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Quarta-feira, 14 de outubro de 2020 II Série-A — Número 18

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

S U M Á R I O

Decretos da Assembleia da República (n.os 77 e 78/XIV): N.º 77/XIV — Quinta alteração à Lei n.º 43/90, de 10 de agosto (Exercício do direito de petição). (a) N.º 78/XIV — Terceira alteração à Lei n.º 43/2006, de 25 de agosto, relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia. (b) Projetos de Lei (n.os 487/XIV/1.ª e 512, 537, 538, 541, 544 e 568/XIV/2.ª): N.º 487/XIV/1.ª (Aprova o regime jurídico aplicável à doação de géneros alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar): — Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 512/XIV/2.ª (Medidas para a recuperação da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades): — Parecer da Comissão de Saúde e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 537/XIV/2.ª (Consagra medidas de promoção do escoamento de bens alimentares da pequena agricultura e agricultura familiar e cria um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar, combatendo o desperdício alimentar): — Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.

N.º 538/XIV/2.ª (Assegure a resposta eficaz da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades e dos cuidados de saúde primários em situação epidemiológica provocada pela COVID-19): — Vide parecer do Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª. — Nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 541/XIV/2.ª (Regime Transitório para a emissão de atestados médicos de incapacidade multiuso): — Vide parecer do Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª. — Vide nota técnica do Projeto de Lei n.º 538/XIV/2.ª. N.º 544/XIV/2.ª (Inquérito nacional sobre o desperdício alimentar em Portugal): — Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 568/XIV/2.ª (PAN) — Define os princípios gerais respeitantes ao exercício da profissão de Técnico Auxiliar de Saúde. Proposta de Lei n.º 62/XIV/2.ª (GOV): Determina a obrigatoriedade do uso de máscara para o acesso ou permanência nos espaços e vias públicas e a obrigatoriedade da utilização da aplicação STAYAWAY COVID. Projetos de Resolução (n.os 649 e 719 a 727/XIV/2.ª): N.º 649/XIV/2.ª — Recomenda ao Governo que adote os procedimentos atinentes a assegurar a consagração do crime de ecocídio na lista de crimes previstos no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional:

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— Alteração do título e do texto iniciais do projeto de resolução. N.º 719/XIV/2.ª (BE) — Reabertura das urgências e reforço do hospital Dr. Francisco Zagalo, em Ovar. N.º 720/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo a criação de um plano nacional de combate à anemia. N.º 721/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que, com urgência, programe, agende e execute as necessárias obras para ampliação e requalificação da escola secundária de Porto de Mós. N.º 722/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova, com urgência, a ampliação e reabilitação da Escola Secundária Raul Proença, do agrupamento de escolas Raul Proença, do concelho das Caldas da Rainha, distrito de Leiria. N.º 723/XIV/2.ª (PEV) — Pela retoma da atividade

assistencial nos cuidados de saúde primários. N.º 724/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que proceda à valorização e promoção do Panteão Nacional de Coimbra. N.º 725/XIV/2.ª (PEV) — Torna gratuita a Linha COVID lares. N.º 726/XIV/2.ª (CH) — Pela criação da Ordem Profissional dos Jornalistas e consequente extinção da Entidade Reguladora para a Comunicação Social. N.º 727/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo o reforço de meios e recursos humanos na Direção-Geral da Saúde de modo a alargar a divulgação de indicadores básicos sobre a COVID-19.

(a) A publicar oportunamente. (b) Publicado em suplemento.

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PROJETO DE LEI N.º 487/XIV/1.ª (APROVA O REGIME JURÍDICO APLICÁVEL À DOAÇÃO DE GÉNEROS ALIMENTARES PARA FINS

DE SOLIDARIEDADE SOCIAL E MEDIDAS TENDENTES AO COMBATE AO DESPERDÍCIO ALIMENTAR)

Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

1 – Nota prévia O Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Pessoas-Animais-Natureza (PAN)

à Assembleia da República, advoga a adoção de um regime jurídico destinado a regular a doação de géneros alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar.

A presente iniciativa é subscrita por um Deputado e duas Deputadas do Grupo Parlamentar do PAN, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República.

O projeto de lei em apreço deu entrada em 9 de setembro de 2020, foi admitido em 14 de setembro e baixou na generalidade, na mesma data, à Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), tendo sido anunciado a 16 de setembro. O Deputado autor deste parecer foi nomeado relator a 23 de setembro.

2 – Objeto, conteúdo e motivação da iniciativa A iniciativa em apreço visa a adoção de um regime jurídico com o intuito de regular a doação de géneros

alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar. Conforme se retira da exposição de motivos, os proponentes consideram que o desperdício alimentar é um

problema estrutural, reconhecido a nível nacional e internacional, especificando que «este é um flagelo que, estando intimamente ligado às situações de pobreza e às desigualdades no acesso e na distribuição de bens alimentares, surge principalmente devido a um modelo económico assente em lógicas de produção e consumo intensivos de recursos de origem mineral, vegetal ou animal, sem atender, por exemplo, aos ciclos de regeneração da natureza ou a uma gestão baseada nos princípios de economia circular.»

No plano dos impactes associados ao desperdício alimentar, além de referirem o volume de alimentos desaproveitados a vários níveis, os proponentes apresentam números, de ordem de grandeza considerável, relativos a impactes climáticos e económicos às escalas nacional e internacional, salientando ainda a perda de recursos escassos como solos, energia e água ao longo do ciclo de vida dos bens alimentares desperdiçados.

Os proponentes da iniciativa destacam alguns dos esforços levados a cabo nos últimos anos para reduzir o desperdício de bens alimentares como a publicação da Resolução da Assembleia da República n.º 65/2015, de 17 de junho, que recomenda medidas contra o desperdício e promove uma gestão eficiente dos alimentos, bem como a aprovação da Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar e a atividade de um conjunto de associações de cariz humanitário que visa a redução do desaproveitamento de alimentos.

Apesar dos esforços já realizados em matéria de combate ao desperdício alimentar, e reconhecidos pelos autores da iniciativa, é da sua convicção de que «a Assembleia da República procure ir mais longe no combate a este flagelo e tome medidas mais robustas.»

Assim, a iniciativa em apreço advoga a adoção de um regime jurídico baseado na articulação entre as empresas do setor agroalimentar, as cantinas públicas, as organizações de voluntariado, as instituições particulares de solidariedade social e as organizações não-governamentais. As entidades autorizadas a «receber, transportar, e entregar aos destinatários finais os géneros alimentícios» são designadas de «operadores», devendo para isso constar de registo próprio, conforme o disposto no artigo 7.º. Os destinatários finais são identificados no artigo 2.º. Definem-se ainda metas nacionais de redução do desperdício alimentar no artigo 4.º, prevê-se a criação de um sistema de incentivos às empresas do setor agroalimentar no artigo 6.º, atribui-se competências às câmaras municipais para a elaboração e execução de

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planos municipais de combate ao desperdício alimentar no artigo 9.º e estipula-se um regime contraordenacional específico no artigo 11.º.

De acordo com o artigo 1.º, a presente iniciativa procede à alteração de legislação sobre a orgânica da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), o regime aplicável à defesa dos consumidores, a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), a Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) e o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC).

A ser aprovado, o presente projeto de lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Cumpre ainda referir que é ponderada na nota técnica anexa a este parecer a necessidade de se promover a consulta de entidades públicas ou privadas no âmbito do seu direito à participação no processo legislativo relacionado, pois, segundo se refere na nota técnica, a presente iniciativa prevê a introdução de alterações significativas num conjunto de diplomas legislativos de natureza diversa, nomeadamente em matéria de defesa do consumidor, da Lei de Bases do Sistema Educativo, do Estatuto dos Benefícios Fiscais e do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas.

Como tal, sugere-se, na nota técnica, a consulta das estruturas representativas das empresas do setor agroalimentar e do setor da distribuição, bem como das entidades de âmbito associativo, das entidades do setor social e cooperativo e, ainda, de organizações não-governamentais relevantes. Ademais, em função da prescrição do artigo 9.º da iniciativa em apreço, é sugerida na nota técnica a consulta da Associação Nacional de Municípios Portugueses, possibilitando a sua participação na discussão da iniciativa, em concordância com a teleologia do artigo 141.º do RAR.

Ademais se informa que a nota técnica sugere, em termos de discussão da especialidade, a inclusão de uma norma revogatória no projeto de lei em apreciação, uma vez que o artigo 16.º da iniciativa propõe a revogação da alínea h) do n.º 2 do artigo 92.º do Código do IRS. Consta ainda da nota técnica uma proposta de aperfeiçoamento do título da presente iniciativa.

3 – Opinião do Deputado relator O Deputada relator exime-se, neste relatório, de expressar a sua opinião política sobre o Projeto de Lei n.º

487/XIV/1.ª, remetendo-a para a discussão das iniciativas em sessão plenária. 4 – Conclusões 1 – O Grupo Parlamentar do Pessoas-Animais-Natureza apresentou à Assembleia da República o Projeto

de Lei n.º 487/XIV/1.ª que «aprova o regime jurídico aplicável à doação de géneros alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar».

2 – Face às considerações anteriormente expendidas, a Comissão de Agricultura e Mar (7.ª) é de parecer que o Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª, do partido Pessoas-Animais-Natureza, reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário.

Palácio de São Bento, 13 de outubro de 2020.

O Deputado relator, Ricardo Vicente — O Presidente da Comissão, Pedro do Carmo. Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CDS-PP e do PAN, na

reunião da Comissão do dia 14 de outubro de 2020.

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5 – Anexos Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços, ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª (PAN) Título: Aprova o regime jurídico aplicável à doação de géneros alimentares para fins de

solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar.

Data de admissão: 14 de setembro de 2020. Comissão de Agricultura e Mar (7.ª). Índice I. Análise da iniciativa II. Enquadramento parlamentar III. Apreciação dos requisitos formais IV. Análise de direito comparado V. Consultas e contributos VI. Avaliação prévia de impacto VII. Enquadramento bibliográfico Elaborada por: Luísa Colaço (DILP), Elodie Rocha (CAE), Maria Nunes de Carvalho (DAPLEN), Paulo Ferreira Campos (DAC) e Helena Medeiros (BIB). Data:8 de outubro de 2020. I. Análise da iniciativa

A procura de modelos de produção e de consumo assentes, em maior ou menor grau, nas ideias de sustentabilidade e economia circular tem marcado, global e indelevelmente, a discussão política e social – e contribuído, em boa medida, para o surgimento e maturação do pensamento económico – que tem animado as primeiras décadas do séc. XXI. O sentimento de urgência, decorrente do consenso científico em torno das causas das alterações climáticas e da necessidade da adoção de políticas públicas, cientificamente sustentadas, de alívio e mitigação dos efeitos da crise climática, tem convidado ao repensar da afetação e reafectação de recursos escassos (independentemente do grau de transformação das matérias em apreço), em domínios tão distintos da vida em comunidade quanto a transição energética e a redefinição dos sistemas de mobilidade urbana, o tratamento de resíduos, a reutilização de semicondutores ou até a vigência dos manuais escolares.

No domínio da produção alimentar, estes temas ganham redobrada importância, não apenas pela ordem de grandeza dos números apresentados pelos proponentes da iniciativa em apreço, mas também pela dupla função que, nos dizeres dos mesmos, o combate ao desperdício alimentar pode assumir enquanto otimização de recursos agrícolas e, simultaneamente, enquanto combate à fome e à pobreza alimentar.

Assim, a presente iniciativa advoga a adoção de um regime jurídico destinado a regular a doação de géneros alimentícios para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao desperdício alimentar. O regime

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proposto assenta na articulação entre as empresas do sector agroalimentar, as cantinas públicas e as organizações de voluntariado, as instituições particulares de solidariedade social e as organizações não-governamentais que, segundo o articulado e em função do seu escopo, adquiram a qualidade de “operadores”

e fiquem habilitados à receção, transporte e entrega de bens alimentícios aos destinatários finais identificados no artigo 2.º, devendo para isso constar de registo próprio (artigo 7.º). Prevê-se ainda a definição de metas nacionais de redução do desperdício alimentar (artigo 4.º), bem como a criação de um sistema de incentivos às empresas acima referidas (artigo 6.º), a atribuição de competência às câmaras municipais para a elaboração e execução dos respetivos planos municipais de combate ao desperdício alimentar (artigo 9.º) e um regime contraordenacional específico (artigo 11.º).

Para tanto, conforme resulta do artigo 1.º do texto da iniciativa, promove-se a alteração de legislação relativa à orgânica da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), ao regime aplicável à defesa dos consumidores, à Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), ao Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) e ao Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC).

• Enquadramento jurídico nacional O combate ao desperdício alimentar é um assunto que está na agenda da Assembleia da República há

vários anos. Já em 2015, a Assembleia da República declarou o ano de 2016 como o ano nacional do combate ao desperdício alimentar, através da Resolução da Assembleia da República n.º 65/2015, de 17 de junho12.

Na sequência desta Resolução, o Governo criou a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA), através do Despacho n.º 14202-B/2016, de 25 de novembro de 2016. O ponto 3 do despacho dá-nos conta dos objetivos da CNCDA: «proceder ao diagnóstico, avaliação e monitorização sobre o desperdício alimentar a nível nacional; identificar as boas práticas existentes a nível nacional e internacional no âmbito do combate ao desperdício alimentar; sistematizar os indicadores de medida do desperdício alimentar, nas diferentes fases da cadeia alimentar, de acordo com as metodologias aplicadas ao nível da União Europeia e da OCDE; promover o envolvimento de entidades da sociedade civil com iniciativas desenvolvidas neste âmbito; promover a criação e o desenvolvimento de uma plataforma eletrónica que assegure a gestão interativa dos bens alimentares com risco de desperdício; propor medidas de redução do desperdício alimentar que integrem objetivos de segurança alimentar, educação escolar, saúde pública, combate à pobreza e de boas práticas na produção, na indústria agroalimentar, na distribuição e no consumo». Como competência é-lhe atribuída a elaboração da Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar3 e do Plano de Ação de Combate ao Desperdício Alimentar4.

Ainda no plano das medidas não legislativas, cumpre dar nota da aprovação pelo Governo, em 2017, do Plano de Ação para a Economia Circular em Portugal, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 190-A/2017, de 11 de dezembro5, com a finalidade de promover a «redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia». Com um âmbito mais vasto do que o projeto de lei em apreço, o Plano integra, nas suas ações macro, a «Ação 4 — Alimentar sem sobrar: produção sustentável para um consumo sustentável», com os objetivos de «conhecer e monitorizar a realidade nacional em matéria de desperdício alimentar na cadeia de valor; diminuir a produção de resíduos orgânicos e aumentar a produtividade da cadeia de valor, sobretudo dos setores ligados à indústria alimentar, contribuindo para a conservação dos recursos naturais; contribuir para a educação do produtor/consumidor».

No plano da legislação ordinária, e considerando que o projeto de lei em apreço propõe a criação de um regime jurídico aplicável à doação de géneros alimentícios, importa fazer referência ao Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de janeiro6, que altera o regime em vigor em matéria de infrações antieconómicas e contra a saúde pública, e para cujo artigo 81.º nos remete a alínea c) do artigo 2.º desta iniciativa legislativa, uma vez que

1 Intitulada «Combater o desperdício alimentar para promover uma gestão eficiente dos alimentos». 2 A Assembleia da República tornou a abordar o assunto do desperdício alimentar na Resolução da Assembleia da República n.º 13/2017, de 6 de fevereiro, na qual recomenda ao Governo medidas de combate do desperdício alimentar. 3 Aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 46/2018, de 27 de abril. 4 O plano de ação é composto por 14 medidas, desenvolvidas nas fichas preparadas pela CNCDA. 5 Alterada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 108/2019, de 2 de julho. 6 Versão consolidada, disponível em www.dre.pt.

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aquele contém a definição de «género alimentício». O Decreto-Lei n.º 194/2012, de 23 de agosto, que aprova a orgânica da Autoridade de Segurança Alimentar

e Económica (ASAE), prevê, no seu artigo 2.º, quais são a missão e as atribuições deste organismo, distribuindo-se estas últimas por diversas áreas – fiscalização das atividades económicas; segurança alimentar; cooperação interna e externa; instrução e aplicação de sanções em processos de contraordenação; e divulgação e informação e valorização profissional –, assumindo relevância, para este iniciativa em particular, as áreas da fiscalização das atividades económicas e da instrução e aplicação de sanções em processos de contraordenação.

A Lei n.º 24/96, de 31 de julho7, que estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores, comete ao Estado, às Regiões Autónomas e às autarquias um dever geral de proteção do consumidor e que tem tradução nos direitos que são atribuídos ao consumidor: à qualidade dos bens e serviços, à proteção da saúde e da segurança física; à formação e educação para o consumo; à informação para o consumo; à proteção dos interesses económicos; à prevenção e à reparação dos danos patrimoniais ou não patrimoniais que resultem da ofensa de interesses ou direitos individuais homogéneos, coletivos ou difusos; à proteção jurídica e a uma justiça acessível e pronta; e à participação, por via representativa, na definição legal ou administrativa dos seus direitos e interesses8. O artigo 6.º da lei é dedicado ao direito dos consumidores à formação e educação, e incumbe ao Estado a promoção de um política educativa para os consumidores, composta tanto por ações dirigidas a todos os consumidores em geral como pela inserção das matérias do consumo e dos direitos do consumidor nos programas educativos escolares desde o ensino básico.

A Lei de Bases do Sistema Educativo – Lei n.º 46/86, de 14 de outubro9 – enuncia, no seu artigo 3.º, os princípios organizativos a que este está sujeito, colocando-se aqui o foco no desenvolvimento da personalidade dos jovens, na formação do seu carácter e do seu sentido de cidadania, por estreitamente relacionado com o assunto desta nota técnica.

Na vertente da legislação fiscal, cumpre referir o Estatuto dos Benefícios Fiscais10 (EBF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho, em cujo artigo 62.º se dá conta dos donativos feitos pelas empresas que são considerados como custos ou perda do exercício, aquando da determinação do seu lucro tributável, e o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas11 (CIRC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, em especial o artigo 92.º, alterado por esta iniciativa legislativa, e o artigo 90.º, relativo à liquidação do imposto.

Finalmente, refira-se, porque citados nesta iniciativa, os seguintes diplomas: • A Lei n.º 71/98, de 3 de novembro – Bases do enquadramento jurídico do voluntariado –, cujo artigo 4.º

define as «organizações promotoras do voluntariado», definição que é replicada no projeto de lei objeto desta nota técnica; e

• O Decreto-Lei n.º 119/83, de 25 de fevereiro, que aprova o Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social, retificado pela declaração publicada no Diário da República, I Série, n.º 75/1983, 1.º Suplemento, 31 de março, e alterado pelos Decretos-Leis n.os 9/85, de 9 de janeiro, 89/85, de 1 de abril, 402/85, de 11 de outubro, 29/86, de 19 de fevereiro, 172-A/2014, de 11 de novembro, que o republica12, e pela Lei n.º 76/2015, de 28 de julho.

O envolvimento da sociedade civil no combate às situações de carência alimentar levou à criação do Banco

Alimentar contra a Fome, com o objetivo de combater o desperdício de bens alimentares e encaminhá-los às pessoas carenciadas, de forma gratuita e em estreita relação com as instituições sociais. Atualmente existem 21 bancos alimentares, espalhados pelo país, e associados numa federação.

Mais recente é a criação do Programa Zero Desperdício, com origem na DARIACORDAR – Associação para a Recuperação de Desperdício, associação sem fins lucrativos criada em 2011. O principal objetivo do Zero Desperdício é reduzir a geração de lixo, capacitando as instituições para a recuperação de alimentos perecíveis. Este modelo tem por objetivo a recuperação de excedentes alimentares em rede, fazendo chegar

7 Versão consolidada, disponível no portal www.dre.pt. 8 Conforme elencado no seu artigo 3.º. 9 Versão consolidada, disponível no portal www.dre.pt 10 Versão consolidada, disponível no portal da Autoridade Tributária e Aduaneira 11 Idem 12 Versão consolidada, à data do Decreto-Lei n.º 172-A/2014, de 11 de novembro

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todas as doações a pessoas em situação de carência, permitindo, assim, acabar com a fome, poupar o investimento financeiro necessário para alimentar as pessoas em carência alimentar e otimizar os recursos naturais, humanos e financeiros utilizados na produção e confeção dos alimentos.

Também a Re-Food trabalha para eliminar o desperdício alimentar, com base no voluntariado, tanto de quem doa os produtos como de quem os recolhe, embala e distribui diretamente às pessoas carenciadas.

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições) Consultada a base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, verificou-se que, neste

momento, sobre matéria conexa, se encontra pendente apenas o Projeto de Resolução n.º 544/XIV/2.ª (PEV) – Inquérito nacional sobre o desperdício alimentar em Portugal.

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições) Na anterior Legislatura localizaram-se as seguintes iniciativas sobre matéria conexa: - Projeto de Lei n.º 932/XIII/4.ª (PAN) –Estabelece o regime legal aplicável à doação de géneros

alimentares, para fins de solidariedade social, por forma a combater a fome e o desperdício alimentar em Portugal – caducado a 24-10-2019;

- Projeto de Lei n.º 266/XIII/1.ª (PAN) – Estabelece o regime aplicável à doação de géneros alimentares, para fins de solidariedade social, por forma a combater a fome e o desperdício alimentar em Portugal – rejeitado a 22-12-2016, com votos contra do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PCP e do PEV; discutido conjuntamente com o Projeto de Resolução n.º 576/XIII (CDS-PP) – Recomenda ao Governo, no âmbito da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar, que promova a divulgação e replicação do modelo de comissariado e Plano Municipal de Combate ao Desperdício Alimentar de Lisboa, com o objetivo de fomentar a criação de uma Rede Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar – aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP e do PAN e abstenções do BE, do PCP e do PEV –, o Projeto de Resolução n.º 577/XIII (CDS-PP) – Recomenda ao governo que adote uma série de medidas que visam a diminuição do desperdício alimentar – aprovado por unanimidade, o Projeto de Resolução n.º 581/XIII (BE) – Recomenda ao Governo medidas de combate ao desperdício alimentar – aprovado parcialmente (pontos 4 e 6 aprovados, restantes pontos rejeitados), o Projeto de Resolução n.º 582/XIII (PEV) – Participação pública para a estratégia nacional e para o plano de ação de combate ao desperdício alimentar – aprovado por unanimidade, e o Projeto de Resolução n.º 583/XIII (PEV) – Diagnóstico sobre o desperdício alimentar em Portugal – aprovado por unanimidade.

Cumpre ainda fazer menção ao Projeto de Resolução n.º 1506/XII/4.ª (PEV) – Combater o desperdício

alimentar para promover uma gestão eficiente dos alimentos – aprovado por unanimidade a 3-06-2015.III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais A iniciativa em apreciação é apresentada pelo partido Pessoas-Animais-Natureza — ao abrigo e nos

termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do RAR.

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A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do RAR, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.

Observa igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR, uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa. Ao prever no artigo 8.º que no prazo máximo de 60 dias após a sua publicação, «o Governo cria um sistema de incentivos para assegurar a adaptação das empresas do setor agroalimentar ao cumprimento do dever previsto no artigo 6.º, garantindo designadamente a disponibilização gratuita de embalagens 100% biodegradáveis, de material de origem biológica e renovável, que sejam compostáveis por processos de compostagem doméstica, industrial ou em meio natural, para as refeições prontas a consumir, em caso de aprovação», a iniciativa poderia implicar um aumento de encargos no ano económico em curso, mas os autores salvaguardaram o cumprimento do limite imposto pelo n.º 2 do artigo 167.º da Constituição e n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, conhecido como lei-travão, adiando a entrada em vigor, que fazem coincidir com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 9 de setembro de 2020. Foi admitido a 14 de setembro, data em que e baixou na generalidade à Comissão de Agricultura e Mar (1.ª), por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, tendo sido anunciado a 15 de setembro.

• Verificação do cumprimento da lei formulário A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, de ora em

diante designada como lei formulário, contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa.

O título da presente iniciativa legislativa – Aprova o regime jurídico aplicável à doação de géneros alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, embora possa ser aperfeiçoado, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final.

O projeto de lei pretende alterar o Decreto-Lei n.º 194/2012, de 23 de agosto, que aprova a orgânica da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, a Lei n.º 24/96, de 31 de julho, alterada pela Lei n.º 85/98, de 16 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, pela Lei n.º 10/2013, de 28 de janeiro, pela Lei n.º 47/2014, de 28 de julho, e pela Lei n.º 63/2019, de 16 de agosto, que estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores, a Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, alterada pelas Leis n.os 115/97, de 19 de setembro, 49/2005, de 30 de agosto, e 85/2009, de 27 de agosto, que aprova a Lei de Bases do Sistema Educativo, o Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho, e o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro.

Consultado o Diário da República Eletrónico, verifica-seque se trata da primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 194/2012, de 23 de agosto, que aprova a orgânica da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, da sexta alteração à Lei n.º 24/96, de 31 de julho, e à quarta, e não à terceira, alteração à Lei n.º 46/86, de 14 de outubro.

Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário: «Os diplomas que alterem outros devem indicar o número de ordem da alteração introduzida» – preferencialmente no título – «e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas». Ora, o título da iniciativa não faz menção aos diplomas alterados nem ao número de ordem da alteração, sendo esta referência feita apenas no artigo que diz respeito ao seu objeto.

No que diz respeito às alterações propostas pela iniciativa em apreço ao Estatuto dos Benefícios Fiscais e ao Código do IRC, deve dizer-se, a este propósito, que a lei formulário foi aprovada e publicada num contexto anterior à existência do Diário da República Eletrónico, atualmente acessível de forma gratuita e universal. Assim, por motivos de segurança jurídica e para tentar manter uma redação simples e concisa, parece-nos mais seguro e eficaz não colocar o elenco de diplomas que procederam a alterações (ou o número de ordem da alteração), quando a iniciativa incida sobre códigos, «leis» ou «regimes gerais», «regimes jurídicos» ou

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atos legislativos de estrutura semelhante. Ora, foi efetivamente esta a opção do legislador no caso sub judice. Assim, e tendo em conta o acima exposto, sugere-se o seguinte aperfeiçoamento do título: Regime jurídico

aplicável à doação de géneros alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar (procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 194/2012, de 23 de agosto, à sexta alteração à Lei n.º 24/96, de 31 de julho, à quarta alteração à Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, e à alteração do Estatuto dos Benefícios Fiscais e do Código do IRC).

Sugere-se, ainda para efeitos de apreciação na especialidade, que seja ponderada a inclusão de uma norma revogatória, uma vez que o artigo 16.º da iniciativa propõe a revogação da alínea h) do n.º 2 do artigo 92.º do Código do IRS.

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

No que respeita ao início de vigência, o artigo 19.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação».

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei formulário.

• Regulamentação ou outras obrigações legais De acordo com artigo 19.º, o Governo procede à regulamentação da presente lei no prazo máximo de 60

dias após a publicação. O artigo 18.º da iniciativa em apreço dispõe ainda que, a cada dois anos, o Governo e a Comissão Nacional

de Combate ao Desperdício Alimentar elaboram e apresentam à Assembleia da República relatórios sobre o impacto da presente lei no combate ao desperdício alimentar, incluindo eventuais sugestões para o seu aperfeiçoamento.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento no plano da União Europeia O desperdício alimentar é motivo de cada vez maior preocupação na Europa, sendo que o desperdício de

alimentos que ainda são comestíveis aumenta os impactos nocivos e causa prejuízos financeiros aos consumidores e à economia.

Estima-se que todos os anos sejam desperdiçados na UE 88 milhões de toneladas de alimentos, representando cerca de 20% dos alimentos produzidos, sendo que os setores grossista e retalhista responsáveis por 5% do desperdício alimentar total.13

A redução do desperdício de alimentos é considerada uma alavanca fulcral para alcançar a segurança alimentar global, libertando recursos finitos para outras utilizações, diminuindo os riscos para o ambiente e evitando perdas financeiras. A Comissão Europeia, no «Roteiro para uma Europa eficiente na utilização de recursos», fixou o objetivo de reduzir para metade a produção de resíduos alimentares até 2020, urgindo os Estados-Membros da UE a reduzirem o desperdício alimentar, em conformidade com a meta de redução do desperdício alimentar acordada como parte dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas. Assim, de forma global, o desperdício alimentar per capita a nível do retalho e dos consumidores deve ser reduzido para metade até 2030 e as perdas de alimentos eliminadas ao longo das cadeias de produção e abastecimento alimentar.

A CE definiu também como prioridade a prevenção do desperdício alimentar no seu Plano de Ação para a Economia Circular, onde os materiais são mantidos dentro da economia — partilhados, reutilizados ou reciclados — aliviando a pressão exercida sobre os nossos recursos e sobre o ambiente e criando

13 Estimativas dos níveis de desperdício alimentar na Europa

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oportunidades comerciais e sensibilizando, a nível nacional, regional e local, a divulgação de boas práticas em matéria de prevenção do desperdício alimentar14.

De forma a cumprir as metas traçadas relativas ao desperdício alimentar previsto nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), a CE:

• Desenvolveu uma metodologia comum harmonizada da UE com o intuito de medir o desperdício

alimentar, facilitando a doação de alimentos e a utilização segura de recursos alimentares de produção de alimentos para animais; melhorou a utilização da sinalização da data por todos os intervenientes na cadeia alimentar; criou em 2016 a Plataforma da UE para as Perdas e o Desperdício de Alimentos em que participam os Estados-Membros e as partes interessadas com o objetivo de apoiar o cumprimento do ODS relativo ao desperdício alimentar, através da partilha de melhores práticas e da avaliação dos progressos realizados ao longo do tempo;

• Tomou medidas de clarificação da legislação da UE relativa aos resíduos, aos géneros alimentícios e aos alimentos para animais e facilitar a doação de alimentos, bem como a utilização de restos de géneros alimentícios e de subprodutos provenientes da cadeia alimentar na produção de alimentos para animais, sem comprometer a segurança dos alimentos para consumo humano e animal. A ação da CE e Estados-Membros é crítica nos domínios em que o desperdício alimentar pode resultar da forma como a sua legislação é interpretada ou aplicada, especialmente nos casos das regras aplicáveis à doação de alimentos aos bancos alimentares e à utilização de alimentos seguros que não foram vendidos como recurso na alimentação para animais;

• Analisou alternativas de melhoria para a utilização da indicação da data pelos intervenientes na cadeia alimentar e a sua compreensão pelos consumidores, com destaque para o rótulo «consumir de preferência antes de» 15.

Em 2008, a Diretiva-Quadro Resíduos, introduziu novas medidas especificamente destinadas a prevenir o

desperdício alimentar, designadamente a obrigação de os Estados-Membros monitorizarem e avaliarem a execução das suas medidas de prevenção de resíduos alimentares através da medição dos níveis de resíduos alimentares, com base numa metodologia comum e comunicarem esses dados à Comissão16. Os dados devem ser acompanhados de um relatório de controlo de qualidade.

Lançada em 2009, a Semana Europeia Anual para a Redução dos Resíduos (EWWR) conta com mais de 25 000 ações de comunicação implementadas em 28 países. Coordenada pela Associação das Cidades e Regiões para a Reciclagem e Gestão Sustentável dos Recursos (ACR+), a semana faz parte de um esforço pan-europeu alargado para reduzir os resíduos e melhorar a gestão dos resíduos. Outra iniciativa de sensibilização pan-europeia é a campanha «Generation Awake» da Comissão Europeia, que promove a utilização sustentável dos recursos naturais.

Em janeiro de 2012, o Parlamento Europeu (PE) adotou a «resolução sobre como evitar o desperdício de alimentos: estratégias para melhorar a eficiência da cadeia alimentar na UE», onde solicita à CE a adoção de medidas concretas, destinadas a reduzir para metade o desperdício de alimentos até 2025. O PE solicitou ainda à CE que analisasse toda a cadeia alimentar, desde a exploração agrícola até à mesa do consumidor, a fim de identificar os setores o desperdício de alimentos tem maior incidência. Com base nesta análise, devem ser criados objetivos específicos em matéria de prevenção do desperdício de alimentos para os Estados Membros.

