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Quinta-feira, 27 de Abril de 2000 II Série-A - Número 35

VIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1999-2000)

S U M Á R I O

Resoluções: (a)
- Empenhamento do Estado português na defesa e promoção do direito à liberdade religiosa.
- Orçamento da Assembleia da República para 2000.
- Aprova, para ratificação, a Convenção sobre Conciliação e Arbitragem no Quadro da Conferência para a Segurança e Cooperação na Europa - CSCE -, concluída em Estocolmo, a 15 de Dezembro de 1992, no Terceiro Conselho Ministerial da OSCE.

Projectos de lei (n.os 47 e 176 a 180/VIII):
N.º 47/VIII (Cria o Observatório da Justiça):
- Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 176/VIII - Lei de alteração do regime do rendimento mínimo garantido (apresentado pelo CDS-PP).
N.º 177/VIII - Cria a Escola Superior de Comércio e Serviços (apresentado pelo PS).
N.º 178/VIII - Privatização da RTP (apresentado pelo PSD):
- Texto e despacho n.º 45/VIII de admissibilidade.
N.º 179/VIII - Elevação de Rossas, no município de Vieira do Minho, à categoria de vila (apresentado pelo PS).
N.º 180/VIII - Privatização do notariado (apresentado pelo PSD).

Proposta de lei n.º 22/VIII:
Aprova a organização e ordenamento do ensino superior.

(a) São publicadas em suplemento a este número.

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PROJECTO DE LEI N.º 47/VIII
(CRIA O OBSERVATÓRIO DA JUSTIÇA)

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

I - Considerações gerais

1 - O projecto de lei n.º 47/VIII, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, visa criar o Observatório da Justiça, órgão independente que funcionará no âmbito da Assembleia da República.
2 - Motiva os Deputados subscritores a frequente verificação de acontecimentos relacionados com a área da justiça que, no entender dos mesmos, transmitem a ideia de um sistema de justiça moroso, dispendioso e de menor qualidade para as pessoas de menores recursos.
3 - Os aspectos do funcionamento da justiça em Portugal que, no entender dos subscritores, devem merecer maior atenção por parte dos responsáveis, são os que se prendem com a desigualdade dos cidadãos no acesso à informação judiciária, ao direito e aos tribunais; o avolumar dos processos, aliado à morosidade das investigações e das decisões judiciais; e as disfunções do sistema prisional, que falha na sua vertente reintegradora do criminoso.
4 - Sobre as preocupações dos autores do projecto de lei, cabe referir, ainda que sucintamente:
4.1 - Alguns números sobre o estado da justiça:
- Em 1999 o total de inquéritos entrados foi de 401 136 e o número de inquéritos findos foi de 424 779 inquéritos:

a) Os inquéritos findos em 1999 representam 67,3% dos inquéritos movimentados nesse ano;
b) 0,15% desses inquéritos (618 inquéritos) findaram por prescrição;
c) Uma parte dos inquéritos findaram em consequência da aplicação da Lei n.º 29/99, de 12 de Maio (Lei da amnistia).

- No que respeita à situação do Laboratório de Polícia Científica em 1999:

a) O número de exames pedidos em 1999 - 21 813 - foi apenas ligeiramente superior ao número de exames que ficaram pendentes, mesmo depois de realizados 18 390 exames nesse ano;
b) O Laboratório de Polícia Científica realizou, em 1999, cerca de mais 8000 exames do que a média de exames realizados nos nove anos anteriores.

- O número de arguidos não condenados, com processos em fase de julgamento, por prescrição do respectivo procedimento criminal, aumentou a partir de 1993. Assim:

a) Entre 1990 e 1992 temos uma tendência decrescente do número de processos arquivados por prescrição do procedimento criminal: de 680 em 1990 para 628 em 1991, para 609 em 1992;
b) Em 1993 arquivaram-se 1442 processos por prescrição do procedimento criminal (mais do dobro de 1992, portanto), 2792 em 1994, 4623 em 1995, 7860 em 1996, 9722 em 1997 e 12 092 em 1998;
c) Quanto a 1999, dados reportados apenas a 65% dos processos findos apontam já para 7822 processos arquivados por prescrição do procedimento criminal.

- No que concerne especificamente aos processos cíveis, em quatro anos evoluiu-se de um total de 645 946 processos pendentes para 1 062 355 processos pendentes. Assim:

a) O número de processos pendentes em 1 de Janeiro de 1995 era de 645 946 e o número de processos entrados nesse ano foi de 636 975, o que dá um total de 1 282 921 processos;
b) Descontados os 523 324 processos resolvidos nesse ano, ficaremos com 759 597 processos pendentes em 31 de Dezembro de 1995;
c) Dividindo tais processos pelo número de juizes existentes em 1995, de acordo com as estatísticas do Ministério da Justiça - 1397 juizes - teremos uma média de 544 processos por juiz;
d) Em 1998 o número de processos pendentes em 1 de Janeiro era de 1 062 355 e o número de processos entrados nesse ano foi de 731 057, o que dá um total de 1 793 412 processos;
e) Descontados os 619 529 processos resolvidos nesse ano, ficam 1 173 883 processos pendentes em 31 de Dezembro de 1998;
f) Dividindo tais processos pelo número de juizes existentes em 1998, de acordo com as estatísticas do Ministério da Justiça - 1563 juizes - teremos uma média de 752 processos por juiz;
g) Entre 1995 e 1998 a média de processos cíveis por juiz aumentou em 39%.

- Quanto a meios humanos e materiais:

a) Entre 1995 e 1998 o número de magistrados aumentou em 220;
b) O número de funcionários de justiça aumentou em mais 700 no mesmo período;
c) Foram aprovadas bolsas de magistrados para destacamento em tribunais onde se verifique a falta ou impedimento de titulares ou a vacatura do lugar;
d) Entre 1996 e Setembro de 1999 foram criados e instalados juízos em 26 comarcas;
e) Em Setembro de 1999 criaram-se e instalaram-se cerca de 80 novos juízos em tribunais.

4.2 - Alguns dados do "Relatório sobre o sistema prisional", de 2 de Março de 1999, elaborado pela Provedoria de Justiça:
- No que concerne ao alojamento, o preceito do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 265/79, de 1 de Agosto, que opta pelo modelo do alojamento individual como regra, não é minimamente cumprido na esmagadora maioria dos estabelecimentos.
- Há 15 estabelecimentos prisionais masculinos acima de dois terços da sua lotação em celas individuais e cerca de 16 estabelecimentos prisionais abaixo de um terço da sua capacidade existente em número de alojamentos celulares, enquanto seis estabelecimentos não têm qualquer espaço de alojamento individual.
- Nos estabelecimentos femininos a propensão para o sistema de camarata é maior.

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Foi recomendado que se consagrasse, nos projectos de remodelação ou de construção de novos estabelecimentos, a existência de um número mínimo de espaços individuais em alojamento, bem como que se tome em consideração a influência que o tipo de alojamento pode ter no percurso prisional e pós-prisional dos reclusos.
- Quanto à saúde, e particularmente no que concerne à situação das doenças infecciosas em meio prisional, é preocupante a evolução que os mesmos registam desde 1996, reclamando uma reflexão profunda sobre a política de controlo da propagação de doenças infecciosas ao nível do sistema prisional.
- Quanto a ocupação, os dados recolhidos apontam para que 44,89% da população prisional se encontra ocupada, fruto, designadamente, de uma maior abertura dos estabelecimentos prisionais ao exterior, o que se tem traduzido numa maior oferta de postos de trabalho por empregadores externos.
- O trabalho no exterior deverá ser encarado como um factor determinante para a reinserção social dos reclusos e, por isso, incentivado.
- Igualmente a formação profissional constitui, a par da educação escolar, um elemento essencial no projecto de ressocialização dos reclusos.
- No entanto, apenas 6,26% da população prisional se encontrava ocupada em actividades de formação profissional, pelo que se recomendou a análise das causas que motivaram o decréscimo do número de acções e de formando verificado e, igualmente, que os planos de execução dos programas na área da formação profissional integrem acções dirigidas a aumentar, qualitativa e quantitativamente, o número de formandos, tendo em especial consideração a necessária adaptação dos currículos à população prisional em presença e à evolução das exigências do mercado de trabalho em meio livre.
5 - Referem-se também os autores do projecto de lei à massificação da justiça que se tem verificado desde 25 de Abril de 1974, bem como ao surgimento de novas formas e fontes de conflitualidade social, à sofisticação dos meios utilizados na prática de crimes e à mediatização da justiça, fenómenos estes que não foram devidamente acompanhados das correspondentes medidas preventivas.
6 - É um facto que Portugal é hoje uma sociedade aberta, com novos padrões de consumo, uma classe média consolidada e com uma população mais escolarizada. Todas estas realidades transformaram a estrutura social do País, o que não deixou de ter reflexos na justiça que hoje temos, determinando mudanças na forma como a mesma se tem de administrar, e que tantas vezes fica aquém daquela que se procura.
7 - É por essa, entre outras razões, que os autores do projecto de lei vêm propor a criação do Observatório da Justiça, ao qual incumbirá "... assegurar a recolha e a sistematização de dados objectivos sobre o funcionamento do sistema judiciário e promover a reflexão sobre as medidas adequadas à resolução dos problemas da administração da justiça (...)".
8 - É certo que as atribuições que se prevêem para este órgão (artigo 2.º) se cruzam, em certa medida, com as competências que a alínea c) do artigo 149.º da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho (Estatuto dos Magistrados Judiciais), atribui ao Conselho Superior da Magistratura. Na verdade, "... estudar e propor ao Ministro da Justiça providências legislativas com vista à eficiência e ao aperfeiçoamento das instituições judiciárias pressupõe, certamente, a avaliação permanente do desempenho das instituições judiciárias", o que não pode deixar de conduzir a conclusões sobre o modo de funcionamento dos tribunais e do grau de satisfação dos cidadãos com a administração da justiça.
9 - Estamos em crer, contudo, que não é esse facto que impede a coexistência e a complementaridade da acção desenvolvida por ambos os órgãos, numa área em que todos os contributos válidos para a resolução de problemas que afectam todos os cidadãos, e em que cumpre igualmente salvaguardar o prestígio das instituições judiciárias, serão certamente bem-vindos.
10 - É de louvar, particularmente, a obrigatoriedade de apresentação de um relatório anual sobre o estado da justiça até 31 de Março de cada ano para apreciação e discussão pela Assembleia da República, precedido das conclusões resultantes de debate prévio entre os membros do Observatório (artigo 5.º, n.º 2) - tarefa que se não antevê fácil, dada a heterogeneidade dos interesses ali representados.
11 - Dúvidas levanta, contudo, a obrigação de apresentação de recomendações quanto a medidas globais ou sectoriais tendentes a melhorar o funcionamento do sistema judiciário, prevista no n.º 3 do artigo 5.º. Para além da reserva referida em 8, supra, é de referir igualmente que tal previsão pode ser entendida como esvaziadora do conjunto das competências que, também em matéria de administração da justiça e sistema judiciário, são hoje as do Provedor de Justiça.
12 - Estas dúvidas são tanto mais justificadas quanto, de acordo com o que consta do artigo 2.º do projecto de lei, destinatárias dessas recomendações serão todas as entidades com intervenção na área da justiça.

II - Parecer

Pelo exposto os Deputados da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias são do parecer que o projecto de lei n.º 47/VIII está em condições de subir a Plenário para discussão na generalidade, reservando os grupos parlamentares as suas posições para o debate.

Palácio de São Bento, 11 de Abril de 2000. O Deputado Relator, Narana Coissoró - O Presidente da Comissão, Jorge Lacão.

Nota: - O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade (PS, PSD, PCP e CDS-PP).

