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Sábado, 3 de março de 2012 II Série-A — Número 133

XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)

SUMÁRIO Projetos de lei [n.os 10, 148, 149, 163 e 164/XII (1.ª)]: N.º 10/XII (1.ª) (Alarga as condições de acesso e atribuição do abono de família): — Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 148/XII (1.ª) (Altera a Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, reforçando as competências da Comissão de Fiscalização de Dados do SIRP nos casos de recolha ilegítima de informação por parte dos Serviços de Informações): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 149/XII (1.ª) (Altera a Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa, consagrando o «período de nojo» para os seus dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades): — Vide projeto de lei n.º 148/XII (1.ª).
N.º 163/XII (1.ª) (Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, procede à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, e procede à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto): — Parecer das Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 164/XII (1.ª) (Reorganização administrativa de Lisboa): — Parecer da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
Propostas de lei [n.os 42 e 44/XII (1.ª)]: N.º 42/XII (1.ª) (Aprova a lei-quadro das fundações e altera o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de 1966): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 44/XII (1.ª) (Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica): — Parecer da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.

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PROJETO DE LEI N.º 10/XII (1.ª) (ALARGA AS CONDIÇÕES DE ACESSO E ATRIBUIÇÃO DO ABONO DE FAMÍLIA)

Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

Índice

Parte I — Considerandos

1 — Nota introdutória 2 — Objeto, motivação e conteúdo da iniciativa 3 — Enquadramento legal e antecedentes

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer Parte III – Conclusões Parte IV — Anexos

Parte I — Considerandos

1 — Nota introdutória: O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projeto de lei n.º 10/XII (1.ª), que «Alarga as condições de acesso e atribuição do abono de família».
O projeto de lei n.º 10/XII (1.ª) foi admitido em 14 de julho de 2011, tendo baixado na mesma data à Comissão de Segurança Social e Trabalho para efeitos de apreciação e emissão do competente parecer, nos termos regimentais aplicáveis (cf. artigo 129.º do Regimento da Assembleia da República.
Subscrito por 10 Deputados do PCP, o projeto de lei n.º 10/XII (1.ª) cumpre os requisitos constitucionais e regimentais aplicáveis (cf. artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República), encontrando-se verificados, também, os requisitos formais de admissibilidade (cf. n 1 do artigo 119.º e n.º 1 do artigo 124.º do Regimento da Assembleia da República).
O projeto de lei n.º 10/XII (1.ª) respeita, igualmente, o disposto na denominada lei formulário (Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro), na sua atual redação, sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas.
Todavia, a presente iniciativa, caso venha a ser aprovada, pode violar o limite imposto pelo n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, sob a epígrafe «Limites da iniciativa», que impede a apresentação de iniciativas que «envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento», na medida em que visa repor «o pagamento do abono nos 4.º e 5.º escalões e a majoração do pagamento nos 1.º e 2.º escalões» e determina a «inexigibilidade de devolução das quantias recebidas a título de abono de família a crianças e jovens por não apresentação de prova escolar ou prova de condição de recursos».
Com o objetivo de impedir a violação do princípio designado de «lei-travão», consagrado no n.º 2 do artigo 167.º da Constituição, sugere-se que o artigo 7.º da presente iniciativa tenha a seguinte redação:

«A presente lei entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.»

2 — Objeto, motivação e conteúdo da iniciativa: Através do projeto de lei n.º 10/XII (1.ª) pretende o Grupo Parlamentar do PCP:

— Revogar a condição de recursos imposta pelo Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, para atribuição do abono de família;

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— Cessar a decisão de devolução de verbas do abono de família recebidas «indevidamente», isto é, de montantes que a Segurança Social continuou a pagar sem que a responsabilidade possa ser imputada aos beneficiários que não podem perder o direito a uma prestação social por entrega tardia de documentos; — Repor a totalidade dos escalões para efeitos de atribuição do abono de família, avançando no sentido de garantir a sua universalidade; — Repor a majoração do abono de família em 25% nos 1.º e 2.º escalões; — Repor critérios mais justos de atribuição da bonificação por deficiência a crianças e jovens. Revogar a condição de recursos imposta pelo Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, para a atribuição do abono de família.

Segundo o proposto no projeto de lei n.º 10/XII (1.ª) pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, o abono de família para crianças e jovens passaria a ter os seguintes valores:

Escalões Idade igual ou inferior a 12 meses Idade superior a 12 meses 1.º escalão €174,72 €43,68 2.º escalão € 144,91 € 36,23 3.º escalão € 92,29 € 26,54 4.º escalão € 56,45 € 22,59 5.º escalão € 33,88 € 11,29 6.º escalão a definir por portaria a definir por portaria

3 — Enquadramento legal e antecedentes: O abono de família para crianças e jovens foi instituído e regulamentado através do Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de agosto. Contudo, este diploma sofreu diversas alterações, tendo a última sido através do Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho (que, ao revogar o artigo 8.º, procedeu à alteração do conceito de agregado familiar com efeitos a partir de 1 de agosto de 2010) e pelos Decretos-Lei n.os 77/2010, de 24 de junho, 116/2010, de 22 de Outubro, e pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, esta última referente ao Orçamento do Estado para 2012.
O Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, «estabelece as regras para a determinação dos rendimentos, composição do agregado familiar e capitação dos rendimentos do agregado familiar para a verificação das condições de recursos a ter em conta no reconhecimento e manutenção do direito às seguintes prestações dos subsistemas de proteção familiar e de solidariedade:

a) Prestações por encargos familiares; b) Rendimento social de inserção; c) Subsídio social de desemprego; d) Subsídios sociais no âmbito da parentalidade.»

Através deste diploma a atribuição de uma prestação de segurança social ou apoio social passou a estar dependente da constituição do agregado familiar e dos diversos rendimentos de todos os seus membros.
Posteriormente, através do Decreto-Lei n.º 116/2010, de 22 de outubro, foi eliminada a majoração de 25% do abono de família nos 1.º e 2.º escalões de rendimento e a atribuição do abono de família aos 4.º e 5.º escalões de rendimento.

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer

A autora do parecer reserva a sua posição para a discussão da iniciativa legislativa em Plenário.

Parte III – Conclusões

Tendo em consideração o anteriormente exposto, a Comissão de Segurança Social e Trabalho conclui:

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1 — O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projeto de lei n.º 10/XII (1.ª), que «Alarga as condições de acesso e atribuição do abono de família»; 2 — A presente iniciativa, porque visa repor «o pagamento do abono nos 4.º e 5.º escalões e a majoração do pagamento nos 1.º e 2.º escalões e determina a inexigibilidade de devolução das quantias recebidas a título de abono de família a crianças e jovens por não apresentação de prova escolar ou prova de condição de recursos», caso venha a ser aprovada, pode violar o limite imposto pelo n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, sob epígrafe «Limites da iniciativa», que impede a apresentação de iniciativas que «envolvam no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento».
Com o objetivo de se ultrapassar esta situação sugere-se que o artigo 7.º da presente iniciativa tenha a seguinte redação:

«A presente lei entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.»

3 — O presente projeto de lei cumpre todos os requisitos constitucionais, legais e regimentais necessários à sua tramitação; 4 — Nos termos regimentais aplicáveis, o presente parecer deverá ser remetido a S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 20 de fevereiro de 2012 A Deputada Relatora, Maria das Mercês Borges — O Presidente da Comissão, José Manuel Canavarro.

Nota: — O parecer foi aprovado por unanimidade.

Nota Técnica

Projeto de lei n.º 10/XII (1.ª), do PCP Alarga as condições de acesso e atribuição do abono de família Data de admissão: 14 de julho de 2011 Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública (10.ª Comissão)

Índice

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria V — Consultas e contributos VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

Elaborada por: Susana Fazenda (DAC) — Maria da Luz Araújo (DAPLEN) — Filomena Romano de Castro (DILP).
Data: 2011.07.19

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa

O projeto de lei em apreço, da iniciativa do Partido Comunista Português, que alarga as condições de acesso e atribuição do abono de família, baixou à Comissão de Segurança Social e Trabalho em 14 de julho Consultar Diário Original

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de 2011, tendo sido designada autora do parecer a Sr.ª Deputada Maria das Mercês Borges, do PSD, na reunião da Comissão de 19 de julho.
Com a apresentação deste projeto de lei, o PCP pretende:

a) Revogar a condição de recursos imposta pelo Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, para atribuição do abono de família; b) Cessar a decisão de devolução de verbas do abono de família que a Segurança Social continuou a pagar naqueles casos em que os beneficiários fizeram uma entrega tardia de documentos; c) Repor a totalidade dos escalões para efeitos de atribuição do abono de família (medida que o Governo deve regulamentar no prazo de 30 dias com base nos valores previstos pela Portaria n.º 511/2009, de 14 de maio, que fixa os montantes das prestações por encargos familiares e das prestações que visam a proteção de crianças e jovens com deficiência e ou em situação de dependência); d) Repor a majoração do abono de família em 25% nos 1.º e 2.º escalões.

De acordo com a proposta de articulado apresentada pelo partido proponente, os valores do abono de família para crianças e jovens passariam a ser os seguintes:
Idade igual ou inferior a 12 meses Idade superior a 12 meses 1.º escalão €174,72 €43,68 2.º escalão € 144,91 € 36,23 3.º escalão € 92,29 € 26,54 4.º escalão € 56,45 € 22,59 5.º escalão € 33,88 € 11,29 6.º escalão a definir por portaria a definir por portaria

II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário

Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais: A presente iniciativa é apresentada pelo grupo parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), no âmbito do poder de iniciativa da lei, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e no artigo 118.º do Regimento. Exercer a iniciativa da lei é um dos poderes dos deputados [alínea b) do artigo 156.º da Constituição e alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento] e um dos direitos dos grupos parlamentares [alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e alínea f) do artigo 8.º do Regimento].
São observados os requisitos formais respeitantes às iniciativas em geral [n.º 1 do artigo 119.º e alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento] e aos projetos de lei, em particular (n.º 1 do artigo 123.º do Regimento), o que significa que a iniciativa originária toma a forma de projeto de lei, porque é exercida pelos Deputados ou grupos parlamentares, está redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto, é precedida de uma exposição de motivos e é subscrita por 10 Deputados (o limite máximo de assinaturas nos projetos de lei é de 20).
Não se verifica violação aos limites da iniciativa impostos pelo Regimento, no que respeita ao disposto no n.º 1 do artigo 120.º (não infringe a Constituição e define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa).
Todavia, a aprovação desta iniciativa pode violar o limite imposto pelo n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, sob a epígrafe «Limites da iniciativa», que impede a apresentação de iniciativas que «envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento», designadamente ao repor «o pagamento do abono nos 4.º e 5.º escalões e a majoração do pagamento nos 1.º e 2.º escalões» e ao determinar a «inexigibilidade de devolução das quantias recebidas a título de abono de família a crianças e jovens por não apresentação de prova escolar ou prova de condição de recursos».
Este princípio conhecido com a designação de «lei-travão» está consagrado no n.º 2 do artigo 167.º da Constituição e para impedir a sua violação, sugere-se que o artigo 7.º da iniciativa tenha a seguinte redação:

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«A presente lei entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.»

Verificação do cumprimento da lei formulário: A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, com as alterações subsequentes, estabelece regras a observar no âmbito da publicação, identificação e formulário de diplomas.
Como estamos perante uma iniciativa legislativa, observadas algumas disposições da designada lei formulário, e caso a mesma venha ser aprovada sem alterações, apenas se pode referir o seguinte:

— Esta iniciativa contém disposição expressa sobre a entrada em vigor, pelo que se aplica o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da citada lei («A presente lei entra em vigor no dia seguinte após a sua publicação»)1; — Será publicada na 1.ª série do Diário da República, revestindo a forma de lei [alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário]; — A presente iniciativa tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, mas não respeita n.º 1 do artigo 6.º da mesma lei, uma vez que altera o Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho2, e não indica o número de ordem da alteração introduzida.
Por esta razão, e também para evidenciar a revogação do Decreto-Lei n.º 116/2010, de 22 de outubro, sugerese que se acrescente ao título (Segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, e revogação do Decreto-Lei n.º 116/2010, de 22 de outubro).

III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes

Enquadramento legal nacional e antecedentes: O Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de agosto3 (texto consolidado4). instituiu o abono de família para crianças e jovens e define a proteção na eventualidade de encargos familiares no âmbito do subsistema de proteção familiar. Este diploma foi retificado pela Declaração de Rectificação n.º 11-G/20035, tendo sofrido diversas alterações sendo as últimas pelos Decretos-lei n.os 245/2008, de 18 de dezembro6 (que o republica), 70/2010, de 16 de junho7 (que ao revogar o artigo 8.º8 veio alterar o conceito de agregado familiar com efeitos a partir do dia 1 de agosto de 2010), 77/2010, de 24 de junho9, 116/2010, de 22 de outubro10, e pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro11 (Orçamento do Estado para 2011).
O XVIII Governo Constitucional12, atendendo à situação económica que o País atravessa, e tendo por base um conjunto de políticas sociais estabelecidas no Programa de Estabilidade e Crescimento 2010-2013 (PEC)13, aprovou o Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho14, que estabelece as regras para a determinação da condição de recursos a ter em conta na atribuição e manutenção das prestações do subsistema de proteção familiar e do subsistema de solidariedade (i), bem como para a atribuição de outros apoios sociais ou subsídios (ii), procedendo ainda à alteração de diversos diplomas (iii). Este diploma entrou em vigor no dia 1 de agosto de 2010.
Nos termos do artigo 2.º15 do Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, a condição de recursos corresponde ao limite de rendimentos e de valor dos bens de quem pretende obter uma prestação de segurança social ou apoio social, bem como do seu agregado familiar, até ao qual o referido diploma condiciona a possibilidade da 1 Na análise da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais sugere-se a seguinte alteração de redação para o artigo 7.º, sob a epígrafe entrada em vigor, «A presente lei entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação».
2 Efetuada consulta à base DIGESTO verificamos que o Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, sofreu, até ao momento, uma alteração introduzida pela Lei n.º 15/2011, de 3 de maio.
3 http://dre.pt/pdf1s/2003/08/177A00/45944605.pdf 4 http://82.102.24.65/pdfs/codigos/abonofamilia.pdf 5 http://dre.pt/pdf1s/2003/09/226A01/00020002.pdf 6 http://dre.pt/pdf1s/2008/12/24400/0891108926.pdf 7 http://dre.pt/pdf1s/2010/06/11500/0208102089.pdf 8 http://arnet/sites/DSDIC/DILP/DILPArquivo/Notas_Tecnicas/XI_Leg/PJL/PJL_364_XI/Portugal_1.doc 9 http://dre.pt/pdf1s/2010/06/12100/0226102262.pdf 10 http://dre.pt/pdf1sdip/2010/10/20600/0476404765.pdf 11 http://dre.pt/pdf1sdip/2010/12/25301/0000200322.pdf 12 http://www.portugal.gov.pt/pt/GC18/Governo/Composicao/Pages/Composicao.aspx 13 http://www.parlamento.pt/OrcamentoEstado/Documents/pec/PEC2010_2013_18mar2010_VFA.PDF 14 http://dre.pt/pdf1s/2010/06/11500/0208102089.pdf 15 http://arnet/sites/DSDIC/DILP/DILPArquivo/Notas_Tecnicas/XI_Leg/PJL/PJL_399_XI/Portugal_1.doc

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sua atribuição. Na verificação da condição de recursos são considerados os rendimentos do requerente e dos elementos que integram o seu agregado familiar. O direito às prestações sociais depende ainda de o valor do património mobiliário do requerente e do seu agregado familiar, à data do requerimento ou do pedido de apoio social, não ser superior a 240 vezes o valor do indexante dos apoios sociais16.
O Capítulo II17 do referido decreto-lei, para efeitos da verificação da condição de recursos, elenca os diversos rendimentos do requerente e do seu agregado familiar, nomeadamente os rendimentos de capitais, os rendimentos prediais definidos no artigo 8.º do Código do IRS18, os rendimentos de capitais definidos no artigo 5.º do Código do IRS19, os rendimentos de pensões e as bolsas de estudo.
Todas as disposições legais, regulamentares ou outras que façam referência a agregado familiar, rendimentos ou a capitação de rendimentos do agregado familiar relativas a prestações, apoios sociais ou subsídios, quando sujeitos a condição de recursos, devem ser entendidas de acordo com o disposto no decreto-lei mencionado.
No passado mês de outubro de 2010, e no seguimento das medidas já adotadas no âmbito dos Programas de Estabilidade e Crescimento, o referido Governo adotou novas medidas tendo em vista a consolidação da despesa pública. Neste sentido, aprovou o Decreto-Lei n.º 116/2010, de 22 de outubro20, eliminando a majoração de 25 % do abono de família nos 1.º e 2.º escalões instituída pela Portaria n.º 425/2008, de 16 de junho21, e cessa a atribuição do abono de família aos 4.º e 5.º escalões de rendimento, procedendo à sétima alteração ao Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de Agosto (institui o abono de família para crianças e jovens e define a proteção na eventualidade de encargos familiares no âmbito do subsistema de proteção familiar).
Este decreto-lei altera, assim, as regras de atribuição do abono de família (v. quadro seguinte).

Escalões Rendimentos mensais das famílias Com 1 filho Com 2 filhos Com 3 filhos Com 4 filhos Com 5 filhos 1.º Até 419,22 euros Até 628,83 euros Até 838,44 euros Até 1.048,05 euros Até 1.257,66 euros 2.º De 419,23 a 838,44 euros De 628,84 a 1.257,66 euros De 838,45 a 1.676,88 euros De 1.048,06 a 2.096,10 euros De 1.257,67 a 2.515,32 euros 3.º De 838,45 a 1.257,66 euros De 1.257,67 a 1.886,49 euros De 1.676,89 a 2.515,32 euros De 2.096,11 a 3.144,15 euros De 2.515,33 a 3.772,98 euros

Enquadramento internacional: Países europeus:

Espanha: Nos termos do artigo 181.º22 da Ley General de Seguridad Social23, será atribuida una asignación económica por cada hijo, menor de 18 años o, cuando siendo mayor de dicha edad, esté afectado por una minusvalía, en un grado igual o superior al 65%, a cargo del beneficiario, cualquiera que sea la naturaleza legal de la filiación de aquéllos, así como por los menores acogidos, en acogimiento familiar, permanente o preadoptivo.
Esta prestação apenas será atribuída a beneficiários que não recebam rendimentos anuais, qualquer que seja a sua natureza, superiores a 11.264,01 euros (artigo 182.º24 da Ley General de la Seguridad Social, conjugado com o artigo 10.º, n.º 1, alÍnea c)25, do Real Decreto 1335/2005, de 11 de novembro26, que regula as 16 Para o ano de 2011 o valor mensal do IAS ç de € 419,22.
17 http://arnet/sites/DSDIC/DILP/DILPArquivo/Notas_Tecnicas/XI_Leg/PJL/PJL_394_XI/Portugal_4.doc 18 http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/codigos_tributarios/irs/irs8.htm 19 http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/codigos_tributarios/irs/irs5.htm 20 http://dre.pt/pdf1s/2010/10/20600/0476404765.pdf 21 Revogada a partir de 19.05.2009, pela Portaria n.º 511/2009, de 14.05 22 http://noticias.juridicas.com/base_datos/Admin/rdleg1-1994.t2.html#a181 23 http://noticias.juridicas.com/base_datos/Admin/rdleg1-1994.html 24 http://arnet/sites/DSDIC/DILP/DILPArquivo/Notas_Tecnicas/XI_Leg/PJL/PJL_364_XI/Portugal_3.doc 25 http://noticias.juridicas.com/base_datos/Laboral/rd1335-2005.html#a10 26 http://noticias.juridicas.com/base_datos/Laboral/rd1335-2005.html Consultar Diário Original

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prestações familiares da Segurança Social). O valor da prestação a receber é acrescido em 15% por cada filho menor a cargo a partir do segundo, inclusive.
O artigo 14.º27, n.º 2, alínea a), do Real Decreto 1335/2005, de 11 de Novembro, estabelece que, para efeitos do cálculo dos valores de referência, serão computados os rendimentos brutos, exceto no caso de rendimentos que procedam de atividades económicas desenvolvidas por conta própria, que serão considerados pelo seu valor líquido, ao qual se deve somar o montante relativo às contribuições sociais.
O valor destas prestações é atualizado anualmente na mesma percentagem em que o são as pensões do regime contributivo da segurança social, fixado na lei orçamental (letra C do n.º 1 do artigo 182.º28 da Lei Geral da segurança Social).
A Lei n.º 39/2010, de 22 de dezembro29 (Orçamento do Estado 2011), estabelece a quantia das prestações familiares30, nomeadamente a prestação económica por filho a cargo.

França: Em França as famílias têm direito ao abono de família (allocations familiales)31 independentemente da situação familiar e do montante de rendimentos.
Os montantes em vigor até 31 de dezembro de 2011 são os seguintes, por mês:

a) Nõcleo familiar com duas crianças 125,78 €; b) Nõcleo familiar com três crianças 286,94 €; c) Juntar, por criança mais 161,17 €

Para além do abono de família, por cada criança com idade superior a 11 e 16 anos recebe-se uma majoração; cujo montante ç de: 35,38 € por filho de 11 a 16 anos, 62,90 € por filho maior de 16 anos.
Mais que uma previsão de situação de desemprego, no caso francês encontramos diversas modalidades de reforço do apoio às famílias, tais como o complemento familiar e o apoio a famílias numerosas ou ainda o «Cartão Criança».
No caso do «Complemento Familiar» (Complément Familial)32, o mesmo é devido a quem tiver pelo menos três filhos a cargo todos com idades superiores a 3 anos. Os recursos disponíveis não podem passar certos limites. Pode-se ter direito ao «Complemento Familiar» a partir do mês seguinte a fazer três anos do 3.º, 4.º, e seguintes filhos.
Os rendimentos de 2009 do núcleo familiar não devem ultrapassar um limite variável de acordo com a situação de cada um.
Esse limite é majorado:

a) Se viver sozinho(a); b) Ou vivendo em conjunto (casado ou não) e que o rendimento conjunto auferido em 2009 seja inferior a 4670,40€. 27 http://noticias.juridicas.com/base_datos/Laboral/rd1335-2005.html#a14 28http://arnet/sites/DSDIC/DILP/DILPArquivo/Notas_Tecnicas/XI_Leg/PJL/PJL_364_XI/Portugal_3.doc 29 http://noticias.juridicas.com/base_datos/Fiscal/l39-2010.html 30 http://noticias.juridicas.com/base_datos/Fiscal/l39-2010.t8.html#da1 31 http://www.caf.fr/wps/portal/particuliers/catalogue/metropole/af 32 http://www.caf.fr/wps/portal/particuliers/catalogue/metropole/cf

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Limites a não ultrapassar: Número de filhos a cargo Casais com um só rendimento Pais sozinhos ou casal com 2 rendimentos 3 filhos 35 493 € 43 419 € 4 filhos 41 408 € 49 334 € Por cada filho a mais 5 915 € 5 915 €

O montante mensal do «complemento familiar« ç de 163,71 €.

IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Iniciativas legislativas: Efetuada consulta à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) não apurámos a existência de iniciativas legislativas pendentes sobre a mesma matéria.

Petições: Efetuada consulta à mesma base de dados (PLC) não apurámos a existência de petições pendentes sobre esta matéria.

V — Consultas e contributos

Consultas facultativas: Não havendo audições obrigatórias, sugere-se a audição ou a solicitação de parecer escrito ao Ministério da Solidariedade e Segurança Social.

VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

A aprovação desta iniciativa pode implicar custos que correspondem a um «aumento das despesas do Estado previstas no Orçamento», uma vez que, como referimos no ponto II da presente nota técnica, propõe a reposição do «pagamento do abono nos 4.º e 5.º escalões e a majoração do pagamento nos 1.º e 2.º escalões» e determina a «inexigibilidade de devolução das quantias recebidas a título de abono de família a crianças e jovens por não apresentação de prova escolar ou prova de condição de recursos».
Por essa razão e com a finalidade de acautelar, do ponto de vista jurídico, a não violação do princípio designado por «lei-travão» previsto nas disposições constitucionais e regimentais mencionadas, sugere-se que a redação do artigo 7.º passe a ser a seguinte:

«A presente lei entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.»

———

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PROJETO DE LEI N.º 148/XII (1.ª) (ALTERA A LEI N.º 30/84, DE 5 DE SETEMBRO, REFORÇANDO AS COMPETÊNCIAS DA COMISSÃO DE FISCALIZAÇÃO DE DADOS DO SIRP NOS CASOS DE RECOLHA ILEGÍTIMA DE INFORMAÇÃO POR PARTE DOS SERVIÇOS DE INFORMAÇÕES)

PROJETO DE LEI N.º 149/XII (1.ª) (ALTERA A LEI-QUADRO DO SERVIÇO DE INFORMAÇÕES DA REPÚBLICA PORTUGUESA, CONSAGRANDO O «PERÍODO DE NOJO» PARA OS SEUS DIRIGENTES E FUNCIONÁRIOS COM ESPECIAIS RESPONSABILIDADES)

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

Parte I — Considerandos

a) Nota introdutória: Os Deputados do Grupo Parlamentar do BE apresentaram à Assembleia da República, em 25 de janeiro de 2012, o projeto de lei n.º 148/XII (1.ª) — Altera a Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa, reforçando as competências da comissão de fiscalização de dados do SIRP nos casos de recolha ilegítima de informação por parte dos Serviços de Informações — e o projeto de lei n.º 149/XII (1.ª) — Altera a Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa, consagrando o «período de nojo» para os seus dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades.
Estas apresentações foram efetuadas nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 124.º desse mesmo Regimento.
Por despachos de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República de 26 de janeiro de 2012, as iniciativas vertentes baixaram à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão do respetivo parecer.

b) Do objeto, conteúdo e motivação das iniciativas: Projeto de lei n.º 148/XII (1.ª): o projeto de lei sub judice, ao abrigo do disposto na alínea q) do artigo 164.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), pretende aprovar a alteração da Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, alterada pelas Leis n.os. 4/95, de 21 de fevereiro, 15/96, de 30 de abril, 75-A/97, de 22 de julho, e Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro.
Segundo os proponentes, «a presente iniciativa enquadra-se na necessidade de reforçar a defesa de direitos fundamentais face ás atividades dos Serviços de Informação da Repõblica Portuguesa (»)« e surge na sequência de notícias veiculadas pela comunicação social que terão deixado «a suspeita sobre os princípios que devem reger a recolha e tratamento de dados e o alerta sobre a necessidade de preservar direitos fundamentais» – cfr. exposição de motivos.
Os autores chamam à colação os artigos 35.º e 37.º da Constituição da República e afirmam que «a comunicação social já tem dado nota de cidadãos que, pelo exercício das suas funções como titulares de cargos põblicos ou políticos, se encontram ‘fichados’ pelos Serviços de Informações, sem que a sua atividade caiba nos parâmetros da ameaça à segurança pública, à defesa nacional ou à segurança do Estado, e sem que os mesmos detenham os meios apropriados à defesa dos seus direitos» – cfr. exposição de motivos.
Afirmam assim pretender «(») reforçar as competências da Comissão de Fiscalização de Dados, entidade que fiscaliza a atividade dos centros de dados. O objetivo é garantir que a denúncia da recolha ilegítima de dados dá origem a um processo de averiguação, protege os cidadãos e o direito de acesso à informação» – cfr. exposição de motivos.

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Os termos da fiscalização dos dados no âmbito do Sistema de Informações da República Portuguesa encontram-se previstos no artigo 26.º do diploma; o qual sofreu, até à data, duas alterações: a Lei n.º 4/95, de 21 de fevereiro, e a Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro.
No âmbito da Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, o artigo 26.º, sob a epígrafe «Fiscalização dos dados», dispunha que:

«1 – Sem prejuízo das competências próprias da Comissão Nacional de Proteção de Dados, a atividade dos centros de dados é fiscalizada por uma comissão constituída por três magistrados, membros do Ministério Público e designados pela Procuradoria-Geral da República, que elegerão de entre si o presidente.
2 – A fiscalização exerce-se através de verificações periódicas dos programas, dados e informações por amostragem, fornecidos sem referência nominativa.
3 – A comissão deve ordenar o cancelamento ou rectificação de dados recolhidos que envolvam violação dos direitos, liberdades e garantias consignados na Constituição e na lei e, se for caso disso, exercer a correspondente ação penal.»

Com a alteração aprovada pela Lei n.º 4/95, de 21 de fevereiro, a exclusividade da fiscalização dos dados passou a ser da Comissão, mantendo-se no todo a forma do seu exercício:

«(»)

1 – A atividade dos centros de dados é exclusivamente fiscalizada por uma comissão constituída por três magistrados do Ministério Público, que elegerão entre si o presidente, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo seguinte.
2 – A Comissão referida no número anterior tem sede na Procuradoria-Geral da República, que assegura os serviços de apoio necessários, sendo os seus membros designados e empossados pelo Procurador-Geral da República, aplicando-se-lhes, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos 9.º a 12.º.
3 – A fiscalização exerce-se através de verificações periódicas dos programas, dados e informações por amostragem, fornecidos sem referência nominativa.
4 – A comissão deve ordenar o cancelamento ou rectificação de dados recolhidos que envolvam violação dos direitos, liberdades e garantias consignados na Constituição e na lei e, se for caso disso, exercer a correspondente ação penal.»

Na sequência da última alteração legislativa, constante da Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro, o preceito manteve, no essencial, a ratio da anterior alteração:

«Comissão de Fiscalização de Dados do Sistema de Informações da República Portuguesa

1 – A atividade dos centros de dados é exclusivamente fiscalizada pela Comissão de Fiscalização de Dados, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo seguinte.
2 – A Comissão de Fiscalização de Dados é constituída por três magistrados do Ministério Público, que elegem entre si o presidente.
3 – A Comissão de Dados tem sede na Procuradoria-Geral da República, que assegura os serviços de apoio necessários, sendo os seus membros designados e empossados pelo Procurador-Geral da República, aplicando-se-lhes, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos 11.º a 13.º.
4 – A fiscalização exerce-se através de verificações periódicas dos programas, dados e informações por amostragem, fornecidos sem referência nominativa.
5 – A Comissão de Fiscalização de Dados deve ordenar o cancelamento ou rectificação de dados recolhidos que envolvam violação dos direitos, liberdades e garantias consignados na Constituição e na lei e, se for caso disso, exercer a correspondente ação penal.»

O projeto de lei em apreço propõe atribuir à Comissão de Fiscalização de Dados uma nova competência que passaria a constar do n.º 5 deste preceito, sendo que o atual n.º 5 passaria a ser o n.º 6. Assim, a

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fiscalização passaria igualmente a exercer-se pelo acesso a dados e informações com referência nominativa, sempre que estivesse em apreciação denúncia da sua recolha ilegítima.
No artigo 27.º do diploma, na versão em vigor, prevê-se o «cancelamento e rectificação de dados», nos seguintes termos:

«1 – Quando no decurso de um processo judicial ou administrativo se revelar erro na imputação de dados ou informações ou irregularidades do seu tratamento, a entidade processadora fica obrigada a dar conhecimento do facto à Comissão de Fiscalização de Dados.
2 – Quem, por ato de quaisquer funcionários ou agentes de informações ou no decurso de processo judicial ou administrativo tiver conhecimento de dados que lhe respeitem e que considere erróneos, irregularmente obtidos ou violadores dos seus direitos, liberdades e garantias pessoais pode, sem prejuízo de outras garantias legais, requer à Comissão de Fiscalização de Dados que proceda às verificações necessárias e ordene o seu cancelamento ou a rectificação dos que se mostrarem incompletos ou erróneos.
3 – Das irregularidades ou violações verificadas deverá a Comissão de Fiscalização de Dados dar conhecimento, através de relatório, ao Conselho de Fiscalização.»

O projeto de lei em apreço propõe também aditar um novo artigo ao diploma: o artigo 27.º-A, que, sob a epígrafe «Fiscalização por requerimento do cidadão», permitiria a qualquer cidadão requerer, fundamentadamente, à Comissão de Fiscalização de Dados a verificação junto dos Serviços de Informações dos dados ou informações que lhes dissessem respeito e a sua legalidade. – cfr. n.º 1 do artigo 27.º-A do projeto de lei.
O procedimento iniciar-se-ia pela averiguação da pertinência do pedido, que, caso suscitasse dúvidas, permitiria à Comissão ter acesso aos dados e à informação em causa. Esta, caso entendesse necessário, poderia ainda confrontar o cidadão com a informação recolhida para avaliar a pertinência. Todavia, a informação recolhida seria recusada àquele, sempre que tal fosse suscetível de colocar em causa a segurança pública, a defesa nacional ou a segurança do Estado.– cfr. n.os 2, 3, 4 e 6 do artigo 27.º-A do projeto de lei.
Caso a Comissão concluísse pelo incumprimento da lei, deveria eliminar ou corrigir os dados e informações, dando conta às instâncias competentes; sendo que poderia ainda ser chamada novamente à colação a Comissão Nacional de Proteção de Dados (cuja intervenção no exercício da fiscalização da Comissão de Fiscalização de Dados havia sido excluída com a alteração legal de 1995), para prestar apoio técnico no âmbito das suas competências. – cfr. n.os 5 e 7 do artigo 27.º-A do projeto de lei.

Projeto de lei n.º 149/XII (1.ª): este projeto de lei, também ao abrigo do disposto na alínea q) do artigo 164.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), pretende igualmente aprovar a alteração da mesma LeiQuadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP).
O BE «(») apresenta uma proposta concreta no sentido de criar um período de impedimento de três anos para aqueles que cessem as suas funções nos Serviços de Informações, não permitindo que quadros destes serviços ingressem de imediato no sector empresarial. Responde, desta forma, à conclusão expressa no parecer de 2010 do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa: «o CFSIRP refletiu sobre a eventual utilidade de se vir a criar um impedimento legal temporário, para dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades» – cfr. exposição de motivos.
Esclarecem os proponentes que «(») o «período de nojo« destina-se a quem tem especial responsabilidade pelo domínio das ações desenvolvidas e pelo acesso à informação no quadro das competências dos sistemas de informação» – cfr. exposição de motivos.
Os proponentes ressalvam o facto de não ter cabimento o argumento «(») aduzido no passado para a reprovação de diploma afim», porquanto o retorno ao anterior posto está salvaguardado na Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro (Estabelece a orgânica do Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e do Serviço de Informações de Segurança (SIS)), acrescendo o facto de não ser nova no nosso ordenamento jurídico a figura do impedimento ao exercício de certas atividades após a cessação de funções em cargos de especial responsabilidade

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(exemplificam com o regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos1) – cfr. exposição de motivos.
O projeto de lei em apreço propõe assim, no artigo 1.º, a definição do âmbito da lei que pretende ver aprovada, determinando a sua aplicação aos dirigentes do SIED e do SIS2 e a funcionários com especiais responsabilidades nestes Serviços de Informações.
No artigo 2.º do projeto de lei os subscritores propõem o aditamento do artigo 31.º-A à Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), que, sob a epígrafe «Impedimentos», veda o exercício da atividade dos dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades, civis ou militares dos Serviços de Informações, no sector empresarial em áreas onde possa ser utilizado o conhecimento de matérias classificadas e na disponibilidade dos serviços de informações, nos três anos seguintes à cessação de funções.
O BE propõe, todavia, que tal impedimento não se verifique, no caso do regresso à empresa ou atividade exercida à data do início de funções nos serviços de informações (sem prejuízo do dever de sigilo)3, e propõe, no caso de violação de tal impedimento, a aplicação de uma pena de prisão até três anos, caso pena mais grave não lhe seja aplicável (n.º 5 do artigo 31.º-A proposto no projeto de lei).
O projeto de lei ora em análise propõe ainda que o Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa emita parecer vinculativo sobre o ingresso em novas funções de dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades que cessem as suas atividades nos serviços de informações. De tal parecer seria dado conhecimento obrigatório ao Conselho de Fiscalização. Seria ao Secretário-Geral e ao Conselho de Fiscalização que competiria a verificação do impedimento ora proposto, apresentando as conclusões ao Ministério Público (n.os 3 e 4 do artigo 31.º-A proposto no projeto de lei).
As iniciativas em apreço prevêm, por último, a sua entrada em vigor «no dia seguinte ao da sua publicação« – cfr. artigo 3.º do projeto de lei n.º 148/XII (1.ª), do BE, e artigo 2.º4 do projeto de lei n.º 149/XII (1.ª), do BE.

c) Enquadramento legal e antecedentes parlamentares: É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre o «Regime do sistema de informações da República e do segredo de Estado» – artigo 164.º, alínea q).
A Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, alterada pelas Leis n.os 4/95, de 21 de fevereiro, 15/96, de 30 de abril, 75-A/97, de 22 de julho, e Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro, procedeu à criação do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, do Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e do Serviço de Informações de Segurança, e da Comissão de Fiscalização de Dados do SIRP5 (atual artigo 7.º).
Nos termos da Lei-Quadro do SIRP, o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, eleito pela Assembleia da República e funcionando junto da mesma, acompanha e fiscaliza a actividade do Secretário-Geral e dos Serviços de Informações, e vela pelo cumprimento da Constituição e da lei, em particular do regime de direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos6.
No seu artigo 26.º a Lei-Quadro define as competências, constituição e poderes da Comissão de Fiscalização de Dados, de entre estes últimos de destacando o de ordenar o cancelamento ou rectificação de dados recolhidos que envolvam violação dos direitos, liberdades e garantias consignados na Constituição e na lei, bem como, sendo caso disso, o exercício da respetiva ação penal.
Consequentemente, o artigo 27.º define os termos do cancelamento de dados, permitindo a quem, por atos de quaisquer funcionários ou agentes dos serviços de informações ou no decurso de processo judicial ou 1 Lei n.º 64/93, de 26 de agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 39-B/94, de 27 de dezembro1, (Declaração de Rectificação n.º 2/95, de 15 de abril), Lei n.º 28/95, de 18 de agosto2, Lei n.º 12/96, de 18 de abril, Lei n.º 42/96, de 31 de agosto, Lei n.º 12/98, de 24 de fevereiro3, Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de março, Lei n.º 30/2008, de 10 de julho, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro.
2 Conforme estão definidos nos artigos 29.º e 37.º da Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro 3 Cfr. artigo 31.º-A, n.º 2, proposto no projeto de lei.
4 Certamente por lapso, o projeto de lei numera como 2.º o artigo referente à entrada em vigor, quando aquele que é efetivamente o artigo 2.º do projeto de lei se refere ao aditamento à lei; este último deveria, pois, ser o artigo 3.º.
5 E, bem assim, do Conselho Superior de Informações e da Comissão de Fiscalização de Dados do Sistema de Informações da República Portuguesa.
6 Mais informações sobre o Conselho de Fiscalização do SIRP, disponíveis no sítio da internet www.cfsirp.pt

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administrativo, tiver conhecimento de dados que lhe respeitem e que considere erróneos, irregularmente obtidos ou violadores dos seus direitos, liberdades e garantias pessoais, poder requerer àquela Comissão que proceda às verificações necessárias e ordene o seu cancelamento ou a rectificação dos que se mostrem incompletos ou erróneos. Do mesmo preceito resulta para a referida Comissão a obrigatoriedade de, através de relatório, dar conhecimento ao Conselho de Fiscalização das irregularidades ou violações verificadas.
O Capítulo V da mesma Lei-Quadro dedica-se aos deveres e responsabilidades, regulando, entre outros, o desvio de funções dos funcionários e agentes, civis ou militares, dos serviços de informações, determinando ainda o agravamento das penas e a aplicação de penas acessórias àqueles, em caso de violação dos seus deveres legais ou por abuso das suas funções (artigos 29.º e 30.º do diploma legal).
O BE já nesta Legislatura apresentou o projeto de lei n.º 52/XII (1.ª) – Altera a Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa em matéria de impedimentos e acesso a documentos -, rejeitado na generalidade em 8 de setembro de 2011, com os votos contra do PSD, PS e CDS-PP, e os votos a favor do PCP, BE e Os Verdes.
No projeto de lei propunha, no artigo 1.º, o aditamento dos artigos 31.º-A e 37.º à Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP).
O artigo 31.º-A, sob a epígrafe «Impedimentos», vedaria o exercício da atividade dos dirigentes, agentes e funcionários (civis ou militares) dos serviços de informações no sector empresarial, em áreas onde possa ser utilizado o conhecimento de matérias classificadas e na disponibilidade dos serviços de informações, nos três anos seguintes à cessação de funções. Todavia, tal impedimento não se verificaria no caso do regresso à empresa ou atividade exercida à data do início de funções nos serviços de informações (sem prejuízo do dever de sigilo). Propunha ainda, no caso de violação de tal impedimento, a aplicação de uma pena de prisão até três anos, caso pena mais grave não lhe seja aplicável (n.º 6 do artigo 31.º-A proposto no projeto de lei). O Secretário-Geral do SIRP emitiria parecer vinculativo sobre o ingresso em novas funções de dirigentes, agentes e funcionários que cessassem as suas atividades nos serviços de informações, do mesmo sendo dado conhecimento obrigatório ao Conselho de Fiscalização. Seria ao Secretário-Geral e ao Conselho de Fiscalização que competiria a verificação do impedimento ora proposto relativo a elementos com identidade protegida, apresentando as conclusões ao Ministério Público. Este último promoveria também a investigação criminal no caso de elementos sem identidade protegida. (n.os 3, 4 e 5 do artigo 31.º-A proposto no projeto de lei).
Em matéria de acesso a documentos pela Assembleia da República, o BE propunha o aditamento do artigo 37.º, que previa a necessidade de fundamentação da recusa de acesso em parecer do Secretário-Geral, com indicação dos interesses a proteger e os motivos ou circunstâncias que a justificam. Caso a Assembleia da República considerasse insuficiente ou incompleta a referida fundamentação, poderia solicitar a intervenção do Conselho de Fiscalização no sentido de permitir esse acesso. O Conselho, atendendo às razões invocadas pela Assembleia da República e ouvido o Secretário-Geral, estabeleceria as regras de acesso, nomeadamente os termos da publicitação e da confidencialidade.
Previa também a sua entrada em vigor «no dia seguinte ao da sua publicação» – cfr. artigo 2.º do projeto de lei n.º 52/XII (1.ª), do BE.

d) Requisitos regimentais e constitucionais das iniciativas: Em termos regimentais e constitucionais nada há a apontar ao projeto de lei n.º 148/XII (1.ª), do BE.
No que concerne ao projeto de lei n.º 149/XII (1.ª), do BE, salienta-se que são os próprios proponentes que, em sede de exposição de motivos, ao repudiarem um argumento «(») aduzido no passado para a reprovação de diploma afim», classificam como tal – afim- o teor do antecedente legislativo desta iniciativa.
A «afinidade» das iniciativas (a presente e o projeto de lei n.º 52/XII (1.ª), do BE, é perfeitamente percetível na tabela constante da nota técnica elaborada pelos serviços, e que aqui se dá por integralmente reproduzida; em resumo, o teor do pretenso artigo 31.º-A, a aditar, o qual agora apresenta um âmbito ligeiramente mais restrito; a presente iniciativa restringe-se apenas a esta alteração, e não já à regulamentação da matéria de acesso a documentos pela Assembleia da República.
Razão pela qual importa chamar à colação o artigo 167.º, n.º 4, da Lei Fundamental, que, por sua vez, tem similar consagração no Regimento da Assembleia da República (artigo 120.º, n.º 3):

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«Os projetos e as propostas de lei e de referendo definitivamente rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa, salvo nova eleição da Assembleia da República.»7

Cumpre-nos apreciar aqui se estamos, ou não, perante a renovação da iniciativa.
Para o efeito, e porque julgamos suficiente e esclarecedor, reportamo-nos apenas neste parecer ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 578/20058, que se pronunciou sobre a questão da renovação da proposta do referendo sobre o aborto, nos termos que aqui se transcrevem:

«Transcrevendo um estudo de Jorge Miranda, o seu artigo ‘Deputado’, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, vol. 3.º, Lisboa, 1990, pp. 483 e segs., a p. 510, a Comissão Constitucional começou por observar que a proibição de renovação se deve a razões de economia processual, já que é de admitir que a Assembleia ‘não voltará atrás sobre as suas deliberações’ e, portanto, que se trataria de «uma forma de obstrução da sua atividade normal a renovação de iniciativas por ela rejeitadas. Mas se, entretanto, vier a darse a renovação da própria Câmara por virtude de eleições gerais, então, em homenagem ao princípio democrático, já não fará sentido que tal restrição funcione.» Seguidamente, analisou qual é o «âmbito mínimo da proibição» de repetição, para o efeito de determinar quando se deve entender que ocorre «renovação» do projeto ou da proposta de lei: «Não bastará, por certo, uma diferença de redação ou mesmo de estrutura, ambas de natureza formal, para a superar. Também não terão tal mérito diferenças de conteúdo de simples pormenor, sem significado bastante para se poder afirmar que não há identidade intelectual, de sentido prescritivo, entre o diploma já rejeitado e o reposto, sem a indispensável mediação temporal estabelecida. O mesmo se diga se houver uma diferença de amplitude das hipóteses sujeitas às correspondentes estatuições menor que a do diploma rejeitado (»). Ainda em consequência daquela ratio, indiferente será a falta de identidade subjetiva das iniciativas legislativas, num caso o Governo, noutro um grupo de deputados, pois o órgão legislativo a que se dirigem as iniciativas legislativas de um ou outro é o mesmo — a Assembleia da República — e é este que delibera sobre elas. Se houver, porém, diferença substancial de conteúdo preceptivo, a razão de ser da proibição do artigo 170.º,n.º 3 (atual artigo 167.º, n.º 4), cessa e esta não será aplicável.»

