nos moldes estritos do direito penal, jTião está, no entanto, excluído que não deva encontrar inspiração nesse sistema.

Ela passa, desde logo, pela identificação de um núcleo de valores cujo desrespeito legitima a intervenção do Estado.

Este núcleo —antecipemos a conclusão— é representado pelas normas criminais. O mundo do direito a que a formação da personalidade do menor deve aspirar é o que vigora na comunidade. Nesta, aquelas normas representam o quadro substancial de referência e o mínimo de obediência devida.

O Estado tem, assim, o direito e o dever de intervir correctivamente sempre que o menor, ao ofender valores essenciais da comunidade e regras mínimas de convivência

social, revele uma personalidade hostil ao dever-ser jurídico básico, traduzido nàs normas criminais. Torna-se então necessário educá-lo para o direito, por forma que interiorize as normas e os valores jurídicos.

A solução tem, além do mais, a virtualidade de se conformar com exigências comunitárias de segurança e de paz social, de que o Estado não pode alhear-se só porque a ofensa provém de cidadão menor.

Esta orientação dá cumprimento:

Ao dever que ao Estado incumbe de garantir o gozo e o exercício dos direitos fundamentais à liberdade e à autodeterminação (de que é titular o menor) e à educação e manutenção dos filhos (de que são detentores os progenitores);

Ao dever que ao Estado incumbe de proteger a infância e a juventude, nomeadamente na formação da sua capacidade de autodeterminação (função educação);

Ao dever que ao Estado incumbe de proteger a paz social e os bens jurídicos essenciais da comunidade (função segurança);

Ao dever que ao Estado incumbe, em homenagem a objectivos de prevenção geral e especial, de atacar precocemente o desenvolvimento de carreiras criminosas.

7 — Enunciados os fins que a intervenção tutelar educativa visa alcançar, há que referir os seus princípios e pressupostos.

O primeiro princípio é o da mínima intervenção.

Nele se consubstancia o inarredável respeito pelo direito do menor à liberdade e à autodeterminação e o de, por regra, evoluir no seu ambiente sócio-familiar natural, sem constrangimentos por parte de outrem ou do Estado.

O primeiro pressuposto é o da existência de uma ofensa a bens jurídicos fundamentais, traduzido na prática de facto considerado por lei como crime.

É nesta sede — a lei penal — que se reprimem as ofensas intoleráveis a bens jurídicos essenciais.

Por outro lado — é este o segundo pressuposto —, sendo finalidade da intervenção tutelar a educação do menor para o direito, e não a retribuição pelo crime, não poderá aplicar-se medida tutelar sem que se conclua, em concreto, pela necessidade de corrigir a personalidade do menor no plano do dever-ser jurídico manifestada na prática do facto.

Esta consideração mostra que a medida tutelar não pretende constituir um sucedâneo do direito penal e que é primacialmente ordenada ao interesse do menor: interesse fundado no seu direito à realização de condições que lhe permitam desenvolver a sua personalidade de forma socialmente responsável.

Por isso, a intervenção não deve ter lugar se a prática do facto exprimir ainda uma atitude de congruência ou mesmo tão-só de não desrespeito para com os valores jurídicos.

A mesma resposta valerá para os casos em que a prática do facto, posto que objectivamente desvaliosa, se insira nos processos normais de desenvolvimento da personalidade que incluem, dentro de limites razoáveis, a possibilidade de o menor testar a vigência das normas através da infracção.

A densificação do que seja a necessidade de educação para o direito não se pode reconduzir a um manual de procedimento mas não se afigura também tarefa excessivamente melindrosa. Trata-se de corrigir uma personalidade que apresenta deficiências de conformação com o dever-ser jurídico mínimo e essencial (corporizado na lei penal), e não meras deficiências no plano moral ou educativo geral.

