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Quarta-feira, 23 de janeiro de 2013 II Série-A — Número 70
XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)
S U M Á R I O
Projetos de lei [n.os
284, 285, 315, 316, 324 e 338/XII (2.ª)]:
N.º 284/XII (2.ª) (Combate os falsos recibos verdes e desenvolve os poderes da autoridade para as condições do trabalho): — Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 285/XII (2.ª) [Clarifica os contratos a prazo, protegendo os trabalhadores (Quarta alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho)]: — Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 315/XII (2.ª) (Combate os "falsos recibos verdes" convertendo-se em contratos efetivos): — Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 316/XII (2.ª) (Criminaliza o recurso aos "falsos recibos verdes"): — Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 324/XII (2.ª) (Regime Jurídico da Educação Especial): — Parecer da Comissão de Educação, Ciência e Cultura e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 338/XII (2.ª) — Cria o regime de vinculação dos professores contratados e estabelece o concurso de
ingresso de professores para necessidades permanentes do sistema educativo (BE). Propostas de lei [n.
os 105, 107, 108, 115, 116 e 123/XII
(2.ª)]:
N.o 105/XII (2.ª) (Aprova o Regime Jurídico do Processo de
Inventário): — Relatório da discussão e votação na especialidade, texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e proposta de alteração. (a)
N.º 107/XII (2.ª) (Estabelece o Estatuto do Administrador Judicial): — Relatório da discussão e votação na especialidade, texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e propostas de alteração. (a)
N.º 108/XII (2.ª) (Aprova o regime jurídico aplicável ao mergulho recreativo em todo o território nacional, em conformidade com o Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de junho, que transpôs a Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno, com a Lei n.º 9/2009, de 4 de março, que transpôs a Diretiva 2005/36/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro, relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais, e
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com o Decreto-Lei n.º 92/2011, de 27de julho, que cria o Sistema de Regulação de Acesso a Profissões): — Relatório da discussão e votação na especialidade, texto final da Comissão de Educação, Ciência e Cultura e propostas de alteração. (a)
N.º 115/XII (2.ª) (Procede à primeira alteração à Lei de Organização, Competência e Funcionamento dos Julgados de Paz, aprovada pela Lei n.º 78/2011, de 13 de julho, aperfeiçoando alguns aspetos de organização e funcionamento dos julgados de paz): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 116/XII (2.ª) (Estabelece os princípios gerais aplicáveis à mediação realizada em Portugal, bem como os regimes jurídicos da mediação civil e comercial, dos mediadores e da mediação pública): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 123/XII (2.ª) (Procede à segunda alteração à Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho, que regula o regime de acesso da iniciativa económica privada a determinadas atividades económicas):
— Parecer da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. Projeto de resolução n.º 585/XII (2.ª): Recomenda ao Governo que, em articulação com a academia, promova um estudo que aborde as vantagens e desvantagens da fragmentação hidráulica em Portugal, e que promova estrita regulamentação de avaliação e salvaguarda dos respetivos impactos ambientais e sobre as populações (PS). Proposta de resolução n.
o 51/XII (2.ª) (Aprova o Acordo
entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América para a Troca de Informação de Rastreio de Terrorismo, assinado em Washington, em 24 de julho de 2012): — Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas e anexo, contendo o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. (a) São publicados em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 284/XII (2.ª)
(COMBATE OS FALSOS RECIBOS VERDES E DESENVOLVE OS PODERES DA AUTORIDADE PARA
AS CONDIÇÕES DO TRABALHO)
Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de
apoio
Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho
ÍNDICE
PARTE I – CONSIDERANDOS
PARTE II – OPINIÃO Do DEPUTADo AUTOR DO PARECER
PARTE III – CONCLUSÕES
PARTE IV – ANEXOS
PARTE I – CONSIDERANDOS
Considerando que:
1. O Projeto de Lei n.º 284/XII (2.ª), da iniciativa do BE, visa combater a precariedade e os “falsos recibos
verdes” e baixou à Comissão de Segurança Social e Trabalho em 20 de setembro de 2012.
2. O signatário autor do presente parecer foi designado na reunião de 25 de setembro da Comissão de
Segurança Social e Trabalho
3. Com este projeto de lei o Bloco de Esquerda pretende:
a) Combater os falsos recibos verdes, dissuadindo as práticas de contratação ilegal;
b) Criminalizar a desobediência às indicações da ACT, para que seja claro que o empregador é punido se
não integrar o falso trabalhador independente;
c) Clarificar o que é falso trabalho independente, bastando que se verifiquem duas condições definidas
para a presunção de contrato de trabalho, sem mais;
d) Obrigar à integração dos falsos trabalhadores independentes nos quados das empresas, na Segurança
Social e nas Finanças, garantindo que a sua antiguidade na empresa é tomada em conta aquando da
realização do contrato;
e) Defender o emprego e o trabalho com direitos, não aceitando a desculpa da crise para acentuar e
chantagem social sobre quem trabalha.
4. A iniciativa é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, nos termos dos artigos 167.º
da Constituição e 118.º do Regimento, que consubstanciam o poder de iniciativa da lei. Não infringe a
Constituição ou os princípios nela consignados e respeita ainda os limites da iniciativa impostos pelo
Regimento, por força do disposto nos n.os
1 e 3 artigo 120.º.
5. Este Projeto de Lei é subscrito por oito Deputados, respeitando os requisitos formais previstos no n.º 1
do artigo 119.º e nas alíneas a) b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento, relativamente às iniciativas em
geral, bem como os previstos no n.º 1 do artigo 123.º do referido diploma, quanto aos projetos de lei em
particular.
6. O Projeto de Lei inclui uma exposição de motivos e cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei
formulário, uma vez que tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto [disposição idêntica à da alínea
b) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento].
7. Em caso de aprovação, a entrada em vigor desta iniciativa legislativa terá lugar 90 dias após a data da
sua publicação, nos termos do artigo 20.º.
8. Sobre a mesma matéria que consta da presente iniciativa, o Grupo Parlamentar do BE apresentou nas
XI e XII legislaturas, as seguintes iniciativas:
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Iniciativas apresentadas GP Estado da iniciativa
Projeto de Lei n.º 574/XI (2.ª) – Combater a precaridade e os falsos recibos verdes
GP/BE Iniciativa caducada em 19.06.2011
Projeto de Lei n.º 3/XII (1.ª) – Combater a precaridade e os falsos recibos verdes
GP/BE Iniciativa rejeitada, com os votos contra do PSD, PS, CDS-PP, e votos a favor do PCP, BE e PEV
9. Sobre o mesmo tema, o BE apresentou também o Projeto de Resolução n.º 214/XII (2.ª), que
recomenda ao Governo que Adote um procedimento especial de combate à precariedade e aos falsos recibos
verdes, que se encontra pendente para apreciação na 10.ª Comissão.
10. O presente projeto de lei foi publicado em separata eletrónica do DAR no dia 3/10/2012, para
apreciação pública pelo período de 30 dias, que terminou em 1/11/2012.
11. Sobre este projeto de lei, foram recebidos contributos da CGTP-IN e da FESAHT, que se pronunciaram
em sentido favorável.
12. A presente iniciativa não parece acarretar, em caso de aprovação, um acréscimo de encargos para o
Orçamento do Estado.
13. Em termos de enquadramento internacional, a legislação comparada é apresentada para os países da
União Europeia, Espanha e Itália, matéria que se encontra desenvolvida na Nota Técnica anexa a este
Parecer.
PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTOR DO PARECER
Esta parte reflete a opinião política do autor do parecer, Deputado Arménio Santos.
O autor do presente parecer exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião sobre a iniciativa em
apreço, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 137.º
do Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – CONCLUSÕES
Pelo que atrás se expôs, emite-se o Parecer seguinte:
1. O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) apresentou o Projeto de Lei n.º 284/XII, que visa o
combate aos falsos recibos verdes e desenvolve os poderes da autoridade para as condições do trabalho.
2. A presente iniciativa legislativa (Projeto de Lei n.º 284/XII) reúne os requisitos constitucionais, legais e
regimentais para ser agendada para apreciação pelo Plenário da Assembleia da República, reservando os
grupos parlamentares as suas posições e decorrente sentido de voto para o debate.
3. Nos termos regimentais aplicáveis, o presente Parecer deverá ser remetido a Sua Excelência a
Presidente da Assembleia da República.
PARTE IV – ANEXOS
Ao abrigo do disposto do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, anexa-se a Nota Técnica
elaborada pelos Serviços competentes e que faz parte integrante deste Parecer.
Palácio de São Bento, 23 de janeiro de 2013.
O Deputado autor do parecer, Arménio Santos — O Presidente da Comissão, José Manuel Canavarro.
Nota: O parecer foi aprovado por unanimidade.
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Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 284 /XII (2.ª)(BE)
Combate os falsos recibos verdes e desenvolve os poderes da autoridade para as condições do
trabalho
Data de admissão: 20 de setembro de 2012
Comissão de Segurança Social e Trabalho (10.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento
da lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: Susana Fazenda e João Mendes Ramos (DAC), António Almeida Santos (DAPLEN), Paula Granada (BIB), Filomena Romano de Castro e Fernando Bento Ribeiro (DILP).
Data: 17 de janeiro de 2013.
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
O projeto de lei em apreço, da iniciativa do Bloco de Esquerda, visa combater a precariedade e os “falsos
recibos verdes”. Baixou à Comissão de Segurança Social e Trabalho em 20 de setembro de 2012, tendo sido
designado autor do parecer o Sr. Deputado Arménio Santos (PSD) na reunião da comissão de 25 de
setembro.
De acordo com a exposição de motivos, com este Projeto de Lei o Bloco de Esquerda pretende:
– Combater os falsos recibos verdes, dissuadindo as práticas de contratação ilegal.
– Criminalizar a desobediência às indicações da ACT, para que seja claro que o empregador é punido se
não integrar o falso trabalhador independente.
– Clarificar o que é falso trabalho independente, bastando que se verifiquem duas condições definidas para
a presunção de contrato de trabalho, sem mais.
– Obrigar à integração dos falsos trabalhadores independentes nos quadros das empresas, na Segurança
Social e nas Finanças, garantindo que a sua antiguidade na empresa é tomada em conta aquando da
realização do contrato.
– Defender o emprego e o trabalho com direitos, não aceitando a desculpa da crise para acentuar a
chantagem social sobre quem trabalha.
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
A iniciativa é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, nos termos do artigo 167.º da
Constituição e do 118.º do Regimento, que consubstanciam o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder
dos deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do
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artigo 4.º do Regimento, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do
artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do Regimento.
É subscrita por oito Deputados, respeitando os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º e nas
alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento, relativamente às iniciativas em geral, bem como os
previstos no n.º 1 do artigo 123.º do referido diploma, quanto aos projetos de lei em particular. Respeita ainda
os limites da iniciativa impostos pelo Regimento, por força do disposto nos n.os
1 e 3 do artigo 120.º.
Verificação do cumprimento da lei formulário
O projeto de lei inclui uma exposição de motivos e cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário,
uma vez que tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto [disposição idêntica à da alínea b) do n.º 1
do artigo 124.º do Regimento].
Quanto à entrada em vigor da iniciativa, em caso de aprovação, terá lugar 90 dias após a data da sua
publicação, nos termos do artigo 20.º do projeto.
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
Face às dificuldades crescentes da aplicação dos vários diplomas dispersos em matéria de legislação
laboral, o legislador entendeu que o respetivo regime deveria ser revisto, compilando vários aspetos sobre a
referida legislação num só diploma, que veio a culminar na entrada em vigor da Lei n.º 99/2003, de 27 de
agosto, que aprovou o Código de Trabalho de 2003 (CT2003). Este diploma alterou a noção de contrato de
trabalho1 e criou uma presunção legal2, a qual foi alterada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de março, no sentido da
sua simplificação3. Desde logo ficou previsto no artigo 20.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de março, que, passados
quatro anos após a sua entrada em vigor, o CT2003 seria revisto.
Em 2005, o XVII Governo Constitucional, no seu Programa, assumiu o compromisso de rever o Código do
Trabalho (CT2003), comprometendo-se, assim, a adotar algumas medidas, nomeadamente criar uma
comissão independente encarregada de avaliar os impactes do Código do Trabalho nas relações laborais,
tendo em vista o lançamento de um Livro Branco das Relações Laborais (LBRL) e relançar a concertação
social.
Neste seguimento, o Governo aprovou a Resolução do Conselho de Ministros n.º 160/2006, de 30 de
novembro4, que criou a Comissão5 do Livro Branco das Relações Laborais (CLBRL), composta por um grupo
1 Nos termos do artigo 10.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, o “contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga,
mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direção destas.” 2 Nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, “presume-se que as partes celebraram um contrato de trabalho sempre
que, cumulativamente: a) O prestador de trabalho esteja inserido na estrutura organizativa do beneficiário da atividade e realize a sua prestação sob as orientações deste; b) O trabalho seja realizado na empresa beneficiária da atividade ou em local por esta controlado, respeitando um horário previamente definido; c) O prestador de trabalho seja retribuído em função do tempo despendido na execução da atividade ou se encontre numa situação de dependência económica face ao beneficiário da atividade; d) Os instrumentos de trabalho sejam essencialmente fornecidos pelo beneficiário da atividade; e) A prestação de trabalho tenha sido executada por um período, ininterrupto, superior a 90 dias.”3 Nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, com a redação dada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de março, “presume-se
que existe um contrato de trabalho sempre que o prestador esteja na dependência e inserido na estrutura organizativa do beneficiário da atividade e realize a sua prestação sob as ordens, direção e fiscalização deste, mediante retribuição.” 4 A Resolução do Conselho de Ministros n.º 160/2006, de 30 de novembro, resolve criar na dependência do Ministro do Trabalho e da
Solidariedade Social a estrutura de missão denominada «Comissão do Livro Branco das Relações Laborais». A Comissão tem a missão de reavaliar o quadro legal vigente e propor alterações com vista à promoção do emprego, à redução da segmentação do sistema de emprego, à mobilidade protegida entre os diferentes tipos de contrato de trabalho e de atividade profissional, ao desenvolvimento da adaptabilidade dos trabalhadores e das empresas à mudança económica e social e ao fomento da contratualidade. 5 A Comissão teve a seguinte composição:
a) Presidente — António de Lemos Monteiro Fernandes; b) Relator — António Maria Bustorff Dornelas Cysneiros; c) Vogais: António Manuel Carvalho Casimiro Ferreira;
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de peritos com a missão de produzir um diagnóstico das necessidades de intervenção legislativa, tendo em
conta o conjunto de conclusões vertidas no Livro Verde, designadamente em matéria de emprego, proteção
social e relações de trabalho.
O Livro Branco das Relações Laborais (LBRL), publicado em novembro de 2007 e que constituiu, também
ele, alvo de debate em sede de Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS), identifica os principais
problemas da realidade económica e social do País e enuncia as propostas de intervenção legislativa que
considera adequadas.
Das propostas apresentadas no âmbito das alterações ao CT2003, a Comissão considera que a presunção
legal de contrato de trabalho a consagrar no CT constitui um dos instrumentos que mais podem favorecer a
erradicação do falso trabalho autónomo. Neste sentido, a recente Recomendação n.º 198 da OIT, sobre a
relação de trabalho, após salientar que a proteção assegurada pela legislação nacional e as convenções
coletivas depende do reconhecimento da existência de relações de trabalho e que existem situações em que a
qualificação é difícil, preconiza nomeadamente que a legislação estabeleça uma presunção legal de contrato
de trabalho, baseada em vários indícios pertinentes.
A Comissão entende que a presunção legal de contrato de trabalho, inicialmente adotada pelo Código do
Trabalho, dependia de um vasto conjunto de indícios cumulativos que a tornavam inútil para ajudar a
identificação do contrato de trabalho nas situações em que a sua qualificação era controvertida.Com efeito, se
o trabalhador conseguisse provar todos esses indícios, mais do que presumir-se o contrato de trabalho, estaria
provada a existência deste em termos que seria muito difícil conceber a possibilidade de a presunção ser
ilidida. Um dos indícios era a prestação do trabalho por um período ininterrupto superior a 90 dias, o que
desde logo impedia a verificação da presunção se o contrato durasse menos tempo. A necessidade da
verificação cumulativa dos indícios tinha o risco de, na falta de algum, se poder negar a existência de contrato
de trabalho.
A Comissão sublinha queo elemento “dependência” não é inequívoco, embora se afigure que deva tratar-
se de dependência económica e não jurídica, porque esta estará referenciada através dos indícios “ordens,
direção e fiscalização” do beneficiário da atividade. Por outro lado, se o trabalhador provar que realiza a
prestação sob as “ordens, direção e fiscalização” do beneficiário da atividade e mediante retribuição, estão
verificados factos de que já será possível concluir que existe contrato de trabalho e não meramente uma
presunção do mesmo.
A Comissão defende que a presunção legal adote alguns dos indícios já consagrados pela jurisprudência
que, de acordo com as regras da experiência, correspondam a elementos mais frequentemente verificados
nas relações de trabalho subordinado. A Comissão sugere, assim, uma nova redação para a presunção legal
de contrato de trabalho6 a consagrar no CT.
Posteriormente, o Governo e a maioria dos parceiros sociais com assento na Comissão Permanente de
Concertação Social (CPCS), alcançaram em 25 de junho de 2008, o acordo tripartido7 que esteve na origem
da Proposta de Lei n.º 216/X, que aprova a revisão do Código do Trabalho.
Assim, em cumprimento do disposto no artigo 20.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, no artigo 9.º da Lei
n.º 35/2004, de 29 de julho, e de acordo com o que foi vertido no Programa do XVII Governo Constitucional, a
João José Garcia Correia; Júlio Manuel Vieira Gomes; Manuel Eugénio Pimentel Cavaleiro Brandão; Maria da Conceição Santos Cerdeira; Mário José Gomes de Freitas Centeno; Pedro de Sá-Carneiro Furtado Martins; A diretora-geral de Estudos, Estatística e Planeamento; O diretor-geral do Emprego e das Relações de Trabalho; O inspetor-geral do Trabalho; O presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego. 6 A Comissão sugere a seguinte redação para a presunção legal de contrato de trabalho a consagrar no CT:
“1 - Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma atividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características: a) A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado; b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade; c) O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma; d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como contrapartida da mesma; e) O prestador de atividade desempenhe funções de direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.”7“Acordo tripartido para um novo sistema de regulação das relações laborais, das políticas de emprego e da proteção social em Portugal.”
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referida proposta de lei procede à revisão do Código do Trabalho e da respetiva regulamentação. O Governo,
propõe, deste modo, no seguimento da proposta plasmada no Livro Branco das Relações Laborais, um quadro
normativo mais eficaz, que unifica os dois principais instrumentos legislativos que disciplinam as relações de
trabalho - o Código do Trabalho e o seu Regulamento.
Na sequência do acima exposto, foi publicada a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro8, que aprovou o atual
Código do Trabalho (CT2009)9.
A doutrina chama a atenção para a circunstância de os critérios utilizados para distinguir o trabalho
subordinado do trabalho autónomo, muitas vezes, só permitirem uma ideia aproximada e consentirem, nos
seus próprios termos, graduações subtis e que nem sempre levam a resultados esclarecedores. Para ilidir a
estas questões, o artigo 12.º do CT2009, conforme se disse, veio consagrar o princípio da presunção de
contrato de trabalho. Assim, plasmou no seu articulado os cinco requisitos a que a jurisprudência e a doutrina
normalmente recorrem para qualificar o contrato de trabalho, que são:
“a) A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade;
c) O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo
beneficiário da mesma;
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como
contrapartida da mesma;
e) O prestador de atividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.”
A exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 216/X, que deu origem à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,
no que concerne aos falsos recibos verdes, menciona que com o desiderato de combater a precariedade e a
segmentação dos mercados de trabalho, alteram-se os pressupostos que operam para a presunção da
caracterização do contrato de trabalho e cria-se uma nova contraordenação, considerada muito grave, para
cominar as situações de dissimulação de contrato de trabalho, com o desiderato de combater o recurso aos
“falsos recibos verdes” e melhorar a eficácia da fiscalização neste domínio.
De acordo com o Prof. Pedro Romano Martinez10 o artigo 12.º do Código do Trabalho 2009 corresponde ao
artigo 12.º do Código do Trabalho de 2003, que teve uma primeira versão em 2003, e outra em 2006 (Lei n.º
9/2006, de 20 de março, que alterou o Código do Trabalho) (…). A singular modificação de 2006 nos mais de
quatrocentos artigos do regime de contrato de trabalho visou substituir uma norma pouco clara e com algumas
deficiências técnicas por um preceito com um sentido dificilmente compreensível.
No que respeita ao contrato de trabalho, e segundo o mesmo professor, por via de regra cabe ao
trabalhador fazer a prova dos elementos constitutivos do contrato de trabalho (artigo 342.º, n.º 1 do CC). Para
invocar a qualidade de trabalhador, incumbe-lhe provar que desenvolve uma atividade remunerada para
outrem, sob autoridade e direcção do beneficiário, demonstrando, designadamente, que se integrou na
respetiva estrutura empresarial. A prova dos elementos constitutivos do contrato de trabalho é, muitas das
vezes, difícil e, para obviar a tal dificuldade, poder-se-ia recorrer à presunção de existência de contrato de
trabalho. É essa a solução constante do artigo 8.1 do Estatuto de los Trabajadores (Espanha) e, de forma
limitada e mitigada, foi esse o sentido de uma (antiga) proposta legislativa, na qual se previa que a Inspeção-
geral do Trabalho podia presumir estar-se perante um contrato de trabalho, sempre que alguém exercesse a
sua atividade em instalações de uma empresa ou organização de outra pessoa; neste caso, a presunção
dispensaria a prova da existência do contrato de trabalho, cabendo ao empregador o ónus da prova (negativa):
em suma, a prova da inexistência do contrato de trabalho. Esse projeto de alteração legislativa foi
abandonado, pelo que a presunção da existência de contrato de trabalho não vigorava na ordem jurídica
portuguesa, seguindo-se o regime regra de repartição do ónus da prova11.
8 Teve origem na Proposta de Lei n.º 216/X que aprova a revisão do Código do Trabalho.
9 O Código de Trabalho (CT2009) foi aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, retificada pela Declaração de Retificação n.º
21/2009, de 18 de março, alterada pelas Leis n.os
105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho (retificada pela Declaração de Retificação n.º 38/2012, de 23 de julho) e 47/2012, de 29 de agosto. 10
In: MARTINEZ, Pedro Romano e outros – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pag.133. 11
In: MARTINEZ, Pedro Romano e outros – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pag.133 e 134.
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Defende também o Prof. Pedro Romano Martinez que, do preceito em análise, contrariamente ao que se lê
na epígrafe e no respetivo texto, não resulta nenhuma presunção (…). Retira-se que o legislador tem em
consideração certos indícios para a existência de subordinação jurídica são, assim: 1) dependência do
prestador da atividade; 2) inserção na estrutura organizativa do beneficiário da atividade; 3) realização da
atividade sob as ordens, direção e fiscalização do respetivo destinatário.
Acrescenta, ainda, quanto ao artigo 12.º do CT2009, que a presunção dele constante melhora
relativamente à solução anterior (artigo 12.º do CT2003), mas continua a não ser uma verdadeira presunção.
Contudo, poderá ficar facilitada a tarefa de qualificação do contrato de trabalho em caso de dúvida, pois
permite-se que a verificação de alguns indícios contratuais (teoricamente dois) possa ser suficiente para se
entender que a relação jurídica em causa é um contrato de trabalho. É evidente que esta facilitação pode
determinar a qualificação de um contrato como de trabalho apesar de faltarem os pressupostos básicos,
nomeadamente por força da alínea a); acresce, ainda, que na alínea e) se confunde presunção com
presumido12.
Por último, o Prof. Pedro Romano Martinez salienta que, tendo em conta a política de combate ao trabalho
dissimulado – indiscutivelmente louvável, resultando a dúvida de saber se as soluções deveriam ser incluídas
no Código do Trabalho -, há um agravamento da punição, artigo 12.º, n.º 2, do CT2009, se o trabalho
subordinado for dissimulado, apresentando-se como autónomo. Este regime enquadra-se numa política que
pugna pela limitação do trabalho precário, com algumas consequências em sede de contrato a termo. Todavia,
a ideia de «causar prejuízo ao Estado» (parte final do n.º 2) pode ser entendido em sentido muito amplo, que
extravasa a relação laboral, nomeadamente por fuga ao fisco13.
O Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho, aprova a orgânica da Autoridade para as Condições
do Trabalho. A referida Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) tem por missão a promoção da
melhoria das condições de trabalho, através da fiscalização do cumprimento das normas em matéria laboral e
o controlo do cumprimento da legislação relativa à segurança e saúde no trabalho, bem como a promoção de
políticas de prevenção dos riscos profissionais, quer no âmbito das relações laborais privadas, quer no âmbito
da Administração Pública.
Ainda no que se refere às condições de trabalho, compete à inspeção-geral do trabalho14 promover e
controlar o cumprimento das disposições legais, regulamentares e convencionais respeitantes às condições de
trabalho, designadamente as relativas a segurança, higiene e saúde no trabalho, e sugerir as medidas
adequadas em caso de falta ou inadequação de normas legais ou regulamentares nos termos do artigo 3.º do
Decreto-Lei n.º 102/2000, de 2 de junho, que aprovou o Estatuto da Inspeção-Geral do Trabalho.
O regime processual aplicável às contraordenações laborais e de segurança social está regulado na Lei n.º
107/2009, de 14 de setembro. Este regime processual prevê a atribuição de competências à Autoridade para
as Condições de Trabalho (ACT) e aos serviços do Instituto da Segurança Social, IP (ISS, IP) para qualquer
um deles poder intervir na identificação de situações de dissimulação de contrato de trabalho, de forma a
prevenir e a desincentivar o incumprimento dos deveres sociais e contributivos das empresas e a garantir o
direito dos trabalhadores à proteção conferida pelo sistema de segurança social.
No que respeita ao desemprego, e segundo os dados divulgados pelo INE, a taxa de desemprego estimada
para o 2.º trimestre de 2012 foi de 15,0%.Este valor é superior em 2,9 pontos percentuais ao do trimestre
homólogo de 2011 e em 0,1 pontos percentuais ao do trimestre anterior. A população desempregada foi de
826,9 mil pessoas, o que representa um aumento homólogo de 22,5% e trimestral de 0,9% (mais 151,9 mil e
7,6 mil pessoas, respetivamente). A população empregada foi de 4 688,2 mil pessoas, o que representa uma
diminuição homóloga de 4,2% e um aumento trimestral de 0,6% (menos 204,8 mil e mais 25,7 mil pessoas,
respetivamente).
No que diz respeito à matéria que consta da presente iniciativa, o Grupo Parlamentar do BE apresentou
nas XI e XII legislaturas, as seguintes iniciativas:
12
In: MARTINEZ, Pedro Romano e outros – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pag.137. 13
In: MARTINEZ, Pedro Romano e outros – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pag.137. 14
Leia-se a publicação intitulada “Estratégias e Práticas para a Inspeção do Trabalho”, que reúne dois documentos da Comissão do Emprego e da Política Social do Conselho de Administração do BIT editados em português no quadro da colaboração existente entre a Autoridade para as Condições do Trabalho e o Escritório da Organização Internacional do Trabalho em Lisboa. Estes documentos são um contributo importante para o debate atual sobre o papel e desafios das inspeções do trabalho no quadro de um mundo globalizado, onde é fundamental promover a qualidade do trabalho, a competitividade e o combate à pobreza.
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Iniciativas apresentadas GP Estado da iniciativa
Projetos de Lei n.os
574/XI (2.ª) – Combater a precariedade e os falsos recibos verdes
GP/BE Iniciativa caducada em 19.06.2011.
Projeto de Lei n.º 3/XII (1.ª) – Combater a precariedade e os falsos recibos verdes
GP/BE Iniciativa rejeitada, com os votos contra do PSD, PS, CDS-PP, e votos a favor do PCP, BE e PEV.
Para melhor acompanhamento da iniciativa em análise enumeram-se os seguintes diplomas:
– Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março;
– Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
CÓDIGO CONTRIBUTIVO: AS ALTERAÇÕES DO OE PARA 2011. Trabalho & Segurança Social.
Lisboa. N.º 10 (Nov. 2010), p. 8-10. Cota: RP-558
Resumo: O presente artigo analisa o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de
Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro, abordando o regime dos trabalhadores
por conta de outrem e dos trabalhadores independentes. Relativamente ao regime dos trabalhadores
independentes são focadas questões relacionadas com a taxa contributiva, base de incidência e obrigações
declarativas.
GUEDES, João – Código dos regimes contributivos do sistema previdencial de segurança social. Vida
judiciária. Lisboa. N.º 139 (Nov. 2009), p. 27-31. Cota: RP - 136
Resumo: O autor debruça-se sobre o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de
Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro. Este código introduz alterações que
assumem especial relevância na relação contributiva entre entidades empregadoras, trabalhadores e a
Segurança Social, destacando-se as alterações introduzidas no regime geral dos trabalhadores por conta de
outrem e no regime dos trabalhadores independentes.
REIS, Inês – Os recibos verdes à luz do Novo Código do Trabalho. Trabalho & Segurança Social. Lisboa.
A. 7, n.º 10 (Out. 2009), p. 13-15. Cota: RP-558Resumo: A autora aborda a questão dos verdadeiros e dos
falsos recibos verdes, associada ao combate à precariedade, à luz do novo Código do Trabalho (aprovado
pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro) que penaliza as empresas que recorram a falsos recibos verdes,
reformulando os indícios que permitem detetar a utilização ilegal dos mesmos.
No presente artigo, a autora procede à destrinça entre contrato de prestação de serviços e contrato de
trabalho, a qual considera inequívoca apenas no plano teórico, já que estes dois tipos contratuais se
aproximam manifestamente com fronteiras pouco definidas e, por vezes, difíceis de delimitar na prática,
apesar de se pautarem por regimes jurídicos distintos e conterem designações diversas.
Em razão desta distinção tão pouco nítida, certas empresas recorrem ao mecanismo dos contratos de
prestação de serviços e à emissão de recibo verde quando o “prestador de serviços” não é trabalhador
independente, no verdadeiro sentido do termo, devendo antes ser qualificado como trabalhador por conta de
outrem e como tal usufruir de um contrato de trabalho, com todos os deveres e regalias a ele inerentes.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha e Itália.
Espanha
Em Espanha o Real Decreto Legislativo 1/1995, de 24 de marzo, por el que se aprueba el texto refundido
de la Ley del Estatuto de los Trabajadores (consolidado), regula as relações laborais e os contratos de
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trabalho que se aplicam aos trabalhadores que voluntariamente prestam serviço retribuído por conta alheia e
dentro do âmbito de organização e direção de outra pessoa, física ou jurídica, denominada empregadora ou
empresário.
Nos termos do artigo 8.1 do referido diploma, o contrato de trabalho pode ser celebrado por escrito ou
verbalmente. Presume-se que o contrato existe sempre que o trabalhador presta um serviço dentro do âmbito
de organização e direção de outro e que recebe em troca a respetiva retribuição.
Compete à inspeção-geral do trabalho e à segurança social a fiscalização do cumprimento das normas em
matéria laboral e o controlo da legislação relativa à segurança e saúde no trabalho, bem como a promoção de
políticas de prevenção dos riscos profissionais15, quer no âmbito das relações laborais privadas, quer no
âmbito da Administração Pública. Compete, ainda, à inspeção-geral do trabalho e à segurança social vigiar o
cumprimento das disposições legais, regulamentares e convencionais respeitantes às relações laborais, nos
termos da Ley 42/1997, de 14 de noviembre, Ordenadora de la Inspección de Trabajo y Seguridad Social e do
seu Regulamento, aprovado pelo Real Decreto 138/2000, de 4 de febrero.
O Real Decreto Legislativo 5/2000, de 4 de agosto, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley sobre
Infracciones y Sanciones en el Orden Social, vem regularizar, aclarar e sistematizar as infrações e as sanções
de ordem social. O capítulo II regula a matéria sobre as infrações inerentes às relações laborais individuais e
coletivas. As infrações são qualificadas como leves, graves e muito graves tendo em atenção a natureza do
dever infringido e a entidade violadora do direito (artigos 6.º, 7.º e 8.º).
Itália
Em Itália os recibos verdes são designados por ‘ritenuta d'acconto’ (retenção de uma verba/retenção por
conta). Esta retenção não é uma forma de contrato, mas sim uma forma de pagamento a que estão sujeitos os
designados trabalhadores “autónomos”. Sob esta forma existem as seguintes formas de colaboração
profissional com as empresas: ‘colaboração coordenada e continuada’ e a ‘colaboração ocasional’.
A figura do trabalho autónomo ou não subordinado é uma categoria que compreende uma tipologia de
funções e profissões muito diversas umas das outras. O que as une é o facto de corresponderem a relações
de trabalho que não se inserem num contrato coletivo e de não terem as garantias de continuidade e tutela
previstas para os trabalhadores por conta de outrem.
Neste estudo da CISL (confederação sindical) pode ver-se a proteção do trabalho ‘não subordinado’
(autónomo).
O trabalho ocasional de tipo acessório é uma modalidade particular de prestação de trabalho prevista pela
Lei Biagi. A sua finalidade é regulamentar aquelas relações de trabalho que satisfazem exigências ocasionais
com carácter intermitente, com o objetivo de fazer emergir atividades próximas do trabalho clandestino,
tutelando dessa maneira trabalhadores que usualmente trabalham sem qualquer proteção seguradora e
previdencial.
O pagamento da prestação tem lugar através dos designados ‘voucher’ (buoni lavoro), que garantem, além
do pagamento, também a cobertura previdencial junto do INPS (instituto nacional de previdência social) e
aquela seguradora junto do INAIL (instituto nacional de acidentes de trabalho).
A Lei n.º 133, de 6 agosto 2008, a Lei n.º 33, de 9 abril 2009 e por fim a Lei n.º 191, de 23 dezembro 2009,
(Orçamento do Estado para 2010) ampliaram progressivamente o âmbito dos prestadores e as áreas de
atividade em que se aplica o trabalho ocasional acessório.
Para um maior desenvolvimento, ver a seguinte ligação do sítio do ‘Ministério do Trabalho e das Políticas
Sociais’.
Recentemente, em Itália, foi aprovada a Lei n.º 92/2012, de 28 de junho, comumente designada como
“Riforma del Lavoro” (Reforma do Trabalho). Este diploma veio incidir em diversos aspetos da disciplina do
contrato a termo (contatos a prazo), modificando diversas partes do Decreto Legislativo n.º 368/2001, de 6 de
setembro.
De acordo com o artigo 1.º do Decreto Legislativo n.º 368/2001, em geral, é permitida a aposição de um fim
à vida do contrato de trabalho em face de razões de carácter técnico, produtivo, organizativo ou substitutivo,
15
De acordo com o estabelecido na Ley 31/1995, de 8 de noviembre, de Prevención de Riesgos Laborales.
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ainda que relacionados com as atividades normais do empregador, a mesma condição é requerida, nos termos
do artigo 20.º, n.º 4, do Decreto Legislativo n.º 276/2003, em relação ao período determinado.
Convém esclarecer que a disposição que impõe um período máximo de prestação de trabalho temporário,
para o mesmo empregador e para o desempenho de tarefas equivalentes, faz referência a 36 meses.
Convém contudo recordar que o parágrafo 4 bis do artigo 5.º do Decreto Legislativo n.º 368/2001
estabelece que, se, como resultado de uma sucessão de contratos a termo para o desempenho de trabalho de
igual valor, a relação de trabalho entre o mesmo empregador e empregado tenha excedido um total de 36
meses, incluindo extensões e renovações, independentemente de períodos de interrupção entre um contrato e
outro, a relação de emprego será considerada por tempo indeterminado a partir da caducidade desse prazo.
Veja-se a este propósito a seguinte ligação no sítio do ‘Ministério do Trabalho e das Políticas Sociais’: Il
lavoro intermittente alla luce delle modifiche introdotte dalla riforma del lavoro.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Efetuada uma pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, verificou-se ter
sido apresentado, sobre matéria conexa, o Projeto de Resolução n.º 214/XII (1.ª) (BE) Recomenda ao Governo
que adote um procedimento especial de combate à precariedade e aos falsos recibos verdes, que se encontra
pendente para apreciação na 10.ª Comissão.
Petições
Efetuada uma pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, verificou-se
que, neste momento, não existe qualquer petição versando sobre idêntica matéria.
V. Consultas e contributos
Em 21/09/2012, a Presidente da Assembleia da República, nos termos do artigo 142.º do Regimento,
promoveu a apreciação da iniciativa pelos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, para efeitos do
disposto no n.º 2 do artigo 229.º da Constituição.
O presente projeto de lei foi publicado em separata eletrónica do DAR no dia 3/10/2012, para apreciação
pública pelo período de 30 dias, que terminou em 1/11/2012.
Sugere-se a consulta facultativa da Autoridade para as Condições do Trabalho, que, com o XIX Governo
Constitucional, transitou para o Ministério da Economia e do Emprego16.
Contributos de entidades que se pronunciaram
Os contributos das entidades que se pronunciaram e em sentido favorável podem ser consultados aqui, o
da CGTP-IN, e aqui, o da FESAHT.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
A presente iniciativa não parece acarretar, em caso de aprovação, um acréscimo de encargos para o
Orçamento do Estado.
———
16
De acordo com disposto no n.º 4 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 86-A/2011, de 12 de julho, que Aprova a Lei Orgânica do XIX Governo Constitucional.
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PROJETO DE LEI N.º 285/XII (2.ª)
[CLARIFICA OS CONTRATOS A PRAZO, PROTEGENDO OS TRABALHADORES (QUARTA
ALTERAÇÃO À LEI N.º 7/2009, DE 12 FEVEREIRO, QUE APROVA A REVISÃO DO CÓDIGO DO
TRABALHO)]
Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de
apoio
Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho
Índice
Nota prévia
Parte I – Considerandos
Artigo 140.º
Artigo 143.º
Artigo 144.º
Artigo 147.º
Artigo 148.º
Parte II – Opinião do Deputado Autor do Parecer
Parte III – Conclusões
Parte IV – Anexos
Nota prévia
1 – A iniciativa legislativa deu entrada na mesa da Assembleia da República em 18/09/2012, tendo baixado,
por despacho de 20/09/2012 da Sr.ª Presidente da Assembleia da República, à Comissão de Trabalho e
Segurança Social, no cumprimento do n.º 1 do artigo 129.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
2 – Em 25/09/2011 foi designado autor do parecer o Deputado Adriano Rafael Moreira.
3 – Nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º, n.º 5, alínea d), e 56.º, n.º 2, alínea a), da Constituição,
do artigo 134.º do Regimento da Assembleia da República e dos artigos 469.º a 475.º da Lei n.º 7/2009, de 12
de fevereiro (Aprova a revisão do Código do Trabalho), o projeto de lei foi publicado no Diário da Assembleia
da República no dia 03.10.2012 para apreciação pública pelo período de 30 dias.
4 – Nos termos do artigo 131.º do RAR foi elaborada pelos serviços, em 08/01/2013, a respetiva nota
técnica.
Parte I – Considerandos
1 – O Grupo Parlamentar do BE propõe, com o presente Projeto de Lei, a alteração dos artigos 140.º,
143.º, 144.º, 147.º e 148.º da subsecção I – Contrato a termo resolutivo, da Secção II – Modalidades de
contratos de trabalho, da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (Código do Trabalho).
2 – As alterações propostas aos artigos em apreço são as seguintes.
a) Revogação da possibilidade de substituição de trabalhador em relação ao qual esteja pendente
processo judicial de apreciação da licitude de despedimento prevista no artigo140.º, 2, alínea a);
b) Limitação da duração máxima da atividade sazonal para um período não superior a 6 meses para
efeitos de ser considerada atividade temporária justificativa de contrato de trabalho a termo (alteração do
artigo140.º, 2, alínea e);
c) Revogação da possibilidade de celebração de contrato a termo nas situações previstas no artigo140.º,
4);
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d) Impossibilidade de celebração de contrato de trabalho a termo quando tiver ocorrido um processo de
despedimento coletivo ou de extinção de posto de trabalho nos 12 meses anteriores (nova redação do n.º 5 do
artigo 140.º);
e) Aumento da duração mínima do contrato de trabalho a termo nos casos de sucessão de contratos fixada
no artigo 143.º, 1;
f) Eliminação das exceções à necessidade de duração mínima dos contratos no caso de sucessão
contratual previstas nas alíneas b), c) e d) do n.º 2 do artigo 143.º;
g) Extensão aos trabalhadores em licença de parentalidade da obrigação de informação a que o
empregador está obrigado no n.º 3 do artigo 143.º;
h) Alteração do regime de conversão em contrato de trabalho sem termo previsto no artigo147.º;
i) Alteração dos limites de duração máxima do contrato de trabalho a termo certo e a termo incerto fixados
no artigo 148.º, n.os
1 e 4, respetivamente.
3 – Reproduz-se de seguida a redação em vigor dos artigos a alterar, assinalando-se as alterações de texto
propostas, rasurado, o que é eliminado pelo GP do BE; em itálico, o que é aditado pelo GP do BE:
Artigo 140.º
Admissibilidade de contrato de trabalho a termo resolutivo
1 – O contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para satisfação de necessidade
temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade.
2 – Considera-se, nomeadamente, necessidade temporária da empresa:
a) Substituição direta ou indireta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre
temporariamente impedido de trabalhar;
b) Substituição direta ou indireta de trabalhador em relação ao qual esteja pendente em juízo ação de
apreciação da licitude de despedimento;
c) Substituição direta ou indireta de trabalhador em situação de licença sem retribuição;
d) Substituição de trabalhador a tempo completo que passe a prestar trabalho a tempo parcial por período
determinado;
e) Atividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da
natureza estrutural do respetivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima, não superior a 6
meses;
f) Acréscimo excecional de atividade da empresa;
g) Execução de tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro;
h) Execução de obra, projeto ou outra atividade definida e temporária, incluindo a execução, direção ou
fiscalização de trabalhos de construção civil, obras públicas, montagens e reparações industriais, em regime
de empreitada ou em administração direta, bem como os respetivos projetos ou outra atividade complementar
de controlo e acompanhamento.
3 – Sem prejuízo do disposto no n.º 1, só pode ser celebrado contrato de trabalho a termo incerto em
situação referida em qualquer das alíneas a) a e c) ou e) a h) do número anterior.
4 – Além das situações previstas no n.º 1, pode ser celebrado contrato de trabalho a termo certo para:
a) Lançamento de nova atividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou de
estabelecimento pertencente a empresa com menos de 750 trabalhadores;
b) b) Contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, em situação de desemprego de longa
duração ou noutra prevista em legislação especial de política de emprego.
5 – Sem prejuízo do disposto no n.º 1, só pode ser celebrado contrato de trabalho a termo resolutivo
quando não tiver ocorrido um processo de despedimento coletivo ou de extinção de posto de trabalho
nos doze meses anteriores.
5 6 – Cabe ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo.
6 7– Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto em qualquer dos n.os
1 a 4.
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15
Artigo 143.º
Sucessão de contrato de trabalho a termo
1 – A cessação de contrato de trabalho a termo, por motivo não imputável ao trabalhador, impede nova
admissão ou afetação de trabalhador através de contrato de trabalho a termo ou de trabalho temporário cuja
execução se concretize no mesmo posto de trabalho, ou ainda de contrato de prestação de serviços para o
mesmo objeto, celebrado com o mesmo empregador ou sociedade que com este se encontre em relação de
domínio ou de grupo, ou mantenha estruturas organizativas comuns, antes de decorrido um período de tempo
equivalente a um terço dois terços da duração do contrato, incluindo renovações.
2 – O disposto no número anterior não é aplicável nos seguintes casos:
a) Nova ausência do trabalhador substituído, quando o contrato de trabalho a termo tenha sido celebrado
para a sua substituição;
b) Acréscimo excecional da atividade da empresa, após a cessação do contrato;
c) Atividade sazonal;
d) Trabalhador anteriormente contratado ao abrigo do regime aplicável à contratação de trabalhador à
procura de primeiro emprego.
3 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto no n.º 1.
Artigo 144.º
Informações relativas a contrato de trabalho a termo
1 – O empregador deve comunicar a celebração de contrato de trabalho a termo, com indicação do
respetivo motivo justificativo, bem como a cessação do mesmo à comissão de trabalhadores e à associação
sindical em que o trabalhador esteja filiado, no prazo de cinco dias úteis.
2 – O empregador deve comunicar, nos termos previstos em portaria do ministro responsável pela área
laboral, ao serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral os elementos a que
se refere o número anterior.
3 – O empregador deve comunicar, no prazo de cinco dias úteis, à entidade com competência na área da
igualdade de oportunidades entre homens e mulheres o motivo da não renovação de contrato de trabalho a
termo sempre que estiver em causa uma trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, ou um trabalhador em
licença de parentalidade.
4 – O empregador deve afixar informação relativa à existência de postos de trabalho permanentes que
estejam disponíveis na empresa ou estabelecimento.
5 – Constitui contraordenação leve a violação do disposto neste artigo.
Artigo 147.º
Contrato de trabalho sem termo
1 – Considera-se sem termo o contrato de trabalho:
a) Em que a estipulação de termo tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo;
b) Celebrado fora dos casos previstos nos n.os
1, 3 ou 4 do artigo 140.º;
c) Em que falte a redução a escrito, a identificação ou a assinatura das partes, ou, simultaneamente, as
datas de celebração do contrato e de início do trabalho, bem como aquele em que se omitam ou sejam
insuficientes as referências ao termo e ao motivo justificativo;
d) Celebrado em violação do disposto no n.º 1 do artigo 143.º.
2 – Converte-se em contrato de trabalho sem termo:
a) Aquele cuja renovação tenha sido feita em violação do disposto no artigo 149.º;
b) Aquele em que seja excedido o prazo de duração ou o número de renovações a que se refere o artigo
seguinte;
b) O celebrado fora dos casos previstos nos n.os
1 ou 3 do artigo 140.º;
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c) O celebrado a termo incerto, quando o trabalhador permaneça em atividade após a data de caducidade
indicada na comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 5 dias após a verificação do termo.
3 – Em situação referida no n.º 1 ou 2, a antiguidade do trabalhador conta-se desde o início da prestação
de trabalho, exceto em situação a que se refere a alínea d) do n.º 1, em que compreende o tempo de trabalho
prestado em cumprimento dos contratos sucessivos.
Artigo 148.º
Duração de contrato de trabalho a termo
1 – O contrato de trabalho a termo certo pode ser renovado até três vezes e a sua duração não pode
exceder os 12 meses.
a) 18 meses, quando se tratar de pessoa à procura de primeiro emprego;
b) Dois anos, nos demais casos previstos no n.º 4 do artigo 140.º;
c) Três anos, nos restantes casos.
2 – O contrato de trabalho a termo certo só pode ser celebrado por prazo inferior a seis meses em situação
prevista em qualquer das alíneas a) a g) do n.º 2 do artigo 140.º, não podendo a duração ser inferior à prevista
para a tarefa ou serviço a realizar.
3 – Em caso de violação do disposto na primeira parte do número anterior, o contrato considera-se
celebrado pelo prazo de seis meses desde que corresponda à satisfação de necessidades temporárias da
empresa.
4 – A duração do contrato de trabalho a termo incerto não pode ser superior a seis três anos.
5 – É incluída no cômputo do limite referido na alínea c) do n.º 1 a duração de contratos de trabalho a termo
ou de trabalho temporário cuja execução se concretiza no mesmo posto de trabalho, bem como de contrato de
prestação de serviço para o mesmo objeto, entre o trabalhador e o mesmo empregador ou sociedades que
com este se encontrem em relação de domínio ou de grupo ou mantenham estruturas organizativas comuns.
Parte II – Opinião do Deputado Autor do Parecer
O autor do parecer reserva a sua posição para discussão da iniciativa legislativa em plenário.
Parte III – Conclusões
1 – O Grupo Parlamentar do BE propõe, com o presente projeto de lei, a alteração dos artigos 140.º, 143.º,
144.º, 147.º e 148.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (Código do Trabalho), relativos ao regime jurídico do
contrato a termo.
2 – O presente projeto de lei cumpre todos os requisitos constitucionais, legais e regimentais necessários à
sua tramitação.
3 – Deverá o presente parecer ser remetido a S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República.
Palácio de S. Bento, 21 de janeiro de 2013.
O Deputado Autor do Parecer, Adriano Rafael Moreira — O Presidente da Comissão, José Manuel
Canavarro.
Parte IV – Anexos
Nota técnica.
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Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 285 /XII (2.ª) (BE)
Clarifica os contratos a prazo, protegendo os trabalhadores - quarta alteração à Lei n.º 7/2009, de 12
fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho
Data de admissão: 20 setembro de 2012
Comissão de Segurança Social e Trabalho (10.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: Susana Fazenda e Maria João Costa (DAC), Paula Granada (BIB), António Almeida Santos
(DAPLEN), Filomena Romano de Castro e Fernando Bento Ribeiro (DILP).
Data: 28 de dezembro de 2012.
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
O projeto de lei em apreço, da iniciativa do Bloco de Esquerda, que clarifica os contratos a prazo,
protegendo os trabalhadores, constituindo a quarta alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 fevereiro, que aprova a
revisão do Código do Trabalho, deu entrada a 18 de setembro, foi anunciado a 20 de setembro e baixou nessa
data à Comissão de Segurança Social e Trabalho, tendo sido designado autor do parecer o Sr. Deputado
Adriano Rafael Moreira (PSD) na reunião da Comissão de 25 de setembro de 2012.
Alega o Bloco de Esquerda na exposição de motivos do projeto de lei em análise que “A crise provou o que
há muito as trabalhadoras e os trabalhadores sabiam: quanto maior a precariedade maior o desemprego.
Aliás, a redução dos direitos laborais e a constante incerteza quanto ao futuro impede a efetivação de direitos
laborais, favorece o abuso de empregadores sem escrúpulos e afeta dramaticamente decisões pessoais como
a saída da casa dos pais ou a maternidade/paternidade. A desigualdade criada pela situação precária é visível
no abaixamento salarial que ocorre e que ronda os 30% - o ganho médio horário de um contrato sem termo
era em 2010 de 6,5 €/h e de um contrato a termo de 4,68 €/h (QP, MSSS, 2010) -; para além de mais horas de
trabalho não remuneradas e piores condições de trabalho face aos trabalhadores com contratos sem termo.
Há ainda outro problema económico grave associado à precariedade e à intensa rotatividade dos profissionais
das empresas: a perda de capital humano específico. A produtividade das empresas é negativamente
influenciada pela perda constante de conhecimento que os trabalhadores levam consigo ao saírem das
empresas. A precariedade afeta a competitividade das empresas e do país.”
Com o projeto de lei em apreço, o Bloco de Esquerda propõe alterações aos artigos 140.º, 143.º, 144.º,
147.º e 148.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprovou o Código do Trabalho, de forma a impedir a
contratação a prazo para funções permanentes; a clarificar a admissibilidade da contratação a prazo; a
combater o desemprego; e a promover a competitividade e a produtividade.
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II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
A iniciativa é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, nos termos do artigo 167.º da
Constituição e do 118.º do Regimento, que consubstanciam o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder
dos deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do
artigo 4.º do Regimento, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do
artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do Regimento.
É subscrita por oito Deputados, respeitando os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º e nas
alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento, relativamente às iniciativas em geral, bem como os
previstos no n.º 1 do artigo 123.º do referido diploma, quanto aos projetos de lei em particular. Respeita ainda
os limites da iniciativa impostos pelo Regimento, por força do disposto nos n.os
1 e 3 do artigo 120.º.
Verificação do cumprimento da lei formulário
O projeto de lei inclui uma exposição de motivos e cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário,
uma vez que tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto [disposição idêntica à da alínea b) do n.º 1
do artigo 124.º do Regimento]. Porém, a expressão: “quarta alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que
aprova a revisão do Código do Trabalho”, deve constar entre parêntesis, para se distinguir do título
propriamente dito, que deve ser o seguinte: “Clarifica os contratos a prazo, protegendo os trabalhadores
(quarta alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho)”.
Quanto à entrada em vigor da iniciativa, em caso de aprovação, terá lugar 30 dias após a data da sua
aprovação, nos termos do artigo 3.º do projeto1.
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
Ao longo da última década a economia portuguesa registou um crescimento económico muito modesto e
um significativo abrandamento do produto potencial. Em simultâneo, o mercado de trabalho foi incapaz de criar
empregos em termos líquidos, apresentando sinais de uma forte segmentação, e a taxa de desemprego
aumentou de forma persistente.
A este respeito, o Relatório do Conselho de Administração do Banco de Portugal 2010 refere que a maioria
dos trabalhadores que transitou do emprego para o desemprego tinha um contrato a termo ou outra forma de
trabalho ocasional. O aumento do desemprego, à semelhança do observado em 2009, ocorreu de forma
generalizada, abrangendo todas as faixas da população e sectores da economia.
O mesmo relatório também refere que (…) Todas as formas de emprego apresentaram uma diminuição em
2010, com exceção dos contratos a termo (ver quadro 4.2.2 e gráfico 4.2.3 da pág.129). As outras formas de
emprego registaram uma forte contração, como resultado principalmente da marcada redução do emprego por
conta própria (quer isolados quer empregadores).
Quanto aos contratos a termo, o mesmo relatório salienta que em relação à composição do emprego por
conta de outrem por tipo de contrato de trabalho, o peso do conjunto dos contratos a termo e dos contratos de
prestação de serviços no total desta categoria de emprego registou uma subida em 2010, regressando à
tendência de aumento observada desde 1995 e apenas interrompida nos anos de recessão económica de
2003 e 2009 (Gráfico 4.2.4). Em 2010, verificou-se uma diminuição de 1.5 por cento no número de
trabalhadores com contrato sem termo, um crescimento de 6.3 por cento do número de trabalhadores com
1 Uma vez que não é possível saber-se com exatidão quantos dias decorrem desde a aprovação de uma iniciativa até à sua publicação,
talvez se pudesse melhorar a redação do artigo 3.º, substituindo-se o termo “aprovação” por “publicação”.
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contrato a termo e uma diminuição de 10.3 por cento do número de contratos de prestação de serviços
(Quadro 4.2.2).
Quanto ao desemprego e o papel dos contratos a termo, o referido relatório acrescenta que o total dos
fluxos entre os vários estados do mercado de trabalho – inatividade, emprego e desemprego – representou 6.9
por cento da população ativa em 2010, valor ligeiramente abaixo do observado em 2009 (7.4 por cento). O
gráfico 4.2.13, apresenta as médias trimestrais desses fluxos ao longo de 2010. (…) Apesar das recentes
alterações legislativas, Portugal ainda apresenta uma elevada proteção formal do emprego permanente,
quando comparada com a existente noutros países europeus. Em consequência, os contratos a termo e o auto
emprego apresentam, em Portugal, um comportamento acentuadamente pro-cíclico, contribuindo para a
redução do desemprego no início das fases de expansão, mas sofrendo fortes contrações nas fases baixas do
ciclo. A evidência empírica mostra que as grandes empresas, para diminuírem o seu nível de emprego,
recorrem principalmente à redução das contratações (em oposição a um aumento das separações).
Adicionalmente, a maior parte da rotação de trabalho é feita através dos contratos a termo. Neste contexto, o
Quadro 4.2.3 evidencia que em 2010 a proporção dos empregados de longa duração subiu 0.2 p.p. e a
duração média do emprego aumentou 1.3 meses.
O referido relatório acrescenta ainda que, apesar de se observar um ligeiro abrandamento, manteve-se em
2010 a tendência de aumento do peso dos contratos a termo nos fluxos do desemprego (inatividade) para o
emprego, correspondendo a 87 por cento (79 por cento) do total (Gráfico 4.2.14). A proporção de
trabalhadores com contrato a termo a passar do emprego para o desemprego ou inatividade também diminuiu
face a 2009 mas continua a representar quase dois terços dos fluxos.
Quanto à taxa de desemprego o mesmo relatório menciona que a evolução do mercado de trabalho em
2010 ficou marcada pelo forte aumento da taxa de desemprego, atingindo 10.8 por cento face a 9.5 por cento
em 2009 e 7.6 por cento em 2008. A taxa de desemprego apresentou uma dinâmica crescente a partir do
terceiro trimestre de 2008, atingindo 11.1 por cento no último trimestre de 2010. O aumento do desemprego
ocorreu de forma generalizada, abrangendo quase todas as faixas da população, independentemente do
género, idade, escolaridade, tipo de contrato e região de residência.
Nota: Os gráficos e os quadros referidos no texto do relatório encontram-se nas págs. 129 à 136.
O Código do Trabalho (CT2009)2 aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que teve origem na
Proposta de Lei n.º 216/X, na Subsecção I, da Secção IX, do Capítulo I, do Título II, consagra no artigo 140.º,
a admissibilidade de contrato de trabalho a termo resolutivo; no artigo 143.º, a sucessão de contrato de
trabalho a termo; no artigo 144.º, o dever de informações relativas a contrato de trabalho a termo; no artigo
147.º, define o contrato de trabalho sem termo; e no artigo 148.º a duração de contrato de trabalho a termo.
O artigo 140.º do CT2009 estabelece que o contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado
para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação
dessa necessidade, obedecendo às situações elencadas nos n.os
2, 3, e 4 do referido artigo.
O n.º 1 do artigo em anotação mantém a técnica utilizada pelo CT2003, de estabelecer os fundamentos
para a contratação a termo através de cláusula geral, densificada com exemplos e complementada por
situações de admissibilidade de contratação a termo fora do âmbito daquela cláusula geral, mas com duração
limitada no tempo. Deste modo, é lícita a contratação a termo, certo ou incerto, independentemente do elenco
legal, sempre que se verifique necessidade temporária de trabalho, aferida segundo critérios empresariais: é
este o sentido da expressão “necessidades temporárias da empresa”. Só há contratação lícita ao abrigo da
referida cláusula geral quando objetivamente existam, reportadas a determinada realidade organizacional,
necessidades de trabalho subordinado limitadas no tempo, defendem, assim, os Drs. Luís Miguel Monteiro e
Pedro Madeira de Brito3.
