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13 DE AGOSTO DE 2018 9

nas sentenças, de que são prova os acórdãos vindos recentemente a público, revelam a persistente

naturalização e desvalorização da violência doméstica.

Toda esta conjuntura deve erigir-se como alerta suficiente para a necessidade de os agentes que trabalham

nesta área e, em especial, os agentes judiciais, apreenderem com toda a profundidade possível o fenómeno da

violência doméstica, estudando os fatores que a originam, que a sustentam, os contornos e as especificidades

das relações de dominação e as dinâmicas deste tipo de violência.

A formação multidisciplinar especializada de todos os agentes judiciais, incluindo dos magistrados, é para

isso crucial sendo, por isso, reclamada não só por diversas associações e coletivos de defesa dos direitos das

mulheres, mas também por quem conhece e trabalha de perto com estas realidades incluindo por vários atores

judiciais.

É igualmente uma das principais recomendações do estudo já citado. Considerando que “para a análise da

prova concorrem vários fatores, fatores culturais dos magistrados, a forma como veem as relações sociais, a

formação que lhes é ministrada na sua aprendizagem profissional, as campanhas de sensibilização para a

violência doméstica (…) é absolutamente crucial uma cada vez maior aposta na formação multidisciplinar dos

magistrados judiciais e do Ministério Público”. Só assim será possível mitigar o efeito de sentenças que, em

processos de violência doméstica, mobilizam argumentos incompreensíveis e que, por esse facto, são

sentenças que não trazem justiça aos casos concretos.

Mas estas sentenças incompreensíveis não se limitam aos Tribunais Criminais. Também nos Tribunais de

Família e Menores as decisões revelam a mesma incompreensão do que é uma relação marcada pela violência

e até dos efeitos que isso tem na vida das crianças. Decisões como entregar a custódia dos filhos ao agressor

ou estabelecer regimes de visitas ao pai quando mãe e crianças tiveram, para sua própria segurança, de ser

colocadas em casa abrigo, não são incomuns. Advogados, associações de defesa e proteção das vítimas e as

próprias vítimas referem frequentemente que os magistrados dos Tribunais de Família e Menores recusam

qualquer tipo de articulação com os Tribunais Criminais argumentando que os dois processos são autónomos e

que o seu papel é unicamente o de decidir a regulação das responsabilidades parentais. Os argumentos de que

o agressor de violência doméstica não deixa de ser um bom pai ou de que as crianças, por não serem os alvos

diretos da violência doméstica, não são verdadeiras vítimas são recorrentes nas sentenças dos Tribunais de

Família e Menores.

Equiparar processos de regulação de responsabilidades parentais no âmbito de casos de violência doméstica

a quaisquer outros decorrentes de casos de divórcio ou separação, é, mais uma vez, ignorar por completo as

especificidades das relações de violência e dominação e sobretudo abrir a porta à revitimização, incluindo das

crianças.

A natureza intrínseca e diferenciada da violência de género e da violência doméstica em particular, além da

sua perigosidade, exige um tratamento adequado e específico. Este é o crime que mais mata em Portugal – no

ano passado foram assassinadas em contexto conjugal ou análogo, 30 mulheres (RASI 2017) exigindo, portanto,

a coragem de propostas concretas.

Compete ao Estado adotar medidas para prevenir e erradicar estas formas de violência a fim de tornar

efetivos direitos fundamentais e constitucionalmente consagrados, como o direto à igualdade, o direito à vida e

integridade física e moral, a não submissão a maus tratos e o direito à liberdade e à segurança.

Com esta premissa por base, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta um Projeto de Lei que

propõe a criação de Juízos de Violência Doméstica, constituindo-se como Tribunais Especializados de

Competência Mista com o objetivo de procederem ao julgamento dos crimes de violência doméstica, tanto no

que respeita aos processos criminais como aos processos de regulação das responsabilidades parentais.

É reconhecida a necessidade de os casos de violência serem tratados por profissionais com formação

específica e adequada à resolução dos problemas que deles decorrem e, por isso, não basta criar estes

tribunais, é preciso que quem vá investigar e julgar detenha o conhecimento adequado. O presente projeto de

lei contribui também para suprir esta necessidade uma vez que atribui o tratamento destes casos a magistrados

e pessoal com formação e experiência nesta área.

Estas propostas têm igualmente o mérito de responder de forma positiva à interpelação feita pela Convenção

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