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Quinta-feira, 2 de junho de 2016 II Série-A — Número 91
XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)
S U M Á R I O
Resolução: Descentralização, Poder Local e Habitação. Recomenda ao Governo o reforço de camas públicas na N.º 65/XIII (1.ª) (Aprova medidas para a criação de uma rede Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e na de centros de recolha oficial de animais e para a Rede Nacional de Cuidados Paliativos. modernização dos serviços municipais de veterinária): — Vide projeto de lei n.º 976/XII (4.ª). Projetos de lei [n.os 976/XII (4.ª) e 65/XIII (1.ª)]: N.º 976/XII (4.ª) (Terceira alteração a Lei n.º 92/95, de 12 de Projetos de resolução [n.os 357 a 360/XIII (1.ª)]: setembro, sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 N.º 357/XIII (1.ª) — Propõe medidas com vista ao de outubro, primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 313/2003, cumprimento da eliminação das barreiras arquitetónicas de 17 setembro, primeira alteração ao Decreto-Lei n.º prevista no Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto (PCP). 314/2003, de 17 de dezembro, primeira alteração à Lei n.º
N.º 358/XIII (1.ª) — Estudantes com necessidades educativas 75/2013, de 12 de setembro, primeira alteração à Portaria n.º
especiais no ensino superior (PS). 421/2004, de 24 de abril – Proíbe o abate indiscriminado de animais pelas câmaras municipais, institui uma política de N.º 359/XIII (1.ª) — Avaliação do Processo Especial de
controlo das populações de animais errantes e estabelece Revitalização (PER) das empresas e dos particulares (BE).
condições adicionais para criação e venda de animais de N.º 360/XIII (1.ª) — Constituição de uma Comissão Eventual
companhia (Iniciativa Legislativa de Cidadãos): para estudar e promover uma reforma do sistema público de
— Relatório da discussão e votação na especialidade e texto segurança social português (PSD).
final da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território,
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RESOLUÇÃO
RECOMENDA AO GOVERNO O REFORÇO DE CAMAS PÚBLICAS NA REDE NACIONAL DE
CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS E NA REDE NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomendar ao
Governo que:
1- Reforce o número de camas públicas na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) e
na Rede Nacional de Cuidados Paliativos (RNCP), garantindo um melhor acesso aos cuidados continuados e
paliativos.
2- Faça o levantamento de todas as unidades de saúde públicas onde existem camas que podem ser
integradas na RNCCI e na RNCP, através de gestão pública.
Aprovada em 13 de maio de 2016.
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.
———
PROJETO DE LEI N.º 976/XII (4.ª)
(TERCEIRA ALTERAÇÃO A LEI N.º 92/95, DE 12 DE SETEMBRO, SEXTA ALTERAÇÃO AO
DECRETO-LEI N.º 276/2001, DE 17 DE OUTUBRO, PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º
313/2003, DE 17 SETEMBRO, PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 314/2003, DE 17 DE
DEZEMBRO, PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 75/2013, DE 12 DE SETEMBRO, PRIMEIRA ALTERAÇÃO
À PORTARIA N.º 421/2004, DE 24 DE ABRIL – PROÍBE O ABATE INDISCRIMINADO DE ANIMAIS PELAS
CÂMARAS MUNICIPAIS, INSTITUI UMA POLÍTICA DE CONTROLO DAS POPULAÇÕES DE ANIMAIS
ERRANTES E ESTABELECE CONDIÇÕES ADICIONAIS PARA CRIAÇÃO E VENDA DE ANIMAIS DE
COMPANHIA (INICIATIVA LEGISLATIVA DE CIDADÃOS)
PROJETO DE LEI N.º 65/XIII (1.ª)
(APROVA MEDIDAS PARA A CRIAÇÃO DE UMA REDE DE CENTROS DE RECOLHA OFICIAL DE
ANIMAIS E PARA A MODERNIZAÇÃO DOS SERVIÇOS MUNICIPAIS DE VETERINÁRIA)
Relatório da discussão e votação na especialidade e texto final da Comissão de Ambiente,
Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação
Relatório da discussão e votação na especialidade
Em 29.05.2015, deu entrada na Mesa da Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 976/XII (ILC) que
visa terceira alteração a Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17
de outubro, primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 313/2003, de 17 setembro, primeira alteração ao Decreto-Lei
n.º 314/2003, de 17 de dezembro, primeira alteração à Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, primeira alteração à
Portaria n.º 421/2004, de 24 de abril – Proíbe o abate indiscriminado de animais pelas câmaras municipais,
institui uma política de controlo das populações de animais errantes e estabelece condições adicionais para
criação e venda de animais de companhia e em 04.12.2015 o Projeto de Lei n.º 65/XIII (PCP) que aprova
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medidas para a criação de uma rede de centros de recolha oficial de animais e para a modernização dos serviços
municipais de veterinária, foram apreciados na generalidade na sessão plenária de 11.12.2015, tendo baixado
à Comissão de Ambiente, Ordenamento do território, Descentralização, Poder Local e Habitação, sem votação
para nova apreciação.
Foi constituído no âmbito da CAOTDPLH um Grupo de Trabalho para proceder à reapreciação das iniciativas.
Assim, o Grupo de Trabalho no âmbito da apreciação na especialidade procedeu às seguintes diligências:
— No dia 18 de abril, visitou três canis municipais:
a) Centro de Recolha Oficial de Animais de Coimbra – reunião de trabalho com Francisco Queirós
(Vereador da Câmara Municipal de Coimbra responsável pelo CMROACC) e com Dr.ª Mariana Portugal
(Médica Veterinária);
b) Centro de Recolha Oficial de Animais de Palmela – reunião de trabalho com a Dr.ª Teresa Palaio
(Diretora do Departamento do Ambiente e Gestão Operacional do Território da Câmara Municipal de
Palmela);
c) Recolha Oficial de Animais de Sintra – reunião de trabalho com Dr. Luís Patrício (Vereador da Câmara
Municipal de Sintra responsável pelo Gabinete Médico-Veterinário) e Dra. Alexandra Pereira (Veterinária
Municipal de Sintra).
— No dia 19 de abril, convidou e promoveu uma audição pública com as seguintes entidades e profissionais:
a) ANMP – Associação Nacional de Municípios Portugueses
b) ANAFRE – Associação Nacional de Freguesias
c) Ordem dos Médicos Veterinários
d) ANVETEM – Associação Nacional de Veterinários Municipais
e) Abrigo de Carinho – Associação Amigos dos Animais
f) Animal
g) ANPC – Associação Nacional de Proprietários Rurais, Gestão Cinegética e Biodiversidade – OSC de 1º
Nível do Sector da Caça
h) APAAE – Associação Proteção Apoio ao Animal Errante
i) APAC – Associação de Proteção Animais Abandonados do Cartaxo
j) Associação Animais de Rua
k) JUS ANIMALIUM – Associação de Direito Animal
l) LPDA – Liga Portuguesa dos Direitos do Animal
m) PSI ANIMAL – Associação Portuguesa de Terapia do Comportamento e Bem-Estar Animal
n) Plataforma Sociedade e Animais
o) Associação “Amicus Canis”
p) AZP – Associação Zoófila Portuguesa
q) Cães Abandonados
r) Clube Português de Canicultura
s) Clube Português de Felinicultura
t) Confederação Nacional dos Caçadores Nacionais – OSC de 1º Nível do Sector da Caça
u) Confederação Ornitológica Mundial
v) PRAVI – Projeto de Apoio a Vítimas Indefesas
w) Projeto Java
x) Sociedade Protetora dos Animais
y) SOS ANIMAL – Grupo de Socorro Animal
z) UZ – União Zoófila
aa) Dr.ª Inês Real – Provedora dos Animais de Lisboa
bb) Dr. Carlos Morbey – Veterinário da Câmara Municipal de Cascais
cc) Óscar Miguel Ferraz – Criador de cães
dd) Dr. Carlos Gomes – Criador de Cães
ee) Dr. Rui Gonçalves – Médico Veterinário e Criador de Cães
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ff) Dr. Luís Cruz – Vice-Presidente da Ordem dos Médicos Veterinários; Diretor Clínico do Hospital
Veterinário das Laranjeiras
gg) José Cansado- Criador e treinador de cães. Proprietário de Hotel Canin
hh) José Carlos Paula Gomes – Criador de gatos e cães
ii) Maria de Fátima Oliveira Pires – Criadora de gatos
jj) Dr. Miguel Madeira – Médico Veterinário e Criador de Cães
kk) Provedora dos Animais de Lisboa – Dr.ª Inês Real
— No dia 20 de abril, procedeu à audição obrigatória dos primeiros subscritores do PJL 976/XII, da iniciativa
dos Cidadãos.