Os referidos autores entendem que a expressão “necessidade temporária da empresa” supõe um critério
de medida da temporaneidade, pois se necessidade temporária é aquela cujo fim no tempo é previsível, é
2 O Código do Trabalho (CT2009) foi aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, retificada pela Declaração de Retificação n.º
21/2009, de 18 de março, alterada pelas Leis n.os
105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho (retificada pela Declaração de Retificação n.º 38/2012, de 23 de julho) e 47/2012, de 29 de agosto. 3 In: MONTEIRO, Luís Miguel e BRITO, Pedro Madeira – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra 2009, pags. 381 e
382.
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seguro que nem todas as necessidades previsivelmente limitadas no tempo permitem contratar a termo: basta
pensar que ainda é antecipável no tempo o fim de necessidade que se estima durar 20 anos.
Crê-se que ao impor duração máxima para a vigência dos contratos destinados a satisfazer necessidades
temporárias, o legislador forneceu o critério da medida admissível da natureza temporária que justifica a
contratação. Isto é, são necessidades temporárias as que possam ser satisfeitas por contratos até seis anos
de duração (cfr. artigo 148.º, n.º 4, no caso do contrato a termo incerto).
Para além da necessidade temporária da empresa, o legislador considerou fundamentarem o recurso ao
contrato a termo por razões empresariais relacionadas com a diminuição do risco de determinadas atividades
e motivos de política de emprego (n.º 4 do artigo em anotação). A dicotomia entre necessidades temporárias e
outros fundamentos para a contratação a termo é claramente evidenciada com a separação entre os n.os
2 e 3
e o n.º 4 do artigo em anotação. A ela corresponde, por outro lado, diferente relação entre motivo justificativo e
duração do contrato.
Os citados autores sublinham que na situação enunciada no corpo do n.º 1 e exemplificada nas diversas
alíneas do n.º 2 do artigo 140.º, exige-se a adequação da duração do contrato à subsistência da necessidade
que o justifica; ou seja, o contrato não pode exceder a duração da necessidade. Nos casos do n.º 4, os
motivos que justificam a contratação a termo não fornecem prazo para esta. Com efeito, subjacentes a estas
possibilidades de contratação a termo estão os referidos motivos de diminuição do risco empresarial e de
política de emprego, pelo que a limitação temporal da contratação decorre não da natureza dos motivos
justificativos, mas de juízo do legislador quanto à duração máxima de um vínculo precário, no caso, dezoito
meses ou dois anos, respetivamente decorrentes das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 148.º.4
Ainda no âmbito do contrato de trabalho a termo, os mesmos autores, sublinham que o preceituado do n.º 1
do artigo 143.º pretende evitar que, através da celebração sucessiva de contratos, o empregador contorne as
limitações à celebração de contratos a termo, designadamente aquela que decorre do número máximo de
renovações do contrato e da duração deste. A norma visa impedir a ultrapassagem das limitações relativas à
duração máxima do contrato de trabalho a termo, seja pela celebração de contrato a termo imediatamente
após a cessação do anterior por decurso do respetivo termo ou qualquer outra causa extintiva não imputável
ao trabalhador, seja pela existência de duas contratações intercaladas por período sem título contratual de
duração inferior a um terço da duração do primeiro contrato5.
A consequência da sucessão de contratos (que não apenas a termo) para o mesmo posto de trabalho
encontra-se prevista no artigo 147.º.
O XIX Governo Constitucional assumiu o compromisso no seu Programa, no Capítulo «Finanças Públicas
e Crescimento», relativo ao Emprego e ao Mercado de Trabalho, de permitir, a título excecional, a renovação
dos contratos de trabalho a termo que caducassem no período de doze meses. Neste sentido foi aprovada a
Lei n.º 3/2012, de 10 de janeiro, a qual estabelece um regime de renovação extraordinária dos contratos de
trabalho a termo certo, celebrados ao abrigo do disposto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009,
de 12 de fevereiro, que atinjam o limite máximo da sua duração até 30 de junho de 2013.
A exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 25/XII que deu origem à Lei n.º 3/2012, de 10 de janeiro,
refere que este regime, que apresenta uma natureza transitória e excecional, é motivado pelo atual contexto
de crise económica e de desemprego e revela-se necessário e adequado à situação de muitos trabalhadores,
prosseguindo o objetivo de contribuir para a manutenção do respetivo vínculo contratual.
Após a revisão do CT2009, o contrato a termo certo passou a ter a duração máxima de três anos, sendo
admitidas três renovações.
Com a entrada em vigor da Lei n.º 3/2012, de 10 de janeiro, podem ser objeto de duas renovações
extraordinárias os contratos de trabalho a termo certo que, até 30 de Junho de 2013, atinjam os limites
máximos de duração estabelecidos no n.º 1 do artigo 148.º6 do atual Código do Trabalho.
4 In: MONTEIRO, Luís Miguel e BRITO, Pedro Madeira – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra 2009, pag. 383.
5 In: MONTEIRO, Luís Miguel e BRITO, Pedro Madeira – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra 2009, pag. 391.
6 O n.º 1 do artigo 148.º do CT estabelece que “o contrato de trabalho a termo certo pode ser renovado até três vezes e a sua duração não
pode exceder: a) 18 meses, quando se tratar de pessoa à procura de primeiro emprego; b) Dois anos, nos demais casos previstos no n.º 4 do artigo 140.º; c) Três anos, nos restantes casos.”
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A Lei n.º 3/2012, de 10 de janeiro, não se aplica aos contratos de trabalho a termo incerto7, uma vez que,
de acordo com o disposto no n.º 6 do artigo 7.º8 da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, o limite máximo de seis
anos teve início à data de entrada em vigor desta lei, donde resulta que o mesmo apenas será atingido em
fevereiro de 2015.
Por último, refere-se que, sobre a matéria em apreço, o Grupo Parlamentar do BE apresentou na passada
sessão legislativa o Projeto de Lei n.º 2/XII (1.ª), que foi rejeitado, na generalidade, em Plenário, com os votos
contra do PSD, PS, CDS-PP, e os votos a favor da Deputada Isabel Alves Moreira (PS), PCP, BE, e PEV.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
BASSANINI, Andrea; NUNZIATA, Luca; VENN, Danielle - Job protection legislation and productivity growth
in OECD countries. Economic policy. London. ISSN 0266-4658. N.º 58 (Apr. 2009), p. 349-402 - Cota: RE-329
Resumo: Parte-se do princípio que à medida que a idade das populações dos países da OCDE aumenta e
a população ativa diminui, se torna cada vez mais importante o crescimento da produtividade e o incremento
da participação de grupos demográficos sub-representados no mercado de trabalho. Assim, as políticas de
promoção da produtividade são fundamentais nas próximas décadas. No entanto, pouco se sabe sobre o
efeito da legislação, relativa à proteção laboral, na produtividade. Este artigo pretende analisar precisamente
esta questão com vista a ajudar à tomada de decisões políticas nesta área.
CORREIA, António Damasceno - Anotações ao regime jurídico do contrato a termo: o tratamento
jurisprudencial. Questões laborais. Coimbra. ISSN 0872-8267. A. 26, n.º 33 (Jan.- Jun. 2009), p. 61-115 - Cota:
RP-577
Resumo: O autor considera que o ponto central das regras atinentes ao contrato a termo é a problemática
dos motivos justificativos para a admissibilidade deste género contratual. Independentemente desse aspeto
nuclear, analisa 16 princípios estruturantes da contratação a termo. Também é dado relevo às questões
atinentes às formalidades, à duração máxima destes contratos e à sua caducidade. Comenta, e por vezes
critica, o tratamento jurisprudencial dado por alguns tribunais de instâncias superiores.
Conclui que se criaram regras que permitiram contribuir para uma maior harmonia do sistema jurídico:
entende que o legislador terá tentado gerar um equilíbrio na gestão desta relação contratual tendo presente
que ela serve de escape ou solução alternativa ao mais rígido esquema normativo do contrato individual de
trabalho e do seu modo de extinção, por forma a que os empregadores fiquem melhor preparados para
cenários menos favoráveis que o mercado e a economia possam vir a originar.
CORREIA, António Damasceno - A noção de trabalhador ausente ou temporariamente impedido para
efeitos de contratação a termo. Recursos humanos magazine. Lisboa. A. 10, n.º 64 (Set.- Out. 2009), p. 30-40
– Cota: RP-810
Resumo: Na opinião do autor, o contrato a termo certo e incerto e outros vínculos contratuais não
permanentes têm representado um dos instrumentos de flexibilização da gestão empresarial. A estratégia
prosseguida pela política laboral dos últimos governos visou dotar esta legislação de maior adaptabilidade à
realidade, contribuindo para ajustar o sistema jurídico nacional às exigências dos empresários portugueses e
dos investidores estrangeiros.
Com o presente artigo, pretende delinear o modo como esta questão tem sido encarada pelos vários
operadores e a forma como o legislador entendeu o conceito de trabalhador ausente ou temporariamente
impedido, evitando desta forma que o empregador incorra em contratação a termo ilícita. Finalmente, o
comentário à jurisprudência pretende esclarecer a forma como os magistrados de instâncias superiores têm
encarado esta matéria.
7 Nos termos do n.º 4 do artigo 148.º do CT, a duração do contrato de trabalho a termo incerto não pode ser superior a seis anos.
8 O n.º 6 do artigo 7.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, determina que o regime estabelecido no n.º 4 do artigo 148.º do Código do
Trabalho, anexo à presente lei, relativo à duração de contrato de trabalho a termo incerto aplica-se a situações constituídas ou iniciadas antes da sua entrada em vigor, contando-se o período de seis anos aí previsto a partir da data de entrada em vigor da presente lei.”
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FRANÇA. Ministère de l'emploi, du travail et de la santé. Guide pratique du droit du travail. 12e éd. Paris:
La Documentation Française : Ministère de l'emploi, du travail et de la santé, 2012. 841 p. (Les
indispensables). ISBN 978-2-11-008721-8. - Cota: 12.06.9 - 152/2012
Resumo: O presente guia apresenta as reformas mais recentes do direito do trabalho em França. No
capítulo 2, aborda o contrato de trabalho nas suas variadas vertentes, nomeadamente, o contrato de duração
determinada, o trabalho temporário, o trabalho a tempo parcial e o trabalho intermitente. Esta edição inclui
todas as novidades regulamentares e legislativas e ainda a jurisprudência francesa mais recente.
GOMES, Maria Irene – Primeiras reflexões sobre a revisão do regime jurídico do contrato de trabalho a
termo pelo novo Código do Trabalho. Scientia ivridica: revista de direito comparado português e brasileiro.
Braga. ISSN 0870-8185. T. 58, n.º 318 (Abr.-Jun. 2009), p. 281-310 - Cota: RP-92
Resumo: Neste artigo, são analisadas as alterações introduzidas ao regime jurídico do contrato de trabalho
a termo pelo novo Código do Trabalho, nomeadamente: quanto à natureza do regime jurídico, requisitos
materiais, requisitos formais, contratos sucessivos, duração máxima dos contratos de trabalho a termo e
renovação do contrato a termo certo.
MACHADO, Susana Sousa – Contrato de trabalho a termo: a transposição da directiva 1999/70/CE
para o ordenamento jurídico português: (in)compatibilidades. Coimbra: Coimbra Editora, 2009. 393 p.
ISBN:978-972-32-1738-4. – Cota: 12.06.9 – 629/2009
Resumo: A autora lamenta que em Portugal não seja promovido um amplo debate sobre a possibilidade,
oferecida pelo Tratado, de transposição das diretivas através de convenção coletiva de trabalho, apesar de
esta ser uma figura constitucionalmente aceite. Neste livro, procura determinar se a implementação do direito
comunitário no âmbito da contratação a termo é total ou parcial.
Coloca a questão se a legislação nacional não prejudica o efeito útil da Diretiva e se está em conformidade
com os objetivos enunciados no acordo-quadro, que pretende melhorar a qualidade do trabalho sujeito a
contrato a termo, garantir a aplicação do princípio de não-discriminação e, ainda, evitar os abusos resultantes
do recurso a contratos a termo sucessivos.
Conclui que a Diretiva 1999/70/CE não foi transposta, ou melhor, foi transposta de forma incorreta ou
inadequada, porque não foram implementadas no ordenamento jurídico português medidas que garantam o
teor e a finalidade da Diretiva, para alcançar os resultados por esta prosseguidos, por forma a atingir uma
solução compatível com as disposições dela constantes.
MARQUES, Jorge Manuel Pereira– O contrato de trabalho a termo resolutivo como instrumento de
política económica: entre a eficiência e a validade. Coimbra: Coimbra Editora, 2011. 196 p. ISBN 978-972-
32-1932-6. Cota:12.06.9 - 323/2011
Resumo: O autor propõe-se apresentar o contrato a termo numa perspetiva diferente, procurando
determinar em que medida o regime pode satisfazer eficazmente os anseios dos empregadores, sem reduzir
os direitos dos trabalhadores a mínimos incomportáveis.
O autor defende que: “Para que o contrato de trabalho a termo resolutivo possa desempenhar o seu papel
como instrumento de política económica, tem de afirmar-se, sobretudo, como um bom instrumento de gestão”.
Assim, é abordado o trabalho temporário em sentido amplo e estrito, o trabalho a tempo parcial e o trabalho
intermitente, assim como o contrato a termo certo e incerto, e ainda, o contrato a termo resolutivo.
RAMALHO, Maria do Rosário Palma – Contrato de trabalho a termo no Código do Trabalho de 2009:
algumas notas. In Código do trabalho: a revisão de 2009. Coimbra: Coimbra Editora, 2011. ISBN 978-972-
32-1867-1. p. 249-261. Cota: 12.06.9 – 340/2011
Resumo: Neste artigo, a autora analisa, por um lado, as alterações sistemáticas no tratamento da figura do
contrato de trabalho a termo no Código do Trabalho de 2009, que têm a ver com a qualificação do contrato de
trabalho a termo como um contrato de trabalho especial e com a reorganização global do seu regime em
termos sistemáticos; e, por outro lado, as alterações substanciais ao regime do contrato de trabalho a termo
que se reportam à natureza deste regime legal, a alguns dos fundamentos objetivos do contrato, à sua
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duração máxima e ao limite de renovações, e ainda à consagração, como nova modalidade deste contrato, do
contrato a termo de muito curta duração.
REBELO, Glória - Efectividade legal e trabalho não declarado e irregular. Dirigir: revista para chefias.
Lisboa. ISSN 0871-7354. N.º 109 (Jan.-Mar. 2010), p. 40-45 - Cota: RP- 255
Resumo: Refere-se que o “trabalho não declarado” e o “trabalho irregular” constituem um fenómeno grave
do ponto de vista ético, legal e económico.
Num momento de difícil conjuntura económica e social, adensa-se a dúvida sobre qual a eficácia, na área
da fiscalização das condições de trabalho, da ação inspetiva de cada estado. Realça-se que as consequências
do trabalho não declarado e irregular não são apenas individuais, mas também sociais.
Conclui-se que a reforma laboral de 2008/2009 pode constituir um ponto de viragem na promoção de maior
efetividade legal e no combate ao trabalho não declarado e irregular em Portugal.
SARÁVIA, Mariana Caldeira - Admissão de trabalhadores: novas regras e novos modelos contratuais.
Trabalho e segurança social: revista de atualidade laboral. Lisboa. N.º 2 (Fev. 2009), p. 7-8 - Cota: RP-558
Resumo: A autora analisa as principais alterações e novidades contidas no novo Código do Trabalho, em
matéria de admissão de trabalhadores por conta de outrem, relativamente aos contratos de trabalho a termo,
contratos de trabalho a tempo parcial, contratos de trabalho intermitente e contratos de trabalho em comissão
de serviço.
Enquadramento do tema no plano da União Europeia
No quadro da legislação europeia aplicável às matérias relacionadas com o direito do trabalho refira-se a
Diretiva 99/70/CE do Conselho, de 28 de junho, que tem como objetivo a aplicação do acordo-quadro relativo
a contratos de trabalho a termo, celebrado pelos parceiros sociais europeus (CES, UNICE e CEEP)9. Este
acordo-quadro enuncia os princípios gerais e os requisitos mínimos relativos aos contratos de trabalho ou
relações laborais a termo, com vista a garantir a aplicação do princípio da não discriminação dos trabalhadores
contratados a termo e a evitar os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos ou relações de
trabalho a termo, reconhecendo que as regras para a sua aplicação devem ter em conta as especificidades
nacionais, sectoriais e sazonais. Neste sentido o acordo-quadro prevê determinadas disposições a
implementar nos Estados-membros para garantir que os trabalhadores contratados a termo não recebam
tratamento menos favorável do que os trabalhadores permanentes em situação comparável e estabelece que
os Estados-membros devem, a fim de evitar situações de abuso associadas a este tipo de contrato e tendo em
conta as necessidades de sectores e/ou categorias de trabalhadores específicos, introduzir medidas relativas
às razões objetivas da necessidade de renovação dos referidos contratos de trabalho, à duração máxima total
dos sucessivos contratos de trabalho a termo e ao número máximo de renovações destes contratos. O acordo-
quadro inclui igualmente disposições relativas à possibilidade de acesso dos trabalhadores contratados a
termo à formação e à garantia de informação sobre as possibilidades de acesso a postos de trabalho
permanentes.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países europeus: Bélgica, Espanha, França e
Itália.
Bélgica
Nos termos da Lei sobre o Contrato de Trabalho, de 1978, com as sucessivas alterações, na Bélgica,
existem contratos por tempo determinado, contratos para a execução de tarefas, contratos de substituição e
contratos para a execução de trabalho temporário (concluído diretamente entre empregador e trabalhador).
Não parece haver restrições à celebração de contratos por tempo determinado.
9 Transposta para o ordenamento jurídico português através do Código do Trabalho, artigo 143.º.
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Os contratos para a execução de tarefas e os contratos de substituição têm celebração restrita pela sua
natureza.
O contrato para a execução de um trabalho temporário só pode ser celebrado:
– para substituir um trabalhador permanente;
– para responder a um aumento temporário de trabalho;
– para assegurar a realização de um trabalho excecional.
Do ponto de vista do prazo, a lei não fixa duração máxima para os contratos por tempo determinado e para
os contratos para a realização de tarefa.
No entanto, em princípio, não é possível renovar estes contratos, sob pena de, em caso de celebração
sucessiva, se entender que o contrato se converteu em contrato por tempo indeterminado.
Ressalvam-se as situações em que o empregador conseguir demonstrar que a renovação se justifica, bem
assim como os contratos cuja duração máxima inicial é de até 2 anos, os quais podem ser renovados até 4
vezes, desde que a duração de cada contrato não seja inferior a 3 meses e que a duração total destes
contratos não ultrapasse os 2 anos. Também os contratos de trabalho sucessivos com uma duração de até 3
anos podem ser renovados mediante autorização prévia do Controlo das Lei Sociais desde que a duração de
cada contrato não seja inferior a 6 meses e que a duração total destes contratos não ultrapasse os 3 anos.
A Lei de 24 de julho de 1987, sur le travail temporaire, le travail intérimaire et la mise de travailleurs à la
disposition d'utilisateurs, com as sucessivas alterações, define o trabalho temporário como a atividade
exercida no contexto de um contrato de trabalho e tendo por objeto proceder à substituição de um trabalhador
permanente ou responder a um acréscimo temporário de trabalho ou assegurar a execução de um trabalho
excecional.
Por substituição de um trabalhador permanente entende-se:
A substituição de um trabalhador, em relação ao qual a execução do contrato de trabalho se encontra
suspensa, salvo em caso de falta de trabalho por razões económicas ou por força de intempéries;
A substituição temporária de um trabalhador cujo contrato chegou ao fim;
A substituição temporária de uma pessoa cujo estatuto é fixado unilateralmente pelo Estado e que
deixou de exercer as suas funções ou as exerce somente a título parcial;
A substituição temporária de um trabalhador que reduziu as suas prestações de trabalho no quadro do
sistema regulamentado pela lei de interrupção da carreira.
Em caso de substituição de um trabalhador permanente, o trabalhador temporário deve pertencer à mesma
categoria profissional que o trabalhador que vai substituir.
A convenção coletiva CCT n.° 36 du 27 novembre 1981 enumera de forma limitativa as atividades que
podem constituir trabalho excecional e determina que essas atividades não podem constituir o campo de
ocupações habituais da empresa utilizadora que recorre ao trabalho temporário. Constitui designadamente
trabalho excecional:
A realização de tarefas de preparação, funcionamento e desmontagem de feiras, salões, congressos,
jornadas de estudos, seminários, exposições, etc.;
A realização de secretariado a executivos que se deslocam temporariamente à Bélgica;
A realização de trabalhos para fazer face a um acidente ocorrido ou iminente;
A realização de reparações urgentes em máquinas ou materiais, desde que a realização dessas
reparações seja indispensável para evitar entraves sérios à normal exploração da empresa;
Os trabalhos que se imponham por uma necessidade imprevista.
Este tipo de trabalho não pode, por via de regra, gerar contratos de duração superior a três meses (sem
possibilidade de prorrogação). No caso dos trabalhos de balanço e inventário, a duração máxima do recurso a
este tipo de trabalho é de sete dias.
Os contratos de substituição não podem durar mais de 2 anos.
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A duração máxima dos contratos de trabalho temporário (6 meses em caso de licença por motivo grave, 3
meses em caso de licença com pré-aviso e 3 meses com possibilidade de renovação até um período igual nos
restantes casos) foi fixada por convenção coletiva.
Por último, cumpre referir a Lei de 5 de junho de 2002, sur le principe de non-discrimination en faveur des
travailleurs avec un contrat de travail à durée déterminée, que, no artigo 4.º, dispõe que, no que respeita às
condições de trabalho, os trabalhadores contratados por tempo determinado não podem ser tratados de forma
menos favorável que os trabalhadores com contrato por tempo indeterminado em posição comparável.
Espanha
Em Espanha é o Real Decreto Legislativo n.º 1/1995, de 24 de março, “por el que se aprueba el texto
refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores” (consolidado) que regula a relação individual de trabalho,
os direitos de representação coletiva e de reunião dos trabalhadores na empresa, a negociação coletiva e os
convénios e as infrações laborais.
O Real Decreto n.º 2720/1998, de 18 diciembre, por el que se desarrolla el artículo 15 del Estatuto de los
Trabajadores en materia de contratos de duración determinada, no Capítulo I remete para o artigo 15 -
Duración del contrato do Real Decreto Legislativo n.º 1/1995, de 24 de março, “por el que se aprueba el texto
refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores. Nesse Real Decreto Legislativo relativo à modificação,
suspensão e extinção do contrato de trabalho, encontramos a enumeração das causas que podem dar origem
à extinção do contrato de trabalho (artigo 49.º e ss.), bem como as compensações devidas aos trabalhadores
pela sua invocação.
Quando um trabalhador é contratado para executar um trabalho ou serviço específico e ou com um tempo
limitado tem de ser celebrado um contrato de ‘duración determinada’. Estes contratos terão uma duração não
superior a três anos prorrogáveis para 12 meses de contrato coletivo. Passado este período, os trabalhadores
adquirem o estatuto de funcionários com vínculo à empresa. Os contratos podem ainda ter uma duração
máxima de 6 meses dentro de um período de 12 meses, quando as condições do mercado, a acumulação de
tarefas ou ordens superiores assim o exigirem, até mesmo para a atividade normal da empresa. Os contratos
podem dar resposta a necessidades sazonais de algumas atividades. Nesse caso, o período máximo de
duração do contrato é de 18 meses e não pode exceder a duração do contrato de três quartos do período de
referência e um máximo de 12 meses.
Em 2006 o governo espanhol procurou combater a precariedade laboral através da Lei n.º 43/2006, de 29
de dezembro, “para a melhoria do crescimento e do emprego”. As principais modificações foram relativas aos
contratos a termo e temporários. Nos termos do n.º 2 do artigo 12.º, os trabalhadores que num período de 30
meses tenham estado contratados por um período superior a 24 meses, com ou sem continuidade, para um
mesmo posto de trabalho com a mesma empresa, mediante dois ou mais contratos a termo, seja diretamente
ou através de empresa, adquirem a condição de trabalhadores fixos, por tempo indeterminado.
O Governo espanhol, recentemente, através Real Decreto-ley 3/2012, de 10 de febrero introduziu
alterações ao Real Decreto Legislativo n.º 1/1995, de 24 de marzo, por el que se aprueba el texto refundido de
la Ley del Estatuto de los Trabajadores - ET (texto consolidado).
O Real Decreto-Lei 3/2012, de 10 de fevereiro, estabelece medidas para a reforma do mercado laboral,
visando favorecer a empregabilidade dos trabalhadores. De acordo com a exposição de motivos do referido
diploma, os serviços públicos de emprego têm sido insuficientes na gestão da colocação de trabalhadores, em
contrapartida, as empresas de trabalho temporário têm emergido como um poderoso impulso para o mercado
de trabalho. Na maioria dos países da União Europeia, tais empresas operam como agências de colocação e
as mesmas contribuem para a criação de emprego e a participação e inserção dos trabalhadores no mercado
de trabalho. Assim, o referido Real Decreto-Lei vem alterar o quadro regulamentar das empresas de trabalho
temporário de modo que lhes permita funcionar como agências de colocação, nos termos da Ley 14/1994, de
1 de junio, por la que se regulan las Empresas de Trabajo Temporal, regulamentada pelo Real Decreto 4/1995,
de 13 de enero.
Os elementos que devem constar na celebração do contrato de utilização de trabalho temporário bem
como no contrato de trabalho temporário estão previstos no Real Decreto 4/1995, de 13 de enero.
Nos termos do artigo 1.º da Lei 14/1994, de 1 de junho, uma empresa de trabalho temporário (ETT) é
aquela cuja atividade fundamental consiste em pôr à disposição de outra empresa utilizadora, com caráter
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temporário, trabalhadores por ela contratados. A contratação de trabalhadores para ceder temporariamente a
outra empresa poderá efetuar-se através de empresas de trabalho temporário devidamente autorizadas nos
termos previstos da referida lei. O mesmo artigo também prevê que as empresas de trabalho temporário
possam atuar como agências de colocação desde que apresentem uma declaração mediante a qual cumpram
os requisitos estabelecidos na Ley 56/2003, de 16 de diciembre, de Empleo.
O artigo 7.º da Lei n.º 14/1994, de 1 de junho, refere que aos contratos de cedência de trabalhadores por
parte das empresas de trabalho temporário aplica-se, quanto à sua duração, o disposto no artigo 15.º do
Estatuto dos Trabalhadores (ET). Estes contratos têm obrigatoriamente que ser formalizados por escrito.
A referida Lei n.º 14/1994, de 1 de junho, no artigo 8.º, elenca os casos em que as empresas não podem
celebrar contratos de “puesto a disposición” (contrato de utilização de trabalho temporário), tais como:
a) Para substituir trabalhadores em greve na empresa de utilização;
b) Para realizar trabalhos ou ocupações especialmente perigosos para a segurança e a saúde no trabalho,
nos termos previstos na disposição adicional segunda da referida lei e nas convenções ou acordos coletivos
de trabalho;
c) Para satisfação de necessidades que foram asseguradas por trabalhador cujo contrato tenha cessado
nos doze meses imediatamente anteriores por despedimento coletivo e por extinção do contrato por vontade
do trabalhador;
d) Para ceder trabalhadores a outras empresas de trabalho temporário.
O contrato de trabalho temporário é um contrato formal, obrigatoriamente reduzido a escrito. Caso não se
observe tal exigência, o mesmo presume-se celebrado por tempo indefinido (artigo 8.º do Estatuto dos
Trabalhadores).
No que se refere à duração do contrato, o artigo 15.º do ET estabelece que quando uma empresa contrata
um trabalhador para a realização de uma obra ou serviço determinado, com autonomia própria dentro da
atividade da empresa e cuja execução, embora limitada no tempo, seja em princípio de duração incerta, estes
contratos não podem ter uma duração superior a três anos, aumentando até 12 meses por convenção coletiva
de âmbito setorial estatal ou, na sua falta, por convenção coletiva setorial de âmbito inferior. Decorrido esse
prazo, o trabalhador adquire a condição de trabalhador fixo da empresa. As convenções podem estabelecer
critérios objetivos e compromissos de conversão dos contratos de duração determinada ou temporários em
indefinidos.
O V Convenio colectivo estatal de empresas de trabajo temporal regula as relações de trabalho entre as
empresas de trabalho temporário (ETT) e os seus trabalhadores assim como as dos trabalhadores que estão
ao serviço da empresa utilizadora. Nos termos da referida convenção, um “trabajador puesto a disposición” é
aquele que é contratado para ser cedido à empresa utilizadora onde vai prestar os seus serviços; “trabajador
de estrutura” é aquele que é contratado para prestar os seus serviços diretamente na empresa de trabalho
temporário. As matérias relacionadas com a estrutura e duração do tempo de trabalho, mobilidade geográfica,
regime salarial, indemnização por extinção do contrato de trabalho, benefícios sociais, são entre outras,
tratadas na referida convenção estatal.
De acordo com a brochura “Atrapados o flexibles?” o trabalho temporário tem estado mais difundido em
países como Polónia, Espanha, Portugal, Países Baixos e Eslovénia onde a incidência do trabalho temporário
representa mais de 17% da população total empregada.
França
Em França as relações laborais são reguladas pelo “Code du travail.
O Código do Trabalho, na Parte I, regula “As Relações Individuais de Trabalho” e, em diversos Livros, no II,
o contrato individual de trabalho, no III, a rutura do contrato individual de trabalho, no IV, o contrato de trabalho
de duração determinada e, no V, o contrato temporário e outros contratos.
O contrato de trabalho por tempo indeterminado é a forma normal e genérica da relação de trabalho,
conforme indica o artigo L1221-2.
O contrato de trabalho de duração determinada que está regulado no artigo L1241 e seguintes vem
estabelecer as condições em que o mesmo pode ser celebrado sucessivamente: substituição de um
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empregado ausente, substituição de um empregado cujo contrato tenha sido suspenso ou empregos de
carácter sazonal (v. L1244-1). A não obediência aos critérios estabelecidos na Lei pode determinar que o
contrato seja considerado de duração indeterminada como estabelece o artigo L1245-1.
O contrato temporário e outros contratos estão regulados nos artigos L1251 e seguintes.
No Code du travail, mais precisamente no Titre IV: Contrat de travail à durée déterminée (CDD) do Livre II:
Le contrat de travail, são determinadas as condições da celebração dos contratos de trabalho a termo certo.
Um CDD é celebrado por um período de tempo limitado e preciso: acaba no dia estabelecido ou, à falta deste,
quando se acaba o trabalho específico para que o contrato foi celebrado. A duração total, já com uma eventual
renovação, não pode ultrapassar o limite máximo autorizado: Fixation du terme et durée du contrat (articles
L1242-7 à L1242-9).
No article L1242-8 é definido que a duração total do contrato a termo certo não pode exceder 18 meses,
com exceção das renovações feitas segundo as condições previstas no article L1243-13.
Esta duração é reduzida para 9 meses quando o contrato é concluído, com o retorno ao serviço efectivo do
assalariado recrutado então substituído ou quando as tarefas a desempenhar são trabalhos urgentes
necessários por medidas de segurança.
A duração do contrato passa para 24 meses:
1. Quando o contrato é executado no estrangeiro;
2. Quando o contrato é concluído no quadro de partida definitiva de um assalariado precedendo-se à
supressão do seu posto de trabalho;
3. Quando é requisitada à empresa contratante uma encomenda excecional para exportação cujos meios
necessários sejam muito superiores aos de que a empresa dispõe normalmente. Nesse caso, a duração inicial
do contrato não pode ser inferior a 6 meses e, antes da contratação, o empregador deve consultar os
delegados do pessoal.
No article L1243-13 é definida a renovação dos contratos de trabalho a termo certo:
1. Podem ser renovados por uma duração definida;
2. A duração da renovação, adicionada à duração do contrato inicial, não pode exceder a duração máxima
prevista no artigo L. 1242-8 (18 meses);
3. As condições da renovação são estipuladas no contrato ou estão sujeitas a uma emenda apresentada ao
contratado antes do final do prazo previsto inicialmente;
4. Essas disposições não são aplicáveis ao contrato de trabalho a termo certo concluído, aplicando o article
L. 1242-3.
No mesmo código do trabalho no Chapitre IV: Succession de contrats estão previstos os contratos
sucessivos com o mesmo contratado articles L1244-1 à L1244-2 e os contratos sucessivos para a mesma
função: articles L1244-3 à L1244-4.
Pode haver uma sucessão de CDD com o mesmo contratado quando for o caso:
1. Substituição de um assalariado ausente;
2. Substituição de um assalariado cujo contrato de trabalho está suspenso;
3. Lugares de carácter sazonal ou para os quais, em certos sectores de atividade definidos por decreto, por
convenção ou por acordo coletivo, é costume não se recorrer ao contrato de trabalho a termo certo pela
natureza da atividade exercida ou do carácter de natureza temporária destes empregos;
4. Substituição de um diretor de empresa artesanal, industrial ou comercial, de um profissional liberal, do
seu cônjuge se participar efetivamente na atividade da empresa ou de um associado não assalariado de uma
sociedade civil profissional, de uma sociedade civil ou de uma sociedade de atividade liberal. Substituição de
um diretor de uma exploração agrícola, uma ajuda familiar de um associado de exploração ou do seu cônjuge
quando este participa na atividade da empresa.
Nos CDD para a mesma função tem de haver um tempo de carência entre contratos. O tempo de carência
deve ser o terço da duração do contrato, se a duração e a renovação deste for superior ou igual a 14 dias; e à
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metade da duração do contrato se a sua duração for inferior a 14 dias. Esse tempo de carência não é aplicável
quando o cargo ocupado é de substituição de um funcionário ausente; se a função desempenhada é por
medidas de segurança; se o trabalho for de carácter sazonal; se o funcionário se recusar a renovar o contrato;
se houver uma rescisão antecipada do contrato; ou se o trabalho for do tipo da alínea 4 anteriormente citada.
No Chapitre V: Requalification du contrat do mesmo código do trabalho, nos articles L1245-1 à L1245-2 é
definido:
1. É considerado contrato permanente de trabalho celebrado em violação dos artigos L1242-1 à 4, L1242-6,
L1242-7 à 8, primeira alínea do L1242-12, primeira alínea do L1243-11, L1243-13, L1244-3 à 4;
2. Quando o tribunal industrial recebe um pedido de reclassificação de um contrato de trabalho a termo
certo para um contrato de trabalho por tempo indeterminado. O tribunal tem de se pronunciar no prazo de um
mês da data de entrada do pedido.
Nas condições estabelecidas pela Loi n.º 2008-596,du 25 juin, portant modernisation du marché du travail,
no artigo 6 são regulamentadas algumas particularidades do CDD.
No site do Ministère du Travail, de l’Emploi et de la Santépodem ser consultadas as especificidades dos
contratos de trabalho a termo certo, o contrat de travail à durée déterminée através da consulta de uma fiche
spécifique. A celebração de um CDD só é possível para a realização de uma tarefa específica e temporária e
apenas em alguns casos enumerados pela lei. Tem de ser obrigatoriamente um contrato escrito, cujo conteúdo
funcional não pode estar relacionado com a atividade normal e permanente da empresa. Celebrado fora do
quadro legal, pode ser considerado um contrato permanente.
Itália
Em Itália a figura reconduzível àquela em apreço na presente proposta de lei é a do “contrato de trabalho
por tempo determinado”, que é o contrato de trabalho que prevê um termo final para a sua duração.
O contrato por tempo determinado é atualmente disciplinado pelo Decreto Legislativo n.º 368/2001, de 6 de
Setembro (emanado em transposição da Diretiva comunitária 1999/70 sobre o trabalho a prazo), que revogou
expressamente a normativa precedente. O DL 368/2001 foi modificado pela Lei n.º 247/2007, de 24 de
Dezembro (em conexão com o Orçamento de Estado para 2007) e pela Lei n.º 133/2008, de 6 de Agosto.
O contrato de trabalho a prazo pode ser estipulado quando existam razões de ordem técnica, produtiva,
organizativa ou de substituição, ainda que reportáveis à atividade normal do empregador. Pode pensar-se, por
exemplo, na necessidade de um aumento de mão-de-obra para fazer frente a picos temporários de atividade
resultantes de circunstâncias excecionais ou de atividades sazonais, mas também para a substituição de
trabalhadores ausentes por doença, férias, etc.
Forma do contrato: a fixação de termo deve resultar de um ato escrito, no qual são para além disso
especificadas as razões da contratação a tempo determinado, na sua falta, o contrato considera-se por tempo
indeterminado. Uma cópia do ato escrito (contrato) deve ser entregue ao trabalhador no prazo de cinco dias a
contar do início da relação laboral. A forma escrita não é exigida quando a duração da relação de trabalho não
supere os 12 dias.
Duração: o contrato de trabalho não pode ter uma duração inicial superior a 36 meses.
Prolongamento: o prazo final do contrato pode ser prolongado, por uma vez, quando o contrato inicial tem
uma duração inferior a três anos e com o consentimento do trabalhador. O prolongamento é admitido quando
subsistam razões objetivas e se refira à mesma atividade laboral para a qual tinha sido estabelecido o contrato
inicial. Em tal caso, a duração total da relação laboral (duração inicial + prolongamento) não pode superar os
três anos.
Readmissão a prazo: há uma regulamentação apropriada para a hipótese em que o trabalhador seja
contratado mais que uma vez com contratos a prazo pela mesma empresa. Nesse caso, se o trabalhador é
contratado novamente com contrato a prazo quando faltem entre 10 a 20 dias para o seu termo, desde que o
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primeiro contrato fosse de duração respetivamente inferior ou superior a seis meses, o segundo contrato é
considerado por tempo indeterminado.
Se, pelo contrário, o trabalhador é novamente admitido com contrato a prazo imediatamente após o termo
do primeiro contrato, de modo que entre o primeiro e o segundo contrato não se verifique nenhuma solução de
continuidade, a relação laboral considera-se por tempo indeterminado desde a estipulação do primeiro
contrato.
Na verdade, hoje o termo do contrato pode ser fixado por razões técnicas, organizativas, produtivas e
substitutivas. Além disso não é exigida nenhuma razão específica para contratar a termo se a relação laboral,
puramente ocasional, não é superior a 12 dias ou se diz respeito a determinadas categorias de trabalhadores:
dirigentes; trabalhadores em mobilidade – só com contrato no máximo por um ano durante o qual o
empregador beneficia de deduções nas contribuições; trabalhadores portadores de deficiência; trabalhadores
que tenham atrasado o acesso à reforma; no sector dos serviços e do turismo por um período não superior a
três dias; para a contratação de pessoal de apoio ou de serviços operativos no sector do transporte aéreo.
A forma do contrato: a contratação a termo deve resultar de um ato escrito. Caso a data de término do
contrato não seja explícita a consequência é a transformação da relação laboral a tempo indeterminado. No
contrato devem ser especificadas as razões concretas do seu termo. Não é suficiente uma indicação genérica
como por exemplo “razões organizativas”. No prazo de cinco dias a partir da admissão o empregador deve
entregar ao trabalhador uma cópia do contrato assinado.
Nesta ligação pode consultar-se um guia sobre esta tipologia de contrato de trabalho.
Atualmente está em discussão a “reforma do mercado de trabalho”. A Ministra do Trabalho anunciou aos
parceiros sociais a intenção do Governo de que o contrato a prazo deva ter maiores custos para a entidade
patronal (“il contratto a tempo determinato dovrà costare un po di più”).
Também em notícias da imprensa, durante a semana passada, se podia ler que nesta proposta governativa
se prevê “uma “majoração contributiva” (quota de 1,4%) sobre os contratos a prazo que a empresa poderá
recuperar, sob a forma de “prémio de estabilização”, se contrata o trabalhador por tempo indeterminado. Para
«limitar o fenómeno da sucessão abusiva de contratos a prazo» prevê-se «o aumento do intervalo temporal»
entre um contrato e outro. Será também eliminada a obrigação de impugnar o contrato a prazo em juízo no
prazo de 60 dias a partir da cessação do mesmo e reduzir-se-á para nove meses o prazo para apresentar a
ação em juízo”.
Em Itália os recibos verdes são designados por ‘ritenuta d'acconto’ (retenção de uma verba/retenção por
conta). Esta retenção não é uma forma de contrato, mas sim uma forma de pagamento a que estão sujeitos os
designados trabalhadores “autónomos”.
Sob esta forma existem as seguintes formas de colaboração profissional com as empresas: ‘colaboração
coordenada e continuada’ e a ‘colaboração ocasional’.
A figura do trabalho autónomo ou não subordinado é uma categoria que compreende uma tipologia de
funções e profissões muito diversas umas das outras. O que as une é o facto de corresponderem a relações
de trabalho que não se inserem num contrato coletivo e de não terem as garantias de continuidade e tutela
previstas para os trabalhadores por conta de outrem.
Neste estudo da CISL (confederação sindical) pode ver-se a proteção do trabalho ‘não subordinado’
(autónomo).
O trabalho ocasional de tipo acessório é uma modalidade particular de prestação de trabalho prevista pela
Lei Biagi. A sua finalidade é regulamentar aquelas relações de trabalho que satisfazem exigências ocasionais
com carácter intermitente, com o objetivo de fazer emergir atividades próximas do trabalho clandestino,
tutelando dessa maneira trabalhadores que usualmente trabalham sem qualquer proteção seguradora e
previdencial.
O pagamento da prestação tem lugar através dos designados ‘voucher’ (buoni lavoro), que garantem, além
do pagamento, também a cobertura previdencial junto do INPS (instituto nacional de previdência social) e
aquela seguradora junto do INAIL (instituto nacional de acidentes de trabalho).
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A Lei n. 133 de 6 agosto 2008, a Lei n. 33 de 9 abril 2009 e por fim a Lei n. 191 de 23 dezembro 2009 (Lei
de Finanças de 2010) ampliaram progressivamente o âmbito dos prestadores e as áreas de atividade em que
se aplica o trabalho ocasional acessório.
Para um maior desenvolvimento, ver a seguinte ligação do sítio do ‘Ministério do Trabalho e das Políticas
Sociais’.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Efetuada uma pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, verificou-se
que, neste momento, não existem quaisquer iniciativas ou petições versando sobre idêntica matéria.
V. Consultas e contributos
Consultas obrigatórias
Trata-se de legislação do trabalho, pelo que há lugar à consulta obrigatória das associações sindicais
[artigo 56.º, n.º 2, alínea a) da CRP] e à promoção da apreciação pública nos termos dos artigos 469.º e
seguintes do Código do Trabalho, a qual decorreu entre 15 de junho e 14 de julho.
A Sr.ª Presidente da Assembleia da República não solicitou a consulta dos órgãos de Governo próprio das
Regiões Autónomas, a qual não se afigura obrigatória.
Consultas facultativas
Caso a Comissão assim o entenda, e em sede de eventual apreciação na especialidade, poderá ser
suscitada a audição ou solicitado o parecer escrito do Governo.
Contributos de entidades que se pronunciaram
Pronunciaram-se em sentido favorável a CGTP-IN e a FESAHT, que subscreveu o parecer daquela
confederação patronal.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
A presente iniciativa não acarreta, em caso de aprovação, um acréscimo de custos para o Orçamento do
Estado.
———
PROJETO DE LEI N.º 315/XII (2.ª)
(COMBATE OS "FALSOS RECIBOS VERDES" CONVERTENDO-SE EM CONTRATOS EFETIVOS)
Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de
apoio
Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho
ÍNDICE
PARTE I – CONSIDERANDOS
Nota introdutória
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Objeto, motivação e conteúdo da iniciativa
Enquadramento legal e antecedentes
Iniciativas legislativas pendentes sobre a mesma matéria
PARTE II – OPINIÃO DA DEPUTADA AUTORA DO PARECER
PARTE III – CONCLUSÕES
PARTE IV – ANEXOS
PARTE I – CONSIDERANDOS
Nota introdutória
O Projeto de Lei n.º 315/XII (2.ª), da autoria do Partido Comunista Português (PCP), deu entrada na
Assembleia da República no dia 7 de novembro de 2012, tendo sido admitido e baixado à Comissão de
Segurança Social e Trabalho a 19 de setembro de 2012.
A apresentação da presente iniciativa por parte do Grupo Parlamentar do PCP recai no âmbito do poder de
iniciativa da lei, observando-se igualmente os requisitos formais respeitantes às iniciativas em geral, pelo que
o projeto de lei em apreciação se encontra em conformidade com os requisitos formais, constitucionais e
regimentais aplicáveis.
Verifica-se igualmente a conformidade com o disposto na Lei Formulário (sobre a publicação, a
identificação e o formulário dos diplomas).
O presente projeto de lei foi publicado em separata eletrónica do DAR no dia 27/11/2012, para apreciação
pública pelo período de 30 dias.
Nos termos do artigo 131.º do RAR foi elaborada pelos serviços, em 18/01/2013, a respetiva nota técnica,
que se anexa.
Objeto, motivação e conteúdo da iniciativa
No que diz respeito ao objeto e motivação da iniciativa em apreciação observamos, na respetiva exposição
de motivos “(…) não só é possível como urgente promover, de uma vez por todas, um efetivo combate aos
falsos recibos verdes para trazer justiça a milhares de trabalhadores” como “urge a criação de mecanismos
dissuasores do recurso a estas práticas ilegais e dar cumprimento ao texto constitucional, protegendo
efetivamente a parte mais débil da relação laboral”.
Assim sendo, “O PCP propõe (…) que, detetada uma situação de irregularidade consubstanciada no
recurso ilegal à prestação de serviços (vulgo recibos verdes), o contrato de prestação de serviços seja
imediatamente convertido em contrato sem termo, cabendo então à entidade patronal provar a legalidade do
recurso aos «recibos verdes».
Quanto ao seu conteúdo, esta iniciativa legislativa é constituída por uma exposição de motivos de que
consta um conjunto de considerações/motivações que lhe servem de base e por um articulado de dois artigos,
que visa alterar o Anexo da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho,
(propondo uma nova redação ao seu artigo 12.º).
3. Enquadramento legal e antecedentes
O presente projeto de lei visa produzir alterações no âmbito da utilização dos chamados “falsos recibos
verdes”, ou seja, nas formas ilegais de utilização do trabalho independente.
No que diz respeito ao âmbito do trabalho independente, a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, retificada pela
Declaração de Retificação n.º 21/2009, de 18 de março, e alterada pela Leis n.ºs 105/2009, de 14 de
setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho e 47/2012, de 29 de agosto, aprovou a revisão
do Código do Trabalho (CT2009), veio introduzir alterações relativas à caracterização do contrato de trabalho,
produzindo consequências no combate ao falso trabalho independente.
O referido Código passou a estabelecer que contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular
se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização
e sob a autoridade destas. O artigo 12.º consagrou a presunção de contrato de trabalho. Este artigo elenca
cinco requisitos a que a jurisprudência e a doutrina normalmente recorrem para qualificar o contrato de
trabalho:
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a) A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade;
c) O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo
beneficiário da mesma;
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como
contrapartida da mesma;
e) O prestador de atividade desempenhe funções de direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.
De acordo com a exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 216/X (GOV), que deu origem ao CT2009,
estas alterações basearam-se no combate aos falsos recibos verdes, mencionando que com o desiderato de
combater a precariedade e a segmentação dos mercados de trabalho, alteram-se os pressupostos que
operam para a presunção da caracterização do contrato de trabalho e cria-se uma nova contraordenação,
considerada muito grave, para cominar as situações de dissimulação de contrato de trabalho, com o
desiderato de combater o recurso aos “falsos recibos verdes” e melhorar a eficácia da fiscalização neste
domínio.
Parece também pertinente, considerando o escopo da presente iniciativa, enquadrar brevemente o regime
processual aplicável às contraordenações laborais (e de segurança social), cuja regulamentação está disposta
na Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. Este regime processual prevê a atribuição de competências à
Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e aos serviços do Instituto da Segurança Social, I. P. (ISS, I.
P.) para qualquer um deles poder intervir na identificação de situações de dissimulação de contrato de
trabalho, de forma a prevenir e a desincentivar o incumprimento dos deveres sociais e contributivos das
empresas e a garantir o direito dos trabalhadores à proteção conferida pelo sistema de segurança social.
A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) “tem por missão a promoção da melhoria das
condições de trabalho, através da fiscalização do cumprimento das normas em matéria laboral e o
controlo do cumprimento da legislação relativa à segurança e saúde no trabalho, bem como a promoção de
políticas de prevenção dos riscos profissionais, quer no âmbito das relações laborais privadas, quer no âmbito
da Administração Pública” (artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho, com a epígrafe
Missão e Atribuições).
4. Iniciativas legislativas pendentes sobre a mesma matéria
No que diz respeito a iniciativas legislativas pendentes na 10.ª Comissão sobre matéria conexa:
Projeto de Lei n.º 284/XII (2.ª) (BE) – Combate os falsos recibos verdes e desenvolve os poderes da
autoridade para as condições do trabalho;
Projeto de Lei n.º 316/XII (2.ª) (PCP) –Criminaliza o recurso aos “falsos recibos verdes”.
Estas iniciativas encontram-se na mesma fase processual da iniciativa em análise.
PARTE II – OPINIÃO DA DEPUTADA AUTORA DO PARECER
A autora do parecer reserva a sua posição para a discussão da iniciativa legislativa em sessão plenária.
PARTE III – CONCLUSÕES
Considerando o exposto anteriormente, a Comissão de Segurança Social e Trabalho conclui:
1. O Projeto de Lei n.º 315/XII (2.ª) corresponde a uma iniciativa legislativa do Grupo Parlamentar do
Partido Comunista Português, com a epígrafe “Combate os “falsos recibos verdes” convertendo-os em
contratos efetivos”;
2. Esta iniciativa pretende que, “quando detetada uma situação de irregularidade no recurso ilegal à
prestação de serviços, (…)se converta imediatamente o contrato de prestação de serviços em contrato sem
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termo, cabendo então à entidade patronal provar a legalidade do recurso (…)” ao contrato de prestação de
serviços;
3. O projeto de lei em apreço cumpre todos os requisitos constitucionais, legais e regimentais necessários
à sua tramitação;
4. Pelo exposto, nos termos regimentais aplicáveis, o presente parecer deverá ser remetido a S. Ex.ª a
Presidente da Assembleia da República.
Palácio de S. Bento, 22 de janeiro de 2013.
A Deputada autora do parecer, Joana Barata Lopes — O Presidente da Comissão, José Manuel
Canavarro.
Nota: O parecer foi aprovado por unanimidade.
PARTE IV – ANEXOS
Nota Técnica
Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 315 /XII (2.ª) (PCP)
Combate os “falsos recibos verdes” convertendo-se em contratos efetivos
Data de admissão: 19 de novembro de 2012
Comissão de Segurança Social e Trabalho (10.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento
da lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: Susana Fazenda, João Ramos (DAC), Lurdes Sauane (DAPLEN), Paula Granada (BIB), Filomena Romano de Castro e Fernando Bento Ribeiro (DILP).
Data: 18 de janeiro de 2013
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
O projeto de lei em apreço, da iniciativa do Partido Comunista Português, visa combater os “falsos recibos
verdes” convertendo-se em contratos efetivos. Baixou à Comissão de Segurança Social e Trabalho em 19 de
setembro de 2012, tendo sido designada relatora a Sr.ª Deputada Joana Barata Lopes (PSD), em reunião da
comissão realizada a 4 de dezembro.
De acordo com a exposição de motivos:
“(…) não só é possível como urgente promover, de uma vez por todas um efetivo combate aos falsos
recibos verdes para trazer justiça a milhares de trabalhadores que são duramente explorados e sujeitos a uma
brutal precariedade” como “urge a criação de mecanismos dissuasores do recurso a estas práticas ilegais e
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dar cumprimento ao texto constitucional, protegendo efetivamente a parte mais débil da relação laboral”.
Assim sendo:
“O PCP propõe (…) que, detetada uma situação de irregularidade consubstanciada no recurso ilegal à
prestação de serviços (vulgo recibos verdes), o contrato de prestação de serviços seja imediatamente
convertido em contrato sem termo, cabendo então à entidade patronal provar a legalidade do recurso aos
«recibos verdes».
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
A presente iniciativa é apresentada pelo grupo parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), no
âmbito do poder de iniciativa da lei, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e
no artigo 118.º do Regimento. Exercer a iniciativa da lei é um dos poderes dos Deputados [alínea b) do artigo
156.º da Constituição e alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento] e um dos direitos dos grupos
parlamentares [alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e alínea f) do artigo 8.º do Regimento.
São observados os requisitos formais respeitantes às iniciativas em geral [n.º 1 do artigo 119.º e alíneas a),
b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento] e aos projetos de lei, em particular (n.º 1 do artigo 123.º do
Regimento). Observar os requisitos formais significa que a iniciativa originária toma a forma de projeto de lei,
porque é exercida pelos deputados ou grupos parlamentares, está redigida sob a forma de artigos, tem uma
designação que traduz sinteticamente o seu objeto, é precedida de uma exposição de motivos e é subscrita
por sete Deputados (o limite máximo de assinaturas nos projetos de lei é de 20).
Não se verifica violação aos limites impostos pelo Regimento, no que respeita ao disposto nos n.ºs 1 e 2 do
artigo 120.º (não infringe a Constituição, define concretamente o sentido das modificações a introduzir na
ordem legislativa).
Este projeto de lei deu entrada em 7/11/2012, foi admitido em 19/11/2012 e baixou na generalidade à
Comissão do Segurança Social e Trabalho. Em 27/11/2012 foi colocado em apreciação pública até
27/12/2012.
Verificação do cumprimento da lei formulário
A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto, adiante
designada como lei formulário, prevê um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário
dos diplomas que são relevantes em caso de aprovação das iniciativas legislativas e que importa ter presentes
no decurso da especialidade em Comissão:
– Esta iniciativa contém disposição expressa sobre a entrada em vigor, pelo que se aplica o disposto no n.º
1 do artigo 2.º da citada lei (“A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação”);
– A presente lei tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto, em conformidade com o disposto no
n.º 2 do artigo 7.º da referida “lei formulário”;
– Será publicada na 1.ª série do Diário da República, revestindo a forma de lei [alínea c) do n.º 2 do artigo
3.º da 2 “lei formulário”].
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
A Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, que aprovou o Código de Trabalho de 2003 (CT2003), alterou a noção
de contrato de trabalho1 e criou uma presunção legal
2, a qual foi alterada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de março,
1 O artigo 10.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, estabelecia que “o contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga,
mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direção destas”. Este artigo alterou a noção
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no sentido da sua simplificação3. Desde logo ficou previsto no artigo 20.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de março,
que passados quatro anos após a sua entrada em vigor, o CT2003 seria revisto.
Em 2005, o XVII Governo Constitucional, no seu Programa, assumiu o compromisso de rever o Código do
Trabalho (CT2003), comprometendo-se, assim, a adotar algumas medidas, nomeadamente criar uma
comissão independente encarregada de avaliar os impactes do Código do Trabalho nas relações laborais,
tendo em vista o lançamento de um Livro Branco das Relações Laborais (LBRL) e relançar a concertação
social.
Neste seguimento, o Governo aprovou a Resolução do Conselho de Ministros n.º 160/2006, de 30 de
novembro4, que criou a Comissão
5 do Livro Branco das Relações Laborais (CLBRL), composta por um grupo
de peritos com a missão de produzir um diagnóstico das necessidades de intervenção legislativa, tendo em
conta o conjunto de conclusões vertidas no Livro Verde, designadamente em matéria de emprego, proteção
social e relações de trabalho.
O Livro Branco das Relações Laborais (LBRL), publicado em novembro de 2007 e que foi, também ele,
alvo de debate em sede de Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS), identifica os principais
problemas da realidade económica e social do País e enuncia as propostas de intervenção legislativa que
considera adequadas.
Das propostas apresentadas no âmbito das alterações ao CT2003, a Comissão considera que a presunção
legal de contrato de trabalho a consagrar no CT constitui um dos instrumentos que mais podem favorecer a
erradicação do falso trabalho autónomo. Neste sentido, a recente Recomendação n.º 198 da OIT, sobre a
relação de trabalho, após salientar que a proteção assegurada pela legislação nacional e as convenções
coletivas depende do reconhecimento da existência de relações de trabalho e que existem situações em que a
qualificação é difícil, preconiza nomeadamente que a legislação estabeleça uma presunção legal de contrato
de trabalho, baseada em vários indícios pertinentes.