PROJECTO DE LEI N.º 176/VIII
LEI DE ALTERAÇÃO DO REGIME DO RENDIMENTO MÍNIMO GARANTIDO

1 - A criação do rendimento mínimo garantido constituiu uma das propostas emblemáticas do anterior governo, encontrando-se em vigor desde 1 de Julho de 1997, de acordo com o previsto no artigo 24.º da Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, que procedeu à sua criação.
Volvidos dois anos e oito meses desde a sua aplicação, verifica-se que tal medida, sendo generosa, não só não cumpre integralmente os objectivos a que se propôs, e que constam da Recomendação do Conselho das Comunidades Europeias de 24 de Junho de 1992, publicada no Jornal Oficial das Comunidades n.º L245, de 26 de Agosto de 1992, que inspirou a criação desta medida pelo anterior governo com

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vista ao combate à pobreza, como tem sido permeável a efeitos perversos.
Com efeito, a atribuição do rendimento mínimo garantido, de acordo com a citada recomendação, tinha como objectivo prioritário o combate à exclusão social através da adopção de medidas que pudessem "preservar nas pessoas com idade e aptidão para trabalhar a vontade de procurar emprego...".
Pelo contrário, verifica-se que, em alguns casos, pela falta de fiscalização quer no início quer no final do processo, esta medida tem provocado efeitos perversos e contraproducentes, abrangendo situações que em nada se enquadram no espírito e na previsão da norma, sustentando em alguns casos dependências que a sociedade não deve subsidiar, como o álcool, a droga ou a ociosidade.
2 - Tudo isto por força de um regime apressadamente aprovado, que enferma de inúmeras lacunas e fragilidades e é permeável à fraude. Assim, esta medida, muitas vezes, acaba por não ajudar famílias em situação de carência, o seu objectivo principal, mas, ao invés, promove e intensifica a carência em que algumas se encontram, dotando-as de meios de sustentabilidade de comportamentos que são a causa da mesma. Em outros casos aplica-se a famílias que, não necessitando daquela prestação social, são por ela abrangidas pelo recurso a falsas declarações, excluindo outras que, de facto, carecem daquela medida.
3 - Recentemente um órgão de fiscalização do Estado democrático, merecedor da maior credibilidade, elaborou um relatório em forma de recomendação que procede ao estudo intensivo da aplicação prática do sistema. Neste relatório o Tribunal de Contas chega a algumas conclusões preocupantes e que justificam a situação descrita. Com efeito, quando aos candidatos basta a apresentação do pedido de autorização de residência para comprovar que residem em Portugal; ou o recibo de entrega do requerimento de candidatura ao rendimento mínimo garantido para efeitos de isenção de propinas; ou quando os técnicos das comissões locais de acompanhamento e do serviço social local parecem não ser suficientes ou não estar organizados para conhecer, sequer, a morada dos beneficiários para efeitos de fiscalização; ou quando a grande maioria dos centros regionais de segurança social desconhecem com rigor o número de pagamentos indevidos e das reposições efectuadas; ou quando apenas 10% dos titulares do rendimento mínimo garantido que recebem o subsídio, estando aptos para trabalhar, frequentam acções de formação profissional; e, acima de tudo, quando o número de novos beneficiários é em muito superior ao número de beneficiários que, por força dos programas de inserção, são dele excluídos, fácil será de concluir que a medida está longe de promover um efectivo, duradouro e eficaz combate à pobreza e exclusão social.
4 - Acresce que um número considerável de beneficiários estão compreendidos na faixa etária dos 18 aos 35 anos, correndo-se o risco de incentivar a falta de inserção social e prolongar um estado de carência que, em alguns casos, mais do que resultante de um qualquer desarranjo estrutural do agregado familiar, resulta de uma escassa cultura de responsabilidade individual. A comprovar isto mesmo verifica-se que, em Dezembro de 1998, cerca de trezentos e cinco mil beneficiários não estavam em condições de serem reinseridos profissionalmente e que, dos restantes cento e sessenta mil, apenas quinze mil se encontravam em condições de frequentar acções de formação profissional, o que representa uma média de reinserção de apenas 5%.
5 - A contratação de pessoal com vínculo precário para a melhoria dos mecanismos de controlo das prestações e acompanhamento mais próximo dos respectivos beneficiários, medida recentemente tomada pelo Governo, por si só não é susceptível de reformar um sistema que tem demonstrado padecer de inúmeras lacunas, que, não sendo corrigidas, podem levar à própria crise da ideia de rendimento mínimo garantido.
6 - O CDS-PP tem assumido um papel activo no combate à pobreza, procurando vencer as suas causas e não apenas minorar os seus efeitos. Para tal tem vindo a propor novos meios de combate à pobreza, denunciando situações e exigindo do Governo a adopção de medidas concretas que representem a efectiva melhoria das condições de vida dos portugueses, nomeadamente daqueles que mais carecidos estão e que se situam na terceira idade, cujos sistemas de reforma são, na maioria dos casos, profundamente injustos.
7 - Nesta matéria três divergências doutrinárias de fundo separam o modelo democrata cristão que preconizamos e o modelo inspirador do rendimento mínimo garantido de natureza socialista:
- Nós entendemos que o eficaz combate à pobreza deverá incidir no aumento das pensões como forma de recompensa por vidas de trabalho, de forma a estimular todos os portugueses a trabalhar em prol do País, na certeza de que terão a devida retribuição no fim das sua carreiras. O rendimento mínimo garantido traduz-se na criação de uma medida que, nuns casos, ajuda famílias contra a pobreza, noutros subsidia a ociosidade. E por isso mesmo, reforçando a natureza transitória do sistema e o incentivo à responsabilidade individual, propõe-se a alteração da denominação para "rendimento social mínimo";
- Nós encaramos qualquer subsídio estatal de carácter social como um investimento que tem por objectivo, para os abrangidos, o acesso a melhores condições de vida com base no seu esforço e numa verdadeira ajuda aos mais pobres. O rendimento mínimo garantido tem criado um ciclo vicioso em que o Estado se limita a acompanhar as circunstâncias, sem cuidar de prever a sua evolução e incentivar os resultados que, na lei, se propõe;
- Nós pensamos que qualquer prestação social que sai do bolso do contribuinte terá de ser transparente e rigorosamente investigada. A aplicação do rendimento mínimo garantido tem sido demasiado permeável à fraude e ao abuso, que, em si mesmos, constituem verdadeiras ofensas a quem trabalha e a quem é verdadeiramente pobre. Verifica-se que, no Orçamento do Estado, a verba inscrita para esta medida é de cerca de 57,5 milhões de contos, o que representa um acréscimo sistemático em relação à verba destinada para o mesmo efeito no ano anterior. Por outro lado, o aumento descontrolado deste medida acentua o já notório "florescimento" de uma economia paralela por parte de um sector dos subsidiados.
8 - Ressalvamos o lado generoso que esta medida detém enquanto forma de promoção da dignidade humana e proclamação do princípio da equidade social pelo qual se devem tratar igualmente situações iguais e desigualmente

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situações desiguais. Mas reconhecendo a tradicional incapacidade administrativa e a impossibilidade de os técnicos de serviço social, nomeadamente nos grandes centros urbanos, por si só procederem a uma efectiva fiscalização da aplicação da medida, e procurando salvaguardar o rigor e a transparência necessários, o CDS-PP, na esteira de uma das conclusões do relatório do Tribunal de Contas que recomendava a alteração da lei, apresenta um conjunto de alterações ao regime do rendimento mínimo garantido previsto no Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, e que se podem agrupar em três fundamentos:

a) Criação de um sistema mais transparente, de modo a que só as famílias e os cidadãos que realmente careçam da prestação sejam por ela abrangidos. Nestes termos o CDS-PP propõe o fim da renovação automática das prestações daqueles que dela beneficiam, exigindo, para que possa ser renovada, a renovação anual da prova da carência dos titulares. Por outro lado, e procurando credibilizar o sistema de forma a conferir a esta medida um carácter de emergência e não assumir a natureza de um "estilo de vida", prevê-se um aumento da idade mínima de acesso para os 25 anos de idade, à semelhança do que ocorre em Espanha e em França, países com uma cultura próxima da nossa. Evita-se, assim, que o rendimento mínimo possa também servir de meio de incentivo à desresponsabilização individual. Conscientes das dificuldades das mães solteiras, e procurando o combate eficaz à falta de planeamento familiar, mantém-se o sistema em vigor para os beneficiários que tenham menores a seu cargo. Por fim, procura-se individualizar e concretizar o sistema de forma a atender às reais necessidades dos portugueses que se encontram em estado de carência e que, de acordo com o relatório apresentado pelo Tribunal de Contas, se encontram, na sua maioria, na faixa etária superior aos 65 anos. É certo que hoje a pobreza, mais do que aspectos quantitativos, assume variantes qualitativas e, neste contexto, prevê-se uma discriminação positiva em favor dos portadores de deficiência física e dos mais idosos que, pelas sua condições pessoais, necessitam de maiores meios de sustento para fazer face às suas necessidades quotidianas. Para tal, podem beneficiar de um aumento que poderá acrescer à prestação calculada de acordo com o critério legal, até 5 % do valor do mesmo, fixado para cada membro do agregado familiar do titular da prestação, desde que não beneficiem de outra contribuição social do regime não contributivo.
b) Criação de um sistema mais rigoroso e eficaz no combate à fraude. O rendimento mínimo garantido tem a sua base de sustentabilidade no Orçamento do Estado, para o qual todos nós contribuímos. A ideia de cada um de nós contribuir para fazer face a quem pouco ou nada tem é solidária e merece o consenso da sociedade portuguesa. A ideia de que tal contribuição sirva também para financiar actos ilícitos e para aumentar os rendimentos de quem não carece efectivamente é um ultraje à pobreza e, certamente, merecerá da parte de todos nós o mais veemente repúdio. Neste contexto, o presente diploma prevê um agravamento das penalidades pela realização de falsas declarações na instrução do processo de concessão, e reforça a obrigatoriedade de realização efectiva dos programas de inserção. No primeiro caso impedindo, pura e simplesmente, o infractor de nova candidatura ao rendimento social mínimo; no segundo prevê-se a inibição de reintegrar a prestação num prazo de 12 meses. Por último, cria-se a possibilidade de a prestação, até ao valor máximo de 50%, ser recebida através do sistema de vales sociais, como forma de financiamento de despesas fixas e determináveis do titular, como a saúde, a habitação ou a educação, de forma a garantir que o montante da prestação é efectivamente canalizado para a melhoria das condições de vida de quem dela beneficia - isto sem embargo do acréscimo à prestação para despesas de habitação ou alojamento que a actual lei já prevê.
c) Criação de um sistema de responsabilização do Governo na organização e execução da medida, promovendo a fiscalização do órgão de soberania eleito democraticamente e que representa o povo português, e impedindo o recurso corrente pelo Governo a uma medida que, necessariamente, deve assumir um carácter extraordinário. Para a consecução do primeiro objectivo prevê-se a realização de um sorteio anual obrigatório para efeitos de fiscalização do cumprimento da lei e um reforço da articulação entre os serviços do regime e os de acção social, através da realização do cruzamento automático de ficheiros entre os titulares do rendimento mínimo e outras prestações sociais existentes anteriormente à criação do rendimento mínimo.
Com vista ao segundo dos objectivos enunciados prevê-se a obrigatoriedade da Comissão Nacional do Rendimento Mínimo elaborar um relatório anual que será entregue em anexo ao Orçamento do Estado, onde faculta à Assembleia da República números relativos aos montantes das reposições, pagamentos indevidos, indeferimentos, fiscalizações e distribuição etária e regional do rendimento social mínimo e taxa de incumprimento dos programas de inserção e de empregabilidade dos titulares.
Por último, relativamente ao terceiro objectivo enunciado, propomos um relação legal obrigatória entre a taxa anual de crescimento do número de titulares do rendimento social mínimo e a taxa de crescimento do desemprego no ano correspondente. Neste contexto, reforçando o carácter transitório da medida, caso se verifique um decréscimo na taxa de desemprego, o número total de beneficiários não poderá aumentar.
São estas as ideias bases do projecto lei que ora se apresenta e sintetiza a posição do CDS-PP quanto a este tema - transparência, rigor, eficácia e responsabilização -, tanto mais que se trata de uma medida de política social dotada de enorme irreversibilidade política e que importa uma grande reflexão prévia pelo poder político. E para que estas características saiam reforçadas e reafirmar o carácter excepcional e transitório da medida propomos a alteração da designação de rendimento mínimo garantido para a de rendimento social mínimo. Esta modificação da designação, para além de corresponder à verdadeira essência desta prestação,

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procede à necessária clarificação do objectivo de ajudar a vencer a pobreza.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do CDS-PP apresenta o seguinte projecto de lei de alteração do regime do rendimento mínimo garantido, que passa a designar-se por "rendimento social mínimo":

Artigo 1.º
(Norma revogatória)

Pelo presente diploma são alterados os artigos 1.º, 2.º, 4.º, 5.º, 7.º, 8.º, 13.º, 18.º e 19.º do Decreto Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, que passam a ter a seguinte redacção:

"Artigo 1.º
(...)

1 - ( anterior corpo do artigo)
2 - A prestação a que se refere o número anterior, designada por prestação de rendimento social mínimo, tem natureza pecuniária, montante variável e carácter temporário.

Artigo 2.º
(Limites)

1 - O número de novos beneficiários a abranger em cada ano por esta prestação não pode ser superior à taxa anual de crescimento do desemprego publicada pelo Governo.
2 - No caso de a taxa anual de desemprego registar um decréscimo em caso algum o número total beneficiários do rendimento social mínimo pode aumentar.

Artigo 4.º
(...)

São titulares do direito à prestação de rendimento social mínimo os indivíduos com idade igual ou superior a 25 anos, ou inferior, se tiverem menores na exclusiva dependência económica do seu agregado familiar, desde que satisfaçam as restantes condições estabelecidas na presente lei.

Artigo 5.º
(...)

1 - A atribuição da prestação de rendimento social mínimo depende da satisfação cumulativa das seguintes condições.

a) (mantém-se)
b) (mantém-se)
c) (mantém-se)
d) (mantém-se)
e) (mantém-se)

2 - São definidas por decreto regulamentar as regras para atribuição da prestação de rendimento social mínimo, nos casos em que, no mesmo agregado familiar, exista mais de um membro com condições para a requerer.
3 - (mantém-se)
4 - Nos casos em que o titular da prestação de rendimento social mínimo não possa, por si, exercer o direito a que se refere a alínea d) do n.º 1 fica sub-rogada no mesmo a entidade competente para atribuição do direito àquela prestação.
5 - A realização de falsas declarações sobre os elementos exigidos pelo n.º 1 deste artigo implica a inibição de nova candidatura pelo infractor.

