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0023 | II Série A - Número 001 | 20 de Setembro de 2001

 

Considerando que desde finais do século XIX e ao longo do século XX personalidades públicas, trabalhadores rurais e suas associações de classe, forças políticas, técnicos e estudiosos da questão agrária postularam de diferentes formas a reestruturação fundiária e a reconversão cultural da agricultura latifundiária alentejana em ligação com a rega;
Considerando que este propósito se mantém actual devido quer à reconstituição das grandes explorações extensivas de sequeiro, novamente concentradas nas mãos de um pequeno número de grandes proprietários, quer ao impasse económico e social da agricultura alentejana, com terras ao abandono e totalmente dependente de subsídios comunitários e de uma PAC que fomentam o parasitismo e o bloqueio da modernização agrícola;
Considerando que o Empreendimento de Fins Múltiplos do Alqueva, ao criar no Alentejo uma das maiores reservas de água da Europa, realiza uma aspiração mais do que secular quanto às possibilidades de iniciar um novo ciclo de desenvolvimento económico e de justiça social na região e no País, assente na irrigação e na modernização agrícola, na normalização do abastecimento de água às populações, no aumento da capacidade energética e no fomento do turismo, o que representa um investimento de cerca de 400 milhões de contos, dos quais 62,5% são financiados pelos contribuintes portugueses;
Considerando que a salvaguarda do interesse público deste investimento e da adequada utilização da água passa pela clara definição dos objectivos estratégicos essenciais que presidem ao conjunto do empreendimento na suas várias dimensões;
Considerando que a existência de água, só por si, como o demonstra a experiência histórica da rega do Alentejo, não garante a realização dos objectivos anteriores e que, consequentemente, é indispensável adoptar medidas reguladoras públicas, medidas que, nomeadamente, evitem a perversão económica, social, ambiental e patrimonial dos objectivos do empreendimento, designadamente transformando-o num instrumento preferencial dos grupos turísticos e dum turismo radicalmente desadequado ao contexto ambiental, patrimonial e paisagístico alentejano, reduzindo a componente agrícola a um aspecto secundário e de lenta e parcial concretização, dominado pelas multinacionais do regadio intensivo e do trabalho semi-escravo (uma extensão da Andaluzia espanhola ou uma variante califomiana do capitalismo selvagem) ou pela especulação fundiária em benefício dos grandes agrários ou dos especuladores imobiliários, tudo com as mais graves consequências económicas, sociais, ambientais e no esgotamento dos solos;
Considerando que a divulgação atempada e ampla dos principais instrumentos de ordenamento e planeamento regional ligados ao empreendimento é fundamental na defesa dos seus objectivos estratégicos, bem como a participação democrática das populações, autarquias, associações ambientais e outras na definição, debate e fiscalização dos mesmos;
A Assembleia da República resolve, nestes termos, recomendar a adopção dos seguintes princípios de política geral para o Empreendimento de Fins Múltiplos do Alqueva:
1 - São objectivos estratégicos essenciais do Empreendimento de Fins Múltiplos do Alqueva os seguintes:

a) Criar uma nova agricultura de qualidade, economicamente rentável e que utilize as terras agrícolas de forma compatível com a defesa do ambiente e a preservação dos recursos naturais, cinegéticos e dos solos;
b) Gerar emprego estável e com direitos e assegurar a justiça social, desde logo no quadro de uma divisão e distribuição das terras incluídas no perímetro de rega;
c) Assegurar para o conjunto dos empreendimentos agrícolas e não agrícolas, designadamente turísticos, sistemas de ocupação do território que assegurem a defesa e melhoria do ambiente e da paisagem, o equilíbrio agro-ambiental e a preservação e valorização do património histórico e cultural;
d) Garantir o princípio da minimização dos efeitos negativos ambientais e patrimoniais e da respectiva compensação e regeneração à escala da destruição prevista pela realização do empreendimento.

2 - A utilização prioritária da água para fins agrícolas no Perímetro de Rega do Alqueva é indissociável de um processo de reestruturação fundiária a empreender sob a iniciativa do Estado. A nova estrutura agrária assentará na definição dos limites máximos de propriedade e de superfície a explorar considerados como mais adequados aos diversos sistemas culturais adoptados ou a adoptar. A nova estrutura agrária é condição essencial à optimização do aproveitamento dos recursos, à criação de emprego e melhoria das condições de vida de uma nova população agrícola a fixar e de uma agricultura de média dimensão, rentável, de qualidade e ecologicamente segura.
3 - O arrendamento e distribuição de terras que decorre do processo de reestruturação fundiária deve estar intimamente ligado a um processo de reconversão cultural, no sentido de as novas explorações, mediante o estímulo de sistemas de fiscalidade próprios, de linhas de financiamento preferenciais adequadas ou de outros condicionalismos a estabelecer, se orientarem para a criação de sistemas culturais de qualidade, economicamente rentáveis, ecologicamente seguros e preservadores dos recursos dos solos.
4 - A entidade pública reguladora do processo de reestruturação fundiária e de reconversão cultural terá a possibilidade de sancionar os arrendatários ou concessionários de terras que utilizem sistemas de culturas delapidadoras do solo ou do ambiente, que não utilizem a água, as obras de aproveitamento hidroagrícola ou as suas explorações para os fins previstos, ou que não respeitem a legislação de trabalho, indo até à revogação dos contratos de cedência do uso da terra.
5 - Os empreendimentos turísticos e outras iniciativas não agrícolas a autorizar no quadro dos planos regionais de ordenamento das albufeiras, da zona envolvente do Alqueva, da bacia do Guadiana ou dos planos directores municipais obedecerão rigorosamente aos princípios da salvaguarda e melhoria do meio ambiente, da paisagem e do património histórico-cultural da região e do uso racional e adequado da água.
6 - O processo de enchimento da barragem do Alqueva deve fazer-se gradualmente, por forma a procurar conciliar a progressiva adopção das várias valências do empreendimento com prevalência para a vertente da rega, a necessidade de proceder ao respectivo balanço e uma adequada desmatação e desarborização feitas ao ritmo do enchimento, poupando a destruição imediata e massiça de vastas áreas de habitats prioritários e espécies ameaçadas ou em vias de extinção e de parte do rico património histórico da região.

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