A Comissão entende que a presunção legal de contrato de trabalho, inicialmente adotada pelo Código de
Trabalho, dependia de um vasto conjunto de indícios cumulativos que a tornavam inútil para ajudar a
identificação do contrato de trabalho nas situações em que a sua qualificação era controvertida.Com efeito, se
o trabalhador conseguisse provar todos esses indícios, mais do que presumir-se o contrato de trabalho, estaria
provada a existência deste em termos que seria muito difícil conceber a possibilidade de a presunção ser
de contrato de trabalho prevista noartigo 1.º do Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de novembro de 1969 (Aprova o novo regime jurídico do contrato individual de trabalho). 2 Nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto “presume-se que as partes celebraram um contrato de trabalho sempre
que, cumulativamente: a) O prestador de trabalho esteja inserido na estrutura organizativa do beneficiário da atividade e realize a sua prestação sob as orientações deste; b) O trabalho seja realizado na empresa beneficiária da atividade ou em local por esta controlado, respeitando um horário previamente definido; c) O prestador de trabalho seja retribuído em função do tempo despendido na execução da atividade ou se encontre numa situação de dependência económica face ao beneficiário da atividade; d) Os instrumentos de trabalho sejam essencialmente fornecidos pelo beneficiário da atividade; e) A prestação de trabalho tenha sido executada por um período, ininterrupto, superior a 90 dias.”3 Nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, com a redação dada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de março, “presume-se
que existe um contrato de trabalho sempre que o prestador esteja na dependência e inserido na estrutura organizativa do beneficiário da atividade e realize a sua prestação sob as ordens, direção e fiscalização deste, mediante retribuição.”4 A Resolução do Conselho de Ministros n.º 160/2006, de 30 de novembro, resolve criar na dependência do Ministro do Trabalho e da
Solidariedade Social, a estrutura de missão denominada «Comissão do Livro Branco das Relações Laborais». A Comissão tem a missão de reavaliar o quadro legal vigente e propor alterações com vista à promoção do emprego, à redução da segmentação do sistema de emprego, à mobilidade protegida entre os diferentes tipos de contrato de trabalho e de atividade profissional, ao desenvolvimento da adaptabilidade dos trabalhadores e das empresas à mudança económica e social e ao fomento da contratualidade. 5 A Comissão teve a seguinte composição:
a) Presidente—António de Lemos Monteiro Fernandes; b) Relator—António Maria Bustorff Dornelas Cysneiros; c) Vogais: António Manuel Carvalho Casimiro Ferreira; João José Garcia Correia; Júlio Manuel Vieira Gomes; Manuel Eugénio Pimentel Cavaleiro Brandão; Maria da Conceição Santos Cerdeira; Mário José Gomes de Freitas Centeno; Pedro de Sá-Carneiro Furtado Martins; A diretora-geral de Estudos, Estatística e Planeamento; O diretor-geral do Emprego e das Relações de Trabalho; O inspetor-geral do Trabalho; O presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego.
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ilidida. Um dos indícios era a prestação do trabalho por um período ininterrupto superior a 90 dias, o que
desde logo impedia a verificação da presunção se o contrato durasse menos tempo. A necessidade da
verificação cumulativa dos indícios tinha o risco de, na falta de algum, se poder negar a existência de contrato
de trabalho.
A Comissão sublinha que o elemento “dependência” não é inequívoco, embora se afigure que deva tratar-
se de dependência económica e não jurídica, porque esta estará referenciada através dos indícios “ordens,
direção e fiscalização” do beneficiário da atividade. Por outro lado, se o trabalhador provar que realiza a
prestação sob as “ordens, direção e fiscalização” do beneficiário da atividade e mediante retribuição, estão
verificados factos de que já será possível concluir que existe contrato de trabalho e não meramente uma
presunção do mesmo.
A Comissão defende que a presunção legal adote alguns dos indícios já consagrados pela jurisprudência
que, de acordo com as regras da experiência, correspondam a elementos mais frequentemente verificados
nas relações de trabalho subordinado. A Comissão sugere, assim, uma nova redação para a presunção legal
de contrato de trabalho6 a consagrar no CT.
Posteriormente, o Governo e a maioria dos parceiros sociais com assento na Comissão Permanente de
Concertação Social (CPCS) alcançaram em 25 de junho de 2008 o acordo tripartido7 que esteve na origem da
Proposta de Lei n.º 216/X, que aprova a revisão do Código do Trabalho.
Assim, em cumprimento do disposto no artigo 20.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, no artigo 9.º da Lei
35/2004, de 29 de julho, e de acordo com o que foi vertido no Programa do XVII Governo Constitucional, a
referida proposta de lei procede à revisão do Código do Trabalho e da respetiva regulamentação. O Governo,
propõe, deste modo, no seguimento da proposta plasmada no Livro Branco das Relações Laborais, um quadro
normativo mais eficaz, que unifica os dois principais instrumentos legislativos que disciplinam as relações de
trabalho - o Código do Trabalho e o seu Regulamento.
Na sequência do acima exposto, foi publicada a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro8, que aprovou o atual
Código do Trabalho (CT2009)9.
A doutrina chama a atenção para a circunstância de os critérios utilizados para distinguir o trabalho
subordinado do trabalho autónomo, muitas vezes, só permitirem uma ideia aproximada e consentirem, nos
seus próprios termos, graduações subtis e que nem sempre levam a resultados esclarecedores. Para ilidir a
estas questões, o artigo 12.º do CT2009, conforme se disse, veio consagrar o princípio da presunção de
contrato de trabalho. Assim, plasmou no seu articulado os cinco requisitos a que a jurisprudência e a doutrina
normalmente recorrem para qualificar o contrato de trabalhos, que são:
“a) A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade;
c) O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo
beneficiário da mesma;
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como
contrapartida da mesma;
e) O prestador de atividade desempenhe funções de direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.”
A exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 216/X, que deu origem à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,
no que concerne aos falsos recibos verdes, menciona que, com o desiderato de combater a precariedade e a
6 A Comissão sugere a seguinte redação para a presunção legal de contrato de trabalho a consagrar no CT:
“1 - Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma atividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características: a) A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado; b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade; c) O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma; d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como contrapartida da mesma; e) O prestador de atividade desempenhe funções de direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.” 7 “Acordo tripartido para um novo sistema de regulação das relações laborais, das políticas de emprego e da proteção social em Portugal.”
8 Teve origem na Proposta de Lei n.º 216/X que aprova a revisão do Código do Trabalho.
9 O Código de Trabalho (CT2009) foi aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, retificada pela Declaração de Retificação n.º
21/2009, de 18 de março, alterada pelas Leis n.os
105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho (retificada pela Declaração de Retificação n.º 38/2012, de 23 de julho) e 47/2012, de 29 de agosto.
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segmentação dos mercados de trabalho, alteram-se os pressupostos que operam para a presunção da
caracterização do contrato de trabalho e cria-se uma nova contraordenação, considerada muito grave, para
cominar as situações de dissimulação de contrato de trabalho, com o desiderato de combater o recurso aos
“falsos recibos verdes” e melhorar a eficácia da fiscalização neste domínio.
De acordo com o Prof. Pedro Romano Martinez10
o artigo 12.º do Código do Trabalho 2009 corresponde ao
artigo 12.º do Código do Trabalho de 2003, que teve uma primeira versão em 2003, e outra em 2006 (Lei n.º
9/2006, de 20 de março, que alterou o Código do Trabalho) (…). A singular modificação de 2006 nos mais de
quatrocentos artigos do regime de contrato de trabalho visou substituir uma norma pouco clara e com algumas
deficiências técnicas por um preceito com um sentido dificilmente compreensível.
No que respeita ao contrato de trabalho, e segundo o mesmo professor, por via de regra cabe ao
trabalhador fazer a prova dos elementos constitutivos do contrato de trabalho (artigo 342.º n.º 1 do CC). Para
invocar a qualidade de trabalhador, incumbe-lhe provar que desenvolve uma atividade remunerada para
outrem, sob autoridade e direção do beneficiário, demonstrando, designadamente, que se integrou na
respetiva estrutura empresarial. A prova dos elementos constitutivos do contrato de trabalho é, muitas das
vezes, difícil e, para obviar a tal dificuldade, poder-se-ia recorrer à presunção de existência de contrato de
trabalho. É essa a solução constante do artigo 8.1 do Estatuto de los Trabajadores (Espanha) e, de forma
limitada e mitigada, foi esse o sentido de uma (antiga) proposta legislativa, na qual se previa que a Inspeção-
geral do Trabalho podia presumir estar-se perante um contrato de trabalho, sempre que alguém exercesse a
sua atividade em instalações de uma empresa ou organização de outra pessoa; neste caso, a presunção
dispensaria a prova da existência do contrato de trabalho, cabendo ao empregador o ónus da prova (negativa):
em suma, a prova da inexistência do contrato de trabalho. Esse projeto de alteração legislativa foi
abandonado, pelo que a presunção da existência de contrato de trabalho não vigorava na ordem jurídica
portuguesa, seguindo-se o regime regra de repartição do ónus da prova11
.
Defende também o Prof. Pedro Romano Martinez que, do preceito em análise, contrariamente ao que se lê
na epígrafe e no respetivo texto, não resulta nenhuma presunção (…). Retira-se que o legislador tem em
consideração certos indícios para a existência de subordinação jurídica são, assim: 1) dependência do
prestador da atividade; 2) inserção na estrutura organizativa do beneficiário da atividade; 3) realização da
atividade sob as ordens, direção e fiscalização do respetivo destinatário.
Acrescenta, ainda, quanto ao artigo 12.º do CT2009, que a presunção, constante do artigo 12.º do CT2009,
melhora relativamente à solução anterior (artigo 12.º do CT2003), mas continua a não ser uma verdadeira
presunção. Contudo, poderá ficar facilitada a tarefa de qualificação do contrato de trabalho em caso de dúvida,
pois permite-se que a verificação de alguns indícios contratuais (teoricamente dois) possa ser suficiente para
se entender que a relação jurídica em causa é um contrato de trabalho. É evidente que esta facilitação pode
determinar a qualificação de um contrato como de trabalho apesar de faltarem os pressupostos básicos,
nomeadamente por força da alínea a); acresce, ainda, que na alínea e) se confunde presunção com
presumido12
.
Por último, o Prof. Pedro Romano Martinez salienta que, tendo em conta a política de combate ao trabalho
dissimulado – indiscutivelmente louvável, resultando a dúvida de saber se as soluções deveriam ser incluídas
no Código do Trabalho –, há um agravamento da punição, artigo 12.º, n.º 2, do CT2009, se o trabalho
subordinado for dissimulado, apresentando-se como autónomo. Este regime enquadra-se numa política que
pugna pela limitação do trabalho precário, com algumas consequências em sede de contrato a termo. Todavia,
a ideia de «causar prejuízo ao Estado» (parte final do n.º 2) pode ser entendido em sentido muito amplo, que
extravasa a relação laboral, nomeadamente por fuga ao fisco13
.
Quanto aos recibos verdes referidos no projeto de lei em análise, os formulários dos Censos para 2011 –
Questionário individual14
– fazem alusão a essa temática, colocando a seguinte questão:
“Qual o modo como exerce a profissão indicada?
10
In: MARTINEZ, Pedro Romano e outros – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pag.133. 11
In: MARTINEZ, Pedro Romano e outros – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pag.133 e 134. 12
In: MARTINEZ, Pedro Romano e outros – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pag.137. 13
In: MARTINEZ, Pedro Romano e outros – Código do Trabalho Anotado – 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pag.137. 14
No ponto 32, da página 4.
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Se trabalha a “recibos verdes” mas tem um local de trabalho fixo dentro de uma empresa, subordinação
hierárquica efetiva e um horário de trabalho definido deve assinalar a opção “Trabalhador por conta de
outrem.”
Com esta pergunta pretendia-se qualificar a forma como é exercido o trabalho prestado a recibos verdes.
A iniciativa em apreço também faz referência à receita fiscal que o OE prevê para 2013. Assim, o Relatório
que acompanha a Proposta de Lei n.º 103/XII que aprova o Orçamento de Estado para 2013, prevê que a
receita fiscal para 2013 ascende a 35.947,7 M€, o que representa um acréscimo de 10,2% face à estimativa
de execução da receita fiscal para 2012. Subjacente a esta evolução encontra-se o aumento em 19,7% da
receita dos impostos diretos, bem como o crescimento em 3,1% da receita derivada dos impostos indiretos,
relativamente à receita estimada para 2012.
No que se refere ao Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS) para 2013, o Governo
estima que a receita líquida em sede de IRS atinja o valor de 12.066,3 M€, antevendo-se uma variação de
30,7% relativamente à receita prevista para 2012. Note-se que esta estimativa engloba a receita adicional
resultante de um conjunto alargado de medidas de política fiscal, entre as quais se destacam a reestruturação
dos escalões e o aumento da taxa média efetiva em sede de IRS, a aplicação de uma sobretaxa, a redução de
deduçõesà coleta (com especial ênfase no caso da dedução à coleta personalizante e da dedutibilidade de
juros com crédito à habitação) e o aumento da tributação sobre rendimentos de capital e sobre mais-valias
mobiliárias.
Relativamente à matéria que consta do projeto de lei em análise, na XI e XII Legislaturas, foram
apresentadas as seguintes iniciativas:
Iniciativas apresentadas GP Estado da iniciativa
Projeto de Lei n.º 407/XI (1.ª) – Combater a precariedade e os falsos recibos verdes (Segunda alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro)
BE Iniciativa retirada em 09.12.2010.
Projeto de Lei n.º 539/XI (2.ª) – Combate os «falsos recibos verdes» convertendo-os em contratos efetivos
PCP Iniciativa caducada.
Projeto de Lei n.º 1/XII (1.ª) – Combate os «falsos recibos verdes» convertendo-os em contratos efetivos
PCP Iniciativa rejeitada, com os votos contra do PSD, PS, CDS-PP, e votos a favor do PCP, BE e PEV.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
CAMPOS, Fernanda - Contratode trabalho e presunção de laboralidadeInCódigo do trabalho: a revisão
de 2009. ISBN 978-972-32-1867-1. Coimbra: Coimbra Editora, 2011. p. 75-91. Cota: 12.06.9 – 340/2011
Resumo: Neste artigo, é feita uma abordagem das caraterísticas que servem para qualificar uma relação
como de trabalho subordinado ou, por exclusão, como autónoma. A autora partilha as suas reflexões sobre a
presunção de laboralidade no novo Código do Trabalho.
PRECÁRIOS EM PORTUGAL: entre a fábrica e o "call center". Org. José Nuno Matos, Nuno Domingos,
Rahul Kumar. Lisboa: Edições 70, 2011. 135 p. (Le Monde diplomatique;1). ISBN978-972-44-1695-3. Cota: 44
- 630/2011
Resumo: Os autores constatam que, em 2010, Portugal era o terceiro país da União Europeia com maior
índice de precariedade laboral. Cerca de 23,2% dos trabalhadores por conta de outrem estavam ligados à sua
entidade patronal por um contrato a termo ou por outro tipo de vínculo precário. No terceiro trimestre de 2010,
estimava-se que 54,6% dos trabalhadores por conta de outrem entre os 15 e os 24 anos possuísse um vínculo
laboral desse tipo. Encontravam-se igualmente nessa situação 11,2% dos trabalhadores entre os 50 e os 64
anos.
Ao longo do livro focam-se diversos casos que refletem uma realidade que se impôs progressivamente nas
mais diversas esferas laborais, da fábrica ao call center, do trabalho doméstico aos centros comerciais. É
apresentado um conjunto de investigações que procuram interpretar o fenómeno da precariedade no quadro
da evolução das relações de trabalho em Portugal.
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REIS, Inês – Os recibos verdes à luz do Novo Código do Trabalho. Trabalho & Segurança Social. Lisboa.
A. 7, n.º 10 (out. 2009), p. 13-15. Cota: RP-558.
Resumo: A autora aborda a questão dos verdadeiros e dos falsos recibos verdes, associada ao combate à
precariedade, à luz do novo Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro) que
penaliza as empresas que recorram a falsos recibos verdes, reformulando os indícios que permitem detetar a
utilização ilegal dos mesmos.
No presente artigo, a autora procede à destrinça entre contrato de prestação de serviços e contrato de
trabalho, a qual considera inequívoca apenas no plano teórico, já que estes dois tipos contratuais se
aproximam manifestamente com fronteiras pouco definidas e, por vezes, difíceis de delimitar na prática,
apesar de se pautarem por regimes jurídicos distintos e conterem designações diversas.
Em razão desta distinção tão pouco nítida, certas empresas recorrem ao mecanismo dos contratos de
prestação de serviços e à emissão de recibo verde quando o “prestador de serviços” não é trabalhador
independente, no verdadeiro sentido do termo, devendo antes ser qualificado como trabalhador por conta de
outrem e como tal usufruir de um contrato de trabalho, com todos os deveres e regalias a ele inerentes.
VICENTE, Joana Nunes –Noção de contrato de trabalho e presunção de laboralidade. In Código do
trabalho: a revisão de 2009. ISBN 978-972-32-1867-1. Coimbra: Coimbra Editora, 2011. p. 59-73. Cota:
12.06.9 – 340/2011.
Resumo: O presente artigo constitui uma abordagem à noção de contrato de trabalho e à presunção de
laboralidade, tal como se encontram definidas no novo Código do Trabalho. A autora propõe-se realçar as
principais alterações trazidas pela reforma do código nesta matéria e apresenta as primeiras reflexões críticas
que o tema lhe suscitou.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha e Itália.
Espanha
Em Espanha, o Real Decreto Legislativo 1/1995, de 24 de marzo, por el que se aprueba el texto refundido
de la Ley del Estatuto de los Trabajadores (texto consolidado), regula as relações laborais e os contratos de
trabalho que se aplicam aos trabalhadores que voluntariamente prestam serviço retribuído por conta alheia e
dentro do âmbito de organização e direção de outra pessoa, física ou jurídica, denominada empregador ou
empresário.
Nos termos do artigo 8.1 do referido diploma, o contrato de trabalho pode ser celebrado por escrito ou
verbal. Presume-se que o contrato existe sempre que o trabalhador presta um serviço dentro do âmbito de
organização e direção de outro e que recebe em troca a respetiva retribuição.
Compete à inspeção-geral do trabalho e da segurança social a fiscalização do cumprimento das normas
em matéria laboral e o controlo da legislação relativa à segurança e saúde no trabalho, bem como a promoção
de políticas de prevenção dos riscos profissionais15
, quer no âmbito das relações laborais privadas, quer no
âmbito da Administração Pública. Compete, ainda, à inspeção-geral do trabalho e da segurança social de
vigiar o cumprimento das disposições legais, regulamentares e convencionais respeitantes às relações
laborais, nos termos da Ley 42/1997, de 14 de noviembre, Ordenadora de la Inspección de Trabajo y
Seguridad Social e do seu Regulamento, aprovado pelo Real Decreto 138/2000, de 4 de febrero.
O Real Decreto Legislativo 5/2000, de 4 de agosto, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley sobre
Infracciones y Sanciones en el Orden Social, vem regularizar, aclarar e sistematizar as infrações e as sanções
de ordem social. O capítulo II regula a matéria sobre as infrações inerentes às relações laborais individuais e
coletivas. As infrações são qualificadas como leves, graves e muito graves, tendo em atenção a natureza do
dever infringido e a entidade violadora do direito (artigos 6.º, 7.º e 8.º).
15
De acordo com o estabelecido na Ley 31/1995, de 8 de noviembre, de Prevención de Riesgos Laborales.
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Itália
Em Itália os recibos verdes são designados por ‘ritenuta d'acconto’ (retenção de uma verba/retenção por
conta). Esta retenção não é uma forma de contrato, mas sim uma forma de pagamento a que estão sujeitos os
designados trabalhadores “autónomos”. Sob esta forma existem as seguintes formas de colaboração
profissional com as empresas: ‘colaboração coordenada e continuada’ e a ‘colaboração ocasional’.
A figura do trabalho autónomo ou não subordinado é uma categoria que compreende uma tipologia de
funções e profissões muito diversas umas das outras. O que as une é o facto de corresponderem a relações
de trabalho que não se inserem num contrato coletivo e de não terem as garantias de continuidade e tutela
previstas para os trabalhadores por conta de outrem.
Neste estudo da CISL (confederação sindical) pode ver-se a proteção do trabalho ‘não subordinado’
(autónomo).
O trabalho ocasional de tipo acessório é uma modalidade particular de prestação de trabalho prevista pela
Lei Biagi. A sua finalidade é regulamentar aquelas relações de trabalho que satisfazem exigências ocasionais
com carácter intermitente, com o objetivo de fazer emergir atividades próximas do trabalho clandestino,
tutelando dessa maneira trabalhadores que usualmente trabalham sem qualquer proteção seguradora e
previdencial.
O pagamento da prestação tem lugar através dos designados ‘voucher’ (buoni lavoro) que garantem, além
do pagamento, também a cobertura previdencial junto do INPS (instituto nacional de previdência social) e a
seguradora junto do INAIL (instituto nacional de acidentes de trabalho).
A Lei n.º 133 de 6 agosto 2008, a Lei n.º 33 de 9 abril 2009 e, por fim, a Lei n.º 191 de 23 dezembro 2009
(Orçamento do Estado para 2010) ampliaram progressivamente o âmbito dos prestadores e as áreas de
atividade em que se aplica o trabalho ocasional acessório.
Para um maior desenvolvimento, ver a seguinte ligação do sítio do ‘Ministério do Trabalho e das Políticas
Sociais’.
Recentemente, em Itália, foi aprovada a Lei n.º 92/2012, de 28 de junho, comumente designada como
“Riforma del Lavoro” (Reforma do Trabalho). Este diploma veio incidir em diversos aspetos da disciplina do
contrato a termo (contatos a prazo), modificando diversas partes do Decreto Legislativo n.º 368/2001, de 6 de
setembro.
De acordo com o artigo 1.º do Decreto Legislativo n.º 368/2001, em geral, é permitida a aposição de um fim
à vida do contrato de trabalho em face de razões de carácter técnico, produtivo, organizativo ou substitutivo,
ainda que relacionados com as atividades normais do empregador; a mesma condição é requerida, nos termos
do artigo 20.º, n.º 4, do Decreto Legislativo n.º 276/2003, em relação ao período determinado.
Convém esclarecer que a disposição que impõe um período máximo de prestação de trabalho temporário,
para o mesmo empregador e para o desempenho de tarefas equivalentes, aponta para 36 meses. Convém
contudo recordar que o parágrafo 4 bis do artigo 5.º do Decreto Legislativo n.º 368/2001 estabelece que se,
como resultado de uma sucessão de contratos a termo para o desempenho de trabalho de igual valor, a
relação de trabalho entre o mesmo empregador e empregado tenha excedido um total de 36 meses, incluindo
extensões e renovações, independentemente de períodos de interrupção entre um contrato e outro, a relação
de emprego será considerada por tempo indeterminado a partir da caducidade desse prazo.
Veja-se a este propósito a seguinte ligação no sítio do ‘Ministério do Trabalho e das Políticas Sociais’: Il
lavoro intermittente alla luce delle modifiche introdotte dalla riforma del lavoro.
Num sítio de um grupo de “trabalhadores precários” pode encontrar-se diversa documentação da situação
italiana relativamente ao tema em análise na presente iniciativa legislativa.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Efetuada consulta à base de dados do processo legislativo e atividade parlamentar (PLC) apuramos a
existência das seguintes iniciativas legislativas pendentes sobre “recibos verdes”:
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Projeto de Lei n.º 284/XII (2.ª) (BE) – Combate os falsos recibos verdes a desenvolve os poderes da
autoridade para as condições do trabalho;
Projeto de Lei n.º 316/XII (2.ª) (PCP) –Criminaliza o recurso aos “falsos recibos verdes”.
Petições
Efetuada consulta à base de dados do processo legislativo e atividade parlamentar (PLC) não apuramos a
existência de qualquer petição pendente sobre matéria conexa.
V. Consultas e contributos
O presente projeto de lei foi publicado em separata eletrónica do DAR no dia 27/11/2012, para apreciação
pública pelo período de 30 dias, que terminou em 27/12/2012.
Contributos de entidades que se pronunciaram
Os contributos das entidades que se pronunciaram podem ser consultados aqui.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face dos elementos disponíveis, não é possível determinar os efeitos ao nível do OE em decorrência da
sua aprovação e da sua consequente aplicação.
———
PROJETO DE LEI N.º 316/XII (2.ª)
(CRIMINALIZA O RECURSO AOS "FALSOS RECIBOS VERDES")
Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho e nota técnica elaborada pelos serviços de
apoio
Parecer da Comissão de Segurança Social e Trabalho
Índice
PARTE I – NOTA INTRODUTÓRIA
PARTE II – CONSIDERANDOS
PARTE III – POSIÇÃO DO AUTOR
PARTE Iv – CONCLUSÕES
PARTE V – PARECER
PARTE I – NOTA INTRODUTÓRIA
O PJL n.º 316/XII (2.ª) que “Criminaliza o recurso aos «Falsos Recibos Verdes»”, da iniciativa do Grupo
Parlamentar do PCP, deu entrada na Assembleia da República em 7 de novembro de 2012, foi admitido em 19
de novembro de 2012 e baixou, na mesma data, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,
Liberdades e Garantias, que se considerou incompetente e solicitou a redistribuição do mesmo à Comissão de
Segurança Social e Trabalho, o que veio a suceder em 20 de novembro de 2013.
A iniciativa legislativa sub judice foi apresentada nos termos e ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo
156.º e no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa [CRP] e na alínea b) do artigo 4.º, no
artigo 118.º e no n.º 1 do artigo 123.º todos do Regimento da Assembleia da República [RAR].
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A apresentação do PJL n.º 316/XII (2.ª) foi efetuada em conformidade com os requisitos formais
estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º e no n.º 1 do artigo 124.º do RAR, e respeita os limites de iniciativa
previstos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 120.º do RAR.
O PJL n.º 316/XII (2.ª) cumpre o disposto na Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, com as alterações que lhe
foram introduzidas pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto [sobre a publicação, a identificação e o formulário dos
diplomas], salvo quanto ao n.º 1 do artigo 6.º da aludida Lei Formulário, na medida em que, ao pretender
alterar o Código do Trabalho deverá, nos termos da citada norma legal, indicar a ordem de alteração
introduzida e, dado que houve alterações anteriores ao Código do Trabalho, identificar os diplomas que
procederam a essas alterações.
Nesta conformidade, caso o PJL n.º 316/XII (2.ª) venha a ser aprovado deverá o seu título ser alterado em
sede de especialidade ou na fixação da redação final de modo a cumprir o disposto na denominada Lei
Formulário.
PARTE II – CONSIDERANDOS
1. Do objeto e da motivação do PJL n.º 316/XII (2.ª)
Através do PJL n.º 316/XII (2.ª) pretende o Grupo Parlamentar do PCP consagrar a criminalização do
recurso aos denominados falsos recibos verdes e a outras formas de contratação de trabalhadores para
trabalho subordinado correspondentes a necessidades permanentes das empresas, que não se encontrem
previstas no Código do Trabalho ou emlegislação especial.
Para tal o efeito, o PJL n.º 316/XII (2.ª) propõe o aditamento do artigo 12.º-A ao Código do Trabalho,
aprovado em Anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que visa punir com pena de prisão de 1 a 5 anos o
empregador que recorra a falsa prestação de serviços ou a outras formas de contratação ilegal.
De acordo com a exposição de motivos que antecede o PJL n.º 316/XII (2.ª) “os trabalhadores, os jovens e
as mulheres (…) já não suportam mais o desemprego e precariedade”, razão que os leva a insistir “na
necessidade urgente de combate efetivo à precariedade e aos falsos recibos verdes”.
Os autores do PJL n.º 316/XII (2.ª) fundamentam a apresentação desta iniciativa legislativa referindo que
“Desde a apresentação do programa do XIX Governo Constitucional, da coligação PSD/CDS-PP, que ficou
claro que o combate à precariedade e aos falsos recibos verdes não era um objetivo, mas pelo contrário todas
as medidas têm conduzido a mais precariedade e a uma tentativa de «legalização dos falsos recibos verdes»”
e, nessa medida, “o PCP propõe que seja criminalizado o recurso indevido a formas de contratação que não
correspondam às situações reais como mecanismo dissuasor das múltiplas ilegalidades que as entidades
patronais cometem e saem impunes”, considerando que “… esse é um passo fundamental e consequente na
luta contra a chaga social da precariedade – do emprego e da vida”.
2. Do enquadramento constitucional e legal
A CRP estabelece no seu artigo 53.º que é garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo
proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.
O princípio constitucional da segurança no emprego não se compadece, natural e objetivamente, com o
recurso a falsos recibos verdes ou a outras formas de contratação precária exercidas à margem da lei.
Daí não ser de estranhar que a doutrina e a jurisprudência constitucional advoguem relativamente a este
princípio da garantia da segurança no emprego que “em particular o legislador, vinculado pelos direitos,
liberdades e garantias, deve proteger o direito à segurança no emprego através da configuração de
instrumentos legais (…) destinados à sua realização” [Vd. CRP Anotada de Jorge Miranda e Rui Medeiros –
Coimbra Editora 2005 -, e Acórdãos 148/97 e 81/95].
No plano jurídico-legal, cumpre ter presente que o legislador ordinário tem vindo a adotar e a reforçar as
soluções normativas com o objetivo de desincentivar o recurso ao falso trabalho independente e a outras
formas de contratação precárias.
Relembra-se a esse propósito que o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto,
estabeleceu expressamente no seu artigo 12.º a presunção da existência de contrato de trabalho sempre que
se encontravam reunidos cumulativamente o conjunto de pressupostos aí estabelecidos.
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Na sua redação inicial o citado artigo do Código do Trabalho dispunha o seguinte:
«Artigo 12.º
Presunção
Presume-se que as partes celebraram um contrato de trabalho sempre que, cumulativamente:
a) O prestador do trabalho esteja inserido na estrutura organizativa do beneficiário da atividade e realize a
sua prestação sob as orientações deste;
b) O trabalho seja realizado na empresa beneficiária da atividade ou em local por esta controlado,
respeitando um horário previamente definido;
c) O prestador de trabalho seja retribuído em função do tempo despendido na execução da atividade ou se
encontre numa situação de dependência económica face ao beneficiário da atividade;
d) Os instrumentos de trabalho sejam essencialmente fornecidos pelo beneficiário da atividade;
e) A prestação de trabalho tenha sido executada por um período, ininterrupto, superior a 90 dias.»
A consagração da presunção legal veio facilitar ao trabalhador a demonstração da existência de um
contrato de trabalho, substituindo o chamado método indiciário que vinha sendo sedimentado pela
jurisprudência portuguesa.
Por seu turno, a Lei n.º 9/2006, de 20 de março – Altera o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º
99/2003, de 27 de agosto, e a respetiva regulamentação aprovada pela Lei n.º 35/2004, de 29 de julho –, que
visou introduzir um conjunto limitado de alterações ao Código do Trabalho, resultantes de um processo de
consultas aos parceiros sociais, veio conferir uma nova redação ao artigo 12.º do Código do Trabalho,
tornando-a mais ajustada, suprimindo alguns dos requisitos anteriormente previstos e a natureza cumulativa
dos mesmos.
A nova redação do artigo 12.º do Código do Trabalho passou a dispor o seguinte:
«Artigo 12.º
Presunção
Presume-se que existe um contrato de trabalho sempre que o prestador esteja na dependência e inserido
na estrutura organizativa do beneficiário da atividade e realize a sua prestação sob as ordens, direção e
fiscalização deste, mediante retribuição».
Também a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro – Aprova a revisão do Código do Trabalho –, que teve origem
na Proposta de Lei n.º 216/X apresentada na decorrência do Acordo Tripartido celebrado em junho de 2008,
entre o Governo e a maioria dos parceiros com assento na CPCS, veio alterar a redação do artigo 12.º do
Código do Trabalho e fê-lo de modo substancial.
Como resulta da exposição de motivos que antecede a Proposta de Lei n.º 216/X que deu origem à Lei n.º
7/2009, de 12 de fevereiro, as alterações introduzidas ao artigo 12.º do Código do Trabalho foram sustentadas
do seguinte modo: “...com o desiderato de combater a precariedade e a segmentação dos mercados de
trabalho, alteram-se os pressupostos que operam para a presunção da caraterização do contrato de trabalho e
cria-se uma nova contraordenação, considerada muito grave, para cominar as situações de dissimulação de
contrato de trabalho, com o desiderato de combater o recursos aos «falsos recibos verdes» e melhorar a
eficácia da fiscalização neste domínio”.
Com a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, o artigo 12.º do Código do Trabalho foi objeto de profundas
alterações, tendo-se reforçado significativamente o combate ao falso trabalho independente, quer seja através
da exigência do cumprimento de apenas alguns dos indícios para efeitos da efetivação da presunção de
laboralidade, quer seja através do previsão da contraordenação muito grave ou de sanções acessórias
aplicáveis às situações de recurso ao falso trabalho independente.
A redação do artigo 12.º do Código do Trabalho passou, assim, a ser a seguinte:
«Artigo 12.º
Presunção de contrato de trabalho
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1 — Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma
atividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:
a) A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade;
c) O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo
beneficiário da mesma;
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como
contrapartida da mesma;
e) O prestador de atividade desempenhe funções de direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.
2 — Constitui contraordenação muito grave imputável ao empregador a prestação de atividade, por forma
aparentemente autónoma, em condições características de contrato de trabalho, que possa causar prejuízo ao
trabalhador ou ao Estado.
3 — Em caso de reincidência, é aplicada a sanção acessória de privação do direito a subsídio ou benefício
outorgado por entidade ou serviço público, por período até dois anos.
4 — Pelo pagamento da coima, são solidariamente responsáveis o empregador, as sociedades que com
este se encontrem em relações de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, bem como o gerente,
administrador ou diretor, nas condições a que se referem o artigo 334.º e o n.º 2 do artigo 335.º.»
Como bem se pode constatar, o combate ao falso trabalho independente ou aos denominados “falsos
recibos verdes”, tem vindo a ser objeto de intervenção legislativa no quadro do Código do Trabalho,
evidenciando uma crescente preocupação do legislador em erradicar este tipo de precariedade laboral.
Por último importa sublinhar que a preocupação do combate à precariedade laboral e, em particular, ao
falso trabalho independente, encontra-se espelhada no Código dos Regimes Contributivos do Sistema
Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro, na sua atual redação,
no âmbito do qual o papel da Autoridade para as Condições do Trabalho foi reforçado através da consagração
da fiscalização oficiosa nas situações em que o trabalhador independente preste pelo menos 80% do valor
total da sua atividade a uma única entidade [cf. artigo 140.º conjugado com o artigo 150.º].
Em suma, através do PJL n.º 316/XII (2.ª), visa o Grupo parlamentar do PCP a adoção de uma nova
solução normativa no combate ao falso trabalho independente, que passa pela criminalização da sua
utilização.
3. Dos antecedentes parlamentares
O combate à precariedade laboral e aos falsos recibos verdes tem sido o mote para a apresentação de
iniciativas legislativas ao longo de várias legislaturas por vários grupos parlamentares. Assim:
Na X Legislatura o BE apresentou o PJL n.º 215/X – Combater a precariedade, melhorando a estabilidade
no emprego, alterando o Código do Trabalho quanto ao contrato de trabalho a termo -, iniciativa legislativa que
não chegou a ser discutida dado que foi retirada.
Também na X Legislatura o PCP apresentou o PJL n.º 295/X – Institui o Programa Nacional de combate à
precariedade laboral e ao trabalho ilegal –, que acabaria por ser rejeitado na generalidade com os votos contra
do PS, do PSD e do CDS-PP e os votos a favor do PCP e do PEV e a abstenção do BE, e o 497/X – Institui o
Programa Nacional de combate à precariedade laboral e ao trabalho ilegal –, que correspondia à retoma do
PJL n.º 295/X, e que não chegou a ser discutido dado que caducou.
Já na XI Legislatura o BE apresentou o PJL n.º 407/XI – Combater a precariedade e os falsos recibos
verdes –, que não chegou a ser discutido dado que foi retirada; o Projeto de Resolução n.º 545/XI –
Recomenda ao Governo que adote um procedimento especial de combate à precariedade e aos falsos recibos
verdes –, rejeitado na generalidade com os votos contra do PS, PSD e CDS-PP e os votos a favor do BE, do
PCP e do PEV, bem como o PJL n.º 574/XI – Combater a precariedade e os falsos recibos verdes –, que não
chegou a ser discutido por ter caducado.
O PCP voltou a apresentar na XI Legislatura a iniciativa legislativa que – Institui o Programa Nacional de
combate à precariedade laboral e ao trabalho ilegal – a qual foi numerada como PJL n.º 587/XII, que
corresponde a uma retoma dos PJL n.os
295/X e 497/X, que caducou.
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Já na presente legislatura, para além do PJL n.º 316/XII (2.ª), objeto do presente parecer, o PCP
apresentou o Projeto de Resolução n.º 18/XII (1.ª) – Recomenda ao Governo a implementação no distrito do
Porto de um plano de combate à precariedade e promoção de emprego com direitos –, que foi rejeitado com
os votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e os votos a favor do PCP, do BE e do PEV; o PJL n.º 69/XII
(1.ª) – Institui o Programa Nacional de combate à precariedade laboral e ao trabalho ilegal – que foi rejeitado
com os votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e os votos a favor do PCP, do BE e do PEV; o PJL n.º
315/XII (2.ª) – Combate os «falsos recibos verdes» convertendo-os em contratos efetivos – já agendado para o
plenário do dia 25 de janeiro de 2013; e o PJL n.º 331/XII (2.ª) – Combate a precariedade laboral e reforça a
proteção dos trabalhadores na contratação a termo – que ainda não foi discutido.
Por seu turno o BE apresentou o Projeto de Resolução n.º 214/XII (2.ª) – Recomenda ao governo que
adote um procedimento especial de combate à precariedade e aos falsos recibos verdes – que baixou à CSST
e se encontra a aguardar discussão; o PJL n.º 3/XII (2.ª) – Combater a precariedade e os falsos recibos verdes
– que foi rejeitado na generalidade com os votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e os votos a favor do
BE, do PCP e do PEV; e o PJL n.º 284/XII (2.ª) – Combate os falsos recibos verdes e desenvolve os poderes
da autoridade para as condições do trabalho – que se encontra agendado para o plenário do dia 25 de janeiro
de 2013.
Finalmente, também na presente Legislatura deu entrada uma iniciativa Legislativa dos Cidadãos a qual foi
numerada como PJL n.º 142/XII (2.ª) – Lei contra a precariedade laboral – que se encontra agendado para o
plenário do dia 25 de janeiro de 2013.
Como se pode constatar dos antecedentes parlamentares, várias têm sido as iniciativas legislativas
apresentadas ao longo das diversas legislaturas com o objetivo de combater os falsos recibos verdes e
erradicar a precariedade laboral, sendo certo que a solução agora avançada pelo PCP através do PJL n.º
316/XII e que consiste na criminalização do recurso ao falso trabalho independente e a outras formas ilegais
de contratação apresenta um traço inovador.
4. Da apreciação pública
O PJL n.º 316XII (2.ª) – Criminaliza o recurso aos «Falsos Recibos Verdes» - foi, nos termos
constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, publicado em separata eletrónica do Diário da Assembleia da
República [DAR], para efeitos de apreciação pública pelas organizações representativas dos trabalhadores e
dos empregadores, pelo período de 30 dias, que decorreu entre 27 de novembro e 27 de dezembro de 2012,
tendo sido recebidos na CSST 32 pareceres, 1 de uma Confederação Sindical (CGTP-IN), 1 de uma
Federação Sindical, 1 de uma União Sindical, 7 de associações sindicais e 22 de comissões sindicais, que se
manifestaram a favor da aprovação da iniciativa legislativa em apreciação.
PARTE III – POSIÇÃO DO AUTOR
O Autor do presente parecer reserva, nesta sede, a sua posição sobre o PJL n.º 316/XII – Criminaliza o
recurso aos «Falsos Recibos Verdes» –, que é de «elaboração facultativa» [cf. n.º 3 do artigo 137.º do RAR],
para a discussão em Plenário da Assembleia da República.
PARTE IV – CONCLUSÕES
1. O PJL n.º 316/XII (2.ª) – Criminaliza o recurso aos «Falsos Recibos Verdes» –, da iniciativa do PCP, foi
apresentado nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis.
2. O PJL n.º 316/XII (2.ª) cumpre igualmente o disposto na Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, com as
alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto, salvo quanto ao n.º 1 do seu
artigo 6.º, pelo que, caso venha a ser aprovado, deverá o respetivo título ser alterado em sede de
especialidade ou na fixação da redação final de modo a cumprir o disposto na lei formulário.
3. Através do PJL n.º 316/XII (2.ª) visa o PCP criminalizar o recurso aos falsos recibos verdes e a outras
formas de contratação de trabalhadores para trabalho subordinado correspondentes a necessidades
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permanentes das empresas, que não se encontrem previstas no Código do Trabalho ou emlegislação
especial, propondo para o efeito o aditamento de um artigo 12.º-A ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei
n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, punindo com pena de prisão de 1 a 5 anos o empregador que recorra a falsa
prestação de serviços ou a outras formas de contratação ilegal.
4. Os autores do PJL n.º 316/XII (2.ª) alegam na respetiva exposição de motivos que “Desde a
apresentação do programa do XIX Governo Constitucional, da coligação PSD/CDS-PP, que ficou claro que o
combate à precariedade e aos falsos recibos verdes não era um objetivo” pelo que, “o PCP propõe que seja
criminalizado o recurso indevido a formas de contratação que não correspondam às situações reais como
mecanismo dissuasor das múltiplas ilegalidades que as entidades patronais cometem e saem impunes”,
considerando que “… esse é um passo fundamental e consequente na luta contra a chaga social da
precariedade – do emprego e da vida”.
5. No plano jurídico, o legislador tem vindo a adotar soluções normativas equilibradas com o claro objetivo
de desincentivar o recurso ao falso trabalho independente e a outras formas de contratação precárias. Para
além do artigo 53.º da Lei Fundamental que estabelece o princípio da segurança no emprego, esta
preocupação encontra-se bem vincada no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de
agosto, na sua atual redação, e no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança
Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro, na sua atual redação.
6. Finalmente, cumpre sublinhar que a criminalização do recurso aos falsos recibos verdes ou a outras
formas ilegais de contratação prevista no PJL n.º 316/XII (2.ª) configura uma solução normativa inovadora no
quadro do ordenamento jus laboral português.
7. O PJL n.º 316XII (2.ª) – Criminaliza o recurso aos «Falsos Recibos Verdes» – foi, nos termos
constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, submetido a apreciação pública junto das organizações
representativas dos trabalhadores e dos empregadores, pelo período de 30 dias, tendo sido recebidos na
CSST 32 pareceres de organizações representativas dos trabalhadores que se manifestaram a favor da
aprovação da iniciativa legislativa em apreciação.
PARTE V – PARECER
Face ao atrás exposto, a Comissão de Segurança Social e Trabalho é do seguinte:
Parecer
a) O PJL n.º 316/XII (2.ª) – Criminaliza o recurso aos «Falsos Recibos Verdes» –, da iniciativa do PCP,
preenche, salvo melhor e mais qualificado entendimento, os requisitos constitucionais, legais e
regimentais aplicáveis para poder ser discutido e votado pelo Plenário da Assembleia da República;
b) Os grupos parlamentares reservam as suas posições de voto para o Plenário da Assembleia da
República;
c) Nos termos regimentais aplicáveis, deverá o presente parecer ser remetido a S. Ex.ª a Sr.ª Presidente
da Assembleia da República.
Palácio de S. Bento, 8 de janeiro de 2013.
O Deputado autor do parecer, Mário Ruivo — O Presidente da Comissão, José Manuel Canavarro.
Nota: O parecer foi aprovado por unanimidade.
Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 316/XII (2.ª)(PCP)
Criminaliza o recurso aos "falsos recibos verdes"
Data de admissão: 19 de novembro de 2012
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Comissão de Segurança Social e Trabalho (10.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento
da lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: Susana Fazenda (DAC), Laura Costa (DAPLEN), Paula Granada (BIB), Filomena Romano
de Castro e Fernando Bento Ribeiro (DILP).
Data: 18 de janeiro de 2013
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
O presente projeto de lei, da iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, deu entrada
na Assembleia da República a 7 de novembro, foi admitido a 19 de novembro, tendo baixado nessa data à
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que se considerou incompetente e
solicitou a sua redistribuição à Comissão de Segurança Social e Trabalho, o que veio a suceder a 20 de
novembro.
O PCP propõe que seja criminalizado o recurso indevido a formas de contratação que não correspondam
às situações reais como mecanismo dissuasor das múltiplas ilegalidades que as entidades patronais cometem
e saem impunes (…) e entende que este é um passo fundamental e consequente na luta contra a chaga social
da precariedade – do emprego e da vida, mediante o aditamento de um novo artigo 12.º-A ao Anexo da Lei n.º
7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho, com a seguinte redação:
«Artigo 12.º-A
Criminalização do recurso ilegal a formas de contratação
Sempre que a entidade patronal recorra a falsa prestação de serviços ou a formas de contratação de
trabalhadores para trabalho subordinado correspondente a necessidades permanentes, que não sejam as
previstas neste Código ou em legislação especial, será punida com pena de prisão de 1 a 5 anos.»
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
A iniciativa legislativa sub judice é apresentada por sete Deputados do grupo parlamentar do PCP, no
âmbito do seu poder de iniciativa, nos termos e ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 156.º e no n.º 1 do
artigo 167.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º, no artigo 118.º e no n.º 1 do artigo 123.º do
Regimento da Assembleia da República (RAR).
A presente iniciativa toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo
119.º do RAR, respeita os limites estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do mesmo diploma e, cumprindo os
requisitos formais estabelecidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 124.º, mostra-se redigida sob a forma de artigos, tem
uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de
motivos.
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O presente projeto de lei deu entrada em 07/11/2012 e foi admitido em 19/11/2012 e anunciado na reunião
plenária de 21/11/2012. Por despacho de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, exarado a
19/11/2012, a iniciativa baixou, na generalidade, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades
e Garantias (1.ª), com indicação de conexão com a Comissão de Segurança Social e Trabalho (10.ª). Por
solicitação da 1.ª Comissão, que considerou que a matéria em causa cabia no âmbito das competências
materiais da 10.ª Comissão e que, ao abrigo do artigo 130.º do RAR, solicitou a S. Ex.ª a Presidente da
Assembleia da República a reapreciação do seu despacho, a iniciativa foi redistribuída à 10.ª Comissão.
Verificação do cumprimento da lei formulário
A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto,
comummente designada por “lei formulário”, possui um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação
e o formulário dos diplomas, as quais são relevantes em caso de aprovação das iniciativas legislativas e que,
como tal, cumpre referir.
Assim, importa assinalar que, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, o projeto de lei
em apreço tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto, identificando que visa criminalizar o recurso
ilegal a formas de contratação. Porém, a presente iniciativa pretende ainda alterar o Código do Trabalho,
aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, através do aditamento de um novo artigo. Ora,
considerando que, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º da referida lei formulário, “os diplomas que alterem outros
devem indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores,
identificar aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas”, a
menção à alteração que se visa introduzir deve constar do título do diploma. Considerando ainda que o Código
do Trabalho já sofreu quatro alterações, produzidas pelas Leis n.º 105/2009, de 14 de setembro, n.º 53/2011,
de 14 de outubro, n.º 23/2012, de 25 de junho, e 47/2012, de 19 de agosto, sugere-se que, em caso de
aprovação da presente iniciativa se altere o seu título, em sede de especialidade ou na fixação da redação
final, propondo-se a seguinte redação: “Criminaliza o recurso aos falsos recibos verdes, procedendo à quinta
alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro”.
Cumprindo o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário que determina que os atos legislativos “entram
em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no próprio dia da
publicação”, o presente projeto de lei, no seu artigo 2.º, prevê que “a presente lei entra em vigor no dia
seguinte ao da sua publicação.”
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
Em 1993, pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, foi aprovado o Código do Trabalho de 2003 (CT2003).
Desde logo ficou previsto no artigo 20.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de março, que, passados quatro anos após a
sua entrada em vigor, o CT2003 seria revisto.
Em 2005, o XVII Governo Constitucional, no seu Programa, assumiu o compromisso de rever o Código do
Trabalho (CT2003), comprometendo-se, assim, a adotar algumas medidas, nomeadamente criar uma
comissão independente encarregada de avaliar os impactes do Código do Trabalho nas relações laborais,
tendo em vista o lançamento de um Livro Branco das Relações Laborais (LBRL) e relançar a concertação
social.
Neste seguimento, o Governo aprovou a Resolução do Conselho de Ministros n.º 160/2006, de 30 de
novembro1, que criou a Comissão
2 do Livro Branco das Relações Laborais (CLBRL), composta por um grupo
1 A Resolução do Conselho de Ministros n.º 160/2006, de 30 de novembro, resolve criar na dependência do Ministro do Trabalho e da
Solidariedade Social a estrutura de missão denominada «Comissão do Livro Branco das Relações Laborais». A Comissão tem a missão de reavaliar o quadro legal vigente e propor alterações com vista à promoção do emprego, à redução da segmentação do sistema de emprego, à mobilidade protegida entre os diferentes tipos de contrato de trabalho e de atividade profissional, ao desenvolvimento da adaptabilidade dos trabalhadores e das empresas à mudança económica e social e ao fomento da contratualidade. 2 A Comissão teve a seguinte composição:
a) Presidente—António de Lemos Monteiro Fernandes; b) Relator—António Maria Bustorff Dornelas Cysneiros;
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de peritos com a missão de produzir um diagnóstico das necessidades de intervenção legislativa, tendo em
conta o conjunto de conclusões vertidas no Livro Verde, designadamente em matéria de emprego, proteção
social e relações de trabalho.
O Livro Branco das Relações Laborais (LBRL), publicado em Novembro de 2007 e que foi, também ele,
alvo de debate em sede de Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS), identifica os principais
problemas da realidade económica e social do País e enuncia as propostas de intervenção legislativa que
considera adequadas.
Posteriormente, o Governo e a maioria dos parceiros sociais com assento na Comissão Permanente de
Concertação Social (CPCS), alcançaram em 25 de junho de 2008, o acordo tripartido3 que esteve na origem
da Proposta de Lei n.º 216/X que aprova a revisão do Código do Trabalho.
Assim, em cumprimento do disposto no artigo 20.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, e de acordo com o
que foi vertido no Programa do XVII Governo Constitucional, a referida proposta de lei procede à revisão do
Código do Trabalho e da respetiva regulamentação. O Governo propõe, deste modo, no seguimento da
proposta plasmada no Livro Branco das Relações Laborais, um quadro normativo mais eficaz, que unifica os
dois principais instrumentos legislativos que disciplinam as relações de trabalho – o Código do Trabalho e o
seu Regulamento.
Na sequência do acima exposto, foi publicada a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro4, que aprovou o atual
Código do Trabalho (CT2009)5.
A exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 216/X que deu origem à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,
no que concerne aos falsos recibos verdes, menciona que, com o desiderato de combater a precariedade e a
segmentação dos mercados de trabalho, alteram-se os pressupostos que operam para a presunção da
caracterização do contrato de trabalho e cria-se uma nova contraordenação, considerada muito grave, para
cominar as situações de dissimulação de contrato de trabalho, com o desiderato de combater o recurso aos
“falsos recibos verdes” e melhorar a eficácia da fiscalização neste domínio.
A iniciativa em apreço faz referência à receita fiscal que o OE prevê para 2013. Assim, o Relatório que
acompanha a Proposta de Lei n.º 103/XII (2.ª), que aprova o Orçamento do Estado para 2013, prevê que a
receita fiscal para 2013 ascende a 35.947,7 M€, o que representa um acréscimo de 10,2% face à estimativa
de execução da receita fiscal para 2012. Subjacente a esta evolução encontra-se o aumento em 19,7% da
receita dos impostos diretos, bem como o crescimento em 3,1% da receita derivada dos impostos indiretos,
relativamente à receita estimada para 2012.
Quanto ao Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS) para 2013, o Governo estima que a
receita líquida em sede de IRS atinja o valor de 12.066,3 M€, antevendo-se uma variação de 30,7%
relativamente à receita prevista para 2012. Note-se que esta estimativa engloba a receita adicional resultante
de um conjunto alargado de medidas de política fiscal, entre as quais se destacam, a reestruturação dos
escalões e o aumento da taxa média efetiva em sede de IRS, a aplicação de uma sobretaxa, a redução de
deduçõesà coleta (com especial ênfase no caso da dedução à coleta personalizante e da dedutibilidade de
juros com crédito à habitação) e o aumento da tributação sobre rendimentos de capital e sobre mais-valias
mobiliárias.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
c) Vogais: António Manuel Carvalho Casimiro Ferreira; João José Garcia Correia; Júlio Manuel Vieira Gomes; Manuel Eugénio Pimentel Cavaleiro Brandão; Maria da Conceição Santos Cerdeira; Mário José Gomes de Freitas Centeno; Pedro de Sá-Carneiro Furtado Martins; A diretora-geral de Estudos, Estatística e Planeamento; O diretor-geral do Emprego e das Relações de Trabalho; O inspetor-geral do Trabalho; O presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego. 3 “Acordo tripartido para um novo sistema de regulação das relações laborais, das políticas de emprego e da proteção social em Portugal.”
4 Teve origem na Proposta de Lei n.º 216/X que aprova a revisão do Código do Trabalho.
5 O Código do Trabalho (CT2009) foi aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, retificada pela Declaração de Retificação n.º
21/2009, de 18 de março, alterada pelas Leis n.ºs 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho (retificada pela Declaração de Retificação n.º 38/2012, de 23 de julho) e 47/2012, de 29 de agosto.
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CAMPOS, Fernanda - Contratode trabalho e presunção de laboralidade. In Código do trabalho: a revisão
de 2009. ISBN 978-972-32-1867-1. Coimbra: Coimbra Editora, 2011. p. 75-91. Cota: 12.06.9 – 340/2011
Resumo: Neste artigo, é feita uma abordagem das caraterísticas que servem para qualificar uma relação
como de trabalho subordinado ou, por exclusão, como autónoma. A autora partilha as suas reflexões sobre a
presunção de laboralidade no novo Código do Trabalho.
PRECÁRIOS EM PORTUGAL: entre a fábrica e o "call center". Org. José Nuno Matos, Nuno Domingos,
Rahul Kumar. Lisboa: Edições 70, 2011. 135 p. (Le Monde diplomatique;1). ISBN978-972-44-1695-3. Cota: 44
- 630/2011
Resumo: Os autores constatam que em 2010, Portugal era o terceiro país da União Europeia com maior
índice de precariedade laboral. Cerca de 23,2% dos trabalhadores por conta de outrem estavam ligados à sua
entidade patronal por um contrato a termo ou por outro tipo de vínculo precário. No terceiro trimestre de 2010,
estimava-se que 54,6% dos trabalhadores por conta de outrem entre os 15 e os 24 anos possuísse um vínculo
laboral desse tipo. Encontravam-se igualmente nessa situação 11,2% dos trabalhadores entre os 50 e os 64
anos.
Ao longo do livro focam-se diversos casos que refletem uma realidade que se impôs progressivamente nas
mais diversas esferas laborais, da fábrica ao call center, do trabalho doméstico aos centros comerciais. É
apresentado um conjunto de investigações que procuram interpretar o fenómeno da precariedade no quadro
da evolução das relações de trabalho em Portugal.
REIS, Inês – Os recibos verdes à luz do Novo Código do Trabalho. Trabalho & Segurança Social. Lisboa.
A. 7, n.º 10 (out. 2009), p. 13-15. Cota: RP-558
Resumo: A autora aborda a questão dos verdadeiros e dos falsos recibos verdes, associada ao combate à
precariedade, à luz do novo Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro) que
penaliza as empresas que recorram a falsos recibos verdes, reformulando os indícios que permitem detetar a
utilização ilegal dos mesmos.
No presente artigo, a autora procede à destrinça entre contrato de prestação de serviços e contrato de
trabalho, a qual considera inequívoca apenas no plano teórico, já que estes dois tipos contratuais se
aproximam manifestamente com fronteiras pouco definidas e, por vezes, difíceis de delimitar na prática,
apesar de se pautarem por regimes jurídicos distintos e conterem designações diversas.
Em razão desta distinção tão pouco nítida, certas empresas recorrem ao mecanismo dos contratos de
prestação de serviços e à emissão de recibo verde quando o “prestador de serviços” não é trabalhador
independente, no verdadeiro sentido do termo, devendo antes ser qualificado como trabalhador por conta de
outrem e como tal usufruir de um contrato de trabalho, com todos os deveres e regalias a ele inerentes.
VICENTE, Joana Nunes – Noção de contrato de trabalho e presunção de laboralidade. In Código do
trabalho: a revisão de 2009. ISBN 978-972-32-1867-1. Coimbra: Coimbra Editora, 2011. p. 59-73. Cota:
12.06.9 – 340/2011
Resumo: O presente artigo constitui uma abordagem à noção de contrato de trabalho e à presunção de
laboralidade, tal como se encontram definidas no novo Código do Trabalho. A autora propõe-se realçar as
principais alterações trazidas pela reforma do código nesta matéria e apresenta as primeiras reflexões críticas
que o tema lhe suscitou.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha e Itália.
Espanha
Em Espanha, o Real Decreto Legislativo 1/1995, de 24 de marzo, por el que se aprueba el texto refundido
de la Ley del Estatuto de los Trabajadores (texto consolidado) regula as relações laborais e os contratos de
trabalho que se aplicam aos trabalhadores que voluntariamente prestam serviço retribuído por conta alheia e
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dentro do âmbito de organização e direção de outra pessoa, física ou jurídica, denominada empregador ou
empresário.
Nos termos do artigo 8.1 do referido diploma, o contrato de trabalho pode ser celebrado por escrito ou
verbal. Presume-se que o contrato existe sempre que o trabalhador presta um serviço dentro do âmbito de
organização e direção de outro e que recebe em troca a respetiva retribuição.
Compete à inspeção-geral do trabalho e à segurança social a fiscalização do cumprimento das normas em
matéria laboral e o controlo da legislação relativa à segurança e saúde no trabalho, bem como a promoção de
políticas de prevenção dos riscos profissionais6, quer no âmbito das relações laborais privadas, quer no âmbito
da Administração Pública. Compete, ainda, à inspeção-geral do trabalho e à segurança social vigiar o
cumprimento das disposições legais, regulamentares e convencionais respeitantes às relações laborais, nos
termos da Ley 42/1997, de 14 de noviembre, Ordenadora de la Inspección de Trabajo y Seguridad Social e do
seu Regulamento, aprovado pelo Real Decreto 138/2000, de 4 de febrero.
