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Terça-feira, 22 de setembro de 2020 II Série-A — Número 4

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

S U M Á R I O

Projeto de Revisão Constitucional n.º 3/XIV/2.ª (CH):

Altera diversas normas constitucionais. Projetos de Lei (n.os 516 e 518 a 521/XIV/2.ª):

N.º 516/XIV/2.ª [Transfere a sede do Tribunal Constitucional, do Supremo Tribunal Administrativo e da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos para a cidade de Coimbra, procedendo à décima alteração à Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional), à décima terceira alteração ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, e à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de janeiro (Lei de organização e funcionamento da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos)]: — Alteração do texto inicial do projeto de lei.

N.º 518/XIV/2.ª (PCP) — Amplia as fontes de financiamento da Segurança Social: — Texto inicial do projeto de lei. — Texto inicial alterado do projeto de lei.

N.º 519/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Cria os centros de nascimento, reforçando o direito das mulheres grávidas quanto à escolha do local de nascimento.

N.º 520/XIV/2.ª (BE) — Estabelece o regime para a nacionalização dos CTT.

N.º 521/XIV/2.ª (BE) — Altera o regime do Complemento Solidário para Idosos, fazendo depender a sua atribuição da situação de pobreza do idoso e não do rendimento dos filhos

e garantindo a convergência do valor de referência com o limiar de pobreza. Projetos de Resolução (n.os 641 a 659/XIV/2.ª):

N.º 641/XIV/2.ª (CDS-PP) — Adoção de medidas para o regular funcionamento dos Cuidados de Saúde Primários.

N.º 642/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que garanta aos advogados, advogados estagiários e solicitadores uma remuneração condigna e justa pelos serviços que prestem no âmbito da proteção jurídica.

N.º 643/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que inicie os processos tendentes à construção de uma escola básica para os 2.º e 3.º ciclos e para o ensino secundário na freguesia de Fernão Ferro.

N.º 644/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo o envolvimento das Forças Armadas nas ações de planeamento e operacionalização das medidas e ações que vierem a ser adotadas nesta nova fase de combate à pandemia, nomeadamente no apoio aos cidadãos em situação de maior vulnerabilidade e risco, como é o caso do apoio aos lares e instituições sociais de todo o País que prestam serviços a esta franja da população mais vulnerável.

N.º 645/XIV/2.ª (BE) — Por um setor das telecomunicações público e universal em Portugal.

N.º 646/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Pela construção de uma escola básica de 2.º e 3.º ciclo e secundária na freguesia de Fernão Ferro, no concelho do Seixal.

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N.º 647/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que adote um conjunto de medidas de valorização dos profissionais do sector da cultura, e que submeta à aprovação da Assembleia da República um estatuto jurídico do intermitente nas áreas artísticas.

N.º 648/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que adote um conjunto de medidas de combate aos paraísos fiscais e que realize uma avaliação de custo-benefício do impacto global económico, social e fiscal da Zona Franca da Madeira.

N.º 649/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que submeta ao Secretário-Geral da ONU uma proposta de alteração ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, que assegure a consagração do crime de ecocídio na lista de crimes previstos no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

N.º 650/XIV/2.ª (PEV) — Intensificação e credibilização da avaliação de impacte ambiental das obras integradas no projeto de acessibilidades marítimas ao porto de Leixões.

N.º 651/XIV/2.ª (BE) — Pela autonomia da Escola Superior de Gestão de Idanha-a-Nova.

N.º 652/XIV/2.ª (BE) — Pela disponibilização de testes COVID-19 gratuitos a professores, assistentes operacionais e alunos.

N.º 653/XIV/2.ª (BE) — Pela valorização da carreira docente.

N.º 654/XIV/2.ª (BE) — Recomenda a contratação de mais professores, técnicos especializados e trabalhadores não docentes para a escola pública.

N.º 655/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo a realização urgente de obras na Escola Secundária de Serpa.

N.º 656/XIV/2.ª (BE) — Recuperação e reforço da atividade dos cuidados de saúde primários.

N.º 657/XIV/2.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de carteiro com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade e à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho.

N.º 658/XIV/2.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de trabalhador da manutenção e montagem de aerogeradores com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade, à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho e à adequação do acesso à reforma.

N.º 659/XIV/2.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade dos trabalhadores do setor dos transportes, comunicações e telecomunicações com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade, à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho bem como a um acesso à reforma adequado ao desgaste da profissão.

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PROJETO DE REVISÃO CONSTITUCIONAL N.º 3/XIV/2.ª

ALTERA DIVERSAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Exposição de motivos

A principal argumentação em torno da progressividade fiscal é o combate à injustiça social que, segundo os

seus defensores, é induzida pelo funcionamento do próprio mercado em si mesmo.

No entanto, este problema não representa por si só um conceito económico, no sentido estrito do termo, mas

antes uma tradução ou demonstração daquelas que acabam por ser as preferências sociais e posições

individualizadas, que não têm de ser necessariamente suportadas por todos.

A exemplo, no nosso País a progressividade do IRS é imposta pelo n.º 1 do artigo 104.º da Constituição da

República Portuguesa que, uma vez mais, deixa bem patente a confusão axiológico-jurídica sobre o que é a

justiça social.

Claro que a Constituição espelha o entendimento dos que, em seu tempo, a assinaram e aprovaram. É,

portanto, fiel ao espírito dos primeiros constituintes e do entendimento doutrinário dominante na época.

Naturalmente que, com isto, não se está a defender que não deve ser exercida cabal e claramente uma

política positiva de redistribuição de rendimento, sobretudo porque esta é uma importante ferramenta para o

alcançar de um mínimo de bem-estar, que permita às franjas mais carenciadas da sociedade portuguesa terem

o necessário apoio que não condicione a sua dignidade e qualidade de vida.

Ainda assim, é uma falácia que as medidas que acabamos de explicitar no parágrafo anterior só consigam

ser alcançadas pela progressividade do imposto como um fim em si mesmo, pela simples razão de que os

impostos devem constituir um meio de recolha de recursos que, posteriormente, visem permitir a implementação

das necessárias políticas orçamentais de bem-estar de que o País precise.

No entanto, não nos podemos esquecer que os políticos e as suas políticas são sufragados pelos eleitores,

mas a progressividade dos impostos nunca foi uma possibilidade sob a qual os portugueses fossem instados a

manifestar-se, razão pela qual não poderá, nem deverá continuar a ter um carácter obrigatório ou pré-

determinado pela ordem constitucional.

Em Portugal, e uma vez mais a título exemplificativo, a progressividade dos nossos impostos é substancial,

existindo cerca de cinco milhões de agregados declarados para efeitos fiscais, dos quais apenas metade líquida

IRS, o que faz com que apenas 2,5 milhões de agregados acabem por contribuir para a receita gerada pelo

imposto mencionado.

Por outro lado, e na prática, na verdadeira dimensão da progressividade do IRS, 10% do total dos agregados

entregam ao Estado 70% da sua receita líquida em sede IRS, o que não é suportável economicamente e fere

as iniciais ambições fiscais de justiça na tributação, levando a um nível de tributação fortemente penalizador do

rendimento do trabalho que, para além dos escalõesmarginais mais elevados, é ainda agravado pelas

contribuições sociais normalmente a cargo do empregado e do empregador.

Aqui chegados estamos perante uma ilegitimidade democrática da progressividade do imposto, porque a

mesma reveste-se de uma natureza discriminatória, pois o que acontece é que quem mais trabalha é que vai

ser também mais onerado em sede de tributação.

Mesmo face ao argumento de que a utilidade marginal do rendimento diminui à medida que este aumentar,

a verdade é que se mantêm as mais sérias dúvidas de que assim seja, na medida em que a utilidade marginal

de uma rubrica se deve aferir pela comparação à utilidade marginal.

No fundo, o imposto deve ser um meio e nunca um fim. E o fim, sendo as políticas fiscais, não necessitam,

para serem bem-sucedidas, de se alimentar da progressividade fiscal, mas antes uma reconfiguração da política

fiscal promovendo impostos economicamente mais eficientes para o mesmo nível de receita.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Chega, abaixo assinado,

apresenta o seguinte projeto de revisão constitucional:

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Artigo I

O n.º 1 do artigo 104.º, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 104.º

Impostos

1 – O imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e

proporcional, combinado com um nível de isenção tributária a definir em lei especial.

2 – (…).

3 – (…).

4 – (…).»

São Bento, 22 de setembro de 2020.

O Deputado do CH, André Ventura.

PROJECTO DE REVISÃO CONSTITUCIONAL

PELO FIM DA OBRIGATORIEDADE DA FORMA REPUBLICANA DE GOVERNO

Exposição de motivos

A atual redação da República Portuguesa, pese embora preveja como baluartes primordiais da sua conduta

a dignidade da pessoa humana e a vontade popular tendo em vista uma sociedade livre, justa e solidária, não

prevê a possibilidade do povo português discutir a forma de governo vigente.

Não deixa, portanto, de ser curioso que o texto constitucional pareça tirar com uma mão o que dá a entender

garantir com a outra, circunstância que se paradigmático-juridicamente já é difícil de compreender, socialmente

também não encontrará no Portugal de hoje o respaldo quotidiano que à época da sua aprovação se pudessem

eventualmente sentir.

A maturidade de uma nação deve ter como ponto de partida a capacidade dessa mesma nação poder, livre

e responsavelmente decidir qual a forma de governo que pretende que a governe, pelo que se torna premente

proceder a uma revisão constitucional que garanta essa mesma possibilidade o que só é possível com o fim da

obrigatoriedade da forma republicana de governo.

Artigo I

As normas do artigo 1.º e do artigo 108.º, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 1.º

Portugal

1 – Portugal é uma nação soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e

empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

Artigo 108.º

Titularidade e exercício do poder

O poder político e a escolha da forma de governo existente pertencem ao povo e é exercido nos termos

da Constituição.»

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São Bento, 22 de setembro de 2020.

O Deputado do CH, André Ventura.

PROJECTO DE REVISÃO CONSTITUCIONAL

PELA CIRCUNSCRIÇÃO DO CARGO DE PRIMEIRO-MINISTRO E MINISTROS DE ESTADO APENAS

PARA INDIVÍDUOS PORTADORES DE NACIONALIDADE PORTUGUESA ORIGINÁRIA

Exposição de motivos

De 25 de abril de 1974 até aos nossos dias, se é verdade que nalgumas matérias muitos avanços políticos

e económicos foram alcançados, não menos verdade é o facto de que se trilhou um claro caminho de

descredibilização da titularidade da maior parte dos cargos políticos, numa dimensão que chega hoje a ameaçar

grosseiramente a soberania e a identidade nacionais.

Este problema não é apenas sentido no nosso País, pois se olharmos desapaixonadamente para a União

Europeia atual, rapidamente poderemos verificar que o inquestionável poderio económico e financeiro que na

esmagadora maioria dos casos esta permitiu a muitos territórios, contrasta com uma descaracterização

crescente dos traços identitários de cada país.

O critério da igualdade a que todos fomos habituámos a respeitar desde tenra idade tem hoje uma

interpretação bem distinta da que se lhe atribuiu no momento da sua interpretação política originária.

Nos momentos de maior esplendor de desenvolvimento comum, a igualdade apregoada, ensinada,

respeitada e cumprida pelas nações assentava na capacidade de compreender que a igualdade se manifesta

em primeiro lugar no respeito e manutenção da diferença.

Hoje, nos momentos de maior estagnação e opacidade mundial, a igualdade transformou-se apenas num

veículo obscuro e ideologicamente enviesado que pretende obrigar a que se considere igual tudo quanto é

diferente.

Tal entendimento corrói o código genético de qualquer país, mina todos os seus decisores jurídicos e políticos

e conduz, tal como se está a assistir, à abertura de um lastro que permite a qualquer indivíduo chegar a

determinadas funções políticas, sem que primeiro compreenda o que elas, na singeleza do local e povo em que

as exercerá, significam.

Urge dotar as instituições portuguesas das consagrações que lhes permitam estar blindadas a perfis ou

incursões verdadeiramente inaceitáveis ao curso da nossa história e soberania nacionais, pelo que o primeiro

passo deverá passar pela circunscrição do exercício do cargo de primeiro-ministro e ministro da nação apenas

a indivíduos portadores de nacionalidade portuguesa originária, nos critérios em que a mesma é relevada para

as eleições presidenciais.

Desta forma, além de garantir o efeito de blindagem institucional nos moldes em que atrás se referiu, devolve-

se à sistemática eleitoral e política nacional o equilíbrio hoje inexistente.

Artigo I

As normas do artigo 150.º e do artigo 183.º, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 150.º

Condições de elegibilidade

1 – São elegíveis para a Assembleia da República todos os cidadãos portugueses eleitores, salvas as

restrições que a lei eleitoral estabelecer por virtude de incompatibilidades locais ou de exercício de

certos cargos.

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2 – O exercício do cargo de primeiro-ministro e de ministro de Estado está circunscrito a indivíduos

portadores de nacionalidade portuguesa originária.

Artigo 183.º

Composição

1 – O Governo é constituído pelo Primeiro-Ministro, pelos Ministros e pelos Secretários e Subsecretários de

Estado, sendo que o primeiro e segundo cargos neste número previstos só poderão ser exercidos por

indivíduos portadores de nacionalidade portuguesa originária de acordo com o artigo 150.º, n.º 2 da CRP.

2 – (…).

3 – (…).»

São Bento, 22 de setembro de 2020.

O Deputado do CH, André Ventura.

PROJECTO DE REVISÃO CONSTITUCIONAL

PELO FIM DOS LIMITES MATERIAIS DE REVISÃO CONSTITUCIONAL

Artigo I

As normas do artigo 288.º, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 288.º

Limites materiais de revisão

(Eliminado).

São Bento, 22 de setembro de 2020.

O Deputado do CH, André Ventura.

PROJECTO DE REVISÃO CONSTITUCIONAL

PELA INTRODUÇÃO DA PENA ACESSÓRIA DE CASTRAÇÃO QUÍMICA PARA AS CONDUTAS QUE

CONFIGUREM OS CRIMES DE ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS, ABUSO SEXUAL DE MENORES

DEPENDENTES E ACTOS SEXUAIS COM ADOLESCENTES

Exposição de motivos

O Estado de Direito Democrático, mormente pelos avanços iluministas progressivamente alcançados no

términus dos grandes conflitos armados, passou a assentar os seus valores identitários em princípios até então

grosseira e reiteradamente violados, os denominados Direitos, Liberdades e Garantias, onde encontramos entre

outros, o direito à vida, à integridade física, à autodeterminação sexual, à liberdade e à segurança.

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Na verdade, e ainda que a multidisciplinaridade dos tempos modernos apresente às sociedades atuais, aos

governantes e ao próprio direito, uma vasta panóplia de novas condutas criminais que a todos exige uma

redobrada atenção a fenómenos outrora diminutos, não pode ainda assim o legislador negligenciar os princípios

supramencionados que ilustram os seus valores fundadores.

Fazê-lo é negligenciar, no seu âmago e equilíbrio, toda a unidade da ordem jurídica e inclusivamente o bem

jurídico da paz pública.

Nos últimos anos, não porque outrora não existissem, mas porque da sua existência se tinha

indubitavelmente menos conhecimento, acentuou-se a preocupação e a necessidade de reflexão sobre a

criminalidade exercida sobre crianças e menores, destacando-se dentro desta os crimes de natureza sexual.

Nesta matéria, muito acentuado tem sido o debate sobre a eficácia do quadro legislativo vigente em prevenir

e responder aos casos de abuso sexual de menores existentes e evitar que os mesmos ou outros similares se

continuem a verificar um pouco por todo o mundo, debate a que Portugal não ficou, como de resto nunca poderia

ficar, indiferente.

Por todos os considerandos que acima viemos expondo, considera o CHEGA que já é hora de serem tomadas

as medidas necessárias, com a coragem que se deve exigir a quem governa, para que as nossas crianças

estejam de uma vez por todas protegidas do flagelo nocivo da criminalidade sexual contra elas dirigida.

A introdução da possibilidade constitucional da pena acessória de castração química e físico-cirúrgica não

resolverá, por si só, os problemas da criminalidade sexual contra menores. Porém, é um passo dado no sentido

de aumentar os níveis de eficácia na prevenção e punição deste sombrio fenómeno que deixa marcas indeléveis

e vitalícias nas suas vítimas e nos responsabiliza a todos pela proteção das nossas crianças.

Artigo I

As normas do artigo 25.º e 30.º, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 25.º

Direito à integridade pessoal

1 – (…).

2 – (…).

3 – Excetuam-se das limitações acima consideradas a aplicação da pena acessória de castração

química para as condutas que configurem os crimes de violação ou abuso sexual de crianças, abuso

sexual de menores dependentes e atos sexuais com adolescentes.

4 – Em alguns casos especialmente previstos na lei, e nos termos estritos definidos por lei especial,

poderá haver lugar a castração físico-cirúrgica.

Artigo 30.º

Limites das penas e das medidas de segurança

1 – Não pode haver penas nem medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade que violem

os princípios e os valores da Constituição da República Portuguesa.

2 – (…).

3 – (…).

4 – (…).

5 – (…).»

São Bento, 22 de setembro de 2020.

O Deputado do CH, André Ventura.

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PROJECTO DE REVISÃO CONSTITUCIONAL

PELA INTRODUÇÃO DA PENA ACESSÓRIA DE TRABALHO OBRIGATÓRIO PARA OS RECLUSOS

QUE CUMPREM PENA NOS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS PORTUGUESES

Exposição de motivos

Os números dos reclusos atualmente a cumprir penas nos estabelecimentos prisionais portugueses,

significam para a sociedade portuguesa um grande fardo do ponto de vista socioeconómico, pois cada recluso

custa ao Estado cerca de 50 euros por dia, o que significa quase 20 mil euros ao ano, por individuo.

Já os 49 estabelecimentos prisionais (EP) do País custam mais de 250 milhões de euros todos os anos ao

Orçamento do Estado, dinheiro dos impostos dos Portugueses que deveriam ser encaminhados para outras

áreas como a justiça e as forças de segurança, por exemplo.

No entanto, muito mais importante do que estes dados e o seu peso na vida do país estão outros, os que

são demonstrativos de que o número de reclusos que, após cumprirem as suas penas e saindo para o exterior,

voltam a ser condenados, muitas vezes pelas mesmas práticas criminais.

Perante esta realidade urge acautelar soluções para o problema sensibilizando o recluso para aquilo que tem

de ser a sua responsabilidades para com a comunidade, que se vê obrigada a sustentar a sua permanência no

estabelecimento prisional e as responsabilidades perante si próprio face às práticas cometidas que o conduziram

à situação em que se encontra.

Essa consciencialização é essencial para que no momento da sua saída da prisão não se verifique a tal

elevada reincidência criminal, resgatando-se a si e à sua família, por um lado, e à comunidade, por outro.

O mais sólido caminho para esse resgate é, sem qualquer dúvida, o trabalho obrigatório na prisão, pois exige

disciplina e interação, uma ligação à realidade da vida de todos os dias e, assim, o regresso, ou o primeiro

ingresso num mundo em que as responsabilidades são compartilhadas, assumindo o recluso por via do trabalho

toda as suas responsabilidades como cidadão ativamente participante para o bem de toda a sociedade,

sociedade que o sustenta, construindo assim uma verdadeira integração social.

Artigo I

As normas do artigo 30.º, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 30.º

Limites das penas e das medidas de segurança

1 – (…).

2 – (…).

3 – (…).

4 – (…).

5 – (…).

6 – Os condenados a quem sejam aplicadas penas ou medidas privativas de liberdade podem, na sua

decorrência e se assim lhes for imposto pela autoridade administrativa competente, prestar trabalho

obrigatório em prol da sociedade, como forma de compensar os custos inerentes à sua permanência no

sistema prisional.

São Bento, 22 de setembro de 2020.

O Deputado do CH, André Ventura.

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PROJETO DE LEI N.º 516/XIV/2.ª (*)

[TRANSFERE A SEDE DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, DO SUPREMO TRIBUNAL

ADMINISTRATIVO E DA ENTIDADE DAS CONTAS E FINANCIAMENTOS POLÍTICOS PARA A CIDADE

DE COIMBRA, PROCEDENDO À DÉCIMA ALTERAÇÃO À LEI N.º 28/82, DE 15 DE NOVEMBRO (LEI DA

ORGANIZAÇÃO, FUNCIONAMENTO E PROCESSO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL), À DÉCIMA

TERCEIRA ALTERAÇÃO AO ESTATUTO DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS, APROVADO

PELA LEI N.º 13/2002, DE 19 DE FEVEREIRO, E À TERCEIRA ALTERAÇÃO À LEI ORGÂNICA N.º 2/2005,

DE 10 DE JANEIRO (LEI DE ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DA ENTIDADE DAS CONTAS E

FINANCIAMENTOS POLÍTICOS)]

Exposição de motivos

Em 2019, os Partidos mais representativos do sistema político nacional reconheceram que Portugal é

identificado como um dos países da União Europeia com um perfil mais centralizado e centralizador. Este cariz

centralizado e centralizador estende-se igualmente à organização judiciária, sendo disso exemplo o facto de a

sede da generalidade dos altos tribunais se encontrar localizada em Lisboa, incluindo a do Tribunal

Constitucional.

Nesta sequência, importa referir que é reconhecido que o desenvolvimento equilibrado dos vários territórios

passa também por uma adequada distribuição do «mapa judiciário» e que a organização judiciária não pode

ficar à margem de um processo mais abrangente de descentralização e de reorganização e de gestão do Estado,

constituindo também um sinal incontornável da aproximação das instituições aos cidadãos.

Por outro lado, a presente iniciativa assinala um incontornável sinal democrático e político, reforçando a

visibilidade do valor da independência do poder judicial relativamente ao poder político, através da distanciação

geográfica das respetivas sedes.

Nos sistemas comparados, o exemplo mais paradigmático deste valor democrático e político encontramo-lo

no Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, que foi localizado na cidade de Karlsruhe, intencionalmente

deslocada das outras instituições federais, designadamente da sede do Governo.

Entre nós, em Portugal, para além dos Tribunais da Relação e do Tribunal Central Administrativo do Norte,

o Tribunal da Concorrência, da Regulação e Supervisão, com sede em Santarém, constitui a experiência mais

recente de um percurso a pressupor e a exigir um processo mais amplo e aprofundado.

Retomando o caminho delineado em 2019, impõe-se dar um passo mais ambicioso no processo de

descentralização das instituições do Estado, alargando esse processo à localização territorial da sede do

Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Constitucional.

A cidade de Coimbra, pela sua centralidade geográfica e pela sua indelével característica de «Cidade

Universitária» e representatividade, no plano nacional e internacional, no ensino do Direito, dispondo hoje,

inclusivamente, de um centro inigualável e especificamente vocacionado ao estudo da jurisprudência – a Casa

da Jurisprudência da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra –, reúne condições ímpares para acolher

a sede do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativo.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do PSD, abaixo assinados,

apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei transfere a sede do Tribunal Constitucional, do Supremo Tribunal Administrativo e da Entidade

das Contas e Financiamentos Políticos para a cidade de Coimbra, procedendo à:

a) Décima alteração à Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo

do Tribunal Constitucional), alterada pelas Leis n.os 143/85, de 26 de novembro, 85/89, de 7 de setembro, 88/95,

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de 1 de setembro, e 13-A/98, de 26 de fevereiro, e pelas Leis Orgânicas n.os 1/2011, de 30 de novembro, 5/2015,

de 10 de abril, 11/2015, de 28 de agosto, 1/2018, de 19 de abril, e 4/2019, de 13 de setembro;

b) Décima terceira alteração ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º

13/2002, de 19 de fevereiro, alterada pelas Leis n.os 4-A/2003, de 19 de fevereiro, 107-D/2003, de 31 de

dezembro, 1/2008, de 14 de janeiro, 2/2008, de 14 de janeiro, 26/2008, de 27 de junho, 52/2008, de 28 de

agosto, e 59/2008, de 11 de setembro, pelo Decreto-Lei n.º 166/2009, de 31 de julho, e pelas Leis n.os 55-A/2010,

de 31 de dezembro, e 20/2012, de 14 de maio, pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, e pela Lei n.º

114/2019, de 12 de setembro;

c) Terceira alteração à Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de janeiro (Lei de Organização e Funcionamento da

Entidade das Contas e Financiamentos Políticos), alterada pela Lei Orgânica n.º 1/2018, de 19 de abril, e pela

Lei n.º 71/2019, de 31 de dezembro.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 28/82, de 15 de novembro

O artigo 1.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 1.º

Jurisdição e sede

O Tribunal Constitucional exerce a sua jurisdição no âmbito de toda a ordem jurídica portuguesa e tem sede

em Coimbra.»

Artigo 3.º

Alteração ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais

O artigo 11.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de

fevereiro, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 11.º

Sede, jurisdição e funcionamento

1 – […].

2 – O Supremo Tribunal Administrativo tem sede em Coimbra e jurisdição em todo o território nacional.»

Artigo 4.º

Alteração à Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de janeiro

O artigo 4.º da Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de janeiro, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 4.º

Sede

A Entidade tem sede em Coimbra, podendo funcionar em instalações do Tribunal Constitucional.»

Artigo 5.º

Transferência e instalação

1 – O processo de transferência e instalação, em Coimbra, da sede do Tribunal Constitucional, do Supremo

Tribunal Administrativo e da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos inicia-se na data da entrada em

vigor da presente lei, ficando definitivamente concluído até ao final do ano de 2022.

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2 – O processo referido no número anterior é acompanhado e monitorizado por uma comissão constituída

por prestigiadas personalidades nacionais, de profissões jurídicas e não jurídicas, a designar pelo membro do

Governo responsável pela área da Justiça, no prazo de trinta dias a contar da entrada em vigor da presente lei.

Artigo 6.º

Mobilidade

1 – Aos trabalhadores com vínculo de emprego público por tempo indeterminado dos mapas de pessoal do

Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativos aplicam-se os instrumentos de mobilidade

previstos na Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, e da Lei

n.º 25/2017, de 30 de maio, que aprova o regime de valorização profissional dos trabalhadores com vínculo de

emprego público, sem prejuízo de outros instrumentos de mobilidade previstos em legislação especialmente

aplicável.

