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Sábado, 6 de Dezembro de 2003 II Série-A - Número 19

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

S U M Á R I O

Projectos de lei (n.os 46, 362, 374, 380, 381 e 382 a 384/IX):
N.º 46/IX (Regula o acesso da Assembleia da República a documentos e informações com classificação de segredo de Estado):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 362/IX (Alteração ao Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Economia e Finanças.
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais e respectivo anexo.
- Relatório da discussão e votação na especialidade, texto final da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais e respectivos anexos (incluindo propostas de alteração apresentadas pelo PSD/CDS-PP e declaração de voto do PS).
N.º 374/IX (Alteração ao Estatuto da Aposentação):
- Vide projecto de lei n.º 362/IX.
N.º 380/IX (Cria o Instituto do Serviço Público de Acesso ao Direito (ISPAD), visando garantir a informação, a consulta jurídica e o apoio judiciário):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 381/IX (Regula o acesso aos documentos da Administração):
- Comunicação da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias acerca da elaboração e aprovação do relatório.
N.º 382/IX - Alteração ao Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de Maio, que estabelece o regime de renda apoiada (apresentado pelo PCP).
N.º 383/IX - Colocação de guardas de segurança metálicas nas vias de comunicação públicas, integradas ou não na rede rodoviária nacional, contemplando a perspectiva da segurança dos veículos de duas rodas (apresentado pelo PSD e CDS-PP).
N.º 384/IX - Cria a Agência Gestora da Floresta Nacional (AGFN), o Fundo de Reconversão Florestal (FRF) e as Unidades de Gestão Florestal (UGF) (apresentado pelo PS).

Propostas de lei (n.os 86 e 102/IX):
N.º 86/IX (Altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2002/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário do âmbito desses litígios):
- Vide projecto de lei n.º 380/IX.
N.º 102/IX (Altera o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

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Projecto de resolução n.o 194/IX: (a)
Sobre a Constituição Europeia (apresentado pela Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa):
- Texto do projecto de resolução.
- Relatório da Comissão referente aos trabalhos da Convenção sobre o Futuro da Europa e sobre o projecto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa.

Proposta de resolução n.o 52/IX (Aprova, para ratificação, o Acordo de Associação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados-membros, por um lado, e a República do Chile, por outro, bem como os seus Anexos, Protocolos e Notas, assinado em Bruxelas em 18 de Novembro de 2002):
- Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa.

Projecto de deliberação n.º 27/IX:
Alteração à Deliberação 15-PL/89, de 7 de Dezembro (apresentado pelo Conselho de Administração).

(a) São publicados em suplemento a este número.

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PROJECTO DE LEI N.º 46/IX
(REGULA O ACESSO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA A DOCUMENTOS E INFORMAÇÕES COM CLASSIFICAÇÃO DE SEGREDO DE ESTADO)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

Introdução

Em 31 de Maio de 2002 diversos Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentaram o projecto de lei n.º 46/IX, que regula o acesso da Assembleia da República a documentos e informações com classificação de segredo de Estado. Esta iniciativa legislativa foi admitida em 5 de Junho desse ano, tendo baixado à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para efeitos de elaboração de relatório e parecer na generalidade. A sua apreciação na generalidade em Plenário encontra-se agendada para o dia 4 de Dezembro de 2003.

Enquadramento legislativo

A matéria do segredo de Estado encontra-se regulada na Lei n.º 6/94, de 7 de Abril. Aí se dispõe que "são abrangidos pelo segredo de Estado os documentos e informações cujo conhecimento por pessoas não autorizadas é susceptível de pôr em risco ou de causar dano à independência nacional, à unidade ou integridade do Estado e à sua segurança interna ou externa" (n.º 1 do artigo 2.º). O risco e o dano "são avaliados caso a caso em face das suas circunstâncias concretas, não resultando automaticamente da natureza das matérias a tratar" (n.º 2 do artigo citado).
A classificação de documentos e informações como segredo de Estado obedece aos princípios da excepcionalidade, subsidiariedade, necessidade, proporcionalidade, tempestividade, igualdade, justiça e imparcialidade, bem como ao dever de fundamentação.
Verificado esse condicionalismo, podem ser submetidos ao regime do segredo de Estado documentos que respeitem, designadamente, às seguintes matérias:

a) As que são transmitidas, a título confidencial, por Estados estrangeiros ou por organizações internacionais;
b) As relativas à estratégia a adoptar pelo país no quadro de negociações presentes ou futuras com outros Estados ou com organizações internacionais;
c) As que visam prevenir e assegurar a operacionalidade e a segurança do pessoal, dos equipamentos, do material e das instalações das Forças Armadas e das forças e serviços de segurança;
d) As relativas aos procedimentos em matéria de segurança na transmissão de dados e informações com outros Estados ou com organizações internacionais;
e) Aquelas cuja divulgação pode facilitar a prática de crimes contra a segurança do Estado;
f) As de natureza comercial, industrial, científica, técnica ou financeira que interessam à preparação da defesa militar do Estado.

Para além disso, a Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (Lei n.º 30/84, de 5 de Setembro, alterada pelas Leis n.os 4/95, de 21 de Fevereiro, 15/96, de 30 de Abril, e 75-A/97, de 22 de Julho) considera, no seu artigo 32.º, como abrangidos pelo segredo de Estado os dados e informações constantes de registos, documentos, dossiers e arquivos dos serviços de informações cuja difusão seja susceptível de causar dano à unidade e integridade do Estado, à defesa das instituições democráticas estabelecidas na Constituição, ao livre exercício das suas funções pelos órgãos de soberania, à segurança interna, à independência nacional e à preparação da defesa militar (artigo 32.º).
O regime do segredo de Estado constitui, assim, uma excepção ao regime da "administração aberta" consagrado no n.º 2 do artigo 268.º da Constituição, que confere aos cidadãos o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas. Mas não se trata - longe disso - do único regime de classificação de documentos. Com efeito, as restrições determinadas por razões atinentes à investigação criminal (segredo de justiça) encontram-se reguladas no Código Penal (artigo 419.º) e no Código de Processo Penal (artigos 86.º a 90.º); as restrições no acesso a documentos por razões de protecção da intimidade das pessoas encontram-se reguladas na Lei de Protecção de Dados Pessoais (Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro) e na lei que regula o acesso aos documentos da Administração (Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 8/95, de 29 de Março, e pela Lei n.º 94/99, de 16 de Julho); as restrições de acesso a informações e documentos no âmbito dos Serviços do Sistema de Informações da República que não se encontrem abrangidos pelo regime do segredo de Estado são reguladas no artigo 28.º da respectiva lei-quadro. Para além disso, existem diversas resoluções do Conselho de Ministros contendo normas e instruções para a segurança nacional, salvaguarda e defesa das matérias classificadas (SEGNAC) - respectivamente, Resolução do Conselho de Ministros n.º 50/88, de 8 de Setembro - Instruções para a Segurança Nacional, Salvaguarda e Defesa das Matérias Classificadas (SEGNAC 1), Resolução do Conselho de Ministros n.º 37/89, de 1 de Junho - Normas para a Segurança Nacional, Salvaguarda e Defesa das Matérias Classificadas, Segurança Industrial, Tecnológica e de Investigação (SEGNAC 2), Resolução do Conselho de Ministros n.º 16/94, de 24 de Fevereiro - Instruções para a Segurança Nacional, Segurança das Telecomunicações (SEGNAC 3), e Resolução do Conselho de Ministros n.º 5/90, de 28 de Setembro - Normas para a Segurança Nacional, Salvaguarda e Defesa das Matérias Classificadas, Segurança Informática (SEGNAC 4) - , elaboradas no âmbito da competência governamental de "fixar as regras de classificação e controlo dos documentos oficiais e, bem assim, de credenciação das pessoas que devem ter acesso aos documentos classificados" (alínea d) do artigo 8.º da Lei de Segurança Interna - Lei n.º 20/87, de 12 de Junho, alterada pela Lei n.º 8/91, de 1 de Abril).
O segredo de Estado constitui, no entanto, a forma mais agravada de classificação de documentos, só sendo aplicável quando a realização dos fins que visa não seja compatível com formas menos estritas de reserva de acesso à informação (n.º 3 do artigo 1.º da Lei n.º 6/94, de 7 de Abril).

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A classificação de documentos ou informações como segredo de Estado é da competência do Presidente da República, do Presidente da Assembleia da República, do Primeiro-Ministro e dos Ministros (n.º 1 do artigo 3.º) - o n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 6/94, de 7 de Abril, referia-se também ao Governador de Macau -, sendo também permitido ao Chefe de Estado-Maior-General das Forças Armadas e aos directores dos serviços do Sistema de Informações da República (SIS e SIEDM) proceder a essa classificação a título provisório, no âmbito da sua competência própria, com a obrigação de comunicação para ratificação, no prazo máximo de 10 dias, a uma das entidades competentes para a classificação definitiva.
A questão para que nos convoca o projecto de lei n.º 46/IX diz directamente respeito ao regime de acesso aos documentos e informações classificados como segredo de Estado. Refere a Lei do Segredo de Estado, no seu artigo 9.º, que "apenas têm acesso a documentos em segredo de Estado, com as limitações e formalidades que venham a ser estabelecidas, as pessoas que deles careçam para o cumprimento das suas funções e que tenham sido autorizadas". Essa autorização é concedida pela entidade que conferiu a classificação definitiva e, no caso dos Ministros, por estes ou pelo Primeiro-Ministro.
Este regime de acesso não é, porém, aplicável ao Presidente da República e ao Primeiro-Ministro, não havendo quanto a estes qualquer restrição no acesso a documentos classificados.
Quanto ao acesso da Assembleia da República a documentos classificados como segredo de Estado, a lei nada refere, mas incumbe a este órgão de soberania fiscalizar o regime do segredo de Estado através de uma comissão de fiscalização independente composta por um juiz da jurisdição administrativa, designado pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que preside, e por dois Deputados eleitos pela Assembleia da República, sendo um sob proposta do grupo parlamentar do maior partido que apoia o Governo e outro sob proposta do grupo parlamentar do maior partido da oposição.
Questão diversa é a de saber se e como a Assembleia da República, para o exercício das suas atribuições e competências, tem o direito de aceder a documentos e informações classificados como segredo de Estado.

Antecedentes parlamentares

A primeira iniciativa legislativa apresentada na Assembleia da República sobre o regime do segredo de Estado (projecto de lei n.º 65/V, do CDS) previa duas disposições relativas ao relacionamento da Assembleia com esse regime: Eram excluídos da possibilidade de classificação como segredo de Estado os actos internacionais que exigissem constitucionalmente a intervenção da Assembleia da República e previa-se que o Estatuto da Oposição pudesse prever a comunicação a esta de factos ou documentos classificados. Esta iniciativa foi debatida na generalidade em 6 de Julho de 1988 e baixou sem votação às Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias e de Defesa Nacional para nova apreciação, que não veio a ter lugar. Em todo o caso, pouco adiantaria quanto à questão em apreço. Desde logo, porque não se vislumbra como poderia um acto internacional que exige constitucionalmente a intervenção da Assembleia da República ser ocultado a esta. Por outro lado, porque o acesso da Oposição ao segredo de Estado era remetido para o respectivo Estatuto, que era omisso quanto a essa matéria - o estatuto da oposição constava da Lei n.º 59/77, de 5 de Agosto - e assim se manteve apesar da sua revisão em 1998, através da Lei n.º 24/98, de 26 de Maio.
Na VI Legislatura (1991-1995) várias iniciativas legislativas incidiram sobre a matéria do segredo de Estado (foi, aliás, nessa legislatura que se aprovou a lei presentemente em vigor), bem como sobre a problemática do estatuto da Assembleia da República perante a aplicação desse regime.
Os projectos de lei n.os 181/VI, do PSD, e 190/VI, do CDS, limitavam-se a atribuir à Assembleia da República um papel fiscalizador do regime do segredo de Estado, a efectuar nos termos da Constituição e do Regimento. Já o projecto de lei n.º 189/VI, do PCP, propunha que o exercício das competências próprias da Assembleia da República e os poderes constitucionais e legais dos Deputados não pudessem ser prejudicados pelo regime do segredo de Estado. Para atingir esse objectivo a Assembleia da República deveria ser regularmente informada sobre a classificação de quaisquer matérias como segredo de Estado e sobre a respectiva fundamentação, através de um relatório semestral a apresentar pelas entidades competentes do qual constasse a lista das informações, documentos ou objectos cujo acesso tivesse sido vedado. O mecanismo de aplicação desse regime seria regulado no Regimento da Assembleia da República.
O PS, apesar do seu projecto de lei n.º 58/VI ser omisso quanto a essa matéria, apresentou em 16 de Novembro de 1994, ou seja, já depois de aprovada a Lei do Segredo de Estado, uma iniciativa legislativa - projecto de lei n.º 460/VI - que visava especificamente regular o acesso da Assembleia da República a informações e documentos classificados como segredo de Estado. Nesse projecto de lei o Grupo Parlamentar do PS previa o acesso da Assembleia da República a informações e documentos classificados por iniciativa das comissões parlamentares ou de grupo parlamentar com representação na Mesa, sendo a respectiva consulta facultada:

a) A um Deputado de cada grupo parlamentar especialmente eleito para o efeito;
b) Aos presidentes dos grupos parlamentares ou a um representante de cada grupo parlamentar na comissão que tenha tomado a iniciativa de requerer o acesso;
c) Exclusivamente ao Presidente da Assembleia da República e ao presidente da comissão que solicitou o acesso, mediante fundamentação de excepcionalidade por parte da entidade com poderes de classificação definitiva.

Na verdade, foi este o antecedente directo mais remoto do projecto de lei n.º 46/IX, tendo sido retomado no essencial na VII Legislatura (1991-1995) através do projecto de lei n.º 398/VII e na VIII Legislatura através do projecto de lei n.º 229/VIII.
Na VIII Legislatura também o PSD apresentou um projecto de lei, com o n.º 258/VIII, de revisão da Lei do Segredo de Estado que, quanto à Assembleia da República, propunha:

a) Que o Presidente da Assembleia da República não ficasse sujeito a qualquer restrição no acesso a documentos classificadas como segredo de Estado;

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b) Que os presidentes dos grupos parlamentares e os presidentes das comissões pudessem, por sua iniciativa ou por solicitação dos respectivos membros, requerer ao Presidente da Assembleia da República o acesso a documentos em segredo de Estado, necessários ao desempenho das competências constitucionais do Parlamento;
c) Que o Presidente da Assembleia da República, por sua iniciativa ou por solicitação do Governo, pudesse diferir, pelo tempo estritamente indispensável, o acesso a documentos em segredo de Estado ou restringi-lo à consulta dos presidentes dos grupos parlamentares e dos presidentes das comissões no gabinete presidencial e sem extracção de cópias;
d) Que a Comissão de Fiscalização do Segredo de Estado a funcionar junto da Assembleia da República fosse presidida por um Vice-Presidente da Assembleia da República, escolhido pelo Presidente de entre os eleitos pelos partidos da oposição;
e) Que a Comissão de Fiscalização mantivesse organizado e actualizado um registo de todas as informações e documentos classificados como segredo de Estado, com base nos elementos fornecidos pelas entidades com poder para tal classificação, que lhe competisse deliberar, sem recurso, sobre o acesso a informação e documentos classificados como segredo de Estado, e que pudesse ainda determinar a desclassificação de informações ou documentos por ter decorrido o respectivo prazo de classificação.

Tratava-se assim, na prática, de retirar o segredo de Estado do âmbito das entidades com competência para a classificação de informações e documentos como tal, colocando o respectivo regime na disponibilidade de um órgão independente no qual a oposição parlamentar se encontrasse em maioria. O projecto de lei n.º 285/VIII não chegou a ser debatido e não foi reapresentado pelos proponentes na presente Legislatura.

Projecto de lei n.º 46/IX

Os subscritores do projecto de lei n.º 46/IX justificam a sua apresentação pelo facto de a Lei n.º 6/94, de 7 de Abril, que aprovou o regime do segredo de Estado, não ter regulado as condições de acesso da Assembleia da República às informações de documentos classificados como tal. Pelo que, considerando que:

a) A Constituição da República Portuguesa e a lei consagram o direito fundamental de acesso dos cidadãos às informações e documentos da Administração e dos órgãos do Estado;
b) A transparência como regra e o segredo como excepção são a expressão de uma vida pública normal que se estende aos mais diversos níveis da actividade política, económica, social e administrativa;
c) A natureza excepcional do segredo de Estado se modela na compreensão de que só podem constituir matérias fechadas ao conhecimento dos cidadãos as informações, objectos ou factos que a serem divulgados de modo não autorizado possam acarretar um dano, mais ou menos significativo, à salvaguarda da independência nacional, da unidade e integridade do Estado e da segurança interna e externa;

Entendem os proponentes que "a necessidade de regulação desta matéria é tanto mais relevante quanto o exercício das competências fiscalizadoras e legislativas da Assembleia da República exigem uma informação e acesso documental que não pode submeter-se a uma lógica de segredo de Estado que excluam o Parlamento, como se este não fosse, também ele, um órgão do Estado".
Embora reconhecendo que o sistema de Governo acolhido na Constituição não impõe que o Parlamento deva ter acesso de forma ilimitada às informações classificadas como segredo de Estado pelo Presidente da República ou pelos membros do Governo, tendo até em conta a publicidade inerente às suas actividades, entendem os subscritores do projecto de lei n.º 46/IX que essa inacessibilidade não pode ir ao ponto de inviabilizar o normal exercício das competências constitucionais da Assembleia da República, designadamente as que implicam necessariamente o acesso ao segredo de Estado.
Por outro lado, o projecto de lei n.º 46/IX propõe-se regular o modo de acesso individual dos Deputados a matéria classificada como segredo de Estado pelo próprio Presidente da Assembleia da República, bem como assegurar em qualquer caso que o acesso do Parlamento ao segredo de Estado não ponha em causa a reserva que lhe é própria.
Assim, o projecto de lei n.º 46/IX prevê que a Assembleia da República possa ter acesso a documentos e informações classificados como segredo de Estado por iniciativa:

a) Das comissões parlamentares;
b) Das comissões de inquérito;
c) Das Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares;
d) Do Primeiro-Ministro.

Os documentos e as informações solicitados serão transmitidos, conforme os casos, aos presidentes dos grupos parlamentares ou a um representante de cada grupo parlamentar na comissão que tenha requerido a acesso. Porém, prevê-se que, mediante decisão fundamentada da entidade com poderes de classificação, assente em excepcionais razões de risco, tais documentos ou informações sejam transmitidos exclusivamente ao Presidente da Assembleia da República e ao presidente da comissão que solicitou o acesso.
Em qualquer caso, o Governo poderá ainda diferir o acesso solicitado, fundadamente e pelo tempo estritamente necessário, em razão de negociações internacionais ou para a salvaguarda de relevante interesse nacional.
Um regime excepcional é, no entanto, previsto para a comissão parlamentar que tenha a seu cargo o acompanhamento da participação de Portugal na União Europeia (o que actualmente compete à Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa), tendo em conta a competência constitucional da Assembleia da República de acompanhar e apreciar, nos termos da lei, a participação de Portugal no processo de construção da União Europeia (alínea f) do artigo 163.º), e o dever constitucional do Governo apresentar, em tempo útil, à Assembleia da República, para esse efeito, informação referente ao processo de construção da União Europeia (alínea i) do n.º 1 do artigo 197.º). Nesse caso, os documentos e informações abrangidos pelo segredo

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de Estado podem ser transmitidos directamente à comissão parlamentar competente em reunião sujeita a segredo e exclusivamente participada pelos Deputados que a integrem.
Os documentos e informações classificados como segredo de Estado pelo Presidente da Assembleia da República serão transmitidos, conforme os casos, aos presidentes dos grupos parlamentares ou a um representante de cada grupo parlamentar na comissão que tenha requerido a acesso.
O projecto de lei n.º 46/IX dispõe que o acesso da Assembleia da República ao segredo de Estado não afecta o direito individual dos Deputados de acesso à informação nos termos estabelecidos do Regimento da Assembleia da República e na lei. Trata-se de uma disposição que exige adequada clarificação em debate na especialidade que venha a ter lugar, na medida em que o Regimento da Assembleia da República é omisso quanto à sua compatibilização com o regime do segredo de Estado e que a classificação de um documento ou informação como segredo de Estado implica forçosamente o afastamento da regra geral de acesso irrestrito por parte dos Deputados. Se assim não fosse, a presente iniciativa legislativa não seria sequer necessária.
Finalmente, o projecto de lei em apreciação remete para despacho do Presidente da Assembleia da República as instruções sobre segurança das informações classificadas, conferindo a este o dever de velar pela aplicação dessas instruções por parte dos agentes e dos serviços parlamentares.

Conclusões

1 - O projecto de lei n.º 46/IX, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, propõe-se regular o acesso da Assembleia da República a documentos e informações com classificação de segredo de Estado.
2 - Trata-se de uma matéria que não se encontra regulada na Lei n.º 6/94, de 7 de Abril, sobre segredo de Estado, que apenas prevê a competência da Assembleia da República quanto à fiscalização da aplicação do regime do segredo de Estado através de uma comissão independente designada para o efeito, nada dispondo quanto ao acesso da Assembleia ao próprio conteúdo dos documentos ou informações classificados.
3 - O projecto de lei n.º 46/IX propõe-se regular os termos e as condições em que os documentos e informações classificados como segredo de Estado podem ser solicitados pela Assembleia da República e podem ser facultados pelas entidades com competência para a classificação.
Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte:

Parecer

Que o projecto de lei n.º 46/IX, do Partido Socialista, que regula o acesso da Assembleia da República a documentos e informações com classificação de segredo de Estado, se encontra em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário para apreciação na generalidade, reservando os grupos parlamentares as suas posições para o respectivo debate.

Assembleia da República, 3 de Dezembro de 2003. - O Deputado Relator, António Filipe - O Vice-Presidente da Comissão, Osvaldo Castro.

Nota: - O relatório, as conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência do CDS-PP,BE e Os Verdes.

PROJECTO DE LEI N.º 362/IX
(ALTERAÇÃO AO ESTATUTO DA APOSENTAÇÃO, REVOGAÇÃO DO DECRETO-LEI N.º 116/85, DE 19 DE ABRIL, E ALTERAÇÃO AOS DECRETOS-LEI N.OS 128/90, DE 17 DE ABRIL, E 327/85, DE 8 DE AGOSTO)

PROJECTO DE LEI N.º 374/IX
(ALTERAÇÃO AO ESTATUTO DA APOSENTAÇÃO)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Economia e Finanças

Relatório

I - Introdução

Os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP apresentaram conjuntamente à Assembleia da República o projecto de lei n.º 362/IX (Vide DAR II Série A, n.º 2, de 20/09/2003) relativo a "Alteração do Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto", tendo o Grupo Parlamentar do BE apresentado o projecto de lei n.º 374/IX relativo também a "Alteração ao Estatuto da Aposentação".
Estes projectos de lei que foram apresentados nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República reúnem os requisitos formais previstos no artigo 138.º do referido Regimento.
Por determinação do Sr. Presidente da Assembleia da República, os projectos de lei vertentes baixaram às Comissões Parlamentares de Economia, Finanças e Plano e de Trabalho e dos Assuntos Sociais, para efeitos de elaboração do competente relatório e parecer, que precede a discussão na generalidade dos mesmos já agendada para o Plenário da Assembleia da República de 27 de Novembro de 2003.

1.2 - O objecto e os motivos dos projectos de lei

Com o projecto de lei n.º 362/IX, pretendem os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP introduzir modificações ao regime de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública, designadamente, nos seguintes moldes:

a) No âmbito do Estatuto da Aposentação (Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro):

- Altera o artigo 51.º estabelecendo que a pensão de aposentação dos subscritores da Caixa Geral de Aposentações sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho, é determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto nos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias, natal ou prestações equivalentes.
- Altera o artigo 53.º estatuindo que a pensão de aposentação corresponde à trigésima sexta parte da remuneração mensal relevante, deduzida da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação com o limite máximo de 36 anos.

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- Adita o artigo 37.º-A relativo à aposentação antecipada consagrando: a possibilidade dos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, poderem, independentemente de sujeição a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, requerer a aposentação antecipada; a redução daquela pensão em 4,5% por cada ano de antecipação em relação à idade legal de aposentação; a redução à razão de um ano por cada período de três anos que exceda 36 anos de serviço para efeitos do número de anos de antecipação a considerar na determinação da taxa global de redução da pensão.

b) Revoga o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que permite aos funcionários e agentes da Administração Pública a aposentação antecipada, com direito à pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica e da idade, desde que não haja prejuízo para o serviço, quando reúnam 36 anos de serviço.
c) Adita um n.º 5 ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 128/90, de 17 de Abril, e altera o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 327/85, de 8 de Agosto (Estabelecimentos de ensino superior, privado ou cooperativo) estatuindo que a remuneração relevante para efeitos de desconto de quota e cálculo da pensão de aposentação não pode ser inferior à estabelecida na convenção colectiva de trabalho aplicável nem superior à que respeite à categoria e escalão da carreira docente instituída para o ensino oficial correspondente ao mesmo tempo de serviço.

Segundo os autores do projecto de lei n.º 362/IX "Por força do Acórdão n.º 360/2003, proferido em 8 de Julho de 2003 pelo Tribunal Constitucional, foram declaradas inconstitucionais, com força obrigatória geral, as normas constantes dos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho", pelo que, "(…) ponderado o vício de natureza exclusivamente formal que o Tribunal Constitucional encontrou nas normas referidas, impõe-se a sua aprovação regular pela Assembleia da República".
Por seu lado, com o projecto de lei n.º 374/IX, pretende o Grupo Parlamentar do BE "importar" para o Estatuto da Aposentação a norma contida no n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que reconhece aos funcionários e agentes da Administração Pública, o direito à antecipação da aposentação, independentemente de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço.
Citando o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 360/2003, de 8 de Julho, os proponentes do projecto de lei vertente acusam os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP de retomarem "(…) a mesma iniciativa legislativa, antes declarada inconstitucional, na tentativa da sua superação, mas persistindo em pôr em causa as legítimas expectativas quanto às condições para a aposentação consagradas na lei em claro prejuízo para os trabalhadores abrangidos pelo Estatuto de Aposentações", concluindo que a sua iniciativa legislativa visa "(…) corresponder às justas expectativas criadas nos trabalhadores (…)".

1.3 - Antecedentes parlamentares

Na presente Legislatura, o Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 28/IX (Vide DAR II Série A, n.º 26, 2.º e 4.º Supl. de 2/10/2002), que deu origem à Lei n.º 32-B/2002 (Vide Diário da República I Série A, n.º 301, Supl. de 30/12/2002), de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2003), aprovada com os votos favoráveis dos partidos da maioria, cujo artigo 9.º contém as normas agora constantes do projecto de lei n.º 362/IX.
As alterações introduzidas pelo aludido artigo 9.º da Lei do Orçamento para 2003 ao Estatuto da Aposentação, foram alvo de cerrada crítica por parte das associações sindicais pelo facto de não terem sido objecto de negociação colectiva e de participação por parte dos trabalhadores, como estipula a Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, (Vide Diário da República I Série A, n.º 121, de 26/04/98) que desenvolve o direito de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público.
Importa aqui recordar que, com o intuito de suprir o incumprimento do disposto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, os grupos parlamentares da maioria provocaram, no seio da Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais, a realização de um conjunto de audições envolvendo a Secretária de Estado da Administração Pública, os parceiros sociais e os sindicatos da Administração Pública.
Depois de aprovado pela Assembleia da República o artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, foi questionado pelo Sr. Presidente da República que, no uso dos poderes que a Constituição da República Portuguesa lhe confere requereu ao Tribunal Constitucional a declaração da inconstitucionalidade e da ilegalidade, com força obrigatória geral, das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da citada Lei (Orçamento do Estado para 2003).
Através do seu Acórdão n.º 360/2003 (Vide Diário da República I Série A, n.º 232, de 07/10/2003), veio o Tribunal Constitucional declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das normas contidas dos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, "(…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho, previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição".
É neste contexto que surgem os projectos de lei n.os 362/IX, do PSD/CDS-PP, e 347/IX, do BE, visando o primeiro reproduzir as normas declaradas pelo Tribunal Constitucional através do Acórdão n.º 360/2003, e o segundo integrar no Estatuto da Aposentação o regime de aposentação antecipada constante do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.