Em junho de 2016, o Conselho adotou conclusões que definem iniciativas destinadas a reduzir as perdas e desperdícios alimentares17, pretendendo:

• melhorar a vigilância e recolha de dados a fim de melhor compreender a problemática;

14 http://ec.europa.eu/food/safety/food_waste/stop/index_en.htm 17 15 Comunicação Da Comissão Ao Parlamento Europeu, Ao Conselho, Ao Comité Económico E Social Europeu E Ao Comité Das Regiões COM(2015) 614 final: Fechar o ciclo – plano de ação da UE para a economia circular 16 O modelo a utilizar pelos Estados-Membros para a comunicação de dados relativos aos níveis de resíduos alimentares deve ter em conta as metodologias estabelecidas na Decisão Delegada (UE) 2019/1597 da Comissão. A Decisão de execução (UE) 2019/2000 da Comissão de 28 de novembro de 2019 estabelece um modelo para a comunicação de dados sobre resíduos alimentares e para a apresentação de relatórios de controlo de qualidade em conformidade com a Diretiva 2008/98/CE do Parlamento Europeu e do Conselho. 17 Perdas e desperdícios alimentares: avaliação dos progressos efetuados na execução das conclusões do Conselho de junho de 2016

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• insistir na prevenção das perdas e desperdícios alimentares e numa maior utilização da biomassa na futura legislação da UE;

• facilitar a doação de produtos alimentares não vendidos a instituições de beneficência. Em 2016, o Tribunal de Contas Europeu (TCE) elaborou um relatório especial intitulado Luta contra o

desperdício alimentar: uma oportunidade para a UE melhorar a eficiência dos recursos na cadeia de abastecimento alimentar onde explana a auditoria efetuada no âmbito do desperdício alimentar e a UE e suas conclusões, onde se destacam «As declarações políticas de alto nível não se traduziram em ações suficientes»; «Os documentos estratégicos da Comissão tornam-se menos ambiciosos com o decorrer do tempo»; «Ações fragmentadas e esporádicas ao nível técnico».

Em 2017, foi criado o subgrupo de doação de alimentos ao abrigo da Plataforma da UE sobre Perdas de Alimentos e Resíduos de Alimentos para apoiar as atividades da UE de forma a facilitar a doação de alimentos. Este subgrupo foi estabelecido com o objetivo de apoiar o trabalho da CE relativamente à doação de alimentos, conforme estabelecido no Plano de Ação para a Economia Circular apoiando o trabalho da CE com:

• A preparação de diretrizes de doação de alimentos da UE para doadores e recetores de excedentes de

alimentos; • A identificação de práticas, diretrizes e regras existentes nos Estados Membros em relação à doação de

alimentos de forma a serem compartilhados com os membros da Plataforma; • A nova definição de um projeto-piloto, a lançar em 2018, de forma a apoiar a redistribuição de alimentos

na UE, aprofundando as práticas de investigação nos Estados-Membros e apoiando a divulgação das futuras orientações da UE a nível nacional.

Na sua Comunicação intitulada «Orientações da UE sobre a doação de géneros alimentícios», a Comissão

Europeia refere que o desperdício alimentar coloca uma pressão indevida nos recursos naturais limitados e no ambiente, procurando a prevenção do desperdício atuar na fome, limitando a produção de excedentes alimentares em cada fase da acedia de abastecimento e a doação de géneros alimentícios apoiar a luta contra a pobreza. Assim, as orientações visam facilitar o cumprimento dos requisitos pertinentes previstos no quadro regulamentar da UE, por exemplo, de segurança e higiene alimentar, e promover uma interpretação comum pelas autoridades reguladoras dos Estados-Membros da UE das regras da UE aplicáveis à redistribuição dos excedentes alimentares.

Em abril de 2018, o Conselho expôs as medidas já tomadas a nível nacional e da UE, reconhecendo a importância de continuar o trabalho no sentido de reduzir as perdas e desperdícios alimentares, de forma a atingir as metas estabelecidas na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

A Diretiva (UE) 2018/85118 do Parlamento Europeu e do Conselho de 30 de maio de 2018 que altera a Diretiva 2008/98/CE relativa aos resíduos refere que a fim de tornar a economia verdadeiramente circular, é necessário tomar medidas adicionais em matéria de produção e consumo sustentáveis centradas em todo o

ciclo de vida dos produtos de modo a preservar os recursos e fechar o ciclo. Dispõe ainda que a promoção da sustentabilidade na produção e no consumo pode contribuir significativamente para a prevenção de resíduos.

Os Estados Membros deverão tomar medidas para consciencializar os consumidores para esta contribuição e

incentivá-los a participar mais ativamente com vista a melhorar a eficiência dos recursos. Nas medidas a tomar

a fim de reduzir a produção de resíduos, os Estados Membros deverão incluir a realização de iniciativas de

comunicação e educação contínuas para aumentar a sensibilização para as questões relativas à prevenção de

resíduos e à deposição de lixo em espaços públicos, e poderão incluir a utilização de regimes de consignação

a fixação de metas quantitativas, e a concessão, se for caso disso, de incentivos económicos adequados aos

produtores. A Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, apresentou como uma das grandes ambições

da Comissão para o período de 2019-2024, o Pacto Ecológico Europeu visando tornar a economia da UE sustentável, transformando os desafios climáticos e ambientais em oportunidades em todos os domínios de

18 De acordo com a informação constante do eur-lex, a Diretiva não se encontra ainda transposta.

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intervenção e tornando a transição justa e inclusiva para todos. Este Pacto prevê um plano de ação para impulsionar a utilização eficiente dos recursos através da transição para uma economia limpa e circular, assim como restaurar a biodiversidade e reduzir a poluição. O plano descreve os investimentos necessários e os instrumentos de financiamento disponíveis, e explica como assegurar uma transição justa e inclusiva. A UE prestará igualmente apoio financeiro e assistência técnica para ajudar quem é mais afetado pela transição para a economia verde, através do Mecanismo para uma Transição Justa19.

Tendo em vista assegurar uma cadeia alimentar mais sustentável, a Comissão delineou a estratégia «Do prado para o prato»20 que contribuirá para a realização de uma economia circular, desde a produção até ao consumo.

A Plataforma da UE para as Perdas e o Desperdício Alimentares emitiu as Recomendações de Ação para a prevenção do desperdício alimentar em dezembro de 2019, onde aborda as ações exigidas em cada fase da cadeia de abastecimento alimentar e um conjunto de recomendações transversais que são comuns em várias fases da acedia de valor alimentar, referindo, nomeadamente, como recomendações de ação para a doação de alimentos a promoção da utilização dos excedentes alimentares para a doação de géneros alimentares, tanto em quantidade como em qualidade e a inovação e modernização dos sistemas de doação.

No âmbito da crise sanitária provocada pela COVID-19, a cadeia alimentar também foi afetada e as medidas adotadas podem, em alguns setores, levar a um aumento do desperdício alimentar. O boletim informativo da Plataforma da UE sobre as Perdas e Resíduos Alimentares tem se centrado na perda de alimentos e nas ações de prevenção de resíduos adotadas pelos Estados Membros da UE no contexto desta crise sem precedentes.

Além disso, a Comissão Europeia organizou, em 26 de junho de 2020, um webinar sobre medição de resíduos alimentares, onde foram abordados exemplos concretos de monitorização nacional de resíduos alimentares.

• Enquadramento internacional

Países europeus A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: França,

Itália, Noruega, Polónia e República Checa.

FRANÇA A Lei n.º 2016-138, de 11 de fevereiro de 2016, relativa à luta contra o desperdício alimentar, introduziu

uma subsecção no Código do Ambiente, intitulada «Luta pela reutilização e contra o desperdício» e composta pelos artigos L541-15-3 a L541-15-15. Mais recentemente, a Lei n.º 2020-105, de 10 de fevereiro, veio proceder à alteração de alguns desses artigos.

A solução legislativa adotada por França envolve nesta luta os produtores, transformadores, distribuidores, consumidores e associações, respeitando as seguintes prioridades: prevenção do desperdício alimentar; utilização os produtos alimentares não vendidos, mas em condições para o consumo humano, através da doação ou da sua transformação; utilização dos restantes para a alimentação animal; ou para produção de composto agrícola ou energético.

É proibida a retirada do mercado de géneros alimentícios ainda não impróprios para consumo e as médias e grandes superfícies comerciais e os distribuidores de meios alimentares com áreas superiores a 400 metros quadrados são obrigados a celebrar acordos com instituições de caridade para entrega de produtos alimentares excedentes que ainda se encontrem próprios para consumo humano, sendo a prevaricação das obrigações estabelecidas na lei punida com multas até 3000 euros, caso se trate de pessoa singular, ou 15 000 euros, se se tratar de pessoa coletiva.

19 A COM (2020) 460 relativa à proposta alterada de REGULAMENTO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO que institui um Fundo para uma Transição Justa foi objeto de escrutínio por parte da Assembleia da República – Parecer CAE. 20 COM (2020) 381.

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ITÁLIA A Lei n.º 166, de 19 agosto de 2016, relativa a disposições concernentes à doação e distribuição de

produtos alimentares e farmacêuticos para fins de solidariedade social e redução do desperdício, permite a cessão gratuita dos excedentes alimentares, embora sem caráter obrigatório nem imposição de sanções. Este diploma prevê como incentivo, nos seus artigos 16 e 17, alguns benefícios fiscais para quem faça essa doação.

NORUEGA Existe, desde 2017, um acordo celebrado entre o Governo e as mais significativas organizações da

indústria alimentar no sentido de reduzir para metade, até 2030, a quantidade de comida desperdiçada. Este acordo enquadra-se nos objetivos de desenvolvimento sustentável fixados pela Organização das Nações Unidas, um dos quais é exatamente o do combate à fome através da redução dos desperdícios alimentares. Exige ainda a obrigação de apresentação de relatórios em 2020, 2025 e 2030, para avaliação do nível e consecução do objetivo a atingir.

POLÓNIA Na Polónia foram tomadas medidas nesta área pela Lei de 19 de julho de 201921 para Combate ao

Desperdício de Alimentos. Esta lei estabelece princípios sobre gestão alimentar e cria a obrigação de os comerciantes de produtos alimentares celebrarem um acordo com uma organização não governamental para doação de alimentos, não destinados a venda, mas ainda próprios para consumo humano.

REPÚBLICA CHECA Desde 1 de janeiro de 2018, em virtude de uma alteração introduzida ao Act No 110/1997 Coll. on Food

and Tobacco Products, todas as superfícies comerciais com áreas de vendas superiores a 400 metros quadrados são obrigadas a doar para fins caritativos alimentos não vendidos. Outros comerciantes do ramo alimentar, como mercearias e pequenas lojas de comida, podem, numa base de voluntariado, entregar comida a organizações não lucrativas que tenham por atividade a recolha de alimentos.

Outros países

REINO UNIDO A página do Waste and Resources Action Programme (WRAP) fornece, num guia bastante completo sobre

a prevenção do desperdício alimentar, informação sobre a legislação aplicável nesta área no Reino Unido. Como aí é sublinhado, a legislação específica em vigor nos quatro países que compõem o Reino Unido foi elaborada à sombra de três atos normativos essenciais:

– O Regulamento (CE) n.º 178/2002, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2002; – O Food Safey Act 1990, aplicável na Grã-Bretanha22; – O Food Standards Act 1999.23

21 No original em polaco. 22 Na Irlanda do Norte vigora legislação semelhante, aprovada pela Food Safety (Northern Ireland) Order 1991. 23 Em https://www.food.gov.uk/ é disponibilizada informação específica dirigida aos negócios do ramo da hotelaria e restauração, que não dispensa a consulta da legislação, sobre regras a observar em matéria de segurança alimentar. A página da Internet da Food Standards Agency, que funciona sob a tutela do Governo, fornece a mesma informação.

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Concretamente acerca do desperdício alimentar, a legislação mais rigorosa é a da Irlanda do Norte, cujo Food Waste Regulations (Northern Ireland) 2015 se refere à recolha, transporte e tratamento de restos alimentares e matérias relacionadas. De acordo com este regulamento24, os donos de negócios relacionados com o setor da alimentação são obrigados a não misturar os restos de comida com lixo e outro tipo de desperdícios, devendo depositá-los separadamente em recetáculos destinados a essa finalidade e nunca em esgotos ou outros contentores. Estes recetáculos próprios são obrigatoriamente postos à disposição dos utentes pelas autoridades distritais (district councils). A obrigação de providenciar os recetáculos passou a impender sobre as autoridades distritais desde 1 de abril de 2015.

Acerca da obrigação de separar os restos alimentares, todos os que levam a cabo atividades ou negócios de produção de alimentos (com exceção dos hospitais) e produzam mais de 50 quilos de restos de comida por semana ficaram obrigados, a partir de 1 de abril de 2016, a separar esses desperdícios alimentares e a entregá-los nos locais próprios para recolha. Antes daquela data, os que produziam desperdícios alimentares em quantidade inferior não estavam obrigados a essa separação. A partir de 1 de abril de 2017, passaram a também ficar abrangidos os hospitais e os que produzam entre 5 e 50 quilos de restos por semana, pelo que só permanecerão isentos dessa obrigação os que produzam menos de 5 quilogramas.

As normas irlandesas, à semelhança da regulamentação correlativa que existe na Grã-Bretanha, contêm definições fundamentais para esta matéria, como acontece com a de atividades e negócios para efeitos de aplicação da lei (business), que inclui a exploração, com intuito lucrativo ou não, de cantinas, clubes, escolas e hospitais.

Ao invés, as Waste (England and Wales) Regulations 2011, que não dizem respeito apenas aos desperdícios alimentares, não obrigam à separação, para recolha, dos restos, mas encorajam o mais possível à reciclagem.

Finalmente, as Waste (Scotland) Regulations 2012 entraram em vigor em 1 de janeiro de 2014, fazendo parte do conjunto de medidas incluídas no Plano «Zero Desperdício» (Zero Waste) do Governo escocês, com o objetivo de se atingir uma taxa de 75% de reciclagem em 2025. Esta lei obriga os negócios ou atividades ligadas aos alimentos que produzam mais de 50 quilos de restos alimentares por semana a proceder à separação dos alimentos para recolha, excetuando-se os meios rurais e os hospitais. A partir de 1 de janeiro de 2016, a obrigação passou a abranger os hospitais e todas as atividades e negócios que produzam mais de 5 quilos de restos alimentares por semana. Este Programa disponibiliza ainda um guia para melhor compreensão da legislação em causa.

Organizações internacionais

Organização das Nações Unidas (ONU) Em 2015, a Organização das Nações Unidas estabeleceu os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

(ODS), que sucederam aos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio. Os ODS são 17, divididos em 169 metas, a atingir até 2030. Um dos propósitos do Objetivo 12, relativo à produção e consumo sustentáveis, é o de «Até 2030, reduzir para metade o desperdício de alimentos per capita a nível mundial, de retalho e do consumidor, e reduzir os desperdícios de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo os que ocorrem pós-colheita».

Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO)25 Esta agência das Nações Unidas produziu, em 2011, um importante relatório, citado na exposição de

motivos do projeto de lei sob análise. Outros dois relatórios relevantes da FAO são os que se intitulam Global Initiative on Food Loss and Waste Reduction e Food losses and waste in the context of sustainable food systems, onde são apontadas as causas do desperdício de alimentos e recomendadas medidas para o

24 No direito anglo-saxónico de matriz britânica, as regulations constituem secondary legislation, com caráter regulamentar e execução de leis (parlamentares) de nível hierárquico superior. 25 A sigla corresponde à denominação em inglês: Food and Agriculture Organization of the United Nations.

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combater, de entre as quais se destaca a adoção de políticas de redistribuição e reaproveitamento de bens alimentares.

V. Consultas e contributos

Genericamente, consoante a matéria em apreço, pode aferir-se a necessidade ou conveniência, infirmadas na Lei Constitucional, no Regimento da Assembleia da República ou em legislação avulsa, de promover a consulta e a coleção de contributos de entidades públicas ou privadas, em virtude do seu direito à participação no processo legislativo relacionado.

Conforme se aduziu supra, a iniciativa em análise contempla a introdução de alterações significativas em diplomas legislativos de diversa natureza, designadamente na matéria concernente à defesa do consumidor, sugerindo-se a consulta de associações de defesa do consumidor, e, eventualmente, de estruturas representativas de empresas do setor agroalimentar e do setor da distribuição.

Cabe ainda sugerir, em função da prescrição do artigo 9.º da iniciativa, a consulta da Associação Nacional de Municípios Portugueses, em consonância com a teleologia do artigo 141.º do RAR.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género Os autores juntaram a respetiva ficha de Avaliação Prévia de Impacto de Género, em função da qual se

afere o caráter neutro da iniciativa legislativa em apreço. O tema e a sua redação não nos oferecem questões quanto a este ponto, não evidenciando, prima facie, qualquer impacto prospetivo diferenciado em função de género.

Linguagem não discriminatória Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta

fase do processo legislativo a redação do projeto de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a linguagem discriminatória em relação ao género.

VII. Enquadramento bibliográfico

BATISTA, Pedro[et al.] – Do campo ao garfo [Em linha]: desperdício alimentar em Portugal.Lisboa: CESTRAS, 2012. [Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119289&img=1006&save=true>.

Resumo: Este livro resultou de um projeto de investigação sobre o desperdício alimentar em Portugal, e procura responder a duas questões: quanto se desperdiça, e porque se desperdiça.

Carateriza-se o desperdício alimentar em Portugal nas suas diferentes etapas: produção, processamento, distribuição e consumo; discutem-se as principais causas do desperdício e faz-se uma análise mais pormenorizada do desperdício das famílias. O capítulo dedicado às famílias menciona algumas pressões externas como a crise económica, as alterações nos hábitos de consumo e nas rotinas das famílias, o impacto dos media na sensibilização para o problema, a subida dos preços dos alimentos e a segurança alimentar e analisa a influência destes fatores nos comportamentos e atitudes dos consumidores.

Destaca-se a Resolução do Parlamento Europeu de 19 de janeiro de 2011, que propõe a redução para metade, até 2025, do desperdício alimentar na União Europeia, e no último capítulo são sugeridas linhas de

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ação para uma estratégia que permita atingir essa meta em Portugal.

CANADÁ. Commission for Environmental Cooperation – Characterization and management of food loss and waste in North America [Em linha]. Montreal: Commission for Environmental Cooperation, 2017. [Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=125293&img=10406&save=true>.

Resumo: Este documento produzido pela Commission for Environmental Cooperation é uma iniciativa de três países, Canadá, México e Estados Unidos, inserida no programa Green Economy and Climate Change. Pretende capacitar o território da América do Norte na redução de perdas e desperdício alimentares nos setores da indústria, comércio e institucional. Apresenta um conjunto de estratégias para a redução de perdas e desperdícios alimentares em toda a cadeia alimentar, desde a produção após a colheita, ao processamento e distribuição até ao setor retalhista e consumidor final.

São, ainda, apresentadas estimativas relativas à quantidade de perda e desperdício alimentares e o seu impacto ambiental e socioeconómico. As oportunidades e sugestões apresentadas dirigem-se aos setores referenciados em cima, aos governos e a organizações não-governamentais no desenvolvimento de políticas e estratégias para a América do Norte.

FOOD LOSS AND WASTE PROTOCOL. Food loss and waste accounting and reporting standard [Em linha]. [S.l.]: FLW Protocol, 2016. [Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=125294&img=10407&save=true>.

Resumo: Este documento constitui-se numa norma mundial de quantificação e comunicação consistente de perdas e desperdícios alimentares. A utilização desta norma permitirá aos países, cidades, empresas, ou outra qualquer entidade elaborar inventários no âmbito das perdas e desperdícios alimentares ao longo da cadeia alimentar e perceber a sua evolução, permitindo uma melhor eficiência na gestão dos recursos e a redução do impacto ambiental que estas perdas significam.

GLOBAL food losses and food waste [Em linha]: extents, causes and prevention. Rome: FAO, 2011. ISBN 978-82-5-107205-9. [Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119286&img=1805&save=true>.

Resumo: A segurança alimentar é uma preocupação muito presente na maior parte dos países em desenvolvimento. A produção de alimentos tem de aumentar significativamente para dar resposta às necessidades de uma população mundial cada vez maior. Este estudo mostra que uma das formas de evitar os desequilíbrios e reduzir as tensões entre as necessidades crescentes em termos de consumo e os desafios do aumento da produção, passa por promover a redução do desperdício de alimentos. Se conseguirmos alcançar esse objetivo, teremos um aumento considerável de eficiência em toda a cadeia alimentar. Considera-se que, num planeta com recursos naturais limitados (terra, água, energia, fertilizantes), e em que são urgentes soluções baratas para produzir alimentos seguros e nutritivos suficientes para todos, a redução do desperdício e das perdas de alimentos deve ser considerada uma prioridade.

HANSON, Craig [et. al.] – Reducing food loss and waste [Em linha]: ten Interventions to scale impact. Washington: World Resources Institute, 2019. [Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=131794&img=16864&save=true>.

Resumo: Este relatório apresenta 10 intervenções de desenvolvimento (políticas e práticas) que, segundo os autores, permitem aumentar o ritmo e amplitude geográfica nos esforços de redução do desperdício alimentar e dos resíduos. Visa ir ao encontro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 12.3 sobre perda e desperdício de alimentos (FAO). Destina-se a gestores públicos, empresas, organizações não governamentais, centros de pesquisa. Para cada intervenção os autores indicam o que é necessário para a sua implementação, a forma de funcionamento e os passos seguintes a desenvolver no futuro. As ações/estratégias passam pelo aumento do número de países a desenvolverem estratégias nacionais no

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âmbito do desperdício alimentar, pela alteração de comportamentos na área do consumo (restaurantes e agregados familiares), pela inovação na produção de soluções de armazenamento mais ecológicas e pelo aumento do financiamento através de subsídios e incentivos à prática de políticas redutoras de desperdício alimentar, entre outras.

HIGH LEVEL PANEL OF EXPERTS ON FOOD SECURITY AND NUTRITION OF THE COMMITTEE ON WORLD FOOD SECURITY, Rome, 2014 – Food losses and waste in the context of sustainable food systems. [Em linha]. Rome: FAO, 2014. [Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119287&img=1806&save=true>.

Resumo: Este relatório analisa o desperdício e a perda de alimentos numa tripla perspetiva: perspetiva sistémica, perspetiva de sustentabilidade ambiental, social e económica e perspetiva da segurança alimentar e nutrição.

O Grupo de Peritos de Alto Nível para a Segurança Alimentar e a Nutrição, responsável pelo relatório, recomenda aos governos e às organizações internacionais que implementem uma melhor integração da cadeia alimentar e do sistema de alimentação e que promovam uma estratégia de segurança alimentar e estratégia nutricional. Deve ser reduzido o desperdício e a perda de alimentos, devem ser avaliadas as potenciais formas de melhorar a eficiência dos sistemas agrícolas e alimentares e a sustentabilidade para a melhoria da segurança alimentar e nutricional. Devem ainda ser analisadas as causas diretas e indiretas do desperdício e da perda de alimentos num determinado sistema e identificar as situações em que será mais eficiente agir.

MANFREDI, Simone – Improving sustainability and circularity of european food waste management with a life cycle approach [Em linha]. [S.l.]: European Union, 2015. [Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

Resumo: Este documento é um relatório técnico do Joint Research Centre (Comissão Europeia) sobre a gestão do desperdício alimentar na Europa e sua melhoria através do recurso à economia circular, entre outros recursos. O relatório visa ajudar os decisores e os gestores de resíduos e de desperdício alimentar a identificar as opções de gestão mais sustentáveis para o desperdício de alimentos e para a minimização de impactos ambientais e económicos, ou seja, visa melhorar a sustentabilidade de gestão de resíduos alimentares europeus.

PORTUGAL. Governo Constitucional, 19 – Prevenir desperdício alimentar [Em linha]: um compromisso de todos. [S.l.: s.n.], 2014. [Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

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Resumo: O documento acima referido propõe a criação de um compromisso para o combate ao desperdício alimentar, começando por caraterizar e explicar este desperdício, com vista a contribuir ativamente para a redução do desperdício alimentar em Portugal. Sugere-se a criação de uma Plataforma Nacional de Conhecimento sobre o Desperdício Alimentar que estude e reúna informação sobre este assunto. São apresentadas linhas orientadoras para cada uma das áreas de intervenção, que poderão constituir um contributo para a elaboração de guias de boas práticas nas seguintes vertentes: produção e transformação; distribuição e comercialização; educação e comunicação; sensibilização e responsabilização; e regulação, agilização e reconhecimento.

STENMARCK, Åsa [et. al.] – Estimates of European food waste levels [Em linha]. Stockholm: Swedish Environmental Research Institute, 2016. Consult. 22 set. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=131792&img=16861&save=true>.

Resumo: Este relatório produzido no âmbito do Projeto FUSIONS, EU – Reducing Food Waste through

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social innovation – apresenta estimativas para a produção e desperdício de resíduos alimentares na UE-28. Os valores são apresentados por setores: produção primária (agricultura e pescas); produção secundária (indústria transformadora alimentar); distribuição (grosso e retalho); restauração e consumo nos agregados familiares. Embora tenham sido recolhidos dados até 2013, a estimativa orienta-se a 2012, dado a falta de fiabilidade e consolidação dos dados recolhidos para 2013.

———

PROJETO DE LEI N.º 512/XIV/2.ª (MEDIDAS PARA A RECUPERAÇÃO DA ATIVIDADE DAS JUNTAS MÉDICAS DE AVALIAÇÃO DE

INCAPACIDADES)

PROJETO DE LEI N.º 538/XIV/2.ª (ASSEGURE A RESPOSTA EFICAZ DA ATIVIDADE DAS JUNTAS MÉDICAS DE AVALIAÇÃO DE

INCAPACIDADES E DOS CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS EM SITUAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA PROVOCADA PELA COVID-19)

PROJETO DE LEI N.º 541/XIV/2.ª

REGIME TRANSITÓRIO PARA A EMISSÃO DE ATESTADOS MÉDICOS DE INCAPACIDADE MULTIUSO)

Parecer da Comissão de Saúde e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer conjunto

Índice Parte I – Considerandos Parte II – Opinião da Deputada autora do parecer Parte III – Conclusões Parte IV – Anexos PARTE I – Considerandos

• Introdução O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da

República o Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª «Medidas para a recuperação da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades»; o Grupo Parlamentar Pessoas-Animais-Natureza (PAN) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 538/XIV/2.ª «Assegure a resposta eficaz da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades e dos cuidados de saúde primários em situação epidemiológica provocada pela COVID-19»; e o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 541/XIV/2.ª «Regime Transitório para a emissão de Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso».

Estas iniciativas legislativas são apresentadas nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), cumprindo os requisitos do n.º 1 do artigo 124.º do RAR.

O Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª (BE) deu entrada a 16 de setembro de 2020, tendo sido admitido no dia 23

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de setembro. Os Projetos de Lei n.os 538/XIV/2.ª (PAN) e 541/XIV/2.ª (PCP) deram entrada a 25 de setembro de 2020, tendo sido admitidos no dia 30.

As três iniciativas em apreço baixaram na generalidade à 9.ª Comissão – Comissão de Saúde. No que diz respeito ao enquadramento legal (nacional e internacional) e doutrinário das presentes

iniciativas legislativas, bem como no que diz respeito a outras iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria, remete-se para as respetivas notas técnicas elaboradas pelos serviços competentes da Assembleia da República, em anexo ao presente parecer.

De realçar que o Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª (BE) salvaguarda a lei-travão (n.º 2 do artigo 167.º da CRP e n.º 2 do artigo 120.º do RAR), o que não se verifica nos Projetos de Lei n.os 538/XIV/2.ª (PAN) e 541/XIV/2.ª (PCP) onde, na respetiva nota técnica, é feita a seguinte ressalva:

«Estas iniciativas poderão implicar, em caso de aprovação, um acréscimo de despesas e/ou uma

diminuição de receitas para o Orçamento do Estado com a saúde, face às medidas que estão previstas para a recuperação da atividade das juntas médicas, bem como a dispensa ou prorrogação de validade dos atestados, em alguns casos. Para salvaguardar o disposto no n.º 2 do artigo 120.º do RAR, que impede a apresentação de iniciativas que ‘envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento’, a entrada em vigor das iniciativas deverá ocorrer com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.»

Relativamente aos títulos das iniciativas, a nota técnica relativa ao Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª (BE)

sugere que, em caso de aprovação na generalidade, seja apreciado na especialidade o seguinte título: «Recuperação da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades». Quanto aos Projetos de Lei n.os 538/XIV/2.ª (PAN) e 541/XIV/2.ª (PCP), a respetiva nota técnica refere o seguinte: «(…) caso seja aprovado, em especialidade, um texto único com todas as normas constantes das presentes iniciativas, sugere-se que seja adotado o seguinte título: ‘Regime Transitório para assegurar a resposta eficaz da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades e a emissão de Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso’».

Caso as presentes iniciativas legislativas sejam aprovadas na generalidade ou baixem sem votação – e, independentemente das entidades que os vários Grupos Parlamentares entendam ouvir ou consultar em sede de especialidade –, importa destacar que ambas as notas técnicas referem que «Considerando a matéria que está em causa, poderá a Comissão de Saúde proceder à audição, ou solicitar parecer, na fase de especialidade, à Entidade Reguladora da Saúde (ERS), à Direção-Geral de Saúde (DGS) e às Administrações Regionais de Saúde (ARS)».

• Objeto e Motivações – Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª (BE):

Com o presente projeto de lei, os Deputados do Grupo Parlamentar do BE que o subscrevem têm como objetivos:

1) «(...) a curto prazo, automatizar a renovação de atestados já emitidos (...)», conforme proposta da

Provedora de Justiça; 2) «(...) criar um mecanismo de emissão automática para situações de doenças conferem sempre elevado

grau de incapacidade (...)»; 3) «(...) um plano de recuperação da atividade suspensa que também abranja as juntas médicas (...)»; 4) «(...) uma modificação sobre a constituição das mesmas, que não devem estar totalmente adstritas a

médicos de saúde pública e devem poder ser feitas por outros médicos com experiência na avaliação de incapacidades.»

Segundo o Grupo Parlamentar do BE, a pandemia de COVID-19 veio comprometer, ainda mais, a

realização atempada das juntas médicas, uma vez que os médicos especialistas em saúde pública foram

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mobilizados para o acompanhamento e combate à pandemia e todas as juntas médicas foram suspensas. Ora, alega o BE que a suspensão das juntas médicas veio pôr em causa o acesso ao Atestado Médico de Incapacidade Multiuso (AMIM) bem como a certas prestações sociais, por parte de pessoas com doenças graves e incapacitantes.

Reconhecendo que a publicação de diplomas por parte do Governo [Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março (artigo 5.º) e Portaria n.º 171/2020, de 14 de julho] teve o intuito de acautelar o acesso a determinadas juntas médicas e a recuperação da atividade assistencial não realizada por força da COVID-19, afirma o BE que estas medidas do Governo não tiveram qualquer impacto.

Relembrando a Recomendação 6/B/2020 da Provedora de Justiça, bem como o alerta da Liga Portuguesa Contra o Cancro, alega o BE que «(...) Há pessoas que solicitaram a renovação do atestado médico de incapacidade multiuso (AMIM) ainda antes da suspensão da atividade por causa da COVID-19 e que não conseguem aceder à junta médica. Assim, correm o risco de caducidade e de perda dos apoios sociais a que têm direito. Há ainda várias pessoas que, entretanto, foram diagnosticadas com doenças graves ou incapacitantes e que também não conseguem acesso à junta médica. Como consequência, não têm acesso ao atestado, a direitos consagrados na lei e a prestações de apoio social a que têm direito (...)» e que há «(...) milhares de pessoas com cancro à espera para realizar a sua junta médica e que se já antes da epidemia se registavam, por vezes, atrasos de 12 meses, agora a situação é muito pior».