Artigo 7.º
(Montante da prestação do rendimento social mínimo)

1 - O montante da prestação de rendimento social mínimo é igual à diferença entre o valor do rendimento social mínimo correspondente à composição do agregado familiar, calculado nos termos do artigo seguinte, e a soma dos rendimentos daquele agregado.
2 - O montante calculado nos termos do artigo anterior poderá ser prestado em vales sociais destinados à satisfação de encargos determináveis e previsíveis dos titulares com habitação, saúde e educação, até ao limite máximo de 50% do valor total da prestação.
3 - A concessão da prestação em vales sociais prevista no número anterior será determinada na decisão a que se refere o artigo 10.º deste diploma.
4 - Sem prejuízo do previsto no número anterior, à prestação calculada nos termos deste artigo poderá acrescer um apoio especial destinado a compensar despesas de habitação ou alojamento, de acordo com o artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 196/97, de 31 de Julho.

Artigo 8.º
(Valor de rendimento social mínimo)

1 - (corpo do artigo anterior)
2 - Os montantes previstos no número anterior poderão ser acrescidos até ao máximo de 50%, caso no agregado familiar existam indivíduos portadores de deficiência física ou mental e idosos com idade superior a 65 anos, salvo se os abrangidos já beneficiarem de prestações sociais do regime não contributivo.
3 - A decisão sobre a concessão do acréscimo da prestação previsto no número anterior será determinada na decisão a que se refere o artigo 10.º deste diploma.

Artigo 13.º
(...)

1 - A prestação de rendimento social mínimo é atribuída pelo período de 12 meses, renovável mediante a apresentação pelo titular, do requerimento previsto no artigo 10.º, n.º 1, e será objecto de reavaliação pelos serviços competentes, nos termos fixados naquele artigo.
2 - (mantém-se)
3 - No caso de o titular, nos termos previstos no número anterior, não cumprir as sua obrigações constantes do programa de inserção fica impedido de apresentar nova candidatura no prazo de 12 meses a contar da data da sua cessação.
4 - Sem prejuízo do previsto no número anterior, a modificação das condições que determinaram o reconhecimento do direito à prestação implica a sua alteração ou extinção.
5 - (anterior n.º 4)

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Artigo 18.º
(...)

1 - (corpo do anterior artigo)
2 - O relatório previsto na alínea c) do número anterior constará em anexo ao Orçamento do Estado, devendo obrigatoriamente conter as seguintes indicações relativas ao ano a que se refere:

a) Número de novos beneficiários;
b) Número de beneficiários cessantes;
c) Número de prestações renovadas;
d) Número de indeferimentos de candidaturas;
e) Montante dos pagamentos indevidos;
f) Montante das reposições efectuadas;
g) Número, tipo e resultados das fiscalizações efectuadas;
h) Distribuição etária e regional dos titulares;
i) Grau de incumprimento dos contratos de inserção celebrados;
j) Taxa de empregabilidade dos titulares.

Artigo 19.º
(Competência do Ministério do Emprego e Segurança Social)

É da competência do Ministério do Emprego e Segurança Social, entre outras:

a) A promoção e divulgação da presente lei;
b) A organização e realização de todos dos procedimentos necessários à sua implementação;
c) Desenvolvimento de acções de formação dirigidas às entidades participantes no processo;
d) Criação e implementação de um sorteio anual obrigatório para efeitos de fiscalização da forma de aplicação do sistema;
e) Proceder ao cruzamento automático dos ficheiros dos titulares do rendimento mínimo e dos ficheiros dos titulares de outras prestações sociais existentes à data da entrada em vigor do rendimento mínimo;
f) Exercer as demais competências previstas neste diploma e no Decreto-Lei n.º 196/97, de 31 de Julho."

Artigo 2.º
(Entrada em vigor)

O presente diploma entra em vigor no prazo de 120 dias a contar da sua publicação, devendo o Governo no prazo máximo de 60 dias proceder à sua regulamentação.

Palácio de São Bento, 12 de Abril de 2000. Os Deputados do CDS-PP: Paulo Portas - Rosado Fernandes - Pedro Mota Soares - Fernando Alves Moreno - Herculano Gonçalves - Maria Celeste Cardona - Telmo Correia - António Pinho - Nuno Teixeira de Melo.

PROJECTO DE LEI N.º 177/VIII
CRIA A ESCOLA SUPERIOR DE COMÉRCIO E SERVIÇOS

O sector terciário, no contexto da economia dos países e no sistema de globalização, tem-se assumido cada vez mais como um motor de desenvolvimento e como a maior "instituição económica" empregadora e geradora de emprego.
Esta evidência tem manifestado, no campo da qualificação, uma especialização cada vez maior do seu conhecimento. Novos produtos e novas formas de comercialização, bem como todo o circuito dos produtos e seus fluxos financeiros, conjugada com a crescente concorrência, têm obrigado a mutações rápidas nas técnicas e processos de gestão.
Em Portugal verificou-se, na última década, um crescimento exponencial neste sector. No comércio a loja tradicional deu lugar às grandes superfícies; nas finanças o balcão de atendimento deu lugar ao conceito de serviço financeiro completo; e no turismo verificou-se uma multiplicação da tipificação de unidades, com a oferta de serviços integrados de lazer. Esta realidade, que assume na qualificação e conhecimento uma base curricular nuclear - a gestão -, reveste-se, hoje, de conceitos, formas e métodos específicos.
A realidade de crescimento e mutações no sector não foi acompanhada pela realidade curricular de ensino, e se em alguns sectores já existem escolas e curricula direccionados, no comércio e serviços em geral, como é exemplo o segmento de distribuição, esta realidade não foi acompanhada com a necessidade de conhecimentos qualificados para o sector.
Por outro lado, a falta de curricula específicos e suas escolas traduz-se num défice de massa crítica que promova e estimule o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo. Este facto não permite o melhor acompanhamento da evolução do sector, sua divulgação e perspectivas de futuro.
Por estas razões, que decorrem da própria natureza do sector e seus mercados, justifica-se a criação de uma Escola Superior de Comércio e Serviços.
Caldas da Rainha tem, no panorama nacional, uma cultura comercial de excepção. A associação comercial dos concelhos de Caldas da Rainha e Óbidos é um exemplo na liderança do processo evolutivo do sector.
Caldas da Rainha situa-se num centro geográfico de excelência. As características para o desempenho de uma escola superior, no âmbito da instituição do ensino politécnico, cujo princípio se reveste na articulação com a realidade económica e social, a região envolvente - distrito de Leiria e região Oeste -, pelas suas especificidades, assume-se como um local privilegiado de parcerias, pela sua forte componente turística, comercial e de serviços. Nestes termos, a Escola Superior de Comércio e Serviços deverá ter a sua instalação na cidade de Caldas da Rainha.
Com a instalação da Escola Superior de Comércio e Serviços nas Caldas da Rainha a sua integração será no Instituto Politécnico de Leiria. A existência de um campus universitário do Instituto Politécnico de Leiria justifica também por si a instalação na cidade de Caldas da Rainha da referida escola.
O ensino superior politécnico, pelas suas características, assume um papel insubstituível no desenvolvimento regional e nacional, contribuindo para o alargamento de acesso dos jovens e trabalhadores ao ensino superior.
Nos termos do artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 54/90, de 5 de Setembro, "As escolas superiores são centros de formação cultural e técnica de nível superior, às quais cabe ministrar a preparação para o exercício de actividades profissionais altamente qualificadas e promover o desenvolvimento das regiões em que se inserem". Por esta razão a Escola Superior de Comércio e Serviços potenciará o desenvolvimento, quer no plano regional quer no plano nacional.

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O artigo 73.º da Constituição da República Portuguesa consagra o direito de todos à educação e à cultura, e que o Estado deverá promover a democratização da educação e as demais condições para a educação realizada através da escola e outros meios formativos que contribua para o desenvolvimento da personalidade, para o progresso social e a participação democrática na vida colectiva.
O artigo 76.º da Constituição da República Portuguesa consagra o acesso à universidade e às demais instituições do ensino superior, garante a igualdade de oportunidades e a democratização do sistema de ensino, devendo ter em conta as necessidades de quadros qualificados e a elevação do nível educativo, cultural e científico do País.
Tendo em conta que o ensino técnico e profissional deve ser generalizado, é vital para a região a criação da Escola Superior de Comércio e Serviços, numa perspectiva de criar novas oportunidades, qualificar jovens e trabalhadores no sector por forma a promover o desenvolvimento económico, social e cultural.
No plano internacional, face aos novos desafios para o século XXI e fazendo jus à Declaração Universal dos Direitos do Homem nesta matéria, a criação da Escola Superior de Comércio e Serviços tenderá a promover quadros no plano nacional que concorram em igualdade com os congéneres europeus.
Deste modo, e ao abrigo das normas constitucionais e regimentais em vigor, os Deputados do Partido Socialista propõem o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
Criação

É criada a Escola Superior de Comércio e Serviços, adiante designada por Escola.

Artigo 2.º
Natureza

A Escola é uma escola de ensino politécnico.

Artigo 3.º
Integração

A Escola fica integrada no Instituto Politécnico de Leiria.

Artigo 4.º
Sede

1 - A Escola tem a sua sede na cidade de Caldas da Rainha.
2 - A Escola poderá abrir pólos noutras localidades da região de Leiria.

Artigo 5.º
Comissão instaladora

O Ministério da Educação nomeará, sob proposta do Instituto Politécnico de Leiria, a comissão instaladora da escola, no prazo de 90 dias após a publicação da presente lei.

Artigo 6.º
Disposições finais

Compete ao Ministério da Educação conceder todo o apoio técnico e financeiro para a instalação e desenvolvimento desta Escola.

Artigo 7.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor após a aprovação da Lei do Orçamento do Estado subsequente.

Assembleia da República, 6 de Abril 2000. Os Deputados do PS: João Pedro Correia - Isabel Vigia - José Miguel Medeiros - António Calvete.

PROJECTO DE LEI N.º 178/VIII
PRIVATIZAÇÃO DA RTP

Exposição de motivos

Como era de prever já há alguns anos, o modelo de serviço público de televisão realizado por uma empresa pública em sistema concorrencial faliu.
Faliu tecnicamente e faliu eticamente.
Com efeito, não só é já hoje insuportável o esforço financeiro que em espiral de crescimento se exige dos contribuintes - sem reais contrapartidas de qualquer espécie ou qualidade -, como é generalizadamente reconhecida como insustentável a manipulação política que o poder exerce sobre a televisão pública - pouco importa se directa ou indirectamente -, ao ponto de se falar não já em canal oficioso do Estado mas, antes, numa estação que é autêntica "voz do dono".
Na sequência da revisão constitucional de 1997, apresentou o PSD um projecto de lei na Assembleia da República em que o actual cenário era antecipado com clareza e onde se propunham medidas de ruptura com um modelo que perdera o seu prazo de validade.
Dizia já então o projecto do PSD "ser nossa convicção que, a não ser a vontade política a fazer esta opção (de reforma), ela acabará por ser feita, mais tarde ou mais cedo, por imposição das circunstâncias, em clima de verdadeiro 'estado de necessidade'"".
Tristemente é esse o estado que hoje se nos coloca!
Com um passivo a ultrapassar já, oficialmente, os 150 milhões de contos, encargos anuais suportados pelos contribuintes, que atingem uns espantosos 100 000 contos por dia, segundo o próprio Governo, e uma progressiva perda de credibilidade e de audiências já impossível de inverter, são verdadeiramente circunstâncias incontornáveis que apontam para a iniludível necessidade de profunda reconfiguração do modelo de serviço público de televisão.
Perante este descalabro o Governo ensaia uma fuga para a frente.
Sem coragem nem determinação em levar por diante as rupturas que se impõem, o governo socialista apresenta como solução peregrina a concentração das várias empresas do sector público da comunicação social numa única entidade.
A criação da holding Portugal Global, reunindo as empresas RTP, RDP e Lusa, é uma decisão errada, penalizadora para os contribuintes e que espelha os apetites de controlo político-partidário da comunicação social do Estado, de que o Partido Socialista tem dado tantas provas.
É uma decisão errada porque não só aumenta e consolida, em vez de reduzir, o peso do Estado na comunicação social como contraria a proibição constitucional de concentra