2 – Os trabalhadores abrangidos pelo número anterior que adiram, imediata e voluntariamente, à

transferência para a cidade de Coimbra beneficiam do regime previsto no artigo 24.º da Lei n.º 25/2017, de 30

de maio.

Artigo 7.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 21 de setembro de 2020.

Os Deputados do PSD: Rui Rio — Adão Silva — António Maló de Abreu – Mónica Quintela – Paulo Leitão –

Filipa Roseta – Luís Leite Ramos – Álvaro Almeida – Emília Cerqueira – Jorge Salgueiro Mendes – Maria

Germana Rocha – Paulo Moniz – Alberto Fonseca – Bruno Coimbra – Hugo Carneiro – Eduardo Teixeira – Olga

Silvestre – Carla Madureira – Carlos Alberto Gonçalves – Lina Lopes – João Gomes Marques – Cláudia André

– Maria Gabriela Fonseca – André Coelho Lima – Hugo Patrício Oliveira – José Cancela Moura – Sara Madruga

da Costa – Sofia Matos – Rui Cristina – Luís Marques Guedes – António Cunha – Cláudia Bento – Ofélia Ramos

– Pedro Roque – Fernanda Velez – Nuno Miguel Carvalho – Isabel Meireles – Ana Miguel dos Santos — Catarina

Rocha Ferreira — Carla Borges.

(*) Texto inicial substituído a pedido do autor da iniciativa a 21 de setembro de 2020 [Vide DAR II Série-A n.º 3 (2020.09.18].

————

PROJETO DE LEI N.º 518/XIV/2.ª

AMPLIA AS FONTES DE FINANCIAMENTO DA SEGURANÇA SOCIAL

(Texto inicial do projeto de lei)

Exposição de motivos

I

O sistema público de segurança social, universal e solidário é um instrumento insubstituível de promoção de

justiça social na distribuição do rendimento nacional a todos os portugueses.

Este sistema público, universal e solidário concretiza as suas finalidades através do regime contributivo, do

regime não contributivo e da ação social, desempenhando estas diferentes modalidades uma função

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complementar entre si, que permite estender a proteção social a um conjunto mais vasto de eventualidades e

de situações de risco.

O sistema previdencial, ou contributivo, assente na solidariedade profissional e intergeracional, visa

assegurar prestações substitutivas de rendimentos perdidos em situações como a doença, desemprego,

parentalidade, invalidez, velhice e morte. O sistema de proteção social de cidadania, ou não contributivo, assente

na solidariedade nacional, visa garantir direitos básicos dos cidadãos.

No período entre 2010 e 2015 o sistema público foi sujeito pela política de direita a um acelerado processo

de fragilização que reduziu o direito à segurança social, corroeu a sua base de financiamento, promoveu o

conflito de gerações e estereótipos sobre os beneficiários, sendo particularmente visados as pessoas idosas, os

desempregados e os beneficiários de prestações sociais não contributivas.

Este ataque foi justificado pelos seus mentores e executores como inevitável para garantir a sustentabilidade

financeira da Segurança Social face aos impactos da crise, à necessidade de redução do défice e aos fatores

demográficos.

Mas na verdade o que se mostrou insustentável foram os PEC, o Pacto de Agressão e a política de

exploração e de empobrecimento dos trabalhadores, do povo e do país que colocaram o sistema público de

Segurança Social ao serviço de uma política económica contrária aos interesses do país, ditada pelos interesses

do grande capital e ao processo de concentração da riqueza. Insustentável mostrou-se a redução de direitos de

Segurança Social que contribuiu para aumentar a espiral de empobrecimento que devastou o país e o tornou

mais pobre, desigual e injusto.

Não foram as despesas com as prestações sociais que se tornaram incomportáveis para o sistema público

de Segurança Social. Incomportáveis tornaram-se os impactos financeiros sobre o regime previdencial

resultantes do fecho de empresas, da redução do número de trabalhadores no ativo, face ao alastramento do

desemprego e da emigração, designadamente de jovens, da proliferação da precariedade e dos baixos salários.

A estes somaram-se as consequências da inércia e cumplicidade perante o elevado volume de divida a este

regime e o uso das suas receitas para fins alheios às suas finalidades.

Este ataque visou de forma premeditada fazer refletir no sistema o aprofundamento das desigualdades da

riqueza e dos rendimentos.

Na verdade, o anterior Governo PSD/CDS procurou aproveitar a oportunidade para implementar o seu projeto

programático de transformar o sistema público de Segurança Social, universal e solidário num sistema público

residual, assistencialista, minimalista e assente na seletividade na atribuição do conjunto de prestações sociais.

II

A evolução registada em 2016, 2017 e em 2018, na sequência do afastamento do PSD/CDS do Governo e

o caminho de reposição de rendimentos e direitos pelo qual o PCP se tem batido, evidencia que o caminho a

trilhar é a adoção de medidas que garantam mais e melhor Segurança Social, pública, universal e solidária.

Neste período há melhorias de entre as quais se destacam: a atualização extraordinária das pensões e a

reposição do mecanismo de atualização das pensões; a criação de uma medida extraordinária de apoio aos

desempregados de longa duração; a melhoria das prestações familiares; o descongelamento do Indexante de

Apoios Sociais; a melhoria de prestações sociais não contributivas, incluindo o Rendimento Social de Inserção;

a reavaliação do regime de pensões antecipadas, sendo desde já garantida a eliminação de qualquer

penalização para as muito longas carreiras contributivas. São medidas que o PCP valoriza sem deixar de

sublinhar a sua insuficiência.

Esta reposição e reforço de direitos verifica-se em paralelo com uma clara melhoria global da situação

financeira em que se destacam o forte crescimento das contribuições e a diminuição da despesa com a proteção

social no desemprego resultante da redução do desemprego.

Assinalam-se ainda sinais positivos quanto à reposição de rendimentos e direitos inerentes ao regime não

contributivo da Segurança Social a que deve ser dada continuidade, com reforço das transferências do

Orçamento do Estado para este regime visando repor rendimentos e direitos confiscados pelo anterior Governo

e estabelecendo critérios de justiça na atribuição de apoios e prestações sociais que lhe são inerentes.

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22 DE SETEMBRO DE 2020

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III

O compromisso do PCP para com a reposição de rendimentos e direitos de segurança social que

naturalmente implicam o aumento de despesa é acompanhado por propostas que visam o aprofundamento do

financiamento do sistema público de segurança social.

Para o PCP a discussão sobre a sustentabilidade da segurança social é bastante pertinente e absolutamente

necessária. Uma discussão que não nega os impactos na segurança social dos fatores demográficos. Contudo,

eles não podem ser instrumentalizados, nem tão pouco absolutizados.

As quebras de natalidade e o aumento da população idosa não podem legitimar políticas de redução de

direitos de segurança social. O declínio demográfico é um problema do país. O Inquérito à Fecundidade

realizado pelo INE revela dois aspetos fundamentais: primeiro, as famílias desejam ter filhos, num número que

permite a renovação das gerações; segundo, a medida considerada mais importante é aumentar o rendimento

das famílias com filhos.

São, pois, necessárias medidas integradas que promovam os rendimentos e a sua estabilidade, melhorando

as expectativas das pessoas quanto ao futuro; que reforcem os direitos dos trabalhadores ao longo do ciclo de

vida; que apoiem a conciliação família-trabalho, sendo um ponto crítico o aumento da taxa de cobertura dos

equipamentos e serviços dirigidos à infância.

Na verdade, é necessário ter em conta os fatores económicos e de distribuição da riqueza entre o capital e

o trabalho. E, nestes domínios, está muito longe de estar devidamente potenciado o aumento de receitas para

o regime previdencial resultantes:

• Da valorização dos salários e do salário mínimo nacional – a parte dos salários e ordenados no PIB é

cada vez mais reduzida. Em 2001 representava 38,7% do PIB e, em 2016, apenas 34,4%. A redução das

contribuições que daqui resulta tem impactos negativos na Segurança Social, que têm de ser invertidos;

• Da redução nas receitas e do agravamento da despesa com o subsídio de desemprego na segurança

social não obstante a política de direita ter optado pela redução da proteção social no desemprego de milhares

de trabalhadores, que não têm nem trabalho, nem subsídio de desemprego. Para o PCP é fundamental

assegurar uma adequada proteção destes trabalhadores, sem deixar de ter como meta o pleno emprego;

• Do elevado volume de dívida e da persistência da fraude e da evasão contributiva;

• Das medidas de isenções e da redução da TSU as quais devem ser reavaliadas.

O projeto de lei que apresentamos visa a diversificação das fontes de financiamento do regime previdencial

que permita a obtenção de receitas suplementares às que já se obtêm atualmente com as contribuições dos

salários.

Uma contribuição que garanta a diversificação das fontes de financiamento do regime previdencial ancorado

no princípio da contributividade. As contribuições para este regime devem não só incidir sobre os salários, mas

considerar igualmente o valor gerado na atividade económica.

IV

Assim, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o presente projeto de lei, que prevê uma contribuição

complementar das empresas que têm mais lucros, mas que contribuem pouco para a Segurança Social tendo

em conta a riqueza líquida refletida no Valor Acrescentado Líquido (VAL), o que permitirá incentivar a criação

de emprego, reequilibrar as condições de desenvolvimento da atividade económica e assegurar a

sustentabilidade do sistema público de Segurança Social a curto, médio e longo prazo.

Desta forma, coloca-se a riqueza produzida a contribuir para o financiamento do regime contributivo e para

a sustentabilidade do sistema de segurança social.

De facto, a manutenção das contribuições das empresas calculadas com base nas remunerações pagas

determina que uma parte do valor gerado pelas empresas escape ao pagamento de quaisquer contribuições.

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Consideramos, portanto, que a presente contribuição complementar deve abranger todas as entidades

patronais responsáveis pelo pagamento à segurança social das contribuições dos trabalhadores ao seu serviço,

apenas sendo excluídas as Administrações Públicas e as entidades sem fins lucrativos, na medida em que não

geram lucros.

De facto, considerando que a proposta que ora se apresenta não se concretiza na substituição das

contribuições sobre os salários por esta contribuição sobre o VAL, mas sim na aplicação desta taxa à diferença

entre esta e aquela. As empresas que já contribuem muito para a segurança social através do modelo atual

(apurado através das contribuições sobre as remunerações), designadamente as micro, pequenas e médias

empresas, nada ou pouco mais terão a entregar à segurança social.

O regime agora proposto pelo PCP traduz-se em benefícios óbvios, quer para os trabalhadores beneficiários,

quer para o financiamento e sustentabilidade da segurança social, introduzindo elementos acrescidos de justiça

social pela afetação de parte da riqueza criada ao financiamento da segurança social.

Desta forma, defende-se o alargamento das contribuições à riqueza criada pelas empresas, num regime de

complementaridade relativamente às contribuições baseadas em salários. Esta contribuição adicional das

empresas tem, nomeadamente, em conta:

• As contribuições devem ser calculadas com base não apenas dos salários, mas nas outras componentes

do valor acrescentado;

• A crescente desconexão entre a riqueza criada pelas empresas (o valor acrescentado) e a parte dessa

riqueza sujeita a descontos para a segurança social – apesar da base de cálculo das contribuições (os salários)

estar a diminuir em percentagem da riqueza criada, isto não significa que a riqueza anualmente criada o esteja.

O que está a acontecer é que uma parcela cada vez maior da riqueza criada escapa ao pagamento de

contribuições;

• A evolução tecnológica em curso conduz a que cada vez mais a riqueza possa ser produzida com a

utilização de uma força de trabalho muito restrita – atualmente as empresas que produzem mais riqueza são as

de capital e conhecimento intensivo e já não, como antigamente, as de trabalho intensivo.

V

Para o PCP, a inversão da atual política passa pela valorização do trabalho, o que exige o pleno emprego e

a melhoria da parte nos salários no rendimento nacional, e pela extensão da base de cálculo das contribuições

ao valor acrescentado líquido das empresas.

A criação de uma taxa sobre o valor acrescentado líquido (VAL) das empresas aplicada de forma

complementar à contribuição sobre os salários, teria as seguintes vantagens:

• Mantém os salários como base de incidência contributiva, pelo que não se põem em causa as receitas

que atualmente são recebidas;

• Não recorre a impostos para o financiamento do sistema previdencial, ou seja, não promove a quebra ou

enfraquecimento de princípios fundamentais do sistema, designadamente do princípio da contributividade, nem

incentiva a quebra na relação entre os salários e as prestações e o enfraquecimento da solidariedade;

• Não penaliza o investimento já que, por definição, o VAL deduz o consumo de capital fixo;

• É menos penalizador das empresas de trabalho intensivo relativamente às de capital intensivo, em termos

relativos.

Assim, no cumprimento destes objetivos, o presente projeto de lei concretiza as seguintes opções:

• Durante o ano, mensalmente, as empresas entregam à Segurança Social as contribuições patronais

aplicando à totalidade dos «ordenados e salários» a taxa de 23,75%, e as contribuições dos trabalhadores

aplicando a taxa de 11%, ou seja, fazendo o mesmo que fazem atualmente;

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• No ano seguinte, a segurança social, com base em dados fornecidos pela administração fiscal – que

constam do Modelo 22 enviado à administração fiscal até maio do ano seguinte, e da Informação Empresarial

Simplificada (IES) entregue até julho do ano seguinte – calcula o VAL de cada empresa, aplicando depois a este

uma taxa de 10,5%;

• Se a soma das contribuições patronais pagas pela empresa durante o ano anterior calculadas com base

nos «ordenados e salários» for superior ao valor obtido aplicando a taxa sobre o VAL fixada para esse mesmo

ano, a empresa não tem de pagar mais à segurança social;

• Se a soma das contribuições patronais pagas pela empresa durante o ano anterior, calculadas aplicando

a taxa de 23,75% aos «ordenados e salários», for inferior ao valor que se obtém aplicando a taxa sobre o VAL

que foi fixada, então a empresa paga à segurança social a diferença em falta;

Esta é a verdadeira alternativa, que confirma que há soluções para preservar o caráter público, universal e

solidário da segurança social.

A segurança social não é de nenhum governo, é dos trabalhadores e do povo, e para o PCP a defesa e

reforço da segurança social é um dos aspetos fundamentais para construir uma sociedade mais justa e solidária.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei visa o reforço da sustentabilidade financeira do sistema previdencial da segurança social

através da ampliação e aprofundamento da sua capacidade de obtenção de receita suplementar, de forma a

complementar a receita que se obtém com as contribuições sobre as remunerações.

Artigo 2.º

Âmbito objetivo

Para cumprimento da finalidade definida no artigo anterior, a presente lei procede à criação de uma

contribuição complementar às contribuições incidentes sobre as remunerações, assente no estabelecimento de

uma taxa a aplicar sobre o valor acrescentado líquido das entidades empregadoras.

Artigo 3.º

Âmbito subjetivo

1 – São abrangidas pela presente lei todas as entidades empregadoras responsáveis pelo pagamento à

Segurança Social das contribuições e das quotizações dos trabalhadores ao seu serviço.

2 – Excluem-se da aplicação da presente lei as entidades empregadoras no âmbito da administração direta,

central ou periférica, da administração indireta do Estado, da administração regional, da administração autónoma

e do sector público empresarial.

3 –Estão igualmente excluídas da aplicação da presente lei todas as entidades sem fins lucrativos.

Artigo 4.º

Apuramento da contribuição complementar sobre o VAL

1 – A Autoridade Tributária e a Aduaneira, com base nos dados comunicados pelas entidades patronais com

a entrega do «Modelo 22» e da «Informação Empresarial Simplificada» (IES), procede ao apuramento do Valor

Acrescentado Líquido de cada entidade patronal e comunica essa informação à segurança social até ao fim do

ano civil.

2 – A contribuição complementar de cada empresa é calculada pela Segurança Social, que aplica uma taxa

de 10,5% ao valor apurado nos termos do n.º 1.

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Artigo 5.º

Cumprimento da obrigação contributiva

1 – Nos termos da legislação aplicável, as entidades patronais mantêm a obrigação de proceder ao

pagamento das contribuições mensais devidas, apuradas pela aplicação das taxas legalmente previstas às

remunerações que, nos termos da lei, constituam base de incidência contributiva.

2 – No final de cada ano deve ser efetuado pela segurança social o apuramento do valor resultante do

somatório das contribuições entregues nos termos do número anterior, após ao que procede à comparação com

o valor resultante da aplicação da fórmula definida no n.º 2 do artigo 4.º.

3 – Se o valor obtido com base na fórmula definida no n.º 2 do presente artigo for superior ao somatório anual

das contribuições entregues pela entidade empregadora efetuado nos termos do n.º 1, a entidade empregadora

deve proceder ao pagamento, até ao final do primeiro semestre do ano seguinte àquele a que respeitam as

contribuições, do montante correspondente à diferença apurada entre estes dois valores.

4 – Se o valor obtido com base na fórmula definida no n.º 2 do presente artigo for inferior ao somatório anual

das contribuições entregues pela entidade empregadora efetuado nos termos do n.º 1, não será devido mais

nenhum pagamento de contribuições por parte da entidade empregadora.

Artigo 6.º

Cumprimento da obrigação contributiva

1 – No prazo de dois anos após a sua entrada em vigor, o Instituto de Gestão Financeira da Segurança

Social, IP (IGFSS) deve fornecer à Assembleia da República um relatório detalhado da avaliação do impacto da

aplicação da presente lei.

2 – O relatório referido no número anterior deve assumir periodicidade bienal, podendo o valor da taxa

estabelecida no artigo 4.º ser ajustado de acordo com a avaliação efetuada.

Artigo 7.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 21 de setembro de 2020.

(Texto inicial alterado do projeto de lei)

Exposição de motivos

I

O sistema público de segurança social, universal e solidário é um instrumento insubstituível de promoção de

justiça social na distribuição do rendimento nacional a todos os portugueses.

Este sistema público, universal e solidário concretiza as suas finalidades através do regime contributivo, do

regime não contributivo e da ação social, desempenhando estas diferentes modalidades uma função

complementar entre si, que permite estender a proteção social a um conjunto mais vasto de eventualidades e

de situações de risco.

O sistema previdencial, ou contributivo, assente na solidariedade profissional e intergeracional, visa

assegurar prestações substitutivas de rendimentos perdidos em situações como a doença, desemprego,

parentalidade, invalidez, velhice e morte. O sistema de proteção social de cidadania, ou não contributivo, assente

na solidariedade nacional, visa garantir direitos básicos dos cidadãos.

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No período entre 2010 e 2015 o sistema público foi sujeito pela política de direita a um acelerado processo

de fragilização que reduziu o direito à segurança social, corroeu a sua base de financiamento, promoveu o

conflito de gerações e estereótipos sobre os beneficiários, sendo particularmente visados as pessoas idosas, os

desempregados e os beneficiários de prestações sociais não contributivas.

Este ataque foi justificado pelos seus mentores e executores como inevitável para garantir a sustentabilidade

financeira da Segurança Social face aos impactos da crise, à necessidade de redução do défice e aos fatores

demográficos.

Mas na verdade o que se mostrou insustentável foram os PEC, o Pacto de Agressão e a política de

exploração e de empobrecimento dos trabalhadores, do povo e do País que colocaram o sistema público de

Segurança Social ao serviço de uma política económica contrária aos interesses do país, ditada pelos interesses

do grande capital e ao processo de concentração da riqueza. Insustentável mostrou-se a redução de direitos de

segurança social que contribuiu para aumentar a espiral de empobrecimento que devastou o País e o tornou

mais pobre, desigual e injusto.

Não foram as despesas com as prestações sociais que se tornaram incomportáveis para o sistema público

de Segurança Social. Incomportáveis tornaram-se os impactos financeiros sobre o regime previdencial

resultantes do fecho de empresas, da redução do número de trabalhadores no ativo, face ao alastramento do

desemprego e da emigração, designadamente de jovens, da proliferação da precariedade e dos baixos salários.

A estes somaram-se as consequências da inércia e cumplicidade perante o elevado volume de divida a este

regime e o uso das suas receitas para fins alheios às suas finalidades.

Este ataque visou de forma premeditada fazer refletir no sistema o aprofundamento das desigualdades da

riqueza e dos rendimentos.

Na verdade, o anterior Governo PSD/CDS procurou aproveitar a oportunidade para implementar o seu projeto

programático de transformar o sistema público de Segurança Social, universal e solidário num sistema público

residual, assistencialista, minimalista e assente na seletividade na atribuição do conjunto de prestações sociais.

II

A evolução registada em 2016, 2017 e em 2018, na sequência do afastamento do PSD/CDS do Governo e

o caminho de reposição de rendimentos e direitos pelo qual o PCP se tem batido, evidencia que o caminho a

trilhar é a adoção de medidas que garantam mais e melhor segurança social, pública, universal e solidária.

Neste período há melhorias de entre as quais se destacam: a atualização extraordinária das pensões e a

reposição do mecanismo de atualização das pensões; a criação de uma medida extraordinária de apoio aos

desempregados de longa duração; a melhoria das prestações familiares; o descongelamento do Indexante de

Apoios Sociais; a melhoria de prestações sociais não contributivas, incluindo o Rendimento Social de Inserção;

a reavaliação do regime de pensões antecipadas, sendo desde já garantida a eliminação de qualquer

penalização para as muito longas carreiras contributivas. São medidas que o PCP valoriza sem deixar de

sublinhar a sua insuficiência.

Esta reposição e reforço de direitos verifica-se em paralelo com uma clara melhoria global da situação

financeira em que se destacam o forte crescimento das contribuições e a diminuição da despesa com a proteção

social no desemprego resultante da redução do desemprego.

Assinalam-se ainda sinais positivos quanto à reposição de rendimentos e direitos inerentes ao regime não

contributivo da segurança social a que deve ser dada continuidade, com reforço das transferências do

Orçamento do Estado para este regime visando repor rendimentos e direitos confiscados pelo anterior Governo

e estabelecendo critérios de justiça na atribuição de apoios e prestações sociais que lhe são inerentes.

III

O compromisso do PCP para com a reposição de rendimentos e direitos de segurança social que

naturalmente implicam o aumento de despesa é acompanhado por propostas que visam o aprofundamento do

financiamento do sistema público de segurança social.

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Para o PCP a discussão sobre a sustentabilidade da segurança social é bastante pertinente e absolutamente

necessária. Uma discussão que não nega os impactos na segurança social dos fatores demográficos. Contudo,

eles não podem ser instrumentalizados, nem tão pouco absolutizados.

As quebras de natalidade e o aumento da população idosa não podem legitimar políticas de redução de

direitos de segurança social. O declínio demográfico é um problema do País. O Inquérito à Fecundidade

realizado pelo INE revela dois aspetos fundamentais: primeiro, as famílias desejam ter filhos, num número que

permite a renovação das gerações; segundo, a medida considerada mais importante é aumentar o rendimento

das famílias com filhos.

São, pois, necessárias medidas integradas que promovam os rendimentos e a sua estabilidade, melhorando

as expectativas das pessoas quanto ao futuro; que reforcem os direitos dos trabalhadores ao longo do ciclo de

vida; que apoiem a conciliação família-trabalho, sendo um ponto crítico o aumento da taxa de cobertura dos

equipamentos e serviços dirigidos à infância.

Na verdade, é necessário ter em conta os fatores económicos e de distribuição da riqueza entre o capital e

o trabalho. E, nestes domínios, está muito longe de estar devidamente potenciado o aumento de receitas para

o regime previdencial resultantes:

• Da valorização dos salários e do salário mínimo nacional – a parte dos salários e ordenados no PIB é

cada vez mais reduzida. Em 2001 representava 38,7% do PIB e, em 2016, apenas 34,4%. A redução das

contribuições que daqui resulta tem impactos negativos na Segurança Social, que têm de ser invertidos;

• Da redução nas receitas e do agravamento da despesa com o subsídio de desemprego na segurança

social não obstante a política de direita ter optado pela redução da proteção social no desemprego de milhares

de trabalhadores, que não têm nem trabalho, nem subsídio de desemprego. Para o PCP é fundamental

assegurar uma adequada proteção destes trabalhadores, sem deixar de ter como meta o pleno emprego;

• Do elevado volume de dívida e da persistência da fraude e da evasão contributiva;

• Das medidas de isenções e da redução da TSU as quais devem ser reavaliadas.

O projeto de lei que apresentamos visa a diversificação das fontes de financiamento do regime previdencial

que permita a obtenção de receitas suplementares às que já se obtêm atualmente com as contribuições dos

salários.

Uma contribuição que garanta a diversificação das fontes de financiamento do regime previdencial ancorado

no princípio da contributividade. As contribuições para este regime devem não só incidir sobre os salários, mas

considerar igualmente o valor gerado na atividade económica.

IV

Assim, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o presente projeto de lei, que prevê uma contribuição

complementar das empresas que têm mais lucros, mas que contribuem pouco para a Segurança Social tendo

em conta a riqueza líquida refletida no Valor Acrescentado Líquido (VAL), o que permitirá incentivar a criação

de emprego, reequilibrar as condições de desenvolvimento da atividade económica e assegurar a

sustentabilidade do sistema público de Segurança Social a curto, médio e longo prazo.

Desta forma, coloca-se a riqueza produzida a contribuir para o financiamento do regime contributivo e para

a sustentabilidade do sistema de segurança social.

De facto, a manutenção das contribuições das empresas calculadas com base nas remunerações pagas

determina que uma parte do valor gerado pelas empresas escape ao pagamento de quaisquer contribuições.

Consideramos, portanto, que a presente contribuição complementar deve abranger todas as entidades

patronais responsáveis pelo pagamento à Segurança Social das contribuições dos trabalhadores ao seu serviço,

apenas sendo excluídas as Administrações Públicas e as entidades sem fins lucrativos, na medida em que não

geram lucros.