Para reforçar os propósitos da sua iniciativa legislativa, o Grupo Parlamentar do BE cita, ainda, duas recomendações feitas ao Governo pela Provedora de Justiça com o objetivo de solucionar excecional e temporariamente todos os problemas com que as pessoas se deparam no acesso a juntas médicas, em particular doentes oncológicos estando, assim, comprometido o seu acesso a benefícios e prestações sociais a que legalmente teriam direito.

O articulado da presente iniciativa legislativa é composto por cinco artigos: • Artigo 1.º – Objeto • Artigo 2.º – Acesso automático a atestado médico de incapacidade multiuso • Artigo 3.º – Recuperação da atividade das juntas médicas • Artigo 4.º – Composição das Juntas Médicas • Artigo 5.º – Entrada em vigor

– Projeto de Lei n.º 538/XIV/2.ª (PAN):

(Importa, neste ponto, dar nota que posteriormente à elaboração da nota técnica e deste parecer, o Grupo Parlamentar do PAN entendeu, ao abrigo do seu direito regimental, proceder à substituição do texto do presente projeto de lei, substituição essa que é substancial.

Ora, tendo em conta que: • o presente parecer foi enviado à Comissão de Saúde no dia 9 de outubro para poder ser distribuído a

todos os Senhores Deputados a tempo de ser analisado para poder ser discutido e votado na reunião de dia 14, conforme contava já na Ordem do Dia da reunião;

• o Grupo Parlamentar do PAN procedeu à substituição do texto da iniciativa no dia 13 de outubro, véspera da reunião da Comissão;

• e que os serviços competentes da Assembleia da República não tiveram tempo de elaborar nova nota técnica,

importa deixar escrita a nota de que o presente parecer, no que a este projeto de lei do PAN se refere, incide sobre a primeira versão publicada e distribuída e não sobre a nova versão que, conforme se refere acima, é substancialmente diferente desta.

Palácio de São Bento, 14 de outubro de 2020.

A Deputada autora do parecer, Ana Rita Bessa.).

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Os Deputados do Grupo Parlamentar do PAN que subscrevem a presente iniciativa legislativa têm como objetivos:

1) Resolver com urgência os atrasos na realização de juntas médicas, por forma a garantir «(...) que todas

as pessoas têm respostas céleres, a problemas que se arrastam no tempo (...)»; 2) «(...) Os reforços do SNS em meios e recursos (...)», em particular ao nível dos cuidados de saúde

primários. Começando por salientar a relevância do Serviço Nacional de Saúde (SNS) no acesso de todos os

cidadãos ao direito fundamental à Saúde, o Grupo Parlamentar do PAN recorda que as dificuldades sentidas no setor se agravaram com a pandemia de COVID-19, destacando as carências de recursos humanos e considerando, a este propósito, «(...) que a entrada de 39 especialistas de saúde pública é manifestamente parca, atendendo às fragilidades do sector».

Entende o PAN que se têm vindo a agravar as dificuldades e problemas nas respostas aos utentes «Considerando a suspensão da atividade exercida pelas juntas médicas, a mobilização dos médicos de saúde pública para o reforço do SNS em contextos hospitalares e/ou outros, de forma a serem dadas resposta aos cuidados de saúde excepcionais exigidos pela COVID-19, e ainda os reconhecidos atrasos na emissão do atestado médico de incapacidade multiuso (AMIM), que podem inclusive chegar aos doze meses».

Relativamente à publicação do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março (n.º 11 do artigo 5.º) e da Portaria n.º 171/2020, consideram os Deputados do Grupo Parlamentar do PAN que «(...) não se reconhecem aos mesmos diplomas, soluções que visem a recuperação da necessária atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidade, e a resposta célere na emissão de novos atestados, deixando de fora muitas pessoas com situação de doença incapacitante (...)» estando, assim, em causa o acesso por parte destas pessoas a benefícios fiscais, apoios sociais ou ao ensino superior através do regime especial.

No que diz respeito à recuperação da atividade nos cuidados de saúde primários, entende o PAN que a legislação publicada nada prevê, com a agravante de que o Plano de Saúde Outono-Inverno 2020/2021 vai implicar para os profissionais de saúde o acréscimo de «(...) uma média de 2 horas ao trabalho já existente destes profissionais, nomeadamente ao nível do aumento do número de horas extraordinárias» sendo, assim, essencial o reforço do SNS em meios e recursos, em particular, neste nível de cuidados uma vez que «(...) para além do agravamento das tarefas e horários que tem estado a colocar estes profissionais no seu limite de capacidade, está já também a ter impacto na incapacidade de resposta de algumas unidades que desta forma não estão a conseguir contactar os utentes, monitorizar os seu estado, como ainda, já não está a ser possível o rastreamento dos contatos epidemiológicos na comunidade».

O articulado da presente iniciativa legislativa é composto por quatro artigos: • Artigo 1.º – Objeto • Artigo 2.º – Reorganização excecional das juntas médicas de avaliação de incapacidade • Artigo 3.º – Lista padronizada de situações clínicas com grau de incapacidade igual ou superior a 60% • Artigo 4.º – Entrada em vigor.

– Projeto de Lei n.º 541/XIV/2.ª (PCP):

Com o presente projeto de lei, o Grupo Parlamentar do PCP pretende: 1) Que a pandemia de COVID-19 e os atrasos daí decorrentes não possam «(...) afetar de modo

irreparável o direito às prestações sociais cuja concretização dependa da emissão do referido atestado (...)» [Atestado Médico de Incapacidade Multiuso – AMIM];

2) Encontrar uma solução para os atrasos na emissão dos AMIM, uma vez que «(...) Não existindo qualquer previsibilidade quanto ao fim da pandemia COVID-19, a atual emergência em saúde pública não poderá colocar em causa esta importante resposta social (...)».

Começando por afirmar que têm chegado ao seu Grupo Parlamentar inúmeras queixas de cidadãos «(...)

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relacionadas com os sucessivos atrasos no cumprimento dos prazos para a emissão de atestado médico de incapacidade multiuso, e que a pandemia veio agravar de forma considerável (...)», afirma o PCP já ter questionado por diversas vezes o Governo não tendo, no entanto, obtido resposta ou vislumbrado soluções para este problema. E recorda que até a Provedora de Justiça já se pronunciou emitindo, inclusivamente, recomendações.

Elencando os vários benefícios e apoios a que uma pessoa com um grau de incapacidade igual ou superior a 60% tem direito – e reconhecendo que a pandemia de COVID-19 obrigou a uma maior exigência aos profissionais de saúde –, afirma o Grupo Parlamentar do PCP que não pode, contudo, aceitar que os cidadãos se vejam privados no acesso a direitos que lhes são legalmente consagrados.

Alegam os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP que a publicação do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 março (artigo 5.º) não se revelou «(...) suficiente para fazer face à dimensão do problema» justificando-se, assim, a apresentação do presente projeto de lei para que a resposta social a estes casos não seja ainda mais comprometida.

O articulado da presente iniciativa legislativa é composto por seis artigos: • Artigo 1.º – Objeto • Artigo 2.º – Concessão do atestado médico de incapacidade multiuso • Artigo 3.º – Situação específica dos doentes oncológicos • Artigo 4.º – Trabalhadores Sinistrados • Artigo 5.º – Prorrogação de efeitos • Artigo 6.º – Entrada em vigor. PARTE II – Opinião da Deputada autora do parecer Nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da Assembleia da República, a Deputada relatora

reserva a sua opinião sobre as presentes iniciativas legislativas para a discussão em sessão plenária que está, de resto, agendada para dia 16 de outubro.

PARTE III – Conclusões 1 – Os Grupos Parlamentares do Bloco de Esquerda, do Pessoas-Animais-Natureza (PAN) e do Partido

Comunista Português (PCP) tomaram a iniciativa de apresentar, respetivamente, à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª – Medidas para a recuperação da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades – (BE), o Projeto de Lei n.º 538/XIV/2.ª – Assegure a resposta eficaz da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades e dos cuidados de saúde primários em situação epidemiológica provocada pela COVID-19 – (PAN) e o Projeto de Lei n.º 541/XIV/2.ª – Regime Transitório para a emissão de Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso – (PCP).

2 – Os referidos projetos de lei foram apresentados nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, encontrando-se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos.

3 – Neste sentido, a Comissão Parlamentar de Saúde é de parecer que os projetos de lei em apreço, ao reunirem todos os requisitos formais, constitucionais e regimentais, e cumprindo o estipulado na lei formulário, devem ser remetidos a Sua Excelência o Presidente da Assembleia da República, para discussão em sessão plenária, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 136.º do Regimento da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 9 de outubro de 2020.

A Deputada autora do parecer, Ana Rita Bessa — A Presidente da Comissão, Maria Antónia Almeida Santos.

Nota: Os considerandos e conclusões do parecer foram aprovados, por unanimidade, tendo-se registado a

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ausência do PAN, na reunião da Comissão do dia 14 de outubro de 2020. PARTE IV – Anexos Anexam-se ao presente parecer as notas técnicas devidamente elaboradas pelos serviços competentes da

Assembleia da República.

Nota Técnica Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª (BE) Medidas para a recuperação da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades

Data de admissão: 23 de setembro de 2020. Comissão de Saúde (9.ª). Índice I. Análise da iniciativa II. Enquadramento parlamentar III. Apreciação dos requisitos formais IV. Análise de direito comparado V. Consultas e contributos VI. Avaliação prévia de impacto Elaborada por: Luisa Veiga Simão (DAC); Cristina Ferreira e Nuno Amorim (DILP) e António Almeida Santos (DAPLEN). Data: 6 de outubro de 2020. I. Análise da iniciativa

• A iniciativa A presente iniciativa, apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda — visa,

fundamentalmente, recuperar a atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades, que os proponentes consideram ter ficado «seriamente comprometida com a epidemia da COVID-19», uma vez que todos os recursos disponíveis em termos de saúde pública foram mobilizados para a combater.

As medidas que têm vindo a ser tomadas para minorar o impacto da COVID-19, nesta atividade, não surtiram efeito, razão pela qual entendem ser necessário criar mecanismos que agilizem a emissão de atestados médicos, quando estamos perante doenças que conferem um alto grau de incapacidade.

Assim, consideram que deve ser atribuído de forma automática, com dispensa de junta médica, o atestado médico de incapacidade multiuso, sempre que exista um diagnóstico de patologia incapacitante, cuja lista deverá ser publicada pela Direção-Geral de Saúde.

Também as juntas médicas deverão ser contratualizadas, com a intervenção de cada Administração Regional de Saúde e com um pacote financeiro específico para esta atividade, por forma a que se recupere o atraso que se tem vindo a verificar no seu funcionamento. Estão igualmente previstas algumas alterações na composição das juntas médicas, para melhor defender o interesse do utente.

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• Enquadramento jurídico nacional A proteção e promoção das pessoas com deficiência encontra-se prevista no artigo 71.º da Constituição da

República Portuguesa (Constituição) cujo n.º 2 dispõe que «o Estado obriga-se a realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência e de apoio às suas famílias, a desenvolver uma pedagogia que sensibilize a sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com eles e a assumir o encargo da efetiva realização dos seus direitos, sem prejuízo dos direitos e deveres dos pais ou tutores.»

Para Gomes Canotilho e Vital Moreira o sentido deste preceito consiste num «duplo direito positivo face ao Estado: de um lado, um direito ao tratamento e à reabilitação da sua deficiência (n.º 2, 1.ª parte) e, do outro lado, um direito à proteção do estado para a «efetiva realização dos seus direitos» (como diz o n.º 2, in fine)1 «Estas modalidades de ação estadual podem ser as mais diversificadas, dentro da grande margem de liberdade deixada ao legislador, desde os subsídios e isenções fiscais até às prestações em espécie de serviços públicos (serviços de recuperação e reabilitação). E podem ir ao ponto de estabelecer preferências ou reservas de quotas para portadores de deficiência, por exemplo, quotas de emprego, de modo a estabelecer uma igualdade de oportunidades, ou mesmo de resultados (discriminação positiva)».2

Jorge Miranda e Rui Medeiros argumentam que «por força do artigo 71, n.º 2, incumbe ao Estado adotar políticas de discriminação positiva dos cidadãos portadores de deficiência (v.g. concessão de benefícios ou isenções fiscais, estabelecimento de quotas para deficientes no acesso à função pública, atribuição de financiamento ou de benefícios ficais às empresas privadas que ofereçam emprego a cidadãos com deficiência).»3

O Atestado Médico de Incapacidade Multiuso (AMIM) é o documento que determina, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades4, o grau de incapacidade da pessoa a que se refere, funcionando como o documento comprovativo para que esta possa usufruir de determinados benefícios ou direitos5.

O Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, retificado pela Declaração de Retificação n.º 16-B/96, de 30 de novembro, e alterado pelos Decretos-Leis n.os 174/97, de 19 de julho, e 291/2009, de 12 de outubro, que o republica, veio estabelecer o regime de avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência, para efeitos de acesso às medidas e benefícios previstos na lei para facilitar a sua plena participação na comunidade. Nos termos do n.º 6 do artigo 4.º «os atestados de incapacidade podem ser utilizados para todos os fins legalmente previstos, adquirindo uma função multiuso, devendo todas as entidades públicas ou privadas, perante quem sejam exibidos, devolvê-los aos interessados ou seus representantes após anotação de conformidade com o original, aposta em fotocópias simples».

As juntas médicas são as entidades com competência para a avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência (n.º 1 do artigo 2.º), são constituídas, para o efeito, no âmbito das administrações regionais de saúde por autoridades de saúde, sendo compostas por um presidente, dois vogais efetivos e dois vogais suplentes [alínea a), do n.º 2 do artigo 2.º].

Os requerimentos de avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência são dirigidos ao adjunto do delegado regional de saúde, devendo este convocar a junta médica e notificar o requerente da data do exame a realizar no prazo de 60 dias a contar da data da entrega do requerimento (n.os 1 e 5 do artigo 3.º).

Para as Juntas Médicas de Avaliação das Incapacidades importa observar o disposto na Orientação da Direção-Geral da Saúde n.º 10/2012, de 23 de julho, sendo de referir que, no caso concreto dos doentes oncológicos, a Circular Normativa n.º 03/ASN, de 22 de janeiro de 2009, da Direção-Geral de Saúde, estabelece desde logo, para uns casos, a incapacidade de 60%, durante o período inicial de cinco anos após o diagnóstico e, para outros casos, de 80% durante sete anos.

O reconhecimento da incapacidade, através do AMIM, confere à pessoa com deficiência a possibilidade de usufruir de um conjunto de direitos e benefícios, como segue6:

1 J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra Editora, 2014, pág. 879. 2 J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra Editora, 2014, pág. 881. 3 Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra Editora, 2010, pág. 1397.4 Aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro. 5 Vd. Instituto Nacional para a Reabilitação. 6 Fonte: Guia prático Direitos das Pessoas com Deficiência em Portugal da Secretaria de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência.

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✓ Atribuição da Prestação Social da Inclusão (PSI); ✓ Proteção social e benefícios sociais, nomeadamente a concessão de juros especiais em empréstimos

bancários, os efeitos em contratos de arrendamento, os descontos na compra de alguns serviços de transporte, lúdicos ou outros, a atribuição de dístico de estacionamento;

✓ Benefícios fiscais, como por exemplo, isenção de Imposto Automóvel na compra de carro; ✓ Bolsas de estudo no ensino superior; ✓ Assistência Pessoal no âmbito do Modelo de Apoio à Vida Independente (MAVI); ✓ Transporte não urgente de doentes; ✓ Isenção de taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde – SNS. Para a aplicação da isenção, o

grau de incapacidade terá de ser igual ou superior a 60%. Sobre os direitos e benefícios previstos para a pessoa com deficiência pode também ser consultado o sítio

da Segurança Social. Pela Circular Normativa da ACSS n.º 5/2012/CD, de 12 de janeiro de 2012, foi reconhecido o efeito

retroativo, por referência ao final do prazo de 60 dias previstos no n.º 5 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, da isenção de taxas moderadoras no SNS por incapacidade igual ou superior a 60%. Também os doentes oncológicos estão dispensados do pagamento de taxas moderadoras até à emissão do AMIM, mediante declaração médica, conforme previsto na Circular Normativa da ACSS n.º 12/2012/CG, de 30 de janeiro de 2012. Esta dispensa converte-se em isenção após a emissão do AMIM.

Em sentido semelhante, o regime aplicável à Prestação Social de Inclusão, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, (versão consolidada), aceita como bastante a apresentação do requerimento de junta médica para efeitos de concessão da prestação a pessoas com 55 anos ou mais, desde que esse requerimento tenha ocorrido antes dos 55 anos e que o grau de incapacidade que resulte da decisão seja igual ou superior a 60%. (n.os 4 e 5 do artigo 15.º).

Refira-se ainda que no âmbito das medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo coronavírus – COVID 19, estabelecidas pelo Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, (versão consolidada), foi aprovado um regime excecional de composição das juntas médicas de avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência (artigo 5.º) prevê-se que «para efeitos de benefícios sociais, económicos e fiscais, é prorrogada, até 31 de dezembro de 2020, a validade dos atestados médicos de incapacidade multiuso emitidos nos termos do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, na sua redação atual.» (n.º 11 do artigo 5.º) 7.

Sobre a recuperação da emissão dos AMIM sugere-se também a consulta das Recomendações n.º 3/B/2020 e n.º 6/B/2020 da Provedora de Justiça.

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições) Consultada a base dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, verificou-se que, neste

momento, não se encontra pendente qualquer petição sobre este assunto e se encontram pendentes as seguintes iniciativas, sobre matéria conexa:

N.º Título Autor

Projeto de Lei n.º 541/XIV/2.ª

Regime transitório para a emissão de Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso PCP

Projeto de Lei n.º 538/XIV/2.ª

Assegure a resposta eficaz da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades e dos cuidados de saúde primários em situação

epidemiológica provocada pela COVID-19 PAN

7 O artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 24-A/2020, de 29 de maio, que lhe aditou os números 10 e 11.

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N.º Título Autor

Projeto de Lei n.º 164/XIV/1.ª

Determina a isenção do pagamento de atestado médico de incapacidade multiusos e determina o deferimento da atribuição da prestação social de

inclusão a partir da data de emissão do atestado de incapacidade multiusos BE

Projeto de Lei n.º 66/XIV/1.ª Gratuitidade do Atestado Médico de Incapacidade Multiuso PCP

Projeto de Resolução n.º 321/XIV/1.ª

Recomenda ao Governo que cumpra as recomendações da Provedora de Justiça para eliminar atrasos significativos na emissão de Atestados

Médicos de Incapacidade Multiuso CDS-PP

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, ao abrigo e nos

termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto nas alíneas b) do artigo 156.º da Constituição e b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto nas alíneas g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e f) do artigo 8.º do Regimento.

A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do Regimento, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Observa igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento, uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa. Apesar de ser previsível que a iniciativa em apreço implique um aumento de despesa do Estado, o artigo 5.º remete a entrada em vigor para a data de entrada em vigor do OE posterior à sua publicação, mostrando-se assim acautelado o limite à apresentação de iniciativas previsto no n.º 2 do artigo 120.º do Regimento e no n.º 2 do artigo 167.º da Constituição, designado «lei-travão».

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 16 de setembro de 2020, tendo baixado na generalidade à Comissão de Saúde (9.ª), a 23 de setembro, por despacho do Presidente da Assembleia da República.

• Verificação do cumprimento da lei formulário O título da presente iniciativa legislativa – «Medidas para a recuperação da atividade das juntas médicas de

avaliação de incapacidades» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário8, embora possa ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final.

Assim, em caso de aprovação na generalidade, sugere-se para efeitos de apreciação na especialidade o seguinte título da iniciativa: «Recuperação da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades».

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro.

No que respeita ao início de vigência, o artigo 5.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor coincidirá com a publicação do Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio

8 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho.

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dia da publicação». Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei

formulário. IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional Países europeus A legislação comparada é apresentada para o seguinte país da União Europeia: Espanha.

ESPANHA A questão da incapacidade e o seu reconhecimento está regulada no Real Decreto 1300/1995, de 21 de

julio9, por el que se desarrolla, en materia de incapacidades laborales del sistema de la Seguridad Social, la

Ley 42/1994, de 30 de diciembre, de medidas fiscales, administrativas y de orden social.De acordo com o artigo 3, a «equipe de valoración de incapacidades» é o órgão competente para avaliar,

qualificar e rever o grau de deficiência, para reconhecer o direito às prestações sociais por invalidez permanente, nos seus diversos graus, bem como apurar as contingências causais da mesma, juntamente com as demais atribuições estabelecidas no diploma. Cada direção provincial do Instituto Nacional de la Seguridad Social tem constituída pelo menos uma equipe, composta por um presidente e quatro vogais. O presidente é sempre o subdiretor provincial do Instituto ou um funcionário do Instituto designado pelo seu Diretor Geral. Os vogais, nomeados pelo Diretor Geral incluem sempre um médico inspetor, um médico facultativo, um inspetor do trabalho e segurança social e um funcionário da unidade orgânica que tramita as prestações sociais, na respetiva direção provincial que exerce funções de secretariado (n.º 3 do artigo 2).

O procedimento de avaliação da incapacidade inicia-se a requerimento da entidade gestora ou colaboradora do Instituto, a requerimento da Inspección de Trabajo y Seguridad Social, a requerimento da entidade responsável pela gestão dos serviços de saúde da Segurança Social, a requerimento do trabalhador ou do seu legal representante ou a requerimento das Mutuas de Accidentes de Trabajo y Enfermedades Profesionales de la Seguridad Social (n.º 1 do artigo 4). Em relação ao procedimento de reavaliação da incapacidade, têm legitimidade para iniciar o processo, além das entidades referidas, também os empresários responsáveis pelas prestações a que os trabalhadores têm direito ou quem, de forma subsidiária ou solidária, partilha essa responsabilidade com estes, (n.º 2 do artigo 4).

Embora tenham sido encontradas referências na comunicação social a atrasos da Segurança Social na tramitação e marcação das juntas médicas, não foram localizadas quaisquer medidas adicionais para as agilizar e acelerar, expeto as medidas gerais já tomadas relativamente à doença provocada pelo vírus SARS-CoV-2.

V. Consultas e contributos

• Regiões Autónomas O Presidente da Assembleia da República promoveu, a 23 de setembro de 2020, a audição das

assembleias legislativas regionais da Madeira e dos Açores, bem como dos respetivos governos regionais, através de emissão de parecer no prazo de 20 dias, nos termos do artigo 142.º do Regimento da Assembleia da República, e para os efeitos do n.º 2 do artigo 229.º da Constituição. Caso sejam emitidos, os mesmos constarão da página eletrónica da iniciativa.

9 Diploma consolidado retirado do portal oficial boe.es.

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• Consultas facultativas Considerando a matéria que está em causa, poderá a Comissão de Saúde proceder à audição, ou solicitar

parecer, na fase de especialidade, à Entidade Reguladora da Saúde (ERS), à Direção-Geral de Saúde (DGS) e às Administrações Regionais de Saúde (ARS).

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género A avaliação de impacto de género (AIG) que foi junta ao projeto de lei pelo grupo parlamentar proponente

valora como neutro o impacto com a sua aprovação, o que efetivamente se pode verificar após leitura do texto da iniciativa.

• Linguagem não discriminatória Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta

fase do processo legislativo a redação do projeto de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a linguagem discriminatória em relação ao género.

• Impacto orçamental A presente iniciativa implica, em caso de aprovação, um acréscimo de despesas para o Orçamento do

Estado com a saúde, face às medidas que estão previstas para a recuperação da atividade das juntas médicas. Para salvaguardar o disposto no n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, que impede a apresentação de iniciativas que «envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento», como já foi referido no ponto III, a entrada em vigor da iniciativa ocorrerá com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Nota Técnica Projeto de Lei n.º 538/XIV/2.ª (PAN)Assegure a resposta eficaz da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades e dos

cuidados de saúde primários em situação epidemiológica provocada pela COVID-19 Projeto de Lei n.º 541/XIV/2.ª (PCP)Regime Transitório para a emissão de Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso

Data de admissão: 30 de setembro de 2020. Comissão de Saúde (9.ª). Índice I. Análise da iniciativa II. Enquadramento parlamentar III. Apreciação dos requisitos formais

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IV. Análise de direito comparado V. Consultas e contributos VI. Avaliação prévia de impacto Elaborada por: Luisa Veiga Simão (DAC); Lia Negrão (DAPLEN); Cristina Ferreira e Nuno Amorim (DILP). Data: 8 de outubro de 2020. I. Análise da iniciativa

• A iniciativa Os Projetos de Lei n.os 538/XIV/2.ª e 541/XIV/2.ª, que foram apresentados, respetivamente, pelo Grupo

Parlamentar do partido das Pessoas-Animais-Natureza (PAN) e pelo Partido Comunista Português (PCP), visam, fundamentalmente, assegurar a recuperação do atraso na realização das juntas médicas de avaliação de incapacidades, que se tem verificado durante este período de pandemia provocada pela COVID-19.

Fundamentando a apresentação da sua iniciativa, refere o PAN, como fator mais relevante, que «a suspensão da atividade exercida pelas juntas médicas, a mobilização dos médicos de saúde pública para o reforço do SNS em contextos hospitalares» e «ainda os reconhecidos atrasos na emissão do atestado médico de incapacidade de multiuso», vieram aumentar as dificuldades e problemas nas respostas aos utentes.

No mesmo sentido, o PCP considera que a pandemia agravou de forma considerável os atrasos no cumprimento dos prazos para a emissão de atestado médico de incapacidade multiuso, ao que acresce que estes atrasos estarão a «afetar de modo irreparável o direito às prestações sociais cuja concretização dependa da emissão do referido atestado».

Assim, o PAN propõe que sejam tomadas medidas conducentes a uma reorganização excecional das juntas médicas e que sejam padronizadas, pela Direção-Geral de Saúde, as situações clínicas com grau de incapacidade igual ou superior a 60 por cento.

Por seu lado, o PCP prevê novas medidas para a concessão do atestado médico de incapacidade multiuso, criando uma situação específica, mais célere, para os doentes oncológicos e para os trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho, e prorrogando, até 31 de dezembro de 2021, a validade dos atestados médicos emitidos nos termos do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, que estabelece o regime de avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência.

• Enquadramento jurídico nacional A proteção e promoção das pessoas com deficiência encontra-se prevista no artigo 71.º da Constituição da

República Portuguesa (Constituição) cujo n.º 2 dispõe que «o Estado obriga-se a realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência e de apoio às suas famílias, a desenvolver uma pedagogia que sensibilize a sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com eles e a assumir o encargo da efetiva realização dos seus direitos, sem prejuízo dos direitos e deveres dos pais ou tutores.»

Para Gomes Canotilho e Vital Moreira o sentido deste preceito consiste num «duplo direito positivo face ao Estado: de um lado, um direito ao tratamento e à reabilitação da sua deficiência (n.º 2, 1.ª parte) e, do outro lado, um direito à proteção do Estado para a «efetiva realização dos seus direitos» (como diz o n.º 2, in fine)».1 «Estas modalidades de ação estadual podem ser as mais diversificadas, dentro da grande margem de liberdade deixada ao legislador, desde os subsídios e isenções fiscais até às prestações em espécie de serviços públicos (serviços de recuperação e reabilitação). E podem ir ao ponto de estabelecer preferências ou reservas de quotas para portadores de deficiência, por exemplo, quotas de emprego, de modo a estabelecer

1 J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra Editora, 2014, pág. 879.

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uma igualdade de oportunidades, ou mesmo de resultados (discriminação positiva)».2 Jorge Miranda e Rui Medeiros argumentam que «por força do artigo 71, n.º 2, incumbe ao Estado adotar

políticas de discriminação positiva dos cidadãos portadores de deficiência ( v.g. concessão de benefícios ou isenções fiscais, estabelecimento de quotas para deficientes no acesso à função pública, atribuição de financiamento ou de benefícios ficais às empresas privadas que ofereçam emprego a cidadãos com deficiência).»3

O Atestado Médico de Incapacidade Multiuso (AMIM) é o documento que determina, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades4, o grau de incapacidade da pessoa a que se refere, funcionando como o documento comprovativo para que esta possa usufruir de determinados benefícios ou direitos5.

O Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, retificado pela Declaração de Retificação n.º 16-B/96, de 30 de novembro, e alterado pelos Decretos-Leis n.os 174/97, de 19 de julho, e 291/2009, de 12 de outubro, que o republica, veio estabelecer o regime de avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência, para efeitos de acesso às medidas e benefícios previstos na lei para facilitar a sua plena participação na comunidade. Nos termos do n.º 6 do artigo 4.º «os atestados de incapacidade podem ser utilizados para todos os fins legalmente previstos, adquirindo uma função multiuso, devendo todas as entidades públicas ou privadas, perante quem sejam exibidos, devolvê-los aos interessados ou seus representantes após anotação de conformidade com o original, aposta em fotocópias simples».

As juntas médicas são as entidades com competência para a avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência (n.º 1 do artigo 2.º), são constituídas, para o efeito, no âmbito das administrações regionais de saúde por autoridades de saúde, sendo compostas por um presidente, dois vogais efetivos e dois vogais suplentes [alínea a), do n.º 2 do artigo 2.º].

Os requerimentos de avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência são dirigidos ao adjunto do delegado regional de saúde, devendo este convocar a junta médica e notificar o requerente da data do exame a realizar no prazo de 60 dias a contar da data da entrega do requerimento (n.os 1 e 5 do artigo 3.º).

Para as Juntas Médicas de Avaliação das Incapacidades importa observar o disposto na Orientação da Direção-Geral da Saúde n.º 10/2012, de 23 de julho, sendo de referir que, no caso concreto dos doentes oncológicos, a Circular Normativa n.º 03/ASN, de 22 de janeiro de 2009, da Direção-Geral de Saúde, estabelece desde logo, para uns casos, a incapacidade de 60%, durante o período inicial de cinco anos após o diagnóstico e, para outros casos, de 80% durante sete anos.

O reconhecimento da incapacidade, através do AMIM, confere à pessoa com deficiência a possibilidade de usufruir de um conjunto de direitos e benefícios, como segue6:

✓ Atribuição da Prestação Social da Inclusão (PSI); ✓ Proteção social e benefícios sociais, nomeadamente a concessão de juros especiais em empréstimos

bancários, os efeitos em contratos de arrendamento, os descontos na compra de alguns serviços de transporte, lúdicos ou outros, a atribuição de dístico de estacionamento;

✓ Benefícios fiscais, como por exemplo, isenção de Imposto Automóvel na compra de carro; ✓ Bolsas de estudo no ensino superior; ✓ Assistência Pessoal no âmbito do Modelo de Apoio à Vida Independente (MAVI); ✓ Transporte não urgente de doentes; ✓ Isenção de taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde – SNS. Para a aplicação da isenção, o

grau de incapacidade terá de ser igual ou superior a 60%. Sobre os direitos e benefícios previstos para a pessoa com deficiência pode também ser consultado o sítio

da Segurança Social. Pela Circular Normativa da ACSS n.º 5/2012/CD, de 12 de janeiro de 2012, foi reconhecido o efeito

retroativo, por referência ao final do prazo de 60 dias previstos no n.º 5 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, da isenção de taxas moderadoras no SNS por incapacidade igual ou superior a 60%.

2 J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra Editora, 2014, pág. 881. 3 Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra Editora, 2010, pág. 1397.4 Aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro. 5 Vd. Instituto Nacional para a Reabilitação. 6 Fonte: Guia prático Direitos das Pessoas com Deficiência em Portugal da Secretaria de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência.