Assim, na sequência dos procedimentos efetuados e após a apresentação de propostas de alteração por
parte de todos os Grupos Parlamentares, tomou como base de trabalho o PJL 65/XIII (PCP) e procedeu à sua
apreciação artigo a artigo, do qual resultou o Texto de Substituição às duas iniciativas legislativas, remeteu
à Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação, que procedeu
à ratificação das votações efetuadas na especialidade, por unanimidade, remetendo a S. Ex.ª o Presidente da
Assembleia da República para efeitos de Votação Final Global.
Mais se informa que os autores das iniciativas legislativas transmitiram à Comissão que retiravam as mesmas
subscrevendo o Texto de Substituição.
Palácio de São Bento, 1 de junho de 2016.
O Presidente da Comissão, Pedro Soares.
Texto de substituição
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei aprova medidas para a criação de uma rede de Centros de Recolha Oficial de Animais, para a
modernização dos serviços municipais de veterinária, e estabelece a proibição do abate de animais errantes
como forma de controlo da população, privilegiando a esterilização.
Artigo 2.º
Deveres do Estado
1 – O Estado assegura a integração de preocupações com o bem-estar animal no âmbito da Educação
Ambiental desde o 1.º Ciclo do Ensino Básico.
2 – O Estado, em conjunto com o movimento associativo e as organizações não-governamentais de ambiente
e de proteção animal, dinamiza anualmente e em todo o território nacional, campanhas de sensibilização sobre
o respeito e proteção dos animais e contra o abandono.
3 – Os organismos da administração central do Estado responsáveis pela proteção, bem-estar e sanidade
animal, em colaboração com as autarquias locais, o movimento associativo e as organizações não-
governamentais de ambiente e de proteção animal, promovem campanhas de esterilização de animais errantes
e de adoção de animais abandonados.
4 – O Governo, em colaboração com as autarquias locais, promove a criação de uma rede de Centros de
Recolha Oficial de Animais capaz de dar resposta de qualidade às necessidades de construção e modernização
destas estruturas, com vista à sua melhoria global, priorizando as instalações e meios mais degradados,
obsoletos ou insuficientes.
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Artigo 3.º
Cedência, occisão e eutanásia em Centros de Recolha Oficial de Animais
1- Os animais acolhidos pelos Centros de Recolha Oficial de Animais que não sejam reclamados pelos seus
detentores no prazo de 15 dias, a contar da data de recolha do animal, presumem-se abandonados e são
obrigatoriamente esterilizados e encaminhados para adoção, sem direito de indemnização por parte dos
detentores que venham a identificar-se como tal após o prazo previsto.
2- Findo o prazo de reclamação, os animais referidos no número anterior podem, sob parecer obrigatório de
médico veterinário ao serviço do município, ser cedidos gratuitamente pelas câmaras municipais ou Centros de
Recolha Oficial de Animais, quer a pessoas individuais, quer a instituições zoófilas devidamente legalizadas e
que provem possuir condições adequadas para o alojamento e maneio dos animais.
3- Para os efeitos do disposto nos números anteriores, as câmaras municipais e os Centros de Recolha
Oficial de Animais divulgam ao público, de forma adequada e regular, os animais de que dispõem para adoção,
nomeadamente através de plataforma informática.
4 – É proibido o abate ou occisão de animais por motivos de sobrepopulação, de sobrelotação, de
incapacidade económica ou outra que impeça a normal detenção pelo seu detentor, em Centros de Recolha
Oficial de Animais, exceto por motivos que se prendam com o seu estado de saúde ou comportamento.
5 – O abate ou occisão de animais é unicamente realizado em Centros de Recolha Oficial de Animais, por
médico veterinário, depois de ponderadas todas as condicionantes de risco que determinem a recolha do animal
e após terem sido cumpridos os períodos de vigilância sanitária, quando a eles haja lugar.
6 – A eutanásia pode ser realizada em Centros de Recolha Oficial de Animais ou centros de atendimento
médico veterinário, por médico veterinário, em casos comprovados de doença manifestamente incurável e
quando se demonstre ser a via única e indispensável para eliminar a dor e sofrimento irrecuperável do animal.
7 – Em qualquer dos casos, abate ou eutanásia, a indução da morte ao animal deve ser efetuada através de
métodos que garantam a ausência de dor e sofrimento, devendo a morte ser imediata, indolor e respeitando a
dignidade do animal.
8 – As normas de boas práticas para a realização de abates e eutanásias são divulgadas pela Direção Geral
de Alimentação e Veterinária e pela Ordem dos Médicos Veterinários.
9 – Para efeitos de monitorização, todos os Centros de Recolha Oficial de Animais publicitam no primeiro
mês de cada ano civil, os relatórios de gestão do ano anterior, contendo os números de recolhas, occisões,
adoções, vacinações e esterilizações efetuadas.
10 – Com base nos relatórios referidos no número anterior, a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária
elabora e publicita um relatório anual relativo à realidade nacional, até ao fim do primeiro trimestre de cada ano
civil.
Artigo 4.º
Vacinação e Esterilização
O Estado, por razões de saúde pública, assegura por intermédio dos Centros de Recolha Oficial de Animais,
a captura, vacinação e esterilização dos animais errantes sempre que necessário, assim como a concretização
de programas Captura, Esterilização, Devolução (CED) para gatos.
Artigo 5.º
Período transitório
1 – Os Centros de Recolha Oficial de Animais dispõem do prazo de 2 anos a contar do início da vigência da
presente lei para proceder à implementação total da proibição prevista no n.º 4 do artigo 3.º.
2 – Os Centros de Recolha Oficial de Animais dispõem do prazo de 1 ano a contar do início da vigência da
presente lei para implementar as condições técnicas para a realização da esterilização, nos termos
regulamentares e legalmente previstos.
3 – Até 31 de maio do ano civil seguinte ao primeiro ano de vigência da presente lei, o membro do Governo
com a tutela sobre a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária apresenta o relatório referido no n.º 10 do artigo
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3.º na Comissão Parlamentar competente em razão da matéria.
Artigo 6.º
Regulamentação
A presente lei é regulamentada no prazo de 90 dias, ouvidas a Associação Nacional de Municípios
Portugueses, a Associação Nacional de Freguesias, a Ordem dos Médicos Veterinários e a Associação Nacional
de Médicos Veterinários dos Municípios.
Artigo 7.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias a contar da sua publicação.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 357/XIII (1.ª)
PROPÕE MEDIDAS COM VISTA AO CUMPRIMENTO DA ELIMINAÇÃO DAS BARREIRAS
ARQUITETÓNICAS PREVISTA NO DECRETO-LEI N.º 163/2006, DE 8 DE AGOSTO
I
Ao longo dos últimos anos, particularmente nos quatro anos de governação PSD/CDS – anos de aumento
do empobrecimento e de agravamento das injustiças e desigualdades sociais – as opções políticas tomadas
tiveram consequências na vida concreta e no dia-a-dia do povo português, numa realidade marcada por
situações de vulnerabilidade económica e social, de pobreza e exclusão social, especialmente agravadas pelo
desemprego, pela exploração e precariedade, pelos baixos salários e pela fragilização dos sistemas públicos de
saúde, ensino e segurança social, enquanto instrumentos de garantia de direitos fundamentais para todos os
portugueses.
Um quadro que se traduziu não em avanços no sentido da inclusão social, plasmada em instrumentos
nacionais e internacionais (e forte razão de luta das associações de defesa dos direitos das pessoas com
deficiência), mas, pelo contrário, significou sim uma espiral de agravamento das injustiças e desigualdades.
Estes são reflexos da política de direita que se repercutem de forma particular nas pessoas com deficiência
ou com dificuldades de mobilidade, designadamente as oriundas das classes trabalhadoras e populares. A
grande maioria das pessoas com deficiência vivem com graves carências económicas e sociais e mesmo as
que não vivem não conseguem aceder a um vasto conjunto de direitos fundamentais que assegurem o direito a
uma vida independente, ao exercício pleno dos seus direitos no domínio da saúde e da reabilitação, do direito à
educação e à cultura, ao desporto, à formação profissional e ao emprego, à participação em igualdade em todos
os domínios da vida em sociedade.