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ção de órgãos de comunicação social, assim afectando as garantias da liberdade e independência de informação.
É uma decisão penalizadora dos contribuintes porque junta uma empresa falida, autêntico sorvedouro de dinheiros públicos, com outras duas aparentemente equilibradas, prenunciando uma derrapagem global de todo o sector que, por ser público, será uma vez mais paga pelos impostos dos portugueses.
E é ainda uma decisão inaceitável pela descarada manipulação partidária de que se reveste, face à anunciada escolha de um Deputado e dirigente do Partido Socialista para presidir à nova empresa em acumulação com a presidência da própria televisão pública.
"À mulher de César não basta ser séria, é preciso parecê-lo" e os sinais de grosseiro e completo controlo partidário que o Governo exibe sobre a comunicação social, paga a peso de ouro pelos impostos dos portugueses, não pode deixar de merecer a denúncia e a revolta do PSD.
O Estado tem muito mais a fazer do que ser empresário ou programador de televisão.
Serviço público de televisão é, hoje e cada vez mais no futuro, algo que não tem a ver, apenas ou exclusivamente, com a propriedade ou a gestão das estações de televisão.
O serviço público de televisão também pode e deve ser exercido por privados, mediante a observância de regras previamente definidas pelo Estado ou mediante formas de concessão a consagrar por lei.
Esta é uma opção que tem a ver com a racionalidade do investimento público, o controlo da despesa e, as prioridades de financiamento.
Continuar tudo como está é condenar os portugueses a ver desviados ou até aumentados os seus impostos para sustentar um exorbitante custo, cada vez mais difícil de justificar.
Manter o Estado como operador de televisão, em concorrência, é persistir injustificadamente numa opção que está hoje ultrapassada e cujos resultados desastrosamente desaconselham.
Mais: é fazer com que o Estado introduza no mercado enormes factores de distorção e de concorrência menos correcta ou leal, sem que aos olhos dos cidadãos fique minimamente evidente qual a contrapartida de serviço público que daí se retira.
A todas estas razões acresce ainda o permanente jogo de acusações e contra-acusações que se fazem quanto à dependência da RTP em relação ao poder político.
Com base em todos estes fundamentos o presente projecto de lei aponta para a vantagem, a conveniência e a inevitabilidade da privatização do Canal 1 da RTP.
Julgamos que a proposta ora formulada revela inúmeras vantagens para todos os intervenientes:

a) Para o Estado:
- Porque vê o seu papel clarificado;
- Porque passa de proprietário concorrente, com todas as implicações negativas, a dinamizador do mercado;
- Porque torna o panorama audiovisual mais transparente;
- Porque acaba com as acusações de ingerência e práticas de manipulação e controlo político;
- Porque deixa de sobrecarregar, de forma inaceitável como hoje sucede, o erário público e o bolso dos contribuintes;
- Porque passa a investir, de facto, no apoio à cultura e produção nacional, em vez de se limitar a financiar custos de uma empresa pública;
- Porque se propõe oferecer a todos os operadores oportunidades iguais.

b) Para os operadores de televisão:
- Porque se acaba com as distorções provocadas à livre concorrência pelos apoios do Estado à RTP;
- Porque todos podem aceder a relevantes apoios visando a produção de programas portugueses de qualidade;
- Porque, na prática, tal possibilidade é uma ajuda inestimável e um contributo financeiro significativo para a elaboração de grelhas de programas qualitativamente melhoradas;
- Porque todos podem contribuir para um projecto nacional que ultrapassa as fronteiras territoriais;
- Porque podem, porventura, apostar em projectos de outro fôlego e outra qualidade.

c) Para a produção independente:
- Porque pode ajudar a criar condições mais favoráveis para o sector da produção independente;
- Porque liberta meios financeiros que se traduzam num incentivo às estações de televisão para fazerem encomendas ao mercado;
- Porque alarga os horizontes da criatividade;
- Porque oferece novas oportunidades, em condições de estabilidade, a autores, actores e, em geral, a todos os profissionais do sector audiovisual;
- Porque um mercado que se estrutura sem vícios é um mercado que pode aspirar a voos mais altos no plano internacional, nomeadamente em matéria de co-produções.
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PSD, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º

1 - O Governo procederá à privatização, por concurso público, do Canal 1 da Radiotelevisão Portuguesa, SA, (RTP), para tanto promovendo a desafectação de meios humanos, materiais e patrimoniais necessários ao funcionamento daquele canal como entidade autónoma.
2 - A existência e o funcionamento do serviço público de televisão são assegurados pelo Estado, nos termos e pelas formas estabelecidas na presente lei.

Artigo 2.º

1 - O serviço público de televisão é assegurado e realizado:

a) Através de um canal público, de acesso não condicionado, em língua portuguesa e sem publicidade, com uma programação assente na produção nacional, que inclua a cobertura imparcial da informação e cujos vários conteúdos estejam ao serviço da formação cívica em geral, da educação e da cultura;

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b) Através dos operadores legalmente habilitados ao exercício da actividade de televisão de cobertura nacional, de acordo com o regime de contratos-programa definido nos termos do presente diploma.

2 - Nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira o Estado assegura a existência de emissões regionais, de acesso não condicionado, baseadas em centros de produção próprios, às quais é disponibilizada a transmissão da programação obtida segundo os critérios definidos no número anterior.
3 - Compete, ainda, ao Estado assegurar a difusão de emissões internacionais, não codificadas, especialmente destinadas ao cumprimento das obrigações de ligação às comunidades portuguesas no estrangeiro e à cobertura do espaço lusófono.
4 - As emissões internacionais devem incluir programação relacionada com actividades desenvolvidas pelas diversas comunidades a que se dirigem.

Artigo 3.º

1 - Os contratos-programa a celebrar entre o Estado e cada um dos operadores de televisão referidos no artigo anterior estabelecem um caderno de encargos, discriminando a tipologia dos programas a produzir e a emitir, a sua duração e o espaço horário em que deverão ser inseridos nas grelhas diárias e semanais de programação.
2 - Para os efeitos do disposto no número anterior são preferencialmente utilizados os horários diários entre as 19 e as 24 horas, nos dias úteis, e entre as 16 e as 24 horas, nos fins-de-semana a feriados.
3 - Os contratos-programa incluem as regras de transmissão dos direitos de antena.

Artigo 4.º

1 - Os custos de difusão das emissões internacionais, referidas no artigo 2.º, são suportados pelo Estado.
2 - Os contratos-programa podem estabelecer formas de os operadores contribuirem com meios operacionais e humanos para a difusão das emissões referidas no número anterior.

Artigo 5.º

1 - É instituído o Conselho do Serviço Público de Televisão, o qual será presidido por um magistrado judicial designado pelo Conselho Superior da Magistratura e integrado por quatro cidadãos, de reconhecida idoneidade e competência, designados pela Assembleia da República, sendo cada um deles propostos por cada um dos quatro partidos mais representados ou, em caso de igualdade, mais votados.
2 - Compete a este Conselho a definição dos cadernos de encargos e a negociação e aprovação dos contratos-programa a celebrar com os operadores privados, bem como a verificação do cumprimento do contratado em relação aos produtos televisivos obtidos.

Artigo 6.º

Os encargos com o serviço público de televisão são suportados pelo Orçamento do Estado, através de verba nele anualmente inscrita, sem prejuízo de um desejável planeamento plurianual dos meios e projectos a mobilizar.

Artigo 7.º

O Governo aprovará, por decreto-lei, as normas necessárias à execução do presente diploma, nomeadamente quanto ao processo de desafectação e privatização do Canal 1 da RTP.

Artigo 8.º

Até à concretização da privatização referida no artigo 1º, o serviço público de televisão continuará a ser assegurado pela RTP, sem prejuízo da designação, no espaço de 90 dias, do Conselho para o Serviço Público de Televisão, por forma a ser preparada a adequada transição para o novo regime.

Artigo 9.º

É revogado o artigo 48.º da Lei n.º 31-A/98, de 14 de Julho (Lei da Televisão), com efeitos a partir da data da tomada de posse do Conselho do Serviço Público de Televisão.

Palácio de São Bento, 12 de Abril de 2000. Os Deputados do PSD: António Capucho - Miguel Macedo - Luís Marques Guedes - Carlos Encarnação - Manuela Ferreira Leite - Fernando Seara.

Despacho n.º 45/VIII, de admissibilidade do projecto de lei

O artigo 1.º do projecto de lei em apreço contém uma injunção dirigida ao Governo no sentido de proceder à privatização , por concurso público do Canal 1 da Radiotelevisão Portuguesa, SA, complementada, no artigo 7.º, pela "obrigação de aprovar as normas regulamentares necessárias à sua concretização".
Admito, assim, o presente projecto de lei no pressuposto de que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, os referidos preceitos não têm a virtualidade constitucional de vincular juridicamente o Governo.
A ver a luz do dia como lei o seu alcance será meramente político, só susceptível de apreciação no quadro da responsabilidade política do Governo perante a Assembleia da República.
À 1.º Comissão.
Registe-se, notifique-se e publique-se.

Palácio de São Bento, 17 de Abril de 2000. O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.

PROJECTO DE LEI N.º 179/VIII
ELEVAÇÃO DE ROSSAS, NO MUNICÍPIO DE VIEIRA DO MINHO, À CATEGORIA DE VILA

Exposição de motivos

A freguesia de Rossas, localidade pertencente ao município de Vieira do Minho, foi, até 1836, sede de concelho, a quem D. Manuel concedeu foral em 23 de Outubro de 1514.
Com uma área de 3239 km2, Rossas é a maior freguesia do concelho de Vieira do Minho e uma das maiores do distrito de Braga.
Nesta importante freguesia, que é considerada o segundo pólo urbano do concelho, a seguir à sede, confluem duas estradas nacionais: a EN 205, que liga esta localidade aos concelhos de Cabeceiras de Basto e a Braga, e a EN 304, via de ligação de Rossas à sede do concelho.
Localizando-se a 11 Km a sudeste da sede do concelho, esta freguesia faz fronteira com os concelhos vizinhos de Cabeceiras de Basto, Fafe, Póvoa de Lanhoso e Montalegre.
Situa-se a 17 Km da cidade de Fafe, a 15 Km de Cabeceiras de Basto, a 20 Km da Póvoa de Lanhoso e a 36 Km da capital do distrito.

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Em temos históricos, esta freguesia, que, como já referimos, foi sede de concelho, é mencionada em documentos de 1014. Em manuscritos de 1195 fala-se de um mosteiro ali existente. As inquirições de 1220 incluem Rossas na Terra de Lanhoso, parte da área desta freguesia era Couto.
A sede do concelho é instituída em 1514, e do passado desta freguesia constitui referência importante o seu Pelourinho, classificado como monumento nacional, e alguns solares, que, pela sua importância, são um testemunho vivo de uma época da nossa História.
Em 1839 Rossas aparece no concelho de Guimarães e, finalmente, em 1852 no de Vieira do Minho.
Esta localidade foi Abadia da apresentação dos Abreus, senhores de Regalados, e cabeça do antigo concelho de Rossas, cuja sede era Celeirô.
Com uma população residente de 3300 habitantes, que nos meses de Verão aumenta para mais de metade, as principais actividades económicas desta freguesia, considerada de transição entre o litoral e o interior do País, ligam-se fundamentalmente à agricultura, à pecuária, à construção civil, ao comércio e serviços.
Com excelentes potencialidades para o turismo em espaço rural, esta freguesia tem beneficiado da aposta efectuada pela autarquia neste sector, possuindo um conjunto de infra-estruturas na área do acolhimento, particularmente na aldeia turística de Agra, recentemente revitalizada.
Rossas conheceu ao longo do século XX, particularmente no período pós 25 de Abril de 1974, um desenvolvimento urbano significativo, decorrente do facto desta localidade ser uma zona de confluência de duas estradas nacionais, o que facilita a circulação de produtos e mercadorias, fundamentais para o seu desenvolvimento económico e social, bem como para a melhoria das condições de vida dos seus habitantes.
A população desta localidade é servida por uma boa rede de transportes públicos, que diariamente e em horários intercalares, estabelece uma ligação efectiva com a sede do concelho, com a capital do distrito, bem como com os concelhos vizinhos de Cabeceiras de Basto, Póvoa de Lanhoso e Fafe.
Esta freguesia possui alguns imóveis de grande interesse patrimonial e arquitectónico, classificados no âmbito do Plano Director Municipal, que constituem referências culturais a preservar, de que são exemplo a Igreja Paroquial de Rossas, datada de 1725, o Pelourinho, as Capelas de Santa Marta, São Frutuoso e São Brás, as Pontes de Parada, São Pedro e Candosa; um conjunto de moinhos de interesse etnográfico e histórico, bem como as Alminhas existentes em vários lugares da localidade.
Embora o crescimento democrático seja significativo, é sobretudo a dinâmica sócio-económica que caracteriza esta freguesia.
Acompanhando esta dinâmica surgem importantes equipamentos e actividades de comércio e serviços, que contribuem para a satisfação das principais necessidades da população, e são o principal contributo para a afirmação da sua visível centralidade.
Rossas possui as seguintes instituições e equipamentos colectivos:
Na área administrativa:
- Uma sede de junta de freguesia, onde se encontra instalado o Projecto de Desenvolvimento Integrado e Luta contra a Pobreza.
Na área da segurança:
- Um posto da Guarda Nacional Republicana.
Na área de apoio à saúde:
- Extensão de Saúde de Rossas, dotada com três médicos permanentes;
- Uma farmácia;
- Laboratório de análises clínicas;
- Uma clínica dentária.
Na área de educação e cultura:
- Uma biblioteca pública;
- Seis escolas do 1.º ciclo do ensino básico;
- Escola básica mediatizada (2.º ciclo);
- Um jardim de infância.
- Um pavilhão desportivo;
- Um campo de futebol.
Na área social:
- Centro Social e Paroquial do Divino Salvador de Rossas e Centro Social e Paroquial de São Lourenço de Agra, instituições de carácter social, que prestam apoio ao domicílio a 55 cidadãos das duas localidades.
- Núcleo de Rossas da Cruz Vermelha Portuguesa, instituição que possui uma corporação de 30 voluntários, desempenhando um importante papel na área de primeiros socorros.
Na área associativa:
- Clube Cultural e Recreativo de Rossas;
- Associação de Defesa dos Interesses de Rossas (ADIR).
Na área do desenvolvimento económico, comércio e serviços:
- Feira Quinzenal de Rossas;
- Posto dos CTT;
- Uma central da Telecom;
- Três praias fluviais, uma das quais equipada com tele-ski, localizada na albufeira de Ermal;
- Um aldeamento turístico;
- Uma agência bancária;
- Quatro restaurantes;
- Uma residencial;
- Vários mini-mercados e mercearias;
- Três talhos;
- Uma peixaria;
- Vários cafés.
Nestes termos, e tendo em conta o estipulado na Lei n.º 11/82, de 2 de Junho, bem como razões de ordem histórica (alínea b do artigo 3.º da citada lei), a povoação de Rossas reúne condições efectivas para ser elevada à categoria de vila.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo único

É elevada à categoria de vila a povoação de Rossas, situada na área do município de Vieira do Minho.

