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43 | II Série A - Número: 005 | 19 de Setembro de 2014

PROJETO DE LEI N.º 661/XII (4.ª) CRIA O TIPO LEGAL DE ASSÉDIO SEXUAL NO CÓDIGO PENAL

Exposição de motivos

O assédio sexual está tipificado como crime autónomo em países como o Brasil, Espanha ou França. Se bem que o assédio sexual no local de trabalho esteja, no nosso país, contemplado no Código de Trabalho, com sanção contraordenacional, é entendimento de feministas e associações, como a UMAR e a APAV, entre outras, que esta previsão é insuficiente para a dimensão e gravidade destes comportamentos.
O assédio sexual é uma forma de coerção, tantas vezes exercida por alguém em posição hierárquica superior à das vítimas, maioritariamente mulheres. Constituído por palavras ou atos de natureza sexual, indesejados e ofensivos para as pessoas que dos mesmos são alvo, os mesmos ocorrem em múltiplos espaços (das ruas, escolas, universidades, transportes públicos aos locais de trabalho) e atingem sobretudo raparigas e mulheres, podendo também ter por alvo grupos de homens mais vulneráveis, como jovens, homossexuais, minorias étnicas.
Atente-se que a Convenção de Istambul reforça a responsabilidade política sobre esta matéria, quando no seu Artigo 40.º consagra: “As Partes tomarão as medidas legislativas ou outras necessárias para assegurar que qualquer conduta indesejada verbal, não-verbal ou física, de carácter sexual, tendo como objetivo violar a dignidade de uma pessoa, em particular quando esta conduta cria um ambiente intimidante, hostil, degradante, humilhante ou ofensivo, seja objeto de sanções penais ou outras sanções legais”.
Sendo certo que a Convenção abre a porta a sanções legais que possam não ser absorvidas pelo quadro penal, também é certo que não as exclui. A questão que se impõe é a de saber se o atual quadro responde ao problema e defende as vítimas, e a realidade conhecida e vivida demonstra que não responde. E é ainda responder á “zona de conforto” criada pela previsão contraordenacional do artigo 29.º do Código de Trabalho Português que, ao proibir o assédio moral e sexual no local de trabalho, cria a ilusão de que mais nada pode ser feito.
Cabe não silenciar tudo o que fica fora deste espaço, multiplicando-se os exemplos: desde o assédio sexual entre professores e alunos, passando pela agressão a que as jovens e mulheres estão sujeitas nas ruas, até aos custos para o desenvolvimento da personalidade de jovens adolescentes, vítimas privilegiadas destes comportamentos. Entendemos, por isso, não ser possível continuar a aceitar a “normalização”, pois o “silenciamento e a cultura patriarcal têm contribuído para que o assçdio sexual seja uma prática social com impunidade em Portugal” (Maria Josç Magalhães, Assédio Sexual: um problema de direitos humanos das mulheres…, 2011, p. 107).
Duas vertentes têm contaminado as escolhas: a divisão entre juristas quanto à dignidade penal do crime (reconhecendo-se os tipos previstos nos n.º 2 dos artigos 163.º e 164.º do Código Penal e o crime de importunação sexual previsto no artigo 170.º) e a confusão conceptual entre sedução e assédio sexual. A contaminação tem favorecido a inércia e a normalização do assédio sexual, como o demonstram os escassos estudos existentes sobre a sua incidência, nomeadamente da autoria da CITE (Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego).
Como bem destaca o parecer da UMAR, relativo à sua proposta legislativa, e sustentado em dados da investigação sobre incidência deste crime: “Consideramos que a tipificação do assçdio sexual como crime produz efeitos dissuasores, uma vez que é transmitida uma mensagem clara de que este comportamento é inaceitável e punido, tendo em vista a proteção da dignidade e liberdade da pessoa humana.” No mesmo sentido, a APAV, reconhecendo a dignidade penal deste crime, sublinha: ”persiste uma cultura de ‘normalização’ destas condutas que a não criminalização pode ajudar a perpetuar”.
Assim, a presente iniciativa legislativa subscreve as posições de juristas, como Clara Sottomayor, quando considera que estas condutas violam direitos à liberdade humana, ao livre desenvolvimento da personalidade e mesmo à livre circulação, e, inspirando-se nas propostas da UMAR e do quadro penal francês, autonomiza o tipo legal de assédio sexual no Código Penal.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as deputadas e os deputados do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

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