O mesmo autor, em Funções, Órgãos e Atos do Estado, Apontamentos de Lições do Prof. Jorge Miranda (Lisboa, 1990, pp. 397 e segs.), observa que «o que conta é a identidade de sentidos prescritivos», e não a «identidade de matérias versadas em duas ou mais iniciativas», sendo irrelevantes «diferenças de simples pormenor» e não contando a identidade subjetiva de quem toma a iniciativa.
Gomes Canotilho e Vital Moreira, em Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed. revista, Coimbra, 1993, p. 537, escrevendo especificamente sobre o referendo, observam que a proibição de repetição «visa evitar a chicana referendária» e que «a identidade de propostas é uma identidade substancial (não basta uma pura diferença formal), a fiscalizar pelo Tribunal Constitucional».
(») No entendimento deste Tribunal, todavia, deve considerar-se que ocorre entre as duas resoluções uma identidade que permite concluir pela renovação de iniciativas referendárias.
Em primeiro lugar, afigura-se irrelevante que apenas haja uma coincidência parcial entre os deputados do Partido Socialista que apresentam os correspondentes projetos. Desde logo porque, como se entendeu no citado Parecer n.º 16/80 da Comissão Constitucional o que releva neste contexto é o destinatário da iniciativa — no caso presente, ambas as propostas de convocação de referendo se dirigem ao Presidente da República.
(») Em segundo lugar, afigura-se igualmente irrelevante para estabelecer a identidade das duas propostas referendárias qualquer diferença verificada na exposição de motivos dos projetos de resolução, apenas tendo cabimento considerar o texto das perguntas que se pretende sejam submetidas ao eleitorado. Na verdade, as diferenças de formulação das perguntas, especialmente tendo em conta que se trata de propostas de referendos e não de textos legislativos, são insuficientes para permitir afirmar que não se pretende que o eleitorado se pronuncie sobre a mesma questão nas duas iniciativas referendárias. Conclui-se, pois, no 7 Do Regimento não consta a última parte do preceito, nem a referência ao referendo.
8 Publicado na I Série do Diário da República n.º 220, de 16/11/2005.

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sentido de que se trata de uma ‘renovação’ de ‘propostas de referendo’, para os efeitos do disposto no n.º 10 do artigo 115.º da Constituição».
Assim, atento o exposto, afigura-se que o projeto de lei em apreço consubstancia uma renovação da iniciativa legislativa já apresentada pelo Bloco de Esquerda, n.º 52/XII (1.ª), na presente sessão legislativa.

Parte II – Opinião do Relator

O signatário do presente parecer mantém sobre o projeto de lei n.º 149/XII (1.ª), do BE, nesta sede, a opinião política expressa pelo seu grupo parlamentar aquando da discussão em Plenário (em 8 de setembro de 2011) do projeto de lei n.º 52/XII (1.ª), que o Bloco de Esquerda aqui renova.
Já no que respeita ao projeto de lei n.º 148/XII (1.ª), do BE, não pode o signatário eximir-se de deixar aqui a seguinte reflexão: A Lei-Quadro, na sua versão atual, prevê, no artigo 27.º, a possibilidade de cancelamento e rectificação de dados por parte de quem, entenda-se, qualquer cidadão que «por acto de quaisquer funcionários ou agentes dos serviços de informações ou no decurso de processo judicial ou administrativo» tenha conhecimento de dados que lhe respeitem e que considere erróneos, irregularmente obtidos ou violadores dos seus direitos, liberdades ou garantias pessoais.
Ou seja, a eventualidade de um cidadão anónimo ter conhecimento de que os serviços de informações possuem dados que lhe respeitam, apenas decorre das situações ali previstas, e, por isso, legais. Não já de quaisquer outras, como as arreigadas «fugas de informações» que parecem poder decorrer do teor do artigo que a presente iniciativa propõe aditar, e assim, de certa forma, legitimar.
Ora, ao Relator levantam-se, desde logo, duas questões:

Se o cidadão não tiver conhecimento por intermédio de funcionários daqueles serviços (obviamente no exercício de funções), ou no decurso de processo judicial ou administrativo, como poderá então tê-lo? A vigorar a alteração agora proposta pelo BE, não parece manifesto o risco de se inundar a Comissão de Fiscalização de Dados de pedidos absolutamente infundados, tornando, por isso, o trabalho daquela Comissão impossível de realizar?

Parte III — Conclusões

1 — O BE apresentou à Assembleia da República o projeto de lei n.º 148/XII (1.ª) - Altera a Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa, reforçando as competências da comissão de fiscalização de dados do SIRP nos casos de recolha ilegítima de informação por parte dos serviços de informações.
2 — Esta iniciativa pretende reforçar as competências da Comissão de Fiscalização de Dados, com o objetivo de garantir que a denúncia da recolha ilegítima de dados dá origem a um processo de averiguação, protege os cidadãos e o direito de acesso à informação.
3 — O BE apresentou ainda o projeto de lei n.º 149/XII (1.ª) - Altera a Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa, consagrando o «período de nojo» para os seus dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades.
4 — Esta iniciativa pretende aprovar o aditamento de um artigo à Lei-Quadro do SIRP, com o objetivo de criar um período de impedimento de três anos para aqueles que cessem as suas funções nos serviços de informações, não permitindo que quadros daqueles serviços ingressem de imediato no sector empresarial, a não ser que o façam para exercício da atividade ou empresa de origem.
5 — Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que:

a) O projeto de lei n.º 148/XII (1.ª), do BE, reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário; b) O projeto de lei n.º 149/XII (1.ª), do BE, não reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário na presente sessão legislativa.

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Parte IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica dos projetos de lei n.os 148 e 149/XII (1.ª), do BE, elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República.
Tendo em conta o extenso argumentário existente, e que vai ao encontro das conclusões exaradas no presente parecer, anexa-se o documento que constitui o «Despacho do Presidente – Contestação BE».

Palácio de São Bento, 24 de fevereiro de 2012 O Deputado Relator, Hugo Soares — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.

Nota: — A Parte I foi aprovada, com os votos a favor do PSD, CDS-PP, PS, e PCP e votos contra do BE.
A Parte III foi aprovada, com os votos a favor do PSD, CDS-PP, PS, e PCP e os votos contra do BE, apenas no que se refere à alínea b), tendo votado favoravelmente a alínea a), tendo-se registado a ausência de Os Verdes.

Nota Técnica

Projeto de lei n.º 148/XII (1.ª), do BE (Altera a Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, reforçando as competências da Comissão de Fiscalização de Dados do SIRP nos casos de recolha ilegítima de informação por parte dos Serviços de Informações) Projeto de lei n.º 149/XII (1.ª), do BE Altera a Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa, consagrando o «período de nojo» para os seus dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades Data de admissão: 26 de janeiro de 2012 Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª Comissão)

Elaborada por: João Amaral (DAC) — Ana Paula Bernardo (DAPLEN) — Dalila Maulide, Fernando Ribeiro e Rui Brito (DILP) — Paula Faria (BIB) Data: 7 de fevereiro de 2012

Índice

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria V — Consultas e contributos VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes às iniciativas

Propondo duas alterações à Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (Lei n.º 30/84, de 5 de setembro), o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda pretende, com o projeto de lei n.º 148/XII (1.ª), salvaguardar o direito fundamental que os cidadãos têm de verificar a correção e legalidade dos dados e informações que a seu respeito tiverem sido eventualmente coligidos pelos serviços de informações.
Para tanto, pretendem, em primeiro lugar, aditar um novo número ao artigo 26.º da referida Lei- Quadro, de acordo com o qual compete à Comissão de Fiscalização de Dados do Sistema de Informações da República Consultar Diário Original

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Portuguesa a verificação dos programas, dados e informações constantes dos centros de dados dos serviços de informações. De acordo com o novo n.º 5 que o BE agora pretende adicionar ao artigo 26.º, a fiscalização da mencionada Comissão de Fiscalização deve ser exercida «sempre que estiver em apreciação denúncia da sua (dos dados) recolha ilegítima». A ser aprovada, esta regra junta-se à atualmente constante do n.º 4 do artigo 26.º, de acordo com o qual a fiscalização é exercida por amostragem, sem referência nominativa.
Este comando agora gizado é, depois, complementado pelo aditamento de um artigo 27.º-A à mesma LeiQuadro, que, sob a epígrafe «Fiscalização por requerimento do cidadão», estabelece os mecanismos que permitem aos cidadãos requerer à Comissão de Fiscalização a verificação da legalidade dos dados ou informações recolhidos pelos serviços de informações a seu respeito, podendo esta, a final, proceder à sua correção ou eliminação, salvaguardadas a segurança pública, a defesa nacional ou a segurança do Estado.
Por outro lado, com o projeto de lei n.º 149/XII (1.ª) o Bloco de Esquerda pretende introduzir na mesma Lei n.º 30/84 uma regra – o artigo 31.º-A – que impeça os dirigentes e funcionários dos Serviços de Informações com especiais responsabilidades, civis ou militares, de exercerem atividade em áreas do setor empresarial nas quais o seu conhecimento de matérias classificadas possa ser utilizado.
Excetuando deste impedimento o regresso à empresa ou atividade já exercida à data do início de funções, os autores da iniciativa estabelecem que, nos casos em que os dirigentes ou funcionários pretendam ingressar em novas funções, o Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) deve emitir parecer vinculativo e dar conhecimento deste ao Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informação da República Portuguesa (CFSIRP), cabendo ainda às mesmas entidades (Secretário-Geral do SIRP e CFSIRP) verificar o incumprimento do impedimento, apresentando as suas conclusões ao Ministério Público.
Refira-se, ainda, que a violação do impedimento ora proposto será – a ser aprovada a iniciativa – punível com pena até três anos de prisão, se outra mais grave não lhe for aplicável.
Finalmente, importa referir que o proposto com esta iniciativa é – com exceção de ligeiríssimas nuances – em tudo semelhante ao constante do projeto de lei n.º 52/XII (1.ª), também do BE, rejeitado na generalidade na reunião plenária de 8 de setembro de 2011, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes.
Para melhor compreensão do que se afirma, anexa-se a tabela em baixo:

Projeto de lei n.º 52/XII (1.ª), do BE Projeto de lei n.º 149/XII (1.ª), do BE

Artigo 1.º Aditamento à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro

São aditados à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, com as alterações da Lei n.º 4/95, de 21 de fevereiro, da Lei n.º 15/96, de 30 de abril, da Lei n.º 75-A/97, de 22 de julho, e da Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro, os artigos 31.º-A e 37.º, com a seguinte redação:

«Artigo 31.º-A Impedimentos

1 – Os dirigentes, agentes e funcionários, civis ou militares, dos serviços de informações, não podem, nos três anos seguintes à cessação das respetivas funções, exercer atividade no sector empresarial, em áreas onde possam utilizar o conhecimento de matérias classificadas na disponibilidade dos serviços de informações.
2 - Excetua-se do disposto no número anterior, o regresso à empresa ou atividade exercida à data do início das funções nos Artigo 1.º Âmbito A presente lei aplica-se aos dirigentes do SIED e do SIS, conforme o disposto nos artigos 29.º e 37.º da Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, e a funcionários com especiais responsabilidades nestes Serviços de Informações.

Artigo 2.º Aditamento à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro

É aditado à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, com as alterações da Lei n.º 4/95, de 21 de fevereiro, da Lei n.º 15/96, de 30 de abril, da Lei n.º 75-A/97, de 22 de Julho, e da Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro, o artigo 31.º-A, com a seguinte redação:

«Artigo 31.º-A Impedimentos

1 - Os dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades, civis ou militares dos Serviços de Informações, não podem, nos três anos seguintes à cessação das respetivas funções, exercer atividade no sector empresarial, em áreas onde possam utilizar o conhecimento de matérias classificadas na disponibilidade dos Serviços de Informações.
2 - Excetua-se do disposto no número anterior, o regresso à empresa ou atividade exercida à data do início das funções nos serviços de informações, não obstante o dever de rigoroso sigilo

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serviços de informações, não obstante o dever de rigoroso sigilo após a cessação de funções, nos termos do n.º 3 do artigo 28.º, com as consequências sancionatórias estabelecidas em caso de incumprimento.
3 - O Secretário-Geral emite parecer vinculativo sobre o ingresso em novas funções de dirigentes, agentes e funcionários, que cessem as suas atividades nos serviços de informações, aferindo as condições estipuladas no n.º 1, e do mesmo dá conhecimento obrigatório ao Conselho de Fiscalização.
4 - A verificação, em caso de suspeita ou denúncia do incumprimento do disposto no n.º 1, por parte de dirigentes, agentes ou funcionários que tenham identidade protegida, cabe ao Secretário-Geral e ao Conselho de Fiscalização, que devem, nos termos da lei, apresentar conclusões ao Ministério Público. 5 – Quando os dirigentes, agentes ou funcionários não estejam sujeitos a proteção de identidade, o Ministério Público promove a investigação criminal.
6 – A violação do disposto no n.º 1 é punível com prisão até três anos, se pena mais grave não lhe for aplicável.

após a cessação de funções, nos termos do n.º 3 do artigo 28.º, com as consequências sancionatórias estabelecidas em caso de incumprimento.
3 - O Secretário-Geral emite parecer vinculativo sobre o ingresso em novas funções de dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades, que cessem as suas atividades nos Serviços de Informações, aferindo as condições estipuladas no n.º 1, e do mesmo dá conhecimento obrigatório ao Conselho de Fiscalização.
4 - A verificação do incumprimento do disposto no n.º 1 cabe ao Secretário-Geral e ao Conselho de Fiscalização que devem, nos termos da lei, apresentar conclusões ao Ministério Público. 5 - A violação do disposto no n.º 1 é punível com prisão até três anos, se pena mais grave não lhe for aplicável.

II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário

Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais: Estas iniciativas legislativas são apresentadas por oito Deputados do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, nos termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º e do artigo 118.º do Regimento. Tomam a forma de projeto de lei, nos termos do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento, mostram-se redigidas sob a forma de artigos, têm uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e são precedidas de uma breve exposição de motivos, cumprindo assim os requisitos formais dos projetos de lei previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.
Definem concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa e, pelo menos o projeto de lei n.º 148/XII (1.ª), do BE, não infringe a Constituição ou os princípios nela consignados, nos termos do n.º 1 do artigo 120.º do Regimento. Com efeito, relativamente ao projeto de lei n.º 149/XII (1.ª), do BE, temos dúvidas sobre se a sua apresentação respeita a regra relativa à renovação das iniciativas, prevista no n.º 4 do artigo 167.º da Constituição e no n.º 3 do artigo 120.º do Regimento, de acordo com a qual os projetos de lei definitivamente rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa.
Os proponentes apresentaram em 2 de setembro de 2011 o projeto de lei n.º 52/XII (1.ª), do BE - Altera a Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa -, que foi rejeitado na generalidade em 8 de setembro de 2011. Pese embora a diferença dos respetivos títulos e o facto de preverem âmbitos mais ou menos abrangentes, entre os dois projetos de lei - o agora apresentado e o que ficou rejeitado - existe, aparentemente, uma identidade normativa em matéria de impedimentos. Assim, ambos promovem o aditamento à Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa de um artigo 31.º-A com idêntico conteúdo, exceção feita para pequenas nuances de redação. Ora, «O que a Constituição proíbe é que a Assembleia venha deliberar sobre um projeto ou uma proposta de lei com certo conteúdo normativo depois de já ter rejeitado, na mesma sessão legislativa, projeto ou proposta de idêntico conteúdo», sendo certo que «o que conta é a identidade de sentidos prescritivos, de normas que se propõem sucessivamente (conquanto haja pequenas variações verbais)»1.
Nesta fase, cumprirá à Comissão a que baixaram ambas as iniciativas pronunciar-se sobre a eventual identidade dos respetivos conteúdos.
Nos termos da alínea q) ao artigo 164.º da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre o regime do sistema de informações.
Estas iniciativas deram entrada em 25 de Janeiro de 2012, foram admitidas e anunciadas em 26 de Janeiro de 2012 e baixaram na generalidade à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª Comissão). 1 Constituição Anotada, de Jorge Miranda e Rui Medeiros, vol II, pag. 559.

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Verificação do cumprimento da lei formulário: A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto, adiante designada como lei formulário, prevê um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas que são relevantes em caso de aprovação das iniciativas legislativas e que importa ter presentes no decurso da apreciação na especialidade em Comissão e, em especial, no momento da redação final.
Os projetos de lei em causa têm títulos que traduzem os seus objetos em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da referida lei formulário.
Ambos pretendem alterar a Lei n.º 30/84, de 5 de setembro (Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa). Ora, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º da referida lei formulário, «os diplomas que alterem outros devem indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas». Através da Base Digesto (Presidência do Conselho de Ministros) verifica-se que a Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, sofreu até à data as seguintes modificações:

1 — Foram alterados os artigos 6.º, 7.º, 8.º, 12.º, 13.º, 15.º, 16.º a 23.º, 24.º, 26.º e 27.º, foi aditado um novo Capítulo VI, foi renumerado o artigo 13.º para artigo 7.º (passando a integrar o Capítulo I), e os artigos 7.º a 12.º para 8.º a 13.º, respetivamente, foi alterada a epígrafe do artigo 1.º para «Objeto», e determinado que o Capítulo III passe a iniciar-se no artigo 14.º, passando a sua Secção I a ter como título «Natureza e dependência», foi determinada a transição na íntegra dos direitos e obrigações contratuais, do património móvel e imóvel, dos orçamentos e recursos financeiros atribuídos aos serviços de informações para os órgãos e serviços previstos nos artigos 19.º, 20.º e 21.º, que são integrados na Presidência do Conselho de Ministros, e foi republicada a lei na íntegra pela Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro; 2 — Foi alterada a redação do artigo 7.º pela Lei n.º 75-A/97, de 22 de julho; 3 — Foram alterados os artigos 8.º e 15.º pela Lei n.º 15/96, de 30 de abril; 4 — Foram alterados os artigos 3.º, 6.º, 8.º, 13.º, 15.º, 16.º a 23.º, 26.º, 28.º, 32.º e 33.º e revogado o Capítulo VI pela Lei n.º 4/95, de 21 de fevereiro.

Sem prejuízo de, em sede de especialidade, poderem ser reunidas as pretendidas alterações num único texto, em caso de aprovação, as presentes iniciativas constituirão a quinta e a sexta alteração à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, respetivamente, menção que deverá constar dos respetivos títulos, o que se propõe:

Procede à quinta alteração à Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa, reforçando as competências da Comissão de Fiscalização de Dados do SIRP nos casos de recolha ilegítima de informação por parte dos serviços de informações; Procede à sexta alteração à Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa, consagrando o «período de nojo» para os seus dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades; Em conformidade com o previsto nas alínea a) e b) do n.º 3 do artigo 6.º da lei formulário, deve ainda proceder-se à republicação integral dos diplomas que revistam forma de lei sempre que existam mais de três alterações ao ato legislativo em vigor - salvo se se tratar de Códigos – ou, se somem alterações que abranjam mais de 20% do articulado do ato legislativo em vigor, atenta a sua versão originária ou a última versão republicada. Tendo em conta a dimensão das alterações propostas por estas iniciativas e o facto desta lei ter sido republicada pela Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro, que constituiu a sua quarta alteração, a republicação não resulta necessária.
A entrada em vigor das iniciativas, em caso de aprovação, «no dia seguinte ao da sua publicação», está em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no próprio dia da publicação».
Na presente fase do processo legislativo as iniciativas em apreço não nos parecem suscitar quaisquer outras questões em face da lei formulário.

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III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes

Enquadramento legal nacional e antecedentes: O projeto de lei em análise pretende alterar a Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, com o objetivo de reforçar as competências da Comissão de Fiscalização de Dados do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) nos casos de recolha ilegítima de informação por parte dos serviços de informações.
A Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, aprovou a Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa, que estabelece as bases gerais do SIRP, tendo sido alterada pela Lei n.º 4/95, de 21 de fevereiro, pela Lei n.º 15/96, de 30 de abril, pela Lei n.º 75-A/97, de 22 de julho, e pela Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro, que a republicou.
O Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informação da República Portuguesa, no exercício da sua missão de acompanhamento e fiscalização da atividade do Secretário-Geral do SIRP e dos serviços de informações, no seu Parecer de 2010, (») refletiu sobre a eventual utilidade de se vir a criar um impedimento legal temporário, para dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades (») em consequência da demissão do ex-diretor do SIED e da sua entrada quase imediata numa empresa privada, suscitando-se dúvidas sobre a correção desta prática.
O regime jurídico aplicável ao Secretário-Geral do SIRP, ao Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e ao Serviço de Informações de Seguranças (SIS), bem como aos centros de dados e estruturas comuns, encontra-se estabelecido pela Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro.
A Lei n.º 6/94, de 7 de abril, aprova o regime do segredo de Estado. O chamado segredo de Estado abrange todas as matérias suscetíveis de pôr em risco ou de causar dano à independência nacional, à unidade e integridade do Estado e à sua segurança interna e externa.
Na presente Legislatura foram apresentados três projetos de lei – os projetos de lei n.º 27/XII (1.ª), do PCP, n.º 52/XII (1.ª), do BE, e n.º 149/XII (1.ª), do BE – relacionados com a atividade do SIRP. Os dois primeiros foram rejeitados em sede de votação na generalidade.

Enquadramento doutrinário/bibliográfico: Bibliografia específica:

Chesterman, Simon - Privacy and surveillance in the age of terror. Survival: global politics and strategy.
London. ISSN 0039-6338. Vol. 52, n.º 5 (oct./nov. 2010), p. 31-46 Resumo: O autor aborda a questão da relação entre liberdade e segurança nos Estados Unidos da América. O problema que se coloca é o de saber de que forma essa relação deve ser gerida. Alan Westin, em 1971, argumentava que «uma sociedade livre não deve ter de escolher entre o uso mais racional de autoridade e a privacidade pessoal». Contudo, e apesar de Westin continuar a ser um dos mais importantes escritores sobre privacidade da sua época, este argumento revelou-se falível. De facto, as sociedades escolhem como gerir a relação entre a autoridade racional e a privacidade, escolha essa que deve ser feita com muito cuidado. Encarar essa relação como um «contrato social» mediado pelo conjunto de cidadãos de um país que são participantes ativos em vez de alvos passivos, proporciona uma base de defesa da liberdade.

Gouveia, Jorge Bacelar – O terrorismo e o Estado de direito: a questão dos direitos fundamentais.
Segurança e Defesa. Infantado, n.º 5 (dez. 2007/fev. 2008), p. 27-29.
Resumo: O terrorismo nos seus novos contornos implicou uma alteração de paradigma no papel do Estado na garantia da segurança dos cidadãos e da sociedade em geral. A grande dificuldade reside nos Estados de direito, globalmente democratizados, em que a necessidade de reforçar o poder estadual não pode ser feita à custa da diminuição dos direitos fundamentais das pessoas. Será que o reforço da segurança só se realiza à custa da diminuição da liberdade? Este direito é aqui entendido em sentido amplo, uma vez que compreenderá não apenas a liberdade pessoal propriamente dita, mas outros direitos, como a intimidade da vida privada e o sigilo das comunicações.

Portnoff, André-Yves - Libertés versus sécurité. Futuribles: analyse et prospective. Paris. ISSN 0337-307X.
n.º 353 (juin. 2009), p. 39-54

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Resumo: A partir de diversos acontecimentos recentes, o autor interroga-se até que ponto a violação da vida privada e a constituição e utilização de bases de dados pessoais se tornaram fáceis e vulgares. Preparase um mundo de vigilância generalizada no qual a vida privada pode ser facilmente violada pelos poderes políticos em nome da segurança, ou por poderes económicos com fins comerciais.
A luta contra o crime ou contra o terrorismo justifica as escutas telefónicas e a vigilância da internet em larga escala? Até que ponto se pode abdicar da liberdade e do respeito do Estado de direito em benefício da segurança? Em que medida existe um aparato tecnológico ou legislativo para preservar a vida privada contra as intrusões comerciais ou politicas? O autor aborda todos estes aspetos e recorda que as redes informáticas constituem também um instrumento de poder sem precedentes para os cidadãos, permitindo-lhes juntar-se e promover os valores que lhes parecem essenciais: agir de acordo com os valores democráticos, sem concessões mas conservando a sua vigilância, continua a ser o melhor meio para preservar a segurança e a liberdade. Rodrigues, Joaquim Chito – Os sistemas de informações e a saúde da democracia. Nova cidadania: liberdade e responsabilidade pessoal. Lisboa. ISSN 0874-5307. A. 12, n.º 46 (2011), p. 39-41.
Resumo: O produto dos sistemas de informações, em democracia, tem duas finalidades primárias: a eficiência e proteção do Estado e a proteção do cidadão. Um dos fatores de análise da saúde das democracias passa, sem dúvida, pela análise e conclusões sobre a organização do Serviço de Informações do Estado e sobre a forma como este é posto em prática, externa e internamente.
Quando os serviços de informações – que por lei servem o Estado, através dos governos legitimamente eleitos, para defesa do país e da própria democracia – passam a servir as polícias, ainda que sob o pretexto da ameaça terrorista, estamos no limiar da perda dos direitos e garantias dos cidadãos. Estamos no limiar de doença grave da democracia.

Enquadramento internacional: Países europeus: A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha e Itália.

Espanha: A Lei 9/1968, de 5 de abril, reguladora de los Secretos Oficiales, define as matérias consideradas como segredo de Estado. A definição das matérias classificadas, a que se refere o artigo 3.º deste diploma, corresponde na esfera da sua competência ao Conselho de Ministros e aos Chefes do Estado Maior das Forças Armadas (artigo 4.º). O Decreto n.º 242/1969, de 20 de fevereiro, veio regulamentar os procedimentos e medidas necessárias para a aplicação da Lei n.º 9/1968, de 5 de abril e para a proteção das matérias classificadas como segredo de Estado. Os artigos 4.º a 8.º deste diploma regulam a violação da proteção das matérias classificadas. O artigo 34.º qualifica as faltas disciplinares e administrativas dos funcionários.
A Lei n.º 11/2002, de 6 de maio, criou o Centro Nacional de Inteligencia, entidade responsável por fornecer ao Presidente do Governo e ao Governo as informações, análises, estudos ou propostas que permitam prevenir e evitar qualquer perigo, ameaça ou agressão contra a independência e integridade territorial de Espanha, os interesses nacionais e a estabilidade do Estado de direito e suas instituições. De acordo com o artigo 2.º da Lei n.º 11/2002, o Centro Nacional de Inteligencia (CNI) rege-se pelo princípio da sujeição ao ordenamento jurídico, levando a cabo as suas atividades específicas nos termos definidos neste diploma e na Lei Orgânica n.º 2/2002, de 6 de maio, reguladora del control judicial previo del Centro Nacional de Inteligencia, e será submetido a controlo parlamentar e judicial, constituindo este a essência do seu funcionamento eficaz e transparente.
A alínea f) do n.º 1 do artigo 8.º da Lei n.º 11/2002 prevê que o pessoal que preste serviço no CNI esteja sujeito a um regime que conjugue os direitos e deveres dos funcionários públicos com o do pessoal sujeito a disciplina militar. A Lei Orgânica n.º 10/1995, de 23 de novembro, del Código Penal, assinala no Título XXIII os delitos de traição contra a paz ou a independência do Estado, e no Capítulo III especifica a questão da revelação de segredos e informações relativas à defesa nacional.
O artigo 11.º da Lei n.º 11/2002, de 6 de maio, assinala o controlo parlamentar sobre o funcionamento e atividades do CNI. Nesta sequência, o CNI submeterá ao conhecimento do Congreso de los Diputados,

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através da Comissão que controla as dotações para as despesas, liderado pelo Presidente da Câmara, a informação adequada sobre o seu funcionamento e atividades. O conteúdo desses encontros e as suas deliberações serão secretos. A citada Comissão terá acesso ao conhecimento de matérias classificadas, salvo as relativas às fontes e meios utilizados pelo CNI e as que provêm de serviços estrangeiros e organizações internacionais, nos termos definidos nos correspondentes acordos e convénios de intercâmbio de informação classificada. Os membros da Comissão estão obrigados a manter segredo sobre as informações secretas e os documentos que recebem. Após análise, os documentos serão devolvidos para custódia ao CNI, para os cuidados adequados, sem que possam ser retidos originais ou reproduções. A Comissão conhecerá os objetivos estabelecidos anualmente pelo Governo, em matéria dos serviços de informação, tendo o diretor do CNI que elaborar anualmente um relatório sobre as atividades e grau de cumprimento dos objetivos definidos.
O Real Decreto n.º 436/2002, de 10 de maio, alterado pelo Real Decreto n.º 612/2006, de 19 de maio, veio estabelecer a estrutura orgânica do CNI.
Importa ainda salientar a Lei Orgânica n.º 10/1995, de 23 de novembro, del Código Penal, que no Título XXIII assinala os delitos de traição contra a paz ou a independência do Estado, e no Capítulo III especifica a questão da revelação de segredos e informações relativas à defesa nacional.

Itália: Quanto a uma medida como a proposta nesta iniciativa legislativa, não encontramos nada semelhante na legislação italiana para o sector.
Em Itália a disciplina do sistema de informações é regulada pela Lei n.º 124, de 3 de agosto de 2007 (Legge 3 agosto 2007, n.º 124), relativa ao «Sistema de Informações da República e a nova disciplina do dever de segredo» (Sistema di informazione per la sicurezza della Repubblica e nuova disciplina del segreto).
O artigo 21.º (Contingente speciale del personale) diz-nos que «Com um regulamento feito expressamente é determinado o contingente especial do pessoal afeto ao DIS (Departamento de Informações para a Segurança) e aos serviços de informação para a segurança, criado junto da Presidência do Conselho de Ministros». Não nos foi possível encontrar o referido regulamento.
O regulamento determina, em particular, «os casos de cessação das relações de dependência, afeto ou não afeto ao quadro de pessoal» (artigo 21.º, n.º 8); as incompatibilidades da relação com o DIS e com os serviços de informação para a segurança, em relação a determinadas condições pessoais, a cargos e a atividades exercidas, prevendo obrigações específicas de declaração e, em caso de violação, as consequentes sanções (artigo 21.º, n.º 9).
Por fim, o n.º 12 do referido artigo 21.º estatui que «todo o pessoal que presta serviço na dependência ou a favor do DIS ou serviços de informação para a segurança está obrigado, mesmo após a cessação de tais atividades, ao respeito do segredo sobre tudo aquilo de que tenha tido conhecimento no exercício ou por causa das suas funções».
Quanto à gestão da informação pessoal, o artigo 26.º (Trattamento delle notizie personali) diz-nos que «a recolha e o tratamento de dados (notícias e informações, no original) têm como objetivo exclusivamente a prossecução dos interesses institucionais do sistema de informações para a segurança». No seu n.º 2 que «O DIS (Departamento das Informações para a Segurança), através da atividade de controlo nos termos da alínea i) do n.º 3 do artigo 4.º2 e os diretores dos serviços de informação para a segurança garantem o respeito pelo estabelecido no n.º 1».
Pensamos ser pertinente o estatuído em matéria de proteção dos dados pessoais, na expressão usada em Itália, de Privacy. A esse propósito releva o artigo 58.º3 do Codice in materia di protezione dei dati personali, aprovado pelo Decreto Legislativo n.º 196/2003, de 30 de junho. 2 i) esercita il controllo sull'AISE e sull'AISI, verificando la conformità delle attività di informazione per la sicurezza alle leggi e ai regolamenti, nonchè alle direttive e alle disposizioni del Presidente del Consiglio dei ministri. Per tale finalità, presso il DIS è istituito un ufficio ispettivo le cui modalità di organizzazione e di funzionamento sono definite con il regolamento di cui al comma 7. L'ufficio ispettivo, nell'ambito delle competenze definite con il predetto regolamento, può svolgere, anche a richiesta del direttore generale del DIS, autorizzato dal Presidente del Consiglio dei ministri, inchieste interne su specifici episodi e comportamenti verificatisi nell'ambito dei servizi di informazione per la sicurezza; 3 Art. 58 (Disposizioni applicabili) 1. Ai trattamenti effettuati dagli organismi di cui agli articoli 3, 4 e 6 della legge 24 ottobre 1977, n. 801, ovvero sui dati coperti da segreto di Stato ai sensi dell'articolo 12 della medesima legge, le disposizioni del presente codice si applicano limitatamente a quelle previste negli articoli da 1 a 6, 11, 14, 15, 31, 33, 58, 154, 160 e 169.

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O Capítulo IV da referida lei prevê o Controlo Parlamentar do Sistema de Informações – artigos 30.º a 38.º da mesma lei.
Está prevista a constituição de uma Comissão Parlamentar para a Segurança da República (Copasir), composta por cinco deputados e cinco senadores, nomeados no prazo de 20 dias, após o início de cada legislatura pelos presidentes das duas câmaras, proporcionalmente ao número de componentes dos grupos parlamentares, garantindo, contudo, a representação paritária da maioria e da oposição, não esquecendo a especificidade das tarefas da Comissão. (artigo 30.º).
Os relatórios da Comissão parlamentar podem ser consultados no sítio dos Serviços de Informação e Segurança da República Italiana.

IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Efetuada consulta à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) não foi apurada a existência de quaisquer outras iniciativas legislativas ou petições pendentes sobre matéria idêntica.

V — Consultas e contributos

Consultas obrigatórias: Nos termos do disposto nos respetivos estatutos (Leis n.os 21/85, de 30 de julho, 60/98, de 27 de agosto, e Lei n.º 15/2005, de 26 de janeiro), deve ser promovida – porventura, por escrito se a Comissão assim deliberar – a consulta do Conselho Superior da Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público e da Ordem dos Advogados.

VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

Em face dos elementos disponíveis não é possível determinar ou quantificar eventuais encargos resultantes da aprovação das presentes iniciativas.

———
2. Ai trattamenti effettuati da soggetti pubblici per finalita' di difesa o di sicurezza dello Stato, in base ad espresse disposizioni di legge che prevedano specificamente il trattamento, le disposizioni del presente codice si applicano limitatamente a quelle indicate nel comma 1, nonche' alle disposizioni di cui agli articoli 37, 38 e 163. (...)