De facto, considerando que a proposta que ora se apresenta não se concretiza na substituição das

contribuições sobre os salários por esta contribuição sobre o VAL, mas sim na aplicação desta taxa à diferença

entre esta e aquela. As empresas que já contribuem muito para a Segurança Social através do modelo atual

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(apurado através das contribuições sobre as remunerações), designadamente as micro, pequenas e médias

empresas, nada ou pouco mais terão a entregar à segurança social.

O regime agora proposto pelo PCP traduz-se em benefícios óbvios, quer para os trabalhadores beneficiários,

quer para o financiamento e sustentabilidade da Segurança Social, introduzindo elementos acrescidos de justiça

social pela afetação de parte da riqueza criada ao financiamento da segurança social.

Desta forma, defende-se o alargamento das contribuições à riqueza criada pelas empresas, num regime de

complementaridade relativamente às contribuições baseadas em salários. Esta contribuição adicional das

empresas tem, nomeadamente, em conta:

• As contribuições devem ser calculadas com base não apenas dos salários, mas nas outras componentes

do valor acrescentado;

• A crescente desconexão entre a riqueza criada pelas empresas (o valor acrescentado) e a parte dessa

riqueza sujeita a descontos para a segurança social – apesar da base de cálculo das contribuições (os salários)

estar a diminuir em percentagem da riqueza criada, isto não significa que a riqueza anualmente criada o esteja.

O que está a acontecer é que uma parcela cada vez maior da riqueza criada escapa ao pagamento de

contribuições;

• A evolução tecnológica em curso conduz a que cada vez mais a riqueza possa ser produzida com a

utilização de uma força de trabalho muito restrita – atualmente as empresas que produzem mais riqueza são as

de capital e conhecimento intensivo e já não, como antigamente, as de trabalho intensivo.

V

Para o PCP, a inversão da atual política passa pela valorização do trabalho, o que exige o pleno emprego e

a melhoria da parte nos salários no rendimento nacional, e pela extensão da base de cálculo das contribuições

ao valor acrescentado líquido das empresas.

A criação de uma taxa sobre o valor acrescentado líquido (VAL) das empresas aplicada de forma

complementar à contribuição sobre os salários, teria as seguintes vantagens:

• Mantém os salários como base de incidência contributiva, pelo que não se põem em causa as receitas

que atualmente são recebidas;

• Não recorre a impostos para o financiamento do sistema previdencial, ou seja, não promove a quebra ou

enfraquecimento de princípios fundamentais do sistema, designadamente do princípio da contributividade, nem

incentiva a quebra na relação entre os salários e as prestações e o enfraquecimento da solidariedade;

• Não penaliza o investimento já que, por definição, o VAL deduz o consumo de capital fixo;

• É menos penalizador das empresas de trabalho intensivo relativamente às de capital intensivo, em termos

relativos.

Assim, no cumprimento destes objetivos, o presente projeto de lei concretiza as seguintes opções:

• Durante o ano, mensalmente, as empresas entregam à segurança social as contribuições patronais

aplicando à totalidade dos «ordenados e salários» a taxa de 23,75%, e as contribuições dos trabalhadores

aplicando a taxa de 11%, ou seja, fazendo o mesmo que fazem atualmente;

• No ano seguinte, a segurança social, com base em dados fornecidos pela administração fiscal – que

constam do Modelo 22 enviado à administração fiscal até maio do ano seguinte, e da Informação Empresarial

Simplificada (IES) entregue até julho do ano seguinte – calcula o VAL de cada empresa, aplicando depois a este

uma taxa de 10,5%;

• Se a soma das contribuições patronais pagas pela empresa durante o ano anterior calculadas com base

nos «ordenados e salários» for superior ao valor obtido aplicando a taxa sobre o VAL fixada para esse mesmo

ano, a empresa não tem de pagar mais à segurança social;

• Se a soma das contribuições patronais pagas pela empresa durante o ano anterior, calculadas aplicando

a taxa de 23,75% aos «ordenados e salários», for inferior ao valor que se obtém aplicando a taxa sobre o VAL

que foi fixada, então a empresa paga à segurança social a diferença em falta;

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Esta é a verdadeira alternativa, que confirma que há soluções para preservar o caráter público, universal e

solidário da segurança social.

A segurança social não é de nenhum Governo, é dos trabalhadores e do povo, e para o PCP a defesa e

reforço da segurança social é um dos aspetos fundamentais para construir uma sociedade mais justa e solidária.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei visa o reforço da sustentabilidade financeira do sistema previdencial da segurança social

através da ampliação e aprofundamento da sua capacidade de obtenção de receita suplementar, de forma a

complementar a receita que se obtém com as contribuições sobre as remunerações.

Artigo 2.º

Âmbito objetivo

Para cumprimento da finalidade definida no artigo anterior, a presente lei procede à criação de uma

contribuição complementar às contribuições incidentes sobre as remunerações, assente no estabelecimento de

uma taxa a aplicar sobre o valor acrescentado líquido das entidades empregadoras.

Artigo 3.º

Âmbito subjetivo

1 – São abrangidas pela presente lei todas as entidades empregadoras responsáveis pelo pagamento à

Segurança Social das contribuições e das quotizações dos trabalhadores ao seu serviço.

2 – Excluem-se da aplicação da presente lei as entidades empregadoras no âmbito da administração direta,

central ou periférica, da administração indireta do Estado, da administração regional, da administração autónoma

e do sector público empresarial.

3 –Estão igualmente excluídas da aplicação da presente lei todas as entidades sem fins lucrativos.

Artigo 4.º

Apuramento da contribuição complementar sobre o VAL

1 – A Autoridade Tributária e a Aduaneira, com base nos dados comunicados pelas entidades patronais com

a entrega do «Modelo 22» e da «Informação Empresarial Simplificada» (IES), procede ao apuramento do Valor

Acrescentado Líquido de cada entidade patronal e comunica essa informação à segurança social até ao fim do

ano civil.

2 – A contribuição complementar de cada empresa é calculada pela segurança social, que aplica uma taxa

de 10,5% ao valor apurado nos termos do n.º 1.

Artigo 5.º

Cumprimento da obrigação contributiva

1 – Nos termos da legislação aplicável, as entidades patronais mantêm a obrigação de proceder ao

pagamento das contribuições mensais devidas, apuradas pela aplicação das taxas legalmente previstas às

remunerações que, nos termos da lei, constituam base de incidência contributiva.

2 – No final de cada ano deve ser efetuado pela Segurança Social o apuramento do valor resultante do

somatório das contribuições entregues nos termos do número anterior, após ao que procede à comparação com

o valor resultante da aplicação da fórmula definida no n.º 2 do artigo 4.º.

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22 DE SETEMBRO DE 2020

21

3 – Se o valor obtido com base na fórmula definida no n.º 2 do presente artigo for superior ao somatório anual

das contribuições entregues pela entidade empregadora efetuado nos termos do n.º 1, a entidade empregadora

deve proceder ao pagamento, até ao final do primeiro semestre do ano seguinte àquele a que respeitam as

contribuições, do montante correspondente à diferença apurada entre estes dois valores.

4 – Se o valor obtido com base na fórmula definida no n.º 2 do presente artigo for inferior ao somatório anual

das contribuições entregues pela entidade empregadora efetuado nos termos do n.º 1, não será devido mais

nenhum pagamento de contribuições por parte da entidade empregadora.

Artigo 6.º

Avaliação

1 – No prazo de dois anos após a sua entrada em vigor, o Instituto de Gestão Financeira da Segurança

Social, IP (IGFSS) deve fornecer à Assembleia da República um relatório detalhado da avaliação do impacto da

aplicação da presente lei.

2 – O relatório referido no número anterior deve assumir periodicidade bienal, podendo o valor da taxa

estabelecida no artigo 4.º ser ajustado de acordo com a avaliação efetuada.

Artigo 7.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 21 setembro de 2020.

Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — Paula Santos — João Oliveira — Bruno Dias — Alma Rivera —

Duarte Alves — Ana Mesquita — João Dias — Jerónimo de Sousa — António Filipe.

————

PROJETO DE LEI N.º 519/XIV/2.ª

CRIA OS CENTROS DE NASCIMENTO, REFORÇANDO O DIREITO DAS MULHERES GRÁVIDAS

QUANTO À ESCOLHA DO LOCAL DE NASCIMENTO

Exposição de motivos

Os Centros de Nascimento são unidades de saúde onde a filosofia de cuidados assenta no reconhecimento

do parto como um processo fisiológico, ao qual é inerente uma dimensão sociocultural e psicológica1. Este

modelo reflete a evidência que estas dimensões não podem facilmente ser separadas e que os cuidados de

saúde materna e obstetrícia de alta qualidade devem ter em conta todos eles.

Neste modelo, a mulher é colocada no centro dos cuidados, sendo parceira no planeamento e na prestação

dos cuidados o que promove a sua autonomia e garante a tomada de decisões informadas2, promovendo,

simultaneamente, a sua saúde e bem-estar3, físico e emocional, através da disponibilização de diversos serviços

e atividades que ajudam na preparação para o parto.4

1 Cit Walsh e Newburn, 2002 (Cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 8) 2 Cit McCourt et al., 2012; Overgaard, Fenger-Grøn e Sandall, 2012; Macfarlane et al., 2014a, 2014b; McCourt et al., 2014 (cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 8) 3 Cit. Downe, 2010; Renfrew et al., 2014; Kennedy et al., 2018 (cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 10) 4 Cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 10

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II SÉRIE-A — NÚMERO 4

22

Os Centros de Nascimento procuram respeitar e capacitar as mulheres e os seus acompanhantes durante a

gravidez e o parto, bem como facilitar uma positiva transição para a parentalidade.5

Indicando os estudos já realizados que o ambiente físico desempenha um papel fundamental na avaliação

da experiência de parto6, importa destacar que o ambiente dos Centros de Nascimento, pelas instalações e

serviços que disponibilizam, influencia e potencialmente promove a saúde e o bem-estar das mulheres, das suas

famílias e dos cuidadores.7 Estes serviços são organizados em torno das necessidades sociais das mulheres e

das famílias com o objetivo de proporcionar uma atmosfera confortável e caseira, em vez de um ambiente clínico,

que pode parecer impessoal, frio e assustador.8

No pleno respeito pelos direitos humanos e reprodutivos das mulheres, nomeadamente dignidade,

privacidade e autonomia, os Centros de Nascimento procuram garantir que todas as intervenções são

devidamente analisadas e que são necessárias e justificadas tendo em conta a melhor evidência científica. 9

Com foco no parto natural, onde as mulheres são as protagonistas, os Centros de Nascimento privilegiam

métodos não farmacológicos de alívio da dor, com vista ao desenrolar fisiológico e seguro do trabalho de parto

e parto. Quando seja necessário, nomeadamente para garantir a segurança da mulher e/ou do bebé ou a pedido

desta, nomeadamente para acesso a analgesia epidural, a mulher é transferida para uma Unidade Hospitalar.

Independentemente do local escolhido pela mulher para o parto, os cuidados que esta pretende receber

devem ser cuidadosamente planeados com o objetivo de melhorar a sua experiência. De facto, as evidências

demonstram que as mulheres querem receber, desde o início da gravidez, informação fiável, regular e baseada

em evidência científica sobre locais de parto e o impacto desta escolha tendo em conta a sua situação

específica.10 Para além disso, os estudos demonstram que quando existe uma boa coordenação dos cuidados

prestados e os cuidadores partilham a mesma filosofia e valores, a experiência das mulheres no parto é mais

positiva.11

Assim, sendo o respeito pela autonomia da mulher um elemento fundamental da filosofia dos Centros de

Nascimento, existe nestes locais uma enorme preocupação em garantir que esta toma decisões informadas,

sendo-lhe disponibilizada toda a informação relevante, nomeadamente sobre locais de nascimento e cuidados

a receber, existindo, ainda, uma clara preocupação em desenvolver um plano de parto em parceria com a

mulher, o qual, tendo em conta a sua situação específica e a melhor evidência científica, é regularmente

discutido e revisto durante a gravidez.12

Por último, os Centros de Nascimento garantem que cada mulher pode aceder ao modelo de cuidados que

melhor se adapta à sua situação concreta, o que contribui, igualmente, para a diminuição das desigualdades

existentes. São, assim, locais que promovem um ambiente salutogénico em que as mulheres que são

marginalizadas, discriminadas ou que se encontram em situação vulnerável podem prosperar.13

Contudo, apesar dos fortes indícios que sugerem que a este tipo de acompanhamento estão associados

resultados positivos para mulheres saudáveis com uma gravidez sem complicações e para os seus bebés, este

modelo não está, ainda, disponível em Portugal, apesar dos esforços que têm sido desenvolvidos nesse

sentido.14

Apesar dos Centros de Nascimento geridos por Parteiras terem uma longa história em alguns países

europeus, como Inglaterra, País de Gales e Escócia, o que se verificou foi que, a partir de 1970, na maioria

destes países, as mulheres começaram a ser aconselhadas a dar à luz em ambiente hospitalar, apesar de não

existirem provas que tal fosse mais adequado para elas.

5 Cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 8 6 Cit McCourt et al., 2016 (Cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 17) 7 Cit. Jenkinson, Josey and Kruske, 2013; Hammond, Homer and Foureur, 2017 (cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 18) 8 Cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 8 9 Idem, página 10. 10 Cit Coxon, Sandall and Fulop, 2013 (cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 13) 11 Rocca-Ihenacho, Newburn and Byrom, 2017 (cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 13) 12 Cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 13 13 Cit Overgaard, Fenger-Grøn and Sandall, 2012 (Cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 11) 14 Cfr. Internacional Confederation of Midwives, 2011 (Cfr. Midwifery Unit Standards, produzido por Midwifery Unit Network e City, University of London, 2018, página 19)

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23

Em consequência, no Reino Unido, o NICE (National Institute for Health and Care Excellence), após a

publicação de diversos estudos científicos sobre locais de nascimento, procedeu à revisão das orientações

constantes do «Intrapartum care for healthy women and babies»15.

De acordo com estas orientações, no caso de se tratar de uma mulher saudável com gravidez sem

complicações, deve-lhe ser garantida a possibilidade de escolher o local de parto que desejar, nomeadamente

em casa, num Centro de Nascimento ou numa unidade hospitalar, devendo a mulher ser apoiada na sua escolha.

Mas este relatório vai ainda mais longe, ao estabelecer que os profissionais de saúde devem informar e

aconselhar estas mulheres que planear o nascimento num Centro de Nascimento é adequado para elas, porque

a taxa de intervenções é menor e o resultado para a mãe e para o bebé é semelhante quando comparado com

o nascimento em unidade hospitalar.

De facto, verifica-se que várias instituições, onde se inclui o NICE, o Midwifery Unit Network (MUNet) e o

European Midwives Association, têm publicado orientações a incentivar a disponibilização e o recurso aos

Centros de Nascimento, o que se está a verificar com particular ênfase no contexto pandémico que vivemos.

De acordo com declaração emitida pela Midwifery Unit Network denominada «Position Statement: Midwifery

units and COVID-19», datada de março de 2020, os Centros de Nascimento podem dar uma contribuição positiva

e constituir uma alternativa numa altura em que, pelo contexto pandémico que vivemos, os sistemas de saúde

em todo o mundo se encontram sobrecarregados devido ao aumento da carga de trabalho dos profissionais e à

falta de recursos humanos, dado que uma parte significativa dos profissionais se encontra a combater a

propagação da COVID-19. Para além disso, sabe-se, também, que existe um maior risco de contaminação pelo

novo coronavírus em instalações hospitalares, até porque uma percentagem significativa, mas desconhecida,

de portadores são assintomáticos. Neste contexto, o recurso aos Centros de Nascimento beneficiará as

mulheres, os bebés e os serviços de saúde, por permitir a redução do número de intervenções obstétricas em

ambiente hospitalar que sobrecarregam ainda mais os profissionais de saúde, bem como a diminuição do

número de infeções por COVID-19 que podem ocorrer em ambiente hospitalar.16

Em abril de 2020, a Midwifery Unit Network emitiu uma nova declaração denominada «European Position

Statement: Midwifery units and COVID-19»17, juntando-se à Organização Mundial de Saúde e à International

Confederation of Midwives (ICM), para reiterar o direito das mulheres a cuidados de alta qualidade antes, durante

e após o parto, afirmando que todas as mulheres, independentemente de infeção por COVID-19 confirmada ou

suspeita, têm direito a um parto seguro e positivo, o que inclui o direito a ser tratada com respeito e a ter com

elas um acompanhante à sua escolha.

Concluem, ainda, que da realidade dos países europeus altamente afetados pela COVID-19, estamos a

aprender que os hospitais podem ser os principais portadores de infeções e a perceber a importância de avançar

para uma abordagem de cuidados centrada na comunidade. Em consequência, apelam aos sistemas de saúde

para que reforcem os seus cuidados centrados na comunidade e apoiem os Centros de Nascimento, deixando

para as unidades hospitalares a prestação de cuidados obstétricos apenas quando necessário para garantir a

saúde da mulher e/ou do bebé.

Os estudos que têm sido realizados sobre esta matéria demonstram a existência de evidências claras e bem

documentadas de que, para mulheres com gravidezes sem complicações, a ocorrência do parto num Centro de

Nascimento é mais segura para a mãe devido às baixas taxas de intervenções desnecessárias e é tão seguro

para os bebés como o nascimento numa unidade hospitalar. Para além disso, a realização do parto num Centro

de Nascimento contribui para a diminuição dos custos para os sistemas de saúde, revelando os dados

disponíveis que os custos com o nascimento em Centros de Nascimento são menores do que nos casos da

realização do parto em unidades hospitalares.18

De acordo com um estudo realizado pela City, University of London, o custo médio total por mãe-bebé nos

casos em que o parto ocorreu em Centros de Nascimento foi de £1296,23, aproximadamente £850 menos do

que o custo médio por mãe e bebé que receberam todos os seus cuidados no Royal London Hospital. Este

estudo destaca ainda que as mulheres que planearam o seu parto num Centro de Nascimento experienciaram

15 Cfr. Intrapartum care for healthy women and babies, publicado pelo National Institute for Health and Care Excellence, em 3 de dezembro de 2014 (https://www.nice.org.uk/guidance/cg190/chapter/Recommendations#place-of-birth) 16 Cfr. Position Statement: Midwifery units and COVID-19, publicado em 31 de março de 2020, pela Midwifery Unit Network 17 Cfr. European Position Statement: Midwifery units and COVID-19, publicado a 8 de abril de 2020, pela Midwifery Unit Network 18 Cfr. Position Statement: Midwifery units and COVID-19, publicado em 31 de março de 2020, pela Midwifery Unit Network e European Position Statement: Midwifery units and COVID-19, publicado a 8 de abril de 2020, pela Midwifery Unit Network

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II SÉRIE-A — NÚMERO 4

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cuidados contínuos de obstetrícia, taxas mais elevadas de parto vaginal espontâneo, maior utilização de uma

piscina de parto, taxas mais baixas de utilização de epidural e taxas de aleitamento materno mais elevadas, em

comparação com aquelas que receberam cuidados em unidades hospitalares.19

O National Childbirth Trust (NCT), preocupado com o facto de poderem estar a diminuir as oportunidades

dadas às mulheres para escolherem o tipo de parto e cuidados que pretendem receber, realizou um Inquérito

online com 2000 novas mães em Inglaterra, País de Gales e Irlanda do Norte denominado «Creating a Better

Birth Environment – Women’s views about the design and facilities in maternity units: a national survey», com o

objectivo de avaliar se o ambiente no parto tem ou não consequências na experiência vivida pela mulher.20

Este estudo concluiu, nomeadamente, que: nove em cada dez mulheres sentiram que o ambiente físico pode

determinar o quão fácil ou difícil é dar à luz; muitas mulheres tiveram acesso limitado a serviços que

consideravam ser muito importantes durante o trabalho de parto; a maioria das mulheres disse que ter um quarto

limpo, ser capaz de se movimentar no quarto e ter mobiliário confortável para si e para os seus acompanhantes

e familiares era bastante importante; as mulheres cujo parto ocorreu em ambiente hospitalar tiveram acesso a

menos serviços e comodidades úteis do que aquelas cujo parto ocorreu em casa ou num Centro de Nascimento;

as mulheres que tinham acesso a boas instalações tinham mais probabilidades de ter um parto vaginal do que

as mulheres que tinham instalações mais pobres e, por último, as mulheres que realizaram uma cesariana de

emergência tiveram menos probabilidade de ter acesso a boas instalações em comparação com as mulheres

que tiveram um parto vaginal.

Para além disso, foi ainda identificado pelas mulheres como importante o facto de conseguirem controlar o

aquecimento e a iluminação, bem como quem entrava no seu quarto durante o trabalho de parto e, ainda, o

acesso fácil a uma casa de banho, com duche ou banheira, ou o acesso a uma piscina de parto.

Importa ter presente que, em fevereiro de 2018, a Organização Mundial de Saúde21 emitiu orientações para

definir padrões de atendimento globais para mulheres grávidas saudáveis e reduzir intervenções médicas

desnecessárias, nas quais recomenda que as equipas médicas e de enfermagem não devem interferir no

trabalho de parto de uma mulher de forma a acelerá-lo, a menos que existam riscos reais de complicações.

O documento inclui 56 recomendações sobre o que é necessário para o trabalho de parto e pós-parto, dos

quais se destaca o direito a ter um acompanhante à sua escolha durante o trabalho de parto e o respeito pelas

opções e tomada de decisão da mulher na gestão da sua dor e nas posições escolhidas durante o trabalho de

parto e ainda o respeito pelo seu desejo de um parto totalmente natural, até na fase de expulsão.

É, ainda, mencionado que a medicalização do parto, uma frase utilizada para descrever a utilização regular

de intervenções médicas para iniciar, acelerar, regular e controlar a gravidez pode ter prejudicado a confiança e

capacidade das mulheres para dar à luz e, potencialmente, diminuído aquilo que deveria ser uma experiência

positiva e memoriável.

De facto, a OMS tem defendido que, para além da prestação de cuidados de saúde clinicamente eficazes,

há que fazer mais para garantir que as mulheres se sentem seguras e confortáveis durante o parto para garantir

uma experiência positiva.

Para melhor conhecer esta realidade, a Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto,

lançou um inquérito às mulheres sobre a sua experiência de parto, em fevereiro de 2015, com uma amostra

superior a 3000 mulheres, destinado àquelas cujo parto tivesse ocorrido em Portugal entre janeiro de 2012 e

março de 2015.22

De acordo com os resultados obtidos, a quase a totalidade dos partos reportados aconteceu em ambiente

hospitalar. Verificou-se que a maioria das mulheres teve alguma intervenção durante o seu trabalho de parto e

parto (apenas cerca de 11% de partos foram sem intervenção), o que contrasta com o número expectável de

partos fisiológicos numa população como a portuguesa.

19 Cfr. The Economic Costs of Intrapartum care in tower hamlets: a comparison between the cost of birth in a freestanding midwifery unit and hospital for women at low risk of obstetric complications, publicado por City, University of London (pode ser consultado em: http://dx.doi.org/10.1016/j.midw.2016.11.006) 20 Cfr. Creating a Better Birth Environment – Women’s views about the design and facilities in maternity units: a national survey, publicado por National Childbirth Trust (pode ser consultado em: https://www.nct.org.uk/sites/default/files/related_documents/BBE_report_311003.pdf ) 21 Cfr. WHO recommendations Intrapartum care for a positive childbirth experience (pode ser consultado em: https://www.who.int/reproductivehealth/publications/intrapartum-care-guidelines/en/) 22 Cfr. Experiências de Parto em Portugal – Inquérito às mulheres sobre as suas experiências de parto, da Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto, que pode ser consultado em http://www.associacaogravidezeparto.pt/wp-content/uploads/2016/08/Experi%C3%AAncias_Parto_Portugal_2012-2015.pdf

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25

A epidural foi o procedimento mais comum (aproximadamente 70%), seguido da episiotomia

(aproximadamente 70%) e ocitocina artificial (mais de 50%).

Cerca de metade das parturientes dizem ter sido submetidas a rutura artificial da bolsa amniótica e a

descolamento das membranas.

Segundo as participantes, mais de dois quintos dos bebés nascidos por via vaginal nasceram por parto

instrumentado: destes, quase dois terços com recurso a ventosa e um terço com recurso a fórceps.

Mais de dois quintos das mulheres consideram que não foram consultadas sobre as intervenções ou exames

realizados durante o trabalho de parto e parto.

Mais de dois quintos das mulheres consideraram que não tiveram informação sobre opções de parto, como

indução, cesariana, parto domiciliar entre outras.

Mais de três quartos sentiram-se bem com a posição para a expulsão adotada. No entanto, surgem exemplos

de mulheres que referem não ter sido respeitadas na escolha sobre a posição para expulsão e quase um quarto

das mulheres não se sentiu bem com a posição adotada.

A grande maioria das mulheres sentiu-se respeitada, ouvida, cuidada, apoiada e segura durante o seu parto,

afirmando que os profissionais de saúde comunicaram de forma positiva e que o parto teve uma influência

positiva na sua relação com o bebé e quase metade refere que a influência na sua autoestima foi positiva.

Contudo, mais de um décimo das mulheres refere que a experiência de parto influenciou de forma negativa

a sua autoestima, existindo, ainda, um número significativo de mulheres que não se sentiu segura, apoiada,

ouvida, respeitada ou bem tratada e para quem o parto teve uma influência negativa, tanto a nível pessoal como

a nível inter-relacional, na relação com o bebé e com o parceiro.

Por último, 1468 mulheres, ou seja, 43,8% das inquiridas, afirmaram não ter tido o parto que queriam.

Os dados constantes deste inquérito merecem a nossa reflexão.

Destacando o caso particular da episiotomia, em fevereiro de 2018, a OMS considerou que o uso rotineiro

ou liberal desta prática não é recomendado para mulheres nas situações de parto vaginal.23 Com esta nova

recomendação, a OMS deixa de admitir uma taxa de praticabilidade de episiotomia entre os 10% e os 15%, o

que demonstra que a OMS está efetivamente a desencorajar a realização deste tipo de procedimento. Não

obstante estas recomendações, a realidade é que a episiotomia é prática recorrente nos hospitais portugueses

no âmbito dos partos vaginais, ultrapassando, como demonstra o Inquérito, os 70%.

