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21 | II Série A - Número: 165 | 18 de Abril de 2012

(balanço custo/benefício), sendo a previsão de que as dificuldades de prova da origem ilícita do rendimento não facilitarão o seu aproveitamento fator fortemente desmotivador da violação dos deveres destinados a assegurar a probidade do serviço público.
Deste modo, mesmo que fosse exato – e não acompanho o acórdão nessa interpretação – que a nova tipificação pressupõe necessariamente a origem ilícita do enriquecimento e se destina a funcionar como mero ―sucedàneo‖ de outras incriminações e visa tutelar os mesmos bens jurídicos, não estaria o legislador impedido de consagrá-la.
Mas o que me parece decisivo é que a transparência da situação patrimonial dos titulares ou agentes do poder público é, por si mesmo, fortemente incentivadora da confiança dos cidadãos na imparcialidade ou probidade da sua atuação. A confiança dos cidadãos e nas instituições públicas e, sobretudo, na capacidade do Estado de fazer cumprir as suas regras por parte dos que o servem, é um fator crucial da existência e coesão das sociedades democráticas. A transparência da situação patrimonial dos servidores públicos, a revelação da congruência entre a evolução da riqueza no período de exercício do cargo e os rendimentos lícitos conhecidos, constitui um meio de fomento ou um travão à erosão da confiança na imparcialidade no exercício das funções do Estado. Estamos, assim, perante um bem jurídico coletivo, inerente à organização democrática do Estado, e é isso que legitima que aos titulares de cargos políticos e equiparados e a titulares de altos cargos públicos já há muito se imponha a apresentação no Tribunal Constitucional da declaração de património e rendimentos, nos termos da Lei n.º 4/83, de 2 de abril, alterada por último pela Lei 36/2010, de 2 de setembro. A confiança da comunidade no são funcionamento das instituições democráticas é um valor constitucional fundamental e, portanto, um bem jurídico com ―dignidade penal‖. A atuação funcional dos agentes põblicos tem de poder ser vista ―como determinada exclusivamente com base em critçrios próprios, adequados ao cumprimento das suas funções específicas no quadro da atividade geral do Estado, e na exata medida em que os critçrios não sejam substituídos ou distorcidos por interesses alheios á função‖ (transpondo aqui para todas as funções do Estado lato sensu o que sobre a imparcialidade da Administração disse Vieira de Andrade, ―A Imparcialidade da Administração como Princípio Constitucional, Boletim da Faculdade de Direito, Volume L, 1974, Coimbra, pág. 224). Não é, por isso constitucionalmente ilegítimo, que, ―partindo da circunstância factual objetiva do enriquecimento desproporcionado ao rendimentos lícitos conhecidos ou declarados, se possa construir uma incriminação que previna e sancione o enriquecimento por causa desconhecida‖ [Germano Marques da Silva ―Sobre a Incriminação do Enriquecimento Ilícito (não justificado ou não declarado) – Breves Considerações nas Perspetivas Dogmática e de Política Criminal‖ Homenagem de Viseu a Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra editora, pág. 51].
Apesar disto, ainda acompanho o acórdão na conclusão de que a incriminação constante do aditando artigo 386.º do Código Penal, mesmo no grau de evidência em que o controlo de constitucionalidade tem de conter-se neste domínio, viola o princípio da proporcionalidade.
Com efeito, do que se trata nas tipificações agora consideradas não é de punir os factos ilícitos geradores do enriquecimento, factos que serão ou poderão ser sempre puníveis autonomamente quando ilícitos; é a falta de transparência sobre as causas de enriquecimento que é incriminada, embora conjugada ou revelada por uma situação patrimonial desproporcionada aos rendimentos de origem lícita conhecidos ou declarados. Ora, a imposição desse dever a todo e qualquer funcionário, na lata aceção penalmente relevante do termo ―funcionário‖, mesmo quando não lhe estejam cometidos poderes suscetíveis de condicionar seja a preparação, formação ou tomada de decisão, seja a conformação da execução desta, ou as opções de prestação do serviço público, é flagrantemente desnecessária (por não existir aí o perigo que se visa prevenir) e excessiva, porque a carga ofensiva que comporta para outros direitos fundamentais, como o direito à reserva da vida privada do próprio e de terceiros, não tem a legitimá-la aquela necessidade.
Porém, o mesmo não sucede relativamente aos agentes sobre os quais já hoje impende o dever de declarar em termos extrafiscais o património e rendimentos, e que são aqueles a que corresponde o âmbito subjetivo de aplicação do artigo 27.º-A da Lei n.º 34/87, de 16 de julho. A exigência de transparência sobre as causas do enriquecimento, cujo desrespeito é punido mediante a incriminação do ―enriquecimento ilícito‖ ç, aqui, um crime específico de um certo tipo de agentes, a quem a lei legitimamente impõe um dever especial de transparência (cfr. artigo 4.º da Lei n.º 4/83, de 2 de abril, na redação que lhe conferiu a Lei n.º 38/2010, de 2 de setembro). Há um prévio dever de comunicar com verdade que obriga os sujeitos deste crime a declarar os seus bens e a fonte dos rendimentos e que pelas razões já aduzidas se destina a proteger as condições

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