1.4 - Do quadro constitucional e legal

A Constituição da República Portuguesa consagra no seu artigo 266.º os princípios fundamentais que enformam a regime da Administração Pública, estabelecendo no artigo 269.º o regime da função pública.
No que especialmente concerne à protecção social, o artigo 67.º da Constituição consagra o direito de todos os cidadãos à segurança social, incumbindo ao Estado designadamente "(…) organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado com a participação das associações sindicais (…)".

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Por outro lado importa sublinhar que a Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, (Vide DAR I Série A, n.º 294, de 20/12/2002) que aprova as Bases da Segurança Social, estabelece, no seu artigo 124.º, o princípio da convergência progressiva entre os regimes de protecção social da função pública e os regimes do sistema de segurança social, estipulando expressamente que "Os regimes de protecção social da função pública deverão ser regulamentados por forma a convergir com os regimes do sistema de segurança social quanto ao âmbito material, regras de formação de direitos e atribuição das prestações".
Quanto ao enquadramento legal relativo à aposentação dos funcionários e agentes da Administração Pública, o mesmo encontra-se previsto no Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, vulgo Estatuto da Aposentação.
No que respeita ao cálculo das pensões dos subscritores da Caixa Geral de Aposentações sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho, o Estatuto da Aposentação não contém actualmente qualquer norma especial, aplicando-se a estes trabalhadores o regime aplicável aos agentes e funcionários da Administração Pública. Através da proposta de aditamento formulada no projecto de lei n.º 362/IX para o artigo 51.º do Estatuto da Aposentação, a pensão de aposentação daqueles subscritores passa a ser determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto auferidas nos últimos três anos, excluindo os subsídios de férias e de natal ou prestações equivalentes.
Relativamente à forma de cálculo da pensão, o artigo 53.º do Estatuto da Aposentação estipula que a pensão de aposentação corresponde à trigésima parte da remuneração que lhe serve de base multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação, até ao limite máximo de 36 anos. A proposta de alteração constante do projecto de lei n.º 362/IX, visa deduzir no cálculo da pensão a percentagem da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, estabelecendo que não podendo a pensão em situação alguma exceder o montante da remuneração mensal relevante líquida, tendo como efeito uma alteração ao montante das pensões.
Quanto ao regime de antecipação da aposentação, o mesmo encontra-se consubstanciado no Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que reconhece aos funcionários e agentes da Administração Pública o direito à aposentação com pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica, desde que não haja prejuízo para o serviço e qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço.
Com o objectivo confessado de contornar a decisão do Tribunal Constitucional que através do Acórdão n.º 360/2003, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, a Sr.ª Ministra do Estado e das Finanças fez aprovar o Despacho n.º 867/03/MEF, através do qual impôs a verificação de um vasto conjunto de requisitos quanto à antecipação da aposentação, cuja inobservância impede a Caixa Geral de Aposentações de proceder à respectiva avaliação, o que veio a traduzir-se numa forte restrição do acesso ao regime de aposentação antecipada.
O referido despacho, que a generalidade das associações sindicais dos trabalhadores da Administração Pública tem vindo a considerar ferido de ilegalidade, determina que "A Caixa Geral de Aposentações só poderá proceder à apreciação dos pedidos apresentados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 116/85 desde que o deferimento venha fundamentado pelo serviço de origem com base nos seguintes elementos:

a) Declaração do dirigente máximo de não ter havido qualquer aumento de pessoal na área funcional do funcionário, nomeadamente descongelamento de vagas, contratação a termo, avenças ou tarefas, nos últimos dois anos;
b) Mapa comparativo do número de aposentações e de novas admissões, caso tenha havido nos últimos dois anos;
c) Clara identificação dos motivos funcionais que permitem assegurar que, com base em critérios gestionários, o serviço pode garantir a actividade com menos pessoal, tendo em conta o plano de actividades e o balanço social;
d) Informação, relativamente aos funcionários em processo de aposentação, do número de anos de serviço no organismo e fundamento legal para a sua admissão;
e) Informação sobre as respectivas classificações de serviço nos últimos três anos, data da última promoção, cursos de formação efectuados em serviço e respectivos custos;
f) Quaisquer outros elementos relevantes, de natureza funcional, que permitam confirmar e existência de prejuízo para o serviço".

Finalmente, o mesmo despacho estipula, ainda, que "Salvo situações devidamente justificadas, o deferimento dos pedidos de aposentação antecipada determina o congelamento de todas as vagas nas mesmas carreiras ou carreiras com idêntico conteúdo funcional no âmbito do respectivo Ministério, pressupondo-se ter sido previamente esgotado o recurso à reafectação ou mobilidade interna".
No que concerne ao regime de antecipação da aposentação, o projecto de lei n.º 362/IX, retomando as normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, revoga o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e inclui aquele regime no Estatuto da Aposentação (Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro), ainda que em moldes diferentes, ou seja, reconhece aos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, independentemente de sujeição a junta médica e da idade e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, o direito a requerer a aposentação antecipada, com a aplicação de um factor de redução do valor da pensão à razão de 4,5% por cada ano de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação.
Por seu lado, o projecto de lei n.º 374/IX, vem incluir no Estatuto da Aposentação (Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro) o regime de aposentação antecipada constante do n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
Finalmente, importa ter presente que as matérias objecto dos projectos de lei vertentes (alteração ao Estatuto da Aposentação), devem ser analisadas tendo em consideração o regime jurídico estabelecido na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, que desenvolve o regime de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público, bem como das normas inscritas na Constituição da República Portuguesa que reconhecem às associações sindicais o direito de exercício de negociação colectiva.

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Com efeito, inclusive por razões que se prendem com as dificuldades ocorridas aquando da aprovação do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, é imperativo recolocar nesta sede as questões já suscitadas no passado pela Assembleia da República e pelo Sr. Presidente da República quanto às normas contidas na referida disposição legal, uma vez que as iniciativas legislativa vertentes, maxime o projecto de lei n.º 362/IX, reproduzem as mesmas.
Na prática, importa aferir se as matérias constantes das iniciativas legislativas em apreço integram ou não o conceito legal de matérias de negociação colectiva, dado que a verificar-se tal, forçoso será concluir que as mesmas enfermam de ilegalidade e de inconstitucionalidade.
O n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa veio reconhecer às associações sindicais o direito de contratação colectiva, o qual é assegurado e densificado nos termos da lei.
O direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública sujeitos ao contrato individual de trabalho encontra-se regulado no Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro. Já o exercício do direito de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, encontra-se vertido na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Os n.os 1 e 2 do artigo 5.º do citado diploma legal consagram expressamente o direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública, relativamente ao seu estatuto, sendo que o interlocutor pela Administração é o Governo, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 14.º. O referido diploma, consagra de forma taxativa as matérias objecto de negociação colectiva, definindo como tal, nomeadamente nos termos da alínea b) do artigo 6.º, as matérias relativas à fixação ou alteração "das pensões de aposentação ou de reforma".
A negociação colectiva deve iniciar-se, nos termos do artigo 7.º, a partir de 1 de Setembro de modo a poder estar concluída tendencialmente antes da votação final global da proposta de Orçamento do Estado, cabendo ao Governo tomar a decisão que entender adequada, caso não tenha sido obtido qualquer acordo, n.º 5 do artigo 9.º.
Ora, uma vez que as normas constantes dos projectos de lei sub judice versam sobre a fixação e/ou a alteração do método do cálculo das pensões de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública, levando à modificação do montante das pensões, parece ser forçoso concluir que integram o conceito de matérias de negociação colectiva, nos termos e para os efeitos previstos na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Neste contexto, tais matérias têm obrigatoriamente que ser objecto de negociação colectiva a exercer entre o Governo e as associações sindicais. Ora, não tendo ocorrido tal negociação e dado que a Assembleia da República não dispõe de mecanismos jurídicos que lhe permitam, em nome da Administração Pública ou do Governo, exercer a negociação colectiva em falta, entende-se que, salvo melhor opinião, as iniciativas legislativas em apreço enfermam de ilegalidade e inconstitucionalidade, por violação de normas e princípios legais e constitucionais que garantem o direito de negociação colectiva às associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
A aprovação tout court das iniciativas legislativas em questão poria em crise as normas contidas no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, diploma legal que assume um valor reforçado.
Aliás, tal entendimento foi já avançado pelo Sr. Presidente da República no requerimento que enviou ao Tribunal Constitucional para a apreciação e declaração de inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro.
Como desenvolvidamente refere o Acórdão n.º 360/2003, do Tribunal Constitucional, o Sr. Presidente da República, a propósito das alterações ao Estatuto da Aposentação constantes do artigo 9.º da Lei do Orçamento do Estado para 2003 (as mesmas a que se refere o projecto de lei n.º 362/IX), suscitou dúvidas de (in)constitucionalidade e de (i)legalidade, nos seguintes termos, sublinhando-se as passagens mais importantes:

"a) Segundo o artigo 56.º, n.º 3, da Constituição, compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei.
No que se refere aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, é a Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, que procede à densificação daquele direito de contratação colectiva, designadamente no seu artigo 6.º, alínea b), que são objecto de negociação colectiva as matérias relativas à fixação ou alteração das pensões de aposentação ou de reforma.
Por sua vez, no que se refere aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito privado, o direito de negociação colectiva rege-se pela legislação geral referente à regulamentação colectiva das relações de trabalho;
b) Ora, uma vez que as normas constantes do artigo 9.º, n.os 1, 2, 4 e 5, da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, fixam ou modificam substancialmente o método de cálculo e, consequentemente, o montante das pensões de aposentação, elas deveriam ter sido objecto de prévia negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
c) Não tendo ocorrido essa negociação colectiva antes da aprovação da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, as normas referidas enfermam de inconstitucionalidade por violação do direito de contratação colectiva das associações sindicais, consagrado no artigo 56.º, n.º 3, da Constituição.
(…)
l) Nestes termos, a inobservância dos procedimentos que, na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, regulam a produção de outros actos legislativos configura-se como inconstitucionalidade por violação indirecta dos artigos 2.º e 112.º, n.º 3, da Constituição, mas, como se infere do disposto no artigo 280.º, n.º 2, alínea a), e do disposto no artigo 281.º, n.º 1, alínea b), também se configura como vício autónomo de ilegalidade por violação de lei com valor reforçado.
m) Não tendo ocorrido, nos termos legalmente previstos, a negociação colectiva e a audição prévia das associações sindicais para efeitos de alteração das normas referentes às pensões e ao regime e Estatuto da Aposentação, as normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, na parte em que se referem aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, enfermam de ilegalidade por violação dos artigos 6.º, alínea b), 7.º, 10.º, n.º 1, alínea d), e 9.º e 14.º da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio".

No Acórdão n.º 360/2003 que proferiu, o Tribunal Constitucional não respondeu àquelas questões, considerando que não valia a pena fazê-lo uma vez que concluiu previamente

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que as mesmas já padeciam de inconstitucionalidade por violarem o direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição.
O referido Acórdão não deixa margens para dúvida quanto a este aspecto ao referir expressamente que "A resposta a esta questão implicaria determinar se a matéria sobre que versam tais normas se inclui no âmbito constitucionalmente imposto para o direito de contratação colectiva (…). A verdade, porém, é que essa averiguação só se impõe se não proceder o segundo fundamento de inconstitucionalidade apontado pelo Presidente da República - a falta de participação das associações sindicais no processo legislativo [alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição] (…)".
Assim, em total coerência com o referido, tendo previamente determinado que houve violação do direito de participação das associações sindicais no processo legislativo, o Tribunal Constitucional concluiu que "(…) torna-se desnecessário determinar se houve ou não desrespeito do direito de negociação colectiva, nos termos já indicados; e igualmente se torna desnecessário analisar quer a questão da eventual inconstitucionalidade por violação indirecta dos artigos 2.º e 112.º, n.º 3, da Constituição, quer o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral".
Neste contexto, uma vez que os projectos de lei em apreço, designadamente o projecto de lei n.º 362/IX, reproduzem as normas declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional através do Acórdão n.º 360/2003, a fundamentação aduzida pelo Presidente da República matem-se actual.
Em conclusão, salvo melhor e mais qualificado entendimento, entende o relator que, dada a inexistência do competente processo de negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, a aprovação dos projectos de lei n.os 362/IX do PSD/CDS-PP e 374/IX do BE poria em crise o cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa bem como com o estatuído na alínea b) do artigo 6.º e dos artigos 7.º, 9.º e 14.º, todos da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.

II - Das conclusões

Face aos considerandos que antecedem, conclui-se do seguinte modo:

1 - Os Grupos Parlamentares do PSD e CDS-PP tomaram a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.os 362/IX sobre "Alteração do Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto". Por seu turno, o Grupo Parlamentar do BE apresentou o projecto de lei n.º 374/IX, sobre "Alteração ao Estatuto da Aposentação".
2 - A apresentação dos citados projectos de lei foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, e reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do referido Regimento.
3 - Com o projecto de lei n.º 362/IX, visam os grupos parlamentares proponentes introduzir alterações ao Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, na sua actual redacção, aos Decretos-Leis n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto, bem como, a revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril. Com o projecto de lei sub judice visam os seus autores, em concreto:

a) Alterar o artigo 51.º do Estatuto da Aposentação passando a pensão de aposentação dos subscritores da CGA sujeitos ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, a ser determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto nos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias, Natal ou prestações equivalentes;
b) Alterar o artigo 53.º do Estatuto da Aposentação, passando a pensão de aposentação a corresponder à trigésima sexta parte da remuneração mensal relevante, deduzida da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação com o limite máximo de 36 anos;
c) Aditar ao Estatuto da Aposentação o artigo 37.º-A, relativo à aposentação antecipada, prevendo expressamente o direito dos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, independentemente da idade, de sujeição a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, a requerer a aposentação antecipada, cujo valor sofre uma redução à razão de 4,5% pelo número de anos de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação;
d) Revogar o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que actualmente estabelece o regime de antecipação da aposentação dos funcionários e agentes da Administração Pública;
e) Aditar o n.º 5 ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 128/90, de 17 de Abril, e alterar o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 327/85, de 8 de Agosto (estabelecimentos de ensino superior, privado ou cooperativo) estabelecendo que a remuneração relevante para efeitos de desconto de quota e cálculo da pensão de aposentação não pode ser inferior à estabelecida na convenção colectiva de trabalho aplicável nem superior à que respeite à categoria e escalão da carreira docente instituída para o ensino oficial correspondente ao mesmo tempo de serviço.

4 - Com o projecto de lei n.º 374/IX, visa o Grupo Parlamentar do BE incorporar no Estatuto da Aposentação o direito à aposentação antecipada, independentemente de qualquer outro requisito, quando o subscritor, funcionário ou agente da Administração Pública, seja qual for a carreira ou categoria em que se integrem, independentemente de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, reúna 36 anos de serviço.
5 - As alterações preconizadas pelas iniciativas vertentes ao Estatuto da Aposentação, não constitui novidade. Na IX Legislatura, em 2002, o XV Governo Constitucional apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 28/IX (Orçamento do Estado para 2003), que deu origem à Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, cujo artigo 9.º continha o conjunto de normas relativas à alteração do

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método de cálculo das pensões de aposentação e do regime da aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública, agora constantes do projecto de lei n.º 362/IX.
6 - O Tribunal Constitucional, através do seu Acórdão n.º 360/2003, a pedido do Sr. Presidente da República declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, "(…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho, previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição".
7 - No pedido que dirigiu ao Tribunal Constitucional o Sr. Presidente da República invocou a violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho consagrado no n.º 2 do artigo 56.º da Constituição, bem como, a violação do direito de negociação colectiva previsto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, e no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa, por entender que as citadas normas fixam ou modificam substancialmente o método de cálculo das pensões, devendo nessa conformidade ser objecto de prévia negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, questão que o Tribunal Constitucional acabou por não analisar.
8 - Assim, na análise aos projectos de lei em apreciação não se deve ignorar a discussão parlamentar ocorrida em torno da aprovação do artigo 9.º da Lei do Orçamento do Estado para 2003 e, maxime, as dúvidas de (in)constitucionalidade e de (i)legalidade suscitadas pelo Sr. Presidente da República.
9 - As normas constantes dos projectos de lei vertentes, uma vez que incidem sobre a fixação/alteração do método do cálculo das pensões de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública integram, à luz do disposto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, o conceito de matérias de negociação colectiva.
10 - Assim, salvo melhor opinião, é forçoso concluir que tais matérias teriam de ser prévia e obrigatoriamente objecto de negociação colectiva a exercer entre o Governo e as associações sindicais.
11 - Dado que tal negociação não se verificou e que a Assembleia da República não dispõe de legitimidade para exercer a negociação colectiva em falta, a aprovação das iniciativas legislativas em questão redundaria numa violação das normas constantes do n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.

III - Parecer

A Comissão Parlamentar de Economia, Finanças e Plano é do seguinte parecer:

a) Os projectos de lei n.os 362/IX do PSD/CDS-PP sobre "Alteração do Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril e 327/85, de 8 de Agosto", e 374/IX do BE sobre "Alteração ao Estatuto da Aposentação", não preenchem, salvo melhor opinião, os requisitos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis para poder ser discutida e votada pelo Plenário da Assembleia da República;
b) O presente relatório e parecer é remetido ao Sr. Presidente da Assembleia da República, para os efeitos tidos por convenientes.

Assembleia da República, 25 de Novembro de 2003. - O Deputado Relator, Fernando Serrasqueiro - O Presidente da Comissão, João Cravinho.

Nota: - As conclusões tiveram a seguinte votação:
Os pontos n.os 1 a 8 foram aprovados por unanimidade; os pontos n.os 9 a 11 foram rejeitados, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS e do PCP.
O parecer foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS e do PCP.

O PSD fez a seguinte proposta de aditamento ao parecer:
"Não se tendo o Tribunal Constitucional pronunciado sobre a eventual violação do direito de negociação colectiva, os grupos parlamentares reservam para o debate em Plenário a sua apreciação sobre a eventual inconstitucionalidade conexa com a alegada violação, constantes dos projectos de lei n.os 362/IX da iniciativa do PSD e CDS-PP, e 374/IX do BE"
que foi aprovada, com votos a favor do PSD e CDS-PP e votos contra do PS e do PCP.

O Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro (PS), relator dos projectos de lei, declarou que não se revê no parecer votado, mantendo as conclusões e parecer que constam no seu relatório.
O Presidente da Comissão informa ainda que, nesta reunião, registou-se a ausência do BE.

PROJECTO DE LEI N.º 362/IX
(ALTERAÇÃO AO ESTATUTO DA APOSENTAÇÃO, REVOGAÇÃO DO DECRETO-LEI N.º 116/85, DE 19 DE ABRIL, E ALTERAÇÃO AOS DECRETOS-LEI N.OS 128/90, DE 17 DE ABRIL, E 327/85, DE 8 DE AGOSTO)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais e respectivo anexo

I - Do relatório

1.1 Nota prévia

Os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP tomaram a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 362/IX [Vide DAR II Série A N.º 2, de 20/09/2003] sobre "Alteração do Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril e 327/85, de 8 de Agosto".
A apresentação do citado projecto de lei foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, e reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do referido Regimento.
Por Despacho de S. Excelência o Presidente da Assembleia da República, o projecto de lei referido baixou à Comissão de Economia e Finanças e à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais com a menção expressa de "para o efeito de se promover a audição das entidades representativas dos trabalhadores".
O projecto de lei vertente será discutido na reunião do Plenário da Assembleia da República do dia 27 de Novembro de 2003.

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1.2 Do objecto e da motivação

Através do projecto de lei n.º 362/IX, visam os Grupos Parlamentares proponentes introduzir alterações ao Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, na sua actual redacção, aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril e 327/85, de 8 de Agosto, bem como, revogar do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
Assim, o projecto de lei em epígrafe encerra em concreto as seguintes soluções normativas:

a) Altera o artigo 51.º do Estatuto da Aposentação passando a pensão de aposentação dos subscritores da CGA sujeitos ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, a ser determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto nos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias, Natal ou prestações equivalentes;
b) Altera o artigo 53.º do Estatuto da Aposentação, passando a pensão de aposentação a corresponder à trigésima sexta parte da remuneração mensal relevante, deduzida da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação com o limite máximo de 36 anos;
c) Adita ao Estatuto da Aposentação o artigo 37.º-A, relativo à aposentação antecipada, que prevê expressamente: (i) a possibilidade dos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, poderem, independentemente de sujeição a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, requerer a aposentação antecipada; (ii) a redução do valor daquela pensão à razão de 4,5% pelo número de anos de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação; (iii) a redução de um ano por cada período de três anos que exceda 36 anos de serviço para efeitos do número de anos de antecipação a considerar para a determinação da taxa global de redução da pensão;
d) Revoga o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que permite que os funcionários e agentes da Administração Pública possam aposentar-se, com direito à pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço;
e) Adita o n.º 5 ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 128/90, de 17 de Abril, e altera o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 327/85, de 8 de Agosto (estabelecimentos de ensino superior, privado ou cooperativo) estabelecendo que a remuneração relevante para efeitos de desconto de quota e cálculo da pensão de aposentação não pode ser inferior à estabelecida na convenção colectiva de trabalho aplicável nem superior à que respeite à categoria e escalão da carreira docente instituída para o ensino oficial correspondente ao mesmo tempo de serviço.

De acordo com a exposição de motivos que acompanha o projecto de lei vertente "Por força do Acórdão n.º 369/2003, proferido em 8 de Julho de 2003 pelo Tribunal Constitucional, foram declaradas inconstitucionais, com força obrigatória geral, as normas constantes dos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho", adiantando que "Não obstante, são de reconhecida importância para o País as significativas modificações que com aquelas normas se pretendia introduzir no método de cálculo das pensões de aposentação e no regime da aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública". Assim, na opinião dos autores do projecto de lei sub judice "(…) ponderado o vício de natureza exclusivamente formal que o Tribunal Constitucional encontrou nas normas supra referidas, impõe-se a sua aprovação regular pela Assembleia da República".

1.3 Dos antecedentes parlamentares

A discussão em torno das alterações ao Estatuto da Aposentação dos trabalhadores da Administração Pública constantes do projecto de lei n.º 362/IX do PSD/CDS-PP não é nova no quadro parlamentar.
Com efeito, na presente Legislatura, em 2002, o XV Governo Constitucional apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 28/IX [Vide DAR II Série A, n.º 26, 2.º e 4.º Suplemento de 02/10/2002] (Orçamento do Estado para 2003), que deu origem à Lei n.º 32-B/2002[Vide DR I Série A, n.º 301, Suplemento de 30/12/2002], de 30 de Dezembro, aprovada [Vide DAR I Série, n.º 56, de 15/11/2002] com os votos favoráveis do PSD e do CDS-PP e os votos contra do PS, PCP, Partido Ecologista os Verdes e do BE, cujo artigo 9.º contém o conjunto de normas relativas à alteração do método de cálculo das pensões de aposentação e do regime da aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública, agora constantes do projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP).
As alterações introduzidas ao Estatuto da Aposentação, através do artigo 9.º da Lei do Orçamento para 2003, foram objecto de forte crítica, quer por parte dos partidos da oposição quer em geral por parte das associações sindicais, que sustentaram a ilegalidade e a inconstitucionalidade daquelas normas, dado o facto de não terem as mesmas sido objecto de negociação colectiva e participação por parte dos trabalhadores, conforme estipulado pela Lei n.º 23/98 [Vide DR I Série A n.º 121, de 26/04/98], de 26 de Maio, que estabelece o regime de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público.
No quadro da Assembleia da República, os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP, com o objectivo de sanarem a omissão da participação dos trabalhadores quanto às alterações ao Estatuto da Aposentação incluídas na proposta de lei n.º 28/IX, desencadearam, no âmbito da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, um conjunto

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de audições com a Secretária de Estado da Administração Pública, com os parceiros sociais e com os Sindicatos da Administração Pública. Importa sublinhar que, à excepção dos grupos parlamentares que suportam o Governo, nenhum outro grupo parlamentar [Vide Declarações de voto do PS e PCP ao requerimento apresentado pelo PSD e CDS-PP, Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, do dia 22/10/2002] aceitou o referido processo de audições, como um procedimento susceptível de suprir o incumprimento do disposto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Após a aprovação pela Assembleia da República da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, o Sr. Presidente da República, no uso dos seus poderes constitucionais, requereu ao Tribunal Constitucional a apreciação e a declaração da inconstitucionalidade e da ilegalidade, com força obrigatória geral, das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da citada Lei (Orçamento do Estado para 2003).
O Tribunal Constitucional veio, através do seu Acórdão n.º 360/2003 [Vide DR I Série A, n.º 232, de 07/10/2003] - Processo n.º 13/2003, dar razão ao Sr. Presidente da República, ao reconhecer e declarar com força obrigatória geral a inconstitucionalidade das normas contidas dos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, "(…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho, previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição".
É, pois, neste contexto, que surge o projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP), visando repor, através de projecto de lei, as normas rejeitadas pelo Tribunal Constitucional através do Acórdão n.º 360/2003.

1.4 Do quadro constitucional e legal

Em matéria de protecção social, o artigo 67.º da Lei Fundamental reconhece o direito de todos os cidadãos à segurança social, cabendo ao Estado nomeadamente "(…) organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado com a participação das associações sindicais (…)".
Por seu turno, a Lei n.º 32/2002 [Vide DAR I Série A, n.º 294, de 20/12/2002], de 20 de Dezembro, que aprova as Bases da Segurança Social, estabelece expressamente o princípio da convergência progressiva entre os regimes de protecção social da função pública e os regimes do sistema de segurança social. Com efeito, o artigo 124.º do citado diploma legal, estipula que "Os regimes de protecção social da função pública deverão ser regulamentados por forma a convergir com os regimes do sistema de segurança social quanto ao âmbito material, regras de formação de direitos e atribuição das prestações". Cumpre sublinhar que este princípio que já se encontrava consagrado na Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto [artigo 70.º] (Lei de Bases da Segurança Social), foi incorporado na Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto [artigo 110.º] (Bases Gerais do Sistema de Solidariedade e Segurança Social), mantendo-se inalterado na citada Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro.
No que respeita em concreto ao quadro legal atinente à aposentação dos funcionários e agentes da Administração Pública, o mesmo encontra-se previsto e regulado no Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, vulgo Estatuto da Aposentação.
O artigo 51.º do Estatuto da Aposentação relativo a regimes especiais, não contém actualmente qualquer norma especial aplicável aos subscritores da Caixa Geral de Aposentações sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho, aplicando-se a estes trabalhadores no que concerne à remuneração relevante para efeitos de cálculo das suas pensões o regime aplicável aos agentes e funcionários da Administração Pública.
Com a proposta formulada no projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP), a pensão de aposentação dos subscritores sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho passa a ser determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto auferidas nos últimos três anos, excluindo os subsídios de férias e de natal ou prestações equivalentes, configurando, assim, uma alteração à remuneração mensal relevante para efeitos das pensões de aposentação daqueles trabalhadores.
O artigo 53.º, relativo à forma de cálculo da pensão, estatui que a pensão de aposentação corresponde à trigésima parte da remuneração que lhe serve de base multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação, até ao limite máximo de 36 anos.
A proposta avançada pelo projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP) vai no sentido de deduzir no cálculo da pensão a percentagem da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, não podendo a pensão, em situação alguma, exceder o montante da remuneração mensal relevante líquida, o que tem como efeito uma alteração ao montante das pensões.
O Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, consagra a aposentação voluntária de funcionários ou agentes com 36 anos de serviço, independentemente da idade (antecipação da aposentação):

O citado diploma legal (cfr. artigo 1.º), que teve como desiderato o descongestionamento e rejuvenescimento da Administração Pública, bem como corresponder a uma antiga pretensão dos funcionários e agentes da Administração Pública, reconhece aos funcionários e agentes o direito à aposentação com pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica, desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço.
No que respeita à tramitação, o referido diploma (cfr. artigo 3.º) estabelece que os requerimentos solicitando a aposentação antecipada devem ser apresentados nos departamentos onde os funcionários prestam serviço, os quais devem ser informatizados, designadamente quanto à inexistência de prejuízo para o serviço e submetidos a despacho do membro do Governo competente, que concordando determinará o seu envio para a Caixa Geral de Aposentações.
Recentemente, na sequência do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 360/2003, que declarou com força obrigatória geral a inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, entre as quais se incluía nomeadamente a revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, a Sr.ª Ministra do Estado e das Finanças aprovou o Despacho n.º 867/03/MEF, de 05/08/2003, através do qual impôs a verificação de um vasto conjunto de requisitos quanto aos pedidos de antecipação da aposentação, cuja inobservância impede a Caixa Geral de Aposentações de proceder à respectiva avaliação
O citado Despacho foi fundamentado com base na existência de uma "(…) total subversão do regime de aposentação antecipada com graves prejuízos para o interesse público (…)"

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e na necessidade de "(…) garantir desde já que não haverá a pura e simples retoma das práticas anteriores, disciplinando com o rigor exigido pela Lei e pelo interesse público a apreciação das situações apresentadas ao abrigo do regime ainda vigente".
Tal Despacho que foi considerado pela quase generalidade das entidades sindicais ouvidas no âmbito da audição em curso levada a cabo pela Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais, ferido de ilegalidade, veio determinar que "A Caixa Geral de Aposentações só poderá proceder à apreciação dos pedidos apresentados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 116/85 desde que o deferimento venha fundamentado pelo serviço de origem com base nos seguintes elementos:

a) Declaração do dirigente máximo de não ter havido qualquer aumento de pessoal na área funcional do funcionário, nomeadamente descongelamento de vagas, contratação a termo, avenças ou tarefas, nos últimos dois anos;
b) Mapa comparativo do número de aposentações e de novas admissões, caso tenha havido nos últimos dois anos;
c) Clara identificação dos motivos funcionais que permitem assegurar que, com base em critérios gestionários, o serviço pode garantir a actividade com menos pessoal, tendo em conta o plano de actividades e o balanço social;
d) Informação, relativamente aos funcionários em processo de aposentação, do número de anos de serviço no organismo e fundamento legal para a sua admissão;
e) Informação sobre as respectivas classificações de serviço nos últimos 3 anos, data da última promoção, cursos de formação efectuados em serviço e respectivos custos;
f) Quaisquer outros elementos relevantes, de natureza funcional, que permitam confirmar e existência de prejuízo para o serviço".