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PROJETO DE LEI N.º 163/XII (1.ª) (DEFINE O REGIME DE AUDIÇÃO E PARTICIPAÇÃO DAS AUTARQUIAS LOCAIS E POPULAÇÕES NO PROCESSO LEGISLATIVO DE CRIAÇÃO, EXTINÇÃO, FUSÃO E MODIFICAÇÃO DE AUTARQUIAS LOCAIS, PROCEDE À PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 17/2003, DE 4 DE JUNHO E PROCEDE À TERCEIRA ALTERAÇÃO À LEI ORGÂNICA N.º 4/2000, DE 24 DE AGOSTO)

Pareceres das Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Parte I — Considerandos

i) Nota introdutória: Um grupo de Deputados do Grupo Parlamentar do BE tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República, em 6 de fevereiro de 2012, o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) – Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, procede à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, e procede à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto.
Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 124.º desse mesmo Regimento.
Por despacho de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República datado de 8 de fevereiro de 2012, a iniciativa vertente baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local para emissão do respetivo parecer, tendo aquela sido designada como comissão competente.
Por ofício n.º 169/CAOTPL, de 15 de fevereiro de 2012, o Presidente da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local solicitou a S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República a reapreciação do despacho que determinou competente a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, no sentido de ser atribuída à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local a competência para a elaboração e aprovação do respetivo parecer, atendendo às competências específicas desta Comissão aprovadas, em 28 de julho de 2011, em Conferência de Presidentes das Comissões Parlamentares, bem como à manifesta conexão direta com a proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) em apreciação nesta Comissão.
Nessa sequência, a Presidente da Assembleia da República decidiu, em 16 de fevereiro de 2012, proceder à redistribuição conforme solicitado, passando, assim, a Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local a ser a comissão competente.
A discussão na generalidade do projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) já se encontra agendada, em conjunto com a proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica», para o próximo dia 1 de março de 2012.

ii) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa: O projeto de lei em apreço pretende introduzir mecanismos de participação das populações das autarquias locais na tramitação das iniciativas legislativas que tenham por objeto a criação, a extinção, a fusão ou a modificação territorial de autarquias locais (cfr. artigo 1.º).
Nesse sentido, a iniciativa sub judice propõe o seguinte:

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A) Sujeição a discussão pública das iniciativas relativas à criação, à extinção, à fusão e à modificação territorial das autarquias locais (cfr. artigo 2.º), nos seguintes termos:

— Discussão pública por um período de 60 dias; — Para o efeito, tais iniciativas são publicadas na II Série do Diário da República ou no jornal oficial da região autónoma, são publicados avisos dessa discussão pública em dois jornais de circulação nacional e nos dois jornais locais de maior circulação no território objeto da iniciativa e as iniciativas ficam disponíveis para consulta pública em sítio eletrónico, bem como nas sedes das autarquias locais diretamente afetadas; — Findo o período de discussão pública, a comissão competente elaborará um relatório contendo o resultado dessa discussão.

B) Dever de o órgão com competência legislativa1 ouvir, obrigatoriamente, os órgãos das autarquias locais afetados pela iniciativa legislativa de criação, extinção, fusão ou modificação territorial de autarquias locais2 (cfr. artigo 3.º, n.º 1), sendo que: O direito de audição é exercido após a discussão pública3 e previamente à votação na generalidade, no órgão com competência legislativa, da iniciativa legislativa (cfr. artigo 3.º, n.º 2); O órgão com competência legislativa remeterá o relatório da discussão pública4 (cfr. artigo 3.º, n.º 3); O direito de audição das autarquias exerce-se pela emissão de parecer pelos respecivos órgãos (cfr. artigo 3.º, n.º 4); Tal parecer deverá ser remetido ao órgão com competência legislativa no prazo de 60 dias5 contados da solicitação do mesmo, prazo esse que se suspende com a proposta de realização de referendo local ou verificada a obrigatoriedade da sua realização (cfr. artigo 3.º, n.os 5 e 6); O referendo local incide obrigatoriamente sobre o parecer relativamente à criação, extinção, fusão ou modificação territorial das autarquias locais, podendo ainda conter duas perguntas adicionais sobre a designação da nova autarquia local e designação da respetiva sede (cfr.
artigo 3.º, n.º 7); 1 A nota técnica repara que «nos n.os 3 e 5 do artigo 3.º deste projeto de lei faz-se referência ao «órgão com competência legislativa». Porém, está em causa matéria da competência exclusiva [alínea n) do artigo 164.º da Constituição] e não delegável da Assembleia da República (n.º 2 do artigo 11.º da Constituição)». Sucede, todavia, que é necessário ter em atenção que a alínea n) do artigo 164.º da CRP, apesar de incluir na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, a criação, modificação e extinção de autarquias locais, a verdade é que fá-lo «sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas». E o certo é que o artigo 227.º, n.º 1, alínea l), da CRP inclui nos poderes das regiões autónomas, a definir nos respetivos estatutos, o poder de «criar e extinguir autarquias locais, bem como modificar a respetiva área, nos termos da lei», poder esse que é concretizado nos Estatutos PolíticoAdministrativos, quer da Região Autónoma da Madeira [cfr. artigo 37.º, n.º 1 alínea g)] quer da Região Autónoma dos Açores [cfr. artigo 49.º, n.º 2, alínea e)], integrando-se na competência legislativa da respetiva assembleia legislativa.
Daí que se compreenda que o BE utilize a expressão «órgão com competência legislativa», pois, dessa forma, pretende abarcar, quer a Assembleia da República quer as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas.
2 Recorde-se que, nos termos do artigo 141.º do Regimento da Assembleia da República, apenas está prevista a audição da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) «sempre que se trate de projetos ou propostas de lei respeitantes às autarquias locais ou outras iniciativas que o justifiquem».
3 Ou seja, o BE permite que as autarquias locais afetadas pela iniciativa legislativa se possam pronunciar duplamente: primeiro na discussão pública e depois, obrigatoriamente, através do exercício do direito de audição.
4 O n.º 3 do artigo 3.º refere-se ao «relatório elaborado nos termos do artigo n.º 2, bem como o relatório da discussão pública». Cremos que este normativo só pode querer reportar-se ao relatório elaborado nos termos do artigo 2.º, n.º 4. Mas neste caso, não faz sentido, por redundante, a sua parte final, uma vez que aquele corresponde precisamente ao relatório da discussão pública.
5 Portanto, são 60 dias de discussão pública, acrescidos de mais 60 dias para a emissão de parecer pelos órgãos das autarquias locais, o que soma quatro meses de processo legislativo exclusivamente dedicado ao cumprimento destas duas novas prerrogativas propostas pelo BE. Isto sem contar com a suspensão do prazo para a emissão do parecer por força da obrigatoriedade de realização de referendo local nos casos em que tem de haver parecer favorável por parte das autarquias afetadas (cfr. artigos 3.º, n.os 6 e 7, e 4.º, n.º 3).

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As iniciativas legislativas sobre a criação, extinção, fusão ou modificação territorial das autarquias locais passam a depender da emissão de pareceres favoráveis, vinculativos, por parte dos órgãos deliberativos das autarquias locais afetadas (cfr. artigo 4.º, n.º 1), sendo que:

— A aprovação desses pareceres carece de maioria absoluta do número de membros em efetividade de funções nos respetivos órgãos (cfr. artigo 4.º, n.º 2); — A emissão desses pareceres depende da realização prévia de referendo local (cfr. artigo 4.º, n.º 3). Ou seja, impõe-se a obrigatoriedade de realização de referendo local nos casos em que tem de haver parecer favorável por parte das autarquias locais afetadas.

C) A revogação da alínea d) do artigo 3.º da Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, que exclui do objeto da iniciativa legislativa de cidadãos as matçrias «(») do artigo 164.º da Constituição, com exceção da alínea i)», isto é, das matérias que se integram na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, com exceção das bases do sistema de ensino. Trata-se de uma alteração que alarga de sobremaneira a possibilidade de recurso à iniciativa legislativa popular, embora o desígnio dos proponentes, como consta da exposição de motivos, fosse apenas o de permitir aos cidadãos a apresentação de iniciativas legislativas em matéria de criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais.

D) O aditamento de um novo artigo 6.º-A à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho (Iniciativa legislativa de cidadãos), contendo regras mais flexíveis sobre o número de assinaturas necessário para a apresentação de iniciativas legislativas em matéria de criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais. Recorde-se que o artigo 6.º desta lei exige um mínimo de 35 000 assinaturas e o novo artigo 6.º-A permite que, em matéria de criação, extinção e fusão de autarquias, a iniciativa possa ser subscrita pelo menor dos seguintes limites:

— Um décimo dos cidadãos eleitores inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas pela iniciativa legislativa de cidadãos; — 15 000 cidadãos inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas por iniciativa legislativa de cidadãos que crie, extinga ou procede à fusão de região administrativa ou área metropolitana; — 7500 cidadãos inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas por iniciativa legislativa de cidadãos que crie, extinga ou procede à fusão de município; — 1500 cidadãos inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas por iniciativa legislativa de cidadãos que crie, extinga ou procede à fusão de freguesia.

E) E que, em matéria de modificação territorial de autarquias locais, quando a mesma seja subscrita pelo menor dos seguintes limites:

— Um quinto dos cidadãos eleitores residentes na área que constitui objeto de modificação territorial; — 1500 cidadãos eleitores inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas pela iniciativa legislativa de cidadãos, quando se trate de modificação territorial de freguesias6.
6 Todavia, a alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º-A, que reproduz ipis verbis a alínea d) do n.º 1 desse artigo 6.º-A, refere «Mil e quinhentos eleitores inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias existentes e que sejam afetadas territorialmente pela iniciativa legislativa de cidadãos, quando se trate de criação, extinção ou fusão de freguesias».
Obviamente que só pode ser uma gralha, já que o n.º 2 desse artigo se refere às situações de modificação territorial de autarquias locais. Daí que o disposto na referida alínea b) só possa reportar-se à modificação territorial de freguesias.

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F) A alteração do artigo 3.º7 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto, de modo a aditar os novos n.os 2 e 3, passando a permitir-se que a emissão de pareceres, por órgãos de autarquias locais, relativamente à criação, extinção, fusão e modificação dos limites territoriais das autarquias locais, no âmbito de procedimentos legislativos, possa ser objeto de referendo local8 e que a lei pode estabelecer a obrigatoriedade de realização de referendo local quanto às referidas matérias.

G) A revogação do artigo 5.º da Lei n.º 142/85, de 18 de novembro (Lei-Quadro da Criação de Municípios), segundo o qual:

«Artigo 5.º Consultas prévias

1 — O projeto ou proposta de lei de criação de novo município deverá obter parecer favorável das assembleias das freguesias a integrar no novo município.
2 — Os municípios em que se integrem as freguesias referidas no número anterior serão ouvidos nos termos da alínea d) do artigo 3.º da Lei n.º 11/82, de 2 de junho.
3 — Para efeito de observância do disposto nos números anteriores, a Assembleia da República ou o Governo, conforme o caso, ouvirão os órgãos das autarquias interessadas, que se pronunciarão no prazo de 60 dias.
4 — As deliberações a que respeitam as consultas de que trata este artigo são tomadas pela maioria absoluta do número de membros em efetividade de funções nos respetivos órgãos.»

H) A revogação do n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 8/93, de 5 de março (Regime jurídico da criação de freguesias), segundo o qual:

«3 – Verificada a existência de todos os elementos necessários à instrução do processo, a Assembleia da República solicitará aos órgãos do poder local os respetivos pareceres, os quais deverão ser emitidos no prazo de 60 dias».

Parte II – Opinião do Relator

Nesta sede, e sem prejuízo de outras questões políticas que esta iniciativa legislativa possa levantar, não se pode deixar de alertar para o facto de o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª), do BE, suscitar sérias reservas de constitucionalidade, uma vez que impõe uma restrição intolerável ao exercício da competência legislativa da Assembleia da República em matéria da sua reserva absoluta.
É que o artigo 4.º, n.º 1, do projeto de lei estabelece a dependência das iniciativas legislativas sobre a extinção, fusão ou modificação de autarquias da obtenção de pareceres vinculativos favoráveis dos órgãos deliberativos das autarquias envolvidas. 7 No corpo do artigo 6.º do projeto de lei, que procede à alteração da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto, lê-se «O artigo 24.º (») passa a ter a seguinte redação:», mas o objeto efetivo da alteração é o «Artigo 4.º». Todavia, o artigo 4.º da referida lei não tem como epígrafe «“Matçrias do referendo local» – essa é a epígrafe do artigo 3.º. Daí que se presuma que o artigo que o BE pretende realmente alterar só possa reportar-se ao artigo 3.º daquela lei. Este reparo também consta da nota técnica dos serviços, que se acompanha.
8 Paradoxalmente, o BE não altera o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei Orgânica n.º 4/2002, de 24 de agosto, que exclui expressamente do âmbito do referendo local «as matérias integradas na esfera de competência legislativa reservada aos órgãos de soberania», sendo certo que a criação, extinção e modificação das autarquias locais é matéria da reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República, nos termos da alínea n) do artigo 164.º da CRP.

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Tal significa, portanto, que se os pareceres emitidos pelas assembleias municipais ou pelas assembleias de freguesia afetadas pela iniciativa forem em sentido negativo estará a Assembleia da República impedida de legislar sobre uma matéria que é da sua reserva exclusiva da competência, o que é constitucionalmente inaceitável.
Recorde-se que, nos termos do artigo 164.º da CRP, alínea n), «É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias: (»)

n) Criação, extinção e modificação de autarquias locais e respetivo regime, sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas».

A redação em vigor foi fixada pela revisão constitucional de 1997, que colocou «(») sob reserva absoluta não só o regime, como dubitativamente até ao momento poderia ser interpretado, mas, também, a própria criação em concreto de cada autarquia local9». Isto naturalmente «sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas», uma vez que, nos termos do artigo 227.º, n.º 1 alínea l), as regiões autónomas têm o poder de criar e extinguir autarquias locais, bem como modificar a respetiva área, nos termos da lei.
Ora, estando em causa uma matéria do domínio absolutamente reservado da competência legislativa da Assembleia da República, em que só este órgão de soberania pode legislar, «sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas», não se vislumbra que possa uma lei impor quaisquer restrições e condicionalismos ao exercício dessa competência constitucional.
Como referem os Professores Gomes Canotilho e Vital Moreira, «É inequívoco o sentido e alcance da reserva absoluta de lei parlamentar. Ela significa, sobretudo: (») (c) que todas e cada uma das normas são formalmente produto da vontade da assembleia representativa10». Daqui decorre, a nosso ver, que não podem órgãos das autarquias locais ditar, por intermédio de parecer vinculativo, a vontade da Assembleia da República, definindo se esta pode ou não legislar sobre a extinção, fusão ou modificação das autarquias locais.
Trata-se, em nosso entender, de uma limitação constitucionalmente inadmissível.
Refira-se que esta questão também é, de certa forma, abordada na nota técnica dos serviços, onde se pode ler:

«No artigo 4.º deste projeto de lei os autores parecem pretender condicionar as iniciativas legislativas em matéria de criação, fusão, extinção ou modificação de autarquias locais, a pareceres vinculativos favoráveis (prévios?) de órgãos locais, o que, numa matéria que a Constituição configurou como sendo da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República merece ponderação pela comissão. A criação e extinção de autarquias locais, designadamente de freguesias, obedece a um regime quadro previsto nas Leis n.os 11/82, de 2 de junho, 8/93, de 5 de março, e 51-A/93, de 9 de julho. De facto, na apreciação das iniciativas legislativas que visem a criação de freguesias, a Assembleia da República deve ter em conta «a vontade das populações abrangidas, expressa através de parecer dos órgãos autárquicos representativos», em conformidade com o previsto na alínea a) do artigo 3.º da Lei n.º 8/93, de 5 de março, mas tal «parecer» configura uma competência meramente «consultiva11» dos órgãos de poder local. Esses pareceres são obrigatórios no sentido em que têm que ser solicitados mas não são vinculativos para a Assembleia da República. Já na alteração promovida à Lei n.º 4/2000, de 24 de agosto, por esta mesma 9 Constituição da República Portuguesa, 4.ª revisão, Setembro 97, prefácio e anotações por Jorge Lacão, Texto Editora, p. 122.
10 Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume II, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, p. 309.
11 Designadamente Acórdãos do TC n.º 238/91 de 29/05/91 e 242/91, de 12/06.

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iniciativa, prevê-se, por outro lado, que «a emissão» destes pareceres pode ser objeto de referendo local que a lei pode estabelecer também como «obrigatório».
Adicionalmente (e reiterando aqui alguns lapsos, incongruências e redundâncias assinalados nas notas de pé de página), considera o Relator que o modelo deliberativo proposto pelo BE — ainda que ancorado no objetivo de fortalecer o poder de decisão das populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais —, configura-se demasiado complexo e até paradoxal.
A complexidade deriva do facto de o modelo subscrever uma dupla pronúncia dos cidadãos (uma no processo de discussão pública e outra por via da participação em referendo, evidenciando-se, aqui, a lógica da democracia direta) e uma dupla pronúncia dos órgãos das autarquias locais (uma por via da sua possível participação no processo de discussão pública e outra pelo requisito de audição destes órgãos que devem emitir pareceres vinculativos, evidenciando-se, aqui, a lógica da democracia representativa). A complexidade pode ainda aduzir-se pelo formato temporal exigido ao processo consultivo.
Na hipótese de inclusão do mecanismo de referendo local no processo (o que é largamente provável em face do consignado no projeto de lei), e considerando a possibilidade de multiplicação deste mecanismo por tantas quantas forem as autarquias afetas pelo princípio da obrigatoriedade do referendo (ou por proposta da sua realização), a pretensão do BE conduziria ao arrastamento do processo consultivo/referendário por largos meses (não é possível determinar este período). O formato temporal acarreta dificuldades extremas do ponto de vista processual e logístico, dado que estaríamos perante um sistema de sucessivas operações interdependentes e excessivamente imprevisível quanto ao seu desfecho12.
Por fim, nota o Relator que o projeto de lei evidencia alguns paroxismos. Por exemplo, o requisito de sujeição a referendo do parecer que resulta do processo de consulta pública (com a agravante de não ser claro quando e como se verifica a obrigatoriedade do recurso ao referendo)13, pode conduzir a um absoluto paradoxo decisório. Podemos ilustrar este paradoxo em casos em que o relatório da discussão pública expressa uma adesão favorável das populações a um qualquer processo de criação ou extinção de freguesias e, depois, por força do recurso ao referendo local a decisão é diferente da anterior. Estaríamos, assim, perante duas decisões contraditórias, só possíveis porque o projeto de lei do BE assume mecanismos que requerem decisões sobre decisões anteriores. O paradoxo pode ser levado ao limite pela inclusão de uma tripla decisão: a relativa ao parecer vinculativo dos órgãos deliberativos das autarquias a partir da realização prévia de referendo local (i.e., se o resultado do referendo for num determinado sentido, e sendo vinculativo, o parecer posterior dos órgãos deliberativos das autarquias ou é destituído de significado se ratificar o resultado do referendo, ou é contraditório, se for em sentido contrário).

Parte III — Conclusões

1 — O BE apresentou à Assembleia da República o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) – Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, procede à primeira alteração à Lei 12 Antecipamos que a eventual aplicação deste modelo em casos de reformas sistémicas relativas à criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais (tal como a que atualmente está em curso), inviabilizaria tal possibilidade, uma vez que para além da multiplicação excessiva de mecanismos de consulta (no limite, poderíamos admitir a realização de 4259 referendos locais e outros tantos processos consultivos e deliberativos), haverá que considerar a concentração deste mecanismo num período idêntico de tempo.

13 Do projeto assume-se que é quando tem que haver parecer favorável por parte das autarquias locais afetadas.
Assim, sempre que se iniciam processos legislativos de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, estas são afetadas e, nestes termos, está verificada a obrigatoriedade do referendo. Por outras palavras não há como escapar à realização de referendos locais.

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n.º 17/2003, de 4 de junho, e procede à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto.
2 — Esta iniciativa visa estabelecer mecanismos de participação das populações das autarquias locais na tramitação das iniciativas legislativas que tenham por objeto a criação, extinção, fusão ou modificação territorial das autarquias locais. Nesse sentido, o BE propõe, nomeadamente, a sujeição dessas iniciativas a discussão pública; a atribuição de carácter vinculativo aos pareceres dos órgãos das autarquias locais afetadas por essas iniciativas legislativas; a obrigatoriedade de realização de referendo local nos casos em que tem de haver parecer favorável por parte das autarquias locais afetadas; e a possibilidade de os cidadãos apresentarem iniciativa legislativa em matéria de criação, extinção, fusão ou modificação territorial das autarquias locais, com um número de assinaturas inferior ao atual mínimo legal (35 000).

Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer:

a) Que o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª), do BE, reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário; b) Que deve ser dado conhecimento do presente parecer à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, a comissão competente para a apreciação do referido projeto de lei.

Parte IV – Anexos

Nada a anexar, atendendo a que a nota técnica, elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, será anexa ao parecer da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, que é a comissão competente para a apreciação do projeto de lei n.º 163/XII (1.ª), do BE.

Palácio de São Bento, 21 de fevereiro de 2012 O Deputado Relator, Manuel Meirinho – O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.

Nota: — As Partes I e III foram aprovadas por unanimidade, tendo-se verificado a ausência de Os Verdes.

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Parecer da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local

Parecer

Índice

Parte I — Considerandos Parte II — Opinião do Deputado autor do parecer Parte III — Conclusões Parte IV — Anexos

Parte I — Considerandos

1 — Introdução: O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) (Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais).
Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto no artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República em vigor à data, reunindo os requisitos formais previstos nos artigos 123.º e 124.º desse mesmo Regimento.
O projeto de lei em causa foi admitido em 8 de fevereiro de 2012 e baixou, por determinação de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, sendo a primeira a comissão competente para apreciação e emissão do respetivo parecer.
Por ofício n.º 169/CAOTPL, de 15 de fevereiro de 2012, o Presidente da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local solicitou a S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República a reapreciação do despacho que determinou competente a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, no sentido de ser atribuída à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local a competência para a elaboração e aprovação do respetivo parecer, atendendo às competências específicas desta Comissão aprovadas, em 28 de julho de 2011, em Conferência de Presidentes das Comissões Parlamentares, bem como à manifesta conexão direta com a proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) em apreciação nesta Comissão.
Nessa sequência, a Presidente da Assembleia da República decidiu, em 16 de fevereiro de 2012, proceder à redistribuição conforme solicitado, passando, assim, a Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local a ser a comissão competente.
A discussão na generalidade do projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) já se encontra agendada, em conjunto com a proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica —, para o próximo dia 1 de março de 2012.

2 — Objeto, conteúdo e motivação: O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda visa com este projeto de lei definir o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais.
Os Deputados proponentes consideram que as «divisões administrativas são, por força das dinâmicas económicas e demográficas, mutáveis. No entanto, há que ter consciência da forte e arreigada identidade local de muitas freguesias e municípios do nosso país, com consequências ao nível da própria representação política enquanto comunidade. Por isso, a lei que enquadra as dinâmicas da divisão administrativa das autarquias locais deve garantir uma adequada participação e adesão das populações».
A iniciativa agora apresentada salienta que «(») Portugal ç um dos países da União Europeia com maior dimensão média dos municípios e, quanto a uma eventual classificação do número de freguesias como elevado, há que lembrar que as mesmas, apesar de ainda disporem de poucas competências e apenas cerca

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de 0,1% da despesa inscrita no Orçamento de Estado, têm uma área média idêntica à média dos municípios de vários Estados-membros da União Europeia».
O projeto de lei ora analisado destaca quatro mecanismos para o fortalecimento do poder de decisão das populações:

— «Alargamento da possibilidade de recurso à iniciativa legislativa popular para a criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais, flexibilizando-se e adequando-se o número de proponentes à escala necessariamente local destas iniciativas; — Promoção da discussão pública das iniciativas legislativas relativas à criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais; — Ampliação do carácter vinculativo do parecer dos órgãos das autarquias locais afetadas por iniciativas legislativas relativas à criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais e, assim, haverá pareceres vinculativos e não vinculativos, consoante o grau de interesse direto da autarquia local consultada; — Obrigatoriedade de realização de referendo local, no que se refere a iniciativas legislativas relativas à criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais, quando o parecer da autarquia local tenha carácter vinculativo».

Nesse sentido, a iniciativa sub judice propõe o seguinte:

Sujeição a discussão pública das iniciativas relativas à criação, extinção, fusão e modificação territorial das autarquias locais (cfr. artigo 2.º), nos seguintes termos:

— Discussão pública por um período de 60 dias; — Para o efeito, as iniciativas são publicadas na II Série do Diário da República ou no jornal oficial da região autónoma, são publicados avisos dessa discussão pública em dois jornais de circulação nacional e nos dois jornais locais de maior circulação no território objeto da iniciativa e as iniciativas ficam disponíveis para consulta pública em sítio eletrónico, bem como nas sedes das autarquias locais afetadas; — Findo o período de discussão pública, a comissão competente elaborará um relatório contendo o resultado dessa discussão.

Dever de o órgão com competência legislativa1 ouvir, obrigatoriamente, os órgãos das autarquias locais afetados pela iniciativa legislativa de criação, extinção, fusão ou modificação territorial de autarquias locais2 (cfr. artigo 3.º, n.º 1), sendo que: O direito de audição é exercido após a discussão pública3 e, previamente à votação na generalidade, no órgão com competência legislativa, da iniciativa legislativa (cfr. artigo 3.º, n.º 2); O órgão com competência legislativa remeterá o relatório da discussão pública4 (cfr. artigo 3.º, n.º 3); O direito de audição das autarquias exerce-se pela emissão de parecer pelos respetivos órgãos (cfr. artigo 3.º, n.º 4); 1 A nota técnica repara que «nos n.os 3 e 5 do artigo 3.º deste projeto de lei faz-se referência ao «órgão com competência legislativa»; porém, está em causa matéria da competência exclusiva [alínea n) do artigo 164.º da Constituição] e não delegável da Assembleia da República (n.º 2 do artigo 11.º da Constituição)». Sucede, todavia, que é necessário ter em atenção que a alínea n) do artigo 164º da CRP, apesar de incluir na reserva absoluta de competência legislativa da AR, a criação, modificação e extinção de autarquias locais, a verdade é que fá-lo “sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas”. E o certo ç que o artigo 227º, n.º 1 alínea l), da CRP inclui nos poderes das regiões autónomas, a definir nos respetivos estatutos, o poder de “criar e extinguir autarquias locais, bem como modificar a respetiva área, nos termos da lei”, poder esse que ç concretizado nos Estatutos Político-Administrativos, quer da Região Autónoma da Madeira [cfr. artigo 37º, n.º 1 alínea g)], quer da Região Autónoma dos Açores [cfr. artigo 49º, n.º 2 alínea e)], integrando-se na competência legislativa da respetiva Assembleia Legislativa. Daí que se compreenda que o BE utilize a expressão “órgão com competência legislativa”, pois, dessa forma, pretende abarcar, quer a Assembleia da Repõblica, quer as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas.
2 Recorde-se que, nos termos do artigo 141º do Regimento da AR, apenas está prevista a audição da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) “sempre que se trate de projetos ou propostas de lei respeitantes às autarquias locais ou outras iniciativas que o justifiquem”.
3 Ou seja, o BE permite que as autarquias locais afetadas pela iniciativa legislativa se possam pronunciar duplamente: primeiro na discussão pública e depois, obrigatoriamente, através do exercício do direito de audição.
4 O n.º 3 do artigo 3.º fala no «relatório elaborado nos termos do artigo n.º 2, bem como o relatório da discussão pública». Cremos que este normativo só pode quer reportar-se ao relatório elaborado nos termos do artigo 2.º, n.º 4, mas neste caso, não faz sentido, por redundante, a sua parte final, uma vez que aquele corresponde precisamente ao relatório da discussão pública.

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Tal parecer deverá ser remetido ao órgão com competência legislativa no prazo de 60 dias5 contados da solicitação do mesmo, prazo esse que se suspende com a proposta de realização de referendo local ou verificada a obrigatoriedade da sua realização (cfr. artigo 3.º, n.os 5 e 6); O referendo local incide obrigatoriamente sobre o parecer relativamente à criação, extinção, fusão ou modificação territorial das autarquias locais, podendo ainda conter duas perguntas adicionais sobre a designação da nova autarquia local e designação da respetiva sede (cfr. artigo 3.º, n.º 7); As iniciativas legislativas sobre a criação, extinção, fusão ou modificação territorial das autarquias locais passam a depender da emissão de pareceres favoráveis, vinculativos, por parte dos órgãos deliberativos das autarquias locais afetadas (cfr. artigo 4.º, n.º 1), sendo que:

A aprovação desses pareceres carece de maioria absoluta do número de membros em efetividade de funções nos respetivos órgãos (cfr. artigo 4.º, n.º 2); A emissão desses pareceres depende da realização prévia de referendo local (cfr. artigo 4.º, n.º 3). Ou seja, impõe-se a obrigatoriedade de realização de referendo local nos casos em que tem de haver parecer favorável por parte das autarquias locais afetadas.

A revogação da alínea d) do artigo 3.º da Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, que exclui do objeto da iniciativa legislativa de cidadãos as matçrias «(») do artigo 164.º da Constituição, com exceção da alínea i)«, isto ç, das matérias que se integram na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, com exceção das bases do sistema de ensino. Trata-se de uma alteração que alarga de sobremaneira a possibilidade de recurso à iniciativa legislativa popular, embora o desígnio dos proponentes, como consta da exposição de motivos, fosse apenas o de permitir aos cidadãos a apresentação de iniciativas legislativas em matéria de criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais.
O aditamento de um novo artigo 6.º-A à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho (Iniciativa legislativa de cidadãos), contendo regras mais flexíveis sobre o número de assinaturas necessário para a apresentação de iniciativas legislativas em matéria de criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais. Recorde-se que o artigo 6.º desta lei exige um mínimo de 35 000 assinaturas e o novo artigo 6.º-A permite que, em matéria de criação, extinção e fusão de autarquias, a iniciativa possa ser subscrita pelo menor dos seguintes limites:

— Um décimo dos cidadãos eleitores inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas pela iniciativa legislativa de cidadãos; — 15 000 cidadãos inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas por iniciativa legislativa de cidadãos que crie, extinga ou procede à fusão de região administrativa ou área metropolitana; — 7500 cidadãos inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas por iniciativa legislativa de cidadãos que crie, extinga ou procede à fusão de município; — 1500 cidadãos inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas por iniciativa legislativa de cidadãos que crie, extinga ou procede à fusão de freguesia.

E que, em matéria de modificação territorial de autarquias locais, quando a mesma seja subscrita pelo menor dos seguintes limites:

— Um quinto dos cidadãos eleitores residentes na área que constitui objeto de modificação territorial; — 1500 cidadãos eleitores inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias afetadas pela iniciativa legislativa de cidadãos, quando se trate de modificação territorial de freguesias6.
5 Portanto, são 60 dias de discussão pública + 60 dias para a emissão de parecer pelos órgãos das autarquias locais, o que dá quatro meses de processo legislativo exclusivamente para cumprir estas duas novas prerrogativas propostas pelo BE. Isto sem contar que com a suspensão do prazo para a emissão do parecer por força da obrigatoriedade de realização de referendo local nos casos em que tem de haver parecer favorável por parte das autarquias afetadas (cfr. artigos 3.º, n.os 6 e 7, e 4.º, n.º 3).
6 Todavia, a alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º-A, que reproduz ipis verbis a alínea d) do n.º 1 desse artigo 6.º-A, refere: «Mil e quinhentos eleitores inscritos no recenseamento eleitoral das autarquias existentes e que sejam afetadas territorialmente pela iniciativa legislativa de cidadãos, quando se trate de criação, extinção ou fusão de freguesias». Obviamente que só pode ser uma gralha, já que o n.º 2 desse artigo se refere às situações de modificação territorial de autarquias locais. Daí que o disposto na referida alínea b) só possa reportar-se à modificação territorial de freguesias.

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A alteração do artigo 3.º7 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto, de modo a aditar os novos n.os 2 e 3, passando a permitir-se que a emissão de pareceres, por órgãos de autarquias locais, relativamente à criação, extinção, fusão e modificação dos limites territoriais das autarquias locais, no âmbito de procedimentos legislativos, possa ser objeto de referendo local8 e que a lei pode estabelecer a obrigatoriedade de realização de referendo local quanto à referidas matérias.
A revogação do artigo 5.º da Lei n.º 142/85, de 18 de novembro (Lei-Quadro da Criação de Municípios), segundo o qual:

«Artigo 5.º Consultas prévias

1 — O projeto ou proposta de lei de criação de novo município deverá obter parecer favorável das assembleias das freguesias a integrar no novo município.
2 — Os municípios em que se integrem as freguesias referidas no número anterior serão ouvidos nos termos da alínea d) do artigo 3.º da Lei n.º 11/82, de 2 de junho.
3 — Para efeito de observância do disposto nos números anteriores, a Assembleia da República ou o Governo, conforme o caso, ouvirão os órgãos das autarquias interessadas, que se pronunciarão no prazo de 60 dias.
4 — As deliberações a que respeitam as consultas de que trata este artigo são tomadas pela maioria absoluta do número de membros em efetividade de funções nos respetivos órgãos.»

A revogação do n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 8/93, de 5 de março (Regime jurídico da criação de freguesias), segundo o qual:

«3 — Verificada a existência de todos os elementos necessários à instrução do processo, a Assembleia da República solicitará aos órgãos do poder local os respetivos pareceres, os quais deverão ser emitidos no prazo de 60 dias».

3 — Iniciativas pendentes sobre a mesma matéria: Da pesquisa efetuada à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) verificouse que, neste momento, estão pendentes as seguintes iniciativas versando sobre idêntica matéria:

— Proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica; — Projeto de lei n.º 120/XII (1.ª), do PSD e PS — Reorganização administrativa de Lisboa; — Projeto de lei 164/XII (1.ª), do CDS-PP — Reorganização administrativa de Lisboa; — Petição n.º 55/XII (1.ª) — Não à redução de autarquias e de trabalhadores; — Petição n.º 64/XII (1.ª) — Solicitam a tomada de medidas necessárias e legais para que não se extingam freguesias; — Petição n.º 69/XII (1.ª) — Petição contra os critérios do Eixo 2 do Documento Verde.

4 — Consultas obrigatórias: Foram já solicitados pareceres aos governos e assembleias legislativas das regiões autónomas, pelo Gabinete de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, nos termos do artigo 142.º do Regimento da Assembleia da República e para os efeitos do n.º 2 do artigo 229.º da Constituição, solicitando o envio dos respetivos pareceres no prazo de 15 dias, nos termos da Lei n.º 40/96, de 31 de agosto. 7 No corpo do artigo 6.º do projeto de lei, que procede à alteração da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto,, lê-se: «O artigo 24.º (») passa a ter a seguinte redação: « mas o objeto efetivo da alteração é o «artigo 4.º». Todavia, o artigo 4.º da referida lei não tem como epígrafe «Matérias do referendo local» – essa é a epígrafe do artigo 3.º. Daí que se presuma que o artigo que o BE pretende realmente alterar só possa reportar-se ao artigo 3.º daquela lei. Este reparo também consta da nota técnica dos serviços, que se acompanha.
8 Paradoxalmente, o BE não altera o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei Orgânica n.º 4/2002, de 24 de agosto, que exclui expressamente do âmbito do referendo local «as matérias integradas na esfera de competência legislativa reservada aos órgãos de soberania», sendo certo que a criação, extinção e modificação das autarquias locais é matéria da reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República, nos termos da alínea n) do artigo 164.º da Constituição da República Portuguesa.

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Nos termos do artigo 141.º do Regimento da Assembleia da República, em coincidência com o previsto nos n.os 1, alínea a), e 3 do artigo 4.º da Lei n.º 54/98, de 18 de agosto (Associações representativas dos municípios e das freguesias), deverão ser consultadas a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE).

Parte II — Opinião do Deputado autor do parecer

O signatário do presente parecer, nesta sede e sem prejuízo de outras questões políticas que esta iniciativa legislativa possa levantar, não pode deixar de alertar para o facto de o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª), do BE, suscitar sérias reservas de constitucionalidade, uma vez que impõe uma restrição intolerável ao exercício da competência legislativa da Assembleia da República em matéria da sua reserva absoluta.
É que o artigo 4.º, n.º 1, do projeto de lei estabelece a dependência das iniciativas legislativas sobre a extinção, fusão ou modificação de autarquias da obtenção de pareceres vinculativos favoráveis dos órgãos deliberativos das autarquias envolvidas.
Tal significa, portanto, que se os pareceres emitidos pelas assembleias municipais ou pelas assembleias de freguesia afetadas pela iniciativa forem em sentido negativo, estará a Assembleia da República impedida de legislar sobre uma matéria que é da sua reserva exclusiva da competência, o que é constitucionalmente inaceitável.
Recorde-se que, nos termos do artigo 164.º, alínea n), «É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias:

«(») n) Criação, extinção e modificação de autarquias locais e respetivo regime, sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas.»

A redação em vigor foi fixada pela revisão constitucional de 1997, que colocou «(») sob reserva absoluta não só o regime, como dubitativamente até ao momento poderia ser interpretado, mas, também, a própria criação em concreto de cada autarquia local9». Isto naturalmente «sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas», uma vez que, nos termos do artigo 227.º, n.º 1 alínea l), as regiões autónomas têm o poder de criar e extinguir autarquias locais, bem como modificar a respetiva área, nos termos da lei.
Ora, estando em causa uma matéria do domínio absolutamente reservado da competência legislativa da Assembleia da República, em que só este órgão de soberania pode legislar, «sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas», não se vislumbra que possa uma lei impor quaisquer restrições e condicionalismos ao exercício dessa competência constitucional.
Como referem os Professores Gomes Canotilho e Vital Moreira, «É inequívoco o sentido e alcance da reserva absoluta de lei parlamentar. Ela significa, sobretudo: (») (c) que todas e cada uma das normas são formalmente produto da vontade da assembleia representativa10».
Daqui decorre, a nosso ver, que não podem órgãos das autarquias locais ditar, por intermédio de parecer vinculativo, a vontade da Assembleia da República, definindo se esta pode ou não legislar sobre a extinção, fusão ou modificação das autarquias locais.
Trata-se, em nosso entender, de uma limitação constitucionalmente inadmissível.
Refira-se que esta questão também é, de certa forma, abordada na nota técnica dos serviços, onde se pode ler:

«No artigo 4.º deste projeto de lei os autores parecem pretender condicionar as iniciativas legislativas em matéria de criação, fusão, extinção ou modificação de autarquias locais, a pareceres vinculativos favoráveis (prévios?) de órgãos locais, o que, numa matéria que a Constituição configurou como sendo da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, merece ponderação pela comissão. A criação e extinção de autarquias locais, designadamente de freguesias, obedece a um regime quadro previsto 9 Constituição da República Portuguesa, 4.ª revisão, Setembro 97, prefácio e anotações por Jorge Lacão, Texto Editora, p. 122.
10 Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume II, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, p. 309.

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nas Leis n.os 11/82, de 2 de junho, 8/93, de 5 de março, e 51-A/93, de 9 de julho. De facto, na apreciação das iniciativas legislativas que visem a criação de freguesias, a Assembleia da República deve ter em conta «a vontade das populações abrangidas, expressa através de parecer dos órgãos autárquicos representativos», em conformidade com o previsto na alínea a) do artigo 3.º da Lei n.º 8/93, de 5 de março, mas tal «parecer» configura uma competência meramente «consultiva11» dos órgãos de poder local. Esses pareceres são obrigatórios no sentido em que têm que ser solicitados mas não são vinculativos para a Assembleia da República. Já na alteração promovida à Lei n.º 4/2000, de 24 de agosto, por esta mesma iniciativa, prevê-se, por outro lado, que «a emissão» destes pareceres pode ser objeto de referendo local que a lei pode estabelecer também como «obrigatório».