O Real Decreto Legislativo 5/2000, de 4 de agosto, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley sobre
Infracciones y Sanciones en el Orden Social vem regularizar, aclarar e sistematizar as infrações e as sanções
de ordem social. O capítulo II regula a matéria sobre as infrações inerentes às relações laborais individuais e
coletivas. As infrações são qualificadas como leves, graves e muito graves tendo em atenção a natureza do
dever infringido e a entidade violadora do direito (artigos 6.º, 7.º e 8.º).
Itália
Em Itália os recibos verdes são designados por ‘ritenuta d'acconto’ (retenção de uma verba/retenção por
conta). Esta retenção não é uma forma de contrato, mas sim uma forma de pagamento a que estão sujeitos os
designados trabalhadores “autónomos”. Sob esta forma existem as seguintes formas de colaboração
profissional com as empresas: ‘colaboração coordenada e continuada’ e a ‘colaboração ocasional’.
A figura do trabalho autónomo ou não subordinado é uma categoria que compreende uma tipologia de
funções e profissões muito diversas umas das outras. O que as une é o facto de corresponderem a relações
de trabalho que não se inserem num contrato coletivo e de não terem as garantias de continuidade e tutela
previstas para os trabalhadores por conta de outrem.
Neste estudo da CISL (confederação sindical) pode ver-se a proteção do trabalho ‘não subordinado’
(autónomo).
O trabalho ocasional de tipo acessório é uma modalidade particular de prestação de trabalho prevista pela
Lei Biagi. A sua finalidade é regulamentar aquelas relações de trabalho que satisfazem exigências ocasionais
com carácter intermitente, com o objetivo de fazer emergir atividades próximas do trabalho clandestino,
tutelando dessa maneira trabalhadores que usualmente trabalham sem qualquer proteção seguradora e
previdencial.
O pagamento da prestação tem lugar através dos designados ‘voucher’ (buoni lavoro), que garantem, além
do pagamento, também a cobertura previdencial junto do INPS (instituto nacional de previdência social) e da
seguradora junto do INAIL (instituto nacional de acidentes de trabalho).
A Lei n.º 133 de 6 agosto 2008, a Lei n.º 33 de 9 abril 2009 e por fim a Lei n.º 191 de 23 dezembro 2009
(Orçamento do Estado para 2010) ampliaram progressivamente o âmbito dos prestadores e as áreas de
atividade em que se aplica o trabalho ocasional acessório.
Para um maior desenvolvimento, ver a seguinte ligação do sítio do ‘Ministério do Trabalho e das Políticas
Sociais’.
Recentemente, em Itália, foi aprovada a Lei n.º 92/2012, de 28 de junho, comumente designada como
“Riforma del Lavoro” (Reforma do Trabalho). Este diploma veio incidir em diversos aspetos da disciplina do
contrato a termo (contatos a prazo), modificando diversas partes do Decreto Legislativo n.º 368/2001, de 6 de
setembro.
De acordo com o artigo 1.º do Decreto Legislativo n.º 368/2001, em geral, é permitida a aposição de um fim
à vida do contrato de trabalho em face de razões de carácter técnico, produtivo, organizativo ou substitutivo,
ainda que relacionados com as atividades normais do empregador; a mesma condição é requerida, nos termos
do artigo 20.º, n.º 4, do Decreto Legislativo n.º 276/2003, em relação ao período determinado.
6 De acordo com o estabelecido na Ley 31/1995, de 8 de noviembre, de Prevención de Riesgos Laborales.
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Convém esclarecer que a disposição que impõe um período máximo de prestação de trabalho temporário,
para o mesmo empregador e para o desempenho de tarefas equivalentes, aponta para 36 meses. Convém
contudo recordar que o parágrafo 4 bis do artigo 5.º do Decreto Legislativo n.º 368/2001 estabelece que, se
como resultado de uma sucessão de contratos a termo para o desempenho de trabalho de igual valor, a
relação de trabalho entre o mesmo empregador e empregado tenha excedido um total de 36 meses, incluindo
extensões e renovações, independentemente de períodos de interrupção entre um contrato e outro, a relação
de emprego será considerada por tempo indeterminado a partir da caducidade desse prazo.
Veja-se a este propósito a seguinte ligação no sítio do ‘Ministério do Trabalho e das Políticas Sociais’: Il
lavoro intermittente alla luce delle modifiche introdotte dalla riforma del lavoro.
Num sítio de um grupo de “trabalhadores precários” pode encontrar-se diversa documentação da situação
italiana relativamente ao tema em análise na presente iniciativa legislativa.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Da pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (PLC), verificou-se que se
encontram pendentes sobre esta matéria as seguintes iniciativas:
– Projeto de Lei n.º 315/XII (2.ª) (PCP) – Combate os "falsos recibos verdes" convertendo-se em contratos
efetivos – Foi admitido em 19/11/2012, tendo baixado, na generalidade à Comissão de Segurança Social e
Trabalho. Foi promovida a apreciação pública (de 27/11/2012 a 27/12/2012).
– Projeto de n.º Lei 284/XII (2.ª) (BE) – Combate os falsos recibos verdes e desenvolve os poderes da
autoridade para as condições do trabalho – Foi admitido em 20/09/2012, tendo baixado, na generalidade à
Comissão de Segurança Social e Trabalho. Foi promovida a apreciação pública (de 03/10/2012 a 01/11/2012).
– O Projeto de Resolução n.º 214/XII (1.ª) (BE) – Recomenda ao governo que adote um procedimento
especial de combate à precariedade e aos falsos recibos verdes – Foi admitido em 08/02/2012 e baixou à
Comissão de Segurança Social e Trabalho para efeitos de discussão.
Petições
Consultada a base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (PLC), verificou-se que não
se encontram pendentes quaisquer petições sobre esta matéria.
V. Consultas e contributos
Consultas obrigatórias
O presente projeto de lei foi publicado em separata eletrónica do DAR no dia 27/11/2012, para apreciação
pública, pelo período de 30 dias, que terminou em 27/12/2012.
Contributos de entidades que se pronunciaram
Os contributos das entidades que se pronunciaram podem ser consultados nesta ligação.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face dos elementos disponíveis, não é possível determinar os efeitos ao nível do OE em decorrência da
sua aprovação e da sua consequente aplicação.
———
PROJETO DE LEI N.º 324/XII (2.ª)
(REGIME JURÍDICO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL)
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Parecer da Comissão de Educação, Ciência e Cultura e nota técnica elaborada pelos serviços de
apoio
Parecer da Comissão de Educação, Ciência e Cultura
Índice
PARTE I – CONSIDERANDOS
PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTORDO PARECER
PARTE III – CONCLUSÕES
PARTE IV – ANEXOS
PARTE I – CONSIDERANDOS
Considerando que:
1. O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) tomou a iniciativa de apresentar à
Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 324/XII (2.ª) – “Regime Jurídico da Educação Especial”;
2. Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto no artigo 167.º da Constituição da República
Portuguesa e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais
previstos no artigo 124.º do Regimento;
3. A iniciativa, em causa, foi admitida em 19 de dezembro de 2012 e baixou, por determinação de Sua
Excelência a Presidente da Assembleia da República, à Comissão de Educação, Ciência e Cultura para
apreciação e emissão do respetivo parecer;
4. O Projeto de Lei inclui exposição de motivos e obedece aos requisitos formais respeitantes às
iniciativas, em geral, e aos projetos de lei, em particular;
5. A iniciativa, em análise, está organizada em trinta e três (33) artigos repartidos por oito (8) capítulos que
tratam, nomeadamente, do «Âmbito, objetivos e conceitos», do «Regime educativo especial em ambiente
inclusivo», das «Estruturas», da «Organização escolar e participação», dos «Procedimentos de referenciação
e avaliação», dos «Instrumentos educativos», da «Intervenção precoce na infância» e das «Disposições finais
e transitórias»;
6. O Grupo Parlamentar do PCP propõe, com apresentação desta iniciativa, definir um novo regime de
apoios especializados, dirigidos aos alunos com necessidades educativas especiais, revogando o regime em
vigor, constante do Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, dizendo que este introduziu “uma escola dita
inclusiva com uma rede de ambientes segregados (as unidades especializadas/estruturadas e as escolas de
referência)”;
7. De acordo com a Exposição de Motivos, no “ano letivo 2012/2013 iniciou-se o alargamento da
escolaridade obrigatória até ao 12.º ano de escolaridade. Tendo em conta a situação específica dos alunos
com necessidades especiais, importa compreender os impactos da Portaria n.º 275-A/2012, de 11 de
setembro, no percurso educativo destes jovens. Este diploma prevê que a partir do 10.º ano de escolaridade
os jovens com Currículo Específico Individual (CEI) passem a ter uma matriz curricular de 25 horas letivas, das
quais 20 horas serão da responsabilidade das instituições de ensino especial e apenas 5h na Escola Pública”;
8. Defende o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português que, conforme consta na exposição de
motivos, no “universo de alunos com Necessidades Educativas Especiais, e em particular os que se
encontram abrangidos pelo Currículo Específico Individual, existe uma diversidade e especificidade próprias
das suas necessidades, sendo por isso absolutamente desadequado um modelo único para dar resposta a
estes alunos”;
9. Salientando ainda que a iniciativa em análise, resulta de um trabalho de auscultação e recolha de
sugestões realizado pelo PCP, junto de entidades representativas de professores, professores de educação
especial, técnicos especializados, estudantes, pais e encarregados de educação;
10. De acordo com a exposição de motivos, a “Educação Inclusiva parte de uma filosofia segundo a qual
todas as crianças e jovens, independentemente das suas características, origens e condições, podem
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aprender juntos, na escola pública das suas comunidades, segundo os princípios da democratização da
educação e da igualdade de oportunidades”;
11. Entende o Grupo Parlamentar do PCP que o Decreto-Lei n.º 3/2008 “introduziu no sistema educativo
português um tremendo equívoco, que urge eliminar. Uma escola dita inclusiva com uma rede de ambientes
segregados (as unidades especializadas/estruturadas e as escolas de referência) é um paradoxo. Não há
escola inclusiva sem turmas inclusivas. A escola tem que se adaptar à diversidade dos seus alunos.”;
12. É admitido, pelos proponentes da iniciativa, a existência de um sistema paralelo de
estabelecimentos de educação e ensino, da rede solidária, para os alunos com deficiência, num regime
supletivo e com paralelismos pedagógicos, apoiados pelo Estado. Contudo, “…a educação de alunos com
necessidades educativas especiais processar-se-á, sempre que possível, nos estabelecimentos regulares de
educação. Cumpre ao Estado criar as condições para que a escola pública possa acolher, progressivamente,
todas as crianças e jovens.”;
13. Por fim, o Grupo Parlamentar do PCP, propõe a criação do Instituto Nacional da Educação Inclusiva,
“(…) organismo verticalizado com a competência para dirigir e coordenar Centros de Recursos para a
Inclusão, operacionalizando-se, deste modo, um modelo orgânico capaz de intervir de forma mais eficiente,
célere e eficaz em todo o sistema educativo e no complexo quadro dos múltiplos serviços de educação e
ensino especial existentes. Introduz-se, por outro lado, um apoio específico para os alunos com necessidades
educativas especiais que frequentam o ensino superior público, através de Gabinetes de Apoio à Inclusão, e
definem-se as bases para uma resposta articulada entre diferentes ministérios tendo em vista a prevenção e
detecção precoce da deficiência e/ou situações de risco e uma intervenção precoce na infância.”;
14. Da pesquisa efetuada à base de dados da atividade legislativa e do processo legislativo (PLC), e em
consonância com o exposto na Nota Técnica, não existem iniciativas legislativas nem petições pendentes
sobre a mesma matéria, na presente legislatura;
15. Contudo, tendo presente a informação que consta na Nota Técnica, verificou a existência de
iniciativas, em anteriores legislaturas, cuja matéria é conexa, a saber:
Projeto de Lei n.º 602/X/4ª – Regime Jurídico da Educação Especial, iniciativa do Grupo
Parlamentar do PCP, que caducou em 14 de Outubro de 2009;
Projeto de Lei n.º 160/XI – Regime Jurídico da Educação Especial, iniciativa do Grupo Parlamentar
do PCP, rejeitado em votação na generalidade, a 8 de abril de 2010;
Projeto de Resolução n.º 565/XI – Recomenda ao Governo que clarifique e agilize o processo de
atribuição do Subsídio de Educação Especial, da iniciativa do Grupo Parlamentar do CDS-PP, o
qual caducado com o final da legislatura.
16. Na sequência do previsto na Nota Técnica anexa, sugere-se a consulta, em sede de especialidade, a
realização de audições parlamentares a diversas entidades diretamente interessadas nesta temática ou
a solicitação de pareceres e pareceres online, através da aplicação informática disponível para o efeito
no sítio da Assembleia da República.
17. Importa ainda salientar que, conforme consta na Nota Técnica, aprovação da presente iniciativa deverá
ter custos para o Orçamento do Estado, nomeadamente os que possam resultar das necessárias
adaptações de recursos em termos de instalações, materiais e equipamentos para utilização pelas
crianças e jovens com necessidades educativas especiais, bem como de recursos humanos adicionais,
assim como os decorrentes da criação do Instituto Nacional para a Educação Inclusiva, da rede nacional
de Centros de Recursos para a Inclusão e dos Gabinetes de Apoio à Inclusão.
18. Pelo que, de acordo com o expresso na Nota Técnica, tendo presente que a aplicação do regime
proposto pela presente iniciativa, envolverá encargos.“(…) de modo a acautelar o princípio denominado
“lei travão”, consagrado no n.º 2 do artigo 167.º da Constituição e no n.º 2 do artigo 120.º do RAR, que
impede a apresentação de projetos de lei que “envolvam, no ano económico em curso, aumento de
despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento”, parece ser adequado que a
presente iniciativa legislativa, caso venha a ser aprovada na generalidade, seja alterada, em sede de
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especialidade, no sentido de ser aditada uma norma que preveja a sua entrada em vigor com a
aprovação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua publicação”;
PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTOR DO PARECER
Esta parte reflete a opinião política do Relator do Parecer, Deputado Jacinto Serrão
O relator do presente Parecer reserva a sua opinião para o debate em Plenário do Projeto em apreço, a
qual é facultativa, conforme o disposto no n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – CONCLUSÕES
A Comissão Parlamentar de Educação e Ciência, em reunião realizada no 22 de janeiro de 2013, aprova o
seguinte parecer:
O Projeto de Lei n.º 324/XII (2.ª), apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português
(PCP), reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais para ser agendado e alvo de apreciação pelo
Plenário da Assembleia da República, reservando os grupos parlamentares as suas posições e decorrente
sentido de voto para o debate.
PARTE IV – ANEXOS
1) Nota técnica
Palácio de S. Bento, 22 de janeiro de 2013.
O Deputado autor do Parecer, Jacinto Serão — O Presidente da Comissão, José Ribeiro e Castro.
Nota: O parecer foi aprovado por unanimidade.
Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 324/XII (PCP)
Regime Jurídico da Educação Especial
Data de admissão: 19 de dezembro de 2012
Comissão de Educação, Ciência e Cultura (8.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
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Elaborada por: Teresa Fernandes (DAC), Maria Paula Faria e Teresa Félix (Biblioteca), Laura Costa
(DAPLEN) e Fernando Marques (DILP).
Data: 2013.01.04
VII. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
O Projeto de Lei n.º 324/XII, da iniciativa do PCP, visa definir um novo regime de apoios especializados,
destinados aos alunos com necessidades educativas especiais, revogando o regime em vigor, constante do
Decreto-Lei n.º 3/20081, de 7 de Janeiro, defendendo que este introduziu “uma escola dita inclusiva com uma
rede de ambientes segregados (as unidades especializadas/estruturadas e as escolas de referência)”.
A presente iniciativa retoma o Projeto de Lei 160/XI, do mesmo grupo parlamentar (rejeitado em votação na
generalidade, a 8 de abril de 2010 - veja-se informação constante do ponto III da nota técnica), introduzindo-
lhe algumas alterações.
Referem-se no quadro constante abaixo algumas das diferenças entre o regime proposto na iniciativa
legislativa em apreciação e aquele que está atualmente em vigor:
Projeto de Lei n.º 324/XII (2.ª) Decreto-Lei n.º 3/2008
Âmbito
Apoios a alunos dos estabelecimentos públicos de educação e ensino de todos os níveis, incluindo o superior, bem como a intervenção precoce na infância e as instituições de educação especial com paralelismo pedagógico
Apoios na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário, dos setores público, particular e cooperativo
Caráter das necessidades Não exige o caráter permanente Permanente
Organização
O Estado deve garantir as condições e recursos para que a educação seja inclusiva, processando-se, sempre que possível, nos estabelecimentos regulares de educação. Previsão de várias adequações.
Adequações para resposta às necessidades educativas especiais. Previsão de escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos e de alunos cegos e com baixa visão. Unidades especializadas para alunos com perturbações de autismo e com multideficiência e surdo-cegueira congénita. Instituições de educação especial.
Instituto Nacional para a Educação Inclusiva (INEI)*
Criação do Instituto, para, entre outras, dirigir e coordenar os Centros de Recursos para a Inclusão (de base concelhia ou interconcelhia) e apoiar os Gabinetes de Apoio à Inclusão no ensino superior público.
Referenciação e avaliação
Referenciação pelos pais e docentes e pelos serviços de saúde e segurança social, no âmbito de programas específicos. Avaliação pelo Departamento de Educação Especial, feita por referência a instrumentos educativos adequados, com escalas adaptadas à realidade portuguesa a definir pelo INEI. Aplicação da CIF como complementar e acessória dos outros instrumentos.
Referenciação pelos pais, serviços de intervenção precoce, docentes ou outros técnicos. Relatório técnico-pedagógico conjunto do departamento de educação especial e do serviço de psicologia, eventualmente com recurso aos centros de saúde ou centros especializados, com avaliação por diferentes instrumentos de acordo com o contexto da sua aplicação, tendo por referência a CIF**.
1 O Decreto-Lei 3/2008, que define os apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos
sectores público, particular e cooperativo, foi alterado, por apreciação parlamentar, pela Lei n.º 21/2008, de 12 de maio.
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Projeto de Lei n.º 324/XII (2.ª) Decreto-Lei n.º 3/2008
Plano individual de transição para a vida pós-escolar
Inicia-se 3 anos antes da idade limite da escolaridade obrigatória. Articulação com o Instituto do Emprego e Formação Profissional e parcerias.
Inicia-se 3 anos antes da idade limite da escolaridade obrigatória. Cooperação/parcerias com várias entidades para a transição da escola para o emprego.
Intervenção precoce na infância
A desenvolver pelos Centros de Recursos para a Inclusão, através de equipas multiprofissionais, que englobam as áreas da educação, saúde e segurança social.
São criados agrupamentos de escolas de referência para a colocação de
docentes, que asseguram a articulação com os serviços de saúde
e da segurança social.
*A Lei n.º 66/79, de 4 de outubro, Lei de Educação Especial, que não chegou a ser regulamentada, já
previa o Instituto de Educação Inclusiva (veja-se ponto III da nota técnica).
**CIF – Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, da Organização Mundial de
Saúde.
VIII. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
A iniciativa legislativa sub judice é apresentada por 10 Deputados do Grupo Parlamentar do PCP, no
âmbito do seu poder de iniciativa, nos termos e ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 156.º e no n.º 1 do
artigo 167.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º, no artigo 118.º e no n.º 1 do artigo 123.º do
Regimento da Assembleia da República (RAR).
A presente iniciativa toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo
119.º do RAR, respeita os limites estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do mesmo diploma e, cumprindo os
requisitos formais estabelecidos nos n.os
1 e 2 do artigo 124.º, mostra-se redigido sob a forma de artigos, tem
uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de
motivos.
O presente projeto de lei deu entrada em 14/12/2012, foi admitido em 19/12/2012 e anunciado na reunião
plenária de 20/12/2012. Por despacho de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, exarado a
19/12/2012, a iniciativa baixou, na generalidade, à Comissão de Educação, Ciência e Cultura.
Verificação do cumprimento da lei formulário
A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto,
comummente designada por “lei formulário”, possui um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação
e o formulário dos diplomas, as quais são relevantes em caso de aprovação das iniciativas legislativas e que,
como tal, cumpre referir.
Assim, importa assinalar que, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, o projeto de lei
em apreço tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto, identificando que visa aprovar o regime
jurídico da educação especial. É, no entanto, de salientar que a presente iniciativa, para o efeito, revoga o
Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro2, e a Lei n.º 21/2008, de 12 de maio3.
Deste modo, considerando que o título deve traduzir, de forma sintética, o objeto e o conteúdo do ato
publicado4 5 e que, por motivos de segurança jurídica e tendo presente o caráter informativo do título, se deve
2 O Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, define os apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e
secundário dos setores público, particular e cooperativo. 3 “Primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro, que define os apoios especializados a
prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos sectores público, particular e cooperativo”. 4 Em conformidade com o disposto o n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 42/2007, de 24 de Agosto (“lei formulário”).
5 Cfr.“Legística - Perspetivas sobre a Conceção e Redação de Atos Normativos”, David Duarte e Outros, 2002, Almedina, p. 200.
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entender que “as vicissitudes que afetem globalmente um ato normativo, devem ser identificadas no título, o
que ocorre, por exemplo em revogações expressas de todo um outro ato”6, atendendo a que a presente
iniciativa legislativa prevê, no seu artigo 33.º, a revogação dos diplomas supra referenciados, propõe-se que,
caso seja aprovada na generalidade, o seu título seja alterado, em sede de discussão e votação na
especialidade ou na fixação da redação final, de modo a passar a constar a referência expressa àquelas
revogações. Assim, sugere-se a seguinte redação: “Aprova o regime jurídico da educação especial e revoga o
Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro e a Lei n.º 21/2008, de 12 de maio.
Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, os atos legislativos “entram em vigor no dia
neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no próprio dia da publicação”, e, de
acordo com o n.º 2 do mesmo artigo, “na falta de fixação do dia, os diplomas referidos no número anterior
entram em vigor, em todo o território nacional e no estrangeiro, no 5.º dia após a sua publicação”. Não
contendo norma de entrada em vigor, o presente diploma, sendo aprovado, entraria em vigor no 5.º dia após a
sua publicação. Contudo, tendo em conta que da aplicação do regime nele vertido parecem resultar encargos,
de modo a acautelar o princípio denominado “lei travão”, consagrado no n.º 2 do artigo 167.º da Constituição e
no n.º 2 do artigo 120.º do RAR, que impede a apresentação de projetos de lei que “envolvam, no ano
económico em curso, aumento de despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento”,
parece ser adequado que a presente iniciativa legislativa, caso venha a ser aprovada na generalidade, seja
alterada, em sede de especialidade, no sentido de ser aditada uma norma que preveja a sua entrada em vigor
com a aprovação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua publicação.
IX. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
A Constituição da República Portuguesa consagra a todos o direito ao ensino com garantia do direito à
igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar, incumbindo ao Estado, estabelecer progressivamente a
gratuitidade de todos os graus de ensino, promover e apoiar o acesso dos cidadãos portadores de deficiência
ao ensino bem como apoiar o ensino especial, quando necessário (artigo 74.º).
Em 1979 foi publicada a Lei n.º 66/79, de 4 de Outubro, que aprovou o regime da Educação Especial e
criou o Instituto de Educação Especial. Esta Lei nunca chegou a ser regulamentada.
Posteriormente, em 1986, foi aprovada a Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de
outubro, que foi alterada pelas Leis n.os
115/97, de 19 de Setembro, 49/2005, de 30 de agosto e 85/2009, de
27 de agosto). Esta Lei determina que o ensino básico é universal, obrigatório e gratuito e tem a duração de
nove anos. Define ainda como um dos seus objetivos, no que diz respeito ao ensino básico, “assegurar às
crianças com necessidades educativas específicas, devidas, designadamente, a deficiências físicas e mentais,
condições adequadas ao seu desenvolvimento e pleno aproveitamento das suas capacidades”.
O Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de agosto (Estabelece o regime educativo especial aplicável aos alunos
com necessidades educativas especiais) definiu o conceito “Necessidades educativas especiais” e determinou
a substituição dos critérios médicos por critérios pedagógicos para a avaliação dos alunos.
Em 2008, o referido Decreto-Lei, foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, retificado pela
Declaração de Retificação n.º 10/2008, que veio definir os apoios especializados a prestar na educação pré-
escolar e nos ensinos básico e secundário dos sectores público, particular e cooperativo, visando a criação de
condições que permitam dar respostas adequadas aos alunos com necessidades educativas especiais de
carácter permanente.
De acordo com este diploma, os objetivos da educação especial baseiam-se na inclusão educativa e social,
no acesso e no sucesso educativos, na autonomia, na estabilidade emocional bem como na promoção de
igualdade de oportunidades, e na preparação para o prosseguimento de estudos ou para uma adequada
preparação para a vida profissional.
6 Cfr.“Legística - Perspetivas sobre a Conceção e Redação de Atos Normativos”, David Duarte e Outros, 2002, Almedina, p. 203.
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A Lei n.º 21/2008, de 12 de maio (alterou o Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, por Apreciação
Parlamentar), prevê que os intervenientes no processo de referenciação e de avaliação dos alunos com
necessidades educativas especiais de carácter permanente, possam propor a frequência de uma instituição de
ensino especial, nos casos em que a inclusão das crianças e dos jovens em estabelecimentos de ensino
regular, se revele comprovadamente insuficiente, em função do tipo e do grau de deficiência.
No desenvolvimento da Lei de Bases do Sistema Educativo, foi publicado o Decreto-Lei n.º 35/90, de 25 de
janeiro com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 55/2009, de 2 de março que define o regime de
gratuitidade da escolaridade obrigatória. Este diploma prevê que os alunos com necessidades educativas
específicas, resultantes de deficiências físicas ou mentais, estejam sujeitos ao cumprimento da escolaridade
obrigatória, não podendo ser isentos da sua frequência, que se processa em estabelecimentos regulares de
ensino ou instituições específicas de educação especial, quando comprovadamente o seu tipo e grau de
deficiência o exijam.
Este Decreto-Lei alarga também aos estabelecimentos dependentes de instituições públicas, privadas ou
cooperativas de educação especial o princípio da gratuitidade consagrada para o ensino básico e reforça em
todo o sistema o apoio social e escolar aos alunos e às famílias e o apoio médico e alimentar, de modo a
promover as condições físicas e ambientais mais favoráveis ao pleno desenvolvimento dos educandos.
A Lei n.º 46/2006, de 28 de agosto regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 34/2007, de 15 de fevereiro, tem por
objeto prevenir e proibir a discriminação direta ou indireta no exercício de direitos por motivos baseados na
deficiência ou risco agravado de saúde, definindo o elenco de práticas discriminatórias que, a verificarem-se,
constituem contraordenações puníveis com coimas adequadas e sanções correspondentes.
No âmbito do ensino básico, foi aprovado o Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de janeiro (“Aprova a
reorganização curricular do ensino básico“), retificado pela Declaração de Retificação n.º 4-A/2001, com as
alterações introduzidas pelos Decretos-Lei n.os
209/2002, de 17 de outubro (“Altera o artigo 13.º e os anexos I,
II e III do Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro, que estabelece os princípios orientadores da organização e
da gestão curricular do ensino básico, bem como da avaliação das aprendizagens e do processo de
desenvolvimento do currículo nacional”), 396/2007, de 31 de dezembro (“Estabelece o regime jurídico do
Sistema Nacional de Qualificações e define as estruturas que regulam o seu funcionamento”), 3/2008, de 7 de
janeiro (“Define os apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e
secundário dos sectores público, particular e cooperativo”, e 18/2011, de 2 de fevereiro (“Permite a
organização dos tempos letivos dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico em períodos de 45 ou 90 minutos e
elimina a área de projeto do elenco das áreas curriculares não disciplinares, procedendo à quarta alteração ao
Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro”), Resolução da Assembleia da República n.º 60/2011, de 23 de
março (“Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 18/2011, de 2 de Fevereiro, que permite a organização dos
tempos letivos dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico em períodos de 45 ou 90 minutos e elimina a área de
projeto do elenco das áreas curriculares não disciplinares, procedendo à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º
6/2001, de 18 de Janeiro”), Decreto-Lei n.º 94/2011, de 3 de agosto (“Revê a organização curricular dos 2.º e
3.º ciclos do ensino básico, procedendo à quarta alteração do Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de janeiro”) e
Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho (“Estabelece os princípios orientadores da organização e da gestão
dos currículos, da avaliação dos conhecimentos e capacidades a adquirir e a desenvolver pelos alunos dos
ensinos básico e secundário”), que aprovou a organização curricular do ensino básico, estabelecendo os
princípios orientadores da organização e da gestão curricular desse nível de ensino, bem como da avaliação
das aprendizagens e do processo de desenvolvimento do currículo nacional. O seu artigo 10º prevê que aos
alunos com necessidades educativas especiais de carácter permanente é oferecida a modalidade de
educação especial.
Importa também referir o Decreto-Lei n.º 20/2006, de 31 de janeiro com as alterações introduzidas pelos
Decretos-Lei n.os
35/2007, de 15 de fevereiro (“Estabelece o regime jurídico de vinculação do pessoal docente
da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário para o exercício transitório de funções docentes
ou de formação em áreas técnicas específicas, no âmbito dos estabelecimentos públicos de educação e
ensino não superior”), 51/2009, de 27 de fevereiro (“Procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 20/2006,
de 31 de Janeiro, que reviu o regime jurídico do concurso para seleção e recrutamento do pessoal docente da
educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como da educação especial, e que revogou o
Decreto-Lei n.º 35/2003, de 27 de Fevereiro”), 270/2009, de 30 de setembro, 41/2012, de 21 de fevereiro
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(“Procede à 11.ª alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e Professores dos Ensinos
Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril”), e 132/2012, de 27 de junho
(“Estabelece o novo regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos básico e
secundário e de formadores e técnicos especializados”), que cria o Quadro de Educação especial e define as
normas para a colocação de professores de educação especial.
No âmbito da promoção de medidas de combate à exclusão social e de igualdade de oportunidades no
acesso e sucesso escolar, assume especial relevância não só assegurar a continuidade como reforçar o apoio
socioeducativo, da responsabilidade do Ministério da Educação, aos alunos dos ensinos básico e secundário.
Neste sentido foi aprovado o Despacho n.º 18987/2009/, de 6 de agosto que regula as condições de
aplicação das medidas de ação social escolar.
Tendo em vista a melhoria das condições educativas propiciadas às crianças e jovens com acentuadas
necessidades educativas, foi aprovada a Portaria n.º 1102/97, de 3 de novembro, com as alterações
introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 281/2009, de 6 de outubro, que garante as condições de educação para os
alunos que frequentam as associações e cooperativas de ensino especial e a Portaria n.º 1103/97, de 3 de
novembro, que garante as condições de educação especial em estabelecimentos de ensino particular, bem
como fixa o regime de apoio financeiro aos alunos que frequentam escolas de educação especial integrados
no regime de gratuitidade de ensino.
No que respeita aos apoios educativos, de acordo com os princípios consagrados na Lei de Bases do
Sistema Educativo, estes abrangem todo o sistema de educação e ensino não superior e desenvolvem-se com
base na articulação dos recursos e das atividades de apoio especializado existentes nas escolas, com vista à
promoção de uma escola inclusiva (Despacho Conjunto n.º 105/97, de 30 de maio, alterado e republicado pelo
Despacho n.º 10 856/2005, 13 de maio de 2005, o qual foi também posteriormente alterado pelo Decreto-Lei
n.º 20/2006, de 31 de janeiro, no que se refere à seleção e recrutamento de pessoal docente para a educação
especial).
Refira-se que sobre a mesma matéria, na X legislatura, foi apresentado o Projeto de Lei n.º 602/X (4.ª) pelo
Grupo Parlamentar (GP) do PCP que caducou em 14 de Outubro de 2009.
Já na XI Legislatura, duas iniciativas merecem também relevo: o Projeto de Lei n.º 160/XI, do GP do PCP
(“Regime Jurídico da Educação Especial”), rejeitado em votação na generalidade, a 8 de abril de 2010, e o
Projeto de Resolução n.º 565/XI do GP do CDS-PP, que “Recomenda ao Governo que clarifique e agilize o
processo de atribuição do Subsídio de Educação Especial”, caducado com o final da legislatura.
Enquadramento bibliográfico
Bibliografia específica
AGÊNCIA EUROPEIA PARA O DESENVOLVIMENTO EM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS -
Special needs education [Em linha]: country data 2010. Brussels: European Agency for Development in
Special Needs Education, 2010. [Consult. 21 dez. 2012]. Disponível em: WWW:
Resumo: Este documento foi produzido pela Agência Europeia para o Desenvolvimento em Necessidades
Educativas Especiais e apresenta dados estatísticos relativos aos alunos com necessidades educativas
especiais, nos países-membros da referida Agência e nos países observadores.
Os dados fornecidos pelos diversos países cobrem os seguintes items: número de alunos no ensino
obrigatório (incluindo os que têm necessidades educativas especiais); número de alunos no ensino obrigatório
com dificuldades educativas especiais; alunos com necessidades educativas especiais segregados em
escolas especiais; alunos com necessidades educativas especiais em turmas especiais segregadas nas
escolas regulares; alunos com necessidades educativas especiais em contextos inclusivos. O presente estudo
inclui ainda dados sobre ensino público e privado; escolaridade obrigatória/faixa etária e definição de
necessidades educativas especiais em cada país analisado.
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AGÊNCIA EUROPEIA PARA O DESENVOLVIMENTO EM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS -
Mapping the implementation of policy for inclusive education [Em linha]: an exploration of challenges
and opportunities for developing indicators. Brussels: European Agency for Development in Special Needs
Education, 2011. [Consult. 26 dez. 2012]. Disponível em:
WWW:
Resumo: Este relatório surge como resultado do projeto de mapeamento da implementação das políticas
para a educação inclusiva. O referido projeto envolveu mais de 60 peritos de 27 países europeus, assim como
representantes da Comissão Europeia, do Eurostat e da Eurydice, os quais contribuíram para os resultados
apresentados e tornaram possível realçar algumas mensagens chave, de forma a orientar o trabalho futuro a
desenvolver nesta área. Estes dados podem ser usados para apoiar iniciativas em curso nesta área.
CARVALHO, Francisco José Rodrigues de – Escola para todos?: a educação de crianças com
deficiência na perspetiva da ecologia humana. Lisboa: Secretariado Nacional para a Reabilitação e
Integração das Pessoas com Deficiência, 2007. 502 p. ISBN 978-989-8051-01-1 Cota 32.06 – 499/2007.
Resumo: Este trabalho é um estudo aprofundado sobre as complexas relações entre os três vértices
fundamentais de uma estratégia educativa relacionados com a problemática da deficiência – a educação
especial, a educação inclusiva e a ecologia humana.
O autor teve como objetivo conhecer o impacto dos fatores interferentes na Escola para todos, bem como a
natureza das interações dos profissionais, no que se refere às crianças com deficiência. A questão de partida
consistiu em saber se a escola atual é de facto uma escola para todos. Por outras palavras, tem mais sentido
as crianças com necessidades educativas especiais estarem submetidas a espaços, métodos e organizações
especialmente desenhadas para que possam atingir o potencial máximo ou, pelo contrário, o que mais
necessitam é de uma educação inclusiva? Será que o ambiente da educação especial é o mais adequado
para uma verdadeira educação para a cidadania?
A educação inclusiva é um processo em que se amplia a participação de todos os estudantes nos
estabelecimentos de ensino regular, procurando perceber e atender às necessidades educativas especiais de
todos, em salas de aulas comuns, num sistema regular de ensino, de forma a promover a aprendizagem e o
desenvolvimento pessoal de todos.
INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO INCLUSIVA. Org. David Rodrigues. Cruz Quebrada: Faculdade de
Motricidade Humana, 2006-2007. Vol. 1. 198 p. Cota: 32.06 – 652/2009 (1)
Resumo: Este livro reúne oito trabalhos (teses do Mestrado em Educação Especial da Faculdade de
Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa), que se referem a diversos aspetos da Educação
Inclusiva.
Ultimamente, tem-se verificado no campo da educação inclusiva um assinalável progresso na sua imagem
pública, surgindo comtemplada em textos legais e integrando numerosos planos educativos, a nível regional e
local.
A educação inclusiva tornou-se – pelo menos ao nível dos discursos - um objetivo educacional importante e
tem uma agenda claramente centrada na melhoria da Escola, que poderíamos chamar de tradicional ou
regular, em três aspetos fundamentais: desenvolver uma Escola que rejeite a exclusão; promover a educação
conjunta de alunos com condições de desenvolvimento muito diferentes e eliminar as barreiras à
aprendizagem.
MUSKENS, George, [et al.] - Inclusion and education in European countries [Em linha]: INTMEAS report for
contract – 2007-2094/001 TRA-TRSPO: final report. Lepelstraat : DOCA Bureaus, 2009. [Consult. 27 dez.
2012]. Disponível em:
WWW:
Resumo: Esta avaliação sobre inclusão e educação, da responsabilidade da Comissão Europeia (Direção-
Geral da Educação e Cultura), foi conduzida pelo Consórcio Europeu de Investigação “INTMEAS” em dez
Estados-membros da União Europeia: França, Alemanha, Hungria, Itália, Holanda, Polónia, Eslovénia,
Espanha, Suécia e Reino Unido. Tendo em consideração a análise preliminar das fontes e prioridades
nacionais, foram identificadas cinco questões chave:
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– Medidas para reduzir o abandono escolar precoce;
– Medidas educativas prioritárias em relação a alunos e grupos desfavorecidos;
– Medidas de educação inclusiva relativamente a alunos com necessidades especiais;
– Medidas de segurança relativas à redução do bullying;
– Medidas de apoio aos professores.
A análise comparativa focou-se nestas cinco questões.
OCDE - Students with disabilities, learning difficulties and disadvantages: policies, statistics and
indicators: 2007. Paris: OECD, 2007. 234 p. Cota: 32.06 – 453/2008.
Resumo: Este livro fornece um conjunto de indicadores e dados estatísticos comparáveis, a nível
internacional, sobre as condições de educação dos alunos portadores de deficiência, com dificuldades de
aprendizagem e desfavorecidos: onde são educados (escolas especiais, turmas especiais ou turmas
regulares), e quais os níveis de educação que frequentam (pré-primária, primária, secundária). Também inclui
informação sobre condições físicas e sobre ratios professor/aluno. Aborda as implicações políticas
relativamente à educação especial.
SEMINÁRIO "DE OLHOS POSTOS NA EDUCAÇÃO ESPECIAL", Lisboa, 2006. [Org.] Conselho Nacional
de Educação. Lisboa: Conselho Nacional de Educação, 2008. 105 p. (Seminários e Colóquios). Cota: 32.06 –
102/2009.
A publicação citada contém as intervenções proferidas no seminário “De olhos postos na educação
especial”, em que participaram, o Conselho Nacional de Educação e a Associação de Cegos e Amblíopes de
Portugal (ACAPO), técnicos e especialistas do Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das
Pessoas com Deficiência e da DGIC, formadores de professores de educação especial, professores de apoio
educativo e do ensino regular, alunos com necessidades educativas especiais, etc. São os relatos dos seus
testemunhos e o debate que se lhes seguiu que constituem o essencial deste livro.
Enquadramento do tema no plano da União Europeia
Nos termos do artigo 10.º do TFUE a União, na definição e execução das suas políticas e ações tem por
objetivo combater, entre outras formas de procedimento discriminatório, a discriminação em razão da
deficiência, podendo, nos termos do artigo 19.º, tomar as medidas necessárias para a sua prossecução, bem
como adotar os princípios de base das medidas de incentivo da União para apoiar as ações dos Estados-
membros neste domínio.
Por seu lado, o artigo 21.º da Carta dos Direitos Fundamentais da UE proíbe qualquer discriminação em
razão de deficiência, estabelecendo o artigo 26.º que “A União reconhece e respeita o direito das pessoas com
deficiência a beneficiarem de medidas destinadas a assegurar a sua autonomia, a sua integração social e
profissional e a sua participação na vida da comunidade”.
Tendo em conta o objeto da presente iniciativa legislativa refira-se que, competindo aos Estados-membros
a principal responsabilidade pelas políticas de igualdade de oportunidades para pessoas deficientes e, em
matéria de educação, a responsabilidade pelo conteúdo do ensino e pela organização do sistema educativo,
foram desenvolvidas a nível da União um conjunto de iniciativas destinadas a apoiar as ações nacionais neste
domínio e a desenvolver medidas complementares à escala europeia e de intercâmbio de experiências e de
boas-práticas.
Neste contexto, e no que refere especificamente aos princípios orientadores comuns e medidas de apoio à
política de educação respeitante a alunos com necessidades especiais de ensino cumpre salientar o seguinte:
A Resolução7 do Conselho, de 31 de maio de 1990, refere o acordo dos Estados-membros quanto à
intensificação dos esforços, no âmbito das respetivas políticas de educação, no sentido do incentivo à
integração dos alunos deficientes no sistema de ensino regular e prevê um conjunto de condições e fatores a
7Resolução relativa à integração das crianças e dos jovens deficientes no sistema de ensino regular.
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tomar em conta a diversos níveis, com vista a proporcionar a melhor qualidade de ensino possível aos alunos
deficientes;
A Resolução do Conselho, de 5 de maio de 2003, relativa à igualdade de oportunidades em matéria de
educação e formação de alunos e estudantes com deficiência, tendo em conta a necessidade de adoção de
novas medidas para melhorar o acesso das pessoas com deficiência à educação e à formação, convida os
Estados-membros e a Comissão a atuar no sentido de “favorecerem e apoiarem a plena integração das
crianças e dos jovens com necessidades específicas na sociedade através da sua educação e formação
adequadas e da sua inserção num sistema escolar [. . .] adaptado às suas necessidades”, promoverem o
acesso das pessoas com deficiência às novas tecnologias, nomeadamente nos domínios multimédia, da
internet e da aprendizagem eletrónica, reforçarem o apoio em serviços e assistência técnica aos alunos com
necessidades especiais de educação, melhorarem a formação de professores nas áreas em que se fazem
sentir necessidades especiais, promoverem a cooperação europeia entre os profissionais desta área e
incrementarem o intercâmbio de informações e experiências nestas matérias;
A Resolução8 do Parlamento Europeu, de 30 de novembro de 2006, sobre a situação das pessoas com
deficiência na União Europeia alargada, na sequência da posição adotada em resoluções anteriores
relativamente ao objetivo e forma de integração de crianças com deficiência nos sistemas gerais de educação
apela, entre outros aspetos, à promoção da “integração precoce, sempre que possível, das pessoas com
deficiência nos sistemas oficiais de ensino, apesar de reconhecer que em certos casos é indispensável um
ensino especializado, além do direito dos pais de escolherem onde desejam escolarizar os seus filhos”, bem
como do acesso das pessoas com deficiência a todos os níveis de educação e formação e às novas
tecnologias;
No contexto do “Programa de Educação e Formação 2010”, o ensino especial integra o conjunto das
matérias abrangidas no quadro da cooperação entre os Estados-membros e a Comissão, com vista à
conceção e implementação das reformas nacionais dos sistemas de educação. Na Comunicação
(COM/2008/865) relativa ao Quadro estratégico atualizado para a cooperação europeia no domínio da
educação e da formação até 2020, a Comissão inclui no conjunto das prioridades imediatas relativamente aos
alunos com necessidades especiais o incentivo à aprendizagem personalizada, através de um apoio oportuno
e de serviços coordenados, a integração desses serviços no sistema de ensino oficial e a criação de vias de
acesso à educação e à formação complementares;
A União Europeia ratificou, na sequência da aprovação por Decisão do Conselho de 26 de Novembro de
2009, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas Deficientes, que pretende “definir em
detalhe os direitos das pessoas deficientes e estabelecer um código de implementação”. A Convenção
consigna o direito das pessoas com deficiência à educação, proibindo a exclusão do sistema de ensino em
razão da deficiência, e a efetivação desse direito através de um sistema de educação inclusiva a todos os
níveis, estabelecendo para o efeito um conjunto de princípios orientadores de ação para o exercício deste
direito (artigo 24.º).
Em 15 de novembro de 2010 foi adotada a nova Estratégia da União Europeia para a Deficiência 2010-
20209, instrumento primordial de política da UE para implementação da Convenção ONU atrás referida, que
configura um quadro de ação a nível europeu para, em conjugação com as ações nacionais, promover a
inclusão ativa e a plena participação das pessoas com deficiência na sociedade10
. O objetivo da igualdade de
acesso destas pessoas a um ensino de qualidade e à aprendizagem ao longo da vida está contemplado no
âmbito deste quadro de ação. Saliente-se que na Comunicação relativa a esta estratégia, a Comissão destaca
o facto de na União Europeia, na faixa etária entre os 16 e os 19 anos, a taxa de não participação na
educação ser de 37% para as pessoas com graves deficiências e de 25% para as pessoas com menores
deficiências, em comparação com 17% para as pessoas que não têm qualquer deficiência.11
8 Resolução de 4 de Abril de 2001 “Rumo a uma Europa sem barreiras para as pessoas com deficiência”
9 Sobre a anterior estratégia neste domínio em vigor até 2010 ver a Comunicação da Comissão, de 30 de outubro de 2003, “Igualdade de
oportunidades para as pessoas com deficiência: Plano de Ação Europeu” (COM/2003/650). 10
A ver com interesse a Resolução do Conselho sobre um novo quadro europeu para a deficiência e o Código de Conduta entre o Conselho, os Estados-membros e a Comissão que estabelece as modalidades internas para a aplicação pela União Europeia e a representação da União Europeia no que diz respeito à Convenção das Nações Unidas relativa aos Direitos das Pessoas com Deficiência. 11
Informação detalhada disponível no endereço http://ec.europa.eu/social/main.jsp?langId=en&catId=89&newsId=933&furtherNews=yes
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No que respeita a área de intervenção relativa à educação e formação, estabelece-se nomeadamente
que “a ação da UE apoiará os esforços nacionais empreendidos no quadro da iniciativa Educação e Formação
2020, o quadro estratégico para a cooperação europeia no domínio da educação e formação, e que visem:
eliminar as barreiras jurídicas e organizacionais que se colocam às pessoas com deficiência no acesso aos
sistemas gerais de ensino e de aprendizagem ao longo da vida; proporcionar apoios atempados ao ensino
inclusivo e à aprendizagem personalizada e a identificação precoce de necessidades especiais; ministrar
formação e apoios adequados aos profissionais que trabalham em todos os níveis de ensino e elaborar
relatórios sobre taxas de participação e resultados obtidos”.
Na Resolução de 25 de Outubro de 2011 intitulada “Mobilidade e integração de pessoas com deficiência
e a Estratégia Europeia para a Deficiência 2010-2020”, o Parlamento Europeu, entre outros aspetos, “entende
que os atuais sistemas de educação e formação não são suficientes para impedir que exista um elevado nível
de abandono escolar precoce por parte de pessoas com deficiência sem políticas públicas adicionais que
ofereçam apoio específico à aprendizagem”, confirma que deverá ser colocada uma ênfase especial na
educação inclusiva, e salienta que todas as crianças, incluindo as portadoras de deficiência, precisam de ver
garantido o direito a um acesso universal a todos os sectores e níveis de educação em todas as instituições,
exortando os Estados-membros a adotarem um conjunto de medidas propostas para resolução das situações
que constituem obstáculos à plena integração das pessoas deficientes.12
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha e França.
Espanha
A Constituição Espanhola de 1978, no seu artigo 49.º, responsabiliza os poderes públicos pela
concretização de uma política de prevenção, tratamento, reabilitação e integração em favor dos deficientes
físicos, sensoriais e psíquicos.
A Ley 13/1982, de 7 de abril, relativa à integração social dos deficientes, desenvolve o preceito
constitucional e estabelece os princípios pelos quais se devem reger as administrações públicas, em todos os
níveis e áreas, em relação às pessoas com deficiência.
Em aplicação e desenvolvimento destes princípios ao âmbito educativo, o Real Decreto 334/1985, de 6 de
marzo, de ordenação da educação especial, estabeleceu um conjunto de medidas, tanto de ordenação e
planificação, tendentes à progressiva transformação do sistema educativo, com o objetivo de garantir que os
alunos com necessidades educativas especiais tenham condições para alcançar os objetivos educativos
estabelecidos com carácter geral para todos os alunos e conseguir uma maior qualidade de vida na vertente
pessoal, social e laboral.
Com respeito à educação dos alunos com necessidades especiais a Ley Orgánica 1/1990, de 3 de octubre
(Ley Orgánica de Ordenación General del Sistema Educativo), consagra os princípios introduzidos pela Ley
13/1982, de 7 de abril e pelo Real Decreto 334/1985, de 6 de marzo, e determina que o sistema educativo
deverá dispor dos recursos necessários para que os alunos com necessidades educativas especiais,
temporárias ou permanentes, possam alcançar os objetivos definidos para a generalidade dos alunos. O
Capítulo V, artigo 36.º, estabelece o princípio da normalização e da integração no que diz respeito à
escolarização dos alunos com necessidades educativas especiais.
O Real Decreto 696/1995, de 28 de abril, vem regular os aspetos relativos à ordenação, à planificação dos
recursos e à organização das soluções educativas para com os alunos com necessidades educativas
especiais, temporárias ou permanentes, necessidades que podem derivar de condições especiais atribuídas a
alunos sobredotados ou com determinadas incapacidades sensoriais, motoras e psíquicas.
A Resolución de 20 de mayo de 1999 propõe um modelo de programa de formação para a transição para a
vida adulta, com o fim de orientar a resposta educativa dirigida aos alunos com necessidades educativas
12
Ver em especial os pontos 58, 59 e 60 da Resolução.
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especiais, escolarizados em Centros de Educação Especial. A Orden de 22 de marzo de 1999 vem regular os
programas de formação, para a transição para a vida adulta, dos alunos com necessidades educativas
especiais, escolarizados nos Centros de Educação Especial.
França
A loi du 11 février 2005, relativa à igualdade de direitos e de oportunidades e sobre a cidadania das
pessoas deficientes, reforça as ações em favor da escolarização dos alunos com necessidades especiais,
afirmando o direito a um percurso escolar contínuo e adaptado, e a uma escolarização em meio escolar
regular, perto do domicílio. Os pais são associados à decisão de orientação do seu filho e à definição do seu
projeto e percurso escolar.
Especialmente relevante neste diploma é o Título IV, Capítulo I, sobre o acesso à escolaridade e ao ensino.
Na organização da escolaridade dos jovens com necessidades especiais, devemos destacar alguns
princípios básicos que caracterizam o sistema educativo francês:
a) O da formação escolar adaptada: nesta sequência devemos destacar o Décret n.º 2005-1752 du 30
décembre 2005, relativo aos percursos de formação dos alunos que apresentam uma deficiência, o Décret
2006-509 du 3 mai 2006, relativo ao percurso escolar dos alunos com deficiências auditivas, e os artigos L112-
1 e seguintes do Código da Educação;
b) O da escolaridade em meio escolar regular: aqui ganham relevo os artigos L351-1 a L351-3 e L352-1 do
Código da Educação;
c) O da escolaridade em estabelecimentos especializados: estas instituições acolhem jovens de menos de
20 anos, que apresentem uma deficiência que possa afetar a sua escolarização em meio escolar normal,
oferecendo uma educação especializada. Neste contexto, podemos distinguir diferentes tipos de
estabelecimentos: os “instituts médico-éducatifs” (artigo L242-12 do Code de l'action sociale et des familles)
que acolhem alunos com deficiência mental, os “instituts thérapeutiques éducatifs et pédagogiques” (artigos
D312-59-1 e seguintes do Code de l'action sociale et des familles) que acolhem alunos que apresentem
problemas de conduta e comportamento que possam perturbar gravemente a sua socialização e o acesso à
aprendizagem, os “établissements pour polyhandicapés” (artigo D312-84 do Code de l'action sociale et des
familles) para jovens e adolescentes que apresentem deficiências mentais ou motoras graves e os “instituts
d'éducation sensorielle” (artigo D312-112 do Code de l'action sociale et des familles) que acolhem os jovens e
adolescentes com deficiências auditivas e visuais. Nos estabelecimentos especializados, devemos ainda
referir os de “caractère sanitaire” (artigo R3112-1 do Code de la santé publique), que acolhem jovens e
adolescentes com alguma doença que lhes afete a escolarização em meio educativo normal.
Outros países
Organizações internacionais
A Declaração de Salamanca (1994), assinada por representantes de 92 países (incluindo Portugal) e por
25 organizações internacionais, compromete-se a pôr em prática o princípio fundamental das escolas
inclusivas. Este princípio consiste em todos os alunos aprenderem juntos, sempre que possível,
independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentem. Estas escolas devem reconhecer e
satisfazer as necessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos vários estilos e ritmos de
aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de currículos adequados, de
uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de utilização de recursos e de uma cooperação
com as respetivas comunidades. É preciso, portanto, um conjunto de apoios e de serviços para satisfazer o
conjunto de necessidades especiais dentro da escola.
A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006), aprovada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas, em 6 de Dezembro de 2006 prevê que os Estados assegurarão:
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“(a) Que as pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema geral de educação em razão de sua
deficiência, e que crianças com deficiência não sejam excluídas de educação primária e secundária gratuita e
compulsória em razão de sua deficiência;
(b) Que as pessoas com deficiência tenham acesso à educação inclusiva, de qualidade e gratuita, primária
e secundária, em iguais bases com os outros, na comunidade onde vive.“
X. Iniciativas legislativas pendentes sobre a mesma matéria
Da pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (PLC), verificou-se que
não se encontram pendentes quaisquer iniciativas legislativas ou petições sobre esta matéria.
XI. Consultas e contributos
Sugere‐se a consulta das seguintes entidades:
Associações de estudantes do ensino básico e secundário
CONFAP – Confederação Nacional das Associações de Pais
CNIPE – Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação
Sindicatos
o FENPROF – Federação Nacional dos Professores
o FNE – Federação Nacional dos Sindicatos da Educação
o FENEI – Federação Nacional do Ensino e Investigação
FEPECI – Federação Portuguesa dos Profissionais de Educação, Ensino, Cultura e Investigação
Associação Nacional de Professores
Associação das Escolas Superiores de Educação – ARIPESE
Associações de Professores
Escolas do Ensino Básico e do Secundário
Conselho Nacional de Educação
Ministros da Educação e Ciência, da Economia e do Emprego e da Solidariedade e Segurança
Social
Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência
Associação de Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO)
Plataforma Nacional de Associações de Estudantes do Ensino Básico e Secundário
Associação Nacional de Municípios Portugueses
Conselho de Escolas
AEEP - Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo
PETI/ PIEF – Programa Integrado Educação Formação
APED – Associação de Professores e Educadores em Defesa do Ensino
MUP – Movimento para a Mobilização e Unidade dos Professores
MEP – Movimento Escola Pública
ANDE – Associação Nacional de Dirigentes Escolares
ANDEE – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial
Comissão Nacional Proteção de Crianças e Jovens
Instituto de Apoio à Criança
Associação Portuguesa de Apoio à Vítima;
Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária
Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial
Entidades de Educação Especial
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CRUP
CCISP
Associações académicas
Para o efeito a Comissão poderá realizar audições parlamentares e bem assim solicitar parecer e
contributos online a todosos interessados, através da aplicação informática disponível para o efeito.
XII. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Da aprovação e da consequente aplicação do projeto de lei em causa, que estabelece o regime jurídico da
educação especial, parecem decorrer encargos, designadamente os eventualmente resultantes das
necessárias adaptações de recursos em termos de instalações, materiais e equipamentos para utilização
pelas crianças e jovens com necessidades educativas especiais, bem como de recursos humanos adicionais,
assim como os decorrentes da criação do Instituto Nacional para a Educação Inclusiva, da rede nacional de
Centros de Recursos para a Inclusão e dos Gabinetes de Apoio à Inclusão.
Assim, conforme referido no ponto II., por forma a acautelar o princípio da “lei travão”, parece ser adequado
fazer depender a entrada em vigor da presente iniciativa da aprovação do Orçamento do Estado subsequente
à sua aprovação.
———
PROPOSTA DE LEI N.º 338/XII (2.ª)
CRIA O REGIME DE VINCULAÇÃO DOS PROFESSORES CONTRATADOS E ESTABELECE O
CONCURSO DE INGRESSO DE PROFESSORES PARA NECESSIDADES PERMANENTES DO SISTEMA
EDUCATIVO
Exposição de motivos
Os sucessivos governos têm recorrido extensivamente à contratação de professores a prazo para suprir
necessidades permanentes do sistema de ensino. A tendência tem sido imparável. Segundo dados do próprio
Ministério da Educação, no ano letivo 1999/2000 foram contratados 26 967 professores, de um total de 144
560; em 2004/2005 o número de professores contratados passou para 29 466 de um total de 151 688.
Desde então observa-se uma aceleração do ritmo de aposentação de professores do quadro sem qualquer
regime de substituição, aumentando o número de professores precários com mais de quatro anos de serviço
para 37 565 no presente, dos quais 11 526 lecionam há mais de 10 anos.
Assim, de ano para ano, os concursos de colocação de docentes destinados a suprir necessidades
transitórias do sistema educativo público vão ilegitimamente sendo usados para responder a necessidades
permanentes do sistema – e assim, o número de docentes contratados a prazo vai crescendo
exponencialmente de ano para ano. Estamos já perante um violação grosseira das normas e diretivas
europeias que, na Diretiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, relativo a contratos de trabalho a
termo, define no artigo 5.º as disposições para evitar os abusos, nomeadamente um número máximo de
contratos sucessivos para funções permanentes.