De acordo com o Relatório Primavera 201824, a episiotomia é uma prática particularmente mais frequente em

Portugal que nos restantes países europeus. Usando dados recolhidos para 20 países em 2010 no âmbito do

projeto Euro-Peristat e considerando os partos vaginais, observou-se uma variação na frequência de episiotomia

de 3,7% na Dinamarca a 73% em Portugal e 75% no Chipre, mostrando como é controverso o uso por rotina da

episiotomia. Dos 907.211 partos vaginais de nascimentos vivos únicos ocorridos entre 2000 e 2015 em hospitais

públicos portugueses, 721.072 (79,4%) foram partos não instrumentais; 696.510 (76,7%) mulheres foram

submetidas a episiotomia; e 5.110 partos vaginais (5,6 por 1.000) foram complicados por lacerações perineais

de terceiro e quarto grau.

Este relatório acrescenta que «temos que pensar que estamos em prevalências como as dos Estados Unidos

em 1979 (60,9%), uma prática depois ativamente contrariada pelas recomendações do ‘American College of

Obstetricians and Gynecologists’, e tendo em 2012, o Leapfrog Group (www.leapfroggroup.org) proposto uma

meta de 12% para episiotomias, revista em 2015 para 5%. Um longo caminho a percorrer e que deverá ser

discutido em Portugal.».

E a verdade é que a limitação do uso da episiotomia a situações restritas tem diversos benefícios como

menor trauma perineal posterior, menor necessidade de sutura e menos complicações25.

Depois, este Inquérito também revela dados preocupantes ao nível do respeito pela autonomia de decisão

da mulher, do dever de informação e da necessidade de obtenção do seu consentimento. Destacamos que um

número muito significativo de mulheres não teve qualquer informação sobre as opções de parto, não foram

consultadas sobre as intervenções ou exames realizados durante o trabalho de parto e parto ou não foram

respeitadas na escolha sobre a posição para expulsão.

23 Cfr. Recomendação 39, constante do Relatório Intrapartum care for a positive childbirth experience, publicado em 2018 pela Organização Mundial de Saúde, página 150. 24 Cfr. Relatório Primavera 2018, do Observatório português dos sistemas de saúde (pode ser consultado em http://opss.pt/wp-content/uploads/2018/06/relatorio-primavera-2018.pdf) 25 Cit Liljestrand J., Episiotomy for vaginal birth: RHL commentary, 2003

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Tal contraria em absoluto as recomendações da OMS26, divulgadas em 2018 e acima mencionadas, que

destacam expressamente a garantia do respeito pelas opções e tomada de decisão da mulher na gestão da sua

dor e nas posições escolhidas durante o trabalho de parto e ainda o respeito pelo seu desejo de um parto

totalmente natural, até na fase de expulsão.

O Inquérito demonstra, ainda, que a grande maioria das mulheres teve alguma intervenção durante o seu

trabalho de parto e parto, dado que apenas cerca de 11% dos partos realizados foram sem intervenção. Estes

números são preocupantes uma vez que as recomendações da OMS vão no sentido de reduzir as intervenções

médicas desnecessárias, devendo os profissionais de saúde não interferir no trabalho de parto de uma mulher

de forma a acelerá-lo, a menos que existam riscos reais de complicações, considerando aquela entidade que a

excessiva medicalização do parto pode ter reflexos negativos na experiência vivida pela mulher.27

Os estudos que têm sido realizados sobre as experiências de parto, nomeadamente o do National Childbirth

Trust ou o da Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto, ambos já mencionados,

revelam aquilo que cada vez mais mulheres reivindicam no momento anterior ao parto, durante o trabalho de

parto e no pós-parto.

As mulheres querem ser informadas de todas as opções de parto e tipos de cuidados que podem receber,

desde o início da sua gravidez, para que possam planear cuidadosamente o parto. Querem ver reforçada a sua

autonomia na tomada de decisões, ser ouvidas durante todo o processo, ver as suas escolhas e opções

respeitadas e ser tratadas como as protagonistas. Querem que o parto seja seguro e sem intervenções clínicas

desnecessárias. Querem que o parto ocorra numa atmosfera calma e familiar, num quarto não-clínico, que lhes

permita liberdade de movimentos. Querem algo tão simples como ter a possibilidade de controlar a iluminação

e o aquecimento do quarto para que se sintam mais confortáveis.

Por tudo isto, cada vez mais mulheres procuram, em Portugal, alternativas ao parto em ambiente hospitalar,

existindo já outras opções, baseadas em evidência científica, que têm vindo a ser recomendadas noutros países

europeus, como os Centros de Nascimento, os quais se encontram já implementados em diversos países como

Espanha, Itália, Reino Unido e Holanda.

Conforme já referido, o Reino Unido, por exemplo, emitiu recentes orientações referindo que deve ser

garantido às mulheres o direito a escolher o local de parto que desejar, devendo os profissionais de saúde

aconselhar todas as grávidas de baixo risco que o planeamento do parto num Centro de Nascimento é adequado

para elas, porque a taxa de intervenções é menor e o resultado para o bebé não é diferente quando comparado

com o nascimento em unidade hospitalar.

Em suma, os estudos já realizados demonstram claramente que os Centros de Nascimento constituem uma

opção segura para as mães e para os bebés, reduzem o número de intervenções desnecessárias e contribuem

para a diminuição dos custos para os sistemas de saúde. Para além disso, tendo em conta a sua filosofia de

cuidados, aumentam a satisfação das mulheres com a sua experiência de parto, promovem a sua autonomia e

garantem que estas são ouvidas e que as suas opções são respeitadas, ocorrendo o parto num ambiente calmo

e confortável.

Em Portugal, apesar das fortes evidências científicas, o grande foco continua a ser o parto hospitalar,

orientado ou realizado por um médico obstetra, mesmo em situações de baixo risco.

Contudo, os Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstétrica têm, também, competência, para a

realização do parto fisiológico e de baixo risco. Nos termos do Regulamento n.º 391/2019, que define as

competências específicas do enfermeiro especialista em enfermagem de saúde materna e obstétrica, este tem

competência, nomeadamente, para acompanhar a mulher inserida na família e comunidade durante o trabalho

de parto, efetuando o parto em ambiente seguro, no sentido de otimizar a saúde da parturiente e do recém-

nascido na sua adaptação à vida extrauterina, sem prejuízo das competências que detém durante o período pré-

natal e pós-natal.

Ora, de uma forma geral, de acordo com dados da OMS, cerca de 70 a 80% das mulheres grávidas podem

ser consideradas de baixo risco no início do trabalho de parto. Nestes casos, o parto poderia ser realizado por

um Enfermeiro Especialista em Saúde Materna e Obstétrica, à semelhança do que já se verifica em diversos

26 Cfr. WHO recommendations Intrapartum care for a positive childbirth experience (pode ser consultado em: https://www.who.int/reproductivehealth/publications/intrapartum-care-guidelines/en/) 27 idem

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22 DE SETEMBRO DE 2020

27

países, nomeadamente no Reino unido, na Holanda, na Suécia e na Finlândia, em que a mulher só é consultada

por um médico obstetra em situações graves ou de risco.

Neste sentido, apresentamos o presente projeto de lei com o objetivo de criar em Portugal Centros de

Nascimento, geridos por Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstétrica, que atuam com autonomia,

lideram e são apoiados por uma equipa multidisciplinar, que pode incluir, nomeadamente, médicos obstetras,

médicos pediatras, fisioterapeutas e doulas, que constituem a sua estrutura de apoio.

Estes são destinados a mulheres saudáveis com uma gravidez de baixo risco e sem complicações e devem

estar localizados em Unidades Hospitalares que possuam a valência de ginecologia/obstetrícia, constituindo

uma ala desta unidade, ou em edifícios próprio e autónomo, desde que situado nas imediações daquelas, por

forma a garantir a transferência da mulher grávida para o hospital caso tal se mostre necessário.

Para além disso, os Centros de Nascimento devem ser tendencialmente públicos, sem prejuízo da natureza

complementar e supletiva do sector privado.

Com a criação dos Centros de Nascimento estamos a permitir a implementação de um modelo alternativo de

assistência ao modelo biomédico tradicional, dando azo a um modelo baseado na evidência, que enfatiza o

protagonismo da mulher no parto, através do reconhecimento da sua autonomia. Assegura-se, ainda, o aumento

do leque de opções disponíveis ao nível dos locais de nascimento, que permita à mulher escolher a opção que

melhor se adequa às suas necessidades, ou seja, parto hospitalar, parto em Centro de Nascimento ou parto

domiciliar.

Não podemos ignorar que muitas mulheres relatam experiências negativas de parto e que muitas declaram

não ter tido o parto que queriam.28 Por isso, é fundamental garantir que a mulher tem acesso a informação

detalhada sobre a sua situação clínica e sobre as várias opções de parto disponíveis, sendo igualmente

essencial que existam alternativas no que diz respeito à escolha do local de nascimento, por forma a garantir

que a mulher pode escolher aquela que melhor responde ao que pretende. E, tendo em conta os relatos das

mulheres sobre o que gostariam de ter tido ou de ter, acreditamos que os Centros de Nascimento podem

constituir uma resposta para estas mulheres por disponibilizarem diversos serviços e atividades que não existem

em contexto hospitalar, mas que são igualmente seguras para ela e para o bebé, como tem demonstrado a

vasta evidência científica que já existe sobre esta matéria.

E, de facto, Portugal tem o dever de alargar o leque de opções disponíveis no que diz respeito aos locais de

nascimento. A este respeito, importa mencionar que o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, na decisão do

caso «Ternovszky v. Hungary» 29, considerou que o direito de escolha do local de nascimento é uma das

vertentes do Direito à Vida Privada, previsto no artigo 8.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, ao

determinar que o termo «vida privada» era amplo e incluía tanto a decisão de se tornar pai ou mãe como as

circunstâncias de o ser, declarando que as circunstâncias de dar à luz fazem incontestavelmente parte da vida

privada de cada um.

A Organização Mundial da Saúde designou o ano de 2020 como o Ano Internacional do Enfermeiro e da

Parteira, reconhecendo que estes são, frequentemente, os primeiros e únicos pontos de cuidados nas suas

comunidades. Esta declaração pretende destacar o importante trabalho desenvolvido pelos enfermeiros e

parteiras na prestação de cuidados de saúde, por dedicarem as suas vidas a cuidar das mães e das crianças,

dando-lhes imunizações que salvam vidas e transmitindo-lhes conselhos vitais. Pretende, também, chamar a

atenção para as condições de trabalho difíceis que muitas vezes enfrentam e para a necessidade de reforço do

investimento, nomeadamente ao nível dos recursos humanos, em enfermagem e obstetrícia.30

Sabemos que muitos Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstétrica, pelas competências que

têm, gostariam de ter um papel mais presente no parto, existindo casos específicos que nos têm chegado de

Enfermeiros que gostavam de gerir um Centro de Nascimento. Para nós, esta pretensão faz todo o sentido, pelo

que a existência de Centros de Nascimento são uma forma de dar mais direitos às mulheres grávidas e de

reconhecer e valorizar aqueles profissionais.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

28 Cfr. Experiências de Parto em Portugal – Inquérito às mulheres sobre as suas experiências de parto, da Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto, que pode ser consultado em http://www.associacaogravidezeparto.pt/wp-content/uploads/2016/08/Experi%C3%AAncias_Parto_Portugal_2012-2015.pdf 29 Disponível em https://hudoc.echr.coe.int/eng?i=001...#{%22itemid%22:[%22001-102254%22]} 30 Cfr. https://www.who.int/campaigns/year-of-the-nurse-and-the-midwife-2020

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece o enquadramento legal para a criação de Centros de Nascimento, reforçando os

direitos das mulheres grávidas quanto à escolha do local de nascimento.

Artigo 2.º

Centros de Nascimento

1 – Os Centros de Nascimento são unidades de saúde cuja filosofia de cuidados assenta no modelo de

assistência prestado por Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstétrica e onde se privilegiam

métodos não farmacológicos de alívio da dor com vista ao desenrolar fisiológico e seguro do trabalho de parto

e parto.

2 – Os Centros de Nascimento incentivam a autonomia da mulher, garantem a tomada de decisões

informadas e promovem a sua saúde e bem-estar, tanto física como emocional, através da disponibilização de

diversos serviços e atividades que ajudam na preparação para o parto e que se encontram organizados em

torno das necessidades sociais das mulheres e das famílias com o objetivo de proporcionar uma atmosfera

calma e confortável e um ambiente familiar.

Artigo 3.º

Critérios para parto em Centros de Nascimento

1 – Os Centros de Nascimento devem ter definidas as condições em que as mulheres se consideram aptas

a receber cuidados naquele local.

2 – Os Centros de Nascimento devem ter definidas indicações e processos de transferência para unidades

hospitalares no período pré-natal, intraparto ou pós-parto.

Artigo 4.º

Segurança e organização dos cuidados

1 – Os Centros de Nascimento devem ter uma política que garanta a liderança clínica e de gestão dos

Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstétrica, bem como que assegure a qualidade e melhoria dos

cuidados prestados, através de uma estrutura organizacional que garanta a filosofia dos cuidados.

2 – Os cuidados de saúde são prestados por uma equipa multidisciplinar que inclua profissionais diretamente

ligados à direção do Centro de Nascimento.

3 – Deve ser garantido o envolvimento dos Centros de Nascimento com a rede local de cuidados maternos

e neonatais, tanto a nível dos cuidados primários como hospitalares.

Artigo 5.º

Localização dos Centros de Nascimento

1 – Os Centros de Nascimento devem estar localizados em unidades hospitalares que possuam a valência

de ginecologia/obstetrícia, constituindo uma ala distinta desta unidade, ou em edifício próprio e autónomo, desde

que situado nas imediações daquelas.

2 – Mesmo quando inseridos em Unidades Hospitalares, os Centros de Nascimento são geridos, com

autonomia, por Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstétrica.

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Artigo 6.º

Financiamento dos Centros de Nascimento

Os Centros de Nascimento devem ser tendencialmente públicos, sem prejuízo da natureza complementar e

supletiva do sector privado.

Artigo 7.º

Regulamentação

O Governo, no prazo de 180 dias, procede à regulamentação da presente lei definindo as condições de

abertura e instalação de Centros de Nascimento.

Artigo 8.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.

Palácio de São Bento, 21 de setembro de 2020.

A Deputada não inscrita, Cristina Rodrigues.

————

PROJETO DE LEI N.º 520/XIV/2.ª

ESTABELECE O REGIME PARA A NACIONALIZAÇÃO DOS CTT

Exposição de motivos

Desde setembro de 2018 que são recorrentes notícias sobre encerramentos de estações dos CTT, na sua

maioria no interior do país. Desde a privatização, levada a cabo pelo último Governo PSD/CDS em 2013, já

encerraram 84 Estações de Correio em todo o País.

Num relatório publicado pela ANACOM, a 10 de janeiro de 2019, indicava-se que «em 2018, os

encerramentos de estações de correios pelo CTT – Correios de Portugal levaram a que tenham subido para 33

os concelhos em Portugal que já não têm estações de correios» e que «e acordo com informação recebida dos

CTT em novembro último, é expectável que o número de concelhos sem estações de correio suba para 48 no

curto prazo, o que significa que 15,6% do número total de concelhos, onde residem mais de 441 mil habitantes,

ficarão sem uma estação de correios».

Os sucessivos encerramentos delapidaram o património de uma outrora prestigiada empresa pública e

prestadora de um serviço público de proximidade com as populações e fator de coesão territorial. O Estado vai-

se afastando, nas suas diversas formas de representação, das populações, que ficam privadas de acesso a um

serviço de correios com que contam desde há muito.

Agravam-se, também, todos os problemas de maior isolamento do interior, acentuando-se a interioridade e

as assimetrias no país que todos dizem querer combater: Governo Assembleia da República, Presidência da

República, partidos políticos, movimentos de utentes e/ou cidadãos. O critério que tem contando – o da

rentabilidade – tem aniquilado as reais necessidades das populações e a correção dos desequilíbrios e

assimetrias territoriais que, de um momento para o outro, deixam de poder usufruir diretamente de um serviço

público essencial: o serviço de correios, nos termos em que está definido no respetivo Convénio de Qualidade

do Serviço Postal Universal.

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Findo o contrato de concessão em dezembro de 2020, a administração dos CTT quer tornar este caminho

irreversível. E, por isso, nos últimos meses de 2018, multiplicaram-se os encerramentos de dezenas de Estações

de Correio, que foram muito para além da lista de 22 que integravam um anunciado «plano de reestruturação

de serviços», aprovado em dezembro de 2017. Tal plano não passou de mais um logro e de uma autêntica

patranha.

Desde logo, porque no mesmo momento em que a administração dos CTT invoca a necessidade de «adequar

a rede de atendimento dos CTT à procura dos serviços postais para garantir a sustentabilidade futura da

empresa e do Serviço Postal Universal» alegando quebra de receitas, o País teve conhecimento que a

Administração dos CTT recebeu, em 2017, salários na ordem das muitas centenas de milhares de euros, à

cabeça dos quais se encontra o seu presidente à época, Francisco Lacerda, cuja remuneração anual foi de

900 000€ – o 7.º mais bem pago da lista do PSI 20, nesse mesmo ano.

Depois, porque já se percebeu que o real propósito da administração de Francisco Lacerda foi transformar a

esmagadora maioria das Estações de Correio em agências bancárias do Banco CTT e apostar nos segmentos

lucrativos dos negócios que estão integrados nos CTT: além do Banco, as Encomendas Expresso, o payshop e

outros serviços financeiros postais que já existiam – certificados de aforro em venda exclusiva, transferências,

etc.

A estratégia é, então, centrar a atividade nos negócios lucrativos e subconcessionando sistematicamente,

quer a privados, quer aos serviços locais das autarquias, a distribuição dos correios, considerada uma área

pouco lucrativa face ao resto do negócio. Desta forma, é clara a pressão para que seja o próprio Estado, através

das autarquias a assegurarem, com os seus próprios recursos, aquilo a que contratualmente os CTT estão

obrigados a fazer.

Importa assinalar que toda a estrutura do Banco CTT assenta sobre a macroestrutura pré-existente dos CTT,

herdada a custo zero pelos novos donos, o que contrasta com todos os outros bancos a retalho que concorrem

no mercado.

Aliás, este Grupo Parlamentar tem vindo a alertar para as várias denúncias de organizações representativas

dos trabalhadores, bem como apuramento da ANACOM (relativa aos anos de 2016 e 2017) que é todo o grupo

CTT a sustentar o Banco CTT, que tem tido opções de gestão incompreensíveis, já que descapitalizam os CTT

em benefício de um banco que não tem tido, desde o início, os resultados esperados.

Uma nova administração tomou posse em maio de 2019, tendo João Bento como administrador. Apesar de

uma tentativa inicial de uma forma diferente de gerir os CTT, os problemas e a estratégia mantêm-se até aos

dias de hoje. Em junho de 2019 João Bento admitiu, no parlamento que iriam «iniciar o processo de reabertura

de lojas em concelhos que ficaram sem estações. Os dois primeiros casos serão divulgados nas próximas

semanas».

Nessa semana reabriu a estação de correios de Vila Flor. Quanto aos restantes 33 municípios onde a

reabertura foi anunciada, continuam à espera. Em 4 meses, reabriu apenas uma estação de correios,

continuando todos os restantes municípios a aguardar. Recordamos que em abril, o ministro das Infraestruturas,

Pedro Nuno Santos, exigiu a reposição de uma loja de correios em todos os municípios do país como condição

para renegociar o contrato de concessão dos CTT.

No ano de 2020 os CTT, tal como o país no geral, tiveram de lidar com uma pandemia que tem alterado o

dia-a-dia de todos e todas. No entanto, foi exatamente o serviço postal que mais se manteve em funcionamento

e teve um papel importante para o dia-a-dia da população em tempo de confinamento, com um acréscimo de

mais do dobro do serviço de encomendas. Mas nem por isso houve uma alteração significativa na gestão da

empresa: em vez de contratar mais trabalhadores (que já antes eram necessários) continuou a despedir

contratados a prazo e não continuando o contrato com agenciados ou em prestação de serviços, dificuldade em

criar condições de segurança para trabalhadores nas estações e postos de distribuição.

No caso dos CTT, a irresponsabilidade política da direita é clara e inequívoca: coube ao PSD e ao CDS a

decisão de entregarem a privados um serviço público que era tido, no contexto europeu, como um dos melhores

da Europa. Mas também nos últimos 4 anos, o governo do PS não conseguiu fazer cumprir sequer as exigências

mínimas do contrato de concessão ou dos acordos que foi firmando com as administrações dos CTT. Por isso,

continua a parecer óbvio que é urgente resgatar os CTT novamente para o controlo público.

É preciso parar urgentemente com a agressão que as sucessivas administrações dos CTT está a promover

contra o povo e o país, e ser o Estado a assumir diretamente a gestão e a propriedade dos CTT em nome da

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31

defesa do interesse público, renacionalizando a empresa o mais rápido possível. Quanto mais tarde se tomar a

decisão, mais vulnerável ficará o Estado para fazer regressar ao controlo público todos os ativos dos CTT que

ainda fazem parte da empresa.

Por último, e no âmbito da decisão de fazer regressar ao Estado todos os serviços integrados no grupo CTT

importará, quanto antes, apurar com rigor todas as decisões de gestão que delapidaram e desvalorizaram tudo

o que pertencia ao património e fazia parte do valor intrínseco dos CTT público. Através de uma auditoria

completa a toda a gestão privada dos CTT, extensível ao período que antecedeu o processo de privatização,

decidido e concretizado pelo governo PSD/CDS, será indispensável apurar todos os factos e decisões relevantes

que contribuíram para o desmantelamento do serviço público universal dos correios em Portugal.

Decidir a nacionalização dos CTT é, no entendimento do Bloco de Esquerda, o único caminho de, nas

condições atuais, ainda ser possível resgatar para o Estado a propriedade e a gestão do serviço público universal

dos correios, garantindo um serviço público universal a todos e todas, bem como garantindo a salvaguarda do

património dos CTT e da melhoria das condições de trabalhado das centenas de trabalhadores desta empresa.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei define o procedimento tendente à apropriação pública por via de nacionalização do controlo

acionista dos CTT – Correios de Portugal, S.A. (CTT), a realizar nos termos do Regime Jurídico de Apropriação

Pública (RJAP), aprovado em anexo pela Lei n.º 62-A/2008, de 11 de novembro, no sentido de salvaguardar o

interesse público nacional.

Artigo 2.º

Apropriação Pública dos CTT

1 – Verificada, desde a privatização dos CTT, a degradação contínua do serviço público refletida:

a) no sistemático encerramento de balcões;

b) na delapidação do seu património e descapitalização da empresa;

c) no contínuo despedimento de funcionários e um grosseiro atropelo do normativo legal existente no que

se refere ao seu enquadramento profissional;

d) na subida de preços incomportável com o princípio da universalidade de acesso;

e) nos danos causados ao tecido socioeconómico nacional e à coesão territorial;

e apurada a inviabilidade ou inadequação de meio menos restrito apto a salvaguardar o interesse público, o

Governo irá proceder à nacionalização de todas as ações representativas do capital social dos CTT.

2 – Ao ato de nacionalização previsto no número anterior aplica-se o disposto nos números seguintes, bem

como, em tudo o que não esteja disposto de forma especial neste artigo, o RJAP.

3 – Por efeito do disposto no n.º 1, e independentemente de quaisquer formalidades, consideram-se

transferidas para o Estado, através da Direção Geral do Tesouro Finanças, todas as ações representativas do

capital social dos CTT, livres de quaisquer ónus ou encargos, para todos os efeitos legais.

4 – A alteração da titularidade das ações produz os seus efeitos diretamente por força da presente lei e é

oponível a terceiros independentemente de registo.

5 – Os CTT passam a ter a natureza de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, continuando

a reger-se pelas disposições legais que regulam as suas atividades, bem como pelos seus estatutos, na medida

em que os mesmos não contrariem o disposto na presente lei, no regime jurídico do setor empresarial do Estado

e no RJAP.

6 – Cabe ao acionista Estado a definição dos objetivos de gestão dos CTT que salvaguardem o interesse

público e a defesa dos direitos dos trabalhadores.

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Artigo 3.º

Auditoria

Será promovida pelo Governo uma auditoria independente que identifique e quantifique todas as ações

lesivas do serviço público tomadas pela gestão privada dos CTT, bem como as tomadas pelo XIX Governo

constitucional no período de preparação do processo de privatização.

Artigo 4.º

Indemnizações

1 – A indemnização devida aos titulares de participações sociais dos CTT, bem como aos eventuais titulares

de ónus ou encargos constituídos sobre as mesmas, é apurada nos termos do estabelecido no RJAP.

2 – Com base na auditoria prevista no artigo anterior, é apurada a indemnização devida ao Estado pelos

titulares de participações sociais dos CTT.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge

Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua — João Vasconcelos

— José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

————

PROJETO DE LEI N.º 521/XIV/2.ª

ALTERA O REGIME DO COMPLEMENTO SOLIDÁRIO PARA IDOSOS, FAZENDO DEPENDER A SUA

ATRIBUIÇÃO DA SITUAÇÃO DE POBREZA DO IDOSO E NÃO DO RENDIMENTO DOS FILHOS E

GARANTINDO A CONVERGÊNCIA DO VALOR DE REFERÊNCIA COM O LIMIAR DE POBREZA

Exposição de motivos

O Complemento Solidário para Idosos (CSI) é um apoio em dinheiro pago mensalmente aos idosos de baixos

recursos residentes em Portugal, com idade igual ou superior à idade de acesso à pensão de velhice do regime

geral de Segurança Social, que se estendeu também, recentemente, a alguns grupos de pensionistas por

antecipação vítimas de grandes cortes nas suas pensões.

