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Segunda-feira, 30 de abril de 2018 II Série-A — Número 106

XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)

SUPLEMENTO

S U M Á R I O

Decreto da Assembleia da República n.º 203/XIII:

Direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa.

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DECRETO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA N.º 203/XIII

DIREITO À AUTODETERMINAÇÃO DA IDENTIDADE DE GÉNERO E EXPRESSÃO DE GÉNERO E À

PROTEÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS SEXUAIS DE CADA PESSOA

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e o

direito à proteção das características sexuais de cada pessoa.

Artigo 2.º

Proibição de discriminação

1 - Todas as pessoas são livres e iguais em dignidade e direitos, sendo proibida qualquer discriminação,

direta ou indireta, em função do exercício do direito à identidade de género e expressão de género e do direito

à proteção das características sexuais.

2 - As entidades privadas cumprem a presente lei e as entidades públicas garantem o seu cumprimento e

promovem, no âmbito das suas competências, as condições necessárias para o exercício efetivo do direito à

autodeterminação da identidade de género e expressão de género e do direito à proteção das características

sexuais de cada pessoa.

Artigo 3.º

Autodeterminação da identidade de género e expressão de género

1 - O exercício do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género de uma pessoa

é assegurado, designadamente, mediante o livre desenvolvimento da respetiva personalidade de acordo com a

sua identidade e expressão de género.

2 - Quando, para a prática de um determinado ato ou procedimento, se torne necessário indicar dados de

um documento de identificação que não corresponda à identidade de género de uma pessoa, esta ou os seus

representantes legais podem solicitar que essa indicação passe a ser realizada mediante a inscrição das iniciais

do nome próprio que consta no documento de identificação, precedido do nome próprio adotado face à

identidade de género manifestada, seguido do apelido completo e do número do documento de identificação.

Artigo 4.º

Proteção das características sexuais

Todas as pessoas têm direito a manter as características sexuais primárias e secundárias.

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Artigo 5.º

Modificações ao nível do corpo e das características sexuais da pessoa menor intersexo

Salvo em situações de comprovado risco para a sua saúde, os tratamentos e as intervenções cirúrgicas,

farmacológicas ou de outra natureza que impliquem modificações ao nível do corpo e das características sexuais

da pessoa menor intersexo, não devem ser realizados até ao momento em que se manifeste a sua identidade

de género.

CAPÍTULO II

Reconhecimento jurídico da identidade de género

Artigo 6.º

Procedimento

1 - O reconhecimento jurídico da identidade de género pressupõe a abertura de um procedimento de

mudança da menção do sexo no registo civil e da consequente alteração de nome próprio, mediante

requerimento.

2 - O procedimento referido no número anterior tem natureza confidencial, exceto a pedido da própria pessoa,

dos seus herdeiros, das autoridades judiciais ou policiais para efeitos de investigação ou instrução criminal, ou

mediante decisão judicial.

3 - A mudança da menção do sexo no registo civil e a consequente alteração de nome próprio realizadas nos

termos da presente lei só podem ser objeto de novo requerimento mediante autorização judicial.

4 - A decisão final sobre a identidade de género de uma pessoa, proferida por uma autoridade ou tribunal

estrangeiro, de acordo com a legislação desse país, é reconhecida nos termos da lei.

Artigo 7.º

Legitimidade

1 - Têm legitimidade para requerer o procedimento de mudança da menção do sexo no registo civil e da

consequente alteração de nome próprio, as pessoas de nacionalidade portuguesa, maiores de idade e que não

se mostrem interditas ou inabilitadas por anomalia psíquica, cuja identidade de género não corresponda ao sexo

atribuído à nascença.

2 - As pessoas de nacionalidade portuguesa e com idade compreendida entre os 16 e 18 anos podem

requerer o procedimento de mudança da menção do sexo no registo civil e da consequente alteração de nome

próprio, através dos seus representantes legais, devendo o conservador proceder à audição presencial da

pessoa cuja identidade de género não corresponda ao sexo atribuído à nascença, por forma a apurar o seu

consentimento expresso e esclarecido, tendo em consideração os princípios da autonomia progressiva e do

superior interesse da criança constantes na Convenção sobre os Direitos da Criança.

3 - A pessoa intersexo pode requerer o procedimento de mudança da menção de sexo no registo civil e da

consequente alteração de nome próprio, a partir do momento que se manifeste a respetiva identidade de género.

Artigo 8.º

Requerimento

O procedimento de mudança da menção do sexo no registo civil e da consequente alteração de nome próprio

tem início mediante requerimento apresentado em qualquer conservatória do registo civil, com indicação do

número de identificação civil e do nome próprio pelo qual a pessoa pretende vir a ser identificada, podendo,

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desde logo, ser solicitada a realização de novo assento de nascimento, no qual não pode ser feita qualquer

menção à alteração do registo.

Artigo 9.º

Decisão

1 - No prazo máximo de oito dias úteis a contar da data de apresentação do requerimento, verificados os

requisitos de legitimidade previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 7.º, o conservador realiza o respetivo averbamento,

nos termos da alínea o) do n.º 1 do artigo 69.º do Código do Registo Civil e, se for o caso, realiza um novo

assento de nascimento, nos termos do n.º 1 do artigo 123.º do mesmo Código.

2 - Nenhuma pessoa pode ser obrigada a fazer prova de que foi submetida a procedimentos médicos,

incluindo cirurgia de reatribuição do sexo, esterilização ou terapia hormonal, assim como a tratamentos

psicológicos e ou psiquiátricos, como requisito que sirva de base à decisão referida no número anterior.

