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32 | II Série A - Número: 209S1 | 11 de Julho de 2012

Parte II – Opinião do relator

Não prescindindo de, em momento ulterior, tomar posição quanto ao conjunto das alterações que a presente proposta de lei introduz ao Código de Processo Penal, entende a relatora expressar aqui a sua opinião relativamente a duas matérias que reputa da maior importância face às suas implicações na estrutura que atualmente conforma o Código de Processo Penal português.
Uma delas prende-se com a possibilidade de utilização das declarações prestadas pelo arguido na fase de inquérito e de instrução, em sede de audiência de julgamento, quando prestadas perante autoridade judiciária, na presença obrigatória de defensor e com a advertência expressa do arguido de que, se não exercer o seu direito ao silêncio, as declarações que prestar podem ser futuramente utilizadas e valoradas como meio de prova no processo.
A primeira perplexidade está na construção deste novo meio de prova, que se alheia por completo da estrutura acusatória do processo penal, constitucionalmente consagrada no n.º 5 do seu artigo 32.º. Dela decorre o princípio da vinculação temática, nos termos do qual a acusação e/ou a pronúncia delimita e fixa o objeto do processo.
Refira-se, a este propósito, a al. b) do Ponto III do Preâmbulo do CPP, no qual o legislador refere expressamente a opção “por converter o inquçrito, realizado sob a titularidade e a direção do Ministçrio Põblico, na fase geral e normal de preparar a decisão de acusação ou de não acusação”.
Em conformidade, diz o artigo 262.ª, n.ª 1, do CPP, que “O inquçrito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher provas, em ordem à decisão sobre a acusação”. É, pois, a acusação que define e delimita o objeto do processo, fixando o thema decidendum, sendo em função dela que o arguido organiza a sua defesa. A acusação, para Gomes Canotilho e Vital Moreira (in Constituição da Republica Portuguesa Anotada, 3ª ed., p. 205), ç “condição e limite do julgamento”. Ou, no dizer do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Setembro de 2008 (proc. 08P2044, acessível em www.dgsi.pt), “A vinculação temática do tribunal constitui a pedra angular de um efetivo e consistente direito de defesa do arguido – sem o qual o fim do processo penal é inalcançável –, que assim se vê protegido contra arbitrários alargamentos da atividade cognitiva e decisória do tribunal e assegura os seus direitos de contraditoriedade e audiência”.
Por seu turno, Figueiredo Dias (in Direito Processual Penal», I, 1974, 145) defende que se «deve pois afirmar que o objeto do processo penal é o objeto da acusação, sendo este que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal e é nele que se consubstanciam os princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consumpção do objeto do processo penal (»). Os valores e interesses subjacentes a esta vinculação (») constituem o cerne de um verdadeiro direito de defesa do arguido e deixam transparecer os pilares fundamentais em que se alicerça um Estado que os acolhe».
Corolário deste princípio são também as cominações previstas para a alteração substancial dos factos, também esta expressão de diminuição das garantias de defesa do arguido que o princípio da vinculação temática não consente.
É, portanto, à luz (e entendimento) da estrutura acusatória do processo penal que deve ser aferida a bondade da proposta agora em análise.
Na verdade, no decurso do inquérito, o objeto do processo está em definição. Por isso, as declarações do arguido nesta fase processual reportam-se a uma realidade parcial. Em bom rigor, o próprio Ministério Público poderá, no momento da tomada de declarações de arguido, estar numa fase de investigação cujo desfecho ele próprio desconhece. Vincular o arguido às declarações proferidas nesta fase processual, independentemente de perante quem sejam proferidas, constituirá sempre, em nosso entender, uma restrição ao direito de defesa que assume a sua plenitude com a fixação do objeto do processo.
Uma outra nota ainda sobre esta questão. A primeira prende-se com o regime das gravações das declarações do arguido. Até quando é guardado o seu registo, mesmo em casos de total irrelevância para o processo? Quem determina a sua utilização como meio de prova (questão que se coloca com a expressão “»as declarações que prestar poderão ser utilizadas no processo»”? Uma segunda questão prende-se com a possibilidade de realização de julgamento em processo sumário de crimes com molduras penais superiores a 5 anos. Não nos pronunciando nesta sede sobre a questão de

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