Parte III — Conclusões

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentou à Assembleia da República o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) que visa definir o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais.
A Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local é do parecer que o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª), apresentado pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais para ser agendado para apreciação pelo Plenário da Assembleia da República, reservando os grupos parlamentares as suas posições e decorrente sentido de voto para o debate.

Parte IV — Anexo

Nota técnica elaborada ao abrigo do disposto do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 22 de fevereiro de 2012 O Deputado Relator, Bruno Vitorino — O Presidente da Comissão, Ramos Preto.

Nota: — Os considerandos e as conclusões foram aprovados poer unanimidade, tendo-se registado a ausência de Os Verdes. 11 Designadamente Acórdãos do TC n.º 238/91 de 29/05/91 e 242/91, de 12/06.

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Nota Técnica

Projeto de lei n.º 163/XII (1.ª), do BE Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, procede à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho, e procede à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto Data de admissão: 8 de fevereiro de 2012 Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local (11.ª Comissão)

Índice

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria V — Consultas e contributos VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

Elaborada por: Fernando Vasco (DAC) — Ana Paula Bernardo (DAPLEN) — Maria Ribeiro Leitão e Lisete Gravito (DILP) — José Luis Tomé (BIB).
Data:20 de fevereiro de 2012

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa

O projeto de lei em apreço, subscrito por Deputados do Grupo Parlamentar do BE, visa legislar em prol do «fortalecimento do poder de decisão das populações», através dos seguintes mecanismos:

«1 — Alargamento da possibilidade de recurso à iniciativa legislativa popular para a criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais, flexibilizando-se e adequando-se o número de proponentes à escala necessariamente local destas iniciativas; 2 — Promoção da discussão pública das iniciativas legislativas relativas à criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais; 3 — Ampliação do carácter vinculativo do parecer dos órgãos das autarquias locais afetadas por iniciativas legislativas relativas à criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais e, assim, haverá pareceres vinculativos e não vinculativos, consoante o grau de interesse direto da autarquia local consultada; 4 — Obrigatoriedade de realização de referendo local no que se refere a iniciativas legislativas relativas à criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais, quando o parecer da autarquia local tenha carácter vinculativo.»

Segundo os proponentes, com a aprovação desta lei consagrar-se-á «o máximo de respeito pelos interesses e identidades coletivas das populações, sem impedir os necessários ajustamentos à divisão administrativa das autarquias locais».

Consultar Diário Original

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II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário

Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais: Esta iniciativa legislativa é apresentada por oito Deputados do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, nos termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição, e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º e do artigo 118.º do Regimento. Toma a forma de projeto de lei, nos termos do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento, mostra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo assim os requisitos formais dos projetos de lei previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento. Não infringe a Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa, respeitando assim, também, os limites que condicionam a admissão das iniciativas previstos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento.
Legislar sobre o regime dos referendos, bem como sobre a criação, extinção e modificação de autarquias locais e respetivo regime, é competência exclusiva da Assembleia da República, nos termos das alíneas b) e n) do artigo 164.º da Constituição. Refira-se ainda que «fora do artigo 164.º, matérias de reserva absoluta da Assembleia da República, pela natureza das coisas, são ainda (») a iniciativa legislativa de cidadãos1».
«A inclusão de qualquer matéria na reserva de competência da Assembleia da República, absoluta ou relativa, é in totum. Tudo quanto lhe pertença tem de ser objeto de lei da Assembleia da República.
A reserva de competência é tanto para a feitura de normas legislativas como para a sua entrada em vigor, interpretação, modificação, suspensão ou revogação.2».
As matérias incluídas nas alíneas b) e n) do artigo 164.º da Constituição são também obrigatoriamente votadas na especialidade pelo Plenário, nos termos do n.º 4 do artigo 168.º da Constituição., Nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 166.º e da alínea b) do artigo 164.º da Constituição, as leis produzidas no âmbito do regime dos referendos, incluindo quaisquer modificações a esse regime, devem ainda revestir a forma de lei orgânica.
Este projeto de lei deu entrada em 6 de fevereiro de 2012, foi admitido e anunciado em 8 de fevereiro de 2012 e baixou na generalidade à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª Comissão) e à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local (11.ª Comissão), tendo inicialmente ficado a 1.ª Comissão a comissão competente. Em 14 de Fevereiro de 2012 a 11.ª Comissão solicitou à Presidente da Assembleia a reapreciação do despacho que determinou competente a 1.ª Comissão nesta iniciativa, no sentido de lhe ser atribuída a competência para a elaboração e aprovação do respetivo parecer. Passou assim a ser competente a 11.ª Comissão.
Em caso de aprovação, e para efeitos de especialidade em comissão, parece relevante salientar ainda o seguinte:

— No artigo 4.º deste projeto de lei os autores parecem pretender condicionar as iniciativas legislativas em matéria de criação, fusão, extinção ou modificação de autarquias locais a pareceres vinculativos favoráveis (prévios?) de órgãos locais, o que, numa matéria que a Constituição configurou como sendo da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, merece ponderação pela comissão. A criação e extinção de autarquias locais, designadamente de freguesias, obedece a um regime quadro previsto nas Leis n.os 11/82, de 2 de junho, 8/93, de 5 de março, e 51-A/93, de 9 de julho. De facto, na apreciação das iniciativas legislativas que visem a criação de freguesias, a Assembleia da 1 Constituição da República Portuguesa Anotada, de Jorge Miranda e Rui Medeiros, Tomo II, pag.s 521 e 522.
2 Constituição da República Portuguesa Anotada de Jorge Miranda e Rui Medeiros, Tomo II, pag. 518.

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República deve ter em conta «a vontade das populações abrangidas, expressa através de parecer dos órgãos autárquicos representativos», em conformidade com o previsto na alínea a) do artigo 3.º da Lei n.º 8/93, de 5 de março, mas tal «parecer» configura uma competência meramente «consultiva3» dos órgãos de poder local. Esses pareceres são obrigatórios no sentido em que têm que ser solicitados mas não são vinculativos para a Assembleia da República. Já na alteração promovida à Lei n.º 4/2000, de 24 de agosto, por esta mesma iniciativa, prevê-se, por outro lado, que «a emissão» destes pareceres pode ser objeto de referendo local que a lei pode estabelecer também como «obrigatório».
— Nos n.os 3 e 5 do artigo 3.º deste projeto de lei faz-se referência ao «órgão com competência legislativa»; porém, está em causa matéria da competência exclusiva [alínea n) do artigo 164.º da Constituição] e não delegável da Assembleia da República (n.º 2 do artigo 11.º da Constituição); — No artigo 6.º deste projeto de lei (Alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto) os autores referem: «O artigo 24.º (») passa a ter a seguinte redação:». Porém, apresentam efetivamente uma alteração ao artigo 4.º da referida lei orgânica. Para além deste lapso, parece-nos que existe um outro, mais relevante: o artigo 4.º da Lei Orgânica n.º 4/2004, de 24 de agosto, tem como epígrafe «Matérias excluídas do referendo local», sendo o artigo 3.º que tem como epígrafe «Matérias do referendo local». A proposta apresentada, tendo em conta o respetivo teor, não se enquadra adequadamente no âmbito do artigo 4.º, mas antes no do artigo 3.º, pelo que, em caso de aprovação, a correção deve ser promovida. Por outro lado, refira-se ainda que, do ponto de vista da redação legislativa, é desnecessário repetir a epígrafe deste artigo 3.º da Lei Orgânica n.º 4/2004, de 24 de agosto, se a mesma não for sujeita a qualquer modificação, tal como desnecessário é também repetir a epígrafe do artigo 3.º da Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, na alteração que lhe é promovida por esta iniciativa.

Verificação do cumprimento da lei formulário: A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto, adiante designada como lei formulário, prevê um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas que são relevantes em caso de aprovação das iniciativas legislativas e que importa ter presentes no decurso da especialidade em comissão e, em especial, no momento da redação final.
O projeto de lei em causa tem um título que traduz o seu objeto, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da referida lei formulário.
Pretende alterar a Lei Orgânica 4/2000, de 24 de agosto, que aprova o regime jurídico do referendo local, e a Lei n.º 17/2003, de 4 de junho (Iniciativa legislativa de cidadãos), mas também promove alterações, sob a forma de revogações, à Lei n.º 8/93, de 5 de março, regime jurídico de criação de freguesias, e à Lei n.º 142/85, de 18 de novembro (Lei-Quadro da Criação de Municípios). Ora, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º da referida lei formulário, «os diplomas que alterem outros devem indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas». Através da Base Digesto (Presidência do Conselho de Ministros) verificou-se que estes diplomas sofreram até à data as seguintes modificações:

— Na Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto, foram alterados os artigos 102.º, 118.º, 119.º e 120.º e aditados os artigos 120.º-A e 120.º-B pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de dezembro, e alterados os artigos 67.º, 75.º, 78.º, 93.º, 94.º, 95.º, 112.º e 135.º pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro; 3 Designadamente Acórdãos do TC n.º 238/91 de 29/05/91 e 242/91, de 12/06.

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— Na Lei n.º 8/93, de 5 de março, foi alterado o n.º 1 do artigo 11.º pela Lei n.º 51-A/93, de 9 de julho; — Na Lei n.º 142/85, de 18 de novembro, foi revogado o n.º 4 do artigo 14.º, pela Lei n.º 124/97, de 27 de novembro, foi alterada a alínea b) do n.º 4 do artigo 4.º e o n.º 1 do artigo 11.º pela Lei n.º 32/98, de 18 de julho; e foram revogados os n.os 1, 2 e 3 do artigo 10.º e os n.os 1 e 2 do artigo 13.º pela Lei n.º 48/99, de 16 de junho.

A Lei n.º 17/2003, de 4 de junho não sofreu quaisquer alterações.
Assim, em caso de aprovação da presente iniciativa, constituirá a mesma a primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, a terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto, a segunda alteração à Lei n.º 8/93, de 5 de março, e a quarta alteração à Lei n.º 142/85, de 18 de novembro, o que deverá constar do título, conforme se propõe:

«Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, procedendo à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto, à segunda alteração à Lei n.º 8/93, de 5 de março, e à quarta alteração à Lei n.º 142/85, de 18 de novembro.»

Em conformidade com o previsto nas alínea a) e b) do n.º 3 do artigo 6.º da lei formulário, deve ainda proceder-se à republicação integral dos diplomas que revistam forma de lei sempre que existam mais de três alterações ao ato legislativo em vigor — salvo se se tratar de Códigos — ou, que somem alterações que abranjam mais de 20% do articulado do ato legislativo em vigor, atenta a sua versão originária ou a última versão republicada. Tendo em conta a reduzida dimensão das alterações propostas por esta iniciativa e o número de alterações sofridas pelos diplomas em causa, a republicação — que não é promovida pelos autores — poderia entender-se como desnecessária. Porém, prevê o n.º 2 do mesmo artigo 6.º que «Sempre que sejam introduzidas alterações, independentemente da sua natureza ou extensão (») a leis orgànicas (») deve proceder-se à republicação integral dos correspondentes diplomas legislativos, em anexo às referidas alterações», termos em que caberá a Comissão decidir sobre a republicação da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto.
A entrada em vigor da iniciativa, em caso de aprovação, «30 dias após a sua publicação», está em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no próprio dia da publicação».
Na presente fase do processo legislativo a iniciativa em apreço não nos parece suscitar quaisquer outras questões em face da lei formulário.

III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes

Enquadramento legal nacional e antecedentes: A presente iniciativa visa estabelecer mecanismos de participação das populações e dos órgãos das autarquias locais na tramitação das iniciativas legislativas que tenham por objeto a criação, extinção, fusão ou modificação territorial de autarquias locais.
Assim sendo, importa, de forma breve, proceder à análise da organização administrativa de Portugal, dos principais artigos da Constituição, da legislação sobre autarquias locais e de outros documentos conexos com esta matéria.

Organização administrativa de Portugal — algumas notas:

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Segundo os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, a autonomia administrativa local não começou com a Constituição de 1976. Vem desde os primórdios do Estado português. Os concelhos ou municípios sempre foram instituições presentes em todas as fases da história do nosso direito público, embora com conteúdos e formas variáveis conforme as épocas e os sucessivos regimes políticos.
A própria monarquia absoluta condescendeu com a teia vasta de autoridades municipais, muitas vezes eletivas; e sabe-se a importância que os municípios tiveram também na formação do Brasil.
Pelo contrário, o primeiro liberalismo — não tanto por influência jacobina quanto pela necessidade de reformar ou recriar as estruturas sociopolíticas e socioeconómicas do país — fez deles tábua rasa e ergueu, desde a base, um novo sistema, com alcance mais ou menos centralizador. Os decretos de Mouzinho da Silveira de 1832, os de Passos Manuel de 1836, e os subsequentes Códigos Administrativos exibem essa tendência, com oscilações.
Um novo mapa administrativo do País resultou da extinção de centenas de concelhos; e, até certo ponto para compensar as populações, instituíram-se entidades inframunicipais, as freguesias. Entretanto, esboçaram-se entidades supramunicipais, os distritos ou as províncias4.
Cumpre, assim, destacar as reformas de 1832, 1836 e 1867, que foram sendo introduzidas ao mapa administrativo de Portugal.
A primeira reforma, da autoria de Mouzinho da Silveira, veio a ocorrer com a publicação do Decreto n.º 23, de 16 de maio de 1832. Dispunha o artigo 1.º que os Reinos de Portugal e Algarves e ilhas adjacentes são divididos em províncias, comarcas e concelhos. Muitos concelhos formam a comarca, muitas comarcas a província, ficando abolidas todas as outras divisões territoriais de qualquer natureza e denominação.
Como referem os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, em 1836 nasceu um novo mapa administrativo de Portugal. A Portaria de 29 de setembro de 1836 desencadeou este processo ao nomear uma comissão cuja missão era a de proceder à elaboração de um projeto para a divisão administrativa do território do reino. Na sequência da referida portaria, o Decreto de 6 de novembro de 1836 determinou, no artigo 1.º, que «o território continental do Reino de Portugal e Algarves fica dividido nos 17 distritos administrativos atualmente existentes, compostos de 351 concelhos, designados nos mapas respetivos que fazem parte do presente decreto». Assim sendo, mantém-se o número de distritos mas reduz-se o número de concelhos de 821 para 351. Nesse mesmo ano, em 31 de dezembro, publica-se o primeiro Código Administrativo, que reúne as últimas alterações relativas à administração e divisão do território.
Posteriormente foi publicada a Lei da Administração Civil, também conhecida como Lei Martens Ferrão, que corresponde ao novo Código Administrativo, aprovado pela Lei de 26 de junho de 1867. Este diploma dispunha no seu artigo 1.º que «o Reino de Portugal se divide para os efeitos administrativos em distritos, os distritos em concelhos e os concelhos em paróquias civis. Cada paróquia civil constitui uma unidade para a divisão administrativa. De grupos de paróquias formam-se os concelhos, assim como de grupos de concelhos se formam os distritos. O número de distritos é fixado em 11». Na sequência desta lei é aprovado o Decreto de 10 de dezembro de 1867 em que se estipula que os concelhos são 159 e as paróquias 1026.
A Constituição de 1933 foi a primeira a consagrar a existência das freguesias, mas apenas impondo-as no Continente e não nos Açores e na Madeira e declarando-as parcelas dos concelhos (artigo 124.º, segundo o qual o território do Continente se dividia em concelhos, que se formavam de freguesias)5. 4 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, págs. 443 e 444 5 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 449

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A freguesia teve origem eclesiástica. A sua génese pode ser encontrada na paróquia, caracterizando-se por ser formada por um grupo de vizinhos que professavam a mesma religião.
A Constituição de 1976 prevê-as em todo o território nacional e autonomiza-as frente aos municípios. Nem estes se reduzem a agregados de freguesias, nem as freguesias se reduzem a elementos integrantes dos municípios, sujeitos a quaisquer poderes por parte destes6.
Já relativamente ao município ou concelho, importa referir que, segundo os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, «esta é a autarquia local mais importante e, pelas suas atribuições, poderá ser comparada às coletividades de base existentes noutros países europeus».
A sua dimensão territorial (resultado, em grande parte, da reforma ocorrida em 1836 que dividiu o país em cerca de 400 municípios) permite-lhe, com relativa eficácia, ir ao encontro das populações. Durante o século XIX o seu número foi ainda diminuindo e no século XX estabilizou-se em pouco mais de 300, sendo atualmente de 308.
O município dispõe também de um conjunto de atribuições e competências, assim como de meios técnicos e financeiros muito mais amplos do que os das freguesias, em domínios como os solos, as construções privadas, os arruamentos, o ambiente, os transportes urbanos, a educação, a cultura, o saneamento básico, entre outros.
O município português é, em média, maior que os dos países da Europa que nos estão próximos, aproximando-se mais da realidade existente em alguns países nórdicos e, em certa medida, na Inglaterra (que, por sua vez, também reduziu o número de entes locais após 1974).
A semelhança com a Inglaterra e o País de Gales verifica-se em dois planos: a existência de uma autarquia local de nível vicinal e uma autarquia local mais ampla e com mais poderes a nível imediatamente superior7».
Atualmente existem 4259 freguesias, distribuídas por 308 municípios. Destes últimos, 278 situam-se no Continente, 19 na Região Autónoma dos Açores e 11 na Região Autónoma da Madeira.
Sobre esta matéria importa citar, por fim, a info-folha A Divisão Administrativa em Portugal, da autoria de Leonor Calvão Borges, onde a autora procura identificar todas as formas utilizadas de divisão administrativa em Portugal, apresentar os seus objetivos e propostas de alteração, bem como a evolução dos cargos (funções e designação) administrativos. Elabora, ainda, um pequeno historial das iniciativas apresentadas e discutidas na instituição parlamentar, quer tenham sido aprovadas ou rejeitadas, apresentando, no final, (») alguns números relativos às várias formas de divisão administrativa e correspondentes mapas, para melhor perceção do problema.

Constituição da República Portuguesa — autarquias locais: A Constituição da República Portuguesa (CRP), no artigo 6.º, determina que o Estado é unitário e respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular e os princípios da subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da Administração Pública.
Segundo os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, a locução «autonomia das autarquias locais» é, literalmente, pleonástica (porque autarquias locais pressupõem autonomia). O seu alcance útil consiste na atribuição às autarquias locais de um acervo de 6 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 449 7 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, págs. 517 e 518.

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poderes próprios (inclusive poderes normativos) a exercer de harmonia com opções por eles livremente feitas no respeito do princípio democrático8.
No mesmo sentido, os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira defendem que o princípio da autonomia local — a expressão «autonomia das autarquias locais» é pleonástica — significa, designadamente, que as autarquias locais são formas de administração autónoma territorial, de descentralização territorial do Estado, dotadas de órgãos próprios, de atribuições específicas correspondentes a interesses próprios e não meras formas de administração indireta ou mediata do Estado, o que não exclui, em certos termos, a tutela estadual (cfr. artigo 242.º)9.
A organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais, de acordo com o estabelecido no n.º 1 do artigo 235.º da Constituição da República Portuguesa, acrescentando o n.º 2 que as autarquias locais são pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas.
Em nota a este artigo, os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira escrevem que no n.º 1 estabelece-se que a «organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais». Este enunciado linguístico aponta para dimensões importantes da constitucionalização do poder local: (1) em primeiro lugar, as autarquias constituem um pilar da própria organização democrático-constitucional do Estado, e não um simples dado orgânicosociológico, preexistente à própria conformação constitucional da organização do poder político; (2) em segundo lugar, a administração local é configurada como uma administração política, democraticamente legitimada, e só nesta veste ela pode afirmar-se como dimensão da organização democrática do Estado; (3) em terceiro lugar, as autarquias locais são a expressão imediata da organização democrática do poder político republicano e não meras corporações administrativas de «administração indireta» do Estado; (4) em quarto lugar, a legitimação constitucional da autonomia local não converte as autarquias locais em «pequenas repúblicas autónomas», pois elas não podem deixar de estar «compreendidas» na organização democrática do Estado10.
Sobre esta matéria acrescentam ainda que quanto à sua natureza jurídica, as autarquias locais são pessoas coletivas territoriais (n.º 2). A personalização jurídica é um pressuposto essencial da autonomia, permitindo a impostação jurídica dos interesses locais. Elas são pessoas jurídicas distintas do Estado stricto sensu, isto é, do Estado central, e não elementos ou componentes dele. A natureza territorial significa que o território constitui o elemento estruturante principal da autarquia, pois serve de: (a) elemento de referência para determinar os sujeitos da pessoa coletiva; (b) elemento de individualização dos interesses a satisfazer; (c) elemento de conotação do objeto (pessoas e bens) dos poderes e direitos atribuídos ao ente territorial (território com âmbito do exercício do poder)11.
A criação ou a extinção de municípios, bem como a alteração da respetiva área, é efetuada por lei, precedendo consulta dos órgãos das autarquias abrangidas (artigo 249.º da Constituição da República Portuguesa).
Os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira consideram que a garantia constitucional das autarquias locais (n.º 1) tem um sentido institucional — garantia institucional — e não um sentido individual. Assegura-se a existência da forma de organização territorial 8 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo I. Coimbra Editora, 2006, pág. 79.
9 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume I.
Coimbra Editora, 2007, pág. 234.
10 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II.
Coimbra Editora, 2007, págs. 714 e 715.
11 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II.
Coimbra Editora, 2007, pág. 716.

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autárquica, mas não se garante um direito individual à criação de uma certa autarquia nem se protege um verdadeiro direito de não extinção.
Obviamente, a extinção de autarquias locais está sempre condicionada pelo princípio da necessidade e deve ter como pressuposto exigências ou fins de interesse põblico (»). E o princípio constitucional da participação democrática exigirá que qualquer alteração que afete a existência ou a delimitação territorial de uma autarquia não seja tomada sem que ela seja devidamente consultada. É evidente que a extinção de uma autarquia só pode fazer-se por fusão ou por incorporação noutra(s), pois não pode existir vazio autárquico, sendo essa, de resto, uma das dimensões da referida garantia institucional. Do mesmo modo, a criação de uma nova autarquia só pode ser efetuada por divisão ou desanexação de outra(s), que assim são diretamente interessadas no processo12.
E desenvolvem esta importante questão afirmando que compete à lei restabelecer a divisão administrativa do território (n.º 4), delimitando as diferentes autarquias. A garantia constitucional da autonomia local não inclui um direito de cada autarquia à manutenção da sua própria existência ou dos seus limites territoriais. A lei pode modificar as fronteiras, criar novas autarquias por cisão ou fusão de outras, extingui-las por divisão ou incorporação em outras.
Ponto é que o não faça de forma arbitrária ou desnecessária, ou sem audição das autarquias abrangidas (cfr. artigos 249.º e 256.º, que devem considerar-se expressão de um princípio geral)13.
Sobre esta matéria os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros consideram que a modificação do município respeita não apenas à alteração da área dos municípios, mas também à criação e à extinção dos municípios.
A Constituição atribui o poder de proceder à modificação do município mediante consulta dos órgãos das autarquias abrangidas. Não parece, portanto, que preveja um direito dos municípios à existência ou à inalterabilidade territorial, ainda que o poder de proceder à modificação de um município não seja absoluto, havendo que respeitar requisitos de razoabilidade e democraticidade14.
Em matéria de modificação dos municípios, o legislador encontra-se ainda vinculado a certos limites materiais. O princípio da proporcionalidade é um dos limites a ser considerado. A criação, alteração ou extinção de municípios terá de ser adequada, atendendo ao fim que se pretende alcançar, necessária, procurando ser a menos lesiva possível, e equilibrada, no sentido de os benefícios delas resultantes suplantarem os seus custos.
Requisito igualmente importante é a viabilidade e sustentabilidade dos novos municípios, que se traduz na verificação de certas condições económico-financeiras e de índices demográficos, geográficos e sociais, de modo a assegurar a existência das novas autarquias locais.
Ao criar, extinguir ou alterar a área de um município o legislador deverá também ter em conta os circunstancialismos histórico-culturais dos municípios em questão. Na verdade, não parece ter sido intenção da Constituição atribuir um poder ao legislador que lhe permitisse proceder à modificação de municípios, descurando a dimensão histórica e cultural que poderá estar associada, em muitos casos, a alguns municípios (cfr. artigo 3.º da Lei n.º 11/82, de 2 de junho).
Finalmente, dever-se-á atender ao princípio da prossecução do bem comum. A necessidade de se considerar o bem comum na modificação de municípios não é inédita, surgindo logo na Constituição de 1822, cujo artigo 219.º dispunha que haveria câmaras em todos os povos, onde assim conviesse ao bem público. E a mesma ideia surge nas Leis n.os 11/82, de 2 de 12 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II.
Coimbra Editora, 2007, págs. 715 e 716.
13 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II.
Coimbra Editora, 2007, págs. 720 e 721 14 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, págs. 518 e 519.

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junho, e 142/85, de 1 de novembro, que obrigam a ter em conta os «interesses de ordem nacional e regional ou local em causa» (artigos 3.º, alínea c), e 2.º, alínea d), respetivamente)15.
Interessante é também refletir sobre a possibilidade de os municípios concretamente envolvidos no processo de criação, alteração e extinção, poderem ou não recorrer ao referendo, nos termos do artigo 240.º.
Concluem os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros que o artigo 240.º dispõe que as autarquias locais podem submeter a referendo dos respetivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas competências dos seus órgãos, não fazendo qualquer referência a competências exclusivas. Parece, assim (») ser possível a realização de um referendo local em caso de modificação de um município, na medida que os órgãos da autarquia envolvida dispõem de competência sobre a matéria, ainda que consultiva16.
A Carta Europeia de Autonomia Local, assinada por Portugal em 15 de outubro de 1985 e que entrou em vigor no ordenamento jurídico português em 1 de abril de 1991, vem prever, no seu artigo 5.º, que as autarquias locais interessadas devem ser consultadas previamente relativamente a qualquer alteração dos limites territoriais locais, eventualmente por via de referendo, nos casos em que a lei o permita.
Sobre esta matéria interessa referir, também, os Acórdãos n.os 390/98, 113/99 e 518/99, do Tribunal Constitucional, todos sobre a apreciação da constitucionalidade e legalidade do referendo local.
Importa, uma vez mais, citar sobre o assunto das autarquias locais os Professores Drs.
Jorge Miranda e Rui Medeiros: porque a organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais, em toda a comunidade política portuguesa e em todo o seu território tem de haver autarquias locais. Nenhuma parcela do País pode deixar de estar organizada sob a forma de autarquia local.
Ou seja: a Constituição não só garante como impõe a existência de autarquias locais em todo o País. Mas não de todas as categoria de autarquias. Se o País tem de estar todo organizado por freguesias e municípios, já as regiões administrativas podem não estar criadas em concreto17.
Já o artigo 236.º da Constituição da República Portuguesa, artigo que vem consagrar as categorias de autarquias locais e divisão administrativa, determina no n.º 1 que no Continente as autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas e no n.º 4 que a divisão administrativa do território será estabelecida por lei.
Fiel à tradição portuguesa — e à de muitos outros países —, a Constituição manteve um sistema de autarquias estruturado em três níveis territoriais, instituindo três categorias de autarquias locais: a freguesia, o município e a região administrativa (n.º 1)18.
A freguesia é, assim, a divisão administrativa mais pequena de Portugal, embora não constitua uma fração de um município. É, sim, uma entidade verdadeiramente autónoma.
Como afirmam os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira, a freguesia é a autarquia local de base. Frequentemente de dimensão reduzida, é grande o seu número, competindo à lei as respetivas competências. (») As freguesias não constituem frações dos municípios, sendo constitucionalmente concebidos como verdadeiros entes territoriais autónomos. Por isso não podem ser transformadas em simples órgãos periféricos dos municípios (nem, obviamente, da Administração Central)19. 15 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 520.
16 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 521.
17 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 446 18 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II.
Coimbra Editora, 2007, págs. 719 e 720 19 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II.
Coimbra Editora, 2007, pág. 751

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Os órgãos representativos da freguesia são a assembleia de freguesia e a junta de freguesia (artigo 244.º da Constituição da República Portuguesa). A assembleia de freguesia é o órgão deliberativo da freguesia, podendo a lei determinar que nas freguesias de população diminuta a assembleia de freguesia seja substituída pelo plenário dos cidadãos eleitores (artigo 245.º da Constituição da República Portuguesa). A junta de freguesia é o órgão executivo colegial da freguesia (artigo 246.º da Constituição da República Portuguesa).
Os órgãos das autarquias locais são eleitos por sufrágio universal direto, excetuando a junta de freguesia, cujo presidente é eleito pela assembleia de freguesia.
Relativamente ao município, a Constituição não procede à sua definição — afirmam os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros —, preferindo, antes, considerar de imediato a questão das modificações que os municípios em concreto possam sofrer e, em seguida, determinar os respetivos órgãos20.
Os órgãos representativos do município são a assembleia municipal e a câmara municipal (artigo 250.º da Constituição da República Portuguesa). A assembleia municipal é o órgão deliberativo do município e é constituída por membros eleitos diretamente em número superior ao dos presidentes de junta de freguesia, que a integram (artigo 251.º da Constituição da República Portuguesa), enquanto a câmara municipal é o órgão executivo colegial do município (artigo 252.º da Constituição da República Portuguesa).
O artigo 238.º da Constituição da República Portuguesa, sobre património e finanças locais, determina, nomeadamente, que as autarquias locais têm património e finanças próprios, dispondo ainda de poderes tributários, nos casos e termos previstos na lei (n.os 1 e 4). De sublinhar também que, de acordo com o artigo 241.º da Constituição da República Portuguesa, as autarquias locais dispõem de poder regulamentar próprio nos limites da Constituição, das leis e dos regulamentos emanados das autarquias de grau superior ou das autoridades com poder tutelar.
A última questão que cumpre destacar é a da competência legislativa da Assembleia da República sobre a matéria das autarquias locais. Nos termos da alínea n) do artigo 164.º da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre a criação, extinção e modificação de autarquias locais e respetivo regime, sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas. Por outro lado, de acordo com a alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar, salvo autorização ao Governo, sobre o estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais.
Importa reter as palavras dos Professores Drs. Gomes Canotilho e de Vital Moreira sobre este assunto: o que a alínea q) reserva exclusivamente para a Assembleia da República é o regime que há-se disciplinar a criação, a extinção e modificação de autarquias locais e não estes mesmos atos (os quais devem revestir eles mesmos forma legislativa: (cfr. artigos 235.º4, 246.º e 253.º). A criação concreta (bem como a extinção ou modificação) pode, depois, na base dessa lei, ser efetuada por outro ato legislativo da própria Assembleia da República, do Governo ou das assembleias legislativas das regiões autónomas (cfr. artigo 227.º, n.º1, alínea l), conforme os casos. Trata-se, portanto, de um caso típico de lei-quadro ou lei de enquadramento, que vincula as leis que lhe dão execução21.
Para os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, a criação, a extinção e a modificação territorial das autarquias locais (incluindo o desmembramento ou a fusão) dependem de lei — e lei da Assembleia da República no Continente (artigo 164.º, alínea n), ou decreto legislativo regional (artigos 227.º, n.º 1, alínea l), e 232.º, n.º 1). (») Aquela lei — aparentemente individual, por dizer respeito a esta ou àquela autarquia, embora com pleno 20 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 518 21 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II.
Coimbra Editora, 2007, pág. 315

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conteúdo normativo pelas consequências substantivas e organizatórias que comporta — está, porém, subordinada a uma lei de valor reforçado — à que estatui o regime de criação, extinção e modificação territorial das autarquias locais (mesmo artigo 164.º, alínea n)22.
A alínea n) do artigo 288.º da Constituição dispõe que as leis de revisão constitucional terão de respeitar a autonomia das autarquias locais, sublinhando que a garantia da autonomia local se impõe ao próprio poder de revisão constitucional, visto que ela constitui um dos explícitos limites materiais de revisão.
Para finalizar, são ainda de destacar mais alguns artigos da Constituição da República Portuguesa. No Capítulo I — Princípios Gerais, do Título VIII — Poder Local, os artigos: 237.º — Descentralização administrativa, 239.º — Órgãos deliberativos e executivos, 240.º — Referendo local, 242.º — Tutela administrativa e 243.º — Pessoal das autarquias locais. No Capítulo II — Freguesia, do mesmo título, os artigos: 247.º — Associação e 248.º — Delegação de tarefas, enquanto do Capítulo III — Município, se distinguem os artigos 253.º — Associação e federação e 254.º — Participação nas receitas dos impostos diretos. Por último, menciona-se o Capítulo V, sobre as organizações de moradores.

Autarquias locais — principais diplomas: A legislação relativa a autarquias locais encontra-se dispersa por diversos diplomas.
Cumpre destacar, em primeiro lugar, a Lei n.º 11/82, de 2 de junho, que aprovou o regime de criação e extinção das autarquias locais e de designação e determinação da categoria das povoações. Este diploma foi alterado pela Lei n.º 8/93, de 5 de março.
Nos termos dos artigos 1.º e 2.º, compete à Assembleia da República legislar sobre a criação ou extinção das autarquias locais e fixação dos limites da respetiva circunscrição territorial, e sobre a designação e a determinação da categoria das povoações (com exceção da parte respeitante às freguesias, que foi revogada pela Lei n.º 8/93, de 5 de março). De acordo com o disposto no artigo 3.º, o Parlamento na apreciação das respetivas iniciativas legislativas deve ter em conta os pertinentes índices geográficos, demográficos, sociais, culturais e económicos; as razões de ordem histórica; os interesses de ordem geral e local em causa, bem como as repercussões administrativas e financeiras da alteração pretendida e os pareceres e apreciações expressos pelos órgãos do poder local.
A Lei n.º 8/93, de 5 de março, veio consagrar o regime jurídico de criação de freguesias.
Este diploma sofreu as alterações introduzidas pela Lei n.º 51-A/93, de 9 de julho.
Nos termos do artigo 2.º, a criação de freguesias incumbe à Assembleia da República, no respeito pelo regime geral definido na presente lei-quadro. O artigo 3.º acrescenta que na apreciação das iniciativas legislativas que visem a criação de freguesias deve a Assembleia da República ter em conta a vontade das populações abrangidas, expressa através de parecer dos órgãos autárquicos representativos a que alude a alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º desta lei, razões de ordem histórica, geográfica, demográfica, económica, social e cultural e a viabilidade político-administrativa, aferida pelos interesses de ordem geral ou local em causa, bem como pelas repercussões administrativas e financeiras das alterações pretendidas.
Na sequência dos princípios constantes da já referida Lei n.º 11/82, de 2 de junho, sobre o regime de criação e extinção das autarquias locais e de determinação da categoria das povoações, foi publicada a Lei n.º 142/85, de 18 de novembro — Lei-Quadro da Criação de Municípios. Este diploma sofreu as modificações introduzidas pela Lei n.º 124/97, de 27 de novembro, Lei n.º 32/98, de 18 de julho, e Lei n.º 48/99, de 16 de junho, da qual também pode ser consultada uma versão consolidada.
Mais tarde, a Lei n.º 48/99, de 16 de junho, veio estabelecer o regime de instalação de novos municípios. 22 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 451

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Importa também citar a Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, que estabeleceu o quadro de competências, assim como o regime de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias, diploma que foi alterado pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de janeiro, que a republica e que foi objeto de retificação pela Declaração de Retificação n.º 4/2002, de 6 de fevereiro, e Declaração de Retificação n.º 9/2002, de 5 de março, e pela Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro.
A Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, aprovou a Lei das Finanças Locais, tendo sido retificada pela Declaração de Retificação n.º 14/2007, de 15 de fevereiro, e sofrido as alterações introduzidas pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, e Lei n.º 64-B/2011 de 30 de dezembro. Deste diploma também se encontra disponível uma versão consolidada.
Sobre a legislação consolidada relativa às autarquias locais e outras temáticas conexas pode ser consultado o dossiê Autarquias Locais.

Memorando de Entendimento — Programa do Governo e outros documentos: Em 17 de maio de 2011 foi assinado o Memorando de Entendimento que prevê, nomeadamente, como medida para aumentar a eficiência e a eficácia na Administração Pública a reorganização da estrutura da administração local. No ponto 3.44 pode ler-se o seguinte:

Existem atualmente 308 municípios e 4.259 freguesias. Até julho 2012 o Governo desenvolverá um plano de consolidação para reorganizar e reduzir significativamente o número destas entidades. O Governo implementará estes planos baseados num acordo com a CE e o FMI. Estas alterações, que deverão entrar em vigor no próximo ciclo eleitoral local, reforçarão a prestação do serviço público, aumentarão a eficiência e reduzirão custos.
Na sequência dos compromissos assumidos, o Programa do XIX Governo Constitucional propõe a descentralização e a reforma administrativa, o aprofundamento do municipalismo, o reforço das competências das associações de municípios e a promoção da coesão e competitividade territorial através do poder local.
No capítulo referente à administração local e reforma administrativa assume-se que o Governo promoverá um acordo político alargado que viabilize uma reorganização do mapa administrativo visando a otimização e racionalização do número de órgãos autárquicos, bem como das respetivas competências, com uma análise detalhada ao sector empresarial local quanto ao pressuposto da respetiva utilidade pública e da racionalização sustentada da despesa.
Aqueles objetivos reformadores podem ser encontrados na Resolução do Conselho de Ministros n.º 40/2011, de 22 de setembro. Efetivamente, e segundo o respetivo preâmbulo, visa-se aprovar com este diploma as orientações e medidas prioritárias a adotar no âmbito da reforma que se pretende levar a cabo na administração local autárquica, mediante a concertação com todos os poderes públicos envolvidos e o aprofundamento do estudo e do debate sobre as novas perspetivas de organização local, de competências, de financiamento e de transferência de recursos, assim como relativamente ao atual enquadramento eleitoral autárquico. Pretende-se, assim, obter um acordo político efetivo e alargado que viabilize a efetiva reorganização do mapa administrativo autárquico, bem como a adequação material do acervo de atribuições e competências face aos novos desafios, sem esquecer a especificidade do sector empresarial local, designadamente no que respeita às utilidades públicas envolvidas, de modo a veicular a sustentabilidade das próprias estruturas empresariais.
Especificamente sobre a organização do território e as freguesias, importa salientar o ponto 4.2, que prevê, nomeadamente, na alínea a), a revisão do atual mapa administrativo, com vista à redução substancial do atual número de freguesias, designadamente por via de soluções que veiculem a respetiva aglomeração, dotando-as de escala e de dimensão mais adequadas,

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atentas as respetivas tipologias e desde que salvaguardadas as especificidades locais; e, na alínea b), a elaboração de uma matriz de critérios demográficos e geográficos suficientemente habilitadores das opções a tomar, tendo presente a tipologia decorrente das noções de freguesia predominantemente urbana, de freguesia maioritariamente urbana e de freguesia predominantemente rural.
De destacar, por último, o ponto 4.4 relativo à democracia local, onde se prevê a promoção da discussão política e cívica relativamente às alterações a introduzir no enquadramento legal autárquico, nomeadamente no que respeita às temáticas estruturantes da organização do território e definição das sedes das freguesias e das atribuições das freguesias e competências dos seus órgãos.
Com o fim de contribuir para o debate sobre esta matéria, o Governo, através do Gabinete do Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, apresentou em setembro de 2011, o Documento Verde da Reforma da Administração Local. Segundo o preâmbulo, este documento pretende ser o ponto de partida para um debate que se pretende alargado à sociedade portuguesa, com o objetivo de no final do 1.º semestre de 2012 estarem lançadas as bases e o suporte legislativo de um municipalismo mais forte, mais sustentado e mais eficaz.
Nos objetivos específicos definidos no 2.º Capítulo, referente à organização do território, define-se como determinante reorganizar o mapa administrativo através da redução do número de freguesias; criar novas freguesias, com ganhos de escala e dimensão, gerando a descentralização de novas competências e o reforço da sua atuação; salvaguardar as especificidades locais, diferenciando áreas de baixa e alta densidade populacional e distinguindo áreas urbanas e áreas rurais; considerar a contiguidade territorial como um fator determinante; propiciar uma redefinição das atribuições e competências entre os municípios e as freguesias; e incentivar a fusão de municípios, tendo como base a identidade e a continuidade territoriais, sem prejuízo de uma fase posterior da definição de um novo quadro orientador da alteração do mosaico municipal.
No âmbito da organização do território e na sequência da assinatura do Memorando de Entendimento, a redução do número de freguesias e a fusão de municípios foi assumida pelo Governo como uma prioridade, tendo já sido concretizada no Programa do Governo e na Resolução do Conselho de Ministros n.º 40/2011, de 22 de setembro.
A terminar, e enquanto fontes informativas, cumpre nomear os sítios da Associação Nacional de Freguesias — ANAFRE, onde pode ser consultada múltipla informação sobre todas as freguesias portuguesas, e da Associação Nacional de Municípios Portugueses — ANMP, que reúne diversa e aprofundada informação relativamente aos municípios de Portugal.