A política de direita levada a cabo pelo anterior governo PSD/CDS fomentou a subversão nas políticas sociais
assentes na garantia de direitos fundamentais, substituindo-as pelo fomento de ações de carácter
assistencialista e caritativo.
As eleições do passado dia 4 de Outubro demonstraram de uma forma inequívoca a vontade do povo
português de mudar as opções políticas no nosso país.
De uma forma clara, os portugueses disseram basta à austeridade, à política de exploração de quem
trabalha, aos baixos salários e ao empobrecimento – que constituíram eixos centrais das opções políticas do
anterior governo PSD/CDS.
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II
No novo quadro político importa ir mais longe na adoção de medidas que garantam passos positivos na
resposta aos problemas mais sentidos pelas pessoas com deficiência. São disso exemplo as questões
relacionadas com as acessibilidades, que estão há décadas no centro das preocupações e reivindicações das
associações de defesa dos direitos das pessoas com deficiência.
A verdade é que no nosso país, o direito a uma vida autónoma, digna e independente é negado a milhares
de pessoas com deficiência, que frequentemente não conseguem mover-se dentro das suas vilas e cidades e
aceder a edifícios públicos.
O Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto, revogou o Decreto-Lei n.º 123/97, de 22 de maio, com o objetivo
de precisar melhor alguns aspetos que não facilitaram a cabal aplicação deste diploma e alargar as Normas
Técnicas de Acessibilidade aos edifícios habitacionais.
No entanto e apesar de este diploma estabelecer que «as instalações, edifícios, estabelecimentos,
equipamentos e espaços abrangentes referidos nos n.os 1 e 2 do artigo 2.º, cujo início de construção seja anterior
a 22 de agosto de 1997, são adaptados dentro de um prazo de 10 anos, contados a partir da data de início de
vigência do presente decreto-lei, de modo a assegurar o cumprimento das normas técnicas constantes do anexo
que o integra», bem como sanções a aplicar em caso de manutenção destas desconformidades após o prazo
referido, a verdade é que muito está por cumprir.
As exigências colocadas por este diploma estão longe de estarem concretizadas, o que continua a pôr em
causa o acesso das pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida a edifícios públicos, dificultando mesmo
a sua simples circulação na via pública.
O PCP considera inadmissível que o acesso a edifícios públicos – sejam estes da administração central,
regional ou local – continue a estar fora do alcance de todas as pessoas, por subsistirem barreiras arquitetónicas
que urge derrubar.
Dado que este diploma entrou em vigor a 8 de fevereiro de 2007 o referido prazo cumprir-se-á dentro de
menos de um ano, pelo que são urgentes medidas que permitam a concretização dos seus objetivos.
Considerando que já passaram mais de 30 anos desde a primeira tentativa legal da eliminação das barreiras
arquitetónicas, que se tem assistido a uma contínua desresponsabilização política e que não são respeitadas
as normas técnicas na maioria de edifícios, estabelecimentos e equipamentos de utilização pública e via pública,
consideramos que é urgente fazer um amplo levantamento da situação das acessibilidades a nível nacional.
Esse levantamento deverá ser efetuado pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, IP (IHRU, IP)
que, nos termos do artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto, é a entidade responsável pelo
acompanhamento da aplicação do decreto-lei devendo proceder, periodicamente, à avaliação global do grau de
acessibilidade dos edifícios, instalações e espaços referidos no artigo 2.º deste diploma.
Da mesma forma, o Instituto Nacional para a Reabilitação (INR) deverá elaborar um relatório circunstanciado
sobre a execução e metas atingidas em relação ao Plano Nacional de Promoção da Acessibilidade (PNPA).
Ambos os relatórios deverão ser imediatamente remetidos à Assembleia da República para esta possa tomar
conhecimento e desenvolver a intervenção necessária em conformidade e com vista ao cumprimento do direito
à mobilidade de todas as pessoas.
III
O Grupo Parlamentar do PCP promoveu, a 23 de Maio, uma Audição Pública, com o objetivo de recolher
contributos e opiniões sobre o problema das acessibilidades para pessoas com deficiência e/ou mobilidade
reduzida. A Audição Pública confirmou as preocupações do PCP sobre esta matéria, já que os testemunhos
deixados, identificando as profundas dificuldades sentidas pelas pessoas com deficiência e/ou mobilidade
reduzida na vida concreta de todos os dias, demonstraram que muito há para trabalhar e para intervir no sentido
de concretizar na vida o que está previsto na lei.
Esta iniciativa legislativa que o PCP apresenta, que resulta também de contributos recolhidos na Audição
Pública, é um primeiro passo num caminho que importa percorrer de forma firme, para responder aos problemas
e dificuldades sentidas pelas pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida.
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O compromisso que assumimos é de contribuir para que se cumpra o direito à mobilidade, integração e
autonomia das pessoas com deficiência.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea
b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo
Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República,
recomendar ao Governo que:
1. Tome as medidas necessárias para que o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU, IP)
elabore, no prazo de 180 dias, um relatório da situação das acessibilidades a nível nacional, dado que foi
a entidade responsável pelo acompanhamento da aplicação do referido decreto-lei e que esse relatório
seja enviado à Assembleia da República;
2. Tome as medidas necessárias para que o Instituto Nacional de Reabilitação (INR) elabore, no prazo de
180 dias, o relatório circunstanciado sobre a execução e metas atingidas em relação ao Plano Nacional
de Promoção da Acessibilidade (PNPA).
3. Tome as medidas necessárias e adequadas para que sejam cumpridas as adaptações previstas no
Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto.
4. Identifique os instrumentos necessários para um efetivo acompanhamento e fiscalização no âmbito do
Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto, tomando as devidas medidas para a implementação e/ou
adaptação desses mesmos instrumentos.
Assembleia da República, 2 de junho de 2016.
Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — Rita Rato — António Filipe — Bruno Dias — João Oliveira — Jorge
Machado — Paula Santos — Francisco Lopes — Jerónimo de Sousa — Paulo Sá — Miguel Tiago — Carla Cruz
— Ana Mesquita — Ana Virgínia Pereira.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 358/XIII (1.ª)
ESTUDANTES COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS NO ENSINO SUPERIOR
A promoção da inclusão das pessoas com deficiência é um dos desígnios claros do programa do Governo,
onde é afirmado que “apenas uma sociedade que integra todas as pessoas pode concretizar todo o seu
potencial”. De facto, as pessoas com deficiência correm um risco agravado de exclusão, seja por obstáculos
ao acesso à informação, seja por inadequação dos meios ao seu dispor para exercerem plenamente a sua
cidadania, realizando todo o seu valor pessoal e profissional vivendo plenamente integradas na sociedade.
Uma das vertentes que deve ser particularmente tida em conta no desenho das políticas de inclusão de
pessoas com deficiência é o acesso em igualdade de condições à educação e formação ao longo da vida, assim
como a possibilidade de usufruir inteiramente de recursos educativos adequados às suas necessidades
especiais.
O objetivo de alcançar uma educação inclusiva que contemple as necessidades de todos os alunos
contribuindo para a valorização e realização das suas potencialidades é, aliás, um dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas para 2030, onde é definido que: “Até 2030, eliminar as
disparidades de género na educação e garantir a igualdade de acesso a todos os níveis de educação e
formação profissional para os mais vulneráveis, incluindo as pessoas com deficiência, povos indígenas
e crianças em situação de vulnerabilidade”. Da mesma forma, o Relatório Conjunto do Conselho e da Comissão
sobre a aplicação do quadro estratégico para a cooperação europeia no domínio da educação e da formação,
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publicado em Agosto de 2015, define como área prioritária a educação inclusiva e equitativa focada na
diversidade dos alunos, incluindo os alunos com necessidade especiais.
O Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, deu um importante passo no sentido de garantir um sistema de
educação flexível que permitisse responder à diversidade de características e necessidades de todos os alunos,
incluindo os alunos com necessidades educativas especiais. O referido decreto-lei cinge-se, no entanto, à
escolaridade obrigatória, deixando de lado o ensino superior. Importa, por isso, alargar esta flexibilidade ao
ensino superior de forma a garantir igual acesso das pessoas com deficiência à aprendizagem ao longo da vida,
e em todos os níveis de ensino.
De acordo com um inquérito elaborado pelo Grupo de Trabalho para o Apoio a Estudantes com Deficiências
no Ensino Superior em colaboração com a Direcção-Geral de Ensino Superior, publicado a 19 de Junho de
2014, das 291 instituições de ensino superior contactadas apenas 94 afirmaram ter serviços de apoio para
alunos com Necessidades Educativas Especiais – NEE.