O anterior governo reconheceu publicamente a insustentabilidade e a injustiça desta situação. Foi esse,
aliás, um dos principais compromissos políticos que a anterior Ministra da Educação assumiu: realizar em
2011 um concurso de colocação de professores para ingresso na carreira e para mobilidade. Mas, no final de
2010, o governo voltou com a sua palavra atrás, e deu o dito por não dito.
Por sua vez, a expectativa criada em junho de 2012 pela promessa do atual Ministro da Educação e
Ciência de retirar da precariedade professores com mais de 10 anos de serviço permanente, num total em
2012 de perto de 12 mil professores, resultou na abertura de um concurso extraordinário para apenas
seiscentas vagas. Da aparente justiça e mais elementar racionalidade de gestão da Escola Pública passámos
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portanto ao ridículo e insulto à inteligência de milhares de professores que se vêm assim mais uma vez de fora
de qualquer via de dignificação profissional.
Ora, é sabido que os docentes contratados desenvolvem as mesmas atividades que os professores
integrados nos quadros e estão sujeitos às mesmas exigências e ao mesmo rigor profissional. De facto, a
única e enorme diferença dos professores contratados em relação aos outros professores é a de que os
contratados estão sujeitos a uma permanente precariedade, nunca sabendo exatamente onde irão – e se irão
– lecionar no ano letivo seguinte, e o que será feito dos projetos em que se envolveram num determinado
estabelecimento escolar. É óbvio que esta instabilidade laboral é não só injusta, como prejudicial para o
desempenho das suas funções. No exato momento em que começam a conhecer e a desenvolver projetos no
âmbito da sua escola, em contacto com uma determinada comunidade educativa, logo são transferidos para
outra escola, onde têm que recomeçar tudo de novo. Por outro lado, é também claro que o sistema educativo
necessita destes professores – as escolas onde estes docentes lecionam precisam e contam com o seu
trabalho e o seu empenhamento.
Contudo, a situação permanece. É inaceitável e insustentável manter a precariedade laboral de milhares de
docentes que respondem hoje a necessidades permanentes do sistema educativo público. São professores
que desde há anos vêm negados o direito a uma carreira e à estabilidade profissional por que pugnam.
O Bloco de Esquerda vem apresentar este projeto de lei precisamente no sentido de repor a justiça e a
estabilidade no sistema educativo. Entendemos ser fundamental proceder à vinculação dos professores
contratados já em 2013.
Para tal, estabelecemos um processo de vinculação relativo aos professores com três ou mais anos
de serviço - ou seja, para os quais a legislação do trabalho estabelece a obrigatoriedade de contrato por
tempo indeterminado. Para a vinculação destes professores deve ser realizado um concurso de colocação,
mediante a criação de vagas que correspondem a necessidades permanentes do sistema educativo.
Assim, propomos que todas as vagas que tenham sido colocadas a concurso de preenchimento de
necessidades transitórias por três anos sucessivos ou que, durante esse mesmo período temporal, tenham
sido preenchidas mediante recurso a renovações de contratos a termo certo de docentes, sejam tornadas
lugares de quadro nas escolas ou agrupamentos de escolas.
Para a entrada em vigor deste projeto de lei não colhe o argumento de não existir expressão orçamental,
devendo o necessário aprovisionamento orçamental ser estabelecido ainda em 2013, garantindo a sua correta
execução financeira e organizativa.
Por fim, propomos que as vagas que forem apuradas como necessidades permanentes e que não sejam
preenchidas pelo processo de vinculação de professores contratados proposto no presente diploma, sejam
preenchidas mediante a realização de um concurso para ingresso nos quadros de escola e de
agrupamento de escolas.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece os termos do regime de vinculação de docentes contratados e o concurso de
ingresso de docentes nos quadros das escolas e dos agrupamentos de escolas.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
O regime de vinculação dos docentes contratados e o concurso de ingresso previsto na presente lei aplica-
se a educadores e professores do ensino pré-escolar, básico e ensino secundário.
Artigo 3.º
Vinculação dos professores contratados
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1 – Durante o ano de 2013, o Ministério da Educação e Ciência procede à abertura de um procedimento
concursal, a ter efeitos no início do ano letivo 2013/2014, com vista à vinculação dos docentes contratados a
termo certo nos quadros de escola e de agrupamento e à sua integração na carreira docente.
2 – O regime de vinculação aplica-se aos docentes que cumpram cumulativamente as seguintes condições:
a) Terem completado três ou mais anos de serviço no exercício de funções docentes no sistema público
educativo;
b) Terem lecionado em estabelecimento de ensino público pré-escolar, básico ou secundário num dos dois
últimos anos letivos.
Artigo 4.º
Apuramento de vagas de quadro relativas a necessidades permanentes das escolas ou
agrupamentos de escolas
São colocadas a concurso, por corresponderem a necessidades permanentes do sistema educativo, todas
as vagas relativas a horários completos que nos últimos três anos consecutivos tenham sido colocadas a
concurso de preenchimento de necessidades transitórias, ou que, durante esse mesmo período temporal,
tenham sido preenchidas mediante renovações de contratos a termo certo de docentes.
Artigo 5.º
Ingresso excecional na carreira docente
Em setembro de 2013, o ingresso na carreira docente dos docentes contratados, que resulta do concurso
definido na presente lei, far-se-á no escalão da carreira dos docentes da educação pré-escolar e ensinos
básico e secundário, correspondente ao índice remuneratório calculado segundo a contagem do tempo de
serviço previsto no artigo 6.º da presente lei.
Artigo 6.º
Contagem do tempo de serviço
1 – Em setembro de 2013, os docentes que integraram os quadros de escola e que ingressaram na carreira
docente mediante o procedimento concursal previsto na presente lei são classificados tendo em conta os anos
de serviço prestados no sistema educativo.
2 – O tempo de serviço prestado na situação de docente contratado, para efeitos de integração na carreira,
é contabilizado até 31 de agosto de 2013.
Artigo 7.º
Concurso para ingresso nos quadros das escolas e agrupamentos de escolas
As vagas que, de acordo com o disposto no artigo 4.º da presente lei, foram apuradas como necessidades
permanentes das escolas e que não forem preenchidas pelo procedimento concursal de vinculação dos
professores contratados previsto no artigo 3.º da presente lei, serão objeto de concurso de colocação e
ingresso nos quadros de escola e agrupamentos de escolas.
Artigo 8.º
Produção de efeitos
O Governo aprova, em 30 dias, mediante decreto-lei, a regulamentação e as normas necessárias à boa
execução da presente lei, relativamente à produção dos seus efeitos no plano financeiro e organizativo.
Artigo 9.º
Entrada em vigor
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A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Assembleia da República, 22 de janeiro de 2013.
As Deputadas e Deputados do Bloco de Esquerda: Luís Fazenda — Pedro Filipe Soares — Cecília Honório
— Ana Drago — Catarina Martins — Mariana Aiveca — Helena Pinto — João Semedo.
———
PROPOSTA DE LEI N.º 115/XII (2.ª)
(PROCEDE À PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI DE ORGANIZAÇÃO, COMPETÊNCIA E
FUNCIONAMENTO DOS JULGADOS DE PAZ, APROVADA PELA LEI N.º 78/2011, DE 13 DE JULHO,
APERFEIÇOANDO ALGUNS ASPETOS DE ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DOS JULGADOS DE
PAZ)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica
elaborada pelos serviços de apoio
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – CONSIDERANDOS
1.1 – Nota introdutória
O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República, em 30 de novembro de 2012, a
Proposta de Lei n.º 115/XII (2.ª) (GOV) que Procede à Primeira alteração à Lei de Organização, Competência
e Funcionamento dos Julgados de Paz, aprovada pela Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, visando aperfeiçoar
alguns aspetos de organização e funcionamento dos julgados de paz.
Esta iniciativa legislativa cumpre os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º e no n.º 1 do artigo
124.º do Regimento da Assembleia da República, tendo sido admitida em 5 de dezembro de 2012.
Por despacho de Sua Excelência a Presidente da Assembleia da República, a iniciativa em apreço baixou à
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para emissão de parecer.
1.2 – Objeto, conteúdo e motivação das iniciativas
Motivação
O Governo apresentou à Assembleia da República a presente iniciativa legislativa visando “aperfeiçoar
certos aspetos da organização, da competência e do funcionamento dos julgados de paz”.
Considera o Proponente que a presente alteração ao regime jurídico dos julgados de paz se justifica tendo
em consideração os elementos obtidos e as conclusões formuladas no estudo de avaliação efetuado pelo
Ministério da Justiça por ocasião da celebração dos dez anos de vigência da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
Salienta também o Governo, na exposição de motivos, que a proposta de Lei tem igualmente o propósito
de tornar definitivo “o projeto que ainda vem sendo tratado pela lei como projeto experimental”.
Regista-se ainda que a otimização do regime jurídico dos julgados de paz está inscrita entre as medidas
constantes do Programa de Assistência Financeira a Portugal [Memorando de Entendimento (MoU) para a
área da justiça].
Objeto
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Com o objetivo de aperfeiçoar o regime jurídico dos julgados de paz, propõe o Governo (i) alterar a
competência dos julgados, (ii) modificar as normas relativas à mediação, (iii) clarificar da existência ou não de
uma carreira dos juízes de paz, (iv)aperfeiçoar o regime do pagamento de custas e (v) alterar as regras
relativas à organização dos julgados de paz.
No que concerne às alterações propostas referentes à competência dos julgados de paz, a iniciativa sub
judice propõe introduzir cinco inovações:
1. Alargar a competência dos julgados de paz em razão do valor. A proposta abandona o critério do valor
da alçada do tribunal de 1.ª instância (€ 5000) fixando que os julgados de paz têm competência para questões
cujo valor não exceda os € 15 000;
2. Alterar a competência em razão da matéria prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º. Os julgados de
paz passam a ser competentes para apreciar, independentemente da qualidade da pessoa do demandante (as
pessoas coletivas passam a poder recorrer aos julgados de paz), ações que se destinem a efetivar o
cumprimento de obrigações, com exceção das ações “que tenham por objeto o cumprimento de obrigação
pecuniária e digam respeito a um contrato de adesão”;
3. Alterar as regras relativas à produção de prova pericial. O juiz de paz passa a analisar previamente a
pertinência da prova pericial requerida, remetendo para o tribunal de 1.ª instância os autos quando considere
necessária a produção de tal prova pericial. Finda a produção da prova pericial no tribunal de 1.ª instância, os
autos regressam ao julgado de paz para a prossecução do julgamento da causa (atualmente, requerida a
prova pericial cessa a competência do julgados de paz e os autos são remetidos ao tribunal competente).
4. Ampliar a competência dos julgados de paz quanto à apreciação e decisão de incidentes processuais
que não estejam expressamente vedados por outras disposições da Lei aos julgados de paz;
5. Introduzir a possibilidade de serem requeridas providências cautelares junto dos julgados de paz.
A presente proposta de lei pretende ainda introduzir modificações nas normas relativas à mediação, de
modo a conseguir um alinhamento das soluções jurídicas da Lei dos Julgados de Paz com as previstas na
proposta de Lei que altera o regime da mediação que o Governo apresentou à Assembleia da República em
30 de Novembro de 2011 (Proposta de Lei n.º 116/XII que estabelece os princípios gerais aplicáveis à
mediação realizada em Portugal, bem como os regimes jurídicos da mediação civil e comercial, dos
mediadores e da mediação pública), com o Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, e com a Lei n.º 9/2009, de
4 de março (alterada pela Lei n.º 41/2012, de 28 de agosto).
A iniciativa legislativa ora em análise altera igualmente o mandato dos juízes de paz. De acordo com o
Proponente, esta alteração pretende dissipar “algumas dúvidas quanto à existência ou não de uma carreira
dos juízes de paz”.
Para alcançar tal desiderato, o Governo altera o período pelo qual são providos os juízes de paz que passa
de 3 para 5 anos, referindo ainda que a renovação desse mandato só pode operar, de acordo com a
exposição de motivos, “regularmente, por uma vez, mediante parecer favorável do conselho de
acompanhamento dos julgados de paz e, de forma excecional, por novo período, devendo neste último caso o
conselho de acompanhamento ter em consideração um conjunto de critérios claramente definidos na lei”.
Aparentemente, essa distinção entre a primeira e as demais renovações, referida na exposição de motivos,
terá deixado de ter correspondência na letra da lei, uma vez que sobre a matéria rege o n.º 3 do artigo 25.º:
«Artigo 25.º
[…]
1 - Os juízes de paz são providos por período de cinco anos.
2 - […].
3 - No termo do período a que se refere o n.º 1, o conselho de acompanhamento pode, excecionalmente,
deliberar, de forma fundamentada, a sua renovação, devendo ter em conta a conveniência de serviço, a
avaliação do juiz de paz, o número de processos entrados e findos no julgado de paz em que o juiz exerce as
suas funções, bem como a apreciação global do serviço por este prestado no exercício das mesmas, devendo
tal procedimento ser adotado caso se justifique ulteriores renovações.»
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Por fim, o artigo 7.º da proposta de lei (“Norma transitória”) estatui que, “a duração e limitação de mandatos
dos juízes de paz prevista no artigo 25.º da Lei dos Julgados de Paz aplica-se aos mandatos dos juízes de paz
em exercício de funções a partir da primeira renovação de mandato subsequente à entrada em vigor da
presente lei”.
A presente iniciativa determina ainda, no regime atinente ao pagamento de custas, que há lugar ao
pagamento de custas nos casos em que os autos são remetidos aos tribunais judiciais de 1.ª instância ou
quando haja lugar à interposição de recurso da decisão. Estabelecendo igualmente que os montantes obtidos
a título de custas nos julgados de paz são repartidos pelo Ministério da Justiça e pelos municípios nos termos
a fixar em portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.
Relativamente à matéria de organização dos julgados de paz, o Governo pretende eliminar a possibilidade
de criar julgados de paz com base em freguesias, estipulando que “os julgados de paz podem ser concelhios
ou de agrupamento de concelhos”, pelo que passam a ter sede no concelho para que são exclusivamente
criados, ou, no caso de agrupamento de concelhos, no concelho que é para o efeito designado no diploma de
criação.
A iniciativa legislativa prevê ainda a possibilidade de criação de julgados de paz junto de entidades públicas
de reconhecido mérito, sendo o seu âmbito de jurisdição definido no respetivo ato constitutivo.
Importa, por fim, mencionar que a proposta atribui ao Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz
a competência para apreciar e decidir as suspeições e pedidos de escusa relativos aos juízes de paz. O
Governo propõe ainda alterar a composição do referido Conselho, que passa a incluir um representante dos
juízes de paz “designado pela associação profissional mais representativa dos juízes de paz”.
Salienta-se também que a proposta ora apresentada revoga os seguintes artigos da Lei dos Julgados de
Paz:
alínea g) do artigo 31.º;
artigo 35.º;
n.º 4 do artigo 50.º;
artigo 52.º;
n.os
2 a 6 do artigo 53.º;
n.º 1 do artigo 64.º;
artigo 66.º;
artigo 68.º.
PARTE II – OPINIÃO DO RELATOR
O Signatário do presente relatório exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a
Proposta de Lei em apreço nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – CONCLUSÕES
1. O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República, em 30 de Novembro de 2012,
a Proposta de Lei n.º 115/XII (2.ª) (GOV) que Procede à Primeira alteração à Lei de Organização,
Competência e Funcionamento dos Julgados de Paz, aprovada pela Lei n.º 78/2001, de 13 de julho,
aperfeiçoando alguns aspetos de organização e funcionamento dos julgados de paz.
2. A presente iniciativa legislativa pretende aperfeiçoar certos aspetos da organização, da competência e
do funcionamento dos julgados de paz, tendo em consideração os elementos obtidos e as conclusões
formuladas no estudo de avaliação efetuado pelo Ministério da Justiça por ocasião da celebração dos dez
anos de vigência da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
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3. O Governo propõe (i) alterar a competência dos julgados de paz, (ii) modificar as normas relativas à
mediação, (iii) clarificar a existência, ou não, de uma carreira dos juízes de paz, (iv)aperfeiçoar o regime do
pagamento de custas e (v) alterar as regras relativas à organização dos julgados de paz.
4. Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de
parecer que a Proposta de Lei n.º 115/XII (2.ª) reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser
discutida e votada em plenário.
PARTE IV – ANEXOS
Segue, em anexo ao presente relatório, a nota técnica elaborada pelos serviços da Assembleia nos termos
do artigo 131.º do Regimento.
Palácio de S. Bento, 22 de janeiro de 2013.
O Deputado Relator, Filipe Neto Brandão — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: O parecer foi aprovado sido aprovado por unanimidade, registando a ausência de Os Verdes.
Nota Técnica
Proposta de Lei n.º 115/XII (2.ª) (GOV)
Procede à primeira alteração à Lei de Organização, Competência e Funcionamento dos Julgados de
Paz, aprovada pela Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, aperfeiçoando alguns aspetos de organização e
funcionamento dos julgados de paz.
Data de admissão: 5 de dezembro de 2012
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: Fernando Ribeiro e Filomena Romano de Castro (DILP), Laura Costa (DAPLEN), Paula
Granada (BIB), Ana Vargas e João Amaral (DAC)
Data: 21 de dezembro de 2012.
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
Na sequência do disposto no memorando de entendimento sobre as condicionalidades de política
económica a que Portugal se encontra vinculado – que preconiza a otimização do “regime dos Julgados de
Paz para aumentar a sua capacidade de dar resposta a pequenos processos de cobranças judiciais” – e no
Programa do XIX Governo Constitucional – de acordo com o qual, “decorrida quase uma década desde a
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criação [dos Julgados de Paz], parece adequado fazer uma avaliação detalhada da sua eficácia prática, e
introduzir os ajustamentos que se mostrarem necessários à célere resolução da pequena conflitualidade” –, o
Governo apresenta à Assembleia da República a iniciativa legislativa sub judice, que pretende “aperfeiçoar
certos aspetos da organização, da competência e do funcionamento dos julgados de paz”, cujo regime jurídico
se encontra regulado na Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
Neste sentido, o proponente destaca cinco pontos em que altera, de forma sensível, as competências dos
julgados de paz:
Aumento da competência dos julgados de paz, em razão do valor, deixando o critério de ser o valor da
alçada do tribunal de 1.ª instância (€ 5000) para se fixar em € 15 000 (artigo 8.º);
Alteração da competência em razão da matéria, deixando a exclusão de competência dos julgados de
paz constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º de operar em função do caráter coletivo da pessoa do
demandante – passando as pessoas coletivas a poderem recorrer aos julgados de paz – para passar a
atender ao tipo contratual em causa, deixando de fora os contratos de adesão;
Produção da prova pericial sujeita à prévia consideração da pertinência feita pelo juiz de paz,
regressando, depois de produzida no tribunal de 1.ª instância, os autos ao julgado de paz para a prossecução
do julgamento (n.os
3 e 4 do artigo 59.º);
Atribuição ao juiz de paz de competência para apreciar e decidir sobre os incidentes processuais
suscitados pelas partes que não sejam expressamente excluídos pela lei dos julgados de paz (artigo 41.º);
Aditamento de um artigo 41.º-A, introduzindo a possibilidade de requerer junto do julgados de paz
providências cautelares.
De acordo com o Governo, aproveita-se ainda o momento para introduzir alterações às regras relativas à
mediação constantes da já referida Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, procurando conjugá-las com o regime
jurídico da mediação, cuja aprovação se propõe através da Proposta de Lei n.º 116/XII (2.ª) e para o qual a
iniciativa legislativa em apreço remete1.
A iniciativa esclarece ainda que há lugar ao pagamento de custas nos casos em que é interposto recurso
da decisão ou em que o processo é remetido para tribunal judicial (n.os
3 a 5 do artigo 5.º), elimina a
possibilidade de criar julgados de paz com base em freguesias (n.º 1 do artigo 4.º) – ainda que se passe a
prever a possibilidade de criação de julgados de paz junto de entidades públicas de reconhecido mérito (n.º 3
do referido artigo) – e altera-se, do mesmo passo, o período pelo qual são providos os juízes de paz (artigo
25.º), que passa de 3 a 5 anos.
Neste aspeto, importa salientar que, de acordo com a exposição de motivos “a renovação do mesmo [o
mandato do juiz de paz] só pode operar, regularmente, por uma vez, mediante parecer favorável do conselho
de acompanhamento dos julgados de paz e, de forma excecional, por novo período, devendo neste último
caso o conselho de acompanhamento ter em consideração um conjunto de critérios claramente definidos na
lei”.
Por outro lado, o artigo 7.º da proposta de lei (“Norma transitória”) pressupõe a existência de uma limitação
ao número de mandatos dos juízes de paz.
Todavia, o n.º 3 cujo aditamento se propõe ao artigo 25.º não impõe tal limite, referindo-se a “ulteriores
renovações”.
Importa, por fim, reter a atribuição ao Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz de competência
para apreciar e decidir sobre as suspeições e pedidos de escusa relativa aos juízes de paz (n.º 2 do artigo
21.º), a alteração da composição do referido Conselho, que passa a incluir um representante “designado pela
associação profissional mais representativa dos juízes de paz” [alínea f) do n.º 2 do artigo 65.º] e os limites ao
adiamento da audiência impostos pelos n.os
2 e 3 cujo aditamento se propõe ao artigo 57.º.
1 Uma vez que vários preceitos da iniciativa legislativa em análise remetem para a lei que, vindo a ser aprovada, regulará o regime jurídico
da mediação (Proposta de Lei n.º 116/XII), convirá ter em atenção, em caso de aprovação de ambas, que esta deverá ter um número anterior àquela. Será também relevante ter em atenção a data de entrada em vigor de ambas as iniciativas, ainda que se preveja que a iniciativa legislativa em análise entre em vigor 90 dias após a data da sua publicação e que a PPL 116/XII, a ser aprovada, venha a entrar em vigor 30 dias após a data da sua publicação.
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II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
A iniciativa legislativa sub judice é apresentada pelo Governo, no âmbito do seu poder de iniciativa,
nos termos e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º e na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da
Constituição da República e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
A presente iniciativa toma a forma de proposta de lei, em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo
119.º do RAR, tendo sido aprovada em Conselho de Ministros de 22 de novembro de 2012.
Respeitando os limites estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR, a iniciativa não infringe a
Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o sentido das modificações a introduzir
na ordem legislativa.
Cumprindo os requisitos formais consagrados nos n.os
1 e 2 do artigo 124.º do RAR, a proposta de lei
mostra-se redigida sob a forma de artigos (alguns dos quais divididos em números e alíneas), tem uma
designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma exposição de motivos.
O artigo 124.º do RAR dispõe ainda, no seu n.º 3, que “as propostas devem ser acompanhadas dos
estudos, documentos e pareceres que as tenham fundamentado”. Por sua vez, o Decreto-Lei n.º
274/2009, de 2 de outubro, que regula o procedimento de consulta de entidades, públicas e privadas, realizado
pelo Governo, prevê no seu artigo 6.º, n.º 1, que “Os atos e diplomas aprovados pelo Governo cujos projetos
tenham sido objeto de consulta direta contêm, na parte final do respetivo preâmbulo ou da exposição de
motivos, referência às entidades consultadas e ao carácter obrigatório ou facultativo das mesmas” ” e no n.º 2
do mesmo artigo que “No caso de propostas de lei, deve ser enviada cópia à Assembleia da República dos
pareceres ou contributos resultantes da consulta direta às entidades cuja consulta seja constitucional ou
legalmente obrigatória e que tenham sido emitidos no decurso do procedimento legislativo do Governo”.
Em conformidade com o estabelecido n.º 1 do supra citado artigo 6.º, o Governo informa, na exposição
de motivos, que “foram ouvidos o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior do Ministério
Público, a Ordem dos Advogados, a Câmara dos Solicitadores, o Conselho de Acompanhamento dos Julgados
de Paz, a Associação Sindical dos Juízes Portugueses, a Associação de Juízes de Paz Portugueses e a
Associação Nacional de Municípios Portugueses” e que “foi promovida a audição do Conselho Superior dos
Tribunais Administrativos e Fiscais, do Conselho dos Oficiais de Justiça, do Sindicato dos Magistrados do
Ministério Público, da Associação dos Oficiais de Justiça, do Sindicato dos Funcionários Judiciais, do Sindicato
dos Oficiais de Justiça e do Conselho Nacional de Consumo”.
Nos termos do n.º 2 do referido artigo 6.º, foram facultados à Assembleia da República os seguintes
pareceres:
Do Conselho Superior da Magistratura;
Do Conselho Superior do Ministério Público;
Da Ordem dos Advogados;
Da Câmara dos Solicitadores;
Do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz;
Da Associação Sindical dos Juízes Portugueses;
Da Associação de Juízes de Paz Portugueses;
Da Associação Nacional de Municípios Portugueses;
Da Associação Portuguesa de Bancos;
Da Confederação do Comércio e Serviços;
Da Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor – DECO;
Da Direção-Geral do Consumidor;
Da União Geral de Consumidores;
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Da ACRA;
Do Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo do Distrito de Coimbra;
Do Centro de Informação de Consumo e Arbitragem do Porto. 2
A iniciativa legislativa em apreço deu entrada em 30/11/2012, tendo sido admitida e anunciada em sessão
plenária em 05/12/2012. Por despacho de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, exarado nesta
mesma data, baixou, na generalidade, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias (1.ª).
Verificação do cumprimento da lei formulário
A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto,
comummente designada por “lei formulário”, possui um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação
e o formulário dos diplomas, as quais são relevantes em caso de aprovação das iniciativas legislativas e que,
como tal, importa fazer referência.
Assim, cumpre assinalar que, em cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 7.º da “lei formulário”, a
proposta de lei em apreço tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto, indicando que visa proceder à
primeira alteração à Lei de Organização, Competência e Funcionamento dos Julgados de Paz, aprovada pela
Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, aperfeiçoando alguns aspetos de organização e funcionamento dos julgados
de paz. Assim, o título observa igualmente o disposto n.º 1 do artigo 6.º da referida lei, que prevê que “os
diplomas que alterem outros devem indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido
alterações anteriores, identificar aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam
sobre outras normas”.
No que concerne à data de entrada em vigor, o artigo 8.º da proposta de lei determina, no n.º 1, que a lei
“entra em vigor 90 dias após a data da sua publicação”. O n.º 2 deste artigo prevê que as alterações aos
artigos 16.º, 21.º, 30.º, 51.º e 53.º produzirão efeitos na data de entrada em vigor da lei da mediação
decorrente de aprovação da Proposta de Lei n.º 116/XII (2.ª), que “estabelece os princípios gerais aplicáveis à
mediação realizada em Portugal, bem como os regimes jurídicos da mediação civil e comercial, dos
mediadores e da mediação pública”3.
Considerando que a presente iniciativa legislativa procede a alterações a 30 artigos da Lei n.º 78/2001, de
13 de julho, composta por 68 artigos, o artigo 6.º da proposta de lei determina a republicação daquela lei, em
observância do disposto na alínea b) do n.º 3 do artigo 6.º da lei formulário, que estabelece que se deve
proceder à republicação integral dos diplomas que revistam a forma de lei sempre que “se somem alterações
que abranjam mais de 20% do articulado do ato em vigor, atenta a sua versão originária ou a última versão
republicada”.
Refira-se ainda que o artigo 5.º prevê a revogação do artigo 68.º da referida Lei n.º 78/2001, de 13 de julho,
que determina que os efeitos financeiros decorrentes da aplicação daquela lei se repercutem no Orçamento do
Estado para o ano de 2002. Ora, estamos perante uma norma caducada, e, de acordo com as boas práticas
de legística, “a republicação deve integrar também as normas publicadas no ato originário, embora não
vigentes por caducidade”4, pelo que parece ser de ponderar que, ao invés de se revogar esta norma que se
reporta diretamente à Lei n.º 78/2001 e não ao diploma em apreciação (relativamente a este o respetivo artigo
8.º estabelece a data de entrada em vigor e de produção de efeitos), se considere a mesma caducada,
fazendo-se essa referência na republicação.
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
2 Não foi enviado, contudo, ao arrepio da regra citada do Regimento, o “estudo de avaliação sucessiva do regime jurídico dos julgados de
paz que o Ministério da Justiça levou a cabo por ocasião da celebração dos dez anos de vigência da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho” que, de acordo com a exposição de motivos, terá motivado a apresentação da proposta de lei sub judice. 3 Considerando que a epígrafe do artigo 8.º é “entrada em vigor”, mas que o seu n.º 2 se refere à produção de efeitos de quatro normas,
sugere-se que, em sede de discussão e votação na especialidade ou na fixação da redação final, a mesma seja alterada, de modo a passar a constar a seguinte redação: “Entrada em vigor e produção de efeitos”. 4 Conforme se pode ler em “Legística- Perspetivas sobre a Conceção e Redação de atos Normativos”, David Duarte e outros, 2002,
Almedina, p. 199, onde se acrescenta: “em rigor, nada há que justifique que uma norma caducada não seja republicada, nomeadamente por ser relevante para a aplicação a factos anteriores à sua caducidade”.
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Enquadramento legal nacional e antecedentes
A Constituição de 1976, na sua primeira versão, não se referia aos julgados de paz, mas previa que a lei
pudesse criar juízes populares e estabelecer outras formas de participação popular na administração da justiça
(n.º 1 do artigo 217.º).
Não obstante, a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais de 6 de Dezembro de 1977 (Lei n.º 82/77, de 6 de
dezembro), afirmou a existência de juízes de paz nas freguesias, eleitos pela assembleia ou plenário, com
competência para exercer a conciliação, julgar transgressões e contravenções às posturas da freguesia,
preparar e julgar ações de natureza cível de valor não superior à alçada do tribunal de comarca quando
envolvessem apenas direitos e interesses de vizinhança e existisse acordo entre as partes em prosseguir com
o processo no julgado de paz (artigo 76.º).
Na sequência da mencionada lei orgânica, foi publicado o Decreto-Lei n.º 539/79, de 31 de dezembro5, que
regulou a organização e o funcionamento dos julgados de paz, incluindo a respetiva vertente processual.
Os juízes de paz não estavam sujeitos a critérios de legalidade estrita, julgando segundo critérios de
equidade, prescrevendo a solução que julgassem mais justa e conveniente com vista a conseguir a harmonia
social. O processo cível era informal, o juiz de paz podia livremente investigar os factos, determinar a
realização dos atos e diligências que julgasse convenientes. Só era admissível a intervenção de advogado na
fase do recurso a interpor para o tribunal da comarca.
Em 22 de fevereiro de 1980, alguns Deputados do Grupo Parlamentar do PSD apresentaram o
requerimento de Ratificação 312/1, relativo ao do Decreto-Lei n.º 539/79, de 31 de dezembro (estabelece a
organização e funcionamento dos julgados de paz). Em 22 de maio do mesmo ano, em reunião plenária, foi o
mesmo requerimento apreciado, procedendo-se à sua votação, com votos contra do PSD do CDS do PPM e
dos Deputados reformadores, e votos a favor do PS, do PCP e do MDP/CDE.
Assim, foi aprovada a Resolução n.º 177/80, de 31 de maio, que resolve recusar a ratificação do Decreto-
Lei n.º 539/79, de 31 de Dezembro. Neste sentido, o regime consagrado no referido diploma não chegou a ser
implementado.
Posteriormente, na revisão constitucional de 19976, passou a Constituição a consagrar os julgados de paz
(n.º 2 do artigo 209.º).
Em 20 de Janeiro de 2000, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou na Mesa da Assembleia da República
os Projetos de Lei n.os
82/VIII e 83/VIII. O primeiro projeto visava alterar a Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei de
Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), de modo a consagrar os julgados de paz na
organização judiciária portuguesa. O segundo projeto visava regular a competência e o funcionamento dos
julgados de paz, a tramitação a que deveriam submeter-se os processos que corressem termos em tais
tribunais, os requisitos para a eleição dos juízes de paz, o estatuto dos representantes do Ministério Público e
a possível intervenção de mandatários judiciais.
Após discussão conjunta na generalidade, em reunião plenária, os dois projetos de lei baixaram à
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. O Projeto de Lei n.º 82/VIII caducou
e o Projeto de Lei n.º 83/VIII foi discutido na respetiva Comissão, que apresentou um texto de substituição que
veio a converter-se na Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, que regula a competência, organização e
funcionamento dos julgados de paz e a tramitação dos processos da sua competência.
Nos termos do seu artigo 2.º, a atuação dos julgados de paz é vocacionada para permitir a participação
cívica dos interessados e para estimular a justa composição dos litígios por acordo das partes. Os
procedimentos nos julgados de paz estão concebidos e são orientados por princípios de simplicidade,
adequação, informalidade, oralidade e absoluta economia processual.
No atual quadro legislativo, os julgados de paz só têm competência para apreciar e decidir ações
declarativas cíveis de valor não superior €5.000, tais como:
o Incumprimento de contratos e obrigações;
o Responsabilidade civil – contratual e extracontratual;
5 Em reunião plenária de 22 de maio de 1980 teve lugar a apreciação do decreto-lei.
6 Pela Lei Constitucional n.º 1/1997, de 20 de setembro (Quarta revisão constitucional).
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o Direito sobre bens móveis ou imóveis – como por exemplo propriedade, condomínio, escoamento
natural de águas, comunhão de valas, abertura de janelas, portas e varandas, plantação de árvores e
arbustos, paredes e muros divisórias;
o Arrendamento urbano, excetuando o despejo;
o Acidentes de viação.
Os julgados de paz procedem, ainda, à apreciação de pedidos de indemnização cível, quando não tenha
sido apresentada participação criminal ou após desistência da mesma, na sequência dos crimes de ofensas
corporais simples, difamação, injúrias, furto e dano simples e alteração de marcos. Todas as questões que os
Julgados de Paz podem resolver encontram-se elencadas no artigo 9.º7 da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
Os Prof. Doutores Gomes Canotilho e Vital Moreira8 referem que a autonomização jurídico-constitucional
dos julgados de paz relativamente aos outros tribunais tem também um significado não despiciendo:
institucionalização de uma estrutura tendencial e gradativamente nacional de composição alternativa de
conflitos. O respetivo regime jurídico-constitucional e jurídico-legal carece de algumas afinações: definição da
sua natureza estatal (são tribunais estaduais, são órgãos de soberania?), recorte do estatuto jurídico-funcional
dos juízes de forma a salvaguardar a independência e a estabilidade.
Nos termos do disposto no artigo 16.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, em cada julgado de paz existe um
serviço de mediação, que disponibiliza a qualquer interessado a mediação como forma de resolução
alternativa de litígios, ainda que excluídos da competência jurisdicional do julgado de paz. Neste sentido, foi
publicada a Portaria n.º 1112/2005, de 28 de outubro, que aprova o regulamento que disciplina a organização
e o funcionamento dos serviços de mediação disponíveis nos julgados de paz e estabelece as condições de
acesso aos mesmos, bem como as regras por que deve pautar-se a atividade dos mediadores de conflitos.
O mediador nos julgados de paz tem de reunir os seguintes requisitos: (i) ter mais de 25 anos de idade; (ii)
estar no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos; (iii) possuir uma licenciatura adequada; (iv) estar
habilitado com um curso de mediação reconhecido pelo Ministério da Justiça; (v) não ter sofrido condenação
nem estar pronunciado por crime doloso; (vi) ter o domínio da língua portuguesa; (vii) ser preferencialmente
residente na área territorial abrangida pelo julgado de paz.
A competência territorial dos julgados de paz pode ser concelhia, de agrupamentos de concelhos
contíguos, de freguesia ou de agrupamentos de freguesias contíguas do mesmo concelho; os julgados de paz
têm sede no concelho ou na freguesia para que são exclusivamente criados, ou, no caso de agrupamentos de
concelhos ou de freguesias, ficam sediados no concelho ou freguesia que, para o efeito, é designado no
diploma de criação (n.os
1 e 2 do artigo 4.º).
Nos termos da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, o Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz é um
órgão que funciona na dependência da Assembleia da República, com mandato de legislatura, e tem a
seguinte competência (artigos 25.º e 65.º):
Nomear os juízes de paz, sobre os quais exerce poder disciplinar;
Acompanhar a criação e instalação e funcionamento dos julgados de paz;
Apresentar relatório anual de avaliação à Assembleia da República entre 1 e 15 de junho de cada ano,
formulando sugestões de alteração do referido diploma e outras recomendações que devam ser tidas em
conta, designadamente pelo Governo ou pela Assembleia da República, no desenvolvimento do projeto.
7 As normas dos n.
os 1 e 2 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, vieram suscitar a questão de saber se a competência atribuída
aos julgados de paz era exclusiva ou alternativa em relação à dos tribunais judiciais. A referida questão foi objeto de decisões contrárias, pois houve quem entendesse que era alternativa, até que o Supremo Tribunal de Justiça, através do Acórdão de uniformização de jurisprudência que proferiu em 24 de maio de 2007 e de que foi relator o Sr. Juiz Conselheiro Salvador da Costa, veio uniformizar a jurisprudência contraditória quanto à competência exclusiva ou alternativa dos julgados de paz, nos termos seguintes: “No atual quadro jurídico, a competência material dos julgados de paz para apreciar e decidir as ações previstas no artigo 9.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, é alternativa relativamente aos tribunais judiciais de competência territorial concorrente”.Entendimento contrário teve o Sr. Juiz Desembargador Fernando Pereira Rodrigues, defendendo que a competência dos julgados de paz é exclusiva (Processo 6403/2007-6), em decisão individual de recurso de agravo, proferida em 12 de julho de 2007, no Tribunal da Relação de Lisboa. 8 In: CANOTILHO, J. J. Gomes e MOREIRA, Vital – Constituição da República Portuguesa Anotada – Coimbra Editora, 4ª edição, volume
II, pág. 555.
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Relativamente aos artigos supracitados, os Profs. Doutores Jorge Miranda e Rui Medeiros9 defendem que o
regime legal de gestão e disciplina dos juízes de paz consagrado nos artigos 25.º, n.º 2, e 65.º, n.os
1 e 2, da
Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, é inconstitucional, porque viola o princípio da independência dos tribunais, e
viola-o em três dimensões: 1. os juízes de paz não estão representados no órgão competente para a gestão e
disciplina dos juízes de paz; 2. os membros desse órgão são nomeados, na sua quase exclusividade, com
base em critérios de confiança política por órgãos externos ao poder judicial (com a exceção do representante
do CSM); 3. o órgão criado pela Lei n.º 78/2001 nem sequer possui toda a competência de gestãodos juízes
de paz, competindo o respetivo recrutamento, seleção, ordenação e afetação à Direção Geral da
Administração Extrajudicial.
O Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz defende10 que (…) as parcerias que estão na
origem dos Julgados de Paz devem ser extensivas a outras instituições de incontroversa dignidade, como é o
caso de Universidades, desde que seja totalmente salvaguardada a imagem jurisdicional dos Julgados de Paz.
Em verdade, para além de outros dispositivos constitucionais aplicáveis, a causa-final constitucional dos
Julgados de Paz é o direito cívico fundamental de acesso ao Direito e à tutela jurisdicional (artigo 20.º da CRP)
ou, mais claramente, o direito à Justiça, sem cuja salvaguarda não há Democracia e nem sequer sociedade
humana digna desse nome.
Segundo o relatório anual do aludido Conselho, até ao final de 2011 os Julgados de Paz tinham recebido
50 053 processos, não obstante serem apenas 25, com uma abrangência de 61 concelhos. “(…) A eficácia dos
Julgados de Paz atingiu um ponto muito alto, mesmo um pouco mais do que no ano anterior: 96,09%, face aos
95,39% de 2010. Em 31.12.2011, transitaram pendentes 3275 processos, enquanto que, em 31.12.2010,
haviam transitado pendentes 2881. Todavia, a eficácia, em 2011, foi realmente superior, da ordem dos
74,71%, face aos 72,98% de 2010. Aconteceu que, enquanto, em 2010, haviam entrado 8157 processos, em
2011 entraram 10.071, tendo findado 9677, contra os 7781 de 201011.
Aconteceu que, enquanto, em 2010, haviam entrado 8157 processos, em 2011 entraram 10.071, tendo
findado 9.677, contra os 7781 de 2010.”
Recorde-se que o artigo 66.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, prevê o desenvolvimento do projeto de
criação e instalação dos Julgados de Paz no conjunto do território nacional, tendo em conta o relatório do
Conselho de Acompanhamento e a apreciação que merecer da Assembleia da República.
Ainda relativamente aos julgados de paz, o XIX Governo Constitucional, no seu Programa, sublinha que os
julgados de paz, criados em 2001, são tribunais dotados de características de funcionamento e organização
próprias e um bom exemplo do que pode ser uma justiça de proximidade. Em todo o caso, decorrida quase
uma década desde a sua criação, parece adequado fazer uma avaliação detalhada da sua eficácia prática, e
introduzir os ajustamentos que se mostrarem necessários à célere resolução da pequena conflitualidade.
No mesmo sentido vai o Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica12,
que estipula um conjunto de obrigações no âmbito do sistema judicial onde prevê que o Governo deve otimizar
o regime de Julgados de Paz, para aumentar a sua capacidade de dar resposta a pequenos processos de
cobrança judiciais.
Para melhor acompanhamento da proposta de lei em apreço, destacam-se os seguintes diplomas:
Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro13
, alterado e republicado pela Lei n.º 7/2012, de 13 de
fevereiro que aprova o Regulamento das Custas Processuais.
Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho que estabelece os princípios e as regras necessárias para
simplificar o livre acesso e exercício das atividades de serviços e transpõe a Diretiva 2006/123/CE14
, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro.
Lei n.º 9/2009, de 4 de março, alterada pela Lei n.º 41/2012, de 28 de agosto, que transpôs para a
ordem jurídica interna a Diretiva 2005/36/CE15
, do Parlamento e do Conselho, de 7 de setembro, relativa ao
9 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição da República Portuguesa Anotada – Coimbra Editora 2007, Tomo III, pág. 112.
10 No Relatório anual, dezembro de 2011, apresentado à Assembleia da República e ao Governo.
11 Fonte: Relatório anual, dezembro de 2011 do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz.
12 Celebrado em maio de 2011, entre o Governo, a Comissão Europeia, e o Fundo Monetário Internacional.
13 Aprovado na sequência da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 26/2007, de 23 de julho.
14 A diretiva estabelece disposições gerais que facilitam o exercício da liberdade de estabelecimento dos prestadores de serviços e a livre
circulação dos serviços, mantendo simultaneamente um elevado nível de qualidade dos serviços.
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reconhecimento das qualificações profissionais, e a Diretiva 2006/100/CE, do Conselho, de 20 de novembro,
que adapta determinadas diretivas no domínio da livre circulação de pessoas, em virtude da adesão da
Bulgária e da Roménia.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
CHUMBINHO, João Paulo da Cunha Rendeiro – Julgados de paz na prática processual civil: meios
alternativos de resolução de litígios. Lisboa: Quid Juris, 2007. 320 p. ISBN 978-972-724-330-3. Cota:
12.21 - 472/2007
Resumo: O autor, que participou na criação do primeiro julgado de paz em Portugal, apresenta neste
livro a sua visão teórico-prática da organização e funcionamento dos julgados de paz.
Analisa a competência dos julgados de paz, as diferenças entre os princípios dos julgados de paz e os
princípios dos tribunais judiciais, as diferenças entre os julgados de paz e os tribunais judiciais ao nível da
organização, as diferenças ao nível do processo e dos procedimentos, a cultura organizacional dos julgados
de paz e dos tribunais judiciais e as diferenças analisadas à luz do princípio da democraticidade.
COELHO, João Miguel Galhardo – Julgados de paz e mediação de conflitos. Lisboa: Âncora, 2003. 174
p. ISBN 972-780-112-9. Cota: 12.21 - 526/2003
Resumo: Para além da análise do regime jurídico vigente, este livro inclui a totalidade dos diplomas
legais, regulamentares e protocolares publicados em matéria de julgados de paz e mediação de conflitos.
Apresenta ainda o relatório e sugestões do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz, com as
perspetivas de evolução destes novos tribunais.
FERREIRA, J. O. Cardona – Justiça de paz: julgados de paz: abordagem numa perspetiva de justiça /
ética / paz / sistemas / historicidade: (competências / objetivos / justiça restaurativa / Magistrados /
advocacia / custas). Coimbra: Coimbra Editora, 2005. 120 p. ISBN 972-32-1367-2. Cota: 12.21 - 74/2006
Resumo: O autor faz uma abordagem aos julgados de paz, à justiça e aos sistemas extrajudiciais em
concreto. Propõe-se refletir sobre a importância dos julgados de paz, referenciar alguns tópicos e apresentar
conclusões. Analisa mais em detalhe as competências e os objetivos dos julgados de paz.
JULGADOS DE PAZ E MEDIAÇÃO: UM NOVO CONCEITO DE JUSTIÇA. Ana Soares da Costa. [et al.].
Lisboa: Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2002. 437 p. Cota: 12.21 - 542/2002
Resumo: Na presente obra reuniram-se alguns trabalhos independentes e originais de um pequeno
grupo multidisciplinar de técnicos que se debruçaram sobre os julgados de paz e a atividade de mediação. Os
trabalhos apresentados debruçam-se sobre os seguintes temas: “Os Julgados de paz e a desjudicialização da
justiça (numa perspetiva sociológica)”; “Os Julgados de paz e a resolução alternativa de litígios: história, direito
e política: uma análise comparada (Brasil, Peru, Colômbia, Venezuela, Espanha, Itália e Portugal)”; “A
mediação como meio privilegiado de resolução de litígios”; “Os Julgados de paz - Análise do regime jurídico”.
PEREIRA, Joel Timóteo Ramos – Julgados de paz: organização, trâmites e formulários. 3.ª ed. Revista,
atualizada e aumentada. Lisboa: Quid Juris, 2005. 688 p. ISBN 972-724-253-7.
Cota: 12.21 - 156/2006
Resumo: O autor faz uma análise muito detalhada dos julgados de paz, a sua natureza e competência,
assim como a sua organização e funcionamento, de acordo com a Lei n.º 78/2001.
PORTUGAL. Leis, decretos, etc. – Coletânea de legislação sobre Julgados de Paz: algumas reflexões.
[Compil.] Direcção-Geral da Administração Extrajudicial; [textos] J. O. Cardona Ferreira [et al.]. Coimbra:
Coimbra Editora, 2006. 262 p.
15
A diretiva estabelece as regras segundo as quais um Estado-membro que subordina o acesso a uma profissão regulamentada ou o respetivo exercício no seu território à posse de determinadas qualificações profissionais (adiante denominado "Estado-Membro de acolhimento") reconhece, para o acesso a essa profissão e para o seu exercício, as qualificações profissionais adquiridas noutro ou em vários outros Estados-membros (adiante denominados "Estado-membro de origem") que permitem ao seu titular nele exercer a mesma profissão.
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ISBN 972-32-1323-0. Cota: 12.21 - 452/2006
Resumo: Esta obra, para além de reunir a legislação relativa aos julgados de paz, apresenta ainda um
breve enquadramento da Lei n.º 78/2001, assim como algumas reflexões de vários autores sobre a mesma lei.
Entre estes, destaca-se o artigo da pág. 209-233, de Pedro Rebelo de Sousa, intitulado: “Os julgados de paz
vistos por nós - o fim da fase experimental”, que analisa a competência dos julgados de paz, o sistema
brasileiro dos “Juizados especiais cíveis”, o sistema espanhol dos “Juzgados de paz”, a figura dos “giudici di
pace” em Itália e os “District Judges” no Reino Unido.
PORTUGAL. Leis, decretos, etc. – Julgados de paz: organização, competência e funcionamento (Lei
n.º 78/2001, de 13 de julho): o que foram, o que são os julgados de paz e o que podem vir a ser. Anot. J.
O. Cardona Ferreira. 2.ª ed. Coimbra : Coimbra Editora, 2011. 384 p. ISBN 978-972-32-1969-2. Cota:12.21 -
639/2011
Resumo: O anotador, Jaime Octávio Cardona Ferreira, que preside ao Conselho de Acompanhamento
dos Julgados de Paz, apresenta uma nota introdutória a esta edição da sua obra, tecendo algumas
considerações, a título pessoal, sobre os julgados de paz, sua organização, competência e funcionamento.
Inclui uma abordagem histórica e destaca alguns aspetos que, segundo o autor, são considerados cruciais: a
proximidade, a coordenação e a divulgação. Apresenta ainda uma compilação de legislação complementar
relacionada com os julgados de paz.
VARGAS, Lúcia Fátima Barreira Dias – Julgados de Paz e mediação: uma nova face da justiça.
Coimbra: Almedina, 2006. 216 p. ISBN 972-40-2891-7. Cota: 12.21 - 662/2006
Resumo: Neste livro, a autora aborda alguns temas que a propósito dos julgados de paz se discutem.
No capítulo II, são analisados os modelos estrangeiros do Brasil e de Itália, e a natureza e regime jurídico
dos julgados de paz.
Enquadramento do tema no plano da União Europeia
O Título V do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) dispõe no Capítulo 1 -
Disposições gerais, que a União facilita o acesso à justiça, nomeadamente através do princípio do
reconhecimento mútuo das decisões judiciais e extrajudiciais em matéria civil (artigo 67.º n.º 4).
O Capítulo 3 regula a Cooperação Judiciária em Matéria Civil e o n.º 1 do artigo 81.º dispõe que a União
desenvolve uma cooperação judiciária nas matérias civis com incidência transfronteiriça, assente no princípio
do reconhecimento mútuo das decisões judiciais e extrajudiciais. O n.º 2 determina que, para este efeito, o
Parlamento Europeu e o Conselho, deliberando de acordo com o processo legislativo ordinário, adotam,
nomeadamente quando tal seja necessário para o bom funcionamento do mercado interno, medidas
destinadas a assegurar:
(…) g) O desenvolvimento de métodos alternativos de resolução de litígios.
O Livro Verde de 2002 sobre os modos alternativos de resolução de litígios surgiu na sequência do plano
de ação de Viena e das conclusões do Conselho Europeu de Tampere. O Conselho dos Ministros da Justiça e
dos Assuntos Internos convidou então a Comissão a apresentar um Livro Verde sobre os modos alternativos
de resolução dos litígios em matéria civil e comercial que não a arbitragem, "para fazer o ponto da situação
existente e lançar uma ampla consulta, a fim de preparar as medidas concretas a tomar. Deverá ser concedida
prioridade à possibilidade de estabelecer princípios fundamentais, quer em geral quer em domínios
específicos, que deem as garantias necessárias para que a resolução dos conflitos por instâncias
extrajudiciais ofereça o nível de segurança exigido na administração da justiça".
Também no Livro Verde relativo a um procedimento europeu de injunção de pagamento e a medidas para
simplificar e acelerar as ações de pequeno montante (COM(2002)746 final) há uma secção destinada à
Resolução alternativa de litígios em que é feito o levantamento dos métodos de resolução alternativa de litígios
existentes nos vários Estados-membros no contexto dos processos judiciais.
Posteriormente, em 6 de junho de 2005, Armando Dionisi (PPE-DE) apresenta pergunta escrita à Comissão
sobre esta matéria. Na pergunta, Os Julgados de Paz na Europa, são colocadas as seguintes questões:
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– Poderia a Comissão indicar se já existem iniciativas comunitárias no sentido de promover e difundir este
modelo de justiça civil?
– Considera a Comissão oportuno encarar a possibilidade de levar a cabo ações de estudo e de
investigação nos diferentes Estados-membros da União Europeia com vista à difusão dos Julgados de Paz na
Europa?
– É a Comissão favorável à criação de um grupo de trabalho integrado por peritos e de uma unidade de
observação incumbidos de analisar as diferentes realidades e identificar os modelos suscetíveis de serem
transpostos para o ordenamento dos diferentes países?
– Tenciona a Comissão propor, nomeadamente com base no modelo italiano dos Julgados de Paz, uma
diretiva destinada a harmonizar os sistemas e a instituir magistraturas similares nos diferentes Estados-
membros?
As duas últimas questões merecem resposta negativa da Comissão e, quanto às duas primeiras são
indicadas uma série de medidas destinadas a simplificar e acelerar as ações de pequenos montantes.
Em termos de acessibilidade, importa mencionar a rede judiciária europeia em matéria civil e comercial
destinada a facilitar a cooperação entre os Estados-membros. Via Internet, os cidadãos podem aceder a
informações sobre o sistema jurídico dos respetivos Estados-membros (o recurso aos tribunais, a assistência
jurídica, etc.) e inclui uma parte sobre meios de resolução alternativa de litígios.
A proposta de lei refere que é aproveitada a oportunidade para introduzir modificações nas normas
relativas à mediação, de modo a conseguir um alinhamento das soluções jurídicas da Lei dos Julgados de Paz
com as previstas na Lei da Mediação, atualmente em preparação, e com o Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de
julho, que transpôs para o ordenamento jurídico interno a Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 12 de dezembro, relativa aos serviços no mercado interno, e com a Lei n.º 9/2009, de 4 de
março, alterada pela Lei n.º 41/2012, de 28 de agosto, que transpôs para o ordenamento jurídico interno a
Diretiva 2005/36/CE16, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro.
A Diretiva 2005/36/CE17 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro de 2005, consagra a
primeira modernização de conjunto do sistema europeu de reconhecimento das qualificações profissionais,
com vista a facilitar o estabelecimento e a livre circulação no mercado interno de pessoas que prestam
serviços qualificados18.
A Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos
serviços no mercado interno, é aplicável a todos os serviços prestados mediante contrapartida económica,
com exceção dos sectores excluídos e estabelece disposições gerais que facilitam o exercício da liberdade de
estabelecimento dos prestadores de serviços e a livre circulação dos serviços, mantendo simultaneamente um
elevado nível de qualidade dos serviços prestados aos consumidores e às empresas.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da UE: Alemanha, Espanha, França e
Itália.
Alemanha
Na Alemanha, analisada a organização dos tribunais, encontramos na base territorial os “Amtsgerichte”
(tribunais de comarca) e os “Landgerichte” (tribunais regionais), que constituem os tribunais cíveis de primeira
instância.
16
Versão consolidada em 2012-08-01, na sequência das alterações posteriores, disponível no endereço http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CONSLEG:2005L0036:20120801:PT:PDF 17
Versão consolidada em 2012-08-01, na sequência das alterações posteriores, disponível no endereço http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CONSLEG:2005L0036:20120801:PT:PDF 18
A Comissão apresentou em 19.12.2011 uma proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2005/36/CE relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais e o Regulamento [...] relativo à cooperação administrativa através do Sistema de Informação do Mercado Interno (COM/2011/883)
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Com competência idêntica aos Julgados de Paz parecem-nos ser os Amtsgerichte. Estes são em princípio
competentes para os litígios cíveis quando o valor do litígio não ultrapassa 5 000 euros e se não houver
competência exclusiva do Landgericht (n.º 1 do artigo 23.º da lei relativa à organização judicial:
Gerichtsverfassungsgesetz – GVG).
Independentemente do valor da causa, os Amstgerichte têm competência exclusiva nos seguintes casos
(ver artigos 23.º e 23.ºA da GVG).
Os Amtsgerichte são competentes para litígios relativos a direitos decorrentes de contratos de
arrendamento de habitação ou à existência de tais contratos (n.º 2, alínea a), do artigo 23.º da GVG).
Além disso, os Amtsgerichte são competentes em primeira instância quanto aos litígios em matéria de
Direito da Família (artigo 23.º-A da GVG). Incluem-se neste âmbito: processos de filiação; obrigações de
alimentos decorrentes de casamento ou de relações de parentesco; obrigação de alimentos da mãe
relacionada com o nascimento de um filho; ações em matéria de casamento; litígios relativos a direitos
decorrentes do regime patrimonial do casamento, mesmo quando a ação envolva terceiros.
As competências exclusivas dos Amtsgerichte decorrem do n.º 2, alíneas b) a h), do artigo 23.º da GVG.
Os Landgerichte são competentes para conhecer todos os litígios cíveis que não sejam da competência
dos Amtsgerichte. Trata-se principalmente de litígios de valor superior a 5 000 euros.
Os Landgerichte dispõem de competência exclusiva sobretudo no caso de litígios relativos a leis sobre a
função pública e a direitos associados a uma responsabilidade administrativa.
Espanha
Em Espanha, os Juízes de Paz foram criados em 1855 e viram a sua institucionalização remodelada ao
longo da história através de várias reformas legislativas. Entre as reformas mais relevantes, destacam-se: a
alteração da sua denominação, passando a designar-se julgados municipais, com um aumento das suas
competências, essencialmente no âmbito penal; o acréscimo das suas competências em matérias de Registo
Civil e de casamento; e, em 1945, a regulação específica, por Decreto, da figura do Juiz de Paz.
Os Julgados de Paz, desde a sua criação e ao longo da sua história, tiveram por finalidade principal dotar a
comunidade de uma alternativa de resolução pacífica dos conflitos de menor complexidade. Com o tempo
foram acrescidas outras finalidades, tais como tornar a justiça mais célere e mais próxima do cidadão, facilitar
os trâmites do Registo Civil e auxiliar o sistema judicial nas atuações que não fossem muito complexas,
permitindo assim o seu necessário e desejado descongestionamento.
A atual Justiça de Paz teve a sua origem no artigo 282.º da Constituição de 1812, que estabelecia que o
Presidente da Câmara de cada povoação exercia funções de conciliação e quem pretendesse demandar por
negócios civis e por injúrias deveria apresentar-se perante ele com essa finalidade.
Em 1985 foi aprovada a Ley Orgánica 6/1985, de 1 de julio, del Poder Judicial, que veio possibilitar a
reestruturação total dos órgãos judiciais a nível nacional e municipal. Entre as principais modificações há que
referir a eliminação dos Julgados de Distrito e a transferência de todas as suas competências para os
Julgados de Primeira Instância e para os Julgados de Paz.
O Capítulo VI da mencionada lei orgânica trata da matéria dos Julgados de Paz. O artigo 99.º refere que
em todos os municípios onde não haja um tribunal de primeira instância e de instrução haverá um Julgado de
Paz com jurisdição na comarca correspondente. Assim, está estabelecido que cada município de Espanha
deve ter um juízo de primeira instância ou um julgado de paz. Os julgados de paz constituem assim o primeiro
grau da estrutura judicial do Estado espanhol.
