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0948 | II Série A - Número 031 | 10 de Outubro de 2002

 

de capital mobiliário, ainda que não correspondente a transações e ainda por mais valias imobiliárias - e que essas formas de valorização só podem ser tributadas em função de um conceito que considere a riqueza acumulada no seu todo.
O imposto sobre a fortuna que é proposto por via do presente projecto de lei responde a essa necessidade. Representa, simultaneamente, a possibilidade de discriminar entre rendimentos de tipo distinto, constituindo ainda um meio de controlo dos outros impostos directos, pela determinação de um tecto contributivo que considera cumulativamente este imposto e o IRS. Garante ainda este projecto de lei que a administração tributária passe a ter uma relação transparente e controlável com o sujeito passivo, cujo registo de propriedade passa a ser completo e verificável, o que é, sem dúvida, o primeiro princípio conducente ao rigor e equidade fiscais.
Este imposto permite igualmente um meio de apreensão justa das faculdades contributivas, que são distintas entre os cidadãos. Nicholas Kaldor, num texto célebre sobre a reforma fiscal indiana, argumentava que não é socialmente aceitável que um marajá sem rendimento mas proprietário de uma fortuna em jóias e ouro, da qual vive como um nababo, pague tanto de imposto como um mendigo desprovido, visto que nenhum dos dois regista um fluxo de rendimentos regulares tributáveis. Assim sendo, um dos efeitos não negligenciáveis deste imposto é incentivar a utilização produtiva dos patrimónios para que o rendimento obtido garanta o pagamento da tributação, penalizando-se as formas ostensivas e rentistas em contrapartida da obtenção de activos financeiros, de rendimentos profissionais e de outras formas de intervenção económica.
A sobre-imposição dos rendimentos do capital que é assim introduzida - através do imposto sobre o rendimento e do imposto sobre a fortuna - justifica-se dado que o sujeito passivo que tem um rendimento de capital detém um estatuto distinto de quem aufere um rendimento de trabalho: o pagamento da força produtiva do trabalhador é esgotado na utilização da sua força de trabalho, ao passo que o proprietário de capital obtém rendimento tanto da execução de funções profissionais como da simples valorização patrimonial inerte.
Por outro lado, considera-se que só é abrangido por esta forma de tributação o sujeito passivo que é proprietário de um património suficientemente elevado que o identifica como uma excepção social.
Nesta situação, fundamenta-se a aplicação da progressividade do imposto, que devia ser um princípio universal da tributação em Portugal.
2 - Foi no contexto desta estratégia de modernização tributária que diversos países têm vindo a introduzir um imposto sobre as fortunas.
Foi o caso do Governo Mauroy, em França em 1982, portanto logo depois da vitória eleitoral de Mitterrand, tendo depois este imposto sido abolido na sequência da inversão da relação de forças políticas. No entanto, o imposto veio a ser restabelecido pelo governo Roccard em 1988, tendo como objectivo financiar o sistema do Rendimento Mínimo de Inserção (RMI), correspondente ao que veio a ser o rendimento mínimo garantido em Portugal.
A Espanha introduziu este imposto em 1977 (Lei n.º 50/1977) com carácter provisório, e tornou-o permanente em 1991 (Lei n.º 19/1991), com o argumento da eficácia na acção redistributiva, para além da função de recenseamento e, portanto, de controlo do imposto sobre o rendimento. O imposto, na sua forma actual, segue um modelo próximo do que é proposto neste diploma, embora a sua incidência seja mais geral (imóveis, bens e direitos afectos a actividades empresariais, depósitos, acções e participações, jóias, peles de carácter sumptuário, objectos de arte e antiguidades, seguros de vida, meios de transporte e direitos de propriedade intelectual), e as suas taxas mais acentuadamente progressivas (de 0,3% até 2,5% para patrimónios superiores a aproximadamente 1,6 milhões de contos, ou 8 milhões de euros).
Outros países, como a Finlândia, o Luxemburgo, a Holanda, a Áustria, a Suíça e a Suécia, introduziram este tipo de imposto há vários anos e têm-no mantido, qualquer que tenha sido a dominância política conjuntural.
A Alemanha, em contrapartida, suprimiu um imposto com estas características, mas o Chanceler Schroeder, quando se candidatou pela primeira vez, admitiu vir a restabelecê-lo.
Em todos estes casos, o imposto incide sobre a fortuna, definida como um valor patrimonial acima de um certo nível de referência, para o que são considerados os bens transaccionáveis de que o sujeito passivo é proprietário no dia 31 de Dezembro de cada ano. Os níveis de referência para o conceito de "fortuna" variam sensivelmente, no entanto, sendo de cerca de 150 000 contos para a lei francesa, enquanto que oscilam entre os 21 000, 35 000 e 36 000 contos para as leis sueca, espanhola e finlandesa, respectivamente.
No presente projecto de lei optou-se por fazer incidir o imposto sobre a fortuna de contribuintes que ultrapasse largamente 10 vezes o património médio nacional, tomando-se como aproximação, para efeitos deste imposto aos valores actuais, o limiar de 175 000 contos, o que representa menos de 1% da população.
Nos termos da lei, os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de lei:

Capítulo I
Incidência

Artigo 1.º
Incidência real

O imposto de solidariedade sobre as grandes fortunas é um imposto que incide sobre o património global dos sujeitos passivos cuja fortuna seja superior a 2500 salários mínimos nacionais.

Artigo 2.º
Património global

Para o cálculo do valor do património global consideram-se:

a) Os valores mobiliários, incluindo partes sociais (quotas, acções, obrigações e outras), e outros títulos, com as excepções previstas na presente lei;
b) Os créditos de toda a natureza;
c) Os instrumentos de poupança, como os planos de poupança-reforma, planos de poupança-acções e outros produtos bancários da mesma natureza;
d) A propriedade imobiliária, incluindo prédios urbanos e fracções autónomas, lotes de terreno e prédios rústicos;

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