Acresce que, de acordo com o Questionário relativo às Necessidades Especiais de Educação para o ano
letivo de 2015/2016, elaborado pela Direcção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência, o número total de
alunos do pré-escolar ao ensino secundário com NEE é de cerca de 79 000 dos quais 11 000 alunos do ensino
secundário, prestes a transitar para o ensino superior.
Neste contexto, importa promover um conjunto de políticas que comportem os adequados instrumentos
especializados de forma a responder de forma rápida e adequada aos obstáculos que impedem tanto o acesso
como o pleno usufruto em igualdade de condições ao ensino e formação ao longo da vida dos alunos com NEE,
sobretudo no que respeita aos apoios, medidas e práticas pedagógicas existentes ao nível das instituições de
ensino superior público, privado ou cooperativo.
Desta forma, a Assembleia da República resolve, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 166.º da
Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo que:
1. Implemente as recomendações do Conselho e da Comissão, tendo em conta as áreas prioritárias e
desafios concretos definidos no que respeita à educação inclusiva que permita a aprendizagem ao longo
da vida;
2. Inste as instituições de ensino superior a responderem às NEE dos seus alunos incluindo, nomeadamente,
práticas pedagógicas adequadas e personalizadas para os alunos invisuais, surdos, ou com outras
limitações significativas ao nível da aprendizagem.
3. A implementação por parte das instituições de ensino superior de práticas pedagógicas necessárias à
resposta às NEE tenha em linha de conta as modalidades específicas de educação definidas pelo
Decreto-Lei n.º 3/2008. Que as mesmas modalidades específicas de educação contemplem as
potencialidades da era digital, através de meios tecnológicos de alta qualidade que facilitem a
aprendizagem individual dos alunos com NEE, como por exemplo a utilização de plataformas online com
os conteúdos curriculares integrais para alunos surdos.
4. Leve a cabo uma avaliação anual da implementação e resultados das práticas pedagógicas
recomendadas às instituições de ensino superior, de forma a manter a monitorização do percurso de
educação e aprendizagem dos alunos com NEE e a garantir também um sistema de ensino superior
inclusivo e justo.
Palácio de São Bento, 2 de junho de 2016
Os Deputados do PS: Susana Amador — Pedro Delgado Alves — Porfírio Silva — Alexandre Quintanilha —
André Pinotes Batista — António Eusébio — Diogo Leão — Elza Pais — Gabriela Canavilhas — João Torres —
Maria Augusta Santos — Maria da Luz Rosinha — Odete João — Palmira Maciel — Sandra Pontedeira — Ivan
Gonçalves — Paulo Trigo Pereira — António Alves Cardoso — Idália Salvador Serrão.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 359/XIII (1.ª)
AVALIAÇÃO DO PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO (PER) DAS EMPRESAS E DOS
PARTICULARES
O Processo Especial de Revitalização (PER) é um instrumento legal, em vigor desde 2012, que surgiu com
o objetivo de responder ao grande aumento do endividamento das empresas e dos particulares.
Este processo destina-se a permitir ao devedor que comprovadamente se encontre em situação económica
difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, isto é, que enfrente dificuldades no cumprimento
pontual das suas obrigações (por falta de liquidez ou por não conseguir obter crédito), de estabelecer
negociações com os seus respetivos credores e a impedir que lhe sejam instauradas ações para cobrança de
dívidas.
O objetivo é que o devedor conclua com os credores um acordo que aprove um plano de recuperação
conducente à sua revitalização económica. Assim sendo, o PER é, na prática, uma espécie de embrião da
insolvência, antecipando os seus efeitos que, tantas vezes, ainda que de forma menos gravosa, já se vêm a
produzir.
Volvidos 4 anos da criação do PER é importante avaliar o impacto deste instrumento e perceber se
efetivamente tem contribuído, ou não, para se assumir como uma forma de recuperação do devedor, seja ele
pessoa singular ou coletiva.
Apesar de ter surgido com intuito de combate ao endividamento, no quadro do “Programa Revitalizar”, criado
por Resolução do Conselho de Ministros do anterior Governo, o PER tem sido alvo de várias críticas tanto de
particulares, como de empresários e trabalhadores de empresas que estiveram envolvidas no processo.
Também as organizações sindicais têm manifestado a sua preocupação relativamente aos efeitos
perniciosos da aplicação do PER. A CGTP, pela voz do seu secretário-geral, Arménio Carlos, considerou que
"A lei das insolvências, que foi apresentada para dar celeridade ao salvamento das empresas, tornou-se num
enormíssimo embuste, porque não só não as salvou, como se tornou numa lei que dá cobertura a patrões sem
escrúpulos, que aproveitam estas oportunidades dos PER (Processo Especial de Revitalização) para acabarem
por resolver problemas fiscais".
As denúncias que têm chegado ao Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda configuram o PER, não apenas
como um balão de oxigénio para as empresas, mas também como uma forma de dissiparem património, com
consequências dramáticas para os credores, designadamente os trabalhadores. Há casos em que são
aprovados planos com o voto favorável do credor, que é também uma empresa da família do dono da empresa
em PER, e que determinam a redução de 50 por cento da dívida dos trabalhadores (salários e indemnizações).
Dados estatísticos recentes divulgados pela Direção Geral de Política de Justiça, no boletim n.º 25, de janeiro
de 2016, fazendo uma análise comparativa dos terceiros trimestres dos anos de 2007 a 2015, confirmam um
“aumento acentuado do número de processos de falência, insolvência e recuperação de empresas entrados nos
tribunais judiciais de 1.ª instância.” No que concerne ao movimento dos processos especiais de revitalização
nos tribunais judiciais de 1.ª instância, no terceiro trimestre de 2015, deram entrada mais cerca de 60,3% do que
no terceiro trimestre de 2013, tendo findado mais cerca de 123,8% do que no terceiro trimestre de 2013. Por
outro lado, as pessoas singulares passaram a assumir o maior peso nos processos especiais de revitalização
(55,8% do total de processos) e o peso das pessoas coletivas de direito privado correspondia a 38,2% desse
total.
Em março de 2015, a empresa de consultoria Turnwin, dedicada à “elaboração de Estudos de Recuperação
Financeira de Empresas na sua apresentação e negociação com os credores”, divulgava estatísticas sobre o
PER, na sequência da publicação do Decreto-Lei n.º 26/2015, de 6 de fevereiro, que veio introduzir alterações
quer ao PER, quer ao Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE). Os dados
avançados pela referida empresa, embora careçam de confirmação oficial, revelam uma tendência que aponta
para um significativo número de PER instaurados por empresas e pessoas singulares que são encerrados com
sentença de declaração de insolvência, sendo que, dos PER homologados, se deu a recaída de um significativo
número de empresas em novo PER ou em processo de insolvência.
Esta breve análise sugere que o PER, enquanto instrumento de recuperação do devedor, está longe de
cumprir os seus objetivos, apresentando resultados manifestamente insatisfatórios, mesmo tendo em conta
dados provenientes de entidades privadas que se dedicam a elaborar estudos na área da recuperação
financeira.
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2 DE JUNHO DE 2016 11
No que toca aos particulares, registam-se situações inaceitáveis de aconselhamento de empresas de
consultoria que praticam valores de honorários avultados e veiculam estratégias fraudulentas, de declarações
de dívidas forjadas, com vista a perdões parciais de dívida no âmbito do PER.
Atendendo aos casos de PER concluídos por declaração de insolvência, é importante salientar que, segundo
os dados da DGAJ, a taxa de recuperação de créditos nos processos de falência, insolvência e recuperação de
empresas, se situava, no 3.º trimestre de 2015, em 17,6%, sendo que aos restantes 82,4% do montante de
créditos reconhecidos pelos tribunais não correspondeu a um pagamento efetivo dos mesmos. Ora, nestas
situações, os trabalhadores, na qualidade de credores reclamantes, deparam-se com o flagelo do desemprego
e o seu direito confina-se ao fundo de garantia salarial, cujo limite são os €9090 e cujo pagamento, atualmente,
demora mais de um ano.