Palácio de São Bento, 13 de Abril de 2000. Os Deputados do PS: Luís Miguel Teixeira - Laurentino Dias - Artur Penedos - mais uma assinatura ilegível.

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PROJECTO DE LEI N.º 180/VIII
PRIVATIZAÇÃO DO NOTARIADO

Exposição de motivos

O notariado português começou por ser privado. Foi Oliveira Salazar que o "nacionalizou". Com o projecto de lei do PSD visa-se regressar à sua matriz original - notariado privado -, que é, aliás, a dominante nos países desenvolvidos da Europa e, de forma particular, nos países latinos.
O objectivo geral do projecto de lei do PSD visa criar condições para assegurar um melhor serviço de notariado e serviço em tempo, que responda com eficácia às necessidades dos cidadãos e das empresas.
Hoje, um dos sectores onde as pessoas e as empresas sentem maior burocracia é justamente na área do notariado, fruto do regime de monopólio existente.
A grande alteração que a privatização que se propõe vai operar, fomentando e estimulando uma concorrência saudável e com regras bem definidas, é indiscutivelmente na maior celeridade e eficácia na resposta às pessoas e às empresas, sem colocar em causa a legalidade e a validade dos actos.
O projecto de lei do PSD visa responder, de forma clara, às necessidades dos cidadãos portugueses que procuram nos notários, com desejável celeridade, a realização de diversos actos e contratos.
Hoje esta é das maiores dores de cabeça para os cidadãos na sua relação com o Estado - os atrasos, a burocracia inútil suscitam a natural irritação das pessoas e em nada abonam a imagem do Estado e dos seus funcionários.
O regime monopolista existente concorre para todos estes vícios, que, em regime concorrencial, tenderão a desaparecer.
Trata-se também de evitar que o investimento estrangeiro que encontrar boas condições para procurar o nosso país não seja dissuadido por razões de lentidão burocrática e processual.
O projecto de lei do PSD contribui, assim, também para o desenvolvimento económico e o aumento da competitividade do nosso país.
Hoje são os grandes investidores estrangeiros quem mais se queixa do funcionamento dos notários. Portugal perde, assim, na competição com outros países da Europa, designadamente a Espanha. Nos inquéritos que habitualmente são feitos às dificuldades dos investidores estrangeiros este é, por regra, o obstáculo mais apontado, porventura mais do que a lentidão dos tribunais.
O projecto de lei do PSD tem em conta a natureza própria da função notarial.
Privatizar os notários não significa proporcionar uma concorrência desregrada.
Os notários são delegatários da fé pública, o que obriga a rigor na definição das condições que permitam o exercício da função e regras para o seu exercício.
Passa a caber ao Estado apenas uma função reguladora e inspectiva que salvaguarde o interesse dos consumidores dos serviços notariais.
A par da fiscalização a cargo das partes - designadamente nos actos contratuais -, o Estado exercerá a sua função pública de fiscalização e inspecção.
Em conclusão, há duas formas possíveis de estruturar os serviços de notariado:

a) Em regime de monopólio público, como actualmente existe;
b) Em regime concorrencial aberto, com mera fiscalização por parte do Estado.

A primeira das soluções pode garantir receitas ao Estado, mas é penalizadora para os cidadãos e as empresas e o custo para o País, em atrasos, em burocracia e em falta de competitividade, é demasiado elevado para poder ser mantido por mais tempo.
A segunda solução - que em Portugal, pela primeira vez, será protagonizada pelo PSD - responde aos desafios dos dias de hoje e constituirá uma reforma estrutural no domínio da justiça portuguesa.
Importa recordar que quase no fim da legislatura anterior - mais precisamente em 26 de Maio de 1999 - o Governo apresentou na Assembleia da República a proposta de lei n.º 285/VII (Aprova o estatuto do notariado).
O Ministro da Justiça sabia, ao apresentar esse diploma, naquela data, que não ia a tempo de viabilizar a sua aprovação.
É, por isso, legítimo supor que o governo do Partido Socialista atrasou intencionalmente o envio daquela iniciativa legislativa por forma a conseguir alcançar dois objectivos políticos a saber:

a) Cumprir, formalmente, o Programa do Governo;
b) Fazê-lo por forma a que fosse materialmente impossível a sua discussão e aprovação, como veio a suceder.

O Governo actual, nesta matéria, parece ter adoptado uma postura diferente do seu antecessor.
O Programa do XIV Governo Constitucional consagra, na área dos registos e notariado, a necessidade de proceder à modernização do "sistema a partir da sua integral informatização, dando-se prioridade à instalação do sistema nacional que possibilite o acesso de todos os cidadãos aos serviços, em condições de celeridade e atendimento adequadas", pormenorizando tal objectivo com projectadas medidas que nada têm a ver com a privatização do notariado.
Ou seja, mais uma vez o Governo evita assumir uma reforma que já defendeu e refugia-se em medidas avulsas que não podem nunca suprir as necessárias alterações do sistema vigente.
Assim, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, apresentam o seguinte projecto de lei:

Capítulo I
Disposições gerais

Artigo 1.º
(Notário)

O notário é o oficial público e profissional liberal encarregado de receber, interpretar e dar forma legal à vontade das partes, redigindo os instrumentos adequados a esse fim e conferindo-lhes fé pública, assegurando-lhes a respectiva conservação, força probatória e força executiva, e praticando os demais actos específicos da função notarial.

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Artigo 2.º
(Função notarial)

1 - A função notarial é exercida exclusivamente por notários, em nome próprio e sob sua responsabilidade, com independência e imparcialidade.
2 - A função notarial reveste, incindivelmente, natureza pública e privada:

a) A natureza pública consiste na garantia da autenticidade dos documentos a que a lei reconhece fé pública e força executiva;
b) A natureza privada corresponde à prestação da assessoria.

3 - O notário é determinado por livre escolha dos interessados e actua a instância da parte, não podendo recusar o seu ministério, salvo nos casos previstos na lei.
4 - Mantêm-se em vigor as disposições aplicáveis aos notários privativos.

Artigo 3.º
(Numerus clausus)

1 - O exercício da função notarial está sujeito ao princípio do numerus clusus.
2 - O número e a sede dos cartórios são determinados em função da população servida, do volume de tráfico jurídico e da facilidade de deslocação entre as localidades, em termos a regulamentar pelo Governo.

Artigo 4.º
(Competência territorial)

O notário exerce a sua actividade dentro dos limites do concelho a que pertence a sua sede.

Capítulo II
Direitos, deveres, incompatibilidades e impedimentos

Secção I

Artigo 5.º
(Prerrogativas)

1 - O notário tem direito a usar selo branco, enquanto símbolo da fé pública delegada, que deve representar, em relevo, o escudo da República Portuguesa, enquadrado pelo nome do notário e pela identificação do respectivo cartório.
2 - O notário tem também direito a usar placa, que identifique a localização do cartório e a identidade do seu titular.

Artigo 6.º
(Remuneração dos actos)

Pelos actos notariais praticados no exercício da sua função, o notário cobra um valor fixado em tabela a aprovar pelo Governo, ouvido o Conselho Superior do Notariado.

Artigo 7.º
(Honorários)

Sempre que à assessoria prestada nos termos do presente estatuto não corresponda a prática de um acto notarial, são cobrados honorários de acordo com os seguintes critérios:

a) Moderação;
b) Dificuldade do assunto;
c) Tempo gasto;
d) Importância do serviço prestado;
e) Posses dos interessados;
f) Adequação ao contexto sócio-económico da área do cartório notarial.

Secção II

Artigo 8.º
(Dever de deontologia)

1 - O notário deve exercer a sua actividade de modo a garantir a dignidade e o prestígio da função e da classe.
2 - O notário deve abster-se de práticas de concorrência desleal.

Artigo 9.º
(Dever de segredo)

1 - O notário está sujeito a segredo profissional em relação a todos os factos de que tome conhecimento no exercício e por causa da sua função, sem prejuízo da publicidade dos actos que devam ser tomados públicos.
2 - Estão também vinculados ao dever de sigilo, nos termos do número anterior, os funcionários do cartório notarial e os intervenientes acidentais.

Artigo 10.º
(Dever de direcção)

Ao notário compete dirigir o serviço e assistir pessoalmente ao funcionamento do cartório notarial.

Artigo 11.º
(Dever de assessoria)

A prestação de assessoria pressupõe o pedido expresso dos interessados e implica o aconselhamento, a recolha, interpretação e conformação da vontade das partes para a prática do acto notarial, a obtenção dos documentos necessários à sua celebração e a prática das diligências que lhe sejam anteriores ou posteriores, indispensáveis à legalização da situação jurídica subjacente.

Artigo 12.º
(Prestação de garantias)

1 - Antes de iniciar o exercício das suas funções, o notário deve fazer um seguro e prestar uma caução.
2 - O seguro destina-se a indemnizar prejuízos causados pelo notário no exercício das suas funções.
3 - A caução visa garantir o pagamento das quantias cobradas pelo notário e devidas ao Estado e, bem assim, das taxas e multas devidas ao Conselho Superior do Notariado.
4 - As modalidades da caução, os termos e forma da sua prestação e o respectivo montante são definidos pelo Governo, ouvido o Conselho Superior do Notariado.

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Artigo 13.º
(Dever de inscrição)

É obrigatória a inscrição no Conselho Superior do Notariado.

Secção III
Incompatibilidades e Impedimentos

Artigo 14.º
(Âmbito das incompatibilidades)

O exercício da função notarial é incompatível com as actividades ou funções que diminuam a independência e a imparcialidade da profissão.

Artigo 15.º
(Enumeração das incompatibilidades)

1 - O exercício da função notarial é incompatível com as funções e actividades seguintes:

a) Titular de cargos políticos e altos cargos públicos ou equiparados, nos termos da legislação aplicável;
b) Magistrado judicial e magistrado do Ministério Público, efectivo ou substituto, e funcionário ou agente de qualquer tribunal;
c) Advogados e solicitadores em exercício e respectivos funcionários;
d) Conservador dos registos e respectivos funcionários e agentes;
e) Funcionário ou agente de quaisquer serviços públicos de natureza central, regional ou local, ainda que personalizados;
f) Membros das forças armadas ou militares no activo;
g) Mediador ou leiloeiro;
h) Quaisquer outras que por lei especial sejam consideradas incompatíveis com o exercício da função notarial.

2 - As incompatibilidades referidas no número anterior verificam-se qualquer que seja o título de designação, natureza e espécie de provimento e modo de remuneração e, em geral, qualquer que seja o regime jurídico das respectivas funções.
3 - Exceptua-se do disposto nos números anteriores o exercício de funções docentes de disciplinas de direito ou de investigação científica de natureza jurídica.
4 - As incompatibilidades não se aplicam a quantos estejam na situação de suspensão, excedente ou de aposentado.

Artigo 16.º
(Impedimentos)

1 - O notário não pode realizar actos em que sejam partes ou beneficiários, directos ou indirectos, quer ele próprio, quer o seu cônjuge ou qualquer parente ou afim, na linha recta ou em segundo grau da linha colateral.
2 - O impedimento é extensivo aos actos cujas partes ou beneficiários tenham como procurador ou representante legal alguma das pessoas referidas no número anterior.
3 - O notário pode intervir nos actos em que seja parte ou interessada uma sociedade por acções, de que ele ou as pessoas indicados no n.º 1 sejam sócios e, bem assim, nos actos em que seja parte interessada alguma pessoa colectiva de utilidade pública a cuja administração ele pertença.

Capítulo III

Secção I
Ingresso

Artigo 17.º
(Requisitos da nomeação)

São requisitos da nomeação para exercer a função notarial:

a) Ser cidadão português;
b) Estar no pleno gozo dos direitos políticos e civis;
c) Não ter sido condenado criminalmente por crime gravemente desonroso;
d) Possuir licenciatura em direito, obtida em universidade portuguesa ou reconhecida em Portugal;
e) Ter frequentado estágio e obtido aprovação em concurso realizado pelo Conselho Superior do Notariado;
f) Estar inscrito no Conselho Superior do Notariado.

Artigo 18.º
(Estágio)

1 - O estágio tem a duração de um ano e deve decorrer sob a direcção de um notário com, pelo menos, 10 anos de exercício efectivo da profissão, livremente escolhido pelo estagiário, nos termos do regulamento aprovado pelo Conselho Superior do Notariado.
2 - São admitidos a estágio com a duração de sete meses:

a) Os magistrados judiciais e os magistrados do Ministério Público com, pelo menos, três anos de actividade profissional e classificação de serviço não inferior a Bom;
b) Os advogados com, pelo menos, três anos de actividade profissional;
c) Os conservadores dos registos com, pelo menos, três anos de serviço e classificação não inferior a Bom.

Secção II
Nomeação e posse

Artigo 19.º
(Nomeação)

A nomeação dos notários compete ao Ministro da Justiça, sob proposta do Presidente do Conselho Superior do Notariado.