Trata-se de uma prestação diferencial, que tem como referencial um valor fixado. Depois dos cortes

efetuados na prestação durante o Governo PSD/CDS, entre 2011 e 2015, o valor de referência do CSI tem vindo

a ser aumentado desde 2016. No entanto, apesar desta recuperação, ele ainda se encontra abaixo do limiar de

pobreza, havendo, contudo, o compromisso do Governo de fazê-lo convergir com aquele montante nesta

legislatura. Com efeito, se o objetivo do CSI é garantir que os idosos com menos recursos têm sempre um

rendimento que os retira da pobreza, a convergência entre o valor do CSI e o limiar de pobreza é uma urgência.

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Ainda que persistam situações de grande carência que merecem intervenção, é um facto que o CSI tem tido um

papel relevante na redução da taxa de risco de pobreza entre os idosos na última década e meia.

Infelizmente, contudo, os potenciais beneficiários do CSI têm de enfrentar uma complexa e carga burocrática

que tem funcionado como um fosso que muitos não conseguem transpor. Na verdade, os idosos requerentes

têm de apresentar comprovativos dos rendimentos não apenas do seu agregado, mas ainda do agregado fiscal

dos seus filhos, ainda que vivam totalmente independentes da família e que não mantenham com aqueles uma

relação de proximidade física ou emocional, quanto mais económica.

O Bloco de Esquerda defendeu, no quadro do debate de Orçamento do Estado para 2020, que era necessário

garantir que a atribuição do Complemento Solidário para Idosos dependesse apenas da situação de pobreza do

idoso e não do rendimento dos filhos. Tendo em conta a aparente disponibilidade do Governo para ir ao encontro

desta solução, embora de forma faseada, o Bloco negociou uma norma segundo a qual se começava a aplicar

o princípio de que a atribuição do Complemento Solidário para Idosos deve depender apenas da situação de

pobreza do idoso e não do rendimento dos filhos, eliminando-se numa primeira fase essa consideração do

rendimento dos filhos para os escalões mais baixos de rendimentos (1.º, que já estava, mas também 2.º e 3.º

escalões). Para o efeito, foi apresentada e votada uma alteração ao Orçamento de Estado que ia no sentido de

ser iniciado um percurso de eliminação total desta condição de exclusão de atribuição da prestação. Assim

sendo, restaria, em 2020, apenas a consideração dos rendimentos dos filhos do requerente que integrassem o

4.º escalão de rendimentos.

A Lei n.º 2/2020 de 31 de março que aprovou o Orçamento do Estado estipulou, no seu artigo 133.º, o

seguinte:

«Durante o ano de 2020, o Governo avalia as regras de atribuição do complemento solidário para idosos,

com vista a eliminar constrangimentos, designadamente:

a) Alargando até ao terceiro escalão a eliminação do impacto dos rendimentos dos filhos considerados na

avaliação de recursos do requerente;

b) Garantindo a simplificação do processo e do acesso à informação exigida, desburocratizando a relação

entre a segurança social e os beneficiários.»

Ora, este compromisso ainda não foi concretizado. Na petição n.º 642/XIII/4.ª, promovida pela Apre!, os

peticionários solicitam a alteração da legislação relativa ao Complemento Solidário para Idosos para que o

rendimento dos filhos não seja considerado para efeitos de atribuição da prestação. Da petição, que recolheu

4627 assinaturas, extrai-se que a inclusão dos rendimentos dos filhos é não só injusta como um atentado à

independência e à autonomia das pessoas idosas, colocadas assim numa situação de constrangimento

relativamente aos seus filhos, de quem não devem dependem. O Bloco de Esquerda acompanha este

entendimento.

Assim é urgente não só garantir que a norma constante do Orçamento de Estado é devidamente executada

como ir mais longe na correção desta injustiça de descaraterização da situação da pobreza do idoso com base

nos rendimentos dos filhos. Além disso, deve ser concretizado também o objetivo de fazer convergir o valor de

referência do CSI com o limiar de pobreza. São esses dois os objetivos do presente projeto de lei.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma procede à alteração do Decreto-Lei n.º 232/2005, de 29 de dezembro, com as alterações

que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 236/2006, de 11 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 151/2009,

de 30 de junho e pelo Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro.

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Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 232/2005, de 29 de dezembro

O artigos 6.º, 7.º, 9.º e 13.º do Decreto-Lei n.º 232/2005, de 29 de dezembro, com as alterações que lhe

foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 236/2006, de 11 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 151/2009, de 30 de

junho e pelo Decreto-Lei n.º126-A/2017, de 6 de outubro, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 6.º

[…]

1 – (…):

a) (…);

b) (Eliminada).

2 – (…).

Artigo 7.º

[…]

1 – (…):

a) (…);

b) (…);

c) (…);

d) (…);

e) (…);

f) (…);

g) (…);

h) (…);

i) (…);

j) (…);

l) (…).

2 – (Eliminado).

3 – (…).

4 – (…).

5 – Os rendimentos previstos no n.º 1 são objeto de atualização nos termos a regulamentar.

6 – Para efeitos do disposto no n.º 1 consideram-se os rendimentos anuais.

Artigo 9.º

[…]

1 – O valor de referência do complemento é de (euro) 6014/ano, sendo objeto de atualização periódica, por

portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Segurança e Solidariedade Social tendo em conta o Índice de

Preços ao Consumidor.

2 – (…).

3 – (…).

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Artigo 13.º

[…]

1 – (…):

a) (…);

b) Apresentar todos os meios probatórios que sejam solicitados pela instituição gestora, nomeadamente para

avaliação da situação patrimonial, financeira e económica dos membros do seu agregado familiar;

2 – (…).

3 – (…):

a) (…);

b) (…).

Artigo 3.º

Regulamentação

O Governo regulamenta a presente lei no prazo de 30 dias após a sua publicação.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Moura Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua —

João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

————

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 641/XIV/2.ª

ADOÇÃO DE MEDIDAS PARA O REGULAR FUNCIONAMENTO DOS CUIDADOS DE SAÚDE

PRIMÁRIOS

Se já antes da pandemia de COVID-19 o Serviço Nacional de Saúde (SNS) apresentava limitações na

capacidade de prestar serviços de saúde a todos os cidadãos a tempo e horas, agora, estas limitações estão

ainda mais exacerbadas.

Como muitas vezes temos feito notar, não bastam boas intenções para garantir um SNS de qualidade e

acessível a todos. Mais do que promessas e anúncios, são necessárias escolhas e medidas concretas que

sustentem estas boas intenções. E uma das áreas em que essas boas intenções têm tardado em ser transpostas

para a realidade é a dos Cuidados de Saúde Primários, (CSP) comummente designados como a «porta de

entrada» no SNS.

Na anterior Legislatura, o Partido Socialista tinha assumido o compromisso de atribuir a cada cidadão um

médico de família. Essa promessa não foi honrada e, em agosto de 2019, havia cerca de 644 mil portugueses

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sem médico de família. Em agosto deste ano esse número tinha já aumentado para 953.051 (dados do Portal

da Transparência). Isto é, no espaço de um ano, há mais 309 mil cidadãos sem médico de família.

Daqui resulta que cerca de 1 milhão de portugueses não tem, neste momento, médico de família atribuído.

Ao não resolver este problema, o Governo está a comprometer o acesso dos cidadãos à prestação de

cuidados de saúde de qualidade e em tempo útil.

Por outro lado, de acordo com a Ordem dos Médicos (OM) e a Associação Portuguesa de Administradores

Hospitalares (APAH), no primeiro semestre deste ano, as consultas presenciais nos centros de saúde caíram

36% face ao primeiro semestre de 2019, o que corresponde a menos 3,8 milhões de consultas presenciais.

Segundo o Bastonário da OM, em declarações no passado dia 8, este é um problema sério que «se pode

agravar nos próximos meses, uma vez que existem doentes sem acesso a consultas desde março, que ainda

não começaram a ser tratados e não há um verdadeiro plano de retoma».

Sendo certo que o número de teleconsultas tem vindo a aumentar (segundo o Portal da Transparência em

julho de 2020 realizaram-se 23 640 consultas em telemedicina quando, em julho de 2019, tinham-se realizado

16 908), esta não é a solução ideal, nem a mais adequada para todos os casos. A este propósito, referiu o

Presidente da APAH, também no passado dia 08, que «os números da telemedicina até podem ser positivos,

mas este recurso será sempre complementar e ainda não está consolidado de forma uniforme em

Portugal e pode mascarar uma realidade que se pode tornar ainda mais grave num futuro próximo», pois

«não é apenas com uma chamada telefónica» que se podem «realizar rastreios, diagnósticos, conhecer o doente

e referenciá-lo adequadamente para os cuidados especializados».

O Governo deve promover a retoma efetiva da atividade assistencial hospitalar suspensa durante os Estados

de Emergência e, na mesma medida, a recuperação da atividade assistencial nos CSP. É urgente retomar as

consultas médicas, as consultas de enfermagem, o seguimento e controlo de doentes crónicos, os rastreios de

doenças oncológicas.

E tem, desde logo, de proceder à colocação de novos médicos de família que, mais uma vez, está atrasada.

Este atraso preocupa o CDS tal como preocupa o Bastonário da OM afirmando, no dia 17, que «já passou cerca

de um mês desde a data limite para os novos médicos de família se candidatarem aos lugares. Tiveram apenas

cinco dias para apresentarem as suas candidaturas, precisamente pela urgência. No entanto,

incompreensivelmente, o concurso fechou e continuam por colocar».

Conforme o CDS tem vindo a defender, são precisas medidas que: reforcem os recursos humanos; que

garantam a fixação de médicos nas zonas carenciadas; que assegurem que as unidades de saúde não se

deparam com falta de material fundamental; que a telemedicina (e não meras consultas telefónicas) seja

assumida como complemento na prestação de cuidados; sejam considerados todos os modelos organizativos

previstos na lei.

E que, finalmente, todos os cidadãos tenham um médico de família.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do CDS-

PP abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de resolução:

Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, a

Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1. Proceda à colocação imediata dos novos médicos de família que se candidataram no último concurso;

2. Tome as medidas necessárias que garantam, efetivamente, a fixação de médicos nas zonas mais

carenciadas do País;

3. Proceda à atribuição de médico de família a todos os cidadãos;

4. Proceda à atribuição de uma Equipa de Saúde Familiar a todos os portugueses;

5. Incentive a prestação de cuidados de saúde domiciliários aos utentes;

6. Garanta a cobertura nacional da rede de Cuidados de Saúde Primários, em particular através da abertura

das unidades necessárias ou da sua contratualização;

7. Proceda ao reforço dos recursos humanos e dos meios necessários ao bom e regular funcionamento dos

Cuidados de Saúde Primários;

8. Uma vez assegurado o reforço dos recursos humanos necessários, efetive em todo o território nacional o

alargamento dos horários das unidades de Cuidados de Saúde Primários, nos dias úteis.

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22 DE SETEMBRO DE 2020

37

Palácio de São Bento, 21 de setembro de 2020.

Os Deputados do CDS-PP: Ana Rita Bessa — Telmo Correia — Cecília Meireles — João Pinho de Almeida

– João Gonçalves Pereira.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 642/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE GARANTA AOS ADVOGADOS, ADVOGADOS ESTAGIÁRIOS E

SOLICITADORES UMA REMUNERAÇÃO CONDIGNA E JUSTA PELOS SERVIÇOS QUE PRESTEM NO

ÂMBITO DA PROTEÇÃO JURÍDICA

A Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, procedeu a alterações profundas no regime de acesso ao direito e aos

tribunais, remetendo para portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Justiça a definição dos termos em

que o Estado garante a remuneração dos profissionais forenses pelos serviços prestados no âmbito da proteção

jurídica, bem como o reembolso das respetivas despesas. Por sua vez, a Portaria n.º 1386/2004, de 10 de

novembro, concretizando o disposto na referida Lei, procedeu à aprovação da tabela de honorários dos

advogados, advogados estagiários e solicitadores pelos serviços que prestem no âmbito da proteção jurídica, a

qual sofreu apenas uma pequena alteração em 2009 e fixou como base de cálculo dos referidos honorários as

unidades de referência que correspondem a ¼ da unidade de conta prevista pelo Regulamento das Custas

Processuais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, a qual era indexada ao Indexante dos

Apoios Sociais (IAS).

O congelamento do valor do IAS ocorrida há alguns anos fez com que os honorários dos profissionais

forenses ficassem por atualizar desde 2010, contribuindo-se, assim, para a degradação e desvalorização dos

seus valores. Na anterior Legislatura, por via do Orçamento do Estado para 2017 (artigo 266.º) e do Orçamento

do Estado para 2018 (artigo 178.º), verificaram-se aumentos do IAS, mas tais aumentos não se traduziram numa

valorização dos honorários dos profissionais forenses, uma vez que, com o intuito de impedir o aumento do valor

das custas processuais, se suspendeu a atualização automática da unidade de conta processual, prevista no

artigo 5.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.

Com o intuito de evitar prosseguir um rumo de degradação e desvalorização dos valores da tabela de

honorários dos profissionais forenses, a Lei n.º 40/2018, de 8 de agosto, por via de uma alteração à Lei n.º

34/2004, de 29 de julho, determinou a obrigatoriedade de atualização anual dos encargos decorrentes da

concessão de apoio judiciário por via de portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça,

devendo tal revisão ter em conta a evolução da inflação e a necessidade de garantir uma remuneração digna e

justa aos advogados intervenientes. Paralelamente, esta Lei previa uma disposição transitória que estabelecia

que, no prazo de um ano a contar da sua entrada em vigor, a Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, deveria ser revista

com o intuito de garantir uma atualização da tabela de honorários para a proteção jurídica e a compensação das

despesas efetuadas, no intuito de assegurar o efetivo, justo e adequado pagamento de honorários e despesas.

Apesar de as alterações introduzidas pela Lei n.º 40/2018, de 8 de agosto, serem claras no sentido de que

deveria haver uma alteração anual dos encargos decorrentes da concessão de apoio judiciário, o Governo só

procedeu a essa atualização, a que estava legalmente obrigado, por via da Portaria n.º 161/2020, de 30 de

junho, que, com efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2020, atualizou os valores da referida tabela por aplicação

do índice de preços no consumidor (sem habitação) referente ao ano de 2019 (0,22%), o que na prática se

traduziu num aumento do valor da unidade de referência usada para o cálculo dos profissionais forenses em

apenas 8 cêntimos.

Este aumento, para além de ser indigno, viola de forma clara o disposto no artigo 36.º, n.º 2 da Lei n.º 34/2004,

de 29 de julho, uma vez que não só não tem em conta a inflação verificada no ano de 2018 (já que, no ano de

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II SÉRIE-A — NÚMERO 4

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2019, o Governo não aprovou a portaria de atualização anteriormente referida e o aumento do índice de preços

no consumidor – sem habitação – foi, em 2018, de 0,95%), como também não garante uma remuneração digna

e justa aos profissionais forenses capaz de compensar os anos de congelamento dos seus honorários (conforme

a parte final do referido artigo determinava).

Para o PAN os advogados, advogados estagiários e solicitadores que prestam serviços no âmbito da

proteção jurídica assumem no nosso país um papel essencial, garantindo um acesso efetivo à justiça por aqueles

que têm menos recursos. Pelo trabalho meritório que levam a cabo estes profissionais merecem uma

remuneração condigna e justa relativamente às funções que desempenham, e não um aumento de apenas 8

cêntimos como aprovou o Governo.

Mas para o PAN é, também, preciso assegurar que o Governo, em conformidade com o exigido pela Lei n.º

40/2018, de 8 de agosto, realize uma revisão transversal da tabela de honorários dos profissionais forenses

capaz de garantir uma remuneração digna e justa a estes profissionais, e de compensar os anos de

congelamento que se verificaram até à entrada em vigor da referida Lei. Sublinhe-se que, entre 2010 e 2017, a

variação do índice de preços no consumidor (sem habitação) foi de 8,487% e tal variação não foi repercutida no

aumento previsto na Portaria n.º 161/2020, de 30 de junho.

A defesa de uma valorização destes profissionais e de uma atualização justa da sua tabela de honorários

foram uma preocupação do PAN na anterior legislatura e uma das propostas que constava do nosso programa

eleitoral para as eleições legislativas de 2019. Relembre-se, de resto, que inclusivamente na anterior legislatura

o PAN apresentou o Projeto de Resolução n.º 1296/XIII que, com o intuito de compensar parcialmente os anos

de congelamento, para o ano de 2019 e cumulativamente com eventuais atualizações decorrentes da Lei n.º

34/2004, de 29 de julho, propunha uma atualização dos valores constantes da tabela de honorários dos

profissionais forenses em 5%, algo que foi chumbado com o voto contra do PS, do PCP e do PEV e abstenção

do PSD e do CDS-PP.

Com a presente iniciativa o PAN, prosseguindo a sua postura ativa de defesa da valorização destes

profissionais forenses e procurando reverter o tratamento indigno dado a estes profissionais pelo Governo,

propõe que o Governo, no exercício das suas competências, altere a Portaria n.º 161/2020, de 30 de junho, de

modo a que a atualização ali prevista inclua, também, a inflação verificada no ano de 2018 e proceda a uma

revisão geral da Portaria n.º 1386/2004, de 10 de novembro, de modo a garantir uma tabela de honorários capaz

de compensar os anos de congelamento e de assegurar o efetivo, justo e adequado pagamento de honorários

e despesas, de acordo com o exigido na Lei n.º 34/2004, de 29 de julho.

Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais

aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1. Proceda à revisão da Portaria n.º 161/2020, de 30 de junho, de modo a assegurar que a atualização do

valor da unidade de referência constante da tabela anexa à Portaria n.º 1386/2004, de 10 de novembro, aplicável

ao ano de 2020, engloba também o valor do índice de preços no consumidor (sem habitação), referente ao ano

de 2018;

2. Avalie uma revisão geral da Portaria n.º 1386/2004, de 10 de novembro, de modo a garantir uma tabela

de honorários dos profissionais forenses capaz de compensar os anos de congelamento ocorridos entre 2010 e

2020, e de assegurar o efetivo, justo e adequado pagamento de honorários e despesas, de acordo com o exigido

na Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, e na Lei n.º 40/2018, de 8 de agosto.

Palácio de São Bento, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e o Deputado do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 643/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE INICIE OS PROCESSOS TENDENTES À CONSTRUÇÃO DE UMA

ESCOLA BÁSICA PARA OS 2.º E 3.º CICLOS E PARA O ENSINO SECUNDÁRIO NA FREGUESIA DE

FERNÃO FERRO

Exposição de motivos

Fernão Ferro, no concelho do Seixal, contava em 2011 com uma população superior a 17 000 habitantes,

sendo que a procura recente que a freguesia teve, também por jovens casais, deixa antever que aquela terá

aumentado desde então.

A oferta escolar na freguesia é composta por três escolas básicas de 1.º ciclo e Pré-escolar, a saber, a Escola

Básica de Fernão Ferro, a Escola Básica dos Redondos e a Escola Básica da Quinta dos Morgados. Ao todo

frequentam as três escolas 750 alunos, que, uma vez encerrado o ciclo escolar do ensino básico, serão

obrigados a seguir o exemplo dos alunos da freguesia que já hoje frequentam os 2.º e 3.º ciclos e ensino

secundário e que são obrigados a deslocarem-se para fora desta para prosseguirem os seus estudos atenta a

inexistência de escolas para os seus anos letivos.

Trata-se, pois, de uma reivindicação legítima aquela que é feita pelos habitantes de Fernão Ferro há vários

anos, reivindicação essa a que urge atender com a construção de uma escola que satisfaça a necessidade

premente de uma escola pública de qualidade, que respeite e valorize não apenas a aprendizagem dos alunos

mas também, e igualmente importante, a possibilidade de darem continuidade a um projeto educativo e formativo

num contexto de maior proximidade e integração identitária com a comunidade, facilitando o quotidiano destas

famílias que se veem atualmente confrontadas com tempos de viagem e deslocações diárias resultantes da

ausência desta resposta educativa.

A construção de uma escola de 2.º e 3.º ciclos e ensino secundário na Freguesia de Fernão Ferro tem, pois,

o mérito não apenas de assegurar a continuidade do percurso académico e do projeto educativo escolar, num

ambiente mais familiar e securizante, mas também o de permitir uma gestão escolar mais eficaz e integrada,

bem como o fortalecimento de importantes laços na comunidade escolar, com o valor pedagógico que esta

opção traz, sempre em respeito pelos padrões legais e de qualidade do ensino no que concerne ao número de

turmas.

Nestes termos, a Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, por

intermédio do presente projeto de resolução, recomenda ao Governo que inicie os processos tendentes à

construção de uma escola básica para os 2.º e 3.º ciclos e para o ensino secundário na Freguesia de Fernão

Ferro.

Palácio de São Bento, 22 de setembro de 2020.

O Deputado e as Deputadas do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 644/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO O ENVOLVIMENTO DAS FORÇAS ARMADAS NAS AÇÕES DE

PLANEAMENTO E OPERACIONALIZAÇÃO DAS MEDIDAS E AÇÕES QUE VIEREM A SER ADOTADAS

NESTA NOVA FASE DE COMBATE À PANDEMIA, NOMEADAMENTE NO APOIO AOS CIDADÃOS EM

SITUAÇÃO DE MAIOR VULNERABILIDADE E RISCO, COMO É O CASO DO APOIO AOS LARES E

INSTITUIÇÕES SOCIAIS DE TODO O PAÍS QUE PRESTAM SERVIÇOS A ESTA FRANJA DA

POPULAÇÃO MAIS VULNERÁVEL

As Forças Armadas tiveram, desde o primeiro momento, um papel fundamental e altamente diferenciador,

na contenção dos efeitos da pandemia da COVID-19, não apenas no apoio ao Serviço Nacional de Saúde como

também no apoio direto à população.

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Com efeito, os nossos militares desenvolveram, com elevada competência, ao longo dos primeiros meses

desta pandemia, diversas ações de descontaminação de lares, escolas, estabelecimentos prisionais e outras

instituições de cariz social, respondendo aos pedidos de ajuda que lhe foram chegando dos outros órgãos do

Estado. Desenvolveram ainda diversas ações de sensibilização no âmbito das boas práticas higiénico-sanitárias

em diversas escolas do País.

A importância da intervenção das Forças Armadas no combate a cenários complexos como é o caso da

pandemia COVID-19, tem sido reconhecida também no plano europeu com diversos países, como Espanha, a

reclamar a participação das Forças Armadas para auxiliar nas ações de contenção deste surto pandémico.

O Partido Social Democrata sempre afirmou desde o início do combate a esta pandemia que as Forças

Armadas são o agente de proteção civil preferencial e melhor preparado para este tipo de missões complexas,

em virtude das valências multidisciplinares e cultura organizacional.

Mas sempre defendemos que a intervenção das Forças Armadas neste tipo de missões não pode ser a de

um mero dispensador de meios, humanos ou materiais. As Forças Armadas devem assumir um papel decisivo

planeamento e operacionalização das ações de combate à COVID-19, permitindo, com isso, uma melhor

racionalização e empenhamento dos meios, representando mais eficiência no resultado.

Assim, num momento em que o número de casos está a aumentar em Portugal e também na Europa, o papel

que as Forças Armadas podem desempenhar na contenção desta pandemia, sobretudo no apoio aos cidadãos

que se encontram em situações de maior risco e vulnerabilidade, é verdadeiramente crucial.

Como já afirmámos, as Forças Armadas estão preparadas e devem ter um papel fundamental no

planeamento e operacionalização das ações a adotar nesta nova fase de combate à pandemia, sobretudo num

momento em que o país retoma a atividade escolar e se aproxima a época da gripe.

Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PSD, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais

aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

Tendo em conta o papel de agente de proteção civil preferencial das Forças Armadas no combate a este tipo

de missões complexas de combate à pandemia, recomenda-se ao Governo que envolva as Forças Armadas no

planeamento e operacionalização das ações a adotar nesta nova fase de combate à pandemia, designadamente

nas ações de apoio aos cidadãos em situação de maior vulnerabilidade e de risco como é o caso dos lares e

demais instituições sociais de todo o País que prestam serviços a esta franja da população mais desprotegida.

Palácio de São Bento, 22 de setembro de 2020.

Os Deputados do PSD: Adão Silva — Ana Miguel dos Santos — Carlos Eduardo Reis — Fernando Negrão

— Olga Silvestre — Paulo Moniz — Sérgio Marques — Pedro Roque.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 645/XIV/2.ª

POR UM SETOR DAS TELECOMUNICAÇÕES PÚBLICO E UNIVERSAL EM PORTUGAL

Depois de ter sido adiado devido à pandemia, a Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) divulgou

o novo calendário para o leilão da tecnologia de quinta geração (5G), apontando para outubro de 2020 a nova

data para o leilão dos direitos de utilização das frequências (DUF) para implementação da tecnologia (faixas 700

MHz, 900 MHz, 1800 MHz, 2,1 GHz, 2,6 GHz e 3,6 GHz).

Desde a primeira versão do regulamento do leilão que a estratégia das operadoras tem sido de resistência

às exigências do regulador, recusando os critérios de cobertura e as recomendações de partilha de

infraestruturas. Por sinal, o Governo colocou-se do lado das operadoras e tem confrontado o regulador com a

necessidade de aligeirar os critérios estipulados no regulamento do leilão.

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Contudo, e ainda antes de pensar no novo leilão, há que olhar para a situação atual da utilização do espectro

radioelétrico que é domínio público do Estado. As falhas da atual tecnologia 4G são evidentes: níveis

manifestamente insuficientes de cobertura em vários municípios e freguesias do país, com especial incidência

nas regiões do interior do país (o que acentua desigualdades territoriais e não responde ao princípio da

universalidade de acesso a este bem); preços dos mais elevados na Europa; falta de partilha de infraestruturas

entre as operadoras responsável por um mau serviço a nível nacional; altas taxas de fidelização e de

refidelização; um setor de atividade que tem vindo a precarizar os seus trabalhadores, sendo especialmente

gravoso o recurso a falso outsourcing e prestações de serviço; claro prejuízo para o Estado no que toca às

necessidades estratégicas.