Está na altura de fazer o balanço da aplicação do PER e de retirar dessa análise as devidas consequências
de forma a acautelar o interesse das partes, com especial enfoque na salvaguarda dos direitos dos
trabalhadores, que se apresentam como o elo mais fraco no quadro das relações laborais.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
No prazo de 90 dias:
1 – Proceda ao levantamento estatístico e analítico da aplicação do PER desde 2012, tendo em consideração
os planos homologados e a sua taxa de sucesso, ponderado pelas recaídas em novo PER ou insolvência;
2 – Elabore um relatório com as conclusões retiradas da análise efetuada e proponha uma estratégia de
recuperação de dívidas de empresas e particulares, no âmbito do Código de Insolvência e Recuperação de
Empresas (CIRE), do SIREVE, ou através de meios alternativos, em que se assegure a salvaguarda dos direitos
dos trabalhadores.
Assembleia da República, 2 de junho de 2016.
As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda: José Moura Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe
Soares — Jorge Costa — Mariana Mortágua — Pedro Soares — Heitor de Sousa — Sandra Cunha — João
Vasconcelos — Domicilia Costa — Jorge Campos — Jorge Falcato Simões — Carlos Matias — Joana Mortágua
— José Manuel Pureza — Luís Monteiro — Moisés Ferreira — Paulino Ascenção — Catarina Martins.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 360/XIII (1.ª)
CONSTITUIÇÃO DE UMA COMISSÃO EVENTUAL PARA ESTUDAR E PROMOVER UMA REFORMA
DO SISTEMA PÚBLICO DE SEGURANÇA SOCIAL PORTUGUÊS
O sistema público de segurança social português é um sistema de repartição em que os descontos das atuais
gerações de contribuintes pagam as prestações sociais dos atuais beneficiários.
O sistema público de segurança social tem dado um contributo da maior relevância para a promoção de
valores essenciais de uma democracia moderna e evoluída, nomeadamente, os valores da solidariedade, da
justiça, da equidade e da coesão social.
Indubitavelmente, o sistema público de segurança social ergue-se como um poderoso instrumento no
combate à pobreza e às desigualdades sociais que é o fim último da ação política.
Para que assim seja, o sistema de segurança social deve ser uma construção dinâmica, capaz de se adaptar
às transformações da sociedade e da economia e deve ser capaz de reunir um conjunto de incentivos e
mecanismos que favoreçam o desenvolvimento económico e social com adequados níveis de proteção social.
Porém, nos tempos que correm, é indiscutível que o sistema público de segurança social atravessa uma
situação de crise que os próximos anos vão certamente agravar.
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II SÉRIE-A — NÚMERO 91 12
Esta crise não é fruto de uma mera conjuntura desfavorável, mas é o resultado de alterações estruturais
significativas nas condições demográficas e económicas adversas do modelo de repartição tal como o
conhecemos.
A estes elementos estruturais haverá que acrescentar os sucessivos ajustamentos paramétricos que têm
vindo a ser feitos no sistema, designadamente no sistema de pensões, que resultaram numa acentuada
deterioração da desadequação do rendimento na reforma (taxa de substituição) e da iniquidade intergeracional,
sem que tenha sido resolvida a sua insustentabilidade financeira.
Esta crise indisfarçável obriga-nos a agir, no sentido de promover, sem mais dilações, uma reforma estrutural
do sistema público de segurança social.
Pode haver a tentação de adiar a reforma da segurança social por parte de alguns dos atuais responsáveis
políticos. Porém é preciso reconhecer que ela é imperiosa e, se não for feita, a insustentabilidade crescente da
segurança social vai agravar-se, de forma incomensurável nos próximos anos, empurrando responsabilidades
desmedidas para as futuras gerações.
Também aqui, adiar soluções é afinal acrescentar crise à crise, insustentabilidade à insustentabilidade, rutura
à rutura.
Esta crise resulta, fundamentalmente, do facto de os elementos estruturais e determinantes do nosso sistema
público de segurança social atravessarem uma situação adversa, que, para além disso, é persistente e
consistente.
Em primeiro lugar, o elemento demográfico.
A Comissão Europeia no “The 2015 Ageing Report” projeta para Portugal um persistente aumento da
esperança média de vida à nascença, para os 83 anos em 2030 e para os 87 anos em 2060. Por outro lado,
este relatório prevê ainda um índice de fecundidade constante de 1,37 em 2030.
Em consequência aquele relatório, estima um elevado crescimento da percentagem da população com mais
de 65 anos em termos da população total, que em 2013 passa de 19,6% para 26,8% em 2030 e 34,6% em 2060.
Em Portugal, verifica-se, de facto, a intensificação do duplo envelhecimento da população. A par de uma
virtuosa longevidade crescente (Portugal é um dos poucos países do mundo onde a esperança de vida
ultrapassou já os 80 anos), constata-se uma quebra acentuada nas taxas de natalidade.
Por sua vez, segundo dados de 2014 do Eurostat, o índice sintético de fecundidade é de apenas 1,23 contra
1,58 da União Europeia, como se demonstra no quadro seguinte.
Quadro I: Evolução do Índice Sintético de Fecundidade em Portugal e na União Europeia, de 2000 a
2014
Taxa bruta de Taxa bruta de
Anos fecundidade em fecundidade na União
Portugal Europeia (28)
2000 1,55 :
2001 1,45 1,46
2002 1,46 1,46
2003 1,44 1,47
2004 1,40 1,50
2005 1,41 1,51
2006 1,37 1,54
2007 1,35 1,56
2008 1,39 1,61
2009 1,34 1,61
2010 1,39 1,62
2011 1,35 1,58
2012 1,28 1,58
2013 1,21 1,54
2014 1,23 1,58 Fonte: Eurostat
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Torna-se bem visível que a redução da taxa de fecundidade é uma tendência consistente e de ciclo longo e
que demorará vários anos a ser invertida.
Por outro lado, o envelhecimento da população está detalhado no quadro II, sublinhando-se, em especial, os
valores crescentes da esperança média de vida aos 65 anos, elemento da maior relevância para o sistema de
pensões.
Quadro II: Taxa de Natalidade, Taxa de Mortalidade e Esperança Média de Vida
Taxa - permilagem Taxa - permilagem Ano (idade) - Média Ano (idade) - Média
Taxa bruta de Taxa bruta de Esperança média de Esperança média de Anos
natalidade mortalidade vida à nascença vida aos 65 anos
2000 11,7 10,2 76,4 17,0
2001 10,9 10,1 76,7 17,1
2002 11,0 10,2 77,0 17,2
2003 10,8 10,4 77,4 17,5
2004 10,4 9,7 77,7 17,6
2005 10,4 10,2 78,2 17,9
2006 10,0 9,7 78,5 18,1
2007 9,7 9,8 78,7 18,2
2008 9,9 9,9 78,9 18,3
2009 9,4 9,9 79,3 18,6
2010 9,6 10,0 79,6 18,8
2011 9,2 9,7 79,8 18,8
2012 8,5 10,2 80,0 19,0
2013 7,9 10,2 80,2 19,1
2014 7,9 10,1 - 19,2 Fonte: INE
Com efeito, é de celebrar o facto de, em apenas 14 anos, se verificar um ganho de esperança média de vida
dos Portugueses, aos 65 anos, de mais 2,2 anos, um dos mais acelerados da União Europeia.
Contudo, devemos frisar que este facto, que devemos celebrar, comporta custos que devemos assumir de
forma insofismada e inadiável.
A par deste envelhecimento em geral, é oportuno destacar ainda a degradação do rácio entre a população
ativa e a população inativa reformada, situação que o quadro seguinte demonstra.
Quadro III: População ativa por pensionista de velhice da Segurança Social
Rácio
População activa por
Anos pensionista de velhice
da Segurança Social
2000 3,5
2001 3,4
2002 3,4
2003 3,4
2004 3,3
2005 3,2
2006 3,1
2007 3,1
2008 3,0
2009 2,9
2010 2,9
2011 2,8
2012 2,7
2013 2,6
2014 2,6 Fonte: INE
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Como se pode verificar, em Portugal, no ano de 2000, existiam 3,5 ativos por cada pensionista do sistema
da segurança social. Ora, desde então, esse valor tem vindo a reduzir-se gradualmente, registando-se, em 2014,
por cada pensionista, 2,6 beneficiários ativos, valor que é ainda mais baixo quando o rácio é calculado em
relação ao número de pensões em pagamento.
Ainda no âmbito da demografia, deve referir-se o comportamento dos saldos migratórios, considerando que
saldos migratórios negativos, como aqueles que se verificam desde 2011, são altamente desfavoráveis para a
sustentabilidade da segurança social.