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Também os doentes oncológicos estão dispensados do pagamento de taxas moderadoras até à emissão do AMIM, mediante declaração médica, conforme previsto na Circular Normativa da ACSS n.º 12/2012/CG, de 30 de janeiro de 2012. Esta dispensa converte-se em isenção após a emissão do AMIM.

Em sentido semelhante, o regime aplicável à Prestação Social de Inclusão, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, (versão consolidada), aceita como bastante a apresentação do requerimento de junta médica para efeitos de concessão da prestação a pessoas com 55 anos ou mais, desde que esse requerimento tenha ocorrido antes dos 55 anos e que o grau de incapacidade que resulte da decisão seja igual ou superior a 60%. (n.os 4 e 5 do artigo 15.º).

Refira-se ainda que, no âmbito das medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo coronavírus – COVID 19, estabelecidas pelo Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, (versão consolidada), foi aprovado um regime excecional de composição das juntas médicas de avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência (artigo 5.º) que prevê que «para efeitos de benefícios sociais, económicos e fiscais, é prorrogada, até 31 de dezembro de 2020, a validade dos atestados médicos de incapacidade multiuso emitidos nos termos do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, na sua redação atual.» (n.º 11 do artigo 5.º)7.

Sobre a recuperação da emissão dos AMIM sugere-se também a consulta das Recomendações n.º 3/B/2020 e n.º 6/B/2020 da Provedora de Justiça.

II. Enquadramento parlamentar Consultada a base dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, verificou-se que, neste

momento, não se encontra pendente qualquer petição sobre este assunto e se encontram pendentes os seguintes projetos de lei e projetos de resolução, sobre matéria conexa:

N.º e Autor Título

Projeto de Lei n.º 512/XIV/2.ª (BE)

Medidas para a recuperação da atividade das juntas médicas de avaliação de incapacidades

Projeto de Lei n.º 164/XIV/1.ª (BE)

Determina a isenção do pagamento de atestado médico de incapacidade multiusos e determina o deferimento da atribuição da prestação social de inclusão a partir da

data de emissão do atestado de incapacidade multiusos

Projeto de Lei n.º 66/XIV/1.ª (PCP) Gratuitidade do Atestado Médico de Incapacidade Multiuso

Projeto de Resolução n.º 699/XIV/2.ª (PSD)

Recomenda ao Governo a simplificação do regime legal de emissão de Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso, bem como a adoção de medidas de urgência

para acelerar a emissão e revalidação desses atestados

Projeto de Resolução n.º 321/XIV/1.ª (CDS-PP)

Recomenda ao Governo cumpra as recomendações da Provedora de Justiça para eliminar atrasos significativos na emissão de Atestados Médicos de Incapacidade

Multiuso. III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais O Projeto de Lei n.º 538/XIV/2.ª é subscrito por três Deputados do Grupo Parlamentar do partido Pessoas-

Animais-Natureza (PAN) e o Projeto de Lei n.º 541/XIV/2.ª (PCP) é subscrito por 10 Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo

7 O artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 24-A/2020, de 29 de maio, que lhe aditou os números 10 e 11.

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156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e na alínea f) do artigo 8.º do RAR.

As iniciativas assumem a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do RAR, encontram-se redigidas sob a forma de artigos, são precedidas de uma breve exposição de motivos e têm uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal, embora possam ser objeto de aperfeiçoamento em caso de aprovação, dando assim cumprimento aos requisitos formais estabelecidos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.

Encontram-se igualmente respeitados, em ambos os projetos de lei, os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR, já que definem concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa e parecem não infringir princípios constitucionais.

As iniciativas, em caso de aprovação, poderão acarretar encargos orçamentais no ano económico em curso, caso em que o limite imposto pela lei-travão (no n.º 2 do artigo 167.º da Constituição e n.º 2 do artigo 120.º do RAR) deverá ser salvaguardado no decurso do processo legislativo, por exemplo, remetendo-se a respetiva entrada em vigor (ou produção de efeitos) para a data de entrada em vigor da lei do Orçamento do Estado subsequente.

Ambas as iniciativas deram entrada a 25 de setembro de 2020. Foram admitidas e baixaram na generalidade à Comissão de Saúde (9.ª), por despacho do Presidente da Assembleia da República, no dia 30 de setembro de 2020, tendo sido, na mesma data, anunciadas em sessão plenária.

• Verificação do cumprimento da lei formulário A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, de ora em

diante designada como lei formulário, contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa.

Os títulos das presentes iniciativas legislativas traduzem sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conformes ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, embora, em caso de aprovação, possam ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final.

A este respeito, as regras de legística formal que têm sido seguidas nesta matéria recomendam que o título dos atos normativos permita a identificação clara da matéria sobre a qual versam.

Desta forma, caso seja aprovado, em especialidade, um texto único com todas as normas constantes das presentes iniciativas, sugere-se que seja adotado o seguinte título:

«Regime Transitório para assegurar a resposta eficaz da atividade das juntas médicas de avaliação de

incapacidades e a emissão de Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso» Em caso de aprovação, as iniciativas em apreço revestirão a forma de lei, sendo objeto de publicação na

1.ª série do Diário da República, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário. A entrada em vigor das iniciativas «no dia seguinte ao da sua publicação», nos termos do artigo 4.º de

ambos os projetos de lei, está também em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o inicio da vigência verificar-se no próprio dia da publicação».

Na presente fase do processo legislativo, as iniciativas em apreço não nos parecem suscitar outras questões em face da lei formulário.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional Países europeus A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: Espanha e

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Irlanda.

ESPANHA A questão da incapacidade e o seu reconhecimento está regulada no Real Decreto 1300/1995, de 21 de

julio8, por el que se desarrolla, en materia de incapacidades laborales del sistema de la Seguridad Social, la

Ley 42/1994, de 30 de diciembre, de medidas fiscales, administrativas y de orden social.

De acordo com o artigo 3, a «equipe de valoración de incapacidades» é o órgão competente para avaliar, qualificar e rever o grau de deficiência, para reconhecer o direito às prestações sociais por invalidez permanente, nos seus diversos graus, bem como apurar as contingências causais da mesma, juntamente com as demais atribuições estabelecidas no diploma. Cada direção provincial do Instituto Nacional de la Seguridad Social constitui pelo menos uma equipe, composta por um presidente e quatro vogais. O presidente é sempre o subdiretor provincial do Instituto ou um funcionário do Instituto designado pelo seu Diretor Geral. Os vogais, nomeados pelo Diretor Geral incluem sempre um médico inspetor, um médico facultativo, um inspetor do trabalho e segurança social e um funcionário da unidade orgânica que tramita as prestações sociais na respetiva direção provincial, que exerce funções de secretariado (n.º 3 do artigo 2).

O procedimento de avaliação da incapacidade inicia-se a requerimento da entidade gestora ou colaboradora do Instituto, a requerimento da Inspección de Trabajo y Seguridad Social, a requerimento da entidade responsável pela gestão dos serviços de saúde da Segurança Social, a requerimento do trabalhador ou do seu legal representante ou a requerimento das Mutuas de Accidentes de Trabajo y Enfermedades Profesionales de la Seguridad Social (n.º 1 do artigo 4). Já quanto ao procedimento de reavaliação da incapacidade, também os empresários responsáveis pelas prestações a que os trabalhadores têm direito ou quem, de forma subsidiária ou solidária, partilha essa responsabilidade com aqueles, têm legitimidade para iniciar o processo, para além das entidades já referidas (n.º 2 do artigo 4).

Embora tenham sido encontradas referências, na comunicação social, a atrasos da Segurança Social na tramitação e marcação das juntas médicas, não foram localizadas quaisquer medidas adicionais para as agilizar e/ou acelerar, expeto as medidas gerais já tomadas relativamente à doença provocada pelo vírus SARS-CoV-2.

IRLANDA É o Department of Employment Affairs and Social Protection a entidade responsável pela marcação das

juntas médicas. O Medical Review and Assessment (MRA) é o principal mecanismo de controlo de incapacidades aplicável aos potenciais beneficiários dos diversos apoios sociais disponíveis no país.

As juntas médicas são realizadas nos centros do Department of Employment Affairs and Social Protection espalhados pelo país, denominados de Medical Review and Assessement Center, por médicos devidamente formados para as funções de avaliação e revisão de incapacidades9. São os próprios centros que marcam e convocam os cidadãos para a realização das medical review and assessements. Das pesquisas efetuadas não foram encontradas quaisquer referências a tempos médios de espera entre o pedido de marcação de um medical review and assessement e a sua realização, nem informação sobre se os tempos médios de espera sofreram alterações com a situação epidemiológica que se vive no país.

V. Consultas e contributos

• Consultas facultativas Considerando a matéria que está em causa, poderá a Comissão de Saúde proceder à audição, ou solicitar

8 Diploma consolidado retirado do portal oficial boe.es. 9 Estas equipas médicas apenas avaliam a incapacidade do examinado para o trabalho que normalmente realizam ou para outro de diferente natureza, não estando nas suas funções a prescrição de tratamentos médicos ou aconselhamento clínico. Para informação adicional visite-se a página da Internet disponibilizada pelo Governo irlandês sobre o tema.

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parecer, na fase de especialidade, à Entidade Reguladora da Saúde (ERS), à Direção-Geral de Saúde (DGS) e às Administrações Regionais de Saúde (ARS).

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género As avaliações de impacto de género (AIG) e (AIG), que foram juntas a cada um dos projetos de lei pelo

respetivo grupo parlamentar proponente, valoram como neutro o impacto com a sua aprovação, o que efetivamente se pode verificar após leitura do texto da iniciativa.

• Linguagem não discriminatória Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. Sem prejuízo de uma análise mais detalhada na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta

fase do processo legislativo a redação dos projetos de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a linguagem discriminatória em relação ao género.

• Impacto orçamental Tal como referido no ponto III, estas iniciativas poderão implicar, em caso de aprovação, um acréscimo de

despesas e/ou uma diminuição de receitas para o Orçamento do Estado com a saúde, face às medidas que estão previstas para a recuperação da atividade das juntas médicas, bem como a dispensa ou prorrogação de validade dos atestados, em alguns casos. Para salvaguardar o disposto no n.º 2 do artigo 120.º do RAR, que impede a apresentação de iniciativas que «envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento», a entrada em vigor das iniciativas deverá ocorrer com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

———

PROJETO DE LEI N.º 537/XIV/2.ª (CONSAGRA MEDIDAS DE PROMOÇÃO DO ESCOAMENTO DE BENS ALIMENTARES DA PEQUENA AGRICULTURA E AGRICULTURA FAMILIAR E CRIA UM REGIME PÚBLICO SIMPLIFICADO PARA AQUISIÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE BENS ALIMENTARES PROVENIENTES DA PEQUENA E MÉDIA

AGRICULTURA E PECUÁRIA NACIONAL E DA AGRICULTURA FAMILIAR, COMBATENDO O DESPERDÍCIO ALIMENTAR)

Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

Índice Parte I – Considerandos

1 – Nota introdutória 2 – Objeto e motivação da iniciativa legislativa 3 – Enquadramento legal e antecedentes

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4 – Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer Parte III – Conclusões Parte IV – Anexos PARTE I – Considerandos

1 – Nota introdutória O Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª (PCP) deu entrada a 25 de setembro de 2020. Por despacho de Sua

Excelência o Presidente da Assembleia da República, foi admitido e baixou, na generalidade, à Comissão de Agricultura e Mar, a 30 de setembro de 2020, para emissão do respetivo parecer.

A iniciativa encontra-se agendada, por arrastamento, com os Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª (PAN) «Aprova o regime jurídico aplicável à doação de géneros alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar» e Projeto de Lei n.º 544/XIV/2.ª (PEV) «Inquérito nacional sobre o desperdício alimentar em Portugal» para a reunião plenária de 15 de outubro de 2020.

A 6 de outubro, na reunião ordinária n.º 49 da Comissão de Agricultura e Mar, foi atribuída a elaboração do Parecer ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que indicou como relator, o signatário, Deputado Francisco Rocha.

O Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª foi subscrito por nove Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), que consubstanciam o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do RAR.

Destacamos, com base na nota técnica anexa, os seguintes aspetos: - A iniciativa em análise toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do

artigo 119.º do Regimento, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz genericamente o seu objeto principal e é precedida de uma exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais estabelecidos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.

- Encontram-se respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR, uma vez que este projeto de lei define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa e parece não infringir princípios constitucionais.

- A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, conhecida como lei formulário, contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas que são relevantes. Assim, em conformidade, sugere-se que o título passe a ser: «Regime simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar».

- Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

- Quanto à entrada em vigor, esta terá lugar no dia seguinte ao da sua publicação, nos termos do seu artigo 6.º, o que está de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual: «Os atos legislativos (…) entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no próprio dia da publicação».

2 – Objeto e motivação da iniciativa legislativa De acordo com os proponentes, o Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª «Consagra medidas de promoção do

escoamento de bens alimentares da pequena agricultura e agricultura familiar e cria um regime público

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simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar, combatendo o desperdício alimentar», estabelece as medidas para promover o escoamento da pequena e média produção alimentar nacional, bem como os mecanismos para a sua implementação e o seu acompanhamento, assegura a criação de um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares, promovendo o escoamento destes bens a um preço justo à produção e o seu consumo em refeições fornecidas em cantinas e refeitórios instalados em serviços do Estado e prevê a criação uma plataforma de contacto direto entre fornecedores destes produtos e os consumidores.

Na exposição e motivos da iniciativa, os subscritores apresentam diversas razões que, em seu entender, justificam os seus objetivos. Destas, citam-se:

- «O surto epidémico de COVID-19 (…) veio dar destaque à fragilidade do país no que concerne à

soberania alimentar, à disponibilização de bens à população e ao escoamento dos bens alimentares provenientes da pequena e média produção nacional.

- A paragem de funcionamento de sectores como a restauração, o quase congelamento das atividades turísticas, bem como o cancelamento ou adiamento de feiras agrícolas e o encerramento de mercados e feiras municipais durante o primeiro semestre de 2020, vieram quebrar os circuitos preferenciais de comercialização dos produtos da pequena e média agricultura, diminuindo drasticamente os rendimentos destes agricultores e produtores pecuários, mas mantendo, ou até aumentando, os custos da exploração.

- Centrando o abastecimento alimentar (…) nos serviços (…) sector da grande distribuição, secundarizando os circuitos curtos de proximidade e a relação direta entre os produtores e os consumidores, vem favorecer a baixa de rendimentos à produção, não concorre para a aplicação de preços justos ao consumidor e deixa à margem dos circuitos de escoamento os pequenos e médios produtores nacionais.

- A dificuldade, (…) de escoamento da produção alimentar dos pequenos e médios produtores nacionais (…), provoca o desperdício de alimentos, custos acrescidos na alimentação de animais e no armazenamento de produtos e a incapacidade de prosseguir a produção, (…) com reflexos na capacidade de abastecimento

futuro. - Combater o desperdício alimentar, fomentar a produção alimentar nacional, assegurar rendimentos

justos aos pequenos e médios agricultores e produtores agropecuários (…) são aspetos que se impõe assegurar.

- (…) no seguimento da exposição de motivos do diploma que consagra o Estatuto da Agricultura Familiar, é fundamental que se criem mecanismos adequados que assegurem o escoamento e a distribuição equilibrada dos bens à população, regular o mercado assegurando preços justos à produção, desafios aos quais (…) é preciso dar resposta adequada.»

3 – Enquadramento legal e antecedentes A Agricultura Familiar viu consagrado o seu estatuto pelo Decreto-Lei n.º 64/2018, de 7 de agosto, tendo

entre os seus objetivos [alíneas a) a c) do artigo 2.º]: • Reconhecer e distinguir a especificidade da agricultura familiar nas suas diversas dimensões:

económica, territorial, social e ambiental; • Promover políticas públicas adequadas para este extrato socioprofissional; • Promover e valorizar a produção local e melhorar os respetivos circuitos de comercialização. Para o efeito de atribuição do título de reconhecimento do Estatuto da Agricultura Familiar foi o diploma

regulamentado pela Portaria n.º 73/2019, de 7 de março. O Decreto-Lei n.º 85/2015, de 21 de maio, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 20/2019, de

30 de janeiro, estabeleceu o regime jurídico aplicável aos mercados locais de produtores, reconhecendo, na sua introdução que «a produção agrícola e agropecuária local, assegurada maioritariamente por agricultura de cariz familiar e por pequenas empresas, assume uma importância relevante na economia nacional» (…) contribuindo a venda direta «para valorizar e promover os produtos locais e, simultaneamente, estimular a economia local, criar emprego, reter valor e população no território (…) e uma maior interação social entre as

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comunidades rural e urbana, favorecendo uma maior ligação das populações às suas origens, desempenhando funções que beneficiam os produtores, os consumidores, o ambiente e a economia local».

No contexto da pandemia COVID-19, o Ministério da Agricultura lançou a 30 de março a campanha e plataforma «Alimente quem o alimenta», com o objetivo de aproximar produtores e consumidores. A plataforma reúne já mais de 900 produtores inscritos e regista perto de 100 000 visualizações desde meados de abril.

A Portaria n.º 86/2020, de 4 de abril, veio também estabelecer um conjunto de medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica da doença COVID-19, no âmbito da operação 10.2.1.4, «Cadeias curtas e mercados locais», da ação n.º 10.2, «Implementação das estratégias», integrada na medida n.º 10, «LEADER», da área n.º 4, «Desenvolvimento local», do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente.

As medidas visam dinamizar a criação de cadeias curtas de distribuição agroalimentar e modelos de comercialização de proximidade de produtos agrícolas e transformados, adaptando as respostas locais aos novos tempos de convivência com a COVID-19.

Registe-se ainda que os Grupos de Ação Local (GAL) lançaram recentemente um conjunto de ações para ajudar agricultores e produtores de pequena dimensão nos territórios rurais através do apoio ao escoamento da produção local através de cadeias curtas e mercados locais.

4 – Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria Por consulta à base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que se encontram pendentes a

seguintes iniciativas a legislativas sobre matéria idêntica ou conexa: - Projeto de Resolução n.º 712 /XIV/2.ª (PSD) – Recomenda do Governo um reforço na estratégia

integrada no combate ao desperdício alimentar. Relativamente a antecedentes parlamentares sobre a mesma temática (iniciativas legislativas e petições),

registam-se entre outras, as seguintes iniciativas, discutidas conjuntamente em 09/06/2020: - Projeto de Lei n.º 382/XIV/1.ª (PCP) – Consagra medidas de promoção do escoamento de bens

alimentares da pequena agricultura e agricultura familiar e cria um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar (Rejeitada);

- Projeto de Lei n.º 412/XIV/1.ª (PCP) – Medidas de promoção do escoamento do pescado proveniente da pesca artesanal – local e costeira – e criação de um regime público simplificado para aquisição, distribuição e valorização do pescado de baixo valor em lota (Aprovada);

- Projeto de Resolução n.º 477/XIV/1.ª (PEV) – Pelo escoamento e fixação de um preço mínimo a pagar ao produtor e pelo combate às práticas desleais nas relações comerciais entre a grande distribuição e os fornecedores de produtos alimentares (Rejeitada).

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer O relator do presente parecer reserva a sua opinião para o debate em plenário da iniciativa, a qual é, de

resto, de elaboração facultativa conforme o disposto no n.º 3 do artigo 137.º do RAR. PARTE III – Conclusões A Comissão de Agricultura e Mar aprova o seguinte parecer: 1 – O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia

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da República o Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª «Consagra medidas de promoção do escoamento de bens alimentares da pequena agricultura e agricultura familiar e cria um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar, combatendo o desperdício alimentar»;

2 – A apresentação do Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª foi efetuada nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, encontrando-se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos.

3 – Em conformidade com a aplicação da lei formulário, sugere-se que o título passe a ser: «Regime simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar».

4 – A Comissão de Agricultura e Mar é de parecer que o Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª reúne as condições constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 13 de outubro de 2020.

O Deputado autor do parecer, Francisco Rocha —O Presidente da Comissão, Pedro do Carmo. Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CDS-PP e do PAN, na

reunião da Comissão do dia 14 de outubro de 2020. PARTE IV – Anexos Nota técnica elaborada pelos serviços da Assembleia da República, ao abrigo do artigo 131.º do Regimento

da Assembleia da República.

Nota Técnica Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª (PCP) Consagra medidas de promoção do escoamento de bens alimentares da pequena agricultura e

agricultura familiar e cria um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar, combatendo o desperdício alimentar

Data de admissão: 30 de setembro de 2020. Comissão de Agricultura e Mar (7.ª). Índice I. Análise da iniciativa II. Enquadramento parlamentar III. Apreciação dos requisitos formais IV. Análise de direito comparado V. Consultas e contributos VI. Avaliação prévia de impacto VII. Enquadramento bibliográfico

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Elaborada por: Isabel Pereira (DAPLEN); Paulo Ferreira Campos (DAC); Leonor Calvão Borges e Nuno Amorim (DILP). Data: 12 de outubro de 2020. I. Análise da iniciativa

• A iniciativa O presente contexto de emergência de saúde pública mundial operou um visível abrandamento da

economia, essencialmente motivado pelo esforço de governos e organizações internacionais, à escala global, no sentido de conter – ou, pelo menos, retardar, obviando a uma previsível saturação da capacidade instalada de resposta médica – a propagação da doença por coronavírus (COVID-19). Esta necessária resposta no âmbito de políticas públicas tem comportado, entre outros aspetos macroeconómicos assinaláveis, uma redução substancial do consumo, com impactos percetíveis ao longo de toda a cadeia de valor, com particular incidência no patamar da produção agrícola e pecuária.

Ao que fica dito acresce o enfraquecimento ou encerramento de importantes canais de distribuição, contribuindo decisivamente para as dificuldades de escoamento de bens essencialmente perecíveis – cuja capacidade de armazenamento e preservação é, em parte, proporcional à dimensão e organização do concreto operador económico – e, por conseguinte, agudizando o problema do desperdício alimentar.

A iniciativa legislativa procura adereçar o problema que se acaba de aludir supra no que à pequena e média agricultura – e, em especial, à agricultura familiar – diz respeito. No dizer dos proponentes, «combater o desperdício alimentar, fomentar a produção alimentar nacional, assegurar rendimentos justos aos pequenos e médios agricultores e produtores agropecuários que representam uma valia inestimável para a defesa do interior e do mundo rural, são aspetos que se impõe assegurar».

O combate ao desperdício alimentar far-se-á, aventam os proponentes, através de medidas de promoção do escoamento de bens alimentares da pequena agricultura e agricultura familiar.

Para tanto, o projeto de lei em apreço giza-se nas seguintes linhas orientadoras: o estabelecimento de um regime simplificado de aquisição e fornecimento de produtos agrícolas e agropecuários, assente num procedimento especial de ajuste direto criado para o efeito e a ser realizado através de plataforma informática própria; o arbitramento, pelos serviços do Ministério da Agricultura, dos preços mínimos aplicáveis à transação dos produtos; o estabelecimento de um patamar mínimo de aquisição, correspondente a 25% dos bens alimentares utilizados na confeção de refeições, por parte das entidades adquirentes assim definidas no articulado da iniciativa, sempre que a oferta o permitir.

• Enquadramento jurídico nacional A Agricultura Familiar viu consagrado o seu estatuto pelo Decreto-Lei n.º 64/2018, de 7 de agosto, tendo

entre os seus objetivos [alíneas a) a c) do artigo 2.º]: • Reconhecer e distinguir a especificidade da agricultura familiar nas suas diversas dimensões:

económica, territorial, social e ambiental; • Promover políticas públicas adequadas para este extrato socioprofissional; • Promover e valorizar a produção local e melhorar os respetivos circuitos de comercialização. Para o efeito de atribuição do título de reconhecimento do Estatuto da Agricultura Familiar foi o diploma

regulamentado pela Portaria n.º 73/2019, de 7 de março. O Decreto-Lei n.º 85/2015, de 21 de maio, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 20/2019, de

30 de janeiro, estabeleceu o regime jurídico aplicável aos mercados locais de produtores, reconhecendo, na sua introdução que «a produção agrícola e agropecuária local, assegurada maioritariamente por agricultura de cariz familiar e por pequenas empresas, assume uma importância relevante na economia nacional» (…) contribuindo a venda direta «para valorizar e promover os produtos locais e, simultaneamente, estimular a

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economia local, criar emprego, reter valor e população no território (…) e uma maior interação social entre as

comunidades rural e urbana, favorecendo uma maior ligação das populações às suas origens, desempenhando funções que beneficiam os produtores, os consumidores, o ambiente e a economia local».

No contexto da pandemia COVID-19, o Ministério da Agricultura lançou a 30 de março a campanha e plataforma «Alimente quem o alimenta», com o objetivo de aproximar produtores e consumidores. A plataforma reúne já mais de 900 produtores inscritos e regista perto de 100 000 visualizações desde meados de abril.

A Portaria n.º 86/2020, de 4 de abril, veio também estabelecer um conjunto de medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica da doença COVID-19, no âmbito da operação 10.2.1.4, «Cadeias curtas e mercados locais», da ação n.º 10.2, «Implementação das estratégias», integrada na medida n.º 10, «LEADER», da área n.º 4, «Desenvolvimento local», do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente.

As medidas visam dinamizar a criação de cadeias curtas de distribuição agroalimentar e modelos de comercialização de proximidade de produtos agrícolas e transformados, adaptando as respostas locais aos novos tempos de convivência com a COVID-19.

Registe-se ainda que os Grupos de Ação Local (GAL)1 lançaram recentemente um conjunto de ações para ajudar agricultores e produtores de pequena dimensão nos territórios rurais através do apoio ao escoamento da produção local através de cadeias curtas e mercados locais.

Um comunicado da Minha Terra – Federação Portuguesa de Associações de Desenvolvimento Local explica que a medida «Cadeias Curtas e Mercados Locais», «gerida pelos GAL localmente no âmbito da Abordagem LEADER/DLBC do PDR2020 (Programa de Desenvolvimento Rural), visa dinamizar a criação de cadeias curtas de distribuição agroalimentar e modelos de comercialização de proximidade de produtos agrícolas e transformados, adaptando as respostas locais aos novos tempos de convivência com a COVID-19». Dos 49 avisos de concurso abertos, «32 concursos (mais de 2,6 milhões de euros) destinam-se especificamente para o apoio às cadeias curtas, pondo em prática a simplificação e flexibilização introduzida nos normativos legais, em concreto a Portaria n.º 86/2020».

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições) Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que, neste momento, com objeto

conexo com o do projeto de lei em análise, se encontram pendentes apenas as seguintes iniciativas: - Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª (PAN) – Aprova o regime jurídico aplicável à doação de géneros

alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar; - Projeto de Resolução n.º 712/XIV/2.ª (PSD) – Recomenda do Governo um reforço na estratégia

integrada no combate ao desperdício alimentar; - Projeto de Lei n.º 544/XIV/2.ª (PEV) – Inquérito nacional sobre o desperdício alimentar em Portugal.

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições) Foram apresentadas na 1.ª sessão da presente legislatura, e já discutidas, as seguintes iniciativas sobre

matéria conexa: - Projeto de Lei n.º 382/XIV/1.ª (PCP) –Consagra medidas de promoção do escoamento de bens

alimentares da pequena agricultura e agricultura familiar e cria um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da

1 Previstos na Portaria n.º 392-A/2008, de 4 de junho («Aprova o Regulamento de Aplicação das Medidas n.os 3.3, ‘Implementação de Estratégias Locais de Desenvolvimento’, e 3.5, ‘Funcionamento dos Grupos de Ação Local, Aquisição de Competências e Animação’, integradas no subprograma n.º 3, ‘Dinamização das zonas rurais’, do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente, abreviadamente designado por PRODER»).

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agricultura familiar (Rejeitada a 9.06.2020, com votos a favor do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, votos contra do PS, do PSD, do PAN, do CH e do IL e a abstenção do CDS-PP), discutido conjuntamente com o Projeto de Lei n.º 412/XIV/1.ª (PCP) – Medidas de promoção do escoamento do pescado proveniente da pesca artesanal – local e costeira – e criação de um regime público simplificado para aquisição, distribuição e valorização do pescado de baixo valor em lota (aprovado com votos favoráveis do PS, do PSD, do BE, do PCP, do PEV, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, votos contra do PAN e do IL e a abstenção do CDS-PP) e com o Projeto de Resolução n.º 477/XIV/1.ª (PEV) – Pelo escoamento e fixação de um preço mínimo a pagar ao produtor e pelo combate às práticas desleais nas relações comerciais entre a grande distribuição e os fornecedores de produtos alimentares (Rejeitado, com votos a favor do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, votos contra do PS, do CDS-PP, do CH e do IL e abstenções do PSD e do PAN), entre outras iniciativas de tema diverso.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP),

ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do RAR.

A iniciativa é subscrita por nove Deputados, assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do RAR, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.

Observa igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR, uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 25 de setembro de 2020. Foi admitido a 30 de setembro, data em que, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, baixou na generalidade à Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), tendo sido anunciado nesse dia. A iniciativa encontra-se agendada, por arrastamento com o Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª (PAN) para a reunião plenária de 15 de outubro.

• Verificação do cumprimento da lei formulário A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, de ora em

diante designada como lei formulário, contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas que são relevantes.

Assim, relativamente ao título, sugere-se o seguinte aperfeiçoamento: «Regime simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média

agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar» Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

No que respeita ao início de vigência, o artigo 8.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor ocorrerá no dia seguinte ao da sua publicação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não

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podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação». Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei

formulário.

• Regulamentação ou outras obrigações legais A presente iniciativa prevê, no seu artigo 7.º, a necessidade de regulamentação posterior das suas normas

no prazo de 60 dias após a publicação da respetiva lei. IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional Países europeus A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha e Irlanda.

ESPANHA Com a declaração do estado de alarma pelo Real Decreto 463/2020, de 14 de marzo2, por el que se

declara el estado de alarma para la gestión de la situación de crisis sanitaria ocasionada por el COVID-19, a liberdade de circulação dos cidadãos ficou limitada, permitindo-se apenas as deslocações necessárias e justificadas por uma das circunstancias previstas no artigo 7. A Orden SND/381/2020, de 30 de abril3, por la que se permite la realización de actividades no profesionales de cuidado y recolección de producciones

agrícolas alargou as situações de justificação de deslocação quando justificadas em atividades não profissionais de agricultura familiar.

Embora não tenha sido localizado um modelo de escoamento de bens alimentares provenientes da pequena agricultura e agricultura familiar, nem um regime público de aquisição e distribuição deste tipo de bens, de âmbito nacional, algumas comunidades autónomas adotaram medidas para apoiar os pequenos agricultores.

Por exemplo, nas Ilhas Baleares foi criado um regime4 de financiamento às micro, pequenas e medias empresas do setor para mitigar os efeitos do estado de alarma provocado pela doença COVID-19. Já o País Basco criou um regime5 de ajudas aos setor que inclui, por exemplo, verbas a fundo perdido, destinadas a pagar o armazenamento ou conservação dos produtos excedentários.

Relativamente à questão do desperdício alimentar, o país não dispõe de um quadro regulatório nacional. Existe, no entanto, regiões autónomas com legislação dirigida a mitigar os efeitos do desperdício alimentar. Na região autónoma de Murcia, a Ley 10/2013, de 18 de octubre, para el aprovechamiento de excedentes alimentarios y creación de la Red Solidaria para el Aprovechamiento de Alimentos6, criou um mecanismo de coordenação e cooperação voluntária para aproveitar o excedente alimentar, que incluiu a criação de um código de boas práticas para o aproveitamento e distribuição de excedentes alimentares (artigo 5).