Artigo 20.º
(Posse)

A posse é conferida pelo Presidente do Conselho Superior do Notariado nos oito dias subsequentes à verificação

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do cumprimento das obrigações referidas no n.º 1 do artigo 18.º, devendo o empossado, na ocasião, prestar juramento e receber o selo branco.

Capítulo IV
Conselho Superior do Notariado

Secção I
Disposições gerais

Artigo 21.º
(Denominação e sede)

1 - O Conselho Superior do Notariado (CSN) tem como objecto a gestão e disciplina dos titulares da função notarial.
2 - O CSN é independente dos órgãos do Estado, sem prejuízo dos poderes atribuídos por lei ao Ministro da Justiça.
3 - O CSN é dotado de personalidade jurídica, autonomia administrativa e financeira e tem sede em Lisboa.

Artigo 22.º
(Atribuições do CSN)

Constituem atribuições do CSN:

a) Defender o Estado de direito, os direitos e garantias dos cidadãos e colaborar na administração da justiça;
b) Atribuir o título profissional de notário e de notário estagiário e regulamentar o exercício da função notarial;
c) Defender a correcta aplicação dos princípios do notariado latino, garantindo a independência e imparcialidade no exercício da função notarial;
d) Zelar pela dignidade e pelo prestígio da função notarial e promover o respeito pelos respectivos princípios deontológicos;
e) Defender os interesses, direitos e prerrogativas dos seus membros;
f) Reforçar a solidariedade entre os seus membros;
g) Assegurar as condições necessárias ao desempenho da função notarial;
h) Exercer jurisdição disciplinar exclusiva sobre os notários e notários estagiários;
i) Determinar a realização de inspecções ao exercício da função notarial;
j) Contribuir para o desenvolvimento da cultura jurídica e para o aperfeiçoamento da laboração da ciência jurídica, com direito de audição sobre os projectos de diplomas legislativos que relevem do exercício da função notarial;
l) Assegurar a representação externa, contribuindo para o reforço das ligações com organismos congéneres e similares estrangeiros;
m) Exercer as demais funções que lhe forem atribuídas por lei.

Secção II
Órgãos do Conselho Superior do Notariado

Artigo 23.º
(Órgãos do CSN)

1 - São órgãos do CSN:

a) O Presidente;
b) O Vice-presidente;
c) O Colégio Notarial;
d) O Conselho Executivo;
e) O Conselho de Inspecção;
f) O Conselho de Jurisdição.

2 - A eleição dos órgãos do CSN e respectivas competências são definidas em diploma do Governo

Capítulo V
Fiscalização da actividade notarial

Artigo 24.º
(Fiscalização do Estado)

1 - Compete ao Ministro da Justiça a fiscalização superior do exercício da actividade notarial e da sua conformidade com as normas aplicáveis, solicitando ao CSN, sempre que necessário ou conveniente, a realização de inspecções.
2 - O Ministro da Justiça pode designar um inspector que deve integrar a equipa de inspecção designada pelo CSN, sem prejuízo do disposto no regulamento de inspecção.

Artigo 25.º
(Fiscalização do Conselho Superior do Notariado)

Compete ao CSN a fiscalização normal do exercício da actividade notarial, mediante inspecções periódicas e extraordinárias.

Artigo 26.º
(Jurisdição disciplinar)

Os notários estão sujeitos à jurisdição disciplinar do CSN, nos termos do respectivo regulamento.

Capítulo VI
Disposições finais e transitórias

Artigo 27.º
(Período de transição)

1 - A transição do actual para o novo sistema de notariado deve operar-se num período de três anos.
2 - O início do período de transição é determinado pelo Governo após a regulamentação do presente estatuto, a instalação do Conselho Superior do Notariado e a entrada em vigor dos diplomas a que se referem os artigos 3.º, 6.º e 12.º.

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Artigo 28.º
(Comissão)

1 - É criada uma comissão para promover a regulamentação e elaborar os projectos de diploma a que se refere o n.º 2 do artigo anterior e, bem assim, para proceder à instalação do Conselho Superior do Notariado.
2 - A comissão é constituída por um presidente e seis vogais, nomeados por despacho do Ministro da Justiça.
3 - A regulamentação do estatuto e a elaboração dos projectos de diploma mencionados no n.º 1 devem ser concluídas nos seis meses subsequentes à nomeação dos membros da comissão.

Artigo 29.º
(Atribuições)

À Comissão incumbe, ainda, assegurar, a título transitório, a prossecução das atribuições próprias do Conselho Superior do Notariado e, especialmente:

a) Organizar e regulamentar os concursos nacionais e de primeira nomeação;
b) Lançar as bases de um sistema de protecção social complementar, com vista à institucionalização de um regime de entreajuda financeira para a classe;
c) Preparar as primeiras eleições para os órgãos do Conselho Superior do Notariado.

Artigo 30.º
(Direito de opção)

1 - Os notários e os adjuntos de notário nomeados em lugares dos serviços externos da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado podem, durante o período transitório, optar pelo novo sistema de notariado.
2 - O mesmo direito assiste aos conservadores e aos adjuntos de conservador que, nas mesmas condições, tenham tempo de serviço no notariado não inferior a dois anos.
3 - O direito de opção deve ser exercido mediante comunicação dirigida ao Director-Geral dos Registos e do Notariado, implicando a extinção da relação jurídica de emprego estabelecido entre o notário, o conservador ou o adjunto e a Administração.

Artigo 31.º
(Concurso de primeira nomeação)

A comissão deve abrir concurso de primeira nomeação no prazo de um ano após o termo do primeiro estágio.

Artigo 32.º
(Preferência)

Em todos os concursos abertos durante o período transitório, e aquando do exercício do direito de opção, os notários gozam de preferência na nomeação para qualquer lugar concursado do concelho onde, à data de abertura do concurso, se encontravam nomeados a título efectivo, ou, subsidiariamente, para qualquer lugar concursado do distrito respectivo.

Artigo 33.º
(Sociedades de notários)

A criação e o funcionamento das sociedades de notários devem ser regulados por lei especial.

Artigo 34.º
(Regulamentação)

O Governo regulamentará a presente lei no prazo de 120 dias.

Palácio de São Bento, 19 de Abril de 2000. Os Deputados do PSD. Miguel Macedo - Guilherme Silva - Luís Marques Guedes - António Montalvão Machado - António Capucho - José de Matos Correia.

PROPOSTA DE LEI N.º 22/VIII
APROVA A ORGANIZAÇÃO E ORDENAMENTO DO ENSINO SUPERIOR

1 - As razões da iniciativa política

A presente proposta de lei visa identificar e regular as bases institucionais essenciais em que deve assentar o ensino superior, a saber:
- A organização institucional, clarificando o modelo binário de ensino superior e aprofundando a natureza plural do sistema, repartido entre o ensino universitário e o ensino politécnico, garante da diversidade, da capacidade de inovação e de uma melhor resposta aos vários tipos de necessidades sociais de qualificações que a sociedade revela, e oferecendo igual dignidade a todos os subsistemas;
- A identidade dos requisitos infra-estruturais, humanos e programáticos, independentemente da natureza pública ou privada dos estabelecimentos, os quais devem ser universais, quando se trata de garantir a decisão não discricionária e não discriminatória, e apropriados, quando se trata de prosseguir programas de aprofundamento da identidade de cada subsistema ou de estabelecimentos ou cursos que já observem os objectivos gerais de qualidade;
- A compreensão da realidade contemporânea determina a adopção de um quadro simultaneamente claro, inovador e flexível, aberto à mudança;
- O sistema de ensino superior como conjunto coerente e complementar, articulando os subsistemas universitário e politécnico, público, particular e cooperativo, constitui um factor integrador obedecendo a regras e requisitos comuns;
- A rede pública como instrumento de organização do ensino superior público, que dota o Estado de um instrumento para a decisão, atento ao facto de uma instituição de ensino superior ser sempre um equipamento de hierarquia elevada, cuja instalação deve atender à justiça espacial e a uma disponibilidade de recursos que não conduza a situações marginais ou irrelevantes;

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- A valorização do ensino superior particular e cooperativo, através da equiparação de requisitos, do paralelismo institucional, da integração em sistemas comuns de avaliação e regulação, etc;
- A exigência de qualidade e relevância social do ensino superior, dado não nos encontrarmos perante uma situação em que os objectivos do crescimento e da expansão possam diminuir os da qualidade e da relevância das formações, sendo sabido que a evolução demográfica está a fazer alterar os padrões da procura de ensino superior e que as exigências da sociedade quanto à natureza das formações oferecidas são crescentes.
Pelas razões adiante expostas, esta é uma proposta de lei de bases de organização e ordenamento do ensino superior, que trata dos fundamentos do sistema de ensino superior em Portugal, e tem como objecto estabelecer os seus princípios essenciais. De organização e ordenamento, visto que é esse o seu principal objecto, assumindo que as questões substantivas relativas às finalidades do sistema de ensino superior, aos graus académicos, etc., pertencem ao foro da Lei de Bases do Sistema Educativo, as quais se dão aqui por adquiridas.
Esta proposta de lei resulta, portanto, de uma atitude de iniciativa política que põe no centro do debate público sobre o ensino superior as questões da organização, do ordenamento e dos requisitos necessários para assegurar a estabilidade institucional e a qualidade do desempenho das instituições. Esta iniciativa decorre, por um lado, da avaliação feita pelo Governo de que não estão devidamente consolidadas as relações entre os subsistemas do ensino superior; decorre, por outro, da consciência de que nem o Estado dispõe de um instrumento de macro-organização como o que o conceito de "rede pública" introduz, nem os requisitos inerentes a cada iniciativa estão devidamente caracterizados e dotados de força normativa.
Constata-se, pois, que nem o edifício normativo do ensino superior está completo enquanto subsistir o défice legislativo que justifica uma lei como esta, nem a acção governamental seria a mais avisada se não interpretasse correctamente as prioridades que cada tempo comporta.

2 - Uma lei sobre a organização e ordenamento do ensino superior

A designação do presente diploma e a sua localização sistemática no ordenamento jurídico do sistema de ensino carecem de uma explicação adicional.
O propósito desta iniciativa legislativa é estabelecer os princípios básicos da organização e ordenamento do sistema de ensino superior. Dado o seu objecto limitado, ela não prejudica os princípios básicos do sistema de ensino em geral, que naturalmente deve respeitar. Dado o seu alcance normativo genérico, e em certo sentido programático, ela não visa estabelecer um código integrado e fechado do sistema de ensino superior, antes pretendendo respeitar a existência autónoma e a especificidade das leis dirigidas a cada um dos subsistemas.
Por conseguinte, este diploma visa situar-se entre a Lei de Bases do Sistema Educativo, a montante, e as leis reguladoras de cada um dos subsistemas do ensino superior, a jusante, nomeadamente a Lei da Autonomia das Universidades, a Lei do Estatuto e Autonomia dos Estabelecimentos de Ensino Superior Politécnico, o Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, sem esquecer outras leis específicas, como a Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior e a Lei da Avaliação do Ensino Superior.
Estando colocada "abaixo" da Lei de Bases do Sistema Educativo, que logicamente a precede, como lei estruturante de todo o sistema de ensino, o diploma que agora se propõe respeita-a e desenvolve-a, sem prejuízo de um ou outro afeiçoamento, devidamente assinalado.
Estando, por outro lado, colocado "acima" das leis sectoriais de cada subsistema do ensino superior, a sua função não é naturalmente "consumi-las" mas, sim, estabelecer entre elas uma unidade e coerência normativa, de acordo com a ideia de unidade jurídica essencial do sistema do ensino superior. Mesmo que esta lei de alcance intermédio não implique grandes alterações nessas leis sectoriais, é evidente que a leitura e interpretação das mesmas terá de ser feita de acordo com a presente lei, se aprovada, como é exigido por elementares princípios de coerência e unidade sistémica da ordem jurídica.
Em suma, do que se trata é de uma lei de bases de "segundo grau", porque "abaixo" da lei de bases primária, que é a Lei de Bases do Sistema Educativo, mas sem dúvida ainda uma lei de bases, dada a natureza e o alcance geral das suas normas e o seu propósito de conferir consistência estrutural a um conjunto de leis sectoriais, até agora dispersas e desintegradas.
Neste sentido, a arquitectura normativa que se propõe para o ensino superior apresenta a seguinte hierarquia descendente:
1.º nível - Constituição da República e normas de direito internacional e comunitário eventualmente aplicáveis;
2.º nível - Lei de Bases do Sistema Educativo;
3.º nível - Lei de Organização e Ordenamento do Ensino Superior (o presente diploma);
4.º nível - Leis específicas de cada subsistema ou de cada tema sectorial (Lei da Autonomia das Universidades, Lei do Estatuto e Autonomia dos Estabelecimentos de Ensino Superior Politécnico, Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior, Lei da Avaliação do Ensino Superior, etc.);
5.º nível - Estatutos dos estabelecimentos.