Com efeito, o saldo migratório, positivo até 2010, embora em acelerada degradação, passou a negativo,
como se pode analisar no quadro IV.
Quadro IV: Saldo Migratório em Portugal, de 2000 a 2015
Indivíduo - Milhares
Anos Saldo migratório
2000 67,1
2001 56,2
2002 41,8
2003 24,7
2004 14,3
2005 15,4
2006 17,1
2007 21,8
2008 9,4
2009 15,4
2010 3,8
2011 -24,3
2012 -37,3
2013 -36,2
2014 -30,0
2015 - Fonte: INE
Em resumo, o elemento demográfico, sendo absolutamente determinante dos aspetos financeiro e
orçamental do nosso sistema público de segurança social, atravessa indesmentíveis degradações e, nas
próximas décadas, a evolução continuará a ser negativa, o que é, por certo, um dos fatores especialmente
críticos.
Um segundo elemento determinante do sistema público de segurança social como o português é a
economia e a sua correlação com o emprego e o desemprego.
O quadro V ilustra a crescente deterioração do crescimento do PIB, o consistente aumento da taxa de
desemprego e ainda a destruição do emprego.
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Quadro V: Evolução do PIB, Taxa de Desemprego e Emprego 2000-2015
%
Taxa de Crescimento Taxa de Desemprego Anos Emprego
PIB (% da pop. ativa)
2000 3,8 3,9 1,9
2001 1,9 4,0 1,8
2002 0,8 5,0 0,5
2003 -0,9 6,3 -0,4
2004 1,8 6,6 0,1
2005 0,8 7,6 0,0
2006 1,6 7,6 0,7
2007 2,5 8,0 0,2
2008 0,2 7,6 0,5
2009 -3,0 9,4 -2,6
2010 1,9 10,8 -1,5
2011 -1,8 12,7 -1,5
2012 -4,0 15,5 -4,1
2013 -1,1 16,2 -2,6
2014 0,9 13,9 1,6
2015 1,5 12,4 1,1 Fonte: INE
Acresce que os sinais que se têm verificado nos últimos dois anos no crescimento do PIB e do emprego são
claramente insuficientes no robustecimento desejável para o orçamento do sistema público de segurança social.
E, se as evidências dos últimos 15 anos são marcadas pelo pessimismo, o cenário projetado para os
próximos anos é igualmente desanimador.
Com efeito, o quadro VI traduz já projeções do atual Governo que não são de molde a garantir a robustez
orçamental desejada ao sistema previdencial de repartição da segurança social.
Quadro VI: Previsões do PIB, Taxa de Desemprego e Emprego 2016-2020
%
Taxa de Crescimento Taxa de Desemprego Anos Emprego
PIB (% da pop. ativa)
2016 (P) 1,8 11,4 0,8
2017 (P) 1,8 10,9 0,7
2018 (P) 1,9 10,4 0,9
2019 (P) 2,0 9,8 1,0
2020 (P) 2,1 9,0 1,2 Fonte: Programa de Estabilidade 2016-2020
Apesar da melhoria do panorama económico em 2014, o crescimento da economia tem-se revelado
insuficiente para estancar a destruição de emprego e assegurar novos postos de trabalho. A Comissão Europeia
projeta que a taxa de emprego em 2060 atinga os 69,6%, apenas 9 pontos percentuais acima do valor de 2013
que se situava em 60,6%.
No âmbito da economia, há, ainda, que sublinhar a mudança gradual no perfil de especialização produtiva
da economia portuguesa, de setores e atividades de baixa ou média intensidade tecnológica e mão-de-obra
intensiva, para atividades e setores intensivos em conhecimento e capital e de baixo apelo ao emprego.
Além da consolidação que se tem verificado nos últimos anos de setores tradicionais de mão-de-obra
intensiva, mas qualificada, como o têxtil ou o calçado e mesmo nos serviços, em especial no turismo, a
perspetiva é um crescimento da economia digital e tecnológica menos propensa a fomentar emprego maciço.
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Quadro VII: Número Total de Empresas e Pessoal ao serviço em Portugal 2008 - 2013
Anos N.º de empresas Pessoal ao serviço
2008 1.262.198 4.181.269
2009 1.224.272 4.055.606
2010 1.168.964 3.960.734
2011 1.136.697 3.850.591
2012 1.086.452 3.623.429
2013 1.119.447 3.480.731
Fonte: INE
Como muito bem ilustra o quadro VII, entre 2008 e 2013, o número total de empresas reduziu-se em 11%,
embora, entre 2012 e 2013 tivesse existido um crescimento no número de empresas de 3%. Já no que toca ao
número de pessoas empregadas no total das empresas, verificou-se uma queda constante entre 2008 e 2013,
cifrando-se esta queda em 17%.
Também aqui, não custa perspetivar uma tendência fortemente penalizadora do emprego nos próximos anos,
numa economia apostada em competir nos mercados internacionais e apostada na implementação da
renovação tecnológica.
Num sistema, como o nosso, em que as contribuições, que alimentam o sistema previdencial de repartição
da segurança social se correlacionam exclusivamente com a remuneração do fator produtivo trabalho e,
principalmente, do trabalho por conta de outrem, esta mudança de perfil das empresas de emprego intensivo
para capital intensivo concorre para a desaceleração do fluxo de contribuições e quotizações e para a
precarização orçamental daquele.
Um elemento mais discreto, o terceiro, mas igualmente importante, é o da produtividade.
Uma produtividade mais elevada pode ajudar a mitigar os impactos negativos provocados por uma
demografia adversa e por baixos níveis de crescimento da economia e do emprego.
Contudo, a evolução da produtividade tem sofrido com as vicissitudes económicas e sociais dos últimos anos
e, por maioria de razão na fase inicial da vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira.
Quadro VIII: Produtividade Aparente do Trabalho
Produtividade Anos Variação Anual (%)
aparente do trabalho
2001 24.192,7 € 4,5%
2002 25.244,5 € 4,3%
2003 26.191,5 € 3,8%
2004 27.500,2 € 5,0%
2005 28.498,2 € 3,6%
2006 29.728,0 € 4,3%
2007 31.539,3 € 6,1%
2008 32.257,1 € 2,3%
2009 33.097,1 € 2,6%
2010 34.088,0 € 3,0%
2011 34.066,8 € -0,1%
2012 34.384,7 € 0,9% Fonte: INE2013 35.840,1 € 4,2%
Para o ano de 2060, a Comissão Europeia estima que o crescimento do PIB potencial por trabalhador seja
de 1,6%, que compara com um crescimento de 0,7% verificado em 2013.
Finalmente, como quarto elemento de um sistema de segurança social como o português, impõe-se
destacar a sua extrema vulnerabilidade a longos períodos de desemprego elevado.
Com efeito, é preciso lembrar que, em situação de desemprego os trabalhadores abrangidos pelos sistemas
de proteção social têm uma resposta social assegurada, no âmbito dessa eventualidade, ainda que temporária,
nomeadamente, através do subsídio de desemprego.
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Por outro lado, durante o período em que é devida a prestação do subsídio de desemprego os beneficiários
destas prestações sociais estão isentos do pagamento de contribuições e de quotizações.
Porém, através do mecanismo da equivalência contributiva, há lugar à formação de direitos, designadamente
ao nível das prestações diferidas, nas quais se incluem as pensões. Uma tal situação, face ao atual esforço
contributivo, insuficiente para cobrir as respetivas responsabilidades prestacionais do sistema, é uma fonte de
défices financeiros atuais e futuros.
Ocorre que, em Portugal, a situação do desemprego é extremamente preocupante. Com efeito, o
desemprego encontra-se acima dos 7,5% desde o ano 2005, atingindo, entre 2010 e 2015, uma taxa superior a
10% (quadro V) e a perspetiva para os próximos anos é que o desemprego continue elevado.
A todos estes factos, acresce ainda o efeito natural de aumento do número de anos das carreiras
contributivas, tornando-as mais longas e progressivamente completas, bem como o aumento do salário médio.
Todas estas realidades que são virtuosas na sua essência para um sistema como o nosso, impõem, como
contrapartida, um aumento do valor das pensões a pagar e, por essa via, uma pressão no equilíbrio orçamental
da segurança social.
Aqui chegados, é por demais evidente que o sistema público de segurança social se encontra à beira de uma
“tempestade perfeita” que importa evitar, empenhadamente.