Determina, ainda, o mesmo Despacho que "Salvo situações devidamente justificadas, o deferimento dos pedidos de aposentação antecipada determina o congelamento de todas as vagas nas mesmas carreiras ou carreiras com idêntico conteúdo funcional no âmbito do respectivo Ministério, pressupondo-se ter sido previamente esgotado o recurso à reafectação ou mobilidade interna".
Em suma, trata-se de um Despacho que ao exigir a observância deste vasto conjunto de condicionalismos, teve como efeito uma forte restrição no acesso ao regime de aposentação antecipada, constante do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
Com o projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP) pretendem os seus autores, retomando as normas constantes dos n.os 1 a 5 do artigo 9.º da Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, proceder à revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e incluir o regime de aposentação antecipada no Estatuto da Aposentação (Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro), prevendo a possibilidade dos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, poderem, independentemente de sujeição a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, requerer a aposentação antecipada. Porém, com a aplicação de um factor de redução do valor da pensão à razão de 4,5% por cada ano de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação.

1.5 Do enquadramento do problema

A discussão em torno das alterações ao Estatuto da Aposentação constantes das iniciativas legislativas vertentes não constitui, como já aqui ficou amplamente demonstrado [Vide ponto 1.3. do presente relatório e parecer], novidade no quadro parlamentar, na justa medida em que as soluções normativas plasmadas no projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP) correspondem na íntegra às normas constantes dos n.os 1 a 5 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2003), declaradas inconstitucionais pelo Acórdão n.º 360/2003, do Tribunal Constitucional.
Neste contexto, entende a relatora que o debate em torno dos projectos de lei em apreciação não pode escamotear aquilo que foi a discussão parlamentar ocorrida aquando da aprovação do artigo 9.º da Lei do Orçamento do Estado para 2003 e, a fortiori, tão pouco pode ignorar as dúvidas de (in)constitucionalidade e de (i)legalidade suscitadas pelo Sr. Presidente da República, bem como, o conteúdo do Acórdão do Tribunal Constitucional, relativamente a tais normas.
Importa, pois, ter presente que as matérias objecto dos projectos de lei em apreciação (alteração ao Estatuto da Aposentação), devem forçosamente ser analisadas à luz do enquadramento jurídico previsto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, que estabelece o regime de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público, assim como dos princípios constitucionais que reconhecem às associações sindicais o direito de exercício de negociação colectiva.
Em suma, até por razões que se prendem com as vicissitudes ocorridas em torno da aprovação do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, afigura-se desejável e imperioso equacionar se as matérias agora constantes da iniciativa legislativa vertente são ou não subsumíveis no conceito legal de matérias de negociação colectiva, dependendo daí, a sua conformidade legal e constitucional.
Como é consabido, a Constituição da República Portuguesa reconhece expressamente às associações sindicais, no seu artigo 56.º, n.º 3, o direito de contratação colectiva, o qual é assegurado nos termos da lei.
No que respeita aos trabalhadores da Administração Pública contratados ao abrigo do regime jurídico do contrato individual de trabalho, o exercício do direito de negociação colectiva foi regulado através do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro.
No que especificamente se refere à Administração Pública, o direito de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público, encontra-se densificado na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
O citado diploma legal, estabelece expressamente (cfr. n.os 1 e 2 do artigo 5.º) o direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública, relativamente ao seu estatuto, definindo a negociação colectiva como "(…) a negociação efectuada entre as associações sindicais e a Administração das matérias relativas àquele estatuto, com vista à obtenção de um acordo", sendo que nas situações de negociação colectiva que revistam carácter geral, o interlocutor pela Administração é o Governo (cfr. n.º 1 do artigo 14.º).

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O referido diploma, consagra de forma taxativa as matérias objecto de negociação colectiva, definindo como tal, designadamente, as matérias relativas à fixação ou alteração "das pensões de aposentação ou de reforma" [cfr. alínea b) do artigo 6.º].
Nos termos do já aludido diploma (cfr. artigo 7.º), a negociação colectiva deve iniciar-se a partir de 1 de Setembro de modo a poder estar concluída tendencialmente antes da votação final global da proposta de Orçamento do Estado, tomando o Governo a decisão que entender adequada, caso não tenha sido obtido qualquer acordo (cfr. n.º 5 do artigo 9.º).
Por último, de sublinhar igualmente que a mesma Lei [cfr. alínea d) do n.º 1 do artigo 10.º], confere aos trabalhadores da Administração Pública o direito de participação, a exercer através das suas associações sindicais, nomeadamente no que concerne a alterações ao Estatuto de Aposentação.
Significa, pois, de jure condito que as normas constantes do projecto n.º 362/IX, quer as que se reportam ao Estatuto de Aposentação, quer as que se reportam ao regime de antecipação da aposentação, uma vez que versam sobre a fixação/alteração do método do cálculo das pensões de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública e, nessa medida, conduzem a uma modificação do montante das pensões, integram o conceito de matérias de negociação colectiva, nos termos e para os efeitos previstos na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Assim, é forçoso concluir que tais matérias têm de ser prévia e obrigatoriamente objecto de negociação colectiva a exercer entre o Governo e as associações sindicais. Em consequência, dado que tal negociação não se verificou no caso vertente e que a Assembleia da República nunca poderia suprir tal omissão porque não dispõe de legitimidade jurídico-legal para, em representação da Administração Pública ou do Governo, exercer a negociação colectiva (cfr. artigo 182.º da CRP e 14.º da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio), não pode o Parlamento aprovar as iniciativas legislativas em questão, sob pena de colocar em crise as normas contidas no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, diploma legal de valor reforçado.
Em suma, salvo melhor entendimento, as normas constantes da iniciativa legislativa em apreço parecem encontrar-se feridas de ilegalidade e inconstitucionalidade, por violação de normas e princípios legais e constitucionais que garantem o direito de negociação colectiva às associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
Idêntico entendimento foi amplamente expendido pelo Sr. Presidente da República aquando do seu requerimento dirigido ao Tribunal Constitucional para efeitos de apreciação e declaração de inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro.
Com efeito, como se pode ler no Acórdão n.º 360/2003, do Tribunal Constitucional, o Sr. Presidente da República alegando que "(…) são significativas as modificações introduzidas pelas normas cuja apreciação pretende, quer no método de cálculo das pensões de aposentação (e, consequentemente no respectivo montante), quer no regime de aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública" sustentou as suas dúvidas de constitucionalidade quanto às referidas normas legais, nomeadamente nos seguintes termos:

"a) Segundo o artigo 56.º, n.º 3, da Constituição, compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei.
No que se refere aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, é a Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, que procede à densificação daquele direito de contratação colectiva, designadamente no seu artigo 6.º, alínea b), que são objecto de negociação colectiva as matérias relativas à fixação ou alteração das pensões de aposentação ou de reforma.
Por sua vez, no que se refere aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito privado, o direito de negociação colectiva rege-se pela legislação geral referente à regulamentação colectiva das relações de trabalho;
b) Ora, uma vez que as normas constantes do artigo 9.º, n.os 1, 2, 4 e 5, da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, fixam ou modificam substancialmente o método de cálculo e, consequentemente, o montante das pensões de aposentação, elas deveriam ter sido objecto de prévia negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
c) Não tendo ocorrido essa negociação colectiva antes da aprovação da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, as normas referidas enfermam de inconstitucionalidade por violação do direito de contratação colectiva das associações sindicais, consagrado no artigo 56.º, n.º 3, da Constituição.

(…)

l) Nestes termos, a inobservância dos procedimentos que na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, regulam a produção de outros actos legislativos configura-se como inconstitucionalidade por violação indirecta dos artigos 2.º e 112.º, n.º 3, da Constituição, mas, como se infere do disposto no artigo 280.º, n.º 2, alínea a), e do disposto no artigo 281.º, n.º 1, alínea b), também se configura como vício autónomo de ilegalidade por violação de lei com valor reforçado.
m) Não tendo ocorrido, nos termos legalmente previstos, a negociação colectiva e a audição prévia das associações sindicais para efeitos de alteração das normas referentes às pensões e ao regime e Estatuto da Aposentação, as normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, na parte em que se referem aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, enfermam de ilegalidade por violação dos artigos 6.º, alínea b), 7.º, 10.º, n.º 1, alínea d), e 9.º e 14.º da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio".

A estas questões, não respondeu o Tribunal Constitucional no Acórdão que proferiu, por ter considerado que tal não se impunha uma vez que concluiu previamente que as mesmas normas estavam feridas de inconstitucionalidade por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição.
Efectivamente, o referido Acórdão o Tribunal Constitucional é claro quanto a este aspecto ao referir que "A resposta a esta questão implicaria determinar se a matéria sobre que versam tais normas se inclui no âmbito constitucionalmente imposto para o direito de contratação colectiva (…). A verdade, porém, é que essa averiguação só se impõe se não proceder o segundo fundamento de inconstitucionalidade

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apontado pelo Presidente da República - a falta de participação das associações sindicais no processo legislativo [alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição] (…)". Ora, tendo determinado que houve de facto violação do direito de participação das associações sindicais no processo legislativo, o Tribunal Constitucional concluiu no seguinte sentido "Chegados a este ponto, torna-se desnecessário determinar se houve ou não desrespeito do direito de negociação colectiva, nos termos já indicados; e igualmente se torna desnecessário analisar quer a questão da eventual inconstitucionalidade por violação indirecta dos artigos 2.º e 112.º, n.º 3, da Constituição, quer o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral".

Em suma, dado que o projecto de lei em apreço padece dos mesmos vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade detectados quanto às normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional, mantêm-se actuais e oportunos os argumentos expendidos pelo Sr. Presidente da República, nos quais nos revemos integralmente.
Nestes termos e à guisa de conclusão é entendimento da relatora que, dada a inexistência do competente processo de negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, as normas constantes do projecto de lei n.os 362/IX (PSD/CDS-PP) enfermam de inconstitucionalidade por violação do disposto no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e de ilegalidade por violação do disposto na alínea b) do artigo 6.º e dos artigos 7.º, 9.º e 14.º todos da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.

1.6 Da audição e discussão pública

a) Da audição

Por deliberação da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, e sem prejuízo da realização do competente processo de consulta pública nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, foram realizadas nos dias 18 e 19 de Novembro de 2003, um conjunto de audições em torno do projecto de lei n.º 362/IX com as associações sindicais dos trabalhadores da Administração Pública, tendo sido ouvidas as seguintes entidades:

- FESAP
- Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado
- Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública
- Sindicato Nacional dos Professores Licenciados
- Sindicato Nacional dos Correios e Telecomunicações
- União dos Sindicatos Independentes

Todas as entidades referidas manifestaram a sua discordância face àquele projecto de lei, ou porque que consideram que relativamente ao mesmo deveria, nos termos legais e constitucionais aplicáveis, ter ocorrido o competente processo de negociação colectiva ou, ainda, porque pura e simplesmente não se revêem nas soluções normativas nele preconizadas.

B) Da consulta pública

Terminado o período de consulta pública do projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP), que decorreu entre o dia 28 de Outubro de 2003 e o dia 26 de Novembro de 2003, deram entrada na Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais 37 pareceres remetidos por associações sindicais dos trabalhadores da Administração Pública, comissões de trabalhadores e plenários de trabalhadores. Acresce, ainda, que foi recebido da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública um abaixo-assinado, subscrito por 62 256 trabalhadores da Administração Pública que se manifestam contra a aprovação do projecto de lei em apreço.
A generalidade das associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, pronunciaram-se acerca do projecto de lei n.º 362/IX em termos negativos, manifestando expressamente a sua oposição à aprovação do mesmo.
Mais especificadamente se dirá a esse respeito que:

No parecer que a FESAP-Frente Sindical da Administração Pública remeteu à Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais, pode ler-se que "Nos termos da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, artigo 6.º, alínea b), as matérias relativas à fixação ou alteração das pensões de aposentação e reforma, são obrigatoriamente objecto de negociação colectiva, sujeitando-se por isso aos procedimentos previstos na referida legislação. Não será inoportuno lembrar que o não cumprimento desses mecanismos de negociação foi a génese da declaração de inconstitucionalidade do anterior projecto de reforma do Estatuto da Aposentação, pelo que um novo incumprimento desses mecanismos acarretará nova declaração de inconstitucionalidade. Até ao presente não existiu ainda qualquer procedimento negocial em relação à matéria referida". No que respeita ao conteúdo material do projecto de lei vertente, refere a FESAP que "(…) o mesmo nos suscita total discordância, dado que nos levanta sérias e fundadas dúvidas acerca da constitucionalidade material de algumas das suas normas".

O Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado, refere-se à iniciativa legislativa dos partidos da maioria nos seguintes termos: "Invoca-se a decisão do Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 360/2003) para justificar a reapresentação das alterações julgadas inconstitucionais, agora pela via, exclusivamente, parlamentar. Diz-se que dessa forma se sana o vício apontado pelo Tribunal Constitucional. A verdade é que o aludido vício não se sana desta forma. Assim, o que se faz é contornar o vício. O Governo não quer reapresentar as alterações, cumprindo os ditames da Lei Fundamental e escuda-se com a Assembleia da República para evitar assumir as suas responsabilidades. Com esta postura, o Governo consegue, duma assentada desrespeitar o Tribunal Constitucional, desacreditar o Parlamento e subverter as regras do jogo democrático, o que é altamente censurável. Afasta ardilosamente a aplicação das regras da negociação colectiva para forçar as associações sindicais a intervirem no processo meramente a título de mera participação. (…) O processo de participação não senta o legislador à mesa com as associações sindicais, não tendo a virtualidade de permitir que estas possam influenciar o processo de elaboração legislativa". Para o STE "Mesmo a entender-se que a audição de associações sindicais a realizar pela Comissão competente da Assembleia da república (…) salvaguardaria o direito constitucional das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho, ainda assim não teriam sido observados os procedimentos impostos pela Lei n.º 23/98, de 26 de Maio. Tratando-se de legislação a aprovar pela Assembleia da República, não regula a lei qualquer processo específico de negociação colectiva". Para além deste aspecto, o STE, alega que do ponto de vista material as soluções preconizadas pelo projecto de lei em causa implica a "(…) violação do princípio da igualdade", bem como, "(…) o princípio da irretroactividade

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das leis", e ainda, "(…) o princípio da protecção da confiança".

Finalmente, também a Frente Comum de Sindicatos seguindo a mesma linha de argumentação, mostra-se desfavorável ao projecto de lei em apreço, referindo no seu parecer que "(…) é inconcebível que se pretenda pelo mecanismo parlamentar da 'discussão e audição pública' denegar um direito fundamental - o direito à negociação colectiva - que constitucionalmente não está cometido à Assembleia da República, mas sim no caso sub judice, ao Governo", adiantando, de igual modo que as alterações em causa, também violam matérias e princípios "(…) constitucionalmente consagrados por:

- Tentar introduzir discriminações negativas, dispensando tratamentos diferentes para situações de facto iguais;
- Violar o princípio da segurança jurídica ao tentar introduzir um tratamento menos favorável para situações de facto já constituídas e/ou em formação;
- A vingarem significariam flagrantes violações do princípio da igualdade;
- Querer impor retroactivamente alterações de discriminação negativa a situações de facto já constituídas".

II - Das conclusões

Atentos os considerandos que antecedem, conclui-se no seguinte sentido:

1 - Os Grupos Parlamentares do PSD e CDS-PP tomaram a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 362/IX sobre "Alteração do Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril e 327/85, de 8 de Agosto".
2 - A apresentação do citado projecto de lei foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, e reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do referido Regimento.
3 - Com o projecto de lei n.º 362/IX, pretendem os grupos parlamentares proponentes introduzir alterações ao Estatuto de Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, na sua actual redacção, aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto, bem como, revogar o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
4 - As soluções preconizadas pelo projecto de lei vertente implicam em concreto:

a) Alterar o artigo 51.º do Estatuto da Aposentação, passando a pensão de aposentação dos subscritores da CGA sujeitos ao regime jurídico do contrato individual de trabalho a ser determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto nos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias, Natal ou prestações equivalentes;
b) Alterar o artigo 53.º do Estatuto da Aposentação, passando a pensão de aposentação a corresponder à trigésima sexta parte da remuneração mensal relevante, deduzida da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação com o limite máximo de 36 anos;
c) Aditar ao Estatuto da Aposentação o artigo 37.º-A, relativo à aposentação antecipada, que prevê expressamente: (i) a possibilidade dos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, poderem, independentemente de sujeição a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, requerer a aposentação antecipada; (ii) a redução do valor daquela pensão à razão de 4,5% pelo número de anos de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação; (iii) a redução de um ano por cada período de três anos que exceda 36 anos de serviço para efeitos do número de anos de antecipação a considerar para a determinação da taxa global de redução da pensão;
d) Revogar o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que permite que os funcionários e agentes da Administração Pública possam aposentar-se, com direito à pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço;
e) Aditar o n.º 5 ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 128/90, de 17 de Abril, e alterar o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 327/85, de 8 de Agosto (estabelecimentos de ensino superior, privado ou cooperativo), estabelecendo que a remuneração relevante para efeitos de desconto de quota e cálculo da pensão de aposentação não pode ser inferior à estabelecida na convenção colectiva de trabalho aplicável nem superior à que respeite à categoria e escalão da carreira docente instituída para o ensino oficial correspondente ao mesmo tempo de serviço.

5 - A discussão em torno das alterações preconizadas pela iniciativa vertente ao Estatuto da Aposentação, não constitui novidade no quadro parlamentar. Na presente Legislatura, em 2002, o XV Governo Constitucional apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 28/IX (Orçamento do Estado para 2003), que deu origem à Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, aprovada, com os votos favoráveis do PSD e CDS-PP e os votos contra do PS, PCP, Partido Ecologista os Verdes e o BE, cujo artigo 9.º contém o conjunto de normas relativas à alteração do método de cálculo das pensões de aposentação e do regime da aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública, agora constantes do projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP).
6 - O Tribunal Constitucional veio, através do seu Acórdão n.º 360/2003 - Processo n.º 13/2003, a pedido do Sr. Presidente da República, reconhecer e declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, "(…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho, previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição".

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7 - No quadro da discussão parlamentar do projecto de lei sub judice, a Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais desencadeou um processo de audição e consulta pública com as associações representativas dos trabalhadores da administração pública. No quadro da audição realizada foram ouvidas as seguintes entidades: FESAP, Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado, Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública, Sindicato Nacional dos Professores Licenciados, Sindicato Nacional dos Correios e Telecomunicações e União dos Sindicatos Independentes.
8 - No âmbito da consulta pública relativa ao projecto de lei n.º 362/IX, que decorreu entre 28 de Outubro de 2003 e 26 de Novembro de 2003, foram recebidos pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais 37 pareceres e um abaixo-assinado subscrito por 62 256 trabalhadores da Administração Pública.

III - Parecer

A Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais é do seguinte parecer:

a) Não se tendo o Tribunal Constitucional pronunciado sobre a eventual violação do direito à negociação colectiva, os grupos parlamentares reservam para o debate em Plenário a sua apreciação sobre a eventual inconstitucionalidade conexa com a alegada violação constante do projecto de lei n.º 362/IX, da iniciativa do PSD e CDS-PP;
b) Para os efeitos tidos por convenientes, o presente relatório e parecer é remetido ao Sr. Presidente da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 26 de Novembro de 2003. - O Presidente da Comissão, Joaquim Pina Moura - A Deputada Relatora, Maria do Carmo Romão.

Nota: As conclusões foram aprovadas por unanimidade;
No parecer: a alínea a) foi aprovada, com votos a favor do PSD e CDS-PP e votos contra do PS; a alínea b) foi aprovada por unanimidade.

Para efeitos dos n.os 7 e 8 do artigo 35.º do Regimento da Assembleia da República, informa-se que o relatório original da Sr.ª Deputada Maria do Carmo Romão (em anexo), sobre a mesma iniciativa legislativa, sofreu a seguinte votação:
Os pontos 1 a 6 e 14 e 15 das conclusões foram aprovados por unanimidade, tendo os demais pontos das conclusões sido rejeitados, com votos contra do PSD e CDS-PP e os votos a favor do PS.
Mais se informa que não se procedeu à votação da alínea a) do parecer, em virtude de a mesma ter ficado prejudicada pela aprovação da proposta de substituição apresentada pelo PSD para essa alínea.
Registaram-se, ainda, as ausências do PCP, do BE e de Os verdes.

Anexo

Relatório apresentado pela Deputada Relatora Maria do Carmo Romão

Relatório e parecer

I - Do relatório

1.1 Nota prévia

Os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP tomaram a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 362/IX [Vide DAR II Série A N.º 2, de 20/09/2003] sobre "Alteração do Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril e 327/85, de 8 de Agosto".
A apresentação do citado projecto de lei foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, e reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do referido Regimento.
Por Despacho de S. Excelência o Presidente da Assembleia da República, o projecto de lei referido baixou à Comissão de Economia e Finanças e à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais com a menção expressa de "para o efeito de se promover a audição das entidades representativas dos trabalhadores".
O projecto de lei vertente será discutido na reunião do Plenário da Assembleia da República do dia 27 de Novembro de 2003.

1.2 Do objecto e da motivação

Através do projecto de lei n.º 362/IX, visam os Grupos Parlamentares proponentes introduzir alterações ao Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, na sua actual redacção, aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril e 327/85, de 8 de Agosto, bem como, revogar do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
Assim, o projecto de lei em epígrafe encerra em concreto as seguintes soluções normativas:

a) Altera o artigo 51.º do Estatuto da Aposentação passando a pensão de aposentação dos subscritores da CGA sujeitos ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, a ser determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto nos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias, Natal ou prestações equivalentes;
b) Altera o artigo 53.º do Estatuto da Aposentação, passando a pensão de aposentação a corresponder à trigésima sexta parte da remuneração mensal relevante, deduzida da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação com o limite máximo de 36 anos;
c) Adita ao Estatuto da Aposentação o artigo 37.º-A, relativo à aposentação antecipada, que prevê expressamente:
(i) a possibilidade dos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, poderem, independentemente de sujeição a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, requerer a aposentação antecipada;
(ii) a redução do valor daquela pensão à razão de 4,5% pelo número de anos de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação;
(iii) a redução de um ano por cada período de três anos que exceda 36 anos de serviço para efeitos do número de anos de antecipação

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a considerar para a determinação da taxa global de redução da pensão;
d) Revoga o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que permite que os funcionários e agentes da Administração Pública possam aposentar-se, com direito à pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço;
e) Adita o n.º 5 ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 128/90, de 17 de Abril, e altera o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 327/85, de 8 de Agosto (estabelecimentos de ensino superior, privado ou cooperativo) estabelecendo que a remuneração relevante para efeitos de desconto de quota e cálculo da pensão de aposentação não pode ser inferior à estabelecida na convenção colectiva de trabalho aplicável nem superior à que respeite à categoria e escalão da carreira docente instituída para o ensino oficial correspondente ao mesmo tempo de serviço.

De acordo com a exposição de motivos que acompanha o projecto de lei vertente "Por força do Acórdão n.º 369/2003, proferido em 8 de Julho de 2003 pelo Tribunal Constitucional, foram declaradas inconstitucionais, com força obrigatória geral, as normas constantes dos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho", adiantando que "Não obstante, são de reconhecida importância para o País as significativas modificações que com aquelas normas se pretendia introduzir no método de cálculo das pensões de aposentação e no regime da aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública". Assim, na opinião dos autores do projecto de lei sub judice "(…) ponderado o vício de natureza exclusivamente formal que o Tribunal Constitucional encontrou nas normas supra referidas, impõe-se a sua aprovação regular pela Assembleia da República".

1.3 Dos antecedentes parlamentares

A discussão em torno das alterações ao Estatuto da Aposentação dos trabalhadores da Administração Pública constantes do projecto de lei n.º 362/IX do PSD/CDS-PP não é nova no quadro parlamentar.
Com efeito, na presente Legislatura, em 2002, o XV Governo Constitucional apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 28/IX [Vide DAR II Série A, n.º 26, 2.º e 4.º Suplemento de 02/10/2002] (Orçamento do Estado para 2003), que deu origem à Lei n.º 32-B/2002 [Vide DR I Série A, n.º 301, Suplemento de 30/12/2002], de 30 de Dezembro, aprovada [Vide DAR I Série, n.º 56, de 15/11/2002] com os votos favoráveis do PSD e do CDS-PP e os votos contra do PS, PCP, Partido Ecologista os Verdes e do BE, cujo artigo 9.º contém o conjunto de normas relativas à alteração do método de cálculo das pensões de aposentação e do regime da aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública, agora constantes do projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP).
As alterações introduzidas ao Estatuto da Aposentação, através do artigo 9.º da Lei do Orçamento para 2003, foram objecto de forte crítica, quer por parte dos partidos da oposição quer em geral por parte das associações sindicais, que sustentaram a ilegalidade e a inconstitucionalidade daquelas normas, dado o facto de não terem as mesmas sido objecto de negociação colectiva e participação por parte dos trabalhadores, conforme estipulado pela Lei n.º 23/98 [Vide DR I Série A n.º 121, de 26/04/98], de 26 de Maio, que estabelece o regime de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público.
No quadro da Assembleia da República, os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP, com o objectivo de sanarem a omissão da participação dos trabalhadores quanto às alterações ao Estatuto da Aposentação incluídas na proposta de lei n.º 28/IX, desencadearam, no âmbito da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, um conjunto de audições com a Secretária de Estado da Administração Pública, com os parceiros sociais e com os Sindicatos da Administração Pública. Importa sublinhar que, à excepção dos grupos parlamentares que suportam o Governo, nenhum outro grupo parlamentar [Vide Declarações de voto do PS e PCP ao requerimento apresentado pelo PSD e CDS-PP, Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, do dia 22/10/2002] aceitou o referido processo de audições, como um procedimento susceptível de suprir o incumprimento do disposto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Após a aprovação pela Assembleia da República da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, o Sr. Presidente da República, no uso dos seus poderes constitucionais, requereu ao Tribunal Constitucional a apreciação e a declaração da inconstitucionalidade e da ilegalidade, com força obrigatória geral, das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da citada Lei (Orçamento do Estado para 2003).
O Tribunal Constitucional veio, através do seu Acórdão n.º 360/2003 [Vide DR I Série A, n.º 232, de 07/10/2003] - Processo n.º 13/2003, dar razão ao Sr. Presidente da República, ao reconhecer e declarar com força obrigatória geral a inconstitucionalidade das normas contidas dos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, "(…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho, previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição".
É, pois, neste contexto, que surge o projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP), visando repor, através de projecto de lei, as normas rejeitadas pelo Tribunal Constitucional através do Acórdão n.º 360/2003.