Na Comunidade de Castilla-La Mancha foi publicado o Decreto 19/2019, de 26 de marzo7, por el que se promueven medidas para evitar el desperdicio alimentario y se facilita la redistribución de alimentos en

Castilla-La Mancha, com medidas para combater o desperdício alimentar como a criação de organizações, sem fins lucrativos, com a finalidade de receber e distribuir alimentos excedentários (artigo 10). No mesmo diploma está prevista a realização de ações de sensibilização, informação e educação relativamente às causas e efeitos do desperdício alimentar, que devem ser incluídas, pelas Administrações públicas, nos seus programas de educação. Tal como no caso da comunidade de Murcia, também na comunidade de Castilla-La

2 Diploma consolidado retirado do portal oficial boe.es. 3 Diploma consolidado retirado do portal oficial boe.es. 4 Diploma retirado do portal oficial das Ilhas Baleares. 5 Diploma retirado do boletim oficial do País Basco. 6 Diploma consolidado retirado do portal oficial boe.es. 7 Diploma consolidado retirado do boletim oficial da comunidade autónoma de Castela-Mancha.

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Mancha está previsto a criação de um código de boas práticas sobre o tema (artigo 15).

IRLANDA De acordo com os Farm Structure Survey 2016 existem cerca de 137 mil quintas de agricultura familiar.

Para escoamento dos produtos provenientes deste tipo de agricultura, está instalada uma rede de pequenos mercados nos quais os produtores locais podem vender os produtos que produzem. De acordo com o Guide to selling through farmers’ markets, farm shops and box schemes in Ireland é possível aos pequenos agricultores venderem os seus produtos nos mercados locais ou criarem pequenas lojas nas próprias quintas, conquanto cumpram as disposições e orientações das autoridades de segurança alimentar.

A questão do desperdício alimentar tem vindo a ser regulada nos últimos anos. Por exemplo, em 2009, com a adoção do Waste Management (Food Waste) Regulations 2009 (S.I. No. 508 of 2009)8 as indústrias identificadas no Schedule 1 do diploma ficaram obrigadas a separar os resíduos alimentares (com a introdução de contentores específicos, de cor castanha, para deposito dos resíduos alimentares e biológicos9). Posteriormente, com a adoção do S.I. No. 430/2015 – European Union (Household Food Waste and Bio-waste) Regulations 201510 foi criado um plano, a implementar por fases e tendo por base a densidade populacional, no sentido de introduzir um serviço de recolha de resíduos, separado da recolha tradicional, apenas para os resíduos alimentares ou biológicos domésticos – com a disponibilização dos referidos contentores específicos identificados pela cor castanha. Os agregados familiares devem separar os resíduos alimentares e biológicos e depositá-los nos respetivos contentores, de forma a permitir a sua recolha separada.

Sobre a implementação destas medidas, informação adicional pode ser encontrada nos sites brownbin.ie, stopfoodwaste.ie e no epa.ie, bem como no portal governamental citizensinformation.ie.

V. Consultas e contributos

• Consultas obrigatórias Regiões autónomas A presente iniciativa revela-se de particular interesse no contexto das Regiões Autónomas da Madeira e

dos Açores – atento o impacto do Estatuto da Agricultura Familiar, bem como da produção agroalimentar, nas economias insulares – pelo que se sugere à Comissão que pondere recomendar a consulta dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 229.º da Constituição.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género Os autores juntaram a respetiva ficha de Avaliação Prévia de Impacto de Género, em função da qual se

afere o caráter neutro da iniciativa legislativa em apreço. O tema e a sua redação não nos oferecem questões quanto a este ponto, não evidenciando, prima facie, qualquer impacto prospetivo diferenciado em função de género.

Linguagem não discriminatória Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

8 Diploma consolidado retirado do portal oficial irishstatuebook.ie. 9 Posteriormente os resíduos são recolhidos pela autoridade local ou, em alternativa, tratados pela própria empresa e entregues à autoridade local. 10 Diploma consolidado retirado do portal oficial irishstatuebook.ie.

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que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta

fase do processo legislativo a redação do projeto de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a linguagem discriminatória em relação ao género.

VII. Enquadramento bibliográfico

BATISTA, Pedro[et al.] – Do campo ao garfo [Em linha]: desperdício alimentar em Portugal.Lisboa: CESTRAS, 2012. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119289&img=1006&save=true>.

Resumo: Este livro resultou de um projeto de investigação sobre o desperdício alimentar em Portugal, e procura responder a duas questões: quanto se desperdiça, e porque se desperdiça.

Caracteriza-se o desperdício alimentar em Portugal nas suas diferentes etapas: produção, processamento, distribuição e consumo; discutem-se as principais causas do desperdício e faz-se uma análise mais pormenorizada do desperdício das famílias. O capítulo dedicado às famílias menciona algumas pressões externas como a crise económica, as alterações nos hábitos de consumo e nas rotinas das famílias, o impacto dos media na sensibilização para o problema, a subida dos preços dos alimentos e a segurança alimentar e analisa a influência destes fatores nos comportamentos e atitudes dos consumidores.

Destaca-se a Resolução do Parlamento Europeu de 19 de janeiro de 2011, que propõe a redução para metade, até 2025, do desperdício alimentar na União Europeia, e no último capítulo são sugeridas linhas de ação para uma estratégia que permita atingir essa meta em Portugal.

CANADÁ. Commission for Environmental Cooperation – Characterization and management of food loss and waste in North America [Em linha]. Montreal: Commission for Environmental Cooperation, 2017. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=125293&img=10406&save=true>.

Resumo: Este documento produzido pela Commission for Environmental Cooperation é uma iniciativa de três países, Canadá, México e Estados Unidos, inserida no programa Green Economy and Climate Change. Pretende capacitar o território da América do Norte na redução de perdas e desperdício alimentares nos setores da indústria, comércio e institucional. Apresenta um conjunto de estratégias para a redução de perdas e desperdícios alimentares em toda a cadeia alimentar, desde a produção após a colheita, ao processamento e distribuição até ao setor retalhista e consumidor final.

São, ainda, apresentadas estimativas relativas à quantidade de perda e desperdício alimentares e o seu impacto ambiental e socioeconómico. As oportunidades e sugestões apresentadas dirigem-se aos setores referenciados em cima, aos governos e a organizações não-governamentais no desenvolvimento de políticas e estratégias para a América do Norte.

FOOD LOSS AND WASTE PROTOCOL. Food loss and waste accounting and reporting standard [Em linha]. [S.l.]: FLW Protocol, 2016. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=125294&img=10407&save=true>.

Resumo: Este documento constitui-se numa norma mundial de quantificação e comunicação consistente de perdas e desperdícios alimentares. A utilização desta norma permitirá aos países, cidades, empresas, ou outra qualquer entidade elaborar inventários no âmbito das perdas e desperdícios alimentares ao longo da cadeia alimentar e perceber a sua evolução, permitindo uma melhor eficiência na gestão dos recursos e a redução do impacto ambiental que estas perdas significam.

GLOBAL food losses and food waste [Em linha]: extents, causes and prevention. Rome: FAO, 2011. ISBN 978-82-5-107205-9. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

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http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119286&img=1805&save=true>.

Resumo: A segurança alimentar é uma preocupação muito presente na maior parte dos países em desenvolvimento. A produção de alimentos tem de aumentar significativamente para dar resposta às necessidades de uma população mundial cada vez maior. Este estudo mostra que uma das formas de evitar os desequilíbrios e reduzir as tensões entre as necessidades crescentes em termos de consumo e os desafios do aumento da produção, passa por promover a redução do desperdício de alimentos. Se conseguirmos alcançar esse objetivo, teremos um aumento considerável de eficiência em toda a cadeia alimentar. Considera-se que, num planeta com recursos naturais limitados (terra, água, energia, fertilizantes), e em que são urgentes soluções baratas para produzir alimentos seguros e nutritivos suficientes para todos, a redução do desperdício e das perdas de alimentos deve ser considerada uma prioridade.

HANSON, Craig [et. al.] – Reducing food loss and waste [Em linha]: ten Interventions to scale impact. Washington: World Resources Institute, 2019. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=131794&img=16864&save=true>.

Resumo: Este relatório apresenta 10 intervenções de desenvolvimento (políticas e práticas) que, segundo os autores, permitem aumentar o ritmo e amplitude geográfica nos esforços de redução do desperdício alimentar e dos resíduos. Visa ir ao encontro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 12.3 sobre perda e desperdício de alimentos (FAO). Destina-se a gestores públicos, empresas, organizações não governamentais, centros de pesquisa. Para cada intervenção os autores indicam o que é necessário para a sua implementação, a forma de funcionamento e os passos seguintes a desenvolver no futuro. As ações/estratégias passam pelo aumento do número de países a desenvolverem estratégias nacionais no âmbito do desperdício alimentar, pela alteração de comportamentos na área do consumo (restaurantes e agregados familiares), pela inovação na produção de soluções de armazenamento mais ecológicas e pelo aumento do financiamento através de subsídios e incentivos à prática de políticas redutoras de desperdício alimentar, entre outras.

HIGH LEVEL PANEL OF EXPERTS ON FOOD SECURITY AND NUTRITION OF THE COMMITTEE ON WORLD FOOD SECURITY, Rome, 2014 – Food losses and waste in the context of sustainable food systems. [Em linha]. Rome: FAO, 2014. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119287&img=1806&save=true>.

Resumo: Este relatório analisa o desperdício e a perda de alimentos numa tripla perspetiva: perspetiva sistémica, perspetiva de sustentabilidade ambiental, social e económica e perspetiva da segurança alimentar e nutrição.

O Grupo de Peritos de Alto Nível para a Segurança Alimentar e a Nutrição, responsável pelo relatório, recomenda aos governos e às organizações internacionais que implementem uma melhor integração da cadeia alimentar e do sistema de alimentação e que promovam uma estratégia de segurança alimentar e estratégia nutricional. Deve ser reduzido o desperdício e a perda de alimentos, devem ser avaliadas as potenciais formas de melhorar a eficiência dos sistemas agrícolas e alimentares e a sustentabilidade para a melhoria da segurança alimentar e nutricional. Devem ainda ser analisadas as causas diretas e indiretas do desperdício e da perda de alimentos num determinado sistema e identificar as situações em que será mais eficiente agir.

MANFREDI, Simone – Improving sustainability and circularity of european food waste management with a life cycle approach [Em linha]. [S.l.]: European Union, 2015. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=131793&img=16863&save=true>.

Resumo: Este documento é um relatório técnico do Joint Research Centre (Comissão Europeia) sobre a gestão do desperdício alimentar na Europa e sua melhoria através do recurso à economia circular, entre outros recursos. O relatório visa ajudar os tomadores de decisão e os gestores de resíduos e de desperdício

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alimentar a identificar as opções de gestão mais sustentáveis para o desperdício de alimentos e para a minimização de impactos ambientais e económicos, ou seja, visa melhorar a sustentabilidade de gestão de resíduos alimentares europeus.

PORTUGAL. Governo Constitucional, 19 – Prevenir desperdício alimentar [Em linha]: um compromisso de todos. [S.l.: s.n.], 2014. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119288&img=1807&save=true>.

Resumo: O documento acima referido propõe a criação de um compromisso para o combate ao desperdício alimentar, começando por caraterizar e explicar este desperdício, com vista a contribuir ativamente para a redução do desperdício alimentar em Portugal. Sugere-se a criação de uma Plataforma Nacional de Conhecimento sobre o Desperdício Alimentar que estude e reúna informação sobre este assunto. São apresentadas linhas orientadoras para cada uma das áreas de intervenção, que poderão constituir um contributo para a elaboração de guias de boas práticas nas seguintes vertentes: produção e transformação; distribuição e comercialização; educação e comunicação; sensibilização e responsabilização; e regulação, agilização e reconhecimento.

STENMARCK, Åsa [et. al.] – Estimates of European food waste levels [Em linha]. Stockholm: Swedish Environmental Research Institute, 2016. Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=131792&img=16861&save=true>.

Resumo: Este relatório produzido no âmbito do Projeto FUSIONS, EU – Reducing Food Waste through social innovation – apresenta estimativas para a produção e desperdício de resíduos alimentares na UE-28. Os valores são apresentados por setores: produção primária (agricultura e pescas); produção secundária (indústria transformadora alimentar); distribuição (grosso e retalho); restauração e consumo nos agregados familiares. Embora tenham sido recolhidos dados até 2013, a estimativa orienta-se a 2012, dado a falta de fiabilidade e consolidação dos dados recolhidos para 2013.

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PROJETO DE LEI N.º 544/XIV/2.ª (INQUÉRITO NACIONAL SOBRE O DESPERDÍCIO ALIMENTAR EM PORTUGAL)

Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

1 – Nota introdutória O PEV apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 544/XIII – Inquérito nacional sobre o

Desperdício Alimentar em Portugal, a 25 de setembro de 2020, tendo sido admitida e baixado à Comissão de Agricultura e Mar (CAM), comissão competente, a 30 de setembro de 2020, para emissão de parecer.

A discussão na generalidade do Projeto de Lei n.º 544/XIV encontra-se agendada para a reunião plenária de 15 de outubro de 2020.

Foi disponibilizada nota técnica que é parte integrante do presente parecer.

2 – Objeto A iniciativa em análise visa determinar em lei um inquérito nacional sobre o desperdício alimentar cujo

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objetivo é obter um diagnostico sobre o nível de perdas alimentares em Portugal. Neste sentido, o inquérito pretende incidir sobre a produção, o armazenamento, o embalamento, o transporte, a distribuição, a venda e o consumo.

O PEV no artigo 3.º do projeto de lei em análise prevê que o procedimento metodológico do inquérito é competência da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA), constituída pelo Despacho n.º 14202-B/2016, de 25 de novembro, e o tratamento dos dados do Instituto Superior de Estatística (INE).

Na sequência da recolha e tratamento dos dados é previsto a elaboração de um relatório com conclusões «claras e objetivas» da responsabilidade da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA), a ser remetido ao Governo (membro com tutela da alimentação) e posteriormente à Assembleia da República (artigo 5.º).

O PEV estabelece que a regulamentação da lei seja executada no prazo de três meses (artigo 6.º). A motivação do PEV na apresentação do projeto de lei em análise prende-se com a necessidade urgente

de se «proceder ao diagnostico, avaliação e monitorização sobre o desperdício alimentar a nível nacional», conforme já está consagrado no objetivo da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA). Entendem que o sucesso da aplicação deste tipo de medidas para o cumprimento destes objetivos «depende do forte envolvimento da sociedade e de todos os agentes implicados», destacando, aliás, os que se encontram em «fase de dificuldade na sua vida, devido às barreiras cridas pelas medidas de resposta à pandemia, com impacto social e económico muito sério.» Os autores da iniciativa consideram que: «a) do ponto de vista ambiental é doloroso que sejam esbanjados recursos naturais para produzir bens alimentares que depois acabam no lixo; b) do ponto de vista social é angustiante que se deitam literalmente fora um conjunto significativo de alimentos que poderiam contribuir para satisfazer necessidades básicas alimentares de uma parte da população.»

3 – Conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e cumprimentos da lei formulário

A presente iniciativa legislativa é apresentada pelo PEV no âmbito do poder de iniciativa da lei, em

conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 167.º e da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR). Respeita os requisitos formais relativos às iniciativas em geral e aos projetos de lei, em particular, previstos nos artigos 124.º do Regimento.

O presente projeto de lei pode resultar num aumento de despesa prevista no Orçamento do Estado, decorrente por exemplo dos meios necessários para proceder ao inquérito (artigo 2.º). Contudo, o projeto de lei não estabelece prazos para a concretização do inquérito proposto, nem a nota técnica que é parte integrante do presente parecer destacam qualquer colisão com a lei-travão.

A nota técnica sugere a consulta da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA), no âmbito das consultas do processo legislativo. A signatária do presente parecer entende que esta audição deve ter lugar em sede de especialidade, em caso de aprovação da iniciativa em análise, na generalidade.

4 – Antecedentes Na presente legislatura deram entrada as seguintes iniciativas: ➢ Projeto de Lei n.º 932/XIV (PAN) – Estabelece o regime legal aplicável à doação de géneros

alimentares, para fins de solidariedade social, por forma a combater a fome e o desperdício alimentar em Portugal.

➢ Projeto de Lei n.º 537/XIV (PCP) – Consagra medidas de promoção do escoamento de bens alimentares da pequena agricultura e agricultura familiar e cria um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar, combatendo o desperdício alimentar.

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Ambas estão agendadas para discussão em plenário dia 15 de outubro de 2020, em conjunto com a

iniciativa em análise. Nas legislaturas passadas destaca-se: ➢ Projeto de Lei n.º 266/XIII (PAN) – Estabelece o regime legal aplicável à doação de géneros

alimentares, para fins de solidariedade social, por forma a combater a fome e o desperdício alimentar em Portugal.

➢ Projeto de Resolução n.º 576/XIII (CDS-PP) – Recomenda ao Governo, no âmbito da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar, que promova a divulgação e replicação do modelo de comissariado e Plano Municipal de Combate ao Desperdício Alimentar de Lisboa, com o objetivo de fomentar a criação de uma Rede Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar.

➢ Projeto de Resolução n.º 577/XIII (CDS-PP) – Recomenda ao Governo que adote uma série de medidas que visam a diminuição do desperdício alimentar.

➢ Projeto de Resolução n.º 581/XIII (BE) – Recomenda ao Governo medidas de combate ao desperdício alimentar.

➢ Projeto de Resolução n.º 582/XIII (PEV) – Participação pública para a estratégia nacional e para o plano de ação de combate ao desperdício alimentar.

➢ Projeto de Resolução n.º 583/XIII (PEV) – Diagnóstico sobre o desperdício alimentar em Portugal. Em 2015 foi publicada as RAR n.º 65/2015 «Combater o desperdício alimentar para promover uma gestão

eficiente dos alimentos». Em 2017 a RAR n.º 13/2017 «Recomenda ao Governo medidas de combate ao desperdício alimentar.»

5 – Conclusões A Comissão de Agricultura e Mar é de parecer que o Projeto de Lei n.º 544/XIV – Inquérito Nacional sobre o

Desperdício Alimentar em Portugal reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutida e votada em plenário, reservando os grupos parlamentares o seu sentido de voto para o debate.

Palácio de São Bento, 9 de outubro de 2020.

A Deputada relatora, Emília Cerqueira — O Presidente da Comissão, Pedro do Carmo. Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CDS-PP e do PAN, na

reunião da Comissão do dia 14 de outubro de 2020. 6 – Anexos Nota técnica, elaborada ao abrigo do disposto no artigo 131.º do regimento da Assembleia da República.

Nota Técnica Projeto de Lei n.º 544/XIV/2.ª (PEV) Título: Inquérito nacional sobre o desperdício alimentar em Portugal

Data de admissão: 30 de setembro de 2020. Comissão de Agricultura e Mar (7.ª).

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Índice I. Análise da iniciativa II. Enquadramento parlamentar III. Apreciação dos requisitos formais IV. Análise de direito comparado V. Consultas e contributos VI. Avaliação prévia de impacto VII. Enquadramento bibliográfico Elaborada por: Luísa Colaço (DILP), Paulo Ferreira Campos (DAC), Isabel Pereira (DAPLEN) e Helena Medeiros (BIB). Data: 12 de outubro de 2020. I. Análise da iniciativa

• A iniciativa A procura de modelos de produção e de consumo assentes, em maior ou menor grau, nas ideias de

sustentabilidade e economia circular tem marcado, global e indelevelmente, a discussão política e social – e contribuído, em boa medida, para o surgimento e maturação do pensamento económico – que tem animado as primeiras décadas do séc. XXI. O sentimento de urgência, decorrente do consenso científico em torno das causas das alterações climáticas e da necessidade da adoção de políticas públicas, cientificamente sustentadas, de alívio e mitigação dos efeitos da crise climática, tem convidado ao repensar da afetação e reafectação de recursos escassos (independentemente do grau de transformação das matérias em apreço), em domínios tão distintos da vida em comunidade quanto a transição energética e a redefinição dos sistemas de mobilidade urbana, o tratamento de resíduos, a reutilização de semicondutores ou até a vigência dos manuais escolares.

Em especial, o tema do desperdício alimentar tem ganho renovada importância no desenho de políticas públicas no espaço europeu.

A iniciativa em apreço visa a aquisição e tratamento de informação que suporte a tomada de decisão e a formulação de estratégicas públicas de mitigação do problema; conforme aduzem os proponentes, «conhecidos os fatores que geram o desperdício, ficam criadas as condições para a definição de objetivos e metas para pôr fim ao problema de forma eficaz».

Para tanto, propõe-se a realização de um inquérito nacional sobre o desperdício alimentar que habilite a obtenção de um diagnóstico realista sobre o nível de perdas alimentares em Portugal, recaindo a responsabilidade da definição da metodologia a aplicar e da organização geral do inquérito na Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA).

• Enquadramento jurídico nacional O combate ao desperdício alimentar é um assunto que está na agenda da Assembleia da República (AR)

há vários anos. Já em 2015 a AR, através da Resolução da Assembleia da República n.º 65/2015, de 17 de junho1,2, declarou o ano de 2016 como o ano nacional do combate ao desperdício alimentar.

Na sequência desta Resolução, o Governo criou a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA), através do Despacho n.º 14202-B/2016, de 25 de novembro de 2016. O ponto 3 deste despacho dá-nos conta dos objetivos da CNCDA: «proceder ao diagnóstico, avaliação e monitorização sobre o

1 Intitulada «Combater o desperdício alimentar para promover uma gestão eficiente dos alimentos». 2 A Assembleia da República tornou a abordar o assunto do desperdício alimentar na Resolução da Assembleia da República n.º 13/2017, de 6 de fevereiro, na qual recomenda ao Governo medidas de combate do desperdício alimentar.

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desperdício alimentar a nível nacional; identificar as boas práticas existentes a nível nacional e internacional no âmbito do combate ao desperdício alimentar; sistematizar os indicadores de medida do desperdício alimentar, nas diferentes fases da cadeia alimentar, de acordo com as metodologias aplicadas ao nível da União Europeia e da OCDE; promover o envolvimento de entidades da sociedade civil com iniciativas desenvolvidas neste âmbito; promover a criação e o desenvolvimento de uma plataforma eletrónica que assegure a gestão interativa dos bens alimentares com risco de desperdício; propor medidas de redução do desperdício alimentar que integrem objetivos de segurança alimentar, educação escolar, saúde pública, combate à pobreza e de boas práticas na produção, na indústria agroalimentar, na distribuição e no consumo». Como competência é-lhe atribuída a elaboração da Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar3 e do Plano de Ação de Combate ao Desperdício Alimentar4.

No ano seguinte, foi aprovada a Resolução da Assembleia da República n.º 13/2017, de 6 de fevereiro, que recomenda ao Governo medidas de combate ao desperdício alimentar, reiterando a necessidade de esta Comissão realizar «um diagnóstico, com a participação de equipas multidisciplinares e de associações e entidades responsáveis, que permita conhecer mais pormenorizadamente os níveis e fatores de desperdício alimentar em Portugal, assim como os obstáculos existentes ao seu efetivo combate».

Cumpre ainda dar nota da aprovação pelo Governo, em 2017, do Plano de Ação para a Economia Circular em Portugal, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 190-A/2017, de 11 de dezembro5, com a finalidade de promover a «redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia». Este Plano integra, nas suas ações macro, a «Ação 4 – Alimentar sem sobrar: produção sustentável para um consumo sustentável», com os objetivos de «conhecer e monitorizar a realidade nacional em matéria de desperdício alimentar na cadeia de valor; diminuir a produção de resíduos orgânicos e aumentar a produtividade da cadeia de valor, sobretudo dos setores ligados à indústria alimentar, contribuindo para a conservação dos recursos naturais; contribuir para a educação do produtor/consumidor».

O envolvimento da sociedade civil no combate às situações de carência alimentar levou à criação do Banco Alimentar contra a Fome, com o objetivo de combater o desperdício de bens alimentares e encaminhá-los às pessoas carenciadas, de forma gratuita e em estreita relação com as instituições sociais. Atualmente existem 21 bancos alimentares, espalhados pelo país, e associados numa federação.

Mais recente é a criação do Programa Zero Desperdício, com origem na DARIACORDAR – Associação para a Recuperação de Desperdício, associação sem fins lucrativos criada em 2011. O principal objetivo do Zero Desperdício é reduzir a geração de lixo, capacitando as instituições para a recuperação de alimentos perecíveis. Este modelo tem por objetivo a recuperação de excedentes alimentares em rede, fazendo chegar todas as doações a pessoas em situação de carência, permitindo, assim, acabar com a fome, poupar o investimento financeiro necessário para alimentar as pessoas em carência alimentar e otimizar os recursos naturais, humanos e financeiros utilizados na produção e confeção dos alimentos.

Também a Re-Food trabalha para eliminar o desperdício alimentar, com base no voluntariado, tanto de quem doa os produtos como de quem os recolhe, embala e distribui diretamente às pessoas carenciadas.

O Instituto Nacional de Estatística, IP (INE, IP), foi criado há 85 anos pela Lei n.º 1911, de 23 de maio de 1935, regendo-se atualmente pelo Decreto-Lei n.º 136/2012, de 2 de julho, que aprova a sua orgânica. Os estatutos do INE, IP, foram aprovados pela Portaria n.º 423/2012, de 28 de dezembro6, que define a sua organização interna. Trata-se de um instituto público de regime especial7, dotado de autonomia administrativa, que integra a administração indireta do Estado, prossegue atribuições da Presidência do Conselho de Ministros na esfera das estatísticas oficiais e goza de independência técnica e profissional no exercício desta sua atividade, podendo, na qualidade de autoridade estatística nacional, exigir a prestação de informação, com caráter obrigatório e gratuito, com garantia da salvaguarda do segredo estatístico, nos termos da lei do Sistema Estatístico Nacional8.

O INE, IP, faz parte do Sistema Estatístico Europeu, na qualidade de autoridade estatística nacional. A sua missão é a «produção e divulgação de informação estatística oficial, promovendo a coordenação, o

3 Aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 46/2018, de 27 de abril. 4 O plano de ação é composto por 14 medidas, desenvolvidas nas fichas preparadas pela CNCDA. 5 Alterada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 108/2019, de 2 de julho. 6 Versão consolidada, retirada do portal www.dre.pt 7 Cfr. alínea a) do n.º 3 do artigo 48.º da Lei n.º 3/2004, de 15 de janeiro, que aprova a lei quadro dos institutos públicos. 8 Lei n.º 22/2008, de 13 de maio, Lei do Sistema Estatístico Nacional.

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desenvolvimento e a divulgação da atividade estatística nacional9». Tem como atribuições: • Produzir informação estatística oficial, com o objetivo de apoiar a tomada de decisão pública, privada,

individual e coletiva, bem como a investigação científica; • Elaborar as Contas Nacionais Portuguesas, em articulação com as demais entidades competentes; • Divulgar, de forma acessível, a informação estatística produzida; • Coordenar e exercer a supervisão técnico-científica e metodológica da produção estatística da sua

responsabilidade, bem como das entidades com delegação de competências e dos Serviços Regionais de Estatística das Regiões Autónomas;

• Cooperar com as entidades nacionais e com organismos de outros Estados, da União Europeia e das organizações internacionais, na área da informação estatística.

O tratamento dos dados pelo INE, IP, previsto no n.º 2 do artigo 3.º desta iniciativa, deve respeitar a Lei n.º

58/2019, de 8 de agosto, que assegura a execução, na ordem jurídica nacional, do Regulamento (UE) 2016/67910 do Parlamento e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados.

A Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, aplica-se aos tratamentos de dados pessoais11: • realizados no território nacional, independentemente da natureza pública ou privada do responsável pelo

tratamento ou do subcontratante, mesmo que o tratamento de dados pessoais seja efetuado em cumprimento de obrigações legais ou no âmbito da prossecução de missões de interesse público, aplicando-se todas as exclusões previstas no artigo 2.º do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD);

• realizados fora do território nacional, quando sejam efetuados no âmbito da atividade de um estabelecimento situado no território nacional; ou afetem titulares de dados que se encontrem no território nacional, quando as atividades de tratamento estejam subordinadas ao disposto no n.º 2 do artigo 3.º do RGPD; ou afetem dados que estejam inscritos nos postos consulares de que sejam titulares portugueses residentes no estrangeiro.

A autoridade de controlo nacional para efeitos do RGPD é a Comissão Nacional de Proteção de Dados

(CNPD), que se rege pela Lei n.º 43/2004, de 18 de agosto12, Lei de organização e funcionamento da CNPD. II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições) Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que, neste momento, com objeto

conexo com o do projeto de lei em análise, se encontram pendentes apenas as seguintes iniciativas: − Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª (PAN) – Aprova o regime jurídico aplicável à doação de géneros

alimentares para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar; − Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª (PCP) – Consagra medidas de promoção do escoamento de bens

alimentares da pequena agricultura e agricultura familiar e cria um regime público simplificado para aquisição e distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da agricultura familiar, combatendo o desperdício alimentar;

− Projeto de Resolução n.º 712/XIV/2.ª (PSD) – Recomenda do Governo um reforço na estratégia integrada no combate ao desperdício alimentar.

9 Artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 136/2012, de 2 de julho. 10 Comummente conhecido como Regulamento Geral de Proteção de Dados 11 Cfr. Artigo 1.º da Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto 12 Versão consolidada, retirada do portal www.dre.pt

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• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições) Na anterior Legislatura localizaram-se as seguintes iniciativas sobre matéria conexa: - Projeto de Lei n.º 932/XIII/4.ª (PAN) –Estabelece o regime legal aplicável à doação de géneros

alimentares, para fins de solidariedade social, por forma a combater a fome e o desperdício alimentar em Portugal – caducado a 24-10-2019;

- Projeto de Lei n.º 266/XIII/1.ª (PAN) – Estabelece o regime aplicável à doação de géneros alimentares, para fins de solidariedade social, por forma a combater a fome e o desperdício alimentar em Portugal – rejeitado a 22-12-2016, com votos contra do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PCP e do PEV; discutido conjuntamente com o Projeto de Resolução n.º 576/XIII (CDS-PP) – Recomenda ao Governo, no âmbito da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar, que promova a divulgação e replicação do modelo de comissariado e Plano Municipal de Combate ao Desperdício Alimentar de Lisboa, com o objetivo de fomentar a criação de uma Rede Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar – aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP e do PAN e abstenções do BE, do PCP e do PEV –, o Projeto de Resolução n.º 577/XIII (CDS-PP) – Recomenda ao governo que adote uma série de medidas que visam a diminuição do desperdício alimentar – aprovado por unanimidade –, o Projeto de Resolução n.º 581/XIII (BE) – Recomenda ao Governo medidas de combate ao desperdício alimentar – aprovado parcialmente (pontos 4 e 6 aprovados, restantes pontos rejeitados) –, o Projeto de Resolução n.º 582/XIII (PEV) – Participação pública para a estratégia nacional e para o plano de ação de combate ao desperdício alimentar – aprovado por unanimidade, e o Projeto de Resolução n.º 583/XIII (PEV) – Diagnóstico sobre o desperdício alimentar em Portugal – aprovado por unanimidade.

Cumpre ainda fazer menção ao Projeto de Resolução n.º 1506/XII/4.ª (PEV) – Combater o desperdício

alimentar para promover uma gestão eficiente dos alimentos – aprovado por unanimidade a 03-06-2015.III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes»

(PEV), ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do RAR.

A iniciativa é subscrita por dois Deputados, assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do RAR, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.

Observa igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR, uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 25 de setembro de 2020. Foi admitido a 30 de setembro, data em que, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da AR, baixou na generalidade à Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), tendo sido anunciado nesse dia. A iniciativa encontra-se agendada, por arrastamento com o Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª (PAN) para a reunião plenária de 15 de outubro.

• Verificação do cumprimento da lei formulário A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, de ora em

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diante designada como lei formulário, contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas que são relevantes

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

No que respeita ao início de vigência, o artigo 7. º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor ocorrerá no dia seguinte ao da sua publicação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação».