Porém, para além da situação acima descrita relativamente aos fatores externos determinantes para a
sustentabilidade do sistema da segurança social, importa proceder a uma análise da qualidade das respostas
que o sistema oferece.
Referimos atrás a enorme importância, para a promoção dos valores essenciais de uma sociedade
democrática e moderna, da construção e do funcionamento robusto, previsível e confiável do sistema público de
segurança social.
No entanto, também neste aspeto, relativo aos valores e aos propósitos últimos do sistema de segurança
social, é imperioso fazer uma reflexão: será que o sistema, na sua atual arquitetura, dá respostas adequadas à
promoção imprescindível da solidariedade inter e intrageracional, ou mesmo à solidariedade entre os mais ricos
e os mais pobres?
Será que este sistema responde cabalmente à promoção da equidade e da justiça social?
É suficientemente clara no sistema de segurança social a distinção entre as funções redistributivas e de
combate à pobreza e a função de seguro social, confiável, equitativa, de transferência de rendimento ao longo
do ciclo de vida?
Será que, finalmente, o atual sistema, no seu funcionamento quotidiano, quer na componente das receitas,
quer na componente prestacional, fomenta a coesão social ou é, pelo contrário, gerador de desconfiança e de
insegurança, senão mesmo de frustração entre as gerações mais novas?
Estas dúvidas são fulcrais e transparecem do quadro abaixo retirado do relatório do Fundo Monetário
Internacional “Portugal - Repensar o Estado”, de 2013 que é um contributo importante para demonstrar a
iniquidade que o nosso sistema de segurança social traduz.
Quadro IX: Benefícios Sociais sem pensões 2010
Fonte: FMI
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Como se pode verificar, existe no país um elevado número de programas de benefícios sociais. Contudo,
nem sempre são os grupos mais pobres que mais beneficiam destes programas de apoio social.
Dividindo todos os beneficiários de proteção social em cinco quintis, dos mais carenciados aos menos,
constata-se que a maioria dos apoios sociais está concentrada nos quintis superiores, ou seja, na população
menos carenciada.
Aliás, como demonstra ainda o quadro, em 2010, o grupo de 20% da população mais pobre obtinha apenas
10,6% dos benefícios da segurança social, sem pensões, enquanto os restantes 89,4% eram distribuídos pelos
restantes 80% da população, arrecadando os 20% mais ricos 37,6% desses benefícios da segurança social.
Este fenómeno agrava-se consideravelmente quando se toma em consideração a distribuição por grupos
sociais dos valores das pensões com as pensões mais elevadas a multiplicarem várias vezes o valor das
pensões mínimas do regime geral.
Para além disso, o atual sistema de pensões fomenta a injustiça, por exemplo na atribuição das pensões
antecipadas dos trabalhadores com longas carreiras contributivas, que são fortemente e injustamente
penalizados pelo fator de sustentabilidade, introduzido no sistema de pensões português em 2008, e que não
leva em devida consideração a duração das carreiras contributivas.
Também a solidariedade dentro do sistema, em especial na área das pensões não tem sido adequadamente
promovida. Atente-se no facto de as pensões médias do sistema contributivo não permitirem a um elevado
número de pensionistas viverem em condições de dignidade.
Segundo o relatório da OCDE, “Pensions at a Glance 2015”, em 2012 em Portugal, aproximadamente 60%
dos pensionistas com mais de 65 anos recebeu a pensão mínima, sendo a percentagem mais elevada dos
países da OCDE. E, sensivelmente 80% da totalidade dos pensionistas recebia abaixo do salário mínimo, ou
seja, eram mais de 2 milhões de pessoas a receber uma pensão inferior a 485€ por mês.
Como se verifica pelo quadro seguinte, Portugal apresentava em 2012 a maior desigualdade de rendimentos
entre os pensionistas.
Importa ainda referenciar os 10% de pensionistas com mais de 76 anos que se encontram em estado de
pobreza, sendo o seu rendimento inferior em 50% ao rendimento médio disponível.
Quadro X: Pensionistas com pensão mínima nos países da OCDE 2012
Fonte: OCDE
Também no que toca ao combate às desigualdades, o nosso sistema responde de forma medíocre.
O quadro que se segue demonstra que, em Portugal, em 2014, após transferências sociais, ainda existe
19,5% da população em risco de pobreza ou exclusão social.
Mais: se olharmos para o ano 2014, verificamos que Portugal apresenta uma das menores reduções dos
níveis de pobreza (7,2 pontos percentuais) entre os países da Zona Euro, comparando os valores antes e depois
das transferências sociais.
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Quadro XI: População em risco de pobreza ou exclusão social
População em risco de População em risco de Limiar de pobreza
pobreza antes de pobreza depois de (moeda nacional)
Anos transferências sociais (%) transferências sociais (%)
2013 2014 2013 2014 2013 2014
EU 28 25,9% 26,1% 16,6% 17,2% - -
EA 18 25,5% 25,7% 16,6% 17,1% - -
Bélgica 26,3% 27,5% 15,1% 15,5% 12.890 EUR 13.023 EUR
Bulgária 26,7% 27,3% 21,0% 21,8% 3.431 BGN 3.885BGN
República Checa 16,6% 17,2% 8,6% 9,7% 116.093 CZK 115.817 CZK
Dinamarca 27,8% 26,8% 11,9% 11,9% 122.573 DKK 124.310 DKK
Alemanha 24,4% 25,0% 16,1% 16,7% 11.749 EUR 11.840 EUR
Estónia 25,4% 28,4% 18,6% 21,8% 3.947 EUR 4.330 EUR
Irlanda 38,5% 37,2% 14,1% 15,3% 11.439 EUR 11.782 EUR
Grécia 28,0% 26,0% 23,1% 22,1% 5.023 EUR 4.608 EUR
Espanha 30,0% 31,1% 20,4% 22,2% 8.114 EUR 7.961 EUR
França 24,4% 24,0% 13,7% 13,3% 12.554 EUR 12.719 EUR
Croácia 29,7% 29,9% 19,5% 19,4% 22.916 HRK 23.760 HRK
Itália 24,6% 24,7% 19,3% 19,4% 9.440 EUR 9.455 EUR
Chipre 24,3% 24,6% 15,3% 14,4% 9.524 EUR 8.640 EUR
Letónia 26,0% 27,0% 19,4% 21,2% 2.799 EUR 3.122 EUR
Lituânia 30,3% 27,5% 20,6% 19,1% 9.734 EUR 9.991 EUR
Luxemburgo 29,4% 27,6% 15,9% 16,4% 19.981 EUR 20.592 EUR
Hungria 26,3% 26,3% 14,3% 14,6% 786.000 HUF 812.960 HUF
Malta 23,3% 23,8% 15,7% 15,9% 7.256 EUR 7.672 EUR
Países Baixos 20,8% 21,3% 10,4% 11,6% 12.504 EUR 12.535 EUR
Áustria 25,9% 25,4% 14,4% 14,1% 13.244 EUR 13.926 EUR
Polónia 23,0% 23,1% 17,3% 17,0% 12.966 PLN 13.439 PLN
Portugal 25,5% 26,7% 18,7% 19,5% 4.906 EUR 4.937 EUR
Roménia 27,8% 28,5% 22,4% 25,4% 5.528 RON 5.823 RON
Eslovénia 25,3% 25,1% 14,5% 14,5% 7.111 EUR 7.146 EUR
Eslováquia 20,1% 19,6% 12,8% 12,6% 4.042 EUR 4.086 EUR
Finlândia 26,4% 27,6% 11,8% 12,8% 13.963 EUR 14.221 EUR
Suécia 27,1% 28,5% 14,8% 15,1% 137.947 SEK 140.780 SEK
Reino Unido 30,1% 29,3% 15,9% 16,8% 9.526 GBP 9.956 GBP
Fonte: Eurostat
Já atrás referimos que o sistema público de segurança social é um instrumento poderoso de combate às
desigualdades.
Não espanta, por isso, que as suas insuficiências, atrás sumariamente enumeradas, contribuam para uma
situação que deve inquietar todos os responsáveis públicos em geral e os responsáveis políticos, muito em
particular: os elevados níveis de desigualdade social, bem patenteados no quadro seguinte referente ao
Coeficiente de Gini.
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Quadro XII: Coeficiente de Gini em 2014 nos países da União Europeia
Coeficiente de Gini 2014
34,5
30,9 EU28=30,9
Fonte: EuroStat
Fonte: Eurostat
É indesmentível: as desigualdades sociais em Portugal são das mais elevadas dos países da União Europeia
e não há perspetiva de uma inversão a curto ou médio prazo, não apenas por razões intrínsecas aos sistemas
de benefícios sociais, mas também a razões extrínsecas de ordem orçamental, financeira, económica, social e
política.