1.4 Do quadro constitucional e legal

Em matéria de protecção social, o artigo 67.º da Lei Fundamental reconhece o direito de todos os cidadãos à segurança social, cabendo ao Estado nomeadamente "(…) organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado com a participação das associações sindicais (…)".
Por seu turno, a Lei n.º 32/2002 [Vide DAR I Série A, n.º 294, de 20/12/2002], de 20 de Dezembro, que aprova as Bases da Segurança Social, estabelece expressamente o princípio da convergência progressiva entre os regimes de protecção social da função pública e os regimes do sistema de segurança social. Com efeito, o artigo 124.º do citado diploma legal, estipula que "Os regimes de protecção social

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da função pública deverão ser regulamentados por forma a convergir com os regimes do sistema de segurança social quanto ao âmbito material, regras de formação de direitos e atribuição das prestações". Cumpre sublinhar que este princípio que já se encontrava consagrado na Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto [artigo 70.º] (Lei de Bases da Segurança Social), foi incorporado na Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto [artigo 110.º] (Bases Gerais do Sistema de Solidariedade e Segurança Social), mantendo-se inalterado na citada Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro.
No que respeita em concreto ao quadro legal atinente à aposentação dos funcionários e agentes da Administração Pública, o mesmo encontra-se previsto e regulado no Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, vulgo Estatuto da Aposentação.
O artigo 51.º do Estatuto da Aposentação relativo a regimes especiais, não contém actualmente qualquer norma especial aplicável aos subscritores da Caixa Geral de Aposentações sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho, aplicando-se a estes trabalhadores no que concerne à remuneração relevante para efeitos de cálculo das suas pensões o regime aplicável aos agentes e funcionários da Administração Pública.
Com a proposta formulada no projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP), a pensão de aposentação dos subscritores sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho passa a ser determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto auferidas nos últimos três anos, excluindo os subsídios de férias e de natal ou prestações equivalentes, configurando, assim, uma alteração à remuneração mensal relevante para efeitos das pensões de aposentação daqueles trabalhadores.
O artigo 53.º, relativo à forma de cálculo da pensão, estatui que a pensão de aposentação corresponde à trigésima parte da remuneração que lhe serve de base multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação, até ao limite máximo de 36 anos.
A proposta avançada pelo projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP) vai no sentido de deduzir no cálculo da pensão a percentagem da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, não podendo a pensão, em situação alguma, exceder o montante da remuneração mensal relevante líquida, o que tem como efeito uma alteração ao montante das pensões.
O Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, consagra a aposentação voluntária de funcionários ou agentes com 36 anos de serviço, independentemente da idade (antecipação da aposentação):

O citado diploma legal (cfr. artigo 1.º), que teve como desiderato o descongestionamento e rejuvenescimento da Administração Pública, bem como corresponder a uma antiga pretensão dos funcionários e agentes da Administração Pública, reconhece aos funcionários e agentes o direito à aposentação com pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica, desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço.
No que respeita à tramitação, o referido diploma (cfr. artigo 3.º) estabelece que os requerimentos solicitando a aposentação antecipada devem ser apresentados nos departamentos onde os funcionários prestam serviço, os quais devem ser informatizados, designadamente quanto à inexistência de prejuízo para o serviço e submetidos a despacho do membro do Governo competente, que concordando determinará o seu envio para a Caixa Geral de Aposentações.
Recentemente, na sequência do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 360/2003, que declarou com força obrigatória geral a inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, entre as quais se incluía nomeadamente a revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, a Sr.ª Ministra do Estado e das Finanças aprovou o Despacho n.º 867/03/MEF, de 05/08/2003, através do qual impôs a verificação de um vasto conjunto de requisitos quanto aos pedidos de antecipação da aposentação, cuja inobservância impede a Caixa Geral de Aposentações de proceder à respectiva avaliação
O citado Despacho foi fundamentado com base na existência de uma "(…) total subversão do regime de aposentação antecipada com graves prejuízos para o interesse público (…)" e na necessidade de "(…) garantir desde já que não haverá a pura e simples retoma das práticas anteriores, disciplinando com o rigor exigido pela Lei e pelo interesse público a apreciação das situações apresentadas ao abrigo do regime ainda vigente".
Tal Despacho que foi considerado pela quase generalidade das entidades sindicais ouvidas no âmbito da audição em curso levada a cabo pela Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais, ferido de ilegalidade, veio determinar que "A Caixa Geral de Aposentações só poderá proceder à apreciação dos pedidos apresentados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 116/85 desde que o deferimento venha fundamentado pelo serviço de origem com base nos seguintes elementos:

a) Declaração do dirigente máximo de não ter havido qualquer aumento de pessoal na área funcional do funcionário, nomeadamente descongelamento de vagas, contratação a termo, avenças ou tarefas, nos últimos dois anos;
b) Mapa comparativo do número de aposentações e de novas admissões, caso tenha havido nos últimos dois anos;
c) Clara identificação dos motivos funcionais que permitem assegurar que, com base em critérios gestionários, o serviço pode garantir a actividade com menos pessoal, tendo em conta o plano de actividades e o balanço social;
d) Informação, relativamente aos funcionários em processo de aposentação, do número de anos de serviço no organismo e fundamento legal para a sua admissão;
e) Informação sobre as respectivas classificações de serviço nos últimos 3 anos, data da última promoção, cursos de formação efectuados em serviço e respectivos custos;
f) Quaisquer outros elementos relevantes, de natureza funcional, que permitam confirmar e existência de prejuízo para o serviço".

Determina, ainda, o mesmo Despacho que "Salvo situações devidamente justificadas, o deferimento dos pedidos de aposentação antecipada determina o congelamento de todas as vagas nas mesmas carreiras ou carreiras com idêntico conteúdo funcional no âmbito do respectivo Ministério, pressupondo-se ter sido previamente esgotado o recurso à reafectação ou mobilidade interna".

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Em suma, trata-se de um Despacho que ao exigir a observância deste vasto conjunto de condicionalismos, teve como efeito uma forte restrição no acesso ao regime de aposentação antecipada, constante do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
Com o projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP) pretendem os seus autores, retomando as normas constantes dos n.os 1 a 5 do artigo 9.º da Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, proceder à revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e incluir o regime de aposentação antecipada no Estatuto da Aposentação (Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro), prevendo a possibilidade dos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, poderem, independentemente de sujeição a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, requerer a aposentação antecipada. Porém, com a aplicação de um factor de redução do valor da pensão à razão de 4,5% por cada ano de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação.

1.5 Do enquadramento do problema

A discussão em torno das alterações ao Estatuto da Aposentação constantes das iniciativas legislativas vertentes não constitui, como já aqui ficou amplamente demonstrado [Vide ponto 1.3. do presente relatório e parecer], novidade no quadro parlamentar, na justa medida em que as soluções normativas plasmadas no projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP) correspondem na íntegra às normas constantes dos n.os 1 a 5 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2003), declaradas inconstitucionais pelo Acórdão n.º 360/2003, do Tribunal Constitucional.
Neste contexto, entende a relatora que o debate em torno dos projectos de lei em apreciação não pode escamotear aquilo que foi a discussão parlamentar ocorrida aquando da aprovação do artigo 9.º da Lei do Orçamento do Estado para 2003 e, a fortiori, tão pouco pode ignorar as dúvidas de (in)constitucionalidade e de (i)legalidade suscitadas pelo Sr. Presidente da República, bem como, o conteúdo do Acórdão do Tribunal Constitucional, relativamente a tais normas.
Importa, pois, ter presente que as matérias objecto dos projectos de lei em apreciação (alteração ao Estatuto da Aposentação), devem forçosamente ser analisadas à luz do enquadramento jurídico previsto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, que estabelece o regime de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público, assim como dos princípios constitucionais que reconhecem às associações sindicais o direito de exercício de negociação colectiva.
Em suma, até por razões que se prendem com as vicissitudes ocorridas em torno da aprovação do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, afigura-se desejável e imperioso equacionar se as matérias agora constantes da iniciativa legislativa vertente são ou não subsumíveis no conceito legal de matérias de negociação colectiva, dependendo daí, a sua conformidade legal e constitucional.
Como é consabido, a Constituição da República Portuguesa reconhece expressamente às associações sindicais, no seu artigo 56.º, n.º 3, o direito de contratação colectiva, o qual é assegurado nos termos da lei.
No que respeita aos trabalhadores da Administração Pública contratados ao abrigo do regime jurídico do contrato individual de trabalho, o exercício do direito de negociação colectiva foi regulado através do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro.
No que especificamente se refere à Administração Pública, o direito de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público, encontra-se densificado na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
O citado diploma legal, estabelece expressamente (cfr. n.os 1 e 2 do artigo 5.º) o direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública, relativamente ao seu estatuto, definindo a negociação colectiva como "(…) a negociação efectuada entre as associações sindicais e a Administração das matérias relativas àquele estatuto, com vista à obtenção de um acordo", sendo que nas situações de negociação colectiva que revistam carácter geral, o interlocutor pela Administração é o Governo (cfr. n.º 1 do artigo 14.º).
O referido diploma, consagra de forma taxativa as matérias objecto de negociação colectiva, definindo como tal, designadamente, as matérias relativas à fixação ou alteração "das pensões de aposentação ou de reforma" [cfr. alínea b) do artigo 6.º].
Nos termos do já aludido diploma (cfr. artigo 7.º), a negociação colectiva deve iniciar-se a partir de 1 de Setembro de modo a poder estar concluída tendencialmente antes da votação final global da proposta de Orçamento do Estado, tomando o Governo a decisão que entender adequada, caso não tenha sido obtido qualquer acordo (cfr. n.º 5 do artigo 9.º).
Por último, de sublinhar igualmente que a mesma Lei [cfr. alínea d) do n.º 1 do artigo 10.º], confere aos trabalhadores da Administração Pública o direito de participação, a exercer através das suas associações sindicais, nomeadamente no que concerne a alterações ao Estatuto de Aposentação.
Significa, pois, de jure condito que as normas constantes do projecto n.º 362/IX, quer as que se reportam ao Estatuto de Aposentação, quer as que se reportam ao regime de antecipação da aposentação, uma vez que versam sobre a fixação/alteração do método do cálculo das pensões de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública e, nessa medida, conduzem a uma modificação do montante das pensões, integram o conceito de matérias de negociação colectiva, nos termos e para os efeitos previstos na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Assim, é forçoso concluir que tais matérias têm de ser prévia e obrigatoriamente objecto de negociação colectiva a exercer entre o Governo e as associações sindicais. Em consequência, dado que tal negociação não se verificou no caso vertente e que a Assembleia da República nunca poderia suprir tal omissão porque não dispõe de legitimidade jurídico-legal para, em representação da Administração Pública ou do Governo, exercer a negociação colectiva (cfr. artigo 182.º da CRP e 14.º da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio), não pode o Parlamento aprovar as iniciativas legislativas em questão, sob pena de colocar em crise as normas contidas no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, diploma legal de valor reforçado.
Em suma, salvo melhor entendimento, as normas constantes da iniciativa legislativa em apreço parecem encontrar-se feridas de ilegalidade e inconstitucionalidade, por violação de normas e princípios legais e constitucionais que garantem o direito de negociação colectiva às associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.

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Idêntico entendimento foi amplamente expendido pelo Sr. Presidente da República aquando do seu requerimento dirigido ao Tribunal Constitucional para efeitos de apreciação e declaração de inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro.
Com efeito, como se pode ler no Acórdão n.º 360/2003, do Tribunal Constitucional, o Sr. Presidente da República alegando que "(…) são significativas as modificações introduzidas pelas normas cuja apreciação pretende, quer no método de cálculo das pensões de aposentação (e, consequentemente no respectivo montante), quer no regime de aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública" sustentou as suas dúvidas de constitucionalidade quanto às referidas normas legais, nomeadamente nos seguintes termos:

"a) Segundo o artigo 56.º, n.º 3, da Constituição, compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei.
No que se refere aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, é a Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, que procede à densificação daquele direito de contratação colectiva, designadamente no seu artigo 6.º, alínea b), que são objecto de negociação colectiva as matérias relativas à fixação ou alteração das pensões de aposentação ou de reforma.
Por sua vez, no que se refere aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito privado, o direito de negociação colectiva rege-se pela legislação geral referente à regulamentação colectiva das relações de trabalho;
b) Ora, uma vez que as normas constantes do artigo 9.º, n.os 1, 2, 4 e 5, da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, fixam ou modificam substancialmente o método de cálculo e, consequentemente, o montante das pensões de aposentação, elas deveriam ter sido objecto de prévia negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
c) Não tendo ocorrido essa negociação colectiva antes da aprovação da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, as normas referidas enfermam de inconstitucionalidade por violação do direito de contratação colectiva das associações sindicais, consagrado no artigo 56.º, n.º 3, da Constituição.

(…)

l) Nestes termos, a inobservância dos procedimentos que na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, regulam a produção de outros actos legislativos configura-se como inconstitucionalidade por violação indirecta dos artigos 2.º e 112.º, n.º 3, da Constituição, mas, como se infere do disposto no artigo 280.º, n.º 2, alínea a), e do disposto no artigo 281.º, n.º 1, alínea b), também se configura como vício autónomo de ilegalidade por violação de lei com valor reforçado.
m) Não tendo ocorrido, nos termos legalmente previstos, a negociação colectiva e a audição prévia das associações sindicais para efeitos de alteração das normas referentes às pensões e ao regime e Estatuto da Aposentação, as normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, na parte em que se referem aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, enfermam de ilegalidade por violação dos artigos 6.º, alínea b), 7.º, 10.º, n.º 1, alínea d), e 9.º e 14.º da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio".

A estas questões, não respondeu o Tribunal Constitucional no Acórdão que proferiu, por ter considerado que tal não se impunha uma vez que concluiu previamente que as mesmas normas estavam feridas de inconstitucionalidade por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição.
Efectivamente, o referido Acórdão o Tribunal Constitucional é claro quanto a este aspecto ao referir que "A resposta a esta questão implicaria determinar se a matéria sobre que versam tais normas se inclui no âmbito constitucionalmente imposto para o direito de contratação colectiva (…). A verdade, porém, é que essa averiguação só se impõe se não proceder o segundo fundamento de inconstitucionalidade apontado pelo Presidente da República - a falta de participação das associações sindicais no processo legislativo [alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição] (…)". Ora, tendo determinado que houve de facto violação do direito de participação das associações sindicais no processo legislativo, o Tribunal Constitucional concluiu no seguinte sentido "Chegados a este ponto, torna-se desnecessário determinar se houve ou não desrespeito do direito de negociação colectiva, nos termos já indicados; e igualmente se torna desnecessário analisar quer a questão da eventual inconstitucionalidade por violação indirecta dos artigos 2.º e 112.º, n.º 3, da Constituição, quer o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral".

Em suma, dado que o projecto de lei em apreço padece dos mesmos vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade detectados quanto às normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional, mantêm-se actuais e oportunos os argumentos expendidos pelo Sr. Presidente da República, nos quais nos revemos integralmente.
Nestes termos e à guisa de conclusão é entendimento da relatora que, dada a inexistência do competente processo de negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, as normas constantes do projecto de lei n.os 362/IX (PSD/CDS-PP) enfermam de inconstitucionalidade por violação do disposto no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e de ilegalidade por violação do disposto na alínea b) do artigo 6.º e dos artigos 7.º, 9.º e 14.º todos da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.

1.6 Da audição e discussão pública

a) Da audição

Por deliberação da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, e sem prejuízo da realização do competente processo de consulta pública nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, foram realizadas nos dias 18 e 19 de Novembro de 2003, um conjunto de audições em torno do projecto de lei n.º 362/IX com as associações sindicais dos trabalhadores da Administração Pública, tendo sido ouvidas as seguintes entidades:

- FESAP
- Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado
- Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública
- Sindicato Nacional dos Professores Licenciados
- Sindicato Nacional dos Correios e Telecomunicações
- União dos Sindicatos Independentes

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Todas as entidades referidas manifestaram a sua discordância face àquele projecto de lei, ou porque que consideram que relativamente ao mesmo deveria, nos termos legais e constitucionais aplicáveis, ter ocorrido o competente processo de negociação colectiva ou, ainda, porque pura e simplesmente não se revêem nas soluções normativas nele preconizadas.

B) Da consulta pública

Terminado o período de consulta pública do projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP), que decorreu entre o dia 28 de Outubro de 2003 e o dia 26 de Novembro de 2003, deram entrada na Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais 37 pareceres remetidos por associações sindicais dos trabalhadores da Administração Pública, comissões de trabalhadores e plenários de trabalhadores. Acresce, ainda, que foi recebido da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública um abaixo-assinado, subscrito por 62 256 trabalhadores da Administração Pública que se manifestam contra a aprovação do projecto de lei em apreço.
A generalidade das associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, pronunciaram-se acerca do projecto de lei n.º 362/IX em termos negativos, manifestando expressamente a sua oposição à aprovação do mesmo.
Mais especificadamente se dirá a esse respeito que:

No parecer que a FESAP-Frente Sindical da Administração Pública remeteu à Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais, pode ler-se que "Nos termos da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, artigo 6.º, alínea b), as matérias relativas à fixação ou alteração das pensões de aposentação e reforma, são obrigatoriamente objecto de negociação colectiva, sujeitando-se por isso aos procedimentos previstos na referida legislação. Não será inoportuno lembrar que o não cumprimento desses mecanismos de negociação foi a génese da declaração de inconstitucionalidade do anterior projecto de reforma do Estatuto da Aposentação, pelo que um novo incumprimento desses mecanismos acarretará nova declaração de inconstitucionalidade. Até ao presente não existiu ainda qualquer procedimento negocial em relação à matéria referida". No que respeita ao conteúdo material do projecto de lei vertente, refere a FESAP que "(…) o mesmo nos suscita total discordância, dado que nos levanta sérias e fundadas dúvidas acerca da constitucionalidade material de algumas das suas normas".

O Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado, refere-se à iniciativa legislativa dos partidos da maioria nos seguintes termos: "Invoca-se a decisão do Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 360/2003) para justificar a reapresentação das alterações julgadas inconstitucionais, agora pela via, exclusivamente, parlamentar. Diz-se que dessa forma se sana o vício apontado pelo Tribunal Constitucional. A verdade é que o aludido vício não se sana desta forma. Assim, o que se faz é contornar o vício. O Governo não quer reapresentar as alterações, cumprindo os ditames da Lei Fundamental e escuda-se com a Assembleia da República para evitar assumir as suas responsabilidades. Com esta postura, o Governo consegue, duma assentada desrespeitar o Tribunal Constitucional, desacreditar o Parlamento e subverter as regras do jogo democrático, o que é altamente censurável. Afasta ardilosamente a aplicação das regras da negociação colectiva para forçar as associações sindicais a intervirem no processo meramente a título de mera participação. (…) O processo de participação não senta o legislador à mesa com as associações sindicais, não tendo a virtualidade de permitir que estas possam influenciar o processo de elaboração legislativa". Para o STE "Mesmo a entender-se que a audição de associações sindicais a realizar pela Comissão competente da Assembleia da república (…) salvaguardaria o direito constitucional das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho, ainda assim não teriam sido observados os procedimentos impostos pela Lei n.º 23/98, de 26 de Maio. Tratando-se de legislação a aprovar pela Assembleia da República, não regula a lei qualquer processo específico de negociação colectiva". Para além deste aspecto, o STE, alega que do ponto de vista material as soluções preconizadas pelo projecto de lei em causa implica a "(…) violação do princípio da igualdade", bem como, "(…) o princípio da irretroactividade das leis", e ainda, "(…) o princípio da protecção da confiança".

Finalmente, também a Frente Comum de Sindicatos seguindo a mesma linha de argumentação, mostra-se desfavorável ao projecto de lei em apreço, referindo no seu parecer que "(…) é inconcebível que se pretenda pelo mecanismo parlamentar da 'discussão e audição pública' denegar um direito fundamental - o direito à negociação colectiva - que constitucionalmente não está cometido à Assembleia da República, mas sim no caso sub judice, ao Governo", adiantando, de igual modo que as alterações em causa, também violam matérias e princípios "(…) constitucionalmente consagrados por:

- Tentar introduzir discriminações negativas, dispensando tratamentos diferentes para situações de facto iguais;
- Violar o princípio da segurança jurídica ao tentar introduzir um tratamento menos favorável para situações de facto já constituídas e/ou em formação;
- A vingarem significariam flagrantes violações do princípio da igualdade;
- Querer impor retroactivamente alterações de discriminação negativa a situações de facto já constituídas".

II - Das conclusões

Atentos os considerandos que antecedem, conclui-se no seguinte sentido:

1 - Os Grupos Parlamentares do PSD e CDS-PP tomaram a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 362/IX sobre "Alteração do Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril e 327/85, de 8 de Agosto".
2 - A apresentação do citado projecto de lei foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, e reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do referido Regimento.
3 - Com o projecto de lei n.º 362/IX, pretendem os grupos parlamentares proponentes introduzir alterações ao Estatuto de Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, na sua actual redacção, aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto, bem como, revogar o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
4 - As soluções preconizadas pelo projecto de lei vertente implicam em concreto:

a) Alterar o artigo 51.º do Estatuto da Aposentação, passando a pensão de aposentação dos subscritores

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da CGA sujeitos ao regime jurídico do contrato individual de trabalho a ser determinada pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto nos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias, Natal ou prestações equivalentes;
b) Alterar o artigo 53.º do Estatuto da Aposentação, passando a pensão de aposentação a corresponder à trigésima sexta parte da remuneração mensal relevante, deduzida da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação com o limite máximo de 36 anos;
c) Aditar ao Estatuto da Aposentação o artigo 37.º-A, relativo à aposentação antecipada, que prevê expressamente: (i) a possibilidade dos subscritores da CGA que contém, pelo menos, 36 anos de serviço, poderem, independentemente de sujeição a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, requerer a aposentação antecipada; (ii) a redução do valor daquela pensão à razão de 4,5% pelo número de anos de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação; (iii) a redução de um ano por cada período de três anos que exceda 36 anos de serviço para efeitos do número de anos de antecipação a considerar para a determinação da taxa global de redução da pensão;
d) Revogar o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que permite que os funcionários e agentes da Administração Pública possam aposentar-se, com direito à pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço;
e) Aditar o n.º 5 ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 128/90, de 17 de Abril, e alterar o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 327/85, de 8 de Agosto (estabelecimentos de ensino superior, privado ou cooperativo), estabelecendo que a remuneração relevante para efeitos de desconto de quota e cálculo da pensão de aposentação não pode ser inferior à estabelecida na convenção colectiva de trabalho aplicável nem superior à que respeite à categoria e escalão da carreira docente instituída para o ensino oficial correspondente ao mesmo tempo de serviço.

5 - A discussão em torno das alterações preconizadas pela iniciativa vertente ao Estatuto da Aposentação, não constitui novidade no quadro parlamentar. Na presente Legislatura, em 2002, o XV Governo Constitucional apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 28/IX (Orçamento do Estado para 2003), que deu origem à Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, aprovada, com os votos favoráveis do PSD e CDS-PP e os votos contra do PS, PCP, Partido Ecologista os Verdes e o BE, cujo artigo 9.º contém o conjunto de normas relativas à alteração do método de cálculo das pensões de aposentação e do regime da aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública, agora constantes do projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP).
6 - O Tribunal Constitucional veio, através do seu Acórdão n.º 360/2003 - Processo n.º 13/2003, a pedido do Sr. Presidente da República, reconhecer e declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, "(…) por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho, previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição".
7 - O Sr. Presidente da República no pedido que dirigiu ao Tribunal Constitucional para efeitos de fiscalização e declaração da inconstitucionalidade das normas contidas no citado artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, invocou, para além da violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho consagrado no n.º 2 do artigo 56.º da Constituição, a violação do direito de negociação colectiva previsto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, e no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa, por entender que as citadas normas fixam ou modificam substancialmente o método de cálculo e, consequentemente, o montante das pensões de aposentação, pelo que deveriam ter sido objecto de prévia negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, aspecto que o Tribunal Constitucional se dispensou de analisar.
8 - Neste contexto, o debate em torno do projecto de lei em apreciação não pode escamotear aquilo que foi a discussão parlamentar ocorrida aquando da aprovação do artigo 9.º da Lei do Orçamento do Estado para 2003 e, a fortiori, tão pouco pode ignorar as dúvidas de (in)constitucionalidade e de (i)legalidade suscitadas pelo Sr. Presidente da República, bem como, o conteúdo do Acórdão do Tribunal Constitucional, relativamente a tais normas.
9 - As normas constantes do projecto de lei vertente, quer as que se reportam ao Estatuto de Aposentação quer as que se reportam ao regime de antecipação da aposentação, uma vez que versam sobre a fixação/alteração do método do cálculo das pensões de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública e, nessa medida, conduzem a uma modificação do montante das pensões, integram o conceito de matérias de negociação colectiva, nos termos e para os efeitos previstos na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio e na Constituição da República Portuguesa.
10 - Salvo melhor e mais qualificado entendimento, é forçoso concluir que tais matérias têm de ser prévia e obrigatoriamente objecto de negociação colectiva a exercer entre o Governo e as associações sindicais.
11 - Dado que tal negociação não se verificou no caso vertente e que a Assembleia da República não pode suprir tal omissão porque não dispõe de legitimidade jurídico-legal para exercer a negociação colectiva, a aprovação da iniciativa legislativa em questão coloca em crise as normas constantes do n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, diploma legal de valor reforçado.
12 - Em suma, o projecto de lei em apreço padece dos mesmos vícios de ilegalidade e de inconstitucionalidade detectados quanto às normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional, mantendo-se, nessa

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medida, actuais e oportunos os argumentos expendidos pelo Sr. Presidente da República a propósito das mesmas.
13 - Assim, conclui-se que, dada a inexistência do competente processo de negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, as normas constantes do projecto de lei n.o 362/IX (PSD/CDS-PP) enferma de inconstitucionalidade por violação do disposto no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e de ilegalidade por violação do disposto na alínea b) do artigo 6.º e dos artigos 7.º, 9.º e 14.º todos da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
14 - No quadro da discussão parlamentar do projecto de lei sub judice, a Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais desencadeou um processo de audição e consulta pública com as associações representativas dos trabalhadores da Administração Pública. No quadro da audição realizada foram ouvidas as seguintes entidades: FESAP, Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado, Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública, Sindicato Nacional dos Professores Licenciados, Sindicato Nacional dos Correios e Telecomunicações e União dos Sindicatos Independentes.
15 - No âmbito da consulta pública relativa ao projecto de lei n.º 362/IX, que decorreu entre 28 de Outubro de 2003 e 26 de Novembro de 2003, foram recebidos pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais 37 pareceres e um abaixo-assinado subscrito por 62 256 trabalhadores da Administração Pública.

III - PARECER

A Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais é do seguinte parecer:

a) O projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP) sobre "Alteração do Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril e 327/85, de 8 de Agosto" não preenche, salvo melhor e mais qualificado entendimento, os requisitos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis para poder ser discutido e votado pelo Plenário da Assembleia da República.
b) Para os efeitos tidos por convenientes, o presente relatório e parecer é remetido ao Sr. Presidente da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 26 de Novembro de 2003. - O Presidente da Comissão, Joaquim Pina Moura - A Deputada Relatora, Maria do Carmo Romão.