Páginas Relacionadas
Página 1534:
1534 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 Artigo. 125.° A execução da medida No process
Pág.Página 1534
Página 1536:
1536 II SÉR1E-A — NÚMERO 54 Porque a intervenção tutelar educativa não visa a punição
Pág.Página 1536
Página 1537:
17 DE ABRIL DE 1999 1537 porque se tornam menos imperativas as razões que determinam
Pág.Página 1537
Página 1538:
1538 II SÉRIE - A — NÚMERO 54 A realização do princípio da obtenção da verdade materi
Pág.Página 1538
Página 1539:
17 DE ABRIL DE 1999 1539 imposição de obrigações. Mas não fica excluída a guarda em i
Pág.Página 1539
Página 1540:
1540 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 uma mais completa estabilização da concordância axiológic
Pág.Página 1540
Página 1541:
17 DE ABRIL DE 1999 1541 soai. Elaborado com a participação do menor, e aprovado pelo
Pág.Página 1541
Página 1542:
1542 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 Lei tutelar educativa TÍTULO I Disposição int
Pág.Página 1542
Página 1543:
17 DE ABRIL DE 1999 1543 CAPÍTULO II Conteúdo das medidas Artigo 9.° Admo
Pág.Página 1543
Página 1544:
1544 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 consentimento do menor quando tiver idade superior a 14 a
Pág.Página 1544
Página 1545:
17 DE ABRIL DE 1999 1545 c) Consoante o caso, a entidade que acompanha a execução ou
Pág.Página 1545
Página 1546:
1546 II série-a — número 54 penas referidas no n.° 1, o regime da medida a executar t
Pág.Página 1546
Página 1547:
17 DE ABRIL DE 1999 1547 que lhe sejam atribuídos factos diversos ocorridos na mesma
Pág.Página 1547
Página 1548:
1548 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 Artigo 43.° Iniciativas cíveis e de protecção 1 — E
Pág.Página 1548
Página 1549:
17 DE ABRIL DE 1999 1549 capítulo II Identificação, detenção e medidas cautelar
Pág.Página 1549
Página 1550:
1550 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 Artigo 57.° Tipicidade São medidas cautelares: <
Pág.Página 1550
Página 1551:
17 DE ABRIL DE 1999 1551 Artigo 67.° Convocação de menores As testemunhas ou qu
Pág.Página 1551
Página 1552:
1552 II SÉRIE-A—NÚMERO 54 3 — A assistência dos serviços de reinserção social tem por
Pág.Página 1552
Página 1553:
17 DE ABRIL DE 1999 1553 bolso ou com a prestação de uma actividade a favor do ofendi
Pág.Página 1553
Página 1554:
1554 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 b) Arquiva o processo, quando, sendo o facto qualificado
Pág.Página 1554
Página 1555:
17 DE ABRIL DE 1999 1555 Artigo 100.ºOrganização e regime da audiência 1 — A au
Pág.Página 1555
Página 1556:
1556 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 3 — As testemunhas, os peritos e os consultores técnicos
Pág.Página 1556
Página 1557:
17 DE ABRIL DE 1999 1557 Secção III Audiência Artigo 115.° Notificações
Pág.Página 1557
Página 1558:
1558 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 Artigo 125.° Efeito do recurso 1 — No exame prelimi
Pág.Página 1558
Página 1559:
17 DE ABRIL DE 1999 1559 Artigo 134.° Recursos 1 — O menor, os pais, o represen
Pág.Página 1559
Página 1560:
1560 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 3 — A substituição da medida, nos termos previstos na alí
Pág.Página 1560
Página 1561:
17 DE ABRIL DE 1999 1561 Artigo 145.° Fins dos centros educativos Os centros ed
Pág.Página 1561
Página 1562:
1562 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 à escolha e determinação pelos serviços de reinserção soc
Pág.Página 1562
Página 1563:
17 DE ABRIL DE 1999 1563 Secção II Princípios da intervenção em centro educativ
Pág.Página 1563
Página 1564:
1564 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 de formação, laborais ou desportivas, na medida do que se
Pág.Página 1564
Página 1565:
17 DE ABRIL DE 1999 1565 7 — O dever de assiduidade consiste em o menor comparecer, r
Pág.Página 1565
Página 1566:
1566 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 ou elemento do pessoal do centro, sem prejuízo da sua ime
Pág.Página 1566
Página 1567:
17 DE ABRIL DE 1999 1567 Suspensão da participação em todas as actividades recreativa
Pág.Página 1567
Página 1568:
1568 SÉRIE-A — NÚMERO 54 Artigo 200.° Prescrição das medidas disciplinares 1 —
Pág.Página 1568
Página 1569:
17 DE ABRIL DE 1999 1569 Artigo 209.° Ficheiro central 1 — O registo de medidas
Pág.Página 1569
Página 1570:
1570 II SÉRIE-A — NÚMERO 54 Artigo 219.° Reclamações e recursos Compete ao dire
Pág.Página 1570