A Ley Orgánica 6/1985, de 1 de julio, del Poder Judicial, reorganizou tanto a competência material dos
juízes de paz como a sua competência territorial. Assim, passaram a ter competências específicas em matéria
civil e penal, na área do Registo Civil e a exercer funções de auxílio judicial.
A competência em matéria civil é regulada pelo artigo 100.º, de acordo com a qual os julgados de paz
conhecem em primeira instância, produzem sentenças e procedem a execuções dos processos que a lei
determine.
A competência em matéria penal, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, abrange crimes de ameaças,
coação, injúrias, perturbações da ordem em atos públicos, desobediência a agentes da autoridade e atuações
penais de prevenção ou de delegação e outras que venham a ser atribuídas por outras leis.
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A nomeação e os requisitos para o cargo de juiz de paz estão consagrados no artigo 101.º da Ley Orgánica
6/1985, de 1 de julio, del Poder Judicial. Aí consta que os juízes de paz são nomeados por um período de
quatro anos, pela Sala de Gobierno del Tribunal Superior de Justicia correspondente e a sua nomeação recai
sobre as pessoas eleitas pelo Ayuntamiento (equivalente às nossas Câmaras Municipais) respetivo, no Pleno
del Ayuntamiento, com o voto favorável da maioria absoluta dos seus membros, entre as pessoas que,
reunindo as condições legais, assim o solicitem. No caso de não haver candidatos, o Pleno elegerá livremente.
As vagas existentes para o cargo de juiz de paz, titular ou substituto, são anunciadas pela Câmara Municipal
respetiva, através de convocatória pública (artigo 5.º do Reglamento 3/1995, de 7 de junio, de los Jueces de
paz).
O resultado obtido pela Câmara será enviado ao juiz de primeira instância e de instrução, que o fará chegar
à Sala de Gobierno del Tribunal de Justicia. Se se entender que a pessoa eleita reúne as condições de
elegibilidade exigidas pela lei, designadamente a idoneidade, será então nomeada, caso contrário, cabe à Sala
de Gobierno del Tribunal de Justicia designar diretamente. O mesmo acontece se, passados três meses desde
a vacatura do lugar, a Câmara não tiver proposto o nome de nenhum cidadão (n.º 4 do artigo 101.º da Ley
Orgánica 6/1985, de 1 de julio, del Poder Judicial e artigos 8.º e 9.º do Reglamento 3/1995, de 7 de junio, de
los Jueces de paz).
Os requisitos que o juiz de paz, titular ou substituto, deve possuir encontram-se previstos no artigo 102.º da
referida lei orgânica: reunir todos os requisitos exigidos para o ingresso na carreira judicial (ser espanhol e
maior de idade), exceto a necessidade da licenciatura em direito, e não se verificar nenhuma das causas de
incapacidade ou de incompatibilidade (artigo 389.º) previstas para o desempenho das funções judiciais, com
exceção do exercício de profissões mercantis. São juízes leigos, não profissionais, que desempenham funções
jurisdicionais sem pertencerem à carreira judicial, apesar de enquanto exercem o seu cargo estarem sujeitos
ao regime de incompatibilidades e proibições da carreira judicial. Os juízes de paz não poderão ainda revelar
factos relativos a pessoas de que tenham tido conhecimento durante o exercício das suas funções.
A nomeação, o regime de incompatibilidades, os direitos e deveres e a responsabilidade dos juízes de paz
estão consagrados também no Reglamento 3/1995, de 7 de junio, de los Jueces de paz, aprovado por acordo
do Consejo General del Poder Judicial, onde não está estabelecido qualquer tipo de diferenciação para as
diversas províncias espanholas. Os direitos e deveres podem ler-se no artigo 17.º e seguintes do referido
Regulamento – o juiz de paz deve residir na localidade sede do Julgado, exceto se for autorizado a residir em
local diferente pela Sala de Gobierno del Tribunal de Justicia e durante o seu mandato goza de
inamovibilidade. Os juízes de paz estão sujeitos ao estatuto jurídico dos juízes e magistrados, embora com
algumas exceções. O seu estatuto é mais flexível que o regime geral dos juízes e magistrados, dado o caráter
temporário do seu mandato e o facto de não serem profissionais. Em caso de doença ou de ausência por
causa legal, o juiz de paz será substituído pelo respetivo substituto. Se este último não existir na localidade em
questão, será o titular de outra localidade a desempenhar ambos os cargos (artigo 25.º do Regulamento n.º
3/1995, de 7 de junho). Cabe a cada Julgado de Paz fixar as horas de audiência.
Em matéria de retribuição, o artigo 103.º da lei orgânica estabelece que os juízes de paz são retribuídos
pelo sistema e em quantia que legalmente se estabeleça, tendo, na sua circunscrição, o tratamento e
precedência que se reconhecem aos juízes de primeira instância e instrução.
A atual regulação dos julgados de paz, prevê um sistema organizativo baseado na possibilidade de
estabelecer agrupamentos de secretarias de julgados de paz, sendo estas reguladas pelo Real Decreto
257/1993, de 19 de febrero.
Na citada Ley Orgánica 6/1985, de 1 de julio, não existe qualquer menção à existência de um órgão com
funções análogas à do Conselho de Acompanhamento de Julgados de Paz19
. As suas funções são
desempenhadas pelo Consejo General del Poder Judicial20
, à exceção da designação dos juízes que é levada
a cabo através de nomeação pelos Ayuntamientos e designação pelo Tribunal Superior de Justicia.
19
Previsto na Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, que regula os julgados de paz. 20
Acuerdo de 15 de septiembre de 2005, del Pleno del Consejo General del Poder Judicial, por el que se aprueba el Reglamento 1/2005.
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França
Em França não existe a figura dos “julgados de paz”, existindo, todavia, os juges de proximité
(normalmente não são magistrados, sendo recrutados, por 7 anos, na sociedade civil, segundo critérios
legalmente estabelecidos, deliberando tendo por base o legalmente instituído), conforme estabelecido pela Lei
n.º 2002-1138, de 9 de setembro (Lei Perben I), sobre a orientação e programação sobre a justiça, alterada
pela Lei orgânica n.º 2003-153, de 26 de fevereiro, relativa ao seu estatuto, com vista a aligeirar o trabalho dos
tribunais e pela Lei n.º 2005-47, de 26 de janeiro, que ampliou as competências da jurisdição de proximidade e
permitiu aos juges de proximité assessorar as audiências.
Estes juges de proximité procuram resolver delitos/infrações penais consideradas menos graves (tumultos
noturnos, caça sem licença, infrações ao código da estrada e atos de violência ligeira, cujos efeitos não
excedam um montante de 4000€), sendo os restantes julgados pelo tribunalde police.
Porém, provavelmente na sequência das conclusões apresentadas pelo relatório da comissão Guinchard,
publicado em 2008 (nomeadamente os n.º 1 e 22), foi aprovada a Lei n.º 2011-1862, de 13 de dezembro,
relativa à distribuição dos processos judiciais e à simplificação de certos processos judiciais, que extingue a
jurisdição de proximidade a partir do dia 1 de janeiro de 2013, mantendo, no entanto, os juges de proximité,
integrando-os, a partir do dia 1 de Julho de 2013, nos tribunais superiores e alterando as suas atribuições.
Não se registam quaisquer relações entre a dimensão dos juges de proximité com quaisquer das câmaras
parlamentares, a não ser o debate e a aprovação das mencionadas leis pela comissão mista paritária entre a
Assembleia Nacional e o Senado (CMP, constituída por 7 deputados e 7 senadores).
Itália
Em Itália o julgado de paz recebe a denominação de ‘Giudice di Pace’.
O “juiz de paz”, em atividade desde 1 de maio de 1995, é o maior corpo de magistrados (4700) e com maior
difusão em todo o país. Ocupou o lugar do “juiz conciliador” – instituto jurídico abolido –, mas diferencia-se
daquele porque lhe foi atribuída uma maior competência em matéria civil e prevê-se que venha a julgar
também em matéria penal, ainda que seja por factos menores de simples avaliação.
Como órgão representativo, existe uma “Associação Nacional dos Juízes de Paz” que é uma associação de
categoria que pugna pela defesa da Constituição e cumprimento das leis e pretende tutelar o prestígio da
figura do “juiz de paz”. Veja-se o seu estatuto.
É ao Conselho Superior de Magistratura que cabe a fiscalização dos julgados de paz nos termos do artigo
16.º da Lei n.º 374/1991, de 21 de novembro, alterada pela Lei n.º 468/1999, de 24 de novembro.
No âmbito territorial de cada julgado, o juiz de paz exerce a jurisdição civil e lida com as causas que são da
sua competência em razão da matéria ou do valor.
A competência em razão da matéria do juiz de paz é, em parte, de carácter exclusivo. São de competência
exclusiva do juiz de paz:
1) As causas relativas à conformidade dos termos e observação das distâncias previstas pela lei,
regulamentos ou costumes sobre o plantio de árvores e sebes;
2) As causas relativas à medida e às modalidades de uso dos serviços de condomínio ou de casas;
3) As causas relativas a relações entre proprietários ou detentores de imoveis destinados a habitação em
matéria de emissão de fumo ou de calor, exalações, ruídos, tremores e outras agitações que superem a
tolerância normal.
Em matéria civil, os “Giudice di Pace” exercem uma função conciliatória entre as partes sem qualquer limite
de valor e de matérias, desde que não sejam da competência exclusiva de outros juízes. Do âmbito destas
matérias estão incluídas questões relacionadas com o direito do trabalho e de família.
Estes juízes também detêm competências no domínio dos recursos sobre a aplicação de uma sanção
administrativa (multa): o Decreto Legislativo n.º 507/1999, de 30 de dezembro, [artigos 98.º e 99.º] confere aos
automobilistas a possibilidade de, no caso de considerarem que a sua multa foi injusta, recorrerem para o
Julgado de Paz, tal como no passado haviam feito em relação ao “Perfeito”
Os “Giudice di Pace” têm competência para resolver os seguintes litígios:
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Causas sobre bens móveis, cujo valor limite são € 2.582,28 (euros), desde que estas causas não sejam
atribuídas a outro juiz; ações de indemnização relativas a acidentes causados por circulação de veículos e
embarcações (marítimas e fluviais) com valor não superior a € 15.493,71 (euros); ações referentes à plantação
de árvores e arbustos e questões de condomínio, de forma exclusiva e sem limite de valor; causas
apresentadas por um proprietário ou por um locatário de um imóvel sujeito a uma arbitragem cível relativa à
emissão de fumo ou de calor, produção de ruídos, escoamento e propagações similares superiores ao
legalmente admitido.
Quando o valor da controvérsia não ultrapassar os € 1.032,91 (euros), o juiz de paz deverá recorrer à
equidade para decidir.
Levar uma questão à apreciação do juiz de paz não implica o pagamento de custas nem o
acompanhamento de advogado, desde que a causa não exceda o valor de € 516,46 (euros).
Na primeira audiência, o juiz de paz interroga as partes, tendo em vista conciliá-las. Na eventualidade de
ser alcançado um consenso o juiz redige um termo de conciliação que deverá corresponder ao acordo verbal
alcançado pelas partes.
Em 2 de janeiro de 2002, entrou em vigor o Decreto Legislativo n.º 274, de 28 de agosto de 2000, que
alarga as competências dos Julgados de Paz em matéria penal, introduzindo também, pela primeira vez, uma
referência expressa à mediação, no seu artigo 35.º. Esta Lei tomou em linha de conta as orientações
formuladas pelo Conselho da União Europeia de 15 de março de 2001, que incentiva o recurso à mediação e o
reconhecimento do direito das vítimas serem informadas sobre os procedimentos criminais. A referida Lei
introduziu uma lista de sanções – multas, prisão domiciliária, serviço à comunidade – destinadas a serem
aplicadas a delitos que estejam abrangidos na competência do Julgado de Paz e apenas no caso da tentativa
de resolução do conflito, através da mediação ou reparação, não lograr êxito. No domínio da competência dos
Julgados de Paz em matéria penal, estão compreendidos delitos como: assaltos, ameaças e injúrias,
correspondendo a cerca de 12% a 14% dos delitos, constantes do Código Penal italiano, praticados durante
um ano.
De sublinhar um aspeto inovador da nova legislação, em vigor desde janeiro de 2002, que consiste na
possibilidade do juiz de paz agir como mediador ou recorrer a mediadores externos. O artigo 29.º do Decreto
Legislativo em apreço permite ao juiz de paz promover diretamente a reconciliação entre as partes, desde que
estejam reunidos dois pressupostos: tratar-se de um crime particular e a vítima ter tido um papel ativo.
O juiz tem ainda a faculdade de suspender a instância, por dois meses, para permitir que a mediação
ocorra, agindo na qualidade de mediador ou encaminhando o processo para um mediador externo.
Outros países
Brasil
A Constituição Federal de 1988, prevê no seu artigo 98.º, os Juizados Especiais. Este artigo dispõe que,
são criados juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a
conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor
potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumariíssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei,
a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau (…), com mandato de quatro
anos e competência para, na forma da lei, celebrar casamentos, verificar, de ofício ou em face de impugnação
apresentada, o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de
outras previstas na legislação.
No desenvolvimento do supracitado preceito constitucional, foi aprovada a Lei n.º 9.099, de 26 de setembro
de 1995 (texto consolidado) que regula os Juizados Especiais. O seu artigo 1.º, dispõe que: “Os Juizados
Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da Justiça Ordinária, serão criados pela União, no Distrito Federal e nos
Territórios, e pelos Estados, para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua
competência.”
Deste preceito é possível perceber que o âmbito de competência dos Juizados Especiais brasileiros incide
sobre matérias de natureza cível e criminal, estando orientados para a conciliação ou julgamento, dispondo
também de competência executiva, nas causas para as quais têm competência. “O processo orientar-se-á
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pelos critérios da oralidade, da simplicidade, da informalidade, da economia processual e da celeridade”, como
refere o artigo 2.º da lei ora em análise. Estes princípios correspondem, quase na totalidade, aos princípios
constantes da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, relativa à organização, competência e funcionamento dos
Julgados de Paz portugueses. Assim, dispõe o n.º 2 do artigo 2.º, atinente aos princípios gerais dos Julgados
de Paz portugueses: “Os procedimentos nos Julgados de Paz estão concebidos e são orientados por
princípios de simplicidade, adequação, informalidade, oralidade e absoluta economia processual.” O princípio
da celeridade, referido na Lei n.º 9099 deu lugar ao princípio da adequação na lei portuguesa, todos os demais
princípios foram decalcados da Lei n.º 9099, pelo que, parece poder concluir-se que, pelo menos no que
respeita aos princípios gerais dos Julgados de Paz, a lei portuguesa foi fortemente inspirada pela Lei dos
Juizados Especiais brasileiros.
O artigo 3.º da Lei n.º 9.099 trata da competência dos Juizados Especiais Cíveis. Nos termos deste preceito
legal estes Juizados “têm competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor
complexidade, assim consideradas:
i. as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo;
ii. as enumeradas no artigo 275, inciso II, do Código de Processo Civil;
iii. a ação de despejo para uso próprio;
iv. as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente ao fixado no inciso I deste artigo.”
Em conformidade com o artigo 3.º, o Juizado Especial tem ainda competência executiva. Com efeito, de
acordo com o artigo 52.º da referida lei, a execução da sentença processar-se-á no próprio Juizado. Tal não
acontece na lei relativa à organização competência e funcionamento dos Julgados de Paz portugueses21, uma
vez que o seu artigo 6.º refere que: “a competência dos Julgados de Paz é exclusiva a ações declarativas.
Para a execução das decisões dos Julgados de Paz deverá aplicar-se o disposto no Código de Processo Civil
e legislação conexa sobre execuções das decisões dos tribunais de 1.ª instância”.
A Competência do Juizado Especial para promover a execução abrange as matérias:
“I – dos seus julgados;
II – dos títulos executivos extrajudiciais, no valor de até quarenta vezes o salário mínimo, observado o
disposto n.º 1 do artigo 8.º desta Lei” (artigo 3.º da Lei n.º 9099).
Ficam excluídas da competência do Juizado Especial as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e
de interesse da Fazenda Pública, e também as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e
capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial, conforme dispõe o n.º 2 do artigo 3.º da lei brasileira
ora em apreciação.
A secção II, do capítulo II, da Lei n.º 9.099, trata dos juízes e conciliadores. Nos Juizados Especiais existe a
figura do juiz, propriamente dito, e dos auxiliares de justiça, com a designação de “Conciliadores” e de “Juízes
Leigos”. Os conciliadores e os juízes leigos são auxiliares da justiça, recrutados, os primeiros,
preferentemente, entre os bacharéis em direito e os segundos entre advogados com mais de cinco anos de
experiência (artigo 7.º).
O juiz é quem dirige o processo, tendo liberdade para determinar as provas a serem produzidas e de as
apreciar, dando especial valor às regras de experiência comum ou técnica, de acordo com o artigo 5.º da lei
em apreço.
O juiz poderá utilizar critérios de equidade adotando, em cada caso, a decisão que reputar mais justa e
“equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum”, conforme dispõe o artigo 6.º.
Nos Juizados Especiais a abertura da sessão inicia-se com uma tentativa de conciliação: o juiz togado ou
leigo esclarecerá as partes presentes sobre as vantagens da conciliação, mostrando-lhes os riscos e as
consequências do litígio, nos termos do artigo 21.º da mesma lei. “A conciliação será conduzida pelo Juiz
togado ou leigo ou por conciliador sob sua orientação. Obtida a conciliação, esta será reduzida a escrito e
homologada pelo juiz togado, mediante sentença com eficácia de título executivo” (artigo 22.º).
21
Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
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No caso de não ter sido possível a conciliação, as partes poderão optar, de comum acordo, pelo recurso ao
juízo arbitral, nos termos do artigo 24.º, cujo n.º 1.º que dispõe: “O juízo arbitral considerar-se-á instaurado,
independentemente de termo de compromisso, com a escolha do árbitro pelas partes. Se este não estiver
presente, o Juiz convocá-lo-á e designará, de imediato, a data para a audiência de instrução.”
O árbitro será escolhido de entre os juízes leigos (n.º 2). Terminada a instrução, ou nos 5 dias
subsequentes, o árbitro apresentará o laudo ao juiz togado para homologação por sentença irrecorrível, em
conformidade com o artigo 26.º da Lei n.º 9099.
Não instituído o juízo arbitral, proceder-se-á imediatamente à audiência de instrução e julgamento, “desde
que não resulte prejuízo para a defesa” (artigo 27.º).
Na audiência de instrução e julgamento serão ouvidas as partes, colhida a prova e, em seguida, proferida a
sentença (artigo 28.º).
A contestação, que será oral ou escrita, conterá toda a matéria de defesa, exceto arguição de suspeição ou
impedimento do juiz, que se processará na forma da legislação em vigor (artigo 30.º).
No que se refere aos meios de prova, o artigo 32.º dispõe que: “todos os meios de prova moralmente
legítimos, ainda que não especificados em lei, são hábeis para provar a veracidade dos fatos alegados pelas
partes.”
Quanto a custas, a sentença de “primeiro grau” não condenará o vencido em custas e honorários de
advogado, ressalvados os casos de litigância de má-fé. Em “segundo grau”, o recorrente, vencido, pagará as
custas e honorários de advogado, que serão fixados entre 10% e 20% do valor de condenação ou, não
havendo condenação, do valor corrigido da causa (artigo 55.º).
O acordo extrajudicial constitui um desiderato, cuja obtenção é procurada nos Juizados Especiais, este,
independentemente da sua natureza ou valor, poderá sempre ser homologado no juízo competente, valendo a
sentença como título executivo judicial, nos termos do artigo 57.º.
Refira-se que a audiência de julgamento é o último recurso nos Juizados Especiais Cíveis, antes é sempre
tentada a conciliação e, não logrado êxito por esta via, a arbitragem.
O Capítulo III da mencionada lei trata dos Juizados Especiais Criminais. Estes foram criados com
competência para a conciliação, para o julgamento e a execução “ dasinfrações penais de menor potencial
ofensivo”, nos termos do artigo 60.º.
No seu artigo 62.º a Lei dos Juizados Especiais prevê alguns dos seus princípios, tais como a oralidade, a
informalidade e a celeridade, tendo em vista assegurar a reparação dos danos materiais e morais sofridos pela
vítima, sendo defendida a aplicação de pena não privativa de liberdade.
O artigo 61.º da Lei n. 9.099/95 considera “infrações penais de menor potencial ofensivo”, para efeitos
desta lei,“as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos
cumulada ou não com multa”.
Nos termos do artigo 95.º Lei n. 9.099/95, com a redação dada pela Lei n.º 12.726, de 16 de outubro de
2012, serão criados e instalados os Juizados Especiais Itinerantes, que deverão dirimir, prioritariamente, os
conflitos existentes nas áreas rurais ou nos locais de menor concentração populacional.
O sucesso dos Juizados Especiais no Brasil já conduziu à sua extensão à justiça federal, através da Lei n.º
10.259, de 12 de julho de 2001, que dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no
âmbito da Justiça Federal.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Da pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (PLC), verificou-se que
não se encontra pendente qualquer iniciativa legislativa sobre a mesma matéria.
Petições
Consultada a base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (PLC), verificou-se que não
se encontra pendente quaisquer petições sobre esta matéria.
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V. Consultas e contributos
Consultas obrigatórias
Nos termos legalmente aplicáveis, foram solicitados, a 11 de dezembro, pareceres às seguintes entidades:
Conselho Superior da Magistratura, Conselho Superior do Ministério Público, Ordem dos Advogados, Câmara
dos Solicitadores, Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz, Associação Nacional dos Juízes de
Paz, Associação Sindical dos Juízes, Associação Nacional dos Municípios Portugueses e Associação Nacional
de Freguesias.
Pareceres/contributos enviados pelo Governo
Em cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 124.º do Regimento da Assembleia da República, o
Governo enviou os pareceres que solicitou e recebeu durante a fase de preparação da iniciativa em análise.
Não enviou, contudo, ao arrepio da regra citada do Regimento, o “estudo de avaliação sucessiva do regime
jurídico dos julgados de paz que o Ministério da Justiça levou a cabo por ocasião da celebração dos dez anos
de vigência da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho” que, de acordo com a exposição de motivos, terá motivado a
apresentação da proposta de lei sub judice.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face dos elementos disponíveis, designadamente do articulado da proposta de lei e da respetiva
exposição de motivos, não é possível avaliar os encargos resultantes da aprovação da presente iniciativa
legislativa e da sua consequente aplicação.
———
PROPOSTA DE LEI N.º 116/XII (2.ª)
(ESTABELECE OS PRINCÍPIOS GERAIS APLICÁVEIS À MEDIAÇÃO REALIZADA EM PORTUGAL,
BEM COMO OS REGIMES JURÍDICOS DA MEDIAÇÃO CIVIL E COMERCIAL, DOS MEDIADORES E DA
MEDIAÇÃO PÚBLICA)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica
elaborada pelos serviços de apoio
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
I – Considerandos
1 – Análise sucinta da iniciativa
A primeira característica que salta à vista na iniciativa em apreço é a da sistematização, isto é:
pretende o Governo reunir num só dispositivo legal o que já hoje se encontra regulado por normativos
diversos, consagrando, assim, “os princípios gerais que regem a mediação realizada em Portugal (…), [o]
regime jurídico da mediação civil e comercial (…), [o] regime dos mediadores em Portugal e (…) o regime da
mediação pública”.
De forma muito sintética, a iniciativa está dividida em seis capítulos:
– O primeiro dos quais – composto pelos artigos 1.º e 2.º – dedicado às disposições gerais;
– O segundo (artigos 3.º a 9.º), que contém os princípios que se aplicarão “a todas as mediações
realizadas em Portugal” (princípios da voluntariedade, da confidencialidade, da igualdade e
imparcialidade, da independência, da competência e da responsabilidade e, finalmente, da
executoriedade);
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– E o terceiro, dedicado à mediação civil e comercial, cuja secção I (contendo os artigos 10.º a 12.º)
reúne as disposições gerais, enquanto a secção II (artigos 13.º a 15.º) regula a mediação pré-judicial,
contendo a secção III (artigos 16.º a 22.º) as normas relativas ao processo de mediação.
É neste último capítulo que se esclarece o âmbito de aplicação da mediação civil e comercial e que se
estabelecem as regras relativas à convenção de mediação, ao mesmo tempo que, no que à mediação pré-
judicial concerne, se definem as regras de suspensão de prazos de caducidade e prescrição e a possibilidade
de homologação de acordo obtido em mediação.
No que ao procedimento respeita, estabelecem-se preceitos sobre o início do mesmo, a escolha do
mediador, a presença das partes e demais técnicos, o final do procedimento, o acordo, a duração e a
suspensão do procedimento.
– O capítulo IV (artigos 23.º a 29.º) contém o estatuto dos mediadores de conflitos, o capítulo V
(artigos 30.º a 44.º) reporta-se aos sistemas públicos de mediação – aos quais se aplica, para além dos
referidos no capítulo II, o princípio da publicidade –, enquanto o capítulo VI se ocupa das disposições
finais e transitórias.
2 – Enquadramento
Esta proposta de lei não nasce do nada, como se lê nos seus considerandos. A mediação, enquanto
processo estruturado através do qual duas ou mais partes em litígio procuram voluntariamente alcançar um
acordo sobre a resolução do seu litígio com a assistência de uma parte terceira neutra e qualificada – o
mediador – tem antecedentes vários que devem ser recordados para melhor compreensão da proposta. O
mediador ajuda as partes a chegarem a acordo sem expressar efetivamente nem formalmente uma opinião
sobre as soluções possíveis para o litígio. Durante a mediação, as partes são convidadas a encetar ou reatar o
diálogo e a evitar confrontos. As partes escolhem a técnica de resolução do litígio e desempenham um papel
particularmente ativo nos esforços para encontrar a solução que mais lhes convém. Em Portugal a mediação
foi acolhida nos Gabinetes de Mediação Familiar, ao nível da regulação do poder paternal e, posteriormente,
nos Julgados de Paz1.
A primeira experiência desta forma de resolução alternativa de conflitos surgiu em 1993, com a criação do
Instituto Português de Mediação Familiar, cuja equipa era multidisciplinar: psicólogos, juristas, magistrados
judiciais e terapeutas familiares. O projeto de desenvolvimento da mediação familiar em Portugal foi da
responsabilidade do Centro de Estudos Judiciários, que organizou e ministrou, conjuntamente com o
Instituto Português de Mediação Familiar, o primeiro curso de formação de mediadores familiares, que
decorreu no ano letivo de 1994/95. É nesta altura e neste contexto que os princípios da mediação, na
área familiar, são introduzidos em Portugal.
No entanto, a institucionalização da mediação familiar, enquadrada nos objetivos de reforçar a proteção
da família e o interesse da criança, só ocorreu em 1997, ano em que o Ministério da Justiça, em parceria com
a Ordem dos Advogados, criou um serviço público familiar, através do Gabinete de Mediação Familiar, para
apoio à resolução de conflitos familiares entre pais com filhos menores em situação de separação ou divórcio,
no que respeita à regulação do exercício do poder paternal, a título experimental, em Lisboa. Este Gabinete de
Mediação Familiar “delimitará a sua ação às situações de conflito parental relativas à regulação do exercício
do poder paternal, à alteração da regulação do exercício do poder paternal e aos incumprimentos do regime
exercício do poder paternal para cujo conhecimento seja competente a comarca de Lisboa” (Despacho n.º 12
368/97).
A atividade do Gabinete de Mediação Familiar é desenvolvida com a garantia de extrajudicialidade,
voluntariedade, gratuitidade, rapidez, flexibilidade e confidencialidade.
Posteriormente, em 1999, a possibilidade de recurso ao mecanismo de mediação surge com a Lei n.º
133/99, de 28 de agosto (adita o artigo 147.º-D2 ao Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de outubro, que aprovou a
Organização Tutelar de Menores), no âmbito do processo de regulação do exercício do poder paternal.
1 A Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, regula a competência, organização e funcionamento dos julgados de paz e a tramitação dos processos
da sua competência. 2 O artigo 147.º-D do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de outubro, que aprovou a Organização Tutelar de Menores), estabelece que “em
qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, designadamente em processo de regulação do exercício do poder
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Também a Lei n.º 166/99, de 14 de setembro (Lei Tutelar Educativa), prevê a possibilidade de
recurso ao mecanismo de mediação, no seu artigo 42.º que, sob a epígrafe Mediação, estabelece que para
realização das finalidades do processo, e com os efeitos previstos na presente lei, a autoridade judiciária pode
determinar a cooperação de entidades públicas ou privadas de mediação (n.º 1). A mediação tem lugar por
iniciativa da autoridade judiciária, do menor, seus pais, representante legal, pessoa que tenha a sua guarda de
facto ou defensor (n.º 2)”.
Ainda em 1999, outras normas preveem mecanismos de mediação, nomeadamente o Decreto-Lei n.º
146/99, de 4 de maio, que estabelece os princípios e regras a que devem obedecer a criação e o
funcionamento de entidades privadas de resolução extrajudicial de conflitos de consumo, e o Decreto-Lei n.º
486/99, de 13 de novembro (Aprova o novo Código dos Valores Mobiliários), que estabelece mecanismos de
mediação de conflitos entre os investidores e as várias entidades intervenientes nos mercados de
valores mobiliários (artigos 33.º e 34.º).
Em 2007, através do Despacho 18778/2007, de 22 de agosto, foi criado o sistema de mediação
familiar (SMF). O SMF tem competência para mediar litígios surgidos no âmbito de relações familiares,
abrangendo, nomeadamente as seguintes matérias:
a) Regulação, alteração e incumprimento do regime de exercício do poder paternal;
b) Divórcio e separação de pessoas e bens;
c) Conversão da separação de pessoas e bens em divórcio;
d) Reconciliação dos cônjuges separados;
e) Atribuição e alteração de alimentos provisórios ou definitivos;
f) Privação do direito ao uso dos apelidos do outro cônjuge;
g) Autorização do uso dos apelidos do ex-cônjuge ou da casa de morada da família.
Atualmente, o SMF funciona em todo o território nacional.
A Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, que regula a competência, organização e funcionamento dos
julgados de paz e a tramitação dos processos da sua competência, prevê a mediação como fase
processual no âmbito dos julgados de paz.
Nos termos do n.º 1 do artigo 35.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, “a Mediação é uma modalidade
extrajudicial de resolução de litígios, de carácter privado, informal, confidencial, voluntário e natureza não
contenciosa, em que as partes, com a sua participação ativa e direta são auxiliadas por um mediador a
encontrar, por si próprias, uma solução negociada e amigável para o conflito que as opõe”.
Nos Julgados de Paz quando o processo é resolvido por acordo alcançado através de mediação, a taxa é
reduzida para € 50, devolvendo-se a cada parte a quantia de € 10, nos termos do artigo 7.º da Portaria n.º
1456/2001, de 28 de dezembro, alterada pela Portaria n.º 209/2005, de 24 de fevereiro.
A mediação é tida por vantajosa para o próprio sistema judicial, já que poderá libertar os tribunais de
processos, dando à justiça tradicional maior oportunidade para se concentrar em outras áreas que não sejam
passíveis de resolução através de meios alternativos.
No caso português a mediação, embora seja uma atividade independente, está integrada num tribunal, não
obstante se tratar de tribunais especiais, como são os Julgados de Paz, o que significa que os encargos com o
pagamento dos mediadores são suportados pelo Ministério da Justiça, nos termos do n.º 1 do Despacho n.º
15 353/20043.
Relativamente às condições de acesso aos serviços de mediação dos julgados de paz e às custas
inerentes, foi publicada a Portaria n.º 1112/2005, de 28 de outubro, que aprova o regulamento que disciplina
a organização e o funcionamento dos serviços de mediação disponíveis nos julgados de paz e estabelece as
condições de acesso aos mesmos, bem como as regras por que deve pautar-se a atividade dos mediadores
de conflitos.
paternal, oficiosamente, com o consentimento dos interessados, ou a requerimento destes, pode o juiz determinar a intervenção de serviços públicos ou privados de mediação. O juiz homologa o acordo obtido por via de mediação se este satisfizer o interesse do menor” 3 O referido n.º 1 do Despacho n.º 15 353/2004, publicado no Diário da República II Série, n.º 178, de 30 de julho de 2004, tem o seguinte
teor: A remuneração a auferir pelo mediador, atribuída por cada processo de mediação, independentemente do número de sessões realizadas, é fixada nos seguintes termos: a) € 100, quando o processo for concluído por acordo das partes alcançado através da mediação;b)€ 90, quando as partes não chegarem a acordo na mediação.
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O mediador nos julgados de paz tem de reunir os seguintes requisitos: (i) ter mais de 25 anos de idade; (ii)
estar no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos; (iii) possuir uma licenciatura adequada; (iv) estar
habilitado com um curso de mediação reconhecido pelo Ministério da Justiça; (v) não ter sofrido condenação
nem estar pronunciado por crime doloso; (vi) ter o domínio da língua portuguesa; (vii) ser preferencialmente
residente na área territorial abrangida pelo julgado de paz.
A Mediação Penal foi introduzida no ordenamento jurídico português através da Lei n.º 21/2007, de
12 de junho. O Governo executou assim o disposto no artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do
Conselho da União Europeia, relativa ao estatuto da vítima em processo penal, que determina que os Estados-
membros se devem esforçar por promover a Mediação, no âmbito de processos de natureza criminal.
O Sistema de Mediação Penal tem competência para mediar litígios resultantes da prática de determinados
crimes4.
Para haver lugar a mediação é necessário, designadamente: i) que exista um processo-crime; ii) que
estejam em causa crimes que dependam de acusação particular ou crimes contra as pessoas ou o património
cujo procedimento penal dependa de queixa; iii) que o tipo de crime em causa preveja pena de prisão até 5
anos ou pena de multa; iv) que o ofendido tenha idade igual ou superior a 16 anos; v) que não estejam em
causa crimes contra a liberdade ou contra a autodeterminação sexual; vi) que a forma de processo em causa
não seja a forma de processo sumário ou a forma de processo sumaríssimo.
No âmbito do quadro legislativo relativo à mediação penal, foi publicada a Portaria n.º 68-C/2008, de 22 de
janeiro, alterada pela Portaria n.º 732/2009, de 8 de julho, que aprova o Regulamento do Sistema de Mediação
Penal.
O Sistema de Mediação Laboral (SML) foi criado através de um Protocolo celebrado em 5 de maio de
2006 entre o Ministério da Justiça e a Confederação da Indústria Portuguesa (CIP), a Confederação do
Comércio e Serviços de Portugal (CCP), a Confederação do Turismo Português (CTP), a Confederação
dos Agricultores de Portugal (CAP), a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses –
Intersindical Nacional (CGTP - IN) e a União Geral dos Trabalhadores (UGT).
Desde o início de funcionamento do SML, em 19 de dezembro de 2006, mais de 80 entidades aderiram a
esta forma de Mediação, designadamente associações profissionais, entidades empregadoras e sindicatos de
referência no panorama nacional.
O SML é um serviço promovido pelo Ministério da Justiça, que permite aos trabalhadores e empregadores
utilizar a mediação laboral para resolver litígios laborais.
O SML tem competência para mediar litígios surgidos no âmbito do contrato individual de trabalho, com
exceção das matérias relativas aos direitos indisponíveis, abrangendo, nomeadamente: pagamento de créditos
decorrentes da cessação do contrato de trabalho; promoções; mudança do local de trabalho; rescisão do
contrato de trabalho; marcação de férias; procedimento disciplinar; natureza jurídica do contrato de trabalho.
O empregador e o trabalhador que tenham um litígio podem, voluntariamente e através de decisão
conjunta, submeter o litígio a mediação. Também o Juiz pode, nos termos do disposto no artigo 279.º-A do
Código de Processo Civil, determinar a intervenção da mediação, salvo quando alguma das partes
expressamente se opuser a tal remessa.
A utilização do SML tem um custo para os mediados no valor de 50€ para cada uma das partes,
independentemente do número de sessões de mediação. Pode não haver lugar ao pagamento dessa taxa
quando seja concedido apoio judiciário a uma ou a ambas as partes.
4Entre os crimes suscetíveis de mediação contam-se as ofensas à integridade física simples ou por negligência, as ameaça, a difamação,
a injúria, a violação de domicílio ou perturbação da vida privada, o furto, o abuso de confiança, o dano, a alteração de marcos, a burla, a burla para obtenção de alimentos, bebidas ou serviços e a usura. Durante a fase de inquérito, fase processual em que se investiga a prática de um crime, o arguido e o ofendido podem, voluntariamente e através de decisão conjunta, requerer ao Ministério Público a remessa do processo para mediação. Também o Ministério Público pode, durante a mesma fase de inquérito e caso tenha recolhido indícios da prática do crime e de quem foi o agente que o praticou, remeter o processo para Mediação, se entender que desse modo se pode responder às exigências de prevenção que no caso se façam sentir. Nesse caso só haverá mediação se o arguido e o ofendido concordarem. Sempre que da mediação resulte um acordo o Ministério Público tem obrigatoriamente de verificar se ele é legal e, em caso afirmativo, esse acordo equivale a desistência de queixa por parte do ofendido e à não oposição do arguido, findando deste modo o processo de mediação penal. Caso o acordo não seja cumprido no prazo fixado, o ofendido pode renovar a queixa no prazo de um mês e o inquérito é reaberto. A utilização do SMP é gratuita, independentemente do número de mediações. O SMP está em funcionamento nas comarcas do Barreiro, Braga, Cascais, Coimbra, Loures, Moita, Montijo, Porto, Santa Maria da Feira, Seixal, Setúbal e Vila Nova de Gaia e ainda nas comarcas-piloto de Alentejo Litoral, Baixo Vouga e Grande Lisboa Noroeste.
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A mediação laboral tem um limite temporal de 3 meses para a obtenção do acordo. No entanto, as partes,
com o acordo do mediador, poderão prorrogar a duração da mediação se assim o entenderem. Em média, um
processo no SML tem a duração de 28 dias.
No momento presente, o SML funciona em todo o território continental.
O Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, prevê a possibilidade da
conciliação poder ser transformada em mediação, nos termos dos artigos 525.º a 528.º.
Em 2009, através da Lei n.º 29/2009, de 29 de junho, alterada pelas Leis n.os
1/2010, de 15 de janeiro,
e 44/2010, de 3 de setembro, que transpôs a Diretiva 2008/52/CE, do Parlamento e do Conselho, de 21
de maio de 2008, relativa a certos aspetos da mediação em matéria civil e comercial, a mediação
passou a estar expressamente prevista no Código de Processo Civil, sendo possível o recurso aos
sistemas de mediação antes ou durante a pendência de um processo judicial.
É neste quadro evolutivo que é apresentada a proposta de lei do Governo.
II – Opinião da Relatora
Tendo em conta o que foi relatado em termos de antecedentes em matéria de mediação no nosso sistema
jurídico, é opinião da relatora que não há fundamento para uma objeção de caráter geral à proposta de lei.
Com efeito, parece claro que estarmos perante um regime unificador de regimes jurídicos de mediação já
existentes de diferente natureza: públicos (laboral, penal e familiar); integrados numa orgânica específica
(julgados de paz); ou casos mais recentes (como os de direito do consumo).
Crê-se que, na especialidade, alguns preceitos poderão ser melhorados, até para benefício do espírito do
sistema, como é o caso do n.º 2 do artigo 11.º, segundo o qual, “Podem ainda ser objeto de mediação os
litígios em matéria civil e comercial que não envolvam interesses de natureza patrimonial, desde que as partes
possam celebrar transação sobre o direito controvertido”. Como bem assinala o Parecer do CSM, “isto
corresponde a não poderem ser sujeitos litígios que respeitassem a direitos indisponíveis na medida em que
em relação a estes, segundo as regras gerais do processo civil, “não é permitida a desistência, confissão ou
transação que importe a afirmação da vontade das partes relativamente a direitos indisponíveis (artigo 299.º
do CPC) ”. Porém a proposta de lei não prevê qualquer norma que permita aplicar subsidiariamente as normas
de direito processual civil, bem pelo contrário, as regras a que o processo de mediação fica sujeito são as
estabelecidas no diploma que institua a entidade responsável pela sua efetivação. Ou seja, afastada, ab initio,
a aplicação subsidiária das regras do processo civil, tal significará, tal como afirma o CSM, uma inversão de
um princípio fundamental do direito privado segundo o qual os direitos indisponíveis não podem ficar sujeitos
aos simples interesses das partes. Não por acaso, não se admite transação quanto aos mesmos. Bem mais
consentâneo com a nossa ordem jurídica seria, pois, que se salvaguardasse na redação da lei a exclusão de
composição de direitos indisponíveis – bastaria um acrescento – sendo que a mediação penal e de sistemas
de família já está salvaguardada pela própria proposta de lei.
Também, e sem esgotar os preceitos que, em especial merecem, em sede de opinião, reparos, o artigo
11.º, n.º 3, da proposta de lei é um preceito claramente abusivo no que toca à restrição que impõe aos poderes
do juiz que homologa um acordo obtido em mediação pré-judicial. Senão vejamos: nos termos do projetado
preceito, A homologação judicial do acordo obtido em mediação pré-judicial tem por finalidade verificar se o
mesmo respeita a litígio que possa ser objeto de mediação, a capacidade das partes para a sua celebração, e
se o seu conteúdo não viola a ordem pública. Dir-se-ia que é pouco. Dir-se-ia mesmo que é de duvidosa
legitimidade o legislador impedir um juiz de, em verificando que um acordo desta natureza enferma, por
exemplo, de qualquer violação a qualquer princípio geral de direito, que viola a boa-fé ou que constitui um
abuso de direito, tenha de – permita-se a expressão – fechar os olhos e proceder à homologação porque
assim o dita a futura lei aqui em apreço.
O regime de confidencialidade das informações levanta dúvidas que se têm por legítimas: há um dever de
confidencialidade imposto ao mediador [artigo 26.º, alínea d)], sancionado pelo sistema público (artigo 44.ºº),
parecendo ser inconsequente a violação de qualquer dever de sigilo noutros sistemas e, para além disso, por
parte de outros intervenientes na mediação (partes, representantes, assistentes, etc.).
A proposta de lei, entre muitas outras falhas, institui um mecanismo legal de fiscalização do exercício da
atividade de mediação pública (artigo 43.º), mas é totalmente omissa, nesse propósito, no que toca à
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mediação privada, o que pode ter consequências fáceis de imaginar, como a homologação de Acordos, que
podem ter sido manipulados, pelo Estado, como, de resto, adverte a PGR.
III – Conclusões
1. O Governo apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 116/XII (2.ª) –Estabelece os
princípios gerais aplicáveis à mediação realizada em Portugal, bem como os regimes jurídicos da mediação
civil e comercial, dos mediadores e da mediação pública.
2. Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de
parecer que a Proposta de Lei n.º 116/XII (2.ª) reúne as condições necessárias para subir a Plenário.
IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
Palácio de S. Bento, 22 de janeiro de 2012.
A Deputada Relatora, Isabel Moreira — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, registando a ausência de Os Verdes.
Nota Técnica
Proposta de Lei n.º 116/XII (2.ª) (GOV)
Estabelece os princípios gerais aplicáveis à mediação realizada em Portugal, bem como os regimes
jurídicos da mediação civil e comercial, dos mediadores e da mediação pública.
Data de admissão: 5 de dezembro de 2012
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: João Amaral (DAC), Fernando Ribeiro e Filomena Romano de Castro (DILP), Laura Costa
(DAPLEN), Luís Correia da Silva e Maria Teresa Félix (BIB).
Data: 21 de dezembro de 2012
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
Com a iniciativa em apreço, pretende o Governo reunir num só dispositivo legal o que já hoje se encontra
regulado por normativos diversos, consagrando, assim, “os princípios gerais que regem a mediação realizada
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em Portugal (…), [o] regime jurídico da mediação civil e comercial (…), [o] regime dos mediadores em Portugal
e (…) o regime da mediação pública”.
De forma muito sintética, a iniciativa está dividida em seis capítulos, o primeiro dos quais – composto pelos
artigos 1.º e 2.º – dedicado às disposições gerais; o segundo (artigos 3.º a 9.º), que contém os princípios que
se aplicarão “a todas as mediações realizadas em Portugal” (princípios da voluntariedade, da
confidencialidade, da igualdade e imparcialidade, da independência, da competência e da responsabilidade e,
finalmente, da executoriedade); e o terceiro, dedicado à mediação civil e comercial, cuja secção I (contendo os
artigos 10.º a 12.º) reúne as disposições gerais, enquanto a secção II (artigos 13.º a 15.º) regula a mediação
pré-judicial, contendo a secção III (artigos 16.º a 22.º) as normas relativas ao processo de mediação.
É neste último capítulo que se esclarece o âmbito de aplicação da mediação civil e comercial e que se
estabelecem as regras relativas à convenção de mediação, ao mesmo tempo que, no que à mediação pré-
judicial concerne, se definem as regras de suspensão de prazos de caducidade e prescrição e a possibilidade
de homologação de acordo obtido em mediação.
No que ao procedimento respeita, estabelecem-se preceitos sobre o início do mesmo, a escolha do
mediador, a presença das partes e demais técnicos, o final do procedimento, o acordo, a duração e a
suspensão do procedimento.
O capítulo IV (artigos 23.º a 29.º) contém o estatuto dos mediadores de conflitos, o capítulo V (artigos 30.º a
44.º) reporta-se aos sistemas públicos de mediação – aos quais se aplica, para além dos referidos no capítulo
II, o princípio da publicidade –, enquanto o capítulo VI se ocupa das disposições finais e transitórias.
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
A iniciativa legislativa sub judice é apresentada pelo Governo, no âmbito do seu poder de iniciativa,
nos termos e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º e na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da
Constituição da República e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
A presente iniciativa toma a forma de proposta de lei, em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo
119.º do RAR, tendo sido aprovada em Conselho de Ministros de 22 de novembro de 2012.
Respeitando os limites estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR, a iniciativa não infringe a
Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o sentido das modificações a introduzir
na ordem legislativa.
Cumprindo os requisitos formais consagrados nos n.os
1 e 2 do artigo 124.º do RAR, a proposta de lei
mostra-se redigida sob a forma de artigos (alguns dos quais divididos em números e alíneas), tem uma
designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma exposição de motivos.
O artigo 124.º do RAR dispõe ainda, no seu n.º 3, que “as propostas devem ser acompanhadas dos
estudos, documentos e pareceres que as tenham fundamentado”. Por sua vez, o Decreto-Lei n.º
274/2009, de 2 de outubro, que regula o procedimento de consulta de entidades, públicas e privadas, realizado
pelo Governo, prevê no seu artigo 6.º, n.º 1, que “Os atos e diplomas aprovados pelo Governo cujos projetos
tenham sido objeto de consulta direta contêm, na parte final do respetivo preâmbulo ou da exposição de
motivos, referência às entidades consultadas e ao carácter obrigatório ou facultativo das mesmas” e no n.º 2
do mesmo artigo que “No caso de propostas de lei, deve ser enviada cópia à Assembleia da República dos
pareceres ou contributos resultantes da consulta direta às entidades cuja consulta seja constitucional ou
legalmente obrigatória e que tenham sido emitidos no decurso do procedimento legislativo do Governo”.
Em conformidade com o estabelecido n.º 1 do supra citado artigo 6.º, o Governo informa, na exposição
de motivos, que “foram ouvidos o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior do Ministério
Público, a Ordem dos Advogados, a Câmara dos Solicitadores, o Conselho de Acompanhamento dos Julgados
de Paz, a Associação Sindical dos Juízes Portugueses, Associação Portuguesa de Arbitragem, a Comissão
Nacional de Proteção de Dados, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e a Comissão de Regulação
de Acesso a Profissões” e que “foi promovida a audição do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e
Fiscais, do Conselho dos Oficiais de Justiça, do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, da
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Associação de Juízes de Paz e do Conselho Nacional do Consumo.”.
Nos termos do n.º 2 do referido artigo 6.º, foram facultados à Assembleia da República os seguintes
pareceres:
Do Conselho Superior da Magistratura;
Do Conselho Superior do Ministério Público;
Da Ordem dos Advogados;
Da Câmara dos Solicitadores;
Do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz;
Da Associação Sindical dos Juízes Portugueses;
Da Associação Portuguesa de Arbitragem (a 29 de maio de 2012 e a 24 de setembro de 2012);
Da Comissão Nacional de Proteção de Dados;
Da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários;
Da Comissão de Regulação de Acesso a Profissões;
Do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais;
Da Direção Geral do Consumidor;
Da União Geral dos Consumidores;
Da Confederação do Comércio e Serviços.
A iniciativa legislativa em apreço deu entrada em 30/11/2012, tendo sido admitida e anunciada em sessão
plenária em 05/12/2012. Por despacho de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, exarado nesta
mesma data, baixou, na generalidade, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias (1.ª).
Verificação do cumprimento da lei formulário
A Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de Agosto,
comummente designada por “lei formulário”, possui um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação
e o formulário dos diplomas, as quais são relevantes em caso de aprovação das iniciativas legislativas e que,
como tal, importa fazer referência.
Assim, cumpre assinalar que, em cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 7.º da “lei formulário”, a
proposta de lei em apreço tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto, indicando que visa
estabelecer os princípios gerais aplicáveis à mediação realizada em Portugal e os regimes jurídicos da
mediação civil e comercial, dos mediadores e da mediação pública.
No que concerne à data de entrada em vigor, o artigo 49.º da proposta de lei determina que a lei “entra em
vigor 30 dias após a sua publicação”.
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
A mediação pode ser definida como um processo estruturado através do qual duas ou mais partes em
litígio procuram voluntariamente alcançar um acordo sobre a resolução do seu litígio com a assistência de uma
parte terceira neutra e qualificada – o mediador.
O mediador ajuda as partes a chegarem a acordo sem expressar efetivamente nem formalmente uma
opinião sobre as soluções possíveis para o litígio. Durante a mediação, as partes são convidadas a encetar ou
reatar o diálogo e a evitar confrontos. As partes escolhem elas próprias a técnica de resolução do litígio e
desempenham um papel particularmente ativo nos esforços para encontrar a solução que mais lhes convém.
Em Portugal a mediação foi acolhida nos Gabinetes de Mediação Familiar, ao nível da regulação do poder
paternal e, posteriormente, nos Julgados de Paz1.
A primeira experiência desta forma de resolução alternativa de conflitos surgiu em 1993, com a criação do
1 A Lei n.º 78/2001, de 13 de julho regula a competência, organização e funcionamento dos julgados de paz e a tramitação dos processos
da sua competência.
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Instituto Português de Mediação Familiar, cuja equipa era bastante multidisciplinar: psicólogos, juristas,
magistrados judiciais e terapeutas familiares. O projeto de desenvolvimento da mediação familiar em Portugal
foi da responsabilidade do Centro de Estudos Judiciários, que organizou e ministrou, conjuntamente com o
Instituto Português de Mediação Familiar, o primeiro curso de formação de mediadores familiares, que
decorreu no ano letivo de 1994/95. É nesta altura e neste contexto que os princípios da mediação, na área
familiar, são introduzidos em Portugal.
No entanto, a institucionalização da mediação familiar, enquadrada nos objetivos de reforçar a proteção da
família e o interesse da criança, só ocorreu em 1997, ano em que o Ministério da Justiça, em parceria com a
Ordem dos Advogados, criou um serviço público familiar, através do Gabinete de Mediação Familiar, para
apoio à resolução de conflitos familiares entre pais com filhos menores em situação de separação ou divórcio,
no que respeita à regulação do exercício do poder paternal, a título experimental, em Lisboa. Este Gabinete de
Mediação Familiar “delimitará a sua ação às situações de conflito parental relativas à regulação do exercício
do poder paternal, à alteração da regulação do exercício do poder paternal e aos incumprimentos do regime
exercício do poder paternal para cujo conhecimento seja competente a comarca de Lisboa” (Despacho n.º 12
368/97).
A atividade do Gabinete de Mediação Familiar é desenvolvida com a garantia de extrajudicialidade,
voluntariedade, gratuitidade, rapidez, flexibilidade e confidencialidade.
Posteriormente, em 1999, a possibilidade de recurso do mecanismo de mediação surge com a Lei n.º
133/99, de 28 de agosto (adita o artigo 147.º-D2 ao Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de outubro que aprovou a
Organização Tutelar de Menores), no âmbito do processo de regulação do exercício do poder paternal.
Também a Lei n.º 166/99, de 14 de setembro (Lei Tutelar Educativa), prevê a possibilidade de recurso do
mecanismo de mediação, no seu artigo 42.º, sob a epígrafe Mediação, estabelece que para realização das
finalidades do processo, e com os efeitos previstos na presente lei, a autoridade judiciária pode determinar a
cooperação de entidades públicas ou privadas de mediação (n.º 1). A mediação tem lugar por iniciativa da
autoridade judiciária, do menor, seus pais, representante legal, pessoa que tenha a sua guarda de facto ou
defensor (n.º 2)”.
Ainda em 1999, outras normas preveem mecanismos de mediação, nomeadamente o Decreto-Lei n.º
146/99, de 4 de maio que estabelece os princípios e regras a que devem obedecer a criação e o
funcionamento de entidades privadas de resolução extrajudicial de conflitos de consumo, e o Decreto-Lei n.º
486/99, de 13 de novembro (Aprova o novo Código dos Valores Mobiliários), que estabelece mecanismos de
mediação de conflitos entre os investidores e as várias entidades intervenientes nos mercados de valores
mobiliários (artigos 33.º e 34.º).
Em 2007, através do Despacho 18778/2007, de 22 de agosto, foi criado o sistema de mediação familiar
(SMF). O SMF tem competência para mediar litígios surgidos no âmbito de relações familiares, abrangendo,
nomeadamente nas seguintes matérias:
h) Regulação, alteração e incumprimento do regime de exercício do poder paternal;
i) Divórcio e separação de pessoas e bens;
j) Conversão da separação de pessoas e bens em divórcio;
k) Reconciliação dos cônjuges separados;
l) Atribuição e alteração de alimentos provisórios ou definitivos;
m) Privação do direito ao uso dos apelidos do outro cônjuge;
n) Autorização do uso dos apelidos do ex-cônjuge ou da casa de morada da família;
Atualmente, o SMF funciona em todo o território nacional.
A Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, que regula a competência, organização e funcionamento dos julgados de
paz e a tramitação dos processos da sua competência, prevê a mediação como fase processual no âmbito dos
julgados de paz.
Nos termos do n.º 1 do artigo 35.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, “a Mediação é uma modalidade
2 O artigo 147º- D do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de outubro que aprovou a Organização Tutelar de Menores), estabelece que “em
qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, designadamente em processo de regulação do exercício do poder paternal, oficiosamente, com o consentimento dos interessados, ou a requerimento destes, pode o juiz determinar a intervenção de serviços públicos ou privados de mediação. O juiz homologa o acordo obtido por via de mediação se este satisfizer o interesse do menor”
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extrajudicial de resolução de litígios, de carácter privado, informal, confidencial, voluntário e natureza não
contenciosa, em que as partes, com a sua participação ativa e direta são auxiliadas por um mediador a
encontrar, por si próprias, uma solução negociada e amigável para o conflito que as opõe”.
Nos Julgados de Paz quando o processo é resolvido por acordo alcançado através de mediação, a taxa é
reduzida para € 50, devolvendo-se a cada parte a quantia de € 10, nos termos do artigo 7.º da Portaria n.º
1456/2001, de 28 de dezembro alterada pela Portaria n.º 209/2005, de 24 der fevereiro.
A mediação é vantajosa para o próprio sistema judicial, já que poderá libertar os tribunais de processos,
dando à justiça tradicional maior oportunidade para se concentrar em outras áreas que não sejam passíveis de
resolução através de meios alternativos.
No caso português a mediação, embora seja uma atividade independente, está integrada num tribunal, não
obstante se tratar de tribunais especiais, como são os Julgados de Paz, o que significa que os encargos com o
pagamento dos mediadores são suportados pelo Ministério da Justiça, nos termos do n.º 1 do Despacho n.º 15
353/20043.
Relativamente às condições de acesso aos serviços de mediação dos julgados de paz e às custas
inerentes, foi publicada a Portaria n.º 1112/2005, de 28 de outubro que aprova o regulamento que disciplina a
organização e o funcionamento dos serviços de mediação disponíveis nos julgados de paz e estabelece as
condições de acesso aos mesmos, bem como as regras por que deve pautar-se a atividade dos mediadores
de conflitos.
O mediador nos julgados de paz tem de reunir os seguintes requisitos: (i) ter mais de 25 anos de idade; (ii)
estar no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos; (iii) possuir uma licenciatura adequada; (iv) estar
habilitado com um curso de mediação reconhecido pelo Ministério da Justiça; (v) não ter sofrido condenação
nem estar pronunciado por crime doloso; (vi) ter o domínio da língua portuguesa; (vii) ser preferencialmente
residente na área territorial abrangida pelo julgado de paz.
A Mediação Penal foi introduzida no ordenamento jurídico português através da Lei n.º 21/2007, de 12 de
junho. O Governo executou assim o disposto no artigo 10.º da Decisão Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho
da União Europeia, relativa ao estatuto da vítima em processo penal, que determina que os Estados-membros
se devem esforçar por promover a Mediação, no âmbito de processos de natureza criminal.
O Sistema de Mediação Penal tem competência para mediar litígios resultantes da prática de determinados
crimes4.
Para haver lugar a mediação é necessário, designadamente: i) que exista um processo-crime; ii) que
estejam em causa crimes que dependam de acusação particular ou crimes contra as pessoas ou o património
cujo procedimento penal dependa de queixa; iii) que o tipo de crime em causa preveja pena de prisão até 5
anos ou pena de multa; iv) que o ofendido tenha idade igual ou superior a 16 anos; v) que não estejam em
causa crimes contra a liberdade ou contra a autodeterminação sexual; vi) que a forma de processo em causa
não seja a forma de processo sumário ou a forma de processo sumaríssimo.