Projeto de lei n.º 163/XII (1.ª): Relativamente à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho — Iniciativa legislativa de cidadãos —, a presente iniciativa visa revogar a alínea d) do artigo 3.º, «Objeto», e proceder ao aditamento do artigo 6.º-A com a epígrafe «Iniciativas legislativas em matéria de criação, extinção e fusão de autarquias locais». Atualmente, a alínea d) do artigo 3.º dispõe que a iniciativa legislativa de cidadãos pode ter por objeto todas as matérias incluídas na competência legislativa da Assembleia da República, salvo as do artigo 164.º da Constituição, com exceção da alínea i).
Pretende, ainda, modificar o artigo 4.º da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto — Aprova o regime jurídico do referendo local —, diploma que sofreu as alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de dezembro, e pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro, e do qual pode também ser consultada uma versão consolidada.
Quanto ao artigo 4.º, o projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) tem como objetivo alterar a epígrafe de matérias excluídas do referendo local para matérias do referendo local, manter a redação do n.º 1, introduzir novos n.os 2 e 3 e passar o atual n.º 2 a n.º 4. Com esta alteração, pode ser objeto de referendo local a emissão de pareceres, por órgãos de autarquias locais,

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relativamente à criação, extinção, fusão e modificação dos limites territoriais das autarquias locais, no âmbito de procedimentos legislativos, podendo a lei estabelecer a obrigatoriedade de realização de referendo local quanto a estas matérias.
Por fim, revoga os artigos 5.º — Consultas prévias da Lei n.º 142/85, de 18 de novembro — e o n.º 3 do artigo 7.º — Instrução do processo (relativo à solicitação de pareceres pelo Parlamento aos órgãos do poder local) da Lei n.º 8/93, de 5 de março.

Enquadramento doutrinário/bibliográfico: Bibliografia específica:

Montalvo, António Rebordão — A carta europeia da autonomia local e o sistema de governo local. Revista de administração local. ISSN 0870-810X. Lisboa. A. 32, n.º 232 (Julh.ago. 2009), p. 353-365. Cota: RP- 224 Resumo: O autor analisa a Carta Europeia da Autonomia Local, ratificada por Portugal em 1990, que, por força de normas constitucionais, faz parte integrante do ordenamento jurídico nacional.
Refere que esta convenção internacional define os direitos, liberdades e garantias das autarquias locais na Europa, conferindo às autarquias locais, entre outras, a garantia de não serem extintas ou integradas, total ou parcialmente, noutras autarquias sem que a sua população seja ouvida.
Em matéria de organização e sistema de governo das autarquias locais a Carta consagrou também que a autonomia local pode exercer-se através do funcionamento de assembleias de cidadãos ou do recurso ao referendo ou a qualquer outra forma de participação direta dos cidadãos permitida por lei.
Em conclusão, a Carta limita-se a garantir a aplicação do princípio democrático na organização e funcionamento político das autarquias locais.

Enquadramento internacional: Países europeus: A legislação comparada é apresentada para o seguinte país da União Europeia: França.

França: Em França la région, le département, la commune, les collectivités à statut particuleir e a Collectivité d'Outre-mer são formas de organização administrativa do território que fazem parte de um conceito mais lato designado por collectivités territoriales. Constituem o quadro institucional da participação dos cidadãos na vida local e garantem a expressão da sua diversidade.
As coletividades territoriais são pessoas coletivas de direito público, com competências próprias, poder deliberativo, executivo e regulamentar.
A administração das coletividades territoriais sobre um determinado território é distinta da do Estado. A repartição das competências entre estas e o Estado é efetuada por forma a distinguir, dentro do possível, as que dizem respeito ao Estado e as que são reservadas às coletividades territoriais. Concorrem com o Estado na administração e organização do território, no desenvolvimento económico, social, sanitário, cultural e científico, assim como na proteção do ambiente, na luta contra o efeito de estufa e na melhoria da qualidade de vida.
A partir de 2008 as entidades governamentais, responsáveis pela organização territorial do país, encetaram medidas no sentido de modificar a legislação respeitante a esta matéria, simplificando-a, por forma a reforçar a democracia local e tornar o território mais atrativo.
A Lei n.º 2010-1563, de 16 de dezembro, define as grandes orientações, assim com o calendário de aplicação, da profunda reforma da organização territorial. Procede à

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complementaridade de funcionamento entre as diversas entidades territoriais, designadamente através da criação de um conseiller territorial, que tem assento tanto no département como na région. De forma simplificada, visa pôr fim à concorrência de funções, às despesas redundantes, à criação, fusão e extinção de entidades territoriais.
Os conseillers territoriaux com assento, ao mesmo tempo, no conseil regional e no conseil général du département, são eleitos por voto uninominal, a duas voltas, por um período de seis anos. São as entidades que contribuem para uma melhor adaptação da repartição das competências às especificidades locais. Seis meses, após a sua eleição, elaboram um esquema regional que define e otimiza a repartição das competências entre a region e os départements.
O Code Général des Collectivités Territoriales enquadra os princípios fundamentais orientadores da organização territorial. Os artigos R2113-1 a R2113-12 especificam o processo de criação de uma nova commune, que passa pela consulta dos eleitores, convocados por arrêté du préfet, publicado três semanas antes do ato eleitoral. Outros artigos do Código, nomeadamente, LO1112-1 a LO1112-7, LO1112-8 a LO1112-14, R1112-1, R1112-2 a R11125, R1112-6 a R1112-7, R1112-8 R1112-14, R1112-15, R1112-17, LO6232-1, LO6442-1 e D6232-1, determinam que os órgãos deliberativos e executivos de uma collectivité territoriale podem submeter a referendo qualquer projeto ou proposta de deliberação tendentes a regular matérias da sua competência ou eleição dos seus membros.
Para além do portal do Ministério do Interior, do Ultramar, das Coletividades Territoriais e da Imigração que apresenta um guia detalhado para o acompanhamento das alterações introduzidas pela Lei n.º 2010-1563, de 16 de dezembro, na organização territorial do país, a Direção de Informação Legal e Administrativa — Vie Publique disponibiliza toda a informação relativa às coletividades territoriais.

IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Efetuada consulta à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) verificou-se que baixaram à 11.ª comissão, sobre matéria parcialmente conexa, as seguintes iniciativas:

— Proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica; — Projeto de lei n.º 120/XII (1.ª), do PSD e PS — Reorganização administrativa de Lisboa; — Projeto de lei n.º 164/XII (1.ª), do CDS-PP — Reorganização administrativa de Lisboa.

Baixaram também à 11.ª Comissão, merecendo proposta para apreciação em Plenário e encontrando-se já agendadas para discussão no próximo dia 24 de fevereiro23, as seguintes petições sobre matéria conexa com a das iniciativas acima identificadas:

— Petição n.º 55/XII (1.ª) (Francisco José dos Santos Braz e outros): «Não à redução de autarquias e de trabalhadores»; — Petição n.º 64/XII (1.ª) (Álvaro Manuel da Silva Nobre e outros): «Solicitam a tomada de medidas necessárias e legais para que não se extingam freguesias».

V — Consultas e contributos

Consultas obrigatórias: 23 Súmula da Conferência de Líderes n.º 22, de 15 de fevereiro de 2012.

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Em 13 de fevereiro de 2012 a Presidente da Assembleia da República promoveu a audição dos órgãos de governo próprios das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, nos termos do artigo 142.º do Regimento da Assembleia da República e para os efeitos do n.º 2 do artigo 229.º da Constituição, solicitando o envio dos respetivos pareceres no prazo de 15 dias, nos termos da Lei n.º 40/96, de 31 de agosto.
Nos termos dos n.os 1, alínea a), e 3 do artigo 4.º da Lei n.º 54/98, de 18 de agosto — Associações representativas dos municípios e das freguesias —, e do artigo 141.º do Regimento da Assembleia da República, deve ser promovida, igualmente, a consulta da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE),

VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

Em face dos elementos disponíveis não é possível quantificar eventuais encargos resultantes da aprovação da presente iniciativa.

———

PROJETO DE LEI N.º 164/XII (1.ª) (REORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA DE LISBOA)

Parecer da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

Índice

Parte I — Considerandos Parte II — Opinião do Deputado autor do parecer Parte III — Conclusões Parte IV — Anexos

Parte I — Considerandos

1 — Introdução: O Grupo Parlamentar do Centro Democrático Social — Partido Popular (CDS-PP) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projeto de lei n.º 164/XII (1.ª) — Reorganização administrativa de Lisboa.
Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto no artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República em vigor à data, reunindo os requisitos formais previstos nos artigos 123.º e 124.º desse mesmo Regimento.
O projeto de lei em causa foi admitido em 8 de fevereiro de 2012 e baixou, por determinação de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, sendo esta a comissão competente para apreciação e emissão do respetivo parecer.
O projeto de lei inclui exposição de motivos, obedece aos requisitos formais respeitantes às iniciativas, em geral e aos projetos de lei, em particular.

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2 — Objeto, conteúdo e motivação: O Grupo Parlamentar do Centro Democrático Social — Partido Popular (CDS-PP) visa com este projeto de lei proceder à reorganização administrativa de Lisboa.
Os Deputados proponentes consideram que a «atual configuração territorial das freguesias de Lisboa é, reconhecidamente, uma das principais causas da inércia de gestão da autarquia: são 53 as atuais juntas de freguesia de Lisboa, desiguais e desequilibradas entre si, faccionadas e extremamente frágeis, com baixo nível de capacidade e de autonomia, sendo que a maioria manifesta falta de dimensão, de escala, de recursos financeiros, humanos e técnicos que dependem de um moroso processo de delegação de competências da Câmara».
A iniciativa agora apresentada salienta que «(») o presente projeto de lei integra inteira e exemplarmente os critérios plasmados na proposta de reforma administrativa constante do documento do Livro Verde apresentado pelo Governo, designadamente o critério dos 20 000 habitantes por freguesia, e vai de encontro às medidas acordadas entre o Governo de Portugal e a denominada troika constituída pelo FMI, BCE e CE, no documento intitulado Portugal — Memorando de entendimento sobre condicionalismos específicos de política económica, que destaca a redução significativa do número de freguesias e dos municípios a vigorar para o próximo ciclo eleitoral.
Consideram os proponentes que o «novo modelo de 11 freguesias, vertido no presente projeto de lei, ao estabelecer que as novas entidades administrativas detêm maior extensão territorial e populacional, maior escala de atuação e maior equidade, justifica plenamente o acolhimento de novas competências e recursos uma vez que potencia a obtenção de ganhos de eficácia na utilização de recursos públicos, sem prejuízo da necessária proximidade à população».
O projeto de lei n.º 164/XII (1.ª) contém 17 artigos, distribuídos por cinco capítulos:

No Capítulo I — Objeto e princípios fundamentais:

Artigo 1.º — Objeto Artigo 2.º — Âmbito Artigo 3.º — Medidas de reorganização administrativa de Lisboa

No Capítulo II — Reconfiguração do mapa de freguesias do concelho de Lisboa:

Artigo 4.º — Princípio de racionalização na organização territorial Artigo 5.º — Fusão de freguesias Artigo 6.º — Freguesias resultantes da fusão Artigo 7.º — Freguesias criadas ex-novo Artigo 8.º — Limites

No Capítulo III — Competências das juntas de freguesia do concelho de Lisboa:

Artigo 9.º — Universalidade e equidade Artigo 10.º — Competências próprias das juntas de freguesia Artigo 11.º — Delegação de competências da Câmara Municipal de Lisboa

No Capítulo IV — Regime fiscal:

Artigo 12.º — Distribuição de recursos Artigo 13.º — Recursos humanos

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Artigo 14.º — Recursos financeiros

No Capítulo V — Simplificação do regime de constituição de áreas de reabilitação:

Artigo 15.º — Transferência de competências da administração central Artigo 16.º — Entrada em vigor Artigo 17.º — Instalação das novas freguesias

3 — Iniciativas pendentes sobre a mesma matéria: Da pesquisa efetuada à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) verificou-se que, neste momento, estão pendentes as seguintes iniciativas versando sobre idêntica matéria:

— Proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica; — Projeto de lei n.º 120/XII (1.ª), do PSD e PS — Reorganização administrativa de Lisboa; — Projeto de lei n.º 163/XII (1.ª), do BE — Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, procede à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho, e procede à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto; — Petição n.º 55/XII (1.ª) — «Não à redução de autarquias e de trabalhadores»; — Petição n.º 64/XII (1.ª) — «Solicitam a tomada de medidas necessárias e legais para que não se extingam freguesias»; — Petição n.º 69/XII (1.ª) — Petição contra os critérios do Eixo 2 do Documento Verde.

4 — Consultas obrigatórias: Nos termos do artigo 141.º do Regimento da Assembleia da República, em coincidência com o previsto no n.os 1, alínea a), e 3 do artigo 4.º da Lei n.º 54/98, de 18 de agosto — Associações representativas dos municípios e das freguesias) —, deverão ser consultadas a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE).

Parte II — Opinião do Deputado autor do parecer

O signatário do presente parecer exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a iniciativa em apreço, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da Assembleia da República, reservando o seu grupo parlamentar a sua posição para o debate em Plenário.

Parte III — Conclusões

O Grupo Parlamentar do Centro Democrático Social — Partido Popular (CDS-PP) apresentou à Assembleia da República o projeto de lei n.º 164/XII (1.ª) — Reorganização administrativa de Lisboa.
A Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local é do parecer que o projeto de lei n.º 164/XII (1.ª), apresentado pelo Grupo Parlamentar do Centro Democrático Social — Partido Popular (CDS-PP), reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais para ser agendado para apreciação pelo Plenário da Assembleia da República, reservando os grupos parlamentares as suas posições e decorrente sentido de voto para o debate.

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Parte IV — Anexos

Nota técnica elaborada ao abrigo do disposto do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 25 de fevereiro de 2012 O Deputado Relator, António Prôa — O Presidente da Comissão, Ramos Preto.

Nota: — Os considerandos e as conclusões foram aprovados por maioria, com os votos a favor do PSD, PS e CDS-PP e votos contra do PCP.

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Nota Técnica

Projeto de lei n.º 164/XII (1.ª), do CDS-PP Reorganização administrativa de Lisboa Data de admissão: 8 de fevereiro de 2011 Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local (11.ª Comissão)

Índice

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria V — Consultas e contributos VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

Elaborada por: Fernando Vasco (DAC) — Ana Paula Bernardo (DAPLEN) — Maria Leitão (DILP) — José Luís Tomé (BIB) Data: 23 de fevereiro de 2012

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa

Dez Deputados do Grupo Parlamentar do CDS-PP apresentaram a presente iniciativa legislativa, que tem por objeto proceder à «Reorganização administrativa de Lisboa».
Segundo os proponentes, «o presente projeto de lei integra inteira e exemplarmente os critérios plasmados na proposta de reforma administrativa constante do documento do Livro Verde apresentado pelo Governo, designadamente o critério dos 20 000 habitantes por freguesia, e vai de encontro às medidas acordadas entre o Governo de Portugal e a denominada troika constituída pelo FMI, BCE e CE, no documento intitulado Portugal — Memorando de entendimento sobre condicionalismos específicos de política económica, que destaca a redução significativa do número de freguesias e dos municípios a vigorar para o próximo ciclo eleitoral.
A reorganização administrativa de Lisboa «(») é assim implementada uma nova configuração do mapeamento político-administrativo das freguesias do município de Lisboa, reconfigurando-o de forma audaciosa em apenas 11 freguesias», segundo os proponentes.
Na exposição de motivos do projeto de lei em apreço, é salientado que «O novo modelo de 11 freguesias, vertido no presente projeto de lei, ao estabelecer que as novas entidades administrativas detêm maior extensão territorial e populacional, maior escala de atuação e maior equidade, justifica plenamente o acolhimento de novas competências e recursos uma vez que potencia a obtenção de ganhos de eficácia na utilização de recursos públicos, sem prejuízo da necessária proximidade à população».

II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário

Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais: A iniciativa legislativa é apresentada por 10 Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Popular, nos termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º e do artigo 118.º do Regimento. Toma a forma de projeto de lei, nos termos do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento, mostra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo assim os requisitos formais dos projetos de lei previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento. Não infringe a Constituição ou os princípios Consultar Diário Original

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nela consignados e define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa, respeitando, também, os limites que condicionam a admissão das iniciativas previstos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento.
Este projeto de lei deu entrada em 7 de fevereiro de 2012, foi admitido e anunciado em 8 de fevereiro de 2012 e baixou na generalidade à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local (11.ª Comissão).
Nos termos do n.º 1 do artigo 236.º da Constituição, «no Continente as autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas».
«A criação, extinção e modificação territorial das autarquias (incluindo o desmembramento ou a fusão) dependem de lei — e lei da Assembleia da República»1. A matéria é da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, nos termos da alínea n) do artigo 164.º da Constituição, e deve ser obrigatoriamente votada na especialidade pelo Plenário, nos termos do n.º 4 do artigo 168.º da Constituição.
Em caso de aprovação, e para efeitos de especialidade em comissão, parece relevante salientar ainda o seguinte:

No Capítulo V, das disposições finais e transitórias, em caso de aprovação, deverá ser ponderada pela comissão a inserção do artigo sobre «Entrada em vigor» como artigo final.

Verificação do cumprimento da lei formulário: A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto, adiante designada como lei formulário, prevê um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas que são relevantes em caso de aprovação das iniciativas legislativas e que importa ter presentes no decurso da especialidade em Comissão e, em especial, no momento da redação final.
Esta iniciativa tem um título que traduz o seu objeto em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da referida lei.
A entrada em vigor, em caso de aprovação, nos termos do artigo 16.º do projeto de lei, «no prazo de trinta dias após a sua publicação», está em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no próprio dia da publicação».
Na presente fase do processo legislativo a iniciativa em apreço não nos parece suscitar quaisquer outras questões em face da lei formulário.

III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes

Enquadramento legal nacional e antecedentes: A presente iniciativa visa proceder à reorganização administrativa de Lisboa através de uma alteração consistente, estruturada e ambiciosa do seu número, como também uma reconfiguração das atribuições próprias destas freguesias, como dois elementos centrais a todo o processo de reforma das estruturas de governação de Lisboa. A definição do novo mapa de Lisboa envolve a extinção das atuais 53 freguesias e a criação, na mesma área territorial, de 11 novas freguesias.

Organização administrativa de Portugal — algumas notas: Segundo os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, a autonomia administrativa local não começou com a Constituição de 1976. Vem desde os primórdios do Estado português. Os concelhos ou municípios sempre foram instituições presentes em todas as fases da história do nosso direito público, embora com conteúdos e formas variáveis conforme as épocas e os sucessivos regimes políticos.
A própria monarquia absoluta condescendeu com a teia vasta de autoridades municipais, muitas vezes eletivas; e sabe-se a importância que os municípios tiveram também na formação do Brasil.
Pelo contrário, o primeiro liberalismo — não tanto por influência jacobina quanto pela necessidade de reformar ou recriar as estruturas sociopolíticas e socioeconómicas do país — fez deles tábua rasa e ergueu, desde a base, um novo sistema, com alcance mais ou menos centralizador. Os decretos de Mouzinho da 1 Constituição da República Portuguesa Anotada de Jorge Miranda e Rui Medeiros, Tomo III, pag. 451.

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Silveira de 1832, os de Passos Manuel de 1836 e os subsequentes Códigos Administrativos exibem essa tendência, com oscilações.
Um novo mapa administrativo do País resultou da extinção de centenas de concelhos; e, até certo ponto para compensar as populações, instituíram-se entidades inframunicipais, as freguesias. Entretanto, esboçaram-se entidades supramunicipais, os distritos ou as províncias2.
A Constituição de 1933 foi a primeira a consagrar a existência das freguesias, mas apenas impondo-as no Continente e não nos Açores e na Madeira e declarando-as parcelas dos concelhos (artigo 124.º, segundo o qual o território do Continente se dividia em concelhos, que se formavam de freguesias).
A Constituição de 1976 prevê-as em todo o território nacional e autonomiza-as frente aos municípios. Nem estes se reduzem a agregados de freguesias nem as freguesias se reduzem a elementos integrantes dos municípios, sujeitos a quaisquer poderes por parte destes3.
A freguesia teve origem eclesiástica. A sua génese pode ser encontrada na paróquia, caracterizando-se por ser formada por um grupo de vizinhos que professavam a mesma religião, tendo nascido na sequência da reforma administrativa efetuada pelo Decreto de 18 de julho de 1835.
Atualmente existem 4259 freguesias, distribuídas por 308 municípios. Destes últimos, 278 situam-se no Continente, 19 na Região Autónoma dos Açores e 11 na Região Autónoma da Madeira.
Sobre esta matéria importa citar, por fim, a info-folha A Divisão Administrativa em Portugal, da autoria de Leonor Calvão Borges, onde a autora procura identificar todas as formas utilizadas de divisão administrativa em Portugal, apresentar os seus objetivos e propostas de alteração, bem como a evolução dos cargos (funções e designação) administrativos. Elabora, ainda, um pequeno historial das iniciativas apresentadas e discutidas na instituição parlamentar, quer tenham sido aprovadas ou rejeitadas, apresentando, no final, (») alguns números relativos às várias formas de divisão administrativa e correspondentes mapas, para melhor perceção do problema.

Organização administrativa do município de Lisboa — alguns antecedentes históricos: Segundo o estudo Evolução das freguesias da cidade de Lisboa ao longo do século XIX, da autoria de Daniel R. Alves, as freguesias de Lisboa sofreram profundas alterações ao longo dos séculos XIX e XX. Não só foram alteradas em número, mas também na sua dimensão geográfica4. Efetivamente, a cidade de Lisboa e o respetivo concelho foram objeto, ao longo destes dois últimos séculos, de algumas reformas, tendo-se registado as mais importantes em 1852, em 1885/1886, em 1895 e, já no século XX, em 1959.
Na primeira metade do século XIX Lisboa tinha 70 freguesias, num concelho que abrangia, para norte, parte dos atuais concelhos de Vila Franca de Xira e Sobral de Monte Agraço e, para oeste, parte de Oeiras e a Amadora. Em meados da centúria, pelo decreto de 11 de setembro de 1852 o concelho foi alterado de forma substancial, ficando reduzido à linha da circunvalação, então criada, cujos limites não ultrapassavam as atuais Rua Maria Pia (a Oeste), Av. Duque de Ávila (a Norte) ou Rua Morais Soares (a Este). Nesta altura contava com 34 freguesias. Esta nova circunscrição manteve-se até 1885, altura em que Lisboa expandiu o seu território até aos limites do atual concelho, em virtude do decreto de 18 de julho desse ano, que criou uma nova circunvalação, passando Lisboa a ter 44 freguesias. No ano seguinte, em decreto datado de 22 de julho, a capital cresceu ainda mais com a incorporação de Sacavém e Camarate, que farão parte do município lisboeta apenas até 1895, quando, por decreto de 26 de setembro, foram de novo desanexadas e incorporadas no concelho de Loures5.
Os limites das freguesias mantiveram-se relativamente estáveis durante o século XIX. No caso das freguesias urbanas, os mesmos foram estabelecidos em 1780, por decreto de 19 de abril, na sequência das alterações urbanísticas resultantes do terramoto de 1755. Porém, em meados do século XX este quadro de estabilidade foi brusca e radicalmente alterado. A reforma introduzida pelo decreto de 7 de fevereiro de 1959 foi efetivamente «radical». No seu preâmbulo são apresentadas as razões de ser de tal alteração que se prendiam com o aumento populacional da cidade, registado entre 1900 e 1950, e com o desenvolvimento urbanístico da mesma6. 2 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, págs. 443 e 444 3 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 449 4 In: Alves, Daniel R. – Evolução das freguesias da cidade de Lisboa ao longo do século XIX – pág. 1 5 In: Alves, Daniel R. – Evolução das freguesias da cidade de Lisboa ao longo do século XIX – pág. 2 6 In: Alves, Daniel R. – Evolução das freguesias da cidade de Lisboa ao longo do século XIX – pág. 2

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O número de freguesias de Lisboa variou, assim, ao longo dos tempos: 70 na primeira metade do século XIX, 34 em 1852, 44 em 1885, 46 em 1886, novamente 44 em 1895 e, 53 após 1959.

Organização administrativa do município de Lisboa — antecedentes legais: O Decreto de 11 de setembro de 1852 veio consagrar no artigo 1.º que o concelho de Lisboa «terá, d’ora em diante, por limites a linha que seguir o muro de circunvalação que cercar Lisboa, e a margem direita do Tejo, compreendida dentro desse muro». O número de freguesias foi fixado em 34.
Posteriormente, o Decreto de 18 de julho de 1885 veio aprovar a reforma administrativa do município de Lisboa, tendo criado nova delimitação. Segundo o artigo 1.º, «o município de Lisboa será limitado pela linha de circunvalação, que, partindo da atual, pelo vale de Chelas, vá entroncar com a estrada militar entre a Ameixoeira e o Lumiar, siga desde este ponto a estrada militar até Benfica, e abrangendo esta povoação, e percorrendo a margem esquerda da ribeira de Algés termine na ponte do mesmo nome». O total de freguesias aumentou para 44.
Coube ao Decreto de 22 de julho de 1886 alterar esta situação, tendo determinado o artigo 1.º que «o município será limitado desde Algés até Benfica pela estrada da circunvalação fiscal e desde Benfica até Sacavém pela estrada militar ou qualquer variante que nesta se faça para facilitar o serviço fiscal». Segundo nota incluída neste diploma, a circunscrição do município de Lisboa pelo lado leste não ficou bem delineada na lei de 18 de julho de 1885, em consequência de se pretenderem isentar do imposto do consumo muitos armazéns de depósito de vinho e outros existentes ao longo do Tejo e da linha férrea de norte e leste. Daí resultaram disposições menos úteis naquela importante reforma, cujos resultados hoje se encontram no estado de experiência, e tendo o governo que despender avultada quantia com toda a secção da estrada fiscal compreendida entre as proximidades da calçada de Carriche e o sítio de Chelas, perdendo-se para o tesouro e para o cofre municipal as receitas de uma área fiscal mais dilatada. E acrescenta: «tendo-se encontrado meio fácil, seguro e económico de alargar o âmbito da cidade de Lisboa até à estrada militar desde Benfica até Sacavém, é conveniente e oportuno modificar a circunscrição do município da capital, levando-a aos limites primitivamente planeados». O motivo para a alteração da área do município de Lisboa foi, assim, de carácter exclusivamente financeiro. Lisboa passou a ter 46 freguesias.
Já no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 42142, de 7 de fevereiro de 1959, se pode ler que a população mais do que duplicou entre 1900 e 1950. Paralelamente, o despovoamento das freguesias do centro da cidade, associado ao contraste entre o número elevado de pequenas freguesias no centro da cidade e as extensas freguesias da periferia, são fortes motivos para evidenciar a necessidade de um ajustamento de áreas e populações paroquiais, criando novas freguesias de expansão e extinguindo algumas do centro da cidade. O crescimento da cidade é, em última análise, a principal causa da necessidade de rever totalmente a sua divisão administrativa. Aos fatores de ordem demográfica e geográfica invocados associou-se, assim, a transformação urbanística da cidade. Refere-se ainda que «a reforma que agora se apresenta, e que muito se deve aos trabalhos realizados no Gabinete de Estudos de Urbanização da Câmara Municipal de Lisboa, é, sem dúvida, a mais profunda de quantas têm alterado a fisionomia paroquial de Lisboa».
Interessante é verificar quais foram os critérios utilizados para delimitar as novas freguesias e reajustar os limites das antigas. De acordo ainda com o preâmbulo do diploma de 1959, procurou-se fundamentalmente que as freguesias correspondessem, quanto possível, a comunidades definidas por uma população socialmente homogénea e não muito numerosa, habitando em área naturalmente delimitada e dotada dos serviços públicos mais comuns (igreja, escolas, etc.). No entanto, não foi possível atingir plenamente este objetivo, pois o rigor das normas teve de ceder perante notórias dificuldades de ordem prática.
Com o presente decreto-lei fixou-se, deste modo, o número de freguesias do município de Lisboa em 53, tendo-se, para o efeito, procedido à supressão de duas freguesias do centro da cidade, à criação de 12 novas freguesias e ao reajustamento dos limites de 41.

Constituição da República Portuguesa — principais artigos sobre freguesias: A Constituição da República Portuguesa (CRP), no artigo 6.º, determina que o Estado é unitário e respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular e os princípios da subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da Administração Pública.

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Segundo os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, a locução «autonomia das autarquias locais» é, literalmente, pleonástica (porque autarquias locais pressupõem autonomia). O seu alcance útil consiste na atribuição às autarquias locais de um acervo de poderes próprios (inclusive poderes normativos) a exercer de harmonia com opções por eles livremente feitas no respeito do princípio democrático7.
No mesmo sentido, os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira defendem que o princípio da autonomia local — a expressão «autonomia das autarquias locais» é pleonástica — significa, designadamente, que as autarquias locais são formas de administração autónoma territorial, de descentralização territorial do Estado, dotadas de órgãos próprios, de atribuições específicas correspondentes a interesses próprios e não meras formas de administração indireta ou mediata do Estado, o que não exclui, em certos termos, a tutela estadual (cfr. artigo 242.º)8.
A organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais, de acordo com o estabelecido no n.º 1, do artigo 235.º da Constituição da República Portuguesa, acrescentando o n.º 2 que as autarquias locais são pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas.
Em nota a este artigo, os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira escrevem que no n.º 1 estabelece-se que a «organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais».
Este enunciado linguístico aponta para dimensões importantes da constitucionalização do poder local: (1) em primeiro lugar, as autarquias constituem um pilar da própria organização democrático-constitucional do Estado, e não um simples dado orgânico-sociológico, preexistente à própria conformação constitucional da organização do poder político; (2) em segundo lugar, a administração local é configurada como uma administração política, democraticamente legitimada, e só nesta veste ela pode afirmar-se como dimensão da organização democrática do Estado; (3) em terceiro lugar, as autarquias locais são a expressão imediata da organização democrática do poder político republicano e não meras corporações administrativas de «administração indireta» do Estado; (4) em quarto lugar, a legitimação constitucional da autonomia local não converte as autarquias locais em «pequenas repúblicas autónomas», pois elas não podem deixar de estar «compreendidas» na organização democrática do Estado9.
Sobre esta matéria acrescentam ainda que, quanto à sua natureza jurídica, as autarquias locais são pessoas coletivas territoriais (n.º 2). A personalização jurídica é um pressuposto essencial da autonomia, permitindo a impostação jurídica dos interesses locais. Elas são pessoas jurídicas distintas do Estado stricto sensu, isto é, do Estado central, e não elementos ou componentes dele. A natureza territorial significa que o território constitui o elemento estruturante principal da autarquia, pois serve de (a) elemento de referência para determinar os sujeitos da pessoa coletiva; (b) elemento de individualização dos interesses a satisfazer; (c) e elemento de conotação do objeto (pessoas e bens) dos poderes e direitos atribuídos ao ente territorial (território com âmbito do exercício do poder)10.
Já o artigo 236.º da Constituição da República Portuguesa, artigo que vem consagrar as categorias de autarquias locais e divisão administrativa, determina, no n.º 1, que no Continente as autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas e, no n.º 4, que a divisão administrativa do território será estabelecida por lei.
Fiel à tradição portuguesa — e à de muitos outros países —, a Constituição manteve um sistema de autarquias estruturado em três níveis territoriais, instituindo três categorias de autarquias locais: a freguesia, o município e a região administrativa (n.º 1)11.
Importa, uma vez mais, citar sobre o assunto das autarquias locais, os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros: porque a organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais, em toda a comunidade política portuguesa e em todo o seu território tem de haver autarquias locais. Nenhuma parcela do País pode deixar de estar organizada sob a forma de autarquia local. 7 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo I. Coimbra Editora, 2006, pág. 79 8 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume I. Coimbra Editora, 2007, pág. 234 9 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, págs. 714 e 715 10 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, pág. 716 11 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, págs. 719 e 720

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Ou seja, a Constituição não só garante como impõe a existência de autarquias locais em todo o País. Mas não de todas as categoria de autarquias. Se o País tem de estar todo organizado por freguesias e municípios, já as regiões administrativas podem não estar criadas em concreto12.
A freguesia é, assim, a divisão administrativa mais pequena de Portugal, embora não constitua uma fração de um município. É, sim, uma entidade verdadeiramente autónoma. Como afirmam os Professores Drs.
Gomes Canotilho e Vital Moreira, a freguesia é a autarquia local de base. Frequentemente de dimensão reduzida, ç grande o seu nõmero, competindo á lei as respetivas competências. (») As freguesias não constituem frações dos municípios, sendo constitucionalmente concebidos como verdadeiros entes territoriais autónomos. Por isso não podem ser transformadas em simples órgãos periféricos dos municípios (nem, obviamente, da Administração Central)13.
Os órgãos representativos da freguesia são a assembleia de freguesia e a junta de freguesia (artigo 244.º da Constituição da República Portuguesa). A assembleia de freguesia é o órgão deliberativo da freguesia, podendo a lei determinar que nas freguesias de população diminuta a assembleia de freguesia seja substituída pelo plenário dos cidadãos eleitores (artigo 245.º do Constituição da República Portuguesa). A junta de freguesia é o órgão executivo colegial da freguesia (artigo 246.º).
Os órgãos das autarquias locais são eleitos por sufrágio universal direto, excetuando a junta de freguesia, cujo presidente é eleito pela assembleia de freguesia.
O artigo 238.º da Constituição da República Portuguesa, sobre património e finanças locais, determina, nomeadamente, que as autarquias locais têm património e finanças próprios, dispondo ainda de poderes tributários, nos casos e termos previstos na lei (n.os 1 e 4). De sublinhar também que, de acordo com o artigo 241.º da Constituição da República Portuguesa, as autarquias locais dispõem de poder regulamentar próprio nos limites da Constituição, das leis e dos regulamentos emanados das autarquias de grau superior ou das autoridades com poder tutelar.
Os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira consideram que a garantia constitucional das autarquias locais (n.º 1) tem um sentido institucional — garantia institucional — e não um sentido individual.
Assegura-se a existência da forma de organização territorial autárquica, mas não se garante um direito individual à criação de uma certa autarquia nem se protege um verdadeiro direito de não extinção.
Obviamente, a extinção de autarquias locais está sempre condicionada pelo princípio da necessidade e deve ter como pressuposto exigências ou fins de interesse põblico (»). E o princípio constitucional da participação democrática exigirá que qualquer alteração que afete a existência ou a delimitação territorial de uma autarquia não seja tomada sem que ela seja devidamente consultada. É evidente que a extinção de uma autarquia só pode fazer-se por fusão ou por incorporação noutra(s), pois não pode existir vazio autárquico, sendo essa, de resto, uma das dimensões da referida garantia institucional. Do mesmo modo, a criação de uma nova autarquia só pode ser efetuada por divisão ou desanexação de outra(s), que assim são diretamente interessadas no processo14.
E desenvolvem esta importante questão afirmando que compete à lei restabelecer a divisão administrativa do território (n.º 4), delimitando as diferentes autarquias. A garantia constitucional da autonomia local não inclui um direito de cada autarquia à manutenção da sua própria existência ou dos seus limites territoriais. A lei pode modificar as fronteiras, criar novas autarquias por cisão ou fusão de outras, extingui-las por divisão ou incorporação em outras. Ponto é que o não faça de forma arbitrária ou desnecessária, ou sem audição das autarquias abrangidas (cfr. artigos 249.º e 256.º, que devem considerar-se expressão de um princípio geral)15.
A última questão que cumpre destacar é a da competência legislativa da Assembleia da República sobre a matéria das autarquias locais. Nos termos da alínea n) do artigo 164.º da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre a criação, extinção e modificação de autarquias locais e respetivo regime, sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas. Por outro lado, de acordo com a alínea 12 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág.
446 13 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, pág. 751 14 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, págs. 715 e 716 15 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, págs. 720 e 721

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q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar, salvo autorização ao Governo, sobre o estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais.
Importa reter as palavras dos Professores Drs. Gomes Canotilho e de Vital Moreira sobre este assunto: o que a alínea q) reserva exclusivamente para a Assembleia da República é o regime que há-se disciplinar a criação, a extinção e modificação de autarquias locais e não estes mesmos atos (os quais devem revestir elesmesmos forma legislativa (cfr. artigos 235.º-4, 246.º e 253.º). A criação concreta (bem como a extinção ou modificação) pode, depois, na base dessa lei, ser efetuada por outro ato legislativo da própria Assembleia da República, do Governo ou das assembleias legislativas das regiões autónomas (cfr. artigo 227.º, n.º 1, alínea l), conforme os casos. Trata-se portanto de um caso típico de lei-quadro ou lei de enquadramento, que vincula as leis que lhe dão execução16.
A criação, a extinção e a modificação territorial das autarquias locais (incluindo o desmembramento ou a fusão) dependem de lei — e lei da Assembleia da República no Continente (artigo 164.º, alínea n), ou decreto legislativo regional (artigos 227.º, n.º 1, alínea l), e 232.º, n.º 1). (») Aquela lei — aparentemente individual, por dizer respeito a esta ou àquela autarquia, embora com pleno conteúdo normativo pelas consequências substantivas e organizatórias que comporta — está, porém, subordinada a uma lei de valor reforçado — à que estatui o regime de criação, extinção e modificação territorial das autarquias locais (mesmo artigo 164.º, alínea n)17.
A alínea n) do artigo 288.º da Constituição dispõe que as leis de revisão constitucional terão de respeitar a autonomia das autarquias locais, sublinhando que a garantia da autonomia local se impõe ao próprio poder de revisão constitucional, visto que ela constitui um dos explícitos limites materiais de revisão.
Para finalizar, são ainda de destacar mais alguns artigos da Constituição da República Portuguesa. No Capítulo I — Princípios Gerais, do Título VIII — Poder Local, os artigos: 237.º — Descentralização administrativa, 239.º — Órgãos deliberativos e executivos, 240.º — Referendo local, 242.º — Tutela administrativa e 243.º — Pessoal das autarquias locais. No Capítulo II — Freguesia, do mesmo título os artigos: 247.º — Associação e 248.º — Delegação de tarefas enquanto do Capítulo III — Município, se distinguem os artigos 249.º — Modificação dos municípios, 250.º — Órgãos do município, 251.º — Assembleia municipal, 252.º — Câmara municipal, 253.º — Associação e federação, 254.º — Participação nas receitas dos impostos diretos. Por último, refere-se o Capítulo V sobre as Organizações de moradores.

