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II SÉRIE-A — NÚMERO 55

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Ainda que seja por princípio desejável a estabilidade da legislação em vigor em matérias estruturantes, tal

desiderato não deve, porém, inibir o legislador de intervir quando se depara com insuficiências da lei em vigor,

geradoras de potencial injustiça ou contradição com as suas próprias finalidades. A matéria sobre a qual versa

a presente iniciativa legislativa enquadra-se, precisamente, numa situação que se pode reconduzir a uma

necessidade de intervenção legislativa corretiva de um desequilíbrio injustificado da lei, a saber, a

possibilidade de alargamento do recurso post mortem a técnicas de procriação medicamente assistida.

Atualmente, o artigo 22.º da Lei n.º 32/2006, de 26 de junho, determina que é «lícita a transferência post

mortem de embrião para permitir a realização de um projeto parental claramente estabelecido por escrito antes

do falecimento do pai, decorrido que seja o prazo considerado ajustado à adequada ponderação da decisão.»

Todavia, a inseminação com sémen do marido ou unido de facto não é permitida, mesmo que exista

consentimento e clara indicação de que o mesmo se destina a um projeto parental comum, inviabilizando a

concretização da vontade de ambas as partes apenas pelo facto de o procedimento de procriação

medicamente assistida se encontrar numa fase distinta, anterior, por não ser ainda possível proceder à

transferência de embrião.

A recolha de sémen do marido ou unido de facto com vista a futura concretização de um procedimento de

inseminação para realizar um projeto parental comum resulta precisamente, na maioria dos casos

documentados, da incerteza quanto à evolução de um quadro clínico em que se regista um risco real de

infertilidade (motivada pela patologia ou pelos tratamentos respetivos) ou mesmo de falecimento do dador

antes da conclusão do processo.

Os fins que se visam prosseguir através do recurso a técnicas de procriação medicamente assistida

permitidas pelo conhecimento científico atual passam inegavelmente pela possibilidade que por esta via se

abre aos casais que se deparam com quadros clínicos que escapam ao seu controlo e que, por vezes, vêm

permitir alargar o leque de opções sobre como enfrentar uma doença crónica e as suas possíveis

consequências negativas no que respeita à fertilidade.

Trata-se, de resto, de uma matéria que não é nova na história da revisão da legislação e da intervenção da

Assembleia da República sobre esta matéria, tendo o Partido Socialista anteriormente proposto a aprovação

de normas com teor em tudo idêntico àquele cuja discussão agora se pretende retomar.

Em 2012, na XII Legislatura, um grupo de cinco Deputados e Deputadas do Partido Socialista apresentou

uma iniciativa legislativa (o Projeto de Lei n.º 137/XII), que não obstante ter por objeto principal o alargamento

dos beneficiários das técnicas de PMA, procedia ainda, como se refere na respetiva exposição de motivos «a

um pequeno alargamento da possibilidade (já admitida na lei em vigor) de inseminação postmortem, sempre

que tal corresponda a um projeto parental previamente consentido pelo dador», e que passava pela alteração

do artigo 22.º da referida Lei n.º 32/2006, de 26 de junho. O projeto, porém, viria a ser recusado em votação na

generalidade.

Em 2015, ainda na XII Legislatura, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista assumiria a apresentação da

matéria, dando entrada do Projeto de Lei n.º 752/XII, contendo a mesma alteração ao artigo 22.º. A iniciativa

viria novamente a ser rejeitada em votação na generalidade.

Iniciada a XIII Legislatura, ainda em 2015, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista viria, uma vez mais, a

dar entrada da iniciativa, que continuou a incluir a referida alteração ao artigo 22.º. Atenta a nova composição

da Assembleia da República, o Projeto de Lei n.º 6/XIII foi aprovado na generalidade, todavia, na discussão na

especialidade, em 2016, a alteração ao artigo 22.º não viria a ser aprovada, tendo tido apenas os votos

favoráveis do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda. Consequentemente, apesar da revisão global da Lei

n.º 32/2006, de 26 de junho, então realizada, a insuficiência da lei ficaria por resolver.

Ademais, a subsistência em vigor do artigo 22.º com a redação atual torna-se mesmo incongruente perante

a evolução que a lei conheceu nos últimos anos: podendo hoje uma mulher não casada e que não integre uma

união de facto recorrer a técnicas de PMA com recurso a um dador anónimo e não existindo garantias de que

este ainda esteja vivo no momento em que o início do procedimento tenha lugar, acaba por vedar-se a

possibilidade de recurso à PMA quando esta era consciente, expressamente consentida e correspondente a

uma vontade comum de ambos os futuros progenitores, admitindo-se, contudo, que nas mesmas

circunstâncias, a intervenção possa ter lugar através de recurso a banco de doação.

Já na presente Legislatura, e perante circunstâncias reais de impossibilidade de recurso a técnicas de PMA

por quem deu o seu consentimento para um projeto parental comum, tendo falecido antes do início do

processo, deu entrada na Assembleia da República a Petição n.º 28/XIV, que tem por primeira subscritora

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