Relatório da discussão e votação na especialidade, texto final da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais e respectivos anexos (incluindo propostas de alteração apresentadas pelo PSD/CDS-PP e declaração de voto do PS)

Relatório da discussão e votação na especialidade

1. O projecto de lei em epígrafe, da iniciativa do PSD e do CDS-PP, baixou à Comissão para discussão e votação na especialidade em 27 de Novembro de 2003, pelo prazo de uma semana.
2. Na reunião desta Comissão, realizada no dia 3 de Dezembro de 2003, procedeu-se, nos termos regimentais, à sua discussão e votação na especialidade.
3. Na reunião encontravam-se presentes os Grupos Parlamentares do PSD, PS, CDS-PP e PCP.
4. Da discussão e subsequente votação na especialidade resultou o seguinte:

Para o artigo 1.º do projecto de lei (Caixa Geral de Aposentações) foi apresentada, pelo PSD e pelo CDS-PP, uma proposta de aditamento de novos n.os 6, 7 e 8 ao artigo, no sentido de estabelecer um regime transitório para os subscritores da Caixa Geral de Aposentações cujos processos de aposentação houvessem sido remetidos à CGA até à entrada em vigor do diploma e para os antigos subscritores da mesma Caixa, cujos requerimentos sejam recebidos pela CGA até à data de entrada em vigor do diploma.
Para o artigo 2.º do projecto de lei (Entrada em vigor) foi apresentada, pelo PSD e pelo CDS-PP, uma proposta de substituição do artigo, no sentido de estabelecer como data de entrada em vigor do diploma o dia 1 de Janeiro de 2004.

O Sr. Deputado Patinha Antão (PSD) explicou que as propostas apresentadas tinham como objectivo acautelar, de forma explícita, os interesses dos subscritores da CGA, estabelecendo um regime transitório até à entrada em vigor do diploma. Em relação à questão de saber se com a apresentação deste projecto de lei se punha em causa a lei da negociação colectiva, matéria muito debatida pela oposição, manifestou a sua confiança nas instituições competentes, nomeadamente no Sr. Presidente da República e no Tribunal Constitucional, que, sem dúvida, apreciariam a matéria, caso tal se justificasse. Porém, no entender do PSD não existia qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade no diploma.
O Sr. Deputado Francisco José Martins (PSD) esclareceu que o PSD pretendia, com a sua proposta de aditamento, acautelar as justas expectativas dos trabalhadores, dando assim acolhimento a algumas das reivindicações formuladas no decorrer do processo de discussão pública do diploma.
O Sr. Deputado Artur Penedos (PS) referiu que as propostas de aditamento do PSD não consubstanciavam verdadeiras normas transitórias, na medida em que não acautelavam os direitos adquiridos e em formação dos trabalhadores da Administração Pública, ao contrário, aliás, do que tinha sido consagrado na Lei de Bases da Segurança Social em que tinham ficado salvaguardados esses direitos.
Por outro lado, lembrou que seria necessário ver, na prática, como se articularia a lei a aprovar com o Despacho n.º 867/03, da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, que fizera transitar para a Caixa Geral de Aposentações competências que esta não pode deter, desrespeitando o Acórdão n.º 360/03, do Tribunal Constitucional que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei nº 32-B/2002, de 30 de Dezembro.
Afirmou que a alteração operada ao artigo 51.º do Estatuto da Aposentação, por via do projecto de lei em apreciação, se traduzia num tratamento discriminatório dos subscritores da CGA, consoante o seu vínculo laboral resulte ou não de contrato individual de trabalho. No primeiro caso, o cálculo da pensão tem em conta a média mensal das remunerações dos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias e de Natal ou prestações equivalentes,

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enquanto no segundo caso tem por base a última remuneração.
Acrescentou que, para além das objecções materiais que a iniciativa em causa lhe suscitava, a matéria constante do projecto de lei n.º 362/IX deveria ser objecto de negociação colectiva, visto que a Lei n.º 23/98 consagra expressamente que as pensões de aposentação ou de reforma devem ser objecto de negociação colectiva, sendo o Governo o interlocutor pela Administração. Assim, o projecto de lei em causa inviabiliza a aplicação da Lei n.º 23/98, sendo portanto ilegal e inconstitucional.
A Sr.ª Deputada Odete Santos (PCP) começou por colocar uma questão prévia, de cariz regimental, que tinha a ver com o facto das propostas de alteração do PSD terem sido distribuídas apenas no decurso da reunião, pelo que os outros grupos parlamentares não tinham tido tempo para as analisar. Por outro lado, a reunião não tinha sido convocada com 24 horas de antecedência, como deveria nos termos regimentais aplicáveis. Assim, solicitou a suspensão dos trabalhos por 30 minutos, a fim de apreciar as referidas propostas.
Deste modo, interromperam-se os trabalhos que recomeçaram 30 minutos mais tarde. Após a verificação do quórum deliberativo, retomou-se a discussão na especialidade.
A Sr.ª Deputada Odete Santos considerou que as alterações propostas pelo PSD não resolviam as duas questões essenciais que a levavam a concluir no sentido da inconstitucionalidade do projecto de lei em causa.
Em primeiro lugar, as legítimas expectativas dos subscritores da CGA não são protegidas através de disposições transitórias. Os trabalhadores que completassem os 36 anos de serviço a partir de Janeiro de 2004 ficariam sem qualquer protecção jurídica. Trata-se, pois, de um caso de lei de retroactividade inautêntica, assim classificada por constitucionalistas como o Prof. Gomes Canotilho, o qual considerava que as situações anteriores à lei deveriam precisamente ser acauteladas através de normas transitórias. Aliás, os princípios constitucionais da confiança no Estado de Direito democrático (vd. artigo 2.º da Constituição) e da proibição do excesso (artigo 18.º da CRP), que é um princípio ínsito a qualquer direito fundamental como é o caso do direito à segurança social, são também violados através das soluções normativas do projecto de lei n.º 362/IX. De facto, a aplicação da taxa de redução anual de 4,5% da pensão, aos subscritores com menos de 60 anos de idade, a acrescer aos 10% de quota, configura, segundo a Sr.ª Deputada, uma lesão insuportável e um restrição excessiva ao direito à segurança social. Trata-se, pois, de uma manifesta inconstitucionalidade, como resulta de um acórdão do Tribunal Constitucional de 1996 que adopta essa mesma tese. Na verdade, a suposta norma transitória que resultava das propostas de alteração agora apresentadas pela maioria, limitava-se a retirar retroactividade ao diploma, mas permanecia a situação de retroactividade inautêntica, como tinha referido.
Em segundo lugar, a Sr.ª Deputada afirmou que as matérias objecto do projecto de lei n.º 362/IX estão necessariamente sujeitas ao disposto na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, que estabelece o regime de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público, assim como aos princípios constitucionais que reconhecem às associações sindicais o direito de exercício de negociação colectiva. Sublinhou que a Lei n.º 23/98 é uma lei de valor reforçado, visto que condiciona outras leis e lembrou que a tramitação nela estabelecida é obrigatória, sendo o Governo obrigado a encetar o procedimento previsto na lei, muito embora não fosse obrigado a ceder na sua posição negocial, pelo que terminada a negociação sem obtenção de acordo poderia apresentar uma proposta de lei à Assembleia da República no sentido que entendesse. Porém, desrespeitados os procedimentos, existia um claro desrespeito pela lei e pelas normas contidas na Constituição da República Portuguesa, visto que esta refere que a negociação colectiva se exerce nos termos da lei. Recordou que o Tribunal Constitucional, num seu acórdão de 1998 analisara uma situação diferente, que tinha a ver com pensões complementares de reforma, para avaliar se essa matéria pertencia a um núcleo duro que a lei poderia ou estaria impedida de excluir da negociação colectiva. Ora, o TC concluíra que o direito à segurança social não pode ser objecto de restrição, mas apenas de conformação pelo legislador.
Sublinhou que o Despacho n.º 867/03, da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, era inconstitucional, por desrespeitar o Acórdão do TC e consubstanciava uma situação de verdadeira chantagem sobre as chefias do serviço no qual se integrasse o trabalhador que solicitasse a aposentação.
Questionou qual o sentido da proposta de aditamento apresentada para o n.º 7, na medida em que lhe parecia que o mesmo se traduzia numa repetição do n.º 6 do artigo 1.º do projecto de lei.
O Sr. Deputado Artur Penedos (PS) opinou que lhe parecia que a proposta para o n.º 7 quereria abranger, no seu âmbito de aplicação, os subscritores que solicitassem a pensão unificada, nos termos da lei.
Esta opinião foi confirmada pelo Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Deputado Francisco José Martins (PSD) lembrou que o Acórdão do TC que tinha declarado a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, tinha concluído pela violação do direito de consulta pública e de participação das associações sindicais na elaboração da legislação do trabalho, ou seja, tratava-se de uma inconstitucionalidade formal que agora tinha sido sanada, com a discussão pública e as várias audições realizadas pela Comissão com as associações sindicais no âmbito do projecto de lei n.º 362/IX. Sublinhou que a Lei n.º 23/98 estabelece como é que o Estado, na sua qualidade de entidade patronal, deve negociar com as associações sindicais. Porém, era inaceitável que se entendesse que essa lei poderia cercear a capacidade de iniciativa legislativa da Assembleia da República o que, em última análise, poria em causa a própria Constituição que atribui poderes legislativos ao Parlamento que seriam depois coarctados por lei.
Salientou que o Decreto-Lei n.º 116/85 não consagrava direitos adquiridos para os trabalhadores, visto que do mesmo não resultava qualquer automatismo na atribuição da pensão de aposentação aos subscritores da CGA com 36 anos de serviço independentemente da idade. Aliás, existiam casos em que o serviço se pronunciava negativamente relativamente à dispensa do funcionário que solicitava a aposentação.
O Sr. Deputado Artur Penedos (PS) considerou que os poderes legislativos da Assembleia da República não se encontravam apenas limitados pela Constituição e lembrou o exemplo da lei-travão, pelo que discordava

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da argumentação do PSD. Para além da lei, referiu que a capacidade legislativa do Parlamento deveria também auto-limitar-se por questões de ordem ética e moral. Finalmente, disse ser inaceitável que a Assembleia da República viole uma lei que ela própria aprovou e afirmou que o PS entregaria uma declaração de voto.

5. Encontrando-se esgotada a discussão, passou-se à votação do projecto de lei, que se processou da forma seguinte:

- Os n.os 1, 2, 3, 4 e 5 do artigo 1.º do projecto de lei n.º 362/IX foram aprovados por maioria com os votos favoráveis do PSD e do CDS-PP e os votos contra do PS e do PCP.
- A proposta de aditamento apresentada pelos Grupos Parlamentares do PSD e CDS-PP para os n.os 6, 7 e 8 do artigo 1.º, foi aprovada por maioria, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS e do PCP.

A proposta de substituição do artigo 2.º do projecto de lei n.º 362/IX, apresentada pelo PSD e CDS-PP, foi aprovada por maioria, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS e do PCP.

6. Segue em anexo o texto final resultante da discussão e votação na especialidade, bem como a declaração de voto apresentada pelo Grupo Parlamentar do PS.

Assembleia da República, 3 de Dezembro de 2003. - O Presidente da Comissão, Joaquim Pina Moura.

Nota: Estiveram presentes na reunião os Grupos Parlamentares do PSD, PS, CDS-PP e PCP, registando-se a ausência do BE e de Os Verdes.

Anexo 1

Texto final

Artigo 1.º
Caixa Geral de Aposentações

1 - O artigos 51.º e 53.º do Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, nas redacções, respectivamente, da Lei n.º 30-C/92, de 28 de Dezembro, e do Decreto-Lei n.º 191-A/79, de 25 de Junho, passam a ter a seguinte redacção:

"Artigo 51.º
Regimes especiais

1 - (...)
2 - (...)
3 - Sem prejuízo de outros limites aplicáveis, a pensão de aposentação do subscritor sujeito ao regime do contrato individual de trabalho determina-se pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto auferidas nos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias e de Natal ou prestações equivalentes.
4 - (anterior n.º 3)

Artigo 53.º
Cálculo da pensão

1 - A pensão de aposentação é igual à trigésima sexta parte da remuneração mensal relevante, deduzida da percentagem da quota para efeitos de aposentação e de pensão de sobrevivência, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a aposentação, com o limite máximo de 36 anos.
2 - A pensão não pode, em caso algum, exceder o montante da remuneração líquida a que se refere o n.º 1.
3 - (...)
4 - (...)"

2 - É aditado um artigo 37.º-A ao Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, com a seguinte redacção:

"Artigo 37.º-A
Aposentação antecipada

1 - Os subscritores da Caixa Geral de Aposentações que contém, pelo menos, 36 anos de serviço podem, independentemente de submissão a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, requerer a aposentação antecipada.
2 - O valor da pensão de aposentação antecipada prevista no número anterior é calculado nos termos gerais e reduzido pela aplicação de um factor de redução determinado pela fórmula 1-x, em que x é igual à taxa global de redução do valor da pensão.
3 - A taxa global de redução é o produto da taxa anual de 4,5% pelo número de anos de antecipação em relação à idade legalmente exigida para a aposentação.
4 - O número de anos de antecipação a considerar para a determinaoão da taxa global de redução da pensão é reduzido de um por cada período de três que exceda os 36."

3 - É revogado o Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
4 - É aditado um n.º 5 ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 128/90, de 17 de Abril, com a seguinte redacção:

"5 - A remuneração relevante para efeitos de desconto de quota e de cálculo da pensão de aposentação não pode ser inferior à estabelecida na convenção colectiva de trabalho aplicável nem superior à que respeite à categoria e escalão da carreira docente instituída para o ensino oficial correspondente ao mesmo tempo de serviço docente."

5 - O artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 327/85, de 8 de Agosto, passa a ter a seguinte redacção:

"Artigo 4.º

1 - (...)
2 - A remuneração relevante para efeitos de desconto de quota e de cálculo da pensão de aposentação não pode ser inferior à estabelecida na convenção colectiva de trabalho aplicável nem superior à que respeite à categoria e escalão da carreira docente instituída para o ensino oficial correspondente ao mesmo tempo de serviço docente.
3 - (anterior n.º 2)"

6 - O disposto nos números anteriores não se aplica aos subscritores da Caixa Geral de Aposentações cujos processos de aposentação sejam enviados a essa Caixa, pelos respectivos serviços ou entidades, até à data de entrada em vigor deste diploma, desde que os interessados reúnam, nessa data, as condições legalmente exigidas para a concessão da aposentação, incluindo aqueles cuja aposentação depende da incapacidade

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dos interessados e esta venha a ser declarada pela competente junta médica após aquela data.
7 - Tratando-se de antigos subscritores da Caixa Geral de Aposentações, o disposto no número anterior aplica-se aos requerimentos recebidos nessa Caixa até à data de entrada em vigor deste diploma.
8 - Nos casos referidos nos n.os 6 e 7, quando o despacho a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, ou a declaração prevista na alínea b) do mesmo normativo legal, sejam posteriores à data de entrada em vigor deste diploma, a situação relevante para efeitos de fixação da aposentação é a existente nesta data.

Artigo 2.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2004.

Assembleia da República, 3 de Dezembro de 2003. - O Presidente da Comissão, Joaquim Pina Moura.

Anexo 2

Propostas de alteração apresentadas pelo PSD/CDS-PP

Artigo 1.º
(…)

1 - (…)
2 - (…)
3 - (…)
4 - (…)
5 - (…)
6 - O disposto nos números anteriores não se aplica aos subscritores da Caixa Geral de Aposentações cujos processos de aposentação sejam enviados a essa Caixa, pelos respectivos serviços ou entidades, até à data de entrada em vigor deste diploma, desde que os interessados reúnam, nessa data, as condições legalmente exigidas para a concessão da aposentação, incluindo aqueles cuja aposentação depende da incapacidade dos interessados e esta venha a ser declarada pela competente junta médica após aquela data.
7 - Tratando-se de antigos subscritores da Caixa Geral de Aposentações, o disposto no número anterior aplica-se aos requerimentos recebidos nessa Caixa até à data de entrada em vigor deste diploma.
8 - Nos casos referidos nos n.os 6 e 7, quando o despacho a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, ou a declaração prevista na alínea b) do mesmo normativo legal, sejam posteriores à data de entrada em vigor deste diploma, a situação relevante para efeitos de fixação da aposentação é a existente nesta data.

Artigo 2.º
(…)

A presente lei entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2004.

Assembleia da República, 2 de Dezembro de 2003. - Os Deputados do PSD: Patinha Antão - Francisco José Martins.

Declaração de voto do PS

Os Deputados do Partido Socialista votaram, na Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, contra o projecto de lei n.º 362/IS (PSD/CDS-PP), sobre "Alteração ao Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto", pelas razões e fundamentos seguintes:

1 - As soluções normativas plasmadas no projecto de lei n.° 362/IX (PSD/CDS-PP) correspondem na íntegra às normas constantes dos n.os 1 a 5 do artigo 9.° da Lei n.° 32-B/2002, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2003), declaradas inconstitucionais pelo Acórdão n.° 360/2003, do Tribunal Constitucional.
2 - Não pode, portanto, o Parlamento escamotear aquilo que foi a discussão parlamentar ocorrida aquando da aprovação do artigo 9.° da Lei do Orçamento do Estado para 2003 e tão pouco pode ignorar as dúvidas de (in)constitucionalidade e de (i)legalidade suscitadas pelo Sr. Presidente da República, bem como o conteúdo do Acórdão do Tribunal Constitucional, relativamente a tais normas.
3 - A Assembleia da República deve, no exercício do seu poder legislativo, observar o respeito pelas leis e pelas normas constantes da Constituição da República Portuguesa, sob pena de pôr em crise direitos, liberdades e garantias dos cidadãos que mereceram a tutela do legislador. No caso vertente, os partidos que suportam o Governo, ao aprovarem o projecto de lei n.° 362/IX, põem em causa o direito de negociação colectiva reconhecido por lei e pela Constituição da República Portuguesa às associações sindicais dos trabalhadores da Administração Pública, não contando, por isso, com o Partido Socialista para mais um atropelo aos mais elementares direitos dos trabalhadores.
Mais especificadamente se dirá,
4 - A Constituição da República Portuguesa reconhece expressamente às associações sindicais, no seu artigo 56.°, n.° 3, o direito de contratação colectiva, o qual é assegurado nos termos da lei. No que especificamente se refere à Administração Pública, o direito de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público, encontra-se densificado na Lei n.° 23/98, de 26 de Maio.
5 - O citado diploma legal, estabelece (cfr. n.os 1 e 2 do artigo 5.°) o direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública, relativamente ao seu estatuto, definindo a negociação colectiva como "(...) a negociação efectuada entre as associações sindicais e a Administração das matérias relativas àquele estatuto, com vista à obtenção de um acordo", sendo que, nas situações de negociação colectiva que revistam carácter geral, o interlocutor pela Administração é o Governo (cfr. n.° 1 do artigo 14.°). Por outro lado, aquela Lei consagra de forma taxativa as matérias objecto de negociação colectiva, definindo como tal, designadamente, as matérias relativas à fixação ou alteração "das pensões de aposentação ou de reforma" (cfr. alínea b) do artigo 6.°).
6 - Significa, pois, à luz do direito constituído que as normas constantes do projecto n.° 362/IX, quer as que se reportam ao Estatuto de Aposentação quer as que se reportam ao regime de antecipação da aposentação, dado que versam inequivocamente sobre fixação/alteração do método do cálculo das pensões de aposentação dos trabalhadores

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da Administração Pública, conduzindo nessa medida a uma modificação do montante das pensões, integram o conceito de matérias de negociação colectiva, nos termos e para os efeitos previstos na Lei n.° 23/98, de 26 de Maio.
7 - Pelo que é forçoso concluir que tais matérias têm de ser prévia e obrigatoriamente objecto de negociação colectiva a exercer entre o Governo e as associações sindicais.
8 - Dado que tal negociação não se verificou no caso vertente e que a Assembleia da República nunca poderia suprir tal omissão porque pura e simplesmente não dispõe de legitimidade jurídico-legal para, em representação da Administração Pública ou do Governo, exercer a negociação colectiva (cfr. artigo 182.° da CRP e 14.° da Lei n.° 23/98, de 26 de Maio), não pode o Parlamento aprovar a iniciativa legislativa em questão, sob pena de colocar em crise as normas contidas no n.° 3 do artigo 56.° da Constituição da República Portuguesa e da Lei n.° 23/98, de 26 de Maio, diploma legal de valor reforçado.
9 - Assim, salvo melhor entendimento, as normas constantes da iniciativa legislativa em apreço encontram-se feridas de ilegalidade e inconstitucionalidade, por violação de normas e princípios legais e constitucionais que garantem o direito de negociação colectiva às associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
10 - Idêntico entendimento já havia sido adoptado pelo Sr. Presidente da República aquando do requerimento que dirigiu ao Tribunal Constitucional para efeitos de apreciação e declaração de inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.° da Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro.
11 - Contudo, o Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 360/2003, que proferiu, não analisou a conformidade legal e constitucional das normas constantes do artigo 9.° da Lei n.° 32-B/2002, de 31 de Dezembro, à luz do direito de negociação colectiva como era pedido pelo Sr. Presidente da República, por ter considerado que tal não se impunha uma vez que concluiu previamente que as mesmas normas estavam feridas de inconstitucionalidade por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho previsto na alínea a) do n.° 2 do artigo 56.° da Constituição.
12 - Ora, visto que o projecto de lei n.° 362/1X padece rigorosamente dos mesmos vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade identificados quanto às normas constantes do artigo 9.° da Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro, mantêm-se actuais e oportunos os argumentos expendidos pelo Sr. Presidente da República, nos quais os Deputados do Partido Socialista se revêem totalmente.
13 - Assim, atentos os considerandos que antecedem, conclui-se que as normas constantes do projecto de lei n.os 362/IX (PSD/CDS-PP) enfermam de inconstitucionalidade por violação do disposto no n.° 3 do artigo 56.° da Constituição da República Portuguesa e de ilegalidade por violação do disposto na alínea b) do artigo 6.° e dos artigos 7.°, 9.° e 14.° todos da Lei n.° 23/98, de 26 de Maio, não podendo nessa medida contar com a aprovação do Grupo Parlamentar do PS.
14 - Finalmente, de sublinhar, também, que algumas das soluções normativas plasmadas no projecto de lei n.° 362/IX, nunca poderiam merecer a aprovação dos Deputados do Partido Socialista por se afigurarem muito gravosas para os trabalhadores da Administração Pública, podendo mesmo vir a gerar no futuro situações de injustiça relativa.

Assembleia da República, 3 de Dezembro de 2003. - Os Deputados do PS: Artur Penedos - Rui Cunha - Vieira da Silva - Maria do Carmo Romão - Maria do Rosário Carneiro.

PROJECTO DE LEI N.º 380/IX
(CRIA O INSTITUTO DO SERVIÇO PÚBLICO DE ACESSO AO DIREITO (ISPAD), VISANDO GARANTIR A INFORMAÇÃO, A CONSULTA JURÍDICA E O APOIO JUDICIÁRIO)

PROPOSTA DE LEI N.º 86/IX
(ALTERA O REGIME DE ACESSO AO DIREITO E AOS TRIBUNAIS E TRANSPÕE PARA A ORDEM JURÍDICA NACIONAL A DIRECTIVA 2002/8/CE, DO CONSELHO, DE 27 DE JANEIRO DE 2003, RELATIVA À MELHORIA DO ACESSO À JUSTIÇA NOS LITÍGIOS TRANSFRONTEIRIÇOS ATRAVÉS DO ESTABELECIMENTO DE REGRAS MÍNIMAS COMUNS RELATIVAS AO APOIO JUDICIÁRIO DO ÂMBITO DESSES LITÍGIOS)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

I - Introdução

O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a proposta de lei n.º 86/IX - Altera e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços, através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios.

(o título oficial desta directiva, inicialmente publicada como 2002/8/CE, como ainda se refere na proposta de lei, foi objecto de rectificação, publicada no Jornal Oficial n.º 32, de 7 de Fevereiro de 2003)

Esta apresentação foi efectuada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição e do artigo 131.º do Regimento, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do Regimento.
Por seu lado, um conjunto de Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 380/IX - Cria o Instituto do Serviço Público de Acesso ao Direito (ISPAD) -, visando garantir a informação e a consulta jurídica e o apoio judiciário.
Esta apresentação foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição e do artigo 131.º do Regimento, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do Regimento.
Admitidas e numeradas, as iniciativas vertentes baixaram à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdade e Garantias para a emissão do respectivo relatório/parecer.

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II - Do objecto, motivação e conteúdo da iniciativa do Governo

A proposta de lei apresentada pelo Governo visa, de acordo com a exposição de motivos, "introduzir rigor na concessão da protecção jurídica, nas suas modalidades e desdobramentos, e reforçar a componente da informação e da consulta jurídica, assegurando um efectivo direito de acesso ao direito e aos tribunais constitucionalmente garantido", procedendo, em consequência, à alteração do regime de acesso ao direito e aos tribunais vigente, que consta da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro.
Esta iniciativa tem de ser considerada ao abrigo do protocolo celebrado entre o Ministério da Justiça e a Ordem dos Advogados, de 22 de Janeiro de 2003, para a criação do Instituto de Acesso ao Direito, a que alude a exposição de motivos.
Nos termos deste protocolo, compete à Ordem dos Advogados, através do previsto Instituto de Acesso ao Direito, promover, organizar, disciplinar, estruturar e assegurar o sistema de acesso ao direito nas vertentes da informação jurídica, consulta jurídica e patrocínio judiciário.
Ao futuro Instituto de Acesso ao Direito competirá a nomeação de advogados oficiosos no âmbito do patrocínio oficioso, a nomeação de defensor oficioso no processo penal, a organização de escalas para assistência nos actos urgentes, a informação e consultas jurídicas nos estabelecimentos prisionais, bem como em outros locais em cumprimento de protocolos celebrados.
O protocolo vem também atribuir à Ordem dos Advogados a incumbência de, uma vez ponderada a insuficiência económica nos termos legais para efeito de concessão de apoio judiciário, avaliar, através da consulta jurídica, a plausibilidade da pretensão antes da nomeação de patrono oficioso.
Os objectivos pretendidos com a celebração do protocolo são agora retomados na proposta de lei, corporizados, sobretudo, no n.º 1 do artigo 14.º e no artigo 21.º, com a finalidade não só de evitar a indicação de patrono oficioso quando manifestamente a pretensão não justifica o recurso a juízo mas também de criar espaço para resolver prévia e extrajudicialmente os conflitos, de modo a evitar o recurso ao tribunal.
Outro propósito almejado pela proposta de lei é o da delimitação do conceito de insuficiência económica, uma vez que o Governo entende ser esta uma lacuna do regime actual que tem dado origem a dúvidas.
Com esta delimitação o Governo pretende "dotar os serviços da segurança social de um critério objectivo e transparente de concessão do benefício, permitindo a qualquer requerente saber com rigor se terá ou não direito ao benefício e em que modalidade e medida".
Assim, a proposta de lei determina, no artigo 8.º, que "encontra-se em situação de insuficiência económica aquele que, tendo em conta factores de natureza económica e a respectiva capacidade contributiva, não tem condições objectivas para suportar pontualmente os custos de um processo".
Esclarece ainda a proposta de lei, neste artigo, que a insuficiência económica das sociedades, dos comerciantes em nome individual nas causas relativas ao exercício do comércio e dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada deve ser aferida, tendo em conta, designadamente, o volume de negócios, o valor do capital e do património e o número de trabalhadores ao seu serviço e os lucros distribuídos nos três últimos exercícios findos. Este conceito aplica-se, com as necessárias adaptações, às demais pessoas colectivas.
No entanto, a proposta de lei não estabelece os critérios de prova e de apreciação da insuficiência, antes remetendo a sua fixação para diploma de menor dignidade ao determinar que a prova e a apreciação da insuficiência económica serão feitas de acordo com o disposto em portaria conjunta dos Ministros responsáveis pelas áreas das finanças, da justiça e da segurança social (artigo 8.º, n.º 4, da proposta de lei).
No âmbito das medidas moralizadoras que pretende introduzir, a proposta de lei vem estipular, no artigo 13.º, n.º 1, um prazo de quatro anos, após o termo da causa, durante o qual, se o requerente de protecção judiciária adquirir de meios económicos suficientes para custear os encargos, o Ministério Público ou qualquer outro interessado instaurará a correspondente acção para cobrança das respectivas importâncias.
Para este efeito, o n.º 2 do artigo 13.º determina que se presume aquisição de meios económicos suficiente a obtenção de vencimento na acção, ainda que meramente parcial, salvo se, pela sua natureza ou valor, o que se obtenha não possa ser tido em conta na apreciação da insuficiência económica nos termos agora estabelecidos na proposta de lei.
Inovadora é também a inclusão das autarquias locais interessadas na cooperação com o Ministério da Justiça no que respeita aos gabinetes de consulta jurídica (artigo 15.º, n.º 1).
Outras modificações promovidas pela proposta de lei verificam-se na modalidade do apoio judiciário, onde se abandona a possibilidade de concessão de dispensa parcial de taxa de justiça e demais encargos com o processo e se prevê a possibilidade de pagamento faseado destes encargos, a pagar até ao limite de quatro anos sobre o trânsito em julgado da decisão final (artigo 16.º, n.os 1 e 2).
Além disso, a proposta de lei vem alargar o regime de apoio judiciário aos julgados de paz (artigo 17.º, n.º 1).
Ainda nesta modalidade, a proposta de lei vem estabelecer que o apoio judiciário deve ser requerido antes da primeira intervenção processual, salvo se a situação de insuficiência económica for superveniente ou se, em virtude do decurso da acção, ocorrer um encargo excepcional; nestes casos, o apoio dever ser requerido antes da primeira intervenção processual que ocorra após o conhecimento da respectiva situação (artigo 18.º, n.os 2 e 3).
No que respeita à transposição para a ordem jurídica nacional da Directiva 2003/8/CE, do Conselho, esta apenas ocorre parcialmente, como é expressamente afirmado no artigo 52.º da proposta de lei. Isto é, o Governo, como revela a exposição de motivos, visa com esta iniciativa tão-só lançar as bases legais para a posterior transposição da referida directiva, o que terá de acontecer até 30 de Novembro de 2004.
A transposição ocorre, então, no âmbito pessoal (artigo 7.º), ao alargar-se a concessão do benefício não só a cidadãos da União Europeia, como acontece hoje, mas também a estrangeiros e apátridas com título de residência válido noutro Estado-membro da União Europeia e, no âmbito da protecção (artigo 6.º e artigo 16.º, n.º 4), ao prever-se a cobertura dos encargos específicos do carácter transfronteiriço dos litígios, sem, no entanto, definir o que se entende por "litígio transfronteiriço", como sucede no artigo 2.º da directiva.