Autarquias locais — principais diplomas: A legislação relativa a autarquias locais encontra-se dispersa por diversos diplomas.
Cumpre destacar, em primeiro lugar, a Lei n.º 11/82, de 2 de junho, que aprovou o regime de criação e extinção das autarquias locais e de designação e determinação da categoria das povoações. Este diploma foi alterado pela Lei n.º 8/93, de 5 de março.
Nos termos dos artigos 1.º e 2.º, compete à Assembleia da República legislar sobre a criação ou extinção das autarquias locais e fixação dos limites da respetiva circunscrição territorial e sobre a designação e a determinação da categoria das povoações (com exceção da parte respeitante às freguesias, que foi revogada pela Lei n.º 8/93, de 5 de março.). De acordo com o disposto no artigo 3.º, o Parlamento, na apreciação das respetivas iniciativas legislativas, deve ter em conta os pertinentes índices geográficos, demográficos, sociais, culturais e económicos, as razões de ordem histórica, os interesses de ordem geral e local em causa, bem como as repercussões administrativas e financeiras da alteração pretendida; e os pareceres e apreciações expressos pelos órgãos do poder local.
A Lei n.º 8/93, de 5 de março, veio consagrar o regime jurídico de criação de freguesias. Este diploma sofreu as alterações introduzidas pela Lei n.º 51-A/93, de 9 de julho.
Nos termos do artigo 2.º, a criação de freguesias incumbe à Assembleia da República, no respeito pelo regime geral definido na presente lei-quadro. O artigo 3.º acrescenta que na apreciação das iniciativas legislativas que visem a criação de freguesias deve a Assembleia da República ter em conta a vontade das populações abrangidas, expressa através de parecer dos órgãos autárquicos representativos a que alude a alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º desta lei, razões de ordem histórica, geográfica, demográfica, económica, social 16 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, pág. 315 17 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág.
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e cultural e a viabilidade político-administrativa, aferida pelos interesses de ordem geral ou local em causa, bem como pelas repercussões administrativas e financeiras das alterações pretendidas.
Na sequência dos princípios constantes da já referida Lei n.º 11/82, de 2 de junho, sobre o regime de criação e extinção das autarquias locais e de determinação da categoria das povoações, foi publicada a Lei n.º 142/85, de 18 de novembro — Lei-Quadro da Criação de Municípios. Este diploma sofreu as modificações introduzidas pela Lei n.º 124/97, de 27 de novembro, Lei n.º 32/98, de 18 de julho, e Lei n.º 48/99, de 16 de junho, da qual também pode ser consultada uma versão consolidada.
Mais tarde, a Lei n.º 48/99, de 16 de junho, veio estabelecer o regime de instalação de novos municípios.
Importa também citar a Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, que estabeleceu o quadro de competências, assim como o regime de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias, diploma que foi alterado pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de janeiro, e Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro.
A Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, aprovou a Lei das Finanças Locais, tendo sido retificada pela Declaração de Retificação n.º 14/2007, de 15 de fevereiro, e sofrido as alterações introduzidas pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro e Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro. Deste diploma também se encontra disponível uma versão consolidada.
Sobre a legislação consolidada relativa às autarquias locais e outras temáticas conexas pode ser consultado o dossiê Autarquias Locais.

Memorando de Entendimento, Programa do Governo e outros documentos: Em 17 de Maio de 2011 foi assinado o Memorando de Entendimento que prevê, nomeadamente, como medida para aumentar a eficiência e a eficácia na Administração Pública a reorganização da estrutura da administração local. No ponto 3.44 pode ler-se o seguinte: Existem atualmente 308 municípios e 4259 freguesias. Até julho 2012 o Governo desenvolverá um plano de consolidação para reorganizar e reduzir significativamente o número destas entidades. O Governo implementará estes planos baseado num acordo com a CE e o FMI. Estas alterações, que deverão entrar em vigor no próximo ciclo eleitoral local, reforçarão a prestação do serviço público, aumentarão a eficiência e reduzirão custos.
Na sequência dos compromissos assumidos, o Programa do XIX Governo Constitucional propõe a descentralização e a reforma administrativa, o aprofundamento do municipalismo, o reforço das competências das associações de municípios e a promoção da coesão e competitividade territorial através do poder local.
No capítulo referente à administração local e reforma administrativa, assume-se que o Governo promoverá um acordo político alargado que viabilize uma reorganização do mapa administrativo visando a otimização e racionalização do número de órgãos autárquicos, bem como das respetivas competências, com uma análise detalhada ao sector empresarial local quanto ao pressuposto da respetiva utilidade pública e da racionalização sustentada da despesa.
Aqueles objetivos reformadores podem ser encontrados na Resolução do Conselho de Ministros n.º 40/2011, de 22 de setembro. Efetivamente, e segundo, o respetivo preâmbulo, visa-se aprovar com este diploma as orientações e medidas prioritárias a adotar no âmbito da reforma que se pretende levar a cabo na administração local autárquica, mediante a concertação com todos os poderes públicos envolvidos e o aprofundamento do estudo e do debate sobre as novas perspetivas de organização local, de competências, de financiamento e de transferência de recursos, assim como relativamente ao atual enquadramento eleitoral autárquico. Pretende-se, assim, obter um acordo político efetivo e alargado que viabilize a efetiva reorganização do mapa administrativo autárquico, bem como a adequação material do acervo de atribuições e competências face aos novos desafios, sem esquecer a especificidade do sector empresarial local, designadamente no que respeita às utilidades públicas envolvidas, de modo a veicular a sustentabilidade das próprias estruturas empresariais.
Especificamente sobre a organização do território e as freguesias importa salientar o ponto 4.2 que prevê, nomeadamente, na alínea a), a revisão do atual mapa administrativo, com vista à redução substancial do atual número de freguesias, designadamente por via de soluções que veiculem a respetiva aglomeração, dotando —as de escala e de dimensão mais adequadas, atentas as respetivas tipologias e desde que salvaguardadas as especificidades locais; e, na alínea b), a elaboração de uma matriz de critérios demográficos e geográficos

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suficientemente habilitadores das opções a tomar, tendo presente a tipologia decorrente das noções de freguesia predominantemente urbana, de freguesia maioritariamente urbana e de freguesia predominantemente rural.
De destacar, por último, o ponto 4.4 relativo à democracia local, onde se prevê a promoção da discussão política e cívica relativamente às alterações a introduzir no enquadramento legal autárquico, nomeadamente no que respeita às temáticas estruturantes da organização do território e definição das sedes das freguesias e das atribuições das freguesias e competências dos seus órgãos.
Com o fim de contribuir para o debate sobre esta matéria, o Governo, através do Gabinete do Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, apresentou em setembro de 2011, o Documento Verde da Reforma da Administração Local. Segundo o preâmbulo, este documento pretende ser o ponto de partida para um debate que se pretende alargado à sociedade portuguesa, com o objetivo de no final do 1.º semestre de 2012 estarem lançadas as bases e o suporte legislativo de um municipalismo mais forte, mais sustentado e mais eficaz.
Nos objetivos específicos definidos no 2.º Capítulo referente à organização do território, define-se como determinante reorganizar o mapa administrativo através da redução do número de freguesias, criar novas freguesias, com ganhos de escala e dimensão, gerando a descentralização de novas competências e o reforço da sua atuação, salvaguardar as especificidades locais, diferenciando áreas de baixa e alta densidade populacional e distinguindo áreas urbanas e áreas rurais, considerar a contiguidade territorial como um fator determinante e propiciar uma redefinição das atribuições e competências entre os municípios e as freguesias.
No âmbito da organização do território, e na sequência da assinatura do Memorando de Entendimento, a redução do número de freguesias e a fusão de municípios foi assumida pelo Governo como uma prioridade, tendo já sido concretizada no Programa do Governo e na Resolução do Conselho de Ministros n.º 40/2011, de 22 de setembro.

Câmara Municipal de Lisboa e Proposta n.º 15/2011 — discussão pública relativa à reforma administrativa de Lisboa: Em 26 de janeiro de 2011 foi apresentada em reunião da Câmara Municipal de Lisboa, pelos eleitos do Partido Socialista, vereador do Partido Social Democrata, vereadores Independentes Cidadãos por Lisboa e Vereador José Sá Fernandes, a Proposta n.º 15/2011 — Discussão Pública relativa à Reforma Administrativa de Lisboa, com vista a possibilitar um amplo debate relativamente ao modelo de organização administrativa da cidade. Esta proposta foi posteriormente submetida a debate e votação na assembleia municipal.
A proposta apresentada tem por base um estudo aprofundado sobre a cidade de Lisboa, realizado por uma equipa do Instituto Superior de Economia e Gestão e do Instituto de Ciências Sociais, coordenada pelo Professor Doutor Augusto Mateus, estudo esse intitulado Qualidade de Vida e Governo da Cidade — Bases para um Novo Modelo de Governação da Cidade de Lisboa. Este estudo foi desenvolvido entre março de 2009 a abril de 2010 e apresentado em julho de 2010.
Sobre as freguesias de Lisboa, pode ler-se no relatório fina, que a sua atual configuração territorial é, reconhecidamente, uma das principais responsáveis do desfasamento entre os espaços públicos e os espaços políticos da cidade. Este desfasamento, conjugado com as elevadas potencialidades inerentes à sua própria escala de governação em maior proximidade, e ainda com as capacidades sinergéticas que uma reforma de âmbito territorial pode alavancar, leva a concluir que se proponha a alteração do número e dos limites das freguesias como um dos elementos centrais a todo o processo de reforma das estruturas de governação de Lisboa18. Em nota, acrescenta que desde pelo menos 1976 que se têm desenvolvido e proposto novos mapeamentos político-administrativos para a reforma das freguesias de Lisboa — incluindo das suas competências e responsabilidades —, nenhum deles tendo atingido uma continuidade efetiva. O Plano Estratégico de Lisboa de 1992 defendia a grande necessidade de reforma das estruturas administrativas a estas escalas, prospetiva igualmente não desenvolvida nos anos subsequentes. Esta temática tem-se tornado cada vez mais perene no capital social e cultural lisboeta, tendo praticamente todas as candidaturas políticas das últimas duas eleições autárquicas referido, de forma crescentemente explícita, a necessidade de alteração do modelo vigente. Diversos estudos têm sido desenvolvidos, desde os próprios estudos de Lisboa XXI (CML, Seixas et al., 2004), até estudos mais recentes (por exemplo, Caetano 2008). Ao nível do cidadão, será de 18 In: Qualidade de Vida e Governo da Cidade Bases para um Novo Modelo de Governação da Cidade de Lisboa, Julho de 2010, pág.
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especial referência o facto de que a reforma da estrutura das freguesias de Lisboa tem a absoluta concordância de cerca de 80% dos inquiridos no recente inquérito desenvolvido no âmbito deste estudo (vejase Relatório de Progresso ICS, novembro de 2009). Por seu lado, a inquirição desenvolvida a todos os presidentes de juntas de freguesia de Lisboa (veja-se Relatório de Progresso ICS de fevereiro de 2010) mostrou como ¾ destes são favoráveis a uma reforma do modelo vigente, colocando esta dimensão como uma das componentes-chave para a qualificação da governação da cidade e das suas problemáticas.
O projeto de lei n.º 164/XII (1.ª) cita, ainda, parte deste relatório final considerando que o mesmo se encontra em consonância com as opções defendidas. Pode ler-se que uma outra opção (opção C) é ainda apresentada (») para a configuração das freguesias. Esta opção conjuga completamente o número e a delimitação das freguesias com as unidades de gestão municipal. Para o âmbito dos espaços políticos de maior proximidade (as assembleias e as juntas de freguesia) esta é uma opção que se desliga de forma considerável das visões mais identitárias e socioculturalmente mais identificáveis dos «bairros» de Lisboa.
Tem, não obstante, duas importantes características que faz com que seja colocada como alternativa: configura estruturas políticas que se aproximam melhor das escalas de representação política de proximidade existentes nas cidades europeias analisadas (Barcelona, Madrid, Paris, Lyon, etc) e permitiria uma conjugação certamente mais integrada entre as políticas de responsabilidade municipal e as de responsabilidade das juntas de freguesia.
A Câmara Municipal de Lisboa criou uma página na internet sobre a discussão pública da reforma administrativa da cidade de Lisboa, onde se podem consultar todos os elementos que levaram à aprovação da proposta de reforma apresentada pela Câmara Municipal de Lisboa, aceder aos estudos do Instituto Superior de Economia e Gestão e do Instituto de Ciências Sociais e às intervenções dos representantes dos grupos municipais e dos especialistas participantes na conferência/debate sobre modelos de governação.
Por último, é importante nomear os sítios da Associação Nacional de Freguesias — ANAFRE, onde pode ser consultada múltipla informação sobre todas as freguesias portuguesas, e da Associação Nacional de Municípios Portugueses — ANMP, que reúne diversa e aprofundada informação relativamente aos municípios de Portugal.

Enquadramento doutrinário/bibliográfico: Bibliografia específica:

Magalhães, Joaquim Romero — Concelhos e organização municipal na época moderna. Coimbra.
Imprensa da Universidade de Coimbra, 2011. ISBN 978-989-26-0096-3. Cota: 04.36 — 244/2011 Resumo: Esta obra agrupa artigos sobre concelhos e aspetos da organização municipal no Reino, ilhas e partes ultramarinas, desde finais do século XV. Este Estado moderno, ou de antigo regime, assenta nos equilíbrios sociais conferidos em lei pelos privilégios que se implantam de modo diverso pelo território em que é reconhecida uma mesma soberania régia. A organização administrativa deste Estado representa-se como um aglomerado de diferenças em que a igualdade jurídica não é um princípio que possa fundamentar o raciocínio político e social. Nesta obra o autor faz uma reflexão sobre a estrutura municipal portuguesa de uma rede de mais de 816 comunidades por todo o Reino, número que se modificou ao longo da época moderna por vontade do soberano, ou a pedido de alguma comunidade.

Oliveira, António Cândido de — Debate sobre a reforma da administração local em Portugal: um breve contributo. Direito regional e local. Braga. ISSN 1646-8392. N.º 16 (out./dez. 2011), p. 5-12. Cota: RP-816 Resumo: Este artigo pretende contribuir para o debate público do objetivo da redução do número de freguesias e dos constrangimentos constitucionais a mais uma vasta reforma da nossa administração local, fazendo também uma breve referência ao tema da regionalização administrativa.

Oliveira, António Cândido de — É necessária uma reforma territorial das freguesias? Direito regional e local. Braga. ISSN 1646-8392. N.º 13 (Jan./Mar. 2011), p. 5-9. Cota: RP-816 Resumo: Neste artigo o autor propõe-se falar das freguesias que ao longo da nossa história, desde o período liberal, nunca foram objeto de uma reforma territorial significativa. Refletindo sobre as reformas territoriais em Portugal e em países da Europa, o autor defende que faz todo o sentido promover apenas

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reformas pontuais da administração local, saudando o trabalho que está a ser desenvolvido no município de Lisboa a este respeito.

Rebelo, Marta — As finanças locais e o plano de ajustamento da troika: a dimensão financeira óptima dos municípios no quadro de reorganização autárquica. Coimbra. Almedina, 2011. ISBN 978-972-40-4704-1. Cota: 24 — 678/2011 Resumo: O presente estudo configura-se como um contributo jurídico e financeiro para a reorganização do território autárquico municipal, determinado pela troika no Memorando de Entendimento que prevê a redução significativa do número de municípios e freguesias.
A autora advoga que as finanças locais, ou a gestão da seleção das competências e das despesas públicas municipais deve ser um critério preponderante nesta reforma da divisão do território autárquico, tendo como objetivos a melhoria da eficiência e redução de custos, mas no respeito da tradição do nosso municipalismo.

Soares, Alberto Ribeiro — Autarquias em 2011: análise do Mapa Autárquico: uma proposta de reestruturação. Revista militar. Lisboa. Vol. 63, n.º 8/9 (ago/set. 2011), p. 1023-1078. Cota: RP-401 Resumo: Este estudo apresenta-se como um contributo para concretizar as imposições da troika relativas à reforma da administração pública local, apresentando propostas destinadas a harmonizar a nova divisão administrativa do País, tendo em consideração as realidades da geografia e da demografia, mas não esquecendo os fatores da interioridade e do isolamento de algumas comunidades. A intenção é racionalizar o que, neste caso, implica reduzir, procurando normalmente a fusão dos concelhos e freguesias existentes.

IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Efetuada consulta à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC), apurámos a existência das seguintes iniciativas legislativas sobre a matéria conexa que baixaram também à 11.ª Comissão:

— Proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica; — Projeto de lei n.º 120/XII (1.ª), do PSD e PS — Reorganização administrativa de Lisboa.

Eventualmente, pode ser também relevante neste contexto:

Projeto de lei n.º 163/XII (1.ª), do BE — Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, procede à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho, e procede à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto —, que baixou também à 11.ª Comissão, sendo, no entanto, a 1.ª Comissão a competente.

Baixaram também à 11.ª Comissão, merecendo proposta para apreciação em Plenário e encontrando-se já agendadas para discussão no próximo dia 23 de fevereiro19, as seguintes petições sobre matéria conexa:

— Petição n.º 55/XII (1.ª) (Francisco José dos Santos Braz e outros): — «Não à redução de autarquias e de trabalhadores»; — Petição n.º 64/XII (1.ª) (Álvaro Manuel da Silva Nobre e outros): «Solicitam a tomada de medidas necessárias e legais para que não se extingam freguesias».

V — Consultas e contributos

Consultas obrigatórias: 19 Súmula da Conferência de Líderes n.º 21, de 1 de fevereiro de 2011.

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Nos termos do n.os 1, alínea a), e 3 do artigo 4.º da Lei n.º 54/98, de 18 de agosto — Associações representativas dos municípios e das freguesias —, e do artigo 141.º do Regimento da Assembleia da República, deve ser promovida a consulta da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE).

VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

Pese embora se estabeleça no artigo 12.º desta iniciativa que «a repartição de competências entre a Câmara Municipal de Lisboa e as novas juntas de freguesia não pode determinar um aumento da despesa pública global prevista no ano da concretização», é previsível, ainda assim, que da aprovação desta iniciativa resultem encargos com repercussões orçamentais que, no entanto, são dificilmente quantificáveis nesta fase e em face dos elementos disponíveis. Sendo o caso, a respetiva produção de efeitos deveria verificar-se apenas no próximo ano económico.

———

PROPOSTA DE LEI N.º 42/XII (1.ª) (APROVA A LEI-QUADRO DAS FUNDAÇÕES E ALTERA O CÓDIGO CIVIL, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 47344, DE 25 DE NOVEMBRO DE 1966)

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

Parte I — Considerandos

Nota introdutória — considerandos: A presente proposta de lei surge na sequência da Lei n.º 1/2012, de 3 de janeiro, a qual determina a realização de um censo dirigido às fundações, nacionais ou estrangeiras, que prossigam os seus fins em território nacional, com vista a avaliar o respetivo custo/benefício e viabilidade financeira e decidir sobre a sua manutenção ou extinção, sobre a continuação, redução ou cessação dos apoios financeiros concedidos, bem como sobre a manutenção ou cancelamento do estatuto de utilidade pública.
Estamos, portanto, perante um ato legislativo cujo objeto principal é a realização de um censos, uma atividade eminentemente administrativa e para a qual a Administração Pública já tem, evidentemente, competência.
O n.º 4 do artigo 3.º da lei que deu origem à que é objeto do presente parecer, reza que «no prazo máximo de 30 dias após publicação da avaliação, o Ministério das Finanças emite, em conjunto com a respetiva tutela setorial, decisão final a determinar:

a) A manutenção ou a extinção da fundação no caso de fundações públicas de direito público ou de direito privado; b) A continuação, a redução ou a cessação de apoios financeiros à fundação, que tenham sido concedidos pela administração direta ou indireta do Estado, regiões autónomas, autarquias locais, outras pessoas coletivas da administração autónoma e demais pessoas coletivas públicas; c) A manutenção ou o cancelamento do estatuto de utilidade pública da fundação.»

A Lei n.º 1/2012, de 3 de janeiro, teve como consequência natural a lei-quadro que se analisa de seguida.

Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa: Como se refere na nota técnica, a presente iniciativa legislativa, apresentada pelo Governo, no âmbito do Programa de Assistência Económica e Financeira a Portugal — decorrente dos acordos celebrados entre o

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Estado português, a União Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu —, e enquadrada no Programa do XIX Governo Constitucional — no ponto em que reconhece «a urgência da redução do Estado paralelo» —, visa aprovar uma lei-quadro das fundações, com a consequente introdução de alterações às disposições do Código Civil que as regula.
Segundo o proponente, a necessidade da apresentação da iniciativa resulta também do reconhecimento de que a utilização arbitrária do instituto fundacional por parte do Estado tem «pervertido a sua natureza e lógica» e causado «sérios danos ao princípio fundacional», enquanto «princípio nobre estribado no ato altruísta de disposição de um património para a prossecução de fins de interesse social» e nas conclusões de um relatório do Tribunal de Contas, de 2011, que identificam «um conjunto de constrangimentos que carecem de solução» e recomendam a «promoção dos procedimentos legislativos com vista à aprovação de um regime jurídico quadro para as fundações, sejam privadas ou públicas, que ataque e resolva as fragilidades apontadas», designadamente as «relacionadas com a inconveniência da existência de diversas entidades responsáveis pelo reconhecimento de entes fundacionais de direito privado e a inexistência de uma atividade sistemática de acompanhamento e controlo dos entes fundacionais».
Ainda de acordo com a exposição de motivos, a proposta de lei-quadro agora apresentada visa devolver o instituto fundacional à sua original natureza altruísta, estabelecendo regras para evitar abusos na sua utilização.
A lei-quadro encontra-se sistematizada em três títulos:

O Título I trata das disposições gerais aplicáveis a todos os tipos de fundações, estabelece os tipos e regula a forma de aquisição de personalidade jurídica, incentiva a autorregulação e a aprovação de códigos de conduta, formula a proibição de utilização do estatuto fundacional para prejudicar credores do património, submete as fundações ao cumprimento de um conjunto de obrigações de transparência, introduz limites às despesas com o pessoal e a administração relativamente às fundações que recebem apoios públicos ou têm benefícios fiscais, proíbe a alienação de bens que integram o património inicial de fundações e que se revistam de especial significado para os respetivos fins, regula o destino dos bens em caso de extinção e cria, no âmbito do Conselho de Ministros, o Conselho Consultivo das Fundações; O Título II trata das fundações privadas e estabelece as disposições gerais relativas à natureza, objeto, criação e regime, regula os processos de reconhecimento e de aquisição do estatuto de utilidade pública, estabelece regras referentes à organização e à modificação, fusão e extinção das fundações privadas, e, finalmente, regula os regimes especiais das fundações de solidariedade social e das fundações de cooperação para o desenvolvimento; O Título III trata das fundações públicas e estabelece o regime aplicável tanto às de direito público como às de direito privado, definindo a sua natureza e objeto e regulando a sua criação e ato constitutivo, submetendoas, em geral, ao regime das pessoas coletivas públicas, estabelece regras referentes à organização, gestão, acompanhamento, avaliação e fiscalização, bem como à modificação, fusão e extinção das fundações, prevê que o Estado, as regiões autónomas, as autarquias locais, as outras pessoas coletivas da administração autónoma e as demais pessoas coletivas públicas fiquem impedidos de criar ou participar em novas fundações públicas de direito privado, ficando as já criadas e reconhecidas sujeitas ao regime das fundações públicas de direito público, com algumas especificidades.
A lei-quadro não se aplica nem às instituições de ensino superior públicas — acabando com a dúvida que a Lei n.º 1/2012 criou —, previstas no Capítulo VI do Título III do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior nem à Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, bem como prevê uma exceção ao exclusivo do uso da denominação fundação para a Fundação para a Ciência e Tecnologia, IP, que não é uma verdadeira fundação, mas cuja denominação se justifica num quadro de relacionamento internacional.
No que se refere ao Código Civil, propõe-se a alteração dos artigos 158.º («Aquisição de personalidade»), 162.º («Órgãos»), 166.º (que passa a designar-se «Publicidade»), 168.º (que passa a designar-se «Forma e comunicação»), 185.º («Instituição e sua revogação»), 188.º («Reconhecimento»), 190.º («Transformação»), 192.º («Causas de extinção»), 193.º («Declaração de extinção»), 194.º («Efeitos da extinção») e o aditamento de um novo artigo 190.º-A («Fusão»).

Parte II — Opinião da Relatora

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Por um lado, é inegável a intenção de se proceder à alteração global do regime jurídico fundacional em Portugal. É uma intenção que vimos percorrer há muitos os anos, tem, arriscaria, uma década. Uma década não é muito tempo, dada a complexidade da matéria. Veja-se o exemplo alemão, em que o BGB está em vigor desde 1900, a parte relativa às fundações só foi revista em 2001 e as primeiras discussões sobre a reforma começaram em 1962.
Por outro lado, não podemos ignorar que, como é adiantado na exposição de motivos da proposta de lei, com os conhecidos compromissos assumidos, comparando o que se escreve na exposição de motivos com os dois pontos do Memorando de Entendimento alusivos às fundações (3.42 e 3.43), o que as contrapartes pretendem é alteração de dois aspetos muito específicos: o controlo dos gastos públicos e a melhoria do governance das fundações públicas ou sob controlo público.
Nada é referido sobre fundações privadas; são a exposição de motivos e as normas da proposta de lei que colocam tudo no mesmo saco.
A vontade velha de proceder a uma revisão global do regime fundacional, conjugada com a necessidade de cumprir os compromissos do Memorando, tem por consequência que a proposta de lei seja um espelho de dois lados: um bom e um mau.
Relativamente aos aspetos diretamente ligados ao Memorando, atrás mencionados — controlo financeiro público e governance —, a proposta é clarificadora; é uma boa proposta.
Já no que se refere a tudo o que tem que ver com aspetos de sistematização dos regimes fundacionais, a proposta é, basicamente, pobre.
E porquê? O Governo abre um caminho difícil de acompanhar, arrepiando a legística, alterando o Código Civil, no que diz respeito às fundações privadas, e, simultaneamente, aprovando uma nova lei-quadro das fundações (todas: públicas e privadas).
Este caminho é tanto mais estranho quanto a separação é até pressuposta pela Constituição, que refere a existência de uma lei de bases das fundações públicas — artigo 165.º, n.º 1, alínea u —, que complete o panorama jurídico privado, regulado desde 1966 pelo Código Civil e, entretanto, por outros diplomas especiais em relação a ele. A aprovação dessa lei de bases é uma vez mais desconsiderada.
A duplicação operada pela proposta, no que toca às fundações privadas, não é perfeita, o que ainda complica mais o estranho cenário criado. Com efeito, existem discrepâncias, em certas áreas, entre o que se estipula na nova versão do Código Civil e na lei-quadro. Um exemplo: as razões para o não reconhecimento fundacional (artigo 23.º da proposta de lei — «Constituem fundamento de recusa do reconhecimento as seguintes circunstâncias:

a) A falta dos elementos referidos no artigo anterior; b) Os fins da fundação não sejam considerados de interesse social, designadamente se aproveitarem ao instituidor ou sua família ou a um universo restrito de beneficiários com eles relacionados; c) A insuficiência dos bens afetados para a prossecução do fim ou fins visados quando não existam fundadas expectativas de suprimento da insuficiência, designadamente se estiverem onerados com encargos que comprometam a realização dos fins estatutários ou se não gerarem rendimentos suficientes para garantir a realização daqueles fins; d) A desconformidade dos estatutos com a lei; e) A existência de omissões, de vícios ou de deficiências que afetem a formação e exteriorização da vontade dos intervenientes no ato de constituição ou nos documentos que o devam instruir; f) A nulidade, anulabilidade ou ineficácia do ato de instituição; g) A existência de dúvidas ou litígios, ainda que potenciais, sobre os bens afetos à fundação.»

E artigo 188.º do CC — «Reconhecimento:

1 — Não será reconhecida a fundação cujo fim não for considerado de interesse social pela entidade competente.

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2 — Será igualmente negado o reconhecimento, quando os bens afetados à fundação se mostrem insuficientes para a prossecução do fim visado e não haja fundadas expectativas de suprimento da insuficiência.
3 — Negado o reconhecimento por insuficiência do património, fica a instituição sem efeito, se o institutidor for vivo; mas, se já houver falecido, serão os bens entregues a uma associação ou fundação de fins análogos, que a entidade competente designar, salvo disposição do instituidor em contrário).

O escrito não altera a constatação de que as propostas de alteração do CC relativas aos principais momentos da vida fundacional — reconhecimento, alteração de estatutos ou de fins e extinção — são positivas.
Merece observação o facto de o âmbito da lei-quadro proposta ser amplíssimo: engloba praticamente todas as fundações, privadas e públicas, com a exceção das fundações públicas de ensino superior, resultantes do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), o que, sem explicação adicional, é incompreensível, mesmo tendo em conta a autonomia universitária constitucional.
Entende-se que quando um ato legislativo doutrina, ou doutrina para lá de uma tentação incólume, traz sempre maus resultados. É o que sucede com o artigo 3.º, o qual vem definir os vários tipos de fundações a que se pretende aplicar, o que pode trazer maus resultados, mas sobretudo levou à escolha de nomes tipológicos que não ajudam o aplicador, antes o confundem. Esta doutrinação legislativa é, no entanto, coerente, conceda-se, com a lei de conteúdo administrativo n.º 1/2012.
A lei-quadro propõe-se igualmente definir, exemplificativamente, o que sejam os fins de interesses social exigidos por si e pelo Código Civil para que possa haver reconhecimento administrativo das fundações. E aqui se reencontra uma reiterada e confusa relação entre o regime do reconhecimento fundacional e o regime das pessoas coletivas de utilidade pública, que esta proposta de lei poderia ter tentado resolver mas que, ao invés, agudiza — por exemplo, os artigos 24.º (Estatuto de utilidade pública) e 25.º (Concessão do estatuto de utilidade pública)).
O reconhecimento fundacional passa para o Primeiro-Ministro (à semelhança do que sucede com o reconhecimento das pessoas coletivas de utilidade pública), sendo que até agora estava na Presidência do Conselho de Ministros e antes disso estava no Ministério da Administração Interna. É incompreensível. Ou só é compreensível à luz de uma cedência da lógica jurídica ao mediatismo. Faria muito mais sentido estar no Ministério da Justiça, na ausência de uma entidade administrativa independente, que pudesse separar instituidor, administração e regulador.
Em geral, como se referiu, as regras de governance (inauguradas pelo artigo 8.º, mas cf. também artigo 26.º e seguintes), são boas, cobrindo as várias áreas fundamentais nesta matéria: transparência, conflito de interesses, responsabilização, eficiência, avaliação.
A criação de um Conselho Consultivo das Fundações, como órgão de consulta do Primeiro-Ministro em matéria fundacional, não sendo uma má ideia, não consegue fazer esquecer a solução melhor de uma entidade independente, à semelhança do Reino Unido, por exemplo.
A relação entre a proposta de lei-quadro e a lei-quadro dos institutos públicos também não é a melhor: há um conjunto de remissões que fica por compreender completamente, nomeadamente a articulação entre o n.º 4 do artigo 3.º da LQIP — As sociedades e as associações ou fundações criadas como pessoas coletivas de direito privado pelo Estado, regiões autónomas ou autarquias locais não são abrangidas por esta lei, devendo essa criação ser sempre autorizada por diploma legal — e o n.º 1 do artigo 57.º da proposta de lei — O Estado, as regiões autónomas, as autarquias locais, as outras pessoas coletivas da administração autónoma e as demais pessoas coletivas públicas estão impedidos de criar ou participar em novas fundações públicas de direito privado.
Serve esta última norma de proibição geral à possibilidade dada pela primeira norma? É, no mínimo, bizarro.
Insiste-se na proibição das fundações de família sem que se entenda a razão.
A enunciação de subtipos de fundação privada, a par das fundações de solidariedade social, as fundações de cooperação para o desenvolvimento e as fundações para a criação de estabelecimentos de ensino superior privado é, crê-se, uma boa ideia para uma lei-quadro. Como que a publicita.

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Constata-se uma viragem de quase 180º no que diz respeito às denominadas fundações públicas de direito privado, que na proposta de lei passam a estar sujeitas à lei-quadro dos institutos públicos e a todas as vinculações a que as fundações públicas ditas de direito público estão sujeitas (artigo 52.º). Mas cabe perguntar para que serve agora a distinção? Desejavelmente deveria haver dois regimes jurídicos fundacionais públicos, para que o decisor pudesse escolher, nos termos da lei. Torna-se difícil compreender como se fará (e porque se fará) tal opção.
Pergunta-se: não seria mais simples, dada a aparente coincidência entre os dois subtipos de fundação pública previstos na proposta de lei e dada a proibição de criação de novas fundações públicas de direito privado, simplesmente extinguir as fundações públicas de direito privado e integrá-las em serviços existentes ou em novas fundações públicas em sentido próprio? Fica a pergunta.

Parte III — Conclusão

Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e garantias é de parecer que a proposta de lei n.º 42/XII (1.ª) reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutida e votada em Plenário.

Parte IV — Anexos

A nota técnica faz parte integrante do presente parecer.

Palácio de São Bento, 29 de fevereiro de 2012 A Deputada Relatora, Isabel Moreira — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.

Nota: — As Partes I e III foram aprovadas unanimidade.

Nota Técnica

Proposta de lei n.º 42/XII (1.ª) Aprova a lei-quadro das fundações e altera o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de 1966 Data de admissão: 8 de fevereiro de 2012 Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª Comissão)

Elaborada por: Francisco Alves e Ana Vargas (DAC) — Luís Martins (DAPLEN) — Leonor Calvão Borges, Lisete Gravito e Fernando Bento Ribeiro (DILP) — Luís Filipe Silva (BIB).
Data: 22 de fevereiro de 2012

Índice

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria V — Consultas e contributos

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I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa

A presente iniciativa legislativa, apresentada pelo Governo no âmbito do Programa de Assistência Económica e Financeira a Portugal — decorrente dos acordos celebrados entre o Estado português, a União Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu e enquadrada no Programa do XIX Governo Constitucional, no ponto em que reconhece «a urgência da redução do Estado paralelo» —, visa aprovar uma lei-quadro das fundações, com a consequente introdução de alterações às disposições do Código Civil que as regula.
A necessidade da apresentação da iniciativa resulta também do reconhecimento de que a utilização arbitrária do instituto fundacional por parte do Estado tem «pervertido a sua natureza e lógica» e causado «sérios danos ao princípio fundacional», enquanto «princípio nobre estribado no ato altruísta de disposição de um património para a prossecução de fins de interesse social» e nas conclusões de um relatório do Tribunal de Contas, de 2011, que identificam «um conjunto de constrangimentos que carecem de solução» e recomendam a «promoção dos procedimentos legislativos com vista à aprovação de um regime jurídico quadro para as fundações, sejam privadas ou públicas, que ataque e resolva as fragilidades apontadas», designadamente as «relacionadas com a inconveniência da existência de diversas entidades responsáveis pelo reconhecimento de entes fundacionais de direito privado e a inexistência de uma atividade sistemática de acompanhamento e controlo dos entes fundacionais».
Ainda de acordo com a exposição de motivos, a proposta de lei-quadro agora apresentada visa devolver o instituto fundacional à sua original natureza altruísta, estabelecendo regras para evitar abusos na sua utilização.
A lei-quadro encontra-se sistematizada em três títulos:

O Título I trata das disposições gerais aplicáveis a todos os tipos de fundações e estabelece os tipos e regula a forma de aquisição de personalidade jurídica, incentiva a autorregulação e a aprovação de códigos de conduta, formula a proibição de utilização do estatuto fundacional para prejudicar credores do património, submete as fundações ao cumprimento de um conjunto de obrigações de transparência, introduz limites às despesas com o pessoal e a administração relativamente às fundações que recebem apoios públicos ou têm benefícios fiscais, proíbe a alienação de bens que integram o património inicial de fundações e que se revistam de especial significado para os respetivos fins, regula o destino dos bens em caso de extinção e cria, no âmbito do Conselho de Ministros, o Conselho Consultivo das Fundações; O Título II trata das fundações privadas e estabelece as disposições gerais relativas à natureza, objeto, criação e regime, regula os processos de reconhecimento e de aquisição do estatuto de utilidade pública, estabelece regras referentes à organização e à modificação, fusão e extinção das fundações privadas, e, finalmente, regula os regimes especiais das fundações de solidariedade social e das fundações de cooperação para o desenvolvimento; O Título III trata das fundações públicas e estabelece o regime aplicável tanto às de direito público como às de direito privado, definindo a sua natureza e objeto e regulando a sua criação e ato constitutivo, submetendoas, em geral, ao regime das pessoas coletivas públicas, estabelece regras referentes à organização, gestão, acompanhamento, avaliação e fiscalização, bem como à modificação, fusão e extinção das fundações, prevê que o Estado, as regiões autónomas, as autarquias locais, as outras pessoas coletivas da administração autónoma e as demais pessoas coletivas públicas fiquem impedidos de criar ou participar em novas fundações públicas de direito privado, ficando as já criadas e reconhecidas ficam sujeitas ao regime das fundações públicas de direito público, com algumas especificidades.
A lei-quadro não se aplica às instituições de ensino superior públicas, previstas no Capítulo VI do Título III do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior, e à Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, bem como prevê uma exceção ao exclusivo do uso da denominação fundação para a Fundação para a Ciência e Tecnologia, IP, que não é uma verdadeira fundação, mas cuja denominação se justifica num quadro de relacionamento internacional.
No que se refere ao Código Civil, propõe-se a alteração dos artigos 158.º («Aquisição de personalidade»), 162.º («Órgãos»), 166.º (que passa a designar-se «Publicidade»), 168.º (que passa a designar-se «Forma e comunicação»), 185.º («Instituição e sua revogação»), 188.º («Reconhecimento»), 190.º («Transformação»),

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192.º («Causas de extinção»), 193.º («Declaração de extinção»), 194.º («Efeitos da extinção») e o aditamento de um novo artigo 190.º-A («Fusão»).

II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário

Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais: A presente proposta de lei que «Aprova a lei-quadro das fundações e altera o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de 1966», é apresentada pelo Governo, no âmbito do poder de iniciativa da lei, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 167.º e alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
Foram observados os requisitos formais respeitantes às iniciativas em geral e às propostas de lei, em particular, previstos no artigo 119.º, no n.º 2 do artigo 123.º, nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 124.º do Regimento da Assembleia da República.
Esta iniciativa legislativa vem acompanhada dos pareceres das seguintes entidades: Centro Português de Fundações, Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, Associação Nacional de Municípios Portugueses, Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores e Governo da Região Autónoma da Madeira.

Verificação do cumprimento da lei formulário: A iniciativa legislativa apresenta de início uma exposição de motivos, obedecendo ao formulário correspondente a uma proposta de lei do Governo e contém, após o articulado, sucessivamente, a data de aprovação em Conselho de Ministros e a assinatura do Primeiro-Ministro, do Ministro dos Assuntos Parlamentares, de acordo com o n.º 2 do artigo 6.º, o artigo 7.º e os n.os 1 e 2 do artigo 13.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto, doravante designada de lei formulário. Considerando que, perante a sua aprovação, no seu articulado não se encontra prevista qualquer disposição normativa sobre o início da sua vigência, a iniciativa legislativa, revestindo a forma de lei, será publicada na 1.ª Série do Diário da República, entrando em vigor no quinto dia após a sua publicação nos termos do n.º 2 do artigo 5.º e da alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º, da lei formulário. Saliente-se, ainda, que a presente iniciativa visa, igualmente, alterar o DecretoLei n.º 284/2007, de 17 de agosto, revogando os artigos 1.º e 2.º, pelo que, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário, se sugere que em sede de redação final seja introduzida a seguinte designação:

«Aprova a Lei-Quadro das Fundações, altera o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de 1966, e procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 284/2007, de 17 de agosto.» III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes

Enquadramento legal nacional e antecedentes: Nos termos do n.º 1 do artigo 46.º da Constituição da República Portuguesa, qualquer cidadão tem o direito de livremente, e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações.
Segundo os Srs. Professores Doutores Jorge Miranda e Rui Medeiros o direito de associação «abrange qualquer forma de organização de pessoa, reguladas pelos artigos 199.º a 201.º-A do Código Civil, podendo as próprias fundações aí caber1.
Também os Srs. Professores Doutores Gomes Canotilho e Vital Moreira se pronunciaram sobre esta matéria, referindo a liberdade de associação como «a expressão mais qualificada da liberdade de organização coletiva privada, ínsita no princípio do Estado de direito democrático e que pode revestir outras formas mais ou menos institucionalizadas (comissões, grupos, clubes, fundações, etc.».2 Contudo, referem ainda que «a 1 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo I. Coimbra Editora, 2006, pág. 954.
2 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume I. Coimbra Editora, 2007, págs.643.