3 - Da decisão desfavorável à mudança da menção do sexo no registo civil e à consequente alteração de

nome próprio ou do não cumprimento dos prazos estabelecidos no presente artigo cabe recurso hierárquico

para o presidente do Instituto dos Registos e Notariado, I.P., nos termos do Código do Registo Civil.

Artigo 10.º

Efeitos

1 - A mudança da menção do sexo no registo civil e a consequente alteração de nome próprio efetuada nos

termos da presente lei não afeta nem altera os direitos constituídos e as obrigações jurídicas assumidas antes

do reconhecimento jurídico da identidade de género.

2 - As pessoas que tenham procedido à mudança da menção do sexo no registo civil e à consequente

alteração de nome próprio passam, desse modo, a ser reconhecidas nos documentos de identificação, com o

nome e sexo neles constantes.

3 - A pessoa que tenha procedido à mudança da menção do sexo no registo civil e à consequente alteração

de nome próprio deve dar início às alterações necessárias à atualização dos seus documentos de identificação

no prazo máximo de 30 dias a contar do averbamento.

CAPÍTULO III

Medidas de proteção

Artigo 11.º

Saúde

1- O Estado deve garantir, a quem o solicitar, a existência e o acesso a serviços de referência ou unidades

especializadas no Serviço Nacional de Saúde, designadamente para tratamentos e intervenções cirúrgicas,

farmacológicas ou de outra natureza, destinadas a fazer corresponder o corpo à sua identidade de género.

2- A Direção-Geral da Saúde define, no prazo máximo de 270 dias, um modelo de intervenção, através de

orientações e normas técnicas, a ser implementado pelos profissionais de saúde no âmbito das questões

relacionadas com a identidade de género, expressão de género e características sexuais das pessoas.

Artigo 12.º

Educação e ensino

1 - O Estado deve garantir a adoção de medidas no sistema educativo, em todos os níveis de ensino e ciclos

de estudo, que promovam o exercício do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de

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género e do direito à proteção das características sexuais das pessoas, nomeadamente através do

desenvolvimento de:

a) Medidas de prevenção e de combate contra a discriminação em função da identidade de género,

expressão de género e das características sexuais;

b) Mecanismos de deteção e intervenção sobre situações de risco que coloquem em perigo o saudável

desenvolvimento de crianças e jovens que manifestem uma identidade de género ou expressão de género que

não se identifica com o sexo atribuído à nascença;

c) Condições para uma proteção adequada da identidade de género, expressão de género e das

características sexuais, contra todas as formas de exclusão social e violência dentro do contexto escolar,

assegurando o respeito pela autonomia, privacidade e autodeterminação das crianças e jovens que realizem

transições sociais de identidade e expressão de género;

d) Formação adequada dirigida a docentes e demais profissionais do sistema educativo no âmbito de

questões relacionadas com a problemática da identidade de género, expressão de género e da diversidade das

características sexuais de crianças e jovens, tendo em vista a sua inclusão como processo de integração

socioeducativa.

2 - Os estabelecimentos do sistema educativo, independentemente da sua natureza pública ou privada,

devem garantir as condições necessárias para que as crianças e jovens se sintam respeitados de acordo com

a identidade de género e expressão de género manifestadas e as suas características sexuais.

3 - Os membros do Governo responsáveis pelas áreas da igualdade de género e da educação adotam, no

prazo máximo de 180 dias, as medidas administrativas necessárias para a implementação do disposto no n.º 1.

CAPÍTULO IV

Meios de defesa

Artigo 13.º

Resolução alternativa de litígios

Sem prejuízo do recurso à via judicial, as partes podem submeter os litígios emergentes da presente lei a

meios de resolução alternativa de litígios, nos termos da lei.

Artigo 14.º

Responsabilidade

1 - A prática de qualquer ato discriminatório, por ação ou omissão, confere à pessoa lesada o direito a uma

indemnização, por danos patrimoniais e não patrimoniais, a título de responsabilidade civil extracontratual, nos

termos do Código Civil.

2 - Na fixação da indemnização, o tribunal deve atender ao grau de violação dos interesses em causa, ao

poder económico dos autores do ilícito e às condições da pessoa alvo da prática discriminatória.

Artigo 15.º

Proteção contra atos de retaliação

É nulo o ato de retaliação que corresponda a um tratamento que tenha como propósito lesar ou desfavorecer

qualquer pessoa, adotado em razão de reclamação, queixa, denúncia ou ação contra o autor desse ato, em

defesa do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e do direito à proteção

das características sexuais de cada pessoa, nos termos da presente lei.

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Artigo 16.º

Direitos processuais das associações e organizações não-governamentais

1 - É reconhecida às associações e organizações não-governamentais, cujo objeto estatutário se destine

essencialmente à defesa e promoção do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de

género e do direito à proteção das características sexuais de cada pessoa, legitimidade processual para a defesa

dos direitos e interesses coletivos e para a defesa coletiva dos direitos e interesses individuais legalmente

protegidos das pessoas associadas, bem como para a defesa dos valores protegidos pela presente lei.

2 - A defesa coletiva dos direitos e interesses individuais legalmente protegidos, prevista no número anterior,

não pode implicar limitação da autonomia individual das pessoas associadas.

CAPÍTULO V

Disposições transitórias e finais

Artigo 17.º

Norma transitória

A presente lei aplica-se aos procedimentos de mudança da menção do sexo no registo civil e da consequente

alteração de nome próprio que se encontram a decorrer à data da sua entrada em vigor.

Artigo 18.º

Norma revogatória

É revogada a Lei n.º 7/2011, de 15 de março, com exceção do seu artigo 5.º.

Artigo 19.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no primeiro dia útil seguinte ao da sua publicação.

Aprovado em 13 de abril de 2018.

O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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