3 - As inovações desta proposta de lei

Destacam-se como inovações principais e mais-valias sistémicas desta proposta de lei as seguintes:

a) Assume-se deliberadamente uma filosofia de regulação unitária e congruente de todo o sistema de ensino superior, nos seus diversos subsistemas, procurando superar a compartimentação sectorial até agora existente, entre o ensino público e o ensino particular e cooperativo, entre o ensino universitário e o ensino politécnico;
b) Propõe-se o aprofundamento e a estabilização da natureza plural do sistema de ensino superior, clarificando o sistema binário - composto por ensino universitário e ensino politécnico - que se defende para Portugal. Neste sentido, para além da salvaguarda da identidade do subsistema universitário, assume-se que o desenvolvimento registado no ensino politécnico justifica que os institutos politécnicos, em vez de serem apenas o

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resultado de um modelo federativo de escolas quase independentes umas das outras, devem constituir-se como vértice de uma organização institucional activa, integrada e dinamizadora do conjunto constituído pelas escolas especializadas. Por isso se diz, no artigo 7.º, "o ensino politécnico é ministrado em institutos politécnicos…", completando o princípio fixado pela Lei de Bases do Sistema Educativo de que o ensino politécnico se realiza em escolas superiores especializadas que podem ser associadas em unidades mais amplas. Trata-se, afinal, de dar aos institutos politécnicos uma dignidade institucional paralela à que as universidades já detêm, salvaguardando simultaneamente a respectiva separação e identidade institucional;
c) Estabelece-se o princípio essencial de que há pressupostos e condições da organização institucional do ensino superior de natureza universal e de validação obrigatória. Isto é, as iniciativas de ensino superior não devem ser avaliadas de forma casuística nem de forma discriminatória e os requisitos necessários devem aplicar-se independentemente de as mesmas serem públicas ou privadas. Significa isto que há uma carta de exigências, qualidade e relevância que é geral e, por isso, não isenta nenhum subsistema, visto que é relativamente a todos que se quer garantir uma relação de confiança com os cidadãos;
d) Põe-se em relevo a centralidade do estabelecimento, seja ou não composto por uma pluralidade de unidades orgânicas, como comunidade de saberes e de competências empenhada em tarefas no âmbito da educação e do conhecimento. Para esse objectivo confluem, entre outros elementos, a reconceptualização dos institutos politécnicos, os cuidados na definição de unidades orgânicas, os limites à dispersão territorial e a exigência de consistência territorial dos estabelecimentos, a importância do projecto educativo próprio, a ênfase num corpo docente próprio, etc. Do que se trata é de assegurar que cada estabelecimento é, em si mesmo, uma iniciativa coerente, na medida em que estabelece uma relação forte entre o conjunto de elementos que lhe são inerentes (docentes, alunos, infra-estruturas e equipamentos) e com um território;
e) Estabelece-se que a iniciativa pública deve satisfazer as exigências de coerência e complementaridade que são inerentes ao conceito de rede pública - constitucionalmente consagrado - e que esta não deve ser injusta do ponto de vista da distribuição espacial nem alheia à existência das pré-condições que a qualificam. A rede pública não pode ser um somatório desgarrado de estabelecimentos dispersos de acordo com lógicas centralistas ou localistas mas, sim, um sistema racionalmente ordenado - daí os novos princípios em matéria de planeamento territorial da rede, de criação de novas unidades orgânicas, de iniciativa de novos cursos;
f) Considera-se que a iniciativa privada, para além da liberdade de criação e do correspondente dever de fiscalização do Estado, partilha os mesmos requisitos de qualidade e tem a sua inserção no sistema de ensino superior baseada no reconhecimento de interesse público, não somente como sistema paralelo e alternativo, mas podendo também constituir-se em recurso para a superação das carências do serviço público de educação. Igualmente se assegura a autonomia orgânica dos estabelecimentos particulares e cooperativos em relação às respectivas entidades instituidoras, as quais assumem responsabilidades pela protecção das expectativas dos respectivos estudantes;
g) Define-se que os requisitos gerais para a criação e funcionamento de um estabelecimento de ensino superior são os que garantam a existência de condições infra-estruturais adequadas, um programa educativo sólido, um corpo docente próprio e qualificado, gestão democrática, integração social dos estudantes e sustentabilidade científica, pedagógica e institucional;
h) Assume-se que a actual fase de desenvolvimento do ensino superior em Portugal exige que as iniciativas a tomar demonstrem relevância e capacidade para qualificar, não as isentando nem da sujeição a mecanismos de avaliação uniforme nem do enquadramento num novo sistema de regulação que, pela sua independência relativamente à Administração e aos interesses envolvidos, assegure coerência e imparcialidade.
Por todas estas razões, o texto desta proposta de lei, organiza-se de tal forma que os seus Capítulos II, V e VI (os que tratam, respectivamente, da organização institucional do ensino superior, dos requisitos dos estabelecimentos, unidades orgânicas e cursos e dos mecanismos de avaliação e regulação), assentam numa economia que respeita a unidade do sistema de ensino superior e a validade geral dos pressupostos e condições a respeitar. Do mesmo modo, o ensino universitário e o ensino politécnico são tratados paralela e simetricamente, quer no Capítulo II, sobre o sistema de ensino superior, quer no Capítulo III, sobre o ensino público, e no Capítulo IV, sobre o ensino superior particular e cooperativo.

4 - Participação na elaboração do projecto

Um anteprojecto desta proposta de lei foi tornado público e enviado às instituições e parceiros do sector.
Entre outros, incluindo algumas opiniões a título individual, foram recebidos pareceres das seguintes entidades: Conselho Nacional de Educação, Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior, Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, Associação Portuguesa do Ensino Superior Privado, Associações de Estudantes do Ensino Superior, FENPROF - Federação Nacional dos Professores, FNE - Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e SNESUP - Sindicato Nacional do Ensino Superior.
Na elaboração desta versão foram considerados todos os argumentos e sugestões recebidos. E muitos foram acolhidos, salvo os que não eram compatíveis com a filosofia e traves-mestras do projecto governamental.

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Assim, nos termos da alínea d) do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei, para ser aprovada e valer como lei geral da República (com pedido de prioridade e urgência):

Capítulo I
Objecto da lei e conceitos básicos

Artigo 1.º
Objecto

A presente lei estabelece o regime da organização e do ordenamento do ensino superior, no quadro da Constituição, das normas aplicáveis de direito internacional e comunitário e das bases gerais do sistema educativo constantes da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, alterada pela Lei n.º 115/97, de 19 de Setembro).

Artigo 2.º
Conceitos

Para efeitos da presente lei entende-se por:

a) "Estabelecimento", a unidade de organização institucional autónoma no âmbito do ensino superior;
b) "Estabelecimento integrado", o estabelecimento composto por mais do que uma unidade orgânica;
c) "Estabelecimento não integrado", o estabelecimento desprovido de unidades orgânicas;
d) "Unidade orgânica", a base institucional, pedagógica e científica dos estabelecimentos integrados, dotadas da autonomia que lhe é conferida pelos Estatutos do estabelecimento no quadro da lei, e através da qual estes organizam e desenvolvem as suas actividades;
e) "Sistema de ensino superior", o conjunto dos diversos subsistemas a que se refere o artigo 4.º

Capítulo II
Organização institucional do ensino superior

Artigo 3.º
Pressupostos da organização do ensino superior

A organização institucional do ensino superior deve assegurar que cada estabelecimento:

a) É uma comunidade autónoma de saberes e competências dedicada à educação e ao conhecimento;
b) Tem um projecto educativo próprio e autónomo;
c) Ministra um ensino de elevada qualidade científica, técnica e cultural;
d) Satisfaz um conjunto adequado de requisitos infra-estruturais, humanos e materiais;
e) Estabelece interacção com a comunidade e o território em que se insere;
f) Contribui para dar resposta às exigências de desenvolvimento do País quanto a formação de nível superior.

Artigo 4.º
Sistema de ensino superior

O sistema de ensino superior compreende os seguintes subsistemas:

a) Quanto à natureza da formação ministrada: o ensino universitário e o ensino politécnico;
b) Quanto à natureza da entidade instituidora: o ensino superior público e o ensino superior particular e cooperativo.

Artigo 5.º
Estabelecimentos de ensino superior

Para os efeitos desta lei são estabelecimentos de ensino superior:

a) As universidades;
b) As escolas universitárias não integradas;
c) Os institutos politécnicos;
d) As escolas superiores politécnicas não integradas.

Artigo 6.º
Ensino universitário

1 - O ensino universitário é ministrado em universidades e, em casos justificados, em escolas universitárias não integradas, que podem adoptar a designação de "institutos universitários".
2 - As universidades organizam-se em unidades orgânicas, designadas faculdades, institutos, escolas, departamentos, ou outra denominação apropriada, nos termos dos respectivos estatutos.

Artigo 7.º
Ensino politécnico

1 - O ensino politécnico é ministrado em institutos politécnicos e, nas áreas definidas por lei, em escolas politécnicas não integradas, de natureza especializada.
2 - Os institutos politécnicos organizam-se em unidades orgânicas designadas escolas politécnicas, ou outra designação apropriada, nos termos dos respectivos estatutos.
3 - Os institutos politécnicos podem ser estabelecimentos de vocação geral ou estabelecimentos vocacionados para uma determinada área de especializações afins.
4 - Os estabelecimentos de ensino politécnico são especialmente caracterizados na sua organização institucional pelos seguintes princípios:

a) Inserção na comunidade territorial respectiva;
b) Ligação às actividades profissionais e empresariais correspondentes à sua vocação específica.

Artigo 8.º
Separação e articulação do ensino universitário e do ensino politécnico

1 - Sem prejuízo da diferente vocação de cada um e da correspondente identidade institucional, o ensino universitário e o ensino politécnico devem estabelecer adequadas formas de articulação.

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2 - Para esse efeito devem ser asseguradas:

a) A valoração recíproca da formação e das competências adquiridas;
b) A participação em projectos comuns de investigação, ensino e formação profissional;
c) Outras formas de cooperação institucional.

Artigo 9.º
Dispersão geográfica dos estabelecimentos de ensino superior

1 - A criação de unidades orgânicas de estabelecimentos de ensino superior fora da sede é excepcional e deve salvaguardar os princípios da unidade e coesão institucional do estabelecimento, da não duplicação de cursos e actividades, e da consistência territorial do conjunto do estabelecimento.
2 - A consistência territorial consiste na proximidade da localização das diversas unidades orgânicas do estabelecimento e da sua inserção em eixos de desenvolvimento territorialmente integrados.

Artigo 10.º
Cooperação entre estabelecimentos

1 - Os estabelecimentos de ensino superior pertencentes ao mesmo ou a diferentes subsistemas podem estabelecer entre si ou com outras instituições, ao abrigo da respectiva autonomia institucional, acordos de associação ou de cooperação para a prossecução de parcerias e projectos comuns, seja com base em critérios de agregação territorial, seja com base em critérios de agregação sectorial.
2 - Do mesmo modo, os estabelecimentos de ensino superior nacionais podem integrar-se em redes e estabelecer relações de parceria e de cooperação com estabelecimentos de ensino superior estrangeiros, e outras instituições, nomeadamente no âmbito da União Europeia, tendo em vista, entre outros efeitos, assegurar a mobilidade de estudantes e de docentes entre os estabelecimentos envolvidos.

Capítulo III
Ensino superior público

Artigo 11.º
Rede pública de estabelecimentos de ensino superior

1 - A rede pública é constituída pelo conjunto coerente e complementar de estabelecimentos de ensino superior público, universitário e politécnico, funcional e espacialmente organizados, visando a prossecução das incumbências constitucionais e legais do Estado no respeitante ao ensino superior.
2 - A definição da rede deve satisfazer critérios de exigência e qualidade inerentes à natureza do ensino superior, considerando nomeadamente:

a) A elevação do nível educativo, cultural e científico do país;
b) As necessidades globais do país na qualificação das pessoas;
c) O papel essencial que a educação e a formação desempenham no desenvolvimento económico, social e cultural.

3 - O planeamento da rede pública deve assegurar o adequado equilíbrio no que se refere:

a) À localização geográfica, natureza e dimensão dos estabelecimentos e à sua articulação com a procura;
b) Às áreas e níveis de formação assegurados;
c) À relação entre a oferta criada e os recursos que a suportam e qualificam.

4 - A rede pública de estabelecimentos de ensino superior deve obedecer a um critério de justa repartição territorial dos estabelecimentos de ensino, privilegiando a relação com o sistema urbano nacional e com os eixos territoriais em que este assenta, no quadro das opções nacionais de ordenamento do território e do desenvolvimento equilibrado do conjunto do território nacional.

Artigo 12.º
Carências do serviço público de educação

1 - As carências do serviço público de educação em áreas de formação consideradas prioritárias para o País podem, enquanto subsistirem, ser supridas por um dos seguintes modos:

a) Contratos-programa, por tempo determinado, entre o Estado e estabelecimentos de ensino superior particulares ou cooperativos, mediante os quais aquele financia total ou parcialmente os segundos pelo diferencial de valor entre as propinas do subsistema público e um valor convencionado estabelecido com base no valor das propinas do subsistema privado;
b) Apoio directo aos estudantes que desejem frequentar essas áreas e não tenham lugar nos estabelecimentos da rede pública, financiando aqueles pelo diferencial de valor entre as propinas dos estabelecimentos públicos e um valor estabelecido com base no valor das propinas do subsistema privado.

2 - Os contratos a que se refere a alínea a) do número anterior estão sujeitos aos princípios de concurso público e avaliação por júri independente, e pressupõem a prévia indicação dos requisitos a que as instituições candidatas devem obedecer.
3 - A elegibilidade dos estudantes e dos estabelecimentos referidos na alínea b) do n.º 1 depende de requisitos objectivos e não discriminatórios.