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Constituição não reconhece paralelamente a liberdade de criação de fundações, o que não quer dizer que elas não gozem de nenhuma proteção constitucional. Por um lado, elas estão implicitamente previstas na importante categoria constitucional das instituições particulares de solidariedade social (n.º 5 do artigo 63.º), que na maior parte dos casos terão natureza fundacional»3, assim como nas fundações culturais referidas no n.º 3 do artigo 70.º.
O regime jurídico das fundações, bem assim como a competência para reconhecimento do seu interesse público, encontra-se disperso por alguns diplomas, dificultando assim a sua identificação e gestão coletiva.
De acordo com o artigo 157.º do Código Civil, as fundações enquadram-se dentro da categoria jurídica das pessoas coletivas, distinguindo-as de outros tipos de instituições congéneres como associações e sociedades.
As fundações dividem-se em públicas ou privadas4, sendo as constituídas por iniciativa e ato do poder administrativo por via legislativa, com meios públicos, para a prossecução de fins altruístas e sempre no interesse público. Já as segundas são constituídas por iniciativa privada, através de ato formal de escritura pública para reconhecimento pelo Estado, para a prossecução dos mais variados fins de interesse coletivo, seja no âmbito cultural, educacional, recreativo, científico ou mesmo de solidariedade social.
A alteração do regime jurídico das fundações tem sido objeto de estudos, tendo sido criados dois grupos de trabalho, em 1999, com o objetivo de apresentarem propostas legislativas. Daí resultou a aprovação da Lei n.º 3/2004, de 15 de janeiro, Lei-Quadro dos Institutos Públicos, onde se incluem as fundações privadas e as fundações de direito privado, nomeadamente as criadas por entidades públicas.
No âmbito da Comissão de Reforma do Regime Jurídico das Fundações, criada pelo Despacho n.º 9457/99 do Ministro da Administração Interna5, com o objetivo de elaborar a proposta de lei de bases das fundações públicas e a proposta de revisão do regime jurídico das fundações privadas, foram elaborados três anteprojetos, compilados em 2002 pelo Secretário de Estado da Administração Interna, num relatório intitulado «Novo regime jurídico das fundações de direito privado — projetos»6. Posteriormente foram apresentados novos projetos legislativos, a saber, de Rui Machete e Henrique Sousa Antunes, em 2004, disponível aqui e de Freitas do Amaral em 20097.
Quanto à sua constituição e existência, implica a coexistência de três atos ou momentos distintos, quais sejam: a instituição ou ato constitutivo, o reconhecimento e o registo.
Quanto ao seu registo, é o mesmo feito no Instituto dos Registos e do Notariado, IP, como na conservatória do registo comercial. A Conservatória do Registo Nacional de Pessoas Coletivas (RNPC) tem por função organizar e gerir o ficheiro central de pessoas coletivas (FCPC), bem como apreciar a admissibilidade de firmas e denominações, e efetuar a sua certificação (Decreto-lei n.º 129/98, de 13 de maio).
No que diz respeito ao seu reconhecimento como fundações de interesse público, encontra-se no âmbito das competências da Presidência do Conselho de Ministros, nos termos do Decreto-lei n.º 284/2007, de 17 de agosto. Apesar disso, e por lei especial, existem outras entidades com competência para esse reconhecimento, caso das fundações de solidariedade social, fundações de ensino e fundações de cooperação para o desenvolvimento.
Esta dispersão legislativa, a que se juntam as competências das administrações regionais e municipais, sobre a constituição de fundações a esse nível, tem conduzido a dificuldades sobre o reconhecimento do seu universo, como é reconhecido pelo próprio Centro Português de Fundações, em artigo intitulado «Fundações Portuguesas: quantos são? Como são?» Disponível aqui.
Note-se ainda que o Tribunal de Contas, em auditoria realizada em 2011 ao serviço de reconhecimento de fundações no âmbito da Secretaria Geral da Presidência do Conselho de Ministros — a quem compete, nos termos do Decreto-Lei n.º 284/2007, de 17 de agosto, o reconhecimento das fundações de interesse público — reconheceu a dificuldade na obtenção de informação exaustiva relativamente a estas instituições, que se encontra repartida por:
3 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume I. Coimbra Editora, 2007, págs.651.
4 Para uma análise do regime jurídico e fiscal bem como do respetivo enquadramento nacional veja-se o artigo de António Joaquim Marques (jurista da Direção-Geral dos Impostos) – Fundações Públicas e Privadas em Portugal publicado na Revista de Doutrina Tributária (4.º Trimestre de 2002, disponível aqui.
5 Publicado no DR II Série n.º 111 de 13 de maio de 1999.
6 Não foi encontrado uma versão do documento on-line 7 Não foi encontrado uma versão do documento on-line

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— O Ficheiro Central de Pessoas Coletivas, onde estavam inscritas 817 entidades à data de realização da auditoria; — A Secretaria Geral da Presidência do Conselho de Ministros, que tinha registo de 162 fundações privadas; — A Direção-Geral de Solidariedade Social, com 200 fundações de solidariedade social registadas, o IPAD com 19 fundações de cooperação registadas e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior com três fundações de educação registadas.

Por sua vez, a Direção-Geral de Contribuições e Impostos comunicou a existência de mais de 40 000 registos, respeitantes não só a fundações mas também a associações, não tendo possibilidade de as diferenciar.
As fundações são instituídas nos termos do Código Civil (artigos 157.º a 194.º) e obtêm a personalidade jurídica por meio de um ato de reconhecimento da autoridade administrativa, cuja competência originária, de acordo com o Decreto-Lei n.º 284/2007, de 17 de agosto, era do Ministro da Presidência, com faculdade de delegação. Cabe hoje ao Primeiro-Ministro, nos termos do n.º 7 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 86-A/2011, de 12 de julho.
O processo de reconhecimento destina-se a apurar a regularidade formal dos estatutos e a adequação do modelo organizacional ali previsto, o interesse social dos fins da fundação e a suficiência do património com que foi dotada pelos seus instituidores. As normas de procedimentos aplicáveis estão fixadas na Portaria n.º 69/2008, de 23 de janeiro.
Têm regime próprio de reconhecimento:

As fundações de solidariedade social — Decreto-Lei n.º 119/83, de 25 de fevereiro — que pertencem ao âmbito de competência do Ministério da Solidariedade e Segurança Social ou do Ministério da Educação e Ciência, consoante a área de atuação; As fundações cujo escopo compreenda a criação de estabelecimentos de ensino superior — Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro — que pertencem ao âmbito de competência do Ministério da Educação e Ciência.

O Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades da Política Económica entre a República Portuguesa, a Comissão Europeia (CE), o Banco Central Europeu (BCE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) determina que, em conjunto com a avaliação do setor empresarial do Estado, deverá ser elaborada uma análise detalhada do custo/benefício de todas as entidades públicas ou semipúblicas, incluindo fundações, associações e outras entidades, em todos os sectores das administrações públicas. Prevê ainda que será regulamentada, através de lei, a criação e o funcionamento de fundações, associações e outras entidades semelhantes pela administração central e local.
Prevêem-se medidas para «melhorar a eficiência da Administração Pública pela eliminação de redundâncias, simplificando procedimentos e reorganizando serviços, regular a criação e o funcionamento de todas as entidades públicas (por exemplo, empresas, fundações, associações)»8, prevendo uma análise detalhada do custo/benefício de todas as entidades públicas ou semipúblicas, incluindo fundações, associações e outras entidades, em todos os sectores das administrações públicas.9. Da análise deverá resultar a regulamentação, através de lei, da criação e funcionamento de fundações, associações e outras entidades semelhantes pela administração central e local. Esta lei, que também permitirá o encerramento de entidades existentes quando tal se justifique, será preparada em coordenação com um enquadramento semelhante a ser definido para as empresas públicas, e definirá os mecanismos de monitorização e reporte, bem como de avaliação do desempenho dessas entidades.
Também no Programa do XIX Governo Constitucional se encontram referências à necessidade de se reduzir substancialmente o «Estado paralelo» (institutos, fundações, entidades públicas empresariais, empresas públicas ou mistas ao nível da administração regional e local), apontando o Governo para que, nos primeiros 90 dias de governação, seja elaborado um levantamento da dimensão deste «Estado paralelo». 8 Pág. 10.
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No âmbito da melhoria dos processos e simplificação das estruturas organizativas, destacam-se as iniciativas de extinguir, fundir ou reduzir estruturas (fundações, institutos, observatórios, etc.) consideradas dispensáveis ou de dimensão excessiva, permitindo um primeiro ganho de eficiência10.
Através da apresentação da proposta de lei n.º 18/XII (1.ª), e como refere na sua exposição de motivos, o Governo dá cumprimento ao princípio da transparência e cooperação no relacionamento entre o Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais e as fundações financeiramente apoiadas por aqueles, considerando necessário, adequado e proporcional a realização de um censo, tendo por base a apresentação de respostas a um questionário e a disponibilização de documentação pelas fundações públicas de direito público ou de direito privado e pelas fundações privadas atualmente existentes, bem como a prestação de informações pelas entidades públicas.
A Lei n.º 1/2012, de 3 de janeiro, determina a realização de um censo dirigido às fundações, nacionais ou estrangeiras, que prossigam os seus fins em território nacional, com vista a avaliar o respetivo custo/benefício e viabilidade financeira e decidir sobre a sua manutenção ou extinção, tratando-se de fundações públicas, sobre a continuação, redução ou cessação dos apoios financeiros concedidos, bem como sobre a manutenção ou cancelamento do estatuto de utilidade pública.
O Portal do Governo disponibiliza às fundações públicas de direito público ou de direito privado e às fundações privadas o acesso a um questionário e a apresentação de respostas ao mesmo, bem como a disponibilização de documentação, conferindo-lhes um papel ativo na avaliação a efetuar.
A participação no censo é obrigatória para as fundações, devendo as respostas ao questionário e a disponibilização de documentação ocorrer exclusivamente através daquele portal, tendo sido já prorrogada a sua data limite para o dia 24 de fevereiro de 2012, nos termos do Despacho n.º 1490-A/2012, do Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e do Secretário de Estado da Administração Pública, de 31 de janeiro, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 22, Suplemento, de 31 de janeiro.

Enquadramento doutrinário/bibliográfico: Bibliografia específica

Baptista, Cristina Paula Casal — As fundações no direito. Coimbra: Almedina, 2006. 106 p. ISBN 972-402890-9. Cota: 748/2006 Neste livro a autora analisa o fenómeno fundacional, sobretudo no contexto europeu, tendo principalmente em mira as fundações privadas, incluindo as fundações privadas de origem pública, sem deixar, no entanto, de fazer referência às fundações públicas. Trata-se de uma análise que, apesar de se situar numa perspetiva eminentemente jurídica, não perde de vista as implicações sociopolíticas do tema. Farinho, Domingos Soares — Para além do bem e do mal: as fundações público-privadas. In Estudos em homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano: no centenário do seu nascimento. Lisboa [etc.] : Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa [etc.], 2006. ISSN 0870-3116. Vol. 1, p. 339-370. Cota: 04.31 — 53/2007 (1) Neste artigo o autor analisa o fenómeno fundacional. destacando, nomeadamente, as fundações públicoprivadas.
Para além do Estado mínimo e do Estado prestador, existem hoje outros modelos de cooperação entre o Estado e a sociedade, modelos que não tomam a sociedade como algo uno, para lá do Estado ou dependente do Estado mas que, à semelhança da pulverização de interesses públicos, integram uma multiplicidade de interesses convergentes com os do Estado.
A fundação surge, neste contexto, como um dos institutos típicos de prossecução de fins altruístas de interesse geral, sejam eles prosseguidos pelo Estado, cuja natureza dos fins é sempre altruísta, sejam eles prosseguidos por pessoas coletivas não estatais.
Faz por isso todo o sentido que, ultrapassada a desconfiança do Estado em relação a uma sociedade que persegue projetos individuais egoístas, este se associe — juridicamente — a tipos de pessoas coletivas que, prosseguindo fins altruístas, prosseguem fins a que a Administração Pública tem estado cometida há mais de cem anos. 10 Página 16.

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As fundações na Europa: aspetos jurídicos = Foundations in Europe: legal aspects. Lisboa: Fundação LusoAmericana, 2008. 349 p. ISBN 978-972-8654-34-4. Cota: 12.06.2 — 102/2008 A presente obra contem as atas do seminário intitulado «As fundações na Europa: aspetos jurídicos», que teve lugar no Auditório da Fundação Luso-Americana em 16 de junho de 2005. Nele foram analisados os aspetos jurídicos do fenómeno fundacional na Europa, nomeadamente o desenvolvimento de um quadro jurídico europeu para as fundações.
As tradições jurídicas europeias são tão diversas que quaisquer esforços na tentativa de identificar um denominador comum ou uma matéria jurídica geralmente partilhada têm sido praticamente infrutíferos. Daí que seja desejável pensar numa estratégia de desenvolvimento jurídico europeu que não tenha necessariamente como objetivo a harmonização. Esse regime jurídico europeu deve ser facultativo, de modo a que os doadores possam optar entre as formas jurídicas nacionais e europeia.

Machete, Rui Chancerelle de; Antunes, Henrique Sousa — Direito das fundações: propostas de reforma.
Lisboa: Fundação Luso-Americana, 2004. 167 p. ISBN 972-8654-09-X. Cota: 533/2006 A presente obra, como o próprio título sugere, apresenta-se como uma proposta de revisão do regime das fundações de direito privado. Tendo em vista contribuir para uma discussão pública informada, dão-se igualmente a conhecer os resultados dos trabalhos da Comissão dos Assuntos Legais, os resultados dos trabalhos da Comissão dos Assuntos Fiscais do European Foundation Center de Bruxelas, relativos à reforma e aperfeiçoamento do enquadramento jurídico para a constituição de fundações na Europa e o projeto de um Estatuto Europeu para as Fundações.

Enquadramento do tema no plano da União Europeia: A presente proposta de lei aplica-se às fundações portuguesas e às fundações estrangeiras e exclui do seu âmbito de aplicação apenas as fundações que tenham sido criadas por ato de direito derivado europeu.
A nível europeu foi recentemente apresentada proposta de Regulamento do Conselho relativo ao Estatuto da Fundação Europeia (FE) — COM(2012) 3511 — com o objetivo de facilitar o apoio das fundações às causas de utilidade pública em toda a União Europeia. Esta iniciativa resultou da perceção da dificuldade sentida pelas fundações nacionais no exercício de atividades transfronteiras, designadamente pela dificuldade de cumprimento de requisitos jurídicos e administrativos estabelecidos pelas diferentes legislações nacionais em vigor na União Europeia.
A proposta pretende criar uma forma jurídica europeia única — a «Fundação Europeia» (FE) — que seria essencialmente a mesma em todos os Estados-membros e coexistiria em paralelo com as fundações nacionais. A aquisição do estatuto de Fundação Europeia far-se-ia a título inteiramente voluntário.
A Fundação Europeia pode ser constituída como tal ou através da transformação de uma fundação nacional em fundação europeia ou através de uma fusão de fundações nacionais. A FE adquire personalidade jurídica com a sua inscrição no registo de um Estado-membro, mas detém capacidade jurídica em todos os Estados-membros.
O Estatuto da Fundação Europeia foi anunciado no Ato para o Mercado Único (IP/11/469). O Ato para o Mercado Único sublinha o contributo das fundações para o financiamento de iniciativas inovadoras em domínios de interesse público, e apela à adoção de medidas para ultrapassar as dificuldades com que se defrontam as fundações que operam em toda a União Europeia.
A presente proposta baseia-se na investigação levada a cabo pela Comissão através de um estudo de viabilidade, a realização de duas consultas públicas e de Análise de Avaliação de Impacto (Ver Síntese da Avaliação de Impacto).
Entre as várias opções ponderadas, foi analisada a hipótese de se proceder à harmonização limitada da legislação no domínio das fundações ao nível dos Estados-membros. No entanto, dado que seria difícil chegar a um compromisso sobre definições harmonizadas devido à diversidade das legislações nacionais, optou-se em alternativa pela elaboração de «Um estatuto da Fundação Europeia», com um regime fiscal não discriminatório de aplicação automática.
11 A proposta de regulamento foi recebida na Assembleia da República, para efeitos de escrutínio, a 13 de fevereiro de 2012.

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Enquadramento internacional: Países europeus: A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha, França e Itália.

Espanha: O artigo 34.º da Constituição de Espanha reconhece o direito à constituição de fundações, remetendo para lei ordinária a instituição do respetivo regime jurídico.
A Lei n.º 50/2002, 26 de dezembro, regula o regime jurídico das fundações. Nos termos do seu artigo 2.º e seguintes, as fundações são organizações constituídas, sem fim lucrativo, que, por vontade dos seus criadores, afetam, de forma duradoura, o seu património, com vista à prossecução de fins de interesse geral.
São organizadas de acordo com a vontade do fundador, o disposto nos estatutos e os princípios gerais constantes da lei.
As pessoas singulares ou coletivas podem criar fundações.
As fundações adquirem personalidade jurídica, a partir do momento da inscrição no Registro de Fundaciones da escritura pública de constituição. Devem estar domiciliadas em território nacional quando nele desenvolvam a sua atividade principal. As fundações estrangeiras que pretendem exercer a sua atividade, de forma estável, em Espanha devem manter uma delegação em território espanhol, que funciona como domicílio para todos os efeitos.
Dos estatutos da fundação devem constar os elementos fundamentais: aquisição da personalidade jurídica, denominação, fins, domicílio, regras básicas de aplicação do património, tendo sempre em vista o cumprimento dos fins a prosseguir, o patronato e quaisquer outras disposições que o fundador considere de interesse especificar, relativamente à gestão do património e aos órgãos de gestão.
Em todas as fundações deve existir o patronato, órgão de gestão e representação dos bens e direitos que integram o património, composto, no mínimo, por três membros, sendo um deles o presidente.
A Lei n.º 50/2002, 26 de dezembro, no seu artigo 38.º, refere a criação do Consejo Superior de Fundaciones, que tem por competência assessorar e informar sobre qualquer disposição legal ou regulamentar de carácter estatal que afete diretamente as fundações, planear e propor medidas necessárias para o seu desenvolvimento e promoção, realizando estudos detalhados para o efeito. É composto por representantes da administração geral do Estado, das comunidades autónomas e das fundações.
Junto do Conselho funciona a Comision de cooperación e infomación registral, da qual fazem parte representantes da administração geral do Estado e das comunidades autónomas. Estabelece os mecanismos de colaboração e informação mútua entre os diferentes registos, nomeadamente no que respeita às denominações e às comunicações em matéria de registo e, se necessário, a extinção das fundações.
Para além da lei que define o regime jurídico das fundações, cabe mencionar o Real Decreto 1337/2005, de 11 de novembro, que a regulamenta. O Real Decreto 1611/2007, de 7 de dezembro, que aprova o regulamento do registo das fundações públicas. A Lei n.º 49/2002, de 23 de dezembro, que estabelece o regime fiscal aplicável às entidades sem fins lucrativos e os incentivos fiscais ao mecenato e o Real Decreto n.º 1270/2003, de 10 de outubro, que a regulamenta.

França: Em França o regime das fundações encontra-se enquadrado por vários diplomas, dada a existência de vários tipos de fundações.
Para o artigo 18.º da Lei de 23 de julho de 1987 a fundação consiste no ato, através do qual uma ou várias pessoas singulares ou coletivas decidem, de forma irrevogável, afetar bens, direitos ou recursos à prossecução e realização de um fim de interesse geral sem fim lucrativo.
A legislação tipifica as fundações de acordo com as seguintes características:

La fondation reconnue d'utilité publique (FRUP), o seu reconhecimento verifica-se, apenas, a partir do momento da emissão pelo Ministro do Interior do decreto de reconhecimento, mediante parecer favorável do Conselho de Estado, publicado no jornal oficial. O processo de reconhecimento é extremamente exigente, visto que o governo francês procura assegurar o real interesse geral e social, consignado no estatuto social,

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como objetivo geral a prosseguir. Tendo em conta o seu caráter de irrevogabilidade, a vida da fundação tornase ilimitada. Pode receber subvenções públicas ou privadas, doações e legados, apelar à generosidade pública, organizar eventos e vender produtos relacionados com seus objetivos. Pode ser proprietária de prédios para investimento. A sua gestão é assegurada por um conselho de administração ou conseil suveillance avec directoire ou collèges obligatoires, que pode ser composto por 7 a 12 membros, pertencendo um terço aos fundadores, um terço aos representantes/comissário do Estado e outro terço a entidades externas altamente qualificadas. Tem como base jurídica o artigo 18.º (modificado) da Lei n.º 87-571, de 23 de julho de 1987, e Decreto n.º 91-1005, de 30 de setembro de 1991.
La fondation abritée ou sous égide não tem personalidade jurídica, visto que é constituída ao abrigo de outra fundação juridicamente reconhecida. A vantagem reside na rapidez da constituição destas fundações.
São criadas, normalmente, no seio do Institut de France, da Fondation de France, ou de uma outra fundação dita de abrigo. Afetam, de forma irrevogável, um património, pertencente à fundação de abrigo para a realização de um determinado fim de interesse geral, sendo gerida pelos órgãos da fundação de abrigo. Base legal: artigo 20.º (modificado) da Lei n.º 87-571, de 23 de julho, e Decreto n.º 91-1005, de 30 de setembro de 1991.
La fondation d’entreprise é criada por uma ou várias empresas para a concretização de um fim de interesse geral de caracter filantrópico, educativo, científico, social humanitário ou outro. O seu reconhecimento concretiza-se mediante arrêté do perfeito do departamento do local da sede da empresa/as. Tem uma duração limitada a cinco anos, ainda que renováveis. Podem ser subvencionadas pelo Estado, coletividades territoriais, institutos públicos e doações de trabalhadores, etc. O conselho de administração é o órgão de gestão. Base legal: artigo 19.º (modificado) da Lei n.º 87-571, de 23 de julho, e Decreto n.º 90-559, de 4 de julho de 1990.
La fondation de coopération scientifique (FCS), pessoa coletiva de direito privado sem fins lucrativos, fica submetida ao regime jurídico das fondation reconnue d'utilité publique (FRUP), sob reserva das disposições específicas decorrentes do Código de Investigação no que respeita às fundações de cooperação científica.
Constituída por estabelecimentos ou organismos públicos ou privados, nos quais se incluem os ligados à investigação e ao ensino superior. Goza de personalidade jurídica a partir do momento da publicação dos seus estatutos no jornal oficial. O conselho de administração que gere a fundação é composto obrigatoriamente por representantes dos professores/investigadores. Base legal: artigos L.344-12 à L.344-16 do Código da Investigação e, subsidiariamente, a Lei n.º 87-571, de 23 de julho.
La fondation partenariale, pessoa coletiva de direito privado sem fins lucrativos, dotada de património é afetada à prossecução de atividades de interesse geral, conforme as missões de serviço público no âmbito do ensino superior. Criadas, apenas, por estabelecimentos de carácter científico, cultural e profissional. Os estatutos fixam as regras de gestão, estando os estabelecimentos de carácter científico, cultural e profissional maioritariamente representados no conselho de administração. Base legal: artigos L.123-3, L 719-12 e L71913 do Código da Educação, e, subsidiariamente, a Lei n.º 87-571, de 23 de julho.
La fondation universitaire é criada ao abrigo de um estabelecimento pública e por esse facto não possui personalidade jurídica. Instituída, apenas, pelos estabelecimentos públicos de caráter científico, cultural e profissional, designadamente uma universidade ou um polo de investigação ou ensino superior. Prossegue um fim não lucrativo de âmbito geral nestas áreas. O conselho de gestão, consagrado no estatuto, concretiza o fim para que a fundação foi criada. Base jurídica: artigo L 719-12 do Código da Educação e Decreto n.° 2008-326, de 7 abril 2008, e, subsidiariamente, a Lei n.º 87-571, de 23 de julho.
Le fonds de dotation é uma pessoa coletiva de direito privado sem fim lucrativo, que recebe e gere, com vista à sua capitalização, bens e direitos de qualquer natureza, que lhe são cedidos a título gratuito, para a realização de um fim de interesse geral. A sua criação resulta de um simples ato declarativo de constituição, junto do perfeito do departamento, da sede social do fundo, publicada no jornal oficial. O conselho de administração define a política de investimento do fundo, segundo as condições precisamente definidas nos estatutos. Base legal: artigos 140.º e 141.º da Lei n.º 2008-776, de 4 de agosto de 2008, e Decreto n.º 2009158, de 11 de fevereiro.
Quanto à fondation hospitalière, apenas os estabelecimentos públicos de saúde podem criar fundações hospitalares. São pessoas coletivas de direito público, dotadas de bens e direitos provenientes de um ou de vários fundadores com vista à concretização de fins relacionados com a saúde. Constituída mediante decreto do Conselho de Estado e publicado no jornal oficial. Regem-se pelas regras gerias relativas às fondations

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reconnues d'utilité publique (FRUP) e pelas regras de funcionamento decorrentes do decreto do Conselho de Estado, que precisa, de forma particular, as modalidades do exercício de controlo por parte do Estado. Base legal: artigo L6141-7-3 do Código de Saúde Pública e Lei n.º 2009-879, de 21 julho de 2009 Destacamos o portal do Centro Francês dos Fundos e das Fundações, que contém toda a informação respeitante à definição do conceito de fundação, aos diversos tipos de fundação e respetivas etapas a percorrer no procedimento de constituição, a quadros comparativos e legislação de enquadramento.

Itália: Os artigos 14.º a 42.º do Código Civil disciplinam as associações (reconhecidas ou não), as fundações e os comités (comissões). De acordo com a lei, as fundações devem ser constituídas por ato público. O ato de constituição e o estatuto devem conter a denominação da organização, a indicação dos fins, do património e da sede, bem como as regras de funcionamento e de administração. O ato constitutivo e o estatuto podem, além disso, conter as normas relativas à extinção do organismo e à devolução do património, bem como as relativas à sua transformação. O artigo 28.º é relativo à «transformação das fundações».
A fundação é uma entidade (organização) sem fins lucrativos constituída por um património destinado à prossecução de um determinado objetivo. É criada pela pessoa física ou jurídica (fundador) que destina o património ao objetivo e os fundadores podem ser mais do que um. Pode também ser constituída por intermédio de uma disposição testamentária: em tal caso surge só após a morte do fundador e tem como património um seu legado.
A Constituição italiana (artigo 18.º) reconhece aos cidadãos o direito de se associarem livremente, sem autorização, para fins que não sejam proibidos aos indivíduos pela lei penal. O mesmo artigo proíbe as associações secretas e aquelas que prosseguem, se bem que indiretamente, objetivos políticos mediante organizações de carácter militar.
Relativamente ao registo das fundações, há a ter em conta o Decreto do Presidente da República n.º 361/2000, de 10 de fevereiro, relativo às «normas para a simplificação dos procedimentos de reconhecimento de pessoas jurídicas privadas e de aprovação das modificações do ato constitutivo e do estatuto». De acordo com o artigo 1.º, «Salvo quanto previsto pelos artigos 7.º (Competências das regiões e das províncias autónomas) e 9.º (Normas especiais), as associações, as fundações e as outras instituições de carácter privado adquirem a personalidade jurídica mediante o reconhecimento determinado pela inscrição no registo das pessoas jurídicas, instituído junta das prefeituras».
Um diploma que não regula propriamente a constituição ou modelo de fundação é a Lei n.º 383/2000, de 7 de dezembro, que «define as características das associações de promoção social». Esta lei reconhece formalmente o associativismo e estabelece alguns requisitos estatutários fundamentais. Entre as normas mais relevantes encontramos a disciplina das fontes de financiamento, a possibilidade de as referidas associações receberem doações, heranças, de serem proprietárias de bens e a capacidade de ser parte processual».
Outro diploma é, por exemplo, o Decreto Legislativo n.º 460/97, de 4 de dezembro, que estabelece uma revisão geral da situação fiscal das associações não lucrativas. Introduz, ainda, regras e deduções para as associações sem fins lucrativos, subdivididas por categorias. Este aplica-se também às fundações.
Há quem defenda que também na Itália seja consentida a constituição de fundações sem personalidade jurídica, as denominadas «fundações fiduciárias», em que um sujeito transfere para um outro a propriedade de determinados bens, incutindo aos mesmos um vínculo de destino de natureza real, que agrava perpetuamente sobre todos os sucessivos proprietários, limitando a faculdade de gozo e de disposição.
A título de aprofundamento pode consultar-se a seguinte ligação para o estudo Enti a scopo ideale e impresa: il modello della fondazione di partecipazione (organismos de fins ideais e empresa: o modelo da fundação de participação).

Outros países: Organizações internacionais O European Foundation Center disponibiliza os seguintes estudos:

— Fundamental Legal and Fiscal Principles for Public Benefit Foundations, datado de 2003, no qual apresenta um modelo de lei-quadro para as Fundações;

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— Comparative Highlights of Foundations Laws: the operating environment for foundations in Europe, datado de 2011; — E ainda os EFC Legal and Fiscal Country Profiles, datados de 2011, de todos os países, disponíveis aqui.

IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Efetuada uma pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar sobre o registo de iniciativas versando sobre idêntica matéria ou matéria conexa, não se verificou a existência de quaisquer iniciativas.

V — Consultas e contributos

Consultas obrigatórias: Relativamente a esta iniciativa, foi promovida, no dia 22 de fevereiro, a audição dos órgãos de governo próprio das duas regiões autónomas, nos termos do artigo 229.º da Constituição da República Portuguesa, do artigo 142.º do Regimento da Assembleia da República e do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 40/96, de 31 de agosto.
A Comissão deverá promover a consulta da Associação Nacional de Municípios Portugueses, da Associação Nacional de Freguesias e, nos termos do disposto nos respetivos Estatutos, do Conselho Superior da Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público e da Ordem dos Advogados.

Consultas facultativas: Atendendo à matéria objeto da iniciativa sugere-se que a Comissão proceda à consulta escrita do Centro Português de Fundações, à Comissão da Liberdade Religiosa e à Confederação Nacional de Instituições de Solidariedade Social.

Pareceres/contributos enviados pelo Governo: Centro Português de Fundações; Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira; Associação Nacional de Municípios Portugueses; Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores; Governo da Região Autónoma da Madeira.

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PROPOSTA DE LEI N.º 44/XII (1.ª) (APROVA O REGIME JURÍDICO DA REORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA TERRITORIAL AUTÁRQUICA)

Parecer da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

I — Dos considerandos

Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa, o Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a proposta de lei n.º 44/XII (1.ª), sob a designação «Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica», no âmbito da sua competência política, já que, nos termos da alínea n) do artigo 164.º da Constituição, existe reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República.

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Reunindo todos os requisitos formais, constitucionais e regimentais, a proposta de lei foi admitida a 8 de fevereiro de 2012, tendo, nessa data, e por determinação de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, baixado à Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local para efeitos de elaboração e aprovação do respetivo parecer, nos termos do disposto do n.º 1 do artigo 129.º do Regimento da Assembleia da República, tendo sido distribuído em 14 de fevereiro de 2012, data em que foi o signatário do presente parecer nomeado relator.
Nos termos do artigo 131.º do Regimento, foi elaborada a nota técnica sobre a aludida proposta de lei, iniciativa que observa os requisitos formais respeitantes às iniciativas legislativas em geral e às propostas de lei, em particular, contendo uma exposição de motivos e obedecendo ao formulário de uma proposta de lei, cumprindo, igualmente e por essa via, o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário.
A proposta de lei em apreço não vem acompanhada de estudos, documentos ou pareceres que a tenham fundamentado, não cumprindo, neste sentido, o requisito imposto no n.º 3 do artigo 124.º do Regimento da Assembleia da República. Por outro lado, o Governo não cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 6.º do DecretoLei n.º 274/2009, de 2 de outubro, uma vez que não enviou à Assembleia da República os pareceres ou contributos resultantes da consulta direta a entidades cuja consulta seja constitucional ou legalmente obrigatória e que tenham sido emitidos no decurso do procedimento legislativo do Governo. Ainda assim, o Governo reconhece a necessidade de, atenta a matéria, e em sede do processo legislativo a decorrer na Assembleia da República, «deverem ser ouvidos os órgãos de governo próprios das regiões autónomas, a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Freguesias».
A presente proposta de lei visa, essencial e objetivamente, estabelecer «os objetivos, os princípios e os parâmetros da reorganização administrativa territorial autárquica», definindo e enquadrando «os termos da participação das autarquias locais na concretização desse processo». Para tal, a proposta de lei «consagra a obrigatoriedade da reorganização administrativa do território das freguesias e regula e incentiva a reorganização administrativa do território dos municípios».
A proposta de lei estatui os seguintes principais objetivos que deve prosseguir a reorganização administrativa territorial autárquica (artigo 2.º):

«a) Promoção da coesão territorial e do desenvolvimento local; b) Alargamento das atribuições e competências das freguesias e dos correspondentes recursos; c) Aprofundamento da capacidade de intervenção da junta de freguesia; d) Melhoria e desenvolvimento dos serviços públicos de proximidade prestados pelas freguesias às populações; e) Promoção de ganhos de escala, de eficiência e da massa crítica nas autarquias locais; f) Reestruturação, por agregação, de um número significativo de freguesias em todo o território nacional, com especial incidência nos lugares urbanos.»

De igual forma, estabelece os princípios a que a mesma reorganização deve obedecer (artigo 3.º) e que são:

«a) Preservação da identidade histórica, cultural e social das comunidades locais, incluindo a manutenção da anterior denominação das freguesias agregadas, nos termos e para os efeitos previstos no presente diploma; b) Participação das autarquias locais na concretização da reorganização administrativa dos respetivos territórios; c) Universalidade do esforço e flexibilidade no desenho de soluções concretas de reorganização administrativa territorial autárquica; d) Obrigatoriedade da reorganização administrativa do território das freguesias; e) Estímulo à reorganização administrativa do território dos municípios; f) Ponderação do elemento demográfico, estabelecendo referências mínimas e máximas para as novas freguesias.»

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A proposta de lei revoga, no seu artigo 17.º, o artigo 33.º da Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro (Lei das Finanças Locais), a Lei n.º 11/82, de 2 de junho (Regime de criação e extinção das autarquias locais e de designação e determinação da categoria das povoações) e a Lei n.º 8/93, de 5 de março (Regime jurídico de criação de freguesias).

II — Da opinião do Deputado Relator

Sendo a opinião do Relator de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento, o Deputado Relator exime-se de, nesta sede, emitir quaisquer considerações políticas sobre a proposta de lei em apreço, reservando a sua posição para a discussão da iniciativa legislativa em sessão plenária, o que sucederá já no dia 1 de março de 2012.

III — Das conclusões

Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa, o Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a proposta de lei n.º 44/XII (1.ª), sob a designação «Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica», no âmbito da sua competência política, já que, nos termos da alínea n) do artigo 164.º da Constituição, existe reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República.
A proposta de lei reúne os requisitos formais, constitucionais e regimentais suficientes para se poder considerar habilitada a discutir na generalidade, já que, apesar de observar os requisitos formais respeitantes às iniciativas legislativas em geral e às propostas de lei, em particular (contendo uma exposição de motivos e obedecendo ao formulário de uma proposta de lei, cumprindo, igualmente e por essa via, o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário), a proposta de lei não vem acompanhada de estudos, documentos ou pareceres que a tenham fundamentado, não cumprindo, neste sentido, o requisito imposto no n.º 3 do artigo 124.º do Regimento da Assembleia da República. De igual forma, o Governo não cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 274/2009, de 2 de outubro, uma vez que não enviou à Assembleia da República os pareceres ou contributos resultantes da consulta direta a entidades cuja consulta seja constitucional ou legalmente obrigatória e que tenham sido emitidos no decurso do procedimento legislativo do Governo.
O diploma visa, essencial e objetivamente, estabelecer os objetivos, os princípios e os parâmetros da reorganização administrativa territorial autárquica, definindo e enquadrando os termos da participação das autarquias locais na concretização desse processo.
Nos termos da alínea a) do n.º 1 e do n.º 3 do artigo 4.º da Lei n.º 54/98, de 18 de agosto, e do artigo 141.º do Regimento da Assembleia da República, devem ser promovidas as consultas à Associação Nacional de Municípios Portugueses e à Associação Nacional de Freguesias, uma vez que, ao abrigo do disposto no artigo 142.º do Regimento da Assembleia da República e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 229.º da Constituição, foram já promovidas, pelo Gabinete da S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, as demais consultas aos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
A Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local considera que a proposta de lei em apreço se encontra em condições de subir a Plenário e emite o presente parecer, nos termos do disposto do n.º 1 do artigo 136.º do Regimento da Assembleia da República.

IV — Anexos

Anexa-se ao presente parecer a nota técnica da proposta de lei n.º 44/XII (1.ª), elaborada ao abrigo do disposto do artigo 131.ª do Regimento da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 28 de fevereiro de 2012 O Deputado Relator, Mota Andrade — O Presidente da Comissão, Ramos Preto.

Nota: — Os considerandos e as conclusões foram aprovados por maioria, com os votos a favor do PSD, PS, votos contra do PCP e BE e a abstenção do CDS-PP.

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Nota Técnica

Proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica Data de admissão: 8 de fevereiro de 2012 Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local (11.ª Comissão)

Índice

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria V — Consultas e contributos VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

Elaborada por: Fernando Vasco (DAC) — Maria da Luz Araújo (DAPLEN) — Maria José Leitão (DILP) — José Luis Tomé (BIB) Data: 20 de fevereiro de 2012

I — Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa

O Governo apresenta à Assembleia da República a presente proposta de lei que visa, nos termos do artigo 1.º, estabelecer «os objetivos, os princípios e os parâmetros da reorganização administrativa territorial autárquica», definindo e enquadrando «os termos da participação das autarquias locais na concretização desse processo», bem como «a obrigatoriedade da reorganização administrativa do território das freguesias e regula e incentiva a reorganização administrativa do território dos municípios».
A presente iniciativa define os objetivos que a reorganização territorial autárquica visa prosseguir:

— «Promoção da coesão territorial e do desenvolvimento local; — Alargamento das atribuições e competências das freguesias e dos correspondentes recursos; — Aprofundamento da capacidade de intervenção da junta de freguesia; — Melhoria e desenvolvimento dos serviços públicos de proximidade prestados pelas freguesias às populações; — Promoção de ganhos de escala, de eficiência e da massa crítica nas autarquias locais; — Reestruturação, por agregação, de um número significativo de freguesias em todo o território nacional, com especial incidência nos lugares urbanos.»

bem como os princípios que a mesma deve obedecer:

— «Preservação da identidade histórica, cultural e social das comunidades locais, incluindo a manutenção da anterior denominação das freguesias agregadas, nos termos e para os efeitos previstos no presente diploma; — Participação das autarquias locais na concretização da reorganização administrativa dos respetivos territórios; — Universalidade do esforço e flexibilidade no desenho de soluções concretas de reorganização administrativa territorial autárquica; — Obrigatoriedade da reorganização administrativa do território das freguesias; — Estímulo à reorganização administrativa do território dos municípios; Consultar Diário Original

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— Ponderação do elemento demográfico, estabelecendo referências mínimas e máximas para as novas freguesias.»