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei formulário.

• Regulamentação ou outras obrigações legais A presente iniciativa prevê, no seu artigo 6.º, a necessidade de regulamentação das suas normas, no prazo

de três meses após a publicação da respetiva lei. IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional Países europeus A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: França,

Itália, Noruega, Polónia e República Checa.

FRANÇA A Lei n.º 2016-138, de 11 de fevereiro de 2016, relativa à luta contra o desperdício alimentar, introduziu

uma subsecção no Código do Ambiente, intitulada «Luta pela reutilização e contra o desperdício» e composta pelos artigos L541-15-3 a L541-15-15. Mais recentemente, a Lei n.º 2020-105, de 10 de fevereiro, veio proceder à alteração de alguns desses artigos.

A solução legislativa adotada por França envolve nesta luta os produtores, transformadores, distribuidores, consumidores e associações, respeitando as seguintes prioridades: prevenção do desperdício alimentar; utilização os produtos alimentares não vendidos, mas em condições para o consumo humano, através da doação ou da sua transformação; utilização dos restantes para a alimentação animal; ou para produção de composto agrícola ou energético.

É proibida a retirada do mercado de géneros alimentícios ainda não impróprios para consumo e as médias e grandes superfícies comerciais e os distribuidores de meios alimentares com áreas superiores a 400 metros quadrados são obrigados a celebrar acordos com instituições de caridade para entrega de produtos alimentares excedentes que ainda se encontrem próprios para consumo humano, sendo a prevaricação das obrigações estabelecidas na lei punida com multas até 3000 euros, caso se trate de pessoa singular, ou 15 000 euros, se se tratar de pessoa coletiva.

ITÁLIA A Lei n.º 166, de 19 agosto de 2016, relativa a disposições concernentes à doação e distribuição de

produtos alimentares e farmacêuticos para fins de solidariedade social e redução do desperdício, permite a cessão gratuita dos excedentes alimentares, embora sem caráter obrigatório nem imposição de sanções. Este diploma prevê como incentivo, nos seus artigos 16 e 17, alguns benefícios fiscais para quem faça essa

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doação.

NORUEGA Existe, desde 2017, um acordo celebrado entre o Governo e as mais significativas organizações da

indústria alimentar no sentido de reduzir para metade, até 2030, a quantidade de comida desperdiçada. Este acordo enquadra-se nos objetivos de desenvolvimento sustentável fixados pela Organização das Nações Unidas, um dos quais é exatamente o do combate à fome através da redução dos desperdícios alimentares. Exige ainda a obrigação de apresentação de relatórios em 2020, 2025 e 2030, para avaliação do nível e consecução do objetivo a atingir.

POLÓNIA Na Polónia foram tomadas medidas nesta área pela Lei de 19 de julho de 201913 para Combate ao

Desperdício de Alimentos. Esta lei estabelece princípios sobre gestão alimentar e cria a obrigação de os comerciantes de produtos alimentares celebrarem um acordo com uma organização não governamental para doação de alimentos, não destinados a venda, mas ainda próprios para consumo humano.

REPÚBLICA CHECA Desde 1 de janeiro de 2018, em virtude de uma alteração introduzida ao Act No 110/1997 Coll. on Food

and Tobacco Products, todas as superfícies comerciais com áreas de vendas superiores a 400 metros quadrados são obrigadas a doar para fins caritativos alimentos não vendidos. Outros comerciantes do ramo alimentar, como mercearias e pequenas lojas de comida, podem, numa base de voluntariado, entregar comida a organizações não lucrativas que tenham por atividade a recolha de alimentos.

Outros países Apresenta-se, aqui, a legislação comparada relativa ao Reino Unido.

REINO UNIDO A página do Waste and Resources Action Programme (WRAP) fornece, num guia bastante completo sobre

a prevenção do desperdício alimentar, informação sobre a legislação aplicável nesta área no Reino Unido. Como aí é sublinhado, a legislação específica em vigor nos quatro países que compõem o Reino Unido foi elaborada à sombra de três atos normativos essenciais:

– O Regulamento (CE) n.º 178/2002, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2002; – O Food Safey Act 1990, aplicável na Grã-Bretanha14; – O Food Standards Act 1999.15 Concretamente acerca do desperdício alimentar, a legislação mais rigorosa é a da Irlanda do Norte, cujo

Food Waste Regulations (Northern Ireland) 2015 se refere à recolha, transporte e tratamento de restos alimentares e matérias relacionadas. De acordo com este regulamento16, os donos de negócios relacionados

13 No original em polaco. 14 Na Irlanda do Norte vigora legislação semelhante, aprovada pela Food Safety (Northern Ireland) Order 1991. 15 Em https://www.food.gov.uk/ é disponibilizada informação específica dirigida aos negócios do ramo da hotelaria e restauração, que não dispensa a consulta da legislação, sobre regras a observar em matéria de segurança alimentar. A página da Internet da Food Standards Agency, que funciona sob a tutela do Governo, fornece a mesma informação. 16 No direito anglo-saxónico de matriz britânica, as regulations constituem secondary legislation, com caráter regulamentar e execução de leis (parlamentares) de nível hierárquico superior.

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com o setor da alimentação são obrigados a não misturar os restos de comida com lixo e outro tipo de desperdícios, devendo depositá-los separadamente em recetáculos destinados a essa finalidade e nunca em esgotos ou outros contentores. Estes recetáculos próprios são obrigatoriamente postos à disposição dos utentes pelas autoridades distritais (district councils). A obrigação de providenciar os recetáculos passou a impender sobre as autoridades distritais desde 1 de abril de 2015.

Acerca da obrigação de separar os restos alimentares, todos os que levam a cabo atividades ou negócios de produção de alimentos (com exceção dos hospitais) e produzam mais de 50 quilos de restos de comida por semana ficaram obrigados, a partir de 1 de abril de 2016, a separar esses desperdícios alimentares e a entregá-los nos locais próprios para recolha. Antes daquela data, os que produziam desperdícios alimentares em quantidade inferior não estavam obrigados a essa separação. A partir de 1 de abril de 2017, passaram a também ficar abrangidos os hospitais e os que produzam entre 5 e 50 quilos de restos por semana, pelo que só permanecerão isentos dessa obrigação os que produzam menos de 5 quilogramas.

As normas irlandesas, à semelhança da regulamentação correlativa que existe na Grã-Bretanha, contêm definições fundamentais para esta matéria, como acontece com a de atividades e negócios para efeitos de aplicação da lei (business), que inclui a exploração, com intuito lucrativo ou não, de cantinas, clubes, escolas e hospitais.

Ao invés, as Waste (England and Wales) Regulations 2011, que não dizem respeito apenas aos desperdícios alimentares, não obrigam à separação, para recolha, dos restos, mas encorajam o mais possível à reciclagem.

Finalmente, as Waste (Scotland) Regulations 2012 entraram em vigor em 1 de janeiro de 2014, fazendo parte do conjunto de medidas incluídas no Plano «Zero Desperdício» (Zero Waste) do Governo escocês, com o objetivo de se atingir uma taxa de 75% de reciclagem em 2025. Esta lei obriga os negócios ou atividades ligadas aos alimentos que produzam mais de 50 quilos de restos alimentares por semana a proceder à separação dos alimentos para recolha, excetuando-se os meios rurais e os hospitais. A partir de 1 de janeiro de 2016, a obrigação passou a abranger os hospitais e todas as atividades e negócios que produzam mais de 5 quilos de restos alimentares por semana. Este Programa disponibiliza ainda um guia para melhor compreensão da legislação em causa.

Organizações internacionais

Organização das Nações Unidas (ONU) Em 2015, a Organização das Nações Unidas estabeleceu os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

(ODS), que sucederam aos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio. Os ODS são 17, divididos em 169 metas, a atingir até 2030. Um dos propósitos do Objetivo 12, relativo à produção e consumo sustentáveis, é o de «Até 2030, reduzir para metade o desperdício de alimentos per capita a nível mundial, de retalho e do consumidor, e reduzir os desperdícios de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo os que ocorrem pós-colheita».

Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO)17 Esta agência das Nações Unidas produziu, em 2011, um importante relatório, citado na exposição de

motivos do projeto de lei sob análise. Outros dois relatórios relevantes da FAO são os que se intitulam Global Initiative on Food Loss and Waste Reduction e Food losses and waste in the context of sustainable food systems, onde são apontadas as causas do desperdício de alimentos e recomendadas medidas para o combater, de entre as quais se destaca a adoção de políticas de redistribuição e reaproveitamento de bens alimentares.

17 A sigla corresponde à denominação em inglês: Food and Agriculture Organization of the United Nations.

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V. Consultas e contributos

Consultas facultativas Sugere-se a consulta da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA). VI. Avaliação prévia de impacto

Avaliação sobre impacto de género Os autores juntaram a respetiva ficha de Avaliação Prévia de Impacto de Género (AIG), em função da qual

se afere o caráter neutro da iniciativa legislativa em apreço. O tema e a sua redação não nos oferecem questões quanto a este ponto, não evidenciando, prima facie, qualquer impacto prospetivo diferenciado em função de género.

Linguagem não discriminatória Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta

fase do processo legislativo a redação do projeto de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a linguagem discriminatória em relação ao género.

VII. Enquadramento bibliográfico BATISTA, Pedro[et al.] – Do campo ao garfo [Em linha]: desperdício alimentar em Portugal.Lisboa:

CESTRAS, 2012. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR: .

Resumo: Este livro resultou de um projeto de investigação sobre o desperdício alimentar em Portugal, e procura responder a duas questões: quanto se desperdiça, e porque se desperdiça.

Caracteriza-se o desperdício alimentar em Portugal nas suas diferentes etapas: produção, processamento, distribuição e consumo; discutem-se as principais causas do desperdício e faz-se uma análise mais pormenorizada do desperdício das famílias. O capítulo dedicado às famílias menciona algumas pressões externas como a crise económica, as alterações nos hábitos de consumo e nas rotinas das famílias, o impacto dos media na sensibilização para o problema, a subida dos preços dos alimentos e a segurança alimentar e analisa a influência destes fatores nos comportamentos e atitudes dos consumidores.

Destaca-se a Resolução do Parlamento Europeu de 19 de janeiro de 2011, que propõe a redução para metade, até 2025, do desperdício alimentar na União Europeia, e no último capítulo são sugeridas linhas de ação para uma estratégia que permita atingir essa meta em Portugal.

CANADÁ. Commission for Environmental Cooperation – Characterization and management of food loss and waste in North America [Em linha]. Montreal: Commission for Environmental Cooperation, 2017. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=125293&img=10406&save=true>.

Resumo: Este documento produzido pela Commission for Environmental Cooperation é uma iniciativa de três países, Canadá, México e Estados Unidos, inserida no programa Green Economy and Climate Change. Pretende capacitar o território da América do Norte na redução de perdas e desperdício alimentares nos setores da indústria, comércio e institucional. Apresenta um conjunto de estratégias para a redução de perdas e desperdícios alimentares em toda a cadeia alimentar, desde a produção após a colheita, ao processamento

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e distribuição até ao setor retalhista e consumidor final. São, ainda, apresentadas estimativas relativas à quantidade de perda e desperdício alimentares e o seu

impacto ambiental e socioeconómico. As oportunidades e sugestões apresentadas dirigem-se aos setores referenciados em cima, aos governos e a organizações não-governamentais no desenvolvimento de políticas e estratégias para a América do Norte.

FOOD LOSS AND WASTE PROTOCOL. Food loss and waste accounting and reporting standard [Em linha]. [S.l.]: FLW Protocol, 2016. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=125294&img=10407&save=true>.

Resumo: Este documento constitui-se numa norma mundial de quantificação e comunicação consistente de perdas e desperdícios alimentares. A utilização desta norma permitirá aos países, cidades, empresas, ou outra qualquer entidade elaborar inventários no âmbito das perdas e desperdícios alimentares ao longo da cadeia alimentar e perceber a sua evolução, permitindo uma melhor eficiência na gestão dos recursos e a redução do impacto ambiental que estas perdas significam.

GLOBAL food losses and food waste [Em linha]: extents, causes and prevention. Rome: FAO, 2011. ISBN 978-82-5-107205-9. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119286&img=1805&save=true>.

Resumo: A segurança alimentar é uma preocupação muito presente na maior parte dos países em desenvolvimento. A produção de alimentos tem de aumentar significativamente para dar resposta às necessidades de uma população mundial cada vez maior. Este estudo mostra que uma das formas de evitar os desequilíbrios e reduzir as tensões entre as necessidades crescentes em termos de consumo e os desafios do aumento da produção, passa por promover a redução do desperdício de alimentos. Se conseguirmos alcançar esse objetivo, teremos um aumento considerável de eficiência em toda a cadeia alimentar. Considera-se que, num planeta com recursos naturais limitados (terra, água, energia, fertilizantes), e em que são urgentes soluções baratas para produzir alimentos seguros e nutritivos suficientes para todos, a redução do desperdício e das perdas de alimentos deve ser considerada uma prioridade.

HANSON, Craig [et. al.] – Reducing food loss and waste [Em linha]: ten Interventions to scale impact. Washington: World Resources Institute, 2019. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=131794&img=16864&save=true>.

Resumo: Este relatório apresenta 10 intervenções de desenvolvimento (políticas e práticas) que, segundo os autores, permitem aumentar o ritmo e amplitude geográfica nos esforços de redução do desperdício alimentar e dos resíduos. Visa ir ao encontro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 12.3 sobre perda e desperdício de alimentos (FAO). Destina-se a gestores públicos, empresas, organizações não governamentais, centros de pesquisa. Para cada intervenção os autores indicam o que é necessário para a sua implementação, a forma de funcionamento e os passos seguintes a desenvolver no futuro. As ações/estratégias passam pelo aumento do número de países a desenvolverem estratégias nacionais no âmbito do desperdício alimentar, pela alteração de comportamentos na área do consumo (restaurantes e agregados familiares), pela inovação na produção de soluções de armazenamento mais ecológicas e pelo aumento do financiamento através de subsídios e incentivos à prática de políticas redutoras de desperdício alimentar, entre outras.

HIGH LEVEL PANEL OF EXPERTS ON FOOD SECURITY AND NUTRITION OF THE COMMITTEE ON WORLD FOOD SECURITY, Rome, 2014 – Food losses and waste in the context of sustainable food systems. [Em linha]. Rome: FAO, 2014. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

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Resumo: Este relatório analisa o desperdício e a perda de alimentos numa tripla perspetiva: perspetiva

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sistémica, perspetiva de sustentabilidade ambiental, social e económica e perspetiva da segurança alimentar e nutrição.

O Grupo de Peritos de Alto Nível para a Segurança Alimentar e a Nutrição, responsável pelo relatório, recomenda aos governos e às organizações internacionais que implementem uma melhor integração da cadeia alimentar e do sistema de alimentação e que promovam uma estratégia de segurança alimentar e estratégia nutricional. Deve ser reduzido o desperdício e a perda de alimentos, devem ser avaliadas as potenciais formas de melhorar a eficiência dos sistemas agrícolas e alimentares e a sustentabilidade para a melhoria da segurança alimentar e nutricional. Devem ainda ser analisadas as causas diretas e indiretas do desperdício e da perda de alimentos num determinado sistema e identificar as situações em que será mais eficiente agir.

MANFREDI, Simone – Improving sustainability and circularity of european food waste management with a life cycle approach [Em linha]. [S.l.]: European Union, 2015. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

Resumo: Este documento é um relatório técnico do Joint Research Centre (Comissão Europeia) sobre a gestão do desperdício alimentar na Europa e sua melhoria através do recurso à economia circular, entre outros recursos. O relatório visa ajudar os tomadores de decisão e os gestores de resíduos e de desperdício alimentar a identificar as opções de gestão mais sustentáveis para o desperdício de alimentos e para a minimização de impactos ambientais e económicos, ou seja, visa melhorar a sustentabilidade de gestão de resíduos alimentares europeus.

PORTUGAL. Governo Constitucional, 19 – Prevenir desperdício alimentar [Em linha]: um compromisso de todos. [S.l.: s.n.], 2014. [Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119288&img=1807&save=true>.

Resumo: O documento acima referido propõe a criação de um compromisso para o combate ao desperdício alimentar, começando por caraterizar e explicar este desperdício, com vista a contribuir ativamente para a redução do desperdício alimentar em Portugal. Sugere-se a criação de uma Plataforma Nacional de Conhecimento sobre o Desperdício Alimentar que estude e reúna informação sobre este assunto. São apresentadas linhas orientadoras para cada uma das áreas de intervenção, que poderão constituir um contributo para a elaboração de guias de boas práticas nas seguintes vertentes: produção e transformação; distribuição e comercialização; educação e comunicação; sensibilização e responsabilização; e regulação, agilização e reconhecimento.

STENMARCK, Åsa [et. al.] – Estimates of European food waste levels [Em linha]. Stockholm: Swedish Environmental Research Institute, 2016. Consult. 6 out. 2020]. Disponível na intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=131792&img=16861&save=true>.

Resumo: Este relatório produzido no âmbito do Projeto FUSIONS, EU – Reducing Food Waste through social innovation – apresenta estimativas para a produção e desperdício de resíduos alimentares na UE-28. Os valores são apresentados por setores: produção primária (agricultura e pescas); produção secundária (indústria transformadora alimentar); distribuição (grosso e retalho); restauração e consumo nos agregados familiares. Embora tenham sido recolhidos dados até 2013, a estimativa orienta-se a 2012, dado a falta de fiabilidade e consolidação dos dados recolhidos para 2013.

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PROJETO DE LEI N.º 568/XIV/2.ª DEFINE OS PRINCÍPIOS GERAIS RESPEITANTES AO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE TÉCNICO

AUXILIAR DE SAÚDE

O Decreto-Lei n.º 231/92, de 21 de outubro, que regula as carreiras profissionais do pessoal dos serviços gerais dos estabelecimentos e serviços dependentes do Ministério da Saúde, definia, no seu artigo 2.º, as áreas de atuação do pessoal dos serviços gerais, para efeito de estruturação das carreiras profissionais, onde se incluía a «Ação Médica». As funções exercidas por estes profissionais encontravam-se devidamente descritas no Anexo II do referido diploma, que definia o conteúdo funcional das carreiras e categorias profissionais a que se referem os artigos 2.º e 3.º, não existindo quaisquer dúvidas em relação ao desempenho da profissão de Auxiliar de Ação Médica.

A Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, veio estabelecer novos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, prevendo, em particular, a revisão dos regimes dos corpos ou carreiras especiais. Neste processo, a categoria de Auxiliar de Ação Médica foi incluída nas carreiras gerais do Estado com o nome de Assistente Operacional, perdendo a autonomia que tinha anteriormente, equiparando os auxiliares de ação médica a outros profissionais do sector do Estado sem esta especialização.

O principal problema resultante da colocação dos técnicos auxiliares de saúde, vulgarmente designados por auxiliares de ação médica, numa categoria de carácter geral prende-se com o facto de não terem ficado definidos os conteúdos funcionais inerentes ao desempenho das suas funções, deixando ao livre arbítrio das chefias a designação das tarefas da sua competência e obrigação, o que provoca conflito entre os vários profissionais e que tem como consequência que aqueles acabem por desempenhar tarefas que não seriam da sua competência, colocando assim em causa a qualidade dos cuidados prestados e a segurança do doente.

Ora, o conteúdo funcional de um técnico auxiliar de saúde em nada se coaduna com o conteúdo funcional dos assistentes operacionais com os quais aquele grupo profissional foi equiparado, nem tão pouco os restantes assistentes operacionais, por exemplo, têm a formação e qualificação necessárias para o desempenho das funções alocadas aos técnicos auxiliares de saúde.

Esta situação, para além das consequências negativas que tem para os utentes, tem provocado enorme desgaste aos técnicos auxiliares de saúde.

Os técnicos auxiliares de saúde representam 20% dos profissionais que desempenham funções no Serviço Nacional de Saúde. Diariamente têm os mesmos constrangimentos, obrigações e riscos que os restantes profissionais de saúde, pelo que é essencial que tenham uma regulamentação laboral equivalente, quer na carga horária, quer no gozo de descansos, quer nas compensações laborais pelo trabalho por turnos, quer na definição das suas funções e competências.

Com o presente projeto de lei o PAN propõe que se dignifique esta profissão, regulamentando a carreira de Técnico Auxiliar de Saúde e definindo claramente as suas competências técnicas, a estrutura de carreira e as funções desempenhadas.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

CAPÍTULO I Disposições Gerais

Artigo 1.º Objeto

A presente lei procede à definição dos princípios gerais respeitantes ao exercício profissional dos técnicos

auxiliares de saúde, reconhecendo e regulamentando esta profissão.

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Artigo 2.º Âmbito

A presente lei aplica-se aos técnicos auxiliares de saúde que exerçam funções em entidades públicas,

entidades públicas empresariais e nas parcerias em saúde, em regime de gestão e financiamento privados, integradas no Serviço Nacional de Saúde, centros de dia e lares de idosos, com natureza pública ou privada, independentemente do tipo de vínculo laboral, sendo aplicável aos técnicos auxiliares de saúde em regime de contrato de trabalho em funções públicas ou com contrato individual de trabalho.

CAPÍTULO II Qualificações

Artigo 3.º

Natureza do nível habilitacional 1 – O nível habilitacional exigido para a carreira de Técnico Auxiliar de Saúde é o nível de qualificação 4

com o Código e Designação de Referencial de Formação 729281 – Técnico/a Auxiliar de Saúde. 2 – Podem ainda ingressar nesta carreira os candidatos que possuam o nível de qualificação 3 e tenham

obtido formação específica e com referencial reconhecido em técnico auxiliar de Saúde, acrescido de estágio profissional de pelo menos 6 meses.

3 – Os assistentes operacionais que, no momento da entrada em vigor da presente lei, exercem funções há pelo menos dois anos em entidades públicas, em entidades públicas empresariais e em parcerias em saúde, em regime de gestão e financiamento privados, integrados no SNS e em instituições inseridas na Rede Nacional de Cuidados Continuados, centros de saúde, centros de dia e lares de idosos são, independentemente do tipo de vínculo laboral, automaticamente reconhecidos como técnicos auxiliares de saúde.

Artigo 4.º

Qualificação de Técnico Auxiliar de Saúde 1 – A qualificação do Técnico Auxiliar de Saúde é estruturada em títulos de exercício profissional e tem por

base a obtenção das capacidades e conhecimentos adquiridos ao longo da formação, ou pela experiência profissional adquirida, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo anterior.

2 – Os títulos de exercício profissional serão emitidos pela Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional, IP, que serão emitidos após a consulta às unidades onde os requerentes desempenhem funções, e/ou contra a apresentação de certificado profissional descritos nos n.os 1 e 2 do artigo 3.º.

Artigo 5.º

Utilização do título No exercício e publicitação da sua atividade profissional, o técnico auxiliar de saúde deve sempre fazer

referência ao título detido.

CAPÍTULO III Carreira

Artigo 6.º

Exercício da profissão Os técnicos auxiliares de saúde têm uma atuação de complementaridade funcional relativamente aos

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demais profissionais de saúde, embora dotada de igual nível de dignidade e autonomia de exercício profissional.

Artigo 7.º

Áreas de exercício profissional 1 – A carreira de Técnico Auxiliar de Saúde organiza-se por áreas de exercício profissional e de cuidados

de saúde, tais como as áreas hospitalar e de saúde pública, bem como de cuidados primários, continuados, na comunidade, designadamente lares, Instituições particulares de solidariedade social, e centros de dia, e clínicas privadas, podendo vir a ser integradas de futuro, outras áreas.

2 – Cada área de exercício profissional tem formas de exercício adequadas à natureza da atividade que desenvolve, sendo objeto de definição em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

Artigo 8.º

Categorias 1 – A carreira de Técnico Auxiliar de Saúde estrutura-se nas seguintes categorias: a) Técnico Auxiliar de Saúde; b) Técnico Auxiliar de Saúde Principal. 2 – Os rácios dos Técnicos Auxiliares de Saúde Principais na organização dos serviços, estruturados

conforme a carreira aprovada pela presente lei e desenvolvidos em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, são estabelecidos em diploma próprio, no prazo máximo de 90 dias após a publicação da presente lei.

Artigo 9.º

Deveres funcionais Os trabalhadores integrados na carreira de Técnico Auxiliar de Saúde devem exercer a sua profissão com

autonomia técnica e respeitando o direito à proteção da saúde dos utentes e da comunidade, e estão sujeitos, para além da observância do dever de sigilo profissional, ao cumprimento dos seguintes deveres:

a) O dever de contribuir para a defesa dos interesses do utente no âmbito da organização das unidades e

serviços, incluindo a necessária atuação interdisciplinar, tendo em vista a continuidade e garantia da qualidade da prestação de cuidados;

b) O dever de esclarecer devidamente o utente sobre os cuidados a prestar e prestados, na medida das suas competências, assegurando a efetividade do consentimento informado.

Artigo 10.º

Conteúdo funcional da categoria de Técnico Auxiliar de Saúde 1 – O conteúdo funcional da categoria de Técnico Auxiliar de Saúde é inerente às respetivas qualificações

e competências, compreendendo plena autonomia técnica, nomeadamente, quanto a: a) Ajudar o utente total ou parcialmente independente nas necessidades de eliminação e nos cuidados de

higiene e conforto de acordo com orientações de um técnico superior de saúde (médico, enfermeiro ou técnico superior de diagnóstico e terapêutica);

b) Auxiliar o enfermeiro na prestação de cuidados de eliminação, nos cuidados de higiene e conforto ao utente total ou parcialmente dependente e na realização de tratamentos;

c) Auxiliar o enfermeiro na prestação de cuidados ao utente que vai fazer ou fez uma intervenção cirúrgica; d) Auxiliar nas tarefas de alimentação e hidratação do utente, nomeadamente na preparação de refeições

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ligeiras ou suplementos alimentares e no acompanhamento durante as refeições; e) Executar tarefas que exijam uma intervenção imediata e simultânea ao alerta do profissional de saúde

dentro das suas competências; f) Auxiliar o enfermeiro na transferência, posicionamento e transporte do utente, que necessita de ajuda

total ou parcial (de acordo com orientações clínicas do serviço); g) Assegurar a recolha, transporte, triagem e acondicionamento de roupa da unidade do utente, de acordo

com as normas e/ou procedimentos definidos; h) Executar a limpeza e higienização das instalações/superfícies da unidade do utente, e de outros

espaços específicos, de acordo com norma e/ou procedimentos definidos; i) Efetuar a lavagem e desinfeção de material hoteleiro, material clínico e material de apoio clínico em

local próprio, de acordo com as normas e/ou procedimentos definidos; j) Assegurar o transporte, o armazenamento e conservação de material hoteleiro, material de apoio clínico

e não clínico de acordo com normas e/ou procedimentos definidos; k) Efetuar a lavagem (manual e mecânica) e desinfeção química, em local apropriado, de equipamentos do

serviço, de acordo com normas e/ou procedimentos definidos; l) Recolher, lavar e acondicionar os materiais e equipamentos utilizados na lavagem e desinfeção, de

acordo com normas e/ou procedimentos definidos, para posterior recolha de serviço interna ou externa; m) Assegurar a recolha, triagem, transporte e acondicionamento de resíduos hospitalares, garantindo o

manuseamento e transporte adequado dos mesmos de acordo com procedimentos definidos; n) Efetuar a manutenção preventiva e reposição de materiais e equipamentos; o) Efetuar o transporte de informação entre as diferentes unidades e serviços de prestação de cuidados de

saúde; p) Encaminhar os contactos telefónicos de acordo com normas e/ou procedimentos definidos; q) Encaminhar o utente, familiar e/ou cuidador, de acordo com normas e/ou procedimentos definidos; r) Auxiliar o médico ou enfermeiro na recolha de amostras biológicas e o seu transporte para o serviço

adequado, de acordo com normas e/ou procedimentos definidos; s) Colaborar no processo de desenvolvimento de competências de estagiários; t) Orientar as atividades de formação de estudantes e/ou estagiários do curso Técnico Auxiliar de Saúde

em contexto académico ou profissional; u) Integrar júris de concursos ou outras atividades de avaliação, dentro da sua área de competência; v) Assessorar as instituições, serviços e unidades, nos termos da respetiva organização interna; w) Desenvolver métodos de trabalho com vista à melhor utilização dos meios, promovendo a circulação de

informação, bem como a qualidade e a eficiência; x) Recolher, registar e efetuar tratamento e análise de informação relativa ao exercício das suas funções,

incluindo aquela que seja relevante para os sistemas de informação institucionais na área da saúde; y) Promover programas e projetos de informação relativos ao desempenho da profissão, nacionais ou

internacionais, bem como participar em equipas e/ou orientá-las. 2 – O desenvolvimento do conteúdo funcional previsto nas alíneas s) e t) cabe apenas a profissionais

detentores de competência pedagógica certificada. 3 – O desenvolvimento do conteúdo funcional previsto nas alíneas u), v) e x) cabe apenas a profissionais

detentores da categoria de Técnico Auxiliar de Saúde Principal.

Artigo 11.º Conteúdo funcional da categoria de Técnico Auxiliar de Saúde Principal

Para além das funções inerentes à categoria de Técnico Auxiliar de Saúde, o conteúdo funcional da

categoria de Técnico Auxiliar de Saúde Principal é sempre integrado na gestão do processo de prestação de cuidados de saúde, e indissociável da mesma, e compreende, nomeadamente:

a) Planear e incrementar ações e métodos de trabalho que visem a melhoria da qualidade dos cuidados

prestados, procedendo à definição ou utilização de indicadores e respetiva avaliação, bem como à

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coordenação de equipas de técnicos auxiliares de saúde; b) Coordenar funcionalmente o grupo de técnicos auxiliares de saúde do serviço ou de equipa da unidade

funcional, em função da organização do trabalho; c) Supervisionar, planear, programar e avaliar o trabalho da respetiva equipa, decidindo sobre afetação de

meios; d) Identificar as necessidades de recursos humanos, articulando com a equipa a sua adequação às

necessidades previstas, nomeadamente através da elaboração de horários e de planos de trabalho e férias; e) Exercer funções executivas, designadamente integrar órgãos de gestão, ou de assessoria, e participar

nos processos de contratualização; f) Determinar as necessidades de recursos humanos, designadamente em função dos níveis de

dependência ou outros indicadores, bem como de materiais, em quantidade e especificidade, nos serviços e/ ou nas unidades do seu departamento, ou conjunto de serviços ou unidades;

g) Elaborar o plano de ação e relatório anual referentes à atividade dos técnicos auxiliares de saúde do departamento ou conjunto de serviços ou unidades e participar na elaboração de planos de ação e respetivos relatórios globais do departamento ou conjunto de serviços ou unidades.

Artigo 12.º

Condições de admissão 1 – O exercício de funções no âmbito da carreira de Técnico Auxiliar de Saúde depende da obtenção do

título profissional atribuído em cumprimento do disposto no artigo 4.º da presente lei. 2 – Para admissão à categoria de Técnico Auxiliar de Saúde Principal são exigidos, cumulativamente, a

detenção do título profissional e um mínimo de cinco anos de experiência efetiva no exercício da profissão ou, na ausência deste tempo, a apresentação de curriculum relevante, nomeadamente no que concerne a formação em gestão de equipas e de métodos pedagógicos.

Artigo 13.º

Recrutamento 1 – O recrutamento para os postos de trabalho sujeitos ao regime do Código do Trabalho, correspondentes

à carreira de Técnico Auxiliar de Saúde, incluindo mudança de categoria, é feito mediante processo de seleção em observância do disposto no artigo anterior.

2 – Os requisitos de candidatura e a tramitação do processo de seleção previstos no número anterior são regulados por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

Artigo 14.º

Remunerações e posições remuneratórias As posições remuneratórias e as remunerações dos trabalhadores integrados na carreira de Técnico

Auxiliar de Saúde são fixadas em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

Artigo 15.º Reconhecimento de títulos e categorias

1 – Os títulos atribuídos pela Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional, IP, no âmbito

da profissão de Técnico Auxiliar de Saúde, bem como as categorias de carreira, são oponíveis para a elegibilidade necessária aos procedimentos de recrutamento e mudança de categoria previstos nas normas aplicáveis.