Capítulo IV
Ensino superior particular e cooperativo

Artigo 13.º
Princípios do ensino particular e cooperativo

A organização do ensino superior particular e cooperativo baseia-se nos seguintes princípios:

a) Liberdade de criação de estabelecimentos, respeitados os requisitos estabelecidos na lei para garantir a idoneidade das entidades instituidoras e a viabilidade e continuidade dos estabelecimentos;

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b) Necessidade de reconhecimento de interesse público, como condição para a sua integração no sistema de ensino superior, nomeadamente para efeito de concessão de graus e de elegibilidade para beneficiar dos apoios públicos;
c) Fiscalização pública dos respectivos estabelecimentos, visando a verificação do cumprimento dos requisitos legais e dos padrões de qualidade inerentes ao ensino superior;
d) Autonomia orgânica dos estabelecimentos em relação às respectivas entidades instituidoras, sendo dotados de estatutos e de órgãos administrativos, científicos e pedagógicos próprios;
e) Responsabilidade das entidades instituidoras pela protecção das expectativas dos respectivos estudantes quanto à continuidade dos estabelecimentos e dos cursos em que se inscreveram.

Artigo 14.º
Apoio do Estado

1 - Os estabelecimentos de ensino privado e cooperativo podem beneficiar do apoio financeiro do Estado, por via de regra mediante contratos-programa, nos termos estabelecidos por lei, nomeadamente no que se refere à acção social escolar, à formação de docentes e à investigação.
2 - Os requisitos de elegibilidade para os apoios públicos obedecerão aos princípios da publicidade, objectividade e não discriminação.
3 - Os estabelecimentos de ensino particulares e cooperativos podem ser chamados a suprir as carências específicas do serviço público de educação nos termos previstos no artigo 12.º, mediante adequado financiamento público.

Capítulo V
Estabelecimentos, unidades orgânicas e cursos

Artigo 15.º
Igualdade de requisitos

1 - A criação e a actividade de estabelecimentos de ensino superior estão sujeitas ao mesmo conjunto de requisitos essenciais, tanto gerais como específicos em função da natureza universitária ou politécnica dos estabelecimentos, independentemente de se tratar de estabelecimentos públicos, particulares ou cooperativos.
2 - Dentro de estabelecimentos da mesma natureza, os requisitos podem ser diferentes de acordo com os graus que os estabelecimentos estão habilitados a conferir.
3 - Em especial são idênticos, para estabelecimentos da mesma natureza, independentemente da natureza da entidade instituidora:

a) Os requisitos respeitantes ao acesso e à fixação do número de vagas;
b) O regime dos graus académicos e da carreira docente.

Artigo 16.º
Requisitos gerais

São requisitos gerais para a criação e actividade de um estabelecimento de ensino superior os seguintes:

a) Instalações e recursos materiais apropriados à natureza do estabelecimento em causa, designadamente espaços lectivos, equipamentos, bibliotecas e laboratórios adequados aos cursos que visam ministrar;
b) Conformidade do programa educativo e dos estatutos com a lei e com os princípios que regem o ensino superior;
c) Oferta de formação e de cursos e graus compatíveis com a natureza do estabelecimento em causa;
d) Existência de um corpo docente próprio, adequado em número e em qualificação à natureza do estabelecimento e aos graus conferidos;
e) Autonomia científica e pedagógica do estabelecimento em relação às entidades instituidoras, conforme os casos, incluindo a existência de direcção científica e pedagógica dos estabelecimentos, unidades orgânicas e dos cursos, consoante os casos;
f) Participação de docentes e alunos na gestão dos estabelecimentos;
g) Garantia da relevância social do ensino, do elevado nível pedagógico, científico e cultural do mesmo e, quando a natureza do estabelecimento o justifique, de desenvolvimento de investigação científica e inovação tecnológica;
h) Disponibilização de serviços de acção social.

Artigo 17.º
Autonomia dos estabelecimentos

1 - A autonomia dos estabelecimentos nos seus diversos aspectos é regulada por lei, no respeito da Constituição e atendendo à especificidade institucional de cada um dos tipos de estabelecimentos de ensino superior.
2 - A autonomia dos estabelecimentos de ensino superior público não prejudica a sua articulação com os objectivos subjacentes à rede pública do ensino superior, nos termos do artigo 11.º, nem os poderes de tutela necessários para manter ou restaurar a normalidade institucional dos estabelecimentos.
3 - A autonomia dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo não prejudica a responsabilidade da entidade instituidora pela sua gestão administrativa e financeira e pela sua continuidade institucional.
4 - Deve ser igualmente assegurada a autonomia dos estabelecimentos em relação aos estabelecimentos congéneres ou concorrentes, ou outras instituições, nomeadamente mediante a limitação de acumulações e a definição das necessárias incompatibilidades quanto à titularidade de cargos e funções.
5 - É interdita, designadamente, a acumulação de funções de gestão ou de direcção de qualquer tipo em estabelecimentos de ensino pertencentes a diferentes entidades.

Artigo 18.º
Criação de estabelecimentos de ensino superior público

1 - A criação de estabelecimentos de ensino superior público, bem como a transformação ou a fusão dos já existentes, ficam condicionadas à sua adequação à rede pública de estabelecimentos de ensino superior.
2 - A criação de estabelecimentos de ensino superior público obedece a um procedimento administrativo a regular por lei.

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Artigo 19.º
Criação de unidades orgânicas de estabelecimentos
de ensino superior público

1 - A criação de unidades orgânicas em estabelecimentos de ensino superior público que envolva aumento de despesa pública carece de autorização prévia do Governo.
2 - A criação de unidades orgânicas de estabelecimentos de ensino superior público, bem como a transformação ou a fusão das já existentes, deve ter em conta a sua relevância no âmbito da rede pública de estabelecimentos de ensino superior.

Artigo 20.º
Criação de estabelecimentos no ensino superior particular e cooperativo

1 - Podem criar estabelecimentos de ensino superior particular as pessoas colectivas de direito privado constituídas para esse efeito.
2 - Podem criar estabelecimentos de ensino superior cooperativo as cooperativas de ensino superior, observados os princípios cooperativos e as normas legais específicas.
3 - A lei estabelece os necessários requisitos de idoneidade institucional e financeira das entidades instituidoras.
4 - O reconhecimento de interesse público de estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo obedece aos requisitos e regras estabelecidos na lei.
5 - O reconhecimento de interesse público de estabelecimentos ou a transformação de estabelecimentos existentes são efectuados mediante decreto aprovado em Conselho de Ministros.

Artigo 21.º
Criação de unidades orgânicas em estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo

1 - A criação de unidades orgânicas em estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo compete às respectivas entidades instituidoras, ouvidos os órgãos administrativos, científicos e pedagógicos dos estabelecimentos.
2 - A autorização de funcionamento de unidades orgânicas de estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo obedece a requisitos e regras estabelecidos na lei.
3 - A autorização de funcionamento de unidades orgânicas reveste a forma de portaria ministerial.

Artigo 22.º
Cursos

1 - A lei estabelece as condições e os termos em que se processa a criação, alteração, suspensão e extinção de cursos, a fixação do plano de estudos, a entrada em funcionamento, os requisitos de ingresso e a fixação do número de alunos a admitir, observadas as especificidades institucionais dos estabelecimentos de ensino superior público, particular e cooperativo e do ensino universitário e politécnico e a natureza dos cursos e graus.
2 - A criação de novos cursos fica dependente da verificação da existência dos necessários recursos materiais e pessoais no estabelecimento respectivo, da avaliação independente da sua valia científica e pedagógica, bem como de estudos idóneos sobre a viabilidade e continuidade da respectiva procura.
3 - A criação e a alteração de cursos conferentes de grau académico estão sujeitas a registo.
4 - O registo relativo aos cursos de ensino superior público fica condicionado:

a) À satisfação dos requisitos fixados nos termos dos n.os 1 e 2;
b) À sua adequação às necessidades da rede pública de estabelecimentos de ensino superior.

5 - O registo relativo aos cursos de ensino superior particular ou cooperativo fica condicionado à satisfação dos requisitos fixados nos termos dos n.os 1 e 2.
6 - No que se refere aos cursos da área da saúde, a avaliação dos requisitos fixados nos termos do n.º 2 é feita em articulação entre os Ministérios da Educação e da Saúde.
7 - O registo pressupõe a assinatura de portaria pelo Ministro da Educação.
8 - O acto de criação de cursos só adquire eficácia com o registo.
9 - Nenhum curso pode iniciar o funcionamento antes da publicação da portaria a que se refere o n.º 7.
10 - O disposto no presente artigo aplica-se, com as necessárias adaptações, à atribuição dos graus de mestre e de doutor.

Capítulo VI
Mecanismos de avaliação e regulação

Artigo 23.º
Sistema de avaliação

1 - Os estabelecimentos de ensino superior estão sujeitos a avaliação do seu desempenho científico e pedagógico.
2 - O sistema oficial de avaliação obedece aos princípios da independência dos respectivos órgãos em relação ao Governo e da participação dos estabelecimentos nos órgãos e nos procedimentos de avaliação.
3 - Constitui obrigação de todos os estabelecimentos submeter-se aos procedimentos de avaliação e tomar as providências necessárias para satisfazer as correspondentes recomendações ou determinações.

Artigo 24.º
Fiscalização governamental

A verificação dos pressupostos, requisitos e condições a que estão legalmente sujeitos os estabelecimentos de ensino superior compete ao Governo, nas formas definidas pela lei, salvo o disposto no artigo seguinte.

Artigo 25.º
Organismo de regulação independente

Sem prejuízo da responsabilidade governamental pela coordenação geral do sistema de ensino superior, poderá ser criado um organismo de regulação independente da Administração e dos interesses envolvidos, o qual visará garantir coerência na evolução do sistema de ensino superior e im

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parcialidade nos procedimentos de reconhecimento de interesse público de estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo e outros procedimentos públicos respeitantes aos estabelecimentos de ensino superior.

Capítulo VII
Disposições finais e transitórias

Artigo 26.º
Regimes especiais

1 - Dentro dos princípios gerais definidos pela presente lei, o Governo aprova, por decreto-lei, os regimes jurídicos especiais reguladores da organização:

a) Dos estabelecimentos de ensino superior público militares e policiais;
b) Do ensino superior ministrado através de modalidades não presenciais.

2 - Sem prejuízo da sua especificidade institucional, a Universidade Católica Portuguesa fica sujeita ao regime estabelecido na presente lei, devendo o respectivo estatuto legal ser objecto das adaptações que se revelem necessárias.

Artigo 27.º
Concretização legislativa

O Governo aprova por decreto-lei:

a) A alteração da Lei do Estatuto e Autonomia dos Estabelecimentos de Ensino Superior Politécnico (Lei n.º 54/90, de 5 de Setembro), tendo em vista dar concretização ao disposto no artigo 7.º;
b) Os critérios a que deve obedecer a definição da rede pública de estabelecimentos de ensino superior a que se refere o artigo 11.º;
c) Os critérios a que deve obedecer a celebração dos contratos programa a que se refere a alínea a) no n.º 1 do artigo 12.º, bem como o mecanismo previsto na alínea b) do mesmo preceito;
d) O procedimento administrativo de criação de estabelecimentos de ensino superior público e de unidades orgânicas de estabelecimentos de ensino superior público a que se referem os artigos 18.º e 19.º;
e) A revisão dos procedimentos legalmente estabelecidos sobre o reconhecimento de interesse público de estabelecimentos e a autorização das unidades orgânicas de estabelecimentos de ensino superior particular ou cooperativo a que se referem os artigos 20.º e 21.º;
f) A adaptação do regime jurídico regulador dos cursos de ensino superior a que se refere o artigo 22.º;
g) A criação do organismo de regulação independente a que se refere o artigo 25.º;
h) Os regimes jurídicos especiais previstos no artigo 26.º

Artigo 28.º
Institutos politécnicos

1 - A entrada em vigor da nova organização institucional dos institutos politécnicos prevista no artigo 7.º só se opera, para cada um, com a entrada em vigor das alterações estatutárias subsequentes à entrada em vigor do decreto-lei a que se refere a alínea a) do artigo 27.º
2 - Relativamente às situações existentes de integração de escolas politécnicas em universidades devem ser tomadas as providências necessárias à sua autonomização como estabelecimentos ou à sua integração em institutos politécnicos existentes ou a criar.

Artigo 29.º
Pólos e extensões

As situações existentes de pólos, extensões e as unidades orgânicas territorialmente separadas de estabelecimentos de ensino superior e que não preencham as condições para ser autorizadas ao abrigo do artigo 9.º devem transformar-se em estabelecimentos autónomos, se para tal possuírem os necessários requisitos, ou integrar-se em diferente estabelecimento, sem o que deverão extinguir-se.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 13 de Abril de 2000. O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres - O Ministro da Presidência, Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho - O Ministro do Equipamento Social, Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho - O Ministro da Defesa Nacional, Júlio Lemos de Castro Caldas - O Ministro da Administração Interna, Fernando Manuel dos Santos Gomes - O Ministro da Economia, Joaquim Augusto Nunes Pina Moura - O Ministro da Educação, Guilherme Waldemar Pereira d'Oliveira Martins - A Ministra da Saúde, Maria Manuela de Brito Arcanjo Marques da Costa.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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