No âmbito do quadro legislativo relativo à mediação penal, foi publicada a Portaria n.º 68-C/2008, de 22 de
janeiro, alterada pela Portaria n.º 732/2009, de 8 de julho, que aprova o Regulamento do Sistema de Mediação
Penal.
3 O referido n.º 1 do Despacho n. º 15 353/2004, publicado no Diário da República II Série, n.º 178, de 30 de Julho de 2004, tem o seguinte
teor: A remuneração a auferir pelo mediador, atribuída por cada processo de mediação, independentemente do número de sessões realizadas, é fixada nos seguintes termos: a) € 100, quando o processo for concluído por acordo das partes alcançado através da mediação; b)€ 90, quando as partes não chegarem a acordo na mediação. 4Entre os crimes suscetíveis de mediação contam-se as ofensas à integridade física simples ou por negligência, as ameaça, a difamação,
a injúria, a violação de domicílio ou perturbação da vida privada, o furto, o abuso de confiança, o dano, a alteração de marcos, a burla, a burla para obtenção de alimentos, bebidas ou serviços e a usura. Durante a fase de inquérito, fase processual em que se investiga a prática de um crime, o arguido e o ofendido podem, voluntariamente e através de decisão conjunta, requerer ao Ministério Público a remessa do processo para mediação. Também o Ministério Público pode, durante a mesma fase de inquérito e caso tenha recolhido indícios da prática do crime e de quem foi o agente que o praticou, remeter o processo para Mediação, se entender que desse modo se pode responder às exigências de prevenção que no caso se façam sentir. Nesse caso só haverá mediação se o arguido e o ofendido concordarem. Sempre que da mediação resulte um acordo o Ministério Público tem obrigatoriamente de verificar se ele é legal e, em caso afirmativo, esse acordo equivale a desistência de queixa por parte do ofendido e à não oposição do arguido, findando deste modo o processo de mediação penal. Caso o acordo não seja cumprido no prazo fixado, o ofendido pode renovar a queixa no prazo de um mês e o inquérito é reaberto. A utilização do SMP é gratuita, independentemente do número de mediações. O SMP está em funcionamento nas comarcas do Barreiro, Braga, Cascais, Coimbra, Loures, Moita, Montijo, Porto, Santa Maria da Feira, Seixal, Setúbal e Vila Nova de Gaia e ainda nas comarcas-piloto de Alentejo Litoral, Baixo Vouga e Grande Lisboa Noroeste.
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O Sistema de Mediação Laboral (SML) foi criado através de um Protocolo celebrado em 5 de maio de
2006entre o Ministério da Justiça e a Confederação da Indústria Portuguesa (CIP), a Confederação do
Comércio e Serviços de Portugal (CCP), a Confederação do Turismo Português (CTP), a Confederação dos
Agricultores de Portugal (CAP), a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional
(CGTP - IN) e a União Geral dos Trabalhadores (UGT).
Desde o início de funcionamento do SML, em 19 de dezembro de 2006, mais de 80 entidades aderiram a
esta forma de Mediação, designadamente associações profissionais, entidades empregadoras e sindicatos de
referência no panorama nacional.
O SML é um serviço promovido pelo Ministério da Justiça, que permite aos trabalhadores e empregadores
utilizar a mediação laboral para resolver litígios laborais.
O SML tem competência para mediar litígios surgidos no âmbito do contrato individual de trabalho, com
exceção das matérias relativas aos direitos indisponíveis, abrangendo, nomeadamente: pagamento de créditos
decorrentes da cessação do contrato de trabalho; promoções; mudança do local de trabalho; rescisão do
contrato de trabalho; marcação de férias; procedimento disciplinar; natureza jurídica do contrato de trabalho.
O empregador e o trabalhador que tenham um litígio podem, voluntariamente e através de decisão
conjunta, submeter o litígio a mediação. Também o Juiz pode, nos termos do disposto no artigo 279.º-A do
Código de Processo Civil, determinar a intervenção da mediação, salvo quando alguma das partes
expressamente se opuser a tal remessa.
A utilização do SML tem um custo para os mediados no valor de 50 € para cada uma das partes,
independentemente do número de sessões de mediação. Pode não haver lugar ao pagamento dessa taxa
quando seja concedido apoio judiciário a uma ou a ambas as partes.
A mediação laboral tem um limite temporal de 3 meses para a obtenção do acordo. No entanto, as partes,
com o acordo do mediador, poderão prorrogar a duração da mediação se assim o entenderem. Em média, um
processo no SML tem a duração de 28 dias.
No momento presente, o SML funciona em todo o território continental.
O Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, prevê a possibilidade da
conciliação poder ser transformada em mediação, nos termos dos artigos 525º a 528º.
Em 2009, através da Lei n.º 29/2009, de 29 de junho, alterada pelas Leis n.os
1/2010, de 15 de janeiro, e
44/2010, de 3 de setembro, que transpôs a Diretiva 2008/52/CE, do Parlamento e do Conselho, de 21 de maio
de 2008, relativa a certos aspetos da mediação em matéria civil e comercial, a mediação passou a estar
expressamente prevista no Código de Processo Civil, sendo possível o recurso aos sistemas de mediação
antes ou durante a pendência de um processo judicial.
Para acompanhamento da Proposta de Lei em análise, destacam-se os seguintes diplomas:
– Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro aprova a Lei de Arbitragem Voluntária.
– Lei n.º 9/2009, de 4 de março, alterada pela Lei n.º 41/2012, de 28 de agosto, transpôs para a ordem
jurídica interna a Diretiva n.º 2005/36/CE, do Parlamento e do Conselho, de 7 de setembro, relativa ao
reconhecimento das qualificações profissionais, e a Diretiva n.º 2006/100/CE, do Conselho, de 20 de
novembro, que adapta determinadas diretivas no domínio da livre circulação de pessoas, em virtude da
adesão da Bulgária e da Roménia.
– Lei n.º 67/98, de 26 de outubro, retificada pela Declaração de Retificação n.º 22/98 , aprova a Lei de
Proteção de Dados Pessoais
– Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março.
– Portaria n.º 203/2011, de 20 de maio que define quais os sistemas de mediação prejudicial cuja utilização
suspende os prazos de caducidade e prescrição dos direitos e procede à regulamentação do seu regime e os
sistemas de mediação judicial que suspendem a instância.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
CAMPOS, Joana – O princípio da confidencialidade na mediação. Scientia ivridica: revista de direito
comparado português e brasileiro. Braga. ISSN 0870-8185. A. 58, n.º 318 (Abr./Jun. 2009), p. 311-333.
Cota: RP-92.
Resumo: Este artigo aborda o tema da mediação. Nele a sua autora pretende identificar, brevemente, quais
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os princípios que enformam este meio de resolução de litígios e lhe são essenciais. Dentro destes, procura
estudar mais aprofundadamente o princípio da confidencialidade e os seus limites. Este estudo centrar-se-á na
mediação levada a cabo nos julgados de paz e em âmbito privado, deixando de fora a mediação nos sistemas
familiar, penal e laboral.
CARDOSO, Maria Manuela de Melo – A mediação em direito do trabalho. Prontuário de Direito do
Trabalho. Coimbra. ISSN 873-4895. N.º 88-89 (Jan./Ago. 2011), p. 197-207. Cota: RP-214.
Resumo: O presente artigo faz uma análise da mediação laboral. Nele a autora começa por contextualizar
a mediação laboral dentro das outras modalidades de resolução alternativa de litígios no nosso país. De
seguida faz uma referência ao Sistema de Mediação Laboral, que se destina à resolução extrajudicial dos
conflitos individuais de trabalho e que vigora entre nós desde 19 de dezembro de 2006. Por último desenvolve
a questão da mediação laboral no Código de Processo do Trabalho e no Código de Processo Civil.
CARMO, Rui do – Um exercício de leitura do regime jurídico da mediação penal. Revista portuguesa de
ciência criminal. Lisboa. ISSN 0871-8563. A. 20, n.º 3 (Jul./Set. 2010), p. 451-474. Cota: RP-514.
Resumo: Neste artigo o autor aborda a questão da mediação penal. Mais precisamente, faz uma análise da
Lei n.º 21/2007, de 12 de junho, que instituiu o regime jurídico da mediação penal em Portugal. Esta análise é
feita em cinco partes: 1. O momento processual e âmbito da aplicação da mediação penal; 2. Os pressupostos
da remessa do processo para mediação; 3. O processo de mediação e a celebração (ou não) de acordo; 4. O
não cumprimento do acordo de mediação e a renovação da queixa; 5. Os casos de não aplicabilidade da
mediação.
CRUZ, Rossana Martingo – Mediação familiar: limites materiais dos acordos e o seu controlo pelas
autoridades. 1.ª ed. Coimbra: Coimbra Editora [etc.], 2011. 213 p. (Centro de Direito da Família). ISBN 978-
972-32-1888-6. Cota: 28.06 - 246/2011.
Resumo: Esta obra aborda o tema da mediação familiar. Segundo o autor, ao lidar com questões
eminentemente pessoais, a mediação familiar é, frequentemente, olhada com desconfiança pelo mundo
jurídico. Uma vertente substancial nesta matéria será a destrinça, por vezes ardilosa, entre o que é mediação
e o que é terapia. Independentemente da demarcação desta fronteira, existem vários aspetos atinentes à
mediação familiar que necessitam de concretização jurídica.
GOUVEIA, Mariana França – Curso de Resolução Alternativa de Litígios. Coimbra: Almedina, 2011. 232
p. (Manuais universitários). ISBN 978-972-40-4528-3. Cota: 12.21 - 264/2011.
Resumo: Neste Curso de Resolução Alternativa de Litígios são apresentadas outras formas de resolução
de litígios que convivem lado a lado com o recurso ao tribunal judicial no atual panorama de oferta
diversificada de justiça. O curso trata de forma introdutória as matérias da negociação, mediação, conciliação,
arbitragem e julgados de paz.
LEITE, André Lamas – Justiça prêt-à-porter?: alternatividade ou complementaridade da mediação penal à
luz das finalidades do sancionamento. Revista do Ministério Público. Lisboa. ISSN 0870-6107. A. 30, n.º 117
(Jan./Mar. 2009), p. 85-126. Cota: RP-179.
Resumo: Este artigo aborda o tema da mediação, mais propriamente da mediação penal. Partindo do
regime legal, o autor analisa até que ponto a mediação cumpre as finalidades preventivas do Direito Criminal.
Fá-lo através da desconstrução de algumas pré-compreensões sobre este mecanismo, nomeadamente da
ideia de que estamos perante um novo paradigma de Justiça, propendendo, sim, para o seu carácter
complementar e necessariamente respeitador dos traços fisionómicos do Direito Processual Penal português.
LEITE, André Lamas – A mediação penal de adultos: um novo paradigma de justiça?: análise crítica
da Lei n.º 21/2007, de 12 de Junho. Coimbra: Coimbra Editora, 2008. 236 p. ISBN 978-972-32-1606-6. Cota:
12.06.8 - 629/2008.
Resumo: A presente obra aborda a questão da mediação criminal, nomeadamente o tratamento legislativo
de que a matéria foi alvo através da Lei n.º 21/2007, de 12 de junho, e da respetiva regulamentação operada
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pelas Portarias nos
68-A a C/2008, todas de 22 de janeiro. Depois de uma introdução e enquadramento do
tema, o autor analisa a questão da mediação como instrumento da política criminal portuguesa seguindo-se
uma referência à legislação de fonte supranacional. Posteriormente, é feita a apreciação crítica à Lei
previamente mencionada.
PRESAS, Immaculada García – Dois modelos de implementação da mediação familiar: Portugal e Brasil.
Scientia ivridica: revista de direito comparado português e brasileiro. Braga. ISSN 0870-8185. A. 57, n.º.
316 (Out./Dez. 2008), p. 711-740. Cota: RP-92.
Resumo: No presente artigo é feita uma análise do tema da mediação familiar. Nele a autora compara dois
modelos de implantação da mediação familiar distintos: um aplicado em Portugal e outro aplicado no Brasil.
Depois de uma breve contextualização histórica e uma análise dos dois modelos, é feita uma breve súmula de
direito comparado com base nestas duas realidades.
SILVA, Paula Costa e – A nova face da justiça: os meios extrajudiciais de resolução de
controvérsias: relatório sobre conteúdo, programa e métodos de ensino. Coimbra: Coimbra Editora,
2009. 191 p. ISBN 978-972-32-1751-3. Cota: 12.21 - 653/2009.
Resumo: O presente texto corresponde ao relatório entregue para obtenção do grau de agregado pela
Universidade de Lisboa. Como o próprio título indica, analisa os meios extrajudiciais de resolução de
controvérsias e, dentro destes, destaca a mediação e a arbitragem.
TILMAN, Vincent – Lessons learnt from the implementation of the EU Mediation Directive: the business
perspective. Legal Affairs [Em linha]. PE 453.173 (Apr. 2011). [Consult. 18 Dez. 2012]. Disponível em
WWW: =40855> Resumo: Este documento apresenta a perspetiva das empresas relativamente à aplicação da Diretiva 2008/52/EC sobre mediação. Nele é analisado o impacto desta Diretiva à luz de três objetivos principais: facilitar o acesso a meios alternativos de resolução de litígios; promover a mediação e procurar um relacionamento equilibrado entre a mediação e o processo judicial. São ainda apresentadas recomendações sobre como promover a mediação no caso das pequenas e médias empresas. VEROUGSTRAETE, Ivan – Lessons learned from implementation of the mediation directive : the judges’ point of view. Legal Affairs [Em linha]. PE 453.169 (Apr. 2011). [Consult. 18 Dez. 2012]. Disponível em WWW: =43070> Resumo: Este documento apresenta o ponto de vista dos juízes de países da União Europeia relativamente à aplicação da Diretiva 2008/52/EC sobre mediação. O facto de a transposição da Diretiva ter variado grandemente de país para país leva a que as expectativas dos juízes sejam também elas muito diferentes nos vários países da União. No entanto, existe um elemento comum que se destaca: todos os juízes dos diferentes países reconhecem a importância dos sistemas alternativos de resolução de conflitos, nomeadamente da mediação. Enquadramento do tema no plano da União Europeia A Lei n.º 29/2009, de 29 de junho, referida na exposição de motivos da iniciativa legislativa em apreciação, transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva 2008/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2008, relativa a certos aspetos da mediação em matéria civil e comercial.5 A presente Diretiva foi adotada com o objetivo geral de assegurar um melhor acesso à justiça, como parte da política da União Europeia para estabelecer um espaço de liberdade, de segurança e de justiça e visa, em particular, facilitar o acesso à resolução alternativa de litígios e promover a resolução amigável de litígios, incentivando o recurso à mediação e assegurando uma relação equilibrada entre a mediação e o processo 5 Informação sobre a mediação nos Estados-membros da UE disponível no endereço https://e-justice.europa.eu/content_mediation_in_member_states-64-EU-en.do
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judicial.6
Em linhas gerais refiram-se como principais disposições desta Diretiva as seguintes7:
– A Diretiva aplica-se aos litígios transfronteiriços, conforme definidos no artigo 2.º, em matéria civil e
comercial - exceto no que se refere aos direitos e obrigações de que as partes não possam dispor ao abrigo
do direito aplicável -, relativamente aos processos em que as partes decidam por acordo recorrer à mediação
após a ocorrência do litígio, aos casos em que um tribunal sugira ou remeta as partes para a mediação ou em
que o direito nacional assim o imponha. Estabelece-se a inexistência de impedimentos a que os Estados-
membros apliquem igualmente as disposições consignadas nesta diretiva aos processos de mediação
internos;
– Tendo em vista a promoção do recurso à mediação, a Diretiva prevê que o tribunal perante o qual é
proposta uma ação possa convidar as partes a recorrerem à mediação para resolução do litígio, sem prejuízo
das condições nela estabelecidas, bem como convidar as partes a assistir a uma sessão de informação sobre
a utilização da mediação;
– Com vista à salvaguarda da qualidade da mediação os Estados-membros devem incentivar o
desenvolvimento e a adesão a códigos voluntários de conduta pelos mediadores, a formação inicial e contínua
dos mediadores, bem como a criação de mecanismos eficazes de controlo da qualidade relativamente aos
serviços de mediação;
– Relativamente à executoriedade dos acordos obtidos por via da mediação, os Estados-membros devem
assegurar que as partes possam requerer que o conteúdo de um acordo obtido através da mediação seja
declarado executório, com as exceções previstas na diretiva, prevendo-se igualmente que o conteúdo de um
acordo assim obtido possa ser dotado de força executória, mediante sentença, decisão ou ato autêntico de um
tribunal ou de outra autoridade competente. Este procedimento permitirá o reconhecimento mútuo e a
execução dos acordos obtidos por via de mediação em toda a União Europeia, nas mesmas condições que as
estabelecidas para as sentenças e as decisões judiciais nomeadamente em matéria civil e comercial e em
matéria matrimonial e de responsabilidade parental8;
– Dado que se pretende salvaguardar a confidencialidade da mediação, os Estados-membros devem
assegurar que os mediadores ou outras pessoas envolvidas no processo não sejam obrigadas a fornecer
provas em processos judiciais ou arbitragens civis ou comerciais, excetuados os casos previstos na diretiva;
– Os Estados-membros devem assegurar que as partes que optaram pela medição para resolução de um
litígio não fiquem impedidas de instaurarem posteriormente um processo judicial ou iniciarem um processo da
arbitragem relativamente a esse litígio, por motivo de expiração dos respetivos prazos de prescrição e
caducidade.
Cumpre igualmente salientar que, nos termos do Considerando (17) da presente Diretiva, para garantir que
a mediação seja conduzida de modo eficaz, imparcial e competente, se deverá chamar a atenção dos
mediadores para a existência do Código de Conduta Europeu para Mediadores, a que igualmente alude a
alínea k) do Artigo 26.º da presente iniciativa legislativa, relativamente aos deveres do mediador de conflitos.
Este Código, adotado pela Comissão Europeia em 2004, é aplicável a todos os tipos de mediação em
matéria civil ou comercial e estabelece um conjunto de princípios que os mediadores a título individual podem
decidir respeitar, de forma voluntária e sob a sua própria responsabilidade.
Os princípios consagrados neste código dizem respeito à competência, nomeação e remuneração dos
mediadores e à promoção dos seus serviços, à garantia da sua independência e imparcialidade, assim como a
um conjunto de princípios que devem nortear a ação dos mediadores no que se refere especificamente ao
6 A ver com interesse as Conclusões do Conselho de maio de 2000 relativas aos modos alternativos de resolução de litígios e o Livro
Verde da Comissão, de 19 de abril de 2002, sobre os modos alternativos de resolução de litígios em matéria civil e comercial (COM/2002/196). 7 A proposta da Comissão (COM/2004/718; SEC/2004/ 1314) relativa à Diretiva 2008/52/CE, assim como a posição das demais
instituições intervenientes no respetivo processo de decisão, podem ser consultadas no endereço: http://www.europarl.europa.eu/oeil/FindByProcnum.do?lang=2&procnum=COD/2004/0251 8 Vejam-se os considerandos (20) e (21) da Diretiva em apreciação e os Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro
de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução das decisões em matéria civil e comercial e o Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental
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processo e resolução do acordo de mediação, e que dizem respeito, entre outros aspetos, ao conhecimento e
concordância das partes em relação às características do processo e condições do acordo de mediação, à
equidade de participação no processo e à confidencialidade de todas as informações tratadas na mediação ou
com ela ligadas.
Considera ainda a Comissão que “a decisão de respeitar este código deontológico não prejudica a
aplicação da legislação nacional ou das normas que regulam determinadas profissões”, e que “as
organizações que prestam serviços de mediação podem considerar desejável elaborar códigos mais
pormenorizados adaptados ao seu contexto específico, ou aos tipos de serviços de mediação que oferecem, e
também relativos a domínios específicos como a mediação familiar ou a mediação de consumo.”
No quadro das iniciativas daComissão Europeia para fomentar a implementação de processos
extrajudiciais de resolução dos litígios de consumo, tais como a mediação, a conciliação ou a arbitragem,
importa ainda fazer referência à Recomendação n.º 98/257/CE da Comissão, de 30 de março de 1998, relativa
aos princípios aplicáveis aos organismos responsáveis pela resolução extrajudicial dos litígios de consumo e à
Recomendação n.º 2001/301/CE, de 4 de abril de 2001, relativa aos princípios aplicáveis aos organismos
extrajudiciais envolvidos na resolução consensual de litígios do consumidor que não se inserem no âmbito da
primeira. Entre os princípios a respeitar contam-se os princípios da imparcialidade, transparência, eficácia e
equidade de procedimento.
Por último, cumpre referir que o artigo 10.º da Decisão-Quadro do Conselho, de 15 de março de 2001
(2001/220/JAI), relativa ao estatuto da vítima em processo penal, consagra a figura da mediação penal no
âmbito do processo penal, dispondo nomeadamente no n.º 1 que “Cada Estado-membro esforça-se por
promover a mediação nos processos penais relativos a infrações que considere adequadas para este tipo de
medida”.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da UE: Alemanha, Espanha, França e
Itália.
Espanha
Em Espanha, a Ley 5/2012, de 6 de julio, regula a mediação em matéria civil e comercial,etranspõe para a
ordem jurídica interna a Diretiva 2008/52/CE9 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2008,
relativa a certos aspetos da mediação em matéria civil e comercial.
Esta lei exclui expressamente do seu âmbito de aplicação: (i) a mediação penal; (ii) a mediação com a
administração pública; (iii) a mediação laboral; (iv) e a mediação em matéria de consumo.
As partes sujeitas a mediação atuam entre si conforme os princípios de lealdade, boa fé e respeito mútuo.
Durante o tempo em que decorre a mediação, uma parte não pode instaurar contra a outra nenhuma ação
judicial ou extrajudicial sobre o mesmo objeto, com exceção de medidas cautelares, ou outras medidas
urgentes imprescindíveis para evitar a perda irreversível de bens e direitos (artigo 10.º).
O recurso à mediação, conforme o disposto no artigo 16.º, suspende os prazos de prescrição e caducidade
de ações, a partir da data em que foi solicitada a mediação, ou o depósito junto da instituição, se for esse o
caso.
O título II enumera os princípios informadores da medição, a saber: o princípio de voluntariedade e livre
disposição, o de imparcialidade, o de neutralidade e o de confidencialidade. Estes princípios orientam a
atuação das partes na mediação, como a boa fé e o respeito mútuo, assim como o dever de colaboração e
apoio ao mediador.
O estatuto do mediador está consagrado no Título III da mesma lei. Para aceder à função de mediador,
este deverá ter um título oficial universitário ou de formação profissional superior, e contar com formação
específica que adquire mediante a realização de um ou vários cursos específicos em instituições acreditadas.
O mediador deverá subscrever um seguro de responsabilidade civil pelo exercício da sua atividade (artigo
9 Deveria ter sido transposta até maio de 2011, estando agora a ser aplicada nos Estados-membros.
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11.º).
O título IV regula o procedimento de mediação. A lei consagra a possibilidade de realização dos atos de
mediação através do recurso a meios eletrónicos de comunicação. As partes poderão acordar que todas ou
algumas sessões do procedimento de mediação se realizem por meios eletrónicos, por videoconferência ou
outro meio análogo de transmissão de voz ou imagem, sempre que esteja garantida a identidade dos
intervenientes e o respeito pelos princípios da mediação (artigo 24.º).
Por último, o título V da aludida lei trata dos requisitos necessários para que o acordo de mediação tenha
força executiva, nos termos do artigo 25.º. As partes podem certificar o acordo alcançado na mediação através
de escritura pública. Quando as partes chegam a um acordo na mediação, depois de já ter iniciado o processo
judicial, podem solicitar ao Tribunal a sua homologação nos termos do disposto na Ley de Enjuiciamiento Civil.
Sem prejuízo do que dispõem as normas europeias e os convénios internacionais vigentes em Espanha,
um acordo de mediação que tenha adquirido força executiva noutro Estado, só poderá ser executado em
Espanha se a sua força executiva emanar da intervenção de uma autoridade com funções equivalentes às
autoridades espanholas.
De acordo com o comunicado do Ministério da Justiça, a Ley 5/2012, de 6 de julio, só prevê a mediação em
matéria civil e comercial, mas o Ministério da Justiça já trabalha noutros âmbitos, como o penal ou o
contencioso administrativo. O Ministério empenhou-se na matéria civil e comercial porque são a esfera natural
e própria das relações entre particulares, entre cidadãos e/ou empresários.
A Ley 5/2012, de 6 de julio, que regula a mediação em matéria civil e comercial vai ser regulamentada por
Real Decreto que estabelecerá os requisitos de formação necessários para exercer a mediação, e por um
segundo Real Decreto relativo à mediação por meios eletrónicos, que desta forma soluciona os conflitos que
podem surgir entre as partes afastadas geograficamente ou com pessoas deficientes.
O mesmo comunicado refere que os mediadores podem ser escolhidos, tendo em conta a sua
especialidade, através do Registo de Mediadores e Instituições de Mediação que o Ministério da Justiça dará a
conhecer através da sua página web.
A mediação no âmbito laboral é muito comum em questões de direito do trabalho. Em certos casos, é
obrigatório o recurso à mediação antes de recorrer aos tribunais. Os conflitos coletivos são habitualmente
objeto de mediação, sendo que também no caso dos conflitos individuais se começa a assistir ao recurso à
mediação em certas Comunidades Autónomas.
As Comunidades Autónomas possuem organismos de mediação laboral que se ocupam destas questões.
A nível estatal, o Servicio Interconfederal de Mediación y Arbitraje (SIMA) coloca à disposição dos cidadãos
um serviço gratuito de mediação em conflitos que transcendam as competências dos órgãos das
Comunidades Autónomas.
Em fevereiro do presente ano foi aprovada a Resolución de 10 de febrero de 2012, de la Dirección General
de Empleo, por la que se registra y publica el V Acuerdo sobre solución autónoma de conflictos laborales
(sistema extrajudicial). Este Acordo tem por objeto o desenvolvimento de um sistema autónomo de solução
dos conflitos coletivos laborais surgidos entre empregadores e trabalhadores ou as suas respetivas
organizações representativas, com aplicação a todo território espanhol, os conflitos contemplados no seu
artigo 4.º.
O referido Acordo exclui do seu âmbito de aplicação os conflitos que versem sobre a segurança social,
exceto os conflitos coletivos que recaiam sobre a segurança social complementar, incluindo os planos de
pensões. Este Acordo exclui ainda do seu âmbito de aplicação os conflitos em que sejam partes o Estado, as
Comunidades Autónomas, entidades locais ou entidades de direito público com personalidade jurídica nos
termos do disposto no artigo 69.º da Ley de la Jurisdicción Social.
O citado Acordo foi celebrado ao abrigo do estabelecido nos Títulos I e III da Ley do Estatuto de los
Trabajadores, dos artigos 6.º e 7.º da Ley Orgánica de Libertad Sindical e dos artigos 2.º h), 63.º, 65.º 3 e 4,
68.º, 156.º.1 e 236.º, entre outros da Ley Orgánica de Libertad Sindical.
A mediação no âmbito penal10 tem como finalidade, por um lado, a reinserção do agressor e, por outro, o
ressarcimento da vítima.
10
Leia-se o Convénio em matéria de mediação extrajudicial entre o Conselho Geral do Poder Judicial e a Comunidade Autónoma de Rioja
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Na justiça de menores (dos 14 aos 18 anos de idade), a mediação está expressamente regulamentada
como instrumento para alcançar a reeducação do menor (n.º 3 do artigo 19º11 da Ley Orgánica 5/2000, de 12
de enero, reguladora de la responsabilidad penal de los menores).Neste âmbito, a mediação é realizada pelas
equipas de apoio dos Tribunais de Menores (Fiscalía de Menores), embora também possa ser realizada por
organismos das Comunidades Autónomas e outras entidades, designadamente Associações.
No âmbito da justiça (não aplicável a menores), a mediação não está regulamentada, embora, com base na
regulamentação penal12 e processual penal13, que permite a conformidade, e a redução da pena por reparação
do dano, bem como nas normas internacionais aplicáveis, na prática, a mediação realiza-se nalgumas
províncias14.
Habitualmente, a mediação é usada para resolução de ilícitos menos graves, como incumprimentos, apesar
de também ser possível recorrer à mediação em processos-crime, caso as circunstâncias o aconselhem.
O Conselho Geral do Poder Judicial15 apoia e supervisiona as iniciativas de mediação levadas a efeito em
Tribunais de Instrução, Tribunais criminais e Tribunais Provinciais em Espanha. Até à data, a Catalunha e o
País Basco registam o maior número de recursos à mediação.
Regra geral, a mediação é realizada por um terceiro imparcial que está obrigado à confidencialidade. As
partes, com a orientação dos seus advogados, podem decidir resolver os conflitos através da mediação e
comunicá-lo ao tribunal, ou podem ser contactadas pelo tribunal quando se considere que o caso é suscetível
de resolução pelo recurso à mediação.
No âmbito penal, é contactado habitualmente em primeiro lugar o agressor e, quando este manifesta o seu
consentimento, é contactada a vítima para procurar a resolução do conflito mediante recurso à mediação.
A mediação realizada pelos organismos públicos é gratuita.
No âmbito da mediação familiar, podem ser consultados alguns dos convénios celebrados entre o
Conselho Geral do Poder Judicial e diversas Comunidades Autónomas.
Para mais informações sobre a matéria supramencionada, pode ser consultado o sítio do Poder Judicial.
França
Em França, há três figuras reconduzíveis à tipologia do mediador de justiça prevista na presente iniciativa
legislativa. Desde logo o ‘conciliateur de justice’ (conciliador de justiça), que tem por finalidade encontrar uma
solução amigável entre 2 partes, tenham elas ou não comparecido diante de um juiz. O conciliador de justiça
não pode intervir se não de acordo com as partes.
Conciliador de justiça
O ‘conciliador’ pode mediar conflitos de ordem civil e comercial tais como: problemas de vizinhança (limites,
direito de passagem, paredes divisórias); disputas entre senhorios e inquilinos, ou de inquilinos entre eles;
litígios de consumo; faltas de pagamentos; defeitos na execução de trabalhos.
Não é possível recorrer ao mesmo em casos de estado civil e de conflitos com a administração (devem
então entrar em contato com o Provedor de Justiça).
A duração da conciliação é de 1 mês no máximo, renovável uma vez pelo mesmo prazo a pedido do
conciliador. O juiz pode por fim à conciliação, em qualquer altura, por sua iniciativa ou do conciliador de justiça
ou a pedido de uma das partes.
Se o recurso à conciliação foi decidido pelo juiz, o conciliador deve informar por escrito do resultado das
trocas. O recurso a um conciliador de justiça é gratuito.
Referências normativas:
11
. O n.º 3 do artigo 19.º dispõe: El correspondiente equipo técnico realizará las funciones de mediación entre el menor y la víctima o perjudicado, a los efectos indicados en los apartados anteriores, e informará al Ministerio Fiscal de los compromisos adquiridos y de su grado de cumplimiento. 12
Ley Orgánica 6/1985, de 1 de julio, del Poder Judicial. 13
Ley de Enjuiciamiento Criminal. 14
Leia-se o Convénio em matéria de mediação extrajudicial entre o Conselho Geral do Poder Judicial e a Comunidade Autónoma de Rioja. 15
El Consejo General del Poder Judicial es un órgano constitucional, colegiado, autónomo, integrado por jueces y otros juristas, que ejerce funciones de gobierno del Poder Judicial con la finalidad de garantizar la independencia de los jueces en el ejercicio de la función judicial frente a todos.
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Código de processo civil: artigos 830.º a 835.º;
Decreto n.° 78-381 de 20 de março de 1978 relativo aos conciliadores de justiça;
Circular de 24 de janeiro de 2011 relativo à conciliação e ao procedimento oral em matéria civil,
comercial e social.
Mediador civil
O mediador civil é uma personalidade independente encarregue de encontrar uma solução amigável para
conflitos entre particulares. Pode ser uma pessoa física ou uma associação representada por uma pessoa
física aprovada pelo juiz.
O mediador civil intervém sobre a decisão do juiz relativamente a uma disputa em que a mediação parece
possível e desejável. Em qualquer caso, não se substitui ao juiz. O mediador não pode intervir se não com o
acordo das partes. A mediação civil não se aplica aos processos penais.
O mediador não tem poderes de investigação. No entanto, pode, com o acordo das partes e para a
finalidade da mediação, ouvir terceiros.
O mediador informa por escrito o juiz do sucesso ou fracasso de sua missão.
Independentemente do resultado da mediação, o caso volta a ser presente ao juiz.
Em caso de acordo, as partes podem pedir ao juiz que ordenou a medida, de homologar o mesmo e de lhe
conferir força executória.
Referências normativas:
Código de Processo Civil: artigos 131-1 a 131-15
Mediador penal
O mediador penal é uma pessoa física ou uma associação autorizada, mandatada pelo procurador da
República para facilitar a regulação de uma infração penal.
O mediador penal intervém de maneira neutra e objetiva. Está submetido ao segredo profissional e presta
juramento.
Ele encontra as partes (vitima e autor dos factos), de modo a que encontrem em conjunto uma solução
amigável para a disputa.
A pessoa que deseja exercer funções de mediador penal deve apresentar um pedido de autorização,
perante a jurisdição em que deseja ser autorizada:
ou junto do procurador da República (jurisdição do tribunal de primeira instância),
ou junto do procurador geral (jurisdição do Tribunal de Recurso).
Referências normativas:
Código de Processo Penal: artigos R15-33-30 à R15-33-37
Itália
Na Itália, a mediação civil (ou mediação civil e comercial, de acordo com a definição da União Europeia que
solicitou a adoção desde 2008) é um instituto do sistema jurídico italiano introduzido pelo Decreto Legislativo
n.º 28/2010, de 4 de março, para a resolução de conflitos entre sujeitos privados relativos a direitos
disponíveis. O instituto visa a deflação do sistema judicial italiano relativamente à quantidade de atrasos e ao
risco de acumular novos atrasos. Na verdade, representa um dos pilares fundamentais da reforma do
processo civil.
No sítio do Ministério da Justiça italiano podemos ler que “A reforma da mediação civil tem como objetivo
principal reduzir o afluxo de novas causas no Sistema de Justiça, oferecendo ao cidadão um instrumento mais
simples e rápido com tempos e custos certos.Esta reforma é acompanhada pela reforma do Processo Civil e
pelo Programa de Digitalização da Justiça com a qual se pretende intervir na fase de procedimento das
causas.A mediação é a atividade profissional realizada por um terceiro imparcial concebida para ajudar duas
ou mais partes, seja para encontrar um acordo amigável para a resolução de um litígio, seja na formulação de
uma proposta para a resolução do mesmo.”
Há um ‘Registo dos organismos de mediação’. A mediação pode ter lugar junto de entidades públicas ou
privadas, que estão inscritos no registo mantido pelo Ministério da Justiça e que prestam o serviço de
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mediação de acordo com a lei, o regulamento ministerial e o regulamento interno de que são dotados,
aprovado pelo Ministério da Justiça.
Tipos de mediação: facultativa, ou seja escolhida pelas partes; requerida, quando o juiz, a quem as partes
já se dirigiram, convida as mesmas a tentarem a mediação; obrigatória, quando para poder prosseguir nos
tribunais, as partes devem ter tentado sem sucesso a mediação.
Desde 21 março de 2011 a mediação será obrigatória nos casos de uma controvérsia (litígio) em matéria
de: direitos reais (distancia entre construções, usufruto e servidão de passagem, etc.); partilhas, sucessões
hereditárias; ‘acordos de família’; locação; comodato; arrendamento por empresas; indemnização por danos
de responsabilidade medica e de difamação através de meio de comunicação social ou outro meio de
publicidade; contratos de seguros, bancários e financiários.
A tentativa de mediação civil tem uma duração máxima estabelecida por lei de 4 meses.
Despesas com a mediação
As partes devem antecipar os custos de início do processo, no valor de 40 €, e pagar as despesas de
mediação.
O valor dos encargos devidos a organismos públicos consta da tabela A do Decreto ministerial n.º 180 de
2010 prevista no artigo 16.º, n.º 4.
Tabela A relativa à relação Valor da causa – Valor por cada parte
Valor minimo da causa in euro Valor máximo da causa in euro Valor per cada parte
até 1000
65
desde 1001 a 5000 130
desde 5001 a 10.000 240
desde 10.001 a 25.000 360
desde 25.001 a 50.000 600
desde 50.001 a 250.000 1000
desde 250.001 a 500.000 2000
desde 500.001 a 2.500.000 3800
desde 2.500.001 a 5.000.000 5200
além de 5.000.000
9200
O Decreto n.º 180/2010, de 18 de outubro, aprova o “Regulamento relativo à determinação dos critérios e
modalidades de inscrição e manutenção do registo dos organismos de mediação e do elenco dos formadores
para a mediação, bem como a aprovação das indemnizações a que têm direito os organismos nos termos do
artigo 16.º do decreto legislativo n.º 28/2010, de 4 de março.
Para maior desenvolvimento ver a ligação ‘La mediazione civile e commerciale’.
Mediação penal
A mediação teve uma receção discreta na justiça penal de menores na primeira metade dos anos 90,
enquanto na justiça penal comum está dando os primeiros passos.
A lei de processo penal entrada em vigor em 1989 deu ao Ministério Público o poder de tentar a conciliação
entre a vítima e o autor do crime apenas para crimes processados mediante queixa.
A recente reforma processual do início do ano 2000 retirou esta tentativa de conciliação ao Ministério
Público e atribui-o ao juiz.
A lei de processo penal recompensa o comportamento do autor do crime que indemnize a vítima ou que
elimine as consequências prejudiciais do crime com uma redução da pena.
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Mediação e reparação na experiência das forças de segurança
A arte da mediação-reparação consiste na capacidade do mediador ciar as condições para a retoma de
uma correta comunicação entre os protagonistas do crime. Pelo que é fundamental que as partes em conflito
consigam recuperar no contexto da mediação o poder de julgar e decidir as suas histórias como uma condição
essencial para reconhecer, reconstruir uma verdade dos factos aceitável para ambas as partes e para, no final,
encontrar autonomamente uma solução ou, pelo menos, uma gestão positiva do conflito.
Mediação e reparação do juiz de paz
A novidade mais importante é sem dúvida a lei que atribui ao juiz de paz algumas competências penais. O
juiz de paz é um juiz honorário criado em 1995 e que até agora tinha poderes limitados a ações cíveis. O
Parlamento decidiu reconhecer ao juiz de paz poderes penais sobretudo em relação a crimes que são
expressão de uma conflitualidade menor (injúrias, difamações, danos, ameaças, lesões pessoais) ou que
prevejam penas muito reduzidas. Esta intervenção legislativa completa uma grande reforma da organização
judiciária italiana que tende a distinguir uma justiça "maior", reservada para crimes mais graves e com maiores
garantias para o arguido, de uma justiça "menor" reservada a crimes com menor alarme social e caracterizada
por procedimentos informais e de um sistema de sanções totalmente renovado.
Para uma análise mais aprofundada, ver no sítio do Ministério da Justiça a ligação “La mediazione penale
minorile”.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Da pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (PLC), verificou-se que
não se encontra pendente qualquer iniciativa legislativa sobre a mesma matéria.
Petições
Consultada a base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (PLC), verificou-se que não
se encontra pendente quaisquer petições sobre esta matéria.
V. Consultas e contributos
Consultas obrigatórias
Nos termos legalmente aplicáveis, foram solicitados, a 11 de dezembro, pareceres às seguintes entidades:
Conselho Superior da Magistratura, Conselho Superior do Ministério Público, Ordem dos Advogados, Câmara
dos Solicitadores, Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz, Associação Portuguesa de
Arbitragem.
Pareceres/contributos enviados pelo Governo
Em cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 124.º do Regimento da Assembleia da República, o
Governo enviou os pareceres que solicitou e recebeu durante a fase de preparação da iniciativa em análise.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face dos elementos disponíveis, designadamente do articulado da Proposta de Lei e da respetiva
exposição de motivos, não é possível avaliar os encargos resultantes da aprovação da presente iniciativa
legislativa e da sua consequente aplicação.
———
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PROPOSTA DE LEI N.º 123/XII (2.ª)
(PROCEDE À SEGUNDA ALTERAÇÃO À LEI N.º 88-A/97, DE 25 DE JULHO, QUE REGULA O REGIME
DE ACESSO DA INICIATIVA ECONÓMICA PRIVADA A DETERMINADAS ATIVIDADES ECONÓMICAS)
Parecer da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e nota técnica
elaborada pelos serviços de apoio
Parecer da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local
Índice
PARTE I – CONSIDERANDOS
PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTOR DO PARECER
PARTE III – CONCLUSÕES
PARTE IV – ANEXOS
PARTE I – CONSIDERANDOS
1 – Introdução
O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 123/XII (2.ª),
que “Procede à segunda alteração à Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho, que regula o regime de acesso da
iniciativa económica privada a determinadas atividades económicas.”
A iniciativa é apresentada pelo Governo, nos termos da alínea d) do artigo 197.º da Constituição e do 118.º
do Regimento, que consubstanciam o poder de iniciativa da lei.
A proposta de lei em causa, apresentada a 10 de janeiro de 2013, foi admitida no dia seguinte e baixou por
determinação de S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, à Comissão do Ambiente, Ordenamento
do Território e Poder Local para apreciação e emissão do respetivo parecer.
A proposta de lei inclui exposição de motivos, obedece aos requisitos formais respeitantes às iniciativas,
em geral e às propostas de lei, em particular.
2 – Objeto, conteúdo e motivação
A presente iniciativa legislativa, apresentada pelo Governo, visa alterar o regime jurídico que “… regula o
acesso da iniciativa privada a determinadas atividades, determinando que o acesso à atividade de captação,
tratamento e distribuição de água para consumo público, recolha, tratamento e rejeição de águas residuais
urbanas, em ambos os casos através de redes fixas, e recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos”.
Considera o Governo que, o atual regime “…é especialmente limitativo no acesso da iniciativa privada à
gestão de sistemas multimunicipais de águas e de resíduos sólidos urbanos, uma vez que apenas admite a
participação de privados em posição obrigatoriamente minoritária no capital das entidades gestoras
concessionárias, limitação igualmente aplicável à subconcessão dos mencionados sistemas.”
A iniciativa apresentada salienta também que, no Programa do XIX Governo Constitucional inclui “… como
uma das medidas previstas para a área do ambiente: «autonomizar o subsetor dos resíduos no seio do Grupo
Águas de Portugal e implementar as medidas necessárias à sua abertura ao setor privado».”
Tal como é referido na exposição de motivos da presente proposta de lei, o próprio PEAASAR II
“…preconiza a criação de condições para uma maior participação do setor privado na prestação dos serviços
de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais.”
Assim, “No que respeita as atividades de captação, tratamento, distribuição e abastecimento de águas e
saneamento de águas residuais, prevê-se a reorganização, sem alteração da natureza das entidades
gestoras, que permanece maioritariamente pública”, através da definição de uma estratégia de “…maior
abertura do subsetor aos privados concretiza-se, pois, através da possibilidade das atuais concessionárias dos
sistemas de titularidade estatal, relativamente às quais o Estado mantém os poderes de direção, autorização,
aprovação, fiscalização e suspensão de atos, poderem subconcessionar tais atividades a privados, garantindo-
se simultaneamente o respeito pela linha de atuação referida.”
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Em particular, no que diz respeito subsetor dos resíduos sólidos “…é criada a oportunidade de privatização,
abrindo-se a possibilidade das concessões virem a ser geridas por entidades privadas. Prevê-se, assim, a sua
autonomização do subsetor no grupo Águas de Portugal e a implementação de medidas que promovam a sua
abertura ao setor privado. Tal estratégia implica a entrada maioritária de entidades privadas nas atividades de
recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos, através da alienação das participações sociais do Estado
nas concessionárias dos sistemas multimunicipais.”
A Proposta de Lei n.º 123/XII (2.ª) propõe, para o efeito, alterações ao artigo 1.º da Lei n.º 88-A/97, de 25
de julho, alterada pela Lei n.º 17/2012, de 26 de abril.
3 – Iniciativas pendentes sobre a mesma matéria
A pesquisa efetuada à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) verificou-se
que, neste momento, não estão pendentes iniciativas versando sobre idêntica matéria.
PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTOR DO PARECER
O signatário do presente parecer exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a
iniciativa em apreço, a qual é, de resto, de “elaboração facultativa” nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do
Regimento da Assembleia da República, reservando o seu grupo parlamentar a sua posição para o debate em
Plenário.
PARTE III – CONCLUSÕES
O Governo apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 123/XII (2.ª) que visa alterar a Lei
n.º 88-A/97, de 25 de julho, que regula o regime de acesso da iniciativa económica privada a determinadas
atividades económicas.
A Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local é do parecer que a Proposta de Lei n.º
123/XII (2.ª), apresentada pelo Governo reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais para ser
agendado para apreciação pelo Plenário da Assembleia da República, reservando os grupos parlamentares as
suas posições e decorrente sentido de voto para o debate.
PARTE IV – ANEXOS
Nota técnica elaborada ao abrigo do disposto do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República.
Palácio de S. Bento, 21 de janeiro de 2013.
O Deputado autor do Parecer, Mário Magalhães — O Presidente da Comissão, António Ramos Preto.
Nota Técnica
Proposta de Lei n.º 123/XII (2.ª)
Procede à segunda alteração à Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho, que regula o regime de acesso da
iniciativa económica privada a determinadas atividades económicas. (GOV).
Data de admissão: 11 de janeiro de 2013
Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local (11.ª)
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Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: Fernando Vasco (DAC),Lurdes Sauane (DAPLEN) Lisete Gravito e Leonor Calvão Borges (DILP), Maria João Costa (DAC) e Luís Correia da Silva (BIB).
Data: 18 de janeiro de 2013.
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
A presente iniciativa legislativa, da autoria do Governo, visa viabilizar a concessão de sistemas
multimunicipais de resíduos sólidos urbanos a entidades de capitais maioritária ou totalmente privados, e a
subconcessão de sistemas multimunicipais de águas e de saneamento de águas residuais a entidades de
natureza também privada.
De acordo com a exposição de motivos desta proposta de lei “…No que respeita as atividades de captação,
tratamento, distribuição e abastecimento de águas e saneamento de águas residuais, prevê-se a
reorganização, sem alteração da natureza das entidades gestoras, que permanece maioritariamente
pública…”.
Neste sentido, segundo o Governo, “… A estratégia definida de maior abertura do subsetor aos privados
concretiza-se, pois, através da possibilidade das atuais concessionárias dos sistemas de titularidade estatal,
relativamente às quais o Estado mantém os poderes de direção, autorização, aprovação, fiscalização e
suspensão de atos, poderem subconcessionar tais atividades a privados, garantindo-se simultaneamente o
respeito pela linha de atuação referida…”.
Prevê, igualmente, o Governo que ”… Relativamente ao subsetor dos resíduos sólidos urbanos, é criada a
oportunidade de privatização, abrindo-se a possibilidade das concessões virem a ser geridas por entidades
privadas. Prevê-se, assim, a sua autonomização do subsetor no grupo Águas de Portugal e a implementação
de medidas que promovam a sua abertura ao setor privado…”.
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
A iniciativa legislativa é apresentada pelo Governo, no âmbito do seu poder de iniciativa, nos termos e ao
abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º e na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição e do artigo
118.º do Regimento.
A presente iniciativa toma a forma de proposta de lei, em conformidade com o previsto no n.º 1 artigo 119.º
do Regimento, é subscrita pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares e
aprovada em Conselho de Ministros de 27 de dezembro de 2012, em conformidade com o n.º 2 do artigo 123.º
do mesmo diploma.
Respeitando os limites estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento, a iniciativa não infringe a
Constituição ou os princípios nela estabelecidos e define concretamente o sentido das modificações a
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introduzir na ordem legislativa (propõe a segunda alteração à Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho, alterada pela Lei
n.º 17/2012, de 26 de abril).
Mostra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto
principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo assim os requisitos formais do n.º 1 e 2
do artigo 124.º do Regimento.
A iniciativa em apreço deu entrada em 10/01/2013, tendo sido admitida e anunciada em 11/01/2013.
Baixou, na generalidade, à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local (11.ª) e
encontra-se agendada para a sessão plenária de 25/01/2013.
Verificação do cumprimento da lei formulário
A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto,
habitualmente designada como “lei formulário”, possui um conjunto de normas sobre a publicação, a
identificação e o formulário dos diplomas, as quais são relevantes em caso de aprovação das iniciativas
legislativas e que, importa ter presentes, em especial, no momento da redação final.
A presente iniciativa tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto, em conformidade com o disposto
no n.º 2 da ”lei formulário”, e respeita o n.º 1 do artigo 6.º da mesma lei.
Será publicada na 1.ª Série do Diário da República, revestindo a forma de lei [alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º
da “lei formulário”].
Não prevendo norma de entrada em vigor, em caso de aprovação, deverá o presente diploma, entrar em
vigor no 5.º dia após a data da sua publicação (n.º 2 do artigo 2.º da lei formulário).
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
A Lei n.º 88-A /1997, de 25 de julho que regula o acesso da iniciativa económica privada a determinadas
atividades económicas, na alínea a) do seu artigo 1.º veda a empresas privadas e a outras entidades da
mesma natureza o acesso à atividade de: captação, tratamento e distribuição de água para consumo público,
recolha, tratamento e rejeição de águas residuais urbanas, em ambos os casos através de redes fixas, e
recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos, no caso de sistemas multimunicipais e municipais, salvo
quando concessionadas (…).
Revoga a Lei n.º 46/77, de 8 de julho, na redação dada pelos Decretos-Leis n.º 449/88, de 10 de dezembro,
n.º 339/91, de 10 de setembro e n.º 372/93, de 29 de outubro, que veda a empresas privadas e outras
entidades da mesma natureza a atividade económica em determinados sectores. E sofre as modificações
introduzidas pela Lei n.º 17 /2012, 26 de abril, que estabelece o regime jurídico aplicável à prestação de
serviços postais, em plena concorrência, no território nacional, bem como de serviços internacionais com
origem ou destino no território nacional e transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2008/6/CE, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de fevereiro de 2008.
Teve origem na Proposta de Lei n.º 88/VII/2, que limita o acesso da iniciativa económica privada a
determinadas atividades económicas. Foi aprovada, por maioria, na reunião plenária de 3 de julho de 1997,
com votos a favor do PS, PSD e CDS-PP e contra do PCP e PEV. E a Lei n.º 17/2012, 26 de abril teve origem
na Proposta de Lei n.º 35/XII/1, que estabelece o regime jurídico aplicável à prestação de serviços postais, em
plena concorrência, no território nacional, bem como de serviços internacionais com origem ou destino no
território nacional e transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2008/6/CE do Parlamento Europeu e
do Conselho, de 20 de Fevereiro de 2008. Foi aprovada, por maioria, na reunião plenária de 9 de março de
2012, com votos a favor do PSD e CDS-PP, contra do PCP, BE e PEV e a abstenção do PS.
O Programa do XIX Governo Constitucional, no que respeita aos objetivos estratégicos a prosseguir na
área do ambiente, propõe:
─ Desenvolver um território sustentável;
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─ Resolver os problemas ambientais de primeira geração (água, saneamento, resíduos e contaminação
dos solos);
─ Implementar a nova geração de políticas ambientais europeias (assentes na internalização dos custos
ambientais na economia), respondendo aos desafios emergentes;
─ Desenvolver uma nova carteira de atividades económicas baseadas nas eco-inovações e nas tecnologias
limpas.
Ainda no capítulo do Ambiente, o Programa inclui medidas destinadas a:
─ Promover a sustentabilidade da política e do sistema de gestão e tratamento de resíduos, implementando
efetivamente a hierarquia dos 3Rs (redução, reutilização e reciclagem); autonomizar o subsector dos resíduos
no seio do Grupo Águas de Portugal e implementar as medidas necessárias à sua abertura ao sector privado.
O Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais para o período de
2007-2013, abreviadamente PEAASAR 2007-2013, aprovado pelo Despacho n.º 2339/2007, de 14 de
fevereiro define a estratégia para o abastecimento de água e o saneamento de águas residuais para aquele
período.
Na sua parte introdutória, o Despacho refere que no PEAASAR 2007-2013 são elencados objetivos
estratégicos e as respetivas orientações que devem enquadrar os objetivos operacionais e as medidas a
desenvolver no período de 2007-2013.
Um dos objetivos operacionais, no contexto da sustentabilidade do sector, mencionado no Plano consiste
em contribuir para a dinamização do tecido empresarial privado nacional e local.
Para a consecução dos objetivos, prevê a adoção de um conjunto de medidas, das quais se destaca a de
estimular o investimento privado e promover a concorrência, com especial destaque para um alargamento e
dinamização muito significativos do mercado dos contratos de exploração e de prestação de serviços,
promovendo assim o desenvolvimento do tecido empresarial nacional e local.
Na continuação do exposto da introdução, é mencionado que sem prejuízo do papel estratégico reservado
às empresas concessionárias de sistemas multimunicipais do Grupo AdP, SGPS, SA, enquanto instrumentos
das políticas públicas para o sector, o PEAASAR 2007-2013 aposta decisivamente num envolvimento
significativo do sector privado como meio de aumentar as valências do processo no sentido de assegurar o
objetivo essencial de qualidade e preço do serviço socialmente aceitável, clarifica os domínios e formas da sua
intervenção e define medidas visando aumentar a concorrência e tornar o processo de participação mais
competitivo e transparente.
Destacamos a evolução legislativa do regime jurídico de gestão de resíduos sólidos. O regime foi aprovado,
pela primeira vez, pelo Decreto-Lei n.º 488/85, de 25 de novembro que lança as bases de um sistema de
registo obrigatório de resíduos e define competências e responsabilidades no domínio da sua gestão. Em
consonância com as normas da então Comunidade Económica Europeia, constituiu, conjuntamente com as
disposições regulamentadoras, instrumento para um planeamento fundamentado e promoção do
aproveitamento e eliminação dos resíduos. Posteriormente foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 310/95 de 20 de
novembro, por sua vez revogado pelo Decreto-Lei n.º 239/97, de 9 de setembro e, igualmente revogado pelo
Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de setembro.
No que concerne ao planeamento da gestão de resíduos, tarefa pertencente ao Estado enquanto
responsável pela política nacional de resíduos, o Decreto-Lei n.º 239/97, de 9 de setembro, nos termos do seu
artigo 5.º, determinou, através de normas regulamentares, a elaboração de cinco planos de gestão de
resíduos, um nacional e quatro sectoriais para cada uma das categorias de resíduos: urbanos, hospitalares,
industriais e agrícolas.
O Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de setembro continua a definir o regime geral da gestão de resíduos, em
conexão com as disposições comunitárias, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2006/12/CE,
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril, e a Diretiva n.º 91/689/CEE, do Conselho, de 12 de
dezembro. Este diploma introduz aperfeiçoamentos ao regime legal até agora em vigor que se prendem com
uma melhor gestão da informação em matéria de gestão dos resíduos. E inclui, igualmente, novos
instrumentos que se prendem com uma melhor gestão da informação em matéria de gestão dos resíduos, hoje
em dia imprescindível não apenas para que a Administração realize cabalmente as suas funções como para
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operadores económicos e grande público. Sofreu modificações, tendo sido a terceira modificação introduzida
pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de junho que o republica.
Na execução do princípio decorrente do n.º 2 do seu artigo 15.º, que estabelece que os planos específicos
de gestão de resíduos são aprovados por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pela área
do ambiente e pela área geradora do respetivo tipo de resíduos, sendo previamente ouvida a Associação
Nacional de Municípios Portugueses no caso do plano específico de gestão de resíduos urbanos, a Portaria
n.º 187/2007, de 12 de fevereiro, modificada pela Portaria n.º 851/2009, de 7 de agosto aprova o Plano
Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos (PERSU II).
Em termos genéricos o Plano Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos (PERSU II) constitui um
instrumento estratégico diretor da gestão de resíduos sólidos urbanos (RSU) para o período de 2007 a 2016,
fundamental para que o sector possa dispor de orientações e objetivos claros, bem como de uma estratégia de
investimento que confira coerência, equilíbrio e sustentabilidade à intervenção dos vários agentes diretamente
envolvidos. Uma gestão exigente e consequente dos resíduos sólidos urbanos (RSU) passa pelo crescente
envolvimento e responsabilização de todos os agentes interessados no setor. Destacam-se como principais
agentes envolvidos e/ou a envolver na prossecução da estratégia consignada no PERSU II os Sistemas
Intermunicipais e Multimunicipais, os Municípios, os Operadores Privados do Sector dos RSU, a Autoridade
Nacional de Resíduos, as Autoridades Regionais de Resíduos, o Instituto Regulador das Águas e Resíduos, a
Inspeção-geral do Ambiente e os cidadãos em geral.
Cabe referir que a iniciativa legislativa em análise, com base na legislação supracitada, tem por objeto
viabilizar a concessão de sistemas multimunicipais de resíduos sólidos urbanos a entidades de capitais
maioritária ou totalmente privados, e a subconcessão de sistemas multimunicipais de águas e de saneamento
de águas residuais a entidades de natureza também privada, de forma a permitir a implementação da
estratégia acima mencionada. Propondo-se, para tal, proceder à segunda alteração da Lei n.º 88-A/97, de 25
de julho, alterada pela Lei n.º 17/2012, de 26 de abril, que regula o regime de acesso da iniciativa económica
privada a determinadas atividades económicas, visando a reorganização do setor de abastecimento de água e
saneamento de águas residuais e recolha e tratamento de resíduos sólidos.
