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0953 | II Série A - Número 031 | 10 de Outubro de 2002

 

Tal como se afirma no parecer da AACS, exigir que esteja "comprovadamente em causa a livre expressão e confronto das diversas correntes de opinião" é pedir o impossível e assim tornar inútil a própria lei. Para além de ser um conceito excessivamente vago - a lei não contem quaisquer parâmetros para a definição das situações de posição dominante no sector da comunicação social -, não se nos afigura claro como pode uma instituição comprovar aquilo que ainda não sucedeu. Só seria possível "comprovar" mostrando provas, o que é manifestamente impossível. "Não só pela dificuldade da comprovação, em si mesma, como pelo vício lógico da lei: exige-se a realização, a priori (antes de a operação produzir efeitos), de uma avaliação que só deveria ter lugar, por natureza, a posteriori (porque carecida de demonstração)", lê-se no parecer. A Lei de Televisão (Lei n.º 31-A/98, de 14 de Julho) é igualmente inócua nesta matéria.
E é a própria AACS que constata a falta de legislação sobre a concentração vertical, como se pode ler no parecer já referido: "A concentração vertical, assim como a chamada concentração multimedia, envolvendo a junção empresarial de meios distintos mas todos envolvendo instrumentalizações mediáticas, incluindo as laterais ou acessórias, não mereceram normatizações específicas. (...) A Alta Autoridade verifica que os mecanismos legais referentes à concentração empresarial, nomeadamente os que possam determinar os seus razoáveis limites, são insuficientes para responder aos novos desafios da concentração multimédia, bem como às exigências de um Estado democrático em matéria de pluralismo e confronto de opiniões. (...) A própria intervenção correctora da AACS, tal como prevista nas leis de imprensa e da televisão, encontra-se condicionada por apenas ter obrigatoriamente lugar nos casos de concentração horizontal sujeitos a pronunciamento do Conselho da Concorrência, sabendo-se que compete ao membro do Governo com a tutela sectorial decidir, casuisticamente, se deve consultar, ou não, este órgão. (...) Ou seja: a Alta Autoridade para a Comunicação Social, para exercer as suas funções de defesa de valores com consagração constitucional, encontra-se refém de iniciativas que lhe são completamente exteriores".
Nas suas conclusões, o parecer da AACS volta a reafirmar a "preocupação pela fraca expressão, ou mesmo inexistência, no ordenamento jurídico português de normas reguladoras da concentração horizontal, vertical e multimédia de órgãos de comunicação social, o que reconduz a avaliação de operações como a vertente ao quadro geral de defesa da concorrência, com possível sacrifício das especificidades do campo mediático sujeitas à apreciação da AACS".
A situação é tanto mais preocupante quanto, como se podia ler no relatório do Sindicato dos Jornalistas de 1992, "em Portugal, não só não se criaram normas anti-monopolistas e de defesa da concorrência, que conciliassem a liberdade de imprensa com o direito à informação e o pluralismo informativo, como ainda se foram reduzindo mecanismos de defesa dos jornalistas, enquanto produtores de informação, perante o poder económico crescente das empresas de comunicação".
Como afirma Jorge Pegado Liz, membro da AACS, na sua declaração de voto de vencido em relação ao parecer referido, por o considerar demasiado tímido, "o essencial da análise não é o número de títulos, nem a adição dos números comerciais, sejam do capital das sociedades ou do volume de negócios, ou mesmo, em termos absolutos, a quota parte do mercado, mas antes de que modo, e em que medida, é que, como expressamente se lê no célebre Relatório Davey (do Comité Especial do Senado canadiano para os Mass Media, presidido pelo senador Keith Davey) "poderia conduzir a uma situação em que as notícias são controladas e manipuladas por um pequeno número de indivíduos e empresas cuja percepção daquilo que deve "sair" coincide em grande medida com o que interessa à General Motors, ou o que interessa para o negócio, ou o que interessa aos meus amigos".
Jorge Pegado Liz conclui que a concentração "no limite pode mesmo conduzir à "espiral do silêncio", com a prevalência da opinião dominante, senão mesmo do pensamento único, de consequências particularmente nefastas no comportamento individual, especialmente numa sociedade como a nossa, cujos padrões e valores são hoje directa e decisivamente influenciados pela Comunicação Social".
Sebastião Lima Rego, outro membro da AACS, também na sua declaração de voto, afirmava que, com a compra da Lusomundo por parte da PT, "é a circulação de ideias que fica bloqueada; é o pluralismo, a independência e a isenção da comunicação social que estão em causa; são os valores de liberdade de expressão das diversas correntes que amalgamam o todo nacional que passam a correr um grande risco; é a eventualidade de afunilamento e de massificação da informação que se perfila, ameaçadora, no horizonte".
Se a concentração de meios de comunicação social é preocupante, a concentração de distribuidoras não o é menos. Este é um instrumento fundamental para a produção e circulação de publicações, pondo em vantagem os jornais e revistas que estão integrados nos grupos que as detêm e em permanente risco que enteja fora deste mercado. O jornal Público, por exemplo, viu-se obrigado a procurar uma distribuidora não especializada em jornais diários para conseguir fugir das empresas detidas pelos seus principais concorrentes.
Hoje, 75% da distribuição é feita em 25% da rede. Não cabe ao legislador apresentar formas do Estado apoiar uma distribuição mais equitativa, mas as parecerias entre as empresas de comunicação social escrita e os Correios de Portugal (a maior rede de distribuição nacional) seria uma solução que o Estado deveria fomentar.
O Parlamento Europeu, no relatório já citado, "exige aos Estados-membros e à Comissão Europeia que velem por que a imprensa continue a dispor de estruturas de distribuição eficazes e baratas" e que "a constituição e exploração de agências responsáveis pela distribuição de jornais e revistas sejam absolutamente transparentes". O relatório do SJ afirma mesmo que "é nos sectores gráficos e da distribuição que o fenómeno da concentração se apresenta mais preocupante".
O que se diz sobre a distribuição da imprensa escrita aplica-se por maioria de razão aos meios de transmissão de dados e de audiovisual. É insustentável o facto dos detentores da rede fixa e de grande parte da distribuição de televisão por cabo serem os mesmos, impedindo assim o desenvolvimento de uma concorrência entre os dois meios.
Perante todos estes factos, o presente projecto de lei pretende travar o processo de concentração emergente e alterar, sempre que necessário, situações já existentes, impedindo a concentração horizontal, vertical e multimédia e dando, assim, corpo legislativo às preocupações constitucionais. Este objectivo não impede, por si só, a existência de sinergias positivas que permitam a convergência de

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