2 – Os títulos de profissionais provenientes dos estados membros da União Europeia, carecem de verificação com a entidade emissora dos mesmos no país de origem.

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CAPÍTULO IV Disposições Finais

Artigo 16.º

Regulamentação No prazo máximo de 90 dias após a publicação da presente lei, o Governo procederá à regulamentação da

presente Lei, mediante prévio diálogo e concertação com os parceiros sociais.

Artigo 17.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação. Assembleia da República, 10 de outubro de 2020.

As Deputados e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês De Sousa Real — Nelson Basílio Silva.

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PROPOSTA DE LEI N.º 62/XIV/2.ª DETERMINA A OBRIGATORIEDADE DO USO DE MÁSCARA PARA O ACESSO OU PERMANÊNCIA NOS ESPAÇOS E VIAS PÚBLICAS E A OBRIGATORIEDADE DA UTILIZAÇÃO DA APLICAÇÃO

STAYAWAY COVID

Exposição de motivos

A situação epidemiológica que se verifica em Portugal em resultado da pandemia da doença COVID-19 tem justificado a adoção pelo Governo de várias medidas com o intuito de prevenção, contenção e mitigação da transmissão da infeção.

Atualmente, o Governo entende que se justifica declarar novamente a situação de calamidade, mantendo-se a necessidade, por razões de saúde pública, de se observarem regras de ocupação, permanência e distanciamento físico, bem como regras de higiene.

Mantendo como prioridade o combate à pandemia, é fundamental garantir que, quando se verifique uma concentração de pessoas em determinados lugares da via pública que obste ao cumprimento do distanciamento físico recomendado, se proceda ao uso de máscara ou viseira, por forma conter a transmissão do vírus e a expansão da doença COVID-19, garantindo a segurança de todos os portugueses.

Concomitantemente, a importância das ferramentas digitais como meio complementar e de reforço da atividade de interrupção de cadeias de transmissão do vírus já sublinhada pela Organização Mundial da Saúde e pela Comissão Europeia, recomenda o desenvolvimento e a utilização de aplicações móveis de notificação da exposição individual a fatores de risco.

Com efeito, o Governo procedeu à aprovação do Decreto-Lei n.º 52/2020, de 11 de agosto, o qual estabeleceu o responsável pelo tratamento dos dados e regulou a intervenção do médico no sistema Stayaway COVID. A utilização de um sistema digital de identificação e notificação de fatores de risco — em função da proximidade física e da duração do contacto com doentes COVID-19 — como medida complementar da estratégia nacional de resposta à pandemia de COVID-19.

Assim, tendo em conta todos estes fatores, o Governo aprovou uma proposta de lei que estabelece a obrigatoriedade do uso de máscara na via pública, sempre que for impraticável a manutenção do distanciamento físico recomendável, e estabelece a obrigatoriedade de utilização da aplicação móvel

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Stayaway COVID, em contexto laboral ou equiparado, escolar, académico, nas forças armadas e de segurança, e na Administração Pública.

Por fim, ao estabelecimento de deveres de obrigatoriedade de uso de máscara e de utilização da aplicação móvel Stayaway COVID associam-se disposições que visam assegurar a sua adoção, tornando-se essencial estabelecer relação com um regime sancionatório que assegure o escrupuloso cumprimento, pela população, das medidas que são indispensáveis à contenção da infeção.

Considerando que algumas das medidas cuja adoção se afigura como necessária integram reserva de competência da Assembleia da República, o Governo apresenta a presente proposta de lei.

Assim: Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da

República a seguinte proposta de lei, com pedido de prioridade e urgência:

Artigo 1.º Objeto

A presente lei determina a obrigatoriedade do uso de máscara ou viseira para o acesso ou permanência

nos espaços e vias públicas e a obrigatoriedade da utilização da aplicação Stayaway COVID em contexto laboral ou equiparado, escolar e académico.

Artigo 2.º

Âmbito territorial A presente lei aplica-se em todo o território nacional.

Artigo 3.º Uso de máscara ou viseira

1 – É obrigatório o uso de máscara ou viseira a pessoas com idade superior a 10 anos para o acesso,

circulação ou permanência nos espaços e vias públicas sempre que o distanciamento físico recomendado pela Autoridade de Saúde Nacional se mostre impraticável.

2 – A obrigatoriedade referida no número anterior é dispensada mediante a apresentação de: a) Atestado médico de incapacidade multiusos ou declaração médica, no caso de se tratar de pessoas

com deficiência cognitiva, do desenvolvimento e perturbações psíquicas; b) Declaração médica que ateste que a condição clínica da pessoa não se coaduna com o uso de

máscaras. 3 – A obrigatoriedade referida no n.º 1 é, ainda, dispensada quando, o uso de máscara ou viseira seja

incompatível com a natureza das atividades que as pessoas se encontrem a realizar.

Artigo 4.º Aplicação Stayaway COVID

1 – É obrigatória, no contexto laboral ou equiparado, escolar e académico, a utilização da aplicação

Stayaway COVID pelos possuidores de equipamento que a permita. 2 – O disposto no número anterior abrange em especial os trabalhadores em funções públicas,

funcionários e agentes da Administração Pública, incluindo o setor empresarial do Estado, regional e local, profissionais das Forças Armadas e de forças de segurança.

3 – O utilizador da aplicação Stayaway COVID que tenha um caso confirmado de COVID-19, nos termos definidos pela DGS, deve proceder à inserção na referida aplicação do código de legitimação pseudoaleatório previsto neste sistema, que deve figurar do relatório que contenha o resultado do teste laboratorial de

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diagnóstico.

Artigo 5.º Fiscalização

A fiscalização do cumprimento das obrigações previstas na presente lei compete à Guarda Nacional

Republicana, à Polícia de Segurança Pública, à Polícia Marítima e às polícias municipais.

Artigo 6.º Regime contraordenacional

O incumprimento dos deveres estabelecidos nos artigos anteriores constitui contraordenação nos termos

previstos no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 28-B/2020, de 26 de junho, na sua redação atual.

Artigo 7.º Direito subsidiário

Em tudo o que se não se encontre previsto na presente lei aplica-se subsidiariamente o regime

contraordenacional previsto no Decreto-Lei n.º 28-B/2020, de 26 de junho, na sua redação atual, e o regime geral do ilícito de mera ordenação social, constante do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, na sua redação atual.

Artigo 8.º

Entrada em vigor A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação. Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 14 de outubro de 2020.

O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa — O Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 649/XIV/2.ª (*) RECOMENDA AO GOVERNO QUE ADOTE OS PROCEDIMENTOS ATINENTES A ASSEGURAR A

CONSAGRAÇÃO DO CRIME DE ECOCÍDIO NA LISTA DE CRIMES PREVISTOS NO ESTATUTO DE ROMA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Exposição de motivos

A COVID-19 veio demonstrar que a forma como nos relacionamos com a natureza é insustentável e nos expõe a perigos de saúde e a custos económicos que põem em causa a vida como a conhecemos. As Nações Unidas, em reação à presente crise sanitária COVID-19 declararam que «no final do dia, a saúde das pessoas e a saúde do planeta estão intimamente relacionadas». A Organização das Nações Unidas para o ambiente afirma também que a atividade humana alterou todos os cantos do planeta, de terra ao oceano e que, à medida que continuamos a invadir incansavelmente a natureza e a degradar os ecossistemas, colocamos em risco a saúde humana, salientando que 75% de todas as doenças infeciosas emergentes são zoonóticas, ou seja, vírus originários da transferência de animais para humanos, decorrente da forma como exploramos e

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depredamos a natureza, enquanto espécie. Têm vindo a ser praticados vários crimes sobre os ecossistemas e, bem assim, sobre a exploração de

recursos naturais, destruindo de forma impune. São exemplo disso a desflorestação da Amazónia, para fins económicos relacionados com explorações agrícolas e pecuárias e, na Ásia, a destruição de vastos habitats para a exploração de óleo de palma; a «grande porção de lixo no Pacífico» que consiste numa ilha rodopiante de 100 milhões de toneladas de pedaços de plástico e tampas de garrafas; os impactos de cinquenta anos de extração de petróleo no delta do Níger, que causaram um desastre ecológico; no Equador, a Chevron, despejou milhões de toneladas de petróleo bruto e águas residuais tóxicas na amazónia ao longo de duas décadas, criando uma lagoa oleosa no local de produção de petróleo de Guanta, perto da cidade de Lago Agrio.

Voltando à destruição da Amazónia – um estabilizador fundamental do sistema climático global e habitat de uma vasta biodiversidade – pela extração de madeira, mineração, plantio e produção de carne poderá transformá-la, a curto prazo, numa savana e condenar espécies que já se encontram em vias de extinção, desde mamíferos, peixes, aves e anfíbios.

Já sobre a emergente indústria de extração de minerais em mar profundo, biólogos marinhos e cientistas ambientais preveem que a mineração de ouro, prata e cobre no fundo do mar poderá ser o próximo grande desastre ecológico. O frágil ecossistema marinho do fundo do mar é uma fronteira sobre a qual sabemos muito pouco e que poderá ter sérias implicações no sistema terrestre tendo em conta o papel fundamental dos oceanos como sumidouro de carbono e fonte de biodiversidade.

Todos os atos que prejudiquem o equilíbrio dos limites planetários têm consequências diretas nos ecossistemas, na vida humana e nos animais que o planeta acolhe. O sistema terrestre é um bem comum que não deve poder ser destruído por alguns em prejuízo de todos os outros.

A Stockholm Resilience Centre (adiante SRC)1 – um centro internacional de investigação multidisciplinar no domínio dos sistemas socioecológicos, isto é, sistemas nos quais os seres humanos e a natureza são estudados como constituindo um todo integrado – tem apontado a necessidade da abordagem ao «sistema terrestre» ser integrada. O «sistema terrestre» corresponde aos processos físicos, químicos e biológicos que interagem com o planeta e inclui a terra, oceanos, atmosfera, polos e os ciclos naturais do planeta – carbono, água, azoto, fósforo, enxofre entre outros. A SRC definiu os «limites planetários», um conceito que envolve limites ambientais, nas vertentes das alterações climáticas, da biodiversidade, do uso do solo, da acidificação dos oceanos, do uso de água potável, dos processos biogeoquímicos, da concentração de ozono e aerossóis na atmosfera e da poluição química. O objetivo da definição dos referidos «limites planetários» possibilitou estipular um «espaço operacional seguro para a humanidade» como pré-condição para o desenvolvimento sustentável. De acordo com as evidências científicas, as ações humanas, desde a Revolução Industrial, tornaram-se no principal motor das mudanças ambientais globais. De acordo com os cientistas que definiram estes conceitos, «transgredir um ou mais limites planetários pode ser prejudicial ou até catastrófico devido ao risco de cruzar limiares que desencadearão mudanças ambientais abruptas não lineares em sistemas de escala continental a planetária», alterando a vida na Terra, tal como a conhecemos. Desde 2009, quatro dos nove limites planetários já foram ultrapassados, nomeadamente, as alterações climáticas, a perda de biodiversidade, o uso do solo e os processos biogeoquímicos, enquanto que os restantes correm um risco iminente de serem ultrapassados.

No que se refere às alterações climáticas, o cenário é dramático. Em agosto de 2020 atingimos já 414 partes por milhão (ppm) de dióxido de carbono na atmosfera2 . O incremento anual tem sido superior a 2 ppm. O Intergovernmental Panel on Climate Change (adiante IPCC)3 aponta as 450 ppm como o nível de concentração máximo que conduzirá ao aquecimento médio de 2 graus centígrados, valor acima do qual se perde a estabilidade climática que temos conhecido nos últimos anos e entramos numa fase de impactos catastróficos para a vida no planeta. Contudo, tal como reconhecido já pelo IPCC, os efeitos de «autoalimentação climática», como o degelo do permafrost, a desflorestação da amazónia e o degelo dos glaciares, entre outros, que se previa que tivessem início numa fase mais adiantada do aquecimento global, já

1 Dados disponíveis em: https://www.stockholmresilience.org/research/planetary-boundaries.html 2 https://climate.nasa.gov/vital-signs/carbon-dioxide/ 3 https://www.ipcc.ch

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começaram. Em 2018, foi publicado um estudo de cientistas da SRC4 (Trajectories of the Earth System in the Anthropocene) que veio revelar que, afinal, tendo em conta os efeitos de «autoalimentação climática», o montante de concentração de CO2 e na atmosfera não pode ultrapassar as 430 partes por milhão, para garantir que não excedemos a barreira dos 2 graus centígrados. Ao atual ritmo de emissões (mais de 2 ppm por ano) tal significa que hoje temos menos de 8 anos para garantir a nossa sobrevivência neste planeta. É altamente improvável não ultrapassarmos a barreira do 2ºC sem uma alteração profunda e imediata do nosso modo de vida, a nível global, incluindo os atuais modelos globais de governação dos bens comuns (limites planetários), e sem a utilização de tecnologias de captura e armazenamento de CO2 (CCS – Carbon Capture and Storage5).

Voltando onde começamos, a COVID-19 permitiu-nos um primeiro vislumbre do que poderá ser o nosso futuro se não agirmos de forma imediata e assertiva na forma como lidamos com a natureza, com a biodiversidade e com as alterações climáticas 6.

Estamos a menos de 8 anos do ponto de não retorno ao nível da estabilidade climática mundial. A questão do ponto de não retorno é de extrema importância. Depois de atingirmos uma determinada concentração de gases com efeito de estufa, o que se prevê não é positivo: eventos climáticos extremos, como cheias, furacões, secas, incêndios florestais, subida do nível do mar, escassez de água potável, desertificação de extensos territórios, disseminação de doenças, entre outros efeitos que nos parecem inimagináveis. Sobre a disseminação de doenças os cientistas preveem que ocorra via as atuais doenças tropicais mais a norte do globo e mais a sul (consoante os hemisférios) e também por via dos milhares de vírus e bactérias que estão inativos nas terras congeladas do Ártico (permafrost), terras essas que estão já a descongelar 7.

Do ponto de vista económico, como já reiteradamente tem sido afirmado por entidades como a OCDE e o Banco Mundial, o custo de não reduzir emissões de gases com efeito de estufa é muito superior ao custo da redução de emissões, seja pelos custos de resposta às diferentes catástrofes provocadas pelas alterações climáticas seja pelos custos da adaptação dos territórios às mesmas.

Mais, face ao eminente colapso dos limites planetários, importa perceber como é que cá chegámos, que fatores estão a contribuir mais para as alterações climáticas quem mais sofrerá com o impacto das alterações climáticas e o que poderemos ainda fazer.

Entre a década de 50 e o final dos anos 80, atingimos as 350 partes por milhão de dióxido de carbono na atmosfera, valor limite do que é considerado o «espaço seguro para a humanidade», o acréscimo anual da concentração de CO2 na atmosfera foi de cerca de 1,2 partes por milhão. Desde então e até ao ano 2000, o acréscimo anual da concentração de CO2 na atmosfera acelerou para 1,6 partes por milhão. Na primeira década do século XXI assistimos a um acréscimo anual de concentração de CO2 de 2,1 partes por milhão. Continuamos a acelerar as emissões de gases com efeito de estufa na última década. Entre 2010 e 2015 tivemos um acréscimo anual de 2,4 partes por milhão e, entre 2015 e 2019, o acréscimo anual foi de 2,5 partes por milhão. Estes números demonstram bem que, até agora, o mundo tem sido incapaz de travar o acréscimo de emissões e evitar esta catástrofe global.

O Banco Mundial estima que as alterações climáticas, até 2050, irão criar mais de 140 milhões de migrantes de zonas da África, América Latina e Sul da Ásia.

Em junho de 2019, as Nações Unidas apresentaram um relatório, sobre direitos humanos, no qual evidenciavam «a distribuição desigual dos impactos das alterações climáticas nas regiões em desenvolvimento e regiões desenvolvidas coloca o mundo em risco de ‘apartheid climático’, no qual ‘os ricos pagam para escapar ao sobreaquecimento, fome e conflito enquanto que o resto do mundo sofre.’»

A situação em que o planeta se encontra é injusta e irracional. Irracional porque não defendemos o bem mais precioso que é a vida e irracional porque mesmo do ponto de vista económico representará uma perda para todos, como já repetidamente alertado pela OCDE, injusta porque será uma catástrofe especialmente sentida por quem menos para ela contribuiu.

O atrás exposto visa fundamentar que uma das mudanças que urge fazer, de forma a desincentivar a

4 https://www.pnas.org/content/115/33/8252 5 Dados disponíveis na seguinte ligação: http://www.ccsassociation.org/what-is-ccs/ 6 Dados disponíveis na seguinte ligação: https://www.theguardian.com/world/2020/apr/27/halt-destruction-nature-worse-pandemics-top-scientists?CMP=share_btn_tw 7 http://www.bbc.com/earth/story/20170504-there-are-diseases-hidden-in-ice-and-they-are-waking-up

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destruição de ecossistemas, é a consagração do crime de ecocídio, no âmbito do Estatuto de Roma8. Esta temática encontra-se, inclusive, já em debate pela sociedade civil e em discussão no próprio TPI9. O tribunal penal internacional (TPI) é o primeiro tribunal internacional permanente e baseado num tratado

(o Estatuto de Roma, adotado a 17 de julho de 1998 por uma Conferência Diplomática reunida para o efeito) criado com o objetivo de julgar sujeitos individuais pela prática dos mais graves crimes internacionais: genocídio, crimes contra a Humanidade e crimes de guerra. Constitui uma organização independente da Organização das Nações Unidas (ONU), embora tenha ligação: o projeto de Estatuto do TPI foi preparado pela Comissão de Direito Internacional e apresentado à Assembleia Geral da ONU em 1994, tendo sido a Assembleia Geral que instituiu o Comité Ad Hoc (1994) e o Comité Preparatório (1995) sobre o Estabelecimento de um Tribunal Penal Internacional.

O Estatuto de Roma entrou em vigor a 1 de julho de 2002, ao atingir a 60.ª ratificação, tendo o seu primeiro julgamento tido início a 26 de janeiro de 2009. A 11 de junho de 2010, a Conferência de Revisão do Estatuto de Roma (realizada em Kampala, Uganda) adotou, por consenso, uma emenda ao Estatuto com uma definição do crime de agressão e estabelecendo o regime de acordo com o qual o Tribunal exercerá jurisdição sobre este crime. A Conferência de Estados Partes deliberou, a 14 de dezembro de 2017, uma vez atingida a 30.ª ratificação desta emenda, ativar a jurisdição do TPI sobre o crime de agressão, com efeitos a partir de 17 de julho de 2018.

Com o presente projeto de resolução o PAN pretende que o Governo Português apresente uma proposta de alteração ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional e que assegure a consagração do crime de ecocídio na lista de crimes que figura no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

A proposta de inclusão do crime de ecocídio no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, ao abrigo do disposto no artigo 121.º do Estatuto, poderá ser realizada por qualquer estado parte da convenção, mediante o envio do texto das proposta de alteração ao Secretário-Geral da ONU, que o comunicará a todos os Estados Partes, que no âmbito da Assembleia dos Estados Partes decidirá, por maioria dos seus membros presentes e votantes, se deverá examinar a proposta, sendo que caso se decida pelo exame da proposta a sua adoção ocorrendo a adoção exigirá a maioria de dois terços dos Estados Partes, quando não for possível chegar a um consenso.

O enquadramento do crime de ecocídio no direito penal internacional, que o PAN agora quer que a Assembleia da República defenda junto do Governo, ainda que no atual contexto de emergência climática assuma uma importância crucial, a verdade é que não é uma discussão nova.

Em 1972, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, conhecida como Conferência de Estocolmo, abordou, pela primeira vez, o tema do crime internacional de ecocídio. Olof Palme, Primeiro-Ministro Sueco, alertou para o uso massivo de produtos químicos e de bulldozers na Guerra do Vietname e instou os estados a que urgentemente debatessem, de forma aprofundada, este tema. Nesta ocasião Indira Gandhi, representante da India, defendeu que a destruição de ecossistemas deveria ser considerada um crime contra a humanidade.

Nos anos 80, a Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas chegou a incluir o crime ambiental no Projeto de Código de Crimes Contra a Paz e a Segurança da Humanidade, que mais tarde se tornaria o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, tendo inclusivamente existido algumas versões posteriores que foram ao ponto de afirmar que o crime de ecocídio poderia ser estabelecido independentemente da intenção do agressor de causar danos ambientais. Contudo, apesar do apoio de muitos países, o crime internacional de ecocídio acabou por não ficar expressamente consagrado no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, que apenas prevê a punição no âmbito dos crimes de guerra para os casos em que é lançado intencionalmente um ataque, sabendo que o mesmo causará danos prejuízos extensos, duradouros e graves no meio ambiente que se revelem claramente excessivos em relação à vantagem militar global concreta e direta que se previa.

Nos últimos anos várias têm sido as vozes favoráveis à consagração do crime de ecocídio no âmbito do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Em 2010, Polly Higgins apresentou uma proposta de alteração ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, que assegurava a consagração do crime de ecocídio no âmbito do elenco de crimes referidos no artigo 5.º, definindo-o como a «degradação parcial ou

8 http://gddc.ministeriopublico.pt/instrumento/estatuto-de-roma-do-tribunal-penal-internacional-22 9 https://asp.icc-cpi.int/iccdocs/asp_docs/ASP18/ASP18.Journal.29Nov19-ENG.pdf#search=ecocide

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total dos ecossistemas, por parte do homem ou de outras causas, que diminui significativamente o aproveitamento do território pelos habitantes». Em 2019, o Papa Francisco defendeu, no âmbito do 20.º Congresso da The International Association of Penal Law, afirmou o seu apoio público à consagração do crime de ecocídio na lista de crimes internacionais contra a paz constantes do referido artigo 5.º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, afirmando que «um sentido elementar de justiça implicaria que alguns comportamentos, dos quais as empresas são geralmente responsáveis, não fiquem impunes» e apelou «a todos os líderes e representantes do sector que contribuam para garantir a proteção adequada da nossa casa comum». Mais recentemente, em dezembro de 2019, na 18.ª sessão da Assembleia dos Estados Partes do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, os Estados de Vanuatu e das Maldivas solicitaram à comunidade internacional que ponderassem de forma séria o acréscimo do crime de ecocídio ao elenco de crimes internacionais previstos no Estatuto.

Portugal deve ter um papel na consagração do crime internacional de ecocídio, e a Assembleia da República pode marcar uma posição nesse processo. Tal consagração garantirá, ainda, um dever de diligência no sentido de que a comunidade internacional, os Estados, o poder político e as empresas deverão impedir o risco ou a danificação extensiva, destruição ou perda de ecossistemas e velar pela sua proteção.

Nestes termos e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, propõe-se que a Assembleia da República recomende ao Governo que adote os procedimentos atinentes a assegurar a consagração do crime de ecocídio na lista de crimes previstos no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

Palácio de São Bento, 13 de outubro de 2020.

As Deputadas e o Deputado do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.

(*) Título e texto iniciais substituídos a pedido do autor a 14 de outubro de 2020 [Vide DAR II Série-A n.º 4 (2020.09.22)].

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 719/XIV/2.ª REABERTURA DAS URGÊNCIAS E REFORÇO DO HOSPITAL DR. FRANCISCO ZAGALO, EM OVAR

O Hospital Dr. Francisco Zagalo, em Ovar, é um hospital que presta um incomparável serviço de proximidade à população do Município de Ovar e também aos residentes nos municípios limítrofes.

É considerado um hospital de excelência em especialidades como a Medicina Interna, Pediatria, Cardiologia, Dermatologia, Medicina Física e Reabilitação, Cirurgia, Ortopedia, Urologia, Otorrinolaringologia e Oftalmologia, contando ainda com uma grande variedade de MCDT (meios complementares de diagnóstico e terapêutica), para além do bloco operatório.

O Bloco de Esquerda apresentou, na anterior Legislatura, um projeto de resolução que previa o reforço do Hospital Dr. Francisco Zagalo, em Ovar, nomeadamente através da sua reabilitação e do seu reforço com a reabertura do serviço de urgências.

Esse projeto, que infelizmente continua atual, foi aprovado, à época, no dia 21 de dezembro de 2018, contando apenas com a abstenção do Partido Socialista.

Acontece que, passados quase dois anos, o Hospital de Ovar continua sem qualquer intervenção e o governo do Partido Socialista continua sem ter uma resposta eficaz para o reforço de uma unidade essencial no distrito de Aveiro.

Importa lembrar que esta unidade – assim como todo o Serviço Nacional, incluindo os cuidados de saúde primários do concelho de Ovar – teve e continua a ter um papel fundamental na resposta à pandemia, principalmente durante o período em que o concelho de Ovar enfrentou um cerco sanitário como medida de combate à COVID-19. O SNS, o Hospital Francisco Zagalo e os centros de saúde, ao contrário de unidades

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privadas, não encerraram portas e os seus profissionais nunca viraram a cara à luta. A resposta à população esteve sempre garantida e podia ter respondido de forma mais eficaz tivesse o Governo cumprido com o projeto aprovado pelo Bloco em 2018.

Mas existem necessidades para além da resposta à pandemia, e esta unidade continua à espera do investimento necessário, já aprovado e recomendado pela Assembleia da República e mais do que uma vez prometido pelo Governo.

O Hospital Dr. Francisco Zagalo carece de uma intervenção importante no bloco operatório, de forma a alcançar as condições técnicas e de segurança para um melhor e mais seguro serviço. É também essencial recuperar o serviço de urgência encerrado pelo governo PS de 2007, medida que obrigou a população do concelho a recorrer ao Hospital de São Sebastião, saturado e com tempos de resposta insatisfatórios.

O que é necessário é o reforço do financiamento, a autonomia de contratação de forma a responder às necessidades e um maior investimento nos equipamentos e nas infraestruturas. O Bloco de Esquerda quer um Serviço Nacional de Saúde reforçado e com maior capacidade de resposta, capaz de retomar a atividade mesmo em contexto de pandemia, que sirva melhor as populações e que tenha os recursos necessários para aumentar a qualidade.

Para isso é preciso rejeitar, de forma clara, tentações de concentração de serviços em mega unidades gestionárias que não tem nenhum objetivo de investimento. É preciso a melhoria dos serviços atuais e a abertura de novas valências e de respostas de proximidade.

A Assembleia da República deve voltar a pronunciar-se a favor destes investimentos no Hospital de Ovar, uma vez que a realidade veio evidenciar ainda mais a pertinência e importância dos mesmos. O Governo, que não cumpriu com resoluções anteriores da Assembleia da República, deve ser instado a atuar de uma vez por todas no sentido de reabrir o serviço de urgências, de executar as obras no bloco operatório deste hospital, de aumentar o orçamento e a autonomia de gestão e de proceder a um investimento que permita uma maior internalização e uma maior resposta na área dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica no Hospital Dr. Francisco Zagalo e no concelho de Ovar.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Avance com as obras necessárias no bloco operatório do Hospital Dr. Francisco Zagalo, em Ovar, com

o objetivo de aumentar a capacidade e a qualidade de resposta; 2 – Proceda à reabertura do serviço de urgência no Hospital Dr. Francisco Zagalo, dotando-o dos

necessários meios complementares de diagnóstico e terapêutica de forma a garantir a qualidade e o bom funcionamento do serviço;

3 – Aumente as transferências para o Hospital Dr. Francisco Zagalo, possibilitando a aquisição de equipamentos e contratação de profissionais e garanta a autonomia do mesmo, nomeadamente para realização de investimento e contratações;

4 – Invista no Hospital Francisco Zagalo e no Centro de Saúde de Ovar com o objetivo de internalização de meios complementares de diagnóstico e terapêutica no SNS, integrando níveis de cuidados e aumentando as respostas do SNS à população.

Assembleia da República, 14 de outubro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Moisés Ferreira — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 720/XIV/2.ª RECOMENDA AO GOVERNO A CRIAÇÃO DE UM PLANO NACIONAL DE COMBATE À ANEMIA

A anemia é definida como uma condição que ocorre quando os níveis de hemoglobina ou de glóbulos vermelhos atingem valores abaixo daquilo que é considerado clinicamente normal. É uma doença que pode ocorrer devido a défices nutricionais ou por fatores hereditários.

Perdas de sangue por hemorragia, gastrites associadas a anti-inflamatórios, úlceras ou lesões oncológicas no sistema digestivo podem ser fatores gatilho para esta condição que afeta 1 em cada 5 adultos em Portugal. Outras situações podem estar na causa do desenvolvimento de uma anemia, como, por exemplo, uma dieta pobre e desequilibrada.

Tendo como sintomas a falta de força e o cansaço, palidez, dores de cabeça ou tonturas, a anemia é muitas vezes confundida com situações de fadiga, o que pode protelar a procura de cuidados de saúde e, consequentemente, retardar o diagnóstico da mesma.

Embora seja, por norma, relativamente fácil de diagnosticar e tratável, na eventualidade de evoluir sem tratamento, poderá agravar outros problemas de saúde, nomeadamente a insuficiência cardíaca.

A nível mundial, as anemias podem ter diversas razões, sendo a mais comum a anemia ferropénica (cerca de 90% dos casos). É estimado que 4 a 5 mil milhões de pessoas podem sofrer da falta deste nutriente essencial e afeta cerca de 15% da população mundial.

Nos países mais desenvolvidos cerca de 9,1% da população é afetada pela doença, o que se traduz em 111 milhões de pessoas afetadas.

Em Portugal, a prevalência da doença é de cerca de 20% de toda a população, ou seja, 1 em cada 5 adultos sofre de anemia. Visto que a média dos países desenvolvidos é de cerca de 9%, podemos constatar que Portugal duplica esse número, e por isso, é classificado como um problema de saúde pública.

Para além de em Portugal o índice de prevalência da doença ser superior à média dos países desenvolvidos, este fator é acentuado pela falta de conhecimento sobre a doença e pelos diagnósticos errados. Dos casos em questão, cerca de 84% das pessoas desconhece ter anemia e apenas 2% da população é efetivamente tratada para a condição.

Esta é uma doença que impacta diretamente nas relações sociais dos indivíduos e podem resultar em implicações negativas no que toca ao rendimento laboral e também na própria vida familiar.

Outra das situações que entendemos ser necessária acautelar é a criação de programas de gestão do sangue do doente. Estes estão associados a uma menor utilização da transfusão, uma redução de custos hospitalares e melhores resultados dos outcomes dos doentes médicos e cirúrgicos.

A Comissão Europeia publicou, em 2017, dois documentos onde apresentou aos Estados-membros, orientações para a implementação de programas de gestão do sangue do doente, que se traduziam num conjunto de evidências clínicas onde se demonstrava que, em diversos cenários clínicos, a anemia e a perda de sangue podiam ser efetivamente tratados, com benefícios para o doente.

Também a Organização Mundial de Saúde aprovou, através da Resolução WHA63.12, um programa idêntico e que assenta em três pilares essenciais: «antes da cirurgia todas as medidas razoáveis devem ser tomadas para melhorar o próprio sangue do doente, para minimizar a perda de sangue e otimizar a tolerância fisiológica especifica do doente à anemia.»

É por isso necessário, através da criação de um plano nacional de gestão de sangue, inverter o cenário atual da prevalência desta doença em Portugal. A deteção precoce e tratamento da anemia e a minimização de perdas hemáticas são pontos-chave deste programa.

A identificação da deficiência de ferro e da anemia no adulto e o seu tratamento são a causa mais comum vista nos cuidados primários. Uma abordagem concertada com os diferentes profissionais envolvidos constitui uma oportunidade de contribuir para a solução do problema de saúde pública que constitui no nosso país a prevalência da anemia.