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Refira-se, no entanto, que parte da matéria constante desta directiva se encontra já consagrada na legislação portuguesa, nomeadamente desde a publicação da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro.

III - Do objecto, motivação e conteúdo da iniciativa do PCP

O projecto de lei do PCP, por seu turno, não tem como preocupação transpor para a ordem jurídica nacional a Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003.
De acordo com a exposição de motivos, o objectivo do projecto de lei do PCP, não obstante a inclusão de disposições gerais sobre o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, assenta sobre a entidade que deve realizar essa tarefa.
Para o PCP a concretização da garantia constitucional do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, que é da responsabilidade do Estado, não pode recair apenas sobre os advogados e a sua Ordem.
Nessa medida, o PCP propõe, com a sua iniciativa, a criação, na dependência do Ministério da Justiça, do Instituto do Serviço Público de Acesso ao Direito (ISPAD), pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e património próprio, com sede em Lisboa e delegações regionais em cada um dos distritos judiciais e delegados locais em cada comarca.
Ainda segundo este projecto de lei, o ISPAD tem como finalidade assegurar que todos os cidadãos possam conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos, garantindo que tal não seja dificultado ou impedido por insuficiência económica ou por razões relacionadas com a condição social ou cultural.
Ao ISPAD compete, assim, assegurar a informação jurídica e garantir a consulta e apoio jurídicos gratuitos, bem como o apoio judiciário e a defesa oficiosa, cabendo-lhe ainda assegurar a organização de escalas de profissionais do foro, nomeadamente nos tribunais judiciais, nos Departamentos de Investigação e Acção Penal, nas esquadras da PSP, nos postos da GNR e nos estabelecimentos prisionais. Por último, compete ao ISPAD representar o Estado nas causas em que este seja parte, quando necessário.
Na prossecução dos seus fins o ISPAD pode celebrar protocolos de cooperação com entidades públicas ou privadas, nomeadamente com o Ministério Público, organizações sindicais, organizações de defesa dos consumidores, associações de inquilinos e associações de protecção das vítimas de crimes.
Como meios financeiros à disposição do ISPAD, o projecto de lei prevê as verbas anualmente inscritas no Orçamento do Estado e a remuneração dos serviços prestados, designadamente os montantes de honorários atribuídos pelo exercício das defesas oficiosas, a procuradoria fixada a favor da parte representada por patrono nomeado e as remunerações fixadas no despacho que indeferir o pedido de apoio judiciário. O ISPAD dispõe ainda, como receitas, do produto das multas impostas aos litigantes de má-fé, do montante dos cheques que prescreverem e de quaisquer outras importâncias que venham a ser-lhe atribuídas por lei.
Os órgãos do ISPAD são o Conselho Superior, os Conselhos Regionais, os delegados locais e a Comissão de Fiscalização.
O Conselho Superior é o órgão central de direcção e tem com presidente um advogado de reconhecido mérito nomeado pelo Governo, ouvida a Ordem dos Advogados. Dos restantes elementos dois são nomeados pelo Governo, sendo um deles solicitador proposto pela Câmara dos Solicitadores, e os outros dois designados pela Ordem dos Advogados. Uma das vice-presidências caberá a um dos elementos nomeados pelo Governo e a outra a um elementos designados pela Ordem dos Advogados.
Os Conselhos Regionais têm três membros das profissões forenses em regime liberal, sendo um deles solicitador, nomeados pelo Conselho Superior do ISPAD mediante proposta da Ordem dos Advogados e da Câmara dos Solicitadores, e mais dois membros indicados pelas câmaras municipais da área das delegações regionais.
Por seu lado, o delegado local de cada comarca é nomeado pelo respectivo Conselho Regional, mediante proposta da Ordem dos Advogados, e exerce as competências que lhe forem delegadas.
A Comissão de Fiscalização é composta por três membros, nomeados por despacho conjunto do Ministro da Justiça e do Ministro das Finanças, competindo-lhe a fiscalização da gestão do ISPAD.
O mandato dos membros dos Conselhos do ISPAD e dos delegados locais é de cinco anos, renovável apenas um vez, podendo, os que exerçam a advocacia ou a profissão de solicitadores, continuar a exercer a sua actividade.
Para além de um quadro de pessoal administrativo, sujeito ao regime da função pública, o ISPAD dispõe, para o exercício das funções inerentes à informação e protecção jurídicas, de um quadro de profissionais liberais do serviço público, composto por advogados, advogados estagiários e solicitadores, que são independentes no exercício da sua actividade, estando vedado, em relação à mesma, qualquer controlo hierárquico.
A admissão ao exercício de funções do quadro, por períodos de cinco anos, renováveis, faz-se através de concursos públicos com prestação de provas, organizados pelo Ministério da Justiça.
A actividade destes profissionais liberais rege-se pelo Estatuto dos Advogados e dos Solicitadores, nomeadamente no que toca às regras deontológicas e à disciplina, competindo à Ordem dos Advogados e à Câmara dos Solicitadores, consoante os casos, o exercício do poder disciplinar e a apreciação do quadro deontológico que rege a actuação daqueles.
Estes profissionais liberais podem continuar a exercer a actividade profissional em regime de profissão liberal, fora do âmbito do ISPAD, desde que tal actividade não colida com a defesa dos interesses assumida no exercício da sua actividade de profissional liberal do serviço público; não podem, contudo, exercer a sua actividade em qualquer empresa ou sociedade de advogados ou de solicitadores, com actividades conflituais ou conexas com a sua actividade no ISPAD.
Os advogados estagiários do quadro do ISPAD são orientados pelo seu patrono formador, devendo os advogados do serviço público garantir a colaboração necessária, sempre que solicitada.
Pelo exercício das suas funções estes profissionais liberais do quadro são pagos pelo ISPAD segundo tabelas remuneratórias e tabelas de suplementos e ajudas de custo, fixadas anualmente por portaria do Ministro da Justiça, mediante proposta do ISPAD.
O projecto de lei garante que o requerente de apoio judiciário mantém a liberdade de escolha do patrono, devendo ter-se em conta as preferências manifestadas pelo

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requerente e a complexidade da causa. Além disso, salienta-se que o requerente do apoio judiciário pode escolher o patrono de entre todo o quadro de profissionais liberais do ISPAD, já que não fica sujeito na sua opção apenas aos profissionais liberais da área da competência territorial do tribunal competente para a lide.
Por outro lado, tipificam-se os casos em que a nomeação de patrono pode recair em profissional liberal fora do quadro do serviço público, desde que este aceite a nomeação, ficando sujeito às tabelas remuneratórias e às tabelas relativas a suplementos e ajudas de custo.
Constata-se, assim, que, apesar de o ISPAD depender do Ministério da Justiça, a Ordem dos Advogados e, embora em menor grau, a Câmara dos Solicitadores têm uma intervenção decisiva na composição dos seus órgãos, mantendo as suas prerrogativas nos âmbitos disciplinar e deontológico relativamente aos profissionais liberais do quadro do ISPAD.

IV - Enquadramento legal vigente

O acesso ao direito e aos tribunais encontra-se consagrado no artigo 20.º da Constituição, epigrafado "Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva", o qual dispõe, no n.º 1, que "a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos".
Diz ainda o artigo 20.º, no n.º 2, que "todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consultas jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade".
A redacção deste artigo, com os seus cinco números, resulta de sucessivas revisões constitucionais, nomeadamente a de 1982 (Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de Setembro), que trouxe uma inovação sem precedentes em direito comparado ao proclamar na epígrafe o "Acesso ao direito" e, no novo n.º 1, que "todos têm direito à informação e à protecção jurídica, nos termos da lei" (tendo o primitivo n.º 1 passado a n.º 2 e o inicial n.º 2 sido autonomizado como artigo 21.º); a de 1989 (Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de Julho), que procedeu à inversão dos dois números do artigo, com texto formulado, inserindo no novo n.º 1 "O acesso ao direito" e no novo n.º 2 a "Consulta jurídica"; e a de 1997 (Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro), que firmou a presente epígrafe, fixou a actual composição dos n.os 1 e 2 e introduziu os n.os 3, 4 e 5.
Para além do preceito constitucional, o direito aos tribunais e à tutela jurisdicional efectiva encontra-se vertido em instrumentos internacionais adoptados ou aprovados por Portugal, como a Declaração Universal do Direito do Homem e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.
Mais especificamente no que respeita à protecção jurídica, vigoram em Portugal a Convenção Europeia dos Direitos do Homem - também designada como Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e como Convenção para a Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais - e a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que consagram expressamente o direito à assistência judiciária gratuita como direito fundamental (nos artigos 6.º e 47.º, respectivamente).
Também na lei ordinária o regime legal do acesso ao direito e aos tribunais teve uma evolução profunda nas últimas décadas do século passado.
A primeira inovação ocorreu com a aprovação da Lei n.º 7/70, de 9 de Junho, que veio inserir disposições relativas à assistência judiciária, instituindo um regime que teve continuidade nas posteriores alterações legislativas.
Nos termos desta lei, tinham direito a assistência judiciária todos aqueles que se encontrassem em situação económica que lhes não permitisse custear as despesas normais do pleito, em duas modalidades: a dispensa total ou parcial de preparos e do prévio pagamento de custas e o patrocínio judiciário.
O direito à assistência era extensivo às pessoas colectivas, às sociedades e a outras entidades que gozassem de personalidade judiciária, mas não aos estrangeiros, quando, em igualdade de circunstâncias, as leis dos respectivos Estados a não reconhecessem aos portugueses.
A segunda mudança aconteceu, em consequência da revisão constitucional de 1982, com a publicação do Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de Dezembro, que veio estabelecer o regime de acesso ao direito e aos tribunais.
Considerava o diploma que, para que o "acesso ao direito" ganhasse forma e efectiva viabilidade, eram necessárias acções de informação e de protecção jurídica, pré ou para judiciária, para além da reconversão do que classicamente se chamava "assistência judiciária".
Este decreto-lei veio, assim, consagrar um sistema alargado de acesso ao direito e aos tribunais desenvolvido em acções e mecanismos sistematizados de informação e de protecção jurídica, esta última com duas modalidades: a consulta jurídica e o apoio judiciário.
O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destinava-se a promover que a ninguém fosse dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural ou por insuficiência de meios económicos, de conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos.
A protecção jurídica era concedida para questões ou causas judiciais concretas ou susceptíveis de concretização em que o utente tivesse um interesse próprio e que versassem sobre direitos directamente lesados ou ameaçados de lesão e a ela tinham direito as pessoas singulares e as pessoas colectivas e sociedades que demonstrassem não dispor de meios económicos bastantes para suportar os honorários dos profissionais forenses, devidos por efeito da prestação dos seus serviços, e para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de uma causa judicial.
Os estrangeiros e os apátridas que residissem habitualmente em Portugal passavam a gozar do direito a protecção jurídica e aos estrangeiros não residentes em Portugal era reconhecido o direito a protecção jurídica, na medida em que ele fosse atribuído aos portugueses pelas leis dos respectivos Estados.
O Decreto-Lei n.º 387-B/87 foi alterado pela Lei n.º 46/96, de 3 de Setembro, que veio, em particular, estender a protecção jurídica a quem tivesse requerido a concessão de asilo e a modificar a aplicação do regime às pessoas colectivas, que passou a poder ser apenas dispensado àquelas com fins não lucrativos e às sociedades e aos comerciantes em nome individual em situações muito precisas.
A terceira modificação do sistema sucedeu com a Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, com a desjudicialização do processo e da decisão de atribuição de apoio judiciário e a tentativa de dignificação do patrocínio oficiosos.
Assim, com esta lei, passou a ser da competência dos serviços da segurança social a apreciação dos pedidos de concessão de apoio judiciário, libertando, deste modo, os

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tribunais da excessiva carga administrativa que os onerava e colocando a tramitação do processo junto de um serviço que dispunha de melhores e mais completas informações a respeito do requerente, sem prejuízo de ficar reservada à Ordem dos Advogados a competência para nomear o patrono e de o financiamento deste ser assegurado pelo Ministério da Justiça.
Ainda com a Lei n.º 30-E/2000 intentou-se uma requalificação do patrocínio oficioso, trazendo a esta modalidade da protecção jurídica as regras gerais sobre a competência dos advogados, advogados-estagiários e solicitadores, para que o apoio judiciário passasse a ser exercido apenas por quem tivesse competência própria para tal, de acordo com o que lhe está atribuído por lei para o exercício do mandato forense, e desta maneira se alcançasse uma mais verdadeira igualdade de meios na lide judicial.
Por último, como já referido, com a Lei n.º 30-E/2000 passaram também a ter direito a protecção jurídica os cidadãos da União Europeia que demonstrem não dispor de meios económicos bastantes para suportar os honorários dos profissionais forenses e para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de uma causa judicial.
Mas, com a entrada em vigor deste diploma, verificou-se uma dificuldade de resposta da segurança social decorrente da inexperiência dos serviços e de um incalculável aumento de pedidos, derivado da divulgação mediática da medida e da proximidade dos cidadãos à rede dos postos de atendimento da segurança social, bem como da indução dos pedidos efectuada pelos próprios serviços e pelos advogados dos requerentes, como maneira de aliviar as despesas judiciais dos seus clientes e assegurar a sua remuneração pelo Estado.
Também a Ordem dos Advogados apontou deficiências no sistema e apresentou propostas de reformas, nomeadamente no sentido de a informação e a consulta jurídica passarem a ser exclusivas da relação advocatícia, defendendo a criação de um Instituo de Acesso ao Direito e de um Fundo de Acesso ao Direito para autofinanciar, mesmo que parcialmente, o sistema de acesos ao direitos e à justiça.
Mais propunha a Ordem dos Advogado que fossem delimitadas as condições económicas de acesso dos requerentes ao apoio judiciário, bem como definido o critério de plausibilidade ou de viabilidade da acção como condição da concessão de patrocínio judiciário.

V - A Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003

A Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, insere-se no desígnio mais vasto, consagrado pela União Europeia, de manter e desenvolver um espaço de liberdade, segurança e justiça.
A progressiva integração do espaço europeu exige, forçosamente, a adopção de medidas no domínio da cooperação judiciária, designadamente em matéria civil, com incidência transfronteiriça, imprescindíveis ao bom funcionamento do mercado interno.
Isso mesmo é reconhecido nos artigos 61.º e 65.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia, quando determinam a adopção destas medidas, com o objectivo, nomeadamente, de eliminar os obstáculos à boa tramitação das acções cíveis, promovendo, se necessário, a compatibilidade das normas de processo civil aplicáveis nos Estados-membros.
Mas o crescente adensamento da rede de relações pessoais, económicas, comerciais e empresariais tem como consequência inevitável o aumento dos litígios jurídicos transfronteiras.
Esses conflitos envolvem não só as empresas mas, cada vez mais frequentemente, também os cidadãos, que se vêem confrontados com ordenamentos jurídicos nacionais distintos, quando não bastante diferentes.
As dificuldades daí resultantes são substancialmente agravadas se se tratar de pessoa sem recursos económicos suficientes e, consequentemente, necessitada de recorrer a um sistema público de assistência judiciária.
Com vista a materializar medidas nesse sentido, o Conselho Europeu, reunido em Tempere em 15 e 16 de Outubro de 1999, convidou o Conselho a estabelecer, com base em propostas da Comissão, normas mínimas que assegurem em toda a União um nível adequado de assistência jurídica nos processos transfronteiras.
Em 2000 a Comissão Europeia apresentou um livro verde sobre assistência judiciária civil - Livro Verde - Assistência judiciária em matéria civil: problemas com que se deparam os litigantes em processos transfronteiras [COM (2000) 51 final] -, cuja finalidade consiste em analisar os obstáculos existentes ao acesso efectivo à assistência judiciária relativamente a cidadãos europeus envolvidos em processos judiciais noutro Estado-membro diferente do seu.
A Directiva 2003/8/CE visa, pois, promover a aplicação do princípio da concessão de apoio judiciário em litígios transfronteiriços às pessoas singulares que não disponham de recursos suficientes, na medida em que esse apoio seja necessário para assegurar um acesso efectivo à justiça.
Nos termos desta directiva o apoio judiciário inclui a assistência de um advogado ou de outra pessoa habilitada por lei para assegurar a representação em juízo, a dispensa ou a assunção das despesas de justiça e a assunção, em determinadas condições, dos encargos suplementares relacionados com o carácter transfronteiriço do litígio, designadamente a interpretação, a tradução e as despesas de deslocação.
O apoio judiciário, que abarca todos os procedimentos em matéria civil, incluindo o direito comercial, o direito laboral e o direito do consumo, independentemente do tribunal onde a acção é proposta, deve também abranger o apoio pré-contencioso tendo em vista um acordo prévio a uma acção judicial.

VI - Análise da iniciativa do Governo

A proposta de lei, apesar das alterações que visa introduzir, não vem alterar substancialmente o regime em vigor, pretendendo antes aperfeiçoá-lo, como reconhece o Governo na exposição de motivos.
Assim, o Governo propõe um reordenamento da sistemática do regime, tendo optado, nomeadamente, por converter os Capítulos IV, V, e VI da Lei n.º 30-E/2000 em secções do Capítulo III da proposta da lei, conjugando, desta maneira, sob o mesmo capítulo toda a matéria relativa à protecção jurídica.
Em consequência, a proposta de lei procede à deslocação para as disposições gerais de alguns artigos que, no regime vigente, dispõem apenas sobre uma das modalidades, de modo a que passem a incidir sobre a protecção jurídica na sua totalidade, como os artigos relativos ao cancelamento, à caducidade e à aquisição de meios económicos suficientes.

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Nos termos da proposta de lei, o acesso ao direito e aos tribunais continua a concretizar-se mediante informação jurídica e de protecção jurídica, sendo esta constituída pelas modalidades de consulta e de apoio judiciário.
Também o procedimento se mantém essencialmente idêntico, nomeadamente no que respeita à legitimidade para requerer a protecção jurídica, à autonomia do procedimento, à audição prévia do requerente, ao tribunal competente e ao alcance da decisão final.
A competência sobre a concessão da protecção jurídica continua a ser do dirigente máximo dos serviços da segurança social e o requerimento continua a ser apresentado em qualquer serviço de atendimento ao público dos serviços de segurança social. Também o prazo para a conclusão do procedimento administrativo e decisão sobre o pedido de protecção jurídica continua a ser de 30 dias, mas passa agora a ser contínuo, não se suspendendo durante as férias judiciais, e, se terminar em dia em que os serviços da segurança social estejam encerrados, transfere-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte. E continua a haver deferimento tácito, decorrido que seja esse prazo sem que tenha sido proferida uma decisão.
As alterações mais significativas ocorrem, como referido, na intervenção da Ordem dos Advogados, designadamente na determinação de competência para a apreciação liminar da existência de fundamento legal da pretensão, o que permitirá uma maior triagem das demandas, libertando os tribunais de acções sem sustentação legal.
Já quanto à delimitação do conceito de insuficiência económica, o enunciado no artigo 8.º da proposta de lei suscita algumas dúvidas na medida em que se afigura ser ainda mais vago e incompreensível para os requerentes e para os apreciadores do pedido do que o sistema actualmente em vigor.
Sobre esta questão, a Lei n.º 30-E/2000 opta, não por um conceito genérico, mas por estabelecer, no artigo 20.º, presunções de insuficiência económica, isto é, critérios concretos e de fácil aferição, que agora são eliminados.
Por último, refira-se que é, no mínimo, de duvidosa legalidade a fixação dos critérios de prova e apreciação da insuficiência económica por mera portaria.
Acresce que este conceito de insuficiência económica tem sede constitucional no referido artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.

VII - Análise da iniciativa do PCP

O projecto de lei não faz a revogação expressa da Lei n.º 30-E/2000 ou de qualquer dos seus artigos. No entanto, inclui disposições gerais sobre o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva que se articulam mal com o regime em vigor, o que terá de ser entendido como uma derrogação dos artigos respectivos da Lei n.º 30-E/2000.
Porém, a confirmar-se essa intenção, mesmo admitindo as opções políticas que parecem traduzir, o regime resultante será deveras lacunar, sendo certo que o projecto de lei, sobre esta matéria, apenas prevê regulamentação dos requisitos para acesso à protecção jurídica.
Neste sentido, atente-se, por exemplo, ao disposto no artigo 5.º do projecto de lei sobre o apoio judiciário, em que deixa de se referenciar que este se aplica em todos os processos, qualquer que seja a forma do processo, e, com as devidas adaptações, também aos processos de contra-ordenações, ou que é independente da posição processual que o requerente ocupe na causa e do facto de ter sido já concedido à parte contrária. Ou considere-se o disposto no artigo 7.º do projecto de lei, em que as presunções apenas se aplicam para efeitos de protecção jurídica, deixando de fora a informação jurídica.
Por outro lado, da leitura do projecto de lei parece decorrer que a actuação do ISPAD se circunscreve às pessoas singulares, com a particular excepção de representação do Estado português, não obstante referências a "entidades" nos artigos 6.º e 9.º.
Com efeito, da conjugação dos artigos 1.º, 6.º e 9.º resulta que os utentes do ISPAD são os cidadãos nacionais de qualquer Estado-membro da União Europeia, os estrangeiros e apátridas residentes em Portugal, bem como os não residentes em Portugal ou em situação irregular num dos Estados-membros, quando igual direito seja reconhecido aos cidadão portugueses pelas leis dos respectivos países de origem, para além do Estado português.
Assim, são excluídas do apoio do ISPAD, e nessa medida do regime do acesso ao direito e aos tribunais que este concretiza, quaisquer pessoas colectivas que não o Estado português.
Por outro lado, a competência do ISPAD, prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 9.º do projecto de lei, para representar o Estado nas causas em que este seja parte contende com as competências do Ministério Público nesta matéria consagradas no artigo 219.º da Constituição da República Portuguesa.

VIII - Conclusões

1 - O Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 86/IX, que "Altera e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiras, através do estabelecimento regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios";
2 - A apresentação foi efectuada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição e do artigo 131.º do Regimento, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do Regimento;
3 - Por seu turno, um conjunto de Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 380/IX - Cria o Instituto do Serviço Público de Acesso ao Direito (ISPAD), visando garantir a informação e a consulta jurídica e o apoio judiciário;
4 - Esta apresentação foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição e do artigo 131.º do Regimento, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do Regimento;
5 - A proposta de lei visa introduzir rigor na concessão da protecção jurídica, nas suas modalidades e desdobramentos, e reforçar a componente da informação e da consulta jurídica, assegurando um efectivo direito de acesso ao direito e aos tribunais constitucionalmente garantido;
6 - A proposta de lei visa, em particular, delimitar o conceito de insuficiência económica;
7 - A proposta de lei prevê uma maior intervenção da Ordem dos Advogados neste âmbito, nomeadamente impondo um juízo obrigatório sobre a existência de fundamento legal da pretensão prévio à nomeação de patrono para a propositura da acção;

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8 - A proposta de lei pretende, por fim, lançar as bases legais da transposição da Directiva 2003/8/CE, do Conselho, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiras, através do estabelecimento regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios;
9 - Já o projecto de lei visa criar, na dependência do Ministério da Justiça, do Instituto do Serviço Público de Acesso ao Direito (ISPAD), pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e património próprio, com sede em Lisboa, delegações regionais em cada um dos distritos judiciais e delegados locais em cada comarca;
10 - O ISPAD tem como finalidade assegurar que todos os cidadãos possam conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos, garantindo que tal não seja dificultado ou impedido por insuficiência económica, ou por razões relacionadas com a condição social ou cultural;
11 - Para além de um quadro de pessoal administrativo, sujeito ao regime da função pública, o ISPAD dispõe, para o exercício das funções inerentes à informação e protecção jurídicas, de um quadro de profissionais liberais do serviço público, composto por advogados, advogados estagiários e solicitadores, que são independentes no exercício da sua actividade, estando vedado, em relação à mesma, qualquer controlo hierárquico;
12 - A actividade destes profissionais liberais rege-se pelo Estatuto dos Advogados e dos Solicitadores, nomeadamente no que toca às regras deontológicas e à disciplina, competindo à Ordem dos Advogados e à Câmara dos Solicitadores, consoante os casos, o exercício do poder disciplinar e a apreciação do quadro deontológico que rege a actuação daqueles;
13 - Estes profissionais liberais podem continuar a exercer a actividade profissional em regime de profissão liberal, fora do âmbito do ISPAD, desde que tal actividade não colida com a defesa dos interesses assumida no exercício da sua actividade de profissional liberal do serviço público; não podem, contudo, exercer a sua actividade em qualquer empresa ou sociedade de advogados ou de solicitadores, com actividades conflituais ou conexas com a sua actividade no ISPAD;
14 - A Ordem dos Advogados e, embora em menor grau, a Câmara dos Solicitadores têm uma intervenção decisiva na composição dos órgãos do ISPAD, mantendo as suas prerrogativas nos âmbitos disciplinar e deontológico relativamente aos profissionais liberais do quadro do ISPAD.
Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte:

IX - Parecer

Que a proposta de lei n.º 86/IX e o projecto de lei n.º 380/IX em análise encontram-se em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições de voto para o debate.

Assembleia da República, 3 de Dezembro de 2003. - O Deputado Relator, Vitalino Canas - O Vice-Presidente, Osvaldo Castro.

Nota: - O relatório, as conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência do CDS-PP, BE e Os Verdes.

PROJECTO DE LEI N.º 381/IX
(REGULA O ACESSO AOS DOCUMENTOS DA ADMINISTRAÇÃO)

Comunicação da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias acerca da elaboração e aprovação do relatório

Encarrega-me o Sr. Vice-Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de informar o Sr. Presidente da Assembleia da República, que, por o projecto de lei n.º 381/IX (Os Verdes) - "Regula o acesso aos documentos da Administração" - ter sido recebido por esta Comissão ontem ao fim da tarde e estar agendado para discussão em Plenário hoje, não é possível, em tempo útil, elaborar e aprovar o competente relatório na generalidade.

Assembleia da República, 4 de Dezembro de 2003. - A Assessora, Luísa Colaço.

