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21 DE MARÇO DE 2017 25

europeias e nos cerca de 35 milhões de cidadãos e cidadãs do Canadá.

Esta convenção internacional abrange um vasto conjunto de matérias que influenciarão decisivamente uma

série de aspetos da vida quotidiana da União Europeia, dos seus Estados-membros e dos seus cidadãos e

cidadãs.

Exatamente por isso é grave a extensão e complexidade técnica do tratado, que dificulta a sua compreensão

pelos cidadãos, que se vêm privados não apenas do conhecimento dos seus traços essenciais como também

da ponderação das suas putativas consequências e efeitos.

Como consequência da falta de informação e debate no quadro da atividade dos diversos parlamentos,

únicos dotados de legitimidade democrática resultante de sufrágio universal, foi também esta convenção

internacional arredada do debate nas diversas opiniões públicas que escrutinam a atividade dos parlamentos.

O processo de negociação está, assim, ferido de falta de um processo democrático que permitisse a

afirmação da dimensão deliberativa da democracia. De igual modo, a dimensão representativa sai deste

processo desprestigiada e ferida, agudizando a crise de confiança dos cidadãos nas instituições europeias.

Ficou a nu, com este processo, o défice democrático que impera nos processos de decisão da União Europeia

e a ausência de um verdadeiro controlo democrático da atuação das suas instituições. Conclui-se que o centro

de decisão se deslocou da legitimidade democrática para a legitimidade tecnocrática, sendo que neste caso o

processo foi levado a cabo num quadro de atipicidade da natureza jurídica da União Europeia.

A aprovação do CETA abala fortemente a estrutura da União Europeia, diluindo o seu papel numa

governança autómata ditada pelos mecanismos do CETA.

Exemplo disso é o recurso à arbitragem para dirimir questões entre Estados-membros e investidores, pondo

mesmo em causa as suas normas constitucionais e soberania, tendo sido diminuído o papel da União Europeia

em benefício de fontes de direito ainda menos democráticas e alteráveis.

O CETA cria um tribunal privado para resolver disputas Investidor-Estado (ICS). É um dos pontos mais

contestado e, por isso, teve mais alterações até hoje. Apesar destas alterações, ainda não estão garantidas

condições de transparência e independência na escolha dos juízes, bem como continuam a ser dadas garantias

e proteção a investidores mas não aos Estados, o que prefigura uma situação de injustiça entre as partes do

acordo.

Os direitos dos investidores no CETA entram em conflito com o direito do Estado de regular em matéria de

investimento e serviço público porque qualquer alteração que um Estado queira implementar tem que estar de

acordo com as obrigações feitas aquando a assinatura do CETA. Isto significa uma limitação do direito de

regulação dos Estados sobre matérias de interesse público, já que é recorrente encontrarmos, nos vários

capítulos, a remissão para o Capítulo 28, correspondente às exceções gerais, que deixa claro o objetivo de

apenas“garantir a observância das disposições legislativas e regulamentares que não sejam incompatíveis com

o disposto no presente Acordo”.

Lembramos que em 2011 o Tribunal de Justiça Europeu redigiu um acórdão que rejeitou a criação de um

tribunal arbitral sobre patentes. No ponto 80 desse Parecer, de 8 de março de 2011, pode ler-se: “Embora seja

verdade que o Tribunal de Justiça não tem competência para se pronunciar sobre as ações diretas entre

particulares em matérias de patentes, cabendo essa competência aos órgãos jurisdicionais dos Estados-

Membros, estes últimos não podem, todavia, atribuir a competência para decidir tais litígios a um órgão

jurisdicional criado por um acordo internacional, que privaria os referidos órgãos jurisdicionais da sua missão de

aplicação do direito da União”. Ora, o princípio da constituição arbitral para gestão de conflitos no âmbito de um

acordo internacional é o mesmo que se coloca com o CETA.

Por outro lado, a ausência de qualquer norma de livre denúncia do tratado que institui o CETA limita

gravemente o livre exercício de competências quer pelos órgãos da União Europeia, quer pelos órgãos dos

Estados-Membros, condenados à eternidade do CETA. Acresce que o papel dos parlamentos europeu e

nacionais é posto em causa pelas reservas de iniciativa quanto à aprovação e denúncia de convenções

internacionais, reservadas a outros órgãos, assim se comprometendo a sua liberdade de iniciativa.

Em todo este tétrico jogo formal, é mais uma vez a legitimidade democrática, que deveria resultar do exercício

da soberania popular por via de eleições, que fica em causa, acrescendo ainda uma diminuição das jurisdições

nacionais e europeias a par da diminuição relativa dos respetivos poderes ordinários.

Se, como já se demonstrou, o CETA leva à erosão da democracia, da soberania, do aparelho jurisdicional e

dos ordenamentos jurídicos da União Europeia e dos Estados-membros, as suas consequências práticas em

domínios concretos é ainda maior.

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