Se a situação se prolongar, tudo indica que o 5G deverá trazer problemas acrescidos, tanto ao nível dos

preços rentistas já aplicados, como de cobertura insuficiente da rede a todo o território nacional. Atualmente,

apesar dos avanços tecnológicos refletidos na tecnologia 5G, são inúmeras as comunidades que se encontram

excluídas do acesso à rede.

Conforme um estudo da ANACOM, são vários os municípios com graves problemas de cobertura do serviço

móvel, com especial incidência nas regiões do interior do país, o que configura uma falha grave, por um lado

por parte das operadoras, ao colocar os interesses do acionista à frente das necessidades das populações e,

por outro, por parte do Estado ao não fiscalizar e fazer cumprir os requisitos de cobertura. Dada as exigências

acrescidas da rede 5G ao nível das infraestruturas, resultado das características da própria tecnologia,

preocupa-nos que no atual cenário, onde as operadoras beneficiam de um elevado poder de mercado, as metas

de cobertura não sejam atingidas e que sejam agravados os problemas existentes com a atual tecnologia.

Com o leilão dos direitos de utilização do espectro a decidir os próximos 20 anos das telecomunicações em

Portugal, as condições para a proteção dos consumidores e do interesse público têm de ser garantidas o quanto

antes, de modo a evitar mais duas décadas de um serviço que fica aquém das necessidades das populações.

É por isso que o Bloco de Esquerda entende ser essencial a disponibilização de um serviço público e

universal de telecomunicações para o país, resgatando para o Estado a rede básica capturada pela Altice (fruto

da privatização ruinosa da PT) e que nunca devia ter deixado a esfera pública. Esta é uma condição fundamental

para travar o despovoamento, reduzir assimetrias regionais e garantir a soberania do País.

Não podemos ignorar, neste contexto, que as audições requeridas pelo Bloco de Esquerda para audição da

ANACOM, Autoridade da Concorrência e Secretário de Estado Adjunto e das Comunicações se revelaram

importantes para compreender as dificuldades que podem advir deste leilão. Por um lado, não parecem estar

asseguradas as condições mais vantajosas para uma efetiva cobertura de rede universal em todo o território,

mas antes uma cobertura que acaba por deixar territórios menos «apetecíveis» para o lucro dos operadores

privados de fora. Por outro lado, mantém a lógica de privatização tanto de estruturas como do próprio espectro,

o que também nos merece oposição.

Deste modo, o leilão dos DUF do 5G deve ser suspenso até estarem reunidas as condições de salvaguarda

do interesse público através da constituição de um operador público que seja detentor da rede básica de

telecomunicações e responsável pela sua gestão. O histórico nas telecomunicações em Portugal de privatização

de infraestruturas de telecomunicações, de Parcerias Público-Privadas para assegurar serviços fundamentais

que cabem ao Estado e de um regime de quase oligopólio por parte de 3 operadores perante milhões de

consumidores só pode ter como conclusão o resgate para a esfera pública de um dos mais importantes e

estratégicos setores da economia em qualquer País.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1. Promova uma alteração na estratégia para o setor das telecomunicações em Portugal, nomeadamente

tendo em conta a necessidade de garantia de domínio público sobre o espectro radioelétrico.

2. Suspenda o leilão da tecnologia de quinta geração, optando pela gestão e exploração públicas na gestão

de redes.

3. Restabeleça uma operadora 100% pública com controlo e gestão sobre as redes de telecomunicações,

que tenha como objetivo a universalidade do acesso a telecomunicações (tanto para cidadãos como a nível de

infraestruturas, nomeadamente ferroviárias e rodoviárias) e a oferta de qualidade e acessível economicamente.

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4. Consolide, no operador público, a capacidade de desenvolvimento e aplicação de tecnologias e sistemas

associadas ao 5G, bem como a recuperação de infraestruturas e o desenvolvimento de fibra ótica, cabos

submarinos e sistemas críticos para o País.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge

Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua — João Vasconcelos

— José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 646/XIV/2.ª

PELA CONSTRUÇÃO DE UMA ESCOLA BÁSICA DE 2.º E 3.º CICLO E SECUNDÁRIA NA FREGUESIA

DE FERNÃO FERRO, NO CONCELHO DO SEIXAL

Todos têm direito à educação e ao ensino, devendo o Estado garantir a igualdade de oportunidades de

acesso e de êxito escolar através, nomeadamente, da criação de uma rede de estabelecimentos públicos de

ensino que cubra as necessidades de toda a população.

Infelizmente, são ainda conhecidos casos de comunidades que não têm estabelecimentos de ensino, o que

dificulta o acesso das crianças e jovens à aprendizagem.

Um desses exemplos é a Freguesia de Fernão Ferro, no concelho do Seixal, que não possui nenhuma escola

de 2.º e 3.º Ciclo do ensino básico, nem do ensino secundário.

Contudo, sabemos que segundo os Censos de 2011, a Freguesia de Fernão Ferro, com um total de 17 059

habitantes, contava, no ano letivo 2018-2019 com 125 crianças na educação pré-escolar e 625 alunos no 1.º

Ciclo, distribuídos por 3 jardins de infância e 3 escolas do 1.º ciclo do ensino básico.

Face à ausência de uma escola do 2.º e 3.º Ciclo do ensino básico e do ensino secundário, os alunos que

frequentam as três escolas do 1.º Ciclo de Fernão Ferro são forçados a prosseguir os seus estudos em escolas

localizadas noutras Freguesia, como Arrentela ou Quinta do Conde, ou até mesmo no concelho vizinho de

Sesimbra.

Esta situação está a tornar-se insustentável, na medida em que a Escola Básica Dr. Carlos Ribeiro, sede do

Agrupamento de Escolas de Pinhal de Frades, que abrange as escolas da Freguesia de Fernão Ferro, conta

com 10 turmas a mais do que a sua capacidade, de acordo com a sua tipologia, o não garante a prestação de

um ensino de qualidade.

Por tudo isto, acompanhamos as preocupações e pretensões dos mais de quatro mil peticionários que

assinaram a Petição n.º 22/XIV/1.ª, com o título «Pela construção de uma escola básica do 2.º e 3.º ciclos do

ensino básico e ensino secundário em Fernão Ferro, Seixal».

De facto, como mencionam os peticionários, a Carta Educativa do Seixal, homologada pelo Ministério da

Educação em 2006, reconhece a urgência da construção de uma escola básica integrada em Fernão Ferro,

tendo inclusive a Câmara Municipal do Seixal já disponibilizado os terrenos para a sua construção. Contudo, até

à data, nada foi feito.

Importa, também, ter em conta que a Freguesia de Fernão Ferro tem registado ao longo do tempo uma

evolução demográfica positiva, tendo sido uma das Freguesias do Município do Seixal com maior aumento

percentual da sua população, sendo expressiva essa tendência de crescimento também na população mais

jovem. Este aumento vem reforçar a necessidade de construção de mais equipamentos escolares na medida

em que é previsível que a situação atual seja agravada pelo aumento populacional.

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Face ao exposto, consideramos urgente que seja promovida a construção de uma escola básica de 2.º e 3.º

Ciclo e de uma escola do ensino secundário na Freguesia de Fernão Ferro, no concelho do Seixal, dando

cumprimento ao contemplado na Carta Educativa do Seixal, dotando aquela freguesia de um equipamento

educativo que garanta um ensino de qualidade e a igualdade de oportunidades.

Nestes termos, a Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, por

intermédio do presente projeto de resolução, recomenda ao Governo que promova a construção de uma escola

básica de 2.º e 3.º Ciclo e de uma escola do ensino secundário na Freguesia de Fernão Ferro, no Concelho do

Seixal.

Palácio de São Bento, 22 de setembro de 2020.

A Deputada não inscrita, Cristina Rodrigues.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 647/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE ADOTE UM CONJUNTO DE MEDIDAS DE VALORIZAÇÃO DOS

PROFISSIONAIS DO SECTOR DA CULTURA, E QUE SUBMETA À APROVAÇÃO DA ASSEMBLEIA DA

REPÚBLICA UM ESTATUTO JURÍDICO DO INTERMITENTE NAS ÁREAS ARTÍSTICAS

A crise sanitária provocada pela COVID-19 trouxe consigo uma crise social e económica, cuja dimensão total

dos respetivos impactos não é neste momento ainda conhecida na totalidade, mas que afetou a generalidade

dos sectores de atividade.

O sector da cultura foi um dos sectores que mais se ressentiu com os efeitos da crise sanitária e é um

daqueles onde se estão a viver situações sociais muito preocupantes. Tal fica a dever-se ao facto este ter sido

um dos primeiros sectores a sofrer com a onda inicial de medidas restritivas tomadas pelo Governo em resposta

à crise sanitária sendo que, muito provavelmente, serão os últimos a conseguir retomar em pleno as suas

atividades normais. Apesar de, nos últimos meses, se ter verificado um abrandamento das medidas de

contenção, o sector da cultura ficou longe de retomar em pleno as suas atividades, tendo sempre o espectro de

eventuais novas restrições ditadas pela evolução epidemiológica.

Embora o Governo esteja neste momento a elaborar um estudo sobre o sector artístico em Portugal e os

impactos da crise a curto e médio prazo, por força do disposto na Resolução do Conselho de Ministros n.º

41/2020, a verdade é que os dados de um estudo recente do Observatório de Políticas de Comunicação e

Cultura da Universidade do Minho1 já nos dão alguns indícios relevantes sobre o impacto da crise sanitária no

sector da cultura. Segundo este estudo, 27,3% e 20,9% das organizações do sector estimam, respetivamente,

ter uma quebra de 75% e entre 50% e 75% das receitas, 34,6% das organizações perdeu ou perderá postos de

trabalho este ano e 70,5% dos profissionais do sector registaram perdas de rendimento superiores a 50% no

volume de negócios.

Os fortes impactos da crise sanitária no sector da cultura demonstram a precariedade laboral a que estão

sujeitos estes profissionais e o quão frágil é este sector do ponto de vista social e económico. Este contexto é

também resultado de anos de desinvestimento e desinteresse no sector por parte dos sucessivos Governos.

Ciente dos graves impactos da crise sanitária no sector da cultura, o Grupo Parlamentar do PAN apresentou

diversas propostas de resposta às necessidades do sector, que não foram aprovadas, como foi o caso do Projeto

de Lei n.º 337/XIV/1.ª, que propôs que as entidades públicas que cancelassem ou adiassem eventos culturais

tivessem de cumprir sempre com o pagamento dos serviços contratados no momento do cancelamento ou

adiamento, ou da proposta de alteração ao Orçamento Suplementar, que visava o reforço de 2 milhões de euros

da linha de apoio a equipamentos culturais independentes e a atribuição de 1 milhão de euros à linha de apoio

1 Dados disponíveis na seguinte ligação: http://polobs.pt/estudo/impactoss-da-covid-19-no-setor-cultural-portugues/.

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social aos artistas, autores, técnicos e outros profissionais das artes por forma a alargar o respetivo âmbito de

beneficiários.

Para o PAN a emergência social no sector cultura exige medidas imediatas que assegurem um apoio social

efetivo aos profissionais do sector, mas também medidas tendentes a corrigir os problemas estruturais do sector

que há muito deveriam ter sido resolvidos.

Com a presente iniciativa o PAN procura assegurar que o Governo, no exercício das suas competências,

adote um conjunto de um conjunto de medidas de valorização dos profissionais do sector da cultura,

reivindicadas há muito pelas suas associações representativas e que procuram garantir soluções que iniciem a

resolução de problemas estruturais do sector.

Em concreto, neste leque de medidas, para além da realização de um conjunto de estudos que melhor

permitam perceber a dimensão da precariedade no sector, destacamos a proposta de definição formal e de

reenquadramento das atividades profissionais ligadas ao sector das artes, do espetáculo e do audiovisual

(nomeadamente no âmbito da classificação portuguesa de profissões e do Código das Atividades Económicas)

e a proposta de consagração de formação específica da Autoridade para as Condições do Trabalho para a

fiscalização das relações laborais do sector da Cultura (uma medida que, articulada com outras, contribuiria de

forma significativa para o combate à precariedade no sector).

Paralelamente, com a presente iniciativa o Grupo Parlamentar do PAN propõe ainda que o estatuto jurídico

do intermitente nas áreas artísticas, que está a ser elaborado pelo Governo, por força da Resolução do Conselho

de Ministros n.º 41/2020, tenha de ser entregue e submetido à aprovação da Assembleia da República até ao

final do ano de 2020. Este estatuto tem de ser objeto de discussão na Assembleia da República, uma vez que

corresponde a uma reivindicação antiga dos profissionais do sector e assegurará um enquadramento jus laboral

destes profissionais adaptado às suas especificidades (pela natureza destas profissões o trabalho prestado tem

um carácter temporário e descontínuo, uma carga horária irregular e uma instabilidade profissional) e capaz de

assegurar uma regulamentação da atividade, de garantir direitos mínimos, uma maior proteção social e um

enquadramento fiscal mais justo.

Nestes termos e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado e as

Deputadas do PAN abaixo assinados, propõem que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1. Apresente e submeta à aprovação da Assembleia da República, até ao final do ano de 2020, um estatuto

jurídico do intermitente nas áreas artísticas;

2. Avalie a definição formal e o reenquadramento das atividades profissionais ligadas ao sector das artes,

do espetáculo e do audiovisual, nomeadamente no âmbito da classificação portuguesa de profissões, do Código

das Atividades Económicas e dos parâmetros do Instituto Nacional de Estatística;

3. Elabore um levantamento exaustivo do tecido cultural existente a partir das Direções Regionais de Cultura

e da Direcção-Geral das Artes, como forma de compreender os intervenientes no sector e fazer o diagnóstico

das necessidades específicas no âmbito nacional, regional, intermunicipal e municipal, particularmente no que

toca à proteção laboral e social dos profissionais do sector das artes, do espetáculo e do audiovisual;

4. Realize, em articulação com os parceiros sociais, o rastreio e classificação das atividades profissionais

ligadas ao sector das artes, do espetáculo e do audiovisual, de modo a assegurar a revisão das listagens

existentes e a potenciar a utilização do Registo Nacional de Profissionais do Sector das Atividades Artísticas,

Culturais e de Espetáculo;

5. Adote medidas de combate à precariedade laboral no sector das artes, do espetáculo e do audiovisual,

nomeadamente garantindo a formação específica da Autoridade para as Condições do Trabalho para a

fiscalização das relações laborais do sector.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e o Deputado do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 648/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE ADOTE UM CONJUNTO DE MEDIDAS DE COMBATE AOS

PARAÍSOS FISCAIS E QUE REALIZE UMA AVALIAÇÃO DE CUSTO-BENEFÍCIO DO IMPACTO GLOBAL

ECONÓMICO, SOCIAL E FISCAL DA ZONA FRANCA DA MADEIRA

Desde o início da crise económica e social provocada pela COVID-19 que, por diversas vezes, o PAN

defendeu que o Governo deveria tomar medidas para assegurar que as perdas de receita e o aumento

significativo de despesa provocados por estas crises, bem como a recuperação económica no pós-COVID-19,

não se iriam fazer com base num modelo que impõe aos cidadãos e cidadãs medidas de austeridade assentes,

por exemplo, em aumentos dos impostos sobre os rendimentos do trabalho, cortes de salários ou promoção da

precariedade laboral, devendo antes basear-se antes em opções políticas, orçamentais e fiscais que tivessem

a coragem de pôr em causa certos interesses instalados que, durante os últimos anos, têm capturado os

recursos financeiros do Estado.

Foi com base nesta visão que, através do Projeto de Resolução n.º 443/XIV/1.ª, chumbado com os votos

contra de PS, PSD e CDS-PP e a abstenção de PCP, CH e IL, propusemos que o Governo assegurasse a

renegociação dos montantes dos empréstimos no âmbito do Fundo de Resolução, a eliminação total da isenção

de impostos sobre os produtos petrolíferos e a adoção, em articulação com a União Europeia, de mecanismos

de combate ao branqueamento de capitais e aos fenómenos de evasão e ilação fiscal assentes em paraísos

fiscais, e que, por via de proposta de alteração ao Orçamento Suplementar, chumbada com os votos contra de

PS e PSD e abstenção do PCP e do CDS-PP, propusemos a renegociação dos contratos dos contratos de

parcerias público-privadas do sector rodoviário de modo a assegurar uma redução significativa dos encargos

para o erário público.

Tendo em conta que a crise económica provocada pela COVID-19 não só não desapareceu, como continua

a ter uma forte carga de imprevisibilidade, a necessidade de medidas de compensação orçamental não só não

desapareceu, como é urgente tendo em conta o pouco que tem sido feito pelo Governo nesta matéria.

O domínio do combate ao branqueamento de capitais e aos fenómenos de fraude, evasão e elisão fiscal

assentes em paraísos fiscais é um dos domínios, onde, devido às perdas significativas de receita que lhe estão

associadas, onde se exigia uma ação mais contundente da parte do Governo, designadamente no quadro da

União Europeia e de outras organizações internacionais de que Portugal faz parte.

Os relatórios de atividades desenvolvidas de combate à fraude e evasão fiscais e aduaneiras, referentes aos

anos de 20181 e de 20192, elaborados pelo Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais, demonstram-

nos a dimensão das perdas de receita que o nosso país teve com alguns dos recentes escândalos internacionais

envolvendo paraísos fiscais. Soubemos, por exemplo, que os casos Malta Files,Swissleaks e Panamá Papers

fizeram o nosso país perder, respetivamente, 9 milhões, 1 milhão, e 5,5 milhões de euros. Sublinhe-se que o

valor recuperado pelo nosso país, por exemplo, no âmbito do caso Panamá Papers fica muito aquém dos 226

milhões, 163 milhões e 146 milhões de euros recuperados, respetivamente, pelo Reino Unido, pela Alemanha e

por Espanha, entre 2016 e 2019.

O relatório referente ao ano de 2019 demonstra que, naquele ano, o valor das recuperações associadas às

offshores se cifrou em apenas em 1.4 milhões de euros. Tal valor é, também, manifestamente insuficiente,

alertando-nos para a necessidade de tomar medidas mais eficazes para evitar e recuperar estas perdas, tendo

em conta que, segundo um relatório da Tax Justice Network3, só para a Holanda o nosso país perde em impostos

cerca de 236 milhões de euros por ano.

1 Disponível na seguinte ligação: https://www.portugal.gov.pt/download-ficheiros/ficheiro.aspx?v=5e7d9854-072b-48db-8da3-3f2fef21b78e. 2 Disponível na seguinte ligação: https://www.portugal.gov.pt/download-ficheiros/ficheiro.aspx?v=e2d8ee56-2f74-426e-9ef3-1ba2a20dfc82. 3 Disponível na seguinte ligação: https://www.taxjustice.net/wp-content/uploads/2020/04/Time-for-the-EU-to-close-its-own-tax-havens_April-2020_Tax-Justice-Network.pdf.

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Os dados destes relatórios, apesar de nos deixarem a sensação de que os valores recuperados ficam aquém

do que era suposto, demonstram-nos a dimensão relevante das perdas do nosso País para paraísos fiscais e

alertam-nos para a necessidade de medidas eficazes para travar tais perdas.

De resto, no passado mês de maio, a própria Comissão Europeia4 reconheceu que, de acordo com os dados

da Europol, durante a crise económica, social e sanitária da COVID-19, tem-se assistido a um aumento dos

procedimentos de branqueamento de capitais, o que ditou a necessidade de se lançar um plano de combate ao

branqueamento de capitais na União Europeia assente em 6 pontos de ação que pretende, por exemplo,

assegurar uma maior articulação entre Estados-Membros e a União Europeia, assegurar uma supervisão

europeia nesta matéria, o aperfeiçoamento das normas europeias nesta matéria ou a harmonização das normas

transpostas pelos países da União Europeia, para «evitar lacunas que são exploradas pelos criminosos».

Por isso, com a presente iniciativa e tendo em vista o objetivo de limitar estas perdas de receita, o PAN

pretende garantir que a defesa de mecanismos de combate eficaz ao branqueamento de capitais e aos

fenómenos de fraude, evasão e elisão fiscal assentes em paraísos fiscais, é um dos principais vetores de

atuação do nosso País no quadro da União Europeia e de outras organizações internacionais de que Portugal

faz parte.

Paralelamente e porque para o PAN este problema tem de ser encarado, também, na sua dimensão interna,

com a presente iniciativa pretendemos que o Governo realize uma avaliação de custo-benefício abrangente do

impacto global económico, social e fiscal da Zona Franca da Madeira, e apresente os respetivos resultados à

Assembleia da República. A Zona Franca da Madeira é uma das áreas de risco em matéria de fraude, evasão

e elisão fiscal, que tem merecido a atenção da Comissão Europeia – que tem mostrado dúvidas quanto à

compatibilidade do regime de benefícios fiscais ali existente com as regras europeias relativas ao mercado

interno – e que implicou, segundo dados do Ministério das Finanças, entre 2015 e 2018, a realização de mais

de 470 inspeções que obrigaram as empresas a fazer correções em IRC na ordem dos 200 milhões de euros.

Tal contexto, associado à não inclusão da Zona Franca da Madeira no âmbito da análise do relatório do grupo

de trabalho do estudo dos benefícios fiscais em Portugal, apresentado no ano de 2019, exige que se faça uma

avaliação do impacto global económico, social e fiscal, ponderado as vantagens e desvantagens deste regime.

Nestes termos e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado e as

Deputadas do PAN abaixo assinados, propõem que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1. Tome as diligências necessárias, no quadro da União Europeia e de outras organizações internacionais

de que Portugal faça parte, para assegurar a adoção de mecanismos de combate eficaz ao branqueamento de

capitais e aos fenómenos de fraude, evasão e elisão fiscal assentes em paraísos fiscais;

2. Realize uma avaliação de custo-benefício abrangente do impacto global económico, social e fiscal do

Centro Internacional de Negócios da Zona Franca da Madeira, e apresente os respetivos resultados à

Assembleia da República.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e o Deputado do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.

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4 Declaração disponível em: https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/pt/speech_20_830.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 649/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE SUBMETA AO SECRETÁRIO-GERAL DA ONU UMA PROPOSTA

DE ALTERAÇÃO AO ESTATUTO DE ROMA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL, QUE ASSEGURE

A CONSAGRAÇÃO DO CRIME DE ECOCÍDIO NA LISTA DE CRIMES PREVISTOS NO ESTATUTO DE

ROMA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Exposição de motivos

A pandemia da COVID-19 veio demonstrar que a nossa relação atual com a natureza é insustentável e nos

expõe a perigos de saúde e a custos económicos que põem em causa a vida como a conhecemos.

Atualmente, são praticados vários crimes sobre os ecossistemas e, bem assim, sobre a exploração de

recursos naturais, de forma impune. São exemplo disso a desflorestação da Amazónia, para fins económicos

relacionados com explorações agrícolas e pecuárias e, na Ásia, a destruição de vastos habitats para a

exploração de óleo de palma. Todos os atos que prejudiquem o equilíbrio dos limites planetários têm

consequências diretas nos ecossistemas e na vida humana. O sistema terrestre é um bem comum que não deve

poder ser destruído por alguns em prejuízo de todos os outros.

Já há muito que os cientistas nos vêm alertando. A Stockholm Resilience Centre (adiante SRC)1 demonstrou

que a abordagem ao «sistema terrestre» deve ser holística. O «sistema terrestre» corresponde aos processos

físicos, químicos e biológicos que interagem com o planeta e inclui a terra, oceanos, atmosfera, polos e os ciclos

naturais do planeta – carbono, água, azoto, fósforo, enxofre entre outros. A SRC definiu os «limites planetários»,

um conceito que envolve limites ambientais, nas vertentes das alterações climáticas, da biodiversidade, do uso

do solo, da acidificação dos oceanos, do uso de água potável, dos processos biogeoquímicos, da concentração

de ozono e aerossóis na atmosfera e da poluição química.

O objetivo da definição dos referidos «limites planetários» foi a possibilidade de estipular um «espaço

operacional seguro para a humanidade» como pré-condição para o desenvolvimento sustentável. Existem

evidências científicas de que as ações humanas, desde a Revolução Industrial, se tornaram no principal motor

das mudanças ambientais globais. De acordo com os cientistas que definiram estes conceitos, «transgredir um

ou mais limites planetários pode ser prejudicial ou até catastrófico devido ao risco de cruzar limiares que

desencadearão mudanças ambientais abruptas não lineares em sistemas de escala continental a planetária»,

alterando a vida na Terra, tal como a conhecemos.

Desde 2009, quatro dos nove limites planetários já foram ultrapassados, nomeadamente, as alterações

climáticas, a perda de biodiversidade, o uso do solo e os processos biogeoquímicos, enquanto que os restantes

correm um risco iminente de serem ultrapassados.

No que se refere às alterações climáticas, o cenário é dramático. Em agosto de 2020 atingimos já 414 partes

por milhão (ppm) de dióxido de carbono na atmosfera2. O incremento anual tem sido superior a 2 ppm. O

Intergovernmental Panel on Climate Change (adiante IPCC)3 aponta as 450 ppm como o nível de concentração

máximo que conduzirá ao aquecimento médio de 2 graus centígrados, valor acima do qual se perde a

estabilidade climática que temos conhecido nos últimos anos e entramos numa fase de impactos catastróficos

para a vida no planeta. Contudo, tal como reconhecido já pelo IPCC, os efeitos de «autoalimentação climática»,

como o degelo do permafrost, a desflorestação da amazónia e o degelo dos glaciares, entre outros, que se

previa que tivessem início numa fase mais adiantada do aquecimento global, já começaram. Em 2018, foi

publicado um estudo de cientistas da SRC 4 (Trajectories of the Earth System in the Anthropocene) que veio

revelar que, afinal, tendo em conta os efeitos de «autoalimentação climática», o montante de concentração de

CO2 e na atmosfera não pode ultrapassar as 430 partes por milhão, para garantir que não excedemos a barreira

dos 2 graus centígrados. Ao atual ritmo de emissões (mais de 2 ppm por ano) tal significa que hoje temos menos

de 8 anos para garantir a nossa sobrevivência neste planeta.