PROJECTO DE LEI N.º 382/IX
ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 166/93, DE 7 DE MAIO, QUE ESTABELECE O REGIME DE RENDA APOIADA

Exposição de motivos

O Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de Maio, procurou reformular e uniformizar os regimes de renda a que estava, até então, sujeito o parque habitacional afecto ao arrendamento social, sujeitando-o ao regime único de renda apoiada.
Apresenta o referido decreto-lei aspectos positivos: o de procurar uniformizar uma panóplia de regimes de arrendamento que, pela sua diversidade, traduziam soluções de desigualdade; o de definir o chamado preço técnico, impedindo o crescimento da renda para valores especulativos; o de avançar com a definição de critérios sociais que, a partir da determinação de uma dada taxa de esforço, permitem o cálculo da renda que o arrendatário pode efectivamente suportar.
Pesem embora estes aspectos positivos, a aplicação do referido diploma revelou a necessidade de melhorar os critérios sociais de cálculo da renda que, tal como estão, conduzem, sobretudo para famílias de mais baixos rendimentos, a um esforço desmesurado. Esta situação é de tal forma sentida que, a generalidade dos municípios tem vindo, de uma ou de outra forma e ao arrepio da lei, a não adoptar os critérios de aplicação nela propostos.
É no sentido de obviar às claras situações de injustiça que resultam, quer da aplicação do decreto-lei, tal como ele está, quer da sua aplicação integral diferenciada, em municípios diversos, que se propõe a presente alteração.
Com esta iniciativa visa-se impedir que rendimentos ocasionais concorram para onerar o valor da renda e instituir critérios de maior justiça social designadamente por famílias de rendimentos mais baixos e para idosos, obviando, assim, a situações em que o valor calculado de renda apoiada atinge valores insustentáveis para muitos agregados.

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Em concreto com estas propostas de alteração ao Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de Maio, visa-se:

- Estabelecer para cálculo do esforço para pagamento de renda apoiada o valor líquido dos rendimentos auferidos e não o valor ilíquido como agora se dispõe;
- Considerar para efeitos de cálculo dos rendimentos do agregado, com vista à aplicação da taxa de esforço, apenas os rendimentos dos elementos do agregado com idade igual ou superior a 25 anos;
- Retirar do cálculo de rendimentos todos os prémios e subsídios de carácter não permanente, tais como horas extraordinárias, subsídio de turno, etc.;
- Considerar para efeitos de cálculo do rendimento do agregado apenas um valor parcial das pensões de reforma, aposentação, velhice, invalidez e sobrevivência, sempre que estas não atinjam o valor correspondente a dois salários mínimos nacionais;
- Limitar o esforço com o valor da renda a pagar a 15% do rendimento do agregado sempre que este não exceda o valor correspondente a dois salários mínimos nacionais.

Nestes termos, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º

Os artigos 3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 11.º do Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de Maio, passam a ter a seguinte redacção:

"Artigo 3.º

1 - Para os efeitos do presente diploma considera-se:

a) (…)
b) (…)
c) "Rendimento líquido mensal", o quantitativo que resulta da divisão por 12 dos rendimentos anuais líquidos auferidos por todos os elementos do agregado familiar à data da determinação do valor da renda.
d) "Rendimento mensal corrigido", rendimento líquido mensal deduzido de uma quantia igual a três décimos do salário mínimo nacional pelo primeiro dependente e de um décimo por cada um dos outros dependentes, sendo a dedução acrescida de um décimo por cada elemento do agregado familiar que, comprovadamente, possua qualquer forma de incapacidade permanente;
e) (…)

2 - Para efeitos do disposto na alínea c) do número anterior consideram-se rendimentos:

a) O valor mensal de todos os ordenados, salários e outras remunerações, incluindo os subsídios de Natal e de férias, mas excluindo os restantes subsídios e prémios, tais como os referentes a horários por turnos e horas extraordinárias;
b) O valor mensal de subsídios de desemprego e rendimento de inserção social;
c) O valor de quaisquer pensões, nomeadamente de reforma, aposentação, velhice, invalidez e sobrevivência;
d) Os valores provenientes de outras fontes de rendimento, com excepção do abono de família e das prestações complementares.

3 - Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior só são considerados os rendimentos dos elementos do agregado familiar com idade igual ou superior a 25 anos.
4 - Para efeitos do disposto na alínea c) do n.º 2, os valores das pensões de reforma, aposentação, velhice, invalidez e sobrevivência considerados são:

a) A totalidade do valor sempre que este iguale ou exceda o valor correspondente a dois salários mínimos nacionais;
b) 75% do valor sempre que este se situe entre os valores correspondentes a um salário mínimo nacional e a dois salários mínimos nacionais;
c) 50% do valor sempre que este iguale ou seja inferior ao valor correspondente a um salário mínimo nacional.

Artigo 4.º

1 - O preço técnico a que se refere o artigo 2.º é calculado nos mesmos termos em que o é a renda condicionada, sendo o seu valor arredondado para o valor em euros imediatamente inferior.
2 - (…)
3 - (…)

Artigo 5.º

1 - (…)
2 - (…)
3 - O valor da renda é arredondado para o valor em euros imediatamente inferior com as seguintes condições:

a) Não pode exceder o valor do preço técnico nem ser inferior a 1% do salário mínimo nacional;
b) Não pode ser superior a 15% do rendimento líquido mensal do agregado familiar, sempre que este não exceda o valor correspondente a dois salários mínimos nacionais.

Artigo 6.º

1 - (…)
2 - (…)
3 - (…)
4 - No acto da presunção deve a entidade locadora estabelecer o montante do rendimento líquido mensal do agregado familiar que considera relevante para a fixação da renda e notificar o arrendatário no prazo de 15 dias.

Artigo 11.º

1 - O regime de renda apoiada estabelecido nos artigos anteriores pode ser aplicado pelas entidades referidas no artigo 1.º às habitações, adquiridas ou promovidas pelas mesmas e destinadas a arrendamento para fins habitacionais.
2 - (…)
3 - (…)
4 - (…)
5 - (…)"

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Artigo 2.º

A presente lei entra em vigor com a aprovação da próxima Lei do Orçamento do Estado.

Assembleia da República, 27 de Novembro de 2003. - Os Deputados do PCP: Honório Novo - Bernardino Soares - Rodeia Machado - António Filipe - Lino de Carvalho - Bruno Dias - Luísa Mesquita.

PROJECTO DE LEI N.º 383/IX
COLOCAÇÃO DE GUARDAS DE SEGURANÇA METÁLICAS NAS VIAS DE COMUNICAÇÃO PÚBLICAS, INTEGRADAS OU NÃO NA REDE RODOVIÁRIA NACIONAL, CONTEMPLANDO A PERSPECTIVA DA SEGURANÇA DOS VEÍCULOS DE DUAS RODAS

Exposição de motivos

A generalidade dos especialistas e responsáveis em segurança rodoviária tem reconhecido, ao longo dos últimos anos, que muitas das guardas de segurança colocadas nas bermas das vias de comunicação pública, integradas ou não na rede rodoviária nacional, não contemplam eficazmente a perspectiva da segurança dos veículos de duas rodas, principalmente tratando-se de motociclos e de ciclomotores.
Na verdade, larga parcela das guardas de segurança existentes nas nossas estradas são construídas com recurso a materiais metálicos e colocadas longitudinalmente, sendo fixadas em prumos, também metálicos, cravados verticalmente no solo.
Ora, quando um motociclo, ou ciclomotor se despiste na faixa de rodagem e seja arrastado ao longo da via em direcção a guardas de segurança cujos prumos não contemplem a perspectiva da segurança daqueles veículos não raro resultam para os seus ocupantes graves danos pessoais, quando não a própria morte.
Parecendo reconhecer a evidência desta situação, o Governo aprovou o Despacho n.º 22 428/2000, de 4 de Outubro, através do qual fixou regras para a colocação de guardas de segurança contemplando a perspectiva da segurança dos veículos de duas rodas.
Desde então, e apesar das expectativas criadas, a quase totalidade das guardas de segurança das nossas estradas continua sem qualquer dispositivo que contemple a perspectiva da segurança dos veículos de duas rodas. Assim como as novas vias da rede rodoviária nacional que entraram em funcionamento sem que as guardas de segurança nelas colocadas contemplem adequada e suficientemente a perspectiva da referida segurança.
Esta situação deve ser alterada, a curto prazo, de modo a que o País não continue a pagar um preço cruel pelo prolongamento do adiamento da adequação das guardas de segurança à protecção dos ocupantes de motociclos e ciclomotores.
Atento a esta dramática realidade o Partido Social Democrata considera ser seu indeclinável dever, perante os milhares de condutores de veículos de duas rodas que circulam nas estradas nacionais e a generalidade dos portugueses, propor, por via legislativa, a obrigatoriedade de as guardas de segurança contemplarem a perspectiva da segurança dos veículos de duas rodas, principalmente nos denominados pontos negros das nossas estradas.
Necessariamente, prevê-se um período suficientemente aceitável ao longo do qual devem ser adaptadas as guardas de segurança existentes mediante a colocação de adequados dispositivos de protecção, mesmo que para o efeito se torne necessário recorrer a meios provisórios, que demonstrem, ao menos temporariamente, permitir uma melhoria de eficácia na segurança rodoviária.
Em todo o caso, o presente projecto de lei não abdica de tornar responsáveis, aqueles que, devendo assegurar a gestão das redes rodoviárias de forma que garanta a segurança dos seus utilizadores, permitam a entrada em funcionamento de novas vias cujas guardas de segurança não contemplem a perspectiva da segurança dos veículos de duas rodas, ou protelem negligentemente a adaptação das actualmente existentes às exigências mínimas de segurança já reconhecidas.
Assim, nos termos das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Partido Social Democrata, abaixo-assinados, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
Objecto

A presente lei estabelece a obrigação de as guardas de segurança a colocar nas vias de comunicação públicas rodoviárias, integradas ou não na rede rodoviária nacional, contemplarem a perspectiva de segurança dos veículos de duas rodas, principalmente nos pontos da via que apresentem elevado risco de acidente.

Artigo 2.º
Concepção e construção de guardas de segurança

As dimensões e perfis das guardas de segurança, bem como os materiais utilizados na sua construção, devem contemplar, nos termos definidos em normas aprovadas pelo Governo, a perspectiva da segurança dos veículos de duas rodas.

Artigo 3.º
Localização de guardas de segurança

1 - As guardas de segurança devem ser colocadas nos pontos das vias que apresentem elevado risco de acidente e nas bermas cuja localização, características, desnivelamento ou obstáculos fixos e rígidos (encontros de pontes, pilares, muros, postes, árvores de grande porte, entre outros) existentes a menos de dois metros do limite da faixa de rodagem, se revelem susceptíveis de provocar danos superiores aos causados pelo embate nos mesmos.
2 - Para os efeitos do disposto no número anterior, as guardas de segurança devem localizar-se:

a) Em auto-estradas (AE), itinerários principais (IP), itinerários complementares (IC) e circulares e variantes, sempre que se considere necessário, e, em especial, em:

- Curvas de raio inferior ao mínimo normal,
- Curvas com sobre elevação inferior à exigida ou inexistente,
- Curvas de raio reduzido associadas a declive acentuado (>4%),

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- Curvas circulares seguidas, (do mesmo sentido) e de raio decrescente,
- Ramos de ligação em laço (loops) e outros de raio reduzido,
- Zonas de entrada dos ramos dos nós de ligação,
- Zonas com perigo de derrapagem (ex: pavimento em calçada ou outros sem adequada aderência);
- Zonas sujeitas a formação de gelo,

b) Em estradas regionais e municipais, nos locais indicados na alínea a) e ainda quando a via seja ladeada de precipícios ou declives acentuados, quando haja perigo de projecção de gravilha e em descidas com acentuada inclinação.

3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, as guardas de segurança colocadas fora das localidades devem, sempre que possível, ser substituídas por bermas livres de obstáculos, com largura suficiente que permita a desaceleração dos veículos em caso de despiste.

Artigo 4.º
Identificação dos pontos que apresentem elevado risco de acidente

1 - Para os efeitos do disposto no artigo anterior, as pessoas colectivas legal ou contratualmente responsáveis pela construção ou manutenção em funcionamento das vias de comunicação pública rodoviária integradas ou não na rede rodoviária nacional devem, no âmbito das respectivas competências, promover a permanente identificação dos pontos das vias sob sua responsabilidade que apresentem elevado risco de acidente.
2 - Na identificação dos pontos das vias que apresentem elevado risco de acidente dever-se-á atender a parecer, a emitir sobre esta matéria, da Prevenção, Rodoviária Portuguesa.
3 - Os pontos identificados nos termos dos números anteriores devem constar de lista obrigatoriamente publicada em Diário da República, após ter sido homologada pelo membro do Governo competente no caso de respeitar à rede rodoviária nacional, ou em boletim municipal, no caso de incidir sobre vias integradas em redes municipais.

Artigo 5.º
Adaptação das guardas de segurança existentes

1 - As pessoas colectivas legal ou contratualmente responsáveis pela construção ou manutenção, em funcionamento das vias de comunicação pública rodoviária integradas ou não na rede rodoviária nacional devem promover a colocação de dispositivos de protecção - saia metálica - nas guardas, de segurança actualmente existentes, nos termos seguintes:

a) Nos pontos que apresentem elevado risco de acidente sob sua responsabilidade, no prazo de um ano a contar da sua publicação, nos termos definidos no n.º 3 do artigo anterior;
b) Nas restantes situações, no prazo de três anos a contar da entrada em vigor da presente lei:

2 - Caso se verifiquem dificuldades na aquisição dos dispositivos previstos no número anterior, as entidades nele referidas devem promover a colocação temporária de outros dispositivos como, por exemplo, DPM (dispositivos de protecção para motociclistas), pneus usados, ou outros artigos com análoga eficácia, nos prumos das guardas de segurança, de forma a serem satisfeitos os prazos estabelecidos no número anterior.
3 - Para os efeitos do disposto nos números anteriores, as entidades referidas no n.º 1 devem, até 31 de Dezembro de 2004, assegurar a identificação dos pontos sob sua responsabilidade que apresentem elevado risco de acidente.
4 - Nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 4.º do presente diploma, os pontos previstos no número anterior são obrigatoriamente sujeitos a publicação.

Artigo 6.º
Responsabilidade

1 - Sem prejuízo pela existência de terceiros, legal ou contratualmente responsáveis, os responsáveis pela decisão de abertura ao tráfego, a partir da data da entrada em vigor da presente lei, respondem civilmente pelos danos pessoais e materiais causados ou agravados pela existência, nos locais identificados no artigo 3.º, de guardas de segurança não contemplando a perspectiva da segurança dos veículos de duas rodas.
2 - O disposto no número anterior é aplicável aos responsáveis pela manutenção em funcionamento das vias existentes que não promovam, nos termos definidos no antigo anterior, a adequação das guardas de segurança existentes à data da entrada em vigor da presente lei.
3 - A responsabilidade prevista nos números anteriores não prejudica a eventual responsabilidade criminal, disciplinar ou contratual dos responsáveis neles referidos:
4 - A responsabilidade civil pode ser transferida para as seguradoras, nos termos gerais previstos na lei.

Artigo 7.º
Regulamentação

O Governo, no prazo de 120 dias após a publicação deste diploma em Diário da República, deverá regulamentar as normas não directamente aplicáveis pela presente lei, designadamente aprovando as normas de construção das guardas de segurança, bem como as demais regras para a sua colocação.

Artigo 8.º
Entrada em vigor

O presente diploma entra imediatamente em vigor após a data da sua publicação.

Assembleia da República, 22 de Novembro de 2003. - Os Deputados: Luís Marques Guedes (PSD) - Guilherme Silva (PSD) - Fernando Pedro Moutinho (PSD) - Rodrigo Ribeiro (PSD) - Melchior Moreira (PSD) - Jorge Nuno Sá (PSD) - Rui Gomes da Silva (PSD) - João Gago Horta (PSD) - Paula Malojo (PSD) - Manuel Oliveira (PSD) - Bessa Guerra (PSD) - Pedro Duarte (PSD) - Miguel Miranda (PSD) - José António Silva (PSD)

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- Jorge Neto (PSD) - João Carlos Duarte (PSD) - Maria João Fonseca (PSD) - Álvaro Barreto (PSD) - Gonçalo Capitão (PSD) - Clara Carneiro (PSD) - Cruz Silva (PSD) - José Manuel Ribeiro (PSD) - Natália Carrascalão (PSD) - Francisco José Martins (PSD) - Fernando Lopes (PSD) - António Ribeiro Cristóvão (PSD) - Judite Jorge (PSD) - Miguel Anacoreta Coreia (CDS-PP) - João Rebelo (CDS-PP) - Álvaro Castello-Branco (CDS-PP) - Telmo Correia (CDS-PP).

PROJECTO DE LEI N.º 384/IX
CRIA A AGÊNCIA GESTORA DA FLORESTA NACIONAL (AGFN), O FUNDO DE RECONVERSÃO FLORESTAL (FRF) E AS UNIDADES DE GESTÃO FLORESTAL (UGF)

Exposição de motivos

A estrutura de propriedade florestal que a história nos legou tem constituído e constitui o principal constrangimento à gestão activa e profissional de uma parte significativa da floresta nacional e, por consequência, a maior limitação à optimização do aproveitamento das potencialidades sociais, económicas e ambientais do importante recurso natural que é a floresta, para além de representar um factor determinante para a propagação dos incêndios.
Pese embora o esforço que foi desenvolvido nos anos mais recentes para a criação de condições para inverter a situação, designadamente com a aprovação da Lei de Bases da Política Florestal e da sua quase plena regulamentação, do Plano de Desenvolvimento da Floresta Sustentável e a dotação de meios financeiros sem precedentes dirigidos ao sector para o período 2000-2006, no âmbito da QCA III e do Plano de Desenvolvimento Rural - "Ruris", graças aos bons resultados obtidos na negociação da Agenda, 2000, persiste a ausência, quase generalizada, de gestão profissional da floresta, particularmente nas zonas de minifúndio onde se situam importantes manchas florestais.
A tragédia que se abateu sobre o país no Verão de 2003 assumiu uma dimensão sem precedentes que exige a tomada de decisões e a adopção de medidas de política tendentes a tudo fazer para evitar a repetição de idêntica calamidade.
O presente projecto de lei ao instituir a Agência Gestora da Floresta Nacional, o Fundo de Reconversão Florestal e as Unidades de Gestão Florestal, visa criar condições para que, no escrupuloso respeito pela propriedade privada, seja rapidamente possível introduzir em Portugal, em especial nas zonas de minifúndio, as mais fustigadas pelo já denominado "ciclo do fogo", um modelo de gestão profissional da floresta de forma não só a melhorar os rendimentos dos proprietários florestais como também a aproveitar ao máximo as potencialidades sociais, económicas e ambientais da floresta, reduzindo simultaneamente ao mínimo as condições favoráveis à ocorrência e propagação de incêndios.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista signatários apresentam à Assembleia da República o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
Agência Gestora da Floresta Nacional, Fundo de Reconversão Florestal e Unidades de Gestão Florestal

A presente lei cria a Agência Gestora da Floresta Nacional, o Fundo de Reconversão Florestal e as Unidades de Gestão Florestal adiante designados por, respectivamente, AGFN, FRF e UGF.

Artigo 2.º
Agência Gestora da Floresta Nacional

A AGFN é o organismo do Estado encarregue de promover e garantir, na área territorial onde exerce as suas competências, o desenvolvimento sustentável dos espaços florestais.

Artigo 3.º
Natureza jurídica

A AGFN é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, na directa dependência do primeiro-ministro.

Artigo 4.°
Regime jurídico

A AGFN rege-se pelo disposto na presente lei, pelas disposições legais que lhe sejam especificamente aplicáveis e, subsidiariamente, pelo regime jurídico das entidades públicas empresariais, ressalvadas as especificidades previstas na presente lei, bem como as regras incompatíveis com a natureza não empresarial daquela.

Artigo 5.º
Tutela

A AGFN exerce as suas funções, no quadro da lei, sem prejuízo dos princípios orientadores de política florestal fixados pelo Governo, nos termos constitucionais e legais, e dos actos sujeitos a tutela governamental, nos termos previstos na lei.

Artigo 6.º
Princípio da especialidade

1 - A capacidade jurídica da AGFN abrange os direitos e obrigações necessários à prossecução do seu objecto.
2 - A AGFN não pode exercer actividades ou usar os seus poderes fora das suas atribuições nem dedicar os seus recursos a finalidades diversas das que lhe estão cometidas.

Artigo 7.º
Isenções

A AGFN esta: isenta de todas as taxas, custas e emolumentos de qualquer natureza nos processos e actos notariais em que intervenha.

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Artigo 8.º
Atribuições e competências da AGFN

1 - São atribuições da AGFN:

a) Promover e garantir o desenvolvimento sustentável dos espaços florestais das zonas territoriais onde exerce as suas competências;
b) Promover o acesso à utilização social dos espaços florestais, harmonizando as múltiplas funções que ela desempenha e salvaguardando os seus aspectos ambientais, paisagísticos, recreativos, científicos e culturais;
c) Assegurar a melhoria do rendimento global dos agricultores, produtores e utilizadores dos sistemas florestais;
d) Optimizar a utilização do potencial produtivo de bens e serviços da floresta e dos sistemas naturais associados, no respeito pelos seus valores multifuncionais;
e) Garantir a gestão do património florestal nacional, nos territórios onde é exercida a sua acção, nomeadamente através do ordenamento das explorações florestais;
f) Zelar pela protecção da floresta contra agentes bióticos e abióticos, nomeadamente contra os incêndios;
h) Promover prioritariamente a constituição de UGF nas zonas abrangidas pelo "ciclo do fogo";
g) Promover acções de sensibilização dos cidadãos, em particular dos jovens, para a importância da salvaguarda e valorização dos recursos florestais.

2 - São competências da AGFN:

a) Colaborar na criação de instrumentos de fomento florestal e assegurar a sua correcta aplicação;
b) Proceder ao reconhecimento, credenciação e extinção das UGF;
c) Avaliar e fiscalizar as UGF e os respectivos Planos de Ordenamento e Gestão;
d) Aprovar os Planos Regionais de Ordenamento Florestal (PROF) e os Planos de Desenvolvimento Florestal (PDF), definidos na Lei de Bases da Política Florestal e os projectos de florestação referentes às áreas geridas pelas Entidades Gestoras das UGF;
e) Autorizar os adiantamentos que forem estabelecidos para as despesas de funcionamento e de investimento das Entidades Gestoras das UGF;
f) Colaborar com as entidades competentes na definição das prioridades de investigação no domínio florestal e na adequação da estrutura curricular dos cursos florestais às necessidades do País e às condições do mercado;
g) Publicar anualmente um relatório para divulgar quantificadamente os resultados da sua acção.

3 - As atribuições e competências da AGFN não podem prejudicar as competências do Instituto da Conservação da Natureza (ICN) na emissão de pareceres, autorizações ou licenciamentos em áreas protegidas ou sítios integrados na Rede Natura, previstos em legislação própria aplicável; nem o regime jurídico da avaliação de impacto ambiental

Artigo 9.º
Competência consultiva

A AGFN pronunciar-se-á sobre todos os assuntos da sua esfera de atribuições que lhe sejam submetidos pela Assembleia da República ou pelo Governo e pode, por sua iniciativa, sugerir ou propor medidas de natureza política ou legislativa nas matérias atinentes às suas atribuições.

Artigo 10.º
Composição da Agência Gestora da Floresta Nacional

1 - A AGFN é constituída por:

a) Uma direcção composta por um presidente e seis vogais;
b) Um núcleo técnico;
c)Um núcleo administrativo

2 - Os núcleos técnico e administrativo, a que se refere o número anterior, serão constituídos por funcionários da Administração, Pública em regime de destacamento ou de requisição.

Artigo 11.º
Nomeação e designação dos membros da AGFN

1 - A direcção da AGFN é nomeada por Resolução do Conselho de Ministros.
2 - Os vogais da direcção da AGFN são nomeados nos seguintes termos:

a) 3 Vogais designados pelos membros do Governo que tutelam as áreas da Administração Interna, do Ambiente e da Agricultura;
b) 1 Vogal designado pela Associação Nacional dos Municípios Portugueses;
c) 1 Vogal designado pelas associações de protecção do ambiente;
d) 1 Vogal designado pelas associações de produtores florestais.

Artigo 12.º
Cooperação com outras entidades

A AGFN pode estabelecer relações de cooperação ou associação, no âmbito das suas atribuições, com outras entidades públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, nomeadamente no quadro da União Europeia, desde que isso não implique delegação ou partilha das suas competências.

Artigo 13.º
Fundo de Reconversão Florestal

O FRF é um fundo destinado a financiar acções que visem o desenvolvimento sustentável e a protecção da floresta contra agentes bióticos e abióticos, sendo a gestão financeira assegurada pelo IFADAP.

Artigo 14.º
Receitas do Fundo de Reconversão Florestal

Constituem receitas do FRF:

a) As dotações do Orçamento do Estado e os recursos financeiros de origem comunitária ou outros

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referentes aos programas direccionados para a floresta;
b) 50% das receitas que caibam ao Estado provenientes das coimas, taxas e licenças referentes às actividades relacionadas com a floresta incluindo as da caça é pesca dás águas interiores;
c) Outras receitas previstas em diploma próprio, designadamente as que vierem a ser instituídas mediante taxação da energia produzida em centrais hidroeléctricas ou da transformação de matérias-primas provenientes de espécies florestais de crescimento rápido.

Artigo 15.º
Prioridades de Acesso aos Financiamentos

1 - Serão prioritariamente financiadas pelo FRF os projectos de florestação que:

a) Incidam sobre áreas que tenham sido percorridas por incêndios florestais;
b )Privilegiem as espécies folhosas tradicionais;
c) Contemplem prémios específicos aos 5.º e 10.º anos para, respectivamente, incentivar a sobrevivência do maior número de exemplares plantados e salvaguardar o rendimento dos proprietários;

2 - Serão também prioritariamente pagas pelo FRF:

a) As compensações devidas aos proprietários afectados no seu rendimento pela localização de aceiros para protecção comum e os incentivos visando a aquisição e manutenção de efectivos de pequenos ruminantes para pastoreio permanente das áreas de protecção não florestadas;
b) Os adiantamentos referentes à comparticipação das despesas de funcionamento e de investimento das Entidades Gestoras das UGF.

Artigo 16.º
Unidades de Gestão Florestal

1 - As UGF são unidades territoriais constituídas por prédios rústicos pertencentes a uma ou mais entidades, sujeitas a um único plano de gestão tendo em vista a gestão profissional e sustentada dos espaços com vocação florestal, a delimitar nos termos do artigo 23.º do presente diploma.
2 - As zonas a delimitar referidas no número anterior terão em conta:

a) Dimensão e limites que assegurem a possibilidade de constituição de dispositivos eficazes de prevenção de incêndios e de combate ao fogo;
b) A existência de pelo menos um responsável técnico qualificado;

3 - As Entidades Gestoras das UGF serão constituídas obrigatoriamente por Organizações de Produtores Florestais, Autarquias Locais, Outras Entidades que integrem pelo menos uma das anteriores, Empresas e, subsidiariamente, por Organismos Públicos.

Artigo 17.º
Competências das Entidades Gestoras Unidades de Gestão Florestal

São competências das Entidades Gestoras das UGF, adiante designadas por EG:

a) Gerir, sustentavelmente a floresta das áreas territoriais para que forem credenciadas e relativamente às quais estejam mandatadas ou em que assumam a gestão provisória nos termos do artigo 21.º;
b) Elaborar e ou colaborar na elaboração e execução dos planos de prevenção contra incêndios referentes à sua zona de actuação;
c) Elaborar e ou contribuir para a elaboração do cadastro da propriedade referente à sua área de intervenção;
d) Proceder ao pagamento das rendas e de outras compensações financeiras que forem devidas aos proprietários das áreas florestais sob sua gestão.

Artigo 18.º
Direitos e deveres dos proprietários das áreas florestais

1 - Constituem direitos dos proprietários de terrenos localizados nas áreas florestais situados nas UGF todos os que são inerentes aos direitos de propriedade consignados na lei civil, designadamente o direito de gerir, arrendar, ceder a outro título, doar ou vender, e, ainda, o direito a compensação adequada sempre que a exploração económica da sua parcela seja prejudicada pelas normas de ordenamento aplicáveis à unidade de gestão onde está integrada.
2 - Constituem deveres dos proprietários florestais, para além dos que decorrem da lei geral, gerir a sua propriedade de acordo com as normas de ordenamento florestal aplicáveis na área de localização das suas propriedades.
3 - No caso dos pequenos proprietários florestais o dever de gestão ordenada definido no número anterior só é aplicável quando o seu património fundiário estiver localizado em área geográfica inserida em UGF com entidade gestora credenciada.

