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II SÉRIE-A — NÚMERO 12

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direito, uma Constituição apoiada na dignidade da pessoa humana, tem que reconhecer a vontade da pessoa

decidir para as questões mais decisivas e mais íntimas da sua vida, onde eu incluo também as decisões, em

alguma medida, sobre as condições da sua própria morte. Na medida em que a lei atual não dá a mínima

possibilidade, portanto é uma proibição total e absoluta, a meu ver tenderia a considerar que este limite está

ultrapassado, ou seja, este limite constitucional de atender, em alguma medida, à autonomia da pessoa não

está a ser respeitado.»

Para além da posição assumida por Jorge Reis Novais, vários são os constitucionalistas que defendem que

uma lei que permita a eutanásia ou o suicídio medicamente assistido não é inconstitucional, nomeadamente

Luísa Neto, Teresa Beleza e Faria Costa.

A discussão sobre inconstitucionalidade resulta de uma eventual violação do artigo 24.º da CRP. Ora, tal

interpretação apenas é possível se se entender que aquele artigo, ao estabelecer que a «vida humana é

inviolável», interdita qualquer violação do direito à vida, independentemente do tipo de agressão em causa.

Todavia, ainda que se diga que a vida humana é inviolável ou que o direito à vida é um direito absoluto, tal

consideração, do ponto de vista estritamente jurídico, não é verdadeira. A admissibilidade de situações como a

possibilidade de matar em legítima defesa demonstram tal facto. O direito à vida, ainda que tendencialmente

absoluto, não tem, atualmente, a configuração de um direito absoluto.

Outra questão que se prende com esta está relacionada com a conceção que temos da função do

ordenamento jurídico. Numa situação de despenalização da morte medicamente assistida, o que poderia estar

em causa, eventualmente, seria o facto de o Estado, com uma lei deste tipo, deixar desprotegida a vida

naquelas circunstâncias por não a estar a proteger suficientemente. Mas, será isto verdade? Isto é, o Estado

não está nunca a desrespeitar o direito à vida: se recai sobre o Estado o dever de proteger a vida humana

contra agressões de terceiros, deverá este protegê-la também contra agressões do próprio? A este respeito,

subscrevemos a posição de Jorge Reis Novais, que defende que um Estado de direito não é um Estado

paternalista e que, portanto, não é um Estado que se destine a proteger a pessoa contra si própria, que duvide

da capacidade e da autonomia da pessoa e que, por isso, a proteja, que se superiorize julgando saber qual é o

interesse que aquela pessoa tem e portanto se propõe protegê-lo mesmo quando a pessoa não quer ser

protegida. Uma vez que o Estado de Direito não funciona nesta base, o dever de proteção de uma pessoa

contra si própria é um dever exigente, no sentido em que o Estado apenas deve protegê-la em último caso.

Em princípio, o Estado reconhece autonomia às pessoas, partindo do pressuposto que as pessoas estão em

condições de ter autonomia.

Chegados aqui, facilmente se compreende que aquilo que deve ser garantido pelo Estado é que a

pessoa que toma a decisão é competente para o fazer. O Estado deve, assim, criar mecanismos que

permitam aferir se a vontade manifestada por determinada pessoa corresponde à sua vontade real, ou seja, se

a pessoa está lúcida e consciente.

Todavia, tem sido defendido que a despenalização da morte medicamente assistida introduzirá a ideia de

que há vidas que são dignas de serem vividas e vidas indignas de serem vividas. Não compreendemos este

argumento. Todas as vidas são dignas, independentemente do seu grau de autonomia ou de dependência,

independentemente de se tratar de alguém interdito por anomalia psíquica ou com plena consciência. A única

coisa que difere são as obrigações do Estado, porquanto o mesmo tem o dever de aferir se a pessoa está em

condições de formular a sua vontade, de forma consciente e lúcida, uma vez que, caso não esteja, o acesso à

morte medicamente assistida não é possível.

Outros argumentos têm sido apresentados contra a despenalização da morte medicamente

assistida, em especial a existência de cuidados paliativos e o argumento da «encosta escorregadia ou rampa

deslizante».

No entanto, o PAN entende que a despenalização da morte medicamente assistida não exclui nem

conflitua com os cuidados paliativos. Estes são de enorme importância, devendo por isso ser valorizados e

continuamente reforçados. Mas a verdade é que os cuidados paliativos não eliminam por completo o

sofrimento em todos os doentes nem impedem por inteiro a degradação física e psicológica, porque nem todo

o sofrimento é tratável. Para além disto, os efeitos associados a estes tratamentos, nomeadamente náuseas e

alterações de consciência, podem comprometer a autonomia e a qualidade de vida dos pacientes. Por este

motivo, mas também por outros, existem também doentes que não pretendem submeter-se aos cuidados

paliativos.

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