Por último, recordamos que sobre o assunto foram apresentadas as seguintes iniciativas legislativas:
─ Projeto de Lei n.º 260/XII (1.ª), da iniciativa do PCP, veda o acesso de empresas privadas às atividades
económicas de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos
sólidos. Tendo sido rejeitado por maioria, na reunião plenária de 6 de julho de 2012, com votos a favor do
PCP, BE e PEV e contra do PSD, PS, e CDS-PP.
─ Projeto de Lei n.º 270/XII (1.ª), da autoria do BE, garante a gestão pública da água e da gestão dos
resíduos sólidos. Baixou à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, na fase de
distribuição inicial na generalidade, em 17 de julho de 2012.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
Bibliografia específica
BAPTISTA, Jaime Melo; Pássaro, Dulce Álvaro; Pires, João Simão – Nota sobre a nova legislação relativa
a serviços públicos essenciais. Revista de administração local. Lisboa. ISSN 0870-810x. Ano 31, n.º 226
(Jul./Ago. 2008), p. 467-474. Cota: RP-224.
Resumo: Neste artigo os autores analisam o impacto da Lei n.º 12/2008, de 26 de fevereiro, nos serviços
públicos essenciais, nomeadamente, no sector das águas e resíduos. O artigo destaca essencialmente o
impacto desta alteração na prática tarifária deste sector. Consideram os seus autores que o mesmo não será
muito significativo, uma vez que a maioria das medidas não tem custo ou é de baixo custo, com exceção da
faturação mensal, que quando aplicada conduz a um aumento de custos em relação à faturação bimestral.
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CONCURRENCE ET RÉGLEMENTATION du secteur de l'eau. Revue de l'OCDE sur le droit et la
politique de la concurrence. Paris. ISSN 1560-7798. Vol. 8, n.º 1 (2006), p. 61-143. Cota: ROI-224.
Resumo: Esta obra aborda o tema da concorrência e regulação do sector da água. Apresar de promoverem
cada vez mais a concorrência no setor da água, os governos não devem deixar de avaliar a importância da
existência de concorrência neste sector. Tradicionalmente considerados como um monopólio natural do sector
público, os serviços da água são cada vez mais abertos pelos governos à concorrência e à participação do
sector privado. Esta prática permite o recurso a novos modelos de financiamento que, em alguns casos,
coloca quase inteiramente os encargos financeiros sobre os consumidores.
Segundo o autor o envio de contatos de concessão para licitação teve efeitos benéficos significativos. O
governo pode ser mais eficaz como um regulador em vez de um prestador de serviços, na medida em que sob
o controlo do governo a água tende a ser distribuída abaixo do seu valor e as infraestruturas tendem a não ter
o investimento necessário.
MAIA, Carla Heliodoro [et al.] – Avaliação dos indicadores de desempenho do serviço de abastecimento
público de água na perspectiva do consumidor. Cadernos INA. Lisboa. N.º 44 (2010), p. 169-226. Cota: RP-
154.
Resumo: Tendo em conta a existência de características tendencialmente monopolistas no sector de
abastecimento público da água em Portugal, justifica-se a existência de uma entidade reguladora que promova
um serviço eficaz e eficiente para os utilizadores. Este controlo é efetuado pelo Instituto Regulador das Águas
e Resíduos (IRAR) que desenvolveu um sistema de avaliação baseado em 20 indicadores de desempenho.
O presente trabalho pretende caracterizar a perspetiva do cidadão face ao sistema de avaliação adotado
pelo IRAR e comparar a avaliação efetuada pelos utentes relativamente ao serviço de abastecimento público
de água prestado pela EPAL, no concelho de Lisboa, com a avaliação do regulador.
PEAASAR II: Plano estratégico de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais,
2007-2013. 1ª ed. [Lisboa] : Ministério do Ambiente Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional,
2007. 171 p. ISBN 978-989-8097-00-2. Cota: 52 - 257/2007.
Resumo: O presente documento apresenta uma nova estratégia para o período de programação dos
fundos comunitários, a designar por Plano Estratégico de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas
Residuais 2007-2013 (PEAASAR II). Esta estratégia é um ponto-chave na definição e consequente clarificação
do sector da água em Portugal.
Nele encontramos um diagnóstico aprofundado da atual situação do sector e a definição do respetivo
enquadramento estratégico e programático, de forma a assegurar a coerência das medidas de política e a
orientar o desempenho dos vários agentes e protagonistas envolvidos. Este diagnóstico é feito tendo em conta
a experiência adquirida nos últimos anos, o novo contexto legal, nacional e comunitário, e as perspetivas que
se abrem com o próximo ciclo de fundos do QREN entre 2007 e 2013.
SILVA, João Nuno Calvão da – Regulação das águas e resíduos em Portugal. Boletim da Faculdade de
Direito. Coimbra. ISSN 0303-9773. Vol. 85 (2009), p. 565-620. Cota: RP-176.
Resumo: O presente artigo analisa a realidade jurídico-económica e institucional do sector das águas e
resíduos em Portugal. Nele o autor procura descobrir as especificidades da regulação do sector das águas e
resíduos, contextualizando a análise sectorial no quadro mais lato do fenómeno regulatório em geral e de
alguns aspetos relevantes de direito da União Europeia, com particular realce para a disciplina dos serviços de
interesse económico geral.
Assim sendo, o trabalho divide-se em três capítulos: o primeiro capítulo caracteriza a atual organização
administrativa e a gestão das atividades de abastecimento de água, saneamento de águas residuais urbanas e
resíduos urbanos; o segundo capítulo analisa o novo quadro institucional e regulatório do sector; o terceiro
capítulo faz uma descrição dos mais relevantes aspetos da disciplina das águas e resíduos enquanto serviço
de interesse económico geral.
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SILVA, João Nuno Calvão da – Responsabilidade dos reguladores na fixação e controlo das tarifas. O
direito. Lisboa. A. 143, n.º 3 (2011), p. 507-569. Cota: RP-270.
Resumo: Neste artigo o autor analisa a nova intervenção do estado na economia, já não como Estado
providência mas como Estado regulador. O Estado providência caracteriza-se por uma intervenção acentuada
nos mais diversos domínios económicos e sociais, que ao assumir um cada vez maior número de tarefas vê a
sua intenção de resolver tudo traída pela finitude dos meios ao seu dispor.
O Estado regulador, por alguns designado como Estado Pós-social, caracteriza-se por um acentuado
recurso a formas jurídico-privadas de organização e atuação administrativas. A busca da eficiência na gestão
da res publica passa pela redução da intervenção estadual e por uma revalorização do papel da sociedade
civil.
Contudo, a falência do Estado intervencionista e regulador da vida económica não tem que determinar o
regresso do Estado abstencionista liberal e da autorregulação do mercado. Considera-se fundamental a
intervenção exterior, a hetero-regulação pública, para garantir o bom funcionamento da concorrência e a
satisfação das necessidades básicas de todos os cidadãos.
É neste âmbito que o autor analisa a regulamentação, nomeadamente, nos sectores da energia, da água e
dos resíduos.
Enquadramento do tema no plano da União Europeia
Em termos gerais, os serviços económicos de interesse geral são referidos no artigo 14.º do Tratado sobre
o Funcionamento da União Europeia (TFUE) conjugado com os artigos 93.º, 106.º e 107.º do TFUE e com o
Protocolo relativo aos Serviços de Interesse Geral, anexo ao Tratado de Lisboa, que determina o conteúdo do
conceito de "valores comuns da União" na aceção do artigo 14.º. Refira-se que os Tratados preveem que a
União e os Estados-membros zelarão por que esse serviços funcionem com base em princípios e em
condições, nomeadamente, económicas e financeiras, que lhes permitam cumprir as suas missões, ainda que
balizando a possibilidade de recurso a auxílios estatais para o efeito. Acresce que existe um reconhecimento
expresso de que os serviços de interesse económico geral ocupam uma posição no conjunto dos valores
comuns da União e desempenham um papel na promoção da coesão social e territorial.
Na Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social
Europeu e ao Comité das Regiões, de 20 de Novembro de 2007, que acompanha a comunicação «Um
mercado único para a Europa do século XXI» – Os serviços de interesse geral, incluindo os serviços sociais de
interesse geral: um novo compromisso europeu [COM(2007) 725], pode ler-se: "Os serviços de interesse geral
abrangem um amplo leque de atividades, dos grandes sectores que operam redes, como a produção e
distribuição de energia, as telecomunicações, os transportes, a radiodifusão e os serviços postais, à educação,
abastecimento de água, gestão de resíduos, serviços de saúde e serviços sociais. Tais serviços são
essenciais para o dia-a-dia dos cidadãos e empresas e espelham o modelo de sociedade europeu."1
No âmbito da regulação dos auxílios estatais, existem ainda referências aos serviços de interesse
económico geral, designadamente a Decisão n.º 2005/842/CE, de 28 de novembro, e o Enquadramento
Comunitário, publicado no JOUE C de 29/11/2005, aplicável por um período de 6 anos a partir da data de
publicação. Em termos jurisdicionais cumpre referir o Acórdão Altmark do Tribunal de Justiça Europeu,
segundo o qual as compensações de serviços de interesse geral não constituem auxílios estatais – e não
estão por conseguinte sujeitas a notificação prévia e autorização da Comissão – desde que estejam reunidos
os seguintes “critérios Altmark”:
A empresa beneficiária deve ser incumbida de uma missão de serviço público claramente definida;
Os parâmetros de cálculo da compensação devem ser previamente estabelecidos de forma objetiva e
transparente;
1 Esta Comunicação vem na sequência de um conjunto de documentos, que se debruçaram sobre este tema, designadamente, a
Comunicação da Comissão, de 26 de abril de 2006, «Realizar o programa comunitário de Lisboa. Os serviços sociais de interesse geral na União Europeia» [COM(2006) 177]; a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, de 12 de maio de 2004, intitulada "Livro Branco sobre os serviços de interesse geral" [COM(2004) 374]; o Livro Verde da Comissão, de 21 de maio de 2003, sobre serviços de interesse geral [COM(2003) 270]; e a Resolução do Parlamento Europeu, de 13 de janeiro de 2004, sobre o Livro Verde sobre serviços de interesse geral [A5-0484/2003].
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A compensação não deve ultrapassar os custos ocasionados pelo cumprimento das obrigações de
serviço público, deduzidos das receitas obtidas (a compensação pode contudo incluir um lucro razoável, isto é,
uma taxa de remuneração dos capitais próprios que tome em consideração o risco);
A empresa beneficiária deve ser escolhida através de concurso público ou a compensação não deve
exceder os custos de uma empresa bem gerida e adequadamente equipada para prestar o serviço público.
Segundo este Acórdão do Tribunal de Justiça, todas as outras formas de compensação constituem auxílios
estatais e estão por conseguinte sujeitas à regra da notificação prévia. Por conseguinte, em termos gerais,
quando a empresa beneficiária é escolhida através de um concurso público e transparente a compensação de
serviço público não constitui uma forma de auxílio estatal sujeita a notificação. Esta compensação não inclui
também auxílios estatais quando o Estado pode demonstrar que a empresa beneficiária da compensação
pública recebe apenas o correspondente ao custo líquido adicional – após dedução das receitas – que uma
empresa bem gerida e adequadamente equipada teria suportado para prestar o serviço.
Especificamente relacionado com a concessão de serviços relacionados a atividade de captação,
tratamento e distribuição de água para consumo público, cumpre referir a Diretiva 2004/17/CE do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de
contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais. Esta Diretiva relativa aos
«setores especiais» da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais (designados «setores
especiais») aplica-se aos contratos públicos celebrados por um poder público nos setores em causa para:
fornecimentos, serviços e obras, que não sejam excluídos excecionalmente pela própria diretiva mas, ao
contrário da diretiva «clássica», não se aplica às concessões de obras. De igual modo, aplica-se a qualquer
poder público ou empresa pública que exerça atividades num dos domínios seguintes: gás, eletricidade, água,
serviços de transportes, serviços postais, extração de combustíveis ou abertura de portos ou de aeroportos; e
qualquer entidade adjudicante que, embora não sendo um poder público nem uma empresa pública, exerça
uma (ou várias) das atividades referidas e beneficie de direitos especiais ou exclusivos concedidos por uma
autoridade competente de um Estado-membro tais como definidos pela diretiva.
Por último, importa referir a Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à
adjudicação de contratos de concessão [COM(2011) 897]2. Esta proposta tem como principais objetivos
garantir a segurança jurídica e o acesso aos mercados das concessões para todas as empresas europeias.
Assim, pretende-se esclarecer o quadro jurídico aplicável à adjudicação de concessões e delimitar claramente
o campo de aplicação desse quadro. Para as entidades adjudicantes são estabelecidas obrigações específicas
que incorporam os princípios dos Tratados aplicáveis à adjudicação de concessões; aos operadores
económicos são asseguradas determinadas garantias básicas quanto ao processo de adjudicação. No que
respeita aos casos de cooperação público-público, a iniciativa europeia em análise esclarece os casos em que
os contratos celebrados entre autoridades contratantes não ficam sujeitos às regras de adjudicação de
concessões. Ao contrário das Diretivas sobre Contratos Públicos, as regras agora propostas não incluem uma
lista explícita de procedimentos de adjudicação. A solução adotada permitirá às autoridades e entidades
adjudicantes seguir procedimentos mais flexíveis na adjudicação de concessões, nomeadamente em reflexo
das tradições jurídicas nacionais e de modo a permitir que os processos de adjudicação sejam organizados da
forma mais eficiente possível.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da UE: Alemanha, Espanha, França e
Reino Unido
2 Esta proposta foi escrutinada pelo parlamento português, estando o parecer final disponível em http://www.ipex.eu/IPEXL-
WEB/scrutiny/COD20110437/ptass.do?appLng=PT
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Alemanha
A principal legislação alemã sobre estas matérias está presente nos seguintes diplomas:
The Water Management Act (WHG);
The Wastewater Ordinance (Abwasserverordnung, AbwV).
A gestão da água e do sector dos resíduos na Alemanha é da responsabilidade dos municípios por si ou
através de associações de municípios. Essa concessão pode ser delegada em empresas municipais,
companhias privadas ou parcerias público-privadas.
O modelo alemão, legislação, estatísticas e estudos de caso podem ser consultados na publicação The
German Water Sector: Policies and Experiences.
Espanha
De acordo com o Decreto Legislativo n.º 1/2001, de 20 de julio, por el que se aprueba el texto refundido de
la Ley de Aguas e a Ley 22/2011, de 28 de julio, de residuos y suelos contaminados as competências em
matéria de abastecimento de água e gestão de resíduos em Espanha encontram-se repartidas por vários
níveis na administração pública, a saber:
1) À Administração Central do Estado compete a responsabilidade de assegurar o percurso dos rios em
território de mais do que uma região e a disponibilidade de recurso nos órgãos competentes das
Administrações Autonómica. Esta competência é gerida pelos organismos das bacias ou confederações
hidrográficas dependentes do Ministério do Ambiente;
2) As comunidades autónomas são responsáveis pela distribuição das águas até aos pontos de toma das
redes de âmbito municipal ou supramunicipal que estão no seu território;
3) As diputaciones provinciales têm competências de coordenação dos serviços municipais e de
assistência e cooperação;
4) Os municípios (e, nalguns casos, as macro comunidades de municípios) devem garantir o
abastecimento de água potável às habitações, aprovar as tarifas de água e estabelecer regulamentos de
prestação de serviços.
O abastecimento de água potável às populações é um serviço público que é regulado, garantido e
controlado pela Administração Pública, mas a Espanha adotou já processos de liberalização e privatização do
setor em meados dos anos 80 do século XX, identificados no Título IV da Ley 29/1985, de 2 de agosto, de
Aguas (já revogada).
Atualmente, o novo enquadramento jurídico (Decreto Legislativo n.º 1/2001, de 20 de julio, por el que se
aprueba el texto refundido de la Ley de Aguas) identifica três sistemas de gestão do abastecimento de águas:
Sistema de gestão público. Utilizado nos municípios que administram e exploram diretamente o
abastecimento e saneamento das suas cidades como serviço municipal. A gestão pode ser simples (depende
diretamente do município), complexa (a gestão é feita por um órgão administrativo dependente do município,
mas com estatuto legal próprio) ou corporativa (quando é realizada por uma empresa municipal em que 100%
da propriedade pertence ao município). A gestão também pode ser assumida por macro comunidades de
municípios que, de maneira conjunta e sem perder a condição de empresa pública, participam de uma
sociedade formada pelos municípios;
Sistema de gestão misto. É o feito pelos municípios em colaboração com empresas privadas. As
sociedades de gestão mista possuem como acionistas de referência o município e uma ou várias empresas
privadas;
Sistema de gestão privado. Feito por intermedio de uma concessão administrativa ou de um contrato de
arrendamento, em que se cede a gestão de toda ou parte do ciclo integral de água a uma empresa privada,
mantendo o município a titularidade do serviço, concedendo apenas uma cessação temporária da gestão.
As empresas privadas mais destacadas deste setor são:
O grupo Aguas de Barcelona (AgBar);
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O Canal de Isabel II;
A SOREA.
O Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente disponibiliza o Libro Digital del Aqua, que
contém, entre outras informações, dados sobre a administração e gestão das águas em Espanha.
Encontra-se, ainda, disponível o seguinte documento: Estudio Sectorial: captación, depuración y
distribuición de aguas.
Quanto ao tratamento de resíduos, a Ley 22/2011, de 28 de julio, de residuos y suelos contaminados
prevê também a sua concessão a privados, à semelhança do que já acontecia com a anterior Ley 10/1998, de
21 de abril, de Residuos.
França
Em França, todos os serviços de água e saneamento são serviços públicos, sendo competência das
coletividades locais no que diz respeito à sua organização e fixação do preço. A sua gestão pode ser feita pelo
próprio município ou delegada em empresas privadas, como acontece na maioria dos casos.
A gestão da água e saneamento em França é regulamentada pelos seguintes diplomas:
ALoi n.º 64-1245 du 16 décembre 1964 relative au régime et à la répartition des eaux et à la lutte contre
leur pollution, primeira grande lei sobre a água, organiza a sua gestão em torno de seis grandes bacias
hidrográficas a partir de uma separação das linhas de água. Desenvolve a noção de “gestão global da água”
no interesse de todos e instaura o princípio do poluidor-pagador, visando preservar a qualidade de água. No
seio de cada bacia, a gestão é atribuída a uma Agence de l'eau;
ALoi n.º 92-3 du 3 janvier 1992 sur l'eau, prolonga e completa a lei de 1964 em torno de uma nova
conceção: a da água como “património comum da nação” (artigo 1.º). A sua proteção e desenvolvimento são
assim do interesse geral.
A lei reforça ainda o princípio de concertação entre atores e utilizadores de água, aumentando as
prerrogativas das coletividades locais na sua gestão (Cap. II) e instaura, no seio de cada bacia hidrográfica um
novo sistema de planeamento global dos recursos: os SDAGE (Schéma Directeur d'Aménagement et de
Gestion des Eaux) e os SAGE (Schéma d'Aménagement et de Gestion des Eaux);
O Décret n.º 89-3 du 3 janvier 1989 relatif aux eaux destinées à la consommation humaine à l'exclusion
des eaux minérales naturelles, que fixa as normas francesas de qualidade da água de torneira;
A regulação das relações contratuais entre os municípios e as sociedades de serviços públicos
delegadas de água é feita através de duas leis:
o A Loi Sapin n.º 93-122 du 29 janvier 1993 relative à la prévention de la corruption et à la transparence
de la vie économique et des procédures publiques e a
o A Loi Mazeaud n.º 95-127 du 8 février 1995 relative aux marchés publics et délégations de service
public;
Finalmente, a Loi n.º 2006-1772 du 30 décembre 2006 sur l'eau et les milieux aquatiques, que renova
completamente o seu regime jurídico.
As novas orientações da LEMA são:
Conceber os instrumentos necessários para atingir, em 2015, os objetivos de bom estado das águas
fixados na Diretiva quadro sobre a água (DCE);
Melhorar o serviço público de água e saneamento, tornando o acesso á água para todos com uma
gestão mais transparente;
Modernizar a organização da pesca em água doce.
A gestão dos serviços de água, saneamento e resíduos é feita pelos municípios, que, na maioria dos
casos, delega esse serviço em estruturas intermunicipais que podem decidir o modo de gestão das instalações
e redes : a gestão direta ou delegada em empresas privadas. Este último recurso passa a ser frequente na
segunda metade do século XX e permitiu o desenvolvimento de grandes grupos industriais, que, hoje em dia,
constituem três grandes grupos económicos:
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Lyonnaise des eaux
Vivendi
SAUR
As empresas privadas possuem uma FP2E / Fédération professionnelle des entreprises de l’eau, criada em
1938, para gestão dos interesses das empresas privadas de abastecimento de água e resíduos,
De interesse para a matéria em questão, encontra-se, ainda, disponível o seguinte documento: La gestion
de l’eau en France.
Reino Unido
A Lei relativa aos recursos hídricos de 1991, a Lei da água de 2003 e a Regulamentação de 2006,
referente aos recursos hídricos, nomeadamente a questão das licenças, são as referências legislativas mais
relevantes do ordenamento jurídico britânico nesta área.
No Reino Unido existem dois modelos de gestão do abastecimento de águas e resíduos:
Gestão privada (Inglaterra e País de Gales);
Gestão pública (Escócia e Irlanda do Norte).
Em Inglaterra e no País de Gales, o abastecimento é fornecido por 10 empresas regionais e 16 pequenas
empresas só de abastecimento de água. Após a privatização das Water Authoraties, foi criado o regulador
Water Services Regulation Authority (Ofwat), e a Environment Agency é responsável pela regulação ambiental
e de gestão de resíduos.
Na Escócia, a empresa pública Scottish Water continua a providenciar o abastecimento de água à
população, o mesmo acontecendo com a empresa pública Northern Ireland Water.
Outros países
Organizações internacionais
A European Federation of National Associations of Water and Wastewater Services, disponibiliza o seguinte
documento: EUREAU Position on the Water Blueprint.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Da pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (PLC) verificou-se que
não se encontra pendente qualquer iniciativa legislativa sobre a mesma matéria.
V. Consultas e contributos
Não se nos afigura existir qualquer obrigação regimental ou constitucional de consulta.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face dos elementos disponíveis não é possível avaliar os encargos resultantes da aprovação da
presente iniciativa legislativa e da sua consequente aplicação
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 585/XII (2.ª)
RECOMENDA AO GOVERNO QUE, EM ARTICULAÇÃO COM A ACADEMIA, PROMOVA UM ESTUDO
QUE ABORDE AS VANTAGENS E DESVANTAGENS DA FRAGMENTAÇÃO HIDRÁULICA EM
PORTUGAL, E QUE PROMOVA ESTRITA REGULAMENTAÇÃO DE AVALIAÇÃO E SALVAGUARDA DOS
RESPETIVOS IMPACTOS AMBIENTAIS E SOBRE AS POPULAÇÕES
Exposição de motivos
Em novembro de 2012, a Agência Internacional de Energia veio afirmar que, em cinco anos, os Estados
Unidos da América irão ultrapassar a Arábia Saudita, tornando-se nos maiores produtores de petróleo até
2017, e que, em 2015, superarão a Rússia, tornando-se nos maiores produtores de gás natural.
Para tais afirmações concorrem não só o aumento da produção e novas políticas destinadas a melhorar a
eficiência energética, mas, também, a adoção de novas técnicas de exploração e extração, como a perfuração
horizontal ou a fragmentação hidráulica, que tornam as reservas muito mais acessíveis. No caso do gás, tais
técnicas, plenas de riscos e de incógnitas ambientais, resultaram aliás num excedente que tem provocado a
queda dos preços.
Em matéria energética, a imprescindível e desejável diversidade nas fontes não se traduz automaticamente
em melhor desempenho ambiental. Com efeito, embora o gás natural seja frequentemente enaltecido pelas
suas relativamente diminutas emissões de carbono quando comparadas às associadas ao petróleo ou ao
carvão, o que é facto é que o novo cenário energético mundial poderá ter como consequência níveis
crescentes de aquecimento global.
O aquecimento global é, aliás, apenas umas das consequências das novas técnicas de exploração e
extração de hidrocarbonetos não convencionais, nomeadamente da já mencionada fragmentação hidráulica, a
qual envolve a injeção de água e químicos sob pressão a grandes profundidades, permitindo a extração de
gás natural, e, como tal, o acesso a novas reservas de combustíveis.
Se nos Estados Unidos a fragmentação hidráulica foi relativamente bem recebida, as primeiras
experiências na Europa encontram-se envoltas em grande polémica, nomeadamente o caso das duas
prospeções no condado de Lancashire em que se registaram dois sismos, situação que originou a sua
suspensão em maio de 2011.
Em consequência, foram realizados pelo Governo britânico diversos estudos técnicos, com base nos quais
se decidiu retomar recentemente a exploração dos recursos endógenos. Aqueles estudos alertaram a
comunidade científica e a população em geral para a existência de risco sísmico, embora o mesmo possa ser
eficazmente gerido com controlo. Ou seja, que a atividade pode processar-se sob estrita regulamentação e
salvaguarda dos respetivos impactos ambientais e sobre as populações.
Atualmente, são vários os países europeus interessados na exploração do gás de xisto com recurso à
fragmentação hidráulica, como sejam a Polónia, a Alemanha, a Holanda, a Espanha, a Dinamarca ou a
Suécia, embora existam países onde a técnica é rejeitada, como França, onde é, aliás, matéria consensual
entre os principais partidos do arco da governação.
Em suma, a fragmentação hidráulica tem sido contestada não só pelos seus potenciais impactos na
atividade sísmica, como, igualmente, pelas consequências que acarreta para a qualidade da água subterrânea
e pela libertação de gases que agravam o aquecimento global.
Por tal motivo, a Comissão Europeia lançou, no final de dezembro de 2012, uma consulta sobre as novas
fontes de energia, visando garantir que os potenciais benefícios económicos e as vantagens em termos de
segurança energética de tais desenvolvimentos possam ser aproveitados de forma segura, não
comprometendo a saúde humana ou o ambiente.
São, de resto, estas preocupações que fundamental a apresentação da presente iniciativa legislativa, com
a qual se pretende que o Governo promova, em estreita articulação com as diversas instituições do ensino
superior com relevante conhecimento sobre a matéria, um aprofundado estudo que aborde as vantagens e
desvantagens da fragmentação hidráulica em Portugal, e, a par, seja promovida estrita regulamentação de
avaliação e salvaguarda dos respetivos impactos ambientais e sobre as populações, permitindo que a
exploração e extração de recursos com recurso àquela técnica opere sob as mais apertadas normas de
segurança.
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Neste sentido, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados
do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam o presente projeto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos do disposto do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição
da República Portuguesa, recomendar ao Governo que:
Em articulação com a academia, promova um estudo que aborde as vantagens e desvantagens da
fragmentação hidráulica em Portugal, e que promova estrita regulamentação de avaliação e salvaguarda dos
respetivos impactos ambientais e sobre as populações.
Palácio de São Bento, 22 de janeiro de 2013.
Os Deputados do PS: Carlos Zorrinho — Pedro Farmhouse — Mota Andrade — António Braga — Acácio
Pinto — Nuno André Figueiredo — Eurídice Pereira — Idália Salvador Serrão — Jorge Fão — José Junqueiro
— Luís Pita Ameixa — Mário Ruivo — Miguel Coelho — Miguel Freitas — Ramos Preto — Renato Sampaio.
———
PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 51/XII (2.ª)
APROVA O ACORDO ENTRE A REPÚBLICA PORTUGUESA E OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA
PARA TROCA DE INFORMAÇÃO DE RASTREIO DE TERRORISMO, ASSINADO EM WASHINGTON, EM
24 DE JULHO DE 2012
Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas e anexo, contendo o
parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas
Parte I – Nota Introdutória
Ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do
n.º 1 do artigo 198.º do Regimento da Assembleia da República, o Governo apresentou a Proposta de
Resolução n.º 51/XII (2.ª), que “Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da
América para Troca de Informação de Rastreio de Terrorismo, assinada em Washington, em 24 de julho de
2012”.
O conteúdo da Proposta de Resolução n.º 51/XII (2.ª) está de acordo com o previsto na alínea i) do artigo
161.º da Constituição da República Portuguesa e preenche os requisitos formais aplicáveis.
Por determinação da Sr.ª Presidente da Assembleia da República, de 5 de dezembro de 2012, a referida
Proposta de Resolução n.º 49/XII (2.ª) baixou à Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades
Portuguesas como a materialmente competente, mas com a menção de que a mesma era conexa com a
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias.
A Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas dirigiu ao Presidente da Comissão de
Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias o ofício n.º 2-19/COM/2013 solicitando emissão de
Parecer, o qual foi aprovado em 12 de janeiro do corrente que se anexa ao presente Parecer, fazendo dele
parte integrante.
Parte II – Considerandos
1- Considerando os antigos laços históricos e sólidos que unem Portugal e os Estados Unidos da América
nos mais diversos campos, seja o económico, o cultural, ou o militar entre outros, a par da relação frutuosa
mantida em todas as áreas do seu relacionamento bilateral, incluindo as áreas da segurança, do combate ao
terrorismo e atividades associadas;
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2- Tendo presente a importância acrescida do presente Acordo, em razão da sua matéria, por envolver o
sensível aspeto relativo ao tratamento de dados pessoais para fins de polícia, o que naturalmente causa
impacto na esfera dos direitos, liberdades e garantias das pessoas;
3- Tendo presente que a transferência de dados pessoais, face à Lei de Proteção de Dados (LPD), Lei n.º
67/98, de 26 de outubro, para um Estado que não pertença à União Europeia “só pode realizar-se com o
respeito pelas disposições da presente Lei e se o Estado para onde são transferidas assegurar um nível de
proteção adequada (n.º 1 do artigo 19.º), dispondo depois a mesma lei, como abertura de exceção, no seu
artigo 20.º, n.º 6, que a transferência de dados possa ocorrer quando tal constituir medida necessária à
prevenção, investigação e repressão de infrações penais, devendo nesse caso o fluxo ser regido “por
disposições legais especificas ou pelas convenções e acordos internacionais em Portugal é parte”;
4- Reconhecendo que exigências para a transmissão a Estados terceiros da União Europeia constantes na
Decisão-Quadro 2008/977/JAI do Conselho, de 27 de novembro de 2008, relativa à proteção de dados
pessoais tratados no âmbito da cooperação policial em matéria penal, e que, nomeadamente, o seu artigo
13.º, dispõe que esse Estado deve assegurar um nível de proteção adequado;
5- Considerando o Protocolo Adicional à Convenção 108, do Conselho da Europa, de 28 de Janeiro de
1981, assinado e ratificado por Portugal, o qual estipula que a transferência de dados pessoais para um
Estado que não é parte da Convenção apenas poderá realizar-se se esse Estado assegurar um nível de
proteção de dados adequado (n.º 1 do artigo 2.º), e à qual os Estados Unidos não aderiram;
6- Considerando mais o Protocolo Adicional à Convenção 108 do Conselho da Europa bem como a
Decisão-Quadro 2008/977/JAI do Conselho, diplomas onde prevê que, em derrogação à exigência de
adequada proteção de um Estado terceiro, a transferência internacional de dados pessoais se possa realizar
se forem assegurados mecanismos suficientes de garantia de proteção da vida privada e dos direitos e
liberdades fundamentais das pessoas;
7- Tendo presente que EUA não têm legislação geral federal em matéria de proteção de dados. O US
Privacy Act, alterado em 1974, contém apenas disposições parcelares, e somente aplicáveis a entidades
públicas, em particular em matéria de confidencialidade e de acesso de retificação para parte dos titulares dos
dados;
8- Tendo presente a inexistência ao nível federal norte-americano de qualquer autoridade independente de
controlo que supervisione o tratamento de dados pessoais, pese embora a existência do Terrorism Screening
Center, autoridade criada em 2003, no âmbito do FBI, e que pretende coordenar ao nível nacional toda a
informação identificativa de terroristas conhecidos ou suspeitos para apoio a outras agências governamentais
as quais procedem na linha da frente ao rastreio de terrorista, designadamente aquando da obtenção de
vistos, controlo de fronteiras, embarque aéreo, imigração e aquisição de nacionalidade;
9- Considerando o objeto do Acordo, verifica-se que do ponto de vista formal o documento encontra-se
organizado em apenas 21 artigos e sistematizado em 4 Capítulos.
9.1 Do Capítulo I
Como acontece habitualmente neste tipo de instrumento jurídico de direito internacional público, o primeiro
dos seus artigos é dedicado à delimitação do objeto e finalidade, que no caso sub judice compreende a
cooperação entre as Partes em matéria de partilha e utilização de informação e rastreio do terrorismo retirada
da informação produzida pelos serviços de informações e pelas entidades responsáveis pela aplicação da lei,
apenas para efeitos de prevenção e combate ao terrorismo e às infrações relacionadas com o terrorismo, tal
como definido no Direito interno das Partes e no Direito Internacional que lhes é aplicável, acrescentando o n.º
2 deste normativo que esta cooperação deverá ser implementada de acordo com o Direito interno das Partes e
o Direito Internacional que lhes é aplicável, incluindo os Direitos Internacional Humanitário e os Direitos
Humanos.
O artigo 2.º trata o conteúdo das definições, sendo de notar que há conceitos comuns e outros cujos
significados são diferentes para Portugal e para os Estados Unidos, como sejam os casos de informação
classificada, terrorista conhecido e suspeito de terrorismo. Assim, nos casos referidos, para Portugal
informação classificada significa qualquer que seja a sua forma, natureza e meios de transmissão, que, de
acordo com o respetivo Direito em vigor, requeira proteção contra a sua divulgação não autorizada e à qual
tenha sido atribuída a marca de classificação de segurança apropriada; e para os Estados Unidos da América
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informação de segurança nacional classificada, definida nos termos da Ordem Executiva 13526, conforme
alterada, ou nos termos de qualquer ordem anterior ou posterior, que requeira proteção contra a sua
divulgação não autorizada e à qual foi atribuída a marca indicativa da natureza classificada quando sob a
forma documental, segundo se dispõe nos pontos i. e ii. da alínea a). No que tange à definição de terrorista
conhecido, para os EUA, nos termos da alínea g), é o indivíduo condenado por um crime de terrorismo num
tribunal dos EUA ou num tribunal estrangeiro de jurisdição competente, ou tenha sido acusado ou indiciado por
um crime de terrorismo num tribunal dos EUA ou num tribunal estrangeiro de jurisdição competente. Para
Portugal trata-te de um indivíduo que tenha sido condenado por um crime de terrorismo num tribunal
português. O suspeito de terrorismo para os Estados Unidos é um indivíduo, em relação ao qual existem
motivos razoáveis para suspeitar que pratica ou tem praticado comportamentos considerados atividades
terroristas ou atividades relacionadas com o terrorismo, ou que está ou tem estado envolvido na preparação e
no apoio às mesmas, com base numa suspeita fundamentada e razoável, e para Portugal um indivíduo que
tenha sido acusado de um crime de terrorismo num tribunal Português, conforme o disposto na alínea h).
De assinalar a verificação de uma desconformidade de conceitos relevante no que respeita à definição de
“terrorista conhecido” que para os EUA é não só a pessoa condenada como a constituída arguida. Sucede que
à luz da lei portuguesa o princípio da presunção da inocência é um direito fundamental, pelo que a atribuição
da qualificação em presença a uma pessoa que não tenha sido objeto de uma condenação pela prática desse
crime configura-se como potencialmente violadora de princípios em que se funda o nosso Estado de Direito,
bem assim como da própria Constituição da República Portuguesa, cujo artigo 32.º, n.º 2, expressamente
refere que “todo o arguido se presume inocente até trânsito em julgado da sentença”.
9.2 Do Capítulo II
Na economia do documento é de grande relevância o disposto no artigo 4.º, pois este normativo trata com
detalhe os princípios a observar no respeitante à troca de informação, o que releva em sede de salvaguarda
dos direitos fundamentais pois envolve o tratamento de dados pessoais para fins policiais. Assim, essas
informações deverão ser: i) obtidas para os fins especificados no presente Acordo e não ser tratadas para
outros fins; ii) adequadas, necessárias, pertinentes e não excessivas relativamente às finalidades para que são
recolhidas, transferidas e depois tratadas; iii) exatas e, se necessário, atualizadas em conformidade com o
Direito interno de cada Parte; iv) e conservadas de forma a permitir a identificação dos titulares dos dados
apenas durante o período necessário para a prossecução das finalidades para que foram transmitidas ou para
que são tratadas posteriormente. De salientar a importância do consagrado em iv) por ai se verter o princípio
da necessidade concreta, tão importante na investigação criminal num quadro generalizado de partilha de
dados pessoais.
Matéria menos controversa embora igualmente relevante é a que se encontra regulada pelos artigo 5.º
respeitante ao período de conservação da informação. De acordo com o previsto, o prazo para a conservação
de dados é o do direito interno das Partes, salvo no caso em que terminados os prazos fixados no Acordo os
dados informativos continuam a ser necessários para efeitos de investigações, de procedimentos penais ou de
aplicação da lei, em curso, que possam ser objeto de controlo judicial. De notar que em Portugal, nos termos
da legislação que regula a identificação criminal, o registo criminal é cancelado após um determinado período
legalmente estabelecido, o que nos casos de crimes com sentença superior a 8 anos de prisão é de 10 anos
após a extinção da pena, desde que não tenha ocorrido nova condenação, ou após o falecimento do titular.
O princípio da reciprocidade encontra-se vertido no artigo 6.º relativo ao âmbito da troca de informações,
pois dele decorre que as partes concordam em conceder-se mutuamente o acesso à informação de rastreio de
terrorismo, a qual deve ser prestada, salvo se a mesma for contrária ao seu interesse nacional, e sob reserva
do Direito interno das obrigações internacionais da Parte. Questão delicada é a que se encontra prevista no
n.º3 deste preceito, pois aí se estabelece qual a informação de rastreio a transmitir e que compreende: nome
completo do individuo, data de nascimento, o número do passaporte ou de outro documento de identificação,
bem como a nacionalidade/cidadania atual e anterior, se conhecida. Mais acrescentando o n.º 4 que
informações adicionais, não classificadas, sobre terroristas conhecidos ou suspeitos de terrorismo, para além
das já enumeradas anteriormente, como impressões digitais e fotografias, podem ser dadas, desde que tal
seja permitido por lei e por decisão da Parte transmissora. A norma contida no n.º 5 deixa aberta a porta para
a possibilidade da celebração de um outro acordo de segurança sobre proteção mútua de informação
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classificada entre as Partes, sendo que a parte afirmativa deste comando diz que o presente Acordo não
impõe a obrigação de troca de informação classificada.
Os procedimentos para a troca de informação encontram-se previstos ao longo dos cinco números do
artigo 7.º, sendo aqui de destacar o disposto no n.º 1 onde se determina que cada Parte deverá designar um
ou mais pontos de contacto que deverão reunir-se logo 30 dias após a entrada em vigor do Acordo sub judice,
o qual, nos termos do n.º 2, deverá começar a ser aplicado o mais tardar 120 dias depois da sua entrada em
vigor. Já os procedimentos para a determinação da existência de coincidências se encontram previstos no
artigo subsequente do Acordo, definindo-se neste aspeto o dever de informar no prazo de 24 horas através
dos pontos de contacto, sempre que encontre uma possível existência de coincidência. Porém, o fundamental
deste normativo é o estatuído no seu n.º 2, pois aqui se dispõe o que as Partes se esforçarão por: i) ajudar a
confirmar se existe uma coincidência associada ao indivíduo; ii) prestar imediatamente informação adicional,
não classificada e passível de ser disponibilizada, à Parte destinatária; iii) pedir às autoridades competentes do
seu Governo que deem informação adicional, não classificada, à Parte destinatária; e iv) coordenar as
respostas operacionais entre os participantes e/ou as autoridades competentes dos dois Governos. Ainda
neste artigo, referir que o seu n.º 3 prevê que a Parte transmissora possa pedir à Parte destinatária que aja ou
se abstenha de agir em relação ao individuo encontrado, sendo que a parte destinatária deverá em
conformidade com o seu Direito interno, ter em consideração esses pedidos, bem como qualquer informação
adicional, não classificada, prestada pela Parte transmissora.
9.3 Do Capítulo III
Será, porventura, do presente Acordo a sua área mais sensível do ponto de vista das garantias, uma vez
que se ocupa da utilização e proteção da informação ao longo dos artigos 9.º a 14.º. Os princípios vertidos na
disciplina do artigo 9.º são os da exatidão e atualidade da informação, como se retira do seu n.º 3 ao estatuir
que a Parte destinatária concorda em não utilizar ou não se basear na informação recebida ao abrigo do
presente Acordo, ou em informação produzida a partir dessa mesma informação, sempre que essas
informações tenham sido substituídas por novas informações, ou no caso do presente Acordo ter terminado,
com a exceção prevista investigações, procedimentos ou aplicação da lei em curso.
Segundo o principio da necessidade de conhecer, aflorado no n.º 1 do artigo 10.º, relativo à Proteção
contra Divulgação conforme a sua epigrafe, o acesso à informação entre as Partes transmissora e destinatária
é restrito a apenas aos funcionários autorizados no seio das respetivas autoridades competentes. Já o n.º 2
vem estabelecer que salvo o consentimento escrito da Parte transmissora, qualquer outra divulgação da
informação recebida ao abrigo do presente Acordo é estritamente proibida, incluindo mas não se limitando à: i)
utilização em qualquer ação ou processo judicial ou administrativo, qualquer processo judicial ou quase-
judicial, ou em qualquer processo que poderia acarretar divulgação pública; ii) divulgação a um Governo de um
país estrangeiro terceiro e/ou a uma organização internacional; iii) divulgação a particulares, incluindo o
indivíduo objeto da informação de rastreio do terrorismo; e iv) divulgação de qualquer informação,
nomeadamente ao indivíduo objeto da informação de rastreio do terrorismo, sobre se um indivíduo é ou não
objeto da informação de rastreio do terrorismo prestada ao abrigo do presente Acordo. No que tange às
garantias, o preceituado no n. º 3 consagra que qualquer reprodução, difusão ou comunicação de qualquer
informação prestada pelas Partes ao abrigo do presente Acordo, que não o nome, a data de nascimento, o
número do passaporte, o país de origem ou de cidadania no passaporte, tem de ser acompanhada de uma
declaração descrevendo as restrições à utilização e divulgação previstas no número anterior do presente
artigo. Enquanto o n.º 4, ainda deste mesmo artigo, se ocupa dos procedimentos a levar a cabo pelas Partes
aquando do pedido de consentimento para uma divulgação, a estatuído no n.º 5 preconiza que qualquer
ambiguidade ou questão relacionada com a divulgação das informações trocadas ao abrigo do presente
Acordo deverão ser objeto de consultas entre as Partes.
A segurança da informação corresponde à epígrafe ao artigo 11.º, dispondo o seu n.º 1 que cada Parte
deverá utilizar garantias de segurança eletrónica adequadas para controlar o acesso, o suporte, a introdução,
o tratamento, a transmissão e o transporte da informação obtida ao abrigo do presente Acordo. Mais, adianta o
normativo do n.º 2 onde se define que cada Parte deverá adotar as medidas técnicas e organizativas
necessárias para garantir a proteção contra o acesso e a introdução de dados não autorizados, a perda, a
corrupção, a má utilização, a destruição, a alteração ou a difusão, acidental ou não autorizada, ou qualquer
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outro tipo de tratamento ilícito das informações obtidas ao abrigo do presente Acordo; essas medidas deverão
assegurar um nível de segurança adequado em relação à natureza dos dados e aos riscos que o respetivo
tratamento apresenta. Finalmente, o terceiro comando deste preceito vem reforçar o grau de segurança, na
medida em que as Partes se obrigam ao dever da utilização de garantias de segurança, eletrónica e física,
adequadas para controlar o acesso à informação obtida ao abrigo do presente Acordo, devendo armazenar
sempre essa informação num sistema de armazenamento seguro, em conformidade com o seu Direito interno.
O Acordo prevê um sistema de supervisão e monitorização do mesmo, regulado pelo artigo seu artigo 12.º
que no n.º 1 determina o dever às Parte em monitorizar o seu cumprimento, pela sua parte quanto à proteção
de informação e comunicar com a outra Parte, quando for adequado, sobre questões de proteção e
segurança. Acrescentando o n.º 2 que cada Parte deverá envidar os seus melhores esforços no sentido de
assegurar que todo o pessoal com acesso à informação obtida ao abrigo do presente Acordo recebe formação
em matéria das garantias necessárias para proteger a informação. Já a norma contida no n.º 3 estabelece o
dever das Partes em manter um registo das entidades e dos indivíduos habilitados a ter acesso às
informações da outra Parte e informar a outra Parte de qualquer tentativa de acesso indevido ou de utilizar ou
divulgar indevidamente informações prestadas pela outra. Por sua vez, do número 4 decorre o dever das
Partes em manter um registo sobre quando foi recebida a informação obtida ao abrigo do presente Acordo,
durante quanto tempo foi conservada essa informação e como foi utilizada, segundo o disposto no presente
Acordo, devendo, a pedido, disponibilizar essa informação à Parte transmissora. Para maior segurança, ficou
consagrado no texto do Acordo que cada Parte deverá assegurar que o registo identifica as entidades que
tiveram acesso à informação partilhada pela Parte transmissora. Finalmente, dispõe o número 5 que cada
Parte deverá utilizar os mais rigorosos procedimentos vigentes para o tratamento de informação pessoal
sensível e/ou de segurança nacional.
Importante garantia, sem dúvida, é a que se consagra no artigo 13.º, o qual dispõe, na medida do previsto
nos respetivos Direitos internos e no respeito pelas restrições à divulgação previstas no artigo 10.º, que cada
Parte deverá assegurar que o titular dos dados tem o direito de indagar junto da autoridade competente se o
potencial tratamento dos seus dados pessoais foi efetuado em conformidade com a lei e no respeito das
condições e dos limites fixados no presente Acordo, e de receber uma resposta adequada. Neste contexto
garantístico, o artigo 14.º é de grande alcance pois, sempre no quadro do direito interno, as Partes, de acordo
com o n.º 1 obrigam-se a assegurar que o titular dos dados pode exercer efetivamente o direito de queixa,
incluindo o acesso a vias de recurso judicial e a possibilidade de pedir indemnização, em caso de violação dos
direitos de proteção dos seus dados pessoais em relação ao rastreio. O número seguinte determina que cada
Parte deverá ter ou instituir procedimentos para os indivíduos registarem queixas relacionadas com o rastreio,
enquanto o n.º3 estabelece que se uma Parte recebe uma queixa relacionada com a informação prestada pela
outra Parte, a Parte que recebe a queixa deverá fornecer uma cópia da mesma à outra Parte e consultar,
quando for adequado, sobre quaisquer ações a serem realizadas. No âmbito deste normativo destacar o seu
número 5 porque nele se encontrar consagrado o princípio da confidencialidade, ao se determinar que uma
Parte não deverá em caso algum revelar ao indivíduo que regista a queixa ou a qualquer outra entidade
privada, e o facto de ter sido enviada uma cópia da queixa à outra Parte ou da queixa se referir à informação
prestada pela outra Parte ao abrigo do presente Acordo.
9.4 Do Capítulo IV
Sobre a relação deste com outros instrumentos jurídicos de direito internacional público, dispõe o artigo
15.º que este não têm por objetivo prejudicar ou restringir qualquer outro instrumento entre as Partes, incluindo
os acordos relativos à aplicação da lei, à troca de informações ou aos esforços de contra-terrorismo. O n.º 2 do
citado preceito refere que o presente Acordo não confere direitos a quaisquer pessoas privadas, nem alarga
ou restringe direitos de outro modo conferidos aos nacionais de cada Parte ao abrigo das respetivas leis
internas.
Em matéria de consultas, conforme o artigo 16.º, a prática deve ser a consulta regular através dos pontos
de contacto e quanto a à eventualidade de conflitos emergentes da aplicação ou interpretação do Acordo
devem os mesmos ser resolvidos através de negociação por via diplomática.
Emendas, vigência e denuncia, entrada em vigor e registo correspondem, respetivamente, às epígrafes dos
artigos 18.º, 19.º, 20.º e 21.º, sendo aqui de destacar a norma ínsita no n.º 3 do artigo 19.º a qual determina
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que o acordado ao abrigo do artigo 10.º quanto à utilização e divulgação de todas as informações recebidas ao
abrigo deste Acordo continua a aplicar-se após a sua denúncia pelas Partes.
A terminar, referir que este novo instrumento direito internacional público, nos termos do artigo 20.º, entrará
em vigor trinta dia após a data da receção da última das notificações, por escrito e por via diplomática, de que
foram cumpridos os procedimentos internos de cada uma das Partes necessários para o efeito, e para que
todo o processo se conclua dispõe 21.º que após a entrada em vigor do presente Acordo, Portugal deverá
submetê-lo para registo junto do Secretariado das Nações Unidas, nos termos do artigo 102.º da Carta das
Nações Unidas, devendo, igualmente, notificar os Estados Unidos da conclusão deste procedimento e indicar-
lhe o número de registo atribuído.
Parte III – Opinião do Relator
O presente Parecer explicita em detalhe a organização e o conteúdo da Proposta de Resolução n.º 51/XII
(2.ª) que aprova “o Acordo entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América para Troca de
Informação de Rastreio de Terrorismo, assinada em Washington, em 24 de julho de 2012”.
Da análise realizada verifica-se a existência de aspetos relevantes que se prendem com diferenças
relativos ao quadro hermenêutico dos conceitos relativos a informação classificada, terrorista conhecido e
suspeito de terrorismo, os quais diferem entre os regimes jurídicos português e norte-americano, tal como
pode ser verificado, por exemplo, no artigo 2.º do capítulo 1.º.
A troca de informação de rastreio de terrorismo é matéria complexa, sensível e delicada, pelo que no
Capítulo III são incluídas normas garantísticas que visam assegurar a correta utilização e a adequada proteção
de informação no respeito pelo direito interno de cada Estado.
Trata-se de um Acordo importante que permite reforçar os laços de cooperação entre os dois Estados nos
domínios da segurança, do combate ao terrorismo e atividades associadas, pelo que deve merecer a
aprovação nesta Comissão.
Parte IV – Conclusões
A Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, em reunião realizada no
dia 22 de janeiro de 2013, aprova a seguinte conclusão:
A Proposta de Resolução n.º 51/XII (2.ª), que aprova o “Acordo entre a República Portuguesa e os Estados
Unidos da América para Troca de Informação de Rastreio de Terrorismo, assinada em Washington, em 24 de
julho de 2012”, reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser apreciada e votada em Plenário.
Palácio de São Bento, 22 de janeiro de 2013.
O Deputado Relator, António Serrano — O Presidente da Comissão, Alberto Martins.
Nota: O parecer foi aprovado, por maioria, com os votos favoráveis dos Deputados do PSD, do PS e do
CDS-PP e as abstenções do PCP e do BE.
Anexo
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
Proposta de Resolução n.º 51/XII (2.ª) que visa a aprovação pela Assembleia da República do Acordo entre
a República Portuguesa e os Estados Unidos da América para a Troca de Informação de Rastreio de
Terrorismo, assinado em Washington, em 24 de julho de 2012 (de ora em diante, Acordo).
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II SÉRIE-A — NÚMERO 70
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1 – Introdução
A Comissão dos Negócios Estrangeiros, competente em razão da matéria para se pronunciar
definitivamente acerca do Acordo, entendeu, em face do conteúdo do mesmo, solicitar a esta Comissão um
parecer. É nesse contexto que o mesmo é aqui presente.
2 – Objetivo do Acordo
O Acordo tem por objetivo declarado “estabelecer os parâmetros da cooperação entre as Partes, em
matéria de partilha e utilização de informação não classificada de rastreio do terrorismo, para efeitos de
prevenção e combate ao terrorismo e infrações relacionadas”.
3 – Base jurídica
O Governo apresenta a proposta de Resolução à AR com base na alínea d) do artigo 197.º da Constituição
(CRP). Está pressuposta, naturalmente, a competência exclusiva do Governo para negociar e ajustar
convenções internacionais (artigo 197.º, n.º 1, alínea b), da CRP).
A base jurídica está correta. Estamos perante uma proposta de resolução de aprovação de um Acordo
internacional.
Caberá à AR decidir se confere a forma de Convenção proposta ou se aprova a proposta de resolução sob
a forma de Tratado internacional. Não sendo propriamente uma matéria de “defesa”, parece claro que, não se
submetendo o Acordo à primeira parte da alínea i) do artigo 161.º da CRP (único caso indiscutível de reserva
de tratado), e não havendo bases consensuais na doutrina ou na jurisprudência (cf. Ac. 494/99 do TC) para se
construir um conceito material de tratado, pode a AR, formalmente, sem impedimento algum, aprovar a
proposta de resolução como a mesma se apresenta, isto é, como uma proposta de aprovação de um Acordo
internacional.
4 – Caraterização do Acordo nos seus aspetos mais importantes
Os traços essenciais do Acordo são os seguintes:
a) Estabelece a cooperação entre as Partes em matéria de partilha e utilização de informação de rastreio
do terrorismo retirada da informação produzida pelos serviços de informações e pelas autoridades
responsáveis pela aplicação da lei, apenas para efeitos de prevenção e combate ao terrorismo e às infrações
relacionadas com terrorismo;
b) Estabelece uma série de “definições” para efeitos de aplicação do Acordo, definições essas que não são
ou não gozam de reciprocidade no respetivo significante: basta ler o artigo 2.º, não valendo a pena reproduzi-
lo, mas talvez merecendo, como ilustração da sublinhada não reciprocidade nos conceitos operativos,
reproduzir apenas alguns exemplos mais problemáticos:
g) "Terrorista conhecido"
i. Para os Estados Unidos: Um indivíduo que:
1. Tenha sido condenado por um crime de terrorismo num tribunal dos EUA ou num tribunal estrangeiro de
jurisdição competente, ou
2. Tenha sido acusado ou indiciado por um crime de terrorismo num tribunal dos EUA ou num tribunal
estrangeiro de jurisdição competente.
ii. Para Portugal: Um indivíduo que tenha sido condenado por um crime de terrorismo num tribunal
português.
h) "Suspeito de terrorismo"
i. Para os Estados Unidos: Um indivíduo, em relação ao qual existem motivos razoáveis para suspeitar
que pratica ou tem praticado comportamentos considerados atividades terroristas ou atividades relacionadas
com o terrorismo, ou que está ou tem estado envolvido na preparação e no apoio às mesmas, com base numa
suspeita fundamentada e razoável.
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ii. Para Portugal: Um indivíduo que tenha sido acusado de um crime de terrorismo num tribunal Português.
c) Esta matéria é sensível porque a operacionalidade do Acordo passa por “Troca de informações de
rastreio de terrorismo” (artigo 3.º), de acordo com as quais, apesar das referências pouco consequentes ao
direito nacional e ao chamado Direito Humanitário Internacional (que engloba Convenções não ratificadas
pelos EUA), Portugal fica efetivamente obrigado a dar aos EUA, sobre terroristas e suspeitos de terrorismos tal
como os mesmos são considerados para os EUA. Ora, esta é uma regra que exceciona a referência ao
respeito pelo direito interno e à máxima segundo a qual o Acordo funciona assegurando o respeito pelos
direitos, liberdades e garantias. Com efeito, à luz do nosso sistema de direitos, liberdades e garantias, à luz,
por exemplo, do direito ao bom nome ou ao direito à presunção de inocência, é problemático justificar com
base num Acordo infraconstitucional que Portugal, através de autoridades que têm a nomenclatura de ponto
de contato (artigo 7.º), possa dar informações às autoridades americanas sobre alguém que não foi sequer
acusado do crime em causa, isto é, do crime de terrorismo.
d) Outro exemplo de não reciprocidade pode ser ilustrado na definição de Autoridade Competente (alínea
f): "Autoridade competente" significa qualquer serviço de informações, autoridade responsável pela aplicação
da lei, serviço de imigração e autoridade de segurança pública de cada uma das Partes, incluindo, para os
Estados Unidos, qualquer autoridade federal, estadual, local, territorial ou de governo tribal, que possam ter
funcionários que têm acesso às informações prestadas ao abrigo do presente Acordo ou, em caso de
coincidência, tal como definida no artigo 8.º, a quem pode ser pedido que dê informações complementares ou
que adote outras medidas tendentes a facilitar o cumprimento do disposto no presente Acordo.
5 – Opinião da relatora
No parecer, a relatora limitou-se a sublinhar os aspetos do Acordo que devem merecer mais atenção por
parte da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. No parecer não há
conclusões definitivas, mas alertas para aspetos do Acordo que devem merecer reflexão.
Em sede de opinião, crê-se que, tratando-se de um Acordo bilateral e, portanto, não passível de aposição
de reservas, pode no entanto o Governo na sua proposta de Resolução ou a AR na aprovação da mesma
aprovar uma declaração interpretativa, na qual deixe claro que considera as referências ao direito interno das
Partes no preâmbulo e no artigo 1.º como impeditivas de qualquer ato de execução do Acordo que viole a
CRP.
Mais se entende que deve ser ouvida a Comissão Nacional de Proteção de Dados.
6 – Parecer
Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer
que proposta de Resolução n.º 51/XII (2.ª) que visa a aprovação pela AR do Acordo entre a República
Portuguesa e os Estados Unidos da América para a Troca de Informação de Rastreio de Terrorismo, assinado
em Washington, em 24 de julho de 2012, reúne as condições necessárias para subir a Plenário, não obstante
alguns aspetos problemáticos que foram apontados neste Parecer e que devem ser analisados pela Comissão
dos Negócios Estrangeiros.
Palácio de S. Bento, 12 de janeiro de 2012.
A Deputada Relatora, Isabel Alves Moreira — O Vice-Presidente da Comissão, Telmo Correia.
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