Artigo 19.º
Contra-ordenações

1 - A violação dos deveres a que se refere o número 2 do artigo anterior, ressalvado o disposto no numero 3 do mesmo artigo constitui contra-ordenação punível com coima de 250 € a 2.500 € por hectare.
2 - O limite máximo das coimas previstas nos números anteriores é elevado a 10 vezes o seu valor sempre que a contra-ordenação seja praticada por pessoa colectiva.
3 - A violação dos deveres, a que se refere o número 1 em 3 ocasiões implica o arrendamento compulsivo da propriedade respectiva a EG da UGF, no prazo máximo de um ano, após a aplicação da última coima, em condições contratuais idênticas às do contrato mais favorável celebrado voluntariamente entre esta e os demais proprietários da sua área de intervenção.
4 - A instauração dos processos de contra-ordenação a que se refere a presente lei é da competência das direcções regionais de agricultura.
5 - É atribuída ao director-geral das Florestas a competência para a decisão de aplicação das coimas a que se refere o presente artigo.

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Artigo 20.º
Exercício da gestão florestal pelas Entidades Gestoras das Unidades de Gestão Florestal

As EG das UGF exercem a sua acção:

a) Nas suas próprias propriedades;
b) Nas áreas cedidas para o efeito mediante qualquer tipo de contrato celebrado com os respectivos proprietários;
c) Nas áreas compulsivamente arrendadas nos termos do número 3 do artigo 19.º;
d) Nas áreas sobre as quais assume a gestão provisória nos termos do artigo seguinte.

Artigo 21.º
Gestão provisória de áreas florestais pelas Entidades Gestoras das Unidades de Gestão Florestal

1 - As EG das UGF poderão assumir provisoriamente a gestão florestal de terrenos localizados nas áreas florestais situados nas suas zonas de intervenção, para além do estabelecido no artigo anterior, nas condições descritas e desde que cumpridos os requisitos definidos no número seguinte.
2 - Quando forem desconhecidos os proprietários de terrenos localizados nas suas zonas de intervenção, após cumpridas as seguintes diligências:

a) Afixação nos locais do estilo e publicados pelo menos num jornal regional e noutro nacional de edital visando identificar os proprietários desconhecidos de prédios rústicos localizados na área da UGF;
b) Deliberação da Assembleia de Freguesia respectiva, sob proposta da Junta de Freguesia, confirmando a realização da diligência referida na alínea anterior e a prevalência do desconhecimento dos proprietários, decorridos que tenham sido, pelo menos 180 dias desde a data da última publicação do edital na imprensa;
c) Elaboração de acta da assumpção da gestão provisória da área em causa pela EG da UGF, na presença obrigatória do Presidente da Junta de Freguesia, do Presidente da Assembleia de Freguesia e de 3 cidadãos residentes há mais de 20 anos na mesma freguesia.

Artigo 22.º
Cessação da gestão provisória

A gestão provisória definida no artigo anterior cessa automaticamente com a identificação do proprietário o qual poderá:

a) Reassumir de imediato a gestão florestal da área em causa no respeito pelo dever de gestão contido no n.º 2 do artigo 18.º, indemnizando a EG da UGF das despesas efectuadas desde a data da acta a que se refere a alínea c) do artigo anterior;
b) Vender, arrendar, doar ou ceder à EG da UGF ou a outrem, a qualquer título, o seu património.

Artigo 23.º
Zonagem das áreas florestais

1 - O membro do Governo que tutela a política florestal estabelecerá, por portaria, no prazo de 90 dias após a entrada em vigor da presente lei, a zonagem do país a gerir por EG de UGF credenciadas pela AGFN.
2 - O Governo colocará em condições de aprovação pela AGFN, até 180 e 365 dias após a publicação da presente lei, respectivamente, todos os Planos Regionais de Ordenamento Florestal e Planos de Gestão Florestal referentes às áreas florestais incluídas na zonagem definida no número anterior.

Artigo 24.º
Regulamentação

Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, compete ao Governo regulamentar a presente Lei no prazo de 120 dias após a sua publicação.

Artigo 25.º
Revogação

Consideram-se revogadas todas as normas que contrariem o disposto na presente lei.

Assembleia da República, 27 de Novembro de 2003. - O Grupo Parlamentar do PS: Capoulas Santos - Miguel Ginestal - José Miguel Medeiros - Vítor Baptista - Fernando Cabral - Nelson Baltazar - Fernando Serrasqueiro - Júlio Miranda Calha - Silva Pereira - e mais uma assinatura ilegível.

PROPOSTA DE LEI N.º 102/IX
(ALTERA O ESTATUTO DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS, APROVADO PELA LEI N.º 13/2002, DE 19 DE FEVEREIRO)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

I - Relatório

1.1. Nota prévia

O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei que "Altera o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro".
Essa apresentação é efectuada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 130.º do Regimento da Assembleia da República. A proposta de lei reúne os requisitos formais previstos no artigo 137.º do Regimento.
Por Despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República de 6 de Novembro de 2003, a proposta vertente desceu à 1.ª Comissão para emissão do respectivo relatório, conclusões e parecer, estando a discussão na generalidade agendada para a reunião plenária de 5 de Dezembro de 2003.
Refere-se a título preambular que foram ouvidos o Supremo Tribunal Administrativo, a Procuradoria-Geral da República e a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais, desconhece-se contudo, a posição das entidades auscultadas.

1.2. Do objecto e motivação

Através da proposta de lei vertente visa o Governo proceder a alterações ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Ficais,

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pelo que se propõem alterações aos artigos 4.º, 6.º, 8.º, 9.º, 23.º, 24.º, 26.º, 27.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 48.º, 49.º, 52.º, 54.º, 56.º, 58.º, 64.º, 66.º, 68.º, 69.º, 74.º e 93.º desse mesmo Estatuto, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro.
Referem os proponentes que é necessário adoptar medidas legislativas e regulamentares previstas nas Leis n.os 13/2002 e 15/2002, designadamente no que se refere à configuração da rede de novos tribunais de primeira instância a instalar por todo o território do continente, determinação da sede e área de jurisdição de cada um desses tribunais e dos moldes em que se deverá concretizar a respectiva organização interna.
Observam os proponentes que "está em curso a elaboração desses diplomas, que envolve a necessidade de proceder a opções em ordem a planear com a máxima racionalidade e eficiência a afectação dos recursos, que são escassos, ao cumprimento das exigências ditadas pela reforma, tanto ao nível das instalações, como dos recursos humanos envolvidos. Algumas dessas opções contendem com soluções consagradas no Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), exigindo a sua revisão em aspectos pontuais, relacionados com a organização dos novos tribunais".

1.3. Das soluções normativas perspectivadas na proposta de lei n.º 102/IX

As alterações preconizadas na proposta de lei sub judice incidem sobre 34 artigos da Lei n.º 13/2002 e inserem-se, na sua grande maioria, na invocada preocupação quanto à necessidade de os tribunais estarem preparados e apetrechados para o crescimento constante do número de processos nesta área do direito.
Assim, as alterações reconduzem-se ao seguinte:

a) Revisão em três aspectos muito pontuais do regime do artigo 4.º do ETAF, no que respeita à delimitação do âmbito da jurisdição:

- O primeiro tem o propósito de esclarecer que o âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos não se estende à apreciação de litígios respeitantes a contratos puramente privados, celebrados entre privados que actuem nessa qualidade, ainda que eles entendam submeter o regime do respectivo contrato a um regime de direito público (por exemplo, ao regime das empreitadas de obras públicas);
- O segundo tem o propósito de esclarecer que o âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos se estende à apreciação de todos os litígios respeitantes à questão da responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público;
- O terceiro tem o propósito de esclarecer que o âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos não se estende à "perseguição judicial", do ponto de vista penal ou contra-ordenacional, de danos ambientais causados por entidades públicas.

b) Por forma a optimizar a gestão dos espaços físicos e dos recursos humanos os tribunais administrativos de círculo e os tributários funcionarão agregados sempre que tal se justifique, e não apenas quando tenham pequena dimensão, pelo que propõe a alteração em conformidade do artigo 9.º do ETAF;
c) Em função do previsível crescimento do volume de processos no Tribunal Central Administrativo, transformado no tribunal de segunda instância da jurisdição administrativa e fiscal para todos os tipos de processos, opta-se por uma solução do desdobramento do Tribunal Central Administrativo num Tribunal Central Administrativo Norte, com sede no Porto, e num Tribunal Central Administrativo Sul, com sede em Lisboa, (nova redacção do artigo 31.º do ETAF);
d) Articula-se o regime do julgamento por tribunal colectivo com o consagrado no Código de Processo Civil, restringindo-se o recurso ao mesmo aos casos em que nenhuma das partes requeira a gravação da prova (artigo 40.º);
e) A proposta de alteração do artigo 42.º do ETAF resulta da necessidade de dar resposta ao problema que, desde logo, se coloca a propósito da formação do tribunal colectivo em tribunais de pequena dimensão.
f) As competências dos presidentes dos tribunais administrativos de círculo e dos tribunais tributários são objecto de alteração, no sentido de lhes ser cometida a competência para presidir aos tribunais colectivos e de os mesmos serem desvinculados de algumas tarefas de gestão corrente do tribunal, desprovidas de conteúdo jurisdicional (artigos 43.º e 48.º);
g) A modificação do artigo 49.º foi suscitada pelo reconhecimento da conveniência em articular e harmonizar a terminologia utilizada no ETAF a propósito dos meios processuais que podem ser accionados no domínio do contencioso tributário com as inovações introduzidas pelo Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
h) As alterações ao artigo 54.º do ETAF visam flexibilizar os moldes em que se deve processar a representação da Fazenda Pública nos processos tributários. A separação dos tribunais tributários do Ministério das Finanças, cuja concretização se prepara, ao permitir que a área territorial de cada tribunal tributário de primeira instância não tenha de ser necessariamente reportada à área de cada Direcção Distrital de Finanças, deve permitir à Fazenda Pública determinar internamente os moldes em que deve promover a sua representação da Fazenda Pública perante a Justiça tributária.

1.4. Problematização em torno da questão específica do âmbito de jurisdição

A matéria do âmbito de jurisdição vem-se revelando um dos mais sensíveis domínios face à natureza de jurisdição própria, tal como está constitucionalmente configurada a jurisdição administrativa.
Pontualmente, importará, para o caso das alterações propostas, suscitar duas questões porventura sem clarificação ainda suficiente.
A primeira, consiste em indagar se, à luz do artigo 4.º, mesmo na sua nova formulação, a actividade da Administração

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sob a forma do direito privado (maxime, sociedades S.A.) se inclui inequivocamente no âmbito de jurisdição dos tribunais administrativos.
A segunda, consiste em averiguar se a declarada intenção de remeter para os tribunais administrativos toda a matéria da responsabilidade civil extracontratual é inteiramente acolhida pela solução legal, uma vez que a norma salvaguarda o inciso "nos termos da lei" e a lei em causa - a que inovadoramente regule o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado - ainda não se encontra aprovada e nos seus trabalhos preparatórios ainda não resulta esclarecido se a responsabilidade da Administração distingue ou não a natureza dos actos de gestão pública face a actos de gestão privada.

1.5. Do enquadramento legal e antecedentes parlamentares

Na VIII Legislatura, no âmbito da Reforma Administrativa, o XIV Governo tomou a iniciativa de apresentar a proposta de lei n.º 92/VIII que "Aprova o Código de Processo nos Tribunais Administrativos - Revoga o Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho [Vd Relatório e parecer da 1.ª Comissão in DAR II Série A n.º 12 de 2/11/2001 e discussão conjunta in DAR I Série n.º 19 de 2/11/2001. Esta proposta deu origem à Lei n.º 15/2002] - "acompanhada da proposta de lei n.º 93/VIII sobre "Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais [Vd Relatório e parecer da 1.ª Comissão in DAR II Série A N.º 12 de 2/11/01 e discussão conjunta in DAR I Série N.º 19 de 2/11/2003. Esta proposta deu origem à Lei n.º 13/2002]" e da proposta de lei n.º 95/VIII "Lei da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado".
A Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, que aprovou o novo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e a Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro, que aprovou um Código de Processo nos Tribunais Administrativos, consubstanciam uma profunda reforma do contencioso administrativo português. Por força de alteração entretanto introduzida pela Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro [Na origem desta Lei esteve a proposta de lei n.º 39/IX], a entrada em vigor destes diplomas terá lugar no dia 1 de Janeiro de 2004.

1.6 - Do enquadramento constitucional
(Artigo 214.º da Constituição da República Portuguesa)

A constitucionalização formal dos tribunais administrativos e fiscais efectuada na 2.ª revisão constitucional - pela qual deixaram de ser uma ordem judicial constitucionalmente facultativa - veio ao encontro das críticas da doutrina que se manifestavam estupefactas ao "ver considerada como facultativa e dependente da lei a existência de uma categoria de tribunais que goza de uma posição solidamente sedimentada no actual sistema judicial".
A consolidação do estatuto constitucional dos tribunais administrativos e fiscais constitui, assim, uma das inovações mais relevantes da 2.ª revisão constitucional.
Os tribunais administrativos e fiscais formam uma estrutura hierárquica, tendo como órgão de cúpula o Supremo Tribunal Administrativo (212.º, n.º 1) que está de certo modo para a justiça administrativa como o Supremo Tribunal de Justiça está para os tribunais judiciais.
Aos tribunais administrativos e fiscais compete o exercício da justiça administrativa e fiscal por outras palavras, compete-lhes "o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações administrativas e fiscais" (212.º, n.º 3).
Estão em causa os litígios emergentes de relações jurídico-administrativas ou fiscais (n.º 3 in fine), ou seja:

1) De um ponto de vista objectivo ou material:
As relações jurídicas controvertidas são reguladas sob o ponto de vista material pelo direito administrativo e fiscal. Não estão, portanto, aqui em causa litígios de natureza privada ou jurídico-civil.
2) De um ponto de vista subjectivo ou orgânico:
As acções e recursos incidem sobre relações jurídicas em que, pelo menos, um dos sujeitos é titular, funcionário ou agente de um órgão de poder público.

Os problemas de compatibilização dos dois critérios, maxime, à luz da "prossecução do interesse público" (Constituição da República Portuguesa, artigo 266.º, n.º 1) não devem, assim, deixar de ser equacionados e esclarecidos.

II - Conclusões

À luz do atrás exposto, cumpre estabelecer por parte da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, as seguintes conclusões:

1. Os tribunais administrativos e fiscais formam uma estrutura hierárquica, tendo como órgão de cúpula o Supremo Tribunal Administrativo (212.º, n.º 1) que está de certo modo para a justiça administrativa como o Supremo Tribunal de Justiça está para os tribunais judiciais.
2. Aos tribunais administrativos e fiscais compete o exercício da justiça administrativa e fiscal por outras palavras, compete-lhes "o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações administrativas e fiscais" (212.º, n.º 3).
3. A Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, que aprovou o novo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e a Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro, que aprovou um Código de Processo nos Tribunais Administrativos, consubstanciam uma profunda reforma do contencioso administrativo português. Por força de alteração entretanto introduzida pela Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, a entrada em vigor destes diplomas terá lugar no dia 1 de Janeiro de 2004.
4. Através da proposta de lei vertente visa o Governo proceder a alterações ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Ficais, pelo que se propõem alterações aos artigos 4.º, 6.º, 8.º, 9.º, 23.º, 24.º, 26.º, 27.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 48.º, 49.º, 52.º, 54.º, 56.º, 58.º, 64.º, 66.º, 68.º, 69.º, 74.º e 93.º desse mesmo Estatuto, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro.
5. Referem os proponentes que é necessário, adoptar medidas legislativas e regulamentares previstas nas Leis n.os 13/2002 e 15/2002, designadamente no que se refere à configuração da rede de novos tribunais de primeira instância a instalar por todo o território do continente, determinação da sede e área de jurisdição de cada um desses tribunais e dos moldes em que se deverá concretizar a respectiva organização interna.

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III - Parecer

Face ao exposto, a 1.ª Comissão é de parecer que a proposta de lei n.º 102/IX, se encontra em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições de voto para o debate.

Assembleia da República, 3 de Dezembro de 2003. - O Deputado Relator, Jorge Lacão - O Vice-Presidente da Comissão, Osvaldo Castro.

Nota: - O relatório, as conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

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PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 52/IX
(APROVA, PARA RATIFICAÇÃO, O ACORDO DE ASSOCIAÇÃO ENTRE A COMUNIDADE EUROPEIA E OS SEUS ESTADOS-MEMBROS, POR UM LADO, E A REPÚBLICA DO CHILE, POR OUTRO, BEM COMO OS SEUS ANEXOS, PROTOCOLOS E NOTAS, ASSINADO EM BRUXELAS EM 18 DE NOVEMBRO DE 2002)

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa

Relatório

Por determinação do Sr. Presidente da Assembleia da República, baixou à Comissão Parlamentar de Assuntos Europeus e Política Externa, a proposta de resolução n.º 52/IX sobre "o Acordo de Associação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados-membros, por um lado, e a República do Chile, por outro", da iniciativa do Governo.
A Comissão Parlamentar de Assuntos Europeus e Política Externa deliberou designar como relator o Deputado José Vera Jardim, do Partido Socialista.

A - Enquadramento geral

O Acordo de Associação enquadra-se nos esforços da União para o estabelecimento duma associação estratégica com os países da América Latina, tal como prevista na declaração adoptada pela Cimeira de Chefes de Estado e do Governo, realizada no Rio de Janeiro em 28 de Junho de 1999. Vem, por outro lado, dar seguimento ao Acordo-Quadro de Associação assinado entre as partes em 21 de Junho de 1996.

B - Conteúdo do Acordo

a) Estrutura organizativa
O Acordo institui uma associação política e económica entre as Partes, com o objectivo do maior aprofundamento das relações de cooperação em diversos domínios - político, económico, comercial, financeiro, científico, tecnológico, social, cultural e de cooperação.
Para a concretização de tais objectivos é criado um Conselho de Associação, composto pelo Presidente do Conselho da União Europeia, pela Presidência seguinte, pelos outros membros do Conselho, por membros da Comissão, por um lado, e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros do Chile, por outro.
Para assistir este Conselho no desenvolvimento das suas actividades existirá um Comité de Associação, constituído por representantes do Conselho e da Comissão.
O Conselho tomará todas as decisões adequadas à plena execução do acordo, reunindo uma vez por ano, alternadamente em Bruxelas e no Chile, podendo ser convocadas reuniões especiais, assumindo a Presidência, alternadamente um representante de uma das Partes.
É criado um Comité Parlamentar das Associação, constituído por membros do Parlamento Europeu e do Congresso Nacional do Chile. Este Comité será informado de todos os dossiers do Conselho da Associação, podendo formular recomendações a esse Conselho.
Finalmente, existe um Comité Misto Consultivo que "assistirá o Conselho de Associação na promoção do diálogo e da cooperação entre as diversas entidades sociais e económicas da sociedade civil."
Para além disso, propõem-se as Partes a realização de reuniões periódicas entre representantes da sociedade civil da União Europeia e do Chile, a fim de poder escutar as sugestões para melhor aplicação do Tratado.

b) Domínios de aplicação

a) Diálogo político - Por meio de reuniões periódicas entre diversas entidades políticas, designadamente de Chefes de Estado e de Governo e de Ministros de Negócios Estrangeiros, as Partes manterão um permanente diálogo político, designadamente concertando as suas posições em matéria de política externa e de segurança.
Refere-se também em especial a luta contra o terrorismo, como domínio da cooperação entre as suas Partes, referindo-se em geral os meios para a execução de tal cooperação.
b) Cooperação - São vários os domínios de cooperação previstos no Tratado desde a que se dirige ao reforço do Estado de Direito e da democracia; a cooperação social; a cooperação económica, financeira e técnica.
No respectivo capítulo (Parte III) desenvolvem-se depois os vários instrumentos e objectivos da cooperação económica referindo-se em especial a Cooperação industrial; PME; Serviços; Promoção de investimentos; Energia; Transportes; Agricultura; Pesca; Aduaneira; Ambiente; Defesa do Consumidor; Propriedade intelectual; Turismo e Exploração mineira.
No que respeita à cooperação aos domínios da ciência, tecnologia e sociedade de informação, bem como nos da cultura, educação e audiovisual também se elencam um conjunto de matérias que serão objecto de cooperação entre as Partes.
Também no que se refere à Cooperação Interinstitucional e Administração Pública e ao domínio social se elencam

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um conjunto de subsectores em que se desenvolverão programas de cooperação. Igualmente no domínio social reconhecendo-se a sua importância, nomeadamente a necessidade do desenvolvimento social acompanhar o desenvolvimento económico.
Aponta ainda o acordo outros domínios de cooperação, em sectores que constituem prioridade actual da União Europeia, nomeadamente a imigração clandestina e a luta contra a droga e a criminalidade organizada.
c) Comércio - Trata-se dum domínio de grande relevância no Acordo sendo aquele que, pela sua própria natureza, regula com mais detalhe as relações entre as entidades signatárias do Acordo.
Tem em vista, designadamente a liberalização progressiva e recíproca do comércio de mercadorias e a facilitação das trocas comerciais, contém o Acordo um conjunto de disposições reguladoras de matérias conexas no que respeita a comércio de bens e serviços, bem como do direito de estabelecimento.
Tudo no sentido da construção progressiva duma zona de comércio livre.
Regulamenta-se também a matéria respeitante a Contratos Públicos no sentido de "assegurar a abertura recíproca e efectiva dos respectivos mercados".
Anexo ao Acordo e fazendo dele parte integrante encontra-se um conjunto de normas sobre o desmantelamento pautal, para cumprimento do objectivo geral de facilitação das trocas entre as duas entidades, como é usual quando se pretende criar uma zona de comércio livre.
d) Os últimos Títulos respeitantes a matéria regulada especificamente dizem respeito a pagamentos correntes e movimento de capitais, direito de propriedade intelectual e concorrência.
e) Finalmente, o Acordo contém um conjunto de cláusulas usuais, neste tipo de contratação internacional, como a resolução de litígios (através de arbitragem), vigência e aplicação territorial, etc.

Nota final

1. O Acordo assume no quadro da relação Europa - América do Sul grande relevância, constituindo instrumento habilitante para um relacionamento mais profundo, nos variadíssimos aspectos que regulamenta, com particular ênfase no diálogo político estruturado, nos vários domínios da cooperação e na criação duma zona de comércio livre entre as Partes contratantes.
O Acordo integra-se na política de relacionamento privilegiado entre a União Europeia e a América latina com vista ao aprofundamento da parceria estratégica que se pretende.
2. A presente proposta de resolução encontra-se em condições constitucionais e regimentais de ser agendada e votada pelo Plenário da Assembleia da República.

Assembleia da República, 25 de Novembro de 2003. - O Deputado Relator, José Vera Jardim - O Presidente da Comissão, Jaime Gama.

Nota: O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade (com votos a favor do PSD, PS e CDS-PP, registando-se a ausência do PCP, do BE e de Os Verdes).

PROJECTO DE DELIBERAÇÃO N.º 27/IX
ALTERAÇÃO À DELIBERAÇÃO N.º 15-PL/89, DE 7 DE DEZEMBRO

A Assembleia da República delibera, nos termos do artigo 16.º, n.º 2, do Estatuto dos Deputados, aprovado pela Lei n.º 7/93, de 1 de Março, o seguinte:

Artigo 1.º

Os Títulos I, IV, V, XIII e XIX da Deliberação n.º 15-PL/89; de 7 de Dezembro, alterado pela Deliberação n.º 4-PL/98, de 7 de Maio, passam a ter a seguinte redacção:

"I - Deslocação de Deputados durante o período de funcionamento do Plenário

1 - (...)
2 - (...)
3 - (...)
4 - (...)
5 - Deputados eleitos pelo círculo de emigração da Europa e residentes nesse círculo

Aos Deputados eleitos pelo círculo da emigração da Europa, residentes no respectivo círculo eleitoral, é-lhes devida uma viagem semanal de ida e volta, em avião, na classe mais elevada praticada, entre o aeroporto de residência e Lisboa, acrescida da importância da deslocação entre o aeroporto e a residência, calculada nos termos do n.º 1.

6 - Deputados eleitos pelo círculo de emigração fora da Europa e residentes nesse círculo

Aos Deputados eleitos pelo círculo de emigração fora da Europa, residentes no respectivo círculo eleitoral, são-lhes devidas duas viagens mensais de ida e volta, em avião, na classe mais elevada praticada, entre o aeroporto de residência e Lisboa, acrescidas da importância da deslocação entre o aeroporto e a residência, calculadas nos termos do n.o 1.
Às deslocações previstas neste número e no anterior aplica-se o Título XVIII.

7 - Deputados com viatura oficial atribuída

a) Nos termos legais e regulamentares estão atribuídas viaturas oficiais nos casos a seguir referidos:

- Vice-Presidentes;
- Gabinete dos Secretários da Mesa;
- Deputados que tenham exercido as funções de Presidente da Assembleia da República;
- Presidente do Conselho de Administração.

b) As viaturas são de uso pessoal, não podendo, no entanto, ser utilizadas para as deslocações em trabalho político, nomeadamente as previstas nos Títulos III a V.
c) Os Deputados a quem tenha sido atribuída viatura oficial devem manifestar expressamente a sua opção entre o abono para despesas de transporte dentro do território continental da República ou a utilização da referida viatura.
d) A gestão da viatura atribuida ao Gabinete dos Secretários da Mesa é da responsabilidade do Secretário do grupo maioritário;
e) A opção manifestada valerá também para as outras deslocações no país em representação da Assembleia da República,

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previstas no Título XVI, a menos que outra decisão seja comunicada para essa deslocação.

IV - Deslocações em trabalho político nos círculos de emigração

1 - (...)
2 - (...)
3 - (...)
4 - Os Deputados eleitos pelos círculos da emigração e que tenham a sua residência em cidades situadas em país estrangeiro, não têm direito a abono de ajudas de custo quando se encontrarem em trabalho político junto dos eleitores da cidade da residência.
5 - Os Deputados eleitos pelos círculos da emigração e que tenham a sua residência em cidades situadas em país estrangeiro, quando se encontrarem em trabalho político fora da cidade da respectiva residência, nesse ou noutro país, terão direito à ajuda de custo que é devida pelo trabalho no estrangeiro:
6 - (Anterior n.º 4)

V - Deslocação em trabalho político em todo o território nacional, de acordo como n.º 2 do artigo 152.º da Constituição da República Portuguesa

1 - A importância global anual para despesas de deslocação em trabalho político em território nacional, é igual ao produto da multiplicação da distância em Kms entre Lisboa e as respectivas capitais de distrito, pelo quantitativo fixado na lei geral para pagamento do quilómetro percorrido em automóvel próprio, sendo essa distância multiplicada por dois em relação às cidades do continente e por um e meio em relação às cidades das Regiões Autónomas (Funchal e Ponta Delgada).
2 - O processamento destas verbas é mensal e obedece às regras definidas no Título VIII da presente deliberação:
3 - (Anterior n.º 4).

XIII - Ajudas de custo

1 - (...)
2 - (...)
3 - (...)
4 - (...)
5 - (...)
6 - Os Deputados eleitos pelos círculos de emigração fora da Europa que residam nesse círculo, durante o período de funcionamento do Plenário, têm direito às ajudas de custo fixadas no n.º 1 do artigo 17.º da Lei n.º 4/85, de 9 de Abril, acrescidas do montante correspondente a mais quatro dias mensais.

XIX - Disposições finais

As importâncias globais previstas nos n.os 1 a 6 do Título I, bem como nos Títulos III e V referem-se a despesas de deslocação que, atenta a sua natureza, não carecem de comprovação."

Artigo 2.º

A presente deliberação entra em vigor na data da sua publicação no Diário da Assembleia da República.

Artigo 3.º

É republicado em anexo o texto integral da Deliberação 15-PL/89, de 7 de Dezembro, alterada pela Deliberação n.º 4-PL/98 e com as alterações introduzidas pela presente Deliberação.

Aprovada em 27 de Maio de 2003. O Conselho de Administração: João Moura de Sá (Presidente) - Fernando Serrasqueiro (PS) - João Rebelo (CDS-PP) - Rodeia Machado (PCP) - João Teixeira Lopes (BE) - Heloísa Apolónia (Os Verdes) - Isabel Côrte-Real (Secretária-Geral) - Joaquim Ruas (Representante dos funcionários parlamentares).

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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