1 Dados disponíveis em: https://www.stockholmresilience.org/research/planetary-boundaries.html 2 https://climate.nasa.gov/vital-signs/carbon-dioxide/ 3 https://www.ipcc.ch 4 https://www.pnas.org/content/115/33/8252

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É altamente improvável não ultrapassarmos a barreira do 2ºC sem uma alteração profunda e imediata do

nosso modo de vida, a nível global, incluindo os atuais modelos globais de governação dos bens comuns (limites

planetários), e sem a utilização de tecnologias de captura e armazenamento de CO2 (CCS – Carbon Capture

and Storage 5).

As Nações Unidas, em reação à presente pandemia por COVID-19 declararam que «no final do dia, a saúde

das pessoas e a saúde do planeta estão intimamente relacionadas»6.

A Organização das Nações Unidas para o ambiente afirma também que a atividade humana alterou todos os

cantos do planeta, de terra ao oceano e que, à medida que continuamos a invadir incansavelmente a natureza

e a degradar os ecossistemas, colocamos em risco a saúde humana, salientando que 75% de todas as doenças

infeciosas emergentes são zoonóticas, ou seja, vírus originários da transferência de animais para humanos.

A perda de habitats e da biodiversidade tem acelerado a emergência das doenças zoonóticas. As alterações

climáticas, por conduzirem a uma perda da biodiversidade, dão também o seu contributo indireto.

Em síntese, a pandemia por COVID-19 permitiu-nos um primeiro vislumbre do que poderá ser o nosso futuro

se não agirmos de forma imediata e assertiva na forma como lidamos com a natureza, com a biodiversidade e

com as alterações climáticas 7.

Estamos a menos de 8 anos do ponto de não retorno ao nível da estabilidade climática mundial. A questão

do ponto de não retorno é de extrema importância. É mesmo sem retorno, pelo menos durante séculos. Depois

de atingirmos uma determinada concentração de gases com efeito de estufa na atmosfera já não há mais nada

que possamos fazer porque se dá um reequilíbrio natural do sistema terrestre que só poderá regressar ao clima

que conhecemos hoje e que tem sido a base da sustentação da vida como a conhecemos, nos últimos 12 mil

anos, vários séculos depois.

Eventos climáticos extremos, como cheias, furacões, secas, incêndios florestais, subida do nível do mar,

escassez de água potável, desertificação de extensos territórios (os cientistas dizem que abaixo do paralelo 40

os territórios serão inabitáveis. Em Portugal o paralelo 40 é na Figueira da Foz), disseminação de doenças, entre

outros efeitos que nos parecem inimagináveis. Sobre a disseminação de doenças os cientistas preveem que

ocorra via as atuais doenças tropicais que passarão a ocorrer mais a norte (e mais a sul, consoante os

hemisférios) e também por via dos milhares de vírus e bactérias que estão inativos nas terras congeladas do

Ártico (permafrost), terras essas que estão já a descongelar 8.

Do ponto de vista económico, como já reiteradamente afirmado por entidades como a OCDE e o Banco

Mundial, o custo de não reduzir emissões de gases com efeito de estufa é muito superior ao custo da redução

de emissões, seja pelos custos de resposta às diferentes catástrofes provocadas pelas alterações climáticas

seja pelos custos da adaptação dos territórios às mesmas.

Mais, face ao eminente colapso dos limites planetários, importa perceber como é que cá chegámos, quem

mais contribuiu para as alterações climáticas, quem mais sofrerá com o impacto das alterações climáticas e o

que poderemos ainda fazer.

Entre a década de 50 e 1988, ano em que atingimos as 350 partes por milhão de dióxido de carbono na

atmosfera, valor limite do que é considerado o «espaço seguro para a humanidade», o acréscimo anual da

concentração de CO2 na atmosfera foi de cerca de 1,2 partes por milhão. Desde então e até ao ano 2000, o

acréscimo anual da concentração de CO2 na atmosfera acelerou para 1,6 partes por milhão. Na primeira década

do século XXI assistimos a um acréscimo anual de concentração de CO2 de 2,1 partes por milhão. Continuamos

a acelerar as emissões de gases com efeito de estufa na última década. Entre 2010 e 2015 tivemos um

acréscimo anual de 2,4 partes por milhão e, entre 2015 e 2019, o acréscimo anual foi de 2,5 partes por milhão.

Estes números demonstram bem que, até agora, o mundo tem sido incapaz de travar o acréscimo de emissões

e evitar esta catástrofe global.

Até 2004, o maior emissor mundial foi os Estados Unidos da América, ultrapassado pela China, desde então.

Neste momento a China emite mais de o dobro dos Estados Unidos. Estes dois países em conjunto, que

representam 22,5% da população mundial emitem 36% do total dos Gases com efeito de estufa. De seguida

temos um conjunto de oito países, Canadá, Alemanha, Irão, Japão, Brasil, Indonésia, Rússia e Índia que

5 Dados disponíveis na seguinte ligação: http://www.ccsassociation.org/what-is-ccs/ 6Dados disponíveis na seguinte ligação: https://www.unenvironment.org/news-and-stories/statement/unep-statement-covid-19 7 Dados disponíveis na seguinte ligação: https://www.theguardian.com/world/2020/apr/27/halt-destruction-nature-worse-pandemics-top-scientists?CMP=share_btn_tw 8 http://www.bbc.com/earth/story/20170504-there-are-diseases-hidden-in-ice-and-they-are-waking-up

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contribuem com 26% para as emissões mundiais. Os restantes 185 países emitem 38% do total dos Gases com

efeito de estufa.

No que respeita à intensidade dos efeitos das alterações climáticas e respetiva capacidade de adaptação os

10 países mais vulneráveis encontram-se na África Sub-saariana, 27 dos 36 países europeus são classificados

como de baixo risco e os Estados Unidos estão na 161.ª posição de nível de risco, num total de 193 países.

Cada pessoa na África Sub-saariana produz em média 0,8 ton CO2 por ano, na Europa 6,4 ton CO2 e nos

Estados Unidos 16,5 ton CO2. É evidente quem nos conduziu a esta situação, os países mais ricos e quem mais

a vai sofrer, os países mais pobres.

O Banco Mundial estima que as alterações climáticas, até 2050, irão criar mais de 140 milhões de migrantes

de zonas da África, América Latina e Sul da Ásia.

Em junho de 2019, as Nações Unidas apresentaram um relatório, sobre direitos humanos, em que alertaram

que, e passo a citar, «a distribuição desigual dos impactos das alterações climáticas nas regiões em

desenvolvimento e regiões desenvolvidas coloca o mundo em risco de ‘apartheid climático’, no qual ‘os ricos

pagam para escapar ao sobreaquecimento, fome e conflito enquanto que o resto do mundo sofre.’»

A situação em que o planeta se encontra é preocupante e injustificável. Seja porque não defendemos o bem

mais precioso que é a vida, seja porque mesmo do ponto de vista económico representará uma perda para

todos, como já repetidamente alertado pela OCDE, seja também porque será uma catástrofe especialmente

sentida por quem menos para ela contribuiu.

Uma das mudanças que urge fazer, de forma a desincentivar a destruição de ecossistemas, é a consagração

do crime de ecocídio, no âmbito do Estatuto de Roma9.

Esta temática encontra-se, inclusive, já em debate pela sociedade civil e em discussão no próprio TPI10.

O tribunal penal internacional (TPI) é o primeiro tribunal internacional permanente e baseado num tratado (o

Estatuto de Roma, adotado a 17 de julho de 1998 por uma Conferência Diplomática reunida para o efeito) criado

com o objetivo de julgar sujeitos individuais pela prática dos mais graves crimes internacionais: genocídio, crimes

contra a Humanidade e crimes de guerra. Constitui uma organização independente da Organização das Nações

Unidas (ONU), embora tenha ligação: o projeto de Estatuto do TPI foi preparado pela Comissão de Direito

Internacional e apresentado à Assembleia Geral da ONU em 1994, tendo sido a Assembleia Geral que instituiu

o Comité Ad Hoc (1994) e o Comité Preparatório (1995) sobre o Estabelecimento de um Tribunal Penal

Internacional.

O Estatuto de Roma entrou em vigor a 1 de julho de 2002, ao atingir a 60.ª ratificação, tendo o seu primeiro

julgamento tido início a 26 de janeiro de 2009. A 11 de junho de 2010, a Conferência de Revisão do Estatuto de

Roma (realizada em Kampala, Uganda) adotou, por consenso, uma emenda ao Estatuto com uma definição do

crime de agressão e estabelecendo o regime de acordo com o qual o Tribunal exercerá jurisdição sobre este

crime. A Conferência de Estados Partes deliberou, a 14 de dezembro de 2017, uma vez atingida a 30.ª ratificação

desta emenda, ativar a jurisdição do TPI sobre o crime de agressão, com efeitos a partir de 17 de julho de 2018.

Com a presente proposta o PAN, cumprindo o disposto no seu programa eleitoral, propõe que a Assembleia

da República tome uma posição simbólica no sentido de que o Governo apresente uma proposta de alteração

ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional e que assegure a consagração do crime de ecocídio na

lista de crimes que figura no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

A proposta de inclusão do crime de ecocídio no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, ao abrigo

do disposto no artigo 121.º do Estatuto, poderá ser realizada por qualquer estado parte da convenção, mediante

o envio do texto das proposta de alteração ao Secretário-Geral da ONU, que o comunicará a todos os Estados

Partes, que no âmbito da Assembleia dos Estados Partes decidirá, por maioria dos seus membros presentes e

votantes, se deverá examinar a proposta, sendo que caso se decida pelo exame da proposta a sua adoção

ocorrendo a adoção exigirá a maioria de dois terços dos Estados Partes, quando não for possível chegar a um

consenso.

O enquadramento do crime de ecocídio no direito penal internacional, que o PAN agora quer que a

Assembleia da República defenda junto do Governo, ainda que no atual contexto de emergência climática

assuma uma importância crucial, a verdade é que não é uma discussão nova.

9 http://gddc.ministeriopublico.pt/instrumento/estatuto-de-roma-do-tribunal-penal-internacional-22 10 https://asp.icc-cpi.int/iccdocs/asp_docs/ASP18/ASP18.Journal.29Nov19-ENG.pdf#search=ecocide

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Em 1972, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, conhecida como Conferência

de Estocolmo, abordou, pela primeira vez, o tema do crime internacional de ecocídio. Olof Palme, Primeiro-

Ministro Sueco, alertou para o uso massivo de produtos químicos e de bulldozers na Guerra do Vietname e

instou os estados a que urgentemente debatessem, de forma aprofundada, este tema. Nesta ocasião Indira

Gandhi, representante da India, defendeu que a destruição de ecossistemas deveria ser considerada um crime

contra a humanidade.

Nos anos 80, a Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas chegou a incluir o crime ambiental no

Projeto de Código de Crimes Contra a Paz e a Segurança da Humanidade, que mais tarde se tornaria o Estatuto

de Roma do Tribunal Penal Internacional, tendo inclusivamente existido algumas versões posteriores que foram

ao ponto de afirmar que o crime de ecocídio poderia ser estabelecido independentemente da intenção do

agressor de causar danos ambientais. Contudo, apesar do apoio de muitos países, o crime internacional de

ecocídio acabou por não ficar expressamente consagrado no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional,

que apenas prevê a punição no âmbito dos crimes de guerra para os casos em que é lançado intencionalmente

um ataque, sabendo que o mesmo causará danos prejuízos extensos, duradouros e graves no meio ambiente

que se revelem claramente excessivos em relação à vantagem militar global concreta e direta que se previa.

Nos últimos anos várias têm sido as vozes favoráveis à consagração do crime de ecocídio no âmbito do

Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Em 2010, Polly Higgins apresentou uma proposta de

alteração ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, que assegurava a consagração do crime de

ecocídio no âmbito do elenco de crimes referidos no artigo 5.º, definindo-o como a «degradação parcial ou total

dos ecossistemas, por parte do homem ou de outras causas, que diminui significativamente o aproveitamento

do território pelos habitantes». Em 2019, o Papa Francisco defendeu, no âmbito do 20.º Congresso da The

International Association of Penal Law, afirmou o seu apoio público à consagração do crime de ecocídio na lista

de crimes internacionais contra a paz constantes do artigo 5.º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal

Internacional, afirmando que «um sentido elementar de justiça implicaria que alguns comportamentos, dos quais

as empresas são geralmente responsáveis, não fiquem impunes» e apelou «a todos os líderes e representantes

do sector que contribuam para garantir a proteção adequada da nossa casa comum». Mais recentemente, em

dezembro de 2019, na 18.ª sessão da Assembleia dos Estados Partes do Estatuto de Roma do Tribunal Penal

Internacional, os Estados de Vanuatu e das Maldivas solicitaram à comunidade internacional que ponderassem

de forma séria o acréscimo do crime de ecocídio ao elenco de crimes internacionais previstos no Estatuto.

A consagração do crime internacional de ecocídio, que agora o PAN quer que a Assembleia da República

defenda de forma simbólica, assume uma extrema importância porque evita o risco ou a danificação extensiva,

destruição ou perda de ecossistemas, proíbe as decisões que resultem em danos extensos, destruição ou perda

de ecossistemas, e impede tomadas de decisão de natureza política, financeira e empresarial que possam trazer

danos significativos. Tal consagração garantirá, ainda, um dever de diligência no sentido de que a comunidade

internacional, os Estados, o poder político e as empresas deverão impedir o risco ou a danificação extensiva,

destruição ou perda de ecossistemas e velar pela sua proteção.

Nestes termos e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado e as

Deputadas do PAN abaixo assinados, propõem que a Assembleia da República recomende ao Governo que,

nos termos do disposto no artigo 121.º Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, submeta ao

Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas uma proposta de alteração ao Estatuto de Roma do

Tribunal Penal Internacional, que assegure a consagração do crime de ecocídio na lista de crimes que figura no

Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

Palácio de São Bento, 22 de setembro de 2020.

O Deputado e as Deputadas do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 650/XIV/2.ª

INTENSIFICAÇÃO E CREDIBILIZAÇÃO DA AVALIAÇÃO DE IMPACTE AMBIENTAL DAS OBRAS

INTEGRADAS NO PROJETO DE ACESSIBILIDADES MARÍTIMAS AO PORTO DE LEIXÕES

O Partido Ecologista «Os Verdes» tem vindo a acompanhar as preocupações da população, das autarquias

e dos diversos setores de atividade relativamente aos impactos ambientais e socioeconómicos da obra de

prolongamento do quebra-mar do Porto de Leixões, e das restantes obras incluídas no projeto de acessibilidades

marítimas do Porto de Leixões (aprofundamento do canal e novo terminal de contentores).

O PEV, através de uma pergunta dirigida ao Ministério das Infraestruturas e da Habitação, em julho do

presente ano, questionou a decisão da Agência Portuguesa do Ambiente de não avançar com os estudos

complementares a desenvolver com o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), os quais tornavam

possível aprofundar o conhecimento acerca dos impactos da obra sobre as atividades económicas, a prática

desportiva, a atividade balnear e turística na envolvência do projeto de prolongamento do quebra-mar do Porto

de Leixões.

Não foram, até hoje, considerados os impactos globais e cumulativos das três intervenções previstas pela

obra de acessibilidades marítimas do Porto de Leixões, tendo sido realizados Estudos de Impacte Ambiental

(EIA) de modo autónomo, apesar de as três obras concorrem para a mesma finalidade e sendo o ambiente

afetado pelos projetos comum (entre as praias de Matosinhos e a zona do estuário do rio Leça), pelo que não é

possível aferir com o mesmo rigor os impactes ambientais, quando esta análise é feita isoladamente e não se

têm em conta os impactos cumulativos.

Quer o relatório síntese do EIA do Novo Terminal de Contentores do Porto de Leixões, quer o EIA referente

à obra do prolongamento do quebra-mar desvalorizam os impactos sobre a qualidade da água.

Se, para este último, foram insuficientes as medições para este critério pela falta de um estudo de previsão

e modelação, no caso do EIA do terminal de contentores, cujo processo de Licenciamento Único de Ambiente

esteve em consulta pública até ao passado dia 10 de setembro, as ações de monitorização e acompanhamento

propostas limitam-se tão somente à qualidade do ar e ao ruído. Como tal, não contemplam a monitorização da

qualidade das massas de água junto ao terminal de contentores (massa de água de transição «Leça» e massa

de água artificial inserida no estuário do rio Leça) nem na envolvente, águas balneares da praia de Matosinhos

e praia Internacional.

Os Verdes voltam a insistir na premência de um estudo cumulativo sobre os impactos ambientais e sociais

da obra de acessibilidades marítimas – numa perspetiva de Avaliação Ambiental Estratégica – por forma a aferir,

com rigor e precisão, dos impactos globais, e respetiva interligação, das obras em questão, tanto mais que as

suas fases de execução poderão vir a coincidir.

Deste modo, será possível potenciar e reforçar o desenvolvimento das obras do projeto de modo mais

sustentável em maior sinergia com a economia local (pesca, turismo, atividades desportivas, restauração e

hotelaria).

A Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL) prevê a adjudicação da obra de

prolongamento do quebra-mar no último trimestre de 2020, tendo a APDL garantido o cumprimento do acordado

com a autarquia de Matosinhos, que a adjudicação só terá lugar com o título de impacto ambiental das restantes

empreitadas.

No entanto, nem a Avaliação Ambiental Estratégica das Alterações ao Plano Estratégico da APDL, cuja

conclusão seria prévia ao início da obra, nem o estudo sobre o valor económico do desporto de ondas em

Matosinhos, uma das recomendações do «parecer favorável condicionado» da comissão de Avaliação ambiental

ao prolongamento do quebra-mar de Leixões, serão do conhecimento público nem das entidades envolvidas,

nomeadamente das associações ambientais, dos representantes das atividades económicas e desportivas

locais nem das autarquias.

A Declaração de Impacte Ambiental, relativa ao Prolongamento do Quebra-Mar Exterior do Porto de Leixões,

pressupõe um prazo de cinco anos, após início da obra, para a realização dos estudos de avaliação do impacte

do projeto na prática de desportos de ondas nas praias de Matosinhos e Internacional e os estudos sobre o valor

económico atual dos desportos de ondas em Matosinhos e no Grande Porto, o que presume que somente a

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posteriori sejam definidas medidas de minimização, potenciação ou compensação em função das conclusões

obtidas , não havendo neste momento lugar a uma previsão sobre possíveis respostas a estes impactos.

Este facto é inadmissível e perverte toda a lógica da utilidade de instrumentos relevantes da política

ambiental, provando-se que muitas vezes estes constituem mais um pro forma do que propriamente uma base

séria para uma tomada de decisão ambientalmente sustentável.

Os Verdes não podem pactuar com esta perversão e, nesse sentido, procuram chamar os decisores políticos

à razão. É nesse sentido, e com o objetivo de resolver o problema criado, que o Grupo Parlamentar Os Verdes

apresenta o seguinte projeto de resolução:

Tendo em conta os parâmetros não avaliados pelo Estudo de Impacte Ambiental, bem como a ausência da

aferição de impactes cumulativos das diversas obras projetadas para o porto de Leixões com vista ao

aprofundamento do canal, ampliação do quebra-mar e do novo terminal de contentores sul, a Assembleia da

República delibera, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, recomendar ao Governo

que:

1. Determine que as obras não avançam sem a realização de uma Avaliação Ambiental séria e completa,

permitindo-se, dessa forma, a ponderação e definição de projetos alternativos ou de medidas de mitigação e

compensação adequadas, privilegiando a proteção ambiental e a articulação com as atividades económicas

existentes.

2. Torne imediatamente públicos, em fase prévia à adjudicação da obra do prolongamento do quebra-mar

do porto de Leixões:

a) o estudo dos impactos do projeto do prolongamento do quebra-mar sobre a prática de desportos de ondas

na praia de Matosinhos e praia Internacional, tornando possível a definição atempada de medidas e/ou

alternativas ao projeto por forma a compatibilizar esta atividade com a atividade marítima e comercial do Porto

de Leixões.

b) o estudo sobre o valor económico atual dos desportos de ondas em Matosinhos e no Grande Porto,

tornando possível a adoção atempada de medidas e/ou alternativas ao projeto por forma a compatibilizar

atividades turísticas, desportivas e a atividade marítima e comercial do Porto de Leixões.

3. Garanta a monitorização contínua da qualidade da água (massa de água do rio Leça e da água balnear

das praias envolventes) no âmbito do acompanhamento ambiental das áreas afetadas por cada um dos projetos.

4. Assegure condições para uma ampla participação e envolvimento do público interessado na avaliação

dos impactos das obras do Porto de Leixões.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

Os Deputados do PEV: Mariana Silva — José Luís Ferreira.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 651/XIV/2.ª

PELA AUTONOMIA DA ESCOLA SUPERIOR DE GESTÃO DE IDANHA-A-NOVA

A Escola Superior de Gestão de Idanha-a-Nova (ESGIN), tal como a Escola Superior de Tecnologia de

Castelo Branco (ESTCB), foi criadas pelo Decreto-Lei n.º 153/97, 20 de junho – sucedendo à anterior Escola

Superior de Tecnologia e Gestão. A criação da nova Escola com sede em Idanha-a-Nova e com autonomia, no

quadro do IPCB, apresentou-se como um contributo positivo para a coesão social e territorial. E, efetivamente,

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ao longo destes anos, a articulação do ESGIN com o Município de Idanha-a-Nova e com tecido socioeconómico

envolvente tem sido um fator relevante no desenvolvimento.

O caminho traçado em 1997 encontrou, entretanto, um duro revés. No âmbito da reestruturação

organizacional do Instituto Politécnico de Castelo Branco (IPCB), o Conselho Geral do IPCB propôs que a Escola

Superior de Gestão de Idanha-a-Nova deixasse de ter sede institucional na localidade. A passagem do IPCB de

seis Escolas a quatro implica a passagem da sede da sede da ESGIN para a Escola Superior de Educação, em

Castelo Branco. A integração na proposta nova Escola de Superior de Informática e Gestão de Negócios implica

perda de sede, autonomia administrativa, pedagógica e científica.

O alargamento social e territorial do ensino superior em Portugal deve-se, em muito, ao papel que os Institutos

Superiores Politécnicos assumiram nas últimas três décadas. Esse desígnio estratégico, a par de uma política

que deve ter como objetivo garantir o direito ao acesso à educação e ao conhecimento, não pode admitir recuos

naquilo que é a ocupação do território e as valências que a deslocalização do ensino superior traz.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – O Governo providencie um estudo técnico sobre os impactos socioeconómicos associados ao

encerramento da Escola Superior de Idanha-a-Nova;

2 – Articule com o Instituto Politécnico de Castelo Branco uma solução, no âmbito do seu plano de

reorganização, que garanta que Idanha-a-Nova continue a ser sede de uma das suas unidades orgânicas e que

a autonomia pedagógica, científica e académica da atual ESGI não será perdida.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Luís Monteiro — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge

Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua —

João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Maria Manuel Rola

— Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 652/XIV/2.ª

PELA DISPONIBILIZAÇÃO DE TESTES COVID-19 GRATUITOS A PROFESSORES, ASSISTENTES

OPERACIONAIS E ALUNOS

O contexto de pandemia obrigou ao encerramento de todos os estabelecimentos escolares no dia 16 de

março de 2020, com grave prejuízo para toda a comunidade escolar, em particular para as aprendizagens dos

alunos.

Uma boa parte dos docentes em exercício de funções nas escolas pertence a grupos de risco, principalmente

devido à faixa etária média da classe docente.

A ausência de sintomas em grande parte da população jovem faz com que as potenciais infeções por COVID-

19 passem despercebidas e se tornem potenciais fatores de contágio, visto que o critério de testagem definida

está associado ao aparecimento de sintomas.

A transmissão do SARS-CoV-2 na população pediátrica permanece «um enigma» alvo de estudo e de poucas

conclusões definitivas.

Segundo um estudo a nível mundial, realizado pela Organização Internacional do Trabalho, a COVID-19

deixou um em cada oito jovens (13%) sem qualquer acesso a aulas, ensino ou formação, números que também

se encontram próximos da realidade portuguesa.

A Escola constitui-se como a espinha dorsal da nossa sociedade enquanto ferramenta fundamental para

debelar desigualdades sociais, pelo que a não frequência de aulas tende a penalizar os mais vulneráveis.

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O regresso às escolas no ano letivo de 2020/21 assume particular importância a todos os níveis, e a

reabertura das escolas é tida como essencial para o retorno de muitas famílias ao trabalho e como um fator de

recuperação de aprendizagem fundamental para as crianças e jovens.

A reabertura das escolas faz aumentar os contactos sociais e físicos devido à mobilidade subjacente de

retorno ao trabalho por parte de muitas famílias, transporte para a escola e retomar de muitas relações sociais

interrompidas, fator que potencia a disseminação do vírus na comunidade.

A identificação precoce de casos positivos pré-sintomáticos ou assintomáticos é uma medida de prevenção

que permite agir sobre eventuais cadeias de transmissão antes que elas se transformem em surtos, dentro e

fora das escolas.

A testagem regular pode ser particularmente importante no período do Inverno onde as constipações ou

gripes podem ser confundidas com a COVID-19. Separar outras doenças da COVID-19 trará menos sobrecarga

ao Serviço Nacional de Saúde e menos sobrecarga aos agregados familiares que assim não necessitam de

períodos de quarentena com consequências económicas e financeiras associadas.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Avalie, em articulação com as autarquias e os serviços de saúde pública, e complementarmente à ação

das autoridades de saúde, a criação de um programa para a realização de testes COVID-19 gratuitos a

professores/as, alunos/as e assistentes operacionais das escolas públicas;

2 – Estruture o programa referido no número anterior tendo em conta a realização de testes periódicos por

amostragem para monitorizar o estado epidemiológico das escolas.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — João Vasconcelos —

José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 653/XIV/2.ª

PELA VALORIZAÇÃO DA CARREIRA DOCENTE

A desvalorização da carreira docente, a persistência da precariedade, regras de concursos que provocam

instabilidade e permitem injustiças, como as ultrapassagens, tudo isso tem afastado da profissão docente

milhares de docentes. Essa desvalorização transmite à sociedade um sinal errado sobre o respeito pela

dignidade profissional dos professores e das professoras.