Sendo este um problema de saúde pública, é necessário, no entender do Bloco de Esquerda, a criação de compromissos no que diz respeito à literacia para este problema e nas formas de combate e prevenção de forma a inverter estes preocupantes números, por isso apresentamos a presente iniciativa legislativa, no sentido de se proceder à elaboração de um plano nacional de combate à anemia, que fomente a literacia para a saúde e a educação nutricional.

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Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo:

1 – Que elabore um Plano Nacional de Combate à Anemia através da criação de programas conjuntos

com a comunidade médica e educativa de forma a fomentar a literacia para a doença; 2 – Incluir nesse plano nacional medidas para que, ao nível da educação nutricional, fomentem a alteração

de hábitos que possam potenciar quadros de anemia; 3 – Que desenvolva ações de formação para a comunidade educativa de forma a saber identificar e

acompanhar casos que possam configurar quadros de anemia; 4 – Investir em meios técnicos, humanos e financeiros do Serviço Nacional de Saúde de forma a

responder eficazmente aos baixos números de diagnósticos e tratamentos da anemia em Portugal. 5 – Criação de um Plano Nacional de Gestão do Sangue do Doente, dotando os estabelecimentos e

serviços do Serviço Nacional de Saúde dos meios humanos, financeiros e técnicos adequados ao seu desenvolvimento e implementação.

Assembleia da República, 14 de outubro de 2020.

As Deputadas e os Deputados do BE: Moisés Ferreira — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 721/XIV/2.ª RECOMENDA AO GOVERNO QUE, COM URGÊNCIA, PROGRAME, AGENDE E EXECUTE AS

NECESSÁRIAS OBRAS PARA AMPLIAÇÃO E REQUALIFICAÇÃO DA ESCOLA SECUNDÁRIA DE PORTO DE MÓS

Exposição de motivos

A Escola Secundária de Porto de Mós precisa de obras urgentes de requalificação, de modo a salvaguardar a segurança dos cerca de 700 alunos que a frequentam.

A construção da escola, com mais de 40 anos, não foi, desde o início, a mais adequada: é tudo pré-fabricado e do tipo pavilhonar.

Os isolamentos dos sete blocos que compõem o edificado da escola da são deficitários, as caixilharias não têm qualidade e as coberturas são em amianto, à exceção das galerias que o Ministério da Educação substituiu recentemente.

Os muros de sustentação de terras estão na iminência de ruir e o pavimento exterior muito degradado, pondo em risco a segurança de alunos, professores e funcionários.

Os alunos queixam-se que nos meses de inverno passam frio nas salas de aulas. A direção do estabelecimento de ensino recorre a alguns aquecedores, mas com as condições térmicas que a escola tem acabam por ser ineficientes. No varão, o calor dentro das salas é, muitas vezes, insuportável.

Por outro lado, as instalações da Escola Secundária de Porto de Mós precisam de ser ampliadas para acolher os alunos da Escola Básica Dr. Manuel de Oliveira Perpétua, na Corredoura. Esta escola, do mesmo agrupamento, também precisa de obras de requalificação, sendo necessário proceder à transferência dos alunos dos 5.º e 6.º anos para que se realizem.

O Governo, através da Secretaria de Estado da Educação, manifestou, no início de 2020, abertura para que a ampliação e requalificação da Escola Secundária de Porto de Mós se pudesse concretizar, mas até à

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data nada foi feito. Nestes termos, o Grupo Parlamentar do CDS, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais

aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que programe, agende e execute as necessárias obras de reabilitação e ampliação da Escola Secundária de Porto de Mós, de modo a garantir as condições adequadas a uma escolaridade de qualidade, garantindo as verbas necessárias à sua concretização.

Palácio de São Bento, 7 de outubro 2020.

Os Deputados do CDS-PP: Telmo Correia — Cecília Meireles — João Pinho de Almeida — Ana Rita Bessa — João Gonçalves Pereira.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 722/XIV/2.ª RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROMOVA, COM URGÊNCIA, A AMPLIAÇÃO E REABILITAÇÃO

DA ESCOLA SECUNDÁRIA RAUL PROENÇA, DO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS RAUL PROENÇA, DO CONCELHO DAS CALDAS DA RAINHA, DISTRITO DE LEIRIA

Exposição de motivos

Construída no final dos anos 70, a Escola Secundária de Raul Proença, estabelecimento de ensino secundário e 3.º ciclo do ensino básico, pertencente ao Agrupamento de Escolas Raul Proença, com valorada avaliação pelo Ministério da Educação e amplo reconhecimento da qualidade do seu projeto educativo e percurso de qualificação dos seus alunos, tem vindo a assistir à acentuada e progressiva degradação das condições de habitabilidade, conforto e desadequação funcional do seu edificado.

A escola é composta por 4 edifícios modulares, ginásio e espaços exteriores de campos desportivos e zonas de estar.

No geral há um baixo desempenho físico-construtivo do espaço escolar com desgaste provocado pelo uso, pelo envelhecimento natural, e pelas patologias construtivas no interior das edificações e recinto exterior, bem como nas redes prediais.

Verifica-se desconforto térmico, acústico e lumínico no geral, e muito baixa eficiência energética, considerando os referenciais atualmente convencionados como obrigatórios/recomendados.

Nos edifícios dos blocos de salas de aulas existem problemas de impermeabilização e observam-se empolamentos das pinturas, desgaste da coloração das fachadas, eflorescências e fissuração nas paredes exteriores, vedantes das janelas ressequidos e estores danificados. Nas instalações sanitárias há maus cheiros e por vezes inundações.

Os pavimentos estão muito desgastados e têm falhas de reparações parcelares. Existem escadas e outros acessos não regulamentares. Os vãos exteriores apresentam caixilharia de alumínio com vidro simples. Não existe sistema de refrigeração/ventilação, o aquecimento de algumas salas é conseguido através da utilização de aquecedores de resistência elétrica. Os equipamentos informáticos e servidores estão obsoletos e cabos de alimentação estão à vista.

Urge uma intervenção que corrija os problemas construtivos manifestos, a reparação e/ou substituição parcial de redes de águas, esgotos e de eletricidade; uma adequação funcional tendo em conta a diversificação e qualificação dos espaços destinados ao ensino-aprendizagem, com relevância para laboratórios das ciências experimentais e espaços de práticas de educação física e desporto; as áreas e contextos de aprendizagem informal, que a evolução do modelo educativo e dos processos de ensino-aprendizagem exigem; a melhoria das condições de segurança e de acessibilidade e da eficiência energética e de sustentabilidade ambiental.

Apesar das várias solicitações à tutela, tem havido uma total ausência de programas integrados de

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intervenção, tendo ocorrido apenas intervenções pontuais e minimalistas do Ministério da Educação e da Direção Regional de Educação e investimento da liderança do agrupamento em ações de conservação, muitas vezes com os meios da escola e da autarquia.

Urge que o Ministério de Educação promova a reabilitação da escola em referência, a qual já foi por diversos interlocutores reconhecida como necessária e de que já foi presente, em cumprimento com o acordado em audiência da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Educação, contributos para um programa preliminar e estimativa orçamental em setembro de 2018.

De acordo com a informação do Gabinete da Secretária de Estado Adjunta e da Educação, recebida pela Câmara Municipal, após pronúncia de contestação, a Escola Secundária Raul Proença integra, como escola de intervenção prioritária, o mapeamento do Sistema Integrado de Gestão dos Estabelecimentos Escolares, que referencia as necessidades de investimento em novas estruturas educativas, bem como de «intervenções de requalificação e modernização de grande dimensão».

Conforme determinado no artigo 50.º do Decreto-Lei n.º 19/2019, de 30 de janeiro de 2019, que concretiza transferências de competências no domínio da educação, é ao departamento governamental que cabe assegurar o financiamento das operações em edifícios e equipamentos escolares, conforme prioridades definidas, inscrevendo-se a Escola Secundária Raúl Proença na priorização pelo critério definido na alínea b) do referido ponto 2 do artigo 50.º do referido Decreto-Lei como escola cujo estado de conservação, bem como os indicadores de utilização e conforto sejam inadequados ao desenvolvimento qualitativo dos respetivos projetos educativos.

Assim nos termos constitucionais e regimentais, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata apresentam o seguinte projeto de resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República

Portuguesa, recomendar ao Governo que realize com urgência a intervenção de ampliação e requalificação da Escola Secundária Raul Proença nas Caldas da Rainha e proceda à cabimentação dos recursos financeiros

Assembleia da República, 13 de outubro de 2020.

Os Deputados do PSD: Hugo Patrício Oliveira — Margarida Balseiro Lopes — Pedro Roque — Olga Silvestre — João Gomes Marques — Luís Leite Ramos — Cláudia André — António Cunha — Firmino Marques — Alexandre Poço — Carla Madureira — Isabel Lopes — Maria Gabriela Fonseca — Duarte Marques — Emídio Guerreiro — Hugo Martins de Carvalho — Isaura Morais — José Cesário — Maria Germana Rocha — Pedro Alves.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 723/XIV/2.ª PELA RETOMA DA ATIVIDADE ASSISTENCIAL NOS CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS

Após o surgimento dos primeiros casos do novo coronavírus SARS-CoV-2, no início de março, e da eclosão da pandemia em Portugal, foram tomadas uma série de medidas para garantir o distanciamento físico levando ao confinamento da generalidade dos cidadãos nas suas habitações, de modo a evitar a disseminação do vírus pela comunidade.

Atendendo a que este é um vírus novo, como tal não existe para já nenhuma vacina nem medicamentos eficazes para a COVID-19, que afeta de forma mais severa doentes de risco, em particular os mais idosos, o Serviço Nacional de Saúde dirigiu todos os esforços para dar resposta à doença, não só ao nível dos hospitais, como também nos cuidados de saúde primários. De um modo geral, enquanto os hospitais se concentraram nos casos severos, os centros de saúde tratavam da população que apresentava sintomas mais leves a moderados.

Os cidadãos reconheceram ao Serviço Nacional de Saúde, uma conquista do 25 de Abril, e aos seus

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profissionais, um papel determinante na resposta à crise de saúde pública. E com a pandemia ficou bem patente o subfinanciamento crónico e o desinvestimento a que foi sujeito o SNS ao longo dos anos (encerramento de unidades de saúde de proximidade, redução de valências de unidades hospitalares, degradação de instalações, falta de profissionais de saúde e de meios).

O facto de o foco estar centrado no novo coronavírus, numa altura em que mal se conhecia o vírus, teve um custo demasiado elevado no funcionamento e na resposta às outras doenças que foram relegadas para segundo plano, em patologias que não podiam esperar pelo diagnóstico, tratamento ou acompanhamento.

No que concerne aos hospitais, foram adiados praticamente todos os atos clínicos programados, como consultas e cirurgias, exames, entre outros serviços, sem que fosse feita, numa primeira fase, a reprogramação das agendas, salvaguardando os casos prioritários ou urgentes.

Quanto aos cuidados de saúde primários, centraram igualmente a sua capacidade de resposta no vírus, reorganizando-se de forma a alargar a resposta e a capacidade de controlar o avanço da contaminação, criando em muitas unidades de saúde áreas dedicadas à COVID-19 e reforçando o atendimento a potenciais infetados.

Todavia, foi genericamente descurada a resposta às outras doenças e condicionado o acesso dos utentes aos serviços de saúde. Desde o início da pandemia foram encerradas praticamente todas as extensões de saúde do país, os horários dos centros de saúde foram reduzidos e os atendimentos complementares foram suspensos.

Aliás, em algumas unidades de saúde, a COVID-19 foi um pretexto para encerrar muitos serviços e reduzir horários, ou para desabituar os utentes dos serviços de proximidade, provocando um receio legítimo de intenção de encerramento de unidades e serviços no futuro.

As consultas programadas deixaram de se realizar presencialmente, mantendo-se apenas as consultas para situações agudas. No entanto, em várias unidades de saúde os utentes passaram a ter de aguardar à porta do centro de saúde, sem qualquer abrigo, e noutros as pessoas passaram a ser atendidas ao postigo ou mesmo à janela.

Perante este cenário, muitas das consultas programadas realizaram-se à distância através de e-mail, telefone ou por outro meio. Embora a telemedicina possa ter um papel facilitador e complementar em determinadas circunstâncias, em nada substitui as consultas presenciais.

Acresce à situação de os utentes passarem a comunicar maioritariamente através de e-mail ou telefone, o facto de terem que aguardar tempos infinitos para que a sua chamada telefónica fosse atendida ou o e-mail respondido, questão motivada pela falta de recursos humanos e de meio técnicos.

As dificuldades no acesso aos serviços nos cuidados de saúde primários têm empurrado muitos utentes para as urgências dos hospitais (muitas vezes por recomendação do SNS 24, ao constatar que os centros de saúde se encontram encerrados ou com horário reduzido), ou a recorrerem ao setor privado (com gastos bastante consideráveis), ou simplesmente, a ficarem sem qualquer tipo de resposta clínica. Desde modo, casos sem gravidade para uma urgência, acabam no hospital justamente por não haver resposta a montante, o que traduz o número elevado de pulseiras verdes e azuis. Os hospitais, face a este cenário, estão a ficar com as urgências num caos com os tempos de espera a aumentar, prevendo-se que a situação venha a piorar devido ao novo coronavírus e às doenças da época, como a gripe sazonal.

Dados de 2017, referentes apenas às unidades de saúde familiar (USF), indicam que estas unidades contribuíram em média para evitar cerca de 650 mil idas às urgências por ano.

Se numa primeira fase havia desconhecimento por completo do vírus, hoje, face à investigação e literatura que tem sido produzida a nível mundial, embora ainda não tenhamos uma vacina segura e eficaz e tratamento da doença, e também face à experiência já acumulada nestes meses em que, no país e no mundo, se procura gerir a pandemia, temos mais conhecimento de como lidar com o novo coronavírus. Não obstante essa evidência, tarda a serem recuperados os serviços de diagnostico, tratamento e acompanhamento dos doentes nos hospitais, tal como não se compreende que passados sete meses ainda não tenha sido retomada e normalizada a atividade assistencial nos cuidados de saúde primários que foi profundamente afetada.

Seja pela falta de resposta direta, pelo facto dos utentes deixarem de procurar os serviços de saúde devido às condicionantes no acesso ou mesmo pelo receio de ficarem infetados com o vírus, desvalorizando por exemplo os sintomas de enfarte ou de AVC, constata-se que, desde março, o número de óbitos registado em Portugal tem sido muito superior à média dos últimos anos, muito para além das 2000 pessoas que faleceram vítimas de COVID-19.

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Tendo em conta que o novo coronavírus não pode servir de pretexto para terminar com serviços de saúde, encerrar unidades e reduzir horários, o Partido Ecologista «Os Verdes» considera que é necessário retomar a atividade assistencial, em particular nos cuidados de saúde primários, de forma a assegurar o acesso à saúde aos utentes e a aliviar a pressão sobre as urgências dos hospitais, evitando que venha a ser condicionada severamente a capacidade de resposta às situações urgentes e de extrema gravidade.

Importa, igualmente, salientar que a incumbência dos cuidados de saúde primários vai muito para além da resposta às situações de doença, tendo um papel decisivo no que concerne à sua prevenção. Por essa via, a retoma do normal funcionamento das unidades de proximidade pode contribuir decisivamente para o combate à COVID-19 através do reforço da informação e formação da população, dada a maior relação de confiança utente/médico de família, e prevenir ou atuar ao nível da saúde mental que tem sido agradava com a pandemia.

Assim, o Grupo Parlamentar de Os Verdes apresenta o seguinte projeto de resolução: Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República exorta o

Governo a: 1 – Repor os horários, reabrir as extensões de saúde, retomar o atendimento complementar nos centros

de saúde, que foram reduzidos ou suspensos com a eclosão da pandemia; 2 – Retomar a atividade assistencial dos cuidados de saúde primários, em particular as consultas

programadas, assegurando os cuidados necessários aos doentes; 3 – Proceder às intervenções necessárias nos centros de saúde, de forma a assegurar condições

adequadas nas áreas de espera e de atendimento aos utentes, evitando que aguardem à porta ou que sejam atendidos ao postigo;

4 – Garantir a contratação de mais profissionais de saúde para os cuidados de saúde primários, nomeadamente médicos, enfermeiros e secretários clínicos, assistentes operacionais, e outros profissionais;

5 – Assegurar a contratação de recursos humanos e de meios para outras unidades do SNS, como os hospitais de forma a assegurar os tempos de resposta garantidos, seja ao nível das consultas como das cirurgias.

6 – Assegurar os meios técnicos necessários, nomeadamente informáticos e de telecomunicações, para que haja uma resposta célere aos utentes, em particular garantindo o atendimento das chamadas telefónicas;

7 – Reforçar o fornecimento de material clínico e medicamentoso, cuja falta compromete a eficiente prestação dos cuidados;

8 – Reforçar a informação e formação a prestar aos utentes nos cuidados de saúde primários de maneira a prevenir a infeção pelo vírus SARS-CoV-2;

9 – Criar um programa específico nos cuidados saúde primários, de forma a prevenir, detetar e atuar ao nível da saúde mental.

Assembleia da República, 14 de outubro de 2020.

Os Deputados do PEV: Mariana Silva — José Luís Ferreira.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 724/XIV/2.ª RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROCEDA À VALORIZAÇÃO E PROMOÇÃO DO PANTEÃO

NACIONAL DE COIMBRA

Exposição de motivos

A Igreja de Santa Cruz, Panteão Nacional, situado na zona histórica de Coimbra, acolhe os túmulos de

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grandes vultos da história portuguesa, o de D. Afonso Henriques, primeiro Rei de Portugal e de seu filho e sucessor, D. Sancho I.

O primitivo edifício do mosteiro e igreja de Santa Cruz foi erguido entre 1132 e 1223, com projeto de mestre Roberto, conceituado artista do estilo românico, recebeu inúmeros privilégios papais e doações dos primeiros reis de Portugal, tornando-se a mais importante casa monástica do reino, contribuiu para o desenvolvimento cultural, económico e político do País.

Da época românica pouco resta, uma vez que, no século XVI, foram executadas grandes reformas e obras de restauro e alargamento da casa monástica, promovidas pelos reis D. Manuel I e D. João III. O grande destaque destas reformas cai inteiramente nos túmulos reais de D. Afonso Henriques e de D. Sancho I.

Em 2003 a igreja de Santa Cruz é reconhecida como Panteão Nacional, título justificado não só pelo facto de a igreja ser o local de repouso do primeiro rei de Portugal, mas também do seu filho e segundo monarca do país, coroado na Sé de Coimbra em 1185.

Esse estatuto é repartido desde 2016 com o Mosteiro dos Jerónimos (Lisboa) e com o Mosteiro de Santa Maria da Vitória (Batalha) mantendo-se a Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa, como o Panteão Nacional original desde 1836.

Assim, face à relevância deste importante património nacional, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Proceda à valorização que o Panteão Nacional de Coimbra exige e lhe é devida, enquanto monumento

onde se encontra sepultado o Primeiro Rei de Portugal e seu filho e sucessor, D. Sancho I; 2 – Insista, em articulação com a autarquia, na conveniente dignificação da área envolvente; 3 – Promova a sua divulgação, conhecimento e visitação como um dos locais mais relevantes da História

de Portugal. Assembleia da República, 12 de outubro de 2020.

Os Deputados do PSD: Ricardo Baptista Leite — António Maló de Abreu — Paulo Rios de Oliveira — Mónica Quintela — Paulo Leitão — Fernanda Velez — Cláudia Bento — Helga Correia — Filipa Roseta — Alexandre Poço — Carla Borges — Isabel Lopes — Olga Silvestre — António Ventura — João Moura — Cláudia André — Sérgio Marques — Firmino Marques — Carlos Silva.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 725/XIV/2.ª TORNA GRATUITA A LINHA COVID LARES

Algumas entidades e empresas que prestavam serviços públicos obrigavam os utentes a pagar somas significativas pelas respetivas chamadas, uma vez que disponibilizam números de valor acrescentado, como é o caso dos designados números únicos com o prefixo «707» e «708».

Os custos poderiam ser mais elevados consoante o tempo de espera no atendimento ou pelo facto das linhas terem instruções lentas, longas e com múltiplas possibilidades de escolha, prática que prolonga ainda mais o tempo de duração da chamada, e, consequentemente, agrava o respetivo valor. Aliás, o recurso a tais números para contacto telefónico tem merecido a contestação de muitos cidadãos e de associações de consumidores.

Por proposta do Partido Ecologista «Os Verdes», as entidades públicas e empresas que prestam serviços públicos passaram a estar impossibilitadas de disponibilizarem números especiais de valor acrescentado com prefixo «7» (artigo 9.º da Lei n.º 7/2020, de 10 de abril), e ficaram, também, sujeitas a facultar uma alternativa

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aos números especiais, com os prefixos «808» e «30», através de números telefónicos com o prefixo «2». Com esta medida, que resultou do Projeto de Lei, do PEV, n.º 258/XIV/1.ª, milhares de cidadãos e

inúmeras empresas deixaram de despender quantias exorbitantes pelas chamadas telefónicas para números de valor acrescentado, quando têm chamadas «gratuitas» para a rede fixa, incluídas nos serviços de telecomunicações subscritos.

Apesar das entidades públicas e empresas que prestam serviços públicos estarem impossibilitadas de recorrerem a linhas de valor acrescentado de prefixo «707» foi, todavia, criada no passado dia 2 de outubro, uma linha de valor acrescentado – 707 207 070 – pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, em parceria com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e a Algarve Biomedical Center, designada de «Linha COVID Lares» para apoio aos lares, para esclarecimento de dúvidas e prestação informações, mas também com o propósito de agilizar os contactos entre as diferentes entidades locais.

A criação de uma linha de valor acrescentado de prefixo «707», para além de ir contra com o que está estabelecido no artigo 9.º da Lei n.º 7/2020, irá acarretar custos desnecessários para os lares (0,10 € ou 0,25 € por minuto, mais IVA, consoante a chamada é de rede fixa ou rede móvel, respetivamente), quando os valores seriam mais reduzidos ou mesmo inexistentes através de uma linha de prefixo «2» (rede fixa), ou através da disponibilização de um número gratuito.

O facto de a linha utilizar um número de valor acrescentado, para além de favorecer as empresas de telecomunicações, leva a que o próprio proprietário da linha receba ainda dinheiro pelas chamadas rececionadas pagas, neste caso, pelos lares.

Tendo em conta a importância de uma linha para dar apoio às Estruturas Residenciais Para Idosos, Os Verdes, tal como defenderam a gratuitidade da Linha SNS 24 (808 24 24 24), consideram que a Linha COVID Lares deve ser também disponibilizada gratuitamente ao contrário do que sucede com o atual número 707 207 070 que tem um custo elevado para quem efetua a chamada.

Não podendo deixar passar esta questão, e sabendo que existe um princípio estabelecido na lei que o Estado deve, obviamente, cumprir, o Grupo Parlamentar de Os Verdes apresente o seguinte projeto de resolução:

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República resolve

recomendar ao Governo que altere urgentemente o número da Linha COVID Lares, atualmente com prefixo «7», para um número de prefixo «800», de forma tornar esta linha gratuita para os lares que efetuam as chamadas e de modo a cumprir a Lei n.º 7/2020, de 10 de abril.

Assembleia da República, 14 de outubro de 2020.

Os Deputados do PEV: José Luís Ferreira — Mariana Silva.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 726/XIV/2.ª PELA CRIAÇÃO DA ORDEM PROFISSIONAL DOS JORNALISTAS E CONSEQUENTE EXTINÇÃO DA

ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL

Exposição de motivos

A comunicação social é considerada o quarto poder, uma denominação que não é um mero acaso. O papel que os jornalistas desempenham na formação e informação da opinião pública é deveras relevante

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e, por conseguinte, o escrutínio e a proteção a estes profissionais não devem ser descurados. Pese embora seja tido como o quarto poder de uma democracia, a verdade é que não depende de dinheiro

público – com exceção do canal público e da rádio pública – e, por isso, a sua base de financiamento resume-se a pouco mais do que à publicidade.

Chegados aqui não será novidade para ninguém que se diga que o jornalismo enfrenta uma série crise. Esta crise financeira leva a uma crise de valores, pois os jornalistas são obrigados a tornar o seu produto apetecível para o leitor, embelezando-o como se de uma embalagem de bombons se tratasse.

Esta mesma crise que ataca os meios de comunicação social em Portugal acaba por ter graves consequências no trabalho diário dos jornalistas que, também não é novidade para ninguém, auferem vencimentos desenquadrados com a exigência e com a responsabilidade das suas funções.

A falta de condições salariais, associada à falta de condições de trabalho, só pode ser combatida com a criação de uma ordem profissional dos jornalistas, tal como já acontece com muitas outras profissões.

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social tem mostrado ter um papel pouco preponderante no acompanhamento dos profissionais deste sector, envolvendo-se apenas quando surgem denúncias e deixando os jornalistas à mercê das vontades dos grandes grupos económicos.

Por tudo isto – que coloca em causa a função do jornalismo – e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado único do Chega propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

– Crie a Ordem Profissional dos Jornalistas para que esta profissão seja devidamente regulada e os seus

profissionais protegidos, substituindo desta forma a Entidade Reguladora da Comunicação Social. Assembleia da República, 13 de outubro de 2020.

O Deputado do CH, André Ventura.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 727/XIV/2.ª RECOMENDA AO GOVERNO O REFORÇO DE MEIOS E RECURSOS HUMANOS NA DIREÇÃO-

GERAL DA SAÚDE DE MODO A ALARGAR A DIVULGAÇÃO DE INDICADORES BÁSICOS SOBRE A COVID-19

Recentemente, vários especialistas portugueses alertaram para a falta de dados públicos sobre a epidemia provocada pela COVID-19, numa longa lista que todos consideram que faz falta, mas não são divulgados pela Direção-Geral da Saúde (DGS).

Entre outros, menciona-se na edição de 10 de outubro do semanário Expresso, que «sempre que o número de doentes em cuidados intensivos desce, não se sabe se é por boa ou má razão. Tanto pode ser mais uma morte, como mais um recuperado. Não há dados que o mostrem, tal como não se sabe quantas pessoas recuperam depois de passar pelos cuidados intensivos ou como é que evoluem as idades médias dos doentes que precisam de ser hospitalizados ou ventilados».

O número diário de surtos ativos e respetiva localização, a evolução do peso das comorbilidades nos infetados e dos óbitos, os dados sobre os principais locais onde o contágio está a ocorrer, são também exemplos da lista de dados que, não obstante serem recolhidos e, à partida, não envolverem questões de privacidade, não são disponibilizados publicamente pela DGS.

Faltam dados quanto aos grupos etários dos doentes internados, impedindo assim a possibilidade de confirmação da existência, ou não, de algum padrão, e não se sabe o tempo médio de internamento das pessoas admitidas em unidades hospitalares, não sendo por isso possível medir o impacto imediato e a prazo no Serviço Nacional de Saúde (SNS).

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Conhece-se muito pouco, ou praticamente nada, sobre quem são os doentes que precisam de cuidados intensivos, quantos ali entram e quantos saem por dia, qual a letalidade nas várias unidades, qual a duração média do internamento e qual a idade média dos admitidos ou como estão distribuídos, geograficamente, por nível etário ou por género. Estes dados são recolhidos e tratados detalhadamente por cada hospital, faltando centralizá-los e torná-los públicos.

Relativamente ao contexto do contágio, os especialistas referem que apesar de o número de novos casos confirmados ser divulgado diariamente, as idades passaram a ser divulgadas apenas através de um gráfico no boletim, faltando a mediana das idades dos infetados que permite, por exemplo, antecipar a probabilidade de agravamento.

Também não são disponibilizados dados públicos sobre os locais mais frequentes do contágio, ou seja, se é em contexto familiar, laboral, social ou até, por exemplo, em instituições como os lares, ou até nos transportes públicos, que se mantêm como uma grande interrogação. Esta informação permitiria perceber as cadeias de transmissão e identificar sectores profissionais onde a transmissão ocorre com mais frequência. A percentagem diária de testes positivos, divulgada noutros países, é outro dos indicadores em falta.

O número de surtos ativos devia ser atualizado e divulgado regularmente, por forma a poder acompanhar-se a evolução dos surtos em escolas, lares ou locais públicos.

Não é conhecida a evolução do número de profissionais de saúde que dia a dia fazem o rastreamento de contactos dos casos positivos, nem o rácio por região, bem como não é divulgado o indicador das chamadas atendidas e não atendidas na linha SNS 24.

Em relação a doenças prévias, conhecem-se os grupos de risco, mas não se sabe como tem evoluído a presença de doenças prévias nos casos confirmados e, consequentemente, qual o peso das diferentes comorbilidades entre os infetados, internados ou nos óbitos.

Quanto aos óbitos, apenas é divulgada informação por grandes regiões, e não por concelho, deixou de estar disponível o quadro da distribuição dos óbitos por grupos etários, sendo apenas feita a distribuição por género, não se conhece quantas pessoas morreram em hospital, em casa ou em instituições, e quantas destas passaram por cuidados intensivos.

De acordo com os especialistas estes dados são fundamentais para conhecer a evolução da epidemia e a sua gravidade, podendo também servir para alertar ou tranquilizar a população e fundamentar decisões que restrinjam direitos dos cidadãos a bem da saúde pública.

Os problemas quanto aos dados disponibilizados, incluindo, em alguns casos, dúvidas sobre a sua fiabilidade, não é exclusivo de Portugal, e tem sido referenciado em vários países. Mas, por outro lado, e tal como se refere, em Portugal, não há um repositório oficial com todo o histórico dos dados, sendo necessário percorrer os 220 boletins diários, publicados desde março, para o conseguir. E recentemente os boletins diários da DGS deixaram de incluir alguns dos quadros que eram usados por epidemiologistas, médicos e investigadores para monitorizar a evolução da COVID-19.

A falta de investimento, tanto para poder melhorar a qualidade desses dados como para os tratar, é uma das causas apontadas para a falta de divulgação de indicadores básicos sobre a COVID-19.

Neste enquadramento, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do CDS-PP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos do disposto do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da

República Portuguesa, recomendar ao Governo a divulgação periódica e regular de um conjunto de indicadores básicos sobre a COVID-19, nomeadamente:

a) Caracterização dos internamentos: divulgação dos grupos etários dos doentes internados, do número de

pessoas admitidas que ficam mais de 24 horas internadas, e do tempo médio de internamento; b) Evolução dos internamentos em cuidados intensivos: disponibilização da caracterização dos doentes

que precisam de cuidados intensivos, quantos entram e quantos saem por dia, qual a letalidade, qual a duração média do internamento, qual a idade média dos admitidos, e qual a distribuição por grupos etários e por género;

c) Contexto do contágio: divulgação da mediana das idades dos infetados, divulgação de dados públicos

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sobre os locais mais frequentes do contágio e divulgação da percentagem diária de testes positivos; d) Surtos ativos: atualização regular de informação sobre surtos em escolas, lares e locais públicos,

nomeadamente localidades com maior aumento da incidência, e medidas tomadas; e) Rastreadores de contactos: divulgação do número de profissionais de saúde que diariamente garantem

o rastreamento de contactos dos casos positivos, bem como o rácio por região, e divulgação do número das chamadas atendidas e não atendidas na linha SNS 24;

f) Doenças prévias: divulgação dos dados respeitantes à evolução das diferentes comorbilidades entre os infetados, internados e nos óbitos;

g) Óbitos por localização: divulgação do número de óbitos por concelho, disponibilização dos quadros de distribuição por grupos etários, divulgação diferenciada do número de óbitos em contexto hospitalar, casa ou outras instituições e divulgação da percentagem que passou por cuidados intensivos.

Palácio de São Bento, 14 de outubro de 2020.

Os Deputados do CDS-PP: Ana Rita Bessa — Telmo Correia — Cecília Meireles — João Gonçalves Pereira — João Pinho de Almeida.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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