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II SÉRIE-A — NÚMERO 55

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Ora, como demonstram diferentes estudos realizados por sociólogos, psicólogos e criminologistas nos

últimos 25 anos, os agressores no âmbito da crueldade animal, cometem amiúde violência contra humanos –

traz-se à colação o estudo realizado pela Northeastern University e Massachusetts SPCA em 1997, o qual

demonstrou que quase 40% dos perpetradores de crimes contra animais, cometeu concomitante ou

subsequentemente crimes violentos contra pessoas.

Ademais, há mais um elemento que urge relevar – de acordo com estudos avançados pela National

Coalition on Violence Against Animals, 15% a 48% das mulheres adiam a sua saída de uma situação de abuso

com receio pela segurança dos seus animais de companhia.

Ou seja, a prevenção e a resposta face a esta problemática – violência contra animais – afigura-se como

questão fulcral, até nesta dupla variante de prevenção e resposta a crimes contra as pessoas, até porque é

importante não olvidar o papel que os animais desempenham na sociedade, confirmada pelo impressionante

dado que dá conta que mais de 50% dos lares portugueses detém animais de companhia, de acordo com um

estudo da GFK (denominado Track.Pets2) 2.

Os dados supra explanados apresentam um duplo objetivo: demonstrar a evidência da necessidade de

melhorar as premissas legais existentes relativamente a esta matéria e a premência de alargamento da tutela

penal aos demais animais sencientes vertebrados.

II – Da necessidade de tutela penal

Pese embora esta questão tinha sido amplamente debatida aquando da discussão das iniciativas

legislativas que deram origem à Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, aqui chegados, até em contraposição com o

regime de outros países, em que têm sido desenvolvidos normativos de índole constitucional em torno da

proteção animal ou, por referência, à defesa do ambiente ou com apelo ao próprio princípio fundamental da

dignidade humana, importa revisitar a necessidade de tutela penal do bem-estar e da vida dos animais, uma

vez que foi recentemente levantada esta questão.

Num Estado de direito democrático onde a dignidade da pessoa humana se assume como diretriz – artigos

1.º e 2.º da lei fundamental – o direito penal apresenta uma função de tutela subsidiária ou de última ratio dos

bens jurídicos essenciais à subsistência da sociedade e ao livre desenvolvimento da personalidade ética de

cada um perante condutas que contra estes atentem de modo socialmente insuportável (carácter

fragmentário).

Como veremos adiante, o objetivo é, à semelhança do que acontece na lei alemã – §17 da Lei alemã de

Proteção dos Animais – conferir tutela penal aos animais sencientes vertebrados.

Como assevera o Conselho Superior da Magistratura no respetivo parecer, os crimes contra animais

tutelam um bem jurídico «composto ou complexo, baseado na proteção da integridade física, saúde e vida de

um determinado animal, pela específica relação que o mesmo natural ou culturalmente tem ou está destinado

a ter com o ser humano», sendo que este bem jurídico-penal «se deverá traduzir num bem essencial ao

desenvolvimento da personalidade ética do homem’ e, portanto, minimamente ligado à dignidade da pessoa

humana».

Ora, como defende Helena Telino Neves, os crimes contra animais «degradam também a nossa

humanidade», sendo que o incumprimento dos deveres morais e jurídico-penais para com os animais revela a

«desumanidade do agente», pelo que põe em causa a relação direta entre humanos.

Em sentido contrário, Fernando Araújo sustenta que as teses indiretas de um estatuto moral dos animais,

são «incapazes de fundamentar o dever absoluto de respeito para com os interesses dos animais – por

exemplo, o dever de abstenção de crueldade mesmo em circunstâncias em que o ato cruel seria indetectado e

não lesaria valores patrimoniais ou não-patrimoniais que não os do próprio perpetrador –, muito em especial

porque, não havendo um dever absoluto e direto de respeito pelos animais, o que se fizesse contra estes

jamais se poderia entender como indiciador de ‘desumanidade’ do agente», considerando que a capacidade

de sofrimento dos animais constitui o fundamento «da consideração ética que lhes é devida» e do interesse

dos próprios animais «no não-sofrimento e respetiva tutela».

2 Para visualização deste elemento, ver por exemplo link https://www.publico.pt/2017/06/18/p3/noticia/em-portugal-mais-de-metade-dos-lares-tem-um-animal-de-companhia-1828249.

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