De facto, enquanto o valor do Coeficiente de Gini atingia o valor médio de 30,9 nos 28 países da União
Europeia, em Portugal aquele Coeficiente era de 34,5, em 2014, segundo dados do Eurostat.
É importante reiterar que os elevados níveis de desigualdade social são contrários à coesão social e a perda
deste valor pode ser causa de muitos, duradouros e imprevisíveis vicissitudes sociais.
Face a todos os elementos acima referidos é imperiosa uma reforma do sistema público de segurança social.
Uma reforma que não siga o caminho estreito e sem horizontes, como aquele que trilhámos nos últimos anos
em que, por um lado, se manteve ou incrementou mesmo o esforço contributivo dos trabalhadores e, por outro,
se procedeu a uma redução definitiva ou transitória das prestações imediatas e especialmente e com maior
impacto, das pensões.
Esta tem sido a regra e continuará a sê-lo, a menos que sejamos capazes de arrepiar caminho.
Uma reforma ampla, consistente, capaz de mudar os princípios estruturais do sistema e do seu
funcionamento, mas uma reforma que tenha um carácter gradual e equilibrado entre as atuais gerações de
beneficiários, especialmente pensionistas, e os atuais contribuintes.
Uma reforma que seja amplamente debatida e tanto quanto possível consensualizada, entre partidos políticos
com representação parlamentar, parceiros sociais e outras entidades da sociedade civil.
Esta reforma terá, desde logo e necessariamente, que equacionar uma diversificação das fontes de
financiamento do sistema, alargando-as, por forma a torná-las mais ajustadas às novas realidades económicas
e sociais, mantendo, no entanto, as contribuições como fonte de financiamento dominante.
Será também uma reforma ao nível das prestações do regime previdencial, com particular destaque para as
pensões futuras, não pondo, de modo algum, em causa as pensões já atribuídas.
Será ainda uma reforma que torne mais eficiente o sistema, para melhor promover os valores que lhe são
intrínsecos e que, do nosso ponto de vista, se estão a degradar na sua eficácia social.
Esta mudança terá de ser gradual, prudente, esclarecida e esclarecedora e garantir o equilíbrio entre os
direitos e os justos interesses dos atuais pensionistas, daqueles que são contribuintes da segurança social e
que querem, com toda a justiça e propriedade, garantir os seus direitos às prestações sociais.
Os jovens, nomeadamente quanto às pensões, precisam de ter a esperança e a confiança de que o sistema
não se converterá numa armadilha no longo prazo, exigindo-lhes contribuições para pagar as atuais prestações,
mas que não terá a capacidade de assumir as obrigações prestacionais no futuro, se nada se alterar.
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Os estudos e promessas de sustentabilidade do sistema público previdencial da segurança social, feitas ao
longo dos últimos anos, são desmentidos pelo repetido défice do sistema previdencial de repartição, como
abaixo se discrimina.
Quadro XIII: Défice do Sistema Previdencial
2012 2013 2014 2015Prev.
jan-dez jan-dez jan-dez jan-dez
Sistema de Proteção 85 141 111 202 21
Social de Cidadania
Sistema Previdencial -603 -1 117 -692 -65 -2
(excl. FSE)
Regimes Especiais 0 0 0 0 0
Fonte: IGSS. Cálculos do CFP.
Nota: Os saldos apresentados excluem as receitas do FSE e despesas com suporte no mesmo.
Para superar estes défices do sistema previdencial de repartição e garantir a sua sustentabilidade, têm sido
realizadas transferências a título excecional do Orçamento do Estado.
Só nos últimos 5 anos, o valor dessas transferências é superior a 5 mil milhões de euros, como se detalha
no quadro abaixo.
Quadro XIV
Transferências extraordinárias do Orçamento de Estado para a conta da Segurança Social
Milhões de Euros
2012 2013 2014 2015 2016
Transferências
Extraordinárias do OE 857 1.430 1.329 894 653para a Segurança Social
Fonte: OE
Estas transferências, absolutamente extraordinárias, repita-se, se por um lado, têm garantido o pagamento
de prestações, dando tranquilidade e segurança aos beneficiários, nomeadamente aos pensionistas, apesar dos
tempos de crise extremada que temos atravessado; por outro lado, é inegável que aquelas transferências
adulteram o princípio da contributividade, segundo o qual o sistema previdencial de segurança social deve ser
autossustentável, através das contribuições dos beneficiários, numa relação sinalagmática essencial.
O “Ageing Group Report 2015” da Comissão Europeia prevê que o peso da despesa pública com pensões
no PIB irá crescer progressivamente de 13,8% em 2013, atingindo 15% do PIB em 2030.
Impõe-se, pois, uma mudança do atual paradigma do sistema público da segurança social.
Uma tal mudança de paradigma passa por uma aposta em mecanismos que promovam os princípios da
contributividade e do desenvolvimento do capital humano e uma cultura de poupança para a reforma.
Uma mudança feita com prudência por parte dos decisores políticos e aceite com confiança por parte dos
milhões de destinatários, os atuais e futuros beneficiários.
Por isso, entendemos que a sociedade portuguesa tem tudo a ganhar com uma reforma da segurança social
que não seja apenas cosmética, paramétrica, pontual, mas que seja uma verdadeira mudança de paradigma.
Na verdade o grande desafio que se coloca é o de saber como adequar o sistema de pensões à realidade
demográfica, económica e financeira, satisfazendo, simultaneamente, os objetivos da sustentabilidade social e
da sustentabilidade financeira.
É neste quadro de novos desafios que, nos últimos anos, diversos países da União Europeia tem promovido
reformas relevantes dos sistemas públicos de segurança social.
Não temos duvidas que a mudança que preconizamos deve incorporar mecanismos que reforcem o princípio
da contributividade, incentivem à participação formal no mercado de trabalho e combatam a evasão contributiva.
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Desta forma, o sistema torna-se mais transparente na relação essencial com os contribuintes e com os
beneficiários que, sendo os seus destinatários últimos, devem poder ter uma perceção clara dos seus direitos e
deveres individuais e sociais, o que converge para uma cultura de responsabilidade coletiva e individual.
Esta mudança imperativa não é consequência de um qualquer modismo mas, antes, uma inadiável resposta
a um sistema que caminha apressadamente para uma situação de insustentabilidade não apenas financeira,
mas também sociopolítica.
Finalmente, uma mudança que promova mecanismos de redistribuição de rendimento transparente e
sustentável, que assegure condições de estabilidade financeira de longo-prazo e que assegure a equidade
intergeracional e intrageracional.
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República
Portuguesa, o seguinte:
1 – É constituída uma Comissão Eventual para estudar e promover a reforma do sistema público de
segurança social;
2 – A Comissão tem por objeto a recolha de contributos, a análise e a sistematização de medidas orientadas
para a sustentabilidade financeira e sociopolítica de longo prazo do sistema da segurança social incidindo,
nomeadamente:
a) Nas fontes de financiamento;
b) No pagamento das prestações sociais e muito em especial das pensões;
c) Na redefinição das relações individuais face ao sistema, quer na vertente de cidadão-contribuinte, quer
na vertente de cidadão-beneficiário;
d) Na promoção de mecanismos de redistribuição do rendimento que seja justo, equitativo e solidário, tanto
numa relação intrageracional, como numa relação intergeracional.
3 – No sentido de garantir uma maior amplitude e completude aos trabalhos, a Comissão deverá proceder a
audições envolvendo, entre outros, os parceiros sociais, outros responsáveis institucionais públicos, privados e
do terceiro setor, bem como personalidades do meio académico.
4 – A Comissão funcionará por um período de 180 dias, prorrogável até à conclusão dos trabalhos;
5 – No final do mandato, a Comissão apresentará um relatório das suas atividades e respetivas conclusões.
Palácio de S. Bento, 2 de junho de 2016.
Os deputados do PSD: Pedro Passos Coelho — Luís Montenegro — Adão Silva — Marco António Costa —
Hugo Lopes Soares — Maria das Mercês Borges — Carlos Abreu Amorim — Luís Leite Ramos — José de Matos
Rosa — Margarida Mano — Carlos Alberto Gonçalves — Miguel Morgado — António Leitão Amaro — Jorge
Moreira da Silva.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.