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0324 | II Série A - Número 012 | 07 de Junho de 2002

 

PROJECTO DE LEI N.º 51/IX
REGULA E GARANTE O EXERCÍCIO DO DIREITO DE INICIATIVA LEGISLATIVA POPULAR

1 - O Grupo Parlamentar do PS propôs a consagração constitucional do direito de iniciativa legislativa popular e obteve a viabilização da nova figura, que veio a ser incluída no acordo de revisão e votada em Plenário por maioria superior a 2/3.
Na redacção que lhe foi dada pela Lei Constitucional n.º 1/97, o artigo 167.º da Constituição veio dar expressão plena ao objectivo político subjacente à proposta do PS - aproximar eleitos e eleitores, abrindo as portas do Parlamento a iniciativas resultantes da criatividade dos cidadãos.
A agenda da Assembleia da República passa, assim, a poder incluir questões que mereçam destaque para um número significativo de portugueses e portuguesas, limitando-se, assim, o risco de fechamento institucional e de criação de temas tabu contra o sentir de correntes de opinião expressivas, evitando um divórcio entre os cidadãos e os seus eleitos para a Assembleia da República.
Na VII Legislatura, o PS procurou dar expressão legal à nova norma da Constituição. Não foi, contudo, possível finalizar em tempo o processo legislativo, que importa agora reiniciar e concluir.
2 - Há que regular em pormenor o novo instituto constitucional, tornando claras as regras aplicáveis e facilitando a sua apreensão pelos futuros utilizadores. O projecto de lei do PS tem um conjunto de características distintivas que o debate já realizado leva os signatários a reafirmar.
A - Parte-se, como é desejável, da distinção que a Constituição estabelece entre o direito de iniciativa legislativa popular e o direito de petição.
Este último não só pode ser exercido a nível individual ou por pessoas colectivas - ao contrário do direito de iniciativa de leis, reservado a colectivos integrados por milhares de pessoas -, como assenta num elevado grau de informalidade. De facto, as petições podem ser apresentadas por qualquer meio, entregues por via postal ou por fax, sujeitas a assinatura a rogo, entregues em qualquer serviço público em Portugal ou no estrangeiro e, devendo embora ser inteligíveis e dotadas de sentido, não é imprescindível que apontem soluções concretamente desenhadas.
Ao invés, a iniciativa legislativa de grupos de cidadãos não visa meramente chamar a atenção para uma situação, criticar actos administrativos, denunciar violações da Constituição ou da lei ou pedir providências aos poderes públicos. Trata-se de, concreta e especificamente, aventar soluções legais, desenhando os respectivos contornos em condições susceptíveis de persuadir os Deputados sobre o bem fundado do proposto.
Não se pretendeu estimular algo indistinguível de uma petição colectiva mas, sim, propiciar a elaboração de verdadeiros e próprios projectos de lei - denominação que melhor se coaduna com a Constituição.
Implica isto que os proponentes redijam em articulado as ideias com que pretendem contribuir para resolver problemas. Tal exigência não é insuportável para quem se proponha levar ao Parlamento soluções inequívocas e claramente enunciadas: basta que, entre os milhares de subscritores, alguns saibam e queiram assumir essa tarefa para a qual, de resto, não se fixa um estilo único, nem um padrão de sofisticação inatingível. A resposta obtida a apelos já feitos a pré-iniciativas populares, remetidas à Assembleia da República com escorreita redacção, revela que esta opção não inviabiliza iniciativas com bom apoio. Por outro lado, não se afigura recomendável a solução alternativa que consistiria em dissolver a iniciativa legislativa em petição genérica ou cometer a serviços da Assembleia da República a sua tradução em projecto. É que, para evitar a infidelidade aos desejos dos proponentes, essa "tradução de desejos" teria de estar sujeita a um vaivém de controlo por parte dos representantes dos interessados. Mau seria que os proponentes se limitassem a assinar soluções esboçadas em termos gerais, sendo as opções concretas mais tarde aprovadas por alguns representantes em articulação com a burocracia parlamentar, prática que claramente diminuiria o âmbito e efectividade da participação.
B - O projecto de lei do PS estabelece uma relação entre o número de cidadãos eleitores necessários para este efeito e o indispensável para desencadear referendos, prevendo que o exercício do direito possa ter lugar por iniciativa de 0,3% dos inscritos no recenseamento eleitoral. É verdade que bastam 5000 eleitores para fundar um partido, mas é certo que este pode não ter expressão pública relevante nem voz parlamentar. Ora, a iniciativa popular dá voz garantida.
Em concreto, a solução proposta pode conduzir à necessidade de reunir assinaturas em quantidade próxima do número de votos necessário para eleger um Deputado.
C - De acordo com o facultado pela Constituição - que permite ao legislador ordinário ampla margem de definição dos termos e condições do novo instituto constitucional -, propõe-se fundamentalmente que a iniciativa popular de leis recaia sobre matérias da área de reserva relativa da Assembleia da República, o que abrange um vasto elenco, desde o diversificado mundo dos direitos, liberdades e garantias, a muitas outras matérias relevantes: direito penal e processual penal; regime das infracções disciplinares; bases do sistema de segurança social, do Serviço Nacional de Saúde, do sistema de protecção da natureza, do equilíbrio ecológico e do património cultural; regime geral do arrendamento rural e urbano; organização dos tribunais; finanças locais e outros aspectos do estatuto das autarquias locais; função pública; ordenamento do território e do urbanismo, entre outras.
Não são abrangidas as matérias sobre as quais não podem também incidir referendos (o que se explica pela mesma ratio legis), bem como as que devam ser reguladas por lei constitucional, lei de valor reforçado ou resolução.
A experiência de aplicação do quadro legal permitirá proceder, em momento ulterior, a ajustamentos que se revelem necessários, ampliando ou restringindo o universo de temas agora delimitado.
D - Aos proponentes são dadas garantias de intervenção e votação em tempo certo de tudo o que propuseram. Sem isso o direito de iniciativa correria o risco de não dar lugar a um debate e votação. Mas acautelou-se que não haja agendamento mecânico: ao Presidente da Assembleia da República caberá garantir o bom cumprimento das prioridades e direitos que o Regimento prevê.
E - Quanto ao procedimento, assegura-se um regime semelhante ao aplicável aos demais projectos de lei, incluindo o incontornável cumprimento das regras constitucionais sobre consultas públicas tendentes a acautelar a participação dos interessados no processo legislativo (uma vez que de um mecanismo de participação não pode resultar a supressão de outros).

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