A valorização da carreira docente é uma reivindicação de vários anos. E ganha, agora, ainda mais urgência

na resposta à crise pandémica da COVID-19. A Escola Pública foi uma das primeiras instituições da Democracia

a ter de responder rapidamente à pandemia, criando um ensino não-presencial de emergência. Nesse esforço

coletivo das comunidades educativas, o papel das professoras e dos professores foi essencial, fazendo uso dos

seus recursos pessoais e dispondo do seu tempo muito para além do seu horário de trabalho. Merecem o nosso

agradecimento por estarem e continuarem na linha da frente junto com tantas e tantos profissionais que

executam funções essenciais.

Reveladas as limitações e os riscos sociais, pedagógicos e psicológicos do ensino a distância, a Escola

Pública teve de se preparar, mesmo com recursos limitados, para receber milhares de crianças e jovens em

condições de segurança neste ano letivo que agora se inicia. E uma vez mais as professoras e os professores,

junto com outros profissionais da educação, compareceram. No entanto, a persistência da instabilidade e da

precariedade, bem como um envelhecimento da classe docente, colocam duros entraves ao cumprimento da

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sua missão. O momento exige, portanto, que se concretizem finalmente as justas aspirações da classe docente.

Os desafios presentes e o futuro da Escola Pública dependem dessa valorização.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Tome medidas para a valorização da carreira docente, nomeadamente através do reconhecimento e

recuperação do tempo de serviço cumprido e não contabilizado para efeitos de progressão na carreira (6 anos,

6 meses e 23 dias);

2 – Crie um regime de concursos justo, que respeite a graduação profissional, e proceda à recomposição da

carreira docente, tomando medidas eliminar as ultrapassagens e desbloquear as progressões dos docentes que

se encontram retidos no 4.º ou no 6.º escalões;

3 – Crie um programa de rejuvenescimento da classe docente e um regime específico de aposentação, que

permita a antecipação voluntária da aposentação e pré-aposentação, sem penalização, das professoras e

professores com idade próxima da reforma;

4 – Promova o cumprimento do limite legal de 35 horas semanais e clarificação sobre a componente letiva e

não letiva.

5 – Tome medidas de combate à precariedade, através da contratação e vinculação dos docentes

contratados que correspondem a necessidades permanentes (incluindo a revisão da norma travão).

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — João Vasconcelos —

José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 654/XIV/2.ª

RECOMENDA A CONTRATAÇÃO DE MAIS PROFESSORES, TÉCNICOS ESPECIALIZADOS E

TRABALHADORES NÃO DOCENTES PARA A ESCOLA PÚBLICA

A crise pandémica da COVID-19 encontrou uma escola pública empenhada em responder ao desafio de

estar na linha da frente e, simultaneamente, debilitada por problemas estruturais anteriores. A limitação ao nível

do número de profissionais e das suas condições de trabalho é uma das dificuldades pré-existente que se agrava

com esta crise de saúde pública e social.

No início do ano-letivo de 2019/20, a falta de professores dos chamados grupos de difícil recrutamento

deixaram por largo período várias turmas, em diferentes pontos do país, sem professores de Inglês, de

Português, de Geografia ou de Informática. A resposta à pandemia agravou a necessidade de recrutar mais

professores e de criar condições para o seu recrutamento. Por um lado, a redução do número de alunos por

turma ou desdobramento de turmas, que já era uma necessidade de ordem pedagógica, tornou-se também uma

necessidade de saúde pública, a fim de viabilizar o distanciamento físico prescrito pelas autoridades de saúde.

Por outro lado, tendo em consideração média de idades avançada do corpo docente e amplitude das condições

de saúde que colocam em risco os profissionais, a urgência de rejuvenescimento da classe docente aumenta,

aconselhando a contratação de novos professores e a reorganização do trabalho docente. Acresce ainda que o

período de ensino não presencial de emergência aumentou as necessidades de acompanhamento pedagógico

dos alunos para recuperação de conteúdos essenciais.

Também no início do ano letivo passado, a falta de funcionários não-docentes causou problemas graves em

vários estabelecimentos de ensino. Vários agrupamentos e escolas não-agrupadas, através das suas direções

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e associações de pais e encarregados de educação, trouxeram a público a gravidade deste problema. Foram

frequentes as paralisações de serviços, blocos e, em alguns casos, escolas inteiras por falta de condições para

um funcionamento normal e seguro. Assinalam-se vários protestos organizados pelos funcionários não-docentes

ou pela comunidade educativa em geral um pouco por todo o País.

Infelizmente chegámos ao início do ano letivo de 2020/21 com a portaria de rácios por rever, ou seja, nem

os mínimos para o funcionamento normal estavam garantidos. No processo de discussão do Orçamento do

Estado para 2020, o Bloco de Esquerda propôs e viu aprovado o aditamento de um artigo acerca do «Reforço

de dotação do pessoal não docente na Escola Pública» (artigo 243.º da Lei n.º 2/2020, 31 de março de 2020),

de onde resultará a «revisão dos critérios e da fórmula de cálculo para a determinação da dotação máxima de

referência do pessoal não docente, por agrupamento de escolas ou escola não agrupada, garantindo que as

escolas dispõem dos assistentes operacionais necessários para a satisfação das necessidades efetivas

permanentes». Contudo, a Portaria ficou por rever durante largos meses.

Do ponto de vista prático, o atual rácio de trabalhadores não-docentes deixa as escolas no limite da sua

capacidade de funcionamento, até tendo em conta o excesso de trabalho e a elevada média de idade dos

trabalhadores. Essa situação é ainda agravada pela precariedade da relação laboral de parte dos não-docentes,

quer dos contratados a prazo, quer os que estão em regime de tarefa/prestação de serviços.

Se num momento normal, como início do ano letivo 2019/20 comprova, o reforço de trabalhadores não-

docentes é ainda mais necessário no contexto da pandemia da COVID-19. A limpeza e higienização dos espaços

e equipamentos, o acompanhamento a alunos com necessidades educativas especiais, as alterações de

horários e de funcionamento das escolas, com a necessidade aproveitar todos os espaços disponíveis e até,

eventualmente, acompanhar os alunos em deslocações necessárias, não se faz sem um número de assistentes

operacionais adequado. Por outro lado, o cumprimento das regras que as escolas terão de cumprir e o apoio

redobrado aos alunos num contexto de crise de saúde pública e socioeconómica exigem o reforço quer do

número de assistentes técnicos quer do número de técnicos especializados atualmente existentes nas escolas.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Reforce o número de professores e educadores para permitir a redução do número de alunos por turma,

o desdobramento de turmas, o desfasamento de horários, o acompanhamento de alunos à distância e proteção

de docentes de grupos de risco, por forma a garantir o distanciamento físico e um melhor acompanhamento

pedagógico dos alunos no contexto adverso de crise pandémica.

2 – Proceda à contratação e integração de todos os trabalhadores da educação que correspondem a

necessidades permanentes, incluindo:

a) a conclusão do Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração

Pública;

b) o reforço do número de assistentes operacionais e de assistentes técnicos para garantir o cumprimento

das regras de higienização, o acompanhamento de alunos, a adaptação e ampliação do uso de espaços, a

reorganização de horários e o cumprimento de novas regras e procedimentos;

c) o reforço de técnicos especializados, nomeadamente para um maior apoio aos estudantes, nomeadamente

ao nível social e psicológico.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — João Vasconcelos —

José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 655/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A REALIZAÇÃO URGENTE DE OBRAS NA ESCOLA SECUNDÁRIA DE

SERPA

O estado de degradação do edificado é um dos problemas que a escola pública enfrenta. A existência de

escolas degradadas prejudica profundamente as alunas e os alunos, dificulta as tarefas dos professores e

demais profissionais de educação e criam uma situação de desigualdade entre as comunidades educativas. A

Escola Secundária de Serpa é uma das escolas afetadas por esse problema.

Escola Secundária de Serpa nunca foi objeto de obras de requalificação de fundo. Tratando-se de uma

Escola com mais de 30 anos, os efeitos da degradação do edificado e equipamentos são sentidos há muito. Os

problemas são os típicos dos edifícios degradados: infiltrações de água, falta de isolamento térmico, instalações

elétricas obsoletas, problemas de canalização e águas residuais. Esta é também uma das muitas escolas que

ainda tem amianto na sua construção e cuja remoção é urgente.

Estas obras são urgentes e necessárias há vários anos. O estado de degradação é tal que parte do edificado

não pode ser usado para atividades escolares por falta de condições de segurança. Pelo que a atual carência

de espaços para garantir distanciamento físico, no contexto da crise pandémica da covid-19, coloca ainda mais

em evidência como a degradação do edificado comporta múltiplos riscos.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Tome todas as medidas necessárias para a realização de obras urgentes de requalificação da Escola

Secundária de Serpa, nomeadamente através da construção de um plano conjunto com a comunidade educativa

e articulado com o Município de Serpa.

2 – Dê as garantias financeiras necessárias à realização das obras de requalificação da Escola Secundária

de Serpa, nomeadamente garantindo a comparticipação nacional em caso de candidatura a fundos

comunitários.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — João Vasconcelos —

José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 656/XIV/2.ª

RECUPERAÇÃO E REFORÇO DA ATIVIDADE DOS CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS

Os Cuidados de Saúde Primários (CSP) são um pilar do Serviço Nacional de Saúde e o serviço de saúde

mais próximo do utente, primeiro responsável pelo acompanhamento regular, pela prevenção da doença e pela

promoção da saúde.

Na pandemia de COVID-19 esta rede de cuidados de saúde primários provou, mais uma vez, ser

excecionalmente importante. A capilaridade e proximidade dos CSP, para além da competência e eficácia das

suas equipas, permitiu o acompanhamento diário, ao domicílio, da maior parte das pessoas infetadas, libertando

pressão do setor hospitalar. Foi também nos centros de saúde que se instalaram muitos ADC – Áreas Dedicadas

COVID-19 Comunidade, especialmente dedicadas a utentes com suspeita de COVID-19.

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A mobilização de recursos para a pandemia e a necessidade de garantir novos procedimentos, circuitos e

organização de equipas, levou a que muitos serviços passassem a ser realizados de forma não presencial, que

muitas consultas médicas e de enfermagem fossem reagendadas e que algumas extensões ou serviços de

consulta aberta sofressem alterações no seu horário de funcionamento.

Foram medidas compreensíveis numa altura em que era preciso a organização de uma resposta rápida e

eficaz, com pouco tempo para a sua preparação. Mas se esta situação é compreensível no início da resposta à

pandemia, com aplicação temporária, o mesmo já não se pode dizer quando a situação tende a tornar-se

duradoura e não meramente temporária.

Não é suportável que os cuidados de saúde primários continuem com a atividade programada comprometida

ou que as funções de vigilância do estado de saúde dos utentes e de prevenção da doença permaneça

prejudicada.

Agora é o momento de o SNS, continuando a responder à pandemia, conseguir também recuperar a atividade

suspensa e retomar a atividade programada. Sabemos que só o Serviço Nacional de Saúde é capaz desta tarefa

gigantesca, mas para isso tem de ter os meios e os recursos necessários. Eles têm, inevitavelmente, de

aumentar e isso é válido também para os cuidados primários de saúde.

O Governo publicou a Portaria n.º 171/2020, de 14 de julho, que «aprova o regime excecional de incentivos

à recuperação da atividade assistencial não realizada por força da situação epidemiológica provocada pelo novo

coronavírus SARS-CoV-2 e pela doença COVID-19», no entanto, esta portaria nada prevê para a recuperação

de atividade nos cuidados de saúde primários. Essa portaria prevê o aumento do limite máximo a pagar às

equipas por produção adicional de primeiras consultas e de cirurgias, mas nada prevê sobre a recuperação da

atividade assistencial dos CSP.

Já no Plano da Saúde para o Outono-Inverno 2020-2021 o Governo, apesar de admitir que o SNS tem, para

além da resposta à COVID-19, manter os cuidados não-COVID e recuperar atividade adiada, pouco diz de

concreto em relação a essa recuperação nos cuidados de saúde primários e nada diz sobre o reforço de meios

para garantir essa mesma recuperação.

Admite-se como objetivo «maximizar a resposta nos cuidados de saúde primários, com atendimento

presencial, não-presencial e domiciliário», mas apenas para concluir «a capacidade de resposta dos cuidados

de saúde primários para a resposta ‘não-COVID-19’ é maximizada através da consagração de períodos

dedicados ao atendimento: 1. Presencial, com pré-agendamento de toda a atividade assistencial programada,

triagem presencial, reorganização dos horários de atendimento e dos espaços. 2. Em visitas domiciliárias e

respostas comunitárias de proximidade, reforçadas sobretudo para as populações mais vulneráveis,

independentemente do seu local de residência; 3. Não-presencial, baseado num atendimento telefónico

qualificado e dedicado, que permita dar resposta às necessidades dos utentes, e no recurso a teleconsulta e

telemonitorização, bem como de vias eletrónicas de comunicação».

É preciso mais do que estes objetivos para garantir que os cuidados de saúde primários têm capacidade para

se organizar para a resposta à COVID e restantes doenças respiratórias e, para além disso, têm a capacidade

de recuperar a atividade programada. É preciso a definição de meios, sejam eles financeiros, humanos e

técnicos, e a concretização do investimento a fazer no imediato.

Face à ausência de um plano de recuperação de atividade para os cuidados de saúde primários e face à

ausência no Plano de Saúde para o Outono-Inverno de definição de meios e de investimento a fazer nos CSP

para essa mesma recuperação, o Bloco de Esquerda avança com a presente iniciativa legislativa, para que se

efetive um verdadeiro programa de recuperação de atividade para os CSP com o consequente investimento e

aumento de meios.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Crie um programa, no âmbito dos cuidados de saúde primários, para recuperação da atividade

assistencial não realizada por força da pandemia de COVID-19, remunerado como trabalho extraordinário e

aplicável a todas as unidades funcionais que compõem os cuidados de saúde primários;

2 – Crie uma linha adicional de financiamento para cada Administração Regional de Saúde IP para abertura

de concursos para contratação de profissionais por tempo indeterminado, nomeadamente assistentes

operacionais e assistentes técnicos para os centros de saúde, enfermeiros para Unidades de Cuidados na

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Comunidade e profissionais para reforçar as Unidades de Recursos Assistenciais Partilhados, sem prejuízo de

outros profissionais considerados necessários pelos Agrupamentos de Centros de Saúde;

3 – Lance um concurso extraordinário para ingresso em formação médica especializada, através da criação

de vagas preferenciais em zonas mais carenciadas conforme previsto no Regime Jurídico da Formação Pós-

Graduada, com o objetivo de aumentar o número de médicos especialistas em Portugal, nomeadamente em

medicina geral e familiar;

4 – Invista em meios de comunicação nos centros de saúde, como o reforço das centrais telefónicas

existentes em todos os centros de saúde, nomeadamente através da criação de centrais digitais móveis e

distribuição de telemóveis pelas unidades, e a dotação de todos os gabinetes de consulta com câmara e outros

equipamentos necessários para realização de teleconsulta;

5 – Aumente a resolutividade dos cuidados de saúde primários através da instalação de meios

complementares de diagnóstico e terapêutica em todos os Agrupamentos de Centros de Saúde e da criação de

Centros de Diagnóstico de Proximidade com integração de cuidados entre cuidados primários e cuidados

hospitalares.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Moisés Ferreira — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge

Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua —

João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro —

Maria Manuel Rola — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

————

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 657/XIV/2.ª

PELA REGULAMENTAÇÃO DA ATIVIDADE DE CARTEIRO COM VISTA À REDUÇÃO DO DESGASTE

RESULTANTE DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE E À GARANTIA DAS CONDIÇÕES DE SEGURANÇA E

SAÚDE NO TRABALHO

O Bloco de Esquerda tem vindo a alertar, sucessivamente, para o crescente número de profissões e

trabalhadores que, por várias razões, têm encetado lutas e lançado alertas para as condições em que se trabalha

em Portugal. Não é por acaso que cada vez mais profissões, de diferentes setores de atividade, têm pedido,

através de petições ou outras formas, o reconhecimento da sua profissão como desgaste rápido.

Os ritmos de trabalho têm-se acelerado, os horários de trabalho são cada vez mais longos e desregulados,

as condições de trabalho são degradadas e não se tem em conta as condições de penosidade inerentes ao

exercício de determinadas profissões.

Através da Petição n.º 637/XIII/4.ª, os peticionários solicitaram que a profissão de carteiro seja qualificada

como desgaste rápido. Para o efeito, invocam três fatores essenciais, nomeadamente a «pressão e stress da

atividade», devido ao «cumprimento rigoroso de um conjunto de prazos que se relacionam com o serviço postal

na sua generalidade», à responsabilidade pela «entrega de notificações judiciais, outras comunicações de

entidades públicas e também correspondência relativamente ao cumprimento de obrigações», o «desgaste

emocional ou físico» associado à carga física de um carteiro apeado, que irá puxar um carrinho de 30 kilos

durante 8 km e 5 horas, de um carteiro motorizado em motociclo, que terá que montar e desmontar o motociclo,

diariamente, dezenas de vezes ou de um carteiro motorizado que terá de entrar e sair da viatura, diariamente,

dezenas de vezes e, finalmente, as «condições de trabalho», uma vez que sendo a atividade desempenhada

no exterior está sujeita a condições climatéricas o que associado a transporte associam a problemas físicos,

designadamente de coluna.

O Bloco de Esquerda entende que é necessário garantir que os trabalhadores desenvolvam a sua atividade

em condições de saúde e segurança no trabalho e que exista regulamentação laboral da atividade que o garanta.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 4

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Essa regulação passa, certamente, por um reforço da contratação coletiva, mas passa também por acautelar

uma legislação do trabalho mais protetora dos trabalhadores, nomeadamente daqueles que trabalham por

turnos, por escala ou com horários noturnos. Por outro lado, o Bloco entende que se deve reduzir o horário de

trabalho para as 35 horas, também no setor privado e olhar de outro modo para a legislação referente às

reformas, acabando com a penalização do fator de sustentabilidade nas reformas antecipadas e pondo fim ao

contínuo aumento da idade da reforma.

Sem prejuízo do debate sobre essas matérias, nomeadamente através de iniciativas legislativas para alterar

o Código de Trabalho e a legislação da Segurança Social que continuam a ser apresentadas pelo Bloco,

entendemos também que há especificidades que a própria regulamentação das profissões deve acautelar.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

Proceda à revisão da regulamentação da profissão de carteiro por forma a impor condições mais limitativas

e protetoras dos trabalhadores, que reduzam o desgaste provocado pelo exercício da sua atividade, garanta

condições de saúde e segurança no trabalho e condições de acesso à reforma adequadas à profissão.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Moura Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua —

João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 658/XIV/2.ª

PELA REGULAMENTAÇÃO DA ATIVIDADE DE TRABALHADOR DA MANUTENÇÃO E MONTAGEM

DE AEROGERADORES COM VISTA À REDUÇÃO DO DESGASTE RESULTANTE DO EXERCÍCIO DA

ATIVIDADE, À GARANTIA DAS CONDIÇÕES DE SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO E À

ADEQUAÇÃO DO ACESSO À REFORMA

O Bloco de Esquerda tem vindo a alertar, sucessivamente, para o crescente número de profissões e

trabalhadores que, por várias razões, têm encetado lutas e lançado alertas para as condições em que se trabalha

em Portugal. Não é por acaso que cada vez mais profissões, de diferentes setores de atividade, têm pedido,

através de petições ou outras formas, o reconhecimento da sua profissão como desgaste rápido.

Os ritmos de trabalho têm-se acelerado, os horários de trabalho são cada vez mais longos e desregulados,

as condições de trabalho são degradadas e não se tem em conta as condições de penosidade inerentes ao

exercício de determinadas profissões.

Através da Petição n.º 619/XIII/4.ª os peticionários solicitaram que a profissão dos trabalhadores da

manutenção e montagem dos aerogeradores seja qualificada como desgaste rápido. Para o efeito, invocam os

desafios colocados ao nível da saúde e segurança tais como:

a) «Trabalhos em altura;

b) Subida e descida várias vezes ao dia de escadas verticais de 70 ou 80 metros de altura;

c) Trabalhos com energia elétrica e mecânica;

d) Espaços confinados;

e) Condições meteorológicas adversas (por exemplo diferentes amplitudes térmicas);

f) Pontos de difícil acesso.»

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22 DE SETEMBRO DE 2020

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Invocam ainda o facto de o trabalho ser executado em locais de «difícil acesso e exíguos», que obrigam a

«esforço físico acrescido e trabalho em posições ergonómicas que acarretam lesões músculo esqueléticas,

causadas por traumatismos repetidos, cumulativos e de tensão muscular, tendo como causa principal os

movimentos ou posturas forçadas, associados à conceção de sistemas músculo-esqueléticos».

O Bloco de Esquerda entende que é necessário garantir que os trabalhadores desenvolvam a sua atividade

em condições de saúde e segurança no trabalho e que exista regulamentação laboral da atividade que o garanta.

Essa regulação passa, certamente, por um reforço da contratação coletiva, mas passa também por acautelar

uma legislação do trabalho mais protetora dos trabalhadores, nomeadamente daqueles que trabalham por

turnos, por escala ou com horários noturnos e em profissões desgastantes. Por outro lado, o Bloco entende que

se deve reduzir o horário de trabalho para as 35 horas, também no setor privado e olhar de outro modo para a

legislação referente às reformas, acabando com a penalização do fator de sustentabilidade nas reformas

antecipadas e pondo fim ao contínuo aumento da idade da reforma.

Sem prejuízo do debate sobre essas matérias, nomeadamente através de iniciativas legislativas para alterar

o Código de Trabalho e a legislação da Segurança Social que continuam a ser apresentadas pelo Bloco,

entendemos também que há especificidades que a própria regulamentação das profissões deve acautelar.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

Proceda à revisão da regulamentação da profissão detrabalhador da manutenção e montagem de

aerogeradorespor forma a impor condições mais limitativas e protetoras dos trabalhadores, que reduzam o

desgaste provocado pelo exercício da sua atividade, garanta condições de saúde e segurança no trabalho e

condições de acesso à reforma adequadas a esta profissão.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Moura Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua —

João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 659/XIV/2.ª

PELA REGULAMENTAÇÃO DA ATIVIDADE DOS TRABALHADORES DO SETOR DOS

TRANSPORTES, COMUNICAÇÕES E TELECOMUNICAÇÕES COM VISTA À REDUÇÃO DO DESGASTE

RESULTANTE DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE, À GARANTIA DAS CONDIÇÕES DE SEGURANÇA E

SAÚDE NO TRABALHO BEM COMO A UM ACESSO À REFORMA ADEQUADO AO DESGASTE DA

PROFISSÃO

O Bloco de Esquerda tem vindo a alertar, sucessivamente, para o crescente número de profissões e

trabalhadores que, por várias razões, têm encetado lutas e lançado alertas para as condições em que se trabalha

em Portugal. Não é por acaso que cada vez mais profissões, de diferentes setores de atividade, têm pedido,

através de petições ou outras formas, o reconhecimento da sua profissão como desgaste rápido.

Os ritmos de trabalho têm-se acelerado, os horários de trabalho são cada vez mais longos e desregulados,

as condições de trabalho são degradadas e não se tem em conta as condições de penosidade inerentes ao

exercício de determinadas profissões.

O Bloco de Esquerda apresentou ainda iniciativas legislativas com vista a introduzir alterações ao regime

jurídico laboral vigente alargando a proteção social dos trabalhadores por turnos e noturnos, a redução do horário

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II SÉRIE-A — NÚMERO 4

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de trabalho para as 35 horas, também no setor privado e a mudar as regras relativas à reforma, pondo fim à

penalização do fator de sustentabilidade nas reformas antecipadas ao contínuo aumento da idade da reforma.

Através da Petição n.º 12/XIII/4.ª os peticionários solicitaram a instituição de um regime especial da idade

legal da reforma para os trabalhadores do setor dos transportes e comunicações, aos 55 anos.

Para o efeito, invocam «as características da organização e desempenho do trabalho no sector dos

transportes e comunicações — trabalho por turnos/escalas, trabalho diurno e noturno, horários variáveis e tempo

de trabalho prolongado, trabalho em subsolo, em cima de água, no ar, em prevenção, em altura, com longas

permanências em veículos sujeitos a vibrações, sujeitos a intempéries, sujeitos a pressão da exposição pública,

tarefas repetitivas e sobrecargas de trabalho — tem um forte impacto na saúde dos trabalhadores, que se

manifestam através das doenças músculo-esqueléticas, problemas renais, de audição e visão, stress,

ansiedade, depressão e sonolência diurna».

O Bloco de Esquerda entende que é necessário garantir que os trabalhadores desenvolvam a sua atividade

em condições de saúde e segurança no trabalho e que exista regulamentação laboral da atividade que o garanta.

Essa regulação passa por um reforço da contratação coletiva e por acautelar uma legislação do trabalho mais

protetora dos trabalhadores, nomeadamente daqueles que trabalham por turnos, por escala ou com horários

noturnos e em profissões desgastantes. É isso que temos proposto no Parlamento, em sucessivas iniciativas

com vista à alteração do Código do Trabalho e da legislação da Segurança Social. Sem prejuízo dessa alteração

estrutural que temos vindo a propor e pela qual continuamos a bater-nos, entende o Bloco que o Governo pode

começar já a atuar no sentido de proteger os trabalhadores do desgaste causado por esta profissão em concreto.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

Proceda à revisão da regulamentação da atividade dos profissionais do setor dos transportes, comunicações

e telecomunicações por forma a impor condições mais limitativa e protetoras dos trabalhadores, que reduzam o

desgaste provocado pelo exercício da sua atividade, garanta condições de saúde e segurança no trabalho e que

integre condições de acesso à reforma adequadas ao desgaste da profissão.

Assembleia da República, 22 de setembro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Moura Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua —

João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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