II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário

Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais: A presente iniciativa é apresentada pelo Governo, no âmbito da sua competência política [alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição].
São observados os requisitos formais respeitantes às iniciativas em geral [n.º 1 do artigo 119.º e alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento] e às propostas de lei, em particular (n.º 2 do artigo 123.º e alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 124.º do Regimento), o que significa que a iniciativa toma a forma de proposta de lei porque é exercida pelo Governo, é redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto, é precedida por uma exposição de motivos, é subscrita pelo PrimeiroMinistro e pelo Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares e contem a menção que foi aprovada em Conselho de Ministros.
A iniciativa em apreciação não vem acompanhada de estudos, documentos ou pareceres que a tenha fundamentado, pelo que não cumpre o requisito imposto pelo no n.º 3 do artigo 124.º do Regimento para as propostas de lei «(») devem ser acompanhadas dos estudos, documentos e pareceres que as tenham fundamentado»).
Acresce a este incumprimento regimental, o facto de o Governo se ter comprometido a enviar à Assembleia da República cópia «(») dos pareceres ou contributos resultantes da consulta direta às entidades cuja consulta seja constitucional ou legalmente obrigatória e que tenham sido emitidos no decurso do procedimento legislativo do Governo», de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 274/2009, de 2 de outubro, que regula o procedimento de consulta de entidades, públicas e privadas, realizado por este órgão de soberania.
Na exposição de motivos pode ler-se:

«Atenta a matéria, em sede do processo legislativo a decorrer na Assembleia da República, deverão ser ouvidos os órgãos de governo próprio das regiões autónomas, a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Freguesias.»

A matéria em causa insere-se no âmbito da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República [alínea n) do artigo 164.º da Constituição].
Este preceito tem correspondência com outras normas constitucionais, designadamente com o n.º 1 do artigo 236.º da Constituição.
O que está reservado exclusivamente para a Assembleia é o regime que disciplina a criação, a extinção ou a modificação territorial das autarquias locais. Por esta razão, como salientam alguns autores, não se deve confundir o regime de criação, extinção e modificação, competência exclusiva da Assembleia, e «traduzido em lei de valor reforçado» (artigo 122.º, n.º 3), «com a decisão em concreto a respeito de qualquer autarquia, em que se reparte a competência entre a Assembleia — quanto às autarquias locais do continente — e as assembleias legislativas regionais — quanto às autarquias das ilhas [artigo 227.º, n.º 1, alínea l)]».

Verificação do cumprimento da lei formulário: A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, com as alterações subsequentes, estabelece regras a observar no âmbito da publicação, identificação e formulário de diplomas.
Como estamos perante uma iniciativa legislativa, observadas algumas disposições da designada lei formulário, e caso a mesma venha ser aprovada sem alterações, apenas se pode referir o seguinte:

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— Esta iniciativa contém disposição expressa sobre a entrada em vigor, pelo que se aplica o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da citada lei («O presente diploma1 entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação»); — Será publicada na 1.ª série do Diário da República, revestindo a forma de lei [alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário]; — A presente iniciativa tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto, de acordo com o n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário.

III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes

Enquadramento legal nacional e antecedentes: A presente iniciativa visa aprovar o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica, com o objetivo de proceder ao reforço da coesão nacional, à melhoria da prestação dos serviços públicos locais e à otimização da atividade dos diversos entes autárquicos.
Assim sendo, importa, de forma breve, proceder à análise da organização administrativa de Portugal, dos principais artigos da Constituição, da legislação sobre autarquias locais e de outros documentos conexos com esta matéria.

Organização administrativa de Portugal — algumas notas: Segundo os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, a autonomia administrativa local não começou com a Constituição de 1976. Vem desde os primórdios do Estado português. Os concelhos ou municípios sempre foram instituições presentes em todas as fases da história do nosso direito público, embora com conteúdos e formas variáveis conforme as épocas e os sucessivos regimes políticos.
A própria monarquia absoluta condescendeu com a teia vasta de autoridades municipais, muitas vezes eletivas; e sabe-se a importância que os municípios tiveram também na formação do Brasil.
Pelo contrário, o primeiro liberalismo — não tanto por influência jacobina quanto pela necessidade de reformar ou recriar as estruturas sociopolíticas e socioeconómicas do país — fez deles tábua rasa e ergueu, desde a base, um novo sistema, com alcance mais ou menos centralizador. Os decretos de Mouzinho da Silveira de 1832, os de Passos Manuel de 1836 e os subsequentes Códigos Administrativos exibem essa tendência, com oscilações.
Um novo mapa administrativo do País resultou da extinção de centenas de concelhos; e, até certo ponto para compensar as populações, instituíram-se entidades inframunicipais, as freguesias. Entretanto, esboçaram-se entidades supramunicipais, os distritos ou as províncias2.
A Constituição de 1933 foi a primeira a consagrar a existência das freguesias, mas apenas impondo-as no Continente e não nos Açores e na Madeira e declarando-as parcelas dos concelhos (artigo 124.º, segundo o qual o território do Continente se dividia em concelhos, que se formavam de freguesias).
A Constituição de 1976 prevê-as em todo o território nacional e autonomiza-as frente aos municípios. Nem estes se reduzem a agregados de freguesias, nem as freguesias se reduzem a elementos integrantes dos municípios, sujeitos a quaisquer poderes por parte destes3.
A freguesia teve origem eclesiástica. A sua génese pode ser encontrada na paróquia, caracterizando-se por ser formada por um grupo de vizinhos que professavam a mesma religião, tendo nascido na sequência da reforma administrativa efetuada pelo Decreto de 18 de julho de 1835.
Já relativamente ao município ou concelho, importa referir que, segundo os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, esta é a autarquia local mais importante e, pelas suas atribuições, poderá ser comparada às coletividades de base existentes noutros países europeus.
A sua dimensão territorial (resultado, em grande parte, da reforma ocorrida em 1836 que dividiu o país em cerca de 400 municípios) permite-lhe, com relativa eficácia, ir ao encontro das populações. Durante o século XIX o seu número foi ainda diminuindo e no século XX estabilizou-se em pouco mais de 300, sendo atualmente de 308. 1 Sugere-se, em vez de «O presente diploma (»)«, «A presente lei (»)« 2 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, págs.
443 e 444.
3 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág.
449.

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O município dispõe também de um conjunto de atribuições e competências, assim como de meios técnicos e financeiros muito mais amplos do que os das freguesias, em domínios como os solos, as construções privadas, os arruamentos, o ambiente, os transportes urbanos, a educação, a cultura, o saneamento básico, entre outros.
O município português é, em média, maior que os dos países da Europa que nos estão próximos, aproximando-se mais da realidade existente em alguns países nórdicos e, em certa medida, na Inglaterra (que, por sua vez, também reduziu o número de entes locais após 1974). A semelhança com a Inglaterra e o País de Gales verifica-se em dois planos: a existência de uma autarquia local de nível vicinal e uma autarquia local mais ampla e com mais poderes a nível imediatamente superior4.
Atualmente existem 4259 freguesias, distribuídas por 308 municípios. Destes últimos, 278 situam-se no Continente, 19 na Região Autónoma dos Açores e 11 na Região Autónoma da Madeira.
Sobre esta matéria importa citar, por fim, a info-folha A Divisão Administrativa em Portugal, da autoria de Leonor Calvão Borges, onde a autora procura identificar todas as formas utilizadas de divisão administrativa em Portugal, apresentar os seus objetivos e propostas de alteração, bem como a evolução dos cargos (funções e designação) administrativos. Elabora, ainda, um pequeno historial das iniciativas apresentadas e discutidas na instituição parlamentar, quer tenham sido aprovadas ou rejeitadas, apresentando, no final, (») alguns números relativos às várias formas de divisão administrativa e correspondentes mapas, para melhor perceção do problema.

Constituição da República Portuguesa — autarquias locais: A Constituição da República Portuguesa (CRP), no artigo 6.º, determina que o Estado é unitário e respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular e os princípios da subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da Administração Pública.
Segundo os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, a locução «autonomia das autarquias locais» é, literalmente, pleonástica (porque autarquias locais pressupõem autonomia). O seu alcance útil consiste na atribuição às autarquias locais de um acervo de poderes próprios (inclusive poderes normativos) a exercer de harmonia com opções por eles livremente feitas no respeito do princípio democrático5.
No mesmo sentido, os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira defendem que o princípio da autonomia local — a expressão «autonomia das autarquias locais» é pleonástica — significa, designadamente, que as autarquias locais são formas de administração autónoma territorial, de descentralização territorial do Estado, dotadas de órgãos próprios, de atribuições específicas correspondentes a interesses próprios e não meras formas de administração indireta ou mediata do Estado, o que não exclui, em certos termos, a tutela estadual (cfr. artigo 242.º)6.
A organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais, de acordo com o estabelecido no n.º 1 do artigo 235.º da Constituição da República Portuguesa, acrescentando o n.º 2 que as autarquias locais são pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas.
Em nota a este artigo, os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira escrevem que no n.º 1 estabelece-se que a «organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais».
Este enunciado linguístico aponta para dimensões importantes da constitucionalização do poder local: (1) em primeiro lugar, as autarquias constituem um pilar da própria organização democrático-constitucional do Estado, e não um simples dado orgânico-sociológico, preexistente à própria conformação constitucional da organização do poder político; (2) em segundo lugar, a administração local é configurada como uma administração política, democraticamente legitimada, e só nesta veste ela pode afirmar-se como dimensão da organização democrática do Estado; (3) em terceiro lugar, as autarquias locais são a expressão imediata da organização democrática do poder político republicano e não meras corporações administrativas de «administração indireta» do Estado; (4) em quarto lugar, a legitimação constitucional da autonomia local não 4 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, págs.
517 e 518.
5 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Tomo I. Coimbra Editora, 2006, pág. 79.
6 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume I. Coimbra Editora, 2007, pág. 234.

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converte as autarquias locais em «pequenas repúblicas autónomas», pois elas não podem deixar de estar «compreendidas» na organização democrática do Estado7.
Sobre esta matéria acrescentam ainda que, quanto à sua natureza jurídica, as autarquias locais são pessoas coletivas territoriais (n.º 2). A personalização jurídica é um pressuposto essencial da autonomia, permitindo a impostação jurídica dos interesses locais. Elas são pessoas jurídicas distintas do Estado stricto sensu, isto é, do Estado central, e não elementos ou componentes dele. A natureza territorial significa que o território constitui o elemento estruturante principal da autarquia, pois serve de (a) elemento de referência para determinar os sujeitos da pessoa coletiva; (b) elemento de individualização dos interesses a satisfazer; (c) e elemento de conotação do objeto (pessoas e bens) dos poderes e direitos atribuídos ao ente territorial (território com âmbito do exercício do poder)8.
A criação ou a extinção de municípios, bem como a alteração da respetiva área, é efetuada por lei, precedendo consulta dos órgãos das autarquias abrangidas (artigo 249.º da Constituição da República Portuguesa).
Os Professores Drs. Gomes Canotilho e Vital Moreira consideram que a garantia constitucional das autarquias locais (n.º 1) tem um sentido institucional — garantia institucional — e não um sentido individual.
Assegura-se a existência da forma de organização territorial autárquica, mas não se garante um direito individual à criação de uma certa autarquia nem se protege um verdadeiro direito de não extinção.
Obviamente, a extinção de autarquias locais está sempre condicionada pelo princípio da necessidade e deve ter como pressuposto exigências ou fins de interesse põblico (»). E o princípio constitucional da participação democrática exigirá que qualquer alteração que afete a existência ou a delimitação territorial de uma autarquia não seja tomada sem que ela seja devidamente consultada. É evidente que a extinção de uma autarquia só pode fazer-se por fusão ou por incorporação noutra(s), pois não pode existir vazio autárquico, sendo essa de resto uma das dimensões da referida garantia institucional. Do mesmo modo, a criação de uma nova autarquia só pode ser efetuada por divisão ou desanexação de outra(s), que assim são diretamente interessadas no processo9.
E desenvolvem esta importante questão afirmando que compete à lei restabelecer a divisão administrativa do território (n.º 4), delimitando as diferentes autarquias. A garantia constitucional da autonomia local não inclui um direito de cada autarquia à manutenção da sua própria existência ou dos seus limites territoriais. A lei pode modificar as fronteiras, criar novas autarquias por cisão ou fusão de outras, extingui-las por divisão ou incorporação em outras. Ponto é que o não faça de forma arbitrária ou desnecessária, ou sem audição das autarquias abrangidas (cfr. artigos 249.º e 256.º, que devem considerar-se expressão de um princípio geral)10.
Sobre esta matéria os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros consideram que a modificação do município respeita não apenas à alteração da área dos municípios, mas também à criação e à extinção dos municípios.
A Constituição atribui o poder de proceder à modificação do município mediante consulta dos órgãos das autarquias abrangidas. Não parece, portanto, que preveja um direito dos municípios à existência ou à inalterabilidade territorial, ainda que o poder de proceder à modificação de um município não seja absoluto, havendo que respeitar requisitos de razoabilidade e democraticidade11.
Em matéria de modificação dos municípios, o legislador encontra-se ainda vinculado a certos limites materiais. O princípio da proporcionalidade é um dos limites a ser considerado. A criação, alteração ou extinção de municípios terá de ser adequada, atendendo ao fim que se pretende alcançar, necessária, procurando ser a menos lesiva possível, e equilibrada, no sentido de os benefícios dela resultantes suplantarem os seus custos.
Requisito igualmente importante é a viabilidade e sustentabilidade dos novos municípios, que se traduz na verificação de certas condições económico-financeiras e de índices demográficos, geográficos e sociais, de modo a assegurar a existência das novas autarquias locais. 7 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, págs. 714 e 715.
8 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, pág. 716.
9 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, págs. 715 e 716.
10 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, págs. 720 e 721 11 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, págs. 518 e 519.

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Ao criar, extinguir ou alterar a área de um município o legislador deverá também ter em conta os circunstancialismos histórico-culturais dos municípios em questão. Na verdade, não parece ter sido intenção da Constituição atribuir um poder ao legislador que lhe permitisse proceder à modificação de municípios descurando a dimensão histórica e cultural que poderá estar associada, em muitos casos, a alguns municípios (cfr. artigo 3.º da Lei n.º 11/82, de 2 de junho).
Finalmente, dever-se-á atender ao princípio da prossecução do bem comum. A necessidade de se considerar o bem comum na modificação de municípios não é inédita, surgindo logo na Constituição de 1822, cujo artigo 219.º dispunha que haveria Câmaras em todos os povos, onde assim conviesse ao bem público. E a mesma ideia surge nas Leis n.os 11/82, de 2 de junho, e 142/85, de 1 de novembro, que obrigam a ter em conta os «interesses de ordem nacional e regional ou local em causa» (artigos 3.º, alínea C9, e 2.º, alínea d), respetivamente)12.
Interessante é também refletir sobre a possibilidade de os municípios concretamente envolvidos no processo de criação, alteração e extinção, poderem ou não recorrer ao referendo, nos termos do artigo 240.º.
Concluem os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros que o artigo 240.º dispõe que as autarquias locais podem submeter a referendo dos respetivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas competências dos seus órgãos, não fazendo qualquer referência a competências exclusivas. Parece, assim (») ser possível a realização de um referendo local em caso de modificação de um município, na medida que os órgãos da autarquia envolvida dispõem de competência sobre a matéria, ainda que consultiva13.
Importa, uma vez mais, citar sobre o assunto das autarquias locais, os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros: porque a organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais, em toda a comunidade política portuguesa e em todo o seu território tem de haver autarquias locais. Nenhuma parcela do país pode deixar de estar organizada sob a forma de autarquia local.
Ou seja, a Constituição não só garante como impõe a existência de autarquias locais em todo o País. Mas não de todas as categoria de autarquias. Se o País tem de estar todo organizado por freguesias e municípios, já as regiões administrativas podem não estar criadas em concreto14.
Já o artigo 236.º da Constituição da República Portuguesa, artigo que vem consagrar as categorias de autarquias locais e divisão administrativa, determina, no n.º 1, que no Continente as autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas e, no n.º 4, que a divisão administrativa do território será estabelecida por lei.
Fiel à tradição portuguesa — e à de muitos outros países —, a Constituição manteve um sistema de autarquias estruturado em três níveis territoriais, instituindo três categorias de autarquias locais: a freguesia, o município e a região administrativa (n.º 1)15.
A freguesia é, assim, a divisão administrativa mais pequena de Portugal, embora não constitua uma fração de um município. É, sim, uma entidade verdadeiramente autónoma. Como afirmam os Professores Drs.
Gomes Canotilho e Vital Moreira, a freguesia é a autarquia local de base. Frequentemente de dimensão reduzida, ç grande o seu nõmero, competindo á lei as respetivas competências. (») As freguesias não constituem frações dos municípios, sendo constitucionalmente concebidos como verdadeiros entes territoriais autónomos. Por isso não podem ser transformadas em simples órgãos periféricos dos municípios (nem, obviamente, da Administração central)16.
Os órgãos representativos da freguesia são a assembleia de freguesia e a junta de freguesia (artigo 244.º da Constituição da República Portuguesa). A assembleia de freguesia é o órgão deliberativo da freguesia, podendo a lei determinar que nas freguesias de população diminuta a assembleia de freguesia seja substituída pelo plenário dos cidadãos eleitores (artigo 245.º da Constituição da República Portuguesa). A junta de freguesia é o órgão executivo colegial da freguesia (artigo 246.º).
Os órgãos das autarquias locais são eleitos por sufrágio universal direto, excetuando a junta de freguesia, cujo presidente é eleito pela assembleia de freguesia. 12 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 520.
13 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 521.
14 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 446 15 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, págs. 719 e 720 16 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, pág. 751

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Relativamente ao município, a Constituição não procede à sua definição — afirmam os Professores Drs.
Jorge Miranda e Rui Medeiros —, preferindo, antes, considerar de imediato a questão das modificações que os municípios em concreto possam sofrer e, em seguida, determinar os respetivos órgãos17.
Os órgãos representativos do município são a assembleia municipal e a câmara municipal (artigo 250.º da Constituição da República Portuguesa). A assembleia municipal é o órgão deliberativo do município e é constituída por membros eleitos diretamente em número superior ao dos presidentes de junta de freguesia, que a integram (artigo 251.º da Constituição da República Portuguesa) enquanto a câmara municipal é o órgão executivo colegial do município (artigo 252.º da Constituição da República Portuguesa).
O artigo 238.º da Constituição da República Portuguesa, sobre património e finanças locais, determina, nomeadamente, que as autarquias locais têm património e finanças próprios, dispondo ainda de poderes tributários, nos casos e termos previstos na lei (n.os 1 e 4). De sublinhar também que, de acordo com o artigo 241.º da Constituição da República Portuguesa, as autarquias locais dispõem de poder regulamentar próprio nos limites da Constituição, das leis e dos regulamentos emanados das autarquias de grau superior ou das autoridades com poder tutelar.
A última questão que cumpre destacar é a da competência legislativa da Assembleia da República sobre a matéria das autarquias locais. Nos termos da alínea n) do artigo 164.º da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre a criação, extinção e modificação de autarquias locais e respetivo regime, sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas. Por outro lado, de acordo com a alínea q), do n.º 1, do artigo 165.º da Constituição é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar, salvo autorização ao Governo, sobre o estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais. Importa reter as palavras dos Professores Drs. Gomes Canotilho e de Vital Moreira sobre este assunto: o que a alínea q) reserva exclusivamente para a Assembleia da República é o regime que há-se disciplinar a criação, a extinção e modificação de autarquias locais e não estes mesmos atos (os quais devem revestir elesmesmos forma legislativa: (cfr. artigos 235.º-4, 246.º e 253.º). A criação concreta (bem como a extinção ou modificação) pode, depois, na base dessa lei, ser efetuada por outro ato legislativo da própria Assembleia da República, do Governo ou das assembleias legislativas das regiões autónomas (cfr. artigo 227.º, n.º, alínea l), conforme os casos. Trata-se, portanto, de um caso típico de lei-quadro ou lei de enquadramento, que vincula as leis que lhe dão execução18.
Para os Professores Drs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, a criação, a extinção e a modificação territorial das autarquias locais (incluindo o desmembramento ou a fusão) dependem de lei — e lei da Assembleia da República no Continente (artigo 164.º, alínea n), ou decreto legislativo regional (artigos 227.º, n.º 1, alínea l), e 232.º, n.º 1). (») Aquela lei — aparentemente individual, por dizer respeito a esta ou àquela autarquia, embora com pleno conteúdo normativo pelas consequências substantivas e organizatórias que comporta — está, porém, subordinada a uma lei de valor reforçado — à que estatui o regime de criação, extinção e modificação territorial das autarquias locais (mesmo artigo 164.º, alínea n)19.
A alínea n) do artigo 288.º da Constituição dispõe que as leis de revisão constitucional terão de respeitar a autonomia das autarquias locais, sublinhando que a garantia da autonomia local se impõe ao próprio poder de revisão constitucional, visto que ela constitui um dos explícitos limites materiais de revisão.
Para finalizar, são ainda de destacar mais alguns artigos da Constituição da República Portuguesa. No Capítulo I — Princípios Gerais, do Título VIII — Poder Local, os artigos: 237.º — Descentralização administrativa, 239.º — Órgãos deliberativos e executivos, 240.º — Referendo local, 242.º — Tutela administrativa e 243.º — Pessoal das autarquias locais. No Capítulo II — Freguesia, do mesmo título, os artigos: 247.º — Associação e 248.º — Delegação de tarefas, enquanto do Capítulo III — Município, se distinguem os artigos 253.º — Associação e federação e 254.º — Participação nas receitas dos impostos diretos. Por último, menciona-se o Capítulo V sobre as Organizações de moradores.
17 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 518 18 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume II. Coimbra Editora, 2007, pág. 315 19 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo III. Coimbra Editora, 2006, pág. 451

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Memorando de Entendimento, Programa do Governo e outros documentos: Em 17 de maio de 2011 foi assinado o Memorando de Entendimento que prevê, nomeadamente, como medida para aumentar a eficiência e a eficácia na Administração Pública a reorganização da estrutura da administração local. No ponto 3.44 pode ler-se o seguinte:

Existem atualmente 308 municípios e 4.259 freguesias. Até julho 2012 o Governo desenvolverá um plano de consolidação para reorganizar e reduzir significativamente o número destas entidades. O Governo implementará estes planos baseado num acordo com a CE e o FMI. Estas alterações, que deverão entrar em vigor no próximo ciclo eleitoral local, reforçarão a prestação do serviço público, aumentarão a eficiência e reduzirão custos.
Na sequência dos compromissos assumidos, o Programa do XIX Governo Constitucional propõe a descentralização e a reforma administrativa, o aprofundamento do municipalismo, o reforço das competências das associações de municípios e a promoção da coesão e competitividade territorial através do poder local.
No capítulo referente à administração local e reforma administrativa assume-se que o Governo promoverá um acordo político alargado que viabilize uma reorganização do mapa administrativo visando a otimização e racionalização do número de órgãos autárquicos, bem como das respetivas competências, com uma análise detalhada ao sector empresarial local quanto ao pressuposto da respetiva utilidade pública e da racionalização sustentada da despesa.
Aqueles objetivos reformadores podem ser encontrados na Resolução do Conselho de Ministros n.º 40/2011, de 22 de setembro. Efetivamente, e segundo, o respetivo preâmbulo, conforme ficou oportunamente assumido no Programa do Governo, são quatro os vetores estratégicos que importa ter presente no âmbito das medidas tendentes à obtenção de um novo paradigma de responsabilidade e de valorização da eficiência na afetação de recursos destinados ao desenvolvimento social, económico, cultural e ambiental das várias regiões do País, sempre sob o acervo proporcionado pelo princípio da subsidiariedade: a descentralização e a reforma administrativa; o aprofundamento do municipalismo; o reforço do associativismo municipal e a promoção da coesão e competitividade territorial através do poder local.
Com este diploma visa-se ainda aprovar as orientações e medidas prioritárias a adotar no âmbito da reforma que se pretende levar a cabo na administração local autárquica, mediante a concertação com todos os poderes públicos envolvidos e o aprofundamento do estudo e do debate sobre as novas perspetivas de organização local, de competências, de financiamento e de transferência de recursos, assim como relativamente ao atual enquadramento eleitoral autárquico. Pretende-se, assim, obter um acordo político efetivo e alargado que viabilize a efetiva reorganização do mapa administrativo autárquico, bem como a adequação material do acervo de atribuições e competências face aos novos desafios, sem esquecer a especificidade do sector empresarial local, designadamente no que respeita às utilidades públicas envolvidas, de modo a veicular a sustentabilidade das próprias estruturas empresariais.
Especificamente sobre a organização do território e as freguesias importa salientar o ponto 4.2 que prevê, nomeadamente, na alínea a), a revisão do atual mapa administrativo, com vista à redução substancial do atual número de freguesias, designadamente por via de soluções que veiculem a respetiva aglomeração, dotandoas de escala e de dimensão mais adequadas, atentas as respetivas tipologias e desde que salvaguardadas as especificidades locais; na alínea b), a elaboração de uma matriz de critérios demográficos e geográficos suficientemente habilitadores das opções a tomar, tendo presente a tipologia decorrente das noções de freguesia predominantemente urbana, de freguesia maioritariamente urbana e de freguesia predominantemente rural; e na alínea d), estimular o processo de integração de municípios, tendo por pressuposto o respeito pelas especificidades e identidades territoriais próprias.
De destacar, por último, o ponto 4.4 relativo à democracia local, onde se prevê a promoção da discussão política e cívica relativamente às alterações a introduzir no enquadramento legal autárquico, nomeadamente no que respeita às temáticas estruturantes da organização do território e definição das sedes das freguesias e das atribuições das freguesias e competências dos seus órgãos.
Com o fim de contribuir para o debate sobre esta matéria, o Governo, através do Gabinete do Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, apresentou, em setembro de 2011, o Documento Verde da Reforma da Administração Local. Segundo o preâmbulo, este documento pretende ser o ponto de partida para um debate que se pretende alargado à sociedade portuguesa, com o objetivo de no final do 1.º semestre de 2012

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estarem lançadas as bases e o suporte legislativo de um municipalismo mais forte, mais sustentado e mais eficaz.
Nos objetivos específicos definidos no 2.º Capítulo referente à organização do território, define-se como determinante reorganizar o mapa administrativo através da redução do número de freguesias, criar novas freguesias, com ganhos de escala e dimensão, gerando a descentralização de novas competências e o reforço da sua atuação, salvaguardar as especificidades locais, diferenciando áreas de baixa e alta densidade populacional e distinguindo áreas urbanas e áreas rurais, considerar a contiguidade territorial como um fator determinante, propiciar uma redefinição das atribuições e competências entre os municípios e as freguesias, incentivar a fusão de municípios, tendo como base a identidade e a continuidade territoriais, sem prejuízo de uma fase posterior da definição de um novo quadro orientador da alteração do mosaico municipal e incentivar a fusão de municípios, tendo como base a identidade e a continuidade territoriais.
No âmbito da organização do território, e na sequência da assinatura do Memorando de Entendimento, a redução do número de freguesias e a fusão de municípios foi assumida pelo Governo como uma prioridade, tendo já sido concretizada no Programa do Governo e na Resolução do Conselho de Ministros n.º 40/2011, de 22 de setembro.
Por último, é importante nomear os sítios da Associação Nacional de Freguesias — ANAFRE, onde pode ser consultada múltipla informação sobre todas as freguesias portuguesas, e da Associação Nacional de Municípios Portugueses — ANMP, que reúne diversa e aprofundada informação relativamente aos municípios de Portugal.

Legislação relativa a autarquias locais: A legislação relativa a autarquias locais encontra-se dispersa por diversos diplomas.
Cumpre destacar, em primeiro lugar, a Lei n.º 11/82, de 2 de junho, que aprovou o regime de criação e extinção das autarquias locais e de designação e determinação da categoria das povoações. Este diploma foi alterado pela Lei n.º 8/93, de 5 de março.
Nos termos dos artigos 1.º e 2.º, compete à Assembleia da República legislar sobre a criação ou extinção das autarquias locais e fixação dos limites da respetiva circunscrição territorial e sobre a designação e a determinação da categoria das povoações (com exceção da parte respeitante às freguesias que foi revogada pela Lei n.º 8/93, de 5 de março.). De acordo com o disposto no artigo 3.º, o Parlamento, na apreciação das respetivas iniciativas legislativas, deve ter em conta os pertinentes índices geográficos, demográficos, sociais, culturais e económicos, as razões de ordem histórica; os interesses de ordem geral e local em causa, bem como as repercussões administrativas e financeiras da alteração pretendida, e os pareceres e apreciações expressos pelos órgãos do poder local.
A Lei n.º 8/93, de 5 de março, veio consagrar o regime jurídico de criação de freguesias. Este diploma sofreu as alterações introduzidas pela Lei n.º 51-A/93, de 9 de julho.
Nos termos do artigo 2.º, a criação de freguesias incumbe à Assembleia da República, no respeito pelo regime geral definido na presente lei-quadro. O artigo 3.º acrescenta que na apreciação das iniciativas legislativas que visem a criação de freguesias deve a Assembleia da República ter em conta a vontade das populações abrangidas, expressa através de parecer dos órgãos autárquicos representativos a que alude a alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º desta lei, razões de ordem histórica, geográfica, demográfica, económica, social e cultural e a viabilidade político-administrativa, aferida pelos interesses de ordem geral ou local em causa, bem como pelas repercussões administrativas e financeiras das alterações pretendidas.
Na sequência dos princípios constantes da já referida Lei n.º 11/82, de 2 de junho, sobre o regime de criação e extinção das autarquias locais e de determinação da categoria das povoações, foi publicada a Lei n.º 142/85, de 18 de novembro — Lei-Quadro da Criação de Municípios. Este diploma sofreu as modificações introduzidas pela Lei n.º 124/97, de 27 de novembro, Lei n.º 32/98, de 18 de julho, e Lei n.º 48/99, de 16 de junho, da qual também pode ser consultada uma versão consolidada.
Mais tarde, a Lei n.º 48/99, de 16 de junho, veio estabelecer o regime de instalação de novos municípios.
Importa também citar a Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, que estabeleceu o quadro de competências, assim como o regime de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias, diploma que foi alterado pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de janeiro, e Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro.

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A Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, aprovou a Lei das Finanças Locais, tendo sido retificada pela Declaração de Retificação n.º 14/2007, de 15 de fevereiro, e sofrido as alterações introduzidas pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, e Lei n.º 64-B/2011 de 30 de dezembro. Deste diploma também se encontra disponível uma versão consolidada.
Sobre a legislação consolidada relativa às autarquias locais e outras temáticas conexas pode ser consultado o dossiê Autarquias Locais.

Proposta de lei n.º 44/XII (1.ª): A presente iniciativa prevê no artigo 12.º a criação de uma Unidade Técnica para a Reorganização Administrativa do Território, que funciona junto da Assembleia da República e à qual compete:

a) Acompanhar e apoiar a Assembleia da República no processo de reorganização administrativa territorial autárquica, nos termos da presente lei; b) Apresentar à Assembleia da República propostas concretas de reorganização administrativa do território das freguesias, em caso de ausência de pronúncia das assembleias municipais; c) Elaborar parecer sobre a conformidade ou desconformidade das pronúncias das assembleias municipais com os princípios e parâmetros de agregação previstos na presente lei e apresentá-lo à Assembleia da República; d) Propor a apresentação às assembleias municipais, no caso de desconformidade da respetiva pronúncia, projetos de reorganização administrativa do território das freguesias.

De destacar o n.º 4 do artigo 9.º e o n.º 5 do artigo 14.º que determinam, respetivamente, que a participação no Fundo de Financiamento das Freguesias (FFF) da freguesia criada por agregação é aumentada em 15% até ao final do mandato seguinte à agregação e que a participação no Fundo de Garantia Municipal (FGM) do município criado por fusão é aumentada em 15% até ao final do mandato seguinte à fusão.
A iniciativa agora apresentada revoga o artigo 33.º da Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro (Lei das Finanças Locais), artigo este referente à majoração do FFF para a fusão de freguesias, e que determina o seguinte:

«1 — Quando se verifique a fusão de freguesias a respetiva participação no FFF é aumentada de 10%, em dotação inscrita no Orçamento do Estado, até ao final do mandato seguinte à fusão, nos termos do regime jurídico de criação, extinção e modificação de autarquias locais.
2 — A verba para as freguesias fundidas, prevista no número anterior, é inscrita anualmente na lei do Orçamento do Estado.»

No caso de fusão de municípios, a Direção-Geral das Autarquias Locais assegura o acompanhamento e o apoio técnico ao respetivo processo (n.º 3 do artigo 14.º).
A proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) prevê ainda a revogação das já anteriormente referidas, Leis n.os 11/82, de 2 de junho (Regime de criação e extinção das autarquias locais e de designação e determinação da categoria das povoações) e 8/93, de 5 de março (Regime jurídico de criação de freguesias).

Enquadramento doutrinário/bibliográfico: Bibliografia específica:

Magalhães, Joaquim Romero — Concelhos e organização municipal na época moderna. Coimbra.
Imprensa da Universidade de Coimbra, 2011. ISBN 978-989-26-0096-3. Cota: 04.36 — 244/2011 Resumo: Esta obra agrupa artigos sobre concelhos e aspetos da organização municipal no Reino, ilhas e partes ultramarinas, desde finais do século XV. Este Estado moderno, ou de antigo regime, assenta nos equilíbrios sociais conferidos em lei pelos privilégios que se implantam de modo diverso pelo território em que é reconhecida uma mesma soberania régia. A organização administrativa deste Estado representa-se como um aglomerado de diferenças em que a igualdade jurídica não é um princípio que possa fundamentar o

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raciocínio político e social. Nesta obra o autor faz uma reflexão sobre a estrutura municipal portuguesa de uma rede de mais de 816 comunidades por todo o Reino, número que se modificou ao longo da época moderna por vontade do soberano, ou a pedido de alguma comunidade.

Oliveira, António Cândido de — Debate sobre a reforma da administração local em Portugal: um breve contributo. Direito regional e local. Braga. ISSN 1646-8392. N.º 16 (out./dez. 2011), p. 5-12. Cota: RP-816 Resumo: Este artigo pretende contribuir para o debate público do objetivo da redução do número de freguesias e dos constrangimentos constitucionais a mais uma vasta reforma da nossa administração local, fazendo também uma breve referência ao tema da regionalização administrativa.

Oliveira, António Cândido de — É necessária uma reforma territorial das freguesias? Direito regional e local. Braga. ISSN 1646-8392. N.º 13 (jan./mar. 2011), p. 5-9. Cota: RP-816 Resumo: Neste artigo o autor propõe-se falar das freguesias que ao longo da nossa história, desde o período liberal, nunca foram objeto de uma reforma territorial significativa. Refletindo sobre as reformas territoriais em Portugal e em países da Europa, o autor defende que faz todo o sentido promover apenas reformas pontuais da administração local, saudando o trabalho que está a ser desenvolvido no município de Lisboa a este respeito.

Rebelo, Marta — As finanças locais e o plano de ajustamento da troika: a dimensão financeira óptima dos municípios no quadro de reorganização autárquica. Coimbra. Almedina, 2011. ISBN 978-972-40-4704-1. Cota: 24 — 678/2011 Resumo: O presente estudo configura-se como um contributo jurídico e financeiro para a reorganização do território autárquico municipal, determinado pela troika no Memorando de Entendimento, que prevê a redução significativa do número de municípios e freguesias.
A autora advoga que as finanças locais ou a gestão da seleção das competências e das despesas públicas municipais deve ser um critério preponderante nesta reforma da divisão do território autárquico, tendo como objetivos a melhoria da eficiência e redução de custos, mas no respeito da tradição do nosso municipalismo.

Soares, Alberto Ribeiro — Autarquias em 2011: análise do mapa autárquico: uma proposta de reestruturação. Revista militar. Lisboa. Vol. 63, n.º 8/9 (go/set. 2011), p. 1023-1078. Cota: RP-401 Resumo: Este estudo apresenta-se como um contributo para concretizar as imposições da troika relativas à reforma da administração pública local, apresentando propostas destinadas a harmonizar a nova divisão administrativa do país, tendo em consideração as realidades da geografia e da demografia, mas não esquecendo os fatores da interioridade e do isolamento de algumas comunidades. A intenção é racionalizar o que, neste caso, implica reduzir, procurando normalmente a fusão dos concelhos e freguesias existentes.

Enquadramento internacional: Países europeus: Atendendo à especificidade que cada país apresenta relativamente à organização administrativa territorial, entendemos incluir, no enquadramento internacional, apenas a França, visto que, a partir de 2010, introduziu uma profunda reforma na sua organização administrativa territorial.

França: Em França la région, le département, la commune, les collectivités à statut particuleir e a Collectivité d'Outre-mer são formas de organização administrativa do território que fazem parte de um conceito mais lato designado por collectivités territoriales. Constituem o quadro institucional da participação dos cidadãos na vida local e garantem a expressão da sua diversidade.
As coletividades territoriais são pessoas coletivas de direito público, com competências próprias, poder deliberativo, executivo e regulamentar.
A administração das coletividades territoriais sobre um determinado território é distinta da do Estado. A repartição das competências entre estas e o Estado é efetuada por forma a distinguir, dentro do possível, as que dizem respeito ao Estada e as que são reservadas às coletividades territoriais. Concorrem com o Estado

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na administração e organização do território, no desenvolvimento económico, social, sanitário, cultural e científico, assim como na proteção do ambiente, na luta contra o efeito de estufa e na melhoria da qualidade de vida.
A partir de 2008 as entidades governamentais, responsáveis pela organização territorial do país, encetaram medidas no sentido de modificar a legislação respeitante a esta matéria, simplificando-a, por forma a reforçar a democracia local e tornar o território mais atrativo.
A Lei n.º 2010-1563, de 16 de dezembro, define as grandes orientações, assim com o calendário de aplicação da profunda reforma da organização territorial. Procede à complementaridade de funcionamento entre as diversas entidades territoriais, designadamente através da criação de um conseiller territorial, que tem assento tanto no département como na région. De forma simplificada, visa pôr fim à concorrência de funções, às despesas redundantes, à criação, fusão e extinção de entidades territoriais.
Os conseillers territoriaux com assento, ao mesmo tempo, no conseil regional e no conseil général du département são eleitos por voto uninominal, a duas voltas, por um período de seis anos. São as entidades que contribuem para uma melhor adaptação da repartição das competências às especificidades locais. Seis meses, após a sua eleição, elaboram um esquema regional que define e otimiza a repartição das competências entre a region e os départements.
O Code Général des Collectivités Territoriales enquadra os princípios fundamentais orientadores da organização territorial.
Para além do portal do Ministério do Interior, do Ultramar, das Coletividades Territoriais e da Imigração que apresenta um guia detalhado para o acompanhamento das alterações introduzidas pela Lei n.º 2010-1563, de 16 de dezembro, na organização territorial do país, a Direção de Informação Legal e Administrativa — Vie Publique disponibiliza toda a informação relativa às coletividades territoriais.

IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Iniciativas legislativas e petições: Efetuada consulta à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) não apurámos a existência de iniciativas legislativas nem petições pendentes sobre a mesma matéria20.

V — Consultas e contributos

Consultas obrigatórias: Nos termos do n.os 1, alínea a), e 3 do artigo 4.º da Lei n.º 54/98, de 18 de agosto — Associações representativas dos municípios e das freguesias —, e do artigo 141.º do Regimento da Assembleia da República, deve ser promovida a consulta da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE), bem como dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, consulta solicitada pelo Gabinete de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República.

VI — Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação

Relativamente aos previsíveis encargos com a aplicação desta iniciativa, tendo em conta a informação disponível, não parece que seja possível aferir, em concreto, quais os custos (diretos ou indiretos) envolvidos.

A Divisão de Redação e Apoio Audiovisual. 20 As únicas iniciativas pendentes encontradas, após pesquisa da base de dados PLC, reportam-se à «Reorganização administrativa de Lisboa» — projetos de lei n.os 120/XII (1.ª), do PSD e PS, e 164/XII (1.ª), do CDS-PP.

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